Documente Academic
Documente Profesional
Documente Cultură
Bclmira Magalhães
Helson Flávio da Silva Sobrinho
Maria do Socorro Aguiar de Oliveira Cavalcante
Análise do Discurso:
Fundamentos &
Práticas
Reimpressão da 1ª edição
/Edufal
Edi1oradaUniver$ldade FeOOraldeAlagoas
Macejó/AL
2016
~
~~~
UN IVERSIDADE FEDERAL DE ALAGOAS
Reitora
;\·faria Vulérla Costa Corre ia
Vice-reitor
]o:"lé Vit:"ira da C ruz
Diretor da Ednfal
Osvaldo Ba1i s1a Acioly Mai..:iel
A5 32 Análise do c.Jisc urso : fundumc ntos & prá ticas I A na Jvlariu Ga ma Florencio .... lct
al.j . - M aceió : E D UFA L, 2009.
131 p.
Bibliog rafia: f. Ll 25 J-131.
l. Teoria do di scu rso. 2. A nálise d o di snirso. 3 . Pdt ii.:as Ui sc ursivas. 4 . Ideo logi a.
!. Florcncio, A na Maria Gama.
C DU : 800.5
Dedicamos este livro aos
ISBN 97 8-85-7 177-5 14-5
nossos a lunos que nos
Edilorn atil inda :
instigaram a produzir uma
Oin•ilos dcsla 1.:di\·fio r csc rrndos i1
Ed uíal - Edi 1 o r~1 da U11i vcr:o;i<h1dc Fcd l!ral de AliLgnas reflexão entre os fundamentos
Ccn\ro ele ln11.:rl!~sc Comuni lário (C IC J
Av. Louri val ML'lll tvlo1a. s/n - Campus A. C. Si môcs
- - - -1
da AD e a perspectiva da
Cilbdc Univcrsil1iri:1 , Mace ió/AI.. Ccp: 57072 -970
Con1atos: www.cdu íal .com.h r 1cont;11o @t:dul"al.co111.br1(82) J2 I-i - l l l l /I 1 1~
ASSOC IA ~/\O DRf,SIU'.!lf!.I\
1OE EDI TORi S UtJ!VERS ITAR IAS ontologia marxiana.
As armas da crítica não podem, de
fato , substituir a crítica das armas; a
força material tem de ser deposta por
força material, mas a teoria também
se .converte em material , uma vez
que se aposse dos homens. A teoria é
capaz de prender os homens desde que
demonstre sua verdade face ao homem,
desde que se torne radical. Ser radical
é aprender algo cm suas raízes. Para
o homem, porém, a raiz é o próprio
homem. (MARX, Introdução à crítica
da filosofia do direito de Hegel)
SUMÁRIO
CAPÍTULO 1
SITUANDO A ANÁLISE DO DISCURSO .... ..... ........ 17
O que entendemos por Análise do Discurso .. ... .. ... ......... 19
Considerações sobre discurso ...... ...... .... ....... ..... .......... ... 26
uanto à Ideologia .............. .... .. ......... ....... ..... ............ ..... 33
APÍTULO 2
A APREENSÃO DO CONHECil\1ENTO:
PROCESSUALIDADE TEÓRICO-
METODOLÓGICA ........... ... ...................... ... ... .. .... ...... 41
/\relação sujeito/objeto nas ciências humanas ........... .... 43
l !ist:ória, Sujeito e Discurso ... .......... .... .... ... ......... ... .. ...... 45
) sujeito na sociedade capitalista .......... ..... .. ... ........... .... 55
C:APÍTULO 3
OISPOSITIVOS TEÓRICO-ANALÍTICOS ....... .. .. ... 63
l iscurso e relações sociais ...... ........... .... ..................... .... 65
'ond ições de produção, formações ideológicas,
lormações discursivas ................. .... ...... .. ...... ...... .. ... ...... . 66
Interdiscurso e Intradiscurso .... .... .............. ........... ... .. ..... 78
Discurso: procedimentos de análise ... .. ........ .................. 85
CAPÍTULO 4
PRODUÇÃO DE SENTIDO E RELAÇÕES
HISTÓRICAS ............ ...... .... ... ............. .. ....................... 91 ÀS LEITORAS E AOS LEITORES
Desvelando sentidos ..... .. ................. ............. ........ ........... 93
O discurso sobre o MST na imprensa .... ......................... 94 DESTE LIVRO
O discurso e as tentativas de "controle" sobre o
trabalhador ............................... .................... ................. 107
A ambiguidade do discurso: a mulher trabalhadora e
inãe ... ..... ..................... ... ............................ .... ................ 115 A reimpressão deste livro tem sido cobrada pelas/
os leitoras/es preocupados/as com a divulgação do
conhecimento e com a prática política, há, pelo menos, dois
anos. Seus autores avaliaram a premência de realizá-la, pois
CONSIDERAÇÕES FINAIS ..................... ......... ....... 125
sua ausência já estava, cada vez mais, se tornando uma lae1ma
nas aulas de análise de discursos e ·também em relação ao
entendimento dos posicionamentos tomados pelo Grupo de
REFERÊNCIAS ........................ ......... ................... ...... 127
Estudos Discurso e Ontologia Marxiana (GEDOM), ou seja,
da especificidade de nossa inscrição na linha Pecheuxtiana
ele estudos do Discurso, consolidada no Brasil.
Optamos por não fazer nenhuma modificação em
relação à primeira edição, pois embora tenhamos avançado nas
discussões teóricas e nas práticas analíticas, entendemos que a
essência de nosso lugar teórico está presente na primeira edição.
Nosso livro não é uma introdução aos estudos discursivos,
mas apresenta simultaneamente urna linguagem acessível
aos iniciantes, e levanta problematizações teóricas cm relação
à apreensão dos silenciamentos produzidos pelas relações
de classes no sistema capitalista e seus efeitos ideológicos,
Cundamentais na constituição dos sujeitos discursivos.
Esperamos que, seguindo a trajetória da primeira,
sta edição nos possibilite realçar a necessidade de
12 Análise do Discurso:
--- · -- -- --~-
antagônicos, produziram significativas contribuições para Discurso, como meio de estabelecer-se urna relação entre o
os estudos da Análise do Discurso. sujeito pesquisador e o discurso - como objeto de esh1do -
Essa produção nasceu da necessidade de atender a deixando claro que tal relação só acontece vinculada a um
algumas dificuldades demonstradas pelos alunos do curso campo teórico-metodológico.
de graduação e da pós-graduação, ante a complexidade O capítulo de número três traz uma descrição teórica
desse campo de estudo. Nossa pretensão é tratar com clareza de categorias da Análise do Discurso, imprescindíveis para
e coerência questões complexas, a fim de despertar nos a compreeensão do funcionamento do discurso, no intuito
leitores a necessidade de aprofundamento de estudos na de fundamentar o leitor para as análises que se processarão
Análise do Discurso. no capítulo quatro. São, pois, dispositivos analíticos que
Outra necessidade que sentimos é a de deixar clara dão sustentação teórico-científica aos caminhos percorridos
a posição do grupo de Análise do Discurso da Universidade pelo analista, na descoberta das relações entre discurso,
Federal de Alagoas que vem desenvolvendo pesquisas em história e ideologia.
Análise do Discurso, nas áreas de linguística, educação No último capítulo, elegemos três momentos
e ciências sociais, tomando como referencial teórico- de análise, com o intuito de desvelar o discurso no seu
metodológico a Análise do Discurso, dialogando com o funcionamento efetivo nas práticas sócio-históricas . No
materialismo histórico-dialético, a partir do próprio Marx, primeiro movimento, nos debruçamos na análise do di scurso
Bald1tin e Lukács. da imprensa sobre o MST (Movimento dos Trabalhadores
Com esse intuito, no primeiro capítulo, iniciamos Rurais Sem Terra), compreendendo corno, nas repo1iagens, se
do nascedouro da Análise do Discurso, na França, na institucionalizam sentidos dominantes, tomando posição nas
década de 60, num contexto de evolução das teorias lutas de classes. Em seguida, derivamos para uma propaganda
linguísticas e de transformações no campo politico. Saindo de uma empresa de telefonia celular que lança sentidos sobre
da França, a Análise do Discurso espalha-se por diversos o trabalhador. E, por fim, analisamos a contraditoriedade do
lugares, encontrando terreno fértil na América Latina e, discurso que simula uma homenagem à mulher trabalhadora,
particularmente, no Brasil. Concebida como teoria crítica da ·nquanto se produz em seus efeitos ambíguos de sentidos.
linguagem, elege o discurso corno objeto de estudo. .Esperamos, pois, que o leitor, ao percorrer as páginas
Como todo campo de saber, a Análise do Discurso que co~npõem este livro, não somente se fundamente na
é constituída de um corpo teórico e de um método próprio, 1 ·o ria da Análise do Discurso, mas sinta-se encorajado a
pois o método, determinante de todo processo de produção ~· mpreender voos mais altos e mais arriscados.
do conhecimento científico, direciona e explicita não só o
caminho pautado pelo pesquisador, mas, também, possibilita
a obtenção de resultados efetivos. É disso que tratamos
no segundo capítulo, da questão do método na Análise do
Capítulo 1
SITUANDO A ANÁLISE DO
DISCURSO
O que entendemos por
Análise do Discurso
1
Trataremos desse conceito mais adiante.
20 Análise do Discurso:
lJ/ Fundamentos & Práticas 21
qual Análise do Discurso estamos falando, pois diferentes torno da episte no\ogia, na França, pois que, como
posições teóricas possibilitam diferentes olhares sobre um afirma Marx (19 3,j) .24), "o modo de produção da vida
mesmo objeto de estudo . Em se tratando de língua e de ma~r~_dic~ o desenvolvimento da vida social,
discurso, esses lugares sinalizam diversas formas de concebê- pol~ti~a e intelectual em geral". Ou seja, toda produção
los e nos possibilitam destacar vários pontos de vista, a partir intelectual de uma época, resulta das contradições sociais
dos quais são analisados. determinantes daquela sociabilidade, de sua conjuntura
Por essa razão, mesmo quando nos referimos à Análise política e econômica.
do Discurso de linha francesa, ainda não podemos abrigar A França dos anos 60 não estava alheia ao turbilhão
sob essa denominação uma única corrente teórica, uma dos acontecimentos mundiais da época; pelo contrário, na
vez que, nos anos 60 e 80, na França, a partir de diferentes Emopa ocidental era mn dos seus centros motrizes. O desfecho
pressupostos teóricos (semiótica, linguística, lexicologia) da segunda guerra mundial dependeu exclusivamente de dois
vários teóricos franceses 2 realizavam trabalhos de análise países não situados na Europa ocidental: Os Estados Unidos
de discursos. Embora considerando de grande relevância a (não europeu) e a União Soviética (leste europeu e parte da
caracterização dessas análises, para compreender as bases Ásia). A Europa ocidental é deslocada do centro do poder
epistemológicas que sustentam essas diferentes abordagens, internacional e passa a viver as inseguranças da guerra fria.
a fim de entender as perspectivas teóricas, filosóficas e A nova ordem mundial, marcada pela disputa geopolítica
metodológicas que caracterizam os vários campos de estudos, ~dois modelos eéÕnômicos _?qtagônicos - capitalismo
não nos ocuparemos dessa tarefa, neste livro. x "socialismo" 3 - gerou uma corridã armamentista sem
Aqui, trataremos, especificamente, da Análise do precedentes. A "prosperidade" da Europa ocidental -
Discurso, fundada por Michel Pêcheux, na França, no final consequência dos investimentos norte-americanos e das
da década de 60 e de sua recepção e seus desdobramentos no inovações tecnológicas - não ocorreu sem o aumento
Brasil, a partir da década de 80. Segundo ORLANDI ( 1994, da desigualdade social, da exploração de classes e do
p.7), "a análise do Discurso [... ]é o acontecimento teórico afloramento dos movimentos sociais. Por isso, segundo
mais importante, depois do estruturalismo, na França.". CARNEIRO (2007, p. 2),
Para entender a relevância atribuída por Orlandi a
esse acontecimento , é necessário abordar alguns fatores Os anos 60 também ficaram conhecidos
que contribuíram para que ele ocorresse - as condições para uns corno a década da contestação
sócio-históricas da época e os intensos debates em e para outros como os anos rebeldes.
'Algun s teóricos marxista s questionam o uso dessa denominação para referir-se ao regime
instituído na União Soviética, a partir de outubro ele 191 7 . C f Chas in: "Da razão cio mundo
' Lé vi-Strauss , Todorov, Banhes, Grcimas, Duboi s, entre outros. 110 mundo sem razão"'.
Análise do Discurso:
Fundamentos & Práticas 23
22
As contradições daqueles anos constitutiva, isto é, seu caráter ao mesmo tempo formal e
foram sentidas por todos , desde atravessado pelo social, pela história e, consequentemente, pela
os jovens. Os livros de Karl Marx
foram popularizados. As n:azelas do
- -----
ideologia. A materialidade da língua funde-se à materialidade
- ._ - - ----
--......._____
d<01istó..ria e opera nas relações sociais. ssa relação
capitalismo eram denunciada s . Os indissociável entre língua, história e ideologia ~
valores foram questionados e os tabus É nessa conjuntura que, em 1969, Michel Pêcheux,
que b ra dos . [ ··· ] No dia 22 de maio _ele elegendo o discurso e não a língua como objeto de estudo
1968 , 10 milhões ele trabalhador~~ funda, na França, a Análise do Discurso, inaugurando
entram em greve. Foi a maior greve.Ja uma região teórica própria, tanto em relação à Linguística,
realizada na França, até então e a maior como em relação às Ciências Sociais em geral. Introduz na
ele toda a Europa. reflexão sobre a língua o sujeito, a história, a ideologia e o
inconsciente. Isso representa uma virada, um acontecimento
Além desses fatos, não podemos esquecer o ~ovimento na história das práticas linguísticas.
