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Sumário

Introdução......................................................................................................................1
1. Do Império Romano ao ano 1000 d.C......................................................................2
2. Da Europa Feudal à Renascença.............................................................................4
3. Da Renascença à Revolução Francesa...................................................................9
4. Da Revolução Francesa à Primeira Guerra............................................................11
5. Da Primeira Guerra aos dias atuais........................................................................12
Fontes de pesquisa.....................................................................................................13
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A NUDEZ NA HISTÓRIA DA VIDA PRIVADA

Introdução

O artigo que aqui apresentamos é um estudo da obra "A História da Vida


Privada", em 5 volumes, dos historiadores Paul Veyne (volume 1), Georges Duby
(volumes 2 e 4), Philippe Ariès (volumes 3 e 4), Roger Charier (volume3), Gerard
Vincent (volume 5) e Antoine Prost (volume 5). Cada livro refere-se a vários aspectos
de uma época específica. Concentramo-nos acerca do debate sobre a nudez, em
seus aspectos de privacidade, intimidade e sociabilidade. Durante a história houve
distintas maneiras de tratar essa questão. Tentamos, assim, fundir a argumentação
sob este motivo de maneira simples e didática.

A coleção dos livros em sua versão em português.


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1. Do Império Romano ao ano 1000 d.C.

Na vida pública, durante a Antiguidade Clássica, houve uma longa


sobrevivência da indiferença em relação à nudez. A nudez do atleta, por exemplo,
ainda hoje continua sendo um indício de posição, como símbolo de saúde.

O papel essencial dos banhos públicos como ponto de reunião da vida cívica
clássica fazia da nudez, entre os pares e diante dos inferiores, uma experiência
cotidiana inevitável. A postura de um homem (nu ou vestido) é a verdadeira marca
de sua condição, uma marca tanto mais convincente quanto minimizada.

Para as mulheres, a vergonha social que havia em exibir, de modo


inconveniente, constituia uma preocupação, não pelo simples fato de se mostrar
nua, pois a nudez diante dos escravos é moralmente tão insignificante quanto a
nudez diante dos animais, e a exibição física das mulheres das classes inferiores
constitui outro sinal de sua desregrada inferioridade em relação aos poderosos.

Exemplos de representações clássicas do corpo, relacionadas ao esporte e à arte.

A sociedade do Oriente mediterrâneo se organizava de modo ainda mais


conservador acerca da generalização da vergonha sexual. Em Antióquia (Síria),
João Crióstomo ousa atacar os banhos públicos, ponto de reunião social, por
excelência da elite. Critica o hábito das mulheres da aristocracia de exibirem a uma
multidão de servos suas intimidades, cobertas apenas de jóias, que constituiam a
marca de sua elevada posição. Na Alexandria (Egito), os farrapos dos pobres
deviam provocar no crente visões perturbadoras, medo inconcebível, nos séculos
anteriores em que essa nudez parcial era tida como indigna, mas dificilmente como
fonte de inelutável perigo moral.
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A nudez cristã tinha um significado muito diferente, homens e mulheres eram


batizados nus na piscina octogonal, adjacente a toda catedral, nas noites de sábado
santo. Nus, como Adão e Eva da criação, saíam da água, mortos para o pecado e
ressucitados para a vida eterna. A nudez constituia, então, uma afirmação de sua
condição de boa criatura, dependente de Deus (antes do pecado ou sem este).

O desaparecimento do batismo por imersão na época carolíngea (séculos VIII e


IX) suscitou a retomada, podemos dizer, ao simbolismo pagão e deu à nudez um
significado sexual e genital que ela não tinha. Mais adiante, desapareceram os
crucifixos em que Cristo se apresenta nu, como todos os escravos condenados ao
mesmo suplício. Um padre de Narbonne teve uma visão desse Cristo, que lhe pediu
para vestí-lo. De fato, era a época em que em Bizâncio (antiga Constantinopla) se
difundia o Crucificado vestido numa longa túnica - o colobium. Obviamente, a
sensibilidade da época começava a recusar esse espetáculo, que parecia indecente
e até perigoso, pois Cristo corria o risco de ser adorado pelas mulheres como um
Deus da fertilidade, à maneira de Príapo (deus romano do amor) ou de Freyr (deus
viking da paz, prosperidade e patrono da fertilidade), cujas representações nuas não
deixaram dúvidas sobre sua função.

