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Entender como o espaço é percebido nas mais variadas sociedades é um

aspecto importante para se intender melhor suas dinâmicas de funcionamento. A este


respeito Shama (1996) na mostra de que forma as matas se tornaram na Inglaterra
dos séculos XVI a XVII um símbolo da liberdade do povo britânico e da comunhão que
este desfrutava com seus soberanos ambas invocadas pelo espírito das histórias de
Robin Hood. Enquanto isso nas florestas reais francesas as arvores eram tratadas
com ordenação e cuidado para que cada uma a seu tempo pudesse fornecer sua vida
a honra do Rei tal como qualquer um de seus súditos. Estes dois casos revelam não
apenas uma percepção da natureza como os usos que são feitos dela

Existem pessoas que possuem uma maior sensibilidade aos ritmos da


natureza, para elas esse contato com o natural é como essencial em suas vidas, já
para outros, tal elemento não representa nada além de imagens, odores e roídos,
sendo assim podemos encontrar percepções totalmente divergentes de um mesmo
ambiente. Partindo desta constatação Yi – fu Tuan (1980) constrói seu conceito de
Topofilia a qual define da seguinte forma:

A palavra “topofilia” é um neologismo, útil quando pode ser definida


em sentido amplo, incluindo todos os laços afetivos dos seres
humanos com o meio ambiente material. Estes diferem profundamente
em intensidade, sutileza e modo de expressão. A resposta ao meio
ambiente pode ser basicamente estética: em seguida, pode variar do
efêmero prazer que se tem de uma vista, até a sensação de beleza,
igualmente fugaz, mas muito mais intensa, que é subitamente
revelada. A resposta pode ser tátil: o deleite ao sentir o ar, água, terra.
Mas permanentes e mais difíceis de expressar, são os sentimentos
que temos para com o lugar, por ser o lar, o lugar de reminiscências e
o meio de se ganhar a vida. (1980, p. 107).

Para se compreender como surge esse sentimento é importante discernir


algumas condições. Em primeiro lugar a cultura que, como já comentamos nos casos
citados por Shama, estabelece muitos dos preceitos norteadores de percepção dos
espaços diferindo de sociedade para sociedade. Logo, a depender do tipo da
sociedade em que nascemos e os valores que recebemos em nossa criação teremos
um determinado tipo de atitude para com os espaços.
Como exemplo disso destacamos sociedades camponesas como tem sido o
Brasil em grande parte de sua História. Para muitos brasileiros, em especial os da
região Nordeste, distingue-se uma forte sensibilidade para os ritmos do tempo e da
terra no sentido de perceber a aproximação das chuvas e as melhores épocas para o
preparo da terra, plantio e colheita.

Um segundo ponto é o espaço propriamente dito. A natureza determina


também as formas de ver, de acordo com o meio em que está inserido, o ser humano
irá buscar formas de se adaptar e melhor viver. Assim, a humanidade tem conseguido
sobreviver em ambientes severos tanto nos desertos escaldantes quanto nos
ambientes congelados do hemisfério norte. Essas populações desenvolvem altos
graus de observação da paisagem. Pode-se perceber com isto que cultura e natureza
estão intimamente ligados sendo praticamente indissociáveis.

Como elaboramos acima, existem níveis distintos de percepção do espaço


em cada pessoa e isso depende não apenas da cultura e do espaço ocupado por este
indivíduo, mas também com as experiências vividas com o meio. Durante a vida de
um ser humano os espaços podem oferecer variadas sensações tanto boas quantos
ruins. Podemos falar neste sentido dos jovens que desiludidos com a falta de
oportunidades do campo vão morar nas cidades em busca de novas formas de vida.
Para muitos deles o campo não é visto como algo belo, idílico e sim como um símbolo
de dificuldades, de serem reféns da terra que dita ano após ano a fartura ou a miséria.
Temos por outro lado aqueles jovens que viveram seus primeiros anos em meio a
natureza, mas que foram bem sedo levados a morar em cidades e afastados de seus
referenciais campestres. Para estes o campo representa um passado em que tudo
era mais simples e divertido. Eles almejam emotivos um reencontro com aquele
mundo.

