Júnior A Primeira Entrevista não corresponde necessariamente à primeira sessão, e sim a todas as sessões iniciais que se realizam até que se possa obter uma percepção relativamente clara da dinâmica do cliente, ou seja, a totalidade do seu padrão de interação no campo organismo-meio ambiente, o que inclui os pontos de fluidez e os pontos de interrupção nesta dinâmica. Podemos dividir a Primeira Entrevista em três partes: Estabelecendo o vínculo Explorando dados Delineando uma percepção “diagnóstica” Trata-se de uma divisão eminentemente didática, pois estas partes acontecem quase que concomitantemente na prática. Porém, é de vital importância que o terapeuta respeite a predominância de uma, em detrenimento das outras, de acordo com o momento em que se está da Primeira Entrevista, ou seja, se no começo, no meio ou no fim. Estabelecendo o vínculo O que justifica o terapeuta priorizar o estabelecimento de vínculo no início da Primeira Entrevista é o fato de que, sem este, a exploração de dados fica seriamente prejudicada e conseqüentemente, também a delineação “diagnóstica”, pois sem vínculo o cliente não traz os dados de forma clara e ampla, tornando-se difícil a obtenção de um fechamento “diagnóstico”, e assim, a efetivação de uma Primeira Entrevista. Na verdade, se o estabelecimento de vínculo não ocorre, raramente o cliente permanente vindo às sessões, interrompendo com muita facilidade a continuidade do processo terapêutico. A postura do terapeuta diante do cliente é o primeiro aspecto que eu quero aqui abordar, pois tal postura é fundamentada numa visão filosófica própria como também num corpo teórico específico, principalmente a Teoria de Campo e o Método Dialógico. O vínculo terapeuta-cliente não é algo unilateral, algo que provém do cliente em relação ao terapeuta, e sim algo – proporcional e bilateral, que ocorre entre o terapeuta e o cliente, ou seja, na proporção em que o cliente vai “dando” ao terapeuta o lugar de terapeuta, o terapeuta vai “dando” ao cliente o lugar de cliente, e assim vice- versa. O cliente sempre sinaliza para o terapeuta, através de palavras e atitudes mais ou menos intencionais e/ ou conscientizadas se o terapeuta o está ou não acompanhando para o estabelecimento de vínculo. É muito importante que o terapeuta considere o nível de conscientização que o cliente possui de sua própria dinâmica, como também o nível de evitação que este possui em relação a mudanças, pois estes níveis caminham de acordo com a maior ou menor existência de suporte interno e/ ou externo no campo do cliente e, dessa forma, precisam ser respeitados, neste momento inicial da Primeira Entrevista. Explorando dados Havendo o vínculo, o terapeuta pode ficar mais a vontade para centrar-se na exploração de dados. Explorar dados significa o terapeuta apreender, através de seu próprio aparato perceptivo, afetivo e cognitivo, o manifestar-se do cliente, no seu aspecto verbal e não verbal (corporal), na sua forma e conteúdo, ou seja, na totalidade de seu manifestar-se, seja esta conscientizada ou não pelo cliente no momento. Então o terapeuta apreende com sua totalidade uma outra totalidade, que é o cliente, onde as “informações” que ele traz, a maneira como as organiza e transmite para o terapeuta, sua movimentação corporal, e o “desenho” que ele vai, mais ou menos conscientemente, fazendo de si mesmo na relação com o seu mundo, constituem esta totalidade. A função do terapeuta nesta etapa, em que a exploração dos dados é figura, consiste no caminhar com o cliente no sentido da “simples” clarificação do que está acontecendo no campo organismo- meio ambiente para uma compreensão e delineação da queixa daquilo que realmente motiva o cliente à terapia. Eu saliento isto, porque muito freqüentemente observo que, por vezes, alguns terapeutas priorizam um “trabalhar” com o cliente num