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A rtigo

Uma estratégia de sustentabilidade


a partir da Agroecologia*

Guzmán, Eduardo Sevilla** e da globalização econômica, assim como aos


cânones da ciência convencional, cuja crise
epistemológica está dando lugar a uma nova
Resumo epistemologia, participativa e de caráter polí-
O presente artigo é uma reflexão, a partir tico. Ao contrário da ciência convencional, que
da Agroecologia, a respeito da emergente éti- utiliza uma forma de conhecimento atomista,
ca ecológica e sociocultural, que nos leva a mecânica, universal e monista, a Agroecolo-
repensar os estilos de desenvolvimento rural, gia, respeitando a diversidade ecológica e so-
dentro de uma perspectiva de sustentabilida- ciocultural e, portanto, outras formas de co-
de. O texto é parte de um trabalho maior, em nhecimento, propugna pela necessidade de
que o enfoque agroecológico é apresentado gerar um conhecimento holístico, sistêmico,
como contraponto à lógica do neoliberalismo contextualizador, subjetivo e pluralista, nas-
cido a partir das culturas locais. Neste senti-
do, o artigo procura destacar aspectos em que
* Texto traduzido e adaptado por Francisco Roberto
a Agroecologia, como um novo campo de estu-
Caporal, mediante autorização do autor. Trata-se de
dos, pode contribuir para o desenho de estra-
parte do texto original intitulado Ética Ambiental y
tégias de desenvolvimento rural sustentável,
Agroecología: elementos para una estrategia de susten-
enfatizando alguns elementos que podem ser-
tabilidad contra el neoliberalismo y la globalización
económica. Sevilla Guzmán, E., ISEC - Universidad de vir como orientadores para a ação. Ademais,
Córdoba, España, 1999, 30p. (mimeo). se desenvolve uma reflexão sobre a importân-
** O autor é Doutor em Sociologia, Professor Catedrá- cia do desenvolvimento local ou endógeno,
tico e Diretor do Instituto de Sociología y Estudios destacando a necessidade de construção e
Campesinos - ISEC, da Escuela Superior de Ingenieros reconstrução do conhecimento local, como
Agrónomos y de Montes - ETSIAM, Universidad de estratégia básica para processos de transição
Córdoba, España. agroecológica.
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Palavras-chave: tanto das relações entre as pessoas como das
Agroecologia, desenvolvimento rural susten- pessoas com os recursos naturais. Tais for-
tável, sustentabilidade, conhecimento local. mas de resistência constituem as respostas
locais a uma generalizada agressão sociocul-
1 Impactos e resistências tural, manifestando-se através de uma gran-
O pensamento científico convencional, de quantidade de elementos específicos de
através do conceito de desenvolvimento, defi- cada etnoecossistema. Dito em outras pala-
niu como o "progresso" para as zonas rurais a vras, nasciam as respostas endógenas,
sua homogeneização sociocultural e, com isso, surgidas a partir da própria cultura local.
levou à erosão do conhecimento local, que foi
desenvolvido e apropriado mediante a intera- 2 Um outro enfoque de
ção entre os homens e a natureza, em cada desenvolvimento, a partir
específico ecossistema. Esta erosão aconte- da Agroecologia
ceu através de um processo de imposição pau- O conceito de desenvolvimento rural que
latina das pautas de relações econômicas, aqui estamos propondo, amparado nos princí-
sociais, políticas e ideológicas vinculadas à pios da Agroecologia, se baseia no descobri-
"modernização", definida e entendida como tal mento e na sistematização, análise e poten-
a partir da identidade sociocultural ocidental. cialização dos elementos de resistência locais
Diante desta imposição e invasão cultural, frente ao processo de modernização, para,
as culturas locais reagiram de diferentes através deles, desenhar, de forma participa-
maneiras, ainda que, em geral, a estrutura tiva, estratégias de desenvolvimento defini-
de poder estabelecida neste processo e guia- das a partir da própria identidade local do et-
da pela lógica do lucro e do mercado tenha noecossistema concreto em que se inserem.
