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METAFÍSICA E MODERNIDADE:
Método e Estrutura,
Temas e Sistema em
Henrique Cláudio de Lima Vaz
1
Rubens Godoy Sampaio
METAFÍSICA E MODERNIDADE:
Método e Estrutura,
Temas e Sistema em
Henrique Cláudio de Lima Vaz
2
CERTIDÃO DE DOUTORAMENTO
3
DEDICATÓRIA
À minha Esposa
Luciana,
4
AGRADECIMENTOS
Ao Amigo
Marcelo F. de Aquino,
grande incentivador deste trabalho e
orientador do meu trabalho de mestrado
5
SUMÁRIO
Abreviaturas ........................................................................................................................................................................ 7
Abstract ................................................................................................................................................................................ 8
Resumo................................................................................................................................................................................. 9
INTRODUÇÃO..................................................................................................................................................................... 10
PRIMEIRO CAPÍTULO – APRESENTAÇÃO TEXTUAL-CRONOLÓGICA DOS TEMAS DE LIMA VAZ .......................... 16
SEGUNDO CAPÍTULO – A METAFÍSICA DO EXISTIR ...................................................................................................... 82
TERCEIRO CAPÍTULO – A COMPREENSÃO GENÉTICA DA MODERNIDADE............................................................. 145
QUARTO CAPÍTULO – O MÉTODO DIALÉTICO E A REMEMORAÇÃO FILOSÓFICA ................................................. 183
QUINTO CAPÍTULO – UM SISTEMA ABERTO: VIA COMPOSITIONIS E VIA RESOLUTIONIS ..................................... 225
CONCLUSÃO .................................................................................................................................................................... 263
6
ABREVIATURAS
AF I – Antropologia Filosófica I
Lima Vaz
AF II – Antropologia Filosófica II
Lima Vaz
7
ABSTRACT
8
RESUMO
9
INTRODUÇÃO
O confronto
A partir da constatação da clausura dos escritos sistemáticos de Lima Vaz, entre a
razão moderna
esta tese quer demonstrar que seu pensamento é uma resposta ao problema que o e o tema do
Absoluto
acompanha desde o início de seu iter filosófico: os encontros e desencontros da
razão moderna com o problema filosófico da afirmação do Absoluto. Os dois termos
desse diálogo desdobraram-se, por um lado, na apresentação em chave dialética da
metafísica do existir de Tomás de Aquino e, por outro lado, num trabalho de
inquirição sobre o processo da gênese da modernidade, isto, é as raízes da
modernidade. Esses dois grandes eixos, é a tese aqui defendida, constituem o
fundamento metafísico que estruturam o pensamento vaziano, e sob o qual se
ergue o seu sistema, tanto na vertente antropológica, quanto na vertente ética. Em
outras palavras, a compreensão vaziana da tensão entre razão moderna e
metafísica apresenta-se na forma de um sistema 1. com uma base teórica de
inspiração tomásica, fundada na metafísica do existir e 2. com uma base
metodológica de inspiração dialética (platônico-hegeliana).
10
A leitura temático-diacrônica se constitui mediante a reflexão nascida Leitura temático-
diacrônica:
do confronto entre os grandes temas desenvolvidos pela razão moderna e a a. A metafísica do
Existir
afirmação do Absoluto. Ela se realiza, por um lado, mediante a exposição b. Genética da
Modernidade
ininterrupta da metafísica do existir gestada ao longo do pensamento clássico greco-
cristão e plenamente desenhada por Santo Tomás. Platão, Aristóteles, o
Neoplatonismo, eventualmente Santo Agostinho, e o próprio Tomás de Aquino são
os autores frequentados por Lima Vaz. A compreensão genética da modernidade,
por outro lado, fecha o arco do diálogo da razão moderna com a questão do
Absoluto . Em outros termos, a constituição e a articulação lógico-dialética da
metafísica do existir, e a compreensão genética da modernidade são os dois
grandes focos significativos da leitura temático-diacrônica.
Esse tema, da Metafísica do Existir, foi constantemente retrabalhado nos Primeiro pólo
temático
textos de Lima Vaz, sempre obedecendo a essa sucessão de posições relativas à METAFÍSICA DO
EXISTIR
possibilidade humana de compreender o Absoluto. Nos artigos em que aprofundou
o tema, a linha de raciocínio sempre foi a mesma: revisitar as posições dos gregos
antigos e do neoplatonismo para, finalmente, concluir com a doutrina tomásica do
ato de existir.
Segundo pólo
No conjunto de sua obra, a metafísica do existir é exposta numa progressão temático
dialética ascendente. Por sua vez, a gênese da modernidade é tratada mediante o GENÉTICA DA
MODERNIDADE
desenvolvimento sucessivo de temas diferenciados, que vão sendo aprofundados
ao longo da constituição do sistema, sempre a partir de perspectivas diferentes:
modernidade e natureza, modernidade e sujeito, ética, direito, ciência empírico-
formal, e, finalmente, modernidade e metafísica. No fim deste itinerário Lima Vaz
realiza o desvelamento das raízes mais profundas da modernidade deitadas no solo
fecundo do século XIII.
A leitura sistemática levanta o véu da resposta dada por Lima Vaz à tensão Leitura sistemática:
a. via
intrínseca ao confronto entre razão moderna e compreensão do Absoluto. Levanta o compositionis
b. via
véu do sistema. Assim como a leitura temática desdobrou-se em dois pólos, a leitura resolutionis
sistemática caracteriza-se por duas direções, ou sentidos: o sentido para-nós do
discurso (via compositionis / via ascensus) e o sentido em-si do discurso filosófico
(via resolutionis / via descensus).
11
pólos temáticos: o pólo da metafísica do existir (seção C. A colocação do
problema: Ontologia e História / seção D. A herança teológica da modernidade:
Problemas de Fronteira) e o pólo da constituição genética da modernidade
(seção E. Sobre a Ontologia da Natureza: o sujeito e o mundo / seção F. A
passagem da universalidade nomotética para a universalidade hipotético-dedutiva).
Portanto, ainda neste primeiro capítulo, no qual são trabalhados textos pré-
sistemáticos, já se anuncia a presença destes dois temas maiores que nortearam
todo o pensamento vaziano: a metafísica do existir de Santo Tomás de Aquino e o
trabalho minucioso de investigação sobre as raízes mais profundas da
modernidade.
Terceiro Capítulo:
No terceiro capítulo, o foco da investigação está dirigido exclusivamente para
A genética da
o tema da constituição genética da modernidade, também no interior dos textos modernidade nos
textos sstemáticos
sistemáticos. Os passos desse capítulo serão dados através do estudo dos
seguintes tópicos: A. A primazia da categoria antropológica de objetividade, B. A
1
. Os textos Antropologia Filosófica I e Antropologia Filosófica II serão indicados no corpo do texto pela
expressão Antropologia Filosófica e nas notas de rodapé pelas abreviaturas AF I e AF II.
AF I - LIMA VAZ, H. C. de, Antropologia Filosófica I, Coleção Filosofia – 15, São Paulo: Edições
Loyola, 1991, 304 pp.
AF II - LIMA VAZ, H. C. de, Antropologia Filosófica II, Coleção Filosofia – 22, São Paulo: Edições
Loyola, 1992, 261 pp.
2. O texto Escritos de Filosofia III – Filosofia e Cultura será indicado no corpo do texto pela expressão
Introdução à Ética Filosófica 2 serão indicados no corpo do texto pela expressão Ética e nas notas de
rodapé pelas abreviaturas EF IV e EF V.
EF IV – LIMA VAZ, H. C. de, Escritos de Filosofia IV – Introdução à Ética Filosófica 1, Coleção Filosofia
– 47, São Paulo: Edições Loyola, 1999, 484 pp.
EF V – LIMA VAZ, H. C. de, Escritos de Filosofia V – Introdução à Ética Filosófica 2, Coleção Filosofia
– 50, São Paulo: Edições Loyola, 2000, 246 pp.
4
. O texto Escritos de Filosofia VII – Raízes da Modernidade será indicado no corpo do texto pela
expressão Raízes da Modernidade e nas notas de rodapé pela abreviatura EF VII.
EF VII – LIMA VAZ, H. C. de, Escritos de Filosofia VII – Raízes da Modernidade, Coleção Filosofia –
55, São Paulo: Edições Loyola, 2002, 292 pp.
12
inversão da dialética mensurante-mensurado, C. A Unidade da razão, D.
Desarticulação da matriz ternária Princípio-ordem-indivíduo e a absolutização da
práxis, E. As raízes metafísicas da modernidade. Aqui encerra-se a apresentação
do pensamento vaziano a partir da perspectiva temática.
Quarto Capítulo:
O passo seguinte a ser dado, inicialmente no quarto capítulo, é o da
A rememoração
exposição do método com o qual serão interpretados os resultados a que se e os aspectos do
método dialético
chegaram nos três primeiros capítulos. Depois de apresentados os temas mais
importantes da filosofia vaziana, e após a elucidação do seu método, no capítulo
quinto serão apresentadas duas possíveis chaves de leitura do sistema vaziano a
partir das direções do discurso filosófico.
13
Primeira Parte
Metafísica e Modernidade:
as duas chaves de leitura temática
14
Primeiro Capítulo
Apresentação textual-cronológica
dos temas de Lima Vaz
Fase pré-sistemática
15
PRIMEIRO CAPÍTULO –
APRESENTAÇÃO TEXTUAL-CRONOLÓGICA
DOS TEMAS DE LIMA VAZ
5
. O texto Escritos de Filosofia VI – Ontologia e História será indicado no corpo do texto pela
expressão Ontologia e História e nas notas de rodapé pela abreviatura OH.
OH - LIMA VAZ, H. C. de, Escritos de Filosofia VI – Ontologia e História, Coleção Filosofia – 52, São
Paulo: Edições Loyola, 2001, 284 pp. (reedição do Ontologia e História).
6
. O texto Escritos de Filosofia II – Ética e Cultura será indicado no corpo do texto pela expressão Ética
e Cultura e nas notas de rodapé pela abreviatura EF II.
EF II - LIMA VAZ, H. C. de, Antropologia Filosófica II, Coleção Filosofia – 22, São Paulo: Edições
Loyola, 1992, 261 pp.
16
para inseri-lo no livro, Lima Vaz fez com que os capítulos dos livros ficassem
sensivelmente diferentes dos próprios artigos.
Grande parte de sua obra encontra-se reunida nos fascículos da revista
Síntese Nova Fase. Mas há um número muito grande de artigos e verbetes que se
encontram em diversas outras publicações.
A.1. 1968 – Ontologia e História7
Os artigos deste livro foram escritos entre 1953 e 1963. A partir desses Ontologia e História
1968
textos vislumbra-se muito do que será desenvolvido em todo o itinerário
subseqüente. Lima Vaz aprofunda suas idéias de forma gradual e dialética,
superando, guardando e conservando todo seu trabalho anterior. Aqui se percebe
toda a influência clássica de Lima Vaz e a importância de Platão, Aristóteles,
Agostinho e Tomás de Aquino. Aqui estão registradas idéias e noções que serão
recuperadas no Raízes da Modernidade, 34 anos depois, e que formarão o núcleo
de inteligibilidade não só do Raízes da Modernidade, mas de todo seu sistema.
Ainda que pareça exagerado, é possível dizer que quase todo o pensamento de
Lima Vaz já se encontra presente, in nuce, no Ontologia e História. Talvez seja
mais difícil detectar os sinais da preocupação a respeito da Ética. Mas de qualquer
forma, os temas mais importantes do pensamento vaziano têm como ponto de
partida esse grande livro.
Na primeira parte – Temas de Ontologia – são encontradas as noções da
dialética platônica, mais especificamente no capítulo sobre A Dialética das idéias no
Sofista. Essas noções trabalhadas no início de seu itinerário filosófico, estarão
presentes para sempre no pensamento vaziano. Ainda na primeira parte e no
capítulo segundo – Itinerário da Ontologia Clássica – se encontra a primeira
apresentação a respeito da metafísica do existir de Santo Tomás como uma
superação do paradigma da ontologia grega que esgota na idéia e no conceito toda
a inteligibilidade do ser. O tema do Absoluto considerado a partir da metafísica do
existir de Tomás de Aquino será a clef de voûte de todo o pensamento vaziano. É
com esta metafísica que Lima Vaz inicia seu sistema e dá a ele seu acabamento
mais bem elaborado e refinado no Raízes da Modernidade. A metafísica do existir
do aquinatense estará presente tanto na Antropologia Filosófica como na Ética.
Ela não reaparece sem mais nem menos, ex abrupto, apenas no final da
elaboração da obra vaziana. Ela vem reaparecendo e emergindo em todos os
momentos importantes de fechamento de cada um dos círculos do sistema. Seja na
7 . “Convém dizer inicialmente uma palavra sobre a origem do livro Ontologia e História. Sua publicação
deve-se à iniciativa de alguns estudantes dominicanos que então trabalhavam na Livraria Duas
Cidades. Reúne artigos publicados entre 1953 e 1963. Como o título indica, alguns desses artigos
tratavam de problemas de Ontologia (1ª parte) outros de problemas de filosofia da História (2ª parte). O
capítulo ‘O Absoluto e a História’ foi escrito ad hoc, como fecho do livro. Na época trabalhávamos
intensamente com a categoria de ‘consciência histórica’, que é o conceito central da segunda parte do
livro. A ênfase na noção de ‘consciência’ como princípio provinha também do confronto crítico com
uma certa concepção marxista da chamada ‘consciência-reflexo’”. NOBRE, M. e REGO, J.M. ,
Conversas com filósofos Brasileiros, Rio de Janeiro: Editora 34, 2000, Entrevista com Henrique
Cláudio de LIMA VAZ, p. 34.
17
categoria de espírito da Antropologia Filosófica, ou ainda nas categorias de
transcendência, realização e pessoa. Também é necessário marcar a importância
do último capítulo do primeiro volume da Antropologia Filosófica – A vida
segundo o espírito – no qual se encontra um aprofundamento da idéia de
inteligência espiritual inspirada tão somente em Tomás de Aquino. Vale a pena
ressaltar que à medida que São Tomás vai se fazendo mais e mais presente, nos
últimos textos, a presença de Hegel vai se tornando menos nítida e mais
abscôndita, mas não menos importante para a compreensão do pensamento
vaziano. Trata-se de um grande círculo que vai se fechando, ou seja, um círculo que
encontra seu fim no ponto de partida. Mas um ponto de partida enriquecido,
diferente de um simples ponto geométrico. Portanto, este segundo capítulo do
Ontologia e História é de fundamental importância para a compreensão dos
pressupostos mais elementares do pensamento vaziano.
No capítulo escrito em 1954, por ocasião do 1600º aniversário de
nascimento de Santo Agostinho são expostas certas idéias8 que estarão presentes
nas categorias de espírito, de transcendência, de realização e de pessoa da
Antropologia Filosófica e na categoria de pessoa moral da Ética.
Na segunda parte – A Reflexão sobre a História – está a primeira síntese
que Lima Vaz elaborou a propósito do seu encontro com uma nova forma de
racionalidade, distinta da racionalidade da filosofia clássica, a saber a racionalidade
moderna. A rigor, no Ontologia e História, está o anúncio do fim da primeira
jornada e a passagem para a segunda jornada filosófica de Lima Vaz. Este fato se
faz presente sobretudo através dos textos Cristianismo e Consciência Histórica I e
II e do texto Consciência e História. Em 1970, Lima Vaz inicia seus cursos sobre
Hegel na Universidade Federal de Minas Gerais. Até então Hegel tinha sido
estudado apenas em função da leitura de Marx, nos tempos em que Lima Vaz
acompanha a Juventude Universitária Católica9.
O último capítulo do Ontologia e História – O Absoluto e a História –
recolhe e sintetiza de forma sistemática toda a segunda parte, mas também se
configura como um esboço e um anúncio daquilo que será, duas décadas mais
tarde, a Antropologia Filosófica em sua dimensão sistemática10. Trata-se de um
artigo programático no qual se encontram os gérmens da Antropologia Filosófica.
8. As noções agostinianas mais presentes em toda a obra vaziana e particularmente nas categorias de
espírito e transcendência são as noções de superior summo e interior intimo.
9
. NOBRE, M. e REGO, J.M. , Conversas com filósofos Brasileiros, Rio de Janeiro: Editora 34,
2000, Entrevista com Henrique Cláudio de LIMA VAZ, p. 30.
10 . SAMPAIO, R.G., O Ser e os Outros, São Paulo: Unimarco, 2001, p.63: “É possível, portanto,
vislumbrar que todo este caminho percorrido por Lima Vaz nesta sua primeira fase filosófica, já se
constitui como um esboço do que será sua Antropologia Filosófica. Todos os elementos tempranos,
após terem sido elaborados, reelaborados e bem amadurecidos, desaguarão no estuário da
Antropologia Filosófica, numa forma mais amadurecida e sistemática, na qual o tema deste trabalho
emergirá como categoria antropológica da intersubjetividade”. Quando este parágrafo foi escrito a Ética
e a metafísica de Lima Vaz ainda não haviam sido publicadas. Hoje, se pode dizer que todos aqueles
temas outrora trabalhados, deságuam, não só na Antropologia, mas no seu sistema como um todo.
18
A.2. 1986 – Escritos de Filosofia I – Problemas de Fronteira
Aqui estão reunidos textos escritos no período de duas décadas: 1963-1984. Escritos de Filosofia I
Problemas de
Esse livro apresenta questões limítrofes entre os campos da Teologia e da Filosofia. Fronteira
1986
Mas antes de se imaginar que esse trabalho seja um dos mais distantes da
perspectiva sistemática de Lima Vaz, nele são aprofundadas questões relativas ao
problema da metafísica do existir, da Experiência de Deus, da Linguagem, da noção
de Pessoa como noção teológica e antropológica e outras questões relativas ao
problema da intersubjetividade, do trabalho e do papel do cristianismo nas
sociedades do mundo ocidental. Assim como há uma linha de continuidade entre o
artigo O Absoluto e a História11 e a Antropologia Filosófica, é possível afirmar que
também há uma linha ascendente de continuidade e aprofundamento dos temas
relativos à metafísica do existir que foram apresentados inicialmente no Ontologia e
História, depois aprofundados na primeira na parte do Escritos de Filosofia I (A
Herança Teológica do Pensamento Moderno), em seguida apresentados a partir da
perspectiva antropológica e gnoseológica nos capítulos sobre a categoria do
espírito, sobre A vida segundo o espírito, e sobre as categorias de transcendência,
de realização e pessoa da Antropologia Filosófica. O mesmo tema se aprofunda
no Escritos de Filosofia III – Filosofia e Cultura, passa pela Ética e alcança seu
acabamento sistemático no Raízes da Modernidade. O título da primeira parte do
Escritos de Filosofia I (A Herança Teológica do Pensamento Moderno) poderia ser
o título do Raízes da Modernidade.
No primeiro capítulo do livro, Lima Vaz estava ensaiando os grandes temas
do último livro da série Escritos de Filosofia, Raízes da Modernidade. Ao
descrever a Fisionomia do Século XIII (primeiro capítulo do Escritos de Filosofia
I)12 é possível perceber a presença dos temas que serão desenvolvidos nos
primeiros quatro capítulos do Raízes da Modernidade: as fontes árabes-judias do
pensamento medieval, a presença de Aristóteles e sua difusão através dos árabes,
o papel das universidades, o nascimento da escolástica, as correntes filosóficas do
século XIII e finalmente a significação do pensamento de Tomás de Aquino,
sobretudo a partir de sua metafísica do existir. Todos estes temas encontram-se no
início e no fim da série dos Escritos de Filosofia.
No segundo capítulo13, Tomás de Aquino e o nosso tempo: o problema do
fim do homem, está explicitada a tese central do Raízes da Modernidade, segundo
a qual o primeiro ato da formação do mundo moderno se realizara com o ressurgir
do aristotelismo no século XIII.
19
O Escritos de Filosofia I antecipa algumas linhas que jamais deixarão
de orientar o labor de Lima Vaz. Por um lado, se detecta a presença daquela que
será a tese do Raízes da Modernidade, mas por outro lado, também se percebe a
colocação sutil de um problema que Lima Vaz irá anunciar como um dos maiores
desafios da nossa época: "Pensar a Liberdade ou unir dialeticamente Liberdade e
Razão, eis a única tarefa da Filosofia"14 à medida que ele estuda a beatitude, o
teocentrismo e a liberdade em Santo Tomás. Este tema se fará presente no
Escritos de Filosofia III, na Antropologia Filosófica, nas estruturas objetivas (do
agir ético e da vida ética) da Ética e na apresentação do estágio ontológico-real do
Raízes da Modernidade.
Já se antevê muito do que ainda está por vir na obra de Lima Vaz: a
presença de Tomás de Aquino e de Hegel como articuladores da tarefa vaziana de
pensar o seu tempo. No renascimento da ciência aristotélica
14 . EF III, p.80.
15
. EF I, p.40.
16 . EF I, p.56.
17 . EF I, p.71.
18 . EF I, p.71.
20
circunscreve outros círculos de forma crescente e helicoidal, ao mesmo tempo
que ratifica a tese segundo a qual toda a investigação vaziana é realizada sob a
sombra das questões que a Modernidade colocou para a inteligência do problema
do Absoluto.
Ética, e Ética e Razão, todos eles inéditos. Nesse volume se encontra o famoso
capítulo lido em muitas faculdades de Direito sobre a relação entre Ética e Direito
no qual é apresentada a distinção entre as chamadas universalidades nomotética e
hipotético-dedutiva. E finalmente o capítulo sobre o ethos da atividade científica:
Ética e Ciência19. Trata-se de um livro com cinco grandes capítulos e 6 adendos.
Os adendos foram todos previamente publicados na Revista Síntese (Nova Fase) e
reeditados no livro.
Nesse grande livro já estão explicitados os pressupostos metafísicos da ética
vaziana e os seus pressupostos metodológicos. Tais pressupostos se fazem
evidentes sobretudo nos dois primeiros capítulos. Mas não se pode dizer que nesse
texto seja possível uma espécie de antevisão do que seria a estrutura da parte
sistemática da Ética, afinal nem mesmo o curso ministrado pelo próprio Vaz nos
anos de 1992-1994 estava organizado e estruturado da forma como os Escritos de
Filosofia IV e V (Introdução à Ética Filosófica 1 e 2) foram redigidos. Nos
manuscritos utilizados em sala para suas aulas não há a mesma estrutura
encontrada nos Escritos de Filosofia IV e V. Todavia parte do conteúdo dos dois
primeiros capítulos do Ética e Cultura são re-trabalhados no capítulo sobre a
Natureza e a Estrutura do Campo Ético que introduz a parte histórica da Ética. E
outros temas vão reaparecendo ao longo da sua obra.
Aos temas tratados no Ética e Cultura não foi dado um tratamento
estritamente histórico-sistemático como se poderá ver nos Escritos de Filosofia IV
21
e V (Introdução à Ética Filosófica 1 e 2). Algumas passagens e alguns temas
serão retomados e estarão presentes nesses dois livros. Contudo, alguns temas de
ética alcançaram sua forma mais acabada no próprio Ética e Cultura, possibilitando
uma retomada e uma recuperação mais breve e sintética nos volumes IV e V da
série Escritos de Filosofia.
"Ligo-me a uma tradição para a qual a filosofia eleva-se, como que por
um movimento inato à sua natureza, sobre o transitório e o événementiel e
procede à busca de princípios que são também fundamentos. Em outras
palavras, só entendo a filosofia como ‘fundacionista’, para usar um termo hoje
em moda”21.
20 . “De Ontologia e História a Antropologia Filosófica, há um bom caminho andado. Para mim, o
clima intelectual havia mudado e o diálogo com Hegel tornara-se prioritário. Na Antropologia
Filosófica, a noção de consciência cede lugar à noção mais abrangente do Eu (em sentido
fenomenológico-dialético, não psicológico) enquanto mediador entre o que nos é dado como natureza
e o que é por nós significado como forma. Em outras palavras, o Eu opera no ser humano a
passagem dialética entre o que ele simplesmente é e a sua auto-expressão, ou seja, a significação
com que ele se anuncia na sua identidade propriamente humana, na sua ipseidade, para falar como
Ricoeur. O conceito de expressividade, cuja origem se deve a J.G. Herder e foi retomado por Hegel e
recentemente posto em circulação por Charles Taylor, é o conceito propriamente fundacional da
Antropologia Filosófica (ver vol.1, pp162-167). A idéia de consciência reaparece aqui como uma das
vertentes constitutivas da categoria de espírito (ibid., pp.211-212) integrada na dialética mais ampla
da auto-expressão do ser humano como espírito”.NOBRE, M. e REGO, J.M. , Conversas com
filósofos Brasileiros, Rio de Janeiro: Editora 34, 2000, Entrevista com Henrique Cláudio de LIMA
VAZ, p. 34.
21
. NOBRE, M. e REGO, J.M. , Conversas com filósofos Brasileiros, Rio de Janeiro: Editora 34,
2000, Entrevista com Henrique Cláudio de LIMA VAZ, pp. 36.
22
Filosófica, ou seja, o ‘ato de existir’ do ser humano enquanto capaz de significar-se a si
mesmo ou do ser humano enquanto expressividade. A metafísica e a
Antropologia Filosófica abriram-me o caminho para a Ética, disciplina que tenho
ensinado nos últimos anos. O conceito fundamental aqui recebido de Platão e
Aristóteles, é o conceito de Bem, que se apresenta como conceito metafísico,
sendo um conceito transcendental coextensivo com o ser, e como conceito
antropológico, definindo como Fim a estrutura teleológica do ser humano como
ser que se autodetermina para o Bem. Esses dois conceitos fundamentais,
antropológico (Eu como expressividade) e ético (Bem) guiaram-me na redação
dos dois textos, Antropologia Filosófica (2 vols.) e Introdução à Ética Filosófica
(2 vols.), que publiquei recentemente. Penso que os conceitos que chamo
‘fundacionais’, presentes já desde o início no núcleo básico das idéias
filosóficas nas quais fui formado, foram sendo explicitados e adquirindo uma
estrutura formal mais definida ao longo de meu magistério e do trabalho de
preparação dos meus cursos. Aqui está realmente o roteiro de formação das
minhas idéias filosóficas fundamentais"22.
Conceitos
fundacionais
do pensamento
vaziano
metafísico.
22
. NOBRE, M. e REGO, J.M. , Conversas com filósofos Brasileiros, Rio de Janeiro: Editora 34,
2000, Entrevista com Henrique Cláudio de LIMA VAZ, pp. 36-37.
23
a. antropológico porque, em primeiro lugar, no Escritos de
Filosofia III – Filosofia e Cultura foram aprofundados 3 temas
diretamente ligados à Antropologia:
i. o tema da cultura
ii. o tema da ética e
iii. o tema da transcendência;
b. ético porque, em segundo lugar, o Escritos de Filosofia III –
Filosofia e Cultura é um texto de passagem da Antropologia
Filosófica para a Ética, a partir da perspectiva da Cultura;
c. metafísico porque
i. há um tratamento mais aprofundado das questões
pertinentes ao problema da transcendência e
ii. nesse livro encontra-se a apresentação mais minuciosa e
detalhada sobre a teoria do juízo que servirá de
fundamento para a metafísica do existir;
iii. há uma (re)apresentação da metafísica do existir
relativamente desvinculada do problema antropológico e
apontando para os tópicos de natureza estritamente
metafísicas que serão tratados sistematicamente no
Raízes da Modernidade.
Escritos de Filosofia
IV e V
A. 6. 1999 – Escritos de Filosofia IV – Introdução à Ética Filosófica 1 e Introdução à Ética
2000 – Escritos de Filosofia V – Introdução à Ética Filosófica 2 Filosófica
O tema da ética começou a ser abordado por Lima Vaz, de forma mais 1999 / 2000
24
"Nossa idéia diretriz é a idéia do homem como auto-expressividade, tendo
como paradigma orientador a linguagem, diferença específica do homo loquens,
aqui considerada em seus elementos constitutivos: a matéria lingüística, o ato
da linguagem e a significação ou expressão significante da matéria pela
mediação do ato. Esse paradigma inspira-se na definição aristotélica do ser
humano como zôon lógon échôn, animal possuidor do lógos (palavra e
significação), capaz de auto-significar-se e de significar o mundo no lógos. O
auto-exprimir-se no lógos é o primeiro e fundamental ato humano e que define,
portanto, como viu Aristóteles, o ser humano enquanto tal, de acordo com o
axioma que estabelece a correspondência ontológica entre ser e operar. O ser
humano, pois, é ou existe como auto-expressão e se auto-exprime efetivamente
seja nas estruturas elementares do seu ser (corpo próprio, psiquismo, espírito),
seja nas relações elementares que o abrem à realidade e permitem, na
reflexão ou retorno sobre si mesmo, constituir-se em sua identidade
(objetividade, intersubjetividade e transcendência), nelas realizando-se e se
auto exprimindo sua unidade profunda como pessoa"23.
23
. EF V, p.17
24 . EF V, p.93.
25 . EF V, p.95.
26 . EF V, p.146.
25
A segunda unidade temática – a vida ética – também se ergue a partir
das estruturas subjetiva, intersubjetiva e objetiva, acompanhando o proceder da
Razão prática naquela tríplice dimensão do agir seguindo os momentos lógico-
dialéticos da universalidade, da particularidade e da singularidade.
Finalmente, de forma análoga à Antropologia Filosófica, a clef de voûte da
ética é alcançada na categoria de pessoa moral.
A leitura da ética vaziana depende da sua antropologia a partir de três
aspectos fundamentais: a. aspecto metodológico; b. aspecto antropológico; c.
aspecto metafísico.
O método seguido para a constituição das categorias obedece, em linhas
gerais, aos mesmos princípios explicitados no quinto capítulo da Antropologia
Filosófica: Objeto e Método da Antropologia Filosófica.
A possibilidade da elaboração de uma ética decorre do pressuposto de que
existe uma natureza humana que pode ser explicitada através de um discurso
constituído por invariantes ontológicos.
Na mesma Antropologia Filosófica estão apresentados, de forma bastante
elaborada, os pilares de uma reflexão geral sobre o ser (na categoria de espírito e
de transcendência) que estará presente do início ao fim do discurso ético do
Escritos de Filosofia V – Introdução à Ética Filosófica 2. A compreensão desse
texto se torna absolutamente impossível sem a apreensão das noções relativas à
constituição do quiasmo do espírito (categoria estrutral do espírito ou categoria
noético-pneumática)27 e das noções relativas às experiências ética do Bem, noética
da Verdade e ético-noética do Ser apresentadas na categoria de transcendência28.
