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POST-A-POST V1.0
Uma Coletânea de Publicações de Fábio Henriques
Mixagem Sem Segredos: O Grupo
https://www.facebook.com/groups/744276519018138/

16 BITS É POUCO MESMO? ............................. 213 Desenvolvimento Histórico Da Referência de


A COISA MAIS BONITA DO ÁUDIO ............... 192 Afinação........................................................ 188
A Controvérsia do Summing Amp................. 25 DESVENDANDO OS SEGREDOS DO HCOMP
A COR NÃO EXISTE........................................... 235 ......................................................................... 265
A TEORIA DO ÁUDIO, A MANIÇOBA E O DESVENDANDO OS SEGREDOS DO RVOX .. 261
JUMBO ............................................................ 252 DEZ DICAS PARA MELHORAR SUA MIXAGEM
A VERDADE SOBRE O PZM .............................. 196 ......................................................................... 156
A verdade sobre o Subkick .......................... 270 DRIVE (distorção) DE CONSOLE OU
ALL ALONG THE WATCHTOWER ..................... 211 "Corrigindo problemas que não existem"
Apps de medição de áudio prestam? ...... 151 ......................................................................... 163
ARTE, TÉCNICA, PRÁTICA E TEORIA .............. 254 Dunkirk: A Guerra e a Guerra ...................... 167
Às Vezes O Bom Senso Engana 1 ................ 147 E QUANDO QUEREM QUE VOCÊ SEJA
Às Vezes o Bom Senso Engana 2 ................ 150 OUTRO? .......................................................... 137
ÁUDIO DE ALTA DEFINIÇÃO – O APITO EM E você pensava que isso era exclusividade
30kHZ .............................................................. 141 do áudio? ...................................................... 229
Áudio de Alta Definição Existe? .................... 38 Equalizador Acústico? .................................... 142
Áudio na Contramão - Os Meios e os Fins 166 EQUALIZADORES SEM SEGREDOS 3: ............. 206
Áudio Não Tem Muita Lógica ....................... 162 EQUALIZADORES SEM SEGREDOS I ............... 202
CABOS BNC? ..................................................... 241 EQUALIZADORES SEM SEGREDOS II: ............. 204
Caçando Mitos - O "sonzão" do equipamento Equipamentos Mega-caros? Pra quê? ...... 159
vintage.............................................................. 73 EXEMPLO PRÁTICO DE COMPRESSÃO
Caçando Mitos (Parte 1).................................. 26 PARALELA E SEU RESULTADO ..................... 269
CANTINHO DO ABSURDO ............................... 158 FAZ SENTIDO "AMACIAR" HEADPHONES? ... 194
CHEGA DE 1176s............................................... 214 FORMATO DE PONTO FLUTUANTE
Coitados dos Dinâmicos ................................ 173 (FLOATING POINT) ..................................... 103
COMO CONSEGUIR BOAS MIXAGENS PARTE Gravação de Voz - Fabio Henriques ......... 222
1 ....................................................................... 237 Gravadores Analógicos de Fita Magnética. 9
COMO CONSEGUIR UMA MIX QUE SOA BEM Gravando Ambiente de Verdade ................ 70
EM QUALQUER LUGAR? .............................. 138 INTERFACE É TUDO IGUAL? ............................. 208
COMO CONTROLAR O VOLUME DE MINHA Kate Perry ........................................................... 193
MIX? ................................................................ 219 LUFS ...................................................................... 271
COMO É O SUPORTE DA AVID ....................... 170 Mais Hz ou mais Bytes? .................................... 98
COMO ESCOLHER O QUE USAR NA MIX? ..... 83 MAIS SOBRE O SUMMING DO MASTER BUS 124
COMO REALMENTE FUNCIONA UM EMT140 MASTERIZAR É ISSO? ........................................ 255
......................................................................... 155 MASTERIZAR EM ANALÓGICO? ..................... 101
COMO TEM LOROTA NO ÁUDIO ................... 152 MINÚCIAS DO ÁUDIO ...................................... 105
Comparando Áudios .......................................... 3 MIXAGEM SEM SEGREDOS: O LIVRO –
Compressor no master? ................................. 243 Capítulo 1 ...................................................... 128
CONVERSÃO ANALÓGICO – DIGITAL ........... 88 MIXANDO DE FONES........................................ 172
Convolução, o processamento do século 21 MIXAR NÃO SE ENSINA, SÓ SE APRENDE
......................................................................... 174 (Mixerman) ................................................... 127
CUIDADO COM A EXIGÊNCIA SELETIVA ..... 260 NÃO CUSTA ALERTAR DE NOVO ................... 201
Cuidado com o que aprende! ..................... 161 NÃO SUBESTIME A VOZ GUIA ........................ 191
CUIDADO COM VR ! ........................................ 168 NINGUÉM VAI SABER QUE VOCÊ EXISTE ..... 169

©2019 by Fábio Henriques


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NOVA TECNOLOGIA DE CORDAS DE Por Que Meu CD não Aparece no Media


GUITARRA ...................................................... 154 Player (ou no Itunes) ? ................................. 16
O Áudio e os UFOs ........................................... 115 POR QUE NÃO PRECISO GRAVAR EM 32 BITS?
O BRUFFLE ........................................................... 126 ......................................................................... 236
O CASO EMBLEMÁTICO DO SOLZINHO DO POR QUE NÃO VOU FICAR RICO COM ÁUDIO
ADAT ............................................................... 239 ......................................................................... 136
O Compressor Sou Eu? ................................... 160 Por que o equipamento não importa: ......... 35
O CONTROLE DO VOLUME DO MASTER ...... 133 POR QUE O MIXADOR MEXE NO MEU
O Equalizador É Você ....................................... 72 SOM???? ....................................................... 145
O Melhor Equipamento do Mundo é o Seu 23 PRA ENTENDER FASE Parte 5 ........................... 251
O MUNDO É MUITO MAIOR DO QUE A GENTE PRA QUÊ MASTERIZAR?.................................... 231
PENSA ............................................................. 264 Pra que serve um engenheiro de gravação
O PROCESSO INVERSO .................................... 144 ......................................................................... 122
O QUE EU GANHO GRAVANDO EM 96kHz ? Primeira Equação Irônica de Henriques : . 114
......................................................................... 217 QUAL O EQUIPAMENTO MAIS DIFÍCIL DE
O QUE EU GANHO USANDO UM SUMMING TRABALHAR? ................................................. 164
AMP? .............................................................. 221 Qual o Equipamento Mais Importante do
O QUE IMPORTA É O RESULTADO?................ 216 Estúdio?............................................................ 15
O QUE SERIA BOM EU SABER PRA ME AJUDAR Quem manda na sua mix? ........................... 135
A SER UM BOM MIXADOR ............................ 97 REFERÊNCIAS E O REVERB DA VOZ ................. 82
O SOM DOS "GRINGOS" ................................. 210 REVERB DO MASTER DO GRUPO OU DE CADA
O VERDADEIRO PROBLEMA DO 16 BITS ....... 123 ELEMENTO SEPARADO? .............................. 234
Otimizando Sua Mixagem (Parte 3).............. 53 Ruído Branco e Ruído Rosa ............................. 37
Otimizando Sua Mixagem (Parte 4).............. 58 SALVE O MEU SOM! .......................................... 165
Otimizando Sua Mixagem (Parte 5).............. 63 SCARLETT JOHANSSON E O MP3. .................. 153
Otimizando Sua Mixagem Parte 1................. 44 Se os Analógicos Eram Tão Bons, Por Que
OTIMIZANDO SUA MIXAGEM PARTE 2 – O Criaram os Gravadores Digitais ................ 18
CAMINHO DAS PEDRAS................................ 49 Será que o vinil dificultaria a pirataria? ..... 148
Otimizando sua Mixagem Parte 6 ................. 78 SLATE DIGITAL VMS - O TESTE ......................... 171
OUVIR A MIX EM DIVERSOS LUGARES - BOM TER OU NÃO TER ................................................ 187
ou RUIM?........................................................ 100 UM ALERTA SOBRE DOIS PLUGINS ................. 266
PARA ENTENDER A LEI DE PAN (Pan Law) ... 195 Um pouco de distorção pode fazer
PARA ENTENDER FASE DE VEZ ........................ 244 maravilhas. ..................................................... 71
PARA ENTENDER FASE DE VEZ PARTE 2 ......... 246 UMA AGRADÁVEL SURPRESA ......................... 263
PARA ENTENDER FASE PARTE 3 ...................... 248 UMA CURIOSIDADE .......................................... 140
PARA ENTENDER FASE PARTE 4 ...................... 249 Uma Desvantagem Inquestionável do Vinil
PARA TIRAR AS DÚVIDAS SOBRE ......................................................................... 102
COMPRESSÃO PARALELA ........................... 242 Uma Pequena História da Mixagem .......... 117
Pelo que estou pagando ao comprar um VC ACHA QUE 16 BITS É POUCO? ................ 189
simulador de fita? ....................................... 267 VINIL HD .............................................................. 185
POR QUE ALGUNS COMPRESSORES POSSUEM VOCÊ NÃO ENJOA? ........................................ 190
UM HPF NO SIDE CHAIN? ........................... 230 Yo No Creo En Brujas, Pero Que Las Hay, Las
Por que gravar em 48kHz ? ........................... 199 Hay .................................................................. 121

©2019 by Fábio Henriques


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1) Comparando Áudios

Ou isto ou aquilo: ou isto ou aquilo...


e vivo escolhendo o dia inteiro![...]
Mas não consegui entender ainda
qual é melhor: se é isto ou aquilo.
Cecília Meireles

De todos os aspectos que envolvem o áudio e o nosso trabalho, o que


considero de longe o mais complicado é a comparação. Pode parecer
fácil, mas o ato de se simplesmente escolher a melhor de duas opções
em áudio envolve uma quantidade enorme de fatores, e o mais
problemático é que a coisa parece simples. A internet está cheia de
exemplos de pessoas, até cheias de boa intenção, tirando conclusões
absurdas porque as baseiam em comparações totalmente
equivocadas. Vamos aqui, primeiramente, mostrar o problema,
desmascarando sua aparente simplicidade, e depois apontar os
métodos corretos de comparação e tomada de decisões.

Já dissemos algumas vezes que um quesito muito importante para


alguém que lide com áudio é sua capacidade de elaborar conceitos e,
a partir de informações recebidas, chegar a uma conclusão. Em outras
palavras, quando a gente pega um som de bumbo e mexe num
equalizador até que finalmente fica feliz com o resultado, nem
percebemos a operação extremamente complexa que nosso cérebro
efetuou. Usamos comparações instantâneas, usamos nossa memória
auditiva para estabelecer conexões com sons que já ouvimos, fazemos
julgamentos conceituais baseados em nossa expectativa perto de
outros sons de outras pessoas que já ouvimos etc. Um mundo de tarefas
são executadas por nossa "CPU" interna, até que finalmente
conseguimos o veredito : "está bom assim". Ok, tem gente que nunca
consegue chegar a um resultado que considera 100% satisfatório, mas
creio que isso seja mais um problema psicológico, o que foge de nosso
escopo aqui.

O fato é que comparar é um processo intimamente ligado a qualquer


tarefa do áudio. Vejamos, então, alguns pontos importantes e
característicos que tornam a comparação de áudios tão importante e
delicada.

PARTICULARIDADES DO ÁUDIO

Quem já jogou um Jogo dos Sete Erros, em que dois desenhos muito
parecidos são apresentados, mesmo sem perceber, estava exercitando
sua capacidade de comparação. O que diferencia este jogo de
qualquer situação em áudio é o fato de que as imagens estão ali, lado
©2019 by Fábio Henriques
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a lado, prontas para uma comparação simultânea. Em áudio, não dá


pra ouvirmos duas informações ao mesmo tempo. Temos que ouvir
primeiro uma e depois a outra. O fluxo de informação é serial. Não há
como eliminarmos o fator tempo de nossas comparações. Assim,
sempre que a gente termina de ouvir a primeira informação e começa
a ouvir a segunda, o próprio fato de a primeira informação já ter
terminado afeta sensivelmente o julgamento da segunda. Então, o fator
a seguir deve ser considerado...

A comparação de áudio não é simultânea

Além disso, a resposta em frequência de nossos ouvidos é mais plana


quanto mais alto o volume de audição. E existe uma tendência natural
de acharmos que soa melhor o que tiver mais volume. Várias vezes
recebi comentários de que a voz de uma mix está "sem peso", "sem
energia", "sem vida", "sem cor", e depois de muitas tentativas de
descobrir qual seria de fato o problema (equalização?, compressão?,
reverb?), descobri que em 100% destes casos basta aumentar um
pouco o volume da voz para receber como resposta um "agora sim!".
Todo profissional de áudio sabe que se há o desejo de que a sua opção
de equalização seja escolhida, basta colocar o canal equalizado um
pouco mais alto na hora de mostrar ao cliente. Assim, o segundo fator
importante é o que você verá a seguir...

Todo profissional de áudio sabe que se há o desejo de que a sua opção


de equalização seja escolhida, basta colocar o canal equalizado um
pouco mais alto na hora de mostrar ao cliente

O que está mais alto soa "melhor"

Faço um desafio agora ao leitor: pense em um adjetivo, um só, usado


em áudio, que seja específico dele, que não tenha tomado
emprestado de outro sentido. A gente diz o tempo todo que o som está
brilhante, fosco, opaco, escuro (visão); pesado, leve, gordo, magro,
fofo, duro, áspero, suave, seco, molhado, quente (tato). E como o som
está intimamente associado a nossos centros emocionais, podemos até
associar com sentimentos, como alegre, triste etc. Se formos radicais,
até mesmo coisas que parecem totalmente típicas do áudio, como
alto, baixo, comprimido, equalizado (tornado igual) têm suas origens em
outros campos.

Tudo bem que não dizemos que um som está "salgado", mas o que dizer
da flauta "doce"? Mas estes empréstimos não são causados por um
defeito de nossos cérebros. Agora, entrando no perigoso terreno das
opiniões, tenho uma teoria particular a este respeito. A audição é um
sentido especial, na medida em que a gente não precisa dar atenção
©2019 by Fábio Henriques
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exclusiva a ele.

O termo "fundo musical" é totalmente adequado, pois representa esta


característica muito importante da sensação auditiva. Somos imersos
em áudio mesmo quando nos concentramos em outro sentido. Dá pra
dirigir ouvindo música, mas não dá pra dirigir vendo um filme. Quantas e
quantas vezes uma cena de ação em um filme nos envolveu
completamente e a gente nem se deu conta de que havia uma trilha
sonora o tempo todo acontecendo! Pois é - o áudio muitas vezes é sutil,
e por isso faltam adjetivos para defini-lo. Já trabalhei com um produtor
que pedia "brilho" quando queria mais reverb, enquanto a maioria
considera brilho uma forma de equalização. Isso nos leva ao terceiro
fator...

Não existem definições universais para uma opinião auditiva

Se até agora vimos questões subjetivas, vindas da pessoa que ouve,


existem ainda as questões objetivas, que dificultam as comparações,
mas são oriundas do próprio método. Por exemplo, suponhamos que
queremos comparar o som de dois microfones. A partir do fator (a),
tendemos a descartar a possibilidade de usar um microfone e depois o
outro, comparando depois. Se estamos usando uma voz, fatalmente a
performance do cantor será ligeiramente diferente nas duas vezes,
comprometendo a comparação. Então podemos optar por colocar os
dois microfones bem juntos um do outro, mas, neste caso, os dois não
estarão exatamente na mesma posição, e isto pode afetar o resultado,
sem contar que somente a presença de outro microfone ao lado pode
provocar reflexões e difrações sonoras, o que também prejudica. E
mais: cada microfone terá de ser ligado a seu próprio pré, o que
também ajuda a atrapalhar o resultado. Ou seja...

O método da medição pode afetar o resultado

Sobre este último, alguém pode argumentar que são variações muito
pequenas e que podem ser desprezadas, e, realmente, se a gente não
aprendesse a trabalhar com este tipo de incertezas, não haveria
nenhuma obra de engenharia (de qualquer tipo) no mundo, mas o nível
de detalhe que os nossos ouvidos são capazes de perceber é
extremamente alto, e os objetos de comparação hoje em dia são tão
sutis em suas diferenças que este tipo de coisa merece especial
atenção.

Uma das Leis de Henriques e o Conceito de “Melhor”

Essa minha busca constante de esclarecer as coisas não é de hoje. Me


©2019 by Fábio Henriques
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persegue desde o primeiro dia em que me aventurei em áudio. Sempre


me deixou surpreso como certos conceitos são amplamente difundidos
e ao mesmo tempo não têm um pingo de veracidade. Hoje em dia,
com os vídeos de internet, então, a coisa chegou a um nível sem
precedentes. Por isso eu elaborei uma "lei", para a qual, sem a menor
modéstia, dei o meu nome. Ela estabelece o seguinte:

A credibilidade de uma afirmação em áudio é diretamente


proporcional à sua exoticidade e à reputação de quem afirma, e
inversamente proporcional à sua veracidade e objetividade.

Ou seja, se um cara "famoso" afirma um absurdo, as pessoas acreditam


muito mais nisto do que na matemática e física que demonstram que é
mentira.
Além disso, muita gente bem intencionada se dedica a fazer
comparações e, diante do resultado, acaba com conclusões
equivocadas. A minha preferida hoje em dia é a da pessoa que me
afirma que ouve diferença entre áudio amostrado em 96 kHz em
relação a 44.1 kHz. Ora, eu até acredito que seja ouvida a diferença,
mas quem disse que "diferente" quer dizer "melhor"? Na maioria das
vezes, o som em 96 kHz é realmente um pouco diferente, porque as não
linearidades dos equipamentos e as distorções por intermodulação o
tornam "menos fiel" ao áudio original. Ou seja, em tese, o fato de se usar
96 kHz pode "piorar" o som.

E, para concluir, temos até mesmo que avaliar o conceito de "melhor".


Segundo Ethan Winer, com quem concordo totalmente, existem
situações em que as pessoas preferem um som com um certo nível de
distorção, que acaba enriquecendo a resposta de harmônicos altos, o
que é o caso do vinil e do aural exciter, por exemplo. Ou seja, é bem
possível que "melhor" queira dizer "mais agradável", e não "mais fiel".

COMO COMPARAR

Dito isto tudo vamos ver dois exemplos de como se efetuar


comparações de maneira decente.

Null Test

O primeiro método é o que se chama Null Test. Por exemplo, queremos


saber de verdade o que muda quando se converte um arquivo WAV
para MP3. Em vez de ficarmos dizendo apenas que MP3 é ruim e coisas
do gênero, façamos um null test. Tomamos o arquivo original e o
arquivo convertido. Colocamos em duas pistas diferentes de um Pro
Tools da vida, alinhamos exatamente os dois áudios, de forma que
fiquem exatamente superpostos, e aí invertemos a fase de um dos
©2019 by Fábio Henriques
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canais. Se os dois áudios forem exatamente iguais, o resultado é silêncio


absoluto (no limite do ruído de fundo do conversor usado). O processo
precisa ser extremamente cuidadoso, porque só o fato de se superpor
exatamente os áudios já envolve muita perícia. Mas, fazendo as coisas
corretamente, temos uma ferramenta poderosíssima para julgar e
comparar.

Existe, porém, um problema sério com o null test: uma vez que a
subtração é feita, perdemos a informação de quem gerou qual
diferença. Ou seja, se pegar dois arquivos em MP3 e fizer um null test,
não tem como eu saber qual dos dois provocou qual alteração.

ABX

"Fazer um AB" em áudio não tem nenhuma conotação perigosa.


Significa apenas "comparar". É aquela situação tipo consulta de
oftalmologista: "é melhor assim ou assim?", "este ou este?". Ou seja, a
gente coloca os áudios em dois canais, sola um, ouve, depois sola o
outro e ouve, fazendo a comparação. Podemos fazer a mudança mais
rápida ou mais lentamente, para simular uma simultaneidade, e como
já vimos antes, precisamos deixar os volumes dos dois canais
exatamente iguais (na medida do possível) para que a comparação
seja honesta. Isso minimiza uma parte dos efeitos, mas este método não
é válido, pois o ouvinte e o testador sabem quem é A e quem é B, e
suas opiniões particulares acabam afetando.

Um teste ABX pleno é um teste duplo-cego, em que nem quem está


ouvindo, nem quem está testando sabe qual áudio é qual. É o teste
recomendado para o pessoal que gosta de dizer que 96 kHz soa
"melhor". O desafio não é identificar se há diferença, mas tentar
identificar qual dos dois, X ou Y, é A e qual dos dois é B. Existem dois
softwares que recomendo para este tipo de teste: o Foobar2000, para
PC, e o ABX Tester, para Mac. Uma coisa importante é fazer o teste
várias vezes, pois existe uma chance de 50% de se acertar com apenas
um teste feito. Se são feitos 20 testes, e se você acertou, digamos, 14
vezes, ainda sim há uma chance de 6% de que você tenha apenas
"chutado" a resposta. Mas, em 20 testes, se você acertou 18 vezes, a
probabilidade de chute é menor que 0,1%. Porém, se foram feitos só dez
testes, mesmo acertando todos, ainda há uma chance de 0,1% de ter
sido apenas coincidência (David Carlstrom). Pra piorar as coisas, se a
gente passa de uns 20 testes, a fadiga auditiva e psicológica começa a
afetar os resultados. Assim, dá pra ver que comparar decentemente é
muito delicado e exige muito apuro técnico.

Existe um famoso trabalho, já citado aqui, feito com todo rigor científico,
em que testes ABX que compararam áudios de CD com áudios de "alta
©2019 by Fábio Henriques
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definição", a probabilidade de acerto obtida foi de aproximadamente


49%, levando à conclusão de que as pessoas não conseguem
identificar qual é qual. Aos mais céticos, ou, no caso, aos mais crédulos,
sugiro o excelente desafio de Justin Coletti, que pode ser encontrado
em:

http://www.trustmeimascientist.com/2013/09/03/think-you-have-golden-ears-
take-the-scientist-challenge/

CONCLUSÕES

Talvez mais importante do que dominar ou tentar aplicar as técnicas de


comparação aqui descritas seja o leitor passar a desenvolver um espírito
crítico a respeito do que lê e escuta por aí. Se ouviu uma afirmação e
ela parece fantástica ou exótica demais, desconfie. Procure saber o
método usado para emiti-la. Francamente, mesmo que um "multi-
grammy-winner" me diga que isso é melhor do que aquilo, se ele não
me mostrar exatamente como chegou a esta conclusão, para mim não
passa de mera opinião, e não deve ser necessariamente desprezada,
mas apenas considerada como tal.

©2019 by Fábio Henriques


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2) Gravadores Analógicos de Fita Magnética


A gravação analógica é realmente mais fiel e natural?

CRONOLOGIA

Até o último quarto do século 19 não havia maneira de registrarmos


áudio de forma a repetir sua performance. Os "áudio players" até então
eram os músicos, e o equivalente a comprar uma música era a compra
de sua partitura. A partir de 1876, com o aparecimento do gramofone,
começa-se a registrar e reproduzir áudio através de métodos
mecânicos. Por volta da virada do século, Poulsen constrói o primeiro
gravador/reprodutor que utilizava magnetismo como método de
registro - o "telegrafone".

O telegrafone usava como mídia não uma fita, mas um fio metálico.
Durante os anos seguintes vários progressos foram conseguidos usando
mídias como fita metálica, fitas de papel recobertas de material
magnético e, finalmente, fitas plásticas recobertas. Por volta do final dos
anos 1930, o "magnetofone", desenvolvido pelos alemães, era usado
principalmente para broadcast e trabalhava já com fitas. Durante a
guerra, o desenvolvimento da tecnologia pelos alemães foi significativo,
enquanto que estagnava nos EUA. Com o fim da guerra, muito deste
material foi apreendido pelos americanos, notadamente por Mullin, que
"importou" esta tecnologia, que foi aprimorada e reintroduzida no
mercado através, principalmente, da Ampeg, entre outras empresas,
como a EMI. A popularização do formato ocorre primeiro em
aplicações profissionais (estúdios de rádio, cinema e gravação de
música), e a partir de 1948 começam a aparecer gravadores de fita
para consumidores domésticos.

Como curiosidade, no primeiro episódio da série Mission: Impossible, de


©2019 by Fábio Henriques
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setembro de 1966, o objetivo da equipe é resgatar uma gravação


magnética guardada por um espião russo. Era uma gravação em fio de
metal, que estava disfarçada como arame de cerca, e ao longo do
filme é usada como linha de pesca (!).

A partir dos anos 1950, a fita analógica magnética dominou o mercado


de gravações profissionais, hegemonia que duraria até a popularização
dos meios digitais de gravação (que a princípio usavam também fita
magnética - DAT, DASH, PRODIGI, ADAT), que, por sua vez, seriam
superados pela gravação em computadores.

A FUNÇÃO DO GRAVADOR

Como já vimos aqui antes, podemos definir a função de um


equipamento "gravador" como sendo a capacidade de registrar
informação da forma mais fiel possível. Um gravador ideal é aquele que
na reprodução devolve a mesma informação que lhe foi entregue.
Embora esta situação seja, na prática, impossível, podemos considerar
como muito eficiente um gravador que, ao reproduzir uma informação,
seja indistinguível da informação original, pelo menos aos sentidos
humanos típicos.

É fato conhecido que um gravador analógico de fita devolve um som


absolutamente diferente do que lhe foi enviado, não sendo necessários
ouvidos treinados para identificar a diferença. Isto lhe confere uma
significativa desvantagem em relação a gravadores digitais, mesmo os
de fita. Pode-se argumentar que esta modificação no som é agradável,
quente, etc., mas um dispositivo que basicamente altera o conteúdo do
áudio é classificado como "processador", e não um "gravador" de
qualidade. Na verdade, é uma questão ovo-galinha. A gente não sabe
se o som entregue por um gravador analógico é "melhor" porque
durante pelo menos trinta anos fomos submetidos exclusivamente à sua
sonoridade ou se o processamento sonoro agradável é uma feliz e
oportuna consequência do ato de gravar.

©2019 by Fábio Henriques


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PRINCÍPIO DE FUNCIONAMENTO

A gravação magnética se baseia na propriedade que alguns materiais


apresentam de, uma vez aplicado a eles um campo magnético,
reterem uma parte de sua intensidade e orientação (norte-sul). O nosso
objetivo é conseguir um meio de registrar de modo permanente uma
onda elétrica que representa um sinal de áudio, que tem valores de
amplitude positivos e negativos e que oscila com uma determinada
periodicidade. Esta amplitude se relaciona com o "volume" do áudio
naquele instante, e a velocidade com que esta oscilação acontece,
com a frequência.

O óxido de ferro (ou ferrugem) é um dos materiais que apresentam


memória magnética, e nos gravadores são usadas finas fitas plásticas
recobertas com ele (através de colas especiais). Na verdade, podemos
interpretar este material como sendo composto de ímãs microscópicos,
que se reorientam de acordo com algum campo externo que incida
sobre eles, assim como acontece quando a gente imanta uma chave
de fenda esfregando nela um ímã permanente.
Assim, um elemento chamado "cabeça de gravação" converte
eletricidade em magnetismo e o faz incidir sobre a fita magnética,
através de uma fenda (gap). A cada instante de tempo, uma certa
amplitude elétrica é convertida em intensidade magnética e incide
sobre uma região de fita. Fazendo a fita se deslocar na frente da
cabeça, conseguimos imprimir as variações desta amplitude. É um
processo semelhante ao que um eletroencefalógrafo ou um sismógrafo
usa para registar graficamente oscilações elétricas.

Pode-se concluir que a habilidade da fita em registrar frequências está


associada ao tamanho destas partículas microscópicas, à velocidade
com que a fita se desloca em sua frente e ao tamanho do gap da
cabeça. Os gravadores profissionais analógicos trabalhavam a
velocidades típicas de 15 e 30 polegadas por segundo (38 e 76 cm/s).
Para graves mais profundos, usava-se a velocidade menor, perdendo,
com isso, os agudos, e para agudos melhores, a maior velocidade
implicava em menor capacidade de registro dos graves.

Uma questão importante é o fato de que para se otimizar a


transferência entre cabeça e fita, estes devem estar em contato direto.
A fita então precisa "esfregar" a cabeça tanto no ato da gravação
quanto no de cada leitura. Isto obviamente provoca um considerável
desgaste tanto da fita em si quanto da própria cabeça, o que traz
algumas consequências indesejáveis. Por exemplo, quando se faz um
projeto todo em fita, ao se gravar os últimos tracks, normalmente os
mais importantes, como a voz, a qualidade da fita já não é tão boa
quanto no início da gravação. Da mesma forma, no momento em que
mais a gente precisa da qualidade da fita, na hora de se passar a
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mixagem para a fita master, é o momento em que a qualidade do


áudio será a pior de todas, o que é um contrassenso.

AS TRÊS CABEÇAS E O MULTITRACKING

Os gravadores profissionais apresentam, na verdade, três cabeças.


Quando ocorre uma gravação, a fita passa primeiro por uma cabeça
apagadora, que imprime um magnetismo bem intenso de frequência
muito alta, que "sacode" e "embaralha" as partículas magnéticas,
resultando em "silêncio". Depois, vem a cabeça de gravação, que
imprime o magnetismo, e, finalmente, a cabeça de reprodução, que
nos permite ouvir o que foi gravado (pode-se, durante a gravação,
ouvir apenas o que está indo para o gravador, mas como ele modifica
o som, é fundamental que se ouça, em algum momento, mesmo que
posterior, exatamente o que foi registrado). Repare que existe um atraso
(delay) entre o sinal que entra e o que sai do gravador, o que desde
cedo foi usado para se obter o famoso "slap echo" em mixagens.

Se empilharmos na vertical um conjunto de várias cabeças de


gravação por um lado e gravação do outro, é possível registrar
diferentes informações simultâneas na fita, o que se chama de
"multitracking". Vamos supor que possamos ouvir separadamente o que
está indo para a cabeça de gravação em um track e o que está
passando pela reprodução em outro. Em tese, poderíamos primeiro
gravar um instrumento e, depois, ouvindo o que foi gravado,
registrarmos a voz, por exemplo, em outro track. O problema é
justamente o atraso entre as duas cabeças, que acaba com o
sincronismo das duas execuções.

Por causa de suas características físicas, se uma das cabeças de


gravação não está efetivamente gravando, ela fica sensível ao campo
magnético que passa à sua frente, e se fizermos um circuito elétrico
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capaz de amplificá-lo, podemos ouvir o som deste ponto. Assim,


podemos gravar na outra cabeça, acima desta, simultaneamente. Este
processo é denominado sel-sync (sincronização seletiva), e ao ser
criado revolucionou o mercado de gravação. A desvantagem é que a
cabeça de gravação não apresenta uma qualidade tão boa de
reprodução, mas este fator deixa de ser importante, pois o processo só
acontece na hora de gravar algo. Na etapa de mixagem ou para
audições monitora-se somente pelas cabeças de reprodução.

BIAS

Algumas pessoas têm uma ideia romântica de que, como a onda


elétrica é convertida diretamente para campo magnético, isso torna
esta gravação mais natural. Porém, as características da fita não
permitem esta passagem direta. Para os valores mais baixos de
amplitude é bem difícil mexer nas partículas de forma a romper sua
posição inicial. Ao mesmo tempo, lá no extremo mais alto de amplitude
começa a ser necessário um aumento cada vez maior de intensidade
magnética incidente para um pequeno aumento de magnetismo
registrado. Para os sinais de baixa intensidade, portanto, ocorre o que se
chama de distorção de crossover, enquanto que nos de alta ocorre a
saturação.

Para evitar estes dois extremos, usa-se um sinal de polarização (bias),


que tem alta frequência, tipicamente acima de 50 kHz, e é aplicado à
fita junto ao sinal de áudio (na verdade, o áudio modula em amplitude
o sinal de bias). Ou seja, o que é gravado não é audível, pois são
variações do sinal de bias provocadas pelo sinal de áudio. Este sinal é
captado durante a reprodução e sobre ele é aplicado um filtro muito
forte (bias trap), para que do gravador só saia informação audível. Só
este fator já seria suficiente para colocar por terra qualquer argumento
de maior "naturalidade" no processo de gravação magnética.

PROBLEMAS MECÂNICOS

Além de todas estas considerações eletromagnéticas, ainda cabe ao


gravador executar a ingrata tarefa de se fazer deslocar pela frente das
cabeças, em velocidade linear constante, uma quantidade
considerável de fita (uns quatro a cinco quilos de um lado a outro).

Basicamente, aparecem daí dois problemas típicos: o Wow (pronuncia-


se "uáu") e o Flutter. O primeiro decorre de variações na velocidade de
deslocamento da fita que provocam alterações de pitch de baixas
frequências (daí a onomatopeia do nome). O segundo aparece como
uma versão em frequências mais altas do Wow, e normalmente decorre
de irregularidades no deslocamento que fazem a fita tremular ao longo
do caminho.
©2019 by Fábio Henriques
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CONCLUSÕES

Toda esta discussão aborda apenas superficialmente a miríade de


problemas a serem contornados em busca de se obter gravações de
qualidade de uma fita analógica. O grau de sofisticação a que estas
máquinas chegaram é realmente surpreendente, mas a custa de
elevados investimentos, tornando-as de uso exclusivo de estúdios com
uma considerável quantidade de recursos.

O fato de que um equipamento destes modifica nitidamente o som


registrado o deixa em desvantagem enquanto "gravador", tendo sido
necessário um gasto gigantesco de tempo, habilidade e recursos, ao
longo de décadas, para suplantar suas deficiências. As possíveis
vantagens de seu uso como "processador" acabaram sendo superadas
pela praticidade, fidelidade e capacidade de adaptação da
gravação digital. E, hoje, com os softwares simuladores, mesmo estas
vantagens acabaram se tornando secundárias. É fácil se conseguir
digitalmente o "som de fita". Já o inverso...

©2019 by Fábio Henriques


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3) Qual o Equipamento Mais Importante do Estúdio?


Sempre começo meus workshops com esta pergunta. É bom começar
assim para já dar uma quebrada de gelo na galera. Como cada um
tem sua preferência, as discussões, muitas vezes bem acaloradas,
acabam acontecendo e as pessoas se enturmam.
Eu costumo concluir estas discussões com a afirmação de que :
- O equipamento mais importantedo estúdio é: A Cafeteira.
Por mais que isso pareça brincadeira, não é não. Quem mixa sabe
muito bem como o trabalho é envolvente e como muitas vezes a gente
está com o prazo pressionando para que se termine logo e etc. Isto
acaba levando a gente a trabalhar muitas horas seguidas, o que tem
óbvios efeitos negativos.
Antigamente a gente se mexia bastante no estúdio. A mesa era grande,
os equipamentos ficavam no rack, tinha fita (pesando alguns quilos
cada) pra trocar, e por aí vai. Hoje em dia, a gente passa a maior parte
do tempo de uma mixagem sentado olhando pra tela do computador
(certa vez um aluno me perguntou "no tempo da fita analógica, vcs
mixavam olhando pra onde?" - faz sentido).
Eu, então, que tenho como filosofia manter-me sempre dentro do
computador, evitando usar hardware externo, acabo trabalhando
horas a fio mexendo apenas as mãos, uma no teclado e outra no
mouse.
Assim, a parada pro café serve a múltiplas utilidades. É a chance de
esfriar a cabeça, esquentar a garganta, recarregar-se de cafeína e
descansar os ouvidos. Mas atenção: nunca peça pra alguém lhe trazer
o café - o importante é ir até onde ele está.
Tive um professor que dizia que o número de horas de trabalho se
media pelo botão de volume. Com o passar do tempo o ouvido vai
cansando e a gente tende a aumentar o volume da sala, e a mix que
começou com o botão na posição "11 horas", depois de algum tempo
já está lá pelas "3 horas", o que é um mau sinal.
Por isso tudo, meu conselho é evitar trabalhar mais de duas horas
seguidas. A cada uma hora e cinquenta, tire 10 minutos para esticar as
pernas e tomar um café, de preferência em silêncio. Muitas vezes o som
da mixagem da gente melhora instantaneamente graças a este
procedimento bem simples. Se vc estiver principalmente com guitarras
distorcidas (que possuem harmônicos altos bem significativos), baixe
esse prazo pra uma hora e meia.
E no final, depois de 9 horas de trabalho, se ainda houver a
possibilidade de dar uma verificada no dia seguinte, deixe pra amanhã
sem remorso. Vá pra casa ver a novela e volte com uma noite de sono
nas costas. É melhor que qualquer aural exciter pra sua mix.

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4) Por Que Meu CD não Aparece no Media Player (ou no Itunes) ?


Esta dúvida é frequente com pessoas que acabaram de gravar e
prensar seus Cds e se frustram porque os nomes das músicas não
aparecem quando vão ouvi-los no computador. Vamos explicar aqui o
que acontece.
Antes de mais nada, vamos conhecer os “subchannels”. Eles são regiões
de armazenamento de dados no CD que não são destinadas aos
dados do conteúdo do áudio em si, mas de outras informações. Estes
subcanais são denominados, P,Q,R,S,T,U,V e W. Os dois primeiros, P e Q,
são usados para definir parâmetros de tempo no CD, como durações
de faixas e etc. Por isso todo mundo acabou chamando este tipo de
informações de “tabela PQ”, ou simplesmente “PQ”. Os outros
subcanais permaneceram sem função na especificação original do CD.
Esta especificação original, publicada em 1980 (pela Philips e Sony
numa edição cuja capa era vermelha) ficou conhecida como “Red
Book”. Posteriormente, surgiu como extensão ao Red Book a
especificação CD-Text, que usa os subcanais R a W para inserir texto.
Por isso, nem todos os CD players são capazes de ler as informações de
nomes de músicas. E também, muitos fabricantes não incluíam CD-Text
nos produtos, por causa da inconformidade com o Red Book. Hoje em
dia, praticamente apenas os Cd players automotivos lêem CD-Text.
Para superar esta limitação no formato original do CD, foram criadas
bases de dados na internet cuja missão é guardar justamente este tipo
de informação para a consulta. A mais famosa e maior delas era a
CDDB (CD data base). Nela, cada CD
é identificado por um código que leva em conta o número de faixas e
sua duração. Ou seja, a partir da duração das faixas é montado um
código que identifica unicamente (no caso ideal) um CD. Há alguns
anos a CDDB foi absorvida pela Gracenote (leia-se Sony).
Quando a gente insere um CD no computador, o media player (ou
outro player, como o iTunes), entra em contato com uma ou mais
destas bases e recupera a informação de capa, título, artista e nomes
de músicas. Ou seja, os players de computador mais famosos não lêem
o CD-Text que você inseriu no Cd master e mandou pra fábrica. É
necessário que você (ou o fabricante) enviem os dados do CD para
estas bases de dados para que a coisa funcione. O iTunes, por exemplo,
assim como outros softwares, possui a opção de enviar os dados do CD
para a Gracenote.
Já o Windows Media Player não informa especificamente qual base de
dados ele consulta, dificultando as coisas para nós. De qualquer forma,
os fabricantes de software tipo Media Player e iTunes pagam uma taxa
para a Gracenote (ou outras bases) para usar estes serviços.
Alternativamente, existe a Freedb, que já pelo nome indica que seus

©2019 by Fábio Henriques


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serviços são gratuitos, mas que não é tão onipresente quanto a


Gracenote. Quando o software é esperto, já guarda as informações
obtidas em uma cache, de forma que se a gente voltar a colocar o
mesmo CD ele não precise recorrer à internet de novo.
Em resumo, se você quiser testar se os títulos de músicas do CD estão
gravados corretamente, precisa achar um player que leia CD-Text.
Tipicamente, no player do carro vai funcionar. Além disso, antes de
contratar os seviços de uma fábrica de Cds, consulte sobre o
cadastramento na Gracenote, ou faça você mesmo o cadastro via
iTunes.

©2019 by Fábio Henriques


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5) Se os Analógicos Eram Tão Bons, Por Que Criaram os Gravadores


Digitais?

Prosseguindo em nossa análise de assuntos polêmicos, neste mês e no


próximo iremos nos deter neste mecanismo de gravação que foi o mais
utilizado durante aproximadamente 50 anos - entre 1948 e 1998: o
gravador de fita analógica.

Independentemente das opiniões a respeito, contrárias e favoráveis,


estas máquinas foram fundamentais na consolidação da música
gravada e nos estúdios do mundo todo. Sua importância foi tão grande
que considero fundamental a qualquer um que se aventure no áudio
conhecer o seu funcionamento. Em parte, este conhecimento pode
funcionar como uma forma de respeito e consideração (e até uma
certa gratidão), já que se não fossem as fitas magnéticas não
estaríamos neste ponto da tecnologia hoje. As dificuldades
apresentadas por esta mídia eram tantas que levaram ao
desenvolvimento de muitas técnicas e muitos dispositivos que
acabaram contribuindo muito para o áudio como um todo.

Alguém pode até ser um pouco mais sarcástico e dizer que se as fitas
analógicas não fossem tão complicadas, talvez o áudio digital ainda
demorasse bem mais pra aparecer. Independentemente disso, o fato é
que sempre aproveitamos este espaço para não só apresentar fatos,
©2019 by Fábio Henriques
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mas também para fornecer maior base teórica aos leitores. Por isso,
vejamos, antes de mais nada, uma diferença fundamental entre áudio
analógico e digital.

O BOLO DE CHOCOLATE

A primeira vez que escrevi profissionalmente sobre áudio, aqui mesmo


na AM&T, lá pelo ano 2000, comentei justamente sobre esta metáfora.
Acho que ela exemplifica muito bem o ponto que queremos abordar.

Imaginem que Joãozinho adora o bolo de chocolate que sua mãe,


Dona Maria, faz. Apesar de morar sozinho, todo fim de semana ele faz
questão de ir até a casa dela e saborear o quitute. Sua mãe é daquelas
cozinheiras que conseguem fazer um bolo sempre com o mesmo
capricho, e sempre com o mesmo inimitável sabor. Pois bem: certo dia
Joãozinho é transferido no emprego para uma cidade a 1.000 km de
distância, o que torna impraticável visitar sua mãe frequentemente.
Como ele poderá fazer para conseguir comer o bolo de chocolate? A
ideia de comprar um de outra pessoa nem passa por sua cabeça, pois
a receita dela é única. Então, depois de muito pensar, ele vê que
existem duas possibilidades.

A primeira maneira de conseguir comer o tal bolo é pedir que sua mãe
o faça e, usando o melhor método possível, o envie para ele. Porém,
para que o bolo chegue em perfeito estado, ela terá que se preocupar
muito no modo como embalá-lo, por exemplo. Da mesma forma,
precisará escolher um meio de transporte que o submeta ao menor
castigo possível. Ou seja, o bolo que vai chegar a Joãozinho
provavelmente não será exatamente o mesmo que saiu da casa de sua
mãe: ele terá sofrido os efeitos da temperatura, dos solavancos da
estrada e até mesmo da passagem do tempo. Por mais que ela
capriche na embalagem e que a transportadora seja zelosa, o bolo
ainda não será, ao chegar, exatamente o mesmo. Além disso, quanto
melhor for a embalagem, o transporte e a rapidez, mais caro será enviar
o bolo. Enviá-lo de helicóptero talvez fosse a melhor opção em termos
de fidelidade, mas certamente a mais dispendiosa.

Porém, existe um outro jeito dele comer o bolo de chocolate. Como


Dona Maria é muito meticulosa, ela sabe exatamente todas as
quantidades de todos os ingredientes usados, e o processo que ela usa
para cozinhar é bem controlado. Assim, ela é capaz de fazer uma
receita extremamente precisa de como fazer o bolo e a enviar por e-
mail para Joãozinho. Pronto. Agora, se ele tiver acesso a todos os
ingredientes e cumprir com extrema precisão a receita, conseguirá
fazer o bolo. Observem que a exatidão do gosto obtido está
diretamente relacionada às duas condições acima. E, também, se sua
mãe errou ao escrever a receita, confundindo algum valor, também
©2019 by Fábio Henriques
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haverá prejuízo do resultado final. Porém, ele poderá repetir o bolo


quantas vezes quiser, deixando Dona Maria em paz pra conversar no
Face com as amigas.

É bem desta forma que áudio analógico e áudio digital se comportam.


Quando se transmite ou grava áudio analógico, a gente o está fazendo
com a coisa em si. A informação passa diretamente de um ponto a
outro. É como se estivéssemos enviando o bolo. Porém, este áudio
sofrerá com as imperfeições que encontrar pelo caminho, ganhando
distorção e ruído a cada equipamento por que passar. No final, se tudo
correr bem, teremos um resultado que não é exatamente como o áudio
original, mas pode ser aceitável. Para que este áudio seja muito
parecido com o original, porém, temos que ter extremo cuidado com
todo o processo, e, muito provavelmente, teremos que usar
equipamentos muito caros.

No mundo da gravação analógica, a qualidade obtida era


extremamente dependente do custo dos equipamentos. Um estúdio
pequeno ("estúdio de oito canais") apresentava resultados bem piores
do que um estúdio grande ("de 24 canais"). E, na verdade, esta
diferença entre pequeno e grande não era de tamanho físico, mas de
tamanho de investimento.

O áudio digital, porém, funciona como a segunda opção de Joãozinho.


Ao converter uma informação analógica para digital, precisamos fazê-
lo com a maior precisão possível, pois da qualidade de nossa "receita"
dependerá a qualidade do produto final. Porém, não adianta sermos
mais precisos que o necessário, pois dependemos tanto de quem vai
executar a receita quanto da sensibilidade do paladar de Joãozinho.
Por exemplo, se a quantidade de farinha especificada for 219,0005
gramas e a balança que Joãozinho usa tiver uma precisão de um
grama, a balança que usamos para elaborar a receita foi
desnecessariamente precisa. É mais ou menos como amostrar em 96
kHz quando 48 kHz é só o que se precisa.

Se a mãe de Joãozinho manda a receita por e-mail, certamente ela


chegará certinha do outro lado. Assim, este método é imune aos
problemas de transmissão. Ele inclusive tem um método de verificação:
se lá do outro chegar "...arinh...", tanto se pode deduzir de que se trata
de farinha ou ligar pra mãe e confirmar. Na transmissão digital são
acrescentados dados que servem justamente como verificação de
possíveis erros. E estes métodos são extremamente eficientes. Pra quem
duvida, você já reparou que seu saldo de R$ 14,53 no internet banking
nunca vem por engano como R$ 14.530,00? E que quando escrevo
"escrevo" neste texto aqui em casa e mando pra revista ele nunca
chega lá como "excrevo"? Pois é: o áudio digital - e a transmissão digital
em geral - possuem como vantagem muito importante esta
©2019 by Fábio Henriques
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capacidade de evitar erros de armazenamento e transmissão.

Finalmente, Joãozinho tem que ser bem obediente e executar com


perfeição a receita, usando os ingredientes exatos. Ou seja, a
qualidade depende também da conversão de digital de volta para
analógico. Assim como no bolo, o resultado certamente não será
exatamente o mesmo do início, porém o grau de precisão é
extremamente alto. Provavelmente a sensibilidade do paladar de João
será insuficiente para detectar a diferença. E ainda há uma vantagem
adicional: Joãozinho pode mexer na receita à vontade, testando muitos
resultados possíveis, e sempre poderá voltar à receita original, o que
nunca aconteceria se ele tivesse o bolo físico.

Em resumo, esta longa história serviu para exemplificar e deixar bem


nítidos estes aspectos importantes. Vejamos o porquê.

POR QUE ÁUDIO DIGITAL?

Não sei se alguém já se perguntou (eu já), mas se a gravação em fita


analógica era tão sensacional, por que diachos inventaram o áudio
digital? O som não era "quente", envolvente, macio e tudo o mais?

Bom, existe a primeira possibilidade, que seria um "complô da indústria


que queria a todo custo ganhar muito mais dinheiro fazendo todo
mundo comprar tudo de novo mesmo que com qualidade pior". Porém
não é nada disso. Quem trabalhava em estúdio sonhava sempre com
menor chiado, menor distorção, maior compactabilidade, menores
valores de wow e flutter, menor crosstalk, e coisas do gênero. Só o fato
de se chegar no estúdio e não precisar gastar meia hora alinhando o
gravador que foi alinhado ontem já seria sensacional. O povo em geral,
por sua vez , mesmo ainda sem saber, certamente iria adorar poder
ouvir áudio de qualidade nas mais diferentes situações e por um custo
bem mais baixo, transmiti-lo pela internet etc. Os pobres dos músicos
independentes e iniciantes iriam agradecer muito se o resultado que
obtivessem em estúdios pequenos fosse da mesma qualidade dos
grandes, e que não houvesse mais limitação de canais.

Ou seja, o áudio digital foi uma ótima novidade, exceto, talvez, pros
mais arraigados às suas próprias limitações pessoais, e aos que, por
natureza, temem a novidade.

UMA NOVA MÍDIA

Imaginemos que estamos em um mundo onde o áudio já tenha nascido


digital. Nunca houve gramofones e nem fitas analógicas. Daí, eu, um
brilhante inventor, apareço com uma novidade que acabei de
©2019 by Fábio Henriques
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inventar: o iNalog (pretendo vender pra Apple). Ele é um gravador


muito legal, capaz de gravar 24 canais diferentes ao mesmo tempo,
mas não pode passar deste limite. Pesa uns 50 kg, mede 1,20 x 0,80 x
0,80 m, consome uns 200 watts de potência (não funciona com
baterias), mas dá um som maneiro. Quer dizer, isso se você alinhá-lo
todos os dias, mas o alinhamento só consome uns 30 minutos. E tem a
mídia. Nada de memória RAM ou pen drives e muito menos hard disk -
estas coisas "frias" e sem vida. A mídia é uma fita de plástico bem fina
coberta com uma pasta de cola e ferrugem. É nesta ferrugem que a
informação será escrita, já que o método de gravação é magnético.
Como a resposta em frequência vai depender da velocidade com que
a fita roda, será preciso muuuuita fita. Assim, a mídia vem em rolos
contendo mais ou menos 500 metros de comprimento, o que faz com
que cada um pese uns 5 kg e tenha uns 30 cm de diâmetro. Eu sei que
é volumoso, mas pelos menos com um rolo desses será possível gravar
surpreendentes 16 minutos e 30 segundos de música!

Para que o iNalog funcione, é preciso transmitir o magnetismo para a


fita, o que é feito por uma "cabeça" magnética, e esta transmissão é
melhor se a fita estiver bem perto. Assim, o que se faz é esfregar a fita na
cabeça. Ok, eu sei que isto provoca um enorme desgaste por atrito na
cabeça, que irá piorando sua performance com o uso, enquanto que a
fita também, cada vez que roda, perde um pouco de qualidade pelo
mesmo motivo. Mas acho que isso não será problema, pois no vinil
ocorre o mesmo problema e os audiófilos não se incomodam.

Tem também o crosstalk, que é o vazamento de um canal nos canais


adjacentes (é difícil fazer o magnetismo ficar quietinho na sua trilha), e
quanto mais grave a frequência, pior. Pra contrabalançar isso basta
você se obrigar a gravar só coisas agudas entre as graves, tipo hihat-
baixo-pratos. Além disso, todo mundo sabe como é complicado e caro
fazer uma máquina que mantenha constante a velocidade de uma fita
tão pesada, e a gente acaba tendo umas flutuações (wow e flutter)
que provocam distorções que são pelo menos 100 vezes maiores que
no digital. Mas, afinal, isso é que dá "vida" à coisa...

Finalmente, o fator mais importante: um iNalog vai custar apenas uns


US$ 40 mil, e cada fita de boa qualidade uns US$ 150. Mas eu sei que
qualquer um pagaria este preço pra ter um som analógico, não é
mesmo?

Estou aceitando pedidos pro meu invento...

©2019 by Fábio Henriques


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6) O Melhor Equipamento do Mundo é o Seu


Frequentemente ouço perguntas de pessoas que querem saber se os
equipamentos que têm são bons, ou o que de melhor podem comprar
com x dinheiros. É bastante compreensível que as pessoas se
preocupem com a qualidade do que produzem. Mais natural ainda é
ver que a dúvida procede, uma vez que somos bombardeados o
tempo todo por propagandas de equipamentos e softwares novos,
todos tentando nos convencer de que só com eles conseguiremos
resultados "profissionais".
Para quem padece com este tipo de dúvida, o meu conselho é o
seguinte: o melhor equipamento do mundo é o seu. As pessoas
precisam se conscientizar de que os resultados sonoros que admiram
não são necessariamente obtidos por causa de determinado
equipamento. O que faz toda a diferença do mundo é saber usar com
maestria o equipamento que se tem.
Outro dia eu recebi um cartão onde se via uma pintura espetacular
feita por uma pessoa que não tem braços e que pinta com os pés.
Experimentem me dar os mesmos pincéis e tintas que ela usou e o
máximo que consigo são bonecos de cinco tracinhos – e usando as
mãos! A diferença entre mim e este pintor é que ele sabe o que fazer
com as ferramentas de trabalho.
O primeiro disco da Alanis Morissette (que eu saiba) foi gravado em
ADAT cara-preta e deu no que deu. Frank Filipetti gravou Hourglass do
James Taylor numa 02R e ganhou o Grammy de melhor gravação do
ano. E os exemplos prosseguem.
O pior é que os exemplos opostos a gente desconhece. Quantos
trabalhos foram gravados em mega estúdios com mega equipamentos
e não deram em nada?
Por isso, a primeira coisa a se combater é esse sentimento generalizado
de que "se eu tivesse o equipamento tal eu conseguiria, mas como não
tenho, sigo frustrado e com maus resultados". Não é assim que a coisa
funciona. Um super resultado sonoro é a soma de uma cadeia de
fatores. Começa com uma boa música, um bom instrumento bem
afinado, um bom arranjo, um bom músico, uma captação adequada,
um equipamento adequado e principalmente um bom profissional de
gravação, mixagem e masterização. E quando eu digo "equipamento
adequado" não quero dizer necessariamente "caro".
Seria porém ingenuidade a gente dizer que um equipamento de
qualidade não ajuda no resultado, mas o estrago que um mau
profissional pode fazer é infinitamente maior, ganhando de longe na
comparação.
Então, antes de se perguntar se o seu equipamento é o melhor,
questione se você está tirando dele tudo o que é possível. Quando essa
limitação começar a atrapalhar, aí sim é hora de pensar num upgrade.

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7) A Controvérsia do Summing Amp

Estava escrevendo meu próximo artigo para a AM&T , falando dos


equipamentos que em tese "melhoram" as mixes, e vcs imaginam o que
falei sobre os summing amps. Hoje, lendo o livro Mastering Audio do Bob
Katz, eis que vejo o seguinte trecho (que traduzi livremente abaixo), que
coincide diretamente com o que escrevi ontem:
A maior panaceia sendo vendida atualmente é o summing amp. É dito
que ele evita os “problemas” envolvidos no summing digital. Muitos
engenheiros se queixam que em suas mixes digitais faltam separação e
profundidade. Mas vamos esclarecer as coisas:
NÃO EXISTE ABSOLUTAMENTE NADA ERRADO COM O SUMMING DIGITAL.
Ele é perfeito em essência, principalmente porque somar números é a
coisa mais fácil que se pode pedir para um DSP fazer.

A partir de testes cegos que executamos chegamos àos resultados:

. Summing analógico pode soar indistinguível do digital, desde que


conversores e componentes analógicos transparentes sejam usados.
Neste caso, não há benefício no summing analógico.

. Qualquer fonte de áudio pode adquirir profundidade e separação ao


passar por certos componentes analógicos, devido a sua distorção
“amigável”.
[...]

.Nem todo estilo musical se beneficia da coloração (alteração de


timbre) resultante do analógico, nem na mixagem, nem na
masterização. Muitos estilos, como clássicos e a maior parte do jazz,
buscam uma abordagem mais “limpa”.

Acho que Mr. Katz resumiu bem a coisa.

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8) Caçando Mitos (Parte 1)


As lendas, a atmosfera do vinil e o problema da escadinha

Pode-se notar hoje em dia dois movimentos muito fortes no áudio. Por
um lado, o conceito muito difundido de que "quanto mais alta a sample
rate, melhor", e, de outro, a ideia de que as gravações em vinil e em fita
são mais "fiéis". Independentemente da veracidade destas afirmações,
sobre as quais falaremos mais adiante, existe, antes de tudo, uma
questão que precisa muito ser abordada. Maior do que qualquer mito
técnico, existe não só uma lenda urbana, mas uma verdadeira crença
quase religiosa na dissociação entre o caráter "matemático e físico" e o
"emocional e espiritual" da música e do áudio. Toda vez que qualquer
assunto técnico vem à tona, lá vêm os "românticos" a criticar a frieza
dos números e defender o lado poético da coisa.

É óbvio que o áudio atua profunda e decisivamente no cérebro


humano. Desde nosso lado mais primitivo, pré-histórico mesmo, que se
beneficiou de nossa habilidade de distinguir sons repentinos em meio a
ruídos de fundo de nível mais ou menos constante (costumo sempre
citar a situação hipotética em que nosso ancestral hominídeo é salvo
de um ataque de urso por conseguir distinguir o som de um graveto
quebrando e determinar sua direção, mesmo estando à margem de um
rio barulhento), até os setores mais evoluídos, que conseguem captar a
beleza de estruturas melódicas e harmônicas de uma sinfonia. Agora,
pressupor que isso conflita com qualquer análise científica é, no mínimo,
ofender séculos de ciência muito bem feita.

Aproveitando o gancho da música clássica, já ouvi gente dizendo


coisas do tipo "como será possível descrever matematicamente uma
obra de Bach?". Esta pessoa esquece que a afinação temperada -
usada por Bach em O Cravo Bem Temperado - nada mais é do que a
matemática e a física a serviço do pragmatismo musical. E se levarmos
nosso raciocínio bem mais para trás, teremos as primeiras investigações
de Pitágoras (há meros 2.500 anos) quanto à questão das consonâncias
e dissonâncias. Tudo ciência.

Talvez o problema central esteja nesta falsa ideia de que a ciência é


algo que não contempla o lado mais espiritual das coisas. Como cita
um enfático leitor em comentário no meu blog: "Fico me perguntando
por que ninguém tenta explicar nossas emoções de forma matemática".
A ele, o que respondi é que isto não é verdade de modo algum. Além
do fato de existirem já esforços no sentido de se descrever matemática
e fisicamente o processo emocional humano (já se consegue mapear
as emoções através de tomógrafos, por exemplo), já até começamos a
esboçar alguns pequenos resultados nesta direção, como nas já
existentes cadeiras de roda movidas por comandos mentais.

©2019 by Fábio Henriques


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É fundamental que a gente não confunda a complexidade de algo


com a nossa incapacidade absoluta de entendermos ou descrevermos
e estudarmos cientificamente. Como diria Arthur Clarke, "qualquer
tecnologia suficientemente avançada é indistinguível de magia". Vai
tentar explicar um iPhone para um pigmeu que nunca teve contato
com nossa civilização... Então, só porque algo é ainda complicado
demais para a gente entender ou descrever não quer dizer que seja
impossível para sempre.

Alguns podem argumentar que, por exemplo, nossos modelos científicos


são pobres. E, de fato, preciso concordar. Você pode passar horas
alinhando a sala de um estúdio apenas pelo gráfico de um analisador
de espectro, mas enquanto não ouvir efetivamente a sala, não há
como saber se o resultado está agradável. Este não é um problema de
impossibilidade, mas de grau de complexidade, tal como vimos acima.
Para lidar com coisas muito complexas, o que a gente tem feito desde
que inventamos a roda até colocar 32 satélites a 2 mil km de distância
da Terra, que nos permitem achar nossa posição com um GPS
comprado por menos de R$ 300, o processo sempre foi mais ou menos o
mesmo: a gente quebra algo bem complicado em pedaços menores,
para que possamos descrevê-los com precisão, e a partir daí montamos
nossa tecnologia. Afinal, se ideologicamente a ciência busca o
entendimento e a descrição da realidade, em termos de engenharia só
é importante que as descrições científicas "funcionem" (a descrição do
"real" reside em outro campo). Pergunte a um doutor em física quântica
se ela é a "verdade" e provavelmente ele vai responder que isso ele não
sabe, mas sabe que as equações que a constituem funcionam.

Sendo assim, por mais que um sinal de 1 kHz ou um ruído rosa sejam uma
pálida amostra do que a maravilha da informação musical pode atingir,
isto não quer dizer que a estejamos resumindo através deste tipo de
simplificação. Este é apenas um jeito simples de lidar com coisas
complexas para que seja possível trabalharmos com elas. Imaginem se
para alinhar um PA precisássemos ficar esperando a chegada de um
superaudiófilo para julgar se o "calor", a "envolvência" e a
"expressividade" do ambiente da micareta estão ok. Por outro lado,
ainda é, sem dúvida, necessária uma boa dose de avaliação
intelectual do técnico de PA, que vai além dos meros testes que os
aparelhos fornecem. Escolher as tintas e os pincéis é apenas uma etapa
para se conseguir uma bela pintura.

A ATMOSFERA DO VINIL

Tomemos um caso bem simples. Em um dos posts mais polêmicos de


meu blog, eu fazia uma comparação técnica entre LPs e CDs, e este foi
um caso emblemático nesta questão de que tratamos. No texto, eu,
antes de mais nada, deixo claro que discuto apenas aspectos técnicos,
©2019 by Fábio Henriques
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pois não acho que contribua em nada, pelo menos neste tipo de
discussão, dar uma mera opinião. Dizer ao leitor o que eu gosto ou
prefiro não o ajudará em nada, mas fornecer-lhe dados palpáveis e
verídicos pode ser uma ferramenta bem útil.

Um dos problemas que levantei no tal post foi o da velocidade angular


constante do LP versus velocidade linear constante do CD. Esta é uma
questão importantíssima na comparação destas mídias, mas confesso
que nunca vi ninguém levantá-la.

Explicando, um LP gira a uma velocidade constante de 33,333333


rotações por minuto, e esta é sua chamada "velocidade angular". A
agulha lê suas informações de forma linear, em círculos concêntricos, a
partir da borda da "bolacha", caminhando em direção ao centro.
Fazendo um paralelo, alguém já reparou que, numa corrida de 400
metros rasos, quanto mais interna a raia, mais para trás o corredor
larga? Isto lhe dá uma desvantagem? É claro que esta diferença entre
os corredores visa compensar o fato de que quem faz a curva por fora
corre uma distância maior do que o que está por dentro. No caso do LP
acontece algo semelhante. Como a velocidade de rotação é
constante, a velocidade linear da borda da bolacha é maior do que
perto do centro. E como o disco leva sempre os mesmos 1,8 segundos
para dar uma volta, o início da primeira faixa percorre uma distância
bem maior que o final da última faixa.
Vejamos um exemplo. Tomemos o LP Time Further Out, do The Dave
Brubeck Quartet, lançado em agosto de 1961 (curiosamente, o mês e
ano em que nasci), que ainda tenho em minha coleção de vinis
"sagrados". O início da primeira música do lado 1, It's a Raggy Waltz,
está a 14,5 cm de distância do centro do disco, e o final da última faixa
deste lado, Far More Blue, está a 6,5 cm. Poupando os leitores do
detalhe do cálculo (inserir qualquer conta com o número Pi aqui não
seria muito amigável), para tocar o primeiro 1,8 segundo de música a
agulha teve a felicidade de percorrer uns 91 cm de vinil. Quase um
metro para uns dois compassos.

Pois bem. Para executar a última volta do LP no final de Far More Blue, a

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agulha teve apenas 41 cm. Ou seja, para o mesmo 1,8 segundo de


música, menos da metade do vinil. O resultado disso é que a qualidade
do áudio é substancialmente menor perto do centro do que perto da
borda. Mal comparando, seria diminuir a sample rate de uma gravação
digital pela metade (para os mais céticos, uma senóide de 1 kHz na
borda tem um comprimento físico de 0,5 mm, e, no centro, 0,2 mm).

