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-~ -,1 !{evo!ução Federalista


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• Sandra Jatahy Pesapento
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104. PARTICIPAÇÃO POLíTICA - Dalmo de tbreu Daliari
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P. Mülier' !
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brasilliense
Sandra Jatahy Pesavento
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liTI~m~ 905
T912
DEDALUS - Acervo - FFLCH-HI
A Revolucao Federalista /
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v.80
e.2
1111111 1111/ 11111 111111111/1111/1111111111 111111111/ 1111111111111
• Brasil História - vol. 3 - A República Velha - A. Mendes
Jr. / R. Maranhão iorqs.l
21200031812
Coleção Tudo é História
• A Crise do Escravlsmo e a Grande Imigração - Pau/a A REVOLUÇÃO FEDERALISTA
Beigue/man
• A Proclamação da República - José Ênio Casa/ecchi

Coleção Redescobrindo o Brasil


• Cai o lmpério - República Vou Ver - Li/ia Schwarcz/Angeli

'rOMBO: 119598

--
SBD-FFLCH-USP

j0083
40 anos de bons livros
Copyright @ Sandra Jatahy Pesavento

Capa e ilustrações:
Miguel Paiva

Revisão:
José W. S. Moraes
Vladimir A. Sachetta

~o
r!.1J..2 ÍNDICE
\/. ~O
Q.;2
Introdução 7
O novo regime e as questões em jogo . . . . . . . . . 10
• Os autoritários e ativos castilhistas: nasce a Re-
pública no Rio Grande 38
"Maragatos" e "pica-paus": a revolução da de-
gola :.................. 72
Indicações para leitura 100

1[P
editora brasiliense s.a.
01223 - r. generª1 jardim, 160
são paulo - brasil jJ
INTRODUÇÃO

A "Revolução Federalista", ocorrida no Rio


Grande do Sul entre os anos de 1893 e 1895, foi com
certeza a mais séria das contestações enfrentadas
pela recém-proclamada República brasileira.
Embora centralizado no estado gaúcho, o epi-.
sódio extrapolou os limites do regional, na medida
em que ameaçou a própria estabilidade do regime,
vinculando-se a um outro movimento de reação à
nova ordem, que foi a "Revolta da Armada".
Desde o ponto de vista mais amplo do ajusta-
mento político-institucional do país às novas condi-
ções econômico-sociais vigentes, a Revolução Fede-
ralista e a Revolta da Armada marcaram os princi-
pais pontos de desestabilização do novo regime.
A instalação da República exigia um novo equi-
líbrio entre coerção e consenso que garantisse a soli-
dez e continuidade da forma política adotada.
O consenso seria articulado pelo grupo econô-
8 Sandra Jatahy Pesavento A Revolução Federalista 9

mico mais poderoso do país: o dos cafeicultores pau- corporativas (Exército X Armada), tendo ainda
listas, que passariam, posteriormente, a assumir fun- como complemento a presença de novos interesses
ções dirigentes. sociais que começavam a aparecer na sociedade bra-
A coerção, por sua vez, estava sendo executada sileira (empresários industriais X operariado).
de imediato pelo grupo depressão que participara da Dentro deste conturbado panorama dos pri-
instalação da República e que se achava bem mais meiros anos da República é que tiveram lugar inci-
aparelhado para isto: o Exército. dentes de contestação à nova ordem, como a Revolta
Os governos militares de Deodoro e de Floriano da Armada e a Revolução Federalista.
(1889 a 1894) foram, portanto, cruciais para a conso- Desde o ponto de vista da questão propriamente
lidação do regime, preparando o terreno para a as- regional, a Revolução Federalista veio a se constituir
censão dos cafeicultores paulistas ao poder com Pru- numa reação ao controle do processo político local
dente de Morais. pelos republicanos seguidores de Júlio de Castilhos e
Estes primeiros governos republicanos tiveram de orientação positivista. Fundamentalmente, esta
como tarefa principal tanto garantir as condições de reação partiu daqueles liberais que, em 1889, haviam
continuidade, expansão e lucratividade da economia sido derrubados do poder.
cafeeira agroexportadora, quando conciliar a neces- Caracterizada por atos de violência e barbárie
sidade de manter a unidade nacional com as tendên- de ambas as facções, a chamada "Revolução da De-
cias de autonomia de algumas economias regionais, gola" contribuiu para a acentuada radicalização po-
expressas através de um federalismo extremado. ' lítica que o Rio Grande do sul experimentou nos 40
Se estas foram, por assim dizer, as questões anos da República Velha que se seguiram.
imediatas a resolver pelos grupos condutores do pro-
cesso - cafeicultores e militares -, o próprio desen- I
volvimento e maior complexidade da sociedade brasi-
leira como um todo neste final do século XIX trouxe- ')
ram à tona diferentes aspirações. As tensões deram-
se tanto no âmbito da condução do processo econô-
mico (apoio ou não à política econômico-financeira
do "encilhamento") quanto do processo político (re-
pública autoritária -X república "liberar' federa-
tiva). As questões desdobravam-se ainda em cisões
regionais (tensão centro X periferia) e em divisões,
)
A Revolução Federalista 11

a frente a classe fundamental e seus grupos auxilia-


res, ou então frações da classe fundamental entre si.
Numa crise assim, as classes subalternas permane-
cem excluídas ou são somente as forças de apoio das
frações em conflito.
Quer parecer que, na transição da Monarquia
para a República no Brasil, manifestou-se uma crise
deste segundo tipo.
o NOVO REGIME O país transforma-se
E AS QUESTOES EM JOGO
A instalação do regime republicano representou
a medida correspondente, a nível político-institucio-
nal, das transformações econômico-sociais que vi-
Em toda análise histórica, o que deve ser privi-
nham se processando na sociedade brasileira, na se-
legiado é a mudança, o movimento. A História é,
gunda metde do século XIX. A medida constituiu-se,
antes de mais nada, contexto dinâmico, processo em
em última análise, na subordinação da máquina po-
constante devir, em transformação.
lítico-governamental às aspirações e interesses do
Todavia, nem todas as crises que ocorrem no
novo grupo economicamente dominante no país: os
seio da .sociedade civil têm o caráter de uma crise fazendeiros de café do Oeste paulista.
orgânica, tal como a definiu Gramsci. Para que esta Ao conferir ao setor progressista dos cafeicul-
se produza, é necessário que a ruptura englobe as tores de São Paulo o papel de 'líderes e condutores do .
"classes fundamentais", isto é; a classe dominante, processo em curso, não se está negando a existência
por um lado, e a classe que aspira à direção de um de conflitos de classe presentes na sociedade brasi-
novo sistema hegemônico, por outro lado. leira. Muito pelo contrário, o que se quer demonstrar
Assim, a luta entre a burguesia (e seus aliados) e é que tais interesses divergentese conflitos permane-
a classe operária (e as demais classes subalternas) cem controlados, escamoteados e mesmo usados pe-
caracteriza uma crise orgânica, porque diz respeito las classes dominantes para a viabilização de seus
aos protagonistas essenciais a nível estrutural.
objetivos.
Mas também as crises podem desenvolver-se no
Sem dúvida alguma, a questão-chave para as
interior do sistema hegernônico mesmo, pondo frente
transformações ocorridas na sociedade brasileira, no
12 A Revolução Federalista 13
Sandra Jatahy Pesavento

decorrer do século XIX, foi a da transição da força- com os custos de reposição da força-trabalho. Ou
trabalho escrava para a força-trabalho livre na estru- seja, o trabalhador é que devia agora prover o seu
tura econômica do país. próprio sustento. Quanto à remuneração deste tra-
Da perspectiva do sistema capitalista como um balhador, refira-se que, pelo menos nos primeiros
todo, tal processo correspondeu ao momento de ex- tempos, durante o chamado "regime de colonato",
pansão do capital, quando este se preparava para as relações de produção não se davam mediante o
apoderar-se da produção em escala mundial. \ pagamento de um salário em dinheiro, não se consti-
Do ponto de vista específico das condições da tuindo, portanto, em relações assalariadas típicas.
situação brasileira, a mudança nas relações de pro- Na medida em que vigoravam outras formas de re-
dução correspondeu, por um lado, aos efeitos da ces- muneração para o trabalhador que não o salário
sação do tráfigo negreiro, imposta sob pressão in- monetário, como o direito à· moradia e ao cultivo da
glesa, em 1850. terra, tal mecanismo revelava-se extremamente lu-
A escassez do braço negro conjugou-se, por ou- crativo para o fazendeiro. Principalmente depois que
tro lado, coma crescente valorização do preço do o Estado de São Paulo passou a arcar com as des-
café no mercado mundial e com a abertura de uma pesas da viagem dos imigrantes, reduziram-se ao
nova frente de plantio no Oeste paulista, com terras mínimo as despesas do empresário cafeicultor com a
de alto potencial produtivo. força-trabalho.
Dentro deste contexto, a questão da mão-de- Tal processo possibilitou, inclusive, a liberação
obra não apenas tornou-se um problema crucial para de capitais para reinversão no próprio processo pro-
o setor de ponta da economia nacional, como moti- dutivo - máquinas para beneficiamento do café, di-
vou discussões e estimulou a busca de saídas frente namização do setor de comercialização (portos e es-
ao impasse, notada mente por parte daquele grupo tradas de ferro) -'- ou então para diversificar a apli-
que mais tinha a lucrar: os cafeicultores da frente cação dos lucros em outras atividades, como por
pioneira paulista. exemplo indústrias, bancos, comércio, companhias
A adoção da força de trabalho livre aumentou as de seguros. Na esteira do crescimento urbano que
possibilidades de acumulaçãono interior da unidade acompanhou estas mudanças, verificou-se um au-
produtiva. mento do serviço público e dos setores de prestação
Além de não precisar "adiantar capital" para a de serviços.
compra do trabalhador, tal como na escravidão ~ O conjunto destas medidas tanto garantiu as
passando a remunerar a mão-de-obra só depois da condições de expansão do surto cafeeiro, eixo dinâ-
tarefa efetuada -, o fazendeiro também não arcava mico da economia nacional, como conferiu ao setor
14 Sandra Jatahy Pesavento Revolução Federalista 15

um cunho capitalista e ao cafeitcultor um caráter Tanto a idéia da república como a do federa-


burguês. Neste contexto, posicionaram-se como um lismo não eram novas na história brasileira, e estive-
grupo progressista, portador de uma série de novas ram presentes em movimentos regionais de rebelião
aspirações: eram imigracionistas, abolicionistas, re- contra o centralismo monárquico emanado do Rio de
publicanos. Janeiro e daqueles que o defendiam: os barões escra-
Fundamentalmente, os cafeicultores de São vocratas do café do Vale do Paraiba do Sul.
Paulo atuaram como críticos da ordem monárquica Na crise do regime monárquico, a idéia da Re-
que, com o seu centralismo, não possibilitava o aten- pública Federativa surgiu associada à da "democra-
dimento aos problemas regionais e entravava o seu cia", identificada como "soberania popular". A no-
processo de desenvolvimento. Embora com posição ção, é claro, trazia consigo a conotação burguesa do
econômica expressiva no setor de produção mais im- termo, ou seja, o "povo", cuja soberania havia de ser
portante do país, os cafeicultores do Oeste paulista respeitada pelos governos, era identificado com o
não possuíam representação política adequada nos proprietário detentor do capital.
quadros da Monarquia. Nesta medida, seus interes- A noção, contudo, exercia atração sobre as ca-
ses acabaram por desembocar na instância política: madas não-privilegiadas na sociedade, em especial as
a mudança do regime. camadas médias urbanas. Estes grupos, surgidos
A idéia da república federativa exercia um também no bojo das transformações econômico-so-
grande fascínio sobre este grupo fortalecido econo- ciais ocorridas no país, não se viam representados
micamente. O federalismo correspondia às preten- politicamente na monarquia. Mostraram-se cativa-
sões de maior autonomia das províncias e de um dos pelo conteúdo democrático da proposta republi-
melhor encaminhamento aos problemas das econo- cana, que lhes abria a chance de participação polí-
mias regionais. Se esta foi uma motivação para os tica. Além disto, a visão da República vinha asso-
grupos oligárquicos das províncias aceitarem a idéia ciada a um conteúdo inequivocamente progressista,
republicana, para os cafeicultores, a mudança do . com perspectivas de melhoria das condições de vida.
regime representava o meio para atingirem o controle 'Em particular, o surgimento do Manifesto Republi-
político da situação nacional. cano de 1870, ocorrido no Rio de Janeiro, prende-se
Sendo o grupo paulista o principal beneficiário em parte às aspirações destes grupos emergentes,
das transformações econômico-sociais ocorridas no enquanto que a criação do Partido Republicano Pau-
final do período monârquico, as mudanças pretendi- lista (PRP), em Itu, no ano de 1873, vincula-se clara-
das pela·burguesia agrária cafeeira restringiram-se à mente aos interesses dos fazendeiros de café.
superestrutura. No bojo destas transformações, emergiam como
A Revolução Federalista 17
16 Sandra Jatahy Pesavento

sociedade brasileira. Tornou-se um dos principais


atores, se bem que de forma incipjente, os empresá-
críticos do regime, denunciando não apenas a sua
rios industriais e o operariado. Estavam, contudo,
inserção subordinada na ordem vigente, como a Mo-
ainda muito fracamente delineados para que pudes- narquia como um todo.
sem expressar os seus respectivos interesses como
A chamada "questão militar" foi motivada, ba-
grupo. Com relação aos industriais, crê-se ser teme-
sicamente, pela defesa que os oficiais faziam do di-
rário afirmar, com precisão, qual o seu posiciona- reito de expressarem abertamente suas críticas à or-
mento frente ao ascenso da idéia republicana. Sendo, dem vigente, o que gerou incidentes de indisciplina e
contudo, recente a sua inserção na ordem monár- punições.
quica, apresentavam uma situação favorável para Dentro a "questão militar", assumiu destaque
serem cooptados pela vaga republicana. Quanto ao justamente a ação da jovem oficialidade, que na
operariado, embora já se registrassem algumas mani- Escola Militar havia entrado em contato com as
festações em defesa de interesses econômicos imedia- idéias positivistas e republicanas defendidas por Ben-
tos, era precária a sua organização. jamin Constant (a influência do Positivismo será de-
Dentre os novos grupos de pressão surgidos na senvolvida no capítulo 3).
sociedade brasileira, o Exército se apresentava como As propostas regeneradoras da sociedade brasi-
o mais importante. Esta instituição vinha desenvol- leira, defendidas pelos jovens militares associados a
vendo, a partir do fim da Guerra do Paraguai, em
elementos da alta oficialidade, foram instrumentali-
1870, a formação de um "espírito de corpo", que foi
zadas pelos republicanos civis.
essencial para sua revalorização perante seus pró-
prios membros e o conjunto da sociedade. Ao con- A aproximação dos dois grupos, efetuada a par-
tir de 1887, fez com que a queda do regime, ocorrida
trário da Marinha, cujos membros eram recrutados
a lS de novembro, se desse através de um golpe
entre a aristocracia, o Exército não era uma organi-
militar.
zação composta pela elite, surgindo como alternativa
Ao mesmo tempo que tais grupos de pressão se
para aqueles que não gozavam dos favores do sis- formavam e agiam no processo de transformações
tema. A Monarquia contava com o seu corpo de econômico-sociais que atravessava a sociedade brasi-
defesa paralelo, constituído pela Guarda Nacional, leira, os setores tradicionais de apoio ao regime afas-
que era objeto de mais atenção por parte da Coroa. tavam-se da Monarquia.
Dentro deste contexto, o incidente da Guerra do Cabe destacar que a omissão ou descontenta-
Paraguai foi fundamental para a identificação do mento destes grupos tradicionais também se deu em
Exército como grupo e a sua revalorização como função das alterações sofridas pelo país no decorrer
instituição dotada de valores próprios no conjunto da
Sandra Jatahy Pesavento
A Revolução Federalista 19
18

