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Os direitos obrigacionais, como foi estudado nos semestres anteriores, qualifica-se por
ser um vínculo jurídico estabelecido entre duas pessoas, por meio do qual o credor exige
do devedor uma prestação (dar, fazer ou não fazer), de modo que o dever específico
vincula uma pessoa à outra. Nesse sentido, são direitos subjetivos relativos, os quais têm
como objeto da relação uma prestação do obrigado. Geram EFEITOS RELATIVOS
(apenas entre as partes).
Os direitos reais, por seu turno, estabelecem-se por vínculo jurídico entre o titular do
direito real e a coletividade, a qual tem dever negativo, isto é, não pode prejudicar o titular
do direito real, qualificando-se por um dever de abstenção. O objeto dessa relação é a
coisa sobre a qual se exercitam as faculdades dominiais de usar, dispor e gozar. Geram
EFEITOS ABSOLUTOS (eficácia erga omnes), ou seja, é possível ter em relação a todos,
até mesmo contra o dono da coisa, caso ela esteja em sua posse.
Características fundamentais dos direitos reais:
a) Absolutismo: são poderes que garantem ao titular do direito real dominação sobre o
objeto. Essa dominação é tão importante que ela é oponível erga omnes, já que sujeitam
a coletividade ao dever de abstenção. Se caracterizam pelo verbo TER (um poder sobre
os bens), o que lhes confere maior duração e estabilidade.
a. Interessante pontuar aqui que os direitos reais são exercidos diretamente
sobre a coisa, com o titular satisfazendo suas necessidades econômicas sem
intervenção de terceiros, sendo portanto ius in re. Como contraponto, os
direitos obrigacionais, titular do direito satisfaz suas necessidades
econômicas por meio de conduta cooperativa do devedor, sendo ius ad rem.
b) Sequela: é a mais importante manifestação da situação de submissão do bem ao titular do
direito real, já que ela permite ao titular do direito real a perseguição do bem onde quer
que ele esteja, tendo ação específica para isso. A sequela decorre do absolutismo, pois se
é possível exigir de todos um dever de abstenção, evidente que pode ser retirado o bem
de quem viole este dever geral.
c) Preferência: consequência da sequela, consiste no privilégio do titular de direitos reais
obter pagamento de débito com o valor do bem.
d) Taxatividade: em razão da sua eficácia erga omnes, absoluta, a criação dos direitos reais
depende da vontade do legislador. A sua força é tamanha que não pode ser criado ao
arbítrio das partes, estando os direitos reais elencados no rol taxativo do art. 1.225 do
Código Civil.
a. A título de ilustração, temos que o último direito real incluído no rol taxativo
acima descrito foi o direito de laje, por meio da Lei 13.465/2017, sendo incluída
no inciso XIII, fato que corrobora com a taxatividade dos direitos reais.
e) Tipicidade: apesar da taxatividade dos direitos reais, a tipicidade proporciona espaço para
que a autonomia privada atue, desde que respeite os limites impostos pelo legislador, e
possa inovar e dar sentido aos direitos reais. Diz-se que a tipicidade é elástica, pois
permite modelar o direito real à situação concreta.
Finalmente, deve-se compreender que a propriedade é tida como o direito real originário, a partir
do qual se examina todo o universo de direitos reais. Ela só é a chave para a compreensão dos
demais direitos reais por ter em seu conteúdo interno o domínio, o qual se materializa pela
possibilidade de o titular da coisa exercer poderes (ou faculdades) de uso, gozo e disposição da
coisa, além de poder reavê-la.
Unidade II - Posse
Conceituação: A posse é um fato, bem como um direito real, apesar de não estar prevista no rol
do artigo 1225. A posse pode ser considerada um direito subjetivo patrimonial, sendo avaliável
economicamente e produzindo efeitos também dessa ordem. Por outro lado, satisfaz também
necessidades extrapatrimoniais.
Teorias da Posse
3. Teoria Eclética
Usa muito da teoria de Ihering, por óbvio. Apenas se aparta dela para dar à posse autonomia
necessária.
Natureza da Posse
Professor entende que a posse tem natureza jurídica de direito real, já que tem a coisa como objeto
da relação jurídica, sujeição direta e imediata da coisa ao titular do direito, eficácia erga omnes.
Portanto, cumpriria os requisitos ensejadores dos direitos reais.