momento em que a simples exploração de dados deveria ser figura, ou seja, eles intencionam trabalhar com o cliente, sem que a Primeira Entrevista tenha sido efetivada. Distinguimosa existência de dois tipos de questões que o terapeuta dirige ao cliente: Questões de Frente e Questões de Bolso. Elas também tecem uma relação de figura e fundo na apreensão do terapeuta ao cliente. a) Questões de Frente: São questões que o terapeuta, desde a chegada do cliente à sessão, começa a dirigir ao cliente. São essas: a-1) “O QUE ESTÁ ACONTECENDO?” – Traz dados do conteúdo do que está acontecendo. a-2) “COMO É ISTO QUE ESTÁ ACONTECENDO?” – Traz dados que especificam e particularizam o conteúdo daquele cliente. a-3) “ONDE E QUANDO ACONTECE?” – Traz dados que contextualizam, em termos de espaço e tempo e de objetos pertinentes de relação, o conteúdo e a forma deste acontecer específico. a-4) “ONDE E QUANDO MAIS ACONTECE?” – Traz dados mais apurados de padrão de interação do cliente, uma vez que tal padrão é desfocado da exclusiva correlação com um único objeto de relação e/ ou espaço e tempo. a-5) “DESDE QUANDO ACONTECE?” – Traz dados de um passado mais ou menos remoto e que está totalmente engajado no momento presente do cliente, como também dados da intensidade qualitativa do que acontece relacionada à quantidade de tempo em que “isto” vem acontecendo. a-6) “O QUE, COMO, ONDE E QUANDO ACONTECEU ESTE MOMENTO?” – Traz dados mais detalhados deste passado pertinente ao presente, possibilitando um entendimento aprofundado, na sua origem, da maneira como este está organizado na percepção atual do cliente. Devido ao fato de o terapeuta ter como função primordial a percepção de intervenção na fronteira-ego de contato do cliente, ele exerce então duas posições que também tecem uma relação de figura e fundo, ou seja, de predominância de uma em detrimento de outra, conforme o momento presente da sessão. Uma é de observador e mediador da comunicação EU-NÃO EU, o que mais comumente conhecemos como a comunicação organismo- meio ambiente. A outra posição é de “simples e puro” objeto de relação, aquele que se diferencia como um NÃO EU para o Eu-cliente, seja esta relação mais ou menos transferencial.
Então, num dado momento, é figura a relação
do cliente com as “suas coisas” e, em outro momento, é figura a relação dele com o terapeuta. Assimcomo sempre nos é importante saber das características que o cliente salienta à sua percepção de cada objeto de relação em destaque no seu campo, é igualmente importante estarmos conscientes das nossas características particulares, enquanto pessoa-terapeuta, para sabermos quais dessas características transmitimos para o cliente e quais e como ele ressalta na sua própria percepção. Uma vez que o cliente que procura terapia, na maioria das vezes, está confuso na sua visão e ação no mundo, torna-se essencial que o terapeuta esteja o mais possível clarificado de sua posição (postura) diante do cliente, pois só assim este poderá se oferecer como referencial estável de relação para que o cliente se vincule e inicie o encontro consigo mesmo. Uma postura aberta, receptiva e uma intervenção fenomenológica, ou seja, que retrate com o mínimo de interpretação possível o que está sendo manifestado pelo cliente em termos daquilo que lhe acontece, são pontos que também favorecem o estabelecimento do vínculo, pois uma vez que o cliente se sente bem recebido e “compreendido” amplamente dentro da sua situação, ele se vincula ao terapeuta e vice- versa. b) Questões de Bolso: São questões, de caráter mais informativo do que descritivo que o terapeuta mantém à parte, até que se faça oportuno dirigi-los ao cliente, evitando assim uma investigação do tipo “pergunta-resposta” e propiciando que os dados obtidos dessa forma, venham de maneira mais ampla e contextualizada para o terapeuta.