Assim, o corpo vestido, banhado, penteado e enfeitado acabava sendo


adorado e, para que não se tornasse idolatrado por outros motivos, era preciso vesti-
lo. São Bento tanto compreendera isso, que em sua regra recomendou aos monges
que dormissem vestidos, "Cada qual terá um leito para dormir" e "se possível for,
todos dormirão num mesmo local", "para que [...], ao soar o sinal, se levantem sem
demora e se apresentem para consagrar à obra de Deus". As noites, para os
monges, também deviam ser consagradas, nesse caso, ao amor de Deus, pela
oração.

A atual versão da imagem de Cristo, onde aparece vestido.


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2. Da Europa Feudal à Renascença

As narrativas feudais debatem amplamente sobre a exposição do corpo nu, ao


olhar de si, de sua captura pelo olhar do outro, da função ambígua do vestuário
(como proteção, pudor ou adorno), da percepção e do uso da nudez nas práticas
sociais das comunidades fictícias literárias. O recurso ao traje aparece nas
narrativas feudais como revelador de desejos exibicionistas e de um sentimento
contraditório de vergonha. Através dessa obsessão, "estar nu ou mal vestido", a
literatura põe em cena o sentimento de incômodo experimentado pelo sujeito posto
nu, a reprovação implícita por outros, que poderia no mesmo instante, encobrir uma
forma jubilosa, ao menos nos caso dos nus masculinos, da representação do Eu.
Pelo desnudamento e pela evocação da vergonha individual, do olhar de outrem e
da relação com o grupo, as representações do corpo nu revestiram-se com
insistência da noção de um exílio e de uma rejeição temidos. Pela relação íntima
com o corpo e, paralelamente, pela relação com o mundo ordenado segundo leis, os
nus - sempre banhados de vergonha - levam o selo de proibições e de tabus que
atuam segundo uma distinção sexual. Contudo, de início, o nu feminino, assim como
o masculino, se oferece sempre em uma fase de segregação, em uma forma de
ruptura com a vida coletiva, por vezes simplesmente com o domínio dos ritos
privados (o banho), porém, mais particularmente, sob a forma de uma fase
articuladora para os homens tornados selvagens e que rejeitam o vestuário.

A moral cristã modificou os costumes sociais.

Revelar o corpo nu, reservado à clausura, à solidão, ao olhar de um círculo


restrito, é fonte de embaraço, de vergonha e de fragilidade. Não nos
surpreendemos, portanto, de ver aqueles que encontram o homem nu em seu
caminho como curadores que favorecem a caminhada na direção do vestuário. O nu
masculino significa destruição de uma ordem anterior, oposição mesmo a um estado
anterior feito de ordem, uma anarquia cujas marcas são o abandono do vestuário, a
destruição da aparência, a abolição das leis do comportamento, desordem gestual e
incoerência do psiquismo: o nu masculino é o significante revolucionário, a
representação de uma ruptura.
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Em compensação, o nu feminino se situa quase sempre na lógica direta de


uma lei criada em absoluto, costume de rei ou vontade de imperador: "cumpriremos
vossa vontade legítima", admitem as jovens no Roman du comte de Poisiliers, obra
literária em que o imperador exige que sejam exibidas aquelas dentre as quais
escolherá sua esposa. Além disso, nas narrativas do Cyele de la Gagevre, o nu
feminino - cuja privacidade sofre uma invasão ilegítima - está freqüentemente
associado a um ganho material (terras, por exemplo). O único caso de um
funcionamento auto-suficiente e feliz da nudez feminina encontra-se em narrativas
com aspecto matriarcal, em que a mulher serve de sua nudez como de um
chamariz.

