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Pedagogia da Luz

Julia Grillo Botafogo


Turma 5 - Juiz de Fora
juliabotafogo@gmail.com

Resumo

Esta pesquisa tem como objeto de estudo os processos pedagógicos propostos pelo
fotógrafo e educador Miguel Chikaoka, fundador da FotoAtiva (PA). O artigo nasceu a partir
da participação da pesquisadora como aluna do curso “De Olhos Vendados” e como
observadora do Projeto “Fototaxia - Em Busca Do Elo Perdido” (2014), que tem como
objetivo trabalhar na formação de educadores, partindo da luz como potência para alcançar
desdobramentos transdisciplinares, como contribuição para a transformação da Educação. A
partir da pesquisa qualitativa, através observação participante, aliada à pesquisa bibliográfica,
este trabalho propõe uma breve análise sobre os processos educativos propostos por Chikaoka
e uma reflexão poético-científica da experiência, de como a fotografia pode atuar como
ferramenta de aprendizagem e produção de conhecimento, abordando temas para além do
mecanismo e resultado plástico, mas como uma dispositivo sensível no exercício da prática
para liberdade.

Palavras-Chaves: Pedagogia da Luz, Miguel Chikaoka, FotoAtiva, Fototaxia, Fotografia e


Educação

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Introdução

“A primeira função da educação é ensinar a ver – eu gostaria de sugerir que se


criasse um novo tipo de professor, um professor que nada teria a ensinar, mas
que se dedicaria a apontar os assombros que crescem nos desvãos da banalidade
cotidiana. Como o Jesus menino do poema de Caeiro. Sua missão seria partejar
‘olhos vagabundos’”1(ALVES, Rubens. A Complicada Arte de Ver, 2004)

Este artigo tem o objetivo compartilhar algumas metodologias propostas pelo


educador e fotografo Miguel Chikaoka e as possibilidades de produção de conhecimento que
surgem através das percepções de suas dinâmicas, usando a fotografia como ferramenta
educativa transdisciplinar.
A experiência proposta por Chikaoka, tem um viés transversal. Busca explorar a
gênese da fotografia na educação, ou seja, busca facilitar o entendimento do processo
fotográfico a partir do reconhecimento da luz como matriz da imagem e, por outro lado,
provocar o exercício do olhar enquanto expressão do nosso estado de ser, sentir e pensar.
Através jogos e brincadeiras se investiga a essência da fotografia e o participante toma
consciência de cada ciclo, compreendendo o todo.
O trabalho parte da sistematização das notas de campo da pesquisadora que em 2014
observou, durante 5 dias, os dois grupos de educadores nas oficinas do projeto “Fototaxia- Em
Busca Do Elo Perdido”. Uma parceria da Universidade Federal do Pará, através do programa
Arte na Escola, a Rede Municipal de Educação de Belém e a Associação FotoAtiva foi
estabelecida com a proposta de atuar na formação continuada de professores do ensino
fundamental. Após as oficinas, a sugestão lançada foi de cada professor pensar a possibilidade
de aplicar um item do que foi visto, em sala de aula, adaptando ao seu contexto, e desenvolver
um projeto pedagógico, para serem orientados. Este processo com professores foi
documentado em cinco escolas pela FotoAtiva.
O Fototaxia havia começado em 2012 e é relatado por Adriele Silva da Silva 2 em seu
artigo entitulado “Memória é Permanência: Fototaxia”, publicado em 2013. Por entraves
burocráticos, o projeto parou. E recomeçou apenas em 2014. Assim, o grupo observado pode

1ALVES, Rubens. A Complicada Arte de Ver. Folha de São Paulo, 2004).


2Adriele Silva da Silva, Belém/PA, 1987. Mestranda em Artes Visuais pela Universidade Federal do Pará.
Enquanto educadora do ensino formal atua na Secretaria Municipal de Educação de Belém na região das ilhas
Sul. Foi coordenadora do Núcleo de Formação e Experimentação da Associação FotoAtiva, instituição sem fins
lucrativos e de educação não-formal, entre 2013 e 2017, mesma instituição que agora assume a função de
Diretora Administrativa. Suas pesquisas versam sobre territórios, educação, arte, infância, processos de cuidado.

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ser considerado o primeiro grupo do Fototaxia. Hoje, o projeto não tem mais este formato,
mas seus multiplicadores continuam a propagar a ideia através de eventos, encontros,
cineclubes, debates e oficinas.
A pesquisa apresenta os principais eixos que conduzem o Fototaxia e as características
presentes na pedagogia proposta pela iniciativa. Traz como exemplos descrições de exercícios
e algumas percepções que emergiram da vivência observada, interpretadas de maneira
qualitativa. Faz-se necessário contextualizar, destacando a base da constituição da FotoAtiva,
Associação fundada por Miguel Chikaoka que atua na disseminação da metodologia. Como
também, apresentar um pouco alguns elementos que constituem a ação-reflexão do educador.
O trabalho ainda convida para um reflexão sobre os métodos de aprendizagem - que
tem como foco a experiência, o processo, a observação, a percepção, a intuição, as conexões,
as trocas de conhecimentos, os insights. Critica também o automatismo e o consumo
excessivo de informações. E revela a potência da fotografia para além da imagem e da
técnica, mas como uma linguagem, um meio de expressão, uma forma de aprender ver o
mundo.

Mottainai - o não desperdício do Outro

Mottainai: ”Cresci ouvindo diariamente a expressão Mottainai, cuja tradução


literal seria “que desperdício!”. Ressoando como um mantra ao longo de toda a
minha infância e adolescência, essa expressão ficou guardada como uma
semente na minha memória e, nos tempos mais recentes, eclodiu com a força
dos significados norteadores do caminho que venho trabalhando. Utilizada
cotidianamente pelos japoneses em situações e contextos dos mais diversos,
essa expressão guarda em si um significado muito profundo: Mottai é um termo
que tem origem budista e refere-se à essência das coisas e Nai exprime uma
negação. Portanto, em seu sentido mais profundo, Mottainai quer dizer a
negação ou o desprezo de laços com a essência das coisas, sejam estas de ordem
material, espiritual ou emocional”

Miguel Chikaoka, nasceu em Registro, comunidade de imigrantes japoneses em São


Paulo, em suas entrevistas sempre fala dos valores que aprendeu com seus pais, da vida
simples e sua cultura oriental e tradição Zen Budista. Se formou em Engenharia pela Unicamp
(Universidade Estadual de Campinas) e abandonou o doutorado em Engenharia Elétrica em
Nancy na França, para qual tinha ganhado uma bolsa. E passou a investir na fotografia que
acabava de descobrir viajando na Europa. Chikaoka (2015) conta que com a fotografia
encontrou uma maneira de dar vazão às angústias e inquietações.