causado a submissão (primeiro formalmente A Agroecologia, que propõe o desenho de
e, mais tarde, em muitos casos, de forma real) métodos de desenvolvimento endógeno para
dos elementos especificamente locais relaci- o manejo ecológico dos recursos naturais,
onados aos recursos naturais de cada etnoe- necessita utilizar, na maior medida possível,
cossistema, a esta outra lógica. Assim, o modo os elementos de resistência específicos de
industrial de uso dos recursos naturais foi cada identidade local. Em nossa opinião, a
substituindo as formas de manejo (campone- maneira mais eficaz para realizar esta tarefa
sas) tradicionais, vinculadas às culturas lo- consiste em potencializar as formas de ação
cais, de maneira que o contexto social, tec- social coletiva, pois estas possuem um poten-
nológico e administrativo, como nova forma cial endógeno transformador. Portanto, não se
de gestão, atuou como mecanismo trata de levar soluções prontas para a comuni-
homogeneizador que implementou, de forma dade, mas de detectar aquelas que existem lo-
paulatina, um modo de vida "moderno", hostil calmente e "acompanhar" e animar os proces-
e dissolvente das formas de relação comuni- sos de transformação existentes em uma di-
tária existentes nas comunidades rurais, nâmica participativa. Este é o núcleo central
onde os valores de uso sempre prevaleciam de nossa proposição teórica e metodológica. 1
sobre os valores de troca. Assim, a ferramenta central de nossa aná-
Não obstante, apesar da persistência des- lise é a agricultura participativa, que trata
te processo de modernização, as comunida- de gerar elementos para o desenho de méto-
des locais geraram múltiplos mecanismos de dos de desenvolvimento endógeno, a partir do
resistência para sobreviver a um contexto for- contexto e com base nos princípios da Agroe-

36 temente hostil à natureza de suas relações, cologia. Através da agricultura participativa,

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A ferramenta central de nossa
pretendemos o desenvolvimento participativo análise é a agricultura
de tecnologias agrícolas, como orientação que
participativa, que trata de gerar
permite fortalecer a capacidade local de expe-
rimentação e inovação dos próprios agriculto- elementos para o desenho de
res, com os recursos naturais específicos de
métodos de desenvolvimento
seu agroecossistema. Se trata, pois, de criar e
avaliar tecnologias autóctones, articuladas endógeno, a partir do contexto e
com tecnologias externas que, mediante o
ensaio e a adaptação, possam ser incorpora- com base nos princípios da
das ao acervo cultural dos saberes e ao siste- Agroecologia
ma de valores próprio de cada comunidade.
Ressalte-se que, apesar de sua crítica à
agronomia convencional desenvolvida em
estações experimentais (que favorece um cul-
tivo específico contra o sistema produtivo em mos que é possível estabelecer a elaboração
sua totalidade; que prioriza o mercado frente de um plano de desenvolvimento sustentável
à reposição de nutrientes; que subestima o para uma zona rural. Vejamos, então, as ca-
conhecimento local, entre outros erros de racterísticas que devem ser levadas em con-
enfoque), a agricultura participativa utiliza ta neste processo.
múltiplas formas de experimentação, mas não
pretende substituir a pesquisa realizada nas a) Integralidade
estações experimentais ou negar a investi- Ainda que o manejo dos recursos naturais,
gação científica. O que pretende é modificá- através da agricultura, da pecuária e da silvi-
la, transformando o núcleo central de poder cultura, seja o elemento inicial para o esta-
que esta detém, baseado na ciência conven- belecimento das estratégias de desenvolvi-
cional, por outro núcleo, agora baseado no co- mento, estas estratégias devem ser aplica-
nhecimento local, porque este responde às das ao conjunto das potencialidades e oportu-
prioridades e capacidades das comunidades nidades de aproveitamento dos distintos re-
rurais, aceitando, ademais, que estas são cursos existentes na comunidade. Desta for-
capazes de desenvolver agroecossistemas efi- ma, deve-se buscar o estabelecimento de ati-
cazes, rentáveis e sustentáveis. vidades econômicas e socioculturais que
Neste sentido, Calatrava (1995) propõe um abranjam a maior parte dos setores econômi-
modelo de desenvolvimento rural ao qual atri- cos necessários para permitir o acesso aos
bui as características de "integral, endógeno meios de vida da população, em busca da me-
e sustentável". Isto é, contra as correntes do- lhoria do bem-estar da comunidade.
