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Assessores
Fernanda Narezi Pimentel Rosa
Ricardo José Gasques de Almeida Silvares
Rogério Sanches Cunha
Analista Jurídica
Ana Karenina Saura Rodrigues
Boletim Criminal Comentado Dezembro-
2019- (semana nº 01)
SUMÁRIO
SUMÁRIO --------------------------------------------------------------------------------------------------------------------- 2
ESTUDOS DO CAOCRIM -------------------------------------------------------------------------------------------------- 3
1-Tema: Estatuto do Desarmamento - A evolução dos decretos regulamentadores e o conflito de leis
penais no tempo....................................................................................................................................3
2-Tema: Foro por prerrogativa de função em crimes comuns cometidos por membros do Ministério
Público e da Magistratura....................................................................................................................15
3-Tema: STF fixa tese de repercussão geral para autorizar compartilhamento de dados bancários e
fiscais sem autorização judicial............................................................................................................20
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2019- (semana nº 01)
ESTUDOS DO CAOCRIM
No ano de 2019, o Poder Executivo da União editou diversos decretos, com o objetivo de alterar a
regulamentação da Lei 10.826/2003 (Estatuto do Desarmamento).
O primeiro deles foi o Decreto 9.685, publicado em 15 de janeiro, que, dentre outras coisas,
aumentou o prazo para renovação dos certificados de registro de armas de fogo para 10 anos e
prorrogou-os automaticamente por tal período.
O reflexo foi imediato: tais alterações atingiram a própria tipicidade dos crimes dos arts. 12, 14, 16 e
19 do Estatuto do Desarmamento, que são normas penais em branco, cujos complementos se
encontram justamente nas normas regulamentadoras infralegais. Assim, por exemplo, se alguém
estivesse sendo processado pelo crime do art. 16, caput, por portar arma de fogo de uso restrito, que
foi reclassificada como de uso permitido, o acusado seria beneficiado pela alteração havida na
regulamentação, ocorrendo uma automática mudança na própria classificação da infração penal,
sendo aplicável o art. 12 ou 14 do Estatuto, a depender das circunstâncias do caso.
O decreto 9.785/2019 foi logo modificado pelo Decreto 9.797/2019, publicado em 22 de maio. Não
houve alteração para fins de classificação das armas, mas, basicamente, um aperfeiçoamento da
redação.
A respeito das publicações desses decretos, este CAOCrim publicou então alguns comentários,
respectivamente, nos Boletins das semanas 2 dos meses de maio e junho, que podem ser acessados
em nossa página na internet. Agora, trazemos no presente texto um resumo do que já comentados
e as atualizações havidas desde então.
Em 25 de junho de 2019, foram publicados nada menos que quatro decretos: 9.844, 9.845, 9.846,
9.847. O primeiro nasceu revogado pelo último; os demais entraram efetivamente em vigor, ficando
revogado o Decreto 9.785. Não houve alteração da sistemática de classificação das armas e
munições, de modo que o quadro iniciado em maio permaneceu o mesmo.
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Paralelamente, vigorava o Decreto 3.665/2000, conhecido como R-105, e que trazia o Regulamento
de Produtos Controlados. Era importante, pois também tratava de armas, acessórios e munições,
com definições relevantes para o entendimento do Estatuto do Desarmamento.
Ainda em 2018, houve a edição do Decreto 9.493, que traria o novo Regulamento de Produtos
Controlados. Foi fixado período de vacatio que deveria terminar em julho de 2019, mas que acabou
sendo estendido, até que, em 13 de outubro de 2019, foi editado o Decreto 10.030/2019, que
revogou tanto o Decreto 3.665/2000 quanto o Decreto 9.493 e efetivamente instituiu novo o
Regulamento de Produtos Controlados.
