Sunteți pe pagina 1din 22

CAO – Crim

Boletim Criminal Comentado – 12/2019


(semana nº 01)

Subprocuradoria-Geral de Justiça de Políticas Criminais e Institucionais


Mário Luiz Sarrubbo

Coordenador do CAO Criminal


Arthur Pinto Lemos Junior

Assessores
Fernanda Narezi Pimentel Rosa
Ricardo José Gasques de Almeida Silvares
Rogério Sanches Cunha

Marcelo Sorrentino Neira


Paulo José de Palma

Analista Jurídica
Ana Karenina Saura Rodrigues
Boletim Criminal Comentado Dezembro-
2019- (semana nº 01)

SUMÁRIO

SUMÁRIO --------------------------------------------------------------------------------------------------------------------- 2
ESTUDOS DO CAOCRIM -------------------------------------------------------------------------------------------------- 3
1-Tema: Estatuto do Desarmamento - A evolução dos decretos regulamentadores e o conflito de leis
penais no tempo....................................................................................................................................3

2-Tema: Foro por prerrogativa de função em crimes comuns cometidos por membros do Ministério
Público e da Magistratura....................................................................................................................15

3-Tema: STF fixa tese de repercussão geral para autorizar compartilhamento de dados bancários e
fiscais sem autorização judicial............................................................................................................20

2
Boletim Criminal Comentado Dezembro-
2019- (semana nº 01)

ESTUDOS DO CAOCRIM

1-Tema: Estatuto do Desarmamento - A evolução dos decretos regulamentadores e o conflito de


leis penais no tempo

No ano de 2019, o Poder Executivo da União editou diversos decretos, com o objetivo de alterar a
regulamentação da Lei 10.826/2003 (Estatuto do Desarmamento).

O primeiro deles foi o Decreto 9.685, publicado em 15 de janeiro, que, dentre outras coisas,
aumentou o prazo para renovação dos certificados de registro de armas de fogo para 10 anos e
prorrogou-os automaticamente por tal período.

Em 8 de maio, houve a publicação do Decreto 9.785/2019, que revogou completamente o antigo


regulamento (Decreto 5.123/2004), trazendo uma completa reclassificação das armas e munições,
de modo que muitas daquelas antes consideradas de uso restrito passaram a ser classificadas como
de uso permitido.

O reflexo foi imediato: tais alterações atingiram a própria tipicidade dos crimes dos arts. 12, 14, 16 e
19 do Estatuto do Desarmamento, que são normas penais em branco, cujos complementos se
encontram justamente nas normas regulamentadoras infralegais. Assim, por exemplo, se alguém
estivesse sendo processado pelo crime do art. 16, caput, por portar arma de fogo de uso restrito, que
foi reclassificada como de uso permitido, o acusado seria beneficiado pela alteração havida na
regulamentação, ocorrendo uma automática mudança na própria classificação da infração penal,
sendo aplicável o art. 12 ou 14 do Estatuto, a depender das circunstâncias do caso.

O decreto 9.785/2019 foi logo modificado pelo Decreto 9.797/2019, publicado em 22 de maio. Não
houve alteração para fins de classificação das armas, mas, basicamente, um aperfeiçoamento da
redação.

A respeito das publicações desses decretos, este CAOCrim publicou então alguns comentários,
respectivamente, nos Boletins das semanas 2 dos meses de maio e junho, que podem ser acessados
em nossa página na internet. Agora, trazemos no presente texto um resumo do que já comentados
e as atualizações havidas desde então.

Em 25 de junho de 2019, foram publicados nada menos que quatro decretos: 9.844, 9.845, 9.846,
9.847. O primeiro nasceu revogado pelo último; os demais entraram efetivamente em vigor, ficando
revogado o Decreto 9.785. Não houve alteração da sistemática de classificação das armas e
munições, de modo que o quadro iniciado em maio permaneceu o mesmo.

3
Boletim Criminal Comentado Dezembro-
2019- (semana nº 01)

Paralelamente, vigorava o Decreto 3.665/2000, conhecido como R-105, e que trazia o Regulamento
de Produtos Controlados. Era importante, pois também tratava de armas, acessórios e munições,
com definições relevantes para o entendimento do Estatuto do Desarmamento.

Ainda em 2018, houve a edição do Decreto 9.493, que traria o novo Regulamento de Produtos
Controlados. Foi fixado período de vacatio que deveria terminar em julho de 2019, mas que acabou
sendo estendido, até que, em 13 de outubro de 2019, foi editado o Decreto 10.030/2019, que
revogou tanto o Decreto 3.665/2000 quanto o Decreto 9.493 e efetivamente instituiu novo o
Regulamento de Produtos Controlados.

Portanto, atualmente estão em vigor e merecem atenção do intérprete do Estatuto do


Desarmamento os seguintes decretos:

9.845/2019

9.846/2019

9.847/2019

10.030/2019

A seguir, apresentamos dois gráficos retratando essa evolução.

Evolução dos Decretos Regulamentadores da Lei 10.826/2003 (Estatuto do Desarmamento)

Decreto 5.123/2004
Modificado pelo:
Decreto 9.685/2019 (15/01/2019)

Decreto 9.785/2019 (08/05/2019)

Modificado pelo:
Decreto 9.797/2019 (22/05/2019)

Decreto 9.847/2019
(em vigor)
+
Decreto 9.846/2019
(em vigor)
+

4
Boletim Criminal Comentado Dezembro-
2019- (semana nº 01)

Decreto 9.845/2019
(em vigor)
(25/06/2019)
Evolução dos Regulamentos de Produtos Controlados

Decreto 3.665/2000 (R-105)

Decreto 9.493/2018
(revogado em vacatio legis)

Decreto 10.030/2019
(em vigor)
(13/10/2019)

O Decreto 9.785/2019: alteração dos critérios de classificação

Segundo o Decreto 9.785, passou a ser considerada arma de fogo de uso permitido a
semiautomáticas ou de repetição:

a) de porte que, com a utilização de munição comum, não atinja, na saída do cano de prova, energia
cinética superior a mil e duzentas libras-pé ou mil seiscentos e vinte joules;

b) portátil de alma lisa; ou

c) portátil de alma raiada, cujo calibre nominal, com a utilização de munição comum, não atinja, na
saída do cano de prova, energia cinética superior a mil e duzentas libras-pé ou mil seiscentos e vinte
joules.