, . de 1968 em Paris, quest10nando o ~egunclo Orlandi, (2007, p. 2), "a Análise do Discurso
dos estudantes, em maio ' .. _
modelo de sociedade vigente, a estrutura conservadora e eh tista se constitui na conjuntura intelectual [... ] do final dos anos
da universidade francesa, clamando por mudanças. .- 60, em que a g1:9nde questão _é_a rela_çãQ.. cl-ª estrutura com a
' O impacto desses acontecimen_tos repercutrn istória, cio indivíduo com o sujeito, da língua com a fala".
mundialmente. Tod<!_essa_convulsão na cc:~rm_tura fr~i:~~~a ,
Segundo Maldidier (1997), a AD surge de uma dupla
filiação. De um lado , Jean Dubois, linguista de renome,
no fi na1 dos a
~ 60 incidiu no campo ep.1stemo cog1LOO ,
' d , b · e: de outro, Michel Pêcheux, filósofo. Ambos marxistas
onde também ocorreu um questionamento o~ ~a ete -
(Althusserianos) na contramão das ideias dominantes na
. dos dentre eles o estruturalismo remante na
estab e l ec 1 ' ' . , · d~ havia França, partilham as mesmas evidências sobre a história,
, da de 60 Também na hngmstica, on e '
França na d eca · - a luta de classe, o movimento social e têm em comum um
.d de em tomo das idéias saussunanas, o
uma aparente um a - . projeto político: "usar a arma da Linguística como um novo
estruturalismo começou a ser questionado. . - do meio de abordar a política". Entretanto, já a partir dos dois
Estudiosos passam a buscar uma compreens~o fundaçlore , a-A - segue caminhos diferentes. Na perspectiva
fenômeno da linguagem, não mais centrado ª?enas na h~gua'. de----le"an Dubois, la é pensada como um progresso da
como dizia Saussure, considerada como um s1stema de_ s_1gnos LinguÍSBca - ssa-se do estudo das palavras, da frase, para
. t. e como uma estrutura estabilizada, o estudo do enunciado, ficando a questão do sujeito falante
i·deologicamente neu 10 _ ~-
- · ·t re 1açoes presa ainda ao psicológico.
ouco sujeita a mudanças. A fala, o sujet_o, as . .,
p . . - exclusões operadas por Saussure - sao tra_z1~las pai a Na perspectiva de Michel Pêcheux, a AD é pensada
sociais , e l mttados a em oposição aos dois quadros teóricos existentes no campo
as discussões linguísticas. Os estudos, ate en ao l ' .
uma "linguística da língua"' passam a considerar sua dualidade da linguística- o estruturalismo saussuriano e o gerativismo
24 Análise do Discurso : Fundamentos & Práticas 25
chomskiano - e corno ruptura epistemológica com a ideologia que foi dito antes. Nesse arranjo sintático, o que nos autoriza
que dominava as ciências humanas - o psicologismo. Elege a classificar a segunda oração de adversativa é o conectivo
o discurso e não a língua como objeto de estudo; teoriza a mas, cuja função é conectar idéias que se opõem. Ponto final.
relação da linguística com a história e a ideologia; concebe Na perspectiva da Análise do Discurso, ao proferir
o discurso como sempre determinado, apreendido dentro de esse enunciado , não se está apenas transmitindo uma
relações que o sujeito estabelece no seu mover-se no mundo ; informaçã.o sobre Pedro - que ele é negro e bonito. Está-se
pensa a enunciação no quadro de uma teoria não subjetiva atribuindo a Pedro uma qualidade que, socialmente, não é
do sujeito. Ou seja, toda e qualquer enunciação é resultado atribuída à cor negra. Daí a escolha do operador mas. "É
t\ das relações sociais que o sujeito estabelece. O sentido ele negro, mas é bonito." Enuncia-se a partir de um lugar social
m~palavra, ele uma frase não é assegurado-- pe 9 arranjo
j/Z sintático de seus elementos. que estabelece como padrão de beleza o branco, o louro,
1 de cabelos lisos ou levemente ondulados. Nes se diálogo,
O sentidõ , afirma Pêcheux, (1988, p.60) , " não
Pedro continua sendo negro, no entanto, esse possível
pertence à própria palavra, não é dado em sua relação com
"incoveniente" é amenizado pela sua beleza. Dessa forma,
a 'literalidade do significante'; ao contrário, é cletenninaclo
o preconceito permanece, mas é suavizado discursivamente.
pelas posições ideológicas que estão em jogo no processo
Esse padrão de beleza resulta de uma construção social em
sócio-histórico no qual as palavras, expressões e proposições
que a classe dominante, cm sua grande maioria , possui essas
são produzidas.". Para explicar essa afirmação de Pêcheux,
trazemos aqui , um diálogo (ouvido em um ônibus) de duas características. Essa escolha pelo modalizador mas (que
jovens que falavam sobre seu final de semana. não é inocente) denuncia a posição, o lugar a p artir do qual
se enuncia e, a partir desse lugar, beleza e negritude são
Você foi ao Maikai, sábado? disse uma delas. antagônicas, logo, Pedro se constihli uma exceção - mesmo
- Fui - responde a segunda. sendo negro, apesar de ser negro, ele é bonito - pois a beleza
-A Paula apareceu por lá? seria, na sociedade ocidental, uma característica própria da
-Apareceu, ficou o tempo todo com Pedro. cor branca ; não da negra. /
-Que Pedro? aquele negro? Essa é a função da AQ· -~x licar os_caminhos do
- Sim, qual é o problema? Pedro é negro, mas é bonito. sentido e os meca111smos e estrutura - do-tex o Ou seja:
explicar porque o texto produz sentido; não os sentidos
Tomemos o último enunciado: Pedro "é negro mas contidos no texto. Daí que, segundo Orlandi (1996 , 60),
é bonito" . Na perspectiva da análise da estrutura, temos aí a pr~ost é!_ da AD é: "a) remeter o texto ao discurso; b)
um período composto por coordenação, constituído de uma esclarecer as relações dest-e co1:1 as Formações :Õiscu rs-ivas4, ,
oração coordenada assindética - Pedro é negro - e uma pensando as relações destas com a ideologia.
oração coordenada sindética adversativa- mas é bonito. Ora,
uma oração adversativa sugere uma oposição com relaç,ão ao 1
Essa cat egoria será desenvolv ida no ca pítulo seguinte
1
\ 1 1 ~ • ')...: {
~-tOir'. iQ.-e ~ ·~léJ..Ald, J ·--'-< ~/'Q_ 0 '_."- ,\i...Á,
'b ' ,.., G.t
, """- ..e i .. e/~,,., 1,. ~...:v ..
~ -1 __(,~ \ 1.. '\ -
....(\ -- -- -
Q
.
•
26 Análise do Discurso: Fundamentos & Práticas
27
Fundada num contexto de evolução das teorias em Pêcheux e em Bakhtin (1992, p.313), "toda época, em
linguísticas e de transformações no campo político, no cada momento histórico, em cada uma das esferas da vida
França, a AD é pensada para se constituir, ao mesmo e da realidade tem tradições acatadas que se expressam e
tempo, corno intervenção científica e _ olítica, consolidando se preservam ,sob o invólucro das palavras, das obras, dos
uma teoria rn~do discurso. É influenciada no seu enunciados". E ainda BAHKTIN (op. cit, p.319) quem afirma,
[' nascedouro por Althusser e F01:1eatÜ{'-- az;enta-se em dois
· conceitos nucleares&eologj_a e discurso. Àssim, a Análise o objeto do discurso de um locutor, seja
\ ' do Discurso fundada por Michel Pêcheux não nasce apenas ele qual for, não é objeto do discurso
t omo um simples campo d~ estudo, como mais t+i:Ha-:ir a de pela primeira vez neste enunciado, e
\ V conhecimento, mas corn~H~~ento de luta pol~ este locutor não é o primeiro a falar dele.
-1 Nesse sentido, a proposta do próprio P°êcheux 1988, p.24) O objeto, por assim dizer, já foi falado,
~ era "contribuir para o avanço dos estudos na perspectiva do controvertido esclarecido e julgado ele
diversas maneiras, é o lugar onde se
, -'~*imaterialismo hist~·ico, d" efeito das relações de classe sobre
cruzam, se encontram e se separam
o que se pode chamar as 'práticas linguísticas"'. diferentes pontos ele vista, visões de
mundo, tendências.
Considerações sobre discurso A partir daí podemos entender que todo discurso
é uma resposta a outros discursos com quem dialoaa
Com relação à concepção de discurso , há tmnbém reiterando, discordando, polemizando. Sendo produzido º'
posições divergentes, seja nas diversas áreas dos estudos socialmente, em um determinado momento histórico, para
da linguagem (Filologia, Linguística do texto, Análise do responder às necessidades postas nas relações entre os
discurso), seja nas diversas tendências ~ntr da uma homens, para a produção e reprodução de sua existência,
dessas áreas. Na perspectiva de Pêcheux, o~ ' se carrega o histórico e o ideológico dessas relações.
confunde com a língua, nem com a fala, nem com o texto; Magalhães (2003, p_]J ) também explicita sua
não é a mesma coisa que transmissào de informações, rosição, assumindo o~'enquanto "práxis humana
tampouco surge do psiquismo individual de um falante. "é ttue só pode ser compreendida a partir do entendimento das
acontecimento que articula uma atualidade a uma rede de
~ ·--·---- '0~1ções s ociais que possibilitam a sua objetivação", pois
memória[ .. .]. Todo discurso é índice de agitação nas filiações lodo discurso -tem a ver com o tipo de relação do sujeito no
sócio-histórrc;,Ú;" (PÊCí-IEUX, 2002 p.45) . prôCesso- deprodução da vida de uma sociedade.
Ou seja, nenhum discurso nasce do nada, mas de um Não há, pois, discurso neutro ou inocei1te uma vez ue
trabalho sobre outros discursos. Essa afirmação apóia-se no p1:?duzi-l_o, o sujeito o faz~tirdc~i"m-Tug-;;-~ial, de
Análise do Discurso: Fundamentos & Práticas 29
28
uma perspectiva ideológica e, assim, veicula valores, crenças, mercados e tem como efeito a manutenção da visão maniqueísta
visões de mundo que representam os lugares sociais que ocupa. :fimdamental para a reprodução capitalista.
, . C\ . •ç\C Numa fase bem anterior a Pêcheux, em_ l 9_ '?:_9/ Essa perspectiva teórica que propõe um novo
olhar para o sentido, o sujeito e a história , introduz
~ ·,' · Bakhtin (1981, p.4l)já afirmava que" s palay~das
questionamentos, não apenas nos estudos da linguagem,
(âJ?artir de uma multidão de fios ideológico~ ~serve121 de
mas, também , no âmbito das ciências humanas , espalha-
trama a todas as relações soci!'lis". É ainda de Bakhtin (Idem,
se por inúmeros lugares, especificamente na América
p. 47), a afirmação de que "toda crítica viva pode tornar-se
Latina e encontra terreno fértil no Brasil. Na França,
elogio, toda verdade viva não pode deixar de parecer para
entretanto, por conta das mudanças históricas ocorridas
alguns a maior mentira". nos anos 80, dos embates dentro do próprio Partido
Explicando essa citação de Bakhtin: no episódio da cornun!sta francês entre althusserianos, garaudyanos 6
destruição das torres gêmeas de 11 de setembro de 2001, o e do desaparecimento de Michel Pêcheux, inicia-se
então presidente dos Estados Unidos, em tom de indignação um processo de desconstrução e de reelaboração dos
declara para o mundo, via televisão: "De hoje em diante, trabalhos franceses em Análise do Discurso.
estamos deflagrando uma guerra - será uma guerra do bem Assim, enquanto na França a AD fundada por
contra o mal.". Ora, naquele momento, quem é o bem na Pêcheux inicia um processo de re-elaboração que culmina
perspectiva da posição do presidente Bush? Os Estados com a suspensão do projeto iniciado por seu fundador e a
' Unidos que, naquele momento, aparecem para o mundo sa ída do althusserianismo, essa corrente chega ao Brasil onde -
como vítima de agressões terroristas. Quem é o mal ? Esse encontra aceitação - tanto no que se refere aos estudos da
é representado pelos agressores - os terroristas. Entretanto, linguagem, quanto à perspectiva teórica de Althusser.
na perspectiva dos países, que veem as ações terroristas /~ A grande contribuição para sua consolidação no
como estratégia de se contrapor às retaliações do governo 1 rasil parte de Eni P. Orlandi. "A AD se instih1cionalizou )
americano, eles são o bem que combate o mal, representado ' nquanto disciplina, como paiie dos cunículos de graduação
pelo "imperialismo norte-americano". Logo, o sentido de pós-graduação, representando organismos de pesquisas
bem ou mal é produzido em função da perspec!~co o que garantiu a estabilidade institucional "(ORLANDI,
2007,p.85). Ainda, segundo a referida autora, (op. cit, p.81),
ideológicã de ca da enunciante.
Esse jogo discursivo se ancora nas relações sócio-
econôrnicas contemporâneas de busca de controle dos
' Quare nta anos antes de os teóricos francese s co meça rem a questionar o estruturali smo " Os althusserianos criti cava m a validade elas posições do PCF que sustenta va n lese do
sau ss uriano, o russo Michail Bakhtin, na então União Soviética, jú publicava Marxismo 111nrxismo humani sta. Os intcleclu ais li gados a Garaudy cri1i cava 111 o afn starn cnto que os
e lilosofia da lin guagem, questi onando Sai1ss ure e desenvolvendo uma teoria marxi sta de 1dlhu sscrian os rea li zavam ern rela ção à prá tica co ncreta , encerrando as teses nrnrxislas
d ·111ro de urn tcorici srno anti-humani sta.
linguage1n .
30 Análise do Discurso: Fundamentos & Práticas 31
j
32 Análise do Discurso:
Fundamentos & Práticas
33
psicofisiológico de sua produção, mas essas pos1çoes? Para responder a essa pergunta teremos de
pelo fenômeno social da interação verbal , desenvolver, ainda que sumariamente, o conceito de ideologia.
realizada através da enunciação .[ ... ] As
leis ela evolução linguística não são leis
ela psicologia individual, mas também não Quanto à ideologia
podem ser divorciadas da atividade dos
falantes. As leis da evolução linguística
são essencialmente leis sociológicas. Reiteradas vezes encontramos, em livros que tratam desse
tema, uma adve1tência a respeito das mais diversas possibilidades
de entendimento e utilização do te11110. Michael Lõwy apud
Consideramos importante também acrescei-, aqui,
Konder (2002, p. 9) c01rnbora essa afinnação quando diz que,
uma interlocução com Lukács, ( 197 6), para quem a língua
medeia tanto a troca orgânica da sociedade com a natureza,
existem poucos conceitos na história
como as relações dos homens entre si e se renova, na vida
da ciência social moderna que sejam
cotidiana, guiada pelas mais diversas necessidades reais que
tão enigmáticos e polissêmicos como
emergem nessa última. Diz Lukács (op. cit, p.80), esse de ideologia. Ao longo dos últimos
dois séculos ele se tornou objeto de
A língua é um complexo em si, [ ...] que acumulação incrível de ambigüidacles,
acolhe todas as manifestações ela viela paradoxos, arbitrariedades, contra-
humana e dá a elas uma figura capaz ele sensos e equívocos.
