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Ergonomia

Ergonomia

Fabiana Raulino da Silva


© 2017 por Editora e Distribuidora Educacional S.A.
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Lidiane Cristina Vivaldini Olo

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

Silva, Fabiana Raulino da


S586e Ergonomia / Fabiana Raulino da Silva. – Londrina :
Editora e Distribuidora Educacional S.A., 2017.
208 p.

ISBN 978-85-522-0139-7

1. Ergonomia. I. Título.

CDD 620.82

2017
Editora e Distribuidora Educacional S.A.
Avenida Paris, 675 – Parque Residencial João Piza
CEP: 86041-100 — Londrina — PR
e-mail: editora.educacional@kroton.com.br
Homepage: http://www.kroton.com.br/
Sumário

Unidade 1 | Ergonomia: conceitos e história 7

Seção 1.1 - Conceituação, históricos e diretrizes da ergonomia 9


Seção 1.2 - Domínios e abordagens da ergonomia 25
Seção 1.3 - Diagnose ergonômica do sistema humano x tarefa 39

Unidade 2 | Macroergonomia 55

Seção 2.1 - Etapas, métodos e técnicas da intervenção ergonômica 57


Seção 2.2 - Fisiologia humana e sobrecargas no trabalho 71
Seção 2.3 - Atividade do ergonomista 89

Unidade 3 | Legislação voltada para a Ergonomia 103

Seção 3.1 - NR 17 e anexos 105


Seção 3.2 - Ergonomia e os Sistemas de Gestão Integrados 120
Seção 3.3 - Legislação, Normas e Regulamentações 134

Unidade 4 | Aplicação da Ergonomia 153

Seção 4.1 - Projetação ergonômica do sistema humano x tarefa x máquina 157


Seção 4.2 - Aspectos psicológicos, cognitivos e mentais 171
Seção 4.3 - Critérios e estimativas 187
Palavras do autor
Prezado aluno, estamos felizes que esteja iniciando seus estudos
na disciplina de Ergonomia. Essa ciência tem como objetivo principal
adaptar as condições de trabalho às pessoas que o executam, de
forma a garantir maior segurança, saúde e desempenho eficiente.
Dessa forma, através da ergonomia, podemos analisar o trabalho de
perto e de forma sistêmica, compreendendo sua realidade e, assim,
realizando ajustes que considerem as necessidades, habilidades
e limitações das pessoas. Portanto, reflita sobre a importância de
estudar essa disciplina! Ao longo de sua trajetória profissional, você
será desafiado a reconhecer aspectos do trabalho que necessitam de
intervenção e poderá realizá-la com maior domínio técnico-científico.
Existe uma obrigatoriedade legal de todas as empresas realizarem
uma análise ergonômica do trabalho para identificar e propor
melhorias aos problemas existentes. No Brasil, essa obrigatoriedade
surge da Norma Regulamentadora 17, do Ministério do Trabalho e
Emprego. Além de se ater às questões de fiscalização e multas,
empresas de todos os segmentos têm aumentado seus interesses na
ergonomia não apenas para atender à legislação mas também para
melhorar seus processos e reduzir os riscos de acidentes e doenças
do trabalho.
Portanto, na Unidade 1 desta disciplina, aprenderemos sobre
os conceitos, as abordagens e os domínios da ergonomia,
compreendendo sua origem e formas de aplicação. Em seguida, na
Unidade 2, estudaremos a metodologia da Análise Ergonômica do
Trabalho, com suas etapas, abordagem interdisciplinar e compreensão
da atuação do ergonomista. Na Unidade 3, avançaremos entendendo
a ergonomia pela perspectiva legal, compreendendo quais leis,
normas regulamentadoras e normas técnicas possuem interlocução
com essa ciência. Por fim, concluímos nossos estudos com a Unidade
4, que tratará da aplicação da ergonomia na prática, abordando sua
ação social, as formas de contrato, os tipos de projeto e as formas
de atuação para implantar as transformações no trabalho. Assim,
convidamos você a iniciar essa jornada que abordará conhecimentos
sobre o corpo humano, sistemas e história do mundo do trabalho.
Então, vamos começar nossos estudos!
Unidade 1

Ergonomia: conceitos e
história

Convite ao estudo
Prezado aluno,

Vamos começar a nos familiarizar com os conceitos


e as metodologias da ergonomia. Desta forma, você irá
compreender que nem sempre o trabalho está adequado às
características físicas e mentais das pessoas, podendo levar a
acidentes e ao adoecimento. Nesta primeira unidade de ensino,
entenderemos como as transformações no mundo do trabalho
levaram ao surgimento de aspectos que consideram cada vez
menos as necessidades do ser humano. Hoje, tudo está mais
rápido e informatizado. As empresas querem ter cada vez mais
padrões de qualidade e processos controlados, criando regras
e métodos que, muitas vezes, desconsideram o ser humano e
suas necessidades.

Nesta unidade, você conhecerá os conceitos de ergonomia,


o histórico do mundo do trabalho e como as pessoas podem
adoecer por problemas existentes na interação entre o ser
humano com outros elementos ou sistemas. Ao finalizar as
Unidades 1, 2 e 3, você terá compreensão de todas as etapas
para se realizar uma Análise Ergonômica do Trabalho e
propor soluções para transformar o que não está adequado.
Finalizaremos com a Unidade 4, na qual aprofundaremos
nossos conhecimentos a respeito de como a ergonomia pode
transformar o mundo do trabalho socialmente e quais os tipos
de projetos e atuações são possíveis dentro dessa abordagem.

Ao final da Unidade 1, você terá atingido os objetivos do


estudo e será capaz de responder o que é a ergonomia, como
ela é regulamentada no Brasil, e quais são seus principais
objetivos como ciência. Além disso, saberá os princípios da
interação do ser humano com outros elementos e sistemas,
aspectos do trabalho real, diferenças entre tarefa e atividade, a
importância da compreensão do trabalho e como realizar uma
diagnose ergonômica.

Para facilitar a compreensão dos conteúdos, será apresentada


uma situação hipotética, na qual você é chamado para fazer
parte de uma equipe de prevenção a riscos ergonômicos de
uma empresa do ramo de cosméticos. A equipe é constituída
por um médico do trabalho, um engenheiro, um técnico de
segurança e quatro trabalhadores do setor de produção. É a
primeira vez que a empresa cria uma equipe para analisar as
questões voltadas à ergonomia, e nenhum dos integrantes tem
experiência na área. Você, que está iniciando seus estudos na
área, é o que mais conhece a respeito dessa ciência, e o dono
da empresa pede que você oriente os demais membros dessa
equipe sobre a importância da ergonomia e sobre os principais
aspectos que deverão ser analisados para, posteriormente,
serem indicadas propostas de melhoria. Dentro desse cenário,
você consegue imaginar como pode orientar a equipe para
que esse trabalho seja realizado de maneira que todos estejam
alinhados?

Em cada seção desta unidade, você irá aumentar seus


conhecimentos em ergonomia e irá ajudar sua equipe a
compreender o que, sua importância na empresa e quais
as vantagens de se ter processos e elementos que sejam
adequados a todos.

Você será o principal responsável pelo sucesso dessa equipe


e pelas melhorias nos processos da empresa. Vamos iniciar
nossos estudos! Lembre-se de que passamos grande parte da
nossa vida trabalhando. Todo trabalho se reflete profundamente
na vida e na felicidade da pessoa que o executa. Desperte o
ergonomista que existe em você e vamos aprender a transformar
o trabalho das pessoas para que elas tenham o máximo de
conforto, segurança e desempenho eficiente!
Seção 1.1
Conceituação, históricos e diretrizes da ergonomia
Diálogo aberto
Relembrando a situação-problema do Convite ao estudo, você
é um profissional de uma empresa do ramo de cosméticos e o
único integrante da equipe que sabe sobre ergonomia. O dono da
empresa chama você para uma conversa para alinhar como será a
primeira reunião com a equipe que irá analisar e atuar de maneira
prevencionista com relação aos riscos ergonômicos existentes no
local de trabalho. Pelo discurso dele, você percebe que ele relaciona
ergonomia apenas a aspectos de postura e mobiliário, e que não
tem claras a importância e a forma como deve atuar frente a essas
questões. O norteamento dessa conversa será essencial para iniciar
os trabalhos com a equipe. Dessa forma, como você explicaria o que
é ergonomia? Qual a importância da ergonomia nas empresas? Quais
vantagens para a empresa e para o trabalhador são obtidas por meio
da ergonomia?
Para que você consiga responder a esses e outros questionamentos,
esses conteúdos serão abordados de forma contextualizada na seção
Não pode faltar. Bons estudos!

Não pode faltar

Quando pesquisamos sobre ergonomia, especialmente em


buscas pela internet, encontramos assuntos ligados à postura e ao
mobiliário. Mas, afinal, o que é ergonomia?

Ergonomia: conceito e definições


Ergonomia é a ciência que visa entender como o ser humano
interage com outros sistemas e elementos do trabalho e modificar
essa interação para que haja maior conforto, segurança e desempenho
eficiente. Em outras palavras, é seu papel planejar, fazer projetos,
avaliar tarefas, postos de trabalho, sistemas, metas, ritmos, ambientes

U1 - Ergonomia: conceitos e história 9


e outros elementos, a fim de propor mudanças para otimizar o bem-
estar do ser humano e o desempenho global do sistema.
Imagine que uma pessoa trabalha na portaria de um prédio. Se
você perguntar a qualquer um o que ela faz, irão dizer que apenas
faz controle de entrada e saída de pessoas e materiais. Mas é muito
mais que isso! Apenas quem realiza o trabalho sabe a realidade de seu
dia a dia. Será que essa pessoa recebeu um bom treinamento para
realizar seu trabalho? Ou aprendeu sozinha? Ela sabe executar todas
as funções? Ou até hoje cria estratégias para não lidar com o que não
sabe (por exemplo, escrever informações em um papel em vez de
acessar um sistema difícil de manusear)? Essa pessoa possui um bom
sistema de computador, de fácil entendimento e ágil que auxilie em
sua tarefa? A iluminação da guarita é adequada? Existe algum horário
em que ela não dá conta de atender a todas as demandas ao mesmo
tempo? Essa pessoa precisa se comunicar com outras para fazer seu
trabalho? Ela sempre tem todas as informações necessárias? Esses
são apenas alguns questionamentos para que perceba que todo
trabalho é complexo. Uma visão sistêmica de tudo que acontece é
essencial para que possamos melhorar o trabalho.
O nosso trabalho possui algumas regras e métodos que
não favorecem as nossas escolhas e atitudes. Mesmo que haja
dificuldades, erros, problemas e limitações, o interesse do trabalhador
é sempre usar seu corpo e sua inteligência para atingir os resultados
esperados. Muitas vezes, o esforço é tanto que a pessoa adoece, se
distrai ou precisa criar mecanismos auxiliares para que possa realizar
seu trabalho, o que pode levar à perda de tempo e retrabalho.
Isso tudo acontece porque nem sempre quem cria o trabalho é
quem o executa. Muitas vezes, seu trabalho está sendo controlado
por pessoas e sistemas que não interagem diretamente com você,
o que faz com que não percebam alguns aspectos da realidade que
influenciam diretamente no seu fazer profissional.
Algumas empresas são tão grandes e possuem tantos
departamentos que a informação se perde. São vistos apenas os
números, as vendas, e são propostas reuniões e ações que não
condizem com a realidade. Nem sempre os trabalhadores se sentem
seguros para expor suas ideias e dificuldades, e, muitas vezes, essas
dificuldades são vistas como “parte do negócio”, “o trabalho é assim
mesmo”, “se não aguenta, vai embora”. Dessa forma, inúmeras

10 U1 - Ergonomia: conceitos e história


empresas possuem um número gigantesco de pessoas com
afastamentos médicos e com uma alta rotatividade de funcionários
que não suportaram trabalhar nas condições impostas.
Situações como essas não acontecem apenas em grandes
empresas. Empresas de todos os portes e segmentos possuem suas
características particulares e problemas relacionados À ergonomia.
É por isso que, no Brasil, existe a Norma Regulamentadora 17, do
Ministério do Trabalho e Emprego, criada para regulamentar a
ergonomia em todas as empresas do país. Nessa norma é citado
que todas as empresas são obrigadas a realizar a Análise Ergonômica
do Trabalho, feita por um ergonomista, profissional que possui
conhecimento na área, e tem como objetivo compreender o
trabalho real para realizar transformações que melhorem a saúde e o
desempenho das pessoas e do sistema.
Todos nós sabemos algo sobre o trabalho por experiência
própria ou pelo que pessoas próximas já nos contaram. Se você
pensar bem, conseguirá se lembrar de alguma situação de trabalho
e de alguns aspectos que poderiam afetar seu desempenho, sua
segurança e sua saúde.
Mas como analisar as situações de trabalho sem que nossa base
seja apenas nosso julgamento e percepções pessoais? A ergonomia
traz uma metodologia de estudo em que a compreensão do
trabalho real acontece em etapas, sempre discutindo quais são as
incongruências entre o que se espera e o que realmente acontece
no trabalho. O ergonomista exerce papel imparcial e relata todos os
aspectos do sistema e da atividade humana que devem ser revistos
para melhorar o trabalho.

Histórico: as mudanças no mundo do trabalho


Se pensarmos no conceito de ergonomia, ela existe desde a Idade
da Pedra. O homem, ao criar utensílios de pedra lascada, descobrir
o fogo e inventar a roda, já estava melhorando as condições de seu
trabalho. Porém, como ciência, o termo ergonomia foi utilizado
apenas em 1857 pelo polonês Jastrzebowski, em um trabalho
intitulado Ensaios da ergonomia, ou ciência do trabalho, baseada nas
leis objetivas da ciência sobre a natureza. O termo vem das palavras
gregas ergon (trabalho) e nomos (regras).

U1 - Ergonomia: conceitos e história 11


Veremos mais detalhes sobre o histórico da ergonomia no Brasil e
no mundo na Unidade 3, mas, para este momento, é importante que
lembremos as transformações do mundo do trabalho ao longo dos
anos para assim entender o contexto socioeconômico da ergonomia
e a importância dessa ciência nas empresas.
Antes do ano de 1700, o trabalho era predominantemente artesanal.
Artesãos realizavam seu trabalho com seus próprios métodos e no
tempo que conseguiam. Tudo era único. Cada um prestava um serviço
e fabricava um produto de forma única e do seu próprio jeito. Com
a Revolução Industrial e a chegada de máquinas, do motor a vapor e
a constante industrialização dos processos, tornou-se necessária uma
organização dos trabalhadores, agora dentro das empresas.
Tudo ficou mais rápido e automatizado. Houve uma grande
divisão das tarefas. Trabalhadores passaram a ser especializados em
fragmentos do processo, e não mais na construção do todo, como
ocorria com os artesãos.
Assim, surge a Administração Científica do Trabalho, trazida
por Frederick Winslow Taylor. As empresas passam a mapear os
processos e a cronometrar cada ação de cada trabalhador. Em
1911, Taylor apresenta os princípios fundamentais da Administração
Científica: substituição de métodos empíricos por procedimentos
científicos (o trabalho deve ser planejado e testado, seus movimentos
decompostos a fim de reduzir e racionalizar sua execução);
selecionar os operários de acordo com as suas aptidões e, então,
prepará-los e treiná-los para produzirem mais e melhor; controlar
o desenvolvimento do trabalho para se certificar de que está sendo
realizado de acordo com a metodologia estabelecida e dentro da
meta; distribuir as responsabilidades para que o trabalho seja o mais
disciplinado possível.
Imagine: a alta repetitividade de gestos, cada trabalhador isolado
em sua tarefa sem conhecer o todo, a falta de significado no trabalho,
a pressão por produtividade, a indução de ritmos e a maquinação. Isso
tudo trouxe uma disciplina que reduziu o ser humano a um simples
realizador de tarefas.
Em seguida, baseado nos ensinamentos de Taylor, surge Henry
Ford, nos Estados Unidos, e implanta a Linha de Produção. Agora,
posicionadas ao longo de uma esteira ou linha, as pessoas passam a
produzir grandes volumes a baixo custo.

12 U1 - Ergonomia: conceitos e história


Naquela época, nas fábricas da Ford, centenas de pessoas de
diversos países eram treinadas para fazerem tarefas fragmentadas.
Elas vinham de diversos lugares do mundo e aprendiam o mínimo do
idioma para fazerem apenas uma tarefa.
As empresas começaram a induzir ritmos e métodos cada vez
mais controlados. No Japão, baseados nos ensinamentos de Taylor e
Ford, as fábricas da Toyota aperfeiçoam ainda mais essa mecanização
de processos e pessoas, reduzindo cada vez mais os tempos e
sistematizando cada vez mais os processos.
Essas mudanças no mundo do trabalho trazem o destaque,
desde Taylor (e especialmente por ele), da divisão do trabalho,
em que quem o concebe (quem estabelece as regras) não é
mais quem o executa. Ocorrem, portanto, muitas representações
erradas, preconceituosas e que reduzem o trabalho, considerando
o trabalhador como mero executante, que não precisa pensar, que
não adoece, e que pode ser controlado.
As transformações que podem ser citadas através do Taylorismo,
Fordismo e Toyotismo nos trazem para um cenário de empresas que
querem cada vez mais máquinas e processos e se preocupam cada
vez menos com as pessoas.
Mesmo que o trabalho ocorra cada vez mais rápido e de forma
cada vez mais controlada por números e processos, o ser humano
ainda usa de si, do seu corpo e de sua inteligência para fazer com que
os resultados sejam atingidos da melhor forma.

O trabalho real: principal enfoque da ergonomia


Jamais podemos ignorar que o trabalho é realizado por pessoas.
Podem existir cada vez mais máquinas, sistemas informatizados
e processos, mas ainda são as pessoas que fazem com que
o trabalho aconteça. E essas pessoas sentem, pensam, agem,
decidem, memorizam, controlam, aprendem, envelhecem, cansam,
colaboram, competem, executam, criam e representam a empresa
para outras pessoas.
Quando você compra um celular e ele apresenta problemas, é
com uma pessoa que você fala. Quando você está com fome, é uma
pessoa que lhe atende e faz sua comida no restaurante.

U1 - Ergonomia: conceitos e história 13


Pense bem: se você liga para a empresa e alguém não lhe trata
da forma adequada, você culpa a empresa! Se o carro não funciona,
você diz que a empresa não fabrica bons carros. Se a comida não foi
bem-feita, você diz que aquele restaurante não é bom.
Dessa forma, a ergonomia surge para que a realidade seja
entendida: pessoas estão fazendo o trabalho e os aspectos reais dele
não podem ser ignorados.
Não basta instalar um sistema, é preciso ver como ele funciona no
dia a dia e treinar as pessoas que vão utilizá-lo em situações reais. Se
esse sistema apresentar problemas ou incongruências, a pessoa que
o utiliza deve receber auxílio, e a empresa deve entender que os erros
foram motivados pelo sistema, e não pela pessoa.
Hoje em dia, a necessidade de controlar o trabalho é tão grande
que as empresas criam metas, indicadores de desempenho, regras e
sistemas que cada vez mais buscam controlar e culpar as pessoas por
erros e falhas.
Ao fazer isso, a empresa ignora o que realmente está acontecendo
e busca soluções que não melhoram a realidade, e sim criam paliativos
que funcionam cada vez menos.

Exemplificando
Exemplificando
Você vai a uma consulta médica. Chegando lá, o sistema que o médico
utiliza para fazer sua receita não funciona. O médico fica preocupado e
leva mais tempo para lhe atender. Os outros pacientes aguardam aflitos
com o atraso, e a recepcionista do local precisa responder a todos sobre
o porquê da demora. O médico tenta fazer o sistema funcionar e não
consegue, fazendo a receita de seus medicamentos à mão, mas sabendo
que precisará lançar no sistema posteriormente para gerar um controle de
suas consultas. Ao sair do local, você recebe uma mensagem perguntando
como foi o atendimento. Você dá uma baixa pontuação devido ao
problema do sistema. A empresa, então, entende que aquela pontuação
baixa diz respeito ao médico e, por isso, ele deve ser penalizado de alguma
forma por não ter atendido às expectativas do cliente.

Perceba que é preciso que a empresa entenda o que realmente


aconteceu e melhore a interação do ser humano com aquele
sistema. Porém, muitas vezes, apenas as pessoas são penalizadas, e

14 U1 - Ergonomia: conceitos e história


isso vai acontecendo até que elas adoeçam ou decidam abandonar
aquele trabalho.
Assim, a ergonomia surge como uma ciência que busca não
apenas preservar a saúde das pessoas mas também fazer uma
construção social no mundo do trabalho, no qual as pessoas sejam
mais valorizadas, e não apenas os processos.

Caracterização e desenvolvimento da ergonomia


Quando falamos de trabalho, precisamos lembrar que as pessoas
são diferentes e mudam ainda mais ao longo do tempo. Homens
são diferentes de mulheres. As pessoas diferem em altura e peso.
Com o passar do tempo, envelhecemos, mas também acumulamos
experiência e conhecimento. Quanto mais realizamos uma tarefa, mais
sabemos sobre ela. Quanto mais tempo permanecemos na empresa,
mais conhecemos os processos e acumulamos conhecimento que
pode ser compartilhado com os demais.
Em uma empresa, todos os trabalhos são interdependentes, e a
regulação dessas interações acontece através das pessoas. Entender
de perto o que acontece em cada trabalho e expor a realidade a todos
os interlocutores é papel fundamental da ergonomia.
Dessa forma, o trabalho real é o principal enfoque da ergonomia.
Para isso, didaticamente, podemos dividir as dimensões de estudo da
ergonomia em: a) aspectos físicos (Ergonomia Física): estuda anatomia
humana, fisiologia, biomecânica e suas relações com o trabalho,
identificando posturas, esforços físicos, movimentos repetitivos,
aspectos relacionados ao levantamento e transporte de cargas,
postos de trabalho inadequados, ferramentas de difícil manuseio e
outros elementos que possam gerar sobrecarga osteomuscular
no ser humano; b) aspectos cognitivos (Ergonomia Cognitiva):
estuda processos mentais, como sensação, percepção, cognição,
memorização, raciocínio e tomada de decisão; c) organização do
trabalho (Ergonomia Organizacional): estuda as regras, estruturas
organizacionais, tempos e métodos da empresa, verificando formas
de realizar o trabalho, ritmos, pausas, metas, regulamentações,
padrões exigidos, entre outros.
Perceba que um trabalho não é realizado apenas pelos
aspectos físicos de uma pessoa. Essas três dimensões ocorrem

U1 - Ergonomia: conceitos e história 15


simultaneamente, por isso é essencial lançar um olhar sistêmico
sobre todas elas.
A ergonomia está diretamente relacionada ao trabalho, e
cada trabalho é único. Essas três dimensões sempre precisam
ser consideradas de forma sistêmica, tratando cada situação de
trabalho com suas peculiaridades. Atualmente, o mercado utiliza
o termo “ergonômico” para alertar o consumidor que seu produto
foi concebido preocupando-se com o design, com seu formato
e aspectos físicos de interação com o usuário. Você já deve ter
escutado termos, como “cadeira ergonômica”, “mesa ergonômica”,
“design ergonômico”. Porém, se pensarmos com cuidado, veremos
que nenhuma cadeira é adequada para todos os tipos de situação de
trabalho que existem; nenhum banco de carro será confortável para
todas as pessoas que se sentarem nele. Dessa forma, utilizar o termo
“ergonômico” apenas pelas características físicas de um objeto não
está correto.

Assimile
Como você pôde perceber no texto, o principal papel da ergonomia é
adaptar o trabalho ao ser humano que o executa, considerando seus
aspectos físicos, mentais e as características da organização do trabalho.
Perceba que, ao falarmos em “organização”, não estamos nos referindo
ao contrário de “bagunça”. O termo “organização do trabalho” vem da
engenharia e diz respeito a regras, ritmos e processos existentes na
empresa para controlarem como o trabalho é realizado. É importante,
caro aluno, que você perceba que em todo trabalho devemos observar
as características da organização, assim como os aspectos físicos
e psicológicos do ser humano que executa o trabalho. Essas três
dimensões não ocorrem separadamente.

Para isso, é preciso saber que a ergonomia é interdisciplinar, pois


ela lança um olhar sobre o trabalho de diversas perspectivas, sempre
considerando, acima de tudo, a visão do próprio trabalhador. É papel
do ergonomista traduzir o que a pessoa entende sobre seu próprio
trabalho e o que pode ser melhorado para que este seja realizado da
melhor forma para o trabalhador e para a empresa.

16 U1 - Ergonomia: conceitos e história


A ergonomia vem ganhando cada vez mais espaço nas empresas
como uma abordagem estratégica de prevenção. Com a chegada
de novas tecnologias, é sempre importante compreender como a
interação do ser humano com o sistema ocorre e quais problemas
devem ser resolvidos para aprimorar essa interação.

Importância da ergonomia nas empresas


Atualmente, muito se gasta com indenizações, afastamentos
médicos, rotatividade de funcionários e retrabalho. A ergonomia
busca melhorar o trabalho de forma a reduzir esses custos, melhorar
a saúde dos trabalhadores e o desempenho estratégico da empresa.
Na década de 1970, o Brasil era um dos países com maior índice de
acidentes do mundo. Para criar diretrizes e obrigatoriedade para que
as empresas tenham requisitos mínimos de saúde e segurança para
seus trabalhadores, o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) criou
as normas regulamentadoras (NRs), um conjunto de procedimentos
e requisitos obrigatórios a serem seguidos pelas empresas regidas
pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).
Dentre essas normas, a Norma Regulamentadora 17 é a que trata
da ergonomia e traz as diretrizes básicas para que o conforto, a saúde
e a segurança dos trabalhadores sejam assegurados. Essa NR tem
força de lei e, caso a empresa deixe de cumprir o que é proposto
nesse documento, ela está sujeita a multas e fiscalizações, além de,
claro, poder adoecer, causar acidentes e diminuir a produtividade de
seus trabalhadores.
Um dos itens da NR 17 trata da Análise Ergonômica do Trabalho,
um estudo que deve ser feito sobre as condições de trabalho,
levando à sua compreensão e posterior transformação, aumentando
a produtividade, saúde, segurança, conforto e sentido na forma com
que as pessoas enxergam em seu trabalho.
A Análise Ergonômica do Trabalho é realizada com uma
metodologia específica a qual será tratada em maiores detalhes na
Unidade 2 de nosso estudo. No momento, é importante que você
saiba que esse estudo envolve um olhar para o trabalho real das
pessoas, considerando o que a empresa prescreve que deve ser feito
e o que o trabalhador enfrenta na realidade para cumprir os resultados
exigidos. Assim, observa-se como o trabalhador pensa, memoriza,

U1 - Ergonomia: conceitos e história 17


aprende, faz, comunica, toca, associa, decide, opera ferramentas,
interage com sistemas, atinge metas e indicadores de desempenho,
carrega cargas, transporta materiais, entre outros.
É importante saber que a empresa deve estar disposta a encarar
a realidade do trabalho. Quando hierarquias superiores (chefes,
superintendentes, diretores, gerentes) acreditam em erro humano
e em pessoas que “não trabalham direito”, ignoram aspectos que
podem estar afetando a todos, padronizando processos que não são
vistos de perto.
Quando as condições de trabalho não estão adequadas, as
pessoas podem realizar esforços em seus corpos e mentes de forma
a adoecerem e precisarem se afastar do trabalho, o que gera custos
para a empresa diretamente (com o que pagarão pelo afastamento)
e indiretamente (treinamento de outra pessoa, novas contratações).
A ergonomia tem papel fundamental na adequação das condições
de trabalho em diversos ambientes. Através dela, pode-se constatar
que trabalhadores realizam esforços para ler documentos porque
a iluminação do ambiente está deficiente; pode-se verificar que as
caixas de um setor de carga e descarga estão muito pesadas e estão
causando dores na coluna dos trabalhadores; pode-se perceber que o
sistema de computador de uma atendente de loja sempre cai quando
chove, o que dificulta a realização do trabalho nessas condições.
Valorizar os saberes dos trabalhadores é essencial para a melhoria dos
processos. Muitas vezes, a empresa foca em diminuir salários e investir
em tecnologias que diminuem a qualidade dos serviços, afetando o
consumidor e gerando ainda mais perdas e custos para a empresa.
Hoje em dia, o capitalismo deixa a concorrência de produtos e
serviços cada vez mais agressiva, as empresas precisam mudar o seu
olhar e perceber que não é possível controlar o incontrolável. Por que
criar metas que farão seus trabalhadores competirem entre si? Não
seria melhor que todos se ajudassem e aprimorassem os processos
em conjunto?
Obviamente, pensar em um trabalho perfeito e sem inadequações
é uma utopia. Realizar uma mudança pode fazer outros problemas
surgirem. A ergonomia, portanto, deve seguir um ciclo contínuo
de análise, modificação e checagem das melhorias, para que possa
acompanhar todas as situações de trabalho ao longo do tempo.

18 U1 - Ergonomia: conceitos e história


Reflita
Pensando em tudo que aprendemos até o momento, vimos que as pessoas
desempenham papel fundamental nas empresas e que, muitas vezes, erros
e acidentes ocorrem pela forma como o trabalho está sendo controlado.
Assim, Você já foi a algum restaurante e não gostou da sua experiência lá?
A comida não estava bem preparada, o atendente foi mal-educado, houve
demora, trocaram seu pedido? Você já utilizou novas tecnologias para pedir
comida (internet, aplicativos de celular) e verificou algum erro? O que pensa
sobre isso agora que aprendeu sobre ergonomia?

Finalizando, esperamos que você tenha compreendido que a


ergonomia é uma ciência interdisciplinar, que usa de diferentes
perspectivas para entender como o trabalho realmente acontece e
propor melhorias efetivas aos problemas que afetam os trabalhadores
e a empresa.

Pesquise mais
Para saber mais sobre ergonomia e a importância de se conhecer o
trabalho real, assista aos vídeos do programa Fantástico da Rede Globo,
referentes ao quadro “Chefe Secreto”, disponíveis no link < http://g1.globo.
com/fantastico/quadros/chefe-secreto/>. Esse quadro mostra diversas
situações nas quais os chefes se disfarçam de trabalhadores comuns em
sua própria empresa e verificam as condições reais e dificuldades que
esses trabalhadores enfrentam todos os dias, podendo assim melhorar as
condições de trabalho a partir de de situações que ele mesmo vivenciou.

Sem medo de errar

Após ter adquirido conhecimentos sobre ergonomia, seus


conceitos iniciais e a importância de se analisar a realidade do trabalho,
você é capaz de analisar a situação-problema apresentada no Diálogo
aberto e iniciar a capacitação da equipe que irá resolver os problemas
relacionados à ergonomia na empresa do ramo de cosméticos.
Vimos que você é um profissional de uma empresa do ramo
de cosméticos e o único integrante da equipe que sabe sobre

U1 - Ergonomia: conceitos e história 19


ergonomia. O dono da empresa chama você para uma conversa para
alinhar como será a primeira reunião com a equipe que irá analisar e
atuar de maneira prevencionista com relação aos riscos ergonômicos
existentes na empresa.
Nesse momento, você ressalta a importância de que todos os
participantes da reunião estejam alinhados quanto aos conceitos de
ergonomia e seus objetivos, e destaca que sempre precisarão consultar
os trabalhadores sobre o trabalho que realizam para entender as reais
necessidades e dificuldades existentes. Pelo discurso do dono da
empresa, você percebe que ele relaciona ergonomia apenas a aspectos
de postura e mobiliário, e não tem clara a importância e a forma como
deve atuar frente a essas questões. O norteamento dessa conversa
será essencial para iniciar os trabalhos com a equipe. Sendo assim,
você explica que a ergonomia é uma ciência que analisa o trabalho de
forma sistêmica, verificando não apenas aspectos físicos do trabalho
mas também aspectos cognitivos (mentais) e organizacionais. Além
disso, a ergonomia é uma ciência interdisciplinar que visa adaptar o
trabalho ao ser humano que o executa, proporcionando o máximo
de conforto, saúde e desempenho eficiente.
Na reunião, você é capaz de apontar que a ergonomia
apresenta papel fundamental nas empresas, primeiramente, por ter
regulamentação legal. A Norma Regulamentadora 17, do Ministério
do Trabalho e Emprego, torna obrigatório que todas as empresas
realizem a Análise Ergonômica do Trabalho e, dessa forma, estão
sujeitas a multas e fiscalizações se não cumprirem essa legislação.
Além disso, ao compreender o trabalho e melhorar suas condições,
são reduzidos custos com afastamentos médicos e rotatividade de
funcionários, além de se melhorar processos de forma estratégica,
evitando perda de tempo, retrabalhos e erros. Devido à sua abordagem
sistêmica, a ergonomia traz benefícios para a empresa e para os
trabalhadores. Ao integrar os saberes existentes na empresa e envolver
todos em busca de melhorias nos processos, possibilitamos que os
trabalhadores possam ter sua saúde preservada e consigam enxergar
maior sentido em seu trabalho, tendo suas necessidades físicas e
cognitivas preservadas, além de serem avaliados e recompensados de
forma mais justa com relação a aspectos de organização do trabalho.

20 U1 - Ergonomia: conceitos e história


Avançando na prática

A consultoria em ergonomia e o checklist padronizado


Descrição da situação-problema
Você é chamado para participar de uma reunião com um
consultor em ergonomia que promete resolver todos os problemas
existentes em sua empresa. Nessa reunião, ele mostra que inventou
um checklist, um conjunto de perguntas padronizadas que
prometem identificar qualquer problema referente a esforços físicos
dos trabalhadores, mapeando as melhores posturas e formas de
realizar esforços em trabalhos puramente braçais. Ao verificar esse
questionário, você percebe que ele é totalmente voltado para como
o corpo dos trabalhadores se comporta em diferentes situações,
verificando posturas no pescoço, ombros, braços, mãos, coluna
e pernas. Você acha que a aplicação desse checklist irá identificar
todos os problemas relacionados à ergonomia na empresa? Com
todos os conhecimentos que adquiriu referentes à ergonomia, há
algum aspecto que possa ser ignorado nessa abordagem?

Resolução da situação-problema
Como aprendemos ao longo desta unidade de ensino,
podemos verificar que não há um padrão que atenda a todos as
situações de trabalho. Cada trabalho é único e apenas a pessoa que
o desempenha pode identificar suas particularidades, dificuldades
e especificações, que nem sempre são de ordem física. Ao analisar
um trabalho, devemos ter um olhar sistêmico e interdisciplinar,
sabendo que não existe um trabalho puramente braçal. Ao
pressupor que os trabalhadores utilizam apenas aspectos físicos,
ignoramos aspectos cognitivos, como memorização, aprendizado
e tomada de decisões, além dos métodos e das regras contidos
na organização do trabalho. Um checklist jamais conseguirá
analisará a totalidade de um trabalho, e não é possível que entenda
o trabalho real. A ergonomia não trata apenas de aspectos físicos
mas também de aspectos organizacionais, ambientais e cognitivos.

U1 - Ergonomia: conceitos e história 21


Faça valer a pena
1. O mundo do trabalho sofreu diversas transformações ao longo dos
anos. Após a Revolução Industrial, a produção em massa tomou conta
dos processos, exigindo cada vez mais uma organização das formas
como o trabalho era realizado. Assim, surgiu a Administração Científica
do Trabalho, que tinha em sua essência o intuito de aplicar a ciência à
administração. Essa metodologia possui ênfase nas tarefas, buscando a
eliminação do desperdício, da ociosidade operária e a redução dos custos
de produção, com o objetivo de garantir uma melhor relação custo/
benefício aos sistemas produtivos das empresas da época.
Quem foi o responsável pela criação da Administração Científica do
Trabalho e qual o nome do sistema de organização do trabalho concebido
para diminuir tempo e desperdício no trabalho?
a) Mario Toyota e Toyotismo.
b) Henry Ford e Fordismo.
c) Frederick Wislow Taylor e Taylorismo.
d) Jastrzebowski e Ergonomia.
e) Henry Ford e Toyotismo.

2. Ao analisarmos o trabalho real, percebemos que o homem usa de


si, de seu corpo e de sua inteligência para realizar sua atividade frente
Às características da organização do trabalho presentes na empresa.
Ao desconsiderar qualquer um desses aspectos, podemos ignorar
características do trabalho que podem levar a adoecimentos, acidentes e
desempenho ineficiente.
Tratando dos domínios da ergonomia, quais são os três aspectos principais
que ela analisa?
a) Postura, esforço e posto de trabalho.
b) Físico, cognitivo e organizacional.
c) Conforto, erro humano e riscos de acidentes.
d) Metas, produtividade e indicadores de desempenho.
e) Organização do trabalho, afastamentos e acidentes.

3. É comum notarmos a palavra “ergonômico” como adjetivo a


objetos que possuam boas características de design. Termos como
“design ergonômico” são utilizados para descrever embalagens e
veículos motorizados, assegurando que houve preocupação com as
características físicas daquele produto. O termo “cadeira ergonômica” é
utilizado com grande frequência na indústria de mobiliário, designando

22 U1 - Ergonomia: conceitos e história


que é uma cadeira que apresenta regulagens e é adequada para todos os
tipos de trabalho.
Considerando que cada situação de trabalho é única, pode existir o
conceito de “cadeira ergonômica”?
a) Sim. Se uma cadeira possui regulagens, isso significa que todas as pessoas
podem utilizá-la de acordo com as suas características, adequando altura
e profundidade do assento e podendo sentar-se em postura adequada, o
que facilita o trabalho.
b) Sim. A cadeira ergonômica é uma resposta da indústria de mobiliário para
adequar as características do mobiliário às necessidades dos trabalhadores.
c) Não. O termo “ergonômico” traz a ideia de que aquele objeto atende a
todas as necessidades de todas as situações possíveis. Pensando que cada
situação de interação do homem com o sistema e demais elementos é
única, o termo “ergonômico” deveria ser evitado.
d) Não. O termo “ergonômico” deveria ser utilizado apenas na Análise
Ergonômica do Trabalho, identificando os momentos em que foi possível
realizar todos os ajustes que um trabalho precisa para ser perfeito.
e) Sim. Se um trabalho é realizado na posição sentada, apenas a Ergonomia
Física pode ser aplicada, identificando a postura correta e selecionando a
cadeira ergonômica adequada àquele trabalho.

U1 - Ergonomia: conceitos e história 23


24 U1 - Ergonomia: conceitos e história
Seção 1.2
Domínios e abordagens da Ergonomia
Diálogo aberto
Prezado aluno, seja bem-vindo a mais uma seção de estudo sobre
“Ergonomia: conceitos e história”.
Vamos, a partir de agora, conhecer as abordagens utilizadas
na ergonomia, a interação entre homem e máquina, e os
constrangimentos da tarefa que ocorrem nessa interação.
Para aproximar os conteúdos teóricos da prática profissional,
vamos relembrar a situação hipotética que foi apresentada no
“Convite ao estudo”, na qual você é um profissional de uma empresa
do ramo de cosméticos e o único integrante da equipe que sabe
sobre ergonomia.
Você precisa capacitar sua equipe para formar um comitê que
atuará na resolução dos problemas relacionados à ergonomia
existentes na empresa. A primeira reunião com a equipe será amanhã.
Após uma conversa esclarecedora com você, o dono da empresa
já entende o que é ergonomia e a sua importância, e ele pede que
você inicie a reunião abordando os seguintes temas: qual o papel
da ergonomia na interação do sistema homem, tarefa e máquina?
Como a ergonomia pode assegurar que o trabalho seja realizado
com conforto, segurança e desempenho eficiente? Por que não
é possível aplicar a mesma solução para todos os problemas de
ergonomia? Se a empresa não possui um programa de prevenção a
riscos ergonômicos, quais os possíveis problemas que podem surgir?
Para que você consiga responder a esses e outros
questionamentos, esses conteúdos serão abordados de forma
contextualizada na seção Não pode faltar. Bons estudos!

Não pode faltar

Passamos grande parte de nossa vida trabalhando. Além de


condições para o nosso sustento, o trabalho dá significado à nossa
vida, a quem somos de verdade.

U1 - Ergonomia: conceitos e história 25


As pessoas não são iguais. Somos diferentes em altura, peso,
gênero, cultura, idade, história de vida, preferências. Além disso,
a mesma pessoa não se mantém igual ao longo da vida (nem ao
longo de um mesmo dia). As pessoas aprendem mais, envelhecem,
adoecem, cansam.
O trabalho tem que considerar o ser humano e suas características.
Não são as pessoas que precisam se adaptar ao trabalho, e sim o
oposto. Se uma caixa está pesada, não sou eu quem deve ficar mais
forte para carregá-la. Se um botão está muito alto, não sou eu quem
precisa se esticar para alcançá-lo. Se eu tento atender um cliente e o
sistema fica travando, não sou eu quem precisa criar estratégias para
consertar isso.
É, na realidade, na observação junto ao trabalhador, que percebemos
que podem existir condições de trabalho que geram sobrecarga na
mente e no corpo das pessoas, e que, muitas vezes, não facilitam a
execução das tarefas, fazendo com que elas sejam realizadas em
condições que diminuem o desempenho do trabalhador.
Dessa forma, surge a ergonomia, que trata de proporcionar
adequações na tarefa para que o trabalhador atue com o que
chamamos de trinômio da ergonomia: conforto, segurança e
desempenho eficiente.

Conforto, segurança e desempenho eficiente: o trinômio da


ergonomia
Trabalhar tem papel central na vida das pessoas. As empresas são
responsáveis por propiciar condições de saúde e segurança para que os
trabalhadores não adoeçam e não se acidentem enquanto estiverem
trabalhando. Essa responsabilidade é prevista em lei, e as empresas que
não atendem aos critérios mínimos de saúde e segurança podem sofrer
multas e processos legais, além de ter seu desempenho prejudicado por
possíveis afastamentos médicos e rotatividade de funcionários. Cada
vez que um trabalhador se afasta, adoece ou se desliga da empresa,
isso gera perda de tempo e de desempenho.
A ergonomia visa adaptar o trabalho às condições reais das
pessoas, e seu objetivo é voltado tanto ao trabalhador quanto à
empresa. Assim, com ações voltadas à ergonomia, garantimos que
o trabalhador tenha melhores condições de conforto, seja ouvido,

26 U1 - Ergonomia: conceitos e história


tenha melhores condições para realizar o seu trabalho, esteja seguro
e saudável. Em contrapartida, ao adaptar o trabalho, os processos da
empresa funcionam melhor, fazem mais sentido, ganha-se tempo,
melhora-se a comunicação entre as pessoas, ganha-se conhecimento
e diminui-se a quantidade de retrabalho e possíveis erros que podem
existir nos processos.
A ergonomia visa adequar o trabalho às características
psicofisiológicas do ser humano, que dizem respeito a todo o conhecimento
referente a como o corpo e a mente das pessoas funcionam.
Para isso, essa ciência utiliza conhecimentos antropológicos,
psicológicos, fisiológicos, anatômicos e de diversas outras ciências ,
com o intuito de entender quais as melhores condições para que o
homem interaja em seu trabalho com outras pessoas, com o sistema,
com as máquinas e ferramentas.

Reflita
Todo ser humano tem características e preferências quando se trata de
trabalho. Pense você: você prefere ficar o tempo todo na mesma posição
ou gosta de alternar sua postura quando tem vontade? Você prefere
mexer em programas de computador que são intuitivos ou prefere ter
dificuldades para acessá-los? Você sente cansaço se fica muito tempo
de pé? O que acontece se você tenta ler alguma coisa no escuro? Como
você se sente quando alguém lhe culpa por alguma coisa que não foi de
sua responsabilidade?

As características psicofisiológicas dos trabalhadores, basicamente,


tratam de nossas preferências referentes ao uso de nosso corpo e da
nossa mente.

Nosso conhecimento a respeito do ser humano não está esgotado.


Ainda há muito que se descobrir sobre como o ser humano funciona em
sua totalidade. Porém, há algumas características que podem ser citadas
e são de extrema importância quando tratamos de ergonomia. Elas são
as que ficam em evidência na interação do homem com seu trabalho.

U1 - Ergonomia: conceitos e história 27


Interação homem x máquina x tarefa
Como já vimos, a tarefa é o que a empresa prescreve. Para dar conta
de realizar a tarefa, o ser humano precisa interagir com outras pessoas,
com sistemas, com ferramentas e com máquinas para que possa atingir
os resultados esperados.

Reflita
Já aconteceu de você tentar utilizar um celular e não conseguir? Ou
precisar ajudar sua mãe a ajustar o canal da televisão porque ela não sabe
mexer no controle remoto? Já teve dificuldade em montar um material
com o manual de instruções e desistir no meio? Já se confundiu com
alguma placa que não estava com a informação clara? Nosso cérebro já
tem armazenado um conhecimento prévio o qual está sendo acionado
constantemente. Ao interagir com uma máquina, ela precisa fazer
sentido para você, frente aos conhecimentos que você já tem. Além
disso, ao manuseá-la, ela deve possibilitar o seu melhor ajuste corporal,
para evitar desconfortos.

