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JOGOS E BRINCADEIRAS II

CURSOS DE GRADUAÇÃO – EAD


Jogos e Brincadeiras II – Prof.a Márcia Morschbacher e Prof.a Ms. Maria Eliza Gama
Santos.

Meu nome é Márcia Morschbacher, sou graduada em Educação Física – Licenciatura


pela Universidade do Oeste de Santa Catarina (Unoesc), especialista em Educação com
Concentração em Educação Física pela Unoesc, especialista em Educação Física Escolar
pela Universidade Federal de Santa Maria/RS (UFSM) e mestranda em Educação Física
pela Universidade Federal de Pelotas/RS (UFPel). Como Professora de Educação Física,
atuei nos anos iniciais do Ensino Fundamental durante quatro anos, além de participar
durante dois anos nos projetos sociais Programa Segundo Tempo e Programa Esporte e
Lazer da Cidade, em 2005, no município de São Miguel da Boa Vista/SC e em 2009, no
município de Santa Maria/RS, respectivamente.
E-mail: mm.edufisica@yahoo.com.br

Meu nome é Maria Eliza Gama Santos. Sou graduada em Educação Física ­­– Licenciatura
Plena pela Universidade Federal de Santa Maria/RS-UFSM, especialista em Supervisão
Escolar pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, mestre em Educação na linha de
Formação Saberes e Desenvolvimento Profissional pelo programa de pós-graduação
em Educação da UFSM, defendendo dissertação sob o título "Formação Continuada de
Professores e Desenvolvimento Institucional de Escolas Públicas: Avanços, Possibilidades
e Limites", no ano de 2007. Como professora substituta atuei nos cursos de Licenciatura
e Bacharelado em Educação Física da UFSM e, atualmente, sou doutoranda do programa
de pós-graduação em Educação da UFSM.
E-mail: melizagama@yahoo.com.br

Fazemos parte do Claretiano - Rede de Educação


Maria Eliza Gama Santos
Márcia Morschbacher

JOGOS E BRINCADEIRAS II

Batatais
Claretiano
2014
© Ação Educacional Claretiana, 2010 – Batatais (SP)
Versão: ago./2014

796 M859j

Morschbacher, Márcia
Jogos e Brincadeiras II / Márcia Morschbacher, Maria Eliza Gama
Santos – Batatais, SP : Claretiano, 2014.
176 p.

ISBN: 978-85-8377-141-8

1. Lazer. 2. Educação. 3. Escola. 4. Cultura. 5. Aprendizagem.


I. Santos, Maria Eliza Gama. II. Jogos e Brincadeiras II.

CDD 796

Corpo Técnico Editorial do Material Didático Mediacional


Coordenador de Material Didático Mediacional: J. Alves

Preparação Revisão
Aline de Fátima Guedes Cecília Beatriz Alves Teixeira
Camila Maria Nardi Matos Felipe Aleixo
Carolina de Andrade Baviera Filipi Andrade de Deus Silveira
Cátia Aparecida Ribeiro Paulo Roberto F. M. Sposati Ortiz
Dandara Louise Vieira Matavelli Rafael Antonio Morotti
Elaine Aparecida de Lima Moraes Rodrigo Ferreira Daverni
Josiane Marchiori Martins Sônia Galindo Melo
Talita Cristina Bartolomeu
Lidiane Maria Magalini
Vanessa Vergani Machado
Luciana A. Mani Adami
Luciana dos Santos Sançana de Melo
Projeto gráfico, diagramação e capa
Patrícia Alves Veronez Montera Eduardo de Oliveira Azevedo
Raquel Baptista Meneses Frata Joice Cristina Micai
Rosemeire Cristina Astolphi Buzzelli Lúcia Maria de Sousa Ferrão
Simone Rodrigues de Oliveira Luis Antônio Guimarães Toloi
Raphael Fantacini de Oliveira
Bibliotecária Tamires Botta Murakami de Souza
Ana Carolina Guimarães – CRB7: 64/11 Wagner Segato dos Santos

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forma e/ou qualquer meio (eletrônico ou mecânico, incluindo fotocópia, gravação e distribuição na
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autor e da Ação Educacional Claretiana.

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Fone: (16) 3660-1777 – Fax: (16) 3660-1780 – 0800 941 0006
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SUMÁRIO

CADERNO DE REFERÊNCIA DE CONTEÚDO


1 INTRODUÇÃO .................................................................................................... 7
2 ORIENTAÇÕES PARA ESTUDO........................................................................... 9

Unidade 1 – CONTEÚDOS ESCOLARES E A CULTURA: BUSCANDO


CAMINHOS PARA UMA RELAÇÃO PEDAGÓGICA
1 OBJETIVOS......................................................................................................... 23
2 CONTEÚDOS...................................................................................................... 23
3 ORIENTAÇÕES PARA O ESTUDO DA UNIDADE................................................ 24
4 INTRODUÇÃO À UNIDADE................................................................................ 26
5 CULTURA, ESCOLA E TRANSMISSÃO CULTURAL............................................. 27
6 CULTURA, ESCOLA E EDUCAÇÃO FÍSICA: ALGUMAS INTERLOCUÇÕES........ 45
7 TEORIAS PEDAGÓGICAS, CULTURA CORPORAL E CONTEÚDOS
DE ENSINO......................................................................................................... 53
8 CULTURA CORPORAL E OS PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS....... 55
9 QUESTÕES AUTOAVALIATIVAS......................................................................... 56
10 C ONSIDERAÇÕES............................................................................................... 59
11 E-REFERÊNCIAS................................................................................................. 60
12 R EFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS....................................................................... 61

Unidade 2 – LAZER E TRANSMISSÃO CULTURAL NA ESCOLA: JOGOS E


BRINCADEIRAS COMO CONTEÚDOS ESCOLARES
1 OBJETIVOS......................................................................................................... 63
2 CONTEÚDOS...................................................................................................... 63
3 ORIENTAÇÕES PARA O ESTUDO DA UNIDADE................................................ 64
4 INTRODUÇÃO À UNIDADE................................................................................ 65
5 O LAZER NA SOCIEDADE MODERNA: ORIGEM, HISTÓRIA E CONCEITOS
CONTEMPORÂNEOS......................................................................................... 66
6 O LAZER COMO VEÍCULO E COMO OBJETO DE EDUCAÇÃO: UM
DUPLO PROCESSO EDUCATIVO........................................................................ 78
7 LAZER COMO PRÁTICA SOCIAL: CONTEÚDOS PARA A EDUCAÇÃO
FORMAL............................................................................................................. 81
8 EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR E O LAZER: UMA RELAÇÃO NECESSÁRIA........ 88
9 TEXTO COMPLEMENTAR................................................................................... 88
10 O LAZER NOS CONTEXTOS SOCIAIS E AS DEMANDAS EDUCACIONAIS....... 93
11 QUESTÕES AUTOAVALIATIVAS ....................................................................... 98
12 CONSIDERAÇÕES ............................................................................................. 99
13 E-REFERÊNCIAS................................................................................................. 100
14 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS...................................................................... 100
Unidade 3 – A RELAÇÃO DOS CONTEÚDOS ESCOLARES, JOGOS E
BRINCADEIRAS COM O PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO DA
ESCOLA
1 OBJETIVO .......................................................................................................... 103
2 CONTEÚDOS...................................................................................................... 103
3 ORIENTAÇÕES PARA O ESTUDO DA UNIDADE ............................................... 104
4 INTRODUÇÃO À UNIDADE................................................................................ 104
5 LEITURA DO TEXTO SOBRE O PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO................. 105
6 AUTONOMIA DA ESCOLA E OS PRESSUPOSTOS ORIENTADORES
DO PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO............................................................. 113
7 ATIVIDADE PRÁTICA RELACIONADA AOS TEXTOS.......................................... 122
8 QUESTÕES AUTOAVALIATIVAS......................................................................... 131
9 CONSIDERAÇÕES............................................................................................... 132
10 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS...................................................................... 132

Unidade 4 – JOGOS E BRINCADEIRAS COMO CONTEÚDO ESCOLAR: A


PRÁTICA DE SALA DE AULA
1 OBJETIVO........................................................................................................... 133
2 CONTEÚDOS...................................................................................................... 133
3 ORIENTAÇÕES PARA O ESTUDO DA UNIDADE................................................ 133
4 INTRODUÇÃO À UNIDADE................................................................................ 134
5 RESENHA DE TEXTO-BASE................................................................................ 135
6 A EDUCAÇÃO FÍSICA NA ESCOLA: REFLEXÕES, LIMITES E
POSSIBILIDADES PEDAGÓGICAS...................................................................... 157
7 O JOGO DE "CAÇADOR": EXPERIÊNCIAS COM A PRÁTICA PEDAGÓGICA
DA EDUCAÇÃO FÍSICA NA ESCOLA................................................................... 164
8 QUESTÕES AUTOAVALIATIVAS......................................................................... 172
9 CONSIDERAÇÕES............................................................................................... 174
10 E-REFERÊNCIAS ................................................................................................. 175
11 R EFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS....................................................................... 175
Caderno de
Referência de
Conteúdo

CRC

1. INTRODUÇÃO
Seja bem-vindo!
Caro aluno, iniciaremos o estudo de Jogos e Brincadeiras II,
que garante a você, futuro professor, o acesso e a aquisição de
conhecimentos relativos aos jogos e brincadeiras, conteúdos de
ensino presentes nos currículos das escolas de Educação Básica.
Focaremos o estudo sobre a cultura, a relação da cultura
com a seleção e a organização dos conteúdos escolares, o lazer
como prática social e como conteúdo escolar, e a relação dos con-
teúdos escolares com os contextos sociais e com os jogos e brinca-
deiras. Todos esses são elementos importantes para a formação de
cidadãos. Procuramos evidenciar o desenvolvimento cognitivo da
criança, do jovem e do adulto com relação ao movimento corporal,
ao jogo, ao brincar e ao lúdico, levando em consideração sua inser-
ção na cultura corporal da sociedade contemporânea.
8 © Jogos e Brincadeiras II

Também priorizamos, com os temas selecionados, que você,


futuro professor, possa transitar nos diferentes conteúdos peda-
gógicos para a Educação Física escolar, adquirindo competências
próprias para atuar como profissional da educação.
Consideramos fundamental que você, ao final deste estudo,
consiga situar a experiência corporal como um fator de formação
do indivíduo e que compreenda que os jogos e as brincadeiras re-
presentam uma parte significativa dessa formação.
Objetivamos, ainda, levá-lo a compreender, criticamente,
o processo de construção cultural dos conhecimentos relaciona-
dos aos jogos e às brincadeiras, a importância da sua inserção nos
currículos escolares e a vivência com diferentes possibilidades do
trato pedagógico desses conteúdos. Ao apropriar-se de tal conhe-
cimento, você atuará com consciência crítica, entendendo, assim,
a importância de sua função no universo escolar.
Esperamos que você consiga selecionar conteúdos referen-
tes ao tema compondo propostas de ensino para a Educação Bási-
ca, respeitando as diferenças de aprendizagem, associando-os ao
contexto dos alunos, à proposta pedagógica da escola e à proposta
educacional do país.
No Caderno de Referência de Conteúdos (CRC) você encon-
trará as unidades básicas. Elas o ajudarão a compreender a im-
portância dos conhecimentos do lazer e dos jogos e brincadeiras
para a formação de um profissional que atuará como professor na
Educação Básica, subsidiando-o com informações para o planeja-
mento e o desenvolvimento de propostas de ensino na escola.
Na Unidade 1, trataremos da relação da cultura com os con-
teúdos escolares no âmbito da Educação Física escolar, situando os
jogos e as brincadeiras no campo da cultura corporal. Outra abor-
dagem será o estudo das propostas pedagógicas que fundamen-
tam o ensino da Educação Física com o intuito de suscitar reflexões
referentes à atuação pedagógica do professor na escola;
© Caderno de Referência de Conteúdo 9

Na Unidade 2, abordaremos a origem do lazer e como ele


se configura em nossa sociedade contemporânea. Será feita uma
análise dos seus limites e suas possibilidades, determinantes e de-
terminados por esta organização social do lazer como veículo e
objeto de educação (educação pelo lazer e para o lazer, respecti-
vamente). Além disso, veremos os jogos e brincadeiras concebidos
como conteúdos escolares e como componentes do lazer, refle-
tindo acerca das possibilidades de interlocução entre o lazer e a
Educação Física escolar.
Na Unidade 3, discutiremos sobre a relação dos jogos e brin-
cadeiras (conteúdos escolares) com o Projeto Político-Pedagógico
da escola. Serão debatidos: o papel deste documento, como e por
quem ele é elaborado, e quais são os seus pressupostos e as partes
que o compõem.
Por fim, na Unidade 4, aproximando você de modo especial
da realidade escolar, proporemos discussões e atividades cuja ên-
fase dá-se na inserção e na intervenção pedagógica do aluno/futu-
ro professor na escola.
Após essa introdução aos conceitos principais, apresentare-
mos, a seguir, no Tópico Orientações para estudo, algumas orienta-
ções de caráter motivacional, dicas e estratégias de aprendizagem
que poderão facilitar o seu estudo.

2. ORIENTAÇÕES PARA ESTUDO

Abordagem Geral
Aqui, você entrará em contato com os assuntos principais
deste conteúdo de forma breve e geral e terá a oportunidade de
aprofundar essas questões no estudo de cada unidade. No entan-
to, essa Abordagem Geral visa fornecer-lhe o conhecimento básico
necessário a partir do qual você possa construir um referencial te-
órico com base sólida – científica e cultural – para que, no futuro

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10 © Jogos e Brincadeiras II

exercício de sua profissão, você a exerça com competência cogniti-


va, ética e responsabilidade social.
Jogos e Brincadeiras II garante aos acadêmicos, futuros
professores, o acesso e a aquisição de conhecimentos relativos
aos jogos e brincadeiras nos currículos das escolas de Educa-
ção Básica.
Focamos o estudo sobre a cultura, a relação da cultura
com a seleção e organização dos conteúdos escolares, o lazer
como prática social e conteúdo escolar, a relação dos conteú-
dos escolares com os contextos sociais e os jogos e brincadei-
ras, elementos importantes para a formação de cidadãos.
A proposta deste Caderno de Referência de Conteúdo é levar
os acadêmicos a compreender criticamente o processo de constru-
ção cultural dos conhecimentos relacionados aos jogos e às brin-
cadeiras, a importância de suas inserções nos currículos escolares,
bem como vivenciar diferentes possibilidades do trato pedagógico
desses conteúdos.
Os acadêmicos, além disso, terão a possibilidade de compre-
ender a interface entre educação e lazer, situando o lazer sob a
perspectiva do duplo processo educativo que o permeia (a educa-
ção para e pelo lazer), assim como as possibilidades pedagógicas
deste no âmbito da Educação Física Escolar. Ao apropriarem-se de
tal conhecimento, os futuros educadores atuarão com consciência
crítica, compreendendo, assim, a importância de sua função no
universo escolar.
Neste Caderno de Referência de Conteúdo, dentre os temas
a serem estudados, pretendemos aprofundar alguns conceitos in-
dissociáveis da discussão sobre os conteúdos escolares, especial-
mente relacionando-os com o Lazer. Nesse sentido, para atender
a essa demanda, propomos o estudo do lazer e sua inserção no
contexto educacional articulado ao estudo de temas como o con-
ceito de Cultura, Projeto Político-Pedagógico, Conteúdos Escola-
res, Conteúdos Escolares da disciplina de Educação Física, entre
outros, conforme é possível visualizar a seguir.
© Caderno de Referência de Conteúdo 11

Organizamos nosso estudo em quatro unidades, apresenta-


das a seguir, com os objetivos específicos de cada uma delas:
• Unidade 1 – Os Conteúdos Escolares e a Cultura: Buscan-
do Caminhos para uma Relação Pedagógica.
• Unidade 2 – Lazer e Transmissão Cultural na Escola: Jogos
e Brincadeiras como Conteúdos Escolares.
• Unidade 3 – A Relação dos Conteúdos Escolares, Jogos e
Brincadeiras, com o Projeto Político-pedagógico da Escola.
• Unidade 4 – Jogos e Brincadeiras como Conteúdo Escolar:
A Prática de Sala de Aula.

Unidade 1
Nessa unidade, objetivamos que os acadêmicos compreen-
dam a relação dos conteúdos escolares da Educação Física com
a cultura, o papel da escola como instituição formal responsável
pela transmissão cultural e que sejam capazes de situar a cultura
corporal no âmbito das aulas de Educação Física.
Inicialmente, discutiremos a cultura como fonte para a sele-
ção dos conteúdos escolares a partir das ideias trazidas por Jean
Claude Forquin (1993) em seu livro Escola e cultura: as bases so-
ciais e epistemológicas do conhecimento escolar.
Esse texto tem a função primordial de questionar os "pré-
-conceitos" sobre a cultura e apresentar dois pontos de vista dis-
tintos e coexistentes na organização curricular das escolas atuais.
Conhecer e identificar essas diferenças é um passo indispensável
para que se compreenda a organização dos conteúdos escolares
a partir da cultura, especialmente no que se refere à legitimidade
dos jogos e brincadeiras inseridos nas aulas de Educação Física.
Em seguida, discutiremos dois tópicos a partir das ideias de
Valter Bracht, baseando-nos em dois textos. No primeiro, funda-
mentado no artigo Educação Física: conhecimento e especifici-
dade, procuraremos situar a cultura corporal de movimento no

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12 © Jogos e Brincadeiras II

âmbito das aulas de Educação Física; o segundo diz respeito às te-


orias pedagógicas discutidas no artigo "A constituição das teorias
pedagógicas da Educação Física". Nele, o autor propõe a análise
do processo de construção das teorias pedagógicas da Educação
Física no Brasil, demonstrando como se refletem as concepções e
os sentidos de corpo na sociedade atual.
Refletiremos sobre a necessidade de ruptura no que diz res-
peito à visão atual de corpo e conheceremos quais são os desafios
postos à educação/Educação Física escolar. Como ponto prelimi-
nar, podemos considerar que a tematização pedagógica da cultura
corporal de movimento pode contribuir para que essas rupturas se
consubstanciem.
No entanto, é necessário compreender os tópicos anterior-
mente mencionados e que sejamos capazes de nos posicionar e agir
ante os desafios atribuídos à educação/Educação Física escolar.
Por fim, trataremos das proposições, para a organização dos
conteúdos e das práticas escolares, contidas nos Parâmetros Curri-
culares Nacionais para a Educação Física Escolar.

Unidade 2
O objetivo central é permitir que os acadêmicos compreen-
dam que o lazer se constitui em uma prática social estabelecida
em uma parte de nosso patrimônio cultural que deve ser transmi-
tido pela educação formal.
Os conteúdos referem-se ao estudo das questões relaciona-
das à transmissão cultural na escola (os elementos mais signifi-
cativos acumulados historicamente e imprescindíveis à formação
dos sujeitos), ao lazer (concebido como elemento da cultura) e aos
jogos e brincadeiras inseridos no espaço escolar como conteúdos
de ensino da Educação Física.
Trabalharemos, inicialmente, com o texto "As Antinomias
dialéticas do lazer", de autoria de Gustavo Martins Piccolo. Por
meio do texto, os acadêmicos poderão compreender a gênese
© Caderno de Referência de Conteúdo 13

do lazer na sociedade moderna e como alguns autores brasileiros


contemporâneos, que se dedicam ao estudo do lazer, posicionam-
-se sobre o tema.
Como segundo passo, propomos reflexões em relação ao
duplo caráter educativo do lazer ( como veículo e como objeto de
educação), dialogando com Nelson Carvalho Marcellino.
Em seguida, propomos o estudo do texto "Nexos entre e
Educação Física Escolar e o Lazer", no qual Elizara Carolina Marin
aborda alguns conceitos e aponta caminhos para a ligação desta
dimensão cultural com a Educação Física escolar.
No tocante aos conteúdos de ensino da Educação Física es-
colar, os Parâmetros Curriculares Nacionais referentes ao Terceiro
e Quarto Ciclos do Ensino Fundamental servirão de aporte teórico
no sentido de situarmos o lazer no âmbito da Educação Física es-
colar.
Por fim, proporemos uma pesquisa de campo em que você
realizará um levantamento dos espaços e das atividades de lazer
de seu bairro e de sua cidade, analisando criticamente as informa-
ções coletadas. O objetivo é evidenciar a relevância de que você,
futuro professor, conheça as possibilidades (e os limites) dos espa-
ços e das atividades de lazer que caracterizam o seu bairro/cidade.
E, para a melhor compreensão do tema tratado, sugerimos
o texto de Jorge Dorfman Knijnik "A questão do jogo: uma contri-
buição na discussão de conteúdos e objetivos da Educação Física
escolar", publicado na Revista Brasileira de Ciências e Movimento
(em abril de 2001). Essa leitura é complementar, mas pode contri-
buir significativamente para a ampliação de seus conhecimentos
sobre os jogos como conteúdos escolares.

Unidade 3
A Unidade 3 tem como objetivos possibilitar aos acadêmicos
a compreensão das dimensões do contexto escolar, bem como a

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14 © Jogos e Brincadeiras II

utilização do Projeto Político-Pedagógico com a organização e o


desenvolvimento do trabalho escolar, em especial com o planeja-
mento dos conteúdos escolares.
Outra meta é aprofundar os estudos sobre o Projeto Político-
-Pedagógico evidenciando o processo de construção desse docu-
mento e suas funções na organização e desenvolvimento do traba-
lho escolar, além dos conceitos básicos e pressupostos fundantes
que o constituem.
Organizamos esta unidade em etapas que começa com o es-
tudo de um texto cuja abordagem são questões relativas à cultura
escolar e à organização e desenvolvimento do trabalho escolar, so-
bretudo no que se refere ao planejamento.
Nesse texto trataremos sobre o Projeto Político-Pedagógico
(compreendido) como elemento indispensável na construção de um
projeto comum e adequado aos objetivos de ensino de uma dada
comunidade escolar. Será evidenciado o processo de construção
desse documento, suas finalidades na organização e no desenvol-
vimento do trabalho escolar e os conceitos básicos e pressupostos
fundantes que o constituem, de modo que se compreenda o papel e
a importância dele para a instituição e a comunidade escolar.
Evidenciaremos, inclusive, em que momento o Projeto Políti-
co-Pedagógico é legitimado legalmente e em que momento a sua
construção e constante reconstrução passam a se constituir em
demanda às escolas.
Como etapa seguinte, proporemos uma importante tarefa: a
análise de um Projeto Político-Pedagógico de uma escola de Edu-
cação Básica. Essa tarefa possibilitará que os acadêmicos interajam
com o lócus de sua futura atuação profissional e que estabeleçam
diálogos com professores de Educação Física mais experientes.
Essa unidade, assim como as demais está organizada com ati-
vidades para serem realizadas na sequência proposta, pois elas criam
um clima de reflexão favorável para as atividades subsequentes.
© Caderno de Referência de Conteúdo 15

Unidade 4
A quarta unidade objetiva ampliar e aprofundar os conceitos
sobre jogos, abordando a proposta de ensino baseada na praxio-
logia motriz e promover a vivência de situações práticas de sala de
aula. Os acadêmicos farão observações e análises dos conteúdos
e metodologias utilizados, articuladas ao campo teórico estudado
ao longo deste Caderno de Referência de Conteúdo.
Antecedendo a atividade de intervenção pedagógica em
uma escola de Educação Básica, ocorrerá o estudo do texto de
Pere Lavega Burgués, El juego motor y la pedagogía de las conduc-
tas motrices, divulgado em 2007 na Revista Conexões - publicação
da Faculdade de Educação Física da Unicamp. Nessa leitura, dá-se
a discussão em torno dos diferentes autores que se dedicam a es-
tudar o jogo e da praxiologia motriz.
Como segundo ponto, discutiremos acerca de alguns ele-
mentos que consideramos fundamentais para compreender o
atual panorama da Educação Física escolar e os limites e possibi-
lidades desta disciplina curricular no que se refere à tematização
da cultura corporal. Retomaremos tópicos estudados nas unida-
des anteriores, bem como articularemos algumas contribuições do
texto do professor Elenor Kunz Pedagogia do esporte, do movi-
mento humano ou da educação física?.
Por fim, como forma de consubstanciar o processo objeti-
vado e engendrado desde a primeira unidade (inclusive, desde a
correlata e antecedente de Jogos e Brincadeiras I), propomos que
os acadêmicos intervenham pedagogicamente em uma escola de
Educação Básica por meio do ensino dos jogos e brincadeiras em
aulas de Educação Física.
A ideia é propiciar que os acadêmicos articulem conheci-
mentos adquiridos mediante o processo de aprendizagem suscita-
dos neste estudo e as experiências da sua atuação pedagógica na
Educação Física escolar.

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16 © Jogos e Brincadeiras II

Outro ponto que destacamos é a relevância representada


pelo diálogo que se estabelecerá entre os acadêmicos, a escola e o
professor de Educação Física que os acompanhará durante a inter-
venção pedagógica. Esse processo será mediado por incessantes
atividades de reflexão sobre a prática pedagógica desenvolvida.

Glossário de conceitos
O Glossário de Conceitos permite a você uma consulta rápi-
da e precisa das definições conceituais, possibilitando-lhe um bom
domínio dos termos técnico-científicos utilizados na área de co-
nhecimento dos temas tratados em Jogos e Brincadeiras II. Veja, a
seguir, a definição dos principais conceitos:
1) Cultura: conjunto de conhecimentos, instituições, valo-
res e símbolos constituídos, acumulados e transmitidos
ao longo das gerações e que permite que as pessoas
deem sentido e significado às suas ações. Pode-se con-
siderar, conforme Laraia (1992, p. 50) que: "A cultura é
um processo acumulativo, resultante de toda a experi-
ência histórica das gerações anteriores". (LARAIA, Roque
de Barros. Cultura: um conceito antropológico. Rio de
Janeiro: Zahar, 1992.).
2) Lazer: em uma asserção intimamente relacionada com o
conceito hodierno de trabalho e com os contemporâne-
os modos de produção, o lazer compreende a apropria-
ção do tempo do nãotrabalho pelos sujeitos e as formas
como esse tempo é utilizado ("como" e "o que" faz-se
com esse e desse tempo). Marcellino (1987), inclusive,
compreende o lazer como apropriação, construção e vi-
vência de cultura. (MARCELLINO, Nelson Carvalho. Lazer
e Educação. Campinas: Papirus, 1987.).
3) Cultura corporal: abarca as atividades corporais huma-
nas geradas, modificadas e perpetuadas no âmbito da
cultura, que trazem consigo sentidos e significados pro-
venientes do contexto e dos processos sócio-históricos
que as legitimam. Esse conceito possibilita compreender
que as atividades corporais são criadas e modificadas
pela sociedade no decurso social e histórico da história
© Caderno de Referência de Conteúdo 17

humana, avançando, nesse sentido, de uma compreen-


são de atividades corporais dadas e inquestionáveis para
a de construções sociais e históricas, passíveis de ques-
tionamento e de construção e reconstrução.
4) Educação Física escolar: disciplina escolar cuja incum-
bência é a tematização da cultura corporal em conso-
nância com uma intencionalidade pedagógica intrinse-
camente relacionada a determinadas visões de mundo.
Os elementos que compõem a cultura corporal e que
necessitam ser tematizados por esta disciplina são os
jogos, os esportes, as lutas, as danças e as ginásticas.
Para Soares et. al. (1992, p.39): "[...] a materialidade cor-
pórea foi historicamente construída e, portanto, existe
uma cultura corporal, resultado de conhecimentos so-
cialmente produzidos e historicamente acumulados pela
humanidade que necessitam ser retraçados e transmiti-
dos para os alunos da escola". (SOARES, Carmen Lúcia,
et. al. Metodologia do ensino de Educação Física. São
Paulo: Cortez, 1992.).

Esquema dos Conceitos-chave


Para que você tenha uma visão geral dos conceitos mais
importantes deste estudo, apresentamos, a seguir (Figura 1), um
Esquema dos Conceitos-chave. O mais aconselhável é que você
mesmo faça o seu esquema de conceitos-chave ou até mesmo o
seu mapa mental. Esse exercício é uma forma de você construir o
seu conhecimento, ressignificando as informações a partir de suas
próprias percepções.
É importante ressaltar que o propósito desse Esquema dos
Conceitos-chave é representar, de maneira gráfica, as relações en-
tre os conceitos por meio de palavras-chave, partindo dos mais
complexos para os mais simples. Esse recurso pode auxiliar você
na ordenação e na sequenciação hierarquizada dos conteúdos de
ensino.
Com base na teoria de aprendizagem significativa, entende-se
que, por meio da organização das ideias e dos princípios em esque-

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18 © Jogos e Brincadeiras II

mas e mapas mentais, o indivíduo pode construir o seu conhecimen-


to de maneira mais produtiva e obter, assim, ganhos pedagógicos
significativos no seu processo de ensino e aprendizagem.
Aplicado a diversas áreas do ensino e da aprendizagem es-
colar (tais como planejamentos de currículo, sistemas e pesquisas
em Educação), o Esquema dos Conceitos-chave baseia-se, ainda,
na ideia fundamental da Psicologia Cognitiva de Ausubel, que es-
tabelece que a aprendizagem ocorre pela assimilação de novos
conceitos e de proposições na estrutura cognitiva do aluno. Assim,
novas ideias e informações são aprendidas, uma vez que existem
pontos de ancoragem.
Tem-se de destacar que "aprendizagem" não significa, ape-
nas, realizar acréscimos na estrutura cognitiva do aluno; é preci-
so, sobretudo, estabelecer modificações para que ela se configure
como uma aprendizagem significativa. Para isso, é importante con-
siderar as entradas de conhecimento e organizar bem os materiais
de aprendizagem. Além disso, as novas ideias e os novos concei-
tos devem ser potencialmente significativos para o aluno, uma vez
que, ao fixar esses conceitos nas suas já existentes estruturas cog-
nitivas, outros serão também relembrados.
Nessa perspectiva, partindo-se do pressuposto de que é você
o principal agente da construção do próprio conhecimento, por
meio de sua predisposição afetiva e de suas motivações internas
e externas, o Esquema dos Conceitos-chave tem por objetivo tor-
nar significativa a sua aprendizagem, transformando o seu conhe-
cimento sistematizado em conteúdo curricular, ou seja, estabele-
cendo uma relação entre aquilo que você acabou de conhecer com
o que já fazia parte do seu conhecimento de mundo (adaptado do
site disponível em: <http://penta2.ufrgs.br/edutools/mapascon-
ceituais/utilizamapasconceituais.html>. Acesso em: 11 mar. 2010).
© Caderno de Referência de Conteúdo 19

Figura 1 Esquema dos Conceitos-chave do Caderno de Referência de Conteúdo de Jogos e


Brincadeiras II.

Como você pode observar, esse Esquema dá a você, como


dissemos anteriormente, uma visão geral dos conceitos mais im-
portantes deste estudo. Ao segui-lo, você poderá transitar entre
um e outro conceito e descobrir o caminho para construir o seu
processo de ensino-aprendizagem.
Ademais, é possível estabelecer relações entre tais conceitos
e compreender o modo como as unidades deste Caderno de Re-
ferência de Conteúdo foram construídas. Além deste, elaboramos
outros mapas conceituais que estão disponíveis no decorrer das
unidades e que possuem finalidades similares a este.
Com base no Esquema dos Conceitos-chave exposto, conside-
ramos que compreender, por exemplo, as relações entre a cultura
e a escola, bem como entre a cultura corporal e a Educação Física
escolar permitirá a você, futuro professor, organizar e legitimar a sua
atuação pedagógica na escola de modo fundamentado e adequado.

Claretiano - Centro Universitário


20 © Jogos e Brincadeiras II

O Esquema dos Conceitos-chave é mais um dos recursos de


aprendizagem que vem se somar àqueles disponíveis no ambien-
te virtual, por meio de suas ferramentas interativas, bem como
àqueles relacionados às atividades didático-pedagógicas realiza-
das presencialmente no polo. Lembre-se de que você, aluno EaD,
deve valer-se da sua autonomia na construção de seu próprio co-
nhecimento.

Questões autoavaliativas
No final de cada unidade, você encontrará algumas questões
autoavaliativas sobre os conteúdos ali tratados, as quais podem
ser de múltipla escolha, abertas objetivas ou abertas dissertati-
vas.
Responder, discutir e comentar essas questões, bem como
relacioná-las com a prática do ensino de Jogos e Brincadeiras II
pode ser uma forma de você avaliar o seu conhecimento. Assim,
mediante a resolução de questões pertinentes ao assunto tratado,
você estará se preparando para a avaliação final, que será disser-
tativa. Além disso, essa é uma maneira privilegiada de você testar
seus conhecimentos e adquirir uma formação sólida para a sua
prática profissional.

As questões de múltipla escolha são as que têm como respos-


ta apenas uma alternativa correta. Por sua vez, entendem-se por
questões abertas objetivas as que se referem aos conteúdos
matemáticos ou àqueles que exigem uma resposta determinada,
inalterada. Já as questões abertas dissertativas obtêm por res-
posta uma interpretação pessoal sobre o tema tratado; por isso,
normalmente, não há nada relacionado a elas no item Gabarito.
Você pode comentar suas respostas com o seu tutor ou com seus
colegas de turma.

Bibliografia básica
É fundamental que você use a Bibliografia Básica em seus
estudos, mas não se prenda só a ela. Consulte, também, as biblio-
grafias complementares.
© Caderno de Referência de Conteúdo 21

Figuras (ilustrações, quadros...)


Neste material instrucional, as ilustrações fazem parte inte-
grante dos conteúdos, ou seja, elas não são meramente ilustra-
tivas, pois esquematizam e resumem conteúdos explicitados no
texto. Não deixe de observar a relação dessas figuras com os con-
teúdos, pois relacionar aquilo que está no campo visual com o con-
ceitual faz parte de uma boa formação intelectual.

Dicas (motivacionais)
Este estudo convida você a olhar, de forma mais apurada,
a Educação como processo de emancipação do ser humano. É
importante que você se atente às explicações teóricas, práticas e
científicas que estão presentes nos meios de comunicação, bem
como partilhe suas descobertas com seus colegas, pois, ao com-
partilhar com outras pessoas aquilo que você observa, permite-se
descobrir algo que ainda não se conhece, aprendendo a ver e a
notar o que não havia sido percebido antes. Observar é, portanto,
uma capacidade que nos impele à maturidade.
Você, como aluno dos Cursos de Graduação na modalidade
EaD, necessita de uma formação conceitual sólida e consistente.
Para isso, você contará com a ajuda do tutor a distância, do tutor
presencial e, sobretudo, da interação com seus colegas. Sugeri-
mos, pois, que organize bem o seu tempo e realize as atividades
nas datas estipuladas.
É importante, ainda, que você anote as suas reflexões em
seu caderno ou no Bloco de Anotações, pois, no futuro, elas pode-
rão ser utilizadas na elaboração de sua monografia ou de produ-
ções científicas.
Leia os livros da bibliografia indicada, para que você amplie
seus horizontes teóricos. Coteje-os com o material didático, discuta
a unidade com seus colegas e com o tutor e assista às videoaulas.
No final de cada unidade, você encontrará algumas questões
autoavaliativas, que são importantes para a sua análise sobre os
conteúdos desenvolvidos e para saber se estes foram significativos
Claretiano - Centro Universitário
22 © Jogos e Brincadeiras II

para sua formação. Indague, reflita, conteste e construa resenhas,


pois esses procedimentos serão importantes para o seu amadure-
cimento intelectual.
Lembre-se de que o segredo do sucesso em um curso na
modalidade a distância é participar, ou seja, interagir, procurando
sempre cooperar e colaborar com seus colegas e tutores.
Caso precise de auxílio sobre algum assunto relacionado a
este Caderno de Referência de Conteúdo , entre em contato com
seu tutor. Ele estará pronto para ajudar você.
EAD
Conteúdos Escolares e
a Cultura: Buscando

1
Caminhos para uma
Relação Pedagógica

1. OBJETIVOS
• Compreender a relação dos conteúdos escolares da Edu-
cação Física com a cultura, bem como o papel da escola
como instituição formal responsável pela transmissão cul-
tural.
• Situar a cultura corporal como conteúdo escolar no âmbi-
to das aulas de Educação Física.

2. CONTEÚDOS
• Cultura escolar e transmissão cultural: currículo e cultura.
• Cultura, escola e Educação Física: algumas interlocuções.
• As teorias pedagógicas da Educação Física.
• A cultura corporal de movimento e a sua inclusão como
conteúdo de ensino.
24 © Jogos e Brincadeiras II

3. ORIENTAÇÕES PARA O ESTUDO DA UNIDADE


Antes de iniciar o estudo desta unidade, é importante que
você leia as orientações a seguir:
1) Tenha sempre a mão o significado dos conceitos explici-
tados no Glossário e suas ligações pelo Mapa Conceitual
para o estudo de todas as unidades deste CRC. Isso faci-
litará a sua aprendizagem.
2) Leia os livros e artigos da bibliografia indicada para que
você amplie seus horizontes teórico-práticos. Estabele-
ça relações com o material didático deste CRC e procure
discutir a unidade com seus colegas e tutores.
3) Observe que, no decorrer da Unidade, encontram-se su-
gestões de leituras complementares.
4) Busque nos periódicos acadêmico-científicos da área da
Educação Física, artigos que possam auxiliá-lo nos estu-
dos tanto dessa unidade quanto das demais. A constan-
te busca de artigos relativos à temática que estamos es-
tudando revela-se como um importante subsídio ao seu
processo de formação. Uma significativa quantidade de
periódicos acadêmico-científicos encontra-se disponível
on-line; outros, você os encontra em bibliotecas. Sugeri-
mos alguns links:
• Google Acadêmico: Disponível em: <http://scholar.
google.com.br/>. Acesso em: 18 jul. 2011.
• Boletim Brasileiro da Educação Física: Disponível em:
<http://boletimef.org/>. Acesso em: 18 jul. 2011.
• Centro Esportivo Virtual (CEV): Disponível em:
<http://cev.org.br/>. Acesso em: 18 jul. 2011.
5) Realize as atividades seguindo cada passo proposto, sem
esquecer de discutir os temas desta unidade com seus
colegas e tutores.
6) Sugerimos as seguintes leituras para complementar as
discussões acerca da representatividade do movimento
crítico para a Educação Física brasileira, que será trata-
do no tópico "Cultura, Escola e Educação Física: algumas
interlocuções":
© U1– Conteúdos Escolares e a Cultura: Buscando Caminhos para uma Relação Pedagógica 25

• BRACHT, Valter. Educação física: a busca da autono-


mia pedagógica. Revista da Fundação de Esporte e
Turismo, Curitiba, v. 1, n. 2, p. 12-19, 1989. Disponí-
vel em: <http://www.boletimef.org/biblioteca/2350/
Educacao-Fisica-a-busca-da-autonomia-pedagogica>.
Acesso em: 18 jul. 2011.
• CAPARROZ, Francisco Eduardo. Entre a educação físi-
ca na escola e a educação da escola: a educação física
como componente curricular. Vitória: UFES, Centro
de Educação Física e Desportos, 1997.
7) Para saber mais sobre as teorias pedagógicas da Edu-
cação Física, sugerimos a literatura complementar a se-
guir: as referências de Caparroz (1997), Darido e Ran-
gel (2005) e Soares (2003) permitem uma visão geral
acerca das teorias pedagógicas da Educação Física. Os
autores dessas obras procuram apresentar, analisar e
discutir cada uma das teorias, bem como contextualizar
o período histórico e político em que emergem essas te-
orias. Já as referências de Freire (1989), Hildebrandt e
Laging (1986), Kunz (1994), Soares et al. (1992) e Tani et
al. (1988) constituem as fontes primárias das seguintes
teorias pedagógicas da Educação Física, respectivamen-
te: proposta construtivista, proposta de aulas abertas às
experiências, proposta crítico-emancipatória, proposta
crítico-superadora e proposta desenvolvimentista.
a) CAPARROZ, Francisco Eduardo. Entre a educação fí-
sica na escola e a educação da escola: a educação
física como componente curricular. Vitória: UFES,
Centro de Educação Física e Desportos, 1997.
b) DARIDO, Suraya Cristina; RANGEL, Irene Conceição
Andrade. Educação Física na escola: implicações
para a prática pedagógica. Rio de Janeiro: Guanaba-
ra Koogan, 2005.
c) FREIRE, João Batista. Educação de corpo inteiro: teo-
ria e prática da Educação Física. Campinas: Scipione,
1989.

