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Era Uma Vez Maria...

Um Estudo de Caso
Autora: Erica Gomes Pontes

Um estudo de caso

Meu primeiro contato com Maria, se deu no início dos ventos de Abril de 2002, em um dos 7
núcleos destinados à assistência à criança a ao adolescente no município de Divinópolis/MG.

Logo de início, é preciso ressaltar a característica central na qual o encaminhamento da criança


é feito: “necessidade de terapia familiar”.

A princípio, não consigo focalizar nenhum tipo de demanda que acarretasse atendimento
psicoterápico em Maria, que desde o primeiro momento em que debruça sobre mim seu olhar,
me procura e me interpela constantemente em sua vontade de “conversar e brincar” comigo.
Eu então, me disponho a ouvir aquilo que ela deseja falar.

No que concerne ao início do tratamento psicoterápico infantil, é importante buscar estabelecer


contato com as figuras parentais, nos moldes de uma entrevista clínica, naquilo em que se
concebe de extrema importância o lugar ocupado pelos pais na análise infantil, contudo, o
mesmo não se efetivou devido as constantes ausências durante o transcorrer de todo o
processo analítico. Decido então, dar andamento aos encontros com a criança, por
compreender que a ausência dos pais implicaria em seu consentimento à proposta terapêutica.

Maria é uma criança de 8 anos de idade e cursava a 2ª série do ensino fundamental em uma
escola municipal. A criança vem de uma família composta por 5 filhos, um pai que desde o
início do ano permanece desempregado, e uma mãe que trabalha como diarista em casa de
família, permanecendo durante todo o dia, ausente do contato com os filhos.

A criança permanece durante o período da manhã sob os cuidados no núcleo assistencial e,


somente após o almoço, é encaminhada a escola, sendo que, no período em que localiza-se
abrigada pelos muros da instituição, demonstra boa capacidade de socialização com as
crianças e com os adultos que ali tem contato direto, porém exterioriza um olhar e um
semblante denunciadores de um viver sofrido e angustiante.

Maria não encarna o estereótipo de criança “problema” tão depreciado pela instituição. Não
apresenta nenhum complicador no que tange as queixas constantes das instituições aos
comportamentos manifestos, ditos inadequados, vivenciados no período infantil. Não é uma
criança agressiva, não hostiliza os colegas, não questiona nem tão pouco transgride os
mandatos institucionais, mostrando-se, aparentemente, plenamente adequada e adaptada à
realidade institucional na qual está inserida. Aparentemente, pois é exatamente esta
“aceitação” exacerbada ao que lhe é oferecido, que entendo como sendo um ponto merecedor
de atenção e escuta. Que situações da vida íntima e familiar dessa criança a levaram a se
posicionar tão passivamente frente à realidade? Que conflitos internos estão subjacentes a
esta pretensa adequação e subordinação de seus desejos em prol da convivência social
pacífica nos grupos dos quais faz parte?

No intuito em esboçar caminhos que pudessem me aproximar e ainda, me permitir uma maior
compreensão da realidade experienciada por Maria, utilizo como fio condutor em todo o
processo psicoterápico (que se fez nos parâmetros da terapia breve de orientação
psicanalítica, em congruência com o aporte teórico oferecido pela psicologia social), um
investimento em instrumentais lúdicos, em especial a análise de desenho infantil e a vivência
corporal por meio de jogos, brincadeiras e dramatizações, recursos essencialmente
ludoterápicos.

No decorrer dos atendimentos, minhas iniciativas incidiam na tentativa de se transcender o


espaço destinado ao guardar – pois o setting terapêutico se fazia no almoxarifado – a um lugar
por excelência do revelar, onde a criança poderia dar voz a toda uma gama de sensações,
sentimentos, culpas, ideais, repressões e angústias, que por infindáveis e imemoráveis anos
manteve guardadas para si. Enfim, poderia dizer de si mesma e através deste dito, encontrar
estratégias que a permitissem melhor lidar com suas dificuldades.

No início de nossos trabalhos, Maria apresenta grande dificuldade em verbalizar. Prioriza a


expressão fácil e corporal, e vez por outra, se permitia me olhar nos olhos, iniciando uma
brincadeira silenciosa de imitação de gestos, que culminava sempre com “risinhos”
tendenciosos. Quando se volta para os materiais que disponibilizo para uso na sessão (lápis de
cor, giz de cera, cola, fita crepe, tesoura, papel, jornal, tinta guaxe, tangran, fantasias entre
outros), sua atuação se dá quase sempre, da mesma forma: inicia um processo de
ordenamento dos materiais, separando-os e classificando-os numa lógica própria, para só
depois, partir para o processo de criação propriamente dito.

