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Preparação de originais
I.eonardo Seiji Miyahara
Revisão
Vera Quintanilha
Capa
H ist ó r ia Antonio Kehl
Diagramação
NA SALA DE AULA Carla Castilho
Bibliografia.
ISBN 8 5 -7 2 4 4 -2 16 -2
Le a n d r o Ka r n a l (o r g .) 0 3 -0 5 4 5 C D D -907
índice para catálogo sistemático:
1. História : Estudo e ensino 907
FRRJ-Biblii
*
Registro E d ito ra C o n te x to
Diretor editorial: Jaim e Pinsky
a ta : DÀ / / O3
ua Dr. José Elias, 520 - Alto da Lapa
0 BC 0 5 0 83 -03 0 - São Paulo - s p
p a b x : (11) 3 83 2 5838
contexto@editoracontexto.com.br
www. ed itoraco n texto .com.br
2007
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editoracontexto
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i ias cognitivas ou sociais, priorizando-as sobre as informações” (Dire Há propostas diferenciadas, em que os conteúdos são organiza
trizes Curriculares Nacionais para o Ensino M édio, artigo quinto, I). São dos tendo como referências temas selecionados ou eixos temáticos, es
considerados meios para a aquisição de capacidades que auxiliem os perando-se maior liberdade e criatividade dos professores. A organiza
alunos a produzir bens culturais, sociais e econômicos e deles usufruir. ção dos conteúdos e sua seleção com base em uma concepção ampliada
Nesse sentido, os conteúdos ocupam papel central no processo de en- de currículo escolar foram assumidas de forma mais sistematizada e
sino-aprendizagem, e sua seleção e escolha devem estar em consonân aprofundada nas propostas, já amplamente conhecidas, dos Parâme
cia com as problemáticas sociais marcantes em cada momento históri tros Curriculares Nacionais (PCNs).
co. Além disso, eles são concebidos não apenas como a organização dos
fenômenos sociais historicam ente situados, na exposição de fatos e Nota-se, ainda, uma via intermediária: mantém-se a opção pela
conceitos, mas abrangem tam bém os procedimentos, os valores, as exposição cronológica dos eventos históricos consagrados pela historio
normas e as atitudes. grafia, mas agora intercalada ou informada por exercícios e atividades,
chamadas estratégias, por meio dos quais os alunos são levados a perce
Esse conjunto de especificidades explica a grande variedade de ber todos os meandros da construção do conhecimento histórico, ins
propostas curriculares, desde as mais clássicas até as mais recentes ten tados a envolver-se nas problemáticas comuns ao presente e ao passado
tativas de inovações, que despontam como promissoras possibilidades estudado e encorajados a assumir atitudes que levam ao posicionamen
cie cam inhar para melhorias cada vez mais substantivas. to como cidadãos. Aproximam-se, assim, as preocupações com a se
qüencialidade dos conteúdos e as finalidades da educação na formação
de indivíduos conscientes e críticos, com autonomia intelectual.
Diversidade na apresentação dos conteúdos
Por fim, a organização dos conteúdos, em muitos casos, é assu
O exemplo clássico de organização dos conteúdos é o que se mida de forma responsável pelos professores, tendo como referência
constituj. a partir das temporalidades. Preponderante ainda na m aioria suas experiências docentes ou as orientações dos órgãos responsáveis
das escolas brasileiras, o tempo, considerado em sua dimensão crono pelas políticas educacionais dos estados e dos municípios.