Claretiano - Centro Universitário


26 © Jogos e Brincadeiras II

d) HILDEBRANDT, Reiner; LAGING, Ralf. Concepções


abertas no ensino da Educação Física. Tradução Son-
nhilde von der Heide. Rio de Janeiro: Livro Técnico,
1986.
e) KUNZ, Elenor. Transformação didático-pedagógica
do esporte. Ijuí: Unijuí, 1994.
f) SOARES, Carmen Lúcia. Do corpo, da Educação Física
e das muitas histórias. Movimento, Porto Alegre, v.
9, n. 3, set./dez. 2003, p.125-147.
g) SOARES, Carmen Lúcia et. al. Metodologia do ensino
de Educação Física. São Paulo: Cortez, 1992.
h) TANI, Go; MANOEL, Edison de Jesus; KOKUBUN,
Eduardo, PROENÇA, José Elias de. Educação Física
escolar: fundamentos de uma abordagem desenvol-
vimentista. São Paulo: EPU: Edusp, 1988.

4. INTRODUÇÃO À UNIDADE
Nesta primeira unidade discutiremos, inicialmente, a cultu-
ra como fonte para a seleção dos conteúdos escolares a partir das
ideias trazidas por Jean Claude Forquin (1993), em seu livro Escola e
cultura: as bases sociais e epistemológicas do conhecimento escolar.
Esse texto tem a função primordial de questionar os "pré-
-conceitos" sobre a cultura e apresentar dois pontos de vista dis-
tintos e coexistentes na organização curricular das escolas atuais.
Conhecer e identificar essas diferenças é um passo indispensável
para que se compreenda a organização dos conteúdos escolares a
partir da cultura, especialmente, no que se refere à legitimidade
dos jogos e brincadeiras inseridos como conteúdos de ensino nas
aulas de Educação Física.
Em seguida, discutiremos dois tópicos a partir das ideias de
Valter Bracht (1997; 1999) em dois textos. No primeiro tópico, fun-
damentado no artigo "Educação Física: conhecimento e especifici-
dade" (BRACHT, 1997), procuraremos situar a cultura corporal de
movimento no âmbito das aulas de Educação Física.
© U1– Conteúdos Escolares e a Cultura: Buscando Caminhos para uma Relação Pedagógica 27

O segundo tópico diz respeito às teorias pedagógicas discuti-


das no artigo "A constituição das teorias pedagógicas da Educação
Física" (BRACHT, 1999). Nele, o autor propõe a análise do proces-
so de construção das teorias pedagógicas da Educação Física no
Brasil, demonstrando como se refletem as concepções e os senti-
dos de corpo presentes na sociedade atual. Refletiremos sobre a
necessidade de uma ruptura no que diz respeito à visão atual de
corpo e conheceremos quais são os desafios postos à educação/
Educação Física escolar.
Como ponto preliminar, podemos considerar que a tema-
tização pedagógica da cultura corporal de movimento pode vir a
contribuir para que essas rupturas se consubstanciem. No entanto,
é necessário compreendermos os tópicos anteriormente mencio-
nados e sermos capazes de nos posicionar e agir ante os desafios
atribuídos à Educação/Educação Física escolar.
Além disso, trataremos das proposições, para a organização
dos conteúdos e das práticas escolares, contidas nos Parâmetros
Curriculares Nacionais (PCNs) para a Educação Física escolar.
Esta unidade, assim como as demais, está organizada com
atividades para serem realizadas na sequência proposta, pois cada
atividade objetiva suscitar um clima de reflexão favorável para as
atividades subsequentes.

5. CULTURA, ESCOLA E TRANSMISSÃO CULTURAL


Todos sabemos que nossa memória é repleta de impressões,
concepções e saberes, bens culturais que vamos construindo em
nossa trajetória de vida.
Retomar essas memórias representa um momento especial
para que possamos, de longe, compreender como construímos
nossa compreensão do mundo, da sociedade, das pessoas, das re-
lações, da escola e, também, das diferentes disciplinas que viven-
ciamos em nossa formação escolar.

Claretiano - Centro Universitário


28 © Jogos e Brincadeiras II

Portanto, convidamos você a refletir neste tópico, que tem


como ponto de partida suas memórias acerca da Educação Física
escolar.
Antes da atividade sugerida a seguir, propomos que você se
recorde das aulas de Educação Física em sua vida escolar. Conside-
re alguns tópicos gerais:
1) Como estava organizada a disciplina de Educação Físi-
ca em cada nível de ensino – Educação Infantil, Ensino
Fundamental e Ensino Médio (número de aulas sema-
nais, estrutura física e material disponível, entre outros
aspectos)?
2) Quais eram os conteúdos de ensino trabalhados nas au-
las?
3) Havia a predominância de algum(ns) conteúdo(s) em es-
pecial?
4) "O quê" desse(s) conteúdo(s) era(m) trabalhado(s)?
5) Qual(is) foram as suas experiências mais marcantes nas
aulas de Educação Física?
Elabore, a partir de suas memórias, uma carta que apresen-
te ao seu professor o que você vivenciou nas aulas de Educação
Física. Em especial, procure lembrar-se dos conteúdos relaciona-
dos aos jogos e às brincadeiras, evidenciando os princípios norte-
adores dessas aulas. Todos participavam? Quais eram os principais
objetivos dos jogos e das brincadeiras propostas? Essas vivências
contribuíram para sua decisão de ser professor de Educação Física?
O que você faria igual e o que você, quando se tornar professor,
pretende fazer diferente daquilo que seus professores fizeram?
Observe, na Figura 1, a obra de Ivan Cruz. Esse artista plásti-
co carioca tem se dedicado a retratar as brincadeiras, compondo
uma série de mais de 150 quadros, denominada Brincadeiras de
Criança.
© U1– Conteúdos Escolares e a Cultura: Buscando Caminhos para uma Relação Pedagógica 29

Figura 1 Brincadeiras de Criança, de Ivan Cruz

Agora, reflita sobre as questões a seguir:


• Quais são os fatores que dificultam ou impedem o acesso
das crianças aos jogos e brincadeiras, retratados na obra?
• Qual é, em sua opinião, o objetivo do artista plástico ao
retratar, especificamente, os jogos e as brincadeiras explí-
citos na obra?
• Você identifica na obra, os jogos e as brincadeiras que vi-
venciou em suas aulas de Educação Física? Quais?

Para contextualizar as questões apresentadas mediante a obra


Brincadeiras de Criança de Ivan Cruz, sugerimos o seguinte do-
cumentário: A invenção da Infância de Liliana Sulzbach, produzido
em 2000. Esse documentário auxiliará você a refletir sobre a in-
fância e as distintas realidades vividas pelas crianças brasileiras.
Acesse os seguintes link’s:
- "A invenção da infância" – parte 1. Disponível em: <http://www.
youtube.com/watch?v=02ziUbI7h6U>. Acesso em: 19 set. 2011.
- "A invenção da infância" – parte 2. Disponível em: <http://www.
youtube.com/watch?v=725NIeNN8I0&NR=1>. Acesso em: 19 set.
2011.

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30 © Jogos e Brincadeiras II

- "A invenção da infância" – parte 2. Disponível em: <http://www.


youtube.com/watch?v=vQvx5VucjUs&feature=related>. Acesso
em: 19 set. 2011.

Resenha
Faça a leitura da resenha do livro Escola e Cultura: as bases
sociais e epistemológicas do conhecimento escolar (1993), de Jean
Claude Forquin, uma versão de sua tese de doutorado (defendi-
da em 1987), intitulada "Le débat sur l'école et la culture chez lês
théoriciens et sociologues de l'educaction em Grande-Bretagne",
apresentado pela professora Maria Eliza Gama.
Nessa obra, Jean Claude Forquin, professor de Psycologie,
Sociologie et Sciences de l’Education da Universidade de Rouen,
França, apresenta uma ampla discussão sobre a educação e a cul-
tura, tema a que tem se dedicado desde a década de 1970. Ele
busca evidenciar diferentes conceitos, bem como as implicações
desses conceitos nas formas de seleção e organização dos conte-
údos escolares.
Para este estudo, utilizaremos parte da obra como elemento
deflagrador e esclarecedor de algumas reflexões acerca de nosso
trabalho com conteúdos do lazer para a Educação Básica.
Segundo o autor, as reflexões sobre a função da escola como
instituição responsável por parte da transmissão de valores, ati-
tudes, hábitos, conhecimentos que constituem a cultura, ainda,
necessitam de profundos estudos. Para ele, a função da escola e o
uso do termo cultura ainda não representam um campo absoluta-
mente seguro nas discussões atuais.
O ensino é uma prática social, que deve ser validada aos
olhos de quem ensina e de quem aprende. Atribuir um valor e um
reconhecimento à educação formal é tão difícil como refutá-lo,
quando não se tem total segurança sobre sua existência.
© U1– Conteúdos Escolares e a Cultura: Buscando Caminhos para uma Relação Pedagógica 31

Pode parecer um tanto contraditória a afirmativa anterior,


pois, de maneira geral, parece que já é consenso na sociedade a
função, o papel e a existência da escola.
Contudo, este não é o sentimento majoritariamente presen-
te nos discursos e produções atuais sobre a educação. Temos, sim,
percebido certa insegurança quando se busca justificar a existên-
cia da educação formal, da forma ainda técnica e conteudista que
se apresenta.
Começamos essa reflexão sobre a importância da educação
formal, das escolas e de seus ensinamentos, pensando na relevân-
cia dos conteúdos escolares.
1) Por que são ensinados determinados conteúdos e não
outros?
2) Para que servem os conteúdos que são ensinados para
os alunos?
3) De que maneira a ação dos indivíduos no mundo será
condicionada por esses conteúdos?
4) Será que os alunos precisam ir à escola para aprender?
Esses questionamentos são indissociáveis de uma reflexão
que busque compreender a função social da escola e a relação da-
quilo que se aprende nessas instituições com a cultura e o mundo
exterior. Você já havia refletido sobre essas questões?
Se não, convidamos você a respondê-las, tomando como re-
ferência a sua experiência como aluno da Educação Básica e, tam-
bém, os conhecimentos adquiridos, até então, neste curso.
Na questão número 4, mencionada anteriormente, além de
respondê-la, faça um exercício a mais: procure identificar conteú-
dos da Educação Física que, em sua opinião, os alunos não preci-
sam ir à escola formal para aprendê-los.
Como se pode ver, todo questionamento e crítica sobre a edu-
cação perpassam por um olhar sobre a "natureza dos conteúdos en-
sinados, sua pertinência, sua consistência, sua utilidade, seu interes-
se, seu valor educativo ou cultural", o que representa um ponto de
necessária e profunda reflexão por parte dos professores.

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32 © Jogos e Brincadeiras II

Atualmente, uma condição que indica a crise pela qual passa


a educação é justamente a falta de argumentos para justificar o
que se ensina ao longo dos muitos anos de escolarização das crian-
ças e dos adolescentes.
Atente para a seguinte questão: sob quais argumentos po-
demos justificar o ensino de determinados conteúdos em aulas de
Educação Física ao longo da Educação Básica? Reflita e não a perca
de vista, pois a retomaremos na sequência de nossos estudos.
Com relação a isso, Forquin (1993, p. 9) diz que "esta crise é
demonstrada pela instabilidade dos programas e cursos escolares
constatada atualmente em toda a parte".
Como aponta o autor sobre a instabilidade curricular, tam-
bém se pode apontar o contrário, que é a situação de engessamen-
to absoluto dos currículos escolares que pouco, ou quase nada, se
alteram ao longo dos anos, mesmo diante da constatação de que
nunca antes se testemunhou tamanhas mudanças (sociais, am-
bientais, políticas, econômicas), na forma de vida dos indivíduos.
Podemos dizer que a escola vive um processo de instabili-
dade, ou efetua trocas constantes, e não estabiliza um programa
sobre o que ensinar aos alunos ou mantêm de forma estável, irre-
fletida e relativizada, os conteúdos escolares.
Será que você se perguntou na condição de aluno: "Para que
estou estudando isso?" E, talvez não tenha sido raro escutar dos
professores: "Um dia você vai saber!" Será que saber da impor-
tância e da relevância do que está sendo ensinado não é condição
básica para que a aprendizagem aconteça?
Para Forquin (1993, p. 10), "não se sabe mais o que verda-
deiramente merece ser ensinado a título de estudos gerais: o dis-
curso dos saberes formadores [...] perdeu seu equilíbrio; a cultura
geral perdeu sua forma e sua substância".
O autor defende que os anos de 1970 foram marcados por
um "discurso de deslegitimação", ou seja, perdeu-se o rumo dos
© U1– Conteúdos Escolares e a Cultura: Buscando Caminhos para uma Relação Pedagógica 33

princípios norteadores da construção social. Nos anos de 1980,


manteve-se o "discurso da restauração", que não extrapolou o ní-
vel do ressentimento e das queixas daqueles que fizeram a crítica
sobre esse processo de educação irrefletido e neutro.
As mudanças do mundo moderno advindas das novas for-
mas de organização política e, principalmente, econômica, fazem
crescer a valorização pelo consumo, pela troca e pelo imediatismo.
Para o autor, passa a reinar um "instrumentalismo estrito", os dis-
cursos da adaptação e da utilização momentânea, ao passo que
questões fundamentais, que dizem respeito à relevância da escola,
são sufocadas ou ignoradas.
A adaptação foi e ainda é uma função posta no alvo das críti-
cas sobre educação. Isso porque nos anos de 1980, quando se res-
salta o caráter político e social da educação e da escola, alerta-se
para a necessidade de uma formação escolar para a transformação
e não apenas para a mera adaptação a uma sociedade. É cobrado
da educação seu papel de formadora de indivíduos críticos e aptos
para uma atuação consciente e ativa na sociedade.
Essa ideia origina-se mais precisamente na década de 1980,
com a propagação da crítica à educação técnica, neutra e dissocia-
da das questões sociais existentes até então.
Percebe-se, nesse período, a manifestação de um sentimen-
to que ressalta o viés político das práticas pedagógicas e o com-
promisso dos professores com a formação de alunos para atuar na
sociedade.
A função social da escola, que já vinha lentamente sendo
questionada, desponta como principal foco de discussão e crítica
no campo científico e das políticas públicas.
Para Pereira (2000, p. 27), "a prática educativa deveria ser,
então, necessariamente vinculada a uma prática social global", ou
seja, os saberes a serem ensinados aos alunos deveriam possibili-
tar a inserção social.

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34 © Jogos e Brincadeiras II

Isso influencia diretamente a formação dos professores,


que, a partir de então, devem priorizar a construção da consciên-
cia sobre a função social da escola e seu papel transformador da
sociedade. Contudo, podemos salientar que, apesar do discurso
político sobre a função social que a educação deveria assumir, na
prática, isso não ocorreu.
De acordo com Oliveira, a função política da educação, nesse
caso, processa-se só no "dizer", mas não no "fazer", ou melhor di-
zendo, o "fazer" da função política da educação se reduziu ao mo-
mento de "dizer". O fazer pedagógico propriamente dito permane-
ceu quase que inalterado (OLIVEIRA apud PEREIRA, 2000, p. 32).
A falta de mudanças consubstanciais nas práticas educativas,
de maneira geral, pode ser observada nas formas de organização
e realização dos processos de formação inicial de professores e de
formação continuada de professores em serviço, que, ainda, per-
petuam características colocadas como obstáculos para a melhoria
destes processos.
Destacamos, como marcas desses processos, a separação
entre a formação teórica e a formação prática, que surge de uma
visão dicotômica associada ao "modelo da racionalidade técnica",
no qual a ação se dá pela aplicação de teorias e técnicas. Essa con-
cepção de formação pauta-se na ideia de que o conhecimento prá-
tico é aprendido a posteriori dos conhecimentos teóricos, ou seja,
a prática é o momento de aplicação das teorias. Tal característica
representa um dos principais entraves do campo educacional, po-
rém, ainda, não foram encontrados mecanismos viáveis e eficazes
para a sua superação.
Como ilustração do "modelo da racionalidade técnica" na
formação de professores, citamos o, popularmente, conhecido
"formato 3 + 1" dos cursos de licenciatura: dos quatro anos de
formação, preconizavam-se três anos para a formação "teórica"
na área específica (Educação Física, Biologia, Matemática, entre
outras) e nas poucas disciplinas de caráter didático-pedagógico
© U1– Conteúdos Escolares e a Cultura: Buscando Caminhos para uma Relação Pedagógica 35

(quando essas estavam contempladas), que compunham os currí-


culos desses cursos, e mais um ano para a "prática", consubstan-
ciados nos estágios curriculares supervisionados.
Forquin (1993) chama a atenção para duas questões prepon-
derantes na discussão do papel da escola como transmissora da
cultura, ou melhor, de conhecimentos extraídos da cultura.
A primeira é a existência de uma mudança visível na cultu-
ra, que vem absorvendo rapidamente as características do mundo
moderno e se desligando dos princípios que serviram de base para
a constituição da sociedade atual, sem que haja tempo para se
estabilizar e se tornar duradouro.
A cultura passa por um processo de instabilidade, muda e
absorve novos princípios, hábitos e valores tão rapidamente que
pode ser definida como pletórica e inconsistente.
A segunda questão, que é decorrente da primeira, é o desa-
fio que essa situação coloca à escola quando tem de definir o que
ensinar, se a cultura que representa o campo para a escolha dos
conhecimentos escolares encontra-se como um terreno movediço.
Queremos ressaltar que, apesar de todas as inseguranças,
dúvidas e questionamentos existentes, a escola continua tendo a
função de transmitir a cultura, isto é, aquilo que representa o in-
dispensável para uma atuação social, seja para manter e preservar,
seja para transformar.
Assim, o pensamento pedagógico, em uma situação parado-
xal, não pode dispensar a ideia de cultura, mas também não pode
utilizar o termo como dotado de um único conceito claro e opera-
tório.
Como podemos ver, tratar do termo "cultura" no contexto
educacional é uma tarefa complexa que requer cuidado para que
seu sentido não seja banalizado ou reduzido a simplificações sus-
tentadas mais pelo senso comum do que pelo campo científico.

Claretiano - Centro Universitário


36 © Jogos e Brincadeiras II

A seguir, discutiremos um pouco sobre a Educação como


mecanismo que reflete e que transmite a cultura. Sugerimos que,
antes da leitura, você escreva um pequeno parágrafo sobre seu
entendimento inicial do tema em destaque.
Para aprofundarmos essas duas assertivas da educação,
como reflexo e como transmissora da cultura, faremos uma distin-
ção entre Educação e Educação Formal.
Você já deve ter ouvido esses termos. Pense, por alguns se-
gundos, quais seriam as diferenças entre essas duas formas de
educar. Conseguiu identificar as diferenças existentes entre elas?
E exemplos?
Entendemos a Educação como todo processo de formação
e socialização dos indivíduos na sociedade, seus hábitos, valores,
conhecimentos que acontecem de forma espontânea e por meio
do convívio e interação social.
Enquanto interagimos com nossos familiares, desde o nos-
so nascimento, estamos em um processo de aquisição e apren-
dizagem dos símbolos que estão à nossa volta. A formação tem a
função de dar condições para agir sobre determinadas situações,
ensinar a fazer algo, em algum lugar e em um determinado tempo,
não necessariamente planejados (SANTOS, 2007).
Já a Educação Formal é entendida como processos planeja-
dos, carregados de intencionalidade, que se desenvolvem em ins-
tituições criadas e organizadas para o ensino e constituídas por
profissionais "formados" para atuarem nesses processos. Estes,
demandam a organização e a produção de saberes próprios, tanto
para quem ensina como para quem aprende, de técnicas e de me-
todologias adequadas.
Esse ensino não se dá de forma espontânea. Ao contrário, é
uma ação deliberada, com a definição prévia de objetivos, meios
e fins, dos quais tanto quem forma como quem se forma devem
tomar conhecimento.
© U1– Conteúdos Escolares e a Cultura: Buscando Caminhos para uma Relação Pedagógica 37

Associando a formação à ideia de mudanças intencionalmen-


te planejadas, além do componente pessoal considerado determi-
nante das formas de aceitação e desenvolvimento da formação,
há, também, os componentes: conhecimento e ações e métodos
de formação, sem os quais a educação não se processa.
Assim, teríamos as propostas de formação pautadas na exis-
tência de três componentes:
• "pessoal" – quem formar? A formação acontece median-
te a vontade e a consciência do formando. O indivíduo é,
em último caso, o principal responsável pela sua forma-
ção;
• "conhecimento" – para que formar? Toda a formação
está, implícita ou explicitamente, relacionada a mudanças
em algum contexto. Logo, faz-se necessária a aquisição
de novos conhecimentos, que resultem em mudanças nas
práticas e nas atitudes dos professores frente às situações
de trabalho;
• "métodos e ações de formação" – como formar? Esse
componente está relacionado ao conjunto de ações e ati-
vidades organizadas e planejadas para que a formação se
processe.
As duas formas de educação têm como consequência a
transmissão dos bens culturais, contudo, a forma como esses bens
são tratados no processo educativo representa o principal ponto
de divergência entre elas.
Você já refletiu sobre a seguinte questão: Em que momento
da história a educação não formal e a educação formal diferen-
ciam-se? Ou, ainda, por que os seres humanos sentem a neces-
sidade de "criar" espaços e tempos específicos para um tipo de
educação sistemático e intencional?
Libâneo (1998), em linhas gerais, fornece-nos as seguintes ba-
ses teóricas para a compreensão dessa questão: o desenvolvimen-

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38 © Jogos e Brincadeiras II

to individual e coletivo (sociedade) dos sujeitos ocorre mediante a


atividade humana prática sobre o meio natural e social (trabalho),
atividade essa que implica a "[...] assimilação (aprendizagem) da ex-
periência humana historicamente acumulada e culturalmente orga-
nizada" (LIBÂNEO, 1998, p. 132). Isso significa que os seres humanos,
ao atuar consciente e objetivamente sobre o meio, transformando a
natureza e o meio social, transformam a si próprios.
À medida que esse processo se complexifica, ou seja, à me-
dida que os sujeitos criam, produzem e transformam objetos, ins-
trumentos de trabalho, conhecimentos, modos de ação, técnicas,
valores, dentre outros elementos, os meios de educação não for-
mal (a oralidade, a imitação e as experiências práticas, por exem-
plo) não são mais suficientes para atender às demandas colocadas
à inserção dos sujeitos na sociedade. É no momento em que a cul-
tura, a experiência humana, historicamente acumulada, necessita
ser comunicada às novas gerações é que os grupos sociais organi-
zam ações educativas intencionais com o propósito de inserir os
indivíduos no meio culturalmente organizado (LIBÂNEO, 1998).
Não podemos perder de vista a seguinte evidência: a finali-
dade da educação formal mencionada por Libâneo (1998) (a ne-
cessidade de inserção das novas gerações à sociedade) não traz
em si, a priori, intenções emancipatórias. Conforme mencionado
anteriormente, a educação coloca-se em constante tensão entre
a transformação e a adaptação/manutenção do status quo social.
Essa questão será discutida nas unidades subsequentes.
Agora conversaremos um pouco sobre cultura e alguns con-
ceitos comumente aceitos tanto nos espaços sociais como acadê-
micos. Para iniciarmos o assunto, vamos nos arriscar um pouco e
escrever um breve parágrafo sobre o que entendemos por cultura.
A cultura é algo que precede a existência de cada indivíduo,
que o institui na condição de sujeito humano. É um conjunto de
hábitos, valores, símbolos, conhecimentos, etc., construídos his-
toricamente.
© U1– Conteúdos Escolares e a Cultura: Buscando Caminhos para uma Relação Pedagógica 39

A partir do momento em que os homens passaram a produ-


zir os aparatos culturais para sua sobrevivência, passou a existir um
mundo paralelo ao natural e, aos poucos, fomos nos apropriando
e condicionando a nossa existência a esse aparato.
A esse processo de transformação e adaptação às novas re-
formulações chamamos de "humanização", ou seja, é a adaptação
a tudo o que foi produzido pela espécie humana e que hoje se faz
indispensável para sua sobrevivência.
Logo, podemos dizer que cultura, em um primeiro momen-
to, é tudo o que foi construído pelo homem para garantir a sua so-
brevivência. Em uma segunda cena do processo evolutivo, pode-
mos dizer que a produção da cultura deixou de ser impulsionada
pela sobrevivência e passou a ser impulsionada (fortemente) pelo
prazer, o prazer de ter (tudo o que for possível e estiver disponível
para o consumo humano).
Para Forquin (1993, p. 11), há dois empregos nas interpreta-
ções e/ou referências sobre o tema "cultura". Um deles é quando
a cultura é vista como característica de um "espírito cultivado",
como atribuir para uma pessoa considerada sábia e de:
[...] posse de um amplo leque de conhecimentos e de competên-
cias cognitivas gerais, a uma capacidade de avaliação inteligente e
de julgamento pessoal em matéria intelectual e artística, um senso
de profundidade temporal das realizações humanas e do poder de
escapar do mero presente .

É esse conceito que sustenta a expressão "esta pessoa é mui-


to culta", quando se quer adjetivar alguém que detém conheci-
mentos sobre as artes, a ciência, a música etc.
Como forma de relativizar essa interpretação da cultura e
de submetê-la à crítica, perguntaríamos: Então, as tribos e socie-
dades que ainda não tiveram acesso ao mundo do conhecimento
científico sistematizado, das artes, da literatura, da música, etc.,
(normalmente presente nas sociedades urbanas) não possuem
cultura?

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40 © Jogos e Brincadeiras II

Cabe, ainda, perguntar: haveria uma "escala de cultura" para


determinar quem tem cultura (ou é mais culto) e quem, suposta-
mente, não teria? Sob quais parâmetros?
Com base nessas questões, observe as Figuras 2 e 3 e reflita.

Figura 2 Mona Lisa, obra de Leonardo Da Vinci, de 1503


© U1– Conteúdos Escolares e a Cultura: Buscando Caminhos para uma Relação Pedagógica 41

Figura 3 Folguedo Nordestino, obra de Militão dos Santos

Você deve ter identificado sem dificuldades a primeira ima-


gem: o nome da obra e o seu autor, sem mesmo reportar-se à le-
genda. Trata-se da Mona Lisa (ou La Gioconda), de Leonardo da
Vinci, obra do século 16. E a segunda, você identificou-a com a
mesma facilidade da anterior?
Nesse momento, cabem outras perguntas: para além da
identificação das obras, que outros elementos as compõem do
ponto de vista teórico-conceitual? Você identifica esses elemen-
tos? É suficiente conhecer e/ou ser capaz de identificar determi-
nadas obras de arte, por exemplo, para interagirmos com essa di-
mensão da cultura?
Analisemos, portanto, as seguintes questões que se referem
às duas obras apresentadas:

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42 © Jogos e Brincadeiras II

• Quais são os períodos históricos e os traços das socieda-


des em que cada obra é produzida e o que elas procuram
representar?
• As diferenças observadas, em termos de cores, vestimen-
tas, posturas, a relação da imagem central com o fundo
(entre outros aspectos), podem estar relacionadas a es-
ses períodos?
Façamos algumas considerações sobre cada uma das obras.
Mona Lisa é produzida por Leonardo Da Vinci no século 16,
período que marca o Renascimento (período considerado como a
transição do mundo medieval para o moderno). Uma de suas ca-
racterísticas é a intensa produção artística e científica (que rompe,
gradativamente, com a Idade Média, período no qual os dogmas
católicos restringiam, consideravelmente, as produções nesses
âmbitos).
É importante, inclusive, nos reportarmos às características
do Renascimento, entre as quais: a valorização da cultura greco-
-romana (marginalizada no período da Idade Média), o antropo-
centrismo, a crença na razão e na possibilidade de que a natureza
possa ser estudada mediante essa razão – origem da ciência.
Em Folguedo Nordestino, Militão dos Santos procura repre-
sentar o nordeste brasileiro por meio de figuras representativas
de sua cultura, como o cangaceiro, o folguedo e a utilização de
cores intensas. Observe, por exemplo, as casas ao fundo: Como
são essas casas? O que sugere a presença do cacto junto às demais
árvores? Reflita sobre esses apontamentos.
Embora tenhamos mencionado somente o período histórico
ao qual Mona Lisa se refere e alguns elementos de Folguedo Nor-
destino que caracterizam o nordeste brasileiro, podemos concluir
que a interação com as diversas dimensões da cultura transcen-
dem o mero contato com elas. Para além disso, coloca-se como
imprescindível conhecer "o quê" e "a quê" as obras se referem, do
ponto de vista social e histórico.
© U1– Conteúdos Escolares e a Cultura: Buscando Caminhos para uma Relação Pedagógica 43

A outra interpretação comumente aceita e presente nos dis-


cursos educacionais é entender a cultura como "um conjunto de
traços característicos do modo de vida de uma sociedade, de uma
comunidade ou de um grupo" (FORQUIN, 1993, p. 11), que podem
ser entendidos como os aspectos mais cotidianos e triviais.
Para o autor, essas duas acepções sobre a cultura possuem
suas limitações quando se fala em educação escolar (formal) e
transmissão cultural. A primeira por ser tradicional, individual,
normativa, "promocional", demasiada "perfectiva" é unilateral,
enquanto a segunda fica no nível descritivo e é redutiva a espaços
únicos.
Para falar em "transmissão cultural", o autor propõe algo
que seja menos restritivo que a primeira e menos global que a
segunda. Olhar a cultura com fins educativos implica um esforço
com o objetivo de identificar no aparato cultural existente o que
é útil e indispensável para os indivíduos. Ou seja, nem tudo o que
existe de disponível na cultura tem o mesmo valor. Segundo For-
quin, 1993, p. 12:
[...] certos aspectos da cultura são reconhecidos como podendo e
devendo dar lugar a uma transmissão deliberada e mais ou menos
institucionalizada, enquanto que outros constituem objeto apenas
de aprendizagens informais, até mesmo ocultas, e, outros, enfim,
não sobrevivem ao envelhecimento das gerações e não conseguem
deixar marcas no tempo .

Logo, cabe-nos questionar: O que significa cultura quando se


fala da função de transmissão cultural da educação?
Podemos assumir como um dos possíveis significados o de
um patrimônio de conhecimentos e de competências, de institui-
ções, de valores e de símbolos, constituído ao longo das gerações
e característico de uma comunidade humana particular, definida
de modo mais ou menos amplo e mais ou menos exclusivo (idem,
p. 12).

A cultura é produto de um processo perpétuo de seleção e


decantação, sendo, ao mesmo tempo, suporte e obra de memória.

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44 © Jogos e Brincadeiras II

Essa interpretação da cultura distingue-se das outras duas,


mas não as exclui, ao contrário, elas existem como parte do con-
junto que compõe de forma majoritária a cultura.
Diante dessas reflexões sobre cultura, cabe um questiona-
mento: sendo a cultura uma herança coletiva, um patrimônio in-
telectual e espiritual, ela pode ficar dentro das fronteiras de uma
nação ou de comunidades particulares?
Com relação a isso, Forquin (1993) ressalta que para pen-
sar em "transmissão cultural" deve-se abrir espaço para discutir
a existência de uma "noção universalista e unitária de cultura hu-
mana". Isto é, a ideia de que o essencial daquilo que a educação
transmite (ou deve transmitir) sempre, e por toda a parte, trans-
cende necessariamente as fronteiras entre os grupos humanos e
os particularismos mentais e advém de uma memória comum e de
um destino comum a toda a humanidade.
Essas reflexões, em nosso entendimento, são cruciais para
que se elaborem propostas educativas vinculadas ao mundo e às
questões sociais atuais.
Logo, devemos assumir para nós, educadores, o desafio de
definir, com base no nosso campo científico e cultural de conhe-
cimentos, o que representam os valores, atitudes, conhecimentos
que devem ser perpetuados, atualizados e/ou modificados e des-
cartados; o que, do campo dos conhecimentos da Educação Física,
deve compor o patrimônio cultural da humanidade.
Forquin (1993, p. 13) cita Hannah Arendt para fazer uso das
ideias da autora sobre as implicações educativas do que ela chama
de "a natalidade". Ou seja, o nascimento de seres humanos em um
mundo que preexiste a eles e no qual os mais experientes têm a
função de introduzi-los e acolhê-los como sucessores.
A relação da cultura com a educação condensa-se pela ne-
cessidade de ter que transmitir e perpetuar a experiência huma-
na considerada como cultura. Essa experiência não deve ser vista
© U1– Conteúdos Escolares e a Cultura: Buscando Caminhos para uma Relação Pedagógica 45

como o somatório de todo o vivido, mas, sim, como o que acedeu


a uma existência pública, comunicável, memorável e que se coloca
como conhecimento imprescindível às novas gerações. Adotamos,
para finalizar esta etapa do estudo, a definição de Hannah Arent,
que consideramos uma forma brilhante de se referir aos processos
educativos. A autora afirma que a educação consiste em inserir
os novos membros de uma geração em um mundo que eles não
conhecem e que terão que habitar por algum tempo.
Concluímos que são conhecimentos básicos para nossa atua-
ção conhecer e compreender o que constitui o patrimônio cultural
da humanidade e, em especial e com profundidade, o que cabe
a nossa área de conhecimento, para que dele possamos extrair e
selecionar o que se considera como o preservável, o valorado, o
necessário para a existência humana.

6. CULTURA, ESCOLA E EDUCAÇÃO FÍSICA: ALGUMAS


INTERLOCUÇÕES
Considerando os aportes teórico-conceituais de Forquin
(1993) e algumas aproximações com a Educação Física propostas
no decurso do texto, consideramos necessário apresentar (e sus-
citar reflexões) acerca das interlocuções entre a cultura, a escola e
a Educação Física.
Se há certo consenso de que a função social da escola é a
transmissão de valores, atitudes, hábitos e conhecimentos que
constituem a cultura, como a Educação Física atua de modo a
atender essa demanda? A promoção da aptidão física, incumbên-
cia que, historicamente, tem legitimado a Educação Física na esco-
la, é plausível?
Procure retomar as reflexões oriundas da questão ante-
riormente proposta: sob quais argumentos podemos justificar o
ensino de determinados conteúdos em aulas de Educação Física
ao longo da Educação Básica? Esperamos que você seja capaz de

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46 © Jogos e Brincadeiras II

argumentar em prol de uma resposta, ainda que provisória, em


relação a esta questão, ao final desta unidade.
Com base nessas questões, apresentamos a resenha do ar-
tigo "Educação Física: conhecimento e especificidade", de Valter
Bracht (1997), produzido pela professora Márcia Morschbacher. O
professor Valter Bracht é doutor pela Universidade de Oldenburg,
Alemanha e autor dos livros Educação física e aprendizagem social
e Educação física & ciência: cenas de um casamento infeliz, entre
outros. Atualmente é professor titular do Centro de Educação Fí-
sica e Desportos da Universidade Federal do Espírito Santo, onde
coordena o Laboratório de Estudos em Educação Física (LESEF).

Educação Física: conhecimento e especificidade


Bracht (1997) inicia as suas considerações, mencionando
que a função/atribuição da Educação Física é a transmissão/tema-
tização e/ou realização de um saber específico.
Nesse sentido, tendo em vista esse pressuposto, o autor in-
tenta possibilitar elementos que possam subsidiar-nos a compre-
ender qual é/seria esse saber específico.
Bracht esclarece, ainda, que a Educação Física padece de
certa crise de identidade em relação ao "que" seria esse "saber
específico" de que trata esta disciplina curricular.
É possível estabelecer relações entre essa crise ao processo
de constituição histórica da Educação Física em nosso país, con-
siderando como marco as mudanças epistemológicas e didático-
-pedagógicas suscitadas a partir da década de 1980.
É a partir desse período que a Educação Física, até então ba-
seada em intervenções pautadas na melhoria da performance, é
questionada por um movimento acadêmico conhecido por "Movi-
mento Crítico" da Educação Física quanto ao seu papel social, na
medida em que esta estaria legitimando em seu interior determi-
nada lógica social.
© U1– Conteúdos Escolares e a Cultura: Buscando Caminhos para uma Relação Pedagógica 47

Para compreendermos a representatividade do "Movimento


Crítico" da Educação Física, apresentamos, a seguir, um breve tex-
to tratando da história da Educação Física brasileira, com o objeti-
vo de situar seus estudos subsequentes.

A história da Educação Física–––––––––––––––––––––––––––


A inserção da Educação Física como componente obrigatório dos currículos das
escolas, na década de 1930, referiu-se à inclusão da ginástica a partir da elabo-
ração de uma especificidade desta para a escola (SOARES, 1996) com finalida-
des higienistas e eugenistas.
Com a transição de uma sociedade de economia agroexportadora para urbano-
-industrial, novas exigências incidiram sobre o processo de legitimação da Edu-
cação Física na escola: a finalidade de formação de mão de obra apta fisicamen-
te e ideologicamente ao trabalho (CASTELLANI FILHO, 2007). Com o decurso
da Segunda Guerra Mundial o esporte adquiriu notoriedade no âmbito da Educa-
ção Física. Esta passa a utilizar-se do esporte de modo inequívoco em sua ma-
nifestação massificada e hegemônica de rendimento, adotando como diretrizes
os códigos desta instituição.
Ao final da década de 1970 e início da de 1980, com o processo de "redemocra-
tização" da sociedade brasileira, fortaleceram-se os movimentos que manifes-
tavam seu descontentamento em relação ao autoritarismo presente no referido
governo (CAPARROZ, 1997).
À Educação Física escolar, especificamente, insurgiu um processo de politização
do seu debate acadêmico, de modo que este componente curricular passou a ser
denunciado e questionado, considerando pressupostos políticos e sociológicos,
sobretudo, de orientação marxista, quanto à sua função de legitimação do sta-
tus quo capitalista (CAPARROZ; BRACHT, 2007). Este processo de politização
constitui o que denominamos de "Movimento Crítico".
Este movimento, inicialmente, dirige veementes críticas e denúncias acerca da
função político-ideológica à qual Educação Física na escola colocava-se a ser-
viço. Sobretudo a partir da década de 1990, adentrou-se um segundo momento
marcado pela necessidade de extrapolar este âmbito e voltar-se à transformação
da prática pedagógica concreta, visto que, se assim não se procedesse, as crí-
ticas do movimento crítico esvaziar-se-iam em mero denuncismo (CAPARROZ;
BRACHT, 2007). É neste processo, que serão elaboradas as propostas/aborda-
gens críticas para o ensino de Educação Física. (Esta é a temática que tratare-
mos na sequência, com o próximo texto de Bracht (1999) "A constituição das
teorias pedagógicas da Educação Física".
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
Realizada a delimitação em relação ao objetivo de suas análi-
ses, Bracht (1997) identifica três interpretações desse "saber" pró-
prio da Educação Física (ou a sua especificidade):

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48 © Jogos e Brincadeiras II

• a atividade física, em alguns casos atividades físico-des-


portivas e recreativas;
• o movimento humano ou movimento corporal huma-
no, motricidade humana ou, ainda, movimento humano
consciente;
• e a cultura corporal de movimento.
Dentre essas expressões-chave, Bracht (1997, p. 14) afirma,
de antemão, que pretende defender a ideia de que: "[...] para a
configuração do saber específico da Educação Física devemos re-
correr ao conceito de cultura corporal de movimento".
Ademais, ele esclarece que a definição do saber próprio da
Educação Física está intrinsecamente relacionada com a função ou
com o papel social a ela atribuído e determina o tipo de conhe-
cimento buscado para sua fundamentação. Em nota, adverte o
autor que:
Aqui estamos em uma via de mão dupla: a função atribuída à Edu-
cação Física determina o tipo de conhecimento buscado para fun-
damentá-la, e o tipo de conhecimento predominante sobre o cor-
po/movimento humano determina a função atribuída à Educação
Física. No entanto, nem um nem outro são autoexplicativos: eles
precisam ser analisados integradamente como componentes de
um movimento mais geral e complexo da sociedade (1997, p. 14).