Isto é algo frio e técnico que transcende qualquer necessidade de


recorrermos a aspectos mais nobres da sensibilidade humana.
Antigamente, quando a gente definia a ordem das músicas de um LP,
obviamente havia a preocupação estética, mas o segundo fator mais
importante era justamente quais músicas mereciam mais qualidade e
quais as que podiam se contentar com menos. E então havia o dilema
de que a segunda melhor música em termos de qualidade técnica seria
a primeira do lado B, mas, em compensação, o ouvinte seria obrigado
a virar o disco após ouvir a primeira do lado A.

No caso do CD, há duas diferenças importantes. A primeira não é tão


relevante, que é o fato dele ser lido do centro para a borda, ao
contrário do LP. Mas a segunda é fundamental. No CD, a velocidade
angular varia no sentido de que a velocidade linear de leitura seja
constante. O CD roda mais rápido nas primeiras músicas do que nas
últimas. Isso garante que, pelo menos neste aspecto, a qualidade da
decodificação será a mesma ao longo de toda a audição. Somando a
isso o fato de que não é preciso "virar" o CD, nossa única preocupação
na hora de definir a ordem das músicas é a artística.

Voltando ao nosso ponto de discussão, depois que eu apresentei essa e


outras importantes desvantagens do LP, choveram comentários falando
da impossibilidade do CD captar a "atmosfera" que o LP capta, e coisas
do gênero. Percebem a "mudança de foco"? Enquanto um medidor de
distorção nos daria uma ideia bem precisa do prejuízo sofrido na última
música, um "atmosferômetro" é algo que ainda não existe. O problema
é focar no que se mede. E pra quem deseja argumentar que o cérebro
é o nosso atmosferômetro, o mínimo que posso dizer é que todos
precisaríamos receber uma calibragem cerebral do Inmetro para que
pudéssemos comparar nossas opiniões.

Pedindo licença aos leitores para emitir, agora sim, minha opinião, acho
um absurdo eu ter que ouvir Far More Blue com a metade da qualidade
de It's a Raggy Waltz. Fim da opinião.

O MITO DA ESCADINHA

Fourier

Vejamos um caso muito interessante e que parece ser o assunto do


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momento no meio do áudio profissional. Mas, antes disso, permita-me


apresentar-lhes uma entidade que será a base de toda a nossa
discussão: a senóide.

Esta é a onda mais simples da natureza, e pode ser conseguida no Pro


Tools através do plug-in Signal Generator. Em outros softwares sempre há
um jeito de gerá-la. É importantíssima, como veremos, mas sozinha dá
um som nada interessante. Experimente e depois volte aqui.

Prosseguindo, para fornecer base à nossa conversa, precisamos, antes


de qualquer coisa, dar um pulinho rápido ao início do século 19,
quando Fourier fazia suas pesquisas (curiosamente, ele estava
preocupado com propagação de calor, e não com música, embora
provavelmente gostasse de Beethoven, que "bombava" nesta época).
Pois bem, Fourier demonstrou que uma onda periódica (aquela cuja
"forma" fica se repetindo, como é o caso idealizado de uma nota
emitida por um instrumento, se desconsiderarmos seu attack e release)
qualquer podia ser entendida e definida como a soma de uma série
(provavelmente infinita) de senóides básicas, como a que vemos na
figura. Isto representou uma senhora simplificação para um
problemaço.

Se a gente olha no Pro Tools um trecho de um áudio, vai ver uma onda
bem complicada. A partir de agora a gente pode analisar esta onda
não a partir deste desenho complicado, mas a partir das diversas
senóides simples que na verdade a compõem. A coisa vai mais longe.
Se a onda é periódica e tem uma fundamental de, digamos, 100 Hz,
estas senóides que a compõem são de frequências múltiplas inteiras
deste valor. Ou seja, uma onda complicada cuja frequência
fundamental é 100 Hz é a soma de uma senóide de 100 Hz mais uma de
200 Hz mais uma de 300 Hz mais uma de 400 Hz, e assim por diante.
Sinistro! Chamamos, em música, a primeira frequência de "fundamental"
e as demais são os seus "harmônicos".

Mas se é assim, o que faz as ondas de 100 Hz do baixo e da tuba

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soarem diferentes? Bem, o que ainda não dissemos é que a intensidade


de cada uma destas senóides - chamadas de "harmônicos" - é que
determina o formato da onda. Para cada harmônico temos um valor
diferente, que pode, inclusive, ser zero.

Resumindo, graças à mania dos cientistas de pegar um problema bem


difícil e simplificar, conseguimos descobrir que ondas bem complexas
podem ser entendidas como soma das ondas mais simples que existem.

Nyquist

A esta altura, todo mundo com pelo menos um pouco de interesse na


área técnica (e o que alguém que não tem estaria fazendo lendo este
texto até aqui?) já tem uma ideia do que é sample rate e o tal de
Teorema de Nyquist. Bom, há várias décadas, muito antes de existir o
áudio digital, o pessoal da Bell Laboratories trabalhava com
comunicações, e Nyquist, ainda nos anos 1930, foi um pioneiro na área
de amostragem de sinais. Seu trabalho foi complementado por outros,
mais notadamente Shannon e Kotelnikov, que diz, explicitamente: "Se
uma função x(t) não contém frequências acima de B Hz, ela é
completamente determinada se dermos as suas coordenadas em uma
série de pontos espaçados de 1/2B segundos."

Versão em "português": imaginemos a simplificação em que temos uma


bela senóide de 1000 Hz. Se anotarmos o valor de sua amplitude 2000
vezes a cada segundo, estaremos determinando exatamente esta
onda, pois nesta função simples não temos nenhuma frequência acima
de 1000 Hz.

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Vejam que interessante: ele afirma (e prova - esse pessoal da


comunidade científica faz uma certa questão disso) que se eu anotar
uma série de números como acima, serei capaz, em outra
oportunidade, de recriar esta onda exatamente como ela era apenas
através destes números. Ninguém na comunidade científica reclamou
que ele estava transformando a senóide em escadinha (voltaremos a
isto mais adiante) e que por isso ela estaria muito longe da realidade.

Mas reparem que o texto diz que deve haver uma frequência máxima
(B) na tal função para que se possa estabelecer a frequência de
amostragem correta. Assim, se temos uma onda mais complexa e
admitimos que ela tem uma frequência máxima, amostrá-la no dobro
desta frequência capta todas as informações a respeito de seu
conteúdo harmônico.

Pois bem, a gente não precisa se preocupar em "acreditar" em Nyquist,


Kotelnikov e Shannon, já que desde 1949 ninguém os desmentiu, então
vamos admitir que o teorema é verdadeiro (aliás, qualquer coisa em
matemática que tenha o nome de "teorema" já implica em ser uma
verdade comprovada e comprovável; para um exemplo interessante,
vale pesquisar a questão da Conjectura de Fermat, que só virou
teorema após 358 anos, quando finalmente foi provado).

Assim sendo, se a gente conseguir garantir (na medida do possível) que


haja uma frequência máxima em um sinal de áudio a ser digitalizado,
amostrá-lo no dobro desta frequência nos dará fidelidade absoluta com
relação aos harmônicos que o constituem. E o tal sinal nem precisa ser
periódico, na verdade. Mais adiante veremos como conseguimos esta
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garantia.

Por enquanto, vejamos a questão da "escadinha". Outro dia vi um


importante cantor dando uma entrevista. Nela, ele disse que preferia o
vinil, pois o digital transformava o áudio numa escadinha, e que isso era
antinatural. Perdeu uma excelente oportunidade de ficar em silêncio.

Vejamos por que.

CONSTRUINDO E DESCONSTRUINDO A ESCADINHA

Se a gente tem um sinal original senoidal, por exemplo, entrando em um


equipamento ou processo, se a onda sai com a sua forma (mesmo que
muito levemente) alterada, significa que ela sofreu uma distorção, e
essa mudança na forma da onda na verdade foi o resultado de termos
acrescentado harmônicos a ela (ou de termos alterado a intensidade
dos seus harmônicos originais).

O processo de amostragem, em um dado momento, realmente


transforma o sinal numa "escadinha", que tem uma certa semelhança
com a onda original porque tem a mesma frequência fundamental. Só
que isto se dá internamente. Antes do sinal ser mandado para a saída,
ele passa por um filtro que elimina todos os harmônicos acima daquela
tal frequência máxima B que vimos anteriormente. Assim, como a
diferença entre a escadinha e a onda original eram os harmônicos
extras que entraram para montar os "degraus" da escada, se a gente
manda estes harmônicos embora, o que temos é justamente a onda
original. Apesar de ter havido a tal escada, não era, de modo nenhum,
antinatural.

Como exemplo, temos as figuras presentes nesta página. Na do alto na


tela temos uma onda quadrada com frequência de 100 Hz. Este é o pior
caso de escadinha possível, em que a senóide original foi toda
transformada numa grande escada. Na segunda, aplicamos um filtro
passa-baixas (filtro de agudos) em 200 Hz, eliminando os harmônicos
acima deste valor. O resultado é justamente a senóide original de 100
Hz. Para os que quiserem verificar, estou disponibilizando uma sessão de
Pro Tools que demonstra isso em http://tinyurl.com/sessao-protools.

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Repare que o som da onda quadrada tem um "zumbido" e que a


senóide fundamental tem um som puro. O conjunto dos harmônicos
acima dos 100 Hz é o responsável pelo zumbido (outra coisa que se
pode notar ao lado do "length" lá em cima no contador de samples é
que uma oscilação completa tem exatamente os 441 samples que uma
onda de 100 Hz tem por segundo, pois cada oscilação desta frequência
tem 1 centésimo de segundo). A conclusão a que chegamos é que
alegar que o problema do digital é a escadinha não procede.

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9) Por que o equipamento não importa:


Um olhar herético em por que fazemos o que fazemos

Autor: Lynn Fuster, editor técnico da Pro Audio Review

[...] Equipamento de gravação nunca foi tão acessível e barato na


história da humanidade. Então todo esse processo deixou as gravações
de música “melhores” do que eram algumas gerações atrás?
Infelizmente, não. Nós estamos em uma encruzilhada, onde a
tecnologia roubou o foco da música a quem ela deveria servir. O
objetivo de escrever uma boa canção deu lugar ao de programar um
bom loop ou encontrar um bom riff.[...] Na década passada nós nos
perguntamos por que a música tem se desvalorizado tantoe por que ela
não se conecta ao público como fazia antigamente. Uma teoria
comum a respeito da falta de envolvimento musical aponta o dedo
diretamente para a gravação digital e consequentemente ao mp3.
Algumas pessoas atribuem erradamente a magia musical que tantos
compositores/músicos buscam (os hits dos anos 50 aos 90) às válvulas e
fitas analógicas. A magia real, porém estava nas performances, não nos
equipamentos.
Então por que chegamos a este estado de coisas? É o resultado de
uma indústria que pressiona o comércio em vez da criatividade. Eu vejo
músicos atualmente que gastam mais tempo falando de equipamentos
e lendo revistas, e fóruns online do que escrevendo músicas ou
praticando seus instrumentos. É triste mas é verdade.
O segredinho que ninguém conta aos iniciantes é que a gente não
precisa de grandes equipamentos pra fazer uma grande gravação.
Vou repetir. A GENTE NÃO PRECISA DE UM GRANDE EQUIPAMENTO PRA
FAZER UMA GRANDE GRAVAÇÃO. O ingrediente mais importante e
necessário para se fazer uma grande gravação é talento. [...] É claro
que equipamento ajuda, mas ele não deve ser o centro das atenções.
Nos últimos meses tenho perguntado a vários engenheiros de renome a
mesma questão: “se alguém te pedisse para fazer uma gravação
usando apenas SM57s você acha que conseguiria uma gravação com
um grande som?” E a resposta de todos eles foi: “É claro!”.
Provavelmente não vai ser tão fácil qunto se usassem o seu próprio kit
de microfones, mas pode ser feito e bem feito. Francamente, falta de
equipamento frequentemente inspira – ou melhor, exige – maior
criatividade.
[...] Então por que a indústria como um todo é tão obcecada com
equipamento? Aqui vai minha teoria. Equipamento você compra,
talento não. É fácil comprar o equipamento usado pra gravar a voz de
Paul McCartney ou Michael Jackson, mas conseguir aquele som é muito
mais difícil, porque não foi o equipamento que fez aquele som, apesar
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de ter contribuído para a coisa. Como Sir Paul McCartney soa se a


gente tirar o Neumann U47, a mesa REDD, o compressor Fairchild eo
gravador BTR? Como Paul McCartney.
Ed Cherney conta que “eu tentei, e na maior parte das vezes sem
sucesso, conseguir um bom som de bateria durante os primeiros
dezesseis anos de minha carreira. Então um dia Jeff Porcaro foi gravar
em uma sessão que eu estava fazendo. Eu me tornei um gênio naquele
dia.”
Glenn Rosenstein uma vez me disse: “Quer saber como conseguir
aquele som de violão do James Taylor? Dá um violão na mão do James
Taylor e coloca um U87 na frente. O som de guitarra mais fácil da minha
vida.”
[...] Como diz Bruce Swedien: “Ninguém sai na rua cantarolando a
mesa”. É a canção. É a melodia.
[...] Eu honestamente preferiria ter um Mick Guzauski, Bill Schnee ou Al
Schmitt mixando numa Mackie do que alguém menos talentoso numa
SSL. Isto porque eu sei que eles conseguem um ótimo resultado
independente do equipamento.
[...] Lembre então destas três coisas:
1.Use o equipamento que você tem.
2.Trabalhe duro para aperfeiçoar o seu ofício.
3. Gaste mais tempo desenvolvendo sua habilidade do que
pesquisando/comprando equipamento
Quando você dominar seu talento, será capaz de usar qualquer
equipamento, bom ou não tão bom. Os grandes equipamentos apenas
tornam sua vida mais fácil.

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10)Ruído Branco e Ruído Rosa

O ruído branco é aquele em que a energia está igualmente dispersa


por todo o espectro de frequências. Como nós tendemos a ouvir de
forma logarítmica, a cada oitava ouvimos o dobro de frequências, e o
ruído acaba ficando fortemente agudo aos nossos ouvidos. Ele é
chamado branco por analogia às cores. É o ruído típico do chiado
entre estações de rádio ou tv. É o mais natural dos ruídos, sendo
facilmente tolerado pelos seres humanos. Não é à toa que o chiado da
fita analógica era aceito.
Mas para medidas de áudio o ruído branco não ajuda, porque não é o
jeito como ouvimos. Assim, se passamos o ruído branco por um filtro
passa baixas de 6dB por oitava geramos o ruído rosa. Ele tem esse nome
porque numa analogia com as cores ele geraria um tom avermelhado.
O ruído rosa possui estatisticamente a mesma quantidade de energia
por oitava e se aproxima do jeito como ouvimos. É por isso que ele é
usado para medidas em áudio.

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11) Áudio de Alta Definição Existe?


Mastered for iTunes

Imagine um casal que tem 7 filhos. Toda vez que a família vai sair junta,
é um problema. É gente demais para um carro. Aí então eles decidem
comprar um meio de transporte em que caiba todo mundo.

Eles podem comprar uma van de 10 lugares, que vai servir muito bem a
todos, ou um ônibus de 40 lugares. Em ambos os casos, a família terá
condições de sair junta com conforto, mas um deles é nitidamente um
exagero. Um ônibus custa bem mais do que uma van. E se a família tem
uma verba limitada, com o mesmo dinheiro vai conseguir comprar uma
van novinha ou um ônibus caindo aos pedaços.

Áudio de alta definição é exatamente isso: você só precisa representar


até 20kHz, então todo sistema amostrado acima de 40kHz irá levar a
família toda sem problemas. Amostrar em 96kHz significa apenas gastar
mais para levar assentos vazios para passear.

Mas aí vem logo o argumento de que existe áudio acima de 20kHz. Na


nossa comparação seria o caso de o ônibus permitir levar um monte de
caronas (primos, cunhados e até desconhecidos), mas pra família
mesmo só a van bastava.

Para os que acham que eu estou exagerando ou sendo equivocado,


vamos ver o que a poderosa Apple tem a dizer.

MASTERED FOR ITUNES

Em janeiro de 2012, a Apple divulgou um paper em que apresenta o


conjunto de ferramentas para a codificação de arquivos de áudio para
o uso em seus dispositivos. O título do documento já é extremamente
impreciso: "Mastered For iTunes - Música como o artista e o engenheiro
de som desejam"

(confira sua versão integral, em inglês, em


https://images.apple.com/itunes/mastered-for-
itunes/docs/mastered_for_itunes.pdf).

Pra começar, acho meio difícil que tanto um quanto o outro prefiram
sua música codificada em AAC, mas tudo bem. É certo que os
encoders atuais são extremamente eficientes, bem mais do que os que
já codificaram (em 128 kbps) mais de 100 milhões de canções em
pouco mais de um ano de lançamento do catálogo do iTunes, em 2003.
Através do atual iTunes Plus, pode-se ter acesso a um conversor que
gera codificação em 256 kbps VBR AAC. A Apple, então, apresenta no
documento o conceito e as ferramentas do "mastered for iTunes". Sem
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entrar na discussão da coisa em si, que valerá um outro artigo inteiro,


voltemos à questão da alta definição.

Neste tal paper, a Apple diz textualmente (tradução e grifo meus):

"O teorema da amostragem de Nyquist estabelece que para


representar um sinal acuradamente deve ser usada uma taxa de
amostragem que seja o dobro da maior frequência sendo
representada. A frequência mais alta audível para os humanos está por
volta de 20 kHz; e, portanto, uma taxa de amostragem de mais de 40
kHz é necessária para representar acuradamente a gama audível de
frequências. Os 44.1 kHz usados nos CDs são adequados para suas
necessidades."

Corretíssimo. Até aí assino embaixo. Só que no parágrafo seguinte temos


a seguinte pérola:

"Mesmo assim, muitos experts sentem que o uso de arquivos PCM de


maior resolução durante a produção fornece áudio de melhor
qualidade e uma experiência auditiva superior no produto final. Por este
motivo, a resolução de 96 kHz/24 bits está rapidamente se tornando o
formato padrão da indústria, sendo também comum encontrar arquivos
de resolução ainda maior, de 192 kHz/24 bits."

Dá pra perceber o absurdo da colocação? Primeiro, temos o


reconhecimento de um fato, e logo a seguir a afirmação de que - ao
contrário do que a Física e a Biologia atestam - o "sentimento" de
"muitos" experts determina o "padrão da indústria"! Estamos investindo
milhões de dólares em desenvolvimento e marketing para satisfazer o
sentimento de (supostos) experts, mesmo que tudo o mais demonstre ser
mero desperdício? E, afinal, que experts são esses? Quantos são
"muitos"? E tem mais: como o que está se oferecendo é um arquivo com
apenas 256 kbps, a ênfase da defesa da alta definição é muito
espertamente jogada para o processo de produção, e não para a
mídia distribuída. Ou seja, segundo o documento, você, como usuário
final, não precisa de áudio de alta definição no produto que tem em
mãos.

Uma coisa interessante é que não vejo ninguém defendendo a subida


de 24 bits para 48 bits no tamanho da amostra, o que faria mais sentido
em justificar a "alta definição", já que estaríamos aumentando a faixa
dinâmica. Ou seja, os "experts" estão preocupadíssimos com resposta
em frequência, mas não estão nem aí pra faixa dinâmica. Curioso, mas
conveniente.

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AS POSSÍVEIS VANTAGENS DA "ALTA DEFINIÇÃO"

Ethan Winer, em seu livro Audio Expert, defende que o uso de taxas
como 96 kHz se justifica apenas quando a representação da
informação acima do limite da audição é importante, como no caso
dos softwares que retiram clicks e outros ruídos impulsivos. Isto porque os
ruídos com esta característica - curtíssima duração e alta intensidade -
possuem amplo espectro de frequências, indo bem acima do que
podemos escutar, e o software pode usar isto como método de
detecção, por exemplo.

Outras pessoas defendem que os instrumentos emitem acima da região


audível, e esta região de cada instrumento interfere na dos outros,
provocando o aparecimento de batimentos na região audível. Pois
bem, admitindo que isto realmente ocorra, primeiro devemos admitir
que os harmônicos desta região acima de 20 kHz são de baixa
intensidade e provavelmente acabam mascarados pelas outras
frequências mais baixas. Segundo, isso tende a acontecer muito mais
intensamente se os diferentes instrumentos estão tocando no mesmo
espaço físico, interagindo acusticamente. Assim, o benefício de usarmos
amostragem em 96 kHz e superiores seria pouquíssimo se comparado ao
consumo de memória, armazenagem e poder de processamento.

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VOLTANDO A DAN LAVRY

Nosso já conhecido Dan afirma categoricamente em seu paper


"Sampling Theory for Digital Audio", de 2004, que:

"Pesquisas mostram que os instrumentos podem produzir energia sonora


acima de 20 kHz, mas há pouca energia sonora acima de 40 kHz. A
grande maioria dos microfones não capta acima de 20 kHz. A audição
humana raramente excede 20 kHz, e certamente não atinge 40 kHz. Isto
sugere que 88.2 e 96 kHz seja exagero. Na verdade, todas as objeções
feitas à amostragem de áudio em 44.1 kHz já ficam totalmente
superadas se aumentamos a taxa para algo como 60 kHz."

Infelizmente, não há equipamentos com esta taxa, e o que se encontra


são 88.2 e 96 kHz. Lavry até admite que se usem estas taxas, mesmo que
elas sejam desnecessárias. Eu me permito discordar, fugindo um pouco
da rigidez matemática e buscando exemplos psicoacústicos feitos com
critério. Um clássico inquestionável é o trabalho "Double-blind test of
SACD and DVD-A vs. Redbook 16/44", de Meyer e Moran, de 2007. Neste
paper, eles demonstram que, sob rigorosas condições de teste, as
pessoas simplesmente não conseguem distinguir áudio de alta definição
do áudio do CD comum. Porém, a provável pressão da indústria gera
quase uma "conspiração universal" a favor do áudio HD. Vejamos o que
diz o relatório da 128ª convenção da AES, de 2010, "High Definition
Audio Developments at the AES" :

"Audiófilos e muitos engenheiros de gravação que usam rotineiramente


sistemas de áudio de alta definição consideram o resultado deste paper
[o de Meyer e Moran] desconcertante, uma vez que a consciência do
potencial para melhor qualidade de gravação é baseada no uso
comercial prático e regular, sendo que o custo aumentado não poderia
se justificar se não houvesse benefício."

Mais uma pérola, como podemos observar. Novamente, o uso regular


por audiófilos e "muitos" engenheiros transforma a realidade, de forma
que "se é mais caro, só pode haver benefício", mesmo que tanto a
matemática quanto testes rigorosos provem o contrário. E o pior é que
esta afirmação está num documento oficial da AES!

MAS EU OUÇO A DIFERENÇA

Agora, sim, chegamos ao cerne da questão. Para aqueles que se


vangloriam de conseguir ouvir a diferença de áudio amostrado nestas
taxas, tenho algumas considerações importantes. Talvez a maior de
todas seja a seguinte: se você está feliz com o resultado que obtém
gastando muito mais memória com menor número possível de canais e
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com maior distorção por intermodulação, nem se incomode. Continue


assim. Afinal, se "muitos experts" o fazem...

Porém, preciso alertar para um detalhe importante: o fato de ouvir


"diferença" não significa que o som está melhor. Muitas vezes há uma
diferença, sim, provocada pelo que se chama de distorção por
intermodulação. Ela é causada por não-linearidades (imperfeições) nos
componentes e circuitos eletrônicos, e quanto maior for a taxa de
amostragem usada, mais ela é acentuada. Então, pode ser que você
esteja ouvindo a interface modificar o som original e não ser mais fiel a
ele. Existem diversos trabalhos que mostram que em muitos casos o ser
humano acha que a distorção é algo que deixa o som mais agradável.

Ethan Winer mostra em seu livro o caso clássico do Aphex Aural Exciter.
Este equipamento reivindicava a capacidade de recuperar a estrutura
harmônica perdida pela inserção de cabos e diversos circuitos no
caminho do áudio. Quando ele apareceu, nem era vendido. Só podia
ser alugado, para manter o segredo de seu funcionamento. Uma
senhora estratégia de marketing, sem dúvida. Houve uma época em
que o Aphex era algo tido como o segredo do sucesso. Acontece que,
analisando o circuito, a gente descobre que o que ele fazia era gerar
uma pequena distorção acima de 5 kHz.

Como já vimos aqui, distorcer significa criar harmônicos altos. Como


resultado, o Aphex ampliava realmente o conteúdo harmônico, porém
sem nenhuma fidelidade direta ao som original. Porém, este
enriquecimento dos harmônicos altos agradava a maioria dos ouvintes,
e daí seu sucesso.

Mesmo que admitamos que o efeito no áudio de alta definição da


distorção por intermodulação deixe o som mais agradável, estaremos
no extremo oposto do argumento inicial, que seria o de maior
fidelidade.

O QUE EU DEFENDO
©2019 by Fábio Henriques
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Acho que a esta altura precisamos, afinal, definir o que seria a minha
sugestão para o trabalho cotidiano. O fato evidente é que não existe
disponibilidade de equipamentos com taxa de 60 kHz. Pesando os prós
e contras, então, eu trabalho tranquilamente gravando em 44.1 kHz no
caso de CDs e em 48 kHz nos DVDs (por força do padrão), e nunca tive
qualquer problema de qualidade final do produto. Para aqueles que
fazem questão absoluta de capturar em taxas maiores, minha primeira
recomendação é analisar se a situação da gravação justifica. Afinal, se
gravar uma orquestra sinfônica pode recomendar tal cuidado, por
outro lado, humming de guitarra captado em 96 kHz é tão ruim quanto
em 48 kHz. E mesmo quando valer a pena gastar mais memória e usar
menos tracks, se o produto final for um CD, a melhor frequência a usar é
88.2 kHz, pois a conversão para o padrão de 44.1 kHz é muito simples.
Gravar em 96 kHz vai obrigar o uso de uma conversão complicada que
anula e até piora qualquer suposto benefício.

CONCLUINDO?

Isto tudo que vimos aqui apenas reforça um fator fundamental em tudo
o que se relaciona a tecnologia de áudio. Esta é uma área da ciência e
da engenharia que é fortemente influenciada pela subjetividade
humana. Lidar com música gravada atua em dois extremos da nossa
consciência. De um lado, temos a emoção em seus aspectos mais
profundos. De outro, a frieza dos números que geram a tecnologia. Não
há como separar estes dois extremos. Caberia a nós, profissionais e
amadores, estabelecer um balanço, de forma que a tecnologia
estivesse a serviço da emoção. O que acaba acontecendo é que a
pressão da tecnologia afeta o nosso lado emocional, em um efeito
reverso. Pensamos que se uma ferramenta é mais "poderosa", o
resultado percebido é certamente melhor. Infelizmente, isto não é a
verdade nua e crua. Somos praticamente forçados a concluir que algo
é mais agradável quando vem de um equipamento mais caro ou mais
avançado. Um colega conta que, certa vez, perguntou ao técnico de
uma mesa megacara que ele instalava: "Por que quando a gente
escuta até mesmo um CD nesta mesa ele soa tão melhor?". E obteve do
técnico a resposta: "Porque você sabe quanto ela custou".

O mais espantoso é que, curiosamente, no caso do áudio analógico,


ocorre o efeito que chamo "reverso-reverso", em que todos acham que
um equipamento mais antigo e mais limitado tecnicamente soa melhor
só por causa disso. Isto é um evidente contrassenso.

©2019 by Fábio Henriques


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12) Otimizando Sua Mixagem Parte 1


Técnicas para produzir mais em menor tempo e com menos estresse

Depois de já termos visto longa e detalhadamente o processo de


mixagem, vamos agora estudar como podemos fazer para conseguir
resultados mais rápidos com menos trabalho. Sinceramente, esta época
romântica de "virar a noite mixando" já perdeu seu atrativo. Verbas e
tempo estão cada vez mais curtos, e a objetividade está virando o
artigo mais cobiçado.

O meu recorde pessoal de horas ininterruptas gravando é 25. Entrei no


estúdio num dia às 9 da manhã e saí no outro às 10. E querem saber? A
música não valeu. E não sou o único, pois antigamente trabalhar longos
períodos era uma necessidade. Não dava pra automatizar tudo numa
mix. Se parasse, tinha que voltar praticamente do zero na outra vez. Se
você acha que as sessões do Pro Tools demoram muito pra abrir, pense
em como era antigamente.

Fique bem claro desde já que otimizar o tempo e a quantidade de


trabalho não tem nada a ver com perder qualidade. Qualidade é algo
que não se deve perder nunca. O nosso objetivo é manter o nível do
resultado consumindo menos tempo e menos neurônios.

O QUE É MIXAGEM

Na verdade, vejamos primeiro o que uma mixagem não é. Mixar não é


ser pago para conseguir o resultado que você acha melhor. Mixar é ser
pago pra conseguir o resultado que o cliente acha melhor. Isso é
realmente complicado. Daí a primeira coisa que deveria acontecer em
uma mixagem é uma conversa. Trocar um pouco de ideias vai
economizar muito tempo. Para mim, que praticamente só trabalho
como freelancer à distância, o início de uma mixagem é sempre
problemático, porque não sei qual a expectativa do cliente. Coloco
reverb e ele não queria reverb; coloco a guitarra alta e ele é o
tecladista, e por aí vai.

Porém, existe o outro lado da moeda, pois há uma parcela considerável


de expectativa do cliente quanto ao que você poderá acrescentar ao
trabalho. Assim, se for possível um bom papo antes, melhor. Quanto a
referências, normalmente elas não são diretamente úteis. Elas acabam
sendo uma forma da gente entender o que o cliente queria pra ele, e
não necessariamente algo que seja aplicável. O melhor orientador que
tenho observado tem sido na verdade a cópia de monitor (as versões
que o cliente tem com ele). No mínimo é o jeito como a música estava
sendo ouvida, e há uma probabilidade muito grande de este equilíbrio
nos dar uma ideia útil dos objetivos.
©2019 by Fábio Henriques
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É preciso, todavia, resistir à tentação de competir com a cópia de


monitor. Procure usá-la apenas pra fornecer um jeitão de pra onde as
coisas vinham vindo até agora. Em alguns casos, o cliente se apaixona
de verdade por sua cópia - a famosa "monitorite" -, e esses casos são
complicados, mas na maioria das vezes existe espaço para trabalhar.

Uma parte delicada da relação mixador x cliente é a questão da


opinião. Imagine que você tenha certeza de que a guitarra está alta
demais, mas o cliente, que por acaso é o guitarrista, pede para
aumentar mais ainda. O que fazer? Esse é o verdadeiro ponto delicado.
Afinal, o cliente é o dono do trabalho, e teoricamente pode fazer o que
quiser. Por outro lado, espera-se que o mixador seja o responsável por
essas coisas, e uma coisa nitidamente ruim pode afetar sua reputação.
Para estas situações, embora eu não tenha uma solução geral e 100%
eficaz, posso dar alguns conselhos.

Antes de mais nada, o que nunca se deve dizer: "ok, afinal é seu rosto
que está na capa...". Isto, além de ser muito mal educado, demonstra
falta de comprometimento da gente com o trabalho. O bom mixador é,
acima de tudo, um parceiro. É aquele jogador que entra aos 30 do
segundo tempo pra decidir a partida e precisa se integrar ao time
rápida e competentemente.

A primeira coisa que a gente deve fazer é ver se realmente estamos


certos ou se só preferimos assim. Mixar é tomar decisões o tempo todo.
Precisamos decidir se a equalização já está boa, se é preciso comprimir
mais, o tipo do reverb, os volumes, tudo. E é praticamente impossível
que todas as nossas decisões sejam as únicas certas. Existem infinitas
soluções possíveis para uma mixagem e muitas delas boas. Precisamos,
então, primeiro relaxar e desapegar. Afinal, para quem consegue
enxergar as coisas por outros ângulos o infinito é apenas um oito
deitado.

Outro método que uso frequentemente é possuir argumentos. Pra quem


leu os Guias de Mixagem, não é novidade que para tudo o que afirmo
no livro eu apresento um motivo. Se estendermos nosso pensamento,
escrever sobre mixagem é justamente convencer as pessoas usando
bons argumentos. Por exemplo, vejamos o caso clássico onde o arranjo
tem dois instrumentos que conflitam. Uma das sugestões mais comuns
que ouço é a de abrir os dois no pan. A guitarra está brigando com o
piano? Joga um pra cada lado e pronto. Só que as pessoas esquecem
que ainda existem situações em que se ouve em mono ou com o
estéreo mal balanceado. Rádio AM é mono, por exemplo. E no carro,
então? Que tal se sua guitarra soasse só no alto-falante que está do
lado da sua perna? Usando esses argumentos, qualquer um vai
concordar que separar no pan pode não ser bom. E aí vem a outra
©2019 by Fábio Henriques
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parte da argumentação, que é a de oferecer soluções. Podemos tentar


equalizar diferentemente os instrumentos para que se separem na mix. É
possível até considerar (dependendo de sua ousadia) que se desligue
um dos canais conflitantes.

Assim, quando alguém perguntar por que você fez alguma coisa, tenha
sempre uma resposta pronta. Não há problema se o motivo foi só pra
ver como ia soar, afinal, não se deve nunca abandonar a
experimentação e o gosto pelo inusitado. Só que se o tecladista
perguntar por que você tirou o grave do pad, se você responder que foi
porque brigava com o grave do baixo, não só é verdade (o que faz
toda a diferença), mas soará razoável.

Finalmente, vem o caso mais perigoso, que é tentar convencer o cliente


de que você está certo porque, apesar de não haver uma justificativa
técnica, "fica mais legal assim". Eu evito isso com todas as minhas forças.
Às vezes acontece da gente ouvir a pergunta clássica: "assim está bom
pra você?". Ela é boa porque já demonstra, por um lado, confiança, e,
por outro, a disponibilidade para o diálogo, mas se assim não está bom
pra mim, por que eu colocaria lá?

Qualquer que seja o jeito, o que buscamos é uma mixagem em que


todos terminem felizes. E na maioria das vezes isso acontece quando os
mixadores conseguem se colocar no lugar de seus clientes. Entender o
que procuram, o que esperam e o que é esperado deles normalmente
funciona muito bem. Nunca perca a chance de aprender com algo e
com alguém.

UMA BOA MIXAGEM

Mixar é uma manifestação artística. Por isso não há como esperar que
haja valores pré-estabelecidos do que se considera uma boa mix.
Vejamos alguns fatores que influenciam o conceito de qualidade:

Fatores prévios

Qualidade do arranjo, da microfonação, dos instrumentos, da


execução e da gravação. Ora, se tudo isso foi feito com habilidade,
fica muito fácil se chegar a uma boa mix. Até mesmo quando há
qualidade na gravação às vezes isso pode ser um problema, porque
pode acontecer de que o responsável pela gravação tenha
conseguido um belo resultado, mas que não nos dá nenhuma margem
para mudanças. Por exemplo, receber para mixar uma bateria que já
foi gravada muito equalizada interfere decisivamente no resultado da
mix. O mesmo pode acontecer quando o guitarrista já grava o som
pronto, principalmente com eco (delay). O tempo do delay pode até
estar correto, mas a proporção de eco em relação ao som direto é
©2019 by Fábio Henriques
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algo que só pode ser decidido adequadamente quando os outros


instrumentos estiverem já nivelados, durante a mixagem. Vozes
gravadas com compressor também podem ser problemáticas.

Sendo um pouco egoísta, posso afirmar que o ideal é quando tudo


chega ao mixador sem nenhum processamento na gravação. Quando
se usava a fita analógica, havia realmente vantagem em se gravar
mais próximo ao som "ideal", mas hoje em dia isso é quase totalmente
desnecessário. Em uma gravação de 24 bits, o som que entra no
gravador é tão próximo do original que, para todos os efeitos, tanto faz
equalizar na gravação ou depois. A exceção pode ser quando existe
um equipamento físico (não um plug-in) do qual se queira a sonoridade.
Daí, realmente é melhor passar por ele ao gravar.

Fatores intrínsecos

Relacionados à mixagem em si, como espectro de frequências, faixa


dinâmica, equilíbrio e originalidade. Em geral, quanto mais amplo o
espectro de frequências que conseguirmos ocupar, melhor. Nosso
cérebro é exigente e gosta que a informação que recebe seja rica em
harmônicos (há os que defendem que é justamente esse o atrativo da
distorção de guitarra). Já a faixa dinâmica é um fator muito discutido
hoje em dia quando se fala na "guerra dos volumes". De fato, se a
música está no máximo de volume o tempo todo, não há dinâmica,
mas, por outro lado, se há muita dinâmica - pontos de volume muito
baixo e em outros muito alto -, corre-se o risco de o ouvinte não ouvir
tudo bem no carro ou em outras situações em que o ruído ambiente
seja alto.

O equilíbrio é justamente a habilidade que o mixador tem de


estabelecer o volume de cada canal ou instrumento a cada instante. A
situação ideal ocorre quando os volumes direcionam a atenção do
ouvinte para os diferentes elementos de um arranjo ao longo da
música. Por exemplo, na hora de um solo de guitarra, é normal que se
traga o volume à frente, mas depois que a voz retorna, se o guitarrista
continua solando, é preciso abaixá-lo um pouco, mas sem tirar
totalmente a atenção dele, pois se ele está no arranjo, supõe-se que
deva ainda ser ouvido.

E a originalidade é quando a gente consegue imprimir um toque


pessoal em uma mix. Não é um fator necessário, mas, quando
acontece, torna mais desafiadora a audição do trabalho como um
todo. Neste caso também há limites. Corre-se o risco de a mixagem
chamar mais atenção para ela do que para a interpretação dos
músicos e para o arranjo. Tudo bem que em alguns momentos o
trabalho do mixador se destaque, mas quando eles são poucos e bem
escolhidos, se revelam mais duradouros, na minha opinião. Afinal,
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quantos consumidores compram um CD pra ver qual filtro fulano usou


na voz?

Fatores Externos

Estilo, tecnologia, público alvo. Mixagem tem moda. Tem época que
todo mundo usa reverb, outras em que ninguém usa reverb.
Normalmente a gente consegue identificar a data de uma gravação
pelo som das coisas. Com a instrumentação também é assim. Som de
piano elétrico do DX7? Então provavelmente é de meados dos anos
1980, por exemplo. Este tipo de coisa normalmente é ditado pela
tecnologia, e o normal é que algo novo seja superutilizado e depois a
coisa se normalize. Assim é que justamente foi quando surgiram os bons
aparelhos processadores, como o REV7 ou a 480. As pessoas passaram
a encher tudo de reverb. E isso se estende culturalmente até as pessoas
que escutam o estilo. Como seria recebido um pagode sem surdão
alto? Ou um "trio" sertanejo?

Resumindo, não existe uma única boa mixagem, mas muitas opções,
que dependem de muitos fatores, mas que acabam resultando em
muitas possíveis mixagens. Pensar nisso com objetividade pode
economizar muitas horas de dúvidas tensas. O fato de que há vários
caminhos não pode nos tirar o foco. No momento em que se está
tomando decisões - o que acontece praticamente o tempo todo -,
temos que agir como se aquela fosse a única decisão correta. Não há
problema se dali a cinco minutos mudarmos de ideia. Ou seja, se você
partir pra equalizar um bumbo e pensar que só ficará feliz quando testar
todas as possibilidades sonoras que pode extrair dele, você vai perder a
novela hoje à noite.

Lembremos sempre do seguinte: A experimentação é louvável, mas se


a cada canal eu for testar tudo o que é possível, o prazo vai acabar e
eu ainda não vou ter chegado no contrabaixo.

Na segunda parte, veremos então uma série de dicas bem práticas


para se chegar aos resultados em menor tempo. Desde já, porém,
deixarei aqui talvez a dica mais importante, que é pra gente já ir
aplicando até mês que vem: aprenda com tudo o que você fizer. Se
você tirou 490 Hz e isso resolveu a cantada da caixa, adivinha onde
você deveria começar a mexer na próxima vez em que isto estiver
acontecendo? Mantenha o seu estoque pessoal de cartas na manga e
evite a todo custo a sensação de que não sabe como conseguiu mas
sabe que ficou bom. Mas também evite parecer o mixador-profeta, que
fica avisando o tempo todo ao cliente que "se eu fizer isso que você
pede não vai ficar bom porque vai acontecer isso e isso". Mostre e
explique ao cliente por que não vai funcionar.

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13) OTIMIZANDO SUA MIXAGEM PARTE 2 – O CAMINHO DAS PEDRAS


Seguindo em nossa jornada em busca de mixagens melhores e mais
rápidas, agora que já discutimos aqui vários aspectos que envolvem o
processo, vejamos como melhorar nossa produtividade na prática.
Como nosso elemento diretor, procuraremos sempre usar o menor
esforço para conseguir mais resultados em menos tempo , mas sem
nunca comprometer a qualidade.
- Usando a Geografia
Hoje em dia, uma sessão de trabalho em um software de gravação
(DAW) éum grande mapa. Perante nossos antepassados do mundo
analógico da gravação, isso representa uma enorme da qual nem nos
damos conta. Por exemplo, podemos saber em dois segundos onde há
viradas de bateria na música, coisa que levava um bom tempo quando
só a audição estava envolvida.
Certo dia um aluno me perguntou: “antigamente, pra onde vocês
ficavam olhando quando mixavam? “, que é mesmo uma boa
pergunta. Então, usemos a visão a nosso favor.
- Coloque os canais em uma ordem que faça sentido
Qualquer que seja a ordem confortável para você, use sempre a
mesma. Minha filosofia particular é colocar no topo da tela os canais
que tocam por mais tempo durante a música, agrupados por tipo. Por
exemplo, bateria no topo, depois baixo, piano base, violões de base,
guitarras base, depois instrumentos de detalhe, depois percussões, etc.
Assim, uma vez que a base esteja ajustada na mixagem, podemos
“esquecer” visualmente aqueles canais, rolando-os para cima e nos
concentrando nos demais.
Não é proibido voltar neles a qualquer momento, mas desse modo
concentramos nossa atenção (e visão) nos pontos necessários. A
exceção é a voz, que, mesmo atuando em toda a música, merece
atenção constante, e por isso fica sendo o último canal de áudio da
tela. Não quer dizer que devemos deixar pra ouvir a voz mais para o
final da mixagem. Muito pelo contrário. A voz deve ser inserida desde
cedo, para comparação, mesmo que a desliguemos logo depois, para
voltarmos a nos concentrar na base.
- Nomeie claramente todos os canais
Nunca, jamais, em hipótese alguma, deixe um canal com o nome de
“Audio 1”. Se neste momento isso não parece importante, daqui a
alguns meses, quando você precisar por algum motivo voltar a mexer
nessa música, certamente será. Ao nomear, evite nomes
“engraçadinhos”, como “tonzim”, “bagunça” ou coisas do gênero. Seja
claro. E como recomendação adicional, procure grafar os nomes
corretamente: por exemplo, “Rhodes”, “Hammond”, “Cajón”. Isso não
vai melhorar o som em nada, mas vai ajudar na sua reputação.

©2019 by Fábio Henriques


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- Sons diferentes em canais diferentes


O cenário é típico. A música começa com um canal de guitarra com
drive fazendo base. A gente ajusta como tal e lá pelo meio ela começa
a solar, o que exije outro tratamento. É muito mais produtivo separar
esse canal em dois, mesmo que aparentemente não seja necessário. Lá
pra frente, no meio de dezenas de canais, quando se quiser aumentar
um pouco o solo, será muito mais rápido se ele já estiver visualmente
destacado na sessão, além de desobrigar o uso de automações.
- Crie grupos
Os grupos, subgrupos ou busses (no fundo, a mesma coisa) são maneiras
práticas de se tratar um conjunto de canais através de um fader só. Seu
uso não consome quase nada de CPU e é um jeito prático de se tratar e
obter mudanças rápidas. Um cuidado no uso de grupos é quanto aos
reverbs. Por exemplo, se você faz um grupo de metais, ou cordas, ou um
naipe qualquer (inclusive coro) , é melhor mandar reverbs a partir do
master do grupo , e não individualmente de cada um dos seus
membros. Para que as mudanças no volume do master também afetem
a mandada do reverb. No caso da bateria, porém, como os timbres das
peças são bem distintos, é mais conveniente se mandar reverb
individualmente dos tambores, já que geralmente pratos e bumbos não
se dão muito bem com reverbs mais longos. No caso de se usar uma
ambiência geral para a bateria, ela pode aí ser mandada do master.
- Use sends
Como vimos, o uso de grupos é muito útil, e os elementos que
conduzem o áudio dos canais para o master do grupo são os buses.
Mas eles também podem ser usados em outra aplicação importante.
Quando queremos usar na mixagem um efeito que vai atingir vários
canais, como é o caso dos reverbs, é muito mais produtivo fazê-lo
usando o conceito de Send (mandada) e Return (volta). Procure ler no
manual do seu software como fazer isso, mas o conceito é sempre o
mesmo. Criamos um canal de Return cuja entrada é um Bus. Nesse
canal se insere o plug-in desejado . Para que um canal tenha esse
reverb, basta criar nele um Send que vá para esse bus, e pronto.
Evite a todo custo insertar um reverb em um canal de áudio. Além de
consumir CPU à toa, isso vai demonstrar a um cliente mais calejado que
você não tem muita experiência.
- Limpe os silêncios
Verifique em cada canal os momentos em que o instrumento não toca
e limpe-os da tela. Veja bem, não abaixe o volume, ou mute o áudio:
tire-os completamente da tela (toda daw permite isso), de modo que
descongestionem sua visão. Isso pode parecer um mero detalhe em
uma sessão pequena, mas, numa gravação ao vivo com 120 pistas, se
um som aparece de repente na música, ficará muito mais fácil
descobrir de que canal ele vem.

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- Deixe os áudios visíveis


Em associação íntima com o item anterior, evite que aconteçam
aqueles trechos em que existe áudio, mas ele está tão baixo que que
praticamente não se vê a forma de onda na tela. Sua daw certamente
possui uma função do tipo “change gain”, que permite dar ganho
diretamente no áudio file, fazendo com que fique mais audível e visível
na mixagem. Bem aplicado, esse processo não atrapalha em nada a
qualidade sonora, pois simplesmente aumenta o volume. O único
cuidado é não exagerar nesse ganho, para que não ocorra saturação.
Deixe uma margem de pelo menos 10 dB até o topo da escala. Isso vai
permitir mais espaço de manobra (headroom) ao longo do trabalho.
- Marque a forma
Se possível, coloque marcadores na linha do tempo que indiquem os
trechos da música: Part A, Parte B, Refrão, etc. Não é necessário ser
esteticamente preciso (nada errado em chamar “Parte C” de
“Especial” ou vice-versa), mas é bom ser exato no ponto marcado.
Além de isso tornar mais fácil a gente se localizar durante o trabalho,
isso acaba facilitando o desenvolvimento de uma linguagem única
com o cliente, da qual falamos no artigo anterior.
- Click (metrônomo)
É importante se manter um canal de metrônomo à disposição, mesmo
que aparentemente não precisemos dele para mixar. Ele pode ser útil
em várias situações, até mesmo lá na pós-mix, quando formos gerar os
samples para uso em shows. E o mais importante: estabeleça o
andamento (BPM) da música e registre-o na sessão como o DAW
permitir. Isso ajudará a calcular efeitos de tempo, como delays, e ainda
facilitará as eventuais edições, como repetições de trecho, troca de
refrão com verso, etc.
- Dê nome aos buses
Uma boa prática, principalmente se você mixa coisas que você mesmo
gravou, é usar sempre os mesmos buses para as mesmas funções. Por
exemplo, o bus 16 será sempre o reverb longo, os buses 1 e 2 serão
sempre o grupo da bateria, e assim por diante. Melhor ainda é quando
a DAW permite que se dê nome aos buses. Nesses casos, pode-se
mudar o nome do bus 16 para REVLONG, por exemplo. Agindo assim,
quando for preciso retornar a uma mix antiga, será muito mais fácil e
rápido criar um mapa mental de como as coisas estão acontecendo
ali.
- Separe os buses por função
Como vimos acima, os buses podem ser usados com duas funções
distintas, pois além de conduzirem os áudios por dentro dos grupos, são
responsáveis por levar os áudios através de sends até os returns onde
estão os plug-ins usados para afetar mais de um canal (como um
reverb).
©2019 by Fábio Henriques
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Se você optou por não nomear os buses, sugiro que os diferencie


através da própria numeração. O que eu particularmente faço é
começar a usar buses de grupos a partir do bus 1, de mdo crescente, e
os buses de send/return a partir de um bus alto (por exemplo, 32), de
forma descendente. Assim, o bus do grupo de bateria será Bus 1-2, o de
metais Bus 3-4, o de coro Bus 5-6 e assim por diante. O reverb longo
usará o Bus 31-32, o reverb curto, o Bus 29-30, etc. Isso fornece um jeito
rápido de distinguir a função de um determinado Bus, e quantos buses
ainda estão disponíveis.
- Coloque efeitos e reverbs no fundo da página da sessão
Obedecendo a nosso critério de dispor os canais agrupados por função
e por tempo de uso numa sessão, é melhor juntar todos returns de
efeitos no fundo da sessão, próximas ao master fader (normalmente o
último). Nestes canais a gente raramente mexe, e portanto é mais fácil
se eles estiverem agrupados em um dos extremos da tela, longe da
atenção. Assim, no início da tela ficam os canais de base – mais
constantes – e no fundo os efeitos – exigindo menos atenção. Podemos
nos concentrar mais no centro da tela, então.
Algumas pessoas preferem colocar as voltas de efeitos logo abaixo dos
canais afetados. Assim, se a pessoa usa um reverb só para os metais e
outro só para as cordas, coloca a volta logo abaixo dos respectivos
másters de grupos. Se o mixador opta por usar esse tipo de filosofia,
realmente assim é melhor, e eventualmente pode-se até insertar o
efeito no canal do master de grupo. Este porém não é o modo como eu
trabalho.
- Crie e use templates
Uma das características mais poderosas em uma mixagem em DAW é a
possibilidade de se aproveitar tudo o que foi feito para uma música
quando for mixar a próxima. Na verdade, a gente já usava essa filosofia
ainda no mundo analógico, só que dava um trabalhão tanto anotar
tudo quanto fazer o recall de todos os ajustes de todos os botões de
todos os equipamentos. Numa mixagem in-the-box, basta salvar um
template de sua última mix e usá-lo na seguinte, pelo menos como
ponto de partida.
Agora que já temos nossa sessão otimizada, poderemos começar
efetivamente a mixar, no próximo artigo dessa série.

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14) Otimizando Sua Mixagem (Parte 3)


Partindo para a mixagem propriamente dita

Após prepararmos nossa sessão de mixagem para um trabalho mais


eficiente, x vamos agora começar a mixagem propriamente dita.

VOLUMES

O aspecto mais complicado e mais difícil de se controlar em uma


mixagem digital é o volume. Isto decorre de duas características muito
importantes. Primeiro, em áudio digital, quanto mais alto estiver o
volume, melhor a qualidade. Isto porque ela está diretamente
relacionada ao número de bits usados para representar cada amostra.
Quanto mais baixo o sinal, menos bits são usados, e menor a qualidade.
Segundo, existe um valor máximo para cada amostra, o chamado FS
(full scale), ou seja, uma vez que se atinja o valor máximo de amplitude,
qualquer tentativa de se aumentar mais ainda implicará em distorção,
que, no caso, não é nada sutil.

Resumindo essas duas características, temos que trabalhar, na maior


parte do tempo, com o volume o mais alto possível, porém sem nunca
atingir ou ultrapassar o máximo, sob risco de se gerar distorção. Isso nos
exige muita cautela, e para que se consiga trabalhar com
tranquilidade, é conveniente nos cercarmos de mecanismos de
segurança, conforme veremos a seguir.

POR QUAL CANAL COMEÇAR?

A gente tem que começar por algum canal, e a enorme maioria dos
profissionais começa pelo bumbo. Para quem trabalha com música
pop, vale lembrar que o trinômio bumbo, caixa e baixo são os pilares da
mixagem. O volume destes três canais estabelece o volume da mix
inteira para o ouvinte. Assim, começar pelo bumbo é prudente. E, mais
ainda: é importante que somente com bateria, baixo e voz a música já
funcione.

ESTABELEÇA UM VOLUME INICIAL

Uma pergunta frequente em meus cursos é "qual o volume que tenho


que colocar no bumbo pra que no final tudo dê certo?". A resposta é
simples, pois o melhor volume é o que for confortável a você. O mais
fácil é se estabelecer um volume máximo que nos permita um "espaço
de trabalho". O termo técnico é headroom. Um valor típico é de uns 6
dB. Particularmente, trabalho com 4 dB. Assim, através do uso de limites
eu me asseguro de que nenhum bumbo ultrapassará -4 dB. Procedo
assim com todos os canais da bateria, e ainda faço um master de
©2019 by Fábio Henriques
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grupo de bateria e também coloco nele um limiter que trava o volume


em -4 dB. Isso nos dá a certeza de que a bateria nunca provocará uma
saturação no master. O que não significa que ela somada aos demais
canais não vai saturar, mas já diminui as possibilidades de problema.

É claro que devemos cuidar para que este limiter da bateria não esteja
atuando exageradamente, o que se consegue estabelecendo os
volumes adequados nos diversos canais do instrumento.

VALORES POSITIVOS NOS FADERS?

Em digital, o maior valor possível de volume para um áudio é 0 dB (FS), e


todos os valores com que a gente trabalha são negativos. E os próprios
softwares de gravação apresentam faders que possuem valores que
passam do zero e ficam positivos. No Pro Tools um fader pode ir até +12
dB. Isto é um pouco confuso, porque o áudio em si tem um valor
máximo de 0 e nunca fica positivo, mas, na verdade, é o próprio
software já estabelecendo um headroom. Fazendo isso, o usuário fica
mais propenso a deixar o fader em torno do zero e automaticamente
tenderá a se proteger da saturação. É preciso não confundir as coisas.
O fader vai até +12, mas o áudio só vai até 0 dB.

Como segurança adicional, procuro não usar valores positivos no fader.


Na prática, isso não muda muita coisa, e desde que os áudios não
saturem, tanto faz se os faders estiverem lá no topo ou não. Porém,
manter este headroom de faders acaba nos resguardando mais ainda
por permitir que lá na frente, durante a mixagem, ainda tenhamos uma
"reserva" de volume que pode ser necessária.

A QUESTÃO DO LIMITER NO MASTER FADER

Muita gente, inclusive eu mesmo, gosta de trabalhar com um limiter


insertado no master fader. Isso tem duas vantagens interessantes.
Primeiro, podemos colocar o limite em um ponto um pouco abaixo do 0
dB (máximo) - digamos, 0,5 dB. Assim o áudio nunca vai saturar, e com
esta pequena margem o LED vermelho não irá acender, evitando
chamar nossa atenção desnecessariamente. A outra vantagem é que
a gente já pode dar uma certa aumentada no volume geral, tornando
a audição um pouco mais próxima do produto final masterizado.

O problema é sabermos dosar o limiter. Se ele estiver atuando muito na


música acabaremos tirando dinâmica e prejudicando a masterização.
O ideal é que o limiter dê um certo conforto na audição, e para isso
bastam uns 2,5 dB de atuação. Na dúvida, é melhor usá-lo somente
para impedir a saturação, sem dar ganho.

Independentemente dos ajustes, é fundamental que uma vez se


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optando por ter um limiter no master, o coloquemos ligado desde o


princípio da mixagem, de forma que todas as nossas decisões auditivas
levem em conta sua presença. Deixar para insertar o limiter no master
fader no final da mixagem tende a gerar mais problemas, e não resolvê-
los.

É PERMITIDO MUDAR DE IDEIA

Uma enorme vantagem da mixagem em estúdio em relação à de


shows é que sempre podemos parar e começar de novo. Imaginem se
o técnico de PA pudesse, lá pela quinta música, gritar lá da mesa
"beleza, pessoal! Acho que agora ficou perfeito! Vamos recomeçar!". Já
no estúdio isso é perfeitamente possível e compreensível. Assim, como
dissemos que se pode escolher um valor qualquer para o volume do
primeiro canal, se no meio da mixagem a gente vê que está ficando
tudo alto, podemos simplesmente voltar e refazer os volumes. O
importante, porém, é que o volume relativo entre os diferentes canais se
mantenha. Por exemplo, se a guitarra 1 estava 3 dB acima da guitarra 2,
provavelmente o melhor é manter essa diferença, mesmo que em
valores absolutos as coisas mudem.

VOLUME DA SALA

Uma dica importante: se sua mix está com tudo muito alto, é provável
que você esteja monitorando com o volume da sala baixo demais, e
vice-versa. A gente costuma ter um volume preferido para ouvir a
monitoração, e é bom que a gente memorize este volume no botão do
controle da sala. Deixe este controle de volume sempre na posição em
que a audição está mais confortável. Eventualmente, se desejar ouvir a
mix mais alta ou mais baixa para verificar estas situações, volte assim
que possível a este valor pré-determinado. Aproveitando esta
tendência, se você está achando que seria melhor ser mais prudente
com o volume da mix, aumente um pouco o volume da sala.

Existe também um caso muito comum em que a pessoa tende a ir


aumentando o volume da sala à medida que vai ficando com os
ouvidos cansados. Essa prática deve ser evitada a todo custo. Preserve
seus ouvidos. A cada 50 minutos, pare por uns 10. O volume voltará ao
normal sem precisar mexer no controle.

AUMENTANDO NO PLUG-IN

Um recurso que uso bastante em tracks que possuem muitas


automações de volume é variar o ganho em um plug-in, e não na
automação. Por exemplo, se temos um canal de voz que tem várias
automações de volume e precisamos de uma versão com, digamos,
mais 1 dB na voz como um todo. Como será uma coisa momentânea,
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eu prefiro ir no último plug-in do canal e simplesmente variar seu ganho.


O efeito é o mesmo de se escrever uma automação no canal inteiro, só
que mais rápido.

É preciso, porém, alguma cautela. Este tipo de mexida deve ser feita no
último plug-in para que a variação do ganho não afete os demais - um
compressor, principalmente. E, além disso, deve-se manter o nosso
cuidado constante de observar se ao dar ganho não saturamos o
áudio.

A PRIMEIRA LEVANTADA

É quando a gente vai desenhar a mixagem. A partir da primeira


levantada de faders, feita despreocupadamente, podemos já
estabelecer planos para os instrumentos e esboçar já uma distribuição
pelo pan. É a hora de se estudar o "jeitão" que a mixagem vai tomar.
Vale lembrar mais uma vez que não temos o compromisso de acertar
de primeira, mas você acabará observando que, na mixagem de um
CD, lá pela quarta música, esta primeira levantada já vai estar muito
próxima do resultado final. Para isso, recordo aqui de nossa regra de
ouro, que é aprender com tudo o que se fizer, de forma que o
aprendido possa ser usado na frente.

A primeira levantada tende a apontar mais os problemas que as


virtudes do arranjo, e já nos permite traçar uma estratégia de como
resolvê-los. É a hora de se pensar em cortar coisas, copiar trechos etc. O
importante também é ter a chance de se dar uma boa ouvida na
música toda, aproveitando o tempo para já ir dando esta primeira
equilibrada de volumes, mas ainda sem muito compromisso.

AMBIÊNCIAS E REVERBS

Neste ponto já se pode elaborar um plano de como atacar a questão


de ambiências. Por exemplo, podemos já prever uma sala para a
bateria, um reverb curto para os instrumentos de base e tambores da
bateria e um terceiro longo para ser usado na voz.

Os reverbs são plug-ins que tipicamente consomem mais poder de CPU


que os outros, e colocá-los desde cedo na mixagem evitará que lá na
frente se descubra que o computador não consegue trabalhar
confortavelmente quando inserirmos estes efeitos.

É sempre bom já prever também um canal para um eventual


delay/eco. E é normal que a gente tenha os nossos reverbs e presets
preferidos, não havendo problema em começar por eles, guardando a
possibilidade de rever mais na frente.

©2019 by Fábio Henriques


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"Colocar os reverbs desde cedo na mixagem evitará que lá na frente se


descubra que o computador não consegue trabalhar
confortavelmente quando inserirmos estes efeitos"

A ORDEM

Agora que temos uma ideia de como a música está soando e de como
deverá soar no final, podemos começar a fazer a coisa de uma
maneira mais formal. Iremos agora nos preocupar não só com volumes
e pans, mas também com os timbres e equalizações. Imaginando
música pop/rock e similares, uma boa ordem para se trabalhar é
começar pela bateria e baixo. Como já dissemos, eles são a fundação
da mixagem. Se não soarem bem juntos, toda a mix deixa de funcionar.
E nunca é demais enfatizar que deve-se evitar deixar para colocar a
voz muito tarde na mix. O ideal é que já neste ponto a gente teste
como a voz está soando em comparação com bateria e baixo.

Agora podemos mutar a voz de novo e ir colocando os instrumentos de


base, ou seja, os que tocam na música toda ou na maior parte dela.
Violões e pianos, por exemplo. Quando eles estiverem com volume e
timbre adequados, aproveitamos para religar a voz e ver como está o
comportamento da mix. Se por um lado bateria e baixo são a base, a
voz é o topo, e é entre estes dois limites imaginários (não de volume,
mas filosóficos) que vamos situar os instrumentos de base.

A seguir, vamos gradativamente colocando os canais de detalhes,


cuidando para que a música se mantenha interessante ao ouvinte.
Lembre que a mixagem conta uma história, assim como melodia, ritmo,
letra e arranjo.

Em nosso próximo encontro veremos dicas de como atuar nas


frequências com os equalizadores e na dinâmica com os compressores.

©2019 by Fábio Henriques


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15)Otimizando Sua Mixagem (Parte 4)


Equalizando com eficiência

Existem quatro domínios em que trabalhamos em uma mixagem: o


domínio das frequências, através dos equalizadores; o domínio dos
volumes, via compressores e faders; o panorama, com o controle de
PAN, e o domínio dos tempos, usando reverbs, delays e outros efeitos.

Quaisquer outros efeitos usados são uma combinação ou


especialização destes. Por exemplo, ao distorcer propositalmente um
áudio, estamos aplicando aumento de volume, e por causa da
mudança na forma de onda original, aumentando o conteúdo
harmônico da informação. Ao usar um chorus, estamos combinando
delays e pitch shifters, que, por sua vez, são elementos que atuam no
domínio das frequências.

Assim, através destes quatro campos de atuação, podemos criar uma


série praticamente infinita de possibilidades. Isto confere uma enorme
riqueza em termos de ferramentas de trabalho técnico e artístico.
Iremos aqui nos concentrar nas frequências, e em como otimizar o
trabalho neste domínio.

EQUALIZAR OU NÃO

A primeira coisa que precisa ficar bem clara a alguém que se inicia no
mundo das mixagens é que a gente não é obrigado a equalizar um
canal. Tem gente que se sente culpada se não equaliza, mas ela nem
sempre é necessária. Existem duas motivações básicas para equalizar: a
corretiva e a criativa. Vejamos como são estas situações.

Equalizar corretivamente consiste em atenuar regiões de frequência em


que um instrumento não atua e também compensar os
excessos/deficiências resultantes do processo de gravação. No primeiro
caso, temos o exemplo do hi-hat, em que podemos filtrar fortemente as
frequências abaixo de, digamos, 800 Hz. Como o instrumento não atua
nesta região, estaremos, com isso, evitando que informações
indesejadas influenciem a mixagem. No segundo caso, podemos citar a
situação em que um violão de nylon foi gravado com um microfone
apontando para a sua boca. Esta região é fortemente sintonizada em
torno de 190 Hz, o que provoca um excesso dessa região, que ao ser
atenuada, equilibra muito o som do instrumento.

MASCARAMENTO

Um efeito determinante em uma mixagem é o fenômeno psicoacústico


chamado mascaramento. Em termos bem simples, o ouvido humano é
sensível a regiões de frequência, e quando uma região já está
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sensibilizada, frequências próximas se tornam inaudíveis. É o que


provoca o efeito de "quando aumento a guitarra, o piano some". E
some mesmo. Por causa do mascaramento, instrumentos de regiões de
frequência semelhantes são excludentes, e brigam por sua
exclusividade. Nesta guerra, quem soar mais alto torna o outro
simplesmente inaudível. É aí que o equalizador vem nos ajudar.

