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Ser migrante: implicações territoriais

e existenciais da migração*

Eduardo Marandola Jr.**


Priscila Marchiori Dal Gallo***

Migração e mobilidade são fenômenos constituintes da experiência


contemporânea. Estar no mundo, hoje, é conviver com a mobilidade e a
migração, e todas suas implicações. Do ponto de vista existencial, esta é uma
experiência desconcertante, em que as referências espaciais e socioculturais
são reconstituídas, num processo que envolve e atinge o próprio cerne da
autoidentidade: a segurança existencial. Partimos da pergunta “que é ser
migrante?” para refletir sobre as implicações existenciais e territoriais da migração,
procurando entendê-la enquanto um fenômeno vivido em diferentes escalas
espaço-temporais, mas que possui, do ponto de vista fenomenológico, uma
mesma essência constitutiva. Esse percurso leva a um pensar ontológico acerca
das estratégias e consequências do fenômeno migratório, o que faz refletir sobre
o papel da identidade territorial, do envolvimento com o lugar e das redes sociais
no movimento de sair do lugar de origem e estabelecer-se no local de destino.

Palavras-chave: Mobilidade. Lugar. Segurança existencial. Fenomenologia da


migração. Geografia da população.

Introdução A tradição dos estudos migratórios con-


solidou uma série de questões fundamentais
Que é ser migrante? Esta pergunta que giraram em torno das leis da migração
expressa a preocupação em pensar o fenô-
(RAVEINSTEIN, 1980) e dos motivos e forças
meno migração na forma como este é vivido.
sociais que atraem ou expulsam as popula-
Em termos fenomenológicos, a atenção re-
ções, enquanto reflexos da própria estrutu-
cai sobre a forma como o fenômeno aparece
na experiência. Essa pergunta expressa tam- ração produtiva do capital e de suas neces-
bém uma preocupação ontológica original: sidades. Neste sentido, os movimentos se
o migrante é um ser deslocado, movido de davam por classes, não por indivíduos que
seu lugar primevo. E é neste deslocamento decidiam isoladamente migrar (SINGER,
que procuramos o significado do que é esta 1973). Versões clássicas, estruturalistas
condição. ou pós-estruturalistas elaboraram estas e

* Uma versão preliminar deste texto foi apresentada no VI Encontro Nacional de Migrações, realizado de 12 a 14 de agosto
de 2009, em Belo Horizonte, Minas Gerais. Agradecemos as leituras críticas e o incentivo de Fernanda Cristina de Paula,
Ricardo Ojima e, especialmente, Daniel Joseph Hogan.
** Geógrafo, pesquisador colaborador do Núcleo de Estudos de População – Nepo, da Universidade Estadual de
Campinas – Unicamp.
*** Bolsista PIBIC/CNPq, Núcleo de Estudos de População – Nepo, da Universidade Estadual de Campinas – Unicamp.

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outras perspectivas para explicar a lógica termos dos territórios migrantes quanto dos
dos processos de redistribuição espacial da estudos de lugares e espaços específicos
população e suas diferentes consequências. diante do fenômeno migratório (RAFFESTIN,
No entanto, apesar destas bases co- 2003; SAQUET, 2007).
muns, enquanto fenômeno complexo e mul- No entanto, a maior parte desta biblio-
tifacetado, a migração é estudada no con- grafia enfoca o tema pelo viés sociocultural,
texto dos estudos populacionais, recebendo dos grupos e de suas práticas, não estando
a confluência de abordagens e disciplinas direcionada para as questões propriamente
que, cada qual com suas preocupações e existenciais destas transformações. Por
objetos, compõem um grande quadro sobre outro lado, a dimensão espacial, via territó-
o migrante, seus movimentos, os processos rio, continua sendo entendida, sobretudo,
materiais, as consequências e implicações como metáfora, ou por um viés materialista,
em diferentes escalas, os simbolismos e que limita o território às relações de poder
as transformações culturais. Conforme estabelecidas por forças econômicas ou
mostram Brettell e Hollifield (2008), cada políticas.
disciplina possui sua questão de pesquisa, A Geografia é a disciplina em que
os níveis ou unidades de análise, teorias estas abordagens estão potencialmente
dominantes e hipóteses orientadoras das conciliadas. Ela é mais do que o estudo de
investigações. padrões espaciais da migração, envolven-
A intensificação dos fluxos migratórios do uma gama de processos e fenômenos
no período pós-1990, com a crescente mobi- constituintes dos lugares, das redes e dos
lidade planetária e novos desenvolvimentos fluxos (HARDWICK, 2008). Favell (2008)
na área de transportes e comunicação, no chama atenção para o potencial da análise
entanto, tem produzido reflexos diretos contemporânea da Geografia, que conside-
nos estudos e teorias migratórias (FAVELL, ra o lugar enquanto dotado de significado e
2008). A velocidade, intensidade e diver- dinâmica cultural, permitindo um olhar para
sidade contemporâneas dificultam muito as dinâmicas próprias do e no espaço, onto-
a apreensão dos fluxos e das dinâmicas logicamente integrante da população que ali
que têm ritmos espaço-temporais muito vive. Para avançar nesse sentido, é necessá-
variados, além de uma diversidade nunca rio trilhar esta reflexão ontológica de fundo,
vista. Diferente da modernidade sólida, para superando a dissociação moderna espaço-
usar uma expressão de Bauman (2001), na sociedade, em busca de uma abordagem
modernidade líquida a fluidez é a tônica eminentemente existencial-fenomenológica.
das instituições, relações sociais, mercado No contexto dos estudos migratórios, a
e até da esfera cotidiana. Isso deixa os dimensão existencial está parcialmente con-
cientistas sempre num terreno pantanoso templada pelos trabalhos historiográficos,
no que se refere à apreensão da realidade que tomam a migração enquanto narrativa e
e seu estudo. memória (DINER, 2008). Com seus estudos
Esse cenário produziu pelo menos dois clássicos sobre a condição do estrangeiro e
rebatimentos em termos das tendências dos sua adaptação, Georg Simmel (1983; 1994)
grandes paradigmas científicos: a ênfase nos foi pioneiro em trazer a dimensão individual
processos identitários, da esfera do cotidiano para uma análise social dos processos
e dos microprocessos; e a atenção à dimen- ligados à migração e à própria sociedade.
são espacial dos fenômenos (SANTOS, 2000; Outras disciplinas que contribuem para
MASSEY, 2008). Nos estudos migratórios, este olhar são a Psicanálise e a Psicologia,
observam-se alterações nas tradicionais que buscam compreender os impactos do
abordagens explicativas das migrações (es- processo migratório para a identidade e a
truturalistas), com fortalecimento da atenção personalidade (VIANA, 1978; DeBIAGGI;
na identidade e nos elementos simbólicos do PAIVA, 2004; OLIVEIRA, 2005; FUKS, 2005).
processo (AHMED, 1999; PADILLA, 2009). Como uma mobilidade em si, a migra-
Por outro lado, a dimensão territorial das mi- ção é um fenômeno que envolve tanto a
grações tem ganhado importância, tanto em materialidade quanto a produção social e