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“A possibilidade de dialogar com o mundo sem a necessidade de palavras, mas
por meio de vibrações imagéticas permite-o projetar suas percepções para além
de seu corpo, para além de sua interioridade, permite-o exercer sua capacidade
comunicativa, sua expressividade, sua liberdade, de modo a lançar-se em outras
direções.”3

Essa decisão veio junto com a vontade de se auto-conhecer, a forma de como gostaria
de se projetar no mundo e alguns questionamentos: “O que eu quero? A benefício de quem?
[...] O que que viria ser da minha vida a partir daí enquanto individuo, ser humano, antes de
ser um engenheiro.”4
Voltou ao Brasil no inicio da década de 80, após “Anos de de Chumbo”5, e escolheu a
capital Paraense para se estabelecer como fotógrafo independente. Com propostas
experimentais coletivas, e novas formas de habitar a cidade (Foto-Varal, Foto-Oficina, Foto-
Pará) e atitude de educador, fundou a FotoAtiva em 1984, e também a agência Kamara Kó 6,
voltada a documentação das questões sociais e ambientais da Amazônia. A fotografia vem
então como uma forma de projetar-se no mundo, expressar seu interior, dialogar com a
realidade, aprender sobre a vida e sobretudo encontrar-se com o outro.
Segundo Paulo Freire “Ninguém liberta ninguém, ninguém se liberta sozinho: Os
homens se libertam em comunhão”.7 Para Chikaoka estar junto sempre foi sinônimo de
aprendizado, desde sua infância com a família, passando pelo foto-clube na França, a suas
oficinas em Belém, onde iniciou seu percurso pedagógico. A ideia de coletivo também esta
presente em seu trabalho artístico. Um exemplo é o projeto Urublues, painel que construiu a
convite da Fundação Cultural do Município de Belém, onde ele monta um grande mosaico a
partir de uma foto sua do Ver-o-Peso, mas especificamente do Mercado de Ferro, construído
por pequenas fotografias advindas de diversos olhares feitas em técnica pinhole. Ele fez um
convite aberto a população, e diversas pessoas anônimas contribuíram na obra. De longe se vê
a imagem base, e de perto, a fotografia revela diversos pontos de vista, revelando identidade
complexidade daquele lugar. A obra de autoria múltipla, também parte de uma ética, ao

3 VIANA, 2010.
4 CHIKAOKA Apud. VIANA, 2010.
5Expressão usada no Brasil para representar o período repressivo da ditadura militar, que durou até até o final do
governo Médici, em março de 1974.
6A trajetória de artística de Miguel Chikaoka pode ser lida na publicação “Navegante da Luz- Miguel Chikaoka
e o navegar de uma produção experimental”, lançada pela Kamara Kó em 2014 e escrita por Marisa Mokarzel.
7 FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2013
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conceber a fotografia como prática social e democrática, experimentável por todos e qualquer
um.8
“Estar no mundo é também, não apenas estar para si, mas estar para os outros, estar
para os terceiros”.9 esta frase de Chikaoka revela seu processo como educador. A filosofia
budista, assim como a física quântica, ensina que nada existe por si só, nada existe por
natureza independente, tudo está inteiramente ligado e dependente do outro.”10
Edgar Morin traz a questão da complexidade, “o conhecimento é, portanto, um
fenômeno multidimensional, de maneira inseparável, simultaneamente físico, biológico,
cerebral, mental, psicológico, cultural e social”.11 Para Morin, complexo quer dizer “o
pensamento capaz de reunir (complexus: aquilo que é tecido conjuntamente), de
contextualizar, de globalizar, mas ao mesmo tempo, capaz de reconhecer o singular, o
individual, o concreto”.12. Ele coloca a importância de percebermos que a nossa lucidez
depende do grau de complexidade o qual organizamos nossas ideias. “Como modo de pensar,
o pensamento complexo se cria e se recria no próprio caminhar”. 13 Ramos (2015) resume:

“O pensamento complexo tenta promover a religação dos saberes reconhecendo


criticamente aquilo que se perde em função da fragmentação, simplificação e
redução do saber. Um modelo de educação que tiver por objetivo compreender a
realidade através de uma concepção que procure ver o todo e as relações das
partes nesse todo, como a concepção complexa, estará colaborando para
construção de sujeitos mais críticos e dispostos a intervir em sua realidade.”

Em entrevista a Beatriz Sallet, Chikaoka (2010) questiona o modelo predominante de


educação e a necessidade de repensar nossa capacidade de construção de conhecimento:

“O modelo de educação predominante ainda é compulsório, competitivo,


fragmentado e reducionista, e a prática da solidariedade institucionalizada é
assistencialista, prepotente e midiática. Edgar Morin, em A cabeça bem feita,
ensina que “a aptidão para contextualizar e integrar é uma qualidade
fundamental da mente humana, que precisa ser desenvolvida, e não atrofiada” e
que “uma inteligência incapaz de perceber o contexto e o complexo planetário
fica cega, inconsciente e irresponsável.” Não há dúvida de que a nossa atrofia
face à sustentabilidade planetária é fruto do processo de fragmentação do
conhecimento pautado na separação das disciplinas, na compartimentação dos
saberes. Repensar a nossa relação ensino aprendizado significa repensar e

8 ANDRADE, 2011.
9 CHIKAOKA apud. VIANA, 2010.
10 VIANA, 2010.
11 MORIN,2012, p. 18 apud. RAMOS, 2015.
12 MORIN; MOIGNE, 2000, p.207 apud. RAMOS, 2015.
13 MORIN, CIURANA e MOTTA, 2003, p. 52 apud. RAMOS, 2015.
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exercitar a nossa capacidade de construção do conhecimento amplo, sem a
ruptura da natureza rizomática dos sentidos e do sentido dessa construção”.

“Não acho apropriado falar de fotografia como disciplina de sala de aula, mas
introduzir essas abordagens como uma alternativa pedagógica potencializadora
do aprendizado amplo e irrestrito, voltado para a formação de base do cidadão.
Acho que a base do ensino fundamental, segmentada por disciplinas, desloca a
função da escola nessa fase da formação. O objetivo deve ser a formação para o
exercício pleno da cidadania de direitos e responsabilidades pautados numa
visão planetária. Não como modismo, por indução midiática, mas com
consciência plena”.

“Pensar fotografia na educação através da luz, por exemplo, e não a partir da


imagem. Vejo problemas na educação voltada para uma formação visando uma
produtividade enquadrada pelos valores dominantes. Estamos num beco sem
saída e teremos que frear e agir de outra maneira”.

Nesse sentido, o ensino transdisciplinar não se restringe à possibilidade de haver


diálogo entre duas ou mais disciplinas, mas da capacidade de perceber o global e tornar
visível os elementos multidimensionais e a relação entre as partes e o todo como coloca Morin
(2014). A capacidade de associar e fazer “leituras de mundos”.14
Para Paulo Freire (1974) a liberação do oprimido se constrói através da ação-reflexão,
ou seja, ter consciência para poder transformar a realidade. O contrário seria a alienação,
práticas esvaziadas do compromisso de transformação do mundo, que fazem o sujeito refletir
sem agir ou agir sem refletir.
Hoje qualquer um pode produzir uma imagem, mas a incapacidade de fazer uma
apropriação mais crítica e criativa da produção de imagem (Chikaoka, 2015) contribui para o
atrofiamento das possibilidades de reflexão. Já o exercício fotográfico, como prática política
de questionamento e aprendizados sensoriais seria algo que propicia o encontro com a
libertação.

“Produzir imagem hoje é uma coisa absolutamente banal: não precisa nem
pensar nada, é só apertar o botão e a coisa acontece. Não tenho nenhum
problema que toda essa parafernália tecnológica exista, mas me preocupo sim
com sua apropriação inadequada. Acabamos sendo vítimas por não termos esse
lugar da prática de mergulho”.15

“É um processo ativo, no qual a pessoa possa se sentir efetivamente integrada,


de corpo e alma. Acho que é o lugar que a educação tem que plantar hoje. Não
dá pra esquecer que somos seres sensíveis e é fundamental trabalhar essa
questão da sensibilidade nesse campo do próximo, do físico. Não tenho nada
contra toda a questão da tecnologia. O problema é a apropriação. E nos

!14 Expressão Paulo Freireana referente ao ato de conhecimento. “A leitura do mundo precede a leitura da
palavra” (FREIRE, Paulo. A Importância do Ato de Ler, 1988).
15 CHIKAOKA, 2015.
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apropriamos muito mal porque temos uma formação péssima, deficiente.
Olhamos tudo como um objeto do desejo”.16

Para Vilém Flusser em a “Filosofia da Caixa Preta” a liberdade do fotógrafo consiste


justamente em “jogar contra o aparelho”, quando conscientemente procuram forçar o aparelho
a produzir uma imagem que não está em seu programa17. Assim, quanto mais o sujeito tem
consciência do processo, do dispositivo e seus componentes, mais tem a firmeza de construir
sua autonomia.