A equalização criativa também pode ser pensada como manifestada


em duas situações. Depois do que vimos acima, fica evidente que
podemos usar o equalizador para "separar" mais dois instrumentos que
compitam por uma região de frequências. No caso, poderíamos
aumentar a região de 3 kHz da guitarra e a de 800 Hz no piano, de
forma que os instrumentos passassem a ser predominantes em regiões
diferentes, tornando-os mais audíveis individualmente.
Independentemente de estar havendo algum fenômeno físico como o
mascaramento, podemos usar o equalizador simplesmente como
elemento artístico, como quando usamos a famosa "voz de telefone"
(que é a equalização com forte filtragem nos extremos agudos e
graves, deixando só as médias).

Neste ponto, já temos condições de conhecer uma das diretrizes mais


importantes envolvendo equalizações: uma mixagem não é a soma do
som mais bonito de cada canal, mas a soma do som mais eficiente de
cada canal. Um iniciante é levado a solar cada canal, deixando o som
o mais bonito possível, e depois ouvir solado o próximo canal, repetindo
o processo, e assim sucessivamente. O problema é que, por causa
(principalmente) do mascaramento, não se pode pensar nos timbres
isolados. Mixar é estabelecer uma relação produtiva entre os diferentes
canais. É a soma que nos interessa. É óbvio que para chegar a isso é
preciso pensar primeiro canal por canal, mas a ideia é não tentar
chegar ao som final através da análise individual. Deixar uma margem
de possibilidades é importante ao longo do processo.

"Uma mixagem não é a soma do som mais bonito de cada canal, mas
a soma do som mais eficiente de cada canal"

COMO EQUALIZAR?

Mas, pensando individualmente (mesmo que não se pretenda chegar


ao som mais bonito dessa forma), como fazer para equalizar? Como
fazer para chegar ao som útil?

A primeira pergunta que se deve fazer é: neste ponto do trabalho, o


som como está precisa ser equalizado? Para responder, podemos
primeiro pensar em que regiões podemos filtrar a partir da resposta do
instrumento. É uma flauta? Então provavelmente podemos colocar um
filtro abaixo de 150 Hz, por exemplo (a extensão nominal da flauta é de
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C4 [261Hz] a C7 [2.093Hz]). É importante ressaltar que, se por um lado a


filtragem do lado grave é tranquila, é preciso muito cuidado na hora de
se filtrar o extremo agudo, pois mesmo que deixemos uma margem em
relação à nota mais alta do instrumento, existem os seus harmônicos,
que não podem ser desconsiderados. É aconselhável se deixar bastante
espaço de frequência para estes harmônicos e para os detalhes da
execução, como o sopro do músico.

Uma vez que os limites inferior e superior estejam definidos e filtrados,


podemos agora pensar se alguma coisa nos incomoda na sonoridade.
Para uma equalização eficiente, é sempre mais produtivo se pensar
primeiro em atenuar e só depois em acentuar. Os instrumentos musicais
típicos tendem a ter uma grande quantidade de energia na região de
médias baixas, e esta região é frequentemente uma candidata a
atenuações. Se você não tem ideia do que poderia melhorar, minha
sugestão é que comece investigando a possibilidade de se atenuar
algum lugar das médias baixas. Mas como descobrir este lugar?

Um macete que uso é pensar no "pior possível". Decido que vou


investigar como ficaria o som com atenuação nas médias baixas. Daí
pego o controle de ganho e acentuo uns 6 a 8 dB (é exagerado de
propósito). Agora giro o controle de frequências de forma a identificar
qual o ponto onde o som ficou o pior possível. Então volto ao controle
de ganho e o reduzo, atenuando. Isso geralmente é o suficiente. A
quantidade de atenuação vai depender também do gosto, e, de
acordo com o que já vimos, podemos deixar uma margem de
segurança.

Da mesma forma que as médias baixas (por volta de 150 a 400 Hz) são
fortes candidatas à atenuação, a região entre 3 e 6 kHz se beneficia de
uma certa acentuação. Esta região, pela alta sensibilidade do ouvido
humano a ela, torna-se fundamental para ajudar a definir e dar nitidez
a um canal. Deve-se, porém, tomar cuidado para se evitar os exageros,
pois, por causa deste mesmo efeito, os excessos podem se tornar bem
desagradáveis e mascarantes.

Em resumo, podemos pensar resumidamente desta forma:

1. Filtrar os graves a partir da extensão do instrumento.


2. Investigar a possibilidade de se filtrar os extremos agudos.
3. Investigar se a atenuação de médias-baixas pode ser interessante.
4. Investigar se a acentuação das médias-altas pode ajudar.

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Lembrando que de um lado as atenuações podem ser intensas,


precisa-se tomar cuidado com as acentuações, pois elas podem inserir
ruídos e valorizar regiões indesejáveis.

AIR

Um exemplo do perigo de se exagerar nas acentuações é o caso do


"air", a região de extremo agudo do espectro. Certa vez eu vi um
colega trabalhando e ele usou um equalizador tipo shelving (prateleira),
dando 12 dB de ganho em 18 kHz para conseguir o tal "air" de que
precisava. O resultado foi, de fato, uma forte presença de agudos, mas
nitidamente não era tão extrema quanto os 18 kHz em que o
equalizador foi situado. O que o colega esqueceu é que quando se
coloca a frequência de um shelving com 12 dB em 18 kHz, estamos
dando ganho provavelmente desde uns 8 a 10 kHz, e foi o incremento
de alguns dB nesta região que forneceu a sensação de ar, e não os 12
dB em 18 kHz. Só que como era um shelving, toda a informação de
extremo agudo foi fortemente acentuada, resultando na introdução de
ruídos indesejados e enorme aspereza sonora.

QUE EQUALIZADOR UTILIZAR?

Já pudemos, em outras oportunidades, discutir aqui como o processo


de elaboração de uma opinião a respeito do som é fundamental, e
também como escolher dentre as inúmeras ferramentas disponíveis. É
claro que os diferentes modelos de equalizadores (de hardware e
software) têm suas individualidades, e que o ajuste dos mesmos
parâmetros com iguais valores em equipamentos diferentes pode
resultar em sonoridades definitivamente distintas. O que não se pode
esquecer, porém, é que o "juiz" do som e do equalizador é o nosso
ouvido. Ou seja, quando equalizamos, o que determina o ponto em
que o som está ok é nossa opinião e não uma regulagem determinada
do equalizador.

Em outras palavras, se, por exemplo, definimos em um certo equalizador


que o melhor é atenuarmos 3 dB em 280 Hz com q=1, se vamos
experimentar outro equalizador o ideal é novamente partirmos do zero
e não comparar esta mesma configuração, uma vez que são
equipamentos diferentes. Na prática, podemos partir desta regulagem,
mas sem achar que ela forneceria exatamente o mesmo resultado.

EQUALIZAÇÃO NA MIXAGEM COMO UM TODO

Como vimos, equalizar envolve correções e criação, e ao longo do


desenvolvimento de uma mixagem podemos rever e alterar várias vezes
o ajuste que fizemos de início. O importante é que não percamos de
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vista o objetivo original, que é oferecer ao ouvinte um espectro o mais


amplo possível de frequências, de acordo com os instrumentos que
compõem o arranjo (não adianta esperar um "gravão" em uma música
com apenas voz e violão).

Em uma situação ideal, o espectro todo será preenchido com toda as


regiões de frequência equilibradas entre si. Se você observar mais para
o final do trabalho que sua mix como um todo precisa de algum ajuste
do tipo tirar médias baixas, ou colocar mais agudos, minha sugestão é
que se evite colocar um equalizador no master e corrigir. Isto até pode
resolver o seu problema imediato, mas você não terá aprendido nada
com a situação e haverá uma boa possibilidade dela acontecer de
novo. Procure, então, investigar o que o levou aos excessos e faltas.
Pode ter sido a mera inexperiência ou a influência do cliente/produtor,
ou a sua monitoração (o que é mais frequente) etc.

Qualquer que tenha sido o fato gerador, minha sugestão é que se atue
individualmente nos canais que contribuíram para essa deficiência na
equalização geral. Afinal, se o problema não é extremo, o fato de
ainda contar com uma masterização acabará produzindo, no mínimo,
o mesmo resultado que uma equalização no master fader. Por
segurança, você pode até mesmo alertar o masterizador de que
desconfia que há falta ou excesso desta ou daquela região.

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16) Otimizando Sua Mixagem (Parte 5)


Volumes

Prosseguindo em nosso processo de utilizar técnicas para otimizar o


trabalho de mixagem, hoje vamos nos concentrar no aspecto mais
importante e mais difícil quando se trabalha em ambiente digital: os
volumes.

DISTORÇÃO E RUÍDO

Para começar, precisamos definir aqui alguns conceitos. Para o caso


em que estaremos analisando aqui, admitiremos algumas coisas.
Primeiro, quando definimos algo como um "gravador", admitimos que
sua função é simplesmente registrar uma informação. Ele deve fazer isso
da maneira mais transparente possível, para que este registro não
interfira no conteúdo da informação.

O fato inevitável no mundo real é que por mais que o gravador seja
bem construído, sempre haverá uma parcela da informação que
acaba sendo modificada pelo processo (algo que a própria Segunda
Lei da Termodinâmica implica). Alguns gravadores modificam bem
pouco, outros modificam pesadamente.

Para nossos fins aqui, definiremos "distorção" como a alteração na


forma de onda original provocada pelo processo de gravação (isso
serve para transmissão também). E a diferença entre o que saiu e o que
entrou chamaremos "ruído". Veremos que este ruído tem uma parcela
inerente ao processo e outra que se deve ao próprio equipamento e à
mídia de armazenamento.

Vale a pena também definirmos o que será pra nós a "saturação".


Considera-se que um sinal está saturado quando o equipamento não
consegue gerar um aumento na amplitude da saída quando ocorre um
aumento na amplitude da entrada. Isto provoca também uma
distorção na forma de onda.

Definidos os termos, comecemos.

O PRINCÍPIO BÁSICO

Existe um fator fundamental em áudio, mesmo o analógico, que


permeia todo o processo de gravação desde seu nascimento, em 1876.
A gente precisa gravar alto. O mais alto possível, sem que isso
prejudique a qualidade, é claro.

No áudio analógico, a característica mais importante neste aspecto é


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que as mídias em que registramos a informação produzem ruído por


elas mesmas. Pegue uma fita analógica que nunca tenha sido usada,
direto da embalagem, ponha em um gravador e aperte o Play.
Instantaneamente você vai ouvir chiado. Faz parte da natureza da
mídia (em termos técnicos, o posicionamento randômico dos domínios
magnéticos na superfície da fita). Isso vale para todo processo
analógico de gravação e transmissão. Você coloca de um lado a
informação que deseja e do outro lado a recebe mais o ruído inerente
à própria mídia (além do inserido pelo equipamento).

Para mantermos o foco, não vou nem lembrar que as não linearidades
das mídias e dos equipamentos/processos provocam, além disso,
alterações na própria informação em si (os defensores do áudio
analógico admitem que estas modificações "melhoram" o som),
modificando as características do sinal original, além de acrescentar
ruído. Por isso, então, é conveniente se gravar bem alto, para que a
informação útil fique bem acima do ruído da mídia/equipamento (ruído
de fundo), mascarando-o.

Os processos digitais de transmissão e gravação foram criados para


acabar com essa dependência das particularidades da mídia. Como a
coisa toda se processa através de codificação da informação e não da
gravação/informação direta, o "chiado" da mídia deixa de importar.
Isso é assim desde o telégrafo, por exemplo, que ao codificar a
informação a ser transmitida via pontos e traços, diminuiu
absurdamente a influência da rede de transmissão na qualidade. A TV
digital é um exemplo recente e nítido do que a codificação, no caso,
digital, pode fazer em termos de independência das mídias. Se há
qualidade de transmissão suficiente, não há chuviscos e/ou fantasmas,
e a nitidez é impressionante. Ou há transmissão boa, ou simplesmente
não há.

Mesmo nos processos digitais, há vantagem em se gravar o mais alto


possível, não por distanciamento do ruído de fundo, mas por uma outra
causa. Em áudio digital, a cada instante de amostragem é feita uma
medida da amplitude do sinal, enquadrando-o dentro de uma "grade"
de valores possíveis. A precisão desta medida está diretamente
relacionada ao espaçamento desta grade. Quanto mais bits, mais
precisamente a medida será feita, e, consequentemente, quando se
voltar ao analógico, mais fidelidade teremos em relação à informação
original. Quanto maior a amplitude, mais bits estaremos usando para
fazer as medidas, e, assim, quanto mais alta a amplitude de um sinal,
mais precisa é sua codificação. A qualidade então depende da
amplitude. Sinais pouco intensos são menos precisos.

Ao mesmo tempo, como os processos digitais não são destrutivos


(sempre existe um "undo"), a liberdade que temos de "mexer" na
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informação é enorme. Há plug-ins dos mais diversos, capazes de


processar os sinais de maneira muito poderosa, já que, no final, é tudo
matemática mesmo. Juntando estas duas coisas, o aumento da
qualidade para volumes altos e o poder de processamento, temos o
pano de fundo perfeito para esta característica tão marcante no
mundo digital de gravação: a busca pelo volume mais alto o tempo
todo.

GUERRA DE VOLUMES

Não se pode negar que a dinâmica faz parte da música.


Principalmente em música clássica, os trechos executados suavemente
(piano) e vigorosamente (forte) fazem parte fundamental da expressão
musical. Só que nós temos que tentar harmonizar estas importantes
diferenças de volume com o fato de que os gravadores gostam e se
beneficiam quando o volume é mais alto.

Existe uma crença de que antigamente os engenheiros se


preocupavam em manter esta dinâmica. Até onde sei, nossa atitude
era de briga constante. O chiado de fita nunca foi "romântico" - foi
sempre um problemão com o qual tínhamos que conviver. Qualquer um
que ouça música clássica em vinil ou fita irá perceber que nos
momentos em pianíssimo a gente tende a ouvir mais a mídia que a
música. Não fosse assim, uma máquina como a Sony 3324 (lançada por
volta de 1982) - digital, 16 bits, em fita, 24 canais, US$ 125.000 - nunca
teria feito o sucesso que fez. Durante um bom tempo as fitas DAT (Digital
Audio Tape), de dois canais, eram o destino de masters na busca de se
fugir da chiadeira da fita.

E mesmo na música pop a coisa às vezes complicava. Ouça a versão


original em vinil de The Talking Drum, do LP Larks' Tongues in Aspic (1973),
do King Crimson - que é basicamente um fade in de sete minutos, e
observe como em mais da metade da música a gente ouve
basicamente o vinil "falando". Ou, por exemplo, o álbum Ummagumma,
do Pink Floyd (1969), com vários trechos em pianíssimo que acabam se
transformando em mero ruído de fundo em sistemas de som típicos
(sistemas megacaros de audiófilos não entram na discussão aqui, pois,
afinal, estamos falando de música "popular").

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Pois bem, no mínimo podemos admitir que o lado técnico se beneficia


se dispusermos de ferramentas que permitam se manter o volume alto
dentro dos limites do bom senso. O problema será definir estes limites.
Não vamos entrar aqui no assunto do excesso de volume nas masters,
pois fugiríamos do nosso escopo - embora possamos voltar a ele
futuramente. Por ora, foquemos nas vantagens que um controle maior
do volume pode trazer.

AS FERRAMENTAS

Assim, podemos admitir que mesmo no mundo pré-digital todo mundo


ficaria feliz se fosse possível aumentar o volume geral sem o risco de se
saturar a saída. Em áudio digital, o sentimento é o mesmo, pois se, por
um lado, maior volume resulta em maior qualidade, a saturação não é
nada sutil, gerando distorção apreciável. Muito da habilidade de um
engenheiro dos tempos do analógico estava em conseguir um ajuste no
gravador que permitisse uma certa ousadia no volume, aproveitando a
pequena distorção gerada pelo processo como um fator de coloração
intencional dos timbres. Mas, no geral, a gente procurava ser mais
conservador.

Já no digital, começaram a aparecer ferramentas - principalmente os


limiters preemptivos - que passaram a permitir que empurrássemos mais
o volume sem o risco de saturar. Com isso, começou a ser possível se
obter maior volume médio nas mixes, e o povo começou a gostar. É
sabido que maior volume geralmente provoca uma sensação mais
empolgante no ouvinte. Na música clássica, o compositor "brinca" com
isso através do contraste, pois os momentos mais suaves servem de
contraponto e preparação para os momentos fortes. Só que a música
pop tem apenas três minutos e pouco pra passar sua mensagem, o que
faz toda a diferença. Assim, meus amigos, mesmo com todo esse papo
de que deve se evitar a guerra desenfreada de volumes, há um lado
bom em se buscar um maior nível médio, desde que exageros sejam
evitados.

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O DESAFIO

Mixando hoje em dia, o grande desafio é se conseguir um volume o


mais alto possível para a mixagem sem que se comprometa
excessivamente a dinâmica, principalmente se estamos trabalhando
com música pop. É preciso certa atenção à exigência do estilo, pois
trabalhos de jazz e alguns estilos de MPB normalmente não são
exigentes quanto a volumes. Clássicos, então, nem se fala. O modo
como a gente vai conseguir dominar a coisa é através do uso esperto
de algumas ferramentas.

CHANGE GAIN

Antes de se pensar em usar plug-ins, o que veremos no nosso próximo


encontro, quando falarmos de compressores e limiters, existem
procedimentos que nos ajudarão muito a conseguir consistência de
volumes. O primeiro deles é o change gain.

Nos tempos da fita analógica era importante se mandar o som para o


gravador já o mais perto possível do desejado. Isto porque uma vez
registrado na fita, era difícil se processar este áudio novamente. Por
exemplo, se depois do sinal gravado a gente descobria que ele
precisava de mais agudos, o resultado era que a gente acabava
aumentando o chiado que vinha junto. Isso valia para compressores
também, para que o volume de gravação ficasse alto (e longe do ruído
de fundo) por mais tempo. Assim, equalizar e comprimir ao gravar era o
mais comum.

Hoje em dia, posso dizer com toda tranquilidade que gravando em 24


bits não existe nenhuma necessidade de se gravar processando. Não é
proibido, obviamente, mas também não é necessário. Isso pode resultar
em variações extremas de dinâmica em um track, com trechos muito
baixos e muito altos. É claro que isto pode nos atrapalhar na hora de
controlar os volumes na mixagem.

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Todo programa de mixagem hoje em dia possui uma função que nos
permite alterar o volume de um trecho de um arquivo de áudio.
Chamaremos aqui essa função com o nome genérico de change gain.
Vejamos como usá-lo e qual é a sua enorme importância. O que
recomendo que se faça é algo mais visual do que auditivo: uma boa
olhada no desenho do track. Se a gente percebe que certos trechos
estão muito baixos, usamos o change gain para uniformizá-los. Isso vai
economizar tremendamente o tempo de mixagem.

É preciso, porém, um certo cuidado para se evitar o exagero. A ideia


não é "normalizar" o áudio, chapando tudo em 0 dBFS. O que vamos
procurar fazer é uniformizar o comportamento do volume ao longo do
track, mantendo um certo "espaço de manobra" (headroom) em
relação ao topo da escala. As figuras ajudam a esclarecer.

Repare, no exemplo, que embora eu tenha corrigido as variações de


dinâmica, fiz isso em termos gerais, resistindo à tentação de abaixar os
ataques (os picos curtos). É importante mantê-los nesta fase, porque são
muito importantes para a caracterização do timbre. Numa etapa
posterior, os limiters se encarregarão de aparar estes excessos. E,
também, a não ser que haja variações extremas no meio de uma frase -
por causa de uma correção ou edição, por exemplo -, deve-se
procurar trabalhar em frases inteiras. Na dúvida, confira ouvindo se o
change gain é realmente útil no meio de uma frase.

Esse tipo de procedimento praticamente dispensa o uso da tão

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endeusada (atualmente) e mal compreendida compressão paralela.


Change gain é menos romântico, mas funciona lindamente e
economiza tempo. E uma vez que os áudios estejam mais ou menos
uniformes, serão necessárias muito menos automações de volume. Os
compressores que eventualmente usarmos precisarão de ajustes muito
menos radicais, e, consequentemente, serão menos audíveis.

Em resumo, se conseguirmos modernizar nosso pensamento, nos


libertando das limitações que os processos analógicos impunham e que
hoje em dia simplesmente inexistem, ganharemos tempo, trabalharemos
menos e teremos um melhor resultado.

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17 ) Gravando Ambiente de Verdade


Como já falei no Guia de Mixagem, a maioria das vezes que recebo
uma música para mixar em que a bateria possui um canal de
“ambiente” ou “sala”, a única coisa que posso fazer com ele é desligá-
lo.
A intenção de quem gravou é boa, mas as condições em que se grava
hoje em dia acabam inviabilizando a coisa. Quando a gente quer
captar o ambiente ou sala, é importante que coloquemos o microfone
de modo a que ele ouça a sala mais que o som direto do instrumento.
Se existe muito som direto, não estamos captando o ambiente na
proporção que o deixe útil. Só que hoje em dia ninguém tem sala
grande o suficiente para que isso seja possível. Colocar um microfone a
três metros de distância de uma bateria, apontando para ela pode ser
um jeito bem natural de captar o seu som direto, mas de forma alguma
podemos chamar esse som de “ambiente”.
Neste caso precisamos até mesmo nos preocupar com o atraso em
relação aos microfones que estão próximos das peles, que mesmo não
sendo longos o suficientes para provocar ecos, podem gerar filtros-
pente.
Nos anos 60 e início dos 70, não havia reverbs eletrônicos, e o pessoal se
virava com molas e plates. As boas salas de gravação, porém, se
destacavam pela sua sonoridade (vide o filme “Sound City” -
imperdível), e eram escolhidas de acordo com ela. Quando se
precisava de mais reverb, então podia-se recorrer às “câmaras de
eco”(echo chambers), que nada mais eram que salas pequenas e bem
vivas, onde havia uma caixa e dois microfones. Quando se desejava
reverb, mandava-se o som do instrumento para a caixa e se captava a
sala através dos microfones. Tosco? Mas funcionava. Pergunte aos
Beatles.
Aqui na Gravadora, a gente tem a felicidade de ser vizinho de dois
estúdios de TV que são meu sonho de consumo. Pés direitos enormes e
salas vivas. Como a gente está gravando o CD da banda de rock
Conexa, e como baixou um certo saudosismo, decidimos fazer um teste
gravando o som ambiente da bateria em um dos dois estúdios. O
problema é que a bateria já estava gravada. Mas como a sala não
sabe deste detalhe, levamos uma estação móvel de Pro Tools até o
estúdio e simplesmente tocamos a bateria em uma caixa e captamos
com dois microfones.

©2019 by Fábio Henriques


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17)Um pouco de distorção pode fazer maravilhas.


O maior inimigo que o mixador enfrenta é o mascaramento. Esse
fenômeno, causado pelo jeito que nossos ouvidos funcionam, consiste
numa briga eterna em que quem estiver mais alto mascara o resto. E aí
a gente tem que se virar pra contornar esse problema. Um jeito clássico
é enriquecer a resposta em frequência do instrumento. Assim, com mais
harmônicos, aumenta a chance dele ser ouvido.
Um dos jeitos mais interessantes de aumentar o conteúdo harmônico é
acrescentar distorção. Pra isso uma das minhas ferramentas preferidas
são os simuladores de amps. Por exemplo, no piano o Sans Amp
funciona muito bem pra ajudar a trazer brilho e consequentemente
audibilidade.
Neste exemplo, temos um piano sem e com sans amp. A distorção é
sutil mas aumenta o conteúdo harmônico o suficiente pro instrumento
aparecer melhor na mix. É claro que se fosse uma faixa onde o piano
estivesse sozinho a gente tenderia a manter o timbre original, mas
dentro da banda funciona super bem.

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18)O Equalizador É Você


Eu acho muito engraçado quando falam do som do equalizador, que
esse modelo é melhor que aquele etc. Eu tenho sobre isso duas
convicções.
Primeiro, a gente acaba escolhendo o plugin equalizador mais pela
facilidade da interface do que pelo som. É a velocidade com que se
chega ao resultado que acaba decidindo.
Segundo, o equalizador sou eu. Pensa bem, vc ouve um som e decide
experimentar atenuar em torno de 250 Hz. Quem vai dizer quando está
bom é o seu ouvido, não o equalizador. Agora, se vc precisa tirar 15 dB
em 300 com Q=1.5 e o equalizador não oferece essa possibilidade, aí tá
a hora de experimentar outro modelo. Ou seja, quem equaliza é vc,
não o plugin.
Pois bem, tudo muito coerente com minha forma de pensar. Até que
usei a linha Retro da Nomad Factory, que emula eqs passivos. Olha, tem
alguma coisa diferente ali. Não acho que seja o caso de usá-los pra
coisas radicais tipo timbrar um bumbo, mas pra dar uma polida final são
inacreditáveis.
Mas isso puxou um outro assunto. Eu olho essas emulações de
equipamentos analógicos e admiro muito a tecnologia capaz de fazer
isso, mas me pergunto, por que emular tão bem as limitações desses
equipamentos? No caso da Nomad, por que não oferecer um modo
PRO em que as frequências não fossem fixas? Seria o equalizador de
meus sonhos! Eu perguntei isso à Nomad e eles me responderam que
existe um outro plugin deles que permite isso. Ou seja, desconversaram.
Não dá pra entender por que tanta fidelidade!!!

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19) Caçando Mitos - O "sonzão" do equipamento vintage


Texto longo - somente para os fortes.
Depois de nossos primeiros assuntos polêmicos, entraremos em território
ainda mais perigoso. Vamos analisar esta história de que existe um tipo
de equipamento que não se fabrica mais e que era muito melhor do
que o de hoje, e o era justamente porque era grande, tosco e,
principalmente, porque tinha botões de fogão.
OUVINDO COM O CORAÇÃO
A primeira coisa à qual precisamos ficar alertas é algo esquecido na
enorme maioria das vezes: a audição atua diretamente nos centros
emocionais de nossos cérebros. Como já dissemos aqui, o que ouvimos
influencia tanto as reações mais imediatas e primitivas, quando se trata
da resposta a sons repentinos e a ruídos de fundo, quanto as áreas de
nossa mente que envolvem um alto grau de processamento, como no
caso em que ouvimos uma complexa passagem musical. Qualquer
compositor de trilhas para filmes conhece bem o efeito que a música
tem sobre a emoção humana.
Pois bem. Em termos de música, quando ouvimos algo que nos agrada,
é extremamente difícil separarmos a mera experiência técnica da
emoção que o conteúdo musical nos causou naquele momento. Ou
seja, na maioria das vezes em que as pessoas dizem que algo que
ouviram tinha um "sonzão", estão se referindo não exatamente ao
conteúdo objetivo da informação sonora musical, mas ao sentimento
agradável que aquilo provocou. Pude comprovar isso várias vezes.
Como ouço música com atenção desde os quatro anos e só comecei a
trabalhar com áudio aos 31, passei a maior parte da minha vida como
ouvinte leigo, e tinha em minha memória vários exemplos de gravações
com um som inacreditavelmente bom, só que em praticamente todos
os casos em que isso aconteceu, fiquei bem decepcionado quando
anos depois fui ouvir novamente em estúdio - e com ouvidos de
profissional. O som não era tão bom assim, e eu até me espantei em
verificar que o que eu achava inacreditável era até bom, mas com as
limitações típicas da tecnologia ou do estilo de cada época. É preciso
que a gente reforce o fato de que todas as músicas que eu achava
geniais continuaram soando assim vinte e tantos anos depois. O que
decepcionou foi apenas o som das coisas, que em minha mente
também eram geniais.
A explicação está no fato de que tendemos a nos lembrar não
exatamente do som das coisas, mas da emoção que aquele som nos
provocou. Em outras palavras, lembramos do que "ouvimos" com o
coração, e não com os ouvidos. E esta conexão entre audição e
emoção é tão difícil de dissociar que muitas pessoas acham dificuldade
em admiti-la mesmo diante das maiores evidências.
Tomemos um caso de estudo: Purple Haze. A gravação é de 11 de
janeiro de 1967. Antes de mais nada, preciso deixar uma coisa
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totalmente clara: eu adoro a música por tudo que está ali em termos de
composição e execução, sendo que dizer que Hendrix era um gênio é
chover no molhado. Mas tecnicamente, ouvindo com os critérios de
hoje em dia, o som pelo som é uma catástrofe. Além das enormes
limitações de timbre, há um chiado enorme. Dá pra ouvir a hora em
que o microfone de voz é ligado, o pedal do bumbo está guinchando,
o reverb da voz é bem feio, o som geral da bateria e baixo é bem
pobre etc. Sem contar que nesta época o pessoal não sabia o que
fazer direito com o estéreo e a voz está só de um lado, por exemplo.
Tomemos outro exemplo - e agora uma legião de leitores irá se revoltar -
, que foi gravado em 1969: Come Together. Ok, ok, os Beatles são
geniais e tal, mas mesmo com esta gravação soando muito melhor do
que Purple Haze, se analisarmos friamente, segundo a tecnologia de
hoje, desafio qualquer produtor a colocar aquele som de bateria numa
gravação moderna e conseguir que o músico fique feliz. O que nos leva
a outra questão importante, que é a constatação de que mesmo com
evolução técnica, já não se fazem mais Beatles como antigamente. Ou
seja, evolução técnica não tem nada a ver com evolução artística. Mas
isso é algo que poderemos discutir no futuro.
TODA GRAVAÇÃO DA ÉPOCA ERA RUIM?
De modo algum. Havia gravações extremamente boas, embora fossem
em número muito pequeno. Tudo dependia mais da filosofia de
gravação do que de qualquer outra coisa. No final dos anos 1950 e
início dos 1960, por causa da limitação de número de microfones e
canais disponíveis, a tendência era gravar com pouquíssimos
microfones, colocados em posições estratégicas. Isso levava a uma
sonoridade muito natural, embora limitasse fortemente o que podia se
fazer em termos de processamento sonoro. Este tipo de técnica chegou
ao auge nas mãos da galera que gravava jazz nesta época, e, para
mim, muitas das melhores gravações de todos os tempos vêm
justamente daí. Duas das melhores que já ouvi (se não as melhores) são
Stardust, de John Coltrane (11 de julho de 1958) - o engenheiro foi o
sensacional Rudy Van Gelder - e 'Round Midnight, de Miles Davis (1956) -
com Frank Laico como engenheiro. Em ambas o som é tão natural que,
no estúdio, com acústica controlada, a gente tem a nítida impressão de
que eles estão ali, tocando na frente da gente. É arrepiante.
EQUIPAMENTO VINTAGE
Feitas estas exceções, a grande maioria do que se gravava na década
de 1960, comparando-se com o que dispomos hoje, tem um som bem
pobre. Daí me causar tanta surpresa as pessoas endeusarem justamente
os equipamentos que fizeram estas gravações. Se o leitor conseguir se
desvincular do pensamento padrão, vai concordar comigo. Mas
normalmente o cara vê aquela mesa da EMI, com os faders de
manivelas e botões de fogão, e conclui que esse equipamento dava

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um "sonzão", sendo que, se falarmos meramente em termos técnicos,


não tem nada de verdade.
Só que os anos 1960 foram uma época tão importante na história da
música pop que o resultado artístico que se obtinha com este
equipamento era antológico, APESAR dele, e não POR CAUSA dele.
Havia crosstalk, chiado, não-linearidades, dependências da umidade e
temperatura, transformadores e muitas outras características que
deixavam muito a desejar, infelizmente. Isso tudo fica ainda mais
evidente se repararmos que hoje podemos recriar com extrema
precisão as características sonoras destes equipamentos, "piorando" o
som através de plug-ins emuladores, mas não conseguiríamos com
aqueles equipamentos recriar nunca a qualidade de que dispomos
hoje.
Tudo bem: Led Zeppelin I (1969 - engenheiro Glyn Johns), mesmo com
as limitações da época, tem um som genial. Foi, provavelmente, a
primeira vez em que se gravou alguém tocando quiálteras no bumbo,
mas se você der aquele som de bumbo para um baterista hoje, ele
provavelmente não vai querer. E precisamos lembrar que é uma
gravação singular em termos de qualidade. Compare com Shades of
Deep Purple (julho de 1968). Há apenas seis meses de intervalo entre as
duas gravações, mas a diferença de qualidade é absurda. Qualquer
um que quiser este som de bateria em seu disco, por favor me fale, que
eu dou a mixagem grátis.
PROGRESSOS
Uma coisa importante é a gente não confundir a qualidade do projeto
e da construção com a qualidade da tecnologia. Os bons
equipamentos da década de 1960 eram muito bem projetados e
fabricados, e alguns eram realmente brilhantes, mas o problema estava
na tecnologia disponível. Microfones como o Neumann U47 estão entre
os melhores jamais fabricados, mas era uma indústria praticamente
artesanal. Desta época também são alguns projetos fantásticos, como
amp Marshall (que era, na verdade, um baterista) e um dos primeiros
samplers - o Mellotron (na verdade, o primeiro sampler foi o
Chamberlain, criado no início da década de 1950). Ao mesmo tempo,
com o maior acesso à possibilidade de se gravar, houve uma
popularização de instrumentos criados décadas antes, como o
Hammond, a caixa Leslie e o Theremin.
Os anos 1970, por sua vez, viram um progresso muito grande na área da
gravação em si, com a chegada dos gravadores multipistas e avanços
na eletrônica, e foi possível fornecer o suporte técnico para o
movimento artístico importantíssimo que acontecia. Ouso dizer que esta
década foi a mais importante da história do binômio música pop/áudio
gravado. Foi a época em que se conseguiu os melhores resultados com
a tecnologia de que se dispunha, mesmo com as limitações técnicas.
Um marco do início desta década é The Dark Side of the Moon (1972),
do Pink Floyd, que apresenta uma série de avanços técnicos aliados à
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criatividade do engenheiro Alan Parsons. Por exemplo, para conseguir


delays da ordem de 700 milissegundos, então inexistentes em
equipamentos, ele fazia loops de fita que saíam do gravador e
passavam por estantes de microfone, para que ficassem com o
comprimento necessário.
O que se conseguiu nestes anos foi tão impactante que mesmo hoje em
dia o som de seus equipamentos mais famosos se tornou referência
artística. Frequentemente ouço alguém dizer que um plug-in é incapaz
de emular perfeitamente um Fairchild 660, por exemplo. Para esta
pessoa preciso dizer que mesmo naquela época um 660 não conseguia
soar igual a outro. E o mesmo equipamento não tinha o mesmo som
dois dias seguidos. E o mais interessante é que o que torna o som deste
tipo de dispositivo tão procurado não é sua fidelidade sonora ou
transparência, mas justamente o contrário: são suas características de
distorção e não-linearidade que o tornam único.
TECNOLOGIA DEMAIS ATRAPALHA?
Mas será que o avanço tecnológico é sempre um condutor para
melhores resultados artísticos? Vejamos o que aconteceu nos anos 1980.
Foi a década de maior avanço tecnológico em termos de eletrônica
de gravação e de instrumentos. Sintetizadores polifônicos, novos
métodos de síntese, vários equipamentos de estúdio novos etc. Porém,
sempre que algo muito novo aparece em termos de tecnologia, o
pessoal acaba superutilizando. Roger Linn faz uma bateria eletrônica
interessante? Pronto: todo mundo se sentia obrigado a usar a Linndrum.
Nesta época, onze em cada dez gravações tinha a bendita caixa.
Ouça, por exemplo, I Want Your Sex, de George Michael (1987).
Um avanço extremamente significativo, mas não necessariamente
benéfico (a princípio), foram os reverbs digitais. Em 1976 aparece a EMT
250, o primeiro reverb eletrônico, e depois as Yamaha REV e,
principalmente, as Lexicon, como a 224 (1976). A Lexicon 480L (1983) fez
tanto sucesso que se tornou o padrão da indústria, e estava presente
obrigatoriamente em todos os estúdios decentes.
Até a chegada destes reverbs, eram os estúdios que tinham que ter
salas com reverbs interessantes (como mostra o recente documentário
de Dave Grohl, Sound City). Mas agora, com bons reverbs artificiais, o
pessoal não queria nada que limitasse a criatividade, e passaram a
abafar as salas e até os instrumentos, deixando tudo por conta dos
reverbs. Daí, foi um festival de baterias e ambiências irreais e excesso
generalizado de reverbs. Posso dizer que a gente reconhece uma
gravação dos anos 1980 pela bateria eletrônica e pela quantidade de
reverb.
As coisas foram se acalmar com o retorno às sonoridades naturais nos
anos 1990, mas isso já será outra história.
CONCLUINDO

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Em resumo, podemos concluir que equipamentos antigos podem até


ter o seu charme, mas em se tratando de tecnologia de gravação,
salvo raras exceções, a gente vai ter resultados muito abaixo do que se
consegue hoje em dia. Se pudessem escolher, muitos dos engenheiros
da época ficariam muito felizes em se livrar de coisas como crosstalk e
chiado. Por isso, a afirmação de que só porque um equipamento é
antigo o seu som é melhor infelizmente está longe da verdade. Existem
bons equipamentos e outros não tão bons, independentemente da
idade e de como são usados, seja por limitações tecnológicas ou
mesmo por pressão de estilo.
Este tipo de pensamento ingênuo acaba supervalorizando certos
aspectos. Por exemplo, como consequência deste tipo de conceito,
hoje existem microfones que usam válvulas, mas são tão ruidosos que se
torna impossível usá-los em aplicações que exigem mais cuidado.
Para encerrar com um exemplo bem pragmático, temos a recente
moda (eu chamaria de "modismo") dos summing amps. Os fabricantes
atuais estão adorando que as pessoas acreditem que introduzir
distorção, não-linearidade e chiado vai deixar suas gravações mais
"analógicas" e "melhores". Este, para mim, é mais um caso da indústria
difundindo um conceito e todo mundo ouvindo com o coração e
acreditando que está subjetivamente ouvindo algo melhor. A questão é
- e sempre será - o seu critério: se você está feliz com o que ouve, tudo
certo; mas se faz força pra se convencer de que seu som melhorou só
porque fulano disse no YouTube que o som fica inacreditável com um
summing amp, algo provavelmente está errado.

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20)Otimizando sua Mixagem Parte 6


Usando compressores
Por que comprimir? Essa é a boa notícia: assim como ninguém é
obrigado a equalizar, também não existe obrigação em comprimir. Mas
se não há, por que usar compressores? O maior vilão das mixagens é o
fenômeno psicoacústico do mascaramento. Quando existe uma região
de frequência intensa em um instrumento, outros instrumentos que têm
menos volume nesta região são completamente ignorados por nossos
ouvidos (já tratamos detalhadamente disso anteriormente). Assim,
quanto menores as variações de volume de um determinado
instrumento, mais fácil será achar um volume médio para ele em uma
mixagem de forma que ele não seja mascarado por outros.
Isso é particularmente importante para a voz, que normalmente precisa
ficar perfeitamente audível o tempo todo. Ao diminuir a variação de
volume, o compressor permitirá que se ache um ponto médio para a
voz em uma mix com mais facilidade. É claro que ao longo da música
poderão ser precisos ajustes neste volume médio, pra que não fique
nem alto nem baixo demais, mas o compressor tornará estes ajustes
muito mais fáceis.
Além desta necessidade técnica, existem também os aspectos
estilísticos envolvidos (afinal, arte é assim mesmo). Se estamos
trabalhando com música pop/rock, por exemplo, não se espera muitas
variações de volume ao longo da música, e os compressores irão nos
ajudar muito a manter os volumes mais constantes, sem o uso excessivo
de automações de volume. Aliás, existe uma tendência geral
atualmente em se trabalhar com tracks bem comprimidos, a ponto
desta compressão ser audível mesmo. Vale a pena ouvir referências do
estilo com que se está trabalhando para uma avaliação do papel dos
compressores. Sem dúvida, a ideia antiga de que se devia ser
comedido com a compressão para mantê-la inaudível já não pode ser
considerada "moderna".
VISÕES MICRO E MACRO
Podemos encarar o fato de comprimir em duas vertentes. Primeiro, a
visão "micro" - ora, imaginemos que estamos com ataque demais em
um instrumento percussivo e queremos diminui-lo. Se usarmos um
compressor bem rápido, ataque mínimo e release mínimo, será possível.
Estamos neste ponto apenas preocupados com a sonoridade do
instrumento em si. Já a visão "macro" avalia a mixagem como um todo
e o papel deste instrumento frente aos outros. Um caso clássico da visão
macro é o compressor de stereo bus da SSL, disponível também em
plug-ins, como o da Waves. O número de hits-número-um que passaram
por um compressor destes é enorme, e sua sonoridade certamente já se
incorporou à nossa cultura de "som de hit".
Neste ponto, vale um pequeno parêntese: uma coisa é muitos hits terem
passado pelo stereo compressor da SSL, a outra, muito diferente, é a
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pessoa pensar que é preciso passar por ele para se ter um hit.
Resumindo, portanto, analisando objetivamente, compressores
diminuem a diferença entre o maior e o menor volume de um canal,
facilitando sua colocação em uma mixagem. Ao mesmo tempo,
subjetivamente falando, os compressores deixam o som com uma
característica interessante em termos de estilo, e familiar ao ouvinte.
TIPOS DE COMPRESSORES
Variando a filosofia com que se ajustam o threshold e a ratio, podemos
ter reduções de ganho semelhantes com ajustes bem diferentes. Um
caso clássico são os compressores em que não se permite a escolha da
ratio, sendo esta pré-ajustada e muitas vezes comportando-se de
acordo com as características do sinal de entrada.
Um dos modos de operação muito interessantes é o "leveler", que usa
uma ratio muito baixa (menor que 2:1) e um threshold também baixo,
de forma que sempre haja compressão, mas que esta seja em taxa
baixa, para diminuir a audibilidade. Este tipo de filosofia é bem
interessante no caso da voz, onde regiões de volume com e sem
compressão muito nítidas podem ser problemáticas.
Um outro tipo de filosofia é o "limiter". Em tese, costuma-se considerar
que um compressor está atuando como limiter se os tempos de attack e
release são curtos e se a ratio é igual ou maior que 10:1. Em um caso
ideal, e no caso dos plug-ins de limiter, como o L1 e o Maxim, pode-se
considerar a ratio como infinito:1, ou seja, para qualquer amplitude
acima do threshold na entrada, o valor de saída é o mesmo.
Com a evolução da mixagem e, principalmente, masterização em
ambiente digital, o uso de limites se propagou rápida e ubiquamente no
áudio. Levando-se em conta que, em digital, quanto maior o volume,
maior a qualidade, o limiter se mostrou uma ótima ferramenta, pois
segura os picos de curta duração e permite subir o nível geral de uma
mix ou de um instrumento. Seu uso exagerado, porém, pode levar a
diminuição exagerada da dinâmica, e muitos consideram que foi a
ferramenta que impulsionou a "guerra de volumes" tão mal vista hoje em
dia.
COMPRESSÃO PARALELA
De tempos em tempos surgem os "melhoraisers", que são equipamentos
ou procedimentos sem os quais é "impossível" se conseguir uma mix
moderna, decente e com "pressão". Por um breve tempo, a
compressão paralela foi o melhoraiser da vez. Mas vejamos do que se
trata.
A técnica consiste em se pegar o sinal original e somar com uma versão
dele pesadamente comprimida. Antes de mais nada, precisamos fazer
uma ressalva. É preciso tomar muito cuidado para se manter a
coerência de fase entre estas duas componentes, sob pena de se
alterar o timbre e até gerar um filtro pente. Assim, se você quer usar

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compressão paralela, prefira os plug-ins de compressores que possuem


um controle de "mix" entre o som direto ("dry") e o comprimido ("wet").
Já vi gente dizendo com firmeza que a compressão paralela dá "vida",
"pressão", "energia" e coisas subjetivas como essas, mas sem especificar
como e porque, então vejamos do que se trata. Quando se soma o
sinal original com um pesadamente comprimido, nos momentos mais
altos haverá pouca soma, por causa da compressão atuando, e nos
momentos mais baixos a porção comprimida irá se somar muito ao som
direto, pois não sofreu compressão. Em resumo, enquanto um
compressor diminui o que é alto (como já vimos), a compressão
paralela aumenta o que é baixo.
Ora, esse tipo de ferramenta era valiosa quando o sinal precisava ser
mandado pra fita o mais pronto possível. Hoje, com a gravação em
computador, isso ficou totalmente dispensável, e um ótimo substituto
para a compressão paralela é o change gain. A gente vai lá e
simplesmente dá ganho nos trechos mais baixos do áudio file. Pronto,
dispensado o melhoraiser. Para quem gosta, porém, da distorção
introduzida com uma compressão paralela pesada, aí são outros
quinhentos, pois o resultado agrada pela distorção e não
necessariamente pela compressão.
COMO ESCOLHER O TIPO DE COMPRESSOR
O que vai determinar a escolha são as características do sinal a
comprimir, o estilo e a facilidade de uso. Compressores valvulados e
suas simulações são notoriamente lentos. Assim, se a gente precisa
diminuir os ataques da caixa, a opção são compressores ou a transistor
ou totalmente de software, pois terão tempos de attack e release mais
maleáveis. Para voz, o uso clássico são os levelers, ou compressores com
soft knee e que permitam ratios baixas e thresholds baixos.
Uma crença que considero sem o menor fundamento é a de que os
compressores "tiram agudos". Muitas vezes, por diminuírem o volume de
saída num primeiro momento, a percepção de agudos por nossos
ouvidos diminui, podendo causar essa sensação. Em outros casos, o
próprio design do compressor usa circuitos que acabam alterando a
resposta em frequência - não como resultado desejado pelo projetista,
mas como consequência inevitável -, o que nos leva a fazer realmente
uma pesquisa em nosso conjunto de equipamentos/plug-ins disponíveis,
e, dessa forma, estabelecer um banco de cartas na manga.
"Existe uma tendência, principalmente no caso de plug-ins, que nos leva
a escolher aquele equipamento cuja interface nos é mais amistosa"
Um fator que não se pode menosprezar e que considero fundamental,
embora eu nunca o tenha visto abordado em publicação nenhuma, é
a facilidade de operação. Existe uma tendência, principalmente no
caso de plug-ins, que nos leva a escolher (como "soando melhor")
aquele equipamento cuja interface nos é mais amistosa. O fator a se
considerar nesta abordagem não é necessariamente o tipo de som
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resultante (já que ele será similar em muitos casos), mas a facilidade,
comodidade e rapidez de se chegar até ele com esta ou aquela
ferramenta.
UMA RECEITA DE BOLO
Antes de mais nada, é preciso ter uma ideia do que se quer. Desejo
manter o volume geral do track mais uniforme? Preciso
diminuir/aumentar a relação entre o volume do ataque e da
ressonância de um instrumento? A compressão poderá ser audível ou
não?
As ferramentas para este tipo inicial de decisão já fornecemos acima.
Agora vejamos, uma vez escolhido o compressor a usar, como fazer um
pequeno ajuste.
1) Parta de um attack e release médios ou de preferência em uma
posição "auto";
2) Escolha uma ratio inicial. Para voz, entre 1.5 e 3:1; para instrumentos,
de 2 a 4:1;
3) Deixe o threshold no máximo;
4) Coloque para tocar um trecho em que haja variações de volume
importantes no track;
5) Venha descendo o valor do threshold até que a redução de ganho
no medidor esteja atingindo no máximo em 6 dB;
6) Se a compressão estiver muito audível, reavalie a ratio e verifique a
forma do "joelho", alternando entre "soft" e "hard" knee;
7) Avalie se o compressor teria que ser mais rápido no attack ou no
release.
Embora muito básico, você vai verificar que este procedimento se
aplica à maioria dos casos. Ele, obviamente, é um mero ponto de
partida, e as experimentações são bem-vindas, desde que não se deixe
para tentar todas elas durante o horário do cliente. Nestas horas, o
"dever de casa" faz uma enorme diferença.

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21) REFERÊNCIAS E O REVERB DA VOZ


Essa questão de referências é muito peculiar em mixagem. É muito comum que o
cliente lhe traga uma ou mais referências sonoras e isso pode ser bom ou ruim.
Vamos ver um caso típico - o reverb da voz.
Até bem pouco tempo atrás, as produções gringas não usavam quase nenhum
reverb na voz. Quanto mais seca melhor. E não há nenhum motivo técnico pra
isso. É mesmo moda. Aí o cliente cantor chegava e dizia "eu quero a minha voz
assim". Ora, conhecendo o gosto brasileiro por voz com reverb a gente já
perguntava: "tem certeza? Porque essa voz está sem reverb". A resposta do cliente
era mais ou menos "é isso mesmo, bem seca é que é legal".
Até ele ouvir a mix.
Aí ele começava a achar a voz "sem vida", "apagada", etc. Daí a gente colocava
reverb e pronto. Tudo se consertava.
Pois é. Esse é o problema da referência, principalmente quando vem do cliente.
Ele pensa que está escolhendo ela pelo som, mas não é. É pela interpretação,
pela música e tudo o que está lá.
Assim, já no Guia de Mixagem Vol. 1 eu alerto: a referência do cliente é
importante pra vc saber onde ele queria chegar. Não tem nada a ver com o que
está gravado. Muitas vezes vc vai ralar pra chegar na referência só para descobrir
que o cliente na verdade não queria aquilo. Assim, peça referências ao cliente
pra ter uma ideia do que se quer, mas evite confiar nelas pra fazer o seu som.

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22)COMO ESCOLHER O QUE USAR NA MIX?


QUAL EQUALIZADOR? QUAL COMPRESSOR?
A gama de possibilidades é enorme, tanto de meios quanto de
resultados, e uma pessoa menos experiente pode se deparar com uma
insegurança compreensível. Dado um certo canal, o que devo usar
para chegar ao resultado que desejo e preciso? Qual será o efeito no
conjunto da música daquilo que eu usar especificamente neste canal?
Isso até nos leva a uma discussão ainda mais básica: o por quê da
necessidade de, afinal, se usar algum processador em um som gravado.
O OBJETO DO TRABALHO
Antes de mais nada, é preciso lembrar da mais importante das coisas
em um trabalho: o cliente. Ele é a finalidade de todo o nosso esforço.
Por mais perfeita que uma mixagem soe para nós, se ela não agrada
ao cliente ou se demoramos a ponto de seu prazo e orçamento
estourarem, o objetivo não foi alcançado. Por isso, torna-se
fundamental que desenvolvamos as capacidades de se entender o
que se precisa, de decidir que ferramentas usar e como fazer isso no
menor tempo, sem prejudicar a qualidade final.
Assim, o mínimo que a gente precisa saber ao se deparar com um
canal a ser trabalhado é o que pretende usar, nem que seja somente a
princípio. Embora seja óbvio o fato de que os diferentes canais que
compõem uma mix interagem, esta interação está longe de ser um
obstáculo tão grande a ponto de fazer com que nos confrontemos com
uma indefinição. Afinal, se eu ficar indeciso porque a voz interfere no
som do bumbo e vice-versa, eu não começo por canal nenhum.
Nesta nossa discussão, vamos nos concentrar nestes dois pontos
básicos: vamos entender por que aparece a necessidade de se "mexer"
no som de um canal e como se dá o processo de decisão sobre "o que"
utilizar. A decisão de qual processador efetivamente usar vai depender
de questões subjetivas (o gosto de cada um) e objetivas (o que se tem
à disposição), e entrar neste aspecto tornaria nossa conversa aqui um
tanto inútil (determinar como escolher o modelo de equalizador, por
exemplo, seria exaustivo e não estaria ajudando muito, porque, como
diria famoso político, estaríamos "dando o peixe, e não ensinando a
pescar").
Antigamente, antes da chegada das DAWs (Digital Audio Workstation -
Pro Tools e similares), havia uma certa "facilidade" neste aspecto. A
gente simplesmente não tinha ferramentas suficientes. Tinha um
equalizador por canal na mesa, mais uns poucos processadores no rack
e olhe lá. Se a mesa fosse realmente bacana, tínhamos o luxo de um
compressor por canal, o que facilitava bastante, mas daí até a gente
poder escolher qual equalizador ou qual compressor queria usar havia
uma enorme e intransponível distância.

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Quando vejo hoje em dia alguém usando seis ou sete reverbs em uma
música fico pensando como esta pessoa faria naquelas épocas. E não
estou falando de muito tempo atrás, não. Até meados da década de
1990 era basicamente isso: poucos recursos e muita criatividade.
Mas vejamos, afinal, o que determina se precisamos ou não moldar o
som de um canal.
A INTERAÇÃO DOS INSTRUMENTOS
Imaginemos um recital de música clássica em que uma cantora
interpreta uma peça acompanhada de uma orquestra de cordas. Será
que o som que sai dos violinos muda o som da voz? Ou será que a voz
muda o som dos violinos? De fato, ouvir voz e violinos é diferente de
ouvir cada um em separado, mas a interação deles é um fator
artisticamente construtivo, e não destrutivo. Como não há jeito de
"equalizar" os violinos ou a cantora acusticamente, por que será que
surge a necessidade de fazê-lo eletronicamente, num ambiente de
mixagem?
A primeira diferença é o jeito como se grava. A situação em que
ouvimos uma cantora e uma orquestra de cordas ao vivo (e sem
amplificação) equivale eletronicamente a colocarmos um microfone
estéreo na mesma posição e altura de nossos ouvidos. Desta forma, na
"mixagem", certamente não precisaríamos mexer nem no som de um
nem de outro (descontando momentaneamente as colorações
provocadas pelo microfone). Na verdade, este tipo de gravação é
extremamente realista, e existem situações, tipicamente na música
clássica, em que se grava exatamente assim: numa sala de concerto
com uma acústica excepcional, com apenas dois microfones
estrategicamente colocados. Um belo exemplo é Moussorgsky: Pictures
at an Exhibition/Night on The Bald Mountain, com Lorin Maazel regendo
a Cleveland Orchestra, da Telarc/Lim, que mesmo sendo uma
gravação de 1979 (uma das primeiras gravações em digital a aparecer
no mercado), continua em catálogo. É uma performance fantástica e o
som é de tirar o fôlego. Pode ser encontrada em diversas lojas na
internet, como na Amazon, em http://tinyurl.com/nightmountain.
Porém existem dois aspectos importantes a considerar. Gravar deste
jeito nos impede de mexer à vontade no som de cada instrumento, e
nem sempre as performances de todos os músicos são equivalentes em
termos de qualidade. Assim, em nome de termos o poder de controlar à
vontade (dentro de certos limites) o som de cada instrumento,
gravamos em separado e/ou colocamos os microfones mais próximos a
cada um deles. E este jeito de gravar, embora seja extremamente útil,
é, infelizmente, completamente antinatural. Não quer dizer que a falta
de naturalidade seja ruim. Nada nos obriga a ficarmos presos à
naturalidade de uma situação. A possibilidade de mexer diretamente
em cada canal é uma ferramenta criativa importante e por isso
universalmente utilizada.
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Vejamos o caso da bateria, por exemplo. Não há nada menos natural


do que colocar um microfone a dois centímetros de distância da pele
de cada tambor, ou do hi-hat. Ninguém ouve bateria desta forma.
Porém, o poder que isto nos proporciona é imenso. E a coisa é tão
poderosa que hoje em dia o som de uma bateria gravada é uma
entidade que não tem muito a ver com a experiência de se ouvi-la
acusticamente. Experimente entrar numa sala onde uma bateria esteja
sendo tocada e perceba se o que você ouve chega ao menos perto
do que escuta em um CD. É totalmente diferente. Não estou discutindo
aqui o que é "melhor", pois isto é uma questão subjetiva. Objetivamente,
porém, o som da bateria moderna gravada (principalmente na música
pop) é uma construção a que todos nos acostumamos.
Pois bem, gravamos as coisas separadas e nos preocupamos
individualmente com a qualidade de cada canal. Quando estamos
"timbrando" um instrumento, estamos otimizando o conjunto formado
por ele mais a sala, o microfone, sua posição, o cabo e o pré-
amplificador, de forma que o resultado gravado seja o mais funcional
possível. Não necessariamente o mais funcional significa o mais "bonito".
Como a gente não sabe ainda o que será preciso fazer neste som
quando ele for somado aos demais, é sempre bom deixar uma margem
para manobra. No tempo da fita analógica a gente tinha já que
imprimir um som mais próximo do desejado, por causa das limitações da
mídia. Com os gravadores digitais, porém, posso afirmar sem medo que
não existe a menor necessidade de se equalizar durante a gravação.
Não é proibido fazê-lo, mas também não é necessário. Uma certa
compressão pode ser útil para que os trechos mais suaves não percam
qualidade na conversão para digital, mas se for usado um sistema de 24
bits, arrisco dizer que nem isso é absolutamente necessário.
Resumindo, então, na mixagem a gente precisa realmente tomar
cuidado com a interação dos diferentes canais para que a soma de
todos soe bem, uma vez que o jeito de gravar não leva em conta esta
interação. Agora, o fato deste fenômeno ocorrer não é determinante: é
apenas uma consequência do método.
PROCESSAR É PRECISO?
Tomando então um canal que desejamos inserir numa mix. Um bumbo,
por exemplo. Eu estaria gastando o tempo valioso do leitor se ficasse
aqui discorrendo sobre todas as possibilidades que enfrentamos nesta
situação. Pra quem gosta de matemática, costumo dizer que uma
mixagem é um sistema com mais variáveis do que equações, e,
consequentemente, pode ter infinitas soluções ou nenhuma solução,
mas jamais pode ter uma solução única (confira em Resolução de
Sistemas Lineares, de J. M. Martínez e A. Friedlander). Pra quem não
gosta, mesmo assim dá pra sacar que não existe "a" mixagem, mas "as
possíveis mixagens". Não há mixagem errada, embora haja muitas
mixagens certas.

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Dizer aqui que cada equalizador tem um som ou um comportamento


não ajuda muito. Então, o que buscamos sempre é simplificar. O ser
humano tem esse jeito de resolver os problemas, seja pra levantar uma
parede ou pra mandar um foguete pro espaço. A gente simplifica um
problema grande, transformando-o em algo resolvível. Então, em vez de
dizermos que não sabemos o que usar porque esse bumbo tem a sua
individualidade e será acompanhado por mais algumas dezenas de
canais, precisamos é nos apoiar fortemente na única coisa
absolutamente definida quando se começa uma mixagem: a
ferramenta que será usada para ouvi-la - nossos ouvidos.
Quando começamos a trabalhar em uma música, a única coisa de que
temos certeza é que nossos ouvidos serão nossos guias e nossos juízes, e
é por aí que devemos começar. Ou seja, voltando ao nosso bumbo
primordial, vamos simplesmente ouvir o que ele tem a dizer. A partir daí
a primeira coisa que precisamos gerar é uma opinião a respeito dele.
FORMANDO UMA OPINIÃO
No meu primeiro dia trabalhando em estúdio, lembro-me de observar o
mestre Guilherme Reis equalizando um bumbo e me perguntado "como
é que ele sabe que já está bom?". Ou seja, quando é que o som já está
"o melhor possível"? A resposta tem duas partes. Primeiro, ao ouvir o som
original precisamos emitir um julgamento sobre ele. Com base na
experiência prévia que temos de ouvir este mesmo instrumento em
outras oportunidades já podemos ter uma ideia a respeito do que fazer
e se é preciso fazer algo. Se nunca ouvimos nada parecido, acabamos
usando o velho bom senso mesmo. A segunda parte da resposta,
porém, é talvez a mais interessante: nós não precisamos acertar de
primeira. A gente pode se dar ao luxo de errar em nosso julgamento. O
que fazemos é, então, montar uma opinião a respeito do que ouvimos e
trabalhar em cima dela. Se lá na frente descobrirmos que nossa opinião
precisa ser revista, não há o menor problema.
Mas e se eu julgar que um som precisa ser trabalhado e melhorado, o
que posso usar para isso? Bom, felizmente as possibilidades não são
tantas assim. A princípio, podemos mexer na resposta, em frequência,
no volume e na ambiência. Como estamos trabalhando apenas em um
canal, podemos momentaneamente parar de nos preocupar com sua
interação com os outros. Ocupemo-nos, então, apenas com o som
dele. Se julgamos que existem regiões de frequência que precisam ser
mexidas, inserimos um equalizador. Se existem muitas variações de
volume no canal, podemos inserir um compressor ou atuar no próprio
áudio, alterando o ganho de certos trechos. E por aí vai.
Agora, qual equalizador especificamente usar? Qual compressor? Pois
bem, neste ponto eu vou contar o maior segredo para mixagens felizes
e tranquilas: aprenda com tudo o que você fizer. É a velha história da
experiência. Certa vez um cliente me perguntou como eu conseguia ter
uma solução rápida para os problemas, e minha resposta foi: "eu já sofri
muito". Em resumo, se a gente aprende com tudo o que faz, vai
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montando um estoque de soluções para os problemas. E os erros e os


problemas ensinam muito mais do que os acertos. Assim, na próxima vez
em que você trabalhar em um instrumento, procure memorizar o tipo de
solução que usou. Depois de você corrigir uma "cantada" de caixa de
bateria atenuando 490 Hz em umas três situações, provavelmente já irá
direto nessa frequência na quarta, mesmo que lá na frente seja
necessário reajustá-la. Este será o ponto de partida. E quanto a quais
plug-ins ou processadores efetivamente usar, depois de um tempo você
vai observar que existe um grupo relativamente pequeno de
ferramentas que a gente acaba preferindo. Isto não é errado: é apenas
producente. Se determinado equalizador lhe deu um resultado bacana
hoje, por que não começar usando ele na próxima vez?
Só que a gente não deve esperar até a hora de uma mixagem ou
gravação pra valer para testar as ferramentas de que dispõe. Assim que
temos acesso a um novo equipamento, plug-in ou processador,
precisamos testá-lo o mais rápido possível na maior quantidade de
situações que pudermos. Desta forma, estaremos aumentando nosso
vocabulário de recursos e já poderemos estabelecer mentalmente em
que situações poderá valer a pena usá-lo.
Sinceramente, uma mixagem em que cada canal usa um equalizador
de modelo diferente me parece um tanto caótica. Não acho errado
experimentar. Muito pelo contrário. Mas também acho que esta
experimentação deve ser reservada para os momentos em que ela será
útil. Se a gente lembrar que existe um cliente com orçamento e prazo a
serem respeitados (e eles sempre existem, mesmo que o cliente seja
você mesmo e o dinheiro seja o seu), levar tempo demais pra escolher
qual equalizador usar no bumbo deixa de ser esmero e passa a beirar a
falta de consideração. É óbvio que cada instrumento tem sua
individualidade, cada músico tem seu som próprio, cada microfone, sua
resposta, mas um bumbo é um bumbo, e as soluções que a gente usa
em um são bem próximas das que usaremos no próximo. Partir do zero a
cada canal de cada mix me lembra o personagem de Guy Pearce no
filme Amnésia, que só lembrava dos últimos 30 segundos de sua vida.
COMO RESOLVER
Resumindo, realmente é interessante reconhecer que o problema da
escolha do que se usar tem duas abordagens. Primeiro, podemos
simplesmente dizer que não se pode determinar a princípio essa ou
aquela solução, mas prefiro - como os leitores dos meus Guias de
Mixagem sabem muito bem - oferecer ferramentas que os auxiliem a
efetivamente resolver os problemas que aparecerem, deixando claro,
como sempre, quando estou citando um fato ou emitindo a minha
opinião.

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23)CONVERSÃO ANALÓGICO – DIGITAL

Imaginemos o seguinte cenário: estamos em 1978. Todos estão


felicíssimos com a sonoridade "quente" das fitas analógicas e com o
desempenho de todos os equipamentos que hoje muitos acham
inigualáveis, os discos de vinil transmitem aquele som lindo e
característico. Então porque diachos iriam as indústrias gastar tanto
dinheiro para desenvolver o áudio digital? Seria parte de um complô
internacional visando levar o público a comprar de novo toda sua
discoteca? Seriam os computadores tentando dominar o mundo
através do controle mental de seus projetistas? Ou quem sabe uma
manobra dos comunistas para derrubar o imperialismo ocidental?

