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O mundo do português e o português no mundo afora:

especificidades, implicações e ações

Pluricentrismo linguístico, ensino e produção


de materiais de Português le no PPPLE

Edleise Mendes
Universidade Federal da Bahia - UFBA
Sociedade Internacional de Português Língua Estrangeira - SIPLE

Introdução

A principal questão que orienta esta reflexão diz respeito


às formas como devemos planejar as ações para o ensino e a
formação de professores de português LE/L2, uma língua pluri-
cêntrica que tem mostrado nos últimos anos a sua importância
como idioma de projeção global. Para desenvolver esta discussão,
analisarei os resultados parciais de um projeto em andamento,
o Portal do Professor de Português Língua Estrangeira / Língua
Não Materna - PPPLE, projeto do Instituto Internacional da Língua
Portuguesa - IILP, o órgão executivo da Comunidade dos Países de
Língua Portuguesa - CPLP, responsável pela promoção, projeção e
difusão do português no mundo. Este projeto implementa ações
para uma gestão multilateral da língua portuguesa e promove
um ensino de idiomas mais sensível culturalmente e focado na
valorização da diversidade, contribuindo para a inclusão das
variedades não-dominantes do português no sistema de gestão
da língua. Essa mudança no modo de governança do português
deve ter como principal objetivo, portanto, contribuir para a
promoção de uma educação em língua portuguesa voltada para
a participação democrática, inclusiva e promotora do diálogo
intercultural.

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O mundo do português e o português no mundo afora:
especificidades, implicações e ações

Pluricentrismo Linguístico em Contexto


Educacional de Português Língua Estrangeira /
Língua Segunda

As línguas pluricêntricas caracterizam-se por apresentar


mais de um centro de referência, de onde emanam variadas nor-
mas linguísticas, nem sempre coincidentes do ponto de vista de
seus usos. As normas variam internamente, porque apresentam
diferenças dentro de uma mesma variedade de uso, e também
variam externamente, como é o caso de normas que diferem
entre países ou regiões. De acordo com os principais teóricos
que fundamentam os estudos sobre pluricentrismo linguístico
(Michael Clyne; 1992; Rudolf Muhr, 2012), o pluricentrismo
linguístico apresenta dois aspectos fundamentais: as relações
entre linguagem e identidade e linguagem e poder. Esta última,
sobretudo, tem demonstrado ser central para a compreensão das
relações entre diferentes variedades de uma língua pluricêntrica,
como o português.
As relações entre as variedades nacionais do português, por
exemplo, têm sido de assimetria e de isolamento, pois baseia-
se na competição entre as normas dominantes ou centrais, as
normas brasileira e portuguesa, e o isolamento das outras va-
riedades não-dominantes ou periféricas, dos demais países de
língua oficial portuguesa, como os Países Africanos de Língua
Portuguesa - PALOP, e ainda Timor-Leste.
A partir da compreensão das implicações de uma língua
pluricêntrica para o ensino e a formação de professores, é ne-
cessário, então, que pensemos em como é possível, no cenário
geopolítico atual do português, pensar em perspectivas menos
excludentes de gestão da língua, visto que o que temos observa-
do, de modo geral, é o que Oliveira (2013, p. 68-69) aponta como
“uma normatização divergente”, que coloca em lados opostos
duas normas, a portuguesa e a brasileira, deixando de lado ou sem
visibilidade as normas em desenvolvimento nos outros espaços
da lusofonia, como já ressaltei. Para o autor, esse tipo de gestão
é disfuncional, visto que no momento atual as línguas jogam

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O mundo do português e o português no mundo afora:
especificidades, implicações e ações

um papel central nos movimentos de internacionalização. Com


isso, se pode entender que para o português se fortalecer como
língua de projeção global é necessário o que Oliveira (2013, p.
69) aponta como uma “normatização convergente”,

[...] aquela normatização que, em benefício dos falantes,


amplia a veicularidade da língua, permite melhor circula-
ção de um mercado linguístico ampliado, com evidentes
vantagens políticas, e finalmente inclui, ao invés de excluir,
os países que até o momento não puderam participar da
gestão de sua própria língua oficial, isto é, os PALOP e
Timor-Leste.