minantes na atualidade, aquele autor atribui
a dito modelo um caráter agrícola/agrário e b) Harmonia e equilíbrio
uma natureza ecológica, considerando que Os esquemas de desenvolvimento, gerados
não existe desenvolvimento rural se este não a partir da base material dos recursos natu-
estiver baseado na agricultura e na sua arti- rais do agroecossistema, devem ser realiza-
culação com o sistema sociocultural local, dos buscando-se uma harmonia entre cres-
como suporte para a manutenção dos recur- cimento econômico e manutenção da quali-
sos naturais. Com base neste trabalho, e re- dade do meio ambiente. Deve existir sempre
alizando as modificações oportunas para
adaptá-lo ao enfoque agroecológico, entende-
um equilíbrio entre os sistemas econômico e
ecológico. Como se depreende do anterior, as 37
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comunidades rurais em questão, do grau
de desenvolvimento da administração lo-
cal, entre outros fatores”.

d) Minimização das externalida-


des negativas nas atividades pro-
dutivas
Este é um tema delicado e que, em geral,
vem determinado pela natureza da dependên-
cia do mercado e dos agentes da circulação.
atividades agrícolas devem ser realizadas Normalmente, os sistemas agroalimentares,
mantendo, também dentro do setor, um cará- através dos insumos de natureza industrial e
ter integral, ou seja, buscando um processo estandartizada, geram uma estrutura de po-
de integração agrossilvopastoril que permita der vinculada às "casas comerciais", na mai-
a manutenção do equilíbrio ecológico. oria dos casos multinacionais (ou vinculadas
a elas) que impõem a lógica do manejo indus-
c) Autonomia de gestão e controle trial dos recursos naturais, introduzindo, com
Os próprios habitantes da zona devem ser isto, as fontes de degradação e determinan-
os responsáveis pela gestão e controle dos ele- do, desta forma, a necessidade de levar a cabo
mentos-chave do processo. Isto não quer di- a internalização das externalidades dentro dos
zer que nossa proposta tenha um caráter já estreitos limites da sustentabilidade. Como
"autárquico", ao contrário, a intervenção pú- é sabido, as externalidades negativas da agri-
blica deve existir em um certo grau dentro do cultura industrializada geram diferentes im-
processo. Entretanto, como mostra a experi- pactos à biosfera: impactos no solo, na atmos-
ência, os processos de desenvolvimento ru- fera, nos recursos hídricos, na biodiversida-
ral, ao longo do tempo, foram impostos pela de, muitas vezes incontroláveis. Por isto, em
intervenção pública, o que não deve ocorrer. nossa proposta de desenvolvimento rural sus-
Tal imposição, muitas vezes, ocorreu de for- tentável joga um papel fundamental o esta-
ma inconsciente por parte da administração, belecimento de redes locais de intercâmbio
já que esta, ao estabelecer as infra-estrutu- de insumos localmente disponíveis, como ele-
ras organizativas necessárias para o estabe- mento de resistência e enfrentamento ao con-
lecimento dos processos, introduzia, também, trole externo exercido pelas empresas comer-
um contexto social, tecnológico e administra- ciais introdutoras dos elementos de natureza
tivo alheio aos mecanismos socioculturais da industrial (o que gera impactos negativos no
comunidade, gerando, com isto, barreiras à manejo dos recursos naturais), tanto na fase
participação local. Como assinala Calatrava de produção como na fase de comercialização.
