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CAMPUS SWIFT
CAMPINAS
2017
TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO
CAMPUS SWIFT
CAMPINAS
2017
Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca da UNIP
Campus II – Swift – Campinas/SP
8
D6117 O discurso midiático no filme V de vingança: aspectos políticos e
discursivos na criação de inimigos / Daniel Clemente. – Campinas, SP:
Universidade Paulista - UNIP, 2017.
84f.
Orientador: Profa. Dra. Monica Oliveira Santos.
TCC (Trabalho de Conclusão de Curso) - Universidade Paulista – UNIP.
Instituto de Ciências Sociais e Comunicação. Faculdade de Letras.
Inclui bibliografia.
1. Análise do discurso. 2. Discurso midiático. 3. Manipulação da
mídia. 4. Letras. I. Santos, Monica Oliveira. II. Clemente, Daniel. III.
Rocha Junior, Antonio Donizeti da. IV. Soares, Diego Henrique Soto
Alves. V. Storoni, Lucas Matheus. VI. Tirico, Lucca Pietrobon. VII.
Universidade Paulista – UNIP. Instituto de Ciências Sociais e
Comunicação. Faculdade de Letras. VIII. Título.
CDU 8
ANTONIO DONIZETI DA ROCHA JUNIOR - B9852A5
DANIEL CLEMENTE – C2396A5
DIEGO HENRIQUE SOTO ALVES SOARES C37DBB1
LUCAS MATHEUS STORONI – C24HEI5
LUCCA PIETROBON TIRICO – C367BJ3
Aprovado em 30/11/2017
Nota: 9,8
BANCA EXAMINADORA
___________________30/11/2017
____________________30/11/2017
Professora Doutora Tyara Veriato
Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP
____________________30/11/2017
Professora Doutora Karina
Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP
AGRADECIMENTOS
Keywords: Discourse Analysis, Media, Film, "V for Vendetta", Study, Imagery.
SUMÁRIO
AGRADECIMENTOS...............................................................................................3
RESUMO..................................................................................................................4
ABSTRACT..............................................................................................................5
INTRODUÇÃO.........................................................................................................6
FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA.............................................................................16
ANÁLISE DO DISCURSO E CONCEITOS GERAIS............................................ 16
IDEOLOGIA E APARELHOS IDEOLÓGICOS DO ESTADO...............................27
IDEOLOGIA............................................................................................................28
CONDIÇÕES DE PRODUÇÃO E INTERDISCURSO........................................... 29
FORMAÇÕES DISCURSIVAS IMAGINÁRIAS E IDEOLÓGICAS....................... 32
INTERPELAÇÃO DO SUJEITO PELA IDEOLOGIA............................................ 34
PARÁFRASE E POLISSEMIA.............................................................................. 36
PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS..............................................................38
OBJETIVOS DA PESQUISA:................................................................................38
FICHA TÉCNICA DAS PERSONAGENS..............................................................41
ANÁLISE................................................................................................................47
CONDIÇÕES DE PRODUÇÃO E INTERDISCURSO........................................... 51
CONTEXTO IMEDIATO, CONTEXTO AMPLO E INTERDISCURSO..................51
ESQUECIMENTOS................................................................................................53
PARÁFRASE E POLISSEMIA.............................................................................. 55
RELAÇÕES DE FORÇA E RELAÇÕES DE SENTIDOS, ANTECIPAÇÃO:
FORMAÇÕES IMAGINÁRIAS...............................................................................56
FORMAÇÕES DISCURSIVAS.............................................................................. 59
IDEOLOGIA E SUJEITO........................................................................................60
O SUJEITO EM SUA FORMA HISTÓRICA.......................................................... 61
INCOMPLETUDE: MOVIMENTO, DESLOCAMENTO E RUPTURA...................62
CONCLUSÃO.........................................................................................................81
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS......................................................................83
6
INTRODUÇÃO
FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
ANÁLISE DO DISCURSO E CONCEITOS GERAIS
A partir destes estudos foi que Pêcheux passou a compreender que uma
sociedade trata-se de uma formação ideológica. Segundo ele, o sujeito fala a
partir de uma posição ligada às condições que o representa da linguagem que
advém das formações discursivas de específica conjuntura social. Deste modo,
um sujeito que produz um discurso, não reconhece que seu dizer é feito de seu
assujeitamento das condições em que está inserido nessa sociedade, ou seja, ao
produzir o discurso, seu dizer é efeito ideológico das condições sociais e
históricas da qual está assujeitado.Desta forma, pode-se concluir que ao construir
a teoria da Análise do Discurso, o objetivo de Pêcheux é compreender o
funcionamento do discurso como sendo efeitos de sentido, bem como, analisar os
discursos e observar como os sentidos produzem as interpretações. Cabe ao
analista do discurso, observar em que posição ocupa o sujeito que produz o
discurso e sob quais condições históricas e sociais, ele o produz, e dessa forma
compreender e explicar seu funcionamento, bem como identificar que efeito
ideológico ocorre nesse discurso.