9.845/2019
9.846/2019
9.847/2019
10.030/2019
Decreto 5.123/2004
Modificado pelo:
Decreto 9.685/2019 (15/01/2019)
Modificado pelo:
Decreto 9.797/2019 (22/05/2019)
Decreto 9.847/2019
(em vigor)
+
Decreto 9.846/2019
(em vigor)
+
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Decreto 9.845/2019
(em vigor)
(25/06/2019)
Evolução dos Regulamentos de Produtos Controlados
Decreto 9.493/2018
(revogado em vacatio legis)
Decreto 10.030/2019
(em vigor)
(13/10/2019)
Segundo o Decreto 9.785, passou a ser considerada arma de fogo de uso permitido a
semiautomáticas ou de repetição:
a) de porte que, com a utilização de munição comum, não atinja, na saída do cano de prova, energia
cinética superior a mil e duzentas libras-pé ou mil seiscentos e vinte joules;
c) portátil de alma raiada, cujo calibre nominal, com a utilização de munição comum, não atinja, na
saída do cano de prova, energia cinética superior a mil e duzentas libras-pé ou mil seiscentos e vinte
joules.
De plano, notam-se duas coisas: o Decreto 9.785/2019 ingressou em definições que, até então, eram
deixadas inteiramente a cargo do Regulamento de Produtos Controlados; e que se abandonou a
técnica de citação expressa dos calibres nominais, mantendo-se apenas o critério da energia cinética
da munição na saída do cano.
Segundo o Decreto 9.785, passou a ser considerada de uso proibido, a arma de fogo: classificada
como de uso proibido em tratados internacionais dos quais a República Federativa do Brasil seja
signatária; e dissimulada, com aparência de objeto inofensivo.
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Passou a ser classificada como de uso restrito a arma de fogo automática, semiautomática ou de
repetição:
a) não portátil;
b) de porte, cujo calibre nominal, com a utilização de munição comum, atinja, na saída do cano,
energia cinética superior a mil e duzentas libras-pé ou mil seiscentos e vinte joules; ou
c) portátil de alma raiada, cujo calibre nominal, com a utilização de munição comum, atinja, na saída
do cano de prova, energia cinética superior a mil e duzentas libras-pé ou mil seiscentos e vinte joules.
O evidente aumento dos limites de energia cinética mostra que houve intenção de deixar na
categoria de armas de uso restrito, na prática, apenas as armas longas, como fuzis, deixando os
revólveres e pistolas, salvo raras exceções (sendo exemplo a pistola .50), na categoria do uso
permitido.
Como já observado e para ficarmos nos exemplos mais comuns, todos aqueles acusados pela prática
do crime do art. 16, caput, da Lei 10.826/2003 – ou seja, que praticaram a conduta de possuir, deter,
portar, adquirir, fornecer, receber, ter em depósito, transportar, ceder, ainda que gratuitamente,
emprestar, remeter, empregar, manter sob sua guarda ou ocultar arma de fogo, acessório ou
munição de uso proibido ou restrito, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou
regulamentar – e cujo objeto do crime, a arma de fogo, tiver sido rebaixado da categoria de uso
restrito para de uso permitido, foram imediatamente beneficiados pelo Decreto 9.785/2019.
Isso significa que os acusados pela prática do crime do art. 16, em casos de aplicação do citado
rebaixamento, não mais estarão sujeitos às penas de 3 a 6 anos de reclusão, mas àquelas previstas
nos arts. 12 e 14 do Estatuto do Desarmamento, conforme as circunstâncias do caso. Assim, se a
arma tiver sido encontrada no interior da residência, passará a ser aplicado, retroativamente, o art.
12, com pena de 1 a 3 anos de detenção, e multa. Se o agente a portava fora de casa, incidirá o art.
14, com pena de 2 a 4 anos de reclusão, e multa.
Além disso, vale lembrar que o delito do art. 16 é considerado equiparado a hediondo pela Lei
8.072/1990, enquanto os demais não, o que trará reflexos na execução penal, notadamente para fins
do cálculo de cumprimento de pena para progressão de regime e livramento condicional.
Nesses pontos, o Decreto 9.785/2019 representou inegável novatio legis in mellius e, como tal,
retroagiu, atingindo até mesmo os processos com trânsito em julgado.