De modo geral, o discurso dominante nas reuniões e concer-


tações governamentais e políticas é o da união de esforços em
torno do desenvolvimento de políticas multilaterais (urgentes)
para a gestão da língua, o qual também se reflete nas reuniões
acadêmicas, da sociedade civil etc. No entanto, na prática, isso
não tem se transformado em ações concretas para a uma gestão,
de fato, multilateral da língua, com o desenvolvimento de políti-
cas de promoção, de ensino e de formação de novos professores
eficazes e conjuntas. O que se deve almejar é o que, mais uma
vez, Oliveira (2013, p. 73) aponta como sendo o cenário desejável
para o português no século XXI:

[...] a constituição de uma língua comum, cada vez


mais útil aos seus falantes e amplificada em seus usos
e âmbitos, não passa pela gestação, nem pela impo-
sição de uma forma central ou única de idioma, mas
– ato político que é – passa pela criação de instâncias
comuns de gestão, que deliberarão, por consenso,
sobre o espaço de variação necessário para que cada
um dos países falantes se sinta representado e possa
investir na promoção deste idioma comum, para seu
próprio benefício e de seus cidadãos, através dos seus
recursos intelectuais, culturais e econômicos.

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O mundo do português e o português no mundo afora:
especificidades, implicações e ações

Algumas ações governamentais, no entanto, já despontam,


e aqui trago exemplos do contexto brasileiro, como a criação
de Universidades, como a UNILA (Universidade da Integração
Latino-americana) e a UNILAB (Universidade da Integração Inter-
nacional da Lusofonia Afro-Brasileira)1 que objetivam promover
a integração regional e também intercontinental, linguística,
cultural e econômica. Temos presenciado, também, a expansão
de acordos de cooperação universitária entre os países lusófonos
e destes com outros países, em diferentes continentes. E, ainda,
posso citar a grande proliferação de Editais (MEC/MRE/CNPQ/
CAPES) para o desenvolvimento de ações de cooperação na área
de formação de professores de português (LE/L2), no Brasil e em
outros países onde haja focos de interesse pela aprendizagem
dessa língua.
No âmbito internacional, e sob a organização econômica e
política da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP),
o Instituto Internacional da Língua Portuguesa - IILP vem desen-
volvendo projetos e desencadeando ações na direção de permitir
a criação de cenários mais promissores para um trabalho de
gestão comum da língua portuguesa, como são os projetos do
VOC (Vocabulário Ortográfico Comum da Língua Portuguesa)2 e
do Portal do Professor e Português Língua Estrangeira (PPPLE)3.
Estes projetos são resultados de uma orientação mais ampla,
constante do Plano de Brasília (2010)4, que mandatou o IILP para
desenvolvê-los e coordená-los.
O VOC é uma base lexical digital formada pelos VON – Vo-
cabulário Ortográficos Nacionais dos oito Estados Membros da
CPLP, prevista no Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de
1990 (AOLP90) e necessário para a aplicação da nova norma or-
tográfica unificada, que melhorará a circulação de livros e outros
materiais escritos entre os países de língua portuguesa, bem

1 Embora seja uma proposta que tem em sua essência um princípio inovador no planejamento
de uma instituição de ensino superior, o de privilegiar o diálogo transnacional, deixa de fora,
em sua formulação, países da CPLP como Portugal (velha competição?) e Timor-Leste.
2 Veja em http://voc.cplp.org/.
3 Veja em http://www.ppple.org/.
4 Acessível em: http://iilp.wordpress.com/.

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O mundo do português e o português no mundo afora:
especificidades, implicações e ações

