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Resumo: O trabalho tem como objetivo perceber como os discursos doutrinários acerca
da intervenção federal se constroem e como eles se relacionam com o poder na defesa
da cidadania brasileira. Esta discussão temática é de todo importante, pois traria em seu
campo significativo toda uma problemática de circunstâncias de crise constitucional
federativa, e por isso, de relações explícitas entre poder soberano e guarda das
cidadanias. Em sua primeira parte, tem o objetivo de contextualizar historicamente o
federalismo como fato histórico, tanto nos Estados Unidos da América, quanto no
Brasil. Desenvolve, também, um estudo das representações do campo jurídico brasileiro
acerca do federalismo e da intervenção federal, ou seja, são apresentados os elementos
que constituem a semântica da linguagem, materializada nos discursos dos atores do
Direito.
Abstract: The study aims to understand how the speeches about federal intervention are
constructed and how they relate to the power in the defense of Brazilian citizenship.
This discussion topic is all important because it would bring in his significant issue field
the federal constitutional crisis situations, and therefore, the explicit relations between
sovereign power and custody of citizenship. In its first part, aims to contextualize
historically federalism as historical fact, both in the United States of America, and in
Brazil. It also develops a study of representations of the Brazilian legal field about
federalism and federal intervention, ie, presents the elements that constitute the
language semantics, embodied in the speeches of the actors of the law.
1. Considerações inicias
A ciência do direito, tomada pelo sentido que o campo jurídico2 brasileiro lhe
dá, significa a produção intelectual doutrinária das possíveis interpretações legais e
judiciais dos institutos ou categorias do direito. Assim a doutrina pretende ocupar um
papel de sugerir interpretações pertinentes aos operadores do direito.
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Para este trabalho usamos os termos “campo do direito”, “campo jurídico” e “mundo do direito”, no
sentido da concepção de Pierre BOURDIEU (1992:206-207), que toma os campos da vida social como
campos magnéticos onde os agentes se aproximam e se afastam em função de luta política. Num campo
há ainda uma estabilidade semântica, de práticas e de visões de mundo, o que, segundo o autor, “permite
a todos os detentores do mesmo código associar o mesmo sentido às mesmas palavras, aos mesmos
comportamentos e às mesmas obras e, de maneira recíproca, de exprimir a mesma intenção significante
por intermédio das mesmas palavras, dos mesmos comportamentos e das mesmas obras.”
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Neste sentido é elucidativa a reflexão de TEIXEIRA MENDES (2008:40): “A dogmática jurídica,
também chamada de doutrina, é uma forma de construção do saber própria do campo jurídico que
consiste em reunir e organizar de forma sistemática e racional comentários a respeito da legislação em
vigor e da melhor forma de interpretá-la. A dogmática é um saber que produz as doutrinas jurídicas,
através das quais o direito se reproduz. Tais doutrinas constituem o pensamento de pessoas autorizadas a
trabalhar academicamente determinados assuntos, interpretar os textos legais e emitir pareceres a respeito
da forma mais adequada de interpretá-los e de aplicá-los. O saber jurídico não é científico, é dogmático
(GEERTZ, 1998:249). O saber jurídico construído pela doutrina é considerado pelo campo como
puramente teórico, mas seria mais bem definido, a meu ver, como um saber abstrato e normativo, que tem
a função de ensinar de forma normalizada e formalizada as regras que estão em vigor. Vale esclarecer que
a visão da doutrina não é uma teoria a qual estão subordinadas as práticas judiciárias. A doutrina jurídica
é um discurso autorizado sobre a lei e suas possíveis interpretações e aplicações jurisprudenciais. É um
discurso normativo, ideal-típico, uma vez que está dizendo como a realidade deve ser e não como a
realidade é. É saber que não se debruça sobre a realidade empírica, com a finalidade de explicá-la ou
compreendê-la, como faz o saber científico. Antes, tem a finalidade de interpretar a lei, recomendando a
melhor forma de aplicação. A doutrina e a legislação estão dirigidas ao mundo do dever-ser: o mundo
empírico está num outro plano e não lhes interessa. Na produção de doutrina jurídica, a observação
empírica está descartada. Por ser um saber normativo e existir com a finalidade de dizer como a realidade
deve ser, não tem base empírica e é comum que os juristas concluam, diante da realidade distinta da
norma, que a realidade está errada, pois ela não deveria ser assim. Um conflito juridicamente traduzido
sofre uma espécie de pasteurização e é adaptado à linguagem jurídica de tal maneira que o campo jurídico
possa decodificá-lo e aplicar a ele as regras jurídicas pertinentes. Evidentemente, as regras jurídicas,
como quaisquer regras definidas socialmente, dizem respeito a um determinado tempo e a um
determinado lugar. No entanto, o campo jurídico tende a tomar as regras jurídicas vigentes num
determinado momento histórico e numa determinada época como regras universais (no sentido cósmico),
absolutas e atemporais”.