De plano, notam-se duas coisas: o Decreto 9.785/2019 ingressou em definições que, até então, eram
deixadas inteiramente a cargo do Regulamento de Produtos Controlados; e que se abandonou a
técnica de citação expressa dos calibres nominais, mantendo-se apenas o critério da energia cinética
da munição na saída do cano.

Quais armas passaram a ser de uso restrito e proibido?

Segundo o Decreto 9.785, passou a ser considerada de uso proibido, a arma de fogo: classificada
como de uso proibido em tratados internacionais dos quais a República Federativa do Brasil seja
signatária; e dissimulada, com aparência de objeto inofensivo.

5
Boletim Criminal Comentado Dezembro-
2019- (semana nº 01)

Passou a ser classificada como de uso restrito a arma de fogo automática, semiautomática ou de
repetição:

a) não portátil;

b) de porte, cujo calibre nominal, com a utilização de munição comum, atinja, na saída do cano,
energia cinética superior a mil e duzentas libras-pé ou mil seiscentos e vinte joules; ou

c) portátil de alma raiada, cujo calibre nominal, com a utilização de munição comum, atinja, na saída
do cano de prova, energia cinética superior a mil e duzentas libras-pé ou mil seiscentos e vinte joules.

O evidente aumento dos limites de energia cinética mostra que houve intenção de deixar na
categoria de armas de uso restrito, na prática, apenas as armas longas, como fuzis, deixando os
revólveres e pistolas, salvo raras exceções (sendo exemplo a pistola .50), na categoria do uso
permitido.

O impacto penal foi grande.

Como já observado e para ficarmos nos exemplos mais comuns, todos aqueles acusados pela prática
do crime do art. 16, caput, da Lei 10.826/2003 – ou seja, que praticaram a conduta de possuir, deter,
portar, adquirir, fornecer, receber, ter em depósito, transportar, ceder, ainda que gratuitamente,
emprestar, remeter, empregar, manter sob sua guarda ou ocultar arma de fogo, acessório ou
munição de uso proibido ou restrito, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou
regulamentar – e cujo objeto do crime, a arma de fogo, tiver sido rebaixado da categoria de uso
restrito para de uso permitido, foram imediatamente beneficiados pelo Decreto 9.785/2019.

Isso significa que os acusados pela prática do crime do art. 16, em casos de aplicação do citado
rebaixamento, não mais estarão sujeitos às penas de 3 a 6 anos de reclusão, mas àquelas previstas
nos arts. 12 e 14 do Estatuto do Desarmamento, conforme as circunstâncias do caso. Assim, se a
arma tiver sido encontrada no interior da residência, passará a ser aplicado, retroativamente, o art.
12, com pena de 1 a 3 anos de detenção, e multa. Se o agente a portava fora de casa, incidirá o art.
14, com pena de 2 a 4 anos de reclusão, e multa.

Além disso, vale lembrar que o delito do art. 16 é considerado equiparado a hediondo pela Lei
8.072/1990, enquanto os demais não, o que trará reflexos na execução penal, notadamente para fins
do cálculo de cumprimento de pena para progressão de regime e livramento condicional.

Nesses pontos, o Decreto 9.785/2019 representou inegável novatio legis in mellius e, como tal,
retroagiu, atingindo até mesmo os processos com trânsito em julgado.

Quanto às munições, o Decreto 9.785 apresentava deficiências evidentes. Dizia seu art. 2º, IV:
“munição de uso restrito - munições de uso exclusivo das armas portáteis raiadas, e das perfurantes,

6
Boletim Criminal Comentado Dezembro-
2019- (semana nº 01)

das traçantes, das explosivas e das incendiárias”. Então, com a redação dada pelo Decreto 9.797,
foram classificadas como munições de uso restrito aquelas que:

a) atinjam, na saída do cano de prova de armas de porte ou portáteis de alma raiada, energia cinética
superior a mil e duzentas libras-pé ou mil seiscentos e vinte joules;

b) sejam traçantes, perfurantes ou fumígenas;

c) sejam granadas de obuseiro, de canhão, de morteiro, de mão ou de bocal; ou

d) sejam rojões, foguetes, mísseis ou bombas de qualquer natureza.

Houve a inclusão da definição de munições de uso proibido: “as munições incendiárias, as químicas
ou as que sejam assim definidas em acordo ou tratado internacional de que a República Federativa
do Brasil seja signatária”.

Quanto aos acessórios, nada mudou em relação à regulamentação que havia na época, eis que o
Decreto 9.785 nada dispôs a respeito, ficando mantidas as definições então existentes, ainda do
Decreto 3.665/2000, até ser revogado e substituído pelo Decreto 10.030/2019.

O regime atual: Decretos 9.845, 9.846, 9.847 e 10.030/2019 e Portaria MD/CE 1.222/2019

Vejamos como ficaram os objetos materiais da maioria dos crimes do Estatuto do Desarmamento
com essa nova regulamentação.

Os conceitos são encontrados no Regulamento do Estatuto, hoje dividido em três Decretos - 9.845,
9.846. 9.847/2019 -, bem como no Regulamento de Produtos Controlados, do Decreto 10.030/2019.
Útil, também, para o estudo do tema é a Portaria do Ministério da Defesa/Comando do Exército
1.222/2019.

Armas de fogo de uso proibido

São armas de fogo de uso proibido: a) as armas de fogo classificadas de uso proibido em acordos e
tratados internacionais dos quais a República Federativa do Brasil seja signatária; e as armas de fogo
dissimuladas, com aparência de objetos inofensivos (art. 2º, III, Decreto 9.847/2019).