Observe, na Figura 4, o esquema que elaboramos para subsi-


diar a sua compreensão acerca dessa complexa relação explicitada
por Bracht (1997):
© U1– Conteúdos Escolares e a Cultura: Buscando Caminhos para uma Relação Pedagógica 49

Figura 4 Esquema demonstrativo das relações entre o tipo de conhecimento que fundamenta
a Educação Física, as expectativas sociais dirigidas a essa área e o seu conhecimento
específico.

Atividade física, movimento humano ou cultura corporal de


movimento? Afinal, qual é a especificidade da Educação Física?
Nesta subseção, apresentaremos as discussões realizadas
por Bracht (1997) em torno da especificidade da Educação Física,
ou seja, aquilo que lhe caracteriza e/ou legitima como disciplina
escolar (e que, por conseguinte, justificam a presença dos jogos
e das brincadeiras como conteúdos de ensino da Educação Física
na escola). Compreender esta questão nos possibilita situar nossa
atuação no âmbito da escola com base em pressupostos diferentes
e, em certa medida, mais coerentes com a Educação Física escolar.
Os termos atividade física e exercícios físicos remetem à
ideia de que o papel da Educação Física seria o de contribuir para
o desenvolvimento da aptidão física considerando o arcabouço te-
órico-conceitual das disciplinas científicas das Ciências Biológicas.
Tem-se como pressuposto básico a lógica do "exercitar-se para":
"[...] exercitar-se para melhorar a saúde, exercitar-se para formar
o caráter, exercitar-se para o desenvolvimento do homem integral,
exercitar-se para" (GONZÁLEZ; FENSTERSEIFER, 2009, p. 12).
No que se refere ao movimento humano como especificida-
de da Educação Física, Bracht (1997) identifica-o com a emergên-

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50 © Jogos e Brincadeiras II

cia do discurso da aprendizagem motora, do desenvolvimento mo-


tor e da psicomotricidade no âmbito da Educação Física. De modo
semelhante à acepção anterior (da atividade física), o movimento
humano torna-se relevante para a formação integral da criança e
seria a disciplina de Educação Física a responsável por prover essa
incumbência.
Nessa perspectiva, a definição clássica de que "[...] a
Educação Física é a educação do movimento e pelo movimento"
(BRACHT, 1997, p. 15) adquire centralidade na legitimação desta
disciplina na escola.
É importante ressaltar, conforme assinala o autor, que am-
bos os termos (atividade física e movimento humano) não repre-
sentam, necessariamente, mudanças em termos de paradigma ou
de concepção, somente uma mudança de denominação do objeto
da Educação Física.
Mas não seriam plausíveis essas "expressões-chave" para
justificar a especificidade de conhecimento da Educação Física a
ser tratado/desenvolvido na escola? Não são esses os discursos
que, comumente, legitimam a presença desta disciplina na escola?
Na sequência, procuramos propiciar subsídios que representam
uma tentativa de elucidar essa questão.
Em favor da cultura corporal de movimento como conhecimento
específico da Educação Física
Para Bracht (1997), as duas definições (construções concei-
tuais) revelam-se insuficientes por não permitirem considerar esse
objeto da Educação Física como uma construção social e histórica.
Compreendem-no como
[...] um elemento natural e universal, portanto, não histórico, neu-
tro politicamente/ideologicamente, características que marcam,
também, a concepção de ciências na qual vão sustentar suas pro-
postas (BRACHT, 1997, p. 15).

Ou seja, o corpo e o movimento humano apresentam-se


"desculturalizados".
© U1– Conteúdos Escolares e a Cultura: Buscando Caminhos para uma Relação Pedagógica 51

Observe e reflita sobre as considerações de Bracht (1997, p. 16):


É importante salientar que se, em princípio, fala-se nestes casos das
mesmas atividades humanas presentes nas concepções anteriores,
as expressões usadas para denominá-las denunciam, para além de
uma diferença terminológica, diferenças e consequências substan-
ciais no plano pedagógico, pois, o objeto de uma prática pedagógi-
ca é uma construção – e não uma dimensão inerte da realidade –
para a qual pressupostos teóricos são fundantes e/ou constitutivos.

Nesse sentido, Bracht (1997) situa a cultura corporal de mo-


vimento como o objeto/conhecimento específico da Educação Fí-
sica.
Na concepção de cultura corporal de movimento, o movi-
mentar-se é definido como uma forma de comunicação, consti-
tuinte e constituída de cultura, além de possibilitada por ela.
Essa concepção permite compreender que o movimentar-se e o
próprio corpo necessitam ser entendidos e estudados como uma
complexa estrutura social carregada de sentido e significado, em
contextos e processos sócio-históricos específicos.
Analise a citação de Carmen Lúcia Soares (1996, p. 7), extra-
ída de seu artigo "Educação Física escolar: conhecimento e espe-
cificidade", cuja referência é sugerida como leitura complementar
desta unidade:
Os atos de andar, correr, saltar, são atos da vida diária, da vida em
sociedade, são traços da cultura que já inscreveu nos corpos estas
ações. Todavia, estes atos da vida diária foram codificados ao lon-
go da história do homem em universos de saber: técnico, científi-
co e cultural. Esta codificação sim poderá ser objeto de ensino da
Educação Física. Por exemplo: o ato de andar será para a ginástica
o conjunto de passos como, por exemplo, o "passo picado", "cru-
zado", "passo valsa", etc.; o ato de correr será uma prova para o
Atletismo como a corrida de velocidade, de meio-fundo, de fundo,
com barreiras, etc.; o ato de saltar será o salto com vara, o salto
triplo, em extensão, em altura; ou na ginástica o salto sobre o ca-
valo, o salto grupado, salto afastado, salto carpado, etc. O ato de
executar um arremesso se vincula ao Atletismo, a Ginástica, aos
jogos e jogos esportivos com bola ou outros materiais. É possível
afirmar que este ato isolado já foi um dia, na história do homem,
um ato de sobrevivência, de defesa, de ataque e se inscreveu em
seu corpo, um corpo que não é somente a expressão biológica do

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52 © Jogos e Brincadeiras II

nosso ser atual, mas a expressão significativa da história do corpo


do homem entre os homens. Cada homem é em si a história do
Homem, resíduos e vestígios de sua longa e plural história. As prá-
ticas físicas fora do mundo do trabalho sistematizadas em torno da
Ginástica, do Atletismo, dos Jogos, dos Jogos Esportivos, da Dança,
possuem características especiais e específicas. Modificam-se pela
técnica, pela ciência e, sobretudo, pelas dinâmicas culturais. Por-
tanto, estas práticas formam um interessante acervo da história do
homem e constituem-se em objeto de ensino, são pedagogizadas.
Não podem merecer o desprezo que o olhar superficial sugere. Não
se esgotam nos clichês: 'são movimentos estereotipados', 'são re-
petitivos', 'são técnicos', 'são para poucos.

Neste momento, necessitamos nos concentrar em duas


questões fundamentais para a atuação do professor de Educação
Física na escola, decorrentes das considerações de Bracht (1997) e
de Soares (1996):
• Quais seriam as repercussões da tematização da cultura
corporal de movimento no âmbito da prática pedagógica
da Educação Física na escola?
• Qual é a relação entre os jogos e as brincadeiras com a
cultura corporal de movimento?
Você pode responder a essas questões com base nos estu-
dos que realizamos até o momento. Elas são importantes para que
possamos avançar em nosso aprendizado.
A tematização pedagógica da cultura corporal de movimen-
to em aulas de Educação Física (aqui você pode relacionar a ex-
pressão "cultura corporal de movimento", especificamente, aos
jogos e brincadeiras; nosso foco, neste Caderno de Referência de
Conteúdo não pode perder de vista que a cultura corporal de mo-
vimento é composta, também, por elementos como os esportes,
as danças, as lutas e as ginásticas) adquire, nesse ínterim, um ca-
ráter diferenciado, comparativamente aos conceitos-chave ante-
riormente mencionados – atividade física e movimento humano.
Que caráter diferenciado seria esse? O fato de que o saber sobre
o movimentar-se do ser humano passa a ser incorporado como
saber a ser transmitido e não apenas instrumento do professor
(BRACHT, 1997).
© U1– Conteúdos Escolares e a Cultura: Buscando Caminhos para uma Relação Pedagógica 53

Os jogos e brincadeiras, por exemplo, são comumente utili-


zados como instrumentos para o desenvolvimento de habilidades
básicas para o esporte (em uma das etapas da iniciação esportiva).
Ou seja, esses elementos são empregados com o intuito de
que os alunos, posteriormente, se apropriem de conteúdos mais
complexos ou, conforme González e Fensterseifer (2009), tenham
condições de exercitar-se de modo competente (do ponto de vista
quantitativo e qualitativo).
Ao adotar-se como elemento fundante da prática pedagógi-
ca a cultura corporal de movimento, os próprios jogos e brincadei-
ras tornam-se conteúdos de ensino, representam saberes a serem
estudados e vivenciados, tendo sempre em vista que se trata de
elementos situados, construídos e reconstruídos em determina-
das condições temporais, sociais e históricas.
Entretanto, há que se esclarecer que não se pretende criti-
car a tradicional utilização dos jogos e brincadeiras com fins mera-
mente utilitários. Quer-se, ao contrário, apresentar outras possi-
bilidades de tematização desses elementos da cultura corporal de
movimento e, portanto, conteúdos de ensino da Educação Física.

7. TEORIAS PEDAGÓGICAS, CULTURA CORPORAL E


CONTEÚDOS DE ENSINO
Na apresentação deste Caderno de Referência de Conteúdo
foi anunciado que teríamos um trabalho rigoroso de leituras e pro-
duções acerca da temática em foco.
Alertamos que o caderno está organizado com base em al-
guns pressupostos teóricos que têm como princípio a problema-
tização como guia e elemento deflagrador da aprendizagem e se-
quências didáticas organizadas para que, ao se debruçar sobre a
solução dos problemas colocados, você alcance as aprendizagens
esperadas.

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54 © Jogos e Brincadeiras II

Chamamos você à responsabilidade de seguir cada passo


proposto. Caso contrário, deixará para trás preciosas oportuni-
dades de construir, autonomamente, uma visão crítica sobre sua
atuação como professor e, em especial, sobre o planejamento e
realização de atividades escolares com os conteúdos específicos. A
seguir, faremos algumas atividades que têm como suporte teórico
o texto de Valter Bracht (1999): A constituição das teorias pedagó-
gicas da Educação Física.
Essa leitura é importante para nosso estudo sobre o lazer
e os jogos e brincadeiras como conteúdo escolar, pois represen-
ta um ensaio inicial que contribui para reflexões sobre as práticas
corporais como parte integrante do aparato cultural. Portanto, de-
vem, segundo as leituras anteriores, constituir-se em conteúdos
da transmissão cultural realizada pela educação formal.
Para isso, Valter Bracht (1999) busca demonstrar como as te-
orias pedagógicas se apropriam da concepção e do significado de
corpo engendrados na e pela sociedade moderna. O texto apre-
senta as teorias pedagógicas em uma visão crítica da sociedade e
apresenta uma possível ruptura da visão moderna de corpo, pro-
curando evidenciar os desafios postos para a Educação Física.
Você deve ter percebido pela leitura do texto "A constituição
das teorias pedagógicas da educação física" que o autor procura
evidenciar os conhecimentos sobre o corpo como um elemento
importante (talvez indispensável) para o entendimento das ações
humanas.
Os conhecimentos sobre o corpo e suas diferentes formas de
movimento têm como objetivo educacional possibilitar o entendi-
mento das práticas corporais, e não somente conhecer diferentes
formas de realizá-las.
Com base no breve estudo que realizamos até aqui, come-
ça a se evidenciar a árdua tarefa que nos cabe: entender quais as
contribuições que os conhecimentos acumulados historicamente
sobre o lazer, o jogo e o brincar devem trazer para os indivíduos
© U1– Conteúdos Escolares e a Cultura: Buscando Caminhos para uma Relação Pedagógica 55

na realização e na compreensão das práticas corporais na e da so-


ciedade.
Ainda sem o objetivo de grandes sistematizações e formula-
ções, mas já tomando como ponto de apoio para nosso estudo o
quê, por quê e como extrair dos conhecimentos acumulados pela
humanidade sobre o lazer, o jogo e o brincar e transpô-los pedago-
gicamente para os espaços escolares.
Não vamos nos aprofundar nessa questão, contudo, convém
mantê-la aquecida à medida que as leituras e reflexões propostas
avançam.
É importante que você procure fazer uma diferenciação, a
partir das ideias de sociedade, inserção dos indivíduos no mundo,
de cultura, de educação, entre dois termos: Reprodução e Trans-
formação. Esses termos são comumente empregados para carac-
terizar e/ou identificar as finalidades do ato educativo. Lembre-se
de que anteriormente mencionamos que a educação coloca-se
em constante tensão entre a transformação e a adaptação, manu-
tenção ou reprodução da sociedade.Chamamos a atenção para o
fato de que reproduzir está relacionado à repetição, fazer tal qual,
enquanto transformar está relacionado a criar, a construir, a mo-
dificar.

8. CULTURA CORPORAL E OS PARÂMETROS CURRI-


CULARES NACIONAIS
Apresentamos para você três leituras sobre a Transmissão
Cultural, uma que visa orientar a relação entre educação e cultura
e as outras de um pesquisador do campo da Educação Física, com
o objetivo de fazer a ligação entre o que está sendo "dito" no cam-
po maior (Educacional) e como as sinalizações estão sendo absor-
vidas pela área específica.
Vemos como fundamental na formação de professores a in-
serção dos conhecimentos relacionados às políticas vigentes no

Claretiano - Centro Universitário


56 © Jogos e Brincadeiras II

país. Por isso, apresentamos como fonte de reflexão os PCNs–Pa-


râmetros Curriculares Nacionais– (BRASIL, 1998), por dois moti-
vos: porque representam a política vigente e pelo fato de que para
discordar, concordar ou transformá-la, temos de conhecê-la.
Vale recordar que os PCNs constituem um referencial edu-
cacional (de adoção não obrigatória) proposto pelo Ministério da
Educação de nosso país, cuja finalidade é orientar a organização
e o desenvolvimento da Educação Básica no país. Além disso, in-
tenta subsidiar a elaboração e/ou a revisão curricular das escolas
vinculadas às redes estaduais e municipais de ensino, bem como
servir de referência para a atuação dos professores da Educação
Básica (Fonte: BRASIL, 1998).
Então, tendo como uma das referências básicas os PCNs de
5ª a 8ª séries da Educação Física (BRASIL, 1998), utilizaremos, para
nosso estudo, algumas partes desse referencial que serão inclu-
ídas paulatinamente, de acordo com a demanda em discussões.

9. QUESTÕES AUTOAVALIATIVAS
Sugerimos que você procure responder, discutir e comentar
as questões a seguir que tratam da temática desenvolvida nesta
unidade.
A autoavaliação pode ser uma ferramenta importante para
você testar o seu desempenho. Se você encontrar dificuldades em
responder a essas questões, procure revisar os conteúdos estuda-
dos para sanar as suas dúvidas. Esse é o momento ideal para que
você faça uma revisão desta unidade. Lembre-se de que, na Edu-
cação a Distância, a construção do conhecimento ocorre de forma
cooperativa e colaborativa; compartilhe, portanto, as suas desco-
bertas com os seus colegas.
Confira, a seguir, as questões propostas para verificar o seu
desempenho no estudo desta unidade:
© U1– Conteúdos Escolares e a Cultura: Buscando Caminhos para uma Relação Pedagógica 57

1) Identifique as diferenças entre Educação e Educação Formal e aponte exem-


plos de cada uma dessas formas.

2) O que significa afirmar que: "Ao adotar-se como elemento fundante da


prática pedagógica a cultura corporal de movimento, os próprios jogos e
brincadeiras tornam-se conteúdos de ensino, representam saberes a serem
estudados e vivenciados, tendo sempre em vista que se tratam de elemen-
tos situados, construídos e reconstruídos em determinadas condições tem-
porais, sociais e históricas"? Escreva um pequeno texto explicitando o seu
entendimento sobre essa afirmação e cite exemplos que você considere co-
erentes com a mesma.

3) Tendo como base a leitura da resenha do livro Escola e Cultura: as bases


sociais e epistemológicas do conhecimento escolar (1993), de Jean Claude
Forquin, responda:
a) Identifique, no texto, as duas questões iniciais e discuta o papel da escola
como transmissora de cultura.
b) Aponte quais as diferenças entre os processos educativos formais e não
formais?
c) Quais as principais implicações e/ou desafios para a educação e para o
trabalho do professor, na definição dos conteúdos de ensino, a partir do
patrimônio cultural?
d) Elabore um diagrama representativo das relações entre Cultura, Educa-
ção, Escola, Conteúdos Escolares, Ensino, Professores, Alunos. Explique
as funções de cada um desses fatores.
4) No início da resenha do livro "Escola e Cultura: as bases sociais e epistemoló-
gicas do conhecimento escolar" (1993), de Jean Claude Forquin, realizamos
alguns questionamentos sobre os conteúdos escolares. Retome a questão
"Procure identificar conteúdos da Educação Física que, em sua opinião, os
alunos não precisem ir à escola formal para aprendê-los?" e explique o que
você considerou relevante na sua resposta.

5) Você conseguiu identificar alguns conteúdos. Por quê?

6) E se não conseguiu identificar conteúdos, por quê?

7) Com base no que você estudou nesta unidade, o que ou qual é o saber espe-
cífico que a Educação Física deve tratar na escola?

8) Faça a leitura e a resenha do texto "A constituição das teorias pedagógicas


da educação física", de Valter Bracht e:
a) Aponte e explique as principais tendências – Militarista, Médica, Esporti-
vista, Desenvolvimentista, Psicomotricidade, Crítico-Superadora, Crítico-
-Emancipatória – que influenciaram o processo de constituição da Edu-
cação Física escolar.
b) Discorra sobre os princípios de sociedade, de homem, de educação que
orientaram essas tendências.

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58 © Jogos e Brincadeiras II

9) Pensando no ensino dos conteúdos da disciplina, devemos procurar articu-


lar o campo teórico com as decisões que temos de tomar nos espaços es-
colares.
a) Pense em um jogo que faça parte da cultura local onde você cresceu.
b) Descreva como esse jogo acontece, com as principais etapas, regras e
funções dos participantes. Escreva o jogo em duas versões: uma pro-
curando atender um ensino pautado nos princípios de uma educação
reprodutora e outra procurando atender um ensino baseado na trans-
formação.
c) Com base nas propostas desenvolvidas e apresentadas, você deverá con-
tatar um colega de curso e combinar a troca das propostas, para que
cada um analise a proposta do outro. A análise é para que você possa
identificar outras hipóteses sobre como os jogos podem ser utilizados
para ensinar com base em diferentes concepções.
10) Quais as intenções sociais, políticas e econômicas que impulsionaram o sur-
gimento da Educação Física escolar?

11) Por que o autor coloca os professores de Educação Física dentro de uma
categoria de trabalhos sociais?

12) Leia atentamente o parágrafo a seguir e escreva se você concorda ou não


com a afirmação. Justifique sua resposta.
O quadro das propostas pedagógicas em EF apresenta-se hoje bas-
tante mais diversificado. Embora a prática pedagógica ainda resista
a mudanças, ou seja, a prática acontece ainda balizada pelo para-
digma da aptidão física e esportiva, várias propostas pedagógicas
foram gestadas nas últimas duas décadas e se colocam hoje como
alternativas (BRACHT, 1999, p. 78).

13) Realize o seguinte exercício: considerando as propostas pedagógicas da


Educação Física escolar (proposta desenvolvimentista, proposta crítico-su-
peradora, proposta crítico-emancipatória, dentre outras, apresentadas no
texto de Bracht (1999) "A constituição das teorias pedagógicas da educação
física"), caracterize o trato pedagógico de cada uma delas em relação aos
jogos e brincadeiras. Construa um quadro-síntese para explicitar esta carac-
terização.

14) Dentre as abordagens pedagógicas discutidas por Bracht, procure comentar


(e justificar) aquela que você achou mais interessante.

15) Dentre as abordagens pedagógicas discutidas por Bracht, qual ou quais você
considera que se liga e/ou toma a cultura como fonte de conhecimentos.
Explique.

16) Escreva um pequeno texto, procurando estabelecer relações entre os prin-


cípios norteadores da tendência pedagógica que têm como foco a Cultura
© U1– Conteúdos Escolares e a Cultura: Buscando Caminhos para uma Relação Pedagógica 59

Corporal com os princípios e proposições que você leu no primeiro texto


sobre transmissão cultural.

17) Considerando as diferentes interpretações do objeto específico da Educação


Física (atividade física, movimento humano e cultura corporal de movimen-
to (BRACHT, 1999)), é possível afirmar que, em cada uma dessas interpre-
tações, temos diferentes enfoques e possibilidades didático-pedagógicas e
formativas no que se refere à prática pedagógica da Educação Física escolar.
Nesse sentido, como os jogos e brincadeiras são concebidos e ensinados
mediante o conceito de cultura corporal?

10. CONSIDERAÇÕES
Nesta unidade, discutimos sobre a cultura como fonte para
a seleção dos conteúdos a serem ensinados na escola. Buscamos
compreender a cultura como construção social e histórica, bem
como estabelecer as relações dessa compreensão com a Educação
Física.
Nesse sentido, tratamos, ainda, da cultura corporal de movi-
mento como o elemento (social e histórico) a ser tematizado peda-
gogicamente nas aulas de Educação Física Escolar (sem perder de
vista, inclusive, que os jogos e as brincadeiras representam com-
ponentes da cultura corporal de movimento).
Posteriormente a essa discussão, sugerimos o estudo das
proposições, para a organização dos conteúdos e das práticas es-
colares, contidas nos Parâmetros Curriculares Nacionais para a
Educação Física Escolar.
Consideramos que agora já temos uma boa base para discu-
tir a seleção dos conteúdos escolares e o papel social da escola no
processo de transmissão cultural. Essa discussão é indispensável
para entendermos a inclusão dos diferentes conteúdos da Educa-
ção Física nos currículos escolares.
A seguir, na Unidade 2, discutiremos a inclusão de um tipo
de conteúdo que pode ser extraído da cultura corporal para os es-
paços escolares, ou seja, os conteúdos do lazer, os jogos e as brin-
cadeiras.

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60 © Jogos e Brincadeiras II

Não devemos, contudo, perder de vista que esses conteúdos


devem ter um papel importante na formação dos futuros cidadãos.

11. E-REFERÊNCIAS

Lista de figuras
Figura 1 Brincadeiras de Criança. Disponível em:<http://cabofrio.olx.com.br/exposicao-
quadros-ivan-cruz-iid-17032680>. Acesso em: 3 jun. 2011.
Figura 2 Mona Lisa. Disponível em: <http://monalisa.2artgallery.com/Mona-Lisa.jpg>.
Acesso em: 3 jun. 2011.
Figura 3 Folguedo Nordestino. Disponível em: <http://www.galeriaaberta.com/militao_
santos/slides/Folguedos%20Nordestinos.JPG>. Acesso em: 3 jun. 2011.

Sites pesquisados
BRASIL, Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares nacionais:
terceiro e quarto ciclos do ensino fundamental: introdução aos parâmetros curriculares
nacionais. Secretaria de Educação Fundamental, Brasília: MEC/SEF, 1998. Disponível em:
<http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/introducao.pdf>. Acesso em: 3 jun. 2011.
­­­­­______. Ministério da Educação, Secretaria de Educação Básica: Parâmetros curriculares
nacionais/educação física (3º e 4º ciclos do ensino fundamental). Secretaria de
Educação Fundamental, Brasília: MEC/SEF, 1998. Disponível em: <http://portal.mec.
gov.br/seb/arquivos/pdf/fisica.pdf>. Acesso em: 3 jun. 2011.
BRACHT, Valter. Educação física: a busca da autonomia pedagógica. Revista da Fundação
de Esporte e Turismo, Curitiba, v. 1, n. 2, p. 12-19, 1989. Disponível em: <http://www.
boletimef.org/biblioteca/2350/Educacao-Fisica-a-busca-da-autonomia-pedagogica>.
Acesso em: 3 jun.2011.
____. A constituição das teorias pedagógicas da educação física. Cadernos Cedes.
Unicamp/SP. Ano XIX, n.48 , Agosto/99. Disponível em:<http://www.scielo.br/pdf/
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_____. Disponível em: <http://lattes.cnpq.br/3097115385391111>. Acesso em: 3 jun.
2011.
CAPARROZ, Francisco Eduardo; BRACHT, Valter. O tempo e o lugar de uma didática da
educação física. Revista Brasileira de Ciências do Esporte, Campinas, v. 28, n. 2, p. 21-37,
jan. 2007. Disponível em: <http://www.rbceonline.org.br/revista/index.php?journal=RB
CE&page=article&op=view&path[]=53&path[]=61>. Acesso em: 3 jun.2011.
FORQUIN, Jean Claude. Educação e Filosofia, n. 11, p. 305-310, jan./jun. e dez/dez. 1997.
Disponível em:
<http://www.seer.ufu.br/index.php/EducacaoFilosofia/article/view/903/818>. Acesso
em: 3 jun. 2011.
© U1– Conteúdos Escolares e a Cultura: Buscando Caminhos para uma Relação Pedagógica 61

RENASCIMENTO Cultural. Disponível em: <http://www.suapesquisa.com/


renascimento/>. Acesso em: 28. set. 2011.
SOARES, Carmem Lúcia. Educação física escolar: conhecimento e especificidade. Revista
Paulista de Educação Física, São Paulo, s. 2, p. 6-12, 1996. Disponível em: <http://citrus.
uspnet.usp.br/eef/uploads/arquivo/v10%20supl2%20artigo3.pdf>. Acesso em: 28 jul.
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SULZBACH, Liliana. A invenção da infância. Documentário (26min.). Parte 1. Disponível
em: <http://www.youtube.com/watch?v=02ziUbI7h6U>. Acesso em: 25 jul. 2011.
_____. A invenção da infância. Documentário (26min.). Parte 2. Disponível em: <http://
www.youtube.com/watch?v=725NIeNN8I0&NR=1>. Acesso em: 25 jul. 2011.
____. A invenção da infância. Documentário (26min.). Parte 3. Disponível em: <http://
www.youtube.com/watch?v=vQvx5VucjUs&feature=related>. Acesso em: 25 jul. 2011.

12. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


BRACHT, Valter. Educação Física: conhecimento e especificidade. In: SOUSA, Eustáquia
Salvadora; VAGO, Tarcísio Mauro Vago. Trilhas e partilhas: educação física na cultura
escolar e nas práticas sociais. Belo Horizonte, 1997. p.13-23.
CAPARROZ, Francisco Eduardo. Entre a educação física na escola e a educação da escola:
a educação física como componente curricular. Vitória: UFES, Centro de Educação Física
e Desportos, 1997.
CASTELLANI FILHO, Lino. Educação física no Brasil: a história que não se conta. 14. ed.
Campinas, SP: Papirus, 2007.
DARIDO, Suraya Cristina; RANGEL, Irene Conceição Andrade. Educação Física na escola:
implicações para a prática pedagógica. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2005.
FORQUIN, Jean Claude. Escola e cultura: as bases sociais e epistemológicas do
conhecimento escolar. Porto Alegre: Artes Médicas, 1993.
FREIRE, João Batista. Educação de corpo inteiro: teoria e prática da Educação Física.
Campinas: Scipione, 1989.
GONZÁLEZ; Fernando Jaime; FENSTERSEIFER, Paulo Evaldo. Entre o "não mais" e o "ainda
não": pensando saídas do não-lugar da Educação Física escolar I. Cadernos de Formação
RBCE, Campinas: CBCE e Autores Associados, v. 1, n. 1. p. 9-24, set. 2009.
HILDEBRANDT, Reiner & LAGING, Ralf. Concepções abertas no ensino da Educação Física.
Tradução Sonnhilde von der Heide. Rio de Janeiro: Livro Técnico, 1986.
KUNZ, Elenor. Transformação didático-pedagógica do esporte. Ijuí: UNIJUÍ, 1994.
LIBÂNEO, José Carlos. Pedagogia e pedagogos: para quê? São Paulo: Cortez, 1998.
PEREIRA, José Emílio Diniz. Formação de Professores: pesquisas, representações e poder.
Belo Horizonte: Autêntica, 2000.
SOARES, Carmen Lúcia. Do corpo, da Educação Física e das muitas histórias. Movimento,
Porto Alegre, v. 9, n. 3, set./dez. 2003, p.125-147.
SOARES, Carmen Lúcia et. al. Metodologia do ensino de Educação Física. São Paulo:
Cortez, 1992.

Claretiano - Centro Universitário


62 © Jogos e Brincadeiras II

TANI, Go; MANOEL, Edison de Jesus; KOKUBUN, Eduardo, PROENÇA, José Elias de.
Educação Física escolar: fundamentos de uma abordagem desenvolvimentista. São
Paulo: EPU / EdUSP, 1988.
EAD
Lazer e Transmissão
Cultural na Escola: Jogos
e Brincadeiras

2
como Conteúdos
Escolares

1. OBJETIVOS
• Compreender que o lazer se constitui na prática social
estabelecida em uma parte de nosso patrimônio cultural
que deve ser transmitido pela educação formal.
• Elaborar planos de ensino para a Educação Básica de for-
ma contextualizada com as realidades locais.

2. CONTEÚDOS
• Lazer: uma construção cultural.
• Lazer como conteúdos de ensino.
• Jogos e brincadeiras como conteúdos para as práticas de
lazer.
64 © Jogos e Brincadeiras II

3. ORIENTAÇÕES PARA O ESTUDO DA UNIDADE


Antes de iniciar o estudo desta unidade, é importante que
você leia as orientações a seguir:
1) Tendo em vista que estudaremos temáticas relacionadas
ao lazer, sugerimos que você acesse o site do Ministério
do Esporte para conhecer as ações implementadas pelo
Governo Federal no âmbito das Políticas Públicas de es-
porte e lazer. Disponível em: <http://www.esporte.gov.
br/>. Acesso em: 19 jul. 2011.
2) Sugerimos as seguintes leituras para complementar os
estudos da unidade:
3) MELO, Victor Andrade de; BRÊTAS, Angela; MONTEIRO,
Mônica Borges. Fundamentos do lazer e da animação
cultural. In: OLIVEIRA, Amauri Aparecido Bássoli de; PE-
RIM, Gianna Lepre (orgs.). Fundamentos pedagógicos
do Programa Segundo Tempo. Maringá: Eduem, 2009.
p. 45-72.
4) MELO, Vitor Andrade de. A animação cultural: conceitos
e propostas. Campinas: Papirus, p. 144, 2006.
5) MARCELLINO, Nelson Carvalho. O lazer e os espaços
na cidade. In: ISAYAMA, Hélder; LINHALES, Meily Assbú
(orgs.). Sobre lazer e política: maneiras de ver, maneiras
de fazer. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2006. p. 65-92.
6) Como atividade complementar, especificamente quan-
do estudarmos a origem do lazer, sugerimos que você
assista ao filme Tempos Modernos, de Charles Chaplin
(Modern Times, EUA, 1936; Direção: Charles Chaplin.
Elenco: Charles Chaplin, Paulette Goddard, 87 min. Pre-
to e Branco, Continental).
7) Leia atentamente o texto, faça anotações, discuta com
seus colegas e tutores. Estas são ações importantíssimas
ao seu processo formativo.
8) Lembre-se de que a aprendizagem desses conteúdos de-
pende de você e todas as atividades propostas têm obje-
tivos específicos para auxiliarem na construção de seus
conhecimentos. Então, não deixe de fazer nenhuma das
atividades propostas.
© U2 – Lazer e Transmissão Cultural na Escola: Jogos e Brincadeiras como Conteúdos Escolares 65

4. INTRODUÇÃO À UNIDADE
Tendo em vista os temas tratados na Unidade 1, abordare-
mos nesta unidade questões relacionadas à transmissão cultural
na escola (ou seja, os elementos mais significativos acumulados
historicamente e imprescindíveis à formação dos sujeitos), ao la-
zer (concebido como elemento da cultura) e aos jogos e brinca-
deiras (também elementos da cultura) inseridos no espaço escolar
como conteúdos de ensino da Educação Física.
Observe que esta unidade encontra-se articulada à anterior
evitando, portanto, a ocorrência da fragmentação entre as unida-
des temáticas. Essa estratégia é relevante no sentido de possibili-
tar que estabeleça relações entre os conteúdos estudados e po-
tencialize, assim, a sua aprendizagem.
Considerando os objetivos propostos e sendo de suma im-
portância, trabalharemos com a leitura e o estudo de textos na
íntegra ou de suas resenhas.
Começaremos com o texto As Antinomias Dialéticas do Lazer
de Gustavo Martins Piccolo. O artigo permitirá que você compre-
enda a gênese do lazer na sociedade moderna e como alguns au-
tores brasileiros contemporâneos, que se dedicam aos estudos do
lazer, posicionam-se em relação à mesma.
Como segundo passo, propomos reflexões em relação ao
duplo caráter educativo do lazer (como veículo e como objeto de
educação), dialogando com Nelson Carvalho Marcellino.
Em seguida, o estudo do texto Nexos entre e Educação Físi-
ca Escolar e o Lazer, no qual Elizara Carolina Marin aborda alguns
conceitos sobre o lazer e aponta caminhos para a ligação dessa
dimensão cultural com a Educação Física escolar.
No tocante aos conteúdos de ensino da Educação Física es-
colar, os Parâmetros Curriculares Nacionais referentes ao Terceiro
e Quarto Ciclos do Ensino Fundamental (BRASIL, 1998), servirão de
importante aporte teórico.

Claretiano - Centro Universitário


66 © Jogos e Brincadeiras II

Por fim, proporemos uma atividade de pesquisa de campo,


em que você realizará um levantamento dos espaços e das ativida-
des de lazer de seu bairro e de sua cidade, analisando criticamente
as informações coletadas. O objetivo é evidenciar a relevância de
que você, futuro professor, conheça as possibilidades (e os limites)
dos espaços e das atividades de lazer que caracterizam o seu bair-
ro/cidade.
Ainda, para melhor compreensão do que trataremos agora,
sugerimos o texto de Jorge Dorfman Knijnik A questão do jogo:
uma contribuição na discussão de conteúdos e objetivos da Edu-
cação Física escolar, publicado na Revista Brasileira de Ciências e
Movimento (volume 9, número 2, em abril de 2001). Essa leitura
é complementar, mas pode contribuir significativamente para a
ampliação de seus conhecimentos sobre os jogos como conteúdos
escolares. Nossa expectativa é que você faça a leitura e dialogue
com o texto.

5. O LAZER NA SOCIEDADE MODERNA: ORIGEM, HIS-


TÓRIA E CONCEITOS CONTEMPORÂNEOS
A fim de avançarmos em nossos estudos, conforme anuncia-
mos na introdução desta unidade, trataremos de uma categoria
mais ampla no âmbito da cultura: o lazer.
É nela que podemos situar os jogos e as brincadeiras, assim
como os demais elementos da cultura corporal e as diversas práti-
cas sociais realizadas pelos sujeitos com a finalidade de ocupação
do tempo livre.
Mencionar o lazer como uma categoria e/ou um elemento
da cultura que abarca um conjunto de práticas sociais com a finali-
dade de ocupação do tempo livre, demanda considerar que essas
práticas sociais encontram-se delimitadas por conteúdos e/ou in-
teresses culturais (do lazer).
© U2 – Lazer e Transmissão Cultural na Escola: Jogos e Brincadeiras como Conteúdos Escolares 67

Nesse sentido, Melo, Brêtas e Monteiro (2009) explicitam


que os conteúdos e/ou interesses culturais do lazer são os seguin-
tes:
1) Interesses físicos: Relacionados à busca de prazer oca-
sionado pelas atividades físicas. Nessa categoria, encon-
tram-se tanto a prática de atividades físicas quanto a
assistir à realização da atividade (por exemplo, assistir a
uma partida de algum esporte);
2) Interesses artísticos: Relacionados às atividades artísti-
cas (por exemplo: artes plásticas, cinema, teatro, músi-
ca, danças em geral). Vale ressaltar que pode tanto as-
sistir e/ou observar às atividades artísticas (exposições
de arte, museus, etc.) quanto realizá-las (artes plásticas,
por exemplo).
3) Interesses manuais: São procuradas pelo prazer oriundo
da manipulação de objetos e produtos. Exemplo: culiná-
ria, marcenaria, artesanato, jardinagem etc.
4) Interesses intelectuais: Referem-se às atividades em
que "o prazer fundamental está relacionado à reflexão
e ao raciocínio", tais como jogos intelectuais (xadrez,
dama, jogos de baralho, truco, buraco, etc.), palestras,
leituras etc.
5) Interesses sociais: Atividades em que a sociabilidade e a
formação de grupos representam os objetivos centrais:
"São atividades buscadas fundamentalmente por pro-
mover o encontro de indivíduos". Exemplo: festas, espe-
táculos, atividades turísticas.
Observe que as atividades de lazer podem congregar vários
interesses: em uma mesma atividade, vários podem ser estimula-
dos e explorados.
Antes de discutirmos as relações passíveis de estabeleci-
mento entre o lazer e a Educação Física escolar, necessitamos nos
reportar à origem do lazer, à sua constituição sócio-histórica e à
diversidade de conceitos que contemporaneamente, permeiam
essa prática social.

Claretiano - Centro Universitário


68 © Jogos e Brincadeiras II

Nesse momento, se faz necessário contemplar tal tema de


estudo para que você possa posicionar-se criticamente em relação
ao conceito e às finalidades do lazer na sociedade contemporânea.
O texto resenhado a seguir servirá de relevante aporte teóri-
co-conceitual para as discussões posteriores e para a sua atuação
pedagógica. Para contemplar as demandas supracitadas, apresen-
tamos a resenha de As Antinomias Dialéticas do Lazer de Gustavo
Martins Piccolo, publicado na Revista Motrivivência em Junho de
2008.
O professor Gustavo Martins Piccolo é doutorando em Edu-
cação Especial pela Universidade Federal de São Carlos (Ufscar),
Mestre em Educação, além de Bacharel e Licenciado em Educação
Física pela UFSCar. Atualmente é professor efetivo da Escola Esta-
dual Florestano Libutti, em Araraquara, São Paulo.
As antinomias dialéticas do lazer
O presente texto busca, através de um árido processo de revisão de
literatura, demarcar o lazer como espaço dialético de apropriação,
fruição e objetivação cultural pela vivência do lúdico na socieda-
de, acentuando ao fenômeno lazer a característica de ferramenta
mediativa na produção do conhecimento, cuja materialidade pode
estar tanto em consonância à incorporação dos objetivos propostos
pelas classes dominantes como também no sentido de crítica a es-
tes postulados. Ainda no arcabouço do texto assinalamos possíveis
relações entre a Educação Física e o lazer, as quais objetivam a pro-
dução de um espaço lúdico libertário e emancipatório. (PICOLLO,
2008, p. 9)

O artigo encontra-se sistematizado em três etapas inter-rela-


cionadas. Na primeira, o autor apresenta o processo de construção
social e histórica do lazer discutindo o cenário mundial e as razões
pelas quais o lazer emerge; na segunda, a contextualização do la-
zer no âmbito da história brasileira e em um terceiro momento,
Picollo analisa e discute os conceitos de lazer coexistentes hodier-
namente fundamentado em autores brasileiros contemporâneos,
que se dedicam aos estudos do lazer.
© U2 – Lazer e Transmissão Cultural na Escola: Jogos e Brincadeiras como Conteúdos Escolares 69

Por fim, com base no processo de análise engendrado nessas


etapas, o autor assinala as possíveis relações existentes entre a
Educação Física escolar e o lazer.
Delimitadas as partes constituintes do artigo que o trato da
temática do lazer se dá desde sua gênese até sua contemporanei-
dade, em um processo que inclui o diálogo com autores brasileiros
representativos dos estudos referentes ao lazer, o autor assinala
que os objetivos desse artigo são:
• identificar e discutir as principais contradições existentes
nos estudos sobre o lazer no Brasil;
• suscitar reflexões que permeiam novos olhares a algumas
relevantes questões para a compreensão do lazer: a ori-
gem, a concepção como elemento constituinte e consti-
tuído pela cultura, o lazer concebido como espaço e tem-
po de crítica aos mecanismos de conformação social, a
"mercantilização" do lazer entre outras.
• estabelecer relações entre o lazer e a Educação Física es-
colar.
Picollo (2008) inicia suas considerações refutando a hipóte-
se de que o lazer apresenta-se como um fenômeno a-histórico ou
atemporal.
Isso significa dizer que a compreensão do que é o lazer e o
que ele representa à sociedade somente pode emergir do estudo
do período social e histórico em que o lazer "nasce" e contempo-
raneamente, desenvolve-se.
Nesse ínterim, o autor delimita como a sua origem (conce-
bido como atividade que se diferencia do trabalho - institucional-
mente delimitado -, ou seja, trata-se da utilização do tempo do
não trabalho) a Revolução Industrial Inglesa.
Essa delimitação é justificada pelas mudanças substanciais
acarretadas por esse processo: O trabalho realizado socialmente
(e institucionalmente) diferencia-se sobremaneira das atividades
cotidianas.