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a corporeidade, necessitando destes três cessos de redefinições das territorialidades,


polos para ser compreendido (CRESSWELL, que não são necessariamente sucessivos
2006; KELLERMAN, 2006). Estas dimensões nem ordenados. Que significa, para a consti-
têm sido exploradas de maneiras diferentes, tuição da identidade e do eu, o rompimento
mas nunca enfrentadas de forma direta pe- da ligação original ser-lugar natal? Em ter-
los estudos migratórios ao mesmo tempo. mos ontológicos, há um abalo na segurança
A dimensão territorial tem sido vista como existencial e na identidade territorial que
organização espacial ou como a dimen- precisa ser compreendido como elemento
são legal das migrações internacionais central do processo migratório.
(sempre com um viés materialista do ter- Este texto é uma aproximação ao
ritório), enquanto a dimensão existencial tema, um convite à sua discussão e suas
tem aparecido em estudos antropológicos, implicações para pensar as migrações e os
históricos, psicossociais ou psicanalíticos. migrantes na contemporaneidade na área
Mas a dimensão propriamente geográfica dos estudos populacionais. Exploraremos
dos processos de territorialização e dester- alguns elementos que ligam ser-lugar
ritorialização só tem sido abordada muito enquanto relação fenomenológica originá-
recentemente, e não necessariamente numa ria, buscando, a partir desta perspectiva,
perspectiva existencial. compreender as implicações territoriais e
O contexto em que tais estudos têm flo- existenciais da migração, pesando o papel
rescido é o das discussões contemporâneas dos grupos e coletividades, mas focando
sobre a modernidade líquida, os novos noma- as repercussões tais como são experien-
dismos e as redefinições das identidades ter- cialmente vividas.
ritoriais. Cresceu nos últimos dez anos a fileira
dos geógrafos dedicados a tirar a dimensão Migrar: desestabilização ser-lugar
territorial de simples metáfora para chão ou
solo, perspectiva que proliferava em toda a Se a pergunta que guia o texto é “que é
bibliografia sobre hibridismos, transcultura- ser migrante?” e a busca por sua resposta
lismo, mudanças culturais e globalização está na territorialidade e na existência, dois
(BADIE, 1996; HALL, 2003; 2009). Alguns termos são centrais para esta construção:
autores, como Mesquita (1995), Haesbaert lugar e ser. Mais importante ainda, a essên-
(2004; 2008), Saquet (2007; 2009) e Raffestin cia fenomênica ser-lugar é central para se
(2003, 2009), têm se dedicado de forma pensar em termos ontológicos a questão
mais sistemática a esta discussão, com suas em tela.
respectivas abordagens e preocupações Casey (2001) afirma que não há lugar
de fundo. Destaque especial merece Jöel sem homem, nem homem sem lugar. Esta
Bonnemaison (BONNEMAISON; CAMBRÉZY, afirmação revela a compreensão ontológica
1996; BONNEMAISON, 2002[1981]; 2005), da espacialidade a partir da qual existe a in-
que, em seus estudos tropicalistas, foi um dissociabilidade ser-lugar, homem-espaço.
dos primeiros a pensar o território em sua Somos nossos lugares, assim como eles
dimensão cultural, chegando a considerar nos são. Não estamos no espaço: somos
o território, junto com o lugar, como um pa- sendo espacialmente (HEIDEGGER, 2001a).
radigma para a nova geografia cultural em A filosofia fenomenológica vem con-
desenvolvimento nos anos 1990. tribuindo de forma notável nos últimos
Nosso ponto de partida, no entanto, é anos para esta compreensão cada vez
diferente do deles, embora corra em parale- mais precisa e ao mesmo tempo ampla da
lo. Se os autores se concentram em compre- espacialidade do ser. Uma longa tradição
ender as implicações para os grupos, nosso de pensamento sustenta esta perspectiva,
enfoque se direciona para existência e, a desde os gregos, embora as bases mais
partir dela, podemos pensar os grupos. É sólidas tenham se consolidado a partir da
na experiência da migração que buscamos fenomenologia do século XX, principalmente
compreender que é ser migrante. Assim, com Heidegger e Bachelard (BOLLNOW,
migrar é sair do seu lugar, envolvendo pro- 2008). O primeiro deles é especialmente im-

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portante neste sentido, já que, perseguindo a integração, a assimilação, a separação


a questão ontológica fundamental, erigiu um ou a marginalização (BERRY; POORTINGA,
conjunto de reflexões que colocam o lugar e 2002), constituindo o processo mais geral
o espaço como centrais para pensar a exis- de adaptação do migrante, que envolve não
tência (MALPAS, 2008; SARAMAGO, 2008). apenas questões comportamentais e cul-
Nessa perspectiva, a dimensão territo- turais (HOGAN, 1974), mas também adap-
rial refere-se à própria constituição do ser, tações do seu próprio modo de ser. Como
enquanto área de controle (mesmo que a adaptação nem sempre é possível (nem
simbólico) que permite a continuação da sempre a pessoa tem condições mentais
existência, fornecendo a chamada segu- de realizá-la), o desgaste emocional pode
rança ontológica (GIDDENS, 2002). É esta se avolumar a ponto de gerar a chamada
segurança que permite ao ser continuar Síndrome do Migrante, ou Síndrome de
sendo, ou seja, manter-se vigente, existindo Ulisses (PASQUA; MOLIN, 2009).
no mundo (HEIDEGGER, 2001b). A expressão antropológica deste pro-
Sack (1997) aborda a dimensão existen- cesso é o embate entre migrantes e esta-
cial da relação com o lugar a partir do self belecidos, problemática clássica de todos
(eu), entendendo a relação self-lugar como os estudos sobre alteridade, adaptação
uma teia indissociável de mútua constitui- cultural e migração (insiders e outsiders)
ção. Para ele, ambos estão no centro de (ELIAS, 1994). O outro é o desconhecido,
constituição da pessoa e do espaço, sendo que ameaça o eu e sua pureza, provocando
o ponto no qual os fenômenos e dinâmicas o medo e a repulsa e, não raro, reações
de outras esferas se embatem na realida- hostis que podem gerar estigmatização
de geográfica. Segundo o autor, o self é (GOFFMAN, 1982; BAUMAN, 1998). Esta
composto pela natureza, pelos significados oposição revela não apenas a diferença de
e pelas relações sociais, tanto quanto o pertença e identidade entre grupos, mas
lugar, e é por isso que ambos apresentam também uma diferenciação de apropriação
personalidades específicas em cada tempo. dos saberes do lugar e de sua inserção
O processo de desenraizamento origi- territorial (MARANDOLA Jr., 2008b).
nal iniciado pelo movimento migratório se Elsa Lechner aborda a questão pelo
dá, em termos existenciais, pela alteração da ângulo da psiquiatria, identificando no pro-
territorialidade consolidada, a modificação cesso migratório elementos potenciais que
desta relação originária self-lugar, saindo do atingem a saúde mental. Segundo a autora,
lugar-natal, o que implica deixar os lugares a experiência migratória é a da descontinui-
de infância, juventude ou idade adulta, res- dade e ruptura, alterando a trajetória pessoal
ponsáveis pela nossa formação enquanto e rompendo laços. “Laços esses que tam-
pessoa e sobre os quais está edificada bém são inscritos no corpo, cinestésicos
nossa identidade. Implica, portanto, sair e vivenciados. Esta experiência provoca
dos territórios da segurança e lançar-se no um deslocamento do sentimento de si que
mundo, em lugares de pouca ou nenhuma pode concorrer para o mal-estar existencial
familiaridade, onde há pouco ou nenhum ou mesmo para a doença.” Ela corrobora a
controle, uma das raízes da insegurança importância da dimensão territorial do pro-
(MARANDOLA Jr., 2008a). cesso, afirmando que na migração “as iden-
A bibliografia clínica e antropológica tidades são inter-territoriais e o sentimento
elenca um razoável número de estresses de pertença quase extra-territorial, desafian-
e lutos causados pela experiência mi- do formas convencionais de representação
gratória, relacionados às várias perdas, das identidades” (LECHNER, 2007, p. 81).
desorientações e incertezas consequentes Migrar é ser obrigado a desenvolver outros
da mudança. O local de destino representa tipos de territorialidade, dando um salto em
uma nova realidade para o migrante em direção ao desconhecido.
termos tanto culturais quanto espaciais. A É por isso que a desestabilização da
bibliografia clássica indica alguns dos pro- ligação essencial ser-lugar causa um abalo
cessos que ocorrem neste devir, tais como na segurança existencial e identidade terri-