(1995: 314), "o tema da autonomia, estreitamente A geração de mercados alternativos de insu-
ligado ao problema da intervenção pública nos mos e produtos tem um papel-chave como es-
processos de desenvolvimento rural, é um tema tratégia de resistência.
muito delicado e polêmico, sobre o qual é difícil
estabelecer soluções genéricas, pois a necessi- e) Manutenção e potencialização dos cir-
dade de intervenção pública (na comunidade lo- cuitos curtos
cal) é função das características da zona, do grau Estreitamente vinculada à característica

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de desenvolvimento geral da região e do país, antes assinalada, aparece esta, como uma
do contexto institucional genérico que afeta às estratégia para manter e potencializar, na
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medida do possível, os mercados locais já que naqueles lugares onde os homens recuperam
os mercados de circuitos curtos permitem a co-evolução com seu ecossistema.
adquirir a experiência e controle na busca de Vale a pena que nos fixemos neste ponto,
mercados regionais e mais amplos. E, somente para considerar a definição que Sidney W.
após o conhecimento da complexidade dos pro- Mintz (1989) apresenta sobre o campesinato
cessos de intercâmbio nos mercados conven- caribenho como "ranura histórica"2 . Este au-
cionais e do estabelecimento de mecanismos tor, mediante uma análise de tipo histórico-
de defesa frente à estrutura de poder carac- antropológica, estudando o manejo dos recur-
terística destes mercados (em geral, vincula- sos naturais de diversas gerações e o siste-
dos à dimensão econômica da globalização), é ma de dominação política em que estas esti-
possível dar-se o passo no sentido de introdu- veram imersas, chegou à conclusão de que,
zir-se em mercados de circuitos mais longos. superados os períodos de tempo em que o con-
Inclusive, quando o debate interno entre as trole colonial europeu manteve os campone-
redes alternativas de comercialização, gera- ses em forma de escravidão, estes começa-
das no nível local, assim o aconselhar, é pos- ram a desenvolver um conhecimento local
sível pensar-se em mercado de exportação de plasmado em formas de manejo agrossilvopas-
natureza solidária. É muito difícil, entretan- toril análogo ao que era realizado em épocas
to, estabelecer uma estratégia de ação gene- anteriores, pelas suas gerações passadas. Isto
ralizada sobre este ponto. O importante, em quer dizer que o homem possui a capacidade
nossa opinião, é assegurar uma tendência a de ler os "indicadores naturais" que lhe são
minimizar a dependência do exterior das co- oferecidos pelo ecossistema e de interpretar
munidades e das redes convencionais de co- as inter-relações da "trama da vida". Isto é,
mercialização. os ciclos climáticos na natureza, junto com
as formas de vida vinculadas a um meio am-
f) Utilização do conhecimento local vin- biente específico, oferecem, por si só, respos-
culado aos sistemas tradicionais de manejo tas locais de natureza ecológica que são apre-
dos recursos naturais endidas e apropriadas pelo conhecimento lo-
Esta é outra característica central no en- cal. Não é necessária a existência de um
foque agroecológico, já que as "respostas" à manejo camponês ou indígena (produto da
agressão modernizadora surgem, em geral, sabedoria acumulada pela transmissão oral
desta base epistemológica. Dito em outras pa- do conhecimento durante muitas gerações)
lavras, a co-evolução local possui a lógica de para se obter o desenvolvimento de tecnologi-
funcionamento do agroecossistema, naquelas as de natureza ambiental específicas para um
zonas em que o manejo tradicional histórico dado agroecossistema. É a lógica ecológica
mostrou condições de sustentabilidade. So- existente nos ciclos naturais, vinculada a
mos conscientes de que, na maior parte das cada aspecto de natureza, que possibilita a
zonas rurais das "sociedades avançadas" ou geração do conhecimento local. Nos agroecos-
em regiões fortemente impactadas pela lógi- sistemas fortemente artificializados, onde o