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70 © Jogos e Brincadeiras II

Esse "novo" trabalho (novas formas e relações de produção)


ocasiona a divisão do trabalho, a expropriação dos trabalhadores
em relação aos produtos feitos por eles , a excessiva carga horária
de trabalho que desencadeia, por conseguinte, reivindicações dos
trabalhadores por maior tempo de "não trabalho" entre outros
elementos.
Atribuir a origem do lazer ao período correspondente à Re-
volução Industrial Inglesa não significa que, anteriormente, não
houvesse atividades semelhantes/próximas ao que, contempora-
neamente, compreendemos como lazer.
Pinto et al. (1998) destaca que desde a Antiguidade, os seres
humanos dedicam-se à atividades designadas sob a denominação
de ócio. Todavia, se faz necessário esclarecer que a categoria lazer
(em uma asserção relacionada à dimensão do não trabalho) emer-
girá mediante aos processos sociais e econômicos desencadeados
pela Revolução Industrial no século 17. A crescente mecanização
do trabalho (característica da Revolução Industrial), o consequen-
te incremento da produção material e a abertura de um tempo de
não trabalho, propiciam o "nascimento" do que contemporanea-
mente, denominamos lazer.
Entretanto, Picollo (2008) assevera que esse tempo de não
trabalho não esteve relacionado diretamente ao atendimento das
reivindicações, por exemplo, das lutas trabalhistas dos trabalhado-
res, de outro modo, a sua justificação estava relacionada á :
[...] aspectos funcionalistas, principalmente no que tange a recu-
peração das forças físicas para o trabalho, ou seja, basicamente ao
descanso e à incorporação incondicional dos ditames estruturais da
sociedade (PICOLLO, 2008, p. 11).

Como atividade complementar, assista ao filme Tempos Mo-


dernos de Charles Chaplin. Veja a seguir a sinopse da produção e
um roteiro com alguns pontos que merecem ser observados en-
quanto você a assiste.
© U2 – Lazer e Transmissão Cultural na Escola: Jogos e Brincadeiras como Conteúdos Escolares 71

Tempos Modernos–––––––––––––––––––––––––––––––––––––
Sinopse: Carlitos, o personagem clássico de Chaplin, consegue
emprego numa grande indústria, transforma-se em líder grevista
por engano e, ao conhecer uma jovem, se apaixona. O filme focali-
za a vida na sociedade industrial caracterizada pela produção com
base no sistema de linha de montagem e na especialização do
trabalho. É uma crítica à "modernidade" e ao capitalismo represen-
tado pelo modelo de industrialização, em que o operário é engolido
pelo poder do capital e perseguido por suas ideias "subversivas".
Observe os seguintes pontos enquanto você assiste ao filme:
a) o contexto sócio-histórico que o filme retrata; b) a organização
do trabalho neste contexto; c) a ociosidade de Carlitos na socieda-
de na qual o desemprego é um mecanismo de sujeição do traba-
lhador em exército suplementar (ou de reserva) de mão-de-obra,
sujeitado à ociosidade; d) o mito, a automação e contradições do
trabalho assalariado; e) o lazer como entretenimento; f) a tentativa
de Carlitos se adequar ao modelo burguês de sujeito e família.

Figura 1 Tempos Modernos de Charles Chaplin (1936).


––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––

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72 © Jogos e Brincadeiras II

Tem-se, a partir desse período, uma sociedade baseada em


uma nova configuração: emerge o binômio trabalho e tempo livre
ou trabalho e não trabalho em que seus contornos são demar-
cados pelo processo de produção e reprodução da existência (o
trabalho) e pela realização de atividades que não se relacionam
diretamente ao trabalho (não trabalho):
O processo responsável por este desenrolar está estritamente re-
lacionado com a quebra radical do tempo natural do trabalho em
tempo rigidamente cronometrado, imposto pela industrialização
mercantil praticada no capitalismo (PICOLLO, 2008, p. 13).

Nesse sentido, conforme é possível visualizar em tais consi-


derações, o lazer emerge tanto das reivindicações dos trabalhado-
res quanto (em certo ponto, de modo hegemônico) como campo
de ação pretensamente estratégico da sociedade industrial e se in-
sere na sociedade moderna como a utilização do tempo livre (não
trabalho) com a prática de atividades corporais e lúdicas diversas
com objetivos múltiplos (PICOLLO, 2008).
Ademais, é necessário esclarecer que o autor considera
como inadequada a compreensão de que o lazer, por si só, apre-
senta como produto a emancipação; de outro modo, Picollo (2008)
o situa, conforme se constata nas considerações anteriores, tanto
na direção da emancipação e da libertação quanto da conforma-
ção social (circunscrita à sociedade capitalista).
No Brasil, o lazer (considerado de forma consolidada) surge
entre o final do século 19 e o início do século 20, período em que
ocorre a internacionalização do capital e a urbanização das cidades.
Em consonância com as perspectivas anteriores, no Brasil,
a gênese do lazer também se dá codificada pela racionalidade do
mercado de trabalho (MARCASSA, 2002 apud PICOLLO, 2008).
Pinto et al. (2008, p. 48) fornece alguns exemplos que sub-
sidiam a compreensão da afirmação acima: "Como forma de 'ocu-
par' o 'tempo de não trabalho', nesse período histórico difundiu-se
a política assistencialista de 'recreação orientada', promotora de
'pacotes' e de atividades".
© U2 – Lazer e Transmissão Cultural na Escola: Jogos e Brincadeiras como Conteúdos Escolares 73

Essa política, difundida tanto no âmbito estatal quanto cor-


porativo, tinha como objetivo a promoção da distração, do descan-
so e da recomposição da força de trabalho. É importante não per-
der de vista ainda, que além do caráter funcionalista do lazer, está
a prática social, que no decorrer do desenvolvimento da sociedade
brasileira fundamentada no capitalismo neoliberal, é reconhecida
como "força econômica". Ou seja, o lazer passa a ser concebido,
difundido e organizado com base no consumo de "mercadorias
lúdico-culturais".
Nesse ínterim, até a década de 1970, seja nos estudos no
âmbito da produção de conhecimento, seja nas intervenções vol-
tadas ao lazer, este é compreendido a partir do seu caráter com-
pensatório em relação ao trabalho.
Não obstante tais considerações, Picollo (2008) esclarece
que da mesma maneira como se perpetua no lazer esse caráter
ideologicamente conservador (coerente com a visão de mundo ca-
pitalista), o lazer carrega consigo uma dimensão subversiva con-
substanciada na possibilidade de crítica ao sistema que lhe dá
respaldo.
Essa possibilidade é visualizada de modo mais clara a par-
tir da década de 1980, período em que o país passa pelo fim da
ditadura e a consequente abertura política; além desses fatores,
colabora para esse processo, a concomitante imersão da Educação
Física em um viés mais crítico.
Joffre Dumazedier, estudioso representativo dessa temática,
a partir da década de 1980, passa a ser criticado pelo caráter fun-
cionalista de seus estudos (e, inclusive, desse próprio conceito de
lazer). Dumazedier (1999 apud PICOLLO, 2008, p. 18), conceituou
lazer como:
[...] conjunto de ocupações às quais o indivíduo pode entregar-se
de livre vontade, seja para repousar, seja para divertir-se, recrear-se
e entreter-se, ou ainda para desenvolver sua formação desinteres-
sada, [...] após livrar-se das obrigações profissionais, familiares e
sociais.

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74 © Jogos e Brincadeiras II

O caráter funcionalista do lazer, tal qual presente no concei-


to de Dumazedier, evidencia-se na medida em que o lazer é con-
cebido e utilizado como uma "válvula de escape" do trabalho e do
enfrentamento das mazelas sociais (PICOLLO, 2008).
Em outras palavras, podemos evidenciar esse caráter funcio-
nalista na utilização do lazer para a recuperação do trabalhador
(do ponto de vista físico e psicológico, por exemplo), para o mas-
caramento das questões sociais (despolitização) pela via do lazer e
entre outros elementos.
Nesse sentido, estudiosos brasileiros, como Nelson Carvalho
Marcellino e Fernando Mascarenhas, debruçam-se sobre o tema
de modo a proporem conceitos, compreensões e práticas trans-
cendentes de lazer. Veremos, a seguir, algumas possibilidades rela-
cionadas a esses conceitos transcendentes.
Nelson Carvalho Marcellino distingue algumas nuances da
visão funcionalista do lazer: a abordagem romântica (a busca da
"paz social" pelo lazer), a abordagem moralista (a manutenção da
"ordem" pelo lazer), a abordagem compensatória ou utilitarista
(compensação das imposições da vida social, especialmente o tra-
balho, com atividades socialmente aceitas e moralmente corretas
(MARCELLINO, 2008).
Dumazedier, ainda apresenta um conceito clássico relacio-
nado aos estudos do lazer: os três "D". Você já ouviu falar? Trata-
-se, no ponto de vista desse autor, de considerar que o lazer possui
três funções fundamentais: a Diversão, o Descanso e o Desenvolvi-
mento (MARCELLINO, 2008). Em suma, podemos a partir do lazer,
proporcionar e/ou vivenciar essas três funções.
Picollo (2008) trata dos conceitos de lazer emergentes a par-
tir da década de 1980 e que nos permitem situar as discussões em
Jogos e Brincadeiras II suscitadas no princípio desta unidade e que
serão propostas posteriormente.
Marcellino (2001 apud PICOLLO, 2008) compreende que o
lazer pode ser entendido como cultura vivenciada no tempo dis-
© U2 – Lazer e Transmissão Cultural na Escola: Jogos e Brincadeiras como Conteúdos Escolares 75

ponível. Ele situa o lazer no âmbito de uma prática social crítica e


criativa de sujeitos historicamente situados. Ou seja, o lazer passa
a ser concebido em relação ao seu potencial de desenvolvimento
dos sujeitos, superando, assim, a tradicional sinonímia entre lazer
e divertimento ou descanso (em uma asserção funcionalista).
Com base nesses pressupostos, Marcellino (2002 apud PI-
COLLO, 2008, p. 20) destaca o aspecto educativo do lazer, desde
que ele seja entendido como possibilidade de atuação no plano
cultural objetivando a construção de novas formas de sociabilida-
de, tendo em vista que:
[...] apenas assim o lazer se transforma em instrumento de con-
tra-hegemonia e de crítica a miséria e opressão que abundam as
múltiplas esferas da sociedade capitalista; por conseguinte, o lazer
também pode adquirir uma função de elevação de nossas cons-
ciências para além do senso comum, fato de fundamental impor-
tância para traçarmos caminhos sociais mais fraternos e solidários.

Mascarenhas (2001; 2005 apud PICOLLO, 2008), por sua vez,


concebe o lazer como um mecanismo de resistência à dominação
ideológica, dotado do objetivo e do potencial de transformar a so-
ciedade (como elemento coadjuvante, associado aos espaços dota-
dos de semelhante possibilidade – como a educação, por exemplo).
Nessa perspectiva, o referido autor compreende o lazer
como força de reorganização da sociedade e como elemento edu-
cativo capaz de fomentar e contribuir à construção de outros valo-
res a balizarem as relações sociais: "Neste contexto, o lazer passa
a ser entendido como tempo e lugar da construção de cidadania
e exercício da liberdade" (MASCARENHAS, 2005 apud PICOLLO,
2008, p. 21).
Até aqui, podemos compreender o lazer como uma prática
social e elemento da cultura que, sendo síntese das determina-
ções históricas, pode exercer tanto a função de transformação so-
cial, em um sentido emancipatório, quanto de interiorização das
relações sociais adaptadas e não questionadoras da sociedade.

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76 © Jogos e Brincadeiras II

Essa relação será também tratada nas posteriores leituras


desta unidade. Por hora, propomos que você reflita sobre as pos-
sibilidades de articulação entre o lazer e a Educação Física escolar
e para as finalidades dessa relação, as quais são concretizadas no
âmbito de nossa intervenção pedagógica.
No tocante à superação do conceito de lazer funcionalista,
constata-se que os autores citados por Picollo (2008) – Nelson
Antônio Marcellino e Fernando Mascarenhas – convergem para a
compreensão de que o lazer apresenta possibilidades de contri-
buir com o processo de transformação social.
Isso acontece na medida que representa um importante ele-
mento de construção da consciência crítica e de formas de inter-
venção social, superando assim, o pretendido senso comum ligado
em nossa sociedade em torno das práticas de lazer e da realidade.
Fundamentado nessas considerações, devemos compreen-
der a profícua relação possível entre a Educação Física e o lazer,
tendo em vista a possibilidade de que a primeira se constitui como
elemento mediador da produção de conhecimentos e do fomento
a práticas de lazer comprometidas com a transformação social.
Não obstante, a priori, seja possível aliar o lazer somente aos
espaços e tempos da educação não formal, Picollo (2008) pondera
que – perspectiva com a qual coadunamos – a Educação Física na
escola também pode (e deve) contribuir à ampliação da tematiza-
ção, da problematização e da vivência do lazer.
Os espaços de educação não formal representam espaços
privilegiados para a vivência do lazer. Neles, o lazer carrega consi-
go, assim como na educação formal, um duplo processo educativo
(tema de estudo do próximo tópico).
Embora este estudo componha o currículo de um curso de
licenciatura, mencionar o lazer nos espaços não formais de educa-
ção é de suma importância.
© U2 – Lazer e Transmissão Cultural na Escola: Jogos e Brincadeiras como Conteúdos Escolares 77

Melo (2006) menciona que na atualidade, o lazer represen-


ta um aspecto cultural que não se encontra plena e democratica-
mente acessível à população brasileira. As limitações e /ou barrei-
ras para o acesso ao lazer referem-se à insuficiência de espaços e
equipamentos (parques, ginásios, quadras, cinemas, bibliotecas,
entre outros), ao restrito tempo de não trabalho que pode ser
destinado a tais atividades em íntima relação com a classe social
da população (o tempo de não trabalho, para grande parte das
pessoas é restrito e/ou sequer existe), a insuficiência de políticas
públicas relacionada ao lazer e entre outros elementos.
Além desses fatores Marcellino (2008) acrescenta que há as
"barreiras intraclasses sociais", tais como as condições sócioeco-
nômicas, o gênero (as mulheres, seja pela rotina do trabalho do-
méstico, seja pela dupla jornada de trabalho têm acesso restrito
ao lazer); a faixa etária (especificamente em relação a crianças e
idosos), o nível de instrução e entre outros.
Nesse sentido, uma importante atribuição ao professor de
Educação Física pode ser a de animador cultural. Isto é, o professor
de Educação Física pode e deve procurar estimular a potencialização
das possibilidades de vivência de lazer da população. Essa interven-
ção pode vir a contribuir com a ampliação do acesso ao lazer e aos
processos de reivindicação da população, junto ao poder público,
pelo provimento desse direito garantido pela Constituição.
Melo (2006, p. 8) assinala que a animação cultural pode ser
compreendida como:
[...] uma tecnologia educacional (uma proposta de intervenção pe-
dagógica) pautada na ideia radical de mediação (que nunca deve
significar imposição), que busca permitir compreensões mais apro-
fundadas acerca dos sentidos e significados culturais (consideran-
do as tensões que nesse âmbito se estabelecem) que concedem
concretude à nossa existência cotidiana, construída com base no
princípio de estímulo às organizações comunitárias (que pressupõe
a ideia de indivíduos fortes para que tenhamos realmente uma
construção democrática), sempre tendo em vista provocar ques-
tionamentos acerca da ordem social estabelecida e contribuir para
a superação do status quo e para a construção de uma sociedade
mais justa.

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78 © Jogos e Brincadeiras II

No final desta unidade, propomos uma atividade em que


você deverá realizar um levantamento dos espaços e das ativida-
des de lazer de seu bairro e/cidade.
Para subsidiá-lo nesta atividade, necessitamos discutir outro
ponto: o espaço e os equipamentos necessários para a prática do
lazer. Entendemos por espaço o "suporte para os equipamentos"
e, por equipamentos, "os objetos que organizam o espaço em fun-
ção de determinada atividade" (MARCELLINO, 2006).
Desses conceitos, assinalamos que democratizar o lazer im-
plica em democratizar o espaço e os equipamentos. No que se re-
fere a eles, Requixa (1980 apud MARCELLINO, 2006) os categoriza
em equipamentos específicos e não específicos.
Os primeiros são construídos com a finalidade da prática do
lazer (campos de futebol, praças, parques, teatro, cinema, etc.); os
segundos são aqueles que, em sua origem, não foram construídos
para a prática das atividades de lazer, mas que , posteriormente,
tiveram a sua destinação primária alterada, parcial ou totalmente,
criando-se espaços para as atividades de lazer ( o lar, a rua, o bar,
a escola, a universidade, etc.)

6. O LAZER COMO VEÍCULO E COMO OBJETO DE EDU-


CAÇÃO: UM DUPLO PROCESSO EDUCATIVO
Considerando que anteriormente mencionamos, não obstan-
te de forma principiante, a dimensão educativa do lazer se faz ne-
cessária, nesse momento, tratar de forma mais detida essa questão.
Como aporte teórico para suprir essa demanda, nos utiliza-
remos de Marcellino (1987). O autor advoga em prol da evidência
de que o lazer congrega um duplo processo educativo – o lazer
como veículo e como objeto de educação. Em relação a esse du-
plo aspecto do lazer, há que se ressaltar que Marcellino aproveitou
as ideias de Renato Requixa. O tema foi discutido em sua obra La-
zer e Humanização, publicado em 1983.
© U2 – Lazer e Transmissão Cultural na Escola: Jogos e Brincadeiras como Conteúdos Escolares 79

Nelson Carvalho Marcellino é doutor em Educação pela Uni-


versidade Estadual de Campinas (Unicamp), mestre em Filosofia
da Educação e licenciado em Ciências Sociais pela Pontifícia Uni-
versidade Católica de Campinas. Atualmente é professor da Uni-
versidade Metodista de Piracicaba, nos cursos de mestrado em
Educação Física e doutorado em Educação.
Inicialmente, é necessário que você evidencie algumas ques-
tões sobrepostas na afirmação grifada anteriormente: O que signi-
fica afirmar que o lazer pode representar tanto um veículo como
um objeto de educação? O que configura, analiticamente, cada
uma dessas dimensões? Por que elas se revelam importantes para
a relação entre o lazer e a escola e/ou o lazer e a Educação Física
escolar? Essas questões necessitam ser compreendidas por você,
futuro professor de Educação Física.
Atente para o fato de que o autor do texto referenciado pro-
cura romper com o conceito de lazer concebido sob um viés fun-
cionalista. Nesse sentido, reflita sobre a citação a seguir:
Trata-se de um posicionamento baseado em duas constatações:
a primeira, que lazer é um veículo privilegiado de educação; e a
segunda, que para a prática positiva das atividades de lazer é ne-
cessário o aprendizado, o estímulo, a iniciação, que possibilitem a
passagem de níveis menos elaborados, simples, para níveis mais
elaborados, complexos, com o enriquecimento do espírito crítico,
na prática ou na observação. Verifica-se, assim, um duplo processo
educativo – lazer como veículo e como objeto de educação (MAR-
CELLINO, 1987, p. 58, grifos do autor).

Abordaremos, primeiramente, o "lazer como veículo de


educação" (explicitado na expressão "educação pelo lazer").
Marcellino (1987) afirma que se relacionam a essa dimensão
as potencialidades do lazer para o desenvolvimento pessoal e so-
cial dos sujeitos.
Isso significa que tanto nas ocasiões em que o lazer é utilizado
com objetivos de relaxamento e de prazer, quanto nas ocasiões cujo
objetivo é a compreensão da realidade, ocorre o desenvolvimento
pessoal e o desenvolvimento social dos sujeitos; este último pelo

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80 © Jogos e Brincadeiras II

[...] reconhecimento das responsabilidades sociais, a partir do agu-


çamento da sensibilidade ao nível pessoal, pelo incentivo ao auto-
aperfeiçoamento, pelas oportunidades de contatos primários e de
desenvolvimento de sentimentos de solidariedade (MARCELLINO,
1987, p. 60).

É necessário esclarecer, entretanto, que para além de uma


conceituação utilitária e acrítica do potencial educativo do lazer –
evidenciada, por exemplo, no consumo dos produtos da indústria
cultural pelo lazer ou mesmo, na difusão do lazer como forma de
"aliviar" tensões e/ou promover o "desenvolvimento integral" dos
sujeitos (discursos comumente presentes e veiculados no âmbito
do lazer) – deve-se ter claro que:
Assim, só tem sentido se falar em aspectos educativos do lazer, se
esse for considerado [...] como um dos possíveis canais de atuação
no plano cultural, tendo em vista contribuir para uma nova ordem
moral e intelectual, favorecedora de mudanças no plano social. Em
outras palavras: só tem sentido se falar em aspectos educativos do
lazer, ao considerá-lo como um dos campos possíveis de contra-
-hegemonia (MARCELLINO, 1987, p. 63).

O "lazer como objeto de educação", em linhas gerais, ex-


plicita-se na necessidade da "educação para o lazer". Esclarece
Requixa (1980 apud MARCELLINO, 1987), que se trata do aprendi-
zado o uso do tempo livre.
No entanto, o "lazer como objeto de educação" também traz
consigo tanto elementos emancipatórios e de apropriação crítica
da realidade, quanto de veiculação e de manutenção do status quo
social.
Analise as citações a seguir. Elas complementam as questões
em estudo nesta seção.
As práticas corporais no âmbito do lazer, considerando seus aspec-
tos educativos, contribuem para a compreensão do novo mundo
social e a intervenção nele. Nesse contexto, torna-se relevante re-
fletir sobre o lazer, tanto pelo seu teor educativo propositivo, quan-
to pelo seu aspecto político-social (FRANÇA, 2003, p. 35).
À guisa de conclusão, reafirmamos a relevância educativa de prá-
ticas no âmbito do lazer, explorando temáticas à luz de reflexões
sobre a realidade sociopolítico-educacional, propiciando ruptura
© U2 – Lazer e Transmissão Cultural na Escola: Jogos e Brincadeiras como Conteúdos Escolares 81

com práticas desvinculadas das atuais exigências sociais. Creio ser


esse o desafio que se coloca como uma tarefa coletiva inadiável
(Idem, p. 45).

Observe a Figura 2. Ela mostra o esquema elaborado para


apresentar os conceitos fundamentais do lazer referenciados em
Marcellino (1987).

Fonte: Marcellino (1987)


Figura 2 Esquema demonstrativo dos conceitos fundamentais relativos ao lazer

7. LAZER COMO PRÁTICA SOCIAL: CONTEÚDOS PARA


A EDUCAÇÃO FORMAL
O lazer tem sido tratado tanto nas produções acadêmicas de
diversas áreas do saber, como nas normativas legais oficiais, de
diferentes âmbitos, como um direito a ser garantido a todo o cida-
dão brasileiro.
A Constituição Federal, no Capítulo II, que trata dos Direitos
Sociais, no Artigo 6º, determina que "são direitos sociais a educa-
ção, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previ-

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82 © Jogos e Brincadeiras II

dência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência


aos desamparados, na forma desta Constituição" (grifo nosso).
A discussão que pretendemos aprofundar é o lazer como
prática social, que constitui parte de nosso patrimônio cultural e,
portanto, deve ser incluído na pauta da organização e desenvolvi-
mento dos currículos e dos conteúdos escolares.
Para problematizarmos essa discussão, colocamos como
ponto de partida a seguinte questão: são os conhecimentos pro-
duzidos pela humanidade sobre o lazer, enquanto campo teórico
e conceitual que devem compor currículos escolares e/ou são os
conhecimentos sobre as diferentes formas de utilizar o tempo livre
que devem ser transmitidos nos espaços de educação formal, ou
seja, na escola?
Para Marin (2008), os estudos sobre o lazer colocam clara-
mente dois desafios à escola e aos professores:
• entender o lazer como parte do patrimônio cultural hu-
mano e, portanto, deve ser transformado e transmitido
às novas gerações.
• revisar os conteúdos escolares majoritariamente traba-
lhados nas escolas, incluindo novas e diversas práticas
corporais como conteúdo de ensino, para que sejam utili-
zados como formas diferentes de se exercitarem no tem-
po livre.
Essa preocupação de pensar sobre o lazer como prática so-
cial que precisa ser desenvolvido e aprimorado, está presente nos
documentos oficiais e tem aparecido como um dos principais ob-
jetivos para o uso dos conhecimentos da Educação Física na vida
cotidiana dos indivíduos.
Nos Parâmetros Curriculares Nacionais de 1ª a 4ª séries o
lazer é colocado como uma das finalidades para o uso dos conheci-
mentos decorrentes das aprendizagens na Educação Física Escolar:
© U2 – Lazer e Transmissão Cultural na Escola: Jogos e Brincadeiras como Conteúdos Escolares 83

O trabalho de Educação Física nas séries iniciais do ensino funda-


mental é importante, pois possibilita aos alunos terem, desde cedo,
a oportunidade de desenvolver habilidades corporais e de partici-
par de atividades culturais, como jogos, esportes, lutas, ginásticas e
danças, com finalidades de lazer, expressão de sentimentos, afetos
e emoções (BRASIL, 1997, p. 15, grifo nosso).

Essa finalidade posta para os conteúdos escolares de 1ª a 4ª


séries também é evidenciada nos Parâmetros Curriculares Nacio-
nais de 5ª a 8ª séries, quando eles propõem que:
O trabalho de Educação Física nas séries finais do ensino funda-
mental é muito importante na medida em que possibilita aos alu-
nos uma ampliação da visão sobre a cultura corporal de movimen-
to, e, assim, viabiliza a autonomia para o desenvolvimento de uma
prática pessoal e a capacidade para interferir na comunidade, seja
na manutenção ou na construção de espaços de participação em
atividades culturais, como jogos, esportes, lutas, ginásticas e dan-
ças, com finalidades de lazer, expressão de sentimentos, afetos e
emoções. Ressignificar esses elementos da cultura e construí-los
coletivamente é uma proposta de participação constante e respon-
sável na sociedade (BRASIL, 1998, p. 15, grifo nosso).

Também podemos retomar a leitura que fizemos, na Unida-


de 1, sobre a transmissão cultural como função primordial da es-
cola e as práticas da cultura corporal como conteúdos de ensino.
As práticas corporais foram aprimoradas, sistematizadas e
cientificadas ao longo da história humana. Esse processo histórico
ocorreu guiado por diferentes necessidades e possibilidades para
o uso das habilidades físicas.
Entre essas possibilidades e necessidades podem-se incluir motivos
militares, relativos ao domínio e ao uso de espaço; motivos econô-
micos, que dizem respeito às tecnologias de caça, pesca e agricultu-
ra; motivos de saúde, pelas práticas compensatórias e profiláticas.
Podem-se incluir, ainda, motivos religiosos, no que se referem aos
rituais e festas; motivos artísticos, ligados à construção e à expres-
são de ideias e sentimentos; e por motivações lúdicas, relacionadas
ao lazer e ao divertimento (BRASIL, 1998, p. 27-28, grifo nosso).

Como podemos observar, algumas práticas têm um caráter


essencialmente utilitário e se relacionam mais diretamente

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84 © Jogos e Brincadeiras II

[...] à realidade objetiva com suas exigências de sobrevivência,


adaptação ao meio, produção de bens, resolução de problemas
e, nesse sentido, são conceitualmente mais próximas do trabalho
(Idem, p. 28).

Assim como outras práticas existem por motivos essencial-


mente subjetivos e simbólicos,
[...] são realizadas com fim em si mesmas, por prazer e divertimen-
to. Estão mais próximas do lazer e da fantasia, embora suas origens,
em muitos casos, estejam em práticas utilitárias (Idem, p. 28).

O lazer se encontra no centro dos estudos e produções sobre


os objetivos das práticas corporais e suas formas de inserção na
escola como conteúdos de ensino.
Para que consigamos entender essa ligação entre os conte-
údos escolares e o lazer e o tempo livre, temos que nos debruçar-
mos em uma tarefa um tanto árdua de conceituação e compreen-
são desses dois termos.
Poderíamos começar dizendo que o tempo livre é um tempo
de não trabalho (trabalho formal e institucionalizado socialmen-
te) e que o lazer é como as pessoas fazem uso desse tempo livre.
Esse uso do tempo livre pode estar condicionado por uma visão
de mundo ligada especialmente ao consumo, ou a uma visão de
mundo que entende o uso do tempo livre desinteressado, livre e
simbólico.
Dessa forma, atualmente, o lazer vem sendo colocado em
dois polos distintos: o viés do consumo e da cultura, como repre-
sentam as Figuras 3 e 4 a seguir:
© U2 – Lazer e Transmissão Cultural na Escola: Jogos e Brincadeiras como Conteúdos Escolares 85

Figura 3 O lazer pelo viés do consumo

Figura 4 A Capoeira como um elemento da cultura corporal e do lazer

Analise as duas imagens e reflita: em que medida a capoeira


(assim como os demais elementos que compõem a cultura corpo-
ral) pode ser e/ou tem sido apropriada e utilizada como lazer pelo
viés do consumo?

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86 © Jogos e Brincadeiras II

Para darmos continuidade a esta parte do estudo, pedimos


que você descreva em um pequeno parágrafo seu entendimento
inicial sobre essas duas formas de entender o lazer. Procure exem-
plificar as duas posições com fatos do seu cotidiano.
O consumo tem sido visto como uma, senão a principal, for-
ma de fazer uso do tempo livre. O consumo dita as regras sobre
o uso do tempo livre, ou seja, ressalta as diferenças sociais. O la-
zer passa a acontecer pelo "consumo" ou pelo "não consumo"; o
primeiro para aqueles que dispõem de recursos, aos quais há o
acesso aos bens e serviços especializados (e caros) disponíveis nos
shopping centers, parques, bares, casas noturnas, pacotes turís-
ticos, cinemas, hotéis, cruzeiros marítimos etc.; o segundo para
a camada da população menos favorecida, à qual resta o espaço
doméstico por meio da televisão.
A mídia tem um papel importante no fortalecimento desses
princípios a partir do momento que se encarrega de difundir, em
massa, os bens de consumo oferecidos pela indústria do lazer.
Os bens de consumo são aqui entendidos como tudo o que
pode ser comprado. Todo o aparato tecnológico, os serviços es-
pecializados, até mesmo os programas televisivos, os quais são
adquiridos camufladamente na compra dos bens propagandeados
pelos meios de comunicação
A falta de opção, de escolhas ou de vontade de adotar outras
formas de lazer pode estar retratando diferentes aspectos da for-
mação cultural de nossa sociedade.
A partir do momento em que o consumo é tido como a prin-
cipal ou a melhor forma de lazer e prazer, e a condição econômica
para acessar suas diferentes possibilidades, temos com certeza,
amplas discussões a serem incluídas nos espaços escolares.
Essa interpretação do lazer merece uma reflexão crítica por
parte da sociedade, assim como um cuidado rigoroso por parte da
escola, que tem por função apresentar aos alunos as diferentes
formas de se inserir na sociedade.
© U2 – Lazer e Transmissão Cultural na Escola: Jogos e Brincadeiras como Conteúdos Escolares 87

Você, como futuro professor, deve se perguntar ao selecio-


nar os conteúdos de ensino e preparar suas aulas, sobre as ex-
periências como aluno da Educação Básica. Em quais situações
a educação para o lazer ocorreu na escola de forma a reforçar o
consumo alienado, e quando serviu para a produção cultural e o
consumo crítico?
A sociedade deve ter condições de fazer a crítica "às concep-
ções que associam lazer ao crescimento econômico, com o con-
sumo, com o uso de equipamentos, com as técnicas de diversão,
e que, em sua essência, correspondem ao apelo do mercado e à
reprodução das desigualdades sociais" (MARIN, 2008, p. 100), de
forma que se elevam valores democráticos, solidários e de inclu-
são social que se sobreponham aos valores hegemônicos do mun-
do do consumo e da competição.
Não podemos deixar de considerarmos a subjetividade dos
sujeitos e suas escolhas para o uso de seu tempo livre; todas as
atividades realizadas são formas de praticar o lazer.
Cabe à escola, de maneira geral, e em especial à Educação Fí-
sica, transmitir e ensinar outras possibilidades para o uso de tempo
livre que tenham como elemento principal as práticas corporais.
Depois desse breve estudo sobre o lazer, podemos ver que
o foco dos objetivos escolares, de nossa área, é ensinar práticas
corporais que possam ser utilizadas no tempo livre dos cidadãos.
Cabe fazer o aluno da Educação Básica entender as diferen-
ças entre as práticas que reproduzem os valores sociais ligadas ao
consumo, à sociedade excludente e desigual e às práticas que lan-
çam valores sociais democráticos, de igualdade e inclusão social.
Como podemos ver, o jogo e o brincar tem uma importante
função para pensar o lazer de forma lúdica e em espaços sociais.

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88 © Jogos e Brincadeiras II

8. EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR E O LAZER: UMA RE-


LAÇÃO NECESSÁRIA
A seguir, aprofundaremos o estudo sobre o lazer e suas re-
lações com a Educação, por meio da leitura do texto Nexos entre
e Educação Física Escolar e o Lazer. Nesse texto, a autora, Elizara
Carolina Marin, aborda alguns conceitos sobre o lazer e aponta
caminhos para a ligação dessa dimensão cultural com a Educação
Física Escolar.
O texto encontra-se disponibilizado na íntegra no Tópico 9
desta unidade, Texto Complementar. Sua publicação neste CRC foi
autorizada pela autora.
A professora Elizara Carolina Marin é doutora em Ciências
da Comunicação pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Uni-
sinos), mestre em Educação Física pela Universidade Estadual de
Campinas (Unicamp) e licenciada em Educação Física pela Univer-
sidade Federal de Santa Maria (UFSM). Atualmente é professora
adjunta do Centro de Educação Física e Desportos (CEFD) da UFSM
e coordena o Grupo de Pesquisa em Lazer e Formação de Profes-
sores (GPELF).

9. TEXTO COMPLEMENTAR
Essa leitura aborda aspectos importantes da relação entre o
lazer e a educação física escolar.

Nexos entre a educação física escolar e o lazer––––––––––––


Elizara Carolina Marin – Doutora em Ciências da Comunicação e Professora
do Centro de Educação Física e Desportos (CEFD) da Universidade Federal de
Santa Maria (UFSM).
Para tratar do tema proposto, parto do princípio de que uma das especificida-
des do campo de conhecimento da Educação Física é a da formação e atuação
pedagógica (BRACHT, 2000). Ainda que não haja unidade, em âmbito nacional,
para a compreensão e a delimitação deste campo de conhecimento, situo a Edu-
cação Física na esfera pedagógica. Com base nesta perspectiva epistemológica,
procuro estabelecer relações entre Educação Física Escolar e Lazer e enfatizar
que a concepção de cultura é um eixo estruturador para pensar os conteúdos da
Educação Física nos diferentes contextos sociais em que ela pode ocorrer.
© U2 – Lazer e Transmissão Cultural na Escola: Jogos e Brincadeiras como Conteúdos Escolares 89

Algumas reflexões sobre o Lazer


É preciso considerar que o tema lazer vem recebendo, na última década, desta-
que em eventos mundiais, em congressos científicos, em revistas de circulação
nacional, em debates de programas televisivos e, especialmente, investimentos
em termos de equipamentos de diversão pela esfera privada. Nesse contexto, é
preciso questionar por que se fala tanto em tempo livre e em lazer: o interesse
reside na crença de que tempo livre e lazer são necessidades humanas que de-
vem ser garantidas? Ou seria uma necessidade do capital gerar tempo livre para
os indivíduos poderem consumir e/ou recompor suas energias para a produção?
Na sociedade contemporânea, são visíveis os amplos investimentos econô-
micos na esfera da diversão. Basta caminhar pelas ruas, sintonizar o rádio,
acessar a Internet e, especialmente, ligar a televisão para identificar os grandes
investimentos em termos de "construção" de equipamentos (como parques,
shopping center, bares, casas noturnas, pacotes turísticos, cinemas, hotéis,
cruzeiros marítimos), de tecnologias, de produções midiáticas e, em termos de
propaganda, estímulo para o consumo desse tipo de entretenimento.
Não obstante, a generalização do entretenimento não significa democratização
dos bens culturais. As desigualdades sociais também se reproduzem na esfera
da diversão. A esfera do tempo livre da diversão não se configura independente
das demais, defende Sue (1982). A condição econômico-social de uma pessoa,
sobretudo o trabalho que realiza, ou ainda o trabalho negado, condiciona em boa
medida as opções no âmbito do tempo livre e o lugar que ela ocupa na estrutura
social.
Boa parte das discussões dos autores do cenário nacional e/ou internacional
aborda o aumento do tempo livre e a ampliação da oferta de bens e serviços na
área do lazer como um avanço da sociedade, desconsiderando as diferenças
sociais e, portanto, as diferenças de oportunidades no usufruto tanto do tempo
livre quanto dos bens oferecidos pela indústria do lazer.
Na esfera da mídia, o termo lazer passou a ser associado ao consumo de bens
oferecidos pelo mercado, revestido da idéia de democratização de possibilidade
de acesso, como se os equipamentos de lazer e as diversas formas de bens e
serviços oferecidos pela indústria do lazer estivessem acessíveis a todos. Trata-
-se, antes, de uma falácia. Diversas pesquisas (LOPES et all, 2002; BORELLI &
PRIOLLI, 2000) identificam que, para elevados percentuais da população brasi-
leira, a vivência de lazer se dá, preponderantemente, no espaço doméstico por
intermédio da televisão. Esta assume grande importância para os setores popu-
lares tanto por ser uma alternativa de lazer que não exige grande investimento
econômico quanto por possibilitar fugir das tensões causadas pelo trânsito e ser
uma contrapartida à correria diária.
Mas, ao que discute García Canclini (2001), não é só no Brasil que este fenôme-
no acontece. Numa pesquisa realizada sobre o consumo cultural na cidade do
México, o autor registra o baixo uso coletivo do espaço urbano, apontando que
95% da população do Distrito Federal vêem, habitualmente, televisão. Nos finais
de semana, a maior parte da população dedica seu tempo livre à vida doméstica,
com alta porcentagem do tempo dedicado ao consumo de programas televisivos.
Uma das teorias desenvolvidas por um dos importantes sociólogos do lazer, Jo-
fre Dumazedier (1979), é a de que a sociedade caminha rumo à civilização do
lazer. O sociólogo italiano Domenico De Masi (2000), muito lido e discutido nos
últimos tempos, na mesma direção, aposta que caminhamos para a sociedade
do tempo livre. Este autor defende a necessidade de redução da jornada de

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90 © Jogos e Brincadeiras II

trabalho para duas horas, para possibilitar não apenas a redução dos níveis de
desemprego como também um novo tipo de consumo: o cultural. Segundo este
autor, na sociedade tecnológica, caberia para a humanidade, apenas, ser criativo
e ocupar o tempo de modo criativo.
Aqui, algumas reflexões precisam ser feitas. Como ser criativo se o trabalho,
para a maioria dos trabalhadores, é desenvolvido por meio de longas jornadas?
Se o trabalho está apartado do saber fazer? Se não se permite ao trabalhador
compreender o processo e o produto do seu fazer? Decorre daí o questionamen-
to sobre qual lazer poderia restituir o que as pessoas perdem de si no trabalho. A
dominação exercida no trabalho também se faz sentir no lazer.
A filósofa Simone Weil (1979) adverte contra os sistemas de reformas ou de
transformação social, anunciadores da diminuição da duração do trabalho. Se
o trabalho não se oferecer enquanto sendo ação-reflexão, inúteis continuarão
sendo as horas de não-trabalho, pois "ninguém aceitaria ser escravo por duas
horas; a escravidão, para ser aceita, deve durar por dia o bastante para quebrar
alguma coisa dentro do homem" (WEIL, 1979, p. 140).
Tais considerações orientam para a impossibilidade de pensar o lazer sem pen-
sar o trabalho e as condições histórico-sociais vividas. Indicam, ainda, a impossi-
bilidade de pensar o lazer apenas na dimensão do divertimento ou da recreação,
normalmente associados.
Pode-se dizer que, por diferentes estratégias e com diferentes interesses, o la-
zer vem sendo associado ao consumo, à função compensatória de reparar as
energias gastas na esfera do trabalho, à função utilitária de ocupar o tempo das
pessoas (com esporte, recreação, entre outras atividades) para supostamente
evitar "riscos de conduta". Tais concepções colaboram para a manutenção do
sistema vigente com suas faces de violência material e simbólica.
No âmbito da esfera pública, o panorama não difere muito da privada. Pesqui-
sas demonstram que, no contexto do currículo de formação de profissionais em
Educação Física das universidades, por exemplo, o trato do conhecimento da
disciplina "Recreação e Lazer" enfatiza a matriz conceitual na perspectiva utili-
tarista que considera a prática da recreação e do lazer um "meio para" alcançar
algo. Há maior preocupação com a demonstração de técnicas recreativas, com o
ensino de jogos, do que com a tematização das relações sociais e históricas que
envolvem o lazer e os contextos nos quais ele se efetiva.
Observo que a crítica que está sendo realizada aqui é direcionada para as con-
cepções que associam lazer ao crescimento econômico, com o consumo, com
o uso de equipamentos, com as técnicas de diversão, e que em sua essência,
correspondem ao apelo do mercado e à reprodução das desigualdades sociais.
Na pesquisa realizada sobre o lúdico na vida de mulheres rurais já se enunciava
que, "pensar o lazer como bens a serem adquiridos é uma idéia que nos barba-
riza, pois arrebata para além de nós, para o exterior – no consumo – o encontro
com a arte, com o lúdico, com a diversão, com dimensões que deveriam estar
presentes em tudo o que fazemos" (MARIN, 1996, p. 85).
Para além das perspectivas assinaladas, objetivo chamar atenção para a com-
preensão do lazer como direito social assegurado pela Constituição brasileira
de 1988 (art. 217, parágrafo III) e como necessidade humana que precisa ser
garantida no cotidianos.
Se pensarmos o lazer, conforme alude Marcellino (1990, p. 34), "como a cultura
– compreendida no seu sentido mais amplo – vivenciada (praticada ou fruída) no
© U2 – Lazer e Transmissão Cultural na Escola: Jogos e Brincadeiras como Conteúdos Escolares 91

‘tempo disponível", dois aspectos tornam-se importantes para destacar os nexos


que se querem estabelecer a seguir. Um diz respeito ao fato de que, na socieda-
de atual, a dimensão lúdica humana constituinte da cultura, tem possibilidade de
se manifestar prioritariamente no espaço/ tempo de não trabalho, dadas as for-
mas de organização do trabalho (extensas jornadas, ritmo da máquina, execução
de tarefas desprovidas de sentido, isenção das garantias dos direitos sociais).
Portanto, o "tempo disponível" abre-se como terreno afeito à dimensão do jogo,
do brinquedo e da festa. Outro aspecto diz respeito ao fato do lazer desenvolver-
-se no terreno da cultura, agregando tanto manifestações construídas historica-
mente pela humanidade, quanto o que é específico do contexto – país, região,
comunidade – onde ele ocorre.