O Bem é a idéia fundante da ética vaziana. Mas a idéia diretriz da Ética é a
idéia de Razão prática29, que tem como seus pólos intencionais a Verdade e o Bem,
alcançados pela racionalidade e pela liberdade humanas que são, por sua vez, “os
dois atributos fundamentais do espírito que especificam os dois princípios
constitutivos da sua atividade, a inteligência e a vontade”30.
27
. AF I, 201-228. Categoria de espírito.
28 . AF II, 93-138. Categoria de transcendência.
29 . EF V, p.25.
30 . EF V, p.33.
26
entrecruzam na unidade da atividade espiritual, pois o espírito teorético conhece o Bem
e o espírito prático realiza a Verdade"31.
Escritos de Filosofia VI
A.7. 2001 – Escritos de Filosofia VI (Reedição do Ontologia e História) Ontologia e História
2001
O livro Ontologia e História foi reeditado em 2001 sem alterações
substanciais33.
O que se podia esperar dessa reedição seria o acréscimo das notas de
rodapé no último capítulo, O Absoluto e a História, que não apareceram na primeira
edição do livro. No entanto, o texto continua no mesmo formato do Ontologia e
História de 1968, inclusive sem as notas de rodapé do último capítulo.
A reedição desse primeiro livro foi muito importante por dois motivos:
a. a primeira edição estava esgotada há muito tempo.
b. no último livro de Lima Vaz – Raízes da Modernidade – são
recuperadas idéias e conclusões presentes no Ontologia e História,
mais particularmente, idéias presentes na primeira parte do livro – Temas
de Ontologia.
Nesse texto foram lançadas as sementes do frondoso sistema vaziano.
Apenas a sua reflexão ética não está pré-figurada no Ontologia e História. Mas o
interesse antropológico e metafísico de Lima Vaz levaram-no de forma inexorável à
reflexão sobre a ética. No Ontologia e História é mais difícil encontrar os
elementos germinais da Ética Filosófica de Lima Vaz. Mas aqui estão os
pressupostos básicos e mais elementares da última obra do itinerário vaziano. A
reedição com o título Escritos de Filosofia VI pode ser oportuna para que o leitor
perceba a proximidade conceitual entre essa obra e o Raízes da Modernidade não
obstante, os 48 anos que separam o primeiro artigo do Escritos de Filosofia VI, do
ensaio sobre as raízes metafísicas da modernidade apresentadas no Raízes da
Modernidade.
31 . EF V, p.34.
32 . EF V, p.19.
33 . É possível perceber um discreto trabalho de atualização das notas bibliográficas.
27
a. de convergência,
b. de conclusão
c. e de fundamentação.
Nesse trabalho há a convergência entre os temas da COMPREENSÃO
GENÉTICA DA MODERNIDADE e da METAFÍSICA DO EXISTIR.
Ao mesmo tempo que ocorre a apresentação da metafísica que sustenta
todo o seu sistema, a partir de uma chave dialética, são apresentadas as raízes da
modernidade que se encontram fincadas no mesmo subsolo doutrinal do século XIII
que serviu de substrato para a elaboração da metafísica tomásica. No Raízes da
Modernidade, Lima Vaz apresenta a metafísica do existir não apenas em confronto
com a Ontologia Clássica, tal como fez no Ontologia e História, mas o faz a partir
mesmo do confronto da razão moderna com o problema do Absoluto.
Esta tese tem como pressuposto que o último livro34 de Lima Vaz
corresponde ao seu esforço de sistematizar a sua reflexão geral sobre o ser, a sua
metafísica, de forma articulada com a ética e com a antropologia. E para tanto a
grande estrutura do texto possui uma simetria com os seus dois outros trabalhos
sistemáticos (a Antropologia e a Ética).
28
e com a parte histórica do Escritos de Filosofia IV – Introdução à Ética
Filosófica 1.
Reunir num único texto toda a sua reflexão metafísica de uma forma
estritamente organizada e que obedecesse aos princípios didáticos presentes na
Antropologia Filosófica implicaria a redação repetida de muitas questões
previamente trabalhadas ao longo da Antropologia Filosófica (a categoria de
espírito, o capítulo sobre A vida segundo o espírito, a categoria de transcendência e
os capítulos a realização e a pessoa), do Filosofia e Cultura (particularmente as
questões relativas à transcendência e à teoria do juízo trabalhada tão
minuciosamente no capítulo sobre Tomás de Aquino), e dos Escritos de Filosofia
IV e V – Introdução à Ética Filosófica 1 e 2.
Nesse texto há uma sistematização da metafísica, tal como ela é
compreendida por Lima Vaz, todavia, trata-se de um texto que depende de suas
obras anteriores – a Antropologia, o Escritos de Filosofia III e a Introdução à
Ética Filosófica 1 e 2. Pois ao longo desses textos e de muitos outros, foram
apresentados muitos elementos constitutivos da compreensão que Lima Vaz tem
da metafísica.
29
B. Os temas estudados por Lima Vaz
Oito anos antes de sua morte, em 1994, Lima Vaz afirmara que sua obra Os cinco temas
e o sistema
filosófica é atravessada por cinco temas35 que pulsam em todo seu pensamento.
Esses temas foram abordados ao longo de seu iter filosófico sempre a partir de um
viés humanista: o ser humano enquanto humano, dotado de razão e liberdade.
Os temas são os seguintes: 1. o mundo, 2. o sujeito, 3. a história, 4. a cultura
(a intersubjetividade e o ethos), 5. a transcendência.
É possível estudar cada um destes temas a partir de sua relação com a
metafísica do existir. Mas também é possível estudá-los a partir do
acompanhamento da reconstituição genética da modernidade.
Além dessas duas possibilidades pautadas pelas leituras temáticas do
pensamento vaziano, também é possível estudar cada um destes temas segundo a
posição ocupada por eles, de forma particular ou articulada, no interior mesmo do
sistema.
Todos esses temas estão integrados ao sistema e atravessados pela
perspectiva da metafísica do existir e pela perspectiva da compreensão genética da
modernidade.
O primeiro momento de articulação sistemática desses temas se realiza na A convergência dos
temas na
Antropologia Filosófica, obra na qual foram organizados sistematicamente a partir Antropologia
Filosófica
duma perspectiva antropológico-personalista que repousa sobre a idéia da unidade
da Razão36.
B.1. O tema do mundo e seu desdobramento obedece a quatro enfoques O tema
do mundo
aprofundados na reflexão sobre a categoria de objetividade mais a frente: a. o
mundo como physis na racionalidade clássica, b. o mundo como natureza científica
na racionalidade empírico-formal, c. o mundo compreendido a partir da
racionalidade fenomenológica e d. o mundo dos objetos da racionalidade técnica.
35 . Temos este discurso gravado, por ocasião de uma entrevista dada a alguns professores da
30
Conceito, para Hegel, é o analogado principal da noção de sujeito. E
sujeito é o que porta em si uma espécie de vis dialética de autodesdobrar-se no seu
próprio conhecimento construindo assim o sistema da sua auto-expressão. E tal
sistema da auto-expressão do sujeito é o que Hegel chama de Ciência da Lógica.
Para Hegel, portanto, o sujeito é o conceito desdobrando-se37.
Em resumo, para Lima Vaz o ser humano é compreendido como
expressividade. E foi sobre esta noção de sujeito como expressividade e modelado
a partir da Lógica de Hegel, que Lima Vaz elaborou toda sua Antropologia
Filosófica38. A idéia de expressividade é sua idéia antropológica nuclear e o ponto
de partida para sua Ética.
O tema da
B.3. O tema da história foi tratado por Lima Vaz através da noção de história
consciência histórica que aos poucos foi sendo substituída pelo problema da
inteligibilidade da história, pois a consciência histórica supõe que a história seja
inteligível e compreensível pelo sujeito para que ele possa alcançar a consciência
da história. Contudo, o interesse de Lima Vaz pela consciência histórica e sobre a
inteligibilidade da história foi se dirigindo aos poucos para dois outros subtemas
tratados mais ou menos de forma simultânea e que estão intrinsecamente
relacionados com o tema da história, a saber, a intersubjetividade e o ethos, pois
não há como falar da história sem a elucidação do que sejam intersubjetividade e
ethos.
B.4. A cultura é um dos temas presentes em toda a obra vaziana, afinal, a
cultura é a obra humana por excelência. No entanto, a apresentação do problema
da cultura desdobra-se nos temas da intersubjetividade e do ethos.
O problema fundamental da intersubjetividade, para Lima Vaz, é o problema O tema da
cultura:
do nós, uma vez que a relação eu-nós engloba a relação eu-tu, ou seja, a relação a intersubjetividade
e o ethos
eu-tu acontece dentro da relação englobante eu-nós. Esta reflexão sobre a
intersubjetividade situa-se entre os dois pólos extremos da heterologia de Lévinas e
da egologia de Husserl39.
A propósito do tema do ethos, Lima Vaz afirma que não há possibilidade de
se pensar uma comunidade humana sem um ethos. E, em função disso, o problema
do ethos tornou-se para ele o problema central da intersubjetividade, e mais
especificamente, do aspecto político da relação de intersubjetividade. Pois a
constituição da pólis como espaço político foi um passo decisivo
que a humanidade deu para constituir-se como comunidade ética.
A comunidade é atravessada por dois grandes desafios. O primeiro desafio é
durar e o segundo durar num espaço de consenso, pois sem o espaço consensual
de transcendência.
38 . AF I p.123.
39 . AF II p.66. Ver o capítulo sobre a categoria de intersubjetividade. AF II p.49-92.
31
ela se destrói e não dura. O espaço do consenso é garantido pelo ethos
enquanto a duração é garantida pelo poder político. E poder político só é poder
político porque nasceu do ethos, sendo que o poder político se constitui com a
submissão do próprio poder à lei, ao nómos
B.5. Todos os temas anteriores apontam e convergem para o tema da O tema da
transcendência
transcendência à medida que esse tema é apresentado como o fundamento dos
discursos sobre o mundo, o sujeito, a história e o sentido da história, bem como o
fundamento da comunidade ética e, portanto, do ethos.
Lima Vaz consegue de forma surpreendente articular todos esses temas de
forma coerente na antropologia, na ética e na metafísica.
Considerando, pois, que a reflexão de Lima Vaz sobre todos esses temas
realizou-se a partir de uma preocupação antropológica, de uma preocupação ética e
metafísica pode-se afirmar com o autor que as categorias de sua antropologia
filosófica, da ética e da metafísica descrevem
“o itinerário dialético do sujeito ao buscar novas formas do seu auto-exprimir-se
e da sua autocomprensão na saída de si mesmo, no êxodo que o leva além das
fronteiras da sua finitude e do seu ser situado e o conduz a afirmar seu ser
como ser-no-mundo e ser-com-o-outro”40.
concomitante à elaboração de seu sistema, a reflexão sobre esses cinco tópicos foi
evoluindo e constituindo o núcleo temático do próprio sistema. Pode-se afirmar que
40 . AF II p.96.
41 . AF II p.96.
32
Lima Vaz estudou cada um desses tópicos sempre a partir de seu empenho em
compreender de forma mais acurada e articulada a Modernidade no seu confronto
com a possibilidade de pensar o Absoluto.
Mundo História
ANTROPOLOGIA METAFÍSICA
ÉTICA
Metafísica Genética da
do Existir Modernidade
SISTEMA
33
partir dos temas trabalhados durante toda a sua vida e a partir, mais
especificamente, da antropologia, da ética e da metafísica.
Em outros termos, pode-se dizer que tanto a perspectiva temática, como a
perspectiva sistemática do pensamento vaziano convergem para um
entrelaçamento e uma articulação definitivas que se realizam a partir da metafísica
do existir. Será a partir do pensamento tomásico que essas duas perspectivas de
leitura da obra ora estudada se encontram de forma harmônica e articulada. Este
procedimento de superação dos temas e de conservação num nível superior de
articulação já indica o caráter dialético do método vaziano que será estudado na
segunda parte deste trabalho.
Nas duas próximas seções será apresentado o trabalho realizado por Lima
Vaz a partir da metafísica do existir numa fase pré-sistemática de seu itinerário
filosófico. E nas duas seções subseqüentes serão apresentados os temas relativos
à inquirição sobre a gênese da modernidade, também num momento pré-
sistemático. Estes temas da metafísica do existir e da genética da modernidade
serão continuados nos capítulos segundo e terceiro, respectivamente, quando esses
temas já se encontram incorporados à reflexão sistemática de Lima Vaz.
42 . OH, p.14.
43 . OH, p.14.
44 . OH, p.16.
34
procede por atribuição e negação, avançando através de um movimento lógico
que – pela força do objetivismo radical do pensamento platônico – responde ao
estatuto ontológico do seu objeto?45.
Ciência
das Idéias
O problema da constituição da ciência das idéias, de uma ciência do real
realíssimo também pode ser expressa da seguinte forma: “quais as relações
ideais supremas e universais que devem ser implicadas em todo juízo dialético, de
modo a preservar a um tempo a ‘identidade’ consigo mesmas e a ‘comunhão’,
mútua das idéias?”46. No capítulo A Dialética das Idéias no Sofista, é apresentada
de forma bastante técnica, a linha de progressão elaborada por Platão para se
alcançar a resposta a estas perguntas.
A Idéia deve poder ser conhecida pela inteligência e para tanto a alma deve
possuir a mesma natureza das Idéias, sob pena de impossibilitar o conhecimento.
Com isso “a alma (e com ela o movimento) entra no âmbito do ser perfeitamente
real (do ontos on) com o mesmo título que as idéias”. Todavia esse movimento não
interfere na realidade mesma das Idéias48. A alma é dýnamis ativa, mas sua
relação com as idéias não implicará uma alteração do real porque tal relação será
apenas de natureza lógica. O estado ontológico das idéias é o estado do repouso
que não será perturbado pelo movimento da inteligência justamente por se tratar de
uma relação lógica.
45 . OH, p.17.
46
. OH, p.19.
47 . OH, p.25. Ver nota 35.
48 . OH, p.31.
49 . OH, p.31.
35
inteligência não é; se não inclui a estabilidade e permanência, o inteligível dissolve-se
numa multiplicidade infinita"50.
A questão das relações das Idéias entre si não pode ser compreendida a
partir da hipótese de um isolamento absoluto entre elas e nem mesmo por meio da
hipótese da indistinção absoluta entre as idéias. É necessário que ocorra uma
participação ordenada, de tal sorte que algumas Idéias se comuniquem entre si,
outras não55. Há combinação e comunhão entre umas e outras.
50
. OH, p.32.
51 . OH, p.32.
52
. OH, p.34.
53 . OH, p.32.
54 . OH, p.33.
55 . OH, p.33.
36
"Como ao gramático e ao músico com respeito às letras e aos tons, é ao
filósofo que compete estudar estas leis de combinação das Idéias e revelar a
estrutura do mundo ideal. Tal é a obra da ciência dialética"56.
56 . OH, p.34.
57 . OH, p.34.
58 . OH, p.36.
37
C.1.3. Para ilustrar o que pretende demonstrar, Platão toma a Idéia de
movimento e afirma que no movimento existe a participação à Idéia de ser, pois o
movimento é. Essa condição do movimento implica outra relação de participação, a
saber com a Idéia de identidade, pois o movimento é identidade consigo mesmo. No
entanto, essa identidade não é identidade com o ser como tal. Isso faz do
movimento um ser distinto dos outros seres. Tal situação inaugura outra
participação da idéia de movimento à idéia de alteridade, pois o movimento é o
outro do repouso ou ainda é ‘outro’ com relação a todos os outros seres.
59 . OH, p.37.
60 . OH, p.37.
61 . OH, p.38.
38
O esquema ontológico que, por um lado, orienta o olhar dialético e por O lógos
e a estrutura da
outro, se constitui ao mesmo tempo como lei do real e norma do discurso faz com realidade
“a. uma Idéia estendida através de muitas outras, das quais cada uma
permanece em si mesma isolada ; b. outras muitas que, distintas entre si, são
entretanto envolvidas do exterior por uma Idéia Única; c. uma Idéia que,
concentrada embora na sua unidade, se estende por muitas totalidades; d. uma
pluralidade de Idéias totalmente isoladas”62.
39
amplitude que o ser real tem na ordem da existência. Segundo Lima Vaz, essa
é a nervura da argumentação platônica.
65 . OH, p.44.
66. ROBIN, L. La pensée grecque et les origines de l’esprit scientifique, Paris, Éditions Albin Michel,
1948, p. 259.
67 . OH, p.45. Ver nota 85.
68
. OH, p.46.
69 . PLATÃO, Ménon, Fédon e Fedro.
70 . OH, p.52.
71 . OH, p.54.
40
incondicionalidade do Bem a necessidade inteligível, que ao ‘ser’ particular de
cada Idéia confere, dentro do sistema de relações que o define, o imperativo
absoluto do ‘dever-ser’”72.
72
. OH, p.55.
73 . OH, p.57.
74 . OH, p.59.
75 . OH, p.63.
41
"Em outras palavras, a unidade do ser em Platão não é uma unidade de
identidade, mas uma unidade de participação. Se há juízo, há síntese; se há
síntese, há diversidade; se há diversidade e síntese, há participação. Assim o
ser se revela como participação na estrutura mesma do ato judicativo"76.
76
. OH, p.63.
77 . OH, p.63.
78
. OH, p.63.
79 . OH, p.63.
80 . OH, p.64.
81 . OH, p.64.
42
Ao chegar neste ponto da investigação a respeito da possibilidade e da
estrutura de uma ciência sobre o ser, Lima Vaz designa o momento platônico desse
itinerário rumo à Ciência suprema como momento objetivo em oposição ao
momento aristotélico que será chamado de momento reflexivo.
Antes de expor aquela reflexão que o acompanhará pelo resto de todo o seu
labor filosófico, a metafísica do existir de Tomás de Aquino, Lima Vaz apresenta o
problema da ciência do ser a partir da perspectiva aristotélica.
Tal posição faz com que Aristóteles se encontre com os mesmos problemas
de Platão, afinal se o ser é uno, como pode encerrar, em si, determinações
opostas? Muitos dos filósofos anteriores propugnavam que o ser era composto de
contrários, e neste sentido, a multiplicidade já seria um primeiro contrário à própria
unidade. Mais uma vez emerge o problema do uno e do múltiplo como oposição
fundamental que deve ser resolvida para que se possa superar o monismo estático
dos eleatas, o dinamismo heraclítico e o relativismo de Protágoras.
82 . OH, p.65.
83 . OH, p.65.
84 . OH, p.66.
43
Aristóteles estabelece o primeiro princípio da ciência do ser, que opera Princípio de não
contradição
a síntese racional entre o uno e o múltiplo, através de uma demonstração que reduz
o adversário ao absurdo – demonstração . O
princípio absolutamente primeiro é o princípio de contradição que se constituirá
como lei do ser que se impõe como lei do pensar.
Mais uma vez a forma absorveu o ato e a inteligibilidade do ser não penetrou
a existência dos seres deixando escapar o mistério de sua originalidade88.
O ser de Platão existe, ele é existencial. Todavia ele tem uma existência
ideal. Por outro lado, o ser de Aristóteles fica restrito aos limites das determinações
da essência.
85
. OH, p.67.
86 . OH, p.67.
87 . OH, p.68.
88 . OH, p.68.
44
Lima Vaz critica a posição aristotélica, pois ela permanece estritamente
lógica se a inteligibilidade do universal não estiver presa a “um inteligível
transcendente que seja plenitude de existência e ao mesmo tempo subsistente
intelecção”89.
Crítica a
Aristóteles
Aristóteles recusou o inteligível transcendente de Platão e foi buscar no
quadro das categorias a inteligibilidade última do real. Mas sem transcendência não
há participação no sentido platônico.
89
. OH, p.68.
90 . OH, p.68.
91 . EF VII, p.71.
92 . OH, p.69.
45
E Porfírio nomeou o princípio supremo, o Uno, com o infinitivo tò einai,
o existir. E não obstante a influência porfiriana no pensamento medieval, sobretudo
através de Boécio, tal influência se manteve no interior do emanatismo neoplatônco
de uma processão de essências93.
Mas precisará superar Aristóteles para fazer com que a existência seja o ato
primeiro e a perfeição das perfeições96.
93
. EF VII, p.71.
94 . EF VII, p.71.
95 . EF VII, p.72.
96 . OH, p.73.
46
isolado da singularidade material e ulteriormente introduzido na “ordem da
necessidade inteligível ou do universal”97.
Mas esse procedimento ainda não foi suficiente para trazer em si toda a
razão da unidade do objeto.
É no juízo que o ser se revela como síntese do uno/múltiplo “na ordem das O Juízo
Tomás precisa conquistar uma unidade “em que o ser do objeto se restitua
como tal”102 sem desvencilhar-se dos vínculos necessários do inteligível em que a
inteligência busca afirmá-lo.
97
. OH, p.70.
98 . OH, p.70.
99
. OH, p.71.
100 . OH, p.71.
101 . OH, p.72.
102 . OH, p.70.
47
Tomás de Aquino irá aprofundar a estrutura do juízo e alcançará um
último e supremo plano de unificação: o plano da existência.
Para o Aquinate dizer o ser deve, em primeiro lugar, significar o ato de existir
e, em segundo lugar, significar a composição de uma proposição alcançada pela
inteligência através da união de um sujeito com um predicado108.
103
. OH, p.72.
104 . OH, p.72.
105
. OH, p.73.
106 . OH, p.73.
107 . TOMÁS DE AQUINO, Suma Teológica, I q. 16, a.3, rep.
108 . TOMÁS DE AQUINO, Suma Teológica, I q. 3, a.4, sol 2.
48
verdadeiro se encontre principalmente no intelecto e o ente principalmente nas
coisas"109.
“deve-se dizer que o não-ente não tem em si algo pelo qual possa ser
conhecido; é conhecido à medida que o intelecto o torna cognoscível. O
verdadeiro se funda no ente, enquanto o não-ente é um ente de razão, isto é
apreendido pela razão”110.
49
Gráfico 4 – O Juízo
JUÍZO
lugar da adequação
formal entre
A possibilidade
desta adequação
depende
da reflexão da da reflexão da
inteligência sobre inteligência sobre
si mesma seu ato
o que implica
o conhecimento da
estrutura deste ato
o conhecimento de si mesma
como orientada para
como princípio ativo desta conformação
conformar-se intencionalmente
com o real
50
do objeto e mostra ao mesmo tempo sua dependência participada à
Inteligência infinita na qual a reditio supra essentiam é a própria subsistência.
"Com efeito, está no livro das Causas: ‘Aquele que conhece sua própria
essência volta à sua essência por um completo retorno’ (quod omnis sciens qui
scit suam essentiam, est rediens ad essentiam suam reditione completa)”113.
“Segue-se que nosso intelecto possível não pode ter uma operação
inteligível senão quando aperfeiçoado por uma representação inteligível. Assim,
conhece a si próprio, como conhece todas as outras coisas, por meio de uma
representação inteligível; conhece sua própria intelecção, e por este ato
conhece a faculdade intelectiva. Deus, porém, é ato puro tanto na ordem dos
existentes como na ordem dos inteligíveis. E assim, por si mesmo a si mesmo
conhece”115.
Esse retorno aos textos de Tomás é fundamental, pois, Lima Vaz está Dialética da
participação
marcado por toda essa reflexão até o termo de toda a sua obra. E, em se tratando
do tema da inteligência ou da reflexão intelectual, ela é compreendida de forma
analógica à participação da Intelecção infinita, que está presente no seio da
inteligência criada.
113
. TOMÁS DE AQUINO, Suma Teológica, I q. 14, a.2 a.
114 . TOMÁS DE AQUINO, Suma Teológica, I q. 14, a.2, sol 1.
115
. TOMÁS DE AQUINO, Suma Teológica, I q. 14, a.2, sol 3.
116 . OH, p.74.
117 . OH, p.74.
118 . OH, p.74.
51
emerge no juízo como participação do ato e da Idéia. E para tanto a
inteligibilidade do ser é coroada pela inteligibilidade da existência119.
119
. OH, p.75.
120 . OH, p.75.
121
. OH, p.76.
122 . OH, p.76.
123 . OH, p.76.
124 . OH, p.76.
52
existente alcance uma inteligibilidade que antes se esgotava na idéia separada
ou no conceito aristotélico. Assim a existência ganha cidadania e alcança o status
de realidade que participa do ser, por isso ela é inteligível e ao mesmo tempo tem
sua primazia na sua relação com a essência, alcançando, portanto, a condição da
própria perfeição.
No fim do primeiro capítulo, Lima Vaz traz para arena da discussão filosófica
a originalidade da posição tomásica que se constitui como uma intuição metafísica
assentada na inteligibilidade radical do ato de existir e discute sua significção
naquele momento histórico para, em seguida, indicar sua significação para o
53
homem moderno. Tal metafísica não se configurou como uma posição de
compromisso entre aristotelismo e cristianismo. Mas foi a síntese, por excelência,
que reuniu aristotelismo e cristianismo sem prescindir dos elementos platônicos – o
exemplarismo e a teoria da participação – definitivamente integrados às bases do
filosofar cristão125.
Tomás de Aquino e a
Modernidade
O pensamento tomásico não se constitui apenas como uma prolongação
das linhas aristotélicas de pensamento. Tomás sempre teve como foco principal
a visão bíblico-cristã. E foi a partir da contemplação do mistério criador de Deus que
emerge a metafísica do ato de existir, que se apresenta como “o pólo conjugado da
sua própria contemplação teológica”126.
De forma clara e distinta já é possível, neste capítulo, vislumbrar teses que O século XIII
e a Modernidade
serão encontradas no núcleo do Raízes da Modernidade. Pois, ao trabalhar
sobre os temas da liberdade, da beatitude e do teocentrismo Lima Vaz realiza seu
trabalho de Erinnerung e justifica a atualidade do pensamento tomásico à medida
que sua filosofia possa significar algo para o homem contemporâneo. Esse trabalho,
bem como toda a filosofia vaziana, será feito tendo como pano de fundo o tema da
gênese da modernidade.
125
. EF I, p.31.
126 . EF I, p.33.
127 . Revista Portuguesa de Filosofia, n.30, (1974), pp. 39-78
128 . EF I, p.38.
54
contestação da subjetividade que se insurge contra o domínio implacável das
estruturas, em nome da gratuidade originária do ato livre"129.
Neste momento, não será apresentada a reflexão de Lima Vaz sobre o tema
da beatitude e da liberdade, tema do capítulo sobre o qual esta seção trabalha. O
foco continua sendo a metafísica do existir no aprofundamento dado por Lima Vaz.
A referência ao tema da beatitude será apenas a ocasião para apresentar outras
características fundamentais do pensamento ora estudado.
129
. EF I, p.38.
130 . EF I, p.40.
131 . EF I, p.40.
132 . EF I, p.56.
55
A linhagem do tratamento que está sendo dado ao tema em questão é,
evidentemente, de matriz ou de inspiração hegeliana133.
133 . EF I, p.56.
134 . EF I, p.56. Esta página é muito esclarecedora para compreensão do pensamento vaziano.
135 . EF I, p.38.
136
. EF I, p.57.
137 . EF I, p.57.
138 . Tomás de Aquino, De Pot. Q.7, a.2, ad 9m: C'est pourquoi il est clair que ce que j'appelle l'être
est l'actualité de tous les actes et c'est pour cela qu'il est la perfection de toutes les perfections.
Et il ne faut pas comprendre qu'à ce que j'appelle être on ajoute quelque chose de plus formel que lui,
le déterminant, comme l'acte (détermine) la puissance; car un être qui est de ce genre est différent
selon l'essence de ce à quoi il est ajouté pour le déterminer. Mais rien ne peut être ajouté à l'être qui lui
soit extérieur, puisque rien en lui n'est extérieur sinon le non être, qui ne peut être ni forme ni matière.
C'est pourquoi, l'être n'est pas déterminé ainsi par autre chose comme la puissance par l'acte, mais
plutôt comme l'acte par la puissance. Car dans la définition des formes, on place les matières propres
par la différence du lieu, comme quand on dit que l'âme est l'acte du corps organique. Et de cette
manière, cet être est distingué de cet autre dans la mesure où il est de telle ou telle nature
(http://www.tradere.org/biblio/thomas/potentia/potentia.htm).
139
. TOMÁS DE AQUINO, Suma Teológica, I q. 4, a.1 sol 3: “deve-se responder que o ser é o que há
de mais perfeito entre todas as coisas, pois a todas se refere como ato. E nada tem atualidade senão
enquanto é; o ser é, portanto, a atualidade de todas as coisas, até das formas”.
56
Aquino de forma análoga ao Sein da lógica de Hegel140, a saber, como uma
imediatidade não-refletida141.
Nessa etapa da obra vaziana, a metafísica do existir está sendo Metafísica do existir e
beatitude
trabalhada a partir do problema da beatitude. Desta forma a primazia da
identidade absoluta do ato de existir é ‘refletida’ como primazia absoluta do fim
último ou como beatitude perfeita de uma natureza que também é razão e como tal
é capaz de pensar o Absoluto como absoluto de existência.
57
"que se autodiferencia ad intra (processões trinitárias) e que matém, na
diferença ad extra (criação), a identidade do movimento real ou histórico da
criatura racional no retorno ao seu Princípio ou no caminho para a sua beatitude
final"146.
146
. EF I, p.59.
147 . EF I, p.66.
148 . EF I, p.66.
149 . EF I, p.66
58
Essa ‘civilização da Razão’, orientada pelo trabalho inaugural dos
gregos, estruturou-se como um “discurso sobre a physis na sua majestosa
grandeza e na eternidade dos seus ciclos”.
"É a physis divina que se apresenta como objeto para a atividade mais
alta da Razão ou do logos, para a theo-logia com a qual a filosofia finalmente se
identifica como forma teórica (no sentido theoría contemplação) da Razão"150.
Mais uma vez é possível encontrar já nesse instante do iter vaziano sinais
evidentes de seu esforço por demonstrar as raízes metafísicas e medievais da
modernidade.
Ainda que não se possa afirmar que o Doutor Angélico possua “uma forma
de pensamento antropocêntrica”, é possível dizer que sua filosofia será um passo
decisivo para a inflexão antropocêntrica da Razão, realizada efetivamente apenas
quando a nova representação do mundo suscitada pela revolução científca substituir
a representação cosmocêntrica da filosofia grega.
150
. EF I, p.66
151 . EF I, p.66
152 . EF I, p.67.
153 . EF I, p.67.
59
reconstrução do mundo a partir de um sistema de leis que enxerga o mundo
como um universo de fenômenos segundo a medida de modelos edificados pelo
sujeito154.