34 Análise do Discurso: Fundamentos & Práticas 35
Não é nossa intenção, aqui, mergulhar nesse emaranhado trabalho revela, como sua condição sine qua 1zo11, não apenas
de sentidos e controvérsias. Trataremos apenas da perspectiva a reprodução de sua "qualificação", mas também a reprodução
de ideologia à qual nos :filiamos sem tecer comentários sobre de sua submissão à ideologia dominante ou da prática dessa
as demais concepções. No máximo, algumas questões pontuais ideologia, pois é nas fomrns e sob as formas de sujeição
sobre a utilização desse conceito dentro da AD e os principais ideológica que se assegura a reprodução da qualificação da
pontos de permanente tensionamento. fôrça de trabalho. Isso equivale a reconhecer "a presença de
Criado pelo filósofo Destrutt de Tracy, em 1801, (para urna nova realidade: a ideologia." Althusser (1987, p.85)
designar a análise das sensações e das ideias) na obra E!ements Para explicar o funcionamento dessa "nova realidade",
de idéologie, o termo ideologia nasce como sinônimo da Althusser (Idem, p.85) formula três teses. Primeira, "A ideologia
atividade científica e tendo por função analisar a facu ldade é uma 'representação' da relação ima inária dos indivíduos
de pensar, devendo constituir-se o fundamento de todas as com s~011aições de existência.". Essa tese acé~tua
ciências. A partir ele então, o termo tem sido abordado sob o caráter imaginário da ideologia, como podemos constatar a
variadas nuances e diferentes perspectivas teóricas. partir da afirmação de Althusser (op.cit. p.88): "Toda ideologia
Segundo VAISMAN (1989, p.17), representa, em sua deformação necessariamente imaginária, não
as relações de produção existentes [... ] mas sobretudo a relação
embora em algumas abordagens o termo (imaginária) dos indivíduos com as relaçõe_s de produção e
ideologia tenha sido trntado a partir de demais relações daí derivadas". ·. . .,;. ~ l ' '
uma fundamentação ontológica, n grande Vale ressaltar q - --imaginário , sentido supracitado,
maimia dos trabalhos sobre o assunto - dos não se refere a irreal, mas a um conjunto de imagens, ou seja,
mais consistentes e densos teoricamente o modo através d ual os ho..Q1ens cJi 111 formas simbo icas
até os mais débeis exemplares da flexão de~entaçã9 da~laçã~-;om a realicia e concreta
política - tem como denominador crnnutn - as coisas, o bem e o mal, o justo e o injusto, o certo e o )
o fato de tornar a questão ideológica a ~ --
errado, os bo~ os mauscosh.lm ~s etc. Para explicar porque
)
partir do ptisma gnoseológico. a representação dos indivíduos "de sua relação individual )
co m as relações sociais que governam suas condições de
Ou seja, segundo a autora, o tratamento do tema existência" é necessariamente imaginária e qual a natureza
tem estabelecido um vínculo estreito com a problemática desse imaginário, Althusser (idem) formula sua segunda
do conhecimento critério gnoseológico. A seguir, traremos lese: ~o_gLa tenú1ma existência material' . Ou seja, as
alguns teóricos que tratam a questão da ideologia, a partir representações imaginárias não têm uliiãeXistência espiritual, ...
de perspectivas diferentes - Althusser (perspectivas mas material, concretizada nos aparelhos ideológicos do
gnoseológica) e Lukács (perpectiva ontológica). Estado (reli ioso jurídico, escolar, familiar etc) e em suas
Em sua obra Ideologia e aparelhos ideológicos de práticas. Sobre a refé"ilda te se, oãl.itOC-(ibidem. p. 90), nos
Estado, Althusser afirma que a reprodução da força ele l'ornece a seguinte explicação:
36 Análise do Discurso:
ou na Justiça, etc. Esta crença provérn ser su·~n ~feito de sujeição ã ldeOTõgíã:Na perspectiva
[... ]elas idéias do dito indivíduo enquanto das teses altlmsserianas, é, ríols, sob a forma de interpelação do
sujeito possuidor de uma consciência indivíduo, como sujeito ideológico, que a instância ideológica
na qual estão as idéias de sua crença. A
contribui para a reprodução das relações sociais.
partir disso, [... ]o indivíduo em questão
Na abordagem Lukácsiana, o fenômeno da ideologia
se conduz de tal ou qual maneira, adota
é analisado sob o fundamento ontológico-prático. Segundo
tal ou qual comportamento prático, e o
que é mais, participa ele certas práticas
Vaisman (op.cit.18)
regulamentadas que são as do aparelho
falar de ideologia em termos ontológico-
ideológico do qual 'dependem'.
práti cos significa analisar esse
fenômeno essencialmente pela função
Ou seja, a ideologia existente em um aparelho id~ológico social que desempenha, ou seja,
prescreve práticas, reguladoras de rituais materiais que: ~1a enquanto veículo de conscientização
perspectiva a1thusseriana, passam a existir nos atos (rnatenms) e prévia-ideação da prática social dos
de um sujeito. Por exemplo: se o individuo crê em Deus ele homens. (Grifo nosso).
cumpre os rituais prescritos pela religião; se ele crê n~ justiça
ele se submete, sem discussão, às regras do direito, etc. E a partir Essa concepçã9_ de ideologia apóia-se na noção
desse entendimento que Althusser extTai a noção de sujeito e de h~m como um ser prático que reage às demandas
formula sua terceira tese, considerada or ele, central: (op. cit.) vos!_?s pela realidade objetiva, um ser que dá respostas a
~eologia inter~cla os i~~i vídL;os c~q;~ant.Q_Sujeit~~. As_si1~;: necessidades determinadas. Segundo LUKÁCS (1978, p.5),
através o mecamsmo da mterpelaçao , a 1deologia recrnta
ou transforma indivíduos em sujeitos. Nessa perspectiva, a O homem torna-se um ser que dá
função da ideologia é não só constituir indivíduos em sujeitos, respostas, precisamente na medida em
mas também, conduzir sua auto-sujeição. que - paralelamente ao desenvolvimento
Segundo Pêcheux & Fuchs (1997, p.166), social e em proporção crescente - ele
generaliza, transformando em perguntas
isso ocorre de tal sorte que cada um é seus próprios carecimentos e suas
conduzido, sem se dar conta, e tendo a possibilidades de satisfazê-los ; e,
impressão de estar exercendo sua livre quando, em sua resposta ao carecimento
vontade, a ocupar o seu lugar em uma que a provoca, funda e enriquece a
ou outra das classes sociais antagôn icas própria atividade com tais mediações,
do modo de produção. frequentemente bem articuladas.
38 Análise do Discurso:
Fundamentos & Práticas
39
Ainda segundo Lukács (op.cit. ), a produção e reprodução "tudo que é ideológico possui um significado e remete a algo
da existência dos homens em sociedade é um processo que se dá fora de si mesmo. Em outros termos tudo que é ideológico é
a partir de posições teleológicas, que são uma especificidade do um signo . Sem signos não existe ideologia."
ser social. Ou seja, só o ser humano é capaz de pré-estabelecer O funcionamento da ideologia se dá, pois, nas relações
um fim para seus atos e antever o resultado de sua ação. Essas sociais ~ e abrange as etermhfações de classe (na
posições teleológicas recebem, de acordo com seu nível de sociedade capitalista) e os horizontes culturais dos integrantes
complexificação, a denominação de "primárias" - rquelas de l~11a formação social, urna vez que a culhtra é a condição
em que o homem transfom1a a natureza para responder às dada para consolidação e desenvolvimento da ideologia.
necessidades de sua sobrevivência (comer, proteger-se dos - A partir desse entendimento de ideologia qu e
efeitos naturais) e "secundárias" - as que orientam as ações assumimos, podemos afirmar que o processo de constihtição
dos homens entre si, induzindo-os a assumirem posições (de dos sujeitos, não ocorre da mesma forma, mas através de
mando, de subordinação, de cooperação, de contestação, de diferentes formas específicas de ideolo ia. Essas formas
adesão, de resistência etc.), frente a situações postas por urna ' pecíficas são denominadas d~ fonIJa ões _ideológicas ,
fmmação social. É das posições teleológicas secundárias nas uma das categorias centrais da Análise do Discurso que será
quais se realiza "a prévia-ideação da prática social dos homens", trabalhada nos próximos capítulos.
no sentido de influenciar outros homens a assumirem posições,
que surge a ideologia.
É oportuno também lembrar o que nos diz Bakhtin
(1981.p.35) sobre essa questão:
A APREENSÃO DO
CONHECIMENTO:
,
PROCESSUALIDADE TEORICO-
METODOLÓGICA
1 1
1
1:
A relação sujeito/objeto nas
ciências humanas
1 Muitas vezes o pesqui sador não lcm consciênc ia pl ena dessa vinculação e ac redi ta qu e
11 escolha do n1 é todo é uma opção pessoal.
44 Análise do Discurso: Fundamentos & Práticas 45
(que prioriza a ideia sobre a matéria) _ou à lógica l~!e~ia}_is'ta Todavia não é suficiente afim1ar que o
(que_prioriza a matéria sobre a ideia) de abordagem do real. mundo dos homens é uma síntese de
,•,
Cada--Ürna (!ess as vertentes condL1zirá a pesquisa para a ideia e matéria. Pois isso pode levar ao
necessidade de procedimentos que respondam às exigências equívoco de cancelar a prioridade da
do pensamento adotado. matéria sobre a ideia, em dois momentos
No caso particular da Análise do Discurso francesa, fundamentais. O primeiro fato é que a
peucheutiana, sua filiação ao materialismo histórico-dialético matéria é anterior à ideia; que a natureza
deve levar seus pesquisadores a buscarem o discurso em
---· ·- -
existia antes de os homens surgirem;
sua processualidade histórica. Isto significa que o analista ~e a ideia é um desenvolvimento
não pode se restringir apenas à materialidade empírica do tardio da matéria. O segundo é que,
em se tratando ela reprodução dos
discurso e nem tomar ideias abstratas que circulam nas
homens , as determinações materiais
sociabilidades, mas tem que tratar os discursos como prática
(que são fundadas prioritariamente pelo
ele sujeitos, no seu fazer histórico-discursivo, buscando a
desenvolvimento das forças produtivas)
posição do sujeito discursivo, pois,_para esse método , constituem o momento predominante das
ideias. (LESSA E TONET, 2008, p.44) .
o mundo cios homens nem é pura
ideia nem só matéria, mas sim uma
Essas colocações ele Lcssa e Tonet se contrapõem à
síntese de ideia e matéria que apenas
acusação, sempre presente, ele que o materialismo histórico-
poderia existir a partir da transformação
da realidade (portanto , é matéria)
conforme um proj e to previamente
__
dialético não dá importância devida ao papel cio sujeito cm
sua teoria. Como vamos discutir mais adiante , Marx confere
icleado na consciência (portanto, possui à.._subietiv.i.dacle uma ênfase que faz com que essa categoria
um momento ideal). (LESSA e TONET, se.' a rqponsável pela possi bilidade de mudança da realidade.
2008, p.43 ).
e a história do povo. Essa é a síntese da materialidade da são essas características que fazem do corpo orgânico um ser
subjetividade que só pode pensar tendo um corpo e que não humano. Finalmente, demarca o tempo histórico e o lugar de
pensa o que quer porque está submetida às determinações nascimento, que vêm incorporar-se ao corpo matéria, ao sujeito
da materialidade social, mas que é capaz de criar outras de uma fami lia e agora ao sujeito de uma sociabilidade específica:
materialidades, como nos prova esse belíssimo poema ao
fazer a vincu1acão sem el iminação das características de meu corpo nascido numa po1ia-e-janela dos Prazeres
' '
cada uma, entre a materialidade corpórea, ao lado da padaria
sob o signo de Virgo
Meu corpo de 1.70 é meu tamanho no mundo sob as balas do 24 / BC
Meu corpo feito de água na revolução de 30
E cinza
Uma porta e janela e não uma casa com eira e beira,
e as determinações histórico-sociais que prendem esse corpo tão comum no Maranhão dos anos trinta, destinada aos
a uma familia, uma ascendência com sua historicidade: abastados, mas uma casa de porta de rua, de uma família
que está submetida às balas provenientes do quartel , sempre
mas sobretudo meu submisso aos poderes maiores da ditadura Vargas.
corpo Essas são a lgumas das variáveis que se tem de levar
nordestino em conta, quando se pretende compreender o lugar do sujeito
do discurso e dos efeitos discursivos da sua práxis.
mais que isso Segundo a onto logia de Marx, o ser social tem corno \ i.- -
maranhense pr~ssualidadc de sua reprodução a criação do novo, isto ~~-
é, a_ marca elo sujeito humano é criar o novo, a partir do já \
mais que isso constituído.
sanluisense Nesse sentido, para Marx, cada ato do sujeito
indiv idual 9 , que é o único que tem possibilidade do pôr
mais que isso tcleológico 1º, de pressupor, necessariamente, uma avaliação -\ r
ferreirense ª
consciente obr~ objetividade, que não significa eficúci a
newtoniense
alzirense ''S ujeito indi vi dua l dete rm inado pelns re lações de produçfio de urnn dada rea lidnd e e
submetido ús pr<ix is ideo lógica s de sua hi storicid ade , e ao seu in co nsc iente .
'ºA capac idade de impri mi r uma marca na realidade através de prévias-ideações, que
O próprio poeta aponta, com o uso da adversativa, o que se ma nifestam a pa rtir da necess idade de agir sobre a objetividade, isto é, pensa r co m o
é mais importante na definição do corpo (mas sobretudo), pois obj etivo de agir. Por exemplo: Planejar uma mesa a ntes de fazê-la.