Armas de fogo de uso restrito

7
Boletim Criminal Comentado Dezembro-
2019- (semana nº 01)

Armas de fogo de uso restrito, segundo o art. 2º, II, do Decreto 9.847/2019, que manteve os mesmos
parâmetros do revogado Decreto 9.785, são as armas de fogo automáticas1 e as semiautomáticas2
ou de repetição3 que sejam: a) não portáteis;4 b) de porte5, cujo calibre nominal,6 com a utilização
de munição comum, atinja, na saída do cano de prova7, energia cinética8 superior a mil e duzentas
libras-pé ou mil seiscentos e vinte joules; ou c) portáteis9 de alma raiada, cujo calibre nominal, com
a utilização de munição comum, atinja, na saída do cano de prova, energia cinética superior a mil e
duzentas libras-pé ou mil seiscentos e vinte joules.

Mas, afinal, levando-se em considerações os calibres nominais, quais são as armas de uso restrito?

Para dar uma resposta a estar importante indagação, o Ministério da Defesa, por meio do Comando
do Exército editou a Portaria 1.222, de 12 de agosto de 2019, contendo anexos com tabelas de
calibres nominais e a respectiva classificação, levando-se em consideração os parâmetros dos

1
Arma de fogo automática: arma em que o carregamento, o disparo e todas as operações de funcionamento
ocorrem continuamente enquanto o gatilho estiver sendo acionado (Decreto 10.030/2019, Anexo III –
Glossário).

2
Arma de fogo semiautomática: arma que realiza, automaticamente, todas as operações de funcionamento
com exceção do disparo, exigindo, para isso, novo acionamento do gatilho (Decreto 10.030/2019, Anexo III –
Glossário).
3
Arma de fogo de repetição: arma em que a recarga exige a ação mecânica do atirador sobre um componente
para a continuidade do tiro (Decreto 10.030/2019, Anexo III – Glossário).
4
Arma de fogo não portátil: as armas de fogo que, devido às suas dimensões ou ao seu peso, precisam ser
transportadas por mais de uma pessoa, com a utilização de veículos, automotores ou não, ou sejam fixadas em
estruturas permanentes (art. 2º, IX, Decreto 9.847/2019).

5
Arma de fogo de porte: as armas de fogo de dimensões e peso reduzidos que podem ser disparadas pelo
atirador com apenas uma de suas mãos, a exemplo de pistolas, revólveres e garruchas (art. 2º, VII, Decreto
9.847/2019).

6
Calibre nominal: é a designação que define ou caracteriza um tipo de munição ou de arma de fogo produzida
pelo fabricante. Normalmente está relacionado às dimensões da munição, expressa em milímetros ou em
frações de polegada (art. 2º, I, Portaria MD/CE 1.222/2019).

7
Cano de prova ou provete: é um cano de dimensões especiais usados para teste com munições (art. 2º, II,
Portaria MD/CE 1.222/2019).

8
Energia cinética: é a energia associada ao estado de movimento de um objeto (art. 2º, III, Portaria MD/CE
1.222/2019).

9
Arma de fogo portátil: as armas de fogo que, devido às suas dimensões ou ao seu peso, podem ser
transportada por uma pessoa, tais como fuzil, carabina e espingarda (art. 2º, VIII, Decreto 9.847/2019).

8
Boletim Criminal Comentado Dezembro-
2019- (semana nº 01)

Decretos 9.847, 9.846 e 9.845. Pode-se perfeitamente afirmar que as tabelas a seguir expostas
também refletem os parâmetros do revogado Decreto 9.785, podendo ser aplicadas retroativamente
aos fatos ocorridos a partir de 8 de maio de 2019.

LISTAGEM DE CALIBRES NOMINAIS DE ARMAS E MUNIÇÕES DE USO RESTRITO

Calibre Nominal Energia (Joules) Classificação(2)


41 Remington Magnum 1657,91 Restrito
44 Remington Magnum 1849,35 Restrito
454 Casull 3130,41 Restrito
460 S&W Magnum 3883,88 Restrito
457 Linebaugh 2359,85 Restrito
480 Ruger 1986,47 Restrito
50 Action Express 1917,38 Restrito
500 S&W Magnum 3900,98 Restrito
500 Special 1991,78 Restrito
6mm Remington 3140,32 Restrito
6.5 Creedmoor 3356,24 Restrito
6.5 Grendel 2464,41 Restrito
6.5 x 55 Swedish 3152,18 Restrito
6.8mm Remington SPC 2636,84 Restrito
7mm Mauser (7x57) 3327,22 Restrito
7mm Remington Magnum 4365,04 Restrito
7mm Remington Short Action Ultra Magnum 4324,95 Restrito
7mm Remington Ultra Magnum 4961,65 Restrito
7mm Shooting Times Westerner 5086,92 Restrito
7mm Weatherby Magnum 4248,57 Restrito
7mm Winchester Short Magnum 4623,38 Restrito
7mm-08 Remington 3715,49 Restrito
7 x 64 Brenneke 3667,25 Restrito
7-30 Waters 2633,16 Restrito
7.62 x 39 2044,60 Restrito
8mm Mauser (8x57) 2801,88 Restrito
8mm Remington Magnum 5247,44 Restrito

9
Boletim Criminal Comentado Dezembro-
2019- (semana nº 01)

9.3 x 62 4794,67 Restrito


204 Ruger 1715,78 Restrito
22-250 Remington 2340,59 Restrito
220 Swift 2340,59 Restrito
222 Remington 1717,63 Restrito
222 Remington Magnum 1711,17 Restrito
223 Remington 1959,07 Restrito
223 Winchester Super Short Magnum 2496,62 Restrito
225 Winchester 2074,61 Restrito
243 Winchester 2893,31 Restrito
243 Winchester Super Short Magnum 3020,36 Restrito
25 Winchester Super Short Magnum 3241,22 Restrito
25-06 Remington 3384,37 Restrito
25-35 Winchester 1720,04 Restrito
250 Savage 2372,58 Restrito
257 Roberts 2598,42 Restrito
257 Weatherby Magnum 4017,36 Restrito
26 Nosler 4488,65 Restrito
260 Remington 3129,17 Restrito
264 Winchester Magnum 3830,64 Restrito
27 Nosler 4623,38 Restrito
270 Weatherby Magnum 4681,35 Restrito
270 Winchester 4063,52 Restrito
270 Winchester Short Magnum 4480,03 Restrito
28 Nosler 4938,30 Restrito
280 AckleyImproved 4478,49 Restrito
280 Remington 4020,74 Restrito
284 Winchester 3674,33 Restrito
30 Nosler 5500,87 Restrito
30 Remington AR 2897,37 Restrito
30 Thompson Center 4022,98 Restrito
30-06 Springfield 4514,68 Restrito