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Sobre a problemática da não-construção de consensos ver AMORIM et al (2005).
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Sensibilidade jurídica é um conceito construído por Geertz para designar a noção de justiça em uma
cultura. Assim, segundo o autor, toda e qualquer cultura tem uma sensibilidade jurídica que pode ou não
se aproximar da nossa, que não é única nem absoluta. Sensibilidade jurídica é o complexo de operações
utilizado por uma sociedade para relacionar princípios abstratos desse direito (GEERTZ, 1998:249).
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2. O Federalismo
Mais uma vez podemos citar o trecho de CAMARGOS e ANJOS (2009: 84):
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Lembre-se que no modelo federal norte-americano há apenas dois níveis de poder : o federal e o
estadual. Diversamente do modelo brasileiro em que o Município, por força dos arts. 1 º e 18 da CRFB/88
integra a Federação.
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É ainda Raul Machado HORTA (2002: 307) quem aponta como principais
características do federalismo e que se constituem como seus princípios, técnicas e
instrumentos operacionais os seguintes elementos:
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Esta divisão na ordem constitucional vigente no Brasil encontra-se insculpida entre os arts. 21 a 25; 30 e
32 da CRFB/88.
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“Esta primeira característica faz menção à decisão criadora da federação que já mencionamos
anteriormente e que é também denominada pacto federativo. O pacto federativo representa a expressão da
vontade dos representantes dos estados que integram a federação de participar da criação do Estado
Federal. Esta vontade é expressa na Constituição. Aqui é também apresentada a característica de que os
estados federados se constituem em partes indissociáveis, não podendo nenhum deles optar por não fazer
mais parte da federação, posto que ao nela adentrarem abriram mão de significativa parcela de soberania
de que eram dotados, restando-lhes a autonomia”. (HORTA, 2002:307).
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“A repartição de competências aqui mencionada há de ser expressa no texto constitucional e há de
delimitar as competências legislativas e administrativas do ente federal e dos entes federados. Ao repartir
a competência a Constituição não há de hierarquizar ou subordinar os entes federados ao federal, mas irá
definir o âmbito de atuação de cada um deles. Esta repartição de competências se constitui no cerne da
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disciplina constitucional acerca do federalismo. É certo que a competência afeta os órgãos do Poder
Judiciário Federal e do Poder Judiciário dos estados, muito embora não seja apresentada como repartição
de competências relacionadas ao federalismo, é de todo correto afirmar que sua definição é corolário do
federalismo.” (HORTA, 2002:307).
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“Esta capacidade de auto-organização dos estados-membros possui limitações e condicionamentos que
são expressos pelo texto da Constituição Federal. Aqui há um estado dentro do Estado e esta capacidade
de se organizar autonomamente é manifestação do poder constituinte decorrente e as Constituições
Estaduais devem ser elaboradas em conformidade com os princípios e preceitos da Constituição Federal.
Cumpre evidenciar que a soberania é atributo exclusivo do poder federal.” (HORTA, 2002:307).