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torial do migrante, que tem de enfrentar um expressa as características do lugar com as


desencaixe espacial. Isso o torna suscetível quais a pessoa se identifica, vendo-se nele
à angústia e ansiedade, impondo a neces- (HERNÁNDEZ et al., 2007; LEWICKA, 2008).
sidade de enraizar-se no lugar de destino, Estes fatores operam como fundamentos da
ou de manter os vínculos com o lugar identidade territorial, ajudando a promover
natal, apesar de ter migrado. A segurança a fixação, sendo para isso o aspecto mais
existencial e a identidade dependem de a importante o envolvimento.
pessoa estabelecer e cultivar laços com o Kyle et al. (2004) afirmam que o atta-
lugar, envolvendo-se com ele (MARANDOLA chment é baseado nos laços emocionais,
Jr., 2008c). na afetividade e na afetação que o lugar
Lussi e Marinuci (2007) e Lussi (2009) provoca na pessoa, sendo a base de todo
procuram sistematizar os elementos e si- o senso de lugar. Este laço de envolvimento
tuações que tornam a condição migrante foi chamado por Tuan (1980) de topofilia,
vulnerável, entre os quais se destacam as referindo-se aos laços que ligam a pessoa a
questões legal, religiosa, familiar, econômica dada porção do espaço. Esta “filia” pode ou
e simbólica. Todos os aspectos arrolados não ser buscada, assim como pode ou não
pelos autores estão associados ao envol- ocorrer sem uma intencionalidade. Dessa
vimento com o lugar, à identidade e ao forma, ela existe em relação tanto aos luga-
processo de territorialização incipiente no res do local de origem quanto aos do local
lugar de destino. de destino, estando no centro dos elemen-
Nesse sentido, o migrante sente a ne- tos que, do ponto de vista da experiência,
cessidade de fixar-se para poder alcançar irão influenciar na forma como os migrantes
uma sensação de bem-estar, aliviando o vão ou não se envolver com o novo lugar.
incômodo sentimento de incerteza e ins- A relação ser-lugar pressupõe uma
tabilidade que perdura e se reforça com a construção mútua e simultânea de ambos:
ausência do lugar. No entanto, a fixação do o sujeito constrói o lugar e ao mesmo tempo
migrante no local de destino tem algumas é construído por esse (CASEY, 2001). Os
restrições ou condições em termos de lugares em que o indivíduo viveu ou vive
identificação sociocultural e espacial. O são responsáveis pela constituição de sua
envolvimento de um indivíduo com o lugar maneira de ser, assim como garantem a
é um processo complexo que não ocorre continuidade desse ser, baseada na expe-
aleatoriamente. Alguns fatores encorajam/ riência. Por meio da percepção, sensação,
incentivam esse envolvimento, enquanto cognição, representação e imaginação, o
outros repelem qualquer tentativa ou inte- lugar-ser se constitui. A experiência tem
resse em fazê-lo. como meio o corpo, grande mediador dessa
Entre os fatores de encorajamento, relação (MERLEAU-PONTY, 1971). Segundo
a identificação com o lugar é crucial. O Casey (2001), o que o corpo experiencia tem
estabelecimento de laços e a sensação efeito direto sobre ele mesmo. Digerida, a
de pertencimento ocorrem em um lugar experiência passa a fazer parte integrante
cujas características sociais, culturais do corpo. Internalizada, ela é responsável,
e a organização espacial não sejam de por meio do processo de somatização,
todo desconhecidas. É o chamado place pela forma de ser do sujeito. Com a inter-
attachment (envolvimento com o lugar), que nalização, o corpo incorpora o lugar que
é um dos aspectos dos efeitos de lugar, permanece na memória “in a virtual state”
ou senso de lugar (LOW; ALTMAN, 1992). (CASEY, 2001, p.688) e se expressa na forma
Para a psicologia ambiental, o processo de ser do sujeito.
de envolvimento com o lugar implica pelo Nessas condições, a relação de soma-
menos mais dois aspectos: a dependência tização ser-lugar se estabelece quando há
do lugar (place dependece), que se refere uma identificação entre eles. O indivíduo
às vantagens comparativas do lugar (o que não pode ou não é capaz de ignorar toda
tem ali que não tem em outros lugares); e a sua história e formação, sendo indiferente
identidade com o lugar (place identity), que às características de sua nova realidade