Antes de mais nada, o áudio digital nos libertou daquela vitrolinha cor
de abóbora com agulha de cerâmica que ligava movendo o braço
para a direita até fazer "clock" e desligava para a esquerda fazendo
"cleck". Se observarmos os equipamentos acessíveis ao consumidor,
veremos que existe muito mais qualidade hoje com os CD players do
que com o vinil em qualquer nível e em qualquer tempo. Basta
perguntar a qualquer amante de música clássica e ele não pestanejará
em preferir ouvir os pianíssimos em vez dos arranhados, ou ouvir os tiros
de canhão da Abertura 1812 sem que a agulha salte do sulco.

O ALCANCE DA DIGITALIZAÇÃO
Ao levarmos a discussão para o lado de "maciez" ou "quentura",
estamos nos referindo a uma minoria seleta de ouvintes que possuem
condições suficientes para avaliar tais sutilezas. E mesmo assim essa elite
audiófila ouve mais com as opiniões pré-concebidas que com os
ouvidos. O objeto do artista é o público, e é inegável que a
digitalização permitiu se chegar a um público muito maior com muito
mais qualidade. Isso vale não só para o áudio, mas também para a
indústria do cinema com o DVD. Hoje, após quatro anos de seu
lançamento, existem nos EUA 20 milhões de DVD players. Os CD players
levaram oito anos para atingir esta marca, enquanto os videocassetes
levaram 12 anos. Agora, se a democratização da tecnologia musical
levou a um crescimento do nível artístico aí já são outros quinhentos.
Deixo para uma próxima oportunidade esta discussão. Por ora, sugiro
conhecermos um pouco melhor o processo de digitalização do áudio,
com suas vantagens e desvantagens, para que tenhamos mais subsídios
na hora de criticar ou elogiar.

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AS VANTAGENS DA CODIFICAÇÃO
Desde os tempos dos tambores da selva ou dos sinais de fumaça, que o
homem sabe a utilidade da codificação para a transmissão de
informações. O código Morse, por exemplo, permitiu transmitir
mensagens através de linhas sem qualidade suficiente para a
transmissão de voz. A escrita nada mais é que um código visual para a
representação de palavras.

Codificar uma informação implica numa maior independência das


características do meio de armazenamento/ transmissão. Foi assim que
nos livramos do chiado da fita analógica. Além disso, no caso da
digitalização (e isso vale para áudio e imagem), uma vez que a
informação esteja codificada, pode ser realizada uma infinidade de
manipulações com os dados, destrutiva ou não-destrutivamente. É isso o
que acontece ao "ziparmos" um arquivo texto ou comprimirmos uma
imagem para JPEG.

O áudio digitalizado é nada mais que uma série de números, e como tal
podem ser submetidos a infinitas operações matemáticas, tornando
possível obter resultados inimaginá-veis no campo analógico. O primeiro
fator a ser subvertido é o tempo. Enquanto as operações com o áudio
analógico são dependentes do tempo, digitalmente é possível por
exemplo verificar instantaneamente em que ponto acontece uma
virada de bateria ou um evento qualquer.

Para que tudo isto seja possível, porém, é fundamental que a


codificação - a transformação das ondas elétricas do sinal de áudio em
números - seja feita de maneira a preservar todas as características do
sinal original. Da qualidade da conversão dependerá a qualida-de de
toda a informação codificada. Veremos a seguir como se realiza esta
conversão.

OS PRINCÍPIOS DA CONVERSÃO

Vamos supor que desejamos copiar exatamente uma curva. (figura 1)

A primeira coisa que faríamos seria colocar eixos de referência. A seguir,


estabeleceríamos divisões regulares no eixo horizontal e para cada
divisão mediríamos a altura do ponto correspondente da curva, como
mostra a figura 2.

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Fazendo isso para todas as divisões, teríamos o gráfico visto na figura 3.

Pode-se notar que para um número de pontos muito pequeno como


este temos pouca chance de desenhar uma nova figura que se pareça
suficientemente com a original. Repare que na região da extrema
direita perdemos a informação de que a curva possuía uma porção
negativa no trecho.

Dobrando-se o número de pontos, aproximamo-nos mais da forma de


onda original, obtendo inclusive a informação de cruzamento pelo zero

na região indicada anteriormente.

TRANSPORTANDO PARA O ÁUDIO

O processo de conversão analógico/digital é mais ou menos o mesmo.


Admitindo que o eixo horizontal represente tempos e o vertical
amplitudes, iremos a cada intervalo préestabelecido proceder a uma
medida da amplitude do sinal. A esta medida chamamos amostra (ou
sample); ao ato de medir chamamos amostragem (sampling) e ao
número de vezes que se amostra por segundo, taxa de amostragem
(sampling rate).O valor desta amplitude é convertido em um número
digital para poder ser armazenado e/ou transmitido. Mais adiante
iremos conhecer como se dá a geração destes valores digitais. Por ora,
voltamos à questão da quantidade de pontos necessária para um
desenho fiel da curva.

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No nosso caso (figura 5), a forma da onda começou a ser mais fiel
quando o número de pontos foi tal que ficou possível representar todas
as sinuosidades da curva. Será que se pode calcular o número mínimo
de pontos que satisfaça esta condição?

HARMÔNICOS E SÉRIE DE FOURIER

Para isso, vamos recorrer a Fourier, que descobriu uma característica


interessante das ondas periódicas (cuja forma se repete no tempo - tais
como as ondas sonoras). Uma oscilação periódica de freqüência
fundamental f, por mais complicada que pareça, pode ser encarada
como a soma de ondas senoidais puras, com freqüências f, 2f, 3f, 4f
etc..., cada uma com uma determinada amplitude. Assim, quando se
toca em um violão a nota Lá com 220 Hz, estamos gerando uma forma
de onda complexa que na verdade pode ser interpretada como a
soma de senóides com 220Hz, 440Hz, 660Hz etc. É daí que vem a Série
Harmônica do estudo de Música.

O TEOREMA DE NYQUIST - TAXA DE AMOSTRAGEM

Voltando agora à conversão digital, graças ao trabalho de, Nyquist


(pronuncia-se "Náiqüist") e outros, descobriu-se que se pode calcular o
menor número de amostras por segundo (a menor taxa de
amostragem) necessário a representar fielmente a forma de uma onda.
Para isso, temos que primeiro admitir que existe uma freqüência máxima
para este sinal de áudio. Ou seja, qualquer que seja a forma da onda,
ela não poderá conter harmônicos acima de um valor fmáx . No caso
da música, admite-se que o
ouvido humano não houve nada acima de 20kHz . Assim, podemos
dizer que nossa fmáx é 20kHz. Agora, de acordo com o Teorema de
Nyquist, temos que todos os harmônicos desta forma de onda serão
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representáveis digitalmente se usarmos uma taxa de amostragem de


pelo menos o dobro de fmáx . Para o nosso caso a taxa de amostragem
deverá ser de pelo menos 40 kHz.

Isto significa que, independente da precisão dos valores das amplitudes


medidos, para digitalizar música precisamos gerar pelo menos 40.000
amostras a cada segundo. Em um CD, a taxa de amostragem é
padronizada em 44.100 amostras por segundo, ou 44,1kHz.

Se quisermos converter para digital a gravação de uma conversa


telefônica, sabendo que os telefones só falam até 3kHz, podemos
admitir com certa folga que nossa máxima freqüência é de 6kHz, e para
isso poderíamos usar uma taxa de amostragem de pelo menos 12kHz,
economizando bastante, pois estaremos gerando apenas um terço das
amostras necessárias para a música em geral.

O TEOREMA DE NYQUIST - ALIASING


Nyquist porém faz uma ressalva importante. Não basta admitirmos que
não existe áudio acima de 20kHz. Temos que garantir que nenhuma
componente acima deste valor entre no sistema, caso contrário
ocorrerá o efeito chamado aliasing (pronuncia-se "êiliesin").

"USAR A FREQÜÊNCIA DE 48kHz, PELO MENOS NOS EQUIPAMENTOS MAIS


ANTIGOS, NÃO MELHORA A RESPOSTA DE AGUDOS"

Este efeito aparece na forma de uma rotação das componentes acima


do limite de

Nyquist em torno da freqüência máxima. Em outras palavras, uma


componente em

22kHz que foi indevidamente convertida por um sistema com taxa de


amostragem de 40kHz irá apare-cer, quando reconvertida para
analógico, em 18kHz (o que era 2kHz acima vira 2kHz abaixo). Da
mesma forma, uma componente em 30kHz aparecerá em 10kHz, e
assim por diante.

Por causa disso, todo conversor analógico/digital possui logo na


entrada um poderoso filtro anti-aliasing, para impedir que freqüências
acima do limite sejam convertidas erroneamente. Só que estamos
precisando de um filtro para este caso que consiga deixar passar tudo
até 20kHz e nada acima deste ponto. Tal filtro, além de fisicamente
impossível de construir, acabaria tendo um custo proibitivo. Por isso,
aproveitando a brecha do teorema de Nyquist, resolveu-se usar para os
padrões de áudio digital freqüências de amostragem acima do limite. É
por isso que o CD usa 44.100Hz. Para dar uma folga de 2kHz para que o
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filtro atenue suficientemente o sinal na entrada para que o aliasing seja


aceitável.

É claro que se poderia ter optado por uma freqüência bem maior
(100kHz, por exemplo), garantindo um aliasing desprezível, mas as
limitações do hardware da época (final dos anos setenta) não o
permitiu. Esta necessidade de se ficar perto dos 40kHz implicava no uso
de filtros que, embora factíveis, ainda eram extremamente caros.
Preocupados com a aceitação comercial dos novos produtos, os
engenheiros de então pensaram em aumentar um pouco mais esta
freqüência - perdendo qualidade na conversão devido à rapidez
excessiva, mas podendo usar filtros mais baratos. Este padrão mais
popular, dito consu-mer digital audio, usaria então a freqüência de
48kHz. Então fica aqui o alerta aos menos avisados. Usar a freqüência
de 48kHz, pelo menos nos equipamentos mais antigos, não melhora a
resposta de agudos! O que se tem na verdade são filtros mais baratos e
conversores menos precisos.

CONVERTENDO AMPLITUDES

Muito bem, já sabemos quantas amostras por segundo temos que tirar
de um sinal para representar todas as suas componentes de freqüência.
Agora veremos como fazer para registrar as medidas de amplitude
obtidas na amostragem.

Antes de mais nada, precisamos conhecer o jeito que os computadores


e sistemas digitais deram para armazenar números. Em qualquer sistema
digital, todas as informações - texto, programas, imagens, sons etc - são
armazenados na forma de números. Estes números formam um conjunto
de dados digitais que são interpretados da maneira conve-niente. Os
circuitos que compõem os sistemas, por sua vez, são muito hábeis em
lidar com condições do tipo ligado/desligado, aceso/apagado, com
tensão/sem tensão. Por isso a melhor maneira de implementar
fisicamente estes números para os computadores e sistemas digitais é
na forma binária.

Este sistema de numeração possui apenas dois algarismos possíveis, "0" e


"1", e qualquer número pode ser escrito usando apenas eles. Na tabela
vemos como escrever os números de 0 a 15.

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Representação binária

Se fôssemos escrever somente até 7, precisaríamos de apenas três


dígitos. Para irmos a 15, foram necessários quatro dígitos, para 31, cinco,
e assim por diante. Resumindo, com n dígitos podemos escrever 2n
números diferentes.

Os conversores digitais, ao medirem a amplitude do sinal no momento


da amostragem, convertem o número medido para um valor digital. Se
o conversor é "de 16 bits", usa números de 16 dígitos binários para
representar estas amplitudes. Ora, se com 16 bits podemos escrever 216
= 65.536 números diferentes, significa que as amplitudes medidas
poderão assumir apenas um destes 65.536 valores. Conversores de 24
bits permitem 16.777.216 valores possíveis. A distância entre dois níveis
consecutivos é chamada Intervalo de Quantização, ou Um Nível de
Quantização.

O número de bits que compõem cada amostra determina a precisão


de nossas amostras, determinando a faixa dinâmica do sinal, conforme
veremos adiante. Por enquanto, vamos observar o seguinte problema.
Vamos supor que estamos usando um conversor de 16 bits e que
fizemos uma amostragem cuja amplitude se encontra entre os níveis
18.422 e 18.423, conforme a figura.

O conversor não conseguirá registrar exatamente o valor da amplitude,


tendo que arredondá-lo para o valor possível mais próximo, neste caso
o nível 18.422 de amplitude. O erro provocado por este
arredondamento é chamado Erro de Quantização, e sobre ele ainda
falaremos bastante. Por enquanto basta perceber que quanto maior o
número de bits por amostra usados pelo conversor, melhor a precisão
da conversão e menor o erro de quantização (figura 6).

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NÚMERO DE BITS E FAIXA DINÂMICA

Agora podemos concluir que a menor amplitude detectável pelo


conversor é da ordem de 1 nível de quantização. O sinal de maior
amplitude é aquele que atinge os extremos dos valores possíveis. Para
calcular a relação entre o sinal de maior e o de menor amplitude, basta
comparar a diferença entre estes dois níveis, o que nos dará a Faixa
Dinâmica do sinal. Como já vimos acima, com 3 bits representamos 8
valores e com 4 bits, 16 valores. De fato, para cada bit que se
acrescenta, multiplicamos por dois os valores representáveis.
Estendendo um pouco o raciocínio e lembrando que dobrar a
amplitude significa aumen-tar 6dB, temos que para cada acréscimo de
1 bit aumentamos 6 dB à faixa dinâmica. Assim, sistemas de 16bits
conseguem 96dB de faixa, enquanto os de 24 bits permitem 144dB! Vale
lembrar que estes valores são teóricos e não levam em conta a faixa
dinâmica de todos os componentes externos - inclusive analógicos - ao
conversor.

RESUMINDO...
Concluímos então que a freqüência de amostragem é responsável por
garantir a resposta em freqüência do sinal convertido, enquanto que o
número de bits por amostra indica a precisão das medidas e
consequentemente a faixa dinâmica do sinal.

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Mês que vem iremos mais a fundo nos conversores. Até lá.

Apêndice - Erros de Arredondamento

Como vimos, a precisão de uma medida é de extrema importância nos


sistemas digitais.
Mas não é só neles que os erros de arredondamento acontecem.

Para exemplificar vamos fazer a seguinte experiência. Pegue uma


calculadora e faça a seguinte conta:

Os mais afoitos atacam vorazmente a calculadora e após algumas


manipulações obtêm o brilhante resultado:

Mas quem parou um pouquinho pra pensar deixou a calculadora de


lado, pois percebeu que o resultado correto é:

A diferença de resultados se deve à imprecisão da calculadora. Na


verdade, seriam necessários infinitos dígitos à direita da vírgula para que
se chegasse ao resultado correto. Esta imprecisão acontece em
qualquer sistema onde se realizam operações matemáticas, e o
conversor digital não poderia ser diferente.

Para um caso mais prático, tente abrir uma empresa com mais dois
sócios e um capital inicial de R$ 1.000,00. Quanto caberá a cada sócio?
Quem respondeu R$ 333,33 está desprezando um centavo. O mais
correto seria dizer que cada um tem "um terço de mil reais".

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24) O QUE SERIA BOM EU SABER PRA ME AJUDAR A SER UM


BOM MIXADOR?
1-Inglês;
2-Teoria Musical;
3-Como funciona cada instrumento (mecanicamente
mesmo);
4-Ler partitura (solfejar não é tão necessário);
5-Reconhecer quando um instrumento está desafinado;
6-Conviver bem com pessoas diferentes;
7-Ter argumento sólido pra tudo o que disser;
8-Ter uma opinião sobre tudo, mas não ser teimoso;
9-Aceitar opiniões dos outros, mesmo que contrárias à sua;
10-Falar coisas difíceis de um jeito amigável;
11-Aprender com cada erro;
12-Não se envaidecer dos acertos;
13-Ser profissional, pois mixar é divertido mas é um trabalho
como qualquer outro;
14-Desistir sem paixão;
15-Apaixonar-se e não desistir.

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25) Mais Hz ou mais Bytes?


Os fabricantes de equipamentos de áudio dependem basicamente do
que existe em termos de componentes. Os produtos só existem porque
existem os componentes para projetá-los. Por exemplo, talvez o melhor
microfone de todos os tempos, o Neumann U47 saiu de linha em 1967
porque a válvula dele, a VF14 simplesmente parou de ser fabricada.
Outro caso são os pré amps. A enorme maioria deles usa amplificadores
operacionais, que são uma espécie bem interessante de componentes,
e no mercado existem dois de excelente desempenho, o TL072 e o 5532.
Assim, há enorme chance de ao abrir um pré amp a gente achar um
desses dois componentes.
A indústria do áudio digital, então, é mais dependente ainda. Se
aparece um conversor A/D ou D/A com características novas, os
projetistas correm para gerar produtos novos. Em paralelo, os
fabricantes precisam colocar novidades na rua. E no caso dos
conversores, o que foi aparecendo nos últimos tempos foram
componentes mais rápidos, capazes de lidar com frequências maiores
de amostragem. Provavelmente o objetivo lá do cara que projetou o
componente não foi atender o mercado do áudio, mas toda uma
gama de aplicações que usa DSPs (digital signal processing). É mais ou
menos assim: o engenheiro descobre que se mudar um pouco o chip
consegue aumentar a frequência de trabalho, e isso pode ser
interessante. Daí cria o chip mais rápido. O engenheiro da empresa de
áudio vê que existem novos chips capazes de amostrar em frequências
maiores. Então projeta o equipamento para usar toda a potencialidade
dos chips.
Ora, caberá ao departamento de marketing gerar interesse nesse
produto, e aí a postura da empresa pode ser simplesmente enaltecer
suas qualidades ou nos casos mais negativos inventar coisas que
contrariam a física e o bom senso (tudo vai depender do tipo de
estratégia que a empresa adota).
Por exemplo, quando uma empresa vem a público declarar que o
"áudio de alta definição" (coisa que não existe, fique-se bem claro, mas
que é assunto pra outro post) permite que você ouça "All blues" do Miles
e descubra coisas que nunca se tinha ouvido, aí é demais. Porque toda
a informação que temos do que Miles e banda tocaram em "All Blues"
está na fita master, que tem obviamente menos qualidade (queiram ou
não) que um áudio de 24bits/44kHz. Onde então estariam escondidas
estas "coisas" que descobriremos? Em uma outra dimensão, talvez?
Bom, quanto aos bits, por que não se usa o esforço de marketing para
vender a ideia de que mais bits seria melhor? Primeiro, porque 24 bits já
fornecem 144dB de faixa dinâmica, bem maior que a própria audição
humana. Segundo, e é aí que considero que está o pulo do gato, usar
48 bits significaria dobrar a largura de todos os buses internos do
equipamento, dobrar o número de componentes, etc etc. Não seria só
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trocar o clock e o chip do conversor. Além disso, para justificar um


aumento tão grande de faixa dinâmica toda a parte analógica da
interface seria tão absurdamente cara que simplesmente não
compensa se gastar esforço para projetar isso.
Ou seja, seria preciso muito marketing pra justificar o aumento do custo
ao aumentar o número de bits, enquanto simplesmente aumentar a
sampling rate é mais barato, e ao mesmo tempo permite que entremos
no reino da especulação.
Simples assim.
Para aqueles que estão se contorcendo e gritando "Mas eu ouço a
diferença em 96kHz", eu respondo com a minha tradicional afirmação
de que eu não disse que era igual, porque provavelmente há mais
distorções por não linearidades na conversão. Em português mais
simples, pode soar diferente sim, mas não necessariamente "melhor".
Até porque o conceito de "melhor" em áudio no final das contas acaba
sendo uma coisa muito pessoal mesmo.

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26)OUVIR A MIX EM DIVERSOS LUGARES - BOM ou RUIM?


Já que aqui nós não temos segredos, deixa eu revelar mais um. Alguém
já se perguntou como é que esses super medalhões da mixagem sabem
que a mix deles vai soar bem em todos os lugares? Pois bem, vou revelar
agora o segredo guardado a sete chaves: eles não sabem !!!!
E não tem como saber. É claro que ninguém é besta de falar, "já que
não sei, então dane-se!". Nada disso. O que se procura é monitorar em
algumas situações que representem mais ou menos a maioria das
condições dos ouvintes.
Por exemplo, até a década de 1990, as Yamaha NS-10 eram
obrigatórias nos estúdios. A presença generalizada de caixas de graves
nos aparelhos dos ouvintes porém as tornaram obsoletas. Daí veio a era
dos monitores "powered". E não é que a gente não se virava bem nos
graves com a NS-10. Por exemplo, um dos mais populares álbuns de
reggae de todos os tempos, "Labour of Love" do UB40 foi mixado com
elas!!
Bom, o fato é que quando mando a mix para um cliente (e sempre
trabalho à distância) e o email de volta dele começa com "eu ouvi em
vários lugares..." eu gelo. "Em vários lugares" quer dizer que vão ser várias
sonoridades diferentes. Não tem como. Mesmo com caixas iguais as
salas são diferentes. Eu sempre recomendo aos clientes que NÃO
ouçam em vários lugares, mas ouçam onde costumam ouvir sempre.
Ninguém ouve música em "vários lugares".
O pior é que hoje em dia há uma chance de 90% de que seu trabalho
seja ouvido ou de fone ou no carro. E só. Ou seja, me perdoem os
puristas, hoje faz mais sentido a gente conferir nossas mixes no fone e no
nosso carro do que em caixas de milhares de dólares.
Vejam bem, não estou dizendo que caixas caras são ruins de trabalhar.
De jeito nenhum. Mas se a gente quer simular a condição de audição
de nosso trabalho no mundo, não tem jeito. É de fone e no carro.
Dito isso, voltemos ao assunto inicial. Eu, como mixador, devo verificar
minha mix em vários lugares? Minha resposta (e ela é apenas minha) é
NÃO. A minha sugestão é que se faça o processo inverso. Pegue vários
discos famosos, Daft Punk, Adelle, Bruno Mars etc. e ouça na SUA
monitoração. Aprenda como os discos que soam bem no mundo inteiro
soam na sua sala. A partir daí, desenvolva a capacidade de julgar a
partir da audição no seu equipamento se sua mix está soando bem na
maioria dos lugares. Dá um certo trabalho, mas economiza um monte
em tempo e principalmente em neurônios. Só por segurança, ouça sua
mix em um bom par de fones e (por que não) no seu carro, E fique por
aí. Relax, man!!!

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27)MASTERIZAR EM ANALÓGICO?
Tema delicado aqui. Muitas vezes um cliente me procura e pergunta se
faço master analógica. A minha resposta é sempre uma pergunta: "Por
quê?".
Antes de mais nada, eu não estou aqui criticando os métodos de
trabalho de nenhum colega. Vou apenas falar do meu, ok?
Pois bem, o cliente grava e converte para dentro de uma DAW. A partir
do momento da gravação, toda a informação está digitalizada. A
mixagem foi toda feita in-the-box e gerou arquivos WAV que vão ser
masterizados.
Ora, o resultado da masterização serão dados digitais (exceto no caso
da mídia vinil).
Fica então a pergunta: se converter de analógico para digital não
preocupou, mixar em digital não preocupou, entregar o resultado
digital não tem alternativa, por que então justamente a masterização
tem que usar uma conversão digital/analógico e outra
analógico/digital a mais? O uso de equipamento analógico justifica
essas duas conversões a mais? Dependendo do equipamento (um
pouco) e do masterizador (muito), pode ser que sim, ou não.
O que acaba acontecendo é que o cliente é obrigado, por força das
limitações de orçamento de hoje em dia a percorrer todo o caminho
de gravação e mixagem ciente de que a coisa poderia ficar melhor, e
atribui à masterização este poder de resolvedora dos problemas. Ela de
fato pode melhorar as coisas, mas não por ser analógica, e sim pela
habilidade do masterizador.
No meu caso, se o cliente pergunta por que não ofereço uma master
analógica minha resposta é : "Porque não quero piorar seu áudio com
duas conversões a mais".
Como sempre defendo aqui, o que importa são os resultados. E para se
avaliar resultados há que se testar. Decidir por masterizar em analógico
só porque a master de fulano foi assim não leva em conta que as
condições em que a mix foi entregue ao masterizador interferem
decididamente no resultado, quer a master seja digital ou analógica.
Quando contrato os serviços de um masterizador, francamente não me
preocupo com o que ele usa. Me preocupo em ouvir o que ele me
entrega. Se me agrada, ótimo, independente do método.
P.S. - para o caso em que a mix foi analógica e gerou arquivos WAV
como resultado, a situação é pior ainda, pois há mais conversões
envolvidas.

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28)Uma Desvantagem Inquestionável do Vinil

Existe um fenômeno com os defensores do vinil que acho curioso. A


maioria realça a sua maior fidelidade e pureza (baseado em seus
ouvidos, é claro), mas estes ouvidos apurados não percebem e nem se
queixam da absurda diferença de qualidade existente entre o track da
borda do vinil e o último do lado.
Vou me dar ao luxo de não provar matematicamente aqui, já que a
coisa é óbvia. A velocidade angular de um player de vinil é constante.
SIgnifica que 1 minuto de música no início da primeira faixa tem um
comprimento maior de vinil para ser escrito. Supondo que a primeira
volta da primeira faixa ocorre a um raio de 15 cm e a última volta da
última faixa ocorre a 5 cm, a primeira volta tem um comprimento de 95
cm e a última 32 cm. Ou seja, uma onda sonora de uma mesma
frequência tem apenas um terço de vinil para ser registrada no centro
do que tinha na borda.
Mais vinil, maior comprimento de onda, mais fácil é para a agulha fazer
a leitura, e consequentemente, a lógica nos leva a admitir que a
qualidade da leitura no centro do LP é muito menor que na borda.
E eu nuca vi nenhum audiófilo reclamar da degradação da qualidade
em relação ao centro!!!!!!!!!! Pode ser que alguém já tenha reclamado
disso, mas por aqui só passa gente que afirma que o vinil INTEIRO soa
melhor do que o CD.
Mesmo que o fator preponderante seja a largura do sulco e a largura
entre os sulcos, ainda assim a diferença de qualidade relativa persistiria.

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29) FORMATO DE PONTO FLUTUANTE (FLOATING POINT)


Os números reais têm uma mania muito chata: eles tipicamente
precisam de vírgula e casas decimais. E, frequentemente, são
irracionais, ou seja, precisam de infinitas casas decimais que não se
repetem e mesmo assim não conseguimos escrevê-los exatamente.
Assim, sempre que lidamos com números reais temos uma grande
probabilidade de termos que trabalhar com valores aproximados. O
formato de ponto flutuante assume essa aparente desvantagem e a
usa para conseguir registrar números muito maiores do que a mera
representação inteira permitiria.
Por exemplo, tomemos o número real 12,345. Primeiro, o normalizamos,
ou seja, o reescrevemos como 0,12345 x 10 2 (dez elevado a 2). Agora
poderíamos armazená-lo apenas guardando os valores 12345 e 2, e
sabendo a que correspondem no formato. Não é necessário registrar o
zero, obviamente.
Existe, então, uma parte inteira, chamada mantissa, a base 10 e o
expoente, que indica onde vai a vírgula. Se armazenarmos no
computador apenas estes dois números inteiros, estaremos
representando o número real, na medida da precisão do número de
bits. Por exemplo, se quiséssemos representar o famoso número π(pi)
com a mantissa de cinco dígitos acima, teríamos 3,1415927 = 0,31416 x
10 1 (mantissa 31416 expoente 1).
Repare que houve um arredondamento. Se a mantissa fosse 31415,
teríamos feito um truncamento. Ambos os números estão "errados", mas
como pi é irracional, não existe forma de representá-lo exatamente, e a
questão é admitir esse pequeno erro e ver como isso afeta o resultado.
Vale também lembrar que tanto a mantissa quanto o expoente podem
ser negativos ou positivos. Exemplo: -0,00045 = -0,45 x 10-3 (mantissa -45
expoente -3).
A vantagem dessa notação é que podemos representar números
enormes ao custo de perda de certa precisão. Por exemplo, podemos
representar números como 1 x 10 50 (dez elevado a 50), que é o número
de átomos do planeta terra, usando apenas três dígitos! Até aí, tudo
simples. Vejamos como usar isso em números binários. A forma é m x 2e ,
em que "m" e "e" podem ser positivos ou negativos. Por exemplo, o
número binário 11,1011 teria expoente 10 (2 em binário, pois tem duas
casas antes da vírgula) e mantissa 111011.
Bem simples. Um detalhe curioso é que, no caso da base 2, ainda é
possível ganhar um bit na mantissa. Por exemplo, tomemos o número
0,000101011. Ele teria mantissa 101011 e o expoente -11 (-3 em binário).
Ou seja, o primeiro bit da mantissa é sempre 1 e não precisamos
representá-lo, deixando-o implícito.
Para igualar as coisas, a maioria das aplicações usa o formato definido
pela IEEE 754. Nele, a palavra tem 32 bits de comprimento. O primeiro
bit indica o sinal da mantissa, o expoente vem a seguir com 8 bits e os
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restantes 23 bits representam a mantissa - mais o bit implícito (o


expoente é representado na forma de sinal e magnitude, ou seja é o
valor -127).
Com esse formato (dispensamos aqui as contas complicadas),
demonstra-se que é possível uma faixa dinâmica de inacreditáveis 1.529
dB. Ou seja, por mais que se aumente o ganho, nunca ocorre
saturação, pois a precisão dos valores continua em 24 bits e apenas
ocorre a mudança no valor do expoente.
O USO EM ÁUDIO DIGITAL
Quais seriam as vantagens e desvantagens do uso de formato floating
point em áudio digital? Antes de mais nada, precisamos ficar alerta
para dois fatos importantes: primeiro, o formato 32bit floating point
gasta 33% a mais de espaço que o inteiro 24 bits. Segundo, se a
interface só trabalha amostrando em 24bits e a gente usa a sessão em
32bfp, haverá provavelmente apenas o preenchimento do expoente
com zeros.
Portanto, na maioria das aplicações, se a gente quer apenas gravar,
24bI é mais do que suficiente. Porém, na hora da mixagem,
principalmente quando há muito processamento (muitas contas pra
fazer), pode ser que o uso do 32bfp se justifique. Porém, a maioria dos
plug-ins que usam floating point já fazem isso internamente,
independentemente do formato da sessão.
Quanto ao caso de uma saturação interna de uma sessão,
normalmente os softwares trabalham com um bus master interno de
precisão dupla, ou seja, 48 bits inteiros, o que eleva a faixa dinâmica a
288 dB. Isso inibe qualquer saturação interna do master.
Talvez o uso mais indicado de 32bfp seja nas situações de
processamento muito intenso, como em restauração de áudio, por
exemplo, principalmente se não sabemos se os plug-ins usam floating
point internamente.

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30) MINÚCIAS DO ÁUDIO

(Traduzido livremente do artigo original de Ethan Winer -


http://ethanwiner.com/audio_minutiae.htm )

Ethan Winer é autor do consagrado livro “Tha Audio Expert”.

Todo mundo sabe que o dither é um importante passo final no


processo de produção quando se prepara um arquivo de mixagem de
24 bits para CD. De acordo com a sabedoria convencional, se você
não usar dither o espectro de frequências e a imagem sonora serão
comprometidos, com passagens suaves e os finais dos reverbs soando
granulados e distorcidos.

Da mesma forma para o jitter, outro “bicho papão” típico. Jitter é um


erro de temporização periódico semelhante ao wow e flutter, mas
ocorre em uma frequência muito maior. Jitter ocasionado por clock
digital ruim é muitas vezes acusado de prejudicar a localização, e fazer
com que instrumentos a percam plenitude e foco, resultando em
sonoridade geral ruim.

A noção de que jitter ou dither afetamr a qualidade do som em si é


pura ficção. Esses mitos foram repetidos tantas vezes que eles são
aceitos como fato por muitos. O jitter se manifesta como ruído mais de
100 dB abaixo da música. Este é mais suave do que o chiado de fundo
de um CD, que nunca se ouve em volume de audição normal. A
quantidade de jitter em conversores digitais modernos é, literalmente,
1.000 vezes menor do que o flutter dos melhores gravadores
analógicos. É verdade que os estúdios com múltiplas fontes digitais se
beneficiarão de um master clock externo, mas isso tem a ver
inteiramente com a sincronização. O mesmo para o dither, cujo efeito é
de 90 dB abaixo do nível de pico. Ninguém consegue ouvir artefatos
tão suaves, especialmente quando eles estão mascaradas pela música
que está tocando. Quando estas coisas são comparadas em um teste
cego com adequada correspondência de nível, de repente o que
tinha sido uma diferença óbvia que "até minha mãe pode ouvir" torna-
se impossível de identificar.

Na prática, o dither reduz a distorção da quantização de “baixa


demais pra se ouvir” para “ainda mais baixa”. Então, eu nunca vou
argumentar contra o uso de dither, porque a melhoria é real e pode ser
medida. A maioria dos programas de edição de áudio inclui uma
opção para o dither, então não há nenhuma razão para não usá-lo.
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Além disso, a música passa por muitos equipamentos entre os


microfones do estúdio e os monitores ou fones do ouvinte. Por isso ele é
importante para minimizar a perda de qualidade em cada etapa,
mesmo que a degradação adicionada por cada dispositivo
individualmente seja inaudível. Mas sugerir que as pessoas
experimentem de ouvido diferentes tipos de dither para selecionar o
que soa melhor é como perseguir unicórnios. Se você tiver que
aumentar o volume de reprodução absurdamente para ouvir o efeito
do dither em um decay de reverb, qual é a vantagem? Além disso,
afirmações de que o dither afeta o espectro de freqüência e fase de
som de sua mix são fáceis de refutar com medidas padrão.

Outro saco de pancadas do áudio é a alimentação AC inadequada


ou "suja", que é acusada de "desfocador de imagem" e "afrouxador de
graves", entre outras reivindicações. Problemas de energia AC graves o
suficiente para ter um efeito audível são raros na maior parte do
mundo civilizado. Problema de energia são facilmente ouvidos como
cliques e pops quando um refrigerador liga ou desliga, ou como de
zumbido causado por dimmers de luz de estado sólido. Ambos os ruídos
são causados quando os impulsos de curta duração são enviados de
volta para a linha de alimentação por parte do dispositivo causador do
problema.

Quando um pico de energia tem uma duração curta, os tempos de


subida e descida correspondentes contêm altas frequências que
podem vazar através de transformadores de potência. Tais impulsos
também podem irradiar através do ar como ondas de rádio a ser
recebido pelos captadores em uma guitarra ou baixo. Mas esses picos
de tensão são muito grandes - geralmente centenas de volts! Compare
isso com a quantidade usual de ruído presente em linhas de corrente
alternada que sãonormalmente medidos em milivolts, ou milésimos de
volt. As fontes de alimentação em equipamentos de áudio
rotineiramente filtram esse ruído de baixo nível.

Uma tarefa de uma fonte de alimentação AC é fornecer uma tensão


razoavelmente constante que é então convertida pela fonte interna de
seu equipamento de áudio para a tensão DC mais baixa exigida por
circuitos de estado sólido usados em pré-amplificadores, equalizadores,
e outros dispositivos. A alimentação AC também deve fornecer
corrente suficiente, especialmente para os amplificadores de potência
que vão entregar vários amperes a uma carga de alto-falante. Um
amplificador de potência de 100 watts empurrando um alto-falante de
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8 Ohms fornece cerca de 3,5 amperes, e esta corrente vem da rede


elétrica AC.

Se uma fonte de alimentação AC é incapaz de fornecer tensão ou


corrente suficientes o resultado é distorção. Mas a energia AC
raramente varia mais do que alguns volts, exceto durante tempestades,
e todos os equipamentos de áudio rotineiramente lidam com tais
variações. Um cabo de alimentação bitola 16 padrão pode fornecer
corrente suficiente para qualquer dispositivo de áudio em seu rack. Se
um amplificador de alta potência precisa de mais corrente,
certamente o vendedor irá fornecer um cabo de alimentação
adequado. A noção de que "Problemas de energia" podem criar uma
sutil falta de plenitude e perda de detalhe musical ou a largura da
imagem estereo é, novamente, facilmente refutada com medidas
básicas de áudio e testes cegos adequados.

Ouvidos não são perfeitos!

Então, por que as pessoas às vezes juram que ouvem a diferença em


clocks de baixo jitter, vários tipos de dither, ou depois de substituir um
cabo de alimentação AC perfeitamente adequado por outro? Um
fator é a fragilidade da percepção auditiva humana. As pessoas muitas
vezes pensam que ouvem uma melhoria, mas é mais provável que eles
simplesmente tenham se tornado mais familiarizados com a música
após repetida audições e notem mais detalhes. Será que aquele ping
delicado do prato realmente ficou mais claro após a substituição dos
capacitores em sua fonte de alimentação, ou você simplesmente
nunca tinha prestado atenção nele antes? Pesquisadores de
psicoaústica estão bem conscientes de que a audição humana é frágil
e de curto prazo. Se você tocar uma parte de uma música, em
seguida, mudar para um clock externo e ouvir de novo, é muito difícil
recordar a sonoridade da reprodução anterior.

Segundo o ex-cientista-chefe da DTS, James Johnston, a memória


auditiva é válida por menos de um segundo. James também explica
que não se consegue concentrar em toda a informação peça de
música ao mesmo tempo. Em uma execução se pode perceber o
órgão, mas ignorar o baixo, e assim por diante. Isto torna muito difícil
saber se as diferenças sutis são reais ou imaginários. Se você tocar o
mesmo techo de música cinco vezes seguidas, o som que chega a seus

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ouvidos não vai mudar, a menos que você mova a cabeça, mas a
maneira como você percebe cada execução certamente irá variar.

Limitações auditivas se estendem além da nossa incapacidade de ouvir


vários detalhes de uma só vez, ou lembrar o timbre exato de um
instrumento por mais do que alguns segundos. Outra questão
importante é o efeito de mascaramento, que obscurece o conteúdo
de uma fonte quando freqüências semelhantes estão presentes em
outra. Quando um track de baixo elétrico é soldo, cada nota pode ser
distinguida claramente. Mas esse mesmo som nítido de graves pode
perder a definição após a adição de uma guitarra ritmo com som
pesado ou de um piano. Estou convencido de que esta é a verdadeira
razão das pessoas acusarem injustamente o jitter ou o "summing ruim"
para a falta de clareza em suas gravações. A perda de clareza é em
nossos ouvidos e cérebro, não no dispositivo de áudio ou na sua fonte
de alimentação.

Sua sala está mentindo para você

Outro fator é a acústica da sala em que se escuta. A menos que você


use fones de ouvido, mover-se até mesmo uma ou duas polegadas
provoca uma verdadeira mudança na resposta de frequência que
chega seus ouvidos. Ao testar tratamento acústico eu medi a resposta
de freqüência em alta resolução em uma sala sem tratamento. Esta
sala é típica do tamanho que você vai encontrar em muitas casas -
cerca de 5 por 3.5 por 2,5 metros de altura. Além de medir a resposta
na posição de audição, eu também medi em outro local a 10 cm de
distância. Esta distância é menos do que o espaço entre as orelhas de
um adulto. Na época, eu estava testando bass traps, então considerei
apenas a resposta de baixa frequência, que mostrou uma mudança
surpreendente para uma distância tão pequena.

A sabedoria popular diz que a resposta de graves em um quarto não


pode mudar muito em pequenas distâncias, porque os comprimentos
de onda são muito longos. (Uma onda sonora de 40 Hz mede mais de
8,5 metros.) Mas você pode ver na figura acima que o pico em 42 Hz
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varia de 3 dB para estas duas localidades próximas, e ainda há uma


diferença, mesmo tão grave como 27 Hz. A razão pela qual a resposta
muda muito, mesmo em baixas freqüências, é que muitas reflexões,
cada um com diferentes delays de tempo e fase, se combinam em
quantidades variáveis em cada ponto da sala. Em salas pequenos as
reflexões são especialmente fortes porque as superfícies refletoras
estão todas próximas, o que aumenta ainda mais a contribuição de
cada reflexão. Além disso, os nulos tendem a ocupar um espaço
relativamente pequeno físicamente, razão pela qual os valores nulos
em ambos os lados do marcador de 92 Hz apresentam profundidades
muito diferentes . Com efeito, o nulo a 71 Hz em um local torna-se um
pico no outro. Se você examinar os mesmos dados em toda a faixa
audível, mostrado na Figura abaixo, as duas respostas são tão
completamente diferentes que você nunca vai achar que essa é a
mesma sala e os mesmos monitores!

Uma causa destas grandes diferenças é o filtro pente. Picos e nulos


profundos ocorrem em distâncias previstas em um quarto de
comprimento de onda, e em freqüências mais altas a distância de um
pico a um nulo e bem pequena. Por exemplo, o comprimento de um
quarto do comprimento de onda de 7 kHz é menos de 2 cm! Nestas
frequências mais altas, os reflexos das uma mesa de café nas
proximidades ou mesmo de um apoltrona atrás dela podem ser
significativos.

Por causa do filtro pente, mover-se mesmo uma pequena distância


altera a resposta consideravelmente em freqüências médias e altas,
especialmente em pequenas salas não tendo nenhum tratamento
acústico. A resposta em um volume cúbico qualquer em uma sala é a
soma do som direto dos alto-falantes, além de muitas reflexões que
chegam de diferentes direções, em diferentes intensidaes, e com
diferentes tempos de atraso. Então, a menos que você se sente
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perfeitamente imóvel, não há jeito do som não mudar


substancialmente quando você mover a cabeça alguns centímetros.

Mesmo com tratamento acústico, as características de emissão dos


monitores provocam mudança na resposta em relação à posição. Os
projetistas de caixas buscam para uma resposta plana não só
diretamente na frente do falante, mas também fora do eixo. Mas é
impossível alcançar a mesma resposta em todos os ângulos. Mesmo se
a resposta não se altera quando você muda sua cabeça alguns
centímetros para um lado, o conteúdo mono proveniente de cada
falante irá chegar a seus ouvidos em momentos diferentes. Isso
também provoca o filtro pente, e é outra razão pela qual o som pode
parecer mudar, mesmo que não o faça.

Nós normalmente não notamos essas mudanças quando nos movemos


porque cada ouvido recebe uma resposta diferente, então o que nós
percebemos é mais uma média do que está acontecendo. Um nulo
profundo em um ouvido provavelmente não está presente no outro
ouvido, e vice-versa. E uma vez que todas as salas têm essa
propriedade, estamos acostumados a ouvir tais mudanças sem dar
muita atenção a elas. No entanto, a mudança na resposta com a
distância é muito real, e é definitivamente audível se você ouvir
atentamente. Se você cobrir uma orelha é ainda mais fácil de perceber
isso, porque as freqüências ausentes por um ouvido não são
preenchidos pelo outro.

Estou convencido de que o filtro pente é o motivo pelo qual as pessoas


relatam uma mudança no som de cabos e clocks, memso quando as
medições mostram que uma mudança audível é improvável. Se
alguém ouve seu sistema usando um cabo de alimentação AC, em
seguida, levanta-se e muda cabos e senta-se novamente, a resposta
de freqüência ouvida certamente será diferente, porque é impossível
sentar-se novamente exatamente no mesmo lugar. Assim, o som
realmente mudou, mas não por causa do cabo!

Com áudio e música, algumas frequências tendem a ter sonoridade


agressiva, tal como o intervalo de cerca de 2 a 3 KHz. Outras
freqüências aprsentam sonoridade mais cheia (50 a 200 Hz), e outras
ainda têm uma qualidade agradavelmente aberta (acima de 5 kHz).
Então, se você escuta em um local que tende a favorecer as
frequências de som duras, em seguida, mudar um cabo ou o clock e
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ouvir de novo em um lugar que suprime a dureza, é razoável acreditar


que a mudança fio é responsável pela diferença. Da mesma forma,
aplicar dither pode parecem afetar o peso, mesmo que a resposta de
baixas freqüências tenha mudado inteiramente devido ao
posicionamento.

Métodos de teste adequados

É comum ler em fóruns de áudio sobre duelos de pré-amplificadores,


placas de som, ou taxas de amostragem. Muitas vezes, alguém se
grava cantando ou tocando um instrumento com uma configuração,
em seguida, gravar-se novamente para comparação. Mas o registo
das diferentes performances não é aceitável porque os detalhes sutis
que ouvimos quando comparamos equipamento também mudam de
uma para outra desempenhoperformance. Por exemplo, um harmônico
de guitarra, ou o brilho de um prato com vassourinhas. Ninguém pode
tocar ou cantar exatamente da mesma forma duas vezes. E também
não conseguem permanecer perfeitamente parados, o que seria
necessário para garantir que o microfone capte o mesmo som.
Portanto, o registo das diferentes performances não é válido para testar
cabos, pré-amplificadores, clocks, ou qualquer outra coisa, a menos
que a diferença seja muito grande, como um microfone Shure SM57
contra um U87 Neumann.

Um auto-teste útil é simplesmente fechar os olhos durante a mudança


entre duas fontes com software. Quando eu me faço um teste cego
usando arquivos de WAV, monto dois tracks paralelos no SONAR. Em
seguida, atribuio as chaves de Mute para essas faixas para o mesmo
grupo, enquanto os interruptores estão em estados opostos. Ou seja, um
track toca enquanto o outro está mutado, e vice-versa. Cada vez que
um dos Mute é clicado, os tracks são trocados. Isto me deixa passar de
um track para o outro sutilmente. Eu coloo o cursor do mouse sobre
qualquer dos dois Mutes, fecho os olhos, em seguida, clico em um
monte de vezes de forma aleatória, sem prestar atenção em quantas
vezes eu cliquei. Dessa forma, eu não sei qual versão vai tocar primeiro.
Então eu começo a reprodução, ainda com os olhos fechados, e ouço
atentamente para ver se eu posso realmente dizer qual a fonte é qual.

Tenho visto argumentos de que os testes cegos são inerentemente


falhos, mas na minha opinião isso é apenas uma desculpa pelos que
não conseguem passar no teste! Teste cego é o padrão para todos os
ramos da ciência, e não faz sentido que ele seja inválido para avaliar a
©2019 by Fábio Henriques
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fidelidade de áudio. Algumas pessoas afirmam os próprios testes são


estressantes porque eles são pressionados para identificar diferenças
sutis, muitas vezes na frente de estranhos. Mas isso é facilmente resolvido
usando um software ABX. Um programa ABX permite que as pessoas se
testem quantas vezes quiserem, ao longo de um período tão longo
quanto eles desejarem, no conforto de seu próprio ambiente de
audição. O testador ABX original era um dispositivo de hardware que
tocava uma das duas fontes de áudio aleatoriamente cada vez que
você apertava o botão. A pessoa que está sendo testada deve
identificar se o "X" que toca atualmente é a fonte A ou a fonte B. Depois
de executar o mesmo teste, digamos, dez vezes, você sabe com
alguma certeza se você realmente pode identificar com segurança a
diferença. Atualmente vários testadores ABX que mantêm o controle de
suas seleções ao longo do tempo estão disponíveis como freeware.

Seja usando um teste cego informal ou software ABX, é importante


entender alguns requisitos básicos. Em primeiro lugar, o volume de
ambas as fontes deve ser igualadp exatamente, com uma precisão de
0,1 dB. Quando tudo o resto é igual, as pessoas geralmente escolhem a
versão mais alta (ou mais brilhante) como soando melhor, a não ser, é
claro, que já seja muito alta ou brilhante. Na verdade, as pessoas às
vezes relatam uma diferença até mesmo em um teste de "A / A", em
que ambas as fontes são as mesmas! E só porque algo parece "melhor"
não é necessariamente maior fidelidade. A aplicação de uma curva
de EQ "carinha feliz" muitas vezes faz a música soar melhor, mas
certamente não é mais fiel ao material original.

O NULL TEST (teste nulo)

Algumas pessoas acreditam que há aspectos da fidelidade de áudio


que a "ciência" ainda não descobriu, ou ainda não consegue medir
corretamente. Mas isso é facilmente refutado com um teste nulo. A
premissa de um teste nulo é subtrair dois sinais de áudio para avaliar o
que resta. A Subtração é feita através da inversão da polaridade de
uma fonte, em seguida, somando-a com a outra fonte com o mesmo
volume. Isto pode ser feito eme um programa DAW usando arquivos
WAV paralelos, ou ao vivo com sinais eléctricos para um dispositivo
somador. Se nada sobra após a subtração, então os sinais são, por
definição, idênticos. E se um sinal de diferença residual aparece, o seu
nível e espectro mostram a extensão ea natureza da diferença.

©2019 by Fábio Henriques


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É possível avaliar um sinal residual, quer pelo ouvido ou com análise de


espectro. Por exemplo, se uma fonte tem uma ligeira queda de baixa
frequência, o que rest aapós o teste nulo conterá apenas baixas
frequências. E se uma fonte acrescenta distorção de terceiro
harmônico forte para um tom de teste de onda senoidal, então o sinal
de diferença residual conterá apenas que o conteúdo sdicional. O
teste nulo tem estado por aí desde a década de 1940, portanto, se
houvesse algum parâmetro de áudio ainda desconhecido, ele
certamente teria sido revelado anos atrás.

©2019 by Fábio Henriques


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31) Primeira Equação Irônica de Henriques :

Q=T+A

Onde
Q = constante de qualidade da música em geral
T = quantidade de tecnologia disponível
A = quantidade de criatividade artística disponível.
Traduzindo, quanto menos tecnologia disponível, maior a necessidade
de criatividade artística (ex década de 1970) e quanto mais tecnologia,
menos criatividade é necessária e a qualidade artístico-musical geral
cai (precisa de exemplo?).
Nos casos extremos, até 1876 toda a música do mundo era só artística,
sem tecnologia (se esquecermos a tecnologia dos instrumentos e das
escalas, por simplificação). E se hoje a gente cria um software auto-
criador de música, nenhuma criatividade artística é necessária.

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32)O Áudio e os UFOs


Olha, pessoal, se tem uma coisa que eu evito com todas as forças são
aqueles "post de desabafo". Não acho que o facebook, e muito menos
um grupo técnico como esse, sejam o lugar para isso, mas acho que
podemos ter uma boa discussão aqui por conta do que vou dizer.
Quem me lê sabe que para tudo o que falo apresento uma justificativa
comprovável. Sempre me baseio na ciência, e procuro nunca apelar
para "o que eu acho", exceto quando me pedem uma opinião.
O trabalho com áudio envolve uma associação profunda entre técnica
e arte, entre matemática e estética. E isso é muito sério. Claro que é
possível trabalhar uma vida inteira com áudio sem precisar se
preocupar com Física, mas se a gente quer saber o que realmente
acontece, quer entender quais os fenômenos que pagam nossas
contas no fim do mês, e principalmente o por que daquilo que vamos
dizer no Youtube, aí tem que se pesquisar um pouco.
E quando eu digo "pesquisar" não é apenas ouvir o que fulano
medalhão bem sucedido falou. Olha, já ouvi muito fulano medalhão
bem sucedido falar cada besteira... Isso não tira o seu valor como
profissional, mas tira o seu poder de argumentação.
Tem várias coisas em áudio que para mim remetem a fotos de UFOs. Já
repararam que foto de UFO é sempre tremida, borrada, com pouca luz,
e etc. Nunca tem foto nítida de um ET batendo pneu do disco voador
nem passando uma água no vidro. É sempre uma coisa misteriosa,
envolvida em bruma, e quase sempre, fora de foco.
Em áudio é a mesma coisa. E depende do assunto da moda. Já foi, por
exemplo, o summing amp. Nossa, como eu tive que ouvir e ler coisas do
tipo " eu não sei como ele faz, mas minhas mixes ganham energia (ou
vida, ou pressão, ou coesão, ou unidade, ou vitalidade, escolha um
termo) quando ponho um summing amp!!".
Amigos, um circuito somador, principalmente se for a emulação de um
analógico, além de somar (dãh), só pode fazer mais duas coisas:
acrescentar ruído e distorcer. É isso que qualquer inserção de
equipamento faz. É por isso que desde sempre existe a recomendação
de sempre se ter o menor número de componentes insertados.
Agora, se a distorção e o ruído deixaram o som como vc queria, que
mal há em usá-los? Nenhum, mas não há magia. Não há "molho". Isso
são expressões que a gente usa quando não consegue saber o que
está acontecendo. E se eu vou fazer um vídeo explicativo ou escrever
um livro técnico não dá pra falar esse tipo de coisa. Ou a gente é
cientificamente preciso ou estaremos apenas expressando uma
opinião.
O que me leva a outro ponto, que é a Síndrome do Fulano Faz Assim e
Ele é Famoso, Então Ele Tem Razão. Sinto muito, mas ser famoso e ter
seus trabalhos bem sucedidos podem enriquecer o cara, podem deixá-
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lo um formador de opinião, mas não fazem com que ele só fale coisas
comprovadamente certas.
Conheço vários profissionais que falam os maiores absurdos, mas que
quando vão pra frente dos botões, são brilhantes. O problema é
quando tentam teorizar.
Esse papo todo veio de nossa saudável e animada discussão hoje a
respeito de hard panning. Acho muito compreensível que as pessoas
tomem um depoimento de um cara como o Chris Lord-Alge (talvez o
mixador mais famoso da atualidade) como uma diretriz. No caso do
hard panning, segundo me disseram, ele só mixa assim, e ele é o melhor,
então mixar assim é que é bom.
Não!!! Primeiro, não consegui achar nenhum exemplo de mix dele com
hard panning (pode ser um problema meu, reconheço), e mesmo
assim, sejamos racionais. Um grande amigo meu (um excelente
profissional) foi fazer o "mixing with the masters" do Chris Lord. Quando
voltou me disse: "cara, tenho todos os presets dele! Vou te passar!".
Agradeci e disse que não queria. Não são os presets, nem os plugins
(que ele não usa, diga-se de passagem), nem os consoles, nem os
estúdios que fazem um Chris Lord-Alge. O que faz a diferença é ele, é o
ouvido dele que diz que um som está bom, não o preset. E se ele não
usa o que diz que usa, sinceramente, não me importo.
Acho que o que importa é ouvir o resultado dele e pensar como eu
chegaria até lá? E convenhamos, se a gente lutar pra ser "tipo" Chris
Lord, o máximo que iremos conseguir é ser uma boa imitação.

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33) Uma Pequena História da Mixagem


Para começarmos nossa aventura, é bem útil conhecermos como as
coisas se desenrolaram até o presente estado da arte. Por exemplo,
alguém que está começando em áudio agora pode imaginar que a
mixagem de muitos canais sempre fez parte do processo de gravação.
O que veremos é que de certa forma até que sim, mas do jeito como
fazemos hoje a coisa é bem recente.

- O Conceito de Mixagem e o Primeiro Mixador

Mixagem, em essência, é o processo de se equilibrar a emissão de


várias informações sonoras, de forma a se conseguir um resultado
satisfatório. Já se percebe que o conceito é bem amplo. Por exemplo,
lá na idade média, durante a apresentação de um coral gregoriano,
cabia ao maestro mixar. Ele era o responsável pelo volume relativo de
cada monge de forma que o resultado fosse equilibrado.
Mais tarde coube aos compositores e maestros o papel de mixadores. O
compositor, quando especificava o número de instrumentos que
desejava para executar sua obra e ao maestro, quando durante os
ensaios e as performances, controlava o volume de emissão de cada
instrumento.
Portanto, não dá pra saber quem foi o primeiro mixador, mas pode-se
perceber como o conceito de mixagem é bem mais vasto que
equalizar em uma mesa.
Mas precisamos ser obviamente um pouco mais focados no nosso
assunto, e então vamos nos restringir à mixagem de música gravada.
Mesmo aí, veremos que durante pelo menos os primeiros 50 anos a
tecnologia, o que tínhamos era mais ou menos o que vimos acima.

- A Era da Gravação Acústica

O áudio gravado se concretiza aproximadamente em 1877, com o


Fonógrafo (de Edison) , com mídia cilíndrica, e dez anos depois, com o
Gramofone (de Berliner). Este usava como mídia discos de um material
chamado “shellac” . O som era captado por um cone que o
concentrava e enviava a uma membrana com uma agulha insertada.
O som fazia vibrar a agulha e esses movimentos eram então gravados
no disco, que girava a uma rotação de 78 rotações por minuto (rpm).
Assim, o ato de mixar era quase como na idade média, com o maestro
controlando o volume dos músicos. Agora, porém, como não havia o
compromisso da performance ficar visualmente bonita, podia-se
também usar como elemento da mixagem a distância do músico ao
cone de captação. Instrumentos com maior volume de emissão
ficavam mais longe e os mais discretos ficavam mais perto, com o
cantor em primeiro plano .
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O aparelho que executava o disco na casa do ouvinte era mais ou


menos como o gravador, só que a agulha passava sobre o sulco do
disco e fazia a membrana vibrar, e essa vibração era amplificada pelo
cone e reproduzida. Tudo mecânico e acústico.

- A Era da Gravação Elétrica

A partir do início dos anos 1920 (quase 50 anos depois de Edison),


começam a ser usados microfones e amplificadores para levar o som
até as agulhas de corte. A coisa era ainda bem complicada e cara, de
forma que normalmente se usava apenas um microfone (em
terminologia atual, era gravação “em um canal”). E isso ainda perdurou
por um bom tempo. Por exemplo, em 1936, quando foram feitas as
antológicas gravações de Robert Johnson em um quarto de hotel no
Texas, foi usado apenas um microfone e um gravador colocado no
quarto ao lado.
Do lado doméstico, os aparelhos de reprodução ainda eram
mecânicos.

- A Gravação Magnética

Embora as primeiras experiências com gravação magnética remontem


ao fim do século XIX, foi com a Segunda Guerra Mundial que a
tecnologia se solidificou.
O serviço secreto alemão desenvolveu o Magnetofone, que gravava
em fitas. Assim os discursos de Hitler eram levados a diferentes locais,
impossibilitando os aliados identificarem onde ele estava fisicamente.
Com o final da guerra, o magnetofone é descoberto por um oficial
americano e levado para os EUA, que a partir dele desenvolveu um
novo gravador/reprodutor. Curiosamente, um grande cantor da época,
Bing Crosby, viu nisso a oportunidade de gravar no conforto de um
estúdio sem a necessidade de se deslocar até a rádio para uma
apresentação ao vivo. Graças a sua “preguiça” e sua vultuosa
contribuição financeira, foi criada a Ampex.
- Multracks
A gravação em fita, depois de alguns anos, começou a permitir o uso
de mais de uma pista (no caso, duas). Com isso, no início dos anos 1950
aparecem o LP (rodando a 33 rpm) e a gravação em estéreo.
Muitos dos progressos da gravação multipistas se devem ao guitarrista
Les Paul , que após desenvolver a técnica de som-sobre-som
(overdubbing), encomendou a primeira máquina que gravava em oito
pistas. É possível então considerarmos Les o primeiro “mixador elétrico”,
embora o processo se desse ainda durante as gravações.
Comercialmente a Ampex lançou gravadores de 3 pitas e
posteriormente de 4 pistas.
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- A Era “Moderna”

A partir de meados da década de 1960 começam a surgir o que


podemos chamar de consoles de gravação. Com a escassez de pistas
nos gravadores, o ato de mixar se concentrava ainda fortemente
durante o processo de gravação. As técnicas de uma captação
eficiente com poucas pistas propiciou uma geração de grandes
engenheiros de gravação, famosos até hoje por sua criatividade e
habilidade. Desta época são clássicos como Pet Sounds, Sargeant
Peppers e The Dark Side of The Moon.
Durante a década de 1970 houve uma constante evolução de
equipamentos como os gravadores e os consoles, que começavam a
dispor de mais canais. Por exemplo, a unidade móvel dos Rolling Stones,
que gravou clássicos como o Led Zeppelin IV e o Machine Head (1971)
dispunha de dois gravadores de 16 pistas sincronizados.
A seguir gravadores maiores de até 24 canais podiam ser usados
sincronizados, propiciando tipicamente 48 pistas. Os consoles ficam
progressivamente maiores e então podemos dizer que a mixagem
como a conhecemos hoje entra em uso amplo.
Eventualmente os consoles começam a ser automatizados
principalmente nos faders, e com a chegada dos computadores, era
possível armazenar e repetir as automações, tornando as mixagem mais
fáceis de refazer e corrigir.

- A Era Digital

Durante os anos 1980 começam a ser usados gravadores profissionais


de fita usando tecnologia digital. Um dos primeiros álbuns internacionais
de sucesso usando gravadores digitais foi “Security” de Peter Gabriel
(1982) .
A tecnologia dos consoles e da automação começa a aumentar em
complexidade e os recursos disponíveis, pelo menos às produções mais
caras, são enormes.

- O Grande Cisma

Até mais ou menos 1992, os estúdios eram basicamente montados e


bancados pelas gravadoras, porque o equipamento era muito caro e
muito raro. As produções “profissionais” envolviam verbas consideráveis.
Do lado dos semi-profissionais, existiam os “estúdios pequenos”, que por
usarem equipamentos menos caros, acabavam produzindo material
que tinha “som de estúdio pequeno”. O salto entre gravar semi-
profissionalmente e profissionalmente era enorme.

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Até que a Alesis lançou o ADAT. Este gravador de 8 pistas digitais,


usando mecanismo de videocassete provocou uma reviravolta no
mercado, uma vez que podia ser conectado em paralelo a outras
unidades. O som obtido nele já podia ser comparável ao obtido por
uma máquina “profissional” de 24 pistas, com uma diferença
considerável de preço (3 adats em conjunto custavam por volta de U$
10.000,00 e uma Sony 3324, US$ 125.000,00 dólares).
Mesmo tendo revolucionado o mercado totalmente, o Adat acabou se
mostrando uma tecnologia de transição, porque logo depois a
gravação em computador apareceu com mais confiabilidade e
capacidade .

- Entram Cena as DAW

No início dos anos 1990, enquanto os Adat ainda dominavam o


mercado de gravação digital e de estúdios de médio e pequeno
portes, as Digital Audio Workstations (sistemas de gravação em
computador), começam a despontar. De início timidamente, e tendo
que vencer uma categoria de usuários ainda pouco confiantes na
tecnologia, as DAW acabaram se consolidando pela qualidade sonora
e principalmente pela facilidade de edição e de uso.
Podia-se agora mixar dentro do computador, embora o número de
canais fosse limitado,
Desta época é o álbum “Stonewall Celebration Concert”, de Renato
Russo (1994), que tive a felicidade de gravar, mixar e masterizar. Este
álbum é provavelmente o primeiro gravado totalmente em
computador no Brasil.

- Século XXI

Com a evolução e democratização da gravação e mixagem em


computador, os procedimentos de mixagem evoluíram
exponencialmente. Por exemplo, antes das DAW, uma coisa com que o
engenheiro de mixagem precisava sempre se preocupar era a pouca
disponibilidade de equipamento. Os consoles só tinham um equalizador
por canal e só os grandes estúdios se davam ao luxo de ter um
compressor por canal. Equipamentos offboard, então, eram críticos.
Reverbs, por exemplo, eram adorados como dádivas dos deuses.
Esta “fartura” de plug-ins de hoje pode acabar induzindo o engenheiro
ao uso excessivo de processadores, e como veremos ao longo destes
textos, é sempre uma boa política se questionar se não existe um jeito
mais simples de fazer as coisas.

