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Dentre os direitos de ordem física, ocupa posição de primazia o direito à vida, como bem maior
na esfera natural e também na jurídica, exatamente porque, em seu torno e como
conseqüência de sua existência, todos os demais gravitam, respeitados, no entanto, aqueles
que dele extrapolam (embora constituídos ou adquiridos durante o seu curso, como o direito à
honra, à imagem e o direito moral de autor”).
Manifestando-se desde a concepção, sob condição do nascimento do ser com vida, esse
direito permanece integrado à pessoa até a morte. Inicia-se como direito ligado à pessoa,
quando o nascituro - que também dispõe desse direito - ao ser liberado do ventre materno,
passa a respirar por si, com o acionamento do mecanismo respiratório próprio. Cessando
somente com a morte da pessoa. Esse direito estende-se a qualquer neonato da espécie
humana, independentemente do modo de nascimento, da condição do ser, de seu estado
físico, ou de seu estado psíquico. Basta que se trate de forma humana, concebida ou nascida
natural ou artificialmente (in vitro, ou por qualquer processo; eventuais anomalias físicas ou
psíquicas, de qualquer grau; estados anormais; coma, letargia ou de vida vegetativa;
manutenção do estado vital com o auxílio de processos mecânicos, ou outros).
Trata-se de direito que se reveste, em sua plenitude, de todas as características gerais dos
direitos da personalidade, devendo-se enfatizar o aspecto da indisponibilidade, uma vez que se
caracteriza, nesse campo, um direito á vida e não um direito sobre a vida. Constitui-se direito
de caráter negativo, impondo-se pelo respeito que a todos os componentes da coletividade se
exige. Com isso, tem-se presente a ineficácia de qualquer declaração de vontade do titular que
importe em cerceamento a esse direito, eis que se não pode ceifar a vida humana, por si, ou
por outrem, mesmo sob consentimento, porque se entende, universalmente, que o homem não
vive apenas para si, mas para cumprir missão própria na sociedade. Cabe-lhe, assim, perseguir
o seu aperfeiçoamento pessoal, mas também contribuir para o progresso geral da coletividade,
objetivos esses alcançáveis ante ao pressuposto da vida.
O relevo desse bem, no âmbito jurídico, está evidenciando desde o tratamento que recebe em
Constituições que, como a nossa, têm proclamado como imperativo fundamental da
convivência social a proteção à vida, incluída dentre os direitos essenciais da pessoa. Mas,
inicialmente de cunho individualista, vem ganhando esse direito, com o avanço da doutrina,
alcance mais expressivo, com a inserção da idéia de dignidade na qualificação da vida: daí, os
vários programas assistenciais, sob responsabilidade do Estado - ou de instituições privadas -
que têm surgido em todo o mundo, como mecanismos de viabilização desse conceito.
JURISPRUDÊNCIA
Vistos etc., acorda, em Turma, a 9ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas
Gerais, incorporando neste o relatório de fls., na conformidade da ata dos julgamentos e das
notas taquigráficas, à unanimidade de votos, EM DAR PROVIMENTO.
Belo Horizonte, 09 de junho de 2009.
VOTO
Cuida-se de apelação contra o r. decisum que indeferiu pedido de alvará autorizativo para
interrupção de gravidez, declarando extinto o processo, sem resolução do mérito, por
impossibilidade jurídica do pedido.
Sustenta a recorrente, em resumo, que o feto padece de grave anomalia congênita,
diagnosticada como “acrania fetal”, sem condições de sobrevida após o nascimento, não
podendo se considerar crime a interrupção da gravidez, haja vista apenas a existência de vida
somática. Aduz que o prolongamento da gestação só irá causar traumas e angústias.
Prima facie, o direito que a criança tem à vida e à saúde constituem primado constitucional,
com absoluta prioridade (CF, art. 227). São bens essenciais ao ser humano, que devem ser
protegidos mediante a efetivação de políticas sociais públicas que permitam não só o
nascimento, mas o desenvolvimento sadio e harmonioso da pessoa, em condições dignas de
existência (ECA, art. 7º).
Mister ressaltar que a norma constitucional, em seu seminal artigo 227, consagra os dois
primeiros direitos básicos da pessoa humana, quais sejam, a vida e a saúde, proclamados
igualmente pelos artigos 7º e 4º, do Estatuto da Criança e do Adolescente.
De todos os valores fundamentais, a vida ressalta como o principal.
(...)
Com esses registros, acompanho, na sua inteireza, o respeitável voto proferido pelo Em.
Relator, para, igualmente, PROVER A APELAÇÃO, expedindo-se o hábil alvará colimado.