10
Boletim Criminal Comentado Dezembro-
2019- (semana nº 01)

30-30 Winchester 2727,99 Restrito

Armas de fogo de uso permitido

Já arma de fogo de uso permitido é definida pelo art. 2º, I, do Decreto 9.847/2019 como: as armas
de fogo semiautomáticas ou de repetição que sejam: a) de porte, cujo calibre nominal, com a
utilização de munição comum, não atinja, na saída do cano de prova, energia cinética superior a mil
e duzentas libras-pé ou mil seiscentos e vinte joules; b) portáteis de alma lisa; ou c) portáteis de alma
raiada, cujo calibre nominal, com a utilização de munição comum, não atinja, na saída do cano de
prova, energia cinética superior a mil e duzentas libras-pé ou mil seiscentos e vinte joules.

De acordo com a tabela contida na Portaria 1.222 do Comando do Exército:

LISTAGEM DE CALIBRES NOMINAIS DE ARMAS E MUNIÇÕES DE USO PERMITIDO

Calibre Nominal Energia (Joules) Classificação(2)


9x19mm PARABELLUM 629,81 Permitido
9x18 Makarov 285,95 Permitido
9x23 Winchester 795,60 Permitido
10mm Automatic 927,55 Permitido
221 RemingtonFireball 955,74 Permitido
25 Automatic 87,78 Permitido
25 North American Arms 151,70 Permitido
30 Luger (7.65mm) 396,41 Permitido
32 Automatic 195,65 Permitido
32 H&R Magnum 320,94 Permitido
32 North American Arms 268,81 Permitido
32 Short Colt 117,99 Permitido
32 Smith &Wesson 129,79 Permitido
32 Smith &WessonLong 177,17 Permitido
327 Federal Magnum 815,61 Permitido
356 TSW 680,34 Permitido
357 Magnum 1322,76 Permitido
357 Sig 685,72 Permitido
38 Automatic 419,17 Permitido

11
Boletim Criminal Comentado Dezembro-
2019- (semana nº 01)

38 Smith &Wesson 202,51 Permitido


38 Special 437,88 Permitido
38 SuperAutomatic +P 569,23 Permitido
380 Automatic 280,26 Permitido
40 Smith &Wesson 666,25 Permitido
400 Cor-Bom 854,35 Permitido
44 S&W Special 632,48 Permitido
45 Automatic 590,48 Permitido
45 Auto Rim 471,20 Permitido
45 Colt 755,15 Permitido
45 Glock AutomaticPistol 661,60 Permitido
45 Winchester Magnum 1318,42 Permitido
6 x 45mm 1505,01 Permitido
17 Hornet 791,07 Permitido
17 Remington 1204,00 Permitido
17 RemingtonFireball 1115,40 Permitido
218 Bee 1028,16 Permitido
22 Hornet 973,61 Permitido
221 RemingtonFireball 1332,02 Permitido
25-20 Winchester 540,51 Permitido
30 Carbine 1278,46 Permitido
32-20 Winchester 433,44 Permitido
38-40 Winchester 716,53 Permitido
38-55 Winchester 1297,16 Permitido
44-40 Winchester 831,14 Permitido
17 Mach 2 206,73 Permitido
17 Hornady Magnum Rimfire 332,46 Permitido
17 Winchester Super Magnum 541,80 Permitido
22 Short 101,82 Permitido
22 Long 128,86 Permitido
22 Long Rifle 247,93 Permitido
22 Winchester Rimfire 228,91 Permitido

12
Boletim Criminal Comentado Dezembro-
2019- (semana nº 01)

22 Winchester Magnum (Rimfire) 440,64 Permitido

Munição de uso proibido

Munições de uso proibido sãos as assim definidas em acordo ou tratado internacional de que a
República Federativa do Brasil seja signatária e as munições incendiárias ou químicas (art. 2º, V,
Decreto 9.847/2019).

Munição de uso restrito

Munições de uso restrito são as munições que: a) atinjam, na saída do cano de prova de armas de
porte ou portáteis de alma raiada, energia cinética superior a mil e duzentas libras-pé ou mil
seiscentos e vinte joules; b) sejam traçantes, perfurantes ou fumígenas; c) sejam granadas de
obuseiro10, de canhão, de morteiro11, de mão ou de bocal; ou sejam rojões, foguetes, mísseis ou
bombas de qualquer natureza (art. 2º, IV, Decreto 9.847/2019).

Vale também aqui a tabela respectiva às armas de uso restrito que vimos acima.

Deve-se atentar para a última alínea, pois nela o Decreto 9.847 trouxe um ponto que pode ensejar
muita discussão. Vejam como o legislador regulamentar definiu como “munição” também as
granadas (de obuseiro, de canhão, de morteiro, de mão ou de bocal), os rojões, foguetes, mísseis e
bombas de qualquer natureza.

Assim, na atual sistemática, as granadas (de obuseiro, de canhão, de morteiro, de mão ou de bocal),
os rojões, foguetes, mísseis e bombas de qualquer natureza devem ser considerados munição (de
uso restrito). Mas, há que se fazer uma última ressalva.

A pergunta que se faz é: tais objetos sempre serão considerados “munição”? Defendemos que não.
Apesar de o atual conceito de “munição” não repetir alguns elementos da definição anterior –
“artefato completo, pronto para utilização e lançamento” –, pensamos que estes são da própria
essência da ideia de munição como objeto atrelado às armas de fogo. Logo, somente será “munição”
o artefato que: for um cartucho e estiver pronto para ser utilizado mediante lançamento por uma
arma de fogo. Ou seja, é aquele que depende de algum instrumento para ser lançado, que somente

10
Obuseiro: armamento pesado, que realiza tanto o tiro de trajetória tensa quanto o de trajetória curva e
dispara granadas de calibres acima de vinte milímetros, com velocidade inicial baixa (Decreto 10.030/2019,
Anexo III, Glossário).