Alguns nexos entre Educação Física Escolar e lazer


Situo a Educação Física como disciplina curricular que tem como principais con-
teúdos o trato da cultura corporal, ou seja, os jogos, a ginástica, as lutas, as
acrobacias, a mímica, o esporte, dentre outros, e que contribui para o processo
de democratização do conhecimento historicamente construído. Conforme pos-
tulado por Coletivo de Autores (2002), a reflexão sobre a cultura corporal busca
problematizar as formas de representações que o homem tem produzido histori-
camente no mundo e exteriorizado pela expressão corporal. Essa produção hu-
mana tornou-se patrimônio cultural e, simultaneamente a ela, outras atividades,
instrumentos, formas de trabalho foram criadas.
A dimensão histórica adotada nesta concepção afasta-se da noção biológica ou
da natureza, e situa os jogos, a ginástica, as lutas, as acrobacias, a mímica, o
esporte, entre outros, como construções humanas no processo histórico, e em
estreita relação com necessidades sociais, econômicas e culturais.
Associada à compreensão de sujeito histórico, está a noção de sujeito cultural
que cria e re-configura movimentos e jogos, que podem vir a ser praticados e
jogados por outras pessoas no processo da vida humana. Tal concepção delega
ao sujeito o papel de produtor de novas culturas corporais.
A partir de tais contextualizações, assinala-se um eixo fundamental de alinhavo
entre a Educação Física Escolar e o lazer, sublinhando aqui o horizonte da cul-
tura. Horizonte este que, desde meu ponto de vista, é de extrema importância
para a profissão docente. No entanto, cabem ainda algumas considerações para
evitarem mal-entendidos, pois, como discute Alfredo Bosi (1987), vigora na so-
ciedade atual – diga-se, sociedade alicerçada nas diferenças de classes – uma
concepção de cultura que visa manter tais diferenças sociais, considerando a
priori que o que a maioria das pessoas faz no seu cotidiano não seja denominado
cultura.
A concepção de cultura amplamente difundida nos diferentes campos sociais
e no senso comum é a de cultura associada a algo que se pode comprar, que
pode tornar-se propriedade, enfim, uma mercadoria ou uma soma de objetos.
Também pode ser uma coisa que se herda; um bem de raiz; de família. Portanto,
nessa concepção, ser culto é ter acesso a livros, a obras de arte, a concertos de
música, ao teatro, a conhecimentos e dentre outros. Expresso de outro modo, ter
cultura é possuir bens que se aproximam dos bens de luxo, e somente as pes-
soas com poder aquisitivo ou que acedem ao conhecimento a possuem. Nessa
concepção, a cultura dá à pessoa uma aura de diferença, de superioridade, e a
distingue das demais. Assim, há pessoas que têm cultura e outras que não têm.
Essa é uma concepção reificada de cultura, e que, por isso, a isola, a distingue,

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92 © Jogos e Brincadeiras II

e a situa no reino do que deve ser visto, apreciado, comprado, e, portanto, sem
relação direta com o cotidiano.
Trata-se de uma concepção muito bem caracterizada por Alfredo Bosi, como
não-democrática. A concepção de cultura que o autor considera democrática e
que tem intrínseca relação com o que quero referendar é a de cultura como vida
pensada; como resultado realizado por meio do trabalho; do fazer quotidiano.
Portanto, cultura é um processo, ou um tecido cujos fios são produzidos nas
ações de longa duração
Essa concepção recoloca a cultura para além de um problema de classe, pois
define que todos têm e produzem cultura, sendo o que homens e mulheres fazem
no seu cotidiano e nas condições que eles podem fazer. A cultura se constrói no
processo da vida e se reconstrói na medida em que vai sendo re-significada – ou
sendo-lhe atribuídos novos significados.
Esta concepção é importante ao ser observada no contexto dos processos pe-
dagógicos, pois recoloca a ênfase no processo de produção das ações e não
somente no resultado ou no produto; e principalmente, porque ela entende todos
os sujeitos como produtores de cultura.
Assim, sendo a Educação Física o campo que trata da cultura corporal, tanto ela
deve levar em conta a produção historicamente construída no contexto global
quanto no local (estado, município, escola), garantindo que os alunos se reco-
nheçam em tais conteúdos. A ação pedagógica desvinculada da cultura dos alu-
nos conduz a uma relação centrada no professor e de negação da participação
dos alunos.
À luz do que assinala Bruhns (1997, p. 37), se considerarmos que grande parte
da população, ao optar por alguma atividade corporal, "não busca alto rendimen-
to, mas uma forma de se exercitar no tempo de lazer", pelo menos uma questão
deve ser posta para a Educação Física, área articuladora dos elementos como
jogos, esportes, dança e ginástica, quais sejam: "se os objetivos almejados no
tempo disponível das pessoas, geralmente relacionado à dilatação das regras
sociais, podem ser alcançados através das modalidades tradicionais (...) e da
busca da performance".
Parece ser necessário revisar a prática pedagógica da Educação Física Escolar
marcada pela hegemonização do esporte, portanto, pelos princípios do rendi-
mento, da competição e das regras e técnicas, para o trato da diversidade que
compõe a cultura corporal. Por esse viés, a Educação Física amplia sua im-
portância tanto no espaço escolar quanto na vida social e, ao levar em conta a
cultura corporal, contribui sobremaneira para o usufruto no tempo e espaço de
vivência do lazer, garantindo suas dimensões de livre escolha, de gratuidade e
de expressão lúdica.
Para viabilizar condições favoráveis de consolidação de tais desafios na esfera
da Educação Física Escolar, aponto algumas vias inter-relacionadas e por mim
consideradas fundamentais:
1) Levar em conta o duplo aspecto educativo do lazer como veículo e
objeto de educação, ou seja, reconhecer a potencialidade do lazer para o
desenvolvimento pessoal e social e a necessidade de aprendizado para o
uso do tempo livre (MARCELLINO, 1987);
2) Atuar por meio de uma ação pedagógica que situe os alunos como produtores
de cultura (BOSI, 1987);
© U2 – Lazer e Transmissão Cultural na Escola: Jogos e Brincadeiras como Conteúdos Escolares 93

3) Atuar como mediador estimulando a participação e valorizando o conhecimento


dos alunos (FREIRE, 2006);
4) Procurar articular troca de experiências entre docentes (por meio de reuniões
pedagógicas, de formação continuada), entre docentes e alunos (participação
e engajamento em projetos coletivos consubstanciados na ação/ reflexão/
ação). Como nos ensina Paulo Freire (1987), a realidade é funcionalmente
domesticadora e somente por meio da práxis, isto é, da ação/ reflexão há
possibilidade de libertar-se da sua força. Defende o autor que ação/ reflexão,
alicerçada no engajamento e na comunhão entre semelhantes, abre-se como
um caminho para a promoção de sujeitos sociais. Neste contexto, urge a
necessidade de recuperar o sentido e o valor das trocas de experiências, e
de imprimir experiências coletivas, inclusive como contraponto à atomização
das relações. Walter Benjamim (1986) é enfático em dizer que estamos
ficando pobres: pobres de experiências e de troca de experiências. Portanto,
compreende-se que a vivência lúdica e a participação ativa (para além
da passividade) sejam canais mobilizadores de trocas e de experiências
coletivas;
5) Estimular, para além das técnicas e da conquista de resultados (esporte
formal e atividades competitivas), a valorização dos processos e percursos
das vivências (READ, 2000). A ênfase na ação pedagógica deve estar
situada na perspectiva do sensibilizar, de modo a possibilitar aos alunos
reconhecerem-se no conteúdo trabalhado. Não visualizo possibilidade de
alargar mentalidades se o processo de formação não apresentar sentido para
a vida dos envolvidos. (MARIN, 2008)
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
Não se esqueça de que os Parâmetros Curriculares Nacionais
(em todos os níveis de ensino na Educação Básica) preconizam que
cada conteúdo de ensino (organizado em blocos) sejam desenvol-
vidos e/ou tematizados na escola considerando as seguintes ca-
tegorias/dimensões: categoria conceitual, categoria procedimen-
tal e categoria atitudinal. Você também não deve se esquecer de
identificar e/ou revisar cada um desses conceitos para a realização
da tarefa proposta.

10. O LAZER NOS CONTEXTOS SOCIAIS E AS DEMAN-


DAS EDUCACIONAIS
Agora que já aprofundamos alguns conceitos sobre lazer e
realizamos algumas ligações dessa prática cultural com a Educação
e os conteúdos escolares, faremos uma atividade prática.

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94 © Jogos e Brincadeiras II

Esta atividade objetiva possibilita aos alunos do Curso de Li-


cenciatura em Educação Física a inserção na cultura corporal vivida
por um determinado grupo social. Esta atividade é indispensável
para uma prática pedagógica que pretenda ser reflexiva, autôno-
ma e inovadora.
Logo, para a continuidade desse estudo – que pretende com-
preender as funções da escola na transmissão de conhecimentos
que potencializem as práticas corporais no uso do tempo livre –
precisamos conhecer a cultura para a qual definimos tais objetivos
e ensino.

Atividade prática
Esta atividade é uma pesquisa de campo que tem por ob-
jetivo identificar os principais hábitos de lazer dos moradores de
sua cidade. Tomamos como pressuposto que seus alunos serão
oriundos dessa comunidade, logo, conhecê-la é fundamental para
a definição e organização de conteúdos curriculares que atendam
às necessidades locais e sejam extraídos da cultura local.
Primeiro passo: você fará um levantamento sobre os espa-
ços públicos próprios para o lazer existentes em sua cidade (tea-
tros, cinemas, praças, parques, shopping centers) para conhecer a
diversidade de possibilidades existentes.
Segundo passo: você fará uma pesquisa de campo em duas
praças ou parques da cidade para coletar e analisar as principais
práticas corporais presentes nos hábitos dos moradores de sua ci-
dade.
Para o desenvolvimento da atividade, você deverá seguir os
seguintes procedimentos:
Primeira parte da pesquisa
1) Faça um levantamento dos espaços formais existentes
para o lazer em sua cidade: museus; bibliotecas públicas;
centros comunitários; clubes recreativos, balneários;
© U2 – Lazer e Transmissão Cultural na Escola: Jogos e Brincadeiras como Conteúdos Escolares 95

campos de futebol; canchas de bocha; escolas públicas;


associação de moradores; praças; ruas e avenidas; igre-
jas e capelas; ginásios municipais; parque de exposições;
campo de golf; cemitério; monumento; estrada turística;
parque; casa de cultura, shopping centers etc. (Se você
encontrar outro espaço que possa ser utilizado para a
prática do lazer, inclua na sua listagem).
2) Busque informações no site da Prefeitura, nas Secreta-
rias de Cultura, de Educação, ou de Lazer e Esporte, ou
outras instituições existentes em seu município.
Essa primeira parte contextualizará as diferentes possibilida-
des existentes nas práticas sociais para o uso do tempo livre.
Segunda parte da pesquisa
1) Identifique as duas praças ou parques mais utilizados
para a realização de práticas corporais em sua cidade.
2) Identifique os horários de maior frequência de pratican-
tes.
3) Faça uma observação nos horários com maior frequên-
cia de praticantes identificando e descrevendo todas as
práticas existentes.
Essa parte da pesquisa contextualizará a realidade (ou uma
parte significativa da realidade) das práticas corporais presentes
nos hábitos da cultura de sua cidade.
A seguir, elaboramos no Quadro 1, um roteiro para auxiliá-lo
na sua atividade de observação dos espaços de lazer escolhidos
para a realização de sua atividade.

Quadro 1 Roteiro de observação dos espaços de lazer


ROTEIRO PARA OBSERVAÇÃO DOS ESPAÇOS DE LAZER
Nome do cadêmico
Localização (endereço e
bairro)
Nome do espaço
observado

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96 © Jogos e Brincadeiras II

ROTEIRO PARA OBSERVAÇÃO DOS ESPAÇOS DE LAZER


Área disponível para as
práticas (citar as áreas:
campo de futebol, praça
infantil, etc.)
Data da observação Horário
Breve descrição do
bairro (condições
estruturais,
socioeconômicas, etc.)
Estrutura física do local Por exemplo:

O local observado é um complexo municipal poliesportivo,


contém:

Um ginásio poliesportivo de grande porte.

Ginásios pequenos que comportam atividades diversas.

Uma pista de atletismo de 400 metros.

Uma área para prática de atividades de "esforço",


composta por: 3 barras em alturas diversas, 4 pranchas
para fazer abdominal, 2 banquinhos pequenos para fazer
apoio.

Uma área para prática de skate, patins e bicicleta


composta por 3 pistas, um centro de convenções em
construção.
Atividades realizadas Por exemplo:

Atividade 1:

Local: Exemplo: ginásio poliesportivo (em cada espaço


são realizadas atividades diferentes e todas devem ser
descritas)

Atividades realizadas: Exemplo: ginástica, alongamento,


ginástica para hipertensos, musculação, futsal.

Tipo de evento/atividade: espontâneo/livre ou com


instrutor.

Quais os materiais utilizados no desenvolvimento da


atividade:

Explique como se desenvolve essa atividade:

Quantas pessoas se envolvem nesta atividade:


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Para concluir o estudo desta unidade é necessário que você


faça duas tarefas, explicitadas a seguir, que têm como objetivo sis-
tematizar e organizar os conteúdos trabalhados, além de possibili-
tar uma auto-avaliação de sua aprendizagem.
Na atividade de campo você deve ter elencado um conjunto
de práticas realizadas nos espaços observados.
A partir deste elenco de práticas complete o Quadro 2 a se-
guir (para agruparem as práticas corporais observadas aos blocos
de conteúdos propostos nos Parâmetros Curriculares Nacionais)
relacionado-as com os blocos de conteúdos.

Quadro 2 Agrupamento das práticas corporais


QUADRO DE SISTEMATIZAÇÃO DAS PRÁTICAS CORPORAIS OBSERVADAS
Práticas Esportes Jogos Lutas Ginástica Atividades Conheci-
corporais rítmicas e mentos
observa- expressi- sobre o
das vas corpo
Jogo de Capoeira* Uso de Grupos de
voleibol* aparelhos dança*
para
ginástica*
Jogo de
basquete*
Corrida*

* Exemplos de como agrupar as práticas observadas tomando como referência os blocos


de conteúdos dos PCN's.

Após a realização deste quadro, faça uma análise das práti-


cas privilegiadas pelos sujeitos observados. Aponte quais os blocos
de conteúdos estão mais difundidos nas práticas corporais utiliza-
das nos espaços de lazer.
Se você fosse elaborar um plano de ensino para alunos oriun-
dos dos contextos observados, quais os conteúdos consideraria
uma demanda escolar para a inserção de novas práticas corporais
como atividades de lazer? Explique por quê.

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98 © Jogos e Brincadeiras II

11. QUESTÕES AUTOAVALIATIVAS


Confira a seguir, as questões propostas para verificar o seu
desempenho no estudo desta unidade:
1) Na sua atuação pedagógica, quais são os conteúdos privilegiados?

2) Quais elementos da cultura corporal – jogos, esportes, danças, lutas – apre-


sentam-se no município ou na comunidade (ou bairro) em que a escola está
inserida?

3) De que forma e com quais expressões a cultura corporal e lúdica presentes


no município, na comunidade (ou bairro) em que a escola se insere estão
sendo utilizadas e apropriadas nas aulas de Educação Física?

4) De que modo na prática pedagógica é possível situar o aluno como produ-


tor de cultura?

5) Ao partirmos do pressuposto de que o lazer constitui uma dimensão da


cultura e que, em um sentido emancipatório, pode convergir e/ou orientar-
-se sob a perspectiva de representar um veículo e um objeto de educação
(MARCELLINO, 1987) – tanto no espaço da educação não-formal quanto da
educação formal, no âmbito da Educação Física escolar responda a seguinte
questão: são os conhecimentos produzidos pela humanidade sobre o la-
zer, enquanto campo teórico e conceitual, que devem compor os currículos
escolares e/ou são conhecimentos sobre as diferentes formas de utilizar o
tempo livre que devem ser transmitidos nos espaços de educação formal,
ou seja, na escola? De que forma?

6) Disserte sobre a relação entre a Cultura, o Lazer, os Jogos e as Brincadeiras


e a Educação Física escolar. Ainda, elabore um Mapa Conceitual para repre-
sentar esta relação:

7) Na origem do lazer, qual era a sua finalidade? E hoje, por que as pessoas
procuram pela prática do lazer?

8) O lazer, atualmente é fomentado por órgãos públicos e privados. Você iden-


tifica os interesses que estimulam essas ações de fomento de acordo com
a fonte deste?

9) Em sua opinião, a asserção de que o lazer se constitui como um direito a ser


garantido a todo cidadão (conforme a Constituição Federal (BRASIL, 1988)),
tem se concretizado na realidade? Justifique.

10) O lazer está ao "alcance" de todos? Quem, em sua opinião, tem acesso às
práticas de lazer? Justifique.
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11) Você conhece algum programa ou projeto de lazer vinculado a órgãos


públicos? Qual/Quais)? Qual é o seu objetivo e característica desse(s)
programa(s)?

12) O que significa afirmar que a Revolução Industrial marca o surgimento e a


consolidação de novas formas de produção e novas relações de produção?
Reflita e faça algumas anotações sobre este tópico.

13) Você está lembrado do parágrafo que você escreveu, no Tópico 7, do seu
entendimento inicial sobre as duas formas de entender o lazer (pelo viés do
consumo e pelo viés da cultura)? Retome aquele parágrafo e reescreva-o
com base no estudo realizado até aqui.

14) O lazer, concebido como a apropriação e/ou utilização do tempo de não-


-trabalho/tempo livre pelos sujeitos, tem sido utilizado em nossa sociedade
contemporânea sob duas perspectivas distintas: o lazer como consumo e o
lazer como dimensão da cultura. Exemplifique situações referentes ao lazer,
tendo como referência cada uma dessas perspectivas/vieses do lazer e ar-
gumente acerca do viés que, em seu ponto de vista, representa, hodierna-
mente, a sua manifestação hegemônica.

12. CONSIDERAÇÕES
Caro aluno, nesta etapa avançamos significativamente no
sentido de compreender as relações existentes entre a cultura, o
lazer e a escola (em um plano macro) e entre o lazer, a cultura
corporal, os jogos e as brincadeiras e a Educação Física escolar.
Discutimos a gênese do lazer, as suas duas dimensões (lazer no
viés do consumo e lazer no viés da cultura) e explicitamos o seu
caráter pedagógico quando concebido e concretizado na escola
sob a perspectiva de um elemento cultural social e historicamente
constituído (lazer como veículo e como objeto de educação).
Ademais, para além de estudos e discussões no âmbito teó-
rico-conceitual, propomos uma pesquisa de campo com a obser-
vação dos espaços e das atividades de lazer de sua cidade/bair-
ro de modo a suscitar reflexões complementares ao processo de
aprendizagem objetivado e engendrado nesta Unidade de estudo.
Após compreendermos e sermos capazes de justificar a in-
serção dos jogos e brincadeiras (e do lazer) em aulas de Educação

Claretiano - Centro Universitário


100 © Jogos e Brincadeiras II

Física, é de suma importância conhecer e intervir no lócus de nos-


sa intervenção pedagógica e profissional: a escola.
Nossa tarefa nas próximas unidades (Unidade 3 e Unidade 4)
é conhecer a escola, seu projeto político-pedagógico, suas carac-
terísticas, suas finalidades e pressupostos e suas ações. Faremos
isso sem que, no entanto, se perca de vista o foco de nos jogos e
as brincadeiras.

13. E-REFERÊNCIAS

Lista de figuras
Figura 1 Tempos Modernos. Disponível em: <http://historianet.com.br/conteudo/
default.aspx?codigo=181>. Acesso em: 19 jul. 2011.
Figura 3 O lazer pelo viés do consumo. Disponível em: <http://www.diaadia.pr.gov.br/
tvpendrive/arquivos/Image/conteudos/imagens/sociologia/3glob.jpg>. Acesso em: 19
jul. 2011.
Figura 4 A Capoeira como um elemento da cultura corporal e do lazer. Disponível
em: <http://userwww.sfsu.edu/~art511_h/emerging08/KLMasterf/KLProject2f/ITrb_
capoeira_pontadoxareu.jpg>. Acesso em: 19 jul. 2011.

Sites pesquisados
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v. 9 n. 2. abril 2001. <http://www.culturainfancia.com.br/docs/a%20questao%20do%20
jogo.pdf>. Acesso em: 28 jul. 2011.
PICCOLO, Gustavo Martins. As antinomias dialéticas do lazer. Motrivivência, Florianópolis,
ano XX, n. 30, Junho/2008. p.09-27. Disponível em: <http://www.periodicos.ufsc.br/
index.php/motrivivencia/article/view/11379>. Acesso em: 19 jul. 2011.

14. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


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1988. São Paulo: Saraiva, 1988.
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1997.
EAD
A relação dos Conteúdos
Escolares, Jogos e Brincadeiras
com o Projeto

3
Político-Pedagógico
da Escola

1. OBJETIVO
• Contextualizar as leituras e o estudo desenvolvido em Jo-
gos e Brincadeiras II com os espaços escolares, a fim de
compreender o processo de elaboração, as contribuições
dos professores na construção e no desenvolvimento do
Projeto Político-Pedagógico (PPP), bem como a importân-
cia desse "processo" para a seleção dos conteúdos de en-
sino na Educação Básica.

2. CONTEÚDOS
• Projeto Político-Pedagógico: alguns conceitos.
• Processo de elaboração de Projetos Político-Pedagógicos
em escolas de Educação Básica.
• Relação dos conteúdos de ensino com o Projeto Político-
-Pedagógico de uma escola.
104 © Jogos e Brincadeiras II

3. ORIENTAÇÕES PARA O ESTUDO DA UNIDADE


Antes de iniciar o estudo desta unidade, é importante que
você leia as orientações a seguir:
1) Para complementar seus estudos sobre Projeto Político-
-pedagógico, solicitamos que seja feita a leitura do texto:
MUÑOZ, Dora. A elaboração do Projeto Educativo da Es-
cola. In: ÁLVAREZ, Manuel (Org.). O Projeto Educativo da
Escola. Tradução de Daniel Angel Etcheverry Burguño.
Porto Alegre: Artmed, 2004.
2) Outra sugestão de leitura complementar a esta unida-
de é o excerto A respeito do projeto político-pedagógico
(cap.1, p.23-26), parte integrante da referência SOARES,
Carmen Lúcia et al. Metodologia do ensino da educação
física. São Paulo: Cortez, 1992.

4. INTRODUÇÃO À UNIDADE
Nesta unidade, temos como objetivo principal a contextu-
alização das leituras e do estudo desenvolvido neste Caderno de
Referência de Conteúdo com os espaços escolares.
Neste nosso estudo, nos propomos não somente realizar
um estudo teórico sobre o Projeto Político-Pedagógico (PPP) nas
escolas de Educação Básica, abordando os seus conceitos básicos
e os pressupostos que o orientam, mas, também, compreender
o processo de elaboração e as contribuições dos professores na
construção e no desenvolvimento do PPP.
Além disso, faremos a análise de um PPP de uma escola de
Educação Básica, em que procuraremos compreender a relação
dos conteúdos escolares com a proposta pedagógica dessa escola.
Esta unidade, assim como as demais, está organizada com
atividades para serem realizadas na sequência proposta, pois cada
tarefa cria um clima de reflexão favorável para as atividades sub-
sequentes.
© U3 – A relação dos Conteúdos Escolares, Jogos e Brincadeiras com o Projeto Político-Pedagógico da
Escola 105

5. LEITURA DO TEXTO SOBRE O PROJETO POLÍTICO-


-PEDAGÓGICO
A seguir, apresentaremos algumas reflexões acerca da or-
ganização e do desenvolvimento do trabalho escolar. Buscaremos
apontar as diferentes dimensões que constituem o trabalho es-
colar e apresentar o Projeto Político-Pedagógico como elemento
indispensável na construção de um projeto comum e adequado
aos objetivos de ensino de uma determinada comunidade escolar.
Para Thurler (2001), um dos fatores condicionantes para a
aceitação de mudanças e de inovações nos contextos escolares é
a teia de relações, valores, atitudes e concepções que definem a
cultura desses estabelecimentos.
Alguns estabelecimentos escolares são "vivos, felizes, aco-
lhedores; outros são tristes, aborrecidos e mesmo, severos", ou
seja, cada escola tem a própria atmosfera e as próprias vibrações,
o que lhes define um contorno único e peculiar.
Toda a ação intencional que se queira eficaz nos espaços
escolares deve levar em conta as especificidades de cada esco-
la, isto é, como sua comunidade (professores, gestores, pais, alu-
nos etc.) vê e compreende a própria realidade, suas práticas, suas
ações e seus resultados.
Nesse sentido, podemos dizer que as mudanças e as ino-
vações estão condicionadas pela existência de projetos institu-
cionais que visem obter resultados positivos a partir de suas im-
plementações. E, ainda, que esses projetos podem e devem ser
elaborados a partir de diagnósticos profundos das realidades e da
cultura escolar.
É possível dizer que a escola é um "organismo vivo", consti-
tuído por diferentes partes e setores que devem ter como ponto
de partida, para o planejamento de suas ações, a aprendizagem
dos alunos.

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106 © Jogos e Brincadeiras II

Podemos assumir, mesmo que momentaneamente, o se-


guinte diagrama, como mostra a Figura 1, para representar a es-
cola:

ESCOLA: QUE ESPAÇO É


ESTE?
Ideologias

Categorias
Métodos e
Educacionais
Instrumentos

Escola é um
Alunos Organismo
VIVO Professores

Contexto

Diferenças
sociais e
Técnicos culturais
administrativos
Figura 1 Diagrama: a escola como um "organismo vivo". 30

Por meio do diagrama podemos dizer que a escola é um es-


paço social complexo, que reproduz a mesma diversidade que en-
contramos na sociedade.
Com base em Álvarez (2004), vamos sistematizar esses as-
pectos da seguinte maneira:
1) As categorias educacionais que integram a sociedade. Já
vimos que a educação pode acontecer de maneira for-
mal e informal. A primeira, na escola, e a segunda, aten-
dida nos diferentes espaços de convívio social. O que
diferencia de modo substancial essas duas categorias é
o caráter sistematizado e intencional da prática pedagó-
gica presente na escola.
2) A diversidade da formação dos professores que atuam
com um mesmo grupo de alunos. Cada professor com
suas características, pessoais e profissionais, com seus
conhecimentos, crenças e valores.
© U3 – A relação dos Conteúdos Escolares, Jogos e Brincadeiras com o Projeto Político-Pedagógico da
Escola 107

3) As diferenças metodológicas sustentadas pelos diferen-


tes aportes teórico-metodológicos disponíveis no cam-
po científico.
4) A heterogeneidade dos alunos, oriundos de diferentes
micro-comunidades e culturas, com atitudes e hábitos
sociais diferentes. Cada qual com as respectivas apti-
dões, interesses e níveis de desenvolvimento.
5) Os diferentes atores que compõem a escola, ou seja, os
técnicos administrativos, os diretores, supervisores, pro-
fissionais externos, os pais etc.
Todo esse conjunto de elementos, quando colocado em
ação, compõe o que podemos chamar de cultura escolar.
Para Schein apud Thurler (2001, p. 41), a cultura da institui-
ção é "a soma das soluções que funciona bem o bastante para aca-
bar prosperando e ser transmitida aos recém-chegados, como ma-
neiras corretas de perceber, de pensar, de sentir, de agir". E uma
parte dessas soluções diz respeito às mudanças e às formas como
os atores de uma instituição se dispõem a mudar.
Todo estabelecimento possui uma cultura maior, que abar-
ca a totalidade dos fenômenos existentes nesses espaços, assim
como também possui subculturas que dizem respeito a pequenos
conjuntos de regras, normas e valores que abrangem setores, gru-
pos e espaços localizados da escola.
Essas culturas, sejam elas a cultura maior ou as subculturas,
são transmitidas de modo involuntário e implícito por meio de
símbolos (atos, produtos e linguagem).
Uma cultura escolar é constituída por diferentes dimensões
que influenciam as mudanças e a forma como elas são recebidas
ou desejadas, defendidas ou refutadas. Cabe aos estabelecimen-
tos, por meio de seus atores, encontrarem o ponto de consenso
que possam garantir coerência e eficiência no desenvolvimento de
propostas escolares, tanto que visem mudanças mais audaciosas
como projetos que proponham à manutenção e à melhoria do que
já existe no espaço escolar.

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108 © Jogos e Brincadeiras II

Antes de proporem reformas audaciosas devem-se conceder


atenção especial ao funcionamento dos estabelecimentos escola-
res e às suas respectivas culturas, analisando a sua organização
social e as formas de interação existentes, pois podemos dizer que
a cultura escolar determinará quais e quando as reformas podem
ser realizadas e ainda aquelas que terão sucesso ou não.
Logo, podemos dizer que um espaço propício a mudanças
e a inovações deve ter em sua cultura, valores favoráveis a novos
projetos, estudos e conhecimentos.
O caráter determinante atribuído à cultura escolar para a
realização de mudanças e efetivação de inovações deixa suben-
tendido a importância da existência de processos de formação
para os professores e para os gestores que tratam de políticas de
descentralização que tornem mais prováveis culturas favoráveis às
mudanças.
Dessa forma, planejar parece ser uma ação natural própria
e inerente às ações escolares, tendo em vista que para considerar
todas as dimensões e condicionantes existentes na escola é neces-
sário um diagnóstico da realidade, um levantamento das necessi-
dades e a proposição de ações.
Entendemos que o planejamento, independentemente de
acontecer de forma implícita ou explícita e deliberada, é uma ação
humana. O homem tem necessidade de modificar seu meio em
busca de satisfação, agindo de maneira intencional que transfor-
me o seu ambiente. Para que a ação humana tenha resultados po-
sitivos é importante que ela seja planejada.
O planejamento pode acontecer de maneira consciente ou
inconsciente. Quando se dá de maneira consciente o planejador
sabe onde e por que quer chegar; porém, quando o processo ocor-
re de forma inconsciente o sujeito corre o risco de se transformar
em um instrumento a serviço de outros interesses.
© U3 – A relação dos Conteúdos Escolares, Jogos e Brincadeiras com o Projeto Político-Pedagógico da
Escola 109

De maneira especial, no contexto educacional, o planeja-


mento deve ser uma ação deliberado a fim de que o educador pos-
sa refletir e avaliar sua prática e trabalhe em prol de seus objetivos
como profissional da educação e ciente de seu papel na sociedade.
Os modelos de planejamento adotados em um determinado
contexto profissional, são condicionantes diretos dos resultados
que serão alcançados no final de cada processo desenvolvido. As-
sumimos, para esclarecer essa questão, dois modelos:
• Tecnicista: ocorre um excesso de planejamento, definição
de objetivos, técnicas de desenvolvimento, sob as quais
tudo será centralizado e organizado com base em crité-
rios de eficácia e eficiência. Nesse tipo de planejamento,
os objetivos são alcançados com o mínimo de gastos e
visando o máximo de rendimento;
• Participativo: enfatiza a necessidade de participação de
toda a comunidade escolar e se estrutura com base nas
contribuições de cada membro ou segmento da escola.
O planejamento na educação se dá em dois níveis distintos
entre si, mas condicionantes uns dos outros: o Planejamento Edu-
cacional e o Planejamento Escolar.
O Planejamento Educacional (PE) processa-se no âmbito go-
vernamental, tanto federal e estadual e municipal. Ele deve estar
sustentado e de acordo com a Lei de Diretrizes e Bases da Educa-
ção Nacional - Lei n. 9394/96 (BRASIL, 1996) e relacionar o desen-
volvimento do Sistema Educacional com o desenvolvimento eco-
nômico, social, político e cultural do país.
O Planejamento Escolar orienta-se pelos eixos: gestão esco-
lar, currículo e avaliação e processa-se ao nível da própria insti-
tuição escolar, sem deixar de vincular-se hierarquicamente, às di-
mensões do Planejamento Educacional.
A escola, como qualquer outra instituição, precisa de pesso-
as responsáveis para planejar o seu funcionamento. Esse planeja-

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110 © Jogos e Brincadeiras II

mento deve estar em consonância com o Projeto Político-Pedagó-


gico (PPP) da escola, que deve ser construído e desenvolvido com
a participação de todos os seus segmentos.
Para tanto, é necessário que algumas pessoas estejam inves-
tidas de autoridade para planejar e executar ações sem as quais
a escola não conseguiria caminhar. Esses sujeitos são: o diretor, o
vice-diretor, o supervisor/coordenador pedagógico, o secretário e
o bibliotecário.
O Planejamento no Âmbito da Sala de Aula, por sua vez, rela-
ciona-se à dimensão do trabalho do professor no desenvolvimento
dos processos de ensino e de aprendizagem.
Nossa intenção não é aprofundar os estudos sobre o plane-
jamento, mas sim trazer esse conceito para que se possa discutir
e aprofundar os estudos sobre o Projeto Político-Pedagógico que
atende a esfera escolar, entre os diferentes níveis do planejamento
no campo educacional.
Chamamos a atenção para a necessária relação que deve exis-
tir entre os diferentes níveis de planejamento e o PPP da escola.
Podemos dizer que o PPP é o filtro capaz de equilibrar as propostas
externas –- com o trabalho interno da escola - Planejamento Escolar.
O PPP faz a mediação entre as políticas públicas, a legislação e as
diretrizes curriculares nacionais com planejamento escolar.
Dessa forma, o PPP constitui-se em um mecanismo de iden-
tificação e compreensão da realidade escolar que possibilita aos
professores a elaboração dos projetos de mudanças e de melho-
rias, por meio da seleção do ensino dos conteúdos.
Álvarez (2004) ressalta cinco funções que o PPP pode de-
sempenhar na organização e funcionamento de uma escola. Para
ele, o PPP é importante porque pode "harmonizar a diversidade,
criando espaços de coerência e tolerância durante o processo de
ensino-aprendizagem, mantendo sob controle as tendências desa-
gregadoras que a diversidade provoca" (p. 17).
© U3 – A relação dos Conteúdos Escolares, Jogos e Brincadeiras com o Projeto Político-Pedagógico da
Escola 111

Pode ser considerada uma "pequena constituição" pela qual


e com a qual a comunidade escolar procura chegar a consensos
sobre as ações e as atividades escolares. Como?
Proporcionando espaços que possibilitem a explicitação de inten-
ções e interesses que compõem os princípios educativos de todas
as partes comprometidas com o funcionamento da escola e nego-
ciando com base nos objetivos e princípios organizacionais com os
quais todos concordam, com a finalidade de dar identidade espe-
cífica à escola e de fazê-lo funcionar de forma coerente (ÁLVAREZ,
2004, p. 17).

Também podemos dizer que o PPP tem como função deter-


minar o regimento e a proposta curricular da escola.
O projeto educativo funciona como um documento de referência,
com base no qual irá se concretizar e se desenvolver todos os do-
cumentos subsequentes que sistematizam a vida escolar de uma
instituição autônoma (ÁLVAREZ, 2004, p. 18).

Como isso pode acontecer de fato na escola? Quando a co-


munidade escolar decide que o trabalho escolar é de responsabi-
lidade de todos e que somente por meio de um projeto comum
esse trabalho pode ser realizado.
Para isso, a escola deve ser reestruturada para criar espaços
em seus tempos e/ou tempos em seus espaços de forma que seus
atores possam "sentar" juntos para a tomada de decisões.
Essa proposição deixa subentendida que outra função do
PPP é "garantir a participação ordenada e eficaz, de todas as cate-
gorias na tomada de decisões" (ÁLVAREZ, 2004, p. 18).
Para que todos possam ter voz e participação ativa na orga-
nização e desenvolvimento da proposta educativa é imprescindível
a definição de papéis, ou seja, passa a existir a obrigatoriedade de
uma definição coletiva das funções, direitos e deveres de cada um.
Essa função recai sobre outra, que é a condição para criar "âmbi-
tos de negociação para a tomada de decisões, os quais fazem do
trabalho consensual o método de gestão" (ÁLVAREZ, 2004, p. 18).