DIREITO AO NOME
O direito à identidade pessoal significa direito a ter nome, que é absoluto e inato. O nome é
composto de prenome e sobrenome. O prenome, simples ou composto, é individual, enquanto
o sobrenome indica a procedência familiar. No Brasil, costuma-se compor o sobrenome,
sucessivamente, com os nomes das famílias materna e paterna, mas não há obrigatoriedade
legal, pois apenas pode conter um ou outro.
Durante muito tempo, o prenome foi imutável, salvo hipóteses estreitas de erro gráfico ou
ridicularia, ou durante o primeiro ano após adquirir a maioridade.
Essa regra foi mudada pela Lei nº 9.708, de 1998, que admite a mudança por apelidos públicos
notórios, ou seja, quando uma pessoa é conhecida no meio social por nome diverso do que foi
registrada.
Inclui-se na direito ao nome a proteção do pseudônimo utilizado para atividades profissionais.
A lesão ao direito ao nome acarreta danos morais, sempre que haja utilização indevida ou não
autorizada e possa ser indiscutivelmente referido à pessoa, máxime quando se tratar de
homônimos. A utilização indevida dá-se com intuito difamatório ou de provocar o desprezo
público ou, ainda, de interesse publicitário ou mercantil.
JURISPRUDÊNCIA
ACÓRDÃO
ALTERAÇÃO DE NOME DE FAMÍLIA -
Supressão do patronímico do pai biológico com
acréscimo do nome do padrasto - Sentença que
determinou somente a adição deste - Decisão
reformada - Nome de família mantido como
registrado.
DIREITO À IMAGEM
Walter Moraes definiu imagem como "toda sorte de representação de uma pessoa" (3).
Segundo Aurélio Buarque de Holanda imagem é "aquilo que evoca uma determinada coisa, por
ter com ela relação simbólica; símbolo" (4).
Dessa forma, compreende-se imagem não apenas como o semblante da pessoa, mas também
partes distintas de seu corpo.
Porém, é necessário uma maior ampliação e especificação da idéia de imagem, já que não
engloba apenas o aspecto físico, mas também exteriorizações da personalidade do indivíduo
em seu conceito social.
Sendo, assim, é bastante propício escrever o conceito de Hermano Duval: "Direito à imagem é
a projeção da personalidade física (traços fisionômicos, corpo, atitudes, gestos, sorrisos,
indumentárias, etc.) ou moral (aura, fama, reputação, etc.) do indivíduo (homens, mulheres,
crianças ou bebê) no mundo exterior" (5).
O direito à própria imagem é inalienável e intransmissível, uma vez que não há como
dissociá-lo de seu titular. Entretanto, não é indisponível e é esta a grande característica do
direito à imagem: a possibilidade de dispor ou não da própria imagem para que outros a
utilizem para diversos fins. Pode assim, a pessoa explorar a sua própria imagem.
1°) quanto ao consentimento: o indivíduo tem a própria imagem usada sem que tenha dado
qualquer consentimento para tal;
2°) quanto ao uso: o consentimento é dado, mas o uso feito da imagem ultrapassa os limites da
autorização;
3°) quanto à ausência de finalidades que justifiquem a exceção: é o caso das fotografias de
interesse público, ou de pessoas célebres, cujo uso leva à inexistência de finalidade que se
exige para a limitação do direito da imagem. Acontece quando o uso dessas imagens não tem
um caráter cultural ou informativo.
Todas essas formas de violação do direito à própria imagem importam em culpa indenizável.
Com a violação ao direito à imagem, o corpo e as suas funções não sofrem alteração física,
mas observa-se uma modificação de caráter moral. A violação é ainda mais agressiva, quando
dentro de um contexto publicitário, onde a fotografia identifica a pessoa ao produto, criando
vínculo de associação de imediata e longa memória.
A proteção jurídica à imagem é fundamental, pois preserva à pessoa, simultaneamente, a
defesa de componentes essenciais de sua personalidade e do respectivo patrimônio, pelo valor
econômico que representa.
A jurisprudência brasileira, bem como o entendimento internacional, tem concedido indenização
nos casos de não-autorização da exposição da imagem, dada a freqüência com que se tem
usado a imagem alheia indevidamente em publicidade, em um evidente desrespeito aos
valores essenciais da personalidade humana, gerado pela falta de criatividade e pela ânsia do
lucro fácil.
Há, ainda, na doutrina, o reconhecimento do direito à imagem para coisas, visando impedir que
terceiros exponham a público telas de pintura, esculturas e outros bens, sem a devida
autorização do proprietário.