do século XIX. Por um lado, os cafeicultores do Vale denominavam "progressistas" devem ser redimensio-
do Paraíba do Sul, progressivamente descapitaliza- nadas como "progressistas conservadoras", .na me-
dida em que postulavam a continuidade do desen-
dos, com terras com um rendimento decrescente,
volvimento econômico, mas sem alteração da ordem
viam-se tolhidos em tentar soluções alternativas para social.
a mão-de-obra, tal como São Paulo, enquanto que se
A maneira como se deu a derrubada da velha
sentiam ameaçados com o endosso da Monarquia à
ordem - a proclamação da República em 1889 -
abolição. Deste "desencanto" surgiram os tais "re-
obedeceu a um arranjo de cúpula, deixando-se o
publicanos de 14 de maio". Entretanto, este dado
povo à margem do processo: ou como alheio aos
não deve ter um peso significativo tão grande, tendo
acontecimentos em curso (massas rurais) ou como
em vista que, no fim da década de 80, a escravidão
pano de fundo dos eventos (massas populares ur-
não mais correspondia à realidade econômica do banas).
país.
Dentro desta perspectiva, a Primeira República
Retomando, pois, o processo analisado, vê-se
que, na coalizão responsável pela queda do regime, foi uma forma de realização do Estado burguês, no
foram atores fundamentais para ° golpe os cafeicul- qual se processou uma nova forma de organização do
poder, onde, mais uma vez, prevaleceram os arranjos
tores paulistas e o Exército, ocupando o papel do
grupo secundário do processo as camadas médias de "cima para baixo".
urbanas, que davam o "respaldo popular" aos even- Para a efetivação do golpe, haviam-se coligado
diferentes grupos com distintas aspirações quanto à
tos.
reorientação da sociedade, mas tendo como traço es-
a
sencial a uni-Ios idéia da República.
o novo regime e seus problemas O processo histórico, no seu desenvolver, have-
ria de mostrar que a República fora proclamada
pelos militares, mas para que os cafeicultores pudes-
A passagem da Monarquia para a República
sem assumir funções dirigentes. Em outras palavras,
deu-se no contexto da transição capitalista no Brasil,
o braço armado dos oficiais do Exército fora instru-
processo que, como já se viu, se deu de forma elitista,
mentalizado pelo grupo econômico mais poderoso do
de cima para baixo. país.
Manteve-se intocada a estrutura agrária, mas o
O Estado que emergiu do golpe de 15 de novem-
setores rurais assumiram uma conotação burguesa e
bro precisava encontrar um novo equilíbrio entre
modificaram-se as relações de trabalho.
coerção e consenso, a fim de garantir a sua estabi-
Visto desta forma, aquelas forças que se auto-
20 Sandra Jatahy Pesavento A Revolução Federalista 21

lidade. Tudo isto, evidentemente, envolve um delicado


No tocante à coerção, tornava-se necessana a equilíbrio de interesses e reconhecimento de direitos
permanência dos militares no poder nos primeiros que extrapola uma análise simplista que associa, me-
anos que se seguiram à instalação da República. canicamente, poder econômico a poder político. O
Nesta medida, os governos de Deodoro (1889- processo revela-se ainda mais complexo porque a
1891) e de Floriano (1891-1894) foram essenciais mudança de regime dá ensejo para que se revele, com
para a consolidação do regime, preparando o cami- mais clareza, uma série de problemas presentes na
nho para a ascensão de Prudente de Morais (cafeicul- sociedade brasileira.
tor, paulista e "republicano histórico"). Em especial, cabe destacar, para efeitos de com-
Quanto ao consenso, este teve de ser articulado preender a construção do aparato de hegemonia, as
pelos cafeicultores paulistas, condutores do processo tensões que se dão intraclasse dominante.
em curso, de molde a colocar seus interesses como Paralelamente a tensões de ordem regional,
hegemônicos sobre a sociedade civil. mais antigas, mas agora revitalizadas (café X grupos
Em última análise, tratava-se de garantir aos agrários regionais), manifestam-se tensões entre os
cafeicultores a supremaciapolitica, cultural e ideo- interesses da oligarquia proprietária de terras, por
lógica da sociedade, constituindo-os em classe hege- um lado, e os do emergente empresariado industrial,
mônica. por outro.
Tal tarefa implicava, por uma parte, a barganha Com relação às tensões presentes no interior dos
e a articulação com as demais oligarquias agrárias do grupos agrários, a base do acerto que iria garantir a
país e, por outra, com os demais setores represen- hegemonia do grupo do café se apoiava numa tripla
tativos do capital (comercial, industrial e financeiro), ordem de fatores:
atores secundários, mas nem por isto desprovidos de 1) em primeiro lugar, a identidade de classe
peso neste jogo de poder. entre os proprietários de terra. Os cafeicultores se
Ora, a constituição da hegemonia de um grupo constituíam na fração dominante da classe, e o fato
_ sobre a sociedade traduz-se, como já foi dito, no de terem todos em comum os mesmos interesses fun-
consenso, aceitação ou reconhecimento, por parte damentais servia de base para o consenso. Estes inte-
dos demais grupos, da posição privilegiada que de- resses centravam-se na defesa do monopólio do prin-
terminado setor passa a ocupar. Implica que os cipal meio de produção, a terra;
demais legitimem e mesmo aceitem o papel de con- 2) em segundo lugar, como importante ele-
dutores da política por parte do grupo que aspira mento de consenso, figura a fórmula política ado-
à hegemonia, tada: uma República oligárquica, baseada num libe-
22 Sandra Jatahy Pesavento A Revolução Federalista 23

ralismo excludente, que garantia a manutenção do


povo à margem do processo político;
3) finalmente, tem-se a tentativa de compatibi-
lização, por parte da política econômica seguida,
entre o programa de apoio ao café e a satisfação dos
interesses das economias regionais.
Com relação às tensões setoriais presentes entre
os grupos privilegiadós da sociedade, não se pode
concordar com as concepções que enfatizam só a
complementaridade ou só a oposição entre o café e a
indústria.
No centro do pais, a indústria, inegavelmente,
surge e se desenvolve no bojo do surto cafeeiro e da
,li transição da força-trabalho escrava para a força-tra-
balho livre. Neste sentido, café e indústria aparecem
como etapas de um processo de desenvolvimento ca-
pitalista que emerge no país.
Na verdade, ocorre no eixo Rio-São Paulo uma
complementaridade entre café e indústria, da qual
não se excluem as contradições.
Por um lado, a industrialização dependeu, em
grande parte, dos capitais, canais de comercialização
e surto migratório provocado pelo café. Por outro
lado, a predominância dos interesses cafeicultores
sobre a sociedade brasileira limitou, em parte, uma
maior crescimento da indústria.
Completando este quadro de unidade e contra-
dição, tem-se que medidas postas em prática pelos ca-
feicultores para beneficiar seu setor tanto podiam be- CAFEICULTORES INDUSTRIAIS
neficiar a indústria quanto prejudicá-Ia. Tome-se
como exemplo a desvalorização da moeda, que bene-
24 Sandra Jatahy Pesa vento
A Revolução Federalista 2S

fíciava o setor agroexportador. Tal medida tanto A hegemonia dos cafeicultores sobre a nação só
pode ser encarada como favorável à indústria, por iria se revelar quando eles passaram a assumir fun-
tornar mais caro o produto importado, quanto preju- ções dirigentes no governo de Prudente de Morais
dicial, uma vez que dificultava a entrada de mâqui- (1894-1898), mas só se completaria em 1921, por
nas estrangeiras para as fábricas. ocasião da terceira operação valorizadora do café.
Dentro desse quadro, a indústria do centro do Neste momento, essa fração de classe dominante bra-
país surgiu em função do complexo cafeeiro de forma sileira conseguiu identificar seus interesses particu-
complementar e subordinada. Desde cedo revelou-se lares com os interesses nacionais, tornando perma-
um setor atrativo para a inversão de capitais, dotado nente a política de defesa do café.
de alta lucratividade. O fato de ser complementar,
Neste longo processo de extensão da hegemonia
contudo, não eliminou a possibilidade de que viesse a
cafeicultora sobre o país, o período dos governos
possuir interesses desvlnculados do setor agroexpor-
militares foi crucial para a reorientação da socie-
tador.
Seus representantes, uma vez definidos como dade.
grupo com interesses diferenciados; oscilarão, nestes O equilíbrio entre as forças era ainda instável e,
primeiros tempos da República, entre compor com ao mesmo tempo que se buscava o novo equilíbrio
entre ascenso e coerção, alguns problemas funda-
os setores agrários ou com outro setor da sociedade
mentais se colocavam.
identificado com uma política de modernização e
Como questão primordial colocava-se a de dar
industrialização: os militares. Desta forma, estes úl- continuidade à expansão da cafeicultura, assegu-
timos tornam-se um importante setor da sociedade a rando a lucratividade do setor. Entretanto, como já
ser cooptado por aqueles que aspiram ao controle do se viu, esta meta deveria ser seguida ao mesmo tempo
poder político no novo regime. que se postulavam os interesses das economias regio-
Quanto às camadas intermediárias - classes nais. Como problemas atrelados e subordinados a
médias -. e camadas subalternas (rurais e urbanas), esta questão prioritâria, colocavam-se a divergência
têm seus interesses diluídos, canalizados ou supri- de interesses setoriais (agroexportação X indústria) e
midos pelos daqueles grupos que se defrontam na os de uma nova questão que aflorava com o surto
. estruturação do novo regime. Sobre as classes subal- industrial (a regulamentação do trabalho).
ternas não se estendeu a prática do consenso, mas
Acrescente-se a estas questões a estruturação
sim a dominação. Elas foram colocadas à margem
das deliberações da política econômica e da estrutu- propriamente dita do novo regime político a seguir:
se uma República autoritária e centralizada ou uma
ração do Estado.
República "liberal" federativa.
A Revolução Federalista 27
26 Sandra Jatahy Pesa vento

(títulos bancários).
As realizações do governo republicano A medida foi complementada por um sistema de
fácil e amplo crédito para as iniciativas que surgis-
Os últimos anos do Império haviam sido de sem.
expansão acelerada dos cafezais em São Paulo, esti- Com isso, ampliava-se internamente o meio cir-
mulados pelos bons preços, pela disponibilidade de culante, pondo à disposição da sociedade recursos
terras; pela oferta de mão-de-obra e pelo incremento para o estabelecimento de empresas, firmas, socie-
da demanda mundial. O Brasil detinha o monopólio dades por ações, necessidades variadas.
do fornecimento do produto no mercado internacio- O aumento do papel-moeda em circulação inci-
nal, e os cafeicultores eram os beneficiários de todo o diu sobre o valor externo da moeda brasileira, oca-
processo de transformação que ocorrera na sociedade sionando uma baixa do câmbio.
brasileira. Paralelamente, para fazer face às necessidades
No decorrer do último ministério imperial, Ouro do novo governo instalado, determinou-se a cobrança
Preto pusera em prática uma política emissora, que de uma taxa-ouro sobre as mercadorias importadas,
tivera a intenção de atenuar os efeitos causados pela ao mesmo tempo que se elevavam as taxas de impor-
abolição sobre aqueles cafeicultores (Vale do Paraíba tação.
do Sul) que haviam sido afetados pela medida e que A que expectativas correspondia a execução
reivindicavam uma indenização pela perda de seus desta política?
escravos. O Encilhamento correspondeu à convergência
Nos primeiros anos da República, o Ministério de mais de um interesse presente na sociedade brasi-
da Fazenda levou a efeito uma política econômico- leira.
financeira que foi, em parte, prosseguimento daque- Com relação aos cafeicultores, a política seguida
las medidas tomadas no final do Império. tanto atendia às suas necessidades de recursos finan-
A nova política, conhecida pelo nome de Enei- ceiros quanto beneficiavam-se com a desvalorização
lhamento, consistiu em conceder aos bancos o direito da moeda. A generalização da mão-de-obra assala-
de emissão na proporção de três vezes o seu lastro- riada, desdobrada na corrente imigratória e na abo-
ouro, gozando os bilhetes bancários de igual reco- lição, exigia a ampliação do meio circulante no país.
nhecimento às cédulas do Tesouro Nacional. O lastro Quanto à questão do câmbio, cabe explicitar a
das emissões bancárias seria dado por títulos da dí- . sua relação com o preço internacional do café e dis-
vida federal. Abandonava-se, com isto, o lastro-ouro, tinguindo os interesses do Estado daqueles dos pro-
tendo-se criado a situação na qual papel-moeda (tí- dutores.
tulos do Tesouro) garantia o curso de papel-moeda
28 Sandra Jatahy Pesavento A Revolução Federalista 29

Estando o preço do café em alta - incremen- Cabe lembrar que, além de se constituírem
tando-se, portanto, o valor das exportações -, me- como fração mais avançada da classe dominante na-
lhoram as condições da balança de comércio. O go- cional, se encontravam organizados. O fato de seus
verno tanto podia com isto aumentar as importações interesses não virem expressos formalmente no dis-
quanto elevar a taxa de câmbio (diminuir a diferença curso do ministro da Fazenda não deve mascarar o
entre o valor do mil-réis e o da libra). Com isto, podia processo de afirmação da hegemonia dos cafeiculto-
melhor enfrentar seus compromissos externos com os res sobre a nação.
credores internacionais'. Tais interesses aparecem, isto sim, mesclados de
Para os cafeicultores, a situação se apresentava outros também presentes na sociedade e que, no mo-
inversa. Não lhes interessava a valorização cambial. mento, não podiam deixar de ser considerados.
Se os compradores internacionais pagavam ao go- Assim é que, na identificação das intencionali-
verno em ouro, os produtores internamente recebiam dades, deve ser contabilizada a presença do grupo
o valor correspondente em papel-moeda nacional. militar - exercendo momentaneamente o poder -
Estando o câmbio alto, receberiam menos dinheiro; associada às aspirações de representantes intelectua-
estando o câmbio baixo, o retorno em mil-réis seria lizados das classes médias.
maior. Tendo como seu porta-voz oficial o ministro da
"Daí as reivindicações dos empresários no sen- Fazenda Rui Barbosa, a postura que aparece expres-
tido de estabilizar o câmbio e impedir a sua elevação sa na política financeira dos primeiros anos da Re-
quando os preços internacionais do café subiam e de pública traz, inequivocamente associadas, as idéias
forçar a sua baixa quando estes declinavam." (Faus- de industrialização e do protecionismo estatal.
to, Bóris, Expansão do café e política cafeeiro) Tendo como exemplo o caso dos Estados Uni-
-Nesta medida, a política de desvalorização da dos, Rui Barbosa argumentava que a via para a in-
II moeda, levada a efeito entre 1889 e 1894, beneficiou dustrialização passava pela "democracia política".
o setor agroexportador. Anulava-se com isso a ele- Desta forma, no seu entender, a República, com a
vação da taxa cambial, realizada a partir de 1887 e sua programação econômico-financeira, conduziria
decorrente do progressivo aumento do preço do café o país para o desenvolvimento industrial. .
no mercado internacional. Nas aspirações dos militares jacobinos, sempre
Nesta medida é que se afirma que os interesses esteve presente uma concepção autoritária de mando,
dos cafeicultores, que se colocam como prioritários que, saneando os "vícios do regime", imprimisse ao
na sociedade brasileira, não podem estar ausentes na país uma reorientação da sociedade no sentido do
análise da política financeira do período. desenvolvimento econômico. Este, por sua vez, se
30 Sandra Jatahy Pesavento 31
A Revolução Federalista

achava associado à idéia da industrialização. Já as


anônimas, permitindo a negociação pública das ações
classes médias, que viam no desenvolvimento da in-
(Gorender, Jacob, A burguesia brasileira). Ao esti-
dústria transformações 'capazes de forjar melhoria
mular a canalização da poupança privada para estas
das condições de vida, abdicavam de uma postura
empresas, favoreceu a concentração de capital.
liberal-democrática em nome do protecionismo do
Resta referir ainda que igualmente se beneficia-
Estado. ram da política encilhamentista as demais economias
No caso, porém, o projeto modernizador dos agroexportadores regionais.
militares ganhou forçanestes anos iniciais da Repú- Afetados negativamente pela inflação que acom-
blica, na medida em que beneficiava também o setor panhou o período, estiveram os consumidores urba-
agroexportador. anos e os grupos econômicos voltados para o abaste-
Na prática, beneficiârios do processo - e não os cimento do mercado interno.
seus promotores diretos - foram também os empre- Em pleno período encilhamentista, o governo
sários' industriais, que lucraram com a política de republicano assinou com os Estados Unidos o Tra-
crédito fácil, com as emissões e o encarecimento do tado de 1891, pelo qual se estabelecia a garantia do
produto importado. O surto industrial dos primeiros mercado americano ao café brasileiro, em troca de
governos republicanos não deve ser, porém, superes-
entrada no país de cereais e produtos manufaturados
timado. O maior número de estabelecimentos não
norte-americanos pagando baixas tarifas alfandegá-
pode ser confundido com o aumento da capacidade
produtiva. Na verdade, o período revelou-se pouco rias.
Em suma, enquanto que o governo brasileiro
favorável à importação de tecnologia, e proliferaram
procurava garantir a continuidade das exportações
as pequenas empresas, que operavam com instru-
daquele que era o setor de ponta da economia na-
mentos de trabalho simples, de caráter artesanal.
cional, assentava-se um golpe sobre os produtores
Favorecidos ainda pelo conjunto de medidas que
para o mercado interno. Em especial, a indústria se
caracterizou o período do Encilhamento foram tam-
ressentiria dos termos do Tratado, com a entrada dos
bémos setores representativos do capital financeiro e
artigos estrangeiros no país.
as companhias de estradas de ferro e de navegação.
Comparando os efeitos do Encilhamento com os
Juntamente com algumas empresas industriais
do Tratado de 1891 sobre a indústria, o processo
que se haviam estrutura do antes da República, estas parece contraditório.
firmas conseguiram absorver as maiores parcelas do É, contudo, característico o primeiro período
capital posto em circulação. Favoreceu-as ainda a lei republicano, quando os interesses fundamentais a
de 1890, que agilizou a organização das sociedades preservar - os do café - devem conviver e também
32 Sandra Jatahy Pesavento A Revolução Federalista 33