Se as crianças se apresentam enquanto selvagens que emergem do reino


animal progredindo para o mundo da Cultura, os outros nus masculinos são todos
oriundos de uma verdadeira regressão em relação aos signos culturais do grupo, um
retrocesso que animaliza o homem. Personagens como Bisdravet e Méilon retornam
à forma humana depois de um tempo de exclusão, em que conservam sabedoria e
memória de homem, e dos traumatizados do amor, dir-se-á por vezes que são muito
semelhantes a um lobisomem.

Criatura do imaginário, o lobisomem é a representação do sentimento do


homem enquanto ser social e, ao mesmo tempo, ser natural.

Retornar-se o vestuário é o primeiro gesto de uma gloriosa reintegração no


grupo, a fase de transição é uma verdadeira amnésia: perda das marcas sociais da
identidade e perda das leis de um comportamento codificado. Assim repelido, por
uma desdenhosa donzela que lhe impôs vãs provas, o herói Yvain Joge, do Dit du
Lévrier, parte sua espada, rasga suas roupas e se vai, inteiramente desorientado
pela floresta.

Yvain espreita a caça, come carne crua, deita diretamente na pedra. Durante a
anamnésia (isto é, o retorno à memória) aparece então como doma e domesticação.
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No estado traumatizado, animal, são particularmente acentuadas a


agressividade e a ruptura de toda a comunicação. Ao mesmo tempo desaparecem
os valores da ética cavalheiresca, proeza, franqueza e vassalagem. Signo de um
verdadeiro movimento de oscilação para o reino animal, é feito um amplo uso do
paradigma desgrenhado / peludo: o homem selvagem aparece, assim, a uma só
vez, nu e revestido, como se textos narrativos mal deixassem proferir "o homem nu".
A pele nova reproduz a função do espaço habitável e da estrutura da sociedade. A
aparência civilizada aparece mais tarde como aquilo que, dessa natureza tornada
exuberante e mal controlada, será domesticado, aparado e polido. Os ritos de
reintegração comportam, com efeito, atos precisos de redução da selvageria, deve
necessariamente passar pela expulsão dos elementos nefastos, anulação da
loucura.

O sentimento de vergonha que atormenta o herói restituído à consciência vem


do fato de que percebe, adivinhando o louco gestual de seu tempo de amnésia, a
deturpação grave de um código: devolvido a si mesmo, ele se vê brutamente
confrontado com o olhar de outros, cristalizados nos valores coletivos. Quando toma
consciência da vida "repulsa e vil" que levou na cidade, a designação do espaço
coletivo não ocorre de maneira casual: a incongruência de sua aparência leva o
herói a reconstituir um pesadelo, o comportamento caótico sob os olhares da
sociedade. Aliás, para avaliar o alcance dessas narrativas na relação com o coletivo,
é preciso sublinhar, na reintegração do exilado, a parte ativa do grupo que deve
ressaltar, por sua descrição, por seu senso íntimista e secreto, que sabe
reestabelecer o ausente e merecer seu retorno: deve apresentar-se como um
envoltório tranquilizador e protetor. Nas narrativas de lobisomens, insiste-se,
particularmente, no quarto que permite ao monstro, no momento do retorno à
aparência humana, não se expor nu ao olhar: o homem cortês aconselha: "levai-o a
um quarto a sós, secretamente, a fim de que não sinta vergonha diante da
assistência".

"Vergonha é ver mulher nua", clama uma das jovens condenadas a se


desnudar sob o olhar perscrutador de um imperador com falta de esposa. Como o
privado frágil, é sempre suscetível de ser entregue ao olhar do grupo. É no próprio
seio do quadro social que a mulher estará nua, o despojamento do vestuário faz dela
uma presa que um olhar de homem pode ilegalmente capturar. Contrariamente ao
homem nu, ela está sempre ligada à tragetória de um desejo nascente ou
confirmado. O processo de desnudamento pode ser sugerido em termos violentos,
como o imperador que ordena diante das trinta jovens: "cada uma ficará nua, tão
nua, como quando saiu do ventre de sua mãe", e acrescenta: "é uma ordem, não um
pedido." Mas se a mulher entra voluntariamente no jogo do exibicionismo exigido
pelo esposo, aceita tornar-se uma das marcas que fundam o poder masculino, como
os vassalos que são anualmente obrigados a reconhecer a beleza da rainha. Como
o vestuário - enquanto modo de representação do Eu - parecia para o homem a
única forma lícita de exibição, a mulher nua aparece aqui em situação substituta.