Na interação do homem com sistemas e máquinas, é importante


lembrar que há preferências que devem ser respeitadas. O ser
humano prefere utilizar alternadamente toda sua musculatura e não
apenas determinados segmentos. Gostamos de nos movimentar,
escolher a melhor postura. Além disso, temos baixa tolerância a tarefas
fragmentadas que são executadas em um curto espaço de tempo.

Exemplificando
Empresas que atuam com produção em massa, criando produtos em
larga escala, geralmente, utilizam linhas de produção para realizar suas
tarefas. A linha de produção é constituída por uma esteira em torno da
qual diversos trabalhadores permanecem lado a lado, onde cada um
faz apenas uma parte do processo. Por exemplo, em uma indústria de
cosméticos, para fazer um perfume: um trabalhador só coloca os frascos
vazios na esteira, o do lado aciona a máquina para envasar o perfume,
o seguinte coloca a válvula que espirra o perfume, o seguinte coloca a
tampa, o seguinte coloca o rótulo e o último guarda o frasco pronto na
caixa. Essa fragmentação faz com que cada trabalhador faça apenas um

28 U1 - Ergonomia: conceitos e história


pedacinho do processo. Estar desvinculado do todo, realizando uma
tarefa curta, fragmentada, que não explora toda a capacidade cognitiva
do trabalhador, pode levar não apenas à alienação (falta de sentido no
trabalho e dissociação da mente com o corpo) mas também a problemas
osteomusculares, por se tratarem de atividades tão curtas e repetitivas.

Todo ser humano prefere que seu tempo seja controlado por ele
mesmo, e não imposto por uma máquina, pela gerência, pelos clientes
ou colegas. Além disso, o homem acelera seu próprio ritmo, deixando
de respeitar os limites do seu corpo, toda vez que se sente motivado
para isso.
As pessoas se sentem bem quando são solicitadas a resolver
problemas, pois são encaradas como pessoas que pensam e agem, e
não como máquinas.
Frederick Wislow Taylor, criador da Administração Científica do
Trabalho, trouxe o conceito de “homem-médio”, que tentava padronizar
os tempos e métodos da tarefa como se todas as pessoas fossem
iguais. O homem não pode ser considerado como uma máquina.
Temos capacidades sensitivas e motoras que funcionam dentro de
certos limites e que variam de uma pessoa a outra e ao longo do tempo
para uma mesma pessoa.
Existe o que chamamos de variabilidade interindividual (as pessoas
são diferentes entre si) e intraindividual (como nós mesmos mudamos)
e que precisam ser consideradas. Somos diferentes entre nós e não
estamos iguais o tempo todo. Envelhecemos e nossas capacidades
se modificam, também acumulamos experiência e aprendizado. Além
disso, seres humanos organizam-se coletivamente para seu trabalho
e uma atenção especial deve estar centrada nisso: quando as pessoas
competem entre si ou não possuem espírito de equipe, a cooperação
não encontra espaço para acontecer naturalmente, o que atrapalha os
processos de trabalho. Nas atividades humanas, a cooperação tem um
papel importante, muito mais que a competitividade.

Apreciação ergonômica do sistema humano x tarefa x máquina


Na interação homem x máquina, precisamos estar atentos para

U1 - Ergonomia: conceitos e história 29


que não haja acidentes, doenças e também para que o desempenho
seja eficiente.
Ao operar uma máquina, deve ser possibilitado que o trabalhador
escolha sua melhor postura, evitando fazer movimentos repetitivos,
força excessiva e sem que nenhuma parte do seu corpo esteja
comprimida por alguma estrutura. Uma pessoa precisa conseguir se
sentar sem que seus joelhos batam contra alguma estrutura. Ao digitar,
precisamos de espaço para apoiar os nossos braços. Isso tudo deve ser
considerado. Mesmo que as pessoas sejam diferentes em altura, peso
e segmentos corpóreos, realizar um estudo para que a maior parte das
pessoas seja atendida é essencial.
Ainda na operação de uma máquina, ela precisa fazer sentido. Nós
já temos informações armazenadas em nosso cérebro e possuímos
preferência por sistemas que sejam intuitivos. Um programa de
computador não pode ser compreendido só por quem o criou.
A ergonomia surge para colocar o trabalhador como agente
central das transformações no trabalho. O desempenho eficiente
não trata apenas da produção mas também de criar condições para
que o trabalhador possa permanecer no processo produtivo durante
o máximo de tempo possível, sem adoecer, se afastar e podendo se
desenvolver profissionalmente nesse fazer.
Quando a ergonomia surge na concepção de um trabalho (no
momento que será feito um projeto e ainda estão sendo desenhadas
as ideias), ela tem um papel mais eficiente, pois já identifica os possíveis
problemas antes que o trabalho seja realizado. Mas se tudo já está em
funcionamento, a ergonomia surge para a correção, e nem sempre
conseguimos consertar algo que já foi concebido de forma inadequada.
A apreciação da ergonomia no sistema “homem x máquina x tarefa”
é centrada em realizar a Análise Ergonômica do Trabalho para cada
situação como se fosse única. A ergonomia lança um olhar sistêmico,
o qual trata de um problema complexo dissolvendo-o em pequenas
partes, entendendo todo o contexto e, principalmente, considerando
a realidade do trabalhador, para depois traduzir isso para a empresa e
propor transformações.
A Análise Ergonômica do Trabalho é um estudo feito por meio
de uma metodologia específica para identificar as diferenças entre o
trabalho prescrito e o real e propor melhorias que consideram o olhar

30 U1 - Ergonomia: conceitos e história


do trabalhador para que o trinômio conforto, segurança e desempenho
eficiente seja atingido.

A macroergonomia
Quando analisamos uma situação de trabalho para propor melhorias,
precisamos entender em qual nível de complexidade se encontram os
problemas que identificamos. Algumas vezes, podemos encontrar um
balcão que está muito baixo para uma operação. Aqui, basta realizar
a troca do balcão, ou elevar sua altura, sendo esse problema visível,
pontual e de fácil entendimento. Aqui, utilizamos a microergonomia,
uma visão mais simplificada e pontual do estudo ergonômico.
A macroergonomia trata de uma análise mais global, sistêmica,
olhando o sistema de produção como um todo. Aqui, vemos o
funcionamento da empresa, suas regras, suas hierarquias e de que
forma aquela situação de trabalho interage e é influenciada pelos
processos como um todo.
Figura 1.1 | Ação macroergonômica

O trabalhador O trabalho A empresa


Variabilidade Condições de Investimento,
intraindividual trabalho manutenção
(predeterminadas e
História, experiência reais)
pessoal, vida pessoal,
personalização,
significação, idade,
estado de saúde,
tempo de casa, etc.

Variabilidade A atividade no Políticas, gestão de


interindividual trabalho recursos humanos,
organização
Diferenças entre
as pessoas,
características
antropométricas
(altura, porte, Resultados do Publicidade,
tamanho dos Trabalho produção qualidade,
segmentos (antecipados x etc.
corpóreos), etc. efetivos)

Fonte: adaptada de Guerin et al. (2001, p. 17-19).

U1 - Ergonomia: conceitos e história 31


Uma característica importante da macroergonomia é que ela
é um método participativo, no qual os trabalhadores são ouvidos
ativamente ao longo da análise, nova concepção e implantação de
qualquer modificação ou novo projeto em seu ambiente de trabalho.
Por participarem ativamente, os trabalhadores contribuem para que as
intervenções necessárias tenham uma maior assertividade. Isso reduz
a margem de erros e tem melhor aceitação, já que essa mudança foi
pensada e construída em conjunto com os trabalhadores.
Uma ação macroergonômica aborda em conjunto quatro
subsistemas principais: o tecnológico, o pessoal, o laboral e o ambiental.
Assim, verifica-se como esses subsistemas interagem e quais os
problemas que surgem nessa interação. Algumas empresas colocam
opções para teste e decidem por aquelas que tiveram melhor aceitação.
Após compreender o trabalho, é necessário propor mudanças
para transformá-lo.

Assimile
A ação ergonômica transforma o trabalho após identificar problemas
relacionados à tarefa. A ergonomia mexe no trabalho, traduz o que ele
realmente deve ser. Se em um setor de carga e descarga os trabalhadores
estão se queixando de dores nas costas, não basta pedir que eles façam
exercícios. A dor já está ali. Não estaremos atuando na causa. Um estudo
do “por que estão surgindo dores nas costas” deve ser realizado, e a
transformação do trabalho deve ocorrer para eliminar o fator causal.

A macroergonomia consiste na adequação organizacional voltada


à concepção das novas tecnologias e ao seu gerenciamento. Olha-
se a situação de trabalho de maneira sistêmica, e sua aplicação
evidencia interações no contexto social e organizacional para a melhor
adequação do sistema de trabalho e concepção de novos sistemas.
Assim, considera-se como organização do trabalho: a) as normas
de produção (escritas ou não, explícitas ou implícitas); b) o modo
operatório (como e com qual padrão de qualidade uma tarefa deve
ser executada – quanto maiores as exigências, menos margem o
trabalhador terá para fazer as ações do seu próprio jeito); c) a exigência
de tempo (quanto deve ser produzido em um determinado tempo, sob
imposição); d) a determinação do conteúdo do tempo (tempo que se

32 U1 - Ergonomia: conceitos e história


gasta para realizar uma subtarefa); e) o ritmo de trabalho (cadência,
refere-se à velocidade dos movimentos que se repetem em uma dada
unidade de tempo, e ritmo, a maneira como as cadências são ajustadas
ou arranjadas); f) o conteúdo das tarefas (modo como o trabalhador
percebe as condições de seu trabalho: estimulante, socialmente
importante, monótono ou além de suas capacidades).
Esses aspectos de organização do trabalho são essenciais para a
identificação do que condiciona a interação entre homem, máquina
e sistema.

Pesquise mais
Agora que já aprendemos mais sobre ergonomia e sua importância
para adaptar as situações de trabalho às características psicofisiológicas
dos trabalhadores, complemente seus conhecimentos lendo o artigo
Integrando a ergonomia ao projeto de engenharia: especificações
ergonômicas e configurações de uso. Disponível em: <http://www.
scielo.br/pdf/gp/v21n4/aop_073313.pdf>. Acesso em: 26 mar. 2017.

Tarefa x atividade: entendendo o real do trabalho


No ambiente de trabalho, pessoas interagem entre si e com
sistemas, máquinas e ferramentas para realizar a tarefa imposta
pela empresa. Como vimos anteriormente na Seção 1.1 desta nossa
primeira Unidade de Ensino, chamamos de “tarefa” o trabalho
prescrito, aquilo que é pedido pela empresa para que o trabalhador
execute para atingir os resultados. Quando um trabalho é prescrito,
geralmente, ele é desenhado por alguém que não vai executá-lo.

Exemplificando
Vamos entender a diferença entre tarefa e atividade: a tarefa diz respeito
ao que a empresa prescreveu para que fosse realizado pelo trabalhador.
A atividade é como o trabalhador usa de sua mente e seu corpo para
executar a tarefa. Imagine um rapaz chamado Rafael, que trabalha em um
banco como gerente de relacionamento. A tarefa de Rafael é atender aos
clientes, abrir contas, oferecer empréstimos e títulos de capitalização, tirar
dúvidas dos clientes, desbloquear cartões, acessar o sistema de computador

U1 - Ergonomia: conceitos e história 33


para verificar as informações sobre a conta do cliente. Agora, vamos
pensar na atividade de Rafael: ele realiza essas ações na posição sentada,
podendo levantar-se quando sente necessidade. No horário de almoço, a
demanda aumenta e, muitas vezes, Rafael acaba se atrapalhando, pois são
muitos clientes que formam fila para serem atendidos. Ele não recebeu
treinamento para operar o sistema de computador, então regularmente se
confunde e perde tempo para acessar as informações. A mesa de Rafael
fica em um canto mais escuro da agência, o que leva à fadiga visual ao
final do dia. Rafael deve memorizar diversos comandos e códigos para
poder realizar a tarefa.

Para entender o real do trabalho, é necessário conversar com


o trabalhador e assistir ao seu fazer em detalhes. Colocar pessoas
que realizam o mesmo fazer em grupos e pedir para que descrevam
suas tarefas e atividades é essencial como parte do método, para
incentivar que os grupos alinhem suas ideias e mostrem o que é de
opinião de todos.
A Análise Ergonômica do Trabalho traz a compreensão do que
o trabalhador deve fazer (a tarefa) e como proceder para atingir
esse objetivo (atividade), bem como as dificuldades que enfrenta.
Para isso, é importante listar uma série de itens do sistema para
entender como o trabalho real ocorre: a) dados referentes ao
homem: quantos trabalhadores interagem naquele local, formação,
qualificação exigida, quem faz o que, horários, turnos, modos de
alternância das equipes, idade, gênero, tempo de casa, treinamento
pelo qual passaram; b) dados referentes às máquinas: estrutura geral;
dimensões características (croqui, foto, fluxograma de produção);
órgãos de comando e de sinalização; princípios de funcionamento
da máquina; aspectos críticos evidentes; c) dados referentes
às ações dos operadores: ações imprevistas; principais gestos;
principais posturas; principais deslocamentos; principais ligações
sensório-motoras; tratamentos de informações (memorização e
demanda cognitiva); principais decisões a serem tomadas; d) dados
referentes ao ambiente de trabalho: espaços e locais de trabalho em
confronto com dados antropométricos e biomecânicos; ambiente
sonoro; ambiente térmico; ambiente luminoso; ambiente vibratório
(intensidade, amplitude, frequência); ambiente tóxico.

34 U1 - Ergonomia: conceitos e história


Finalizando, esperamos que tenha compreendido o que é o
trinômio da ergonomia, o papel da ergonomia na adaptação das
características psicofisiológicas do ser humano (respeitando suas
diferenças) em sua interação com máquinas e sistemas, e como a
ergonomia pode assegurar um desempenho eficiente.

Sem medo de errar

Após ter adquirido conhecimento sobre a interação homem x


máquina x tarefa, a importância de se identificar o trabalho real
e os constrangimentos da tarefa e a importância do trinômio
conforto, segurança e desempenho eficiente, você já pode analisar
a situação-problema apresentada no Diálogo aberto e iniciar a
capacitação da equipe.
Vimos que você é um profissional de uma empresa do ramo
de cosméticos e o único integrante da equipe que conhece sobre
ergonomia. Você já é capaz de preparar a sua reunião com a equipe
explorando que a ergonomia visa adaptar o trabalho às condições
psicofisiológicas das pessoas, e que isso só é possível se vocês
compreenderem o trabalho real.
Ao analisar como a organização funciona de forma sistêmica, a
ergonomia aparece de forma a identificar um problema complexo,
a analisá-lo em sua realidade e a propor melhorias que envolvam a
opinião dos trabalhadores, garantindo assim maior eficiência.
Você também explica que a ergonomia visa promover o
conhecido trinômio: conforto, segurança e desempenho eficiente.
Assim, os trabalhadores conseguem realizar as tarefas prescritas com
maior margem de manobra para escolherem a melhor forma de fazer
seu trabalho e sem serem atrapalhados pelo sistema, pelas máquinas,
ferramentas, pelo ambiente ou até por outras pessoas. A ergonomia
surge para otimizar processos e garantir que sejam realizadas reais
transformações, com o propósito de resolver os problemas ao invés
de apenas abrandá-los. Isso ocorre através da Análise Ergonômica do
Trabalho, estudo que analisa como a tarefa e atividade ocorrem e
quais são as propostas de melhoria para cada situação de trabalho.
A ergonomia tem papel central na interação homem x máquina por
nos trazer o trabalhador para um papel central no trabalho. O trabalho
deve se adaptar às preferências do ser humano. Não é possível se

U1 - Ergonomia: conceitos e história 35


padronizar máquinas, processos e sistemas. O ser humano tem que
interagir com esses elementos, tendo o maior controle possível sobre
eles. Somos diferentes e não existe uma forma de todas as situações
estarem adequadas a todas as pessoas.
Você encerra a reunião refletindo como poderá conduzir os
trabalhos na empresa a partir de agora.

Avançando na prática

O novo posto de trabalho


Descrição da situação-problema
Fabiana é recepcionista de um prédio comercial há cinco anos.
Ela já conhece todos os visitantes e profissionais que ocupam os
andares, além de ter decorado com maestria os nomes de todas
as empresas que se encontram no prédio, incluindo seu ramal
de acesso. Fabiana sai de férias e, quando retorna, percebe que
realizaram mudanças no seu posto de trabalho. Percebe uma
cadeira mais confortável, uma mesa grande e um sistema de
computador totalmente equipado, com novos ramais, um sistema
de cadastro de visitantes e uma câmera fotográfica conectada ao
sistema para efetuação do cadastro. Após um mês, Fabiana começa
a apresentar atestados e se afasta do trabalho. Ao conversar com o
médico, Fabiana diz que o novo posto de trabalho, embora pareça
melhor, é desconfortável, e que o sistema de computador que
deveria facilitar seu trabalho, na verdade só atrapalha: a cadeira não
se aproxima direito da mesa, gerando uma postura desconfortável;
o sistema trava a cada novo cadastro, o que aumenta a fila de
espera para as pessoas entrarem no prédio e, consequentemente,
gera atrasos e impaciência; a câmera não é fácil de operar e, se dá
erro, não possibilita que Fabiana o conserte. Qual foi o problema
desse novo posto de trabalho? Se ele foi pensado para facilitar o
trabalho de Fabiana, por que isso não aconteceu?

Resolução da situação-problema
Modificar a situação de trabalho sem considerar a opinião do
trabalhador e sem possibilitar a sua participação nesse processo,
geralmente, traz uma diversidade de problemas que surgem ao

36 U1 - Ergonomia: conceitos e história


não se considerar o trabalho real. É necessário conversar com o
trabalhador e assistir ao seu fazer em detalhes. A Análise Ergonômica
do Trabalho traz a compreensão do que o trabalhador deve fazer
(a tarefa) e como proceder para atingir esse objetivo (atividade),
bem como as dificuldades que enfrenta. Se a ergonomia tivesse
sido aplicada na concepção desse posto de trabalho, certamente,
Fabiana identificaria esses problemas e poderia evitar que eles
fizessem parte desse trabalho.

Faça valer a pena


1. A ergonomia é o conjunto dos conhecimentos científicos relacionados
ao homem e necessários à concepção de instrumentos, máquinas e
dispositivos que possam ser utilizados com o máximo de ____________,
____________ e ____________.
Assinale a alternativa que completa a frase.
a) dinheiro, tecnologia e energia.
b) rotatividade, multas e adoecimento.
c) conforto, segurança e desempenho eficiente.
d) produtividade, desconforto e ritmo imposto.
e) velocidade, erro humano e adoecimento.

2. A Análise Ergonômica do Trabalho traz a compreensão do que o


trabalhador deve fazer (a tarefa) e como proceder para atingir esse objetivo
(atividade), bem como as dificuldades que enfrenta. Para isso, é importante
listar uma série de itens do sistema para entender como o trabalho real
ocorre. Quando falamos de “organização do trabalho”, estamos nos
referindo a quais elementos?
Assinale a alternativa correta.
a) Posto de trabalho, ferramentas, máquinas e matéria-prima.
b) Iluminação, vibração, ruído e temperatura.
c) Apenas regras escritas que precisam ser obedecidas pelos trabalhadores.
d) Todos os elementos que eliminam bagunça e promovem a limpeza
da empresa.
e) Normas de produção, modo operatório, exigência de tempo, determinação
do conteúdo do tempo, ritmo de trabalho e o conteúdo das tarefas.

3. As pessoas são diferentes entre si e ao longo da vida. Dessa forma, não


podemos conceber um trabalho considerando que as pessoas são iguais.

U1 - Ergonomia: conceitos e história 37


Qual das alternativas a seguir cita aspectos que analisamos quando se
trata de variabilidade interindividual?
Assinale a alternativa correta.
a) Cabeça, tronco e membros.
b) Conforto, segurança e desempenho eficiente.
c) Como mudamos ao longo da nossa vida, experiência pessoal, vida
pessoal, personalização, significação e estado de saúde.
d) Diferenças entre as pessoas, como características antropométricas
(altura, porte, tamanho dos segmentos corpóreos), gênero e idade.
e) Normas de produção e tarefa, atividade.

38 U1 - Ergonomia: conceitos e história


Seção 1.3
Diagnose ergonômica do sistema humano x tarefa
Diálogo aberto
Prezado aluno, esta seção encerra nossa Unidade 1, intitulada
“Ergonomia: conceitos e história”. Nesta seção, além de retomarmos
diversos conceitos aprendidos anteriormente, também iremos imergir
em novos conhecimentos voltados à diagnose do sistema humano
x tarefa x máquina, a importância de compreender o trabalho para
transformá-lo, antropometria, usabilidade e desenho universal.
Para construirmos uma relação entre a teoria e a prática, vamos
relembrar a situação hipotética que foi apresentada no Convite
ao estudo. Você é um profissional de uma empresa do ramo de
cosméticos e o único integrante da equipe que sabe sobre ergonomia.
Após ser convidado pelo dono da empresa para encabeçar os
projetos voltados à ergonomia e, também, treinar uma equipe para
auxiliá-lo, você já aprendeu diversos conceitos que poderão auxiliá-lo
nessa jornada: o que é ergonomia, sua importância, seu histórico, sua
base legal no Brasil, a importância de entender a diferença entre tarefa
e atividade, o trinômio da ergonomia e a importância de nos atermos
às características psicofisiológicas do ser humano.
Agora, você realizará a primeira reunião com a equipe de ergonomia
da empresa e iniciará uma capacitação para que possam começar
os trabalhos de prevenção e resolução dos problemas relacionados
à ergonomia. Assim, será importante que você relembre: o que é
antropometria? Quais riscos relacionados à ergonomia podem surgir
ao não haver um bom dimensionamento do posto de trabalho de
acordo com as dimensões do corpo humano? Por que é preciso
compreender o trabalho para transformá-lo? O que é usabilidade?
Quais as vantagens de um design acessível voltado às situações de
trabalho? O que é desenho universal?
Para que você consiga responder a esses e outros questionamentos,
esses conteúdos serão abordados de forma contextualizada na seção
Não pode faltar. Com esses conceitos, a equipe já se prepara para os

U1 - Ergonomia: conceitos e história 39


primeiros passos voltados a um programa de ergonomia e percebe
que esse trabalho está apenas começando. Bons estudos!

Não pode faltar

Estamos encerrando a nossa Unidade de Ensino 1. Após


compreender o que é ergonomia e sua importância nas empresas,
chegou a hora de aplicarmos os novos conhecimentos. Como vimos
anteriormente, a ergonomia possui três tipos de abordagem: física,
cognitiva e organizacional. Essas três vertentes estão correlacionadas.
Não existe um trabalho em que uma pessoa utilize apenas sua
mente e não seu corpo; da mesma forma, não existe um trabalho
puramente braçal em que nada deva ser pensado. Todo trabalho
possui uma organização de tempos e métodos para poder ocorrer
em congruência com os resultados esperados.
Sendo assim, vamos entender como ocorre a diagnose envolvida
nessa interação.

Diagnose ergonômica do sistema humano x tarefa x máquina


Diagnose é um termo que significa analisar a situação em detalhes,
permitindo um melhor conhecimento da situação de trabalho. Para
se obter a diagnose correta de um problema voltado à ergonomia,
devemos lembrar que todas as situações de trabalho são complexas
e precisam ser analisadas de forma sistêmica, envolvendo todos os
interlocutores (alta gerência, chefia imediata, Serviços Especializados
em Engenharia de Segurança e Medicina do Trabalho – SESMT,
trabalhadores e demais envolvidos na tarefa analisada) que estão
relacionados a essa situação de trabalho. Para isso, a ergonomia utiliza
uma metodologia que identifica quais constrangimentos a tarefa traz
para o ser humano em sua relação.
A palavra “constrangimento” é utilizada em ergonomia como uma
tradução de “constrain”, e é utilizada com o significado de restrição,
dificuldade (e não de “vergonha”, como usualmente significa na língua
portuguesa). Dessa forma, devemos lembrar que a tarefa, muitas vezes,
é prescrita por quem não a executa, e isso pode gerar dificuldades
para o trabalhador, podendo levar a problemas de segurança, de
conforto e de desempenho eficiente.

40 U1 - Ergonomia: conceitos e história


Para uma diagnose eficaz de um problema voltado à ergonomia,
devemos sempre entender qual é a demanda principal que está
gerando a necessidade de análise. A Análise Ergonômica do Trabalho
– estudo exigido pela Norma Regulamentadora 17, do Ministério do
Trabalho e Emprego – não possui uma periodicidade de realização.
Diversos documentos e programas voltados à saúde e segurança do
trabalho são de realização anual (como o Programa de Prevenção
a Riscos Ambientais – PPRA – e o Programa de Controle Médico
de Saúde Ocupacional – PCMSO). Já a Análise Ergonômica do
Trabalho deve ser realizada sempre que identificamos que há fatores
relacionados à tarefa que atrapalham o trabalhador, podendo gerar
riscos à sua saúde, segurança e ao seu desempenho.
Assim, a demanda da análise se refere ao problema principal
que exige um estudo aprofundado. Pode ser a chegada de uma
nova linha de produção que não está com altura adequada para
os trabalhadores; pode ser que um laboratório esteja com baixo
iluminamento (densidade de luz em cima de uma superfície) no
balcão, o que atrapalha a visibilidade; pode ser que o trabalhador
precise operar diversos sistemas de computador sem treinamento, o
que leva a erros e perda de tempo; pode ser que as metas impostas
pela empresa não se enquadrem na realidade.
Esses são alguns exemplos de problemas de ordem ergonômica.
Didaticamente, podemos dividi-los em: a) organizacionais:
relacionados a tempos e métodos, ritmos, indicadores de
desempenho, metas, normas e regras da empresa; b) físicos:
relacionados a como o corpo do trabalhador interage com o
sistema, envolvendo postura, força excessiva, repetitividade,
compressão mecânica (ter parte do corpo pressionada contra
alguma superfície) e demais problemas envolvendo o posto de
trabalho, ferramentas e materiais na interação com o ser humano;
c) ambientais: relacionados ao ruído, iluminamento ineficaz e
conforto térmico, havendo a necessidade de realizar medições dos
agentes ambientais para assegurar o conforto dos trabalhadores; d)
cognitivos: exigência de memorização, falta de treinamento, tomada
de decisão, representações e interação com sistemas.
É importante realizar uma imersão na realidade do trabalho ao
observarmos o trabalhador em ação e todas as suas nuances.

U1 - Ergonomia: conceitos e história 41


Exemplificando
Como já foi visto, tarefa é a prescrição da empresa do que deve ser feito
para se obter os resultados esperados. Atividade é como o trabalhador
usa de si, seu corpo e mente para realizar a tarefa. Como exemplo,
podemos citar um goleiro. Sua tarefa é pegar a bola, defender o gol
e realizar o lançamento para dar início a uma nova jogada. A atividade
envolve qual postura esse jogar irá adotar, como ele pensa e decide a
respeito de para qual jogador lançará a bola, como fica seu rendimento
durante o jogo, quais estratégias utiliza para realizar a tarefa e quais
constrangimentos enfrenta.

Cada atividade é única e só pode ser identificada na real situação de


trabalho. Muitos estudiosos realizam pesquisas voltadas à ergonomia
em laboratórios. Embora sua relevância seja inegável, esses estudos
são desenvolvidos em ambientes controlados, o que pode mascarar
certos fatores que impactam diretamente na realidade do trabalhador.
Dessa forma, sempre que for identificada uma oportunidade de
melhoria em uma situação de trabalho, um piloto deve ser construído
com os trabalhadores e deve ser testado antes da implantação final.
Para uma diagnose ergonômica eficaz, após identificação das
características da empresa, dos trabalhadores e das tarefas a serem
analisadas (de acordo com a demanda), é necessário realizar uma
análise das posturas, tomada de informações, deslocamentos,
necessidade de comunicação e características dos sistemas. Para
isso, realizam-se entrevistas, observação, gravações em vídeo,
fotografia e aplicação de questionários para verificar onde existe
uma incongruência entre o prescrito e o real que afete a saúde e o
desempenho eficiente dos trabalhadores.
É importante ressaltar que a aplicação de um questionário não
deve substituir a análise, e sim complementá-la. Existem diversos
checklists utilizados para verificar aspectos específicos do trabalho (por
exemplo, a postura). Lembrando que o trabalho não demanda apenas
exigências físicas, um questionário de postura irá identificar aspectos
apenas desse domínio, havendo necessidade de ser complementado
por uma análise global que envolva as outras abordagens.
Ao analisar a interação entre o homem, a tarefa e as máquinas/
sistemas, devemos lembrar que o trabalho deve estar adequado às

42 U1 - Ergonomia: conceitos e história


características psicofisiológicas do ser humano. As pessoas tendem
a ultrapassar seus limites para realizar o trabalho prescrito e acabam
utilizando estratégias para dar conta do que lhes foi pedido. Se existe
margem de manobra, ou seja, se a pessoa consegue adaptar a situação
de trabalho, ela o faz. Porém, se a tarefa é altamente prescritiva e
restringe a margem de manobra dos trabalhadores, esse alto controle
faz com que ele deva se adaptar ao que está sendo proposto, o que
pode levar ao adoecimento.
As pessoas são diferentes entre si e ficam diferentes com o passar
do tempo. Padronizar um posto ou uma situação de trabalho pode
deixar de considerar aspectos das pessoas que eram primordiais para
uma boa interação do homem com seu trabalho.

Compreender o trabalho para transformá-lo


Vamos pensar um pouco: é mais eficaz corrigir um problema ou
identificar como evitar um problema? Em ergonomia, diversas vezes,
precisamos ser criativos e identificar como corrigir um problema já
existente. Se for possível analisar uma situação de trabalho enquanto
ela ainda está na fase de projeto, podemos evitar que ela seja
concebida sem considerar as características humanas.
Boa parte dos problemas relacionados à ergonomia ocorrem
porque a situação de trabalho foi concebida sem levar em
consideração a realidade. Pensa-se no posto de trabalho de um
operador de telemarketing e sabe-se que seu trabalho consiste em
“atender o cliente”. Mas o que está por trás disso? Quais dificuldades
esse trabalhador enfrenta todos os dias? O que tem que memorizar?
Até onde ele pode realmente resolver o problema do cliente? De
quem ele depende? Qual o seu grau de autonomia?
Para que o trabalho seja adaptado ao ser humano, quem o realiza
deve ser consultado desde o princípio. Testar uma nova linha de
produção com o trabalhador mais bem treinado, mais saudável,
sem nenhuma intercorrência deixa de considerar que, no dia a
dia, diversos trabalhadores, com ou sem experiência, saudáveis ou
não, com materiais que nem sempre serão de fácil movimentação,
estarão trabalhando naquela linha. Por isso, impor um ritmo que não
permita que esses trabalhadores tenham autonomia sobre ele pode
levar ao adoecimento, uma vez que eles deverão se adaptar ao ritmo
estabelecido sem considerar suas necessidades físicas e cognitivas.

U1 - Ergonomia: conceitos e história 43


O mesmo pode ocorrer com uma pessoa que opera uma
ferramenta desgastada e tem prazo para entregar os materiais que
dependem dessa ferramenta. Ou um gerente de banco que tem
metas para fazer seus clientes pagarem um empréstimo, sendo
que nem sempre esses clientes têm dinheiro para fazer um acordo.
Como estabelecer uma meta sobre aquilo que o trabalhador não
tem controle? Ainda, como uma pessoa pode trabalhar realizando
a digitação de códigos de barra quando os números vêm com difícil
visualização e o local de trabalho está escuro?
É preciso verificar qual a visão da empresa sobre o trabalho e como
a alta hierarquia identifica uma determinada situação. Em seguida,
observamos de perto a situação de trabalho em sua realidade para,
por fim, traduzir para a empresa o que realmente ocorre e quais
problemas estão gerando riscos à segurança, conforto e desempenho
eficiente dos trabalhadores.
Dentre as abordagens da ergonomia, os aspectos físicos são os de
mais fácil visualização, pois são identificados em posturas e esforços
que os trabalhadores realizam na interação com a tarefa e a máquina
durante a realização do trabalho.
Um posto de trabalho ou ferramenta que não considerem as
características físicas dos trabalhadores podem levar a uma baixa
performance e até mesmo ao adoecimento.

Antropometria: as medidas do corpo humano


A Antropometria é o estudo das medidas humanas. Por meio
dela, podemos identificar o tamanho dos segmentos corpóreos e
realizar projetos e design de produtos com maior confiabilidade. Em
ergonomia, utilizamos a Antropometria com grande frequência para
identificar aspectos físicos em postos de trabalho.
Sempre que possível, um posto de trabalho deve apresentar
regulagens, com possibilidade de adaptação à maior parte das
pessoas. Porém, isso gera custos altos para as empresas, que acabam
padronizando as medidas, e nem sempre elas se adéquam às medidas
dos trabalhadores que utilizarão esses materiais. Quando se pretende
obter medidas representativas e confiáveis de uma população,
devemos lembrar que ela sempre será composta de indivíduos dos
mais variados tipos e dimensões. Como já vimos, existem variações

44 U1 - Ergonomia: conceitos e história


intraindividuais (que ocorrem durante a vida de uma pessoa) e
interindividuais (entre as pessoas, como altura, peso e idade).
Além disso, estudos antropométricos mostram que variações étnicas
também influenciam nas medidas dos segmentos corpóreos – os
extremos são encontrados na África e na África Central, com indivíduos
mais altos e mais baixos (os pigmeus), respectivamente. Diversos estudos
antropométricos já foram realizados pelo mundo todo, gerando tabelas
com valores de base para as populações de diferentes regiões.
Existem muitos exemplos de inadequação de produtos
que foram exportados para outros países sem considerar as
necessidades de adaptação aos usuários. Por exemplo, linhas de
produção japonesas foram exportadas para os Estados Unidos,
onde se encontra uma população com medidas consideravelmente
maiores que as do país oriental.
Realizar a correção de um posto de trabalho que foi concebido
de forma inadequada nem sempre é possível. Assim, é primordial
que, sempre que possível, seja analisado o projeto do produto
e realizado um estudo antropométrico para identificar se são
necessárias modificações.
William Sheldon, na década de 1940, realizou um estudo com a
população americana que mapeou três tipos físicos básicos: ectomorfo
(corpo e membros finos, alongado); mesomorfo (tipo musculoso,
ombros e peito largos); e enfomorfo (formas arredondadas, abdome
grande, maior depósito de gordura).
Figura 1.2 | Tipos físicos

Fonte: Iida (2005, p. 104).

U1 - Ergonomia: conceitos e história 45


Para se realizar um estudo antropométrico, a primeira providência
é definir onde ou para que serão utilizadas as medidas. Por exemplo,
para o projeto de um posto de trabalho administrativo, no qual
trabalharão digitadores, podemos utilizar, basicamente, algumas
medidas (a partir do chão) consideradas no projeto de um posto de
trabalho sentado: altura da fossa poplítea (joelho), que indicará altura
do assento; altura do cotovelo (indicará a altura da mesa); altura da
região lombar, que indicará onde ficará o encosto; altura dos olhos
(posição do monitor); altura da coxa (espaço entre assento e mesa);
largura do quadril (largura do assento); tamanho do antebraço e das
mãos (tamanho do apoio de braços, quando existir).

Assimile
Antropometria é a parte da antropologia que trata da mensuração do
corpo humano e de suas partes. Para o dimensionamento de objetivos,
produtos e postos de trabalho, utilizamos os conceitos de antropometria
para assegurar a adaptação às características físicas das pessoas.

Esse é um exemplo de medidas da antropometria estática, em que


a pessoa estará parada em uma posição e são realizadas as medidas
dos segmentos corpóreos. Por sua vez, a antropometria dinâmica
analisa movimentos e zonas de alcance.

Figura 1.3 | Exemplos de zonas de alcance máximo na posição sentada

Plano transversal Plano sagital


20 cm acima do cotovelo 10 cm à direita do plano de simetria
Fonte: Iida (2005, p. 125).

46 U1 - Ergonomia: conceitos e história


Essas medidas possibilitam não apenas a construção de postos de
trabalho, mas a criação de modelos computacionais, tridimensionais
e matemáticos que podem realizar simulações.
De acordo com a Antropometria, sabemos que nem sempre é
possível adequar um posto de trabalho ou o design de qualquer produto
a todas as pessoas. Por isso, procura-se adequar o projeto à maioria das
pessoas e promover adaptações aos que não se adequarem.

Reflita
Não existe homem-médio. Mas então, como podemos agir para
garantir o máximo de adaptabilidade das pessoas a um mesmo posto
de trabalho? Pensando em tudo o que já foi aprendido em ergonomia,
lembre-se de que cada situação é única, porém, garantir o máximo de
margem de manobra e autonomia podem ser saídas interessantes para
problemas relacionados à concepção de novas situações de trabalho.

O levantamento de dados antropométricos mostra a variabilidade


das dimensões de uma população, portanto, não podem ser
consideradas as medidas que se referem a uma população de outra
região, pois isso pode influenciar nos resultados finais.
Sempre que possível, devemos adequar o desenho de postos de
trabalho e produto a todos os trabalhadores. Embora nem sempre
seja possível, os princípios de usabilidade e desenho universal podem
auxiliar nessa tarefa.

Usabilidade e desenho universal


O desenho universal visa à concepção de equipamentos, estruturas
e objetos para serem utilizados pela maioria das pessoas, de forma
simples, intuitiva e sem necessitar de projetos de adequação.

Assimile
Já aconteceu de você preferir comprar uma impressora nova a tentar
consertar a que já tem? Ou já saiu correndo porque sua avó não sabia
como manusear o controle da televisão e trocou de canal sem querer?

U1 - Ergonomia: conceitos e história 47


Problemas de usabilidade e desenho universal podem levar o usuário a
erros e até mesmo a desistir de utilizar determinado serviço ou produto.
Isso ocorre porque, muitas vezes, o teste com o usuário é realizado
somente no final do processo de criação. Consultar as pessoas que
utilizarão determinado produto ou serviço desde o início é primordial
para garantir o máximo de adaptação.

Para que se trate de desenho universal, sete princípios básicos


devem ser seguidos:
1) utilização equitativa: pode ser utilizado por qualquer um;
2) flexibilidade: engloba diversas preferências e capacidades individuais;
3) simplicidade e intuitividade: fácil de compreender
independentemente do nível de experiência das pessoas;
4) informação perceptível: informação condiz com as capacidades
sensoriais do utilizador;
5) tolerância ao erro: minimiza consequências negativas de ações
acidentais ou involuntárias;
6) esforço físico mínimo;
7) dimensão e espaço adequados para utilização.
O desenho universal garante o máximo de acessibilidade: a ausência
de barreiras para garantir a igualdade de oportunidades e usabilidade,
que é a facilidade com que as pessoas podem empregar uma
ferramenta ou objeto a fim de realizar uma tarefa específica. Aplicado a
um projeto, consiste na criação de ambientes e produtos que possam
ser usados por todas as pessoas, na sua máxima extensão possível.
De forma geral, as contribuições da ergonomia são relevantes
para as práticas projetuais. A área com o enfoque no design apresenta
interesse para melhorias das condições humanas que abrange não
apenas o trabalho executado a partir de máquinas e equipamentos
mas também as demais situações em que ocorre o relacionamento
entre o homem e uma atividade produtiva.

48 U1 - Ergonomia: conceitos e história


Pesquise mais
O comercial do Banco Itaú intitulado Crianças e a evolução tecnológica
(disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=oHm4TopsB7A>.
Acesso em: 18 maio 2017) mostra a questão de usabilidade pela
perspectiva de crianças tentando entender o funcionamento de objetos
antigos. Para garantir a usabilidade, o produto deve respeitar nossas
representações mentais e ser intuitivo, e o vídeo mostra como as
crianças lidam com isso.

Esperamos que tenha compreendido o que é usabilidade,


antropometria, desenho universal e a importância de se compreender
o trabalho para transformá-lo.
Agora que finalizamos esta unidade de ensino, para melhor
aplicabilidade dos conhecimentos adquiridos, elabore um manual
com recomendações de prevenção a riscos ergonômicos para
alguma tarefa específica de sua escolha. Para a confecção desse
manual, faça uma introdução sobre ergonomia, descrição da tarefa
escolhida (com fotos e apontamentos sobre os constrangimentos
identificados) e as recomendações que achar pertinentes.

Sem medo de errar

Depois de muito estudo, você adquiriu diversos conhecimentos


relacionados à ergonomia, à sua importância nas empresas, às
questões voltadas à tarefa e à atividade, aos domínios físico, cognitivo e
organizacional, à antropometria, ao desenho universal e à usabilidade.
Agora, chegou a hora de analisarmos a última etapa da situação-
problema apresentada no Diálogo aberto.
Vimos que você é um profissional de uma empresa do ramo
de cosméticos e o único integrante da equipe que conhece sobre
ergonomia. Você realiza a primeira reunião com a equipe de ergonomia
e inicia a capacitação para que eles possam começar os trabalhos de
prevenção e resolução dos problemas relacionados à ergonomia.
Assim, você explica que um bom caminho para começar a
abordagem ergonômica é identificar fatores organizacionais,
cognitivos e físicos. Um estudo antropométrico voltado ao

U1 - Ergonomia: conceitos e história 49


mapeamento das medidas corpóreas da população trabalhadora será
de grande utilidade ao analisar as medidas dos postos de trabalho e as
posturas adotadas por esses trabalhadores.
Isso é importante porque, caso não haja um bom dimensionamento
do posto de trabalho de acordo com as dimensões do corpo humano,
os trabalhadores podem adotar posturas desconfortáveis que podem
levar ao adoecimento. Utilizar os preceitos de desenho universal (que
visa à concepção de equipamentos, estruturas e objetos para serem
utilizados pela maioria das pessoas, de forma simples, intuitiva e sem
necessitar de projetos de adequação) e usabilidade, que é um termo
utilizado para definir a facilidade com que as pessoas empregam uma
ferramenta ou mesmo um objeto para realizar uma determinada
tarefa, é essencial para garantir uma boa adequação do trabalhador. É
preciso compreender o trabalho para transformá-lo, e isso só é possível
observando-se de perto a realidade do trabalho e as características da
tarefa prescrita que possam gerar constrangimentos aos trabalhadores.
A partir desses conceitos, você e sua equipe estão prontos para realizar
intervenções relacionadas à ergonomia com sucesso.

Avançando na prática

A filial japonesa da fábrica de eletrônicos


Descrição da situação-problema
Uma indústria japonesa do ramo de eletrônicos decide instalar
uma de suas filiais no Brasil. Para isso, exporta suas linhas de
produção e os sistemas de computador utilizados para controle
dos ritmos e métodos do setor operacional. Após apenas um
mês de funcionamento, o departamento médico constata uma
alta rotatividade de trabalhadores (muitos pedem demissão e
outros são contratados em seu lugar) e diversos afastamentos
por problemas na coluna. Ao analisar a linha de produção, você
percebe que ela foi toda desenvolvida para a população japonesa
e que os trabalhadores estão realizando suas tarefas em posturas
inadequadas por não terem espaço para acomodarem suas pernas,
devido ao fato de a linha estar com altura baixa para a operação.
O que será preciso fazer para adequar as linhas de produção e
diminuir os problemas?

50 U1 - Ergonomia: conceitos e história


Resolução da situação-problema
Para adequar a linha de produção às características dos
trabalhadores, é necessário realizar uma Análise Ergonômica
do Trabalho para identificar onde os trabalhadores estão
encontrando problemas e como a tarefa está gerando problemas
que levam aos afastamentos. Durante a análise, é importante
realizar um estudo antropométrico e identificar quais posturas e
esforços estão sendo realizados e que podem estar levando aos
afastamentos e à rotatividade dos trabalhadores. Após identificar
os possíveis problemas e propor soluções, é necessário realizar as
modificações da situação de trabalho envolvendo os trabalhadores
e experimentando um protótipo, antes de modificar de forma
irreversível, considerando a população que irá interagir com esse
posto de trabalho e a adaptação da maioria, sempre priorizando
regulagens, quando forem possíveis.

Faça valer a pena


1. O desenho universal garante o máximo de acessibilidade, que é
a ausência de barreiras que garante a igualdade de oportunidades e
usabilidade. O que é usabilidade?
Assinale a alternativa correta.
a) Capacidade de usar ou ser usado.
b) Termo utilizado para definir a facilidade com que as pessoas empregam
uma ferramenta ou mesmo um objeto para realizar uma determinada tarefa.
c) Termo utilizado em informática para tratar do ser humano utilizando
um computador.
d) É o sinônimo de Ergonomia Organizacional.
e) É o termo utilizado para adequações de pessoas com deficiência.

2. Em ergonomia, sabe-se que projetar um posto de trabalho ou uma


ferramenta sem considerar as reais medidas do ser humano pode levar a
problemas de saúde, de segurança e de desempenho eficiente.
Qual o nome da ciência que estuda as medidas do corpo humano?
a) Fisiologia.
b) Psicologia.
c) Engenharia.
d) Antropometria.
e) Usabilidade.

U1 - Ergonomia: conceitos e história 51


3. _______________________, traduzida da palavra “constrain”, é uma
palavra utilizada em ergonomia que diz respeito às restrições e limitações
que a tarefa prescrita pode apresentar ao trabalhador.
Complete a frase:
a) Usabilidade.
b) Tarefa.
c) Atividade.
d) Constrangimento.
e) Contração.