Num dos pólos do dualismo superado por Tomás estava a ordem eterna
das essências e seu Princípio criador. No outro lado estava a eternidade da matéria.
Mas a modernidade instaurou um novo dualismo no qual se confrontam, de um lado
a subjetividade legisladora dos fenômenos e de outro lado o domínio inacessível da
realidade em si mesma, da realidade numenal.
Hegel supera este dualismo levando a cabo uma filosofia que se afirma um
pensamento da identidade (dialética) e da diferença que se constitui como lógica do
Absoluto156.
154 . EF I, p.67.
155 . EF I, p.68.
156 . EF I, p.68.
60
O primeiro dualismo foi enfrentado por Tomás. O segundo por Hegel.
Lima Vaz é herdeiro desses dois pensadores. Do primeiro, ele recebe o conteúdo ou
a matéria. Do segundo, Lima Vaz recebe a forma ou o método. E será com estas
duas grandes ferramentas conceituais que ele construirá sua filosofia.
Gráfico 5 – Dualismos
Antiguidade Modernidade
DUALISMO DUALISMO
Cosmocêntrico antropocêntrico
Matéria Forma
Conteúdo Método
157 . EF I, p.69.
61
teocentrismo torna-se um lugar privilegiado de inspiração para que se
estabeleçam formas fecundas de superaração do dualismo gerado pelo
antropocentrismo da modernidade. O esforço de Lima Vaz irá se orientar para a
constituição de um pensamento da totalidade que parta de uma identidade original e
absoluta que possa ser denominada como o sentido radical e que, ao mesmo
tempo, não possa ser pensado a partir da irredutível diferença dos dualismos que
opõem o homem ao mundo, o homem a si mesmo, a natureza à cultura, o indivíduo
à sociedade, a contingência à necessidade, o destino cego à liberdade e,
finalmente, o lógico ao real.
158 . EF I, p.71.
159 . EF I, p.74.
160 . EF I, p.84.
62
mitos do saber técnico que substitui, no nosso mundo, a submissão às entidades
sobrenaturais nas sociedades sacrais"161.
161 . EF I, p.84.
162 . EF I, p.84.
63
contraponto de toda a reflexão anterior sempre foi o horizonte da modernidade
que impôs seus interditos ao pensamento do Absoluto.
O desafio de
Lima Vaz
E.1. Nesta seção e na próxima, será apresentado o tema da compreensão
genética da modernidade numa fase pré-sistémática do pensamento vaziano, a
partir dos temas do mundo, do sujeito, da ética e do direito.
Mas esse caminho foi vedado pela filosofia moderna, responsável que foi
pelo refluxo da transcendência para a imanência do sujeito. E nesse horizonte se
coloca o maior desafio teórico a ser enfrentado por Lima Vaz: repensar o Absoluto
transcendente no clima filosófico da modernidade, inspirado sobretudo na tradição
cristã165. Juntamente com este desafio está a tarefa de pensar uma antropologia que
seja coerente com a perspectiva vaziana.
163 . EF III, p.257. Nota 8: “Convém ter presente aqui que todas as variantes pós-cartesianas da teoria
64
intenção filosófica, buscam formas para pensá-lo dentro das fronteiras de uma
conceitualidade antropológica, de tal sorte que se estabeleça, em princípio, uma
separação radical entre Absoluto e transcendência. Um absoluto imanente ao
mundo humano ou nele encontrando o único lugar do seu ser e da sua
expressão, tal o gigantesco desafio especulativo que atravessa a filosofia
moderna e que encontrou no Sistema hegeliano sua mais grandiosa resposta.
História, Sociedade, Tecnociência, ou o Ser mesmo, mas sujeito ao pastoreio
do homem, segundo a metáfora de Heidegger, como desenhar a face humana –
a face a ser reconhecida pelo homem moderno – do Absoluto?”166
Não obstante Lima Vaz tenha realizado, ele mesmo, a divisão da sua
jornada filosófica em três grandes fases é possível detectar desde o início de sua
produção filosófica a emergência do tema da Modernidade com suas aporias e seus
desafios tal como já foi brevemente demonstrado em algumas passagens
anteriores.
65
inóspita à inteligência, das ‘proposições sem significação’? O empirismo lógico dos
neopositivistas e a repugnância existencialista a uma expressão racional do
transcendente obrigam-nos, em última instância, a formular estas graves
interrogações"169.
A partir disto, em toda obra vaziana podem ser encontrados sinais dessa Etapas pré-
sistemáticas da
preocupação. Esses sinais podem ser encontrados de forma dispersa, no interior de gênese da
modernidade
reflexões que se constituíram em torno dos temas do Absoluto, da História, do
Sujeito, da Natureza e do Ethos. Esses temas são nucleares no interior do
pensamento vaziano e a partir do seu entrelaçamento fornecem a urdidura da
compreensão da modernidade buscada por Lima Vaz e a tessitura de seu sistema.
Esses temas convergem e estabelecem uma organização conceitual seja a partir
da perspectiva temática (compreensão genética da modernidade / metafísica do
existir), seja a partir da perspectiva sistemática (via compositionis / via resolutionis).
O tema
No livro Ontologia e História e, mais especificamente no artigo Ciência e do mundo
Ontologia da Natureza é possível encontrar uma reflexão pré-sistemática sobre o
tema do Mundo que só alcançará seu termo na Antropologia Filosófica com a
categoria de objetividade e no capítulo 10 do Raízes da Modernidade – O
Problema da Criação171. É nessa reflexão sobre o tema do mundo (no livro
Ontologia e História) que Lima Vaz inaugura a sua reflexão sobre a gênese da
modernidade.
Ética e Direito
Mas será apenas no Ética e Cultura que a convergência entre os temas
começa a alcançar uma certa centralidade e com isto torna-se possível tomar com
as mãos o fio de Ariadne que guiou toda a formação da compreensão genética da
modernidade.
66
Direito172 e do cotejo entre dois tipos de universalidades distintas: a
universalidade nomotética e a universalidade hipotético-dedutiva. Esse foi o primeiro
momento em que Lima Vaz apresentou uma elaboração mais organizada e mais
precisa conceitualmente a respeito das diferenças existentes entre o horizonte da
filosofia clássica e a nova paisagem da filosofia moderna. Ao realizar o cotejo entre
a universalidade nomotética e a universalidade hipotético-dedutiva, ele o fez
considerando a natureza ontológica das relações entre Ética e Direito na Filosofia
Clássica e a ruptura desse tipo de relação entre Ética e Direito nos tempos
modernos.
Etapas sistemáticas
Em seguida, o tema da compreensão genética da modernidade foi se da genética da
modernidade
desdobrando em outras formas e articulações conceptuais que atingiam,
gradualmente, uma profundidade sempre maior no empenho vaziano de
compreender a Modernidade.
Objetividade
Na Antropologia Filosófica, a temática da compreensão genética da
modernidade atinge um estágio superior de articulação na primeira categoria de
relação, a categoria de objetividade e, mais especificamente no nível da
compreensão explicativa, fechando uma reflexão que fora iniciada no Ontologia e
História. Ao mesmo tempo, é possível notar que a reflexão realizada em 1968 por
ocasião do último capítulo desse texto, O Absoluto e a História alcança uma forma
acabada e sistematizada com a Antropologia Filosófica.
Matriz ternária,
Em seguida, o problema da compreensão da modernidade vai se mostrar a absolutização da
práxis, o nihilismo e o
partir do desenvolvimento de vários temas, tais como a questão da inversão da tempo
dialética mensurante-mensurado, da desarticulação da matriz ternária Princípio-
ordem-indivíduo, da absolutização da práxis, do problema do niilismo, da
transformação na concepção do tempo e finalmente a partir da busca pelas raízes
medievais (ou metafísicas) da Modernidade, quando ocorre a substituição da
primazia da inteligibilidade da essência pela primazia da inteligibilidade da
existência a partir da metafísica do existir de Tomás de Aquino. Essas formas
distintas de tratamento do mesmo problema foram elaboradas nos Escritos de
Filosofia III, IV, V e VII.
67
seu momento de maior refinamento filosófico no capítulo Tomás de Aquino: do
ser ao Absoluto quando é apresentada novamente a metafísica do existir de São
Tomás e a relevância das posições de Hegel e Heidegger a respeito da metafísica
Clássica.
Crise ética
68
sobre a possibilidade de uma ontologia da natureza e concluindo que tal
reflexão conduz inevitavelmente ao tema do Absoluto.
Argumento de
O texto é iniciado com a afirmação de que a filosofia da ciência só pode retorsão
existir dentro de um horizonte mais vasto “em que a tensão necessária entre o
‘sujeito’ e o ‘mundo’ impõe à razão filosófica a constituição de uma filosofia da
natureza”173, pois a oposição eu-mundo se desdobra em todos os níveis da
consciência humana, afinal a consciência sempre é consciência de alguma coisa.
Mas para se buscar a edificação de uma filosofia da natureza é necessário refutar a
recusa neopositivista em ultrapassar a reflexão da ciência a partir de seus métodos,
suas estruturas semânticas e suas formas lógicas. E tal refutação Lima Vaz realiza
com o argumento de retorsão, afirmando que o juízo através do qual o neopositivista
interdita a possibilidade de uma filosofia da natureza que se pronuncie sobre o ser
do mundo (distinto de sua tradução em termos de objeto científico) já traz em si uma
afirmação sobre esse ser: a afirmação de sua “identidade com as formas de sua
expressão lógico-científica”174.
Com isso, o tema do mundo se coloca para Lima Vaz, como uma questão
filosófica ineliminável176, afinal o mundo é o limite circundante das estruturas
intencionais da consciência e quando ela pronuncia qualquer juízo sobre o ser dos
objetos do mundo, em última análise se encontra implicado o problema mesmo de
uma filosofia da natureza. É na autoposição da consciência como estrutura
intencional que coloca a possibilidade mesma de uma filosofia da natureza, que por
sua vez se constitui como uma exigência fundamental da intencionalidade filosófica.
69
uma recuperação histórica dos termos do problema, cotejando a visão clássica
e grega do mundo com a visão moderna da ciência de matriz galileano-newtoniana.
ONTOLOGIA DA
E.3. A ciência helênica das essências foi substituída por uma ciência de leis. NATUREZA e o
sujeito
O mundo contemplado tornou-se um mundo construído. À essência como realidade
dada sucedeu-se a lei como hipótese verificada. O ‘eu’ inteligível da contemplação
teve seu lugar tomado pelo ‘eu’ construtor (ou demiurgo do universo técnico) para
quem a evidência matemática é o lugar da verdade clara e distinta179. No entanto, a
evolução da ciência moderna fez com que o ‘eu’ se neutralizasse para que os
“centros de referência da interpretação (e da construção) do ‘mundo’ se ‘objetivem’
como matrizes de relações matemáticas.
177
. OH, p.110.
178 . OH, p.113.
179 . OH, p.115.
180 . OH, p.115.
70
Essência como realidade dada Lei como hipótese verificada
Neste primeiro momento é possível perceber que Lima Vaz trabalhou com
duas noções centrais: a noção de ‘eu’ e a noção de ‘mundo’. E apresentou, a partir
da questão sobre a possibilidade de uma ontologia do mundo, as transformações
conceituais que orientaram a gênese da modernidade no espaço da física-
matemática alterando profundamente ambas as noções. O ‘eu’ inteligível e
transcendental dos clássicos tornou-se um ‘eu’ artífice, construtor de toda a
realidade circundante nos termos possibilitados e oferecidos pela algebrização
cartesiana da matemática e da geometria que de ora em diante poderá ser aplicada
71
ao mundo. E o mundo, por sua vez, tornou-se a ‘natureza’ tecno-científica,
descrita na linguagem exata e precisa da matemática.
Ética
É importante notar que a transformação realizada na compreensão da ética e Direito
e do direito tem suas raízes mais profundas nos termos da seção anterior. A virada
conceitual na Ética e no Direito depende, em última análise, da evolução do
conceito de natureza, que, por sua vez, depende da noção de ‘eu’.
Eu inteligível Eu construtor
→
↓ ↓
Mundo Natureza técno-científica
→
↓ ↓
Relação ontológica entre Ruptura da relação entre
ética e direito → ética e direito
72
Agora, portanto, será o momento de apresentar os termos desse passo
decisivo na constituição da modernidade a partir das perspectivas da Ética e do
Direito.
Revolução
O fenômeno que forjou os pressupostos epistemológicos da passagem do Científica
horizonte clássico (universalidade nomotética) para o horizonte da modernidade
(universalidade hipotético-dedutiva) foi a Revolução Científica, também responsável
pela matematização da física e pela pretensão matematizante de compreensão da
realidade. Um dos efeitos mais significativos desta revolução cultural foi a
emergência da técnica como fator determinante de abordagem da natureza.
Universalidades
Ao mesmo tempo é possível detectar uma oposição histórica marcada pelas
diferenças entre a antropologia política clássica e pela antropologia política
moderna. Na primeira, o direito tem a forma de uma universalidade nomotética. Na
segunda, o direito assume as características de uma universalidade hipotético-
dedutiva.
encontra oculto e precisa de uma explicação oriunda de uma primeira hipótese, não
verificada empiricamente, que tem a necessidade de ser dedutivamente corroborada
pelas suas conseqüências185. O primeiro caso pertence ao âmbito da ontologia
antiga. O segundo caso encontra-se sob a égide do pensamento científico moderno.
Naquele caso a política e a ética conservavam uma relação intrínseca com a ética, e
tal relação desmoronou com o advento da modernidade à medida que a política
constituiu-se como esfera autônoma e independente da normatividade ética.
Freqüentemente a política passa a se opor a qualquer tipo de normatividade ética.
73
A relação entre ética e direito no pensamento clássico estava assentada
correspondência entre
sobre a correspondência existente entre a ordem do cosmo e a ordem da cidade o cosmo e a cidade
“sob a soberania de uma mesma lei universal que inspira as primeiras tentativas de
definição de uma esfera do direito e da justiça” à qual o homem buscava se elevar
para desvencilhar-se de um mundo marcado e determinado pela violência e pelo
caos186.
74
O mundo humano está submetido à ordem do universo. Em
contraposição à noção de autonomia moderna, há no horizonte grego a primazia da
noção de cosmonomia.
Tal concepção estabelece uma união inconsútil entre lei e natureza – entre
physis e nómos que será desalinhavada quando a filosofia moderna elaborar um
novo conceito de natureza, distinto do conceito grego de physis.
Ruptura
A ruptura com a tradição clássica e a passagem da universalidade
nomotética para a universalidade hipotético-dedutiva decorre da emergência de uma
nova forma de razão, por um lado, herdeira da razão grega, por outro lado, a ela
oposta. A razão moderna elaborou uma nova visão de homem e uma nova visão de
natureza que não comportavam os traços constitutivos da universalidade
nomotética. Conseqüentemente serão delineadas novas teorias morais e
190
políticas .
A idéia de
Neste momento de sua apresentação da mudança de universalidades, Lima natureza
Vaz dirige seu foco para a transformação do conceito de natureza.
Essa nova relação do homem com o mundo será responsável pela formação
de uma nova “constelação de valores polarizados em torno do problema da
satisfação das necessidades”. E a organização sociopolítica será determinada
exatamente por este problema.
75
transforma profundamente a própria idéia de natureza na sua relação com o agir do
homem"192.
A visão moderna de natureza, faz com que esta seja destituída das
características da physis clássica. A natureza não é mais o fundamento de uma
ordem imutável à qual se deva referir a práxis humana.
A modernidade faz com que surja uma nova homologia entre natureza e
sociedade, e assim, a nova maneira de compreender a natureza também será
aplicada à sociedade, inaugurando uma nova forma de compreender a política, a
ética, o direito.
76
sociedade que é, ao mesmo tempo, negação e continuação daquela situação
originária.
Refluxo
Contudo, a ruptura ocasionada pela mudança de horizontes provocou a da ética
separação entre ética e direito ou entre ética e política fazendo, sobretudo, com que
o espaço da ética sofresse um refluxo para o campo do subjetivo e do irracional,
juntamente com a religião e com outras formas de conhecimento.
77
separação entre ética e direito acontece a fragmentação da imagem de homem
na pluralidade dos universos culturais, o que torna mais difícil a adequação das
convicções individuais e das liberdades individuais com uma constelação de valores
reconhecidos universalmente e que possam ser legitimados num sistema de normas
e fins posto pela sociedade198.
198
. EF II, p.174.
199 . EF II, p.178.
200 . EF II, p.147.
201 . EF II, p.180.
78
Quadro 3 – Quadro comparativo das universalidades nomotética e hipotético-
dedutiva202
NOMOTÉTICA HIPOTÉTICO-DEDUTIVA
Correspondência entre a ordem cósmica e a Pensamento ético, social e político submetido aos
ordem da cidade sob a soberania de uma princípios epistemológicos e às regras metodológicas da
mesma lei universal que inspira as primeiras nova ciência da natureza, ciência de tipo hipotético-
tentativas de definição de uma esfera do direito dedutivo, e tendo a análise matemática como seu
e da justiça à qual o homem deve elevar-se instrumento privilegiado – paradigma da mecânica
para libertar-se do mundo da violência e do galileiano-newtoniana163/165
caos148
Cosmonomia Autonomia
Relação INTRÍNSECA entre Ética e Política Relação EXTRÍNSECA entre Ética e Política
Política como esfera independente da normatividade ética
e freqüentemente oposta a ela147
Referência constitutiva da ação política a uma Mito do começo absoluto – sem tradição
tradição252
Política como arte e sabedoria Política como técnica racionalmente otimizada do exercício
do poder 254 e 257
Política como PRÁXIS Política como TECHNÉ,
é julgada pelos critérios da auto-realização do ou como arte de persuadir e comandar
homem segundo os critérios da verossimilhança e da força157
ou do seu ser-em-razão-de-si-mesmo
MELHOR CONSTITUIÇÃO MELHOR CONSTITUIÇÃO
é a que defende as condições melhores para a é a que garante mais eficazmente o exercício do poder258
prática da justiça258
Hierarquia de fins Jogo de Forças
Ciência política tem como objetivo definir a Ciência Política trabalha com hipóteses que permitem
forma de racionalidade que vincula o livre agir deduzir um plano mais rigoroso para o exercício eficaz do
do cidadão à necessidade, intrínseca à própria poder,
liberdade, e portanto, eminentemente ética, de vem a ser, para o domínio mais completo do espaço
conformar-se com a universalidade da justiça259 onde as liberdades individuais podem mover-se258
Critérios do bem melhor e mais perfeito Critérios do útil e do eficiente265
NOMOTÉTICA VONTADE DE PODER
regida pela razão do melhor: trata-se de que se impõe como constitutiva do político sem outra
legitimar o poder pela justiça na perspectiva de finalidade a não ser ela mesma e sem outras razões
uma teleologia do Bem e fazer assim, da legitimadoras senão as que podem ser deduzidas da
vontade política, uma vontade instauradora de hipótese inicial da sua força soberana
leis justas
Racionalidade Política ordenadora de uma Racionalidade Técnica que obedece à racionalidade da
prática em vista de um FIM que é a justiça na causa eficiente e dos seus instrumentos, e que esgota seu
cidade259 FIM na eficácia do seu exercício258
História-tradição História-ciência
Anterioridade da comunidade na qual Hipótese do pacto social que reúne,
o indivíduo encontra-se inserido numa sociedade organizada, os indivíduos dispersos
NATUREZA NATUREZA
é a physis na imutabilidade da sua ordem e como campo de fenômenos que se oferece à atividade
fundamento de um nómos objetivo ao qual deve conceitualizante e legisladora da razão e à atividade
referir-se a práxis humana163 transformadora da técnica
TRAGÉDIA ANTIGA: POLÍTICA MODERNA
DESTINO que age sobre as liberdades FAZER na ordem da
do alto de um céu misterioso causalidade eficiente
CAPRICHO DOS DEUSES258 RAZÕES DO PODER258
A questão fundamental da ANTIGA FILOSOFIA A tarefa primordial do PENSAMENTO MODERNO é
PRÁTICA no âmbito da vida social, era a propor uma solução analítica satisfatória ao problema da
determinação dos requisitos essenciais que associação dos indivíduos, tendo como alvo assegurar a
asseguram ao homem, como cidadão, exercer satisfação de suas necessidades vitais163
na sociedade política os atos próprios da vida
virtuosa ou da vida ordenada para o bem da
cidade163
Tempo qualitativo Tempo quantitativo
Passado e Presente como componentes Predomínio do fazer técnico onde o TEMPO é cálculo e
202 . Os números no interior das células do quadro indicam as páginas do livro EF II.
79
estruturais de um TEMPO QUALITATIVO, que previsão; o tempo se distende todo na planificação e
se articulam dialeticamente para constituir o domínio do FUTURO255
TEMPO HISTÓRICO, o tempo do ethos ou da
tradição20
Ethos que organiza qualitativamente o TEMPO Esvaecer-se do horizonte da tradição em face do avançar
PASSADO numa perspectiva axiológica em do TEMPO QUANTITATIVO ao qual a história-ciência
cujo prolongamento – pela reiteração, pelo parece submeter-se e que abre largo espaço para o
confronto ou pela transgressão – deverão niilismo ético e político253
situar-se as opções ético-políticas do TEMPO
PRESENTE253
A primazia do tempo quantitativo transfere do passado para o futuro a instância normativa do tempo ou o
seu centro de gravidade: o que significa conferir ao tempo por vir os predicados axiológicos que
asseguravam a exemplaridade do passado na formação do ethos tradicional20 .
203 . EF V, p.118.
80
Segundo Capítulo
A metafísica do existir
81
SEGUNDO CAPÍTULO – A METAFÍSICA DO EXISTIR
82
qual está a resposta à pergunta sobre a possibilidade radical do sujeito como
sujeito204.
A Antropologia Filosófica vaziana é socrática, pois é um saber do sujeito e
não só sobre o sujeito. A organização desse saber deve exprimir, no nível filosófico,
o processo real e total do autoconstituir-se do homem como sujeito. A subjetividade
emerge no coração da compreensão filosófica.
Portanto, a Antropologia procederá à objetivação conceitual e discursiva da
subjetividade humana (homem-sujeito enquanto sujeito). E tal experiência não se
refere à subjetividade abstrata do EU PENSO, mas se trata de uma experiência
situada, pois o homem só pode tornar-se objeto de si mesmo na pergunta filosófica
enquanto situado, i.e., enquanto circunscrito pela finitude da sua situação.
Os contornos da situação humana fundamental a serem traduzidas nas
Experiência
dimensões da experiência filosófica são: a Natureza, a Sociedade, o Eu. Segundo
Lima Vaz, experiência é uma interpenetração de presenças; a presença do homem
é uma presença no mundo, um ser-com-os-outros e uma presença a si mesmo.
Dessa forma, tais dimensões se abrem para a transcendência que nenhuma
experiência ou conceito pode circunscrever e constituem o ser homem como um
itinerário para o Absoluto.
Lima Vaz faz com que os temas mais significativos de seu iter filosófico
alcancem uma convergência conceitual no tema do sujeito como expressividade e,
ao mesmo tempo, lança o homem em direção ao Absoluto.
A parte sistemática é constituída pelas regiões categoriais de estrutura
(corpo, psiquismo e espírito), de relação (objetividade, intersubjetividade e
transcendência) e de unidade (realização e pessoa).
A unidade das categorias de corpo próprio, psiquismo e espírito instauram o
Categorias
domínio estrutural do homem. Tal domínio corresponde ao ser substancial do ser antropológicas
humano ou à sua unidade ontológica, que, enquanto unidade, o faz distinto dos
outros seres; tal distinção já coloca o homem em face do seu universo de relações e
o constitui como ser finito (noção de finitude), “o que diz respeito à multiplicidade na
ordem do ser”. Tal fato, por sua vez, implica “a finitude dos seres múltiplos e a
infinidade do Uno ao qual o múltiplo se opõe”205. A finitude apresenta-se pois como
noção metafísica. Contudo, o homem “defronta-se com a multiplicidade dos seres
organizados na forma de um mundo” e tal fato constitui o homem como um ser em
situação e como um ser-no-mundo. A situação206 apresenta-se pois, como uma
noção antropológica. E porque é finito e situado, o homem torna-se um ser relativo
204 . AF I p.160.
205
. AF II p.141.
206
. A noção de SITUAÇÃO será recuperada na Ética – na parte sistemática – e se fará presente como
o momento intermediário (particularidade) de todas as etapas de desdobramento da Razão Prática,
seja na dimensão do AGIR ÉTICO, seja na dimensão da VIDA ÉTICA.
83
aos outros seres e esse seu ser-em-relação encontra sua manifestação nas
categorias de objetividade, intersubjetividade e transcendência.
O discurso antropológico parte da unidade estrutural do eu, constituída pelas
Organização
categorias de corpo próprio e psiquismo que convergirão para a categoria de categorial
207
. AF I, p.201.
208 . AF I, p.201.
209 . AF I, p.202.
210 . AF I, p.202.
84
consentimento ao Ser (enquanto bem)211. Em virtude de sua amplitude
transcendental, o espírito não é uma estrutura ontológica do homem ligada,
irrevocavelmente, à contingência e finitude humanas, tal como ocorre com as
categorias do corpo e do psiquismo.
211
. AF I, p.202.
212 . AF I, p.202.
213 . AF I, p.202.
214
. A apresentação das características metodológicas da Antropologia Filosófica será realizada no
próximo capítulo.
85
também pode ser caracterizada pela emergência da consciência racional215 que
pode ser considerada uma forma diferenciada de consciência que se caracteriza por
dois traços fundamentais para a formulação da dialética do espírito: 1. a prioridade
em-si ou normatividade absoluta do objeto na sua intrínseca essencialidade – na
sua verdade e na sua bondade; 2. a prioridade para-si ou normatividade absoluta
do sujeito na plenitude imanente do seu ato, que tem em si mesmo a sua própria
perfeição216.
215
. AF I, p.205.
216 . AF I, p.205.
217
. AF I, p.206.
218 . AF I, p.206.
219 . AF I, p.206.
220 . AF II p.73.
86
mundo) mediante a qual o mundo é para o homem algo compreendido e
significado pelo próprio sujeito.
ESTRUTURA
NOÉTICO-PNEUMÁTICA
PERFECTIO SIMPLEX
χ
Amplitude transcendental a VERDADE o BEM Amplitude transcendental
da VERDADE é o BEM é a VERDADE do BEM
ACOLHIMENTO da INTELIGÊNCIA da LIBERDADE CONSENTIMENTO
ESTRUTURA DIALÉTICA
DE IDENTIDADE NA
DIFERENÇA
SUPRASSUNÇÃO
DAS OPOSIÇÕES
EU CORPORAL EU PSÍQUICO
Compreensão
A.3. Compreensão explicativa – Certas operações do espírito podem ser explicativa
objeto da ciência. É possível estudar a linguagem mediante os mais variados ramos
das ciências da linguagem, é possível estudar o ato livre através da Psicologia da
Vontade, as operações cognitivas através das novas ciências da cognição e das
neurociências. Mas não há como se aplicar os procedimentos metodológicos
próprios da explicação científica para o espírito como tal. Afinal, sendo ele
reflexividade consigo mesmo, torna-se impossível o exercício da mediação
abstrata, própria da compreensão científica.
221 . AF I, pp.201-238.
87
A.4. Compreensão filosófica – A categoria de espírito não é
Compreensão
univocamente antropológica. Ela ultrapassa os limites da conceitualidade Filosófica
Ttranscendental:
O termo transcendental pode ser compreendido segundo dois aspectos: em sentidos clássico e
kantiano
primeiro lugar como condição de possibilidade. O espírito pertence à “estrutura
transcendental do ser do homem”. Trata-se de uma categoria ontológica interior ao
discurso através do qual se afirma o ser do homem223. O segundo aspecto do termo
transcendental corresponde ao sentido clássico que compreende a noção
transcendental como uma noção análoga ao ser, que ultrapassa as fronteiras
humanas obedecendo ao “movimento lógico da analogia de atribuição que aponta
para o espírito absoluto e infinito como princeps analogatum”224.
Aporética histórica
Na filosofia clássica greco-cristã, a reflexividade está relacionada, em Platão
à ciência da idéia, em Aristóteles ao pensamento do pensamento, em Plotino à
reflexão sobre o nous e, finalmente, em Tomás de Aquino à reditio ad essentiam. Na
filosofia moderna, a partir de Descartes, a reflexividade dirige-se para a constituição
do Cogito.
222 . AF I, p.208.
223 . AF I, p.208.
224 . AF I, p.209.
88
A dimensão transcendental do espírito como synesis ou como
reflexividade absoluta, ou, ainda, como pensamento do pensamento tem seu
momento inaugural com a teologia do nous em Anaxágoras, e atravessa a história
da filosofia com Platão, Aristóteles, Plotino e com o neoplatonismo. Mas será
apenas com Tomás de Aquino que se alcança a formulação definitiva do
“conhecimento de si do espírito absoluto na identidade da sua essência e da sua
existência”225. Este tema reaparecerá no idealismo, e alcançará seu ápice com
Hegel “que faz do conceito de espírito, coroado pelo espírito absoluto na sua
absoluta reflexividade, o conceito central de sua filosofia”226.
225 . AF I, p.212.
226 . AF I, p.212.
227 . AF I, p.212.
89
Quadro 4 – O quiasmo do Espírito: Verdade e Bem
Verdade
Perfeição Unidade Ordenação Reflexividade
Pneuma nous logos Synesis
ato unidade ordem reflexividade
Bem
Perfeição Unidade Ordenação Reflexividade
Pneuma nous logos Synesis
vida independência norma fim
Aporética
Lima Vaz realiza a aporética do espírito considerando-o primeiramente como crítica
estrutura racional, e depois como estrutura volitiva. Ao chegar na aporética crítica
os termos do problema retornam ao núcleo da metafísica do existir e à tensão entre
as dimensões categorial e transcendental do espírito.
228 . AF I, p.217.
229 . AF I, p.217.
230 . AF I, p.217.
90
absoluta do espírito enquanto tal, e a particularidade da estrutura
psicossomática”231 mediante a qual ele se coloca no espaço e no tempo do mundo.
231 . AF I, p.218.
232
. AF I, p.218.
233 . AF I, p.219.
234 . AF I, p.219.
235 . AF I, p.219.