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112 © Jogos e Brincadeiras II

Essa função é determinante para que não ocorra falta de en-


tendimento sobre os limites e as possibilidades de participação de
cada grupo social que compõe a escola.
É comum a sinalização de que os pais devem participar das
decisões escolares. Isto é consenso e não se colocam dúvidas so-
bre essa afirmação, contudo existem limites para isto.
Esses limites são entendidos no momento em que as fun-
ções, os deveres e os direitos de cada um são especificados e
discutidos abertamente, delimitando os âmbitos possíveis para a
negociação das decisões. Por exemplo: na definição dos objetivos
escolares e o que se espera da escola, o limite de participação dos
pais é apontar as necessidades que percebem em suas comunida-
des, as expectativas para a vida dos filhos, da sociedade etc. Ca-
berão aos profissionais da educação definirem os conteúdos, os
métodos e as ações para atenderem à demanda levantada com os
pais. Ser democrático e fazer acontecer uma gestão participativa,
ao contrário do que pode parecer, depende de uma definição clara
de papéis e funções.
O objetivo das discussões sobre esse ponto, é levar a co-
munidade escolar a perceber que para cada ação da escola são
exigidos conhecimentos profissionais próprios e que a educação
é um campo de atuação de profissionais formados e habilitados
para isso.
As ações escolares não devem ser decididas com base na ne-
gociação dos interesses pessoais. Elas devem se fundamentar em
uma negociação madura pelos interesses sociais que, para acon-
tecer, cada uma deve renunciar a uma parte dos seus interesses e
opiniões a fim de chegar a uma decisão que satisfaça os interesses
mínimos de todos.
Por fim, podemos dizer que se essas funções forem colo-
cadas em prática, outra acontece em decorrência das primeiras.
Instaura-se "um modelo de autoavaliação formativa, de caráter
institucional, mediante a negociação de indicadores de eficácia ca-
© U3 – A relação dos Conteúdos Escolares, Jogos e Brincadeiras com o Projeto Político-Pedagógico da
Escola 113

pazes de orientar a autorregulação do funcionamento da escola."


(ÁLVAREZ, 2004, p. 20).
A realidade nos mostra que grande parte das escolas tem
elaborado esse documento apenas para cumprimento de mais
uma formalidade burocrática. A maior das vezes, o PPP é elabo-
rado por um pequeno grupo constituído, na sua maioria, pelos
membros das equipes diretivas.
Além disso, os processos de sensibilização da comunidade
escolar para a elaboração do PPP de difusão e implementação das
proposições, são quase inexistentes, resultando na falta de conhe-
cimento sobre seus conteúdos pela comunidade escolar.

6. AUTONOMIA DA ESCOLA E OS PRESSUPOSTOS


ORIENTADORES DO PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGI-
CO
Tendo em vista as questões discutidas acerca da cultura es-
colar, do trabalho pedagógico e do Projeto Político-Pedagógico,
consideramos necessário ampliar tais discussões de modo a subsi-
diá-lo no processo de compreensão da relevância do PPP para as
instituições escolares.
Para tanto, traremos as contribuições de Ilma Passos Alen-
castro Veiga mediante seu texto Perspectivas para reflexão em tor-
no do projeto político-pedagógico. Nosso objetivo, além de discu-
tir as considerações da autora, é estabelecer relações com a nossa
especificidade de atuação na escola.
Ilma Passos Alencastro Veiga é doutora e pós-doutora em
Educação pela Universidade Estadual de Campinas, professora ti-
tular aposentada e pesquisadora associada sênior da Universidade
de Brasília. Atualmente, leciona no Centro Universitário de Brasília
e tem se dedicado a estudar os seguintes temas: formação de pro-
fessor, didática, educação superior, docência universitária e Pro-
jeto Político-Pedagógico. Iniciaremos o estudo desse texto apre-

Claretiano - Centro Universitário


114 © Jogos e Brincadeiras II

sentando uma citação que sintetiza a pertinência e a relevância


do Projeto Político-Pedagógico para a consecução das finalidades
educacionais atribuídas à escola e que a caracterizam.
Reporte-se, nesse momento, às unidades anteriores em que
discutimos o caráter da escola, instituição de educação formal, e
ao papel da educação na tarefa de tematizar pedagogicamente a
cultura.
No tocante à Educação Física, é necessário relembrar que os
temas/componentes da cultura corporal são os conteúdos de en-
sino cuja tematização é de nossa incumbência.
O projeto pedagógico exige profunda reflexão sobre as finalida-
des da escola, assim como a explicitação de seu papel social e a
clara definição de caminhos, formas operacionais e ações a serem
empreendidas por todos os envolvidos com o processo educativo.
Seu processo de construção aglutinará crenças, convicções, conhe-
cimentos da comunidade escolar, do contexto social e científico,
constituindo-se em compromisso político e pedagógico coletivo.
Ele precisa ser concebido com base nas diferenças existentes entre
seus autores, sejam eles professores, equipe técnico-administrati-
va, pais, alunos e representantes da comunidade local. É, portanto,
fruto de reflexão e investigação. (VEIGA, 1998, p. 9, grifo nosso).

De modo convergente ao texto estudado anteriormente,


pode ser considerado o Projeto Político-Pedagógico e o guia para
a prática pedagógica. Fruto de processos coletivos de reflexão, in-
vestigação e deliberação coletiva da comunidade escolar (profes-
sores, gestores, equipe técnico-administrativa, alunos, pais, repre-
sentantes de entidades e associações comunitárias, entre outros
integrantes), é esse documento que fundamenta e sistematiza as
ações realizadas na escola.
Nesse sentido, o Projeto Político-pedagógico não é um do-
cumento restrito à dimensão pedagógica e/ou ao conjunto de pro-
jetos e planos de cada professor em sua sala de aula. Assim, "em
suma, é um instrumento clarificador da ação educativa da escola
em sua totalidade" (VEIGA, 1998, p. 12).
Refere-se, portanto, desde o entorno social da escola, os
princípios filosóficos e sociológicos que permeiam um determina-
© U3 – A relação dos Conteúdos Escolares, Jogos e Brincadeiras com o Projeto Político-Pedagógico da
Escola 115

do viés educativo, até os elementos "micro" situados no interior


da sala de aula – conteúdos de ensino, organização e desenvolvi-
mento da prática pedagógica, processos avaliativos etc.
No que se refere à Educação Física, compreendemos que
esta não pode colocar-se à margem do Projeto Político-Pedagógi-
co. Objetivamos suscitar com essa afirmação a evidência de que é
nosso compromisso, na condição de professores de Educação Físi-
ca, participar ativamente do processo de construção, discussão e
reconstrução do Projeto Político-Pedagógico de nossa escola.
Fica explícito que, mediante o Projeto Político-pedagógico,
a escola apresenta certa autonomia para direcionar e orientar o
"caminho" que almeja seguir, sobretudo no que se refere à forma
como organizará o seu trabalho pedagógico.
Você deve estar se perguntando... Mas sempre foi assim?
Ou, o que representa essa autonomia?
Essa relativa autonomia passa a ser assegurada legalmente a
partir de 1996 com a promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional (LDB – Lei nº. 9394/96) que prevê no seu artigo
12, inciso I: "Os estabelecimentos de ensino, respeitadas as nor-
mas comuns e as do seu sistema de ensino, terão a incumbência
de elaborar e executar sua proposta pedagógica" (BRASIL, 1996).
Pelo exposto, conforme o texto citado na íntegra, a LDB pre-
coniza que essa autonomia, no que se refere à elaboração e exe-
cução da proposta pedagógica das escolas, mantém-se atrelada ao
cumprimento das normas comuns (estabelecidas em nível nacio-
nal) e as do seu respectivo sistema de ensino (por exemplo, no
que alude à sua vinculação à Rede Municipal ou à Rede Estadual
de Ensino).
A autonomia sugerida pela LDB, e explicitada pela finalidade
com que as escolas elaboram e implementam seus Projetos Políti-
co-Pedagógicos, coloca para essas instituições a responsabilidade
de que:

Claretiano - Centro Universitário


116 © Jogos e Brincadeiras II

Parar ser autônoma, a escola não pode depender somente dos ór-
gãos centrais e intermediários que definem a política da qual ela
não passa de executora. Ela concebe sua proposta pedagógica ou
projeto pedagógico e tem autonomia para executá-lo e avaliá-lo ao
assumir uma nova atitude de liderança, no sentido de refletir sobre
as finalidades sociopolíticas e culturais da escola (VEIGA, 1998, p.
15).

No entendimento de Veiga (1998, p. 12), "este preceito legal


está sustentado na ideia de que a escola deve assumir, como uma
de suas principais tarefas, o trabalho de refletir sobre sua intencio-
nalidade educativa" (grifo nosso).
Você percebeu que o inciso I do artigo 12 da LDB (BRASIL,
1996), transcrito anteriormente não menciona "Projeto Político-
-Pedagógico" ou "projeto pedagógico", mas sim, "proposta peda-
gógica". Esclarecemos, assim como corrobora Veiga (1998), que se
trata de sinônimos. Mencionamos, ainda, que "projeto pedagógico"
diferencia-se de "plano de trabalho": enquanto o projeto pedagó-
gico "[...] aponta um rumo, uma direção, um sentido explícito para
um compromisso estabelecido coletivamente" (VEIGA, 1998, p. 13),
o plano de trabalho representa o detalhamento das ações relativas
às atividades pedagógicas e administrativas (VEIGA, 1998).
A reflexão em torno da "intencionalidade educativa" da es-
cola, ação precípua na elaboração e construção e/ou avaliação,
discussão e reconstrução do Projeto Político-Pedagógico, demanda
que a comunidade escolar discuta e reflita acerca da concepção de
educação que fundamenta as ações pedagógicas da escola e a rela-
ção dessa concepção com a sociedade e a escola, além da inerente
reflexão em torno do "tipo" de sujeito a ser formado (VEIGA, 1998).
Algumas dessas questões, não obstante serão tratadas tam-
bém na Unidade 4, necessitam ser esclarecidas e discutidas. Isso
porque conhecer os pressupostos norteadores do Projeto Político-
-Pedagógico é de suma importância para que você, futuramente,
sinta-se instigado e seguro para participar ativamente do processo
de construção desse documento em sua escola.
© U3 – A relação dos Conteúdos Escolares, Jogos e Brincadeiras com o Projeto Político-Pedagógico da
Escola 117

Nesse ínterim, fundamentados em Veiga (1998), discutire-


mos os pressupostos fundantes do Projeto Político-Pedagógico, a
saber: os pressupostos filosófico-sociológicos, os pressupostos
epistemológicos e os pressupostos didático-metodológicos.
Conhecer as finalidades, as características do processo de
construção e os pressupostos que compõem e fundamentam o
Projeto Político-Pedagógico são fundamentais para que você pos-
sa tanto participar de suas construções quanto analisá-los.
Adiantamos que a coleta de informações e a sua análise será
a atividade prática que proporemos na etapa posterior ao estudo
dos textos desta unidade.
Os pressupostos filosófico-sociológicos referem-se aos ele-
mentos fundantes que estabelecem um determinado projeto de
formação humana para a atuação em um determinado tipo de so-
ciedade (VEIGA, 1998).
Tendo em vista que a escola (e as ações pedagógicas desen-
volvidas no seu interior) não se encontra à margem do contexto
social mais amplo (na Unidade 1 explicitamos essa relação ao tra-
tarmos do caráter da educação formal e a sua origem a partir da
complexificação da sociedade), ou seja, ambas, escola e socieda-
de, estabelecem relações de interação recíproca, o tipo de sujeito
e de sociedade projetado implica em determinada concepção de
educação e prática pedagógica correspondente. Para Veiga (1998,
p. 20):
Ora, para sabermos que escolas precisamos construir, que cidadãos
queremos formar, nós temos que saber para que sociedade esta-
mos caminhando. Definindo o tipo de sociedade que queremos
construir, discutiremos qual a concepção de educação correspon-
dente.

Em suma, discutir os pressupostos filosófico-sociológicos


passa a informar-se em relação às seguintes questões:
Qual é o contexto filosófico, sociopolítico, econômico e cultural em
que a escola está inserida?
Que concepção de homem que se tem?

Claretiano - Centro Universitário


118 © Jogos e Brincadeiras II

Que valores devem ser defendidos na sua formação?


O que entendemos por cidadania e cidadão?
Em que medida a escola contribui para a cidadania?
Em que dimensão a escola propicia a vivência da cidadania?
A formação da cidadania tem sido o fio condutor do trabalho peda-
gógico na escola?
Até que ponto a escola se preocupa em colocar o sujeito (aluno)
como centro do processo educativo?
Como a escola deve responder às aspirações dos alunos, dos pais e
dos professores?
Qual é o papel da escola diante de outros espaços formadores?
(VEIGA, 1998, p. 20).

Na próxima unidade, discutiremos outros pontos acerca des-


ses pressupostos filosófico-sociológicos. Procuraremos apresentar
as relações entre a educação, a Educação Física escolar, os propósi-
tos de formação humana, os projetos históricos e as visões sociais
de mundo, enfatizando o compromisso ético e político que per-
meia a prática pedagógica do professor, em nosso caso, de Educa-
ção Física.
Os pressupostos epistemológicos levam em conta o processo
de construção e de transformação do conhecimento. No que se re-
fere à escola, Veiga (1998) considera que a análise do processo de
produção do conhecimento escolar amplia a compreensão sobre
as questões curriculares.
Por exemplo, se o conhecimento é concebido na perspectiva
de ser o resultado ou o produto de pesquisas, aborda-se o mesmo
como um elemento estático, acabado e acumulativo, "[...] pois se
resume a um conjunto de informações neutras, objetivas e impes-
soais sobre o real elaborado e sistematizado no trabalho de inves-
tigação da realidade" (LEITE, 1994 apud VEIGA, 1998, p. 21). Essa
forma de concebê-lo repercute diretamente na prática pedagógica
realizada na e pela escola e, epistemologicamente, relaciona-se a
determinadas formas de compreender e explicar o mundo.
© U3 – A relação dos Conteúdos Escolares, Jogos e Brincadeiras com o Projeto Político-Pedagógico da
Escola 119

De outro modo, ao concebermos o conhecimento na quali-


dade de processo, passamos a elevá-lo à condição de dinamismo
e de movimento, isto é, em um processo de constante construção
e reconstrução: "Na qualidade de processo, o conhecimento é di-
nâmico, está envolto por um contexto de controvérsias e diver-
gências, traz subjacente uma série de compromissos, interesses e
alternativas que contestam sua condição de objetividade e neutra-
lidade" (LEITE, 1994 apud VEIGA, 1998, p. 21).
De modo recorrente, assim como na concepção de conheci-
mento como produto, como processo, suscita possibilidades pe-
dagógicas e formativas distintas. Vamos ampliar essa discussão
contextualizando-a com a Educação Física escolar.
Imagine que você esteja em uma aula de Educação Física
para o sexto ano (Anos Finais do Ensino Fundamental) trabalhando
com os alunos sobre os "jogos populares" e que, nessa categoria, a
aula seja sobre a "Amarelinha".
Exemplificaremos duas configurações diferentes de aulas,
cada uma delas fundamentada, epistemologicamente, nas con-
cepções de conhecimento anteriormente mencionadas:
• conhecimento-produto: o professor apresenta diferentes
possibilidades de jogar "Amarelinha" e os alunos experi-
mentam cada uma das formas de jogar. A aula baseia-se
na realização bem-sucedida das formas de jogar (expli-
citando, claramente, uma concepção em que o conheci-
mento representa um conjunto de informações sistemati-
zadas, estáticas e neutras).
• conhecimento-processo: o professor elabora e se utiliza
de estratégias didáticas em que a "Amarelinha" é apre-
sentada de forma contextualizada social e historicamen-
te. As diversas maneiras de jogá-la emanam tanto daquilo
que os alunos conhecem e do que o professor apresenta,
como do conhecimento sistematizado em torno desse
jogo. Para além das experiências de ordem prática (expe-

Claretiano - Centro Universitário


120 © Jogos e Brincadeiras II

riências corporais com o jogo de "Amarelinha"), a mesma


é abordada em relação à sua origem, evolução histórica e
diferentes configurações em função do contexto social e
geográfico em que ela é jogada.
Você percebe as diferenças entre as duas concepções? Visu-
aliza diferentes possibilidades formativas em relação a esses dois
exemplos de aula de Educação Física, brevemente discorridos?
Justifique.
Isso posto, as questões relativas aos pressupostos epistemo-
lógicos que norteiam o Projeto Político-Pedagógico são:
Qual é então, nosso papel neste momento, uma vez que há uma
compreensão entre nós professores e especialistas, de que a cons-
trução do conhecimento é condição sine qua non para a formação
do educando?
O que significa construir o conhecimento no campo da educação
básica? Como construir o conhecimento interdisciplinar e globali-
zador, conseguindo, de fato, trabalhar o específico e avançar para a
compreensão das relações sociais?
Como avançar a prática pedagógica de forma que o conhecimento
seja trabalhado como processo e, dessa forma, contribuir para a
autonomia do aluno, do ponto de vista intelectual, social e político,
favorecendo a cidadania?
Como a relação entre ensino e pesquisa pode favorecer essa cons-
trução?
Como definir o essencial e o complementar na organização do co-
nhecimento curricular?
Em que nível o aluno deve participar da organização dos programas
escolares?
De que forma partir do conhecimento trazido pelo estudante para
relacioná-lo com o novo conhecimento?
Como propiciar a aquisição de conhecimentos e habilidades inte-
lectuais aliadas às atitudes de cooperação, co-responsabilidade,
iniciativa, organização e decisão?
Como viabilizar a compreensão das relações sociais que o traba-
lho gera com relações sociais mais amplas por meio de conteúdos
curriculares históricos, criativos, não tomados em si, mas à luz do
trabalho em questão?
© U3 – A relação dos Conteúdos Escolares, Jogos e Brincadeiras com o Projeto Político-Pedagógico da
Escola 121

Qual é a concepção de conhecimento, currículo, ensino, aprendiza-


gem e avaliação? (VEIGA, 1998, p. 21, grifos da autora)

Os pressupostos didático-metodológicos compreendem os


elementos didáticos relacionados mais diretamente aos processos
de ensino-aprendizagem, tais como os métodos e as técnicas de
ensino.
No entendimento de Veiga (1998, p. 22, grifos da autora),
Quanto aos pressupostos didático-metodológicos, entende-se que
a sistematização do processo ensino-aprendizagem precisa favore-
cer o aluno na elaboração crítica dos conteúdos, por meio de mé-
todos e técnicas de ensino e pesquisa que valorizem as relações
solidárias e democráticas.

Você deve ter percebido que os três pressupostos nortea-


dores do Projeto Político-Pedagógico se encontram intimamente
relacionados. Ou seja, determinados pressupostos filosófico-so-
ciológicos tendem a convergir para determinados pressupostos
epistemológicos e, por conseguinte, para determinados pressu-
postos didático-metodológicos.
Observe o esquema apresentado na Figura 2:

Figura 2 Esquema representativo da relação entre os pressupostos orientadores e o Projeto


Político-pedagógico.

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122 © Jogos e Brincadeiras II

É possível concluir que o Projeto Político-Pedagógico repre-


senta um relevante e imprescindível elemento ao desenvolvimen-
to do trabalho pedagógico escolar.
Conhecer o Projeto Político-Pedagógico da escola em que
você atua (atuará), representa uma demanda precípua da sua
prática pedagógica. Para além desse "conhecer", é de suma im-
portância, ainda, que você participe ativamente dos processos de
elaboração e reelaboração coletiva desse documento e da "vida"
da escola.
Como última etapa desta unidade, de modo a corroborar e/
ou ressignificar os estudos empreendidos até esse momento, pro-
pomos uma atividade de análise de um Projeto Político-Pedagógi-
co de uma escola de Educação Básica.

7. ATIVIDADE PRÁTICA RELACIONADA AOS TEXTOS


As orientações a seguir são para a atividade proposta de
análise do PPP de uma escola. As tarefas foram elaboradas a par-
tir dos itens contidos no Roteiro para Construção e Análise de
PPP, apresentados no Quadro 1.

Tarefa 1
1) Contatar uma Escola de Ensino Fundamental da Rede
Pública ou Particular (preferencialmente a rede pública).
2) Fazer uma apresentação pessoal e solicitar o apoio da
escola para a realização das atividades referentes ao cur-
so.
3) Apresentar documento oficial, emitido pelo Centro de
Formação de Professores, ao qual você está vinculado
como aluno.
4) Informar à escola sobre as atividades que serão realiza-
das
5) Análise do PPP da escola. Para isso será necessário que a
escola conceda uma cópia do documento.
© U3 – A relação dos Conteúdos Escolares, Jogos e Brincadeiras com o Projeto Político-Pedagógico da
Escola 123

6) Observação de duas aulas de Educação Física. Para isso


será necessário o contato com um professor que aceite
colaborar com as atividades da disciplina. (Esta atividade
poderá ser realizada nesse momento ou, impreterivel-
mente, no decurso da Unidade 4).
7) Análise do Plano de Curso (Plano Anual) da disciplina
de Educação Física para uma das Séries Finais do Ensi-
no Fundamental. Para isso, será necessário que a escola
conceda uma cópia do documento.
8) Elaboração e realização de atividade práticas com alu-
nos, sob orientação do professor regente. Esta atividade
será realizada na Unidade 4.

Tarefa 2
Recolher cópia do Projeto Político-Pedagógico da Escola.
Após essa etapa, você fará uma análise do documento seguindo o
Roteiro para Construção e Análise de PPP. Dê uma olhada no rotei-
ro antes de continuar. Ele foi elaborado pela autora deste Caderno
de Referência de Conteúdo, Maria Eliza Gama Santos, e é utiliza-
do nos encontros realizados em Escolas de Educação Básica para
orientar a elaboração dos PPPs dessas instituições.
Você observou, com certeza, que ele é relativamente exten-
so, contudo permite uma análise rigorosa, além de fomentar diver-
sas reflexões sobre a organização e o desenvolvimento do trabalho
escolar.
Consideramos essa uma oportunidade ímpar, ainda durante
a formação inicial, poder ter acesso, investigar e até mesmo cri-
ticar (no sentido da reflexão, relativização e melhoria) as propo-
sições vigentes em uma escola, além de poder estabelecer uma
relação com as práticas efetivadas.
A atividade, como já foi mencionado, é a análise do PPP da
escola a partir dos itens contidos no Roteiro para Construção e
Análise de PPP, apresentado a seguir.

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124 © Jogos e Brincadeiras II

Orientações para a análise de PPP e para a produção de um


texto sobre as suas constatações.
1) Realize a leitura detalhada do Roteiro para construção e
análise de PPP.
2) Faça uma primeira leitura detalhada do PPP da Escola de
Educação Básica sem o uso do roteiro.
3) Utilize como ferramenta de leitura fazer marcações no
texto (marcadores coloridos) e apontamentos de suas
interpretações e/ou dúvidas nas margens do texto.
4) Faça a segunda leitura do PPP utilizando o roteiro. Você
observará que alguns itens não estão contemplados, ou-
tros podem aparecer, ainda, de forma incipiente, e ou-
tros podem aparecer de forma complexa e sustentada.
5) Escreva com detalhes o que foi encontrado no texto e se
ele possibilita compreender o que a escola é ou preten-
de ser.
6) Por fim, escreva um texto, no qual você deverá mostrar
suas impressões sobre o PPP. Procure destacar o que
você considerou adequado, do ponto de vista teórico, e
o que não atende às finalidades educacionais.

Quadro 1 Roteiro para construção e análise de PPP.


ROTEIRO PARA CONSTRUÇÃO E ANÁLISE DO PPP
1. Informações gerais
a) Ano de elaboração
b) Dados de identificação da escola
• Data de funcionamento
• Endereço
• Níveis de atuação
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Escola 125

ROTEIRO PARA CONSTRUÇÃO E ANÁLISE DO PPP


2. Diagnóstico da realidade
a) Informações estruturais: Qual é o retrato da nossa escola?
• Espaço físico
• Setores
• Materiais disponíveis
• Estrutura organizacional
• Segmentos de ensino.
• Número de alunos por segmento.
• Turnos de funcionamento.
b) Informações pedagógicas:
• Quem são nossos professores?
• Percentual de professores que atuam fora da área de formação.
• Percentual de professores quanto do nível de escolaridade.
• Tipo de contrato (carga horária, efetivas, temporárias).
• Quem são nossos alunos?
• Faixa etária.
• Índices de aprovação, abandono e reprovação.
• Percentual de alunos em distorção idade/série.
• Matérias que mais reprovam.
c) Informações sobre os processos de ensino e de aprendizagem:
• Como ensinamos em nossa escola?
• Concepções que permeiam o espaço escolar.
• Metodologias utilizadas.
• Formas de avaliação mais frequentes.
d) Informações sociais – familiares
• Como é a família do nosso aluno?
• Condição socioeconômica.
• Principais dificuldades e facilidades.
• Estrutura familiar.
• Moradia.
• Número de familiares.

Claretiano - Centro Universitário


126 © Jogos e Brincadeiras II

ROTEIRO PARA CONSTRUÇÃO E ANÁLISE DO PPP


e) Informações sociais - referentes ao bairro

• Localização do Bairro.

• Qualidade de vida.

• Condições de saneamento, segurança, saúde, transporte e espaços de


lazer.

f) Informações sociais - externas ao bairro

• Características econômicas da cidade.

• Estado e país.
3. A proposta de trabalho
a) Filosofia da escola
• Qual o ideal de sociedade, indivíduo, escola e educação que
acreditamos?
b) Finalidades e objetivos da escola
c) Onde a escola pretende chegar
• O que a escola persegue com maior ênfase (deve estar diretamente
ligado à realidade colocada pelo diagnóstico, ou seja, buscar atender
demandas levantadas no diagnóstico inicial).
• Qual a concepção de sociedade e de cidadão que a escola pretende
formar?
d) A partir desta definição de sociedade e de indivíduo a escola deve fazer um
paralelo com o diagnóstico inicial e definir como fazer para alcançar tais
objetivos?
e) Quais os que deverão ser viabilizados para a implementação de ações
concretas.
f) Quais as concepções de Ensino e de aprendizagem que possibilitarão
alcançar tais objetivos.
• Como deveremos ensinar para que nossos alunos adquiram os
conhecimentos necessários para atuar na sociedade que acreditamos?

• Qual o papel do professor?

• Qual o papel do aluno?

• Qual a função dos conteúdos?


g) Qual currículo será adotado pela escola?
• Quais os conteúdos que atenderam às especificidades locais?
© U3 – A relação dos Conteúdos Escolares, Jogos e Brincadeiras com o Projeto Político-Pedagógico da
Escola 127

ROTEIRO PARA CONSTRUÇÃO E ANÁLISE DO PPP


h) Sistema de avaliação.
i) Como devemos avaliar em nossa escola?
j) Qual a estrutura organizacional que possibilitará tais ações pedagógicas?
• Definir cargos e funções.

• Atribuições de cada profissional.

• Colegiados.

• Equipes de docentes.

• Serviços (refeitório, transporte, secretaria, biblioteca).

• Associações de pais e de alunos.


k) Definir o funcionamento de cada componente da estrutura organizacional
• Recursos humanos.

• Recursos materiais.

• Recursos econômicos.

• Recursos de tempo.
m) Organização do tempo escolar
• Calendário escolar.

Após esse intenso trabalho de análise do Projeto Político-


-Pedagógico da escola, convidamos você a refletir e responder as
questões a seguir:
1) Como o PPP estabelece relação entre o trabalho escolar
e a sociedade? Qual sua opinião a respeito?
2) Você considera que o conteúdo do PPP sobre o diagnós-
tico da realidade social e escolar dos alunos é suficien-
te para orientar a elaboração de propostas curriculares
voltadas para a cultura e o contexto local? Qual a sua
opinião sobre isso? Quais seriam suas sugestões se você
fosse convidado a reelaborar esse documento?
3) Quais as propostas existentes para o ensino da Educação
Física?
4) Existe um momento em que o PPP aborda a importância
da Educação Física Escolar?

Claretiano - Centro Universitário


128 © Jogos e Brincadeiras II

5) Qual a sua opinião sobre a existência ou não de referên-


cias à Educação Física Escolar no PPP?
Essas questões serão abordadas em um fórum de discussão
promovido ao longo deste estudo, e suas contribuições serão mui-
to importantes para os seus colegas.
Agora você já tem uma impressão da proposta pedagógica
na escola: Quais os princípios? Quais as finalidades? Qual o papel
social assumido pela escola? Quais os objetivos educacionais tra-
çados? Isso possibilitará realizar as atividades seguintes.
Retome e leia os itens "f" e "g" do roteiro de análise do PPP, pois
eles têm uma grande relevância para as discussões deste Caderno de
Referência de Conteúdo. Ou seja, é no momento em que a comuni-
dade escolar discute esses aspectos do trabalho escolar, que ficam
definidos os conteúdos que serão ensinados e como serão ensinados.
Logo, retomá-los é uma tarefa indispensável para compreen-
der a relação dos conteúdos escolares como meio social (cultural)
e a função desses conteúdos para a vida dos futuros cidadãos.
Entendemos que, para isso, entender essas relações, nada
melhor do que uma situação real, ou seja, buscar dentro da escola
os acertos e (talvez) as contradições existentes.
Então, para fecharmos esta unidade, vamos discorrer um
pouco sobre como os conteúdos referentes a lazer, jogos e brinca-
deiras, estão planejados e organizados na disciplina de Educação
Física na escola.
Vamos à proposta: sempre recorrendo à realidade escolar na
qual você agora está inserido (a Escola de Educação Básica que o
acolheu para seus estudos), analisar o Plano de Curso para a disci-
plina de Educação Física em uma das séries finais do Ensino Fun-
damental.
Deixamos a seu critério a escolha da série, por razões óbvias:
a definição a priori poderia ser um fator complicado para a sua
inserção e seu acolhimento na escola.
© U3 – A relação dos Conteúdos Escolares, Jogos e Brincadeiras com o Projeto Político-Pedagógico da
Escola 129

Você deverá ler atentamente o Plano de curso da disciplina e


responder às seguintes questões:
• Você já havia se deparado com um documento desses? O
que achou?
• Identifique os objetivos do ensino para essa série?
• Qual a relação dos objetivos propostos com os presentes
no texto dos PCNs, lidos na unidade anterior, para as sé-
ries finais do Ensino Fundamental?
Agora identifique os conteúdos propostos no Plano de Curso
(Plano Anual), os agrupando de acordo com os blocos de conteú-
dos propostos nos PCNs.
Para isso, vamos nos valer do Quadro 2, utilizado na unidade
anterior:

Quadro 2 Agrupamento dos conteúdos do Plano de Curso


BLOCOS DE CONTEÚDOS DOS PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS
Esportes Jogos Lutas Ginástica Atividades Conhecimentos
rítmicas e sobre o corpo
expressivas
Jogo de Capoeira* Uso de Grupos de
voleibol* aparelho dança*
Práticas para
corporais ginástica*
observa-
das Jogo de
basquete*
Corrida*

* Exemplos de como agrupar as práticas observadas tomando como referência os blocos


de conteúdos.

Agora que já fez o agrupamento dos conteúdos do Plano de


Curso, você tem uma "fotografia" de "como" e "quais" os conte-
údos são selecionados para compor o currículo escolar para essa
série.

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130 © Jogos e Brincadeiras II

Se tomarmos os conceitos de patrimônio cultural, transmis-


são cultural e a escola como instituição formal responsável por
essa transmissão, temas trabalhados na Unidade 1, poderíamos
dizer que agora você conhece uma parte dos conhecimentos da
área da Educação Física considerada um patrimônio que deve ser
transmitido às novas gerações.
Ou seja, é possível dizer que os conteúdos contemplados
para o ensino devem ser representantes desse patrimônio cultural.
Contudo, também podemos, sem denegrir ou desmerecer
os conteúdos que se fazem presentes nos currículos escolares, nos
questionarmos se, de fato, esses conteúdos são a parte do patri-
mônio cultural que precisam ser transmitidos pela escola.
Colocamos essa dúvida para chamar a atenção para a neces-
sidade que temos de relativizar o que ensinamos, de submeter à
crítica e à reflexão os currículos escolares nas diversas áreas e, em
especial, na Educação Física Escolar.
Olhando para o quadro que você produziu com suas análises
no Plano de Curso, relate como ficaram os conteúdos relacionados
aos jogos e às brincadeiras?
• Há unidades específicas para eles?
• Se houver unidade(s) específica(s) para lazer, jogos e brin-
cadeiras, qual a carga horária destinada?
• Se não houver unidade destinada para os jogos, onde está
planejado o ensino desses conteúdos? Qual a sua opinião
sobre isso?
Se relacionarmos essa análise realizada no Plano de Curso
com suas observações da Unidade 2, feitas nos espaços de lazer de
sua cidade, é possível dizer que os conteúdos presentes no Plano
de Curso, atenderiam às demandas identificadas nas práticas cor-
porais de lazer?
Então, responda: o que você modificaria nesse plano de cur-
so com relação aos conteúdos sobre o lazer, os jogos e as brinca-
deiras? O que incluiria ou descartaria do programa proposto?
© U3 – A relação dos Conteúdos Escolares, Jogos e Brincadeiras com o Projeto Político-Pedagógico da
Escola 131

Esperamos que você tenha conseguido perceber que há uma


estreita relação entre a cultura, o lazer (como patrimônio cultural),
a proposta pedagógica da escola e os conteúdos escolares.
Para fecharmos esta unidade, e deixar representada e visí-
vel a sua compreensão sobre as relações estabelecidas entre es-
ses elementos constitutivos dos processos educativos, elabore um
diagrama representativo dessas relações e escreva um pequeno
texto explicando esse diagrama.

8. QUESTÕES AUTOAVALIATIVAS
Para uma breve revisão dos conceitos apresentados nesta
unidade, procure responder as questões a seguir. Esse processo é
de suma importância para que você verifique o seu conhecimento
em relação aos temas tratados na Unidade 3. Sugerimos, portan-
to, que responda, comente e discuta essas questões de modo a
fortificar os seus estudos. Outra dica importante é trocar ideias e
debater com seus colegas e tutores.
1) Elabore um quadro-síntese apresentando os principais conceitos e tópicos
tratados nesta unidade. Propomos que nesse quadro, além da apresentação
de cada conceito, você disserte sobre o mesmo, aprimorando, assim, a sua
aprendizagem.

2) O Projeto Político-pedagógico representa um dos documentos-referência


(além da legislação educacional) às ações pedagógicas desenvolvidas na es-
cola. Nesse sentido, explicite a relevância de que os professores, bem como
a comunidade escolar, conheçam e participem do processo de elaboração/
reelaboração desse documento:

3) O Projeto Político-pedagógico que a elaboração é demandada às escolas e à


sua comunidade escolar a partir da promulgação e vigência da Lei de Diretri-
zes e Bases da Educação Nacional (LDBEN – Lei nº. 9394/96), possibilita uma
relativa autonomia às escolas no sentido de que estas, respeitadas as nor-
mas comuns estabelecidas a nível nacional e as normas do seu respectivo
sistema de ensino, assumam a tarefa de "refletir sobre a sua intencionalida-
de educativa" (VEIGA, 1998, p.12). Considerando essas evidências e o fato de
que o Projeto Político-pedagógico se baseia em determinados pressupostos
(filosófico-sociológicos, epistemológicos e didático-metodológicos), disserte
sobre as relações entre a tarefa da escola de refletir sobre a intencionalidade
que fundamenta as suas ações educativas e esses três pressupostos:

Claretiano - Centro Universitário


132 © Jogos e Brincadeiras II

9. CONSIDERAÇÕES
Caro aluno, acabamos de concluir mais uma unidade. Espe-
ramos que nesse momento você tenha compreendido alguns con-
ceitos básicos sobre a elaboração do Projeto Político-Pedagógico
de Escolas de Educação Básica, as suas finalidades, os seus pres-
supostos orientadores, e tenha conseguido estabelecer relação
entre esse documento, a seleção dos conteúdos de ensino e as
práticas pedagógicas efetivadas com os alunos.
A seguir, na Unidade 4, vamos vivenciar a realidade escolar, a
fim de refletir sobre a adequação dos estudos realizados até o mo-
mento aos diferentes modelos e concepções de prática pedagógicas.

10. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


ÁLVAREZ, Manuel (Org.). O Projeto Educativo da Escola. Porto Alegre: Artmed, 2004.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de
1988. São Paulo: Saraiva, 1988.
______. Presidência da República. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - 9.394,
de 20 de dezembro de 1996. Diário Oficial, Brasília, 23 dez. 1996.
______. Ministério de Educação. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros
Curriculares Nacionais: Educação Física – ensino de primeira à quarta série. Brasília:
MEC/SEF, 1997.
______. Parâmetros Curriculares Nacionais: Educação Física – ensino de quinta a oitava
séries. Brasília: MEC/SEF, 1998b.
______. Ministério de Educação. Secretaria de Educação Básica. Orientações curriculares
para o ensino médio: v. 1 – Linguagens, códigos e suas tecnologias. Brasília: ME/SEB,
2006.MUÑOZ, Dora. A elaboração do Projeto Educativo da Escola. In: ÁLVAREZ, Manuel
(Org.). O Projeto Educativo da Escola. Tradução de Daniel Angel Etcheverry Burguño.
Porto Alegre: Artmed, 2004.
SOARES, Carmen Lúcia et al. Metodologia do ensino da educação física. São Paulo:
Cortez, 1992.
THURLER, Mônica Gather. Inovar no interior da escola. Porto Alegre: Artes Médicas, 2001.
VEIGA, Ilma Passos Alencastro. Perspectivas para reflexão em torno do projeto político-
pedagógico. In: VEIGA, Ilma Passos Alencastro; RESENDE, Lúcia Maria Gonçalves de
(Orgs.). Escola: espaço do projeto político-pedagógico. Campinas, SP: Papirus, 1998.
VEIGA, Ilma Passos Alencastro; RESENDE, Lúcia Maria Gonçalves de (Orgs.). Escola:
espaço do projeto político-pedagógico. Campinas, SP: Papirus, 1998.
EAD
Jogos e Brincadeiras como
Conteúdo Escolar: a Prática
de Sala de Aula
4
1. OBJETIVO
• Contextualizar as leituras e o estudo desenvolvido nes-
te Caderno de Referência de Conteúdo com os jogos e as
brincadeiras que serão apresentados.

2. CONTEÚDOS
• Resenha do texto El juego motor y la pedagogía de las
conductas motrices, de Pere Lavega Burgués.
• A Educação Física na Escola: reflexões, limites e possibi-
lidades pedagógicas. O jogo de "caçador" como exemplo
de prática pedagógica envolvendo jogos e brincadeiras.

3. ORIENTAÇÕES PARA O ESTUDO DA UNIDADE


Antes de iniciar o estudo desta unidade, é importante que
você leia as orientações a seguir:
134 © Jogos e Brincadeiras II

1) Para conhecer mais sobre a Praxiologia Motriz, uma das


temáticas que serão estudadas nesta unidade, sugeri-
mos como leituras complementares:
a) RIBAS, João Francisco Magno. Contribuições da pra-
xiologia motriz para a educação física escolar: ensino
fundamental. 2002. 241 f. Tese (Doutorado) – Facul-
dade de Educação Física, Unicamp. Campinas, 2002.
b) RIBAS, João Francisco Magno (Org.) Jogos e espor-
tes: fundamentos e reflexões da praxiologia motriz.
Santa Maria: Editora da UFSM, 2008.
c) RIBAS, João Francisco Magno. Praxiologia Motriz:
construção de um novo olhar dos jogos e esportes
na escola. Motriz, Rio Claro, v.11 n.2 p.113-120,
mai./ago. 2005. Disponível em: <http://www.rc.unesp.
br/ib/efisica/motriz/11n2/10MRJ.pdf>. Acesso em: 27 set.
2011.
2) Para complementar o estudo do Tópico 7 desta unidade,
A Educação Física na escola: reflexões, limites e possibili-
dades pedagógicas, sugerimos a literatura a seguir. Nes-
sas referências, os autores discutem o processo desen-
cadeado na década de 1980 pelo movimento crítico da
Educação Física brasileira e as dificuldades constatadas
em torno da necessidade de transformação da prática
pedagógica na escola.
a) BRACHT, Valter et al. Pesquisa em ação: educação fí-
sica na escola. 2. ed. Ijuí: Ed. Unijuí, 2005.
b) MUNIZ, Neyse Luz. Influências do pensamento pe-
dagógico renovador da educação física: sonho ou
realidade? 1996. 102f. Dissertação (Mestrado em
Educação Física) – Universidade Gama Filho, Rio de
Janeiro: PPGEF/UGF, 1996.

