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I. INTRODUÇÃO
Não foram poucas vezes em que nos diários, crônicas e novelas, Lima referiu-se
aos subúrbios e a linha da estrada de ferro da Central do Brasil. A “cidade”, que
é a maneira como os suburbanos chamam até hoje a região central da capital do
Rio de Janeiro, era sem dúvida sua boa companheira. (SCHWARCZ, 2017, p.
163).
É possível dizer, então, que da mesma maneira que a cidade era uma
personagem recorrente de Lima Barreto, sempre presente em suas crônicas e romances,
Lima foi um frequentador assíduo do trem –de segunda Classe – para transitar
cotidianamente entre o subúrbio e a região central, era um personagem importante da
cidade do Rio de Janeiro.
Nesse sentido, o subúrbio sempre representou parte da literatura de Lima
Barreto, assim como a questão racial, outra realidade vivenciada por ele e denunciada
em seus escritos, e, portanto, Lima era também era um personagem que representava o
subúrbio, conforme afirma Lilia Schwarcz:
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Acadêmica do curso de Letras/Literaturas da Faculdade de Letras da Universidade Federal do Rio de
Janeiro. Este trabalho foi apresentado como avaliação da disciplina Fundamentos da Cultura Brasileira,
ministrado pela Prof.ª Dr.ª Luciana Nascimento no 1º semestre de 2018.
2
Afonso Henriques de Lima Barreto nasceu no Rio de Janeiro em 1881. Autor de inúmeros romances,
contos e crônicas, escreveu regularmente sobre a cidade e a vida urbana do Rio de Janeiro, onde faleceu
em 1922.
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Os subúrbios cariocas e a linha da Estrada de Ferro Central do Brasil
foram motes prediletos na obra de Lima Barreto. Por vezes eles
surgiam como coadjuvantes; por vezes, viravam atores principais. No
"centro" ele trabalhava como amanuense, encontrava sua turma de
farras, percorria os bares e as redações de jornal (cf. Resende, 2016).
Era também por lá que perambulava e colhia material, andava
como flâneur, ou simplesmente acompanhava o ritmo acelerado da
cidade. Era, porém, no percurso que percorria todos os dias - do
subúrbio de Todos os Santos, na Rua Boa Vista, até a Secretaria da
Guerra, que ficava na Praça da Aclamação (atual Praça da República),
e vice-versa -, que o escritor encontrava tempo para observar não só
passageiros, como as arquiteturas das várias estações, os vizinhos, os
"aristocratas do local", os funcionários públicos como ele, os
estudantes, os humilhados, os operários, as moças. O trajeto do trem
era pretexto, ainda, para marcar diferenças sociais que delimitavam
classe, raça, gênero e região, singularidades que ficavam ainda mais
claras quando comparadas com a população da capital. O importante é
que no conjunto de sua obra o escritor vai elaborando essa geografia
íntima, a partir do percurso que empreendia entre os subúrbios e o
centro do Rio, e o oposto também. (SCHWARCZ, 2017, P. 123.).
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Em seu texto, Charles Baudelaire um lírico no auge do capitalismo, Walter
Benjamin refere-se ao termo flâneur como sendo uma espécie de sujeito atento e
observador que vaga pelas ruas em uma reflexão sobre a cidade moderna. Esse conceito
pode ser observado em vários aspectos desta crônica de Lima Barreto, em que é
possível acompanhar um sujeito que vaga pelo subúrbio, observa e conhece suas ruas.
Além de outra visão sobre o centro da cidade reformada, “As Enchentes” nos
fornece exemplos concretos de um traço da escrita de Lima que se faz tão presente
quanto o tom crítico: a ironia. Essa característica marcante do autor, na verdade, anda
ao lado da critica como explica Áureo Joaquim Camargo:
Lima Barreto, conhecido por suas ironias, denuncias e teimosias, não deixou sua
experiência suburbana fora de sua “literatura militante”. Em seus escritos, Lima mostra
o subúrbio através de diferentes perspectivas, algumas vezes de maneira mais distante e
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coadjuvante, outras de forma mais central e protagonista. Entretanto, não se pode negar
que o subúrbio sempre foi um personagem significativo para Lima Barreto.
Através de seus escritos, como se pode ver pelas crônicas aqui analisadas, Lima
apontava as contradições dessa cidade marcada por desigualdades. Ao ironizar tais
contradições, Lima se apropriava dos personagens controversos desta cidade, por isso,
políticos –e outras figuras das quais o autor descordava –estavam constantemente
presentes em sua literatura.
Por conta disso, quando trata das desigualdades, o autor não ignora as diferenças
entre o subúrbio e o centro. E quando aponta as contradições, Lima não deixa de
apresentar a visão de um suburbano, uma vez que vivenciou essa realidade. Portanto,
Lima acrescenta essa visão para literatura, além de apontar a diferença entre o subúrbio
e o centro como uma contradição por si só.
IV. REFERÊNCIAS
BARRETO, Lima. Vida Urbana: Artigos e Crônicas. São Paulo: Brasiliense, 1956.
CANDIDO, Antonio. A vida ao rés do chão. In: In: ______. A crônica: o gênero, sua
fixação e suas transformações no Brasil. Rio de Janeiro: Fundação Casa de Rui Barbosa,
1992.
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Disponível em https://www.maxwell.vrac.puc-rio.br/23905/23905_1.PDF. Acesso em
30/06/2018
PINHEIRO, Paulo Sérgio. Viagem ao lado obscuro da Belle Époque carioca. Folha de
S.Paulo, São Paulo, 4 de maio de 1986. Livros, p. 92.
SCHWARCZ, Lilia Moritz. Da minha janela vejo o mundo passar: Lima Barreto, o
centro e os subúrbios. In: Estudos Avançados. vol.31 no.91 São Paulo Set./Dez. 2017,
p. 123-142. Disponível em http://www.scielo.br/pdf/ea/v31n91/0103-4014-ea-31-91-
0123.pdf. Acesso em 01/06/2018.
______. Lima Barreto, triste visionário. São Paulo: Cia. das Letras, 2017
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