ca da modernização, a erosão do conhecimen- manejo tem uma natureza profundamente
to local foi tão forte que parece tremendamen- industrializada, também é possível gerar um
te difícil o "resgate" destes conhecimentos conhecimento local que aporte soluções es-
locais. Não obstante, existe uma contunden- pecíficas para cada realidade. Este conheci-
te evidência empírica que nos mostra a pos- mento oferecerá respostas análogas àquelas
sibilidade de recriação e, inclusive, de inova- que, há séculos atrás, estabeleceram os ha-
ção de tecnologias de natureza ambiental, bitantes da mesma zona, realizando um ma- 39
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nejo ambiental dos recursos naturais. turismo rural. A pluriatividade que propomos
Cremos que a evidência até agora acumu- se baseia mais na complementaridade de ati-
lada nos permite desenhar sistemas de ma- vidades e supõe uma recuperação de práti-
nejo dos recursos naturais de natureza agro- cas ecológica e economicamente sustentá-
ecológica, com base no conhecimento local, veis que historicamente se realizavam na
inclusive naquelas zonas de manejo fortemen- comunidade. Neste sentido, o turismo rural
te industrializado. Os processos de transição (e outras iniciativas semelhantes e deriva-
da agricultura convencional a um manejo das) só é válido no contexto das estruturas
agroecológico são, por conseguinte, suscetíveis associativas existentes na comunidade ru-
de ser realizados, independentemente da zona ral para reforçar seus laços de solidariedade
em que nos encontremos. Como afirma e buscando uma complementaridade de ren-
Calatrava (1995: 315), "Em se tratando de uma das que permita a melhoria do nível de vida
zona de agricultura industrial, inclusive muito dos agricultores.
intensiva, deve-se analisar detidamente seu ní- Todas estas características de um novo
vel de sustentabilidade e tentar, a partir dos pon- estilo de desenvolvimento, acima comenta-
tos de estrangulamento, reconduzir o sistema em das, necessitam ser entendidas a partir do
busca de contextos de sustentabilidade. Isto não conceito de "endógeno", como passamos a
implica, necessariamente, a implantação da agri- abordar a seguir.
cultura ecológica em sentido estrito, senão que a
recondução gradual dos sistemas agrícolas em 3 O endógeno como construção
direção a situações ecologicamente desejáveis"3. social recriadora da
heterogeneidade no meio rural
g) Pluriatividade, seletividade e comple- Ainda que, etimologicamente, endógeno
mentaridade da renda signifique "nascido desde dentro"4, seu signi-
As estratégias de desenvolvimento rural ficado está distante de ter um caráter estáti-
sustentável, aqui propostas, se baseiam no co, até porque a mudança social não só é ubí-
princípio agroecológico que indica a necessi- qua, senão que, ademais, se produz com gran-
dade de articular os elementos de sustentabi- de intensidade e vigor nas comunidades ru-
lidade existentes nas formas históricas de rais e nos sistemas tradicionais de manejo
manejo, com as novas tecnologias de nature- dos recursos naturais. Nos lugares onde tais
za ambiental. Quer dizer, estão baseadas na sistemas, pela sua durabilidade na história,
geração de uma "modernidade alternativa" provaram ser sustentáveis, a mudança soci-
quanto ao manejo dos recursos naturais. O uso al e a inovação tecnológica são uma constan-
múltiplo do território e o aproveitamento de te, ainda que, na maior parte dos casos, re-
todas as suas potencialidades, mediante a sultam invisíveis aos "olhos urbanos". Como
reutilização da energia e materiais, buscan- deixamos claro quando nos referimos à res-
do a reposição dos elementos deteriorados, posta da Agroecologia, esta articula o tradici-
constitui uma prática histórica mais recen- onal (com sustentabilidade histórica) com o
te, pretende inventar de novo, agora com o novo (tecnologias e processos de natureza
nome de pluriatividade. Entretanto, a prática ambiental). É somente unindo ambas as ca-
real dos programas sobre pluriatividade, no racterísticas que a aplicação dos princípios
