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O DESENVOLVIMENTO NA PERSPECTIVA DE AMARTYA SEN E A

REGULAÇÃO POR MEIO DO SALARY CAP: UMA ANÁLISE SOBRE O


EQUILÍBRIO COMPETITIVO PARA A EXPANSÃO DA LIBERDADE1

DEVELOPMENT IN THE PERSPECTIVE OF AMARTYA SEN AND THE


REGULATION THROUGH THE SALARY CAP: AN ANALISYS OF THE
COMPETITIVE BALANCE FOR THE EXPANSION OF LIBERTY

Nathan de Freitas Fernandes


Graduado em Direito pela Unidade de Ensino Superior Vale do Iguaçu - UNIGUAÇU
(2015). Pós-graduado em Gestão Tributária pela Pontifícia Universidade Católica do
Paraná - PUCPR (2016-2017). Mestrando em Direitos Fundamentais e Democracia
no programa de Mestrado Interinstitucional UNIBRASIL-UNIGUAÇU.

Resumo

Sob as perspectivas propostas pelo economista Amartya Sen, o


conceito polissêmico de desenvolvimento ganhou novos
contornos, afastando-se de uma análise restritiva pautada no
crescimento econômico, e buscando uma perspectiva mais
holística, voltada à expansão da liberdade como parâmetro para
o desenvolvimento. Nessa esteira, em análise ao ambiente dos
esportes profissionais podemos verificar a existência de um
instrumento contratual denominado salary cap, cujo objetivo de
implantação se pauta na busca pelo equilíbrio competitivo por
meio da regulação da liberdade econômica dos clubes. Assim,
levando-se em consideração os contornos do instituto em
comento, o presente estudo terá como finaldiade a análise de
sua fenomenologia a fim de aquilatar se a mesma se coaduna
com a perspectiva de desenvolvimento pautada na expansão
das liberdades, e se, desse modo, pode ser considerada como
uma efetiva demonstração acerca da aplicabilidade prática de
suas teorias no meio esportivo, com a abertura de margem à
transcendência das conclusões para além desse meio.
Palavras-chave: desenvolvimento; capacidades; liberdade
substantiva; salary cap; equilíbrio competitivo.

Abstract

Under the perspectives proposed by the economist Amartya

1Trabalho apresentado em cumprimento às exigências da disciplina Teorias da Justiça e Filosofia da


Constituição. Professor Dr. Paulo Ricardo Schier. Mestrado em Direitos Fundamentais e Democracia.
Mestrado Interinstitucional UNIBRASIL-UNIGUAÇU. Fevereiro de 2019.
Sen, the polysemic concept of development gained new outlines,
moving away from a restrictive analysis based on economic
growth, and seeking a more holistic perspective, aimed at
expanding freedom as a parameter for development. In this
wake, in an analysis of the professional sports environment, we
can verify the existence of a contractual instrument called salary
cap, whose implementation objective is based on the search for
competitive equilibrium through the regulation of the economic
freedom of the clubs. Thus, taking into consideration the contours
of the institute in question, the present study will have as an end
the analysis of its phenomenology in order to assess whether it
is in line with the perspective of development based on the
expansion of freedoms, and if, In this way, it can be considered
as an effective demonstration of the practical applicability of its
theories in the sports environment, with the opening of margin to
the transcendence of the conclusions beyond this means.
Key-words: development; capabilities; substantive freedom;
salary cap; competitive balance.

1. INTRODUÇÃO

A evolução da concepção de desenvolvimento passou a contar com


novas perspectivas a partir dos estudos de Amartya Sen, calcadas não (somente) em
uma análise restrita ao âmbito econômico, mas sim voltada a efetiva expansão das
liberdades, elemento que passa a tomar lugar de destaque no âmbito do
desenvolvimento.
Assim, com espeque na teoria proveniente da obra Desenvolvimento
Como Liberdade, promoveremos uma análise do instituto regulatório utilizado nas
ligas esportivas denominado salary cap, visando verificar se sua fenomenologia se
coaduna com a perspectiva de desenvolvimento pautada na expansão das liberdades,
e se, desse modo, tem o condão de confirmar o densenvolvimento pautado na
expansão das liberdades.
Nessa esteira, a fim se alcançar os objetivos do presente estudo,
serão trazidas primeiramente noções preliminares acerca da concepção de
desenvolvimento conforme as perspectivas de Amartya Sen, e, para tanto,
passaremos pela análise de seus conceitos básicos, tais como funcionamento,
capacidades e liberdades.
No capítulo seguinte adentraremos ao estudo do instituto utilizado no
âmbito das ligas esportivas denominado salary cap, abordando a contextualização
histórica de seu surgimento, bem como seu conceito, objetivos, a fenomenologia de
seu funcionamento e seus efeitos práticos na mitigação do desequilíbrio competitivo.
Por fim, no último capítulo deste trabalho abordaremos de forma mais
aprofundada se a fenomenologia do salary cap, fundada na regulação das liberdades
econômicas, se coaduna com as concepções de desenvolvimento de Amartya Sen,
pautada na expansão das liberdades, no meio esportivo, bem como se a forma de
efetivação do instituto permite a conclusões para além desse meio.

2. O DESENVOLVIMENTO COMO EXPANSÃO DA LIBERDADE NA


PERCPECTIVA DE AMARTYA SEN

A busca pelo desenvolvimento sempre foi um objetivo a ser alcançado


pela sociedade moderna, entretanto, desde que tal busca se tornou um paradigma, o
próprio conceito de desenvolvimento sofreu diversas mudanças em seu conteúdo, sua
razão, sua finalidade, seus mecanismos e nos instrumentos necessários a sua
construção, do que se estabeleceu uma verdadeira polissemia em seu entorno2.
Pois bem, as diversas discussões em torno da definição de um
conceito de desenvolvimento têm provocado uma ampliação do debate sobre
modelos, provocando um deslocamento que aponta para a construção de alternativas
econômicas sustentáveis e para a ideia de um desenvolvimento humano3.
Assim, foram criadas inúmeras motivações para justificar os diversos
significados do desenvolvimento, assim como seus diferentes mecanismos, e desse
modo, proposições se empenharam na (re)colocação da sociedade como razão
primordial do desenvolvimento, destacando-se as inovações teóricas tangentes à
abordagem do desenvolvimento sob a ótica das necessidades básicas, incorporando
variáveis qualitativas nas análises econômicas4.
Nessa esteira, impende destacarmos as concepções de Amartya

2 SILVA, Dalvanir Avelino et al; Do Desenvolvimento Como Crescimento Econômico ao


Desenvolvimento Como Liberdade A Evolução de um Conceito; Editora Unijuí, ano 16, n. 42, 2018.
Disponível em:
https://www.revistas.unijui.edu.br/index.php/desenvolvimentoemquestao/article/view/5827/5651.
3 Idem.
4 Idem.
Sen5, economista indiano que, contrastando com as definições mais restritivas de
desenvolvimento, ligadas ao crescimento econômico, expandiu a análise em tela para
uma abordagem mais holística focada nas capacidades, por meio da qual compreende
o desenvolvimento como sendo um “um processo de expansão das liberdades reais
que as pessoas desfrutam”6, com a finalidade de expansão das liberdades humanas
para a boa vida.
Mister nesse momento colhemos a crítica tecida por Amartya Sen7 em
sua obra condutora “Desenvolvimento Como Liberdade”, por meio da qual, ainda que
reconheça o desenvolvimento econômico como instrumento de expansão da
liberdade, consigna que uma concepção adequada de densenvolvimento não deve se
pautar exclusivamente em uma análise calcada em crescimento econômico,
destacando a necessidade de priorização da expansão da liberdade, vejamos:

Uma concepção adequada do desenvolvimento deve ir muito além da acumulação


de riqueza e do crescimento do Produto Nacional Bruto e de outras variáveis
relacionadas à renda. Sem desconsiderar a importância do crescimento econômico,
precisamos enxergar muito além dele. [...] o crescimento econômico não pode ser
considerado um fim em si mesmo. O desenvolvimento tem de estar relacionado
sobretudo com a melhoria da vida que levamos e das liberdades que desfrutamos.
Expandir as liberdades que temos razão para valorizar não só torna nossa vida mais
rica e mais desimpedida, mas também permite que sejamos seres sociais mais
completos, pondo em prática nossas volições, interagindo com o mundo em que
vivemos e influenciando esse mundo.