como na Internet. Além disso, e como o próprio projeto do VOC


ressalta5, será a maior base lexical digital da língua portuguesa,
permitindo uma participação ampliada dos países da comunidade
lusófona na gestão da língua.
O outro projeto de relevância do IILP, o PPPLE, e que será
mais adiante discutido, é uma plataforma on-line que tem como
objetivo primordial oferecer à comunidade de professores e inte-
ressados em geral, on-line e gratuitamente, materiais e recursos
para o ensino e a aprendizagem do português como língua es-
trangeira/segunda língua, em três níveis de proficiência e nas oito
variedades linguísticas nacionais dos países de língua oficial por-
tuguesa. Desse modo, ele é concebido, desenvolvido e alimentado
de forma multilateral, criando um sistema internacionalizado de
gestão do ensino e da formação de professores de PLE/PL2 e fun-
cionando como instrumento de cooperação linguístico-cultural
entre os Estados Membros da Comunidade de Países de Língua
Portuguesa (CPLP). Isso permite, consequentemente, mudanças
no modo de conceber as normas linguísticas, dando visibilidade
às variedades que não estão no centro, valorizando outras normas
nacionais. Além disso, utiliza o potencial das TICs (acessibilidade,
amplitude de atuação, baixo custo, circularidade, flexibilidade)
para a promoção, a difusão e a projeção da língua portuguesa.
Há um conjunto significativo de pesquisas que exploram a
diversidade linguística e os aspectos estruturais das diferentes
variedades das normas nacionais da língua portuguesa, sempre
em escala comparativa, mas há muito pouca consideração dos
impactos dessa diversidade sobre o ensino e formação de pro-
fessores desta língua. E se pensarmos no contexto de ensino de
português língua estrangeira (PLE), essa questão torna-se muito
mais evidente, uma vez que nesses espaços há uma forte liga-
ção entre linguagem e identidade nacional, como podemos ver
representado nos materiais e cursos que são desenvolvidos em
diferentes partes do mundo. A chave dominante nesses casos,
quando estão em jogo planejamentos de cursos, desenvolvimento

5 Para maiores informações, visite o site do IILP: http://www.iilp.org.cv/.

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O mundo do português e o português no mundo afora:
especificidades, implicações e ações

de currículos, formação de professores e avaliação e produção


de materiais didáticos, é sempre a relação “uma nação – uma
língua”. Isso faz com que não haja a possibilidade de diálogo
entre os diferentes espaços-pessoas da grande comunidade de
língua portuguesa.
Os desafios, então, surgem de perguntas como: Quais va-
riedades devem ser ensinadas, especialmente em contextos em
que diferentes normas linguísticas coexistem? Podemos formar
professores, considerando diferentes padrões normativos de
referência? Como avaliar e produzir materiais para o ensino de
português LE/ L2, considerando diferentes variedades nacionais?
Como incluir nos centros de discussão dos planejamentos po-
líticos e educacionais voltados para o PLE/PL2 outras línguas e
culturas que estão além do binômio Portugal-Brasil?
Essas questões nos mostram que há muitas reflexões ainda
em curso e que são necessárias para nos ajudar a compreender
como enfrentar a complexidade das sociedades contemporâneas
e, sobretudo, promover uma educação linguística voltada para o
plurilinguismo e para o trânsito entre línguas-culturas estrangei-
ras ou dentro de uma mesma língua, como é o caso do português.

Ensinar Português Incluindo as Variedades Não-


Dominantes – É Possível?

Um dos pontos positivos do processo acelerado de desen-


volvimento do português na atualidade, seja qual for o contexto
em que é ensinado a falantes de outras línguas, é o crescente
interesse e a forte demanda por um ensino de qualidade, com
materiais de qualidade e a partir de abordagens contemporâne-
as para o ensino/aprendizagem de línguas, o que tem forçado
pesquisadores, professores e profissionais que atuam na área
a buscarem novos caminhos para a sua formação e atualização.
Entre outros aspectos, eles têm sido obrigados a rever os
velhos esquemas de curso e os métodos pouco flexíveis e aber-
tos a mudanças para refletirem sobre questões importantes e

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O mundo do português e o português no mundo afora:
especificidades, implicações e ações

relevantes para o professor contemporâneo, como, por exemplo,


sobre visões de língua e de linguagem menos sistêmicas e mais
sensíveis culturalmente, sobre os materiais como fontes de apren-
dizagem e não como fim, e, ainda, sobre as práticas de sala de
aula como experiências situadas de uso da língua portuguesa em
uma perspectiva mais ampla, que a considere língua de âmbito
global e não apenas o reflexo de um país ou nação.
Adicionalmente, essa necessidade de ampliação da oferta do
português e da formação de novos professores tem exigido das
instituições governamentais, como também das privadas, a alo-
cação de recursos para o desenvolvimento de projetos de cursos
e também de materiais, além da formação de novos professores.
Nos próximos anos, muitos resultados dessa efervescência serão
evidentes, como uma grande quantidade de novos materiais no
mercado, o grande contingente de professores formados e em
contínuo processo de formação, a criação de cursos e de recursos
em ambiente virtual, para o acesso de toda a comunidade PLE/
PL2. Estamos, de fato, vivendo novos tempos para o português,
e que seja duradouro.
Por esse motivo, as instituições dos países de língua por-
tuguesa precisam criar condições para acolher seus visitantes
(estudantes, professores, pesquisadores, gestores e técnicos),
oferecendo-lhes infraestrutura acadêmica e ambiente linguísti-
co e culturais multilaterais. Para dar conta disso, é de extrema
importância, no cenário geopolítico do português hoje, que
sejam construídos acordos de cooperação internacional atra-
vés dos quais os interesses acadêmicos, linguísticos e culturais
estejam voltados para todas as línguas e culturas em interação,
em suas especificidades e particularidades, de modo a garantir
o necessário transito de ideias, tecnologias e modos de produzir
conhecimento que almejamos.
Nesse cenário, é necessário, sobretudo, que pensemos na in-
tegração das diferentes línguas que vivem em português, ou seja,
nas diferentes línguas-culturas lusófonas espalhadas pelo mundo.
De modo geral, seus agentes, principalmente os que podem de-