contexto das estratégias de desenvolvimento da Agroecologia chega a garantir um risco mí-
rural integrado, se limitou à introdução de nimo de degradação da natureza e da socie-
atividades não-agrícolas no trabalho dos agri- dade produzido pela artificialização dos ecos-
40 cultores, especialmente aquelas vinculadas ao sistemas, por um lado, e pelos mecanismos

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de mercado, por outro. ção de um repertório ecológico e cultural pró-
Levando-se em conta o que antes menci- prio, que não é senão o produto dos intercâm-
onamos, o "endógeno" não pode ser visualizado bios gerados entre o pedaço da natureza (agro-
como algo estático e que rechace o externo. Ao ecossistema) que adquire uma identidade
contrário, o endógeno "digere" o que vem de específica na co-evolução e os contínuos ele-
fora, mediante a adaptação à sua lógica etnoe- mentos externos que dinamizam esta, intro-
cológica e sociocultural de funcionamento. Ou duzindo uma mudança sociocultural e uma
seja, o externo passa a se incorporar ao endó- alteração da sucessão ecológica, retardando-
geno quando tal assimilação respeita a identi- a e simplificando o ecossistema em compa-
dade local e, como parte dela, a autodefinição ração com seu estado pré-agrícola.
de qualidade de vida. Somente quando o exter- Ainda que no ecossistema exista um me-
no não agride as identidades locais é que se nor número de espécies e tipos biológicos, o
produz tal forma de assimilação. legado cultural introduzido mediante a
Os mecanismos de assimilação do externo domesticação leva consigo um acervo cultu-
por parte da localidade ocorrem através de ral que, mesmo que simplifique também a
atores locais, os quais incorporam a seus "es- estrutura do solo e a diversidade das distin-
tilos de manejo dos recursos naturais" aque- tas populações vivas, fortalece a circulação de
les elementos externos que não sejam agres- nutrientes, gerando, por sua vez, um mais
sivos ou contrários a sua lógica de funciona- rápido crescimento e uma maior vulnerabili-
mento. É por isto que os processos de moder- dade do sistema. Definitivamente, o homem
nização, como forma de agressão, que impõem artificializa a natureza através da cultura,
uma homogeneidade sociocultural são recha- deixando impressa nela a sua marca (huella)6
çados por aqueles grupos e indivíduos que e introduzindo, deste modo, sua específica
mantêm uma lógica de funcionamento de identidade.
natureza endógena. Em todo caso, as forças Portanto, é falsa a crença generalizada de
sociais existentes na localidade são hetero- que a identidade concreta de uma localidade
gêneas, razão pela qual determinados "esti- é produto de seu isolamento. Ao contrário, as
los de manejo dos recursos naturais" incor- respostas socioculturais e ecológicas, resul-
poram, acriticamente, os elementos moder- tantes da co-evolução, são produtos tanto do
nizantes, vendo-se sujeitos às suas formas de manejo dos recursos naturais, como das ex-
erosão ecológica e cultural. Portanto, para plicações que dada cultura atribui aos resul-
entender cabalmente "o endógeno", é neces- tados obtidos. Quando as respostas são ade-
sário compreender o que aqui denominamos quadas à localidade (comunidade) e a suas
"estilos de manejo dos recursos naturais"5. condições concretas e específicas, se produz
Assim, utilizamos o conceito de estilos de a geração de um potencial endógeno, eviden-
manejo dos recursos naturais, com referên- ciando as próprias possibilidades e limitações.
cia ao espaço sociocultural e ecológico que O mais relevante das respostas socioculturais
existe entre o homem e os recursos naturais, e ecológicas geradas a partir do local são os
gerado como conseqüência da co-evolução no mecanismos de reprodução e as relações so-
interior de um específico etnoecossistema. ciais que surgem destas respostas. É nos pro-
Significa, pois, aqueles ajustes entre os ele- cessos de trabalho e nas instituições sociais
mentos da biosfera (ar, água, solo e diversi- geradas em torno deles, onde aparece a au-
dade biológica) e a matriz cultural que permi- têntica dimensão do endógeno.