Sendo Michel Foucault (1996) o autor que contribui para a Análise do Discurso ao
estabelecer base teórica que também discute sobre relações de poder e efeitos
de sentido, o autor é um grande referencial ao estudar a dinâmica do poder
dentro da sociedade, bem como a forma como o poder se estabelece nas
relações que envolvem a todos no próprio cotidiano. Foucault revela que o poder
não se estabelece como um mecanismo de força (de uma macro estrutura para
uma microestrutura), isto é, segundo o autor, o poder não se resume a uma
escala de opressão que parte do maior em direção ao menor, mas que se
estabelece por meio de microrelações de poder que permeiam a sociedade, ou
seja, se manifesta desde pequenas instituições como a escola, família e igreja.
A obra “A ordem do discurso – Michel Foucault” é a transcrição da aula inaugural
1
proferida pelo autor no Collège de France em 1970 . Foucault evidencia desde o
princípio, a questão do poder relacionado ao discurso, baseando toda a sua obra
em sua aula inaugural, por meio desta relação discurso e poder. No início dessa
aula inaugural, Foucault demonstra certa inquietação ao iniciar esse discurso:
Por meio desta obra e na intenção de justificar o fato de que existe uma grande
responsabilidade em discorrer sobre o discurso, Foucault afirma que ao invés de
ser a fonte ou o início do discurso, que ele próprio (Foucault) fosse o ponto de
seu desaparecimento, entretanto ele afirma que a instituição responderia a essa
inquietação, afirmando que não há o que temer, pois o discurso está posicionado
de forma a possuir um lugar de honra que ao mesmo tempo o desarma e que
portanto, se o discurso possui algum poder, este advém apenas de nós, seres
humanos em sociedade.
Focault apresenta então a hipótese de seu trabalho, resumindo-a da seguinte
forma:
Supõe que em toda sociedade, a produção no discurso é ao mesmo
tempo, controlada, selecionada, organizada e redistribuída por certo
número de procedimentos que tem por função conjurar seus poderes e
perigos, dominarem seu acontecimento aleatório, esquivar sua pesada e
temível materialidade”. (FOUCAULT, 1996, pág. 08- 09).
PROCESSOS EXTERNOS
INTERDIÇÃO DA PALAVRA:
b) Ritual da circunstância
É a interdição que faz referência à determinados tipos de
discursos que só podem ser ditos em certos tipos de ocasiões,
c) Direito privilegiado
Refere-se ao discurso que só pode ser proferido por determinados tipos de
sujeitos.
A partir dessas questões, conclui-se que as interdições são consideradas por
Foucault como a ligação do discurso com o poder e o desejo, assim como deixam
claro que o próprio discurso é também objeto de desejo. Assim, essas três
interdições são resumidas pelo autor, da seguinte forma:
SEGREGAÇÃO DA LOUCURA
23
Este procedimento afirma que a palavra do louco é o que permite separar o louco
dos outros indivíduos, no entanto essa palavra não é aceita como verdadeira, é
rejeitada, portanto a separação implica a rejeição, princípio dialógico visto que é
apenas por meio dessa separação e rejeição que existe a aceitação.
VONTADE DE VERDADE
PROCESSOS INTERNOS
24
a) Comentário
Foucault estabelece dois tipos principais de discurso. O primeiro, discursos
originais dos quais se fala e os outros discursos que são retomados e ditos
novamente, ou seja, comentários a respeito dos primeiros discursos. Portanto o
comentário surge da repetição e do renascimento do discurso primário. Foucault
ressalta que apesar de o comentário ser um desnível entre um outro tipo de
discurso, ele tem um papel solidário, pois permite a construção infindável de
novos enunciados e tem a função de dizer o que estava silenciado nos outros
discursos, ou seja, por meio do comentário, adiciona-se novas ideias aos
discursos anteriores.
b) Autor
Enquanto o comentário gira em torno da identidade do discurso que o origina, o
principio do autor gira em torno da individualidade do mesmo, logo, o que um ator
escreve ou deixa de escrever, de que forma ele assimila ou modifica sua época,
são traços que se pode observar a partir deste princípio.