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O mundo do português e o português no mundo afora:
especificidades, implicações e ações

sencadear políticas linguísticas mais amplas, não trabalham de


modo conjunto para que dentro de nossa própria comunidade
busquemos a diálogo intercultural, para que possamos almejar
ter força e representatividade como língua de projeção mundial.
A partir de um trabalho conjunto dos diferentes países e
gestores governamentais, responsáveis pelas políticas para a
promoção do português, cada professor formado e em atuação,
nos diferentes contextos de ensino que despontam, é um agen-
te difusor e promotor de nossa(s) língua(s)-cultura(s), capaz de
impulsionar o importante reconhecimento do português como
língua que cresce no cenário mundial.
No entanto, as dificuldades para isso decorrem do fato de
que embora as instituições reconheçam a necessidade de um
trabalho conjunto, por parte dos governos e agentes de políticas
educacionais, para a criação de ações conjuntas para o ensino
e a formação de professores de língua portuguesa, no espaço
da Comunidade de Países de Língua Portuguesa – CPLP, são as
variedades brasileira e portuguesa que continuam sendo o foco
central dessas ações. De modo geral, como já observamos em ou-
tros momentos desse texto, as outras variedades não dominantes
circulam em espaços periféricos e são tributárias dos conteúdos,
cursos e materiais editoriais produzidos pelo Brasil e por Portu-
gal. Como é possível contribuir para a mudança desse cenário no
contexto da educação linguística em língua portuguesa?
Nessa direção é que foi desenvolvido o Portal do Professor
de Português Língua Estrangeira / Língua Não Materna (PPPLE),
um dos projetos estratégicos do Instituto Internacional da Língua
Portuguesa (IILP) e que foi projetado, desenvolvido e alimenta-
do de modo multilateral, como já ressaltamos anteriormente.
O PPPLE inclui em sua base de dados Unidades Didáticas (UD)
produzidas pelas equipes dos diferentes países participantes
que já começaram a desenvolver seus materiais: Angola, Brasil,
Moçambique, Portugal e Timor-Leste; e mais proximamente Cabo
Verde e, em seguida, os outros membros da CPLP. Há também
disponíveis UD produzidas para grupos específicos: português

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O mundo do português e o português no mundo afora:
especificidades, implicações e ações

para falantes de língua de herança – português para crianças;


português para falantes de chinês; português para falantes de
espanhol. Neste momento, já temos disponíveis em torno de
700 UD, o que representa 1400 horas de aulas de português (LE/
LNM), em três níveis de proficiência (1, 2 e 3).
A experiência de desenvolvimento do PPPLE permitiu, por-
tanto, que as variedades não-dominantes do português, como as
de Angola, Moçambique e Timor-Leste pudessem estar presente
em uma iniciativa comum voltada para o ensino de português
como língua não materna. E isso se concretizou de diferentes
modos, desde permitir que as equipes nacionais de especialistas e
professores desses países pudessem desenvolver os seus próprios
materiais de ensino, até a produção de conhecimentos teóricos e
metodológicos relevantes para essas comunidades educacionais.
Uma primeira questão de relevância que envolve a experiên-
cia de ensino-aprendizagem de PLE/PLNM através do PPPLE foram
os princípios comuns que o organizaram. Desse modo, não foi
a definição dos conteúdos que representava o mais importante,
mas, sobretudo como as experiências de ensinar e aprender po-
deriam se organizar a partir dos conteúdos eleitos por cada país
participante e suas respectivas variedades linguísticas. Um dos
princípios mais importantes que animam o Portal, desse modo, é
o foco no ensino da língua em uso. A língua portuguesa, então,
é ensinada a partir das experiências de vida de seus próprios
falantes, sempre considerando os seus ambientes de existência,
com suas caraterísticas linguística e culturais. Isso permite que o
professor fique atento, como orientador e guia das experiências
de aprender a língua, para que os significados construídos sejam
autênticos, contextualizados e não apenas informações sobre a
“gramática”. Importantes são os sentidos construídos no processo
de aproximação e reconhecimento da língua, e, sobretudo, na
interação promovida a partir dela.
Para que esse princípio se concretize no PPPLE, cada UD
(Unidade Didática) é organizada a partir de uma “situação de
uso” da língua, que representa as diferentes possibilidades de