Tal conclusão decorre das constatações de Amartya Sen8 no sentido


de que, “se a liberdade é o que o desenvolvimento promove, então existe um
argumento fundamental em favor da concentração nesse objetivo abrangente” e,
desse modo, ver o desenvolvimento como expansão das liberdades substantivas
implica na impossibilidade de sua redução a algum dos meios que desempenham um
mister nesse processo, atraindo-se uma necessidade de visão mais holística pautada
pela eliminação das fontes de privação de liberdade.
Nesse contexto, em relação à privação de liberdade, Sen9 destaca
que tal intercorrência pode se originar de “[...] processos inadequados (como a

5 SEN, Amartya Kumar; Desenvolvimento como Liberdade; Tradução por Laura Teixeira Motta; São
Paulo: Companhia das Letras, 2016, p. 28-29.
6 Ibidem, p. 16.
7 Ibidem, p. 29.
8 Ibidem, p. 16.
9 Ibidem, p. 31.
violação do direito ao voto ou de outros direitos políticos ou civis), ou de oportunidades
inadequadas que algumas pessoas têm para realizar o mínimo do que gostariam
(incluindo a ausência de oportunidades elementares como a capacidade de escapar
de morte prematura, morbidez evitável ou fome involuntária)”.
Mister destacar a este ponto que, assim como Amartya Sen, que
definia o desenvolvimento focado na liberdade, decorrente da expansão das
capacidades, o economista brasileiro Celso Furtado, de igual sorte sustentava que o
desenvolvimento referir-se-ia diretamente à ideia de realização das potencialidades
humanas, de modo que o desenvolvimento aconteceria quando a expansão da
capacidade criativa dos homens conduzisse à sua autodescoberta, com a ampliação
de seu mundo em relação a valores materiais e espirituais10, conceito que se aproxima
do alargamento das capacidades humanas (Sen), ao passo em que ambos se
relacionam à ideia de desenvolvimento focado em uma dimensão humana e social.
Nesse passo, impende destacar que o conceito de desenvolvimento
de Furtado não somente refutava uma análise sob a prespectiva do “desenvolvimento
econômico”, calcado na acumulação de riquezas, mas ainda consignava que
justamente essa ótica reforçava, inerente ao sistema capitalista, demonstrava a ideia
de complementariedade entre o desenvolvido e o subdesenvolvido, relação
assimetrica que se caracterizava como a base do subdesenvolvimento11.
Pois bem, ao traçar tal definição de desenvolvimento, voltada à
eliminação de privações de liberdade que limitam as escolhas e as oportunidades das
pessoas de exercer ponderadamente sua condição de agente e, portanto, ao propor
o enfoque da expansão de liberdades, Amartya Sen mudou o conteúdo do
desenvolvimento, tornando-o mais complexo e adequado à avaliação da sociedade
atual.
Ora, a despeito da aparente simplicidade da noção de
desenvolvimento assentada por Sen, certo que por meio de uma análise crítica

10 FURTADO, Celso. El desarrollo como proceso endógeno. Enero - abril, 2011 apud SOUZA, Dellany
Maria Dantas et al apud O desenvolvimento como alargamento das capacidades humanas:
aproximações entre Amartya Sen e Celso Furtado; Revista Brasileira de Desenvolvimento Regional,
Blumenau, v. 2, p. 47-58, 2014. Disponível em:
https://www.academia.edu/12746501/O_desenvolvimento_como_alargamento_das_capacidades_hu
manas_aproxima%C3%A7%C3%B5es_entre_Amartya_Sen_e_Celso_Furtado.
11 FURTADO, Celso. O Mito do Desenvolvimento Econômico; Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1974, p.

94.
depreende-se que tal concepção implica, em verdade, que cada indivíduo assuma a
responsabilidade por suas próprias escolhas, definindo em processos amplos de
discussão e decisão que espécie de vida deseja levar, a fim de que coletivamente se
promova o desenvolvimento.
Isso posto, depreende-se que a partir dessa concepção de
desenvolvimento, a condição de agente dos indivíduos torna-se elemento central no
que concerne ao trato dos problemas e privações a que estão submetidos,
destacando-se, entretanto, que a dita condição de agente se encontra limitada pelas
oportunidades sociais, políticas e econômicas de que o indivíduo dispõe.
Importante destacar que o termo “agente” adotado por Sen12,
consoante esclarecido pelo próprio, não se está sendo utilizado na concepção que
quem age em nome de outro, que lhe é empregada na economia e na teoria dos jogos,
mas sim em uma significação mais antiga e maior, no sentido “ [...] de alguém que age
e ocasiona mudança e cujas realizações podem ser julgadas de acordo com seus
próprios valores e objetivos, independentemente de as avaliarmos ou não também
segundo algum critério externo”.
Ademais, consoante assevera Porsse13, o termo “agente” utilizado por
Sen implica em uma acepção:

[...] relacionada a indivíduos que agem e ocasionam mudanças, sendo suas


realizações julgadas em termos de seus próprios objetivos e valores. Enquanto
agentes ativos de mudança, as pessoas podem cuidar de si mesmas, influenciar o
mundo e ajudar uns aos outros. Conforme o aspecto de agência, os indivíduos não
são vistos como meros beneficiários passivos de programas de desenvolvimento,
mas sim como membros de uma sociedade que participam de ações políticas,
econômicas e sociais, bem como interagem no mercado, na esfera política e em
outras esferas.

Nessa esteira, depreende-se que a condição de agente de


determinado indivíduo se encontra diretamente relacionada à sua liberdade
substantiva, e então, desse modo, quanto mais liberdade, maior será seu potencial e
sua condição para a realização de mudanças e de influenciar processos nas diversas
esferas da vida social, política e econômica.

12 SEN, Amartya Kumar; Desenvolvimento como Liberdade; Tradução por Laura Teixeira Motta; São
Paulo: Companhia das Letras, 2016, p. 34.
13 PORSSE, Melody de Campos et al; A Abordagem das Capacitações: Um Modelo Alternativo para as

Ações Públicas In Redes, Santa Cruz do Sul, v. 13, n. 1, p. 159- 181, 2008., p. 142. Disponível em:
https://online.unisc.br/seer/index.php/redes/article/view/196/1483.
Levando-se em consideração o exposto deprende-se que, de acordo
com a abordagem de Amartya Sen, a expansão da liberdade (substantiva) se trata,
ao mesmo tempo, tanto do fim primordial quanto do principal meio do
desenvolvimento14, assumindo um papel ao mesmo tempo constitutivo e instrumental
na construção do desenvolviment e, em consequência, na construção do indivíduo
como agente transformador.
Como leciona Amartya Sen15, existem duas razões distintias para
determinação da liberdade individual como elemento central no processo de
desenvolvimento, relacionadas respectivamente a razão avaliatória, segundo a qual o
progresso necessita ser avaliado verificando-se se houve aumento da liberdade das
pessoas; e a razão da eficácia, de acorco com a qual o desenvolvimento depende da
livre-condição de agente das pessoas.
Mas então, quais seriam os fatores que determinariam o aumento da
liberdade individual?
Pois bem, segundo modelo téorico desenvolvido por Sen, a liberdade
se trata de uma função direta das capacidades, razão pela qual a expansão das
capacidades implicaria, por consequência, em uma expansão das liberdades, e
exatamente nesse ponto se encontra o fundamento de Amartya Sen ter elaborado seu
argumento central em torno da ideia do desenvolvimento como liberdade.
Os limites da expansão das liberdades (substantivas), que decorrem
das capacidades, são formulados consoante as desvantagens individuais existentes
em função da limitação das capacidades possuídas por cada pessoa. Assim, as
capacidades podem ser definidas como um conjunto de vetores de funcionamentos
que um indivíduo pode realizar, refletindo tanto a oportunidade quanto a restrição no
que concerne à escolha dentre diversos estilos de vidas possíveis e, nessa toada,
impende trazermos a baila a valiosa lição de Amartya Sen16 acerca da capacidades,
no sentido de que:

O conjunto de capacidades representa a liberdade pessoal de realizar várias

14 SEN, Amartya Kumar; Desenvolvimento como Liberdade; Tradução por Laura Teixeira Motta; São
Paulo: Companhia das Letras, 2016, p. 25.
15 Ibidem, p. 17.
16 SEN, Amartya Kumar; O Desenvolvimento como Expansão de Capacidades; Lua Nova, nº 28-29,

São Paulo, Brasil, 1993. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-


64451993000100016.
combinações de efetivações. Se a liberdade é intrínsecamente importante, as
combinações disponíveis para a escolha são todas relevantes para se avaliar o que
é vantajoso para uma pessoa, mesmo que ele ou ela escolha apenas uma
alternativa. Nessa perspectiva, a escolha é, em si mesma, uma característica
valiosa da vida de uma pessoa.

As capacidades são, nessa perspectiva, um tipo de liberdade que


decorre das combinações de funcionamentos, consistindo nas “combinações
alternativas de funcionamentos cuja realização é factível”17 para o agente, ou seja, na
liberdade substantiva de promover combinações alternativas de funcionamentos para
ter estilos de vida diversos.
Isso posto, podemos consignar que cada pessoa dispõe de um
conjunto distinto de capacidades, do qual decorrem diferentes vetores de
funcionamentos, ou seja, as várias combinações de estados e de ações que o
indivíduo, na condição de agente transformador, pode pensar em termos de
desempenho do que pode ou não realizar com a sua vida.
Ainda, consoante leciona Amartya Sen18, a capacidade de uma
pessoa se trata de uma noção derivada, que:

[...] reflete as várias combinações de efetivações (atividades e modos de ser) que


uma pessoa pode alcançar. Isso envolve uma certa concepção da vida como uma
combinação de várias "atividades e modos de ser". A capacidade reflete a liberdade
pessoal de escolher entre vários modos de viver. A motivação subjacente — o foco
na liberdade — é bem apreendida no argumento marxista de que o que
necessitamos é "substituir o domínio das circunstâncias e do acaso sobre os
indivíduos pelo domínio dos indivíduos sobre o acaso e as circunstâncias.

Desse modo podemos estabelecer como ponto central da análise


tecida por Sen em seu estudo como sendo a constatação de que a capacidade
consiste na possibilidade de obtenção de bem-estar, que os funcionamentos
contribuem diretamente para a realização desse objetivo e, por fim, que a própria
possibilidade de escolha é em si uma parte valiosa do viver19.
Nessa senda, em relação à liberdade como possibilidade de escolha

17 SEN, Amartya Kumar; Desenvolvimento como Liberdade; Tradução por Laura Teixeira Motta; São
Paulo: Companhia das Letras, 2016, p. 105.
18 SEN, Amartya Kumar; O Desenvolvimento como Expansão de Capacidades; Lua Nova, nº 28-29,

São Paulo, Brasil, 1993. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-


64451993000100016.
19 SEN, Amartya, Kumar; A Ideia de Justiça; 2. ed. Tradução por Ricardo Doninelli Mendes; Rio de

Janeiro: Record, 2008, p. 194.


e, portanto, da liberdade substantiva como um fim em si mesmo, mister colacionarmos
valiosa lição deduzida por Sen no sentido de que:

Ao avaliarmos nossas vidas, temos razões para estarmos interessados não apenas
no tipo de vida que conseguimos levar, mas também na liberdade que realmente
temos para escolher entre diferentes estilos e modos de vida. Na verdade, a
liberdade para determinar a natureza de nossas vidas é um dos aspectos valiosos
da experiência de viver que temos razão para estimar. 20

Partindo das premissas até então delineadas, e levando-se em


consideração que as capacidades refletem a possibilidade para alcançar bem-estar,
a abordagem de desenvolvimento por meio de um processo de expansão da
liberdadade e, portanto, da expansão da capacidade, nos permite extrair as diversas
facetas que a pobreza pode assumir, que se caracteriza como a privação de
capacidades elementares, ou seja, a impossibilidade de realização de um
funcionamento elementar21, e propor uma solução que assegure uma vida digna a
todos ao focar nas capacidades e nos funcionamentos, consistente na redução da
injustiça e da desigualdade, mediante a garantia que todos possam realizar os
funcionamentos básicos tidos como essenciais22.
Assim, pautado por tais constatações, e consoante a razão avaliatória
da igualdade, Amartya Sen sustenta que “o êxito de uma sociedade deve ser avaliado,
nessa visão, primordialmente segundo as liberdades substantivas que os membros
dessa sociedade desfrutam”23, sendo possível, destarte, afirmar que somente há
desenvolvimento quando os benefícios do crescimento servirem à expansão das
capacidades humanas, com a consequente ampliação das liberdades substantivas,
ou seja, do conjunto das coisas que as pessoas podem ser ou fazer na vida.
Destarte, por meio dessa perspectiva, ao invés de oferecer um
modelo teórico com uma sociedade perfeita e justa, o que se deseja, ao focar nas

20 SEN, Amartya, Kumar; A Ideia de Justiça; 2. ed. Tradução por Ricardo Doninelli Mendes; Rio de
Janeiro: Record, 2008, p. 194.
21 SEN, Amartya Kumar; Desenvolvimento como Liberdade; Tradução por Laura Teixeira Motta; São

Paulo: Companhia das Letras, 2016, p. 36.


22 “O conceito de ‘funcionamento’ que tem raízes distintamente aristotélicas, reflete as várias coisas

que uma pessoa pode considerar valioso fazer ou ter. os funcionamentos valorizados podem variar dos
elementares, como ser adequadamente nutrido e livre de doenças evitáveis, a atividades ou estados
pessoais muito complexos, como poder participar da vida da comunidade e ter respeito próprio” in SEN,
Amartya Kumar; Desenvolvimento como Liberdade; Tradução por Laura Teixeira Motta; São Paulo:
Companhia das Letras, 2016, p. 95.
23 SEN, Amartya Kumar; Desenvolvimento como Liberdade; Tradução por Laura Teixeira Motta; São

Paulo: Companhia das Letras, 2016, p. 33.


capacidades e nos funcionamentos, é reduzir a injustiça e a desigualdade, por meio
da igualdade de capacidade e de funcionamentos, a fim de garantir que os indivíduos
possam efetivar os funcionamentos básicos e elementares.
Isso posto, consoante já delineado alhures, ante a adoção de um
critério de igualdade pautado pelas capacidades e funcionamentos como parâmetros
para definição da redistribuição de riqueza, a pobreza caracteriza-se como a
incapacidade para a realização de funcionamentos básicos, ou seja, a privação dos
indivíduos em relação à vida que podem levar e das liberdades que têm, em
decorrência de sua inadequação para gerar capacidades minimamente aceitáveis.24
No entanto cabe consignar que, consoante destaca Amartya Sen, sua
teoria da justiça de não busca reduzir a igualdade a uma visão estreita e unifocal
pautada simplesmente pela igualdade de capacidades, haja vista a
multidimensionalidade de seu conteúdo e, desse modo, destaca que a igualdade não
se trata do único valor em relação ao qual uma teoria da justiça precisaria se
preocupar, porquanto uma política poderia ser defendida não por elevar a igualdade
de capacidades, mas sim pela expansão das capacidades de todos.25
A despeito do grau de densidade que uma análise sob um viés
igualitário exige, e que não se basta na análise de capacidades, cabe questionar se a
expansão das capacidades não seria, em si mesma, enquanto caminho pelo aumento
da liberdade substancial, uma forma de busca pela igualdade.
Pois bem, delineadas as questões centrais da teoria de Amartya Sen
no que concerne ao desenvolvimento, à liberdade e às capacidades, impende
adentrarmos à análise do instituto denominado salary cap, a fim de aquilatarmos sua
estreita relação com a perspectiva de desenvolvimento segundo o referido autor.