Conforme o caso, as violações do direito à imagem impõem ao agressor a obrigação de reparar
os danos sofridos pela vítima, seja para restauração do equilíbrio patrimonial rompido, seja
para compensar o prejuízo moral suportado. O dano material destrói ou reduz o patrimônio do
indivíduo, e a indenização por violar o direito à imagem não deve se limitar ao valor que o
indivíduo perdeu (dano emergente), mas também deve se estender para quanto deixou de
ganhar (lucro cessante). Já o dano moral repara a perda de um bem jurídico sobre o qual o
lesado teria interesse. E a reparação se faz através da fixação de uma indenização com a
finalidade de amenizar os sentimentos indesejados, os quais tiveram como causa a violação do
direito. A reparação aos danos tem como objetivo, também, representar para o ofensor um
desestímulo a novas práticas abusivas.
Por derradeiro, ressalte-se, ainda, que o direito à imagem estendesse também ao indivíduo que
faleceu, cabendo nessas circunstâncias aos herdeiros zelar por sua integridade e promover sua
defesa.
JURISPRUDÊNCIA
Processo Nº 583.00.2003.025718-8
Texto integral da Sentença
Vistos. RONALDO MELÃO ajuizou a presente ação de indenização por dano moral em face da
TVSBT CANAL 4 DE SÃO PAULO S/A, alegando, em síntese, que, na condição de Oficial de
Justiça, e em cumprimento a mandado judicial, teria sido abordado por repórter de programa
jornalístico da ré que insistiu em exibir a sua imagem sem a sua autorização expressa,
colocando o microfone da emissora em riste próximo ao seu rosto.
Com isso, segundo o autor, a ré teria praticado auto-tutela, influenciando no ato processual em
favor dos seus próprios interesses, daí porque socorre-se da presente demanda para pleitear a
condenação da ré no pagamento de indenização em decorrência da violação ao direito de
imagem.
Regularmente citada (fls.54), a ré ofereceu contestação (fls. 56/77), instruída com documentos
(fls. 79/99), argüindo, preliminarmente, ausência de pressuposto processual válido, uma vez
que inexiste notificação premonitória prevista no artigo 57 da Lei de Imprensa, e, no mérito,
sustentando a aplicação da referida Lei, pugna pela improcedência da ação, discorrendo sobre
o conteúdo da ordem judicial que padecia de dúvidas quanto a sua autenticidade e certeza.
Argumenta, ainda, que não praticou ato ilícito, exercendo livremente o direito de informar e que
todo o “dramalhão” descrito na petição inicial não condiz com a reportagem. Impugna, também,
a pretensão de indenização para ressarcimento dos danos morais que carece de comprovação,
não se tratando do denominado dano “in re ipsa” e invoca para tanto o artigo 944 do Código
Civil. Subsidiariamente pugna pela necessidade de tarifação para fins de arbitramento do dano
moral, propugnando pela improcedência do pedido, caso não acolhida a preliminar.
O autor se manifestou em réplica (fls.102/110), seguindo-se a especificação de provas
(fls.122/123 e 125), sendo o feito saneado (fls. 149/149vº), deferindo-se a produção de prova
pericial, consubstanciada no laudo de fls. 223/247. A instrução foi encerrada e os debates
foram substituídos pela apresentação de memoriais (fls. 288/294 e 296/300). É o relatório.
DECIDO. Cuida-se de ação de indenização por dano moral fundada na violação do direito de
imagem do autor.
Observo que a insistência da ré em ver aplicada a Lei de Imprensa não encontra guarida, na
medida em que esta vetusta Lei, em razão das regras contidas no atual Código Civil, no que
tange ao ato ilícito e suas conseqüências no campo da indenização, a par do que a
Constituição Federal de 1988 já resguardava quanto à possibilidade de indenização para
ressarcimento dos danos morais, não pode ser aplicada, na medida em que isto redundaria em
tarifação de eventual indenização, reconhecimento de prescrição que na verdade é regulada
pelo disposto no art. 206 CC
Aliás, prevalecer a tese da ré, estar-se-ia prestigiando um regime jurídico incompatível com as
atuais regras que definem o ato ilícito em geral, não se podendo fazer distinção de uma ofensa
pelo meio em que é difundido se isto diminui o direito do ofendido de buscar uma justa
reparação. Em suma: aplica-se o regime jurídico previsto no vigente Código Civil como
fundamento de direito da pretensão deduzida pelo autor.
Ultrapassada a fase instrutória, dela foi possível extrair que o pedido é procedente. Com efeito,
a prova pericial, que consistiu em degravação de parte do programa televisivo ancorado pela
apresentadora Sônia Abrão, é conclusiva quanto a exposição do autor na reportagem
relacionada ao cumprimento da ordem judicial que impedia a ré de veicular o Campeonato
Paulista de Futebol (vide resposta ao quesito V a fls. 246).