91
o ser na sua forma inteligível, ou na perfeição do seu ato. Pela liberdade o
espírito é consentimento, ou inclinação ao ser na sua existência. Mas a estrutura
categorial do espírito no homem (como inteligência e liberdade) é limitação da
infinitude do espírito em-si na sua relação transcendental com o ser. O ato de existir
é, ao mesmo tempo, a. ponto de entrelaçamento entre liberdade e inteligência, b.
perfeição absoluta decorrente da primazia do próprio ato de existir na dialética do
espírito, e, c. caminho que conduz à afirmação do espírito absoluto como Existente
absoluto – Ipsum esse subsistens. No Existente absoluto a “diferença retorna na
identidade absoluta da inteligência e do inteligível (Verdade)”236 e na identidade
absoluta da liberdade e do amável (Bem). A primazia do ato de existir “confere ao
espírito a primazia na ordem das pefeições do ser”, e faz com que esta categoria
seja o “fecho da abóbada da estrutura ontológica” do ser humano.
236 . AF I, p.219.
92
B.1 A reflexão de Lima Vaz sobre a transcendência parte do seguinte
paradoxo subjacente à cultura ocidental: sobre o planeta apareceu a primeira
civilização efetivamente universal que não se reconhece em nenhum sistema
simbólico consensual e universalmente aceito.
Para pensar a questão da transcendência Lima Vaz parte em primeiro lugar
de seus resultados sobre a categoria do espírito compreendida como a origem de
um dinamismo histórico mais profundo, e, em segundo lugar, da correspondente
gestação inexaurível de formas e símbolos (religiosos, filosóficos, estéticos e
mesmo sociais e políticos) que procedem do excesso ontológico, ou da
superabundância ontológica, que, já tendo sido conceitualizada filosoficamente pela
noção de espírito, no âmbito da unidade estrutural do ser humano, agora apresenta-
se como categoria de relação, vem a ser, como relação de transcendência.
“A relação de transcendência exprime como que o excesso ontológico (do
sujeito enquanto se auto-afirma como ser), pelo qual nos sobrepomos ao
mundo e à história (o que é evidente quando refletimos sobre o mundo e a
história no horizonte do ser) e avançamos, assim, além do ser-no-mundo e do
ser-com-o-outro, buscando um fundamento último para o Eu sou primordial que
nos constitui” 237.
93
Ela suprassume dialeticamente, num estágio final, as várias oposições:
exterioridade-interioridade, objetividade-intersubjetividade, superior summo-interior
intimo. A estrutura conceitual fundamental do pensamento do Absoluto é a síntese
entre interioridade e exterioridade, ou seja, a identidade na diferença entre o
transcendente e o imanente. Daí procede o paradoxo da relação de transcendência:
entre o sujeito e a transcendência não se verifica a distinção adequada entre
termos finitos e que permita falar de não-reciprocidade ou de reciprocidade.
Contudo, ela possibilita a suprassunção da tensão entre a não-reciprocidade da
relação de objetividade (transcendência do Absoluto) e a reciprocidade da relação
de intersubjetividade (Imanência do Absoluto).
94
Segundo Voegelin, a experiência da transcendência permite pensar
uma História da ordem e uma ordem da História. Para este pensador, a idéia da
participação no ser como totalidade, na qual o homem se sente justamente
integrado, manifesta-se em torno dos conceitos de essência e existência. A
essência como ser-parte no todo constitui o problema fundamental do qual emerge
a idéia de ordem. A experiência da transcendência no tempo-eixo encontra suas
expressões paradigmáticas na idéia de Revelação em Israel e na idéia de Filosofia
na Grécia. A inflexão civilizatória inerente à relação de transcendência, tem lugar
naquelas estruturas profundas do espírito onde se assentam os símbolos e
conceitos com que o homem exprime seu conhecimento da ordem do ser e sua
participação nela.
Estes símbolos e conceitos se apresentam em 4 funções típicas: 1. a
experiência da participação; 2. a preocupação com a permanência e o fluir dos
seres na comunidade; 3. o processo de simbolização da ordem do ser; 4. a
convivência em tradições distintas e a emergência do verdadeiro e do falso no
monoteísmo de Israel e na Filosofia grega.
Na esteira do pensamento de Voegelin, para Lima Vaz, a experiência
fundante da participação do Ser evidencia a pergunta pelo Princípio como
fundamento último do Ser. As tradições bíblica e grega exprimiram o Princípio,
respectivamente, como um Absoluto de existência ou como um Absoluto de
essência, isto é, como Causa eficiente primeira ou como Idéia suprema.
Esta experiência fundante da participação do Ser pode ser distinguida em
três grandes formas:
a) Experiência noética da Verdade (Filosofia Primeira, metafísica)
b) Experiência ética do Bem (Ciência da Práxis – Ética)
c) Experiência noético-ética do Absoluto
a) A experiência noética da verdade constitui o primeiro traço da Experiência noética da
verdade
diferenciação noética da consciência, assinalando a irrupção do tempo-eixo no
mundo grego. Platão foi sua expressão paradigmática. O discurso verdadeiro é
homólogo ao ser, que é propriamente o verdadeiro. Portanto, a idéia de verdade
como expressão de uma relação fundamental do homem com a realidade é um
conceito ontológico que traduz uma relação do homem com o ser. A experiência
noética da verdade supõe no homem uma homologia estrutural entre a inteligência,
na perfeição do seu ato, e o ser, no seu desdobramento, condição de possibilidade
da correspondência da intuição intelectual com a verdade. Esta experiência
metafísica (experiência do Ser ou da identidade entre ser e verdade) permite a
descoberta do fundamento a partir da presença originária do homem ao ser, que é
propriamente experimentada na reflexão do espírito sobre si mesmo.
Para Lima Vaz, Kant desarticulou o arquétipo platônico da experiência
noética da verdade, deslocando-a do plano ontológico para o gnosiológico, i.e.,
95
circunscrevendo-a às condições da experiência organizadora dos fenômenos,
ou seja, à finitude da situação do sujeito no mundo.
b) A experiência ética do bem está intimamente ligada à anterior. Sua origem
Experiência ética do
deve-se a Sócrates, tendo sido elevada por Platão ao nível metafísico, devendo a bem
96
experiência: a. da abertura ao ser; b. da inteligibilidade do ser; c. da essência
ou experiência eidética.
A pré-compreensão da relação de transcendência é o solo mais profundo
onde se enraízam todas as experiências humanas, pois ela atesta a irrupção da
transcendência na imanência, seja esta pensada no âmbito da relação de
objetividade, seja na relação de intersubjetividade. Portanto, para Lima Vaz, não é
consistente pensar qualquer experiência humana na sua contingência e na sua
faticidade, sem o pano de fundo das questões transcendentais em torno da unidade,
da verdade, da bondade, da beleza e do ser.
242 . AF II p.122.
243 . AF II p.136, nota 130.
97
A exposição vaziana da compreensão filosófica da relação de
Interdito
transcendência leva em consideração a situação atual do pensamento filosófico,
que nega o espírito e, a fortiori, a transcendência. Em outras palavras, Lima Vaz
expõe e critica o interdito kantiano e pós-kantiano à relação de transcendência. As
conseqüências primeiras dessa negação, ou interdito, são a dissolução da
inteligência espiritual e o abandono da ambição sistemática da razão. No
pensamento pós-hegeliano, a razão deixa de apontar para a transcendência e se
orienta para a imanência da história, da natureza e do homem, rejeitando toda
noção de sistema (de estrutura vertical), permanecendo na horizontalidade do
campo do operável humano. Feuerbach (projeção), Marx (alienação) e Freud
(ressentimento e ilusão) são os protagonistas da elaboração de críticas implacáveis
ao pólo da transcendência.
Em outras palavras, o termo ad quem da relação é rejeitado (seja como
Sucedâneos
Absoluto formal ou Absoluto real) e a conseqüência disto é o retorno da relação
sobre si mesma e o seu ulterior desdobrar-se no espaço da imanência, originando
diversos sucedâneos conceptuais, designados como mitos pós-metafísicos, ou
mitos de uma civilização para a qual a experiência da transcendência perdeu sua
efetividade histórica: ideologia (mito da Verdade), hedonismo (mito do Bem), história
(mito de Deus).
A filosofia dos séculos XIX e XX assiste, assim, ao florescimento dos vários
sucedâneos da transcendência metafísica: filosofias do sujeito, da história, da
existência, da linguagem e do cosmo. A procissão destes sucedâneos conduz o
homem, inexoravelmente, em direção ao niilismo ético e ontológico e à equivalência
entre o ser e o nada, e entre o bem e o mal.
“Assim sendo, a negação do espírito que percorre, sob mil formas, a filosofia
pós-hegeliana244, prolonga-se necessariamente em negação da transcendência,
tendo em vista sobretudo a sua significação metafísica. Essa negação foi
antecipada pelo interdito kantiano à possibilidade da metafísica como ciência,
negação que o Idealismo alemão tentou superar num grandioso esforço
especulativo. No entanto, de Feuerbach e Marx a nossos dias, passando por
Augusto Comte e seus epígonos, a negação do espírito e da transcendência
parece a sinalização de um non plus ultra posta ao termo de todos os caminhos
da filosofia contemporânea”245.
traz implícita a sua afirmação e, portanto, retorna sobre si mesma para negar-se, ou
seja,
"a negação da transcendência pressupõe no sujeito que a enuncia uma
abertura intencional à infinitude do Ser, pois só no horizonte dessa abertura a
transcendência pode ser pensada: e como poderia ser negada sem ter sido
pensada, isto é, de alguma maneira, posta ou afirmada pelo pensamento?246
244 . AF I p.201-202.
245 . EF III, p.200.
246 . EF III, p.201. Ver notas 15 e 17.
98
Sem discutir mais longamente essa espécie de sanção lógica inerente ao ‘monstruoso
poder do negativo’ que trazemos em nós, concluamos que a evidente finitude
do nosso espírito, situado na contingência do Mundo e da História, só pode
compor-se com a sua também evidente infinitude intencional, atestada no
pensamento do Ser, se aceitarmos obedecer à exigência lógica e existencial de
afirmar o transcendente como Absoluto do ser”247.
99
Ao afirmar eu sou para a transcendência, a universalidade do ser não
é posta pelo sujeito. Antes, pelo contrário, o transcendente põe o sujeito, que se
refere a ele de maneira constitutiva. Aqui não tem lugar a negação imposta à
limitação eidética das categorias anteriores.
Pelo princípio de totalização, o sujeito é para o Absoluto e esse ser-para
suprassume as relações de objetividade e intersubjetividade, por um lado,
compreendendo assim todos os aspectos do ser-para do homem, e, por outro lado,
constituindo-o como expressão adequada do seu ser-para-si. A síntese entre ser-
em-si e ser-para é alcançada nas categorias de unidade.
O sentido metafísico conferido à categoria de transcendência como categoria
antropológica caracteriza-se pela radical dependência do sujeito finito para com o
Absoluto. Na categoria de transcendência, a relação do sujeito finito para com o
Absoluto é uma relação real. Por sua vez, a relação do Absoluto para com o sujeito
finito é uma relação de razão ou de exemplaridade. Relação que não é relação. O
sujeito se relaciona com o transcendente não em razão de uma reciprocidade
ontológica, mas em razão da sua radical dependência. A partir desta sua existência
como ser-para-o-Absoluto, o sujeito existe como ser-para-a-verdade, ser-para-o-
bem. Na Antropologia Filosófica, a posição da transcendência manifesta-se como
termo ad quem do movimento intencional de constituição das outras categorias,
como última condição de possibilidade.
O sujeito que busca formas de se auto-exprimir e de se auto-compreender à
medida que sai de si mesmo, ultrapassa as fronteiras da sua situação, marcada pela
finitude e se afirma como um ser-no-mundo e um ser-com-o-outro.
“Ora, é justamente no encaminhar-se para a transcendência que o
itinerário perfaz a reflexão total do espírito sobre si mesmo e o sujeito pode
reencontrar-se no nível mais profundo do seu ser, onde, enquanto espírito,
acolhe o Absoluto presente como Verdade (medida), como Bem (norma) e
como Ser (fim) a todo ato de inteligência e liberdade”250.
250 . AF II p.96.
100
limites da sua situação mundana e histórica lançando-se na direção de uma
suposta realidade trans-mundana e trans-histórica:
“Sem admitir a presença antropológico-cultural desse movimento de
transcendência, ao menos a partir de certo estágio da evolução das sociedades,
permanecem enigmáticas e inexplicáveis a imensa variedade e a originalidade
dos universos simbólicos construídos pelo homem ao longo dos tempos e das
culturas, e que se organizam e perduram mediante crenças, costumes, normas,
instituições, saberes, artes. Por outro lado, interpretar esse movimento por meio
de uma hermenêutica reducionista como a proposta por L. Feuerbach e
epígonos, utilizando o mecanismo psicológico da projeção, seria empobrecê-lo
enormemente na profusão fenomenológica de todos os seus aspectos,
deixando-o finalmente sem explicação convincente”251.
101
possível a comunicação entre os sujeitos”253. Não é possível a intuição
transparente do outro, pois a contingência mundana dos sujeitos falantes é um
obstáculo intransponível254. Nesse sentido, o ser-no-mundo e a respectiva relação
de objetividade que situa o homem em meio às coisas determinam a exterioridade
do medium da linguagem pelo qual os sujeitos se comunicam. Nesse medium, “os
signos têm um corpo sonoro, escrito, gestual ou mesmo silencioso e imóvel, e,
nesse corpo, os significados se encarnam e se submetem ao jogo ambíguo do
oculto e do manifesto”255.
A partir da oposição entre natureza e história, entre exterioridade e
interioridade, entre não-reciprocidade e reciprocidade, e, em termos antropológicos,
entre relação de objetividade e relação de intersubjetividade, a tradição filosófica
conceitualizou a relação de transcendência256.
A origem do problema da transcendência encontra sua presença e sua
experiência histórica numa “poderosa aspiração difusa no corpo das antigas
civilizações que agiu no sentido de transformar profundamente suas estruturas
simbólicas e organizacionais”257. E esta experiência histórica, no coração das
civilizações, abriu para o ser humano uma nova dimensão, mais abrangente e
profunda, da relação do homem com o mundo e com o outro, enfim, com a
realidade.
“Com efeito, ela acaba dando um novo sentido às outras grandes formas da
experiência que integram a dinâmica do processo de civilização: a experiência
da transformação do mundo pelo trabalho e a experiência da edificação da
sociedade pelo reconhecimento. Desta sorte, a idéia da transcendência passa
a imprimir direções novas à ‘ordem da história como história da ordem’ ”258.
253
. EF III, p.196.
254
. AF II p.75.
255
. EF III, p.197.
256 . EF III, p.197. “Ele (o adjetivo transcendental) reúne, como é sabido, duas metáforas, uma
espacial, outra dinâmica. A primeira designa a transgressão dos limites de determinado espaço
intencional, por exemplo, na acepção com que é empregado ao nos referirmos aos atributos da noção
de Ser como atributos transcendentais ou seja que ultrapassam, na sua extensão lógica, todo conceito
limitado. A segunda exprime o movimento intencional ou lógico que leva justamente o pensamento
para além (trans) das fronteiras dentro das quais habitualmente se move. A metáfora dinâmica inclui
igualmente a indicação de uma direção para o alto (ascendere), na qual estão presentes alguns dos
problemas teóricos mais decisivos levantados pela idéia de transcendência (EF III, p.193-194).”
257 . EF III, p.206.
258 . EF III, p.205.
102
enquanto pergunta sobre o ser, exprime a experiência da “transcendência
enquanto experiência de participação na absoluta universalidade do ser”259.
“Desta sorte, as questões sobre o conhecer, o agir e o esperar são, para nós,
questões radicais porque formuladas no espaço da transcendência ou porque
avançam até as bordas do abismo infinitamente profundo que separa o ser do
não-ser e que Parmênides ousou pela, pela primeira vez, audaciosamente
devassar”260.
A exaustão do discurso
Diante desse quadro de interdição de uma experiência que por mais de dois sobre a transcendência
milênios organizou o ser do homem (seu conhecer, seu agir, seu esperar, e a forma
de compreender-se a si mesmo), Lima Vaz questiona se, de fato, teria ou não
chegado a seu termo o tempo histórico iluminado pela idéia da transcendência. Na
sua hermenêutica cultural da modernidade pós-cristã, ele se interroga, a respeito da
possibilidade da exaustão teórica e histórica do discurso da experiência da
103
transcendência, que ocupou, por tantos séculos, o lugar mais elevado no
universo simbólico da civilização. Ele se pergunta pelos rumos do homem sem a
presença da luz que a transcendência lançou nos seus recônditos mais profundos,
iluminando-o e orientando-o no seu confronto com o insondável enigma do seu
próprio mistério266.
A partir das conquistas e das opções realizadas pela modernidade pós-cristã
a constelação e o horizonte simbólico hodiernos deixaram de possuir referenciais
axiológicos definidos, impondo-se por si o espaço da hegemonia de forças
exclusivamente materiais e econômicas, que por sua própria natureza “não são
portadoras de fins e valores, a não ser o fim de uma produção sem fim, e o valor de
uso inscrito na destinação dos objetos produzidos”267. Para Lima Vaz, a mentalidade
contemporânea é marcada indelevelmente pela presença da dialética do produzir-
usar que, paradoxalmente, gera uma “crise no meio da abundância”.
“...uma crise que tem talvez sua raiz mais profunda no aumento prodigioso da
capacidade humana de produzir e no definhar, até o quase desaparecimento,
da capacidade humana de contemplar. A absolutização da práxis, essa, no seu
conceito moderno, absorvendo a antiga distinção entre o fazer e o agir, é, sem
dúvida, o núcleo dinâmico da cultura da modernidade”268.
A TEORIA DO JUÍZO
B.3.2. No capítulo Tomás de Aquino: do Ser ao Absoluto, de Filosofia e DE TOMÁS DE
AQUINO
Cultura, Lima Vaz estuda a vertente gnoseológica da teoria do juízo de Tomás de
Aquino, num esforço de ultrapassar os limites da teoria do conhecimento para
alcançar o espaço da vertente teológica da metafísica. Como experiência de
rememoração filosófica, esse capítulo pretende reabilitar o pensamento de Santo
Tomás, mostrando a atualidade da metafísica do existir no interior de um horizonte
marcado pelo irresistível avanço da técnica.
104
Lima Vaz coloca a pergunta sobre a possibilidade do homem viver
autenticamente no interior dessa forma de existência-reflexo, própria da
modernidade e que faz do mundo dos objetos a referência objetiva primordial para a
vida humana. Tal interrogação não pode ser respondida senão em termos
metafísicos e a partir do lugar teórico da metafísica tomásica do ato de existir:
Teologia grega e
Antes de atingir o núcleo da questão relativa à metafísica do existir teologia cristã
propriamente dita, Lima Vaz indica uma das razões estruturais que possibilitaram o
evento histórico-especulativo oriundo do encontro entre a filosofia grega e o kérigma
cristão: a homologia entre a dimensão teológica da filosofia grega e o teocentrismo
do cristianismo272. Todavia, concomitante a essa homologia há uma heterologia
decorrente da diferença existente entre os movimentos da theologia grega e da
theologia cristã. A constituição da theologia grega se dá através de um movimento
ascendente (anábasis) que se inicia no sensível e alcança seu termo no inteligível e,
mais especificamente, num Primeiro Princípio. A theologia cristã, por sua vez,
constitui-se mediante um movimento descendente de katábasis, à medida que o
Absoluto desce para contingência do mundo e da história273.
105
as categorias fundamentais da tradição metafísica grega”276. Ainda que a
evolução do médio e do neoplatonismo tenha alcançado um monoteísmo
protológico, no qual se aliaram mística e razão, Lima Vaz alerta que, ainda assim,
permanece o abismo conceitual entre a noção de processão plotiniana e a noção
bíblico-cristã de criação. O criacionismo bíblico277 possibilitou a conjuntura histórica
de uma filosofia cristã que repensasse a theologia grega do Princípio, exatamente a
partir da categoria da criação. As questões teóricas da tradição cristã situadas no
interior do espaço filosófico inaugurado pelos gregos se organizam como pergunta
de rerum originatione radicali.
Lima Vaz segue o caminho aberto por Étienne Gilson, segundo o qual a
“questão metafísica da existência” não é compreendida como fato contingente, mas
como ato278. Tomás de Aquino, através de sua intuição fundadora, fez do esse, do
ato de existir, o fundamento absoluto e a fronteira última que a inquirição da
inteligência humana pode alcançar.
Essência
A ciência grega do ser institui-se como ciência da Essência. A revelação e existência
bíblica da criação e do nome de Deus, por sua vez, resgata a existência do puro
acontecer. Com isto essência e existência se estabelecem como pólos dialéticos
que determinam o campo da inteligibilidade no qual se desenvolverá o “pensamento
do ser” codificado em metafísica, ou como filosofia primeira. Este é o horizonte que
se constitui como lugar teórico e ponto de partida de Tomás.
106
Quadro 5 – Anábasis e Katábasis
Grécia Israel
Anábasis Katábasis
Contemplação Revelação
ESSÊNCIA EXISTÊNCIA
Vertentes
1. Gnoseológica 2. Teológica
107
das perspectivas lógica, psicológica, gnosiológica e metafísica. No entanto, é o
ponto de vista gnosiológico que se prolonga na dimensão metafísica283.
Vertente gnoseológica
Ordem, inteligência e
O preâmbulo de Tomás na direção da construção de sua metafísica é dado fim
pelo reconhecimento do caráter sapiencial da ciência primeira. Tomás articula, no
seu comentário à Metafísica de Aristóteles284, três idéias matrizes e constitutivas da
metafísica, das quais decorre seu caráter sapiencial: as idéias de ordem, de
inteligência e de fim285. Ordem: esta idéia rege a atividade cognoscitiva do homem;
sem ela o ser humano se perderia num caos inextrincável. Inteligência: esta idéia
está ligada à idéia de ordem, pois é através da inteligência que é dada ao homem a
capacidade de contemplar a ordem universal. Mas tratando-se da Inteligência
primeira, cabe a esta a instituição da ordem. Fim: esta idéia encontra-se
intrinsecamente ligada às duas anteriores, pois o fim é aquilo cuja consecução só é
possível por causa da ordem, que por sua vez só pode ser conhecida por causa da
inteligência. Assim, a sabedoria é conhecimento da ordem, da unidade e do fim.
Enquanto o Sábio é o “ordenador do universo das razões”.
283 . Lima Vaz deixa bastante claro que sua posição se aproxima da leitura de Joséph Maréchal e
108
FILOSOFIA PRIMEIRA – “a própria natureza do conhecimento intelectivo no
qual vigora a identidade intencional entre a inteligência e o inteligível na sua
transcendência sobre as limitações da matéria”288.
109
existir, que transluz no conceito de criação e da revelação do Absoluto como
puro existir”294. Para fazê-lo, no entanto, Tomás precisará justificar a divisão
aristotélica da física, da matemática e da filosofia primeira.
A originalidade de
Aqui está a originalidade de Tomás, pois segundo ele o objeto próprio da Tomás de Aquino
metafísica não está no termo de um “processo abstrativo da inteligência como
noção universalísima do ser (ens generalissimum ut nomem), mas transluz na
intencionalidade dinâmica do ato judicativo como identidade dialética entre a forma
do juízo (est) e o ato ou perfeição suprema (existir, esse)”296.
110
‘qüididades’ onde ele se exerce como ‘razão’(ratio) ao nível da existência onde
procede como ‘inteligência’(intellectus)298".
298
. EF III, p.320.
299 . EF III, p.322.
300 . EF III, p.323.
301 . EF III, p.323.
111
Portanto ao resultado da atribuição de uma ‘qüididade’ a um sujeito
concreto (síntese concretiva) corresponde a unidade ontológica do objeto enquanto
ser. E tal unidade ontológica é afirmada no juízo. É, portanto, na afirmação que o
limiar da metafísica, segundo Tomás de Aquino, é transposto. Na afirmação, tem
lugar a “apercepção cognoscitiva da unidade transcendental (...) do ser”. Na
afirmação, se dá a operação da separatio que evidencia a natureza do existir (esse)
como ato e perfeição suprema do ser.
112
Gráfico 7 – Da síntese concretiva ao ser302.
Da síntese concretiva
ao ser
aspecto aspecto
psicológico gnoseológico
intelecto agente intelecto possível
síntese concretiva
receptividade
de uma faculdade intelectiva
não-intuitiva
implica a alteridade
supõe o conhecimento do objeto
como passagem sua objetividade
da potência ao ato incoativa
(inicial, que começa)
e em que a sua
à medida que sua natureza
EXISTÊNCIA é
QÜIDITATIVAMENTE expressa
afirmada em virtude
É CONHECIDA
dessa mesma natureza
1 2
à unidade da
síntese concretiva e que é afirmada
que resulta da atribuição da no JUÍZO
quididade a um sujeito
corresponde a unidade
ontológica do objeto
enquanto ser
113
"É justamente na perspectiva desse horizonte que se pode falar de uma função
tética do juízo, ou seja, da posição incessante do existir (esse) na afirmação
como valor inteligível supremo do real"303.
Vertente
Ao atingir esta questão relativa ao Absoluto real, se apresenta a segunda teológica
vertente metafísica da teoria tomásica anunciada anteriormente, a saber, a vertente
teológica que parte do Ser para alcançar o Absoluto.
Mas para além das cinco vias, há três outros tópicos na obra do Aquinate
que não se encontram entre as provas da existência de Deus por não se
constituírem como provas formais da existência de Deus, mas estão presentes ao
longo de toda a sua obra305: a. a dialética da distinção real da essência e da
existência no ser finito, que implica sua identidade no Ser infinito; b.a estrutura
analógica do conceito de ser; c. a estrutura finalista da inteligência humana, que
implica a existência de Deus como fim absoluto da inteligência finita306.
303
. EF III, p.325.
304 . EF III, p.326.
305 . EF III, p.328.
306 . EF III, p.328.
114
Esses tópicos são os alicerces conceptuais da metafísica tomásica e
organizam a estrutura significante em referência constitutiva ao Absoluto real: como
Ato puro do existir, como Princípio, e como Fim.
115
redargüitiva do ceticismo radical, põe em evidência a ordenação ao Absoluto do
dinamismo intelectual manifestado no ato judicativo"310.
Com isto, é possível ver, com clareza radiante, a raiz da idéia que atravessa
Absoluto como
todo o pensamento vazeano a respeito da posição do Absoluto no coração da exigência da Razão
Existência-reflexo
Essa reflexão cuidadosa sobre a teoria do juízo de Tomás de Aquino tem em
vista o horizonte no interior do qual o homem hodierno se encontra: o mundo
técnico-científico. Esse universo marcado e determinado pela técnica e pela ciência
faz com que o homem exista numa “forma de existência-reflexo” nele produzida pela
relação com o mundo dos objetos técnicos, que acaba sendo a sua referência
objetiva primordial.
116
técnica, da utilidade e da produtividade? Para responder esta interrogação é
necessário um exercício teórico de alcance metafísico que aponta exatamente para
a metafísica tomásica do ato de existir. Pois no momento em que o avanço
irresistível de uma técnica que se dirige para a reificação mais e mais completa do
próprio homem (com a biotecnologia e a nanotecnologia), “a descoberta do
horizonte transcendental do existir na afirmação judicativa mostra que o homem,
enunciador do juízo e portador da intencionalidade infinita do logos do ser, só irá
alcançar a profundidade do seu existir autêntico na transgressão de todas as
fronteiras que a limitação eidética dos objetos técnicos traçar diante dele”317. Pois ao
ser que assume o ônus metafísico, e infinito, de enunciar o existir dos seres só
conseguirá existir autenticamente quando assumir sua abertura constitutiva ao
Absoluto: “no consentimento às formas absolutas da Verdade e do Bem e no
reconhecimento da ordenação de todo o ser ao Existir transcendente absoluto”318.
A estrutura
Lima Vaz divide a Ética em duas grandes partes: a histórica e a sistemática. da ética
Por sua vez, a parte sistemática é constituída por duas grandes dimensões: o agir
ético e a vida ética. Cada uma destas dimensões é apresentada a partir de três
117
momentos lógico-dialéticos distintos: a universalidade, a particularidade e a
singularidade. A articulação silogística de universalidade-particularidade-
singularidade adotada na parte sistemática denuncia de forma bastante evidente
uma metodologia dialética de matriz hegeliana.
Definição
Para Lima Vaz a Ética é a “reflexão sobre a estrutura e o modo de operar da de ética
Razão prática, que manifesta a sua originalidade ao constituir-se e operar em
sinergia inter-causal de razão e vontade"322. Para a articulação lógico-estrutural da
Razão prática, Lima Vaz propõe-se a acompanhar o “movimento do seu operar
segundo a ordem da sua seqüência dialética”323. Em resumo:
"A finalidade, pois, da Ética filosófica é simplesmente a de mostrar ao
indivíduo que pretende responder à questão como convém viver? seguindo os
ditames da Razão prática, qual a estrutura inteligível e o modo de operar dessa
forma da razão que justificam reflexivamente (ou em termos de autojustificação,
pois a razão só pode justificar-se diante de si mesma) aqueles ditames"324.
A ética e o quiasmo do
O desdobramento da Razão prática, em sua ordenação necessária ao Bem, espírito
depende do quiasmo do espírito, que assume na Antropologia Filosófica, como já
foi mostrado, caráter central e fundante nas categorias de espírito e transcendência.
O quiasmo do espírito constitui-se por um lado, como abertura da inteligência finita à
amplitude transcendental da verdade, e por outro lado, como abertura da liberdade
finita à amplitude transcendental do bem. A circularidade entre inteligência e
liberdade realiza-se entre verdade e bem. A vertente especulativa e a vertente ética
do pensamento vaziano, que remontam ao pensamento tomásico, são
perfeitamente comparáveis entre si, em amplitude e profundidade. Em última
análise, esse quiasmo estrutura o próprio sujeito, e se constitui como condição de
possibilidade da experiência noética da verdade, da experiência ética do bem e da
experiência ético-noética do ser, próprias do momento da pré-compreensão da
categoria de transcendência. A verdade e o bem, como dimensões transcendentais
do ser, orientam, pois, a estruturação da ética vaziana, uma vez que todas as
categorias da ética dependem das prerrogativas metafísico-antropológicas da
racionalidade e da liberdade.
322
. EF V, p.233.
323 . EF V, p.233.
324 . EF V, p.233.
325 . EF IV, p.216.
118
Assim como ocorre no pensamento de Tomás de Aquino, as categorias
metafísicas de ordem e perfeição presidem o discurso da ética vaziana. A categoria
de ordem, de origens platônica, neo-platônica e agostiniana, é a reta disposição
dos seres segundo a escala do grau de perfeição que compete a cada um326. Essa
noção de ordem, no pensamento de Tomás, conjuga-se com a noção aristotélica de
perfeição como ato
"e é assim que encontra uma realização privilegiada na ação humana
que recebe o selo de sua perfeição – ou de sua plena realização como ato – ao
inserir-se livremente na ordem do universo – ou na ordem da natureza – que é a
norma objetiva da ação. Ela é, então, por excelência ação ética. Ora a noção
de perfeição sendo logicamente conversível à noção de ser, não é senão outra
expressão da noção de bem. Por outro lado a noção de ordem implica
necessariamente, do ponto de vista ontológico, a noção de fim".