““As imagens não são conjuntos de símbolos com significados inequívocos [...].
As imagens oferecem aos seus receptores um espaço interpretativo: são
símbolos ‘conotativos’” Através do olhar se estabelecem relações significativas,
seja do lugar do fotógrafo, seja do lugar do espectador, uma vez que as imagens
são mediações entre o homem e o mundo.”18

Para Chikaoka: “Você não precisa fazer a grande foto. O processo, a sensação de estar
fazendo aquilo é o que interessa”. 19 Em entrevista concedida a Maria Hirszman na Revista
Zum, Chikakoka (2015) explica sua analogia do exercício da construção da câmera obscura
como prática para liberdade:

“Hoje, trabalhando com os educadores, o que importa não é a construção da


câmara escura para ver imagem. O que importa é saber que para construir a
câmara obscura você vai trabalhar com as mãos, que é o corpo. O que são
corpo, dedos e mãos, hoje tão subutilizados por saberem apenas teclar? Não
precisamos mais fazer para criar, para sentir o mundo. Parece que tudo está na
ponta do dedo. Isso é cruel porque a gente está se distanciando do nosso ser,
entende? Então, quando a pessoa pega uma folha de papel cartão para dobrar e
transformar naqueles visores de imagem do modelito de câmara obscura,
importa sim o resultado. É uma câmara mágica, uma caixa mágica, mas importa
também o reconhecimento do papel, de onde ele vem, quem o inventou, como
podemos trabalhá-lo, que técnica precisamos para “dominá-lo”. São estes
lugares que precisam ser resgatados nesse processo. Não dá mais pra ficar
olhando para a coisa como um fim. Sobretudo na educação, o percurso é a coisa
mais importante. É no percurso que se constitui o conhecimento. E quando digo
percurso quero dizer um percurso vivenciado, não um percurso dito, algo que
sei que é assim porque alguém disse que é.”

Jorge Larrosa (2002) traz a ideia que silêncio e a pausa são momentos importantes
para construir esse ser sensível. As animações de Hayao Miyazaki são marcadas por esses
momentos de espaço e tempo. São momentos de contemplação, de respiro, quando os
personagens param e o espectador para junto. O critico americano Roger Ebert descreve: “os

16 CHIKAOKA, 2015.
17 FLUSSER, 2002, p.107.
18 FLUSSER, p.28 1998 Apud. ANDRADE 2011
19 Entrevista “Miguel Chikaoka, mestre do desenho com a luz”, publicada em 7 de março de 2010. Disponível
em: <https://docplayer.com.br/58529290-Mostra-fotografica-de-30-de-marco-a-30-de-abril-museu-da-ufpa-
terca-a-sexta-das-09-00-as-17-00-sabado-e-domingo-10-00-as-14-00.html>. Acesso em 21 Mar. 2019.
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personagens vão apenas sentar por um momento, ou vão suspirar, ou olhar um córrego, […]
apenas para dar uma sensação de tempo, de espaço e de quem eles são”. 20 Miayazaki
responde: “A gente tem uma palavra para isso em japonês. É chamada de “Ma”21 . Vazio. Isto
está lá intencionalmente”.22 É um conceito antigo presente na arte e cultura japonesa. Ele é
importante e tem significado. Ma é uma ausência que permite que algo se manifeste através
dela.23 O diretor complementa “O que realmente importa são as emoções subjacentes.”24
Para Maturana as emoções estão na base do ser humano. “As emoções são dinâmicas
corporais que especificam os domínios de ação em que nos movemos. […] Se queremos
entender as ações humanas não temos que observar o movimento ou o ato como uma
operação particular, mas a emoção que o possibilita.”25
Larrosa traz a ideia do “sujeito da experiência”, aquele que pausa para pensar, respirar,
refletir o que acabou de ouvir ou falar, sentir de que forma isso repercutiu nela mesma. Que se
deixa tocar, emocionar, que é atencioso, paciente, está passivo à paixão e aberto à sua própria
transformação.

“A experiência, a possibilidade que algo nos aconteça ou nos toque, requer um


gesto de interrupção, um gesto que é quase impossível nos tempos que correm:
requer parar para pensar, parar para olhar, parar escutar, pensar mais devagar,
olhar mais devagar, e escutar mais devagar, parar para sentir, sentir mais
devagar, demorar-se nos detalhes, suspender a opinião, suspender o juízo,
suspender a vontade, suspender o automatismo da ação, cultivar a atenção e a
delicadeza, abrir os olhos e os ouvidos, falar sobre o que nos acontece, aprender
com lentidão, escutar aos outros, cultivar a arte do encontro, calar muito, ter
paciência e dar-se tempo e espaço”.26

Chikaoka acredita trabalho com Arte contribui neste processo de construção de um


olhar mais livre. Andréa Feijó Andrade traz o teórico da educação John Dewey para refletir a
arte como possibilidade de uma experiência significativa.

“Para Dewey, toda experiência tem dois aspectos: o aspecto imediato de ser
agradável ou desagradável, e o relativo à sua influência em experiências futuras.

20EBERT, 2002. Disponível em: <https://www.rogerebert.com/interviews/hayao-miyazaki-interview> Acesso


em 21 Mar. 2019.

21 Seu ideograma (間) é a combinação de dois caracteres: um que significa Porta e outro que significa Sol.
22 Em entrevista a EBERT, 2002.
23 Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=Kyp3YV2t0gQ> Acesso 27 de Mar. 2019
24 Em entrevista a EBERT, 2002.
25 MATURANA, 2009.
26 LAROSSA, 2002.
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Para ele, a experiência é central no conhecimento que podemos ter do mundo.
[…] Assim, para o autor, o problema central de toda ação educativa baseada na
experiência, como uma força em movimento, “é selecionar o tipo de
experiências presentes que possam viver frutífera e criativamente nas
experiências subsequentes”.27

Neste sentido, Chikaoka afirma “O que importa acima de tudo não é a formação do
fotógrafo, mas a formação do ser humano. É o ser humano que sustenta o fotógrafo”.28
Chikaoka busca para si uma postura de facilitador do conhecimento. Segundo Rubem
Alves no documentário “Rubem Alves – O professor de espantos” (Dulce Queiroz, TV
Câmara, 2013), o facilitador seria “É um professor que não ensina nada. […] É um professor
de espantos. O objetivo da educação não é ensinar coisas porque as coisas já estão na Internet,
estão por todos os lugares, estão nos livros. É ensinar a pensar. Criar na criança essa
curiosidade.”
No livro Pedagogia da Autonomia (1996) - saberes necessários à prática educativa,
Paulo Freire chama a atenção para importância do exercício da curiosidade, diz que
independente da idade do educando, o caráter humano é de permanente busca, e por isso vale
a pena colocar alma, emoções, não reprimir sentimentos, dar valor as possibilidades de
mudança, estimular a autonomia, de analisar, intervir, entender, aprender fazendo. Tudo isso
corrobora para uma pedagogia transformadora, pois ser sujeito da aprendizagem, é ser
também o sujeito do conhecimento. Freire diz que o educador é um mediador que proporciona
diversas oportunidades de aprendizagem. E que o ato de aprendizagem não é a transferencia
de conteúdo, nem a memorização. Tem haver com reflexão metodológica de desvelar a
compreensão igualmente critico do educador e educando, adentrar no processo de
aprendizagem como sujeito ativo, e de forma suave, revelar que tudo está ligado.
Chikaoka (2015), faz um exercício de cartografia sobre as origens de suas reflexões e
apresenta alguns ingredientes que o alimentam o seu processo com a luz.