Em compensação, a função do nu masculino parece estreitamente ligada aos


ritos da sociabilidade e às marcas de coesão do grupo, submetidas a provas
repetitivas: a tendência exibicionista do homem passa por uma total declaração pelo
vestuário.
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À mulher, ao contrário, é atribuída uma situação de vergonha ("ser vista") e lhe


está reservado um modo infeliz de exibicionismo, pois a mulher nua parece viver
uma socialização mediatizada do corpo na medida em que - ao lado do vestuário
que é para o homem o signo da integração do Eu, recuperado pela coletividade - ela
não parece senão um signo entre outros.

O processo do nu ao vestido, aparece todo carregado de simbólica coletiva:


expulsão e reintegração rituais, são etapas significativas do homem medieval com
seu corpo. Em modo menor, a mulher é excluída dessa problemática: posta a nu,
admirada, punida, ela serve para fazer nascer o desejo e permanece para o homem
um dos trunfos da imensa alegria em si.

Em uma era, a partir de então, destinada ao sentimento de vergonha, o pudor,


que se exprime claramente por ocasião dos retornos à aparência humana, e é mais
explícito ainda entre as mulheres obrigadas a ficar nuas (com excessão da rainha
ativa que só procura reunir confirmações de sua beleza). Mas aquelas, que na torre
do imperador devem desnudar-se (submetidas de fato a um teste de virgindade),
opõe a ordem cruel, malévola, um processo de despojamento do corpo muito lento e
constrangido: tiram seus cintos, rasgam seus laços de seda, abrem o fecho do
pescoço - tremem por medo e incômodo.

Reflexo do corpo de Adão, mas invertido como que por um espelho, o corpo
feminino (mais permeável à corrupção por ser menos fechado) requer uma guarda
mais atenta e é ao homem que cabe a sua vigilância. A mulher não pode viver sem o
homem, deve estar sob seu poder. Anatomicamente, ela está destinada a ficar
encerrada, submetida em uma cerca suplementar, a permanecer no seio da casa, e
só sair dali escoltada, enterrada em um envólucro de vestiário mais opaco.

É preciso erguer diante do corpo um muro, o muro "vida privada". Por natureza,
ela é obrigada ao retiro, ao pudor, deve preservar-se. Deve sobretudo, ser colocada
sob o governo dos homens, desde o nascimento até a morte, porque seu corpo é
perigoso, em perigo e fonte de perigo: por ele, o homem perde sua honra, por ele
corre o risco de ser desencaminhado, por essa armadilha tanto mais perigosa
quanto está mais preparada para seduzir.

O corpo era objeto de uma moral e de uma prática que o historiador tinha
dificuldade em descobrir antes do final do século XIII, porque a arte, decididamente
realista, e os escritos sobre esse assunto mascaram quase tudo. O princípio era de
que é preciso respeitar seu corpo, pois que ele é o templo do espírito e ressuscitará,
cuidar dele, mas com prudência, amá-lo ternamente como, segundo São Paulo, os
maridos devem ter afeição por sua mulher: guardando a distância, desconfiando,
pois o corpo é tentador como o é a mulher, ele leva os outros aos desejos, leva a
desejar os outros. O mais aparente nos textos que nos informam é uma forte
tendência a temer seu corpo, e dele libertar-se, levando aos extremos do ascetismo
até a abandoná-los aos insetos.