Conquanto o laudo não apresente as imagens do autor sendo abordado de frente pelo repórter
da ré, fica patenteado pela transcrição dos comentários da repórter-âncora o induzimento para
que o autor, no regular exercício de suas funções como oficial de justiça, fosse impedido de
cumprir a ordem judicial, gerando mais confusão e, o que é pior, utilizando o meio de
comunicação em causa própria (confiram-se as fotos de fls. 242/244, em especial a primeira
foto em que o autor está de costas e há aparentemente alguém com a mão perto do seu rosto,
presumindo que empunhasse um microfone).
A transcrição de parte dos comentários da repórter-âncora mostra-se pertinente, pois falam por
si mesmos e revelam de maneira clara a intenção de diminuir ou dificultar o cumprimento de
ordem judicial, expondo o oficial de justiça a uma situação que poderia ter sido evitada.
A repórter-âncora a fls. 229 faz proselitismo quanto ao direito de sua emissora de transmitir o
Campeonato Paulista de Futebol. Informa à sua audiência que a justiça deu ganho de causa ao
SBT quanto a transmissão exclusiva e lamenta quanto a situação tão desagradável e tensa,
referindo-se evidentemente ao cumprimento da ordem judicial.
Ao final dessa parte de transcrição do programa a repórter-âncora diz: “Que é isso! Olha gente,
tem um oficial de justiça querendo que seja válida a decisão, a liminar que a Globo ganhou em
primeira instância”, para em seguida já a fls. 230 insistir que o direito de transmissão exclusiva
era do SBT, concluindo em seu comentário evidentemente tendencioso “É lamentável esse tipo
de atitude, é triste para a história da televisão brasileira, não é? É, que coisa!”. Em seguida a
repórter-âncora chega a manter diálogo com um comandante de helicóptero que sobrevoa o
local para depois falar com o advogado do SBT no local identificado como Dr. Marcelo na foto
de fls. 237, vindo deste a conduta ilícita, consistente em obstruir o cumprimento da ordem, pois
segundo o advogado “(...) só que o que é que acontece (sic), os oficiais de justiça querem por
que querem cumprir! E eles não podem, por uma série de motivos.”
Após a repórter-âncora falar com o presidente da Federação Paulista de Futebol termina por
insistir que a transmissão do Campeonato Paulista era do SBT. Nítido que o repórter do SBT
ao abordar o autor que estava exercendo suas funções profissionais deu causa não só a expor
a imagem deste e também do Poder Judiciário a uma situação de questionamento acintoso e
de afronta, que não era lícito dele exigir e nem tampouco ele representava a instância para
revogação daquela ordem.
Se a ré tinha ou não o direito a transmitir o Campeonato Paulista de Futebol, não vem ao caso.
O que ocorreu na esfera da imagem e dignidade do autor foi justamente a exposição de sua
figura, diminuição de suas funções por meio de atuação da ré, em causa própria. Patente o
abuso do direito de informar e também da utilização de meios intimidatórios na exposição
indevida da pessoa do autor, como se ele fosse o culpado pela confusão gerada pela ré e por
usa emissora concorrente.
Os meios de comunicação não podem nunca utilizar o direito sagrado de informação para
justificar os seus próprios interesses, agravando mais a conduta do ilícito quando expõe
pessoas que apenas têm a incumbência funcional de cumprir as ordens.
É evidente que o autor sentiu-se intimidado e humilhado e esta situação por si só configura o
denominado dano moral “in re ipsa”, dispensando qualquer repercussão danosa.
O dever de indenizar, portanto, se impõe. Busca-se na fixação de indenização para reparação
do dano moral um valor de desestímulo, mas que não sirva de fonte de enriquecimento sem
causa e, por isso, baseia-se nos critérios de razoabilidade e proporcionalidade, para externar o
conceito aberto do denominado “prudente arbítrio” do juiz.
Na espécie, levando em consideração tais critérios e em especial a gravidade da atuação da
ré, por meio de seus prepostos (rectius: repórter local e repórter-âncora), fixo a indenização
para ressarcimento dos danos morais em R$ 30.000,00 (trinta mil reais), observada a correção
monetária, desde o ajuizamento da ação e juros de 1% ao mês desde a citação, a fim também
de que não venha a repetir tais expedientes.
Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido, com o fim de condenar a ré a pagar ao
autor a quantia de R$ 30.000,00 (trinta mil reais), corrigida monetariamente desde o
ajuizamento da ação e acrescida de juros de 1% ao mês desde a citação.
Em razão da sucumbência arcará a ré com as custas, despesas processuais e verba honorária
fixada em 15% (quinze por cento) sobre o valor da condenação.P.R.I.
São Paulo, 30 de março de 2006, JOÃO CARLOS CALMON RIBEIRO, Juiz de Direito