satisfazer outros interesses, principalmente se eles nais. Principalmente para São Paulo, e secundaria-
provierem de aliados em potencial dos grupos agrá- mente para Minas, o federalismo seria a forma de
rios. assegurar o predomínio do grupo agroexportador ca-
Com a República acabava, no dizer de Faoro, o feeiro na política nacional, bem como organizar, a
"agrarismo exclusivo do Império" (Faoro, Raymun- nível de tributação, os mecanismos financeiros capa-
do, Os donos do poder). zes de beneficiá-los.
Definida assim a política econômico-financeira Esta disputa esteve presente nos primeiros mo-
seguida no decorrer dos governos militares, estabe- mentos da República e, na sua primeira instância,
lecia-se no país uma divisão no que diz respeito ao assumiu a forma do debate entre a convocação da
apoio ou não às medidas determinadas pelo governo Constituinte ou a prorrogação do regime de exceção
federal. Tratava-se, em última análise, de legitimar (Governo Provisório). Enquanto que os militares pe-
ou denunciar as diretrizes imprimidas na condução diam a continuidade do governo autoritário, no qual
do processo econômico. Esta questão ficará mais eles ocupavam os postos-chave, a constitucionaliza-
clara quando se analisar, no capítulo 3, o caso do Rio ção era reivindicada pelos políticos civis. Além "disso,
Grande do Sul, com sua economia voltada para o havia desconfiança do exterior, principalmente da-
mercado interno e sua posição com relação ao setor queles grupos que emprestavam dinheiro para o
agroexportador dominante. Brasil, de que o governo republicano não assumiria
Quanto ao processo politico propriamente dito, os compromissos e dívidas contraídas no tempo do
este apresentava, no momento imediato ao 1S de no- Império.
vembro, um problema também fundamental para ser A convocação de uma Assembléia Constituinte,
resolvido. De que forma se estruturaria o novo re- no final do ano de 1890, marcou a vitória dos polí-
gime: nos moldes de uma República centralizada e ticos civis sobre as intenções dos militares.
autoritária ou com feição "liberal" e organização A disputa entre as duas formas de encaminha-
federativa? mento do problema politico teve continuidade du-
Defensores da primeira proposta eram os mili- } rante os trabalhos da Constituinte, que se prolonga-
tares, através de sua alajacobina, influenciados pelas ram até 24 de fevereiro de 1891.
11
idéias positivistas de um Estado forte, ditatorial, pro- Os militares tentaram exercer pressão durante
I gressista, modernizante e regenerador. A segunda os trabalhos, resultando disso a aprovação de duas
proposta era a desejada pelo café e que, de um modo medidas: o princípio de que a escolha do primeiro
geral, correspondia às aspirações de descentralização presidente deveria ser feita indiretamente pelo Con-
e atendimento aos problemas das economias .regio- gresso e a aprovação do artigo 6~, que permitia ao
A Revolução Federalista 35
34 Sandra Jatahy Pesavento

dades mais populosas: São Paulo e Minas, os grandes


governo central intervir nos estados sempre que lá se estados cafeeiros.
manifestasse uma agitação contrária aos interesses Com relação ao processo eleitoral, caia o censo,
da União.
vigente na época da Monarquia, mas mantinha-se o
Entretanto, as disposições que prevaleceram na
voto não-secreto, não-obrigatório e não-universal,
Constituição de 1891 foram aquelas que respondiam
uma vez que dele estavam excluídos os analfabetos,
aos interesses dos cafeicultores.
Fundamentalmente, estes reivindicavam a des- mulheres, mendigos, religiosos com voto de obediên-
centralização política, no que eram acompanhados cia e menores de 21 anos. Não existia justiça liberal
pelos grupos oligárquicos regionais. O poder destes autônoma, independente da situação política vi-
I grupos locais, já reconhecido na Monarquia, foi am- gente. A fraude era, pois, generalizada, sendo as
I

pliado com a República. eleições nos estados manipuladas pelos proprietários


A primeira Constituição republicana adotou de terras - os coronéis. Eleições feitas, cabia ao
I I para o pais a forma federativa, dando grande auto- poder Legislativo, estadual e federal, o seu "reconhe-
nomia aos estados. Estes podiam contrair emprésti- cimento": quem não era a favor da situação caía
fora ...
mos externos e possuir uma justiça e efetivos mili-
No que toca às oposições, a nível local, regis-
tares próprios.
trava-se a presença de grupos rivais, mas dentro do
No tocante à discriminação das rendas, a Cons-
mesmo partido: ao Partido Republicano (PR) da si-
tituição estabeleceu que à União caberiam os impos-
tuação contrapunha-se o PR de oposição, que se
tos de importações e o imposto do selo, enquanto que alternavam no poder. A regra era de que o governo
os estados recolheriam os impostos de exportação, federal legitimasse estas mudanças a nível regional,
bens móveis, transmissão de propriedade, indústrias
reconhecendo a "nova situação" que fosse criada.
e profissões.
Outras vezes - conforme a sua conveniência - o
Esta divisão garantia que São Paulo concentras-
governo central podia intervir nos estados (valendo-
se a maior parte dos recursos, tanto por ser o maior
exportador quanto por captar as taxas de importação se do artigo 6!l da Constituição) para inverter a si-
de todo o país, quando assumisse funções dirigentes tuação política local, tornando a "oposição" em ".si-
a nível nacional. tuação" .
No que toca ao poder Legislativo, estabeleceu-se Entretanto, tais dissidências não se dividiam em
que a representação na Câmara dos Deputados seria programas partidários diferenciados, nem se colo-
proporcional ao número de habitantes de cada es- cavam contra o regime em si. Caso à parte, e que será
tado. Tal princípio consagrava a supremacia das uni- analisado no próximo capítulo, foi o do Rio Grande
36 Sandra Jatahy Pesavento A Revolução Federalista 37

do Sul. trabalho.
De um modo geral, a Constituição de 1891 con- O liberalismo econômico e político, que atendia
sagrou, no plano institucional, os interesses dos aos interesses do setor agrário e do alto comércio e
grandes estados e, particularmente, os da burguesia finanças, vinha agora beneficiar também os empre-
paulista. sários industriais.
O Estado que daí emergiu era estruturalmente Remetendo para a instância privada os contra-
oligârquico - por responder aos interesses da classe tos e questões relativas ao trabalho, o Estado liberal
dominante agrária - e-liberal na forma. de 1891 garantia a acumulação no setor industrial.
Garantia, em tese, a liberdade de iniciativa e a No dizer de Viana, "o segredo da compatibili-
liberdade política, mas, na prática, este princípio só dade dos industriais com os agrários, no que con-
se efetivava para os proprietários. cerne à configuração da ordem, consiste exatamente
O povo, mais uma vez, ficava à margem do no liberalismo ortodoxo que a oligarquia foi compe-
processo. lida a criar para legitimar a idéia da federação (Via-
As propostas de Benjamin Constant, em 1889, na, Luiz Werneck, Liberalismo e sindicato no Bra-
de estabelecer uma regulamentação do trabalho, com sil).
fixação de salários, duração da jornada diária, re- Desta forma, desde os primeiros anos do novo
pouso semanal, férias anuais e forma de dispensa dos regime o futuro grupo dirigente tecia as bases de sua
operários após sete anos de serviço, não obtiveram hegemonia e seu acesso ao poder. É claro, contudo,
aprovação. que não se postulava abertamente como candidato à
O projeto, inegavelmente progressista para a classe dirigente e hegemônica, No seu discurso, em
sua época, deve ser entendido mais à luz do "pro- nome dos ideais do liberalismo, perseguia interesses
gressismo social" dos jovens militares de orientação que eram apresentados como "universais" para toda
positivista do que do entendimento do operário como a sociedade.
um ator social digno de participar do processo em O novo regime, entretanto, era recente e seu
curso. equilíbrio e solidez ainda precários.
Embora algo tenha sido feito em termos de legis- Neste conturbado panorama dos governos mili- .
lação social no decorrer do Governo Provisório, como tares, ocorreram aquelas que se constituíram nas
por exemplo a regulamentação do trabalho do me- mais sérias contestações à nova ordem: a Revolta da
nor, a Constituição de 1891 colocou a questão em Armada e a Revolução Federalista.
termos de pura ortodoxia liberal, repelindo-se toda e
qualquer tentativa de intervenção no mercado de
tE
A Revolução Federalista 39

pecuária como um todo.


Para os rio-grandenses, o problema era visuali-
zado como uma "crise de braços", mas a questão
tinha implicações mais fundas.
Frente ao processo de transformação econô-
mico-social que se desenvolvia no Brasil, o braço es-
cravo tornava-se escasso, notadamente para as re-
giões desvinculadas da agroexportação. O preço dos
OS AUTORITÁRIOS negros elevara- se muito e ocorria no país uma dre-
E ATIVOS CASTILHISTAS: nagem interna de mão-de-obra escrava para a região
NASCE A cafeicultora, habilitada a pagar melhores preços.
REPÜBLICA NO RIO GRANDE Ao mesmo tempo que se elevava o custo da repo-
sição da força-trabalho, outros produtos necessários
para o fabrico do charque - como o sal ou aniagem
para o enfardamento - sofriam altas taxas de im-
Os últimos anos portação.
da Monarquia na Província Revela-se aqui a subordinação dos interesses da
Província sulina com relação ao centro que, alegando
Situada no extremo sul do país, a Província do razões de ordem fiscal, aumentava os impostos de
Rio Grande do Sul possuía uma economia especia- importação, em detrimento das necessidades de uma
lizada no fornecimento de gêneros de subsistência economia regional.
para o mercado interno brasileiro. Desvinculada do Por outro lado, o preço do charque sofria uma
processo agroexportador, a Província tinha seus inte- limitação nas praças de consumo do centro do país.
resses subordinados aos da economia central do país, Sendo os proprietários rurais os compradores do pro-
que se apresentavam como prioritários a nível na- duto rio-grandense, com o que alimentavam seus es-
cional. cravos, tinham interesse em adquirir um artigo a
Seu mais importante produto era o charque, que baixo preço. Uma das formas de conseguir isto era
servia de alimentação para os escravos. permitir a entrada, nas alfândegas do país, do char-
Ao redor da década de 70, a charqueada gaúcha que platino (principalmente uruguaio). Neste caso,
encontrava-se em crise, com efeitos negativos sobre a os argumentos da economia agroexportadora não
mais se direcionavam em termos de "interesses fis-
40 Sandra Jatahy Pesavento A Revolução Federalista 41

cais", mas sim dos do "liberalismo econômico". mento do gado e outras melhorias. Embora, a partir
Em última análise, o que se revela é a dispari- dos anos 80, possa também registrar-se alguma pou-
dade de condições entre a economia regional e a ca coisa neste sentido no Rio Grande do Sul, elas
central agroexportadora. foram insuficientes para alterar as características de
Enquanto que o café buscava diminuir o seu uma criação extensiva, de gado solto em campo na-
custo de produção e potencializava as suas condições tivo.
de acumulação no processo de transição da força- Como fato significativo, cabe referir que, nas
trabalho, a economia pecuária gaúcha descapitali- últimas décadas do Império, a fronteira da província
zava-se. já se achava definitivamente demarcada e iniciara o
As soluções para a "questão da mão-de-obra" processo de cercamento dos campos. A contrapar-
- que, em última análise, era a versão sulina de tida social desta alteração econômica foi a extinção
crise do escravismobrasileiro - viam-selimitadas ao da figura do "gaúcho errante", do "índio vago" que
Rio Grande do Sul. percorria o pampa a cavalo. Definida legalmente a
O Rio Grande do Sul não teve condições de pro- propriedade da terra e do gado, coagia-se a massa
mover uma imigração sistemática de força-trabalho rural despossuída a empregar-se nas estâncias de
livre, tal como São Paulo, para o atendimento das criação de gado, colocando-se sob a dependência
necessidades da charqueada; nem dispôs de capital deste ou daquele patrão. Além da realização das
suficiente para uma renovação tecnolôgica que per- tarefas pertinentes ao trato do gado, estes homens
mitisse a substituição da charqueada como forma constituíam guardas pessoais dos senhores de terras,
mais avançada de beneficiar a carne (caso platino). prontos a defender seus bens e interesses em caso de
Como forma de compensar as flutuações do luta armada.
preço do artigo no centro do país, o charqueador Nos anos finais da Monarquia, a pecuária gaú-
buscava ressarcir-se de eventuais perdas impondo cha encontrava-se em crise, mas não a economia rio-
um baixo preço ao gado.' Com isto, a crise da char- grandense como um todo. Achava-se em ascensão a
queada repercutia sobre toda a pecuária, abrindo-se agricultura colonial praticada pelos imigrantes de
internamente uma área de atrito entre as duas fra- origem estrangeira, notadamente alemães, em re-
ções da camada dominante local. gime de pequena propriedade.
Ao generalizar-se para toda a pecuária, a crise Ao redor de 1870, os produtos coloniais, que até
afetava inclusive possibilidades de renovação da ati- então abasteciam preferentemente o mercado regio-
vidade criatôria. No Uruguai, a criação moderni- nal, começaram a avultar na pauta das exportações
zava-se, com o cercamento dos campos, o refina- para o centro do país.
A Revolução Federalista 43
42 Sandra Jatahy Pesavento

Em termos globais de economia da província, o


surto agrícola compensava em parte as atribulações
da crise da pecuária.
Tanto os produtos pecuários como os agrícolas
viam-se igualmente afetados pela precariedade dos
transportes na província. A primeira ferrovia, cons-
truída em 1874, ligava Porto Alegre a São Leopoldo,
núcleo da colonização alemã, e demonstra bem a
importância crescente que a agricultura começara a
assumir nos quadros da economia gaúcha. As demais
ferrovias - Taquari a Cachoeira, em 1883, atin-
gindo Santa Maria em 1885; Rio Grande a Bagê, em
1884; Barra do Quaraí a Itaqui, em 1888 - revela-
vam-se insuficientes para as necessidades de escoa-
mento dos produtos da província, acrescido do fato
de que o único porto de mar - Rio Grande - tinha
sua barra obstruída pela areia e não possuía um cais
apropriado, não permitindo o acesso de navios de
grande calado.
A região mais próxima da fronteira encontrava
no contrabando e no escoamento do charque, através
do porto de Montevidéu, a forma de compensar a
precariedade dos transportes. Este procedimento,
contudo, não podia ser seguido pelos pecuaristas de
outras regiões da província, bem como vinha ferir os
interesses dos comerciantes de Rio Grande e Porto
Alegre, prejudicados pela atuação dos contrabandis- .
tas da fronteira. BANCÃRIOS FUNCIONÃRIOS
A capital da província experimentava um surto
de desenvolvimento rápido a partir do momento que
se tornara o escoadouro dos produtos coloniais e sede
44 Sandra Jatahy Pesavento A Revolução Federalista 45

de ativo comércio, algumas manufaturas e casas ban- sáram do recurso das forças irregulares da campanha
cárias. A emergência de Porto Alegre como o princi- gaúcha para fazer frente ao castelhano. Enquanto
pal centro urbano da província se fez acompanhar do perduraram os conflitos platinos de fronteira, o Rio
crescimento das camadas médias da população: fun- Grande teve, na militarização de sua sociedade, um
cionalismo público, pequenos comerciantes, profis- fator que fez o centro transigir muitas vezes no aten-
sionais liberais, bancários. dimento às necessidades regionais, em troca do apoio
Todas aquelas questões que afetavam a econo- das tropas gaúchas na defesa da fronteira.
mia regional - transportes, escassez de mão-de- Em 1870, com o fim da guerra do Paraguai,
obra, renovação da pecuária - eram visualizadas tiveram fim os conflitos platinos e com isso deixou de
pelas camadas dominantes locais através da ótica da ter sentido o trunfo político com que podia contar o
dominação política do centro sobre a província. Em Rio Grande nas suas relações com o centro. A situa-
suma, o nó da questão era entendido como sendo o ção se revelava mais grave porque coincidia com a
do centralismo monárquico e do uItitarismo que ema- crise da pecuária gaúcha.
navam da ação dos principais detentores do poder, os Dentro deste contexto, o Partido Liberal sulino
cafeicultores do Vale do Paraíba do Sul. Os proprie- empreendeu um esforço de reerguimento e conquista
tários de terra, gado e charqueadas do sul do país da hegemonia política da província.
identificavam-se, preferencialmente, com aquela r Desde 1868, através do seu jornal A Reforma,
postura político-partidária que se batia pela descen- I os liberais iniciaram uma grande propaganda de ali-
tralização e pelo federalismo: o Partido Liberal. ciamento na província, tendo a seu favor o prestígio
A subordinação econômico-política do Rio Gran- que seus chefes haviam adquirido no decorrer da
de com relação ao centro manifestava-se de dife- Guerra do Paraguai. Sob a liderança do general Osô-
rentes formas: ia desde a designação de presidentes rio, os liberais proclamavam-se "herdeiros das tradi-
da província em desacordo com os interesses da re-
i' ções gloriosas de 35" (Revolução Farroupilha) e pro-
gião até a manipulação da política tributária nacio- punham reformas de cunho político no regime, como
nal em proveito da economia agroexportadora. a de conceder maior autonomia às províncias através
Entretanto, até 1870, o Rio Grande do Sul con- da descentralização administrativa.
tou a seu favor com Um elemento na barganha polí- Através de uma campanha agressiva, os liberais
tica com o centro, que conseguia às vezes atenuar em foram ganhando cada vez mais adeptos, agregando
parte a subordinação. dissidentes das coalizões partidárias que se forma-
Região fronteiriça, tanto a Coroa portuguesa vam no Império, bem como dos próprios conserva-
quanto, posteriormente, o Império brasileiro preci- dores, que se haviam cindido. O Partido Liberal foi
46 Sandra Jatahy Pesavento 47
A Revolução Federalista
I

