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TEORIAS E SISTEMAS

PSICOLÓGICOS IV

autores
THAIS CONCEIÇÃO MONTEIRO
LUIS ANTONIO MONTEIRO CAMPOS
ANNE MELLER

1ª edição
SESES
rio de janeiro  2019
Conselho editorial  roberto paes e gisele lima

Autores do original  thais conceição monteiro, luis antonio monteiro campos, anne
meller

Projeto editorial  roberto paes

Coordenação de produção  andré lage, luís salgueiro e luana barbosa da silva

Projeto gráfico  paulo vitor bastos

Diagramação  bfs media

Revisão linguística  bfs media

Revisão de conteúdo  luis antonio monteiro campos, josé carlos tavares da silva

Imagem de capa  stocksnapper | shutterstock.com

Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida
por quaisquer meios (eletrônico ou mecânico, incluindo fotocópia e gravação) ou arquivada em
qualquer sistema ou banco de dados sem permissão escrita da Editora. Copyright seses, 2019.

Diretoria de Ensino — Fábrica de Conhecimento


Rua do Bispo, 83, bloco F, Campus João Uchôa
Rio Comprido — Rio de Janeiro — rj — cep 20261-063
Sumário
Prefácio 5

1. História e surgimento da Psicologia Cognitiva 7


Influências filosóficas 8

Influências psicológicas 12
O Behaviorismo 13
A Psicologia da Gestalt 24

2. A epistemologia genética de Jean Piaget 29


Fundamentos da Epistemologia Genética 30
A hereditariedade 35
A adaptação 36
O esquema 40
A equilibração 43

Características gerais dos principais períodos de desenvolvimento 45


Período sensório-motor (0 a 2 anos) 47
Período pré-operacional (2-7 anos) 50
Período de operações concretas (7 a 11 anos) 53
Período das operações formais (12 anos em diante) 55

3. A Psicologia Cognitiva e seus objetos de estudo 59


O surgimento da Psicologia Cognitiva, seu contexto e objeto de estudos 61

Os processos cognitivos 66
Os processos de sensação e percepção 66
Organização perceptiva 68

Atenção e consciência 71

A memória 74
4. Terapias cognitivas 87
Teoria social cognitiva de Albert Bandura 88

Teoria do constructo pessoal de George Kelly 91

Terapia racional emotiva de Albert Ellis 94

Terapia cognitiva de Aaron Beck 96

Terapia dos esquemas de Jeffrey Young 99

5. Aplicações da cognição na atuação profissional 105


Psicologia Cognitiva e Terapia Cognitiva 106

A origem da Terapia Cognitivo-Comportamental 107

O Modelo Cognitivo e a Terapia Cognitiva 111

Como funciona uma sessão de Terapia Cognitivo-Comportamental? 112

A formação do terapeuta da TCC 113

Eficácia da Terapia Cognitiva-Comportamental 114

Áreas de atuação: saúde, escolar e organizacional 115


A saúde 115
Escola e Organizações 117

A subjetividade na produção da saúde e da educação 120

Os sujeitos perante a inovação tecnológica 121


Prefácio

Prezados(as) alunos(as),

Este livro tem como objetivo incrementar seus estudos sobre a Psicologia
Cognitiva, escola psicológica abordada na disciplina Teorias e Sistemas
Psicológicos IV.
Desde o surgimento da Psicologia como ciência moderna, no século XIX, po-
de-se observar o interesse relacionado à mente humana, sua constituição e função.
Contudo, tais questões foram abordadas ao longo da História da Psicologia de
diversas formas.
No período anterior ao surgimento da Escola Cognitiva, na década de 50 do
século XX, a Psicologia sempre flertou com os aspectos relacionados à construção
do conhecimento e como esses influenciavam o comportamento humano.
Na fundação da Psicologia Científica com W. Wundt, o interesse centrava-se
nos elementos básicos da consciência e como estes se organizavam de forma ativa
no processo de apercepção. No Estruturalismo de Titchener, a ênfase voltava-se
para as estruturas da mente. Com o funcionalismo de William James, o impor-
tante era compreender a função da consciência, considerada como aspecto evo-
lutivo e específico da espécie humana em detrimento de outras espécies animais.
No Behaviorismo, ocorre a suspenção momentânea do interesse sobre os aspectos
mentais, em que, inclusive, a mente era considerada como obstáculo à cientifici-
dade da Psicologia.
Apesar do posicionamento dos Behavioristas, prioritariamente nos Estados
Unidos, com relação à mente/ consciência, e a ênfase no estudo do comportamen-
to e seu condicionamento, a Psicologia nunca rescindiu os estudos sobre memória,
linguagem, percepção, linguagem e desenvolvimento cognitivo (GOODWIN,
2005). Os aspectos cognitivos sempre estiveram presentes, até mesmo no
Behaviorismo, a exemplo de E. Tollman, com seu behaviorismo intencional e a
construção da sign-gestalt, ou mapa mental.
Além deste movimento dentro do campo psicológico, fora da Psicologia cien-
tistas também se engajam na produção de máquinas, tomando como paradigma
a mente humana, como exemplo pode-se citar o computador, enquanto os es-
tudiosos sobre a memória faziam o movimento inverso, utilizavam o paradigma
da máquina, notadamente o computador, para entender a memória humana. A
utilização de jargões informacionais também penetrou e se consolidou nos estudos

5
sobre os processos cognitivos: input, output, fluxograma, memória de curto pra-
zo (memória RAM), entre outros. Outros estudos de áreas transversais, como a
Filosofia da mente, a Inteligência artificial e os avanços nas pesquisas com imagens
no cérebro, deram o suporte e o contexto necessário para que, em meados da dé-
cada de 1950, fosse consolidado o campo da Psicologia Cognitiva.
Neste sentido, este livro apresenta os aspectos principais para municiar o aluno
em seus estudos. No primeiro capítulo, são apresentadas as ideias filosóficas que
influenciaram a Psicologia Científica moderna e, portanto, a Psicologia Cognitiva.
Em seguida, são apresentadas as escolas psicológicas anteriores e como cada uma
delas teve influência na Psicologia Cognitiva.
O segundo capítulo aborda a Epistemologia Genética, a teoria do desenvolvi-
mento cognitivo de Jean Piaget, psicólogo que influenciou de forma substancial o
modelo de construção de pensamento e inteligência e os processos de construção
de conhecimento.
O terceiro capítulo abarca o surgimento da Psicologia Cognitiva propriamen-
te dita e explicita seus objetos de estudo. Sem a intenção de aprofundar cada pro-
cesso cognitivo, alguns deles foram reunidos de forma resumida considerando sua
importância para o entendimento dos capítulos posteriores que tratam das Teorias
Cognitivas e Sociocognitivas da personalidade, como memória, percepção, lin-
guagem, emoção e resolução de problemas.
O quarto capítulo entra nas Teorias Cognitivas e Sociocognitivas da persona-
lidade, introduzindo as terapias cognitivas, como as de Aron Beck, Albert Ellis,
Jeffrey Young, entre outros. E, finalizando, o quinto capítulo traz temáticas atuais
relacionadas à cognição, como a neuropsicologia e o inconsciente cognitivo.
Com este material em mãos, espera-se que o aluno tenha o suporte necessário
para adentrar o fascinante campo de estudos da cognição humana, conhecimento
indispensável para a formação em Psicologia, independentemente da abordagem
terapêutica ou área de atuação a ser seguida posteriormente.

Bons estudos!
1
História e
surgimento da
Psicologia Cognitiva
História e surgimento da Psicologia Cognitiva
Neste capítulo, serão introduzidas as ideias filosóficas e psicológicas que in-
fluenciaram a Psicologia Cognitiva. No âmbito da Filosofia, serão abordadas as
noções de Empirismo, Racionalismo, Mecanicismo e Positivismo, que marcaram
a origem da ciência moderna. Tais ideias inovaram a forma de pensar o conheci-
mento e sua construção, o que mudou a forma como o homem entende o mundo.
No que se refere às influências psicológicas, cabe destaque às escolas de pensamen-
to Behaviorista e seus diversos autores e à Psicologia da Gestalt, com seus estudos
sobre a percepção e o pensamento.

OBJETIVOS
•  Apresentar as ideias filosóficas básicas que influenciaram a Psicologia Cognitiva;
•  Introduzir os conceitos behavioristas fundamentais que possibilitaram o surgimento da Psi-
cologia Cognitiva e, posteriormente, da Terapia Cognitiva;
•  Expor as noções de pensamento e percepção, fundamentais para o entendimento dos
processos cognitivos.

Influências filosóficas

Desde a Antiguidade, a Filosofia, através de Platão e Aristóteles, desejava en-


tender como o homem constrói o conhecimento, o que determina seus pensamen-
tos, comportamentos e sentimentos. A cognição já aparecia como um objeto de
investigação necessário para o entendimento da humanidade.
Entretanto, somente a partir do século XVII é que podemos encontrar as
raízes filosóficas da Psicologia Científica, que teve início no século XIX com
Wilhelm Wundt. Ideias como o Racionalismo, o Mecanicismo, o Empirismo e o
Positivismo foram fundamentais para a constituição da Psicologia como ciência e é
perceptível sua influência no desenvolvimento das escolas psicológicas posteriores.
O Mecanicismo apresenta o conceito de que tudo no Universo funciona como
uma grande máquina. Sua origem remonta à física de Galileu Galilei (1564-1642)
e de Isaac Newton (1642-1727). Para eles, o funcionamento do Universo físico

capítulo 1 •8
era comparável ao de um relógio ou máquina e, portanto, passível de mensuração
e determinação de suas leis de funcionamento e organização (SCHULTZ, 2005).
A relação do Mecanicismo com a Psicologia é a de que, a partir do conhecimento
dos elementos básicos dos processos mentais e ou comportamentais e de sua res-
pectiva organização, é possível mensurar o fenômeno, descrevê-lo e predizer seu
funcionamento adequado ou não.

Nesse período [século XVII], os métodos e as descobertas da ciência avançavam a


passos largos junto com a tecnologia, e a combinação entre elas foi perfeita. A obser-
vação e a experimentação tornaram-se os diferenciais da ciência, seguidas de perto
pela medição. Os especialistas tentavam definir e descrever os fenômenos, atribuindo-
-lhes um valor numérico, processo vital para o estudo do funcionamento do Universo
como uma máquina. Os termômetros, os barômetros, as réguas de cálculo, os micrô-
meros, os relógios de pêndulo e outros dispositivos de medição eram aperfeiçoados e
reforçavam a ideia da possibilidade de se medir qualquer aspecto do Universo natural
[incluindo o homem]. (SCHULTZ, 2005: p. 25)

Outra figura importante que habitava a vida e a imaginação dos intelectuais


e aristocratas da época eram os robôs. Haviam robôs que imitavam animais e
humanos, como patos, monges, flautistas e até guerreiros com armadura em ba-
talha. Sem dúvida, essas máquinas influenciaram a perspectiva médica de organi-
zação e funcionamento do corpo humano e da mente humana. A IA (Inteligência
Artificial) e o computador do século XX, têm suas ideias de origem fundamen-
tadas nesta época. Cabe destacar a importância do computador, da calculadora e
da IA, ou máquinas capazes de pensar, para o surgimento das ciências cognitivas
incluindo a Psicologia Cognitiva.
O racionalismo, ou a consideração de que o conhecimento deve ser pautado
na razão humana, vai ser utilizado por Descartes, também no século XVII, para
construir sua conhecida obra Discurso sobre o método (e sua argumentação para a
construção do conhecimento científico). Para ele, o conhecimento deve estar pau-
tado na dúvida metódica, ou sistema de pensamento onde uma ideia vai sofrendo
questionamento (dúvida) até chegar a uma afirmativa válida e inquestionável. A
partir deste trabalho mental, ele chega ao resultado de que a única coisa de que ele
não pode duvidar é de que era ele quem duvidava, chegando à verdade elementar
do “Penso, logo existo”.

capítulo 1 •9
Em seu Discourse on Method (1637/1960), ele explica como só aceitava como ver-
dadeiro aquilo de que não se podia duvidar. Assim, rejeitou a proposição de que os
sentidos fossem absolutamente verazes, pois podem iludir, além de questionar os argu-
mentos plausíveis de outros filósofos pelo fato de existirem outros contra-argumentos
igualmente plausíveis. No entanto, descobriu que a única coisa de que não podia duvi-
dar era do fato de que ele era quem duvidava. (GOODWIN, 2005:p. 48)

Renée Descartes ainda introduz outros conceitos fundamentais para a Psicologia


Moderna, como o problema mente-corpo, a existência de ideias inatas, a teoria
do arco reflexo, a localização das funções mentais no cérebro, que, sem dúvida,
fundamentaram escolas como o Behaviorismo, a Gestalt e a Psicologia Cognitiva.
Influenciada pelos robôs do século XVII, a questão da interação mente-corpo
introduzida por Descartes traz a noção de que estas duas instâncias são fenômenos
de substâncias distintas, onde a mente guia o corpo, que seria uma máquina, na
realização das ações. A vinculação entre os dois estaria localizada no cérebro, mais
especificamente na glândula pineal. Desta forma, caberia à mente guiar, por meio
da vontade (poder mental), todo e qualquer comportamento humano.
Com relação ao arco-reflexo, o filósofo acaba fundamentando a noção de com-
portamento para o behaviorismo, estabelecendo a relação entre o estímulo ambien-
tal que gera a resposta reflexa no organismo, um tipo de comportamento involuntá-
rio (ou comportamento respondente, para o Behaviorismo do século XX).
Em contraponto ao Racionalismo cartesiano, surge um movimento, na
Inglaterra, que considerava a construção do conhecimento pautada na experiên-
cia. John Locke (1632-1704) rejeitava a noção de ideias inatas e acreditava que o
ser humano nascia como uma tabula rasa, ou tela em branco, e que, a partir de sua
experiência no mundo, por meio do contato dos órgãos sensoriais com a qualida-
de física da matéria, as pessoas constroem o conhecimento acerca do mundo. O
Empirismo também influenciou a metodologia de construção do conhecimento
científico que nascia na época. Segundo essa noção, só é válido o fato passível de
verificação objetiva.

O interesse principal de Locke estava voltado ao funcionamento cognitivo, isto é, à forma


como a mente adquire o conhecimento. (...) Assim, Locke explicava a aparente natureza
inata de algumas ideias fundamentado no conceito de aprendizagem e do hábito. Então,
como a mente adquire o conhecimento? Para Locke, assim como para Aristóteles, a
mente adquiria o conhecimento por meio da experiência. (SCHULTZ, 2005: p. 41)

capítulo 1 • 10
John Locke ainda influenciou a Psicologia com outros conceitos, tais como a
Teoria do Associacionismo e as ideias simples e complexas. As ideias simples
podem ser entendidas como sensação ou reflexão, são elementares, e possuem a
característica de serem recebidas passivamente pela mente. Já as ideias complexas
são derivadas da combinação de ideias simples, criadas pela mente de forma ativa
(SCHULTZ, 2005). Deste processo de combinação de ideias simples em comple-
xas decorre a Teoria da Associação, noção primeira para a ideia de aprendizagem,
muito utilizada pela Psicologia Científica.
Outro conhecimento filosófico fundamental para a Psicologia (e as outras
ciências) é o Positivismo de Auguste Comte (1798-1857). Segundo este filósofo,
o conhecimento válido seria aquele passível de observação empírica. Qualquer
ideia pautada na metafísica, na especulação ou na religião deveria ser ignorada,
visto que não sustentava ou levava ao entendimento dos fatos reais. De acordo
com o Positivismo, a sociedade científica é considerada a mais evoluída, onde o
progresso social somente é possível por meio do conhecimento científico, único
válido. Neste viés, a Matemática deveria pautar toda construção de conhecimento,
que deveria ter a função de explicar os fenômenos por meio de Leis Gerais.
Todas essas noções filosóficas foram fundamentais para a construção da
Psicologia como ciência, no século XIX, e da Escola Cognitiva na década de 1950. O
Mecanicismo influenciou todo o pensamento psicológico ao comparar a mente hu-
mana a uma máquina, segundo o qual, se fosse possível chegar a seus elementos básicos
e entender sua organização, seria possível compreender e predizer seu funcionamento.
Tanto Wilhem Wundt, fundador da Psicologia, quanto Titchener, no
Estruturalismo1, tentaram entender os elementos básicos da consciência: a expe-
riência mediata2 e a experiência imediata3. Entretanto, se o rigor metodológico é
criticado por Titchener com relação ao método introspectivo4, ele não demons-
trou o interesse que Wundt teve em explicar o processo de construção da consciên-
cia por meio da apercepção5.
1  Estruturalismo foi a escola psicológica que acreditava que o objeto de estudo da Psicologia deveria ser a
estrutura da mente.
2  A Experiência Mediata é aquela que é mediada pelo corpo, o que hoje se chama sensação. Exemplo: forma,
cor, brilho.
3  A Experiência Imediata é a que sofre interpretação da mente para entender o fenômeno. Exemplo: entendimento
de que um alimento que tem a forma de coração, é vermelho e brilhoso é uma maça.
4  Introspecção significa exame do próprio estado mental. A crítica de Titchener quanto ao método introspectivo
referia-se à falta de objetividade na observação do fenômeno, já que o objeto a ser estudado e o observador eram
a mesma pessoa.
5  A Teoria da Apercepção refere-se ao modo de construção ativa da consciência, que, segundo Wundt, não ocorria
somente por meio do somatório de experiências mediatas e imediatas.

capítulo 1 • 11
O Mecanicismo influenciou diretamente, ainda, o Behaviorismo e a própria
Psicologia Cognitiva. Quanto ao Behaviorismo, a influência encontra-se na ideia de
reduzir o comportamento a seus elementos básicos para ser possível sua observação e
sua experimentação no sentido de compreender seu funcionamento e poder predizê-
-lo posteriormente. Na Psicologia Cognitiva, o Mecanicismo é facilmente percebido
na comparação da mente humana, em sua constituição e funcionamento, com as
máquinas calculadoras, os computadores e a inteligência artificial.
O Racionalismo influenciou a constituição da Psicologia na diversidade de
objetos elencados para estudo, como a mente ou consciência, o pensamento lógico
ou racional, a resolução de problemas entre outros.
Com relação ao Positivismo e ao Empirismo, sua influência no método de
construção do conhecimento é fundamental, sem o qual não se poderia chamar a
Psicologia moderna de científica. Desde o método experimental até a matematiza-
ção das características psicológicas, como o limiar6, a sensação, os componentes do
comportamento, até a observação do fenômeno in loco para a respectiva descrição,
como no caso do comportamento social ou da interação entre indivíduos, passan-
do pela observação clínica e categorização de sintomas, estas noções foram base
para a construção do arcabouço teórico das diversas teorias psicológicas.

Influências psicológicas

Pode-se dizer que a Psicologia Científica nasce com uma preocupação cogniti-
va. Desde seu início, os objetos escolhidos para estudo centravam-se na mente ou
consciência, na sua constituição, construção e funcionamento. As primeiras escolas,
até o surgimento do Behaviorismo com sua preocupação relacionada ao método de
construção do conhecimento psicológico, trazem os problemas da estruturação da
mente7, seu funcionamento e a função8 da consciência para o ser humano.
O Behaviorismo rompe com essa tradição, descartando os conceitos mentalis-
tas e centralizando seus estudos no comportamento humano por meio da meto-
dologia experimental. Sua intenção era consolidar a Psicologia como uma ciência
de fato e direito, mudando de um objeto que não possibilitava uma observação

6  Limiar refere-se a menor quantidade de estímulo necessária para se obter uma resposta do organismo. Destaca-
se que o limiar é diferente para organismos diferentes e que num mesmo organismo o limiar pode mudar ao longo
do tempo.
7  A escola que se preocupava em explicar a estrutura da mente humana é o Estruturalismo.
8  A escola que possuía interesse na função da mente ou consciência é o Funcionalismo de William James. Para
ele, a consciência tinha a função de adaptar o ser humano ao ambiente.

capítulo 1 • 12
empírica para outro passível de mensuração e experimentação em laboratório, nos
moldes da ciência positivista.
Apesar de críticas severas, pode-se dizer que os behavioristas conseguiram o
que desejavam. A notoriedade que a Psicologia obteve, nos Estados Unidos, na
figura de Skinner, e a aplicabilidade das teorias do condicionamento clássico e
operante são fatos irrefutáveis. Até hoje as teorias da aprendizagem produzidas
por Pavlov, Thorndike, Watson e Skinner são utilizadas em escolas, na educação
dos filhos, em empresas, no treinamento de animais, nas relações interpessoais e
na clínica psicológica. A próxima seção deste capítulo traz em destaque esta escola.
Um dos sistemas psicológicos que apontam negativamente para o mecanicis-
mo do Behaviorismo é a Psicologia da Gestalt. Originada na Europa, sua crítica
centrava-se não no objeto proposto pelos Behavioristas, o comportamento, mas na
descontextualização do comportamento, o que, segundo a Gestalt, acarretava uma
visão distorcida do fenômeno. A Gestalt irá criticar esta abordagem [Behaviorismo],
por considerar que o comportamento, quando estudado de maneira isolada de um
contexto mais amplo, pode perder seu significado (o seu entendimento) para o psicó-
logo. (BOCK; FURTADO & TEIXEIRA: 1999, p. 60). Por sua importância nos
estudos dos processos de sensação e percepção, que influenciaram profundamente
o surgimento da Psicologia Cognitiva, a Psicologia da Gestalt também será abor-
dada especificamente em seção posterior.

O Behaviorismo

O behaviorismo de John Watson e o condicionamento Clássico

O Behaviorismo, ou Comportamentalismo, nasceu em 1913, nos Estados


Unidos, com John Watson, a partir da obra A Psicologia como os Behavioristas a
veem. Esta escola se origina da crítica intensa ao método introspectivo utilizado
por W. Wundt e E. Titchener e sua falta de objetividade ou imparcialidade na
observação do fenômeno. Considerava, ainda, que a mente, ou consciência, não
poderia ser encarada como objeto científico, dada a impossibilidade de observação
empírica da sua existência. Em contraponto, sua proposição para um objeto ob-
servável centra-se no comportamento, tendo em vista a possibilidade inequívoca
de verificação, mensuração e estabelecimento de relações causais.

capítulo 1 • 13
O behaviorismo tem uma nítida afinidade com vários movimentos filosóficos (...) Por
exemplo, a importância que o behaviorista dá ao ambiente na moldagem do compor-
tamento é um reflexo do ditame empirista/associacionista britânico segundo o qual a
experiência é o grande determinante da mente e do caráter. Além disso, existem pa-
ralelos entre as relações estímulo-reação do behaviorista e o conceito de associação.
(...) Durante o século XIX, também surgiu o Positivismo, cujas origens geralmente são
atribuídas ao filósofo francês Auguste Comte (1798-1857). Essa corrente filosófica
foi adotada como artigo de fé pelos behavioristas. Comte afirmava que nós só podería-
mos ter certeza do conhecimento que provém de eventos publicamente observáveis.
(GOODWIN, 2005: p. 332-333)

Neste sentido, os behavioristas desejavam que a Psicologia fosse reconhecida


como ciência objetiva de fato, de acordo com o modelo positivista. Para isso
delimitaram como objeto o comportamento, que poderia ser reduzido à rela-
ção básica entre estímulo e resposta e, desta forma, seria possível a realização
de experimentos9 em laboratórios próprios para o estudo e, consequentemente,
o estabelecimento de Leis Gerais causais sobre o comportamento pautados na
mensuração da intensidade10 do estímulo e na magnitude11 da resposta. Watson
buscava uma Psicologia Científica que lidasse com atos comportamentais observáveis
e passíveis de descrição objetiva, por exemplo, em termos de “estímulo” e “resposta”.
Além disso, a Psicologia de Watson rejeitava qualquer termo ou conceito mentalista
(SCHULTZ, 2005: p. 228).
Uma grande influência anterior ao Behaviorismo de Watson foi Ivan Pavlov
(1849-1936). Seu estudo sobre o reflexo da salivação em cachorros proporcionou
a Watson a base metodológica para entender o comportamento reflexo (ou com-
portamento involuntário) e como ocorre a aquisição de novos comportamentos
desse tipo.

9  A pesquisa experimental, modelo amplamente utilizado pelos Behavioristas, pretende o estabelecimento de


uma relação causal, ou seja, deseja entender o que causa determinado efeito. Para isso, preconiza alguns padrões:
utilização de variáveis dependente e independente, e a reprodução do fenômeno em laboratório para o controle de
variáveis intervenientes. A variável dependente é aquela que deverá ser medida e a variável independente refere-se a
qualquer variável que o pesquisador insere no ambiente do estudo de forma voluntária para verificação de seu efeito
na variável dependente. No caso do Behaviorismo, o estímulo, ou alteração no ambiente, é a variável independente,
e a resposta, ou alteração no organismo, configura-se como variável dependente. Nesta situação, os behavioristas
desejavam entender o que o estímulo ambiental provoca como efeito no organismo.
10  Intensidade do estímulo refere-se à força/quantidade do estímulo, ou a uma variável passível de medição.
11  Magnitude da resposta refere-se à força/quantidade de resposta emitida pelo organismo em decorrência da
intensidade do estímulo aplicado no organismo.

capítulo 1 • 14
O trabalho de Ivan Pavlov sobre a aprendizagem ajudou a transferir a ênfase da visão
tradicional do associacionismo – das ideias subjetivas para os eventos psicológicos
quantificáveis e objetivos, tais como a secreção glandular e o movimento muscular.
Como consequência, o trabalho de Pavlov proporcionou a Watson o método para estu-
dar e tentar controlar e modificar o comportamento. (SCHULTZ, 2005: p. 240)

Pavlov, um fisiologista russo, descobriu como os organismos podem adquirir


novos comportamentos a partir da associação de um estímulo a um repertório
comportamental existente. Seu estudo sobre a fisiologia da digestão com cachorros
o fez, acidentalmente, descobrir o reflexo condicionado e criar o tipo de aprendi-
zagem conhecido como condicionamento clássico.
O experimento que levou Pavlov ao reflexo condicionado foi realizado por
meio de uma incisão na boca de um cão para a coleta da saliva do animal diante
da estimulação do alimento. A salivação era mensurada em termos de quantidade
e gotas (magnitude da resposta do organismo) diante da apresentação de vários
tipos de comida (intensidade de estímulo ambiental). Durante esse processo, ele
percebeu que a salivação, que deveria ser automática e não intencional para o
alimento quando este estava na boca do animal (reflexo inato e não condicionado
ou aprendido), passou a ocorrer antes de o animal se alimentar, ou seja, o cão
aprendeu a antecipar a comida de alguma forma (reflexo condicionado). Muitas
vezes, os cães salivavam com a visão do alimento ou com barulhos associados à
apresentação da comida, como passos ou tiques de metrônomo.

Estímulo
(comida)
Registro
cumulativo

Fonte: SCHULTZ, 2005.

capítulo 1 • 15
A partir dos estudos deste fisiologista os analistas comportamentais aprofunda-
ram cada vez mais o estudo dos reflexos inatos e aprendidos. Os reflexos inatos são
aqueles que estão presentes desde o nascimento e constituem uma preparação míni-
ma para a sobrevivência em contato com o meio externo. Como exemplo pode-se
citar o reflexo da sucção, o reflexo da marcha, da suspensão da respiração de bebê
quando ele é colocado imerso em uma piscina (MOREIRA; MEDEIROS, 2007).
Esse tipo de comportamento básico é o que exemplifica a relação mais simples do
que os behavioristas classificam como comportamento: S ⇒ R; em que S significa
o estímulo, ou seja, a alteração no ambiente, e R significa a resposta, ou alteração
no organismo.
Durante a vida, os organismos aprendem diversas formas de se comportar
diante das mudanças ambientais utilizando-se do repertório comportamental já
existente. Muitas vezes, as associações não são óbvias como as do cachorro do
experimento de Pavlov que associou o som à comida, e um estímulo que não tem
nada a ver com o contexto (estímulo neutro) começa a eliciar (produzir) uma res-
posta que o organismo já emitia. Este modelo de aprendizagem é entendido como
uma forma de o organismo se adaptar a novos contextos.

1. Antes do condicionamento 2. Antes do condicionamento

Resposta Resposta
Comida Sino
Salivação Sem salivação
Estímulo Resposta Estímulo Sem resposta
incondicionado incondicionada neutro condicionada

3. Durante o condicionamento 4. Depois do condicionamento

Resposta Sino Resposta


Sino Comida Salivação Salivação
Sem resposta Estímulo Resposta
condicionada condicionado condicionada

Figura 1.1  –  Condicionamento clássico.

capítulo 1 • 16
Na figura, temos a reprodução do condicionamento clássico de Pavlov:

Estímulo incondicionado
(SI — não aprendido) Comida elicia (pro-
1O MOMENTO duz) a Salivação resposta incondiciona-
da (RI — reflexo inato e não aprendido);

Introdução de um estímulo neutro


(SN — que não tem a ver com o contexto
2O MOMENTO e que não eliciaria a resposta esperada)
Som;

Emparelhamento ou pareamento do
Som (SN – estímulo neutro) com a Co-
3O MOMENTO mida (SI – estímulo incondicionado)
que elicia uma Salivação (RI – resposta
incondicionada);

Som (SC – estímulo condicionado) elicia


4O MOMENTO Salivação (RC – resposta condicionada).

