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Nota do Autor. — Havia muito tempo que eu pensava isto mesmo em relação aos
volumes de poesías.
PRIMEIRA PARTE
A MEU IRMÃO
(JOSÉ JOAQUIM GOMES COELHO)
Dezembro de 1859.
Nota do Autor. — Duvidar da verdade desta poesia, era duvidar dos meus senti-
mentos mais puros, dos meus mais queridos afectos e nesse caso, não sei de palavras
que me pudessem justificar.
A MORTE DO POETA
Março de 1860.
1857.
Março de 1882.
Quem te disse o segredo destas lágrimas,
Pra assim me consolares?
Quem te disse que a dor que me angustiava
Cedia aos teus olhares?
3 de Junho de 1862.
SAUDADE E ESPERANÇA
Morena, morena
Dos olhos castanhos,
Quem te deu morena,
Encantos tamanhos?
Encantos tamanhos
Não vi nunca assim.
Morena, morena
Tem pena de mim.
Morena, morena
Dos olhos rasgados,
Teus olhos, morena,
São os meus pecados.
Morena, morena
Dos olhos galantes,
Teus olhos morena
São dois diamantes.
POESIAS
Morena, morena
Dos olhos morenos,
O olhar desses olhos
Concede-me ao menos.
Concede-me ao menos
Não sejas assim.
Morena, morena
Tem pena de mim.
Tu sentada ao pé da fonte
O horizonte contemplavas
Vias o Sol declinando
E, corando, suspiravas.
Nota do Autor. — Não é muito fácil esta espécie de leitura, o sentido das letras
é diferente, conforme os desejos do que as pretende decifrar e daí mil decepções e amar
gos desenganos.
Eu não sei se li bem ou mal; mas é certo que depois disso, o livro parece fechado...
nao descubro caracteres novos.
CULTO SECRETO
Julho de 1859.
Nota do Autor. —Em vez de —enfim — antes lhe devera chamar — rebate falso.
A ser mais de que um sonho, não passou de um desejo. Não se deve portanto tirar
ilações arrojadas porque seriam falsas.
METAMORFOSE
Tu olhaste — e do letargo
Mago influxo me desperta;
Surjo ao amor, surjo à vida,
À luz de uma aurora incerta.
1 de Maio de 1860.
Onde vai teu pensamento
Quando, os olhos elevando,
Segues das aves ligeiras
Esse harmonioso bando?
18 de Outubro de 1862.
A CABREIRA
De As Pupilas do Sr Reitor.
NUVENS
4 de Setembro de 1862.
LAVA OCULTA
Abril de 1860.
Nota do Autor. — Esta poesia é um enigma, que eu não decifrarei. Isto quase eqüi-
vale a dizei que ficará sendo um enigma para todos e para sempre talvez.
Foi escrita o ano passado e esquecida. Encontrei-a, fiz-lhe algumas modificações
• inclui-a nesta colecção. É em grande parte imaginária.
PRESSÁGIO
Contigo, eu só no bosque
Ouvia-te, tao triste,
Soltar, mais triste, a voz;
Falavas magoada
Da paz que só existe
Da fria morte após.
E os olhos lacrimosos
Fitavas nos espaços
Da mais amena cor,
Como se desejasses
Romper terrenos laços
E o azul do céu transpor.
Calado eu te fitava,
Porém ao ver-te o pranto
Banhar-te a face assim,
Não sei que dor pungente,
Não sei que mago encanto,
Me fez falar-te enfim.
POESIAS
Olhaste-me e sorriste;
E quanto não diziam
Então os olhos teus!
Quão íntima tristeza,
Que dor não reflectiam
Quando os erguestes aos céus!
E eu ficava mudo,
Olhando-te inquieto,
Sem bem te compreender;
E um ramo de cipreste,
O arbusto teu dilecto,
Vieste-me oferecer.
De novo emudeceste,
E eu, triste, contemplei-te:
Mas não, não te entendi,
Parecia que na mágoa
Achavas um deleite,
Qual nunca igual senti!
POESIAS
Abril de 1860.
Agosto de 1859.
ILUDAMO-NOS
Desenganos do passado,
Não servireis ao porvir?
Sempre a perder ilusões
Sempre ilusões a sentir!