Quanto às munições, o Decreto 9.785 apresentava deficiências evidentes. Dizia seu art. 2º, IV:
“munição de uso restrito - munições de uso exclusivo das armas portáteis raiadas, e das perfurantes,
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das traçantes, das explosivas e das incendiárias”. Então, com a redação dada pelo Decreto 9.797,
foram classificadas como munições de uso restrito aquelas que:
a) atinjam, na saída do cano de prova de armas de porte ou portáteis de alma raiada, energia cinética
superior a mil e duzentas libras-pé ou mil seiscentos e vinte joules;
Houve a inclusão da definição de munições de uso proibido: “as munições incendiárias, as químicas
ou as que sejam assim definidas em acordo ou tratado internacional de que a República Federativa
do Brasil seja signatária”.
Quanto aos acessórios, nada mudou em relação à regulamentação que havia na época, eis que o
Decreto 9.785 nada dispôs a respeito, ficando mantidas as definições então existentes, ainda do
Decreto 3.665/2000, até ser revogado e substituído pelo Decreto 10.030/2019.
O regime atual: Decretos 9.845, 9.846, 9.847 e 10.030/2019 e Portaria MD/CE 1.222/2019
Vejamos como ficaram os objetos materiais da maioria dos crimes do Estatuto do Desarmamento
com essa nova regulamentação.
Os conceitos são encontrados no Regulamento do Estatuto, hoje dividido em três Decretos - 9.845,
9.846. 9.847/2019 -, bem como no Regulamento de Produtos Controlados, do Decreto 10.030/2019.
Útil, também, para o estudo do tema é a Portaria do Ministério da Defesa/Comando do Exército
1.222/2019.
São armas de fogo de uso proibido: a) as armas de fogo classificadas de uso proibido em acordos e
tratados internacionais dos quais a República Federativa do Brasil seja signatária; e as armas de fogo
dissimuladas, com aparência de objetos inofensivos (art. 2º, III, Decreto 9.847/2019).
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Armas de fogo de uso restrito, segundo o art. 2º, II, do Decreto 9.847/2019, que manteve os mesmos
parâmetros do revogado Decreto 9.785, são as armas de fogo automáticas1 e as semiautomáticas2
ou de repetição3 que sejam: a) não portáteis;4 b) de porte5, cujo calibre nominal,6 com a utilização
de munição comum, atinja, na saída do cano de prova7, energia cinética8 superior a mil e duzentas
libras-pé ou mil seiscentos e vinte joules; ou c) portáteis9 de alma raiada, cujo calibre nominal, com
a utilização de munição comum, atinja, na saída do cano de prova, energia cinética superior a mil e
duzentas libras-pé ou mil seiscentos e vinte joules.
Mas, afinal, levando-se em considerações os calibres nominais, quais são as armas de uso restrito?
Para dar uma resposta a estar importante indagação, o Ministério da Defesa, por meio do Comando
do Exército editou a Portaria 1.222, de 12 de agosto de 2019, contendo anexos com tabelas de
calibres nominais e a respectiva classificação, levando-se em consideração os parâmetros dos
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Arma de fogo automática: arma em que o carregamento, o disparo e todas as operações de funcionamento
ocorrem continuamente enquanto o gatilho estiver sendo acionado (Decreto 10.030/2019, Anexo III –
Glossário).
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Arma de fogo semiautomática: arma que realiza, automaticamente, todas as operações de funcionamento
com exceção do disparo, exigindo, para isso, novo acionamento do gatilho (Decreto 10.030/2019, Anexo III –
Glossário).
3
Arma de fogo de repetição: arma em que a recarga exige a ação mecânica do atirador sobre um componente
para a continuidade do tiro (Decreto 10.030/2019, Anexo III – Glossário).
4
Arma de fogo não portátil: as armas de fogo que, devido às suas dimensões ou ao seu peso, precisam ser
transportadas por mais de uma pessoa, com a utilização de veículos, automotores ou não, ou sejam fixadas em
estruturas permanentes (art. 2º, IX, Decreto 9.847/2019).