52 U1 - Ergonomia: conceitos e história


Referências
ABRAHÃO, J. I. et al. Introdução à ergonomia: da prática à teoria. 1. São Paulo:
Blucher, 2009.
BRASIL. Ministério do Trabalho e Emprego. Manual de aplicação norma
regulamentadora nº 17. 2. ed. Brasília: MTE/SIT, 2002.
COMERCIAL Itaú - crianças e a evolução tecnológica. 16 abr. 2011. Disponível em:
<https://www.youtube.com/watch?v=oHm4TopsB7A>. Acesso em: 18 maio 2017.
CYBIS, W A. Ergonomia e usabilidade: conhecimentos, métodos e aplicações. São
Paulo: Novatec, 2015.
GGUÉRIN, F. et al. Compreender o trabalho para transformá-lo: a prática da ergonomia.
São Paulo: Edgard Blucher, 2001.
IIDA, Itiro. Ergonomia: projeto e produção. 2. ed. São Paulo: Blucher, 2005.
LIMA, F.; DUARTE, F. LIMA, Francisco; DUARTE, Francisco. Integrando a ergonomia ao
projeto de engenharia: especificações ergonômicas e configurações de uso. Gestão e
Produção [online]. v. 21, n. 4, p. 679-690, 2014. Disponível em: <http://www.scielo.br/
scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-530X2014000400002&lng=en&nrm=iso>.
Acesso em: 26 mar. 2017.

U1 - Ergonomia: conceitos e história 53


Unidade 2

Macroergonomia

Convite ao estudo
Prezado aluno, nesta unidade, começaremos a sistematizar
nossos estudos em Ergonomia aprendendo a realizar uma Análise
Ergonômica do Trabalho, cuja obrigatoriedade consta na Norma
Regulamentadora 17, do Ministério do Trabalho e Emprego.
Dessa forma, aprenderemos cada etapa da Análise Ergonômica
do Trabalho, como sistematizar seu estudo, como estruturar
os registros de tudo que é visto, falado e acordado na empresa,
sempre com a participação dos trabalhadores envolvidos na
situação de trabalho escolhida para ser analisada.

Como vimos na Unidade 1, é de extrema importância valorizar


os saberes dos trabalhadores. É papel do ergonomista conversar
com todas as pessoas envolvidas na situação de trabalho que
gera a demanda de um estudo em ergonomia. Existem diversas
informações a serem colhidas, opiniões a serem ponderadas,
situações e elementos a serem observados e muita conversa para
acontecer. É importante seguir alguns passos e prestar atenção
a alguns fatores de forma a identificar os constrangimentos
pelos quais os trabalhadores passam para atingir os resultados
envolvidos na tarefa. Ao entender as diferenças entre a tarefa
prescrita e o trabalho real e verificar como o trabalhador utiliza
seu corpo e sua mente para dar conta do que lhe é proposto,
podemos identificar as oportunidades de melhoria e propor
soluções para transformar o trabalho.

Assim, na Unidade 2, aprenderemos as etapas da


Intervenção Ergonômica; a metodologia da Ergonomia da
Atividade; fatores humanos no trabalho (especificamente,
iniciando nossos estudos em biomecânica e fisiologia); e a
atuação do ergonomista nas empresas.
Ao final desta unidade, você terá atingido os objetivos do
estudo e será capaz de desenvolver uma Análise Ergonômica do
Trabalho. Além disso, saberá os impactos do trabalho no corpo dos
trabalhadores, identificando aspectos de interação do ser humano
com outros elementos e sistemas.

Para facilitar a compreensão dos conteúdos, será apresentada


uma situação hipotética: você é contratado como ergonomista
em uma empresa fabricante de mobiliário e precisa auxiliar na
elaboração de um protótipo de posto de trabalho para gerentes
de relacionamento de um grande banco. Os gerentes estão
reclamando que o atual mobiliário possui quinas vivas, tem uma
cadeira sem regulagens que causa desconforto na região das
costas e não está bem localizado com relação às janelas. Para
realizar o projeto, você sabe que deve obedecer a alguns preceitos
com base na ergonomia para assegurar o conforto, a segurança e
o desempenho eficiente dos trabalhadores. Os gerentes precisarão
de uma mesa, cadeira, telefone, impressora e computador. Para
iniciar o trabalho, você precisa se lembrar: quais são as zonas
de alcance que devem ser respeitadas? Qual a demanda desse
trabalho? Por que é necessário realizar uma Análise Ergonômica
do Trabalho antes de se modificar o mobiliário? Qual será o seu
papel como ergonomista?

Em cada seção desta unidade, você irá aumentar seus


conhecimentos em ergonomia e irá ajudar sua equipe nas etapas
para realização do seu estudo e sistematização de um documento
final que mostre esses resultados e propostas.

Você será o principal responsável pelo sucesso dessa


intervenção, lembrando que um mobiliário nunca é “apenas
um mobiliário”, ele fará parte de um contexto e deve ser
escolhido com a opinião de todos os envolvidos.

Vamos iniciar nossos estudos! Lembre-se de que todo trabalho


se reflete profundamente na vida e na felicidade da pessoa que
o executa. Você tem papel fundamental na transformação do
trabalho e da qualidade de vida dos trabalhadores.

Bons estudos!
Seção 2.1
Etapas, métodos e técnicas da intervenção ergonômica
Diálogo aberto

Relembrando a situação-problema do Convite ao estudo, na


qual você é contratado como ergonomista em uma empresa de
mobiliário para auxiliar na elaboração de um protótipo de posto de
trabalho para gerentes de relacionamento de um grande banco,
você realiza a primeira visita ao banco para identificar qual a demanda
que levou à sua contratação. Ao visitar a agência para iniciar a
análise ergonômica do trabalho dos gerentes de relacionamento
para a modificação do seu mobiliário, precisa identificar quais serão
as etapas da intervenção ergonômica. Para isso, é importante que
relembre: o que é a demanda e qual é a demanda nesse caso? Qual
é a importância de realizar uma análise global da empresa e da
população de trabalhadores? Quais são os impactos de se analisar a
tarefa na escolha das características do mobiliário?
Para que você consiga responder a esses e outros questionamentos,
esses conteúdos serão abordados de forma contextualizada no item
Não pode faltar.

Não pode faltar

A obrigatoriedade da Análise Ergonômica do Trabalho consta na


Norma Regulamentadora nº 17, do Ministério do Trabalho e Emprego.
Todo estudo em ergonomia tem como objetivo a segurança, o
conforto e o desempenho eficiente dos trabalhadores, dessa forma,
deve ser sistematizado para que as informações sejam compreendidas
por todos os envolvidos.
Assim, a Ergonomia da Atividade, tendo sua origem na França,
possui uma metodologia própria, considerando aspectos voltados ao
trabalho real e aspectos sociais contidos no contexto no qual aquele
trabalho está inserido.

U2 - Macroergonomia 57
Não há um modelo pronto e são diversos os exemplos de
documentos que sistematizam uma Análise Ergonômica do Trabalho,
porém existem algumas etapas básicas que precisam ser seguidas
para se garantir que os aspectos mais importantes da situação de
trabalho sejam analisados.

Etapas da intervenção ergonômica


O primeiro item da Norma Regulamentadora nº 17 (NR 17) aponta
que o principal objetivo da ergonomia é estabelecer parâmetros que
permitam a adaptação das condições de trabalho às características
psicofisiológicas dos trabalhadores, de modo a proporcionar um
máximo de conforto, segurança e desempenho eficiente.
Quando falamos em “parâmetros”, não estamos falando,
necessariamente, de números e questões quantitativas. Percebe-se
uma tentativa constante de criar regras, manuais, números, indicadores
e tantas outras limitações que acabam restringindo cada vez mais a
autonomia das pessoas, na tentativa de alcançar um padrão que molde
cada pessoa e cada fazer como se todas as situações fossem iguais.
Por exemplo: qual o peso correto para caixas serem carregadas
sem prejudicar a saúde das pessoas?
Muitos já tentaram estabelecer um padrão. A própria Consolidação
das Leis do Trabalho (CLT), em seu Capítulo V, Título II, artigo 198, diz
que é 60 kg o peso máximo que um trabalhador pode carregar. O
estabelecimento de um peso depende das condições e do contexto
onde essas caixas estão.
A que altura elas estão do chão (quanto mais baixas, maior esforço
na coluna para alcançá-las e manipulá-las)? São fáceis de pegar?
Quantas vezes por minuto elas devem ser carregadas? Quanto tempo
na jornada o trabalhador dedica para carregá-las? Existe assimetria
nesse trabalho de forma a aumentar a sobrecarga na coluna?
Perceba que o peso das caixas é apenas um dos fatores. Todas essas
perguntas podem ser respondidas com uma infinidade de respostas,
dependendo de cada situação, de cada trabalho e de cada trabalhador.
O papel do ergonomista se foca aqui: os limites de tolerância nem
sempre podem ser medidos objetivamente. Às vezes, uma solução
sempre é dar maior flexibilidade, autonomia e opções para que o
trabalhador escolha a melhor forma de trabalhar. Para avaliar conforto,

58 U2 - Macroergonomia
apontado na NR 17 como objetivo da ergonomia, é imprescindível a
expressão do trabalhador, pois só ele pode confirmar a adequação
das soluções propostas.
Sabemos que é difícil para técnicos acostumados a lidar com
números e valores objetivos terem de levar em conta a opinião dos
trabalhadores e se basearem nela para realizar mudanças no trabalho.
Como “provar” que essa solução será melhor? Onde estão os números?
Onde estão as tabelas que identificam riscos em uma atividade?
É sempre importante, ao iniciar um estudo em ergonomia,
capacitar as pessoas e ensiná-las sobre os objetivos e a metodologia da
ergonomia, para evitar expectativas que induzam a números que não
fazem sentido. Lembre-se de que a origem das atuais inadequações
existentes no mundo do trabalho deve-se, em grande parte, à
separação radical entre a concepção das condições e organização do
trabalho e a sua execução (por exemplo, na Administração Cientifica
do Trabalho de Taylor, vista na Unidade 1). Ao se ignorar a opinião
do trabalhador e tentar apontar tudo objetivamente, esquecemos
aspectos cognitivos essenciais nas condições de trabalho. Essas
condições se referem ao levantamento, ao transporte, descarga
de materiais e mobiliário, equipamentos, às condições ambientais,
ao posto de trabalho, à organização do trabalho e aos aspectos
cognitivos (treinamentos, aprendizado, decisões).

Reflita
É importante apontar que a organização do trabalho não deve ser
considerada intocável e passível de ser modificada apenas por iniciativa da
empresa. Os trabalhadores devem ter voz a respeito de como o trabalho
é conduzido e seus saberes devem ser considerados na concepção de
cada aspecto do trabalho. Precisamos nos perguntar até que ponto as
regras, os ritmos, as metas e os indicadores condizem com a realidade.
Será que o trabalhador é avaliado verdadeiramente pelo seu trabalho?
Será que o sistema implantado realmente facilita o trabalho?

A Análise Ergonômica do Trabalho não possui um modelo


ou protocolo especifico, porém possui 12 passos que devem ser
minimamente seguidos de acordo com o Manual de Aplicação da

U2 - Macroergonomia 59
Norma Regulamentadora nº 17. Eles estão esquematizados na Figura
2.1 e serão vistos em detalhes ao longo desta seção.

Figura 2.1 | Os 12 passos para elaboração da Análise Ergonômica do Trabalho

Fonte: elaborada pelo autor.

Metodologia da ergonomia da atividade: a demanda e a análise


global da empresa e dos trabalhadores
Toda Análise Ergonômica do Trabalho parte de uma demanda, e
este é o primeiro passo:
1) Análise da demanda e do contexto.
A obrigatoriedade desse estudo de acordo com a Norma
Regulamentadora nº 17 tem levado as empresas, muitas vezes, a a
realizarem a Análise Ergonômica do Trabalho de forma rotineira e
protocolar, o que leva a análises superficiais que não contribuem com
a melhoria das condições de trabalho.
Sempre que uma empresa for notificada a realizar uma Análise
Ergonômica do Trabalho, todos devem ter clareza do objeto de
análise: ergonomista, trabalhadores envolvidos na situação de trabalho,
departamento de saúde, chefia imediata, alta hierarquia da empresa,
enfim, todos que de alguma forma influenciam aquele trabalho. A
Análise Ergonômica do Trabalho deve deixar clara, no início, qual foi a
demanda que a motivou, para que todos saibam de quais problemas

60 U2 - Macroergonomia
esse documento irá tratar. Toda situação de trabalho precisa ser
analisada para identificar seus aspectos reais, porém, uma vez que
não há queixas e problemas apontados, aquela situação não precisa
ser estudada. Esse é um processo construtivo e participativo para a
resolução de um problema complexo que exige o conhecimento das
tarefas, da atividade desenvolvida para realizá-las e das dificuldades
enfrentadas para se atingir o desempenho e a produtividade exigidos.
A demanda pode ser de saúde (acidentes e doenças), social
(reclamação de sindicato), legal (multas, notificações e fiscalizações) e
para melhorar a qualidade de um produto ou serviço para ganhos de
produtividade. Ela deve ser discutida e reconstruída pelo ergonomista
e seus interlocutores logo nos primeiros contatos. A origem do
problema, algumas vezes, não é o que havia sido explicado e pode
ser que não estivesse claro a todos os envolvidos.
Após análise da demanda e do contexto para situar o problema
a ser analisado, o segundo passo é: 2) análise global da empresa.
Aqui, precisamos identificar características próprias da empresa para
contextualizar a situação de trabalho. Dessa forma, identificamos
localização geográfica, situação econômica, grau tecnológico, quem
são seus clientes, sua regulamentação (regras internas, procedimentos,
políticas, estratégias), tipos de produto e serviço (inclusive, padrões
de qualidade e certificações), estrutura administrativa (organogramas
e fluxogramas de processos que estejam relacionados à demanda),
características das matérias-primas, variações sazonais da produção,
principais tarefas, arranjo físico (leiaute), automação, metas produtivas,
capacidade de produção, índice de produtividade e organização do
trabalho (horários, turnos, cadências, ritmos, remuneração, forma de
contratação e exigências).
Esse mapeamento é importante para identificar, inclusive, as
melhorias a serem propostas.
Em seguida, precisamos realizar o terceiro passo: 3) análise da
população trabalhadora. Devemos mapear a política de pessoal, faixa
etária, se há rotatividade, tempo de casa, experiência, categorias, níveis
hierárquicos, características antropométricas, pré-requisitos, nível de
escolaridade e capacitação (quais treinamentos específicos a empresa
proporciona para cada tarefa), estado de saúde e absenteísmo.
Devemos conhecer os trabalhadores para entender como
melhorar o trabalho para eles. É importante ressaltar que, ao tratar da

U2 - Macroergonomia 61
idade e do tempo de casa dos trabalhadores, não apontamos a média
de idade, e sim as faixas etárias em histograma.

Exemplificando
A Figura 2.2 mostra um exemplo de descrição de faixa etária de uma
população de trabalhadores.

Figura 2.2 | Exemplo de histograma com a distribuição de frequências


referentes à idade

Fonte: elaborada pelo autor.

Perceba que as idades estão agrupadas em faixas etárias. Assim,


conseguimos visualizar a distribuição de idades e identificar, inclusive,
se a empresa permite um envelhecimento da sua população de
trabalhadores ou se é uma empresa que emprega apenas jovens.

Metodologia da Ergonomia da Atividade: a tarefa e o pré-diagnóstico


Após identificar a demanda e reconstruí-la, podemos identificar
quais situações de trabalho precisam ser analisadas. Este é o quarto
passo: 4) definição das situações a serem estudadas.
Essa definição está totalmente relacionada à demanda reformulada.
Estudamos apenas as situações que envolvem a demanda escolhida.
Como vimos na Unidade 1 de nosso estudo, é imprescindível
identificar aspectos da tarefa prescrita (o que a empresa espera) e do

62 U2 - Macroergonomia
trabalho real. Realizar reuniões iniciais para identificar a participação
de cada ator naquela situação de trabalho e o que cada um pensa
sobre a demanda do estudo é essencial.
Por exemplo: um engenheiro de processos pode acreditar que
seu sistema de indicadores de desempenho seja a melhor forma de
identificar os melhores trabalhadores e busca apontar como elegíveis
para promoção apenas os trabalhadores que se dão bem com esse
sistema. Pode acontecer, na realidade, de trabalhadores altamente
capacitados não serem bem avaliados pelo sistema, o qual não
considera aspectos reais do trabalho.
Assim, o quinto passo é: 5) descrição das tarefas (prescritas e reais) e
das atividades desenvolvidas para executá-las (como o trabalhador age,
pensa, usa seu corpo e sua mente). É importante que a descrição da tarefa
permita compreender o que o trabalhador deve fazer (a tarefa), como
proceder para atingir esse objetivo (atividade) e as dificuldades que enfrenta.
Nessa descrição, devemos mapear dados: a) sobre os trabalhadores
(formação necessária, quem faz o que, o que utiliza, de quem precisa,
aspectos biomecânicos e antropométricos, posturas utilizadas, para onde
olha e de quais informações precisa, demanda cognitiva, decisões a serem
tomadas, ações imprevistas, com quem precisa se comunicar, de quem
e do que depende, deslocamentos necessários); b) dados do posto de
trabalho (dimensões, órgãos de comando, sinalizações, princípios de
funcionamento de máquinas e ferramentas, problemas aparentes), como
quinas vivas, panes e falta de calibração, por exemplo; c) interação homem
x máquina (informações necessárias, improvisações, gambiarras, principais
regulações em relação ao homem, ao posto, ao sistema); d) dados
ambientais (conforto térmico, iluminamento, ruído que possa atrapalhar
na concentração e causar desconforto, vibração, questões tóxicas).

Assimile
Iluminação e iluminamento são duas coisas diferentes. Iluminação é o
efeito provocado pela luz. Digamos que é a luz que sai de uma fonte
natural (janela) ou artificial (lâmpadas). Iluminamento é o quanto de luz
incide sobre uma superfície. Pode ser que em um ambiente haja muita
iluminação, mas alguns postos de trabalho podem ser prejudicados
(por exemplo, por questões de leiaute inadequado). Assim, problemas
específicos de iluminamento podem levar ao desconforto visual ou
ainda podem limitar a visibilidade de informações importantes.

U2 - Macroergonomia 63
Ao descrever a tarefa e como a atividade surge, precisamos mapear
as exigências do trabalho. Algumas perguntas devem ser feitas: quais os
esforços dinâmicos (movimentos, deslocamentos, carregamento de
peso) e estáticos (duração e frequência de postura exigida)?; Quais são as
exigências sensoriais, Quais órgãos dos sentidos são recrutados, cores,
sinais luminosos, sons, estímulos, comandos e grau de precisão exigido?
Quanto mais rígidas as regras e o grau de precisão de alguma
tarefa, mais limitado estará o trabalhador. Quanto maior a margem
de manobra (flexibilidade e autonomia) do trabalhador, mais fácil de
adequar o sistema às suas necessidades.
O sexto passo é: 6) estabelecimento de um pré-diagnóstico
e, como o nome indica, ainda não é o diagnóstico final. Nessa
etapa, deve ser explicitado às várias partes envolvidas tudo o que foi
entendido e analisado com relação à tarefa e situação de trabalho
motivada pela demanda. Assim, tudo será validado, podendo o
ergonomista continuar com essas conclusões ou abandoná-las
como hipótese para o problema, verificando se tudo que analisou até
então faz sentido para o estudo.
Em seguida, temos o sétimo passo: 7) observação sistemática.
Filmar, fotografar, observar livremente, entrevistar (questionários,
roteiros semiestruturados) e realizar grupos focais são métodos de
coleta de informação. Avaliar conforto de acordo com a opinião de
um único trabalhador pode não ter validade geral. Deve-se conversar
com diversos trabalhadores e, principalmente, validar com eles se o
que você entendeu e escreveu faz sentido para todos. Realize grupos
em que as pessoas falam livremente sobre o que elas fazem. Perguntar
o que uma pessoa faz e como é seu trabalho é um início poderoso.
Você pode se surpreender com a quantidade de informações e
saberes que partem das verbalizações dos trabalhadores.
Ao pedir para que o trabalhador reflita sobre o que faz e sobre
a importância do que faz, você já causa uma transformação: o
reconhecimento do sentido no trabalho é um dos caminhos que leva
à saúde.
Caso encontre alguma frase importante, você pode citá-la na
análise, jamais identificando quem a disse. Um termo de consentimento
assegurando a confidencialidade das informações é essencial.
Existem, na literatura, alguns modelos de checklists utilizados em
ergonomia. Lembre-se de que nenhum deles consegue mapear

64 U2 - Macroergonomia
uma situação de trabalho em sua totalidade. Conversar com os
trabalhadores e valorizar seus saberes e opiniões é muito importante.
Mesmo assim, esses checklists e ferramentas podem ser utilizados
como métodos auxiliares, sempre complementados pela opinião
do ergonomista, devido à limitação deles. Alguns exemplos são:
Equação Niosh de levantamento e transporte de cargas, Rapid Upper
Limb Assessment (Rula), Occupational Repetitive Action (Ocra), Strain
Index, Checklists de Couto, entre outros.

Pesquise mais
Para saber mais sobre os checklists utilizados em ergonomia, leia o
Capítulo 2 da dissertação de mestrado de Joellen Ligeiro, intitulada
Ferramentas de Avaliação Ergonômica em Atividades Multifuncionais:
A contribuição da Ergonomia para o design de ambientes de trabalho,
de 2010, disponível em: <https://www.faac.unesp.br/Home/Pos-
Graduacao/MestradoeDoutorado/Design/Dissertacoes/joellen-ligeiro.
pdf>. Acesso: em: 27 abr. 2017.

Além disso, para entender melhor a limitação dos checklists, leia o artigo A
contribuição da ergonomia para a identificação, redução e eliminação da
nocividade do trabalho, de Ada Ávila Assunção e Francisco P. A. Lima (2003),
disponível em: <http://www.forumat.net.br/at/sites/default/files/arq-paginas/a_
contribuicao_da_ergonomia_para_a_ident._reducao_e_eliminacao_da_
nocividade_cap_rene_mendes.pdf> acesso em: 27 abr. 2017.

Metodologia da Ergonomia da Atividade: o diagnóstico e a


proposta de melhorias
O oitavo passo é: 8) diagnóstico ou diagnósticos do problema
apontado como demanda para a Análise Ergonômica do Trabalho.
Depois de analisar todas as situações em detalhe e sistematizá-
las, é possível formular um diagnóstico que permitirá o melhor
conhecimento da situação de trabalho.
Chegar a um diagnóstico quer dizer encontrar a causa dos
sintomas referentes à situação de trabalho. Em um frigorífico,
podemos atribuir uma inflamação dos nervos da mão devido aos
movimentos repetitivos, porém esses movimentos, provavelmente,
foram motivados pela velocidade da esteira da linha de produção.

U2 - Macroergonomia 65
Reflita
Dessa forma, é possível propor uma solução simplificada para essa
situação, como a troca da ferramenta de corte?

Alterar a organização do trabalho pode ser a única saída para a


preservação da saúde, de acordo com a situação.

Por fim, os últimos três passos são correlacionados: 9) validação


do diagnóstico: em que o ergonomista o apresenta a todos os
atores envolvidos, os quais poderão confirmá-lo, rejeitá-lo ou sugerir
maiores detalhes que escaparam à sua percepção; 10) projeto de
modificações: alteração para sanar os problemas e transformar
realmente a situação do trabalho resolvendo os problemas e
reduzindo os fatores que induzem ao adoecimento, à insegurança
ou ineficiência; 11) cronograma de implantação: traçar um plano
de ação com data, responsáveis, objetivos e custos, e de acordo
com prazos, prioridades e urgências; 12) acompanhamento das
modificações: o ergonomista não deve abandonar o estudo na
entrega das informações iniciais. É primordial que ele acompanhe as
modificações, e isso deve estar acordado desde o início. É preciso
avaliar o impacto das modificações sobre os trabalhadores e, se
possível, formar um comitê de melhorias relacionadas à ergonomia
que seja capacitado para continuar com os estudos e as melhorias.
Finalizando, esperamos que tenha compreendido as fases da Análise
Ergonômica do Trabalho e a metodologia da Ergonomia da Atividade.

Sem medo de errar

Após ter adquirido conhecimento sobre ergonomia e as etapas


necessárias para se realizar a Análise Ergonômica do Trabalho, você
é capaz de analisar a situação-problema apresentada no Diálogo
aberto e iniciar a capacitação da equipe que irá resolver os problemas
relacionados à ergonomia na agência bancária em questão.
Você é contratado como ergonomista em uma empresa de
mobiliário para auxiliar na elaboração de um protótipo de posto de
trabalho para gerentes de relacionamento de um grande banco.

66 U2 - Macroergonomia
Você realiza a primeira visita à agência bancária para identificar qual a
demanda que levou à sua contratação.
Dessa forma, você identifica que a demanda inicial é a modificação
do mobiliário.
Ao visitar o banco para iniciar a análise ergonômica do trabalho dos
gerentes de relacionamento para a modificação do seu mobiliário, você
precisa identificar que as etapas da intervenção ergonômica são: 1)
identificação e reformulação da demanda; 2) análise global da empresa;
3) análise da população de trabalhadores; 4) definição da situação a
ser estudada; 5) descrição da tarefa; 6) pré-diagnóstico; 7) observação
sistemática; 8) diagnóstico; 9) validação do diagnóstico; 10) propostas de
melhorias e projetos; 11) cronograma de ação; 12) acompanhamento.
Para uma boa análise do mobiliário e realização de considerações
pertinentes, essa análise deve ser feita considerando os saberes
dos trabalhadores e sua opinião sobre o conforto com relação ao
mobiliário, entendendo quais as facilidades e dificuldades que ele
representa na realização da tarefa.
Ao analisar a tarefa, a população de trabalhadores e as características
da empresa, podemos traçar um plano de ação contextualizado à
realidade da empresa e de seu grau tecnológico, além de adequar as
características fisiológicas da população de trabalhadores específica
daquela empresa. Ao analisar a tarefa na escolha das características
do mobiliário, podemos garantir que os trabalhadores foram ouvidos,
opinaram e que foram observados todos os aspectos da utilização
daquele mobiliário que podem influenciar na realização do trabalho.

Avançando na prática

Epistemologia e ética em Ergonomia


Descrição da situação-problema
Você é chamado por uma montadora de veículos para realizar
a Análise Ergonômica do Trabalho em uma de suas filiais. Como a
filial é nova, pedem que você analise todas as situações de trabalho
da empresa, em busca de propostas de melhoria. Após a conclusão
do estudo, você identifica que uma das situações de trabalho exige
que o trabalhador realize muitos movimentos repetitivos e força
excessiva. Ao validar esse diagnóstico, o empregador pede que

U2 - Macroergonomia 67
você retire essa informação de seu relatório. O que é preciso fazer
nessa situação?

Resolução da situação-problema
É necessário registrar a realidade do trabalho e propor melhorias.
Não há importância em registrar um problema voltado à ergonomia.
O que é preciso é montar um cronograma e manter o foco nas
modificações que devem ser feitas para adequar o trabalho às
características psicofisiológicas dos trabalhadores. Lembre-se de
que é o seu nome que estará vinculado às informações coletadas
e existe responsabilidade civil e criminal com relação à omissão de
informações referentes à saúde e segurança no trabalho. Oriente o
empregador a manter as informações e direcionar as energias para
modificações que não serão benéficas apenas aos trabalhadores, mas
sim a toda a empresa.

Faça valer a pena

1. Não existe um modelo pronto de Análise Ergonômica do Trabalho, porém


existem algumas etapas básicas que precisam ser seguidas para se garantir
que os aspectos mais importantes da situação de trabalho sejam analisados.
A respeito das etapas para a realização da Análise Ergonômica do Trabalho,
assinale a alternativa correta.
a) São 12 passos: demanda, análise global da empresa, análise global da
população trabalhadora, definição da situação de trabalho, descrição da
tarefa, pré-diagnóstico, observação sistemática, diagnóstico, validação do
diagnóstico, proposta de melhoria, cronograma e acompanhamento.
b) São 5 passos: objetivo, desenvolvimento, materiais e métodos, resultados
e discussão.
c) São 12 passos: demanda, análise local da empresa, análise da população
trabalhadora afastada, descrição da tarefa, descrição da atividade, pré-
diagnóstico, observação sistemática, diagnóstico, validação do diagnóstico,
proposta de melhoria, cronograma e acompanhamento.
d) São 3 passos: ergonomia física, ergonomia organizacional e ergonomia
cognitiva.
e) Não existem etapas fixas, pois não há um modelo de documento.

2. Nesta etapa, mapeamos a política de pessoal, faixa etária, se há


rotatividade, tempo de casa, experiência, categorias, níveis hierárquicos,

68 U2 - Macroergonomia
características antropométricas, pré-requisitos, nível de escolaridade e
capacitação (e quais treinamentos específicos a empresa proporciona para
cada tarefa), estado de saúde e absenteísmo.
Com relação à Análise Ergonômica do Trabalho, qual das etapas a seguir
trata do mapeamento dos elementos mencionados?
a) Análise global da empresa.
b) Descrição da tarefa.
c) Análise da população trabalhadora.
d) Análise global da situação de trabalho.
e) Monitoramento de absenteísmo.

3. A metodologia da análise ergonômica do trabalho permite descrever a


realidade do trabalho e propor melhorias às condições analisadas.
Analise as alternativas a seguir e assinale aquela que contém elementos
utilizados na metodologia da Análise Ergonômica.
a) Valorizar os saberes dos trabalhadores, mapear as características da
empresa e reformular a demanda com os atores envolvidos.
b) Aplicar checklists, desenvolver um método próprio de coleta de dados
que não precise utilizar a opinião dos trabalhadores e criar programas que
gerem conforto aos trabalhadores.
c) Realizar a Análise Ergonômica do Trabalho utilizando as fases descritas
na ABNT 12301, propor melhorias e acompanhar melhorias.
d) Verificar multas anteriores da empresa, copiar dados de riscos físicos,
químicos e biológicos do PPRA para a AET e propor melhorias.
e) Mapear apenas as posturas, aplicar ferramenta de análise e propor uma
solução padrão que atenda todas as situações de trabalho.

U2 - Macroergonomia 69
70 U2 - Macroergonomia
Seção 2.2
Fisiologia humana e sobrecargas no trabalho
Diálogo aberto

Relembrando a situação-problema do Convite ao estudo, você é


contratado como ergonomista por uma empresa de mobiliário e precisa
projetar novos postos de trabalho dos gerentes de relacionamento de
um grande banco. Após uma visita, você identifica que os gerentes estão
reclamando que o atual mobiliário possui quinas vivas, tem uma cadeira
sem regulagens que causa desconforto na região das costas e não está
bem localizado com relação às janelas. Para realizar o projeto, você sabe
que deve obedecer a alguns preceitos de base de ergonomia para assegurar
o conforto, a segurança e o desempenho eficiente dos trabalhadores. Os
gerentes precisarão de mesa, cadeira, telefone, impressora e computador.
Ao conversar com eles para iniciar seus estudos e criar o protótipo de
posto de trabalho, você percebe que deve responder aos seguintes
questionamentos: quais aspectos de biomecânica ocupacional você
deverá considerar? Sabendo que os trabalhadores estão distribuídos em
três turnos de trabalho, o que deverá ser considerado com relação à fadiga
e monotonia? Quais aspectos podem gerar carga física do trabalho caso
o posto de trabalho não esteja bem organizado e dimensionado? Qual é
a importância de se verificar não apenas aspectos físicos mas também os
cognitivos envolvidos na tarefa dos gerentes?
Para que você consiga responder a esses e outros questionamentos,
esses conteúdos serão abordados de forma contextualizada no item
Não pode faltar.

Não pode faltar

Nesta seção, vamos discutir alguns aspectos relacionados à


fisiologia e biomecânica em situações ocupacionais. Sabemos que
cada situação de trabalho é única e sua singularidade se apresenta em
diversos aspectos. Só conseguimos conhecer a realidade do trabalho
e suas dificuldades conversando com o trabalhador.

U2 - Macroergonomia 71
A função do ergonomista sempre é compreender o trabalho para
transformá-lo. Para isso, é fundamental conhecer preceitos básicos
relacionados ao funcionamento do corpo humano, para propor
adequações que respeitem as limitações e os riscos de saúde que
podem aparecer quando projetamos de forma inadequada um
ambiente ou uma situação de trabalho.

Fadiga, monotonia e motivação


Nosso corpo precisa de energia e de estímulos para funcionar de
maneira adequada.
Se estamos cansando ou tendo sono no trabalho, pode ser por
causa de alguma inadequação nele.
Quando ouvimos a palavra “monotonia”, logo nos remetemos
àquilo que é chato, parado, moroso. Em ergonomia, pensando em
situações de trabalho, monotonia é a reação do organismo a um
ambiente uniforme, pobre em estímulos ou com pouca variação.
Isso leva à sensação de sonolência e diminuição da atenção. Se nada
está acontecendo e nada está pedindo que você interaja ativamente com
atenção, a tendência é que os pensamentos se direcionem para outro
lugar. Um exemplo são as operações repetitivas na indústria (trabalhar na
linha de produção com atividades altamente segmentadas e de ciclos de
tempo curtos, sem variação) e o tráfego rotineiro (dirigir um caminhão na
estrada por longa distância no período noturno).
As condições que podem levar a estados de monotonia são
as atividades repetitivas, de longa duração, com mínimo grau de
dificuldade, sem possibilidade de desligar-se mentalmente de todo
do trabalho, e as tarefas de observação de longa duração, pobres em
estímulos, com a obrigação de atenção permanente.
Fadiga, por sua vez, está relacionada com uma capacidade de
produção diminuída e a uma perda de motivação para qualquer atividade.
Esse cansaço, falta de energia, é causado por um conjunto
complexo de fatores, cujos efeitos são cumulativos: os fatores
fisiológicos, relacionados com a intensidade e duração do trabalho
físico e intelectual; os fatores psicológicos, como a monotonia e a falta
de motivação; e os fatores ambientais e sociais, como iluminação,
ruídos, temperaturas e relacionamento social com a chefia e os
colegas de trabalho.

72 U2 - Macroergonomia
Reflita
Já percebeu como é comum as pessoas reclamarem que é segunda-
feira e festejarem que a sexta-feira chegou? Passamos grande parte das
nossas horas produtivas trabalhando. Pense: dormimos, acordamos,
trabalhamos, estudamos e voltamos para casa. A sexta-feira vira símbolo
do final de uma maratona cansativa e estressante. O final de semana torna-
se uma premiação aos trabalhadores cansados daquele trabalho que não
os motiva, não lhes traz sentido, significado, ou desenvolvimento pessoal.

A monotonia e a fadiga remetem a um tipo de cansaço corporal


e mental que pode estar relacionado ao tipo de tarefa realizada
por aquele trabalhador. Ao transformar essa situação de trabalho,
devemos pensar em como motivar esse trabalhador, em criar
perspectivas para que ele possa explorar sua inteligência naquela
tarefa e ser recompensado quando tiver destaque em algum indicador
que realmente tem sentido com o que está sendo feito.

Pesquise mais
Para saber mais sobre as questões que geram motivação e
sustentabilidade no trabalho, leia a tese de doutorado de Claudio Marcelo
Brunoro, apresentada em 2013, na Escola Politécnica da Universidade
de São Paulo, com o título Trabalho e sustentabilidade: contribuições
da ergonomia da atividade e da psicodinâmica do trabalho. Disponível
em: <http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/3/3136/tde-19092014-
105026/pt-br.php>. Acesso em: 7 maio 2017.

Para motivar um trabalhador, é necessário analisá-lo


individualmente, conhecer suas habilidades, suas aspirações, seus
problemas e seu convívio social. De posse dessas informações, é
possível saber quais necessidades a empresa deve preencher para
motivá-lo no trabalho.

U2 - Macroergonomia 73
Reflita
É preciso tomar cuidado com indicadores de desempenho. Geralmente,
setores voltados à análise de processos criam indicadores de desempenho
voltados a números, vendas e metas, desconsiderando totalmente o fator
humano. Essas metas não se relacionam com a realidade do trabalho e,
muitas vezes, levam os trabalhadores a criarem mecanismos de defesa
para conseguirem trabalhar sendo avaliados o tempo todo. Pense:
avaliar apenas o valor da venda sem considerar o tempo gasto para dar
atenção ao cliente? Avaliar o tempo de atendimento sem perceber todo
esforço e demanda cognitiva para resolver um problema? Criar metas
que causem competição entre trabalhadores do mesmo setor?

Uma motivação bem-sucedida é voltada a indicadores de


desempenho reais, espaços abertos de discussão (e não de punição)
e cooperação entre equipes. A ergonomia é voltada às características
psicofisiológicas dos trabalhadores e, para nos adequarmos a elas, é
preciso conhecer alguns pontos importantes.

Fatores humanos no trabalho


As características psicofisiológicas estão relacionadas ao
conhecimento do funcionamento do ser humano. Embora não
seja possível generalizar e nem mapear todas as características
possíveis, há alguns pontos que fazem parte do consenso de estudos
voltados às preferências dos seres humanos em ambiente de
trabalho: 1) preferem escolher livremente a sua postura de acordo
com a tarefa que estiver desempenhando; 2) preferem alternar os
músculos utilizados na tarefa, e não apenas determinados segmentos
corporais; 3) toleram mal tarefas fragmentadas com tempo curto
para execução, especialmente se for imposto por uma máquina,
pela chefia, pelos clientes ou colegas, ou seja, preferem impor sua
própria cadência ao trabalho; 4) são estimulados a acelerar sua
cadência quando estimulados, não levando em conta os limites
do seu sistema musculoesquelético; 5) sentem-se bem quando
solicitados a resolver problemas, afinal, são seres que pensam e
agem (e não uma máquina que só executa movimentos); 6) têm
capacidades sensitivas e motoras que funcionam dentro de certos

74 U2 - Macroergonomia
limites, que variam entre as pessoas e ao longo do tempo; 7) suas
capacidades sensorimotoras modificam-se com o envelhecimento,
mas perdas eventuais são compensadas por estratégias e experiência;
8) organizam-se coletivamente para gerenciar a carga de trabalho, ou
seja, nas atividades humanas, a cooperação tem um papel importante,
muito mais que a competitividade.
Para criar um posto de trabalho ou desenhar uma situação de
trabalho, deveríamos sempre priorizar as características descritas.
Um posto de trabalho, mesmo quando projetado levando em
consideração as características antropométricas, pode acabar
se tornando desconfortável por outros fatores (organizacionais,
ambientais e sociais).

Biomecânica ocupacional
A biomecânica ocupacional é a ciência que estuda movimentos
corporais e forças relacionados ao trabalho. Vamos abordar alguns
dos princípios básicos de biomecânica ocupacional e os principais
pontos de atenção para se priorizar a saúde dos trabalhadores quando
interagirem com seu posto de trabalho, máquinas, ferramentas e
materiais.
Nosso corpo é a máquina mais extraordinária que existe. Células
unem-se para formar tecidos, os quais se unem para formar sistemas.
Em biomecânica ocupacional, priorizamos a forma como nossos
ossos, músculos e articulações funcionam e interagem nas situações
de trabalho.
Nossos músculos são constituídos em seu centro por feixes de
fibras e em suas extremidades por tendões. Os tendões inserem-
se nos ossos, fixando o músculo que, ao contrair, movimenta o
segmento corpóreo no qual está localizado.

U2 - Macroergonomia 75
Figura 2.3 | Estrutura muscular

Fonte: Sobotta (2000, p. 11).

Caso haja uma demanda que exceda o limite desse músculo,


ele pode tencionar, inflamar e até mesmo se romper. O trabalho
muscular se traduz pela contração de certos músculos e pelo
relaxamento de outros. Existem outras estruturas (bursas, nervos,
ligamentos, entre outras) que interagem ativamente com nossos
ossos, músculos e articulações, porém nossa atenção será voltada
aos principais segmentos corpóreos e aos pontos de atenção
voltados às situações de trabalho.

Pesquise mais
Atualmente, é muito fácil encontrar vídeos e animações que representam
o corpo humano com grande precisão. Como sugestão de pesquisa,
verifique no YouTube vídeos sobre a articulação do ombro, a coluna
vertebral e mãos e punhos. Experimente usar como palavras-chave
“biomecânica” e “anatomia” junto às articulações que deseja conhecer
melhor. Sugerimos alguns vídeos:

Biomecânica da coluna:

Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=yY_7GH0D0LA>.


Acesso em: 31 jul. 2017.

76 U2 - Macroergonomia
Biomecânica do ombro:

Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=oXVl5kSekak>.


Acesso em: 31 jul. 2017.

Biomecânica do cotovelo:

Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=SmsjtdoZKJc>.


Acesso em: 31 jul. 2017.

O corpo humano é um sistema de alavancas. Os músculos


produzem força e movimentam os segmentos corpóreos, tendo
as articulações como eixo. Quando existe o movimento com essa
força rotatória em torno da articulação, é gerado um torque (força
rotatória vezes o braço de alavanca). Para cada movimento, há pelo
menos dois músculos que trabalham antagonicamente: quando um
se contrai, outro se distende. Da maneira parecida com as alavancas
mecânicas, nosso corpo trabalha com três tipos:
1. Alavanca interfixa ou de primeira classe: o eixo (apoio) está entre
a força e a resistência (o que transmite velocidade, mas com pouca
força). Um exemplo dessa alavanca é o tríceps.
2. Alavanca inter-resistente ou de segunda classe: a resistência está
entre o eixo e a força. É o caso dos músculos da parte posterior da
perna que se ligam ao calcanhar, mas é rara no corpo humano (seria
a ideal para gerar força).
3. Alavanca interpotente ou de terceira classe: a força é aplicada
entre o eixo e a resistência. É a alavanca mais comum no corpo
humano e é a que tem a força mais prejudicada.

U2 - Macroergonomia 77
Figura 2.4 | Alavancas do corpo humano

Fonte: Iida (1990, p. 74).

É preciso respeitar os limites de força do nosso corpo devido a


esse sistema de alavancas. Quando realizamos um movimento que
demanda muita força ou exige muitos movimentos sem pausas
suficientes para descanso, podemos adoecer. Nesse sistema de
movimentos, vamos verificar como se comportam os segmentos
corpóreos mais utilizados no ambiente de trabalho.

A coluna vertebral e os membros inferiores


A coluna vertebral é uma estrutura flexível composta por 33
vértebras divididas nas seguintes regiões: cervical (pescoço), com
7 vértebras; torácica (tronco), com 12 vértebras; lombar (região da
cintura), com 5 vértebras; sacro (região do quadril), com 5 vértebras
fundidas; e o cóccix (ponta final da coluna), que tem de 4 a 5 vértebras,
também fundidas.
A coluna possui dois tipos de curvatura, as lordoses (cervical e
lombar) e as cifoses (torácica e sacral).

78 U2 - Macroergonomia
Figura 2.5 | Coluna vertebral

Fonte: adaptada de: <https://goo.gl/cMBU6K>. Acesso em: 6 jul. 2017.

Quando analisamos situações de trabalho, o principal risco


relacionado à coluna é no levantamento e transporte de cargas. A
Norma Regulamentadora nº 17 trata especialmente disso, porque é
extremamente difícil padronizar um peso que seja correto e seguro
para todas as situações possíveis de trabalho.
Entre as vértebras existe uma estrutura cartilaginosa chamada disco
intervertebral. Esse disco absorve possíveis impactos e, em casos de
sobrecarga de força ou postura que possa sobrecarregá-lo, esse disco
pode se romper, levando à possibilidade de uma hérnia discal.

U2 - Macroergonomia 79
Figura 2.6 | Disco intervertebral

Fonte: adaptada de <https://goo.gl/QiXPoR>. Acesso em: 6 jul. 2017.

No Capítulo V, Título II, da Consolidação das Leis do Trabalho


(CLT), em seu artigo 198, é estabelecido que o peso máximo a ser
carregado por um trabalhador (adulto e do sexo masculino) é de
60 kg. Esse peso foi estabelecido em uma época em que não havia
muitos estudos para embasar qual o melhor peso a ser estipulado.
Para questões de fiscalização, sempre que encontramos um número,
facilitamos a padronização desse parâmetro, mas sabemos que em
ergonomia isso não funciona. Não é possível estabelecer um peso
seguro para todas as situações. Em 1991, o National Institute of
Occupational Safety and Health (Niosh) desenvolveu uma equação
para ser aplicada nas situações de trabalho em busca de um peso
que seja mais seguro para ser levantado e transportado. A equação
considera as seguintes variáveis: peso da carga (utilizando 23 kg
como peso máximo em situações ideais); distância dos tornozelos
até o centro da carga (devido à localização do centro de gravidade);
grau de assimetria; qualidade da pega; quantidade de vezes que essa
carga é movimentada por minuto; duração da jornada; altura da pega
em relação ao solo e altura para onde essa pega será transportada.