11
Morteiro: armamento bélico pesado de carregamento antecarga (carregamento pela boca), que realiza tiro
de trajetória curva (Decreto 10.030/2019, Anexo III, Glossário).

13
Boletim Criminal Comentado Dezembro-
2019- (semana nº 01)

pode ser, em razão do princípio da taxatividade, uma arma de fogo. Já um artefato que não é lançado
por arma, mas pela força muscular ou é deixado, inerte, em algum lugar para explodir não pode ser
considerado “munição”, mas “artefato explosivo”.

Munição de uso permitido

Não há uma definição direta de munição de uso permitido. Pode-se, porém, concluir que será
permitida a munição que não for considerada restrita ou proibida, bem como aquela que sirva para
ser disparada por arma de uso permitido (vide tabela respectiva acima).

Acessório

O Decreto 3.665/2000 definia acessório como o “engenho primário ou secundário que suplementa
um artigo principal para possibilitar ou melhorar o seu emprego” (art. 3º, I). O novo Decreto
10.030/2019 define acessório de arma de fogo como o “artefato que, acoplado a uma arma,
possibilita a melhoria do desempenho do atirador, a modificação de um efeito secundário do tiro ou
a modificação do aspecto visual da arma” (Anexo III, Glossário).

Embora o art. 16 da Lei 10.826 faça menção a acessório de uso restrito ou proibido, a atual
regulamentação restringiu-se a definir, direta ou indiretamente, os acessórios de uso permitido e
restrito.

O Decreto 10.030/2019 classificou os “produtos controlados pelo Comando do Exército” ou “PCEs”


em de uso proibido, restrito ou permitido. Dentre os produtos de uso restrito, estão os acessórios de
arma de fogo que tenham como objetivo: a) suprimir ou abrandar o estampido; ou b) modificar as
condições de emprego, conforme regulamentação do Comando do Exército (art. 15, § 2º, II).

No primeiro caso, tem-se os popularmente conhecidos “silenciadores”; no segundo, tudo dependerá


da regulamentação a ser trazida pelo Exército, mas pode-se pensar em dispositivos de mira a laser,
lunetas e coisas do tipo.

O acessório que não for classificado como de uso restrito, será considerado de uso permitido. Para
saber se a nova regulamentação trará reflexos penais, será necessário comparar a regulamentação
anterior – vista acima, quando tratamos da evolução dos decretos – com o que vier a ser publicado
a respeito pelo Comando do Exército.

14
Boletim Criminal Comentado Dezembro-
2019- (semana nº 01)

2-Tema: Foro por prerrogativa de função em crimes comuns cometidos por membros do Ministério
Público e da Magistratura

No boletim da última semana de novembro divulgamos uma tabela retratando o foro competente
para o processo e julgamento de autoridades acusadas da prática de crimes funcionais.

Na presente edição focaremos o foro especial para membros do Ministério Público e da Magistratura
acusados da prática de crimes comuns, de acordo com o entendimento adotado pela PGJ/SP.

É certo que, por ocasião do julgamento da questão de ordem suscitada na ação penal n. 937/RJ, no
que toca aos membros do Congresso Nacional, o Plenário do Egrégio Supremo Tribunal Federal fixou
o entendimento de que o foro por prerrogativa de função se restringe aos crimes cometidos durante
o exercício do cargo e desde que mantenham relação com a função desempenhada pelo agente.

O voto condutor, de relatoria do Ministro Luís Roberto Barroso apresenta a seguinte ementa:

“DIREITO CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL PENAL. QUESTÃOD E ORDEM EM AÇÃO PENAL.


LIMITAÇÃO DO FORO POR PRERROGATIVA DE FUNÇÃO AOS CRIMES PRATICADOS NO CARGO E EM
RAZÃO DELE. ESTABELECIMENTO DE MARCO TEMPORAL DE FIXAÇÃO DE COMPETÊNCIA. I. Quanto
ao sentido e alcance do foro por prerrogativa 1. O foro por prerrogativa de função, ou foro
privilegiado, na interpretação até aqui adotada pelo Supremo Tribunal Federal, alcança todos os
crimes de que são acusados os agentes públicos previstos no art. 102, I, b e c da Constituição,
inclusive os praticados antes da investidura no cargo e os que não guardam qualquer relação com o
seu exercício. 2. Impõe-se, todavia, a alteração desta linha de entendimento, para restringir o foro
privilegiado aos crimes praticados no cargo e em razão do cargo. É que a prática atual não realiza
adequadamente princípios constitucionais estruturantes, como igualdade e república, por impedir,
em grande número de casos, a responsabilização de agentes públicos por crimes de naturezas
diversas. Além disso, a falta de efetividade mínima do sistema penal, nesses casos, frustra valores
constitucionais importantes, como a probidade e a moralidade administrativa. 3. Para assegurar que
a prerrogativa de foro sirva ao seu papel constitucional de garantir o livre exercício das funções – e
não ao fim ilegítimo de assegurar a impunidade – é indispensável que haja relação de causalidade
entre o crime imputado e o exercício do cargo. A experiência e as estatísticas revelam a manifesta
disfuncionalidade do sistema, causando indignação à sociedade e trazendo desprestígio para o
Supremo. 4. Orientação aqui preconizada encontra-se em harmonia com diversos precedentes do
STF. De fato, o Tribunal adotou idêntica lógica ao condicionar a imunidade parlamentar material –
i.e., a que os protege por suas opiniões, palavras e votos – à exigência de que a manifestação tivesse
relação com o exercício do mandato. Ademais, em inúmeros casos, o STF realizou interpretação
restritiva de suas competências constitucionais, para adequá-las às suas finalidades. Precedentes. II.

