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O estudo da agricultura sob o modo capitalista de produção tem-se caracterizado pelo debate
político entre as muitas correntes de pensamento que dedicam atenção especial ao campo.
Todos procuram de uma forma ou de outra, entender o processo de desenvolvimento do
modo capitalista de produção em sua etapa monopolista. Essa etapa, por sua vez, apresenta traços
típicos como a presença de grandes complexos industriais a integrar a produção agropecuária. Esse
processo contínuo de industrialização do campo traz na sua esteira transformações nas relações de produção
na agricultura, e, conseqüentemente, redefine toda a estrutura socioeconômica e política no campo.
Para exemplificar essa colocação, basta lembrar os movimentos grevistas dos bóias-frias de
Guariba, em São Paulo no ano de 1984. Nesse caso, a greve dos cortadores de cana-de-açúcar e dos
apanhadores de laranja foi eminentemente urbana. Trabalhadores rurais fazendo greves nas cidades
— esse é o fato qualitativamente novo no campo brasileiro. Esse fenômeno decorre de alterações nas
relações de produção na agricultura, pois agora a colheita pode ser feita pelas indústrias de suco, no caso
da laranja. A etapa final do processo produtivo no campo (aquela que emprega ainda o maior
contingente da força de trabalho) não é mais controlada pelo agricultor. Fracionou-se o processo
produtivo em função da necessidade tecnológica da indústria.
Outra característica das relações de produção no campo sob o modo capitalista de produção
decorre do fato de que a força de trabalho familiar tem um papel muito significativo e vem
aumentando numericamente de modo expressivo. Para exemplificar esse fato, basta lembrar o caso
brasileiro, em que ela representa mais de 80% da força de trabalho empregada na agricultura, ou
então recorrer ao exemplo norte-americano, cujas pesquisas recentes mostram uma participação
massiva das family farms, isto é, da produção baseada no trabalho familiar. Assim, a agricultura norte-
americana também não tem seu suporte nas corporate farms e sim nas family farms. Esse mesmo fenômeno
ocorre também na maioria dos países da Europa.
Procurando entender essas e outras transformações que o campo vem sofrendo, surgem inúmeras
Ariovaldo Umbelino de Oliveira
correntes de interpretação dessas realidades. De uma maneira geral, poder-se-ia dizer que todos os
estudiosos da questão agrária concordam, tanto para o campo como para a cidade, com o processo de
generalização progressiva por todos os ramos e setores da produção, e do assalariamento, relação de
produção específica do modo capitalista de produção. No entanto existem discordâncias quanto à
interpretação do processo. Para uns, ele leva inevitavelmente à homogeneização: a formação de um
operariado único num pólo, e de uma classe burguesa no outro. Para outros, esse processo é
contraditório, portanto heterogêneo, o que leva a criar obviamente, no processo de expansão do
assalariamento no campo, o trabalho familiar camponês.
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1.1. A destruição dos camponeses e a modernização dos latifúndios
Outra corrente teórica que procura entender o desenvolvimento da agricultura sob o capitalismo é aquela
que vê nos camponeses e nos latifúndios as evidências da permanência de relações feudais de produção.
Essa corrente parte do princípio de que há uma penetração das relações capitalistas no campo. De
certo modo crêem esses autores que há uma dualidade em jogo: um setor urbano industrial capitalista
nas cidades e um setor feudal, semifeudal, pré-capitalista, atrasado no campo. Esses autores entendem que a
penetração das relações capitalistas no campo ocorre a partir do rompimento das estruturas que
garantem a coerção extra-econômica, ou seja, particularmente a partir do rompimento com as estruturas
políticas tradicionais de dominação. Acreditam mesmo que a economia colonial (expressão da política
mercantilista dos países europeus) é caracterizada por instituições políticas e jurídicas feudais, que são os
instrumentos necessários à dominação econômica das metrópoles.
Essa teoria contempla o processo de separação fundamental que ocorre na produção camponesa em
função da penetração das relações tipicamente capitalistas no campo. Esse processo passaria por três
fases distintas:
a) Haveria a destruição da chamada "economia natural", o que criaria o produtor individual, o
agricultor propriamente dito. Isso ocorreria em função da separação do camponês, pequeno
produtor familiar de subsistência, dos estreitos vínculos e hierarquias comunitárias tradicionais.
b) Uma vez criado pelo processo anterior, o camponês, agora produtor individual, ver-se-ia
forçado a abandonar a pequena indústria doméstica, tornando-se exclusivamente agricultor.
Esse processo dar-se-ia pela sua introdução cada vez maior na economia de mercado. Assim,
essa fase caracterizar-se-ia pela separação da indústria rural e a agricultura.
Ariovaldo Umbelino de Oliveira