Alguém que pode ser colocado nesse segundo grupo foi Oswaldo Lamartine
de Faria, agrônomo e escritor Norte-Rio-Grandense com atuação entre as décadas
de 1950 a 2000. Em toda a sua produção intelectual podemos ver despontado em
grandes quantidades essa atração pelo meio natural. Uma amostra disso se encontra
em Sertões do Seridó (1980) onde ele fala:

Espia-se a água se derramando líquida e horizontal pela terra adentro


a se perder de vista. As represas esgueiram-se em margens
contorcidas e embastadas, onde touceiras de capim de planta ou
madante de hastes arroxeadas debruçam-se na lodosa lama. O verde
das vazantes emoldura o açude no cinzento dos chãos. Do silencio
dos descampados vem marulhar das marolas que morrem nos rasos.
Curimatãs em cardumes comem e vadeiam nas águas beirinhas nas
horas frias do quebrar da barra ou morrer do dia. Nuvens de marrecas
caem dos céus. Pato verdadeiro putrião e paturi grasnam em coral
com o coaxar dos sapos que abraçados se multiplicam em infindáveis
desovas geométricas. Gritos de socó martelam espaçadamente os
silêncios. O mergulhão risca em rasante vôo o espelho líquido das
águas. Garças em branco-noivo fazem alvura na lama. É o arremedar,
naqueles mundos, do começo do mundo... (1980, p. 23).

Antes de mais nada devemos destacar algumas pesquisas dentro da


academia sobre este personagem, tais trabalhos foram produzidos tanto na área de
História quanto na área de Letras. Em primeiro lugar temos Medeiros Neta (2007) que
tratou da Historiografia seridoense a partir de autores como Manuel Dantas, José
Augusto de Medeiros Juvenal Lamartine e próprio Oswaldo Lamartine. Esta pesquisa
proporcionou pensar em como esses autores ligados por laços de parentesco
puderam construir o espaço do Seridó através de seus textos. Já Peñero (2010)
procurou fazer uma comparação entre os textos Sertões do Seridó (1980) de
Lamartine e Grande Sertão Veredas (2011) de Guimarães Rosa buscando traçar uma
comparação entre a construção do Sertão em Rosa e suas aproximações com o
Sertão de Oswaldo. No trabalho mais recente Castro (2015) nos apresenta um
panorama sobre a vida de Oswaldo Lamartine trazendo para tanto uma grande gama
de fontes. Todos esses trabalhos vão investigar de uma forma ou de outra a relação
entre Oswaldo Lamartine e o Seridó, porém quase nenhum deles trata dos outros
espaços onde ele viveu bem como da influência deles na sua visão de mundo.

Com esta motivação tratamos neste trabalho da relação entre Lamartine e o


meio nas diversas espacialidades em que ele viveu tendo sempre em mente sua
profunda ligação com a natureza, com o Seridó e com a memória.

O primeiro passo para se compreender essa relação é tratar da história de


vida de Oswaldo dando ênfase em sua formação familiar e carreira profissional bem
como no ambiente cultural de sua época. Ele faz parte de uma família tradicional seu
pai Juvenal Lamartine (1874-1956) foi um político oriundo de Serra Negra do Norte
um dos municípios da microrregião do Seridó que desenvolveu carreira nas primeiras
décadas do século XX durante o final da República Velha em um contexto de grandes
modificações políticas e sociais. Ocupando vários cargos políticos, desde 1906 em
1930 Lamartine se põe do lado de Washington Luís e quando tem início a revolução
ele é retirado do posto de governador e forçado a se exilar na Europa de onde só
retorna em 1944.

Sendo um dos dez filhos do governador deposto, Lamartine se vê sem o pai


e sua família sendo desestruturada e a partir daí será levado a estudar em colégios
internos primeiro no Recife e posteriormente no Rio de Janeiro. Sua formação superior
inclui o curso na Escola Superior de agronomia de Lavras em Minas Gerais após a
conclusão do curso retorna para terras potiguares e vai ajudar o pai na administração
da fazenda Lagoa Nova em São Paulo do Potengi. Durante sua vida profissional
trabalhará como administrador no Núcleo Agrícola de Pium e no Serviço de
Colonização do Ministério da Agricultura em Barra da Corda Maranhão. Deve-se
acrescentar ainda que durante muitos anos foi funcionário do Banco do Nordeste
sediado no Rio de Janeiro. Mesmo estando tanto tempo afastado ele sempre buscava
um jeito de visitar sua terra natal fazendo isso em seus períodos de férias escolares e
de trabalho.