Fotografia:“No final dos anos 1970, […] Em meio ao envolvimento com os


movimentos políticos e culturais, recebi o convite de um coletivo29 de arte-
educadores para ministrar um curso de iniciação à fotografia. Desenhei um

27 DEWEY, 2010, p.29 Apud ANDRADE, 2011.


28Em entrevista para ZUM, Miguel Chikaoka fala sobre sua formação e trajetória fotográfica”, Publicada em: 09
de março de 2015. Disponível em” <https://revistazum.com.br/radar/entrevista-chikaoka/> Acesso em 21 Mar.
2019.
29Escola de Arte Ajir (1980), coletivo de artistas, arte-educadores e intelectuais que tinham como projeto a ação
pública, com intervenções e ocupações em praças e espaços públicos. Através do grupo, Chikaoka lançou sua
primeira oficina de fotografia.
!9
roteiro de atividades visando, por um lado, facilitar o entendimento do processo
fotográfico a partir do reconhecimento da luz como matriz da imagem e, por
outro, provocar o exercício do olhar enquanto expressão do nosso estado de ser,
do sentir e do pensar. Essa experiência foi o lugar de partida para o que venho
trabalhando até hoje.”

Pinhole e fotogramas: “Em 1983, a pesquisadora e educadora Regina Alvarez


esteve em Belém ministrando a oficina “Fotografia sem câmera”, […] tive o
privilégio de conhecê-la e trocar algumas ideias sobre o potencial educativo dos
fazeres que nos aproximam sensorialmente da origem do processo fotográfico.
A partir desse momento, as práticas com o fotograma, a construção e uso de
câmeras pinhole passaram a integrar o roteiro de atividades de minhas oficinas.”

Câmera obscura: “em 1984, […] Rino Marconi que nos brindou com a
construção de uma câmera obscura utilizando uma caixa de papelão. Até então,
meu conhecimento sobre a formação da imagem era baseado no estudo da física
e da experiência de captura com a câmera pinhole. Enfiar a cabeça numa caixa
de papelão e ver a imagem projetada através de um furinho foi incrível. Logo
incorporei mais esse “momento pré-fotográfico” nas atividades das oficinas
como meio de instigar o entendimento da gênese do processo fotográfico.”

Segundo Suely Rolnik (2016), cartografar tem haver com acompanhar a latitude e a
longitude das intensidades dos afetos, marcar e remarcar a multiplicidade rizomática dos
movimentos. O cartógrafo, o que ele busca, são as potencialidades para a criação de mundos,
“que esteja mergulhado nas intensidades de seu tempo e que, atento às linguagens que
encontra, devore as que lhe parecerem elementos possíveis para a composição das cartografias
que se fazem necessárias. O cartógrafo é, antes de tudo, um antropófago30”.31Aquele que
busca absorver o outro, incorporar-lo e devolver de maneira transformada.
No Site Olhavê, na seção “A foto que eu queria ter feito”32, onde fotógrafos,
pesquisadores e curadores são convidados a mostrar a foto que queriam ter fotografado e o
porquê. Chikaoka responde: “Oi Alexandre, juro que, durante esse tempo que passou,
lembrei-me de muitas fotos que aprecio, mas curiosamente não se deu o “insight”… De
repente, O Vento! Portanto, se possível enquadrá-lo na seção, O Vento, do Manoel de Barros,
é uma foto que eu queria ter feito.”33
O Vento

Queria transformar o vento


Dar ao vento uma forma concreta e apta a foto
Eu precisava pelo menos de enxergar uma parte física do vento: uma costela, o
olho...

30A Antropofagia foi um movimento cultural tematizado por Oswald de Andrade, celebrava como uma saída
para o problematização da identidade brasileira e antídoto contra o imperialismo.
31 ROLNIK, 2016 p. 23.
32 Disponível em: <https://olhave.com.br/category/a-foto-que-eu-queria-ter-feito/> Acesso em: 27 de Mar. 2019.
33Disponível em: <http://olhave.com.br/2010/03/a-foto-que-eu-queria-ter-feito-miguel-chikaoka/> Acesso em:
27 de Mar. 2019.
!10
Mas a forma do vento me fugia que nem as formas de uma voz.
Quando se disse que o vento empurrava a canoa do índio para o barranco.
Imaginei um vento pintado de urucum a empurrar a canoa do índio para o
barranco
mas essa imagem me pareceu imprecisa ainda
estava quase a desistir quando me lembrei do menino montado no cavalo do
vento - que lera em Shakespeare
Imaginei as crinas soltas do vento a disparar pelos prados com o menino
Fotografei aquele vento de crinas soltas.
Manoel de Barros 34

Fototaxia

“Segundo a leitura livre de Miguel Chikaoka (2010) de três diferentes


dicionários para elaboração escrita do projeto “Fototaxia ou fototropismo é a
designação dada ao movimento dos seres vivos, especialmente das plantas, em
resposta a estímulos luminosos que poderão ser de frente para a fonte de luz
(fototaxia positiva), em sentido oposto a esta (fototaxia negativa) ou
perpendicular à direção dos raios luminosos (fototaxia transversal). Por
exemplo, a fototaxia nas plantas é tal que o caule apresenta reação positiva, isto
é alonga-se em direção à luz, e a raiz reação negativa, conduzindo a um
crescimento desta em afastamento da fonte luminosa.” Levando-nos, portanto, a
considerar que o projeto que nos propomos a analisar quando se apropria de um
termo da biologia para falar de educação considera as relações como estruturas
orgânicas e que se nutrem e vivem de diferentes processos ao mesmo tempo”.35

Associação FotoAtiva foi fundada em 1984, por Miguel Chikaoka e se consolidou


como um núcleo de referência para o desenvolvimento de uma cultura fotográfica na região
amazônica. Com uma ampla rede de parceiros e colaboradores em sua trajetória, a
organização da sociedade civil sem fins lucrativos, hoje é reconhecida como Entidade de
Utilidade Pública Municipal e Estadual.
O coletivo nasceu da intenção de experimentar e experienciar o território. Sempre em
diálogo com os movimentos sociais e culturais, trazendo à tona a força e complexidade do
Norte do país, universo tão rico na diversidade cultural e na beleza natural e de seu povo, e ao
mesmo tempo tão carente de políticas públicas efetivas e justiça social. Foi justamente desse
descompasso que se despertou processos poéticos, descobrindo juntos novas potencias de
linguagem e atravessamentos 36.
A base do FotoAtiva é o Núcleo de Formação e Experimentação (NFE), que parte de
práticas intuitivas e experimentais, propostas por Miguel Chikaoka, e promovem o diálogo da
fotografia com a educação não formal. Chikaoka propõe uma pedagogia própria, que

34 BARROS, in Ensaios Fotográficos, Editora Record, 2000.


35 CHIKAOKA, 2010 apud. SILVA, 2013.
36 Tema da exposição de 35 anos do FotoAtiva
!11
podemos chamar de pedagogia da luz37, que consiste em “assumir a luz como elemento vital e
objeto de estudo, propiciando leituras e abordagens transversais que potencializam a
implementação de práticas pedagógicas transdisciplinares”38 e acredita que o ensino de Arte
em sala de aula deve propiciar formas de expressão que sintetizam o emocional e cognitivo.
O NEF busca trabalhar na construção de um projeto integrado, que possa ser
financiado de forma colaborativa. Suas frentes de trabalho são: “conceber a FotoAtiva como
um espaço de referência para acolher professores e educadores da cidade; elaborar uma ação
integral em parceria com escolas na região; e garantir a formação continuada dos
arteducadores fotoativistas para realização de atividades artístico-pedagógicas com os mais
diversos públicos”39.
A proposta didática desenvolvida pelo NFE incorpora o lúdico (processos artesanais
de construção de imagens e atividades sensoriais), a reeducação do olhar, e permanentes
discussões acerca do processo de aprendizagem, do fazer fotográfico, suas possibilidades e
subjetividades. Sobretudo, abordagem que potencializem a construção de uma consciência
crítica. Funciona como um laboratório de compartilhamento de práticas pedagógicas,
metodologias de trabalho, trocas de experiências e processos criativos entre seus participantes
-estudantes, professores, escolas, comunidades, arte-educadores, entre outros interessados.
Além do Fototaxia, o NFE promove oficinas, cursos, Jornadas Fotográficas e o Pinholeday
Belém.
Abaixo estão descritas algumas propostas de dinâmica de Miguel Chikaoka, exemplos
de atividades e percepções que surgiram a partir da reflexão de seus participantes, retirados do
caderno de campo da observadora.

