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Como começou a história da música na Igreja? Perguntei pra turma e quase os fiz
morrer ao colocar a música da época pra gente ouvir. Podia ver alguns alunos pedindo
com os olhos para acabar logo, outros quase dormiram, alguns estavam se descobrindo
como monge católico, mas graças a Deus ninguém veio pra cima do professor. Tiveram
que ouvir Cantochão e partes da missa, Kyrie, Gloria, Credo, Agnus Dei. Passamos por
Thomas Thallis [nenhuma relação como o Roberto, você sabe], Palestrina, Bach,
William Byrd e Schubert. Pedi pra eles comentarem só no final, depois fiz uma pausa
para o café – para alegria geral. Voltei com Hillsong, Jesus Culture, John Mark
McMillan e mandei cinco perguntinhas:
3. Hoje, o que garante que a ação do ouvinte é ativa no período de música dentro dos
cultos? Os gestos, as danças, gritos, assobios, palmas?
4. O silêncio desapareceu dos nossos cultos? Onde está aquele silêncio que Jesus
buscava para orar?
5. Existe algum fator que caracteriza e diferencia uma música sacra? Seria só musical
ou teria algo espiritual?
Foram embora com essa perguntas. Mas lá no inicio mostrei a linha do tempo desta arte
tão rica que chamamos “música sacra” e que também pode ser denominada “música do
Templo”. Depois apontei quais seriam os pressupostos bíblicos para ela existir:
LINHA DO TEMPO
PRESSUPOSTOS BÍBLICOS
o primeiro dia da semana, ajuntando-se os discípulos para partir o pão, Paulo, que
En
havia de partir no dia seguinte, falava com eles; e prolongou a prática até à meia-noite.
Atos 20:7
E, depois da lição da lei e dos profetas, lhes mandaram dizer os principais da
sinagoga: Homens irmãos, se tendes alguma palavra de consolação para o povo,
falai.
Atos 13:15
No primeiro dia da semana cada um de vós ponha de parte o que puder ajuntar,
conforme a sua prosperidade, para que não se façam as coletas quando eu chegar.
1 Coríntios 16:2
Que fareis, pois, irmãos? Quando vos ajuntais, cada um de vós tem salmo, tem
doutrina, tem revelação, tem língua, tem interpretação. Faça-se tudo para
edificação.
1 Coríntios 14:26
Aqui entra o ponto tão ressaltado por você: a direção do culto, o propósito dele e do
que existe nele, edificar.
OS LIMITES
Na outra aula (sim, eles tiveram coragem de continuar!), cheguei com uma pergunta:
Mais uma vez ligamos o sistema de som e rolou: Divisa de Fogo / Ministério Fogo no
Pé. [reteté], O Som do Céu/Tribo do Funk [funk carioca] e Abalou/ Mylla Karvalho.
[calypso]. Aí a sala veio abaixo, foi uma loucura! O clima descontraído ajudou a gente a
pensar sobre a perguntinha dos limites e partimos para o tão aguardado tema O
SAGRADO E O PROFANO NA MÚSICA DA IGREJA. Os fiz ler alguns embates
históricos sobre o tema – justamente porque tem muito blogueiro e gente preguiçosa
achando que esse debate é da igreja do século XXI, quando que de fato tal tensão
acompanha a vida da igreja desde sua nascente e vai continuar acompanhando…
“Porque se o povo ocupa seu tempo com flautas, saltérios, coros, danças, bater palmas
à moda egípicia, e outras frivolidades desordenadas, torna-se bem indecentes e
intratáveis, batendo címbalos e tambores e fazendo barulho com os instrumentos de
engano.” Citado por Idelsohn em Jewish Music, pág. 94. [fonte, Helen G Grauman,
1968, pág 173]
João XXII [1249 -1334] é severamente criticado no livro O Nome da Rosa, de Umberto
Eco, retratado pela personagem principal Guilherme de Baskerville e pelos frades
menores como um herege sagaz. [Wikipédia]
“ João XXII, tornou pública, em 1324, a bula Docta sanctorum patrum, na qual
condenava alguns dos usos musicais na liturgia da época:
‘alguns discípulos da nova escola tentam, com novas notas, expressar melodias
compostas por eles mesmos, em detrimento dos antigos cantos. Por meio do descante
introduzem a efeminação e chegam a desprezar os princípios fundamentais do
antifonário e do gradual. Os sons que correm sem descanso, deleitam o ouvido mas
não curam a alma, fazendo-nos esquecer da piedade.’