4. INTRODUÇÃO À UNIDADE
Nesta unidade, como forma de consubstanciar o processo
de ensino-aprendizagem, realizado desde a primeira unidade, pro-
pomos que você intervenha pedagogicamente em uma Escola de
© U4 – Jogos e Brincadeiras como Conteúdo Escolar: a Prática de Sala de Aula 135

Educação Básica, trabalhando com o ensino dos jogos e brincadei-


ras em aulas de Educação Física.
Nesse sentido, é chegada a hora de você se utilizar dos co-
nhecimentos adquiridos durante o processo de aprendizagem e os
articular com as experiências da sua atuação pedagógica na Edu-
cação Física escolar.
Outro ponto a ser destacado é a relevância de dialogar cons-
tantemente com a escola e com o professor de Educação Física
que o acompanhará durante o período de sua inserção e de sua
intervenção pedagógica na escola.
Não se esqueça de socializar as suas experiências com os co-
legas e tutores. Assim, todos podem refletir acerca dos limites e das
possibilidades da Educação Física escolar e da tematização pedagó-
gica dos jogos e brincadeiras nas aulas desta disciplina curricular.
Antecedendo esse momento, propomos uma tarefa de leitu-
ra e de resenha de um texto de Pere Lavega Burgués.

5. RESENHA DE TEXTO-BASE
Estudaremos o artigo de Pere Lavega Burgués, El juego mo-
tor y la pedagogía de las conductas motrices, publicado em 2007
na Revista Conexões – Revista da Faculdade de Educação Física da
Unicamp.
Pere Lavega Burgués é Doutor em Ciências da Atividade Física
e do Esporte – especialidade Praxiologia Motriz, pela Universidade
de Barcelona, licenciado em Educação Física pela Universidade Po-
litécnica de Madri e, atualmente, é professor da Universidade de
Lleida, na Espanha.
Esse texto é importante para seu estudo sobre o lazer, os jo-
gos e as brincadeiras como conteúdos escolares, por apresentarem
o jogo como um cenário privilegiado para o ensino de "condutas
motoras". Atente para o fato desses conteúdos da Educação Física

Claretiano - Centro Universitário


136 © Jogos e Brincadeiras II

ainda serem trabalhados sem critérios nem rigor no entendimento


e na explicação do jogo.
Nesse sentido, o autor faz uma revisão conceitual das prin-
cipais características do jogo (como prática motora lúdica e regra-
da), ao mesmo tempo em que evidencia algumas das principais
preocupações da Educação Física atual.
Por fim, apresenta a praxiologia motriz como um conheci-
mento que pode oferecer ferramentas para o ensino dos conte-
údos relativos ao jogo no contexto educativo diário. Leia atenta-
mente o resumo do referido artigo:
El juego motor y la pedagogía de las conductas motrices
A Educação Física interessada por fazer um uso pedagógico das si-
tuações motoras encontra no jogo um cenário privilegiado. No en-
tanto, atualmente são muitos os docentes que atuam sem critério
nem rigorosidade em sua atividade cotidiana quando se trata de
entender e aplicar o jogo. Neste artigo, se faz uma revisão concei-
tual das principais características do jogo (como prática motora lú-
dica e regrada), ao mesmo tempo que se evidenciam algumas das
principais preocupações da educação física atual. Finalmente, para
vencer esta miopia disciplinar se propõe usar as lentes da praxio-
logia motriz, interessada em desvelar as propriedades dos jogos e
em oferecer ferramentas que permitam aplicar no contexto educa-
tivo diário. Neste contexto se pode justificar que a estrela polar do
uso educativo do jogo se encontra na aplicação de uma verdadeira
pedagogia das condutas motoras. (LAVEGA BURGUÉS, 2007, p. 27)

Pere Lavega Burgués principia seu artigo considerando que


se o objetivo é conceituar e abordar o jogo em termos absolutos,
coloca-se, nessa situação, um problema de ordem conceitual.
A justificativa, segundo o autor, é que "o jogo, em sua con-
dição de realidade complexa, resiste frente a qualquer intenção
de definição ou de conceituação categórica" (LAVEGA BURGUÉS,
2007, p. 28).
Problematização: É possível conceituar e caracterizar "jogo"
tendo em vista as suas múltiplas configurações nos diversos con-
textos sócioculturais (e nos diversos períodos históricos)?
© U4 – Jogos e Brincadeiras como Conteúdo Escolar: a Prática de Sala de Aula 137

O que caracterizava, por exemplo, o jogo presente na Anti-


guidade? E na Modernidade? Analise as imagens apresentadas nas
Figuras 1, 2 e 3 e procure responder a essas questões:

Figura 1 Pulando Corda, de Ivan Cruz.

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138 © Jogos e Brincadeiras II

Figura 2 Jogos para Crianças, (Children’s Games), obra datada de 1560, de Pieter Bruegel.

Figura 3 O jogo institucionalizado: esporte de alto nível.


© U4 – Jogos e Brincadeiras como Conteúdo Escolar: a Prática de Sala de Aula 139

Com a finalidade de ilustrar a "realidade complexa" do jogo,


as imagens representam diferentes faces. Note que um jogo po-
pular como Pular Corda (Figura 1), as diferentes manifestações do
jogo na Idade Média (Figura 2) e o esporte de alto nível (concebido
aqui como uma manifestação do jogo que, no decurso da Moder-
nidade, é institucionalizado) (Figura 3), são apenas algumas das
possibilidades de representação da polissemia da categoria jogo.
Nesse sentido, torna-se relevante que você problematize
constantemente essa questão. O trato pedagógico com os jogos
e as brincadeiras em aulas de Educação Física demanda que você,
futuro professor, reflita constantemente acerca dos sentidos e sig-
nificados atribuídos/adquiridos pelo jogo no decurso dos diferen-
tes períodos sócio-históricos. Problematizar essa questão com as
crianças, os adolescentes e os adultos que frequentam as aulas de
Educação Física, representa um interessante momento da prática
pedagógica.
Tendo em vista a polissemia apontada por Lavega Burgués
(2007) em relação ao conceito de "jogo", desde as suas raízes la-
tinas nos termos "iocus" "jocus" ou em suas expressões "ludus",
"ludere", "lusus" ou "ludicrum" (TRAPERO, 1971; MOLINER, 1982;
COROMINAS, 1984; LAVEGA; 1996 apud LAVEGA BURGUÉS, 2007)
até os múltiplos significados cotidianos que o tem caracterizado, o
referido autor ainda pontua a dispersão que tem caracterizado a
Educação Física no que se refere à apropriação do jogo na condi-
ção de elemento de estudo e de intervenção.
Não são raras as ocasiões, critica Lavega Burgués (2007), em
que estudiosos tratam e/ou sistematizam as diversas manifesta-
ções do jogo mediante critérios questionáveis do ponto de vista
científico. Entre essas sistematizações, citam-se as seguintes:
1) Formas jogadas, jogos de regras, jogos sem regras.
2) Esportes que não são jogos, jogos menores, jogos espor-
tivos, jogos pré-desportivos (estabelecendo, portanto,
uma hierarquia entre os mesmos).

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140 © Jogos e Brincadeiras II

3) Jogos alternativos, esportes alternativos (com exíguo es-


clarecimento do que significa e/ou caracteriza o termo
"alternativo", geralmente utilizado para diferenciar de-
terminado tipo de jogo do esporte institucionalizado ou
de alto nível).
4) Jogos tradicionais, jogos populares, jogos típicos do país.
5) Jogos esportivos individuais ou esportes individuais.
Consoante o autor, essa "confusão" conceitual evidencia-se
no âmbito da intervenção profissional em que, independentemen-
te dos objetivos que fundamentam determinada prática pedagógi-
ca, elege-se jogos sem critérios, ordem ou justificação.
Com base nessas questões, advoga o autor que é necessário
refletir criticamente e buscar vislumbrar formas coerentes pelas
quais o jogo possa ser tratado/tematizado pedagogicamente em
aulas de Educação Física.
Não obstante Lavega Burgués (2007) reconheça que a de-
finição em termos absolutos da essência do jogo represente um
desafio repleto de limitações, reitera-se, pela complexidade des-
sa prática social, o autor apresenta e discute o resultado de uma
pesquisa (LAVEGA BURGUÉS, 1996 apud LAVEGA BURGUÉS, 2007)
que consistiu na revisão conceitual, realizada a partir de estudio-
sos que dedicam-se a esse tema, com o objetivo de apresentar a
complexidade inerente à natureza do jogo.
Entre outros, Pere Lavega Burgués (2007) destaca os se-
guintes: Agricol de Bianchetti, Bally, Bülher, Cagigal, Claparede,
Dehoux, Fraiberg, Gualazzini, Hartmann, Huizinga, Klein, Loy,
Margolin, Miranda, Navarro Adelantado, Ortega y Gasset, Olaso,
Parlebas, Piaget, Roberts, Arth y Bursh, Russel, Schmitz, Slavson,
Vygotsky, Winnicott, Wundt, Lin Yutang.
Metodologicamente, a pesquisa compreendeu a análise de
conteúdo realizada a partir de uma amostra de definições sobre o
jogo. Da análise das informações originaram-se os seguintes pon-
tos, apresentados e discutidos a seguir:
© U4 – Jogos e Brincadeiras como Conteúdo Escolar: a Prática de Sala de Aula 141

O jogo como manifestação ativa


Lavega Burgués (2007) destaca que, a maioria dos autores
estudados, ressalta a condição dinâmica do jogo utilizando-se de
diferentes termos para caracterizá-lo: realidade, fenômeno, ser,
conduta, ação, movimento, motricidade, situações motrizes, prá-
tica, exercício, esforço, comportamento, práxis, ato, impulso, ativi-
dade entre outros.
Nesse momento, é necessário refletir: como é possível que
tantas expressões possam caracterizar o jogo?
Para subsidiá-lo nesse processo, relembre os estudos reali-
zados na Unidade 1, ocasião em que tratamos do conhecimento
específico da Educação Física. Retorne ao Mapa Conceitual apre-
sentado e ao texto de Valter Bracht (1997) "Educação Física: co-
nhecimento e especificidade".
Procure responder a essa pergunta antes de prosseguirmos.
E anote-a, ela servirá como subsídio às análises posteriores reali-
zadas pelo autor do artigo.
O que todos esses termos apresentam em comum? A com-
preensão de que o jogo se constitui em uma manifestação ativa.
Justifica Lavega Burgués (2007, p. 30) que "deduz-se uma primeira
reflexão importante; se quiser ser coerente com o uso do jogo,
há que se evitar jogadores espectadores, já que o jogo é antes de
tudo atuar, sentir...,fluir mediante a participação ativa, a saber,
através da ação motriz".

A dimensão lúdica ou a alma do jogo


Outro ponto analisado pelo autor é a dimensão lúdica do
jogo, a qual, mediante a análise de conteúdo já anteriormente alu-
dida, desencadeia alguns pontos passíveis de destaque.
Em outras palavras, Lavega Burgués (2007) assinala que al-
guns pontos/aspectos são articulados pelos estudiosos do jogo, ao
tratar da sua dimensão lúdica. Vejamos quais são esses pontos:

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142 © Jogos e Brincadeiras II

1) Voluntário, liberação, ação livre (Huizinga); voluntário,


apetite/vontade (G. Bally), valores de liberdade (Sch-
mitz), movimento livre (Roux).
2) Agradável, gratificante, prazer moral (Chateau), alegria,
diversão (Huizinga), satisfação (Tilguer, Ruskin y Renzi),
tempo livre pessoal (Tilguer, Ruskin y Renzi), forma de
felicidade (Ortega y Gasset).
3) Espontâneo, indisciplinado, instintivo, impulsividade
(Buytendijk), irracional (Huizinga), intuitivo (Marani), de-
safio à racionalidade (Duvignaud), fantasia (Klein).
4) Desinteressado, sem importância, prazer funcional, gra-
tuito, improdutivo, sem fins exteriores, fim em si mes-
mo, infinitude interna (Scheuerl), transitório (Huizinga),
supérfluo (Huizinga), sem seriedade (Huizinga), futilida-
de (Marani), inutilidade (Marani), sem metas extrínse-
cas (Garvey), sem intencionalidade (Duvignaud), inten-
cionalidade vazia (Duvignaud), sentido em si (Baldwin
y Grosse), alegria funcional (M.Yela), invenção gratuita
(D’Agostino).
5) Incerto, tensão (Cagigal), insegurança, probabilidade,
aventura (Haigis), mudanças de forma/instabilidade
(Garvey), "manta de retalhos" (em espanhol: "variopin-
to", cambiante (Ommo Gruppe), mutante (Duvignaud),
maleável (Duvignaud), plasticidade (Duvignaud), flutu-
ante (Ciskszentmihalyi), metamorfose (J. Miranda).
6) Ambivalente (Duvignaud), oscilante, contraste (Huizin-
ga), oscilante (J. Miranda).
7) Consciente, decisão, compromisso, subjetividade im-
pregnada de decisões e sentido (Duvignaud), mundo au-
todirigido (K. L. Schmitz).
8) Ordem (Huizinga), harmonia, ritmo, estética (Schiller,
Kant), proporção (Cagigal), equilíbrio (Cagigal).
9) Fictício, separado (Huizinga), abstração, fantasia, imagi-
nação, orientação própria, absorção (Huizinga), repre-
sentação simbólica (Frobenius), fins fictícios (Clapara-
de), simulação (Spencer), fluir (Ciskszentmihalyi).
10) Sério (Wallon), solenidade (Huizinga), atividade necessá-
ria (K.Groos), necessidade interior (Schiller).
© U4 – Jogos e Brincadeiras como Conteúdo Escolar: a Prática de Sala de Aula 143

Reorganizamos os pontos/elementos característicos supraci-


tados por Lavega Burgués (2007) de outra maneira com a intenção
de que você consiga identificá-los em consonância com cada autor
citado, ou seja, utilizamos como critério os autores que estudam
o jogo.
Essa reorganização permitirá analisar os distanciamentos e
as aproximações entre os autores estudados por Lavega Burgués
(2007) no texto que estamos analisando. Observe o Quadro 1:

Quadro 1 Quadro demonstrativo dos diferentes pontos de vista


acerca do jogo
QUADRO DEMONSTRATIVO DOS DIFERENTES PONTOS DE VISTA ACERCA DO JOGO*
Nº. AUTOR CARACTERÍSTICA (S) DO JOGO
1 Huizinga Voluntário, liberação, ação livre, alegria, diversão,
irracional, transitório, supérfluo, sem seriedade,
oscilante, contraste, ordem, fictício, separado,
abstração, fantasia, imaginação, orientação própria,
absorção, solenidade.
2 G. Bally Voluntário, apetite/vontade.
3 Schmitz Valores de liberdade.
4 Roux Movimento livre.
5 Chateau Agradável, gratificante, prazer moral.
6 Tilguer, Ruskin y Satisfação, tempo livre pessoal.
Renzi
7 Ortega y Gasset Forma de felicidade.
8 Buytendijk Espontâneo, indisciplinado, instintivo, impulsividade.
9 Marani Intuitivo, futilidade, inutilidade.
10 Garvey Sem metas extrínsecas, mudanças de forma/
instabilidade.
11 Duvignaud Desafio à racionalidade, sem intencionalidade,
intencionalidade vazia, mutante, maleável,
plasticidade, ambivalente, consciente, decisão,
compromisso, subjetividade impregnada de decisões
e sentido.
12 Klein Fantasia.

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144 © Jogos e Brincadeiras II

QUADRO DEMONSTRATIVO DOS DIFERENTES PONTOS DE VISTA ACERCA DO JOGO*


13 Scheuerl Desinteressado, sem importância, prazer funcional,
gratuito, improdutivo, sem fins exteriores, fim em si
mesmo, infinitude interna.
14 Baldwin y Grosse Sentido em si.
15 M.Yela Alegria funcional.
16 D’Agostino Invenção gratuita.
17 Cagigal Incerto, tensão, proporção, equilíbrio.
18 Haigis Insegurança, probabilidade, aventura.
19 Ommo Gruppe "Manta de retalhos", cambiante.
20 Ciskszentmihalyi Flutuante, fluir.
21 J. Miranda Metamorfose, oscilante.
22 K. L. Schmitz Mundo autodirigido.
23 Schiller, Kant Harmonia, ritmo, estética.
24 Frobenius Representação simbólica.
25 Claparade Fins fictícios.
26 Spencer Simulação.
27 Wallon Sério.
28 K. Groos Atividade necessária.
29 Schiller Necessidade interior.
Fonte: Adaptado de Pere Lavega Burgués (2007).

Em análise a todos esses pontos que agrupamos, de acordo


com cada autor é possível considerar que esses estudiosos apre-
sentam aspectos divergentes/antagônicos para caracterizar o jogo.
Explicita-se, nesse sentido, a evidência mencionada por La-
vega Burgués (2007) em relação à polissemia do jogo. Ela é pos-
sível de ser evidenciada no plano empírico quando analisamos
as múltiplas manifestações do jogo e, inclusive, no plano teórico-
-conceitual na medida em que os sujeitos se propõem a estudá-lo.
Consideramos, ainda, que a multiplicidade de elementos ca-
racterizadores do jogo está relacionada com as diferentes aborda-
gens utilizadas pelos autores. Quer dizer que os pontos de partida
tomados por cada autor para o estudo do jogo em certos casos são
convergentes; em outros, divergentes – fato que permitiu Lavega
© U4 – Jogos e Brincadeiras como Conteúdo Escolar: a Prática de Sala de Aula 145

Burgués (2007) agrupar as características do jogo atribuídas pelos


autores estudados em determinadas categorias.
Observe que Huizinga atribui ao jogo a característica de "sem
seriedade", ao passo que Wallon caracteriza-o como "sério" – em
exemplo de pontos divergentes; e existe certo consenso quanto ao
caráter de "mutável" em Huizinga, Garvey, Duvignaud, Ciskszent-
mihalyi e J. Miranda – à guisa de exemplo no caso da convergência
de características.
Vamos fazer um pequeno exercício no que se refere às múlti-
plas manifestações de um mesmo jogo? Resgate no texto o excerto
em que mencionamos as múltiplas manifestações do jogo no pla-
no empírico. Tomemos como exemplo o Jogo de Taco.
Você conhece o Jogo de Taco? Como ele é denominado na
região em que você reside? Quais são as suas regras?
O que denominamos anteriormente de Jogo de Taco, apre-
senta uma série de outras denominações de acordo com os di-
ferentes locais, regiões e tempos históricos possíveis de ser con-
siderados: "bate-ombro", "bete-ombro", "taco", "bete", "bets",
"bets-lombo", "betcha", "becha", "tacobol", "casinha" ou "lesca".
A origem do jogo de Taco possui algumas versões como a
sua criação por jangadeiros no Brasil durante o século XIX e a sua
origem do "cricket" britânico (o nome "bets" seria uma alusão à
rainha Elizabeth I).
De qualquer maneira, ele representa um jogo popular apre-
ciado por adultos e crianças que se revela ao mesmo tempo com-
plexo, devido às regras e expressões linguísticas particulares ("casi-
nha", "tempo a dois", "vitória", "uma para trás", "bolinha perdida"
entre outras).
Leia a seguir um pequeno texto produzido especialmen-
te para este Caderno de Referência de Conteúdo com o objetivo
de descrever uma das possibilidades de manifestação do Jogo de
Taco.

Claretiano - Centro Universitário


146 © Jogos e Brincadeiras II

Nesse texto, procuramos abordar questões relacionadas ao


jogo, desde suas regras básicas até as memórias oriundas da infân-
cia cujas tardes de domingo eram ocupadas com o jogo de Taco.
Leia-o e contextualize-o com a imagem inserida logo após o
texto.

Memórias do jogo de Bets: do tempo a dois à bola perdida–––


Tarde de domingo, os mesmos programas na televisão, típicos para os horários
e, muitas vezes, já pouco divertidos para as crianças. Não fosse o Sol que con-
vidava as crianças para o pátio, talvez aquele e tantos outros, seriam domingos
iguais uns aos outros: monótonos, adultos conversando e tomando mate, progra-
mas de televisão – os mesmos –, sucessivas trocas de canais, futebol com times
para os quais não se torcem, filmes repetidos...
Mas tinha-se o Sol e este permitia que as tardes de domingo pudessem ser
utilizadas de outras formas. Mas de que forma: futebol? Pegador? Esconde-es-
conde? Casinha? Nada disso... Bets.
Logo após o almoço, mesmo sob os protestos dos adultos de que o Sol ainda
estava "quente", reunia-se um grupo de crianças e lá estavam a procurar os
materiais fundamentais ao famoso Bets. Encontrar a bola e as garrafas pet (as
populares "casinhas") era relativamente fácil, o dilema estava nos tacos. Crian-
ças, cujo jogo passado não guardavam os seus tacos, tinham sérios problemas
para encontrar e, às vezes, fabricar outros. Atraso no jogo, na certa. De qualquer
forma, jogo marcado é jogo marcado. Então, se colocavam à procura de um pe-
daço de madeira adequado. Se o pedaço fosse útil para os pais, somente com
permissão.
Encontrados os preciosos pedaços de madeira, as duas crianças mais experien-
tes tinham a notável tarefa de prepará-los para o uso. Golpes certeiros de faca
em uma das extremidades da madeira para fabricar os "cabos" e lá estavam os
tacos. Quase tudo pronto para as partidas mais emocionantes de Bets do mundo.
Limpeza do campo, posicionamento das "casinhas" na sombra, buraco no chão
de terra batida (daquela terra vermelha), times formados... "os tacos são de
quem?" Cuspe no taco, decisão no "seco ou molhado". Taco lançado para o
alto por todo mundo, contagem do "seco" e do "molhado". Agora, finalmente o
desejado jogo.
Concentração, pontaria, seriedade (o jogo sério, estratégico, tático...), atenção,
tensão, ingredientes típicos do Bets. Tudo isso para, de um lado, a dupla que lan-
çava a bola, derrubar a "casinha" e ficar com os tacos e, de outro, a dupla com os
tacos, para rebater a bola e correr de uma "casinha" a outra, marcando pontos.
Intervalo de jogo?... "Tempo a dois".
Bola passando perto da "casinha" sem ser rebatida... Frio na barriga para todo
mundo.
Bola rebatida para trás ou bola no pé do rebatedor... Reincidência na terceira,
perdia os tacos.
"Bola perdida!", problema na certa. Escondida por entre arbustos e entulhos, a
bola era garimpada por lançadores e rebatedores, afinal o jogo precisa continuar!
© U4 – Jogos e Brincadeiras como Conteúdo Escolar: a Prática de Sala de Aula 147

Bola encontrada, volta ao jogo, e o placar? Doze a dois? Sim, doze a dois, pon-
tos de dois em dois, cada corrida de uma "casinha" para a outra, tocar o taco no
buraco feito no chão, taco com taco no meio do percurso e: dois pontos. Vinte e
quatro, vitória.
Mas o ponto da vitória, o macht point sempre foi o maior desafio para as crianças.
Era preciso uma tacada forte e certeira, bola para bem longe para dar tempo para
ir até a "casinha" e, no meio do campo, em coro, contar até vinte e quatro e gritar
"Vitória!".
Mas, espere, tacada na bola e para o alto, lançador vai em direção à ela e... bola
na mão: o grito de vitória imediato.
E assim eram as tardes dos domingos ensolarados... as emoções do Bets, bem
maiores que a da televisão, das conversas dos adultos, do futebol daquele time,
do filme repetido. Entre uma tacada e outra, entre uma corrida e outra, em uma
vitória ou uma derrota e outra as crianças viviam (vivíamos) a sua (nossa) infân-
cia e construíam (construíamos) o mundo.
––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––
Após analisarmos as diferentes caracterizações ao jogo uti-
lizadas pelos autores estudados por Lavega Burgués (2007, p. 32),
é importante considerarmos o seguinte posicionamento do autor:
No âmbito da educação física, quando um autor prescinde e/ou
carece de um posicionamento disciplinar ou epistemológico bem
construído, muitas vezes é substituída pela simples enumeração de
alguns aspectos qualitativos, que não servem para lançar luz para
a busca de diretrizes para a tarefa docente. No entanto, talvez a
alma do jogo representada por esta lista inacabada de itens, pode
contribuir para que o professor de educação física reconheça a im-
portância de emergir estes aspectos em cada situação de jogo que
surge. Caso contrário, se não são contempladas e, por exemplo, são
restritas: a liberdade para intervir, a espontaneidade, a incerteza do
resultado, a criatividade ou a seriedade que é cada instante para
o protagonista, certamente estará diminuindo a dimensão lúdica
desta situação motriz, diminuindo o seu potencial de educação.

As regras (ou o corpo) do jogo


O jogo apresenta certa particularidade que pode tanto dife-
renciá-la quanto igualá-la a algumas práticas sociais: trata-se de
regras que compõem esse jogo, as quais implicam no respeito aos
direitos e às condições colocadas pelas mesmas, aos quais estão
sujeitos aqueles que nele intervêm.
Todavia, há que se ressaltar que as regras do jogo, ao con-
trário, por exemplo, das "regras" que organizam nossa sociedade,

Claretiano - Centro Universitário


148 © Jogos e Brincadeiras II

são passíveis de deliberação e aceitação voluntária por parte dos


sujeitos envolvidos com o jogo.
Consoante com Lavega Burgués (2007), a natureza conven-
cional do jogo prevê uma contribuição pedagógica muito relevan-
te. Isso porque ele se fundamenta no respeito aos demais, em
aceitar voluntariamente as regras e, concomitantemente, se obri-
gar a seguir as proibições e restrições impostas por essas regras
(porque as aceitou voluntariamente).
Temos de complementar o posicionamento do autor ressal-
tando que o caráter pedagógico, do ponto de vista da contribuição
ao processo de formação das crianças na escola, explicita-se, so-
bretudo, na possibilidade de que o jogo – pelas suas características
de mudança e de transição, já anteriormente aludidas e associa-
das a outras características como a representação simbólica, por
exemplo – seja jogado, discutido e transformado pelos seus par-
ticipantes.
No âmbito das aulas de Educação Física, contribui para a
consecução dessa possibilidade didático-pedagógica a contextua-
lização histórica de determinado jogo.
Em outras palavras, compreender o jogo como um elemento
da cultura construído social e historicamente contribui para que os
alunos se reconheçam como sujeitos que podem e devem trans-
formar determinado jogo em consonância com os seus objetivos e
necessidades, sem, no entanto, deixar de conhecê-lo em sua for-
ma tradicional.
Nessa etapa, relataremos a experiência realizada no decor-
rer da pesquisa sobre as possibilidades de transformação do es-
porte (aqui também compreendido como jogo) em consonância
com as intenções dos sujeitos (MORSCHBACHER, 2009).
© U4 – Jogos e Brincadeiras como Conteúdo Escolar: a Prática de Sala de Aula 149

Experiência prática sobre a possibilidade de transformação


didático-pedagógica do esporte
A pesquisa intitulada "Possibilidades de formação crítico-
-emancipatória a partir do processo ensino-aprendizagem do con-
teúdo esporte: uma proposta desenvolvida em uma escola pública
do município de São Miguel da Boa Vista – SC" (MORSCHBACHER,
2009) objetivou desenvolver aulas de Educação Física por meio
do ensino-aprendizagem do futebol evidenciado com a imple-
mentação de uma proposta didático-metodológica. As aulas são
fundamentadas na proposta crítico-emancipatória de Kunz (2001;
2003), a fim de promover a reflexão crítica acerca da tematização
pedagógica do esporte no âmbito da escola.
A pesquisa foi realizada com as crianças que frequentavam
a 4ª série (Séries Iniciais do Ensino Fundamental), no ano letivo de
2008, em uma escola pública vinculada à Rede Municipal de Ensi-
no de São Miguel da Boa Vista – SC (município do extremo oeste
catarinense).
Dentre as atividades desenvolvidas no decurso da referida
proposta didático-metodológica, se propôs que as crianças elabo-
rassem e/ou transformassem, coletivamente, um jogo de futebol.
Nesta atividade, o grupo construiu dois painéis: no primeiro
as crianças anotaram as características do futebol institucionaliza-
do (identificado pelas crianças como aquele que viam pela tele-
visão) e, no segundo, os itens/regras que compuseram o "novo"
jogo de futebol.
Sobre o futebol institucionalizado, as crianças realizaram um
levantamento das suas características mediante um interessante
diálogo: "Coloca que tem número na camisa dos jogadores"; "Lá
na Barra Bonita, assim na camisa tem um quadrado e tá escrito In-
dependente"; "Mas daí entra nos símbolos"; "Tem também o tênis
pra jogar"; "Então escreve tênis adequado ou apropriado".

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150 © Jogos e Brincadeiras II

Em seguida, o grupo elaborou/transformou o jogo de fute-


bol de acordo com os seus interesses e necessidades. Analise o
Quadro 2 :

Quadro 2 O jogo de futebol elaborado pela 4ª série


NOSSO FUTEBOL
• Se passou da rede é fora (bola);

• sem mão;

• bola fraca;

• na hora do escanteio pode entrar na área do goleiro;

• o goleiro não pode passar do meio de campo.

Observou-se, nesse processo, um complexo diálogo em que


cada situação proposta era refletida quanto à sua viabilidade ao
jogo objetivado.
Após a vivência prática do referido jogo, na aula seguinte,
disposta a refletir sobre o jogo elaborado, as crianças decidiram
repensar e modificar algumas regras.
Em cada item a ser modificado, as crianças apresentavam ar-
gumentos para validarem tais ações: "Nós não tivemos a chance de
pegar a bola"; "Só se a gente pegasse sozinha, não porque alguém
tocou!". "Tem que ter fora"; "É, porque se não tivermos oportuni-
dades como ontem, todo mundo iria querer cobrar o lateral e daí
não daria certo"; "Mas e quando é fora?"; "Quando passar da linha.
Todo mundo concorda?"; "Tem que ter mão, porque senão alguém
vai colocar a mão por querer"; "Essa do goleiro ir até o meio de cam-
po é boa!"; "É, porque ele não fica lá parado feito uma múmia, ele
participa mais"; "Essa regra de que só vale entrar na área na hora do
escanteio tinha que mudar, porque os outros podem entrar só que
o outro time, não"; "É melhor se a gente puder entrar sempre, que
daí vale gol de dentro da área também!"; "Se valer gol de dentro da
área, não precisa chutar forte para fazer o gol"; "É, porque se não
chuta forte de fora da área, os outros pegam".
© U4 – Jogos e Brincadeiras como Conteúdo Escolar: a Prática de Sala de Aula 151

O quadro 3 representa as regras e características do jogo


elaboradas pelas crianças e, ainda, os itens levantados acerca do
futebol enquanto manifestação institucionalizado.

Quadro 3 Itens anotados pelas crianças com as características do


futebol e a elaboração do "Nosso Futebol".
FUTEBOL NOSSO FUTEBOL

• lateral; • tem fora;

• falta; • tem mão;

• escanteio; • o goleiro não pode passar do meio de


campo;
• pênalti;
• o goleiro só pode chutar a bola com o
• gol; pé no tiro de meta;
• meio de campo; • vale entrar na área a qualquer hora;
• fora (campo de jogo); • lateral com o pé;
• mão (falta); • tocar a bola para todos;
• trave; • vale gol de lateral (regra introduzida no
decorrer do jogo).
• reserva;

• área do goleiro;

• barreira;

• roupas e símbolos;

• tênis apropriado.

Redefinidos os aspectos atinentes ao jogo de futebol elabo-


rado, as crianças decidiram jogá-lo a fim de verificar a sua viabili-
dade.
Nesse momento, observaram-se gestos de cooperação, visí-
veis desde a realização de passes até a contínua e autônoma troca
de goleiros e nas cobranças de lateral, quando cada equipe con-
vencionou uma ordem, o que permitia que cada criança, à sua vez,
pudesse realizá-las.

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152 © Jogos e Brincadeiras II

Ao final da aula, referindo-se ao jogo, as crianças mencionaram


que: "A gente criou um jogo só nosso e foi legal"; "A gente aprendeu
que futebol não é só de um jeito, pode ser como a gente quer".
Agora é a sua vez: analise e comente esse relato evidencian-
do o seu ponto de vista em relação às possibilidades pedagógicas
mencionadas por Lavega Burgués (2007) articuladas com o relato
supracitado.
No que se refere às regras de um jogo, Lavega Burgués (2007)
aponta que os estudiosos do tema destacam a condição do jogo
como um sistema de regras utilizando-se de diferentes denomina-
ções. Veja o Quadro 4:

Quadro 4 As diferentes denominações para o conceito de regras


AS REGRAS DO JOGO
Autor Denominação
Huizinga Regulamento, criador de ordem ou acordo.
Parlebas Sistema de regras, estatuto, codificação ou acordo ludomotor.
Marani Código, normas.
Yela Liberdade transformada em lei.
Schmitz Limites internos.
Robles; Olaso Lei, ser convencional.
Fonte: Adaptado de Pere Lavega Burgués (2007).

Parlebas (2002 apud LAVEGA BURGUÉS, 2007) considera in-


clusive que as regras estabelecem os limites entre as práticas que
o autor denomina de "quase-jogos" (situações motrizes sem re-
gras, abertas e passíveis de mudança em cada intervenção) e as
que são jogos (situações motrizes codificadas que dispõem de um
estatuto) ou até mesmo os esportes (situações motrizes regradas
e institucionalizadas).
Em relação à análise de Lavega Burgués (2007), em linhas ge-
rais, as regras dos jogos referem-se aos seguintes elementos que
integram o sistema de regras: os jogadores (número e tipo de in-
teração), os espaços (dimensões e modo de utilizá-los), o material
© U4 – Jogos e Brincadeiras como Conteúdo Escolar: a Prática de Sala de Aula 153

(características e formas de manipulá-los) e o tempo (início, sequ-


ências temporais e fim).
Leia com atenção a seguinte citação extraída do artigo de
Pere Lavega Burgués (2007, p. 34, grifos nossos). Ela é muito im-
portante para que você compreenda a razão pela qual o jogo vem
sendo estudado sob perspectivas distintas – e, em não raras oca-
siões, antagônicas.
O esforço por elaborar uma definição em torno do conceito de jogo
não tem sentido, se não cumprir a função de servir de lente que
permita "iluminar" o caminho a seguir em seu estudo e na inter-
venção no plano prático. A dispersão e a carência de fórmulas a
seguir que evidencia o exame das definições, também se obser-
va no estudo detalhado das teorias do jogo, que pela extensão a
ser respeitada neste artigo não se vai tratar. No fundo as distin-
tas interpretações disciplinares sobre o jogo formuladas desde a
fisiologia (Shaller, Lazarus, Schiller, Spencer...), a biologia (Harvey
Carr, Stanley Hall, Groos, Bally Eibl-Eibesfeldt, Lorenz...), a psi-
cologia (Freud, Winnicott, Erikson, Claparede, Wallon, Chateau,
Wund, Piaget, Vygotsky, Elkonin...), a sociologia e a antropologia
(Malinowski, RadcliffeBrown, Firth, Gmelch, Langsley, Eifermann,
Salter, Salamone, Raabe, Lance, Geertz, Turner, Huizinga, Caillois,
Sutton-Smith,...) não deixam de ser contribuições complementares
e periféricas para o professor de educação física. Apesar de propor-
cionar reflexões interessantes e eruditas, não centram a atenção
em desvelar as constantes e a ordem interna que caracterizam as
situações de jogo pelas quais a educação física se interessa. Mais
uma vez, o cenário observado justifica a necessidade de encontrar
uma estrela polar que indique o caminho a seguir em meio a esta
escuridão conceitual. Neste contexto, será necessário ir ao legado
teórico e prático (epistemológico) que oferece a ciência da ação
motriz criada pelo professor Parlebas.

Na citação anterior, você deve ter percebido que o autor se


utiliza da crítica à aplicabilidade/utilização dos conhecimentos pro-
duzidos sobre o jogo no âmbito da intervenção prática, ou seja, no
caso da Educação Física, nas intervenções pedagógicas cotidianas.
Para a superação dessa crítica (que, do ponto de vista prá-
tico, poder-se-ia denominar, insuficiência) Lavega Burgués (2007)
aponta a Praxiologia Motriz. Trata-se de uma perspectiva de estu-
do em que os jogos e os esportes são estudados e entendidos con-
siderando a sua "essência" ou a sua lógica interna (RIBAS, 2005).

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154 © Jogos e Brincadeiras II

Com base nessas considerações, estudaremos, não obstan-


te de modo breve, algumas questões que permeiam a Praxiologia
Motriz.
A praxiologia motriz ao considerar como objeto de estudo as leis,
regularidades e mecanismos de funcionamento que se desenca-
deia em qualquer jogo motor oferece um legado extraordinário
para que todo professor ou professor de educação física que saiba
e queira usar as 'lentes' desta disciplina seja coerente, rigoroso e
científico em seu exercício profissional (LAVEGA BURGUÉS, 2007,
p. 34).

O que vem a ser a "lógica interna" de um jogo?


Acompanhe o seguinte exemplo (a representação de uma
adaptação do exemplo citado por Lavega Burgués (2007) do jogo
"balón prisionero"): dez crianças jogam "Caçador" na quadra da
escola. (esse jogo está descrito na próxima seção).
As regras desse jogo delimitam as ações das crianças – aqui-
lo que é permitido e aquilo que não é permitido fazer em um jogo
de "Caçador" -, ou seja, "[...] estabelecem os limites da prática
dentro das quais se gera uma ordem ou lógica interna" (LAVEGA
BURGUÉS, 2007, p. 36).
Nesse jogo, as crianças manipulam o material (a bola), se
relacionam de modo singular com os demais jogadores (em cola-
boração ou em oposição), com o espaço (ocupando e utilizando
determinados espaços, de uma ou outra forma) e com o tempo
(levando em consideração as sequências temporais do jogo, o seu
início e o seu fim).
Para Lavega Burgués (2007), todas essas possibilidades são
ações motrizes do jogo de "Caçador", entendidas como o resul-
tado visível de um conjunto de relações internas que permite
considerar o jogo como um sistema: "A este conjunto de modos
singulares de relações internas que demanda um jogo e as suas
consequências sobre a prática denomina-se lógica interna" (p. 36).
Nesse sentido, é possível concluir que: "Cada jogo dispõe de
uma lógica interna específica que orienta os protagonistas a re-
© U4 – Jogos e Brincadeiras como Conteúdo Escolar: a Prática de Sala de Aula 155

solverem determinados problemas ou adaptações" (LAVEGA BUR-


GUÉS, 2007, p. 37, grifo nosso).
Assim, ao refletirmos sobre os diferentes jogos que com-
põem nossa cultura corporal de movimento e tomando por base
a análise de suas lógicas internas, podemos considerar que a Edu-
cação Física escolar possui um interessante e vasto arcabouço de
possibilidades pedagógicas no âmbito da tematização dos jogos e
da cultura corporal de movimento.
Como podem ser classificados os jogos considerando as suas
lógicas internas?
Parlebas (1981 apud LAVEGA BURGUÉS, 2007) classifica os jo-
gos utilizando como critério a interação motriz com outros jogado-
res e a relação com o meio. Analise cada uma dessas classificações
No que refere-se às interações motrizes com outros jogado-
res, veja no Quadro 5 a classificação dos jogos que o referido autor
propõe.