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34) Yo No Creo En Brujas, Pero Que Las Hay, Las Hay


Pois bem, já que o assunto está bombando e como estou com vontade
de escrever, vamos pensar juntos.
Você tem um equipamento (hardware e software) que traz como
bandeira a vantagem de que grava em até 192 kHz. Beleza, por que
não usar? Eu até sei que não é necessário, mas que mal faz? Como
dizem os hispânicos, "eu não acredito em bruxas, mas que elas existem,
existem".
Porém, o cara que é cismado vai observar no manual que o tal
equipamento grava , digamos, 48 pistas simultâneas em 48kHz e só 24
pistas simultâneas em 96 kHz, ou 12 em 192kHz. Peraí um pouco. O
fabricante que se vangloria que vai até 192 me avisa que nesse caso eu
só posso gravar ao mesmo tempo um quarto das pistas!!!
Daí eu penso: "tudo bem, eu só gravo um cara de cada vez mesmo..." ,
mas vamos pensar um pouco por que há essa limitação. Isso acontece
porque o equipamento tem limite. Ele irá fazer um esforço bem maior
para gravar em altas taxas e por isso não consegue atender bem a
muitas pistas simultâneas.
Eu, como um cara precavido, não quero que meu equipamento
trabalhe no limite. Quero ele trabalhando feliz ali na região de conforto.
Esse funcionamento próximo do limite técnico pode em vários casos se
refletir em algo importante: distorção por não-linearidades. Em outras
palavras, trabalhando perto do limite há boas chances de se
introduzirem distorções e consequentemente a conversão ser menos fiel.
Assim, embora faça sentido ao meu cérebro que gravar em taxa mais
alta seja benéfico, no final das contas eu posso surpreendentemente
estar realizando uma conversão pior.
Mas poxa, e se você acha o som melhor em 96 ou 128 do que em 44 ou
48? Primeiro, se está soando diferente e você não está sendo
psicologicamente influenciado quando acha isso, o que pode estar
acontecendo é que estas distorções podem estar deixando o som mais
agradável (por incrível que pareça) embora menos fiel.
Isso é o que acontece em uma situação bem diferente, como no caso
dos summing amps. Já ouvi um monte de gente dizendo que não sabe
como eles fazem, mas que a mix soa melhor se usar um summing amp.
Bom, eu sei o que eles fazem: distorcem e geram ruído. E concordo que
muitas vezes isso deixa o som "melhor".
O nome distorção é bem negativo, mas o resultado nem sempre é. Isso
porque a distorção aumenta o conteúdo harmônico alto - uma coisa
que o ser humano adora.
Assim, amigos, não há nada de errado em focar no resultado. Usar 96 te
deixa feliz, mesmo gastando o dobro de HD e com menos pistas
simultâneas? A LaCie agradece.

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35) Pra que serve um engenheiro de gravação?


O que muita gente mais nova não se dá conta é que os papéis
mudaram ao longo do tempo. Nos tempos do analógico, dava um
trabalho tão grande conseguir um som decente (e mantê-lo assim ao
longo do processo), que não sobrava muito tempo pra gente se
dedicar a coisas mais conceituais.
A galera craque tirava um sonzão não POR CAUSA do equipamento,
mas APESAR dele.
Com a gravação em DAW e afins a coisa simplificou muito. Alguém que
grave nos últimos 15 anos já sentiu vontade de voltar pro início da
música pra conferir se o som que tá lá é o mesmo que ouviu ao gravar?
Claro que não!!! A gente volta pra ouvir a performance, não pra
conferir o som. Só que no tempo da fita, tinha que voltar pra conferir,
porque o que ia era diferente do que voltava.
Hoje, felizmente, um profissional de áudio é tão valorizado por sua
capacidade crítica, por suas opiniões, como por "tirar um som decente".
Tirar um sonzão de voz é importante, mas saber se um take foi bom ou
não é essencial, E saber como ajudar o cantor a transformar um take
bom em um ótimo é o que faz escolherem você de novo. E isso não
depende de saber tirar um som bom.
É por isso que sempre enumero como uma das coisas mais importantes
para um profissional de áudio o espírito crítico. Ter sempre uma opinião
formada sobre tudo faz as pessoas confiarem no seu trabalho, mesmo
que discordem dela.
Mas vale sempre lembrar uma das Leis de Henriques para Gravação:
"Concorde efusivamente. Discorde cautelosamente".

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36) O VERDADEIRO PROBLEMA DO 16 BITS


Não, pessoal, o "problema" do áudio de 16 bits não é a precisão nem o
número de intervalo de quantização. O problema é a escala dos
gráficos usados para ensinar áudio digital.
Por simplicidade, os autores fazem um gráfico com intervalos visuais
enormes entre dois níveis, o que leva o aluno a pensar que a
quantização transforma as ondas bonitas em escadas grosseiras.
Usar 16 bits implica em se ter 65.536 níveis de quantização. Comparado
aos 16 milhões de níveis dos 24 bits, tudo bem, é pouco, mas de quanto
se trata realmente 65.536 coisas?
Em vez de gráficos toscos, façamos a seguinte experiência de
pensamento: Tomemos a linha de fundo do campo do Maracanã , que
mede 68 metros. Agora imaginemos que marcamos sobre a linha de
fundo um intervalo de 1 milímetro. Isso é um intervalo de quantização
em 16 bits.
Deu pra ver como áudio digital é preciso?

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37) MAIS SOBRE O SUMMING DO MASTER BUS


Cada DAW tem um summing diferente?
Independente de fazer a comparação com o Reaper, que certamente
farei, quero levar o argumento pra outro lado. Primeiro. Não existe
nenhuma necessidade técnica, repito, NENHUMA necessidade técnica
de se implementar um "algoritmo de summing" que faça alguma
operação com o áudio além de somar. Se um programador da minha
equipe me viesse com essa ideia eu lhe diria: faça um plugin, mas
nunca mexa com o master bus. Isso por um princípio básico: o master
bus não deve fazer NADA com o áudio além de somar. Qualquer coisa
que ele faça por conta própria é considerada "processamento", o qual
não lhe foi pedido pelo usuário,
E por favor, o argumento de que existe algum procedimento especial
pra gerar o master bus não procede, por que nem nos consoles
analógicos isso acontece. Os artefatos analógicos que aparecem no
master são subprodutos e não propositais - a não ser em equipamentos
específicos analógicos de summing - que apareceram, depois de uma
intensa campanha de boatos e factoides espalhados no mercado,
para "esquentar" um áudio falsamente intitulado de "frio" do summing
digital.
Reparem, os summing amps foram mais uma pseudo cura para o
"problema" justamente dos summing digitais serem neutros!!!!
O que os summing analógicos fazem de especial com seu áudio é
simplesmente , além de somá-los, introduzir distorção (que pode ser sutil
ou não ), intermodulação, desvios de fase, crosstalk e ruído. Porque não
tem mais nada que um summing analógio possa fazer além disso.
Qualquer observação do tipo "o som fica mais quente" carece
obviamente do rigor científico a que nos prestamos aqui. Na maioria
das vezes, "mais quente" significa "com maior conteúdo harmônico
introduzido por distorção e crosstalk".
Atenção: não estou dizendo que summing analógico PIORA o som, pois
depende do que se deseja, mas o que ele faz é isso o que falei.
Dito isto, convenhamos, em um momento de crise como esse, com
vários fabricantes competindo no mercado de DAWs, se o master bus
oferecesse algum tipo de processamento além da mera soma, vcs não
acham que isso iria ser alardeado aos quatro ventos? A própria Avid
tem o HEAT, que é exatamente isso!!
Por isso, sem duvidar de meus caros amigos a quem respeito muito, se
realmente a mera mandada para o master bus no Reaper altera de
alguma forma o conteúdo do áudio, então FUJAM do Reaper. O que
um mixer se propõe a fazer é meramente somar, e essa é a coisa mais
simples. Se ele faz algo a mais sem o usuário pedir, o controle deixa de
estar na sua mão e isso é um absurdo.

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Mas a minha opinião definitiva virá só depois dos testes. Por enquanto,
fica o suspense. http://reaper.fm/download.php
P.S> uma das coisas mais fascinantes do áudio digital é que qualquer
sinal, por mais complexo que seja, matematicamente é apenas uma
sucessão de números.

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38) O BRUFFLE
Não sei se é só comigo, mas frequentemente recebo material
problemático onde a música é um shuffle. Para quem não está
familiarizado, uma breve explicação. E por favor, quem tem mais estudo
que eu na área, me corrija nos escorregões.
Uma música "shuffle" é aquela em que todas as subdivisões de tempo
são em tercinas. Pode-se até interpretar que é um 4/4 tocado em 12/8.
O caso mais clássico é o jazz tradicional, onde aquela levada de prato
de condução é o shuffle típico. No rythm and blues é frequente
também. Só que dá um trabalhão ficar escrevendo um monte de
quiálteras e o pessoal escreve como se fosse um quaternário ou binário
normal, apenas com a observação "shuffle". Daí todo músico saberá
que onde se leem, por exemplo, duas colcheias, na verdade é pra
tocar uma quiáltera formada por colcheia, pausa de colcheia e
colcheia (ou semínima e colcheia). É comum que essa proporção varie
um pouco, gerando o que se chama de "swing". Cada baterista de jazz
tem o seu swing característico que estabelece quanto dura a primeira
nota e a última do grupo de colcheias. (no samba tb rola um swing na
duração da semicolcheia do grupo colcheia pontuada-semicolcheia ,
no bumbo - P.S. aquele "samba de japonês" que vem nos presets de
bateria eletrônica soa esquisito justamente porque coloca a
semicolcheia exatamente no tempo, derrubando o swing).
E todas as subdivisões da música são assim. Isso está no sangue dos
americanos, mas nós, brasileiros temos uma certa dificuldade com isso.
Somos binários e quaternários por natureza - vide o samba. E já vi gente
muito boa escorregando no shuffle feio. Com os bateristas é o caso mais
comum. A levada vem em shuffle bonito, e na hora da virada, lá vêm as
benditas colcheias e semicolcheias quadradinhas pra bagunçar tudo.
Daí eu criei um termo que designa o shuffle frequente no Brasil : o Bruffle.
E a coisa se estende a outros instrumentos. É muito comum encontrar
tracks de shaker e pandeirola numa música shuffle. E preciso alertar:
não dá pra colocar shaker e pandeirola em shuffle !!!!!!!! porque a
tendência é sempre tocar reto - é claro que sempre se pode editar, ou
pode haver caras que conseguem shufflear a pandeirola, mas
naturalmente, não rola.
Então, já que é muito difícil acabar com o Bruffle, se vc notar que o
shaker e o hi-hat não se encaixam, pode ir lá ver que a música pode ser
shuffle, e vc vai ter bastante trabalho pra coisa soar.

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39) MIXAR NÃO SE ENSINA, SÓ SE APRENDE (Mixerman)

Estava eu aqui divagando e pensando: deve haver alguma


vantagem em ficar velho.
Pelo menos do lados das mixagens, deve haver algo pra tirar de bom
depois de 40.000 horas de estúdio e mais de 3.000 mixagens, pra
compensar a perda auditiva que vem com a idade (mesmo que a
gente se cuide). Dinheiro certamente não é.
Daí um grande amigo estava me dizendo ontem que admira minha
capacidade de mixar bem qualquer estilo de música (isso na opinião
dele, hehehe). E aí eu cheguei à seguinte conclusão: pra mixar bem a
gente precisa na verdade não é entender cada estilo de música, mas o
jeito que o cérebro humano interpreta a música.
A gente fica ligado em equipamento, resposta em frequência e tudo
mais, e acaba deixando de lado o fato mais importante: mixamos pra
pessoas ouvirem. Se então a gente entende como o cérebro funciona,
as mixes acabam funcionando.
O pior é que um cérebro tentando entender outros cérebros, fica em
desvantagem. Por isso esse conhecimento não é nada fácil de colocar
em palavras. Faz parte do lado místico da coisa. Como diria Mixerman:
Mixar não se ensina, só se aprende.
Mas como um cara que escreve livros sobre mixagem pode dizer uma
coisa dessas? Bom, não tenho a pretensão de ensinar a mixar, mas
apenas compartilho meus métodos. E isso, pelo feedback dos meus
amigos leitores, tem funcionado.
Aprendamos juntos, então!

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40) MIXAGEM SEM SEGREDOS: O LIVRO – Capítulo 1


Foi só eu falar em livro que o buchicho começou. Só que este projeto
estou fazendo com calma, talvez esperando a crise dar uma
amainada. Alguns primeiros escritos já foram publicados na Música &
Tecnologia, e deles temos este primeiro aqui:

Mixagem Sem Segredos – Capítulo 1


Há nove anos, meus bravos editores me incentivaram a começar a
escrever sobre um assunto que eu mesmo julgava bem difícil: mixagem.
Como este foi sempre um processo muito individualizado e praticado
por um número relativamente pequeno de pessoas, eu achava que
seria quase impossível falar de mixagem de modo que fosse útil para um
número grande de pessoas.

O desafio, porém, falou mais alto, e aceitei a tarefa. Porém eu


precisava antes fazer uma autoanálise e verificar se seria capaz de
elaborar um método sistemático e eficiente. A minha maior certeza era
a de que eu não queria falar sobre “como eu mixo”, mas oferecer um
jeito, um conjunto de procedimentos que fosse acessível e que, no
mínimo, permitisse às pessoas o adaptarem para suas necessidades e
estilos.

Para minha surpresa e felicidade, o valente “Guia de Mixagem” fez um


enorme sucesso e hoje é usado até mesmo como livro didático em
cursos superiores de produção e áudio. Isso tudo me incentivou a
continuar o empreendimento, e seguiram-se a ele o Volume 2 – que
analisa a mixagem a partir dos instrumentos musicais e não do
equipamento (coisa que autor nenhum fez) e o Volume 3, que é o
primeiro livro em português que trata da mixagem surround 5.1 (além de
abordar a mixagem de shows gravados ao vivo).

Por consequência disso tudo, meu nome acabou intimamente


relacionado com o ensino de mixagem, o que tem me incentivado
bastante no sentido de pesquisar cada vez mais sobre o processo. Ao
mesmo tempo, o número antes restrito de pessoas que mixam (e tentam
mixar) tem subido enormemente, fruto da facilidade de acesso às
ferramentas e à dificuldade de acesso a verbas e orçamentos.
Foi assim que pude perceber uma mudança na realidade dos meus
leitores. O Guia parte de dois pressupostos. Primeiro, de que a mixagem
era algo ainda misterioso e pouco acessível a muitos, e segundo, que as
pessoas se aventurando nesse mundo já possuíam conhecimentos
suficientes no uso dos diversos equipamentos e plug-ins necessários.
Uma coisa que meus cursos me demonstraram nos últimos tempos é que
as pessoas estão cada vez mais íntimas do ato de mixar, mesmo que

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ainda não dominem todo o conhecimento antes considerado


necessário.

Não se pode ignorar que os plug-ins e equipamentos à disposição têm


facilitado muito as coisas, e hoje é bem possível com uma boa dose de
musicalidade e bom gosto se chegar a resultados muito bons. Mas acho
que o mais importante não é conseguir um resultado bom, mas saber
como obter resultados bons sempre. Para isso, basicamente é preciso
ter método. Saber exatamente por que se toma uma atitude nos
permite repetir de modo eficiente o trabalho. O ato de mixar não pode
ser o resultado de uma série de procedimentos aleatórios que tiveram a
felicidade de dar certo.

Os Elementos Necessários

Mixar envolve a amigável convivência dos dois seguintes requisitos:


Musicalidade – afinal, o resultado esperado no nosso caso é uma
música ou um evento musical que cumpra o seu papel artístico e
técnico. O termo musicalidade é em si mesmo bem complexo, pois
envolve senso artístico e espírito crítico, sem necessariamente exigir que
venha de um músico.
Podemos considerar que um curso eficiente de mixagem exigiria como
pré-requisito mais ou menos uns dez anos de audição criteriosa de boa
música, de preferência de vários estilos. É mais ou menos como
aprender uma língua. Por mais que se saiba a gramática, se você não
adquire vocabulário não consegue nem se expressar nem entender o
que ouve. Ouvir música com senso crítico nos fornece o vocabulário
que nos municia de recursos e soluções.

Técnica – é possível conseguir eventualmente uma boa mixagem


usando todas as ferramentas apenas com base na musicalidade, mas o
problema é a capacidade de repeti-lo. Principalmente para quem quer
fazer isso profissionalmente, mixar precisa de método. A coisa tende a
dar mais certo mais vezes quando se sabe exatamente por que e como
foi feita cada etapa. Assim, hoje continua sendo extremamente útil que
se domine uma série de conhecimentos que vão permitir e facilitar o
trabalho. E como a informação está aí disponível pra todo mundo,
temos que lembrar que é possível que o nosso cliente saiba identificar o
fato de que nós não sabemos alguma coisa, e essa é uma situação a se
evitar a todo custo. É claro que não se espera que saibamos tudo, mas
há coisas que são bem básicas, como o conceito de fase, por exemplo.
Dizer a um cliente que está ocorrendo problema de fase em um canal
mono acaba revelando uma fragilidade conceitual perigosa.

Será que alguém pode imaginar que uma pessoa possa ser um bom
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músico sem saber e praticar escalas? Sem ouvir outros músicos? Sem
estudar teoria ? Bom, na verdade isso é possível em alguns raríssimos
casos, mas para nós, meros mortais, estudar e praticar precisa fazer
parte do dia-a-dia. Mixar é exatamente como executar um instrumento,
neste aspecto.

Sem Segredos

O que estou propondo neste momento é apresentar uma visão


atualizada do processo de mixagem, que acumula tudo o que pude
vivenciar como resultado do Guia de Mixagem e da evolução dos
processos técnicos. Vamos entrar mais a fundo nos assuntos do que no
Guia, e atendendo a inúmeros pedidos, vamos nos dedicar com a
devida atenção aos processadores que são as nossas ferramentas de
trabalho.

O nosso título, Mixagem Sem Segredos, na verdade é uma brincadeira,


pois tem um duplo sentido. Se por um lado a pessoa é levada a
entender que vamos revelar todos os segredos, na verdade o que
quero dizer é que em mixagem não há segredos. Geralmente as
“pegadinhas”, o “pulo do gato”, o “caminho das pedras” são meras
fantasias românticas. Mixar pode sim ser um processo com começo,
meio e fim, com etapas racionais e metódicas, sem porém perdermos o
lado artístico da coisa. Na verdade, o fato de dominarmos a parte
técnica da coisa ao contrário de nos engessar conceitualmente, nos
libera para concentrar nossa criatividade onde ela será realmente útil –
o lado artístico da coisa.

É bem verdade que o raciocínio excessivamente técnico pode acabar


nos levando a uma atitude burocrática em relação à mixagem. Porém
o que acabo observando é que quando não se domina a técnica é
que as mixagens acabam se tornando todas iguais, porque acaba
faltando repertório de soluções ao mixador.

O Que Veremos

Pra começar, precisaremos avaliar como ocorrem os dois extremos da


cadeia de transmissão da mixagem, o som de um lado e o ouvinte do
outro.

Física do Som – não há como correr. Mixar é trabalhar com som, e é


preciso conhecer os detalhes desta forma de energia para saber utilizá-
la em nosso benefício. O lado bom da coisa é que não precisamos nos
atentar para toda a física do som, mas podemos nos concentrar nos
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aspectos que nos serão úteis efetivamente no trabalho. Fenômenos


como as diferenças de fase, o filtro pente, a relação entre comprimento
de onda e frequência, por exemplo, influenciam diretamente nosso
trabalho, mesmo que não percebamos.

Psicoacústica – é como o caso da questão de que se uma árvore cai


no meio da floresta, sem ninguém para ouvir, podemos dizer que ela fez
barulho? Não existe mixagem se não existir um ouvinte. A mixagem só
está completa se alguém a ouve do outro lado da coisa. Assim,
precisamos saber com detalhes como o ser humano ouve, e que
características serão importantes para nosso trabalho. Conhecer os
efeitos como o mascaramento podem significar a diferença entre uma
noite de sono alegre e muitas horas de dor de cabeça.

A partir dessa sólida base teórica, poderemos nos concentrar nos quatro
parâmetros técnicos envolvidos na mixagem:

Frequências – controlaremos a resposta em frequência de nosso


trabalho através dos equalizadores. Veremos a fundo os principais
métodos de funcionamento e as características de vários tipos de
equipamentos. Tenho verificado que muitas pessoas que achavam que
já dominavam os equalizadores acabaram descobrindo diversas
novidades quando são apresentadas ao seu estudo sistemático. Não
desceremos a nível de circuitos, é claro, pois manteremos o foco no uso
e não na construção.

Volumes – estudaremos diversos aspectos envolvendo volumes e como


explorar este parâmetro para um resultado eficiente. Os principais
equipamentos envolvidos são os compressores, que são talvez aqueles
que mais podem apresentar novidades mesmo aos mais experientes.
Além disso, precisamos conhecer seu “primo” funcional, o expansor
(que em sua versão mais radical é conhecido como noise gate).

Tempos – o terceiro parâmetro importante são os aspectos que


envolvem tempo. Basicamente lidaremos com efeitos como reverbs e
delays. Suas características e seu uso. Nessa categoria acabam se
incluindo flangers, e etc.

Panorama – aqui lidaremos com a espacialidade no ambiente estéreo.


Basicamente discutiremos as diferentes filosofias de como se usar o
espaço esquerda-direita para os efeitos artísticos desejados.

Além disso, ainda veremos questões envolvendo monitoração e


principalmente como lidar com os ambientes acústicos que temos de

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usar no mundo real. Como conviver com a acústica de seu estúdio sem
traumas e conseguir resultados úteis é uma preocupação da enorme
maioria das pessoas, e falaremos disso bastante.

Ainda precisaremos nos municiar de conhecimentos técnicos diversos,


como áudio digital, mp3, a falácia do áudio de alta resolução e coisas
do gênero.

Resumindo

Já deu pra ver que temos um longo caminho pela frente, mas iremos
paulatinamente nos aprofundando de maneira sólida e consistente no
mundo da mixagem.

Embora tudo o que vimos aqui possa acabar dando uma ideia de que
seremos excessivamente técnicos, na verdade iremos sempre manter a
dualidade técnico x prática em foco, para que seja possível aplicar
imediatamente os conhecimentos.

Como exercício inicial, proponho que nos atentemos para o fato de


que o aspecto básico mais importante com que um mixador deve se
preocupar é a Opinião. O tempo todo mixar envolve ter uma opinião a
respeito do que estamos ouvindo e do que pretendemos fazer. O bom é
que no estúdio podemos estar errados em nossa opinião, mas a ideia é
que nossa experiência nos conduza no caminho de cada vez mais
emitir opiniões que se mostrem eficientes.

Para esse exercício crítico, peguemos duas músicas de épocas


diferentes. Por exemplo, Purple Haze, de Jimi Hendrix (1967), e Rosana,
do Toto (1982). Reparemos as características sonoras dos diferentes
instrumentos, dos arranjos, e vejamos o que mudou nos 15 anos que
separam estas duas gravações. Será que essa fama de que “o
equipamento velho é que era bom” é realmente merecida? O que
seria um som “bom”?

Manifeste sua opinião aqui em nosso grupo.

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41) O CONTROLE DO VOLUME DO MASTER


Por conta dessa interessante discussão sobre a atuação no master
fader, gostaria de sistematizar os pontos de vista e também apresentar
um exemplo pessoal.
Primeiro, existem dois níveis de discussão. Tecnicamente, o master fader,
por suas características internas, suporta bem atenuações e ganhos
consideráveis sem o risco de perda de qualidade. Isso antes de tudo é
tranquilizador.
Em um segundo nível, porém, um profissional de mixagem precisa se
preocupar com a repetição das coisas. Se em um dia você precisou
atenuar 8dB no master e no dia seguinte, em uma mix semelhante,
precisou dar ganho de 6dB, isso pode indicar que vc está um pouco
sem controle sobre suas mixes.
O nosso objetivo é não sermos "vítimas" dos canais gravados, mas
dominá-los, conseguindo extrair deles o que almejamos como
sonoridade final. Por isso considero fundamental que os resultados
possuam uma relação bem clara de causa e efeito. Saber exatamente
como se chegar ao resultado é uma das virtudes de um mixador que
deseje resultados consistentes. Isso porque quando um possível cliente
ouve uma mix sua, gosta e o procura para o trabalho dele, está
querendo justamente que vc aplique sua habilidade para conseguir
aquela sonoridade, e não para ajudá-lo a apenas "explorar
possibilidades".
Ok, um certo grau de experimentação faz parte fundamental do
processo, mas quem tem orçamento e tempo apertado normalmente
precisa de mais objetividade nos resultado, deixando essa parte
experimental para uma parcela da mix que a destaque e faça a
diferença no final.
Trago aqui como exemplo o meu mais recente desafio que foi
obedecer ao padrão EBU R-128 de loudness. Por conta de meu trabalho
na Gomus, tive que começar a mixar segundo esses estritos parâmetros
para o broadcast. Foi um desafio para quem veio do meio
exclusivamente de CD/DVD onde o objetivo é "quanto mais alto
melhor".
E o desafio foi muito bom, porque pude exercitar mais uma vez a
capacidade de adaptação. Tinha 35 vídeos para mixar, todos eles
obedecendo à norma. Assim, tendo conseguido o primeiro resultado -
mesmo que com esforço e com um certo grau de incerteza - me
preocupei em desenvolver um método que me permitisse não ter que
inventar a roda 35 vezes. Como se consegue? Como sempre, com
trabalho duro. Que volume deve ter a trilha para que no final não
precise corrigir muito? Que faixa dinâmica devo permitir para ficar
dentro dos parâmetros? O que eu precisava era não só chegar ao
resultado, mas entender como cheguei a ele.

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Para encurtar uma história longa, felizmente eu hoje consigo ficar dentro
de um limite de + ou - 1.5dB do resultado da norma, o que considero
beeemm razoável. No final , isso reduziu o tempo de mixagem à
metade para cada vídeo, sem perda de qualidade, embora no início
eu acabasse gastando mais tempo que o normal. E o melhor, servirá
para os próximos trabalhos.

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42) Quem manda na sua mix?


Outro dia um amigo me perguntou por que eu preferia usar um plugin
de compressor "neutro" como o FabFilter Pro-C, que não emula nenhum
hardware, em vez de um "clássico". Confesso que nunca tinha parado
pra pensar no assunto, mas na verdade, quando a gente usa um desses
emuladores, nós temos que nos adaptar às características deles.
Usando um versátil como o Pro-C, o plug-in é que se adapta ao que
queremos.
O processo é o seguinte: primeiro, e aí é a parte mais difícil, eu tenho
que decidir o que eu quero em termos de som para um determinado
caso. Se eu tenho vários plug-ins pra escolher, preciso saber de
antemão como cada um deles responde e daí escolho o mais
adequado (é claro que se pode simplesmente experimentar também).
Com um plugin versátil, dá pra moldá-lo pra atender minha
necessidade.
Quando a gente se coloca como princípio ficar usando só plugins
emuladores de hardwares, corremos o risco deles acabarem
mandando no nosso som, e isso é algo definitivamente perigoso. Não
acho que eles não valham a pena, muito pelo contrário, mas sempre os
uso quando preciso do som deles, e nunca me forço a me adaptar a
suas singularidades.
O perigo não está neles, que são muito interessantes, mas de cairmos
na "pegadinha da guitarra signature". Esse fenômeno acontece quando
o cara compra uma Fender SRV e acha que vai tocar igual ao Stevie
Ray. Adaptando para o áudio, se o Al Schmitt usou um Fairchild 660 pra
gravar o Paul McCartney, então basta eu usar o plugin que tenho a voz
dele? Como disse o editor da Pro Audio Review, se você tirar o U47, a
mesa REDD e o 660, ainda vai ter um Paul McCartney. É isso o que faz a
diferença.

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43) POR QUE NÃO VOU FICAR RICO COM ÁUDIO


Meus amigos leitores já devem estar cansados do assunto, mas uma
recente conversa inbox com um um membro aqui do grupo me fez ver
que ainda não está claro como as coisas funcionam,
Tem sites e empresas que ganham dinheiro vendendo áudio de "alta
definição" (Hi-Res Audio) e partem do pressuposto que isso vai te
proporcionar uma experiência mais "fiel" ao áudio original. Estão
ganhando dinheiro vendendo chiado.
Vamos parar pra pensar um pouco. Alguém chega e te diz que vc vai
ouvir Off The Wall do Michael Jackson em 192kHz e ele vai soar melhor.
Pois bem, quando esse álbum foi gravado, em 1979, o áudio digital
estava nascendo. E embora os bons gravadores analógicos
conseguissem reproduzir até uns 30kHz, era uma região que nem eles
prestavam atenção, principalmente porque não havia onde escutar
essas frequências (mesmo que os seres humanos conseguissem). Todo o
equipamento (exceto alguns amps de potência) se preocupava com a
região até 20kHz e as caixas nem pensavam em tentar reproduzir isso.
Ou seja, mesmo que fosse possível registrar algo útil acima de 20kHz,
ninguém durante o processo produtivo foi capaz de ouvir essa
informação,e se vc for um superhumano capaz de ouvir 25kHz
provavelmente vai ouvir algo que o Michael não gostaria que vc
ouvisse.
Se tudo correr bem e não houver distorções por intermodulação ou
coisas do gênero, tudo o que vc vai baixar ou reproduzir com esses
áudios será simplesmente ruído branco dos próprios equipamentos
envolvidos.
P.S.1 - O uso de 24 bits realmente pode ser um ganho, pois nos coloca
com uma relação sinal ruído indiscutível, mas mesmo 16 bits estará mais
de 20dB acima da SN típica de gravações dessa época.
P.S. 2 - Antes que alguém venha falar de aliasing e reflexão especular, já
aviso que desde que os filtros digitais começaram a usar oversampling
(há um tempão), o aliasing não é mais problema significativo.

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44) E QUANDO QUEREM QUE VOCÊ SEJA OUTRO?


Imagino que esta seja uma situação muito comum a todo mundo que
mixa profissionalmente. O cliente (em potencial ou de fato) encontra
com você e diz o que pensa sobre a mix: "Eu queria um som gringo", ou
"Eu queria o som do disco do fulano", ou coisas do gênero.
A primeira coisa que a gente se pergunta é: "Você gravou pensando
nisso? Fez um som inacreditável na gravação da bateria e do resto? Ou
fez o que foi possível com os recursos disponíveis e está me passando a
responsabilidade do toque de Midas?". Será que o som "gringo" vem do
mixador, ou é o resultado de uma soma onde todas as parcelas
contribuem?
É inevitável que a gente acabe desenvolvendo um som próprio, uma
personalidade sonora. Todo bom profissional tem uma. E em um mundo
ideal, o cliente chegaria pra nós e pediria pra fazermos o som que
fizemos no disco tal que mixamos. Mas é raro um cliente que escolha o
mixador pelo som que ele já conseguiu. O que normalmente acontece
é algo como: "A grana só deu pra contratar você, então me consiga o
som do Tom Lord".
E o pior é que não dá pra reclamar, porque afinal, a gente também se
baseia nesses medalhões pra ter uma referência, mas é realmente
muito bom (e raro) o caso em que o cliente te procura e pede pra você
fazer o que acha melhor, pois já conhece seu som e sua capacidade.
Ou será que alguém liga pro Tom Lord e pede um som bem "Brit Pop"?

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45) COMO CONSEGUIR UMA MIX QUE SOA BEM EM QUALQUER LUGAR?
Faz sentido conferir a mix em um monte de lugares?
Frequentemente leio ou ouço uma frase vinda de clientes e de colegas:
“Ouvi em um monte de lugares e ...”.
Para alguém que deseja que sua mixagem agrade ao maior número
possível de pessoas (de preferência TODAS as pessoas), é natural que se
procure verificar como ela está soando no maior número possível de
lugares.
Mas isso faz realmente sentido? Contrariando o senso comum, posso
tranquilamente dizer que não: não vale a pena ouvir em um monte de
lugares.
Antes de mais nada precisamos pensar no que são esses “lugares”. A
coisa vai muito além de caixas e salas. Isso porque é preciso levar em
conta que diferentes formatos soam diferentes (mesmo que muito
pouco). Então, seria preciso verificar o trabalho em WAV, mp3, AAC,
FLAC, e por aí vai. Além disso, há diferentes mídias onde o trabalho irá
soar: rádio AM e FM, TV analógica e digital, vinil e CD, celulares,
streaming ...
Só aí é que entram os monitores e salas. E de uma coisa você pode
estar certo: sabe como os grandes mixadores têm certeza de que suas
mixes vão soar bem em TODOS os lugares? Eles não têm. Nenhum deles.
O que eles fazem é primeiro saber como sua mix soa em seus ambientes
de trabalho. Ao mesmo tempo eles procuram saber como uma mix
notoriamente boa no mercado soa lá. A partir do julgamento de como
uma mix “famosa” soa na sua sala isso vai servir de parâmetro para
julgar sua própria mix.
O processo é justamente o inverso: em vez de tentar saber como sua
mix vai soar em um monte de lugares, descubra como um monte de
mixes soam em seu lugar de trabalho.
Por via das dúvidas, vale a pena investir no jeito em que você espera
que sua mix vá ser ouvida pela maioria das pessoas. Hoje, praticamente
todo mundo ouve música no fone de celulares – mas como não dá pra
saber qual fone seu ouvinte vai usar, procure apenas saber como sua
mix soa em um bom par de fones. Procure o equilíbrio e não o realce –
relaxe que o Beats vai aumentar os graves pra você, e se você fizer isso
antes sua música vai acabar distorcendo nos graves. Neste caso,
confira apenas se os pans estão funcionando bem e se os reverbs não
estão exagerados, pois é isso o que dá problema nos fones.
Outro lugar onde muita gente ouve é no carro, mas cada carro é um
carro, então, da mesma forma que nos fones, confira em seu carro se os
pans estão ok e se a dinâmica está tão grande que as partes mais
suaves somem no meio do trânsito – sim, há lugares, como os carros, em
que você ainda quer a guerra do loudness.

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Se o objetivo de seu trabalho for o broadcast (rádio, tv ou internet),


lembre que a enorme maioria dos falantes nesses casos irá favorecer as
médias, então vc pode até dar uma ajudazinha entre 1 e 4 kHz “just in
case” e procure não exagerar nos graves.
E se vc ainda, por teimosia ou precaução, quiser dar uma conferida em
vários lugares, lembre que a mix vai soar diferente em cada um eles, e
se vc estiver agoniado porque queria que ela soasse igual em todos, o
problema pode não estar na mix, mas na sua expectativa. Assuma sua
mix e seja feliz .

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46) UMA CURIOSIDADE


Se áudio de "alta definição" tipo 96kHz faz diferença, por que diachos a
maioria dos analisadores de espectro só mostram até uns 30kHz (com
sorte) e praticamente nenhum equalizador se importa com nada acima
de 22kHz? E não adianta argumentar que o shelving de agudos atua
acima disso. Se essa região fizesse alguma diferença tinha eq tipo
peaking centrado em 30kHz, ou quem sabe 40kHz.

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47) ÁUDIO DE ALTA DEFINIÇÃO – O APITO EM 30kHZ


Pois bem, como todo mundo já conhece minha implicância com essa lorota de
áudio de alta definição, fui na fonte. Fui lá no site que vende isso, o HDTRacks e
baixei legalmente uma música gravada em 1956 - St. Thomas - Sonny Rollins, do
álbum Saxophone Collossus. Está disponível gratuitamente, então convido todo
mundo a baixar e experimentar. É só ir lá no site, se cadastrar e baixar o "2015 HI-
Res Music Sampler".
Aí começa a parte boa. Baixei, abri uma sessão em 96kHz e importei o áudio.
Antes de mais nada, a música é sensacional. Adoro Sonny Rollins. E como posso
mostrar na foto, há conteúdo acima de 20kHz, sem dúvida. Ok, está de -55dB pra
baixo, o que mesmo para um golfinho exigiria um ambiente acusticamente bem
controlado para ouvir, mas tudo bem. FIltrei tudo acima de 20kHz pra ficar mais
fácil visualizar e... que surpresa!!!
Abro um parêntese para um desafio. Para quem afirma que ouve a diferença do
áudio em 96kHz, peguemos o caso dessa música. Pela foto dá pra ver que ali em
30kHz (o analisador não enxerga muito acima disso, infelizmente) existe um "apito"
alto pra caramba. Tem uma componente bem alta em 30kHz que se fosse em
1kHz seria não só audível como extremamente incômoda.
Portanto, meu amigo que ouve acima de 20kHz, baixe oficialmente essa música e
me diga se esses 30kHz te incomodam. No caso deste HDTracks, você está
pagando cerca de R$10,00 por música (provavelmente que vc já tem em CD)
para ouvir (1) Algo que nem os músicos, nem o engenheiro, nem o produtor da
gravação ouviram (2) algo que não faz parte da música - no caso, um apito.
No caso, desconfio que esses 30kHz possam ter alguma relação com a frequência
de Bias do gravador analógico usado, mas não tenho como verificar.

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48) Equalizador Acústico?


TRADUÇÃO DE Leonardo Giglio (obrigado!!!!)
Pesquisadores inventam prisma acústico
8 de agosto de 2016 por Hillary Sanctuary
Os cientistas da EPFL inventaram um novo tipo de "prisma acústico" que
pode dividir um som em suas freqüências constituintes (componentes).
Seu prisma acústico tem aplicações na detecção de som.
Quase 400 anos atrás, Newton mostrou que um prisma poderia dividir a
luz branca nas cores do arco-íris, com cada cor correspondente a uma
freqüência de onda diferente. Tal "prisma óptico" depende de um
fenômeno físico (refração) para dividir a luz em suas frequências
constituintes.
Agora, existe um prisma para o som . Hervé Lissek e sua equipe na EPFL
inventaram um "prisma acústico" que divide o som em suas freqüências
constituintes usando apenas propriedades físicas. Suas aplicações em
detecção de som são publicadas no Journal of the Acoustical Society
of America .
O prisma acústico é inteiramente feito pelo homem, ao contrário dos
prismas opticos, que ocorrem naturalmente sob a forma de gotas de
água. A decomposição do som em suas frequências constituintes
depende da interação física entre uma onda sonora e a estrutura do
prisma. O prisma acústico modifica a propagação de cada freqüência
individual da onda sonora, sem necessidade de cálculos
computacionais ou componentes eletrônicos.
O prisma acústico
O prisma acústico parece um tubo retangular feito de alumínio, com
dez buracos perfeitamente alinhados ao longo de um lado. Cada
orifício conduz a uma cavidade cheia de ar dentro do tubo, e uma
membrana é colocada entre duas cavidades consecutivas.
Quando o som é dirigido para dentro do tubo em uma extremidade, os
componentes de alta freqüência do som escapam do tubo através dos
furos perto da fonte, enquanto as baixas freqüências escapam através
dos furos que estão mais distantes, na direção da outra extremidade do
tubo. Assim Como a luz se comporta através de um prisma óptico, o
som é disperso, com o ângulo de dispersão dependendo da freqüência
da onda.
As membranas são fundamentais, uma vez que vibram e transmitem o
som para as cavidades vizinhas com um atraso (delay) que depende
da frequência. O som atrasado então escapa através dos furos e para
o exterior, dispersando o som.
Detecção angular por freqüência
Para levar o conceito um passo adiante, os pesquisadores perceberam
que poderiam usar o prisma acústico como uma antena para localizar
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a direção de um som distante simplesmente medindo sua freqüência.


Como cada ângulo de dispersão corresponde a uma freqüência
particular, é suficiente medir a componente principal da freqüência de
um som de entrada para determinar de onde ela vem, sem realmente
mover o prisma.
O princípio do prisma acústico depende do design das cavidades,
dutos e membranas, que podem ser facilmente fabricados e até
mesmo miniaturizados, possivelmente levando a uma detecção angular
do ruído mais viável economicamente, sem recorrer a caros microfone
arrays (alguns microfones dispostos em uma determinada ordem ou
diferentes posições) ou antenas móveis.
Mais informações: Hussein Esfahlani et al. Explorando as propriedades de
vazamento de onda de linhas de transmissão de metamateriais para
encontrar a diretividade de um único microfone (single mic) , The
Journal of Acoustical Society of America (2016). DOI: 10.1121 / 1.4949544
Referência do periódico: Journal of the Acoustical Society of America
OBS: achei legal esse link explicando sobre microfone array (nem sabia
q existia isso hehe) http://www.learningaboutelectronics.com/…/What-
is-an-array-…
https://phys.org/news/2016-08-acoustic-prism.html

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49) O PROCESSO INVERSO


Esse grupo para mim é um constante aprendizado, principalmente
sobre as pessoas, mais do que equipamento e tecnologia. Eu fico
impressionado em ver o jeito como algumas pessoas abordam o
processo de análise, crítica e opinião sobre equipamentos e plugins.
Não que eu ache errado ou certo, pois isso não existe, mas me
surpreende que pessoas prefiram isso ou aquilo baseadas em aspectos
não só subjetivos como muitas vezes até metafísicos. Explico.
Eu penso que para alguém que tenha gravação e mixagem como
meio de vida ou como algo mais sério, o processo deveria ser o
seguinte. O equipamento/plugin chegou. O que a gente deve fazer é
testá-lo. Usá-lo experimentalmente em uma série de situações,
procurando analisar objetivamente os resultados, de preferência sem
um pré-conceito. Este é o jeito esperto de agir, porque quando chegar
a oportunidade de usar (ou não) este equipamento, serão estes testes
prévios que indicarão se ele será útil.
Só que muitas vezes eu vejo que as pessoas dizem, "hum, nessa guitarra
o plugin tal ia ficar bom" baseadas apenas na subjetividade, ou porque
é maneiro usar um compressor velhão, ou porque tem um cara no
youtube que falou que o Coldplay usa, ou sei lá o quê, menos porque
"já usei nessa situação e resolveu".
O processo então fica um loop assim: escolhe-se o plugin baseado em
achismo, roda-se botão tentando fazer o cilindro encaixar no buraco
quadrado, desiste-se desse plugin, repete-se o processo com outro
plugin.
É por isso que as mixes costumam demorar.
Não estou dizendo que não se deve experimentar, mas estou afirmando
que é muito mais produtivo se focamos onde a experimentação
realmente é útil.
Um caso clássico são os simuladores de amps. Tem um monte de gente
que é filosoficamente contra, tipo, "não ouvi e não gostei". Posso afirmar
tranquilamente que usar mal um simulador é muito fácil, usar bem é
difícil. Mas quando se pesquisa e fuça e rala em cima, você pode obter
resultados surpreendentes. E para quem afirma que uma simulação do
VoxAC30 não é igual ao de verdade, eu respondo: "Eu não tenho o de
verdade, mas tenho a simulação". E aí o que eu tenho que fazer é
conseguir o som que desejo com as ferramentas que tenho, ou desistir e
me lamentar.
O business adora quando você se convence que só vai ter um som bom
quando desistir de seu pré de US$1.000,00 e comprar um de US$3.000,00.
Aí você batalha e consegue comprar, só pra perceber que o seu som
não triplicou de qualidade (e na maior parte das vezes nem dá pra
notar a diferença). E fica mais deprimido achando que você deve ter

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algum problema. Mas você pode ficar tranquilo: o seu único problema
será como fazer pra pagar os 3 mil dólares.
50) POR QUE O MIXADOR MEXE NO MEU SOM????
Um leitor me indaga a respeito de um post indignado que leu de um
músico importante onde ele reclama que os músicos investem um
tempo enorme e uma significativa quantidade de dinheiro para
conseguirem o seu "som", um timbre único e pessoal que os caracteriza
e individualiza perante outros músicos.
E realmente a gente tem que concordar que quando ouve um Dave
Gilmour, já sabe que é ele só pelo som (mas eu acredito que o fraseado
tb tenha a ver).
Muito bem, a reclamação é: "Por que diachos vem um mixador e mexe
no meu som?".
A resposta não é simples. Primeiro, é preciso distinguir entre dois tipos de
mixadores: os ruins e os bons. Infelizmente não tem uma placa na frente
do estúdio dizendo "Aqui se mixa mal". A pessoa tem que usar trabalhos
anteriores que ouviu como referência ou tem que acreditar no cara. Eu
não preciso me estender aqui falando de gente incompetente, porque
isso é óbvio demais: o cara mexe porque não sabe o que está fazendo.
Eu já escrevi isso algumas vezes: "Mixar não é fazer o som que a gente
quer, mas fazer o som que o cliente quer." A verdadeira habilidade está
em conseguir que a gente e o cliente queiramos a mesma coisa - mas
isso é outro papo.
Existem situações em mixagem em que infelizmente é necessário alterar
o timbre original do instrumento que o músico gosta - vou chamar aqui
por comodidade de TOIMG. (Pessoal, desculpem me alongar mas a
questão merece.)
Primeiro, é preciso saber se a gravação foi fiel ao TOIMG ou não. Às
vezes o que está na gravação não foi bem microfonado, ou foi
equalizado na gravação, o que muda tudo. Mas vamos admitir que o
músico está feliz com o som da gravação e já ouviu um monte de vezes
a cópia de monitor e considera isso tudo ok.
O problema tem nome: Mascaramento. Uma mixagem não é a soma
do MELHOR som de cada canal, mas a soma do som mais EFICIENTE de
cada canal, para que a soma resulte.
Se o músico tem um som inconfundível de violão de nylon e a mix tem
ele e grande orquestra, o som do violão no resultado será diferente do
violão solado MESMO QUE O MIXADOR NÃO MEXA NELE!!!! O problema
é da audição humana.
Um guitarrista de rock que vai mixar sua própria banda e quer ser fiel ao
TOIMG vai deixar 250Hz em todos os canais de guitarra que tocam
juntos, e sua mixagem será embolada e confusa.

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Assim, mesmo a contragosto, às vezes precisamos alterar o timbre


original do instrumento para ele poder entrar na mix. Caberá ao nosso
criterioso músico se preocupar para que o arranjo preserve seu timbre, e
não a gente, que nesse caso tem que se virar pra tudo soar bem. É
como eu digo: "Quem tira o grave do seu pad de teclados não sou eu -
é o baixo!"
Isso pra não falar em equalizações criativas, onde a alteração se dá por
uma questão de expressão. Nesse caso é mais fácil que todos cheguem
a uma conclusão juntos.
Particularmente costumo respeitar muito o timbre de cada músico,
acho que isso é o mínimo que um bom mixador deve fazer. Mas se um
baterista chega dizendo que o grave do hihat faz parte do seu som,
vamos ter que arrumar lugar pra ele na mix prejudicando outro
instrumento - não existe almoço grátis.
Agora uma pergunta maldosa: o músico manda seu trabalho pro Cris
Lord-Alge (dez paus uma música) e ele altera o som. Pode?
E é aí que eu tomo a liberdade de esticar o assunto. Cada vez mais o
mixador se torna um membro da equipe artística. Não somos apenas
resolvedores de problemas. Os artistas querem que a gente contribua
para o trabalho, e nossos "instrumentos" são equalizadores e
compressores. Então vc ouve uma mix do Tom Lord e tá lá o "som de
caixa do Tom Lord" e duvido que o baterista reclame que ele "mexeu no
meu som".
Mas beleza, eu sei que tem muito curioso por aí rodando botão e
prejudicando toda uma classe, mas o meu alento é que também tem
muito músico ruim querendo obter uma tremenda mix. Nesse caso eu
também poderia perguntar "por que ele não toca afinado"? "por que
tudo gravado com os efeitos e o eco no tempo errado"? "Por que esse
arranjo é essa bagunça"?
Eu me solidarizo com o músico criterioso e caprichoso que investe muito
no seu timbre, mas convido a ele que também se solidaize com os
mixadores sérios que por sua vez também investem muito tempo e
dinheiro para conseguir o seu timbre próprio nas mixes - que se tudo
correr bem deixará todos satisfeitos.

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51)Às Vezes O Bom Senso Engana 1


Vamos pensar na seguinte situação, da qual falo no Guia Vol.1: vc está
parado no sinal, esperando para atravessar uma avenida bem
movimentada. Neste momento passa um ônibus levando uma orquestra
de metais que toca a toda altura, enquanto um homem usa uma
britadeira e um avião a jato dá um rasante bem em cima, Pois bem,
nesse caso, quantas ondas sonoras estão chegando ao seu ouvido?
Uma. A cada instante, cada ponto do tímpano está submetido a um
valor de pressão único, e ao longo do tempo o cérebro entende
apenas uma onda sonora, que no caso é bem complexa, mas é
apenas a soma dos inúmeros componentes sonoros, com seus positivos
e negativos.
É baseado nisso que o áudio digital funciona, pois mede um único valor
de amplitude a cada amostra. O intervalo entre amostras determina a
maior componente de frequência codificada, enquanto que a
precisão desta medida determina a faixa dinâmica. Só isso.
Assim faço a seguinte pergunta: supondo que você trabalha em uma
sessão com apenas um arquivo mono de áudio de 1 minuto
,48kHz/24bits. Vc faz o bounce e obtém um arquivo de 8,6MB.
Responda rápido, sem pensar: se agora a sessão tem 100 arquivos de 1
min 48kHz/24b e vc os mixa para um bounce mono, quantos MB terá o
arquivo final?

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52) Será que o vinil dificultaria a pirataria?


Sinceramente eu, com o maior respeito, considero a suposição de que
as limitações e dificuldades em se copiar LPs iriam minimizar a pirataria
são apenas wishful thinking. Já havia pirataria no tempo do LP,
principalmente na forma de cassetes. O que não havia era a facilidade
de acesso. A banca/loja do pirata não tinha todos os LPs do mundo,
enquanto a internet começou a permitir acesso fácil a qualquer obra, e
isso alavancou a pirataria.
DVDs de filmes eram muito desagradáveis de copiar e sempre houve
pirataria deles à vontade em qualquer camelô. O que eu considero
mito é o music business - e uma grande parte da comunidade técnica -
considerar que o povo busca qualidade de áudio e vídeo. Isso vale
para uma parcela muito pequena. O povo quer consumir de um jeito
barato e prático desde o tempo do cassete e depois com o mp3. É por
isso que não há quase pirataria de Blu-rays nos camelôs.
Os CDs só vingaram quando apareceram porque havia três coisas que
os tornavam desejáveis - (1) vc conseguia qualidade sem gastar uma
fortuna, como no caso do vinil (2) o ato de tocá-los não incorria no risco
de arranhar a mídia (3) posteriormente, o aparecimento do walkman,
que levou a qualidade à portabilidade.
Todos nós, profissionais e amantes do áudio, queremos e buscamos o
máximo de qualidade técnica. Mas isso não é o que o público quer -
eles querem facilidade de acesso com um mínimo aceitável de
qualidade.
O maior problema da música hoje não está no lado técnico. O maior
problema é que essa facilidade de produzir música e a facilidade de
ouvi-la sem pagar (ou pagando pouco) tranformou a música pop em
coisa rapidamente consumível e substitível, Os tradicionais 15 minutos
de fama viraram 3:30.
Mas as pessoas ainda gostam de música, o que os festivais sempre
lotados demonstram. Mas eu me pergunto se as pessoas que curtem
música ainda admiram e curtem músicos.
Quero dizer, exceto vendo ao vivo, será que o grande público ainda
admira, ainda se emociona com uma performance?
Quando um show de DJ é cotado para um dos melhores de um festival
que teve várias bandas tocando, isso me preocupa bastante. Não que
um show de DJ não seja válido - pelo contrário - mas colocá-lo numa
mesma comparação com performances de músicos me parece
descabido, pois são tipos diferentes de show. E o pior é que muitas
bandas estão apelando para samples e apenas dublando no palco.
Está ocorrendo o processo inverso, num feedback muito preocupante.
Para onde vamos é a pergunta que fica no ar. As verdades são: as
pessoas ainda gostam de música e ainda são fãs de seus artistas. Resta
saber o quanto isso as motiva a comprarem gravações e vídeos, e até
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quando elas estarão dispostas a irem a shows que estão mais e mais se
transformando em dublagens de luxo.

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53) Às Vezes o Bom Senso Engana 2


Eu ainda me surpreendo com a quantidade de pessoas que adota a
prática de "não colocar nenhum canal exatamente no centro,
deslocando uns 5 a 8 % para um dos lados alternadamente - isso para
descongestionar o centro".
Ahn?
Por que fazer isso "descongestionaria" o centro da mix?
Antes de mais nada vamos lembrar que um canal paneado no centro
não está no centro, mas igual dos dois lados. Não existe centro em
mixagem estéreo. Por isso, deslocá-lo um pouco para um dos lados só
eleva o volume desse lado um pouco. Isso não facilita em nada a
discriminação auditiva. E o pior: se vc tiver um número ímpar de canais,
os volumes dos lados da mix tenderão a ficar desequilibrados, o que vai
deixar o masterizador meio nervoso.
Mas ok, digamos que a pessoa quis dizer que descongestiona o centro
aparente da mix. Primeiro, se o centro está congestionado, significa que
o arranjo e a mixagem levaram a isso. Por "congestão" entenda-se a
dificuldade de distinguir os instrumentos. Isso não é causado pela
sobreposição do pan, mas sim ela sobreposição de frequências. Ou
seja, eu diria que equalizar 1dB que seja já descongestiona mais que
mover 5% no pan.
E agora o fator que detona o argumento: os ouvidos só são bons de
localizar os agudos. A gente tende a ouvir quanto mais grave, mais sem
direção muito definida. Ou seja, deslocar um bumbo 5% para um lado:
(1) Não descongestiona tecnicamente, e (2) não descongestiona
espacialmente, então pra que fazer isso?

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54) Apps de medição de áudio prestam?


Pois bem, amigos, depois de uma discussão interessante ter aparecido
aqui a respeito de medições com celulares, fui dar uma investigada.
Usei apenas um aparelho celular comum para as medidas e portanto
não há muito rigor científico, mas serve como primeira tomada de
dados. Quem quiser colocar suas experiências aqui vai ajudar muito.
Aparelho Samsung J7
Calibração via Nady ASM-2 Analog SPL meter
Apps - "Sound Meter' da Tools Dev
"Pro Audio Tools" da FranJAM
"Spectral Audio" da Penda Software
Gerador - Signal Generator do Pro Tools
Mesmo com este teste bem simples, pude observar o seguinte:
Analisadores de espectro - as medidas foram EXTREMAMENTE precisas,
chegando nas médias altas a 1% de precisão. Consegui leituras precisas
até por volta de 45 Hz, o que é surpreendente.
SPL meters - bem mais complicado. Medidas de ruído rosa em FAST
response e wheighting C , depois de calibrado o celular via o Nady,
foram muito boas, com discrepâncias na ordem de uns 5%. Medidas de
senóides e outras formas de onda foram bem discrepantes. Como
atenuante temos o fato de que geralmente a medição de SPL é
voltada a ruído rosa mesmo.

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55) COMO TEM LOROTA NO ÁUDIO.


Uma das antigas são os CD's com substrato de ouro 24K. Coisa especial
para audiófilos. O cara gastava mais para comprar porque afinal o ouro
deve permitir uma leitura muito mais fiel, certo? ERRADO.
A informação de um CD não está no metal, mas no plástico. O metal é
apenas um espelho. No plástico existe uma sucessão de buracos
microscópicos. Quando o laser reflete onde não há buraco, retorna "em
foco". Se há buraco, retorna "fora de foco".
Ou seja, como o metal é um espelho, e como a informação é 1 ou 0 e
portanto não depende totalmente da reflectividade do metal, tanto faz
que o metal seja ouro ou alumínio. Basta ser um bom refletor E isso
ambos são.
A única característica vantajosa do ouro seria sua excelente resistência
à oxidação, mas como o metal fica selado dentro do plástico, sem
contato com o ar, isso não importa.

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56) SCARLETT JOHANSSON E O MP3.


Alguns amigos já me mandaram um famoso post onde Scarlett aparece
sem maquiagem como uma música sem mixar, maquiada como
mixada, super linda como masterizada e toda pixelada como mp3.
A piada é engraçada mas me levou a pensar - que mania chata essa -
numa analogia mais real. Por exemplo, se o mp3 fosse o pixelamento (e
na verdade em imagem até é), eu ainda reconheceria a Scarlett
perfeitamente.
Então aí vai minha versão mp3 da Scarlett. Imagine que vc conseguiu
um encontro com ela. Vão sair pra jantar. Música masterizada é levar a
Scarlett e pronto. Mas pense bem, para simplesmente sair pra jantar, o
que te preocupa é a pele da Scarlett, o cabelo, os olhos, a boca, a voz,
o cérebro (sim meus amigos, o cérebro!).
Mas para um jantar, pra quê vc está levando além disso tudo o fígado,
o baço, os intestinos, o pâncreas, a bexiga, a traquéia, laringe, esôfago,
pleura, vesícula, ovários ? (opa, melhor deixar os ovários)
- Nossa, Scarlett, esse seu apêndice te dá um toque de charme
irresistível!
Dá pra entender a analogia? Se a Scarlett funcionasse sem isso tudo
que está lá dentro, se fosse pra sair e ter uma noite bacana, seria o
suficiente. O mp3 é isso. Embora não te dê o produto completo, te
apresenta o suficiente pra vc ainda receber a informação que faz a
diferença.
P.S. - antes que os superficiais me critiquem, isso aqui é uma analogia.
Ninguém aqui está reduzindo um ser humano a um mero conjunto de
órgãos, ok? Senso de humor, galera.

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57) NOVA TECNOLOGIA DE CORDAS DE GUITARRA


Desenvolvidas pelo Dr. Jonathan Kemp, titular de Tecnologia Musical do
Music Centre da Universidade de St. Andrews, as novas cordas
prometem manter os intervalos harmônicos durante a ação da
alavanca de trêmolo (whammy bar) de guitarras.
O assunto é tratado no paper “The Physics of Unwound and Wound
Strings on the Electric Guitar Applied to the Pitch Intervals Produced by
Tremolo/Vibrato Arm Systems”.
http://journals.plos.org/plosone/article…
As novas cordas permitem que movimentos equivalentes da alavanca
provoquem a mesma diferença de pitch nas cordas. Isso não é o que
acontece nas cordas G, D, A e E. A sensibilidade otimizada não
beneficia apenas usuários de alavanca, pois permite que agora não é
mais difícil de se executar um bend na corda D do que nas suas vizinhas,
e que a E grave não sobe mais de afinação do que o resto das cordas
quando tocada com mais intensidade. A dependência da afinação
também fica reduzida.
Outra vantagem é que a construção é tão barata quanto a das cordas
tradicionais e não exige mudanças no instrumento.

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58) COMO REALMENTE FUNCIONA UM EMT140


Em vez de eu ficar mostrando o que cada botão do plugin faz ( o que
vc poderia descobrir sozinho com o manual), por que não vemos como
o equipamento original funciona?
Vídeo simples e direto ao ponto. Abaixo a tradução do que ele fala:
"Olá, eu sou Dan Dietrich , do Wall toWall Recording, em Chicago, e
hoje nós vamos falar sobre o EMT140 Plate Reverb.
Eis como ele funciona. Vc manda um sinal seco a partir da sala de
controle via ou um Aux Send de seu console analógico ou uma
interface de seu DAW. Ele vem através de tie lines e entra no Driver
Amplifier do EMT , que amplifica o sinal e o envia para a bobina que
está no meio da placa de metal. Sobre a bobina fica um ímã
permanente, e então o que você tem ali é basicamente um altofalante
onde em vez de um cone de papel você tem a placa.
Agora precisamos enviar o sinal processado de volta para a sala de
controle , o que acontece via os dois captadores do EMT, que são
conectados a um amplificador que dá ganho no sinal e o balanceia.
Para alterar o tempo de reverb do EMT, você move esse amorteceedor
para mais perto ou mais longe da placa. Mais longe... você tem um
temo de reverb longo, de 4 a 5 segundos e ao mover para perto, você
tem tempos mais curtos.
Obrigado por assistir o vídeo a respeito do EMT 140 Plate Reverb..."

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59) DEZ DICAS PARA MELHORAR SUA MIXAGEM


1 – Opinião – tenha sempre uma;
O mais importante em uma mixagem é ter a habilidade de sempre se
ter uma opinião a respeito das coisas. “Gosto disso ou não gosto”. É isso
o que toca uma mix e é isso o que passa confiança ao cliente.
2 – Aprenda com tudo o que fizer;
O objetivo é trabalhar melhor em menos tempo. É isso o que o cliente
quer: rapidez e qualidade. Se vc tiver que começar do zero todo dia,
isso vai ficar difícil;
3 – Estabeleça uma memória de volume;
O volume de uma mix é essencial para a qualidade. Demais é ruim e de
menos, também. A melhor maneira de se manter um volume estável é
se desenvolver uma memória de volume. Ou seja, acostumar-se com
um certo volume da monitoração e trabalhar a maior parte do tempo
com ele.
4 – Não tenha medo de errar – esteja pronto para começar de novo;
Errar é totalmente permitido, desde que se aprenda com os erros. Aliás,
saber reconhecer que algo não deu certo é uma virtude.
5 – Escolha as ferramentas pelo objetivo – não inverta a ordem;
Evite o processo de primeiro pensar em um plugin e depois tentar
encaixá-lo de todas as formas. Geralmente dá errado. Experimente
partir de algo que já deu certo em outras mixes, e a partir daí, mude ou
não.
6 – O som mais útil não é o mais bonito;
Solar cada canal e deixar o som bem bonito não faz com que ao abrir
todos, a soma esteja boa. Uma mix é uma soma do som mais útil de
cada canal, e não o mais bonito.
7 – Pense daqui a seis meses;
Seja claro em sua mix. Nomeie corretamente os tracks. Pense sempre
que se você abrir sua mix daqui a seis meses, deve ser capaz de
retomá-la.
8 – Não tenha vergonha de usar presets e templates;
Coisas que já deram certo, podem continuar ajudando. Equalizações
que já funcionaram em um kit de bateria podem servir para o mesmo kit
em outra música. Use templates e não tenha vergonha de usar presets,
ou pelo menos de partir deles.
9 – Não experimente demais nem de menos;
Uma mix cujo resultado é interessante provavelmente possui um certo
grau de experimentação. Porém não deixe que a vontade de
experimentar comprometa o prazo ou o desenvolvimento do resultado.

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Experimentação é sempre bem vinda, e saber quando parar de


experimentar também é.
10 - Tenha coragem de acabar.
Existe uma enorme chance de o prazo acabar antes da mix. Isso quer
dizer que vc deve acabar mesmo não estando 100% feliz? É claro que
não. O importante é que você estabeleça objetivos que consiga
alcançar. O segredo em terminar uma mix realizado está não só na
habilidade de fazê-la, mas também na capacidade de prever o que é
possível fazer. Já vi um monte de gente que empaca numa mix porque
o problema está na verdade no arranjo e na gravação/execução.

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60) CANTINHO DO ABSURDO


O áudio tem duas crueldades. De um lado, software é uma coisa que
parece fácil de projetar, então muita gente acaba menosprezando. Do
outro, não existe formação absolutamente necessária para se trabalhar
com áudio/música usando essas tecnologias (e tem excelentes
profissionais que estão nesse caso, felizmente).
O cara ouve um monte de coisas no youtube, ou faz associações
equivocadas em leituras e daí passa a afirmar muita coisa absurda.
Por exemplo, esse caso do "Não existe nada mais rápido que a luz,
então uso um compressor ótico" merecia um prêmio.
Ou o caso de "não gosto de mantar meu áudio pela internet, porque
acho que isso muda o som". Isso revela uma ignorância até ingênua de
como se passa a comunicação de dados pela rede. Será que os
engenheiros são um bando de preguiçosos incompetentes que não se
preocupam com a segurança do que transmitem? Será que os bilhões
de dólares que circulam pela internet financeira ficam à mercê de
serem "alterados" no caminho? N.Sra. do Checksum, valei-me!
Será que o Pércio posta uma foto no Instagram e o que vai pra lá é a
imagem da Pernitta?

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61) Equipamentos Mega-caros? Pra quê?


A gente se envolve com tecnologia e música, e acaba se
entusiasmando com o progresso. O problema é quando a gente se
deixa levar pela coisa. Uma das justificativas que mais ouço para o uso
de altas taxas de amostragem é "comparei com cuidado e consigo
ouvir a diferença". Até que ponto se gastar o dobro da quantidade de
dados e só poder tocar a metade dos canais (fora distorções e não-
linearidades) justifica, aí é que a coisa pega.
O music business - sim, meus amigos, este é o objeto da enorme maioria
de quem grava e reproduz - vive de: Muitas pessoas ouvindo e
querendo ouvir. Infelizmente para alguns, o fato de um grupo seletíssimo
de poucos felizardos poder ouvir sutilezas sonoras não sustenta artista
nenhum.
Quando alguém se vangloria de ter um equipamento que quase
ninguém tem, ou ouvir com mais fidelidade do que todo mundo, está
em um enorme exercício de auto promoção.
"Eu tenho uma gravação da Orquestra de Cleveland com o Lorin
Maazel que ninguém tem!!!" Pobre da Orquesta de Cleveland. "Com
este amp de fone eu ouço detalhes de Kind of Blue que ninguém
ouve!!". Nem o Miles ouviu. Será que ele ia gostar disso?
Não se trata de menosprezar a qualidade ou de se contentar com
pouco. É apenas uma questão de foco. Desde que o mundo é mundo
(ou pelo menos desde 1876), a gente produz música pra que atinja da
melhor maneira o maior número de pessoas. O caminho do meio - a
melhor tecnologia possível que possa chegar a mais gente - é
tranquilamente a melhor opção. Quando o áudio digital acabou com o
chiado, os arranhões e os discos "pulando", ninguém nem reparou que
não tinha mais o "calor", a "envolvência", ou qualquer outro termo
obscuro. Quando as pessoas começaram a não precisar mais de
equipamento enorme e caro pra ter qualidade de reprodução, todo o
resto passou a não fazer diferença.
Afinal, se você, músico ou técnico, tivesse que escolher, iria preferir que
seu trabalho fosse ouvido por 100 "audiófilos" ou 100.000 "populares"?
Provavelmente a Sennheiser precisa do marketing de um fone de
350,000,00 , mas paga as contas com os fones de 35,00.