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para estabelecer prontamente relações portanto, fundamental para o migrante


com o local de destino. Não encontrando alcançar tranquilidade e estabilidade onto-
tal identificação de forma clara, o migrante lógica no lugar de destino.
tende a recriar seus lugares na expectativa A casa é o marco zero de todo o relacio-
de preservar sua forma de ser, bem como namento espacial e social, servindo como
para reafirmar sua identidade territorial. São ponto de apoio para que o migrante possa
as relações e laços promotores do envolvi- construir e interligar seus lugares. Nesse
mento com os lugares que dão as fundações movimento de expansão, o migrante corro-
e sustento para o ser (CASEY, 1993). bora para o adensamento da rede social ao
A necessidade por parte do migrante de mesmo tempo em que tem a possibilidade
preservar sua personalidade, sua identidade de participar dela.
e voltar a ter a sensação do pertencimento
leva a um gradual e contínuo processo de Redes sociais: territórios e lugares
edificação de “lugares próprios”, os quais migrantes
permitem ao migrante enraizar-se. Estes
lugares e suas articulações são, na verdade, Nesse processo de construção de seus
o território dos migrantes. Esses lugares lugares, o migrante vai compondo uma nova
se configuram como base e fundamento das rede de relacionamentos baseada em luga-
redes sociais estabelecidas por eles. res específicos, aumentando aos poucos
Entre os lugares dos quais o migrante sua sensação de segurança e promovendo
tem que abrir mão na mudança, possivel- seu enraizamento. Isso ocorre tanto com mi-
mente sua maior perda é a casa. Lugar grantes temporários (estudantes, trabalha-
por excelência, onde estão fundadas as dores que vão para outros países e deixam
memórias e, em último grau, a própria iden- suas famílias no país de origem, etc.) quanto
tidade (BACHELARD, 1993), a casa é onde com famílias que migram para recomeçar a
as sensações de pertencimento, conforto vida, embora com especificidades oriundas
e segurança são máximas. A ligação entre da própria característica do movimento e da
o self e a casa é essencial na composição sua situação.
do mundo vivido e da própria inserção na A matriz desta nova rede, não raro, é
sociedade (TUAN, 1982). A casa pode ser a própria rede migratória que o levou até o
entendida como o lugar mais personificado local de destino. As chamadas redes sociais
do indivíduo, no qual cada detalhe é um são fundamentais para compreender o pro-
reflexo das suas vontades e interesses. O cesso migratório, tanto nos motivos e fluxos
inverso também é verdadeiro, a casa como quanto para a discussão sobre a inserção
“fundamento espacial do ser-no-mundo” do migrante no local de destino. Elas se
(MARANDOLA Jr., 2008b, p. 170) será o configuram como uma das mais importantes
lugar mais absorvido e internalizado, sendo estruturas para compreensão da organi-
base constituinte da identidade e da forma zação social da migração (MASSEY et al.,
de ser do indivíduo. A casa é onde a pessoa 1987). A análise estrutural das redes sociais
busca e funda seu lugar no mundo. da migração possibilita uma perspectiva
Tendo se afastado de sua referência complexa e instigante da organização social
identitária essencial, a casa, que pode e cultural dos fluxos migratórios, integrando
envolver toda a terra natal e seu imaginário relações de parentesco, vizinhança e ami-
(BACHELARD, 1993; TUAN, 1980), o migran- zade (FAZITO, 2002).
te precisa reconstruir sua casa ao mesmo Soares (2004) indica a proximidade da
tempo em que reconstitui a si mesmo. No rede social com a rede pessoal e a própria
ato/processo de personalizar a sua casa é rede migratória. Em todos os casos, pensar
que o migrante recoloca as bases espaciais o papel das redes no fenômeno migratório
de sua existência. Tornando a casa uma permite entender a dimensão estrutural das
expressão de si mesmo, a pessoa traz à escolhas e motivos da migração. Por outro
tona/convoca o ser. Personalizar a casa é lado, a partir das redes sociais, é possível
apropriar-se, fixar-se, enraizar-se, sendo, compreender também o capital simbólico

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e material a que o migrante tem acesso impostos pela nova realidade vivida pelo
no local de destino. É neste sentido que migrante certamente traz mais benefícios
pensamos o papel da rede social e suas do que ações individuais. As redes sociais
relações com a territorialidade e os lugares funcionam para os migrantes como uma
migrantes: em que medida elas conseguem estratégia para sua sobrevivência e susten-
diminuir o impacto da ruptura com o lugar tabilidade (FAZITO, 2002).
de origem, em termos familiares, culturais Para o migrante, essas redes represen-
e existenciais? tam um referencial identitário e um meio
A inserção nas redes sociais possibilita fundamental para orientar seu envolvimento
a identificação e o pertencimento, podendo no local de destino. Em vez de partir de
gerar alívio/amortecimento ao impacto das relações puras (GIDDENS, 2002), sem re-
mudanças espaciais vividas pelos migran- ferenciais prévios, os migrantes possuem
tes, por forneceram um espaço de seguran- uma rede de lugares e relacionamentos
ça onde o seu modo de ser é reconhecido, baseados na confiança alicerçada na origem
ligando-o ao lugar-natal. Em vista disso, comum, sendo o fato de serem conterrâneos
são importantes para amenizar os estresses a base dos laços de confiança e do novo
causados pela migração (PASQUA; MOLIN, processo de territorialização. Seus lugares
2009). são construídos pelos e para os migrantes
A base da rede social é a cooperação a partir de seus aspectos socioculturais.
entre seus integrantes, sendo que a identi- Os migrantes passam a adquirir domínio/
ficação é o que fornece a liga e estabelece controle espacial do local de destino, geran-
a confiança. Essas redes se fundamentam do territorialidades ao recriar seu território
nas relações de amizade, vizinhança, paren- identitário.
tesco, trabalho e origem comum (SOARES, As redes sociais são, portanto, também
2002) entre os migrantes. A reciprocidade redes territoriais, pois são alicerçadas em
garante que a rede social funcione da manei- lugares específicos onde o grupo se encon-
ra mais igualitária/democrática possível para tra, conserva práticas comuns associadas
seus membros, pois permite a troca do capi- ao lugar natal e propaga, a partir dele, sua
tal social entre os membros de forma geral. territorialidade. Em geral, as redes sociais
Fusco (2002) afirma ser a reciprocidade uma mantêm pouca relação com o sistema do
norma de comportamento no interior das lugar (GODOI, 1998), constituindo-se em
redes sociais que funciona como um dos lugares marginalizados ou pouco frequen-
mecanismos da circulação do capital social. tados pelos estabelecidos, o que contribui
Essas redes têm papel central no territó- para a separação entre estes e os migran-
rio dos migrantes. Nelas há o encontro das tes. Não é muito diferente dos enclaves
cosmovisões do migrante com o imaginário étnicos, em que códigos de conduta dos
local, o que produz a recriação de símbolos migrantes e estabelecidos constrangem o
que fazem parte da sua identidade, num uso e a frequência de lugares na cidade,
verdadeiro encontro de culturas (SCALERA, configurando territorialidades distintas entre
2009). As redes sociais representam, então, os grupos (VARADY, 2005). Essa separação,
um suporte importante, uma vez que garan- no entanto, não é monolítica; há os lugares
tem o acomodamento/inserção do migrante, marcados pela permeabilidade entre os ter-
sendo constituídas tanto pelas pessoas e as ritórios e grupos, possibilitando o encontro
relações que desenvolvem entre si como e o compartilhamento do espaço.
pelas organizações e instituições sociais Esta concentração nos territórios e lu-
(SOARES, 2002; 2004). gares migrantes dificulta o estabelecimento
As redes sociais surgem no sentido de de relações/interação com a cidade e seus
recuperar o bem-estar e o sentimento de habitantes, tornando difícil o desenvolvimen-
pertencimento do migrante, constituindo to de laços afetivos com o local de destino,
uma resposta às dificuldades de inserção/ já que esse não é vivenciado livremente.
adaptação encontradas no local de destino. A provável falta de familiaridade com as
A cooperação para enfrentar os desafios estruturas, dinâmica e cotidiano da cidade