5
Arma de fogo de porte: as armas de fogo de dimensões e peso reduzidos que podem ser disparadas pelo
atirador com apenas uma de suas mãos, a exemplo de pistolas, revólveres e garruchas (art. 2º, VII, Decreto
9.847/2019).
6
Calibre nominal: é a designação que define ou caracteriza um tipo de munição ou de arma de fogo produzida
pelo fabricante. Normalmente está relacionado às dimensões da munição, expressa em milímetros ou em
frações de polegada (art. 2º, I, Portaria MD/CE 1.222/2019).
7
Cano de prova ou provete: é um cano de dimensões especiais usados para teste com munições (art. 2º, II,
Portaria MD/CE 1.222/2019).
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Energia cinética: é a energia associada ao estado de movimento de um objeto (art. 2º, III, Portaria MD/CE
1.222/2019).
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Arma de fogo portátil: as armas de fogo que, devido às suas dimensões ou ao seu peso, podem ser
transportada por uma pessoa, tais como fuzil, carabina e espingarda (art. 2º, VIII, Decreto 9.847/2019).
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Decretos 9.847, 9.846 e 9.845. Pode-se perfeitamente afirmar que as tabelas a seguir expostas
também refletem os parâmetros do revogado Decreto 9.785, podendo ser aplicadas retroativamente
aos fatos ocorridos a partir de 8 de maio de 2019.
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Já arma de fogo de uso permitido é definida pelo art. 2º, I, do Decreto 9.847/2019 como: as armas
de fogo semiautomáticas ou de repetição que sejam: a) de porte, cujo calibre nominal, com a
utilização de munição comum, não atinja, na saída do cano de prova, energia cinética superior a mil
e duzentas libras-pé ou mil seiscentos e vinte joules; b) portáteis de alma lisa; ou c) portáteis de alma
raiada, cujo calibre nominal, com a utilização de munição comum, não atinja, na saída do cano de
prova, energia cinética superior a mil e duzentas libras-pé ou mil seiscentos e vinte joules.
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Munições de uso proibido sãos as assim definidas em acordo ou tratado internacional de que a
República Federativa do Brasil seja signatária e as munições incendiárias ou químicas (art. 2º, V,
Decreto 9.847/2019).
Munições de uso restrito são as munições que: a) atinjam, na saída do cano de prova de armas de
porte ou portáteis de alma raiada, energia cinética superior a mil e duzentas libras-pé ou mil
seiscentos e vinte joules; b) sejam traçantes, perfurantes ou fumígenas; c) sejam granadas de
obuseiro10, de canhão, de morteiro11, de mão ou de bocal; ou sejam rojões, foguetes, mísseis ou
bombas de qualquer natureza (art. 2º, IV, Decreto 9.847/2019).
Vale também aqui a tabela respectiva às armas de uso restrito que vimos acima.
Deve-se atentar para a última alínea, pois nela o Decreto 9.847 trouxe um ponto que pode ensejar
muita discussão. Vejam como o legislador regulamentar definiu como “munição” também as
granadas (de obuseiro, de canhão, de morteiro, de mão ou de bocal), os rojões, foguetes, mísseis e
bombas de qualquer natureza.
Assim, na atual sistemática, as granadas (de obuseiro, de canhão, de morteiro, de mão ou de bocal),
os rojões, foguetes, mísseis e bombas de qualquer natureza devem ser considerados munição (de
uso restrito). Mas, há que se fazer uma última ressalva.
A pergunta que se faz é: tais objetos sempre serão considerados “munição”? Defendemos que não.
Apesar de o atual conceito de “munição” não repetir alguns elementos da definição anterior –
“artefato completo, pronto para utilização e lançamento” –, pensamos que estes são da própria
essência da ideia de munição como objeto atrelado às armas de fogo. Logo, somente será “munição”
o artefato que: for um cartucho e estiver pronto para ser utilizado mediante lançamento por uma
arma de fogo. Ou seja, é aquele que depende de algum instrumento para ser lançado, que somente
10
Obuseiro: armamento pesado, que realiza tanto o tiro de trajetória tensa quanto o de trajetória curva e
dispara granadas de calibres acima de vinte milímetros, com velocidade inicial baixa (Decreto 10.030/2019,
Anexo III, Glossário).