adquirindo tal força na província que em 1873, em


1878, retirada em 1887 e novamente reativada em
pleno período de domínio do Partido Conservador no
1888. Segundo esta medida, estabelecia-se a redução
Brasil e na província, conseguiu ganhar nas eleições
dos impostos de importação no Rio Grande do Sul
para a Assembléia Legislativa local. Teve início, en-
para uma série de mercadorias, bem como se possi-
tão, um período em que o presidente da província era
bilitava a diminuição dos impostos de exportação se-
conservador, mas a Assembléia era liberal (1873-
gundo os interesses da província.
1877). Neste momento, a atuação dos liberais foi de
Quanto ao crédito, através da influência de Sil-
cunho acentuadamenté inconformista, denunciando veira Martins, propiciavam-se os empréstimos das
os vícios do regime. casas exportadoras para as charqueadas e estâncias
Em 1878, com a ascensão do Partido Liberal ao rio-grandenses.
poder no Brasil, o domínio dos liberais no Rio Gran- Qual o objetivo de tais medidas?
de se tornou inconteste. Com a morte de Osôrio, em Nitidamente, o Partido Liberal buscava favo-
1878, assumiu a chefia do partido Gaspar Silveira recer a produção e a exportação gaúchas, notada-
Martins, que desempenhava as funções de mediador mente a dos produtos pecuários, e preservar os inte-
entre as classes dominantes locais e o poder politico resses do comércio litorâneo face à presença do con-
central. Internamente, dedicou-se a solidificar a he- trabando.
gemonia dos liberais na província, estendendo uma Ante a incapacidade da repressão policial ou
aliança política com os novos setores emergentes na militar ao contrabando, atividade antiga e à qual
sociedade gaúcha: os colonos alemães e o 'setor mais estavam ligados significativos capitais da fronteira
representativo da comunidade teuta - os comer- rio-grandenses e da zona platina, o Partido Liberal
ciantes e a elite intelectualizada.
optou por medidas de apoio governamental para a
Através da sua posição de mediador dos favores
economia gaúcha, medidas estas em estreita depen-
com o poder central, o Partido Liberal centralizou
dência dos favores do governo central.
sua atuação, na década de 80, em três questões eco-
Em nome dos princípios do liberalismo econô-
nômicas: transportes, impostos e créditos.
mico, reduziram-se impostos, facilitava-se o crédito e
Quanto aos transportes, o Partido Liberal con-
o escoamento da produção como forma de reduzir os
seguiu que se construíssem algumas vias férreas na custos e garantir às mercadorias rio-grandenses con-
província (vide p. 41), ao mesmo tempo que se bateu, dições de concorrência no mercado frente aos simi-
sem sucesso, pela abertura da barra. lares platinos.
No tocante aos impostos, obteve a concessão da A política, contudo, era paliativa, na medida em
tarifa especial para o Rio Grande, estabelecida em que não atingia o cerne da questão, que era a moder-
48 Sandra Jatahy Pesavento A Revolução Federalista 49

nização ou renovação da estrutura produtora gaúcha. votar e ser votado aos não-católicos e estrangeiros
Beneficiados com a política eram os charquea- naturalizados. Além disso, introduzia alterações no
dores e estancieiros de Pelotas, Bagé e Rio Grande, esquema censitário: reduzia-se a quantia necessária
zona diretamente ligada ao comércio do litoral e para ser eleitor, mas duplicava-se aquela dos cargos
favorecida com a ligação ferroviária até o porto de eletivos (deputados e senadores).
Rio Grande. Beneficiados eram também os comer- O objetivo do líder liberal gaúcho era claro: por
ciantes de Porto Alegre, e Rio Grande, muitos deles um lado, ampliava no Rio Grande sua massa elei-
de origem alemã, que viam na redução dos impostos toral de manobra, com o ingresso dos colonos ale-
alfandegários uma forma de preservarem seus inte- mães no processo político. Por outro lado, estabelecia
resses contra o comércio ilícito de fronteira. uma aliança com os setores enriquecidos da comuni-
Quanto aos contrabandistas, embora não fos- dade teuta, que puderam ocupar cargos eletivos atra-
sem favorecidos pelas medidas postas em vigor, as vés do Partido Liberal. Surgiram no cenário político
medidas consagravam, na prática, uma divisão de gaúcho deputados alemães, comerciantes, como
esferas de influência: a dos capitais platinos associa- Haensel, ou intelectuais, como Koseritz, que se colo-
dos ao contrabando, na fronteira, e a do comércio cavam como mediadores entre os interesses dos pe-
litorâneo, ligados a uma área especifica da pecuária quenos proprietários rurais e os pecuaristas deten-
gaúcha. tores do poder.
O conjunto das medidas, tomadas em acerto Solidificava-se, assim, a "aliança gasparista",
com o governo central, permite compreender a mu- que garantia a hegemonia do Partido Liberal na pro-
dança de orientação do Partido Liberal rio-gran- víncia.
dense ao longo da década de 80: de atacante e critico
da ordem, toma-se defensor das instituições monár-
quicas. A nova proposta:
A complementação no plano político da aliança A República positivista dos gaúchos
estabelecida pelos liberais no Rio Grande do Sul com
outros setores sociais deu-se por ocasião da Lei Sa- Apesar das barganhas empreendidas pelo Par-
raiva, aprovada em 1881, sob influência da campa- tido Liberal na sua relação com o centro e, inter-
nha desencadeada na Assembléia Geral por Silveira namente, no estabelecimento de alianças para solidi-
Martins. ficar sua hegemonia, a província apresentava uma
Esta lei estabelecia a reforma do sistema eleito- série de tensões e problemas.
ral vigente, garantindo eleições diretas e direito de Permanecia a dificuldade da pecuária gaúcha
A Revolução Federalista SI
so Sandra Jatahy Pesavento

idéia de redistribuição do poder no plano provincial e


em renovar seu processo produtivo, à semelhança do à reorientação da economia gaúcha como um todo.
platino, para o que se faziam necessários avultados Os propagandistas da nova proposta eram um
capitais e amplo crédito. Decaíam as rendas da pro- grupo de jovens bacharéis recém-formados, geral-
víncia, provenientes tanto das isenções de impostos mente filhos de estancieiros rio-grandenses. Quando
quanto da persistência do contrabando. estudantes, a maior parte deles na Faculdade de Di-
A rede ferroviária apresentava-se insuficiente, e reito de São Paulo, haviam entrado em contato com
a barra permanecia obstruida. Ao lado destes pro- as idéias republicanas e positivistas, bem como viven-
blemas não resolvidos, que afetavam o setor tradicio- ciado todo o clima de efervescência política.e trans-
nal da economia gaúcha, acrescentavam-se as de- formações econômico-sociais experimentadas pelo
mandas da nova área que ascendia na província:
Porto Alegre e zona colonial serrana. Desde 1870 que centro do país.
Quase todos eles iriam destacar-se na política
se haviam formado estâncias na zona da serra (Cruz
rio-grandense e mesmo nacional. Liderados por Júlio
Alta, Vacaria) e, no decorrer desta década, a imigra-
de Castilhos, o grupo de republicanos gaúchos in-
ção italiana velo povoar a região com suas pequenas
cluía os nomes de Joaquim Francisco de Assis Brasil,
propriedades rurais. Em especial, os comerciantes de
Antônio Augusto Borges de Medeiros, José Gomes
Porto Alegre tinham interesse em garantir-se como
Pinheiro Machado. A este grupo de jovens advoga-
receptadores dos produtos da região norte do estado, dos juntaram-se outros filhos de estancieiros gradua-
que se encontrava mal servida de estradas e vias dos em Medicina: Carlos Barbosa Gonçalves, Fer-
férreas. nando Abbot e Ramiro Barcelos.
Ora, manifestava-se, como se vê, um descom- Durante a década de 80, o grupo de republi-
passo entre as necessidades da economia regional canos fez intensa campanha na província, difun-
como um todo e a estrutura política do Império, que dindo suas idéias e formando clubes republicanos
estabelecia a dependência do poder local ao poder nos diferentes municípios.
central. Começaram a surgir críticas ao imobilismo Como fruto da intensa agitação promovida pelos
do Partido Liberal, incapaz de resolver as questões jovens profissionais liberais liderados por Castilhos,
.que se antepunham ao desenvolvimento da região. em 1882 realizou-se na província a primeira conven-
Neste contexto, a idéia da República surgiu
ção republicana, quando já formado oficialmente o
como uma possibilidade alternativa para o encami-
nhamento dos problemas do Rio Grande. Partido Republicano Rio-grandense (PRR).
Além da adoção do princípio do federalismo e
A proposta republicana, que implicava a mu-
dança do regime a nível nacional, vinha associada à do endosso do Manifesto Republicano de 1870 (Rio
52 Sandra Jatahy Pesavento A Revolução Federalista 53

de Janeiro), o PRR manifestou, desde este momento, A nova aliança política abrigava no seu interior
uma nítida influência positivista, adotando o lema variados segmentos sociais.
"ordem e progresso". Neste mesmo ano, os republi- Já se viu que seu núcleo central foi constituído
canos apresentaram candidatos seus nas eleições pro- pelos jovens profissionais liberais egressos das facul-
vinciais, sendo derrotados. dades do centro do país. Na maior parte, constituíam
Em 1883, no primeiro congresso realizado, tra- uma ala do Partido Liberal desencantada com o re-
tou-se da necessidade de criação de um jornal parti- gime e que assumia uma postura crítica radical.
dário que melhor difúndisse as novas idéias. Em Eram filhos de estancieiros, mas geralmente desvin-
1884, surgia A Federação, jornal que se tornou o culados da pecuária tradicional do eixo Pelotas- Rio
órgão oficial do PRR, tendo por redator Júlio de Cas- Grande-Bagé. Manifestavam uma profunda descon-
tilhos. formidade com o imobilismo do Partido Liberal, de-
Neste mesmo ano, por ocasião do Segundo Con- nunciando suas negociações com o centro que o ha-
gresso Republicano, foram lançadas as "bases do viam feito deixar de lado uma postura combativa.
programa dos candidatos republicanos", que refle- Associadas a eles, encontravam-se as novas ca-
tiam o pensamento de Júlio de Castilhos e a influên- madas médias urbanas, que não viam seus interesses
cia de Augusto Comte. representados na política partidária imperial. Tais
Ao lado da preocupação com o desenvolvimento setores apresentavam-se como politicamente dispo-
dos transportes, comunicações e indústrias, afir- níveis e, portanto, predispostos para ser arregimen-
mava-se a necessidade de implantação da república tadas por uma nova proposta partidária que surgisse.
federativa como condição para manter a unidade na- Além desse núcleo constitutivo, o PRR buscou
cional. ampliar a sua base social de apoio político, tentando
No decorrer dos anos seguintes, o PRR centra- cooptar para seus quadros aqueles setores egressos
lizou sua atuação na busca de novos adeptos. do complexo colonial-urbano que haviam enrique-
A tarefa proselitista, contudo, não era fácil: tra- cido: industriais e comerciantes. Da mesma forma,
tava-se da emergência de um novo partido nos qua- preocupou-se em incorporar os pequenos proprietá-
dros de uma situação política dominada pelo Partido rios rurais de origem imigrante, em especial os ita-
Liberal. Era preciso, pois, que, além de ralizar uma lianos, de chegada mais recente e que não haviam
intensa propaganda, o partido oferecesse novas solu- sido englobados na aliança gasparista.
ções para velhos problemas, assim como estabele- Finalmente, o PRR foi capaz de estabelecer uma
cesse uma base social mais ampla do que aquela tra- sólida e vantajosa ligação com o Exército. Isto foi,
çada pelo grupo no poder. em parte, facilitado pelas vinculações que a socie-
54 Sandra Jatahy Pesavento
A Revolução, Federalista 55

dade militarizada da campanha gaúcha sempre man-


etapa final do progresso humano, fase em que os
teve com o Exército, desde os conflitos de fronteira
detentores do conhecimento científico - uma elite
do período colonial. Ao contrário do centro do país, a
de sábios - comandariam a sociedade. Acha-se im-
carreira de armas nunca deixou de ser prestigiada no
Rio Grande do Sul. Por outro lado, nos momentos plícita nas idéias do positivismo de Augusto Comte a
finais do Império, a aproximação tomou-se ainda "afirmação de que o poder pertence a quem possui o
maior devido ao ideário positivista, adotado pelo saber. Por este motivo o positivismo declara que uma
PRR, e que tinha grande penetração nos meios mili- sociedade ordenada e progressista deve ser dirigida
pelos que possuem o espírito científico, de sorte que a
tares.
Ao ser adotado pelo PRR como matriz inspi- política é um direito dos sábios, e sua aplicação, uma
radora da conduta política e administrativa do par- tarefa de técnicos ou administradores competentes"
(Chauí, Marilena, O que é ideologia).
tido, o positivismo veio conferir uma feição sui gene-
Deste conjunto de idéias, os republicanos gaú-
ris ao republicanismo gaúcho. chos recolheram aqueles princípios que melhor se
No contexto europeu do século XIX, onde sur- adequavam às aspirações e problemas locais, adap-
giu, o positivismo foi uma das correntes ideológicas tando-os e incorporando-os à sua proposta política.
de justificação do triunfo da sociedade burguesa e do Qual era, essencialmente, a proposta do mino-
modo capitalista de produção. ritário porém ativo grupo republicano, na sua traje-
Seus princípios norte adores - ordem e pro- tória de expansão e proselitismo na sociedade rio-
gresso - estão assim diretamente relacionados com
grandense?
o progresso em curso na sociedade: a ordem bur- Em termos propriamente econômicos, a idéia do
guesa era o elemento a conservar; o progresso eco-
progresso traduzia-se numa proposta de desenvolvi-
nômico, o objetivo a atingir. Daí, pois, os lemas posi-
mento das forças produtivas na província que aten-
tivistas: "a ordem por base, o progresso por fim",
"o progresso é a continuidade da ordem". desse a todos os setores da economia. Em outras
A idéia de progresso e de evolução, presente nas palavras, o PRR oferecia um projeto de constituir no
diferentes correntes de pensamento do século pas- Rio Grande uma base econômica alternativa ao pre-
sado, acha-se ligada à concepção positivista de histó- domínio absoluto da pecuária. Ao incorporar novas
ria. Encarada como uma evolução lógica e natural de áreas e setores, procurava corresponder à satisfação
estágios, a história das sociedades culminaria com o de distintos interesses presentes na sociedade rio-
grandense que sofrera uma diversificação significa-
advento da fase positiva ou científica, caracterizada
pelo primado da razão e da ciência. Corresponderia à tiva.
Como forma de conseguir este desenvolvimento
56 Sandra Jatahy Pesavento A Revolução Federalista 57

