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Introdução
A diferenciação entre o conhecimento efetivo acerca da realidade e o
que não pode ser comprovado existe ao menos desde a Grécia Antiga.
Tal problematização permitiu compreender o que é ciência e o que são
questões de fé, gerando a distinção entre mito e filosofia. As correntes
da filosofia, em suas mais diversas vertentes, valorizam, como você sabe,
a reflexão racional.
Neste capítulo, você vai verificar o que diferencia o conhecimento de
crenças individuais e místicas e como tal diferenciação se deu na Grécia
Antiga. Você também vai conhecer os principais filósofos da Antiguidade
Clássica e ver como as suas teorias se distinguem. Além disso, você vai
verificar como os métodos utilizados por esses pensadores os auxiliaram
a chegar ao que acreditavam ser o conhecimento.
Conhecimento e misticismo
Se hoje existe alguma diferenciação entre conhecimento e misticismo, tanto
no âmbito das discussões cotidianas quanto no universo científico, os respon-
sáveis são os gregos antigos. Na atualidade, é comum diferenciar pareceres
científicos de opiniões, ou mesmo distanciar crenças individuais de postulados
universais científicos. Crenças relacionadas a narrativas lendárias, bruxaria
e discursos religiosos, por exemplo, apesar de terem um grande valor social,
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cultural e individual, não podem ter validade científica na medida em que não
é possível comprová-las e sistematizá-las a partir da realidade factual. Assim,
a ciência é cética e se fundamenta a partir de conhecimento comprovável
sobre a realidade.
Na Grécia Antiga, esse foi um dos maiores paradigmas. A separação
entre verdade (aletheia) e opinião (doxa) e entre ficção/mito e realidade
aconteceu devido à falência do mito frente às novas correntes de pensamento
que surgiram nesse período (JAEGER, 2013). Dessa forma, o distanciamento
em relação às narrativas míticas se deu principalmente por uma mudança
na educação do homem grego. Em síntese, houve uma alteração no modo de
vida da Grécia Antiga.
No período dito mítico, a educação era voltada aos ensinamentos de Ho-
mero (928–898 a.C.) e Hesíodo (750–650 a.C.) e consistia em “[...] formar a
aristocracia grega nos critérios de exaltação da coragem bélica e heroica, em
elogiar a preparação para a guerra, para o cuidado da casa, treinar para o
sucesso no exercício dos negócios particulares” (NUNES, 2017, p. 61). Por-
tanto, o mito era uma maneira de explicar o mundo e os fenômenos naturais,
mas também uma maneira de repassar valores morais e culturais às novas
gerações (JAEGER, 2013).
Nesse contexto, o termo grego areté (excelência, virtude) era norteador
desse ideal de educação, pois buscava-se formar o cidadão, o guerreiro, com
um caráter virtuoso em todos os aspectos e tendo excelência em seu desempe-
nho social, qualquer que fosse (NUNES, 2017). Assim, as obras de Homero e
Hesíodo serviram como ideal para o cidadão grego arcaico, já que retratavam
as narrativas míticas que buscavam explicar a origem e as causas da realidade,
bem como dos sentimentos e das virtudes humanas. Ao conhecer figuras
heroicas como Ulisses e Aquiles, o cidadão grego aprendia com as virtudes
desses personagens, a quem deveria buscar assemelhar-se.
Entretanto, apesar de “educarem” o cidadão, as narrativas míticas tratavam
sempre de fatos e acontecimentos exteriores à vida ordinária (JAEGER,
2013). Ou seja, ao inteirar-se de mitos com personagens sobre-humanos, o
cidadão vivia uma espécie de paradoxo, pois via que em si não havia nada
de sobrenatural. Assim, aos poucos, o mito vai perdendo a sua validade em
relação à explicação da realidade; ele adquire cada vez mais valor cultural e
menos valor epistemológico. Contudo, não há como determinar uma ruptura
abrupta entre essas duas perspectivas, dado que outras explicações da rea-
lidade foram sendo elaboradas aos poucos e que o cidadão ainda mantinha
as suas crenças (JAEGER, 2013). Por volta do século VI a.C., o pensamento
Filosofia grega 3
O livro de Homero intitulado Odisseia narra a saga de Odisseu (que no mito romano
se chama Ulisses), um dos grandes heróis da Guerra de Troia. A narrativa conta como
foi o retorno de Odisseu à sua terra natal, Ítaca. No poema, Odisseu passa por vários
lugares e várias situações em que se misturam elementos da realidade e da mitologia.
Essa obra é uma das principais da Antiguidade Grega (JAEGER, 2013).
No link a seguir, confira um vídeo sobre as distinções teóricas entre Sócrates, Platão e
Aristóteles e sobre o pensamento desses filósofos gregos.
https://qrgo.page.link/LjXZR
Filosofia grega 9
Leitura recomendada
SÓCRATES, Platão e Aristóteles: documentário filósofos e a educação. [S. l.: s. n.], 2017.
1 vídeo (25 min). Publicado pelo canal Rony Historiador. Disponível em: https://www.
youtube.com/watch?v=6s2yErEe7tc. Acesso em: 21 jul. 2019.