-\ '
Fundamentos & Práticas 51
Aná lise do Discurso:
50
É dessa realidade que tratam os analistas do discl:~·so, é a produção do novo. Tanto há transformação quando de
aquela füta-âe discurso, isto é, uma subj etividade objetivada, uma árvore se produz uma casa, como quando se constroem
como a:finua Pêcheux (1988). discursos que contribuem para a mudança da subjetividade,
Enfim, podemos sintetizar dizendo que o objeto de que passará a agir sobre a realidade posta de forma diferente.
estudo da Análise do Discurso, se constitui nesses processos Embora dê ênfase à subjetividade, enquanto
tão bem explicitados pela poesia. Algo que parte de um transformadora, para o materialismo histórico-dialético, os
pensamento prévio de um sujeito (hist~rico-soc.ial, ~ue sofre critérios de verdade são sem pre objetivos, pois a subjetividade
todas as determinações que essa condição lhe impoe) e que tem o poder de mudar a realidade, de captar a realidade,
se materializa em um discurso. E como di z o poeta - "Assim mas ela depende da lógica dessa mesma realidade, para
a mesma dita realidade existe, simplesmente existe" . conseguir realizar essas duas atividades. Não há nenhuma
Outra questão fundamental, tanto para o autonomia plena da subjetividade, que é determinada pelas
materialismo histórico-dialético corno para a Análise relações sociais e que escolhe as alternativas apresentadas
do Discurso, se refere à capacidade que só o ser social pelo seu tempo histórico. Por mais _iq_d ividuais que pareçam
possui ele imprimir uma finalidade a sua práxis . Estamos ~ escollias do suj eito elas são sociais. Embora o sujeito,
chamando atenção para o pôr teleológico de qualqu er na maioria das vezes, tenl~ ilusª-o de autonomia, em
prática humana, inclusive a discursiva. f:i.?Ciedades divididas em classes, todas as escolhas, das mais
Nesse sentido é que precisamos fazer um resgate na pessoais - como a quem se pode amar, até as econômicas, à
11 forma de exp !orar o traba lbado r - são determinações sociais.
teoria do discurso do ser consciente •
No entanto, nenhuma realidade oferece apenas urna
O po nto ele partida de Ma r x são all.ernativq, e é nesse espaço de escolha que a subjetividade
bornens dotados de consciência. Não e ~~a capacidade de produzir o novo cm todas as práticas
há atividade humana se m consciência, h ~~ inclusive a discursiva. Entende-se, pois, a afirmação
sem subjetividade. Não há ato hum ano da concepção rnarxiana de que_a vicia individual e a genérica
sem consciência. [ .. .] o homem não é não co_nstituem entidades autônomas que se relacionam,
meramente um ser racional ou um ser mas, ao contrário, são partes de um todo impossível de ser
dotado de alm a ou um ser a quem se di ssociado . Na verdade, não há individl!_ajidade. sem gênero
atribui algum princípio, mas o homem é llurn_.9J10, como não há gcncriaãCfe s em indivíduos capazes
atividade (CI-IASIN, 1999, p. l 08/1 1O). dt.: se_r.econhecerem como tais, e por isso conscientes de seu
l'i-;la.I:::.l10-mundo 12 • Nas palavras ele Marx,
A atividade (prática humana) é transformadora , já
que a lógica de reprodução do ser social, corno já foi dito, 1 ' l\s lc tema se r{i desenvolvido mai s adiant e. No cntanlo, é important e se destacar, desde já,
'!"'~ cssc contínuo é qu e marca a cli ícrcnça entre uma ind ividua lidade que não consegu irá. se
ili' lucar do cotidiano, de outra que scró capa?.., por c.xcmr lo, de produzir uma obra prima.
N ilo estamos focaliz;1nclo ainda o papel do in consciente na íornrnçiio da indi vidua lidade,
p11i s que remos aqui dar ê nfa se ao papel da co nsciên cia nas práticas humanas.
11 Que r-:flcte, põe finali<la<l e nas açõ-:s.
Análise do Discurso: Fundamentos & Práticas 55
54
Capítulo 3
DISPOSITIVOS TEÓRICO-
ANALÍTICOS
Discurso e relações sociais
" O homem age cm uma
determinada situação concreta da
realidade e tem e deve ter como
escopo elo seu agir a mudança
clesta."(LUKÁCS , 1981 ,p. IV)
17
CfCa va lcantc (2007).
66 Análise do Discurso: Fundamentos & Práticas 67
Sendo, como se vê, resultado e possibilidade de relações transformação e/ou estabilização dessa mesma realidade em
sociais, o discurso, deduz-se, é essencialmente ideológico, visto que é produzido.
que o sujeito que o produz o faz de rnn lugar social, de uma Para a AD, não há um sentido dado, único, verdadeiro,
posição ideológica, como explicitado no capítulo anterior. mas sentidos vários que estão além das evidências. Procura-se
Ratificamos, então, que concebemos o discurso como compreender como se constituem os processos de produção
ideológico, pois sua produção requer um sujeito socialmente de sentidos que se fazem presentes no texto e dão lugar,
situado; e é este lugar que define uma posição ideológica e ao analista do discurso, a investigar como tal texto produz
aponta como o sujeito participa da produção de uma sociedade. sentidos. Isso mostra que os dizeres não podem ser vistos
A circularidade ele discursos na sociedade como 111ensagens que são transmitidas e compreendidas em
propicia, pois, a manutenção ou alteração de regras sociais sua transparência, mas em seus efeitos de sentido, produzidos
determinadoras das relações de dominação, que somente por sujeitos que realizam suas escolhas, em determinadas
podem ser detectadas no empreendimento da descoberta situações, que se mostram no modo como dizem.
ele sentidos silenciados ou obscurecidos no dizer. É a partir Mas, para que possamos entender como esta categoria
desse entendimento que, neste capítulo, serão trabalhadas as - Condições de Produção - é fundamental na análise de um
categorias da Análise do Discurso, tais como: condições de discurso, precisamos concebê-la em seus dois sentidos: amplo
produção, formações discursivas, interdiscurso, intradiscurso, e estrito. O primeiro, expressa as relações de produção, com
pré-construído, memória, esquecimento, silenciamento, etc sua carga sócio-histórico-ideológica. O segundo, diz respeito
que dão sustentação para que sentidos latentes venham à às condições imediatas que engendram a sua formulação.
tona, por se tratar de uma teoria que trabalha as diferenças Vejamos a notícia veiculada na Revista ISTO É,
e contradições que, em permanente confronto no âmbito de sessão Semana, no. 2045, ano 32, 21 de janeiro de 2009:
uma conjuntura sócio-histórica, SLtbjazern ao discurso.
Ano de 2009, com fottes indícios - divulgados pela na verdade, o desemprego recebeu cartão vermelho
mídia - de que a ministra Dilma Rousseff é a escolhida pelo apenas para duas pessoas, de acordo com as conveniências
Presidente Lula para candidatar-se à Presidência da República, políticas, o que confirma o modelo de sociedade explicitado
como sua possível substituta. Este é um enfoque constante na no parágrafo anterior.
imprensa, que divulga até a trnnsforrnação física e de postura A O prefeito de BH, Márcio Lacerda (PSB),
pública da provável candidata. Daí a notícia poder ser lida e deu cartão vermelho para o desemprego segue-se Pelo
interpretada pelos leitores, produzindo efeito de sentido de menos o dos amigos. Pelo menos, restringe a ação de corte
campanha eleitoral, pois a própria revista vem sendo um forte no desemprego apontando para as condições materiais
veículo de divulgação do processo de preparação da candidatura. especificas em que o discurso foi produzido: numa sociedade
Essas são algumas condições imediatas: Brasil, ano que antecede constituída de contradições ideológicas que afetam os
eleições para a Presidência da República, a escolha- sutilmente sujeitos e os sentidos em suas posições políticas.
insinuada - do Presidente, a atuação da imprensa, que divulga
a questão, tanto positiva, quanto negativamente. Nessas situações, os sujeitos do discurso
As condições amplas atuam no processo de interagem na constituição das relações
constihüção de sentidos trazendo à memória a formação de discursivas, trazendo elementos que
derivam da história, da sociedade e de
uma sociedade capitalista subdesenvolvida que se fez, e ainda
suas contradições ideológicas, para a
pennanece, com suas instituições impregnadas pelo abuso
produção dos efeitos de sentido que se
de poder, favoritismos , nepotismos, concretizados no uso mostram na materialidade discursiva
de empregos públicos como moeda de troca entre políticos. e se articulam teoricamente com o
É a língua fazendo sentindo, como trabalho simbólico, pelo conceito de formação discursiva. É
movimento do discurso nas relações sociais. pela inscrição da língua na história que
Em O prefeito de BH, Márcio Lacerda (PSB), deu o sentido acontece, como relação do
cartão vermelho para o desemprego, deu cartão vermelho sujeito - perpassado pela língua - com
configura-se como outro elemento que introduz o discurso a história (FLORENCIO, 2007 p. 38).
do futebol, com seu sentido de retirada do jogador do campo.
A cor vermelha traz um sentido de exclusão, produzindo, Desse modo, vê-se, as relações sociais e a luta de
na relação com desemprego, um efeito de sentido de fim ~lasses são as condições materiais da produção do discurso, .?
do desemprego, mas subvertido pela ironia 18, visto que, compreendendo sujeito e situação, em suas relações sociais,
abrangentes da culhtra, economia, política, de um determinado
momento histórico e de momentos outros , resgatados pela
" Na ironia o enunciador se responsabiliza pelo linguístico, mas não pelo sentido, pois el e memória sócio-histórica e ideológica, ratificando, assim, o
(J
sub vcrlc sua própria fala. (cf. Main gucncau, 1997) caráter histórico e ideológico do discurso. !'
) 1
70 Análise do Discurso:
r Fundamentos & Práticas 71
Esse complexo, em sua contraditoriedade, constitui como organização de posições políticas e ideológicas,
a sociedade, em dado momento histórico, objeto e lugar constituem suportes indispensáveis para as formações
da práxis humana. Assim, a ideologia tem em si a função discursivas, conceituadas por Pêcheux (1988, p. 160), corno
de estabelecer um mecanismo estruturante do processo ele
significação que acontece nas relações sociais, e é no discurso aquilo que numa formação ideológica
que as fonnações ideológicas se materializam. dada, isto é, a partir de uma posição dada,
Assim, ao analisar um discurso, o analista eleve numa conjuntura dada, determinada pelo
recorrer, dentre ou.tras categorias, à identificação das estado de luta de classes, determina o
fonnações ideológicas que representam uma estrutura sócio- que pode e deve ser dito (articulado sob
ideológica de uma formação social. Elas - as formações a forma de uma arenga , de um se1111ão,
ideológicas - dão sustentação ao dizer, produzindo sentidos de um panfleto, de urna expos ição, de
que discursivamente procuram camuflar conflitos e deixar um programa, ele).
passar a idéia de ausência de contradições ele classes.
A ilusão de urna transparência de sentidos é que Os sentidos se produzem, pois, nas formações
conduz ao efeito ideológico e às posições assumidas pelo discursivas representativas das formações ideológicas.
sujeito do discurso, como responsável pelo sentido do dizer. Retornando à sequ ência discursiva:
É o complexo de valores, atitudes e representações históricas "VAI QUE ELAVIRAPRESIDENTE"
das diferentes classes que deixa entrever que se pode falar
O prefeito de BH, I\·1árci o L3.cerct3. (PSB ), deu rartão
das mesmas coisas, uti li zanclo a mesma linguagem, a partir
de diferentes lugares, ou seja, atribuindo-lhes diferentes vermelho paia o desemprego. Pelo menos o dos arr.ri.gos
sentidos. Para PÊCHEUX (1988 , p.160), '\ Nu.ma só c3.netada, recontratou. Igor Rou.sseff e Cláudio
Gale3!10, itm.ão e ex-rm.rido da ministra Dilma Rousseff,
As palavras, expressões proposições, que tinharn sido e:xonetados com outros 250 füncionários,
etc., mudam de sentido segundo as
afl.stados por Fernanck1 Pimet1tal (PT) Boa p:ute dos
posições sustentadas por aqueles que
as empregam, o que quer dizer que elas outros 248 não teve a mesma smte.
adquirem seu sentido em referência a
essas pos ições, isto é, em referência às Podemos constatar que este é um discurso próprio da
formações ideológicas, [ ... ] nas quais formação social neo-liberal, em seu caráter confuso e polêmico
essas posições se inscrevem. de defesa da liberdade, visto que, no campo político - dessa
formação - , a liberdade acontece numa visão individualista de
Ou seja, o sentido se configura nas posições (formações benesses particulares, em decorrência das relações de poder
ideo lógicas) em que se inscrevem. As formações ideológicas, solidificadas. Essa fornrnção social está, pois, representada pela
74 Análise do Discurso: Fundamentos & Práticas 75
formação ideológica do capital, principalmente em sociedades a Márcio Lacerda, mas aponta para a imprensa que já começa
subdesenvolvidas, em que o dominante pode agir conforme suas a ser mais cuidadosa em suas críticas e denúncias que possam
questões pessoais, corno no caso acima, citado pela imprensa. se direcionar a alguém, com a possibilidade de deter o poder,
A imprensa denuncia e nos traz um não-dito: o prefeito ocupando o mais alto cargo político do País.
que reconduz os funcionários é do PSB: "O prefeito de BH, Essas são pistas que apontam para um funcionamento
Márcio Lacerda (PSB)"; e o que anteriormente exonerou os do discurso midiático, em suas relações tendenciosas com o
funcionários , do PT: "tinham sido exonerados com outros discurso político eleitoral de partidarismos e disputas: ambos
250 funcionários, afastados por Fernando Pimental (PT)" se direcionam para a sedimentação de sentidos unívocos, no
- ambos são partidos ligados ao governo. Ou seja, denuncia intento de estabilizá-los corno "verdades".
um favoritismo - do PSB - em relação a pessoas ligadas ao Desse modo, lembramos PÊCI-IEUX (1997a, p.77),
alto escalão do governo federal, mas, ao mesmo tempo abre a ao se referir ao discurso proferido por um político:
possibilidade de provocar efeitos de sentido ético em relação
ao PT. No entanto, não cita quem fez a contratação inicial. O que diz ou que anuncia, promete ou
Como se pode ver, a imprensa oscila entre posições oriundas de denuncia, não tem o mesmo estatuto
.1
diferentes formações ideológicas e seu discurso (da imprensa), conforme o lugar que e le ocupa; a
consequentemente, aponta para difrrentes fmmações discursivas mesma declaração pode ser uma arma
temível ou uma comédia ridícula
que deixam vir à tona o lugar do dominado, procurando produzir
segundo a posição do orador e do que
um sentido de denúncia, mas escapa, na pista discursiva PT, ao
ele representa, em relação ao que diz.
apontar para uma possível posição ética do dominante (também
ligado ao governo) no ato de exoneração.