c) Disciplinas
O principio que diz respeito às disciplinas, se define por um domínio de objetos,
um conjunto de regras, um sistema anônimo à disposição de quem quer que seja
seu inventor,por esse motivo se distancia do autor, pois este veicula a uma
individualidade enquanto a disciplina é um conjunto de procedimentos que pode
ser adotado por qualquer que seja o autor. Além disso, a disciplina também se
desvincula do comentário pois ela pressupõe que o que é requerido para
construção de novos enunciados ao contrário do comentário que se baseia em
discursos pré existentes. Pra que haja uma disciplina, é necessário que haja a
possibilidade formular novos enunciados
25
SOCIEDADE DE DISCURSO
Este princípio que se insere nos procedimentos internos, se define basicamente
por um sistema social discreto que veicula suas ideias de forma explícita apenas
para determinados grupos de pessoas pertencentes a esta ordem, um exemplo
desta condição é a maçonaria, pois esta apesar de não explicitar e expor suas
ações para a sociedade como um todo, pode interferir na mesma sem deixa de
manter seus “segredos”, portanto a sociedade do discurso tem o objetivo de
conservar ou proferir seus discursos de forma que esses possam veicular
internamente entre esse grupo fechado de pessoas.
DOUTRINAS
O inverso da Sociedade do Discurso está presente no princípio das Doutrinas,
pois enquanto a Sociedade do discurso limita a quantidade de pessoas ou grupos
que podem ter acesso ao seu enunciado, as Doutrinas emancipam e organizam
suas ideias selecionando todos os grupos que compactuam e aceitam essas
“verdades”, estão portanto, ligados a uma Doutrina.
APROPRIAÇÃO SOCIAL
Este princípio pode ser exemplificado como formas de educação que são formas
de manter ou modificar a apropriação social dos discursos, este princípio
promove a ritualização da palavra, a qualificação e a fixação de papéis e a
constituição de um grupo doutrinário através do ensino.
RITUAL
É definido pela qualificação do sujeito e seu comportamento ao proferir o
discurso bem como o os elementos simbólicos que o acompanham. Determina as
propriedades e papéis do sujeito que falam.
Após discorrer sobre todos esses procedimentos, Foucault apresenta seu método
de análise que segundo ele devem cumprir os papéis de questionar a vontade de
verdade, restituir ao discurso, o caráter de acontecimento e suspender a
soberania do significante. Portanto Foucault afirma que o seu método se baseia
no princípio da inversão, ou seja, considera que todos os princípios anteriores,
(autor, disciplina e vontade de verdade) que são considerados como geradores
de discursos infinitos, necessitam da atenção do princípio de rarefação, pois ao
mesmo tempo em que são geradores infinitos de discurso, esses princípios são
também limitadores, portanto o processo de inversão proposto por Foucault,
consiste basicamente em separar esses princípios e invertê-los passando da
forma positiva em que se encontram funcionando, para a observação de pontos
negativos, problematizando-os e detectando seus defeitos.
Dentro destes conceitos, em seguida considera-se também o princípio da
Descontinuidade, através do qual, os discursos devem ser tratados como práticas
descontínuas que podem tanto se cruzar como se excluir, levando a
compreensão de que não necessariamente os discursos serão sempre a
resignificação de novos discursos.
Baseado nas definições apontadas por Michel Foucault (1998) no que diz respeito
aos princípios do discurso, conclui-se em seu conjunto de ideias apontam que o
discurso é basicamente um conceito dialético que busca impor a verdade aos que
o ouvem, levando em consideração o desejo e o poder, ressaltando que existem
sistemas de exclusão existentes no discurso, sistema que exclui tudo aquilo que
está fora do padrão discursivo.
27
Para Pêcheux (1975), o sujeito do discurso não se pertence, ele se constitui pelo
esquecimento daquilo que o determina isto é: significação do fenômeno da
interpelação do indivíduo em sujeito do seu próprio discurso. De acordo com as
reflexões de Pêcheux, as discussões acerca das manifestações do sujeito em
que o sentido é decorrente das condições de produção dos discursos e,
consequentemente, das formações discursivas dos sujeitos em interlocução,
possui ligação direta com as ações e representações condizentes com
determinadas posições de classe, constituídas por uma ou por várias formações
discursivas, que se relacionam entre si e determinam o que pode e deve ser dito
por um sujeito em um determinado contexto.
Pêcheux caracteriza as formações discursivas, como o lugar de desenvolvimento
das formações ideológico-discursivas, “em função das relações de dominação,
subordinação e contradição” (Gregolin, 2001, p.18). As práticas discursivas
possuem regras específicas que determinam as formações discursivas. As
formações também têm como característica a instabilidade. A instabilidade é
proveniente da heterogeneidade presente na formação discursiva, a qual é
constantemente atravessada e invadida por diversas enunciações que dão este
caráter plural, contraditório, desigual e subordinado.