3. SALARY CAP COMO INSTRUMENTO DE REGULAÇÃO ECONÔMICA PARA O


EQUILÍBRIO COMPETITIVO

O salary cap se trata de um instrumento de regulação do mercado


esportivo, tendo surgido inicialmente na National Basketball Association (NBA), que

24 SEN, Amartya Kumar; Desigualdade Reexaminada; 2. ed. Tradução por Ricardo Doninelli Mendes;
Rio de Janeiro: Record, 2008, p. 39.
25 SEN, Martya Kumar; A Ideia de Justiça; 2. ed. Tradução por Ricardo Doninelli Mendes; Rio de

Janeiro: Record, 2008, p. 247-249 e 262.


promoveu sua implantação na temporada 1984-198526, e se popularizado na
sequência, com a consequente implantação em diversas outras ligas esportivas, tanto
dos Estados Unidos, como as demais “grandes ligas” – National Hockey Association
(NHL), National Football League (NFL) e Major League Baseball (MLB) – quanto em
demais importantes ligas esportivas ao redor do mundo27.
Consoante assevera Dietl Helmut, historicamene é possível verificar
que as ligas esportivas americanas empregaram diversas formas de regulação a fim
de evitar riscos como o desequilíbrio competitivo bem como a falência de clubes em
decorrência de elevados gastos com o salário de jogadores, sendo possível citar como
um dos mais relevantes a utilização de cláusulas de reserva 28, cujo a utilização,
entretanto, começou a ser deixada de lado em meados dos anos 1970 em decorrência
do ativismo dos sindicatos de jogadores e à ameaça de ações judiciais antitruste, e
questionamento de âmbito trabalhista29, vejamos:

Competitive imbalance leading to boring games and the ruinous escalation of player
salaries play the dominant role among the dangers cited in all attempts to regulate
professional team sports since the introduction of the first professional leagues in
the USA. Throughout their history, American professional team sports have
employed a wide array of regulations against these dangers. Reserve clauses
limiting free agency of players were the most prominent example in this context. The
reserve clause dissolved in the 1970s, because of players’ unions, and the anti-trust
threats.30

Com o fim da cláusula de reserva, após o fim de seus contratos, os

26 DIETL, Helmut et al ;The Combined Effect of Salary Restrictions and Revenue Sharing in Sports
Leagues; Economic Inquiry Vol. 49, Issue 2, p. 447-463, 2011. Disponível em:
http://www.isu.uzh.ch/static/ISU_WPS/102_ISU_full.pdf.
27 Idem.
28 A cláusula de reserva se tratava de uma regulação contida no contrato de jogadores por meio da

qual este declarava que, ao final do contrato, seus direitos seriam retidos pela equipe contratante,
ficando impedidos de formalizarem contrato com outro clube sem a liberação de seu contratante, que
poderia, ainda, decidir por transferí-lo, negociá-lo ou vende-lo.
29 DIETL, Helmut et al; Salary Cap Regulation in Professional Team Sports; University of Zurich, ISU

Working Paper Series v. 86, 2010. Disponível em:


http://www.isu.uzh.ch/static/ISU_WPS/86_ISU_full.pdf.
30 Em tradução livre: “O desequilíbrio competitivo que leva a jogos entediantes e a escalada ruinosa

dos salários dos jogadores desempenham um papel dominante entre os perigos citados em todas as
tentativas de regulamentar os esportes coletivos profissionais desde a introdução das primeiras ligas
profissionais nos EUA. Ao longo de sua história, os esportes de equipe profissionais americanos
empregaram uma ampla gama de regulamentações contra esses perigos. Cláusulas de reserva
limitando a livre agência de jogadores eram o exemplo mais proeminente neste contexto. A cláusula de
reserva foi dissolvida na década de 1970, por causa dos sindicatos dos jogadores e das ameaças
antitruste”. DIETL, Helmut et al; Salary Cap Regulation in Professional Team Sports; University of
Zurich, ISU Working Paper Series v. 86, 2010. Disponível em:
http://www.isu.uzh.ch/static/ISU_WPS/86_ISU_full.pdf.
atletas tornaram-se free agents31 e, portanto, livres para a realização de novo contrato
com seus antigos clubes, ou então com outros que lhes oferecessem contratação.
Ocorre que, essa situação, que veio a ser denominada “Restricted
Free Agency”, acabou culminando com uma verdadeira guerra de lances pelos
melhores jogadores, situação que acabou por representar uma considerável
vantagem às equipes mais abastadas, denominados de large-market, que possuiam
maiores condições econômicas para a manutenção de folhas de pagamento
astronômicas, ocasionando desequilíbrio competitivo em razão do efeito de
“acumulação” de talentos esportivos.
Assim, justamente ante tal cenário, gize-se negativo ao próprio
desenvolvimento esportivo, fora implantada o instrumento de regulação denominado
salary cap, que pode ser conceituado como um teto salarial que limita o montante total
de salários pagos por um clube aos seus jogadores32, o qual geralmente é
estabelecidos com base na receita auferida pela liga esportiva33, e imposto aos clubes
por meio de acordos coletivos, os chamados Collective Bargaining Agreements (CBA),
que por sua vez decorrem de negociações entre sindicatos de representação de
classe dos jogadores e os órgãos de administração das respectivas ligas34.
Pois bem, ainda no tocante aos motivos que levam as ligas à adoção
do salary cap, importante consignarmos os esclarecimentos de Dietl Helmut35, para

31 O termo free agente, ou agente livre em vernáculo, trata-se de uma nomenclatura para designar um
jogador que não possui restrições de contratação e, portanto, pode livremente ser contratado por
qualquer clube ou franquia.
32 Além do salary cap que, como visto, se trata de um teto de gastos imposto aos clubes, muitos acordos

coletivos ainda preveêm o estabelecimento de um piso salarial mínimo aos atletas (floor). DIETL,
Helmut et al; The Effect of Salary Caps in Professional Team Sports on Social Welfare; The B.E.
Journal of Economic Analysis and Policy, v. 9, p. 129-151, 2009. Disponível em:
http://www.isu.uzh.ch/static/ISU_WPS/72_ISU_full.pdf.
33 A despeito de ser mais usual que o salary cap seja fixado tendo como base em base da receita

auferida pela liga, existem outros modelos de paramatrização (v.g. a estipulação de limites individuais
aos clubes, com base em sua própria receita).
34 DIETL, Helmut et al; The Effect of Salary Caps in Professional Team Sports on Social Welfare; The

B.E. Journal of Economic Analysis and Policy, v. 9, p. 129-151, 2009. Disponível em:
http://www.isu.uzh.ch/static/ISU_WPS/72_ISU_full.pdf.
35 Em tradução livre: “As ligas que adotaram o teto salarial geralmente o fazem porque acreditam que

o acréscimo de talentos por equipes mais ricas afeta a qualidade do produto esportivo que eles querem
vender. Se apenas um ou um punhado de equipes dominantes for capaz de vencer de forma
consistente e desafiar o campeonato, muitos dos competidores serão eliminados pela equipe superior,
reduzindo a atratividade do esporte para os torcedores no estádio e os telespectadores na televisão. A
receita da televisão é uma parte importante da renda de muitos esportes em todo o mundo, e quanto
mais equilibrados e empolgantes forem os concursos, mais interessante será o produto televisivo e
maior será o valor dos direitos de transmissão televisiva. Uma liga desequilibrada também ameaça a
viabilidade financeira dos times mais fracos, porque se não houver esperança de, a longo prazo, sua
quem o instrumento representa o mais recente estado de desenvolvimento na luta
pelo controle de custos e pela promoção do equilíbrio competitivo, e que por sua vez
consigna o seguinte, in verbis:

The leagues that have adopted salary caps generally do so because they believe
letting richer teams accumulate talent affects the quality of the sporting product they
want to sell. If only one or a handful of dominant teams are able to win consistently
and challenge for the championship, many of the contests will be blowouts by the
superior team, reducing the sport's attractiveness for fans at the stadium and viewers
on television. Television revenue is an important part of the income of many sports
around the world, and the more evenly matched and exciting the contests, the more
interesting the television product, and the higher the value of the television broadcast
rights. An unbalanced league also threatens the financial viability of the weaker
teams, because if there is no long-term hope of their team winning, fans of the
weaker clubs will gravitate to other sports and leagues.