« Só a materna saudade
Nossa carreira detém,
Embora no Céu, quem há-de
Esquecer o amor de mãe?»
20 de Outubro de 1861.
•
VOZ DE SIMPATIA
35 de Abri] de 1860.
Nota do Autor. — Se chegar aos olhos da pessoa a quem é dirigida, ela com-
preenderá.
O DESTINO DA LIRA
12 de Agosto de 1860.
...
* * *
As aves perpassando
Agitam a ramagem,
E a perfumada aragem
Nos bosques se introduz;
Aí mil vozes falam
Ao céu sereno e mudo;
No bosque é sombra tudo,
No céu é tudo luz.
Ridente madrugada,
Hora em que do oriente
Com o gládio refulgente
O arcanjo da luz vem;
E as trevas se dissipam,
Com as trevas a tristeza,
Que em toda a natureza
A noite eivado tem.
POESIAS
1 de Julho de 1862.
NOVA VÉNUS
28 de Fevereiro de 1863.
* * * • •
Nota do Autor. — Desde já afirmo que não fui eu o protagonista da história. Ainda
não tive uma indigestão deste gênero de fruta, e nem sei, para falar francamente, se mesmo
quando a tivesse, a ficaria abominando para sempre. O caso, enquanto a mim, não foi de
natureza que justificasse semelhante aversão; mas enfim há susceptibilidades tais... Não
afirmamos, contudo, que a dieta tenha sido escrupulosamente observada.
Nesta espécie de fruta, parece-me que, ao contrário do que se diz para as outras,
é a qualidade e não a quantidade que faz o mal.
SEGUNDA PARTE
A J. , ,
Nota do Autor. — Esta poesia foi enviada ao redactor da Grínalda, João Marques
Nogueira Lima, assinada com o pseudônimo Júlio Dinis, em 9 de Março de 1861 e publicada
no 3.° número daquele jornal. No dia 18 de Março, à noite, o Passos elogiou-a, sem saber
quem ara o autor.
A NOIVA
(NO ÁLBUM DA EX.maSR.a D. ISABEL M. FIGUEIREDO
DE CARVALHO)
É o amor o sentimento
Que me faz arfar o seio?
Este gozo por que anseio
E a que aspira o coração?
É pois amor este fogo,
Esta vaga inquietação?
1859.
Nota do Autor. — Não sou por certo eu o melhor juiz da verdade desta poesia,
crevi-a de palpite. Julgue-a quem pode.
QUINZE ANOS
(NO ÁLBUM DO MEU AMIGO J. M. NOGUEIRA LIMA)
1862.
O BOM REITOR
As criancinhas nuas
Que estremeceu,
Já nem sequer se lembram
Do nome seu.
No salgueiral vizinho,
Ao pôr do Sol,
Vai carpir-lhe saudades
O rouxinol.
Da solitária Lua
A triste luz
Grava-lhe em vagas sombras,
Estranha cruz.
Julho de 1864.
1885.
A JOVEM MAE
1862.
A VIDA
Trigueira! se tu soubesses
O que é ser assim trigueira!
Dessa ardilosa maneira
Porque tu o sabes ser;
Não virias lamentar-te,
Toda sentida e chorosa,
Tendo inveja à cor da rosa,
Sem motivos para a ter.
Abril de 1864.
Il
— «Ó Maria gloriosa!
Serva pura e mãe de Deus:
Virgem, dos Céus Soberana,
Escuta os lamentos meus i
III
Abril de 1864.
METEORO
Setembro de 1860.
Escrita em um álbum.
A DESPEDIDA DA AMA
Março de 1865.
NO ALTAR DA PÁTRIA
il
No campo já se escuta
Das alas o marchar.
Que agigantada luta
Além se vai travar?
O sangue rutilante
Inunda e tinge o chão;
Aos ais do agonizante
Responde a imprecação.
POESIAS
Em pé, os combatentes,
Perdidos os corcéis,
Cingem-se quais serpentes
Em pérfidos anéis.
III
As hostes vitoriosas
Porque tão tristes vêm?
Ai, que ânsias dolorosas
Sentia a pobre mãe!
IV
À ensangüentada arena
Os passos seus conduz;
Raiou sobre esta cena
Da Lua a tarda luz.