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“A regra geral que vigora no federalismo é a de que o ente político mais abrangente irá respeitar a
autonomia do ente político menos abrangente; excepcionalmente e em casos definidos taxativamente na
Constituição Federal, a União Federal intervirá nos estados ou diretamente nos municípios quando estes
infringirem os chamados princípios constitucionais federais sensíveis. A intervenção é um mecanismo de
defesa da própria federação, seja contra interferências externas ao Estado Federal, e principalmente em
razão das intempéries ocorridas nos estados federados. Várias são as maneiras de se desencadear o
processo interventivo, e quando este é desencadeado muitos são os mecanismos e instrumentos
constitucionais para mantê-lo como uma medida estrita, temporária e da mais absoluta excepcionalidade.”
(HORTA, 2002:307).
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“O federalismo pressupõe um Poder Legislativo bicameral, onde uma das Casas Legislativas é
constituída de representantes do povo e a outra Casa Legislativa será constituída pelos representantes dos
estados federados. Como expressão da absoluta igualdade entre os estados integrantes da federação,
cumpre destacar que o número de representantes por estado é o mesmo para cada um dos estados. Esta
Casa Legislativa autoriza o estado federado a participar das principais decisões legislativas tomadas no
âmbito federal. Muito embora a federação nos apresente dois estados de competências diferenciadas, é
forçoso considerar que o estado federado apresenta estruturas que estão amalgamadas no Estado Federal e
uma delas e de considerável relevo é a Casa Legislativa dos estados que compõem o Poder Legislativo
Federal.” (HORTA, 2002:307).
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“Qualquer necessária alteração do texto da Constituição Federal deve ser acessível aos estados
federados e normalmente esta possibilidade de propor emendas a Constituição Federal se dá através dos
órgãos legislativos estaduais.” (HORTA, 2002:307).
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“Esta característica é certamente conseqüência direta da autonomia dos estados federados. Qualquer
mudança substancial na estrutura da federação ou dos estados federados vai depender da aquiescência
direta da população diretamente interessada. Estas formas de consulta popular se constituem resquícios de
democracia direta e normalmente se dão através do plebiscito ou do referendo, conforme o momento em
que sejam realizados.” (HORTA, 2002:307).
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3. O federalismo no Brasil
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“Um órgão de cúpula no Poder Judiciário que exerça a jurisdição das questões afetas à Constituição
Federal. Que esta mesma estrutura de poder jurisdicional venha a dirimir conflitos entre a União e
qualquer que seja a parte, entre os estados federados e pessoas de direito público interno. Fica
evidenciada também a preocupação de preservação da Constituição Federal através do controle de
constitucionalidade concentrado em um órgão jurisdicional. Há também a peculiar característica de que a
União ou o Estado Federal não fique sujeito à jurisdição de justiças estaduais.” (HORTA, 2002:307).
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Discorrendo sobre o assunto em obra que se tornou referência neste tema, José
Murilo de CARVALHO (1991:68) assim afirma: “Estas observações não estão, no
entanto, distantes da frase de Aristides Lobo, segundo o qual o povo teria assistido
bestializado à proclamação da República, sem entender o que se passava”.
período de forte centralização e autoritarismo por parte da União federal, havendo aqui
verdadeira submissão dos estados federados à União.
4. Intervenção Federal
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“Art. 34. A União não intervirá nos Estados nem no Distrito Federal, exceto para: I - manter a
integridade nacional; II - repelir invasão estrangeira ou de uma unidade da Federação em outra; III - pôr
termo a grave comprometimento da ordem pública; IV - garantir o livre exercício de qualquer dos
Poderes nas unidades da Federação; V - reorganizar as finanças da unidade da Federação que: a)
suspender o pagamento da dívida fundada por mais de dois anos consecutivos, salvo motivo de força
maior; b) deixar de entregar aos Municípios receitas tributárias fixadas nesta Constituição, dentro dos
prazos estabelecidos em lei; VI - prover a execução de lei federal, ordem ou decisão judicial; VII -
assegurar a observância dos seguintes princípios constitucionais: a) forma republicana, sistema
representativo e regime democrático; b) direitos da pessoa humana; c) autonomia municipal; d) prestação
de contas da administração pública, direta e indireta. e) aplicação do mínimo exigido da receita resultante
de impostos estaduais, compreendida a proveniente de transferências, na manutenção e desenvolvimento
do ensino e nas ações e serviços públicos de saúde.”