Quadro 5 Classificação dos jogos segundo as interações motrizes


com outros jogadores
CLASSIFICAÇÃO DOS JOGOS SEGUNDO AS INTERAÇÕES MOTRIZES COM OUTROS
JOGADORES (PARLEBAS, 1981 APUD LAVEGA BURGUÉS, 2007)
Nº. Tipo de Jogo Caracterização Exemplo (s)
01 Jogos A sua lógica interna não exige a interação Jogos de
Psicomotores com outras pessoas. repetição de
movimento
e controle do
corpo.
02 Jogos 1. Jogos cooperativos: a sua lógica interna Pega-pega
Sociomotores orienta os jogadores a respeitar acordos corrente, maria-
coletivos, tomar decisões e realizar ações -mole, entre
coletivamente e estar em constante outros.
comunicação com os outros.
2. Jogos de oposição: as ações motrizes Jogos esporti-
realizam-se diante de um oponente. vos, caçador,
pega-pega,
taco, entre
outros.

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156 © Jogos e Brincadeiras II

Em relação ao critério de relação com o meio, a seguinte


classificação é proposta no Quadro 6 a seguir.

Quadro 6 Classificação dos jogos segundo as relações com o meio


CLASSIFICAÇÃO DOS JOGOS SEGUNDO AS RELAÇÕES COM O MEIO
(PARLEBAS, 1981 APUD LAVEGA BURGUÉS, 2007)
Nº. Tipo de Jogo Caracterização Exemplo (s)
01 Jogos em A relação do jogador com o meio não está Jogos
um meio caracterizada pela incerteza, tendo em vista que esportivos.
estável o espaço é regular e conhecido pelo sujeito.
02 Jogos em A relação do jogador com o espaço é marcada Jogos
um meio pela incerteza, considerando que as condições aquáticos.
instável desse espaço mudam constantemente devido à
sua irregularidade.

Considerando essas classificações, além das questões trata-


das no artigo de Pere Lavega Burgués (2007), é possível visualizar
a Praxiologia Motriz como uma possibilidade de sistematização do
trato pedagógico com o jogo.
Isso não significa, contudo, que a Praxiologia Motriz seja a
única possibilidade de estudo e de sistematização prática, tendo
em vista que nosso objetivo não foi tratá-la como o único "cami-
nho" a ser seguido.
De qualquer forma, a Praxiologia Motriz e outros aportes
teórico-conceituais que, porventura, sejam utilizados para funda-
mentar o processo de ensino dos jogos e brincadeiras, não devem
estar à margem de algumas questões de ordem pedagógica como:
Qual é o sentido da sua atuação pedagógica na escola? Educação
Física escolar, para quê?
Certamente você já estudou e/ou discutiu acerca dessas
questões neste curso. Proporemos aqui, mais uma vez, algumas
reflexões que vêm ao encontro do caminho que propomos traçar
neste estudo desde o seu início.
Para tanto, nesse momento, é imprescindível que reflita cri-
ticamente sobre a temática que discutiremos a seguir. Ela está in-
© U4 – Jogos e Brincadeiras como Conteúdo Escolar: a Prática de Sala de Aula 157

timamente relacionada com cada uma das unidades anteriores e


culmina com a atividade prática que, posteriormente, proporemos
a você.
Por enquanto, reflita sobre as duas questões supracitadas –
"Qual é o sentido da sua atuação pedagógica na escola?" e "Edu-
cação Física escolar, para quê?"

6. A EDUCAÇÃO FÍSICA NA ESCOLA: REFLEXÕES, LI-


MITES E POSSIBILIDADES PEDAGÓGICAS
Você se encontra em uma etapa muito especial deste Ca-
derno de Referência de Conteúdo: a que carrega consigo tanto as
temáticas estudadas nas unidades anteriores (até mesmo em Jo-
gos e Brincadeiras I e nas demais que compõem o currículo deste
curso) quanto um processo de preparação à próxima atividade: a
sua intervenção pedagógica na escola na condição de professor de
Educação Física. Nesse sentido, não poderíamos deixar de abordar
alguns elementos que consideramos imprescindíveis à atuação do
professor de Educação Física na escola. Eles objetivam suscitar a
sua reflexão em torno de aspectos que permeiam a prática peda-
gógica da Educação Física escolar.
Vamos utilizar como ponto de partida as considerações dis-
cutidas na Unidade 1 acerca da intencionalidade pedagógica, ca-
racterística que torna peculiar e/ou diferencia a educação formal
da educação não formal.
Essa intencionalidade, conforme explicitamos anteriormen-
te, não se encontra somente relacionada a objetivos de aprendiza-
gem situados no plano micro da atividade escolar (ou seja, a sala
de aula e as aprendizagens suscitadas em seu interior), consubs-
tanciados na tematização da cultura.
De modo mais amplo, essa intencionalidade expressa tam-
bém determinados projetos históricos intimamente relacionados
a visões sociais de mundo que coexistem hodiernamente em nos-

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158 © Jogos e Brincadeiras II

sa sociedade e que, entre outras incumbências, procuram explicar


e servir de referência às nossas ações.
Afirmar que a intencionalidade pedagógica, explícita ou im-
plícita nas ações da educação formal, referencia determinados
projetos históricos, significa considerar que as ações por ela de-
senvolvidas mantêm relação de reciprocidade entre que tipo de
sujeito se pretende formar, com que finalidade e para que tipo
de sociedade (SOUZA, 2009).
É por essa razão que, ainda na Unidade 1, problematizá-
vamos o fato de que a educação coloca-se em constante tensão
entre a transformação e a adaptação/manutenção do status quo
social. Essa tensão se evidencia na medida em que diferentes pro-
jetos históricos lutam por legitimidade social.
No tocante à Educação Física, Soares et al., 1992, p. 62 acre-
dita que:
Por essas considerações podemos dizer que os temas da cultura
corporal, tratados na escola, expressam um sentido/significado
onde se interpenetram, dialeticamente, a intencionalidade/objeti-
vos do homem e as intenções/objetivos da sociedade.

No âmbito da Educação Física, a tensão entre projetos his-


tóricos (referenciados em determinadas visões sociais de mundo)
é evidenciada com eloqüência a partir da década de 1980. As crí-
ticas e denúncias dirigidas à Educação Física nesse período, ques-
tionam o projeto histórico hegemônico balizador da sua prática
pedagógica na escola.
Em outras palavras, debate-se acerca do sujeito que a Edu-
cação Física objetiva formar, com que finalidade e para que tipo
de sociedade.
Ao contrário do que uma análise superficial possa sugerir, o
processo engendrado nesse período ultrapassa o âmbito das aulas
de Educação Física e situa-se no plano epistemológico (e político)
da área.
© U4 – Jogos e Brincadeiras como Conteúdo Escolar: a Prática de Sala de Aula 159

Para Kunz (2006), a perspectiva era que a Educação Física


superasse as influências do esporte institucionalizado e de rendi-
mento, bem como das Ciências Biológicas e, assim, "[...] passaria a
ser um recorte do conhecimento do ser humano a ser constituído
pelas Ciências Humanas e Sociais, em especial pelas ciências da
educação" (p. 11).
Consideramos que essas discussões apresentam-se atuais e
pertinentes frente ao panorama da Educação Física escolar bra-
sileira, tanto no que se refere ao âmbito acadêmico (espaço em
que o debate tem avançado significativamente) quanto na escola,
nosso lócus de intervenção profissional.
Entretanto, tem-se constatado que na escola, carecemos de
ações efetivas no sentido de ressignificar a prática pedagógica da
Educação Física escolar.
De modo convergente, Kunz (2006) entende que a Educação
Física na escola encontra-se em um processo de ressignificação de
sua identidade pedagógica. Esse processo já foi evidenciado ante-
riormente ao aludirmos à década de 1980 e às distintas relações
observadas no âmbito acadêmico e na escola.
Não obstante fosse possível recorrer a respostas simplistas e
aparentemente inequívocas, González e Fensterseifer (2009) aten-
tam para a complexidade que permeia esse processo de ressignifi-
car a identidade pedagógica da Educação Física Escolar.
Assim, de modo a redimensionar a Educação Física no âm-
bito escolar, no entendimento de Bracht e González (2005 apud
GONZÁLEZ; FENSTERSEIFER 2009, p. 11), dentre outras iniciativas,
colocou-se como necessária a superação do tradicional papel da
Educação Física Escolar como atividade de "exercitar-se para" e
a sua transformação para a condição de componente curricular:
Particularmente no que respeita ao campo educacional, questio-
nou-se o paradigma de aptidão física e esportiva que sustentava de
forma extensiva as práticas pedagógicas da EF nos pátios escolares.
[...] podemos apontar que, entre outras iniciativas, o movimento

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160 © Jogos e Brincadeiras II

renovador entendeu que uma das ações necessárias para transfor-


mar a EF seria "elevá-la" à condição de disciplina escolar, tirando-a
da categoria de mera atividade.

Esse processo, para os autores supracitados, vem acompa-


nhado de uma nova demanda:
[...] se coloca [...] um conjunto de questões que não faziam parte
das preocupações da tradição desta área, e que balizam as teorias
pedagógicas quando buscam legitimar um componente curricular
num projeto educacional (GONZÁLEZ; BRACHT, 2009 apud GONZÁ-
LEZ; FENSTERSEIFER 2009, p. 11).

As razões que legitimam historicamente a presença da Edu-


cação Física nos currículos escolares dizem respeito à possibilidade
de propiciar que os sujeitos se exercitassem para melhorar a saúde,
para auxiliar na aprendizagem requerida pelos demais componen-
tes curriculares, para formar o caráter, entre outras incumbências.
Somente a partir da década de 1980 (González, Fenstersei-
fer, 2009) ocorre a justificativa da inclusão da Educação Física no
currículo escolar, vinculada à concepção de que ela teria como
responsabilidade tematizar pedagogicamente um conhecimento
específico. A relevância de tal conhecimento fundamenta-se na
necessidade de que as gerações mais jovens apropriem-se critica-
mente deste a fim de potencializá-las diante do mundo contem-
porâneo.
O conjunto de questões para a "elevação" da Educação Físi-
ca, conforme se mencionou anteriormente, à condição de discipli-
na, situam-se entre as seguintes:
Por que a Educação Física deve compor o currículo da escola?
Quais são os seus objetivos educacionais?
Quais são os seus conteúdos? Ou, qual é o conhecimento a ser te-
matizado pedagogicamente pela Educação Física na escola?
Como são sistematizados os conteúdos ao longo dos níveis de ensi-
no e dos anos escolares?
Como ensinar estes conteúdos?
Como avaliar seu ensino? (GONZÁLEZ; FENSTERSEIFER, 2009, p. 11).
© U4 – Jogos e Brincadeiras como Conteúdo Escolar: a Prática de Sala de Aula 161

Não obstante reconheçam-se significativos avanços tanto à


produção de conhecimentos quanto à sua prática pedagógica no
âmbito da Educação Física Escolar, González e Fensterseifer (2009,
p. 12, grifo nosso) de modo similar a certeza de outros autores
(MUNIZ, 1996; KUNZ, 2003; 2006; BRACHT et al., 2005), mencio-
nam as dificuldades com que as requeridas transformações da prá-
tica pedagógica desta disciplina curricular vêm processualmente
se consolidando.
Assim, na nossa compreensão, a EF encontra-se entre o ainda não
e o não mais, ou seja, entre uma prática docente na qual não se
acredita mais, e outra que ainda se tem dificuldades de pensar e
desenvolver.

Com base nessas questões, discutiremos alguns pontos que


permeiam três perguntas-chave:
• Educação Física: para quê?
• O que ensinar?
• Como ensinar?
Durante o seu processo de formação no Curso de Licenciatu-
ra em Educação Física, dentre essas questões, qual(is) é(são) a(s)
questão(ões) que se encontra(m) no centro de suas preocupações?
Utilizaremos como referência o texto de Kunz (2006)
"Pedagogia do esporte, do Movimento Humano ou da educação
física?" para tratar dessas questões e das relações estabelecidas
entre Jogos e Brincadeiras II, a atividade que em seguida será
proposta e a sua formação como um todo.
O professor Elenor Kunz é doutor em Ciências do Esporte e
pós-doutor pela Universidade de Hannover. Atualmente é profes-
sor titular da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).
Inicialmente, pode-se considerar que a pergunta (e suas pos-
síveis respostas) "Educação Física, para quê?" Precede as questões
"O que ensinar? (conteúdos) e "Como ensinar?"(métodos de en-
sino).

Claretiano - Centro Universitário


162 © Jogos e Brincadeiras II

Nessa perspectiva, o "o quê" e o "como" necessita emergir das


possibilidades de respostas à pergunta "para quê". Essencialmente
há que se "[...] preocupar com a questão do sentido/significado do
ensino de Educação Física na escola e, em função destes sentidos,
buscar sua legitimidade teórica" (KUNZ, 2006, p. 18, grifo nosso).
A busca pela resposta à pergunta "Educação Física, para
quê?" demanda que discussões e estudos mais amplos sejam con-
templados nos cursos de formação de professores de Educação
Física, superando, nesse sentido a lógica da abordagem direta das
metodologias ou didáticas de ensino (KUNZ, 2006).
É por essa razão que iniciamos este estudo tratando da edu-
cação e da escola como espaços e tempos de transmissão/tema-
tização da cultura e que esclarecemos algumas questões acerca
do fato de que a prática pedagógica desenvolvida em seu interior
relaciona-se intimamente com determinados projetos históricos.
É necessário atentarmos também para o fato de que a nossa
atuação na escola, a forma como organizamos, planejamos e de-
senvolvemos nossa prática pedagógica, não se encontra à parte
dessas discussões.
Ressaltamos que nós, professores, possuímos um compro-
misso ético e político com a formação das crianças, jovens e adul-
tos que estão na escola. Nesse sentido, definir criticamente qual é
esse compromisso, é de suma importância.
Assim, coloca-se como diretriz necessária à Educação Física
escolar "[...] estudar e discutir uma pedagogia para além da didá-
tica e metodologia" (KUNZ, 2006, p. 18, grifo nosso).
O autor supracitado ainda menciona que, tendo em vista que
a didática e a metodologia ocupam-se dos conteúdos e métodos
do trabalho pedagógico, ou seja, dentre outras questões, tentam
responder às perguntas: "O que ensinar?" (conteúdos) e "Como
ensinar?" (métodos), a pedagogia ocupa-se de uma questão mais
ampla: "Educação Física, para quê?". Segundo Kunz (2006, p. 18):
© U4 – Jogos e Brincadeiras como Conteúdo Escolar: a Prática de Sala de Aula 163

A Educação Física que é ensinada nas escolas serve para quê? Ela
fomenta a saúde? Ela socializa e educa para uma visão de mundo
de forma crítica e emancipadora? Com o que a Educação Física, re-
almente, pode contribuir com a Educação, com uma formação que,
no caso, chamamos crítico-emancipatória?

O autor refere-se a uma formação crítico-emancipatória,


conforme estudamos na Unidade 1, em alusão à proposta crítico-
-emancipatória (na oportunidade, denominada por Bracht (1999)
de "tendência crítico-emancipatória"). O que não significa que as
questões que estamos abordando não possam estar relacionadas
à prática pedagógica da Educação Física com outra fundamenta-
ção (na proposta crítico-superadora, por exemplo).
Queremos enfatizar aqui, que a preocupação com questões
como "Educação Física, para quê?", "O que ensinar?", "Como en-
sinar?", entre outras questões, não representa uma preocupação
exclusiva, por exemplo, da proposta crítico-emancipatória.
Esse conjunto de questões permeia todas as tendências pe-
dagógicas da Educação Física Escolar (sobre essas tendências, ver
o artigo "A constituição das teorias pedagógicas da Educação Físi-
ca" (BRACHT, 1999), estudado na Unidade 1), ressalvadas, todavia,
as peculiaridades dessas tendências.
Diante desses apontamentos e discussões, qual(is) é(são)
a(s) perspectiva(s) ou o(s) caminho(s) possível(is) para a Educação
Física escolar? Um deles é a retomada de algumas temáticas já
discutidas desde a década de 1980, tais como educação, escola,
ensino, corpo, movimento humano, cultura corporal/cultura de
movimento entre outros. Além disso, é necessário relacioná-las
aos estudos e às experiências empíricas (uma aproximação, nesse
sentido, efetiva, entre os aportes teórico-conceituais fundantes de
nossa prática pedagógica e a realidade interventora representada
pela prática cotidiana do ensino escolar) (KUNZ, 2006).
As temáticas/conceitos citadas são denominadas por Kunz
(2006; 1998) como os "temas fundamentais" do ensino da Edu-
cação Física. São esses "temas", estudados sob teorias filosóficas,

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164 © Jogos e Brincadeiras II

sociológicas, culturais, psicológicas, históricas (entre outros) - ob-


serve que estamos nos referindo à proposta crítico-emancipatória,
à crítico-superadora, às aulas abertas, à própria Praxiologia Motriz
(estudada anteriormente) etc. - que podem nos auxiliar a respon-
der às perguntas: "Educação Física, para quê?", "O quê ensinar?"
e "Como ensinar?".
A resposta à pergunta "Educação Física, para quê?" deman-
da que tenhamos condições de apontar a direção para o tipo de
sujeito que pretendemos (e, de certo modo, necessitamos) for-
mar, com que finalidade e para que tipo de sociedade.
Acreditamos que você tenha condições de realizar algumas
considerações sobre essa questão. Por isso, disserte acerca da per-
gunta "Educação Física, para quê?" relacionando-a ao projeto for-
mativo de sujeito e de sociedade.
Abordadas essas questões que, reiteramos, consideramos
fundamentais para a atuação do professor de Educação Física na
escola, proporemos alguns exemplos de jogos, os quais servirão
de referência para a atividade prevista no Caderno de Prática (CP)
anexo a este Caderno de Referência de Conteúdo.

7. O JOGO DE "CAÇADOR": EXPERIÊNCIAS COM A


PRÁTICA PEDAGÓGICA DA EDUCAÇÃO FÍSICA NA ES-
COLA
Nessa seção, adotamos uma estratégia de organização em
que você estabelecerá diálogos com este Caderno de Referência
de Conteúdo (CRC). A ideia é que ao final desta unidade e deste
caderno de Jogos e Brincadeiras II conclua a tarefa proposta que
integra uma das atividades relativas ao processo avaliativo.
Nesta etapa, realizaremos algumas análises sobre o popular
Jogo de "Caçador", que servirá de importante aporte para a sua
experiência com a prática docente em Educação Física – proposta
no CP.
© U4 – Jogos e Brincadeiras como Conteúdo Escolar: a Prática de Sala de Aula 165

Primeira versão do ensino do Jogo de "Caçador"


O Jogo de "Caçador", também é popularmente conhecido
como "Barra Bola", "Queimada", "Mata-mata", entre outras deno-
minações, dependendo da região brasileira.
Além das diferentes denominações, o jogo apresenta con-
figurações ora semelhantes, ora distintas em alusão, por exem-
plo, às regras que o compõe. Você conhece e/ou já ouviu falar do
"Caçador-Rei" ou do "Caçador Maluco"? Essas duas variações do
Jogo de "Caçador" explicitam suas diversas manifestações e, até
mesmo, do jogo compreendido como uma categoria do lazer e um
elemento da cultura corporal.
Na ocasião em que você entrar em contato com as crianças
que frequentam a escola (ou que brincam em praças e outros es-
paços) e conversar com elas sobre as atividades de lazer que mais
apreciam, confirmará essa evidência no tocante aos jogos e brin-
cadeiras.
Um interessante ponto de partida para a prática pedagógica
do professor de Educação Física é, ao trabalhar com o Jogo de "Ca-
çador" na escola (ou outros jogos e brincadeiras), procurar conhe-
cer a maneira como os seus alunos o conhecem (e o denominam).
Em função da atual configuração da sociedade, comumente
constatam-se mudanças em relação aos jogos e brincadeiras que
as crianças conhecem e que, cotidianamente, brincam.
Muito provavelmente, sobretudo em relação aos jogos e
brincadeiras mais tradicionais e/ou populares, algumas crianças
(em função das maiores ou menores experiências pregressas) po-
dem conhecê-los de maneira restrita.
Uma possibilidade colocada para a Educação Física escolar,
ressalvados os objetivos educacionais próprios à educação formal,
podem ser, também, a ampliação do repertório de conhecimentos
dos alunos da Educação Básica em relação à multiplicidade de jo-
gos e brincadeiras presentes na cultura.

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166 © Jogos e Brincadeiras II

Retornando ao Jogo de "Caçador", nesta etapa da unidade,


conforme mencionamos anteriormente, você estabelecerá diá-
logos com o Caderno de Prática. No decurso do TópicoPrimeira
versão do ensino do Jogo de "Caçador apresentaremos algumas
indicações de como o diálogo será estabelecido e de como poderá
auxiliar no desenvolvimento da atividade prática proposta no Ca-
derno de Prática.
Nesse momento, apresentaremos e discutiremos algumas
sugestões didáticas no que se refere à tematização pedagógica
do Jogo de "Caçador". Elas serão interessantes para que você as
utilize em consonância com as demandas encontradas durante o
desenvolvimento da atividade prática explicitada no Caderno de
Prática.
O Jogo de "Caçador" permite que um grande número de par-
ticipantes possa jogá-lo, portanto, é possível que todos os alunos
participem, tendo em vista que as turmas das escolas são, geral-
mente, numerosas, (aproximadamente 30 alunos ou mais).
Etapa 1: apresentar o Jogo de "Caçador" aos alunos
Uma etapa muito importante de uma aula de Educação Físi-
ca é o momento em que o professor propõe e apresenta o jogo aos
alunos. Ele pode adotar várias estratégias para tal, dependendo da
intencionalidade com que a aula é desenvolvida, ou seja, os seus
objetivos. Listamos, a seguir, algumas sugestões:
• Após dividir os alunos em duas equipes, explicar as regras.
• Apresentar o jogo, inicialmente, em linhas gerais, contex-
tualizando, se possível a origem histórica e as variações
de denominações e de regras, situadas espacialmente e
temporalmente. Em seguida, sondar os alunos quanto ao
"quê" conhecem e "como" jogam "Caçador" e explicar as
regras do jogo que intenta que os alunos vivenciem.
• Estabelecer as regras do jogo dialogando com os alunos
(reporte-se, por exemplo, ao relato de experiência apre-
© U4 – Jogos e Brincadeiras como Conteúdo Escolar: a Prática de Sala de Aula 167

sentado nessa seção sobre a "criação do novo jogo de fu-


tebol") entre outras possibilidades.
Sugestão: em uma aula de Educação Física, caso a turma ul-
trapasse 35 alunos, é interessante fazer uma divisão. O ideal é que
fiquem grupos de no mínimo 10 alunos para cada lado da quadra.
Outra possibilidade, é dividir o espaço disponível de modo a
organizar dois ou mais jogos concomitantes, evitando que os alu-
nos permaneçam durante certo tempo de uma aula sem realizar
a atividade.
Etapa 2: a lógica interna do Jogo de "Caçador"
Primeira parte: marcar um espaço de aproximadamente 18
metros de comprimento por 9 metros de largura (semelhante à
quadra de voleibol). Esse espaço, entretanto, irá variar em função
do espaço disponível à aula de Educação Física. Divida a quadra
conforme a Figura 4.

Caçador
Equipe Caçador
Vermelha Equipe
Equipe Azul Equipe Vermelha Azul

Figura 4 Divisão da quadra para a primeira versão do jogo de Caçador.

Segunda parte: posicionar todos os jogadores na faixa cen-


tral na quadra oposta ao lado que vai ficar o caçador da mesma
equipe, conforme mostra a Figura 4.
Terceira parte: cada equipe deve escolher um colega para
iniciar na função de "caçador". Este deverá se dirigir para o fundo

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168 © Jogos e Brincadeiras II

da quadra, em posição oposta à sua equipe.


Quarta parte: em seguida os caçadores começam a jogar a
bola em direção aos jogadores da equipe oponente. Todos aqueles
que forem "pegos" (ou que forem tocados pela bola) posicionam-
-se no fundo oposto do seu campo de jogo (isto é, o local em que
se encontra o "caçador" de sua equipe no início do jogo), realizan-
do as suas ações de jogo nesse local – arremessar a bola com o
intuito de tocá-la nos integrantes da equipe oponente.
Quinta parte: os jogadores podem tentar pegar a bola,
quando conseguem, e também podem arremessá-la em direção
aos jogadores da equipe oponente, assumindo momentaneamen-
te a função de caçadores.
Sexta parte: o jogo termina quando uma das equipes é toda
"caçada". Vence a equipe que "caçar" todos os integrantes da ou-
tra, primeiro.
Etapa 3: o Jogo de "Caçador" acontece
Nessa etapa, os alunos vivenciam o "Caçador". Apresenta-
-se como possibilidade de que, no decurso do jogo, os alunos e o
professor discutam as regras do jogo e as modifiquem conforme os
seus interesses e necessidades.
Etapa 4: diálogo com os alunos
Após o término do jogo, é importante conversar com os alu-
nos sobre o desenvolvimento da aula e o que acharam. Pode-se
perguntar se gostaram e quais mudanças nas regras proporiam. É
sempre de grande relevância registrar tudo o que conversar com
os alunos.

Segunda versão do ensino do Jogo "Caçador"


Conforme anunciamos anteriormente, o Jogo de "Caçador"
apresenta inúmeras variações, localizadas espacialmente e tempo-
ralmente. A seguir apresentamos outra possibilidade.
© U4 – Jogos e Brincadeiras como Conteúdo Escolar: a Prática de Sala de Aula 169

Essa versão permite muitos participantes, e não é necessário


dividi-los em equipes. É possível colocar todos os alunos partici-
pando de uma só vez.
Regras do jogo
Primeira: marcar um espaço de aproximadamente 18 me-
tros de comprimento por 9 metros de largura (semelhante à qua-
dra de voleibol). Esse espaço, entretanto, irá variar em função do
espaço disponível à aula de Educação Física. Todos os jogadores
ocupam toda a quadra, conforme a Figura 5 a seguir.

Bola

Figura 5 Divisão da quadra para a segunda versão do jogo de Caçador.

Segunda: a regra básica é que dois jogadores começam como


"caçadores", e todos os outros como "caça".
Terceira: todos os jogadores podem se deslocar livremente,
contudo ninguém pode sair dos limites demarcados.
Quarta: os caçadores se deslocam na quadra e procuram se
manter próximos de algum caçado, jogando a bola entre si. Con-
tudo, quando estão de posse da bola não podem andar, pois pre-
cisam ficar com um pé de apoio fixo no chão, podem se mexer no
raio de extensão de sua perna fixa e estender os braços para tentar
encostar a bola nos caçados.
Quinta: os caçadores obterão sucesso se forem rápidos em
trocar a bola entre si, devem, portanto, estar atentos uns aos ou-

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170 © Jogos e Brincadeiras II

tros. São frações de segundos que cada caçador têm para pegar a
bola e encostar/tocar nos caçados, pois estes podem se deslocar
livremente sempre.
Sexta: todo aquele que for caçado se torna caçador e assu-
me, juntamente com os outros dois, a função, ficando sujeitos às
mesmas limitações impostas à figura do caçador. O jogo termina
quando só existirem caçadores.
Após o término do jogo, pode-se conversar com os alunos
(de forma semelhante à primeira versão apresentada) sobre o de-
senvolvimento da aula, o que acharam. Pode-se perguntar se gos-
taram e quais mudanças nas regras proporiam. O registro desse
diálogo reiteramos, é fundamental. Lembre-se de que reflexão
sem registro se perde com o tempo e muitos detalhes acabam dei-
xados de lado.

Terceira versão do ensino do Jogo de"Caçador"


Nessa terceira versão proposta ao ensino do Jogo de "Caça-
dor", as regras e/ou a sua lógica interna para o funcionamento do
jogo são as mesmas da versão apresentada anteriormente.
Contudo, o objetivo dessa versão do jogo é evidenciar as di-
ferenças que podem existir em grupos sociais e colocar os alunos
como responsáveis pela organização de um espaço de lazer que
tenha como fundamento a inclusão de todos.
Para que isso fique mais evidente, o professor (você) vai es-
colher alguns participantes para representar um conjunto de alu-
nos com maiores limitações do que os outros. Por exemplo:
• Um aluno será vendado.
• Dois alunos só poderão andar com um pé só.
• Dois alunos só poderão usar uma das mãos.
Observação: o número de alunos (um aluno, dois alunos,
etc.) pode e deve ser modificado em consonância com as carac-
terísticas da turma, sobretudo em relação à quantidade de alunos
da turma.
© U4 – Jogos e Brincadeiras como Conteúdo Escolar: a Prática de Sala de Aula 171

Outro aspecto a ser ressaltado é a importância do profes-


sor desenvolver estratégias que permitam que os alunos troquem
constantemente de papéis, propiciando, assim, múltiplas experi-
ências no que diz respeito a esse Jogo de "Caçador" e aos diferen-
tes papéis que o constituem.
Como sugestão à organização do jogo, caso o professor com-
preenda que, no momento em que a aula acontece, os alunos te-
nham condições de organizá-lo autonomamente, pode-se propor
que eles assumam essa responsabilidade sob a seguinte condição:
todos devem participar do jogo, de modo que os colegas com limi-
tações não sejam discriminados ou representem problemas para o
jogo.
Nesta atividade, o professor não se exime da responsabilida-
de pedagógica de seu papel, de outra forma, tem um papel funda-
mental, o de mediador das decisões do grupo. Essa estratégia de-
manda que o professor fique atento ao que acontece no decorrer
da aula e que problematize as regras e demais diretrizes definidas
pelo grupo.
Em diversas ocasiões essa estratégia, inicialmente, desenca-
deia dificuldades por parte dos alunos no sentido de que definir
regras e diretrizes de um jogo não é uma tarefa simples.
Assim, pode ser que os alunos tenham dificuldades de defi-
nirem regras que privilegiem a cooperação, a socialização e a inclu-
são. Caberá ao professor, sem que fique explícita sua intervenção,
problematizar e estimular o diálogo e dar sugestões.
Por exemplo:
• Para o aluno vendado tem que existir um guia, que o aju-
de a fugir da bola. O aluno vendado não poderá ser mira-
do diretamente. O alvo é sempre o guia. Nessa situação,
o professor pode problematizar algumas questões, como:
se as possibilidades de mobilidade do aluno vendado são
restritas, como propiciar que as suas ações sejam bem-

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172 © Jogos e Brincadeiras II

-sucedidas?
• Como ficam as regras para os alunos com dificuldades de
mobilidade? Serão submetidos às mesmas regras ou os
colegas vão propor outras que os ajudem a participar de
forma igualitária?
É de suma importância que o professor observe a interação
entre os alunos e como uns colaboram com os outros desde o mo-
mento de organização até a efetivação do jogo.
Lembre-se de que, nesse caso, a aprendizagem dos conte-
údos começa na organização do jogo. Este é um momento ímpar
para que os alunos aprendam atitudes e procedimentos diferentes
com relação ao uso dos conhecimentos sobre as práticas corporais
diferentes daqueles que podem aprender apenas como executo-
res.
Após o término do jogo, pode-se conversar com os alunos
(de forma semelhante às versões apresentadas anteriormente) so-
bre o desenvolvimento da aula, o que acharam. Pode-se perguntar
se gostaram e quais mudanças nas regras proporiam.
Sobretudo nessa etapa, dadas as características do jogo pro-
posto, é interessante instigar os alunos sobre as experiências vi-
venciadas no processo de organização e desenvolvimento coletivo
deste. O registro desse diálogo reiteramos, é fundamental.

8. QUESTÕES AUTOAVALIATIVAS
Confira, a seguir, as questões propostas para verificar o seu
desempenho no estudo desta unidade.
1) Pere Lavega Burgués (2007), após o estudo dos autores que se dedicaram
a estudar o jogo, apresenta uma síntese de diferentes enfoques e caracte-
rísticas atribuídas por esses autores aos jogos. Qual(is) a(s) razão(ões) para
que sejam observadas determinadas convergências e/ou determinadas di-
vergências entre esses enfoques e características atribuídas ao jogo?
© U4 – Jogos e Brincadeiras como Conteúdo Escolar: a Prática de Sala de Aula 173

2) A Praxiologia Motriz (LAVEGA BURGUÉS, 2007) objetiva servir de diretriz ao


processo ensino-aprendizagem do jogo, abordando sob a perspectiva da(s)
lógica(s) interna(s) que o compõe e o caracteriza. Apontamos, entretanto,
um limite e/ou uma necessidade colocada a essa perspectiva. Identifique-a
e explicite as possibilidades de atendimento e/ou superação dessa deman-
da. Referenciando-se em alguns autores, cujas preocupações corroboram as
perspectivas mencionadas no que se refere à prática pedagógica da Educa-
ção Física, reflita acerca do compromisso político-social como professores
que se encontram (encontrarão) atuando na escola e que possuem sob sua
incumbência promover a tematização da cultura (a cultura corporal, o lazer,
os jogos e brincadeiras). A seguir, registre seu ponto de vista em relação às
seguintes afirmações:
a) "Assim, nessa trajetória e nesse patamar alcançado pela Educação Físi-
ca brasileira nos últimos quinze anos, tem-se uma sensação de que, ao
mesmo tempo em que evoluímos no desenvolvimento de pressupostos
teórico-metodológicos com referências das áreas humanas e sociais, dei-
xamos uma enorme lacuna, um vazio existente entre essa evolução e a
Educação Física no seu ‘estar sendo’ (BRACHT et al, 2003)" (KUNZ, 2006,
p.12).
b) "[...] as pesquisas e publicações que, início dos anos 90, se preocupavam
e, concretamente, sugeriam intervenções na realidade empírica da área,
em especial, a escolar praticamente não tiveram continuidade e apro-
fundamentos. Refiro-me às chamadas propostas interventoras: crítico-
-superadora, crítico-emancipatória, aulas abertas, etc." (KUNZ, 2006,
p.13).
c) "Enfim, parece que nos encontramos numa fase em que temos de refle-
tir seriamente sobre a questão de retomar e aprofundar o pensamento
teórico específico da área ou partir primeiro para um avanço nas inter-
venções concretas na realidade empírica" (KUNZ, 2006, p.14, grifos do
autor).
d) "A Educação Física pode e deve ser discutida do ponto de vista epistemo-
lógico, social-filosófico e cultural, como também biológico e técnico. Pre-
cisa, no entanto, cada vez mais investigar a própria prática e refletir mais
sobre ela. Se o campo didático-pedagógico relacionado ao profissional
que atua diretamente na prática não for, sequer, mencionado nas avan-
çadas elaborações teóricas da área, resta pouca esperança, no desenvol-
vimento de valores, compromissos e interesses pedagógicos, para revo-
lucionar, também, a prática cotidiana do professor" (KUNZ, 2006, p.15).
3) Disserte sobre as relações existentes entre a educação formal, determina-
dos projetos históricos e determinadas visões de mundo. Explique-as e as
evidencie mediante uma situação da prática pedagógica cotidiana da Edu-
cação Física escolar:

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174 © Jogos e Brincadeiras II

9. CONSIDERAÇÕES
Caro aluno, esperamos que os estudos e as atividades pro-
postas nesta unidade tenham suscitado relevantes aprendizagens
e experiências a você.
Procuramos articular os aportes teóricos que fundamenta-
ram os estudos desta unidade e das anteriores com a necessária
experiência da prática pedagógica da Educação Física na escola,
lócus de sua futura atuação docente, para que você conhecesse
e vivenciasse o cotidiano escolar com o acompanhamento de um
professor de Educação Física mais experiente.
Considerando o "caminho" que você percorreu no decurso
de Jogos e Brincadeiras II, esperamos que os objetivos traçados
tenham sido alcançados.
Ademais, esperamos que, na medida do possível, as suas ex-
pectativas em relação a este estudo também tenham sido alcan-
çadas.
Se nos reportarmos às etapas de estudo e de atividades pro-
postas, constataremos que o caminho foi árduo, característica que,
entretanto, não constituiu um limite às aprendizagens objetivadas
e suscitadas; ao contrário, evidenciou o quão complexo (no senti-
do de algo que traz consigo elementos "enredados" e articulados)
e relevante é a nossa atuação pedagógica na escola.
É necessário considerar que os temas estudados em cada
uma das unidades representam um recorte (não obstante qualita-
tivamente considerável) do processo de ensino dos jogos e brinca-
deiras em aulas de Educação Física.
Nesse sentido, esperamos que você esteja motivado para
não permanecer restrito aos apontamentos e encaminhamentos
aqui propostos, mas que, para além destes, seja capaz de ampliar
os seus horizontes no tocante a gama das temáticas abordadas
neste Caderno de Referência de Conteúdo.
© U4 – Jogos e Brincadeiras como Conteúdo Escolar: a Prática de Sala de Aula 175

Por fim, agradecemos a oportunidade de estarmos juntos


até essa etapa de sua formação.

10. E-REFERÊNCIAS

Lista de figuras
Figura 1 Pulando corda. Disponível em: <http://www.brincadeirasdecrianca.com.br/
quadr/pulando_corda.jpg>. Acesso em: 27 set. 2011.
Figura 2 Jogos para crianças (Children’s Games). Disponível em: <http://fits.depauw.
edu/aharris/Courses/Stolen/FinalProjects/SANNESS/Elder/bruegel13.jpg>. Acesso em:
27 set. 2011.
Figura 3 O jogo institucionalizado: esporte de alto nível. Disponível em: <http://oglobo.
globo.com/fotos/2008/10/08/08_MVG_futsal2.jpg>. Acesso em: 27 set. 2011.

Sites pesquisados
El juego motor y la pedagogía de las conductas motrices. Disponível em:
<http://polaris.bc.unicamp.br/seer/fef/printarticle.php?id=60&layout=ps>. Acesso em:
31 jul. 2011.
LAVEGA BURGUÉS, Pere. El juego motor y la pedagogía de las conductas motrices. Motor
games and pedagogy of motor conducts. Revista Conexões, v. 5, n. 1, 2007. Faculdade
de Educação Física da Unicamp. Disponível em:<http://polaris.bc.unicamp.br/seer/fef/
include/getdoc.php?id=152&article=60&mode=pdf>. Acesso em: 20 jul. 2011.
RIBAS, João Francisco Magno. Praxiologia Motriz: construção de um novo olhar dos jogos e
esportes na escola. Motriz, Rio Claro, v. 11 n. 2 p. 113-120, mai./ago. 2005. Disponível em:
<http://www.rc.unesp.br/ib/efisica/motriz/11n2/10MRJ.pdf>. Acesso em: 20 jul. 2011.

11. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


GONZÁLEZ; Fernando Jaime; FENSTERSEIFER, Paulo Evaldo. Entre o "não mais" e o "ainda
não": pensando saídas do não-lugar da Educação Física escolar I. Cadernos de Formação
RBCE, Campinas: CBCE e Autores Associados, v. 1, n. 1. p. 9-24, set.2009.
KUNZ, Elenor. Educação física escolar: seu desenvolvimento, problemas e propostas.
In: SEMINÁRIO BRASILEIRO EM PEDAGOGIA DO ESPORTE: FUNÇÕES, TENDÊNCIAS E
PROPOSTAS PARA A EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR, 1998, Santa Maria. Anais... Santa
Maria: CEFD-UFSM, 1998. p. 114-119.
______. Educação Física: ensino & mudanças. 2.ed. Ijuí: Unijuí, 2001.
______. Pedagogia do esporte, do movimento humano ou da educação física? In: KUNZ,
Elenor; TREBELS, Andreas Heinrich. Educação física crítico-emancipatória: com uma
perspectiva da pedagogia alemã do esporte. Ijuí: Unijuí, 2006.

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______. Transformação didático-pedagógica do esporte. 5.ed. Ijuí: Unijuí, 2003.


MORSCHBACHER, Márcia. Possibilidades de formação crítico-emancipatória a partir do
conteúdo esporte: uma proposta desenvolvida em uma escola pública de São Miguel
da Boa Vista - SC. 2009. 99f. (Relatório de Pesquisa) – Universidade do Oeste de Santa
Catarina, São Miguel do Oeste, 2009.
SOARES et. al. Metodologia do ensino de Educação Física. São Paulo, Cortez, 1992.
SOUZA, Maristela da Silva. Esporte escolar: possibilidade superadora no plano da cultura
corporal. São Paulo: Ícone, 2009.

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