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e também a prevalência da impessoalidade (identificação não apenas com o lugar de


dificultam a constituição de lugares, pois origem, mas também com os lugares de
seus dois “suportes” essenciais ficam au- destino) e de identidades unas (o indivíduo
sentes: não há identificação com a cidade se identifica prioritariamente com seu lugar
e/ou convívio com seus habitantes. de origem).
Esse é um fenômeno comum entre Já a multiterritorialidade busca rever
migrantes de baixa qualificação que migram a forma como o processo de territorializa-
clandestinamente para países centrais, ção se apresenta na contemporaneidade
como o caso de brasileiros nos Estados Uni- (HAESBAERT, 2004; 2007). Num cenário
dos ou na Europa (SALES, 1999; ALMEIDA, mundial em que predominam a fluidez, o
2009a; 2009b). Pela condição ilegal e dificul- móvel e o globalizado, há o afrouxamento
dades com a língua, os migrantes não se das fronteiras estatais e territoriais (que se
arriscam muito em viagens ou em transitar tornam gradativamente mais permeáveis,
pelas cidades e raramente despendem seus embora mais conflituosas também) e os
dias ou horas de folga em atividades de lazer fluxos ocorrem de maneira mais aleatória,
e convívio social, concentrando-se no traba- dispersa e descontinua, aumentando a
lho (em geral com longas jornadas) e nas tensão entre mobilidade e imobildiade. O
remessas para suas famílias. Essa é outra migrante constrói múltiplas territorialidades,
forma de territorialidade e de envolvimento mas não apenas ele: todos vivemos vários
com o lugar de destino que tem sido anali- territórios ao mesmo tempo. O território é
sada de diferentes maneiras, que tendem a produzido na articulação dos processos
ressaltar o impacto das novas possibilidades de desterritorialização e reterritorialização,
de mobilidade e de identidade na constru- que dão origem aos territórios-rede. Estes
ção de territorialidades. Três abordagens proporcionam a experiência, identificação
ou entendimentos são mais presentes na e apropriação de diversos territórios e o
leitura da migração e suas territorialidades trânsito em diversas territorialidades.
contemporâneas: o transnacionalismo; a Por fim, a interterritorialidade propõe
multiterritorialidade; e o entreterritórios. uma reflexão sobre a produção dos territó-
O transnacionalismo, por exemplo, rios pelos migrantes e suas implicações,
considera o movimento migratório para além num cenário de forte fluidez espaço-tempo-
de sua dinâmica polarizada e unidirecional, ral, no qual se constroem territórios em mo-
pois os fluxos não se limitam mais à saída do vimento e sob múltiplas influências culturais
local de origem e ao assentamento (pensa- (VANIER, 2008). Diante da intensificação da
do como definitivo e determinante) no local mobilidade em detrimento da estabilidade,
de destino (MASSEY, 1993). A rigidez da há de se considerar que os processos de
permanência é posta em cheque pela inten- construção/estruturação territorial e forma-
sa transitoriedade dos migrantes em função ção da identidade do indivíduo migrante
da interconectividade e expansividade de têm se tornado complexos. Os migrantes
seus territórios e simultaneidade de práticas vivem entre territórios e entre culturas;
territoriais, culturais, econômicas e multina- desenvolvem uma identidade fragmentada
cionais (LINDÓN, 2007). O migrante mantém em função de sua situação de ocupante
ativa e viva suas relações com lugares que da fronteira entre ser e não ser cidadão e
estão geograficamente distantes, rompen- de dividir-se entre estratégias de vida que
do com a noção de obrigatoriedade da atendam às exigências do local de origem
assimilação e aculturamento (vistos como e do local de destino (ALMEIDA, 2009c). Os
processos indissociáveis da migração) migrantes ativam diversos territórios e todos
(DUNN, 2008). Reconhecem-se a relevância eles contribuem para formação de sua iden-
e a potencialidade das práticas individuais tidade social e cultural; o cruzamento dessas
e sociais do migrante que permitem a ele pluralidades constitui a interterritorialidade.
se adaptar sem transformações identitárias As três perspectivas, aqui resumidas,
radicais. Isso abre a possibilidade da exis- possuem pontos em comum (especialmente
tência de identidades duais ou múltiplas seu ponto de partida: a fluidez contempo-

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Marandola Jr., E. e Dal Gallo, P.M. Ser migrante: implicações territoriais e existenciais da migração