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62) O Compressor Sou Eu?


Algum tempo atrás escrevi um post em que afirmava que na verdade
nós é que somos os equalizadores, porque qualquer que seja a
ferramenta (hardware ou software), nós é que dizemos quando o som
está bom ou não. Se bem que alguns fabricantes de plugins vêm
insistindo em tentar fazer isso pra nós automaticamente - o que já é um
outro assunto.
Ontem a Softube lançou um email onde afirmava que na verdade nós
podemos ser interpretados como um compressor, ou, olhando às
avessas, o compressor pode ser entendido como a automatização de
um processo humano.
Assim, todo compressor possui pelo menos os três blocos básicos: o
DETECTOR, o COMPARADOR e o REDUTOR DE GANHO. No caso da
gente, o detector são os ouvidos, o comparador é o cérebro e o redutor
de ganho são os dedos no fader. Pensando bem, é totalmente
verdade.

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63) Cuidado com o que aprende!


Ontem um grande amigo me alertou para um fato importante a
respeito de uma de minhas "cláusulas pétreas" em meus livros: o
conselho de "aprender com tudo o que se faz".
Essa política é boa mas exige um certo cuidado. Como ele bem
salientou, ao mesmo tempo em que se procura aplicar o que já vimos
que deu certo, não podemos incorrer no erro gravíssimo de achar que
isso vai dar certo sempre.
Ele cita o caso de um técnico que descobriu como foi benéfico usar
compressão paralela em uma certa bateria, e a partir daí começou a
usar isso em todas as baterias como condição inicial.
Esse é um procedimento potencialmente perigoso. Acho que mais do
que tudo, a lição que precisamos aprender quando algo dá certo , é
que isso pode ser tentado em outros casos. Achar que isso é a solução
para tudo, não só é perigoso, mas pouco esperto.
Daqui pra frente, sempre que eu postular "aprenda com tudo o que
faz", vou fazer a ressalva: "e veja se essa solução se aplica nos próximos
casos".

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64) Áudio Não Tem Muita Lógica


Pois bem, publiquei aqui duas mixes, uma de 1960 e outra de 1997. Além
dos quase quarenta anos que as separam, existe obviamente uma
gigantesca diferença técnica.
Independente da questão artística, o som que se conseguia nos anos
1960 era bastante pobre (excepcionalmente, o som de violão dos
Shadows é muito interessante). O bumbo é quase inaudível, o baixo não
tem graves, e etc. Deixando qualquer aspecto de "gosto" de lado, se
analisarmos friamente, a gravação dos anos 1990 supera em muito.
Maaaassss, os fabricantes investem pesado em simulações de
equipamentos "clássicos" que operavam na década de 1960, exaltando
seu som "superior". Como assim? Tem lógica isso?

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65) DRIVE (distorção) DE CONSOLE OU "Corrigindo problemas que não


existem"
Uma das aplicações mais na moda no mundo in-the-box são os
simuladores de drive de consoles. Já vimos aqui algumas vezes que esse
tipo de processamento simplesmente acrescenta distorção - ou seja,
aumento do conteúdo harmônico.
Obviamente isso nem sempre é ruim. Na verdade pode ser muito bom
quando se precisa de que um instrumento ganhe destaque em uma
mix, devido à eterna competição dos mascaramentos.
O que muita gente não se dá conta é que esse processo era muito mais
útil nos tempos pré-digitais, porque a fita analógica e mais toda a
eletrônica que se colocava no meio do caminho acabavam
empobrecendo a resposta em frequência das coisas. Não é à toa que
criaram o Aphex Aural Exciter (que nada mais era que um distorcedor).
Então, usar drive de consoles pode ser bem legal, desde que se tenha
em mente que a gente não está mais tentando corrigir uma deficiência
dos métodos de gravação. Estamos apenas buscando uma sonoridade
- que pode ser útil ou não.
Pra quem já testou esse tipo de plug-in e não notou diferença nenhuma,
a não ser em uso extremo, nada de pânico. É isso mesmo. Tem tanta
coisa envolvida que o processamento é bem sutil, ficando evidente só
quando se pesa a mão.
Bom, tem o caso de violão com cordas velhas, peles de bateria
cansadas e afins, que acabam ganhando com uns harmônicos a mais,
mas convenhamos que aí se trata de apagar incêndio, e não de se dar
um calorzinho.

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66) QUAL O EQUIPAMENTO MAIS DIFÍCIL DE TRABALHAR?


Ontem um colega nosso trouxe um problema muito comum aqui.
"Quando mixava pra mim e pra minha banda, minhas mixes eram
ótimas e todo mundo adorava Agora que mixo pra fora, elas pioraram".
Amigo, você provavelmente está enfrentando o equipamento mais
difícil de trabalhar: O CLIENTE. Você pode dominar os compressores,
equalizar como ninguém, achar uma sala incrível no reverb, mas se não
for craque em lidar com o Cliente, danou-se.
A gente tem que, antes de mais nada, entender a situação. O artista
rala muito pra conseguir uma verba, um repertório, e etc. Reúne todas
as esperanças e expectativas no trabalho, e a gente ao mixar é um dos
elementos mais importantes na concretização da coisa. A pressão
psicológica é mesmo enorme. E um bom mixador tem que saber bem
lidar com a situação.
O pior é que todos os clientes são diferentes, mas existem muitas coisas
em comum. Há desde os que não entendem nada e sabem disso até os
que entendem muito e não sabem. Talvez o pior seja o que pensa que
sabe. O cara faz um curso na Universidade Youtube e acha que
consegue ouvir quando a voz está "muito comprimida". Ou quando tem
muito 2K. Francamente, prefiro a pessoa que me diz que o som está
muito "gordo", ou "abafado". É mais fácil de entender do que um
diagnóstico errado.
Mas talvez o parâmetro mais difícil deste "equipamento" seja o Botão
"Cônjuge". Namorada, namorado, marido, melhor amiga e coisas do
gênero são muuuuito complicados. É comum a gente ouvir que "minha
amiga cantora achou a minha voz baixa". É claro que achou!!!!! Ela é
sua amiga!!! E é cantora!!!!
Pra encurtar uma história longa, em um paraíso dos mixadores, o Cliente
iria ouvir nossa mix e discutir coisas nobres como o tamanho da sala do
reverb. Na vida real a gente tem que ouvir que "ouvi a mix em um
monte de lugares..." . Como assim? Você ouve o Bruno Mars em um
monte de lugares e fica comparando? A gente trabalha anos em uma
profissão, tem um portfólio de milhares de músicas mixadas, e a NOSSA
opinião é a que menos vale! O que vale é soar bem no churrasco do
cunhado!

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67) SALVE O MEU SOM!


Frequentemente recebo contato de pessoas querendo uma
masterização e perguntando se uso equipamento analógico pra isso. A
minha resposta é sempre "Pra quê? ".
A realidade que está aí é a seguinte. Não há verba, há plugins e DAWs
de sobra que se pode "conseguir", e um monte de gente querendo
fazer seu som acontecer. Aí a pessoa grava do jeito que consegue,
com o equipamento que consegue, e mixa do jeito que pode. É isso ou
nada, então é melhor fazer do que ficar se lamentando.
O problema é achar que um bendito equipamento analógico na última
etapa vai salvar as coisas e deixar o som mais ... (coloque o adjetivo
que mais gostar - quente, profissa, enérgico, pesado, etc).
Se foi tudo feito em ambiente digital, manter-se por aí é provavelmente
a decisão mais coerente. Antes de mais nada, inserir um equipamento
analógico no processo significa realizar uma conversão D/A e uma
outra A/D, o que pode mudar mais as coisas do que o esperado, mas as
pessoas parecem esquecer isso.
Se a mídia final é um LP, até acho viável, já que no final haverá mesmo
uma conversão. Mas pra streaming ou CD, não vejo vantagem
nenhuma.
Quando trabalhava no AR Studio, em 1996, constantemente chegava
material gravado em ADAT Cara-Preta pra gente "só passar pela fita
analógica e voltar pro ADAT", pra "dar uma esquentada". Claro que não
rolava.
Só pra ilustrar, o CD "Quanta Live" do Gil - Grammy Americano de World
Music - foi gravado e mixado em ADAT no estúdio B do AR e não teve
fita analógica em momento nenhum. O único "equipamento" analógico
usado foi o Genial Engenheiro Paulo Junqueiro

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68) Áudio na Contramão - Os Meios e os Fins


Em toda a engenharia a simplicidade é uma virtude. Chegar ao mesmo
objetivo com menos recursos é prova de extrema habilidade. Mas no
áudio parece que não.
Pra quem quiser levantar a bola de que música é arte e não
engenharia, preciso lembrar que música é matemática o tempo todo
(harmonia é isso), mesmo que não pareça. E áudio é justamente o uso
da engenharia em benefício da arte. Então objetividade e simplicidade
deveriam ser estimulados.
Por exemplo, tem engenheiros famosos que até registram como marca
os seus métodos mirabolantes de trabalhar . Um cara usa três
compressores multibanda mais três equalizadores ao mesmo tempo na
voz e isso dá o maior prestígio no youtube. Daí você ouve o resultado na
música e a voz é apenas uma voz bem colocada de maneira
competente. Ou seja, certamente ele conseguiria com menos recursos,
mas isso não ia dar buchicho.
A gente vai e acha uma equalização e uma compressão que
funcionam e é visto como pouco criativo.
O tempo todo o que vejo são as pessoas falando - corretamente - que
o que importa são os resultados. Mas na midia parece que o que
importa são os meios.

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69) Dunkirk: A Guerra e a Guerra


Enquanto o filme Dunkirk registra de uma maneira sui generis um
marcante episódio da Segunda Guerra Mundial, os merecidos Oscars
de Edição de Som e Mixagem trazem uma curiosa observação.
Na tela, desenrola-se uma guerra, e ao mesmo tempo no áudio,
destaca-se uma outra: a do Loudness. O som do filme, inclusive a
minimalista trilha de Hans Zimmer (sem temas), se caracteriza por uma
faixa dinâmica elevadíssima, como se observa já na primeira cena -
onde o som suave de passos contrasta com tiros ensurdecedores. E ao
longo de toda a história, o que ouvimos não é a massa claustrofóbica e
angustiante de Saving Private Ryan, por exemplo, mas o eterno
contraste entre silêncios e impactos. Entre esses dois extremos, nas
cenas o som se comporta quase como um "leitmotif", como um drone
sonoro. Ora o ruído do motor de um spitfire, ora o barulho do mar.
O som de Dunkirk é uma transposição da angústica dos personagens,
que lembra a linguagem de Terrence Malik. Esse jeito de ver as coisas
certamente não agrada todo mundo, mas pra nós do áudio, a coisa é
um pouco diferente. O que está nesse sound design não só é uma
perfeita interpretação da proposta do diretor Nolan, mas um fruto dos
tempos modernos de nossa área.
Mesmo que o cinema nunca tenha sido significativamente afetado
pela guerra do loudness, na Batalha de Dunkirk, a dinâmica foi o
grande vencedor.

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70) CUIDADO COM VR !


Como a discussão está muito boa, por que não apimentá-la mais?
Pra quem acha que fone não serve pra se chegar a um resultado,
principalmente por causa da espacialidade e ambiência, preciso fazer
um alerta. Ao que tudo indica os sistemas de Realidade Virtual vão
crescer cada vez mais, e eles são essencialmente pra se ouvir de fones.
Nesse momento, a imagem está dominando as atenções, e a gente vê
um monte de vídeos (inclusive clipes oficiais) onde a interação com a
imagem é de 360 graus, mas onde o som continua chapado em dois
canais à frente.
Estamos com a oportunidade raríssima de estabelecer novos
parâmetros, só comparável ao que aconteceu com o aparecimento
do estéreo no fim dos anos 1950. Ainda não se sabe muito bem o que
fazer com o áudio, e cabe a nós participar dessa nova situação
técnica.
Embora o Ambisonics sirva pra se monitorar de vários modos, devido aos
óculos de VR, parece que fones tendem a ser mais importantes até do
que já são hoje.
Por isso, galera, é bom ficar atento e no mínimo treinar como se
conseguir resultados de fones. E pra quem acha que hoje isso é ainda
uma bizarrice, lembro das primeiras mixes em estéreo, com a banda de
um lado e cantor do outro...

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71) NINGUÉM VAI SABER QUE VOCÊ EXISTE


Já existiu uma época em que não importava muito a quem comprava
um disco quem tinha gravado (nem o conceito de mixagem como a
conhecemos existia).
Por exemplo, na foto a gente pode ver a contracapa de um dos
maiores discos de todos os tempos, "Kind of Blue". É uma gravação
tecnicamente fantástica - além de artisticamente espetacular - mas a
gente não tinha o direito de saber quem gravou.
Hoje se sabe que o engenheiro foi Fred Plaut (1907-1985), um mega
profissional da Columbia nas décadas de 40, 50 e 60. Mas lá em 1959,
quando o álbum foi gravado, as pessoas provavelmente não prestavam
atenção nisso.
Claro que a partir dos anos 70 a história mudou, mas com o declínio do
conceito de álbum a partir dos 2010 e a emergênca de novas formas
de ouvir música - leia-se: Streaming e Youtube - nós profissionais de
áudio estamos enfrentando um problema ao mesmo tempo direto e
reverso.
Enquanto o papel da tecnologia nas gravações ganha cada vez mais
importância, ao mesmo tempo os modos de distribuição de música
simplesmente ignoram a ficha técnica.
A gente ouve música no Spotify e no Youtube e não tem a menor ideia
de quem gravou/mixou/masterizou. Com sorte sabe quem tocou.
Obviamente dá pra procurar saber, mas exige uma iniciativa do
ouvinte.
Pergunto-me se já não seria a hora de começarmos a dar uma
valorizada em tantos bons profissionais e lutar pra que sites de streaming
de áudio e vídeo (pelo menos os oficiais) apresentassem as fichas
técnicas? O Spotify agora começou a oferecer essa possibilidade, mas
que eu saiba, apenas de autor, produtor e intérprete. Que seja apenas
o começo.
http://variety.com/…/spotify-adds-songwriter-and-producer-…/

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72) COMO É O SUPORTE DA AVID


Quero compartilhar com os colegas minha experiência. Eu tinha
instalado em minha máquina o PT12.8 e por razões de compatibilidade,
o PT10. Tentei instalar o PT2018 e a Avid reclamava que eu não tinha
autorização no iLok. Mas eu tenho o Pro Tools Perpetual License.
Pois bem, resolvi testar o atendimento da Avid. A técnica Arianne me
atendeu por email, me dando várias sugestões, e como é praxe em
suporte, partiu das coisas mais óbvias, tipo ressincronizar o iLok. Depois
de um vai-e-vem de mensagens, várias delas iniciadas pela própria
Arianne, sem eu ter pedido - o que foi surpreendentemente bom - ela
pediu para comandar remotamente minha máquina.
Como eram 6:20 da manhã, pedi para tentarmos à noite. Ela prometeu
que pediria a outro técnico para assumir. Hum, sei.
Pior que rolou. Dessa vez foi a Margarita que me atendeu (aliás, que me
procurou). Assumiu o comando de meu computador e - como era de se
esperar - fez exatamente o que a outra tinha sugerido. E achou meu PT
10, que está rodando, e falou logo que estava resolvido. Antes que ela
desligasse, falei que não era esse o problema, e que não conseguia
instalar o 2018. Ela olhou meu desktop (detalhe: eu disse que o
instalador estava no meu desktop e ela perguntou se era o desktop do
meu computador. Aí eu vi que meu inglês deve ser bem ruim) e viu que
eu tinha o PT12.8 instalado.
Ela então corretamente diagnosticou que eu tinha que desinstalar o
12.8 para a licensa ficar liberada pro 2018. Ora, toda essa ladainha teria
sido evitada se a Avid dissesse nas instruções de download do 2018 que
eu tinha de desinstalar o 12.8 - o que aliás o instalador podia fazer
sozinho.
Disse à Margarita que o problema devia ser esse mesmo e que eu
poderia assumir daí pra frente. Sem nem se dar o trabalho de responder
ela abortou a conexão e me mandou pra avaliação do atendimento,
encerrando o caso.
Veredito: o atendimento da Avid funciona e chega a ser insistente pra
nos atender. Eles funcionam 24horas e atendem bem, embora eles
pudessem ter economizado uma grana e eu um monte de horas se eles
tivessem explcado melhor as coisas.
No final, só uma coisa incomodou: Margarita se foi sem nem ao menos
se despedir. Nem um "bye". A minha latinidade ficou frustrada, mas
convenhamos, apesar do nome latino, Margarita foi como o drink
homônimo: eficiente e gelada, mas que resolveu, resolveu.

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73) SLATE DIGITAL VMS - O TESTE


Há alguns meses, a Gomus adquiriu aqui o VMS da Slate Digital. É um
simulador de microfones que proclama sua perfeita recriação de
clássicos do mundo principalmente dos vocais. O sistema consiste em 3
partes. O microfone padrão, o pré-amp associado e o plug-in simulador.
Fizemos vários testes aqui logo de início, inclusive usando outros prés e
trocando o microfone, e o resultado foi bem produtivo.
Quando se começa a usá-lo, a gente espera diferenças absurdas entre
o som dos microfones simulados, mas não é bem assim. A coisa é um
pouco mais sutil, embora não menos verdadeira. Com um pouco de
pesquisa, o sistema se mostrou muito útil e os resultados impressionaram,
principalmente se levarmos em conta o custo.
Porém, uma coisa que ainda não tinha feito era um teste comparativo
mais cruel, usando como fonte um ruído rosa. É isso o que divido aqui
com os colegas. Ele foi extremamente elucidativo. Quando a gente
testa com alguma voz ou instrumento, entram em cena um monte de
outras variáveis, que dificultam um pouco o julgamento puro e simples,
e nada como um impessoal ruído rosa pra equilibrar as coisas.
Este teste , embora artisiticamente inexpressivo, nos ajudou a identificar
as características sonoras da simulação em si, e de cada modelo
individualmente, facilitando muito a identificação e futuras escolhas no
trabalho.
No link, a sessão de Pro Tools 12 usada e os áudios, que podem ser lidos
por qualquer DAW. Temos o ruído rosa original - o mesmo para todas as
simulações, o ruído captado pelo Mic+pré padrões do sistema, e o
resultado de cada modelo do microfone. São só 10 segundos de cada,
e por isso recomendo que se ouça em loop algumas vezes cada áudio
para depois comparar.
É impressionante como fica fácil identificar a sonoridade de cada
microfone, e com poucas audições a gente aqui já conseguia
identificar o modelo do mic pelo timbre! É um ótimo exercício!!
https://we.tl/tn4wOLSheU
Agradecimentos à Gomus Music e a Bruno Pierantoni .

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74) MIXANDO DE FONES


Apenas para deixar claro meu ponto de vista, e convidando todo
mundo a deixar os seus:
1) Mixar com caixas é uma experiência insuperável, mas não é mais
uma recriação do ambiente médio do ouvinte - que é o nosso objetivo
(pelo menos de quem quer ser ouvido pelo maior número de pessoas);
2) É possível se obter mixes que soem bem em fones e caixas, mixando
em fones ou em caixas. Essa ideia de que uma mix em caixas soa bem
nos fones e o contrário não, vem do fato de que a pessoa foi treinada e
está acostumada com as caixas. Aí realmente isso acontece. Se houver
treinamento em mixar de fones, dá pra se conseguir excelentes
resultados em ambos;
3) Da mesma forma que caixas melhores facilitam a mixar melhor, é
preciso bons fones para se mixar bem. Quanto maior a qualidade dos
fones, mais fácil trabalhar;
4) Em nenhum momento eu sugeri o abandono das caixas. O que
defendo com unhas e dentes é que hoje não é aceitável se entregar
uma mix que soe bem nas caixas e não soe tão bem nos fones. Ou seja,
onde quer que se mixe, temos que nos preocupar com a audição de
fones.
Atenção: esse tipo de coisa não é novidade. Se você vai mixar para LP
(vinil), tem que se preocupar muito com a coerência de fase. A
espacialidade dos graves em estéreo pode estar linda, mas se eles não
estiverem em fase o tempo todo seu LP não vai rolar. Ou seja, adequar-
se às mídias sempre foi preocupação.
E por último, pedindo desculpas por me alongar, mixo em caixas todos
os dias, e adoro isso. Mas também trabalho tranquilamente de fones. Foi
preciso treino, mas com bom equipamento e mente aberta, rola.

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75) Coitados dos Dinâmicos


Uma pequena polêmica - sempre dentro de nossos rigorosos parâmetros
de etiqueta - tem movimentado o grupo. Como é que eu, enquanto
autor de livro sobre microfonação - Guia de Microfonação - afirmo
categoricamente que dinâmico no violão eu nem penso em usar? Que
postura radical é essa?
Bom, levando em conta a postura mais eticamente correta, eu poderia
ter afirmado que "na maior parte dos casos, não se indica o uso de mics
dinâmicos para o violão, principalmente o de nylon". Felizmente, porém,
o movimento aqui no grupo tem sido intenso, e como intervenho
apenas nos meus minutos vagos entre um bounce e outro, acabei
decidindo resumir. Polêmica armada kkkk.
Vamos então aos fatos, com a devida justificativa técnica. Instrumentos
como o violão, possuem uma importante contribuição dos harmônicos
altos na definição e na riqueza de seu timbre. Nos microfones
condensadores, a informação acústica só precisa colocar em
movimento o diafragma, porque ele está suspenso em um colchão de
ar. Isso faz esses microfones serem mais sensíveis a esse tipo de
harmônicos, que geralmente possuem baixa amplitude.
Os de diafragma pequeno costumam ser ainda mais sensíveis e mais
fiéis, porque além de terem menos massa, tendem a oscilar de modo
mais uniforme para esses comprimentos de onda. Os de diafragma
grande, por sua vez, possuem características tímbricas que acabam os
colocando também como opções muito adequadas.
Agora vejamos os dinâmicos de bobina móvel. Como o nome já diz, o
diafragma está colado a uma bobina de fio, ficando com mais massa.
Ou seja, os pobres dos harmônicos altos têm que fazer um grande
esforço pra sensibilizá-lo. Como resultado, eles não são muito bem
captados. No caso dos dinâmicos de fita, por suas características físicas
e elétricas, eles favorecem as frequências baixas, e a insensibilidade aos
harmônicos mais altos também é significativa.
Isso tudo torna os dinâmicos muito menos indicados para captar violões.
Porém, existem situações em que podem dar resultados, quando se
quer uma sonoridade menos rica, ou quando o músico toca bem forte,
e por aí vai.
Então, amigos, nem penso em usar dinâmicos no violão, mas não acho
um erro usá-los. Se for o som que você estiver buscando, vá em frente e
boas gravações!!!

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76) Convolução, o processamento do século 21


Captando o comportamento de reverbs

Já começam a aparecer no mercado processadores que recriam


ambientes e equipamentos através do processo chamado convolução.
Tudo indica que este novo ramo de equipamentos será o grande
atrativo dos próximos anos em áudio. Vamos então conhecer um
pouco mais deste assunto.

Áudio digital
Vamos recordar rapidamente como se obtém áudio digital a partir de
uma fonte analógica. Para convertermos um sinal analógico, fazemos
periodicamente uma medida de sua amplitude e anotamos seu valor.
Esta medição é chamada de amostra (sample) e é feita de acordo
com a taxa de amostragem (sampling rate). Se usamos a taxa de
amostragem de 44.100Hz, a cada segundo são lidas 44.100 amostras do
sinal. Cada amostra é convertida para um número binário
(representado por uma série de zeros e uns) e armazenada ou
transmitida, de acordo com o caso. Para converter-se de volta ao
analógico, lemos cada um destes valores, convertendo-os para
amplitudes na mesma taxa em que foram escritos (44.100 vezes por
segundo). Passamos então o sinal por um filtro passa-baixas e obtemos
a forma de onda original.

A precisão de cada medida de amplitude amostrada depende do


número de bits usados para escrever o valor binário resultante. Em um
CD, cada amostra é representada por um número de 16 bits, podendo
©2019 by Fábio Henriques
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ser qualquer valor entre 0 e 65.535 (ou -32.768 e 32.767). Em sistemas de


24 bits, os valores podem ir de 0 a 16.777.215 (ou -8.388.608 e 8.388.607),
o que já nos indica que quanto maior o número de bits usados, maior a
precisão com que estas medidas serão feitas e, conseqüentemente,
maior a fidelidade do sinal armazenado. De fato, o número de bits
acaba determinando a faixa dinâmica do sistema (relação sinal/ruído).
Para cada bit temos aproximadamente 6dB de ganho na faixa
dinâmica. Em um CD, portanto, temos uma faixa teórica de 96dB; para
24 bits temos espantosos 144dB (maior que a faixa dinâmica do ouvido
humano!).

Os reverbs e sua complexidade


Vamos usar os reverbs para demonstrar o mecanismo da convolução, já
que eles são um exemplo típico na aplicação desse processo.
Antes de mais nada, vejamos o que é exatamente reverb. Quando
estamos em uma sala na presença de uma fonte sonora, o som chega
a nossos ouvidos por três caminhos: primeiro chega o som direto, que
vem diretamente da fonte; a seguir as primeiras reflexões (early
reflections), resultantes da reflexão do som em uma ou poucas
superfícies; depois, resultando de muitas reflexões e de reflexões das
reflexões, começam a chegar uma série de sons, que se superpõem de
tal forma que não conseguimos mais distingui-los.

Assim, passamos a percebê-los como um som contínuo - um


prolongamento do som original. Este é chamado de reverberação
(para encurtar: reverb). As características do comportamento de um
som dentro da sala vão depender da distribuição desse espaço, dos
materiais de que são feitas as paredes e de outras superfícies refletoras
©2019 by Fábio Henriques
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existentes. Geralmente, a duração da reverberação e sua


característica de freqüência dependem da sala.

Vale a pena lembrar que delay é diferente de eco, que é diferente de


reverb. Chamamos de eco uma repetição nítida de um som e de delay
o tempo entre o som original e esta repetição ou entre ecos sucessivos.
No reverb, as repetições não são nítidas e são percebidas como um
som contínuo. Para completar, chamamos ainda de pre-delay o tempo
entre o som original e a primeira reflexão integrante da reverberação
ocorrida, fator fortemente influenciado pelo tamanho da sala e pela
posição da fonte dentro dela. Podemos admitir que as primeiras
reflexões em uma sala são como ecos com delays muito curtos entre si
e que a reverberação é a combinação de ecos tão densos e delays
tão confusamente espaçados, que acabamos entendendo-os como
um som contínuo.
Pelo que vimos até aqui, embora gerar ecos com equipamentos seja
mais ou menos simples, recriar reverbs parece ser uma tarefa bem
complicada, já que devemos gerar muitas repetições randomicamente
(quase aleatoriamente) espaçadas no tempo.

Reverbs analógicos
A recriação de reverbs era uma das tarefas mais ingratas para os
sistemas analógicos. Se por um lado os ecos eram relativamente simples
(a própria máquina analógica já fornecia o famoso tape echo), a
complexidade envolvida na simulação de reverberações nos obrigava
a processos curiosos.
Antes dos reverbs digitais, a única chance era usar um transdutor
©2019 by Fábio Henriques
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elétrico'acústico excitando um meio reverberante. O resultado era


captado por um transdutor acústico 'elétrico. O caso mais simples é o
das câmaras de eco - salas especialmente projetadas para receber
alto-falantes cujo som era captado por microfones. Para obter reverb, o
engenheiro mandava o som para o falante e recebia o som vindo dos
microfones. É claro que ajustar os parâmetros deste reverb significava
mexer na posição dos microfones na câmara ou nas superfícies das
paredes, cobrindo-as ou descobrindo-as conforme a necessidade.
Outro caso interessante era o dos plates, cujo elemento reverberante
era uma placa metálica colocada em vibração por um transdutor. O
reverb era captado por outro transdutor, colocado a uma certa
distância ao longo da placa. Esta placa poderia ter grandes dimensões,
sendo instalada muitas vezes sobre o teto dos estúdios. Podiam também
ser usadas molas como elementos reverberantes, tais como nos reverbs
de amplificadores de guitarra.
Os sons obtidos com os equipamentos acima, embora definitivamente
pouco realistas, acabaram sendo incorporados à sonoridade das
gravações, caindo no gosto dos engenheiros, dos músicos e do público.
Os plates particularmente são até hoje simulados pelos processadores
digitais, pela beleza do efeito que fornecem. Fidelidade a ambientes
verdadeiros, porém, é um outro assunto.

Reverbs digitais
A partir de 1978, aparecem os reverbs digitais, que na verdade
empregam um processo mais ou menos simples para criá-los.
Basicamente usam uma boa quantidade de delays e realimentações
para criar uma densa série de ecos que vão diminuindo de intensidade
no tempo. A qualidade dos reverbs está intimamente relacionada aos
algoritmos (software) que vão estabelecer os diferentes delays e
realimentações, além da própria topologia (o modo como são
©2019 by Fábio Henriques
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conectados os componentes) do equipamento.

Hoje em dia, os reverbs digitais utilizam os Processadores de Sinais


Digitais - DSPs (Digital Signal Processors) - para criar os reverbs. Para tal,
eles utilizam geradores de ecos. O caso mais simples é um atraso (delay)
que sofre realimentação e é re-atrasado, gerando um eco que se
repete e vai diminuindo de intensidade ao longo do tempo.
Sofisticando mais o projeto, combinam-se unidades de ecos em série e
paralelo com tempos tais que acabam simulando uma reverberação.
É claro que estes bloquinhos das figuras 5 e 6 representam trechos de
algoritmos (software) aplicados aos DSPs. É da qualidade destes
algoritmos que vai depender diretamente a qualidade do reverb
obtido.

Ao longo dos anos, o grau de sofisticação destes reverbs digitais tem


permitido a criação de sonoridades excepcionais, simulando os mais
variados tipos de ambientes, além da recriação de reverberadores
analógicos antigos (plates, molas e câmaras) com precisão. Porém,
quando se trata de uma emulação perfeita de ambientes existentes, os
reverbs digitais ainda não apresentam a fidelidade necessária.

Convolução e reverb
©2019 by Fábio Henriques
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Para recriarmos o som de uma sala exatamente como ele é, precisamos


modelar o comportamento desta sala, obtendo sua resposta para
todas as freqüências possíveis durante um certo tempo. Será que existe
um processo que permita justamente isto - saber como uma sala
responde a todas as freqüências durante um certo tempo? É aí que
entra a convolução.

Resposta ao impulso (Impulse Response-IR)


Quem já teve oportunidade de ver um técnico de som entrando em
uma sala desconhecida pôde observar que ele imediatamente
começa rodar pela sala a bater palmas de tempos em tempos,
intercalando com gritos de "Ah!" e "Êh!" . Não, não é uma cerimônia
religiosa para convocar bons espíritos para a gravação. O que ele está
fazendo é (mesmo sem saber) obter uma resposta ao impulso da sala
(aproximadamente).
Um impulso é um sinal de duração extremamente curto e amplitude
elevada. No caso ideal, o impulso é chamado Função Delta ( ) e
apresenta amplitude infinita para × = 0 e zero para qualquer outro valor
de x, sendo que a área sob ela é igual a 1. Conforme a figura 7.

Figura 7

Confuso, não? Mas já vamos desvendar este mistério. Pode-se imaginar


o impulso acima como um estalo de alto volume e curtíssima duração
(na verdade, duração infinitesimal). Pode-se provar que este impulso
carrega dentro dele todas as freqüências e todas com a mesma
energia. Quando submetemos uma sala a um som que é um impulso
ideal, estamos banhando a sala com todas as freqüências - todas com
a mesma energia. Se registrarmos o comportamento do som na sala a
partir do impulso, teremos o que se chama de Resposta ao Impulso
(Impulse Response - IR), que descreve o comportamento da sala ao
longo do tempo para qualquer freqüência. Assim, temos toda a
informação sobre a sala. Para que isto aconteça, a resposta da sala
deve ter uma característica linear e deve ser invariável no tempo.
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Como o reverb de uma sala é sempre o mesmo, independentemente


da hora em que se toca (desde que as paredes permaneçam em seu
lugar) a condição de invariância é atendida; quanto à linearidade,
vamos por hora admitir que também é satisfeita.

Figura 8 - Resposta ao impulso de uma sala

As más notícias
O que acabamos de ver é que, se formos capazes de produzir um som
com as características do impulso ideal em uma sala, e se conseguirmos
registrar o que acontece logo depois disso dentro da sala, teremos
definido completa e perfeitamente suas características de resposta. Em
outras palavras, sua ambiência, seu reverb. O problema é sempre o "se".
Primeiro, não se consegue produzir um impulso ideal, mas só
aproximações. Segundo, o impulso ideal possui todas as freqüências
dentro dele com igual energia, só que esta energia é infinitesimalmente
pequena, e na prática nosso gráfico da resposta teria valores baixos
demais. Mais adiante veremos como os engenheiros contornam estes
dois obstáculos.
Pode-se, por enquanto, admitir que o nosso impulso, na prática, é uma
batida de palma, uma descarga de centelha elétrica ou, quem sabe,
uma bombinha de festa junina. De fato, mede-se a característica
acústica de uma sala desta forma. A aproximação é suficiente para
estimarmos seu RT60 (tempo que o som na sala leva para cair 60dB
depois do impulso) e de que modo este decaimento ocorre. Mas, se
queremos recriar fielmente um ambiente através de um equipamento
de reverb, esta aproximação é insuficiente. Precisamos ser mais precisos.

Entra em cena o digital


Vamos imaginar que conseguimos as condições ideais e obtivemos
uma gravação da resposta ao impulso de uma sala. Depois, a
convertemos para digital. Teremos então registrado a IR através de uma
série de amostras consecutivas. Este será o nosso modelo digital da sala,
a sua Resposta ao Impulso. Temos então registrada uma série de
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informações que nos permitem recriar digitalmente a sala.


Para que entremos com o sinal de um instrumento neste recriador de
salas, e saiamos com o som do instrumento e mais a sala, devemos
efetuar entre eles a operação que chamamos convolução. Dizemos
que o sinal de saída é a convolução do sinal de entrada com a
resposta ao impulso da sala. Nos sistemas digitais, podemos obter a
convolução da seguinte forma: lembre que a IR da sala está
representada pela série de amostras resultantes de sua digitalização. Se
agora pegarmos cada amostra do som do instrumento, multiplicamos
por cada amostra da IR da sala e depois somarmos todos os valores
obtidos, teremos então efetuado a convolução.

Figura 9

Simples, não?
Simples, mas trabalhoso. Suponhamos que a IR de uma sala tem três
segundos de duração. Se vamos tocar uma nota com duração de um
segundo, teremos:
N = número de samples da IR = 3 × 44100 = 132.300 samples
M = número de samples do sinal de entrada = 1 × 44100 = 44100 samples
Cada sample do sinal de entrada será multiplicado por 132.300 samples
da IR. Portanto, teremos:
132.300 × 44100 = 5.834.430.000 de multiplicações
Depois, temos que somar todos os resultados obtidos, o que nos dá mais
5.834.430.000 somas para fazer.
Em resumo, tudo se resume a contas simples, mas são bilhões e bilhões
delas, e muito poder de processamento é necessário. Por isso, os
equipamentos digitais evitaram usar convoluções como forma de
processar os sinais porque não tinham velocidade e capacidade
suficiente. Depois partiram para o outro método já visto, que usa
múltiplos delays para criar ecos complexos, simulando reverberações.

Finalmente a convolução
Em 1999 já começava a haver tecnologia para produzir chips de DSP
com a capacidade de realizar o número necessário de operações em
tempo hábil de produzir equipamentos viáveis, mas ainda com certa
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dificuldade. No início deste ano, a sempre pioneira Sony anuncia sua


primeira unidade de reverb usando convolução, o DRE-S777.

O DRE-S777 chegou ao mercado no final de 1999 custando uns US$


6.500,00, oferecendo reverbs capturados a partir de salas reais. Os
dados destas salas vêm em CD-ROM, e precisam ser carregados no
equipamento, que possui drive próprio. As saídas podem ser em estéreo
ou em quatro canais. Usando super-DSPs com quase dez vezes a
capacidade dos usados na época, o equipamento permite a
convolução de 256 mil pontos, fornecendo decays de até 5.5 segundos.

Capturando salas
Lembram lá atrás, quando falamos sobre a dificuldade de se obter as
condições ideais para a captura da IR de uma sala? Vejamos como
foram ultrapassadas essas dificuldades.
Gravar um reverb não parece ser muito difícil, a não ser que se queira
usar o resultado para a convolução. Como já vimos, apesar do impulso
ideal conter todas as freqüências, suas amplitudes são infinitesimais e,
na prática, impossíveis de registrar. Aumentar a largura do impulso para
que ele contenha mais energia faz com que ele deixe de ter uma
resposta em freqüência uniforme.
Outro aspecto é a respeito da faixa dinâmica (e conseqüentemente da
relação sinal/ruído), que deve ser maior que a do sistema de
reprodução do som então capturado.
A solução dada pelos engenheiros da Sony foi a seguinte: em vez de
usar um impulso, eles usam uma varredura de freqüências (sinal senoidal
que começa no extremo mais grave e vai subindo até o mais agudo do
espectro) gerada por computador e reproduzida em um enorme PA de
extrema fidelidade, colocado no ambiente a ser capturado. O reverb
resultante é capturado por quatro microfones colocados em lugares
estratégicos da sala. As distâncias e os ângulos entre eles são
rigidamente determinados para, posteriormente, serem reproduzidos em
surround de quatro canais. A varredura de freqüências é então
executada e gravada 16 vezes.
As informações destas 16 gravações recebem um intenso tratamento
posterior em computador, que consiste primeiro em alinhá-las quanto à
fase. Como todas as medições têm coerência de fase, os valores se
somam, melhorando o nível final em 24dB. O ruído de fundo, como é
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aleatório, só sobe, no geral, 12dB (na média, há cancelamentos e


reforços no ruído), melhorando a relação sinal/ruído da gravação em
uns 12dB (dois bits), ou seja, é como se o sinal tivesse sido gravado em
26 bits, mesmo usando um sistema de 24.
Neste ponto entra o pulo do gato. O som que temos não é a resposta
ao impulso, mas a resposta à varredura. O sinal registrado contém
resposta a todas as freqüências, mas o fato gerador foi evoluindo ao
longo do tempo e não estava concentrado em t=0, como no caso do
impulso. Assim, processa-se o sinal gravado de forma a concentrar as
freqüências no tempo inicial, transformando a resposta resultante
naquela que seria obtida pelo impulso, tornando-se então finalmente a
Resposta ao Impulso.

IR Doméstico
O próximo passo na evolução tecnológica é óbvio. No início de 2001, a
Sony lançava a segunda versão do S777, permitindo agora (por
aproximadamente US$ 10 mil) ao usuário capturar suas próprias salas. O
processo de captura é praticamente o mesmo descrito acima, e está
ao alcance do usuário. As aplicações, principalmente para som de
cinema e TV são então bastante ampliadas.

Chega a concorrência
Inevitavelmente a concorrência chegou para desafiar a Sony, e fez
bonito. Ainda em 2001, a Yamaha lançava o SREV1 Sampling
Reverberator, usando 32 DSPs e conseguindo 520 mil cálculos por
sample!!! Como o S777, o SREV1 também permite que o usuário amostre
suas próprias salas, usando o mesmo princípio de sinal de varredura,
chamado TSP (time-stretched pulse - pulso estendido no tempo).

A este produto vieram se juntar os plug-ins de reverbs via convolução,


tais como o Tascam Giga Studio, o Altiverb e mais recentemente o
Emagic Space Designer, dos quais falaremos no próximo mês.

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Só reverbs?
Mas será que só os reverbs podem ser objeto da convolução? Porque
não podemos usar o mesmo processo para capturar o comportamento
de equalizadores, compressores, prés e microfones?
A principal dificuldade é que para capturarmos fielmente estes
equipamentos não podemos nos basear naqueles dois princípios
básicos - linearidade e invariância no tempo. Alterar o nível do sinal de
entrada muda a resposta ao impulso em função da não-linearidade de
seus componentes. No caso do compressor, por exemplo, cada posição
do controle de ratio, por exemplo, muda a sala em questão, tornando
necessária a captura de nova IR. Mas como não poderia deixar de ser,
alguém conseguiu um jeito de aplicar a convolução nestes casos - o
engenheiro Mark Kemp, cujo trabalho levou ao artigo do próximo mês,
quando falaremos também da convolução aplicada a compressores,
equalizadores e prés - o Sintefex e seu derivado Liquid Channel, da
Focusrite.

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77) VINIL HD
Várias pessoas me trouxeram, inclusive o nosso colega Luis Gustavo essa
informação, querendo colocar em discussão aqui. Esse assunto é
sempre empolgante e toca em pontos chave do mundo do áudio,
então, vamos lá.
Que tal olharmos a situação primeiro como fenômeno? Pois bem,
imaginemos que temos a gravação mais sensacional do mundo. Um
som inigualável, uma coisa do outro mundo. Bom, existem duas
possibilidades. A primeira, de que foi gravado em fita analógica, o que
hoje é raríssimo, mas que se aconteceu, eu preciso dizer que não se
enquadra, porque em minha opinião um som inigualável não pode vir
com chiado junto, e com fita SEMPRE vem.
Então vamos para o caso em que esse som incrível foi gravado em um
sistema digital. Mesmo que tenham sido usados equipamentos
analógicos na mix e master, o que temos são 0s e 1s, mais nada. Se
transferimos esta master para uma mídia com procedimentos lossless, o
que teremos são os mesmos 0s e 1s. O que está na master está na mídia.
Agora, alguém decide prensar em vinil. Pergunto por quê? O som
"melhora"? Mas ele já não era inigualável e perfeito? Será que vai ficar
"perfeito 2.0"? Ou mais que perfeito? Mas beleza, vamos dizer que o som
não melhora, porque afinal tem menos faixa dinâmica e todos os
problemas que conhecemos, mas que fica mais "quente", mais
"humano", mais agradável ou outro adjetivo obscuro.
Temos então uma situação onde quem gravou, quem mixou e quem
masterizou, coitados, tomaram todas as decisões ouvindo ainda de um
jeito que não era o mais legal. Como eles não ouviram a coisa pós vinil,
o resultado final foi conseguido por sorte?
O vinil tem problemas sérios - e não vou me repetir em numerá-los - mas
ninguém é proibido de preferir sua sonoridade. NInguém é dono do
gosto de ninguém. `Só que pra ser totalmente honesto ao conceito de
que o áudio de uma gravação soa melhor em vinil, essa teria que ter
sido feita como nos antiquíssimos tempos, onde da mesa se ia direto
para uma mesa de corte de acetato. Se uma pessoa afirma que o som
gravado em digital melhora ao passar para o vinil, indiretamente está
admitindo que o som digital foi fiel durante o processo de gravação.
E agora vem a maior sensação de todos os tempos dessa semana: o
vinil HD, prometendo 30% mais volume e o dobro da "fidelidade", seja lá
o que isso for. Admitindo que isso seja verdade, pergunto: se precisava é
porque não era tão bom. E preciso dizer, o áudio digital não ganha
nada em qualidade quando é sampleado em "alta" resolução - apesar
do que um bando de gente afirma sem provar. Se o vinil ganha, é
porque não era tão bom.
E uma pergunta final: mesmo em HD, a agulha seguirá atritando a
mídia, e com a velocidade angular constante, a qualidade do início da

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primeira música continuará sendo muito melhor que o final da última


música. E isso ninguém tem como resolver. Ah, mas a capa...

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78) TER OU NÃO TER


Mais uma coisa curiosa a respeito do áudio: a tecnologia avança e
todo mundo se apressa em absorver certas coisas, enquanto outras
ficam paradas no tempo, ou possuem uma inércia enorme para
mudarem.
Por exemplo, o conceito de "possuir" uma obra musical. O que se
compra (ou comprava) ao se adquirir um CD, ou quando se paga por
um download na Apple Store? O direito de ouvir aquela obra quando e
onde se quiser. Vc não passa a possuir uma música quando a compra,
mas é dono da decisão e dos meios de ouvi-la.
Só que a revolução dos smartphones e da internet colocou um poder
enorme nas mãos das pessoas - mesmo que elas nem percebam. Eu
mesmo, quando decido ouvir determinada música, fico com preguiça
de vasculhar os CDs (que obviamente não estão em ordem) , e prefiro
procurar no Youtube ou o Spotify.
A "posse" de uma obra musical está cada vez menos útil, pois se
podemos ouvi-la honestamente onde e quando quisermos, sem pagar e
sem limitações, por que comprar uma mídia ou um download?
Do lado do consumo, todos se adaptam rapidamente às novidades,
mas do lado da produção a coisa é mais complicada. Muitas teias de
aranha e ferrugem precisam ser retiradas. O music business precisa
continuar arranjando meios de se manter vivo. Enquanto isso, nós
continuamos apegados aos conceitos antigos, ainda trabalhando
basicamente para o ouvinte que compra a obra, senta em casa e
coloca a música no sistema de som da sala para ouvir com atenção.
Esse consumidor está praticamente extinto, mas todo o mercado do
áudio ainda trabalha como se ele fosse o maior objetivo.
Eu penso que a nova maneira de comercializar música poderia ser
através de apps. Vc lança não mais um CD, ou downloads gratuitos,
mas um app que toca o seu álbum, e que você pode vender por um
preço muito baixo. Com sorte, quem é fã vai preferir pagar R$ 4,90 pra
ter o novo "álbum" de seu artista, com as letras, imagens, entrevistas e
clipes, links e etc, tudo concentrado dentro de um app que é moleza
de programar.

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79) Desenvolvimento Histórico Da Referência de Afinação


Adaptado de: BERG, Richard; STORK, David – “The Physics of Sound”
A primeira coisa que é feita ao se afinar um piano ou uma orquestra é
ajustar o Lá (A) em 440Hz. A partir dele são afinadas as outras notas. Este
não foi sempre o padrão de afinação. Esse padrão ao longo dos
séculos tem estado em total anarquia. Em geral, porém, nos últimos 500
anos o padrão tem subido aproximadamente uma terça menor,
embora tenha havido muita variação.
Mesmo sem um padrão oficial, durante a idade medieval e
renascença, a afinação em geral era uma terça menor abaixo da
atual, particularmente na igreja. Isso tem sérias implicações na
execução moderna por seu efeito na extensão das vozes e dos
instrumentos, o que leva a se executar muitas vezes de modo
transposto.
Durante a Renascença, principalmente na música leiga, havia a
tendência de se usar padrões que podiam chegar a uma quarta ou
quinta acima do 440.
Por volta do barroco tardio o padrão praticamente se estabilizou em
torno um semitom abaixo do atual. Bach escreveu a maior parte de
suas obras para A=415Hz, e Handel usava 422.5Hz como seu padrão. A
invenção do diapasão por John Shore (séc XVIII) ajudou a
padronização.
Por volta do fim do século XIX o padrão mais usado ficava em torno de
A=435Hz, embora com variações consideráveis. Mozart e Beethoven
usavam a afinação um semitom abaixo da atual.
A maior parte da pressão para a subida do padrão veio dos
instrumentistas de cordas, já que os instrumentos tendem a soar mais
brilhantes com a tensão maior das cordas. Isso provocava problemas
aos fabricantes de sopros e até mesmo de cordas, que tinham de
reforçar a estrutura de seus instrumentos. Começou a ser necessário usar
metal para as cordas mais agudas dos violinos.
Com o aumento da troca de músicos entre orquestras pro toda a
Europa e Estados unidos, tornou-se necessária uma padronização. Foi
então que o padrão internacional de A=440Hz foi criado, por volta de
1920. No entanto continuava a pressão pelo uso de afinações mais
altas, como 442 e 444, chegando até a 448, na busca por sonoridades
mais brilhantes. Esse tipo de padrão é normalmente criticado pelos
músicos de sopro, que precisam readaptar seu modo de tocar.
Hoje o padrão universalmente usado na música popular é A=440Hz,
com eventual uso do 442Hz em música clássica. Outros padrões podem
ser usados na recriação de formas musicais mais antigas.

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80)VC ACHA QUE 16 BITS É POUCO?


A culpada é a bendita escadinha. Onze de cada dez textos que
explicam como o áudio digital funciona fazem um gráfico
demonstrando os níveis de quantização, e pra simplificar desenham
uma escada com degraus enormes.
Aí a gente fica achando que a coisa é tosca. Afinal, 16 é um número
tão pequeno! Bom, pequeno, vírgula. Nesse caso o 16 representa
quantos bits serão usados para representar a amplitude no momento de
cada sample. Ou seja, ele representa 2 elevado a 16.
Em termos de faixa dinâmica, 16 bits significam aprox. 96 dB, o que é
muuuuito mais do que qualquer sistema analógico de gravação jamais
sonhou. Matematicamente, são 65536 valores possíveis.
Mas afinal, o que são 65536 coisas? Parece pouco nessa época de
gigas e teras, mas pensemos bem, vamos converter isso em dinheiro,
mas do meu jeito. Vamos supor que você receba 65536 moedas de um
real e queira fazer uma pilha. Ela vai ter 78 metros de altura! O
equivalente a um prédio de 25 andares!
Resolvi falar nesse assunto enquanto via o Mengão ser garfado pela
arbitragem semana passada. Olhei pra linha de fundo e comecei a
pensar. A linha de fundo oficial tem 65 metros. Imagine uma senóide
cuja amplitude caiba certinho na linha de fundo do Maracanã. Pois
bem, usando 16 bits, um intervalo de quantização (um degrauzinho do
tal gráfico), teria 1 milímetro.
Da próxima vez que vc for a um campo de futebol, leve uma régua,
coloque na bandeirinha de corner, e meça 1 milímetro. Aí olhe pra
bandeirinha oposta e contemple como um sistema de 16 bits é
preciso!!!

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81) VOCÊ NÃO ENJOA?


Hoje tenho algumas palavras mais duras. Estava vendo naquele site
Quora alguém perguntando: "Vocês músicos não enjoam de tocar todo
dia a mesma coisa?". Daí lembrei das muitas vezes em que me
perguntaram como eu aguento ouvir quarenta vezes uma música.
Lá no Quora, é claro que imediatamente apareceu um músico para dar
a resposta poética padrão: "cada dia é uma experiência nova, bla, bla,
blá." Isso de certa forma me incomodou. Afinal, quando a gente tem
uma profissão, um trabalho que leva a sério, não precisamos de
atrativos para conviver com o dia-a-dia. Ser músico é uma profissão,
assim como ser profissional de áudio, e dentista, e caixa de banco.
É claro que nosso trabalho pode ser muitas vezes mais divertido que a
maioria, mas ainda assim é um trabalho, e a ideia é que nos divirtamos
com ele. Um músico toca todo dia a mesma coisa com maestria não
porque é "legal", mas acima de tudo porque é o seu trabalho. Nós
ouvimos a mesma música quarenta vezes porque é o nosso trabalho, e
é assim que de certa forma nos divertimos.
Embora busquemos ser geniais todo dia, não dá pra imaginar que
nossos resultados dependam de coisas como nosso humor naquele dia.
Seria isso justo com o cliente que está pagando? Já pensou chegar no
fim da mix e dizer : "foi mal, irmão. Sua música não ficou tão legal
quanto podia porque hoje não estou inspirado. Na próxima, se dermos
sorte, vai ficar melhor..."
Para quem não faz disso sua profissão, é normal que haja dias com
resultados melhores e outros piores. Para quem vive disso, porém, a
busca por um mínimo de excelência deve ser constante. O resultado de
um dia ruim deve ser tão bom quanto o de um dia bom. Somos meio
como os atores. O show não pode parar, mesmo que meu time perca,
meu carro enguice, meu dente doa, e que a música seja chata.

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82) NÃO SUBESTIME A VOZ GUIA


É sempre assim, a gente grava uma base e a partir dela constrói todo o
processo da gravação, com os overdubs. Durante esses primeiros
momentos, normalmente se coloca uma voz guia - uma vozinha feita
sem as condições ideais, em um microfone qualquer, só pra orientar os
outros músicos.
Dai a gente - e o cantor - convive com essa voz durante todas as
sessões de gravação, e todo mundo meio que internaliza isso ,
trabalhando para aquela voz.
Chega lá no final a hora de colocar a voz pra valer. Toda a pressão
psicológica ataca, o cantor fica gripado, o ambiente do estúdio é
gelado e seco, por causa do ar condicionado, fica todo mundo
olhando pro cantor, etc. É uma situação muito estressante.
Daí muitas vezes bate o sentimento de "ah se essa voz guia valesse...".
Pois bem, por que não valer? Por que não gastar 15 minutos da sessão
que gerou a base e fazer uma voz guia no capricho? Uma boa hora é
quando os outros músicos saem pra comer, por exemplo
(principalmente quando há restrição de
tempo/grana). Pare tudo no estúdio, capriche no mic, no pré, na
posição do mic e faça uma tremenda voz guia. De preferência, afine
no capricho. E mais importante: não envolva esse processo em
responsabilidade desnecessária. Mantenha a filosofia de voz guia, mas
com a técnica de voz valendo. Faça rápido e não encha muito a
paciência do cantor. O clima deve ser o mais relaxado possível, mas
que gere uma voz bacana.
Durante toda a gravação tudo será mais fácil, e lá no final, na hora da
pressão de colocar a voz definitiva, os resultados aparecerão mais
rápido. Até quando o resultado for aproveitar a voz "guia".

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83) A COISA MAIS BONITA DO ÁUDIO


Todo mundo sabe que eu valorizo muito os aspectos técnicos, mas
felizmente consigo juntar bem isso com a parte artística. Foi o que me
fez passar de "operador de Pro Tools" a mixador. Então, fico tranquilo pra
afirmar:
"NÃO HÁ NENHUM EQUIPAMENTO, PLUG-IN OU PROCEDIMENTO EM
ÁUDIO QUE SÓ MELHORE OU SÓ PIORE O SOM, PORQUE LIDAMOS
ESSENCIALMENTE COM ARTE, ONDE OS CONCEITOS DE MELHOR E PIOR
SÃO SEMPRE RELATIVOS."
Uma coisa é dizer, por exemplo, que a faixa dinâmica do vinil é menor
que a do áudio digital. Outra muito diferente é dizer que isso o deixa
"pior".
Felizmente, as coisas não são tão pretas ou brancas assim.
Como artistas e técnicos que somos ao mesmo tempo, vivemos
atuando em milhares de tons de cinza.

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84) Kate Perry


Quando eu tinha 21 anos, fui diagnosticado com câncer.
Era setembro em Nova York - duas semanas antes de eu começar o
meu último ano na escola de áudio.
Em vez de aproveitar os últimos dias de verão, voei de volta para a
Califórnia e comecei a quimioterapia e radioterapia.
Todos os dias fui levado ao mesmo quarto no Stanford Hospital. Eu tirava
minha camisa, deitava em uma mesa de metal fria e esperava.
Uma técnica de laboratório entrava, me cumprimentava e perguntava
...
"Há alguma coisa que você queira ouvir hoje?"
"Não", eu sempre dizia. "Apenas seus favoritos."
Ela sorria, virava-se e saía. E alguns segundos depois, o último single de
Katy Perry começava a tocar de um alto falante de duas polegadas
acima da minha cabeça. Eu estive naquela mesa fria de metal todos os
dias durante três meses , ouvindo Katy Perry enquanto um enorme
pedaço de metal girava sobre minha cabeça, vomitando radiação
ionizante no meu peito.
Eu me sentia como uma engrenagem em um sistema naquele ano -
como pouco mais que um conjunto de estatísticas e sinais vitais. Mas
ouvir Katy Perry me fez sentir menos sozinho. Sua música me lembrou
que eu ainda era humano , que eu ainda podia me sentir conectada
ao mundo ao meu redor, que havia vida fora do câncer - e talvez até
depois dele.
Como músicos, é fácil esquecer o poder que temos.Muitas vezes
ficamos tão obcecados com os detalhes que perdemos a visão geral.
Lembre-se: o que você faz é muito mais do que equipamentos, plugins
ou técnicas. Dando o seu melhor, você pode impactar os outros de
maneiras que você não pode imaginar.
E você não precisa ser Katy Perry para fazer isso. Grande ou pequeno,
amador ou profissional ...
Você nunca sabe quem está realmente ouvindo.
- Jason Moss ( behindthespeakers.com )

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85) FAZ SENTIDO "AMACIAR" HEADPHONES?


Taí mais uma das falsas verdades do áudio que têm o dom de se
propagar com mais rapidez quanto mais infundadas. O tempo todo
vejo gente dizendo que o fone tal precisa de um burn-in
(amaciamento) antes de ficar bom.
Não há nenhum embasamento técnico nisso, a não ser a mera opinião
das pessoas. Sem desmerecer a capacidade de ninguém, pode até
existir uma diferença de percepção depois de um tempo, mas a causa
é outra.
O ser humano tem uma capacidade muito grande de se adaptar. Isso
se manifesta através do Efeito de Habituação (Habituation Effect), onde
nosso cérebro passa a responder menos a estímulos constantes.
Aqui no Rio, ali na Usina, tinha uma fábrica de cigarros, e toda vez que
eu passava lá, ficava me perguntando como os vizinhos conseguiam
conviver com aquele cheiro. Se vc perguntasse a algum morador dalí,
ele provavelmente ia dizer "que cheiro?". O fato é que nosso cérebro,
que não é bobo nem nada, evoluiu de forma a cancelar estímulos
constantes, podendo dessa forma dedicar atenção às novidades.
Isso tudo foi pra dizer o seguinte: o som da primeira vez que vc ouve um
fone é diferente de todas as outras vezes, e tenderá a ser mais familiar e
amistoso quanto mais for ouvido. Isso provoca a impressão de que o
fone foi "amaciando", mas na verdade quem foi amaciando foi você.
P.S. - é claro que não estou incluindo aqueles fones de 19,99 comprados
no supermercado que você colocou pra tocar sozinho com volume
máximo no amp durante três dias seguidos.Potências elevadas
provocam calor nas bobinas, e também causam problemas mecânicos
por excesso de excursão dos diafragmas, mas aí não é "amaciar", é
derreter.

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86) PARA ENTENDER A LEI DE PAN (Pan Law)


Precisamos dar uma esclarecida nessa questão da Pan Law ( o Pro Tools
chama de Pan Depth). Vamos pegar um exemplo. Suponhamos que
temos um canal paneado para um dos lados com um volume X. Então
o deslocamos para o centro. Ele estava todo saindo apenas em uma
caixa. Quando ele está no centro, ele se divide entre duas caixas. Assim,
para que – em tese – seu volume ouvido seja o mesmo, é preciso que se
atenue alguns dB de cada lado, para que a audibilidade dos dois lados
somados seja a mesma.
No Pro Tools, por exemplo, é possível escolher quantos dB são
atenuados. O padrão depois da versão 8.1 é -3,0dB, que costuma ser o
padrão da indústria. Alguns consoles ingleses adotam o padrão de -
4,5dB, e o padrão de -6dB é o usado para a maior compatibilidade
com mono.
O problema é bem delicado, na verdade. Quando se usa -3dB, o que
está se fazendo é mandar metade da potência acústica para cada
caixa, o que faz todo sentido. Porém, quando uma mix estéreo é
somada eletricamente em mono, o que é paneado para o centro
ganha 6dB, o que altera o equilíbrio da mix. Alguns consoles optam por
uma solução intermediária. Daí o valor de -4,5dB.
Até aí já está complicado demais, mas ainda piora, porque tudo isso
depende das características acústicas do lugar onde se ouve. Este é um
dos motivos pelos quais evito em minhas mixes instrumentos paneados
completamente para um lado sem uma compensação do outro,
exceto no caso de dobras e coisas já gravadas em estéreo.

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87) A VERDADE SOBRE O PZM


(Texto extraído do capítulo 11 do Guia de Microfonação - Fabio
Henriques )
Crown PZM
Um problema já conhecido nosso é aquele que aparece devido a
reflexões em superfícies próximas ao microfone, como no caso de
posicionarmos a estante com a letra muito perto de um microfone de
voz.
Vejamos um caso parecido, que acontece quando desejamos uma
captação de ambiente e colocamos um microfone muito próximo a
uma parede.
Ao diafragma chegam basicamente sons vindos de duas fontes: os que
incidem diretamente e os que batem na superfície, refletem e são
captados pelo diafragma. Dependendo da distância envolvida, isso
implicará a atenuação de diversas frequências e intensificação de
outras, devido às diferenças de fase.
Por exemplo, uma onda de 1.000 Hz leva 1 milissegundo para completar
seu ciclo (dizemos que esse é seu “período”) e 0,5 milissegundo para
completar meio ciclo. Isso significa que, se somarmos um sinal de 1.000
Hz com ele mesmo atrasado em 1 ms, teremos um reforço de volume,
pois os dois sinais estarão em fase. Porém, se tomamos agora esse
mesmo sinal de 1.000 Hz e o somamos com ele mesmo, só que atrasado
0,5 milissegundos, ocorrerá uma forte atenuação (numa situação ideal,
um cancelamento completo), pois os dois sinais estarão em oposição
de fase (quando o original está no máximo, o atrasado estará no
mínimo).
Se agora atrasarmos um sinal qualquer (um ruído rosa, por exemplo) em
1 milissegundo e somarmos com o sinal original, ocorrerá que, por causa
desses reforços e atenuações referentes a diferenças de fase, teremos
em 500 Hz e em
seus múltiplos ímpares (1.500 Hz, 2.500 Hz, 3.500 Hz etc.) um
cancelamento de fase e consequente atenuação muito forte,
enquanto nos seus múltiplos pares (1.000 Hz, 2.000 Hz, 3.000 Hz etc.)
teremos um ganho (de 6 dB), pois as frequências estarão em fase e se
somarão, conforme o gráfico abaixo.
Esse tipo de efeito é chamado comb filter (filtro pente). Reparem que os
picos e nulos estão espaçados igualmente numa escala linear. Usando-
se uma escala logarítmica para plotar as frequências (que é a forma
mais comum de se ver), o espaçamento iria se aproximando à medida
que subíssemos na escala. A diferença obviamente estaria só no
gráfico, e não no som obtido.
O resultado alcançado pode ser usado como efeito (é a base do
famoso flanger), mas também pode provocar um prejuízo sonoro numa
captação em que esse efeito não é desejado. Assim, ao gravar,
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precisamos nos certificar de que não há superfícies muito próximas ao


microfone que possam ocasionar o comb filtering.
Existem, porém, situações em que temos interesse justamente em captar
o som que as paredes ouvem, para obter um som do ambiente. Assim,
seria útil se fôssemos capazes de captar bem próximo a superfícies sem
que houvesse a ocorrência do filtro pente. Para esses casos, diversos
fabricantes apresentam soluções na forma dos chamados “microfones
de superfície” (boundary microfones). Destes, talvez o mais famoso (e o
primeiro a ser comercializado) seja o Crown PZM (Pressure Zone
Microphone).
Nesse microfone, o diafragma é colocado bem próximo a uma placa
metálica, e esta pode ser fixada a uma superfície. A distância do
microfone à placa é tão pequena (5 mm) que o primeiro
cancelamento ocorre fora da zona audível de frequências. Assim, a
onda incidente e a refletida estão sempre em fase, e a região em que
isso acontece, nas cercanias da superfície, é chamada “zona de
pressão”.
O PZM permite, então, que o coloquemos no tampo de um piano,
colado a paredes etc. Pode ser usado colocado sobre o chão do
palco, para captar as vozes dos atores, ou sobre uma mesa, para
gravar uma reunião. Como microfones de ambiente, são muito úteis,
pois nos mostram como as paredes ouvem uma fonte sonora sem que o
microfone deteriore a resposta. E, por falar nela, eles possuem uma
resposta semiesférica, comportando-se como omnidirecional sem
coloração da placa para cima.
Uma crença muito comum é a de que o microfone capta as vibrações
da placa, o que, como vimos, não é verdade. Já ouvi pessoas dizendo
que o prendem a uma placa grande de acrílico e suspendem em uma
estante, e com isso há uma
melhor captura dos graves por causa da vibração da placa. Na
verdade, não é nada disso o que acontece, já que microfone não
capta vibrações da placa (o fabricante inclusive afirma que isso é
justamente uma de suas virtudes).
O fenômeno envolvido, na verdade, é a difração das ondas sonoras.
Imaginemos um caso em que um PZM colado a uma placa de 50 x 50
cm é colocado de costas para uma orquestra e de frente a uma
bateria. Quando ondas sonoras incidem sobre um obstáculo, aquelas
cujo comprimento de onda for muito pequeno em relação ao
obstáculo (os agudos, no caso) serão simplesmente refletidas de volta.
Para as ondas cujo comprimento seja muito maior do que o obstáculo
(no caso, os graves), elas o contornam, sendo, então, captadas pelo
microfone. Assim, o fenômeno envolvido não é um aumento dos graves,
mas uma atenuação das
médias altas e agudos. O resultado é uma resposta com graves mais

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intensos que os agudos, não por causa do efeito do PZM, mas por uma
questão de acústica básica.