A identidade se perde com o aparecimento do traje, o homem social passa a


ser um homem vestido.
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Há malícia em evocar o nu, em primeiro lugar porque o uso da pele é um dos


elementos discriminadores de representação social, em seguida, porque o corpo nu,
em uma sociedade de ordem, define o extraviado ou o excluído sob o olhar das
pessoas vestidas; enfim, porque a nudez confina o natural do homem. A sociedade
passou a se manter de pé, pelo concenso expresso, pela aparência dos indivíduos.

A sociedade no fim da Idade Média se desenvolveu economicamente e


multiplicou os estatutos. O vestuário se tornou assim uma das marcas essenciais de
conviência social, destinando a cada parte do povo, seu papel e seu lugar. A nudez é
o sinal de uma regressão em relação à ordem coletiva, de uma ruptura com os
círculos da sociabilidade medieval. Na literatura, a nudez feminina significa luxúria e
exibição forçada das prisioneiras cativas entre as quais um imperador de romance
escolhe uma mulher. Quanto à nudez masculina, estava associada, nas
representações literárias, aos fantasmas da loucura ou da vida selvagem, assim
como o menino-lobo.

Outras origens se erguem e fazem da nudez uma invenção da cultura cristã:


Adão, o glorioso, e Jesus, o suplicado, impõem ao povo fiel o esplendor do corpo
virgem e dor do corpo martirizado. No final da Idade Média, na pintura do norte da
Europa, a partir do séculoXV, traz a nudez triunfante de Adão e de Eva e a nudez de
Cristo torturado até a morte.

O diálogo entre o homem e sua imagem, tal como refletem os artistas, participa
da consciência nova que os homens e as mulheres do fim da Idade Média tiveram
seu corpo revelado, sem se iludir sobre o corpo delicioso e pecador, do qual a alma
escapará no último suspiro para ir habitar na monotonia do corpo sofredor no
purgatório, diante do nu reconciliado no fim da Idade Média, que não se espere
conhecer o íntimo. A intimidade é bem o último círculo do privado, mas passa
necessariamente pelo corpo oferecido e despojado. A nudez supõem um olhar, um
olhar percebido, desde o apelo que ressoou no paraíso nesta etapa, o olhar que os
homens e mulheres do final da Idade Média lançaram sobre seu próprio corpo.
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3. Da Renascença à Revolução Francesa

Evidentemente, é sobre o corpo que as normas da civilidade se exercem com


maior rigor. Não é ele ao mesmo tempo a base das paixões, uma incansável
moralização das condutas ordena que se esqueça o corpo e respeite a presença
divina. Ela traça um caminho difícil e cheio de contradições. "Foi o pecado que nos
impôs a necessidade de vestir-nos e cobrir de roupa nosso corpo", portanto a
vestimenta deve obedecer a uma norma religiosa e moral que em todos os casos
associa a nudez ao pecado original.

A conduta moral define que o corpo deve ser vestido.

Em determinados casos essa evolução sobre o corpo e a nudez começou


muito antes do século XVIII. A decência específica, exigida na época de início, era
que "algumas partes do corpo o pudor natural nos leva a esconder". Depois, a
relação com o corpo ficou mais severa: É muito honesto para uma criança pequena
manusear suas partes pudentas, mesmo com vergonha e pudor.

Mas tudo não passa de uma única teoria: "O julgamento moral está totalmente
integrado à experiência corporal". Ainda que se trate aqui de uma função
considerada vil e repulsiva, no entanto com relação aos gestos mais cotidianos,
progressivamente, se impõe uma distância que, do corpo ao corpo, tende a
intercalar o espaço neutro de uma tecnologia que governa a ameaçadora
espontaneidade da sensualidade. Assim como quando se está deitado, não se devia
deixar que as cobertas sugerissem a forma do corpo, assim como, "quando sair da
cama não se deve deixá-la descoberta, nem colocar a touca de dormir em algum
assento ou outro lugar onde outros possam vê-la. A vigilância se tornou tão estreita
que acabou proibindo toda relação imediata consigo mesmo: o decoro exige também
que, ao nos deitarmos, escondamos de nós mesmos o nosso corpo e evitemos
lançar-lhe até os menores olhares". Negação radical de qualquer intimidade.