33
PARÁFRASE E POLISSEMIA
PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
OBJETIVOS DA PESQUISA:
PERCURSO TEÓRICO
CORPUS DA PESQUISA
49
ESQUECIMENTOS
(...) é hora de nos vingarmos de um cházinho que eles nos deram a algumas
centenas de anos, sugiro que a gente vá àquelas docas essa noite e jogue essas
caixas no lugar onde tudo o que vem dos escrotos ulcerados da avertérica
merecem! (Lewis Prothero, V de Vingança,2:50)
Nesse caso, o sujeito não prioriza a fonte de sua afirmação, pois para ele não é
importante evidenciar uma informação, mas usar um suposto acontecimento
como pretexto para jogar um indivíduo contra o outro (os EUA contra a
Inglaterra), mesmo assim, o sujeito prevê a possibilidade de o interlocutor sentir a
necessidade de uma fonte dessa informação, por isso afirma que apenas “leu” a
notícia desse suposto acontecimento.
Por meio desse mesmo mecanismo de Antecipação, o sujeito também determina
a configuração de suas palavras ao prever que sua colocação insere-se em um
contexto que pode ser desnecessariamente agressivo, por esta razão, ele faz
com que sua sua agressividade seja justificável pela ideia de que o indivíduo a
quem se agride, merece tal agressão:
Ou seja, o sujeito conduz sua enunciação de modo a fazer com que a “falta de fé”
seja um problema passível de sofrer agressão.
FORMAÇÕES DISCURSIVAS
De acordo com Orlandi (2007 p. 43) “a formação discursiva se define como aquilo
que numa formação ideológica dada, ou seja, a partir de uma posição dada em
uma conjuntura sócio-histórica dada, determina o que pode e
o que deve ser dito”.
É portanto considerando e partindo do princípio de que as palavras não se
significam sozinhas fazendo sentido em si mesmas mas através da formação
ideológica e discursiva presente no contexto no qual se inserem, que se é seguro
afirmar o caráter ideológico de cada discurso.
No discurso de Prothero aqui analisado, o caráter ideológico é identificado pela
memória discursiva que ao ser analisada, se relaciona não apenas à outros
discursos, mas como também à fatos e contextos históricos que apresentam
determinados tipos de ideologia. Desta forma, apenas é possível afirmar que esse
discurso de Lewis Prothero faz relação com a ideologia fascista, porque a
historicidade presente na caracterização dessa ideologia, nos confere elementos
dessas posições ideológicas que estão em jogo com no processo sócio-histórico
em que as palavras são produzidas, isto é, a agressão contra grupos sociais
minoritários, a evidenciação da fé como verdade absoluta e modelo de regras e o
caráter ameaçador do sujeito. Porém esta relação ideológica não se restringe
apenas ao fascismo, mas também a outros acontecimentos históricos que
conferem a repulsa contra grupos não cristãos, com por exemplo a catequização
dos índios por parte dos Jesuítas que no ano de 1.500 consideravam a cultura e
religiosidade indígena não apenas como “falta de fé” mas também como
selvageria.
Sabemos que o personagem “V” fala de uma revolução, e que talvez ele seja um
revolucionário, mas a revolução, o descontentamento não começou com o
personagem. É possível notar que a todo o momento ele é interpelado por
discursos muitas vezes de extrema esquerda e outras anarquistas. O seu
personagem basicamente constitui uma ideologia e “V” afirma em certo momento
durante o filme: “Por baixo desta máscara há uma ideia, Sr. Suttler, e ideias são a
prova de bala”, constituindo a noção de ideologia, perpassando o sentido de ideal
revolucionário que um homem e uma máscara pode fazer com uma sociedade.
Na mesma reflexão, põe-se em pauta o poder, adquirido por “V” por meio da
invasão ao prédio televisivo, a rede geral, e o poder usurpado pelo Alto Chanceler
Adam Suttler, todas estas ações nos remetem a dois eixos também citados por
Orlandi (2005) p. 33: “Todo dizer, na realidade, se encontra na confluência dos
dois eixos: o da mémoria (constituição) e o da atualidade (formulação). E é desse
jogo que tiram seus sentidos.”
É neste momento que a reflexão sobre o dito deve começar, apesar do
sarcasmo e de toda a ironia presente neste discurso, algumas falas sugerem
muito mais do que dizem, reparem:
Neste momento a sua fala termina, vemos o convite para a ida até o parlamento,
mas o convite fica vago e não especifica do que realmente se trata esta visita, se
seria um protesto, uma homenagem ou alguma exibição. O personagem então
retira o disco de exibição do discurso e se retira do prédio, mas antes fantasia
todos os presentes na sala de exibição com vestes idênticas as suas e se
mistura, ao final da conferência um dos policiais consegue identifica-lo, porém há
luta corporal e “V” sai ileso após sua nova companheira Evey (salva
anteriormente por Ele dos homens dedo) ter atacado um dos policiais. Eles
fogem.