lógica, conjtinua sendo a m edida utilizada para explicar a trajetória da
Immanidade. A periodização que se impôs desde o século X IX — His-
lória Antiga, M edieval, M oderna e Contem porânea — está presente Cuidados especiais
cm grande parte dos livros didáticos; retrocede-se às origens, estabele-
cendo-se trajetórias homogêneas do passado ao presente, e a organiza- Seja qual for a proposta apresentada, há cuidados especiais que
çiío dos acontecimentos é feita com base na perspectiva da evolução. O merecem ser lembrados. O primeiro se refere ao envolvimento do alu
i|ue caracteriza a organização dos conteúdos, nessa perspectiva, é a li no com o objeto de estudo que está sendo trabalhado. Na exposição
nearidade e a seqüencialidade. M ais recentemente, encontra-se uma factual e linear, que supõe o aluno como receptáculo de ensinamentos,
tentativa de superação da seqüencialidade e linearidade em obras que além dos textos expositivos e detalhados, estão presentes exercícios vol
tomam como fio condutor da exposição a chamada História integrada, tados especificamente para o teste de compreensão e fixação de conteú
cm que América e Brasil figuram juntam ente com povos da Pré-Histó- dos. A preocupação com o desenvolvimento de competências e habili
i ia, assim como a presença da História da África. dades não faz parte dos horizontes dessas propostas pedagógicas.
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Já as propostas curriculares que concebem o currículo e a edu sobre alguns conceitos considerados fundamentais e sobre os desdobra
cação dentro dos padrões mais atualizados constroem a trama exposi- mentos contidos em sua abrangência.
i iva procurando envolver o aluno por meio da problematização dos te
mas, de sua abordagem, da relação necessária com o mundo cultural
tio aluno; as atividades constituem o cerne do trabalho pedagógico História
apresentado, pensado sempre do ponto de vista da construção de um
conhecimento escolar significativo. A preocupação não é com a quan- O objetivo primeiro do conhecimento histórico é a compreen
i idade dos conteúdos a serem apresentados, ou com as lacunas de con- são dos processos e dos sujeitos históricos, o desvendamento das rela
icúdo de História que ficariam por ser preenchidas, de acordo com a ções que se estabelecem entre os grupos humanos em diferentes tem
lista de assuntos que tradicionalmente fazem parte dos conteúdos a se pos e espaços. Os historiadores estão atentos às diferentes e múltiplas
rem transmitidos pela escola. O que está em evidência é o modo de tra possibilidades e alternativas apresentadas nas sociedades, tanto nas de
balhar historicamente os temas/assuntos/objetos em pauta. hoje quanto nas do passado, que emergiram da ação consciente ou in
consciente dos homens; procuram apontar para os desdobramentos
que se impuseram com o desenrolar das ações desses sujeitos.
CONCEITOS FUNDAMENTAIS PARA O
liNSINO DE HISTÓRIA NA ESCOLARIDADE BÁSICA A aprendizagem de metodologias apropriadas para a construção
do conhecimento histórico, seja no âmbito da pesquisa científica seja
Alguns conceitos fazem parte do arcabouço que foi se consti- no do saber histórico escolar, torna-se um mecanismo essencial para
mindo através dos tempos, pela prática dos historiadores. Construiu- que o aluno possa apropriar-se de um olhar consciente para sua pró
m' uma ‘lógica da História”, que pode ser concebida como um conjun pria sociedade e para si mesmo. Ciente de que o conhecimento é provi
to de procedimentos e conceitos em torno dos quais devem girar as sório, o aluno terá condições de exercitar nos procedimentos próprios
IHcocupaçÕes dos historiadores. Independentemente das mais variadas da História: problematização das questões propostas, delimitação do
i oncepçÕes de mundo, posicionamentos ideológicos ou proposições de objeto, exame do estado da questão, busca de informações, levanta
nrdem meto*dológica, não há como não trabalhar com esses conceitos, mento e tratamento adequado das fontes, percepção dos sujeitos histó
"ii pelo menos com uma parte importante deles. As propostas pedagó- ricos envolvidos (indivíduos, grupos sociais), estratégias de verificação
l',u as, sejam elas quais forem, têm um compromisso implícito com es- e comprovação de hipóteses, organização dos dados coletados, refina
is práticas historiográficas ao produzirem o conhecimento histórico mento dos conceitos (historicidade), proposta de explicação para os fe
• si o lar com suas especificidades e particularidades. O que diferencia as nômenos estudados, elaboração da exposição, redação de textos. Dada
■livt-rsas concepções de História é a forma como esses conceitos e pro- a complexidade do objeto de conhecimento, é imprescindível que seja
' ■ilimentos são entendidos e trabalhados. incentivada a prática interdisciplinar.