Compulsando de forma detida os argumentos favoráveis expostos à


implantação do salary cap como meio de controle em ligas esportivas, como
destacado alhures, verifica-se que o instrumento surgiu como resposta aos riscos do
mercado esportivo, tendo como objetivos a obtenção de equilíbrio competitivo entre
os clubes, bem como a garantia de manutenção da viabilidade financeira da liga,
sendo esses os pontos chave que norteam sua aplicação prática.
Nesse mesmo sentido, Dietl Helmut36 expressamente consigna os
objetivos da implantação do salary cap, conforme se depreende do trecho a seguir
destacado, confira-se:

The stated rationale for caps focus on two main objectives: increasing competitive
balance ainda maintaining financial stability. The concerne for competitive balance
describes one of the most important peculiarities of professioanl team sports. It is a
wideheld belief tha certain degree of uncertanty about the outcome is necessary to
ensure an entertaining competition. Salary caps prevent large-market clubs froem
becoming too dominant by helping small-market clubs to keepstar players who would

equipe vencer, os torcedores dos clubes irão gravitar para outros esportes e ligas.” DIETL, Helmut et
al; The Effect of Salary Caps in Professional Team Sports on Social Welfare; The B.E. Journal of
Economic Analysis and Policy, v. 9, p. 129-151, 2009. Disponível em:
http://www.isu.uzh.ch/static/ISU_WPS/72_ISU_full.pdf.
36 Em tradução livre: “O raciocínio declarado para o teto concentrar-se em dois objetivos principais:

aumento do equilíbrio competitivo, mantendo ainda a estabilidade financeira. A preocupação com o


equilíbrio competitivo descreve uma das peculiaridades mais importantes dos esportes coletivos
profissionais. É uma crença ampla de que certo grau de incerteza sobre o resultado é necessário para
garantir uma competição divertida. Os limites salariais impedem que os clubes do grande mercado se
tornem dominantes demais ao ajudar os clubes de pequenos mercados a manterem os jogadores que,
de outra forma, seriam atraídos por ofertas salariais mais altas dos clubes do grande mercado.”.DIETL,
Helmut et al; The Effect of Salary Caps in Professional Team Sports on Social Welfare; The B.E.
Journal of Economic Analysis and Policy, v. 9, p. 129-151, 2009. Disponível em:
http://www.isu.uzh.ch/static/ISU_WPS/72_ISU_full.pdf.
otherwise be atracted by higher salary offers from large-market clubs.

Quanto à efetividade do instrumento na garantia de estabilidade


financeira, certo é que a limitação do montante de salários que o clube pode pagar a
seus jogadores tem o papel de impedir que um clube, na tentativa de maximização de
seus vitórias, tente adquirir talentos mediante a oferta de elevadas remunerações,
comprometendo assim mais do que suas possibilidades financeiras podem arcar,
entretanto, tal objetivo não se trata do assunto central aqui em estudo, razão pela qual
não compete abordá-lo com maior profundidade.
De outro vértice, no que concerne ao objetivo de aumento do equilíbrio
competitivo, cumpre tecermos análise mais detida.
Inicialmente destaca-se que, conforme consignado por Dietl Helmut,
os estudos de Quirk e Fort37 sugerem que os limites salariais têm o condão de
promover melhoramento no equilíbrio competitivo ao passo em que impedem que os
clubes de large-market, detentores de maior capacidade econômica, ofereçam maior
remuneração a jogadores talentosos contratados por um clube de small-market, isto
é, de menor poder econômico, evitando a utilização do poder econômico para
acumulação de talentos em um mesmo clube, ao passo em que permite aos times
menores que mantenham seus principais atletas.
Assim, nessa esteira Fort e Quirk38 consignam que o salary cap se
trata do único dispositivo de proteção efetivo para a manutenção da viabilidade
financeira e o aumento do equilíbrio competitivo.
Outrossim, destaca-se que, ao promover estudos acerca da questão
em apreço, o pesquisador Stefan Késenne39, obteve resultados indicativos de que, a
implantação do salary cap nos moldes da NBA40, importaria não somente em melhora

37 QUIRK, James; FORT, Rodney; Pay Dirt: The Business of Professional Team Sports; Princeton,
NJ: Princeton University Press,1992 apud DIETL, Helmut et al; Salary Cap Regulation in Professional
Team Sports; University of Zurich, ISU Working Paper Series v. 86, 2010. Disponível em:
http://www.isu.uzh.ch/static/ISU_WPS/86_ISU_full.pdf.
38 FORT, Rodney; QUIRK, James; Cross-Subsidization, Incentives, and Outcomes in Professional

Team Sports Leagues; Journal of Economic Literature 33, 1995, 1265.1299 apud DIETL, Helmut et
al; Salary Cap Regulation in Professional Team Sports; University of Zurich, ISU Working Paper
Series v. 86, 2010. Disponível em: http://www.isu.uzh.ch/static/ISU_WPS/86_ISU_full.pdf.
39 KÉSENNE, Stefan; The Impact of Salary Caps in Professional Team Sports; Scottish Journal of

Political Economy 47, 2000, 422.430. Disponível em:


https://onlinelibrary.wiley.com/doi/epdf/10.1111/1467-9485.00171.
40 Em seus estudos, Stefan Késenne desenvolveu um modelo teórico composto por duas equipes,

sendo uma um clube de large-market e a outra de samll-market, e com a implantação de salary cap
do equilíbrio competitivo, mas também na distribuição dos salários dos jogadores e,
ainda, no aumento do lucro, tanto dos times grandes quanto dos pequenos.
Ocorre que tal objetivo, de aumento do equilíbrio competitivo, pode
ser observado tanto sob um viés primário e finalístico, quanto secundário e
instrumental, como meio para a realização de objetivos de caráter econômico. Explica-
se.
No primeiro caso, ou seja, por meio de uma análise pautada em uma
visão do salary cap como instrumento voltado ao aumento do equilíbrio competitivo,
verifica-se que como a regulação econômica tem o condão de promover a
maximização da qualidade esportiva e, em ultimos termos, culminando com o próprio
desenvolvimento da liberdade em decorrência da expansão das capacidades dos
clubes com menor poder econômico.
E, nesse passo, beira a ironia conceber que um instrumento que visa
a aumento de equilíbrio competitivo por meio de uma regulação do poder econômico
tenha sido concebido nos Estados Unidos, país tido como um dos expoentes – se não
o maior – do capitalismo e do liberalismo.
Entretanto, temos que levar em consideração que o equilíbrio
competitivo ainda pode ser observado por um viés secundário, ou seja, como meio
para concretização de um fim.
Ora, sendo certo que o equilíbrio competitivo tem o condão de
maximizar a qualidade esportiva, por certo que, a contrariu sensu, o desequilíbrio
importa na minimização da qualidade das ligas, objeto que, sob a ótica de mercado,
se trata de um produto a ser vendido e, desse modo, certo que a redução na
competitividade importa em perda de atratividade aos olhos dos torcedores – e
consumidores – que, frente a resultados esperados em consequência da existência
de clubes dominantes, podem vir a perder interesse e migrar para outras ligas,
gerando grandes perdas financeiras, não somente decorrentes da redução na venda
de ingressos aos estádios, mas, de igual sorte, na venda de produtos e,
principalmente, de espaço nas grandes mídias, ou seja, quanto mais equilibrados e
empolgantes forem as competições, mais interessante será o produto e, em