Dinâmica de apresentação

Se solicita que cada um escolha um objeto afetivo que trouxe consigo, forme uma roda
e coloque o objeto no meio. Chikaoka inicia com um bate-papo informal falando sobre o

37Pedagogia da Luz também foi um grupo de estudos do NFE do FotoAtiva, criado em 2011 com objetivo de
reunir educadores e interessados em em compartilhar estudos e práticas educativas transdisciplinares pautados
nas abordagens filosóficas e científicas da fotografia e da pedagogia, assim como tem o caráter de formar
educadores multiplicadores com princípios que espelhem a filosofia do FotoAtiva. Mas hoje se encontra inativo.
38 SILVA, 2013.
39 Disponível em: <http://www.fotoativa.org.br/?page_id=3825> Acesso 20 de Mar. de 2019.
!12
projeto. Depois pede que cada um pegue o seu objeto e através dele fale de si, e das
expectativas da formação. A proposta da dinâmica de apresentação é um primeiro desafio,:
fazer com que cada participante faça uma auto-reflexão de si, um exercício do conhecimento
que tem de si mesmo, de sua identidade. Na dinâmica cada um fala das coisas que gosta, da
forma como se comporta, acredita, se expressa e sonha. Como suas características estão
empregadas em um objeto e porque. Este momento que marca a individualidade e ao mesmo
tempo a diversidade do grupo.

Os materiais

Para dividir os participantes em 4 grupos. Se aponta para um e diz: 1, o que está do


lado 2, e na sequencia 3, 4. E começa novamente. 1,2,3,4. Depois pede para quem é 1 se
juntar com 1, quem é 2 se juntar com 2 e assim por diante.
Cada grupo recebe uma folha de papel cartão de duas faces, uma cartolina mais
grossa, de uma lado com cor, do outro papel kraft. Se pede para escrever sobre: Primeiro, a
origem do material, Segundo suas características e suas propriedades físicas e último suas
possibilidades. Se estipula um tempo de 1 2 minutos para isso, depois cada grupo lê o que
escreveu.
Exemplo grupo 1: Origem: madeira, natureza mais a intervenção humana, papiro
(China/Egito), celulose, industrializada, manufatura de materiais orgânicos; Características:
leve, flexível, bonito, pigmentado, perecível, reciclável; Possibilidades: infinitas, criar
imagens e objetos, escrever, desenhar, cortar, colar, pintar, arte, fotografar, vedar, abanar,
embalar, produzir som, dividir, se comunicar, refletir, absorver, livros.
Depois se pede para construir um objeto, a partir dessas possibilidades, usando além
do papel, apenas cola. Pode cortar e rasgar. Desfazer para depois fazer. Após a feitura, cada
grupo apresenta seu objeto. E conta como como foi o processo de criação, até chegar na ideia.
Na turma da manhã, sugiram os seguintes exemplos: Grupo 1: Partiu da
individualidade “o papel é meu” e cada um montou seu objeto na sua área. E depois buscaram
uma complementaridade entre eles, explorando o 3d e os contrastes. Grupo 2: Explorando o
papel, descobriram o som, através do movimento. Constroem assim flautas. Grupo 3: Como
cada idade recebe o papel. A criança que amassa e cheira, mastiga. O adolescente que dobra e
faz barquinho e aviãozinho. E o adulto artista que faz uma escultura. Grupo 4: Forma abstrata

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sem definição ou utilidade. Relação com as artes visuais. Apresenta harmonia, unidade, busca
movimento e complementaridade da cor. Grupo 5: Caixa, barco, porta retrato - Exercício de
memória. Construção a partir do que já haviam aprendido e tido experiência. Exploram o 3D e
a utilidade. Grupo 6: Ideia dos “cabeçudinhos”, cultura local “São João”, cada um faz uma
parte do corpo. Pensaram na criança e no brincar. Grupo 7: Se pensa na regionalidade,
relaciona com a cor do açaí e a flor da amazônia. Exploram a tecnologia do origami. Grupo 8:
Formas que se vê pela cidade, relação com artistas (Gaudi, Ligia Clarck, Arte Concreta), com
a matemática, volume com a cidade, impossibilidade e possibilidade (como juntar, encaixar,
deixar em pé).
O momento de trabalhar em grupo é um exercício muito importante, a interação entre
pessoas diferentes, o respeito ao tempo do outro, de pensar pelo outro para depois se incluir.
A potencialidades que se instaura em usar apenas um material. Que tudo é aproveitado e pode
ser encarado como uma brincadeira. A atividade convida a explorar a criatividade, trabalhar os
limites e a diversidade de possibilidades de construção. Tudo isso mexe com auto estima,
confiança e auto conhecimento dos participantes. Da margem também para a investigação
(origem, pesquisa, história).

Mãos para…

Chikaoka pede em 1 minuto fazerem uma lista com o assunto “Mãos para…”. Uma
infinidade de sentidos surge: sentir, olhar, tocar, se comunicar, cozinhar, esquentar, acariciar,
massagear, cutucar, empurrar rasgar, cortar, abrir, fechar, apertar, dedicar, harmonizar, pintar,
desenhar, escrever, moldar, coçar, alisar, conciliar, limpar, comer, pescar, apontar, apoiar,
fotografar, se pendurar, ritmar, conduzir, brincar, unir, cavar, escalar, trabalhar, carregar,
negar, afirmar, lavar, batucar, aplaudir, nadar, segurar, chamar, esfregar, misturar, plantar,
semear, sovar, simbolizar, dominar, transmitir entre outros. Um grupo começa ler. O que for
saindo cada grupo deve eliminar de sua lista e ler apenas o que ainda não foi dito.

Câmera obscura e o silêncio

“Em 2007, durante o Encontro de Inclusão Visual do FotoRio, tive a


oportunidade de trabalhar numa roda constituída por ouvintes e não-ouvintes.
Sem conhecimento da linguagem dos sinais, conduzi a construção de um
dispositivo óptico explicando verbalmente cada passo, com o cuidado de
mostrar o movimento das minhas mãos de forma mais contundente. O que mais

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surpreendeu nessa experiência foi a rapidez e a precisão dos não-ouvintes em
executar os passos, enquanto muitos ouvintes pediam para repetir a explicação
sobre cada etapa e movimento demonstrados. Intrigado, resolvi, conduzir em
silêncio as atividades manuais, com grupos de ouvintes, servindo-me apenas de
movimentos corporais. Foi a oportunidade de integrar silencio e o deslocamento
da atenção para o fluxo de informações através do som para a luz, dos ouvidos
para os olhos. Sem alardes, com mais eficiência e precisão.”40

O grupo é orientado para atividade que consiste na construção da câmera obscura em


silêncio. Fazendo uma analogia com a fotografia, as informações seriam passadas através das
ondas de luz e não através das ondas sonoras. Chikaoka conta que esta dinâmica surgiu em
uma oficina em Recife, junto a um grupo de fotografia e educação, para não ouvintes. Onde a
ideia principal seria apenas usar as mãos como ferramenta e uma folha de papel, inspirado no
Origami (arte da dobradura de papel). Nem régua, nem tesoura. Os dedos medem e as mãos
rasgam. Um pequeno pedaço de madeira e cola branca são distribuídos. As instruções são
dadas, o porque do uso da madeira, para ajudar a vincar as dobras. A importância de uma
posição confortável para o trabalho, para poder usar a ajuda do corpo na construção. Postura
para cortar, dobrar, usar o peso do corpo. Da visão, para que todos possam se ver e
acompanhar a feitura. E do silêncio, para poder haver concentração. E o conselho, de estar
atento ao que está fazendo e se alguém se perdesse ou não estivesse acompanhando para fazer
“barulho”, “muito barulho”. Chikaoka demostrava o barulho levantando as mãos e sacudindo,
e muito barulho sacudindo rápido.