Súbito em desvario
Solta um sentido ai,
Junto a um cadáver frio
Desfeita em pranto cai.
POESIAS
Em divas esplêndidos,
Cruzadas as pernas,
Fuma, horas eternas.
O ardente sultão
Subindo-lhe ao cérebro
O mágico aroma,
Esquece Mafoma,
Houris e Alcorão.
Cerveja britânica,
De furor espuma?
De coisa nenhuma
Me podes servir.
Quando oiço do lúpulo
Gabarem proezas
Às boas inglesas,
Desato-me a rir.
Até na Lapónia
Da gente pequena,
Se fuma; e no Sena,
No Tibre e no Pó,
No Volga e no Vístula,
No Tejo e no Douro;
Que imenso tesouro
Se deve a Nicot!
Tornadas Vesúvios,
As bocas fumegam
De nuvens que cegam
Vomitam montões.
Fumar! Oh delícias!
Prazer de nababo!
E leve o Diabo
Do mundo as paixões.
vol. II—12
TERESA
Iluminavam-lhe as faces
Os raios de estranho fogo.
Ao vê-la compreendi logo
Tudo o que se ia passar.
«Teresa, que tens? Responde.»
Disse, cingindo-a a meu peito;
E ao levantá-la do leito
Assustou-me aquele olhar.
Abril da 1864.
A NOVIÇA
(NO ÁLBUM DA EX.MA SR.ª D. JÚLIA ALVES PASSOS)
Julho de 1865.
O CASTIGO DE DEUS
Na brandura do semblante,
No olhar magoado e aflito
Lê-se um poema inteiro escrito
De caridade e de amor.
Corre ansiada e pressurosa
E toda cheia de graça
Em socorro da desgraça
Com piedoso fervor.
POESIAS
II
III
IV
«Compadece-te, Senhora,
Destas lágrimas sentidas;
Estende a mão protectora
Sobre aquelas pobres vidas.
VI
Só à luz da madrugada
Se acalma a brava tormenta.
Que noite em ânsias passada,
Tão pavorosa! tão lenta!
1865.
A INGLESA
Na solidão da devesa
Vinha a delicada inglesa
Flores colher.
Erguida, de manhã cedo
Passeava já no arvoredo
Sozinha, a ler.
1866.
VOL. 11 — 13
O CARVALHO DA FLORESTA
1868.
A ESMOLA DO POBRE
E a mendiga, alvoroçada,
Ao colo os braços lhe lança,
E beija a pobre criança,
Chorando de comoção.
É assim que a caridade
Do pobre ao pobre consola.
Nem só da mão sai a esmola,
Sai também do coração.
— «Tecedeira, tecedeira,
Como hei-de viver sem ti?»
— «Não tem que saber, menino
É viver como até aqui.»
— «Tecelão? Eu te prometo
Que tecelão me farei.
Porque vou tecer tal teia,
Que nela te enredarei.»
E se passados anos,
Saudoso enfim voltares
De novo a estes lugares
Que deixas amanhã,
Entra no cemitério,
E da erva entre a verdura
Verás a campa obscura
Da tua... pobre irmã.
1868.
A FOLHA SOLTA DO OLMEIRO
Inveja de liberdade,
Inveja de espaço e vida,
Um sonhar de mocidade,
Um aspirar de iludida!
Um ignoto desalento,
Um como faltar de vida
A toma; e ao sopro do vento
Baqueia desfalecida.
Na arcada da sé famosa
Vê-la entrar, tal como o sonho!
Entre coquete e piedosa,
Rosto entre grave e risonho;
E elevá-ios de repente,
Em sítio certo e ajustado,
A encontrar o olhar ardente
Dum ardente namorado;
Afastar-se de repente,
E, como que por encanto,
Romper febril e impaciente
Em inexplicável pranto;
POESIAS
E na alcova recatada...
Pára, pára, fantasia,
Como ias longe, coitada,
Sonhando da Andaluzia I
1868.
EM HORAS TRISTES
Já despe galas
A natureza
Véu de tristeza
Tudo envolveu;
Desfolha o Outono
No prado as flores,
Densos vapores
Sobem ao céu;
Gemem os ventos
Nas densas matas;
Das cataratas
Dobra o fragor;
Calam-se os cantos
Na umbrosa selva;
Da húmida relva
Cresce o verdor.