rânea), mas dão soluções analíticas bem micro, na qual um grupo relacional exerce
diferentes à situação das territorialidades no suas práticas sociais e afirma seus aspec-
novo cenário das migrações deste século. tos e atributos identitários, atendendo suas
Como abordagens e conceitos amplos, se necessidades relacionais e preservando sua
prestam tanto às análises mais estruturais identidade (COSTA, 2005). Esta prática aca-
quanto às de trajetórias pessoais, o que nos ba sendo uma saída eficiente para a situação
permite uma ampla discussão sobre suas destes grupos migrantes.
consequências. O território ganha, assim, um desenho
Todas foram pensadas em termos da reticular, fundamentando e sustentando as
migração internacional, em que o controle redes sociais a partir de lugares hierarquiza-
legal do Estado-Nação exerce uma media- dos conectados por uma rede de itinerários
ção essencial para todas estas teorias, pois (BONNEMAISON, 2002). Esta forma de
não se pode esquecer que os vínculos com enraizamento coloca o lugar e o território
o país dependem também de ações e polí- como o principal ponto de suporte da iden-
ticas específicas dos países de origem em tidade, estendendo a relação ser-lugar ao
amparar e promover a integração de seus grupo-lugar.
cidadãos, que estão no exterior, à política e à A estruturação das redes sociais,
vida cultural do país de origem (MENA, 2009). portanto, é fundamental para a identidade
Além disso, situações de ilegalidade não territorial dos migrantes. Identificar-se com
permitem a comunicação ou a visita frequen- um território implica tornar-se parte de
te entre parentes imigrados. Por outro lado, determinados círculos sociais e redes de
os países que têm grandes contingentes de lugares e itinerários e partilhar um sentimen-
cidadãos fora de suas fronteiras desenvol- to coletivo em relação a signos, códigos e
vem mecanismos de mantê-los ligados ao práticas culturais. No caso das migrações
Estado-Nação. Até países como o Brasil, internacionais, associações de emigrantes
tradicionalmente receptor de migrantes, têm formam e articulam muitas destas redes,
alterado sua postura em relação ao cres- funcionando como matricial da própria rede
cente número de emigrantes em diáspora, social (MELNIK et al., 2009; PADILLA, 2009).
promovendo políticas transnacionais que Na construção de suas redes, os migrantes
visam manter estes brasileiros integrados. exercem papel central como parte integrante
Redes de televisão internacionais têm tido e atuante na criação das geoestruturas,
um papel importante nesse sentido, assim além de serem responsáveis por traçar na
como sistemas civis de registro e votação paisagem uma complexa semiografia capaz
no exterior, facilitando a manutenção do vín- de exprimir e representar sua concepção
culo com o país de origem e influenciando de mundo.
a formação das novas territorialidades no Por sua fisionomia, dinâmica e ambiên-
país de destino. cia, o lugar representa um ponto de familiari-
Do ponto de vista existencial, os migran- dade e receptividade para o migrante, onde
tes constroem territorialidades próprias que se encarna sua cultura e se apresentam seus
são verdadeiros microcosmos ou pequenos símbolos, signos e códigos. O lugar é por si
mundos nos quais compartilham lugares, só um referencial identitário, sendo a mani-
paisagens, signos e símbolos. Nos micro- festação espacial dos laços de afetividade
cosmos tem-se uma existência espacial que ligam o grupo a seu território e fundam a
coletiva: o grupo pensa, organiza e vive seu identidade cultural (BONNEMAISON, 2002)
território de maneira semelhante por parti- e territorial.
lhar uma mesma cultura e um determinado Os migrantes tentam recriar, de certa
estilo/modo de vida. forma, seu território perdido no novo lugar.
As redes sociais como uma rede de Para fazê-lo, eles reproduzem os geossím-
lugares-chave (lugares dos migrantes) bolos e a organização socioespacial de seu
podem ser entendidas como microcosmos antigo território, além de garantirem lugares
ou microterritórios, resultantes de uma sin- onde suas práticas possam ser realizadas. Ao
gularização, através de uma territorialização restabelecer os elos espaciais e identitários,

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o grupo migrante é capaz de se enraizar e que não exige conhecimento da cultura local
dar fundamento à sua identidade que, evi- para entender sua dinâmica. O migrante
dentemente, não será a mesma, pois agora pode ir aos mesmos lugares padronizados
são migrantes num outro lugar e não estão que frequentava em sua terra natal e usu-
isentos das influências locais, incorporando- fruir de uma impessoalidade que lhe dá
as mesmo que parcialmente. Recriar seu segurança. O migrante os frequenta sem
território é uma forma de dar suporte e inibição, pois não há o compromisso de se
manutenção à identidade e à sua forma de envolver com ele.
existir/ser pela presença de referenciais iden- Essas características dos lugares neu-
titários. Nesse sentido, territorializar-se serve tros advêm, em grande medida, de sua
como um mecanismo protetor da segurança relação com os sistemas abstratos, entre os
existencial (MARANDOLA Jr., 2008c). quais estão os chamados sistemas peritos
Fundamentadas na família e nos laços (GIDDENS, 1991).
elementares de parentesco, vizinhança e Esses sistemas tendem a apresentar
amizade, as redes sociais têm a capacidade certa uniformidade em termos de fun-
de oferecer segurança existencial, atuando cionamento, independentemente de sua
como casulo protetor (GIDDENS, 2002), o localidade. Seu funcionamento baseia-se
qual, constituído e construído pelos migran- em alguns procedimentos padrão que, ao
tes, filtra as eventuais ameaças que esses serem cumpridos, permitem sua utilização.
possam sofrer (MARANDOLA Jr., 2008b). A Os sistemas peritos são os principais res-
confluência de “lugares próprios” propor- ponsáveis pelas transformações ocorridas
cionada pelas redes instiga as famílias, os nas relações pessoais, sendo grandes
amigos e conhecidos a se encontrarem e promotores da impessoalidade.
cultivarem seus laços, assim como estabe- A possibilidade de trafegar entre di-
lecerem novos outros. ferentes lugares, independentemente de
O mesmo não pode ser dito com relação seus atributos socioespaciais e sociocul-
ao sistema do lugar, pois a falta de envolvi- turais, tem permitido o deslocamento dos
mento entre os migrantes e a população local indivíduos de forma muito mais fluida, fora
priva o casulo protetor de uma fonte impor- das suas territorialidades. Um processo
tante de confiança e segurança, obrigando-o cada vez mais frequente que tem marcado
a estratégias de segurança desencaixadas, nossas metrópoles corresponde às migra-
que estão diretamente vinculadas à existên- ções espontâneas, marcadas por decisões
cia de uma rede impessoal de instituições, individuais (MARANDOLA Jr., 2008b,c). Em
organizações e empresas, cujo forte é a pa- vez de grupos sociais migrantes, ligados
dronização e dispersão espacial. Paralela às a um lugar específico que operava como
redes sociais, uma nova rede organiza estes lugar de expulsão, hoje temos migrantes
migrantes do tempo da globalização: a rede de grupos difusos espacialmente, que, no
de lugares globais, chamada por Bauman espaço impessoal da metrópole, não têm
(2001) de lugares neutros. se orientado unicamente pela existência de
Segundo o autor, estes lugares envol- redes sociais previamente estabelecidas.
vem certa homogeneização e padronização Torna-se possível viver uma vida inteira
do comportamento social, não exigindo numa cidade ou região sem integrar-se às
envolvimento ou socialização para serem dinâmicas do sistema do lugar. Mesmo
frequentados; pelo contrário, isso é quase após vários anos, a pessoa ainda pode
desnecessário. São os shoppings, as gran- se considerar “de fora”, pois os laços de
des redes de supermercados, lojas multina- envolvimento com o lugar não ultrapassam
cionais e outros serviços similares que estão aqueles ligados à sobrevivência e às práti-
organizados segundo os mesmos códigos cas cotidianas funcionais. Este tipo de expe-
globais associados à vida metropolitana. riência é possível tanto pelos lugares neutros
Esses lugares, ao contrário do sistema quanto pela possibilidade de manter os la-
do lugar ou das redes sociais dos migrantes, ços essenciais com o lugar de origem, o que
são regidos por uma lógica desencaixada, tem acontecido tanto internamente quanto