11
Morteiro: armamento bélico pesado de carregamento antecarga (carregamento pela boca), que realiza tiro
de trajetória curva (Decreto 10.030/2019, Anexo III, Glossário).
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pode ser, em razão do princípio da taxatividade, uma arma de fogo. Já um artefato que não é lançado
por arma, mas pela força muscular ou é deixado, inerte, em algum lugar para explodir não pode ser
considerado “munição”, mas “artefato explosivo”.
Não há uma definição direta de munição de uso permitido. Pode-se, porém, concluir que será
permitida a munição que não for considerada restrita ou proibida, bem como aquela que sirva para
ser disparada por arma de uso permitido (vide tabela respectiva acima).
Acessório
O Decreto 3.665/2000 definia acessório como o “engenho primário ou secundário que suplementa
um artigo principal para possibilitar ou melhorar o seu emprego” (art. 3º, I). O novo Decreto
10.030/2019 define acessório de arma de fogo como o “artefato que, acoplado a uma arma,
possibilita a melhoria do desempenho do atirador, a modificação de um efeito secundário do tiro ou
a modificação do aspecto visual da arma” (Anexo III, Glossário).
Embora o art. 16 da Lei 10.826 faça menção a acessório de uso restrito ou proibido, a atual
regulamentação restringiu-se a definir, direta ou indiretamente, os acessórios de uso permitido e
restrito.
O acessório que não for classificado como de uso restrito, será considerado de uso permitido. Para
saber se a nova regulamentação trará reflexos penais, será necessário comparar a regulamentação
anterior – vista acima, quando tratamos da evolução dos decretos – com o que vier a ser publicado
a respeito pelo Comando do Exército.
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2-Tema: Foro por prerrogativa de função em crimes comuns cometidos por membros do Ministério
Público e da Magistratura
No boletim da última semana de novembro divulgamos uma tabela retratando o foro competente
para o processo e julgamento de autoridades acusadas da prática de crimes funcionais.
Na presente edição focaremos o foro especial para membros do Ministério Público e da Magistratura
acusados da prática de crimes comuns, de acordo com o entendimento adotado pela PGJ/SP.
É certo que, por ocasião do julgamento da questão de ordem suscitada na ação penal n. 937/RJ, no
que toca aos membros do Congresso Nacional, o Plenário do Egrégio Supremo Tribunal Federal fixou
o entendimento de que o foro por prerrogativa de função se restringe aos crimes cometidos durante
o exercício do cargo e desde que mantenham relação com a função desempenhada pelo agente.
O voto condutor, de relatoria do Ministro Luís Roberto Barroso apresenta a seguinte ementa:
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Atenta leitura do voto condutor nos permite observar que a sua fundamentação se escora em
apontada disfuncionalidade do foro por prerrogativa de função, nos moldes estabelecidos pela
Constituição de 1988, produtora de duas indesejáveis consequências. A primeira relacionada ao
afastamento do Pretório Excelso de seu típico papel de Suprema Corte, transformando-o em tribunal
criminal de primeiro grau e a segunda à ineficácia do sistema de justiça criminal.
Nesse diapasão, entendeu o nobre Relator que “se o foro privilegiado pretende ser, de fato, um
instrumento para garantir o livre exercício de certas funções públicas, e não para acobertar a pessoa
ocupante do cargo, não faz sentido estendê-lo aos crimes cometidos antes da investidura nesse cargo
e aos que, cometidos após a investidura, sejam estranhos ao exercício de suas funções”.