E as andorinhas
Vão-se juntando,
Bando após bando
Na beira-mar;
Deixam as neves
Já iminentes,
Auras clementes
Vão demandar.
Chama-as o instinto,
Que à turba alada
Indica a estrada
Da imigração.
Mas, ai, na selva
Jaz esquecida
Uma, ferida
Por cruel mão.
Debalde a vítima
Da má ventura
Inda procura
O voo erguer;
Debalde; exânime
Cai na floresta,
Já não lhe resta
Senão morrer.
«Ó companheiras
De horas felizes,
A outros países
Passais sem mim?
Sob os rigores
Do triste Outono,
Ao abandono
Deixais-me assim?!
POESIAS
E sobre os mares
O alado bando
Vai demandando
Outro país.
E cedo a neve
Do frio Inverno
Esconde o terno
Par infeliz.
de 1869.
O JUIZ ELEITO
As raparigas, chorosas,
Confiavam-lhe seus amores;
As desoladas esposas
Seus caseiros dissabores;
POESIAS
1 de Março de 1860.
de 1869.
C...
Lisboa 1869.
AS ANDORINHAS
1864.
Nota do Autor. — Faz parte do romance «Uma flor de entre o gelo» publicado
Serões da Província, em 1870.
O PALHAÇO VELHO
«Palhaços! rápidos!
À arena! à arena!
Quer-se uma cena
Que faça rir.
Exige-a o público
Em altas vozes;
Ide, velozes,
Ide-o servir!»
E os clowns lépidos
Ágeis, disformes,
Saltos enormes
No circo dão.
Soam frenéticas
Palmas e bravos.
Pobres escravos
Da multidão!
Danças ridículas,
Fingidas lutas,
Jogos, disputas,
Travam-se ali;
Ditos equívocos,
Palavras soltas,
Saltos e voltas...
E o povo ri.
POESIAS
Pertence ao número
Um clown idoso,
Curvo, rugoso,
Cheio de cãs;
Os membros trôpegos
De muita idade
Move à vontade
Das turbas vãs.
É ele o último
Dos companheiros,
Que, mais ligeiros,
Deixam-no atrás,
A turba indómita
Com grandes gritos
Ao som de apitos
Assuada faz.
E o velho cômico
Treme assustado
Do desagrado
De seu senhor.
Escusa lágrima
Cai-lhe escaldante...
«Palhaço, adiante!
Coisa melhor!»
E aquele mísero
Truão do povo
Tenta de novo
Fazê-lo rir.
Mas, pobre vítima!
Dos lados todos
Chufas, apodos
Vêm-no ferir.
E o velho, trêmulo,
Não deixa a cena,
Fazia pena
Vê-lo saltar,
Recresce a fúria
Nas galerias...
Velho, não rias!
Nobre é chorar!
POESIAS
Porém, silêncio!
Que o velho fala;
Tudo se cala,
Tudo o escutou.
Em tom de súplica,
Com as mãos erguidas,
Estas sentidas
Vozes soltou:
«Sede magnânimos,
Meus bons senhores!
Que as minhas dores
São infernais!
Chorar no íntimo,
Rir no semblante!
Rir incessante!
Ai, que é de mais!
«Deponho a máscara,
Que vos ilude,
Já que não pude
Fazer-vos rir.
Este cilício,
Que me angustia,
Deixe este dia
De me pungir.
«Tenho família,
Filhos que choram,
Vozes que imploram
Pedindo pão.
Oiço a miséria
Bater-me à porta...
Velho, que importa?
Vai ser truão.
POESIAS
«Sentes decrépito
Tremer-te o braço?
Faz-te palhaço.
Que esperas ? Vai!
Loucos escrúpulos,
Velho, refreia,
Perante a idéia
De que és... um pai.
— «O miserável!» murmura
O forasteiro sombrio,
O pastor desceu a encosta
E passou pra além do rio.
E quando de madrugada
Conduzia ao monte o gado,
Encontrou na ribanceira
O corpo de um afogado.
Conheceu o forasteiro
Pelas vestes que trazia;
Foi enterrado na aldeia.
Quem era? Ninguém sabia.
NA MADEIRA
(A uma Criança)
' Tinha Júlio Dinis ao escrever esta «Explicação prévia» 20 anos apenas.