As “Questões de Bolso” não são tão
determinadas e específicas quanto às de frente. Elas variam em número e forma conforme cada cliente e terapeuta mas, mesmo assim, enumerarei algumas que considero importantes: b-1) Genetograma da família atual, situando dados como: idade, posição, profissão, estado civil, religião, sexo do cliente e dos demais membros dessas famílias ou dessa “grande” família. b-2) Forma de interação do cliente com sua família, seu chefe e/ ou colegas de trabalho, seus amigos e conhecidos, seus “inimigos” e estranhos, seu parceiro “amoroso” (namoro ou casamento).
Os dados da história pessoal do cliente como da de
sua família são de vital importância para que se possa compreender a dinâmica do mesmo. O principal interesse do Gestalt-terapeuta na exploração de todos estes dados, não é tanto descobrir a veracidade ou não dos fatos e sim saber, juntamente com o cliente, como ele organiza estes dados no seu campo perceptivo e que tipo de ação se dá, a partir dessa forma de organização, pois toda pessoa age com ela mesma e com o mundo que a circunda, a partir da forma como percebe a si-mesma e este mundo. Delineando uma percepção “diagnóstica”
Quando se faz claro, numa unidade total de
interação do cliente com seu “específico” meio, retratando os aspectos mais estáveis e, como também, os mais mutáveis do seu padrão de funcionamento, chegamos então ao final da “Primeira Entrevista”.
O que denota que temos, então, um parecer
“diagnóstico” do cliente, ou seja, da forma como ele funciona com o meio, que faz com que se interrompa ou restrinja seu contato organismo- meio, podendo-se afirmar, então, que ele está ou tem um problema. Não existe problema em si e, sim, uma interação organismo-meio que não leva à satisfação organísmica e que assim chamamos de problema. E para entendermos como se constitui um problema, é necessário sabermos como a pessoa participa para a manutenção deste problema, ou seja, suas razões organísmicas para tal forma de interação com o meio, como também, as características particulares deste meio (objeto de relação) com o qual a pessoa está em interação. Na constituição de um problema sempre há a presença de 3 (três) pontos:
1- O que acontece 2- O que a pessoa faz 3- Não satisfação
Na grande maioria das vezes a pessoa parte do
ponto nº 01 (o que acontece) e em seguida para o ponto nº 03 (não satisfação), nunca situando ou situando de forma insuficiente o ponto nº 02 (o que ela faz). Incluímos aqui o ponto nº 04, representando a EFETIVA MUDANÇA, pois é exatamente o ponto onde a pessoa (cliente) quer chegar, ou seja, ela quer que toda a configuração situacional se transforme sem ser preciso entrar em contato com o que ela faz (ponto-2). Isto é impossível; uma vez que a minha interação organismo-meio é a mesma, os resultados obtidos continuarão os mesmos, nenhuma mudança acontecerá. Metaforicamente falando, é como a pessoa querer que os ovos cozidos que ela come todas as manhãs tenha uma consistência mais líquida, ao mesmo tempo, que continua aplicando o mesmo tempo de cozimento que os leva a ficar mais sólidos. Toda forma de ação que não leva à satisfação, detona pontos de interrupção no padrão de interação do organismo com seu meio, que aparecem, conforme a forma de cada pessoa funcionar, em diferentes momentos, desde a formação até a destruição da Gestalt, delineando assim uma dinâmica da pessoa, ou seja, um “diagnóstico” do funcionamento do campo (organismo + meio ambiente). O ponto de interrupção é correlacionado e/ ou situado dentro do processo de formação e destruição de gestalten, das quatro qualidades de contato (perceptiva-afetiva- cognitiva e motora), da função ego alienação-assimilação, das fases do desenvolvimento da pessoa, segundo Fritz Perls, de um diagnóstico diferencial entre neurose e psicose e entre dinâmica histérica, dinâmica depressiva e dinâmica obsessiva, dentro da visão de saúde e doença da Gestalt Terapia. satisfação Pessoa faz