É inolvidável, por outro lado, que, tratando-se o foro por prerrogativa de função de espécie de
imunidade formal, outorgada aos membros do Congresso Nacional pelo artigo 53, § 1º, da
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Constituição da República, bem como que a simetria estabelecida pelo artigo 27, caput”, da
Constituição da República determina que as imunidades conferidas constitucionalmente àqueles
parlamentares estendem-se aos Deputados Estaduais, a estes também deve ser aplicado o referido
entendimento firmado pelo Pretório Excelso.
Aliás, nestes termos vem decidindo o Egrégio Tribunal Regional Federal da 4ª Região, conforme se
constata pela ementa abaixo transcrita.
Registre-se que é nítida a integral compatibilidade dos fatos analisados nos mencionados julgados
com aqueles que constituem objeto de apuração no presente procedimento persecutório.
É importante que se diga, até porque a competência originária criminal deste Colendo Órgão Especial
abarca o processo e julgamento de infrações penais praticadas por autoridades detentoras de foro
especial diversas dos parlamentares estaduais, que o entendimento pretoriano acima esposado não
se estende a todas elas, como, por exemplo, aos magistrados e membros do Ministério Público.
É indiscutível que, nas hipóteses de infração penal cometidas por magistrados e membros do
Parquet, a teleologia da norma que institui o foro especial para aludidas autoridades transcende à
necessidade de que aquele que goza da prerrogativa tenha condições de exercer com liberdade e
independência as funções inerentes ao cargo público que ocupa. Nesses casos, imprescindível se
mostra que também o acusador e o julgador da autoridade detentora do foro especial reúnam
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O mesmo se diga da situação do promotor de Justiça que se deparasse com a hipótese de oferecer
denúncia em face do Procurador-Geral de Justiça do Ministério Público a que pertence.
Dentre tantos outros, tratam-se de exemplos que revelam questões tormentosas que não foram
analisadas na QO na AP 937.
“Cumpre ressalvar, no entanto, que o entendimento ora estabelecido se restringe ao caso concreto,
incapaz de espraiar efeitos automáticos para outras hipóteses, tais como membros de carreiras
ligadas à atividade judicante (v.g. Ministério Público, Magistratura), em que o foro por prerrogativa
não visa unicamente resguardar a função daquele que, porventura, venha a ser julgado, mas também
a autonomia e independência da própria unidade sentenciante, evitando-se nefastas interferências
de autoridade mais graduada sobre os mais novos. Isto tudo sem contar outros aspectos negativos.
Tal raciocínio, inclusive, pode ser transportado, com a devida ponderação, da Lei n. 8.112/90, que
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disciplina que a competência para julgar o processo administrativo disciplinar, e impor penalidade,
resulta da ascendência hierárquica da autoridade julgadora sobre o acusado, fundada no princípio
da hierarquia, como meio de proteger o processante de represálias advindas de sua atividade
disciplinar”.
Hipótese em que Desembargador do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná reponde pela prática,
em tese, de delito de lesão corporal ocorrido em Curitiba-PR.
O crime que é imputado ao réu não tem relação com o exercício do cargo de Desembargador, de
modo que, a princípio, aplicando-se o precedente produzido pelo Supremo Tribunal Federal no
julgamento da QO na AP 937, não teria o réu foro no Superior Tribunal de Justiça.
Para além disso, nos casos em que são membros da magistratura nacional tanto o acusado quanto o
julgador, a prerrogativa de foro não se justifica apenas para que o acusado pudesse exercer suas
atividades funcionais de forma livre e independente, pois é preciso também que o julgador possa
reunir as condições necessárias ao desempenho de suas atividades judicantes de forma imparcial.
A necessidade de que o julgador passa reunir as condições para o desempenho de suas atividades
judicantes de forma imparcial não se revela como um privilégio do julgador ou do acusado, mas como
uma condição para que se realize justiça criminal de forma isonômica e republicana.
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Daí a segura conclusão de que as razões subjacentes à norma constitucional que confere o foro por
prerrogativa de função à magistrados e membros do Ministério Público vão além daquelas
considerada pelo Egrégio Supremo Tribunal Federal na QO na AP 937, motivo pelo qual, em relação
as mencionadas autoridades, não cabe a interpretação restritiva, fundada em redução teleológica,
imposta pelo Pretório Excelso naquele julgado.