Detenção
Para Savigny, seria a situação em que não há animus domini. Para Ihering, a regulamentação do
direito objetivo, sendo o detentor aquele que perdeu a proteção possessória em razão de óbice
legal. Em razão do nosso sistema ter consagrado a teoria objetiva de Ihering estabelecendo a
regulamentação do obstáculo legal. Assim, a detenção é a posse degradada, juridicamente
desqualificada pelo ordenamento, sendo as hipóteses:
a) Os servidores da posse (fâmulos da posse) – Art. 1.198
São os fâmulos da posse aqueles que exercem poder de fato sobre a coisa em nome de outrem
(real possuidor), sob sua ordem.
Podemos compreender que esta modalidade depende de relação subordinativa entre os
sujeitos, sendo que o real possuidor dá ordens que o detentor cumpre, isto é, é uma
atuação sem autonomia do detentor. O detentor, além disso, tem o dever de conservar a
coisa, podendo ser restituído das despesas de conservação, e o dever de informação de
eventual moléstia à posse.
Nos termos do enunciado 493 do Conselho de Justiça Federal, apesar de não ter tutela
judicial da posse, pode o detentor exercer o desforço imediato ou a legitima defesa da
posse – desde que o faça em nome e em proveito do possuidor.
Exemplo: o professor Marcelo faz uso de uma caneta na sala de aula. Essa caneta não lhe
pertence, tampouco está em sua posse, apesar dele exercer atos de posse. Ele é detentor
da coisa, que pertence, na realidade, à UFMG, autarquia a qual ele é subordinado.
Permissão é a autorização expressa do possuidor para que o terceiro use a coisa, ou seja,
é um ato POSITIVO e PRÉVIO do possuidor.
o Ex.: é o empréstimo de caneta em sala de aula, em que há pedido prévio de um
colega ao outro.
Tolerância é o consentimento tácito do uso da coisa, sendo este uso transitório e podendo
ser suprimido. Portanto, é ato NEGATIVO.
o Ex.: ainda usando do “empréstimo”, quando um colega usa do computador de
outro sem prévio aviso, sendo que aquele ao notar a situação a franqueia pelo
período do intervalo.
d) Atuação em bens públicos de uso comum do povo ou de uso especial – art. 100 do CC
Opção legislativa de proteger o bem público, evitando que o particular possa possuir aquilo que
seria público. Grande discussão existe em razão de qual bem público seria esse, se tudo aquilo
que for público ou apenas os bens que cumprissem a função de prestação de serviços públicos.
Discussão é de direito administrativo, mas a doutrina tende ao bem público que é utilizado com
essa finalidade pública, que efetivamente cumpra a finalidade a que o Estado se presta.
EFEITOS DA DETENÇÃO:
O detentor não tem legitimidade para as ações possessórias (tutela jurisdicional). Apesar
disso, ele poderá exercer o direito de sequela contemporâneo à agressão (mediante
autotutela), desde que em nome e proveito do possuidor, mas não poderá, por vias
judiciais, reaver o bem que lhe foi injustamente tomado.
Interversão dos atos de posse: inércia no tempo (critério objetivo) + crença de agir em
nome próprio (critério subjetivo). Quando o detentor passa a exercer os atos de posse não
mais em nome de outrem, mas em nome próprio, deixando de ser um fâmulo da posse,
por exemplo. Exemplo disso é o do empregado que passa a agir em nome próprio, após a
inércia do dono do terreno. Nesse ponto, começará a correr o tempo para efeitos de
usucapião (usucapião = posse + tempo) e a propriedade poderá ser invertida.
o Interversão pode ser unilateral (como no exemplo), de acordo com o enunciado
237 aprovado na III Jornada de Direito Civil.
o Pode ser bilateral, como o exemplo do contrato de compra e venda entre o
detentor e o possuidor.
Classificações da posse
Atenção ao fato de que a boa-fé não está sujeita a toda e qualquer atividade ou relação.
Exemplo disso é o artigo 1268, que restringe a proteção da boa-fé apenas para quando a
coisa for oferecida ao público, em leilão ou estabelecimento comercial. Isso não significa,
lado outro, que não restará caracterizada a posse de boa-fé, que ensejará certas garantias,
como, por exemplo, o possuidor de boa-fé não será acusado de receptação, bem como
poderá fazer jus ao valor pago, por meio da restituição. Um problema que surge é com
relação à compra de bens imóveis, adquiridos de boa-fé, sob a falsa aparência do registro,
vendida por um não proprietário. Nessa seara, destaca-se o artigo 1247, que traz o direito
do proprietário real do imóvel a reivindicá-lo, independente da boa-fé. Uma exceção é a
do artigo 1242, que é uma modalidade de usucapião, a ser tratada posteriormente.
