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Lisboa
28 de Setembro de 2010
BREVE HISTÓRIA DO INFINITO
1 Motivação e Inversão
O que vamos ver nas próximas páginas é algo que Hilbert, a figura tutelar da
matemática no século XX, considerou ”o mais espantoso produto do pensamento
matemático”.
Se num baile estiverem tantos homens como mulheres, sabemos que é possı́vel
fazer pares mistos de forma a que ninguém fique sem par para dançar. Ou seja,
se temos tantos homens quantas mulheres podemos arumar todas as pessoas em
pares mistos.
G. Cantor deu o passo inverso: se numa sala temos homens e mulheres ar-
rumados em pares mistos, então é porque temos tantos homens como mulheres.
Qual a utilidade desta inversão?
1
Conseguimos arrumar todas as pessoas em pares? Não, porque todas as
mulheres estão a dançar com mais de um homem. Vamos a nova tentativa:
António, Branca
Carlos, Antónia
Bernardo, Carlota
2
homens quantas mulheres. Vamos então ver se há forma de agrupar todas as
pessoas em pares mistos.
Uma forma de o fazer será juntar o homem n com a mulher 2n. Assim,
teremos os pares (1, 2), (2, 4), (3, 6), etc. Será que todas as pessoas estão em-
parelhadas? Por exemplo, quem é o par da mulher 1000? resposta: é o homem
500. E quem é o par do homem 2240 (o número de partı́culas do universo)? É
a mulher 2241 .
É certo que o conjunto dos pares etá contido no conjunto dos números. Apa-
rentemente haveria mais homens que mulheres, mas como conseguimos agrupar
todas as pessoas em pares mistos, isto significa que há tantos homens quan-
tas mulheres e bem assim o número de números naturais é igual ao número de
números pares.
Exercı́cio Prove que há tantos números naturais como há números naturais
maiores que 1000.
Exercı́cio Prove que há tantos números naturais como há números inteiros.
3
1 0.1
2 0.2
3 0.3
4 0.1
5 0.2
6 0.3
7 0.1
8 0.2
9 0.3
10 0.01
11 0.11
12 0.21
... ...
123 0.321
... ...
1000 0.0001
... ...
4
1 0.a1 a2 a3 a4 . . .
2 0.b2 b2 b3 b4 . . .
3 0.c1 c2 c3 c4 . . .
4 0.d1 d2 d3 d4 . . .
... ...
Será que existe um homem que não aparece na tabela? Cantor responde.
Seja a um número entre 0 e 8. Vamos denotar por ā o número seguinte; além
disso 9̄ = 0. Com esta notação construı́mos o seguinte número do intervalo
[0, 1]: ω = 0.a¯1 b¯2 c¯3 d¯4 . . .. E agora a questão é esta: ω aparece na tabela? Bom,
se aparece na tabela está emparelhado com a mulher n. Contudo o homem que
faz par com a mulher n tem na n-ésima casa décimal o algarismo a, enquanto ω
tem na n-ésima casa decimal o algarismo ā. E a 6= ā. Portanto, não é possı́vel
que ω faça par com a mulher n. Como n era arbitrário, conclui-se que nenhuma
mulher da lista 1, 2, 3, . . . faz para com ω.
Ou seja, existe uma forma de —seja qual for o emparelhamento— construir
um número do intervalo [0, 1] que não tem par. Assim concluı́mos que é im-
possı́vel arranjar par para todos os homens e consequentemente os conjuntos
(infinitos) 1, 2, 3 . . . e [0, 1] têm cardinalidades diferentes.
Factos e Curiosidades
2{1,2,3} = {{}, {1}, {2}, {3}, {1, 2}, {1, 3}, {2, 3}, {1, 2, 3}}.
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4.2 O Teorema de Cantor
Podemos agora enunciar o resultaado mais famoso de Cantor e assim responder
à questão colocada no inı́cio desta secção.
Nestes termos a pergunta inicial tem uma resposta afirmativa: é fácil en-
contrar uma sequência infinita de infinitos cada vez maiores; nomeadamente,
começando com um conjunto infinito X temos
X 2X
|X| < |2X | < |22 | < |22 | < ...