O esquema anterior também pode ser representado da seguinte forma:

SI RI
Comida Salivação
(es�mulo incondicionado) (resposta incondicionada)

SN + SI RI
Som Comida Salivação
(es�mulo (es�mulo (resposta incondicionada)
neutro) incondicionado)

SC RC
Som Salivação
(es�mulo condicionado) (resposta condicionada)

Alguns efeitos do condicionamento clássico são importantes para o enten-


dimento da Psicologia Cognitiva e muito utilizados nas Terapias Cognitivas. São
eles a habituação, a potenciação, a extinção respondente, a dessensibilização
sistemática e o contracondicionamento.

capítulo 1 • 17
A habituação ocorre quando um organismo deixa de responder ao estímulo
após ser apresentado a ele diversas vezes em curtos intervalos de tempo. Por exem-
plo, depois de um tempo dentro de uma sala que possui ar-condicionado ligado e
barulhento, a pessoa habitua-se ao barulho e deixa de percebê-lo. Entretanto, cabe
destacar que isto acontece se a intensidade do estímulo for pequena ou média,
visto que uma intensidade grande pode gerar aversão ou trauma.
No sentido oposto à habituação, temos a potenciação, que significa uma sen-
sibilização do organismo a determinado estímulo, aumentando a magnitude da
resposta. Por exemplo, um pintor possui maior sensibilidade para a discriminação
de cores do que uma pessoa que não costuma trabalhar com cores diferentes.
Neste caso, diz-se que houve uma potenciação para as cores. A mesma situação
pode acontecer para músicos ou pessoas que tocam instrumentos: elas ficam sen-
sibilizadas para a discriminação das notas musicais.
A extinção respondente, a dessensibilização sistemática e o contracondi-
cionamento aludem à situação de finalização de determinada resposta, sendo,
muitas vezes, aplicados, como intervenção, por psicólogos ou analistas do com-
portamento para acabar com uma ação indesejada.
Na extinção respondente, a resposta deixa de ser emitida porque o estímulo
incondicionado não é mais apresentado emparelhado ao estímulo condicionado.
Exemplo: na situação de uma pessoa ter adquirido um trauma de andar de carro
em razão da ocorrência de um acidente, se ela continuar a andar de carro, sem que
haja a ocorrência de novos acidentes e dependendo da magnitude do trauma, é
capaz de perder o medo de andar de carro, voltando a fazê-lo com tranquilidade.
Esse tipo de tratamento é muito comum para medos ou fobias de baixa intensida-
de, em que a pessoa é colocada diante de seu estímulo aversivo para extinguir sua
resposta inadequada e disfuncional (MOREIRA & MEDEIROS, 2007).
Entretanto, se a magnitude da resposta aversiva for muito grande, a extinção não
terá o efeito desejado, podendo até acarretar o efeito contrário, com o exacerbamento da
aversão, produzindo uma fobia, por exemplo. Neste caso, existem dois outros processos
que podem ser utilizados: a dessensibilização sistemática e o contracondicionamento.
A dessensibilização sistemática consiste em dividir o processo de extin-
ção em pequenos passos, com base na generalização respondente12. É necessário
construir uma escala crescente da intensidade do estímulo (menor para maior) –
ou hierarquia da ansiedade – em função da magnitude da resposta (menor para
12  Generalização refere-se ao evento em que estímulos (S) parecidos com o estímulo condicionado (CS) começam
a eliciar a mesma resposta condicionada (CR). Isto ocorre pela semelhança dos estímulos (tamanho, cor, textura etc.).
Quanto mais parecidos os estímulos, mais semelhante (em magnitude) será a resposta (MOREIRA & MEDEIROS, 2007).

capítulo 1 • 18
maior) e, a partir deste procedimento, ir apresentando à pessoa os estímulos de
menor intensidade para os de maior intensidade.
O objetivo do processo é que a pessoa se acostume (ou habitue) com o estí-
mulo aversivo aos poucos e pare de emitir a resposta aversiva, de tal forma que ela
possa novamente entrar em contato com o objeto ou a situação que a fazia sofrer.
Por exemplo: uma pessoa fora mordida por um cachorro grande quando criança e
passou a ter fobia de cachorro, o que a impede de ficar em ambientes coexistindo
com este animal, ou na mesma calçada, mesmo que ele esteja longe. Neste caso,
pode-se começar apresentando figuras de cachorros em revistas, fotos e imagens
de televisão, bonecos de cachorro e cachorro pequeno dentro de uma gaiola. Após
este passo, é possível que a pessoa consiga lidar com um filhotinho de cachorro
dentro de uma gaiola, depois fora da gaiola, tocar o cachorro, e assim em sequên-
cia. A ideia é introduzir um passo após o outro a partir da melhoria da ansiedade
da pessoa a cada proposta nova, até que, no final, a pessoa consiga entrar em
contato com cachorros maiores. Interagindo com os animais ou não, se a pessoa
conseguir permanecer num ambiente com cachorros, ou não precisar atravessar a
rua por causa do pânico sentido quando vê um animal na rua, ela já estará tendo
comportamentos mais funcionais, e seu nível de estresse já terá diminuído.
O contracondicionamento possui a proposta de condicionar a resposta con-
trária/ inversa ao estímulo condicionado. Se determinado comportamento ina-
dequado, como agressividade ou birra, gera algum ganho ou prazer, a ideia é que
não somente a emissão deste comportamento tenha seu ganho extinto, mas que
ele produza um estímulo aversivo como consequência. Como exemplo pode-se
citar o hábito de fumar. Tal hábito pode estar vinculado ao controle da ansiedade,
o que gera prazer momentâneo à pessoa até que ela tenha outro pico de estresse e
recorra ao cigarro novamente para aliviar a ansiedade. No caso de um contracon-
dicionamento, o cigarro deverá não somente parar de extinguir a ansiedade, mas
também gerar alguma sensação ruim e aversiva, como enjoo e ânsia de vômito, o
que, como consequência, produzirá o comportamento de afastamento do cigarro.
Outro exemplo pode ser o de produzir sensação de relaxamento por meio de
associação de estímulos calmantes com estímulos anteriormente aversivos ou an-
siogênicos. Uma forma utilizada para lidar com a fobia de falar em público pode
ser um processo de relaxamento e respiração antes da apresentação, para reduzir o
grau da ansiedade e estresse.
Diante das informações expostas até o momento, já é possível verificar a grande
e importante influência do Behaviorismo na Psicologia Cognitiva. Entretanto, essa

capítulo 1 • 19
influência não se limita ao condicionamento clássico e às teorias decorrentes, mas abar-
ca também outro momento do movimento behaviorista, com Skinner e Bandura.

O Behaviorismo de B. F. Skinner e o condicionamento operante ou modela-


gem do comportamento

O Behaviorismo de Skinner é considerado uma renovação da teoria de Watson


que, como o fundador do Behaviorismo, acreditava que as pessoas construíam sua
personalidade e aprendiam seu comportamento por meio de condicionamentos.
Para Skinner, a Psicologia deveria preocupar-se em descrever os comportamentos
observáveis e não em explicar o que não conseguia observar ou em especular o que
estava dentro do organismo e seu efeito no comportamento, como era o desejo
de outros behavioristas, como E. Tolman13 e Clarck Hull14 (SCHULTZ, 2005).
Skinner não duvidava da existência das condições mentais ou fisiológicas internas, ape-
nas não aceitava sua validade no estudo científico do comportamento (SCHULTZ,
2005: p. 294).
Skinner inventou o termo comportamento operante para designar o tipo de
comportamento voluntário e aprendido a partir dos condicionamentos ao longo
da vida e, também, para diferenciá-lo do comportamento respondente ou refle-
xo. Para ele, a maioria dos comportamentos humanos são os operantes, porque
operam uma modificação no ambiente. Essa base de pensamento dá o suporte
para a sua teoria da aprendizagem ou modelagem do comportamento.
Segundo Skinner, as pessoas aprendem novos comportamentos a partir da
consequência que estes trazem para os agentes da ação. Se a consequência for po-
sitiva, a tendência é a repetição do mesmo comportamento. Caso a consequência
seja negativa, o organismo tende a não o repetir.
O condicionamento operante de Skinner foi influenciado pela Lei do efei-
to de E. L. Thorndike (1874-1949), da mesma forma que Pavlov influenciou
Watson na fundação do Behaviorismo.

13  Edward Tolman foi um comportamentalista que postulou a vinculação entre comportamento e intenção,
apesar de não considerar a intencionalidade um aspecto mentalista. Para ele, qualquer comportamento era dotado
de propósito, isto é intenção/objetivo. Por essa teorização, ele é considerado o autor do chamado Behaviorismo
Intencional. Outra temática interessante postulada pelo behaviorista foi a de Sign Gestalt ou mapa mental, que se
refere ao mapeamento esquemático que fazemos mentalmente dos ambientes que conhecemos (SCHULTZ, 2005).
14  Clarck Hull é outro neobehaviorista que contribuiu com a ideia de impulso que desencadeia o comportamento.
Tais impulsos aconteceriam pautados em variáveis intervenientes, as quais eram consideradas, pelo autor, como as
verdadeiras motivadoras do comportamento e aconteciam dentro do corpo, como os impulsos nervosos, secreções e
necessidades como a fome (SCHULTZ, 2005).

capítulo 1 • 20
Thorndike acreditava que aprender é estabelecer conexões15 e, portanto, para
estudar o comportamento manifesto dos animais era preciso decompor o com-
portamento em termos de estímulos e respostas, para a verificação das conexões
realizadas pelos organismos. Com este objetivo, ele criou um experimento em que
colocava um gato privado de alimentação numa caixa fechada. O gato precisava
aprender a operar o trinco para escapar da caixa a fim de poder chegar até o ali-
mento. Thorndike observou que, posteriormente ao evento, o animal continuava
a apresentar o mesmo comportamento de quando estava colocado naquela situa-
ção (SCHULTZ, 2005).

Figura 1.2  –  Experimento de E. Thorndike.

Com base nesse experimento, Thorndike postulou três leis da aprendizagem


(SCHULTZ, 2005):
1. Lei da Tentativa e Erro, que se refere à tendência em repetir as ações até chegar
ao êxito;
2. Lei do Efeito16, que indica a tendência à repetição de comportamentos que ge-
ram satisfação e à não repetição de comportamentos que geram insatisfação;

15  Teoria do Conexionismo (SCHULTZ, 2005).


16  A Lei do Efeito pode ser explicada, de acordo com alguns estudiosos do comportamento animal, como o
surgimento de uma resposta evolutiva dos organismos para se manterem vivos, tendo em vista que o cérebro realiza
uma leitura de que tudo aquilo que gera satisfação ou prazer é considerado positivo para a sobrevivência do indivíduo
e de sua prole. Da mesma forma, aquilo que gera desprazer traz sensação de perigo e risco para a manutenção da
vida do indivíduo e de sua prole.

capítulo 1 • 21
3. Lei do Exercício ou do Uso e Desuso17, que postula sobre a força da associa-
ção de uma situação à resposta emitida. Neste sentido, quanto mais a resposta é
realizada, mais forte ela fica e, quanto menos usada, mais fraca fica.

Partindo da Lei do Efeito e da ideia de que as pessoas aprendem pautadas nas


consequências das próprias ações, Skinner postula a modelagem do comportamento
decorrente de estímulos reforçadores e punidores. Os estímulos reforçadores são
aqueles que aumentam a tendência à repetição de um comportamento. Os estí-
mulos punidores, ao contrário, diminuem a tendência à repetição de um compor-
tamento. Cabe destacar que tanto reforço quanto punição podem ser usados para
aumentar ou diminuir comportamentos adequados ou inadequados. Por exemplo: a
criança pequena faz birra (comportamento inadequado) porque deseja um brinque-
do, e os pais, para acabar com a birra da criança, compram e dão o brinquedo deseja-
do. Neste caso, a criança foi reforçada a continuar fazendo birra quando quiser algo.
Além do reforçamento e da punição, Skinner também teorizou sobre as possi-
bilidades de reforço, ou tipos de reforço, e possibilidades de punição, ou controle
aversivo do comportamento.
Considerando que um reforço é uma consequência que aumenta a probabi-
lidade futura da ação, Skinner apresentou a possibilidade de reforços positivos e
reforços negativos. O reforço positivo relaciona-se a todo evento que aumenta a
probabilidade futura da resposta que o produz adicionando (oferecendo) algo ao
organismo sentido como positivo. Quando uma criança recebe a estrela dourada
da professora porque tirou nota boa na prova ou quando ganha um pirulito, no
médico, porque se comportou adequadamente, houve a apresentação de um estí-
mulo sentido como agradável após o comportamento desejado ser emitido.
Já o reforço negativo refere-se a todo evento que aumenta a probabilida-
de futura da resposta que o remove ou atenua. Neste sentido, o comportamento
desejado a ser emitido está vinculado à retirada de um estímulo aversivo, como
levantar com o toque do despertador para desligá-lo. O comportamento deseja-
do é levantar da cama e o estímulo aversivo é o toque estridente do despertador.
17  A Lei do Uso e Desuso é fundamental para a explicação da construção e da manutenção de hábitos, de
aprendizagens complexas como escrever ou calcular e, também, de como funciona o cérebro na criação e na
manutenção das sinapses. A cada aprendizagem, pode-se dizer que construímos sinapses, ou vinculação entre os
neurônios, que são fundamentais para a transmissão de informações e a realização dos comandos do cérebro para
o corpo, desde as ações mais básicas, como o comportamento reflexo e um movimento automático, até a exposição
de uma aula pelo professor. Neste sentido, quanto mais usamos determinadas sinapses, mais forte elas ficam e mais
fácil a evocação ou lembrança das informações. Nesta mesma lógica, quanto menos usamos uma conexão sináptica,
mas difícil fica sua evocação ou lembrança, tendendo ao esquecimento.

capítulo 1 • 22
Neste caso, a pessoa realizou o comportamento adequado a partir da retirada do
estimulo aversivo. Outro exemplo é dirigir na velocidade regulamentada (compor-
tamento desejado) para não receber multa (estímulo aversivo).
O controle aversivo18 do comportamento ocorre quando se utiliza a punição
positiva ou negativa com o objetivo de eliminar comportamentos inadequados,
ameaçadores ou indesejáveis. A ideia que subjaz é a de que as pessoas tendem a
evitar aquilo que é desagradável. Entretanto, comportamentos que sofreram pu-
nição tendem a se repetir assim que as contingências punitivas forem removidas
(MOREIRA & MEDEIROS, 2007). Esse fato leva à reflexão sobre se a punição
realmente gera aprendizagem ou somente evitação da consequência aversiva.
Considera-se punição a consequência que torna a ocorrência do comporta-
mento menos provável, ou seja, diminui a probabilidade de um comportamento
acontecer. Da mesma forma que o reforço, existem a punição positiva e a punição
negativa. Na punição positiva, ocorre a apresentação de um estímulo aversivo19
que reduz a probabilidade de ocorrência futura do comportamento indesejado
(ibid.). Seguem alguns exemplos: jogar bola dentro de casa, levar uma surra e não
o fazer mais; ultrapassar o sinal vermelho, ser multado e não o fazer mais; falar
“palavrão”, levar uma “bronca” e não o fazer mais.
A punição negativa diminui a probabilidade da emissão de um comporta-
mento a partir da retirada de um estímulo agradável ou positivo. Como exemplos
podem-se citar: fazer traquinagens, perder a mesada e deixar de fazê-lo; assaltar, ser
preso (perder a liberdade) e não infringir mais as leis; dirigir embriagado, perder a
carteira de motorista e não repetir o comportamento inadequado (MOREIRA &
MEDEIROS, 2007).

O Behaviorismo de Albert Bandura e Julien Rotter

A partir de Albert Bandura e Julien Rotter, o Behaviorismo abre-se para no-


vas perspectivas. Esses autores ainda são considerados behavioristas, porém mais
abertos e preocupados com questões cognitivas.
Albert Bandura concordava com a possibilidade de moldar comportamentos
por meio do reforçamento, entretanto acreditava na aprendizagem vicária ou vi-
cariante, na qual o organismo aprende com base na observação das consequências
18  O controle aversivo do comportamento é realizado por meio da punição (positiva ou negativa) e do reforçamento
negativo.
19  Cabe destacar que um estímulo aversivo para um organismo pode não o ser para outro. A aversão é relativa
entre os organismos.

capítulo 1 • 23
das ações de outros organismos e não necessariamente no próprio reforçamento.
Para o autor, é possível controlar o próprio comportamento, observando as consequên-
cias, ainda que não experimentadas, de determinado comportamento e fazendo uma
opção consciente de agir ou não da mesma forma (SCHULTZ, 2005: p. 306).
Bandura acreditava que, entre o estímulo e a resposta, existia um processo
cognitivo que fazia com que o indivíduo antecipasse as consequências de seu com-
portamento, julgando a necessidade de fazê-lo ou não. O autor é conhecido, tam-
bém, por seus estudos sobre a auto eficácia, entendida como senso de autoestima
e crença de que a pessoa possui habilidades necessárias para lidar com situações
adversas. Autoeficácia: a percepção do indivíduo de sua autoestima e a competência
em lidar com os problemas da vida (ibid., p. 307).
Julien Rotter também enfatizava o processamento consciente na realização
dos comportamentos. Ele introduziu ao referencial do Behaviorismo a perspectiva
de que (...) os indivíduos se percebem como seres conscientes capazes de mudar as pró-
prias vidas, e que o comportamento é determinado pelo estímulo externo e pelo esforço
que oferece – no entanto, a influência relativa desses dois fatores é intermediada pelos
processos cognitivos (SCHULTZ, 2005: p. 310). Rotter postulou, ainda, alguns
princípios que resultariam nos comportamentos:

•  O indivíduo cria expectativas subjetivas em relação às consequências ou aos resulta-


dos de seu comportamento com base na quantidade e no tipo de reforço que recebe.
•  Ele calcula a probabilidade de determinado comportamento conduzir a um reforço
específico e o ajusta apropriadamente.
•  Atribui valores diferentes para os diversos reforços e avalia seu valor relativo nas va-
riadas situações.
•  Como cada indivíduo apresenta um comportamento exclusivo e único no ambiente
psicológico, o mesmo reforço pode adquirir diferentes valores para diversas pessoas
(Ibidem).

A Psicologia da Gestalt

A Psicologia da Gestalt surge na Alemanha, no período entreguerras. Sua


fundamentação teórica possui a psicofísica como antecessora, especificamente as
teorias das sensações do movimento (espaço-forma) e da melodia (tempo-forma)
(BOCK, FURTADO & TEIXEIRA, 1999). Esta escola se origina de crítica feita
à metodologia behaviorista, de redução do comportamento a seus elementos bá-
sicos (estímulo e resposta) para ser possível seu enquadramento na metodologia
experimental. A Psicologia da Gestalt também delimitava o objeto da Psicologia

capítulo 1 • 24
como o comportamento, entretanto, considerava que a descontextualizarão do
objeto das circunstâncias mais amplas o descaracterizavam e não permitiam seu
entendimento pelo psicólogo (BOCK, FURTADO & TEIXEIRA, 1999).
Max Wertheimer (1880-1943) é considerado seu fundador, e Wolfgang
Köhler (1887-1967) e Kurt Koffka (1886-1941), que foram seus alunos, seus
colaboradores no experimento pioneiro sobre o movimento. Neste experimento,
Wertheimer discutia que a percepção do movimento estava além da respectiva
sensação visual. Como numa fita de cinema em que são projetadas imagens está-
ticas que, entretanto, em determinada temporalidade de exibição, possibilitam à
pessoa a percepção do movimento (Idem). Neste sentido, a percepção não tem a
ver com o fenômeno em si, mas como o cérebro organiza a entrada da informação
(MOURA & CORREA, 1997).
O objeto central de estudo da Gestalt é a percepção (...) através da qual são
aprendidas as estruturas que integram o meio comportamental ou fenomenológico
(MOURA & CORREA, 1997: p. 31). Para essa escola, a percepção é fundamen-
tal para todo e qualquer processo cognitivo. Neste sentido, entendendo a orga-
nização da percepção, ter-se-ia a base de entendimento do pensamento humano.
Os três princípios básicos que fundamentam a percepção e a construção do
pensamento são:
1. O todo é maior que a soma das partes, ou seja, na própria experiência do mo-
vimento projetado pelo fotograma cinematográfico, o resultado do filme extrapola
a apresentação da fita quadro a quadro;
2. O campo psicológico (ou perceptivo) é percebido em continuidade e não
como partes associadas;
3. O campo perceptivo organiza-se no sentido da boa forma ou do equilíbrio
cognitivo, o que possibilita melhor entendimento do fenômeno (MOURA &
CORREA, 1997).

A melodia pode ser outro exemplo de como os princípios da Gestalt funcio-


nam: a percepção que se tem é de um som contínuo e equilibrado, que possui
uma identidade auditiva, e não de notas associadas. Tanto é assim que as pessoas
conseguem perceber a mesma música em notas diferentes.
Para Wertheimer, a percepção estrutura-se e organiza-se por meio de alguns
postulados: 1) fechamento ou closura; 2) proximidade; 3) semelhança; 4) conti-
nuidade e 5) figura-fundo. Segundo MOURA e CORREA (1997),

capítulo 1 • 25
•  Fechamento ou closura – tendência das formas imperfeitas de se completarem;
•  Proximidade – tendência de que os estímulos que aparecem a distâncias reduzidas
sejam assimilados como componentes de uma mesma forma;
•  Semelhança – tendência de que estímulos de composição homogênea e distribuídos
a distâncias reduzidas sejam percebidos como integrantes de um mesmo conjunto;
•  Continuidade – fator pelo qual não encontramos dificuldades em perceber linhas
interrompidas como contínuas. (MOURA & CORREA, 1997: p. 32)

A Gestalt ainda contribui com os estudos sobre o pensamento, que deve ser
considerado um processo cognitivo superior e ser reduzido a mera associação de
ideias, mas como uma estrutura nova, que serve para a redução de tensão/pressão
psicológica desencadeado por um problema cognitivo (Ibid.).
W. Köhler acrescentou importante noção sobre o pensamento e a resolução
de problemas, como o insight. Criticava a ideia de aprendizagem por ensaio e erro
desenvolvida por E. Thorndike, argumentando que (...) o que ocorre é a súbita rees-
truturação do campo perceptual, permitindo que aspectos fundamentais à solução do
problema, anteriormente não percebidos, sejam vistos ou levados em conta (MOURA
& CORREA, 1997: p. 36).
Outras noções importantes sobre o pensamento produzidas pela escola da Gestalt
são o pensamento produtivo, a atividade automatizada e a rigidez funcional. O
pensamento produtivo refere-se àquele que acontece após um período de preparação,
a partir da análise atenta de suas relações internas e da reorganização dessas relações de
modo a construir algo novo (MOURA & CORREA, 1997). Na atividade automati-
zada, ocorre a reprodução daquilo que já existia, sem produção criativa ou investigação
de novas soluções para o problema. O que ocorre é a repetição mecânica de passos memo-
rizados ou aprendidos sem uma verdadeira compreensão (MOURA & CORREA, 1997:
p. 37). Um exemplo claro é quando o aluno decora e repete o discurso do professor
sem a elaboração cognitiva necessária para o entendimento da teoria.
O fenômeno da rigidez funcional ocorre quando a experiência passada interfe-
re negativamente no pensamento produtivo, ou seja, para a reorganização do pen-
samento produtivo é importante um grau de flexibilidade, caso contrário, haverá
a reprodução automática daquilo que já existe (MOURA & CORREA, 1997). É
possível perceber este fenômeno em indivíduos que possuem crenças muito arrai-
gadas sobre determinadas questões e sentem dificuldade de perceber a situação ou
o objeto sob uma nova perspectiva. O preconceito, a homofobia e o racismo têm
como base uma rigidez funcional do pensamento, que não apresenta abertura para
incluir novas informações do contexto em constante mudança.

capítulo 1 • 26
Para o encerramento desta parte, cabe destacar que, além do Behaviorismo e
do Gestaltismo, outra influência psicológica fundamental para os estudos cogniti-
vos foi a teoria do célebre Psicólogo Jean Piaget que, com sua obra sobre o desen-
volvimento cognitivo e seus conceitos sobre inteligência, pensamento, esquema
entre outros aspectos, tornou-se fundamental para o entendimento da cognição
humana. A Epistemologia Genética será abordada no próximo capítulo.

ATIVIDADES
01. Leonardo é um rapaz de 25 anos que sofre de claustrofobia. Ele conseguiu um novo tra-
balho que o está deixando muito empolgado e apreensivo. O empolgamento deve-se ao fato
de que, em sua nova função, ele terá autonomia e conseguirá produzir como sempre sonhou.
Além disso, as possibilidades de crescimento profissional são enormes e o salário, mais benefí-
cios, está acima da média para a função, de acordo com o mercado. Entretanto, sua apreensão
decorre de seu transtorno e do fato do escritório ficar no último andar de um prédio de 25
pavimentos. Você, como psicólogo, indicaria que processo de tratamento para Leonardo?
a) Reforço negativo
b) Reforço positivo
c) Dessensibilização sistemática
d) Punição positiva
e) Generalização

02. A Psicologia animal influenciou o surgimento do Behaviorismo e, ainda hoje, podemos


verificá-la, principalmente no cotidiano das pessoas que possuem animais de estimação. Na
atualidade, muitas pessoas tratam seus animais como membros da família. Essa situação
acarreta, muitas vezes, a humanização dos cães, em que seus tutores consideram que eles
pensam como humanos, o que acaba por desencadear comportamentos inconvenientes nos
bichinhos, como: posse do dono; fazer as necessidades no lugar errado; latir muito para
outras pessoas e outros animais; pular nos pratos para pegar os alimentos dos donos, entre
outros comportamentos inadequados. Os treinadores costumam indicar a educação pautada
na premiação quando o animal realiza algum comportamento correto, ao invés de castigá-lo.
Este tipo de treinamento refere-se à utilização de:
a) reforço positivo. e) contracondicionamento.
b) reforço negativo.
c) generalização respondente.
d) punição negativa.

capítulo 1 • 27
03. Quando uma pessoa tem a capacidade orquestrar suas habilidades e competências
para resolver desafios e adversidades do cotidiano, dizemos que ela tem:
a) autossuficiência. d) autoeficácia.
b) prepotência. e) liderança.
c) resiliência.

04. A aprendizagem é uma característica cognitiva muito estudada pelos psicólogos desde
o surgimento da Psicologia Científica no século XIX. O tipo de aprendizagem que ocorre a
partir da observação das consequências da ação de outras pessoas é chamado de:
a) aprendizagem por imitação.
b) condicionamento operante.
c) condicionamento clássico.
d) condicionamento verbal.
e) aprendizagem vicária ou vicariante.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BOCK, A. M. B.; FURTADO, O.; TEIXEIRA, M. L. T. Psicologias – uma introdução ao estudo de
Psicologia. 13. ed. Rio de Janeiro: Editora Saraiva, 1999.
GOODWIN, C. J. História da Psicologia Moderna. São Paulo: Cultrix, 2005.
MOREIRA, M. B.; MEDEIROS, C. A. M. Princípios básicos de análise do comportamento. Porto
Alegre: Artmed, 2007.
MOURA, M. L. S.; CORREA, J. Estudo Psicológico do pensamento: de W. Wundt a uma ciência
da cognição. Rio de Janeiro: EdUERJ, 1997.
SCHULTZ, D. P.; SCHULTZ, S. E. História da Psicologia Moderna. 8. ed. São Paulo: Thomson
Learning, 2007.

capítulo 1 • 28
2
A epistemologia
genética de Jean
Piaget
A epistemologia genética de Jean Piaget
Este capítulo trata da importante influência do psicólogo do desenvolvimento
Jean Piaget (1896-1980) e sua Epistemologia Genética para a fundamentação teóri-
ca sobre a cognição humana. Piaget debruçou-se sobre a construção do pensamento
infantil, por meio de experimentos e observação de campo, conseguindo caracterizar
a construção do pensamento nas diversas fases do desenvolvimento infantil até a eta-
pa adulta. Esse autor trouxe ainda grandes contribuições com as noções de esquema,
inteligência, equilibração, assimilação, acomodação e o desenvolvimento da ideia
de que a cognição, ou a construção de conhecimento, está na base da adaptação
humana em relação ao ambiente. Nesta perspectiva, a teoria piagetiana torna-se im-
portante base teórica para o entendimento da Psicologia Cognitiva.

OBJETIVOS
•  Apresentar a Epistemologia Genética de Jean Piaget;
•  Introduzir a base conceitual de Jean Piaget sobre adaptação, esquema, hereditariedade,
inteligência e equilibração;
•  Expor os períodos do desenvolvimento e suas características cognitivas.

Fundamentos da Epistemologia Genética

Jean Piaget (1896-1980), psicólogo suíço, iniciou seus estudos na Biologia,


transitou pela Filosofia, Lógica, Matemática, Física, Teologia, Sociologia,
Epistemologia e, finalmente a Psicologia, em que deixou um grande legado para a
compreensão do desenvolvimento humano e da construção da cognição humana
e contribuições para a educação.
A pergunta principal que envolveu Piaget e o fez adentrar as fronteiras das
ciências humanas é “como o homem constrói o conhecimento”, aspecto, conside-
rado por ele, que torna o ser humano diferenciado das outras espécies, tipicamente
homo sapiens sapiens. Tal preocupação faz com que seja designado construtivista,
porque desejava entender como ocorre a construção do conhecimento.

capítulo 2 • 30
A preocupação central de Piaget foi o “sujeito epistêmico” (...), isto é, o estudo dos
processos de pensamento presentes desde a infância inicial até a idade adulta. Inte-
ressou-se basicamente pela necessidade de conhecimento típico do homem, que o
define como espécie homo sapiens. (Rapapport, 1981, p. 51)

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Figura 2.1  –  Jean Piaget (1896-1980).

A formação da Epistemologia Genética piagetiana remete a uma ideia que


extrapola as estruturas biológicas que funcionam para a produção da cognição hu-
mana, ou seja, pretende esclarecer como ocorre a gênese (origem) do conhecimen-
to, desde o nascimento até a idade adulta. A questão que se coloca é como o pen-
samento simbólico se constrói a partir das operações neurofisiológicas do cérebro.
Para o autor, a base biológica é importante, mas o convívio social é que faz
a diferença no desenvolvimento cognitivo. Com relação ao aspecto social, Piaget
não apresenta especificações relacionadas ao conceito (La Taille, Khol e Dantas,
1992). Entretanto, considera que a interação é fundamental para o desenvolvimento

capítulo 2 • 31
da inteligência, pois o homem é um ser social: (...) a inteligência humana somente se
desenvolve no indivíduo em função de interações sociais que são, em geral, demasiada-
mente negligenciadas20. (Piaget apud La Taille, 1992, p. 11)
A interação do sujeito com o objeto e com outros sujeitos era considerada
tão importante para o autor, que o fez ser reconhecido como interacionista, pois
acreditava que o homem está em constante interação com o mundo num processo
ativo de construção de conhecimento, com o objetivo de compreender a realida-
de. E, a partir dessa interação, o sujeito manipula o meio, interioriza aquilo que é
externo e delimita contornos simbólicos para construir uma realidade subjetiva e
passível de entendimento. Neste sentido, quanto mais estimulante for o ambiente,
mais propício será para a evolução da cognição (La Taille, 1992).