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O mundo do português e o português no mundo afora:
especificidades, implicações e ações

interação e de comunicação, em variados níveis de complexidade


e de formalidade. Cada equipe nacional, então, tomando a sua
variedade linguística como referência, elege as situações que
melhor atendem às suas expectativas de ensino e aprendizagem
do português, como podemos verificar nos exemplos apontados
a seguir.

Quadro 1 - Situações de uso nas UD do PPPLE

País / Variedade Situações de Uso


Angola Organização de visita a uma cidade angolana; Diálogo
com agentes de migração e de fronteira; Solicitação de
informação por correio eletrônico.
Brasil Cumprimentos diários e expressão de sentimentos;
Conhecimento e caracterização do carnaval de rua;
Preparo de refeição saudável e discussão sobre cuidados
nutricionais; Festa de aniversário.
Moçambique Conversa sobre alimentação, vestuário e organização
familiar; Solicitação de informações sobre riquezas do
mar; Encomenda de refeições presencialmente ou por
telefone.
Portugal Reflexão sobre o poder da televisão; Compreender
avisos e dar indicações; Entrevista para emprego; Con-
sulta médica.
Timor-Leste Leitura de poemas de autoria timorense; Descrição
de características de personalidade e comportamento
das pessoas; Conhecimento e divulgação de cidades
turísticas.

A partir das situações de uso, foi necessário pensar em con-


junto na seleção das amostras da língua-cultura em português a
ser ensinada, ou seja, na seleção dos gatilhos6 que criam as ex-
periências de interação em sala de aula. Isso traz a compreensão
6 Denomino de gatilho a todo tipo de desencadeador de experiências de uso da língua-cultura,
como textos de variados gêneros (orais, escritos e multimodais), situações, jogos, filmes etc.

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O mundo do português e o português no mundo afora:
especificidades, implicações e ações

de que produzir planejamentos de cursos e aulas ou materiais


didáticos não significa enfeitá-los com conteúdos culturais, com
exemplares de situações, dados históricos e/ou folclóricos carac-
terísticos de determinado país ou grupo social de referência. E
essa tem sido a prática corriqueira dos materiais voltados para
o ensino de línguas, os quais tratam a cultura apenas como con-
teúdo a ser ensinado e como algo estático, perpétuo, que pode
ser conservado intacto.
No ambiente do PPPLE, a cultura é compreendida como a
dimensão mais ampla da experiência humana, ou seja, ela é o
produto de tudo o que sentimos, fazemos e produzimos ao vi-
vermos em sociedade, o que inclui as nossas crenças, tradições,
práticas, artefatos, mas não só isso. Isto é, ela é também toda a
rede simbólica de interpretação do mundo que nos cerca e de
nós mesmos. Por isso mesmo, é heterogênea, mutável e flexível,
transformando-se e sendo transformada pelas forças internas de
mudança e também pela influência do contato com outras redes
simbólicas, com outras culturas. Desse modo, os exemplares de
uma língua-cultura a ser ensinada não podem se limitar a falar
sobre cultura, mas permitirem, além disso, a vivência de experi-
ências culturais (Mendes, 2011).
Nesse sentido, todo e qualquer produto de um determina-
do modo de viver em sociedade é, essencialmente, cultura. Nas
práticas de sala de aula, então, as equipes nacionais seleciona-
ram toda sorte de amostras de linguagem: textos de variados
gêneros, orais e escritos, inclusive os multimodais; imagens e
figuras; situações reais de interação, jogos, acontecimentos e
comportamentos típicos de seu grupo social etc. Para todos
nós, envolvidos no projeto, era necessário compreender que os
exemplares da língua deveriam ser representativos das variadas
situações sociais de uso da linguagem. Cada texto ou material
selecionado (em seu sentido lato) representa uma amostra da
língua-cultura em foco, em toda a sua potencialidade linguística
e cultural. Ao mesmo tempo, todas as experiências de interação
e de uso da linguagem organizam-se dentro de temas, que são

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O mundo do português e o português no mundo afora:
especificidades, implicações e ações

fortemente marcados culturalmente, como podemos ver nos


exemplos destacados no Quadro 2 a seguir.