Detectada a dificuldade de expressão verbal, procuro induzir a possibilidade da fala nas


pequenas brechas que ocorrem quando Maria realiza sua produção, ou seja, no momento em
que a criança se põe a utilizar o recurso lúdico como modo metafórico de dizer daquilo que a
incomoda, eu adentro a fantasia da criança, brinco e viajo imaginativamente com ela,
procurando lhe oferecer ferramentas que, no exercício da fala acerca do que se criou, permita o
estabelecimento de conexões e relações com os mais diversos campos de inserção social da
criança.

Nesse sentido, recursos como a interpretação, a pontuação de frases e a marcação de


determinados pontos do discurso trazido, foram facilitadores do processo que, tem por
finalidade, fazer emergir à consciência da criança, a posição subjetiva que ela ocupa em
relação aos outros, em especial à sua família e ao núcleo assistencial no qual está inserida.

Sabe-se que a família é o primeiro grande grupo no qual somos introduzidos, e é ela a
responsável por o que se convencionou nomear socialização primária, ou seja, é no seio
familiar que são internalizados os primeiros valores, normas, convenções, papeias e
representações, que nos permitem perceber o mundo e a nos situarmos nele. Em nossa
sociedade eminentemente capitalista, o que vigora é o modelo de família nuclear burguesa,
onde pai, mãe e filhos vivem miraculosamente sem conflitos, numa expressão contínua de
amor eterno. Contudo, este modelo idealizado permanece ausente da real situação vivida por
milhares de lares que não conhecem outra, senão a realidade da miséria econômica e afetiva,
do desemprego e da marginalização. A família de Maria compactua desta realidade, o que
esclarece a recusa da criança em dizer qualquer fato que faça menção a sua vida familiar.

Sendo questionada acerca de situações corriqueiras do cotidiano familiar, a criança responde


com extrema evasão e um certo teor de indiferença para aqueles que também o foram e são
indiferentes para com ela. Maria chega a não conseguir se recordar de nenhuma situação, de
nenhum momento em que estavam juntos todos os membros de sua família, e quando
indagada e provocada a verbalizar alguma característica sobre os pais, responde com
parâmetros de ordem física e objetiva, ausentes de impregnação afetiva:

Pai = alto

Mãe = usa óculos

A impressão que me fica é a de uma família extremamente fragmentada, onde os papéis não
são suficientemente desempenhados nem tão poucos os cuidados são exercidos da forma na
qual as crianças necessitam, e a cada um, é entregue a responsabilidade de aprender por si
só, a sobreviver no mundo. Em relatos posteriores, após ter-se estabelecido o vínculo
transferencial, Maria me confirma esta hipótese, denunciando a forma na qual a família se
gerencia. A mãe é caracterizada pela criança como “ muito nervosa” (sic), “sempre briga com
meu pai quando ele chega mais tarde e xinga muito” (sic), assumindo uma posição repressora
e autoritária. Já no que tange ao pai, a criança o revela enquanto um fraco, alguém que precisa
ser socorrido, que precisa de ajuda para exercer sua função e é exatamente neste buraco que
a criança se localiza: “é ruim eles brigarem na frente da gente. Teve um dia que minha mãe
mandou meu pai embora e aí eu começasse a chorar e a pedir pro meu pai não ir embora e a
minha mãe deixou ele ficar”. (sic)

De acordo com Frida Atè (1999), a questão do lugar dos pais sempre esteve presente nos
tratamentos psicanalíticos de crianças, em sua prática, afirma que o analista infantil
necessariamente tem que lidar com os pais, já que a criança é totalmente dependente deles,
tanto no aspecto objetivo quanto no subjetivo. Assim, a forma como os pais se posicionam é
determinante no processo terapêutico do paciente infantil, pois entende-se como o lugar dos
pais não apenas o seu papel ou sua importância no tratamento, mas a forma com que se
posicionam, interferindo nas configurações que assume a prática clínica e modificando-a.

O que subtraio da conduta de Maria é exatamente uma tentativa de salvaguardar sua família do
desenlace total, para tanto, a criança não mede esforços e se coloca enquanto fiadora, avalista
deste pai que se apresenta insuficiente enquanto tal, no entanto, este investimento retorna em
conseqüências perigosas e danosas à saúde da psíquica da criança, que acaba por chamar
para si, a responsabilidade do fracasso conjugal de seus pais, vivenciando fortes e
avassaladores sentimentos de culpa.