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A categoria “doutrina brasileira” é aqui usada a partir das obras de vários doutrinadores que tem
reconhecimento e prestígio no campo jurídico brasileiro e que circulam como bibliografia básica nos
cursos de graduação em Direito. Como exemplo desses doutrinadores podemos citar: BARROSO (1998),
BONAVIDES (2005), FRANCO (1968), LEWANDOWSKI (1994), MORAES (2006), SILVA (2006),
AGRA (2007), CRETELLA JR (1998), HORTA (1995), LENZA (2006), TAVARES (2007) e
ZIMMERMANN (2002).
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Em relação à lógica taxonômica que estrutura as categorias da doutrina jurídica brasileira, significa
dizer que a organização dos institutos jurídicos apropria-se dos princípios das ciências biológicas dos
séculos XVIII e XIX, que se preocupava em conhecer a natureza dos animais e das plantas, classificando-
os em Reinos, Ordens, Classes, Gêneros e Espécies. Sendo assim no discurso dogmático jurídico temos
como Reino o Sistema Jurídico brasileiro, como Ordem o Direito Constitucional, como Classe a
Federação, como Gênero a Intervenção Federal e como Espécies a Espontânea e a Provocada, o que mais
uma vez remonta o pensamento selvagem em seu discurso totêmico, segundo Claude Levy Strauss, ao
naturalizar o discurso mítico LÉVY-STRAUSS (1976:56-97).
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De acordo com CAMARGOS E ANJOS (2009:93): “Na história do federalismo brasileiro é possível
notar que a intervenção, notadamente por ser medida excepcional, foi utilizada com muita parcimônia,
principalmente no período em que vivemos certa normalidade política e democrática. Entretanto, na
ditadura de Getúlio Vargas, de 1937 a 1945, e durante a ditadura militar, de 1964 a 1984, a intervenção
foi utilizada com maior freqüência.”
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Sobre esta experiência histórica autoritária interessante a passagem de AGRA (2007:297): “Na história
dos textos constitucionais brasileiros, o instituto da intervenção sempre respeitou os princípios do Estado
Democrático de Direito. Contudo, o Ato Institucional 5 (AI-5) extrapolou os limites da intervenção,
tornando-a um instrumento de coação do regime militar. Pelo AI-5 foi permitido ao Presidente da
República, alegando interesse nacional, intervir nos Estados-membros e nos Municípios sem respeitar as
barreiras legais firmadas pela Constituição.
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Retratando a discussão quanto ao papel do Presidente da República na intervenção federal informa-nos
AGRA (2007:301-302): “Controvertida é a questão de saber se o Presidente da República tem
obrigatoriedade ou não de decretar a intervenção quando houver pedido. Na questão acerca da
intervenção no governo da Bahia, em 1920, Rui Barbosa afirmava que a intervenção dependeria do poder
discricionário do Presidente, e Epitácio Pessoa defendia a tese de que o pedido vincularia o Chefe do
Executivo, cabendo a ele apenas decretar a intervenção. A tese hoje preponderante é a de que o Presidente
pode ou não decretar a intervenção diante do caso concreto. O pedido não o vinculará, cabendo a ele,
pelas circunstâncias específicas do caso, analisar a conveniência ou não da decretação. Todavia, quando o
objetivo da intervenção for o de prover à execução de lei federal, ordem ou decisão judicial e de assegurar
a observância dos princípios sensíveis, a doutrina predominante se posiciona no sentido de que o pedido
se torna vinculante, obrigatório, porque os motivos são eminentemente de cunho jurídico. Os mesmos
parâmetros valem para a intervenção nos Municípios, nos mesmos casos pertinentes aos Estados-
membros.”