É após esta fala que algumas ações são desencadeadas, como a caça
ao “V”, a entrega de mascaras para a população e a busca por fabricar mentiras e
novos fatos para estancar as ações de “V”.
Antes mesmo de saírem do prédio da televisão, Evey é atacada e ele a ajuda a
escapar, assim os dois se escondem em seu esconderijo, onde ele explica
superficialmente algumas de suas intenções.
O ponto a se chegar é em como este discurso agiu em toda a população, o
método de “V” em fabricar um novo inimigo e de a mídia toda do filme também
coloca-lo como inimigo. Esta fabricação de inimigos se arrasta desde a
colonização, e para tanto é necessário que haja argumentos e que haja certo
esquecimento de alguns discursos, como sugere Michel Pecheux (1975 APUD
ORLANDI, 2005 p. 34) há dois esquecimentos, um que acontece de maneira
consciente, onde o falante sabe do que fala, assim como “V” cita, por exemplo o
filme “O conde de Monte Cristo” e também há o esquecimento número dois, onde
de maneira inconsciente o sujeito tem a ilusão da realidade do pensamento, deste
modo pode-se concluir que nenhum sujeito cria seu discurso, ele é interpelado
por milhares de discursos vindos desde muito antes de sua existência como
falante.
Quando o personagem fala que a culpa pelo país estar sendo governado por um
regime totalitário é da população há a interpelação do discurso de Joseph-Marie
Maistre, que era a favor da monarquia em sua época. Entretanto, este discurso é
recolocado numa nova significação e reaproveitado, a esta ação damos o nome
de Paráfrase:
“... aquela que não explica, nem serve para tornar inteligível ou interpretar o
sentido, mas que nos leva a melhor compreender os processos de
significação, o modo de funcionamento de qualquer exemplar de linguagem
para significar. Com efeito, a relação que a análise do discurso estabelece
com o texto não é para dele extrair um sentido mas sim para problematizar
essa relação, ou seja, para tornar visível sua historicidade e observar a
relação de sentidos que aí se estabelece, em função do efeito de unidade”
(2007, p. 173).4
2
Referências bibliográficas episódicas que não constam na fundamentação teórica também foram utilizadas ao
longo dessa análise por questões pontuais.
3
ORLANDI, Eni P. As formas do silêncio. Campinas. Editora da Unicamp, 2007, p.90.
4
ORLANDI, Eni P. As formas do silêncio. Campinas. Editora da Unicamp, 2007, p.173.
V, que remete à casualidade da situação num ambiente comum. Assim, a
significação dos elementos discursivos pode ser observada a partir do que são os
sujeitos em relação ao ambiente e o que eles representam. O ambiente é
estilisticamente composto, não só nessa sequencia, mas em todo momento ao
longo do filme, por colorações tristes e monotonia cotidiana, num colorido-triste que
foge ao monocromático de ambientações noir. As cores, por mais que variem entre
si, não fogem dos tons escuros e o contraste com cinza constante ou amarelo
pálido, que passa a impressão de neutralidade clássica, mas ao mesmo tempo
tecnologia. Cabe que, das cores, é necessário captar seus sentidos e efeitos, a
forma como se fazem significar coletivamente. As cores podem produzir uma
multiplicidade de efeitos. Assim como aborda Eva Heller, em A psicologia das cores:
como as cores afetam a emoção e a razão, “nenhuma cor está ali sozinha, está
sempre cercada de outras cores. A cada efeito intervêm várias cores – um acorde
cromático” (2014, p.21)5.
A cor cinza, considerando a ideia de futuro distópico, conduzindo uma sensação
desânimo, degradação e tristeza, sem interferir na expressão de outras cores com
seu ar de ‘apatia social’. Essa não interferência, além de carregar em si o contexto
do filme, em que a indignação coletiva da população é canalizada para apatia, olhar
conformista e impotência, ao invés de comoção transformadora. Propicia uma maior
liberdade para outras cores, essas que inferem na estrutura dos enunciados uma
resposta para esses sentimentos de desolação em um contrastivo trabalho de
levante agressivo através do questionamento e transformação revolucionária. Essas
cores compõe o visual de V: o vermelho, o branco e o preto. Sua marca em
vermelho é contrastiva com o tom sombrio de suas roupas pretas e face pálida,
juntos, destoantes em sua interação com o ambiente. A episteme das cores e seus
significados, assim como outros elementos visuais pode parecer insustentável em
primeiro momento, mas se comprova no todo da materialidade do filme. Assim como
cita Tania C. Clemente de Souza, em Discurso e imagem: Perspectivas de análise
não verbal6:
5
HELLER, Eva. A psicologia das cores: como as cores afetam a emoção e a razão. São Paulo. Editora G. Gilli,
2014, p.21.