econômico global e equilibrado da economia, o PRR finaceiro -, bem como dos colonos de .origem imi-
dispunha-se a encarar como prioritária a questão dos grante, interessados na preservação de seu patrimô-
transportes e eliminar os privilégios. nio.
Para que o processo harmônico de todas as ati- Em termos políticos, a proposta positivista da
vidades econômicas da província fosse atingido, fa- república é de um governo autoritário e centralizado,
zia-se necessária a conservação da ordem social. Nes- fixando o poder entregue a uma elite dirigente, fi-
te ponto, o PRR apresentava-se como defensor dos liada ao partido.
produtores, englobando nesta categoria não apenas Ora, como já se viu, segundo a postura positi-
os detentores do capital como os trabalhadores dire- vista há uma clara distinção entre os que detêm o
tos. Ao mesmo tempo que procurava garantir a acu- saber técnico e que, por conseqüência, estão melhor
mulação privada de capitais - postulando que o habilitados para mandar, e o restante da sociedade,
estado seria tão rico quanto maior fosse a fortuna que, deve obedecer. Esta postura autoritária é, con-
privada de seus cidadãos -, o PRR afirmava ser da tudo, "suavizada" pela apresentação de um Estado
"ordem natural" das coisas a existência de ricos e apolítico: se é negado o conflito social e não ocorre a
pobres. Empresários e operários, ambos produtores, supremacia de uma classe sobre as outras, o Estado
contribuíam cada qual de uma maneira para o pro- não tem funções políticas, de dominação, mas s6
gresso, e o trabalho executado pelo produtor direto técnicas, de administração sobre as coisas materiais.
encontra o seu "justo preço" no "salário liberalmente Nesta perspectiva, o Estado republicano gaúcho
concedido" pelo patrão. Desta forma de entendi- se apresentava nos melhores moldes de um Estado
mento da realidade, o capital, social na sua origem burguês: aparentemente neutro, não identificado
(porque fruto do trabalho dos homens) tinha um com nenhuma classe social em particular, com o
destino social, revertendo ao trabalhador sob a forma poder exercido em função dos interesses da coleti-
de salário... •. vidade. Entretanto, é inegável que, sob a capa de
O entendimento da questão econômico-social é, uma aparente neutralidade, o Estado rio-grandense
eminentemente, "progressista conservadora". Ao sempre correspondeu aos interesses dos detentores
mesmo tempo que postula o desenvolvimento econô- do capital.
mico, pressupõe a defesa de posições adquiridas e Quando ao caráter autoritário do mando, este
nega o conflito social. foi um componente que esteve presente na sociedade
Diante desta proposta, torna-se clara a possibi- sulina, desde os primôrdios, quando eram comuns
lidade de adesão ao partido daqueles grupos deten- atos de violência e arbitrariedade.
tores do grande capital - industrial, comercial e A crítica ao funcionamento político da Monar-
58 Sandra Jatahy Pesavento A Revolução Federalista 59

quia se fazia acompanhar, na proposta positivista, de Castilhos neste processo, constituíam, como já se viu,
um cunho de moralidade, expresso no lema positi- um grupo minoritário, mas extremamente ativo e
vista de praticar sempre a "sã política, filha da moral combativo.
e da razão". Estes princípios eram especialmente Radicais na sua intransigência com a Monar-
caros às camadas médias urbanas, que não se viam quia, progressistas para os quadros da época, de-
enquadradas nos quadros políticos imperiais e não monstraram extrema habilidade política nos inciden-
gozavam dos favores que eram dispensados às classes tes que levaram à queda do regime.
dominantes. Nos momentos finais da Monarquia, o PRR teve
Se, no plano da realidade regional, os republi- atuação decisiva, atuando como agente catalisador
canos postulavam um governo centralizado, no plano dos descontentamentos não apenas no plano regional
nacional batiam-se pelo federalismo, considerado como também no nacional.
como a única forma de garantir a unidade do país. Dois incidentes, sobretudo, demonstraram a
Conciliavam, nesta postura, o objetivo de garantir a capacidade do combativo grupo em fazer com que
au tonomia político-administrativa em relação ao cen- acontecimentos locais assumissem uma dimensão
tro com a necessidade de manter a integração econô- mais ampla.
mica com o mercado interno brasileiro. O de menor expressão deu-se em função de um
Em suma, frente a uma política econômica vol- incidente ocorrido na Câmara Municipal da cidade
tada preferencialmente para a pecuária, o PRR ofe- gaúcha de São Borja: um vereador republicano, Apa-
recia um projeto de desenvolvimento global da eco- rício Mariense, apresentou em 1888 uma moção,
nomia; frente a um governo com uma nítida postura aprovada pela Câmara, de que fosse feita uma con-
de classe, ofereciam uma aliança mais ampla entre os sulta à nação para ver se haveria ou um Terceiro
setores detentores de capital, na qual os pecuaristas Reinado. Ao utilizar A Federação para difundir e
fossem um dos elementos do acerto; finalmente, ante celebrar o incidente, Castilhos aumentou a sua reper-
um Estado monárquico patrimonial, marcado pela cussão, fazendo com que republicanos de outras pro-
política dos favores e dos benefícios, onde o público e víncias também questionassem o problema.
o privado se confundiam, através de regime de con- A atuação mais destacada dos republicanos gaú-
cessões, apresentavam um Estado burguês, que devia chos foi, contudo, no seu envolvimento com a cha-
assegurar a liberdade de competição entre os produ- mada "Questão Militar".
tores. Captando com muita argúcia que o que estava
Os portadores destas idéias, conhecidos como realmente em jogo era a não-subordinação do militar
castilhistas, dada a liderança inegável de Julio de à autoridade política dos civis, Castilhos ofereceu,
60 Sandra Jatahy Pesavento A Revolução Federalista 61

em 1886, as páginas de A Federação para o tenente- negociações. Neste ponto, revelavam extraordinário
coronel Serra Madureira defender-se pela imprensa senso político: como grupo minoritário, se defron-
contra os ataques que o ministro da Guerra lhe fi- tados em negociação direta ou pelo voto com a si-
zera, acusando-o de insubordinação. tuação vigente, seriam derrotados pela máquina elei-
Em artigo de sua autoria, Castilhos afirmava toral montada.
que a questão não afetava apenas a honra do oficial
punido, mas a de todo 9 exército nacional. Com habi-
lidade, conseguiu envolver na questão o marechal
Deodoro da Fonseca, comandante de Armas do Rio
Os castilhistas no poder
Grande do Sul e presidente interino da província Com a efetivação do golpe militar de 1S de no-
nessa época. vembro, processou-se o expurgo dos liberais, com a
Na verdade, os republicanos civis instrumentali- extradição de seus principais líderes, como Silveira
zaram os militares, aumentando o seu inconfor- Martins, que embarcou para o exílio na Europa. Os
mismo com o regime e produzindo o desfecho da republicanos foram levados ao poder, ficando na
situação com o golpe de 1Sde novembro. chefia do estado o visconde de Pelotas, um militar,
Não apenas os aproximavam os tradicionais la- ex-liberal, mas profundamente envolvido nas ques-
ços que o Rio Grande sempre mantivera com as tões que antagonizaram o Exército com a Monarquia
Forças Armadas, mas também a identidade de pro- nos anos finais do regime.
postas quanto ao tipo de governo a ser instalado: a Castilhos, já reconhecido tacitamente como líder
república autoritária, de feição positivista. do PRR, ocupou o posto de secretário do Governo
A atuação regional do PRR extrapolava, assim, Estadual, cargo que lhe dava amplas oportunidades
os limites da província, assumindo uma dimensão de arranjos políticos.
nacional. A base do novo consenso seria dada por uma
Com relação a este processo mais amplo que aliança entre grupos sociais díspares, sob a êgide de
sacudia o país, o PRR distanciava-se da proposta de um Estado aparentemente neutro e portador do inte-
república postulada pelos cafeicultores paulistas, resse de todas as classes sociais. Ora, a neutralidade
mas unia-os a intencionalidade da mudança do re- do Estado é uma aparência; essencialmente, o Es-
gime. tado positivista era representativo dos interesses do
Como tática, o PRR optava pela linha conspira- capital: agrário, comercial, industrial e financeiro.
tória, pela intransigência ideológica e pela intensa Note-se, contudo, que o PRR não abrigava em seu
mobilização e propaganda de aliciamento, recusando seio a totalidade dos representantes do setor agrário
62 Sandra Jatahy Pesavento A Revolução Federalista 63

rio-grandense; desalojara mesmo do poder, com a


República, o setor mais representativo dos proprietá-
rios de terra, arregimentados no Partido Liberal.
li Para manter afastada do poder esta facção polí-
I tica da classe dominante, o novo grupo dirigente
precisava justamente ampliar a sua base social. Para
garantir a adesão ao partido e à orientação castilhista
de governo, era preciso que os interesses de outros
grupos sociais fossem também contemplados. Assim,
ao lado dos interesses prioritários dos setores deten-
tores do capital, o PRR procurou envolver outros
setores sociais portadores de aspirações diferentes,
cooptando-os para seus quadros burocráticos (classes
médias) ou utilizando-os como base de apoio (colo-
nos, pequenos proprietários).
Esta realidade encontrava correspondência no
plano de formulação de um programa de governo,
na proposta de desenvolvimento global da economia,
na condenação dos privilégios, no governo autoritá-
rio, "acima da sociedade" e moralizador.
A solidificação do novo governo não se daria
apenas pela barganha de interesses e de apoio polí-
tico no seio da sociedade civil. Na verdade, esta foi
uma tarefa árdua que foi continuada pelo sucessor de
Júlio de Castilhos na chefia do PRR e do governo
estadual, Borges de Medeiros.
-'/
Nestes primeiros anos de República, mais pro-
priamente do que os mecanismos de consenso, preva-
leceram os da coerção.
Para isto, o Rio Grande contou a seu favor com EXÉRCITO BRIGADA MILHAR
o apoio do Exército e a criação da Brigada Militar,
64 Sandra Jatahy Pesavento A Revolução Federalista 65

força estadual de repressão ligada ao governo e cria- país e internamente, no arranjo politico entre as
da por Júlio de Castilhos. classes sociais.
No período do Governo Provisório, os militares No que toca à política econômico-financeira do
se mantiveram no poder no centro do país e os casti- Encilhamento, ficou estabelecido que o Rio Grande
lhistas no do Rio Grande. No final desta etapa, Deo- do Sul fosse a sede de um dos bancos emissores par-
doro foi eleito pelo Congresso presidente constitucio- ticulares. Esta determinação gerou manifestações
nal do Brasil, e Castilhos presidente do estado pela públicas contra a medida em Porto Alegre e desapro-
Assembléia Constituinté local. vação total dos republicanos. A atitude do PRR deve
Durante o primeiro ano da República, sucede- ser entendida à luz do que considerava serem os inte-
ram-se no sul os governos militares (Pelotas, general resses da economia gaúcha como um todo: voltada
Frota, general Costa), mas, na prática, quem nor- para o abastecimento do mercado interno brasileiro,
teava as diretrizes da política era Castilhos, o chefe a política emissionista posta em prática representava
do PRR, que se mantinha apoiando o governo de uma perda do poder aquisitivo para o consumidor
Deodoro. nacional. Desta forma, afetaria diretamente as ven-
Na verdade, o acerto do Rio Grande com o das do Rio Grande do Sul.
Governo Provisório central não se deu sem atritos. Ao defender os interesses da economia regional
Por um lado, o PRR precisava do apoio político- e dos setores sociais nela representados - principal-
militar do centro para manter-se no poder, mas, por mente produtores agropecuários e industriais -, o
outro lado, não concordava com todas as decisões da PRR procurava resguardar o pacto político que for-
política econômica federal. Estas, algumas vezes, vi- jara. Sua argumentação, contudo, se fazia em termos
nham ferir os interesses da economia regional. de denunciar a concessão de privilégios a um esta-
Os interesses do centro, como já se viu, resul- belecimento particular de créditó e de defender um
tavam neste momento de uma acomodação entre as federalismo radical, posicionando-se contra a inter-
pretensões dos militares, grupos agroexportadores e venção do centro em matéria financeira que afetasse
classes médias. No contexto rio-grandense, o PRR o estado. Significativo foi, neste caso, o manifesto
não apenas tinha de conciliar no seu interior interes- dos grandes comerciantes de Porto Alegre, criticando
ses variados e, muitas vezes, opostos, como tinha de o estabelecimento do banco emissor no estado. Con-
enfrentar os grupos até então arregimentados na siderando que muitas casas eram importadoras, a
aliança liberal-gasparista. depreciação do valor da moeda reverteria em maiores
Estes foram, por assim dizer, pontos de tensão dificuldades nas operações com o exterior.
nas relações do Rio Grande do Sul com o centro do Com relação à questão do contrabando, já se viu
66 Sandra Jatahy Pesavento A Revolução Federalista 67

que uma das realizações do Partido Liberal, na época uma vez que permitia a entrada no país de trigo,
da Monarquia, fora a obtenção da tarifa especial - banha, couros e manufaturados norte-americanos
isenções fiscais para produtos importados pelo Rio mediante baixas tarifas.
Grande do Sul para desestimular o comércio ilícito. Mais uma vez, os castilhistas argumentavam em
Isto fora anulado com a instalação da República, e os defesa da produção gaúcha para o mercado interno.
republicanos castilhistas aplaudiram a medida, ar- Nota-se, nas posturas anunciadas pelo PRR com
gumentando que as isenções fiscais prejudicavam a relação às diferentes medidas do governo central no
indústria gaúcha pela éntrada do manufaturado es- terreno econômico, que prevaleceram os interesses
trangeiro. Em substituição às tarifas especiais, o Go- regionais em detrimento do incondicional apoio à
verno Provisório resolveu reprimir o contrabando ditadura militar.
pela força, estabelecendo delegacias ao longo da Entende-se por interesses regionais a especifici-
fronteira e delimitando "zonas fiscais". da de de uma economia voltada para o mercado in-
Esta era uma questão ainda mais delicada em terno, buscando expansão, e a especificidade do novo
termos de Rio Grande do Sul, onde o contrabando arranjo social que o PRR tentaria articular, englo-
era uma realidade muito antiga, com sólidos inte- bando novos contingentes sociais.
resses envolvidos. Se a repressão tinha todo o apoio Este arranjo interno de forças era extremamente
dos comerciantes do litoral e Porto Alegre, vinha frágil justamente num período de grande instabili-
desagradar aos comerciantes da fronteira, afetos ao dade, quando o novo regime ainda não se consoli-
comércio ilícito. dara.
O PRR oscilou entre tomar uma posição efetiva, Os comerciantes de Porto Alegre e Rio Grande,
o que revela a sua indecisão entre quais forças sociais por exemplo, ora se viam identificados com a postura
se apoiar e/ou cooptar. Após inúmeros debates no assumida pelo PRR na questão do banco emissor,
partido, venceu a tendência que identificava a "zona ora se viam prejudicados, como na questão do con-
fiscal" como um privilégio, tendo o PRR enviado ao trabando.
governo federal uma moção na qual pedia sua extin- No que toca à organização político-administra-
ção , Neste caso, o PRR decidiu-se em tentar ganhar tiva do regime, os castilhistas não partilharam da
para si, como base do apoio, os contrabandistas da tentativa militar de prolongar o estado de exceção,
fronteira. mas o PRR endossou a candidatura de Deodoro à
Com relação ao Tratado de Comércio firmado presidência, quando a Assembléia Constituinte foi
em 1891 com os Estados Unidos, o PRR denunciou o convocada.
acordo como lesivo aos interesses do Rio Grande, Como já haviam se registrado atritos, no plano
68 Sandra Jatahy Pesavento A Revolução Federalista 69

econômico e político, entre o Governo Provisório e o Todavia, os republicanos rio-grandeses conse-