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Marandola Jr., E. e Dal Gallo, P.M. Ser migrante: implicações territoriais e existenciais da migração

internacionalmente (BAUMAN, 2007). Os Para a cidade, diminuem a participação


lugares neutros facilitam a adaptação na e o envolvimento com seus próprios proble-
medida em que não exigem familiaridade mas. Reduzir a cidade à sua dimensão fun-
e envolvimento com o lugar (MARANDOLA cional potencializa que ela seja guiada pelo
Jr., 2008b). consumo e pelos sistemas produtivos. Isso
Por outro lado, se antes mudar-se retroalimenta a disposição das pessoas de
significava distanciamento absoluto, hoje não fazerem da metrópole seu lugar. Para as
migrantes regionais ou até internacionais pessoas, seu não envolvimento as mantém
conseguem manter vívidos os laços com fora de redes de proteção locais, estando
a terra natal, ficando, em muitos casos, completamente dependentes das redes
integrado existencialmente a ele e apenas privadas de proteção, produzindo uma se-
funcionalmente ligados ao lugar de mora- paração clara entre migrantes com e sem
dia atual. As melhorias tanto nos sistemas condições de pagar por estes mecanismos.
de transporte (malhas aérea e rodoviária) A indiferença torna-se uma forma de
quanto de comunicação (telefonia e Internet) relação com o lugar, estando associada
possibilitam esta vivência deslocada do diretamente ao não envolvimento que, para
lugar: à distância. Tuan (1998), é uma forma de escapismo que
O reflexo disso, no entanto, é que as pode afetar de forma ambivalente a vulnera-
regiões metropolitanas estão cheias de bilidade individual do escapista: expondo-o
migrantes temporários: pessoas que vivem a certos riscos, protegendo-o de outros. A
a semana no trabalho e acorrem à casa- coletividade, no entanto, será atingida de
natal no final de semana, feriados e férias. forma mais direta, afetando diretamente a
Pessoas que, ao se aposentarem, voltarão vulnerabilidade do lugar e a efetividade das
para seus lugares e territórios que foram redes sociais de prover proteção.
mantidos durante anos. São temporários
por não considerarem este o seu lugar; Migração em tempos líquidos
entendem-se fora do lugar (MARTINS, 1986).
Estes migrantes aproveitam a possibi- É fundamental pensar os movimentos
lidade do deslocamento e da proximidade migratórios para além das condições ou
para manter seus laços fundamentais, seu motivações econômicas. Enquanto deslo-
casulo protetor (GIDDENS, 2002) fundado camento de pessoas, a intencionalidade
em sua casa e terra natal. Assim, tendem a e a volição têm papel central em vários
ter relações mais funcionais com a cidade e momentos do processo. Não que hoje não
a região, morando nela durante a semana, vejamos grupos sociais em migração. Os
mas, em função de seus retornos periódicos, fluxos continuam sendo parte fundamental
mantêm seus laços mais fundamentais e da problemática. No entanto, a importância
duradouros com sua cidade natal. Ativida- de questões existenciais aumenta nos atuais
des corriqueiras, que exigem confiança e tempos líquidos da modernidade líquida,
conhecimento locais, como comprar bens tempo de flexibilização de todos os campos
duráveis (um carro, por exemplo), tratamen- da vida social, inclusive das relações amoro-
tos de saúde mais delicados, planejamento sas, da vida comunitária, das instituições e
de viagens, etc., não são realizadas na das normatizações (BAUMAN, 2001; 2007).
metrópole, mas sim na terra natal, onde as Nessa fluidez contemporânea, o peso das
redes e a memória dão segurança, além decisões tem sido jogado para o indivíduo,
de ser uma estratégia de manter o vínculo mesmo que não haja parâmetros socialmen-
(MARANDOLA Jr., 2008b, c). te definidos que o oriente em sua decisão
As metrópoles, em especial em áreas (BECK, 1999). A dimensão geográfica do
muito densas e com alta fluidez, abrigam processo, ligada à constituição das identida-
cada vez mais pessoas que não procuram des territoriais, do lugar e das redes sociais
e até evitam o envolvimento com ela: não é fundamental para compreender este ser
querem pertencer, seu lugar é outro. Quais migrante e os riscos e incertezas aos quais
são as consequências? fica exposto.

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Marandola Jr., E. e Dal Gallo, P.M. Ser migrante: implicações territoriais e existenciais da migração

Mobilidade é parte integrante de nosso dor para a personalidade e a autoidentidade


tempo. A sociedade se volta para os móveis, (SENNET, 2005).
criticando os imóveis. Essa constante mobi- Há cada vez mais migrantes sem redes
lidade gera incertezas, tornando as balizas que estão jogados no espaço metropolitano-
existenciais fluídas e frouxas (BAUMAN, globalizado, territorializando-se nos lugares
2007; GIDDENS, 2002). Se vivemos real- neutros, os quais garantem melhor adapta-
mente num momento em que a mobilidade ção a cada mudança. As redes sociais co-
tornou-se um paradigma para as ciências meçam a se estabelecer a partir de relações
sociais, ou seja, um fundamento da própria puras (GIDDENS, 2002), diminuindo ou até
reprodução social, como o quer Urry (2007), perdendo sua efetiva força territorializadora.
a reflexão sobre a migração tem que avançar No entanto, quais são as consequências de
na mesma medida, incorporando as mais longo prazo deste tipo de identidade territo-
diferentes dimensões e consequências rial? Seria esta substituta daquela ligada à
relacionadas ao fenômeno. Hoje, a migra- casa-natal e ao casulo protetor? Quem está
ção possui muito mais facetas do que as mais exposto a riscos: o migrante metropo-
condicionantes externas ou estruturais. Em litano, que em todo lugar está em sua rede
vista disso, é essencial questionar quais são de lugares, ou aquele menos móvel, que se
as consequências espaciais e existenciais fixa fortemente em seu sistema do lugar?
do ato de migrar. Ao mesmo tempo, as Esta fluidez tem sido tratada de diferen-
tradicionais variáveis demográficas (ciclo tes maneiras: multiterritorialidade, interterri-
vital, gênero e origem) são reveladoras das torialidade, transnacionalismo. O que estas
abordagens têm em comum é a constatação
implicações para os lugares de origem e
de que há necessidade de compreendermos
destino, abrindo uma caixa-preta que pre-
as formas de identidade e territorialização
cisa ser desvelada.
na sociedade contemporânea, que estão
As fronteiras são construídas por cor-
em mutação e não são tão claras quanto no
poreidades, enquanto os valores mantêm
estágio anterior da modernidade.
uma tendência mundializada de difusão.
Nossos territórios hoje são construídos
Comunidades são instituídas e vividas
de muitas maneiras: na fixidez, no movimen-
corporeamente, sendo a base do engaja-
to, na continuidade, na descontinuidade e
mento e do próprio sentido de identidade
em arranjos com escalas espaço-temporais
(AHMED, 1999). As trajetórias ganham muito variadas. Identidade, alteridade, tem-
peso num contexto em que a estrutura do poralidade são temas inerentes à questão do
sistema criou possibilidades de escolha território e das territorialidades atualmente,
(via mercado) de estilos de vida, direções, sendo fundamentais para todo processo
destinos, motivações (VELDE; NAERSSEN, migratório contemporâneo (CLAVAL, 1999).
2007; ASCHER, 1995). Os fluxos clássicos Além disso, estamos constantemente envol-
continuam a existir, mas há muitos outros vidos em várias territorialidades diferentes,
que são orientados por lógicas distintas, difusas e mutantes. A questão que nos
produzindo consequências específicas interessa, pensando nas implicações exis-
tanto para os locais de destino quanto para tenciais e territoriais da migração, é: quais
os de origem. são as consequências desta forma de ser-
Em vista disso, é importante pensar no-mundo para a constituição do ser-lugar?
tanto os móveis quanto os imóveis (BILS- Para caminhar em direção à compreen-
BORROW, et al., 1984; HAESBAERT, 2008). são do que é ser migrante, é fundamental
Por que foi e por que ficou? Estamos em entender estes novos processos de territo-
uma transição de valores entre a virtude rialização e de construção de significados.
de ser imóvel (fixado, apegado às raízes, Se os referenciais identitários se dispersam
tradicional) e ser móvel (desembaraçado, no espaço, as possibilidades podem ser
progressista, moderno) (CRESSWELL, muito maiores de identificação, culminando
2006). Mas o que não se fala são dos riscos numa territorialidade ampla e dispersa. Mas
desta mobilidade e do potencial desagrega- a distância não é exercida sem cobrar seu