Isto significa que todo ser é perfeito em sua ordem. Todo ser é orientado
para o seu fim e age em vista desse fim.
"Tal é a ação ética enquanto ato humano que deve realizar por
definição, a perfeição do ser humano enquanto ser racional e livre. Bem e Fim
ou perfeição e ordem são, pois, as categorias metafísicas que subjazem à Ética
tomásica como ética filosófica e que devem ser levadas em conta a cada passo
de sua elaboração conceitual"327.
119
Gráfico 8 – As categorias de Fim e Bem na dimensão do agir ético
PRIMEIRA DIMENSÃO DA
PARTE SISTEMÁTICA
O AGIR ÉTICO
Categorias de
FIM, BEM
e Valor
SEGUNDA DIMENSÃO DA
PARTE SISTEMÁTICA
A VIDA ÉTICA
Categorias de
FIM e BEM
120
"Todo movimento dialético tem como momento inicial o momento da
universalidade. Dele parte a seqüência lógica dos momentos que irão integrar a
estrutura inteligível do objeto que pretendemos compreender. Esse primeiro
momento da universalidade irá mostrar-se como momento (dialeticamente)
abstrato, devendo ser ulteriormente determinado pelos momentos da
particularidade e da singularidade. Estamos, pois, diante da tarefa de pensar o
horizonte objetivo para o qual se orienta a intencionalidade do agir ético ao
transcender os limites eidéticos da estrutura subjetiva e da estrutura
intersubjetiva. Trata-se, em suma, de integrar o horizonte objetivo na seqüência
lógica e no movimento dialético segundo os quais estamos tentando
compreender as dimensões fundamentais do agir"328.
O ser humano, enquanto agente racional e livre, deve dirigir sua própria
ação ordenando-a ao bem que é o fim. Isso torna o agir humano constitutivamente
ético, ou moral. Nesse sentido, a noção de fim como bem é logicamente conversível
e correlativa à noção de perfeição o que implica uma ordem dos fins segundo a
escala das perfeições e, portanto um fim último.
"O fim conhecido pela razão é o bem do sujeito, e o bem ao qual a
vontade deve consentir é o fim tal como a razão o conhece. Fim e bem
exprimem, desta sorte, no nível da universalidade, o perfil eidético com que o
objeto se apresenta à intencionalidade do agir ético"330.
328 . EF V, p. 104.
329 . EF V, p.96.
330 . EF IV, p.106.
121
quando Lima Vaz apresenta as Idéias transcendentais de Ser, Essência,
Unidade, Verdade, Bondade, Causalidade, Bem e Fim. Idéias que são objetivas em-
si e das quais derivam a possibilidade de pensar os seres com os quais a razão
humana estabelece a oposição relativa do conhecer e do ser conhecido331.
Para Lima Vaz essas idéias não são apenas símbolos da objetividade ou da
cognoscibilidade dos seres que existem independentemente do sujeito. A
objetividade atribuída a essas idéias reside na sua própria imanência, sendo elas
objetivas em-si.
"...na concepção clássica por nós adotada o predicado da objetividade
real cabe às Idéias por sua própria natureza.(...) pois ‘o que é causa de um
efeito determinado contém de modo eminente a perfeição daquele efeito’. As
idéias são a causa formal da objetividade dos seres particulares pois estes só
podem ser conhecidos como objetivamente reais à medida que recebem os
predicados das Idéias: ser-distinto, ser-uno, ser-verdadeiro, ser-bom... Logo, às
Idéias compete eminentemente a atribuição da objetividade real"332.
Tanto o agir ético, como a vida ética são dotados de uma estrutura objetiva à
medida que se referem primeiramente à universalidade das idéias de Fim e de Bem.
122
Estas idéias possuem um estatuto ontológico próprio e um alcance
metafísico que atestam a necessidade de uma “ciência do ser”, vem a ser, de uma
metafísica. A reflexão ética, propriamente dita alcança seu termo na categoria de
pessoa moral, após a apresentação da universalidade objetiva do mundo ético que
se desdobra, através do fluxo do movimento dialético nos momentos da
particularidade e da singularidade. Portanto, todo o viés metafísico da ética filosófica
é dado, sobretudo, pelas categorias de Fim e Bem, que antes de tudo são
categorias metafísicas, ou metafísico-éticas. E todo o pensamento metafísico que
dá suporte à reflexão ética é oriundo da metafísica do existir que será desenvolvida
de forma mais detalhada na próxima seção, pois a reflexão mais acabada sobre a
possibilidade de uma ciência do ser propriamente dita, só será realizada no livro
Raízes da Modernidade.
A estrutura da
Raízes da Modernidade é a obra em que ocorre a confluência das duas Metafísica (Raízes da
Modernidade)
possibilidades temáticas de leitura do pensamento vaziano: é o lugar onde genética
da modernidade e metafísica do existir se entrelaçam de forma inconsútil. Tal como
na Antropologia Filosófica e na Introdução à Ética Filosófica, o texto vaziano
dedicado à metafísica é constituído por uma parte histórica336 e uma parte
sistemática337. A parte sistemática é precedida por uma introdução na qual Lima Vaz
desenha a posição protológica do esse na afirmação, através da qual ele
reapresenta a teoria do juízo de Tomás de Aquino como o ponto de partida da
metafísica338.
123
Em cada um dos capítulos da parte sistemática de Raízes da
Modernidade é apresentado, primeiramente, um certo aspecto da metafísica do
existir. Segue-se o contexto medieval desse aspecto metafísico, e, finalmente, sua
relação histórico-filosófica com o advento da modernidade. Nesse último livro, à
medida que são explicitadas as raízes metafísicas da modernidade, verifica-se de
forma definitiva o entrelaçamento entre metafísica e modernidade. No capítulo
seguinte, que apresenta o desdobramento e a evolução da modernidade, serão
explicitados os aspectos metafísicos responsáveis pela eclosão do processo de
gênese e surgimento da Modernidade pós-renascentista.
Contexto
ideo-histórico
D.1.1. A teoria tomásica do juízo desempenha papel importante na
argumentação de Lima Vaz em favor da metafísica do existir. Sua exposição é
sustentada pelas grandes matrizes teóricas, pelos grandes paradigmas e pelos
grandes temas que plasmam o cenário ideo-cultural do século XIII. O arcabouço
conceitual do século XIII foi orientado por três questões matriciais, que, desde a
aurora grega da filosofia, passaram a determinar a abrangência de todo o domínio
do saber:
124
Gráfico 10 – As três matrizes
O SUBSOLO DOUTRINAL
DO SÉCULO XIII
Linhas mestras do arcabouço
simbólico adotado pela
civilização medieval
Capítulo 5 - gráfico 5.1
ENS
VERUM CAUSA
BONUM
IDÉIA como matriz do FIM
como matriz do SER como matriz do
CONHECER AGIR
No campo da Metafísica e da
Ontologia descobriremos o solo
mais profundo onde irão brotar as
raízes da Modernidade
125
A questão relativa ao conhecer introduz “no campo da reflexividade da
razão a interrogação sobre os modos e caminhos da construção do saber”340: ratio
intelligendi. A questão relativa ao ser “levanta a pergunta fontal sobre a origem e a
razão causal do existir inteligível”341: causa essendi. E a questão do agir refere-se
ao problema da teleologia da vida humana e sobre a ordem dos fins342: ordo vivendi.
"Modos de compreender, causa do ser, ordem do viver: tais os três
eixos que vêm sustentando a estrutura do universo simbólico da civilização
ocidental desde a invenção grega da razão"343.
340
. EF VII, p.76.
341 . EF VII, p.76.
342 . EF VII, p.76.
343 . EF VII, p.77.
126
Gráfico 11 – Os três paradigmas e os quatro temas.
RENASCENÇA
FILOSÓFICA
DO SÉCULO XIII
Capítulo 5 - Gráfico 5.4
no 1º plano a questão
EMANATISMO CRIACIONISMO
sobre a origem do ser
NEOPLATÔNICO BÍBLICO
dividida entre...
ONTOLOGIA
descrição da processão a partir
do Uno absoluto, da 1ª Inteligência, METAFÍSICA DA ARISTOTÉLICO-AVERROÍSTA "Tudo que de
NEO-AGOSTINISMO
desta hierarquia das Inteligências, EXISTÊNCIA da substância qualquer modo exista
destas a Alma e desta a pluralidade boaventuriano é feito por Deus"
tomásica Mestres da
dos seres materiais
Faculdade de Artes
QUATRO TEMAS
O modelo aristotélico da
O problema do UNO O problema da redução Tema da essência
analogicidade da noção
PLATÃO, ARISTÓTELES, ao UNO e da existência
de unidade
PLOTINO E PROCLO SÃO BOAVENTURA TOMÁS DE AQUINO
SIGER DE BRABANT
127
D.1.2. Partindo da oposição existente entre o Uno e o múltiplo, Tomás de
Síntese
Aquino consegue integrar os três paradigmas metafísicos, i. é, o substancialismo tomásica
A inteligibilidade
O ato de existir, a partir da solução tomásica, será ao mesmo tempo o do real
núcleo mais profundo bem como a fonte primeira de inteligibilidade do real. Nesse
plano é encontrado o Princípio criador ou o Existir absoluto – Ipsum Esse subsistens
– de cuja ação criadora procedem os existentes finitos, e cujo existir é formalmente
o termo real da criação:
“a natureza protológica ou fundante do existir (esse) é intuída
imediatamente pela inteligência na afirmação judicativa que separa o esse do
contorno lógico que define os conceitos abstratos”348.
D.2. A partir dessa recapitulação da teoria do juízo, Lima Vaz inicia a PRIMEIRA JORNADA
ESPECULATIVA:
sistematização, propriamente dita, da metafísica do existir. Duas grandes jornadas
Itinerário da
especulativas indicam o roteiro a ser seguido, respectivamente, a que leva ao ser Metafísica do
Esse na esfera
absoluto, e a que leva aos entes relativos. do ser absoluto
Assim como a intuição do ser finito diante dos seres relativos permite
postular o Ipsum Esse subsistens (primeiro estágio), essa mesma intuição avança
para o horizonte da inteligibilidade do próprio esse (segundo estágio), que exige a
identidade entre o ser e o pensar. Afinal Inteligência e inteligibilidade são noções
correlativas.
352
. EF III, p.175.
353 . EF VII, p.105.
354
. EF VII, p.109.
355 . EF VII, p.107.
130
quanto ad extra (livre criação da multiplicidade dos esse finitos e relativos segundo
a exemplaridade do Verbo)”356.
para a forma da coisa conhecida, a vontade, por sua vez, está dirigida para a coisa
mesma. Aqui se apresenta um dos maiores problemas da metafísica: a tensão entre
o problema da liberdade e do Absoluto ou, mais especificamente, a “atribuição da
Vontade e, conseqüentemente, da Liberdade ao Esse absoluto como constitutivos
intrínsecos da sua inteligibilidade”358. Ao Absoluto é atribuída, por um lado, a
necessidade intrínseca de ser e existir a partir de si mesmo – a absoluta aseidade (a
se, a partir de si). Mas, por outro lado, ao Absoluto também se atribui a
autodeterminação infinita “como absoluta subsistência reflexiva em si mesmo, ou
seja, absoluta Liberdade”359.
Norma inteligível do
Posição imediata Inteligibilidade Esse absolutamente identidade radical Sua expressão na que se desdobra nas Inclinação volitiva
Bonum transcendental
do Esse absoluto radical do Esse inteligível com o Lógos Inteligência arquétipa noções transcendentais do Espírito
que é igualmente FIM
Infinita complacência do
Princípio de toda Esse Absoluto como
Estrutura transcendental Esse subsistens na sua
inteligibilidade das estrutura inteligível
da inteligibilidade do Esse própria essência enquanto
coisas que SÃO ou existem manifestada nas Idéias
Fim para si mesmo
361
. EF VII, p.132.
362 . EF VII, p.133.
133
de transcendência: entre o sujeito e a transcendência não se verifica a distinção
adequada entre termos finitos e que permita falar de não-reciprocidade ou de
reciprocidade. Contudo, ela possibilita a suprassunção da tensão entre a não-
reciprocidade da relação de objetividade (transcendência do Absoluto) e a
reciprocidade da relação de intersubjetividade (Imanência do Absoluto).
370 . EF VII, p.153. Ver nota 15: “A relação ‘transcendental’, ou seja, que se define pela total relação
recíproca dos seus termos, e é distinta da relação predicamental ou categorial, é propriamente a
relação do ato e da potência, por exemplo, a relação do esse e da essentia na unidade existencial do
ser finito. Por analogia, a relação de criaturalidade pode ser dita transcendental, da parte do ser finito,
na sua total dependência causal para com o Ser infinito e Criador. Da parte do Ser infinito, ela é uma
relação de razão, que não implica nada de real no Criador, mas é pensada por nós sob dois pontos de
vista: a transcendência do Ato criador supremamente livre e sua imanência no ser criado, ao qual
confere duração na existência”.
371
. EF VII, p.167.
372
. EF VII, p.166.
373 . EF VII, p.166.
374
. EF VII, p.166.
375 . EF VII, p.195.
376
. EF VII, p.195.
377 . EF VII, p.195.
136
A idéia de participação está situada na convergência e na correlação das
noções transcendentais Verum-Bonum e na transcendência do Esse absoluto.
Essência Existência
Universal Singular
Ordem:
O estágio ontológico-formal é determinado pela categoria de ordem. E o
categoria do
estágio ontológico-real pela categoria de finalidade. A categoria de ordem permite terceiro estágio
ontológico-formal
que os seres finitos recebam sua identidade e subsistam na diferença que os
distingue entre si conforme a essência própria de cada um.
383
. EF VII, p.186.
384 . EF VII, p.186.
385
. EF VII, p.171.
386 . EF VII, p.195.
387
. EF VII, p.204.
388 . EF VII, p.208.
138
a obtenção de um fim). A metafísica do existir na esfera dos seres relativos possui
uma estrutura taxiológica e uma estrutura teleológica que “convergem para o
Princípio donde partiu o itinerário, ou seja, o Esse subsistente na sua absoluta
transcendência e na sua radical imanência no cerne dos seres finitos, o seu
esse"389.
ser real é
ESSÊNCIA EXISTÊNCIA PARTICIPAÇÃO ANALOGIA ORDEM ser ordenado FINALIDADE ABSOLUTO
Conclusão
A conclusão deste capítulo deve indicar apenas que o tema da metafísica do
existir é o tema primordial do pensamento vaziano. A compreensão da obra de Lima
Vaz depende em primeiro lugar da intelecção desta herança tomásica que serve de
eixo para a estruturação da antropologia, da ética e da metafísica aqui estudadas.
390 . LIMA VAZ, H.C., Bio-bliografia, in PALÁCIO, C. (org) Cristianismo e História, Coleção Fé e
É por isso que todo o conhecimento alcançado por Lima Vaz a respeito da
obra de Tomás não se configurou como um mero exercício de erudição. Todo seu
empenho esteve entrelaçado com as perspectivas da filosofia moderna e orientado
para um novo horizonte que se confrontasse com os interditos e problemas
colocados pela modernidade ante a possibilidade de se pensar o Absoluto como
uma figura da transcendência que possa iluminar a vida e o futuro da humanidade.
Na Antropologia, como já foi dito, Lima Vaz explicita com clareza meridiana
que seu intento consiste em “exprimir o sentido do Absoluto de existência
391
. EF VII, p.247-250.
392 . EF VII, p.250.
141
submetendo-o à dialética da identidade na diferença, do em-si e do para-nós,
constitutiva do espírito humano”393.
Todo o percurso metafísico de Lima Vaz foi marcado por uma ênfase à
perspectiva noética. Com a Antropologia e a apresentação da categoria de espírito
a reflexão se desdobra num viés ético que será reapresentado e aprofundado no
Escritos de Filosofia V – Introdução à Ética Filosófica 2. E alcançará seu termo
na reflexão metafísica do estágio ontológico-real do itinerário do Esse absoluto
(categorias de participação e analogia) e no estágio ontológico-real do itinerário do
esse relativo, mais especificamente, na convergência das categorias de ordem e
finalidade quando o círculo se fecha e o esse relativo alcança seu Fim retornando
ao Princípio do discurso filosófico.
393 . AF II p.120.
142
Gráfico 14 – Tomás de Aquino no Século XX394
Tomás de Aquino
no século XX
3 tendências
3ª Tendência
1ª Tendência Repensar a herança doutrinal
2ª Tendência
Literatura de TAq inserindo-a na lógica das
2 linhas
Manualística grandes intuições geratrizes
do universo filosófico da modernidade
verdades normativas para dará a Tomás de Aquino definirá sua situação na história O programa crítico de KANT
O confronto da teoria tomásica Diálogo com a articulação Comparação cuidadosa e
o exercício da reflexão um lugar no mundo da filosofia e mostrará a atualidade inspirou um anova e original
da reflexão com o orgânica entre História e Sistema minuciosa entre HEIDDEGGER
filosófica e teológica filosófico do século e a fecundidade das teses versão da fundamentação
COGITO cartesiano realizada por HEGEL. e Tomás de Aquino
cristãs XX genuinamente tomásicas tomásica da Metafísica
G.Siewerth, G. Fessard,
R. GARRIGOU-LAGRANGE JOSEPH DE TONQUEDÉC JACQUES MARITAIN ETIENNE GILSON JOSEPH DE FINANCE JOSEPH MARÉCHAL J.B.LOTZ
Bernhard Lakebrink
143
Terceiro Capítulo
144
TERCEIRO CAPÍTULO – A COMPREENSÃO
GENÉTICA DA MODERNIDADE
395. AF II, p.9-48. A palavra objetividade , neste contexto, refere-se à relação antropológica segundo a
qual “o homem se comporta em face do mundo-natureza, transformando-o pela Técnica e explicando-o
pela Ciência”.
145
Neste nível, o problema que desafiou Lima Vaz foi pensar como se realizou
a passagem conceitual da physis clássica para a natureza criada por Deus, ou seja,
como pensar a transcendência a partir do problema do mundo? Essa reflexão,
apresentada primeiramente no livro Ontologia e História, no artigo Ciência e
Ontologia da Natureza, alcança nessa categoria de objetividade um primeiro grau de
sistematização e atinge seu zênite especulativo no capítulo O Problema da Criação
do Raízes da Modernidade.
O segundo enfoque aborda a natureza a partir de um ponto de vista 2º enfoque
racionalidade
empírico-matemático, segundo o qual a natureza é compreendida pelos empírico-formal
o mundo como
instrumentos da ciência empírico-formal nascida do racionalismo moderno. O novo naturezacientífica
formal, adquiriu tal grau de autonomia que ele não pode mais ser analisado pela
proposta cartesiana de o homem ser o possessor e o senhor do mundo, pois hoje é
o mundo técnico que vem assenhorando-se da vida dos seres humanos.
Pode-se, portanto, afirmar que existe uma inversão nas prioridades das
relações antropológicas quando se percebe que os critérios de valoração próprios
do campo poiético penetraram no campo do prático, exercendo de forma ilegítima
um poder de transformação que deteriora e adultera o específico das relações
intersubjetivas que deveriam ser pautadas, como já se disse, pelos critérios do bom
e do melhor, e jamais pelos vetores da objetividade, enquanto categoria
antropológica.
tinha em vista o problema da alienação do trabalho que por sua vez originava-se da
inversão da dialética do finis operis e do finis operantis, quando o útil, o lucrativo, e
a acumulação, ou seja o finis operis, tornavam-se um fim em si mesmo.
“O elemento específico da alienação do trabalho é fundamentalmente a
inversão da relação de poder que dirigida originariamente do homem ao mundo,
se volta agora do mundo ao homem”400.
Na dualidade estrutural entre o sujeito e o objeto da práxis (agir) e entre o Primazia do sujeito e
negação do objeto
sujeito e o objeto da poíesis (fazer), emerge a primazia do sujeito como
característica do primeiro momento de um processo dialético. Nesse momento, o
objeto é negado em si mesmo para ser significado segundo o metro da
400
. EF I p.132. Ver também SAMPAIO, R.G., O Ser e os Outros, São Paulo: Unimarco, 2001, p.53:
“O trabalho alienado é a ação destituída da significação humana, da alegria criadora e assim não é
capaz de realizar o ser humano. Pois o trabalho enquanto pessoal, ato humano que confere
significação humana ao objeto trabalhado, deve ser realizador do homem. Na situação de alienação, o
trabalho perde sua ressonância humana, o objeto predomina sobre o ato, e o ato torna-se objeto. Há
portanto uma inversão da instância mensurada sobre a instância que deveria ser a mensurante. O
objeto torna-se a medida e o homem transforma-se no objeto medido”.
401
. EF II p.36-40.
402
. EF II, p.36.
403 . EF II, p.36. Ver nota 1: Como termo da ação, o objeto é prãgma, expressão objetiva da práxis, ou
ainda, se se têm em vista os fins subjetivos da ação ou a utensilidade do objeto, ele é chrema (o que é
útil ou utilizável). No prãgma se dá pois, a síntese entre o finis operantis e o finis operis. Ver Lima Vaz,
Trabalho e Contemplação apud Escritos de Filosofia I – Problemas de Fronteira, SP, Ed. Loyola, 1986,
pp. 122-140.
404
. EF II, p.37.
405 . EF II, p.37.
149
intencionalidade ativa do sujeito: sua capacidade, seus instrumentos, suas regras e
seus fins. Nesse primeiro momento, o sujeito impõe sobre o objeto a sua primazia.
Isto decorre, em termos antropológicos de uma superabundância ontológica406 do
sujeito no seu confronto com o objeto. Ou ainda do aspecto não recíproco da
relação de objetividade, ou da relação do homem com o mundo-natureza.
No momento ulterior, esta primazia do sujeito será negada, pois a realidade Primazia do objeto e
negação do sujeito
do objeto (sua verdade) será a medida da práxis e da poíesis.
justificação num nível que transcende o teor empírico dos objetos e a contingência
do agir particular de cada indivíduo da sociedade.
151
Gráfico 15 – Dialética da constituição do ethos: dialética do mensurante-
mensurado411
Dialética da constituição da
PRÁXIS HUMANA
DUALIDADE
ESTRUTURAL
DIALÉTICA DO
MENSURANTE-MENSURADO
1º MOMENTO 2º MOMENTO
PRIMAZIA PRIMAZIA
DO SUJEITO DO OBJETO
Negação Negação da Negação
Negação do objeto Negação da Primazia do Sujeito
Constituição do ETHOS
suprassunção da dialética
sujeito-objeto
mensurante-mensurado
C. A Unidade da Razão
411
. EF III, p.132.
412 . SNF, n.68, p.53-85.
413
. SNF, n.68, p.58.
414 . SNF, n.68, p.57.
152
E para apresentar os principais traços da Ética Lima Vaz descreve e
caracteriza as formas de racionalidade vigentes neste momento e busca identificar
as formas de racionalidade ética correspondentes aos múltiplos usos da razão.
A partir do ponto de vista teórico três questões se entrelaçam no tratamento Três questões
A identidade e a reflexividade na razão finita do ser humano têm lugar no Unidade analógica da
razão
domínio do intencional, ou seja, como unidade na diferença da razão com o ser e da
razão consigo mesma417.
"A identidade com o ser e a reflexividade permitem, por sua vez, atribuir à
Razão uma unidade analógica, segundo a qual as suas formas se diferenciam em
Essa estrutura analógica da Razão foi rompida. E com isto os modelos de Ruptura da
unidade analógica
racionalidade da física e da matemática, da dialética, da lógico-lingüística, da da razão
421
. SNF, n.68, p.61.
422 . SNF, n.68, p.61.
423
. SNF, n.68, p.61.
424 . SNF, n.68, p.62.
155
construção da inteligibilidade dos fenômenos segundo formas a priori (da
sensibilidade e do próprio Entendimento)"425.
Na seqüência de sua reflexão Lima Vaz estabelece a distinção entre Razão Razão e
racionalidades
e racionalidade, afirmando que a Razão é universal e a racionalidade é particular. A
primeira se refere aos sujeitos capazes de usá-la (sujeitos racionais) e à realidade
que pode ser por ela compreendida (realidade racional). O conhecimento da Razão
opera a partir de princípios e obedece a regras da demonstração.
Todavia essa distinção não implica uma relação unívoca e estática tal como
a relação dos termos gênero e espécie. Essa distinção implica uma relação entre a
Razão e as racionalidades, como relação entre o universal e o particular,
compreendida dinamicamente, pois a Razão é assumida como conceito analógico
que na sua efetivação histórica apresenta uma estrutura em movimento,
analogicamente participada por várias formas de racionalidades.
425
. SNF, n.68, p.62.
426 . SNF, n.68, p.63.
156
uma identidade absoluta da Razão em si mesma, que é igualmente a absoluta
reflexividade do Ser em si mesmo”427.
A razão finita é
Retornando ao ponto de vista histórico, é possível constatar que a razão Pólos metafísico e
lógico
clássica tinha sua estrutura analógica organizada ao redor do pólo metafísico. No
horizonte da razão clássica a atividade intelectiva (nous ou inteligência espiritual)
realiza seu ato mais excelente e perfeito na contemplação do Absoluto real.
Enquanto no horizonte desenhado pela razão moderna, a primazia foi dada ao pólo
lógico, o que implicou o início de um processo que erodiu a estrutura analógica
própria do período clássico.
Lima Vaz apresenta uma tipologia das racionalidades modernas, que giram
ao redor do pólo lógico. Esse pólo, por sua vez, organiza estas racionalidades a
partir da proximidade delas com a racionalidade lógico-matemática. Quanto maior
for a proximidade de um certo discurso científico da racionalidade lógico-matemática
(racionalidade matriz) maior será o grau de universalidade e maior será o alcance
gnosiológico deste discurso científico430.
As racionalidades organizadas pelo pólo lógico possuem dois traços Tipologia das
racionalidades
principais: a. o conhecimento concebido como auto-produção, ou como produção
ilimitada de novos conhecimentos; b. o conhecimento como produtor de objetos. A
partir desses dois traços e da consideração da proximidade com a racionalidade
matriz segue-se a seguinte tipologia: 1. a racionalidade lógico-matemática (como
Na seqüência de sua reflexão Lima Vaz comenta as idéias éticas formuladas Descartes
por Descartes, Hobbes, Kant e Hegel. Descartes propõe sua moral provisória de
submissão prudente ao ethos tradicional até o momento em que se consiga
constituir uma Ética racional e universal, inscrita no “triângulo epistemológico”
formado pelo método, pelo sistema e pelo sujeito. Desse programa logrou-se
buscar no sujeito o princípio lógico-ontológico do agir ético e constituir uma Ética de
caráter autonômico, em detrimento do modelo clássico, considerado essencialmente
ontonômico e no qual o “ser objetivo, mediatizado pela ‘reta razão’, é a fonte da
moralidade”433.
432
. SNF, n.68, p. 70.
433 . SNF, n.68, p. 71.
434
. SNF, n.68, p. 72.
435 . SNF, n.68, p. 73.
160
necessidade do movimento dialético determinado pelo telos da sociedade política.
Essas realizações que se referem ao vasto domínio do Direito tornaram-se o ponto
de partida para as éticas pós-hegelianas e contemporâneas marcadamente
determinadas pelo entrecruzamento das idéias de autonomia do sujeito, de razão e
de experiência.
Como essa intencionalidade não se dirige para um pólo metafísico – por ora
interditado – cabe a ela retornar sobre si mesma orientando-se para o pólo lógico
imanente ao sujeito. O que faz do sujeito ao mesmo tempo, princípio da
racionalidade e fundamento da sua aprioridade transcendental sobre o dado da
experiência.
437
. SNF, n.68, p. 75.
438 . EF II p.8.
162
Ao tratar destas questões ele realiza, concomitantemente, um aprofundamento da
sua compreensão da modernidade e encontra no novo paradigma filosófico da
modernidade as causas do problema ético contemporâneo.
439
. EF III, p.146.
440 . EF III, p.146.
163
A assimetria entre os termos estruturais da comunidade ética assumiu
dimensões civilizatórias com o advento da modernidade que imanentizou o princípio
ordenador no arbítrio do indivíduo441 e transformou aquela estrutura ternária numa
estrutura binária, sem o princípio ordenador (agora absorvido pelo sujeito) e agora
mantida apenas com a lei de um lado e o indivíduo de outro.
“(...) uma crise que tem talvez sua raiz mais profunda no aumento
prodigioso da capacidade humana de produzir e no definhar, até o quase
desaparecimento, da capacidade humana de contemplar. A absolutização
da práxis, essa, no seu conceito moderno, absorvendo a antiga distinção
entre o fazer e o agir, é, sem dúvida, o núcleo dinâmico da cultura da
modernidade”453.
454
. ROSA, João Guimarães, Primeiras Histórias, Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 26ª ed., 1988.
455 . EF III, p.149.
167
crise ética planetária, Lima Vaz repete seu procedimento ao afirmar que uma nova
figura da transcendência poderia re-estabelecer o equilíbrio conceitual perdido com
a desagregação da matriz Princípio-ordem-indivíduo.
Ao apresentar a metafísica do existir na sua última etapa, a partir do Raízes PRIMEIRA JORNADA
ESPECULATIVA:
da Modernidade o texto foi pautado pelas duas jornadas especulativas e
Itinerário da
sistemáticas que são construídas a partir de 4 roteiros, presentes em cada uma das Metafísica do
Esse na esfera
do ser absoluto
jornadas sistemáticas: o roteiro noético-metafísico, noético-ontológico, ontológico-
formal e ontológico-real. No fim de cada um destes roteiros Lima Vaz apresenta a
conexão conceitual com um elemento constitutivo da compreensão genética da
modernidade. Portanto, as etapas seguintes obedecerão exatamente à sucessão
daquelas duas jornadas especulativas, constituídas pelos quatro roteiros indicados
em cada uma das duas jornadas especulativas. Todavia o conteúdo a ser
esse na esfera do ser Absoluto, é marcado pela presença das categorias de categorias do
primeiro estágio
Absoluto e Razão, e pela implicação necessária da presença de um Absoluto noético-metafísico
Vaz se limita a afirmar que as noções transcendentais que atravessam as grandes categorias do
terceiro estágio
linhas de toda a filosofia medieval penetram no espaço definido pela modernidade ontológico-formal
Seu itinerário inicia-se com o estágio noético-metafísico através do qual se Liberdade e Absoluto:
qual se considerou o Esse absoluto como estrutura inteligível que se manifesta nas
Idéias. No estágio ontológico-formal (terceiro estágio) investigou-se a estrutura
transcendental da inteligibilidade do Esse. No estágio final da primeira etapa
sistemática, o estágio ontológico-real é percorrido considerando-se a norma
inteligível do Bonum transcendental, que é, ao mesmo tempo, Fim.
