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Falar de fascismo no Brasil.

Por Vladimir Safatle

5 de julho de 2019 Brasil, Destaque Combate Racismo Ambiental


Há uma fenda global que parece crescer, por onde passaria a emergência de
novas formas de governo com traços claramente fascistas
No El País
Há o medo de certas palavras. Esse medo vem na maneira com que
tentamos, até o limite, não utilizá-las. Porque seu uso acende alertas
vermelhos, nos quebra a letargia de sentir que, por mais que nossa
situação atual seja complicada, a vida corre. E corre com um correr de
quem acaba por acertar seu passo, abaixar os gritos. Bem, não há palavra
que nos leve mais a temer seu uso do que “fascismo”. No entanto, é ela que
se ouve de forma cada vez mais insistente quando se é questão da situação
brasileira atual. Coloquemos então, de maneira direita e simples, uma
questão que vários de nós já colocou a si mesmo: Estaria o Brasil
caminhando para o fascismo?
Esta questão não se ouve apenas no Brasil. Ela se ouve na Itália, na Hungria,
na Polônia, nas Filipinas. Esta confluência de semblantes perplexos a fazer
o tour do mundo não é mero acaso. Ela indica uma fenda global que parece
paulatinamente crescer, fenda por onde passaria a emergência de novas
formas de governo com traços claramente fascistas.
Mas não seriam tais governos simplesmente “populistas”? Não é assim que
se diz hoje, “governos populistas de direita”? Sim, é assim que se diz. Mas e
se este uso extensivo do termo “populismo” fosse, na verdade, uma forma
de não chamar de gato um gato? Pois talvez os chamamos de “populistas”
para não dizer o que eles realmente são: governos nos quais uma certa
concepção de ‘estado total’, uma forma explícita de implosão de qualquer
possibilidade de solidariedade social com grupos historicamente
vulneráveis, uma noção paranoica de nação e o culto da violência são a
verdadeira tônica. Mas seria isto exatamente “fascismo”? E por que não
falar em “populismo”, neste caso?
Lembremos como o uso extensivo da noção de “populismo” voltou. Há pelo
menos dez anos havia ficado claro que a política mundial tendia a se
deslocar para os extremos. A incapacidade de responder ao processo de
degradação social provocado pela crise econômica de 2008, ou seja, a
inanidade das políticas neoliberais diante da crise e sua partilha, em maior
ou menor grau, por todos os principais atores políticos, provocara uma
desidentificação tal com o poder instituído, uma frustração tal daqueles
que um dia acreditaram nas sereias da globalização, que o fortalecimento
dos extremos era uma tendência irresistível. A democracia liberal havia
tocado seu limite. Pois o problema não era apenas econômico, ele era
principalmente político. Não havia espaço no campo político para ações e
discursos de ruptura clara com a ordem econômica responsável pela
pauperização de camadas cada vez maiores da população.
Diante de um desejo de recusa forte dos limites de nossa vida institucional,
criou-se essa palavra mágica que faz tudo o que coloca em questão os
sistemas de paralisias e acordos da democracia liberal parlamentar parecer
“irracional”, “emotivo”, “fruto de frustrações”, “convite a regressões
atávicas”, ou seja, “populista”. Ainda de quebra, o termo permitia juntar os
extremos, falar de um populismo de direita e de um populismo de
esquerda, anulando com isto os dois polos, fazendo-os operar em uma
balança de equivalências. Como se, no fundo, existisse apenas a
“democracia” que conhecemos e os “populismos”.
Mas era claro que as diferenças entre os polos eram profundas. À direita,
via-se uma crítica à pauperização social que colocava a conta da catástrofe
nas costas dos mais desfavorecidos, a saber, os imigrantes espoliados por
relações de trabalhos sub-humanas, os refugiados vítimas das
consequências das intervenções imperialistas em regiões de conflito
perene, como o Oriente Médio. Quando não havia grandes levas de
imigrantes, via-se a mobilização das clivagens originárias de raça e de
gênero, em uma reedição de estratégias cuja ressonância fascista era
evidente. À direita, via-se ainda todo o imaginário a respeito da fronteira, da
imunidade do corpo social, da invasão, do contágio retornar diretamente
dos discursos mais inflamados de Goebbels.
Ou seja, não havia proximidade alguma entre os polos. Mas estávamos
diante de uma prática de “normalização” da extrema-direita e recuperar a
tópica do “populismo” vinha mesmo a calhar. Porque recusar sua
normalização acabaria por levar toda a força anti-institucional ao outro polo
e com isto produzir uma ruptura sem negociação com a ordem econômica
atual.
Mas nada disto respondeu à pergunta colocada no início deste artigo, a
saber, estaria o Brasil caminhando para o fascismo? Talvez fosse o caso de
levantar alguns traços que têm a força de falar por si mesmos.
Quando o jurista nazista Carl Schmitt procurou explicar o que era o Estado
total fascista, ele tomou o cuidado de estabelecer uma distinção. Segundo
ele, nós conheceríamos uma forma de Estado total no interior das
democracias parlamentares. Trata-se desse Estado que ouve todos os lados
da sociedade, que está presente em todos os conflitos sociais e que produz
estruturas de mediação e de legislação em todas as esferas da vida social.
Ele procura dar conta dos conflitos trabalhistas, dos problemas de
desigualdade, da violência específica contra grupos vulneráveis, entre
outros. O Estado está assim, em todos os lugares. Ele não pode pairar
acima da sociedade e decidir, pois é apenas a emulação dos conflitos
sociais. Contra isto, dirá Schmitt, precisamos de outro Estado total. Mas sua
função será diferente: ele deverá usar toda sua força para despolitizar a
sociedade, impedir que as escolas sejam focos de sedição e formação,
impedir que os trabalhadores pressionem seus patrões através de
obrigações legais, usar a força policial para impedir greves, paralisias,
ocupações. Assim, pode-se garantir a única liberdade real, a saber, a
“liberdade de empreender” (que é sempre uma liberdade para alguns, ou
melhor, para os de sempre). Este era o Estado total fascista.
Por outro lado, nesse Estado, um dos poucos princípios liberais que
qualquer democracia real deveria preservar, a saber, a possibilidade de que
indivíduos sempre terão, independente de quem são ou do que fizeram, de
se defenderem do Estado quando julgados, não existia. Pois essa
possibilidade exige inviolabilidade do sistema de defesa (em bom
português, meu advogado de defesa não pode ser grampeado pelo juiz),
exige desinteresse da parte dos julgadores (mais uma vez, em bom
português, se sou candidato a presidente, o juiz que julga meu caso não
pode me prender porque tem um projeto pessoal de poder e quer ser ele o
próprio presidente).
Por fim, e esta era uma compreensão precisa de Franz Neumann, o Estado
nazista não governa. Ele é uma associação instável entre grupos que estão
em conflito contínuo. Mas esse conflito é uma forma de perpetuar o
“movimento”, já que ele permite ao governo entrar em conflito contínuo
com o Estado, dizer sempre que nosso grande projeto não está a ser
implementado porque forças obscuras estão agindo dentro do Estado para
impedir nossa grande redenção. O estado nazista é uma crise permanente
elevada à condição de governo. A única coisa que tenho a dizer é: junte os
pontos e diga se a cena não lhe parece demasiado familiar.

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