Importa tentar perceber quais são os conceitos que são impres- Faz parte da construção do conhecimento histórico, no âmbito
■iiulfveis para que os alunos saídos da escola básica tenham uma for- dos procedimentos que lhe são próprios, a ampliação do conceito de
iii ii,.10 histórica que os auxilie em sua vivência como cidadãos. A títu- fontes históricas, que podem ser trabalhadas pelos alunos: documentos
I" dc sugestão e como início de discussão, propõe-se uma reflexão oficiais, textos de época e atuais, mapas, ilustrações, gravuras, imagens
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de heróis de histórias em quadrinhos, poemas, letras de música, litera- social. Pode-se dizer que o status ontológico do passado garante a com-
mra, manifestos, relatos de viajantes, panfletos, caricaturas, pinturas, preensibilidade do processo. A dimensão de elaboração, de construção
lotos, rádio, televisão etc. O importante é que se alerte para a necessi cognitiva, nos leva a entender a possibilidade das diversas interpreta
dade de que as fontes recebam um tratamento adequado, de acordo ções do passado histórico, dependentes de posicionamentos teóricos e
com sua natureza. metodológicos diferenciados.
É preciso deixar claro, porém, que não é proposta do ensino bá Assim, a História, concebida como processo, busca aprimorar o
sico a formação de pequenos historiadores. O que importa é que a or exercício da problemalizaçao da vida social, como ponto dc partida pa
ganização dos conteúdos e a articulação das estratégias para trabalhar ra a investigação produtiva e criativa, buscando identificar as relações
com eles leve em conta esses procedimentos para a produção do conhe sociais de grupos locais, regionais, nacionais e de outros povos; perce
cimento histórico. Com isso, evita-se passar para o educando a falsa ber as diferenças e semelhanças, os conflitos/contradições e as solida-
sensação de que os conhecimentos históricos existem de forma acaba riedades, igualdades e desigualdades existentes nas sociedades; compa
da, e assim são transmitidos. rar problemáticas atuais e de outros momentos, posicionar-se de forma
crítica no seu presente e buscar as relações possíveis com o passado.
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ferentes concepções de tempo e as periodizações propostas; de situar Conceber a História como o resultado de sujeitos históricos
os acontecimentos históricos nos seus respectivos tempos. O conceito im plica não atribuir o desenrolar do processo como sendo ação da
de tempo supõe também que se estabeleçam relações entre continui vontade de instituições, como o estado, os países, a escola etc., ou re
dade e ruptura, permanências e mudanças/transformações, sucessão e sultante do jogo de categorias de análise (ou conceitos), como siste
simultaneidade, o antes-agora-depois. Leva-nos a estar atentos e fazer mas, capitalism o, socialismo etc. Perceber que a trama histórica não
ver a importância de se considerarem os diversificados ritmos do tem se localiza nas ações individuais, mas no embate das relações sociais,
po histórico quando o situamos na duração dos fenômenos sociais e no tempo.
naturais. E justamente a compreensão dos fenômenos sociais na dura
ção temporal que permite o exercício explicativo das periodizações,
que são frutos de concepções de mundo, de metodologias e até mes Cultura
mo de ideologias diferenciadas.