Ilustração da feitura da câmera. Fonte: Compilação da Autora, 2014.

40 CHIKAOKA, 2015.
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O processo é conduzido com muita calma, de forma instigante e com brincadeiras.
Mas cada brincadeira tem um porque. O porque de se ajoelhar, para jogar peso quando se esta
vincando. O porque de pisar na dobra enquanto cola, porque a cola requer tempo para colar,
então enquanto pisa se faz de equilibrista, bailarina, aviãozinho. Fazer da espera um momento
prazeroso. O porque do papel alumínio, que veda a luz e do papel vegetal por ser translúcido
não se pode ver através, mas que absorve um pouco de luz, suficiente para formar a imagem.
Com as câmeras construídas se fala sobre a fisiologia do olho. E algumas instruções
são dadas para a saída. De dar tempo para os olhos se acostumarem. A importância de ficar na
sombra ou em um lugar com menos luz. O cuidado de tentar vedar a entrada de luz nas
laterais, para tapar com as mãos. E para testarem um furo, um furo um pouco maior, dois
furos, e depois colocar uma lente (lupa) e observar a diferença.

De olhos vendados e pincéis de Luz

“De olhos vendados” faz parte desse processo de busca pelo aprimoramento do
olhar para além do visível imediato, superficial. O nome é uma grande
provocação. De uma certa forma, se formos pensar do ponto de vista do olho,
seria um ‘não ver só com os olhos’ ou os sentidos da percepção, é o
desdobramento do que chamei um dia “fotografia sensorial”. Um exercício de
revelação dos sentidos da alma, um mergulho pra dentro de si. É estudar a foto
enquanto momento. E sabe, gosto de trabalhar com cada vez menos aparatos.
Hoje existem coisas por demais sofisticadas, câmeras de última geração... fico
pensando que isso é uma aberração, tanta informática, tanta tecnologia. As
pessoas acabam esquecendo as coisas simples. Vou fazer 60 anos e ainda lembro
da vida simples que minha mãe levava. Cuidava da horta, andava a cavalo. Era
um mundo diferente, né? Outra forma de vida. Hoje a gente quer uma coisa,
aperta um botão, e lá está.” 41

Chikaoka também propõe algumas dinâmicas sensoriais. Em duplas, ambos de olhos


vedados, um sente a mão do outro, se conectam, depois juntos, experimentam uma semente
que lhes é dada, e trocam percepções, falam sobre ela, o objetivo não é descobrir que semente
é, e sim remeter, traduzir o sentindo da semente, como por exemplo uma potência de vida
latente.
Depois em um pequeno pedaço de papel fotográfico velado (exposto a luz), tentar
decodificar o sentido em imagem, imaginar e fazer a árvore daquela semente. Com um pincel
com revelador: toda a potencia da luz no papel é revelada pelo pincel. Essa atividade é
chamada de Pincéis de Luz.

41 CHIKAOKA, 2015.
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Chikaoka propõe outras dinâmicas sensoriais, como vedar os olhos e ser conduzido
pelo outro, e depois trocar. Esses momentos são ambientados com música. Chikaoka sempre
coloca musica nos momentos de criação, nos intervalos e na chegada.

Pinhole e Fotogramas

“Exercitar o pinhole remete em contrapartida ao fato de que, quanto menor o


tamanho do furo feito, melhor, mais perfeita a imagem captada. Trata-se de um
exercício de reduzir o tamanho da janela, de reduzir o tamanho quantitativo de
informação para que efetivamente nos aproximemos da perfeição de imagem, da
clareza. Era como falar assim: precisamos usar o pinhole mais como exercício
espiritual, de consciência, e não apenas para a produção física da imagem. É
necessário pensar que naquele momento em que você está abrindo um furo para
a luz entrar, você está diante de um exercício muito profundo. Para mim tudo
isso está ali dentro desse ato, trata-se de um momento de reflexão, de poética
mesmo.”42

A sala em clima de laboratório: ao entrar os participantes encontram um ambiente com


com luzes apagadas e uma luz de segurança vermelha acesa. Esta atividade dura mais de um
dia. A proposta é apenas para experimentação da luz, com a construção de pequenas câmeras
fotográficas de potinhos de filme preto, usando papel fotográfico e revelando no laboratório.
A primeira etapa é a construção do obturador. Dois papeis cartões já cortados. A
medida para envolver o pote e deslizar com facilidade, a medida de não agarrar ou deixar
muita folga. Envolver o primeiro pedaço, este é apenas usado de base para o outro, para
facilitar tirar e medir a folga do outro com o pote. O outro pedaço é feito um furo, com
vazador de lona e martelo. Funcionara como obturador. Colocar e tirar o primeiro que servia
de calço. Uma fita imã é usada de base, para dar peso. Pode passar por cima do furo, depois é
feito o ajuste com estilete. Com obturar feito, é cortado com um estilete o buraco do tubo,
para que fiquem na mesma altura. Colar papel alumínio no potinho. A colagem tem que ser
bem feita para não rasgar, pois tanto o alumínio, quanto o potinho tem superfície lisa. Usar
cola branca, somente um pouquinho, passar no pote, espalhar com o dedo, fica apenas o brilho
e colar o alumínio, com a parte brilhante para fora. Com a caneta marcadora, fazer uma
bolinha onde esta o furo no papel alumínio. Servirá como uma mira, para saber que chegou no
furo. Furar com com espinho Mandacaru. Chikaoka fala que espinho fala do lugar, propõe sair
para buscar um espinho e dos cuidados se deve ter com o espinho. Recomenda que apenas o
instrutor fure os potinhos para padronizar.

42 CHIKAOKA, 2015.
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Uma folha é distribuída. Com espaço para 6 fotogramas e espaços para anotações em
baixo de cada fotograma. Tempo, Luminosidade, posição e observação. O exercício proposto
é fazer 3 fotos, na mesma posição com 3 tempos diferentes. Neste momento é reforçado que o
importante não é a imagem como resultado e sim as observações da luz, por isso 3 tempos
diferentes, a investigação.
Como é muita gente, para agilizar o exercício, no carregamento se escreve o nome do
participante atrás da folha e a numeração, e nos intervalos se descarga em uma caixa.
Posteriormente todos são revelados juntos. Não importa ver sua imagem e sim o processo de
revelação. Posteriormente cada um identifica sua imagem.
São dadas as instruções de saída. A contagem do tempo é feita, um carangueijo, dois
caranguejos, 3 caranguejos, para dar cadencia, se não a tendencia é contar 123456789. Se
ensina como colocar o papel dentro, identificar o lado sensível. Sair com o furo tapado, só
abrir quando estiver posicionado. Ver se esta bem tapado. Sobre quando estiver no quarto
escuro, não ter luz, cuidado com a luz do celular. A explicação que o papel não enxerga a luz
vermelha (como um problema auditivo, alguém que não escuta o grave, o grave é igual ao
silêncio). Mas o filme enxerga o vermelho, por isso tem q ser feito em total escuridão.
Cuidado ao sair, sair todos juntos, já com os potes fechados. O tempo que ficou aberto enche
o copinho de luz, o objetivo é encher na medida certa. Chikaoka diz “não existe erro, tudo é
teste de luz”, se saiu preto ou branco, é puro resultado da luz. Em primeira instancia olhar
para luz e não para imagem. Primeiro decidir onde colocar a câmera, olhar para luz, e proteger
do sol o furo, colocar na sombra ou colocar a mão em cima para que o sol não insira
diretamente no furo. Segundo pensar e escolher a direção da câmera.
No dia seguinte a proposta pode ser tema livre e com o exercício de anotar o máximo
de informação de cada fotograma. Ou sugerir trabalhar com zonas. Como por exemplo,
fotografar apenas mãos, sendo a mão a base de formação: mãos na sombra, mãos no sol, com
contraste, sem contraste, em cima, em baixo, de longe, de perto. Ou escolher um objeto que
traz para si e tirar foto dele em diferentes situações. Ou ainda fazer o exercício em duplas,
cada um fotografar o pé do outro, mas com percepções da luz. Fazer comparação da luz para
poder fazer leituras de imagem. Uma outra proposta sugerida seria o exercício com variantes,
trabalhando também com um mesmo objeto. Ângulos diferentes, mesmo tempo, mesma luz,
mesmo lugar. Lugares diferentes, mesmo tempo, mesma luz, mesmo ângulo. Tempos

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diferentes, mesma luz, mesmo lugar, mesmo angulo. E luzes diferentes (esperar, ou modificar,
com refletor, abrir e fechar janela), mesmo tempo, mesmo lugar, mesmo angulo.