Rio Grande, esta posição não foi endossada por to- guiram a aprovação no Congresso da realização de
dos os republicanos, registrando-se algumas defec- eleições diretas para presidentes e vice-presidente da
ções no partido. República, adotada como norma constitucional. Nas
Na Assembléia Constituinte, os representantes eleições realizadas no âmbito da Assembléia, após
do Rio Grande, liderados por Castilhos, defenderam esta ter encerrado a sua tarefa constituinte, a dele-
um federalismo extremado para a União, a fim de gação gaúcha, em sua maioria, votou em Deodoro
para presidente.
garantirem a maior autonomia para as regiões. Face
Com esta medida, reforçavam seus laços com o
à aceitação deste princípio, puderam, uma vez na
governo militar no centro do país, solidificando sua
Constituinte estadual, estabelecer um regime unitá-
posição no âmbito regional.
rio e centralizado, sob o comando hierarquizado e
O domínio dos castilhistas no sul começara a ser
sectário do partido.
contestado desde os momentos iniciais da República.
Castilhos defendeu ainda a necessidade de es-
A primeira oposição organizada ao PRR deu-se em
tabelecer a autonomia financeira dos estados, com a
1890, com a formação da União Nacional, formada
rigorosa discriminação entre os impostos estaduais e
por alguns antigos liberais, seguidores de Silveira
federais. Com isso, objetivava aumentar as vendas do
Rio Grande e estabelecer no sul um Estado capaz de Martins, e pelos partidários do clã dos Silva Tavares.
fazer frente aos problemas de infra-estrutura neces- Estancieiros de Bagé, pertenciam, na época do Im-
sários à produção regional. Foram derrotados nas pério, ao Partido Conservador e com a República
suas pretensões pelos setores ligados à agroexpor- haviam aderido ao PRR. Entretanto,logo incompati-
tação càfeeira, que no momento se preparavam para bilizaram-se com os castilhistas, desertando do par-
alcançar a posição dirigente no país e por isso que- tido para passarem a opor-se ao PRR. Com este inci-
riam um Executivo mais fo~te, dentro dos quadros de dente, os castilhistas perderam seu único ponto de
um federalismo moderado. apoio em Bagé, cidade tradicionalmente liberal e
O gaúcho Demétrio Ribeiro, então ocupando o gasparista.
Ministério da Agricultura, defendeu na Constituinte Em 1891, a União Nacional transformou-se em
a incorporação do proletariado à sociedade (princí- "Partido Republicano Federal" (PRF), que agregou
pio positivista), identificando-os como os artífices da alguns republicanos dissidentes, como Barros Cas-
sal, Antão de Faria e Demêtrio Ribeiro. O partido
riqueza, como produtores diretos que eram. Suas
concorreu com o PRR nas eleições para a Consti-
propostas, contudo, foram ignoradas pelos demais
tuinte estadual, não conseguindo eleger nenhum de-
parlamentares.
70 Sandra Jatahy Pesavento A Revolução Federalista 71

putado. Grande.
Muito mais do que meras querelas internas de A Constituição estadual foi promulgada a 14 de
políticos gaúchos, o episódio é significativo para de- julho, data significativamente escolhida por ser o
monstrar o difícil arranjo que se processava no inte- aniversário da Queda da Bastilha. A seguir, Júlio de
rior da sociedade civil. Devido a sua intransigência e Castilhos foi eleito por unanimidade pela Assembléia
sectarismo extremado, agravados pela liderança au- primeiro presidente do estado, com um mandato de
toritária de Castilhos e pelo endosso dos ideais posi- cinco anos.
tivistas, começavam a ocorrer dissidências nos qua- Na prática, a Constituição gaúcha isntituciona-
dros republicanos. Por outro lado, o PRR estava lizava o governo autoritário e centralizado no Rio
encontrando dificuldades em captar para si os com- Grande, através do qual se possibilitava ao PRR o
ponentes da antiga aliança gasparista. Daí a necessi- controle da oposição, mantendo-a afastada do poder.
dade de garantir-se pelo lado da coerção, uma vez
,I que o consenso se revelava difícil.
No decorrer dos trabalhos da Assembléia Cons-
i
I tituinte estadual, os castilhistas tiveram a oportuni-
dade de organizar o poder local de acordo com os
seus princípios e interesses.
Foi determinado que o Legislativo estadual teria
suas funções restritas a questões orçamentárias, en-
quanto que as funções do Executivo foram amplia-
das, cabendo-lhe legislar por decreto sobre questões
não-financeiras.
O presidente do Estado podia nomear seu vice.
Além disso, podia reeleger-se continuamente, desde
que obtivesse três quartos da votação total. Vincu-
lando este dispositivo com o fato de as eleições não
serem secretas, pode-se ter uma idéia da fraude elei-
toral que ocorria. Na verdade, o governador podia
praticamente "eternizar-se" no poder. Baseado neste
princípio é que Borges de Medeiros, sucessor de Cas-
tilhos, ficou 2S anos à testa do governo do Rio
lt
A Revolução Federalista 73

que as divergências que existiam entre elas. Por outro


lado, o surgimento de uma cisão entre as Forças Ar-
madas (Exército X Marinha), justamente entre os
grupos dotados do poder de repressão, vinha amea-
çar a segurança do novo regime.
O Rio Grande, com a sua economia regional
voltada para a defesa do mercado interno, tinha
interesses diferenciados do setor agroexportador ca-
"MARAGATOS" E "PICA-PAUS": feeiro. Da mesma forma, gaúchos e paulistas tinham
A REVOLUÇÃO DA DEGOLA diferente entendimento da questão federativa. En-
quanto o PRR postulava um federalismo extremado,
que garantisse autonomia à região, preservando-a da
interferência do centro, o PRP era adepto de um
A instabilidade inicial e o golpe federalismo moderado, no qual se permitisse que a
União (ou aqueles que controlassem o poder central)
manipulasse os interesses dos pequenos estados em
A República se iniciava, pois, marcada por uma seu favor.
série de tensões, nos planos nacional e regional. Estas Apesar de prevalecerem, no plano econômico e
tensões se definiam no confrontamento de grupos de no da organização político-administrativa do país, os
interesses que possuíam diferentes posições quanto à
interesses dos paulistas, todo o peso e o desgaste das
orientação da política econômica e quanto à forma
tensões presentes na sociedade recaía sobre os mili-
de organização do poder político.
tares.
Para fins deste estudo, importa analisar a tensão
Como ocupantes do poder, os militares se apre-
de cunho regional e aquela que se registrou no seio
sentavam no papel de executores das medidas gover-
das Forças Armadas. Tais divergências ameaçavam,
namentais e mediadores dos conflitos.
respectivamente, a articulação do novo consenso e a
Autodefiniam-se como guardiães da ordem e do
eficácia do aparelho de coerção que, juntos, davam regime. Presos a valores corporativos, próprios da
estabilidade ao regime. instituição à qual pertenciam, os militares, contudo,
Em outras palavras, era preciso que, entre as não se movimentavam isolados do contexto social.
classes dominantes agrárias, houvesse uma acomo- Careciam da legitimidade da sociedade civil, do res-
dação entre seus interesses que se revelasse mais forte paldo de uma classe que desse sustento a seus atos.
74 Sandra Jatahy Pesavento A Revolução Federalista 75

Proclamada a República, começaram a surgir crises damente os jovens oficiais, não reconhecendo mais
entre civis e militares. Notadamente, os paulistas, Deodoro como seu líder, voltaram-se para Floriano
aspirantes à posição hegemônica e dirigente da na- Peixoto, eleito vice-presidente em 1891 pela Assem-
ção, desejavam a retirada dos militares do centro do bléia Constituinte. Sintomaticamente, Floriano fora
poder político nacional, uma vez cumprida a sua ta- eleito, mas integrava a chapa contrária à de Deo-
refa de consolidar o regime. Na verdade, dentre os doro, encabeçada pelo paulista Prudente de Morais.
grupos civis, o único .corpo verdadeiramente coeso A mais séria das cisões, contudo, foi aquela aberta
dos primeiros anos da República era o PRP dos pelo posicionamento da Marinha, totalmente contra
cafeicultores. Deodoro.
O PRR, que desde antes da queda do regime A Armada brasileira tinha uma composição so-
havia optado pela manutenção de uma aliança com o cial e atuação diferente do Exército. Enquanto que
Exército, tinha de, regionalmente, fazer frente à opo- este acolhia preferencialmente elementos egressos
sição dos ex-liberais e .da dissidência republicana. dos setores médios, aos quais proporcionava ascen-
O governo de Deodoro teve de enfrentar uma são e meio de vida, a Marinha sempre fora um corpo
série de problemas, tanto em decorrência da política de elite. Nos quadros de seus oficiais, s6 constavam
financeira emissionista (inflação, falência de firmas) representantes das camadas privilegiadas da popu-
quanto em função de incidentes criados entre a pre- laçãô, Neste sentido, a Armada sempre gozava de
sidência e os ministros (Rui Barbosa, Benjamin prestígio durante o período monárquico e não parti-
Constant). cipava do movimento de contestação que conduziu à
Deodoro demonstrou inclusive muita inabilidade queda do regime em 1889.
política: às numerosas substituições de ministros, Ante os tropeços e arbitrariedades cometidas
seguiram-se incidentes com a restrição à liberdade de pelo primeiro governo republicano, a Marinha pas-
imprensa. Para culminar, no projeto da construção sou a criticiar o regime instalado.
de um porto de mar em Torres, no Rio Grande do Contra a vontade do grupo deodorista, fora
Sul, o presidente quis conceder o privilégio a um convocada a Constituinte e, uma vez reunida a As-
amigo seu, tentando forçar o governo a assegurar-lhe sembléia, também à sua revelia fora estabelecida
"garantia de juros" sobre o capital empregado (se a uma República federativa. Todavia, no decorrer do
companhia não rendesse os juros estipulados, o go- ano de 1891, o presidente manteve uma linha de go-
verno federal cobriria a diferença). verno em permanente atrito com o Legislativo.
Dentro deste contexto, cisões começaram a apa- Como forma de precaver-se, os políticos civis
recer entre os militares. Certa ala do Exército, nota- apresentaram no Congresso um projeto de lei para
76 Sandra Jatahy Pesavento A Revolução Federalista 77

definir as responsabilidades do presidente da Repú- ristas.


blica, numa clara tentativa de diminuir os poderes do O PRR postulava uma combinação entre fede-
Executivo frente ao Legislativo. ralismo e centralismo na mediação entre a política
Como resposta aos impasses criados, Deodoro interna do estado e as relações com o poder central.
dissolveu o Congresso a 3 de novembro de 1891, no Frente à União, defendiam o federalismo radical e,
primeiro golpe de estado da história republicana. no governo regional, adotavam o centralismo de fei-
A maioria dos governos estaduais, que havia ção autoritária e positivista.
sido colocada no poder pelo próprio Deodoro, apoiou O sectarismo dos castilhistas os levava a consi-
o ato do presidente, hipotecando-lhe solidariedade. derarque quem não comungava com suas idéias
As reações ao golpe, porém, fizeram-se sentir de estava necessariamente contra elas.
imediato: a ala jovem do Exército, oficiais ligados a Por ocasião do golpe de estado de Deodoro,
Floriano e alunos da Escola Militar denunciaram sua Castilhos se viu no dilema entre apoiá-Ia - tal como
inconformidade com o golpe; os almirantes Wanden- vinha fazendo até então - ou condená-lo, com o que
kolk e Custódio de Mello lideraram um levante da precisaria desfrutar o apoio do novo mandatário da
Armada no Rio de Janeiro; congressistas denuncia- nação que assumiria o poder.
ram, em manifesto à nação, o seu repúdio ao fecha- Embora sem se pronunciar formalmente pelo
mento do Legislativo central. No Pará, o governo apoio a Deodoro, Castilhos optou por telegrafar ao
Lauro Sodré rebelou-se contra o ato de Deodoro, mas presidente, devendo garantir a "manutenção da or-
a negativa da Marinha em executar a repressão tor- dem" no Rio Grande do Sul. Era, sem dúvida, uma
nou impraticável qualquer medida punitiva. atitude ambígua, mas que não foi perdoada pelas
No Rio Grande do Sul, a situação era extrema- forças políticas da oposição. Na verdade, a maior
mente delicada para os castilhistas. Desde a procla- parte da opinião pública manifestou-se contrária ao
mação da República que o PRR optara pela aliança golpe e, como se viu, as próprias forças armadas
com o Exército e o apoio a Deodoro. A medida tinha majoritariamente se colocaram contra Deodoro. O
um alcance político fundamental, pois representava Exército como um todo reorientava-se para o novo
a garantia da permanência do PRR no poder e o líder que surgia na figura de Floriano. Enquanto
controle da oposição gasparista e da dissidência Deodoro figurava como que atentando contra as ins-
republicana. tituições, deixava de cumprir a tarefa para a qual o
A intransigência dos castilhistas estava 'fomen- Exército se considerava predestinado: mantenedor
tando defecções no seio do próprio partido e dificul- da ordem, sentinela do governo. Com tal concepção,
tava a adesão ao republicanismo dos políticos gaspa- a maioria das Forças Armadas deixava de legitimar
78 Sandra Jatahy Pesavento A Revolução Federalista 79

Deodoro, e o Exército voltava-se para Floriano como A Revolução Federalista


o intérprete das mais puras intenções da corporação,
Esta transição Castilhos não percebeu e pagou caro o tempo em que os republicanos dissidentes
seu erro de cálculo. controlaram a' situação política no Rio Grande foi
Na medida em que guarnições militares e forças chamado pejorativamente pelos castilhistas de "go-
navais pronunciaram-se contra Deodoro, os oposi- vernicho". Ao ser deposto, Castilhos dissera que en-
tores de Castilhos, mobilizando forças populares e tregava o poder "à anarquia". Durante os conturba-
contando com o apoio de alguns comerciantes de dos meses em que a oposição governou, o PRR foi
Porto Alegre, obrigaram Júlio de Castilhos a renun- incansável no seu ataque à situação estadual, pre-
ciar em 12 de novembro de 1891. parando a volta de Castilhos ao poder.
O governo foi entregue aos republicanos dissi- Embora a chefia do governo fosse ocupada pelo
dentes, que por sete meses dirigiram o Rio Grande. general Barreto Leite, quem verdadeiramente gover-
A queda de Castilhos no Rio Grande do Sul e as nava eram os republicanos dissidentes, como Assis
articulações dos políticos civis com as forças militares Brasil e Barros Cassal. Como primeiras medidas, o.
no Rio de Janeiro tornaram a situação insustentável "governicho" anulou a Constituição "positivista" es-
para Deodoro da Fonseca, que, a 23 de novembro de tadual de 1891 e derrubou os governos municipais,
1891, renunciou, passando o cargo a Floriano Pei- fiéis a Castilhos.
xoto. Entretanto, mesmo fora do governo, os casti-
Como primeiras medidas, Floriano reabriu o lhistas apresentavam vantagens com relação à dissi-
Congresso, decretou a liberdade de imprensa e, va- dência. Em primeiro lugar, controlavam a mais orga-
lendo-se do artigo 6? da Constituição, substituiu as nizada e eficiente máquina política estadual, en-
situações estaduais que haviam apoiado o golpe de quanto que os dissidentes, além de serem minoria
Deodoro. frente ao PRR, não possuíam uma organização parti-
Com relação ao Rio Grande do Sul, contudo, dária tão burocratizada e com raízes no interior.
sua atuação dependeu do rumo tomado pelo processo Os dissidentes haviam sabido aproveitar-se de
político regional. uma situação política nacional que propiciara a que-
da de Castilhos, mas careciam de bases sociais e
políticas fortes para manterem-se no poder.
Um exemplo da arregimentação das forças do
PRR foi o encontro realizado em Monte Caseros, na
Argentina, ,no qual 16 dirigentes do PRR, entre os
80 Sandra Jatahy Pesavento A Revolução Federalista 81

quais Pinheiro Machado e Manuel Nascimento Var- Bagé. Socialmente, era formado majoritariamente
gas (pai de Getúlio Vargas), tramaram uma conspi- pelos pecuaristas da região da Campanha, ligados ao
ração para restaurar Castilhos no poder. comércio e contrabando na zona da fronteira.
Em segundo lugar, a própria dubiedade do ato Dentre as suas principais proposições, estavam
de Castilhos, ao apoiar Deodoro, foi habilmente ex- a república parlamentar, a atribuição de maior poder
plorada por ele como sendo uma medida tática para ao governo central, a eleição do chefe de Estado pelo
ver se o golpe era defensável ou não, ou, em outras parlamento, a representação das minorias no Legis-
palavras, se fora dado para preservar a República ou lativo.
destruí-Ia. A defesa de Castilhos foi feita através das Ora, este grupo tinha um significado social e
páginas do jornal A Federação, no dia seguinte à sua econômico muito maior do que o dos republicanos
queda (13 de novembro de 1891). dissidentes. Trazia no seu passado, também, uma
Em terceiro lugar, o fato de os militares locais e experiência de mando político nos quadros do Im-
de muitos políticos do interior do Rio Grande terem pério.
condenado o golpe de Deodoro não significou que se A tendência foi de os federalistas se aproxima-
posicionavam, automaticamente, contra Castilhos. rem dos dissidentes, começando a se fazerem presen-
Muito pelo contrário, mostraram-se solidários com o tes no "governicho". Por outro lado, com o surgi-
governante deposto e, através do PRR, continuaram mento do PFB, desarticulou-se aquele que era a ex-