80 U2 - Macroergonomia
Quanto mais baixa estiver a carga, pior será o movimento para
transportá-la. O movimento de flexão de coluna associado à rotação
ou ao carregamento de peso traz um sério risco para a coluna,
especialmente para a região lombar, que suporta todo esse peso.
Deve-se evitar posicionar cargas em alturas baixas e, sempre que
possível, aplicar a equação Niosh de levantamento e transporte de
cargas para analisar situações.
Além disso, existem diferentes alturas para bancadas de acordo
com a natureza e o objetivo do trabalho: quanto mais precisão visual
necessária, mais alta a bancada; quando maior necessidade de força,
mais baixa a bancada (para facilitar o uso da coluna).

Figura 2.7 | Altura adequada de bancada para os diferentes tipos de trabalho

Fonte: Iida (1990, p. 147).

É preciso ter atenção não apenas ao disco intervertebral, mas a


toda limitação dessa estrutura. Atividades realizadas em bancadas
baixas podem levar a pessoa a ficar muito tempo com a cabeça
projetada para baixo, o que sobrecarrega toda a musculatura posterior
do pescoço.
Quando for possível, para trabalhos realizados em pé, providenciar
um apoio para os pés de forma que o trabalhador possa alternar o
peso de apoio. Além disso, atividades dinâmicas costumam ser mais
confortáveis para membros inferiores, já que a contração estática
atrapalha o fluxo sanguíneo e o relaxamento da musculatura.

U2 - Macroergonomia 81
Membro superior – ombro e braços
A articulação do ombro é uma das mais complexas do corpo
humano, pois permite o maior grau de liberdade de movimentos
(flexão, extensão, abdução, adução, rotação interna e rotação
externa). Essa articulação é composta por três ossos: a escápula, a
clavícula e o úmero (osso do braço).
Todo nosso corpo é interligado por isso qualquer alteração em uma
estrutura pode influenciar direta ou indiretamente em outra. É o que
acontece no ombro. Se o trabalhador realizar atividades manuais sem um
apoio adequado para os antebraços, esse peso permanece sustentado
pelos ombros. Caso não haja equilíbrio entre as forças dos músculos do
ombro, uns podem movimentar mais a articulação ao que outros, e esse
desequilíbrio pode levar ao impacto de estruturas dentro da articulação.
No ombro, existe uma estrutura gelatinosa chamada bursa, localizada
entre estruturas musculares e ósseas para auxiliar na absorção de impacto.
Essa estrutura pode inflamar quando há sobrecarga de movimentos
ou exigência de força. Os tendões e as estruturas musculares também
podem inflamar ou romper, especialmente em situações nas quais
é necessário elevar o ombro acima de 90°. Quando realizamos esse
movimento, há uma grande aproximação entre as estruturas do ombro,
podendo haver um impacto.

Exemplificando
Quando um objeto está muito alto, ou algum comando de uma
máquina, ou uma ferramenta, essa situação leva o trabalhador a elevar os
ombros para poder alcançar o objeto. Faz parte do trabalho, mas é um
movimento que pode levar ao desconforto e a possíveis lesões. Limitar
a altura dos objetos a serem manipulados é um bom exemplo de ação
que protege o ombro.

É necessário ter atenção a todas as atividades que são exercidas


com membros superiores e respeitar as zonas de alcance adequadas.
A repetitividade, exigência de força excessiva, presença de compressão
mecânica e manutenção de posturas contra a gravidade que possam
gerar desconforto são fatores de risco ergonômico.

82 U2 - Macroergonomia
Membro superior – mãos e punhos
Nossa mão é extremamente inervada, tem diversos músculos e
ossos, o que possibilita uma infinidade de movimentos e capacidade
de destreza e sensibilidade. O dimensionamento incorreto da força
e a velocidade de movimentos exigidos nesse segmento podem
gerar limitações nas tarefas, podendo provocar acionamentos
acidentais ou ainda sobrecarga do sistema musculoesquelético.
Essas exigências inadequadas, a repetitividade, os desvios extremos
e frequentes do punho, a concentração de pressão, a vibração e
exposição ao frio têm levado a um aumento nos diagnósticos de
doenças ocupacionais em membros superiores, como síndrome do
túnel do carpo, tenossinovites e tendinites.

Assimile
O sufixo “-ite” indica inflamação quando falamos em doenças. Portanto,
tendinite é a inflamação dos tendões; tenossinovite é a inflamação da
bolsa sinovial que contorna o tendão; bursite é a inflamação da bursa.

A síndrome do túnel do carpo é uma das afecções mais comuns nos ambientes
de trabalho. Essa doença é causada pela pressão sobre o nervo mediano, no
punho, o que leva à perda de força, dores e parestesias (sensações cutâneas
subjetivas, como formigamento). O nervo mediano chega à mão através de um
canal formado pelos ossos do punho (ossos carpais), mantidos juntos por uma
membrana resistente (ligamento carpal transversal). Esse espaço é chamado
de túnel do carpo, uma estrutura rígida por onde também passam diversos
músculos. Qualquer inchaço de tecido adjacente (provocado por repetitividade
ou exigência de força, por exemplo) pode ocasionar compressão do nervo,
causando a síndrome do túnel do carpo.
Figura 2.8 | Disposição das estruturas do túnel do carpo

Fonte: adaptada de <https://goo.gl/663iZ1>. Acesso em: 7 jul. 2017.

U2 - Macroergonomia 83
Fisiologia e carga física do trabalho
Como vimos, cada uma das principais estruturas corporais precisa
de atenção para que possa atuar com o melhor desempenho e menor
risco. Obviamente, não conseguimos dissociar nosso corpo de nossa
mente. Sempre que notarmos questões físicas (que são mais visíveis),
devemos nos aproximar e valorizar os saberes dos trabalhadores em
questões cognitivas também.
A sigla LER significa lesões por esforços repetitivos, sendo também
denominada como distúrbios osteomusculares relacionados ao trabalho
(DORT). São doenças caracterizadas pelo desgaste de estruturas do
sistema musculoesquelético que atingem várias categorias profissionais.
Geralmente, são causadas por movimentos reincidentes e contínuos
com consequente sobrecarga dos nervos, músculos e tendões. O
esforço excessivo, má postura, estresse e condições desfavoráveis de
trabalho também contribuem para o seu aparecimento.
Para não haver implicações legais e aumentar o desempenho do
corpo nas diferentes situações de trabalho, é preciso ter atenção aos
tipos de risco que podem estar presentes.
Alguns outros preceitos podem ser observados em relação à
fisiologia e biomecânica no trabalho. Um deles é a questão do
trabalho estático versus o trabalho dinâmico. No trabalho dinâmico,
existem contração e relaxamento dos músculos, o que aumenta o
volume do sangue circulado e permite um melhor relaxamento e
alternância da musculatura. O trabalho estático é aquele que exige
contração contínua para manter uma determinada posição, o que
diminui o fluxo sanguíneo e pode sobrecarregar a musculatura.
O trabalho muscular intenso pode ativar o mecanismo de eliminação
do calor gerado pelo metabolismo. Durante o movimento, há uma
melhor irrigação sanguínea e, portanto, maior abastecimento de oxigênio.
De maneira geral, a concepção dos postos de trabalho não leva
em consideração o conforto do trabalhador, mas sim as necessidades
da produção. Nas posturas predominantemente em pé, por exemplo,
há tendência à acumulação do sangue nas pernas (resultando em
varizes e sensação de peso); tensão muscular permanentemente
para manter o equilíbrio dificulta a execução de tarefas de precisão;
e a penosidade, ou seja, o esforço causado pela posição em pé
pode ser reforçada se o trabalhador ainda tiver que manter posturas
inadequadas dos braços (acima do ombro, por exemplo), inclinação

84 U2 - Macroergonomia
ou torção de tronco ou de outros segmentos corporais. Só devemos
escolher essa postura se forem necessários deslocamentos
contínuos, manipulação de cargas ou exigência de aplicação de
força para baixo. Do contrário, devemos priorizar a postura sentada,
sempre favorecendo que o trabalhador possa alternar entre as duas
quando quiser. Sentado, o esforço postural (estático) e as solicitações
sobre as articulações permitem melhor controle dos movimentos
pelo que o esforço de equilíbrio é reduzido, sendo a melhor postura
para trabalhos que exijam precisão. Essa postura leva a menor gasto
energético e maior conforto.
Basicamente, esses são alguns princípios que podem auxiliar
a entender as principais questões voltadas às sobrecargas físicas
relacionadas ao trabalho. Há uma infinidade de situações, e abordamos
aqui as que motivam as maiores discussões em ergonomia.

Sem medo de errar

Após compreender mais sobre os aspectos biomecânicos e


de fisiologia e avançar nos seus conhecimentos sobre ergonomia,
ao conversar com os gerentes de relacionamento do banco para
iniciar seus estudos para criar o protótipo de posto de trabalho, você
consegue perceber que deverá considerar aspectos biomecânicos
que respeitem a realidade daquele trabalho e que deverá consultar
os trabalhadores a todo momento. Questões voltadas à altura
da bancada, a movimentos realizados em membros superiores,
membros inferiores e coluna vertebral e a repetitividade, força
excessiva, compressão mecânica e postura ideal devem ser analisadas
a todo momento. Sabendo que os trabalhadores estão distribuídos
em três turnos de trabalho, é necessário verificar como esse trabalho
está sendo organizado, seus indicadores de desempenho e se a tarefa
está organizada de forma fragmentada que possa levar à monotonia
ou tenha alta demanda, gerando cansaço e fadiga. Se algum desses
aspectos não for considerado, pode-se gerar carga física do trabalho.
Compreendendo que as pessoas toleram mal tarefas fragmentadas
com tempo curto para execução, especialmente se for imposto por
uma máquina, pela chefia, pelos clientes ou colegas, ou seja, preferem
impor sua própria cadência ao trabalho, devemos sempre considerar
os aspectos físicos, cognitivos relacionados ao trabalho.

U2 - Macroergonomia 85
Avançando na prática

Atendendo a lei
Descrição da situação-problema
Você é o ergonomista contratado por uma grande rede de
supermercados para realizar a análise da carga e descarga de um
dos Centros de Distribuição. Chegando lá, você nota que todas as
cargas estão posicionadas sobre paletes no chão e que pesam 60
kg. Ao conversar com o empregador, você aponta essa questão e
ele diz que a CLT indica o peso de 60 kg, por isso está atendendo
a lei. O que você diz ao empregador?

Resolução da situação-problema
Embora 60 kg conste como peso máximo na CLT, em momento
algum ela cita que toda situação deva ter esse peso. A Norma
Regulamentadora nº 17 deixa claro que não se pode carregar um
peso que possa causar risco à saúde dos trabalhadores. Nesse caso,
é necessário realizar a Análise Ergonômica do Trabalho no setor,
estipular um peso e uma transformação em toda situação, levando
em conta as variáveis da Niosh e a opinião dos trabalhadores.

Faça valer a pena

1. De acordo com o sistema de alavancas do corpo humano, analise as


afirmações a seguir.
( ) Alavanca interfixa ou de primeira classe: o eixo (apoio) está entre a força e
a resistência.
( ) Alavanca inter-resistente ou de segunda classe: a resistência está entre o
eixo e a força.
( ) Alavanca interpotente ou de terceira classe: a força é aplicada entre o eixo
e a resistência.
( ) Alavanca intercalada ou de quarta classe: há mudança da localização da
força entre eixo e resistência durante o movimento.
Atribua V para verdadeiro e F para falso e assinale a alternativa com a sequência correta.
a) V - F - F - F.
b) F - F - V - V.
c) F - F - F - F.
d) V - V - V - V.
e) V - V - V - F.

86 U2 - Macroergonomia
2. A coluna vertebral é uma estrutura flexível composta por 33 vértebras
divididas nas seguintes regiões: cervical (pescoço), com 7 vértebras;
torácica (tronco), com 12 vértebras; lombar (região da cintura), com 5
vértebras; sacro (região do quadril), com 5 vértebras fundidas; e o cóccix
(ponta final da coluna) tem de 4 a 5 vértebras, também fundidas.
Com relação à coluna vertebral, assinale a alternativa correta.
a) Existe uma estrutura cartilaginosa entre as vértebras chamada disco
intervertebral.
b) Lordose é uma das doenças que pode afetar a coluna vertebral.
c) Cifose é uma das doenças que pode afetar a coluna vertebral.
d) O peso máximo que alguém pode carregar individualmente é 60 kg.
e) O peso máximo a ser carregado em qualquer situação de trabalho é 23 kg.

3. Com relação à biomecânica ocupacional, analise as afirmações a seguir:


( ) No trabalho dinâmico, existem contrações e relaxamento dos músculos,
o que aumenta o volume do sangue circulado e permite um melhor
relaxamento e alternância da musculatura.
( ) O trabalho estático é aquele que exige contração contínua para manter
em uma determinada posição, o que diminui o fluxo sanguíneo e pode
sobrecarregar a musculatura.
( ) Quando houver manipulação de cargas acima de 10 kg, o trabalho deve
ser realizado na posição sentada.
( ) Alavanca interpotente ou de terceira classe é aquela em que a força é
aplicada entre o eixo e a resistência. É a alavanca mais comum no corpo
humano e é a que tem a força mais prejudicada.
Atribua V para verdadeiro e F para falso e assinale a alternativa com a
sequência correta.
a) V - V - V - V.
b) V - V - F - V.
c) F - F - F - F.
d) F - F - V - V.
e) F - F - F - V.

U2 - Macroergonomia 87
88 U2 - Macroergonomia
Seção 2.3
Atividade do ergonomista
Diálogo aberto

Mais uma vez, vamos relembrar a situação-problema do Convite


ao estudo: você é contratado como ergonomista em uma empresa
de mobiliário para auxiliar na elaboração de um protótipo de
posto de trabalho para gerentes de relacionamento de um grande
banco. Ao atuar como ergonomista, você terá papel fundamental
na compreensão do trabalho dos gerentes de relacionamento
e na transformação das condições de trabalho que precisam
ser consideradas para assegurar saúde, conforto, segurança e
produtividade a esses trabalhadores. Desta forma, qual é o papel do
ergonomista nas empresas? Quais são os diferenciais da visão do
ergonomista frente à mudança nos processos das empresas? Qual
é a importância de uma atividade multiprofissional no momento da
análise ergonômica do trabalho? Para que você consiga responder a
esses e outros questionamentos, esses conteúdos serão abordados
de forma contextualizada no item Não pode faltar.

Não pode faltar

Estamos encerrando a nossa Unidade 2. Após entender as


etapas para a realização de uma Análise Ergonômica do Trabalho
e compreender alguns dos principais aspectos da Biomecânica
Ocupacional que podem ser observados nas situações de trabalho,
vamos entender o papel do ergonomista e seu campo de atuação.

Exemplos e situações de experiências em ergonomia


A ergonomia mostra-se como uma ciência que visa à
compreensão do trabalho real. Para isso, é preciso termos em mente
que o profissional ergonomista precisa permear diversas áreas do
saber para abranger todos os aspectos do sistema, do ambiente e do
ser humano para detectar as oportunidades de melhoria.

U2 - Macroergonomia 89
Quanto mais informações e ideias forem trocadas entre diferentes
profissionais, maior será o entendimento daquele universo de
trabalho. Formar equipes e criar espaços para diálogos e trocas de
ideias é essencial para que a abordagem ergonômica faça sentido e
seja eficiente.
Um ergonomista pode atuar em diversas esferas: pode auxiliar no
design de um novo produto; pode verificar se um website é intuitivo e
de fácil navegação; pode analisar a organização do trabalho e verificar
se as metas e os indicadores de desempenho estão adequados à
realidade dos trabalhadores; pode analisar o projeto de uma nova
linha de produção; pode propor melhorias em uma nova fábrica;
pode auxiliar no redimensionamento de um posto de trabalho; pode
verificar o fluxo de processos de uma determinada empresa; pode
contribuir com a sugestão de troca de ferramentas de um determinado
processo; pode propor alternativas a processos de retrabalho e fluxos
obsoletos; entre tantos outros.
Vamos pensar: o que todas as situações listadas têm em comum?
Todas precisam que alguém olhe a realidade do trabalho de fora,
sem pré-julgamentos, buscando apenas otimizar o que já existe e
aproveitando a sabedoria dos envolvidos. Muitas vezes, observamos
que cada profissional está centrado apenas em seu setor, em sua
realidade, e que já tem uma visão preestabelecida do que ocorre ao
seu redor. O ergonomista aparece como um tradutor da realidade.
Através de questionamentos-chave sobre o que ocorre no dia a dia
da empresa, ele propõe uma reflexão sobre a realidade do trabalho e,
assim, um novo olhar sobre o que sempre aconteceu.

Reflita
Já aconteceu de existir na sua casa algum aparelho com defeito? Existe
uma perda de tempo ou alguma tarefa é atrapalhada por ele, mas você
sempre deu um jeito de transpor esse obstáculo e se acostumou com o
aparelho com essa limitação? De repente, aparece alguém de fora: uma
visita, um profissional que veio consertar outra coisa, um parente que
não visita há algum tempo. Essa pessoa olha o aparelho com defeito e,
de repente, identifica como consertar o problema. Parecia tão simples,
tão rápido, mas você, que sempre esteve ali, já não enxergava mais como
alterar aquela realidade que já nem incomodava mais. Como dica, assista
ao vídeo em que Antônio Abujamra recita o texto Eu sei, mas não devia,

90 U2 - Macroergonomia
de Marina Colasanti, no Programa Provocações (TV Cultura), disponível
em: <https://www.youtube.com/watch?v=ruN_LR60ZfQ> . Acesso em:
16 maio 2017.

Nossos olhos se acostumam com a realidade atual. Mudar e transformar


é necessário para a melhoria constante do sistema.

Precisamos ter sempre em mente: deve existir sentido no trabalho!


O trabalhador não é apenas um “fazedor” de alguma coisa. Ele precisa
se identificar, ser valorizado, enxergar sentido naquilo e perceber que
faz diferença na empresa de alguma forma. Ser punido por regras
que não fazem sentido faz com que o trabalhador fique desmotivado
e busque estratégias para que aquela regra (que não se aplica à
realidade) não o prejudique.

Exemplificando
Imagine a seguinte situação: em uma agência bancária, estão dois
gerentes de relacionamento. Naquele horário, geralmente, estão três
gerentes, porém um está em uma reunião externa. Eles são avaliados
mensalmente por diversos indicadores de desempenho, e um deles
é a satisfação do cliente (mensurada através do número de elogios e
reclamações). Um dia, entra um cliente no banco com muita pressa,
pois é o único dia e o único horário que tem disponível naquela semana.
Esse mesmo cliente já havia tentado realizar uma transação via internet
e aplicativos de celular, porém, por questões de segurança, isso não foi
permitido (sendo por esse motivo que fora ao banco pessoalmente). Ao
chegar, o cliente pega fila (o que já o deixa irritado) e o tempo de espera
piora com a lentidão do sistema e o afastamento de um dos gerentes.
Quando finalmente é atendido, o sistema cai e o problema não pode
ser resolvido. O cliente fica extremamente aborrecido e realiza uma
reclamação, que pontua negativamente o trabalho do gerente. Pense
a respeito: foi culpa do gerente? Esse indicador realmente reflete a
realidade do seu trabalho? Foi levado em consideração que a meta se
manteve a mesma, mesmo com menos pessoas no local?

U2 - Macroergonomia 91
Ergonomia como atividade profissional
Para resolver questões relacionadas a inadequações da tarefa
que causam constrangimentos aos trabalhadores, o profissional
ergonomista realiza uma análise de todos os aspectos que influenciam
na situação de trabalho, compreendendo o que acontece na realidade
e propondo melhorias que transformem esse trabalho para que haja
maior conforto, segurança e desempenho eficiente.
Desta forma, o ergonomista será o profissional que realizará a
Análise Ergonômica do Trabalho, estudo que visa entender as variáveis
e a complexidade que existem em cada trabalho.
No Brasil, a profissão do ergonomista ainda não é regulamentada.
A Associação Brasileira de Ergonomia (Abergo) é uma associação
sem fins lucrativos que une os profissionais de ergonomia e procura
estudar e divulgar as interações das pessoas com a tecnologia, a
organização e o ambiente, considerando as suas necessidades,
habilidades e limitações.
De acordo com a Abergo, o ergonomista é o profissional que
tem as seguintes competências: investigar, avaliar e reconstruir as
demandas de projetos ergonômicos, assegurando a ótima interação
entre as variáveis envolvidas no trabalho; entender as bases teóricas
para planejamento ergonômico; aplicar uma abordagem integrada em
suas análises; entender as exigências para gerenciamento de riscos;
entender a diversidade de fatores que influenciam o desempenho
humano e suas inter-relações; demonstrar compreensão de
métodos de mensuração pertinentes para a avaliação e o projeto
em ergonomia; reconhecer seu escopo pessoal de competência
(sabendo de suas limitações); analisar e interpretar os achados das
investigações; apreciar o efeito de fatores que influenciam a saúde e
o desempenho humano; consultar adequadamente as observações
e interpretação de dados de seus levantamentos; analisar diretrizes,
normas e legislação que influenciam a atividade; tomar decisões
justificáveis para transformação do trabalho; documentar os achados
ergonômicos de forma adequada; manter a documentação e o registro
adequados do projeto e intervenção; prover um relatório em termos
compreensíveis pelo cliente e apropriados ao projeto; determinar
a compatibilidade da capacidade humana com as solicitações
planejadas ou existentes; determinar como ocorre a interação entre
as características, habilidades, capacidades e motivações de uma

92 U2 - Macroergonomia
pessoa e a organização, os ambientes planejados ou existentes,
os produtos manuseados, equipamentos, sistemas de trabalho,
máquinas e tarefas; determinar se um problema é tratável por uma
intervenção ergonômica; adotar uma visão holística da ergonomia
no desenvolvimento de soluções; desenvolver estratégias para
implementar um novo projeto que estabeleça um local de trabalho
saudável e seguro; comunicar-se de forma efetiva com o cliente e as
pessoas com quem interage profissionalmente; fazer recomendações
apropriadas para projeto ou intervenção ergonômica; entender
as hierarquias dos sistemas de controle; esboçar recomendações
apropriadas para projeto; gestão organizacional; seleção de pessoal,
educação, desempenho humano; supervisionar a aplicação do plano
ergonômico; avaliar e monitorar os resultados da implementação;
produzir reflexão ou pesquisa avaliativa relevante para a ergonomia;
demonstrar compromisso com uma prática ética e altos padrões
de desempenho; e reconhecer forças e limitações pessoais e
profissionais, sabendo o impacto da ergonomia na vida das pessoas.
Essas são algumas das várias funções e competências do
profissional ergonomista listadas pela Norma Abergo 1001. Perceba a
seriedade das competências listadas. O ergonomista é um profissional
que provoca a reflexão das pessoas acerca do seu trabalho, e essa é
uma grande responsabilidade.

Ergonomia: atividade multiprofissional


Ninguém é detentor de todo o conhecimento. Somos limitados
pessoal e profissionalmente. A grande beleza do conhecimento é que
ele é inesgotável, e isso faz com que precisemos uns dos outros para
alcançar outros níveis de raciocínio e solução.
Solucionar um problema complexo exige que estudemos
suas partes e que seja proposta uma reflexão com todos os atores
envolvidos e diferentes profissionais para que a realidade do trabalho
seja compreendida para ser transformada de maneira eficaz.
Lembrando dos 12 passos da Análise Ergonômica do Trabalho, não
podemos esquecer que a ação do ergonomista não termina na
proposta de melhorias. Ao modificar o trabalho, novos problemas
podem surgir, e um acompanhamento e uma reavaliação devem ser
realizados constantemente.

U2 - Macroergonomia 93
Quando tratamos de informações organizacionais, pode
acontecer de sermos confrontados com questões delicadas (e até
mesmo constrangedoras). É preciso ter cautela se isso acontecer. A
empresa deve sempre ser comunicada durante a realização da Análise
Ergonômica do Trabalho, e não apenas ao final dela. Em cada etapa,
feedback e entrega parcial (junto a uma reunião de repasse) podem
reduzir os riscos de situações de conflito.
Os ergonomistas, para solucionar questões complexas
relacionadas ao trabalho, devem ter um conhecimento avançado
em diversos campos e ciências. Dessa forma, a ergonomia é uma
disciplina transdisciplinar, de acordo com a demanda que motiva a
condução da análise.
Uma abordagem multidisciplinar refere-se a um conjunto de
disciplinas que tratam, ao mesmo tempo, de uma determinada
questão (cada uma em sua área). Em uma abordagem interdisciplinar,
já há possibilidade de troca de instrumentos, técnicas, metodologias
e conceitos entre as disciplinas, havendo diálogo entre elas. Por
fim, na abordagem transdisciplinar (na qual enquadramos a
ergonomia), busca-se resolver um problema do mundo real com
base na experiência acadêmica e não acadêmica (saber profissional),
articulando conhecimentos e propondo soluções que transcendem
o âmbito de cada disciplina e surgem por meio de uma articulação
que gera uma nova visão da natureza e da realidade.

Pesquise mais
A abordagem transdisciplinar da ergonomia vem da necessidade de lidar
com problemas complexos. Edgar Morin, pensador contemporâneo que
estuda as ciências da complexidade, traz a importância de não sermos
reducionistas e não simplificarmos algo aparentemente fácil de resolver.

Para compreender mais sobre a Teoria da Complexidade, leia o artigo:

SANTOS, Silvana Sidney Costa; HAMMERSCHMIDT, Karina Silveira de


Almeida. A complexidade e a religação de saberes interdisciplinares:
contribuição do pensamento de Edgar Morin. Rev. bras. enferm., Brasília , v.
65, n. 4, p. 561-565, ago. 2012. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.
php?script=sci_arttext&pid=S0034-71672012000400002&lng=en&nrm=i
so>. Acesso em: 16 maio 2017.

94 U2 - Macroergonomia
A complexidade do trabalho depende das propriedades do sistema
técnico, do contexto organizacional e de certas características dos
resultados, como a gravidade das consequências das ações do
trabalhador e o grau de irreversibilidade. Em alguns casos, os erros
são tolerados e podem ser fontes de aprendizagem quando podem
ser corrigidos. Em outros, são inadmissíveis devido à gravidade e
irreversibilidade dos efeitos. Quanto mais rígido é um sistema, mais
difícil se torna manobrar os imprevistos que surgem continuamente.

Atuação do ergonomista: compreender e transformar


Os ergonomistas são profissionais formados em diversas áreas,
que têm como objetivo compreender o trabalho de forma global para
transformá-lo. Essa análise deve incluir os aspectos físicos, cognitivos,
sociais, organizacionais, ambientais e outros. É importante saber:
ao perguntar a uma pessoa como é o seu trabalho, provocamos
uma reflexão de extrema importância, que já inicia um processo de
transformação do sentido do trabalho. Pensar sobre o que fazemos
nos localiza no tempo e espaço, volta a atenção para nós mesmos
e nossa missão no mundo. Dessa forma, esses profissionais analisam
os aspectos físicos, cognitivos e organizacionais, como já vimos na
Unidade 1 de nosso estudo.
Lembrando: características da anatomia humana, antropometria,
fisiologia, biomecânica, postura, manuseio de materiais, movimentos
repetitivos, distúrbios musculoesqueléticos relacionados ao trabalho,
projeto de postos de trabalho, segurança e saúde do trabalhador estão
no domínio da Ergonomia Física. Processos mentais, percepção,
memória, raciocínio, interações entre pessoas e outros elementos de
um sistema, carga mental, tomada de decisões, interação homem-
computador, estresse e treinamento estão no domínio da Ergonomia
Cognitiva. Por fim, a otimização dos sistemas sócio-técnicos
(estruturas organizacionais, políticas e processos), comunicações,
programação do trabalho (tempos e métodos), trabalho cooperativo,
cultura organizacional, metas e indicadores estão no domínio da
Ergonomia Organizacional. O ergonomista lança seu olhar para
esses três pilares, reformulando a demanda e construindo uma
solução junto a todos os atores envolvidos.
No Brasil, não existem cursos superiores para formação de
ergonomistas, mas estão disponíveis diversos cursos de pós-

U2 - Macroergonomia 95
graduação. De qualquer forma, a atuação multiprofissional dessa
prática faz com que a profissão do ergonomista permeie diversas
outras e não encontre um fim em si mesma.
Obviamente, para uma ação eficaz, o apoio da alta administração
da empresa é essencial, e isso se consegue com muito diálogo
para a transformação do olhar sobre qualquer que seja o problema
que gerou a demanda da Análise Ergonômica do Trabalho. Muitos
profissionais estão acostumados a ver o problema de um ponto de
vista particular. É preciso que sejam feitos esforços para derrubar
barreiras que separam as profissões, para que todos trabalhem
cooperativamente na solução de problemas.
A melhor forma de fazer isso é com a realização de reuniões
periódicas, de curta duração, com esses profissionais, para discutir
conceitos, apresentar resultados e mantê-los informados sobre a
evolução dos trabalhos. Quando surgir algum problema em que se
torne necessário pedir a colaboração de algum deles, ela poderá
ser obtida mais rápido, com menor resistência, pois o assunto já é
sabido. O ergonomista, seja na concepção (análise de um projeto
antes de sua execução, projetando uma atividade futura proválvel),
na correção (realizar ajustes em situações reais que já existem), ou
na conscientização (capacitação e treinamentos para elucidar fatores
ergonômicos), tem atuação participativa e necessita de escuta ativa.

Assimile
Evitar erros é mais fácil do que corrigi-los. Dessa forma, se um produto
ou serviço ainda está no papel, é mais fácil redesenhá-lo do que corrigi-
lo após ser fabricado. Obviamente, muito só é visto após o protótipo e
a confecção, mas pensar numa situação adversa pode evitar muitos
problemas futuros. A abordagem da “atividade futura provável” de
François Daniellou trata da possibilidade de concepção de um projeto
imaginando-se diferentes formas de atividades futuras. Assim, considera-
se a variabilidade das situações de trabalho tendo como ponto de partida
“situações de referência”. Longe de representarem um modelo, elas
permitem a ampliação das oportunidades de decisões e de opções de
projeto.

96 U2 - Macroergonomia
O ergonomista é o profissional que busca trazer soluções ao
trabalho que proporcionem maior autonomia; tempo para se tomar
a decisão e agir; recursos alternativos; grau de cooperação na
equipe; melhoria da gestão; melhoria na carga de trabalho aceitável
e possibilidade de espaços de discussão com relacionamentos
aceitáveis e satisfatórios no trabalho. Para isso, ele analisa
documentos (para constituir e reconstruir a demanda, analisando
a empresa globalmente); realiza entrevistas não estruturadas (para
não induzir as verbalizações dos trabalhadores e não determinar
o caminho da conversa); observação do trabalho real (registros,
filmagens, fotografias, entrevistas); descrição das tarefas; registro das
verbalizações (registrar as falas dos trabalhadores é essencial para se
alcançar o trabalho real); autoconfrontação (coloca o trabalhador em
situação de trabalho, observando suas ações, de forma que ele pode
esclarecer, tanto para o ergonomista como para ele mesmo, seus
comportamentos e suas ações).
Finalizando, esperamos que tenha compreendido qual o papel do
ergonomista e, principalmente, a responsabilidade e importância de
sua atuação no mundo do trabalho.

Sem medo de errar

Mais uma vez, vamos relembrar a situação-problema do Convite


ao estudo: você é contratado como ergonomista em uma empresa
de mobiliário para auxiliar na elaboração de um protótipo de posto
de trabalho para gerentes de relacionamento de um grande banco.
Ao atuar como ergonomista, você tem papel fundamental na
compreensão do trabalho desses gerentes e na transformação das
condições de trabalho que precisam ser consideradas para assegurar
saúde, conforto, segurança e produtividade para eles. Dessa forma,
vimos que o ergonomista tem como papel analisar o trabalho de
forma sistêmica e respeitando sua complexidade, compreendendo
para propor melhorias para transformação. Seu papel é assegurar a
ótima interação entre as variáveis envolvidas no trabalho em uma
abordagem integrada que possibilite entender a diversidade de fatores
que influenciam o desempenho humano e suas inter-relações.
A visão do ergonomista mostra a realidade do trabalho de fora,
sem pré-julgamentos, buscando apenas otimizar o que já existe e

U2 - Macroergonomia 97
aproveitando a sabedoria dos envolvidos, atuando como um tradutor
da realidade. Por meio de questionamentos-chave sobre o que
ocorre no dia a dia da empresa, o ergonomista propõe uma reflexão
sobre a realidade do trabalho e, assim, um novo olhar sobre o que
sempre aconteceu. A atividade multiprofissional é de fundamental
importância para solucionar um problema complexo que exige que
estudemos suas partes e que seja proposta uma reflexão com todos
os atores envolvidos e diferentes profissionais para que a realidade do
trabalho seja compreendida para ser transformada de maneira eficaz.

Avançando na prática

"Para todo problema complexo existe sempre uma solução


simples, elegante e completamente errada” (Henry Louis Mencken)
Descrição da situação-problema
O setor de Carga e Descarga de uma rede de supermercados
apresentou um aumento significativo no número de trabalhadores
afastados por problemas na coluna lombar. Após realizar a Análise
Ergonômica do Trabalho, o ergonomista contratado identificou que
as cargas estavam em alturas baixas, havia poucos trabalhadores
para dar conta das metas estabelecidas e o ritmo estava acelerado
devido ao início do mês, que sempre apresentava maior demanda.
Como solução para esse problema, o ergonomista sugeriu que
os trabalhadores tivessem orientação postural e passassem a
realizar a tarefa se abaixando com as pernas para alcançar a carga
e não flexionando a coluna. Após treinamento, os problemas
continuaram e, agora, alguns trabalhadores se afastaram com
problemas nos joelhos. O que pode ter dado errado?

Resolução da situação-problema
A Análise Ergonômica do Trabalho é um estudo voltado à
complexidade do trabalho. O Manual de Aplicação da Norma
Regulamentadora nº 17 traz 12 passos para a realização dessa
análise e mostra a importância de se consultar os trabalhadores
e valorizar seus saberes em todo o processo. O principal objetivo
da ergonomia é transformar o trabalho. É de extrema importância
a orientação postural e consciência das posições e escolhas

98 U2 - Macroergonomia
biomecânicas mais favoráveis ao trabalhador, porém apenas isso
não transforma o trabalho. Mais uma vez, jogamos apenas no
trabalhador a responsabilidade de não adoecer. Como plano de
ação, regularizar a altura das cargas e transformar a organização
do trabalho (metas, ritmos e métodos) através de um cronograma
de prioridades que satisfaça a necessidade de trabalhadores e
empresa torna-se extremamente necessário para que o problema
seja resolvido com eficiência.

Faça valer a pena

1. No Brasil, a profissão do ergonomista ainda não é regulamentada.


Existe, porém, uma associação sem fins lucrativos que une os profissionais
de ergonomia e procura estudar e divulgar as interações das pessoas
com a tecnologia, a organização e o ambiente, considerando as suas
necessidades, habilidades e limitações. Essa associação procura criar
normas que trazem diretrizes para a prática de ergonomistas no Brasil.
Qual o nome dessa associação?
Assinale a alternativa que contém o nome da associação, cujo objetivo é o
estudo, a prática e a divulgação da ergonomia no Brasil.
a) ABREST.
b) ABEPRO.
c) ABERGO.
d) ERGOBR.
e) FUNDACENTRO.

2. Com relação às competências do profissional ergonomista, é correto afirmar:


( ) O ergonomista investiga, avalia e reconstrói as demandas de projetos
ergonômicos, assegurando a ótima interação entre as variáveis envolvidas
no trabalho.
( ) O ergonomista busca entender a diversidade de fatores que influenciam o
desempenho humano e suas inter-relações, demonstrando compreensão de
métodos de mensuração pertinentes para a avaliação e o projeto em ergonomia.
( ) O ergonomista deve reconhecer seu escopo pessoal de competência
(sabendo de suas limitações) e procurar ter uma atuação transdisciplinar.
( ) O ergonomista pode atuar na concepção (análise de um projeto
antes de sua execução, projetando uma atividade futura provável),
na correção (realizar ajustes em situações reais que já existem) e na
conscientização (capacitação e treinamentos para elucidar fatores
ergonômicos) de problemas voltados à ergonomia.

U2 - Macroergonomia 99
Analise as afirmações, atribua V para verdadeiro ou F para falso e assinale a
alternativa que indica a sequência correta.
a) F - V - V - V.
b) V - F - F - F.
c) F - F - V - V.
d) V - V - V - V.
e) F - F - F - F.

3. A abordagem em que se busca resolver um problema do mundo real


com base na experiência acadêmica e não acadêmica (saber profissional),
articulando conhecimentos e propondo soluções que transcendem o âmbito
de cada disciplina e surgem por meio de uma articulação que gera uma nova
visão da natureza e da realidade chama-se _________________.
Assinale a alternativa que completa corretamente a frase acima com o nome
correto da abordagem.
a) Abordagem multicurricular.
b) Abordagem multidisciplinar.
c) Abordagem interdisciplinar.
d) Abordagem disciplinar.
e) Abordagem transdisciplinar.

100 U2 - Macroergonomia
Referências
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de Deontologia do Ergonomista Certificado. 2003a. Disponível em: <http://www.
abergo.org.br/arquivos/normas_ergbr/norma_erg_br_1002_deontologia.pdf>. Acesso
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______. Norma ERG BR 1001: Competências Essenciais para os Ergonomistas
Certificados. 2003b. Disponível em: <http://www.abergo.org.br/arquivos/normas_
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redução e eliminação da nocividade do trabalho. In: MENDES, R. (Org.). Patologia do
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BOUYER, G. C.; SZNELWAR, L. I. Análise cognitiva do processo de trabalho em sistemas
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BRUNORO, Marcelo. Trabalho e sustentabilidade: contribuições da ergonomia da
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IIDA, Itiro. Ergonomia: projeto e produção. São Paulo: Edgard Blucher, 1990. 465 p.

U2 - Macroergonomia 101
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v. 15, n. 2, p. 407-419, maio/ago. 2008.

102 U2 - Macroergonomia
Unidade 3

Legislação voltada para a


Ergonomia

Convite ao estudo
Caro aluno!

É com grande prazer que iniciamos a Unidade 3 do nosso


estudo, voltada para a legislação que regulamenta a ergonomia
no Brasil e no mundo. Está sendo uma excelente jornada até
agora. Já entendemos, na Unidade 1, o que é a Ergonomia e
sua importância na manutenção de boas condições de trabalho,
tanto para o trabalhador como para a empresa. Vimos alguns
exemplos de situações e aprendemos que, ao tratar de seres
humanos, precisamos entender que eles possuem características
psicofisiológicas que os diferenciam de máquinas e, portanto,
não podemos padronizar tempos e métodos entendendo que
todas as situações são iguais. É preciso analisar o trabalho real de
forma sistêmica. Assim, na Unidade 2 de nosso ensino, iniciamos
os estudos voltados para a Análise Ergonômica do Trabalho e o
papel do profissional ergonomista, entendendo o passo a passo e
a metodologia da Ergonomia da Atividade.

Agora, na Unidade 3, entenderemos o contexto histórico que


trouxe a Ergonomia para o Brasil, suas origens e como foi criada
a Norma Regulamentadora nº 17, que traz a obrigatoriedade
da ergonomia nas empresas. Ao final da unidade, você terá
conhecimentos e habilidades para identificar itens obrigatórios
relacionados à ergonomia dentro das empresas, questões mínimas
de conforto, saúde e desempenho eficiente estabelecidos pela
legislação, normas e regulamentações que, além da NR 17,
também influenciam na abordagem ergonômica, e a importância
de questões ergonômicas terem um acompanhamento constante.
Para facilitar a compreensão dos conteúdos, trouxemos a
situação-problema na qual você é convidado como ergonomista a
realizar uma análise ergonômica do trabalho em uma empresa de
telemarketing. A empresa possui 10.000 funcionários espalhados
em diversas cidades pelo Brasil, possui certificação internacional de
ISO 9001, ISO 45001 e SA 8000 e presta serviço de venda através
do teleatendimento para grandes empresas de telefonia (aparelhos
celulares, pacotes de dados e planos pós e pré-pago de ligações).
A empresa está iniciando um Comitê de Ergonomia, porém nunca
realizou uma Análise Ergonômica do Trabalho, e os contratantes
acreditam que estejam com toda a situação sob controle, uma vez
que todos os postos de trabalho estão dimensionados conforme
os aspectos de mobiliário apontados no anexo II da Norma
Regulamentadora nº 17. Ao visitar o ambulatório médico, você
detecta que grande parte dos afastamentos médicos na empresa
se dá por motivos de infecção urinária e doenças mentais. Para
iniciar seu trabalho como ergonomista, você pode identificar
as etapas para iniciar uma Análise Ergonômica do Trabalho e as
principais características desse tipo de trabalho?

Em cada seção desta unidade, você irá aumentar seus


conhecimentos relacionados à legislação e estará cada vez
mais capacitado a ser um agente de transformação do trabalho
e das condições de trabalho no Brasil e no mundo. Trabalhar
com ergonomia e transformar o trabalho para que ele seja
mais saudável e faça mais sentido é uma forma de melhorar o
mundo. Perceba que existe um aspecto social muito relevante
em transformar o trabalho em algo que faça sentido e traga
realização na vida das pessoas.

Você será o principal responsável pelo sucesso na realização da


Análise Ergonômica do Trabalho nessa empresa e, amparando-se
na legislação e auxiliando a empresa a entender sua interpretação,
você estará melhorando a vida de centenas de pessoas.

Bons estudos!
Seção 3.1
NR 17 e anexos

Diálogo aberto
Relembrando a situação hipotética do nosso Convite ao estudo,
você é contratado como ergonomista para realizar uma análise
ergonômica do trabalho em uma empresa de telemarketing. A
empresa está iniciando um Comitê de Ergonomia, porém nunca
realizou uma Análise Ergonômica do Trabalho, e os contratantes
acreditam que estejam com toda a situação sob controle, uma vez
que todos os postos de trabalho estão dimensionados conforme
os aspectos de mobiliário apontados no anexo II da Norma
Regulamentadora nº 17 (que trata do assunto). Ao visitar o ambulatório
médico, você detecta que grande parte dos afastamentos médicos na
empresa se dá por motivos de infecção urinária e doenças mentais.
Para iniciar seu trabalho como ergonomista, você pode identificar as
etapas para iniciar uma análise ergonômica do trabalho e as principais
características desse tipo de trabalho?
Dessa forma, ao iniciar a realização da análise ergonômica do
trabalho na empresa, você precisa se amparar na legislação para
apontar quais aspectos devem ser transformados no trabalho dos
atendentes de telemarketing para solucionar os problemas apontados
pelo departamento médico. Para isso, você precisará relembrar: o
que estabelece a Norma Regulamentadora nº 17? De quanto em
quanto tempo deve ser realizada a analise ergonômica do trabalho?
Quais aspectos devem ser considerados com relação ao mobiliário
dos atendentes? Quais aspectos relacionados ao trabalho podem
influenciar na saúde mental desses trabalhadores?
Para que você consiga responder a esses e outros questionamentos,
esses conteúdos serão abordados de forma contextualizada na seção
Não pode faltar.
Tenha um excelente estudo!

U3 - Legislação voltada para a Ergonomia 105


Não pode faltar

Histórico da Ergonomia no Brasil e mundo


Se pensarmos na definição de Ergonomia voltada à adaptação
das condições de trabalho às características psicofisiológicas do
homem, então sua origem vem desde a Pré-história. Ao inventar a
roda, descobrir o fogo e manufaturar objetos em pedra lascada
para satisfazer suas necessidades, o conceito de Ergonomia estava
pairando cada uma dessas ações. O Museu do Louvre, na França,
destaca papiros egípcios com recomendações para a construção
de utensílios e arranjos organizacionais que trazem aspectos
ergonômicos em suas considerações. Leonardo da Vinci, no desenho
de seu homem vitruviano, conceito apresentado na obra Os dez
livros da Arquitetura, escrita pelo arquiteto romano Marco Vitruvio
Polião, traz a importância das noções de antropometria e medidas
humanas. Na Idade Média, Lavoisier e Villeneuve já realizaram estudos
relacionados à toxicologia e ergonomia. Dessa forma, analisando a
história, podemos perceber que, mesmo sem mencionar a palavra
“ergonomia”, a preocupação com saúde, conforto e desempenho
eficiente de trabalhadores existe desde sempre.
A primeira definição de Ergonomia foi feita em 1857, por um
cientista polonês chamado Wojciech Jastrzebowski. Em uma
perspectiva típica da época, ele publica o artigo intitulado Ensaios
de ergonomia, ou ciência do trabalho, baseada nas leis objetivas da
ciência sobre a natureza atestando a ergonomia como uma ciência
natural, estabelecendo que é uma ciência do trabalho e requer que
entendamos a atividade humana em termos de esforço, pensamento,
relacionamento e dedicação.

Assimile
Esforço, pensamento, relacionamento e dedicação. Jastrzebowski
destaca a importância de se mobilizar os quatro aspectos: físico-motor,
estético-sensorial, mental-intelectual e espiritual-moral. Assim, dando
origem à palavra ergonomia unindo as palavras ergon e nomos (trabalho
e regras, respectivamente; regras para o trabalho), o pesquisador polonês
cria a palavra que está sendo tão difundida no mundo hoje.