Interversão da Posse
Não obstante a regra do art. 1.203 estabelecer que a posse manterá caráter de sua aquisição,
existem situações que podem mudar este caráter da posse. A mudança de comportamento de quem
detém a coisa é fundamental para transformar a detenção em posse injusta, mas não para
transformar posse injusta em posse justa. Todavia, em algumas situações, pode haver a mudança
da causa possessionis:
a) Fato de natureza jurídica
São sanados os vícios de origem da posse por meio de relação jurídica real ou obrigacional,
transformando a posse injusta em justa. Necessariamente BILATERAL.
Exemplo: o possuidor injusto, após certo tempo, decide celebrar um contrato de compra e venda
com o possuidor antigo, sanando o vício que contaminava sua posse.
b) Fato de natureza material
São atos exteriores e prolongados do possuidor de inequívoca intenção de privar o proprietário
do poder de disposição sobre a coisa. A mudança é considerada não porque há uma vontade do
possuidor, mas uma desídia do proprietário, que não exerce seu direito de sequela, de modo que
sua reiterada omissão gera uma expectativa de direito tal no possuidor que este passa a ter animus
domini.
O Enunciado 237 da Jornada de Direito Civil do Conselho da Justiça Federal estabelece ser
cabível a interversão na hipótese em que o possuidor direto demonstrar ato exterior e inequívoco
de oposição ao antigo possuidor indireto, tendo por efeitos a caracterização do animus domini.
Aquisição da Posse
O art. 1.204 estabelece qual o momento em que será considerada a aquisição da posse: Adquire-
se a posse desde o momento em que se torna possível o exercício, em nome próprio, de qualquer
dos poderes inerentes à propriedade.
Importante ressaltar que a relação contratual é a mais comum forma de aquisição da posse, mas
que ela, por si só, não transfere posse. É necessária a tradição da coisa para que haja efetivo
exercício dos poderes.
Modos de Aquisição da Posse:
1. Originária (posse natural): não pressupõe relação intersubjetiva, mas quando pessoa
pratica, de forma pública e reiterada, atos que demonstram a sujeição do bem ao seu
titular. Exemplo: sujeito adquire o objeto mediante roubo ou quando uma pessoa encontra
um livro perdido na rua. Não se cogita vícios anteriores que maculem essa posse.
2. Derivada (posse civil): surge a partir de uma relação intersubjetiva, pressupondo a
existência de uma posse anterior, a qual será transmitida ao novo possuidor. Como a posse
deriva de outra, pode ser ela contaminada pelos vícios genéticos da posse anterior.
3. Singular: a aquisição singular ocorre quando é possível determinar o objeto da aquisição.
Exemplo: aquisição exclusiva sobre um telefone celular.
4. Universal: ocorre quando não se pode determinar ou especificar o objeto da posse.
Exemplo: doação transfere 30% dos bens de certo indivíduo a uma entidade, de modo
que não há individualização da coisa, mas apenas a universalidade de seu acervo
patrimonial.
5. Inter vivos: pressupõe relação intersubjetiva com declarações de vontade. Exemplo:
contrato bilateral de compra e venda.
6. Causa mortis: fato decorrente da morte, pode ser gerada também a posse, como a herança,
como postula o artigo 1784 do CC. É o direito de saisine.
Quem pode adquirir?
Os menores de 18 anos e portador de transtornos mentais que apreendam o bem e pratiquem atos
possessórios. Em razão disso, têm direito à tutela possessória judicial, por meio de representação
ou assistência em juízo.
Posse pode ser adquirida por representante do possuidor (aquele que tem mandato ou não – caso
do caseiro, o qual tem um contrato de trabalho que não é, em si, mandato), por terceiro sem
mandato, dependendo de ratificação e, por fim, por entes despersonalizados.