6
Comunicação apresentada no 2º Colóquio Latinoamericano de Analistas Del Discurso, La Plata eBuenos Aires,
agosto/1997
“A não co-relação com o verbal, porém, não descarta o fato de que a imagem pode ser lida.
Propriedades como a representatividade, garantida pela referencialidade, sustentam, por um lado, a
possibilidade de leitura da imagem e, por outro, reafirmam o seu status de linguagem” (1997, p. 3).7
V parece encarnar o sentido obstinado do herói (Emond) em sua sina vingativa, mas
não se pode excluir o desfecho do filme, único momento da trama em que a
máscara é retirada, há uma quebra de expectativa e a verdade foge ao esperado: V
já está morto e sua “identidade” não é revelada. Dele mesmo, a máscara em
momento algum é retirada. É quando as pessoas saem às ruas, caracterizadas
como o personagem e retiram a máscara, que o arco da identidade se fecha,
trazendo ao imaginário que todos são ele. Que a coletividade se rebelam contra o
autoritarismo e que em nenhum momento as atitudes de V foram o pressuposto do
trabalho de um único homem numa revolução e sim produto do coletivo, anulando a
espera por uma figura revolucionária, fazendo de todos componentes da ação de
destruir um governo autoritário.
Mas outro referencial, em específico nesse diálogo, é elucidado pelo ar melancólico
e trágico do personagem e sua postura com relação à Evey: O Fantasma da Ópera
de Gaston Leroux (2005). Não só se inscreve à V a história do homem inocente que
é preso, torturado e se recupera disso como receptáculo da vingança, mas também
a sensibilidade depressiva de um fantasma mal quisto, de postura que remete à
operas trágicas, de caráter dúbio – Terrorista/monstro/fantasma ou homem sensível
e emocionalmente fragilizado.
Não há aí, uma sentido absoluto, os contextos enunciativos sempre irão alterar a
forma como os sujeitos irão identificar os objetos. Não há, para Bakhtin (2002),
sentidos absolutos, mas uma construção de sentidos que envolve elementos do
sistema linguístico e dos elementos mutáveis nos enunciados. Envolve também a
avaliação da situação enunciativa, que tem por base a cultura cujas especificidades
afetam a consciência (BRAIT, 2009)9.
8
V de Vingança. Direção: James Mc Teigue. [S.I.]: Warner Bros, 2005. 1 DVD (2:03:26 min).
9
BRAIT, Beth (Org.). Bakhtin e o círculo. São Paulo: Contexto, 2009.
Está na relação e imagem construída de um ao outro a ideia de tutorar: não é em
todo o filme Evey faz parte da massa insatisfeita, ao mesmo tempo em que não se
pode apontá-la como totalmente manipulada pelas técnicas governamentais de
manipulação ideológica, estando em contato com a produção de mentiras na
emissora de TV, também acaba tendo um caráter conformista, de impotência de
ação com relação ao governo. Assim, parte de uma massa insatisfeita, porém sem
ação ou respostas para “como agir”. E nos questionamentos: é certo esse agir?
Quais são as opções de ação? E assim “Acha que explodir o parlamento vai tornar
o país melhor?”.
Cria-se questões que são essenciais para a trama, como a relação entre justiça e
vingança, suas diferenças e característica, em um mundo distópico, ou seja, a
sociedade em seu modelo de antítese da utopia, em que os valores que guiam a
justiça são corrompidos e pelo bem, muitas vezes se deve valer pela ilegalidade.
Essas questões, tutoradas por V à Evey, num modelo que irá remeter igualmente à
O Fantasma da Ópera. Do homem mascarado movido por interesses diversos que
acaba por auxiliar uma jovem. No filme está presente na intenção de Evey de
entender mais sobre os ideais de V, conforme se aprofunda nas questões que a
cercam e passa à enxergar com clareza tanto os propósitos de V, como as
intenções reais do governo. Evey, em dado momento, fala sobre o antigo sonho de
ser uma atriz, algo que mudou evidentemente após a morte de seus pais. Os
conhecimentos dela com relação à teatro, reconhecendo uma fala de Macbeth, de
Shakespeare, desperta a atenção de V. Assim é possível chegar à repostas em
primeiro momento, tal qual não há um bem e um mal e sim forças conflitantes que
se antagonizam num jogo de poderes.