3-Tema: STF fixa tese de repercussão geral para autorizar compartilhamento de dados bancários e
fiscais sem autorização judicial
Em decisão monocrática proferida no dia 16 de julho de 2019, o ministro Dias Toffoli impôs a
suspensão de investigações criminais e processos judiciais nos quais houvesse determinados dados
fiscais e bancários compartilhados sem autorização judicial entre órgãos de fiscalização tributária e
de investigação criminal.
A decisão foi proferida no Recurso Extraordinário 1.055.941, interposto pelo Ministério Público
Federal contra acórdão proferido pelo Tribunal Regional Federal da 3ª Região, que havia anulado
ação penal na qual dados bancários obtidos pela Receita Federal haviam sido compartilhados com o
Ministério Público para fins penais. Segundo o acórdão recorrido, compartilhamentos de
informações bancárias para instruir investigações criminais só podem ser promovidos mediante
autorização judicial, que não havia sido emitida naquele caso.
O Ministério Público Federal argumentou que a quebra de sigilo bancário sem autorização judicial já
foi considerada válida pelo STF, que, no recurso extraordinário 601.314, julgou constitucional a Lei
Complementar 105/01, especialmente o disposto em seu art. 6º:
“As autoridades e os agentes fiscais tributários da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos
Municípios somente poderão examinar documentos, livros e registros de instituições financeiras,
inclusive os referentes a contas de depósitos e aplicações financeiras, quando houver processo
administrativo instaurado ou procedimento fiscal em curso e tais exames sejam considerados
indispensáveis pela autoridade administrativa competente.”
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O Recurso Extraordinário 1.055.941 já havia tido a repercussão geral reconhecida pelo STF em
12/04/2018 e seu julgamento estava previsto para o mês de novembro passado. À época, o ministro
Dias Toffoli afirmou que embora o STF tivesse proferido decisões admitindo o compartilhamento de
dados para fins penais, os julgamentos fundamentais sobre o art. 6º da Lei Complementar 105/01
apenas tangenciaram a questão da possibilidade de que informações obtidas pelo Fisco fossem
compartilhadas com órgãos de investigação criminal. Por isso se justificava o reconhecimento da
repercussão geral, para que o tribunal pudesse decidir sobre o tema de forma específica e com
efeitos abrangentes.
A decisão se fundamentou no fato de que no julgamento daquelas ações constitucionais o STF foi
expresso ao admitir, para a finalidade de fiscalização e controle tributário, apenas e tão somente o
compartilhamento de dados relativos à identificação dos titulares das operações e aos montantes
globais movimentados, ou seja, não se contemplou a troca de informações com detalhes acerca da
origem e da natureza das movimentações. E, naquele momento, havia dúvidas a respeito do nível de
detalhamento do que estava sendo compartilhado entre os órgãos de fiscalização tributária e o
Ministério Público e as polícias.
A medida provocou intensa reação devido à extensão de seus efeitos, que, na prática, paralisaram
investigações sobre infrações penais relativas a organizações criminosas, tráfico de drogas, tráfico de
armas, corrupção, lavagem de dinheiro, etc.
Nas sessões ocorridas nos dias 20, 21, 27 e 28 de novembro, o mérito do recurso foi julgado, e o
tribunal admitiu o compartilhamento de informações entre os órgãos fiscais e os órgãos de
investigação e persecução criminal, tal como já ocorria antes que se suspendessem as apurações
criminais em curso.
Na sessão do dia 4/12, o Tribunal aprovou a seguinte tese de repercussão geral no RE 1.055.941:
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Boletim Criminal Comentado Dezembro-
2019- (semana nº 01)
2 – O compartilhamento pela UIF e pela Receita Federal do Brasil, referente ao item anterior, deve
ser feito unicamente por meio de comunicações formais, com garantia de sigilo, certificação do
destinatário e estabelecimento de instrumentos efetivos de apuração e correção de eventuais
desvios.
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