te sua articulação, gerando tecnologias espe-
cíficas e locais. Isto, por sua vez, leva à apari-
Para finalizar, podemos afirmar que o en-
foque agroecológico pretende ativar este po- 41
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tencial endógeno, gerando processos que consistente definição oficial de sustentabili-
dêem lugar a novas respostas e/ou façam dade que leva a crer que a repetição e o apro-
surgir as velhas (se estas são sustentáveis). fundamento dos processos de difusão de ino-
O mecanismo de trabalho, através do qual se vações, em sua vertente mais moderna, de-
obtém esta ativação, é constituído pelo forta- nominada intensificação verde, podem trazer
lecimento dos marcos de ação das forças so- a solução para os descaminhos do desenvol-
ciais internas à comunidade local. É assim vimento convencional. Por isto, é importante
que se realiza a apropriação, por parte dos ato- precisar aqui o que é o "sustentável" sob o
res locais, daqueles elementos de seu entor- ponto de vista da Agroecologia, para evitarmos
no (tanto genuinamente locais, como generi- as armadilhas da sustentabilidade presente
camente exteriores) que permitem a que es- no discurso ecotecnocrático8.
tes atores estabeleçam "novos cursos de ação". O fazemos tomando como base os ensina-
mentos de Gliessman (1990), que afirma que
a sustentabilidade não é um conceito absolu-
to, mas, ao contrário, só existe mediante con-
Para finalizar, podemos afirmar textos gerados como articulação de um con-
que o enfoque agroecológico junto de elementos que permitem a perdura-
bilidade no tempo dos mecanismos de repro-
pretende ativar este potencial dução social e ecológica de um etnoecossis-
endógeno, gerando processos tema. Assim, os contextos de sustentabilida-
de, que buscamos através da Agroecologia,
que dêem lugar a novas respostas devem ser construídos a partir de ações que
tenham em conta, entre outros, os seguintes
e/ou façam surgir as velhas (se
elementos:
estas são sustentáveis) a) a ruptura das formas de dependência que
põem em perigo os mecanismos de reprodu-
ção, sejam de natureza ecológica, socioeco-
4 Como conclusão: a nômica e/ou política;
sustentabilidade no enfoque b) a utilização daqueles recursos que per-
da Agroecologia mitam que os ciclos de materiais e de ener-
Para a Agroecologia, o desenho de modelos gia existentes no agroecossistema sejam o
agrícolas/agrários alternativos, de natureza mais fechados possível;
ecológica, constitui-se no elemento median- c) a utilização dos impactos benéficos que
te o qual se pretende gerar estratégias de de- se derivam dos ambientes ecológico, econô-
senvolvimento sustentável, utilizando como mico, social e político, existentes nos diferen-
núcleo central o conhecimento local e as "pe- tes níveis, desde a propriedade até a socieda-
gadas"7 que, através da história, este gerou de maior;
nos agroecossistemas, produzindo ajustes e d) a não-alteração substantiva do meio am-
soluções tecnológicas específicas de cada lu- biente quando tais mudanças, através da
gar, isto é, gerando, criando e/ou recriando o trama da vida, podem significar transforma-
endógeno. Entretanto, como sabemos, a arti- ções significativas nos fluxos de materiais e
culação transnacional dos Estados, através energia que permitem o funcionamento do
dos organismos internacionais, gerou um fal- ecossistema. Isto significa a necessidade de

42 so discurso ambiental, estabelecendo uma in- tolerância ou aceitação de condições biofísi-


cas, em muitos casos, adversas;
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e) o estabelecimen- tentabilidade, devem
to dos mecanismos
Novas estratégias de ação, garantir o incremento
bióticos de regeneração orientadas para a construção de da biodiversidade e da
dos materiais deterio- diversidade cultural,
rados, para permitir a contextos de sustentabilidade, minimizando, ao mes-
manutenção, a longo devem garantir o incremento da mo tempo, as depen-
prazo, das capacidades dências às quais os
produtivas dos agroe- biodiversidade e da diversidade etnoecossistemas es-
cossistemas; tão submetidos. No que
cultural, minimizando, ao mesmo
f) a valorização, re- diz respeito às formas
cuperação e/ou criação tempo, as dependências às quais de relação com os re-
de conhecimentos lo- cursos naturais, estas
cais, para sua utiliza-
os etnoecossistemas estão devem atender não so-
ção como elementos de submetidos mente à utilização dos
criatividade, que me- mesmos, mas também
lhorem o nível de vida a sua conservação, em-
da população, definido a pregando, para isto, tec-
partir de sua identidade local; nologias respeitosas para com o meio ambi-
g) o estabelecimento de circuitos curtos ente. Ademais, as intervenções externas de-
para o consumo de mercadorias que permi- vem garantir a abertura de espaços na admi-
tam uma melhoria da qualidade de vida da nistração que permitam a efetiva participa-
população local e uma progressiva expansão ção dos atores locais.