Quadro 2 – Seleção de temas nas UD do PPPLE

Temas
Angola A palanca negra gigante; Caminho de ferro de Benguela;
Cruzeiro ao Lobito; Um músico angolano.
Brasil Vocês têm wi-fi?; Mentiras e desculpas; Museu do Paço;
Crendices e superstições.
Moçambique Riquezas do mar; O valor da capulana em Moçambique;
Hábitos culturais da população Macua.
Portugal Expressões idiomáticas; Planos para o futuro; Quando eu
era pequenino.
Timor-Leste Poema e lenda timorenses; Trajes tradicionais de Timor-
Leste; Tipos de Tétum; Uma cerimônia de casamento
timorense.

O trabalho realizado nessa perspectiva permitiu que as


equipes envolvidas no PPPLE experimentassem a criação de
oportunidades de reflexão sobre as suas próprias variedades
linguísticas, inclusive sobre as dificuldades de reconhecimento de
algumas delas como normas mais ou menos estabilizadas. Além
disso, para muitos dos especialistas envolvidos no projeto, e,
posteriormente, para muitos professores que começaram a fazer
uso dos materiais do Portal, foi muito revelador compreender que
se podia ensinar língua de modo mais sensível culturalmente e
considerando a real expressão dos falantes de uma determina-
da realidade linguística e cultural, tal como ela é. No caso de
Timor-Leste, por exemplo, alguns teóricos e estudiosos da língua
portuguesa defendem que este país não apresenta, de fato, uma
variedade do português estável, visto que a representatividade
dessa língua na população não passa dos 24%. No entanto, seja
como língua materna ou como língua segunda, o importante é
que os professores de Timor-Leste, incentivados pelo governo,

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O mundo do português e o português no mundo afora:
especificidades, implicações e ações

desejam ensinar aos seus alunos o português que cresce em


sua comunidade e não o português importado de Portugal ou
do Brasil. Nesse sentido, o PPPLE foi uma das primeiras opor-
tunidades que os professores de português desse país tiveram
de produzir os seus próprios materiais de ensino, contribuindo
para o processo de valorização e de desenvolvimento de sua
variedade nacional.
Os professores de Timor-Leste, e também dos outros países
cujas variedades do português são periféricas, a partir dessas ex-
periências podem atuar como intérpretes privilegiados da língua-
cultura que estão ensinando, sensibilizar-se para olhar o mundo
que os cerca com olhos diferentes, olhos capazes de selecionar
mais do que pretextos para a abordagem de aspectos gramaticais,
mas unidades de sentido, formas de ser e de viver representadas
nos textos de todas as naturezas e nas produções culturais em
suas diferentes manifestações. Assim, eles assegurarão que, em
suas salas de aula, os aprendizes possam ter contato com a língua
que estão aprendendo em sua dimensão não só linguística, mas
também sociocultural, histórica e política. (Mendes, 2008, 2011)
Nas primeiras experiências de produção de Unidades Didá-
ticas para o PPPLE que desenvolvemos, no Brasil e no exterior,
uma das principais queixas dos professores foi justamente a
inexistência de materiais para o trabalho com o português que
considerem as especificidades do seu contexto profissional, seja
porque não atendem às necessidades dos alunos, seja porque
ainda trabalham com visões fechadas de língua. Ao contrário
de incentivarem o desenvolvimento da competência linguístico-
comunicativa em português, de desenvolverem práticas de orali-
dade e de letramento situadas, esses materiais ainda insistem no
trabalho exclusivo com a forma e com a repetição mecanicista de
exemplos descontextualizados de língua. Além disso, desconside-
ram as especificidades de suas variedades nacionais, sobretudo
nos casos das variedades não-dominantes do português.
O PPPLE representa, portanto, um modo de subverter essa
situação, criando espaço para que professores de português de