Lamartine nasceu no início do século XX e presenciou uma série de


modificações no Brasil e sobretudo no Nordeste. Albuquerque Junior (2009)
analisando o próprio processo de invenção discursiva dessa territorialidade discute
que o Sertão nordestino por ter a característica de interior de afastado da civilização
surge como o espaço da essência ou da alma nacional bem como do verdadeiro
brasileiro. Temos ai um processo de construção em que o Sertão é colocado, por suas
elites econômicas, como um contraponto a identidade cosmopolita ou moderna
identificada com o litoral.

O clima intelectual em que Lamartine cresceu fui muito marcado pelo


movimento folclorista que, conforme mostra Albuquerque Junior (2013), teve um
grande desenvolvimento durante as primeiras décadas do século XX, sobretudo na
região Nordeste. Foi composto, em sua maioria, por membros de famílias tradicionais,
conservadoras e influentes em seus respectivos estados. Entre os nomes importantes
dentro desse movimento estavam, Luís da Camara Cascudo1, Gustavo Barroso e

1
Luís da Câmara Cascudo foi um grande amigo de Oswaldo Lamartine. No livro de Cascudo para
Oswaldo publicado 2005 foram reunidas correspondências endereçadas por Cascudo a Lamartine nas
Mauro Mota2. Algumas das características desse movimento são, a valorização de um
passado agropastoril marcado por um tipo de sociabilidade hierárquica, passado pré
– industrial no qual prevaleciam modos de produção artesanais. A partir desses
elementos esses intelectuais construíram a ideia do que é a cultura popular.

Estas são as condições possibilitaram o desenvolvimento em Oswaldo


Lamartine de uma topofilia em níveis tão fortes que transcenderam as distancias. A
seguir vamos mostrar como esse sentimento vai se construindo e reconstruindo ao
longo da sua vida.

Experiências da infância (1919-1929)

Quando Lamartine nasceu seu pai ocupava o cargo de deputado tendo


portanto uma condição de vida bem elevada para a época. Ele não nasceu no Seridó,
interior nordestino, mas no seu oposto, o litoral em Natal. Seus primeiros anos de vida
foram quase todos passados na cidade com pequenas visitas ao Seridó a terra de
seus pais e avós. Sobre essas visitas ele recorda:

Quando no Sertão, mesminho Casimiro... Da camisa aberto o peito, /


- Pés descalços nus. O dia principiava com a caneca de leite mugido
ainda ao quebrar da barra e se findava com as estórias de Trancoso.
Noites de um sono só parecendo um piscar de olhos. Vadiava-se de
boi – de – osso, cavalo de pau, nadar com cavalete de mulumgu,
mergulhar em desafio à “galinha gorda/ Gorda é ela ...” Jogar canga-
pé, tirar caçote, armar arapuca, fojo e mundé, andar a cavalo enfim,
todo esse rico e sadio viver rural. (2001, p. 16).

Nestas palavras se observa algumas coisas interessantes. A citação a


Casimiro de Abreu deixa clara a influência do romantismo no modo de ver de mundo
de Lamartine. Farias (2007) define a saudade como uma das principais
características do romantismo e muito mais presente em Cassimiro a quem define
como o poeta da saudade.

Essa saudade lhe acompanhará durante todo o seu percurso como escritor,
podemos dizer inclusive que, a saudade é o grande motivador de sua escrita já que é

quais podemos observar uma constante troca de informações e referências sobre o folclore e a história
potiguar.
2
No livro Em Alpendres de Acauã: Uma conversa com Oswaldo Lamartine de Faria quando ele cita os
livros mais significativos de sua vida aparecem entre eles, Terra do Sol de Gustavo Barroso, Paisagens
da Seca de Mauro Mota e Vaqueiros e cantadores de Luís da Camara Câscudo.
no período no qual se encontra mais distanciado do Sertão que ele começa a escrever
e pesquisar sobre ele3. Assim como Cassimiro que vivendo em Portugal escreve seu
livro As primaveras (1859) tendo em mente o Brasil, Oswaldo se via como uma
espécie de exilado no Rio de Janeiro que escreveu seus livros com o pensamento
focado no Sertão.

Por falar em Sertão é interessante notar como ele constrói esse espaço. Ao
contrário das descrições convencionais que definem a paisagem sertaneja com
pinceladas de sofrimento e dor, a abordagem de Lamartine é a de um Seridó leitoso
e hídrico. Suas brincadeiras são quase todas na água. Água boa e limpa dos açudes
que vai venerar em seu ensaio Os Açudes dos Sertões do Seridó (1978). Isso se deve
talvez pela posição ocupada por seu pai dentro da hierarquia social daquela época
uma vez que além de político, Juvenal Lamartine também era proprietário rural e
pecuarista. A visão sobre o Seridó seco, pedregoso vai aparecer posteriormente em
suas obras.