espacial do comércio, segundo os acordos par- Por fim, a Agroecologia, como enfoque ci-
ticipativos alcançados pela sua forma de ação entífico que promove o desenvolvimento ru-
social coletiva; e finalmente, ral sustentável, está assentada na busca e
h) a potencialização da diversidade local, identificação do local e sua identidade para, a
tanto biológica como sociocultural. partir daí, recriar a heterogeneidade do meio
Assim, novas estratégias de ação, orienta- rural, através de diferentes formas de ação
das para a construção de contextos de sus- social coletiva de caráter participativo. AA

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A rtigo
Notas
1
Ver Sevilla Guzmán y González de Molina para caracterizar e explicar a heterogeneidade
(1993). "do endógeno". Assim, com o objetivo de tentar
definir as diversas formas específicas de manejo
2
N.T.: No contexto do artigo, ranura histórica dos recursos naturais existentes em uma
se refere a uma fissura ou pequeno espaço comunidade rural, elaboramos há alguns anos
existente nas próprias contradições do sistema (González Molina y Sevilla Guzmán, 1993: 73-
hegemônico. 9) o conceito de "forma social de exploração"
(referente tanto à exploração dos recursos
3
N.T.: Este processo vem sendo tratado na naturais como do trabalho humano). Se trata
EMATER/RS, a partir do conceito de Transição "da forma específica de relação ou combinação
Agroecológica. entre o trabalho humano, os saberes, os
recursos naturais e os meios de produção, com
4
Ver Ploeg & Long (1994). o objetivo de produzir, distribuir e reproduzir os
5
bens e serviços socialmente necessários para a
A gênese teórica do conceito do "estilo de vida". Ainda que a denominação não tenha sido
cultivar" (Style of Farming) se desenvolveu nos a melhor, o conceito em si mesmo nos permitir
Países Baixos e se deve a E.W. Hofster (1957) e a reelaboração do "estilo de cultivar", como
à Escola de Wageningen sua primeira continuidade teórica.
configuração, tendo cabido a Bruno Benvenuti
6
& Jan Douwe van der Ploeg (Ploeg & Long, 1994) N.T.: A palavra "huella" não tem uma
sua configuração empírica. Tal conceito faz tradução literal para o português que expresse
referência à articulação de: a) o repertório o mesmo significado do castelhano. Ela significa
cultural existente, vinculado a uma forma de as marcas históricas de uma cultura em um dado
manejo; b) a organização específica dos ecossistema.
elementos internos da exploração agrícola 7
concreta; c) o modo de interpretar e modelar as Aqui com o mesmo sentido de huellas ou
relações da propriedade com o mercado e a marcas históricas.
tecnologia; e d) a forma de gestão e a política
8
administrativa da propriedade. Ademais, o Sobre o "discurso ecotecnocrático da
conceito de "estilo de cultivar" possui, em nossa sustentabilidade", ver Alonso Mielgo y Sevilla
opinião, uma grande potencialidade analítica Guzmán (1995).

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