Piaget apresentou uma visão interacionista. Mostrou a criança e o homem num pro-
cesso ativo de contínua interação, procurando entender quais os mecanismos men-
tais que o sujeito usa nas diferentes etapas da vida para poder entender o mundo.
(Rapapport, 1981, p. 51)

A interação ou socialização, para o autor, era de tal importância que ele ar-
gumentava que somente através da socialização é que a inteligência se desenvolve
em toda a sua potencialidade, tornando-se cada vez mais flexível e permitindo a
resolução de problemas cada vez mais complexos. Seguindo o desenvolvimento, o
pensamento parte do mais básico e primitivo, que é o pensamento prático sensó-
rio-motor, para o formal, ou seja, aquele que permite abstrações lógicas.
Quanto ao tipo de relação social, Piaget destacava dois tipos básicos: a coação
e a cooperação. Defendia que somente através da cooperação, que deveria ser exer-
citada desde muito cedo com e pelas crianças, é que o pensamento se desenvolve
em toda a sua plenitude; é a base do pensamento crítico e reflexivo, com possibi-
lidade de ultrapassar aquilo que já é instituído socialmente, trazendo flexibilidade
e criatividade no trabalho cognitivo. Por outro lado, criticava a forma tradicional
de educação coercitiva, ou seja, que metodologicamente coage o aluno a perma-
necer no mesmo discurso do professor, dos pais ou da sociedade, não permitindo
a transcendência reflexiva do pensamento (La Taille, 1992).

20  A negligência a que se refere o autor remete a outras teorias psicológicas, como o Estruturalismo que centrava
seus estudos na estrutura da mente humana, ou o Behaviorismo, que descartava qualquer conceito mentalista com
o intuito de explicar a Psicologia por meio do comportamento humano e animal.

capítulo 2 • 32
Não somente a coação leva ao empobrecimento das relações sociais, fazendo com
que, na prática, tanto o coagido quanto o autor da coação permaneçam isolados, cada
um no seu respectivo ponto de vista, mas também, ela representa o freio ao desenvol-
vimento da inteligência. (La Taille, 1992, p. 19)

O predomínio de relações de coação torna o pensamento rígido, visto que


o que prevalece socialmente é a reprodução do instituído. Sociedades pautadas
nesse tipo de relação e de educação permanecem “no mesmo lugar” e fortalecem
a desigualdade, pois “matam” a criatividade e a inovação, corroboram com o pre-
conceito, o racismo e outras formas de exclusão social.
Em termos individuais, pode-se perceber, já numa perspectiva da Psicologia
Cognitiva, que a rigidez de pensamento produz transtornos mentais e comporta-
mentos disfuncionais. Além de sustentar um padrão de personalidade egocêntrico
e imaturo, onde a pessoa se coloca no centro de todas as situações e não consegue
ter a noção de reversibilidade, ou das consequências das suas ações.
A inteligência, então, estaria vinculada à flexibilidade cognitiva e não ao con-
teúdo do saber científico propriamente dito. A possibilidade de enxergar o mundo
sob diversas óticas e poder articular sua cognição em problemas ou desafios coti-
dianos cada vez mais complexos, mostra o processo de estruturação da inteligência.
Neste sentido, para Piaget, é a construção do conhecimento que permite a
adaptação do indivíduo ao ambiente. Ao internalizar objetos, eventos ou fenôme-
nos a pessoa pode dar sentido ao mundo, compreendendo-o e, dessa forma, agir
sobre a realidade satisfazendo suas necessidades.

A preocupação central de Piaget dirige-se à elaboração de uma teoria do conhecimen-


to, que possa explicar como o organismo conhece o mundo. E esta colocação reflete
sua formação inicial em Biologia, pois considera que só o conhecimento possibilita ao
homem um estado de equilíbrio interno que o capacita a adaptar-se ao meio ambiente.
Existe, para ele, uma realidade externa ao sujeito do conhecimento, e é a presença
desta realidade que regula e corrige o desenvolvimento do conhecimento adaptativo. A
função do desenvolvimento não consiste em produzir cópias da realidade externa, mas
sim, em produzir estruturas lógicas que permitam ao indivíduo atuar sobre o mundo de
formas cada vez mais flexíveis e complexas. (Rapapport, 1981, p. 52)

Tal como o organismo em constante contato com o ambiente entra em de-


sequilíbrio orgânico e reage, impulsionando comportamentos para voltar à

capítulo 2 • 33
homeostase, a mente funciona da mesma forma. Diante de um problema novo,
desafio não solucionado ou informações ainda não elaboradas, a mente humana
entra num estado de desequilíbrio ou dissonância. O movimento a seguir é de
tentar categorizar o novo a partir do que já existe. Caso não seja possível, o que
será realizado é a construção de uma nova estrutura de pensamento para dar conta
daquilo que ainda não consta na mente. É a partir deste processo que acontece a
aprendizagem e o desenvolvimento cognitivo. Especificamente é o que Piaget trata
como equilibração, tópico que será abordado adiante.
Resumindo, a questão central para o autor era o estudo da gênese do conheci-
mento humano, ou seja, quais são e como ocorrem os processos mentais vinculados
na resolução de problemas e atuação no ambiente. Para tanto, estudou os processos
cognitivos da memória, do pensamento, da linguagem, imaginação, percepção, imi-
tação, lógica, entre outros. A ideia era construir uma teoria explicativa sobre como
o organismo conhece o mundo e como, a partir desse conhecimento, tal organismo
chega a um equilíbrio interno que lhe permite adaptar-se ao ambiente e suas mu-
danças (Rapapport, 1981). Então, segundo Piaget, existe uma realidade externa ao
sujeito epistêmico (do conhecimento) que regula o desenvolvimento adaptativo. A
função do desenvolvimento não é produzir uma cópia interna ao sujeito da realidade,
mas produzir estruturas lógicas que permitam ao indivíduo atuar sobre o mundo de
forma cada vez mais flexível e complexa (Rapapport, 1981, p. 52).
Para sua pesquisa, a principal técnica utilizada pelo autor foi a observação
clínica e a aplicação de provas, por meio de experimentos de inúmeras crianças e
jovens de várias faixas etárias. Piaget teve contato com Alfred Binet e sua testagem
relativa ao Quoeficiente de Inteligência (QI). Todavia, o que mais o instigou não
eram os acertos das questões, mas os erros, que estimulou seu desejo em com-
preender a lógica subjacente às respostas incorretas dos testes. (Rappaport, 1981;
La Talle, 1992). O desdobramento dessas pesquisas levou ao que se conhece atual-
mente como as categorias explicativas de pensamento nos períodos de desenvolvi-
mento do recém-nascido até o adolescente.
No Brasil, o construtivismo piagetiano chega na década de 60, tornando-se
parte dos currículos de psicologia e pedagogia. Tal teoria é introduzida, também,
no ensino fundamental, tornando-se um verdadeiro modismo, onde muitas vezes
a sua aplicação ocorre sem um conhecimento verdadeiro sobre esta teoria, acarre-
tando várias distorções na prática educativa. (Rapapport, 1981)

capítulo 2 • 34
A hereditariedade

No construtivismo piagetiano, a hereditariedade penetra como uma base filo-


genética, ou seja, o ser humano herda uma série de estruturas biológicas típicas da
espécie que, por meio das sensações e da neurofisiologia, o preparam para o sur-
gimento da mente. Esse desenvolvimento ocorre na interação entre o organismo
e o ambiente. A partir deste processo, surgem estruturas cognitivas, os esquemas,
base de toda a estruturação do pensamento e do processo cognitivo. Os esquemas,
em seu início, correspondem a estruturas mais simples que se tornam complexas
com idade e, portanto, mais propícias a lidar com os desafios de cada faixa etária.

O indivíduo herda uma série de estruturas biológicas (sensoriais e neurológicas) que


predispõem ao surgimento de certas estruturas mentais. Portanto, a inteligência não
a herdamos. Herdamos um organismo que vai amadurecer em contato com o meio
ambiente. Desta interação organismo-ambiente resultarão determinadas estruturas
cognitivas que vão funcionar de modo semelhante durante toda a vida do sujeito.
(Rapapport, 1981, p.55)

Neste sentido, é necessário o amadurecimento biológico para o processo de


aprendizagem. Entretanto, como a construção do conhecimento ocorre na inte-
ração com o meio (físico e social), quanto mais rico em estímulos este for, mais
recursos intelectuais a criança desenvolverá.

Quando se fala de ambiente, é bom lembrar que este inclui tanto aspectos físicos como
sociais, de relacionamento humano, que tornam mais difícil e complexo o processo de
adaptação. Isso porque a criança vai precisar desenvolver recursos intelectuais para
solucionar uma ampla variedade de situações para viver satisfatoriamente em determi-
nado ambiente social. (Rappaport, 1981, p.55)

A dificuldade do processo de desenvolvimento de habilidades de relaciona-


mento apontadas por Rappaport (1981), ou habilidades sociais, é um dos gran-
des problemas educacionais e interpessoais da atualidade. É perceptível ciclos de
hostilidade e violência infanto-juvenis e até o surgimento de novos transtornos já
classificados no DSM-V ou CID11, como o Transtorno Desafiador Opositivo,
que aparece geralmente como comorbidade do TDAH – Transtorno de Déficit
de Atenção e Hiperatividade, caracterizado por uma falta de habilidades sociais ao
lidar com frustrações, grande impulsividade, testagem do limite de outras pessoas

capítulo 2 • 35
(principalmente adultos e figuras de autoridade) e que traz como consequên-
cia um ciclo cada vez maior de hostilidade, agressividade, violência, ansiedade e
impulsividade.

Entre os estímulos sociais estão os comportamentos, tarefas, conceitos etc., que são
ensinados, deliberadamente ou não, pelas pessoas da cultura [família, escola e outros
grupos de socialização da criança] através dos processos que costumamos chamar de
aprendizagem social. Ou, dito de outra forma, a aprendizagem social se refere àqueles
comportamentos, atitudes e conhecimentos que a criança adquire através do contato
humano constante e contínuo. (Rappaport, 1981, p.55)

Cabe ressaltar que a inteligência ou a personalidade não são herdadas, mas


construídas na interação entre o biológico e o ambiente social que a criança está
inserida, e dependem do vínculo interpessoal (de tolerância, carinho e respeito)
que os adultos estabelecem com a criança.

Entenda-se, pois, que, no caso da linguagem ou de outros aspectos que dependem


do desenvolvimento cognitivo [habilidades sociais, relacionamento interpessoal], o
sujeito herda a capacidade para a aprendizagem e o desempenho. Mas a plena reali-
zação dessas capacidades depende das condições que o meio ambiente irá oferecer.
(Rappaport, 1981, p. 56)

As habilidades sociais são aprendidas com base em exemplos e ensinamentos


entre os adultos, os jovens e as crianças, que, em situações de conflito ou desafios,
se desequilibram emocionalmente. Nesse momento, cabe ao adulto explicitar sen-
timentos, emoções e refletir com as crianças e os adolescentes qual a melhor forma
de resolver a situação. Portanto, no vínculo estabelecido entre crianças, jovens e
adultos, é fundamental a tolerância ao erro, a empatia, o diálogo e o acolhimento,
uma vez que suas organizações de pensamento são distintas e acarretam com-
preensões diversas da mesma situação.

A adaptação

Segundo a teoria piagetiana, os organismos possuem uma tendência à cons-


trução do conhecimento voltado para sua adaptação. O organismo vem com uma
base biológica propícia para essa edificação. Essa construção é prazerosa, pois via-
biliza maior flexibilidade para a resolução de problemas e desafios, que acabam por
satisfazer toda ordem de necessidades.

capítulo 2 • 36
Fisiológica e mentalmente, o organismo tende ao equilíbrio, visto que o dé-
ficit orgânico, ou a dissonância cognitiva, é encarado como algo que pode trazer
risco ao funcionamento do corpo ou à parte psicológica. Nesse sentido, o corpo
vem preparado desde o nascimento para se aproximar daquilo que gera prazer e se
afastar daquilo que gera desprazer.
Os reflexos, ou comportamentos involuntários, são exemplos de mecanismos
básicos e primitivos de adaptação do recém-nascido. Como exemplo, o recém-nas-
cido possui os reflexos da preensão palmar e plantar21, sucção22, entre outros que,
posteriormente, farão parte do repertório comportamental voluntário da criança
mais velha, do jovem e do adulto.
Quando o déficit é orgânico, o corpo impulsiona um comportamento consu-
matório para saciar a necessidade que se estabelece e voltar à homeostase. Exemplos
de necessidades fisiológicas básicas são fome, sede, sono, os quais saciamos com
comportamentos consumatórios de alimentação, ingestão de líquidos e descanso.
Entretanto, todos esses comportamentos são aprendidos: aprendemos o que deve-
mos comer ou não, beber ou não e aonde devemos descansar. Esses movimentos
adaptativos já são exemplos de como a mente e o corpo funcionam, visando a uma
flexibilidade para resolução de problemas que surgem no cotidiano da interação
do sujeito com o ambiente.
Com relação à questão mental, em face de novas informações ou desafios, a
mente entra em dissonância. Tal como o corpo, a mente também trabalha no sen-
tido de enquadrar aquilo que não conhece e que gera desprazer em algo que traga
o equilíbrio, ou a impossibilidade de sentido gera desconforto e ansiedade. Este
mecanismo é a construção de conhecimento.

Em última análise, poderíamos dizer que o conhecimento possibilita novas formas de


interação com o ambiente, proporcionando uma adaptação cada vez mais completa e
eficiente e, neste sentido, é gratificante para o organismo, que se sente mais apto a
lidar com situações novas. (Rappaport, 1981, p. 56)

Na teoria construtivista, o conhecimento advém de dois processos: assimilação


e acomodação. Na assimilação, a informação nova é processada cognitivamente com
21  Os reflexos de preensão palmar e plantar referem-se aos movimentos involuntários do bebê quando o adulto
introduz algo na palma da mão do recém-nascido e ele fecha os dedos sobre o objeto e, quando a planta do pé
também é estimulada e ele faz o mesmo movimento, fechando os dedos dos pés como se fossem pegar o objeto.
22  O reflexo da sucção refere-se ao movimento involuntário de introduzir algo na boca do bebê e ele iniciar o
comportamento de chupar/sugar.

capítulo 2 • 37
base na verificação de categorias já existentes na memória. Em caso afirmativo, a
nova informação é apropriada pelo esquema já existente. Caso não haja categorias
semelhantes, ocorre uma reorganização do esquema para a incorporar a nova in-
formação. A esse processo denomina-se acomodação. Segundo Rappaport (1981),

(...) novas questões movimentam o organismo no sentido de resolvê-las. Para tanto vai
se utilizar das estruturas mentais já existentes ou então, quando estas estruturas se
mostram ineficientes, elas serão modificadas a fim de se chegar a uma forma adequa-
da para se lidar com a nova situação. Assim, no processo global de adaptação, estariam
implicados dois processos complementares: assimilação e acomodação. (p. 57)

Os processos de assimilação e acomodação estão presentes em toda a vida do


indivíduo. Simplificando, pode-se conceituá-los da seguinte forma:
A) A assimilação constitui-se na incorporação do novo a uma estrutura já existen-
te; trata-se de uma atualização do repertório comportamental anterior; tentativa
de solucionar um problema com base numa estrutura cognitiva já aprendida;
B) A acomodação refere-se ao processo de modificação das estruturas vigentes,
reorganizando-as com o objetivo de solucionar um problema adaptativo no qual
estruturas antigas perderam sua eficiência.

Por exemplo, muitas crianças pequenas de 2 ou 3 anos, muitas vezes até antes
mesmo dessa idade, são apresentadas a livros-brinquedo de plástico onde apa-
recem primeiras palavras ou primeiras figuras geométricas. No caso das figuras
geométricas, como quadrado, círculo, triângulo, retângulo, elas estarão represen-
tadas no livro como os brinquedos com que a criança possui contato, como a bola
(círculo), a casa (quadrado + triângulo), o carro (quadrado + círculos), o caminhão
(retângulo + círculos). E, por meio dessas figuras, a criança constrói o esquema de
figuras geométricas básicas:

Figura 2.2  –  Representação de esquema inicial de


figuras geométricas básicas.

capítulo 2 • 38
Durante a aprendizagem, a criança verá outras figuras geométricas que inclui-
rá no esquema, como o losango, o trapézio, o hexágono. Este é um exemplo de
assimilação. Em seguida, virão as formas tridimensionais mais complexas como
a pirâmide (triângulo tridimensional), cubo (quadrado tridimensional), cone (cír-
culo tridimensional). Desta forma, o esquema não terá como incorporar estes
novos elementos sem uma reorganização/ transformação, como demonstrado na
figura 4. O que ocorre é que o conteúdo já presente no esquema não viabiliza o
entendimento e a compreensão da informação nova. Portanto, é necessária uma
transformação qualitativa do esquema, ou acomodação.

Figura 2.3  –  Assimilação de novas formas ao esquema anterior


(losango, trapézio e hexágono).

Figura 2.4  –  Acomodação (reorganização) do esquema de figuras geo-


métricas básicas a partir da incorporação de figuras tridimensionais.

O processo de adaptação intelectual é extremamente dinâmico e proporciona


crescimento e desenvolvimento intelectual, porque possibilita que o sujeito ad-
quira competência e flexibilidade cada vez maiores para lidar com as situações da
vida prática.

capítulo 2 • 39
Pode-se dizer, então, que, por meio dos processos de assimilação e acomo-
dação, novos conhecimentos possibilitam novas formas de interação com o am-
biente, proporcionando uma adaptação cada vez mais completa e eficiente. Esse
fato torna a aprendizagem gratificante para o organismo, que se sente mais apto
a lidar com situações novas e desafiadoras. Ou seja, novas questões movimentam
o organismo no sentido de resolvê-las; para tanto, ele vai se utilizar de estruturas
mentais já existentes. Quando essas estruturas se mostrarem ineficientes, elas serão
modificadas com o objetivo de resolver o problema ou lidar com a nova situação.

O esquema

Piaget teve sua formação básica em Biologia, o que o fez utilizar esta ciência
como paradigma para pensar as questões mentais e a construção de conhecimento.
Tal como o corpo humano, que se desenvolve desde o nascimento até a morte,
as estruturas psíquicas e o pensamento também terão esse mesmo movimento.
Segundo Piaget (2010), O desenvolvimento psíquico, que começa quando nascemos e
termina na idade adulta, é comparável ao crescimento orgânico: como este, orienta-se
essencialmente, para o equilíbrio. (p.13)
Neste sentido, se a base para o desenvolvimento orgânico é a célula, que é a
estrutura básica do corpo, segundo o autor, a estrutura básica do pensamento é o
esquema. Por analogia, pode-se dizer que o esquema é a “célula do pensamento”
que tende a uma complexidade cada vez maior, considerando a interação cada vez
mais complexa da mente com o ambiente.

Da mesma maneira que o corpo está em evolução até atingir um nível relativamente
estável – caracterizado pela conclusão do crescimento e pela maturidade dos órgãos
–, também a vida mental pode ser concebida como evoluindo na direção de uma forma
de equilíbrio final, representada pelo espírito adulto. (Piaget, 2010, p. 13)

O recém-nascido não possui uma capacidade de pensamento e entendimento


do mundo que o cerca. Essa habilidade vai se desenvolvendo à medida que ele vai
se relacionando com o mundo, quando o ambiente vai lhe oferecendo situações
cada vez mais complexas. A criança pequena, ao nascimento, não consegue identi-
ficar onde está, compreender o que está acontecendo, muito menos saber quem é,
ou que tem mãe e pai, ou o que ocorre no ambiente que a cerca.

capítulo 2 • 40
Não se está ponderando sobre ausência de pensamento, mas de um tipo de
pensamento muito primordial, primitivo, vinculado às sensações, ao aqui-ago-
ra, sem possibilidade de entendimento temporal, capacidade de planejamento ou
identificação de pessoas, objetos ou situações. Na verdade, o bebê não sabe iden-
tificar o que sente organicamente e afetivamente, nem sabe mobilizar o próprio
corpo para a realização de ações. Pode-se dizer que o recém-nascido é um corpo
desorganizado que herdou estruturas biológicas e neurológicas complexas e uma
tendência a aprendizagem com o objetivo de se adaptar e sobreviver ao meio.

Quando nascem, as crianças não são dotadas de capacidades mentais prontas, mas
apenas de alguns reflexos, como chupar e agarrar, além de tendências inatas a exer-
citá-los e a organizar suas ações. Herdam, portanto, não uma inteligência organizada,
mas alguns elementos (estrutura biológica e neurológica) que determinam seu modo
de reagir ao ambiente, que é, no início da vida, absolutamente caótico para a criança.
(Rappaport, 1981, p. 58-59)

No início da vida, a criança não tem nenhum conhecimento da realidade ex-


terna ou de seus estados internos (emoções e sentimentos). As crianças dispõem,
apenas, de sensações provenientes do exterior e do interior, porém não apresentam
nenhuma capacidade de discernimento sobre elas, agindo, quando possível, atra-
vés de atos reflexos.
No decorrer de sua existência, a criança, a partir da sua interação com o mundo,
irá formar estruturas mentais com o objetivo de organizar o caos de sensações e es-
tados internos. Tal estrutura organizadora, ou unidade básica de pensamento ou de
ação, é o esquema. Conforme mencionado anteriormente, os esquemas são estru-
turas mentais que podem ser simples (como uma resposta a um estímulo – sugar o
dedo) ou complexos (como o esquema simbólico que temos das pessoas – mãe, pai,
professor e nossa identidade, por exemplo – ou a forma de resolver problemas ma-
temáticos ou teorias científicas, como as teorias psicológicas). Ou seja, podem refe-
rir-se a uma sequência de ações realizadas por um bebê, a estratégias para solução de
problemas matemáticos ou imagens conceituais de pessoas ou objetos (Rappaport,
1981). Vemos então que o esquema constitui a unidade estrutural da mente e que, da
mesma forma como as unidades estruturais biológicas, não é um elemento estático, po-
rém, dinâmico e variado em seu conteúdo (Rappaport, 1981, p. 60).
A transformação do esquema em seu conteúdo, bem como em sua estrutu-
ra, ocorre no processo de desenvolvimento mental do sujeito e através dos pro-
cessos de assimilação e acomodação. Neste sentido, os esquemas são estruturas

capítulo 2 • 41
dinâmicas que se modificam e se adaptam enriquecendo o repertório comporta-
mental e psíquico do indivíduo.
Quando um esquema já absorveu (ou assimilou) toda ordem de informações
semelhantes e complementares relativas a algum aspecto do conhecimento ne-
cessário para lidar com as questões cotidianas, ocorre um “salto qualitativo” (ou
acomodação) que o transforma em uma nova estrutura. Para Piaget, o desenvolvi-
mento mental estará vinculado a essas mudanças estruturais dos esquemas, ou en-
tendendo de forma mais abrangente, à estrutura de organização do pensamento,
que vai do mais simples, como o esquema sensorial e motor, até o mais complexo
pensamento abstrato.
Para a Psicologia Cognitiva, a noção de esquema pode abarcar tanto a noção
de sistema cognitivo de processamento de uma informação (tal como um sistema
computacional), mapa mental ou sign-gestalt23, até o conteúdo conceitual e ima-
gético agrupado, organizado e classificado na nossa memória.
Nos seres humanos, um mapa mental ou sign-gestalt pode ser exemplificado
como o a referência do ambiente doméstico, da vizinhança ou até mesmo a re-
ferência evocada pelo motorista para seguir determinada trajetória de casa para o
trabalho. Outro exemplo é o mapa mental que as pessoas cegas constroem a partir
das sensações não visuais que possuem, como a pressão plantar a partir de sina-
lizadores nos pisos de ruas e outros ambientes. Para os cegos, este equipamento
é fundamental porque serve como a visão, criando referências mentais dos cami-
nhos que devem seguir.
O esquema de processamento de informação pode ser entendido como um
modelo de experiência interna, tal como um “óculos”, construído através da
história de vida do sujeito, suas memórias e sentimentos relacionados com cada
experiência particular, e a partir do qual toda informação/estímulo externo pas-
sa por ele para ser representado e compreendido. Nesta perspectiva e de acordo
com as terapias cognitivas, quanto mais organizado e realista for o modelo de
processamento, mais funcional será o pensamento, a percepção da situação e/ou
pessoa e sua emoção/ sentimento, o que acarretará comportamentos mais adequa-
dos e funcionais. Por outro lado, também ocorrem várias interferências externas
23  Mapa mental ou sign-gestalt é um conceito introduzido pelo behaviorista Edward Tolman (1886-1959), a partir
de experimentos com um rato num labirinto onde o animal deveria percorrer o labirinto até achar o queijo no meio
do labirinto. Após a ocorrência de sucesso pelo rato, Tolman repetiu o experimento outras vezes colocando o rato
para percorrer o mesmo labirinto, entretanto alterando o local de início do percurso do sujeito. Apesar de iniciar em
lugares distintos, o rato chegava ao meio do labirinto, obtendo o queijo, a partir de comportamentos cada vez menos
caóticos e mais intencionais. Deste experimento, Tolman argumenta que o sujeito criou uma sign-gestalt ou mapa
mental do labirinto que o fez achar o queijo cada vez mais rápido, independentemente do lugar onde era colocado.

capítulo 2 • 42
(ambientais) e internas (da própria memória) na formação desses modelos inter-
nos de experiência, o que pode acarretar uma estrutura de processamento que re-
sultará em pensamentos, emoções/sentimentos e comportamentos disfuncionais.
Como exemplo podem-se citar os transtornos de ansiedade ou pânico, cuja base
é uma cognição vinculada a uma sensação de risco físico ou psíquico iminente.
No caso do esquema entendido como conteúdo, pode-se exemplificar com o
conceito de mãe. Para o bebê, que tem um pensamento de base sensório-motora, a
mãe é aquela pessoa que satisfaz suas necessidades e o deixa confortável, acionando
seu centro de prazer no cérebro. Para a criança que já está inserida na linguagem,
por volta de 3 ou 4 anos, sua mãe é diferente das outras mães, é aquela que a pro-
tege, brinca e organiza sua vida, totalmente necessária nos mínimos detalhes, visto
que é seu “porto seguro”. Para a criança que possui 7 ou 8 anos, mãe é aquela que
manda estudar, tomar banho, comer direito, impõem limites, diz o que pode ou
não fazer, é aquela que, muitas vezes, é sentida como chata, porém ainda necessá-
ria e muito amada. Na adolescência, a mãe é aquela que “limita” sua independên-
cia e autonomia de fazer tudo o que deseja; é aquela que impõe responsabilidades
e deveres. Na fase adulta, mãe significa um estado de ser com o próprio filho, que
estará pautado em todo o modelo de experiências internas e afetivas com a própria
mãe, desde o início da própria vida, visto que os esquemas têm conteúdos cumu-
lativos. Ou seja, para se chegar ao estado de ser mãe, é necessário construir uma
representação mental sobre o que é ser mãe, vinculado a todas as experiências pes-
soais com a própria mãe, com outras mães e com o que a cultura identifica como
mãe. Resumindo, é desta forma que os esquemas conceituais são construídos.

A equilibração

O processo de equilibração das estruturas cognitivas corresponde à organiza-


ção das estruturas do pensamento num sistema coerente que possibilita ao indiví-
duo a adaptação à realidade. Essa organização mental, ou equilíbrio, será transfor-
mada à medida que o indivíduo conseguir atingir novas formas de compreender e
atuar sobre a realidade de acordo com sua idade.
Esse movimento de dissonância para equilíbrio tenderá a uma forma final
que será atingida na adolescência, com pensamento formal. Essa modalidade de
padrão intelectual se inicia na adolescência e persistirá durante a idade adulta.
Neste sentido, as estruturas de pensamento, ou esquemas, do adolescente e do
adulto permanecem semelhantes. A diferença ocorre por conta da diversidade e da

capítulo 2 • 43
quantidade de experiências que um adulto tem em relação ao adolescente, visto
que os esquemas são cumulativos e, portanto, permitem aos adultos uma quanti-
dade maior de articulações para a resolução de problemas.
Com isso, pode-se dizer que apesar da formação cognitiva do adolescente e
do adulto terem as mesmas possibilidades, o que os diferencia é a quantidade de
experiências e o conhecimento que o adulto tem e o adolescente ainda não tem.
Quanto à criança, a teoria piagetiana evidencia que a modalidade de pensa-
mento é totalmente diferente da do adulto. Segundo Piaget (2010), [O] Estudo [do
pensamento da criança] mostra, em primeiro lugar, aquilo em que a criança difere do
adulto, isto é, o que falta à criança para raciocinar como um adulto normal de cultura
média (p. 69).
Desta forma, não adianta tratar a criança como um mini-adulto, porque sua
organização de pensamento não adquiriu a complexidade do pensamento formal
e, neste sentido, ela possui características próprias. A especificidade do pensamento
infantil não significa incapacidade, incompetência ou problemas de processamento
cognitivo, mas somente que ainda não adquiriu a habilidade cognitiva do adulto,
tanto por questões de desenvolvimento neurofisiológico, porque ainda está em de-
senvolvimento, como por conta das experiências vividas. Adiante, com as caracterís-
ticas de cada fase, esclarecer-se-á as diferenças na organização de pensamento.
Importante ressaltar que o desenvolvimento intelectual persiste durante a
vida. Entretanto, depois de atingido o modelo de organização de pensamento das
operações formais na adolescência, essa forma de raciocínio predomina durante
toda a existência, e seu desenvolvimento posterior consistirá numa ampliação de
conhecimentos em extensão e em profundidade.
Neste sentido, pode-se dizer que o desenvolvimento humano na teoria piage-
tiana é caracterizado como um processo de equilibração progressiva, com o obje-
tivo de chegar a uma forma final que é o pensamento formal (Rappaport, 1981).
Primeiramente, tem-se o pensamento pautado em esquemas sensório-moto-
res (0 a 2 anos); em seguida, esses esquemas são transformados em representação
mental por conta da aquisição da linguagem (2 a 7anos); posteriormente, surge
o pensamento operatório concreto (8 a 11 anos) e, finalmente, se o ambiente for
favorável em estímulos e viabilizar aprendizagens eficazes, chega sua forma final,
que resulta na conquista das operações formais a partir dos 12 anos. Ou seja, o
desenvolvimento consiste numa transformação cognitiva constante, de um estado
de equilíbrio para um de desequilíbrio, e numa síntese para um equilíbrio supe-
rior, no sentido de que a criança terá aprendido a lidar com os problemas do meio

capítulo 2 • 44
de forma mais eficiente (inteligente) e adaptada. É importante esclarecer que as
faixas etárias não são rígidas, mas flexíveis, entretanto certas conquistas cognitivas
dependerão da maturação neurofisiológica, como a aquisição da linguagem.