A perspectiva de Pêchcux na Análise do Discurso diz
Assim, deixa ele dizer quem contrntou primeiro, em
respeito à questão da existência da luta de classes, pois, para
que circunstâncias o PT exonerou, tentando conduzir o leitor
Pêcheux, não há como teorizar sobre algo, sem uma posição
a um possível sentido de ética para um representante do PT. ideológica. Ou seja, sem se posicionar perante uma sociedade
Melhor dizendo, a imprensa, reconhecida pela sociedade como de classes, pelo fato ele não admitir uma separação entre
veículo neutro de infonnações, oscila entre diferentes formações t~2Eia e política, pois a AD se configura corno uma política de
ideológicas representadas pelas formações discursivas que leitura, uma reflexão teórica na a1iiculação entre o linguístico,
propiciam o discurso e permitem a divisão do sujeito: acusa, o histórico e o social.
mas atenua as posições políticas, visto que ela também faz Jntrocluzida por Pêchcux na Análise do Discurso, as
uso de uma medida preventiva: "VAI QUE ELA VIRA formaçÔes discursivas são concebidas como provenientes ele
PRESIDENTE". E ela (Dilma Rousseff) é elo PT. Desse uma formação ideológica que lhes dá supo1ie, corno lugar ele
modo, se ELA VIRA PRESIDENTE, não diz respeito apenas articulação entre língua e discurso. Cada formação ideológica
76 Análise do Discurso: Fundamentos & Práticas 77
traz em si, como um de seus elementos de composição, uma ou Podemos constatar, ainda, uma outra vari ação de
várias formações discursivas, como lugar em que as formações sentido para a expressão cartão vermelho, con sagrada no
ideológicas realizam um traball10 de estabelecimento de sentidos futebol, mas aqui utilizada no discurso político, rcferindo-
- aceitáveis pela formação dominante, ou não. Desse modo, se, ironicamente - pelo menos o dos amigos e boa parte
pode-se falar das mesmas coisas, _il tril;mindo-lhes di ferent~s dos outros 248 não teve a mesma sorte - ao pretenso fim
sentidos, porque as palavras mudam de sentido ao passai~ de do desemprego na prefeitura da cidade de Belo Horizonte,
uma fonnação discursiva para outra. desinstalando-se da formação discurs iva do futebol e sendo
Se a formação discursiva estabelece o que pode e deve in troduzida no discurso jornalí stico sobre desmandos
ser dito, é porque algo existe - em conflito com esta afirmação políticos. Percebe-se, na crítica, a formação discursiva que
- que não pode e (ou) não deve ser dito e que, vindo de outro
provém de um lugar que questiona as relações políticas de
lugar, de outras formações discursivas, ah se imiscui, cm
apadrinhamento - recontratou Igor Rousseff e Cláudio
diferentes efeitos de sentidos, muitas vezes rejeitados, mas
Galeano, irmão e ex-marido da ministra Dilma Rousseff,
que se evidenciam, sob a forma de discursos outros. Assim,
fa lando sobre a ~m1ção ideológica do dominante. Para
a formação discursiva assume caráter plural, com fronteiras
qu e se fale elas mesmas coisas, em diferentes lugares, isto
tênues e instáveis , sempre passíveis ele deslocamentos
é, atribuindo-lhes sentidos outros, acionam-se valores,
provocados por contradições ideológicas.
atitudes, representações históricas das diferentes classes. E
Na sequência di scursiva em questão,
mais, quando se co loca urna ocorrência corno sorte, retira-
"VAI QUE ELA VIRA PRESIDENTE" se a responsabilidade de qualquer atitude. A sorte não tem
autoria, 2 1 é destino, predestinação, fortuna, ventura. Nesse
O prefeito de BH, Márcio Lacerda (PSB), deu cartão caso, a recontratação não é privil égio para uns em detrimento
vermelho para o desemprego. Pelo menos o dos dos outros 248, não se configura nepotismo, não se direciona
amigos. N urna só canetada, recontratou lgor Rousseff e .. , . a "prevenir" um reconhecimento do favor, se a Ministra
Cláudio Galeano, irmão e ex-marido da ministra Dilma :;.---- '\~irar" Pres idente, ou mesmo, no momento presente, em
~ou~se~f, _que tinham sido exonerados c~m outros lSO J que, como Ministra , já detém um forte poder.
func10nanos, afastados por Fernando Pimental CP:JI No entanto, essa heterogeneidade discursiva 22 (que
Boa paiie dos outros 248 não teve a m~sma sorte.". ) se mostra na sequência discursiva em ques tão , pelo tom de
denúncia e ao mesmo tempo pela tentativa de isenção da eixos: a primeira pensada num eixo ve1iical, como lugar do já-
1
( , responsabilidade), acontece nos constantes pr9cessos de d ito anteriormente e esquecido. O sujeüo, então, empreende
reprodução e transformação e se marca pela identidade e_rela um movimento de retorno e identificação, escolhendo o
)
divisão, sem abandonar seu lugar de constituição ele s~nttclos. que é relevante para a possibilidade de produção de novos
Ainda que determinado por uma formação sentidos para o seu discurso. A segunda - o intradiscurso -
discursiva que determina o seu dizer, o sujeito enfrenta como eixo horizontal em que os discursos são produzidos,
contradições ideológicas que se fazem presentes e desfazem em determinadas condições, em dado momento, no propósito
a homogeneidade, expressando a divisão, própria de urna de entendimento do que está sendo dito. Entretanto, isso
complexidade social, pelo compartilhamento de seu espaço somente acontece numa relação entre os eixos, sempre
discursivo com outros sujeitos. numa remissão ao que já foi dito anteriormente, em outras
condições de produção. Desse modo, não se pode pensar
em efetivação de discursos, em instituição de sentidos sem
Interdiscurso e Intradiscurso a relação entre estes dois eixos.
Os discursos formulados (interdiscurso) que
A relaçãQ_entTe o já-dilo e o que se diz, i'nelhor dizendo, permitem o dizer (intracliscurso) constituem o lugar elo já-
entre sentidos anteriom1ente constituídos e uma formulação atual dito, do pré-construído, em que o sujeito se identifica com
é 0 que a AD vai denominar de lnterdiscurso e Intraclisc~1r~o, as formações discursivas que sustentarão a produção do
respectivamente. O primeiro, discursos já constituídos que entram seu dizer, sempre num movimento de ressignificação. Para
na produção discmsiva ressignificando o já-dito antes, noutro COURTINE e MARANDIN (1981, p.58),
lugar, como espaço de confrontos ideológicos das relações de
dominação/subordinação. Dessa forma, está intrnduzida na AD O intcrdiscurso consiste cm um processo
a noção de interdiscurso, como o que é falado antes, em outrn de reconfiguração incessante no qual urna
lugar e como o que possibilita dizeres outrns, convoc~ldos na formação discursiva é conduzida [ ... ] a
história, ideologicamente marcados, que vão afetar os discursos inc01vorar elementos pré-construídos
produzidos pelo sujeito, em dada condição de produção. produzidos no exterior dela própria; a
O seoundo (o intradiscurso) é compreendido como o produzir sua redefinição e seu retorno,
b f' a suscitar igualmente a lembrança de
que está sendo dito em situação e momento dados, como LO
do discurso, corno füncionamento discursivo, atravessado seus próprios elementos, a organizar
sua repetição, mas também a provocztr
pelo intercliscurso, por isso indissociados.
eventualmente seu apagamento, o
Essas categorias - intercliscurso e intradiscurso - são
esquecimento ou mesmo a denegação.
pensadas por Courtine (1984) num entrelaçamento entre dois
Análise do Discurso: Fundamentos & Práticas 81
80
E cm 2006 (p.69), Courtine afirma que "todo já-dito, como um objeto ideo lógico que atravessa o sujeito
discurso concreto produzido por um sujeito no interior num proce ~§.2 e assujcitmnento, mas dando lugar, também,
de uma formação discursiva está, portanto, dependente ~ransgress~o~pqrque, ao rn~s~1o-tempo em qu e este sujeito
do intcrdiscurso que lhe é fornecido pelos elementos pré- reproduz o já-dito, identificando-se com uma determinada
construídos " 23 . formação discursiva, ele o faz de um novo lugar, produz
O discurso da imprensa, aqui cm questão, traz em diferentes sentidos para o pré-construído que retorna , mas
sua formulação o discurso do futebol deu cartão vermelho, se faz novo.
pela via de um pré- _s~n..§.!!;~J do umjá-di!.9 que penetra o s~u_ ·' ~ Assim, o sujeito, ao r to m ai: a di sc ursos pertencentes
discurso p ~.-a sL~steotação de seu di zer. Canetada, expressao A tra(s)J:o_rmação(ões) cliscursiva(s), sempre realiza
reconhecida como própria ao poder de decisão de pessoas que escolhas relevantes ao seu discurso, ao tempo em que se
ocupa~ cargos de comando, no abuso de autoridade. E, como marca pela alteridade, pela historicidade, apesar da constante
2
já foi visto, além desses (elo futebol, do abuso de poder) \ no ~ busca pela unicidade. A presença do outro no entrelaçamento
seu discurso de denúncia , traz, também, o discurso atenuai1te de vários di scursos (interdiscurso) provindos de outro lugar
para atitudes de pessoas ligadas ao governo, ao tentar trazer é que abre possibilidades p ara novos efeitos de sentido que
um efeito de sentido ao que poderia ser uma atitude ética do se concretizam no di scurso.
prefeito do PT afastados por Fernando Pimental_ (~T). A esse lugar anterior, onde estão os já-ditos, prontos
Mas a contradição se instaura quando se sabe que a M1mstra , a serem convocados, a AD denomina memória discursiva,
autoridade que motiva a ação "preventiva" - vai que ela vira como um lugar de retorno a outros discursos, não como uma
presidente-, é membro do partido dos Trabalhado~es - PT. repetição, mas corno ressignificação. Ao mes mo tempo em
Assirn, vejamos: o PT afastou pessoa s ligadas a que a ciona a memória, essa rnen!Ória sofre alterações na
um membro do PT que havi a permitido, numa gestão não
medida em gue ocorrem lactlirns, fá JEa s, ;_pagaii~1entos do
citada na notícia, que seus parentes fossem contratados, o
que não pode e ou não deve ser dito. Sentidos historicamente
que justifica o ato de recontratação como prevenção de uma
sedimentados vêm à superfície pela via do esquecimento,
possivel retaliação, em caso de a Ministra ser eleita: vai que
pelo não-dito que , embora funcionem pela interdição,
ela vira presidente. propiciam a produção de novos sentidos , num misto de
Os pré-construídos expressos por - deu cartão
memória e esquecimento, pelo mo vimento de idas e vindas
vermelho e canetada - se configuram, pois, como o sempre
entre as diferentes formações discurs ivas. Há, então, uma
oi Noção desenvolv ida por Pêchc ux ( 1988), a part ir da defini ção de Pa ul 1k nry: "o que
constante tensão entre lembrar e esquecer. Sujeitos não se
n.: 1111..!W a u1na co nstrução anterior, ex teri or". constituem sem memória, da mesma forma que discursos não
,., Estes últimos configurado s também em: " Pe lo menos o dos amigos" e "Boa parle dos
outros 248 n5o teve a mesma so rte".
se produzem sem memória e sem inconsciente.
82 Análise do Discurso:
Fundamentos & Práticas 83
Todavia, no apagamento da memória, surge para o Para Orlandi (2001, p.82), "há sempre no dizer um
sujeito a ilusão necessária de que o discurso que ele produz é não-dizer necessário. Quando se diz 'x', o não-dito 'y'
original, inicia-se com ele, sem vínculo histórico. A isso PêchetLX
permanece como uma relação de sentido que informa o
(1988, p.173) nomeia "esquecimento no. l '', da instância do
dizer de 'x'".
ideológico, do inconsciente, necessário para que se efetive a
Há, pois, um silêncio necessário que é presença,
identidade do sujeito, embora essa identidade não se fixe, pois
condição para que se realize o processo de constituição do
a memória não permite este "esquecimento", abrindo brechas
que possibilitam o surgimento de diferentes dizeres. Está aí a sentido, do sujeito e da incompletude própria da linguagem.
possibilidade de o sujeito transitar por diferentes formações Ao falar, o sujeito tem necessariamente uma relação com o
discursivas, de ser habitado por diferentes discursos, pois isto é silêncio, pois não se pode dizer tudo; se assim o fizesse, estaria
o resu1tado de um sujeito histórico que é afetado pela memória. incorrendo, no excesso do dizer, na ausência de sentido. Desse
Há, ainda, um a outra forma de esquecimento, modo, o silêncio é fundamento para que o sujeito produza
denominada por Pêcheux (1988) corno "esquecimento no. sentido e o reinstaure em cada dizer. Nas palavras de Orlandi
2". Este provoca no sujeito a i.lusão de que o seu discurso (l 993, p.71), "mais se diz, mais o silêncio se instala, mais os
é formulado com determinadas palavras, e não outras, sentidos se tomam possíveis e mais se tem ainda a dizer".
porque tais palavras são por ele (o sujeito) controladas. Portanto, o silêncio de que se trata aqui não se
Melhor dizendo, há uma ilusão de autonomia elo suj eito confunde com o ato de calar, da ausência de sentido; é a
sobre a escolha ela forma do dizer. Pêcheux (op.ciL) assim possibilidade do dizer que se imiscui no discurso e estabelece
o denomina: "'esquecimento' pelo qual todo sujeito-falante uma relação necessária com o sujeito, o que prova a
'seleciona' no interior de uma formação discursiva que o impossibilidade do não-sentido.
domina, isto é, no sistema ele enunciados, formas e sequências
Melhor dizendo, há um eterno e contínuo movimento
que nela se encontram em relação de paráfrase". Ao fazer uso
entre silêncio e sentido, porque não existe um vazio no antes
de determinadas palavras, o sujeito recorre a paráfrases que
do dizer. O que existe é o silêncio que é sentido, possibilidade
subjazem ao seu dizer, pela necessi dade ele se fazer entender,
o que confirma que o dizer não prescinde elos sentiC:os. de di zer. O sujeito passa ininterruptamente "das palavras ao
Conclui-se, pois, que em todo processo discursivo silêncio e do silêncio às palavras"(ORLANDI, op cit., 72),
os sentidos são múltiplos, instáveis, sempre apontando para porque há sempre um sentido a ser produzido . Daí poder-
a incompletude da linguagem, para sentidos que não são se falar de instabilidade e multiplicidade de sentidos, de
ditos, que poderão irromper a qualquer momento , porque incompletude da linguagem. O silêncio é, portanto, fundador
constituem o ponto de sustentação da relação entre os do sentido, tem primazia sobre o dizer.
discursos. Há uma tentativa de unidade de sentidos que se Ainda em Orlandi (1993, p. 75) vamos encontrar,
desfaz na fugacidade constitutiva da linguagem. também a noção de política do silêncio, definida
84 Análise do Discurso: Fundamentos & Práticas 85
pelo fato de que ao di zer algo apagamos Essa mesma autora (idem 75-76) nos diz ainda que
necessariamente outros sentidos
possíveis, mas indesejáveis, em uma Se diz 'X' para não (deixar) dizer 'Y',
situação discursiva dada. [... ] a política este sendo o sentido a se descartar do
do silêncio produz um recorte entre o dito. É o não dito necessaria mente
que se diz e o que não se diz, enquanto o excluído. Por aí se apagam os sentidos
silêncio fundador não estabelece nenhuma que se quer evitar, sentidos que pode1iam
divisão: ele significa em (por) si mesmo. instalar o trabalho significativo de uma
'outra' formação discursiva.