106 U3 - Legislação voltada para a Ergonomia


Na Unidade 1 de nosso estudo, vimos como os trabalhos de Taylor e
Ford transformaram as relações de trabalho e os impactos de seus estudos
no trabalho até hoje. Quando quem prescreve o trabalho está distante
de quem o executa, podem existir diversas incongruências no trabalho
real que levam ao adoecimento dos trabalhadores e à diminuição do
desempenho eficiente da empresa. Assim, durante a Revolução Industrial,
as relações de trabalho se transformam. O trabalho dos artesãos, com suas
próprias regras, seu próprio ritmo e seu próprio preço, dá lugar às linhas de
montagem. Velocidade, ritmo imposto e padronizações.

Pesquise mais
Para saber mais, leia o Capítulo II do livro A Máquina que Mudou o Mundo
(WOMACK; JONES; ROOS, 1992), que traz o extraordinário estudo do
Massachussetts Institute of Technology (MIT), nos Estados Unidos, sobre a
indústria automobilística. O livro retrata suas várias fases, desde a produção
artesanal até a produção em massa, chegando à produção enxuta, que
perdura até hoje. Na obra, os autores apontam fatos sobre as automatizações,
a chegada de trabalhadores de todas as partes do mundo (que recebiam,
inclusive, um minicurso de inglês para poderem se comunicar minimamente
na empresa), a produção do Ford T (carro padronizado na cor preta que
vinha com um manual de instruções sobre a manutenção do carro e de
suas peças). O International Motor Vehicle Program (IMVP), título do estudo,
é um referencial histórico que traz em detalhes as transformações do
trabalho nessa indústria e em outras que seguem o mesmo modelo e é
uma leitura enriquecedora para ergonomistas.

A Revolução Industrial não pode ser limitada apenas aos avanços


nos processos técnicos. Houve toda uma evolução das formas
de divisão do trabalho e das formas de interação entre pessoas e
equipamentos. O conceito de “homem médio” para a padronização
de tempos e métodos ainda deixa traços nos trabalhos atuais.
Em 1915, foi formado na Inglaterra um comitê destinado a estudar
a saúde dos trabalhadores empregados na indústria de guerra, como
uma espécie de assistência técnica ao fator humano nela, verificando
peso das armas, formato e demanda cognitiva existente em controles
de cockpits de avião (a perda de um piloto, que demorava de 2 a 4
anos para estar preparado, era um ponto de atenção nesses estudos),
além de todo o aparato tecnológico.

U3 - Legislação voltada para a Ergonomia 107


Médicos, fisiologistas e engenheiros abordaram diversas questões
de inadaptação entre trabalho e trabalhadores envolvidos nessa
produção. Assim, formou-se a ergonomia clássica imediatamente
após a Segunda Guerra. Essa ergonomia traz um paradigma mecânico
do ser humano e se baseou em diversas disciplinas científicas e
trabalhos de estudiosos e filósofos da Antiguidade (como Aristóteles,
Bernardino Ramazzini, Gilbreth, entre outros) e em todos esses estudos
da época da guerra. Assim, os estudiosos no pós-guerra continuaram
seus trabalhos voltando-se para a produção civil, utilizando métodos,
técnicas e dados obtidos para a indústria.
Em 1947 nasce a primeira sociedade de ergonomia, a Ergonomics
Research Society, criada por um engenheiro chamado Murrel,
trazendo a corrente de ergonomia chamada de Fatores Humanos
(Human Factors Engineering ou HFE), como uma continuidade da
prática já mencionada em operações civis.
A HFE, ou Escola de Fatores Humanos, trata de projetos de
instrumentos, dispositivos e sistemas, baseando-se em procedimentos
experimentais que vão do laboratório clássico para o estudo de fatores
humanos em si mesmo até às modernas técnicas de simulação,
buscando uma melhor conformação das interfaces entre pessoas e
sistemas técnicos. Ferramentas de análise ergonômica e softwares de
simulação são exemplos de produtos dessa escola.
Posteriormente, nasce na Europa uma nova forma de ergonomia:
a Ergonomia da Atividade. Estudiosos percebem que tratar as
questões de trabalho em ambientes simulados (laboratórios) e com
variáveis controladas não mostra a realidade. Mesmo confirmando a
importância desses estudos, é preciso uma nova metodologia para se
enxergar a complexidade e os aspectos invisíveis do trabalho que não
são identificados dessa forma.
Assim, no período do pós-guerra, surge outra vertente da
ergonomia, ensejada pelas necessidades da reconstrução do parque
industrial europeu dizimado pela guerra. Em 1949, surge essa
proposta de metodologia, de Suzanne Pacaud, resgatada em 1955
por Obrendame e Faverge como análise do trabalho.
A proposta de metodologia de análise veio a ser formalizada
somente em 1966, por Alain Wisner, já como Análise Ergonômica
do Trabalho (AET). É importante destacar o nome do professor
Alain Wisner (pronuncia-se “visnér”), professor de ergonomia do

108 U3 - Legislação voltada para a Ergonomia


Conservatoire National des Arts et Métiers, em Paris, França: tratando a
ergonomia como arte, esse professor é um dos grandes responsáveis
pelo estabelecimento da Ergonomia no Brasil e pelo preparo e
formação dos primeiros e grandes nomes de ergonomistas no país.
Na década de 1970, na Europa, nasce um conceito novo – a
intervenção ergonômica, hoje expressão corrente nos EUA e no
Japão. Temos também a Macroergonomia, vista em nossa Unidade 2
de ensino, numa perspectiva de análise estratégica e organizacional.
Em 31 de agosto de 1983, é criada a Associação Brasileira de
Ergonomia e, em 1990, é publicada a Norma Regulamentadora nº 17.

Histórico da NR 17
Com a chegada dos computadores, na década de 1980, tivemos
um aumento na quantidade de trabalhadores que atuavam com
digitação. Em 1986, diante dos numerosos casos de tenossinovite
ocupacional entre digitadores, os diretores da área de saúde do
Sindicato dos Empregados em Empresa de Processamento de Dados
no Estado de São Paulo (SINDPD/SP) fizeram contato com a Delegacia
Regional do Trabalho, em São Paulo, e com a Fundação Jorge Duprat
de Figueiredo (Fundacentro) – um centro de pesquisas relacionado à
saúde e segurança do trabalho, vinculado ao Ministério do Trabalho e
Emprego –, para buscar respostas para os fatores causadores dessas
doenças e proposições de melhoria.
Após alguns estudos, foram identificados o pagamento de prêmios
de produção, a ausência de pausas, a prática de horas extras e a dupla
jornada de trabalho, entre outros.
Durante 1988 e 1989, a Associação de Profissionais de
Processamento de Dados (APPD nacional) realizou reuniões com
representantes da Secretaria de Segurança e Medicina do Trabalho
(SSMT) em Brasília, da Fundacentro e da DRT/SP para elaborar um
projeto de norma que estabelecesse limites à cadência de trabalho
e proibisse o pagamento de prêmios de produtividade, bem como
estabelecesse critérios de conforto para os trabalhadores de sua base,
que incluíam o mobiliário, a ambiência térmica, a ambiência luminosa
e o nível de ruído.
Nesse mesmo período, o Ministério do Trabalho convocou
toda a sociedade civil para que organizasse seminários e debates

U3 - Legislação voltada para a Ergonomia 109


com o objetivo de recolher sugestões para a melhoria de todas as
Normas Regulamentadoras (NR). Nesses seminários, chegaram várias
sugestões de alteração da NR 17, mas eram propostas de alterações
pontuais conservando a estrutura geral em vigor. Não havia nenhuma
proposta concreta que fosse ao âmago da questão: o controle da
cadência e do ritmo do processo produtivo.
Em um seminário nacional realizado em dezembro de 1989, em
São Paulo, foi utilizada a adaptação do texto Les écrans de visualisation:
guide méthodologique pour médecin du travail, publicado pelo
Institut National de Recherche en Sécurité (INRS), em 1987, na França.
Nesse seminário, foi decidido que não deveria ser elaborada uma
norma apenas para os profissionais em processamento de dados,
pois as lesões por esforço repetitivo (LER) eram observadas também
em várias outras atividades profissionais. Além disso, o secretário de
Segurança e Medicina do Trabalho também não concordava com
a ideia de elaborar uma norma que abrangesse apenas o setor de
processamento de dados, argumentando que, dentro em breve,
todos os setores produtivos exigiriam uma norma específica. Assim,
foi estabelecido que se fizesse a redação da NR 17, porém deram o
prazo de apenas 10 dias para que ela fosse escrita.

Reflita
Apenas digitadores foram estudados, e as regras deveriam ser agora para
todos. Além disso, os estudos que apontaram fatos para a redação da
NR 17 vieram da França. Vamos pensar a respeito: na França, precursora
da Ergonomia da Atividade, não estabelecemos valores fechados para
situações de trabalho por saber que cada situação é diferente e depende
do contexto no qual está inserida. Assim, na redação da NR 17, os seus
redatores sabiam do perigo em estabelecer limite de peso para caixas
e quantificar pausas de forma metódica. Pouco tempo para escrever,
apenas uma profissão como estudo de base e sem poder colocar
parâmetros exatos. Esse foi o contexto no qual a NR 17 foi escrita.
Não bastassem essas complicações, precisamos também entender o
contexto no qual uma norma regulamentadora é escrita.

110 U3 - Legislação voltada para a Ergonomia


Para estabelecer parâmetros e criar uma norma regulamentadora,
é preciso existir uma Comissão Tripartite: representantes dos
empregadores, representantes dos empregados e representantes
do Governo. Geralmente, essas representações vêm das classes
patronais, sindicatos e da Fundacentro.
Após a publicação da NR 17, a classe patronal, principalmente a
Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) e a Federação
Brasileira dos Bancos (Febraban) se deram conta das possibilidades
abertas pela nova redação e que as alterações não se limitavam à área
de processamento de dados. Com diversos embates com advogados
dessas instituições, que exigiam a modificação do conteúdo da norma
referente às metas de produção, uma nova proposta foi encaminhada
à SSST e publicada em 23 de novembro de 1990, pela Portaria nº
3.751, com alterações que, infelizmente, comprometeram, em parte,
o seu entendimento e a sua aplicação prática. Para se ter uma ideia,
a norma em si é redigida em apenas 4 páginas, porém o Manual para
sua interpretação possui 101 páginas.

Interpretação da NR 17
A Norma Regulamentadora pode ser consultada no site do
Ministério do Trabalho e Emprego. Em seu item 17.1, aponta
que seus objetivos são voltados a estabelecer parâmetros que
permitam a adaptação das condições de trabalho às características
psicofisiológicas dos trabalhadores, de modo a proporcionar
um máximo de conforto, segurança e desempenho eficiente.
Essas condições de trabalho incluem aspectos relacionados ao
levantamento, transporte e descarga de materiais, ao mobiliário, aos
equipamentos e às condições ambientais do posto de trabalho e à
própria organização do trabalho.
Perceba que a norma não trata de valores, números e regras.
Assim, em seu item 17.1.2, ela torna obrigatória a realização da análise
ergonômica do trabalho, devendo abordar, no mínimo, as condições
de trabalho, conforme citadas anteriormente.
Quando a norma traz o termo “Análise Ergonômica do Trabalho”,
ele já faz alusão ao trabalho do Professor Wisner e à sua metodologia,
e é isso que nunca ficou muito claro para empresas, ergonomistas
e auditores fiscais. Como vimos em nossa Unidade 2, existe
uma metodologia para se fazer essa análise, e ela não tem uma

U3 - Legislação voltada para a Ergonomia 111


periodicidade estabelecida, já que ela própria indica a necessidade
de ser refeita sempre que há inadequações entre trabalho prescrito
e real e quando há embates voltados ao conforto, à segurança e ao
desempenho eficiente dos trabalhadores.
Ao tratar do levantamento e transporte de cargas, a norma
estabelece que não deverá ser exigido nem admitido o transporte
manual de cargas cujo peso possa comprometer a saúde ou a
segurança do trabalhador. Veja que não são sugeridos números. Em
nossa Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), no capítulo V, título II,
artigo 198, é estabelecido o peso máximo de 60 kg para levantamento
e transporte de cargas.
Nas unidades anteriores de nosso estudo, já vimos que isso não
pode ser tomado como ponto de partida. Uma análise da situação
com todas as suas reais características é essencial para se adequar um
peso que não comprometa a saúde do trabalhador, além de destacar
treinamentos e uso de equipamentos de auxílio.
A norma destaca que, sempre que o trabalho puder ser executado
na posição sentada, o posto de trabalho deve ser planejado ou
adaptado para essa posição. Pode existir trabalho em pé, e já vimos que
em algumas situações não é possível realizar o trabalho sentado (por
exemplo, o carregamento de peso). Nesses casos, devem ser instalados
assentos para descanso. Esse item destaca apenas que cadeiras e
bancadas devem ter as dimensões corretas. Se um trabalhador possui
baixa estatura, deve ser dimensionado um apoio para pés.
Com relação às condições ambientais, elas também devem estar
adequadas às características psicofisiológicas dos trabalhadores e à
natureza do trabalho a ser executado. Nos locais de trabalho onde
são executadas atividades que exijam solicitação intelectual e atenção
constantes, a norma aponta as seguintes condições de conforto:
a) ruído: seguir o estabelecido na NBR 10152 (Inmetro).
b) temperatura efetiva entre 20 °C e 23 °C.
c) velocidade do ar não superior a 0,75 m/s.
d) umidade relativa do ar não inferior a 40%.
Note que em momento algum a norma estabelece esses
parâmetros para todos. As constantes brigas por temperatura do ar
condicionado não são respondidas pela norma. Uma análise precisa
ser realizada e, principalmente, uma conversa esclarecedora com os

112 U3 - Legislação voltada para a Ergonomia


trabalhadores sobre o tema. Muitas vezes, as reclamações são por
falta de conhecimento sobre o tema.
A norma também estabelece que em todos os locais de trabalho
deve haver iluminação adequada, natural ou artificial, geral ou
suplementar, apropriada à natureza da atividade. A NBR 5413 é citada
como norma a ser consultada para essa adequação. É importante
destacar que, ao procurar essa norma no site da ABNT (Associação
Brasileira de Normas Técnicas), ela consta como cancelada e
substituída pela Norma ISO 8995-1. Porém, a nota técnica do
Ministério do Trabalho e Emprego nº 224/2014 pede que a norma
antiga continue sendo utilizada.
Com relação à organização do trabalho, ela deve ser adequada
às características psicofisiológicas dos trabalhadores e à natureza do
trabalho a ser executado. Como vimos na Unidade 1 de nosso estudo,
o termo diz respeito a:
a) normas de produção.
b) modo operatório.
c) exigência de tempo.
d) determinação do conteúdo de tempo.
e) ritmo de trabalho.
f) conteúdo das tarefas.
Nas atividades que exijam sobrecarga muscular estática ou
dinâmica do pescoço, ombros, dorso e membros superiores e
inferiores, e a partir da análise ergonômica do trabalho, deve ser
observado o sistema de avaliação de desempenho para efeito de
remuneração e vantagens; pausas para descanso; retorno ao trabalho
após qualquer tipo de afastamento igual ou superior a 15 dias, e a
exigência de produção deverá permitir um retorno gradativo aos
níveis de produção vigentes na época anterior ao afastamento.

Anexos I e II da NR 17
O primeiro anexo da norma refere-se ao trabalho de operadores de
check-out, ou seja, caixas de supermercados. Aqui, por se tratar de uma
situação específica de trabalho, a norma procura estabelecer alguns
números e regras, para assegurar as mínimas condições de conforto,
segurança e desempenho eficiente. Perceba que são “condições

U3 - Legislação voltada para a Ergonomia 113


mínimas”, pois mesmo atendendo a todos os itens da norma, algo que
não foi contemplado por ela pode prejudicar os trabalhadores.
O posto de trabalho deve ser projetado para atender às características
antropométricas de 90% dos trabalhadores, respeitando suas zonas de
alcance e a visualização da tarefa. Deve também assegurar a postura
para o trabalho na posição sentada e em pé, garantindo um espaço
adequado para livre movimentação e colocação da cadeira, permitindo
a alternância do trabalho em pé e sentado. A cadeira deve ser adequada,
o sistema deve ter esteira para facilitar a movimentação de mercadorias
nos check-outs com comprimento de 2,70 metros ou mais. Deve-
se disponibilizar sistema de comunicação com pessoal de apoio e
supervisão e manter mobiliário sem quinas vivas ou rebarbas, devendo
os elementos de fixação (pregos, rebites, parafusos) serem mantidos de
forma a não causar acidentes.
A norma traz a importância de os trabalhadores estarem protegidos
de condições climáticas adversas, já que muitos estão perto das portas
de saída dos mercados, o que os submete a vento e todas as intempéries.
A balança para pesagem de alimentos deve estar alinhada à esteira,
para que o trabalhador apenas empurre o peso para posicioná-lo,
sem precisar erguê-lo.
A norma estabelece que o empregador deve adotar medidas para
evitar que a atividade de ensacamento de mercadorias se incorpore
ao ciclo de trabalho ordinário e habitual dos operadores de check-
out. Além disso, o número de check-outs e de trabalhadores também
é organizado com base nos parâmetros do Anexo I.
A garantia ao respeito de pausas fisiológicas e treinamentos
específicos também são listadas.
O anexo II da Norma Regulamentadora nº 17 estabelece
parâmetros mínimos para o trabalho em atividades de
teleatendimento/telemarketing nas diversas modalidades desse
serviço, de modo a proporcionar um máximo de conforto,
segurança, saúde e desempenho eficiente.
Esse tipo de trabalho tem crescido muito no Brasil e é um grande
ponto de atenção. Trabalhadores são submetidos a metas abusivas
e completamente desconexas da realidade de trabalho, tendo suas
pausas monitoradas e pontuadas, o que faz com que muitos não
realizem pausas fisiológicas para atendimento da meta ou por um
grande fluxo de ligações.

114 U3 - Legislação voltada para a Ergonomia


Além das demandas cognitivas em precisar atender pessoas
com problemas e requisições diversas, muitas vezes eles não têm
autonomia para resolver os problemas e com sistemas lentos e
desconectados entre si, o que provoca diversas consultas, cliques e
diversas telas.
Embora a norma traga uma infinidade de parâmetros de tamanho
da bancada, condições ambientais, de organização de trabalho e,
inclusive, de assédio, muitas vezes, as empresas realizam campanhas
motivacionais que podem exigir vestimentas e dar prêmios
insignificantes que podem agravar as condições de trabalho.
É preciso ter cuidado ao se realizar uma Análise Ergonômica do
Trabalho utilizando o anexo II da NR 17, havendo a necessidade de uma
interpretação em conjunto de cada um se seus itens pelas empresas,
pois elas podem acreditar que a norma trate apenas do mobiliário.
O que se vê são metas abusivas, indicadores de desempenho que
prejudicam a autonomia dos trabalhadores, treinamentos ineficazes,
incentivo à competição entre pessoas que deviam se ajudar, clientes
agressivos e falta de suporte psicológico, além da existência de três
pausas obrigatórias (duas de 10 minutos e uma de 20) que não dão
conta das necessidades fisiológicas e que não são suficientes para
uma descompressão e alimentação adequadas.

Exemplificando
Em uma de minhas análises, escutei o depoimento de alguns atendentes
sobre pegarem muito trânsito e chegarem famintos ao trabalho,
comendo tão rápido que não conseguem comer devagar nem quando
estão em casa. A pausa de 20 minutos leva o tempo de desconectar
do terminal, descer até a área livre, comer e voltar. Existem prédios de
diversos andares e sem elevador. Alguns apontam que são monitorados
pelo horário de fazer a pausa, mas se cai uma ligação, eles devem
atender e isso é indicado como quebra para receber a meta. Existem
diversos tipos de trabalho que se caracterizam como teleatendimento,
mas não chamam a atividade assim, mantendo a jornada de trabalho e
parâmetros do anexo II fora da regularidade.

U3 - Legislação voltada para a Ergonomia 115


A norma estabelece parâmetros para mobiliário, ambiente e,
principalmente, para a organização do trabalho, destacando pausas,
folgas semanais, o máximo de 6 horas diárias (e, se houver horas
extras, deve haver mais uma pausa de 15 minutos antes das horas
adicionais, e isso não pode ocorrer por mais de 10 dias).
Em seu item 5.1.2.1, o anexo II estabelece que devem ser levadas
em consideração as necessidades dos operadores na elaboração
das escalas laborais que acomodem necessidades especiais da vida
familiar. É um grande desafio explicar isso para a empresa, que tem
como prioridade atender o cliente e, geralmente, desloca e muda
escalas de acordo com sua própria lógica.
Por fim, o anexo destaca a importância de se realizar a Análise
Ergonômica do Trabalho envolvendo todas as dimensões necessárias.

Sem medo de errar

Retomando a nossa situação-problema, você é convidado como


ergonomista para realizar uma análise ergonômica do trabalho em
uma empresa de telemarketing. Ao iniciar a realização da análise, você
precisa se amparar na legislação para apontar quais aspectos devem
ser transformados no trabalho dos atendentes de telemarketing para
solucionar os problemas apontados pelo departamento médico.
Para isso, você precisará relembrar que o anexo II da Norma
Regulamentadora nº 17 estabelece parâmetros mínimos para o
trabalho em atividades de teleatendimento/telemarketing nas diversas
modalidades desse serviço, de modo a proporcionar um máximo de
conforto, segurança, saúde e desempenho eficiente. Relembramos
que a Análise Ergonômica do Trabalho parte de uma demanda e não
tem periodicidade de realização, porém em um setor de telemarketing,
mesmo atendendo a todos os parâmetros da NR 17, podem haver
outros pontos de interesse que precisem de análise. A norma aponta
aspectos do mobiliário com dimensões adequadas de bancada,
cadeira, terminal eletrônico e headset, e todos esses parâmetros são
tratados com valores exatos. Mesmo que sejam totalmente atendidos,
aspectos referentes à saúde mental desses trabalhadores devem ser
considerados. Esse tipo de trabalho tem crescido muito no Brasil, e é
um grande ponto de atenção. Trabalhadores são submetidos a metas
abusivas e completamente desconexas da realidade de trabalho,

116 U3 - Legislação voltada para a Ergonomia


tendo suas pausas monitoradas e pontuadas, o que faz com que
muitos não realizem pausas fisiológicas para atendimento da meta ou
por um grande fluxo de ligações.
Além das demandas cognitivas em precisar atender pessoas
com problemas e requisições diversas, muitas vezes, eles não têm
autonomia para resolver os problemas e devem lidar com sistemas
lentos e desconectados entre si, o que provoca diversas consultas,
cliques e telas. O que se vê são metas abusivas, indicadores de
desempenho que prejudicam a autonomia dos trabalhadores,
treinamentos ineficazes, incentivo à competição entre pessoas que
deviam se ajudar, clientes agressivos e falta de suporte psicológico,
além da existência de três pausas obrigatórias (duas de 10 minutos e
uma de 20) que não dão conta das necessidades fisiológicas e que não
são suficientes para uma descompressão e alimentação adequadas.

Avançando na prática

Late como cachorro, mas é um gato


Descrição da situação-problema
Você é chamado como ergonomista para identificar o que
está acontecendo em um grande banco com centrais por todo o
país. Com os atuais avanços tecnológicos, o banco está criando
uma forma para que os seus gerentes de relacionamento atendam
apenas a distância, utilizando chat para comunicação e terminais
de atendimento eletrônico. O banco chama você para iniciar a
análise de projeto dessa nova situação de trabalho. Quais pontos
referentes ao trabalho de teleatendimento precisam de atenção e
alinhamento imediatamente ao se deparar com essa situação?

Resolução da situação-problema
É preciso verificar o desvio de funções. O anexo II da NR 17,
em seu item 1.1.2, estabelece que se entende como trabalho de
teleatendimento/telemarketing aquele cuja comunicação com
interlocutores clientes e usuários é realizada a distância por
intermédio da voz e/ou mensagens eletrônicas, com a utilização
simultânea de equipamentos de audição/escuta e fala telefônica e
sistemas informatizados ou manuais de processamento de dados.

U3 - Legislação voltada para a Ergonomia 117


Se os gerentes farão esse tipo de trabalho, o anexo II da NR 17 deve
ser respeitado.

Faça valer a pena

1. As condições de trabalho que incluem aspectos relacionados ao


levantamento, transporte e descarga de materiais merecem um destaque
especial na interpretação da Norma Regulamentadora nº 17.
Em relação ao peso ideal que um trabalhador pode erguer sem risco de
adoecimento, é correto afirmar:
a) O peso de 60 kg, de acordo com a CLT, é o peso máximo adequado e
garante que o trabalhador não adoeça.
b) O peso de 23 kg, de acordo com a NIOSH, é o peso máximo adequado
e garante que o trabalhador não adoeça.
c) O peso de 25 kg, de acordo com a Hudson de Araújo Couto, é o peso
máximo adequado e garante que o trabalhador não adoeça.
d) Não é possível garantir um peso ideal que contemple todas as situações
de trabalho e nem é possível garantir que um trabalhador não adoeça.
e) O peso de 10 kg, de acordo com a NR 17, é o peso máximo adequado e
garante que o trabalhador não adoeça.

2. A origem da palavra ergonomia vem das palavras gregas ergon e nomos


(regras para o trabalho).
Com base na origem da palavra ergonomia, assinale a alternativa que traz
o nome do estudioso que a utilizou pela primeira vez.
a) Leonardo da Vinci.
b) Wojciech Jastrzebowski.
c) Frederick Wislow Taylor.
d) James Ford.
e) Bernardino Ramazzini.

3. A Norma Regulamentadora nº 17 visa estabelecer parâmetros que


permitam a adaptação das condições de trabalho às características
psicofisiológicas dos trabalhadores, de modo a proporcionar um máximo
de conforto, segurança e desempenho eficiente.
Assinale a alternativa que traz corretamente os nomes das atividades
profissionais tratadas nos anexos I e II da NR 17, respectivamente.
a) Operadores de check-out e trabalho em teleatendimento/telemarketing.
b) Caixas de supermercado e digitadores.

118 U3 - Legislação voltada para a Ergonomia


c) Telemarketing e caixas de supermercado.
d) Operadores de check-in de aeroportos e telemarketing.
e) Os anexos tratam de disposições gerais e atualizações da Norma
Regulamentadora nº 17, não trazendo situações específicas.

U3 - Legislação voltada para a Ergonomia 119


Seção 3.2
Ergonomia e os Sistemas de Gestão Integrados

Diálogo aberto
Você é convidado como ergonomista para realizar uma análise
ergonômica do trabalho em uma empresa de telemarketing. A
empresa possui 10.000 funcionários espalhados em diversas cidades
pelo Brasil, possui certificação internacional de ISO 9001, ISO 45001
e SA 8000 e presta serviço de venda através do teleatendimento para
grandes empresas de telefonia (aparelhos celulares, pacotes de dados
e planos pós e pré-pago de ligações). Essa empresa possui certificação
internacional de Qualidade, Saúde e Segurança no Trabalho e de
Responsabilidade Social. Quais impactos essas certificações podem
trazer para os aspectos relacionados à ergonomia na empresa? Quais
os requisitos de base de cada normatização? Quais as vantagens para
a empresa em realizar uma certificação internacional nesses aspectos
e quais as suas responsabilidades?
Para solucionar esse estudo de caso, vamos ao item Não pode
faltar do nosso estudo.

Não pode faltar

Sistemas de Gestão Integrados: saúde, segurança, meio


ambiente, qualidade e responsabilidade social
Até o presente momento, conversamos sobre a ergonomia e
sua importância nas empresas, abordando a metodologia da Análise
Ergonômica do Trabalho, seu histórico e a legislação brasileira que trata
especificamente da Ergonomia no Brasil: a Norma Regulamentadora
nº 17, do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE).
Para realizar a ação ergonômica na empresa, devemos lembrar
o quão importante é conhecê-la. Só entenderemos o trabalho real
se uma análise global da empresa – seus processos e suas regras –
for realizada. O trabalho sempre está inserido em um determinado
contexto que o condiciona. As regras e normas de produção podem
afetar diretamente a saúde no trabalho.

120 U3 - Legislação voltada para a Ergonomia


Vamos pensar: digamos que haja uma linha de produção dentro
de uma empresa de cosméticos em que os trabalhadores realizam
a colocação de tampas em um batom. Pode acontecer de a
empresa trocar seus fornecedores e a matéria-prima em busca de
padrões mais altos de qualidade, buscando tampas mais rígidas, que
geram dificuldades na tarefa e sobrecarregam as mãos e os punhos
dos trabalhadores. Pode acontecer de o setor que busca a gestão
ambiental da empresa pedir a troca de determinados materiais que
eram essenciais para a tarefa.
Conhecer a empresa e sua forma de funcionamento é necessário
para se traçar em qual cenário as relações de trabalho acontecem.
Como vimos anteriormente, na metodologia da Análise Ergonômica
do Trabalho, de forma esquemática o ergonomista precisa mapear
o contexto comercial e econômico, quem são os consumidores,
quais regulamentações a empresa obedece, quem é a concorrência,
a posição da empresa no mercado, o que vem, quais seus padrões
de qualidade, materiais, história e perspectivas futuras, suas políticas,
estrutura administrativa, localização, processos, modelo de gestão,
grau de evolução tecnológica, principais etapas do processo de
produção, índice de produtividade, horários, turnos, cadências e
demais aspectos da organização do trabalho.
Dessa forma, estamos ressaltando a importância de saber como
é a gestão da empresa. Quando falamos em gestão, estamos nos
referindo a formas de administrar e controlar um negócio.
A globalização e o capitalismo promoveram uma mudança nas
necessidades competitivas das empresas: o consumidor está mais
exigente e bem informado, o que torna essencial que a empresa
busque a imagem de ser responsável com seus processos, a qualidade
de serviços e produtos, responsabilidade com seus trabalhadores e
com o meio ambiente.
Mundialmente, existem normas que trazem alguns requisitos para
que as empresas consigam organizar seus processos e melhorar
sua forma de gestão. Atualmente, empresas com poder aquisitivo
organizam seus processos seguindo fielmente esses requisitos e, em
seguida, passam por uma auditoria de órgãos auditores que garantem
a certificação delas. Essa certificação pode ser voltada à qualidade
dos serviços ou produtos, gestão ambiental, saúde e segurança e
de responsabilidade social. Caso a empresa não consiga certificar

U3 - Legislação voltada para a Ergonomia 121


seus processos, mesmo assim, é interessante conhecer e aplicar os
requisitos das normas que se enquadrem à sua realidade.
Assim, as empresas buscam mapear seus processos através de
requisitos predefinidos por normas internacionais, o que permite que
possam melhorar a gestão de aspectos, como qualidade, meio ambiente,
saúde e segurança e responsabilidade social de forma coordenada.
No Brasil, houve a tradução de normas internacionais de sistemas
de gestão integrados: ABNT NBR ISO 9001/2015 para a Gestão da
Qualidade; ABNT NBR ISO 14001/2015 para a Gestão Ambiental; OHSAS
18001/2007 (sendo atualizada para a ABNT NBR ISO 45001/2016) para
a Gestão em Saúde e Segurança; e as normas SA 8000 e ABNT NBR
16001/2012 sobre as diretrizes de Responsabilidade Social.
Essas normas têm em comum o fato de seguirem um método de
controle da melhoria contínua dos processos e produtos chamado
PDCA ou Roda de Deming (referente a William Edwards Deming, um
dos precursores da gestão da qualidade).
O ciclo PDCA é uma ferramenta baseada na repetição sucessiva
nos processos, com o objetivo de tornar a gestão de uma empresa
mais ágil, clara e objetiva. O ciclo tem quatro etapas que se repetem
com foco na melhoria contínua: Planejar (elaborar um plano de ação
para atingir os resultados necessários); Realizar (executar o processo,
fabricar o produto, realizar o serviço); Checar (conferir a realidade
com os resultados esperados); Agir (ajustar e tomar ações corretivas).
Perceba que podemos aplicar as quatro fases do PDCA a
praticamente tudo: estabelecer uma meta, realizar, checar para ver o
que pode ser melhorado e realizar ajustes.

122 U3 - Legislação voltada para a Ergonomia


Figura 3.1 | Ciclo PDCA ou Roda de Deming

Agir Planejar
Agir de acordo com o avaliado, Estabelecer uma meta ou identifcar um
determinar e confeccionar novos planos problema.
de ação, promovendo a melhoria Analisar sistematicamente e definir o
contínua. PLANO DE AÇÂO.

Checar
Realizar
Monitorar e avaliar periodicamente
Executar as atividades conforme
os resultados, confrontando com o
mapeadas no PLANO DE AÇÃO para
planejado, objetivos, especificações e
analisar sua eficácia na realidade.
consolidando resultados.

Fonte: elaborada pela autora.

O ciclo PDCA estabelece que todos os indicadores estabelecidos


na empresa tenham foco na melhoria contínua. Os Sistemas de
Gestão, isolados ou integrados (quando implantados em conjunto),
sempre seguirão a lógica de melhoria contínua.
Vamos abordar cada um deles e sua relação com a Ergonomia.

Gestão da Qualidade – a norma ISO 9001/2015


Já aconteceu de você ir ao supermercado e encontrar uma fruta
com um “selinho de qualidade”? Atualmente, torna-se cada vez mais
comum vermos selos de qualidade e promessas sobre a procedência
dos produtos e garantia de qualidade de serviços.
Embora “qualidade” seja um conceito relativo (pois um produto
ou serviço pode ser interpretado e sentido de formas diferentes pelas
pessoas), mapear processos para garantir a qualidade é essencial para
a competitividade e o sucesso da empresa.
Imagine duas calças de mesmo número e da mesma marca terem
tecidos diferentes? Ou imagine ir a duas lojas da mesma marca em locais
diferentes e ter atendimentos e informações completamente divergentes?
A qualidade aumenta a confiança do consumidor. Para garantir
requisitos que assegurem a qualidade de produtos e serviços, o

U3 - Legislação voltada para a Ergonomia 123


Comitê Técnico Quality Mangement and Quality Assurance (ISO/TC
176) elaborou a norma ISO 9001, que foi o ponto de partida para a
padronização de requisitos de gestão. No Brasil, ela foi revisada pela
Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), ABNT NBR ISO
9001, com sua última revisão em 2015 (até o momento, já que essas
normas podem ser revistas sempre que necessário para atualizar seus
requisitos e aplicação).
A ABNT é o Foro Nacional de Normalização por reconhecimento da
sociedade brasileira. Foi fundada na década de 1940 e é representante do
Brasil nos foros sub-regionais, regionais e internacionais de normalização.
A ISO 9001, geralmente, é o primeiro foco das empresas. A norma
ISO 9001 não impõe nenhum padrão de qualidade ou uniformidade
de nenhum requisito. É a organização que deve definir livremente
como estabelecer, implementar e manter o sistema.
Essa norma traz sete princípios da qualidade e estabelece requisitos
para atingi-los:
1) Foco no cliente: sempre precisamos nos perguntar “qualidade
para quem?”, pois apenas conhecendo o público-alvo é possível
garantir sua satisfação e superação de expectativas.
2) Liderança: possuir equipes com líderes que promovem o
engajamento e foco em resultados.
3) Comprometimento das pessoas: comprometimento, alinhamento
e comunicação entre pessoas da organização.
4) Abordagem de processos: estabelecer processos de forma a
garantir uma padronização.
5) Tomada de decisão baseada em evidências: criar indicadores,
monitorar e medir processos.
6) Melhoria: o que pode ser medido pode ser melhorado e, seguindo
o ciclo PDCA, devemos nos perguntar sempre o que pode melhorar.
7) Gestão de relacionamentos: interação e gerenciamento dos
relacionamentos entre pessoas, processos e organizações.
A norma ISO 9001 não impõe nenhum padrão de qualidade ou
uniformidade de nenhum requisito. É a organização que deve definir
livremente como estabelecer, implementar e manter o sistema.

124 U3 - Legislação voltada para a Ergonomia


Figura 3.2 | Os sete princípios da qualidade da ISO 9001/2015

Fonte: elaborada pela autora.

Assimile
Como pode ser visto, esses sete princípios buscam o engajamento de
equipes com foco em resultados e na tomada de decisões baseada em
evidências. Analisando cuidadosamente esses princípios, precisamos
ser cautelosos e verificar se o foco em resultados e o estabelecimento
de indicadores que não condizem com a realidade do trabalho podem
estar gerando adoecimentos e problemas com conforto, segurança e
desempenho eficiente dos trabalhadores.

Muitas vezes, pela busca desenfreada de controle de seus


processos, as empresas começam a estabelecer metas e indicadores
totalmente incoerentes com a realidade do trabalho, como avaliar
negativamente um atendente que não resolveu um problema,
sendo que seu sistema de computador não dava autonomia para
essa resolução; ou cobrar rapidez numa linha de montagem sem
considerar os esforços físicos dos trabalhadores; ou ainda penalizar
trabalhadores que não atingiram os padrões de qualidade de
uma determinada peça sendo que não possuíam ferramentas ou
treinamento adequados para realizar o trabalho.

U3 - Legislação voltada para a Ergonomia 125


Pesquise mais
Para saber mais sobre a Gestão da Qualidade e sua abordagem na
atualidade, assista à entrevista do consultor em gestão empresarial
Waldez Ludwig, no Programa do Jô, em 2011 disponível em: <https://
www.youtube.com/watch?v=-4UB7XRnK40>. Acesso em: 13 jun. 2017.

Gestão Ambiental – a norma ISO 14001/2015


Empresas de todos os tipos e portes estão cada vez mais
preocupadas em atingirem um bom desempenho sem danificar
o meio ambiente. Assim, realizam a gestão de seus resíduos e
procuram controlar o impacto de suas atividades, serviços e
produtos no ambiente.
Quando compramos um produto, como é seu descarte? Quais
impactos o seu processo de produção causa ao meio ambiente? De
onde veio e qual matéria-prima foi utilizada?
Atualmente, os consumidores têm grande preocupação com
essas questões. Assim, é essencial que as empresas demonstrem
aos seus clientes, fornecedores e sociedade que elas exercem suas
atividades sem provocar danos ao meio ambiente estabelecendo um
Sistema de Gestão Ambiental (SGA).

Exemplificando
Historicamente, há uma série de fatos relacionados a ações irresponsáveis
com o meio ambiente. Para saber mais, veja o exemplo da empresa
Volkswagen, que utilizou um programa para mascarar a emissão de
poluentes em carros a diesel. Leia a matéria Que vias a Volks pode seguir
após o escândalo das emissões, de Luísa Melo, no site da Revista Exame,
disponível em: <http://exame.abril.com.br/negocios/que-vias-a-volks-
pode-seguir-apos-o-escandalo-das-emissoes/>. Acesso em: 13 jun. 2017.

A norma ISO 14001 foi elaborada e reformulada buscando a


articulação com a ISO 9001, para que pudessem ser aplicadas de
forma integrada. Também baseada no ciclo PDCA, traz a correlação
dos seguintes elementos: política ambiental, planejamento,

126 U3 - Legislação voltada para a Ergonomia


implementação e operação, verificação, análise pela administração
e melhoria contínua.
Assim, a empresa precisará criar uma política que seja adequada
à natureza, planejando a escala e os impactos ambientais de suas
atividades; com comprometimento com melhoria contínua, com
requisitos legais; com estrutura para o estabelecimento e a análise dos
objetivos e metas ambientais; com documentação e comunicação a
todos da empresa.

Gestão de Saúde e Segurança do Trabalho – a norma OHSAS


18001/2007 (atual ISO 45001/2016)
A norma OHSAS 18001 (Occupational Health and Safety
Assessment Series) foi desenvolvida para ser compatível com as
normas ISO 9001 e ISO 14001, em resposta à demanda de clientes
para uma gestão da Segurança e Saúde no Trabalho. Também
baseada no ciclo PDCA, fornece elementos para uma gestão eficaz,
assim como a ISO 14001: Política de saúde e segurança do trabalho,
planejamento, implementação e operação, verificação e ação
corretiva, análise crítica pela direção e melhoria contínua.
Além de trazer diretrizes para a criação de uma política de saúde
e segurança do trabalho, a norma traz definições de riscos e perigos,
indicando procedimento para sua identificação nas atividades, no
comportamento e fatores humanos, no local de trabalho e sua vizinhança,
nos equipamentos, na infraestrutura, em mudanças na organização,
processos, obrigações legais e controles necessários e na ergonomia.
A norma OHSAS 18001 foi reformulada no Brasil como ISO
45001/2016, trazendo a saúde e segurança como focos da empresa,
introduzindo a gestão de riscos e maior descrição e detalhamento
dos requisitos. Embora não seja tratada pelo nome, a ergonomia
permeia toda a norma, já que aponta a necessidade de se verificar a
interação dos trabalhadores com os processos de trabalho, máquinas,
equipamentos e organização.
Da mesma forma que a Norma Regulamentadora nº 17, não há
descrição de formas e pontos de atenção voltados à ergonomia,
cabendo ao ergonomista conhecer os caminhos de análise e
melhoria através da metodologia da Análise Ergonômica do Trabalho,
seguindo ainda o PDCA de acordo com a demanda.

U3 - Legislação voltada para a Ergonomia 127


Gestão da Responsabilidade Social – as normas SA 8000 e ISO
16001/2012
A norma SA 8000 (Social Accountability 8000) foi desenvolvida pela
Social Accountability International (SAI), nos Estados Unidos, tendo
como principal enfoque garantir os direitos básicos dos trabalhadores.
Essa norma destina-se a qualquer organização que pretenda garantir
parâmetros éticos associados aos seus processos de negócio. A SA
8000 tem como base um conjunto de convenções da Organização
Internacional do Trabalho (OIT) e da Organização das Nações Unidas
(ONU), sendo a certificação suportada no cumprimento de oito
requisitos centrados na responsabilidade social: Trabalho Infantil:
a empresa não deve se envolver ou apoiá-lo; Trabalho Forçado: a
empresa não deve apoiar, se envolver, nem exigir que os trabalhadores
façam depósitos ou deixem documentos de identidade ao iniciar na
empresa; Segurança e Saúde no Trabalho: a empresa deve prover um
ambiente seguro, com um responsável que assegure que todos os
trabalhadores recebam treinamento e tenham acesso à água potável
banheiros, limpos e instalações e processos seguros; Discriminação:
respeito à raça, classe social, nacionalidade, religião, deficiência, sexo,
orientação sexual, associação a sindicato ou afiliação política e idade,
jamais interferindo nos direitos dos trabalhadores e não permitindo
ofensas ou ameaças; Práticas Disciplinares: não deve se envolver
ou apoiar a utilização de punição corporal, mental ou coerção física
e abuso verbal; Liberdade de Associação e Direito à Negociação
Coletiva: deve respeitar esse direito, facilitar formas de associação e
garantir o respeito; Horário de Trabalho: jornada de trabalho prevista
na lei, com horas extras apenas voluntárias (não excedendo 12 horas
por semana); Salário: garantir comprometimento e respeitar as leis.

Reflita
Ainda existe trabalho escravo. Atualmente, novas formas de limitação
à liberdade dos trabalhadores surgiram. Há diversos exemplos nas
indústrias de confecção, carvoarias, empresas de limpeza e muitas
outras. A Convenção Suplementar sobre Abolição da Escravatura, do
Tráficoo de Escravos e das Instituições e Práticas Análogas à Escravatura,
da ONU, conceitua a Servidão por Dívida como

128 U3 - Legislação voltada para a Ergonomia


[...] o estado ou a condição resultante do fato de que
um devedor se haja comprometido a fornecer, em
garantia de uma dívida, seus serviços pessoais ou os
de alguém sobre o qual tenha autoridade, se o valor
desses serviços não for equitativamente avaliado no
ato da liquidação de dívida ou se a duração desses
serviços não for limitada nem sua natureza definida.
(ONU, 1966, [s.p.])

Assim, há exemplos de empresas que induzem trabalhadores a saírem


de suas terras natais e os escravizam, alegando que existe uma dívida
referente à passagem e habitação. Para saber mais, veja a notícia do
Portal R7 intitulada Record flagra trabalho escravo em rodovia que liga
São Paulo a Minas Gerais, disponível em: <http://noticias.r7.com/fala-
brasil/videos/record-flagra-trabalho-escravo-em-rodovia-que-liga-sao-
paulo-a-minas-gerais-15102015>. Acesso em: 13 jun. 2017.