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“Art. 90. Compete ao Conselho da República pronunciar-se sobre: I - intervenção federal, estado de
defesa e estado de sítio; II - as questões relevantes para a estabilidade das instituições democráticas. § 1º -
O Presidente da República poderá convocar Ministro de Estado para participar da reunião do Conselho,
quando constar da pauta questão relacionada com o respectivo Ministério. § 2º - A lei regulará a
organização e o funcionamento do Conselho da República.
Art. 91. O Conselho de Defesa Nacional é órgão de consulta do Presidente da República nos assuntos
relacionados com a soberania nacional e a defesa do Estado democrático, e dele participam como
membros natos: I - o Vice-Presidente da República; II - o Presidente da Câmara dos Deputados; III - o
Presidente do Senado Federal; IV - o Ministro da Justiça; V - o Ministro de Estado da Defesa; VI - o
Ministro das Relações Exteriores; VII - o Ministro do Planejamento. VIII - os Comandantes da Marinha,
do Exército e da Aeronáutica. § 1º - Compete ao Conselho de Defesa Nacional: I - opinar nas hipóteses de
declaração de guerra e de celebração da paz, nos termos desta Constituição; II - opinar sobre a decretação
do estado de defesa, do estado de sítio e da intervenção federal; III - propor os critérios e condições de
utilização de áreas indispensáveis à segurança do território nacional e opinar sobre seu efetivo uso,
especialmente na faixa de fronteira e nas relacionadas com a preservação e a exploração dos recursos
naturais de qualquer tipo; IV - estudar, propor e acompanhar o desenvolvimento de iniciativas necessárias
a garantir a independência nacional e a defesa do Estado democrático. § 2º - A lei regulará a organização
e o funcionamento do Conselho de Defesa Nacional.”
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“Art. 60. A Constituição poderá ser emendada mediante proposta: I - de um terço, no mínimo, dos
membros da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal; II - do Presidente da República; III - de mais
da metade das Assembléias Legislativas das unidades da Federação, manifestando-se, cada uma delas,
pela maioria relativa de seus membros. § 1º - A Constituição não poderá ser emendada na vigência de
intervenção federal, de estado de defesa ou de estado de sítio.”
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“Art. 49. É da competência exclusiva do Congresso Nacional: IV - aprovar o estado de defesa e a
intervenção federal, autorizar o estado de sítio, ou suspender qualquer uma dessas medidas;”
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“Art. 84. Compete privativamente ao Presidente da República: X - decretar e executar a intervenção
federal;”
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“Art. 136. O Presidente da República pode, ouvidos o Conselho da República e o Conselho de Defesa
Nacional, decretar estado de defesa para preservar ou prontamente restabelecer, em locais restritos e
determinados, a ordem pública ou a paz social ameaçadas por grave e iminente instabilidade institucional
ou atingidas por calamidades de grandes proporções na natureza. § 1º - O decreto que instituir o estado de
defesa determinará o tempo de sua duração, especificará as áreas a serem abrangidas e indicará, nos
termos e limites da lei, as medidas coercitivas a vigorarem, dentre as seguintes: I - restrições aos direitos
de: a) reunião, ainda que exercida no seio das associações; b) sigilo de correspondência; c) sigilo de
comunicação telegráfica e telefônica; II - ocupação e uso temporário de bens e serviços públicos, na
hipótese de calamidade pública, respondendo a União pelos danos e custos decorrentes. § 2º - O tempo de
duração do estado de defesa não será superior a trinta dias, podendo ser prorrogado uma vez, por igual
período, se persistirem as razões que justificaram a sua decretação. § 3º - Na vigência do estado de defesa:
I - a prisão por crime contra o Estado, determinada pelo executor da medida, será por este comunicada
imediatamente ao juiz competente, que a relaxará, se não for legal, facultado ao preso requerer exame de
corpo de delito à autoridade policial; II - a comunicação será acompanhada de declaração, pela
autoridade, do estado físico e mental do detido no momento de sua autuação; III - a prisão ou detenção de
qualquer pessoa não poderá ser superior a dez dias, salvo quando autorizada pelo Poder Judiciário; IV - é
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4.1.ADIN Interventiva
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“Art. 36. A decretação da intervenção dependerá: III de provimento, pelo Supremo Tribunal Federal, de
representação do Procurador-Geral da República, na hipótese do art. 34, VII, e no caso de recusa à
execução de lei federal.”