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88)Por que gravar em 48kHz ?

Resposta apressada de quem conhece como o áudio digital


funciona: Porque eu tenho uma resposta em frequência até 24kHz.
Mas será que isso no final é realmente vantajoso?

Infelizmente a coisa não é tão simples assim. Primeiro um pouco de


história. No início dos anos 90 a sony criou a fita de áudio digital - o
DAT, que em sua versão profissional amostrava a ... 44.1kHz. Só que
eles precisavam popularizar o produto e queriam criar uma versão
"consumer". O problema era que, já que as perdas em cópias eram
ínfimas, as pessoas podiam pegar uma fita DAT feita em estúdio e sair
copiando, fazendo versões piratas em casa.

Daí um gênio pensou: por que não criamos uma taxa de


amostragem diferente só para aparelhos domésticos? Estava criado
o padrão de 48kHz. E por que maior que 44.1kHz? Porque com os
filtros antialiasing da época o som ficava PIOR.

Ou seja, o padrão 48kHz foi criado para deixar o áudio digital


doméstico com MENOS QUALIDADE!

Ok, hoje, depois do oversampling, essa diferença de qualidade caiu,


mas ainda assim não compensa usar 48kHz para algo que vá virar
CD, mesmo que efetivamente haja um aumento de qualidade
audível por conta dessa taxa maior (o que particularmente não
creio). Existe algo que as pessoas parecem esquecer: A conversão
de 48kHz para 44.1kHz não é fácil, e tende a deteriorar mais a
qualidade do que o suposto benefício da banda maior.

Pra quem não gosta do filtro antialiasing do 44.1kHz, sinto informar


que converter 48kHz para 44.1kHz equivale passar o áudio por outro
filtro passa baixas, com todos os problemas inerentes.

E terceiro ponto. Imagine que vc faça sua própria master em 48kHz,


deixando o áudio bacaninha batendo 0.1dB abaixo do topo.
Quando vc converter o resultado para 44.1kHz para colocar no CD
irá perceber que ocorre saturação em diversos pontos, vinda da
irregularidade do filtro aí de cima.

Mas quando vale a pena gravar em 48 kHz? Quando o material final


for um DVD, por exemplo, que por padrão tem o áudio nessa taxa (e
16 bits, o que é muito pior para o áudio, infelizmente).

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Mas e quando for DVD e CD? Bom, aí a gente tem que escolher pra
quem vai dar mais atenção, e se for ao 48kHz, cuidamos de
converter para 44.1kHz antes de masterizar o CD.

O que me leva a outro pensamento. Alguém pode dizer que é


melhor converter as mixes para 44.1kHz antes da master. E daí eu
tenho que argumentar que se a conversão é mesmmo um problema,
por que então não gerar os áudios já em 44.1kHz pra melhorar a
qualidade da mix? E voltamos assim à pergunta lá do título.

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89)NÃO CUSTA ALERTAR DE NOVO


Gente, é preciso deixar bem claros alguns pontos importantes, embora
eu já tenho falado isso um monte de vezes:
1) Usar taxas de amostragem tipo 96kHz em tese só traz uma
consequência: você consegue registrar fielmente frequências acima de
20kHz;
2) Até hoje, que eu tenha conhecimento, não existe trabalho científico
que comprove que as pessoas conseguem ouvir incontestavelmente
essa região de frequências;
3) A comparação de áudios é a coisa mais difícil de se fazer, porque é
extremamente suscetível a questões subjetivas;
4) O MAIS IMPORTANTE: se você comparou 96kHz com 48kHz e notou
DIFERENÇA, essa diferença pode se dever a problemas na interface.
Sim, a interface precisa trabalhar mais perto de seus limites para gravar
em 96kHz, e por isso, podem ocorrer não-linearidades (=distorção) que
mudam as características sonoras abaixo de 20kHz, e por isso são
audíveis.
Então, simplesmente dizer que "eu consigo ouvir a diferença" não sigifica
que você está ouvindo coisas que acontecem acima de 20kHz, mas
que provavelmente está ouvindo as diferenças provocadas pela
interface nas frequências abaixo disso,
Agora, se mesmo assim você prefere usar 96kHz, mesmo gastando o
dobro de HD e usando metade das tracks possíveis na DAW, porque
gosta mais do som , siga em frente feliz. O importante é apenas tomar
cuidado para não confundir "a interface em 96kHz me dá um som que
eu gosto" com "96kHz dá um som melhor".

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90) EQUALIZADORES SEM SEGREDOS I


Por que os gráficos de frequências são desse jeito?
Vcs já repararam que os gráficos de resposta em frequência possuem
as linhas verticais desenhadas em intervalos de tamanhos diferentes,
enquanto as linhas horizontais possuem intervalos iguais? Por que será?
Primeiro precisamos pensar um pouco no motivo da existência dos
gráficos. Eles são uma maneira visual de representar o comportamento
da relação entre duas grandezas físicas. Em um gráfico de resposta em
frequência, é exibida a relação entre as diferentes frequências (no eixo
horizontal) e suas amplitudes (no eixo vertical). Em outras palavras, a
cada instante um gráfico deste tipo exibe a intensidade de cada
frequência. Só que esse gráfico só é realmente útil se ele mostrar
visualmente o que percebemos com nossos ouvidos. Ou seja, se uma
informação de áudio tem a frequência F1 com a mesma intensidade
percebida da frequência F2, elas devem aparecer com a mesma altura
no gráfico.
Só que nossos ouvidos possuem um jeito particular de ouvir as diferentes
frequências. Para que possamos ouvir uma faixa grande de frequências
nossos ouvidos arranjaram uma solução inteligente: o conceito de
oitava. Independente da cultura, todos os seres humanos possuem o
senso de oitava, segundo o qual quando dobramos a frequência,
achamos que estamos ouvindo a mesma “nota”, só que mais aguda.
Assim, se a gente ouve o Lá de 440Hz (o chamado Lá4) e depois ouve a
frequência de 880 Hz, entende que também é um Lá (Lá 5), só que mais
agudo. Ao mesmo tempo, 220Hz serão também um Lá, só que mais
grave (Lá 3). Ou seja, multiplicando ou dividindo a frequência por 2,
temos a mesma “nota”.
Até aí parece simples. Mas reparem que entre o Lá 3 e o Lá 4 existem
220Hz e entre o Lá 4 e o Lá 5 existem 440Hz. Ou seja, o dobro de “ Hertz”.
E assim por diante. A cada vez que subimos uma oitava, dobramos o
número de “Hertz” no intervalo. Porém, para nossos ouvidos o intervalo é
o mesmo. Fisicamente, subir uma oitava equivale a subir uma escada
onde cada degrau tem o dobro da altura do anterior. Só que
auditivamente, os degraus dessa escada possuem a mesma altura. Foi
esse o jeito que o nosso ouvido arrumou para conseguir ouvir uma
região tão grande de frequências (comparativamente, o olho humano
só enxerga uma região menor que uma oitava).
Em que isso afeta um gráfico? Bem, para que o gráfico visualmente se
aproxime da sensação provocada na audição, os intervalos de
frequência precisam ir se aproximando uns dos outros, em direção aos
agudos. Se vcs olharem mais detalhadamente um gráfico desses, verão
que o intervalo entre 100Hz e 200Hz é maior que o intervalo entre 200Hz
e 300Hz, e assim por diante. Quando chegamos em 1kHz, parece que o
tamanho se repete, mas reparem que a próxima divisão está em 2kHz.
Ou seja, na verdade ela é dez vezes mais estreita que a região de 100 a

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200 Hz.
Um gráfico desses, onde o eixo horizontal cresce desta forma, enquanto
o eixo vertical cresce linearmente, é chamado Mono-log (pois esse
crescimento no eixo horizontal é chamado logarítmico). Independente
do nome complicado, o motivo na verdade é simples, como vimos: nos
aproximar da relação entre o que vemos e ouvimos.
No próximo post, ruído branco e ruído rosa.

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91)EQUALIZADORES SEM SEGREDOS II:


Por que ruído tem cor?
Antes de mais nada, por que “ruído”? Nesse caso (e certamente
existem outros), ruído significa “ausência de informação”. Para nós essa
ausência é bem útil, e vamos ver como.
O problema clássico é arranjar um jeito de medir como um sistema
(equipamento, plugin, etc) responde às diferentes frequências possíveis.
Para fazer isso, seria interessante se houvesse um sinal de áudio que nos
mostrasse todas as frequências com a mesma energia. A natureza já é
boazinha e nos atende muito bem, porque fenômenos ditos aleatórios
têm exatamente essa característica.
Tipicamente, se sintonizamos um rádio ou uma TV entre duas estações, o
que temos é simplesmente o movimento aleatório dos elétrons na
antena, com a presença de qualquer frequência possível, e ouvimos
isso na forma do famoso “chiado”. Ali, nenhuma frequência é
privilegiada e todas apresentam estatisticamente a mesma energia. O
termo “estatisticamente” é importante, porque como a coisa é
aleatória e natural, as frequências não ficam ali sempre com a mesma
amplitude, mas na média as elas tendem a se nivelar.
O bom senso já nos indica que esse tipo de sinal deve ser muito bom
para avaliarmos a resposta em frequência de alguma coisa. O
problema é que a gente, por preguiça, em vez de usar “ruído aleatório
de amplitudes estatisticamente equivalentes e espectro largo”, resolveu
dar a ele um nome mais simples.
Pausa. Vamos pra cor pra depois voltarmos.
Cor é um fenômeno puramente humano. Para a natureza não existe
cor: existem as diferentes frequências da luz. É nosso jeito de interpretar
os diferentes comprimentos de onda. Como todo fabricante de TV
sabe, a luz que interpretamos como branca é apenas a soma de todos
os comprimentos de onda, com energia equivalente. Entendemos isso
como “branco” (como nossos olhos possuem sensores somente para
verde, azul e vermelho, basta que a tv gere essas três cores pra gente
enxergar branco).
Assim, nada mais razoável do que chamar o ruído sonoro que possui a
mesma energia distribuída ao longo de todas as frequências como
“ruído branco”. E é esse o que tenderíamos a usar. Porém, como vimos
no post passado, nosso ouvido tem uma característica importante. À
medida que se sobe nas frequências, damos um jeito de “apertá-las”
umas contra as outras, de forma que cada oitava tem o dobro de
frequências da oitava anterior.
Por causa disso, o ruído branco, que possui a mesma energia ao longo
do espectro, acaba soando agudo. Até o nome “chiado” é uma
onomatopeia, que simula o som que ele tem. Para que um ruído nos
seja auditivamente equilibrado , ele precisa ter a mesma energia por
oitava. O jeito que se deu foi atenuar a intensidade do ruído branco
com um filtro de 3dB/oitava (potência) ou 6dB/oitava (amplitude),

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permitindo que nossos ouvidos percebam uma resposta


estatisticamente constante ao longo de todo espectro. Precisávamos
então dar um nome pra esse ruído. No caso da luz, filtrar frequências
altas significa deixar o branco mais avermelhado. Daí alguém escolheu
o nome “ruído rosa” (pink noise).
Em um gráfico de resposta em frequência, com o eixo horizontal
logarítmico, o ruído branco se apresenta com mais amplitude em
direção aos agudos. Já o ruído rosa tende a exibir uma resposta mais
plana. Auditivamente, a presença dos graves no ruído rosa (ou sua
ausência no ruído branco) é evidente. Graças a esse tipo de resposta é
que o ruído rosa se popularizou como ferramenta de análise de resposta
em frequência.
Existem outros tipos de ruído, tais como ruído cinza, que é o ruído
branco que se adequa à curva de equal loudness – útil na
psicoacústica; ruído marrom, cuja potência decresce 6dB/oitava , e até
ruído preto, que em áudio digital significa “silêncio”.
Na figura podemos ver o ruído branco no fundo e a criação de um
ruído rosa, através da aplicação de um filtro de 6dB/oitava.
Como última observação, guardemos uma inform
ação importante: os seres humanos costumam ser mais adaptáveis e
aceitar melhor ruídos rosa e brancos – de espectro amplo e de caráter
aleatório – ondas do mar, chuva, ar condicionado, etc enquanto
toleram bem menos os ruídos mais impulsivos ou de espectro estreito –
um apito, uma torneira pingando, etc.
No próximo post: e o eixo vertical? Será que existe um jeito fácil de
entender dBs e logaritmos?

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92) EQUALIZADORES SEM SEGREDOS 3:


Afinal, por que usamos logaritmos?
É aquilo: a gente aprende um negócio superchato na escola, acha que
nunca mais vai usar e dá graças a Deus quando acaba a matéria. Aí
vamos trabalhar com áudio e vemos a coisa aparecer de novo. É o
caso dos logaritmos, a base por trás das medidas em dB.
Os logaritmos assustam, mas são uma ferramenta poderosa que está aí
pra facilitar nossa vida, por incrível que pareça. Como sempre fazemos,
vamos primeiro entender a necessidade dessa “complicação
facilitadora”. A culpa é de nossos ouvidos.
Lembram quando vimos que os ouvidos deram um jeito esperto de
conseguir ouvir muitas frequências através do sentido de oitava? Pois
bem, quando se trata de volumes (intensidades), nossos ouvidos são
mais craques ainda. O que entendemos como audição é o que o nosso
tímpano percebe de vibração do ar, o que provoca variações de
pressão sobre ele. A quantidade de energia envolvida está relacionada
com o quanto essa membrana vai se deslocar pra frente e pra trás. Só
que ela é extremamente sensível. A diferença de pressão entre o som
mais intenso e o mais fraco que percebemos é da ordem de um trilhão
de vezes. Se a pressão mínima valesse 1, a máxima valeria
1.000.000.000.000. Ou seja, precisamos de um mecanismo capaz de
perceber uma gama extremamente alta de pressões possíveis. Vamos
guardar essa informação por enquanto.
Os logaritmos são um jeito de trabalhar com grandezas muito grandes
usando números pequenos, e de simplificar contas complicadas
também. Vejamos como. Vejamos a seguinte conta: 10 x 10 x 10 = 1000 .
A matemática tem um jeito prático de escrever isso, na forma de
expoentes: 10^3 = 1000. Em palavras, dez elevado a três é igual a mil. É
fácil entender que 10^4 é 10000, 10^5 é 100000 e por aí vai. Todo
mundo já percebeu que nesse caso o expoente é igual ao número de
zeros. Então, se eu escrevo 10^2 todo mundo entende que estou
falando do número...100. E 10^1 ? É o próprio 10. E agora, resumindo o
que levou horas pra entender na aula de matemática, quanto é 10^0 ?
Todos respondem agora animadamente: 1 , porque esse numeral não
tem nenhum zero.
Então se a gente combinar que estamos falando da base 10, se eu
disser apenas “4” , todo mundo sabe que na verdade estou falando do
número 10000. Em outras palavras, qual o expoente a que eu tenho que
elevar o número 10 pra obter 10000? A resposta é 4. Um jeito resumido
de dizer isso é afirmar que o logaritmo de 10000 na base 10 é 4 (log
10000 = 4). Então, meus amigos, qual é o log 1000000000000? Isso
mesmo, 12. Reparem que bastou eu escrever 12 para representar o
número 1 trilhão. Não é prático? No caso das contas, para multiplicar
dois números, basta somar seus logaritmos (10 x 100 = 1000 ou 1 + 2 = 3) ,
subtrair para dividir, multiplicar para elevar a uma potência e dividir
para tirar uma raiz – e isso era uma mão na roda quando não existiam
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calculadoras (as réguas de cálculo trabalhavam assim).


Bom, tá tudo muito simpático, mas é claro que a coisa não é tão
simples. Por exemplo, eu sei que o log de 10 é 1 e o de 100 é 2, mas qual
o log de 50? Bom, aí a coisa complica. Eu sei que é um número entre 1
e 2, mas não é 1,5 (na verdade o log 50 é 1,699...). Ou seja, temos que ir
na calculadora, mas pelo menos podemos ter uma ideia da grandeza
do valor. De especial importância para nós é o log 2 = 0,301... ou
aproximadamente 0,3. Vamos guardar no bolso mais essa informação.
Voltando à audição, o que nossos ouvidos fizeram foi ir ficando menos
sensíveis à medida que a pressão aumenta. Nós interpretamos que um
som com 10 vezes mais energia tem o dobro do volume. Então,
voltando a nossas medidas de pressão, imaginemos que o mínimo que
o ouvido percebe é o nosso ponto de 0 (não vamos nos preocupar com
unidades por enquanto). Quando houver dez vezes mais energia,
entenderemos isso como 1, e assim por diante, até que lá no topo,
quando ouvir começa a doer, e temos uma pressão 1000000000000
maior que o tal do mínimo, estaremos medindo algo como 12.
É isso que usaremos na próxima etapa pra medir em decibéis.

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93) INTERFACE É TUDO IGUAL?


Resposta curta: Não.
A discussão de hoje foi interessante e agradeço muito a colaboração
fundamental de Ricardo Felix Ranier Alves e Yago Marques , que nos
deram bons exemplos de equipamentos com diferenças apreciáveis.
Quando levanto a questão de que comparar áudio é dificílimo,
obviamente não estou desacreditando de meus colegas, vamos deixar
claro. É que esse assunto de comparação me deixa muito encafifado
mesmo.
É claro que esperar que gastando pouco numa interface eu terei a
mesma performance do que gastando muito seria muita ingenuidade.
Porém, não é uma garantia que uma interface mais cara será
necessariamente melhor. Este é meu ponto.
Para o nível de ruído ambiente que encontramos em estúdios pequenos
e home studios, é possível que muitas diferenças de qualidade acabem
se diluindo. Ao mesmo tempo, tento combater de todas as formas o
pensamento de que se eu juntar dinheiro e gastar em uma interface
cara (ou um pré caro) , o meu som vai melhorar. Posso dizer com certa
convicção que existe um monte de variáveis importantes. Gastar muito
em uma interface achando que isso irá resolver os problemas sonoros aí
sim é pensamento mágico.
Daí a defender que basta comprar uma interface qualquer que é tudo
a mesma coisa, já são outros quinhentos. Em todas as etapas do áudio
a gente deve procurar maximizar a qualidade. Então, em respeito aos
fabricantes que cuidam de seus projetos e buscam oferecer um melhor
produto, preciso fazer essa ressalva.
Existem duas situações importantes em questão. Quando se possui
alternativas de prés e conversores e quando tudo se concentra apenas
em uma interface. Nesse segundo caso, é preciso se evitar a sensação
de que o "meu som é ruim porque minha interface não é boa". Olha,
existem pouquíssimos casos em que isso é verdade. Isso não inviabiliza o
fato de que a gente pode escolher prés e conversores pelo som que
oferecem. Claro que sim, e de preferência sem olhar o preço.
Isso tudo foi apenas para ressaltar que particularmente não me deixo
levar pelo preço de um equipamento para atestar sua qualidade, até
porque em áudio o conceito de qualidade está profundamente
relacionado a sua relação com o utilizador. O que luto há muito tempo
é para tirar da cabeça das pessoas essa frustração a que muitos são
levados. "Ah se eu tivesse dinheiro para comprar uma boa interface".
Não cola. A enorme maioria das interfaces é boa o suficiente. Podem
soar diferente, mas certamente não são a fonte de seus problemas.
Aliás, provavelmente o problema é mais psicológico mesmo.
Tiro o exemplo dos plug-ins. Hoje, é possível a qualquer um conseguir
quaisquer plug-ins, independente do preço. Isso melhora o som das

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pessoas? É a falta de plug-ins que atrapalhava? Outro exemplo são as


guitarras. Se fosse possível "baixar" grátis uma Les Paul, todo mundo ia ser
Jimmy Page?
Finalmente, agradecendo mais uma vez a participação de todo
mundo, fica aqui de novo meu ponto de vista. Hoje em dia, com a
tecnologia do jeito que está, é dificílimo que a "culpa" de um som ruim
esteja no equipamento. Ao mesmo tempo, o fato de possuir
equipamentos mais sofisticados também não garante qualidade
sonora, porque usar mal um equipamento caríssimo é tão fácil quanto.

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94) O SOM DOS "GRINGOS"


Se há uma coisa que me deixa irritado é esse papo de "gringos". Esse
complexo de viralatas que nós temos, sempre dando credibilidade a
engenheiros americanos e ingleses (mais a engenheiros americanos e
produtores ingleses) , independente do que estão falando. Se um
"gringo" fala algo que parece uma bobagem, o problema devo ser eu e
não ele. Afinal, ele gravou o disco da Fulana, que foi sucesso.
O fato de ser "gringo"pode apresentar uma certa vantagem, pois se
trata de um mercado maior, com mais história nas gravações
comerciais de sucesso. Esses caras inventaram os jeitos de gravar que
temos usado, tudo certo. Mas hoje em dia nós não estamos aqui
fazendo imitações pobres. Temos o nosso som, e depois de tantos anos,
temos a nossa autoridade para criar e opinar.
Quando meu trabalho fica bonito e alguém gosta muito, dá uma
enorme tristeza ouvir que ficou "gringo". Mas o pior é quando alguém
me pede pra copiar o som de um "gringo" que acabou de aparecer no
mercado e não faz nada de mais, na maioria das vezes reinventando a
roda e deixando ela um pouco quadrada.
Putz, são 25 anos de áudio, mais de 400 CDs, mais de 4.000 mixagens
rodando no mercado, 45000 horas de estúdio e alguns Grammy e muita
gente quer que eu faça o "som de fulano". Será que ainda não tenho
personalidade pra fazer o "meu som"? Se eu não copiar de um "gringo"
a música tem menos chance de fazer sucesso?
Não estou dizendo que influências são ruins. Pelo contrário, fazer-se
valer de influências é saudável e produtivo, desde que elas sejam
apenas influências e tendências. Agora, ficar comparando mixes pra
ver se estamos "colando no gringo" é muito desagradável. Afinal, se a
gente trabalhar extremamente bem, conseguiremos no máximo, ser
uma imitação. E, detalhe, esse mesmo "gringo", que fez essa música seis
meses atrás, já está em outra, provavelmente diferente dessa.
O maior elogio que já ouvi foi quando me disseram: "Só de ouvir essa mix
eu saquei que era sua!". E reparem que ele não disse que ela estava
boa ou ruim, mas disse que era nitidamente minha. Foi minha maior
recompensa.

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95) ALL ALONG THE WATCHTOWER


Quem gostaria de voltar a assistir um filme em VHS numa tv de tubo de
525 linhas? Ou de voltar a usar um celular daqueles que eram só
telefone e tinham uma "tampa" que a gente abria pra falar? Quem se
habilita a trocar seu Spotify por um rádio AM? Ou o seu Waze por uma
pergunta ao balconista do bar?
Mas em áudio não é assim. Existe esse sentimento generalizado de que
a tecnologia prejudicou o som das coisas. E o pior é que a lógica é mais
ou menos assim: "Antigamente se fazia música boa que fazia sucesso e
vendia disco, então vamos usar o equipamento que os caras usavam e
pronto. O segredo deve ser esse."
Parece que ninguém se preocupa em verificar se a qualidade da
música produzida é boa, ou se o perfil do consumidor é o mesmo
daqueles tempos.
O mundo inteiro mudou. E é preciso que tecnicamente reconheçamos
que nunca se teve tanta qualidade disponível a um preço tão baixo
para quem produz música quanto hoje. Nosso equipamento - inclusive o
software (leia-se plugins) é de muito mais qualidade técnica do que o
que se usava de 15 anos pra trás. E o preço nunca foi tão baixo quanto
agora.
As pessoas ficam muito saudosistas e acabam erroneamente convictas
de que o equipamento antigo era melhor. Um amigo meu já disse em
uma música que "só se tem saudade do que foi bom", e tem razão.
Ninguém sente falta de perder 20% de uma sessão de gravação
esperando a fita voltar, ou de ter só 24 canais no gravador, ou de uma
fita só gravar 16,5 minutos. Ninguém sente falta de um HD de 1 Giga
que custava 1000 dólares, ou do Protools 5.3 (Deus o tenha).
Fica essa crença generalizada de que o som das coisas era melhor que
hoje, mas isso é apenas romantismo. Esses dias mesmo eu gravei uma
recriação de All Along The Watchtower, na versão do Hendrix, e posso
dizer com a maior tranquilidade duas coisas: é um dos 10 melhores rocks
de todos os tempos e, comparado ao que é possível hoje, o som é
muito ruim.
Antes que comece o tiroteio, peço um pouco de calma. Tecnicamente
hoje se faria muito melhor, e disso não fica a menor dúvida. Agora,
nunca ninguém vai fazer o que Dylan e Hendrix fizeram. Não é disso que
estou falando, porque não foram os prés que fizeram a música pro
Dylan, e não foi o console que disse ao Jimi o que fazer. Qualquer um
tem hoje facilmente o som do clavinet de "Superstition", mas ele não
vem com o Stevie Wonder. E também é claro que não há mal nenhum
em se preferir aquela sonoridade à de hoje. Arte 'arte, e gosto é gosto.
Minha questão é: com a tecnologia de hoje, a gente consegue "piorar"
(digamos assim) a qualidade para chegar ao som do Hendrix original,
mas aquela galera, com aquele equipamento, por mais que tentasse,

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não chegaria nos níveis de qualidade técnica que é possível hoje. Isso
não os faz artisticamente piores, nem nós melhores. Só deixa as coisas
hoje mais fáceis, rápidas e baratas.
Se eu tenho a pretensão de ter conseguido um som melhor que o do
Hendrix? Claro que não. Mas conseguir aquela sonoridade com as
ferramentas de hoje é só questão de opção. Antigamente, era falta de
opção.

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96) 16 BITS É POUCO MESMO?


Mais uma crença muito difundida no áudio é a de que 16 bits é uma
quantização insuficiente. Antes de mais nada, precisamos lembrar que
16 bits correspondem a 96dB de relação sinal/ruído, coisa que um
circuito analógico tem que suar muito pra conseguir.
A gente olha para o número 16 e acha ele pequeno, mas esquece do
poder da potenciação. Esse 16 corresponde a 65536 valores. O
problema é que a gente não tem uma noção mental de quanto
realmente é isso.
Por exemplo, peguemos uma desprezada moeda de R$ 0,05 (pobre
Tiradentes). Pois bem, 16 bits de moedas de 5 centavos são R$ 3276,80 .
Se a gente empilhá-las, consegue uma coluna de 108 metros de altura
(um prédio de 30 andares).
Se a gente faz uma pilha de papel sulfite de 6,5 metros de altura, 1 bit
corresponde a uma folha.
Contar de 1 a 65536 leva 18 horas.
Mas vamos a uma coisa mais fácil de visualizar: vamos fazer uma pilha
de latas de cerveja? Com 16 bits de latas, temos 8200 metros de altura.
Mais ou menos 20 toneladas de cerveja!!! Agora a gente começa a
gostar de 16 bits...

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97) CHEGA DE 1176s !


(ou A Síndrome de Curupira)
No início dos anos 1990, era um esforço heróico se conseguir fazer
plugins. Equalizar, comprimir e reverberar eram tarefas bem
complicadas, na época. Então a gente já ficava muito feliz de
conseguir ter esse básico de processadores digitais à disposição. Se o
som era bom? Sinceramente, eu era feliz e entusiasmado. Pra quem já
teve que afinar usando apenas Pitch Shift e um tom de referência,
Melodyne é coisa dos deuses.
Daí, com o desenvolvimento da tecnologia de convolução e impulse
responses ( e ao mesmo tempo das CPUs e demais equipamentos
digitais), começou a enorme revolução que a emulação de
equipamentos clássicos representou.
A indústria do áudio sempre foi coisa pra poucos, pela baixa demanda
e pelos preços proibitivos. Os estúdios grandes pertenciam às
gravadoras porque só elas tinham a quantidade de dinheiro necessária.
Os processadores eram meio que artesanais, e podiam se dar a esse
luxo. E realmente, a tecnologia do áudio de alta qualidade pré-digital
chegou a extremos de requinte e eficiência.
Grandes hits que estão até hoje em nossas memórias eternizaram uma
certa sonoridade e um jeito de fazer áudio. E com isso, as ferramentas
usadas para consegui-los se consolidaram como grandes fundações da
sonoridade geral.
Nada mais natural que usar a nova tecnologia para recriar digitalmente
esses equipamentos – mesmo que isso no fundo represente uma
tentativa desesperada de se conseguir na verdade o sucesso daqueles
hits, mais do que sua sonoridade.
Obviamente a indústria sente uma enorme atração pelo glamour que
esses equipamentos apresentam. Então começou a onda de
emulações, com o reforço da crença difundida de que os
equipamentos possuem um calor, uma musicalidade, um “mojo” que os
digitais - estéreis e gelados – não conseguem. Um marketing
conveniente, reforçado pela falta de conhecimento generalizada de
como o áudio digital realmente funciona. E daí a coisa foi ganhando
vulto.
Hoje o que temos é uma enxurrada de emulações. Existem dezenas de
plugins que até visualmente tentam passar ao consumidor a ideia de
que ele pode ter em suas mãos o mais próximo possível de um 1176, de
um 660, um LA2A, um EQP, e por aí vai. É claro que a primeira pergunta
que se faz é se eles soam iguais aos originais. E daí eu pergunto “pra
quê?”.
Um enorme parêntese agora: eu já usei esses equipamentos
praticamente todos, e posso garantir a meus fieis leitores que eles
realmente são únicos. Soam incríveis (dependendo da manutenção) , e

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sua fama está preservada justamente por causa de seus projetos


brilhantes. São vitórias da engenharia eletrônica.
Agora, uma pessoa começando recentemente, que nunca ouviu um
equipamento desses, e provavelmente nunca ouvirá, precisa se
preocupar com a fidelidade? Pra quê? Sua música não vai ser um hit
porque o som do plugin do 1176 não é exatamente igual ao original?
Tem certeza?
Acho que já está na hora de agradecermos muito a todo mundo que
se dedicou durante os últimos anos e dizer: Chega de 1176s! Já temos o
suficiente! Não precisa fazer mais uma emulação! É hora de andar pra
frente!
Ficamos todos com essa Síndrome de Curupira, andando pra frente
com os pés virados pra trás, e sem ganhar nada com isso. Existem vários
desenvolvedores com trabalhos brilhantes que podem até se inspirar
nos clássicos, mas que não usam isso como cavalos de batalha.
É hora de nós como usuários começarmos a valorizar plugins que são
bons justamente porque não tentam imitar ninguém. Essa ideia fixa de
copiar hardware para ganhar aceitação no mercado não ajuda
ninguém. Vejo várias empresas que lançam como primeiro produto uma
cópia do LA-2A. Não dava pra ter a coragem de dar uma ideia nova?
Vejam a PSP, a Fabfilter, a Tokyo Dawn, a Klanghelm, a Sound Spot, e
tantas outras, que mesmo até se inspirando em antiguidades, têm a
coragem de fazer novos produtos.
Estamos caindo em uma monotonia sonora que está deixando tudo
meio sem graça. Como diria Jacb Dylan, “a única novidade é que está
tudo exatamente como sempre foi”. Um monte de gente reclama que
a música está sem inovação, quando nós, técnicos, fazemos questão
de soar igual.
Como artistas/técnicos que somos, temos um compromisso com a
transgressão, com o novo, com o inusitado, e ficar copiando 1176 não
vai ajudar em nada.

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98) O QUE IMPORTA É O RESULTADO?


Estava hoje trabalhando e pensando numa coisa que constantemente
leio aqui, e confesso que muitas vezes também falo: O que importa é o
resultado. Mas, pensando bem, será mesmo?
Eu acho que depende. Para quem mixa artesanalmente, pesquisando
com calma sonoridades próprias e etc, é possível que o importante seja
como a coisa ficou. Porém no mundo real, onde não existe almoço
grátis, o jeito como se chega ao resultado acaba sendo tão importante
quanto ele em si.
Vivemos uma fartura de plugins e uma facilidade enorme em se obtê-
los, e isso acaba acostumando mal as pessoas. A gente vê o tempo
todo coisas como canais com três equalizadores e três compressores
diferentes, dois reverbs juntos num mesmo canal, reverbs insertados em
um monte de canais, e por aí vai. De fato, se o resultado agradou, isso
EM UM PRIMEIRO MOMENTO, é o que importa, mas com a continuidade
das coisas, é preciso se desenvolver a capacidade de ser econômico,
prático e rápido.
Isso tudo porque existe o resultado e o Resultado. Meu lado pessimista
costuma dizer que "se a gente esperar tempo suficiente, todo mocinho
morre no final". Como diria Renato Russo, "o pra sempre sempre acaba".
Ou seja, pode parecer que acabar uma mix de modo satisfatório seja o
objetivo, mas que tal acabar a mix de modo satisfatório e uma hora
mais cedo? Que tal chegar em casa num sábado a tempo de curtir a
família? Ver um episódio dos Irmãos à Obra?
Se você tem um cliente, num primeiro momento, certamente esse foco
no resultado pode causar uma boa impressão. A coisa começa com
"como ele é caprichoso! levou uma hora fazendo o som da guitarra!"
mas depois de sete músicas se transforma em "como ele é lerdo! levou
uma hora pra fazer o som da guitarra!!".
Então, meus amigos, em algumas situações, o que importa é realmente
o resultado, mas cada vez mais a gente deve se preocupar em como
fazer para otimizar sempre as coisas, conseguindo a mesma qualidade
com menos recursos e menos tempo. Isso não é superficialidade: é bom
senso.
E se todos os dias vc tem que começar do zero, reinventando suas mixes
todas de novo, como diria Jonathan Scott: "Acho que temos um
problema..."

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99) O QUE EU GANHO GRAVANDO EM 96kHz ?


Quem me acompanha aqui, sabe de minha posição a respeito de
"altas sample rates" e "áudio de alta definição".
Resumindo, para os mais afoitos, não acho errado usar. Acho
desnecessário e dispensável, porque não se ganha nada gravando em
sample rates acima de 48kHz. Ou melhor, ganha-se o que não se queria,
conforme veremos a seguir.
É aquilo, você usa e é feliz? Tudo certo. Mas para quem quer realmente
saber o que acontece, vamos lá.
Não posso deixar de listar os diversos argumentos que tenho ouvido a
favor dessas coisas, e portanto, vamos a eles, um por um. Quem usa
altas sample rates, como 96kHz, geralmente justifica com:
1) Eu ouço a diferença.
Nem precisaria comentar essa, porque, afinal, esse tipo de afirmação é
totalmente subjetivo. Fazer um teste isento é muito difícil, e em tudo
quanto é experiência controlada o resultado é justamente o oposto.
2) Mais frequência significa melhor qualidade.
Quem afirma isso infelizmente precisa estudar um pouco de teoria de
áudio digital. Da mesma forma que uma TV que reproduza ultra violeta,
ou uma câmera de 100 Mega pixels, não adianta o equipamento ser
capaz de reproduzir coisas que o ser humano não é capaz de
perceber. Aumentar a sample rate significa apenas registrar frquências
que não somos capazes de ouvir.
2,5) Os filtros digitais provocam aliasing em torno de 20kHz
Quem afirma isso precisa ler algum livro escrito depois de 1995. Depois
do oversampling isso não é mais problema.
3) Já que pode, por que não?
Essa eu divido em duas partes. Primeiro, porque desperdiçar recursos
não é uma boa política. Espaço em HD anda sobrando? RAM à
vontade? Bem, se formos apelar para o politicamente correto, fazer HD
e RAM gasta água e gera CO2 (talvez isso sensibilze alguns). Para o
resto, a taxa de acesso ao HD fica mais alta, o número de canais da
DAW diminui, e etc.
Agora, para a segunda e mais importante parte, aguarde mais um
pouco.
4) Gravando em 96kHz eu registro a interação de frequências acima de
20kHz cujo resultado aparece abaixo de 20kHz.
É essa derradeira afirmação que quero atacar hoje. Isso é uma mera
suposição, e eu decidi tirar a teima e mostrar aqui. Vejamos:
Toda vez que se usa um equipamento analógico (ou a parte analógica
de um equipamento digital) , temos a presença de um ruído de fundo,
gerado pelo próprio equipamento. Não dá pra evitar. Ele sempre estará
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lá. maior ou menor. Hoje eu gravei o ruído de fundo de dois prés tidos
como entre os melhores do mundo: os Neve 1084 e 1073. Mas o
resultado seria o mesmo com quaisquer prés de qualidade.
Na primeira figura, temos o ruído de fundo do 1084 e na segunda o
ruído de fundo do 1073, gravados em 96kHz. Em ambos eu passei um
filtro de graves em 10kHz, Então só estamos registrando frequências
acima de 10kHz.
Reparem que há ruído (extremamente pequeno, é verdade) , até os
48kHz, como era de se esperar. Na terceira figura, eu somei esses dois
áudios, sem nenhum filtro. Ora, deveriam aparecer frequências abaixo
de 10kHz, resultantes da interação entre as frequências altas dos dois. Só
que não aparece nada, mesmo dando um zoom até -150dB (muito
abaixo do limite da audição).
Ou seja, com ruído branco, que tem todas as frequências possíveis, não
registrei nada pela combinação delas abaixo de 10kHz.
Assim, não há vantagem nenhuma em usar 96kHz. E mais ainda,
concluindo o item (3): Já que pode, por que não? Porque ao gravar em
96kHz vc estará captando chiado acima de 20kHz, que pode ser bem
alto. Ele estará sempre lá, mesmo que o áudio que nos interessa não
esteja.

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100) COMO CONTROLAR O VOLUME DE MINHA MIX?


Um membro do grupo me fez essa pergunta. Informa que tentou por
várias vezes, investiu uma boa grana e ainda assim não consegue uma
uniformidade. Me pergunta também se algum equipamento do tipo
VRM ajudaria.
Bom, antes de mais nada, esse problema não só é muito comum, mas
também é o mais crítico numa mixagem digital.
A primeira coisa que se pode fazer é ter calma e não entrar em
desespero. Existem várias soluções. Vamos ver algumas:
1) Se o volume entre os instrumentos está ok, então a melhor coisa a
fazer é contar com um masterizador. A função dele é justamente
encontrar o volume ótimo para sua mix. É uma solução mais barata que
investir em equipamentos - principalmente se não temos a certeza de
como usá-los.
2) Não existe um equipamento mágico que vai resolver o seu problema
de inconsistência de volume. Um VRM ou coisa parecida vai mais
atrapalhar do que ajudar.
3) Esqueça essa história de "ouvir em vários lugares". Isso só aumenta a
incerteza, pois cada lugar é diferente. O desafio é apenas fazer sua mix
funcionar no seu lugar de trabalho. Se isso rolar, 90% do problema já
foram.
4) Para "calibrar" o seu lugar de trabalho - a sua monitoração, ouça
muitas músicas parecidas com seu estilo. Ouça muitas mesmo, mas com
ouvido técnico, tentando estabelecer uma memória de como as coisas
soam no seu monitor.
5) Ao longo dessa audição, ache um volume (no botão de volume das
caixas mesmo) em que você gosta de ouvir essas músicas. Vc vai ver
que o seu valor confortável será sempre mais ou menos o mesmo.
6) Marque esse lugar no botão e nunca mais mexa nele. Esse é o seu
volume confortável de trabalho e ele deve ser uma âncora. Pode até
ser útil no futuro que vc compare sua música com volumes diferentes,
mas até vc estabelecer uma memória de volume, não mexa nesse
botão.
7) Comece uma mix colocando o botão do volume do monitor nessa
posição de conforto. Agora, escolha um instrumento, ou grupo de
instrumentos para ser sua âncora de volume. Eu faço isso com a bateria.
Faço um grupo de bateria e através de um limiter "travo" o volume em -
4dB (algumas pessoas partem de -6, ou outro valor, não importa).
8) Agora, construa toda a sua mix comparando o volume de cada
instrumento com essa âncora. Procure não alterar mais o volume da
âncora, ou sua referência vai embora.
9) Mais para o final da mix, vc pode afinar mais esses valores, mas deixe
para o fim mesmo.
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10) Trave também o master para que o volume não ultrapasse,


digamos, -1dB. O tempo todo vc vai ter que monitorar esses dois limiters
(bateria e master) para ver se não estão atuando demais, Se estiverem,
reduza os volumes dos canais dos grupos.
11) Aos poucos, com a repetição do processo, seu cérebro vai começar
a memorizar os volumes. De tanto eu fazer isso, hoje eu consigo saber a
posição do botão de volume das caixas só ouvindo a mix.
12) E mais uma vez, esqueça "técnicas" como ruído rosa, simuladores ou
coisas do gênero, Aprenda a relação entre volume que vc ouve e
volume que está na mix para a sua sala. Domando sua monitoração, o
volume da mix não só vai pro lugar, como tenderá sempre a ir prá lá.

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101) O QUE EU GANHO USANDO UM SUMMING AMP?


Como já afirmei aqui anteriormente, não existe nenhuma necessidade
técnica de se passar o áudio que está dentro de uma DAW por um
summing ou console analógico externo.
Não há nada que precise consertar ou melhorar. Agora, se a pessoa
deseja a sonoridade que isso proporciona, pagando o preço de uma
conversão D/A e A/D a mais, então , como sempre, é uma questão de
gosto.
Tecnicamente, sem entrar no mérito se a coisa soa melhor, ou mais
"quente", o que um summing acrescenta é distorção harmônica e ruído
de fundo. Apesar do nome negativo, essa distorção pode ser
interessante, pois aumenta o conteúdo harmônico. Agora, ruído é ruído.
O chiadinho, por menor que seja, vem com a coisa.
Na figura, podemos ver a resposta de um sinal que seguiu por dentro do
Pro Tools (esquerda) e que passou por um summing com fader em 0dB
(direita). O que se vê ali no extemo agudo é o que se "ganha" ao passar
no summing, mesmo sem mandar áudio nenhum: chiado.
E olhem que esse summing é de um dos dois maiores fabricantes de
áudio do mundo.

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102) Gravação de Voz - Fabio Henriques


Publicado em 01/11/2002 -Revista Música e Tecnologia
Características da Voz como Instrumento
A dificuldade que a voz apresenta ao ser gravada vem de alguns
fatores bastante característicos que veremos abaixo.
Faixa Dinâmica Extensa: é comum encontrarmos performances onde
existe uma variação de nível muito grande, com o cantor emitindo
baixo demais em alguns trechos (principalmente, os mais graves) e alto
demais em outros (geralmente, nos agudos). Os momentos mais altos
podem ocasionar a saturação do gravador e até mesmo do circuito do
microfone, enquanto os mais baixos, por não terem volume suficiente,
provavelmente terão um som de qualidade pior. Uma primeira solução
poderia ser o fato de informar ao cantor do problema e contar com a
sua habilidade técnica para corrigi-lo. Porém, isto raramente funciona,
só servindo para deixar o cantor mais preocupado com a técnica e
menos à vontade. Por isso, contamos com nossos recursos para
minimizar a faixa dinâmica, sendo os dois mais usados o compressor e a
pilotagem do fader. Mais adiante veremos como usá-los.
Alteração de Timbre: freqüentemente, a variação de volume vem
acompanhada de uma forte variação de timbre ao longo da música.
Isto ocorre por causa da variação da distância do microfone (que
apresenta um som mais grave ao se cantar mais perto - o chamado
"efeito de proximidade") e também por causa da diferença na emissão
da voz pelo cantor. A maneira mais comum de se corrigir este efeito é
através do uso de equalizadores. O plug-in Mic Modeler também é
excelente para contrabalançar o efeito da variação da distância da
boca ao microfone.
Ruídos de Execução: tipicamente ocorrem três tipos de ruídos gerados
pela voz. A sibilância, que é a captação dos "esses" com nível muito
alto; os puffs que aparecem na emissão de consoantes como "p" ou "b"
e ruídos ocasionados pelo movimento dos lábios, da boca ou da
mandíbula, aparecendo como pequenos estalos, principalmente,
quando o cantor abre a boca para começar uma frase. No caso da
sibilância, podemos alterar a posição do cantor e do microfone e usar
um dispositivo (ou plug-in) chamado de-esser. Para os puffs coloca-se
uma tela (o pop filter) na frente do microfone para diminuir a
velocidade do ar que chega à cápsula. Para os outros ruídos, se não for
possível afastar mais o cantor, só mesmo limpando o canal de voz
posteriormente com uma ferramenta do tipo Pro Tools.
Interpretação: todos nós usamos e ouvimos vozes todos os dias durante
várias horas. Por isso, este é o instrumento musical mais tocado e,
certamente, o que causa maior impacto. Nossa ligação com o som de
voz é bastante profunda, começando ainda antes de nosso
nascimento, durante a gestação. Por isso, gravar bem uma voz envolve
não só fazê-lo tecnicamente certo, mas também psicológica e
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artisticamente convincente. Em outras palavras, não basta a voz estar


afinada e no tempo pois, além disso, ela deve apresentar uma boa
interpretação.
Disposição do Cantor: a voz é o único instrumento cujo timbre depende
do seu próprio estado de espírito. Além disso, é o único que fica rouco,
afônico, gripado, mal-humorado, etc. Nossa tarefa é fornecer as
melhores condições ao cantor tanto relativas ao som (principalmente,
nos fones) quanto ao ambiente em que a voz será gravada
(iluminação, temperatura, tranqüilidade etc.) O técnico deve lembrar
sempre que a sua atitude em relação à gravação influencia
decisivamente em uma boa performance.
Microfonação
Normalmente, os melhores microfones do estúdio são os usados para
voz, sendo os mais utilizados os condensadores de diafragma grande.
Existe uma tendência geral para se usar os condensadores valvulados,
embora haja transistorizados com excelentes performances. Assim
muitos podem achar que o microfone mais caro é melhor para se usar,
mas nem sempre isto é verdade. Sempre que possível, vale a pena
testar a voz com vários microfones, escolhendo o mais adequado
àquela pessoa e àquele estilo. Por exemplo, Paul Rodgers só canta com
o Shure SM57 - um microfone dinâmico de baixo custo.
A configuração mais usada é a cardióide. A omni pode ser usada se
estiver ocorrendo muito efeito de proximidade, ou para maior
fidelidade, mas deve-se tomar cuidado em verificar se a acústica da
sala não interfere. As salas menos vivas são indicadas. Para as salas
onde há maior reverberação natural recomenda-se o uso de anteparos
em volta do cantor para diminuí-la.
Qualquer que seja a sua opção de microfone (e na realidade dos
estúdios menores existe apenas um bom microfone disponível), deve-se
tomar muito cuidado com o posicionamento. Um bom lugar para se
colocar o microfone é diretamente à frente do cantor, com o
diafragma na altura do nariz e inclinado ligeiramente para baixo a fim
de apontar diretamente para a boca. Se o timbre estiver muito opaco e
se a sibilância não atrapalhar, experimente colocá-lo à altura da boca
e exatamente na vertical.
Se houver excesso de sibilância, pode-se tentar inclinar mais o
microfone, ou colocá-lo ligeiramente de lado. Lembre, porém, que isto
terá uma tendência de diminuir o brilho do som da voz. Para diminuir os
puffs, usa-se o pop filter, que é colocado entre o microfone e o cantor.
O pop filter é ótimo também para manter o cantor longe do microfone,
ajudando a reduzir os puffs e evitando o aumento dos graves devido ao
efeito de proximidade.
A distância típica entre o cantor e o microfone deve ser de cinco dedos
a um palmo, facilmente delimitada pela colocação do pop filter. Se o
cantor tiver uma boa técnica de microfone, pode-se reduzir esta
distância e deixar que ele se movimente mais para perto quando julgar
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necessário. Existe, porém, uma tendência muito comum nos cantores de


irem se aproximando cada vez mais do microfone com o passar do
tempo. Verifique constantemente a distância. É freqüente também a
estante de microfone sofrer pequenos deslocamentos que mudam a
altura. Vale a pena verificá-la. Tome cuidado ao posicionar o
microfone, pois muitos cantores cantam apontando o rosto para cima
ou para baixo enquanto outros costumam flexionar um pouco os
joelhos.
Para se microfonar coros (backing vocals), costumo usar dois cardióides,
um para os homens e outro para as mulheres. Os dois grupos são
colocados um de frente para o outro para aumentar o isolamento de
cada microfone. Como um microfone estará de costas para o outro, o
vazamento estará chegando a cada um deles justamente na região de
menor sensibilidade. Os dois grupos podem ser gravados em um mesmo
canal, embora gravar separadamente permita maior facilidade de
equilíbrio posterior. Quando não for conveniente ou necessário dividir os
cantores, pode-se usar um microfone em omni para dar mais liberdade
de posicionamento a eles. Para grupos de até três pessoas a maioria
dos cardióides funcionará. Especial atenção deve ser dada aos
vazamentos de fones.
Para corais a situação mais problemática é a dos fones. Raramente o
estúdio disporá de um fone para cada cantor e, se dispuser, os
vazamentos poderão incomodar bastante. Outro aspecto é que muitos
cantores de coral nunca cantaram de fone e também precisam ouvir a
voz do companheiro do lado para uma melhor afinação. Assim, pode-
se optar por monitorar através de caixas, tocando só a base dentro do
estúdio. Extremo cuidado, porém, deve ser tomado pois certamente
haverá vazamentos que serão impossíveis de tirar na mixagem. Uma
sugestão adicional é colocar o coral de costas para uma parede com
alta absorção acústica, reduzindo assim as reflexões do som das caixas
de monitor que chegariam à frente do microfone.
Certifique-se de que a base não tem nenhuma informação que não
será usada na mixagem, como metrônomo ou voz guia. De preferência
não mande bateria para esta caixa, pois será mais difícil de esconder
na mixagem. Um terceiro método pode funcionar eventualmente, que
é mandar fones só para o regente e para alguns elementos-chave no
coral. Este caso pode ser tentado se a base não for muito ritmada, por
exemplo.
A colocação de microfones para corais grandes pode usar as técnicas
estéreo (X-Y, M-S, etc). A mais interessante talvez seja o par espaçado
de omnis (a chamada técnica A-B), com um microfone central extra
também omni para corais muito grandes. Lembre-se de deixar
microfones de detalhe se houver solistas. Muito cuidado com as
diferenças de fase. Verifique se não está ocorrendo alteração sonora
muito grande em mono.
Voltando ao caso da gravação de voz principal, uma questão
interessante é se devemos colocar o microfone em pé ou de cabeça
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para baixo. Para os transistorizados, tanto faz, dependendo apenas da


vontade do cantor. Se ele precisar ler a letra, a posição invertida será
melhor e se ele gostar de ter contato visual constante com a técnica
pode-se optar pela posição normal. Para os valvulados alguns técnicos
defendem a posição invertida porque o calor gerado pela válvula
aquece o ar em volta do microfone e este ar tende a formar um fluxo
ascendente. Se o microfone estiver na posição normal, este fluxo de ar
quente ao passar na frente da cápsula pode alterar o som. Tudo bem
que este motivo é bem sutil, mas tem fundamento.
Ler a letra ao cantar pode se tornar um fato bastante problemático.
Primeiro porque o conjunto do pop filter mais o microfone representa
um obstáculo considerável à visão e também porque a presença da
estante com a letra próxima ao microfone pode ocasionar reflexões
sonoras indesejáveis. O microfone e o pop filter devem ser colocados de
forma a atrapalhar a visão o mínimo possível. Observe com cuidado se
o cantor não está virando o rosto para ler a letra, o que ocasionará
mudanças de timbre. Quanto à estante onde a letra é colocada, o som
da voz refletido em sua superfície pode chegar ao microfone e
provocar cancelamento de algumas freqüências se ela estiver próxima
demais, devido ao efeito chamado filtro pente. Por isso, procure usar
estantes vazadas, tais como aquelas dobráveis usadas para partituras, e
mantenha a letra o mais longe possível do cantor - provavelmente
imprimindo-a com letras grandes.
A escolha do pré-amp segue os mesmos princípios dos microfones.
Geralmente, os melhores (leia-se "mais caros") tendem a dar melhores
resultados, mas vale bastante a pena testar várias opções (quando elas
existirem, é claro). Os pres valvulados costumam ser mais suaves, mas
normalmente apresentam ruído de fundo mais alto.
Os Fones
Se o microfone e o pré são importantes para uma boa captação do
som da voz, dos fones dependerá a qualidade da voz emitida, já que
eles influem diretamente na afinação, na consistência dinâmica,
tímbrica e na interpretação. Segundo minha experiência, não existe
nenhuma relação direta entre voz baixa no fone e afinação alta ou
vice-versa. O que tenho constatado é que para cada pessoa existe um
nível bem definido para a voz em relação à base que faz com que ela
cante afinado. Se a voz estiver acima ou abaixo deste tal volume, a
pessoa desafinará (para cima ou para baixo). Para achar este volume,
comece com uma mix de fone que esteja boa para você e passe a
música com o cantor. Se ele não estiver afinando, experimente abaixar
ou aumentar um pouco o volume da voz nos fones até que se perceba
uma melhoria na afinação. Alguns cantores sabem exatamente como
seus fones devem estar e ajudam muito os técnicos; outros não têm a
menor idéia mas são bastante precisos ao solicitar esta ou aquela
alteração de equilíbrio. O pior caso são os que pensam que sabem o
que estão falando e acabam desequilibrando completamente a

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monitoração. Infelizmente, não há como saber de antemão qual é o


caso, e você deverá se adaptar a cada pessoa.

Ao fazer o equilíbrio dos fones, leve em conta não só que a mixagem


deverá ser boa, mas também que o cantor deverá se sentir seguro com
ela. Use, então, um par de fones na técnica e vá fazendo a mixagem
com eles no ouvido. Evite a tentação de fazer as mandadas de olho -
embora você, provavelmente, já tenha uma perfeita noção de como
está o equilíbrio dos fones só olhando para as mandadas, o cantor
poderá se sentir bastante inseguro, achando que você não dedicou a
atenção necessária a este aspecto tão importante. Na primeira vez que
você gravar um determinado cantor, além de fazer o equilíbrio usando
fones na técnica, vá até o estúdio e ouça o fone da posição do cantor,
aproveitando para testar o microfone. O assistente de estúdio poderá
fazer as alterações nas mandadas que você indicar. Aproveite para
verificar o reverb e a sibilância - uma boa maneira é contando de 60 a
66 forçando os esses, o que também é legal porque sai do famoso "alô,
som!" e "um, dois, três; testando".
Lembre-se também que muitos cantores passam o equilíbrio de seus
fones apenas ouvindo, esquecendo que ao cantar o som chegará a
seus ouvidos de duas fontes, dos fones e do seu próprio corpo. Peça,
então, que ele cante um pouco com a base para verificar se o
equilíbrio está mesmo certo.
Tome cuidado com o volume total dos fones, pois eles podem vazar
facilmente para o microfone. Use-os no menor volume possível que
ainda seja confortável para o cantor. Se você começar com eles altos,
a fadiga auditiva poderá prejudicar o cantor depois de algumas horas.
Se ele estiver usando os fones com volume alto, deixe claro que eles
não deverão ser retirados da cabeça próximo ao microfone, para que
não haja realimentação (microfonia). Se o cantor gostar de tirar um dos
fones para afinar melhor, peça que ele o mantenha colado à cabeça,
ou cancele você a mandada do som para aquele lado. Previna-se
quanto ao hábito muito comum de o cantor acabar de cantar e
pendurar os fones no microfone!
Os vazamentos durante a gravação de coros e backing vocals são
críticos, embora não sejam um problema tão sério porque estas vozes
são usadas em menor volume nas mixagens. Cuidado, porém, para que
nas mudanças de formação ou de música não sejam esquecidos fones
ligados dentro do estúdio.
O Ambiente
É bastante cruel a tarefa do cantor. Deve dar o melhor de si em uma
sala que o ar condicionado deixou fria e com baixíssima umidade,
ouvindo a música e sua voz de uma maneira nada natural (os fones),
sabendo que qualquer falha será notada, que todos os seus
movimentos estão sendo julgados e por aí vai. Nossa tarefa é fazer com
que o ambiente seja o mais confortável possível, física e
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emocionalmente. Tudo deve ser levado em conta. Retire todos os


instrumentos possíveis da sala, verifique se não há poeira, mande aspirar
o tapete na véspera (uma rinite alérgica pode arruinar o dia), ajuste a
temperatura e a iluminação de acordo com o gosto do cantor. Procure
usar iluminação indireta e - importantíssimo - não deixe que haja
contraste térmico entre o estúdio e a técnica (gripes podem arruinar a
semana inteira).
Deixe sempre uma cadeira confortável à disposição e, principalmente,
uma jarra de água à temperatura ambiente, mesmo que ele não peça.
A hidratação das cordas vocais é importantíssima para uma boa
performance e para que a voz dure mais tempo. Café ou chá deve ser
deixado à disposição, mas não necessariamente dentro do estúdio.
Além das características físicas do ambiente, a sua atitude e a das
outras pessoas dentro da técnica devem ser cuidadosamente
avaliadas. Peça ao produtor, com antecedência, que restrinja
fortemente o número de pessoas no estúdio durante a gravação das
vozes. Visitas neste momento serão sempre inconvenientes. Como diz o
velho ditado: "no estúdio ou você está trabalhando ou atrapalhando".
Se julgar necessário, reduza as luzes da técnica também ao mínimo
para não distrair o cantor. Tenha uma cópia das letras à mão e reduza
ao máximo a possibilidade de telefonemas ou outras interrupções. Mais
importante do que qualquer outra coisa: mantenha a atenção no
cantor e na performance. Evite conversar e, principalmente, rir e fazer
gestos enquanto o cantor estiver gravando. Demonstre interesse e dê
sua opinião sempre que julgar necessário. Seja, porém, sempre positivo.
Não minta para agradar. Seja sincero, mas cuidado com o jeito de dizer
as coisas. "Acho que você está melhorando cada vez mais, vamos
tentar mais uma!" soa bem melhor do que "essa foi uma porcaria!".
Você deve estar se perguntando se essa atitude tão disciplinada por
parte do técnico é realmente necessária. Só posso dizer que funciona.
Devemos lembrar que nossa função não é só gravar uma voz afinada e
no tempo. Temos que conseguir extrair a melhor performance possível
no menor tempo, e a maioria dos cantores conta com o produtor e o
técnico como parceiros. Você deve demonstrar (e sentir) que faz parte
do time e que está decidido a obter um bom resultado.
Mantenha também os bons hábitos, pois é necessário que o produtor e
os músicos em geral confiem em seu trabalho e em sua
responsabilidade. Por exemplo, quando o produtor for lá dentro para ter
uma conversa direta com o cantor, desligue o microfone
imediatamente.
Quanto à gravação em si, existem dois métodos básicos. Pode-se fazer
um take, ou seja, gravar uma vez, e ir corrigindo os trechos necessários,
ou fazer vários takes e combiná-los em um outro canal aproveitando os
melhores momentos de cada um (a este processo chamamos
comping). Nestes dias de fartura de canais acho muito menos
desgastante a segunda opção, desde que se limite a três ou no máximo
quatro o número de takes a combinar. Se o comping ainda possuir
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momentos problemáticos, pode-se agora fazer novos três ou quatro


takes e assim por diante. Por experiência própria posso afirmar que é
inviável fazer um comping a partir de mais de quatro takes - quando
vamos ouvir o sétimo canal já não lembramos mais do primeiro.

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103) E você pensava que isso era exclusividade do áudio?


Estava eu aqui pesquisando (pois é, podia estar vendo vídeos de
gatinhos, principalmente nas férias) um jeito decente de se calibrar um
higrômetro (aparelho que mede umidade relativa do ar) para o estúdio.
E eis que descubro uma área que me lembrou muito o que vivemos no
áudio. Ao que me parece, os fumantes de charutos precisam se
preocupar muito com a umidade, e usam sempre os higrômetros - e
precisam calibrá-los. Aí começa a polêmica.
Existe um método que inunda a internet. Usa uma certa quantidade de
sal, com uma certa quantidade de água, deixados num certo tamanho
de recipiente durante um certo número de horas. Cada lugar usa
valores meio diferentes. E o seu higrômetro tem que ler exatamente 75%.
Se não leu, é erro dele. Eu li coisas super técnicas como "coloque água
mas não muita". Brilhante.
Meu desconfiômetro começou a urrar, diante de tantas evidências de
"gambiarra institucionalizada" , e fui pesquisar mais. Como se esperava,
as pessoas começam a achar valores desconexos, revelando a
fragilidade do teste, e aí são imediatamente rechaçadas, com "vc
deixou 6 horas, mas eram 12" ou "deixou 12 mas eram 24" , chegando
até a 48horas. Isso pra não falar das outras variáveis.
Muito parecido com o que acontece no áudio. Que alívio.
P.S>Existe pelo menos um produto que se destina extamente a isso, com
um certo rigor, chamado Boveda Test Kit. Mas o importante é a atitude
científica. É possível fazer o teste do sal com rigor, mas é muito longo pra
explicar aqui. E toda medida física tem uma incerteza, que deve ser
considerada.

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104) POR QUE ALGUNS COMPRESSORES POSSUEM UM HPF NO SIDE


CHAIN?
Existem vários exemplos de compressores que têm um controle muitas
vezes chamado de HPF. O que ele faz é aplicar um filtro de graves no
sinal que controla o compressor (ou seja, o sidechain), mas não filtra o
áudio que está sendo comprimido.
Por que isso é interessante, a ponto dos fabricantes gastarem dinheiro
colocando isso lá?
Pois bem, precisamos de um pouquinho de Física. Se você observar o
comportamento da várias frequências em uma música verá que os
graves possuem bastante energia e costumam durar muito (notas
longas) - por exemplo, o contrabaixo. Ao mesmo tempo os agudos são
menos intensos e principalmente são sons de curta duração - por
exemplo, hihat.
Isso afeta diretamente o resultado da compressão, principalmente no
master bus e numa masterização. Digamos que vc deseja masterizar um
pagode e coloca um compressor leve no estéreo. O surdão é bastante
presente nessas mixes,e por isso vai afetar muito o compressor, que irá
atuar fortemente toda vez que o surdão tocar. A música toda vai
abaixar nitidamente nessas horas. Então, a gente aplica um filtro de
graves no sidechain. Dessa forma, o compressor fica menos sensível aos
graves, e vai atuar menos na hora em que o grave fica muito presente.
A questão óbvia é: "mas aí a mix não vai ficar com graves demais?" Sim,
mas o controle precisa ser feito individualmente no canal do grave
excessivo, e não no master bus. Um compressor no master para segurar
excesso de graves é a ferramenta errada para corrigir um problema
certo.

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105) PRA QUÊ MASTERIZAR?