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O mundo do português e o português no mundo afora:
especificidades, implicações e ações

todo o mundo possam ensinar a língua a partir de diferentes


variedades nacionais, a depender de seus interesses, desejos e
oportunidades. Por apresentar esse potencial, o PPPLE também
contribui para preparar os professores para avaliarem, de modo
crítico, e a partir do seu contexto de atuação, os materiais que
melhor atendem às necessidades de seus alunos, além de serem
capazes de produzir os seus próprios materiais. O portal fornece
materiais e recursos de ensino, mas também é um espaço para a
autoformação de professores. A experiência do Portal nos permite
compreender que cada um de nós, como mediadores culturais,
precisamos exercitar e ensinar aos nossos alunos de PLE-PLNM
aquilo que Peter Burke (2009) define como “tradução cultural”.
Viver em português, para a maior parte das pessoas, exige dos
sujeitos dispostos ao diálogo o constante exercício da tradução,
da negociação. Isso é necessário para que em lugar da criação
de zonas bem delimitadas entre a língua de cultura nacional e
uma língua que se pretenda global, seja possível a construção de
ambientes plurais, plurilinguísticos, nos quais as línguas-culturas
em contato (LM, LE, L2) convivam em situação de acréscimo, de
encontro positivo.
A partir da experiência de desenvolvimento do PPPLE, ainda
em curso e em processo de ampliação para outros países, foi
possível incluir Angola, Moçambique e Timor-Leste nas práticas
de produção de materiais para o ensino de PLE-PLNM. Consequen-
temente, também permitiu que os especialistas desses países e
seus professores pudessem, pelo menos de modo inicial, decidir
sobre o que é importante e relevante ensinar para os seus alunos,
respeitando-se as suas variedades da língua, antes deixadas de
lado nas políticas para a educação em língua portuguesa traçadas
a partir de Portugal e do Brasil.

Ensinar a viver em português – Algumas


considerações finais

Partindo, portanto, das reflexões que aqui iniciei, as quais


defendem práticas de ensino e de formação em Português, inter-

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O mundo do português e o português no mundo afora:
especificidades, implicações e ações

culturais e críticas, e que consideram mais do que tudo a língua


portuguesa como língua global, nos planejamentos de cursos
e nos materiais didáticos, o português não é apenas a língua
de referência linguística stricto sensu, mas a ponte, a mediação
necessária, o ambiente confortável dentro do qual sujeitos em
interação olham para as suas proximidades e diferenças e pensam
sobre elas, trabalhando com o objetivo comum de construírem
sentidos para si, para o outro e para o mundo que os cerca.
Para a construção do PPPLE, que permitiu um espaço de
inclusão de variedades não-dominantes do português no cenário
de produção de materiais de ensino, foi necessário considerar
como princípio fundamental o caráter pluricêntrico da língua
portuguesa. Reconhecer que esta é uma língua de muitas culturas,
que inclui falantes de todo tipo, deslocamentos de toda nature-
za, sentimentos dos mais variados quanto às experiências que
vivenciam em outros espaços de socialização, em outras línguas-
culturas. Mas em todas essas situações, há o forte sentimento dos
que ensinam Português a partir do PPPLE de que somos de todos
parte de uma comunidade maior, a da língua portuguesa que nos
une, mas também somos muito diferentes em nossos modos de
ser, de viver e de interpretar o mundo. Mas é especialmente isso
que nos faz uma comunidade muito especial, que está aprenden-
do a reconhecer a diferença como tesouro a ser valorizado, e a
igualdade como patrimônio a ser preservado.
A partir do PPPLE, ensinar português significa ensinar a
compreensão de que aprender essa língua é também ultrapassar
o espaço restrito de um país ou região. Isso significa pertencer
a algo muito maior, que abrange todas as nossas representações
simbólicas do que é “nosso” em oposição ao que é dos “outros”;
engloba todas as pessoas que se identificam com a língua portu-
guesa, independentemente do sotaque que ela apresente.
Desse modo, foi importante problematizar a representação
que temos da nossa cultura nacional ou identidade cultural, que é
sempre vista como algo uno, coeso e indestrutível – pelo menos é
esse sentimento de unidade que nos faz enxergá-la assim. Como