Luz é…

“Vida, alegria, sabedoria, clareza, conhecimento, direção, energia, sol, onda,


cores, estrela, dualidade, alimento, amizade, insight, calor, força, vibração,
infância, descoberta, inspiração, ideia... […] uma lista de palavras a partir de
perguntas como: qual o significado da luz? o que ela representa? o que ela
simboliza? […] fiquei impressionado com a amplitude de temas que poderiam
ser abordados a partir de uma simples lista de significados. Provocar esses
atravessamentos coletivamente, discutindo ou desdobrando-os em atividades, é
um desaguar em um mar de possibilidades sem fim. […] Mas quando volto à
realidade e penso na velocidade de deslocamento da luz no plano terrestre,
aproximadamente 300.000Km/s, sinto-me transportado para uma outra
dimensão, pois isso quer dizer que, viajando com a luz, posso dar uma volta
inteira no planeta em menos 1,5 décimo de segundo, ou 7 voltas em 1 segundo.
Essa sensação de instantaneidade se anula quando penso o lugar das estrelas que
posso ver a olho nu. A Proxima Centauri, por exemplo, está a apenas 4,2 anos
luz. Calculando o que representa isso em termos métricos, temos uma distância
de quase 40 trilhões de quilômetros. Se teimasse em chegar por lá, com uma
nave a uma velocidade de 1000 km/h, aterrissaria nessa estrela dentro de 4,5
milhões de anos. Mesmo sem sair do chão, a experiência com o tempo através
da luz é algo impressionante. Uma estrela como Antares, centenas de vezes
maior do que o sol, encontra-se a 600 anos luz da terra. Isso quer dizer que
estamos vendo hoje é, na verdade, a Antares de uma época bem remota, antes da
descoberta do Brasil. Essa experiência do tempo-espaço com a luz e a sensação
de estar no presente e no passado é bastante estranho. Por isso, vejo no ato de
contemplar a paisagem celestial e observar os milhares de pontos luminosos um
momento para o exercício de leitura e de reflexão que nos ajuda a atingir uma
consciência cósmica. Para concluir esta rápida viagem com a luz, vamos visitar
um lugar que considero de uma potência mágica e reveladora: o minúsculo
orifício de uma câmera obscura pinhole, por onde os raios da luz, refletida por
uma cena iluminada e que se encontra em frente à câmera, passam para dentro e
projetam-se no seu interior formando uma imagem invertida e perfeita dessa
cena. Como é possível cruzar, simultaneamente, milhares de raios por um
orifício milimétrico portando tantas informações ?”43

Em uma roda, cada um fala o significado que tem da luz para si, e leva um conceito de
luz para alguém na sua direção oposta, simbolizando esse corpo cheio de luz. Com um rolo de
barbante na mão, para mostrar que a luz se propaga em linha reta, como a luz se comporta, a
pessoa percorre o caminho da luz e entrega o rolo para outra pessoa, e fica segurando a ponta
do barbante, o outro segue na mesma dinâmica, fala “Luz é…,” percorre a direção oposta, e
entrega o rolo e fica segurando parte do barbante, assim o rolo vai passando de mão em mão,
diversos significados vão surgindo: espiritualidade, revelação, brilho, caminho, imagem. No
final se tem uma grande Teia de Luz. Chikaoka fala da velocidade da luz, estrela que já
morreu e ainda a vemos, que sem luz não há vida, mas que também ela incomoda, queima,
que não a vemos e que ela não ocupa espaço.

43 CHIKAOKA, 2015.
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Outra dinâmica para demonstrar porque a luz se propaga em linha reta e porque a
imagem é invertida, é feita em trios. Antes, em outro momento, cada um desenha um olho,
qualquer tipo de olho em um pequeno pedaço papel cartão quadrado com um furo no meio de
2cm de diâmetro. Se usa materiais diversos: guache, pinceis, tesoura, cola, revistas. Chikaoka
faz dinâmica do “Pássaro, o Ninho e a Tempestade” e assim dividi o grupo em trios, para
fazer a atividade. Cada um pega seu papel cartão que desenhou o olho. Chikaoka demostra o
funcionamento da dinâmica. Em que um fica parado, segurando o olho, este representa o olho
em si, a frente, seria o exterior, e o verso seria, o interior, onde forma a imagem. Olhando
através de seu olho e do buraco do olho que está parado, quem fica do lado de fora, conduz o
movimento. E quem esta do outro lado o segue. Assim, se quem conduz vai para cima, o de
dentro para baixo. Buscando sempre o olho do outro, através do orifício. Depois entre eles, se
revezavam.

Percepções

Miguel Chikaoka sempre fecha seus encontros com as percepções do dia, e no dia
seguinte abre com as percepções do dia anterior, dando tempo a reflexão. O momento de se
falar sobre as percepções é muito rico, onde se abre para cada um se colocar da sua maneira,
se instaura um espaço de trocas de conhecimento. E no último encontro, em roda, se propõe
que cada um ajude a recapitular, tudo que foi dado, uma maneira de reforçar o conteúdo
aprendido.
Chikaoka, se coloca disponível para falar dos processos, de onde se quer chegar, o que
esta por de trás de cada dinâmica. Afirma que toda dinâmica está dentro de um contexto e que
tudo tem sentido, e que se para alguém algo não faz sentido, ele convida a discutir. Diz que
não se deve focar a atenção com que o aluno vai produzir e sim com o processo que ele vai
vivenciar. Ter menos preocupação com a imagem e sim com que esta detrás dela. A
provocação surge para mostrar os caminhos. Discutir o material antes de usar o material. Falar
sobre as mãos antes de usar as mãos (para construir a câmera). A partir da ideia de falar do
materiais antes de trabalhar com eles se pode tirar a lição de discutir antes o que é Ser
Humano. Para depois refletir o que é ser Professor. Sentir a mão do outro antes da semente.
Sentir e falar sem ver. Observar para além de olhar. Observar sem falar. A relação de depois
de sentir a semente, desenhar o que sentiu, a árvore a qual ela faz parte. De onde vem esta

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imagem? O que é imagem? Quantas imagens tem na mente de uma pessoa? Ela entra somente
pelo olho?Chikaoka busca desconstruir e se questionar sobre a ideia de necessidade de
inclusão:

“Para pensar e trabalhar com os surdos, mudos ou cegos precisamos desafiar a


nossa capacidade de percepção. Não faz sentido querer que os cegos cheguem
onde chegamos; nós é que devemos chegar onde eles chegaram. Ou seja, trata-
se de aprender com eles, como eles resolvem o que nós, “normais”, perdemos a
capacidade de resolver. No fundo a questão da inclusão, pelo menos na
educação, deve ser inversa.”44

Propõe religar os sentidos, colocar para fora o que se pensa, o que se sente, o que se
pode criar e modificar a realidade. Propõe com a câmera obscura, olhar exaustivamente como
a luz entra. Observar através da câmera obscura, a noite, a luz artificial, o amanhecer, o sair
do sol. Chikaoka acredita que o trabalho com Arte contribui neste processo de construção de
um olhar mais livre.
No pinhole, mergulhar no processo fotográfico pela latência, pelas possibilidades, pela
imprevisibilidade, pelo inacabamento. Chikaoka sugere sair fora do trilho, do controle
imediato, diferente do senso comum que busca ter controle absoluto e acertar sempre.
Chikaoka costuma repetir que não existe erro45, tudo é experimentação. Se saiu tudo preto, ou
tudo branco, tudo é resposta da luz. E quando perguntam sobre a melhor câmera, responde
que não existe melhor câmera, existe melhor relação fotógrafo-câmera. E sempre coloca que
nada é problema, tudo é desafio.
Chikaoka acredita que a fotografia pode ser bastante útil como ferramenta de
aprendizagem na sala de aula.