A nova escola a que se refere este documento recebeu o nome de Ars nova ,
representada principalmente por Philippe de Vitry e Guillaume de Machaut.” [ in História
da Música Sacra, 1998, Ediciones Altaya S.A]
João Calvino (1509 – 1564 ) Instituiu o saltério de genebra (salmos, com música
diretamente ligada ao texto, de formato majestoso, moderado, modesto e
compreensível). Aboliu toda tradição católica, a música erudita e folclórica. Queria
proteger a Igreja de acréscimos da tradição humana. Acreditava que Paulo previu só o
cântico dos Salmos do Antigo Testamento no culto público. Era cantado em francês e
sem nenhum acompanhamento.
“Para satisfazer as exigência do novo culto evangélico, em 1523 Lutero publicou Ordem
de Culto, que acentuava o lugar central da pregação. Sua Fórmula da Missa, excluía as
implicações sacrificiais, recomendava a ministração do cálice aos leigos e aconselhava
o emprego de hinos populares” [Walker, vol II, pág 24, 1983]
PRA PENSAR
Em seguida, separei a turma em grupos. Cada grupo deveria ter no máximo 5 pessoas.
Entreguei as perguntas que deveriam ser discutidas entre os participantes:
1. Existe uma música sacra? O que faz a música ser boa para as reuniões da Igreja?
2. Se você fosse um mestre, líder ou pastor da Igreja e tivesse que delinear a forma
ideal para o serviço de música, o que você tentaria proibir e o que estabeleceria como
certo? Descreva o melhor formato de música para a sua Igreja.
Palavras-chave: ponto de tensão, redenção de cultura, limites pessoais, materiais
disponíveis para fazer a música.
Nessas duas aulas não falei quase nada. Só no final coloquei algumas conclusões
obvias e simples, as quais compartilharei aqui nesse longo texto. Se quiser chegar
nelas, basta ir para o último parágrafo.
Sobre a hinologia dos primeiros cristãos, não sabemos como era a melodia, pois a
partitura musical só veio a ser desenvolvida séculos depois. Uma coisa sabemos:
Jesus, aqui na terra, nunca cantou um hino cristão! A nossa música é filha da sinagoga
que Jesus frequentava. Essas músicas eram passadas de geração em geração, de
forma oral, tiradas de ouvido. Mas é bem certo que a estrutura melódica tenha recebido
além da influência de música judaica, uma contribuição grega também – estes, os
gregos, foram sendo acrescentados à fé cristã e até o século IV a música da Igreja era
cantada em grego, sendo substituída pelo latim depois de Constantino. As sinagogas, o
templo, os gentios, os gregos, homens, mulheres, bárbaros, gente da alta sociedade e
escravos, toda essa cultura se misturou – tudo por causa de Cristo que é o ponto de
encontro – e desse encontro se formou a musicalidade dos primeiros cristãos. Não
temos a partitura, o som exato dessa música, mas temos aqui alguns textos que
provavelmente faziam parte do cancioneiro da época e que são mencionados na Bíblia:
1 Timóteo 3:16
crido no mundo,
recebido na glória
Filipenses 2:5-11
que, embora sendo Deus, não considerou que o ser igual a Deus era algo a que devia
apegar-se;
mas esvaziou-se a si mesmo, vindo a ser servo, tornando-se semelhante aos homens.
Por isso Deus o exaltou à mais alta posição e lhe deu o nome que está acima de todo
nome,
para que ao nome de Jesus se dobre todo joelho, no céu, na terra e debaixo da terra,
e toda língua confesse que Jesus Cristo é o Senhor, para a glória de Deus Pai.