O áudio, parodiando Lulu Santos, caminha "a passos de formiga e sem


vontade". Os progressos tecnológicos são muito mais rápidos do que
nossa capacidade de explorá-los plenamente e transformá-los em
rotinas.
A coisa é tão difícil que você vê gente fazendo videozinhos pro Youtube
explicando como novidade coisas que já nem se usa muito mais.
A questão da masterização precisa ser encarada sob um novo prisma,
sob uma nova ótica, para que fiquemos mais conectados com os
progressos técnicos, inclusive do próprio mercado.
Antes de mais nada, deixo claro: o Masterizador é um elemento muito
importante para um trabalho, mas se o seu projeto não permite que se
use um profissional para isso - se é vc mesmo que vai "masterizar" - é esse
o assunto que quero abordar aqui.
Primeiro, quais as funções históricas do masterizador e por que ele
surgiu? Não vou fazer um histórico muito detalhado aqui, pra não
perder o foco. Então, para nós são importantes duas coisas:
antigamente, mixar era um processo muito complicado que era difícil
repetir. Voltar numa música significava reconfigurar o estúdio inteiro e
todos os seus equipamentos. Resumindo, mixar uma música era um
processo que começava num dia e tinha que acabar no mesmo dia.
Segundo: os produtos eram basicamente álbuns e não singles.
Assim, uma das funções mais importantes do masterizador era ouvir tudo
em grupo e unificar as sonoridades, para que o álbum tivesse um som
próprio. E ele era o encarregado disso porque não dava pra voltar nas
mixes e porque ele tinha melhor capacidade de julgamento e de ação
nos seus equipamentos sofisticados.
Como terceira função, ao longo do tempo - com a chegada de
equipamentos cada vez mais poderosos - ele foi assumindo a
responsabilidade de conseguir cada vez mais volume, pois a regra era
"o ouvinte prefere o que estiver mais alto". Então, o cara que conseguia
mais volume era o melhor.
Aí a tecnologia evoluiu, os processos de produção se modernizaram e
se democratizaram. Hoje o que domina é o conceito de single e não de
álbum, a gente pode repetir uma mix quantas vezes quiser, e existem os
LUFS para nos preocuparmos em soar bem.
Porém, com essa mesma democratização e com a falta de verbas para
os projetos, as mixes estão sendo feitas cada vez mais por pessoas com
menor experiência e (se me permitem ) até mesmo com menor
competência técnica (muitas vezes por pura necessidade e não por
opção).
Daí, modernamente o masterizador profissional começou a assumir o
papel de "Salvador de Mixes".
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Quando é possível contar com alguém para dar aquela mexida final,
consertando deficiências de sonoridade, e até mesmo deixando a
coisa mais amistosa para os ouvintes, é ótimo. É um conforto saber que
minha mix, sobre a qual tenho dúvida, será mandada para um cara dar
uma polida, um acerto final. Tudo certo. É uma consequência dos novos
tempos, e é totalmente válido.
Porém, e quando não haverá esse "Masterizador"? E quando é você
mesmo que vai aprontar sua mix para o mercado? Esse é meu ponto:
nesse caso, ESQUEÇA A MASTERIZAÇÃO.
OBS: (Antes que os mais afoitos venham aqui reclamar do absurdo disso,
lembro que essas frases de efeito são propositalmente radicais, para
chamar a atenção para um fato. Então, leia até o final com calma.
Pegue uma fatia de panetone e meia dúzia de castanhas e
prossigamos)
Vamos lá. Você mixou a música e está achando perfeita - o que já é
uma vitória - e agora se transforma em masterizador e subitamente a
mix não consegue chegar no que você queria. Bom, ou a mix sofreu
uma transformação durante a noite ou a porção mixador que existe em
você não está se dando muito bem com a porção masterizador.
Minha proposta é que você esqueça que haverá uma masterização,
Não conte com ela, porque vc não precisa soar dentro de um conceito
de álbum, não precisa ficar com um loudness absurdo e não tem como
corrigir vícios de sonoridade que você mesmo gerou.
Você não troca de ouvidos quando se propõe a masterizar!
Agora que você não está mais contando com uma self-MASTER , as
coisas só ficaram um pouco mais complicadas, porque vai ter que rever
seus conceitos. A mix só estará "top" quando for comparada com o
mesmo critério que vc usaria quando fosse se masterizar "a si mesmo". A
vantagem está em não se contar com algo depois da mix pra consertá-
la.
Corrija sua mix antes de uma "masterização", porque se é você mesmo
o masterizador, você tem o poder de resolver tudo na mix aberta, coisa
que um masterizador externo não tem.
Mas para não ficarmos neuróticos com isso, vamos então dar um nome
novo para uma coisa importante. É preciso também não ser tão radical.
Particularmente trabalho minhas mixes para precisarem de pouquíssima
correção no final, mas que mal há em se permitir que isso aconteça?
Principalmente na questão do loudness, é perfeitamente pertinente dar
um ajuste final no ganho , e até mesmo fazer pequenas correções de
equalização.
Só que pra tirar o peso dessa etapa de polimento, porque não
passamos a chamar de Pós-Mixagem? Reconheço que às vezes é útil a
gente se colocar um pouco fora da mix e ouvir de um jeito mais

©2019 by Fábio Henriques


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comparativo, quase que como uma pessoa de fora. Se a mix estiver


soando bem, essa "pessoa de fora" terá pouca coisa pra mexer.
Agora, se nessa pós-mixagem você descobre que a música não
chegou, a culpa não é do seu Masterizador Interno. É do mixador que
mora em você, e é ele quem tem que corrigir as coisas.

©2019 by Fábio Henriques


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106) REVERB DO MASTER DO GRUPO OU DE CADA ELEMENTO


SEPARADO?
Uma pergunta recent de um colega nosso me levou a esse post, já que
esse é um assunto interessante. A questão é: se tenho um grupo de
cordas, por exemplo, mando o reverb a partir do master do grupo ou
de cada canal individualmente?
Como tudo em mixagem, não tem jeito certo. Vamos então ver as
características técnicas. Quando se envia o reverb de cada elemento,
o problema é que qualquer variação no volume, na compressão e na
equalização do master do grupo não afeta as mandadas. Assim, por
exemplo, se abaixamos o volume do master, as mandadas
permanecem, e o resultado é que a proporção de reverb aumenta , ou
seja, aumentamos o reverb.
Mandando o reverb do master, as variações no grupo se refletem
também na mandada do reverb, e a coisa fica mais sob controle. Isso
resulta num maior sentimento de que os membros do grupo tocaram
juntos em uma mesma sala. Normalmente isso acontece com cordas e
metais, por exemplo.
Por outro lado, há casos em que é mais vantagem se mandar
quantidades de reverb diferentes para cada canal. Um exemplo
clássico é a bateria. Particularmente, uso dois reverbs: uma ambiência
bem curta para o grupo da bateria, para ambientá-la em uma sala
bacana, e outro um pouco mais longo, mandando diretamente da
caixa e ton-tons. Isso porque reverbs no bumbo costumam não ficar
bons, e nos pratos acabam embolando demais as altas.
Mas de novo, cada caso é um caso, e o mais importante é que no final
tudo soe como você queria.

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107) A COR NÃO EXISTE


Estávamos essa semana discutindo um assunto muito comum, que é a
dificuldade de se comparar as coisas em áudio. Muitas pessoas até se
esforçam para efetuar um teste coerente, mas a maioria das vezes
acaba chegando a conclusões equivocadas, porque o áudio é um
fenômeno humano. Nosso cérebro, esse malandrão, ao mesmo tempo
que nos ajuda, pode nos pregar peças.,
Como sempre digo, só existe mixagem se tem alguém pra ouvir. Não
existe mixagem fora do cérebro humano, e isso é um fator decisivo.
Acho que uma excelente maneira de explicar isso é a sensação de cor.
Sim, meus amigos. Cor na natureza não existe: ela é apenas a
interpretação que nosso cérebro dá às diferentes intensidades de
energia eletromagnética que as células da retina conseguem captar.
Todo mundo sabe que só temos células que percebem vermelho, azul e
verde. Para nós, branco é a soma dessas três cores. A TV em cores se
baseia nisso, e a iluminação por LEDs nos shows também. Já repararam
que no escuro da noite tudo fica azul? isso porque as células sensíveis
ao azul possuem mais sensibilidade que as outras.
Assim, pensando na cor, apresento algumas curiosidades para
pensarmos em fenômenos do áudio. Na primeira figura, temos dois
cachorros obviamente iguais. Na segunda, colocamos os mesmos
cachorros em um fundo e eles ficam diferentes!
Aí o pessoal que acredita em coisas como áudio de alta resolução, ou
que afirma que o som do ProTools no Mac é diferente do Windows vai
dizer: eu vejo os cachorros diferentes, e acredito nos meus olhos, então
eles são diferentes!!!!!!
Um gif interessante mostra fenômeno
parecido: https://twitter.com/Sci_Phile/status/571388980752752640
Pensando nessa analogia, quando você for fazer um teste que exija
uma forte interpretação, como por exemplo tentar identificar diferenças
entre um áudio gravado em 48kHz e o mesmo áudio em 96kHz e notar
que são diferentes, lembre dos cachorrinhos. Ou acredite em seus olhos
e ouvidos malandrinhos.

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108) POR QUE NÃO PRECISO GRAVAR EM 32 BITS?


Como já afirmei aqui em diversas ocasiões, a aparente vantagem em
se gravar usando um formato de 32 bits acaba não se justificando na
enorme maioria das aplicações.
Antes de mais nada, usar 24 bits já permite uma faixa dinâmica de
144dB, o que ultrapassa qualquer capacidade humana. Talvez por
causa disso, as interfaces usem palavras de 24 bits. É possível que haja
interfaces capazes de gravar em 32 bits, mas digamos que existe uma
gigantesca probabilidade de vc usar uma que use 24.
Nesse caso, usar 32 bits para gravar só acrescenta bits 0 do 25o ao 32o
bit, e vc estará gastando 384kbits por segundo por canal à toa, se usar
48kHz. (23Mbits por minuto por canal)
Mas, o leitor cuidadoso irá lembrar que nem só de faixa dinâmica vive
uma mixagem. Existe a precisão das contas. O fato é que os projetistas
de plugins não são bobos nem nada, e usam mais bits para processar,
quando necessário.
Vamos verificar se é isso mesmo?
Na imagem 1 temos um áudio vindo de CD, ou seja, usando 16 bits,
tocando dentro do Pro Tools, se não fizermos nada com ele. Na imagem
2 eu peguei o fader desse canal e subi 0.1 dB - praticamente nada - e
observe que a DAW passou a usar 32 bits para representá-lo.
Mas o bus interno do Pro Tools vai mais longe que isso. Podemos verificar
usando um plugin como o H-Comp, da Waves. Sem nenhum áudio
tocando e apenas colocando o controle "analog" ( leia-se "chiado") no
máximo , podemos ver na imagem 3 que o Pro Tools usa 48 bits.
Lembrando que de 16 bits para baixo já estamos numa região abaixo
de -96dB.
Na imagem 4 temos o que acontece ao tocarmos uma senoide com
amplitude de -139.9dB peak. Usamos mais de 48 bits.
Isso comprova que mesmo gravando em 24 bits, os brilhantes projetistas
nos permitem a segurança de uma profundidade maior de bits quando
necessário.
P.S. - Antes que os mais afoitos venham bradar - se é que leram até aqui
- eu disse que não "preciso" gravar em 32. Eu não disso que não "devo"
gravar assim. Não há prejuízo em se gravar em 32 bits. Só é
desnecessário.

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109) COMO CONSEGUIR BOAS MIXAGENS PARTE 1


Tenho visto aqui um monte de gente muito séria , bem intencionada e
bem disposta querendo produzir boas mixagens mas ainda infelizes com
o resultado.
É claro que existe um fator a considerar que é a autocrítica. Essa é uma
questão subjetiva difícil da gente avaliar. Mas certamente existe um
Caminho das Pedras que pode facilitar muito a jornada. Vamos dar
uma olhada.
- EVITE O EXCESSO DE INFORMAÇÃO
Quando comecei, não havia quase nenhuma informação. Hoje tem
informação demais, e a maioria tem problemas. A internet é território
livre, e temos a mesma facilidade de ouvir coisas certas e bobagens
absurdas. Então, não se deixe influenciar pela quantidade de
informação. Procure os videos bem produzidos, e procure ouvir o
resultado das pessoas que estão "ensinando". Muitas vezes o cara é
engraçado, ou o estúdio é cheio de equipamento, e vc vai ouvir o que
ele faz e ou não tem nada demais ou é ruim mesmo.
- NÃO EXISTEM EQUIPAMENTOS/PROCESSOS MÁGICOS
Ao contrário do que a maioria fala/mostra/acredita/divulga, o único
equipamento indispensável é o seu ouvido (na verdade, o seu critério,
comandado pelo que ouve). Hoje é possível se conseguir ótimos
resultados com um mínimo de equipamento. Então, desencana. Se o
seu resultado não está bom, não é por causa da placa, nem dos
plugins. Vamos focar no que realmente precisa melhorar.
É claro que se vc tem apenas uma placa de camelô, um fone de
supermercado e um microfone de plástico, infelizmente vc não tem
equipamento suficiente. Mas convenhamos, você sabe qual o
equipamento mínimo que precisa.
- NÃO USE NENHUM PLUGIN - USE OS FADERS
Esqueça todos os plugins. Não use nenhum. Agora pratique equilibrar o
que ouve apenas usando volumes e pan. Lembre que vc está mixando.
Então, se o som da gravação está um desastre, vc tem que voltar pra
casa 1 desse jogo. Não se conserta uma gravação ruim na mixagem.
Mas dá pra dar uma boa melhorada. Só que mais pra frente. Aprenda a
fazer um equilíbrio só usando faders. Enquanto você não conseguir isso,
não dá pra pensar em usar plugin nenhum. Quando estiver satisfeito
com isso, passe para a próxima etapa.
- APRENDA A USAR UM EQUALIZADOR
Não compre nem baixe nenhum. Use o que veio na DAW. Pratique
muito. Leia a teoria a respeito (LEIA!!!!). Esqueça os vídeos. Leia o
manual do equalizador. Ele te ensina tudo o que vc precisa. Pegue
vários sons e mexa nos controles procurando entender o que resultou. A
seguir passe a prever: "se eu mexer nesse controle, vai acontecer isso.."

©2019 by Fábio Henriques


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Quando vc estiver sendo capaz de prever o som que vai sair ao mexer
em um controle, siga adiante. Enquanto isso não acontecer, continue
praticando junto com o item anterior.
- USE EQUALIZADORES SÓ PARA CORRIGIR
Volta na gravação que agora vc já sabe equilibrar nos faders e teste o
que está ainda te incomodando em cada canal. Tem um grave
desnecessário no Hihat? Tem agudos demais na guitarra? A voz não
consegue aparecer? Pois bem, insira equalizadores e só atenue. Não dê
ganho em nada. Filtre o que não ajuda e atenue o que está
atrapalhando. Reequilibre os faders e repita até que sua mix soe melhor
do que estava. Perseverança!!!!
- LIBERTE-SE DE PENSAR EM SÓ UM CANAL
Como desafio maior dessa etapa, vc deve chegar ao ponto de atenuar
uma região de um canal para beneficiar os outros. Se vc conseguir
descobrir que atenuando 300Hz no piano vai deixar lugar pra voz, vc
está no caminho certo.

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110) O CASO EMBLEMÁTICO DO SOLZINHO DO ADAT


Em 1992/3 apareceu um equipamento que revolucionou
completamente o mundo do áudio: o Alesis ADAT.
Antes dele, gravar 24 pistas digitais em fita exigiam uma máquina tipo a
Sony 3324 , que custava US$ 125.000,00. O que o ADAT permitia era a
gravação de 8 pistas em uma fita de videocassete VHS e custava US$
3.500,00 mais ou menos. E ainda era possível rodar vários em
sincronismo. Agora dava para gravar 24 pistas por um décimo do preço
e praticamente com a mesma qualidade.
O primeiro modelo, que ficou conhecido como "Cara Preta" , foi uma
revolução, porque levou a qualidade do áudio digital para o estúdio
pequeno. Sim, os estúdios médios e pequenos estavam doidos pra se
livrar das fitas analógicas. Logo depois apareceu o melhorado modelo
XT, e com ele o "solzinho".
Antes do ADAT tinha "som de estúdio pequeno" e "som de estúdio
grande". Isso foi tendendo a diminuir e com muita rapidez.
O desenvolvimento das DAWs acabou forçando uma obsolescência
rápida aos gravadores como o ADAT e similares (que logo
apareceram), mas não tiraram sua importância histórica como midia de
transição.
Pois bem, por conta de acalorada e muito proveitosa discussão aqui
sobre o assunto de sempre - qualidade, avaliação, subjetividade e
objetividade - acabei me lembrando do "Solzinho" do ADAT.
Explicando. Uma das coisas que consolidou a tecnologia digital em
termos de confiabilidade ( e não só na música), foi a capacidade de
prever, encontrar e corrigir erros de armazenamento e transmissão sem
prejuízo da qualidade da informação. É uma área extremamente
importante e recebe muita atenção, porque você não quer receber no
aplicativo do banco o seu saldo como "mais ou menos 1300 Reais" . E no
áudio somos tão rigorosos quanto nas finanças, não é mesmo?
Já vi absurdos de pessoas conceituadas dizendo que não comprimem
áudio em zip ou rar porque muda o som.
Valei-me , N. Sra, do Checksum !!!
O tal do solzinho do ADAT é emblemático, porque era uma luz no painel
(marcada em amarelo na foto) que acendia quando o conversor D/A
estava fazendo uma interpolação. Isso quer dizer o seguinte. A fita roda
de forma sequencial. Num HD, se a leitura dá erro, o sistema manda ler
de novo. Na fita, não tem como. E a fita, principalmente depois
algumas dezenas de passadas começava a dar muitos erros (a cabeça
de leitura também começava a sujar).
Aí, o D/A vinha lendo a fita e , por exemplo, tinha os valores 12453,
12454, XXXXX , 12456 e etc. Bom, usando um pouco de bom senso,
podemos deduzir que há uma boa chande do valor que deu erro ser
12455, certo? Isso é uma interpolação.
©2019 by Fábio Henriques
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Mas como o conversor era honesto, avisava acendendo o "solzinho",


dizendo: "pessoal, estou inventando dados". Com bom senso, mas
inventando.
Zilhões de pessoas usavam ADATs e nunca souberam o que era aquele
solzinho que de repente começava a acender o tempo todo. Graças à
ignorância generalizada (no sentido de ignorar mesmo) , começou a
haver gente que inclusive dizia que preferia o som quando o solzinho
acendia !!!!!!
Ah, como o áudio é divertido...

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111) CABOS BNC?


Por conta de nossa recente discussão aqui (muito boa, por sinal) a
respeito de Word Clock, vi muito as pessoas usando a expressão "cabo
BNC". Mas o que tem ele de especial?
Bom, pra começar, BNC é o conector, e não o cabo. BNC significa
"Bayonet Neill Concelman" , por causa do tipo de travamento
(baioneta) e em homenagem a seus inventores (Neill e Cocncelman).
Sua vantagem é justamente o jeito de se travar firmemente e sua
compatibilidade com o cabo em questão, que é o que vamos estudar
a seguir.
O nome correto para o cabo é Cabo Coaxial 75-ohms. Para conectar
um word clock, por causa das altas frequências envolvidas (na casa dos
MHz), não se pode usar cabos de microfone, por exemplo. Os cabos
coaxiais são bem parecidos com cabos de áudio, com um condutor
central, um isolamento e uma malha externa. Porém são muito
diferentes.
Quando se trabalha com frequências assim altas, a geometria do cabo
começa a influenciar a propagação das ondas. No áudio isso não
ocorre. As características importantes do cabo são suas propriedades
físicas, como a constante dielétrica (epsilon) e a permeabilidade
magnética (mü) . Sua impedância é dada pela forma do cabo (de sua
seção transversal) , e portanto é fundamental que a medida do isolante
se mantenha constante ao longo de todo cabo.
É por isso que ele é mais "duro" e menos maleável que um cabo de
áudio: para que a distância entre o condutor central e a malha
permaneçam constantes, garantindo a impedância de 75ohms e
consequentemente otimizando a transmissão.
Bons cabos coaxiais não são baratos, mas devem ser levados muito a
sério, sob pena de jogar fora todo o esforço empregado para se
implantar um word clock no sistema.

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112) PARA TIRAR AS DÚVIDAS SOBRE COMPRESSÃO PARALELA


Lembram quando expliquei aqui outro dia que apesar de ser envolta
em mistério e principalmente em explicações cheias de criatividade, a
compressão paralela era em resumo um meio de aumentar o que era
baixo?
Pois bem , apresento aqui dois arquivos que permitem verificar isso. São
dois WAVs, um sem compressão e outro com uma compressão paralela
pesada. Reparem que o efeito é muito interessante, pois todas as ghost
notes e a reverberação da sala vêm para a frente, gerando um loop
muito rico em sonoridade.
Resumindo, só porque a explicação para uma coisa é simples, não quer
dizer que a coisa é pouco útil. O efeito pode ser mesmo bem útil,
mesmo que a gente não precise recorrer a explicações como "energia",
"envolvimento" ou coisas do gênero.
Na foto os ajustes no FG-Stress que geraram o
efeito. https://drive.google.com/…/1mhIgPmwtuvWec0Vhsc4o7Wb6GY7
6Sbh…

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113) Compressor no master?


Um detalhe do Pro Tools que muitos desconhecem
Como já foi dito aqui no grupo outro dia, os inserts no Master Fader são
Pós-Fader. Assim, se vc está saturando a entrada de um plugin no
master, abaixando o fader vc corrige isso facilmente.
Porém é preciso cuidado quando se usa um compressor no master e a
atuação dele é importante para o som. Nesse caso, se a música
terminar em fadeout, irá mudar a compressão. Tudo bem que o fade
out pode parecer apenas um detalhe, mas se o som depende muito do
compressor, esse som vai mudar durante o fade.
Para evitar isso, o próprio manual recomenda que se mande todas
saídas que iam para o master, para um auxiliar. Daí se põe o compressor
no auxiliar, e se manda a saída dele para o master.

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114) PARA ENTENDER FASE DE VEZ


Tenho notado que um dos conceitos mais complicados para a galera
em geral é o de Fase. Vejo muita gente boa se embananando e
confundindo as coisas. Vamos procurar entender bem o fenômeno,
porque ele é extremamente útil no mundo do áudio, e tem muitas
aplicações e implicações, que vão muito além de apertar um
botãozinho de inversão de fase no pré.
Observem as duas senoides da figura. Imaginemos que elas são
periódicas, ou seja, que não têm início nem fim: estão aí tocando
constantemente. Reparem que as duas possuem a mesma amplitude e
a mesma frequência. O que é diferente entre elas?
Alguém prontamente vai dizer que a azul está “na frente” da vermelha,
mas infelizmente, não é possível afirmar isso. A vermelha pode estar na
frente da azul, mas tão na frente que parece que é ao contrário. Dá pra
perceber?
Como se trata de duas ondas periódicas, que não começam nem
terminam, não podemos a priori dizer que uma está na frente e outra
está atrás.
Porém há algo diferente entre elas. Se fixarmos um ponto no eixo
horizontal, veremos que verticalmente as ondas estão em momentos
diferentes de seu ciclo. Portanto, na própria figura podemos ver que
existe a diferença Teta (essa letra que parece um O cortado).
É óbvio que se essas senoides representam duas ondas sonoras, esse
Teta aí pode ser pensado como uma diferença de tempo. Porém existe
um problema. A velocidade de propagação de uma onda sonora não
depende da frequência. Então eu poderia desenhar outro par de
senoides de frequência diferente em que apenas para as formas de
onda, a diferença Teta, seria a mesma, mas a distância entre elas seria
diferente.
Exemplificando, imaginemos que essas duas ondas da figura possuem
frequência de 1000Hz (1kHz). O comprimento de onda seria então o
mesmo para as duas, 35 cm. então nessa figura podemos imaginar que
Teta mede mais ou menos um oitavo disso (pela posição das ondas no
desenho): 4,38cm. Se fôssemos pensar que Teta mediria o tempo entre
elas, nesse caso seriam 125 milissegundos.
Pois bem, mas e se essas ondas da figura tivessem uma frequência de
500Hz? Bom, agora o comprimento de cada ciclo seria 70cm, a
distância Teta seria no caso 8,75 cm. Se Teta medisse tempo, nesse caso
seriam 250 milissegundos.
Dá pra ver que esse valor de Teta, se fosse medido em tempo ou
distância, dependeria da frequência. Será que não existe um jeito de
conseguirmos ficar independentes dela?
Sim, meus amigos, e é justamente a fase. E aí chegamos à parte
complicada.

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Uma onda senoidal tem esse nome porque está associada a coisas que
giram. Como todo mundo que estudou trigonometria (com licença da
má palavra) um dia na vida sabe, pontos de um círculo estão
associados a ângulos, e a seus senos e cossenos. Para nós, felizmente,
isso não importa muito. Basta saber que podemos dividir um
comprimento de onda em 360 partes, 360 “graus”. A figura 2 assusta um
pouco mas explica. Dessa forma, metade do comprimento de onda
são 180 graus e um quarto de comprimento de onda são 90 graus, No
nosso caso, temos uma diferença de um oitavo do comprimento de
onda, ou seja, 45 graus.
Então, agora podemos interpretar que existe uma diferença de fase
entre essas duas ondas da primeira figura de 45graus, e para dizer isso
não precisamos saber sua frequência nem seu comprimento de onda.
Resumindo, podemos interpretar que o ângulo de fase é uma medida
do quão deslocada uma onda está em relação a outra, independente
de sua frequência.
Isso tem um monte de vantagens para a análise de ondas. Para nós,
acho que já é informação suficiente para uma manhã de domingo.
Fiquemos aqui por enquanto.
P.S. – embora tenhamos usado a letra grega Teta para demonstrar uma
diferença de fase, o símbolo tradicional para o ângulo de fase é a letra
grega Phi (fi), que aparece muitas vezes nos consoles e prés, e muito
mais ainda estilizada por um zero cortado.

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115) PARA ENTENDER FASE DE VEZ PARTE 2


Antes que o pânico se espalhe entre meus valentes colegas aqui,
vamos colocar um pouco de prática na coisa. Talvez tudo fique melhor
de entender.
Vamos todos juntos fazer o seguinte experimento. Coloque seu celular
tocando uma senoide (tem aplicativos pra isso - gerador de funções) de
1000 Hz , ou apenas imagine essa situação.
Agora coloque dois mics iguais um exatamente do lado do outro e vá
gravando o resultado. Na daw, coloque os dois canais em mono, para
somar os mics.
O sinal resultante vai ter o dobro do sinal de cada mic sozinho, certo?
Até aí tudo bem,
Agora, lentamente vá puxando um dos mics para trás e observe o que
acontece com a soma dos dois canais. O volume vai começar a
diminuir até que chega em um valor mínimo (em tese, zero - na prática,
quase). Anote a que distância entre os mics isso aconteceu.
Continue puxando e perceba que o volume irá começar a aumentar,
até que vai atingir um máximo. Anote essa distância.
Isso está acontecendo porque a mesma onda está chegando em
tempos diferentes aos dois mics, e como ondas têm momentos positivos
e negativos, às vezes a soma aumenta o volume e às vezes abaixa.
E como vimos isso depende da distância.
Até aí , moleza. Eu poderia anotar esse valor de distâncias e sempre
usar os mics em posições que acentuem o som e evitaria as distâncias
em que eu tenho atenuações.
O enorme problema é que isso tudo que funcionou bem para 1000Hz
vai funcionar diferente para outras frequências. Se vc começasse com
800Hz, as distâncias de máximos e mínimos seriam outras.
Ou seja, a diferença de tempo de chegada afeta diferentemente o
sinal, de acordo com a frequência. Resultado prático, ao deslocar o
segundo mic nós mudamos o som do que está sendo gravado, e
dependendo da distância entre os mics isso irá soar diferente.
Acabamos de fazer um equalizador físico!!!! Ou melhor, um "filtro pente"
(explico isso no futuro).
Agora, vamos lá. Falta pouco.
Houve uma atenuação de uma frequência em uma certa distância. Isso
porque para uma mesma onda, estamos somando trechos diferentes
de seus altos e baixos. Uma outra maneira de dizer isso é dizer que está
havendo diferença de fase entre essas duas captações.
FASE - é um determinado ponto de uma onda. DIFERENÇA DE FASE - é
quando combinamos dois ou mais pontos de uma mesma onda.

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Então, em vez de dizer: "Estou captando dois pontos diferentes de uma


mesma onda e por isso a soma dos dois sinais está com um volume X"
Posso simplesmente dizer : "Está havendo diferença de fase".
E agora para deixar os mais curiosos incomodados, perdoem as
maiúsculas: SEMPRE QUE COMBINO MAIS DE UMA CAPTAÇÃO DE UMA
MESMA ONDA, ESTÃO ACONTECENDO DIFERENÇAS DE FASE !!!!!
Mas e quando os dois microfones estão lado a lado? Simplesmente a
diferença existe mas vale zero (zero existe!).
Mas eu fiz isso e o som melhorou!!! Exatamente, por uma feliz
coincidência, as atenuações e reforços foram de um jeito que deixaram
seu som melhor, mas não quer dizer que amanhã isso vá dar certo com
outro instrumento ou outra música.
-------- X ---------- X ---------- X ---------- X ---------- X ---------
ATENÇÃO: só para quem curte matemática!!!
A equação que descreve uma senoide é
y(t) = A sen (2P t + F)
onde A = amplitude, P = número Pi , t= tempo e F = fase (olha ela aí).
Então, naquela primeira figura do outro post, a diferença das equações
das ondas vermelha e azul era apenas o valor F - a fase.

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116) PARA ENTENDER FASE PARTE 3


Na figura, apresento a experiência que sugeri na parte 2. Coloquei dois
mics captando a mesma fonte de 1kHz. Os dois alinhados, e depois fui
afastando um deles e gravando os sinais diretos e sua soma. O resultado
é contundente, como podem ver.
Os mics foram dois km85 Neumann. Os dois preamps são api 512c ,
monitores Adam A77X.
OBS: não houve nenhuma manipulação nos áudios. As distâncias entre
mics são aproximadas a + - 0,5cm.

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117) PARA ENTENDER FASE PARTE 4


A REGRA DO 3:1 E A REGRA DO 2:1
A esta altura todo mundo já está cansado de saber que captar uma
mesma onda sonora com mics a uma distância um do outro implica em
ondas que possuem uma diferença de fase entre elas. Se essas
distâncias são pequenas, como vimos, da ordem de alguns centímetros,
começam a ocorrer cancelamentos e reforços que podem deixar o
som pior.
Por causa disso, existem procedimentos de segurança que nos ajudam
a evitar esses problemas. Eles são:
Regra do 3:1 (três pra um)
Para evitar problemas de fase, ao captar duas fontes sonoras, se a
distância do mic ao instrumento 1 for X a distância do outro mic a ele
deve ser no mínimo 3X.
Exemplo1: imagine um naipe de trompete e sax, que estão sentados
lado a lado. Se o microfone do trompete estiver a 30cm de distância
dele, o microfone do sax deve estar a pelo menos 90cm do trompete, e
vice-versa.
Exemplo2: vc deseja gravar um dueto de violões. O mic do violão 1 está
a uma distância de 20cm dele. O mic do segundo violão precisa estar a
pelo menos 60cm de distância do violão 1.
Por extensão, se vc vai usar um mic próximo e um distante - em um amp
de guitarra, por exemplo, o que está distante deve estar a mais do triplo
da distância do primeiro.
OBS: Essa regra não se aplica a gravar um mesmo instrumento em
estéreo - aí as técnicas coincidentes e quase coincidentes se aplicam,
Coisa que veremos mais adiante, e que, é claro, vc acha no Guia de
Mixagem Vol. 1.
Regra do 2:1 (dois pra um)
Ao posicionar um mic, a superfície refletora mais próxima deve estar
pelo menos no dobro da distância do mic à fonte.
Exemplo: um locutor vai gravar um texto e vai lê-lo, ou um cantor vai
cantar lendo a letra. Se o mic está a 15cm de distância da boca, o
papel com o texto ou com a letra deve estar pelo menos a 30cm de
distância.
OBS: Por que essa distância pode ser menor que no primeiro caso? Na
verdade ela é maior, porque a onda precisa sair da boca, ir até a
superfície e voltar até o mic. Isso acaba resultando num caminho
aproximadamente 4 vezes maior.

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118) PRA ENTENDER FASE Parte 5

FInalmente , depois de montes de teoria, vamos ver uma consequência


prática das coisas.
A essa altura todo mundo já está mais do que sabendo que captar a
mesma frequência com dois mics posicionados com um deles um
pouco atrás do outro pode dar sérios problemas.
Faltou só a gente averiguar o que acontece se a gente mantém a
distância entre os mics constante e varia a frequência. Afinal, é isso o
que acontece no dia a dia.
Se a gente escolhe esse jeito diferentão de microfonar (com um 15cm
na frente do outro, por exemplo), o que vai acontecer com o som de
um instrumento, que tem várias frequências?
Pela teoria, por causa desses centímetros, algumas frequências vão se
reforçar e outras vão se cancelar.
O efeito resultante é chamado de Filtro Pente, que em outra
oportunidade vamos explicar.
Fiz a experiência e o resultado está na figura. Mantive a distância entre
os mics e fui variando a frequência. Nos dois primeiros tracks temos os
sinais de cada mic, no terceiro, temos a soma dos dois e no quarto, a
soma dos dois com o botão de inversão de polaridade apertado em
um dos prés.
As medidas foram 1k8Hz, 2kHz, 3kHz, 3k6Hz e 5k7Khz.
Fica totalmente claro que se estivéssemos gravando um violão,
estaríamos, entre outras coisas, "equalizando" com atenuação forte em
1k8 e 5k7 e ganho em 3k6. Se isso seria bom ou ruim, depende do seu
objetivo. Mas se você, como eu, prefere um bom e velho equalizador
para isso, é melhor alinhar os mics.
P.S. - reparem que o botãozinho de inversão só mudou o problema de
lugar, mas não acabou com ele.

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119) A TEORIA DO ÁUDIO, A MANIÇOBA E O JUMBO


Nos últimos tempos temos discutido bastante a questão do
conhecimento teórico e seu valor no trabalho do profissional de áudio,
em todas as suas diferentes aplicações.
Houve um tempo em que certamente esse tipo de coisa não se
aprendia na escola. Não por uma característica da coisa, mas por falta
de escolas. A realidade do trabalho em áudio, mais especificamente
em estúdio, era a de que existiam pouquíssimos profissionais, operando
equipamentos caríssimos e artesanais, e com objetivos pouco
segmentados na tecnologia.
Os equipamentos que hoje ingenuamente se acha que eram
“indispensáveis” para ter “aquele” som, eram usados muitas vezes não
por sua excelência, mas por falta de opção – técnica ou financeira.
Os profissionais de então eram realmente artesãos, e somente pessoas
de altíssima competência teriam conseguido os resultados incríveis que
eles conseguiram.
Isso não invalida, depois de tantos anos e de tanta água passada por
baixo de tantas pontes, o conhecimento teórico que hoje se mostra tão
importante. A competitividade é muito maior, e o equipamento está
muito mais fácil de adquirir e de usar, mas as características
fundamentais do áudio – em sua íntima relação entre tecnologia e arte
– continuam as mesmas.
Reconhecer o extremo talento dos que despontam pela
experimentação e pela prática é muito justo, da mesma forma que se
valoriza um músico que toque “de ouvido”.
Mas o aprendizado pela prática às vezes tem sérios problemas, como
no caso da Maniçoba.
Maniçoba é um cozido com base nas folhas da mandioca, muito
consumido no Norte do país.
Os índios que inventaram o prato não sabiam que tinham que retirar o
Ácido Cianídrico das folhas, porque ele é venenoso. Não havia teóricos
da química pra isso.
Então fico imaginando lá na tribo, os cozinheiros tentando preparar a
folha de mandioca:
O primeiro cozinhou 1 dia. Provou, morreu.
O segundo cozinhou 2 dias. Provou, morreu.
O terceiro cozinhou 3 dias. Provou, morreu.
...
Até que o sétimo, por perseverança ou por fome, provou e não morreu.
Estava criada a maniçoba.
O conhecimento prático pode ter esses pequenos probleminhas.
É claro que a mera teoria também. Como no caso do cara que acha
que ler o manual inteiro do Boeing 747 é o suficiente para tirá-lo do

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chão. Ou de quem quer tirar a carteira de motorista só assistindo as


aulas teóricas.
A teoria pode cortar caminhos, pode evitar micos e certamente
fornece solidez para as decisões, mas não é o suficiente para fazer as
coisas acontecerem, principalmente em situações que envolvam a arte
e suas manifestações.
O progresso vem de duas perguntas básicas: Por quê e Como. Teoria e
prática.
“Teoricamente, a teoria é igual à prática. Na prática, não”.

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120) ARTE, TÉCNICA, PRÁTICA E TEORIA


Mixar é como tocar um instrumento. Existe uma parte teórica
extremamente importante e é necessário praticar muito. Eu vejo muita
gente preocupada com attack e release de compressores e ao mesmo
tempo não saber um mínimo sobre Música.
Para trabalhar bem com música é preciso um mínimo de teoria. Saber a
diferença entre um compasso ternário e um quaternário, por exemplo,
Não que se chegue ao extremo de diferenciar um diminuto de um
meio-diminuto, mas pelo menos saber a diferença entre uma Semínima
,uma Semicolcheia e uma Semifusa.
Isso vai ajudar no mínimo a não pagar mico com os clientes músicos,
como o do cantor que achou o tom de Ré Maior muito alto e pediu
para abaixar para Ré Menor.
Ou do cara que vai pintar colcheias em decoração de baile e desenha
o colchete invertido - um clássico!
P.S. - Onde estão os erros na figura?

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121) MASTERIZAR É ISSO?


(Um texto longo mas necessário)
O áudio passa por fases muito interessantes. O que estamos vivendo
hoje, porém, é algo de proporções nunca vistas.
ANTES
Desde sua criação, a tecnologia de gravação envolvia ambientes e
equipamentos caríssimos e megaespecializados, a que quase ninguém
tinha acesso. É possível se notar isso pela diferença de qualidade entre
os resultados de “grandes” produções e as outras. Só que o mercado
de música por sua vez era gigante.
Vendia-se milhões e milhões de discos, mas os meios de produção
nunca foram popularizados. É angustiante pensar em quantos artistas
incríveis morreram no anonimato porque não existia um Youtube para
transformá-los em stars.
HOJE
O que existe hoje de tão diferente é a facilidade de acesso. Qualquer
um , independente de diferença de orçamento, pode ter acesso aos
meios de produção de áudio que em muito ultrapassam (tecnicamente
falando) o que somente os maiores estúdios possuíam.
É como se de repente qualquer um pudesse “baixar” uma Gibson Les
Paul Custom de graça. De posse dessa ferramenta, vira todo mundo
Jimmy Page? Se chovesse Fender Stratocaster, teríamos um monte de
Hendrix nos quintais?
Mas o áudio está assim. E o pior: todo o “áudio business” é um Titanic
que demora a fazer curvas, e por isso há um contraste nítido entre ser
fácil fazer e usar técnicas do tempo em que era difícil.
VINTAGE
Canso de ver vídeos de “dicas” que faziam sentido no tempo das fitas –
onde uma vez gravado, o som estava determinado – mas que hoje são
tão românticos como desnecessários.
Uma voz tem muita variação de volume? Use vários compressores em
série!!! Super romântico e “old style”, é verdade, mas é muito mais fácil ir
lá e dar um “change gain” no áudio. Ah, mas isso não gera um vídeo
legal de “dicas” no Youtube. Chegamos ao ponto em que o making of
passa a ser mais importante que o resultado?
O PRODUTOR
Pois bem, até uns vinte anos atrás, o processo de produção de uma
gravação se dava mais ou menos assim: o estúdio era muito caro, e o
resto dos investimentos necessários também. Por isso era melhor que se
aproveitasse para gerar um “álbum” – ou seja, que se gravasse um
grupo de músicas. Mesmo que os produtos fossem lançados em singles,
o esforço envolvido na produção era tanto que agrupá-los fazia sentido
– e era bem visto pelo público por uma série de fatores artísticos.
Produtor era o cara que conseguia pegar um monte de músicas e
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transformá-las em um “produto” – daí o nome. Muitas vezes ele não era


nem músico, mas era bom em gerenciar pessoas, em dominar uma
estética e principalmente como chegar a ela com o menor tempo, a
menor verba e a maior qualidade.
OS PROCESSOS - MIXAGEM
Para melhor utilizar os recursos e as suas diferentes especializações, os
processos se dividiam em pré-produção, gravação e mixagem. Eram
em etapas cronológicas e podiam usar até lugares e profissionais
diferentes especializados em cada uma.
As mixagens levavam pelo menos um dia por música, e principalmente,
costumavam estar prontas no mesmo dia. Era muito complicado
continuar amanhã uma mix iniciada hoje, principalmente em estúdios
de aluguel. Então o foco era na relação entre os diferentes
instrumentos. Ninguém se preocupava muito em como as mixagens
soavam umas em relação às outras.
Não havia como “levar um cdzinho pra casa pra dar uma ouvida”. Um
mp3zinho, nem pensar. E o pior. O master gerado pela mix não podia
rodar, porque, sabe como é, fita tem esse problema de piorar a cada
passada nas cabeças.
No início dos 1990 havia o DAT (digital audio tape), que permitia uma
ouvida fiel e sem prejuízo, mas só tinha mesmo no estúdio, e tempo de
estúdio era caro pra ficar “dando uma ouvida”.
Então, as mixes eram pensadas e feitas quase de maneira individual,
como uma coleção de singles.
MASTERIZAÇÃO
Pois bem, daí entra a figura do Masterizador. A etapa de masterização
era absolutamente necessária, e tinha os seguintes objetivos:
1) Colocar as músicas na ordem do álbum
2) Estabelecer o intervalo entre elas
3) Corrigir a sonoridade para uniformizar o som das músicas dentro do
álbum
4) Corrigir a sonoridade para evitar os vícios ocasionados pela
monitoração da mix
5) Eventualmente, e se possível, corrigir problemas das mixes
6) Otimizar o volume final de cada faixa, para aproveitar melhor o uso
da mídia
7) Otimizar o volume final das faixas entre si, para melhor contar a
história do álbum
Para fazer esse monte de coisas importantes, a gente confiava em duas
coisas: no equipamento e nos ouvidos do masterizador. Era o seu
equipamento de qualidade e sua experiência ouvindo o trabalho de
um monte de gente que nos dava confiança.
Portanto, a coisa era muito mais um processo de arrumação do
trabalho para que se enquadrasse na proposta do artista e produtor (e

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gravadora) , e ao mesmo tempo se adequasse técnica e artisticamente


ao mercado – onde seria ouvido em conjunto com outros trabalhos.
FAST FORWARD – O PROCESSO ATUAL
Embora a maioria das pessoas envolvidas não perceba, o processo
produtivo mudou completamente. Primeiro, todo mundo tem acesso a
um monte de equipamentos e plug-ins que simulam equipamentos. Os
níveis de qualidade são variados, mas a facilidade de acesso é
inimaginável para um viajante do tempo que saísse de 1980 e chegasse
em seu home studio hoje. Você tem mais equipamento que ele.
Então, falando a verdade nua e crua, a separação drástica entre as
etapas de gravação, mixagem e masterização hoje é absolutamente
desnecessária. Isso não quer dizer que não seja útil. É perfeitamente
válido concentrar esforços em cada etapa, principalmente se cada
uma será entregue a um profissional diferente.
Eu me dirijo aqui às pessoas que possuem um perfil cada vez mais
constante aqui no grupo: os “produtores” que fazem o seu trabalho do
início ao fim, por escolha ou por necessidade: Não é preciso pensar
como se gravação, mixagem e masterização fossem etapas
necessariamente diferentes.
Você grava a sua música, mixa pra somar bem os canais entre si e dá
uma arrumada no som final para que tenha o volume
necessário/possível. Esse processo é totalmente válido, e acho que
chegou a hora em que precisamos assumir que ele existe e
principalmente de que ele é perfeitamente possível na missão de
produzir um hit.
MASTERIZAR É ISSO?
Daí eu vejo muita gente desesperada tentando “masterizar” sua
música. Para essas pessoas, meu conselho é: desapegue. Isso que você
está fazendo não é uma masterização. É uma melhoria final, para obter
o melhor resultado possível. Isso é perfeitamente válido, principalmente
se for um single.
Desmasterize-se!!!! Várias das etapas de uma masterização clássica não
estarão a seu alcance. Se for só uma música, não é preciso uniformizar
com outras. Se for mais de uma música e você vai usar os mesmo
monitores e o mesmo estúdio (ou home estúdio) pra essa “master-que-
não-é-master”, então não adianta tentar corrigir sonoridade da mix. E se
você é quem vai fazer, não adianta contar com os ouvidos tarimbados
de alguém para julgar as coisas.
O único parâmetro a seu alcance é o volume final. E mesmo isso é difícil
de conseguir sem as técnicas especializadas dos masterizadores
profissionais. O lado bom, porém, é que do jeito que as coisas são hoje,
o volume excessivo deixou de ser tão importante.
O QUE EU FAÇO, ENTÃO?
Primeiro que tudo, se você tem verba, mande as mixes para um
masterizador. Se tudo correr bem, ele vai acrescentar muito a seu
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trabalho. Não só com volume, mas com possibilidades tímbricas


também.
O masterizador sempre acerta? Claro que não, mas ele sempre estará
disponível para ouvir suas observações e alterar para que você seja
atendido. Você não é mais uma figura passiva na master (embora
dependendo do caso isso se transforme em algo bem caro) .
MAS EU NÃO TENHO VERBA
Ok, temos que masterizar, porque a realidade é essa. Então, primeiro
vamos nos conformar com o fato de que não faremos uma
“Masterização”. A vantagem é que ela nem sempre é necessária.
Como sempre digo: se estou feliz com o som de minha mixagem,
porque quando eu ligar o Modo Masterização eu ainda tenho que
procurar melhorar o som? Ele não estava bom?
Meu objetivo ao mixar é ter o som mais pronto possível, até mesmo no
volume. Quando a gente consegue isso, masterizar passa a ser um
processo de apenas cuidar com os extremos de frequência (os sub
graves e os super agudos) e principalmente adequar o loudness.
Se for um álbum, podemos até pensar em uniformizar a sonoridade
entre as músicas, mas nem isso é tão decisivo, porque é raro as pessoas
ouvirem um álbum em seguida hoje.
E ainda tem um lado mórbido nisso tudo. O nível de atenção a detalhes
que as pessoas dedicam à audição hoje é muito menor do que
antigamente. Exceto os apaixonados por áudio, as pessoas ouvem
fazendo outras coisas ao mesmo tempo, e nesse ambiente, as sutilezas
entre músicas acaba tendo menor importância.
MINHA MÚSICA NÃO SOA IGUAL ÀS OUTRAS
Se esse é o caso, provavelmente não é por causa da master dos outros
e nem você vai resolver com sua master. O som não se define na
master. Ele se solidifica apenas.
Quando os equipamentos e plug-ins começaram a ficar acessíveis a
todo mundo, licita ou ilicitamente, as pessoas passaram a acreditar que
isso bastava. Bem-vindos ao mundo real. Isso não é suficiente.
Esse foco no equipamento que nos vendem, essa atitude a que chamo
de EXOPLISMOFILIA (do grego “exoplismos=equipamento + filia=amor”)
é uma grande ilusão. Não importa apenas TER a ferramenta. É preciso
saber O QUE fazer com ela.
E isso demanda estudo e prática. Muito de ambos.
O que fará o seu trabalho ter sucesso não é o som. É o conteúdo. O som
vai ajudar muito, mas o público não vai dizer “a música é ruim, mas o
som é ótimo”. Isso é papo de músico e da gente do áudio. Quem
movimenta o mercado, quem dá milhões de views e likes , são as
pessoas que simplesmente gostam da música, sendo ela uma soma de
coisas onde certamente a sonoridade influi, mas não basta.
OK, não posso ter uma caneta de ouro, mas é bom que eu escreva
coisas incríveis com minha Bic.
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DESMASTERIZE-SE!!
Se não houver espaço para um mixador no orçamento, assuma. Mixe o
melhor possível e dê uma boa caprichada no final. Até chame isso de
masterização, por falta de nome melhor, mas tenha um trabalho do
qual você se orgulhe, sem precisar comparar excessivamente com
outros.
Há um lado cruel e elitista no music business: o fato de que quanto
maiores os recursos, quanto melhores os profissionais envolvidos, melhor
tende a ser o resultado. Porém, o lado bom desse mundo é que mandar
pro Al Schmitt mixar e o Bob Ludwig masterizar não garantem que sua
música será um sucesso. Isso vai depender de um monte de fatores,
como oportunidade, temporalidade, qualidade de todos os seus
elementos. É isso que faz nosso mundo tão fascinante.

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122) CUIDADO COM A EXIGÊNCIA SELETIVA


Um editor pediu a um repórter para resumir em uma palavra a
declaração de um economista sobre o futuro do Brasil. O repórter então
analisou o discurso e concluiu:
"Bom".
Aí o editor viu que tinha espaço na página e pediu para o repórter
resumir em duas palavras. Depois de pesquisar muito ele pinçou:
"Nada bom".
A simplificação é um recurso muito importante para se resolver
problemas complexos. A Física usa isso o tempo todo (quem não lembra
do "movimento retilíneo uniforme"?) .
O problema é que uma simplificação mal feita pode levar a
interpretações complicadas.
Em áudio existe um negócio a que chamo exigência seletiva, onde
algumas pessoas se preocupam demais com certos aspectos e
esquecem do todo.
Uma das "máximas" do áudio é que "OS AMPS VALVULADOS TÊM O SOM
MELHOR". Eu nem preciso entrar em detalhes para deixar claro que essa
é uma simplificação bem perigosa. Existem ótimos amps e pré-amps a
válvula e a transistor também (o FET é um tipo de transistor). E existem os
não tão bons nos dois casos.
Uma das justificativas para esse tipo de afirmação vem do fato de que
"os amps valvulados geram harmônicos pares e os transistores geram
harmônicos ímpares".
Admitindo que isso seja verdade , faltou o complemento da frase:
"QUANDO DISTORCEM". Ou seja. quando um pré ou um amp distorce,
pode favorecer mais um tipo de harmônico ou outro, e os harmônicos
pares, como são oitavas da fundamental. tendem a ser mais
"agradáveis".
Essa preferência vem dos amps de guitarra, onde distorção é algo
quase sempre desejável, em vários graus de importância. Mesmo uma
guitarra limpa pode se beneficiar de alguns harmônicos a mais.
Mas existem várias aplicações onde o baixo ruído de fundo é muito mais
importante do que a quantidade de harmônicos gerados na distorção,
por exemplo, e aí os transistores podem ser a melhor opção.
É perfeitamente válido se preferir esse ou aquele tipo de equipamento,
mas eu sempre acho curioso quando alguém me pergunta se eu vou
gravar a voz com pré (ou mic) valvulado, sem ter a menor noção do
que isso representa.
Não basta sair repetindo o que se ouve. É preciso se entender bem o
que está acontecendo.

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123) DESVENDANDO OS SEGREDOS DO RVOX


O Rvox da Waves é um dos plugins de compressor mais famosos para
voz, e certamente um dos meus preferidos. Mesmo não sendo
unanimidade, é indiscutível que é um dos mais fáceis de se ajustar para
se conseguir um som "profissional" de voz.
Mas qual será o segredo do Rvox? Simulação de algum hardware?
Bom, a Waves obviamente não esclarece. Então, colocando em ação
meu Plugindoctor, decidi investigar.
Primeiramente, a resposta em frequência é abslutamente plana, e a
THD (distorção harmônica total) ficou em impressionantes -170.2dB ,
com nenhuma presença visível de harmônicos. Somando o ruído, temos
os excelentes -147dB. Resumindo, o Rvox não parece ser a emulação de
nenhum hardware, e é um plugin de baixíssimo ruído.
Quanto à Ratio, pode-se ver na figura 1 que ela fica em torno de 2:1,
com um Knee suave, o que costuma ser o conjunto de valores preferido
para vozes em vários compressores.
Para os parâmetros temporais, podemos ver na figura 2 que o Attack é
rapidíssimo (zero, para todos os efeitos), o que pode ser o grande
segredo de sua eficiência na voz. O Release, por sua vez, como se vê
na figura 3, fica por volta de 0,8 a 1 segundo.
Em resumo, o Rvox possui distorção e ruído baixíssimos, soft knee, ratio
de 2:1, attack extremamente curto e release de aproximadamente 1
segundo. Qualquer afirmação de que o Rvox "tira agudos"
provavelmente pode vir do attack curto, já que a resposta em
frequência é absolutamente plana.

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124) UMA AGRADÁVEL SURPRESA


Todos sabem que procuro valorizar muito os desenvolvedores de
software e hardware que fazem bons trabalhos a preços decentes.
O Valhalla, por exemplo, está se firmando cada dia mais como "o
reverb", por sua qualidade, facilidade de operação e principalmente
por custar US$50.
MInha simpatia por fabricantes como a Rode, por exemplo, é notória.
E cada vez mais temos visto um número maior de desenvolvedores
apresentando belos trabalhos, como a Klanghelm, e principalmente a
Tokyo Dawn .
Isso tem mexido com os alicerces de gigantes até então intocáveis -
leia-se "Waves" - que estão sendo obrigados a fazer promoções e
investirem em propaganda massiva.
A Soundspot sempre me pareceu promissora, e comprei vários plugins
deles. Alguns sinceramente baratos e inúteis, outros baratos e úteis, ma
non troppo. Porém, todos bem realizados. ( A lamentar apenas a
preguiça deles em fazer manuais escritos ) .
Daí eles chegam com uma agradável surpresa: o Kinetik. Um mini
channel strip que deixa de fora tudo o que não é absolutamente
necessário e foca - muito competentemente - no que é objetivo.
Compressor sem complicações, eq de quatro bandas com as
frequências nos lugares mais comuns de usar e um drive final para
enriquecer os harmônicos. Tudo simples e direto. Baixa THD, EQ limpo e
verídico. compressor objetivo.
Uma mix possui normalmente a maior parte dos tracks em que a gente
só precisa dar uma comprimida, uma trabalhada no EQ e já foi. O
Kinetik é pra esse tipo de canal (mas não que não possa ser usado de
modo mais , digamos, sofisticado). Tem tudo o que se precisa e não tem
o que normalmente não se precisa.
Pra coroar o sundae com uma bela cereja, está sendo vendido a 15
Libras - Menos de 80 reais. O bom negócio.
P.S. - Não tenho endorsement deles , e paguei pelo meu. Só que o meu
lado engenheiro sente prazer em ver um trabalho bem feito.

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125) O MUNDO É MUITO MAIOR DO QUE A GENTE PENSA


Eu sou ainda do tempo em que o mercado de áudio profissional era
feito de poucos equipamentos muito caros para poucas pessoas (ou
empresas) com muito dinheiro.
Felizmente pude vivenciar essa transformação do mercado na sua
completa democratização atual. Quem tem um computador com uma
DAW hoje tem muito mais tecnologia à disposição do que muitos
profissionais das antigas ao longo de todas as suas carreiras.
Só que a gente não faz ideia (pelo menos eu não fazia) do tamanho
que a coisa hoje é. Vamos pegar o caso dos fones SENNHEISER HD 6XX,
vendidos pela Massdrop - um site de compras coletivas. É um fone de
220 dólares. Nada barato.
Pois bem, só este site vendeu, só deste modelo , 75.000 fones. Sim, meus
amigos, mais de um Maracanã transbordando de fones caros de
apenas um modelo.
Fico aqui imaginando quantas assinaturas o Sr. Slate já vendeu.
P.S. - a Massdrop não entrega no Brasil.

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126) DESVENDANDO OS SEGREDOS DO HCOMP


Seguindo nossa jornada para descobrir os mistérios de plugins e
equipamentos, o plugin da vez é o Waves Hcomp.
Esse é um dos compressores mais usados por aí, e é o meu preferido
para caixa de bateria pop/rock.
A princípio ele não tem muitos mistérios. Apenas dois, na verdade: o
parâmetro ANALOG e o PUNCH.
Na figura 1 temos a resposta em frequência, sem compressão nenhuma
rolando, para as quatro posições do botão. Dá pra ver que a posição 3
afeta substancialmente a resposta, com uma atenuação máxima de
uns 2,5dB em 2kHz. Em OFF a resposta é absolutamente flat.
Na figura 2 temos o attack em 300ms e na figura 3 o mesmo attack com
o Punch no máximo. E aí vemos o grande segredo: mesmo depois que o
detetor percebeu que era hora de comprimir, ele deixou um certo
tempo passar antes de disparar o ataque, como se vê nas setas. Posso
dizer então que o valor do parâmetro Punch corresponde
aproximadamente ao tempo em milissegundos antes que o attack
comece a agir. Uma espécie de histerese.
Na figura 4 vemos que o mesmo acontece para o release.
Faz todo sentido.

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126 ) UM ALERTA SOBRE DOIS PLUGINS

Não sei se é tarde demais, mas me vejo na obrigação de alertar aos


colegas sobre minha opinião a respeito de dois plugins recentemente
em oferta na Waves.
São eles o Abbey Road TG12345 e o TG Mastering Chain. Antes de mais
nada, ambos são muito bons, apresentando as características a que se
propõem e até oferecendo modernizações e acréscimos que valorizam
mais os produtos.
Mas ambos são plugins bem difíceis de usar por pessoas menos
experientes. O meu conselho para quem está começando em
mixagem, ou até mesmo que está em nível intermediário, é que invista
em outros plugins de mais fácil operação e resultado tão bom quanto,
como por exemplo o Scheps Omni Channel, na mesma faixa de preço.
Os equalizadores de ambos os TGs são muito efetivos e colorem como
proposto, mas os compressores são muito temperamentais, exigindo
muito trabalho para soarem como o esperado. O resultado vem, mas
não é simples.
Para quem quer dar uma "esquentada" através de compressores
antigos, há outras ondas na própria Waves mais fáceis de surfar (com o
perdão do trocailho).

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127)Pelo que estou pagando ao comprar um simulador de fita?


Vamos analisar o que o Kramer Master Tape, por exemplo, entrega.
Lembrando que ele é uma emulação super fiel de uma máquina de
1/4" para 15 e 71/2 ips e várias magnetizações.
Na figura 1 temos o que eu usei como ajustes. A única diferença em
relação ao default de fábrica é a magnetização, que coloquei em 250
nWb/m.
Na figura 2, a resposta em frequência. Na 3, a distorção. Sem distorção
nenhuma teríamos apenas a barrinha em 1kHz. O resto é distorção.
Reparem que curiosamente os harmônicos ímpares são bem mais
intensos que os pares - e tem gente que culpa os transistores por esse
tipo de distorção e chama ela de ruim.
Na fig 4, a forma de onda, que sem distorção, seria uma senóide. Na fig
5 temos a famosa compressão de fita, que nesse caso é mais ou menos
2:1.

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128) EXEMPLO PRÁTICO DE COMPRESSÃO PARALELA E SEU


RESULTADO
Essa gravação foi feita ontem aqui no estúdio. No link temos o som com
os mics diretos de cada peça, depois um canal de "sala", que foi feito
com um U47 , virado de costas para a bateria e de frente para o vidro,
a 2 metros de distância. Esse áudio da sala foi muito comprimido através
de um C1LA de hardware e gravado. O segundo trecho é apenas esse
canal. O terceiro trecho é a soma desses dois canais, como foi usada
no resultado.
Não há nenhuma equalização ou tratamento. Apenas a compressão
no canal de sala mais o som direto dos mics próximos.
Compressão paralela é apenas isso: a soma de um áudio direto com
ele mesmo (ou muito semelhante, no caso) bem comprimido..
https://soundcloud.com/fabiohenri…/teste-compressao-paralela

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129) A verdade sobre o Subkick

Um dos mitos praticamente universais do áudio é o subkick. A DW


lançou o que chama de “moon microfone” que, em outras palavras, é
um subkick bem feitinho. Mas custa US$ 400,00. Só por esporte, Fiz um
com um falante de carro usado que no total saiu por R$ 15,00.

Mas afinal, o subkick dá um gravão abaixo do bumbo? Não.

O princípio de funcionamento é o que se chama em Física de


“vibração simpática”. Quem põe o subkick em movimento é o bumbo,
certo? Então o vai-e-vem do cone só pode se dar na mesma
frequência em que a fundamental do bumbo ocorre. Como se pode
ver na figura, onde o canal de cima é o bumbo e o de baixo, o subkick,
a frequência fundamental é exatamente a mesma, como era de se
esperar.

Mas afinal o que o subkick faz? Ele simplesmente nos dá um reforço na


frequência de ressonância mais grave do bumbo. É como se a gente
aumentasse os graves com o equalizador.

Não estou dizendo que não merece ser usado. Acho até legal, mas daí
a achar que ele deixa o bumbo mais grave do que ele é, há uma longa
distância.

Ah, já ia esquecendo. Normalmente o canal do subkick vem atrasado


em relação ao bumbo. Então, se vc não corrigir esse atraso, pode
acabar com MENOS graves ao somar o subkick.

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130) LUFS

Essa misteriosa sigla significa "Loudness Units relative to Full Scale". É uma
medida em dB cujo objetivo é quantificar o jeito como percebemos o
volume, e não apenas a amplitude de um sinal.

Ela está definida no padrão ITU-R BS 1770-4 (International


Telecommunication Unit é um órgão normatizador de
telecomunicações) e recomendada na EBU R-128 (European
Broadcasting Union) . No Brasil, está especificada em
http://www.anatel.gov.br/…/procedimentos-…/786-portaria-559…

Esse tipo de norma visa uniformizar os volumes percebidos dos diversos


conteúdos apresentados em broadcast (TV), e por tabela acaba
dando uma trégua na infame Guerra do Loudness.

Existem diversos plugins que implementam essas medidas, e hoje são


fundamentais para quem entrega áudio final.

Se você vai gerar um material para TV, deve se conformar a essas


normas, com, por exemplo, um loudness de -23 LUFS (o que para nós
seria algo como -23dB, o que pode parecer pouquíssimo). É uma
medida estatística, e a norma procura favorecer a dinâmica - altos e
baixos - do conteúdo.

Em termos de áudio musical, valores altíssimos estão na casa de -6 LUFS,


e com o tempo o valor de -9 LUFS está se firmando como um "padrão"
razoável para um CD.

A coisa começou a nos afetar diretamente quando os sites de


Streaming, como Youtube, Spotify e iTunes começaram a usar
niveladores automáticos de volume. Eles uniformizam o volume dos
áudios através de algoritmos próprios, mas na média, favorecem
aqueles que apresentam em torno de -12 a -14 LUFS.

Como o algrtimo leva em conta a média - e aqui é a coisa MAIS


IMPORTANTE para a gente que faz música - se você entrega um
material bem alto, na pressão, marcando -7LUFS praticamente o tempo
todo, os algoritmos vão abaixar o volume até que ele chegue aos -13.
Ou seja, quanto mais alto e constante o volume de seu material, mais
ele será atenuado.

Uma música em que o volume esteja o tempo todo em -13, sem


dinâmica, não irá receber atenuação nem ganho. Porém, se sua
música tem uma média de -13 mas tem momentos bem acima disso,
porém curtos, na média o algoritmo vai deixar esses picos passarem, e
sua música, além de ter dinâmica, tenderá a soar mais alto.
©2019 by Fábio Henriques
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Então a habilidade hoje está em "trabalhar" o padrão. O conceito


antigo de manter tudo o tempo todo na pressão, hoje acaba sendo
uma desvantagem. Mas o problema é que muita dinâmica faz com
que seu áudio ouvido num celular no meio de uma academia ou no
trânsito acabe se perdendo no ruído de fundo. Assim a habilidade está
em manter uma dinâmica mas evitando trechos de nível muito baixo.

©2019 by Fábio Henriques


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©2019 by Fábio Henriques

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