Com relação a sua infância urbana vivida no número 431 da avenida


Rodrigues Alves esquina com a rua Trairi Lamartine esboça o cenário da seguinte
forma:

Quando em natal, manhazinha, apanhar frutas no sitio da casa; caçar


com baladeira; empinar papagaios (raias, bandejas e relógios) de
cauda armadas de rocegas (lascas de fundo de garrafa Cinzano
presas por taliscas; Futebol de botão (ai da visita em dia de chuva que
pendurasse capa no cabide lá de casa); peladas de bola – de – meia
na Rua Potengi e de borracha e couro no campo do Triangulo (onde
hoje é o Ateneu). Ali se amagotavam os meninos que vinham apanhar
água em latas, galões e roladeiras (barris tracionados pelo eixo) e,
seduzidos pela bola, esqueciam da obrigação. A pisa era grande
quando voltavam para casa. Éramos moleques de calça-curta e
felizes. Lembro de Zé Tamaru, João Calango, Baíca, Nazareno,
Antônio Scipião e tantos outros humildes meninos da Solidão...
(LAMARTINE DE FARIA, 2001.p. 16).

Essa infância urbana narrada por Lamartine apresenta uma cidade que ainda
apresenta traços do mundo rural entre eles os sítios onde se pode recolher frutas. Era
uma época em que não existiam tantos muros, onde as crianças tinham plena

3
Lamartine publica seu primeiro estudo sobre o Sertão
liberdade de vivenciar vários espaços desbravando os bairros em diversos tipos de
brincadeiras coletivas que ele cita em múltiplos exemplos.

Ao analisarmos essas duas passagens podemos perceber claramente como


se dá a perspectiva espacial da criança. Sobre isto Yi – fu Tuan (1980) salienta que
ao contrário do adulto a criança tem uma capacidade de percepção dos espaços muito
mais aguçada. Ela não se preocupa tanto com a estética dos lugares mas com as
sensações que estes podem lhe proporcionar através dos sentidos do tato, olfato e
paladar. Além do mais, a criança não está tão ligada as regras e postulados sociais
tendo uma maior liberdade para explorar. Mesmo que a medida que cresce ela seja
moldada pelo imperativo dos pais a se conter.

Na experiência de Lamartine estas atitudes se revelam com bastante clareza.


Tanto no Seridó quanto em Natal suas memorias revelam uma infância a céu aberto
em que o interior da casa não é recordado. Outro ponto notável é como o movimento
é frequentemente mencionado nessas lembranças, são meninos que estão sempre
correndo, andando ou nadando. O ato de apanhar frutas direto do pé nos mostra
também essa forte relação com o meio, nela participam o tato no contato com a planta,
o cheiro da fruta fresca e o paladar do seu gosto. Ao empinar pipas eles também
tomam consciência da amplitude do espaço acima de suas cabeças. Foi dessa
maneira, explorando a terra, a água e o ar que Lamartine passou sua infância, um
bicho solto como gostava de se denominar.

A vida nas fazendas (1940-1955)

A formação básica de Lamartine foi totalmente realizada em colégios fora do


Rio Grande do Norte em função de todas as complicações trazidas pela Revolução
de 1930. Primeiro veio o Ginásio do Recife depois foi para o Instituto Lafayrtte no Rio
de Janeiro. Logo após nos anos de 1937-38 passou a estudar na Escola de Agronomia
de Lavras em Minas Gerais de onde só regressa em 1941.

A partir deste momento, munido de sua formação em Agronomia passa a


ajudar seu pai, recém chegado do exílio na Europa nos afazeres da Fazenda Lagoa
Nova, município de São Paulo do Potengi. Lá ele trabalhará entre 1941 a 1948 e neste
período convive com Pedro Ourives, Zé Lourenço, Chico Julião, Bonato Liberato
Dantas e Olinto Ignácio todos eles grandes mestres de ofício que serviram de
professores para o jovem Lamartine nas artes da pesca, caça, encouramento, entre
outras. Para ilustrar essa relação citemos Lamartine:

Vivi sob as mesmas telhas com Bonato Liberato Dantas (1897-1955)


quando ele fazia uma tarrafa – veterano pescador de açude que foi.
Espiava, perguntava, rabiscava figuras e anotações. Daí o A.B.C da
pescaria de açudes. A mesma coisa com Pedro Américo de Oliveira,
vulgo Pedro Ourives (1878-1964) seu filho Francisco Lins (1916-
1990), um remontando uma sela roladeira e o outro costurando um
encouramento. Resultante – Encouramento e arreios do Vaqueiro. A
caça nos Sertões consequência de momentos vividos, ouvidos e lidos.
(LAMARTINE DE FARIA, 2001.p. 62).