A ideia de verdade, transparência discursiva, e atenção, mais uma vez são
passadas com os enfoques simples na face dos interlocutores e mais uma vez, a
composição do cenário como uma cozinha e com elementos não distrativos,
reforçam a atenção para os enunciados.
Evey questiona: “Acha que explodir o parlamento vai tornar o país melhor?” e V
responde: “As pessoas não deveriam temer seu governo. O governo é que deveria
temer o seu povo...” – O espaço casual que compreende o ‘espaço imediato’
esclarece e controla a produção do discurso, assim como as predicações dos
sujeitos envolvidos nele, em sua produção (Evey e V). O processo de produção que
se define aí: os dois personagens, a cozinha no refúgio de V (o fato de ser um
refúgio e a liberdade para se abordar diferentes assuntos em seu interior, sem temor
do peso do estado vigilante), a referência à explosão na cena anterior e seus
artifícios e o formato em que esse diálogo vem, são os mecanismos formais dessa
produção e compõe parcialmente as condições de produção enunciativa – O que vai
completar esse processo é o olhar (contexto) amplo, que irá efetivar o sentido do
recorte.
É esse “desprender” do discurso que elucida as condições de produção dadas aqui
– O discurso analisado se desprende de algo, ou seja, é condicionado. Em Análise
Automática do Discurso, Pêcheux (1997 p.77) exemplifica melhor a questão das
condições de produção, “um discurso é sempre pronunciado a partir de condições
de produção dadas: por exemplo, o deputado pertence a um partido político que
participa do governo ou a um partido da oposição; é porta-voz de tal ou tal grupo
que representa tal ou tal interesse, ou então está ‘isolado’, etc. Ele está, pois, bem
ou mal, situado no interior da relação de forças existentes entre os elementos
antagonistas de um campo político dado. O que diz, o que anuncia, promete ou
denuncia, não tem o mesmo estatuto conforme o lugar que ele ocupa; a mesma
declaração pode ser uma arma temível ou uma comédia ridícula segundo a posição
do orador e do que ele representa, em relação ao que diz. Um discurso pode ser um
ato político direto ou um gesto vazio, para ‘dar o troco’, o que é uma outra forma de
ação política”.
É cabível trazer ao espaço da discussão e análise, algumas compreensões da
citação sobre os enunciados que tomam como princípio o jogo de imagens em que
os personagens (sujeitos) estão inseridos, assim como as formações imaginárias do
campo da memória (interdiscurso). Dentro do contexto sócio-histórico e ideológico,
pode-se dizer que V está localizado de forma opositora a algo, no caso do governo,
e sua fala o constitui e firma posição ao passo que evidencia os elementos
antagonistas desse governo: “As pessoas não deveriam temer seu governo. O
governo é que deveria temer o seu povo...” – Nessas duas orações é possível
identificar essa relação de pode, de oposição, em/no algo “errado” do governo. Esse
“errado”, por sua vez, seria essa inversão de papéis. Um governo que produz medo
para afugentar o povo, para criar a falsa ilusão de necessariedade das pautas
conservadoras e das reações agressivas, como o toque de recolher, perseguições
antissemitas e homofóbicas, etc. Um governo que se gere e sustente a partir desse
ciclo.
A atitude de Evey não é um gesto vazio, mas está no interior de suas questões e
querer se fazer entender. Os questionamentos dela tem em uma de suas funções, o
jogo de atribuições imagéticas das funções imaginárias: que atribui à V, e vice-
versa. Influindo tudo às condições de produção e por sua vez, nos processos de
significação. Essas atribuições influenciam diretamente as possibilidades
enunciativas nessa situação discursiva. “Acha que explodir o parlamento vai tornar
o país melhor?” condiciona a resposta de V e partindo da compreensão do início da
fala de V, “Explodir um prédio levará a isso?” aparece como um condutor desse
diálogo, mas não só, pois marca que o primeiro “dito” foi também significado e
estratificado nessa segunda oração, servindo como condição para o final da fala de
V: “O prédio é um símbolo, assim como o ato de destruí-lo. O poder dos símbolos
emana do povo. Sozinho, um símbolo não tem valor, mas com gente suficiente
explodir um prédio pode mudar o mundo”.
Mesmo que indissociáveis na prática, aqui, para entendimento, as complexidades
amplas, o sentido amplo, do discurso podem ser tratadas como esses elementos
que se antagonizam e está expresso na fala de V. Primeiro, na comentada relação
polarizada de poderes conflitantes, numa interferência na esfera política. V é o
porta-voz de ideais que procuram romper com as estruturas governamentais de sua
atualidade, exaltando a sociedade antagônica e independente ao poder do Estado,
crítico às concessões ao poder em troca de segurança e tem como aparato para
suas atitudes o uso de simbologias que remetam a qualquer um que signifique sua
imagem e discurso a ideais sociopolíticos ou acontecimentos históricos, numa
performance metalinguística que não esconde seus processos: o de criar sentido
que convirjam à um outro – Romper com o atual governo, Estado autoritário.