nos moldes utilizados pela NBA, isto é, definido-se o limite em relação a porcentagem fixa das receitas
totais da liga na temporada anterior. In KÉSENNE, Stefan; The Impact of Salary Caps in Professional
Team Sports; Scottish Journal of Political Economy 47, 2000, 422.430. Disponível em:
https://onlinelibrary.wiley.com/doi/epdf/10.1111/1467-9485.00171.
consequência, maiores serão os lucros.
Outrossim, há de se destacar a existência de outro argumento de
cunho econômico para a implantação do salary cap, qual seja, evitar o aumento
excessivo do salário dos principais jogadores, haja vista que, inexistente um limite de
gastos, certamente o cenário esportivo tornaria a vivenciar período similar àquele
entre o fim das reserve clausules e a implantação do teto de gastos, forçando clubes
a investirem cada vez mais em salários, em uma espécie de leilão, até que os custos
se tornassem insustentáveis41.
Justamente nesse diapasão Késenne42 sustenta que o salary cap não
tem somente o condão de promover um aumento no equilíbrio competitivo, mas
também uma melhor distribuição salarial, ainda evitando a falência dos clubes em
decorrência de gastos com folha de pagamento, importando, na prática, em
manutenção de um percentual de lucro, encourajando a continuidade de
investimentos.
Ademais, certo que, ainda que sob esse viés instrumental, as
constatações tecidas importam, mesmo que tacitamente, no reconhecimento de que
um ambiente equilibrado seria economicamente mais fértil, razões que poderiam
justificar, guardadas as devidas proporções, os benefícios econômicos de um
equilíbrio social.
Assim, por meio desse breve escorço pudemos apresentar a ideia
geral relacionada ao salary cap e, principalmente, sua utilização como instrumento de
regulação econômica para aumento da capacidade competitiva dos clubes e, desse
modo, tecidas tais questões iniciais, impende promovermos uma abordagem do
instituto em comento sob a ótica da teoria de Amartya Sen, em especial no que
concerne ao desenvolvimento como processo de expansão das capacidades para
aumento da liberdade, o que passamos a fazer.

41 Processo que tem sido observado nas ligas européias de futebol, consoante destacado por Dietl
Helmut in DIETL, Helmut et al; The Effect of Salary Caps in Professional Team Sports on Social
Welfare; The B.E. Journal of Economic Analysis and Policy, v. 9, p. 129-151, 2009. Disponível em:
http://www.isu.uzh.ch/static/ISU_WPS/72_ISU_full.pdf.
42 KÉSENNE, Stefan; The Impact of Salary Caps in Professional Team Sports; Scottish Journal of

Political Economy 47, 2000, 422.430. Disponível em:


https://onlinelibrary.wiley.com/doi/epdf/10.1111/1467-9485.00171.
4. A REGULAÇÃO POR MEIO DO SALARY CAP: UMA ANÁLISE SOBRE O
EQUILÍBRIO COMPETITIVO PARA A EXPANSÃO DA LIBERDADE

Como visto alhures, a motivação da implantação do salary cap parte


da ideia de regulação econômica a fim de vedar a interferência negativa da
sobreposição do poder econômico e permitir a expansão das capacidades esportivas
dos clubes, assim como da qualidade esportiva como um todo.
Inicialmente é importante destacar que, consoante prega Amartya
Sen43, ainda que as facilidades econômicas apresentam relevância para o
desenvolvimento, falecem de uma importância de per si, ao passo em que sua
utilidade encontra-se subordinada às coisas que ela nos permite fazer, as liberdades
substantivas que ela nos ajuda a obter. Assim, por meio dessa ótica, a riqueza não se
trata de um fim em si mesma, mas um caminho para se ter o tipo de vida que se
valoriza, e que se encontra relacionada à capacidade de sua converção em condições
de vida desejáveis.
Nessa esteira, Amartya Sen44 consigna que o crescimento econômico
não pode ser tratado como um fim em si mesmo, mas sim como um meio (liberdade
instrumental)45 para o desenvolvimento que, por sua vez, se relaciona à melhora da
vida dos indivíduos mediante o fortalecimento de suas liberdades (substantivas),
vejamos:

[...] o crescimento econômico não pode sensatamente ser considerado um fim em


si mesmo. O desenvolvimento tem de estar relacionado sobretudo com a malhora
da vida que levamos e das liberdades que desfrutamos. Expadir as liberdades que
tenis oara valorizar não só torna nossa vida mais rica e mais deseimpedida, mas
também permite que sejamos seres sociais mais complexos, pondo em prática
nossas volições, interagindo com o mundo em que vivemos e influenciando esse
mundo.

Não por ouro motivo, ao deduzir a conclusão de que a riqueza se trata

43 SEN, Amartya Kumar; Desenvolvimento como Liberdade; Tradução por Laura Teixeira Motta; São
Paulo: Companhia das Letras, 2016, p. 28.
44 Ibidem, p. 29.
45 Em sua obra “Desenvolvimento Como Liberdade” Amartya Sen cita 5 (cinco) tipos de liberdades

instrumentais: i. Liberdades políticas; ii. disponibilidades econômicas; iii. oportunidades sociais; iv.
garantias de tranparência; e v. proteção social. In SEN, Amartya Kumar; Desenvolvimento como
Liberdade; Tradução por Laura Teixeira Motta; São Paulo: Companhia das Letras, 2016, p. 25.
de um meio em proveito de alguma outra coisa, Sen cita Aristóteles 46, que em sua
obra Ética à Nicomaco destacou que a riqueza “[...]” evidentemente não é o bem que
estamos buscando, sendo ela meramente útil e em proveio de alguma coias”, ou seja,
apenas uma liberdade instrumental que, ligada às demais liberdades instrumentais,
pode contribuir para o aumento da liberdade em geral (substantiva).
Nesse mesmo sentido podemos citar a ideia de Ignacy Sachs47, que
assim como Amartya Sen, também afirma ser o crescimento econômico insuficiente
para assegurar o desenvolvimento, que, por sua vez, deve ser socialmente includente,
ecologicamente sustentável e economicamente sustentado, visando promover o bem-
estar e a realização das potencialidades humanas.
Atentos à tal perspectiva, certo que as facilidades econômicas
caracterizam-se como liberdades instrumentais, e que, portanto, não podem ser
concebidas como um fim em si mesmas, ao passo em que devem se traduzir em
meios para o aumento da liberdade geral, e assim, as liberdades econômicas somente
terão real relevância ao passo em que puderem influenciar e contribuir positivamente
na expansão das liberdade substantiva, de modo que, a contrariu sensu, uma vez
constatada a ausência de contribuição nesse sentido, certo que não terá atendido seu
papel, sendo, destarte, inócua a análise de de desenvolvimento calcada em tal
indicador.
Ora, como destacado anteriormente, a diferença entre as facilidades
econômicas dos clubes de ligas esportivas, ou seja, a desigualdade na extensão da
liberdade econômica de clubes considerados large-markets daqueles denominados
small-markets se trata de um exemplo que nos demonstra um cenário no qual a
liberdade instrumental não milita, de fato, em favor da expansão da liberdade, ao
passo em que, como se verificou, uma vez desregrado o mercado as facilidades
econômicas conduzem ao desequilíbrio competitivo e, em consequência, à diminuição
da própria liberdade esportiva, acarretando prejuízos à liga.
Pois bem, destarte depreende-se que o fio condutor da celeuma em
pauta se trata justamente da análise do efeito negativo das facilidades econômicas,