VOL. Il — 1 5
POESIAS
Dezembro de 1859.
SONHO OU REALIDADE?
1857.
Estes noventa e tantos versos foram os primeiros que me saíram da pena com pre-
tensões a poesia. Por isso os transcrevo. O assunto é digno da idade em que os escrevi.
Quem aos 17 anos não tenha sentido alguma coisa de semelhante e experimentado
o desejo de a exprimir, melhor do que eu o pode fazer, é homem de cujas afeições e senti-
mentos permitir-me-ão duvidar.
NAO TE AMO
(CANÇÃO)
Em vez de canção, melhor lhe chamaria cantiga. Não tem, nem poderia ter outra
aspiração. A pessoa a quem ela se refere ó uma pessoa imaginária, ou antes, era-o quando
isto escrevi, pois falando verdade, mulheres tenho encontrado que estão no caso de se
lhes poder oferecer estas cinco quadras e não se deverem dar por ofendidas. Mas basta
de notas para uma coisa tão pouco notável.
PENSO EM TI!
1858.
Aspirar, aspiro, mas... Esta poesia (perdoem-me o nome) nao é um simples Jogo
de fantasia. O que ela é. escuso de o dizer. Os que a entenderam dispensam explicações.
Os outros não sei se feliz se infelizmente para eles, nem com um volume inteiro de notas
a entenderiam melhor.
Em quanto a este tique que nela figura, se me perguntarem quem é. colocam-me
em sérias dificuldades. Não saberei responder talvez satisfatoriamente.
CISMANDO
1857.
EVOCAÇÃO A TEMPESTADE
Do arcanjo do extermínio
O gládio chamejante
Ostente-se radiante
De ameaçadora luz;
Da tempestade às fúrias
Assistirei sorrindo
E bradarei: Bem-vindo!
Ao gênio que a conduz.
1857.
A ROMEIRA
1857.
CANTARES
1859.
MELANCOLIA
1859,
Só quem não soubesse nada da minha vida. me poderia pedir explicações desta
poesia. Se, para uma produção desta natureza ter merecimento, bastasse ser escrita sob
a impressão aos sentimentos que nela se exprimem, podia esta ser uma obra-prima. Infeliz-
mente há mais algumas condições a satisfazer.
NAO POSSO
Qual é a linguagem,
Que as sensações exprime
Dessa hora tão sublime
Das confissões de amor?
Se um ente amado expira...
Junto ao lutuoso leito,
Do que nos vai no peito
Quem pode ser cantor?
Novembro de 1859.
Se esta poesia tem um leve fumo de verdade, ele é tão fraco e desvanecido, que
não me atrevo a alistá-la entre as verdadeiras, em quanto ao facto; pois em quanto aos
sentimentos, sustento que o é; e julgo não ser o único nesta crença.
Estes versos talvez me justifiquem de arguições futuras. É uma poesia de preven-
ção. Olhem-na como tal.
AURORA DE ARREPENDIMENTO
Novembro de 18S9.
Se esta poesia tem um leve fumo de verdade, ele é tão fraco e desvanecido, que
não me atrevo a alistá-la entre as verdadeiras, em quanto ao facto; pois em quanto aos
sentimentos, sustento que o é; e julgo não ser o único nesta crença.
Estes versos talvez me justifiquem de arguições futuras. É uma poesia de preven-
ção. Olhem-na como tal.
AURORA DE ARREPENDIMENTO
E de medonha abóbada
Os ecos despertando,
Seu grito continuando,
Repetem-me: Caim!
Oh! que mortal angústia
Este suplício eterno!
E nem no próprio Inferno
Se penará assim!
E, se me vedes trêmulo,
Perante vós curvar-me
E a fronte rociar-me
Um frígido suor...
Embora! a alma intrépida
E forte permanece,
O corpo é que parece
Ceder a um frio horror!
Do templo no vestíbulo
Severo te elevavas
E anátemas lançavas
Tremendos contra nós;
Ao grito de sacrílegos
O bando estremecera,
Sem mim talvez cedera
Em breve à tua voz.