Falamos aqui, da identidade política do personagem, e suas atitudes até esse ponto
do filme, usar a máscara de Guy Fawkes, o símbolo do “V” que remete diretamente
ao “A” de anarquia, explodir o prédio da justiça, etc. são discursos políticos diretos.
“O prédio é um símbolo”, no caso, o nomeado ‘prédio da justiça’, o que indica a
concepção, a ideia que esse edifício passa socialmente como potencial para sua
explosão. “Assim como o ato de destruí-lo” – Não há justiça, olhando para as
atitudes do governo ficcional, então não há motivos para que esse prédio exista.
Esse prédio é assim, na visão do personagem, nada além de um amontoado de
pedras, tijolos e cimento, não vai muito além de sua questão material, símbolo
apenas da decadência da justiça: não faz nada além de enfeitar e exaltar primórdios
e ideais afugentados pelo totalitarismo do governo. Assim, elucida-se a questão dos
símbolos e do discurso que servem a regras dos jogos de poder. Nas palavras de
Saussure, o símbolo tem como característica não ser jamais completamente
arbitrário; ele não está vazio, existe um rudimento de vínculo natural entre o
significante e o significado (Saussure, 1995: 82) 10.
“O poder dos símbolos emana do povo”, pois quem, se não o povo, a
coletividade, tem a ação direta de dar significados aos símbolos? Nessa fala assim,
o personagem procura sintetizar os processos de leitura e significação simbólica;
“Sozinho, um símbolo não tem valor”. É possível assim, em decorrência de menções
diretas ao símbolo e seu valor, como ele se dá em coletivo e fazendo uso dos
sujeitos, fazer menção direta aos esquecimentos de Pêcheux ou o sujeito como
efeito ideológico elementar althusseriano na visão do sujeito assujeitado não
produtor dos significados, mas sim envolvido pelas multiplicidades das formações
discursivas, na ilusão de realidade do pensamento. Tornando a destruição do prédio
da justiça enfim um símbolo de justiça, não mais o prédio em si, mas o seu desfazer
simbólico, é o que constitui os significados de sua conclusão, “mas com gente
suficiente explodir um prédio pode mudar o mundo”, como um representante dos
interesses da liberdade, descaracterizado da imagem de sujeito, mas símbolo da
interferência ideológica direta, num ato de inferência política direta. Permanece
assim a mensagem de anti-conformismo e do povo como legítimo detentor do poder
em sua coletividade.
Em “o poder dos símbolos emana do povo” e “sozinho, um símbolo não tem valor”
há uma relevante questão a ser observada: o discurso aqui revela uma reflexão
aprofundada sobre o símbolo e suas questões, dialogando diretamente com a
imagem do “quem sou eu” de V e a questão do sujeito assujeitado, do segundo
esquecimento. O discurso proferido é assim dito e não de outra forma, com
persuasão quase didática, que procura manter no caráter da ação, sua estrutura, o
já-dito, de famílias parafrásticas que indicam uma ideologia de processos: o povo (o
sujeito) atribui aos recortes (símbolos) seu significado no processo de significação.
Mas o discurso do locutor faz o interlocutor consciente da ordem enunciativa e
ilusão referencial, e comunica as possibilidades do dizível e, por sua vez, as
múltiplas significações oferecidas pelas famílias parafrásticas, podendo ou não,
diferentes significados serem atribuídos à um objeto (símbolo).
Segundo Orlandi (1999 p.35) a ilusão referencial “nos faz acreditar que há uma
relação direta entre o pensamento, a linguagem e o mundo, de tal modo que
pensamos que o que dizemos só pode ser dito com aquelas palavras, que só pode
10
SAUSSURE, Ferdinand. (1995). Curso de linguística geral. São Paulo: Cultrix.
ser assim”. Esse pensamento se comunica diretamente com o significar e o validar
de um símbolo.
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CONCLUSÃO
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
DUMAS, Alexandre. O Conde de Monte Cristo. Jorge Zahar ed. Rio de Janeiro:
editora Zahar, 2009.
FOUCAULT, Michel. A Ordem do Discurso. São Paulo: Loyola, 1996.
1 A obra “A Ordem do Discurso – Michel Foucault” utilizada como parte da bibliografia deste trabalho é
uma edição publicada em 1996, Editora Loyola, São Paulo. 22