46ARISTOTELIS; The Nicomachean Ethics; ed.rev. trad; D. Ross, Oxford University Press, 180, p,7. in
SEN, Amartya Kumar; Desenvolvimento como Liberdade; Tradução por Laura Teixeira Motta; São
Paulo: Companhia das Letras, 2016, p. 28.
47 SACHS, Ignacy; Desenvolvimento: includente, sustentável, sustentado; Rio de Janeiro:

Garamond, 2004, p. 71.


consistentes em na composição de uma maior folha de pagamento como um indicador
de quebra de liberdade, dada a possibilidade de oferecimento de maiores salários com
a finalidade de agregar talentos em detrimento da saúde do equilíbrio competitivo.
Não obstante nossa investigação se paute nos efeitos decorrentes da
desigualdade de liberdade econômica, impende consignar que Amartya Sen 48
assevera que a relação entre a desigualdade de renda e desigualdade em outros
espaços relevantes “pode ser muito distante e contingente devido às várias influências
econômicas – além da renda – que afetam as desigualdade de vantagens individuais
e liberdades substantivas”, inexistindo, nessa esteira, uma relação inexorável entre
desigualdade de renda e desigualdade de liberdade, haja vista que tais conclusões
são dependentes de um exame mais holístico, pautado em outras contigências que
possam ser tidas como relevantes no caso concreto.
Entretanto, levando-se em consideração o contexto já exposto
anteriormente, podemos extrair de forma patente que, ao menos na amplitude do
presente estudo, é possível concluir que a diferença de liberdade econômica tem o
condão de implicar na quebra da liberdade (substantiva), principalmente dos clubes
caracterizados como small-market, já que com o menor poder econômico deixarão de
ser competitivos, sendo o equilíbrio competitivo verdadeira condição para a garantia
(ou o aumento) da liberdade econômica e esportiva e, portanto, condição inafastável
para o desenvolvimento da própria capacidade esportiva, sendo esse o motivo que,
consoante deduzido alhures, avoca a utilização do instrumento de regulação
denominado salary cap.
Todavia, cumpre consignar que a implantação do salary cap, com o
consequente efeito regulatório em relação às facilidades econômicas, não tem como
escopo simplesmente a obtenção de igualdade de capacidades, até porque Amartya
Sen49 se mostra grande crítico da tentativa de erradicação da desigualdade por meio
de uma proposta igualitária unifocal, vejamos:

A proposta igualitária visa à redução da injustiça, usando a igualdade de capacidade


e de funcionamentos, sendo uma abordagem formulada como alternativa à
prosperidade econômica como fundamento do planejamento e da elaboração de

48 SEN, Amartya Kumar; Desenvolvimento como Liberdade; Tradução por Laura Teixeira Motta; São
Paulo: Companhia das Letras, 2016, p. 146-147.
49 SEN, Amartya Kumar; A Ideia de Justiça; 2. ed. Tradução por Ricardo Doninelli Mendes; Rio de

Janeiro: Record, 2008, p. 247.


políticas de desenvolvimento. Se a igualdade é importante, e a capacidade é de
fato uma característica central da vida humana (como já busquei argumentar neste
livro), não seria correto presumir que devemos exigir a igualdade de capacidades?
Tenho de dizer que a resposta é não, e por várias razões distintas. Podemos,
naturalmente, atribuir uma significação para a igualdade de capacidades, mas isso
não significa que temos de exigir a igualdade de capacidades mesmo que seja
conflitante com outras considerações importantes. Significativa como é, a igualdade
de capacidades não é necessariamente um “trunfo” sobre todas as outras
considerações de peso (incluindo outros aspectos significativos da igualdade), com
as quais possa estar em conflito.

Nesse passo, Sen50 formula sua crítica à proposta igualitária em


quatro pontos: i) a capacidade se trata apenas de um aspecto da liberdade
relacionado com as oportunidades substantivas, e não pode considerar devidamente
a justiça e a equidade envolvidas em processos que tenham relevância para a ideia
de justiça, não sendo possível a redução da igualdade a um único espaço; ii) a
possibilidade de que, a despeito da importância da liberdade para o julgamento das
vantagens pessoais, haja outras exigências sobre os juízos distributivos, que não
sejam mais aceitos como exigências de igual liberdade geral para diferentes pessoas;
iii) a possibildiade de definição da capacidade de diversas maneiras, incluindo-se a
distinção entre liberdade como bem-estar, agência, poder, controle, oportunidade ou
processo, que podem ser gradudas de formas diversas devido às variações razoáveis
na escolha dos pesos relativos a serem relacionados aos diferentes tipos de
capacidades, ou diferentes tipos de funcionamentos; e por fim iv) a igualdade não se
trata de per si do único valor a se preocupar na busca pela justiça, havendo mesmo
apelo na busca pela redução da desigualdade de capacidades e na busca pelo avanço
geral das capacidades de todos.
Ademais, acerca deste último ponto deduzido, impende trazermos à
baila o argumento proposto por Amartya Sen 51 no que concerne a necessidade de
uma busca arrazoada pela justiça, in verbis:

Se fizermos a simples distinção entre considerações agregativas e distributivas de


justiça social, a perspectiva das capacidades, com sua indicação de uma importante
maneira de avaliar as vantagens e as desvantagens, tem implicações para ambas
as considerações. Por exemplo, uma instituição ou uma política pode muito bem ser
defendida não porque aumenta a igualdade de capacidades, mas pela razão de que
expande as capacidades de todos (mesmo que não haja nenhum ganho
distributivo). A igualdade de capacidades ou, de maneira mais realista, a redução

50 SEN, Amartya Kumar; A Ideia de Justiça; 2. ed. Tradução por Ricardo Doninelli Mendes; Rio de
Janeiro: Record, 2008, p. 247-249.
51 Ibidem, p. 249.
da desigualdade de capacidades, certamente tem apelo sobre nossa atenção, mas
o mesmo acontece com o avanço geral das capacidades de todos. Ao negar a
concentração exclusiva na igualdade de capacidades, ou em considerações gerais
baseadas na capacidade, não desqualificamos o papel extremamente significativo
das capacidades na ideia de justiça (discutido acima, em especial nos capítulos 11-
13). A busca arrazoada de um elemento muito importante da justiça social, que não
desloque todo o resto, ainda pode ter um papel crucial no empreendimento de
melhorar a justiça.

Isso posto, a despeito da constatação dos efeitos negativos


decorrentes da desigualdade de facilidades econômicas, cumpre consignar que a
utilização do salary cap não tem o escopo de buscar simples (e aparente) igualdade
de capacidade entre os clubes, haja vista a impropriedade de uma busca calcada
exclusivamente em uma análise unifocal de igualdade de capacidade e
funcionamentos para a busca da redução da injustiça, e assim destacamos que a ótica
sob a qual observamos a fenomenologia do instituto regulatório de gastos em tela se
pauta pela expansão de capacidades.
Nessa esteira, o salary cap não desafia os argumentos deduzidos por
Sen em desfavor de uma proposta igualitária reducionista, ao contrário, reafirma seus
argumentos de expansão da liberdade por meio do desenvolvimento das capacidades.
Ora, como se viu anteriormente em Dietl Helmut52 e Késenne53, com
a instituição do salary cap objetivou-se evitar que a influência negativa da
desigualdade entre o poder econômico de clubes esportivos pudesse culminar com o
desequilíbrio competitivo e, em consequência, em prejuízos à liga como um todo, ou
seja, impedir que a desigualdade de liberdade econômica pudesse vir a restringir à
liberdade subjetiva, sendo certo que nesse cenário as facilidades econômicas, na
condição de liberdades instrumentais, não estariam concorrendo para sua finalidade
precípua de promoção da liberdade substantcial, mas sim culminando com a
despotencialização da liberdade e quebra da ideia de competição.
Desse modo, depreende-se que a ideia em tela extrapola a mera
proposta de igualdade unifocal pautada pela redução da desigualdade de capacidade
econômica, porquanto não busca apenas a equiparação das capacidades nessa