A vida é me um martírio;
Minha alma outrora forte
Ao sopro de agra sorte
Vergou, pendeu pró chão;
Nem mesmo a paz do túmulo
Me resta! No seu seio
Penar inda receio
Pra sempre ! Deus perdão I
POESIAS
Novembro de 1859.
Escusado é dizer que nao sou eu quem fala neste canto de remorsos. Conquanto
pecador, como todos os filhos de Adão, ainda não está tão cheio o meu cabaz de culpas.
Aqui usei da liberdade, que nos dá a lira, boa ou má, de exprimir, não só os nossos senti-
mentos, mas também os dos outros. Se bem ou mal o fiz, desta vez, não o sei, e espero ter
juizes que o possam saber melhor do que eu.
•
AS MULHERES
(RECORDAÇÕES DE UM VELHO)
Os livros abandonava,
Horas e horas passava
Com ela, sem o sentir;
Meu tio franzia a testa,
Porém, à hora da sesta,
Costumava ele dormir.
Estremeci de surpresa
Ao contemplar a beleza
Com que brilhava uma actriz!
Perdido fiquei a vê-la!
Nunca vi mulher tão bela!
Nem uns olhos tão gentis!
Abandonar os amores
Que se pra os mais só tem flores
Eu por mim poucas lhe vi.
Jurei, mas quis meu fadário,
Que a cruz levasse ao Calvário,
Que remédio obedeci.
Já o Verão principiava
E com ele começava
O tempo dos arraiais;
Quis que a uma acompanhasse
E como tal recusasse
Deixou-me pra nunca mais.
Julho de 18S9.
Desta poesia eu sou apenas uma espécie de editor, mas não responsável. £ um
velho que fala, e eu não afirmo, pela minha parte, que penso exactamente como ele neste
assunto. O sexo feminino me perdoe portanto estas sextilhas. Estou pronto a contradizer
a ilação que delas se pretendeu tirar.
Debaixo do ponto de vista em que o nosso octogenário encara as mulheres, eu
devo confessar que não tenho motivos para lhes querer mal nenhum. Ele julgou-as severa-
mente, mas é certo que também não valia mais do que elas. As feridas do coração cicatri-
zavam-lhe com uma rapidez espantosa e. em quanto a mim, estes corações são no amor
uma calamidade e não merecem sorte melhor que a que ele teve.
Já vêem que sou imparcial.
EXALTAÇÃO
Abril de 1860.
Esta exaltação, como quase todas, terminou em nada. Não cheguei a incomodar os
convivas dos festins da vida para me darem lugar, e espero que nunca os incomodarei.
Meu caminho é outro. Divirtam-se em paz.
UMA CONSULTA
— E o remédio? — Morrer.
Janeiro de 1860,
22 de A b r i l de 1860
Esta é como i n d i c a o título, uma profissão de fé. Por ela avalie-se a verdade de
todas as poesias que f a z e m parte deste álbum íntimo. Se o meu modo de pensar fizer
mudança a seu tempo v i r á nova profissão. Até aqu; é esta que regula.
UM PARECER
As camélia: peónias
Que o jardim ostenta ufano,
E outras destes hierarquias,
Prefiro a rara violeta,
E a rosa que vegeta
Pelos campos todo o ano.
8 de Julho de 1860.
DESALENTO
6 de Agosto de 1860.
DESESPERO
13 de Agosto de 1860.
O DESTINO DAS FLORES
28 da junho de 1882.
FALSOS AMIGOS
Outra versão:
Onde iria
Mendigar expressões pra celebrar-vos,
Loiras searas, agradáveis ceifas,
Serões risonhos a que amor preside,
Onde se trocam abraços mil, mil beijos,
A cada milho-rei? Não sei cantar-vos,
Verdes relvas, de orvalho rociadas,
Sussurrantes arroios das campinas,
Copados, odoríferos pomares...
POESIAS
1860.
*
* *
Cartas a meu primo José Joaquim
Pinto Coelho.
1862.
*
«O caminho da existência
É então grato e florido.
Ai ! Bem fácil é o olvido
De tudo o que a alma sofreu !
Como à roseira da várzea
Que todo o ano floresce,
A cada flor que fenece
Uma outra flor sucedeu.
1865.
*
1
Última carta em verso que Júlio Dinis dirigiu a José Joaquim Pinto Coelho.
Era desta maneira que festejava os aniversários de seu primo,