Algo é dito para que não seja dito o indesejável, o
não permitido, porcj_'ue há sentidos que, se não evitados, No entanto, o silenciamento imposto em determinadas
podem trazer à tona sentidos outros que apontam para uma situações não se sustenta, em virtude do constante movimento
formação discursiva que precisa ser excluída. Há um dizer do sujeito que, em sua dispersão constitutiva, ultrapassa os
que se faz necessário ao apagamento de possíveis sentidos limites do dizível, para produzir sentidos outros que lhe são
não convenientes e que impõem limites à presença de proibidos, mostrando, então, o movimento constitutivo entre
detenninadas fonnações discursivas. A política do silêncio as tênues fronteiras das formações discursivas.
produz sentidos necessários ao apagamento de todo um
conjunto de sentidos que não devem ou não podem ser
produzidos. . Discurso: procedimentos de análise
Outra forma de realização da política do silênc10
trabalhada por Orlandi (op.cit) é o silêncio 1oca1, que é a Após discutirmos os pressupostos que permitem
interdição, a censura. Esta forma impositiva de silêncio - elaborar um caminho para análise, vamos desenvolver as
constituída nas fronteiras de diferentes fom1ações discursivas - etapas necessárias para a análise discursiva do ponto de vista
funciona pelo impedimento de detem1inadas palavras, ou seja, metodológico.
de sentidos que, necessariamente excluídos, interditam aos Conforme demonstramos no desenvolvimento das
sujeitos a inserção em uma determinada fo1mação discursiva . categorias analíticas, o primeiro aspecto a ser abordado
Nesse sentido, acontece, portanto, um silenciamento, diz respeito ao objeto discursivo a ser analisado . Devemos
como uma política do sentido, diferentemente do silêncio precisar qual o recorte da realidade que será ponto de
fundador. O primeiro, "produz um recotie entre o que se diz e partida para nossas análises. Temos de ter o entendimento
o que não se diz, enquanto o silêncio fundador não estabelec~ de que todo discurso é o resultado de uma intervenção do
'---
nenhuma divisão: ele significa em (por) si mesmo". Orlandt sujei to_ sobre um aspecto da realidade, que objetiva, na
(idem, 75). materialidade discursiva, o ponto de vista da subjetividade;
86 Análise do Discurso: Fundamentos & Práticas 87
este, como vimos anteriormente, tem as classes sociais capitalismo, ressalta que partiu de homens e mulheres, isto é,
como determinante e sofre, através das diversas mediações ela população, para chegar à exploração realizada no sistema
ideo1ógicas recalcadas no inconsciente, condicionamentos capitalista, isto é, ao conceito de mais-valia25 .
que se revelam na materialidade discursiva. Na verdade, estamos trabalhando com os conceitos
O segundo aspecto diz respeito ao papel do de fenômeno, essência e totalidade, imprescindíveis para
funcionamento da língua para as práxis discursivas, como, a descoberta da lógica da realidade estudada. Para o
por exemplo, a metáfora e a metotJim~ que possibilitam ao materialismo histórico-dialético, naqa cll1e é humano escapa
sujeito fazer desfocai~ e c nâénsaÇôêS), estabelecendo _a<2_J1istórico, significando que não há explicação definitiva
um jogo discurs~ie fYrdbura encobrif"o que o sujeito tem e única para nenhum aspecto da vida humana, embora haja
a ilusão de não revelar. Analisando o livro sobre os sonhos ti3 õs µe essencialidade, tais como a característica do ser
ele Freud, Zizek afirma: social ~e criar o n.9v_o sempre. No entanto, dependendo
de corno se dá o fenomênico, essa característica sofre
A constituição essencial do sonho, modificação, pois, cm cada momento histórico dado "as
portanto, não é seu 'pensamento latente', formas ideológicas não se equivalem, e o efeito simulação-
mas sim esse trabalho (os mecanismos recalque que elas engendram não é homogêneo" (PÊCHEUX,
de deslocamento e condensação, a 1988, p. 77). É a categoria da totalidade que faz com que se
figuração dos contelielos ele palavras relacionem o essencial e o fcnomênico, produzindo sempre
e sílabns) que lhe confere a form:1 ele algo novo.
sonho. (ZIZEK,1996, p.298).
Essas características meto cio 1ó gicas possibilitaram
à Teoria do discurso elaborar um caminho que leva ao
Estamos ressaltando que só a partir da materialidade desvelamento discursivo. Estamos nos referindo a três
discursiva, isto é, do fenômeno é que se pode chegar ao conceitos essenciais para a realização da análise discursiva.
silenciado. Marx em A ideologia alemã (1998) ressalta que O primeiro é o dito, isto é, a materialidade discursiva
para que haja qualquer relação social é necessário que homens apresenta uma forma que pretende dizer, um conteúdo. Essa
e mulheres estejam vivos. Isto é, para que se busque explicar forma precisa ser pesquisada, pois funciona corno a porta
essas relações temos que levar em conta, em primeiro lugar, a de entrada para a elucidação de sentidos do discurso. A
realidade fenoménica, que, no caso, está dada pelas relações maneira de elaborar essa primeira fase é fazer uso do processo
efetivas entre os seres sociais, para chegar à explicação dos descritivo, nomeando as diferentes possibilidades de análise
fatores essenciais que determinam a forma de se relacionar dessa materialidade, os recursos Linguísticos empregados.
das pessoas, num determinado tempo e espaço.
Em O Capital ( 1985), esse mesmo autor, ao explicitar 25
O conceito de mais-valia se refere ao tempo ele trab alho que é apropriado pelo patrão,
a metodologia empregada para sua elaboração teórica sobre o gerando o lucro da empresa.
88 Análise do Discurso: Fundamentos & Práticas
A descrição é uma fase fundamental para a análise, embora e ntão , formação discursiva aquil o llll l'
saibamos que nem tudo o que foi descrito será efetivamente num a formação ideo lóg ica clad:1, is to l'.
empregado na explicação, na interpretação . 3 partir de um a posição numa con ju nlur :r
Concluída essa etapa, passamos para o não-dito, dada, determin ada pela luta de cL rs SL'.',
que só poderá ser apreendido através elo dito. Aqui os dete rmina o que pode ser e deve ser clil() ,
processos metafóricos, metonímicos, os lapsos, os equívocos, (Pl~C H EUX , 1988, p. 160).
constituirão chaves elas expl icações, mas sempre tendo como
pre1mssa Sintetizando, temos que a interpretação rca li zad:1
pelo analista do di scurso se dá sempre a partir de u111
que a "indiferença" da língua em relação lu gar di scursivo , e, nesse se ntido, será também arct:1d :1
à luta ele classes caracte1iza a autonomia ideo lo gicamente pela posição de classe. No entant o, o
relativa do s istema lin g üí stico e que, analista do discurso tem que buscar a objetividade qu <..:
dissirnetricamente, o fato de as classes não será possível através dos dispositivos teóricos da teori n do
sere m " indiferentes" à língua se traduz di sc urso e dos di spositivos analíticos que o objeto discurso
pelo foto de que todo processo discursivo ac iona. F inaliza ndo, ratifi ca mos o que já assinalamos: o f~1lo
se inscreve numa relação ideo lógica de 1
ele ser ideológico não isenta o conhecimento científi co d:1
cl asses (PÊCHEUX,1988, p .92). busca da explicação cio objeto.
-
PRODUÇAO DE SENTIDO E
RELAÇÕES HISTÓRICAS
Desvelando sentidos
efeito de transparência? Por que não escolher aquelas Alan Marques/Folha Imagem
Voltando à imagem, vemos pessoas pisoteando a As primeiras pistas que temos já foram postas: trata-se de uma
placa de concreto que tem escrito "Estados Unidos"; pessoas reportagem da revista Veja sobre o MST, publicada em outubro
de mochilas; outras de bonés. No fundo, avistamos fotógrafos de 1999. Como sabemos, é preciso buscar o aprofundamento
captando outras imagens do mesmo acontecimento. Como das condições de produção desse discurso, isso quer dizer que
bom observador, poderemos notar que há bandeiras não se pode ficar apenas nas condições de produção imediatas,
tremulando ao vento, que se olharmos com cuidado, pois limitar-se a elas é restringir a possibilidade de ir à raiz
identificaremos como bandeiras do MST; em urn a das desse funcionamento. Por isso, é impo1iante ter clareza de que
bandeiras também é possível ver a imagem de Chc G~1cvara. para a Análise do Discurso:
O que será isso que descrevemos agora? São pistas que o
analista precisa seguir. Os dizeres não são, como dissemos,
Poderemos, nesse sentido, exercitar as possibilidades apenas mensagens a serem decod ificadas.
da interpretação. Numa primeira aproximação muitos podem São efeito s ele sentidos que são
dizer que a foto revela uma "manifestação", outros que é um produz idos em condições determinadas
"protesto", um "movimento grevista'', uma "revolta", enfim, e que estão ele alguma forma presentes
no modo como se diz, deixando vestígios
vá1ias possibilidades de dizer algo sobre o mundo. No entanto,
que o analista ele discurso tem ele
temos materializada na reportagem urna forma determinada
apreender. São pistas que ele aprende a
de dizer sobre este acontecimento. Esta forma é reveladora
seguir para compreender os sentidos aí
de outros caminhos de sentido também determinados pela
produzidos, pondo em rel ação o dizer
formação social capitalista. Acima ela foto seguia uma legenda com sua exterioridade, suas condições
que descrevia o acontecimento que vimos na imagem. ele produção. Esses sentidos têm a ver
com o que é dito ali mas também em
Ato do MST em frente da Embaixada dos Estados outros lugares, assim como com o que
Unidos em Brasília: baderna não é dito, e com o que poderia ser dito
e não foi. Desse modo, as margens do
É preciso esclarecer que o leitor está ainda diante da dizer, do texto, também fazem parte dele.
26
materialidade discursiva em sua manifestação fenornênica . (ORLANDI, 2001, p. 30)
É preciso agora ir adiante buscando compreender como o
discmso funciona, ou seja, tomá-lo enquanto objeto discursivo. O trabalho do analista se torna mais complexo quando
buscamos compreender as determinações mais profundas
da sociedade brasileira. Compreender essas determinações é
lançar luzes para a compreensão do discurso. Nessa direção,
' " Segundo Marx ( 1988, p.253) "toda ciênc ia seria supérflua se a forma de man ifestação
e a essênc ia das coisas coincidissem imediatamente" . o dispositivo de análise exige maiores aprofundamentos. Será
98 Análise do Discurso:
Fundamentos & Práticas 99
sociedade mais justa, sem explorados nem exploradores". Os trabalhadores destituídos de terra. O campo é um lugar
objetivos do Movimento pretendem transformar a estrutura contrnditoriamente marcado por riqueza e, também, por muita
agrária brasileira e, por isso, questionam, a partir de suas miséria. Essa ordem social contraditória foi fundada pela
práticas de ocupação, a forma de ser da sociedade capitalista exploração do homem pelo homem, logo não é algo natural,
desnaturalizando a desigualdade social. é efeito de processos históricos 28 . Trata-se do resultado do
Diante disso, as práticas do MST podem ser tomadas tipo de colonização ao qual o Brasil foi submetido (colônia
como Acontecimento. O estudo de RODRIGUES (2006 , p. de exploração) que dividiu as terras brasileiras entre uma
46-8) destaca isso ao afirmar que: pequena elite. Essa situação também reflete o resultado
de conquistas territoriais, além do extermínio de povos
O Discurso de Reforma Agrária pela indígenas e, consequentemente, apropriação de suas terras.