União de posses
É a continuação da posse pela soma do tempo do atual possuidor com o de seus antecessores,
como se diferentes posses se reduzissem a uma só. Em razão disso, o art. 1.206 estabelece que a
posse causa mortis é transmitida com os mesmos caracteres. O art. 1.207 explicita que o sucessor
universal continua a posse do sucessor, enquanto ao sucessor singular é facultado unir sua posse
à do antecessor, para efeitos legais. Assim, importante diferenciar a sucessão da acessão.
a) Sucessão (sucessio possessionis): não há aquisição da posse, mas passagem da posse por
inteiro, sem se destacar da posse antiga. Isso faz com que não sejam afetadas as
qualidades da posse, isto é, se ela é injusta, de má-fé, sem justo título, mantendo o caráter
que tinha anteriormente.
b) Acessão (accessio possessionis): sempre se verifica por ato inter vivos, por meio de
relação jurídica. Cria-se a possibilidade do novo possuidor de unir sua posse à do
antecessor, cujas qualidades serão mantidas. A posse nova, desligada da anterior, tem
vantagem de ter justo título, o que permitiria usucapião especial, mas a contagem do
tempo será do início dos exercícios dominiais. Assim, se houver qualquer vício na posse
anterior, ele será mantido, tendo o novo possuidor apenas a faculdade de separar a sua
posse da anterior.
Efeitos da Posse
I) Efeitos Econômicos
1. Direito aos Frutos
Os frutos são as utilidades econômicas que as coisas periodicamente produzem, cuja percepção
não gera perda ou fim da coisa. São explicitados em três categorias:
4. Ações Possessórias Atípicas: são mecanismos que não foram pensados exclusivamente
para tutelar a posse, mas o fazem, incidentalmente.
a. Reivindicatória: a causa de pedir é a propriedade, mas pode ter como objeto a
tutela da posse. Deverá ser apresentado o registro imobiliário registrado no
cartório de registro de imóveis. Desvantagem: processada pelo procedimento
comum, fazendo com que a satisfação do direito possa ser mais lenta, ainda que
seja possível a antecipação da tutela jurisdicional, de acordo com o art. 300 do
CPC. Assemelha-se à reintegração de posse, mas a causa de pedir é diferente.
b. Imissão na posse: ação pela qual o novo proprietário quer ter a posse, contudo
jamais a teve, buscando por essa ação ter posse pela primeira vez.
c. Nunciação de obra nova: ação pautada no direito de vizinhança, nos casos de
construção, concluída ou não, que tem potencial ou já tenha causado dano.
Objetiva resguardar a incolumidade pública ou dos imóveis de vizinhos. Não
necessariamente haverá a desconstrução da obra, mas a sua regularização.
d. Ação demolitória: ação que visa a desconstrução de obra ainda não concluída,
porquanto afeta o imóvel do autor da demanda.
e. Ação de dano infecto: obra já concluída, em péssimo estado de conservação. A
ação visa a desconstrução da obra.
f. Embargos de terceiro: é a ação que tem o terceiro, que não é parte da relação
processual, mas sofre com seus efeitos. É regulado pelo artigo 674, CPC/15.
Perda da Posse
A posse é perdida quando se deixa de exercer de fato o domínio.
Segundo o art. 1.223 do CC, a perda da posse exercida sobre alguma coisa irá ocorrer quanto o
possuidor deixar de exercer o poder fático-dominial sobre a coisa, ainda que contra a sua
vontade.
Por seu turno, o art. 1.224 estabelece que se considera perdida a posse para quem não presenciou
o esbulho, quando, tendo notícia dele, se abstém de retornar a coisa, ou, tentando recuperá-la, é
violentamente repelido.
Assim, são as formas de perda da posse:
1. Abandono: é a renúncia à posse de alguma coisa em razão da
manifestação, da intenção de deixar ou largar aquilo que lhe pertence.
Torna-se res derelicta (coisa abandonada).
2. Tradição: é o ato de entregar coisa móvel. A partir da entrega, perde-se a
posse.
3. Perda da posse: dá-se por acontecimento involuntário, contra vontade do
possuidor. Aquele que encontra a coisa tem o dever legal de devolvê-la ou
entregar à autoridade competente.
4. Destruição da coisa: é o perecimento total do objeto. Em a coisa deixando
de existir, impossível se faz o exercício de poderes fático-dominiais sobre
ela.
5. Pela posse de outrem: dá-se por meio do esbulho.
6. Pela apreensão ou sequestro da coisa: dá-se por determinação policial ou
judicial que retira a coisa da posse de alguém.