Características gerais dos principais períodos de desenvolvimento

A Epistemologia Genética teoriza o desenvolvimento humano pautado na


construção de conhecimento e na mudança dos processos cognitivos. Conforme
mencionado anteriormente, a neurofisiologia do organismo muda e possibilita
uma produção de conhecimento acerca do mundo cada vez mais complexa, por
meio dos saltos qualitativos da estrutura básica do pensamento, o esquema. Essas
transformações do esquema ocorrem pelos processos de assimilação e acomoda-
ção, possibilitando diferentes formas de interação com o ambiente diante dos de-
safios encontrados pelo organismo.
Piaget encontrou, em suas pesquisas, formas distintas de interatuar com o
ambiente nas diferentes faixas etárias, as quais denominou de estágios ou períodos.
Segundo Rappaport (1981),

Assim sendo, podemos dizer [segundo Piaget] que a determinadas faixas etárias cor-
respondem determinados tipos de aquisições mentais e de organização destas aqui-
sições que condicionam a atuação da criança em seu ambiente. A criança irá, pois, à
medida que amadurece física e psicologicamente, que é estimulada pelo ambiente
físico e social, construindo sua inteligência. (p. 63)

Diferentemente de outras teorias explicativas sobre o desenvolvimento que


também consideram características específicas de cada faixa etária, como a psi-
canálise freudiana24, Piaget evidencia os aspectos conscientes e a ação da criança
para a construção do seu próprio conhecimento. Ou seja, apesar da necessária
maturação orgânica, neurológica e fisiológica, a criança participa ativamente para
a construção de seu conhecimento relativo ao real, sendo considerada agente do
próprio desenvolvimento. Ressalta-se que um ambiente estimulante é fundamen-
tal para o desenvolvimento.

24  Na teoria de Freud, encontra-se um paralelismo relacionado às faixas etárias utilizadas por Piaget. Para a
Psicanálise, as fases do desenvolvimento são: fase oral (0 a 2 anos), fase anal (2 a 3 anos), fase fálica (3 a 6/7 anos),
período de latência, que não é considerado propriamente uma fase, (6 a 11 anos) e fase genital (12 anos em diante).
Tanto Piaget quanto Freud acreditam na maturação biológica que dará sustentação cada vez maior à interação do
organismo com o ambiente. Entretanto, se a psicanálise preconiza um desenvolvimento com base na afetividade, a
teoria piagetiana centraliza o desenvolvimento nas estruturas de pensamento e na construção do conhecimento.

capítulo 2 • 45
No caso de Piaget, não há dúvida também que o crescimento orgânico, a maturidade
neurológica e fisiológica geral seja um dos determinantes fundamentais do desenvol-
vimento psicológico, mas este não será dado à criança. Ela é quem irá construir seu
crescimento mental. A criança é vista como agente do próprio desenvolvimento. Ela irá
construí-lo a partir de quatro determinantes básicos, já citados anteriormente (matura-
ção, estimulação do ambiente físico, aprendizagem social e tendência ao equilíbrio); e
este processo é observado em todas as crianças. (Rappaport, 1981, p. 64)

Assim sendo, o desenvolvimento avança em determinadas etapas (ou perío-


dos) caracterizadas pelo surgimento de estruturas singulares que formam determi-
nado estado de equilíbrio psíquico. Os períodos de desenvolvimento dependem
dos estágios e das construções antecedentes, porém são distintos. Pode-se dizer
que "o essencial dessas construções sucessivas permanece no decorrer dos estágios ulte-
riores, como subestruturas sobre as quais se edificam as novas características" (Piaget
apud Rappaport, 1981, p. 64).
Um exemplo é o caso do adulto que já atingiu a organização de pensamento
lógico-formal, considerada a forma final de equilíbrio cognitivo. Essa organização
lhe permite pensar de maneira abstrata e lógica em situações hipotéticas. Ele pos-
sui a capacidade de criar teorias científicas, doutrinas filosóficas ou segurar com
a mão objetos que deseja. No primeiro momento, o adulto estará utilizando as
operações lógico-formais, ou seja, uma forma superior de equilíbrio, adquirida
na adolescência, e no segundo momento, um esquema sensorial-motor, aquisição
obtida na primeira infância.

O desenvolvimento inicia-se a partir do equipamento inicial (reflexos inatos) que vão


gradualmente (no primeiro ano de vida) se transformando em esquemas sensoriais
motores rudimentares. Esses esquemas incluem ações motoras explícitas, sendo, por-
tanto, uma forma de inteligência exteriorizada, que irá se modificar, ao longo do tempo,
no sentido de uma interiorização gradual, caminhará para um desligamento progressi-
vo da ação e para a formação de esquemas conceituais que supõem uma ação mental.
(Rappaport, 1981, p. 65)

Por conseguinte, a teoria piagetiana divide o desenvolvimento em:


a) Período sensório-motor: de 0 a 2 anos;
b) Período pré-operatório: de 2 a 7 anos;
c) Período das operações concretas: de 8 a 11 anos;
d) Período das operações formais: de 12 anos em diante.

capítulo 2 • 46
As características básicas de cada período serão abordadas a seguir.

Período sensório-motor (0 a 2 anos)

No início desse período, o bebê tem um equipamento orgânico sem possi-


bilidades de ação voluntária. A base hereditária dota-o de reflexos que possibili-
tam sua sobrevivência. Os movimentos são caracterizados por espasmos corporais
caóticos sem um objetivo claro. Entretanto, esses movimentos caóticos permitem
chamar a atenção do respectivo cuidador, que zelará por suas necessidades básicas,
o que torna possível a continuação de sua sobrevivência.
No início da vida, a criança não consegue diferenciar o mundo interno do
mundo externo. Não há a sensação de limite corporal, mas de que os meios in-
terno (psíquico) e externo (ambiente) estão misturados. As impressões corporais
não são diferenciadas de forma consciente como algo que parte do corpo ou do
exterior. Ou seja, ainda não há uma delimitação egóica ou do “EU”.
Apesar de um início rudimentar de aparelho psíquico que não permite uma
troca complexa com o ambiente, é nesse período que se assiste o nascimento da
inteligência. Nesse momento são construídos os esquemas sensório-motores que
estarão no alicerce de todo e qualquer outro tipo de conhecimento.
A parte sensorial dos esquemas iniciais é produzida com base na entrada da
informação ambiental pelos órgãos sensoriais que, ao chegar ao cérebro, marca as
primeiras impressões sobre o mundo e iniciam a memória. Essa memória ainda
não pode ser evocada de forma consciente, mas sua importância é fundamental,
pois representa o alicerce para a transformação qualitativa dos esquemas e, conse-
quentemente, do pensamento. Piaget (2010) reconhece que,

A esse respeito, nos limitamos a observar que esses reflexos, enquanto estão ligados
às condutas que desempenharão um papel no desenvolvimento psíquico ulterior, (...).
Desde o início, os reflexos da sucção melhoram com o exercício: um recém-nascido
mama melhor depois de uma ou duas semanas que nos primeiros dias. Em seguida, es-
ses reflexos conduzem a discriminação ou reconhecimentos práticos fáceis de serem
notados. Enfim, eles dão lugar, sobretudo, a uma espécie de generalização da atividade
(...) Em suma, assimila uma parte do seu universo à sucção, a ponto que se poderia ex-
primir seu comportamento inicial, dizendo-se que, para ele, o mundo é essencialmente
uma realidade de sugar. (p. 18)

capítulo 2 • 47
Os esquemas motores surgem do reflexo, equipamento básico de sobrevivên-
cia do organismo. A maioria dos atos reflexos serão repetidos exaustivamente até
que o cérebro consiga organizá-los e dominá-los com a finalidade de realizar ações
voluntárias. Esse processo representa gênese da memória de procedimentos.
Os reflexos representam inicialmente, para a teoria piagetiana, o prenúncio da
assimilação mental, [que] vão rapidamente se tornar mais complexos por integração
nos hábitos e percepções organizados, constituindo o ponto de partida de novas condu-
tas, adquiridas com a ajuda da experiência (Piaget, 2010, p.18).
Mesmo com um aparelho psíquico impossibilitado de realizar operações com-
plexas, pode-se dizer que já existe o pensamento no bebê. Não um pensamen-
to racional e temporal como no caso do adulto, todavia esse processo cognitivo
apresenta-se como um mediador prático com relação ao ambiente, vinculado ao
aqui-agora, e permitirá, ao final do estágio sensório-motor, a realização de ações
voluntárias para a resolução de problemas específicos dessa faixa etária.
A conquista de movimentos voluntários, na primeira infância, ocorre sem a
destreza ou a precisão nas ações. Entretanto, ao final dessa etapa, a criança estará
andando/ correndo, segurando o que deseja, subindo e descendo dos lugares. Ou
seja, terá uma percepção melhor do ambiente que a cerca e maior domínio sobre
ele, que exercitará de forma constante para adquirir cada vez mais agilidade na
satisfação de suas necessidades corporais, cognitivas e afetivas.
Outra aquisição psíquica fundamental dessa etapa é a diferenciação cada vez
maior entre o eu interno e o ambiente externo (Bock; Furtado; Teixeira, 1999),
o que propicia o desenvolvimento da noção de permanência do objeto. Isso sig-
nifica o entendimento, pela criança, de que o objeto existe sem estar presente no
mesmo ambiente que ela ou sem que possa vê-lo. Essa habilidade mental é a base
para a construção da própria identidade, visto que a criança consegue perceber sua
existência sem se ver diretamente.
Uma forma de testagem para saber se a criança já obteve a noção de perma-
nência do objeto é apresentar um brinquedo (bola, carrinho ou outro) ao bebê
e depois esconder esse brinquedo na frente dele. Se o bebê ainda não adquiriu
essa competência, ele ficará olhando para o adulto sem saber o que aconteceu.
Na verdade, para a criança, o objeto deixou de existir no momento em que foi
escondido. Caso a criança já tenha adquirido a noção de permanência do objeto,
ela se dirigirá ao local onde o objeto foi oculto e apontará para ele ou irá pegá-lo,
mostrando-o para o adulto.

capítulo 2 • 48
Assim, gradualmente, a criança irá conquistar alguns comportamentos que lhe per-
mitam dar uma organização à realidade pela conquista da permanência substancial
dos quadros sensoriais (que será obtida pela aquisição da noção de permanência dos
objetos em torno dos 9 meses de idade, e que permitirá à criança a concepção de
um mundo estável onde a existência dos objetos é independente de sua percepção
imediata), da construção de um espaço prático (um espaço geral que contém todos
os outros espaços parciais e os objetos neles contidos, bem como sua interrelação e
a percepção de si mesmo como um objeto espacialmente colocado e integrado); da
causalidade (reconhecer as relações de causalidade entre si, objetivando causas para
os acontecimentos) e a objetivação das séries temporais. (Rappaport, 1981, p. 68)

Neste sentido, durante os dois primeiros anos da criança ela passa de um es-
tado de “passividade”25 e submissão ao adulto, para outro de interatividade com
ambiente objetivando conquistá-lo e satisfazer as próprias necessidades, mesmo
que ainda seja de forma rudimentar, haja vista as respectivas possibilidades intelec-
tuais. É neste momento que verificamos o surgimento da inteligência26.
A vinculação entre inteligência e plasticidade remete à possibilidade cada vez
maior e melhor de um indivíduo ao enfrentar uma situação, isto é, quanto mais
plástica for sua cognição (percepção, resolução de problemas, planejamento, entre
outras), maior será sua probabilidade de êxito e, portanto, maior será seu grau de
adaptação psicológica ao meio.
Resumindo, nessa etapa, a criança trabalha ativamente para formar uma no-
ção do eu, que dará sustentação ao seu autoconceito, se distinguir como objeto
dos demais objetos existentes no exterior e de se colocar em relação a eles.
Concluindo: a criança, ao final dessa etapa, deverá ter capacidade de: 1)
apresentar comportamentos intencionais e inteligentes, ou seja, deve ser capaz
de encadear duas, três ou mais ações para chegar a um objetivo; 2) unir e proces-
sar informações obtidas nas várias modalidades sensoriais, tanto do meio externo
como do meio interno; e 3) atuar no meio externo compreendendo-o como um
local permanente.

25  Para Piaget (2010), essa passividade inicial do bebê é relativa, visto que o autor considera que os atos reflexos
já demonstram uma atividade adaptativa de origem genética do organismo.
26  Conforme mencionado anteriormente, a inteligência, na teoria piagetiana, não tem como referência o conteúdo
formal e científico, mas está vinculada à plasticidade e flexibilidade do organismo na resolução de problemas que
se tornarão cada vez mais complexos no decorrer da vida do sujeito. Essa plasticidade não se refere, apenas, às
questões sobre como resolver situações cotidianas, mas também a uma percepção mais abrangente da realidade e
saber lidar com emoções nas relações interpessoais.

capítulo 2 • 49
Período pré-operacional (2-7 anos)

Nessa etapa, ocorre o surgimento da linguagem propriamente dita. O repertó-


rio lexical da criança aumenta significativamente com relação ao período anterior.
Entretanto, a maior parte da linguagem utilizada no início desse período dá-se por
imitação dos adultos de referência. Isso significa que, muitas vezes, a criança repete
as palavras que escuta sem saber direito seu sentido ou como deve utilizá-las.
O desenvolvimento da linguagem ocorre em razão do desenvolvimento neu-
rofisiológico, que acarreta também a precisão cada vez maior dos movimentos e o
desenvolvimento da motricidade fina que acarretará a possibilidade da escrita ao
final do período.
A linguagem permite que a criança transforme os esquemas sensório-moto-
res em representação mental, o que traz um salto qualitativo significativo para o
desenvolvimento da memória, compreensão do mundo e, também, para a socia-
lização cada vez maior.
Com a capacidade de formar representações mentais, a criança inicia o pro-
cesso de rompimento com o tempo e espaço do aqui-agora. Ou seja, ela consegue
evocar objetos que não estão presentes, além de entrar no jogo simbólico de utili-
zação de coisas e palavras como signos27 que representam outras coisas ou palavras.

Ao se aproximar dos 24 meses a criança está desenvolvendo ativamente a linguagem


o que dará possibilidades de, além de se utilizar da inteligência prática decorrente de
esquemas sensoriais-motores formados na fase anterior, iniciar a capacidade de repre-
sentar uma coisa pela outra, ou seja, formar esquemas simbólicos. Isto será conseguido
tanto a partir do uso de um objeto como se fosse outro (quando por exemplo, uma caixa
de fósforos pode se transformar num carrinho para brincar), de uma situação por outra
(na brincadeira de casinha a criança estará representando situações da vida diária) ou
ainda de um objeto, pessoa ou situação por uma palavra. (Rappaport, 1981, p. 68)

A brincadeira de faz-de-conta é um importante instrumento da criança por-


que a faz incorporar o mundo e dar sentido a realidade, compreendê-la, além de
exercitar as formas de lidar com os desafios do dia a dia. Brincar que está no lugar
de outra pessoa, como a mãe, o pai, a professora, o artista, o cantor, o médico,
entre outros, é uma forma da criança introjetar valores, exercitar comportamentos,
entender o cotidiano.
27  Um signo pode ser entendido como algo que representa aquilo que ele (signo) não é. Por exemplo, a palavra
GATO pode representar o animal gato ou ser utilizado para falar de formas de furtar eletricidade ou outros bens não
materiais de outros sujeitos, como gato-net ou gato-elétrico.

capítulo 2 • 50
Cabe ressaltar que, nesse período, o pensamento da criança ainda não possui
compatibilidade com o pensamento do adulto, haja vista que sua organização
ainda é bem diferente. Esse tópico é de grande relevância para o entendimento de
adultos que lidam com crianças, porque há uma importante tendência do adul-
to em julgar as crianças como se elas tivessem pensamentos semelhantes aos de
adultos. Neste sentido, age-se como se a criança entendesse a totalidade das conse-
quências de suas falas e ações. Entretanto, o pensamento e a afetividade da criança
ainda não são maduros para a compreensão total das consequências de suas ações.
Apesar da aquisição da linguagem viabilizar um salto qualitativo importante
na relação da criança com o mundo, a transformação de sua organização de pen-
samento e de sua visão de mundo ocorre de forma lenta e gradual.
A criança dessa fase apresenta um pensamento e comportamento egocêntri-
cos, ou seja, centrado no próprio ego. Destaca-se que egocentrismo não significa
egoísmo. O egocentrismo marca uma etapa em que a criança enxerga o mundo
a partir de sua própria ótica, ou seja, possui dificuldade de entender como suas
ações afetam outras pessoas. Então, se ela deseja algo, não pensará se outro amigo
também precisa, porque o fato de o amigo precisar também do brinquedo ou do
lápis não está em seu campo de entendimento. Inclusive, se algum adulto interfere
autoritariamente, negando aquilo que ela (criança) afirma necessitar, e impõe uma
colaboração ou divisão forçada, a criança pode se sentir melindrada e injustiçada.
Neste sentido, é importante que o adulto tenha cuidado, empatia e compreensão
sobre como a criança pode estar se sentindo para conseguir contornar a situação
conflituosa sem propiciar questões que poderão interferir negativamente no auto-
conceito da criança.

O egocentrismo caracteriza-se, basicamente, por uma visão da realidade que parte do


próprio eu, isto é, a criança não concebe um mundo, uma situação da qual não faça
parte, confunde-se com objetos e pessoas, no sentido de atribuir a eles seus próprios
pensamentos, sentimentos, etc. (Rappaport, 1981, p. 68-69)

Uma consequência do egocentrismo é o pensamento animístico, com que a


criança entenderá coisas, objetos, animais, plantas, brinquedos. Por exemplo, a Lua
“vai para casa” quando Sol “acorda”; os bonecos e bonecas “aprendem” como as
crianças na escola; os animais “falam” como pessoas; os brinquedos “possuem senti-
mentos”. Esse processo significa atribuir características humanas a coisas não huma-
nas. Segundo Rappaport (1981): Este egocentrismo é tão marcante que se manifestará

capítulo 2 • 51
em todas as áreas de atuação da criança, ou seja, intelectual, social de linguagem. Daí
a riqueza fantástica da argumentação da criança, em que fadas-madrinhas, super-
-homens e outros personagens desse tipo convivem tranquilamente com homens
comuns e, mesmo com a rotina da vida diária, sem entrar em choque.
A própria questão moral na criança também é afetada. Segundo a teoria pia-
getiana, a moral desse período é heterônoma, ou seja, parte de fora (das figuras de
referência) para dentro (da criança), o que faz com que ela tenha uma relação de
amor e temor com essas pessoas (pai, mãe, professor etc.)

No aspecto afetivo, surgem sentimentos interindividuais, sendo um dos mais relevan-


tes o respeito que a criança nutre pelos indivíduos que julga superiores a ela. Por exem-
plo, em relação aos pais, aos professores, é um misto de amor e temor. Seus sentimentos
morais refletem essa relação com adultos significativos – a moral da obediência –, em
que critério de bem e mal é a vontade dos adultos. (Bock; Furtado; Teixeira, 1999, p. 102)

Algumas provas piagetianas para verificação desse egocentrismo serão comen-


tadas a seguir. É claro que quanto mais estimulante for o ambiente e quanto mais
perto do período a criança estiver, mais socializada e menos egocêntrica ela ten-
derá a ser.

PRIMEIRA PROVA: TESTAGEM DE QUANTIDADE


Duas fileiras de cinco fichas, emparelhadas uma a uma, um
embaixo da outra. Pergunta-se à criança de 5 anos se as filei-
1O MOMENTO ras são iguais, se possuem a mesma quantidade de fichas. A
criança possivelmente responderá que sim.

Mantém-se as posições das cinco fichas na primeira fileira e


desloca-se uma das fichas da segunda fileira para mais adian-
te, porém na mesma linha. Pergunta-se novamente à crian-
2O MOMENTO ça de 5 anos se as fileiras são iguais, se possuem a mesma
quantidade de fichas. A criança possivelmente responderá que
a primeira (ou a que está acima) tem mais fichas do que a
segunda.

capítulo 2 • 52
SEGUNDA PROVA: TESTAGEM DE CONSERVAÇÃO DE VOLUME
Apresentam-se dois copos de formatos diferentes para a
criança, um fino e alto e um largo e baixo, porém que pos-
1O MOMENTO suem o mesmo volume. Enche-se o copo baixo e largo com
uma quantidade de líquido.

Pega-se o copo largo e baixo e despeja-se, na frente da


criança, o líquido do primeiro copo no copo fino e alto. Em
seguida, pergunta-se se os copos possuem a mesma quan-
tidade de líquido. Possivelmente a criança responderá que o
2O MOMENTO copo alto e fino possui mais líquido do que o primeiro, baixo
e largo. Isso ocorre porque a criança apresenta egocentris-
mo intelectual, ou seja, permanece vinculada ao aqui-agora
sem ter a noção de reversibilidade do objeto.

Resumindo, nessa etapa, para a criança os acontecimentos fundamentais são:


1. Surgimento da linguagem;
2. Possibilidade de representar simbolicamente os esquemas sensório-motores;
3. Relação com o mundo caracterizada pelo egocentrismo.

Entretanto, pode-se dizer que a criança estará cada vez mais se desligando da
família em direção à socialização. Apesar do interesse por outras crianças, por cau-
sa do egocentrismo dessa fase, a interação caracteriza-se muito mais por um brin-
car “junto” separadamente do que por um brincar em conjunto e se relacionando.
Entretanto, os adultos de referência ainda permanecem como seu porto seguro e
referência de regras e valores.

Período de operações concretas (7 a 11 anos)

Neste período, ocorre a escolarização formal da criança, onde ela inicia a eta-
pa de aquisição da leitura e da escrita e das operações básicas da Matemática. Os
processos mentais estarão evoluindo continuamente e começará a saída do ego-
centrismo para um pensamento de base mais racional e lógica.
O declínio do egocentrismo possibilita grandes conquistas intelectuais, com
a formação de esquemas, de fato, conceituais e uma compreensão da realidade
mais racional e não animista ou fantasiosa, o que faz com que a criança não tolere
contradições em seu pensamento.

capítulo 2 • 53
A criança terá um conhecimento real, correto e adequado de objetos e situações da
realidade externa (esquemas conceituais) e poderá trabalhar com eles de modo lógico.
Assim, a tendência lúdica do pensamento, típica da idade anterior, quando o real e o
fantástico se misturavam nas explicações fornecidas pela criança, será substituída por
uma atitude crítica, A criança não irá mais tolerar contradições no seu pensamento, ou
entre o pensamento e a ação como antes, mas sim, irá sentir necessidade de explicar
logicamente suas ideias e ações. (Rappaport, 1981, p. 72)

Outra habilidade adquirida com o desenvolvimento é a internalização das


ações físicas, ou seja, a criança consegue planejar ou comparar mentalmente (cál-
culo mental) uma relação entre objetos sem ter que as testar concretamente. Por
exemplo, se oferecermos a criança pré-operacional uma série de varetas diferentes
para serem ordenadas por altura, a criança irá tomar duas a duas, para realizar
comparações e, em seguida, completar o exercício (Rappaport, 1981). A criança
da etapa operacional pode realizar as comparações mentalmente, sem a necessida-
de de agrupar as varetas e verificar seus tamanhos na realidade externa. Ou seja, a
criança operatória conseguiu internalizar a ação.
Outra relação importante que essa etapa já permite é a reversibilidade do
objeto, conquistada com a saída do egocentrismo. A reversibilidade será uma no-
ção utilizada tanto na linguagem como nas operações lógicas: na conservação de
massa, volume e tamanho, mesmo que figuras e objetos se apresentem de forma
diferente. A reversibilidade ocorre também nas relações interpessoais, nos senti-
mentos e valores. A criança operatória inicia sua entrada na empatia ao sair do
egocentrismo. Consegue entender que as regras são para todos e compreende que
pessoas diferentes possuem sentimentos diferentes relacionados a um fato comum.
Um exemplo claro da reversibilidade adquirida pela criança pode ser verifi-
cado por meio de um simples problema de raciocínio de lógica matemática: se
traçarmos uma reta do Rio até São Paulo teremos 300 km. Qual é a distância de
São Paulo até o Rio voltando por essa mesma reta. A criança pré-operacional não
saberá responder, mas aquela que já conquistou a noção de reversibilidade, enten-
derá que o retorno é de 300 km também.

O que possibilitará isto, no plano intelectual, é o surgimento de uma nova capacidade


mental da criança: as operações, isto é, ela consegue realizar uma operação física
ou mental dirigida para um fim (objetivo) e revertê-la para o seu início. (Bock; Furtado;
Teixeira, 1999, p. 104)

capítulo 2 • 54
Na questão da ética, a reversibilidade permite que a criança entenda que as re-
gras e os valores são para todos e é necessário refletir antes de agir, porque tudo pos-
sui uma consequência boa ou má, que vai depender do objetivo da ação. No campo
social, a criança consegue perceber e legitimar que outras pessoas podem sentir e
pensar de forma diferente e consegue relacionar vários pontos de vista diferentes.

A criança adquire uma autonomia crescente em relação ao adulto, passando a orga-


nizar os próprios valores morais. Os novos sentimentos morais, característicos desse
período, são: o respeito mútuo, a honestidade, o companheirismo e a justiça, que con-
sidera a intenção na ação. (Bock; Furtado; Teixeira, 1999, p. 104)

Outra característica importante é que as novas habilidades da criança estarão


relacionadas a seu mundo concreto. Ela ainda precisará do suporte do real para a
realização das operações, tanto que, no início do período, a aquisição da leitura e
da escrita, ou mesmo das operações matemáticas, é realizada com base em elemen-
tos concretos do mundo do sujeito. Na leitura, utilizam-se personagens de que
as crianças gostam e que fazem parte de sua geração; na Matemática, utilizam-se
pedaços de pizza ou chocolate para exemplificar a operação de divisão e fração.
Resumindo, nessa etapa, a criança desenvolve, com o pensamento, as capaci-
dades de: entender relações causais ou de meio e fim; ordenar ou sequenciar even-
tos ou ideias; ponderar ideias sob pontos de vista diferentes de forma simultânea;
entender o conceito de número, que, no início, estará vinculado ao objeto con-
creto, mas, no final, a ideia de valor ganhará contornos abstratos e qualitativos28.

Período das operações formais (12 anos em diante)

Este período representa a conquista do equilíbrio superior da organização de


pensamento do sujeito. O pensamento formal vai acompanhá-lo para o resto da
vida. A grande diferença que ocorre entre as fases atual e anterior é que, na etapa
das operações concretas, a criança necessita ainda de um suporte real para a reali-
zação das operações. Nesse período, o descolamento pode ser total, ou seja, o ado-
lescente possui a capacidade de construir teorias filosóficas, políticas e científicas,
visto que seu pensamento consegue extrapolar o momento e o tempo presente.
28  Exemplo: na criança pré-operacional, se forem apresentada 5 moedas de 1 centavo e 1 moeda de 1 real, ela
não terá a noção de valor e, portanto, se for questionado onde tem mais dinheiro, ela responderá que nas 5 moedas
de 1 centavo. Com a noção de valor, a criança operatória consegue identificar que, mesmo a quantidade de moedas
sendo menor, o valor maior é da moeda de 1 real e não das 5 moedas de 1 centavo.

capítulo 2 • 55
Começam a pautar seu pensamento as questões filosóficas sobre a vida, como
porque vivemos e morremos, qual a finalidade da vida, além de conceitos abstra-
tos, como amor, beleza, democracia, justiça, entre outros; (...) adquire capacidade
para criticar os sistemas sociais e propor novos códigos de conduta; discute os valo-
res morais de seus pais e constrói os seus próprios (adquirindo, portanto, autonomia)
(Rappaport, 1981, p. 74).
Nessa etapa, o jovem possui a capacidade de construir argumentação para de-
fender suas ideias, (...) torna-se consciente de seu próprio pensamento, refletindo sobre
ele a fim de oferecer justificações lógicas para os julgamentos que faz; lida com relações
entre relações etc. (Rappaport, 1981, p. 74).
A contestação de ideias consideradas antiquadas, como o ponto de vista dos
pais ou de outros adultos, também é uma característica marcante desse momento.
Ao mesmo tempo que o adolescente tende a se afastar dos pais, recorre a uma
aproximação do grupo de amigos, com o objetivo de ancorar o sentimento de per-
tença e afiliação. Esse movimento é importante porque permite ao jovem adquirir
cada vez mais autonomia em seu comportamento e em seu pensamento, além de
contribuir para a construção de sua identidade de adulto.
Na perspectiva piagetiana, pode-se dizer que, quando se adquire as capacida-
des mencionadas acima, o indivíduo atingiu sua forma final de equilíbrio e, nesse
sentido, completou seu desenvolvimento cognitivo ou sua organização do pensa-
mento (Rappaport, 1981).