15
Boletim Criminal Comentado Dezembro-
2019- (semana nº 01)

Quanto ao momento da fixação definitiva da competência do STF 5. Partir do final da instrução


processual, com a publicação de despacho de intimação para apresentação de alegações finais, a
competência para processar e julgar ações penais – do STF ou de qualquer outro órgão – não será
mais afetada em razão de o agente público vir a ocupar outro cargo ou deixar o cargo que ocupava,
qualquer que seja o motivo. A jurisprudência desta Corte admite a possibilidade de prorrogação de
competências constitucionais quando necessária para preservar a efetividade e a racionalidade da
prestação jurisdicional. Precedentes. III. Conclusão 6. Resolução da questão de ordem com a fixação
das seguintes teses: ‘(i) O foro por prerrogativa de função aplica-se apenas aos crimes cometidos
durante o exercício do cargo e relacionados às funções desempenhadas; (ii) após o final da instrução
processual com a publicação do despacho de intimação para a apresentação de alegações finais, a
competência para processar e julgar ações penais não será mais afetada em razão de o agente
público vir a ocupar cargo ou deixar o cargo que ocupava, qualquer que seja o motivo (QO na AP 937,
Rel. Min. Roberto Barroso, Tribunal Pleno, j. em 3 de maio de 2018)”.

Atenta leitura do voto condutor nos permite observar que a sua fundamentação se escora em
apontada disfuncionalidade do foro por prerrogativa de função, nos moldes estabelecidos pela
Constituição de 1988, produtora de duas indesejáveis consequências. A primeira relacionada ao
afastamento do Pretório Excelso de seu típico papel de Suprema Corte, transformando-o em tribunal
criminal de primeiro grau e a segunda à ineficácia do sistema de justiça criminal.

Amparado em tais constatações, visando a preservação dos princípios da igualdade e da república,


propõe o eminente Relator uma interpretação restritiva do texto constitucional, de acordo com a
teleologia da prerrogativa de foro especial e com os demais elementos de hermenêutica
constitucional, baseada na “chamada ‘redução teleológica’ ou, de forma mais geral, da aplicação da
técnica da dissociação, que consiste em reduzir o campo de aplicação de uma disposição normativa
a somente uma ou algumas das situações de fato previstas por ela segundo uma interpretação literal,
que se dá para adequá-la à finalidade da norma. Nessa operação, o intérprete identifica uma lacuna
oculta (ou axiológica) e a corrige mediante a inclusão de uma exceção não explícita no enunciado
normativo, mas extraída de sua própria teleologia. Como resultado, a norma passa a se aplicar apenas
a parte dos fatos por ela regulados. A extração de ‘cláusulas de exceção’ implícitas serve, assim, para
concretizar o fim e o sentido da norma e do sistema normativo em geral”.

Nesse diapasão, entendeu o nobre Relator que “se o foro privilegiado pretende ser, de fato, um
instrumento para garantir o livre exercício de certas funções públicas, e não para acobertar a pessoa
ocupante do cargo, não faz sentido estendê-lo aos crimes cometidos antes da investidura nesse cargo
e aos que, cometidos após a investidura, sejam estranhos ao exercício de suas funções”.

É inolvidável, por outro lado, que, tratando-se o foro por prerrogativa de função de espécie de
imunidade formal, outorgada aos membros do Congresso Nacional pelo artigo 53, § 1º, da

16
Boletim Criminal Comentado Dezembro-
2019- (semana nº 01)

Constituição da República, bem como que a simetria estabelecida pelo artigo 27, caput”, da
Constituição da República determina que as imunidades conferidas constitucionalmente àqueles
parlamentares estendem-se aos Deputados Estaduais, a estes também deve ser aplicado o referido
entendimento firmado pelo Pretório Excelso.

Aliás, nestes termos vem decidindo o Egrégio Tribunal Regional Federal da 4ª Região, conforme se
constata pela ementa abaixo transcrita.

“PENAL. PROCESSO PENAL. FORO POR PRERROGATIVA DE FUNÇÃO. NOVO POSICIONAMENTO DO


STF. LIMITAÇÃO AOS CRIMES COMETIDOS DURANTE O EXERCÍCIO DO CARGO E RELACIONADOS ÀS
FUNÇÕES DESEMPENHADAS. CRIME COMETIDO POR DEPUTADO ESTADUAL EM MANDATO
ANTERIOR COMO PREFEITO MUNICIPAL. DECLINAÇÃO DA COMPETÊNCIA. 1. Conforme
entendimento recente do Plenário do Supremo Tribunal Federal, o foro por prerrogativa de função
aplica-se apenas aos crimes cometidos durante o exercício do cargo e relacionados às funções
desempenhadas pelo mandatário (Questão de Ordem na Ação Penal nº 937). 2. Embora o acusado
esteja exercendo o mandato de deputado estadual, trata-se de mandato distinto, não relacionado
com os fatos, o que afasta a competência por prerrogativa de função, por simetria ao quanto decidido
pela Suprema Corte. 3. Declinada a competência para o juízo de primeira instância. (TRF4,
INQUÉRITO POLICIAL nº 5062739-76.2017.404.0000, 4ª Seção, Des. Federal LUIZ CARLOS CANALLI,
por unanimidade, juntado aos autos em 2-7-2018)”.

Registre-se que é nítida a integral compatibilidade dos fatos analisados nos mencionados julgados
com aqueles que constituem objeto de apuração no presente procedimento persecutório.

Conforme já mencionado, os fatos delituosos em apuração, que, em tese, envolvem o investigado


Fulano de tal, foram cometidos antes de sua diplomação como Deputado Estadual, o que, portanto,
seguido o entendimento jurisprudencial acima apontado, afasta a incidência da prerrogativa de foro
perante esta Colenda Corte e determina a declinação de competência nos termos acima alinhavados.

É importante que se diga, até porque a competência originária criminal deste Colendo Órgão Especial
abarca o processo e julgamento de infrações penais praticadas por autoridades detentoras de foro
especial diversas dos parlamentares estaduais, que o entendimento pretoriano acima esposado não
se estende a todas elas, como, por exemplo, aos magistrados e membros do Ministério Público.

É indiscutível que, nas hipóteses de infração penal cometidas por magistrados e membros do
Parquet, a teleologia da norma que institui o foro especial para aludidas autoridades transcende à
necessidade de que aquele que goza da prerrogativa tenha condições de exercer com liberdade e
independência as funções inerentes ao cargo público que ocupa. Nesses casos, imprescindível se
mostra que também o acusador e o julgador da autoridade detentora do foro especial reúnam

17
Boletim Criminal Comentado Dezembro-
2019- (semana nº 01)

condições para o desempenho imparcial da atividade acusatória e judicante, o que, em verdade,


constitui condição para a realização de justiça criminal efetiva.