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“Art. 34. A União não intervirá nos Estados nem no Distrito Federal, exceto para: VII - assegurar a
observância dos seguintes princípios constitucionais: a) forma republicana, sistema representativo e
regime democrático; b) direitos da pessoa humana; c) autonomia municipal; d) prestação de contas da
administração pública, direta e indireta. e) aplicação do mínimo exigido da receita resultante de impostos
estaduais, compreendida a proveniente de transferências, na manutenção e desenvolvimento do ensino e
nas ações e serviços públicos de saúde.”
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de 30 dias para ingressar com a ação direta interventiva perante o Supremo Tribunal
Federal.
Proposta a ação, o relator ouve em 30 dias os órgãos que elaboraram ou
praticaram o ato. Após a oitiva dos órgãos, o relator tem 30 dias para apresentar o
relatório, que remeterá a todos os Ministros. O julgamento será feito pelo Pleno,
podendo fazer uso da palavra o Procurador Geral da República e o órgão que emitiu o
ato.
Se a decisão for pela inconstitucionalidade, o Supremo Tribunal Federal
comunica aos órgãos interessados e requisita ao Presidente da República a decretação da
intervenção federal, estando este obrigado a cumpri-la, sob pena de responder por crime
de responsabilidade com base no art. 12 da Lei 1079/5030.
A Lei 4337/64 expressamente proíbe a concessão de liminar. Tal provimento
é incompatível com a ação interventiva, porque a suspensão liminar do ato impugnado
transformaria em ação direta de inconstitucionalidade, o que é fiscalização abstrata e
não concreta (MENDES, 2008).
Este é, portanto, o escopo doutrinário da intervenção federal no Brasil, ou seja,
instituto jurídico de manutenção da supremacia constitucional diante de desequilíbrios
federativos e desrespeitos aos princípios fundamentais a cidadania.
Esse é, pois, o panorama do que a doutrina constitucional brasileira, e como tal
o campo jurídico brasileiro, representam acerca do federalismo e da intervenção federal.
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“Art. 12. São crimes contra o cumprimento das decisões judiciárias: 1 - impedir, por qualquer meio, o
efeito dos atos, mandados ou decisões do Poder Judiciário; 2 - Recusar o cumprimento das decisões do
Poder Judiciário no que depender do exercício das funções do Poder Executivo; 3 - deixar de atender a
requisição de intervenção federal do Supremo Tribunal Federal ou do Tribunal Superior Eleitoral; 4 -
Impedir ou frustrar pagamento determinado por sentença judiciária”.
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suspende, para viabilizar os direitos do cidadão, visto que esta autonomia não está, por
alguma circunstância, sendo capaz de promovê-los.
Ocorre que, a doutrina jurídica brasileira quando representa a intervenção
federal, através da categoria ‘medida drástica’ remete este instituto jurídico a uma
memória histórico-política brasileira de momentos autoritários, o que leva a esses
doutrinadores a não interpretá-la como uma categoria própria à defesa da democracia.
Em suas interpretações, se sopesam os valores envolvidos – a não suspensão
das autonomias e a defesa da cidadania - escolhem sempre a manutenção das
autonomias em detrimento dos direitos do cidadão, por considerarem medida menos
grave. Na verdade, a doutrina jurídica brasileira não vislumbra que a intervenção
federal, numa ambiência de estabilidade democrática, é, antes de tudo, o último remédio
de que podem se valer os cidadãos para verem seus direitos respeitados quando
ineficientes as gestões de seus estados membros.
Sendo assim, a doutrina jurídica brasileira não diz que o principal papel da
intervenção federal no Estado Democrático de Direito é proteger o pacto federativo, e
como tal, a constituição federal, no intuito de se ver respeitada a própria razão de
existência do Estado: a Cidadania.
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