“Saber que, por exemplo, um professor de matemática, pode enxergar em algum


momento algo que potencializa a discussão sobre a questão das formas
geométricas ou do sistema métrico. Ele pode construir uma câmera, que é um
objeto tridimensional, que tem uma medida, e que no final vai nos permitir ver
uma imagem", demarca. “Mas o educador não pode enxergar isso como ensino
de fotografia nunca. Ele tem que enxergar o percurso interessante para a
obtenção de uma imagem. Um auxílio”46

44 CHIKAOKA, 2010.
45 Morin em Os sete saberes necessários à educação do futuro também valoriza o erro como enquanto
instrumento de aprendizagem.
46 Disponível em: ,https://diariodonordeste.verdesmares.com.br/editorias/verso/fotografia-para-
educar-1.409563>.
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Considerações Finais

Partindo da ideia que “a educação é uma mudança de estado”47 as dinâmicas relatadas


fazem interface no plano da emoção, em que a finalidade não é unicamente o fazer
fotográfico, mas criar um processo inspirador. Espaços tempos, Ma, para que a experiência
aconteça. Assim como Miayazaki diz “o que realmente importa são as emoções subjacentes”,
Chikaoka coloca que o se sente é mais importante. Porque o que vai permanecer, é o
sentimento.48 E diz: “Acredito que o encontro com a essência que nos enlaça é o antídoto
contra o desperdício”. 49
Miguel Chikaoka incentiva as pessoas a buscarem seus caminhos individuais,
passando ou não pela fotografia. Conforme coloca Silvio Gallo (2008) experiência educativa
pode ser repetida, mas sempre gerará diferença. “Cada singularidade é a dobra do eu no outro
e do outro no eu.”50

“Educar significa lançar convites aos outros; mas o que cada um fará – e se fará
– com estes convites, foge ao controle daquele que educa. Para educar, portanto,
é necessário ter o desprendimento daquele que não deseja discípulos, que
mostra caminhos, mas que não espera e muito menos controla os caminhos que
os outros seguem. E mais: que tenha ainda a humildade de mudar seus próprios
caminhos por aquilo que também recebe dos outros”.51

Adriele Silva, em entrevista a pesquisadora em março de 2019, conta o caminho que o


Fototaxia seguiu:

“Fototaxia se converteu em um grupo de estudos vinculado ao NFE, e


atualmente encontra-se inativo. Porém, o tempo que esteve ativo, tinha algumas
frentes de trabalho: arrecadação de fundos para ser auto gerido e outra de
pesquisa, leitura e organização de práticas entre o próprio grupo. Até que até
que surgiu a oportunidade de unir teoria e prática, vincular ao projeto Circular52 ,
onde a associação participa com a ação FotoAtiva Portas Abertas. O grupo de
estudos Fototaxia entendeu que aquele evento era muito potente. E começaram
a preparar algumas atividades que estariam vinculadas a programação dos

47 DELEUZE, 2006, p. 238 apud. GALLO


48 CHIKAOKA, 2010 Apud. VIANA, 2010.
49 CHIKAOKA, 2015.
50 GALLO, 2008.
51 GALLO, 2008.
52O projeto Circular emerge da necessidade de revalorizar o Centro Histórico da Cidade de Belém, atenta ao
potencial da diversidade de espaços, coletivos e empreendimentos culturais sediados nos bairros da Campina,
Cidade Velha e Reduto. Com a adesão de um número cada vez maior de membros, organiza atividades
culturais em estabelecimentos e praças públicas da região e a mobiliza processos educativos para jovens e
adultos dos bairros do projeto e demais circulantes interessados. Disponível em: <http://
www.projetocircular.com.br/institucional/o-projeto/> Acesso 25 de março de 2019.
!22
Circulares: oficinas, experimentações que eram de crianças para crianças, de
adultos para crianças, de adultos para adultos. Pintura em tecido, avião de papel,
origami, fanzine, experiências de brincadeiras, elástico, peteca, bolinha de gude,
boli-boli muitas oficinas. A ideia era ocupar a praça para brincar. O grupo
desenvolveu kit dos jogos, ensinando como brincar. Os participantes do
Fototaxia propunham, organizavam estas atividades e disponibilizavam para o
público. Hoje o que fica do Fototaxia é a ideia que todo que de certa maneira
partilhou dessa tempo, desse espaço de experiencia, de vivência, se tornou um
multiplicador dessas ideias. De como trabalhar de maneira mais integrada com o
mundo. Como pensar uma educação que é mais abrangente, no sentindo que não
é só instrução, mas que é sentimento, é troca afetiva. Ter a sensibilidade para
estar com o outro, ouvir o outro, é o primeiro passo. Que os outros nos ensinam
muito, o tempo todo. E que quando estamos no papel de facilitador ou
facilitadora, as vezes é uma questão de disponibilizar os materiais, que a magica
acontece sozinha, as pessoas por si, conseguem dar conta das experiencias.”

Portanto, “educar com a luz, para a luz” são convites que Miguel Chikaoka lança para
a educação para a liberdade. “Segundo ele, a luz é mais do que luz propriamente dita, está
numa perspectiva de plano aberto, é repetindo o olhar na direção dela que se leva a planos que
anteriormente não tinha.”53 Chikaoka (2014) fala que tudo é uma questão de ponto de vista, se
está esta cansado é porque esta olhando da mesma maneira. Que é preciso desdobrar, para não
perder o dom da investigação, como a criança, estar sempre em uma via pulsante, como poeta
Manuel de Barros que reinventa as palavras.
A Pedagogia da Luz nos ensina a expandir o olhar acerca dos fragmentos, reivindica o
conhecimento e educação como algo abrangente e trabalha com a imagem fora dos valores
dominantes. No exercício da complicada arte de ver, tentar revelar o Eu, o Outro e a História
que a história não conta54. Através da ‘escrita da luz’ 55, a ação tem como base a engrenagem
do sentir, observar, olhar para dentro, refletir, encontrar o outro, trocar ideias, entender o
mundo, depositar anseios, inventar, explorar possibilidades, absorver saberes, experienciar o
caos, experimentar o imprevisível e tirar suas próprias conclusões.

“Na verdade somos todos uma luz efêmera, mas uma luz que está aqui e agora e
que, ao se “apagar” vai se transformar, para os que ficam, no que chamamos de
morte. Essa ausência de luz é na verdade um outro estado de luz. […]
precisamos estar do outro lado da luz para ver a luz. É como morrer para ver a
vida. Há um provérbio zen que diz: “Só encontrará a vida quem a perdeu”.
Considero que a percepção e contato com a luz nesse processo é uma
oportunidade para expandirmos a leitura da luz para além da matéria. Não é por
nada que, em todas as culturas, a luz se faz e desfaz
simbolicamente” (CHIKAOKA, 2010)56


53 BRITO, Y; COSTA, V; PINHEIRO, V., 2015.

54Samba-enredo da Mangueira, campeã do carnaval carioca de 2019 que diz: “Tem sangue retinto pisado, atrás
do herói emoldurado. Mulheres, tamoios, mulatos. Eu quero um país que não está no retrato”
55 Como podemos traduzir o termo grego fotografia.
56 Entrevista. MESTRE do desenho com a luz. Publicada no jornal Diário do Pará, 2010.
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