Mais tarde, na década de 1950, Lamartine irá trabalhar como administrador


de duas colônias agrícolas. A primeira foi no município de Pium – RN e a outra em
Barra da Corda no Maranhão. Esta foi outra oportunidade para vivenciar atividades
junto a terra algo que muito o agradava. Nesta ocasião esteve em contato com os
índios Kraô que assim como os mestres de oficio foram grandes professores de
percepção espacial nas caçadas que faziam juntos. Ele conta que quando um desses
formidáveis caçadores se colocava no rastro de um bicho “podia botar a panela no
fogo” tamanha era a sua capacidade de rastrear, o que revela é claro, um grande
conhecimento do território bem como dos hábitos dos animais da região.

Da mesma forma como o Sertão do Seridó será um espaço importante por ser
um foco de reminiscências da infância, essas fazendas e os núcleos coloniais serão
relevantes por proporcionarem ricas experiências sensoriais em um contato direto
com a terra e com a natureza circundante. Isto é identificado por Tuan como o segundo
e o terceiro estágio da topofilia onde o espaço começa a ser verdadeiramente
percebido para além da mera visualidade. Aqui ele ganha significados e desperta
fortes sentimentos.

O “exílio” no rio de janeiro e o retorno a terra natal (1955-1995

De 1955 a 1979 Oswaldo trabalha no Banco do Nordeste. Um homem como


Lamartine tão afeito a terra e a natureza trabalhando em um banco em afazeres
burocráticos pode parecer um tanto estranho, entretanto nesta época ele já havia
constituído família e precisava da estabilidade que uma carreira poderia proporcionar.
Os anos que passa como bancário serão muito importantes para definir em
muitos aspectos a sua personalidade saudosista. Vejamos o que Lamartine fala sobre
esse período.

O homem é um animal de grande capacidade de adaptação. E morar


no Rio não é castigo. Eu tinha uma companheira de excelente convívio
e procurei encontrar na cidade grande alternativas do meu agrado –
acesso a boa bibliografia das áreas de conhecimento de minha
curiosidade, aprendizagem com alguns conhecedores daquilo que me
interessava, etc. (LAMARTINE DE FARIA, 2001.p. 58 – 59).

Estando tanto tempo afastado do seu Sertão, Lamartine nunca o tirou da


memória e ainda mais se esforçou para que através do conhecimento, das leituras
realizadas em sebos do Rio de Janeiro, pudesse se manter em contato com os temas
relacionados a esse espaço. Este será o período em que ele escreve a maioria de
seus ensaios o que nos leva a pensar que o afastamento da sua terra natal pode ter
sido um grande catalizador para a sua escrita. Todas aquelas experiências adquiridas
nos dias passados nas fazendas agora poderiam ser transmitidas para o papel tendo
“em tudo certa preocupação de guardar para não ver se perder – usura sem cifrão, a
tudo engavetar – cacoete do pássaro casaca – de – couro que tudo carrega para o
desarrumado ninho” (LAMARTINE DE FARIA, 2001.p.63).

Além da leitura e escrita sobre a cultura e o espaço sertanejo outra forma pela
qual Oswaldo se mantinha entretido era o trabalho em um pequeno pedaço de terra
em Itaipava no Rio de Janeiro. Lá ele podia calejar as mãos e se sujar de terra. A
principal atividade nesse chão era plantar arvores em homenagem a seus entes
queridos falecidos ele explica:

E uma forma de orar para quem não sabe rezar com palavras. Veja
que a gente fica de joelhos para plantar. Em Itaipava/ RJ, onde tive um
lenço de chão, plantei árvores em homenagem aos meus mortos. E
ainda hoje daqui dessas lonjuras, sou capaz de identificar cada uma.
Sei onde está o pé – de – sibipiruna de meu pai, os angicos de minha
mãe e Terezinha (minha babá), o ipê amarelo de Hélio Galvão. Arsênio
Pimentel e Erica filha dele, Isadora e Lucy em araucária. Zila Mamede,
Luís Tavares, Leonardo, Zé Gonçalves e Armando Viana, pinus elioti
e thaeda. Guilherme Azevedo em bordão – de – velho, José Braz em
piquiá o Cego Lula (Luiz Maranhão Filho) em pinho de Riga além dos
irmãos e tantos outros amigos que, nas minhas insônias, ainda daqui
os cultivo. (LAMARTINE DE FARIA, 2001.p. 40).
Sabemos que as arvores tem sido símbolos muito fecundos ao longo do tempo
em variadas culturas. Shama (1996) salienta seu uso como representantes de uma
identidade nacional e cita o caso das sequoias americanas que através de sua
longevidade e grande porte estariam ali desde muito antes do Mayflower a anunciar o
destino manifesto do povo estadunidense, tais plantas serviram de tema para muitos
de seus grandes paisagistas. Mais além de identidades nacionais, arvores tem sido
usada em muitas religiões como no Cristianismo com sua arvore da vida e arvore do
conhecimento. Dentro da iconografia cristã abundam imagens de arvores significando
a ressurreição de cristo como a oliveira.

As arvores plantadas pelas mãos de Lamartine podem ser neste caso


símbolos de memória daqueles que se foram ou até mesmo uma forma de unir essa
memória a terra e torna-la fisicamente permanente, literalmente enraizada na terra.

Certa vez Tacito Costa disse em reportagem da revista Preá:

O Sertão é, antes de tudo, um estado d’alma. Que nem o tempo nem


o exílio podem destruir. A trajetória do escritor potiguar Oswaldo
Lamartine de Faria mostra isso. O Sertão o habita, portanto não faz
diferença que more em Natal ou Rio de Janeiro; numa casa de muros
altos ou num apartamento. Porque o Sertão é onipresente. (COSTA,
2005.p. 8).

E de fato tudo o que vimos até agora nos mostra isso, a força dessa ligação
com a terra natal e o poder das lembranças. Tuan salienta isto como um dos estados
mais avançados da topofilia quando homem personifica seu lugar especial tanto pela
força das lembranças quanto pelas marcas deixadas em seu corpo.

O retorno ao Rio Grande do Norte se dá em circunstancias dolorosas após a


morte de sua segunda esposa Maria de Lourdes Leão Veloso (1917 – 1995). Depois
de tamanha perda sua volta é inevitável. O lugar escolhido foi a fazenda Acauã
município de Riachuelo no sopé da Serra dos Macacos. Lá ele pode novamente
desfrutar de uma vida simples e em suas palavras “lamber suas feridas”. Será o
começo de uma vida ascética quase monacal na solidão quase total quebrada apenas
pela presença de seu fiel cachorro Parrudo e por visitas de amigos e familiares. Lá
ele permanecerá como descreve Vivente Serejo:

Restava, diante dele, o caminho da volta. Não mais para os sertões do


Seridó, a Fazenda Ingá, o país da infância. Mas Lagoa Nova, na
Ribeira do Camaragibe, a fazenda do seu pai. Um mundo sem fim de
dez mil hectares e onde viveria de 1941 a 1947. Para retornar,
cinquenta anos depois, e envelhecer, silencioso e sábio, olhando do
seu lenço de terra os longes do sertão, ou, como ele gosta de dizer,
até bater com os olhos nas paredes do céu. (SEREJO, 2005.p. 13).

Conclusão

Neste trabalho procuramos explorar aspectos da relação entre o escritor


Oswaldo Lamartine de Faria e alguns dos espaços onde viveu no decorrer de sua
vida. Com intuito seguimos o conceito de topofilia apresentado por Yi – fu Tuan como
as relações afetivas entre o homem e o meio ambiente que o rodeia sendo estas
escalonadas da simples apreciação visual até a noção de formar com a natureza um
todo indivisível.

Tomando esta premissa seguimos para a infância de Lamartine metade


urbana metade rural e vislumbramos como as relações espaciais que ele teve quando
pequeno lhes proporcionou um forte apego ao espaço do Seridó enquanto terra de
suas origens familiares.

Posteriormente mostramos sua vivencia como administrador rural e de que


forma a convivência com homens de oficio das mais variadas artes manuais e técnicas
tradicionais lhe fascinou. Foram anos de muita experiência que depois pode ser
transformada em livros.

Por fim tivemos sua longa estada no Rio de Janeiro, anos de muita saudade
da terra natal que ajudaram a moldar sua personalidade e estilo. Tempo também de
muitas leituras em horas e horas passadas entre os livros dos sebos cariocas reunindo
se alimentando das palavras de grandes escritores. E no final o retorno ao chão natal
machucado pela perda.
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