I 'I
a manter ligações com Castilhos.
Em quarto lugar, a volta de Gaspar Silveira
Martins do exílio em 1892 veio dar um forte argu-
pressão política dos republicanos dissidentes: o PRF.
Muitos dos dissidentes não aceitaram a idéia parla-
mentar e recusavam-se a unir-se aos federalistas.
mento aos castilhistas na sua busca de apóio e rearti- Desta forma, à medida que enfraqueciam os dissi-
culação com o governo central. O retorno do líder dentes enquanto grupo, crescia a influência dos fede-
político dos tempos da Monarquia agitou o meio dos ralistas.
antigos liberais, que, em março de 1892, promove- Todos estes incidentes foram habilmente explo-
ram uma convenção na cidade gaúcha de Bagé, terra (ftl rados pelos castilhistas para conseguirem estabelecer
de Silveira Martins. uma nova aliança com o poder central e retornarem
Por ocasião desse encontro, foi fundado o Par- ao poder no Rio Grande do Sul.
tido Federalista Brasileiro (PFB), sendo Gaspar Sil- Quanto mais se fortaleciam os gasparistas, mais
veira Martins aclamado seu chefe. denunciavam os castilhistas que o PFB almejava a
O novo partido reunia ex-liberais e alguns ex- restauração da Monarquia. Um outro argumento de
conservadores, como o clã dos Tavares, naturais de que se valia Castilhos era relembrar o antigo anta-
82 Sandra Jatahy Pesavento A Revolução Federalista 83

gonismo das forças políticas civis da época do Impé- nistas, O retorno do parlamentarismo pretendido por
rio com os militares. Silveira Martins lembrava a Monarquia e era meio
O PRR posicionava-se corno o único governo caminho andado para a queda do regime.
legal do estado e argumentava com a prova irrefutâ- Mas a renovação da aliança PRR/Exército apre-
vel que tinha o apoio das tropas do Exército sediadas sentava ainda outras conotações: Floriano tinha ne-
no Rio Grande do Sul. cessidade de contar com o apoio de grandes banca-
Ora, dentro deste quadro, com o ascenso fede- das no Congresso que legitimassem seu governo. A
ralista e a queda da importância dos dissidentes, a entrega do Ministério da Fazenda por Floriano ao
única alternativa republicana no estado era real- paulista Rodrigues Alves teve também esse sentido.
mente o PRR. Na sua busca de bases políticas, o Exército buscava
Para recuperar o poder no sul através de um respaldo social no apoio de oligarquias regionais.
golpe, Castilhos necessitava do apoio do Exército Tão logo Castilhos retornou ao poder, restaurou
nacional corno um todo e do novo presidente militar a Constituição estadual de 1891 e renunciou, pas-
do Brasil. . sando o governo a um seu correligionário de partido,
Para Floriano, a situação no sul se revelava so- Vitorino Monteiro. Nas eleições para a presidência
bre muitas opções: apesar de Castilhos ter dado apoio estadual de dezembro de 1892, retornou ao governo
ao golpe de Deodoro, a alternativa federalista lhe pelo sufrágio do "povo". '
parecia inviável, com tendências restauracionistas. Com o retorno do PRR ao poder, teve início a
Desta forma, quando, em 17 de junho de 1892, perseguição sistemática aos federalistas, o que obri-
com o apoio da Guarda Cívica de Porto Alegre e de gou muitos líderes a emigrarem para o Uruguai, com
seus correligionários, Castilhos retornou ao poder nó suas famílias e simpatizantes,
Rio Grande do Sul, Floriano legitimou o golpe. Radicalizava-se a política no Rio Grande do Sul
Restaurava-se, assim, a aliança do PRR com os pelo enfrentamento de duas organizações partidárias
militares, identifica das ambas as posições com a con- com diferentes propostas de ordenação da sociedade.
solidação da República. O PRR defendia a realização de um governo
O apoio de Floriano a Castilhos tinha razões autoritário de cunho positivista,enquanto que o PFB
muito claras: além de se colocar corno a única e ver- acentuava o conteúdo liberal da 'república parlamen-
dadeira força republicana no estado, os castilhistas tar que propunha. Enquanto o PRR batia-se pelo
tinham em comum com os 'militares as mesmas pro- federalismo radical e pela manutenção das ligações
postas autoritárias de conotação positivista quanto à com o Exército como meio de preservar a autonomia -
reorganização do poder. Além disso, para os floria- do estado, o PFB buscava reconstituir o pacto entre a
84 Sandra Jatahy Pesavento A Revolução Federalista 85

região e o centro como forma de mediatizar o aten- traram atos tão bárbaros, com requintes de cruel-
dimento para os problemas locais. O PRR propunha dade, como neste período da história gaúcha. O Rio-
uma nova forma de articulação entre o Estado e a Grande experimentou a fase de maior radicalização
sociedade, na qual uma elite partidária representaria política já vivida pela região.
os interesses do capital agrário, industrial, comercial Dependendo das fontes. de consulta, as arbitra-
e financeiro: o PFB tinha uma proposta mais niti- riedades e matanças começaram deste ou daquele
damente pró-pecuária e se baseava na apropriação lado.
do poder público pelos interesses privados da classe. É bem verdade que, quando os castilhistas su-
Estas diferentes posturas se traduziam na ques- biram ao poder, "varreram" os liberais dos seus car-
tão imediata do controle do poder político estadual, gos e os perseguiram; por sua vez, quando do "gover-
pondo frente a frente aqueles que haviam sido derru- nicho", foi a vez de os republicanos serem persegui-
bados do poder em 1889 e os que haviam ascendido dos, registrando-se assassinatos em revide aos crimes
com a República. praticados pelo PRR.
Durante a Monarquia, vigorava um esquema de Com o retorno dos republicanos ao poder, abriu-
bipartidarismo, no qual liberais e conservadores se se um novo período de violências e perseguições, que
alternavam no poder. Com a República, subiram no mais fizeram recrudescer a radícalização política.
Rio Grande os republicanos, que passaram a per- Enquanto o PRR reorganizava a Guarda Civil,
seguir o objetivo de manter afastada do poder polí- transformando-a em Brigada Militar e aumentando
tico aquela parcela da classe dominante que fora a dotação orçamentária estadual para os aparatos da
derrubada. repressão, os federalistas, no exílio,. armavam-se e
Tanto no período que decorreu entre a ascensão preparavam-se para a invasão. Esta tarefa lhes era
de Castilhos como governante constitucional do Rio facilitada, tendo em vista que muitos possuíam pro-
Grande, em 1891, até a sua queda, no final do ano, priedades no Uruguai.
quanto no decorrer do "governicho", começaram a Alguns incidentes isolados registraram-se no de-
registrar-se atos de violência e arbitrariedades no correr do segundo semestre de 1892. Tentativas de
estado. aproximar os dois líderes para evitar o enfrentamento
Por um lado, deve-se ter em conta que a socie- fracassaram.
dade sulina sempre conviveu com a violência, desde o Os republicanos continuaram a sua perseguição
seu período formativo, marcado pelas guerras contí- sistemática aos federalistas, obrigando-os a umaemi-
nuas com o castelhano pela posse da terra e do gado. gração maciça para além da fronteira. Estes, por sua
Todavia, em nenhum período de sua história se regis- vez, viam na guerra civil a única forma de inverter a
86 Sandra Jatahy Pesavento A Revolução Federalista 87

situação política do estado, uma vez que o apoio de


Floriano a Castilhos não lhes dava esperança de uma
intervenção federal em seu favor.
A 2 de fevereiro de 1893, deu-se a primeira in-
vasão, quando os revoltosos, vindos do Uruguai, pre-
tenderam tomar a cidade de Bagé. Começava a Revo-
lução Federalista.
As tropas federalistas eram constituídas, basica-
mente, dos estancieiros da Campanha com seus ho-
mens, na maioria civis, ex-liberais e ocupantes de
postos e/ou cargos políticos municipais no período
imperial. Sendo comandantes da antiga Guarda Na-
cional, recebiam o título de coronéis, sem terem,
Ir
contudo, outra formação militar do que aquela ad-
quirida nas guerras de fronteira com os platinos.
Desde o ponto de vista militar, as tropas rebeldes
lutavam com precariedade de recursos, se compa-·
radas com os republicanos. Afeitos às lides do campo
e ao uso da montaria, seus piquetes eram dotados de
grande mobilidade e atacavam de surpresa, a cavalo,
portando lanças.
Desde o início, os federalistas receberam de seus
adversários a alcunha de "maragatos". A atribuição
do nome tem diferentes interpretações. A mais aceita
atribui esta designação ao fato de os revoltosos con-
tarem em seus efetivos com muitos elementos oriun-
dos de uma província uruguaia que fora povoada por
espanhóis vindos de Maragateria (Love, Joseph, O
regionalismo gaúcho). Ao atribuir esta designação
aos federalistas, os castilhistas tentaram depreciá- "MARAGATOS" "PICAPAUS"
los, dando-lhes a conotação de "invasores estrangei-
88 Sandra Jatahy Pesavento 1I A Revolução Federalista 89

ros" do Rio Grande. Os federalistas, contudo, adota- Os federalistas, tendo como comandante su-
ram a designação, que, ao lado do lenço vermelho, se premo o general "Joca" Tavares e como líder político
tornou o seu distintivo corrente. Gaspar Silveira Martins, tiveram ainda nas suas hos-
Pelo seu lado, atribuíram aos republicanos a al- tes o destacada general maragato Gumercindo Sa-
cunha de "pica-paus", em alusão ao uniforme das raiva. Típico gaúcho da fronteira, estancieiro abas-
tropas do Exército que lutaram no estado em auxílio tado, com ligações econômicas e políticas no Uru-
h Castilhos e que constava de roupa azul e quepe guai, notabilizou-se nas campanhas militares contra
vermelho. os "pica-paus", atuando com extrema mobilidade
Diferentes no seu ideário e proposta política, os em ataques-relâmpago.
Do lado dos "pica-paus", destacavam-se os ge-
dois blocos partidários rivais agora também distin-
guiam-se na designação popular e no símbolo visual: ) nerais Pinheiro Machado, Manoel Nascimento Var-
"maragatos" eram os do lenço vermelho, "pica- gas, Firmino de Paula e João Francisco Pereira de
paus" eram os do lenço branco. Souza.
II Uma vez desencadeada a Revolução, os "pica- Os atos e violência e barbárie, que já vinham se
paus" contaram não apenas com o apoio integral do \ registrando desde antes do deflagrar da Revolução,
Exército federal, posto à disposição do governo gaú- após a invasão de fevereiro de 1893 atingiram uma
cho por Floriano, como também do governo paulista, escala nunca vista até então.
que passou a dar auxílio material para a causa en- Como já se disse, os cronistas da época são ex-
dossada pelo presidente do país. tremamente tendenciosos, porque partidários de uma
É sintomática, no caso, a união daqueles grupos ou outra facção.
mais interessados na preservação da República, no- O certo é que de ambos os lados generalizou-se a
tadamente daquele que seria o mais beneficiado com prática da "degola", forma de execução rápida e
a consolidação do regime. barata, uma vez que não requeria o emprego de arma
As forças republicanas também contavam, tal de fogo. Consistia, na sua maneira mais usual, em
como as federalistas, com o recurso das tropas for- matar a vítima tal como se procedia com os car-
necidas pelo coronéis com seus homens. Alguns de- neiros: o indivíduo era coagido a, de mãos atadas nas
les, como Pinheiro Machado, arcavam com o sus- costas, ajoelhar-se. Seu executor, puxando sua ca-
tento material de armas e roupas de seus efetivos. beça para trás, pelos cabelos, rasgava sua garganta,
De um lado e de outro, figuravam nomes dos de orelha à orelha, seccionando as carótidas, com um
principais clãs rio-grandenses e elementos de des- rápido golpe de faca. .
taque na política local. Uma vez desencadeada a violência, a barbárie se
90 Sandra Jatahy Pesavento A Revolução Federalista 91

deu num crescendo. A cada piquete aprisionado e gando os cadáveres nos rios. Como represália, o chefe
degolado, o adversário vingava-se .com uma atroci- republicano Firmino de Paula, na batalha do Boi
dade maior. Preto, ordenou a degola de aproximadamente o mes-
Ainda hoje, no Rio Grande, uma expressão po- mo número de federalistas. O mesmo Firmino de
pular lembra esta prática sanguinária. Quando se Paula, após a morte de Gumercindo, mandou desen-
quer significar que uma coisa não vale a pena, diz-se terrar seu cadáver e degolâ-lo.
"isso é gastar pólvora t?mchimango!". Chirnango, no Os mandantes de tais degolas - 'e de outros
caso, foi a alcunha que os republicanos receberam na crimes usuais da época, como estupros, castrações,
época de Borges de Medeiros, sucessor de Júlio de ou dos saques e incêndios de propriedades eram os
Castilhos no governo do Rio Grande. Quanto ao chefes políticos, exacerbados no calor da guerra pela
"gastar pólvora", significa - na concepção de um radicalização política extrema a que chegara o es-
maragato - que, para dar cabo de um republicano, tado. Entretanto, os executores de todos estes atos
não valia a pena gastar um tiro; vai na faca mesmo, eram membros da massa rural empobrecida.
que é mais simples e barato ... Peões de estância, "crias" de fazenda, agrega-
No decorrer dos combates de 1893, os maraga- dos dos senhores de terra, marginais do campo, des-
tos contavam com o recurso de homens, armas e ca- possuídos: foi toda uma massa coagida a lutar por
valos do Uruguai. Da mesma forma, os republicanos interesses completamente alheios. Acostumados a
contratavam também soldados: mercenários do outro obedecer, a viver na dependência de coronéis, sem
lado da fronteira para engrossar suas hostes. Quando opção de vida, sem terra, sem recursos, brutalizados,
da prisão de um piquete, para identificar dentre os a população anônima dos campos executou atos
cativos quais eram os uruguaios, era pedido que pro- cruéis e habituou-se ao crime.
nunciassem a letra J ou a palavra "pauzinho", ambas Muitos deles tornaram-se matadores profissio-
difíceis de serem ditas corretamente pelos platinos. nais, hábeis degoladores, requisitados pelos chefes
Uma resposta imperfeita significava a degola instan- políticos em função dos serviços que podiam prestar.
tânea. Se, entre os membros da oligarquia, destacou-se
Talvez os incidentes que se tornaram mais tris- como mandante de inúmeros atos de violência o coro-
temente famosos pelos atos de terror foram os do Rio nel castilhista João Francisco (alcunhado "degolador
Negro e Boi Preto. No combate de Rio Negro, pró- do Cati", local onde morava), a história guardou
ximo a Bagé, o chefe maragato Joca Tavares, ven- também o nome de um certo Adão Latorre, mulato
cendo os castilhistas e as tropas federais que os auxi- que prestava seus hábeis serviços de degola para os
liavam, mandou degolar mais de 300 homens jo-
maragatos.
92 Sandra Jatahy. Pesavento A Revolução Federalista 93

No decorrer do ano de 1893, a Revolução Fede- sição do regime, bem como a sua composição social,
ralista atingiu uma nova projeção, envolvendo-se a tornavam uma instituição, se não saudosistas da
com mais um levante da Armada que eclodira no Rio velha ordem, pelo menos potencialmente crítica da
de Janeiro. República. Cabe ainda distinguir nuanças nas posi-
Quanto aos federalistas, depois de fracassada a ções de seus líderes. Enquanto Cust6dio de Mello
tomada de Bagé, colunas de revolucionários percor- teria aspiração de suceder Floriano na presidência,
riam o Rio grande, da zona da Campanha até as Saldanha da Gama tinha tendências confessada-
Missões, sempre perseguidos por tropas federais e mente monarquistas. O almirante Wandenkolk, por
castilhistas, mas recebendo reforços do Uruguai. seu lado. era ferrenho opositor da política de Flo-
A partir de julho de 1893, começaram a apro- riano, e os incidentes decorrentes da sua atitude com
ximar-se as lideranças da Marinha e dos maragatos. relação ao governo militar é que conduziram à se-
Emissários de Gumercindo Saraiva procuraram líde- gunda Revolta da Armada.
res da Marinha, e oficiais da Armada entraram em Com o objetivo de apressar o fim da revolta no
.,
I1
contato com revoltosos federalistas . sul, em julho de 1893 Wandenkolk liderara um ma-
A partir deste momento, com a união de dois logrado ataque ao porto de Rio Grande, que estava
movimentos de contestação, a República enfrentou o em poder das tropas de Floriano e dos castilhistas.
II seu mais sério revés.
A Marinha brasileira já se pronunciara uma vez
Ante o fracasso, navegou para o Rio de Janeiro, em
busca do apoio do restante da Marinha, sendo con-
contra o Exército por ocasião do golpe de Estado de tudo preso na altura de Santa Catarina e enviado
Deodoro. para a capital do país.
O pronunciamento da Marinha, sob a liderança A partir de então, em solidariedade ao almi-
do almirante Cust6dio de Mello, fora um dos inci- rante punido e posicionando-se contra o governo de
dentes que contribuíram para a renúncia de Deo- Floriano, levantou-se a Armada no Rio de Janeiro sob
doro. a liderança de Custódio de Mello, pretendendo to-
Como já foi afirmado anteriormente, a Armada mar a capital do país. Fracassado este intento, o
não participara das articulações que conduziram à movimento estendeu sua ação para o sul, sendo to-
queda do regime em 1889. Uma vez instalada a mada Desterro, capital de Santa Catarina, onde os
República, não assumiu uma posição dirigente, tal revoltosos instalaram um governo provisório.
como o Exército, abrindo-se com isso uma cisão no Por esta mesma época, os maragatos, que ha-
seio das Forças Armadas. viam invadido, no Rio Grande do Sul, a zona da
Esta sua forma de inserção nos quadros da tran- serra, sempre perseguidos pelos republicanos, atin-
Sandra Jatahy Pesavento A Revolução Federalista 95
94