Ocupação não é apenas um . trabalho Além disso, revela as consequências do modelo econômico
de re-configuração discursiva, mas já (agropecuário) implantado na década de 1960 que continuou
se configura em um discurso novo, um
privilegiando os capitalistas e agora privilegia o agronegócio,
acontec imento, em relação aos demais
tornando ainda mais pobres os pequenos agricultores.
discursos dos movimentos de luta pela
terra que antecedera m ao MST. Esse Numa nanativa mais sucinta, podemos dizer ainda
discurso novo representa, entre outros que o conflito se expressa devido à existência de grandes
aspectos, a contribuição histórica do latifúndios. De um lado, os proprietários querem preservar
MST [... ].É um discurso que questiona "suas" tenas e, de outro lado, o Sem Terra, busca uma paiiilha
o próprio Estado, sua função social, de terras onde possa trabalhar e sobreviver, o MST luta pela
seus princípios e suas ações . Esse Reforma Agrária. Segundo INDURSKY (1995 , p. 129),
tipo de posicionamento culmina por
fundar uma nova prática social para
esse novo sujeito emerge como sujeito
os sem-terra cujo enunciado de base
político que passa a contestar a ordem
esse discurso representa : "ocupar,
jurídica, promovendo um confronto de
resistir e produzir". As unidades desse
interpretações: de um lado, encontram-
enunciado representam os objetivos e
se aqueles que defendem o direito
concepções do MST, é uma superação
de propriedade e que só vêem a
dos movimentos que o antecederam.
questão por esse ângu lo ; de outro lado,
Essas afirmações nos exigem fundamentar também " Es tamos nos re ferindo ;io trabalho estranhado que segundo M;irx é uma produção de
que a zona rural brasileira é um espaço de conflitos de re lações soc iai s determinadas: "Se o produ to do trabalho niio pertence ao trabalhador, se
a ele se contrapõe como poder estranho, isto só é poss íve l porque o produto cio trabalho
classes. Há, no campo, alta concentração de terra (grandes pert ence a outro homem di stinto do trabalhador. Se a sua atividade constitui para e le um
latifúndios) e, ao mesmo tempo, um grande número de martírio, tem de ser fonte de deleite e de praze r para outro. (MARX, 200 l ,p.119)
102 Análise do Discurso:
Fundamentos & Práticas 103
29
Para Bakthin ( 198 1, p. 32), "um signo não existe apenas como parte de uma realidade; É a partir dessa maneira de dizer (atividade
ele também reflete e refrata uma outra. Ele pode distorcer essa n:alidade, ser-lhe fiel, ou
apreendê-la de um ponto de vista espec ífico. etc. Todo signo está suj eito aos critérios de
jornalística) que a imprensa se insere nas práticas históricas;
ava liação ideológica (isto é: se é verdadeiro, falso, correto, justificado, bom, etc.). O domínio mas vale lembrar que ela também tem sua gênese nessas
do id eo lóg ico coincide com o domínio dos signos: são mutuamente corresponde nt es".
mesmas práticas, pois compreendemos que o discurso
104 Análise do Discurso: Fundamentos & Práticas 105
jornalístico não está dissociado da processualidade histórica meio social, tomando-se óbvio (evidência), rnna vez que aquilo
e, por isso, é também espaço de lutas de classes. que é visto/lido se apresenta como tendo um sentido natmal,
É bom relembrar que o modo de dizer, bem como e, a linguagem aparece como algo neutro e transparente.
os efeitos de sentido produzidos são regidos pela formação Como foi dito, o trabalho com o discurso exige uma
social. Desse modo, o discurso da imprensa traz as marcas abordagem crítica diante da linguagem, visto que se trata
da lógica e dos interesses do capitaPº. de aprynder, pela análise da materialidade discursiva, os
O que acabamos de refletir nos ajuda a avançar processos de sentido que atuam na história. A linguagem
nas análises. Nesse sentido, já podemos retomar nossas é sempre lugar de conflito, segundo Bakhtin (1981, p. 46),
considerações sobre o MST como acontecimento discursivo, "em todo signo ideológico confrontam-se índices de valor
destacando que suas práticas são interpretadas, ou seja, as contraditórios. O signo se torna a arena onde se desenvolve
ações do Movimento são noticiadas em toda a imprensa a luta de classes".
brasileira e, nos anos noventa, o MST é discursivisado com Munidos dessas reflexões vamos buscar questionar,
uma crítica negativa nos principais órgãos da imprensa escrita a partir da materialidade discursiva, o que seria "baderna"?
e televisava do país. Cabe observar que a palavra "baderna" produz o
Retomando a materialidade discursiva "Ato do MST efeito de sentido de desordem, confusão, e, por fim , conflito.
em frente da Embaixada dos Estados Unidos em Brasília: É importante levar em consideração que estamos tomando
baderna", podemos observar que o funcionamento do para nossa análise a materialidade da língua onde está sendo
discurso da imprensa sobre o MST encaminha os sentidos realizado o processo discursivo 3 1• É importante destacar que
para repudiar o Movimento: "Ato do MST: baderna". entre o enunciado "Ato do MST" e a palavra "baderna" há
Em virtude das práticas sociais do MST, ou seja, sua o sinal gráfico (dois pontos) que atua como uma form a de
inscrição nas relações sociais, a imprensa se percebe obriga,da definição do acontecimento "Ato do MST: baderna". A ação
a falar sobre o MST, descrevê-lo, infonná-lo à sociedade. E o do MST é definida como "baderna" e esses sentidos negativos
que faz a revista e, nessa prática de tomar a palavra, sempre são o que, de modo dominante, têm circulado nos noticiários
uma prática social, ela instaura um processo de significação, e nas falas cotidianas. Pela sua repetição (paráfrase) se produz
de tal modo, que se confunde o fato em si e o dizer sobre ele. o efeito de evidência que associa MST a baderna.
Isso faz instalar várias interpretações sobre o acontecimento
histórico, atribuindo-lhe sentido e, nessa luta, algumas
interpretações tornam-se dominantes, outras são silenciadas.
11 É importante ressa ltar qu e : "a lín gua na An áli se do Di scurso é tomada cm sua fo rma
Alguns sentidos vão-se discursivisando e se cristalizando no materíal enqu anto orde m s ig nificante capaz de equívo co , de des li ze. de falha , ou seja,
enquanto s istema s intáti co intrin secamen te pa ss íve l de jogo que co mporta a ínscri ção
cios efe itos lin guís ti cos materiai s na hi stória para produz ir sentidos [ ... ]. Para o an ali sta
de di scurso a lín g ua não será obj eto de in vestigação primordial , mas um pressuposto
"' Ver G a ia (2 005). fundamental pa ra anali sar a materíaliclacle ci o di scurso ". (FERR EIRA, 200 3, p. 196 e 197).
106 Análise do Discurso: Fundamentos & Práticas 107
O discurso dominante reinscreve o "ato" do MST Diante do que estudamos, podemos concluir que o
como "ato" ilícito e sinaliza que as práticas estão fora da discurso sobre o MST é uma manifestação do movimento
ordem. Aqueles objetivos do MST que citamos no início de de reprodução/transformação da sociedade capitalista. A
nossa análise "lutar pela terra, pela Reforma Agrária e pela imprensa, ao relatar os fatos, já está determinando e (re)
construção de uma sociedade mais justa, sem explorados produzindo sentidos sobre os Sem Terra. Esses sentidos, urna
nem exploradores" ficam comprometidos com a associação/ vez texh1alizados, vão constituindo a representação sobre o
definição produzida MST=baderna. MST para os leitores e para a sociedade em geral. Se esse
Para finalizar nossa análise, poderemos citar o discurso faz parte do movimento de reprodução/transfo1111ação
enunciado, publicado na Veja em 23 de janeiro de 2009, das relações sociais é porque ele está afetado pelos conflitos e
que voltou a circular durante a comemoração dos 25 anos interesses de classes, tornando a posição dos dominantes, mas
do MST: aparect(ndo como parte da opinião pública. Considerando, por
outro lado, que os leitores da revista são vistos como aqueles
Os 25 anos do MST: invasões, badernas e desafio à lei que reproduzem os sentidos dominantes, para a sociedade como
um todo, a dita classe média, pessoas que exercem atividades
Como resultado, podemos afirmar que os sentidos sobre fundamentais para a prática ideológica, em instituições como
o MST vão sendo textualizados e a imprensa fala tomando escola, Estado, igrejas, etc., percebemos como a representação
posição nos conflitos de classes e, assim, busca salvaguardar negativa do MST, hoje, domina praticamente todos os discursos,
a propriedade privada tida, na sociedade capitalista, como independente da posição de classe dos sujeitos sociais.
natural. Como vimos, definir o MST corno ''baderna" serve
aos interesses da classe dominante, que o vê como inimigo a O discurso e as tentativas de "controle" sobre o trabalhador
ser eliminado. Segundo INDURSKY, (1995. p. 127 e 129),
Quando tratamos de discurso, o linguístico e o
O discurso jornalístico assume histórico são instâncias constitutivas do dizer do sujeito. Se
a posição-sujeito elos fazendeiros, o discurso é mediação entre os homens, efeitos ele sentido
apontando a ilegalidade das ações elos entre interlocutores, isto significa que não estamos tratando
sem-terra[ ... ]. Em sua ótica, fica apenas
de transmissão ele info1111ação, mas sim de efeitos de sentido
uma única leitura, que é dada como a
leitura. E fica assim instituída a visão que elevem ser levados em consideração junto com as relações
hegemônica sobre a problemática da entre os sujeitos e as condições ele produção elo discurso.
terra no Brasil. Visão esta que acaba É pensando nisso que vamos avançar no exercício
sendo repassada para o leitor da mídia analítico a partir da propaganda ela companhia ele telefonia
como a "opinião pública". móvel Claro.
108 Análise do Discurso: Fundamentos & Práticas 109
Patrão X Empregado
Quando observamos a materialidade discursiva acima , Estamos constatando isso a partir das propriedades
nosso olhar é direcionado para a imagem e, cm segui.da, para discursivas encontradas no corpo do texto:
11 o Análise do Discurso: Fundamentos & Práticas 111
Proprietário da empresa/do negócio = "sua empresa/ Corno sujeito e sentido não são transparentes, precisamos
seu negócio" desconfiar do óbvio, pois não há discmso sem sujeito, nem
sujeito sem ideologia. Desse modo, ao volvermos o olhar
Trabalhador= "funcionário" sobre a palavra "controle", podemos constatar como ela vai
produzindo sentido quando se vai desvelando a posição de onde
ela é dita. Podemos entender, primeiramente, que ela incide
Pelas pistas da materialidade discursiva observamos: sobre a palavra "celulares" (você controla todos os celulares da
há funcionários e há donos de empresas. Além disso , sua empresa). Mas, no movimento de paráfrase-polissemia que
especifiquemos ainda, há também outra empresa "pensando" presenciamos, a palavra "controle" vai incidir, essencialmente,
corno se deve "definir" o modo como o funcionário "vai usar sobre os "funcionários". Ou seja, essa palavra que, em seu efeito
os celulares" da empresa. Essas pistas revelam a determinação de transparência, direcionava para os celulares, vai revelando
da constituição histórica do sentido e do sujeito 32 . os interesses emjogo (posição sujeito) de quem a dita. Ela vai
Em seguida, podemos analisar o que se diz no topo da incidir sobre os dias, os horários e os tipos de ligação e, até
propaganda que aparece em letras menores: mesmo, de modo individualizado, sobre o consumo mensal "de
cada tm1" dos ft.mcionários. Desse modo, é sobre os ftmcionários
Gestor Online: Você controla pela que o "controle" quer/precisa atuar.
Internet todos os celulares da sua Compreendemos esse movimento porque "as palavras,
empresa. É só acessar o site da Claro e expressões, proposições, etc., mudam de sentido segundo as
pronto: você economiza escolhendo os
posições sustentadas por aqueles que as empregam[ ... ], isto é, em
dias, os horários e os tipos de ligação
referênciaàsformações ideológicas[ ... ] nas quais essas posições
que os seus funcionários podem fazer,
se inscrevem." (PÊCI-:IEUX, 1988, p. 160). Por isso, o argmnento
e até o consumo mensal de cada um.
Tudo para dar mais tranqüilidade para da empresa de telefonia é que o empresário "economiza"
você e sua empresa. Claro Empresas. "controlando" as "ligações" dos "seus funcionários". E argumenta
A gente pensa mais no seu negócio. que essa "economia" (reduzindo gastos a pa1tir do controle sobre
os celulares/funcionários) tem por finalidade "tudo para dar mais
tranquilidade para você e sua empresa".
30É importante destacm· que: "Quando trabalhamos com a produção de discursos dos
Desde as primeiras críticas de Marx em relação à
sujeitos, temos de compreender que eles estão se movendo na s contradições da s relações lógica liberal, um ponto é constantemente ressaltado por
sociais de uma determinada sociedade; especialmente , trabalhamo s com a sociedade
burguesa e a forma de ser desta , que tem por lógica transformar tudo em mercadorias, tem
este autor: o tempo de trabalho precisa ser controlado, pois é
impli cações forte s na constituição dos sujeitos e elos di sc ursos. Essa questão é int eressante através desse controle que se obtém a possibilidade de maior
porque permite abordar os sujeitos hi stóri co-sociai s inseridos em práticas obj etivas que
con stituem sua subjetividade e que concomitantemente constituem a própria objetividade" .
exploração da mais valia. Diversas formas de se efetivar
(S ilva Sobrinho, 2007 , p. 77) esse controle foram usadas ao longo da história do sistema
112 Análise do Discurso: Fundamentos & Práticas 11 3
capitalista, fazendo com que uma área do saber humano - a funcionário (que não pensa na empresa) que é utilizada/
Administração de Empresas - fosse sempre crucial para o enfatizada para interpelar os empresários. O uso tido como
bom desempenho das unidades produtoras. Embora com inadequado do celular da empresa pelos funcionários para
diferentes abordagens e abrangência, administrar uma atividades outras, e não da razão comercial, é sinalizado
empresa é ter o controle do trabalhador com o objetivo de como prejuízo para a empresa. Podemos constatar isso
obter maiores lucros. na finalização do enunciado da propaganda onde a Claro,
Essa é a tranquilidade que a CLARO oferece aos que também é uma empresa, diz: "A gente pensa mais no
outros empresários. seu negócio" revelando que é o empresário falando para o
O analista pode questionar, por outro lado, o que é empresário. É a classe dominante falando para seus iguais e
tranquilidade? Quais os sentidos mobilizados para afetar os dando possibilidades de exercer maior "controle" sobre "seus
empresários e levá-los a aderirem ao "gestor on1ine" da Claro? funcionários'', ou seja, exercer poder sobre os trabalhadores.
Antes de responder, voltemos a Pêcheux (1988 , A forma comparativa que absolutiza a própria Claro
p. 145), pois ao falar sobre as condições ideológicas da como a empresa que "pensa mais no seu negócio'', revela
reprodução/transformação das relações de produção, esse os interesses dos sujeitos de classes , ou seja, manter a
filósofo enfatiza que essas condições contraditórias são exploração e o "controle'' das relações de trabalho a fim de
constituídas em um dado momento histórico e avança na sua permitir mais tranquilidade para o empresariado e para a
reflexão ao considerar que: empresa e, assim, por consequência, reproduzir a manutenção
das relações de exploração dos homens sobre os homens
os 'objetos' ideológicos são sempre como preconiza a lógica do capital 33 •
fornecidos ao mesmo tempo que a
Nessa materialidade discursiva , podemos constatar
'maneira de se servir del es ' - seu
que, nas relações de trabalho, há resistência dos sujeitos.