A norma brasileira ABNT NBR 16001/2012 também é base de


certificação e define a Responsabilidade Social de uma organização
como a responsabilidade pelos impactos de suas decisões e atividades
na sociedade e no meio ambiente, por meio de um comportamento
ético e transparente que contribua para o desenvolvimento sustentável,
inclusive a saúde e o bem-estar da sociedade; leve em consideração
as expectativas das partes interessadas; esteja em conformidade com
a legislação aplicável e seja consistente com as normas internacionais
de comportamento e esteja integrada em toda a organização e seja
praticada em suas relações.
Com base nessa norma, as organizações devem desenvolver
programas que deverão contemplar 11 elementos da Responsabilidade
Social: boas práticas de governança; combate à pirataria, sonegação,
fraude e corrupção; práticas leais de concorrência; direitos da criança
e do adolescente, incluindo o combate ao trabalho infantil; direitos
do trabalhador, incluindo o de livre associação, de negociação, a
remuneração justa e benefícios básicos, bem como o combate
ao trabalho forçado; promoção da diversidade e combate à
discriminação (por exemplo: cultural, de gênero, de raça/etnia, idade,
pessoa com deficiência); compromisso com o desenvolvimento

U3 - Legislação voltada para a Ergonomia 129


profissional; promoção da saúde e segurança; promoção de padrões
sustentáveis de desenvolvimento, produção, distribuição e consumo,
contemplando fornecedores, prestadores de serviço, entre outros;
proteção ao meio ambiente e aos direitos das gerações futuras; ações
sociais de interesse público.
Precisamos lembrar que atender todos os requisitos da norma
não significa necessariamente que a organização é socialmente
responsável, mas que ela possui um sistema de gestão da
Responsabilidade Social.
Ao verificar os requisitos de ambas as normas, percebemos como
a Ergonomia também é citada indiretamente, pela busca de assegurar
os direitos e melhores condições de trabalho aos trabalhadores.

Sem medo de errar

Lembrando a situação-problema do nosso Convite ao estudo, você


é convidado para realizar uma Análise Ergonômica do Trabalho em
uma empresa de telemarketing. A empresa possui 10.000 funcionários
espalhados em diversas cidades pelo Brasil, possui certificação
internacional de ISO 9001, ISO 45001 e SA 8000 e presta serviço
de venda por teleatendimento para grandes empresas de telefonia
(aparelhos celulares, pacotes de dados e planos pós e pré-pago de
ligações). Ela possui certificação internacional de Qualidade, Saúde e
Segurança no Trabalho e de Responsabilidade Social. Após adquirir
novos conhecimentos voltados a Sistemas de Gestão Integrados
na Seção 3.2 da Unidade 3 de nosso estudo, você agora consegue
identificar que as certificações da empresa podem trazer aspectos
positivos e negativos, caso não estejam integrados e coesos entre si,
especialmente quando relacionados à ergonomia na empresa.
Priorizar a qualidade em detrimento da saúde e segurança dos
trabalhadores, estabelecendo metas abusivas e indicadores de
desempenho para atender o princípio de tomada de decisão baseada
em evidências vai contra quaisquer princípios de ergonomia. Por
outro lado, mapear processos e priorizar a saúde e segurança junto
à qualidade, ao meio ambiente e à responsabilidade social é uma das
chaves do sucesso de qualquer empresa. Cada normatização possui
seus requisitos, que são descritos em cada uma das normas. As normas
mais citadas quando tratamos de Sistemas de Gestão Integrados

130 U3 - Legislação voltada para a Ergonomia


são: ABNT NBR ISO 9001/2015 para a Gestão da Qualidade; ABNT
NBR ISO 14001/2015 para a Gestão Ambiental; OHSAS 18001/2007
(atualizada para a ABNT NBR ISO 45001/2016) para a Gestão em
Saúde e Segurança; e as normas SA 8000 e ABNT NBR 16001/2012,
que trazem diretrizes de Responsabilidade Social.
Assim, percebemos que um Sistema de Gestão Integrado visa
unificar os processos de qualidade, gestão ambiental, segurança,
saúde ocupacional e responsabilidade social. A gestão integrada desses
sistemas torna mais eficiente a implantação das políticas, objetivos,
processos, procedimentos e práticas do que por meio de sistemas de
gestão individuais para cada processo de uma organização.

Avançando na prática

O que importa é a qualidade?


Descrição da situação-problema
Em uma indústria de cosméticos, o departamento médico
identifica um aumento dos casos de dores nos ombros e afastamentos
por tendinites em uma das linhas de produção. Ao realizar a Análise
Ergonômica do Trabalho, você identifica que os responsáveis pela
implantação do Sistema de Gestão de Qualidade trocaram as tampas
de um determinado produto. As novas tampas são feitas de um
material mais rígido e exigem maior esforço para serem posicionadas
no produto final. O que se deve fazer nesse caso? Priorizar a saúde
ou a qualidade?

Resolução da situação-problema
É importante que ambos os sistemas sejam integrados e que os
responsáveis por cada sistema de gestão recebam treinamento e
aprendam a importância de se atingir padrões de qualidade sem que
isso ocorra em detrimento da saúde do trabalhador. Buscar um novo
tipo de tampa ou verificar uma forma de seu posicionamento e não
sobrecarregar os membros superiores dos trabalhadores é essencial
para que a empresa opere de forma coesa e com alinhamento entre
processos e prioridades.

U3 - Legislação voltada para a Ergonomia 131


Faça valer a pena

1. Para implantar um sistema de gestão em uma empresa, é necessário


seguir uma série de requisitos que têm como objetivo mapear elementos
essenciais, facilitando o processo de análise, elaboração de um plano de
ação e acompanhamento através do ciclo PDCA.
Sobre os sistemas de gestão e as normatizações equivalentes no Brasil,
analise as afirmações.
( ) ABNT NBR ISO 9001/2015 é referente ao Sistema de Gestão da Qualidade.
( ) SA 8000/2014 é referente ao Sistema de Gestão Ambiental.
( ) OHSAS 18001/2007 é referente ao Sistema de Gestão em Saúde e Segurança.
( ) ABNT NBR ISO 14001/2015 é referente ao Sistema de Gestão da
Responsabilidade Social.
Com relação às normas internacionais e sistemas de gestão integrados,
marque verdadeiro ou falso e assinale a alternativa correta.
a) F, F, F, F.
b) V, V, V, V.
c) V, F, V, F.
d) V, V, F, F.
e) F, F, V, V.

2. O ciclo PDCA é uma ferramenta baseada na repetição sucessiva dos


processos, com o objetivo de tornar a gestão de uma empresa mais ágil,
clara e objetiva. As normas que estabelecem parâmetros e requisitos
de gestão seguem as etapas do PDCA como forma de centralizar seus
processos em melhoria contínua.
O ciclo tem quatro etapas que se repetem com foco na melhoria contínua.
Assinale a alternativa que cita essas quatro etapas de forma correta:
a) Pilot – Design – Create – Art.
b) Prototipar – Desenhar – Criar – Arrumar.
c) Planilha – Documento – Certificação – Arquivo.
d) Planejar – Desenhar – Checar – Argumentar.
e) Plan – Do – Check – Act.

3. A ISO 9001 é a norma que certifica os Sistemas de Gestão da Qualidade


e define os requisitos para a implantação do sistema através de ferramentas
de padronização para a implantação da Gestão da Qualidade.
Com base no sistema de gestão de qualidade, assinale a alternativa que cita
adequadamente os sete princípios da qualidade de acordo com a ISO 9001:

132 U3 - Legislação voltada para a Ergonomia


a) Padronizar tamanhos, padronizar materiais, padronizar atitudes,
padronizar comportamentos, padronizar forma de liderança, padronizar
preço e padronizar concorrência.
b) Foco no cliente, liderança, comprometimento das pessoas, abordagem
de processos, tomada de decisão baseada em evidências, melhoria e
gestão de relacionamentos.
c) Planejar, implantar, checar, corrigir, avaliar, modificar, melhorar.
d) Trabalho escravo, trabalho infantil, salário, saúde e segurança do
trabalho, discriminação, horas extras e livre afiliação a sindicatos.
e) Reutilizar, reduzir, reciclar, retificar, reorganizar, remanejar e racionalizar.

U3 - Legislação voltada para a Ergonomia 133


Seção 3.3
Legislação, Normas e Regulamentações

Diálogo aberto
Relembrando a nossa situação-problema para esta unidade de
estudos, você é convidado como ergonomista para realizar uma
Análise Ergonômica do Trabalho em uma empresa de telemarketing. A
empresa possui 10.000 funcionários espalhados em diversas cidades
pelo Brasil, possui certificação internacional de ISO 9001, ISO 45001
e SA 8000 e presta serviço de venda através do teleatendimento
para grandes empresas de telefonia (aparelhos celulares, pacotes de
dados e planos pós e pré-pago de ligações). A empresa está iniciando
um Comitê de Ergonomia, porém nunca realizou uma Análise
Ergonômica do Trabalho, e os contratantes acreditam que estejam
com toda a situação sob controle, já que todos os postos de trabalho
estão dimensionados conforme os aspectos de mobiliário apontados
no anexo II da Norma Regulamentadora nº 17. Ao visitar o ambulatório
médico, você detecta que grande parte dos afastamentos médicos na
empresa se dão por motivos de infecção urinária e doenças mentais.
Para concluir sua análise ergonômica do trabalho, é de extrema
importância que você converse com o Comitê de Ergonomia para
alinhar suas sugestões de melhoria em ergonomia com os demais
programas existentes na empresa. Nesse cenário, é importante
verificar: quais outras normas regulamentadoras se relacionam com a
NR 17 de Ergonomia? Por que é importante alinhar esses programas?
Qual a importância do Comitê de Ergonomia e em quais fases da
análise ergonômica do trabalho ele deve estar envolvido?
Para responder essas e outras questões, veja o item Não pode faltar
do nosso estudo. É importante ter em mente que entender sobre a
legislação que nos cerca – não apenas sobre ergonomia, mas de tudo
que influencia nosso dia a dia – pode ajudar a nos tornar mais críticos,
a nos proteger e a proteger as pessoas ao nosso redor, além de poder
criar uma visão crítica de transformação do mundo. Parabéns por todo
o estudo até o presente momento! Vamos em frente!

134 U3 - Legislação voltada para a Ergonomia


Não pode faltar

Até aqui já tivemos uma longa jornada! Agora que estamos


encerrando a Unidade 3 de nosso estudo e estamos perto de finalizar
a nossa disciplina de Ergonomia, é inevitável olhar para trás e pensar
em tudo que já aprendemos.

Legislação e normas técnicas relacionadas à ergonomia


Sabemos que a Ergonomia é a ciência que visa compreender
o trabalho para transformá-lo. Aproximando-se do trabalho real e
entendendo o que exatamente é enfrentado pelos trabalhadores
para que possam alcançar os objetivos da tarefa (estabelecidos
pela empresa e por si próprios), os profissionais que trabalham com
Ergonomia tocam em uma transformação não apenas voltada à
saúde, à segurança, ao conforto e ao desempenho eficiente, mas
propõem sugestões que podem tornar o trabalho mais sustentável,
significativo, com sentido para quem o desempenha.
Nossa legislação serve de pano de fundo para essa temática.
Infelizmente, ainda precisamos da obrigatoriedade por lei e das
multas e demais formas de punição aos que não cumprem o que é
estabelecido por ela. Obviamente, nem todas as pessoas entendem
o que deve ser feito para que o trabalho seja realizado em melhores
condições. Muitas empresas acreditam que estão realizando os
melhores processos e monitorando suas atividades da melhor forma.
É nosso papel educar essas pessoas e explicar o que é estabelecido
por lei e o que se torna mais eficiente em termos de melhorar o
trabalho, tornar processos mais coesos e eficazes, e integrar equipes
para um desempenho voltado à excelência, performance, saúde e ao
desenvolvimento profissional.
Embora haja pelo Ministério do Trabalho e Emprego uma
norma regulamentadora específica voltada à ergonomia – a Norma
Regulamentadora nº 17 –, não podemos esquecer que todas tratam de
Saúde e Segurança do Trabalho e, portanto, todas possuem correlação
com a ergonomia de alguma forma. A seguir, veremos quais normas
regulamentadoras e técnicas fazem correlação com a Ergonomia.

U3 - Legislação voltada para a Ergonomia 135


Interface da NR 17 com outras normas regulamentadoras
Como vimos anteriormente, a NR 17 visa estabelecer parâmetros
que permitam a adaptação das condições de trabalho às características
psicofisiológicas dos trabalhadores, de modo a proporcionar um
máximo de conforto, segurança e desempenho eficiente. Essa
norma traz a obrigatoriedade da realização da Análise Ergonômica
do Trabalho, que, por se tratar de uma metodologia baseada na
Ergonomia da Atividade (criada na França), necessitou de um Manual
de Aplicação (criado pelo Ministério do Trabalho em 2002, 12 anos
depois da criação da norma), explicando alguns passos essenciais
para a sua realização.
Atualmente, temos disponibilizadas 36 normas regulamentadoras.
Movimentos sociais e necessidades do mundo do trabalho sempre
impactam nessas normas, gerando atualizações ou a criação de
novas regulamentações. Veja quais são as normas regulamentadoras
atuais no quadro a seguir:
Quadro 3.1 | Normas Regulamentadoras do Ministério do Trabalho e Emprego

NR 1 - Disposições Gerais NR 19 - Explosivos


NR 20 - Líquidos Combustíveis e
NR 2 - Inspeção Prévia
Inflamáveis

NR 3 - Embargo ou Interdição NR 21 - Trabalho a Céu Aberto

NR 4 - Serviços Especializados em
NR 22 - Segurança e Saúde
Eng. de Segurança e em Medicina
Ocupacional na Mineração
do Trabalho
NR 5 - Comissão Interna de
NR 23 - Proteção contra Incêndios
Prevenção de Acidentes
NR 6 - Equipamentos de Proteção NR 24 - Condições Sanitárias e de
Individual – EPI Conforto nos Locais de Trabalho
NR 7 - Programas de Controle
NR 25 - Resíduos Industriais
Médico de Saúde Ocupacional

NR 8 - Edificações NR 26 - Sinalização de Segurança

NR 27 - Registro Profissional do
NR 9 - Programas de Prevenção de Técnico de Segurança do Trabalho
Riscos Ambientais no MTB (Revogada pela Portaria
GM n.º 262/2008)
NR 10 - Segurança em Instalações
NR 28 - Fiscalização e Penalidades
e Serviços em Eletricidade

136 U3 - Legislação voltada para a Ergonomia


NR 11 - Transporte, Movimentação,
NR 29 - Segurança e Saúde no
Armazenagem e Manuseio de
Trabalho Portuário
Materiais
NR 30 - Segurança e Saúde no
NR 12 - Máquinas e Equipamentos
Trabalho Aquaviário
NR 31 - Segurança e Saúde no
NR 13 - Caldeiras e Vasos de Trabalho na Agricultura, Pecuária,
Pressão Silvicultura, Exploração Florestal e
Aquicultura
NR 32 - Segurança e Saúde no
NR 14 - Fornos Trabalho em Estabelecimentos de
Saúde
NR 15 - Atividades e Operações NR 33 - Segurança e Saúde no
Insalubres Trabalho em Espaços Confinados
NR 34 - Condições e Meio
NR 16 - Atividades e Operações
Ambiente de Trabalho na Indústria
Perigosas
da Construção e Reparação Naval

NR 17 – Ergonomia NR 35 - Trabalho em Altura

NR 36 - Segurança e Saúde no
NR 18 - Condições e Meio
Trabalho em Empresas de Abate
Ambiente de Trabalho na Indústria
e Processamento de Carnes e
da Construção
Derivados

Fonte: elaborada pela autora.

Por tratarem de saúde e segurança, de alguma forma, todas as


normas regulamentadoras se correlacionam.
A NR 1 trata da ordem de serviço, estabelecendo que todos os
trabalhadores sejam informados de suas atividades, riscos, formas
de proteção e medidas emergenciais durante a realização de seus
trabalhos. A NR 2 trata da inspeção prévia, estabelecendo que todas
as edificações passem por uma inspeção de forma a garantir sua
segurança antes de serem realizadas atividades. A NR 3 estabelece que
sejam embargadas obras e interditados setores, máquinas e locais que
ofereçam risco grave e iminente à saúde e segurança dos trabalhadores.
A NR 4 trata dos serviços especializados em Engenharia de Segurança
e Medicina do Trabalho, uma equipe constituída por profissionais da área
de saúde e segurança (técnico em segurança do trabalho, técnico em
enfermagem, enfermeiro do trabalho, médico do trabalho e engenheiro
de segurança) que pode ser de presença obrigatória nas empresas de
acordo com o número de funcionários e grau de risco. Além disso, a

U3 - Legislação voltada para a Ergonomia 137


NR 4 traz quadros de controle de acidentes e doenças do trabalho que
ajudam no controle estatístico e prevencionista da empresa. A NR 5 trata
da Comissão Interna de Prevenção de Acidentes (CIPA), que estabelece
que, de acordo com o número de funcionários e grupamento das
empresas de acordo com sua Classificação Nacional de Atividade
Econômica (CNAE) e com a Classificação Nacional de Pessoa Jurídica
(CNPJ), as empresas possuam uma comissão de trabalhadores eleitos
pelos seus colegas e outros indicados pelo empregador para avaliar as
condições de saúde e segurança do trabalho e tomarem ações junto
aos demais trabalhadores e empresa de forma a combater doenças e
acidentes do trabalho.
A NR 6 trata dos equipamentos de proteção individual, e a NR 8 sobre
normas de circulação e proteção contra intempéries em edificações.
As normas regulamentadoras 7 e 9 tratam, respectivamente, do
Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional (PCMSO) e
do Programa de Prevenção a Riscos Ambientais (PPRA). Esses dois
programas são de realização anual e são totalmente correlacionados.
O PPRA traz um mapeamento dos riscos físicos, químicos e biológicos
na empresa, em cima dos quais o PCMSO faz o controle médico.
Essas duas normas trazem em detalhes como realizar a proteção
dos trabalhadores de acordo com os riscos inerentes ao trabalho,
estabelecendo que se tente sempre eliminar por completo o risco.
Caso isso não seja possível, que esse risco receba uma medida que
proteja a todos (isolando-o) e medidas administrativas de proteção.
Apenas em último caso adotamos um equipamento de proteção
individual, pois primeiro precisamos esgotar todas as alternativas que
procurem não deixar apenas ao trabalhador a sua proteção.
A NR 10 trata de riscos com eletricidade e especificações para evitar
acidentes dessa natureza. As normas regulamentadoras 11, 12, 13 e 14
tratam de transporte de materiais, máquinas e equipamentos, caldeiras
e vasos de pressão e fornos, respectivamente. Essas normas tratam
em detalhes sobre a proteção quando tratamos de maquinário. Sua
observância faz correlação com as demais normas regulamentadoras,
porém especificamente tratando de máquinas de toda natureza.
A NR 15 é a norma que traz especificações referentes a riscos
químicos, físicos e biológicos, especificando quando esses agentes
tornam as atividades insalubres, ou seja, estão acima dos limites
de tolerância e podem adoecer o trabalhador. A NR 16 especifica

138 U3 - Legislação voltada para a Ergonomia


quais atividades são tratadas como perigosas, como a atividade
de profissionais de segurança pessoal e patrimonial, pessoas que
trabalham com explosivos e radiações, motociclistas, entre outros.
A NR 18 trata especificamente da construção civil e aborda em
detalhes todas as atividades e riscos inerentes a essa área de atuação.
As normas 19, 20 e 21 tratam dos riscos com explosivos, líquidos e
combustíveis inflamáveis e trabalho a céu aberto, respectivamente.
Algumas normas tratam de segmentos bem específicos, como
a NR 18. Por exemplo, a NR 22 é específica para a mineração;
a NR 29 trata do trabalho portuário (portos); a NR 30, do trabalho
aquaviário (embarcações); a NR 31 trata da agricultura, pecuária
silvicultura (métodos naturais e artificiais de regenerar e melhorar
os povoamentos florestais), exploração florestal e aquicultura; a NR
32 trata de estabelecimentos de saúde; a NR 33 trata de espaços
confinados (área ou ambiente não projetado para ocupação humana
contínua, que possua meios limitados de entrada e saída, cuja
ventilação existente é insuficiente para remover contaminantes ou
onde possa existir a deficiência ou enriquecimento de oxigênio); a NR
34 trata da indústria da construção e reparação naval; a NR 35 trata de
trabalhos em altura (acima de 2 metros); e a última norma publicada,
a NR 36, trata de empresas de abate e processamento de carnes e
derivados. Essas normas são tão específicas que trazem linguagem e
particularidades de cada um dos segmentos dos quais tratam.
A NR 23 trata de proteção contra incêndios, estabelecendo medidas
de gerenciamento de emergências. A NR 24 traz condições sanitárias e
de conforto nos locais de trabalho. As normas 25 e 26 tratam de resíduos
industriais e sinalização. A NR 27 foi revogada pela Portaria GM nº 262/2008
e tratava do registro profissional do técnico em Segurança do Trabalho.
Por fim, a NR 28 trata de fiscalização e penalidades, estabelecendo as
multas para cada item de cada norma regulamentadora.
Como podemos ver, cada uma a sua forma, quando tratam de
melhorar o trabalho e proteger o trabalhador, essas normas estão
direta ou indiretamente relacionadas à NR 17, de Ergonomia. Já que
seu principal objetivo é que o trabalho esteja nas melhores condições
possíveis de ser realizado, atender minimamente a essas normas é a
base para qualquer ação ergonômica eficiente.
É importantíssimo alinhar as questões de saúde e segurança da
empresa. Por exemplo, quando tratamos do ruído na NR 15, ela

U3 - Legislação voltada para a Ergonomia 139


estabelece um teto de limite de tolerância de trabalho a 8 horas
de jornada e 85 decibéis de ruído. Esse valor, embora com base
legal pela NR 15, pode incomodar o trabalhador e atrapalhar sua
atividade, principalmente se ele trabalha com tarefas que exigem alta
concentração. Nesse momento, a NR 17 trata do conforto acústico
e cita as normas técnicas da ABNT NBR 10151 e NBR 10152 para que
haja a observância no ruído.
Muitas vezes, as normas regulamentadoras buscam na ABNT
uma forma de descrever mais tecnicamente uma ação que é, por lei,
obrigatória. Dessa forma, há diversas normas ABNT que estão citadas
nas NRs e trazem especificações técnicas que não são foco destas
últimas (o que as deixaria por demais extensas).

Assimile
As Normas Regulamentadoras (NR) são um conjunto de requisitos e
procedimentos relacionados à segurança e medicina do trabalho, de
observância obrigatória às empresas privadas, públicas e órgãos do
governo que possuam empregados regidos pela Consolidação das
Leis do Trabalho (CLT), de responsabilidade do Ministério do Trabalho
e Emprego. Já as Normas Técnicas da Associação Brasileira de Normas
Técnicas (ABNT) buscam aplicar regras e procedimentos de forma a
estabelecer diretrizes ou características mínimas para atividades ou para
seus resultados, visando à obtenção de um grau ótimo de ordenação
em um dado contexto.

É preciso alinhar as informações de todas as regulamentações


para que não sejam mantidas informações contraditórias nos planos
de ação. É importante lembrar que sempre o que for mais restritivo e
proteger mais o trabalhador é o ideal. No caso mencionado, quanto
menos ruído, melhor. Não podemos tratar a legislação friamente e
sem avaliar o trabalho real, pois as normas regulamentadoras trazem
parâmetros mínimos, ou seja, sempre podemos melhorar quando
temos condições para tal.
A NR 17 cita ainda a NBR 5413, sobre parâmetros de iluminância.
Iluminação é a quantidade de luz que sai de uma fonte luminosa,
como uma lâmpada. Iluminância é a quandidade de luz que incide em
um determinado lugar, como na bancada de trabalho. Um aparelho

140 U3 - Legislação voltada para a Ergonomia


chamado luxímetro é utilizado para mensurar a incidência de luz no
ambiente de trabalho; lux é a unidade de medida da iluminância. A
Nota Técnica nº 224/2014, do Ministério do Trabalho e Emprego,
estabelece que essa norma continue sendo usada, mesmo que tenha
sido substituída pela NBR ISO 8995-1, da ABNT.
É importante lembrar, caro aluno, que cancelamentos e substituições
de normas acontecem sempre que preciso. O mundo do trabalho
evolui em grande velocidade e, quanto mais estudos e mudanças
ocorrem, mais emergem necessidades de atualização da legislação.

Exemplificando
Os anexos I e II da NR 17 surgiram por demandas específicas que
ocorreram em um contexto histórico e um diferente cenário de quando a
norma foi originalmente criada. Novas profissões surgirão com os avanços
da tecnologia e com necessidades criadas pelo homem e sua evolução.
Nossa legislação acompanha essas transformações, havendo atualizações
que podem incluir ou excluir aspectos relacionados ao trabalho.

O anexo II da NR 17 ainda cita a Resolução RE nº 9, de 16 de


janeiro de 2003, da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa),
sobre o uso de ar-condicionado.
Embora não seja citada na NR 17, a ABNT NBR 9050 trata de
aspectos de acessibilidade e é de grande valia ao tratarmos de layout
e adequação na Ergonomia Física.
Ao redor do mundo, diversas normas voltadas à ergonomia estão
sendo estudadas, desenhadas e estabelecidas por grupos de discussão.
No Brasil, a ABNT estuda normas ISO em busca de regulamentar
tarefas, como puxar e empurrar, trabalho estático, levantamento e
transporte de cargas, trabalho mental, entre outros. As normas ISO são
padrões desenvolvidos pela International Organization for Standartization
(ISO), organismo internacional não governamental com sede em
Genebra. Essas normas trazem requisitos de assuntos específicos para
padronizar as empresas de forma a proporcionar melhor desempenho e
a melhoria contínua baseada na reavaliação constante de seus processos
e aplicação de ajustes, sempre que necessário.

U3 - Legislação voltada para a Ergonomia 141


Pesquise mais
Ao acessar o site Target, disponível em <https://www.target.com.br/>
(acesso em: 23 jun. 2017), você pode encontrar as normas técnicas
da ABNT relacionadas à ergonomia e também verificar arquivos para
consulta pública de normas ainda não publicadas.

O papel do ergonomista na interpretação da norma e na ação


ergonômica
Ao realizar a Análise Ergonômica do Trabalho, é essencial que
o ergonomista faça reuniões periódicas com trabalhadores e a alta
gestão, de forma a realizar a ação ergonômica.
Para transformar o trabalho, é necessário compreendê-lo. O
ergonomista não pode simplesmente apontar o item da NR 17 e
obrigar a empresa a atendê-lo, especialmente porque muitos itens
não são de fácil interpretação. É preciso ter paciência e uma ação de
educação desses interlocutores.
Desde que iniciamos nossos estudos, pensamos muito sobre o
trabalho e sobre o que aceitamos como imutável. Aceitamos trabalhar
com algo que adoece, desmotiva, não tem sentido. Aceitamos o nó
na garganta, a dor nas costas, a meta que nos desvaloriza. Aceitamos
como se isso fosse uma verdade absoluta não passível de mudança. A
ergonomia faz um movimento social oposto, promovendo diálogos,
espaços de discussão e acesso à realidade.
O pré-julgamento de que vai ser caro, de que o jeito atual está
ótimo, de que o problema são as pessoas acaba gerando uma ideia
fixa que precisa ser combatida aos poucos.
Com um discurso neutro, o ergonomista chega com a seguinte
pergunta: “O que você faz?”.
Quando as pessoas pensam no que fazem, como fazem, com
quem fazem, tudo começa a se transformar e a ficar mais claro. Pensar
no seu fazer já começa a promover a transformação do trabalho.

142 U3 - Legislação voltada para a Ergonomia


Reflita
O quadro Chefe Secreto do programa Fantástico, da Rede Globo,
traz as transformações que ocorrem quando o gestor se aproxima de
determinadas tarefas que ocorrem todos os dias, mas estão distantes
de um olhar crítico da alta gerência. Não podemos observar apenas
números, pois eles trazem uma análise fria do que nem sempre descreve
a realidade. Veja o quadro Chefe Secreto, disponível em: <http://g1.globo.
com/fantastico/videos/t/edicoes/v/chefe-secretoexecutivo-consegue-
manter-disfarce-ate-final-da-experiencia/5611543/>. Acesso em: 23 jun.
2017. E reflita sobre o que ocorre com gestor e trabalhadores quando há
essa aproximação.

Lembre-se sempre: a Análise Ergonômica do Trabalho não


transforma tudo apenas na entrega de seu relatório final e nas suas
recomendações. Tudo começa a se transformar no andamento do
trabalho, ao desvendar aos principais atores daquela situação suas
particularidades e onde cada um interfere no fazer do outro.
Por se tratar da Ergonomia da Atividade e de uma metodologia
desenvolvida na França, a NR 17 pode ter interpretações diversas, o
que torna necessária a ação do ergonomista baseada no manual de
interpretação da norma do Ministério do Trabalho (BRASIL, 2002).
Diálogos são imprescindíveis, e pensar sobre o trabalho, sua
organização e particularidades, com mediação do ergonomista, é o
caminho mais eficiente para a melhoria das condições de trabalho.

Papel do Comitê de Ergonomia no cumprimento da legislação


O Manual de Aplicação da NR 17 (2002) traz 12 passos básicos
para a realização da Análise Ergonômica do Trabalho. É importante
saber que a ação ergonômica jamais se esgota em si mesma. O passo
de número 12 traz a importância de se acompanhar as melhorias,
porém não podemos simplesmente entregar um documento para a
empresa para que ela leia e interprete de forma livre. Os trabalhadores
e a alta gestão precisam estar engajados em todo o processo de
análise, promovendo discussões e reflexões sobre o trabalho real. Ao
terminar a análise de uma determinada situação, os diálogos devem
estar vivos e devem ser acompanhados por um comitê formado por

U3 - Legislação voltada para a Ergonomia 143


pessoas que participam ativamente dessas discussões e têm poder de
decisão sobre o trabalho.
Assim, o Comitê de Ergonomia é um grupo de profissionais da
empresa que se responsabilizam por tratar das ações relacionadas
à ergonomia em toda a empresa. Esses profissionais se reúnem
e estabelecem ações, custos, prazos, modos de operacionalizar
uma ação, responsáveis e onde realizar cada ação. Dessa forma, a
ação ergonômica permanece viva e é acompanhada regularmente,
promovendo mudanças e melhorias de forma contínua, estimulando
os diálogos entre trabalhadores.
Esse comitê deve estar envolvido em todas as fases da análise, para
que acompanhe os diálogos e o raciocínio que levará ao diagnóstico
final. Com ele, é mais fácil o controle e o engajamento com outras
áreas da empresa que possam tratar de assuntos similares, além do
cumprimento da legislação.
Prezado aluno, quando pensamos sobre o trabalho real e sobre uma
ação ergonômica eficaz, precisamos sempre lembrar que devemos
unir esforços e ter uma visão congruente do que torna a empresa um
local mais seguro, confortável e com melhor desempenho.
Diversas empresas possuem certificações que atendem às normas
ABNT NBR 9001/2015 (Sistema de Gestão de Qualidade), ABNT NBR
14001/2015 (Sistema de Gestão Ambiental), norma OHSAS 18001
(Sistema de Gestão em Saúde e Segurança do Trabalho, atualizada para
a norma ISO DIS 45001/2016) e a norma SA 8000 (Responsabilidade
Social). Quando uma empresa estabelece os requisitos de um sistema
de gestão integrado (ou seja, que integre todas as áreas citadas), ela
busca uma forma de melhorar continuamente seus processos. Uma
empresa não pode priorizar a qualidade dos produtos acima da
saúde e segurança de seus trabalhadores, também não pode priorizar
a responsabilidade social e perder seu potencial competitivo, ou
denegrir o meio ambiente.
Dessa forma, um ergonomista precisa realizar uma análise global
da empresa e seu contexto, para só assim entender a realidade de
cada situação de trabalho. Mesmo que não tenha poder aquisitivo
para a instalação oficial desses sistemas em busca de certificação, é
interessante que toda a empresa siga princípios e sistematize seus
processos para facilitar a coerência entre áreas e tarefas.

144 U3 - Legislação voltada para a Ergonomia


Você já é um agente de transformação social e agora está pronto
para abrir os olhos para cada transformação que pode realizar apenas
compreendendo o trabalho real.

Sem medo de errar

Vamos retomar a situação-problema da nossa unidade e


responder aos questionamentos desta seção? Você é convidado
para realizar uma análise ergonômica do trabalho em uma empresa
de telemarketing. A empresa possui 10.000 funcionários espalhados
em diversas cidades pelo Brasil, possui certificação internacional de
ISO 9001, ISO 45001 e SA 8000 e presta serviço de venda através
do teleatendimento para grandes empresas de telefonia (aparelhos
celulares, pacotes de dados e planos pós e pré-pago de ligações).
Após adquirir novos conhecimentos nesta Seção 3 da Unidade
3, vimos que, por tratarem de Saúde e Segurança, de alguma forma
todas as normas regulamentadoras se correlacionam com a Norma
Regulamentadora nº 17. Seja por tratarem de outros programas
de saúde, mapearem riscos, proporem aspectos de segmentos
específicos, todas promovem uma base de requisitos mínimos para
saúde e segurança na empresa, o que interfere diretamente nos itens
estabelecidos na NR 17.
Como cada norma trata de um assunto específico, é importante
alinhar o cumprimento de seus requisitos de forma a não promover
ações incongruentes. Deve-se ter em mente que se o que for mais
restritivo e mais auxiliar o trabalhador é o que mais deve ser priorizado.
Diversas empresas possuem certificações que atendem às normas
ABNT NBR 9001/2015 (Sistema de gestão de Qualidade), ABNT
NBR 14001/2015 (Sistema de Gestão Ambiental), norma OHSAS
18001 (Sistema de Gestão em Saúde e Segurança do Trabalho,
sendo atualizada para a Norma ISO/DIS 45001/2016) e a norma SA
8000 (Responsabilidade Social). Quando uma empresa estabelece
os requisitos de um sistema de gestão integrado (ou seja, que
integre todas as áreas citadas), ela busca uma forma de melhorar
continuamente seus processos.
Nesta seção vimos também a importância do Comitê de
Ergonomia, que deve estar envolvido em todas as fases da análise
para que acompanhe os diálogos e o raciocínio que levará ao

U3 - Legislação voltada para a Ergonomia 145


diagnóstico final. O cumprimento da legislação, com a formação
desse comitê, fica de mais fácil controle e engajamento com outras
áreas da empresa que possam tratar de assuntos similares.
Com base em todas essas informações, você consegue atender
de forma eficaz e segura a empresa que o contratou, compreendendo
o trabalho, transformando-o e propondo uma mudança social na vida
de seus trabalhadores.

Avançando na prática

O que fazer com esse RUÍDO?


Descrição da situação-problema
Em um laboratório de informática de uma escola, foram instaladas
diversas impressoras devido à falta de espaço nos outros setores.
Assim, durante a aula, diversas impressões eram feitas, levando a
um alto nível de ruído apontado por professores e alunos. Ao tratar
com a direção da escola, a diretora afirma que há uma norma
regulamentadora, a NR 15, que estabelece que é de 85db(A) o nível
de ruído ocupacional que pode ser insalubre, em um período de até
8 horas, podendo chegar a 100db(A) no período de 2 horas, tempo de
duração das aulas de informática. Isso está correto?

Resolução da situação-problema
A aplicabilidade das normas deve ser coesa à realidade do
trabalho. Não se trata apenas de insalubridade, mas da necessidade
de se realizar um trabalho com níveis de ruído que não atrapalhem a
concentração e o andamento das atividades. Assim, deve-se consultar
a NR 17 e as normas NBR 10151 e 10152 (que tratam da avaliação do
ruído e sua aceitabilidade para proporcionar conforto acústico) para
verificar questões de conforto acústico e verificar um melhor local
para alocação das impressoras.

146 U3 - Legislação voltada para a Ergonomia


Faça valer a pena

1. Atualmente, temos disponibilizadas 36 normas regulamentadoras.


Movimentos sociais e necessidades do mundo do trabalho sempre
impactam nessas normas, gerando atualizações ou a criação de novas
regulamentações. Com base no exposto, analise as afirmações a seguir
sobre os temas das normas regulamentadoras:
( ) NR 4 – Trata do SESMT – Serviço Especializado em Ergonomia pelo
Ministério do Trabalho.
( ) NR 5 – Trata da Cipa – Comissão Interna de Prevenção a Acidentes.
( ) NR 6 – Trata de EPI – Equipamentos de Proteção Individual.
( ) NR 9 – Trata do PPRA – Programa de Prevenção a Riscos de Acidentes.
Com base nos temas referentes a cada uma das normas regulamentadoras
do Ministério do Trabalho e Emprego, analise as afirmações, assinale
verdadeiro ou falso e assinale a alternativa correta:
a) V, V, V, V.
b) F, F, F, F.
c) F, V, V, F.
d) V, V, F, F.
e) F, V, V, V.

2. A NR 17 visa estabelecer parâmetros que permitam a adaptação das


condições de trabalho às características psicofisiológicas dos trabalhadores,
de modo a proporcionar um máximo de conforto, segurança e desempenho
eficiente. Para isso, um dos aspectos relacionados ao trabalho e analisados
pela Ergonomia são as condições ambientais.
De acordo com a Norma Regulamentadora nº 17, qual norma da Associação
Brasileira de Normas Técnicas trata dos parâmetros de iluminância?
Assinale a alternativa correta.
a) ABNT NBR 10152.
b) ABNT NBR 5413.
c) ABNT NBR 9050.
d) ABNT NBR 10151.
e) ABNT NBR 5410.

3. A descrição do processo de elaboração da Norma Regulamentadora


nº 17 é importante para que, expondo o contexto social e os atores
envolvidos, possamos compreender seus avanços e limitações. Para
melhor compreensão da norma, o Ministério do Trabalho e Emprego
publicou, em 2002, o ______________________________________.

U3 - Legislação voltada para a Ergonomia 147


O texto trata de um documento que foi elaborado para auxiliar na
interpretação dos itens da Norma Regulamentadora nº 17 e na metodologia
da Análise Ergonômica do Trabalho. Assinale a alternativa que preenche
corretamente a lacuna.
a) Manual de Boas Práticas da Anvisa.
b) Consolidado de Leis do Trabalho (CLT).
c) Livro de Interpretação da Ergonomia.
d) Manual de Postura Aplicada.
e) Manual de Aplicação da Norma Regulamentadora nº 17.

148 U3 - Legislação voltada para a Ergonomia


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U3 - Legislação voltada para a Ergonomia 149


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150 U3 - Legislação voltada para a Ergonomia


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U3 - Legislação voltada para a Ergonomia 151


Unidade 4

Aplicação da Ergonomia

Convite ao estudo
Prezado aluno, é com extrema alegria que iniciamos a nossa
última unidade de estudos, a Unidade 4. Depois de uma longa
jornada entendendo o que é Ergonomia e desmistificando diversas
questões relacionadas ao mundo do trabalho, entendemos o papel
da Análise Ergonômica do Trabalho em conhecer para transformar
a realidade e tornar o trabalho mais confortável, seguro e com
melhor desempenho. Aprendemos, até o presente momento,
a importância do trabalho em nossas vidas e os aspectos legais
que fazem com que a Ergonomia seja regulamentada, no Brasil ,
pela Norma Regulamentadora nº 17, do Ministério do Trabalho e
Emprego, e demais regulamentações. Agora é hora de finalizarmos
nossos estudos em Ergonomia, estruturando uma proposta
comercial e identificando como realizar transformações no
trabalho após uma Análise Ergonômica do Trabalho participativa
e construtiva, identificando como criar um projeto e imaginar uma
atividade futura provável após mapear os pontos mais importantes
com os demais interlocutores.

Dessa forma, na Seção 4.1, entenderemos como ocorre


a construção social em Ergonomia, ou seja, como a ação
ergonômica transforma o mundo do trabalho e, por consequência,
a vida das pessoas e nossa sociedade (o que apresenta grande
responsabilidade). Para a realização da Análise Ergonômica do
Trabalho, é preciso que tenhamos noção de como realizar uma
proposta comercial e um contrato claro de trabalho, o que está
intimamente relacionado à demanda que motiva o estudo. Depois,
iniciaremos nossos estudos voltados à projetação ergonômica do
sistema humano x tarefa x máquina.
Na Seção 4.2, aprofundaremos nossos conhecimentos em
Ergonomia Cognitiva e Psicologia do Trabalho, Percepção e
Processos Cognitivos, Carga Mental do Trabalho e Ergodesign.
Na Unidade 1 de nosso estudo, iniciamos a parte conceitual de
desenho universal e usabilidade. Agora, em nossa Unidade 4 de
aplicação da Ergonomia, iniciaremos um novo olhar voltado
às transformações do trabalho e à importância de se considerar
os saberes dos trabalhadores nas propostas de melhoria e nos
projetos de modificação.

Por fim, na Seção 4.3, encerrando nossas 60 horas da disciplina


de Ergonomia, trataremos de aspectos práticos de projeto, como
aspectos físicos de projeto e de mobiliário, aspectos cognitivos,
ambientais e organizacionais, a intervenção ergonômica,
concluindo com a Validação e Transformação do Trabalho,
quando percebemos que cada mudança dá início a um novo
ciclo, uma nova visão e, claramente, uma nova necessidade.

A Ergonomia surge para nos fazer pensar que não podemos


nos acomodar e aceitar condições de trabalho como se fossem
imutáveis. Em busca de mais saúde, sentido no trabalho, maior
condição competitiva no trabalho e melhoria contínua de
processos, a Ergonomia surge como uma disciplina que promove
um pensamento sobre o real do trabalho e sobre como ele pode
melhorar e fazer mais sentido em diversos aspectos.

Para auxiliar no desenvolvimento das competências


mencionadas e atender aos objetivos específicos do tema em
questão – “Projetação Ergonômica do Sistema Humano x Tarefa x
Máquina” –, a seguir, será apresentada uma situação hipotética que
visa aproximar os conteúdos teóricos e a prática.

Um desenvolvedor de softwares contrata você como


ergonomista para auxiliá-lo a criar um sistema de computador
para a recepção de hóspedes em um hotel. Seu papel será muito
simples: verificar os aspectos de usabilidade, acessibilidade e
ergodesign envolvidos na interação das pessoas com esse sistema.
Assim, é preciso relembrar: qual a vantagem de se contratar um
egonomista para participar na concepção de um sistema que
exige interação de pessoas com máquinas? Quais aspectos físicos
e cognitivos devem ser considerados nessa interação? Qual a
importância da opinião do trabalhador e da participação do usuário
na concepção de qualquer trabalho?

Agora, você já é um agente dessa transformação e não


poderíamos estar mais orgulhosos!

Vamos continuar nossos estudos, finalizando a disciplina, mas


jamais a nossa busca por conhecimento e as transformações que
podemos trazer com ele.

Bons estudos!
156 U4 - Aplicação da Ergonomia
Seção 4.1
Projetação ergonômica do sistema humano x
tarefa x máquina

Diálogo aberto
Para a primeira seção da Unidade 4, vamos retomar a situação-
problema proposta no Convite ao estudo, para auxiliar na
sistematização dos conhecimentos adquiridos em nossa unidade.
Um desenvolvedor de softwares contrata você como ergonomista
para auxiliá-lo a criar um sistema de computador para a recepção
de hóspedes em um hotel. Seu papel será muito simples: verificar
os aspectos de usabilidade, acessibilidade e ergodesign envolvidos
na interação das pessoas com esse sistema. Ao iniciar a análise dos
aspectos de usabilidade no programa de computador, você percebe
que precisa realizar uma reunião inicial com o desenvolvedor para
montar sua proposta comercial e o contrato, para formalizar a
demanda do trabalho. Quais são os aspectos primordiais a serem
considerados ao realizar uma proposta comercial de análise
ergonômica do trabalho? Por que é preciso reformular a demanda
e explicar o que é ergonomia a todos os envolvidos? Quais aspectos
devem ser considerados na interação homem x máquina para
assegurar saúde, conforto e desempenho eficiente dos usuários?
Para responder a essas e outras questões, vamos iniciar o Não
pode faltar da nossa seção. Como um ergonomista, você não é
apenas um investigador de possíveis soluções de problemas: e sim
um articulador da verdade junto aos trabalhadores, mostrando as
melhores opções e facilitando diálogos acerca do trabalho real.
Como um agente de transformações, inspire-se e bons estudos!

Não pode faltar

É inevitável: ao falarmos sobre a Ergonomia da Atividade, falamos


de uma construção social. As pessoas passam boa parte de suas
vidas trabalhando e, aqui, nos referimos aos mais diferentes tipos de

U4 - Aplicação da Ergonomia 157


trabalho e formas de contratação (quando há contratação). Alguém
pode trabalhar em casa, ser dono do próprio negócio, prestar serviços
temporários, estar há muitos anos na mesma função, estar há muitos
anos na mesma empresa em funções diferentes ou, ainda, ter
realizado diversos tipos de trabalho na vida.
Quando trabalhamos, adquirimos saberes referentes ao que
fazemos. Entendemos cada dia mais sobre nossas ações e sobre os
diversos aspectos de nosso trabalho, criando, assim, competência
sobre nosso fazer profissional.

Assimile
Para Fleury e Fleury (2001), em seu artigo científico intitulado
Construindo o conceito de competência, competência é uma
característica subjacente a uma pessoa que está relacionada com
desempenho superior na realização de uma tarefa ou em determinada
situação, envolvendo aptidões (talento natural da pessoa que pode
ser aprimorado), habilidades (demonstração de um talento particular
na prática) e conhecimentos (o que as pessoas precisam saber para
desempenhar uma tarefa).