"O Bem para Platão, o espírito para Hegel significam ao mesmo tempo o
Princípio absoluto de toda inteligibilidade e o supremo paradigma da Liberdade
como absoluta autodeterminação: o Bem como Idéia na perspectiva da ontologia
antiga, o espírito como Sujeito segundo o postulado da metafísica moderna, mas
que Hegel irá ler na noésis noéseos aristotélica"471.
No segundo texto, de forma discreta e concisa, Lima Vaz indica que Hegel
tentou compor dialeticamente livre-arbítrio e liberdade no próprio movimento do
espírito. E o espírito é imanente enquanto objetivo, e transcendente enquanto
absoluto. Desta forma a liberdade torna-se o caminho e o fim da filosofia na sua
realização subjetiva.
468
. EF VII, p.127.
469 . EF VII, p.128.
470. LIMA VAZ, H.C. de, Filosofia e Cultura: Perspectiva Histórica, in Escritos de Filosofia III – Filosofia
e Cultura, 1999, Loyola, SP, p.80.
471 . EF III, p.80.
173
Em síntese, nesse capítulo Lima Vaz reapresenta uma idéia recorrente e já O Problema da
Criação:
explicitada desde muito cedo em suas obras. Ao tratar da questão da criação, Lima a passagem para a
segunda jornada
Vaz afirma que com o advento da modernidade ocorrem alterações profundas na especulativa
A segunda jornada especulativa que trata do itinerário metafísico do esse SEGUNDA JORNADA
ESPECULATIVA:
relativo, obedece a mesma seqüência dos 4 roteiros bem como segue a mesma
Itinerário da
estrutura: ao final de cada um dos estágios Lima Vaz apresenta o aspecto da Metafísica do
Esse na esfera
do ser finito
modernidade que deita suas raízes no subsolo doutrinal do século XIII.
problema a respeito da estrutura inteligível do ser finito. Estes paradigmas alcançam categorias do
primeiro estágio
sua última radicalidade metafísica ao serem transformados pela doutrina cristã da noético-metafísico
"A unidade Infinito-finito procede unicamente do Infinito, sem que resulte num
terceiro termo. A oposição é suprimida pelo Infinito que, porém, permanece na sua
infinita distância ontológica. O finito subsiste nessa e por essa suprassunção da
oposição: por um lado, ele está infinitamente distante do Infinito transcendente; por
outro, está dele infinitamente próximo em virtude da imanência do Infinito que o
preserva da queda no nada dando-lhe o esse como ato fundante do seu ser"474.
478
. EF VII, p.188.
479 . EF VII, p.189.
480
. EF VII, p.189.
481 . EF VII, p.190. Ver nota 41.
176
O modelo de participação horizontal se configura como o espaço que
‘pasteuriza’ e iguala toda uma classe de fenômenos que participam de um mesmo
modelo teórico-científico.
Lima Vaz trata das duas últimas categorias (ordem e finalidade) de forma a categoria do
terceiro estágio
entrelaçá-las num trabalho especulativo interdependente, não obstante cada uma ontológico-formal
482. RIFKIN, J., A era do acesso – A transição de Mercados convencionais para Networks e o
nascimento de uma Nova Economia, SP, Pearson Education do Brasil, 2001, p. 6
483 . EF VII, p.191.
177
delas refira-se a um estágio distinto, a saber o estágio ontológico-formal e o
ontológico-real, respectivamente.
decorrência desse novo estatuto ontológico da natureza, o ser deixa de ser visto
como tal, para ser compreendido única e exclusivamente como objeto, como
artefato construído e elaborado pelo sujeito. Portanto o objeto também se encontra
destituído daquelas prerrogativas. O advento da modernidade está na emergência
do objeto útil em detrimento do ser contemplado.
Tópicos estudados:
Tópicos estudados: Tópicos estudados:
Racionalidade
Mensurante-mensurado, Século XIII,
moderna, ciência
matriz ternária, absolutização da nominalismo tardo-medieval,
newtoniana
práxis, itinerário da razão moderna metafísica do existir
180
significativa será apresentada, em seguida, concomitantemente à explicitação do
método vaziano.
181
Segunda Parte
O Método e o Sistema
182
Quarto Capítulo
O Método Dialético
e a rememoração filosófica
G.W. F. Hegel
Enciclopédia das Ciências Filosóficas, §15
486 . HEGEL, G.W.F., Enciclopédia das Ciências Filosóficas (1830), § 15, pp.55-56. São Paulo:
487
. LIMA VAZ, H.C. de, Método e Dialética, in BRITO, E.F. e CHANG, L.H. (orgs), Filosofia e Método,
São Paulo: Loyola, 2002, p. 9.
488
. Os textos mais importantes para se compreender a importância da dialética para Lima Vaz são os
seguintes: LIMA VAZ, H.C. de, Método e Dialética, in BRITO, E.F. e CHANG, L.H. (orgs), Filosofia e
Método, São Paulo: Loyola, 2002; LIMA VAZ, H.C. de, Escritos de Filosofia III – Filosofia e Cultura,
capítulos I e II, São Paulo: Loyola, 1997; LIMA VAZ, Escritos de Filosofia VI – Ontologia e História,
cap. I – A Dialética das Idéias no Sofista, São Paulo: Loyola, 2001, 13-55.
489 . EF III, p.15: “Os tempos pós-hegelianos assistiram a uma ruptura profunda dessa tradição com a
injunção da necessidade do ‘tornar-se mundo’ da filosofia anunciada por alguns herdeiros do próprio
Hegel. Esse programa de ‘mundanização’ da filosofia, ao mesmo tempo que significou uma radical
inversão da direção crítica da intenção filosófica, antes voltada para a desordem do sensível, agora
apontando para a transcendência do inteligível, trouxe consigo, conseqüentemente, a motivação e o
impulso para a gigantesca tarefa teórica de ‘desconstrução’ da tradição metafísica e ética que
assegurara por mais de dois milênios a identidade espiritual e cultural do Ocidente”.
EF III, p. 78: “Depois de Hegel, o problema da presença da filosofia na nossa cultura assume a figura
de novo paradoxo. Com efeito, anunciada por alguns tidos como herdeiros, a ‘morte da filosofia’ é
entendida como seu ‘tornar-se mundo’, vem a ser, como o reconhecimento de que a filosofia, como
tarefa teórica, não tem mais lugar num mundo que incorporou na sua práxis todos aqueles desígnios
e fins da Razão que solicitaram por tantos séculos a meditação do filósofo. A filosofia, portanto, morre
na teoria para renascer na práxis, segundo o conhecido programa da chamada esquerda hegeliana”.
490 . SNF, n.23, p.3. “... a posição arquetipal que algumas idéias e diretrizes do hegelianismo passaram
lógos)495.
Sexto Empírico496 e Diógenes Laércio497 consideravam Zenão de Eléia o
Zenão e
inventor da dialética. O próprio Hegel afirma nas suas Lições sobre a Filosofia da Heráclito
dialético. O movimento dialético tem seu termo normalmente numa Idéia última que
integra todos os seus momentos”503, fechando e concluindo o movimento de
circularidade dialética que recupera, através da suprassunção, todos os momentos
anteriores do iter percorrido dialeticamente.
Com a transição de Platão para Aristóteles, no cenário filosófico da época, a
Declínio
dialética declina e o método analítico alcança um lugar de destaque definitivo na da dialética
“À dialética assim entendida Aristóteles dedicou oito livros dos Tópicos A fragmentação do
e o livro das Refutações Sofísticas. Essa acepção do termo dialética método analítico
prevaleceu na tradição posterior. A dialética passou a ser uma das ’artes
liberais’ formadoras do trivium (gramática, dialética, retórica), arte de raciocinar
encontravam no Hades atoladas no lodo. Na República há outra passagem no Livro II, 363d referindo-
se à mesma crença: “Quanto aos homens ímpios e injustos, esses, pelo contrário, enterram-nos no
lodo no Hades, e obrigam-nos a transportar água num crivo, e ainda em vida lhes imputam má fama”.
503.
LIMA VAZ, H.C. de, Método e Dialética, in BRITO, E.F. e CHANG, L.H. (orgs), Filosofia e Método,
São Paulo: Loyola, 2002, p. 11.
504. LIMA VAZ, H.C. de, Método e Dialética, in BRITO, E.F. e CHANG, L.H. (orgs), Filosofia e
Método, São Paulo: Loyola, 2002, p. 11. Ver CIRNE LIMA, C. R. V., Carta sobre a Dialética – O que é
dialética? In SNF, v.21 n.67 (1994): p. 439: “Os analíticos, para expressar algo, utilizam frases ou
proposições compostas de sujeito, predicado e cópula (respectivamente de argumento e função),
somente tais construções sintáticas possuem um valor de verdade, apenas elas, não os conceitos, são
verdadeiros ou falsos. Na linguagem dialética, entretanto, tais proposições compostas de sujeito e
predicado não são, via de regra utilizadas na argumentação. As ‘idéias’ de Platão e os ‘conceitos’ de
Hegel, porém, sempre possuem um valor de verdade e sempre apresentam algo como verdadeiro ou
como falso (as idéias se atraem mutuamente, elas entram em conflito e se repelem, elas se
reunificam), mesmo que quase nunca se desdobrem explicitamente em sujeito e predicado. Esta
diferença fundamental de estrutura sintática dá a ambas as línguas características próprias, tornando-
as radicalmente diferentes uma da outra”.
505
LIMA VAZ, H.C. de, Método e Dialética, in BRITO, E.F. e CHANG, L.H. (orgs), Filosofia e Método,
São Paulo: Loyola, 2002, p. 12.
187
e discutir sobre qualquer tema, e a ela assim entendida referiu-se Santo
Ambrósio ao escrever: Non in dialectica complacuit Deo salvum facere populum
suum. Essa concepção lógico-formal da dialética predominou na primeira época
da teologia medieval, a partir do século XI, antes que fosse conhecido todo o
Organon aristotélico (século XIII) e, como tal, foi criticada pelos seguidores da
chamada ‘teologia simbólica’ (São Pedro Damião, São Bernardo etc...). Daqui
procede uma certa conotação pejorativa do termo dialética, que permanece até
nossos dia na linguagem comum”506.
506
. LIMA VAZ, H.C. de, Método e Dialética, in BRITO, E.F. e CHANG, L.H. (orgs), Filosofia e
Método, São Paulo: Loyola, 2002, p. 12.
507 . CIRNE-LIMA, C.R., O Absoluto e o sistema: Agostinho, Tomás de Aquino e Hegel, in OLIVEIRA
que parte de uma Idéia e permanece no âmbito do mundo das idéias (República, VI,
511b-c; VII, 522c-534a). O ‘caminho dialético’ seguido por Platão nos diálogos da
maturidade e nos diálgos da velhice não obedece a um conjunto de regras rígidas e
pré-fixadas, pois ela deve seguir “as peculiaridades do lógos próprio do conteúdo
investigado a partir da pergunta ou aporia inicial, da qual parte o diálogo"512.
No Sofista513, Platão rejeita a tautologia do monismo lógico-ontológico (– A é
A) do eleatismo e apresenta as condições transcendentais de possibilidade da
dialética como caminho ou como método. Tais condições são as seguintes: a) a
possibilidade lógico-ontológica da proposição – A é B; b) a possibilidade lógico-
ontológica do discurso – A é B, AB é C, ABC é D...514.
515. LIMA VAZ, H.C. de, Método e Dialética, in BRITO, E.F. e CHANG, L.H. (orgs), Filosofia e
Método, São Paulo: Loyola, 2002, p. 14. Ver CIRNE-LIMA, C., Liberdade e Razão, in MACDOWELL,
J. A. A. A. (org), Saber Filosófico, História e transcendência, São Paulo: Loyola, 2002, p.182: “O
Absoluto é Ser, o Absoluto é Nada. O sujeito lógico e seu quantificador são exatamente o mesmo tanto
na tese como na antítese. De onde se conclui com rigor, com exatidão e com claareza que tese e
antítese não são proposições contraditórias e sim contrárias. Por isso podem ser ambas falsas. O
motor da Dialética não é a contradição, e sim a CONTRARIEDADE”.
516
. EF III, p.13.
517
. EF III, p.29.
518 . EF III, p.30. “A este saber Platão denominou dialética: a dialética é o termo da paidéia filosófica
nos diálogos da maturidade, assim como o método dialético é a forma própria do pensamento filosófico
na República, no Fedro e nos chamados diálogos metafísicos. A dialética, porém, não tem para Platão
a estrutura formal de uma disciplina filosófica como terá a filosofia primeira de Aristóteles. A
caracterização da dialética como méthodos deve ser entendida segundo a acepção literal do termo, ou
seja, a de ‘caminho’, o que põe em evidência o seu enraizamento no terreno da cultura vivida, pois é
justamente a partir das aporias nela presentes que o ‘caminho’ dialético começa a desdobrar-se em
estágios, seja de ascensão ao mundo das Idéias, para a qual o instrumento do procedimento dialógico
é considerado essencial, seja de discurso sobre as Idéias, no qual consiste propriamente a dialética”.
190
caminhos que se iniciam na pólis representam as aporias que assolam a cidade e
seus habitantes no campo das representações e dos valores que constituem a
constelação simbólica da comunidade. A dialética indica o caminho de saída das
aporias de um certo tempo histórico519.
A filosofia de Platão tem uma profunda relação com a cultura de seu tempo,
pois ela busca “recuperar, ordenar e unificar no conceito as intuições fundamentais
da vida espiritual dos gregos, pois é o implícito metafísico nelas presentes que,
explicitado e feito objeto de um saber adequado – a dialética – , torna possível a
superação das aporias que ameaçavam romper a unidade da cultura”520.
Hegel foi para Lima Vaz uma espécie de plaque tournante. Ao perceber a
necessidade de uma releitura da ontologia clássica a partir da Erinnerung hegeliana,
seu olhar dirigiu-se, ao mesmo tempo, para a ontologia clássica, num movimento
regressivo, e para a modernidade da ilustração européia, num movimento
progressivo. Cabe lembrar que a re-leitura do livro lambda da Metafísica de
Aristóteles também faz parte do projeto vaziano de repensamento da ontologia
clássica.
519
. EF III, p.32.
520 . EF III, p.33.
521. Esta seção sobre a dialética hegeliana foi retirada quase que integralmente do texto de SAMPAIO,
R.G., O Ser e os Outros, São Paulo: Unimarco, 2001, p.73-78.
522. LIMA VAZ, H.C. de, Método e Dialética, in BRITO, E.F. e CHANG, L.H. (orgs), Filosofia e
Método, São Paulo: Loyola, 2002, p. 15.
523. LECRIVAIN, A., Dialéctique, Encyclopédie Philosophique Universelle, Les Notions Philosophiques,
Dictionnaire, , Vol. II, T. I, p.633.
524 . EF III, p.306.
191
disso, Hegel atribuiu um sentido ontológico à distinção kantiana entre Vernunft e
Verstand, conferindo um alcance metafísico à dialética transcendental de Kant525.
intellectus"526.
MOVIMENTO
DIALÉTICO
MD
CIÊNCIA DA
FENOMENOLOGIA LÓGICA FILOSOFIA
DO ESPÍRITO ENCICLOPÉDIA DO DIREITO
MD = exposição do caminho MD = caminho do Sistema
MD = exposição do caminho MD = caminho da liberdade na
da Idéia no desdobramento de na sua autoconstrução
da consciência para o saber sua efetivação como direito
sua inteligibilidade imanente
DOIS
ASPECTOS
Formal Teleológico
Estrutura Circularidade
Triádica Dialética
"Conceito puro, conceito total, este em-si ainda indeterminado não se mostra
'universal verdadeiro, infinito' senão enquanto se afirma 'imediatamente' tanto
na particularidade como na singularidade"532.
530 . A terminologia tese, antítese e síntese não é hegeliana e segundo Lima Vaz é inadequada e
errônea.
531 . LIMA VAZ, H.C. de, Por que Ler Hegel Hoje?, Boletim do SEAF, n.1, BH, 1982, p.67.
532 . LABARRIÈRE, P.-J, Universalité, in Encyclopédie Philosophique Universelle, Les Notions
Philosophiques, Dictionnaire, , Vol. II, T. II, p.2676.
193
forma inadequada que reveste, face ao entendimento, o que a continuação do
processo racional mostrará ser essencialmente concreto, pois o que existe e tem
valor é o universal concreto. A universalidade abstrata tem a forma da
imediatidade533.
A particularidade constitui o segundo momento das determinações do
Particularidade
conceito, mediando a universalidade e a singularidade. Esta enumeração, porém,
não é muito significativa, pois, tais momentos são co-extensivos uns aos outros,
cada um deles sendo a expressão do todo sob uma dessas modalidades534.
O particular é a negação da racionalidade universal, indeterminada e
abstrata. É o momento da determinação ou negação, no seio da universalidade. O
movimento dialético é todo interior ao conceito, à racionalidade do real. Portanto, a
particularidade exprime a autodeterminação do conceito, seu livre poder de se
realizar na limitação do ser particular535.
“... à medida que a diversidade só pertenceria à comparação exterior, algo para
si-mesmo só deve ser idêntico consigo, e, desse modo, a segunda proposição
não contradiz a primeira. Mas, então, a diversidade também não pertence ao
Algo ou ao tudo; não se constitui determinação essencial desse sujeito; essa
segunda proposição, desta maneira, não pode ser absolutamente enunciada.
Mas, se conforme a proposição o algo mesmo é diverso, ele o é por sua própria
determinidade. Contudo, assim não é mais visada à diversidade como tal, mas
à diferença determinada...”536.
Segundo Hegel
“O conceito como tal contém os momentos da universalidade, enquanto
livre igualdade consigo mesma em sua determinidade; da particularidade, da
determinidade em que permanece o universal inalteradamente igual a si
mesmo; e da singularidade, enquanto reflexão-sobre-si das determinidades da
universalidade e da particularidade; a qual unidade negativa consigo é o
determinado em si e para si, e ao mesmo tempo o idêntico consigo ou o
universal”540.
539
. LIMA VAZ, H.C. de, Por que Ler Hegel Hoje?, Boletim do SEAF, n.1, BH, 1982, p.68.
540 . HEGEL, Enciclopédia, § 163.
541
. HEGEL, Enciclopédia, § 163.
542 . LIMA VAZ, H.C. de, Por que Ler Hegel Hoje?, Boletim do SEAF, n.1, BH, 1982, p.68.
195
base que contém em si o gênero e a espécie, e que é ela própria substancial. É
esta a inseparabilidade posta dos momentos em sua diferença (§ 160) – a
clareza do conceito, em que cada diferença não produz interrupção,
perturbação alguma, mas é igualmente translúcida”543.
543
. HEGEL, Enciclopédia, § 164.
544 . LIMA VAZ, H.C. de, Por que Ler Hegel Hoje?, Boletim do SEAF, n.1, BH, 1982, p.69.
545
. LIMA VAZ, H.C. de, Por que Ler Hegel Hoje?, Boletim do SEAF, n.1, BH, 1982, p.69.
546 . LIMA VAZ, H.C. de, Por que Ler Hegel Hoje?, Boletim do SEAF, n.1, BH, 1982, p.69.
196
seu sistema, e em todo o seu itinerário filosófico. Este aspecto, da circularidade
dialética, ora apresentado como um aspecto da dialética hegeliana que determina
toda a obra vaziana, já está subjacente em Ontologia e História sob os conceitos
de symploké e diairésis. A idéia de retorno, de circularidade dialética emergirá,
novamente, no texto Raízes da Modernidade sob a figura da via compositionis e
da via resolutionis, recuperando uma terminologia aristotélica presente nos
Analítica Posteriora, que será desdobrada de forma mais cuidadosa logo à frente.
Para elaborar sua ontologia do agir humano, sua ontologia do ser humano e
sua metafísica, Lima Vaz utiliza o método dialético.
No Raízes da Modernidade Lima Vaz deixa bastante claro que as duas
jornadas especulativas ali realizadas orbitam em torno da metafísica do existir de
Tomás de Aquino. E ao buscar uma compreensão da inteligibilidade radical do
existir será descrito um itinerário lógico-dialético denominado ‘itinerário da
metafísica do esse’550.
548
. LIMA VAZ, H.C. de, Método e Dialética, in BRITO, E.F. e CHANG, L.H. (orgs), Filosofia e
Método, São Paulo: Loyola, 2002, p. 16.
549.
LIMA VAZ, H.C. de, Método e Dialética, in BRITO, E.F. e CHANG, L.H. (orgs), Filosofia e Método,
São Paulo: Loyola, 2002, p. 15.
550
. EF VII, p.90.
551 . EF VII, p.90. Ver nota 34: “O esquema que propomos a seguir não deve ser lido, por conseguinte,
em seqüência linear dos temas ele percorridos, mas como um movimento lógico de uma reflexão que
integra dialeticamente cada um dos passos a partir da inteligibilidade fontal do esse”.
198
enquanto tal (Antropologia Filosófica), do agir humano enquanto agir livre e
racional (Ética) e dos pressupostos metafísicos, ou das condições transcendentais
que permitem a elaboração do discurso e que amarram o sistema a partir da
compreensão da oposição finito/infinito, homem/Absoluto (metafísica).
552 . EF VII, p.158. Ver também CIRNE LIMA, C. R. V., Carta sobre Dialética – O que é dialética? In
E. A Rememoração Histórica
555
. EF VII, p.158.
556. LIMA VAZ, H.C. de, Método e Dialética, in BRITO, E.F. e CHANG, L.H. (orgs), Filosofia e
Método, São Paulo: Loyola, 2002, p. 15.
557
. EF VII, p.158. Ver também EF III, pp. 79-80.
558 . SNF, n. 55, p.684.
200
História ele explicita a necessidade e o valor intrínseco do procedimento de
recuperação do labor filosófico do qual o Ocidente é herdeiro. Na Antropologia, na
Ética e em Raízes da Modernidade encontrar-se-á de forma explícita e bem nítida
o esforço vaziano de iniciar sua reflexão a partir de material histórico autorizado e
fundamentado.
560
. OH, p.57-59.
561 . OH, p.92.
562 . Na Antropologia Filosófica há uma introdução bastante breve (pp.9-19) Na Ética há uma seção
introdutória mais extensa e muito densa. De todas as suas introduções, esta é a maior introdução
elaborada por Lima Vaz (pp. 7-76). Finalmente no livro Raízes da Modernidade a Introdução tem uma
dimensão intermediária entre as dimensões da Antropologia Filosófica e as dimensões da Ética.
563 . A ESTRUTURA da obra vazeana será aprofundada de forma mais cuidadosa logo à frente.
Todavia, neste momento se impõe uma certa antecipação desta estrutura visto que para Lima Vaz a
REMEMORAÇÃO HISTÓRICA se apresenta como um elemento constitutivo do seu método de
filosofar. À frente serão apresentados gráficos que indicam de forma bastante clara a simetria
estrutural presente na Antropologia Filosófica, na Ética e na metafísica vazeanas.
202
obras sistemáticas564 têm duas grandes partes: a parte histórica e a parte
sistemática. Contudo, vale ressaltar que a exposição de cada uma das categorias
segue uma estrutura de conceitualização filosófica que repete o momento da
aporética histórica no interior do qual se faz uma rememoração mais específica
daquele determinado objeto, p. ex.: aporética histórica da categoria de corpo,
aporética histórica da categoria de psiquismo e assim sucessivamente.
"A reflexão filosófica conta entre seus passos metodológicos (...), uma
rememoração histórica do problema ao qual se aplica, percorrendo as
vicissitudes teóricas da sua transmissão ao longo daquela que constitui a
tradição viva da filosofia. Essa rememoração assume a forma de uma aporética
à medida que as formulações e soluções propostas para o problema em
questão se articulam dialeticamente ao longo do tempo em oposições e
sínteses que convergem justamente para o presente da reflexão capaz de
abraçá-las e de repropor o problema no âmbito de uma nova iniciativa do
filosofar"565.
564 . Antropologia (Antropologia Filosófica I e II), Ética (Escritos de Filosofia IV e V), metafísica (Escritos
de Filosofia II – Raízes da Modernidade). O Escritos de Filosofia III – Filosofia e Cultura deve ser
compreendido como um livro de passagem da Antropologia para a Ética. Mesmo este livro que não
possui uma posição estrutural dentro do Sistema possui um primeiro capítulo que apresenta a relação
filosofia/cultura em primeiro lugar, a partir da perspectiva histórica (Capítulo Primeiro: Filosofia e
Cultura – Perspectiva Histórica, pp. 3-80). Apenas no segundo capítulo, a questão será abordada de
forma teórica e mais sistemática (Capítulo Segundo: Cultura e Filosofia – Perspectiva Teórica, pp. 82-
100).
565
. AF I, p.25.
566 . AF I, p.165.
567
. AF I, p.26.
568 . EF IV, p.473.
203
nos desafios do presente”569 a base historiográfica é indispensável para a
realização deste empenho rememorativo.
Rememoração na
Lima Vaz obedecerá, na Antropologia Filosófica a divisão consagrada pela Antropologia
Filosófica I
historiografia que divide a História Ocidental em 4 grandes fases: Antropologia
Antiga, Medieval, Moderna e Contemporânea. Filosofia e Cultura pode ser
considerado uma continuação da Antropologia Filosófica, sobretudo nos aspectos
relativos às categorias de relação. Seguindo o princípio metodológico da
rememoração como elemento constitutivo do próprio ato de filosofar, o livro inicia-se
por um capítulo cujo título é Filosofia e Cultura: perspectiva histórica. Como na
Antropologia Filosófica, o Filosofia e Cultura alcança seu zênite filosófico ao
entrelaçar suas conclusões com o pensamento de Tomás de Aquino. Afinal o
objetivo vaziano mais decisivo é criar condições e possibilidades para um
reencontro com a tradição metafísica, através do exercício de uma Erinnerung que
revele toda a proficuidade do pensamento tomásico à luz dos desafios da
modernidade.
Rememoração na
Na Ética, a parte histórica é dividida em seções mais numerosas. Depois de Ética: Escritos de
Filosofia IV
uma grande introdução572 (I. Natureza e Estrutura do Campo Ético) constituída por 4
capítulos, tem início a sinopse histórica com a ética antiga (ética antiga, socrático-
platônica, aristotélica e helenística), seguida pela ética cristão-medieval (ética pré-
agostiniana, agostiniana, a ética de Tomás de Aquino e a ética da Idade Média
tardia). Finalmente, à ética moderna (com a transição renascentista, a sabedoria
cartesiana e a ética de Hobbes), seguem-se a ética kantiana e depois duas seções
da ética pós-kantiana. Na parte sistemática, a aporética histórica se repete e se faz
Invariância
Ao mesmo tempo que existe esta articulação temática de invariantes fundamental
conceptuais ético-antropológicos, Lima Vaz detecta através da aporética histórica da
Ética uma terceira continuidade relativa ao tema da Razão que se percebe incapaz
de abranger todo o horizonte do agir em seu uso imanente, circunscrito ao domínio
da lógica unívoca própria do campo estritamente empírico. A lição que a
continuidade histórica oferece indica “um movimento para a transcendência além
do univocamente lógico e do circunscritivamente empírico” que não significa um
desprendimento dos limites da experiência, afinal o ethos é um fato empírico e de
natureza histórico-social. Todavia, é “nítida e inequívoca a intencionalidade para a
transcendência que atravessa a praxis humana”579. E tal situação impõe a exigência
de busca de um fundamento último para as razões do agir ético que ultrapasse o
terreno do ethos empiricamente descrito, para penetrar no espaço propriamente
metafísico580.
"O roteiro histórico que agora pretendemos seguir tem, pois, a orientá-lo
uma constelação de três evidências que permanecem elevadas sobre cada
passo do nosso itinerário: a continuidade temática e conceitual do pensamento
ético das suas origens até hoje; a pressuposição do núcleo antropológico que
sustenta esta continuidade; a intencionalidade metafísica que orienta o
pensamento ético na busca de sua fundamentação. Além, pois, da visão
histórica, buscamos nessa nossa sinopse dos grandes modelos do pensamento
ético uma confirmação do que afirmávamos ao termo da Introdução, sobre a
necessária conjunção entre Ética, Antropologia e Metafísica581".
582
. Uma primeira abordagem profunda deste século XIII, Lima Vaz já realizara no primeiro capítulo do
Escritos de Filosofia I – Problemas de Fronteira, p. 11 – 33.
583
. SAMPAIO, R.G., O Ser e os Outros, São Paulo: Unimarco, 2001, p.11.
584. É possível fazer uma leitura de todo o pensamento vazeano exclusivamente a partir da perspectiva
do tema do Absoluto, tal como já foi realizada a empresa de fazê-la a partir da perspectiva da categoria
antropológica da Intersubjetividade. Ver SAMPAIO, R.G., O Ser e os Outros, São Paulo: Unimarco,
2001, 212 p.
585
. Tal como já foi dito acima, o estudo sobre a categoria de transcendência continua no Filosofia e
Cultura.
586 . AF II, p.109.
207
ele tratados, pois tal empreitada é um elemento constitutivo do próprio ato de
filosofar. E tal característica é uma das mais notórias de todo o seu modo de pensar
a filosofia.
590
. SAMPAIO, R.G., O Ser e os Outros, São Paulo: Unimarco, 2001, p.103. Ver AF I p.14.
591 . AF II p.215.
209
O gráfico seguinte esquematiza os três níveis de conhecimento. Destes três
níveis, o mais complexo é o nível da compreensão filosófica que terá seu
desdobramento no momento seguinte desta seção, dedicado à estrutura da
conceitualização da compreensão filosófica.