Às vésperas do Iluminismo, toda uma gama de práticas corporais cai, assim,


numa clandestinidade furtiva, vergonhosa. Organiza-se ao redor do corpo uma
esfera do silêncio e do segredo. Do privado ao público, do íntimo ao secreto: não
forçaremos porém, as linhas de uma evolução extraordinariamente complexa.
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Se é clara a direção em que os comportamentos mudam entre o século XVI e o


começo do XIX, tais transformações se efetuaram em rítmos e segundo cronologias
muito variáveis. As funções corporais logo são subtraídas ao campo da civilidade.

Do final da Idade Média a meados do século XVIII, nossos tratados em


particular ignoram o corpo, à exclusão do rosto e das mãos, que são as únicas
partes expostas. Os cuidados concentram-se no visível, na roupa e, sobretudo, na
roupa branca, cujo frescor ostentado na gola e nos punhos constitui sinal autêntico
do asseio. Porém, ao mesmo tempo, é inseparável de uma idéia do corpo que rejeita
a água como um agente perigoso, suscetível de penetrar por toda parte.

A higiene reabilita a intimidade corporal. Enfocada pela medicina e depois


levada às escolas, logo se tornará, aliás, o dispositivo inédito de uma forma de
controle coletivo dos comportamentos. Vemos que a socialização das técnicas do
corpo, por mais que sejam expressamente reguladas, na verdade, só conseguem
impor-se através de registros de representações e de práticas estabelecidas, ao
mesmo tempo que ultrapassam o campo específico da civilidade.

A roupa foi usada com a função de esconder a superfície do corpo. Mas faz da
intimidade corporal o objeto de investimentos autônomos. A história do asseio não é
isolada, em todo caso, convida a reconhecer no mundo dos gestos reprovados a
outra forma silenciosa de intimidade.
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4. Da Revolução Francesa à Primeira Guerra

Cento e cinqüenta anos depois, a sala de banho é transformada em santuário,


fecha-se sobre a nudez dos senhores que já não toleravam ser vistos por seus
criados, "madames se vestiam sozinhas e penteavam-se pessoalmente. Ela se
tranca em sua toalete e é muito difícil que alguém tenha direito de entrar" (Diário de
uma criada de quarto). Mostra-se que essa expulsão foi precedida por uma "relação
mais exigente do indivíduo consigo mesmo". Essa exigência de mais intimidade não
se manifesta apenas no banheiro, mas, também, no dormitório e em toda a casa.

Os ricos, principalmente, viviam sobre as vistas dos criados, comiam, dormiam


sob os olhos deles. Acabaram por perderem as intimidades a dois (os casais). E a
exigência de recusa aos criados o tranformou num intruso, no século XIX. Em 1830
começa a moda dos retratos, de famílias, de pessoas e parentes passados que
morreram ou amigos. Mas esse processo favorece por fim a vulgarização e a
contemplação da imagem da nudez. Tende a modificar o equilíbrio dos modos de
simulação erótica, a difundir um novo tempo de desejo, testemunha-o prestígio do
nu. O legislador percebeu-o bem depressa e, desde 1850, uma lei proíbe a venda de
fotos obscenas em vias públicas. Após 1880, a foto pública de amador suprime o
intermediário profissional, alivia o ritual da pose, abre de par em par a vida privada
para a objetiva, a partir de então ávida de imagens íntimas.

No início do século XIX, é no seio do espaço privado que o indivíduo se


prepara para afrontar o olhar dos outros; ali configura-se sua apresentação em
função das imagens sociais do corpo. Impõe-se nessa época a elaboração de uma
estratégia de aparência, um sistema de comunhões e ritos que visam somente a
esfera privada. Assim, ao cabo de décadas, a camisola de dormir deixa aos poucos
de ser tolerada fora do quarto. Tornou-se símbolo de uma intimidade erótica e menor
alusão a ela. Outro fato histórico renova então as condutas privadas: o inaudito
sucesso da lingerie. A extrema sofistificação da vestimenta invisível valoriza a nudez,
dando-lhe maior profundidade. Enquanto se multiplicavam os estágios do despir-se
(no final do século), a acumulação erótica ainda era um tabu. As mulheres usavam
corpetes para manter a silhueta esbelta e acentuar as curvas das ancas e dos seios.