O trabalhador aprende sobre seu trabalho e desenvolve-se através dele.


Assim, consegue identificar mudanças, agir sobre imprevistos e entender
formas de evolução e melhoria daquilo que faz. O trabalhador está sempre
autorregulando a realidade de trabalho, mobilizando recursos para
resolver novas situações, compreendendo a si, ao outro e a organização,
assim, o trabalho não é um conjunto de tarefas associadas ao cargo e
friamente descritas: é um prolongamento direto da competência que o
trabalhador mobiliza frente a situações mutáveis e complexas.

Pensando na importância de se reconhecer o saber dos


trabalhadores a respeito de seu trabalho, ao iniciarmos uma ação
ergonômica, fazemos com que cada trabalhador pense em sua
realidade, em seu papel, no que faz, em como é a organização, no
que deseja para si, em como enxerga seu mundo e o que pode ser
melhorado nele.
Caro aluno, é importante que pense a respeito disto: a ação
ergonômica faz com que os trabalhadores e a organização lancem um
olhar sobre si próprios com a sua mediação. Dessa forma, você será

158 U4 - Aplicação da Ergonomia


o condutor de diversos diálogos e reflexões que poderão promover
profundas mudanças antes mesmo da entrega das propostas de melhoria.
“Só sei que nada sei, e o fato de saber isso, me coloca em vantagem
sobre aqueles que acham que sabem alguma coisa” (Sócrates).

Construção social em ergonomia

A Ergonomia no Brasil é amparada pela Norma Regulamentadora


nº 17, do Ministério do Trabalho e Emprego, que torna obrigatória
a realização da Análise Ergonômica do Trabalho para adequar
as condições de trabalho às características psicofisiológicas dos
trabalhadores, proporcionando o máximo de conforto, segurança
e desempenho eficiente. Além disso, o termo “ergonômico” passou
a representar um falso sinônimo para “design confortável”, muito
difundido na indústria automobilística e de mobiliário.
Como já vimos anteriormente, a abordagem da Ergonomia da
Atividade não traz essa visão reducionista: a ergonomia não busca
identificar apenas aspectos físicos de mobiliário e condições de
postura. Ela vai além dessas barreiras e busca diminuir cada vez mais
a distância entre o trabalho prescrito e o trabalho real.
Essa abordagem busca trazer maior saúde, segurança e sentido na
realização das tarefas e condições de trabalho, o que promove uma
melhor organização do trabalho e aproveita melhor os recursos de
sistemas, postos de trabalho e, obviamente, humanos, promovendo
desempenho mais eficiente.
A Ergonomia, como ciência, envolve diversas ciências. Como
vimos anteriormente, trata-se de uma abordagem transdisciplinar,
que vai além do conhecimento científico e das delimitações entre os
objetos de estudo das mais diversas ciências.
Quando tratamos o conhecimento como “científico”, ele passa
por diversas barreiras impostas por modelos e teorias que assegurem
uma metodologia à prova de confrontação. Quando falamos de
trabalho, tratamos de situações únicas e que dificilmente poderiam
ser controladas por um ambiente simulado em laboratório e continuar
com todas as variáveis reais, o que não as torna menos importantes.
Dessa forma, precisamos pensar sobre as construções sociais que
ocorrem quando mergulhamos na realidade do trabalho: ao fazer

U4 - Aplicação da Ergonomia 159


alguém pensar sobre si, sobre o que faz, sobre a importância de seu
trabalho e como ele poderia fazer mais sentido, ser mais seguro,
confortável e gerar maior eficiência, abrimos espaço para uma
reflexão que não pode ser contida assim que iniciada.
Alguns pesquisadores tratam (e até definem) a Ergonomia como
uma arte, e não como uma ciência, por saberem que não existem
barreiras claras em sua metodologia. Porém, ela provoca questões de
pesquisa e contribui para a construção de conhecimento, valorizando
a realidade e questões empíricas relacionadas ao trabalho.
Claramente, o conhecimento científico e as bases formais de
educação apresentam grandes pilares na produção e construção
do conhecimento, porém, valorizar os saberes da prática e os
conhecimentos tácitos dos trabalhadores é de fundamental
importância para uma ação ergonômica de significado.

Assimile
O saber tácito é aquele de difícil verbalização, o que limita que possa
ser transferido por meio da linguagem formal. Uma pessoa pode
saber como fazer algo, sem conseguir articular aos outros em maiores
detalhes. O conhecimento construído para a realização do trabalho real
é produzido pela inteligência do corpo, através da qual o sujeito enfrenta
as provas que o mundo real apresenta e assimila respostas, aprende
comportamentos, hábitos e práticas, além de propor diálogos e desafios.
De acordo com o estudioso Michael Polanyi, o conhecimento tácito vem
da interiorização das nossas experiências com o mundo. Só podemos
aprender uma teoria matemática praticando sua aplicação, pois a
sabedoria real está na habilidade de usá-la. Não é olhando para as coisas,
mas interiorizando nossa interação com elas que compreendemos seu
significado conjunto.

Precisamos compreender que as constantes transformações do


mundo do trabalho, muitas vezes, apontaram para a ideia de “homem-
médio”, trabalho puramente braçal, tarefas fragmentadas e desvalorização
dos saberes da prática. Um ergonomista olha além dessas barreiras e
promove ações que, aos poucos, transformam o mundo do trabalho,
propondo uma nova realidade baseada em aprendizado, saúde, sentido
no trabalho e desempenho cada vez mais valorizado e eficiente, tendo
como pilares a realidade do trabalho e a cooperação.

160 U4 - Aplicação da Ergonomia


A proposta comercial e a análise da demanda

É na análise da demanda que se inicia a ação ergonômica. Um


ergonomista pode ser procurado por diversos motivos: uma demanda
de fiscalização trabalhista; um aumento do número de afastamentos
dos trabalhadores por doenças osteomusculares; para análise do
projeto de uma nova linha de produção; para a compra de um novo
mobiliário; para a identificação de aspectos de melhoria em uma nova
atividade de trabalho; para o estudo de condições de iluminamento;
atendimento da Norma Regulamentadora nº 17, para adequação das
condições de trabalho; entre outros.
Muitas empresas buscam a Análise Ergonômica do Trabalho
anualmente, como parte de um programa de melhoria contínua.
Devemos lembrar que a análise não deve ser feita superficialmente,
mapeando questões que não exploram a realidade do trabalho e
tampouco buscam transformações eficazes.
Assim, é importante que o ergonomista evite fechar contratos e
preços a distância, especialmente quando não conhecer a empresa
e sua realidade. A proposta comercial deve partir após uma reunião,
na qual o ergonomista explique o que é a Ergonomia da Atividade e,
especialmente, sua metodologia, para que fique claro entre ambas as
partes que esse processo será construtivo, participativo e demandará
a participação de diversos interlocutores, reuniões e sigilo na análise
de discursos e documentos.
Nem sempre a demanda está clara por parte de quem contrata o
ergonomista. Uma simples “troca de mobiliário” pode ser desvendada
como um problema mais complexo ao se aproximar da realidade dos
trabalhadores, o que necessitará de diálogos e traduções da realidade
através da metodologia da Análise Ergonômica do Trabalho.
É possível que o ergonomista seja chamado apenas por questões
da Ergonomia Física (mobiliário, design e postura), o que é legítimo,
porém isso não pode ser tratado como um delimitador da pesquisa
e do método.
Para realizar a proposta comercial, é preciso ter noção da empresa
como um todo, seu grau tecnológico e a situação (ou situações) a ser
estudada. Geralmente, o ergonomista cobra por horas de trabalho, que
consideram seus deslocamentos, a análise, o tratamento de dados, as

U4 - Aplicação da Ergonomia 161


reuniões, os grupos de discussão e a elaboração de um relatório com
descritivo da Análise Ergonômica do Trabalho. Tudo isso parte da demanda.
A proposta deve ser elaborada especificando cada um dos
12 passos da metodologia da atividade: análise e reconstrução
da demanda, análise global da empresa, análise da população
trabalhadora, definição da situação de trabalho a ser analisada (muitas
vezes chamada de hipótese de nível 1), descrição da tarefa prescrita,
real e atividade, pré-diagnóstico (ou hipótese de nível 2), observação
sistemática, diagnóstico, validação do diagnóstico, proposta de
transformações, cronograma e acompanhamento das melhorias.
Cada um desses passos deve ser descrito e contemplado
na proposta comercial, detalhando especificamente qual será a
metodologia de coleta de dados (análise de documentos, termos de
consentimento, entrevistas, grupos de discussão, reuniões com alta
gestão e grupos de trabalhadores, observações livres, entre outros).
Além disso, validar o diagnóstico é fundamental, um momento
em que trazemos todas as impressões e validamos com os diversos
interlocutores em busca da valiosa visão comum sobre o problema.
O último passo trata do acompanhamento das melhorias (já que, ao
modificar um trabalho, podemos gerar novos problemas ou novas formas
de racionalidade), e essa etapa pode ser conduzida por um Comitê de
Ergonomia formado na própria empresa. É interessante que a formação
do Comitê e seu preparo também constem na proposta comercial.

Propostas e contratos

Cada tipo de demanda, empresa e forma de trabalho irá gerar


propostas e contratos diferentes.
O contrato referente à Análise Ergonômica do Trabalho deve
deixar clara a demanda e deve ser elaborado apenas após uma
reunião inicial que esclareça o que é a Ergonomia da Atividade, como
esse estudo será conduzido e como será a apresentação final de
resultados, de forma a esclarecer possíveis quebras de expectativa
quanto ao método e seu produto final.
Inicie o contrato explicitando os objetivos da Análise Ergonômica
do Trabalho e seu amparo legal na Norma Regulamentadora nº 17.
Em seguida, esclareça a demanda que motivou o estudo.

162 U4 - Aplicação da Ergonomia


Liste os 12 passos e cite detalhadamente o método e suas
necessidades (agendamento de reuniões, deslocamento de trabalhadores
de suas atividades para realizar grupos de discussão, acesso a documentos
sigilosos). Tudo que estiver acordado em contrato será de fundamental
importância para embasar a ação ergonômica e possibilitar que sua
metodologia seja seguida com sucesso.
A precificação está diretamente relacionada com a complexidade
da situação de trabalho a ser analisada e da metodologia escolhida para
a observação sistemática. Claramente, uma empresa que possua 10
pessoas em uma situação de trabalho é diferente da que possui diversas
filiais e centenas de pessoas a mais. Além disso, a quantidade de processos
e a complexidade da organização do trabalho são fundamentais na hora
de se realizar uma proposta: quanto maior a empresa, mais prescrições
e processos podem fazer parte de seu cotidiano e mais complexa pode
ser sua interferência nas tarefas dos trabalhadores.
Lembre-se de que a Análise Ergonômica do Trabalho não se
encerra na visita à empresa. Algumas horas em frente ao computador
serão essenciais para colocar imagens, montar fluxos e planilhas
para sistematizar cada vez mais as ideias adquiridas durante a análise.
Verifique também se será necessário que algum outro profissional
auxilie em suas investigações.
É importante que sua análise tenha uma linguagem clara, objetiva
e imparcial, o que é extremamente difícil depois de se conhecer
tanto sobre o trabalho de alguém. A imparcialidade é de fundamental
importância para que sua linguagem não assuma lados e trate
igualmente a empresa e os trabalhadores em busca das melhores
condições para ambos.

Exemplificando
A tese de Carlos Antonio Ramirez Righi (2002), intitulada Modelo para
implantação de programa de ergonomia na empresa – MipErgo, traz
um modelo de proposta voltado à Ergonomia da empresa Ford. Para
saber mais sobre um modelo de proposta em Ergonomia e itens a serem
explorados na elaboração do contrato, leia o subitem 2.3.6 “Programas
Corporativos de Ergonomia”.

Disponível em: <https://repositorio.ufsc.br/bitstream/handle/123456789/106531/187604.


pdf?sequence=1>. Acesso em: 10 jul. 2017.

U4 - Aplicação da Ergonomia 163


Projetação ergonômica do sistema humano x tarefa x máquina

Para realizar um projeto ergonômico que esclareça as relações


do Sistema Humano x Tarefa x Máquina, é importante que o
ergonomista tenha uma visão sistêmica a respeito da organização do
trabalho, aspectos físicos (biomecânica, repetitividade, levantamento
e transporte de cargas, força excessiva, características do posto de
trabalho), sistemas, aspectos cognitivos e ambientais. Pode ser que
uma demanda priorize uma visão sobre um ou mais aspectos, porém
todos devem ser considerados.
A Organização Internacional do Trabalho (OIT) mapeou alguns
pontos da ação ergonômica a serem considerados. Esses pontos
abordam o local de trabalho, armazenamento e manuseio de
materiais, as ferramentas, máquinas da produção, design de postos
de trabalho, iluminação, controle de substâncias e agentes perigosos,
instalações e a organização do trabalho, totalizando 128 pontos.

Pesquise mais
No Brasil, o texto da Organização Internacional do Trabalho foi traduzido
pela Fundacentro em 2001, como o documento intitulado Pontos de
Verificação Ergonômica - Soluções Práticas e de Fácil Aplicação para
Melhorar a Segurança, a Saúde e as Condições de Trabalho.

Disponível em: <http://www.fundacentro.gov.br/biblioteca/biblioteca-digital/


publicacao/detalhe/2011/6/pontos-de-verificacao-ergonomica-solucoes-
praticas-e-de-facil-aplicacao-para-melhorar-a>. Acesso em: 10 jul. 2017.

Esse documento traduzido pela Fundacentro traz diversos exemplos


de soluções práticas para diversas situações operacionais de trabalho.
Realizar adequações em tarefas já existentes exige a correção de uma
situação através de um olhar que considere a realidade do trabalho e a
visão dos trabalhadores sobre melhorias na situação atual.
Entretanto, em situações em que temos a necessidade de
elaboração de um projeto de uma nova situação de trabalho, estamos
tratando de uma abstração, ou seja, da criação de uma situação que
ainda não existe.

164 U4 - Aplicação da Ergonomia


Assim, quando tratamos de uma situação futura provável (ou,
para não determinarmos certezas, uma situação futura possível),
é importante que estudemos situações de referência e realizemos
alguns protótipos e simulações considerando os saberes dos
trabalhadores e sua participação ativa.
Nenhuma situação é totalmente previsível e sua singularidade faz
com que possamos imaginar algumas variáveis, mas sabendo que
a realidade gerará outro contexto. Um projeto de ergonomia deve
envolver, portanto, os participantes em todas as etapas do projeto,
inclusive no início, quando a demanda ainda está sendo estabelecida.
A primeira etapa de um Projeto Ergonômico do Sistema Humano
x Tarefa x Máquina consiste na análise de situações similares que
criem uma referência de base, realizando uma Análise Ergonômica
do Trabalho em situações parecidas com a situação a ser projetada,
considerando suas variabilidades e estratégias dos trabalhadores para
interagirem com ela. A segunda etapa consiste em identificar situações
de ação características, numerando-as e determinando prioridades de
mantê-las na nova situação ou modificá-las parcial ou totalmente. Por
fim, a última etapa consiste na simulação do trabalho futuro, criando
ações características, instalações que representem as condições
reais no futuro, deslocamentos, necessidades de comunicação e
informação, riscos, posturas e competências necessárias.
Esse tipo de abordagem procura antecipar os problemas
que possivelmente surgirão ainda durante o projeto, sendo mais
eficaz na busca de soluções e com custos menores em casos de
modificações necessárias.
Tanto na formulação de uma proposta comercial como na
projetação relacionada à interação homem x máquina é primordial a
realização da Análise Ergonômica do Trabalho e o desenvolvimento
dos 12 passos expostos em seu Manual de Aplicação. Após conhecer
a realidade do trabalho e promover reflexões acerca de sua realidade,
é possível desenvolver projetos e modificações que promovam
transformações significativas.

U4 - Aplicação da Ergonomia 165


Reflita
O problema da adaptação do trabalho ao homem é que nem sempre ele
pode ser resolvido na primeira tentativa. Geralmente, estamos tratando de
um problema complexo para o qual não existe resposta pronta, necessitando
de uma análise que identifique seus aspectos gerais. Numa situação ideal,
a ergonomia deveria ser aplicada desde as etapas iniciais do projeto de
urna máquina, sistema, ambiente ou local de trabalho, incluindo o ser
humano como um de seus componentes, considerando as características
ou restrições de forma conjunta. Lembre-se de que algumas vezes deve-
se fazer aquilo que é possível, mesmo que não seja uma alternativa ideal,
para se iniciar uma transformação do trabalho. Não subestime uma ação
simples, que pode melhorar o dia a dia de um ser humano.

Nesta seção, conseguimos identificar que a Ergonomia apresenta


um papel social. Porém, para se realizar uma Analise Ergonômica do
Trabalho assegurando a clareza de seus objetivos e de sua metodologia,
é necessária a correta formulação de uma proposta comercial e um
contrato de trabalho. A ergonomia centrada na atividade tem como
principal objetivo transformar o trabalho. Essa é a maior finalidade
da ação ergonômica. Assim, o ergonomista auxilia na concepção
de situações de trabalho que não alterem a saúde e segurança
dos trabalhadores; valoriza seus saberes; considera os objetivos
econômicos da empresa; cria projetos de sistemas de produção, de
processos, da organização do trabalho e das tarefas de forma real, e
não simplificada ou estereotipada. Em projetos, a ergonomia busca
uma aproximação das especificações com a atividade executada pelo
trabalhador, suas representações, variabilidades, modo operatório e
sobrecarga de trabalho vinculadas ao trabalho real, tendo como base a
análise da atividade do trabalhador.
Como ergonomista, a realidade do trabalho é a nossa principal
fonte de ideias. Vamos exercitar isso respondendo à situação-problema
da nossa seção.

166 U4 - Aplicação da Ergonomia


Sem medo de errar

Um desenvolvedor de softwares contrata você como ergonomista


para auxiliá-lo a criar um sistema de computador para a recepção
de hóspedes em um hotel. Seu papel será muito simples: verificar
os aspectos de usabilidade, acessibilidade e ergodesign envolvidos na
interação das pessoas com esse sistema. Assim, é preciso relembrar:
qual a vantagem de se contratar um egonomista para participar na
concepção de um sistema que exige interação de pessoas com
máquinas? Quais aspectos físicos e cognitivos devem ser considerados
nessa interação? Qual a importância da opinião do trabalhador e da
participação do usuário na concepção de qualquer trabalho?
Ao iniciar a análise dos aspectos de usabilidade no programa de
computador, você percebe que precisa realizar uma reunião inicial
com o desenvolvedor para montar sua proposta comercial e o
contrato, para formalizar a demanda do trabalho.
Após iniciar nossos estudos na Unidade 4, você consegue
identificar que é primordial considerar os 12 passos metodológicos
de realização da Análise Ergonômica do Trabalho, descritos em
seu Manual de Aplicação, para realizar uma proposta comercial.
Assim, após reformular a demanda (passo inicial de cada análise), é
importante abordar: análise global da empresa, análise da população
trabalhadora, definição da situação de trabalho a ser analisada (muitas
vezes chamada de hipótese de nível 1), descrição da tarefa prescrita,
real e atividade, pré-diagnóstico (ou hipótese de nível 2), observação
sistemática, diagnóstico, validação do diagnóstico, proposta de
transformações, cronograma e acompanhamento das melhorias.
Cada um desses passos deve ser descrito e contemplado na proposta
comercial, detalhando especificamente qual será a metodologia de
coleta de dados (análise de documentos, termos de consentimento,
entrevistas, grupos de discussão, reuniões com alta gestão e grupos
de trabalhadores, observações livres, entre outros). Além disso, validar
o diagnóstico é fundamental, um momento em que trazemos todas
as impressões e validamos com os diversos interlocutores em busca
da valiosa visão comum sobre o problema. É preciso reformular a
demanda e explicar o que é ergonomia a todos os envolvidos,
especialmente sua metodologia, para que fique claro entre ambas as
partes que esse processo será construtivo, participativo e demandará

U4 - Aplicação da Ergonomia 167


a participação de diversos interlocutores, reuniões e sigilo na análise
de discursos e documentos. Nem sempre a demanda está clara
por parte de quem contrata o ergonomista. Uma simples troca de
mobiliário pode ser desvendada como um problema mais complexo
ao se aproximar da realidade dos trabalhadores, o que necessitará de
diálogos e traduções da realidade por meio da metodologia da Análise
Ergonômica do Trabalho. Após estabelecer todos esses pontos da
proposta comercial, sua análise pode ser iniciada, identificando quais
aspectos devem ser considerados na interação homem x máquina
para assegurar a saúde, o conforto e o desempenho eficiente
dos usuários – uma visão sistêmica a respeito da organização do
trabalho, aspectos físicos (biomecânica, repetitividade, levantamento
e transporte de cargas, força excessiva, características do posto de
trabalho), sistemas, aspectos cognitivos e ambientais.

Avançando na prática

Mas eu só queria uma cadeira nova


Descrição da situação-problema
Miriam, uma secretária executiva de um escritório de
contabilidade, queixa-se há dias de dores nas costas. O chefe dela
manda um e-mail a você, um consultor em ergonomia, para que, a
distância, indique um novo mobiliário, após enviar fotos de como é
o posto de trabalho atual. Ele pede que você precifique sua ação e
envie, inclusive, dados de fabricantes de mobiliário. Com base em
seus conhecimentos, como proceder nessa situação?

Resolução da situação-problema
A Análise Ergonomica do Trabalho parte da análise e
reconstrução da demanda que a motiva. Ao se propor uma solução
sem analisar o trabalho real, entender as tarefas da trabalhadora e
considerar suas opiniões, pode-se estabelecer um diagnóstico e
posterior proposta de solução superficiais e que não melhoram as
condições de conforto, segurança e nem melhoram o desempenho
da trabalhadora. Uma solução eficaz seria marcar uma reunião
com o empregador e explicar os princípios da ergonomia e sua
metodologia, destacando a importância da análise, reformulando,
assim, a demanda antes da proposta comercial.

168 U4 - Aplicação da Ergonomia


Faça valer a pena
1. Uma pessoa pode saber como fazer algo, sem conseguir articular
aos outros em maiores detalhes. O conhecimento construído para
a realização do trabalho real é produzido pela inteligência do corpo,
através da qual o sujeito enfrenta as provas que o mundo real apresenta
e assimila respostas, aprende comportamentos, hábitos e práticas, além
de propor diálogos e desafios. Dessa forma, o saber de difícil verbalização,
que vem da interiorização das experiências com o mundo, é chamado de
________________.
Assinale a alternativa que completa o texto com a forma de saber de difícil
valorização descrita por Polanyi em 1966.
a) Competência.
b) Saber braçal.
c) Saber tácito.
d) Saber acadêmico.
e) Saber formal.

2. A Ergonomia no Brasil é amparada pela Norma Regulamentadora nº 17,


do Ministério do Trabalho e Emprego, que torna obrigatória a realização da
Análise Ergonômica do Trabalho para adequar as condições de trabalho às
características psicofisiológicas dos trabalhadores, proporcionando o máximo
de conforto, segurança e desempenho eficiente.
Com relação à elaboração de uma proposta comercial em Ergonomia,
assinale a alternativa correta.
a) A proposta comercial deve partir da explicação do que é a Ergonomia
da Atividade e, especialmente, sua metodologia, para que fique claro entre
as partes que esse processo será construtivo, participativo e demandará
a participação de diversos interlocutores, reuniões e sigilo na análise de
discursos e documentos.
b) Uma proposta comercial pode ser sempre padronizada, já que todas
as situações de trabalho são iguais. Um mobiliário sempre obedece a
regulamentações já existentes, o que facilita um modelo de contrato para
todas as tarefas.
c) A proposta comercial deve ser elaborada única e exclusivamente pela
empresa, pois é apenas o empregador quem tem a visão clara de suas
necessidades e do que quer que seja feito na empresa.
d) A proposta comercial pode ser padronizada, porém revista anualmente.
Como a proposta comercial da Análise Ergonômica do Trabalho geralmente
ocorre anualmente junto ao Programa de Prevenção a Riscos Ambientais
– PPRA –, pode ser padronizada, revisando apenas o preço estabelecido.

U4 - Aplicação da Ergonomia 169


e) O ergonomista deve ser o único responsável pela elaboração da proposta
e reformulação da demanda, pois os empregadores nunca têm clareza dos
reais problemas de suas empresas.

3. Uma proposta comercial em Ergonomia deve ser elaborada


especificando cada um dos 12 passos da metodologia da atividade:
análise e reconstrução da demanda, análise global da empresa, análise
da população trabalhadora, definição da situação de trabalho a ser
analisada (muitas vezes chamada de hipótese de nível 1), descrição da
tarefa prescrita, real e atividade, pré-diagnóstico (ou hipótese de nível 2),
observação sistemática, diagnóstico, validação do diagnóstico, proposta
de transformações, cronograma e ________________.
De acordo com o Manual de Aplicação da Norma Regulamentadora nº 17,
assinale a alternativa que trata do último passo descrito para a realização
da Análise Ergonômica do Trabalho:
a) Envio do boleto bancário.
b) Atividade futura provável.
c) Proposta de modificações.
d) Reformulação da demanda.
e) Acompanhamento das melhorias.

170 U4 - Aplicação da Ergonomia


Seção 4.2
Aspectos psicológicos, cognitivos e mentais

Diálogo aberto
Nesta seção, vamos tratar de aspectos mentais relacionados ao
trabalho. Na aplicação da Ergonomia, é preciso que o ergonomista
tenha visão ampla sobre os processos de trabalho e sobre como a
tarefa é realizada, identificando os constrangimentos que podem
advir do trabalho. Para pensar sobre os aspectos mentais e o papel
da Ergonomia, vamos retomar nossa situação-problema: um
desenvolvedor de softwares contrata você como ergonomista para
auxiliá-lo a criar um sistema de computador para a recepção de
hóspedes em um hotel. Seu papel será muito simples: verificar os
aspectos de usabilidade, acessibilidade e ergodesign envolvidos na
interação das pessoas com esse sistema.
A Ergonomia Cognitiva leva em consideração aspectos voltados
ao aprendizado, à percepção, cognição e memória. Pensando que
você será o ergonomista responsável em considerar esses aspectos
no desenvolvimento do software, é importante que você relembre:
o que é percepção? O que é cognição? Por que um design que não
considera o usuário durante o processo de criação pode induzir a
erros e perda de produtividade?
Para responder a essas e outras questões, vamos à seção Não
pode faltar do nosso estudo! Agora, vamos fazer uma breve imersão
pelos caminhos da mente no trabalho e vamos enxergar de perto a
beleza do processo de aprendizado.

Não pode faltar

Vamos iniciar nossa seção com a seguinte afirmação: é preciso


valorizar os saberes dos trabalhadores.
Em um estudo realizado com colhedores de tomate do interior do
estado de São Paulo, sob a perspectiva da Ergonomia, foi analisado como
ocorria o aprendizado desses trabalhadores. Sem terem tido qualquer

U4 - Aplicação da Ergonomia 171


tipo de treinamento formal, eles conseguiam identificar variáveis do fruto
para sua colheita ou descarte: distinguiam cores, formatos, tamanhos e
problemas com os tomates através do tato e da visão.
Ao visualizar e pegar os frutos, os trabalhadores acessavam em sua
memória uma sequência de representações mentais que faziam com
que eles conseguissem tomar decisões importantes sobre a colheita.
Especificidades técnicas, como a aplicação de venenos, potássio,
controle de pH da terra e irrigação, eram discutidas abertamente
entre eles. Além disso, mesmo recebendo por caixa colhida, os
trabalhadores não competiam entre si, pois perceberam que, ao se
ajudarem, o trabalho ficava mais fácil.
Os trabalhadores sabiam que, se utilizassem macacão, o veneno
aplicado poderia entrar e, devido ao calor, penetrar ainda com mais
facilidade na pele. Enquanto eles conseguiam distinguir os tons dos
tomates com maestria, para os autores da pesquisa, parecia tudo igual.
Vamos refletir um pouco: o trabalho de um colhedor de tomate,
muitas vezes, pode ser enxergado como puramente braçal por olhos
que estão afastados de sua realidade. Porém, esses trabalhadores
realizam escolhas, tomam decisões, aprendem, memorizam,
raciocinam para que sua ação final de colheita seja guiada por uma
sequência de processos mentais.
Quando falamos de processos mentais em Ergonomia, estamos
tratando da Ergonomia Cognitiva.

Ergonomia Cognitiva e psicologia do trabalho

A Ergonomia não analisa apenas postura, ela analisa a interação do


homem com seu trabalho em sua totalidade. Por critérios didáticos,
podemos dizer que a Ergonomia possui abordagens física, organizacional
e cognitiva, estando todas elas correlacionadas no estudo que conduz a
Análise Ergonômica do Trabalho, podendo priorizar um ou outro aspecto
de acordo com a demanda que a motivou.
A Ergonomia Cognitiva busca descrever como a cognição
humana afeta o trabalho e é afetada por ele, buscando otimizar as
características do trabalho, entendendo os processos cognitivos
face às situações de resolução de problemas nos seus diferentes
níveis de complexidade.

172 U4 - Aplicação da Ergonomia


Imagine um piloto de avião diante dos diversos comandos
luminosos no painel à sua frente. Um médico tendo que tomar
decisões ao realizar um pronto atendimento de urgência em um
paciente que acabou de ser baleado. Um policial que precisa definir
estratégias e planos para atuar no caso de um assalto. Um programador
que precisa desenvolver códigos e correlacionar estratégias com
linguagem própria.
Ao realizar a Análise Ergonômica do Trabalho, dependendo da
demanda que a motivou, é preciso traçar como o aprendizado do
homem ocorre em seu trabalho e sua relação com os símbolos,
processos e sistemas; além disso, analisamos a chamada carga
de trabalho, sobrecarga advinda de inadequações do trabalho que
podem causar constrangimentos.
Em 2014, um banco foi processado pelo Ministério Público do
Trabalho do Piauí por assédio moral. Você pode encontrar a notícia
disponível no portal da Época Negócios em: <https://goo.gl/u7jEvq>
(acesso em: 20 jul. 2017). O banco chegava a enviar mensagens de
texto até mesmo de madrugada, lembrando seus funcionários das
metas que teriam que bater no dia seguinte. Um trabalhador relatou
ter recebido até 80 mensagens em um único dia.
O item 17.6.1, da Norma Regulamentadora nº 17, determina que
a organização do trabalho deve ser adequada às características
psicofisiológicas dos trabalhadores e à natureza do trabalho a ser
executado. Dessa forma, prêmios por produtividade, ritmos impostos
de forma inadequada, formas de avaliação de desempenho que se
mostram pouco claras ou injustas e regras de produção que diminuem
a autonomia dos trabalhadores aumentando a carga de trabalho são
fatores de atenção para a Análise Ergonômica do Trabalho.
Para entender o papel da Ergonomia Cognitiva na análise dessas
questões, precisamos entender os processos mentais que ocorrem
no trabalho. Quando falamos em competência, não estamos nos
referindo a quem realiza sua tarefa com perfeição. As competências
são inerentes a todos os indivíduos. Entender em que bases se
constroem as competências do trabalhador é fundamental para
que a Ergonomia Cognitiva possa sugerir alterações no contexto da
situação e até mesmo na concepção de interfaces informatizadas
mais adaptadas.

U4 - Aplicação da Ergonomia 173


Percepção e processos cognitivos

Para começarmos a falar sobre processos mentais no trabalho e


o papel da Ergonomia, é importante que possamos entender o que é
percepção, cognição, representação e competência.
A percepção é a captação de sensações pelos órgãos dos sentidos.
O trabalhador recolhe informações sobre a situação de trabalho e as
relaciona para, apenas depois, julgar e escolher ações apropriadas.
Após passar pela percepção, é na cognição que os saberes atingem
um nível mais profundo, podendo ser compreendida como uma série
de conexões que envolvem aquisição, armazenamento, retenção e
uso do conhecimento. Esses processos incluem os fundamentos da
atenção, memória, percepção, raciocínio e aprendizagem. Através
dessas funções, o homem compreende e interage com o mundo,
incluindo seus estímulos internos (pensamentos e sentimentos), pois
é por meio da capacidade cognitiva que se pode planejar ações,
realizar julgamentos e solucionar problemas.
Criamos associações o tempo todo. Nosso aprendizado vai
se acumulando e gerando um universo de informações que são
tratadas, armazenadas e recrutadas quando há necessidade. O que
é decorado pode não criar associações e, portanto, ser esquecido.
Porém, o aprendizado adquirido do trabalho traz uma riqueza de
interações e representações únicas àquele contexto.
A cognição é a reflexão sobre o conhecimento humano. Uma
árvore só é uma árvore se compartilharmos o que entendemos o que
é a sua forma, a cor das folhas, das flores, do formato dos frutos, do
seu tamanho. Uma palavra só é uma palavra se ela apresenta sentido.
Pesquise mais
Para entender mais sobre as emoções humanas, assista à animação
Divertida Mente, da Disney Pixar, que mostra o papel das emoções humanas,
valores, aceitação, depressão, representações e amadurecimento.

Além disso, nossas associações mentais apresentam uma riqueza


de associações tão grande que o pensamento percorre todo o nosso
corpo, gerando uma ação. Uma ação não é apenas um gesto. Antes,

174 U4 - Aplicação da Ergonomia


ela foi pensada, antecipada, desenhada em nossa mente.
No gesto de carregar uma caixa há a decisão da força, da forma,
do aprendizado da melhor forma de executar aquele gesto. O
trabalhador estabelece quais os resultados da tarefa e identifica como
alcançá-los, através do ritmo, da velocidade, da forma.
Os processos de sensação, percepção e cognição se completam
na formação de um conhecimento que gera uma ação.
Quanto mais aprendemos, mais conseguimos antecipar uma
ação e tomar decisões. Chamamos de conhecimento tácito o
conhecimento adquirido da prática que é tão internalizado, tão
prático, que é de difícil verbalização. É aquele saber que você obtém
quando pergunta à sua mãe “quanto de sal é para colocar”. É tão
intrínseco, tão próprio às mãos dela, que não é possível explicar de
maneira formal.
Os trabalhos fragmentados que parecem ser simples são
extremamente complexos, pois demandam habilidades que só são
adquiridas após uma longa história de interação naquele trabalho. Essas
habilidades dependem do desenvolvimento do que chamamos de
competência. A competência é a capacidade de regulação que faz com
que tenhamos conhecimento, habilidade e atitude frente ao que nos
acontece, lidando com a variabilidade de acordo com cada situação.
Os conhecimentos sobre o trabalho são mobilizados num
contexto específico (pois uma atividade é sempre única), obedecendo
à variabilidade interindividual e intraindividual. Uma mesma tarefa
realizada por pessoas diferentes não irá gerar o mesmo resultado,
pois ela é afetada pela sua experiência de vida, sendo constantemente
revista e transformada.
Em Ergonomia, definimos que a competência (ou expertise) é
o conhecimento que é antecedente e pode sofrer transformações,
evoluindo com a prática e o tempo.
É importante salientar que, para colocar em ação os
conhecimentos e habilidades que possui, o trabalhador dispõe
de uma estrutura cognitiva que funciona como um esquema ou
um mapa da situação que engloba os fatores com os quais está
mais familiarizado ou que são significativos no contexto. Essa
estrutura pode ser chamada de representação, mapa mental, ou
seja, diz respeito às formas de armazenamento e estruturação
diferenciados do conhecimento.

U4 - Aplicação da Ergonomia 175


Em nosso cérebro existe esse mapa, o qual é alimentado ao
longo de nossa vida com representações. Aprendemos que “verde”
significa “siga” e “vermelho” significa “pare”. Embora pessoas mais
jovens possam nunca ter visto um disquete, associam sua imagem
ao ato de “salvar documento” ao elaborar algo no software Microsoft
Word. Você já pode ter passado pela experiência de alguém na sua
casa trocar o canal da TV e não conseguir consertar um erro por não
entender o que aconteceu.
Criamos representações o tempo todo. Elas podem ser
entendidas tanto em um sentido técnico, quando se referem à
expressão de um conhecimento com a ajuda de símbolos, quanto
em um sentido psicológico, quando fazem referência a um
conjunto de valores e propriedades atribuídos a um fenômeno para
armazenamento na memória.

Exemplificando
Em psicologia e design, falamos sobre o conceito de Gestalt, teoria
sobre a essência da forma completa, que trata do nosso reconhecimento
visual das figuras e formas inteiras, em que o todo é maior do que apenas
a soma de suas partes.

Quando olhamos uma forma, fazemos diversas associações de acordo


com as nossas representações mentais. A perna de uma mesa continua
sendo sua perna mesmo sem a mesa lá. Conseguimos associar essa
ideia. Em Gestalt, há seis princípios que ditam a forma como organizamos
nossa percepção visual:

Figura 4.1 | Princípios da Gestalt

Fonte: elaborada pela autora.

176 U4 - Aplicação da Ergonomia


Princípio Figura-fundo

Alguns objetos parecem destacar-se do fundo e outros parecem recuar.

Proximidade

Tendência a ver os objetos que estão próximos como um grupo.

Similaridade

Tendência a agrupar objetos com base em sua semelhança.

Continuidade

Tendência a perceber as figuras de forma contínua ao invés de


interrompidas ou descontínuas.

Fechamento

Tendência a fechar ou completar objetos que não são completos.

Simetria

Tendência a perceber os objetos como se formassem imagens de espelho.

Desta forma, com as representações mentais, os trabalhadores


conseguem adaptar em sua mente um esquema em que selecionam
as informações mais importantes e as organizam, de forma a criar
uma relação e um sentido entre elas. Uma imagem da tarefa e de
cada uma de suas partes é esquematizada e, de acordo com a
experiência do trabalhador, relações são criadas para antecipar ações
e resolver problemas de acordo com o que foi aprendido e está
sendo recrutado agora.
Todo trabalhador escolhe estratégias que podem ser entendidas
como um processo de categorização (colocar os pensamentos em
categorias, agrupá-los), resolução de problemas e tomada de decisão
que resultam em um modo operatório (que nada mais é do que uma
sequência de ações e operações após regularmos os objetivos, os meios
disponibilizados, os resultados que queremos e nosso estado interno).
Elaborar novos modos implica reinterpretar a situação presente
e formular estratégias para solucionar os problemas, bem como

U4 - Aplicação da Ergonomia 177


antecipar incidentes. O processo descrito depende da categorização,
do reconhecimento de padrões e como são agrupados de maneira a
elaborar modelos ou identificar características de um dado contexto
ou situação.
Agora, pensemos: e se um trabalhador tem uma meta que não é
clara para ele? E se um painel de comandos não faz sentido? E se a
lógica na sequência de processos de um trabalho apresenta falha?

Carga mental do trabalho

Quem planeja o trabalho não enxerga a essência cognitiva


escondida no trabalho parcelado porque está em outro “mundo de
atuação”. Trabalhadores possuem uma competência cognitiva, a
qual é adquirida pelas associações entre suas percepções e as ações
relacionadas ao trabalho.
Quando ocorre um acidente, um erro, uma falha, é muito difícil,
dentro da organização, se estabelecer uma compreensão recíproca
do que aconteceu, porque não há senso comum na linguagem, em
como o trabalho é visto.
Não existe erro humano, ou distração, ou negligência: existe
dificuldade em compreender o ponto de vista do trabalhador. Os
modelos mentais adotados nas situações de trabalho tendem a ser
incompletos, muito pessoais, instáveis e não científicos. As pessoas se
apropriam da situação para tomar decisões. Assim, elas reorganizam
conteúdos através de um acúmulo quantitativo de conhecimentos.
A carga mental é observada onde quer que os processos de
experiência e comportamento humano ocorram e abrange desde
aspectos cognitivos (atenção, concentração, memória, percepção,
tomada de decisão) até aspectos emocionais, que abrangem afetos,
sentimentos e motivação para com o trabalho.
As cargas de trabalho são definidas como exigências ou demandas
psicofisiológicas do processo de trabalho, gerando, ao longo do
tempo, as particularidades do desgaste na saúde do trabalhador. Em
outras palavras, as cargas são mediações entre o processo de trabalho
e o desconforto psicofisiológico.
Quando citamos a carga mental, nos referimos à relação entre
constrangimentos impostos pela tarefa, pela interface, pelos

178 U4 - Aplicação da Ergonomia


instrumentos e pelo ambiente (carga funcional), junto às atividades
desempenhadas e à capacidade de trabalho do trabalhador.
A carga de trabalho, em Ergonomia Cognitiva, pode ser dividida
em: carga psíquica: referente ao sentido no trabalho e fator afetivo;
carga cognitiva: referente às exigências cognitivas das tarefas (uso
da memória, as decisões, os raciocínios); e carga mental: aspectos
psíquicos e cognitivos integrantes desses dois outros conceitos.
Enquanto o trabalhador consegue regular as cargas de trabalho, tendo
margem de manobra para tomar decisões e equilibrar as demandas e os
esforços, ele consegue atingir os resultados com saúde e eficiência.
O problema é quando essa regulação não acontece de forma
eficiente. No mundo do trabalho, estamos lidando cada vez mais com
processos informatizados e formas de controle de produção cada vez
mais distantes da realidade. Quanto maiores as empresas, maiores as
quantidades de processos e formas de controle do que está sendo feito
em cada pedacinho da organização. Números. Números de vendas.
Números de atendimentos. Números de pessoas que se afastaram do
trabalho. Números que separam os melhores dos piores. Números que
avaliam os melhores e os piores. Rankings. Desafios.
Os cenários criados para se trabalhar podem gerar injunções
paradoxais: por exemplo, deixar um cliente satisfeito, mas não ter
autonomia para resolver o problema dele; não poder se envolver
com o cliente, mas ter que ouvi-lo e conquistá-lo durante uma venda.
Deve-se fazer uma pausa em um horário específico, mas, se surgir
cliente, deve-se atendê-lo.
As organizações criam diversos tipos de indicadores de
desempenho e metas para controlar e “motivar” os trabalhadores,
levando a uma desumanização das relações de serviço. As pessoas
passam a ser vistas como números e leva-se uma visão reducionista
do que acontece realmente no trabalho. Pode acontecer de se
racionalizar tanto a produção, os processos e os controles que isso
pode levar ao adoecimento e a uma lógica que, na realidade de
trabalho, não funciona e não leva a processos mais eficientes.

U4 - Aplicação da Ergonomia 179


Assimile
O programa Undercover Boss, da CBS, mostra quando um chefe atua
como um dos trabalhadores da produção de forma disfarçada, mas
consegue ver através dos números frios que alcançam sua mesa. Para
que possa assimilar melhor a interpretação de números e a avaliação
fria de trabalhadores através de indicadores de desempenho sobre
seus fazeres, assista ao episódio O Chefe Espião - O Call Center
da GSI Commerce, disponível em: <https://www.youtube.com/
watch?v=bFiuv7yVu2w> (acesso em: 20 jul. 2017). Note no episódio o
que acontece quando o próprio presidente da empresa não entende a
lógica de como é realizado o trabalho na ponta. Devido a indicadores de
desempenho e situações colocadas para se controlar o trabalho, nem
sempre é possível distinguir realmente quais são os trabalhadores com
melhor desempenho, porque os indicadores não são claros e as metas
não mostram as reais competências.

A fragmentação do trabalho e a busca pelo controle criam


situações que geram constrangimento aos trabalhadores e podem
levar ao adoecimento. A sistemática de controle criada pelas
empresas leva a indicadores de desempenho, metas e sistemas
informatizados que controlam essas variáveis, fazendo com que
os trabalhadores sejam perseguidos por esses números, que nem
sempre refletem a realidade do trabalho.
Esse controle intenso e contínuo ocorre ao longo de todo o
processo de trabalho, muitas vezes sem considerar a atividade do
trabalhador, seu conhecimento técnico, a maneira de fazê-lo, sua
rapidez, seu zelo e seu comportamento. A falsa ideia de controlar
tudo e garantir o bom andamento das operações resulta em um
monitoramento do trabalho graças à tecnologia disponível e na falta
de um debate mais profundo com relação aos limites éticos das
possibilidades de controlar as pessoas.
Quando esses processos de controle são rígidos, não há margem
de manobra para modificações no trabalho. Um grande número de
normas, procedimentos, atitudes e responsabilidades prescritas que
devem ser seguidos à risca tratam os processos mentais de forma
reducionista, levando a um grau de pressão e controle tão grandes
que podem levar ao adoecimento.

180 U4 - Aplicação da Ergonomia


Exemplificando
Como exemplo, leia o artigo Trabalhar em centrais de atendimento:
a busca de sentido em tarefas esvaziadas (SZNELWAR; ABRAHAO;
MASCIA, 2006). O artigo trata dos aspectos do trabalho de centrais
de atendimento, mostrando que essa tarefa é fortemente limitada,
constrangida pelo tempo, com pouca autonomia para regular o seu
ritmo, o fluxo de chamadas e as pausas. Porém, a relação com o cliente
requer uma certa flexibilidade do tempo para que se possa desenvolver
um tratamento adequado, o que mostra uma contradição de variáveis.