giam os estados de Santa Catarina e do Paraná. os florianistas jacobinos, assim como para os paulis-
Ora, a existência de dois focos rebeldes e a sua tas, que auxiliavam materialmente a presidência, es-
união tática, com vistas a abalar mais profunda- tava em jogo não apenas o regime, mas a manuten-
mente o governo, levou a umaradicalização ainda . ção da unidade nacional, ameaçada de desmembra-
maior dos grupos em combate. mento.
Por um lado, Floriano, o Exército e os castilhis- No final de 1894, a sorte dos revoltosos já se defi-
tas foram identificados com a causa republicana e a nira. Coube, contudo, ao novo presidente da Repúbli-
solidificação do regime; por outro, os maragatos, que ca- Prudente de Morais, empossado a 15 de novem-
no plano local. combatiam o PRR, tinham sido leva- bro de 1894 - dar início às tarefas de pacificação.
dos a unir-se com a Marinha, que no plano nacional Com Prudente de Morais, os cafeicultores assu-
lutava contra o florianismo. miram posições dirigentes e alijaram do poder o
A acusação dos republicanos não se fez esperar: grupo de militares jacobinos.
os maragatos e a Marinha não eram só revoltosos Na sua luta contra a Armada e os maragatos do
sul, o Exército cumpria o seu papel de defensor do
III contra o governo, mas sim contra a forma de governo
regime. Floriano era denominado "consolidador da
I· vigorante no pais. A acusação de serem monarquis-
tas tomou novo alento na fase final da revolução, República", mas os militares foram obrigados a
I
quando as forças da Marinha estiveram sob a chefia ceder a direção política do país a um governo civil.
do almirante Saldanha da Gama. A necessidade de Esgotado, mas vitorioso na luta, o Exército bra-
manter a luta contra os governos federal e estadual sileiro perdia no terreno da política. Cedia suas fun-
I fez Silveira Martins transigir e lançar, junto com ções dirigentes para o grupo civil que representava o
Saldanha da Gama, um manifesto no qual solicitava setor econômico mais rico do país e em ascensão: os
a realização de um plebiscito a fim de que a nação se fazendeiros paulistas de café.
pronunciasse sobre qual a forma de governo que o No decorrer do ano de 1895, a guerra se concen-
Brasil deveria adotar. A medida, evidentemente, foi trou não só no Rio Grande do Sul. A morte dos prin-
denunciada como monarquista. cipais líderes revoltosos ~ Gumercindo Saraiva, Sal-
As contestações tinham, contudo, os seus dias danha da Gama - de uma certa forma favoreceu as
contados. Floriano concentrara, no decorrer dos anos negociações de paz.
de 1893 e 1894, todos os efetivos do Exército nacional Esta se concluiu finalmente em 23 de agosto de
para debelar os revoltosos, pois agora a luta se tra- 1895. Aos rebeldes maragatos o governo federal ga-
vava no litoral do Rio de Janeiro, Paranâ, Santa rantia seus direitos civis; ante sua demanda de que se
Catarina e todo o Estado do Rio Grande do Sul. Para redigisse uma nova Constituição federal, ficou a pro-
96 Sandra Jatahy Pesavento A Revolução Federalista 97

messa de que o assunto seria examinado pelo Con- disso, o Rio Grande do Sul foi também o único es-
gresso. tado onde o partido da situação (PRR) manteve-se no
governo até o final da Primeira República, sem per-
mitir a alternância do poder para a outra parcela da
A ''pax positivista" classe dominante na oposição. Mesmo a nível de Le-
gislativo, a representatividade da oposição era mí-
Reprimida a Revolta da Armada e finda a Revo- nima. Até 1906, só eram eleitos políticos do PRR.
lução Federalista, terminava a primeira grande crise A partir desta data, com a lei Rosa e Silva, de repre-
que abalou a República brasileira nos seus contur- sentação das minorias, a oposição passou a ser repre-
bados anos iniciais. sentada no Legislativo estadual, mas na proporção
No plano federal, consolidava-se o regime e as- de três deputados para 36 do PRR.
cendiam os paulistas às funções dirigentes da nação; A consolidação e a permanência do PRR, que
lil
no plano local, garantia-se a permanência dos casti- junto com a bipolarização política foi a principal
lhistas no governo do estado. herança da guerra para o Rio Grande, é um fenô-
111:
Terminavam a instabilidade politica e a violên- meno que está a merecer maiores estudos.
cia que haviam caracterizado o período de 1889 a Evidentemente, para isso contou muito o efi-
I 1895; iniciava-se o longo domínio do PRR. no Rio
Grande, que se estenderia até 1930. A "pax positi-
ciente aparato repressivo do estado gaúcho, com sua
Brigada Militar, seus "Corpos de Provisórios". En-
vista", que se sucedeu nos anos subseqüentes ao tretanto, os quase 40 anos de domínio de um partido,
fim da luta, era fundamentalmente uma "paz de ce- num estado com uma oposição tão aguerrida, não
, mitério", com uma significativa dose de mortos,exi- podem ser explicados apenas em termos de coerção e
lados, vencidos e a economia pecuária desorganizada .. violência pura.
O incidente, contudo, definiu uma característica É claro, ainda, que estes anos iniciais do domí-
peculiar ao Rio Grande no decorrer da República nio republicano foram marcados pelo predomínio da
Velha: foi o Único estado da federação marcado pela coerção.
intensa radicalização política existente entre dois É, preciso, contudo, ter em conta os mecanis-
blocos político-partidários, com diferentes posturas e mos de consenso, que puderam ser melhor postos em
programas. Enquanto que nos demais estados brasi- prática nos anos que se seguiram ao fim do conflito.
leiros duas facções republicanas se alternavam no Júlio de Castilhos e, principalmente, Borges de
poder, no Rio Grande vigoravam duas agremiações Medeiros, seu sucessor a partir de 1898 no governo
com propostas de ação e ideologias distintas. Além do estado, buscaram estabelecer alianças, barganhas
98 Sandra Jatahy Pesavento A Revolução Federalista 99

e cooptar os principais segmentos da sociedade su- para a sociedade, justificando e legitimando o domí-
lina. Através de favores, incentivo à produção e ao nio do PRR no estado.
cooperativismo, um programa de desenvolvimento Se estas considerações podem ser feitas para a
paralelo, de todas as forças econômicas do estado, realidade interna do Rio Grande no período pós-Re-
prioridade dos transportes, convites ao engajamento volução Federalista, o fim do conflito explicitou re-
político-partidário, concessão de empregos, o PRR gras para a articulação do Rio Grande com o centro.
buscou ampliar as bases sociais de sua organização Ao longo de toda a República, o Rio Grande
política. Os principais beneficiários de todas estas continuou na sua tradicional posição de "celeiro do
medidas foram os grupos detentores do capital agrá- país", fornecendo gêneros de subsistência Para o
rio, industrial, comercial e financeiro. Note-se que, mercado interno brasileiro.
enquanto os federalistas, e posteriormente os seus Politicamente, com a ascensão do grupo cafei-
herdeiros libertadores da década de vinte, eram niti- cultor e, posteriormente, de seu aliado mineiro, o Rio
damente uma agremiação que postulava o atendi- Grande afirmou um modus vivendi com a União.
II1I
mento preferencial dos interesses da pecuária, o PRR Excluído do poder central, o Rio Grande do Sul
tinha uma proposta política de atendimento à pe- não "aspiraria" à presidência da República; em con-
cuária em termos de igualdade com outras formas de trapartida, a União não interviria na situação polí-
capital. Seu núcleo diretivo era constituído de estan- tica interna do estado para favorecer a oposição. O
cieiros, mas que tinham uma proposta diferente para Rio Grande ficava, assim, como o "feudo" do PRR,
a condução do desenvolvimento econômico gaúcho. que controlava regionalmente o poder.
. Não se deve esquecer ainda a preocupação do Embora não participando da política do "café
PRR com os pequenos produtores coloniais de ori- com leite" que se seguiria, o Rio Grande iria cultivar
gem imigrante, ou a cooptação dos setores médios as suas relações com o Exército, constituindo-se
através de ampliação dos quadros burocráticos. assim numa forma alternativa de poder que compa-
Cabe lembrar ainda que o PRR tornou-se cada recia unida no jogo político nacional sempre que
vez mais, no Rio Grande do Sul, uma rígida, hierar- I'~ houvesse uma cisão das oligarquias (como aconteceu
quizada e disciplinada escola partidária, criando em 1909;1921 e 1930).
uma estrutura vertical de mando. Esta posição o Rio Grande manteve até a crise
Como corolário, o positivismo, ocupando a posi- dos anos vinte, quando, em coligação com oligar-
ção de matriz inspiradora da conduta política e ad- quias dissidentes, buscou a redistribuição do poder
ministrativa, desempenhava a função ideológica, de em escala nacional.
fornecer respostas, ditar normas e oferecer valores
• .J
A Revolução Federa/ista 101

LOVE, Joseph. O regionalismo gaúcho. São Paulo, Pers-


pectiva, 1975.
PESAVENTO, SandraJatahy. História do Rio Grande do
Sul. 2!l ed. Porto Alegre, Mercado Aberto, 1981.
PICCOLO, Helga L. "A política rio-grandense no Impé-
rio", in RS: economia e política. Porto Alegre, Mercado
Aberto, 1979.

INDICAÇÕES PARA LEITURA Como obras específicas sobre a Revolução Federa-


<, lista, recomenda-se para consulta, entre outras:
DOURADO, Ângelo. Voluntários do martírio. Porto Ale-
1 ) gre, Martins Livreiro, 1977.
~I I Como obras gerais que abordam o período anali-
ESCOBAR, Wenceslau. Apontamentos para a história
rio-grandense de 1893. Porto Alegre, s. ed., 1920.
sado, recomenda-se em especial: FRANCO, Sérgio da Costa. "O sentido histórico da Revo-
W CARONE, Edgard. A República Velha (instituições e clas- lução de 1893", in Fundamentos da cultura rio-gran-
11 co ses sociais). São Paulo, DIFEL, 1970. dense. 5~ série. Porto Alegre, Faculdade de Filosofia
CASALECCHI, José Enio. A proclamação da República. da UFRGS, 1962.
São Paulo, Brasiliense, 1981. VILLA-LOBOS, Raul (pseud. Epaminondas Villalba) . .A
COSTA, Emília Viotti da. Da Monarquia à República: revolução federalista no Rio Grande do Sul. (documen-
Ilr momentos decisivos. São Paulo, Grijalbo, capo IX e X, tos e comentários) Rio de Janeiro, s. ed., 1897.
1977.
FAUSTO, Boris, "Expansão do café e política cafeeira",
in História Geral da Civilização Brasileira. São Paulo,
DIFEL, 1975.

Como obras que abordam o período em termos de


Rio Grande do Sul, indica-se:
FRANCO, Sérgio da Costa. Júlio de Castilhos e sua época.
. Porto Alegre, Globo, 1967.

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Sobre a Autora

Professora de História do Brasil e História do Rio Grande do Sul


...-
Leno::!
da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
Mestre em História pela Pontifícia Universidade Católica do Rio PRIME IRO TOQUE é uma publicação com crônicas,
Grande do Sul em 1978. resenhas, comentários, charges, dicas,
Atualmente cursando doutorado na USP.
mil atrações sobre as coleções de bolso da Editora
Publicou: República Velha Gaúcha, Porto Alegre, Movimento,
Brasiliense. Sai de três em três meses.
1980; RS: a economia e o poder nos anos 30, Porto Alegre, Mercado
Aberto, 1980; História do Rio Grande do Sul, 2:' ed., Porto Alegre,
Por que não recebê-Ia em casa? Além do mais,
Mercado Aberto, 1982; RS: agropecuária colonial e industrialização, não custa nada. Só o trabalho
Porto Alegre, Mercado Aberto, 1983; além de vários ensaios em obras de preencher os dados aí de baixo,
coletivas e revistas especializadas; participação em congressos e seminá- recortar, selar e pôr no correio.
rios com apresentação de trabalhos.

NOME: .
END.: : .
BAIRRO: FONE: .
Caro leitor: CEP: CiDADE: EST.: .
Se você tiver alguma sugestão de novos títulos para
os nossas coleções, por favor nos envie. Novas idéias, PROFISSÃO: IDADE: .
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Imlgraçlo P. Salguelmao 3 • A guerra clvJl espanhola Anuela M. jesullaS José Cartos Sebe 5B • A
luta contra li metrópole (A,la li Almelda 32 - A legislação tra- república de Welmar e a aace~
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••• M. Florenzano 9 • Pari_ 1968: Abelardo Blencc/Cerlos A. Dóris (191().t917J Anna M. M. Ccrrêe
•• barricadas dI) de •• Jo Olgárla 38· O Imigrante e a pequena pro- 63 • América central Héctor' Pé-
C. F. Matos 10 • Nordeste !naur- prled.de M. Thereza Schorer Pe- rez Brlgnol I 64 • A guerra fria
gente (1850-1890) Hamilton M. trone 39 - O mundo antigo: eco- Déa Fenelon as • O feudalismo
Montelro 11 - A revoJuçio Indus- noml. e aocledade M. Beatrlz B. Hllárlo Franco Jr. 6G • URSS: o
trial Francisco 1016518812 . O. Floreruenc 40 • Guerra civil ama- socialismo real (1921·1964) Da-
qullombol li a rebelllo negra rleana Peter L. Elsenberg 41 . nlel A. R. Filho 61 Os liberais ew

Clóvis Moura 13 . O coronell.mo Cultura- e partlelpaçio nOI anos a crise da Repuollca Velha Paulo
M. de Lourdes Janottl 14 . O 60 Heloisa B. de Hollanda 42 • G. F. Vlzentlnl 68 A redemoere-
w

governo J. Kubltsc:heck Rlcardo Revoluçio de 1930: a domlnaçio tização espanhola Reglnaldo C.


Maranhllo 15 • O movimento d. oculta Itelo Tranca 43 • Contra a Moraes 69 A etiqueta no antigo
w

1832 Maria H. Capelato 16 • A chibata: marinheiros brasileiros regime Renato Jantne Ribeiro
AmirlÇII pr4-colomblana C. Fla- em t9tO M. A: Silva 44 • Afro. 70 • Conte."Jtado: a guerra do
marlen Cardoso 17 • A abolição Am6rfca: a escravldlo do novo novo mundo Antonio P. Tota
da •• cl'llvldlo Suely R. A. de mundo Clro F, Cardoso 45 • A 71 . A famma brasileira Enl de
Ouelroz 18 • A proclamaçlo da Igral' no Brasll·Col6nla Eduardo Mesquita Samara 72 • A econo-
república J. ênlc Casalecchl 19 • Hcorneert 46 • Militarismo na mia cafeeira José Roberto do
A revoltl de Princesa Inês C. América latina ChSvls Bossl 47 • Amaral lapa 73 • Argélia: a
Rodrlgues 20 HI.t6rla
w politlca Bandelrantllmo: verso e reverso guerra e a independência Musta-
do futebol bralllelro J. Ruflno Carlos Henrtcue Devldcff 48 • fá Vazbek 74 • Reforma agr'rla
dOI Santos 21 • A Nlcartigua san- O govemo Goulart e o golpe no Brasll·Colônla leopoldo J~
dlnlall Marlsa Mlllrega 22 • O lfu- de 64 Calo N. de Tolado 49 A w blm 75 • Os caipiras de Sio
mlnlamo e os rela fll6.ofO$ l. R, Inqulslçlio Anlta Novlnsky 50 • A Paulo Gerias R. Brandão 76 • A
Salinas Fortes Z3 • Movimento pODala lirabe moderna e o Brasil chanchada no cinema brasileiro
eatudlntll no Brasil Antonio Men- SlImanl Zeghldour 51 • O nasel- AfrAnio M, Cetenl/José lnâclo
dee Jr. 24 • A comuna de Parll meni0 das f6brlc8a Edgar S. de M. Sousa 77 • A Gulné-Blssau
H. González 25· A rebaUlo Decea 52 • Londres e Paris no Ladlslau Dowbor 78 • A cidade
praieira Izabel Maraon 26· A prl. século XIX Maria Stella Martlns de São PauJo Caio Prado Jr. 79
mlVera de Praga Sonla Goldfeder Breectenl 53 • Oriente Médio e o • A Revoll.lção Federallstl Sano
27 • A conatruçl:o do soclalllmo mundo dos lirabos Maria Vedda dra Jatahy Pesavento 80 •
nII China D. AerAo Reis Filho Unhares 54· A autogo8tio Música popular brasileira Valter
21 • OpullnGla • mls'"a na. lugoslava Bertlno Nobrega de Krausche 8t • A emoção Corl~
Mina Geral. Leura Verguelro Ouelroz 55 • O golpe de 1954: thlens Juca KfourJ.
29 . A bursau-fa br•• ilelra Jacob a burguesia contra o popullsmo

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ASAIR
A balaJadI M. de Lourdas Janottl çamblcana Dente! A. Reis Filho 'rejeda O estado Asolutlsta
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Femando Novaes A, clvlllzaçio ~~:I~od~~~aar~~ ~9~emDa~:91: Arnaldo Contler O, macarthtsmo O
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Paulo P. Castro A guerra do. 8rasll Maria de lourdes Msnzlnl Luiz Eduardo Prado de Oliveira 0>-
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Sergio Pinheiro A revoluçlo mo- Ellzabate Fellpa/Marla Crlstlna

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