No final do século XIX, o corpo já está mais livre. Os gestos e as posturas são
permitidos e o corpo deixa de ser percebido como exterior à pessoa. Os prazeres do
corpo nu em meio a fluidez de um banho de mar já não é tão julgado.
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5. Da Primeira Guerra aos dias atuais

A rebelião do corpo certamente constitui um dos aspectos mais importantes da


vida. Com efeito, ela modifica a relação do indivíduo consigo mesmo e com os
outros. A novidade no final do século XX são as atividades físicas: surgiram para o
culto ao corpo, pela aparência, bem-estar e realização. "Sentir-se bem na própria
pele" se torna um ideal.

Os esportes modificaram a relação do homem com o seu corpo, rompendo tabus.


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O espelho surge (e não é uma invenção novecentista, mas sua banalização e a


forma de usá-lo são próprias desse século): a pessoa não se olha mais no espelho
com o olhar de outro, ela se olha de uma maneira que, de modo geral, ninguém está
autorizado a fazer: sem maquilagem, sem roupa, totalmente nua. Assim, as
manifestações narcisistas do banheiro são percorridas por sonhos e lembranças.
Cuidar do corpo é prepará-lo para ser mostrado.

A roupa se torna funcional, prática e confortável, mesmo contra os costumes,


passa a valorizar o corpo e deixar adivinhar suas formas, realçando-as e, por vezes,
revelando-as. Exibe o bronzeado, a pele lisa e firme, a flexibilidade. Aliás, mostra-se
cada vez mais o corpo: cada etapa desse desnudamento parcial começa
provocando certo escândalo, depois se difundi rapidamente e acaba se impondo,
pelo menos entre os jovens, aumentando a distância entre gerações. É o caso da
mini-saia nos meados dos anos 60 ou 70, depois do mono-biquíni nas praias,
mostrar os seios e as coxas deixa de ser indecente. Nas cidades, durante o verão,
vêem-se homens de bermuda, camisa aberta, mostrando o tronco nu. O corpo não é
apenas assumido e reabilitado: é reinvindicado e exposto à visão de todos.

Para as normas do entreguerras, o avanço do nu é o avanço da indecência, no


mínimo da provocação. Para a nova norma, é o contrário, uma coisa muito natural,
uma nova maneira de habitar o próprio corpo. Prova disso é o fato que o nu avança
não só nos lugares públicos, mas, também, no universo doméstico. As famílias no
verão sentam a mesa em trajes de banho. Os pais vão e voltam do banheiro para o
quarto nus, sem se esconder dos filhos. É difícil saber até que ponto essas práticas
prevalecem, o que certamente depende dos meios e das gerações. Mas sua mera
possibilidade mostra que não se trata de depravação, e sim de uma mudança de
normas.

De fato, o corpo se tornou o lugar da identidade pessoal. Sentir vergonha do


próprio corpo é sentir vergonha de si mesmo.

Fontes de pesquisa

Veyne, Paul. História da vida privada: do Império Romano ao ano Mil. Companhia
das letras, 1990, 14ª edição.

Duby, Georges. História da vida privada: da Europa Feudal à Renascença.


Companhia das letras, 1990, 10ª edição.

Aries, Philippe, & Charier, Roger. História da vida privada: da Renascença ao


Século das Luzes. Companhia das letras, 1991, 8ª edição.

Duby, Georges, & Aries, Philippe. História da vida privada: da Revolução Francesa
à Primeira Guerra. Companhia das letras, 1995, 1ª edição.

Prost, Antoine, & Vincent, Gerard. História da vida privada: da Primeira Guerra aos
dias atuais. Companhia das letras, 1995, 1ª edição.

Revista Eletrônica de Ciências - Número 21 - Agosto / Setembro de 2003.

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