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preço. Os riscos dessas novas formas de como sequenciais ou ordenados, ou mesmo


constituição das identidades atingem dire- à ainda prevalência na leitura puramente
tamente o ser, produzindo consequências materialista do território e da territorialidade
existenciais significativas (MARANDOLA (SAHR; SAHR, 2009). A fluidez está nos
Jr., 2008a). Bauman (2007) fala de tremores movimentos, nos sentidos e na própria
existenciais que atingem os mecanismos constituição territorial e do ser, e por isso o
de autoidentidade e que fluidificam as cer- pensar estes fenômenos deve ser no mesmo
tezas. A incerteza, uma marca de qualquer sentido. A dimensão ontológica da migração
vida migrante, é a marca de nossa época, precisa ser investigada em suas implicações
e por isso ser migrante é a experiência de territoriais, contribuindo assim para uma
nosso tempo. perspectiva abrangente e compreensiva da
É necessário, igualmente, refletir sobre migração e da mobilidade.
a multiplicidade de modalidades e proces- Para isso, se mostra necessário avan-
sos migratórios. Uma constelação de moti- çar nas metodologias qualitativas, como as
vos, densidades, direções, temporalidades biografias e a análise das especificidades
e espacialidades configura as migrações e e da diversidade (LECHNER, 2007). Com a
as mobilidades contemporâneas, tornando fluidez contemporânea, métodos que dão
necessário um esforço interdisciplinar para relevo às trajetórias particulares permitem
acompanhar estas mutações. Por outro lado, apreender novos elementos que são re-
as diferentes situações espaciais também levantes no processo, ampliando assim o
precisam ser consideradas. Migrantes em universo de questões e fatores relevantes
espaços urbanos metropolitanos ou em no fenômeno da migração.
pequenas cidades e áreas rurais enfrentarão O desafio que se apresenta aos estudos
condições e desafios diferenciados, relacio- migratórios é avançar teoricamente em suas
nados com a inserção destes lugares nas abordagens, buscando uma compreensão
redes, bem como com a própria especifici- abrangente e multifacetada do fenômeno.
dade das dinâmicas sociais locais. As dimensões territorial e existencial da
Os processos associados a territorializa- migração fazem parte constituinte do fenô-
ção, desterritorialização e reterritorialização meno, e por isso sua reflexão e o avanço
têm sido apontados como essenciais para na sua problematização contribuirão para
compreender estas dinâmicas atualmente. enfrentar as questões que a sociedade tem
No entanto, é necessário prestar atenção colocado sobre a mobilidade no mundo
à tendência de positivar estes movimentos contemporâneo.

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Resumen

Ser emigrante: implicaciones territoriales y existenciales de la emigración

Migración y movilidad son fenómenos constituyentes de la experiencia contemporánea. Estar


en el mundo, hoy, es convivir con la movilidad y la migración, y todas sus implicaciones.
Desde el punto de vista existencial, esta es una experiencia desconcertante, en la que las
referencias espaciales y socioculturales son reconstituidas, en un proceso que involucra y
alcanza la propia esencia de la autoidentidad: la seguridad existencial. Partimos de la pregunta
“¿que es ser emigrante?”, con el objeto de reflexionar sobre las implicaciones existenciales
y territoriales de la emigración, procurando entenderla como fenómeno vivido en diferentes
escalas espacio-temporales, aunque posee, desde el punto de vista fenomenológico, una
misma esencia constitutiva. Este recorrido lleva a un pensamiento ontológico acerca de las
estrategias y consecuencias del fenómeno migratorio, lo que propicia la reflexión sobre el papel

R. bras. Est. Pop., Rio de Janeiro, v. 27, n. 2, p. 407-424, jul./dez. 2010 423
Marandola Jr., E. e Dal Gallo, P.M. Ser migrante: implicações territoriais e existenciais da migração

de la identidad territorial, de la implicación con el lugar y de las redes sociales en el proceso


de salir del lugar de origen y establecerse en un nuevo lugar de destino.
Palabras-clave: Movilidad. Lugar. Seguridad existencial. Fenomenología de la emigración.
Geografía de la población.

Abstract

Being a migrant: territorial and existential implications of migration

Migration and mobility are determining phenomena of contemporary experience. Living in today’s
world means having to deal with mobility and migration, with all the implications this process
involves. From an existential point of view, migration is a disconcerting experience where spatial
and sociocultural references must be reconstituted in a process that shakes up the core of an
individual’s personal identity, namely, his or her existential security. We start off here with the
question of “What is it to be a migrant?” From there, we discuss the existential and territorial
implications of migration and look at it as a phenomenon that is experienced on different spatial
and temporal scales. Phenomenologically, this experience has a single constitutive essence
that leads to an ontological way of thinking about the strategies and consequences of the
phenomenon of migration. This, in turn, leads to a reflection on the role of territorial identity and
on involvement with places and social networks when a person leaves her or his place of origin
and settles down somewhere else, that becomes their place of destination.
Keywords: Mobility. Place. Existential security. Phenomenology of migration. Population
geography.

Recebido para publicação em 01/05/2010


Aceito para publicação em 15/06/2010

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