ATIVIDADES
01. Jean Piaget foi um biólogo suíço que adentrou o campo psicológico com o objetivo de
entender “como o homem constrói o conhecimento”. Diante dessa afirmação pode-se dizer:
a) O interesse do autor era entender como a inteligência era construída pautada nos con-
teúdos científicos da época.
b) O autor entendia que, somente através da construção do conhecimento, o ser humano
poderia se adaptar ao ambiente que o cerca.
c) Desejava comparar as mentes dos animais inferiores e às dos seres humanos.
d) O autor reconhece que o aspecto principal na construção cognitiva é o meio, conside-
rando que o ser humano é passivo, pois somente recebe as informações que armazena
como um reflexo do meio na mente.
e) Destacava o crescimento orgânico como aspecto principal para o desenvolvimen-
to humano.

capítulo 2 • 56
02. Sobre o processo de equilibração, pode-se dizer que:
a) Tem como resultado, necessariamente, a construção de novos esquemas.
b) Funciona por meio dos processos de adaptação e assimilação.
c) Corresponde ao que Piaget denomina de desenvolvimento cognitivo, partindo de estru-
turas de pensamento de menor equilíbrio para estruturas de maior equilíbrio.
d) Refere-se ao processo de construção da inteligência regulada pela acumulação de con-
teúdos formais.
e) Resulta na construção da memória que funciona como um espelho, ou seja, possui inte-
riorizado um reflexo da realidade externa.

03. Uma criança que ainda compreende o mundo de forma anímica e fantasiosa, em que
os bichos de pelúcia têm sentimentos e necessidades humanas, ficando cansados, tristes e
felizes; uma vaca pode ser irmã de um frango numa família adotada com pais humanos, está
em que período de desenvolvimento cognitivo?
a) Sensório-motor
b) Pré-operatório
c) Operatório-concreto
d) Operações formais
e) Nenhuma das respostas acima

04. Um adulto de 30 anos que está iniciando seu letramento nesta etapa da vida e ainda
necessita utilizar objetos concretos, como varetas ou os próprios dedos para fazer operações
matemáticas básicas, como adição e subtração, está utilizando mecanismos de que etapa do
desenvolvimento cognitivo?
a) Sensório-motor
b) Pré-operatório
c) Operatório-concreto
d) Operações formais
e) Nenhuma das respostas acima

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BOCK, A. M. B.; FURTADO, O.; TEIXEIRA, M. L. T. Psicologias – uma introdução ao estudo de
Psicologia. 13. ed. Rio de Janeiro: Editora Saraiva, 1999.
PIAGET, J. Seis estudos de Psicologia. 24. ed. Revista. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2010.

capítulo 2 • 57
RAPPAPORT, C. R.; FIORI, W. R.; DAVIS, C. Teorias do Desenvolvimento: conceitos fundamentais.
Volume 1. São Paulo: EPU, 1981.
LA TAILLE, Y.; OLIVEIRA, M. K; DANTAS, H. Piaget, Vygostky e Wallon – Teorias psicogenéticas em
discussão. São Paulo: Summus, 1992.

capítulo 2 • 58
3
A Psicologia
Cognitiva e seus
objetos de estudo
A Psicologia Cognitiva e seus objetos de
estudo

Neste capítulo, abordaremos como a Psicologia Cognitiva surgiu no campo


psicológico dos Estados Unidos, no século XX. Naquele momento, a grande ênfa-
se nas Teorias Behavioristas e na Psicanálise deixava poucas opções para os profis-
sionais que não se identificavam com essas abordagens.
O Behaviorismo, com sua ênfase na análise comportamental e argumentação
sobre a falta de objetividade e cientificidade nos estudos de conceitos mentalistas,
e a Psicanálise, centrada nos processos inconscientes, geraram críticas por parte
dos teóricos que desejavam retomar os estudos sobre os aspectos da consciência,
sobre os processos de construção do conhecimento e a ideia de que o homem é
ativo em seu projeto de existência.
O zeitgeist, ou clima científico da época, também estava muito propício para
o surgimento de uma teoria psicológica sobre como as pessoas constroem seu
conhecimento acerca da realidade e como esse conhecimento afeta seu comporta-
mento. Além dos estudos dentro da própria Psicologia sobre memória, sensação
e percepção, linguagem, pensamento, desenvolvimento e as pesquisas vinculando
os processos cognitivos com a neuroanatomia e neurofisiologia, outras áreas se
atentavam para a produção de teorias do conhecimento utilizando o paradigma
“mente como máquina” ou “máquina como mente”, como a Inteligência Artificial
e a construção dos computadores, por exemplo. É neste período que surge, oficial-
mente, a Psicologia Cognitiva como escola de pensamento.

OBJETIVOS
•  Apresentar o surgimento da Psicologia Cognitiva e seu contexto;
•  Expor os objetos de estudo da Psicologia Cognitiva;
•  Explicitar os processos cognitivos fundamentais para a construção de uma teoria do co-
nhecimento humano, como: memória, linguagem, sensação e percepção; atenção; pensa-
mento e resolução de problemas.

capítulo 3 • 60
O surgimento da Psicologia Cognitiva, seu contexto e objeto de
estudos

Desde o seu início como área científica, os especialistas interessados pelo


campo da Psicologia demandaram o estudo e a compreensão sobre as bases e o
funcionamento da mente, além de tentar entender o que era a consciência e seus
processos. Mesmo durante o Behaviorismo, que descartava os conceitos menta-
listas enfatizados pelas primeiras escolas psicológicas, como o Estruturalismo e
o Funcionalismo, o estudo da vida mental, com especial interesse pela memória,
percepção, atenção e linguagem, continuava por especialistas que não concorda-
vam com o Behaviorismo de Watson.

Nas décadas de 1920, 1930, e 1940, as páginas das principais publicações especia-
lizadas ainda continham diversos artigos sobre a pesquisa cognitiva de tópicos como
a memória, a atenção, a percepção, a linguagem e o pensamento, entre os quais se
destaca o famoso estudo dobre o “efeito stroop” (...) Além disso, surgiram livros so-
bre temas cognitivos no apogeu do Behaviorismo, inclusive um que tinha o título de
Cognitive Psychology, “Psicologia Cognitiva” (Moore, 1939). Embora seu tratamento da
cognição fosse mais uma revisão dos primeiros anos do século que o apelo por uma
nova abordagem (Knap, 1985), o livro abordava muitos dos tópicos que seriam trata-
dos pelos psicólogos cognitivos duas décadas depois. E, no front teórico, os gestaltis-
tas promoveram o estudo da cognição e discussões com os behavioristas ao longo de
1930 e 1940. (GOODWIN, 2005, p. 476)

No que se refere aos estudos sobre memória, o psicólogo inglês Frederick


Bartlett (1886-1969) surge questionando a teoria tradicional de Hermann
Ebbinghaus e sua pesquisa sobre a memorização de estímulos artificiais (grupos
de sílabas sem sentido), base de sua hipótese sobre a memória por associação
(GOODWIN, 2005, P. 477).
Bartlett acreditava que a memória era construída de forma ativa e organizada
em uma totalidade coerente e de acordo com o contexto da pessoa, processo que
nomeou de esquema. Propôs que o estudo do processo mnemônico deveria ser
feito por meio do contexto de situações realistas do cotidiano da pessoa.

capítulo 3 • 61
Bartlett inicia o livro sobre a memória questionando a pesquisa de Ebbinghaus, basea-
da nos efeitos da repetição por memorização de estímulos altamente artificiais – as
famosas sílabas sem sentido –, e sua base teórica associacionista. Ele propõe que, em
vez disso, a pesquisa sobre a memória se voltasse mais para os atributos da pessoa
que memoriza e menos para a natureza dos materiais de estímulo, e que a memória
fosse entendida no contexto de situações realistas, pelo uso de materiais do dia a dia,
e não de artificiais sílabas sem sentido. Além disso, ele achava que, em vez de acumular
passivamente força associativa em decorrência da prática e da repetição, a pessoa que
memoriza organiza ativamente o material em todos coerentes, aos quais se referiu
usando a palavra esquemas. (GOODWIN, 2005, p. 477)

Além das influências internas da Psicologia, como os estudos sobre os proces-


sos mnemônicos e de outras escolas psicológicas conforme explicitados no capítu-
lo I, e das críticas ao modelo Behaviorista, a Psicologia Cognitiva contemporânea
também contou com influências externas significativas.
O próprio clima científico dentro da Física, questionando o modelo mecani-
cista e consolidando a concepção de que o observador influencia o fenômeno e,
portanto, a de que a neutralidade na observação é intangível, traz uma perspec-
tiva diferenciada para a construção do conhecimento científico. A partir desse
momento, torna-se vital a experiência consciente para se obterem as informações
sobre o fenômeno (SCHULTZ & SCHULTZ, 2005, p. 428).

No início do século XX, surge uma visão desenvolvida a partir de trabalhos de Albert
Enstein, Neils Bohr e Werner Heinsenberg. Eles rejeitavam o modelo mecanicista do
Universo, originário da época de Galileu e Newton e protótipo para a visão mecanicis-
ta, reducionista e determinista da natureza humana adotada pelos psicólogos desde
Wundt até Skinner. A nova perspectiva da Física descartava a necessidade de total
objetividade e a completa separação entre o universo externo e o observador.
Os físicos reconheciam a provável interferência de qualquer tipo de observação feita
sobre o universo natural. (...) Desse modo, a investigação científica passou do universo
independente identificável objetivamente para a observação do universo pelo indivíduo.
(SCHULTZ & SCHULTZ, 2005, p. 429)

Neste sentido, o relógio deixa de ser a comparação por excelência da máquina


que serve como analogia ao funcionamento do corpo humano e da mente, e surge
a metáfora do computador. A partir da invenção do computador por Alan Turing
em razão de necessidades militares na década de 1940, é iniciada a comparação
entre essa máquina, a mente humana, seu funcionamento e sua organização. O

capítulo 3 • 62
computador é um aparelho onde entram informações externas que são codificadas
e transformadas em output. Neste sentido, pode-se dizer que o funcionamento
neurológico ocorre da mesma forma (GODWIN, 2005, p. 484).

Os psicólogos tomavam como base as operações do computador para explicar o


fenômeno cognitivo. Dizem que os computadores exibem uma inteligência artificial
e normalmente são descritos em termos humanos. A capacidade de armazenagem
chama-se memória; os códigos de programação, a linguagem, as novas gerações de
computadores, as evoluções.
O funcionamento dos programas de computador, basicamente formados de conjuntos
de instruções para o tratamento de símbolos, é semelhante ao da mente humana. Tan-
to o computador como a mente recebem do ambiente e processam grande quantidade
de informações (estímulos sensoriais ou dados). Ambos compilam essas informações,
manipulando, armazenando e recuperando os dados, atuando de várias maneiras.
(SCHULTZ & SCHULTZ, 2005, p. 434)

Em 1948, um matemático chamado John von Neuman, na palestra de aber-


tura do Hixon Symposium, utiliza jargões da ciência da computação para explicar
fenômenos cognitivos. Segundo GODWIN, 2005, a analogia apareceu algumas
vezes nos anos 1950 até que, na década de 1960, a descrição de fenômenos cognitivos
em jargão da área da computação e a apresentação de modelos cognitivos como organo-
gramas tornaram-se lugar-comum. (p. 484). Os modelos de memória dos manuais
de Psicologia naquele momento expressam exatamente a questão. A teoria sobre a
memória de Atkinson e Shiffrin, na década de 1960, ilustra este processo através
de um organograma composto por receptáculos de entrada de informações sen-
soriais que são codificados e transferidos para a memória de curto prazo (MCP)
e, posteriormente, para a memória de longo prazo (MLP). Neste modelo, a me-
mória de curto prazo seria análoga à memória RAM (Random Access Memory),
e a memória de longo prazo seria a memória permanente. Esse processo pode ser
entendido como o Input (entrada) da informação. Para a lembrança, ocorria o
processo inverso, ou a recuperação da informação na memória de longo prazo e a
saída, ou Output pela memória de curto prazo. (GODWIN, 2005)
Além do computador tomado como paradigma para entendimento da mente
humana, o contrário também começou a ser especulado: será que o computador
conseguiria realizar de forma autônoma processos cognitivos tão complexos como
a mente humana e, quem sabe, suplantá-la? Surge a perspectiva da inteligência
artificial o IA.

capítulo 3 • 63
No início, os cientistas da computação e os psicólogos cognitivo acolheram com gran-
de entusiasmo a noção da inteligência artificial. (...)
Em 1950, o gênio da computação Alan Turing (1912-1954) propôs uma maneira de
verificar a hipótese de que o computador seria capaz de pensar. Chamado Teste de Tu-
ring, o processo consistia em convencer o indivíduo de que um computador com o qual
estava se comunicando era realmente uma pessoa, e não uma máquina. Se o indivíduo
não conseguisse distinguir entre as respostas do computador e as humanas, a má-
quina estaria exibindo inteligência semelhante à do homem. (SCHULTZ & SCHULTZ,
2005, p. 435-p.436))

Outra mudança paradigmática e que coloca em cheque o paradigma expe-


rimental dos behavioristas e da aprendizagem por associação surge por meio de
Noam Chomsky e a linguística. Para ele,

A aquisição da linguagem se processava rápido demais para que o condicionamento


tivesse importância. Mesmo que aprendêssemos uma sentença por segundo, não ha-
veria nem em uma vida inteira segundos suficientes para aprendizagem de todas as
sentenças que podemos produzir. (GODWIN, 2005, p. 485)

Ou seja, diante da complexidade e da rapidez da aquisição da língua pelas


crianças, a explicação behaviorista com a utilização de condicionamento clássi-
co ou operante para a aprendizagem da fala torna-se inviabilizada. A linguagem,
então, deixa de ser vista como comportamento verbal e passa a ser compreendida
como estrutura, com um conjunto de regras que permite ao indivíduo a produção
de um número infinito de expressões e ideias e organização do pensamento. Para
Chomsky, a capacidade de aprendizagem e utilização da linguagem era notada-
mente uma característica humana que diferencia a espécie de outros animais. E,
ainda, que existiriam universais da linguagem em todos os idiomas, os quais so-
mente o cérebro humano é capaz de compreender (GODWIN, 2005).
Diante desse cenário de desenvolvimento tecnológico e contínua necessidade
sobre o entendimento relacionado à mente humana e ao processamento cognitivo,
duas figuras de destaque, reconhecidos como “pais” da Psicologia Cognitiva con-
temporânea, foram Ulric Neisser e George Miller.
George Miller torna-se importante para a consolidação da Psicologia Cognitiva
a partir de seu interesse pela teoria da informação e dos modelos mentais baseados

capítulo 3 • 64
na metáfora computacional. Segundo SCHULTZ & SCHULTZ (2005), Em tor-
no da década de 1950, após investigar a teoria estatística da aprendizagem, a teoria da
informação e os modelos de mente baseados no computador, Miller chegou à conclusão
de que o behaviorismo, literalmente, não iria “funcionar” (p. 431).
Em 1956, George Miller divulga o artigo “O mágico número sete, mais ou
menos dois: alguns limites da nossa capacidade de processamento da informação”,
onde expõe pesquisa sobre a capacidade média consciente de lembrança de sete
pedaços de informação, podendo ser números, cores ou palavras. O impacto da
descoberta foi a de trazer para o centro das atenções acadêmicas o processamento
consciente num contexto de hegemonia behaviorista.
Na década de 1960, Miller inaugura o Centro de estudos Cognitivos, com
Jerome Brunner, vinculado à Universidade de Harvard, cujo objeto de estudos
foi denominado de cognição. O desejo era delimitar um objeto que marcasse
a diferença com a Psicologia da época e, mesmo sem conseguir conceituar de
maneira adequada, naquele momento, o que era a cognição, este foi o termo
escolhido para designação dos processos mentais a serem estudados (SCHULTZ
& SCHULTZ, 2005, p. 433).
Ulrich Neisser frequentou as aulas de George Miller, o que despertou seu in-
teresse pela Psicologia Cognitiva e o fez largar o estudo da Física e ir para o curso
de Psicologia. Apesar de também considerar difícil tentar outra vertente dentro da
Psicologia que não fosse a behaviorista, teve contato com Wolfgang Köller, psicó-
logo da Gestalt, que o orientou para sua dissertação de mestrado, e com Abraham
Maslow, que foi seu diretor acadêmico quando assumiu a posição de professor na
Brandeis University (SCHULTZ & SCHULTZ, 2005).
Em 1967, Neisser publica sua obra Cognitive psychology, na qual expõe suas
ideias sobre como deveria ser tratada a Psicologia. O trabalho também foi um mar-
co divisório na história da Psicologia, uma tentativa de definir um novo tratamento
para a disciplina. A obra tornou-se extremamente conhecida, e Neisser sentia-se cons-
trangido por ser identificado como o “pai” da Psicologia Cognitiva (SCHULTZ &
SCHULTZ, 2005, p. 433).
Para ele, a cognição deveria ser definida como a informação sensorial que
é recebida, transformada, codificada, reduzida, elaborada, armazenada e recupe-
rada, ou seja, a cognição está em tudo o que o ser humano consegue realizar
(SCHULTZ & SCHULTZ, 2005).

capítulo 3 • 65
Os processos cognitivos

Os processos de sensação e percepção

Desde o surgimento da Psicologia como ciência, com W. Wundt em 1879, os


processos de sensação e percepção permanecem de fundamental importância para a
construção da mente humana. O próprio conceito de LIMIAR, que, com sua ma-
tematização, permitiu a entrada da Psicologia no paradigma científico, está relacio-
nado ao processo sensorial que, na época de Wundt, era denominada de experiência
mediata, relativo à entrada de estímulo no organismo através dos órgãos sensoriais.
Wundt também se interessava pela experiência imediata, ou elaboração inter-
pretativa do estímulo que entrara no organismo. Para o criador da Psicologia, a
experiência mediata e a experiência imediata configuravam as bases da vida men-
tal. Ele acrescentou o processo de Apercepção para explicar a formação da mente,
que considerava ser mais do que a soma dos processos mediatos e imediatos. O
processo de Apercepção consistia na construção ativa da consciência por meio de
uma faculdade organizadora já presente na mente.
Sensação e percepção são processos cognitivos contínuos e necessários para a
atribuição de sentido ao mundo e à realidade. Enquanto a sensação está vinculada a
fisiologia do organismo, a percepção possui a função de dar sentido ao que se sente.
A partir dos processos de sensação e percepção, é possível a criação dos esque-
mas que organizam o pensamento e a memória e permitem a construção pelas pes-
soas das representações que embasam a consciência de si e do mundo, viabilizando
sua ação sobre a realidade.
A cada momento o ser humano é envolvido por uma série de estimulações
do ambiente que entram no organismo pelos órgãos dos sentidos, como a visão,
a audição, o olfato, o tato, o paladar. Além da estimulação externa, o organismo
conta com a estimulação interna, ou propriocepção, que comporta o processa-
mento cerebral sobre as articulações e a musculatura, viabilizando o equilíbrio e a
consciência corporal.
Todo o processo de sensação, tanto de estimulações externas quanto de esti-
mulações internas que ocorrem através das terminações nervosas do organismo,
oportuniza o mapeamento do corpo e do ambiente pelo cérebro, formando uma
espécie de holograma, ou representação mental do corpo no ambiente, que pro-
picia a origem de esquemas fisiológicos básicos para a sobrevivência. Como exem-
plo, temos os esquemas das necessidades mais básicas, como fome, sede, sono,

capítulo 3 • 66
dor e outros, que pautam representações sobre o mundo mais complexas, como o
autoconceito, as emoções, os sentimentos, a compreensão de constructos abstratos
como amor, justiça, beleza etc. Neste sentido, os processos de sensação e percepção
estão na base da produção de todas as representações mentais (ou conhecimento)
que o ser humano possui a respeito do mundo e de si mesmo.
Na estruturação do conhecimento sobre o mundo por meio dos processos de
sensação e percepção, ocorrem os processamentos top-down (de cima para baixo)
e bottom-up (de baixo para cima). O processamento bottom-up acontece quando
os receptores sensoriais são estimulados e a informação “sobe” até o cérebro para a
integração das informações recebidas.
No cérebro, ocorre a codificação, a organização e a interpretação da estimu-
lação sensorial por meio de todas as memórias já constantes no repertório mental
existente, segundo nossas experiências e expectativas sobre o ambiente. Esse se-
gundo processo é entendido como processamento top-down.
Todo o processo sensorial e perceptivo é alicerçado nos limiares das pessoas.
O conceito de limiar refere-se à quantidade mínima de estímulo para que este seja
percebido e processado pelo indivíduo.

ATENÇÃO
O limiar é uma variável orgânica que é diferente entre as pessoas e as espécies e passí-
vel de mudança de um momento para o outro no mesmo indivíduo, dependendo da situação
em que este se encontra. Por exemplo, o limiar sonoro para escutar um apito de cachorro: os
humanos não escutam, e os cachorros sim; o limiar para a dor: existem pessoas que são mais
resistentes à dor do que outras.

Outra questão relevante para o entendimento dos limiares é a possibilidade do


organismo de detectar sinais. Detectar um estímulo fraco, ou sinal, depende não ape-
nas de sua intensidade (como o tom do teste de audição), mas também de nosso estado
psicológico – nossa experiência, expectativas, motivação e vigilância (MYERS, 2012,
p. 175). Ou seja, dependendo do estado emocional, fisiológico (cansaço, doença,
atenção alterada), o limiar aumenta ou diminui.
Entretanto, como o ser humano está em constante estimulação sensorial, que
parte do ambiente e de dentro do organismo, é importante que haja um filtro que
possibilite a interrupção ou diminuição da sensação para estímulos que não são

capítulo 3 • 67
importantes. Esse processo se denomina adaptação sensorial. A adaptação sen-
sorial possui a função de diminuir o foco de atenção para estímulos que não são
vitais para a sobrevivência do organismo.

Embora a adaptação sensorial reduza a nossa sensibilidade, ela oferece uma impor-
tante vantagem: liberdade para focar mudanças informativas no ambiente sem sermos
distraídos pelo constante burburinho da estimulação de segundo plano, que não traz
informações. Nossos receptores sensoriais estão abertos alertas à novidade; deixe-os
entediados com repetições e eles liberarão nossa atenção para coisas mais impor-
tantes. (...) Isso reforça uma lição fundamental: percebemos o mundo não exatamente
como ele é, mas como é útil para nós percebê-lo. (MYERS, 2015, p. 178)

Neste sentido, é importante ressaltar que as representações mentais não são


um espelho da realidade (ou reflexo da realidade na mente), mas que são trans-
formadas ativamente, tanto pela interferência de novas estimulações quando o es-
tímulo inicial está sendo codificado, quanto pelo repertório de esquemas mentais
já existentes no organismo.

Organização perceptiva

A partir da noção de que a mente não é um simples combinado, ou somatório,


de todas as estimulações que entram no organismo, os psicólogos da Gestalt introdu-
ziram a ideia de que as pessoas possuem uma tendência a organizar os estímulos que
recebem do ambiente. Segundo Myers (2012), os psicólogos da Gestalt enfatizavam a
nossa tendência a integrar partes de informação em um todo significativo (p. 199).

CURIOSIDADE
Gestalt é uma palavra alemã que significa forma ou todo. Daí surgiu o princípio muito
citado por gestaltistas de que “o todo é maior que a soma das partes”.

Levando em conta a ideia de uma tendência organizadora da mente, os teóri-


cos da Gestalt introduziram uma série de princípios conhecidos como princípios
de organização perceptual (KLEINMAN, 2015), que seguem explicitados:

capítulo 3 • 68
1. Lei da Semelhança – tendência no agrupamento de itens que são semelhan-
tes. Na figura abaixo tendemos a ver colunas de quadrados e colunas de círculos e
não as linhas.

2. Lei da simplicidade – tendência a perceber sempre de forma mais simples.

Forma Simples Forma Complexa

3. Lei da Proximidade – tendência em agrupar os objetos que estão perto, per-


cebê-los como um todo.

CURIOSIDADE
O ditado popular “Dize-me com quem andas que te direi quem és” também
pode ser entendido pelo princípio da proximidade. A interpretação seria que, em decorrência
da proximidade de uma pessoa com outras, ela seria semelhante ao grupo. Sabe-se que, de
fato, o ser humano tem a tendência de se aproximar daqueles com que tem afinidade, mas

capítulo 3 • 69
temos que ter cuidado com os juízos de valor que fazemos das pessoas sem conhecê-las de
verdade.

4. Lei da Continuidade – tendência a perceber os padrões suaves e contínuos


em vez de padrões descontínuos.

CURIOSIDADE
Outro provérbio que exemplifica os princípios da Gestalt, no caso o da continuidade,
é “Filho de peixe, peixinho é.” Ou seja, a ideia de continuidade que a descendência traz
aos ancestrais.

5. Lei do preenchimento (ou fechamento) – tendência ao preenchimento dos


espaços vazios para se entender a figura como um todo coerente.

CURIOSIDADE
Você já viu um negativo fotográfico antigo, antes das máquinas de fotografia digitais? Os
filmes antigos eram realizados através de filmadoras que gravavam quadro a quadro, como
se fossem fotos. Quando exibidos, a velocidade com que os filmes eram passados trazia a
percepção de continuidade. Entretanto, o que estava sendo transmitido era o quadro a qua-
dro da cena.

capítulo 3 • 70
6. Lei da Figura Fundo – tendência inata em reconhecer somente uma parte do
evento de cada vez. A primeira percepção estará baseada no contexto de vida da pessoa,
o que é mais pregnante em sua memória. O que você vê primeiro na figura abaixo?

Atenção e consciência

A atenção é a ação cognitiva através da qual se processa uma quantidade limi-


tada de informações por meio de um enorme número de estímulos disponível para
os órgãos dos sentidos e outros processos cognitivos. A atenção inclui processos
conscientes e inconscientes.
A funcionalidade da atenção é a de ser um filtro consciente para determina-
das informações, tendo em vista que o ser humano está em constante processo
de input de estímulos. Neste sentido, quando a atenção está concentrada em um
grupo de estímulos, ela “carrega” os processos cognitivos para a codificação, a or-
ganização, o processamento e o armazenamento da informação.
Atenção e consciência são dois processos cognitivos diferentes que se
complementam. A consciência inclui tanto o sentimento de percepção consciente
como o conteúdo da consciência, parte da qual pode estar sob o foco da atenção.
(STERNBERG, 2010, p. 108)
A atenção ainda promove alguns benefícios às cognições e à consciência do
indivíduo (STERNBERG, 2010):
1. Ajuda a monitorar as interações entre o ambiente e o ser humano;

capítulo 3 • 71
2. Ajuda no estabelecimento de relação entre passado (memória) e presente (sen-
sações), dando um sentido de continuidade na experiência;
3. Ajuda no controle e no planejamento de situações futuras.

A Psicologia Cognitiva também estuda os processos pré-conscientes e in-


conscientes. Entretanto, tais estudos não se configuram como aproximações à
Psicanálise, visto que não entende pré-consciente ou inconsciente como instâncias
psíquicas, mas como características das informações que permanecem armazena-
das e ao acesso da atenção para utilização.
As informações pré-conscientes são aquelas que não estão no foco da cons-
ciência no momento presente, mas quando houver uma estimulação, a pessoa
pode evocar rapidamente e a qualquer momento que seja necessário. Por exemplo,
a imagem mental da própria casa ou o nome de uma rua no respectivo bair-
ro residencial.

VOCÊ SABIA?
Existe um processo cognitivo chamado priming que é utilizado pelos psicólogos para
pesquisa e confirmação de informações pré-conscientes. O priming pode ser entendido
como ativação de uma informação armazenada, ou seja, diante de um estímulo igual ou se-
melhante apresentado anteriormente, a pessoa recupera a informação. Exemplo: um anúncio
mostra um refrigerante na televisão e a pessoa lembra que tem o mesmo refrigerante em sua
geladeira. O processo de priming é importante porque facilita a evocação de informações que
não estão na nossa atenção no momento, tendo em vista que somente conseguimos manter
a atenção em poucos estímulos num mesmo momento (STERNBERG, 2010).

De uma maneira geral, os processos cognitivos são diferenciados entre au-


tomáticos e controlados. Os processos automáticos são aqueles que ocorrem na
forma do âmbito da consciência, e os controlados são aqueles que necessitam do
controle consciente.
Durante a vida, vários processos controlados tornam-se automáticos. Por
exemplo, falar, ler, escrever e até mesmo andar. Quando se aprende algo novo, é
importante estar focado e consciente daquela informação ou ação. O pensamento
fica todo voltado para as etapas necessárias ao bom andamento da aprendizagem
e ao resultado satisfatório. Entretanto, ao longo do tempo, quando as pessoas

capítulo 3 • 72
realizam muitas vezes a mesma tarefa, ela se torna automática. Quando se aprende
a ler, o processo de juntar as sílabas em voz alta e depois perceber o sentido da
palavra ou sentença que se está lendo é totalmente consciente. Após a aquisi-
ção da fluência na leitura, o processo torna-se automático de tal forma que, so-
mente visualizando parte da palavra, a pessoa já consegue identificá-la e perceber
seu significado.
Segundo STERNBERG (2010),

Os processos automáticos não requerem controle consciente. Em sua maior par-


te, são realizados sem consciência, mas pode-se estar consciente de estarem sendo
feitos. Eles demandam pouco ou nenhum esforço, ou mesmo intenção. Os processos
automáticos múltiplos podem ocorrer simultaneamente ou, pelo menos, muito rapida-
mente e sem uma sequência específica, e são chamados de processos paralelos.
Em comparação, os processos controlados são acessíveis ao controle consciente e
até mesmo o requerem, sendo realizados em sequência, isto é, um de cada vez. Levam
mais tempo para serem executados, pelo menos em comparação com os processos
automáticos. (p.113-114)

O processo de atenção possui quatro funções básicas (STERNBERG, 2010):


a detecção de sinais, a atenção seletiva, a atenção dividida e a busca.
1. A detecção de sinais ocorre quando se percebe determinado estímulo;
2. A atenção seletiva refere-se ao processo de prestar atenção voluntariamente a
determinado estímulo;
3. A atenção dividida ocorre quando se orquestra a atenção em mais de um estí-
mulo para desempenhar mais de uma tarefa por vez;
4. A busca refere-se ao processo de tentar encontrar o estímulo que está imerso
num contexto com diversas distrações.