Compreensão Compreensão
Pré-compreensão Explicativa Filosófica
N F N F N F
a NATUREZA são os dados resultantes a FORMA são os conceitos as FORMAS são os CONCEITOS ou as
a NATUREZA é mundo da vida a FORMA compreende todas as a NATUREZA é dada na experiência
dos procedimentos operatórios e o discurso da ciência, que CATEGORIAS que exprimem
oferecido à experiência modalidades de expressão filosófica da objetivização do sujeito
da observação metódica e obedecem a regras formais próprias intelectualmente essa experiência e o
natural da experiência natural como sujeito
da experimentação de constituição discurso que articula esses conceitos
S S S
A estrutura da
F.2. O processo de constituição das categorias passa primeiramente pelas conceitualização
filosófica
etapas que correspondem aos seguintes níveis de conhecimento: pré-compreensão,
compreensão explicativa e compreensão filosófica. Ao atingir o nível da
compreensão filosófica, esta por sua vez, se desdobrará em 3 outros momentos:
momento do objeto, da categoria e do discurso. Em outras palavras, no itinerário
seguido por Lima Vaz, a articulação da compreensão filosófica segue os momentos
da análise aristotélica do saber: o momento do objeto (o que é dado
empiricamente), o momento do conceito (a expressão noética do objeto) e o
momento do discurso (a articulação discursiva da expressão noética do objeto)593.
592
. AF I, p.159-160.
593 . AF I, p.162.
210
Filosófica é a bússola do sistema vaziano. Sem ele o leitor terá sérias dificuldades
para compreender o desenvolvimento do pensamento de Lima Vaz. A assimilação
da estrutura nele desenhada é fundamental para a leitura da Ética e da Metafísica.
Os passos apresentados nesta seção irão nortear a composição da parte
sistemática da Ética e da Metafísica.
O gráfico seguinte apresenta de forma esquemática toda a estruturação da
conceitualização filosófica que irá marcar todo o sistema vaziano.
Compreensão Compreensão
Pré-compreensão
Explicativa Filosófica
mediação empírica
mediação abstrata mediação transcendental
Princípio de
Aporética Aporética
LIMITAÇÃO
Histórica Crítica
EIDÉTICA
Princípio de
ILIMITAÇÃO
Momento Momento TÉTICA
Eidético Tético
Princípio de
TOTALIZAÇÃO
594
. AF I, p.165-167.
595 . AF I, p.161.
211
A determinação do objeto596 é um momento aporético que se traduz na
problematização radical do objeto: o que é? O que é o homem, o que é o agir
humano, o que é o ser? É o lugar da delimitação do objeto a ser tratado. Trata-se da
explicitação do objeto próprio da formalização categorial no aspecto problemático
com que ele se apresenta a partir dos pontos de vista histórico e crítico. Nela são
traçadas as linhas do problema que a reflexão filosófica tem diante de si, tais como
resultam da rememoração (aporética histórica) e como resultam da redução crítica
(aporética crítica) desses termos hoje. Assim, a determinação do objeto desdobra-
se nos momentos da aporética histórica e da aporética crítica.
A aporética histórica é a recuperação temática do problema em questão Aporética histórica
constitutivas do objeto, do seu eidos, tal como ele é apresentado a partir da pré-
compreensão, da compreensão explicativa e da aporética histórica.
O momento tético corresponde ao ato de afirmação do ser no juízo, próprio Momento tético
596 . AF I p.165.
212
eidos do agir humano e na Metafísica é o momento da limitação do eidos do esse
relativo.
“...o exame crítico da categoria propõe-se investigar a possibilidade de se reunir
na unidade do conceito os dois momentos que designam a tensão fundamental
presente em cada categoria antropológica: o momento eidético e o momento
tético. O momento eidético exprime a limitação do conteúdo da categoria seja à
sua estrutura interna (eidos ou essência) seja à finitude e situação do sujeito. O
momento tético diz respeito ao dinamismo da afirmação pela qual o sujeito se
põe (thesis) a si mesmo na enunciação primeira e fundante do Eu sou:
enunciação que referindo o sujeito ao horizonte ilimitado do ser, estabelece-o
no campo de uma tensão dialética fundamental entre a limitação do eidos que
especifica a afirmação e o dinamismo intrínseco à mesma afirmação que
aponta para a ilimitação do ser”597.
597 . AF II p.223.
598
. EF V, p.15.
599 . EF V, p.16.
600
. SAMPAIO, R.G., O Ser e os Outros, São Paulo: Unimarco, 2001, p.108. AF I, 162.
601 . AF I p.166.
213
fundamental da auto-afirmação do eu ou da auto-afirmação da sua expressão como
sujeito. Em outras palavras, trata-se de exprimir a referência constitutiva do eu sou
ao eidos do corpo próprio, do psiquismo, e das categorias subseqüentes.
“a categoria deve exprimir no discurso filosófico que tem por objeto o ser do
homem, ou na Ontologia do ser do homem, a suprassunção dialética do que é
dado ou da natureza do corpo, do psíquico... aqui já pré-compreendidos pela
mediação empírica do saber do homem sobre si mesmo segundo o esquema
(N)-(S)-(F) -, e compreendidos na mediação abstrata das ciências segundo o
esquema [N]-[S]-[F], no discurso da Antropologia Filosófica, em virtude da
mediação transcendental expressa no esquema {N}-{S}-{F}”602.
602 . AF I, p.193.
603
. EF V, p.19.
604 . EF V, p.19.
214
Gráfico 3: Estrura da conceitualização filosófica (II)605
Compreensão
Filosófica
mediação transcendental
Determinação
do OBJETO e Discurso
determinação da DIALÉTICA
CATEGORIA
Princípio de
Aporética Aporética
LIMITAÇÃO
Histórica Crítica
EIDÉTICA
Princípio de
ILIMITAÇÃO
Momento Momento TÉTICA
Eidético Tético
Princípio de
TOTALIZAÇÃO
articula como discurso das categorias, tendo como mediação fundamental a posição
do sujeito (momento tético), que afirma a sua unidade através da estrutura
categorial ou na coerência do discurso dialético. O estágio do discurso é marcado
pela articulação propriamente filosófica das categorias que exprimem
conceitualmente o sujeito (antropologia), das categorias que exprimem
conceitualmente os invariantes do agir humano (ética) e das categorias que
exprimem conceitualmente as noções pertinentes à intelecção do Esse Absoluto e
do esse relativo (metafísica)607. A dialética, neste ponto, define-se como discurso
sobre as categorias608, i.é, momento da articulação dos conceitos, o qual supõe uma
relação de oposição entre seus termos e de suprassunção (Aufhebung) progressiva
dos termos. Essa articulação é dialética porque as categorias são suprassumidas
em níveis sempre mais profundos de integração, alcançando assim uma unidade do
sujeito, de seu agir e de sua relação com o Absoluto. O método dialético que orienta
o movimento interno de constituição da Antropologia, da Ética e da Metafísica
também realiza um movimento de síntese que suprassume a Antropologia no
discurso da Ética, e a Antropologia e a Ética no discurso da Metafísica.
609
. AF I p.167.
610 . AF I p.167 e AF II p.65.
217
Segundo o princípio de totalização611, o movimento dialético do discurso Princípio de
totalização
deve ter como alvo a igualdade entre o objeto e o ser num sistema organizado de
categorias. É o princípio da totalidade ou da completude do discurso.
No caso da Antropologia, o homem identifica-se com uma sucessão de
categorias, a qual forma o discurso da totalidade que possibilita a compreensão do
homem. Este princípio faz o discurso avançar até a categoria de pessoa (força de
unidade absoluta no homem), quando por força da inversão do princípio da
ilimitação tética, o discurso alcança o seu termo.
Estes princípios são as forças vetoriais que impulsionam e movimentam todo
o discurso dialético do sistema vaziano, forçando a passagem de uma categoria a
outra e provocando o entrelaçamento entre antropologia-ética-metafísica. Eles são
apresentados, minuciosamente, na Antropologia Filosófica I, mas também se
farão presentes na Ética (Escritos de Filosofia V) e na Metafísica (Escritos de
Filosofia VII). Todavia a presença destes princípios nos volumes V612 e VII613 dos
Escritos de Filosofia (ética e metafísica, respectivamente) não é tão didática como
nos dois volumes da Antropologia Filosófica. À medida que o discurso vai se
organizando, a nitidez dos princípios indicados vai se perdendo. Na verdade, esta
nitidez, vai sendo perdida na própria Antropologia.
Por se apresentar como a primeira parte do seu sistema, o texto da
Antropologia é marcado por um caráter didático e esquemático que facilita o
trabalho do leitor novel que pretenda mergulhar no sistema de Lima Vaz. O texto é
muito bem dividido. As passagens são explicitadas de forma clara e devidamente
numerada. As passagens da pré-compreensão, para a compreensão explicativa e
depois para a compreensão filosófica sempre são anunciadas com subtítulos. E no
interior da compreensão filosófica, ao menos inicialmente, as passagens referentes
a cada um dos momentos do discurso (objeto, categoria e discurso) também vão
sendo indicadas com clareza meridiana. Mas gradualmente, as passagens internas
ao momento da compreensão filosófica vão ficando menos nítidas e o leitor pode
não perceber o momento em que as passagens foram realizadas. E tal dificuldade
vai se agravando nos textos da Ética e da Metafísica (Raízes da Modernidade).
É óbvio que esta forma de conduzir o discurso não se configura como um
relaxamento da parte de Lima Vaz. Trata-se apenas de perceber que o leitor já
alcançou uma certa autonomia e uma certa maturidade para seguir os passos
metodológicos do discurso sem a manudução paternal do autor. No início da Ética
Sistemática há uma síntese da Antropologia e um anúncio discreto dos níveis de
conhecimento presentes na Antropologia.
611 . AF I p.167.
612 . Volume da parte sistemática da ética vazeana: Escritos de Filosofia V – Introdução à Ética
Filosófica 2.
613 . Volume da metafísica vazeana: Escritos de Filosofia VII – Raízes da Modernidade.
218
"O movimento dialético que organiza em sistema as categorias obedece
ao princípio geral da suprassunção (Aufhebung) que assume na unidade do
discurso (pensada como unidade do ser ético como tal) a particularidade das
categorias. Por sua vez, a constituição de cada categoria tem como ponto de
partida um dos aspectos da realidade do ethos preexistente ao indivíduo e que
experimenta como uma das manifestações fundamentais de seu Lebenswelt, de
seu ‘mundo da vida’. Pela mediação do Eu sou o indivíduo se manifesta, com
efeito, como indivíduo ético e participante da comunidade ética – ou como
existente na realidade do ethos. Essa existência se auto-exprime seja no nível
da pré-compreensão (saber ético), seja no nível da compreensão explicativa
(ciências empíricas do ethos), seja, finalmente, no nível da compreensão
transcendental (filosófica), ou Ética, que oferece a fundamentação inteligível
última da existência ética"614.
614
. EF V, p.19-20.
615 . EF V, p.20.
219
sujeitos, dentro do horizonte universal do Bem. Em outras palavras, a afirmação
primordial do Eu sou na ordem moral é necessariamente dotada de uma
ilimitação tética que impele o discurso ético além dos limites da subjetividade
singular. Justamente em razão dessa transcendência da auto-afirmação sobre
os limites eidéticos do ato o subjetivismo moral amplamente difundido em
nossas dias, aparece como filosoficamente insensato e eticamente estéril"616.
Como já se disse logo acima, a segunda aparição dos princípios que regem
o discurso dialético na Ética, se dá na passagem da estrutura intersubjetiva para
estrutura objetiva do agir ético.
616
. EF V, p.65.
617 . EF V, p.65.
618
. EF V, p.65.
619 . EF V, p.93.
220
compreensão filosófica). A exposição sistemática ocorre no nível da compreensão
filosófica, respeitando os momentos da aporética histórica e da aporética crítica
(determinação do objeto e da categoria). Os princípios de limitação eidética,
ilimitação tética e de totalização se mantêm presentes organizando o discurso mas
de forma quase abscôndita.
620
. EF VII, p.264. É importante notar que esta citação é retirada de um dos textos complementares do
Escritos de Filosofia VII – Raízes da Modernidade, a saber o penúltimo capítulo, Presença de
Tomás de Aquino o horizonte filosófico do século XXI, pp.
221
sistemáticos mais importantes da reflexão sobre o Absoluto são exatamente a
categoria antropológica de transcendência e as páginas de Raízes da
Modernidade.
Em vista disto, escrever uma obra sobre o tema do Absoluto, que
obedecesse rigorosamente aos passos estabelecidos no capítulo Objeto e Método
da Antropologia Filosófica, no qual Lima Vaz desenha sua estrutura da
conceitualização filosófica, implicaria repetir de forma desnecessária, ou apenas
com finalidades estritamente didáticas idéias e conceitos já previamente elaborados
na Antropologia Filosófica II e enriquecidos em Filosofia e Cultura.
Com isto, se afirma que Raízes da Modernidade depende da leitura da
Antropologia Filosófica, e mais especificamente da exposição elaborada por
ocasião das categorias de espírito e transcendência, bem como também depende
da seção Filosofia e transcendência de Filosofia e Cultura, pois se por um lado em
Raízes da Modernidade há toda uma Erinnerung do século XIII, na Antropologia
há, de forma sistematizada a Erinnerung da categoria de transcendência e da
experiência humana do Absoluto. E além disto, em Raízes da Modernidade há o
devido aprofundamento das questões relativas ao problema do Esse Absoluto.
De qualquer forma, no plano geral das obras há uma estrutura simétrica
como será mostrado logo a seguir, cuja identificação pode ser valiosa para a leitura
mais atenta dos textos de Lima Vaz. O cotejo da estruturação interna das jornadas
especulativas (ou sistemáticas) da antropologia, da ética e da metafísica vazianas
apresenta diferenças próprias e inerentes às exigências do respectivo conteúdo que
está sendo apresentado dialeticamente. Apesar do completo desaparecimento dos
níveis de conhecimento da pré-compreensão e da compreensão explicativa em
Raízes da Modernidade devido ao trabalho prévio realizado por ocasião da
categoria de transcendência, ainda existe todo o processo de constituição das
categorias que se orienta pela análise aristotélica do saber.
222
Na Antropologia, através das categorias de espírito, transcendência e
pessoa já são apresentados todos os elementos para a articulação da antropologia
com a metafísica. Ainda na Antropologia Filosófica, por ocasião da apresentação
da categoria de intersubjetividade e de transcendência novamente são
apresentados os elementos conceptuais responsáveis pela articulação da
Antropologia com a Ética, e desta com a Metafísica.
No início da Introdução à Ética Filosófica, Lima Vaz apresenta os
elementos que fazem com que a Ética esteja articulada com a Antropologia e com a
Metafísica apresentando de forma muito sintética alguns dos resultados da
Antropologia. Ao mesmo tempo, ele aponta para os pontos nodais que estarão
presentes na articulação da Ética com a metafísica.
G.W. F. Hegel
Enciclopédia das Ciências Filosóficas, §14622
622 . G.W.F. Hegel, Enciclopédia das Ciências Filosóficas, §14, v. I, A Ciência da Lógica, São Paulo:
225
por uma introdução, por uma parte histórica e por uma parte sistemática, seguida de
uma conclusão. Filosofia e Cultura desenvolve alguns temas iniciados na
Antropologia Filosófica, aprofundando reflexões que serão amadurecidas e
sistematizadas na Ética e em Raízes da Modernidade, mas que neste momento
não entram no foco deste capítulo.
Temas Textos
1. Antropologia Filosófica I
ANTROPOLOGIA
2. Antropologia Filosófica II
Obra intermediária entre a
3. Filosofia e Cultura
Antropologia e a Ética
4. Intr.à Ética Filosófica 1
ÉTICA
5. Intr.à Ética Filosófica 2
METAFÍSICA 6. Raízes da Modernidade
A Introdução dos
textos
Nas introduções de suas obras, Lima Vaz apresenta os termos do problema
que deverão ser enfrentados ao longo da parte sistemática. Mas antes de iniciar a
parte sistemática sempre acontece o trabalho da rememoração do problema em
foco.
No caso da Antropologia Filosófica, a parte histórica segue a clássica A parte histórica
226
c) finalmente, em todos os 4 estágios de cada uma das duas jornadas especulativas
de Raízes da Modernidade, Lima Vaz realiza uma cuidadosa aporética histórica,
marcada sempre pelos seguintes passos: Platão, Aristóteles, Neoplatonismo,
Agostinho e Tomás de Aquino.
Estrutura da
Aporética Histórica
da Metafísica
EF VII
Raízes da Modernidade
MODERNIDADE
6
Segundo Lima Vaz, o século XIII é marcado por uma riqueza e por uma
complexidade doutrinal peculiares, o que justifica a dedicação integral de toda a
parte histórica do Raízes da Modernidade a este século marcado pela presença de
Tomás de Aquino. Mas por outro lado, o trabalho rememorativo não deixou de ser
feito visto que a preparação de cada uma das categorias é precedida pelo itinerário
histórico do problema em questão.
A passagem da parte histórica para a parte sistemática realiza-se, sempre, A transição da
parte histórica
através de um capítulo intermediário, que recolhe os resultados da investigação para a parte
sistemática
histórica, e indica os caminhos que serão trilhados na parte sistemática.
No caso da Antropologia Filosófica, o capítulo de transição intitula-se
Objeto e Método da Antropologia Filosófica. Ele é de fundamental importância, pois
nele são indicados os passos metodológicos do processo de sistematização da
Antropologia, que depois será transcrito para a Ética e para a Raízes da
Modernidade.
No segundo volume da Ética (Escritos de Filosofia V – Introdução à Ética
Filosófica 2), o capítulo de transição da abordagem histórica da ética para a
abordagem sistemática da ética é a própria Introdução. Neste capítulo são
indicados a possibilidade e os limites de uma ética sistemática, a lógica e a dialética
próprias do discurso ético e o roteiro a ser seguido no desdobramento sistemático-
construtivo desta obra.
Em Raízes da Modernidade, a passagem para o trabalho de sistematização
da metafísica acontece no capítulo O subsolo doutrinal do século XIII no qual são
227
apresentados os termos do problema, como ele será tratado e qual será o roteiro a
ser seguido.
Em linhas gerais, a parte sistemática de cada um dos pilares do sistema A parte sistemática
vaziano tem sua similitude restrita ao fato de que ela sempre foi constituída por duas
partes, sucedida por uma seção na qual se estabelece a unidade das partes
precedentes.
A Antropologia tem sua parte sistemática dividida em regiões categoriais. A A parte sistemática
da Antropologia:
primeira região categorial reúne os invariantes conceptuais de estrutura. A segunda regiões categoriais
O RETORNO.
O primeiro e o
Lima Vaz publicou seu primeiro texto filosófico em 1948, na Revista último texto:
sobre a metafísica
Verbum623. O título deste texto, Que é metafísica, ajuda em muito na compreensão
daquilo que será apresentado como uma das características mais marcantes do
método adotado por Lima Vaz, e que ele próprio explicita com bastante clareza na
Antropologia, na Ética e em Raízes da Modernidade: a idéia de retorno.
Significativamente, seu primeiro e seu último texto versam sobre a metafísica. O
primeiro trabalho é uma espécie de levantamento sobre algumas formas distintas de
se compreender a metafísica. O último trabalho é o resultado de anos de
investigação sobre o mesmo tema, e que alcança uma compleição própria e original,
a partir da influência que a grande tradição metafísica teve em sua formação
filosófica: Platão, Aristóteles, Agostinho, Tomás de Aquino e Hegel.
624
. EF VII, p.220.
625. Giornale di metafísica, Società Editrice Internazionale, Turim, 1947, n. de Julho-Setembro, An. II,
n.4-5. Trata-se de um artigo redigido a partir de uma pergunta do diretor do Jornal, Prof. M.F. Sciacca,
da Universidade de Pavia, dirigida a vários filósofos, que depois tiveram suas respostas publicadas
neste número da revista. Pe. Vaz leu as várias respostas e comentou-as uma por uma.
230
seja o discurso em-si, que inverte a seqüência para esta ordem, 1.metafísica,
2.ética e 3.antropologia.
O leitor que queira realizar uma leitura sistemática da obra vaziana deverá
fazê-lo obedecendo em primeiro lugar à cronologia dos textos. Uma leitura completa
deveria compreender todos os seus artigos que alcançaram a casa dos três dígitos.
É possível, porém, alcançar uma visão bastante abrangente e muito profunda de
sua obra seguindo a seqüência de publicação de seus livros principais. Este
percurso, será indicado como o percurso ou a leitura, ou ainda, o sentido de
compreensão para-nós. A compreensão mais acabada e completa de todo o
pensamento vaziano só pode ser alcançada ao termo da leitura de Raízes da
Modernidade. Este texto, além de ser o ponto de chegada e o trabalho que ilumina
retrospectivamente, toda a trajetória vaziana, contém em si questões já antecipadas
e presentes no início da reflexão filosófica de Lima Vaz. Isto faz com que o tema de
Raízes da Modernidade possa ser compreendido, ao mesmo tempo, como o ponto
de chegada e como o ponto de partida de toda a reflexão vaziana, onde se realiza o
retorno ao começo de toda sua produção filosófica. Onde se fecha o círculo dos
círculos, e para onde convergem todos os seus grandes temas.
626
. Este capítulo foi escrito em 1954.
627 . Ver a primeira seção: A Herança teológica da Modernidade.
628 . No AF I, ver a categoria de espírito e o capítulo final: A vida segundo o espírito. No AF II, ver as
630 . Todo o texto da Ética está atravessado pela doutrina do quiasmo do espírito no qual se entrelaçam
o Bem e a Verdade.
631
. AF I, p.224.
632
. “A essa distinção gnosiológica corresponde o princípio ontológico de origem platônica (ver, por
exemplo, República VI, 504 c) que S. Tomás assim enuncia: perfecta sunt naturaliter imperfectis priora
(Summa Theol., Ia, q. 77, a. 4c.)”. AF I, 237, nota 105. S. Tomás diz que “ A dependência de uma
potência de outra pode-se entender de duas maneiras: primeiro, segundo a ordem da natureza,
enquanto as coisas perfeitas são naturalmente anteriores às imperfeitas. Depois, segundo a ordem da
geração e do tempo, enquanto o que é imperfeito evolui para o perfeito”.
633 . AF I, p.224.
232
tomista. Todavia é possível afirmar que esta opção metodológica também tem uma
filiação platônica e hegeliana.
No seu artigo sobre A Dialética das Idéias no Sofista634, Lima Vaz apresenta
as noções platônicas de symploké e diaíresis
Symploké – Diaíresis –
634
. OH, p.40.
635 . OH, p.40.
233
necessário ultrapassar o espaço da Antropologia Filosófica e mostrar
como esta característica se faz presente nas outras obras, bem como, demonstrar
que toda a obra vaziana pode ser lida a partir destas duas direções. Afinal tal
condição é encontrada no núcleo da Antropologia Filosófica, exatamente quando
Lima Vaz expõe a categoria de espírito e as categorias correlatas ao espírito, a
saber, a transcendência e a Pessoa.
636
. AF I, p.225.
637 . AF I, p.246.
234
ser, ou quando o para-si (a reflexão) do espírito finito ou do sujeito humano
reivindica a tarefa titânica de instaurar o em-si inteligível do objeto?” 638.
638 . AF I, p.261.
639
. AF II, p.191.
640. EF V, p.209. Ver as notas 2, 3 e 4 desta mesma página. G.W.F. Hegel, Enciclopédia das
Ciências Filosóficas (1830), § 15, pp.55-56. São Paulo: Loyola, 1995. Tradução de Paulo Meneses e
José Machado. Tomás de Aquino, Suma Teológica, Ia.IIae., q.2 5 ad 3m.
235
determinidade ou elemento. O círculo singular, por ser em si totalidade, rompe
também a barreira de seu elemento e funda uma esfera ulterior. Por
conseguinte, o todo se apresenta como um círculo de círculos, cada um dos
quais é um momento necessário, de modo que o sistema de seus elementos
próprios constitui a idéia completa, que igualmente aparece em cada elemento
singular"641.
641. HEGEL, G.W.F., Enciclopédia das Ciências Filosóficas (1830), § 15, pp.55-56. São Paulo:
Loyola, 1995. Tradução de Paulo Meneses e José Machado.
642
. AF I e AF II.
643. EF IV, EFV. O EF III, pode ser compreendido como um livro de passagem da Antropologia para a
Ética. Por várias vezes Lima Vaz afirmou que o ethos é coextensivo à cultura.
644. LIMA VAZ, H.C. de, Método e Dialética, in BRITO, E.F. e CHANG, L.H. (orgs), Filosofia e
Método, São Paulo: Loyola, 2002, p. 16.
645 . EF VII, p.95.
236
entanto, que o uso da via compositionis em chave dialética, como aqui
propomos, está de acordo com a estrutura teórica da metafísica tomásica do
esse"646.
Para dar mais visibilidade ao tema das duas direções do sistema, o gráfico
seguinte ilustra a diferença entre as duas formas possíveis de se percorer o sistema
de Lima Vaz.
646
. EF VII, p.95. Nota 1.
647 . EF VII, p.129.
237
Gráfico 19 – Via Compositionis e Via Resolutionis
Obra de
Lima Vaz
VIA
RESOLUTIONIS
VIA VIA
COMPOSITIONIS RESOLUTIONIS
ordem de ordem de
CONSTITUIÇÃO FUNDAMENTAÇÃO
das categorias das categorias
- do complexo
FIM INÍCIO ao simples
Metafísica Metafísica
3 1
Ética Ética
2 2
Antropologia Antropologia
1 3
VIA
COMPOSITIONIS
238
Portanto, nos três textos sistemáticos de Lima Vaz é possível detectar a
presença de dois roteiros de leitura, marcados pelo movimento da circularidade
lógico-dialética. Um deles percorre uma ordem, ou uma direção de inteligibilidade
para-nós, à medida que parte da manifestação mais elementar do nosso ser, qual
seja o estar-no mundo pelo corpo próprio, e avança
"A metafísica do esse na esfera dos esse finitos apresenta aqui uma
estrutura taxiológica e teleológica que convergem para o Princípio donde partiu
o itinerário, ou seja, o Esse subsistente na sua absoluta transcendência e na
sua radical imanência no cerne dos seres finitos, o seu esse (In Im Sent., d. 14,
q.2, a.2). O fundamento da ordem e da finalidade em cada ser finito é o
princípio intrínseco que o constitui como tal, a essência. Por sua vez, o ato da
essência, a forma, é o princípio de distinção no ser, tornando-o receptivo do
esse (Summa Theol., Ia., q. 76 a. 7, c.). Por conseguinte, a unidade da ordem, e
a finalidade que lhe é inerente, compõem-se com a pluralidade das formas nos
seres distintos, segundo uma escala de perfeições. Desenha-se aqui, portanto,
a participação vertical na perfeição absoluta do Primeiro Princípio (C.Gentiles
III,c.97) 650".
A presença destas duas direções nos textos de Lima Vaz se apresenta como
uma característica que pode ser estendida a toda a sua obra. Afinal, a pretensão de
Lima Vaz é sistemática, seja no plano da Antropologia, da Ética, ou da articulação
de ambas com a metafísica.
651
. EF IV e EF V.
652 . EF VII.
653
. AF I e II.
654 . EF VII, p.92.
240
C. Via compositionis: a constituição das categorias do sistema As categorias
antropológicas
241
Gráfico 20 – As categorias da Antropologia
PESSOA
REALIZAÇÃO
CATEGORIAS DE
UNIDADE
ESPÍRITO TRANSCENDÊNCIA
PSIQUISMO INTERSUBJETIVIDADE
CATEGORIAS DE CATEGORIAS DE
ESTRUTURA RELAÇÃO
242
O trabalho de constituição das categorias éticas obedece ao mesmo método, As categorias
éticas
mas se realiza através de um desdobramento orientado por estruturas diferentes.
A primeira dimensão da ética sistemática – o agir ético – desdobra-se em Primeira dimensão:
o agir ético
três estágios dialéticos distintos: estrutura subjetiva do agir ético, estrutura
intersubjetiva do agir ético e estrutura objetiva do agir ético. Mas ainda é necessário
acompanhar o desenvolvimento de cada uma destas estruturas para conseguir
identificar as categorias éticas. O trabalho de articulação das categorias se realiza
através de uma reflexão dirigida pelos níveis lógico-dialéticos da universalidade, da
particularidade e da singularidade.
A segunda dimensão da ética sistemática – a vida ética – também se
desdobra em três estágios dialéticos distintos: estrutura subjetiva da vida ética, Segunda
dimensão:
a vida ética
estrutura intersubjetiva da vida ética e estrutura objetiva da vida ética. O trabalho de
identificação das categorias também exige o acompanhamento do desenvolvimento
de cada uma destas estruturas. Cada uma destas estruturas também é constituída
pelos três momentos da universalidade, da particularidade e da singularidade. O
esquema abaixo ilustra o processo de constituição das categorias no seio de cada
uma das estruturas. Ao menos do ponto de vista formal, é possível afirmar que o iter
de constituição das categorias éticas é mais complexo do que o trabalho realizado
na antropologia e na metafísica.
As categorias éticas estão indicadas no quadro seguinte:
Níveis lógico-
Estágios dialéticos de
Dimensões
Dialéticos articulação das Categorias
categorias
Universalidade Verdade e Bem
Estrutura
Particularidade Situação
subjetiva
Agir Ético
Universalidade Justiça
Estrutura
Particularidade Situação
intersubjetiva
Singularidade Igualdade e Dignidade
Idéias transcendentais:
Universalidade
Bem e Fim
Estrutura objetiva
Particularidade Situação: Cultura
Singularidade História
243
Uma outra forma possível para indicar o movimento dialético que orienta a
constituição da ética filosófica pode ser feita a partir do gráfico que segue logo
abaixo. Este esquema indica os níveis que devem ser percorridos no trabalho de
constituição de cada uma das categorias da Ética.
Estágios Dialéticos
Estruturas
subjetiva
intersubjetiva
objetiva
SITUAÇÃO
Categoria Condições Categoria
sine quibus non
Pré-compreensão
Compreensão Explicativa
Compreensão Filosófica
244
Na metafísica, o procedimento de sistematização das categorias também se
realiza através de duas jornadas especulativas distintas. A primeira jornada define-
se pelo esforço de acompanhar o itinerário da metafísica do existir no horizonte do
Esse infinito. A segunda jornada tem seu desenho traçado a partir do itinerário da As categorias
metafísicas
metafísica do existir no horizonte dos esse relativos. Cada uma destas jornadas
subdivide-se em 4 roteiros lógico-dialéticos distintos, no interior dos quais serão
identificadas as categorias da metafísica: roteiro noético-metafísico, roteiro noético-
ontológico, roteiro ontológico-formal e roteiro ontológico-real. Foram estes roteiros
que marcaram a apresentação da última seção do segundo capítulo que tinha como
escopo indicar a última etapa do desenvolvimento da metafísica do existir. Estes
mesmos roteiros serviram para concluir o último passo da compreensão genética da
modernidade (terceiro capítulo).