'sentido', isto é, sua orientação, ou
seja, os interesses de classe aos quais Funcionários que fazem outras ligações, que conversam
eles servem -, o que se pode comentar durante as horas de trabalho, que burlam as regras da
dizendo que as ideologias práticas são empresa , que afetam o processo de extração da mais-
práticas de classes (de luta de classes) na valia. Isso confirma que "não há identificação plenamente
Ideologia. (PÊCHEUX, 1988, p.146). bem sucedida, isto é, ligação sócio-histórica que não seja
afetada, de uma maneira ou de outra, por uma 'infelicidade',
Sendo assim, como o discurso é materialidade do no sentido performativo do termo" (PÊCHEUX, 2002,
ideológico, ele manifesta as lutas de classes. Nessa direção,
"Segundo Marx: "O capit a l é entã o o poder de do111i11io sobre o trabalh o e sobre os seus
podemos compreender, a partir da propaganda, a construção produt os. O capitali sta tem este poder, não em ra zão das suas virtud es pessoai s ou humanas.
de uma imagem dos funcionários corno indivíduos ma s co mo 11m111·ictário ci o capital. O seu poder é o poder de co mpra cio se u ca pital, a que
nada se pode contrapor"'. (MARX, 2001 , p. 80)
prejudiciais à empresa. No intradiscurso é a imagem cio
114 Análise do Discurso: Fundamentos & Práticas 1J5
p. 56). Na análise que estamos desenvolvendo , podemos fatalidade mecânica, ela é histórica.
compreender que tal propaganda revela seu outro, revela (ORLANDI, 2006, p. 20).
que há resistência do trabalhador, por isso, a necessidade
de tentar "controlar o trabalho " (tempo de trabalho) do Podemos constatar que há determinação histórica dos
funcionário pelo "controle do celular". sentidos e dos sujeitos e que como afim1a Pêcheux, não há
Por fim, se voltamos à imagem da propaga nda , dominação sem resistência. É impo1iante ressaltar, por fim,
ficamos em dúvida se na imagem apresentada trata-se que esses efeitos de sentidos não se restringem às propagandas,
de uma foto do dono da empresa ou de um funcionário pois perpassam as práticas sociais da sociedade capitalista.
usando o celular da empresa. Essa ambiguidade faz parte da Certamente, podemos encontrar esses discursos em outros
sociedade em que vivemos, pois nem sempre é possível ter lugares e em outras condições de produção. Cabe a nós analistas
clareza de quem manda e de quem obedece, ou mesmo, de desvelá-los em sua concretude histórica e buscarmos caminhos
quem manda e de fato manda e de quem obedece pensando para que possamos, de fato, vislumbrar novos sentidos.
que está mandando. Essas questões são orientadas pela
posição do sujeito nas relações sociais e pelos efeitos ela
projeção do imaginário que afeta a produção do discurso. A ambiguidade do discurso: mulher trabalhadora e mãe
Segundo Orlandi:
Neste momento desenvolveremos urna análise a paiiir de
A materialidade dos lugares dispõe a duas materialidades discursivas que trntam da profissionalização
vida dos sujeitos e, ao mesmo tempo, da mulher. A primeira é assinada pelo Coren (Conselho Regional
a resistência desses sujeitos constitui de Enfermagem de São Paulo) e circulou no Jornal Folha de
outras posições que vão materializar
São Paulo. A segunda materialidade é um panfleto assinado
novos, outros lugares, outras posições.
pela UFPE (Universidade Federal de Pernambuco) e circulou
É isso que significa a determinação
histórica dos sujeitos e dos sentidos:
no campus universitário. São discursos que "homenageiam" as
nem fixados ad etemwn, nem desligados mulheres que desempenham atividades de trabalho fora de casa.
corno se pudessem ser quaisquer uns. Diante dessas materialidades reafi1111aremos nosso
Porque é histórico é que muda e é posicionamento, enquanto analistas, ressaltando a impo1iância
porque é histórico que se mantém . Os de considerarmos o caráter determinante das relações de
sentidos e os sujeitos poderiam ser classes na produção do discurso retornando a centralidade
sujeitos ou sentidos quaisquer, mas não do trabalho a fim de fundamentar a nossa compreensão do
são. Entre o possível e o historicamente processo histórico de produção e reprodução da vida humana .
determinado é que trabalha a análise de A esse respeito , partimos de pressupostos teóricos e
discurso . A determinação não é urna
rnetod0lógicos que consideram ser a reprodução dos seres
11 6 Aná lise do Discurso:
Fundamentos & Práticas li 7
COURTINE, J.J. Quelques problemes théoriques et GREGOLIN, Maria do Rosário. Fouc:rnlt e Pêcheux na análise
méthodologiques en analyse du discours; à propos du discours do discurso: diálogos e duelos. São Carlos: Claraluz, 2004.
communiste adressé aux chrét iens. Langages, (62). Paris :
HAROCHE, C laudine, HENRY, Paul, PÊCHEUX, Míchel.
Larousse, 1981.
La scmantiquc e la coupurc sa ussurienne: langue, language,
COURTINE, Jean-Jacques, MARANDIN, J-M, Quel obj ct pour cliscours. Jn Langage, nº. 24, Paris: Didicr/Larousse, 1971.
l'analyse clu discours?. In Materialités discoursives . Li lle,
Presses Un ivcrsitaires de Li llc, 1981. HENRY, Pau l. Os fundamentos teóricos da 'Aná lise Automática
do Discurso' ele Michel Pêcheux (1969). ln: GADET, F &
COURTINE, Jean-Jacques. Definition d'Oreientations HAK, T. ( orgs.) . Por uma análise automática do discurso.
Théoriques et Méthoclologiques en Analyse de Discours. ln Uma in trod ução à obra de Michcl Pêchcux. 3" cd. Tracl. Eni
Philosofiques, vol. IX, n.2 , Paris, France, 1984. Orlandí. Campinas, SP: Editora da U ni carnp, 1997.
COURTINE, Jean-Jacques. Metamorfoses do discurso !NDURSKY, Freda. O entrelaçamento entre o po lítico, o jurídico e a
politico: as derivas da fala pública. São Carlos: C laraluz, 2006. ética no discurso do/sobre o MST: uma questão ele lugar-fronteira. ln
Revista da ANPOLL, nº 1, São Paulo : Human itas, 1995.
COURTINE, Jean-Jacques. O chapéu de C lémentis: Observação
sobre memória e o esquec imento na enunciação do disc urso KONDER, Leandro. A questão da ideologia. São Paulo:
político . ln INDURSKY, Freda; FERREIRA, M" Cristina Boitcmpo, 2002.
Leandro . (org.). Os múltiplos territélrios da Análise do
Discurso. Porto Alegre: Editora Sagra Luzzatto, 1999. LEONTIEV, A lcx is. O desenvolvimento do psiquismo. Sã.o
Pau lo: Centauro, 2004.
~
FERREIRA, Maria Cristina Leandro. O caráter singular da
língua no discurso. ORGANON, v.17 , n.35, jan/clez 2003. ESSA, Scrgio & TONET, Ivo . .Introdução à filosofia de
' arx. São Pau lo: Expressão Popular, 2008.
FLORENCIO, Ana Maria Gama. A voz do poder no jogo dos -- - --- --- -- -- - - -·-
sentidos :um estudo sobre a escola. Maceió: Edufal, 2007. LESSA, Sérgio. Mundo dos homens: trabalho e ser socia l. São
Paulo: Boitempo, 2002.
FREUD, S. Obras escolhidas. Edição Standard Brasileira das
obras psicológicas completas. Volume XfX. Rio de Janeiro : LUKÁCS, Gcorg. O Trabalho. Trad. Ivo Tonct. Maceió: 1997.
Imago, 1976. (mimeo).
130 An áli se do Discurso : Funda mentos & Práticas 131
LUKÁCS, George . A Reprodução. Tradu ção Sérgio Lessa: MARX, Karl & ENGELS , Frieclri ch. A ideologia A lemã. São
1992.(mimeo) Paulo ,SP: Ecl . Martin Claret. São Paulo. 2004.
LUKÁCS, George. A s Bases Ontológicas do Pensamento MARX, Karl & ENGELS, Fricclric h. A ideologia Alemã. São
e da At ividade do H omem. São P::i ulo, Temas de C iências Pa ulo: Mmtins Fo ntes, 1998 .
Humanas, vol 4, l 978.
/ MARX, Karl. Manuscritos econ,ômicos-filosóficos. São Pau lo:
MAG ALHAES, Be lmi ra. As Marcas do corpo contando a Ed. Martin Clarct, 200 l ._.., p.Jl.""1''-{J
História : um estudo sobre a violência dom éstica. Mace ió:
EDUFAL, 2005. ~ .. MARX, Karl. O Capital. Livro I. 2º ed, São Paulo: Nova
~
Cu ltural, 1985.
MAGALHAES , Be lrnira. O sujeito do discurso: um diálogo
possível e necessário. 111 Rev ista Linguagem em (Dis)curso. MARX , Karl. Para a crítica da economia política. Coleção Os
Programa de Pós-graduação cm ciências da ling uagem Un isul. Pensado res . São Pau lo: Nova Cul tura l. 1996.
vo l 3 Especial. Santa Ca tar ina, 2003 .
ORLAND l, Eni. Análise cio D iscurso. ln ORLANDl, Eni.
MAINGUENEAU, Dominique. Novas tendências em análise & LAGAZZl-RODRIGU ES, Suzy (orgs .). Discurso e
do discurso. Campinas , SP: Pon tes, 1997 . te xtualidade. Campi nas : Pontes, 2006 .
MALDlDlER, D.; NORMAND, Cl. ; ROBlN, R. Discurso ORLANDl, En i. (org.) Gestos de leitura . Carnpinas-SP: Ecl . da
e Ideo logia: Bases para uma pesqu isa ln. ORLANDI, Eni et Un icamps, 1994.
ai (org). Gestos de Leitura : Da hi stória no discurso 2ºed.
Campinas, SP: Editora da UNICAMP, 1997. ORLANDT, Eni . Anúlise de discurso: princí pios e
procedimentos. Camp inas: Pontes , 1999.
MALDIDIER, Den ise. A inquietação do discurso: (Re) ler
Miche l Pêcheux Hoje. Camp inas: Pontes, 2003. ORLANDT, Eni. Análise de di scurso em suas diferentes
tradições : o Brasil. ln INDURSK.Y, Freda & FERREIRA , Mª
MALDIDIER, Denise. E lementos para urna H istória da Aná lise Cristina ( org.). Michel Pêcheux e a A núlise do Discurso: uma
do Discurso na França . ln ORLAND I, En i et al (org). Gestos de re lação de nunca acabar. São Carlos: Claraluz, 2007 .
Leitura: da história no discu rs o. 2ºecl . Campinas, SP : Editora
da UNICAMP, 1997. ORLANDI , En i. As formas do silêncio no movimento dos
scnt"idos. Campi nas : Edi tora ela Uni camp, 1993 .
MARIANI , Bethàni a. O PCB e a imprensa : os com unistas
no imaginário elos jornais (1922-1989). R io de j ane iro , Reva n, ORLAND l, Eni . Discurso e texto: fo rmu lação e circu lação elos
Campinas, Ed. da Unicamp , 1998 . sentidos.Campinas: Pontes, 200 l.
132 Análise do Discurso: Fundamentos & Práticas 133
ORLANDI, Eni. Interpretação: Auto ri a leitura e efeitos do RODRIGUES , Marlon Leal. MST: discurso de reforma
trabalho simbólico. Petrópolis: Vozes, 1996. agrária pela ocupação: acontecimento discursivo. Tese de
doutorado IEL-Unicamp, Campinas, 2006.
ORLANDI, En i. Paráfrase e polissemia: a fluidez nos limites
do simbólico. ln Revista Rua. nº 4. Unicamp-Nudecri, SAUSSURE, Ferdinand ele. Curso de Lingüística Geral. São
Campinas, 1998. Paulo: Editora Cultrix, 1995.
PÊCHEUX, Michel & FUCllS, C. A propósito da aná li se SILVA SOBRINHO, Helson Flávio. Discurso, velhice e classes
automát ica do discurso: atualização c perspectivas ( l 975). ln: sociais: a dinâmica contraditóri a elo dizer agitando as filiações
de sentidos na processual idade histórica. Maceió: Edufa l, 2007.
GADET, F. & HAK, T. (orgs.). Por uma análise automática
SILVA SOBRINHO, Helson Flávio. Trilhar caminhos, seguir
do discurso. Uma introdução à obra de Michel Pêchcux. 3"
discursos: aonde isso poderá nos levar? ln Anais do II
ed.Carnpinas, SP: Editora ela Unicamp, 1997.
SEMINÁIUO DE ANÁLISE DE DISCURSO (II SEAD).
Porto A legre, o ut/nov de 2005.
PÊCHEUX, Michel. Análise Automát ica elo Discurso, (AAD-
69). ln: GADET, F. & HAK, T. (orgs.). Por uma análise SILVEIRA. Paulo & DORAY, Bcnarcl (orgs.) . Teoria marxista
automática do discurso. Uma introdução à obra deMichel da subjetividade. São Pa ul o: Vértice, 1989.
Pêcheux. 3ª ecl. Campinas, SP: Editora da Unicamp, 1997a.
STEINBERGER, Margarclhe Born. Discursos geopolíticos
PÊCHEUX, Michel. A Análise de Discurso: três épocas (1983). da mídia: jornalismo e imaginúrio internacional na América
ln GADET, F. & HAK, T. (org) Por uma Análise Automática L<lt ina. São Paulo: Cortez, 2005.
do Discurso: uma introdução à obra de Michel Pêcheux. 3º Ed.
Campinas-SP. Ed itora da Unicamp. 1997b. VAISMAN , Ester. A ideologia e su<l determinação ontológica.
ln Ensaio, São Pau lo, nºl 7/18 , 1989.
PÊCHEUX, Michel. O Discurso: Estrutura ou Acontecimento.
3º ed. Campinas: Pontes, 2002. ZIZEK, S lavoj. Um mapa da ideologia. Rio ele Janeiro:
Contraponto, 1996.
PÊCHEUX, Michel. Papel da memória. ln ACHARD, P ierre .
ZOPPl-FONTANA, Mónica. "Os.fi·ios e5paços da semântica
Papel da memória. Campinas : Pontes, l 999a.
exafa111 1111/. sujeito ardente ". Anais do 1 SEAD (Seminário
de Estudos em Análise de Discurso). Porto Alegre, UFRGS,
PÊCHEUX, Michel. Semântica e Discurso. Uma crític:; à
nov/2003. CD-R 2004.
afirmação do obvio. Campinas: Editora da Unicamp, 1988.
ZOPPJ-FONTANA, Mónica. Acontec imento, mquivo, memóri<l:
Revista ISTO É, sessão Semana, nº. 2045, ano 32, 21 de janeiro às margens da lei. ln Leitura, Discurso: história, SL~jeito e
de 2009. ideologia. nº 30- julho~janeiro de 2002. Maceió: Edufa l, 2005.