Adaptativamente, os seres humanos desenvolveram o processo de atenção seleti-


va, atenção dividida, detecção de sinais e busca para viabilizarem sua proteção contra
perigos e percepção de oportunidades para a sobrevivência. Em termos evolutivos, a
capacidade de identificar predadores que surjam subitamente no campo visual é uma
grande vantagem para a sobrevivência de um organismo e, em última instância, seus
genes (STERNBERG, 2010, p. 146). Entretanto é bem mais recorrente do que se
pensa a cegueira à mudança, que é a incapacidade para detectar mudanças em objetos
ou cenas que estejam sendo vistas (STERNBERG, 2010, p. 146).

capítulo 3 • 73
Uma patologia que tem sido evidenciada largamente na atualidade é o
Transtorno do Déficit de Atenção/Hiperatividade. Esse transtorno neurofisioló-
gico acarreta a dificuldade de focar, de prestar atenção de forma adequada para se
adaptar ao ambiente.
Há evidências científicas de que o TDAH tem aumentado desde sua descober-
ta em 1845. Pesquisas demonstram que essa condição pode ser herdada genetica-
mente, mas que fatores ambientais podem estar associados, como fumo e bebida
durante a gestação, aditivos químicos, açúcar, determinados pigmentos e chumbo.
Além desses, a exposição intensa à televisão e a videogames também aparece como
hipótese de geradores de risco ambiental para o desenvolvimento do transtorno.
Os portadores de TDAH possuem diferenças nos circuitos cerebelares fron-
tais e na regulação da dopamina. Atualmente, há o consenso entre os especialistas
quanto ao tratamento do TDAH que deve passar pela medicação e pela terapia ou
intervenções comportamentais.
Os sintomas mais verificados no transtorno são a falta de atenção, a hiperativi-
dade (nível de agitação que extrapola o comportamento normal para determinada
faixa etária) e a impulsividade. Sua incidência na infância evidencia a razão de 2
meninos para 1 menina. Na fase adulta, a incidência é a mesma para os dois sexos.

A memória

A memória é um processo cognitivo fundamental, porque, além de dar supor-


te a outros processos cognitivos, em razão do armazenamento de todas as infor-
mações recebidas e processadas, ela também gera nossa própria existência como
identidade e singularidade. Ela está na base de nossa personalidade, de nossas
crenças e de nosso autoconceito.
É com base na capacidade de armazenamento da memória que sabemos quem
somos e que possuímos uma história de vida individual e coletiva, dentro de nossa
família e dos grupos a que pertencemos. Pode-se dizer que os laços da memória
são maiores que os “laços de sangue”, pois o fato de se passar por eventos em con-
junto gera sentimento de pertença, familiaridade e cumplicidade.
Utiliza-se o conceito de memória para designar tanto o processo cognitivo,
como o conteúdo armazenado. A memória como processo é o meio dinâmico
de aquisição, formação, conservação e evocação de informações ou experiências
passadas. A aquisição pode ser definida como aprendizagem, e a evocação refere-se
aos processos de recordação, lembrança, recuperação de informações armazenadas.

capítulo 3 • 74
A memória como processo cognitivo possui três operações básicas que repre-
sentam (cada uma) estágios de processamento: 1) codificação; 2) armazenamento;
3) recuperação. Na codificação, os dados sensoriais são transformados em repre-
sentação mental; o armazenamento refere-se à manutenção das informações co-
dificadas na memória; e a recuperação refere-se ao acesso ou ao uso das informa-
ções armazenadas.

VOCÊ SABIA?
Nossa memória não é um reflexo da realidade. O processo por meio do qual os estí-
mulos externos entram no organismo e transformam-se em representação mental chama-se
transdução. No processo de transdução, há uma grande perda de informações, visto que
estamos imersos num mar de estímulos e que nosso cérebro não consegue processar todas
as informações constantes no ambiente. Então, o cérebro “escolhe” aquelas informações
relevantes para a nossa sobrevivência e o critério de escolha passa pelas informações já
constantes em nossa memória.

O processo de codificação de informações é bastante complexo. As informa-


ções e os estímulos que sofrem INPUT através das terminações nervosas e dos
órgãos sensoriais são codificados mais de uma vez. Primeiramente, passam pela
transformação do ambiente físico, externo ao organismo, para o ambiente bioquí-
mico e elétrico, interno ao organismo. Essas informações “traduzidas” são levadas
ao cérebro para serem transformadas em representação mental e começarem a
fazer parte do repertório cognitivo (conteúdo) armazenado. Essa “tradução”, ou
“transformação”, é atividade realizada pelos neurônios.
Neste sentido, é comum esquecermos o que é trivial e incorporar à nossa me-
mória fatos irreais. A lembrança não é igual à realidade, pois o cérebro converte
a realidade e as informações em códigos e as evoca também por meio de códigos.
Tais códigos são sinais elétricos e bioquímicos que entram no organismo pelas
diversas vias dos sentidos.
Nos processos de “tradução” e “transformação” do conteúdo inicial até o final,
sempre há perdas de informações, porque esses procedimentos sofrem interferên-
cia do repertório cognitivo já existente na memória e, também, das informações
que continuam entrando nela.

capítulo 3 • 75
CURIOSIDADE
Só é possível lembrarmos daquilo que aprendemos. Nossa memória possui um pro-
cesso de esquecimento normal, que tem uma funcionalidade enorme, porque nosso cérebro
entraria em colapso se tivesse que processar TUDO do ambiente externo e interno ao orga-
nismo. Então, pode-se dizer que somos aquilo que recordamos e o que resolvemos esquecer.
O processo de esquecimento é ativo, no sentido de que o cérebro “escolhe/ seleciona” ativa-
mente o que deve ser esquecido. Essa escolha ativa está pautada no que já existe no cérebro
e facilita a detecção de sinais. Nesse sentido, nossas memórias e o que esquecemos dizem
respeito a quem somos, configuram nossa singularidade (ou personalidade) e fazem-nos
reconhecer o nosso próprio EU.

Apesar de ser um processo cognitivo individual, o fato de o indivíduo estar em


sociedade faz com que sua memória seja processada no âmbito coletivo. Através
das relações sociais e da comunicação cotidiana, são criadas memórias comuns
aos membros de um grupo ou comunidade. Tal memória comum oportuniza e
alimenta as relações sociais, pois permite a criação de uma identidade comum
ao grupo. A importância desse processo é que memórias coletivas são criadas,
construindo a identidade dos povos e das civilizações. Tal conjunto de memórias
denomina-se História.

VOCÊ SABIA?
Utilizamos o termo memória para designar tanto o processo cognitivo quanto os conteú-
dos armazenados. Dessa forma, pode-se caracterizar a memória por tipos de função, duração
e conteúdo. Por exemplo: memória de trabalho (função), memória de longo prazo e de curso
prazo (duração), memória autobiográfica e semântica (conteúdo armazenado).

O primeiro modelo de memória segundo sua função e duração surgiu na


década de 1960 e é considerado um modelo tradicional. Nele, existiriam dois
componentes: a memória primária, que armazenaria as informações primárias,
e a memória secundária, que armazenaria as informações de caráter permanente.

capítulo 3 • 76
Posteriormente, surge o modelo de Richard Atkinson e Richard Shiffrin, que
propunham uma memória com três sistemas de armazenamento (receptáculos):
sensorial, de curto prazo e de longo prazo.

O modelo diferencia entre estruturas para a retenção de informações, são receptácu-


los, e informações armazenadas nas estruturas, que são denominadas de memória.
Hoje, entretanto, os psicólogos cognitivos comumente descrevem os três receptáculos
como memória sensorial, memória de curto prazo e memória de longo prazo. Atkinson
e Shiffrin também não estavam sugerindo que os três receptáculos são estruturas
fisiológicas distintas. Os receptáculos são, preferivelmente, constructos hipotéticos
– conceitos que não são, por si só, diretamente mensuráveis ou observáveis, mas que
atuam como modelos mentais para a compreensão de como opera um fenômeno psi-
cológico. (STERNBERG, 2010, p.158)

O armazenamento sensorial é capaz de armazenar quantidades de informações


limitadas por períodos breves e constitui o repositório inicial de informações que
serão parte das memórias de curto prazo e de longo prazo. É onde ocorre o ar-
mazenamento icônico, ou registro sensorial de natureza visual e descontínua, que
retém informações por períodos muito breves.
O armazenamento de curto prazo mantém a informação por alguns segundos
ou até poucos minutos, se a pessoa for treinada. A maioria das pessoas não tem
acesso à memória sensorial, mas ao receptáculo da memória de curto prazo. A
função da memória de curto prazo é o de controlar e regular o fluxo de informa-
ções dirigido e/ ou originado para o receptáculo de longo prazo. É fundamental
para as nossas atividades diárias e permite que o processamento da informação seja
percebido de forma contínua pela pessoa. Por exemplo, a pessoa começa a leitura
de um parágrafo; a memória de curto prazo viabiliza a permanência da informação
das frases anteriores enquanto ainda há leitura e, por causa desse processo conse-
guimos entender o texto como um todo e de forma contínua.
A memória de longo prazo comporta conteúdos que permanecem retidos por
longos períodos, talvez indefinidamente. É fundamental para a nossa vida diária
e armazena informações como nomes de pessoas, datas importantes, fórmulas e
teorias complexas, onde guardamos objetos, localização de nossa rua e eventos de
nossa infância. O interessante dessa memória é que os pesquisadores em cognição
ainda não conseguiram determinar sua capacidade de armazenamento ou dura-
ção. Ou seja, uma pessoa aos 103 anos pode lembrar de eventos aos 3 anos de
idade, por exemplo.

capítulo 3 • 77
VOCÊ SABIA?
A memória de longo prazo é organizada por meio das memórias declarativas de proce-
dimentos. As memórias declarativas dividem-se em episódicas ou autobiográficas (que se
referem a eventos aos quais assistimos ou dos quais participamos) e memória semântica
(que é a memória de conhecimentos gerais).
A memória procedural ou de procedimentos é também conhecida como os “hábitos” e
refere-se às capacidades sensoriais ou motoras, como andar, sentar, correr, ler, escovar o
cabelo etc.

Informações Resposta
do ambiente produzida

Registros Memória de
Memória de
sensoriais: curto prazo
longo prazo
VISUAL (MCP)
(MLP)
AUDITIVO Processos de
. controle de envio
RECEPTÁCULO
. de informação
DA MEMÓRIA
. e estratégias de
PERMANENTE
TÁTIL recuperação

Figura 3.1  –  Modelo da Memória Atkinson e Shiffrin.

Atualmente, o modelo mais utilizado para explicar o processo cognitivo da


memória é o de Alan Baddeley, ou Memória de Trabalho. Esse modelo surge na
década de 1970 e corresponde à memória de curto prazo do modelo tradicional.
Ela não produz arquivos nem os armazena. Sua funcionalidade está no processa-
mento e na organização da informação que chega e que sai. Dá suporte aos ou-
tros processos cognitivos, em razão do gerenciamento das informações. Possui três
componentes distintos com capacidades independentes: o circuito fonológico, o
bloco de esboço visuoespacial e o executivo central. (SETRNBERG, 2010)
O circuito fonológico é o responsável pelo armazenamento de um número
limitado de sons por um período curto (alguns segundos) e possui dois compo-
nentes (STERNBERG, 2010):
1. Armazenamento fonológico – que conserva uma quantidade limitada de in-
formações em um código acústico e declina depois de alguns segundos;

capítulo 3 • 78
2. Processo de repetição subvocal – permite que a pessoa repita em silêncio,
para si mesma, as palavras do armazenamento fonológico. Tal processo ajuda a
conservar os itens no armazenamento fonológico e para a tradução de palavras
impressas, gravuras ou outro material não auditivo, em linguagem (ou forma fo-
nológica) de modo que seja possível mantê-las no armazenamento fonológico.

O bloco de esboço visuoespacial é responsável pelo armazenamento de in-


formações visuais e espaciais. Consegue, também, armazenar informações visuais
codificadas a partir de estímulos verbais. Tal como o circuito fonológico, o bloco
visuoespacial também possui uma capacidade limitada. Então quando há uma
estimulação espacial exacerbada, a pessoa não consegue representar os estímulos
com exatidão suficiente para serem recuperados com êxito.
O executivo central é o gerente da informação. Responsável pela integração
das informações oriundas dos outros dois componentes e da memória de longo
prazo. Desempenha papel importante na atenção, planejando estratégias de como
manejar um problema e coordenando o comportamento. É, ainda, responsável
pela supressão de informações não pertinentes. Uma característica importante é
que possui capacidade limitada para executar tarefas simultâneas, pois não conse-
gue tomar muitas decisões ao mesmo tempo.
A memória de trabalho possui como função gerenciar a realidade, mantendo
por alguns segundos ou poucos minutos a informação que está sendo processada.
É ainda responsável por determinar o contexto em que os diversos fatos, aconte-
cimentos ou outro tipo de informação ocorrem e se vale a pena ou não fazer uma
nova memória de tal evento Por gerenciar a informação, sustenta outros processos
cognitivos, como: raciocínio, solução de problemas, cálculo mental etc. Não é um
arquivo passivo de armazenamento de informações, mas possui um processamen-
to altamente ativo e flexível, onde o material está constantemente sendo maneja-
do, combinado e transformado.

VOCÊ SABIA?
Que é a memória de trabalho que mantém a informação “viva” por tempo suficiente para
entrar na memória propriamente dita, ou não, por meio do processo que determina se tal
informação é nova (ou não) e se é útil (ou não) para o organismo.

capítulo 3 • 79
Bloco de esboço
Circulo fonológico
visuoespacial

Execu�vo central

Memória de longo prazo

Figura 3.2  –  Memória de trabalho.

Apesar de estar analogamente no lugar da memória de curto prazo do modelo


tradicional, a memória de trabalho é mais flexível que aquela, porque seus com-
ponentes podem estar trabalhando ao mesmo tempo. Por exemplo, o executivo
pode estar trabalhando numa tarefa enquanto o circuito fonológico trabalha em
outra. Isso possibilita às pessoas realizarem duas tarefas ao mesmo tempo, uma
que requeira repetição verbal, e outra que requeira julgamentos espaciais, como
dirigir um carro (utilização do bloco visuoespacial) e escutar música (armazena-
mento fonológico).

CURIOSIDADE
Estudos indicam que o humor e as emoções influenciam tanto a codificação e o armaze-
namento das informações quanto a recuperação ou a lembrança delas:
•  De maneira geral, as pessoas evocam fatos agradáveis com maior exatidão do que os de-
sagradáveis;
•  A evocação de informações apresentadas no meio de um programa violento de televisão
é reduzida;
•  A memória é intensificada quando o material a ser aprendido é congruente com o estado
de humor da pessoa naquele momento;
•  Em muitos casos, a memória se intensifica quando o estado de humor durante a recupera-
ção corresponde ao estado de humor durante a codificação.

capítulo 3 • 80
Já foi mencionado que a memória não é um reflexo da realidade, consideran-
do-se seu processo de aquisição, de codificação, de armazenamento e de recupe-
ração das informações. Muitos fatores influenciam o processo de memorização
e de recuperação, como o humor e as emoções, o estado geral de saúde, a capa-
cidade sensoperceptiva, o cansaço, a atenção, a capacidade de entendimento e o
interesse pela informação, entre outros. São tantas as variáveis que influenciam a
construção da memória e sua evocação que suas distorções são comuns. Algumas
distorções são:
1. Transciência – quando a memória desaparece rapidamente;
2. Falta de atenção – quando a atenção não está direcionada para a informação
a ser adquirida ou retida;
3. Bloqueio – quando a pessoa sabe que tem algo de que deveria se lembrar, mas
não consegue naquele momento (efeito da ponta da língua);
4. Atribuição errônea – quando as pessoas não conseguem se lembrar onde
leram ou ouviram algo, podendo até achar que ouviram ou leram algo que, na
realidade, não aconteceu;
5. Sugestionabilidade – refere-se à suscetibilidade das pessoas à sugestão; caso
lhes seja sugerido que viram algo, as pessoas podem pensar que se lembram de
tê-lo visto;
6. Viés – quando a recordação de uma experiência passada é referenciada por
uma experiência atual. Ex.: uma pessoa que sofre de dor crônica sofre uma predis-
posição ao se lembrar da dor no passado, tendo-a sentido, ou não;
7. Persistência – refere-se à lembrança persistente de fatos considerados impor-
tantes quando, no contexto maior, não o são. Ex.: alguém com muitos sucessos,
mas um fracasso importante, pode se lembrar melhor do fracasso do que dos vá-
rios sucessos.

O esquecimento de informações também é um processo recorrente funcional,


pois o cérebro precisa de espaço para informações novas e mais adaptativas, de
acordo com a etapa da vida da pessoa. Esse esquecimento normal ou fisiológico
ocorre por desinteresse do indivíduo ou por desuso da informação. Porém, existe o
esquecimento que não é funcional. Neste caso, verificam-se as perdas de memória
por traumas psíquicos ou orgânicos, como uma doença neurodegenerativa ou um
trauma físico localizado na cabeça, que interferem patologicamente nos processos
de registro e recordação mnêmicos.

capítulo 3 • 81
Nos casos de doença neurodegenerativa ou lesão cerebral, o esquecimento
ocorre segundo a Lei de Ribot, e na seguinte ordem:
1. O sujeito perde as lembranças e seus conteúdos na ordem e no sentido inverso
que os adquiriu;
2. A pessoa perde primeiro os elementos recentemente adquiridos e, depois, os
elementos mais antigos;
3. Perde primeiro os elementos mais complexos e, depois, os mais simples;
4. Perde primeiro os elementos mais estranhos, menos habituais e, depois, os
mais familiares;
5. Primeiramente perde os conteúdos mais neutros, depois, os elementos afetivos
e, apenas no fim, perde os hábitos e os comportamentos costumeiros mais profun-
dos enraizados no repertório comportamental e mental.

Quanto às patologias relacionadas à memória, existem, também as alterações


quantitativas, como as amnésias e as hipermnésias, e as qualitativas (ou param-
nésias), como ilusão mnêmica, fabulação, alucinação, criptomnésia, lembranças
obsessivas e as Agnosias (DALGALARRONDO, 2008).

Alterações quantitativas

Refere-se a uma alteração do ritmo psíquico, e não propria-


HIPERMNÉSIAS mente da memória; os elementos mnêmicos afluem rapida-
mente, ganhando em número e perdendo clareza e precisão.

Refere-se à perda de memória, seja a capacidade de fixar


AMNÉSIAS (OU ou a capacidade de manter e evocar antigos conteúdos
HIPOMNÉSIAS) mnêmicos.

Com relação as amnésias, pode-se dividi-las em:


1. Amnésia psicogênica: há perda de elementos mnêmicos focais, os quais têm
valor afetivo ou simbólico, como um evento significativo da sua vida. Entretanto,
ele consegue se lembrar de tudo ao redor, do contexto;
2. Amnésia orgânica: trata-se de amnésia menos seletiva. O esquecimento se-
gue, em geral a Lei de Ribot;
3. Amnésia anterógrada: é a incapacidade de fixar informações a partir do even-
to que causou o dano cerebral;

capítulo 3 • 82
4. Amnésia retrógrada: perda de memória para fatos que ocorreram antes do
evento traumático.

Alterações qualitativas

As paramnésias envolvem uma deformação do processo de evocação de con-


teúdos mnêmicos previamente fixados. O indivíduo apresenta lembrança defor-
mada que não corresponde à sensopercepção original:
1. Ilusões mnêmicas – há o acréscimo de elementos falsos a um núcleo verda-
deiro de memória. A lembrança adquire caráter fictício;
2. Alucinações mnêmicas – são criações imaginativas com aparência de lem-
branças que não correspondem a nenhuma lembrança verdadeira;
3. Fabulações – elementos da imaginação ou lembranças isoladas completam
artificialmente as lacunas de memória. São imaginações que preenchem um vazio
na memória. Podem ser produzidas ou induzidas pelo examinador (diferente das
ilusões e alucinações);
4. Criptomnésias – falseamento da memória em que as lembranças aparecem
como fatos novos ao paciente, que não as reconhece como lembrança, vivendo-as
como uma descoberta;
5. Lembranças obsessivas – são também denominadas como ideias fixas que,
uma vez instaladas na consciência, não conseguem ser repelidas voluntariamente
pelo paciente, embora seja reconhecida como absurda e indesejável;
6. Agnosias (alterações de reconhecimento) – definidas como déficit do re-
conhecimento de estímulos sensoriais, objetos e fenômenos, que não podem ser
explicadas por um déficit sensorial ou por perdas cognitivas globais.

ATIVIDADES
01. O limiar é uma medida sensorial importante para o processamento do estímulo e, con-
sequentemente, para a ação a ser realizada. Pode-se definir limiar como:
a) quantidade mínima de estímulo capaz de eliciar uma resposta no organismo.
b) quantidade máxima de estímulo capaz de eliciar uma resposta no organismo.
c) quantidade média de estímulo capaz de eliciar uma resposta no organismo.
d) quantidade dependente de estímulo capaz de eliciar uma resposta no organismo.
e) não existe possibilidade de mensuração do limiar sensorial.

capítulo 3 • 83
02. Sobre os processos de sensação e percepção, pode-se dizer que:
a) a sensação se refere à interpretação do estímulo que entra no organismo pela via
dos sentidos.
b) a percepção se refere à interpretação do estímulo que entra no organismo pela via
dos sentidos.
c) sensação e percepção são processos independentes que não se relacionam.
d) o processo bottom-up se refere à interferência das informações já existentes no orga-
nismo para o processamento de informações novas.
e) O processo top-down se refere ao input da informação através das terminações nervo-
sas que segue até o cérebro para ser codificada.

03. O processo cognitivo chamado memória é altamente dinâmico e flexível. Uma de suas
produções mais fascinantes é que não se pode entender a memória como um reflexo da
realidade. Explique.

04. O processo de atenção e a consciência estão vinculados continuamente, apesar de se-


rem considerados distintos. A consciência necessita da atenção e a atenção é influenciada
pelo estado de consciência. Explique.

05. Quais são os componentes da memória de trabalho?


a) Memória de longo prazo e memória de curto prazo
b) Memória sensorial e memória de curto prazo
c) Memória de longo prazo e memória sensorial
d) Executivo central, bloco de esboço visuoespacial e circuito fonológico
e) Memória icônica e memória sensorial

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
DALGALARRONDO, P. Psicopatologia e semiologia dos transtornos mentais. 2 ed. São Paulo:
Artmed, 2008.
GOODWIN, C.J. História da Psicologia Moderna. São Paulo: Cultrix, 2005.
KLEINMAN, P. Tudo o que você precisa saber sobre Psicologia: um livro prático sobre o estudo da
mente humana. São Paulo: Editora Gente, 2015.
MYERS, D. G. Psicologia. 9. ed. Rio de Janeiro: LTC, 2012.

capítulo 3 • 84
SCHULTZ, D. P.; S. E. SCHULTZ. História da Psicologia Moderna. São Paulo: Thomson Learning,
2005.
STERNBERG, R. J. Psicologia Cognitiva. São Paulo: Cengage Learning, 2010.

capítulo 3 • 85
capítulo 3 • 86
4
Terapias cognitivas
Terapias cognitivas
O estudo das funções cognitivas é observado desde os antigos filósofos, quan-
do estes observavam a atividade do pensamento humano. Sem dúvida nenhuma,
este conhecimento de como o homem pensa e interpreta o mundo a partir de sua
estrutura biológica tem tido avanços substanciais nos últimos séculos. Mas quan-
do a abordagem cognitiva apareceu?
Costuma-se atribuir a data de setembro de 1956, quando um famoso
Seminário aconteceu no MIT (Massachussets Institute of Tecnology). A partir desse
evento, onde vários estudiosos que despontavam (Jean Piaget, Noam Chomsky,
George Myller entre outros) fizeram suas brilhantes palestras, sentiu-se que uma
confluência de ideias de vários campos de conhecimento originaria um novo cam-
po de estudos: a Psicologia Cognitiva.
Não demorou muito para que a abordagem cognitiva crescesse. A década
de 1960 assistiu, com grande entusiasmo, não só ao crescimento da Psicologia
Cognitiva, mas também ao nascimento de formas de intervenção dentro dessa
ideia de complexidade do comportamento humano e processamento das informa-
ções captadas do mundo. Assim, vimos as terapias cognitivas nascerem.

OBJETIVOS
Reconhecer os principais conceitos das Teorias cognitivas:
•  Teoria Sociocognitiva de Albert Bandura;
•  Teoria dos Constructos Pessoais de George Kelly;
•  Teoria Racional-Emotiva de Albert Ellis;
•  Teoria Cognitiva de Aaron Beck;
•  Terapia dos Esquemas de Jeffrey Young.

Teoria social cognitiva de Albert Bandura

Albert Bandura, canadense, da Universidade de Stanford, criou a Teoria


da Aprendizagem Social, que posteriormente veio a ser chamada de Teoria
Sociocognitiva. A teoria focaliza o estudo do comportamento humano inserido no
contexto social, valorizando os processos cognitivos do sujeito. Assim, as pessoas

capítulo 4 • 88
não precisam apenas ser condicionadas a aprender, mas também aprender através
das observações da vivência de outras pessoas e suas interações com o seu meio.

©© ALBERT BANDURA | WIKIMEDIA.ORG

O que a gente pensa, crê e sente afeta seu comportamento. Os efeitos naturais e
extrínsecos de suas ações, por sua vez, determinam em parte seus padrões de pensa-
mento e reações afetivas.

Albert Bandura (in Friedman, 2003)

Bandura ampliou o conceito de reforço comportamental. Para ele, os meca-


nismos de aprendizagem não eram restritos às relações entre as variáveis observá-
veis. O autor acreditava que havia lugar na teoria da aprendizagem para variáveis
não observáveis ou internas que intermediavam a relação estímulo-resposta.
A teoria parte do princípio do reforço: quando as pessoas alteram o compor-
tamento consequente, fornecem informações. O reforço dá informações sobre o
que uma pessoa precisa fazer para assegurar os resultados esperados. Ele só pode
ocorrer quando a pessoa está ciente das contingências e antecipa que elas se apli-
carão a futuros comportamentos.
Para a teoria Social Cognitiva, as pessoas observam os resultados dos seus
comportamentos e os resultados dos comportamentos dos outros. Assim, conse-
guem desenvolver as prováveis consequências de produzir aquele comportamento
futuro. Bandura distingue aquisição e desempenho. A aquisição é quando um

capítulo 4 • 89
comportamento passa a integrar o repertório comportamental do indivíduo, via
condicionamento. O desempenho leva em consideração as variáveis que não são
observáveis, porque as pessoas se comportam, com tudo aquilo que aprendem,
condicionando ou observando o condicionamento de outras pessoas.
Para o desempenho de um comportamento observado, pode-se perceber três
tipos de incentivos: direto, vicário (indireto) e autoadministrado. O incentivo di-
reto viria do próprio condicionamento, com seus reforços. O incentivo vicário, ou
indireto, teríamos a aprendizagem pela observação do condicionamento de outras
pessoas. O autoadministrado teria origem em variáveis não observáveis, que fa-
riam a autorregulação de comportamentos. Para Bandura, o comportamento será
realizado se acreditarmos que será benéfico agirmos assim.
Na teoria de Bandura, as influências pessoais, as forças ambientais e o próprio
comportamento funcionam como determinantes interdependentes ao invés de
autônomos. Os fatores externos influenciam o comportamento pela mediação dos
processos cognitivos das pessoas.
Surge então o conceito de autossistema: um conjunto de processos cogni-
tivos pelo qual uma pessoa percebe, avalia e regula o próprio comportamento,
de modo que ele seja apropriado ao meio e eficaz para que ela alcance suas me-
tas. Então, além de ser influenciado por estímulos externos de reforçamento do
ambiente, o comportamento também é influenciado por expectativas, planos e
metas (variáveis internas).
A aprendizagem observacional consiste na premissa de que as pessoas podem
aprender ao observar o comportamento das outras pessoas. Envolve a emissão de
um comportamento na ausência de reforçamento. A aprendizagem observacional
também é chamada de modelação, pela observação de modelos.
Porém, na visão de Bandura, não é apenas uma cópia do comportamento dos
outros. Há uma decisão de forma consciente sobre se vão ou não se comportar de
acordo com o comportamento aprendido na observação. Muitos comportamentos
são aprendidos por meio da aprendizagem observacional, mas se a pessoa vai reali-
zar ou não tal comportamento depende de uma variedade de fatores.
O comportamento aprendido por observação não precisa ser reforçado para
ser repetido. Da mesma forma, a observação de um comportamento que é punido
tem muito baixa a probabilidade de ser executado. Para Bandura, o que mais in-
fluencia o observador a reproduzir ou não um comportamento são as consequên-
cias esperadas deste comportamento, ou seja, a expectativa de resultado.

capítulo 4 • 90
Além dessa expectativa de resultado, outros fatores influenciam a probabili-
dade do comportamento ser executado ou não. Esses fatores podem estar relacio-
nados com o próprio modelo (status do modelo, sua competência e poder) e/ou
características daquele que observa (baixa autoestima, mais dependentes ou aque-
las pessoas que foram mais reforçadas no passado para imitar comportamentos).
Os comportamentos podem ser mudados de forma terapêutica. Isso acontece
quando temos um desenvolvimento da autoeficácia. A autoeficácia envolve cren-
ças de quanto competente alguém é para estar apto a se comportar em determi-
nada situação e desenvolve-se da expectativa que podemos, com esforço pessoal,
dominar uma situação e ter o resultado que desejamos. A meta da terapia é criar
e reforçar a autoeficácia.

Teoria do constructo pessoal de George Kelly

Crer que o homem é autor do seu destino, não significa negar que possa ver-se tragi-
camente limitado por suas circunstâncias... por mais que lhes fossem negados, ainda
havia uma infinidade de possibilidades diante deles. A tarefa era gerar a imaginação
necessária para ver essas possibilidades.