Assim, para resolver demandas relacionadas à Ergonomia


Cognitiva, a Análise Ergonômica do Trabalho deve considerar como
recuperar o sentido do trabalho, gerar o conhecimento que impede
a alienação do trabalhador, valorizar o trabalho como agir humano
através do qual o homem se transforma e transforma a sociedade,
como livre expressão da sociedade criadora, como superação dos
limites pela espécie humana.

Ergodesign

Em Ergonomia, qualquer ação eficaz deve ser realizada em


conjunto. Quanto mais visões e opiniões acerca da mesma situação,
mais alinhadas serão as interpretações de diferentes pessoas sobre a
mesma problemática.
Como já vimos, o ergonomista tem papel de tradutor entre as
partes, aproximando a lógica do trabalhador da visão distante de
quem concebe o trabalho.
Ao falarmos de ergodesign, estamos tratando da participação do
usuário no processo de criação de artefatos, sistemas e processos.
Nada de pedir a opinião de quem vai usar algo apenas no final do
processo: no ergodesign, o usuário participa ativamente de toda a
concepção, realizando testes e opinando em todas as etapas.
É disso que trata a Ergonomia: quem cria algo tem sua lógica própria.
Porém, muitas vezes, essa lógica só faz sentido para quem a cria.

U4 - Aplicação da Ergonomia 181


Reflita
Você já refletiu sobre a importância dos saberes dos trabalhadores,
especialmente os adquiridos na prática. Valorizar os saberes dos
trabalhadores e dos usuários finais de algum produto ou sistema é
fundamental para um desempenho eficiente. Veja o vídeo do filósofo
Mario Sergio Cortella sobre a história da fábrica de pasta de dentes,
disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=f0z56D5qCO0>
(acesso em: 20 jul. 2017).

Com o desenvolvimento das tecnologias de informação e


comunicação, chegamos à era da informação com transformações
nas atividades econômicas, sociais e educacionais. Nossas
interpretações e a velocidade com a qual as mudanças ocorrem
trazem um cenário cada vez mais competitivo. As empresas precisam
se organizar e rever seus processos de forma a, constantemente, se
adequarem às rápidas mudanças trazidas pela tecnologia.

Podemos definir design como uma atividade que consiste em


determinar as propriedades formais dos objetos a serem produzidos,
considerando suas relações estruturais e funcionais que dão coerência
do ponto de vista do produtor e do usuário.
Assim, o ergodesign busca garantir a usabilidade, conjunto de
fatores que deixam os objetos fáceis de usar, eficientes e agradáveis
(da perspectiva do usuário).
Vamos pensar em alguns exemplos de objetos: balde cheio de
água (a pega é adequada?); abridor de vinho (pega e força exigidas);
impressora (algumas pessoas preferem comprar um novo modelo ao
invés de procurar conserto para uma impressora).
A usabilidade apresenta os seguintes objetivos: efetividade (uma
mistura de eficácia e eficiência), produtividade (quantidade adequada
de recursos do sistema em relação à efetividade alcançada), segurança
(oferecer níveis aceitáveis de risco de danos) e satisfação, learnability
(fácil de aprender) e memorability (fácil de lembrar como se usa).
Quando um erro leva o usuário a desistir de usar um artefato ou
ainda leva à perda de tempo; quando as ações não são intuitivas;

182 U4 - Aplicação da Ergonomia


quando o próprio sistema te induz ao erro devido às opções limitadas
e não claras; quando os símbolos não fazem sentido; quando apenas
alguém experiente consegue utilizar; quando são precisos diversos
passos para uma ação que poderia ser simplificada: nessas situações,
podemos dizer que temos problema de usabilidade e precisamos de
um estudo em ergodesign.
Passamos grande parte de nossas vidas no trabalho e um dos
aspectos mais belos do ser humano é sua capacidade de evolução
e aprendizado. Ao tratarmos dos aspectos cognitivos do trabalho,
fazemos uma imersão nesse universo rico em detalhes que é a mente
humana, e torna-se urgente a valorização de todas as pessoas, todos
os trabalhos e todas as relações.
Por isso, aprender sobre sofrimento mental no trabalho,
compreender sua origem, permite antecipar-se às patologias do
trabalho e adotar medidas preventivas que favoreçam a conservação
da saúde física e, principalmente, mental dos trabalhadores.

Sem medo de errar

Retomando a situação-problema da nossa seção, um


desenvolvedor de softwares contrata você como ergonomista para
auxiliá-lo a criar um sistema de computador para a recepção de
hóspedes em um hotel. Seu papel será muito simples: verificar os
aspectos de usabilidade, acessibilidade e ergodesign envolvidos na
interação das pessoas com esse sistema.
A ergonomia cognitiva leva em consideração aspectos voltados
ao aprendizado, à percepção, cognição e memória.
Pensando que você será o ergonomista responsável em considerar
esses aspectos no desenvolvimento do software, você entende que
a percepção é a captação de sensações pelos órgãos dos sentidos.
O trabalhador recolhe informações sobre a situação de trabalho e as
relaciona para, apenas depois, julgar e escolher ações apropriadas.
Após passar pela percepção, é na cognição que os saberes atingem
um nível mais profundo, podendo ser compreendida como uma série
de conexões que envolvem aquisição, armazenamento, retenção e
uso do conhecimento. Esses processos incluem os fundamentos da
atenção, memória, percepção, raciocínio e aprendizagem. Através
dessas funções, o homem compreende e interage com o mundo,

U4 - Aplicação da Ergonomia 183


incluindo seus estímulos internos (pensamentos e sentimentos), pois
é por meio da capacidade cognitiva que se pode planejar ações,
realizar julgamentos e solucionar problemas.
Conhecendo sobre processos mentais e relembrando sobre
ergodesign, entendemos que, quando o design não considera o
usuário durante o processo de criação, ele pode induzir a erros e perda
de produtividade. A usabilidade apresenta os seguintes objetivos:
efetividade (uma mistura de eficácia e eficiência), produtividade
(quantidade adequada de recursos do sistema em relação à efetividade
alcançada), segurança (oferecer níveis aceitáveis de risco de danos),
satisfação, learnability (fácil de aprender) e memorability (fácil de
lembrar como se usa).

Avançando na prática

Desisti de bater a meta


Descrição da situação-problema
Em uma central de teleatendimento, há uma equipe de 10
trabalhadores. Hoje, chegam 5 trabalhadores novos que tiveram
um breve treinamento através de uma apostila impressa sobre
como atender o cliente. Ao chegar na empresa, o coordenador
mostra os indicadores de desempenho. Caso os trabalhadores
consigam desempenho satisfatório em todos eles, receberão
uma bonificação de 30% no salário. Os indicadores eram: realizar
pausa na hora certa (indicada via sistema); “sorriso na voz”; meta
de vendas; meta para fazer o cliente mudar de ideia caso ligue
cancelando o produto; meta de velocidade de atendimento.
Ao final do mês, nenhum dos trabalhadores conseguiu bater
todas as metas, referindo as seguintes situações: o sistema pedia
para realizarem pausas enquanto ainda estavam em ligação; para
atender bem o cliente, não podiam acelerar o atendimento; não
possuíam autonomia para alguns tipos de problemas; sorriso na
voz é um indicador avaliado subjetivamente; fazer o cliente mudar
de ideia era uma meta muito difícil de se bater.
Pensando em toda essa situação, como a Ergonomia Cognitiva
poderia auxiliar nessa situação de trabalho?

184 U4 - Aplicação da Ergonomia


Resolução da situação-problema
Indicadores de desempenho e metas são comuns em centrais
de teleatentedimento. A organização do trabalho é um dos
aspectos a serem estudados na Análise Ergonômica do Trabalho e,
quando ela não está adequada às características psicofisiológicas
dos trabalhadores, pode levar ao adoecimento. Quando esses
indicadores estão afastados da realidade do trabalho, eles
podem gerar injunções paradoxais (elementos susceptíveis de
induzir confusão, devido a uma manipulação oculta, como um
cartaz no qual está escrito PROIBIDO COLAR CARTAZES), não
correlacionando de forma justa a premiação com o indicador
avaliado. Os indicadores escolhidos pela empresa em questão
não avaliam o trabalhador e sua competência. Trabalhadores
exemplares podem não atingir as metas devido a problemas
do próprio sistema. Assim, a Ergonomia Cognitiva pode estudar
a relação dos trabalhadores com esses indicadores e propor
modificações mais adequadas à realidade da tarefa.

Faça valer a pena


1. A psicologia da Gestalt foi fundada por pensadores alemães, como Max
Wertheimer, Wolfgang Kohler e Kurt Koffka e trata de como as pessoas
interpretam o mundo, afirmando que o todo é diferente da soma de suas partes.
Com relação à Gestalt e às leis da organização perceptiva, assinale a alterativa
que cita corretamente os seis princípios da Gestalt de percepção da forma:
a) Princípio do planejar, princípio do agir, princípio do checar e princípio do
corrigir (também conhecido como Ciclo PDCA).
b) Princípio da percepção, princípio da cognição, princípio da competência,
princípio da memória.
c) Princípio dos objetivos, princípio dos meios disponibilizados, princípio
dos resultados produzidos e princípio do estado interno do operador.
d) Princípio da figura-fundo; princípio da proximidade; princípio da
similaridade; princípio da continuidade; princípio da fechamento; princípio
da simetria.
e) Princípio da efetividade, princípio da produtividade, princípio da
segurança e princípio da satisfação.

2. A fragmentação do trabalho e a busca pelo controle cria situações que


geram constrangimento aos trabalhadores e podem levar ao adoecimento.

U4 - Aplicação da Ergonomia 185


A sistemática de controle criada pelas empresas leva a indicadores de
desempenho, metas e sistemas informatizados que controlam essas
variáveis, fazendo com que os trabalhadores sejam perseguidos por esses
números, que nem sempre refletem a realidade do trabalho.
Em Ergonomia Cognitiva, é essencial que sejam estudados os processos
mentais relacionados ao trabalho. Quando falamos da captação das
sensações pelos órgãos dos sentidos, estamos nos referindo à:
a) Competência.
b) Cognição.
c) Percepção.
d) Carga Mental.
e) Ergonomia Cognitiva.

3. Após passar pela percepção, os saberes atingem um nível mais profundo,


podendo ser compreendidos como uma série de conexões que envolvem
aquisição, armazenamento, retenção e uso do conhecimento. Esses
processos incluem os fundamentos da atenção, memória, percepção,
raciocínio e aprendizagem. A esse processo de associação de saberes
damos o nome de ___________________.
Com relação a processos mentais que existem na interação do homem
com seu trabalho, analise a afirmação acima e assinale a alternativa que
completa corretamente a lacuna:
a) Memorização.
b) Usabilidade.
c) Ergonomia.
d) Carga de Trabalho.
e) Cognição.

186 U4 - Aplicação da Ergonomia


Seção 4.3
Critérios e estimativas

Diálogo aberto
Vamos relembrar a situação-problema da nossa unidade: um
desenvolvedor de softwares contrata você como ergonomista para
auxiliá-lo a criar um sistema de computador para a recepção de
hóspedes em um hotel.
A Ergonomia tem um papel fundamental na preservação da saúde
dos trabalhadores e na melhora da produtividade na empresa. Com
os seus conhecimentos em Ergonomia, você já sabe que nunca é
possível conhecer o trabalho real sem conversar com os trabalhadores
e sem trazer à luz os seus saberes referentes ao fazer profissional.
Dessa forma, é importante que você se lembre por que é importante
compreender o trabalho para transformá-lo. Quais são os aspectos
cognitivos, ambientais e organizacionais a serem considerados em
uma análise ergonômica do trabalho? Por que é importante realizar a
validação dos resultados obtidos na análise ergonômica?
Essas e outras questões serão respondidas ao longo da nossa
última seção e ao finalizar nossa disciplina de Ergonomia. Com
orgulho, sabemos que você será um grande agente de transformação
envolvido no mundo do trabalho.

Não pode faltar

A Ergonomia é uma ciência transdisciplinar: sua metodologia


permeia diversas áreas do conhecimento em busca de respostas que
permitam a compreensão das diferentes situações de trabalho e suas
transformações. Por isso, é preciso que fique claro que a ação da
Ergonomia deve ser construtiva e participativa. Quanto mais pessoas
participarem e conhecerem a importância das transformações, mais
eficaz serão as propostas de melhoria e mais adequadas estarão à
realidade dos trabalhadores e da empresa.

U4 - Aplicação da Ergonomia 187


Toda situação de trabalho é complexa. Ao tentar simplificá-las,
podemos estar impondo regras, metas, indicadores e condições
inadequadas à realidade. Frases, como “foi sempre assim”, “não tem
problema ficar desse jeito”, e até mesmo “mas isso não é Ergonomia”,
podem surgir caso a ação ergonômica não seja realizada corretamente.
O processo de transformação se inicia com diálogos e reflexões
de todos os atores acerca de seu trabalho e do que é real.
É importante entender: quando estamos distantes de uma
situação, dependemos da informação que nos é passada sobre ela.

Reflita
Suponhamos que sua família more em outro estado e fique difícil visitá-
la sempre. Dessa forma, você encontra formas de acompanhar o que
acontece a distância. Redes sociais, troca de mensagens e ligações são
formas de contato via meios relacionados a telefone e internet. Vamos
pensar: isso assegura que você saberá tudo o que está acontecendo por
lá? Imagens, conclusões a respeito do que está vendo nas redes sociais
e ligações breves mostram tudo que está acontecendo do outro lado?

Temos racionalidade limitada e tiramos conclusões em cima de


padrões, regras e simplificações que nós mesmos criamos para facilitar
o processo, mas que nem sempre correspondem à realidade.

Ao se aproximar da realidade do trabalho, podemos verificar que


existem normas, regras, questões relacionadas à cultura organizacional
e valores da empresa que indicam uma forma de funcionamento que
é controlada a distância e, muitas vezes, pode deixar de enxergar
aspectos importantes que a tornariam mais saudável e competitiva.
Atualmente, a opinião do cliente tem papel central na competitividade
das empresas. O consumidor está cada vez mais crítico e formador de
opinião. Com a chegada da internet, novas formas de compra e acesso
à informação transformaram as relações de trabalho e de consumo.
Para verificar os reais problemas, com o objetivo de conseguir que o
trabalho faça cada vez mais sentido, seja saudável, eficaz e deixe os
clientes satisfeitos, é preciso abrir mão de fórmulas prontas de controle
para criar alternativas criativas que possam resolver problemas que,
muitas vezes, são ignorados por parecerem obsoletos.

188 U4 - Aplicação da Ergonomia


Aspectos físicos, de projeto e de mobiliário

Quando analisamos aspectos físicos do trabalho, é importante


termos embasamento na Biomecânica Ocupacional e na
Antropometria, para assegurar melhor adequação desses aspectos
físicos às características psicofisiológicas dos trabalhadores.
Embora cada situação de trabalho seja única, existem alguns
pontos baseados nessas ciências que nos fornecem diretrizes
para adequar postos de trabalho, posicionamento de materiais e
ferramentas para assegurar uma melhor postura, evitar movimentos
que gerem sobrecarga repetitiva, compressões mecânicas e uso de
força excessiva.
No levantamento e transporte de cargas, a aplicação da equação
NIOSH (citada no Manual de Aplicação da Norma Regulamentadora
nº 17) pode auxiliar na realização da análise, já que ela mapeia fatores
que podem influenciar nos riscos de problemas na coluna, como
altura da carga, peso da carga, altura para onde essa carga será
deslocada, fator de assimetria, distância dos calcanhares ao centro da
carga, frequência de levantamento (por minuto e durante a jornada)
e qualidade da pega. Quanto mais próxima a carga estiver do chão,
maior probabilidade de necessitar de frequentes flexões de coluna
para alcançá-la.
Um treinamento de levantamento e transporte de cargas pode
auxiliar os trabalhadores a terem consciência corporal das melhores
formas de levantamento, mas temos que lembrar que não adianta
treinar os trabalhadores para situações que estão inadequadas e
devem ser transformadas, senão fica mais uma vez nas mãos do
trabalhador se adaptar a uma condição de trabalho ruim, e não o
oposto, como preza a Ergonomia.
Sempre que possível, o mobiliário de trabalho deve possuir
regulagens que permitam que as características antropométricas dos
trabalhadores (tais como sua altura, comprimento dos braços e das
pernas) sejam consideradas e permitam maior conforto e adaptação
ao posto de trabalho. Além disso, deve permitir alternâncias de
posturas, pois não existe nenhuma postura confortável quando
mantida por longos períodos de maneira fixa.

U4 - Aplicação da Ergonomia 189


O trabalho estático exige maior demanda muscular que o trabalho
dinâmico. É importante priorizar aspectos que protejam as articulações
e conservem a energia, priorizando rodízios de atividades ou maior
número de movimentos para permitir maior alternância muscular.
O estudo dos movimentos é de extrema importância, pois na
literatura constam alguns movimentos que, ao serem realizados com
uso de força ou com grande frequência, podem ser fator de risco para
doenças osteomusculares, por exemplo: flexões de pescoço acima
de 20° e mantidas por muito tempo; elevação do ombro acima de
90° com risco aos músculos do chamado manguito rotador; manter
braços elevados e sem apoio de antebraços; desvios em punho; uso
de força e movimentos repetitivos em mãos; uso da pega em pinça
na região dos dedos para uso de força, ao invés do uso para precisão;
permanecer sentado sem utilizar adequadamente as regulagens
do posto de trabalho; postos de trabalho sem espaço adequado
para membros inferiores; flexão associada à rotação de coluna;
carregamento de peso excessivo; ritmos de trabalho que impedem a
recuperação muscular por causa da repetitividade; entre outros.
É difícil conceber mobiliários e situações de trabalho que atendam
a todos os trabalhadores, inclusive os extremos. Atualmente, existem
diversas normas da Associação Brasileira de Normas Técnicas que
podem auxiliar nos projetos relacionados à parte física e de mobiliário
da empresa. Normas, como a ABNT NBR 13962, que trata de móveis
para escritório (especificamente cadeiras), e a NBR 9050, que trata
de aspectos de acessibilidade, são exemplos de documentos
norteadores que possuem medidas, parâmetros e metodologias de
adaptação das condições físicas do ambiente de trabalho. Normas
Regulamentadoras do Ministério do Trabalho e Emprego, como a nº
17 (Ergonomia), nº 12 (Máquinas e Equipamentos) e nº 24 (Condições
Sanitárias e de Conforto), são exemplos de normas norteadoras que
também podem auxiliar nos parâmetros para adequação de aspectos
físicos do trabalho.
É importante sempre considerar a natureza do trabalho para
dimensionar a bancada (para trabalhos de maior precisão, ela deve
estar mais alta, e para trabalhos de força, deve estar mais próxima da
cintura para facilitar o uso do tronco e do melhor grau de contração
da musculatura dos braços). Além disso, os materiais, as ferramentas e
os equipamentos devem estar dispostos dentro das zonas de alcance

190 U4 - Aplicação da Ergonomia


adequadas (proximal, distal e ocasional), já vistas na Unidade 2 de
nosso estudo.
O arranjo físico deve seguir uma lógica que facilite o deslocamento
de materiais e elimine deslocamentos desnecessários. A comunicação
entre os trabalhadores deve ser facilitada e a sequência dos processos
deve ser entendida por todos.
Sempre que o trabalho puder ser executado na posição sentada, o
posto de trabalho deve ser planejado ou adaptado para essa posição,
porém não devemos esquecer que a postura mais adequada para o
trabalhador é aquela que ele escolhe livremente e que pode variar. Os
esforços estáticos devem ser evitados ao máximo.
De acordo com a Nota Técnica nº 60/2001 do Ministério do
Trabalho e Emprego, a postura em pé só é justificada quando a tarefa
exige: deslocamentos contínuos; manipulação de cargas com peso
igual ou superior a 4,5 kg; alcances amplos frequentes; operações
frequentes em vários locais de trabalho; aplicação de forças para baixo.
Com relação a exigências visuais, a posição das fontes de
informações visuais vai determinar o posicionamento da cabeça e
do tronco. Se o plano de trabalho é muito alto, o trabalhador deverá
elevar os ombros e os braços durante a tarefa. Se for muito baixo, ele
trabalhará com as costas inclinadas para frente.
Levar em conta a opinião dos trabalhadores antes da compra de
um determinado mobiliário tem mostrado um bom resultado, em
que as empresas colocam opções para teste e decidem por aqueles
que tiveram melhor aceitação.
É importante ter um especial cuidado para frases relacionadas a
design que indicam um produto “ergonômico”. Uma cadeira pode ser
confortável para assistir televisão, mas inconveniente a uma secretária
que deve ter acesso alternadamente ao arquivo, ao microcomputador e
ao telefone para realizar sua tarefa. Não existe um produto ergonômico
que atenda a todas as situações de forma igual. É preciso um estudo da
realidade do trabalho para verificar suas características.
O ergonomista deve fazer um controle junto ao departamento
médico da empresa (quando existente) ou à assessoria especializada
em Saúde e Segurança do Trabalho para fazer um controle de
afastamentos e, principalmente, de queixas. O controle de queixas é
eficaz por ainda estar na esfera preventiva: a pessoa ainda está lá, não
se afastou e é possível identificar os fatores de risco daquela tarefa.

U4 - Aplicação da Ergonomia 191


Com o surgimento do Nexo Técnico Epidemiológico (NTEP),
automaticamente, o CID (número que indica a doença de acordo com
o Código Internacional de Doenças) e o CNAE (número que indica o
ramo de atividade da empresa de acordo com a Classificação Nacional
de Atividade Econômica) são cruzados quando há o afastamento de
um trabalhador. Caso o sistema acuse que é possível que aquela
atividade econômica gere aquela doença, automaticamente, é
acusada uma doença ou um acidente do trabalho, responsabilizando
a empresa por esse caso. Cabe à empresa provar (ou não) se é
realmente responsável por aquela doença. Dessa forma, é importante
um mapeamento das condições de trabalho para se eliminar fatores
que possam gerar nexo causal entre as tarefas e possíveis doenças
que os trabalhadores possam adquirir.

Aspectos cognitivos, ambientais e organizacionais

Como falamos anteriormente, quando estamos afastados de uma


situação, criamos formas de acompanhá-la a distância. Nas empresas,
isso ocorre através de metas, indicadores e números.
Uma situação de trabalho acaba sendo resumida a números que
são vistos a distância e interpretados dentro das limitações que as
pessoas que os recebem conseguem entender.
Frederick Wislow Taylor, por meio da Administração Científica do
Trabalho, criou uma forma de impor uma divisão racional das tarefas
que, em seguida, foram cronometradas pelo casal Gilbreth.
Claro que é importante o controle de toda a operação e formas de
sistematizar o trabalho para garantir uma racionalidade que garanta a
qualidade, os custos adequados e as melhores formas de trabalho. O
que apontamos é que a repetição de velhas fórmulas e métodos de
trabalho, inadaptados à realidade atual, apenas enfatiza a insistência
em erros, tais como dar ao trabalhador tratamento secundário
diante do trabalho. Pode existir um controle, mas desde que ele seja
adequado à realidade.

192 U4 - Aplicação da Ergonomia


Exemplificando
Como vimos anteriormente, criar um sistema que monitore se um
trabalhador de teleatendimento está fazendo pausas na hora certa, a distância,
mostrará quais trabalhadores são pontuais e assíduos e quais não respeitam
as escalas e regras da instituição. Porém, é preciso cuidado, pois isso pode
condicionar trabalhadores a não realizarem pausas fisiológicas que estão
previstas na legislação, por medo de penalizações. Além disso, é importante
verificar se as condições de trabalho permitem a saída no momento certo e
se as condições físicas do local permitem que esse período seja suficiente.
Por exemplo, se um sistema verifica que um atendente deve entrar em
pausa às 9h30 da manhã e às 9h28 ele precisa atender a ligação de um
cliente, ele não está burlando uma regra ou infringindo a pausa. É preciso
saber até onde vai a racionalidade do sistema e até onde ela pode afetar a
saúde, a segurança, o conforto e o desempenho eficiente do trabalhador.
Nesse caso, ou ele faz a pausa, ou atende o cliente, ambos indicadores de
qualidade da empresa, que acabam entrando em conflito e, assim, causam
perda da eficácia do sistema.

Outro fator de atenção é o tempo. Impor tempos e métodos sem


considerar os limites dos trabalhadores pode gerar sérios riscos à saúde.
Precisamos saber se o trabalho está adaptado ao trabalhador, se ele
possui todas as qualidades requeridas pela tarefa que deve realizar ou,
ainda, se ela será realizada a contento, com a devida segurança.
O estudo de movimentos e tempos procura analisar a decomposição
da operação em elementos que possibilitam eliminar movimentos
vistos como inúteis, proporcionando economia de tempo e esforço
do trabalhador, melhorando, assim, a eficiência do trabalho.
A cronoanálise trata da obtenção de um tempo-padrão de
divisão de tarefas, através da medição da tarefa, organização de seus
elementos e análise da média aritmética das medições realizadas para
se obter o melhor tempo. Para isso, é vista a imagem de um “operário-
padrão” que faça as tarefas em “condições normais” para que possa
ser padronizado o ritmo de trabalho.
As situações de trabalho não são iguais e os trabalhadores também
não. Dar um certo grau de autonomia e possibilidade de autogestão
pode impressionar com seus resultados. O ritmo livre é mais tolerado
pelo trabalhador, pois permite contornar os incidentes sem diminuir
a produção.

U4 - Aplicação da Ergonomia 193


Exemplificando
O documentário Carne Osso, visto anteriormente (disponível em:
<https://www.youtube.com/watch?v=imKw_sbfaf0>. Acesso em: 30
jul. 2017), trata da realidade dos frigoríficos no Brasil. As questões da
alta divisão de tarefas, da monotonia e da alienação do trabalho ficam
evidentes. Tratar o ser humano como uma máquina que apenas executa
movimentos e deve ser controlada a todo momento pode induzir a
doenças e, ao invés de criar controles eficazes, traz uma racionalidade já
ultrapassada de desempenho eficiente no trabalho.

A ideia de economia de movimentos e energia parte da premissa


de que o homem funciona como uma máquina e é dotado apenas de
movimentos. Considerar aspectos cognitivos, a importância da pausa
(não apenas para a parte muscular, mas para descompressão da carga
mental), são fatores fundamentais para a valorização dos trabalhadores
e o fortalecimento do aspecto humano da empresa.
É de estranhar que apenas os tempos, os movimentos e as metas
sejam sistematizados e estudados com grande cuidado, enquanto a
forma de realização do trabalho propriamente dito, tal como melhor
postura, conforto, melhor forma de tomada de decisão, autonomia,
facilidade para execução de tarefas, bem como estabelecimento de
limites, deixe de ser objeto de atenção mais aprofundada.
Para se administrar um trabalho na atualidade, não podemos olhá-lo
com a ótica dos tempos passados. Precisamos de novos paradigmas.
A Ergonomia não prega a ausência de controle ou de regras, ela
apenas busca uma organização eficiente sem que seja imposta de
forma violenta e arbitrária, inutilizando a cooperação dos trabalhadores
(afinal, organizar é colocar em ordem num conjunto de recursos, e os
trabalhadores fazem parte disso).
Quando falamos de problemas de cooperação e hierarquia,
percebemos que a divisão do trabalho define quem faz o quê, como e
em quanto tempo, havendo o problema de quem concebe o trabalho
não é a mesma pessoa que o executa.
Atualmente, os clientes estão melhor informados e mais exigentes,
com demandas, personalidades e expectativas diferentes. Por essa nova
lógica de relações de mercado, mídias sociais, avanços da tecnologia e

194 U4 - Aplicação da Ergonomia


das formas de conhecimento e comunicação, apenas um trabalhador
bem treinado, que tenha autonomia e competência pode dar um
atendimento de excelência. Se a excelência é uma preocupação da
empresa, ela precisa entender que não adianta o trabalhador saber
todos os aspectos do trabalho se não pode decidir, se o sistema não
funciona, ou se não tem acesso a todas as informações.
As tarefas são projetadas de maneira fragmentada e sem considerar
que os trabalhadores preferem iniciar e finalizar a fabricação de um
produto, entender, melhorar processos, e não apenas executar gestos
como se fossem máquinas.
As metas estabelecidas, os controles e os prêmios por produtividade
foram um recurso eficiente para controlar o trabalho e impulsionar
o capitalismo a curto prazo, mas trouxeram efeitos danosos com o
passar do tempo.
Estamos diferentes. As novas tecnologias reformulam a forma de
pensar e de se comunicar da nossa sociedade, o que, obviamente,
impacta na maneira das pessoas enxergarem seu trabalho. O taylorismo
pressupõe que todos os homens são iguais e que não há variabilidade
no sistema. Sabemos que estabilidade, no mundo real, é uma utopia.
As cronoánalises são realizadas durante um tempo muito curto,
em ótimas condições, com trabalhadores com grande experiência. Aí,
impõem-se um ritmo para os demais em outras condições, com picos
de produção, afastamentos, instabilidades. O alto ritmo induz altas
demandas e metas de produção, que farão as pessoas ultrapassarem
seus limites para alcançá-las, podendo levar ao adoecimento.
Uma mesma cadência pode não ser tolerada igualmente durante
toda a jornada de trabalho. Lembrando o que apontamos sobre o NTEP,
o estabelecimento de ritmos e metas pode levar ao adoecimento e a
empresa pode responder legalmente por isso.
O ser humano pensa! Considerar a direção do olhar; o que ele
precisa decidir; com quais sistemas, pessoas, ferramentas e variáveis
ele tem que interagir; com quem se comunica; de quem depende;
quais as repercussões de um erro; o que o motiva; quais suas metas e
como está sendo avaliado; com quem pode contar em um momento
de dificuldade; quanto sentido faz a forma como seu trabalho é
organizado; qual a relação com a chefia? Esses aspectos são de
fundamental importância para se realizar uma Análise Ergonômica do
Trabalho eficaz.

U4 - Aplicação da Ergonomia 195


Quando analisamos as normas de produção, podemos identificar
que até mesmo nas que estão escritas há diversas incongruências:
“atenda bem o cliente, mas seja rápido”; “resolva o problema do cliente,
mas você não pode decidir isso sozinho”.
Como atender uma regra sem infringir a outra? Como prestar um
serviço de qualidade com tantos controles e sem autonomia? Como
atender bem se não tenho tempo?
O trabalho precisa de normas, mas elas precisam ser coerentes. Os
trabalhadores preferem lidar com problemas e resolvê-los, gostam de
transpor obstáculos e de obterem reconhecimento por isso.
Os atuais sistemas de gestão apenas fixam metas de produção e
deixam os trabalhadores se desdobrarem para atingi-las, sem notar
de longe que os serviços são garantidos graças às habilidades dos
trabalhadores de contornar tudo para atingir os resultados (mesmo que
custe a sua saúde e mesmo que o sistema pudesse ajudar no processo).
O trabalhador não pode ser encarado como alguém que sempre
fará pouco e sempre quebrará as regras quando tiver autonomia.

A intervenção ergonômica

Hoje, mais do que nunca, necessitamos de um pensamento que


nos ajude a reunir informações nas ciências e tecnologia, visando,
principalmente, à segurança e qualidade de vida do trabalhador.
A ideia de controle precisa ser revista com cuidado. Deve existir uma
forma de trabalho e uma disciplina em sua realização, mas é preciso
pensar até que ponto indicadores de desempenho, formas de punição
e de controle realmente garantem as melhores formas de trabalho.
Dar maior autonomia ao trabalhador; verificar se há uma boa
interação com os sistemas informatizados envolvidos em seu trabalho;
ter treinamentos adequados a sua realidade de trabalho e pessoas que
possam dar suporte em situações de maior complexidade para que ele
não esteja sozinho; criar espaços para discussão integrando diversas
hierarquias; criar pesquisas de satisfação que permitam total anonimato
e possam ser discursivas (o que dificulta a coleta e o tratamento de
dados, mas traz informações mais ricas que podem ser limitadas quando
delimitamos as possibilidades de resposta); ter tratamento diferenciado
no retorno de trabalhadores afastados; criar situações que encorajem

196 U4 - Aplicação da Ergonomia


a cooperação entre pares, e não a competição (é importante que a
empresa compita com concorrentes e não consigo mesma).
Esses são alguns exemplos de ações que podem ser propostas
após uma Análise Ergonômica do Trabalho. O relatório final da análise
não necessariamente deve ficar restrito aos tópicos mencionados na
Norma Regulamentadora nº 17 e nos 12 passos especificados em
seu manual. Eles servem de orientação que deve permear toda a
análise. Dependendo da situação, prioriza-se alguns em particular (por
exemplo: problemas de mobiliário, iluminamento, de sistema ou de
aspectos mentais).
Atualmente, há uma grande demanda pela padronização dos
procedimentos e a premissa básica é que só assim se atingirá a
qualidade prevista. Os Sistemas de Gestão Integrados são um exemplo.
Deve haver um padrão de qualidade, mas não um padrão de processos
que crie “engessamento” da produção.
Limites fixados pela empresa podem superar a capacidade de um
ou vários trabalhadores colocando em risco sua saúde. É papel do
ergonomista realizar uma intervenção que traga à luz os aspectos reais
do trabalho e proporcione uma maior valorização dos trabalhadores,
uma exposição da realidade do seu trabalho e uma nova lógica que
promova uma reflexão da empresa e mudança de seus processos que
possam atender a demanda inicial.
A intervenção ergonômica é um processo coletivo. As respostas
aos problemas devem ser discutidas entre todos, considerando
as características da empresa, a demanda inicial e as prioridades,
para assim se estabelecer um cronograma de ações. A intervenção
ergonômica não se encerra na entrega do relatório. Deve haver um
acompanhamento das modificações e constante capacitação dos
profissionais que cuidam da Ergonomia na empresa (e podem formar
o Comitê de Ergonomia).
A Análise Ergonômica do Trabalho precisa ser vista com cuidado por
todos os envolvidos. Utilizar checklists isolados e formas de padronizar a
análise são maneiras de reduzir a realidade do trabalho e de se produzir
relatórios superficiais que não resolvem o problema.

U4 - Aplicação da Ergonomia 197


Pesquise mais
Uma leitura interessante é a do livro Como mentir com estatística (2016),
de Darrel Huff. O livro trata do mau uso da estatística para maquiar
dados e abalizar opiniões. O autor aponta como dados podem ser
mal interpretados por amostras enviesadas, gráficos dúbios, listagens
incompletas e indicadores que são controversos.

Validação e transformação do trabalho

Geralmente, cada um vê uma parte do processo dentro da empresa:


a sua parte. Tudo que vemos a respeito do outro é uma interpretação
nossa, influenciada por quem somos, nossa formação, nosso dia a dia.
É por isso que é de extrema importância a validação dos resultados
com todos os agentes envolvidos.
Quem contratou o ergonomista não estará surpreso, pois a esse
ponto já foram feitas a reconstrução da demanda, diversas reuniões de
reflexão e entregas parciais.
Os trabalhadores precisam ter acesso ao que foi compilado e
interpretado com suas verbalizações: isso pode ser feito em grupos
focais, onde são lidos os trechos de interesse que são confirmados ou
refutados pelos trabalhadores.
A participação dos trabalhadores durante a intervenção é de extrema
importância, pois aajuda a detectar falhas ou enganos na interpretação
das observações e verbalizações durante o método. O ergonomista
acumula conhecimento a cada análise ergonômica e, mesmo que
cada situação seja única, experiências anteriores contribuem com o
trabalho do ergonomista como situações de referência.
Os ergonomistas identificam os atores do processo de
transformação durante a análise ergonômica, abordando múltiplos
fatores envolvidos na situação de trabalho. Assim, ele analisa seus
papéis e os procedimentos para propor transformações.
É importante destacar que o diagnóstico final pode trazer
contradições entre diferentes lógicas presentes na empresa. É papel
do ergonomista alinhar as visões e interpretações de todos os atores
envolvidos em busca de um denominador comum.

198 U4 - Aplicação da Ergonomia


Assimile
De acordo com Castro e colaboradores (2006), a especificidade da
entrevista em autoconfrontação está em convocar o sujeito trabalhador
a se expressar não sobre as profundezas de sua alma e sentimentos, mas
sobre a complexidade do seu comportamento atual. Dessa forma, não
existe nenhum julgamento de valor sobre a ordem de importância dessas
instâncias, apenas um reconhecimento de diferença. O entendimento da
ação em situação de trabalho permite ao indivíduo revelar a trama complexa
de seu comportamento diante das exigências do trabalho, resultante
de diversas lógicas em jogo (às vezes, em conflito): do trabalhador, do
coordenador, da chefia, do usuário, do sistema, da organização.

Tudo está em constante mudança. Novas tecnologias surgirão.


Tudo estará cada vez mais rápido, conectado, diferente. É importante,
caro aluno, que você não pare nunca. Busque, pesquise, conheça.
Sempre se aproxime do novo e conheça os mais diferentes tipos de
fazeres e saberes.
Ao se aproximar da realidade do trabalho, podemos verificar que
existem normas, regras, questões relacionadas à cultura organizacional
e valores da empresa que indicam uma forma de funcionamento
que é controlada a distância e, muitas vezes, pode deixar de enxergar
aspectos importantes que a deixariam mais saudável e competitiva.
Não existe mobiliário perfeito. Não existem fórmulas prontas. Cada
situação deve ser analisada e suas melhorias acordadas em conjunto.

Como diria Albert Einstein: “A mente que se abre a uma nova ideia
jamais voltará ao seu tamanho original”. Não se acostume em como
as coisas são impostas. Busque o melhor. Transforme. Analise. Crie
formas de mostrar seu ponto de vista. O trabalho tem papel central nas
nossas vidas, então por que ele não pode ser realizado de uma maneira
mais saudável e feliz?
Contamos com você para ser esse agente de transformação! Que
sua vida seja repleta de sucesso!
Todas essas conexões deixarão o seu olhar cada vez mais atento
e rico em detalhes para poder transformar o mundo do trabalho com
suas análises e propostas de melhoria. Seja aquele que enxerga o real,

U4 - Aplicação da Ergonomia 199


vê além de números e valoriza os saberes e a vida dos trabalhadores.
Foi um prazer estar com você ao longo dessas 60 horas de estudo! “Ser
grande é abraçar uma grande causa” (William Shakespeare).

Sem medo de errar

No estudo de caso, em que um desenvolvedor de softwares


contrata você como ergonomista para auxiliá-lo a criar um sistema de
computador para a recepção de hóspedes em um hotel, percebemos
que a Ergonomia tem um papel fundamental na preservação da saúde
dos trabalhadores e na melhora da produtividade na empresa.
Com os seus conhecimentos em Ergonomia, você já sabe que nunca
é possível conhecer o trabalho real sem conversar com os trabalhadores
e sem trazer à luz seus saberes referentes ao fazer profissional.
Dessa forma, é importante lembrar que o papel da Ergonomia
é compreender o trabalho para transformá-lo: é aproximar quem
concebe o trabalho da realidade de quem o executa, mediando as
lógicas dos diferentes atores envolvidos e propondo melhorias que
realmente tragam maior conforto, segurança e desempenho eficiente.
Uma Análise Ergonômica do Trabalho deve identificar aspectos da
organização do trabalho (como metas, indicadores, tempos e regras),
cognitivos (raciocínio, cognição, percepção, aprendizado, memória,
interação com sistemas e máquinas) e ambientais (ruído, iluminamento
e conforto térmico) de acordo com a demanda do estudo. É importante
realizar a validação dos resultados obtidos na análise ergonômica
porque, geralmente, cada um vê uma parte do processo dentro da
empresa: a sua parte. Tudo que vemos a respeito do outro é uma
interpretação nossa, influenciada por quem somos, nossa formação,
nosso dia a dia. É por isso que é de extrema importância a validação
dos resultados com todos os agentes envolvidos. Os trabalhadores
precisam ter acesso ao que foi compilado e interpretado com suas
verbalizações: isso pode ser feito em grupos focais, nos quais são
lidos os trechos de interesse que são confirmados ou refutados pelos
trabalhadores. A participação dos trabalhadores nos apontamentos
feitos durante a intervenção é de extrema importância, pois evidencia
falhas na metodologia ou pontos específicos, uma vez que cada análise
é sempre uma nova descoberta.

200 U4 - Aplicação da Ergonomia


Avançando na prática

A cronoanálise perfeita
Descrição da situação-problema
Em uma grande fábrica de cosméticos, chegou uma nova
linha de produção. Importada do Japão, a linha era quase
totalmente automatizada, tendo como processos manuais apenas
o abastecimento de frascos de vidro, fechamento das tampas e
guarda nas caixas. Para o primeiro teste da linha, são chamados os
trabalhadores mais experientes da fábrica, sendo feitos os testes de
intervalos de tempo que cada tarefa estava consumindo. Assim, foi
feita a cronoanálise (cronometragem de cada tarefa e seu tempo,
encontrando uma média de tempos para estabelecer um padrão
de acordo com a produção). Após dois meses de funcionamento,
quatro trabalhadores se afastaram com problemas nas costas e
na região do ombro. Quando questionados pelo médico, eles
disseram que não conseguiam se adaptar à linha de produção
(que possuía pontos nos quais pessoas de estatura de mediana ou
alta não conseguiam se posicionar de forma confortável) e que,
muitas vezes, os ritmos de produção acabavam gerando muitos
movimentos repetitivos e sem pausas para descanso.
O que poderia ter sido feito para evitar esses problemas?

Resolução da situação-problema
Toda nova situação de trabalho demanda uma Análise
Ergonômica do Trabalho inicialmente. Antes da compra da linha
de produção, seria interessante a análise do projeto, para realizar
alterações ainda em sua concepção. Por vir do Japão, onde a
população possui características antropométricas diferentes da
do Brasil, é possível que haja pontos na linha de produção que
precisem ser redimensionados com base na população atual. Além
disso, o teste para a cronoanálise utilizando apenas trabalhadores
experientes pode se afastar da realidade, na qual há uma variabilidade
inter e intraindividual dos trabalhadores que pode interferir nesses
tempos. É interessante pensar alternativas em que os trabalhadores
possuem uma meta de produção, mas têm autonomia sobre os
tempos e as formas de parada para descompressão.

U4 - Aplicação da Ergonomia 201


Faça valer a pena
1. A Ergonomia visa adequar o trabalho às características psicofisiológicas
do ser humano, que dizem respeito a todo o conhecimento referente
a como o corpo e a mente das pessoas funcionam. Para isso, essa
ciência utiliza conhecimentos antropológicos, psicológicos, fisiológicos,
anatômicos e de diversas outras ciências para entender quais as melhores
condições para que o homem interaja em seu trabalho com outras pessoas,
com o sistema, com as máquinas e ferramentas.
Com base nos seus conhecimentos referentes ao trinômio da Ergonomia
(conforto, segurança e desempenho eficiente) e à Biomecânica
Ocupacional, é correto afirmar:
a) Sempre que um trabalho puder ser executado em pé, ele deve ser
projetado para essa posição.
b) Devemos incentivar que os trabalhadores permaneçam com os ombros
elevados acima de 90° sempre que forem transportar alguma carga.
c) Devemos estabelecer que seja de 60 kg a carga máxima a ser carregada
individualmente por um trabalhador (exceto jovens e mulheres).
d) Devemos realizar a Análise Ergonômica do Trabalho sempre que houver uma
demanda, de forma a estudar as especificidades de cada situação de trabalho.
e) É possível padronizar um mobiliário de forma a atender todas as necessidades
de todas as pessoas: são os chamados mobiliários ergonômicos.

2. Um órgão do governo americano responsável pela Saúde e Segurança


Ocupacional desenvolveu uma equação que permite calcular qual seria
o limite de peso recomendável levando-se em conta diversos fatores,
traduzidos pela Nota Técnica nº 477, elaborada pelo Centro Nacional
de Condiciones de Trabajo da Espanha, que trata dessa equação.
O nome do órgão responsável, que também dá nome a equação, é
_____________________.
Analise a afirmação acima a respeito da equação de levantamento e transporte
de cargas e assinale a alternativa que completa corretamente a frase:
a) National Institute for Occupational Safety Health – NIOSH.
b) Occupational Safety and Health Administration – OSHA.
c) Occupational Health and Safety Assessments Series – OHSAS.
d) International Organization for Standardization – ISO.
e) Occupational Repetitive Actions – OCRA.

3. A postura em pé provoca maior desgaste energético e fadiga, e deve


ser evitada sempre que possível. Quando for preciso realizar um trabalho

202 U4 - Aplicação da Ergonomia


em pé, devem ser posicionados assentos para descanso. De acordo com a
Nota Técnica nº 60/2001, do Ministério do Trabalho e Emprego, a postura
em pé só é justificada quando a tarefa exige alguns fatores.
Analise as alternativas a seguir e assinale corretamente a que descreve um
dos fatores que justificam o trabalho com a postura em pé:
a) Necessidade de digitação e entrada eletrônica de dados.
b) Necessidade de montagem de eletrônicos.
c) Manipulação de cargas com peso igual ou superior a 4,5 kg.
d) Atividades com pouca ou nenhuma necessidade de deslocamento.
e) Todas as atividades que precisam ser realizadas no mesmo local.

U4 - Aplicação da Ergonomia 203


204 U4 - Aplicação da Ergonomia
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