Colossenses 1:15-20
poderes ou autoridades;
João 1:1-14
Estava no mundo,
mas de Deus.
Lucas 2:14
[Alguns lembraram que o artista popular Roberto Carlos canta isso em “Todos estão
surdos” e que artistas “religiosos” andam gritando conteúdos bem diferentes]
Hebreus 1:3
1 Pedro 1:18-21
Pois vocês sabem que não foi por meio de coisas perecíveis
Lucas 1:46-53
[ “O Magnificat”, texto usado em grandes obras sacras desde o primeiro século da era
cristã]
Disse então Maria: A minha alma engrandece ao Senhor,
porque atentou na condição humilde de sua serva. Desde agora, pois, todas as
gerações me chamarão bem-aventurada,
Com o seu braço manifestou poder; dissipou os que eram soberbos nos pensamentos
de seus corações;
Outros cânticos parecem ser mencionados em textos como Lucas 1:67-79; 2:29-32
Efésios 5:14, 1 Pedro 2:21-25; 3:18-22. Sem mencionar a “música do céu”, os “novos
cânticos do apocalipse” que podem ser lidos aqui Apocalipse 4.8,11; 5.9-10, 12-13;
7.10,12; 11.15, 17-18; 12.10-12; 15.3-4; 19.1-8; 21.3-4.
PRA PENSAR +
“Os mestres da Igreja deveriam se preocupar com o que estamos cantando ao invés de
ficar tentando definir como devemos cantar? Avalie o conteúdo dos hinos primitivos
encontrados no Novo Testamento e compare com o que é cantado na sua Igreja nos
dias de hoje. Faça um breve comentário.”
CONCLUSÃO
Após uma boa conversa encontramos algumas conclusões. Enfim, como deve ser a
música na Igreja? Quais os fundamentos bíblicos, revelados por Deus, para o serviço
de música?
Que fareis, pois, irmãos? Quando vos ajuntais, cada um de vós tem salmo, tem
doutrina, tem revelação, tem língua, tem interpretação. Faça-se tudo para edificação. 1
Coríntios 14:26
Colossenses 3:16
Pois sobre ele é afirmado: “Tu és sacerdote para sempre, segundo a ordem de
Melquisedeque”. A ordenança anterior é revogada, porquanto era fraca e inútil
( pois a lei não havia aperfeiçoado coisa alguma ), sendo introduzida uma esperança
superior, pela qual nos aproximamos de Deus. E isso não aconteceu sem juramento!
Outros se tornaram sacerdotes sem qualquer juramento,mas ele se tornou sacerdote
com juramento, quando Deus lhe disse: “O Senhor jurou e não se arrependerá: ‘Tu és
sacerdote para sempre’ “.Jesus tornou-se, por isso mesmo, a garantia de uma aliança
superior. Ora, daqueles sacerdotes tem havido muitos, porque a morte os impede de
continuar em seu ofício; mas, visto que vive para sempre, Jesus tem um sacerdócio
permanente. Portanto ele é capaz de salvar definitivamente aqueles que, por meio dele,
aproximam-se de Deus, pois vive sempre para interceder por eles.
5. É privilégio de TODOS.
Não há judeu nem grego; não há escravo nem livre; não há homem nem mulher; porque
todos vós sois um em Cristo Jesus. Gálatas 3:28
E mais: “Louvem o Senhor, todos vocês, gentios; cantem louvores a ele todos os povos”
Romanos 15:11
Certamente esses pressupostos são suficientes para orientar nossa música de culto.
Mas o que pode sustentar uma modalidade artística que surge historicamente em outro
contexto, diferente da eclesia, do templo, nasce nas ruas, pra saciar uma vontade de
divertimento, de devaneios e de outros amores? Quais categorias cristãs estão
disponíveis para pensarmos essa modalidade que toma agora a forma de
entretenimento? Acredito, meu querido Yago, se ainda me lê, que precisamos
urgentemente descobrir os pilares para o palco, enquanto retomamos a verdade a
respeito do templo. Posso lhe dizer que essa tem sido uma aventura muito linda e que é
muito bom tê-lo no caminho.
Marcos Almeida