Várias são as sessões onde o tema das “brigas” se faz presente de forma camuflada, onde a
criança munida do recurso lúdico me convida a travar com ela uma “batalha naval”, e
demonstra extrema satisfação quando executa na completa extensão da palavra, as figuras
parentais, ali representadas pelos navios maiores. O pedido pelas brincadeiras, em especial os
jogos de competição, aonde um, inevitavelmente, irá se sobrepor a um outro, se tornam
constantes na medida em que interpelo a criança no sentido de que fale sobre sua família.
Como Maria referenda sua fala a partir do querer (querer jogar comigo), eu transporto e abro
seu discurso para a dimensão das coisas que ela quer em cada situação de sua vida, e
ressalto o núcleo familiar. A resposta da criança vem sem demora afirmando não querer nada
na família. Nesse momento interpreto à criança que diante do que ela tem vivido, acabou
desenvolvendo um mecanismo de defesa, onde entendeu-se por bem que a estratégia mais
eficaz, de dá a partir da afirmação: não querer nada com a sua família, numa tentativa de
afastar aquilo que lhe causa tamanho sofrimento.

No instante em que Maria consegue verbalizar sua fantasia de morte aos pais, imediatamente é
tomada por um sentimento de culpabilização: “Eu fiz errado” (sic), afirma acerca de sua
produção pictórica. Minha proposição é justamente elucidar para a criança que seus
sentimentos são legítimos e pontuo acerca do desenho: “Errado não, diferente sim. Você fez
diferente.”

De acordo com Melanie Klein, a vivência deste processo de culpabilização, representa um


avanço, pois essa capacidade referenda a chegada da criança à posição depressiva, que
implica num grau de integração pessoal, assim com a aceitação da responsabilidade por toda a
destrutividade que está ligada ao viver. Segundo a autora, a posição depressiva está
diretamente ligada a mudanças fundamentais na organização libidinal infantil.

A partir desta colocação, a criança passa a trabalhar como tema central nos atendimentos, a
questão dos diferentes, isto é, dos opostos, que vem validar a própria relação conjugal de seus
pais. Maria então passa a utilizar o “tangran” (quebra cabeça de origem chinesa praticado há
muitos séculos em todo o Oriente cujo nome significa “tábua de sete sabedorias”), separando
as figuras em partes iguais (cores e formas). A interpretação vai de encontro às tentativas da
criança em ajuntar os opostos – pai e mãe – e edificar a seu modo, sua casa, isto é, manter de
pé sua família. Porém, para arcar com este lugar, a criança acabava sofrendo duras
conseqüências, inclusive o sentimento de solidão, exteriorizado nos vários desenhos de
árvores isoladas e abandonadas no branco da folha de papel.

É interessante notar que, a criança não só diz de si ao utilizar recursos lúdicos, como também
responde, por via da brincadeira, à interpretação. Na sessão seguinte, Maria já é tomada por
um movimento diferente, e se apropria do tangran, porém valorizando o ajuntamento de pares
diferentes. Desta brincadeira, faz-se a evolução para um jogo mais elaborado e requisita minha
presença para “auxiliá-la” a formar uma “partida de futebol”, onde todas as peças se misturam,
se chocam e se fundem, se esbarram e caem no chão, isto é, interagem verdadeiramente. É
somente quando a criança se permite acolher e aceitar as diferenças que circundam sua vida,
que lhe é possível de fato exercer uma interação com as demais pessoas.

No que concerne ao papel da brincadeira na análise infantil, Melanie Klein afirma que todo ato
de brincar da criança poderia ser visto como uma projeção de sua realidade psíquica. Portanto
se olharmos uma criança brincando, seremos capazes de visualizar seu mundo interior.

Por fim, é importante levar em conta a todo o momento o contexto pessoal e a realidade
externa que circunda a criança. Com uma subjetividade ainda em formação, dependente tanto
psíquica como concretamente dos pais e das instituições nas quais está inserida, a criança
mais do que o adulto estabelece vínculos móveis e dinâmicos, não apenas com a sua família,
mas com as demais figuras que podem representá-la, entre elas, destacando-se a figura do
analista. Cabe a ele trabalhar esses vínculos, com os pais, com a instituição e com a própria
criança.

Não espero, é verdade, que Maria, assim como a personagem da estória infantil, após o
regresso de suas aventuras à casa, se depare com um lar harmonioso, feliz, liberto de toda
espécie de conflito. Este final, talvez não possa ser escrito, nem por ela, nem tão pouco por
mim. Mas acredito que verdadeiramente, é possível à Maria transformar seu pequeno mundo
interno num lugar de maior leveza para que, ao olhar-se no espelho, se descubra enquanto
força crescente de vida, que é capaz de lutar, que é capaz de ser...

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