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O mundo do português e o português no mundo afora:
especificidades, implicações e ações

ressalta Hall (2001), uma cultura nacional, ou essa “comunidade


imaginada”, busca unificar os seus membros numa mesma iden-
tidade cultural, representando-os todos como pertencentes a
uma grande família, não importando o quanto sejam diferentes
entre si, com relação a classe, gênero, etnia, credo, ideologia etc.
Então, como ainda aponta Hall (2003, p.45), “A alternativa não é
apegar-se a modelos fechados, unitários e hegemônicos de ‘per-
tencimento cultural’, mas abarcar os processos mais amplos – o
jogo da semelhança e da diferença – que estão transformando a
cultura no mundo inteiro” (Ver também Mendes, 2009).
A partir da experiência desenvolvida no PPPLE, todos os in-
tegrantes das equipes nacionais nos empenhamos em aprender
a ser diferentes, mais abertos, “mais alargados”, como nos diz
Hall. Nós vivenciamos o diálogo como um exercício constante
de querer viver com outros, a começar por aqueles “outros” que
fazem parte da nossa própria comunidade lusófona. E isso pode
e deve ser ensinado.
O processo de ensino-aprendizagem de português como
língua pluricêntrica, portanto, deve ser capaz de desenvolver nos
alunos as capacidades de tradução, de movimento e deslize entre
as línguas-culturas portuguesas, permitindo que cada aprendiz
construa o seu próprio lugar na língua, com suas próprias ferra-
mentas e possibilidades. A eles deve ser permitido construírem
os seus próprios modos de representação, de aproximação e
de pertencimento a essa grande comunidade representada pela
língua portuguesa.
Devido ao limite de espaço deste texto, apenas iniciamos
a discussão sobre a inclusão de variedades não dominantes do
português nas políticas de ensino e de desenvolvimento de ma-
teriais instrucionais para a educação linguística nessa língua. Isso
foi possível através da criação do Portal do Professor de Português
Língua Estrangeira / Língua Não Materna – PPPLE, projeto ainda
em crescimento e desenvolvimento, inclusive com a perspectiva
da inclusão de outras variedades periféricas do português, como
as de Cabo Verde, Guiné-Bissau e São Tomé e Príncipe. Como o

308
O mundo do português e o português no mundo afora:
especificidades, implicações e ações

projeto está em processo de amadurecimento, ainda não temos


dados sobre os impactos do trabalho com as variedades presentes
no PPPLE nas práticas cotidianas de ensino e aprendizagem, nos
diferentes contextos onde o Portal tem sido amplamente utili-
zado. Também este trabalho não se ocupa de fazer descrição do
comportamento linguístico dessas variedades, mas de mostrar,
do ponto de vista político, um modo alternativo de gestão das
variedades de uma língua pluricêntrica, como é o português.
Finalmente, para que possamos alcançar esses ganhos,
precisamos:

1) Almejar políticas linguísticas para o português que sejam re-


sultados de ações de colaboração e de uma gestão multilateral,
voltada para a valorização do multilinguismo e para a inclusão
das variedades não-dominantes.

2) Trabalhar para a construção de ações educacionais e de


formação de novos professores partilhadas e que signifi-
quem espaços de diálogo e de aproximação e não de divisão.

3) Promover e projetar o português como patrimônio comum


que, ao se fazer presente em espaços multilíngues, seja meio
para a reafirmação e o reconhecimento do patrimônio das outras
línguas.
Referências

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nations. Berlin/New York: Mouton the Gruyter, 1992.
HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. Rio de Janeiro:
DP&A, 2001.
HALL, Stuart. Organização de Liv Sovik. Da diáspora: identidades e
mediações culturais. Belo Horizonte: UFMG, 2003.
MUHR, Rudolf. Linguistic dominance and non-dominance in pluricentric
languages: a typology. In: MUHR, R. (Ed.) Non-dominante varieties os
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309
O mundo do português e o português no mundo afora:
especificidades, implicações e ações

MENDES, Edleise. Língua, cultura e formação de professores: por uma


abordagem de ensino intercultural. In: Mendes, Edleise; Castro, M. L.
S. (Org.) Saberes em português: ensino e formação docente. Campinas/
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MENDES, Edleise. O português como língua de mediação cultural:
por uma formação intercultural de professores e alunos de PLE. In:
Mendes, Edleise. (Org.) Diálogos interculturais: ensino e formação em
português língua estrangeira. Campinas/SP: Pontes, 2011. 139-158.
MENDES, Edleise. Vidas em português: perspectivas culturais e
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1, no. 2. Instituto Internacional da Língua Portuguesa (IILP), Praia,
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OLIVEIRA, Gilvan M. de. Um atlântico ampliado: o português nas
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português no séc. XXI – Cenário geopolítico e sociolinguístico. São
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