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O que é uma virtude? É uma força que age, ou que pode agir.

Assim a virtude de uma planta e


de um remédio, que é tratar, de uma faca, que é cortar, ou de um homem, que é querer e agir
humanamente. Esses exemplos, que vêm dos gregos, dizem suficientemente o essencial: virtude é
poder, mas poder específico. A virtude do heléboro 1 não é a da cicuta2, a virtude da faca não é a da
enxada, a virtude do homem não é a do tigre ou da cobra. A virtude de um ser é o que constitui seu
valor, em outras palavras, sua excelência própria: a boa faca é a que corta bem, o bom remédio é o
que cura bem, o bom veneno é o que mata bem...
Note o leitor que, nesse primeiro sentido, que é o mais geral, as virtudes são independentes do
uso que delas se faz, como do fim a que visam ou servem. A faca não tem menos virtude na mão do
assassino do que na do cozinheiro, nem a planta que salva mais virtude do que a que envenena.
Não, claro, que esse sentido seja privado de todo e qualquer alcance normativo 3: qualquer que seja a
mão e na maioria dos usos, a melhor faca será a que melhor corta. Sua capacidade específica
também comanda sua excelência própria. Mas essa normatividade permanece objetiva ou
moralmente indiferente. À faca basta cumprir sua função, sem a julgar, e é nisso, certamente, que
sua virtude não é a nossa. Uma faca excelente nas mãos de um homem mau não é menos excelente
por isso. Virtude é poder, e o poder basta à virtude.
Mas ao homem não. Mas à moral não. Se todo ser possui seu poder específico, em que excele
ou pode exceler (assim, uma faca excelente, um remédio excelente...), perguntemo-nos qual é a
excelência própria do homem. Aristóteles respondia que é o que o distingue dos animais, ou seja, a
vida racional4. Mas a razão não basta: também é necessário o desejo, a educação, o hábito, a
memória... O desejo de um homem não é o de um cavalo, nem os desejos de um homem educado
são os de um selvagem ou de um ignorante. Toda virtude é, pois, histórica, como toda a
humanidade, e ambas, no homem virtuoso, sempre coincidem: a virtude de um homem é o que o faz
humano, ou antes, é o poder específico que tem o homem de afirmar sua excelência própria, isto é,
sua humanidade (no sentido normativo da palavra). Humano, nunca humano demais... A virtude é
uma maneira de ser, explicava Aristóteles, mas adquirida e duradoura, é o que somos (logo o que
podemos fazer), porque assim nos tornamos. Mas como, sem os outros homens? A virtude ocorre,
assim, no cruzamento da hominização (com o fato biológico) e da humanização (como exigência
cultural); é nossa maneira de ser e de agir humanamente, isto é (já que a humanidade, nesse sentido,
é um valor), nossa capacidade de agir bem. “Não há nada mais belo e mais legítimo do que o
homem agir bem e devidamente”, dizia Montaigne5. É a própria virtude.
Isso, que os gregos nos ensinaram, que Montaigne nos ensinou, também pode ser lido em
Spinoza: “Por virtude e poder entendo a mesma coisa, isto é, a virtude, enquanto se refere ao
homem, é a própria essência ou a natureza do homem enquanto ele tem o poder de fazer certas
coisas que se podem conhecer apenas pelas leis de sua natureza” 6; ou, eu acrescentaria, de sua
história (mas esta, para Spinoza, faz parte daquela). Virtude, no sentido geral, é poder; no sentido
particular, poder humano ou poder de humanidade. É o que também chamamos as virtudes morais,
que fazem um homem parecer mais humano ou mais excelente, como dizia Montaigne, do que
outro, e sem as quais, como dizia Spinoza, seríamos a justo título qualificados de inumanos 7. Isso
supõe um desejo de humanidade, desejo evidentemente histórico (não há virtude natural), sem o
qual qualquer moral seria impossível. Trata-se de não ser indigno do que a humanidade fez de si, e
de nós.
A virtude, repete-se desde Aristóteles, é uma disposição adquirida de fazer o bem. É preciso
dizer mais, porém: ela é o próprio bem, em espírito e em verdade. Não o Bem absoluto, não o Bem
em si, que bastaria conhecer ou aplicar. O bem não é para se contemplar, é para se fazer. Assim é a

1 Erva medicinal usada pelos antigos como analgésico.


2 Designação comum a várias plantas venenosas.
3 Do francês normatif. Que tem a qualidade ou força da norma. Na Filosofia, diz-se de conhecimento que enuncia ou
que constitui uma norma.
4 Ética a Nicômaco, I, 6, 1097 b 22/1098 a 20.
5 Ensaios, III, 13.
6 Ética, IV, definição 8.
7 MONTAIGNE, Ensaios, II, 36 (Dos mais excelentes homens; SPINOZA, Ética, IV, proposição 50, escólio.
virtude: é o esforço para se portar bem, que define o bem nesse próprio esforço. (…) A virtude ou,
antes, as virtudes (pois há várias, visto que não se poderia reduzir todas elas a uma só, nem se
contentar com uma delas) são nossos valores morais, se quiserem, mas encarnados, tanto quanto
quisermos, mas vividos, mas em ato. Sempre singulares, como cada um de nós, sempre plurais,
como as fraquezas que elas combatem ou corrigem.

(COMTE-SPONVILLE, André. Pequeno Tratado das grandes Virtudes. São Paulo: Martins
Fontes, 1996, [Preâmbulo])

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