Noético-metafísico
na esfera do Esse
Itinerário da
Existência e Idéia
absoluto
Noético-ontológico
Essência e Existência
metafísica do existir
Noético-metafísico
na esfera dos esse
Itinerário da
Participação e Analogia
relativos
Noético-ontológico
Ontológico-formal Ordem
Ontológico-real Finalidade
245
Gráfico 22 – Estrutura da Antropologia Filosófica
ANTROPOLOGIA
Parte Histórica
AF I
AF I
1. Idade Antiga
Introdução
2. Idade Média
Antropologia e Filosofia
3. Idade Moderna
Problema Filosófico das Ciências Humanas
4. Idade Contemporânea
Parte Sistemática
INTRODUÇÃO
AF I
5. Objeto e Método
da Antropologia Filosófica
SISTEMÁTICA I SISTEMÁTICA II
AF I
AF II
CATEGORIAS DE ESTRUTURA
CATEGORIAS DE RELAÇÃO
Corpo Próprio
Psiquismo (O tempo e a Morte) Objetividade
Espírito Intesubjetividade
Transcendência
A vida segundo o Espírito
CONCLUSÃO
AF II
CATEGORIAS DE UNIDADE
Realização
Pessoa
A pessoa humana entre
o tempo e a eternidade (morte)
246
Gráfico 23 – Estrutura da Introdução à Ética Filosófica 1 e 2
ÉTICA
Parte Histórica
EF IV
EF IV - Seção I. Caps.1,2,3 e 4. 1. Idade Antiga
2. Idade Média
Natureza e Estrutura do Campo Ético
3. Idade Moderna
4. Idade Contemporânea
Parte Sistemática
INTRODUÇÃO
EF V
Introdução
SISTEMÁTICA I SISTEMÁTICA II
EFV EFV
O AGIR ÉTICO A VIDA ÉTICA
Estrutura Subjetiva do Agir Ético Estrutura Subjetiva da Vida Ética
Estrutura Intersubjetiva do Agir Ético Estrutura Intersubjetiva da Vida Ética
Estrutura Objetiva do Agir Ético Estrutura Objetiva da Vida Ética
CONCLUSÃO
EF V
A PESSOA MORAL
247
Gráfico 24 – Estrutura do Escritos de Filosofia VII – Raízes da Modernidade
METAFÍSICA
Parte Histórica
EF VII
EF VII. Cap. I. O século XIII
Fenomenologia e Axiologia 2. Formação e Fisionomia
da Modernidade 3. Roteiros e Doutrinas
4. Crise Final
Parte Sistemática
INTRODUÇÃO
EF VII
O subsolo doutrinal do
século XIII
SISTEMÁTICA I SISTEMÁTICA II
CONCLUSÃO
EF VII
Tomás de Aquino
Textos complementares
248
D. Antropologia e Sistema.
Lima Vaz exprime no início da Antropologia seu intuito de organizá-la
sistematicamente, o mesmo acontecendo no início da Ética e da Metafísica. Por
conseguinte, as próximas seções tem por objetivo explicitar, brevemente, as
intenções sistemáticas de Lima Vaz.
Como já se viu, a Antropologia Filosófica é constituída por duas partes,
uma histórica e uma sistemática que não são proporcionais entre si. A parte menor
colocada no início da Antropologia é de natureza histórica. A segunda parte
apresenta sistematicamente as categorias antropológicas. A primeira parte é
precedida por uma introdução na qual são apresentados os problemas da relação
entre Antropologia e Filosofia e da relação entre Filosofia e Ciências Humanas e
Naturais.
A primeira questão colocada por Lima Vaz diz respeito à relação entre
Filosofia e Antropologia, pois ele detecta que no centro das mais variadas Antropologia e
Filosofia.
expressões da cultura, mito, literatura, política, ciência, filosofia, ética. O ser humano
se confronta com as perguntas fundamentais sobre si mesmo. Kant exprimiu-as de
maneira definitiva nas seguintes formulações: o que posso saber?; o que devo
fazer?; o que me é permitido esperar? e, finalmente, o que é o homem?"655. Tais
perguntas correspondem a uma arquitetônica das disciplinas filosóficas, que se
apresentam, respectivamente como Teoria do Conhecimento, Teoria do Agir Ético,
Filosofia da Religião, Antropologia Filosófica e Metafísica. A peculiaridade da última
pergunta está no fato de o homem ser o interrogador de si mesmo, e interiorizar a
relação sujeito-objeto de forma reflexiva656.
Ao se encontrar com as ciências da vida e com as ciências humanas, nos Crises histórica e
metodológica
fins do século XVIII, a pergunta filosófica pelo homem atinge uma situação crítica
com duas faces distintas. Por um lado, pode-se falar de uma crise histórica
decorrente do entrelaçamento das diversas imagens de homem no ocidente. E, por
outro lado, eclode uma crise metodológica decorrente da fragmentação do objeto da
Antropologia Filosófica nas múltiplas ciências do homem, bem como, pelo fato de
as várias ciências humanas possuírem peculiaridades sistemáticas e
epistemológicas inconciliáveis657.
Duas correntes teóricas, tentarão superar esta crise: a corrente naturalista,
segundo a qual a explicação última do fenômeno humano é reduzida à natureza
material (Lévi-Strauss, antropólogo; J. Monod, biólogo); e a corrente culturalista, Duas vertentes de
superação
que acentua a originalidade da cultura e a separação do ser natural e do ser naturalismo e
culturalismo
cultural (W. Dilthey – ciências hermenêuticas/ ciências empírico-formais).
655 . AF I p.9.
656
. AF I p.9.
657 . AF I p.10.
249
Portanto, a situação da pergunta pelo homem encontra-se no interior de uma Tarefas da
Antropologia
tensão cujos pólos são a natureza e a cultura, o que coloca a Antropologia Filosófica Filosófica
diante de três tarefas: a) elaborar uma idéia de homem que considere a tradição
filosófica e as contribuições das ciências humanas; b) justificar criticamente essa
idéia para que sirva de fundamento da unidade dos múltiplos aspectos do fenômeno
humano; c) sistematizar filosoficamente a sua constituição como Ontologia,
respondendo ao problema clássico da essência: o que é o homem?658. A
consecução destas tarefas aponta para a constituição de uma antropologia integral.
A sistematização rigorosa da Antropologia Filosófica realizada por
Lima Vaz se propõe encontrar um centro conceptual que consiga unificar as A sistematização
658
. AF I p.11.
659 . AF I, p. 163.
250
Esta noção da auto-expressividade como espírito, ou do eu como
expressividade, é uma noção sem conteúdo. O eu, no começo da Antropologia
Filosófica, é um nada. Mas, ao mesmo tempo, é tudo, pois ele é condição de
possibilidade para a autoposição do sujeito. Tudo procede da função mediadora do
sujeito. Esta posição é análoga ao ser da lógica hegeliana. O espírito é o método.
O homem enquanto objeto da interrogação feita por ele mesmo está inserido
no interior de um horizonte epistemológico constituído pelo domínio metacientífico,
pelo domínio das ciências hermenêuticas e pelo domínio das ciências empírico-
formais. Estes domínios tão amplos tendem a formar pólos epistemológicos
privilegiados responsáveis pela formação de certas imagens do homem que
acentuam determinados aspectos da realidade humana. Os pólos epistemológicos
fundamentais são a) o pólo das formas simbólicas, isto é, o horizonte das ciências
da cultura; b) o pólo do sujeito, isto é, o horizonte das ciências do indivíduo e do seu
agir indvidual, social e histórico; c) o pólo da natureza, isto é, o horizonte das
ciências naturais do homem.
Lima Vaz busca uma articulação entre estes três pólos que consiga, ao
mesmo tempo, evitar qualquer forma de reducionismo e constituir uma antropologia
integral. Mas seu trabalho não acaba com a antropologia, uma vez que ele continua
desenvolvendo e aprofundando certos aspectos de sua antropologia em Filosofia
e Cultura. Os aspectos mais importantes e que continuam sendo desenvolvidos a
partir das questões da Antropologia são todos aspectos que se situam na linha de
continuidade das categorias de relação.
Os temas tratados a partir da categoria de objetividade são aqueles
relacionados à primazia da técnica e da ciência no mundo contemporâneo. Os
temas tratados a partir da categoria de intersubjetividade são aqueles relativos ao
problema da cultura, da importância histórica e teórica da filosofia no horizonte
cultural do homem contemporâneo e os problemas civilizatórios concernentes às
ardentes questões éticas da atualidade. Finalmente, o tema da categoria de
transcendência continua a ser trabalhado seja a partir da perspectiva antropológica
seja a partir da perspectiva da metafísica do existir.
Portanto, tal como já foi afirmado, Filosofia e Cultura é um texto de
passagem, que serve para aprofundar certos temas fundamentais da Antropologia
Filosófica e preparar os horizontes da reflexão ética da Introdução à Ética
Filosófica 1 e 2, bem como apresentar noções fundantes da metafísica do existir de
Tomás de Aquino, mais especificamente relacionadas com a sua teoria do juízo. Em
síntese, Filosofia e Cultura não é apenas uma coletânea de artigos brilhantes.
Trata-se de um elo conceptual fundamental que estabelece relações profundas
entre a Antropologia e a Ética Filosófica.
251
E. Ética e Sistema.
Tal como fez no início da Antropologia Filosófica660, Lima Vaz indica, já no
prefácio de seu Introdução à Ética Filosófica 1, sua pretensão de elaborar uma
Ética sistemática. Essa obra tem 3 objetivos a serem alcançados: a) indicar qual a
situação da Ética no interior do atual panorama desenhado pela Filosofia e pelas
Ciências Humanas, estabelecendo ao mesmo tempo a especificidade filosófica da
Ética: situação da ética; b) realizar um trabalho de rememoração dos grandes
modelos filosóficos do pensamento ético, afinal, mais do qualquer outra disciplina
filosófica, a Ética depende e vive permanentemente das lições da história:
rememoração; c) refletir sobre as estruturas e categorias fundamentais da Ética,
organizando-as de modo a evidenciar sua articulação dialética e sistemática:
sistema 661.
De forma bem clara e explícita, Lima Vaz indica sua intenção sistemática:
"A intenção que nos guiou ao redigir estas páginas foi a de tentar uma
reflexão histórico-sistemática sobre os temas e problemas fundamentais da
Ética filosófica"662.
Para que esta empresa consiga ser realizada é necessário que Lima Vaz
reconheça, portanto, a natureza filosófica das categorias éticas que vão permitir o
pensamento dos fundamentos racionais do agir segundo o ethos e sua vinculação
com uma concepção filosófica do homem – uma Antropologia Filosófica – e com
uma ciência do ser – uma metafísica. O escopo vaziano em articular a antropologia,
com a ética e com a metafísica é nítido e evidente.
Esta articulação da ética com a metafísica se coloca como uma tarefa
fundamental, pois, a razão não consegue circunscrever todo o horizonte do agir
humano, ou mesmo propor uma explicação de todas as dimensões do ethos, se o
seu uso imanente estiver restrito ao campo do empírico segundo uma lógica
unívoca e não analógica.
A razão sempre busca um fundamento último para as razões do agir ético,
visto que ao longo da história a reflexão ética vê elevar-se diante de si inumeráveis
sucedâneos do absoluto que justificam e legitimam a ação humana.
A ruína da ética
"O que a história nos mostra é que a reflexão ética, na sucessão de
suas grandes épocas vê elevar-se sempre em seu horizonte a figura de algum
absoluto ao qual são pedidas a justificação e a legitimação definitivas das
razões do agir. Mesmo quando a Ética, na tarda modernidade, pretende
edificar-se toda no domínio da imanência histórica ou mundana e libertar-se de
660
. AF I, p.11.
661 . EF IV, p.9.
662
. EF IV, p.9.
663 . EF V, p.7.
252
qualquer vínculo com a metafísica no sentido clássico preconizando um
relativismo universal dos valores, a sombra do absoluto continua a projetar-se
em seu caminho, seja ele postulado como Natureza, o próprio Sujeito como
autonomia incondicionada, o polimorfo inconsciente, a História, a Sociedade ou
o Estado, esse ‘deus mortal’ no dizer de Hobbes e de Hegel. A alternativa
radical a esse necessário encontro com o absoluto seria a eversão de todos os
valores: o fim da Ética, o niilismo"664.
664
. EF IV, p.84.
665 . EF V, p.8.
666
. EF V, p.7.
667 . EF V, p.19.
253
Ao tratar da possibilidade e dos limites de uma ética sistemática Lima Vaz
apresenta uma brevíssima exposição sobre a natureza etimológica da palavra
sistema e seus sentidos ao longo da história, para afirmar que atualmente a
concepção vigente de sistema tem seu paradigma no modelo de sistema formal
assentado numa lógica unívoca. A atribuição de uma estrutura analógica à idéia de
sistema permite a possibilidade de um discurso ético que respeite as peculiaridades
históricas, sociais e culturais dos vários ethoi existentes.
Sistema
Lima Vaz se afeiçoará a esta noção de sistema aberto, que retornará no seu O sistema
aberto
texto sobre a metafísica – Raízes da Modernidade. Além disto, o termo sistema
não passa de uma representação simbólica cuja finalidade é assegurar que a
realidade por ele representada se oferece à compreensão humana e portanto pode
ser racionalmente ordenável.
A importância da noção de sistema aberto se deve, por um lado, à
impossibilidade de manter o discurso ético fechado ao campo das próprias razões
do ethos, e, por outro lado, à necessidade de ultrapassar as fronteiras noéticas do
ethos através de uma abertura para a transcendência que exige uma
fundamentação última de natureza metafísica.
668
. EF V, p.14.
669 . EF V, p.17.
254
abertura ao infinito através da categoria de espírito, enquanto aspecto estrutural, e
através da categoria de transcendência, no campo das relações antropológicas.
A existência de uma pretensão sistemática no coração do pensamento
vaziano é indiscutível. Tal pretensão é notória, e vai se tornando gradualmente mais
e mais explícita à medida que seus textos vão se tornado cada vez mais
interdependentes entre si.
Esta seção tem como objetivo mostrar que o pensamento vaziano pode ser Objetivos
desta tese
compreendido a partir tanto de uma perspectiva temática, quanto de uma
perspectiva sistemática. A partir da primeira perspectiva é possível apresentar dois
temas que atravessam todo o pensamento de Lima Vaz: a metafísica do ato de
existir e a compreensão genética da modernidade.
A partir da perspectiva do sistema é possível percorrê-lo através de duas
direções distintas, e, ao mesmo tempo, complementares: a via compositionis e a via
resolutionis. A primeira direção permite o acompanhamento de todo o processo de
desdobramento do discurso propriamente dito. Ao seguir esta direção o leitor da
obra de Lima Vaz acompanha a posição sucessiva de cada uma das categorias da
Antropologia, da Ética e da Metafísica. Esta é a via compositionis que indica a
ordem de constituição das categorias através de um processo ascendente, de
natureza dialético-especulativa. A segunda direção, através da qual o sistema
vaziano pode ser lido e compreendido, tem seu início no exato momento em que se
pode contemplar todo o edifício vaziano a partir de sua altura especulativa máxima,
a partir do tópico mais importante de toda a obra ora estudada: o tema do Absoluto.
Esta segunda direção é designada por Lima Vaz como via resolutionis.
255
"O retorno do discurso sobre si mesmo ao alcançar a categoria de
pessoa mostra as peculiaridades da sua estrutura dialética no âmbito dessa
categoria. O princípio da limitação eidética, aplicando-se aqui ao eidos total do
ser-homem, definido pela sucessão das categorias, configura esse eidos como
a resposta adequada à amplitude da pergunta ‘o que é o homem?’ Em virtude
desse princípio, o discurso se autolimita, tendo encontrado seu termo na
categoria de pessoa e permitindo a dupla leitura da inteligibilidade para-nós
(sucessão das categorias) e da inteligibilidade em-si (fundamentação última das
categorias). Ao mesmo tempo, em virtude do princípio da ilimitação tética, ao
afirmar o seu ser como pessoa, estabelecendo entre os dois termos uma
equação ontológica, o sujeito rompe a limitação eidética da sua finitude e da
sua situação, abrindo-se à infinito intencional do ser e tende a orientar o
dinamismo mais profundo da sua autorealização, o alvo da união final, pela
contemplação e pelo amor, com a infinitude real do Existente absoluto (ipsum
Esse subsistens)"670.
670
. AF II, p.226.
671 . AF II, p.226.
672
. AF II, p.226.
673. AF II, p.227.
256
Algo análogo ocorre com a Ética, pois o sujeito moral é pessoa moral que Pessoa moral
Lima Vaz encontra as linhas fundamentais de inspiração para a sua ética nas
suas origens clássicas, os paradigmas platônico e aristotélico, segundo os quais se
pressupõe uma relação constitutiva do ser humano a uma instância racional, em si
mesma trans-histórica, mas normativa de todo o agir histórico: “a instância de um
Bem transcendente”675. Segundo Lima Vaz, esta instância permanece como um
invariante conceptual na variação de toda a tradição ocidental.
"A afirmação do Bem como princípio do ser e do ser conhecido (ratio
essendi e ratio cognoscendi) da práxis humana é, como mostrou Aristóteles, o
princípio de uma ciência da práxis (a Ética), revelando-se também, por sua
natureza, uma ciência prática. Uma ciência que discorra sobre o que é o Bem
(em si mesmo, em cada um de nós e na comunidade humana) e, ao mesmo
tempo, nos ensine como tornar-nos bons (Ét. Nic, II, 2, 1103 b 26-28). Mas a
utilidade da Ética como ciência prática (ou pragmática, como se costuma dizer
hoje) decorre de sua fundamentação numa ciência da prática ou num discurso
ordenadamente conduzido sobre estrutras inteligíveis subjacentes ao operar da
razão que conduz a práxis, ou seja, da Razão prática em sua ordenação
necessária ao Bem. Apresentar uma versão, entre outras possíveis, desse
discurso, tal nosso escopo nessa Introdução à Ética Filosófica. Estamos
convencidos de que a prática ética só pode ser justificada em razão por uma
ciência da prática, que tenha como princípio e fundamento uma metafísica do
Bem: (...) não há Ética sem metafísica"676.
O discurso metafísico já tem seu início com a questão do Absoluto. Mas ele
também apresenta uma evolução e uma seriação de categorias que parte da pré-
compreensão do Absoluto, e culmina na demonstração da sua existência e na
demonstração de sua natureza677. Tanto o discurso antropológico, quanto ético e
metafísico, em última análise, têm como condição de possibilidade do discurso a
presença do Absoluto no dinamismo intelectual do ser humano: a pré-compreensão
do Absoluto. Todavia o trabalho de constituição das categorias ou de redação do
discurso filosófico, na antropologia e na ética, não é iniciado com o tema da posição
do Absoluto. É necessário acompanhar todo o desdobramento do conceito para se
674
. EF V, p.239.
675 . EF V, p.241.
676
. EF V, p.242.
677 . EF III, p.332. Nota 140.
257
alcançar a intelecção da presença do Absoluto como termo do discurso e intui-lo
como presença necessária para a possibilidade mesma do início do próprio discurso
filosófico. Já a Metafísica é iniciada de forma explícita pela tematização da presença
do Absoluto no dinamismo intelectual do ser humano.
G. O sistema aberto
678
. LABARRIÈRE, J.-P, Système, Encyclopédie Philosophique Universelle, Les Notions
Philosophiques, Dictionnaire, Vol. II, p.2532.
679 . LABARRIÈRE, J.-P, Système, Encyclopédie Philosophique Universelle, Les Notions
Philosophiques, Dictionnaire, Vol. II, p.2532.
258
pressuposto fundamental de Lima Vaz assenta-se sobre a aceitação de um
Transcendente absoluto que é Princípio e Fonte do existir e portanto condição de
possibilidade da existência dos esse relativos e da inteligência finita. Mas este
Transcendente também é FIM e conseqüentemente o Bem para o qual o ser
humano tende, em vista de sua abertura transcendental ao ser ou de sua infinitude
intencional.
Na Antropologia Filosófica, Lima Vaz não usa a expressão sistema aberto.
Todavia, a compreensão do sujeito como infinitude intencional, como portador das
prerrogativas da liberdade e da racionalidade, como termo da relação de
transcendência e como pessoa faz com que o tema metafísico da sua abertura à
amplitude transcendental do ser seja uma exigência. E, como tal, só é possível
representar este aspecto fundamental da condição humana através de um sistema
que tenha a abertura como característica necessária do sistema, e, por conseguinte,
faz com que esta característica seja uma exigência sine qua non para a elaboração
do próprio sistema, pois o homem é compreendido como espírito e como ser-para-o-
Absoluto680.
O mesmo acontece com a Ética, afinal tal como já foi dito algumas vezes ao Ética
longo deste trabalho, toda a ética vaziana depende da noção de Bem, conversível a
noção de Fim, que por sua própria natureza é uma noção estritamente metafísica
que implica a impossibilidade do discurso sobre o homem esgotar-se no campo da
imanência, impulsionando-o para além do horizonte empírico de sua existência.
A metafísica organizada e sistematizada em Raízes da Modernidade é o
ponto de chegada e de conclusão do trabalho vaziano. Mas é, também, o ponto de
partida, pois tal como fora anunciado no início desta tese e no seu primeiro capítulo,
o tema da metafísica do existir já estava presente nos primeiros escritos de Lima
Vaz. Este tema atravessou todo o iter filosófico vaziano, e alcançou o seu termo
nesta empresa de natureza sistemática, através de um procedimento dialético de
inspiração platônica e hegeliana.
Seja como ponto de chegada, seja como ponto de partida, a metafísica do
existir organizada dialeticamente em Raízes da Modernidade é a chave de
inteligibilidade, é a clef de voûte de todo o pensamento vaziano. A metafísica
apresentada por Lima Vaz é o lugar conceptual de onde se pode contemplar toda
sua obra de forma coerente e completa. É o lugar de cuja altura especulativa se
pode iluminar todas as trilhas identificadas neste trabalho e por ele percorridas.
Mas antes de qualquer coisa, a metafísica subjacente ao pensamento
vaziano é assumida como condição de possibilidade de uma antropologia integral e
de uma ética que não esteja restrita às determinações de qualquer horizonte último
681
. EF VII, p.220.
682 . EF VII, p.221.
260
tempo em que realiza a convergência mais difícil e admirável de todas: modernidade
e metafísica. Simultaneamente, Lima Vaz dá acabamento ao seu sistema e explicita
com acuidade filosófica admirável a origem dos pressupostos doutrinais e
metafísicos que inauguram a modernidade e que inauguram o tempo em que o
homem do terceiro milênio vive.
261
CONCLUSÃO
Modernidade e metafísica:
Um sistema aberto
262
CONCLUSÃO
De uma forma mais sucinta e esquemática é possível dizer que esta tese
teve como hipóteses a serem confirmadas ao longo do seu desdobramento as
seguintes proposições:
263
a via descensus, a compreensão do sistema só pode ser alcançada a partir de seu
vértice metafísico, do qual partem, de forma radial, todos os elementos estruturais e
fundacionais da ética e da antropologia. A partir da via compositionis, ou da via
ascensus, é feito o caminho de subida e, portanto, de constituição de cada uma das
categorias antropológicas, éticas e metafísicas. Esta é a ordem da redação dos
textos, da leitura propriamente dita, e da edificação do próprio sistema. Todavia o
alicerce e as bases desse sistema são a própria metafísica do existir que se coloca
como elemento fundante e como condição de possibilidade do próprio discurso
filosófico e sistemático de Lima Vaz. Com isso há o fechamento de um grande
círculo – o círculo do sistema.
Lima Vaz formou-se dentro de uma escola filosófica que inicialmente fez com
que ele caminhasse no seio de uma filosofia marcada pela tradição clássica. Ele
percebeu a dissolução dessa tradição no seio da contemporaneidade e buscou
reencontrar essa tradição por meio de um movimento de suprassunção dialética, no
coração mesmo da contemporaneidade.
“Partindo da tradição, e tendo vivido o fim ou a exaustão de uma forma
de recebê-la e entendê-la, a ela voltamos para, a partir da sua compreensão
renovada, podermos definir o lugar e a perspectiva da nossa presença no
centro e não às margens da nossa desafiadora realidade”685.
Por causa disso o retorno à tradição não se coloca para Lima Vaz como um
simples exercício de erudição. Esse retorno, manuduzido por Hegel, fez com que a
tradição se abrisse num tempo do conceito muito mais profundo no seu passado e
muito mais complexo na sua história do que a tradição escolástica permitira como
ponto de partida.
“Retornar ao começo, remontando o tempo histórico e reconstituindo o
tempo lógico era, para nós, voltar à manhã grega da Filosofia (...). O caminho
de volta da contemporaneidade à tradição não é pois, o melancólico refúgio no
passado da desesperança resignada de compreender o presente. É o desafio
do presente, vivido como problema, que obriga a rememorar o passado e a
captar no conceito o tempo que passa pela mediação refletida do tempo
passado. Tal a lição que aprendemos na intensa meditação da hegeliana
Fenomenologia do Espírito” 686.
Com isto Lima Vaz busca reinventar a experiência do logos. E seu primeiro
anúncio “é o de que ele (o logos) dá razão (lógon didónai), distingue e une: ou seja,
o logos é fundamento, ordem e finalidade”689. O logos tem suas exigências de
fundamentação, de ordenação e de finalização e com isto impõe a recuperação da
idéia de Sistema no sentido da articulação ordenada do pensamento, sem a qual é
impossível estabelecer uma leitura coerente da realidade. Mas a Razão também faz
com que o homem desça até as questões primeiras e essenciais. Ela interroga para
responder, e a resposta deve ter a mesma envergadura da questão. E das
respostas surgem novas perguntas e disso decorre a natureza circular e constitutiva
do logos filosófico. Nesse sentido Lima Vaz afirma que o lógos é constitutivamente
interrogante e sistematizante “na pulsação elementar de sua vida”, e tal pulsação é
o elemento fundamental da vida e da reflexão filosóficas.
688
. SNF, n.55, p. 688
689 . SNF, n.55, p. 689.
267
situação, implica a intuição de que o Absoluto deve ser pensado simplesmente
como uma exigência do próprio dinamismo intelectual do ser humano. Para Lima
Vaz a exigência do Absoluto transcendente está inscrita na própria essência e no
dinamismo mais profundo da Razão690. E nesse sentido, o Ser que se coloca como
Ipsum Esse subsistens é o ponto de partida fundacional da existência dos esse
relativos, ao mesmo tempo em que é o ponto de chegada de um itinerário marcado
pelos passos dados pela inteligência finita do ser humano, que consegue perceber
que o zênite e o momento de exaurimento das suas capacidades intelectivas se dá
apenas ao atingir a altura especulativa de uma reflexão exigencial sobre o Absoluto
que possa servir de rota para a existência humana, a partir da emergência de uma
nova figura da Transcendência que ilumine e oriente os caminhos do homem neste
milênio que se inaugura.
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HEGEL, G.W.F. Enciclopédia das Ciências Filosóficas, III - A Filosofia do Espírito, São
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283
ÍNDICE DE GRÁFICOS
284
ÍNDICE DE QUADROS
285
ÍNDICE ANALÍTICO
Certidão de doutoramento................................................................................................................ 3
Dedicatória ......................................................................................................................................... 4
Agradecimentos ................................................................................................................................ 5
Sumário .............................................................................................................................................. 6
Abreviaturas ....................................................................................................................................... 7
Abstract .............................................................................................................................................. 8
Resumo............................................................................................................................................... 9
INTRODUÇÃO .................................................................................................................................. 10
PRIMEIRO CAPÍTULO – APRESENTAÇÃO TEXTUAL-CRONOLÓGICA DOS TEMAS
DE LIMA VAZ .................................................................................................................................... 16
A. Cronologia dos textos de Lima Vaz ................................................................................ 16
B. Os temas estudados por Lima Vaz ................................................................................ 30
C. A colocação do problema: Ontologia e História ............................................................. 34
D. A herança teológica da modernidade: Problemas de Fronteira ..................................... 53
E. Sobre a Ontologia da Natureza: o sujeito e o mundo. ................................................... 63
F. A passagem da universalidade nomotética para a universalidade hipotético-dedutiva:
Ética e Direito. ..................................................................................................................... 72
SEGUNDO CAPÍTULO – A METAFÍSICA DO EXISTIR .................................................................. 82
A. A categoria de espírito: Antropologia Filosófica ............................................................. 82
B. A categoria de transcendência: Antropologia Filosófica e Filosofia e Cultura. .............. 92
C. As categorias de Bem e Fim: A Ética ........................................................................... 117
D. As categoria de Ser e de Existência: Raízes da Modernidade .................................... 123
TERCEIRO CAPÍTULO – A COMPREENSÃO GENÉTICA DA MODERNIDADE ....................... 145
A. A primazia da categoria antropológica da objetividade ........................................... 145
B. Inversão da dialética mensurante-mensurado ......................................................... 148
C. A Unidade da Razão ................................................................................................ 152
D. Desarticulação da matriz ternária Princípio-ordem-indivíduo e a absolutização da
práxis ............................................................................................................................ 162
E. As raízes metafísicas da modernidade .................................................................... 168
QUARTO CAPÍTULO – O MÉTODO DIALÉTICO E A REMEMORAÇÃO FILOSÓFICA ............. 184
A. A dialética: uma introdução .......................................................................................... 184
B. A Dialética em Platão: uma ontologia ........................................................................... 189
C. A Dialética em Hegel: um método ................................................................................ 191
D. Lima Vaz e a Dialética .................................................................................................. 197
E. A Rememoração Histórica ............................................................................................ 200
F. O aspecto formal da constituição das categorias: os níveis do conhecimento e a
estrutura da conceitualização filosófica. ........................................................................... 208
QUINTO CAPÍTULO – UM SISTEMA ABERTO: VIA COMPOSITIONIS E VIA
RESOLUTIONIS .............................................................................................................................. 225
A. A simetria entre as partes do Sistema .......................................................................... 225
B. O aspecto teleológico da constituição das categorias: a via compositionis e a via
resolutionis. ....................................................................................................................... 229
C. Via compositionis: a constituição das categorias do sistema ...................................... 241
D. Antropologia e Sistema. ............................................................................................... 249
E. Ética e Sistema. ............................................................................................................ 252
F. Via Resolutionis: O Absoluto e a sistematização da metafísica. .................................. 255
G. O sistema aberto .......................................................................................................... 258
Conclusão ...................................................................................................................................... 263
Bibliografia ..................................................................................................................................... 269
Índice de Gráficos ......................................................................................................................... 284
Índice de Quadros ......................................................................................................................... 285
Índice Analítico .............................................................................................................................. 286
286