George Kelly (in Lawrence, 2003)

George Kelly era um psicólogo americano, muito conhecido por sua teoria da
personalidade, a Teoria dos Constructos Pessoais, que desenvolveu desde a década
de 1920 (quando iniciou seus estudos em Psicologia) até final da década de 1960.

capítulo 4 • 91
A teoria de Kelly começou a se esboçar ao atender crianças. Ele tentava en-
tender o comportamento da criança que levava o professor (que a havia encami-
nhado) a perceber a queixa. Ou seja: observava que tipo de construção o professor
tinha delas, levando a uma análise dos professores, além dos alunos.
Assim nasce a noção dos constructos. Constructo é a forma que percebemos e
como interpretamos os eventos e como nos comportamos diante dessas interpre-
tações. Temos a capacidade de perceber e representar o ambiente em vez de sim-
plesmente responder a ele, podendo assim reinterpretar, construir ou desconstruir
conceitos. Porém, as pessoas só conseguem perceber os eventos dentro dos limites
das categorias que estão disponíveis a elas.
Os constructos são formados por polos, que representam cada extremo de sua
dicotomia. Os elementos abstraídos são semelhantes dentro de um polo e diferen-
tes do outro polo. Então, para se formar um constructo, são necessários três polos:
dois elementos semelhantes entre si, chamados de polo de similaridade e o terceiro
elemento que deve ser percebido como diferente dos outros dois, chamado de
polo de contraste. Os constructos são organizados num sistema hierarquizado,
cada qual com uma amplitude de conveniência (todos os eventos para os quais a
pessoa encontraria uma aplicação para o constructo).
A diferenciação se dá pelo número de constructos, sua complexidade, a orga-
nização deles e quão abertos para mudanças eles estão. Isto diz respeito não só às
diferenças dos constructos em si, mas a diferença entre os sistemas de constructos
entre as pessoas. As diferenças dos sistemas de constructos fazem parte do proble-
ma de comunicação entre os grupos de pessoas.
As implicações da Teoria dos Constructos para a Psicologia Clínica é obser-
vada naquilo que Kelly denominou de processo de construção segundo o Ciclo
de Experiência e a concepção construtiva das emoções como ciclos de transição.
Sobre o Ciclo de Experiência, Kelly atribui grande importância aos processos
antecipatórios e à atribuição de sentido àquilo que era percebido da experiência.
Para o autor, as pessoas deveriam ter como objetivo estender o âmbito de conve-
niência de sua teoria pessoal, fazendo-a cada vez mais explicativa e internamente
coerente. Outro fator importante seria sua capacidade de gerar hipóteses con-
trastáveis, ou seja, suscetíveis de serem submetidas a prova de seu valor preditivo
e rechaçadas se não cumprissem sua função de antecipação de situações futuras.
Esta capacidade para elaborar antecipações e contrastá-las, foi descrita por
Kelly como o “ciclo completo da experiência”, na qual a fase de antecipação implica
a derivação de uma hipótese pessoal sobre o curso provável de um acontecimento.

capítulo 4 • 92
As consequências do Ciclo de Experiências serão mais profundas quanto maior for
a implicação da pessoa no resultado. Quando está diante do acontecimento, im-
plica a disposição da pessoa em operacionalizar a hipótese, contrastando-a quanto
ao seu valor preditivo. O resultado desse contraste é a confirmação, ou não, da
antecipação. Essa fase de confirmação/não confirmação do Ciclo de Experiências
vai ser acompanhada de manifestações emocionais.

Ciclo de experiências

1. Antecipação do 2. Implicação no
acontecimento resultado

5. Revisão constru�va do 3. Encontro com o


sistema de constructos acontecimento

4. Confirmação/não
confirmação da
antecipação ou
hipóteses

A manifestação cognitiva da construção (Antecipação) traz sua validação


ou não validação das emoções conseguintes. O processo de discriminação que
ocorre no Ciclo de Experiências não é essencialmente cognitiva. Por discrimina-
ção humanas podem entender também os níveis que se denominam fisiológicos
ou emocionais.
Kelly equiparou a emoção à consciência das transições dos sistemas de cons-
tructos (validações), definindo quatro emoções relevantes para a prática clínica
e o trabalho deste processo psicoterápico: ameaça, medo, culpa e ansiedade. As
pessoas aprendem a controlar suas emoções no decorrer de seu desenvolvimento
porque são capazes de predizer cada vez com maior acerto como responderão
ante as diferentes situações ambientais. Mantendo o trabalho de autonomia da
emoção e da cognição, o controle emocional firma-se na capacidade de predizer a
própria conduta, produzindo uma experiência emocional de natureza mais delibe-
rada. Considera-se, assim, a emoção como processo psicológico não independente
da cognição.

capítulo 4 • 93
Terapia racional emotiva de Albert Ellis

Muito do que chamamos de emoção nada mais é do que um certo tipo — um tipo pre-
conceituoso, preconceituoso ou fortemente valorativo — do pensamento.

Albert Ellis (in Lawrence, 2003)

A Terapia Racional Emotiva (TRE) foi fundada por Albert Ellis, em 1955, e
é considerada uma teoria de personalidade e um método cognitivista de psicote-
rapia. A teoria entende a pessoa como um organismo biopsicosocial. Ellis entende
que dentro deste complexo, há quatro processos básicos: percepção, comporta-
mento, pensamento e emoção, que são integralmente relacionados. A emoção
é um estado complexo de reação humana que é interrelacionada com todos os
outros processos. O que geralmente chamamos de pensamento é uma avaliação
relativamente calma e não apaixonada de uma dada situação, ou percepção or-
ganizada. O pensamento e a emoção não são dois processos diferentes, mas se
sobrepões significativamente. Portanto, as emoções afetadas podem muitas vezes
ser melhoradas pela mudança na maneira de pensar.
Para Ellis, os seres humanos funcionam baseados em crenças racionais (rela-
cionado com estados emocionais equilibrados, mesmo os negativos) e irracionais
(que produzem estados emocionais perturbados). As pessoas perseguem metas e
propósitos e procuram a manutenção da vida e a busca da felicidade (hedonismo).
Apesar disso, interessam-se em aderir aos interesses sociais e a objetivos de longo

capítulo 4 • 94
prazo que podem deixar de satisfazer os de curto prazo (Hedonismo Responsável).
Este conceito é muito importante dentro da TRE.
As causas das dificuldades são as crenças irracionais que fazemos a nosso pró-
prio respeito. São cognições mal adaptativas que nos causam desconforto e sofri-
mento. Têm um cunho absolutista em relação aos acontecimentos e possuem uma
forma de avaliação dogmática. Ellis listou as crenças irracionais (Rangé, 2001):
1. A ideia de que existe uma extrema necessidade para qualquer ser humano
adulto ser amado ou aprovado.
2. A ideia de que se deva ser inteiramente competente, adequado e realizador em
todos os aspectos possíveis para se considerar como tendo valor.
3. A ideia de que é terrível e catastrófico quando as coisas não são do jeito que
gostaríamos muito que fossem.
4. A ideia de que certas pessoas são más, perversas e deveriam ser severamente
responsáveis e punidas por sua maldade.
5. A ideia de que a infelicidade humana é externamente causada e de que as pessoas
têm pouca ou nenhuma habilidade para controlar seus infortúnios e distúrbios.
6. A ideia de que, se alguma coisa é ou pode ser perigosa ou assustadora, deve-se
ficar terrivelmente preocupado e ficar ruminando sobre possível ocorrência.
7. A ideia de que é mais fácil evitar do que enfrentar certas dificuldades ou res-
ponsabilidades da vida.
8. A ideia de que se deva ser dependente dos outros e de que se necessite de al-
guém mais forte em quem se apoiar.
9. A ideia de que a história passada de alguém é um determinante definitivo do
seu comportamento presente e, se algo afetou uma vez fortemente a sua vida, isso
continuará tendo indefinidamente um efeito similar.
10. A ideia de que se deva ficar muito transtornado com os problemas e as preo-
cupações de outras pessoas.
11. A ideia de que há invariavelmente uma solução certa, perfeita e precisa para
todos os problemas humanos e de que é catastrófico se essa solução perfeita não é
encontrada.

Em relação à intervenção terapêutica, a TRE sustenta que a mudança mais


efetiva e duradoura depende da reestruturação das crenças irracionais. A Terapia
elucida sua distorção cognitiva e reestrutura essas crenças irracionais por meio da
conscientização delas, mostrando ao cliente como estão causando e mantendo sua
perturbação, demonstrando quais são os elos ilógicos nessas crenças e ensinando-o
a repensá-las numa maneira mais lógica e construtiva.

capítulo 4 • 95
Terapia cognitiva de Aaron Beck

A Terapia Cognitiva busca aliviar as tensões psicológicas por meio da correção das
concepções errôneas. Ao corrigir as crenças errôneas, podemos acabar com as rea-
ções excessivas.

Aaron Beck (in 2007)

Aaron Beck é um psiquiatra norte-americano conhecido como pai da Terapia


Cognitiva e inventor das Escalas Beck de Ansiedade (BAI), Depressão (BDI), de
Ideação Suicida (BSI) e de Desesperança (BHS). É presidente do Beck Institute for
Cognitive Therapy and Research.
A Terapia Cognitiva foi desenvolvida na década de 1960, a partir de formu-
lações a respeito da depressão. Após observação e prática clínica, Beck criou o
primeiro modelo cognitivo para a depressão, que, mais tarde, veio a ser utilizado
como modelo compreensivo de outros transtornos.
Os terapeutas cognitivistas trabalham em dois níveis: estrutura do sintoma,
onde são manifestos os problemas; e esquemas subjacentes, que são as estrutu-
ras inferidas. Essas estruturas podem promover uma forma distorcida ou disfun-
cional de perceber os acontecimentos, influenciando afetos e comportamentos.
Importantes estruturas cognitivas estão categórica e hierarquicamente organiza-
das. Essas estruturas cognitivas que organizam a experiência e o comportamento,

capítulo 4 • 96
também conhecidas como esquemas, são determinantes, fornecem as instruções
para guiar a direção e a qualidade de vida cotidiana.
A Terapia Cognitiva identifica três níveis de pensamento:
1) Pensamento automático – são espontâneos, fluem de acordo com os acon-
tecimentos do dia a dia e não são acessíveis à nossa consciência. Surgem como
sentença ou imagem e suas distorções são frequentemente observadas nos trans-
tornos. As distorções incluem (Falcone in Rangé, p. 50, 2008):
99 Inferência arbitrária: o paciente chega a uma conclusão na ausência
de evidências;
99 Abstração seletiva: o paciente focaliza um aspecto da situação e deixa de
considerar outros aspectos mais relevantes;
99 Supergeneralização: o paciente chega a uma conclusão negativa que vai
muito além da situação atual;
99 Desqualificação do positivo: o paciente insiste em não considerar as ex-
periências positivas;
99 Personalização: o paciente relaciona eventos externos a si mesmo, quando
não há nenhum indício para isso;
99 Catastrofização: o paciente espera o pior que pode acontecer em determi-
nada situação;
99 Leitura mental: o paciente acredita que as pessoas reagem de forma nega-
tiva a ele próprio sem ter evidências disso.

2) Crenças intermediárias – são crenças que estão localizadas num segundo ní-
vel de pensamento e, por isso, não estão relacionadas diretamente com situações.
Elas ocorrem como suposições e regras e, por essa razão, têm um estilo condicio-
nal, tipo “Se...então...”. As crenças intermediárias estão num nível mais profundo
que os pensamentos automáticos e, por terem estilo de regras, costumam ser mais
resistentes às mudanças.
3) Crenças centrais – nível mais profundo da estrutura cognitiva. As crenças
centrais são compostas de ideias absolutas e rígidas a respeito de si mesmo, dos
outros e do mundo. São desenvolvidas desde a infância, a partir de situações trau-
máticas, as quais originam as distorções. Também chamadas de esquemas, já que
seu sistema de crenças orienta para as situações de vida, alterando sua percepção e
seus comportamentos.

capítulo 4 • 97
Tanto as crenças centrais, quanto as intermediárias e os pensamentos automá-
ticos relacionam-se no funcionamento psíquico do paciente. Podem ser inferidas
por meio de técnicas cognitivas.
As crenças disfuncionais afetam as emoções e os comportamentos. Assim,
certos esquemas tendem a produzir julgamentos viciosos e erros cognitivos em
certas situações.
Os esquemas disfuncionais agem em relação a três pontos: a percepção de
si mesmo, do mundo e de seu futuro, configurando a Tríade Cognitiva. Aaron
Beck, quando iniciou seus escritos sobre Terapia Cognitiva, identificou a tríade
nos pacientes deprimidos. Depois, observou que esses três elementos continham
distorções importantes em todos os outros transtornos. São os problemas de pen-
samentos, esquemas negativos e erros cognitivos que causam os transtornos.
A Terapia Cognitiva trabalha com modelos compreensivos que trazem a dire-
ção para as intervenções cognitivistas.
•  Modelo cognitivo da depressão: o paciente deprimido possui um padrão
de pensamento muito negativo em relação a ele mesmo, ao mundo e ao seu futuro
(tríade cognitiva da depressão). A crença central disfuncional é ativada quando
uma pessoa entra em depressão e as mais adequadas deixam de operar. Num nível
de depressão leve, o indivíduo consegue ter consciência de suas distorções cogni-
tivas. Num nível mais severo, os pensamentos negativos tornam-se dominadores,
afetando os sintomas afetivos e comportamentais;
•  Modelo cognitivo da ansiedade: as distorções cognitivas dos pacientes com
ansiedade relacionam-se com o perigo. Costumam supervalorizar as situações con-
sideradas perigosas e subestimar os próprios recursos para enfrentá-las, causando
desequilíbrio na tríade. Assim, os temas das crenças versam sobre a ideia de vulne-
rabilidade. O problema central, nos transtornos de ansiedade, não está no afeto,
mas sim nos esquemas cognitivos relacionados ao perigo. À medida que se avalia o
perigo, formam-se vários círculos viciosos que mantêm a ansiedade. Uma vez dispa-
rado o gatilho, os próprios sintomas de ansiedade são percebidos como nova ameaça
de perigo. Inicia-se um círculo vicioso de manutenção de ansiedade e aumento da
sensação de vulnerabilidade, demonstrando esquemas cognitivos hipervalentes;
•  Modelo cognitivo dos transtornos de personalidade: os pacientes man-
têm seus esquemas disfuncionais hipervalentes que inibem os outros esquemas
mais adaptativos. Esses pacientes demandam mais do terapeuta por causa disso. As
crenças centrais ou esquemas variam de acordo com o tipo de transtorno.

capítulo 4 • 98
A Terapia Cognitiva possui quatro características básicas:
1. Apresenta ênfase numa aliança terapêutica segura. Metas da terapia, o que
abordar nas sessões, entre outras, supõe uma boa relação entre paciente e terapeuta.
2. Tem caráter educativo. A Terapia Cognitiva pretende dar autonomia para o
paciente ser seu próprio terapeuta por meio da descoberta guiada. Além disso, por
várias vezes, as informações são apresentadas de maneira didática a ele.
3. Baseia-se nas queixas do paciente e nas metas estabelecidas com o terapeuta.
4. Apresenta sessões estruturadas para que o paciente desenvolva autonomia.

A tarefa da terapia é produzir uma mudança nas cognições disfuncionais e


tornar a pessoa mais consciente das condições em que elas se tornam operacionais.

Terapia dos esquemas de Jeffrey Young

As armadilhas vitais são padrões de larga evolução. Estão profundamente enraizadas e,


igualmente às adições dos maus hábitos, são difíceis de mudar. Para isso se requer uma
firme vontade para aceitar a dor, já que se deve encarar as armadilhas e entendê-las.

Young, 2012

Young desenvolveu a Terapia dos Esquemas, a princípio, para tratar pacientes


com problemas caracterológicos. Pacientes com problemas caracterológicos têm
uma série de atributos que os distinguem de casos do Eixo I e II dos Transtornos
Psiquiátricos e que tornam esses pacientes de difícil tratamento, uma vez que

capítulo 4 • 99
lidarão com esses esquemas disfuncionais por toda a vida. Esses pacientes, muitas
vezes, fazem terapia e uso de medicamentos psicotrópicos. A Terapia do Esquema
mostrou-se bastante eficaz no tratamento da depressão e da ansiedade, nos trans-
tornos alimentares, nos problemas de casal e nas dificuldades duradouras de rela-
cionamentos. A Terapia do Esquema ajuda a organizar e a entender os problemas
crônicos, identificando desde a infância os esquemas que foram se produzindo.
Esses esquemas foram chamados de Esquemas Desadaptativos Remotos.
De acordo com Young (2008), Esquema Desadaptativo Remoto é um tema
ou padrão amplo, formado de memórias, emoções e sensações corporais, relacio-
nado a si mesmo ou aos relacionamentos com as outras pessoas. É desenvolvido
durante a infância ou a adolescência, sendo elaborado ao longo da vida do indiví-
duo e disfuncional em nível significativo.
Assim, entende-se que esses esquemas são padrões emocionais e cognitivos de-
sadaptativos iniciados remotamente e desenvolvidos de forma complexa durante a
vida do sujeito. Os comportamentos desadaptativos correspondem a respostas do
indivíduo a esses esquemas.
São 18 Esquemas Desadaptativos Remotos, agrupados em cinco categorias
que se chamam Domínios, os quais representam necessidades não satisfeitas, de
acordo com Young (p. 28-31, 2008):
99 Desconexão e Rejeição – as necessidades de proteção, estabilidade, segu-
rança, entre outros, não foram ou serão satisfeitas.
1. Abandono/instabilidade – envolve a sensação que os outros são instáveis e
indignos de confiança, atrapalhando radicalmente as relações.
2. Desconfiança/abuso – expectativa que só os outros irão abusar, humilhar e
mentir. Para o paciente, o prejuízo é intencional ou resultado de negligência.
3. Privação emocional – o desejo de ter apoio emocional não será satisfeito
pelos outros. Pode ser privação de cuidados, de empatia ou de proteção.
4. Defectividade/vergonha – sentimento de ser falho, mau, inferior, ou de não
merecer o amor de pessoas importantes que têm relacionamentos.
5. Isolamento social/alienação – sentimento de que está isolado do resto do
mundo, que é diferente das outras pessoas.

99 Autonomia e desempenho prejudicados – percepção de si mesmo e do


ambiente que causa dificuldade de se separar, se tornar independente e autônomo.
6. Dependência/incompetência – crença de que não é capaz de gerir responsa-
bilidades da própria vida, supondo que necessita de ajuda alheia.

capítulo 4 • 100
7. Vulnerabilidade ao dano/doença – medo exagerado de que uma catrástrofe
possa vir a qualquer momento em sua vida.
8. Emaranhamento/self subdesenvolvido – relação de envolvimento emocio-
nal muito exacerbado em relação aos pais, dificultando desenvolvimento social e a
própria individuação.
9. Fracasso – crença que fracassou ou fracassará.

99 Limites prejudicados – prejuízo nos limites internos, falha nas responsa-


bilidades com outros indivíduos e para objetivos a longo prazo.
10. Arrogo/grandiosidade – crença que é superior a outras pessoas, que tem di-
reitos ou privilégios especiais.
11. Autocontrole/autodisciplina insuficientes – Baixa tolerância à frustração e
dificuldade de exercer autocontrole.

99 Direcionamento para o outro – foco excessivo nos desejos, necessidades


e solicitação dos outros.
12. Subjugação – submissão excessiva ao controle dos outros.
13. Autossacrifício – cumprimento excessivo das satisfações dos outros à custa da
própria gratificação.
14. Busca de aprovação/busca de reconhecimento – ênfase excessiva na obten-
ção de aprovação, reconhecimento ou atenção de outras pessoas.

99 Supervigilância e inibição – supressão excessiva dos próprios sentimen-


tos, impulsos e escolhas no cumprimento de regras e expectativas.
15. Negativismo/pessimismo – foco generalizado e regular nos aspectos negati-
vos da vida e minimização dos aspectos positivos.
16. Inibição emocional – inibição excessiva da ação, dos sentimentos, da comu-
nicação espontânea para evitar a desaprovação alheia.
17. Padrões inflexíveis/postura crítica exagerada – crença que se deve dispender
grande esforço para atingir elevados padrões de comportamento e desempenho
para evitar críticas.
18. Postura punitiva – crença que as pessoas devem ser punidas de maneira mui-
to rigorosa quando erram.

A Terapia do Esquema, assim como a Terapia Cognitiva, tem como meta


ajudar os pacientes a identificar seus esquemas e torná-los conscientes destes. O

capítulo 4 • 101
tratamento, então, tem como objetivo aumentar o controle consciente sobre os
esquemas, as memórias, emoções, sensações corporais, cognições e os comporta-
mentos disfuncionais a eles associados.

ATIVIDADES
01. De acordo com a teoria de George Kelly, um constructo é:
a) algo quase inquestionável, uma verdade a priori.
b) uma forma de perceber ou interpretar eventos.
c) uma forma de enfrentar as limitações emocionais.
d) a construção de situações fóbicas.

02. _________________ considera que as causas das dificuldades psicológicas estão rela-
cionadas às crenças e ou às afirmações irracionais que habitualmente fazemos a nós mesmos.
a) Albert Ellis
b) Aaron Beck
c) Jeffrey Young
d) George Kelly

03. Julgue verdadeira ou falsa cada uma das afirmativas abaixo.


a) O principal objetivo da Terapia Cognitiva consiste nas modificações dos comportamen-
tos, evocando assim uma transformação cognitiva e emocional. ( )
b) A Terapia dos Esquemas baseia-se numa estrutura que se desenvolve com base na
avaliação externa das pessoas. ( )
c) A Terapia Cognitiva propõe que os esquemas são conscientes. ( )
d) A Teoria Racional-Emotiva de Albert Ellis considera que as causas das dificuldades psi-
cológicas estão relacionadas às crenças e ou afirmações irracionais que habitualmente
fazemos a nós mesmos. ( )

04. Quanto à Terapia Cognitiva, leia as duas afirmações abaixo e, depois, marque a op-
ção correta.
I. A Terapia Cognitiva é assim chamada porque suas técnicas visam corrigir erros ha-
bituais de pensamento. Apesar de ter sido inicialmente desenvolvida para o tratamento da
depressão, sua utilidade em outros problemas psicológicos ficou bem estabelecida poste-
riormente.

capítulo 4 • 102
II. A Terapia Cognitiva utiliza técnicas não diretas, com o propósito de modificar pensa-
mentos (cognições) e comportamentos inadequados. O terapeuta e o paciente comunicam-
-se de forma indireta, não discutindo problemas e metas.

a) Apenas a afirmativa I é verdadeira.


b) Apenas a afirmativa II é verdadeira.
c) As afirmativas I e II são verdadeiras.
d) As afirmativas I e II são falsas.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BECK, J. Terapia Cognitivo-Comportamental. Porto Alegre: Artmed, 2013.
BOTELLA, L.; FEIXAS, G. Teoría de lós constructos personales: aplicaciones a la prática
psicológica. Barcelona: Editorial Laertes,1998.
FRIEDMAN, H. S.; SHUSTACK, M. W. Teorias da Personalidade: da Teoria Clássica à pesquisa
moderna. 2. ed. São Paulo: Pearson Education, 2003.
GARDNER, H. A. Nova Ciência da Mente. São Paulo: EDUSP, 1996.
LAWRENCE A. P.; OLIVER P. J. Personalidade: teoria e pesquisa. Porto Alegre: Artmed, 2003.
MATLIN, M. Psicologia Cognitiva. Rio de Janeiro: LTC, 2005.
RANGÉ, B. Psicoterapias cognitivo-comportamentais: um diálogo com a psiquiatria. Porto Alegre:
Artmed, 2001.
YOUNG, J. E.; KLOSKOV,J. S. Reinventa tu vida. Cómo superar las actitudes negativas y sentirse bien
de nuevo. Espanha: Paidós Ibérica, 2012.
YOUNG, J. E.; KLOSKO,J. S.; WEISHAAR, M. E. Terapia do Esquema. Guia de técnicas cognitivo-
comportamentais inovadoras. Porto Alegre: Artmed, 2008.

capítulo 4 • 103
capítulo 4 • 104
5
Aplicações da
cognição na
atuação profissional
Aplicações da cognição na atuação
profissional

Neste capítulo, serão introduzidas as possíveis aplicações da cognição, possi-


bilitando aos seus leitores perceber que é um vasto campo teórico e com diversas
possibilidades na atuação profissional.

OBJETIVOS
•  Apresentar possíveis aplicações da cognição na atuação do profissional;
•  Permitir contato teórico com a Terapia Cognitiva;
•  Ampliar o conhecimento acerca das possíveis aplicações da Cognição.

Psicologia Cognitiva e Terapia Cognitiva

Entendemos por Psicologia Cognitiva “o estudo de como as pessoas percebem


as informações, aprendem-nas, lembram-se delas e pensam nelas” (Sternberg, R.;
Sternberg, K., 2016). É da função do psicólogo cognitivo estudar os elementos
da cognição, como se desenvolvem, suas interações e estimulação precoce dos ele-
mentos ainda prematuros. À estimulação dos elementos cognitivos aplicamos o
nome de Terapia Cognitiva.

São do interesse do psicólogo cognitivo: percepção visual, atenção, consciência, me-


mória, imagens mentais, aprendizagem, linguagem, pensamento, solução de proble-
mas, tomada de decisão, raciocínio e inteligência.

É sabido que o indivíduo é a integração de todos esses processos e que a separa-


ção desses elementos psicológicos é muito mais didática do que empírica. No entan-
to, o aumento da demanda dos transtornos psicológicos fez nascer a necessidade da
compreensão sobre quais seriam os processos cognitivos envolvidos na produção dos
comportamentos disruptivos. Desta necessidade, estabeleceu-se a diferença entre a
Terapia Cognitiva e a Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC).

capítulo 5 • 106
A origem da Terapia Cognitivo-Comportamental

Atribui-se a Aaron Beck (1921- ), psiquiatra norte-americano, a criação da


Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC). Beck, inicialmente de formação psi-
canalítica, pretendia fundamentar, por meio de uma validação empírica, que os
processos da melancolia seriam uma espécie hostilidade retrofletida deprimida.
No entanto, sua pesquisa evidenciou a presença de um “senso de derrota, fracasso
e perda”. Sendo assim, a interpretação dos dados obtidos demonstrou que os sin-
tomas de depressão são passíveis de explicação pelos termos cognitivos, aos quais
a maioria dos avaliados descreviam tendenciosidade nas situações, com a presença
de representações negativas de si mesmo, do mundo pessoal e do futuro, forman-
do, assim, a tríade cognitiva (Beck, A; Knapp, P., 2008).
Embora a Psicanálise tenha tido uma relevante importância para o desenvolvi-
mento das estratégias e conceitos da Terapia Cognitiva, na medida em que Freud
formula uma estruturação hierárquica em processos primários e secundários,
os teóricos da Psicologia do Eu (Adler, Horney, Rank e Sullivan) tinham maior
influência por terem sido os primeiros a dedicar importância ao entendimento
dos pacientes sobre os fatos e de como poderiam lidar com isso. Ainda assim, as
diferenças epistemológicas aumentaram e fundamentaram-se da seguinte forma
(Beck, A; Knapp, P., 2008):

TCC PSICANÁLISE
Tratamento em problemas presentes Desvelar traumas escondidos no passado

Análise de experiências psicológicas Sonhos, sintomas, chistes e atos falhos


acessíveis oriundos do inconsciente

Breve duração Análise termináveis e intermináveis

Estruturado Associação livre

Modificação dos pensamentos Elaborar e repetir

Cognição distorcida Sintoma como representante da falta

Pensamentos e crenças Afetos e pulsões

capítulo 5 • 107
Segundo KNAPP, Paulo & BECK, Aaron T. (2008), no trabalho intitula-
do “Fundamentos, modelos conceituais, aplicações e pesquisa da terapia cogniti-
va”, existe um crescente interesse em torno da abordagem da Terapia Cognitivo-
Comportamental (TCC), e isso acontece em razão do grande número de pesquisas
que atestam sua eficácia em inúmeros transtornos psicológicos com base em evi-
dências empíricas.
O início do TCC tem seu marco na década de 1960, com Aaron T. Beck,
M.D., então professor de psiquiatria na University of Pennsylvania. Aaron Beck
exercia as técnicas da Psicanálise, porém, em um esforço para fazer a técnica ser
aceita pelo meio médico, buscou experimentos que pudessem demonstrar, com
validade empírica, suas intervenções. Ao contrário, seus resultados apontaram a
existência de cognições distorcidas e negativas como características básicas nos
depressivos, em especial, pensamentos e crenças (Beck, 2013).
A TCC é uma abordagem da Psicologia que se caracteriza por ser um modelo
de psicoterapia breve, estruturado e direcionado para a resolução de problemas
atuais e a modificação de pensamentos e comportamentos disfuncionais (Beck,
1964). Frequentemente, os problemas vivenciados pelos indivíduos surgem a par-
tir da sua interpretação a respeito de determinado evento, o que, por sua vez,
influência no humor e no comportamento subsequente. A ideia central de qual-
quer Terapia Cognitiva é quebrar o ciclo que perpetua e amplifica os problemas
do indivíduo e, no TCC, não seria diferente. Para tanto, há uma série de técnicas
capazes de modificar os pensamentos disfuncionais e, consequentemente, eliminar
o impacto da tendenciosidade no humor e no comportamento (Knapp, 2004). A
terapia cognitiva tem sido utilizada no tratamento de diversos transtornos mentais
com pacientes de diferentes níveis de educação, renda e cultura (Beck, 1997),
sendo também eficaz para as terapias de casal e famílias (Dattilio, 2004) e a reedu-
cação alimentar (Beck, 2009; Meyer, 2004).
Para exemplificar, Judith Beck supõem uma pessoa deprimida que, ao passar
um cheque sem fundo, poderia ter um pensamento automático: “Eu não faço
nada direito!”. Então ela prossegue

Esse pensamento poderia, então, conduzir uma reação específica. Você se sentiria tris-
te (emoção) e se refugiaria na cama (comportamento). Se, então, examinasse a validade
dessa ideia, poderia concluir que fez uma generalização e que, na verdade, você faz muitas
coisas bem. Encarar a experiência a partir dessa nova perspectiva provavelmente faria você
se sentir melhor e levaria a um comportamento mais funcional. (Beck, 2018, p. 23)

capítulo 5 • 108
A fim de que as mudanças comportamentais e do humor sejam mais duradou-
ras, Beck continua falando sobre a ação dos terapeutas que atuam em um nível
mais profundo de cognição, que são:

as crenças básicas do paciente sobre si mesmo, seu mundo e as outras pessoas. A


modificação das crenças disfuncionais subjacentes produz uma mudança mais dura-
doura. Por exemplo, se você continuamente subestima suas habilidades, pode ser que
tenha uma crença subjacente de incompetência. A modificação dessa crença geral
(isto é, ver a si mesmo de forma mais realista, como alguém que tem pontos fortes e
fracos) pode alterar a sua percepção de situações específicas com que se defronta
diariamente. Você não terá mais tantos pensamentos com o tema: “Eu não faço nada
direito”. Em vez disso, em situações específicas em que comete erros, você provavel-
mente pesará: “Eu não sou bom nisso [tarefa específica]”. (Beck, 2018, p.23)

É bastante comum, nas Terapias Cognitivas, encontramos amplas descrições,


técnicas e manobras que podem ser utilizadas na saúde, nas escolas, nas orienta-
ções vocacionais e nas organizações. No caso da terapia de Beck, isto é, a Terapia
Cognitivo-Comportamental (TCC) é adicto uma direção para o comportamento
observável e aplicadas técnicas psicoterapêuticas voltadas para que as estruturas
cognitivas modifiquem o conjunto comportamental a fim de que o sujeito amplie
seu repertório de habilidades que conduzam ao cliente novos horizontes para os
pensamentos distorcidos, avaliações cognitivas irrealistas e emoções conflituosas
(Beck, A.; Knapp, P., 2008).
Desde quando ficou evidente o papel da cognição na depressão e surgiram
inúmeras tentativas de intervenção psicoterapêutica na literatura, isto é, na meta-
de do século passado, é possível perceber um progresso nas pesquisas da Psicologia
Cognitiva na direção da estrutura e das possibilidades de remodelação. Para avaliar
a validade, objetividade e fidedignidade dos sistemas psicológicos foram eleitos
três condições imprescindíveis: a teoria deveria descrever uma psicopatologia com
abrangência suficiente para que pudesse dialogar com outras abordagens psicote-
rápicas; que se constituíssem a partir de bases empíricas passíveis de investigação
científica; e que fosse possível validar quantitativamente a eficácia da terapia.
Segundo Judith S. Beck (2018), embora a Terapia Cognitivo-Comportamental
seja adaptável a todos os indivíduos, para manter seus critérios de cientificidade,
tem dez princípios básicos para o tratamento:
1. A TCC está em contínuo desenvolvimento e formulação acerca dos problemas
do paciente em seus termos cognitivos particulares;

capítulo 5 • 109
2. A TCC requer uma aliança terapêutica sólida com o paciente;
3. A TCC enfatiza a participação e a colaboração ativa;
4. A TCC tem foco nos objetivos e nos problemas;
5. A TCC tem ênfase no presente;
6. A TCC é educativa por ter objetivo em ensinar o paciente a ser o seu terapeuta
ao mesmo tempo que ensina como prevenir recaídas;
7. A TCC pretende ser breve;
8. A TCC tem suas sessões estruturadas;
9. A TCC ensina seus pacientes a identificar, avaliar e responder às crenças e
pensamentos disfuncionais;
10. A TCC utiliza inúmeras técnicas para mudar o pensamento, o humor e o
comportamento do paciente.