52 DIETL, Helmut et al; The Effect of Salary Caps in Professional Team Sports on Social Welfare; The
B.E. Journal of Economic Analysis and Policy, v. 9, p. 129-151, 2009. Disponível em:
http://www.isu.uzh.ch/static/ISU_WPS/72_ISU_full.pdf.
53 KÉSENNE, Stefan; The Impact of Salary Caps in Professional Team Sports; Scottish Journal of

Political Economy 47, 2000, 422.430. Disponível em:


https://onlinelibrary.wiley.com/doi/epdf/10.1111/1467-9485.00171.
métrica, até porque inviável se apontar tal elemento econômico como causa absoluta
da restição de liberdade, a despeito de seu reconhecimento como fator de restrição
de possibilidades de expansão esportiva aos times com menor poderio econômico,
mas sim a expansão das capacidades esportivas por meio do aumento do equilíbrio
competitivo e, em ultimo caso, da própia liberdade esportiva.
Como visto por meio do estudo de Estefan Késenne54, se trata de uma
ação que tem o condão de promover não a busca pela igualdade, mas sim pela
regulação da liberdade econômica (instrumental) a fim de se promover a expansão da
capacidade e, por meio dessa expansão, garantir o aumento do equilíbrio competitivo.
Outrossim, nem mesmo se alegue que o salary cap importa, de
alguma forma, em restrição à liberdade de mercado, muito festejada por Amartya Sen
como importante instrumento de desenvolvimento, porquanto, como visto alhures, não
se trata de uma norma imposta por meio de algum órgão regulador, mas sim
decorrente dos Collective Bargaining Agreements (CBA), ou seja de livres
negociações entre os sindicatos de representação de classe dos jogadores e os
órgãos de administração das respectivas ligas, sendo, portanto, uma cláusula
contratual estabelecida por meio da autonomia privada das partes, e, nessa esteira,
contraditório seria pressupor que uma cláusula firmada livremente pelas partes
pudesse ser considerada como restrição de liberdade.
Ora, ante o exposto consignamos não ser possível pensar no contexto
delineado sem transportá-lo à realidade social, ainda que levando-se em consideração
as limitações deste raciocínio face a desconsideração dos demais “espaços
relevantes”, como uma verdadeira metáfora para a demonstração da relação entre a
desigualdade de facilidades econômicas e a consequente restrição na expansão de
capacidades, culminando com a efetiva quebra de liberdade substantiva.
Nessa esteira, ainda que a questão trazida à baila se mostre mais
complexa que um simples raciocínio silogístico, haja vista as demais capacidades e
funcionamentos a serem considerados, bem como os processos de desenvolvimento,
certo é que a representação nos dá um (forte) indicativo acerca da relação entre
desigualdade econômica e restrição de liberdade substantiva, ainda que tal relação

54 KÉSENNE, Stefan; The Impact of Salary Caps in Professional Team Sports; Scottish Journal of
Political Economy 47, 2000, 422.430. Disponível em:
https://onlinelibrary.wiley.com/doi/epdf/10.1111/1467-9485.00171.
somente possa ser traçada dentro de um mesmo universo.
Por fim, resta patente que a ideia em tela representa, em verdade,
efetiva demonstração de uma aplicação exitosa da teoria do desenvolvimento como
liberdade, exposta por Amartya Sen, e, em especial, de expansão das capacidades
na busca pela liberdade substantiva.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Por meio do presente estudo verificou-se que o desenvolvimento não


pode mais ser conceituado com vistas a perspectiva exclusivamente econômica, e,
nesse passo, que a partir dos estudos de Amartya Sem, as perspectivas do
desenvolvimento passaram a se voltar à ideia de expansão das liberdades, elemento
que tomou lugar de destaque em sua teoria da justiça.
Assim, consoante foi possível extrair do modelo téorico desenvolvido
por Sen, a liberdade – como finalidade do desenvolvimento – pode ser concebida
como uma função direta das capacidades, que por sua vez se tratam do conjunto de
vetores de funcionamentos, elemento que traz a dicotomia entre oportunidade e
restrição no que concerne à escolha dentre diversos estilos de vidas possíveis, e,
desse modo, consigna-se que a expansão das capacidades implica, por
consequência, na expansão da liberdade (substantiva).
Nesse passo, tendo em vista a ideia de desenvolvimento como
liberdade traçada por Sen, promoveu-se a análise do instituto denominado salary cap,
largamente utilizado atualmente nas grandes ligas esportivas, principalmente nas
grandes ligas americanas, por meio do qual impõe-se um teto na folha salarial dos
clubes, com o objetivo de se promover o aumento do equilíbrio competitivo e a
manutenção da estabilidade financeira da própria liga.
Em atenção à contextualização histórica, verificou-se que o salary cap
surgiu em decorrência de acordo de vontades, como forma de mitigação do cenário
de leilão de atletas iniciado após o encerramento da utilização da cláusula de reserva,
destinada a vinculação dos jogadores ao clube contratante, em decorrência do qual o
maior poder econômico dos clubes denominados large-market em comparação com
aqueles caracterizados como small-market, culminou com a deflaração de um
processo de quebra do equilíbrio competitivo.
Nessa senda, ante as constatações da literatura especializada foi
possível depreender os efeitos do salary cap e, em especial, de sua utilização como
instrumento de regulação econômica para aumento da capacidade competitiva dos
clubes, em decorrência da efetiva obtenção de aumento de equilíbrio, fora promovida
a análise da fenomenologia do instituto em voga, sob a ótica da teoria de Amartya
Sen, pautada pelo desenvolvimento como liberdade e, em especial, quanto ao
processo de expansão das capacidades.
Como visto, a busca pela erradicação da desigualdade pautada pela
igualdade de capacidades foi duramente criticado por Amartya Sen em decorrência
de se tratar de uma análise reducionista pautada por uma igualdade unifocal, no
entanto, diferentemente do que pudesse parecer em perfunctória análise, no
desenvolvimento do presente estudo foi possível verificar que, a regulação econômica
promovida pela implantação do salary cap não busca meramente garantir a igualdade
de capacidade entre os clubes de large e small-market, mas sim a abertura de espaço
para negação dos efeitos negativos do desequilíbrio econômico como fator de
restrição de possibilidades de expansão esportiva dos times com menor poder
econômico e, assim, promover a expansão das capacidades esportivas por meio do
aumento do equilíbrio competitivo e, em ultimo caso, da própia liberdade esportiva.
Assim, pôde-se verificar que o instituto em comento não desafia os
argumentos críticos trazidos à baila por Sen, haja vista se afastar da proposta
igualitária reducionista, ao passo em que, em sentido diametralmente oposto, reafirma
os argumentos no tocante à expansão da liberdade por meio do desenvolvimento das
capacidades, caracterizado, no caso em tela, com o aumento do equilíbrio econômico,
questão que chama a atenção quanto à possibilidade de estabelecimento de um
paralelo à realidade social. Ora, por mais que o exercício desse raciocínio tivesse de
desconsiderar inumeros outros elementos relevantes na equação social, como uma
verdadeira metáfora para a demonstração de que a desigualdade de capacidades
econômicas tem o condão de resultar na restrição quanto restrição à expansão das
demais capacidades daqueles com menores facilidades econômicas, resutlando na
quebra de sua liberdade substantiva.
Isso posto, de acordo com as considerações possíveis de serem
firmadas no decorrer da presente pesquisa, é possivel verificar que, a fenomenologia
de funcionamento do salary cap como “expansor” de capacidades e, enfim, de
liberdade substantiva, tem o condão de demonstrar a exitosa aplicação da teoria de
Amartya Sen quanto ao desenvolvimento como liberdade, confirmando-se, dessa
forma, os benefícios de sua concepção holística de desenvolvimento.

REFERÊNCIAS

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Realizações? As Concepções de Justiça de John Rawls e de Amartya Sen;
SABERES, Natal RN, v. 1, n. 13, Mar. 2016, 76-96. Disponível em:
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20/12/2018.

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