É inegável que o processo e julgamento de magistrados e membros do Ministério Público em


primeiro grau de jurisdição geram questões não examinadas pelo precedente estabelecido pelo
Egrégio Supremo Tribunal Federal no julgamento da QO na AP 937.

Evidentemente, não seria adequado para o alcance do interesse público, consubstanciado na


realização da efetiva justiça criminal, admitir que juiz de primeiro grau pudesse julgar o presidente
do Tribunal a que se encontra vinculado, autoridade esta que detém atribuição para deliberar sobre
sua promoção ou sobre a imposição de sanção em caso de eventual cometimento de infração
disciplinar. É inquestionável, que, nessas hipóteses, a imparcialidade do órgão jurisdicional estaria
comprometida.

O mesmo se diga da situação do promotor de Justiça que se deparasse com a hipótese de oferecer
denúncia em face do Procurador-Geral de Justiça do Ministério Público a que pertence.

Anote-se que o comprometimento da imparcialidade do órgão julgador ou acusador não se revela


apenas nessas hipóteses extremas em que eles se deparam com a situação de valorar conduta
criminosa atribuída ao chefe da instituição a que pertencem.

A imparcialidade indispensável para a realização da efetiva justiça criminal ainda estaria


comprometida nas hipóteses em que, por dever de ofício, magistrado e membro do Ministério
Público tivessem que desempenhar suas funções em processo criminal em que figurasse como réu
um colega de comarca ou de promotoria.

Dentre tantos outros, tratam-se de exemplos que revelam questões tormentosas que não foram
analisadas na QO na AP 937.

Atento a tais circunstâncias peculiares, em minucioso voto-vista lançado na QO suscitada na AP n.


857, levado à sessão de julgamento de 20/06/2018, o culto Ministro Felix Fischer, faz expressa
ressalva a respeito da prerrogativa de foro de “membros de carreiras ligadas à atividade judicante”,
nos seguintes termos:

“Cumpre ressalvar, no entanto, que o entendimento ora estabelecido se restringe ao caso concreto,
incapaz de espraiar efeitos automáticos para outras hipóteses, tais como membros de carreiras
ligadas à atividade judicante (v.g. Ministério Público, Magistratura), em que o foro por prerrogativa
não visa unicamente resguardar a função daquele que, porventura, venha a ser julgado, mas também
a autonomia e independência da própria unidade sentenciante, evitando-se nefastas interferências
de autoridade mais graduada sobre os mais novos. Isto tudo sem contar outros aspectos negativos.
Tal raciocínio, inclusive, pode ser transportado, com a devida ponderação, da Lei n. 8.112/90, que

18
Boletim Criminal Comentado Dezembro-
2019- (semana nº 01)

disciplina que a competência para julgar o processo administrativo disciplinar, e impor penalidade,
resulta da ascendência hierárquica da autoridade julgadora sobre o acusado, fundada no princípio
da hierarquia, como meio de proteger o processante de represálias advindas de sua atividade
disciplinar”.

No mesmo sentido, conduziu-se o Colendo Superior Tribunal de Justiça em questão de ordem


suscitada na ação penal n. 878, proposta em face de Desembargador do Tribunal de Justiça do Estado
do Paraná, onde se imputou a aludida autoridade a prática de crime de lesão corporal, que não
mantinha qualquer relação com o cargo ocupado pelo réu. Segue a ementa do julgado.

“PROCESSO PENAL E CONSTITUCIONAL. QUESTÃO DE ORDEM NA AÇÃO PENAL. COMPETÊNCIA


CRIMINAL ORIGINÁRIA DO STJ. ART. 105, I, “A”, DA CONSTITUIÇÃO. QO. NA AP 937/STF. QO NA
APN857/STJ. AGRG NA APN866/STJ. DESEMBARGADOR. CRIME SEM RELAÇÃO COM O CARGO.
VINCULAÇÃO FUNCIONAL. PRERROGATIVA DE FORO. FINALIDADE DA NORMA. EXERCÍCIO
INDEPENDENTE DAS FUNÇÕES PELA AUTORIDADE DETENTORA DE FORO. IMPARCIALIDADE DO
ÓRGÃO JULGADOR. CREDIBILIDADE DO SISTEMA DE JUSTIÇA CRIMINAL. COMPETÊNCIA DO STJ.

Hipótese em que Desembargador do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná reponde pela prática,
em tese, de delito de lesão corporal ocorrido em Curitiba-PR.

O crime que é imputado ao réu não tem relação com o exercício do cargo de Desembargador, de
modo que, a princípio, aplicando-se o precedente produzido pelo Supremo Tribunal Federal no
julgamento da QO na AP 937, não teria o réu foro no Superior Tribunal de Justiça.

A interpretação do alcance das hipóteses de prerrogativa de foro previstas na Constituição da


República, não obstante, responde não apenas à necessidade de que aquele que goza da prerrogativa
tenha condições de exercer com liberdade e independência as funções inerentes ao cargo público
que lhe confere a prerrogativa.

Para além disso, nos casos em que são membros da magistratura nacional tanto o acusado quanto o
julgador, a prerrogativa de foro não se justifica apenas para que o acusado pudesse exercer suas
atividades funcionais de forma livre e independente, pois é preciso também que o julgador possa
reunir as condições necessárias ao desempenho de suas atividades judicantes de forma imparcial.

A necessidade de que o julgador passa reunir as condições para o desempenho de suas atividades
judicantes de forma imparcial não se revela como um privilégio do julgador ou do acusado, mas como
uma condição para que se realize justiça criminal de forma isonômica e republicana.

Questão de ordem resolvida no sentido de se reconhecer a competência do Superior Tribunal de


Justiça nas hipóteses em que, não fosse a prerrogativa de foro (art. 105, I, da Constituição), o
Desembargador acusado houvesse de responder à ação penal perante juiz de primeiro grau vinculado

19
Boletim Criminal Comentado Dezembro-
2019- (semana nº 01)

ao mesmo tribunal” (QO na AP n. 878-DF – 2016/01154695-0 f, Rel. Min. Benedito Gonçalves,


21.11.2018).