Além da TCC de Beck, existem muitas outras formas de Terapia Cognitivo-


Comportamental. Abaixo, seguem algumas escolas que mantêm a mesma concei-
tualização e ênfase:

FORMA PRINCIPAIS TEÓRICOS


Terapia Racional-Emotiva
Ellis, 1962
Comportamental

Terapia Comportamental Dialética Lineham, 1993

Terapia de Solução de Problemas D’Zurilla e Nezu, 2006

Terapia de Aceitação e Compromisso Hayes, Follette e Linehan, 2004

Terapia de Exposição Foa e Rothbaum, 1998

Terapia de Processamento Cognitivo Resick e Schnicke, 1993

Psicoterapia de Análise
McCullough, 1999
Cognitivo-Comportamental

Lewinsohn, Sullivan e Grosscup, 1980;


Ativação Comportamental
Martell, Addis e Jacobson, 2001

Modificação Cognitivo-Comportamental Meichenbaum, 1977

capítulo 5 • 110
Em meio às diferenças no que se refere aos objetivos e técnicas, Dobson
e Block (1988) elencaram três premissas básicas partilhadas pelas terapias
cognitivo-comportamentais:
1. A atividade cognitiva afeta o comportamento e suas implicações clínicas são
evidentes, já que alterações cognitivas conduzem a alterações comportamentais;
2. A atividade cognitiva pode ser monitorada e alterada. Justamente porque o
indivíduo é possuidor de acesso direto às suas próprias cognições é que são capazes
de alterá-las;
3. A mudança de comportamento almejada pode ser afetada pela mudança cog-
nitiva. Os terapeutas cognitivo-comportamentais afirmam que, além da mudan-
ça nas contingências de reforçamento, as alterações ao nível cognitivo funciona-
riam como métodos alternativos para se efetuarem mudanças comportamentais
e enfatizam os procedimentos que levam em conta tal processo. Tal ênfase é,
muitas vezes, citada como um diferencial importante em relação aos terapeutas
comportamentais.

É possível que o surgimento de outras alternativas terapêuticas cognitivo-


-comportamentais tenha acontecido por causa da pouca valorização das cognições
nas terapias comportamentais tradicionais (Beidel & Turner, 1986). Por sua vez,
Dobson & Block (1988) apontam que o entrave aconteceu em virtude da manu-
tenção de explicações behavioristas para os comportamentos humanos complexos
o que por sua vez não encontrar reflexos nos problemas trazidos pelos pacientes.
Independentemente das hipóteses acerca do motivo do surgimento de ou-
tras abordagens teóricas, para alguns analistas do comportamento, as novas te-
rapias cognitivo-comportamentais, tem pouco da Análise do Comportamento.
Justamente por isso, acabaram produzindo condições para o ressurgimento da
noção de determinantes internos do comportamento, o que era ignorado pelo
behaviorismo (Schwartz, 1982).

O Modelo Cognitivo e a Terapia Cognitiva

O principal fundamento teórico que proporcionou a aplicação dos conheci-


mentos da Psicologia Cognitiva para uma Psicoterapia é o postulado denominado
Modelo Cognitivo, o qual afirma que o pensamento de uma pessoa influencia
suas emoções e seu comportamento. Esse modelo foi construído por Aaron Beck
(1921- ), por meio de suas pesquisas acerca dos processos psicológicos na depressão.

capítulo 5 • 111
Adiante, afirma Judith Beck (2018, p. 50):

A terapia cognitivo-comportamental está baseada no modelo cognitivo, o qual parte


da hipótese de que as emoções, os comportamentos e a fisiologia de uma pessoa são
influenciados pelas percepções que ela tem dos eventos. [...] Não é a situação em si
que determina o que a pessoa sente, mas como ela interpreta uma situação.

A partir dos pressupostos do modelo cognitivo, observamos que a interpre-


tação da percepção da situação acontece no nível de pensamento e que este pode
ocorrer simultaneamente com outros pensamentos, porém mais superficiais, e re-
cebe o nome de pensamento automático.
Os pensamentos automáticos não são deliberados, mas surgem espontanea-
mente, rápidos e breves. Algumas pessoas podem sequer perceber a presença dos
pensamentos automáticos e é por esta característica que aumenta a possibilidade
de não serem criticados ou questionados, tornando-se assim, passiveis de serem
tomados como verdadeiros.
Outro conceito que surge pelo desdobramento do modelo cognitivo é o que
entendemos por crenças. Crenças são as ideias que as pessoas têm de si mesmas,
sobre as outras e sobre o seu mundo. As crenças surgem pela tentativa de as pes-
soas entenderem o seu ambiente e que, por meio da organização das experiências,
buscam adaptações da forma mais coerente para serem funcionais onde habitam.
As crenças são divididas em:
•  Crenças nucleares: são as ideias que funcionam em níveis mais profundos,
pois são globais, rígidas e supergeneralizadas.
•  Crenças intermediárias: são aquelas que são influenciadas pelas crenças
nucleares e formam as atitudes, as regras e os pressupostos de alguém.

Como funciona uma sessão de Terapia Cognitivo-Comportamental?

Estruturalmente, as sessões de TCC são muito parecidas para os vários trans-


tornos, podendo as intervenções variar de acordo com o paciente. Existem diver-
sos livros que propõem formulações cognitivas, estratégias e técnicas que auxiliam
desde o diagnóstico como formatos de sessões. Em linhas gerais, as sessões seguem
os seguintes tópicos:
1. Estabelecer a aliança terapêutica;
2. Checar o humor, os sintomas e as experiencias do paciente durante a semana
que passou;

capítulo 5 • 112
3. Pedir que nomeie os problemas que precisa resolver;
4. Examinar as atividades de autoajuda (“plano de ação” ou “exercício de casa”);
5. Discussão de um problema específico que o paciente tenha trazido;
6. Conceituar cognitivamente as dificuldades do paciente (perguntando sobre
seus pensamentos e emoções);
7. Planejar colaborativamente uma estratégia com soluções objetivas e diretas do
problema.

Segundo Judith Beck (2018, p. 55):

Um aspecto muito significativo para o terapeuta cognitivo-comportamental é que as


crenças disfuncionais podem ser desaprendidas, e novas crenças baseadas na reali-
dade e mais funcionais podem ser desenvolvidas e fortalecidas durante o tratamento.
A maneira mais rápida de ajudar ao paciente a se sentir melhor e a se comportar mais
adaptativamente é facilitar a modificação direta das suas crenças nucleares o mais
rápido possível, porque, depois que faz isso, o paciente tende a interpretar situações ou
problemas futuros de maneira mais construtiva.

É possível que se consiga bons resultados logo no início do tratamento, porém,


quando o paciente possuiu crenças disfuncionais muito arraigadas, ou nucleares,
e estas são questionadas acerca da sua validade muito precocemente, coloca-se em
risco a aliança terapêutica e o terapeuta terá sua credibilidade colocada em dúvida
e podendo até perdê-la.
Para que tal vínculo não pereça, o curso comum das TCC, necessita, logo no
início, ter um cuidado especial na identificação e modificação de pensamentos
automáticos provenientes das crenças nucleares.

A formação do terapeuta da TCC

Seria imperícia acreditar que sendo a sessão de TCC estruturada e dotada de


estratégias faria o trabalho do psicoterapeuta ser mais simples ou menos trabalho-
so. Ao contrário, o terapeuta da TCC, partindo do conceito de modelo cognitivo,
precisa realizar muitas tarefas concomitantemente:
A. Durante a sessão: conceituar o caso, desenvolver o rapport, identificar o pro-
blema, coletar dados, separar os elementos da queixa do paciente, interpretar cog-
nitivamente a fala do paciente, testar hipóteses e educar o paciente;

capítulo 5 • 113
B. Fora da sessão: estruturar as próximas sessões, fazer resumos periódicos corri-
gir testes psicológicos e inventários.

A fim de atingir um nível de competência como terapeuta, Beck (2018) pro-


põem o desenvolvimento das seguintes habilidades:

NÍVEL DE HABILIDADE APRENDIZADO


Desenvolver a relação terapêutica,
habilidade de conceituação e
Aos iniciantes
técnicas da Terapia
Cognitivo-Comportamental.

Três estágios:
1. Desenvolver a capacidade básica de
conceituar casos nos termos cognitivos
com base na avaliação e em dados cole-
tados na sessão;
Expertise
2. Proficiência em estruturar técnicas
compatíveis com a conceituação e, com isso,
compreender melhor o fluxo da terapia;
3. Habilidade em integrar novos dados
à conceituação já realizada.

Embora aparente ser muito complexo atingir o nível máximo da expertise na


TCC é importante para os iniciantes focarem que seu objetivo não é curar o pa-
ciente hoje e que ninguém espera isso. E que o que importa realmente é fazer uma
boa aliança de trabalho e, se possível, resolver algum problema. Para aprimorar as
habilidades terapêuticas só temos o tempo!

Eficácia da Terapia Cognitiva-Comportamental

A TCC tem-se mostrado eficaz no tratamento de diversos transtornos psiquiá-


tricos, problemas psicológicos e problemas médicos com componentes psicológi-
cos. Tal eficácia é mensurada em diversos estudos científicos, uma expressiva taxa
de redução dos sintomas em pacientes com ou sem intervenção medicamentosa.
Em 2008, foram contabilizados cerca de 330 artigos de resultados de interven-
ções cognitivo-comportamentais (Beck, A.; Knapp, P., 2008). Em 2018, mais de
500 estudos de aplicações foram contabilizados (Beck, J., 2018), e a produção de

capítulo 5 • 114
pesquisas continua. Segundo Beck, A. & Knapp, P. (2008, p. 55), “alguns estudos
de resultado usando neuroimagem recentemente confirmaram o que já se previa:
as TCC produzem mudanças fisiológicas e funcionais em muitas áreas cerebrais."
Por fim, Beck, A. & Knapp, P. concluíram brilhamente sobre a eficácia da TCC:

Não há dúvida de que a abordagem cognitiva de Beck representa uma mudança teóri-
ca no entendimento e tratamento de transtornos emocionais. Mais de 40 anos após a
publicação da teoria cognitiva da depressão, a TC tornou-se a abordagem psicoterápi-
ca independente mais importante e com melhor validação científica. Com o movimento
recente em direção à prática baseada em evidências, a TC recebeu atenção destaca-
da. Novas indicações da TC são desenvolvidas para uma ampla gama de condições
médicas e psicológicas, embora as bases teóricas do modelo cognitivo permaneçam
inalteradas. Conforme Beck ressaltou, “o progresso contínuo na pesquisa e prática
evidenciado na história das terapias cognitivo-comportamentais pode ser interpretado
como uma indicação de que o futuro do campo indubitavelmente presenciará avanços
contínuos” (2008, p. 63).

Áreas de atuação: saúde, escolar e organizacional

A Psicologia Cognitiva é um campo de investigação experimental que, in-


dependente dos fenômenos particulares, busca a união das teorias com os dados
empíricos, com o objetivo de promover compreensão e aplicações sobre a capaci-
dade de adaptação e interação da cognição humana com outros seres e com outros
processos não cognitivos.
Quando falamos em processos categorizados como “não cognitivos”, referimo-nos
à possibilidade de direcionar a pesquisa cognitiva para uma aplicação aos conhecimen-
tos das necessidades básicas dos seres humanos, cujas conclusões viabilizem estabelecer
estratégias que otimizem suas ações e desenvolvam qualidade de vida.
Neste sentido, pretendemos destacar as contribuições da Psicologia Cognitiva
da Terapia Cognitiva-Comportamental na Saúde, na Escola e nas Organizações.

A saúde

O cuidado sobre o corpo e, consequente, a promoção da saúde e do cuidado


é um processo atravessado por contextos sociais, geográficos, culturais e modifi-
cado ao longo da história. O desejo pela boa saúde e a promoção da qualidade de
vida é um fenômeno transmitido das classes superiores até àqueles pertencentes à

capítulo 5 • 115
força de trabalho, e os padrões foram estabelecidos conforme as possibilidades das
manifestações de poder que variam da técnica aos recursos, perpassando pelas pos-
sibilidades institucionais, da disponibilidade de tempo e da associação da beleza
com a higienização burguesa (Moraes, A., 2008).
No entanto, estamos diante de uma revolução mundial que se baseia em uma
visão mais ampla da complexa relação saúde-doença e de seus determinantes, de
maneira que o modo como cuidamos da vida passou a ser enriquecido pelo acesso
às informações, fazendo com que a saúde pudesse ser mais relacionada com o de-
senvolvimento humano e com a qualidade de vida, tornando-nos mais adaptáveis,
promovendo ambientes mais favoráveis e viabilizando melhorias e assertividade na
tomada de decisão e solução de problemas.
A Primeira Conferência Internacional sobre a Promoção da Saúde foi realiza-
da em Ottawa, no Canadá, em novembro de 1986, e culminou na produção de
uma carta em que se denominava a promoção da saúde como um processo que
capacita a sociedade para ser atuante na melhoria da qualidade de vida e, conse-
quentemente, da saúde, afirmando a necessidade de que este deve ser um processo
ativo do sujeito pela busca de um completo bem-estar social, físico e mental.
A carta de Ottawa revoluciona o posicionamento da sociedade diante da saúde
na medida em que estabelece pré-requisitos para a saúde; a necessidade da defesa
de recursos para a promoção e defesa direta da saúde por ser causa e meio de de-
senvolvimento pessoal, social e econômico; construir políticas públicas saudáveis
no ponto de vista do asseguramento legislativo, fiscais e educacionais e desenvolvi-
mento de bens e serviços voltados para uma equidade de acesso à saúde e à higiene.
Compreendendo que o acesso à informação já como um dispositivo para o
serviço da medicina preventiva e preditiva, o paciente com igual acesso poderia
entender melhor suas contribuições, tornando-se atuante na aquisição do quadro
saudável para a prevenção de doenças e os tratamentos. Desta forma, vislumbra-
mos, no desenvolvimento das habilidade cognitivas, uma excelente forma de au-
mentar o desenvolvimento da aplicabilidade de dispositivos médicos inteligentes,
promover a saúde primária e desafogar os pronto-atendimentos com emergências
que poderiam ser resolvidas no âmbito ambulatorial.
A computação cognitiva e o desenvolvimento cognitivo sobre a responsabili-
dade individual sobre a própria saúde igualmente poderá ser auxiliar na redução
de custos, no aumento da eficiências dos dispositivos de saúde e seus operadores, e
previsão de atuação por meio da análise cruzada de dados para controle de epide-
mias e doenças endêmicas, otimizando e realocando recursos.

capítulo 5 • 116
Escola e Organizações

Em decorrência dos estudos da Psicologia Social e do Trabalho, a partir da


década de 1960, na Inglaterra, ressoou os primórdios da teoria das Habilidades
Sociais. Inicialmente ainda alicerçada pelos estudos sob a égide do treinamento
corporativo, consolidou-se em uma investigação própria quando encontrou expli-
cações que se aplicassem, para fins de desempenho social, em um modelo meto-
dológico inovador que, no manejo da ansiedade, tornar-se-ia possível adequar as
emoções em relação a outra pessoa com base em um treinamento de habilidades
(Bueno, Oliveira, & Oliveira, 2001).
De modo mais consistente, o Treinamento das Habilidades Sociais (THS)
tornou-se mais sedimentado quando aplicado a qualquer dificuldade de natureza
interpessoal e de resolução de problemas, facilmente agrupado na dificuldade de
comunicação, cooperação e expressão de sentimentos (Bueno et al., 2001).
Segundo Bueno, Oliveira, & Oliveira (2001), a utilização dos treinamentos de
habilidades sociais já registrou sucessos, cientificamente publicados, em pacientes
psiquiátricos, alcoolistas, nos transtornos de personalidade e depressão, além de
aplicabilidades práticas para o desenvolvimento da autoestima em crianças e a
reabilitação de presidiários, demonstrando o impacto sobre a capacidade de rea-
daptação e de desempenho escolar. Ainda neste panorama, pesquisas relatam que
pessoas tidas como problemáticas são as que possuem baixos níveis de compreen-
são interpessoal e autopercepção de competência diante de seus pares.
Por essas aproximações, foi possível teorizar que algumas habilidades sociais
estão, de algum modo, envolvidas em várias características de personalidade e se
sucedem na constatação de que “a competência social é capaz de prever o nível de
felicidade que o indivíduo encontrará na vida” (Argyle & Lu, 1990 como citado
em Bueno et al., 2001).
No cenário da Psicologia Social no Brasil, destaca-se o Inventário de
Habilidades Sociais (IHS), desenvolvido por Del Prette & Del Prette (1998),
como referência em avaliação e pesquisa, o qual pretende avaliar as habilidades
sociais em cinco fatores das habilidades sociais, a saber:
1. Enfrentamento com risco;
2. Autoafirmação na expressão de afetos positivos;
3. Conversação e desenvoltura social;
4. Autoexposição a desconhecidos ou a situações novas e;
5. Autocontrole da agressividade a situações aversivas.

capítulo 5 • 117
Por outro lado, baseado no conceito de que a personalidade é um construc-
to constituído em índices fatoriais, o teste NEO-PI-R (Costa & McCrae, 1992,
como citado em Bueno et al., 2001) surge a partir de uma compilação moderna de
instrumentos tradicionais, tal como o 16PF, o CPS, e o MMPI. Neste instrumen-
to, o cenário da avaliação da personalidade adota o Modelo dos Cinco Grandes
Fatores, que são:
1. Extroversão;
2. Socialização;
3. Escrupulosidade;
4. Neuroticismo e;
5. Abertura para novas experiências.

Baseado em uma relação conceitual entre as habilidades sociais e os traços


de personalidade, Bueno, Oliveira, & Oliveira (2001) parte da hipótese de que
as diferentes habilidades sociais poderiam ser explicadas pelos diferentes traços
de personalidade.
Após realização de variâncias e correlacionais das habilidades sociais, foi pos-
sível chegar a algumas conclusões (Bueno et al., 2001):
•  Sobre os gêneros:
1. Homens tendem ao enfrentamento com risco maior do que as mulheres;
2. Mulheres tendem a demonstrar mais autoafirmação na expressão de afetos
positivos do que os homens;
3. Não se evidenciou qualquer resultado significativo de que as habilidades so-
ciais não se desenvolvem ou melhoram com a idade.
•  Entre as características de personalidade:
1. Extroversão com correlação negativa com o neuroticismo;
2. Extroversão com correlação positiva com abertura para novas experiências,
socialização e escrupulosidade;
3. Não se evidenciou correlação entre neuroticismo e abertura para novas
experiências;
4. Abertura para novas experiências apresentou alta correlação positiva com es-
crupulosidade, socialização e extroversão.
•  Entre os fatores de habilidades sociais:
1. Enfrentamento com risco altamente correlacionado com autoafirmação na
expressão de afetos positivos;

capítulo 5 • 118
2. Enfrentamento com risco compreende a autoafirmação na expressão de afetos
positivos, mas não o contrário;
3. Conversação e desenvoltura social correlacionou-se com as habilidades de au-
toexposição a desconhecidos ou a situações novas e autocontrole da agressividade
a situações aversivas;
•  Correlação entre habilidades sociais e características de personalidade:
1. Enfrentamento com risco, autoafirmação na expressão de afetos positivos e
conversação e desenvoltura social possuem correlações com todos os traços de
personalidade;
2. Autoexposição a desconhecidos ou a situações novas somente se correlacionou
como extroversão e neuroticismo;
3. Autocontrole da agressividade a situações aversivas correlacionou-se com so-
cialização e neuroticismo.
•  Correlação parcial entre Enfrentamento com risco e traços de
personalidade:
1. Existe correlação entre enfrentamento com risco e extroversão e abertura para
novas experiências;
2. Socialização e escrupulosidade não tem evidências de correlação entre abertu-
ra para novas experiências, neuroticismo e escrupolosidade.
•  Correlação parcial entre Autoafirmação na expressão de afetos positivos
e traços de personalidade:
1. Autoafirmação na expressão de afetos positivos possui correlação com sociali-
zação e neuroticismo;
2. Extroversão não possui correlação com neuroticismo;
3. Escrupulosidade não possui correlação com socialização;
4. Abertura para novas experiências sem correlação com socialização ou
escrupulosidade.
•  Correlação parcial entre conversação e desenvoltura social com traços
de personalidade:
1. Socialização e abertura para novas experiências não possuem correlações signi-
ficativas com conversação, desenvoltura social e escrupulosidade;
2. Conversação e desenvoltura social requer um conjunto de traços de persona-
lidade que não necessariamente altruístico;
3. Autoexposição a desconhecido ou a situações novas obteve correlação signifi-
cativa com extroversão e neuroticismo.

capítulo 5 • 119
•  Correlação parcial entre autocontrole da agressividade a situações
aversivas:
1. Autocontrole da agressividade a situações aversivas está correlacionado apenas
com socialização quando comparados com os traços de personalidade.

Após análise das correlações existentes, foram encontradas evidências que cor-
roboram com a concepção de diferenças entre os gêneros e as primeiras habilidades
sociais e, que existem diversas associações dos diferentes traços de personalidade
com as diferentes habilidades sociais. Os resultados ainda apoiaram a validade de
ambos os instrumentos para programas de seleção, desenvolvimento, treinamen-
to, aconselhamento e orientação psicológica (Bueno et al., 2001).

A subjetividade na produção da saúde e da educação

A possibilidade de ouvir a subjetividade por meio da ordem do discurso é um


processo novo, visto que “jamais, antes do século XVIII, um médico teve a ideia
de saber o que era dito (como era dito, por que era dito) nessa palavra que, contu-
do, fazia a diferença” (Foucault, 2014, p. 11).
A interdição do louco, dono das palavras sem razão, consolidou, a partir das
classificações escolásticas da Idade Média, uma associação de que qualquer discur-
so sem o notório saber validado pela lógica vigente deveria ser rejeitado e trans-
formado em um discurso sem identidade e individualidade, desapropriado de um
valor simbólico e, portanto, destituído de uma verdade. Desta forma, um discurso
carregado de subjetividade passava a fazer parte de uma forma de crendice ou um
jogo metafórico aumentando as diferenças entre as classes pelo uso de um poder
velado pela ordem do discurso (Foucault, 2014).
Atualmente, as Teorias da Subjetividade têm alcançado uma epistemologia
qualitativa baseada em pesquisas empíricas e demonstrado que sua inserção é uma
alternativa que permite novas práticas, que possibilitam a inteligibilidade sobre
processos da saúde, em detrimento do modelo materialista dominante que su-
bestima o valor fundamental da anamnese que possa ser capaz de fazer aparecer
o doente com sua doença. Nesta comunicação das subjetividades dos envolvidos
no processo de saúde, tem demonstrado maior restabelecimento da homeostasia
corporal, do vínculo entre os sujeitos e as melhores escolhas e aceitação nas abor-
dagens clínicas (Barros & Botazzo, 2011; Da Costa & Magalhães Goulart, 2015).

capítulo 5 • 120
Em um contrassenso algumas instituições escolares ainda insistem em se opor
a mudanças que possam alcançar seu público contemporâneo (Bonioli, 2014;
Morin, 2011; Perrenoud, Thurler, Macedo, Machado, & Alessandrini, 2002).
Em uma postura contraproducente, a escola tradicional e os modelos de ava-
liação aparentemente se opõem ao modelo sociológico de cooperação e constru-
ções dialógicas, alterando em seus métodos contrários as oficinas, uma distância
maior do comprometimento social, da igualdade e estabelecendo um caráter in-
dustrial de concorrência sob as personalidades dos jovens promovendo fetiches de
afirmação pouco eficiente e de simpatia em troca da empatia. Não sem motivos,
o processo de sociabilidade tem gerado grandes inquietações quanto à eficácia do
conhecimento e do conceito de competência ante a possibilidade do aumento da
falta de autocontrole manifesta pela reincidência narcísica ou pela hibernação da
indiferença, objetivando reduzir a própria ansiedade (Senner, 2012).

Os sujeitos perante a inovação tecnológica

Perante as mudanças da automação, os trabalhadores enfrentaram uma sensa-


ção de frustração e conformação, marcado sobretudo, pela desvalorização daquilo
que perdeu serventia mediante a substituição pela máquina. A cooperação e a
repetição foram rapidamente substituídas por uma nova organização do trabalho
e subjetiva que privilegiava a criatividade, e a capacidade de isolamento e compe-
titividade. Neste ensejo, a contabilidade automática da produção e do seu controle
conduziu para uma transformação mental, fazendo surgir o sentimento de agres-
sividade, desconfiança e vigilância de si (Rebecchi, 1990).
Para os trabalhadores e estudantes dotados com ferramentas tecnológicas e per-
meados com inúmeras crenças, atitudes e estereótipos diferentes sobre suas formas
de utilização e teorias sobre o futuro das inovações, já iniciaram formas diferenciadas
de transmissão de conhecimento (Gonçalves, 2003). Nestas diferenciações, os pro-
cessos formais de aquisição do conhecimento científico, isto é, as escolas e as univer-
sidades, não poderiam ficar apáticos diante dessas transformações. Assim, inúmeras
propostas de sistemas inovadores de ensino e aprendizagem têm sido apresentadas
de modo inovador, colaborativo e num paradigma que aponta para uma mediação
diferenciada, ao qual o acesso à informação se encerra no segundo plano, em detri-
mento do saber escolher informação (Moran, Masetto, & Behrens, 2013).

capítulo 5 • 121
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GABARITO
Capítulo 1

01. C 03. D

02. A 04. E

Capítulo 2

01. B 03. B

02. C 04. C

Capítulo 3

01. A 02. B

03. Porque as representações mentais que organizam o conhecimento na memória são


transformadas ativamente, tanto pela interferência de novas estimulações quando o estímulo
inicial está sendo codificado, quanto pelo repertório de esquemas mentais já existentes no
organismo. Neste sentido, pode-se dizer que somos aquilo que recordamos e que resolve-
mos esquecer.

capítulo 5 • 126
04. Atenção e consciência são dois processos cognitivos diferentes que se complemen-
tam. A consciência inclui tanto o sentimento de percepção consciente como o conteúdo da
consciência, parte da qual pode estar sob o foco da atenção (STERNBERG, 2010, p. 108). A
atenção ainda promove alguns benefícios às cognições e à consciência do indivíduo (STER-
NBERG, 2010): ajuda a monitorar as interações entre o ambiente e o ser humano; ajuda
no estabelecimento de relação entre passado (memória) e presente (sensações), dando
um sentido de continuidade na experiência; ajuda no controle e no planejamento de situa-
ções futuras.

05. D

Capítulo 4

01. B 03. V, F, F, V

02. A 04. A

capítulo 5 • 127
ANOTAÇÕES

capítulo 5 • 128

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