Daí a segura conclusão de que as razões subjacentes à norma constitucional que confere o foro por
prerrogativa de função à magistrados e membros do Ministério Público vão além daquelas
considerada pelo Egrégio Supremo Tribunal Federal na QO na AP 937, motivo pelo qual, em relação
as mencionadas autoridades, não cabe a interpretação restritiva, fundada em redução teleológica,
imposta pelo Pretório Excelso naquele julgado.

3-Tema: STF fixa tese de repercussão geral para autorizar compartilhamento de dados bancários e
fiscais sem autorização judicial

Em decisão monocrática proferida no dia 16 de julho de 2019, o ministro Dias Toffoli impôs a
suspensão de investigações criminais e processos judiciais nos quais houvesse determinados dados
fiscais e bancários compartilhados sem autorização judicial entre órgãos de fiscalização tributária e
de investigação criminal.

A decisão foi proferida no Recurso Extraordinário 1.055.941, interposto pelo Ministério Público
Federal contra acórdão proferido pelo Tribunal Regional Federal da 3ª Região, que havia anulado
ação penal na qual dados bancários obtidos pela Receita Federal haviam sido compartilhados com o
Ministério Público para fins penais. Segundo o acórdão recorrido, compartilhamentos de
informações bancárias para instruir investigações criminais só podem ser promovidos mediante
autorização judicial, que não havia sido emitida naquele caso.

O Ministério Público Federal argumentou que a quebra de sigilo bancário sem autorização judicial já
foi considerada válida pelo STF, que, no recurso extraordinário 601.314, julgou constitucional a Lei
Complementar 105/01, especialmente o disposto em seu art. 6º:

“As autoridades e os agentes fiscais tributários da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos
Municípios somente poderão examinar documentos, livros e registros de instituições financeiras,
inclusive os referentes a contas de depósitos e aplicações financeiras, quando houver processo
administrativo instaurado ou procedimento fiscal em curso e tais exames sejam considerados
indispensáveis pela autoridade administrativa competente.”

Argumentava-se também que, ao julgar conjuntamente as Ações Diretas de Inconstitucionalidade


2.390, 2.386, 2.397 e 2.859, o STF confirmou a constitucionalidade do compartilhamento de dados
bancários.

20
Boletim Criminal Comentado Dezembro-
2019- (semana nº 01)

O Recurso Extraordinário 1.055.941 já havia tido a repercussão geral reconhecida pelo STF em
12/04/2018 e seu julgamento estava previsto para o mês de novembro passado. À época, o ministro
Dias Toffoli afirmou que embora o STF tivesse proferido decisões admitindo o compartilhamento de
dados para fins penais, os julgamentos fundamentais sobre o art. 6º da Lei Complementar 105/01
apenas tangenciaram a questão da possibilidade de que informações obtidas pelo Fisco fossem
compartilhadas com órgãos de investigação criminal. Por isso se justificava o reconhecimento da
repercussão geral, para que o tribunal pudesse decidir sobre o tema de forma específica e com
efeitos abrangentes.

Em 16 de julho, o ministro determinou: 1) “a suspensão do processamento de todos os processos


judiciais em andamento, que tramitem no território nacional e versem sobre o Tema 990 da Gestão
por Temas da Repercussão Geral”; 2) “com base no poder geral de cautela, a suspensão do
processamento de todos os inquéritos e procedimentos de investigação criminal (PIC’s), atinentes
aos Ministérios Públicos Federal e estaduais, em trâmite no território nacional, que foram
instaurados à míngua de supervisão do Poder Judiciário e de sua prévia autorização sobre os dados
compartilhados pelos órgãos de fiscalização e controle (Fisco, COAF e BACEN), que vão além da
identificação dos titulares das operações bancárias e dos montantes globais, consoante decidido pela
Corte (v.g. ADI’s nsº 2.386, 2.390, 2.397 e 2.859, Plenário, todas de minha relatoria, julg. 24/2/16,
DJe 21/10/16)”.

A decisão se fundamentou no fato de que no julgamento daquelas ações constitucionais o STF foi
expresso ao admitir, para a finalidade de fiscalização e controle tributário, apenas e tão somente o
compartilhamento de dados relativos à identificação dos titulares das operações e aos montantes
globais movimentados, ou seja, não se contemplou a troca de informações com detalhes acerca da
origem e da natureza das movimentações. E, naquele momento, havia dúvidas a respeito do nível de
detalhamento do que estava sendo compartilhado entre os órgãos de fiscalização tributária e o
Ministério Público e as polícias.

A medida provocou intensa reação devido à extensão de seus efeitos, que, na prática, paralisaram
investigações sobre infrações penais relativas a organizações criminosas, tráfico de drogas, tráfico de
armas, corrupção, lavagem de dinheiro, etc.

Nas sessões ocorridas nos dias 20, 21, 27 e 28 de novembro, o mérito do recurso foi julgado, e o
tribunal admitiu o compartilhamento de informações entre os órgãos fiscais e os órgãos de
investigação e persecução criminal, tal como já ocorria antes que se suspendessem as apurações
criminais em curso.

Na sessão do dia 4/12, o Tribunal aprovou a seguinte tese de repercussão geral no RE 1.055.941:

21
Boletim Criminal Comentado Dezembro-
2019- (semana nº 01)

1 – É constitucional o compartilhamento dos relatórios de inteligência financeira da UIF e da íntegra


do procedimento fiscalizatório da Receita Federal do Brasil, que define o lançamento do tributo, com
os órgãos de persecução penal, para fins criminais, sem a obrigatoriedade de prévia autorização
judicial, devendo ser resguardado o sigilo das informações em procedimentos formalmente
instaurados e sujeitos a posterior controle jurisdicional.

2 – O compartilhamento pela UIF e pela Receita Federal do Brasil, referente ao item anterior, deve
ser feito unicamente por meio de comunicações formais, com garantia de sigilo, certificação do
destinatário e estabelecimento de instrumentos efetivos de apuração e correção de eventuais
desvios.

22

S-ar putea să vă placă și