A ampliação do conceito de cultura, fruto da aproximação en
As considerações sobre a riqueza e com plexidade do conceito tre História e Antropologia, enriquece o âmbito das análises, cami
de tempo são imprescindíveis para que sejam evitados os anacronis- nhando de forma positiva para a abertura do campo científico da His
mos, não tão raros nas explicações históricas. O anacronismo consis tória Cultural. As representações sociais dão unidade a todas as
te em atribuir a determinadas sociedades do passado nossos próprios manifestações da vida, quer individual, quer social. Cultura não é ape
sentimentos ou razões, e assim interpretar suas ações; ou aplicar cri nas o conjunto de manifestações artísticas. Envolve as formas de orga
térios e conceitos que foram elaborados para um a determ inada épo nização do trabalho, da casa, da família, do cotidiano das pessoas, dos
ca, em circunstâncias específicas, para outras épocas com caracterís- ritos, das religiões, das festas etc. Assim, o estudo das identidades so
(icas diferentes. ciais, no âmbito das representações culturais, adquire significado e im
portância para a caracterização de grupos sociais e de povos.
Sujeito histórico
é
Historicidade dos conceitos
Perceber a complexidade das relações sociais presentes no coti
diano e na organização social mais ampla im plica indagar qual o lugar
Os conceitos históricos somente podem ser entendidos na sua
que o indivíduo ocupa na tram a da H istória e como são construídas
historicidade. Isso quer dizer que os conceitos criados para explicar
as identidades pessoais e as sociais, em dimensão temporal. O sujeito
certas realidades históricas têm seu significado voltado para essas rea
histórico, que se configura na inter-relação complexa, duradoura e
lidades, não sendo possível empregá-los indistintamente para toda e
c ontraditória entre as identidades sociais e as pessoais, é o verdadeiro
qualquer situação semelhante. Dessa forma, os conceitos, quando to
construtor da História. Assim, é necessário acentuar que a trama da
mados em sua acepção mais ampla, não podem ser utilizados como
I Iistória não é o resultado apenas da ação de figuras de destaque, con
modelos, mas apenas como indicadores de expectativas analíticas.
sagradas pelos interesses explicativos de grupos, mas sim a construção
Ajudam-nos e facilitam o trabalho a ser realizado no processo de co
consciente/inconsciente, paulatina e imperceptível de todos os agentes
nhecimento, na indagação das fontes e na compreensão de realidades
sociais, individuais ou coletivos.
históricas específicas.
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Registre-se que é possível distinguir os conceitos, na escala de sua mentiras sociais; valorização do patrimônio sociocultural, próprio e de
compreensão, entre aqueles que são mais abrangentes e os que se refe outros povos, incentivando o respeito à diversidade; valorização dos di
rem a realidades mais especificamente determinadas. Quando o concei reitos conquistados pela cidadania plena, aí incluídos os corresponden
to tem uma compreensão geral, que se aplica a realidades histórico-so- tes deveres, sejam dos indivíduos, dos grupos e dos povos, na busca da
ciais semelhantes, pode receber a denominação de “categoria”. Por consolidação da democracia.
exemplo, a categoria trabalho, homem, continente, revolução etc.
Nesse sentido, os conceitos ou categorias são abertos, são vetores à es
pera de concretizações com base na elaboração de conhecimentos espe CONCLUSÃO
cíficos, de acordo com os procedimentos próprios da disciplina Histó
ria. No momento em que se atribui a essas categorias as determinações Ao desenvolver a discussão sobre algumas das questões básicas
históricas e suas especificidades, como trabalho assalariado, trabalho que se colocam para o ensino de História, optamos por sugerir um a sé
servil, trabalho escravo, por exemplo, já estamos lidando com conceitos rie de considerações a respeito de dois blocos de questões: os conteú
que, por sua vez, poderão receber ainda mais especificações, como tra dos e os conceitos. Com certeza, não são questões consensuais entre
balho servil na Germânia, na Francônia, e assim por diante; a revolução historiadores e professores de História. Não foi intenção definir con
socialista, a revolução industrial etc. Não há uma “democracia” consi ceitos ou sugerir os conteúdos que os alunos deverão dom inar no
derada em sua essência, mas democracias: na Grécia, no século XIX, a transcorrer da escolaridade básica. M as, sim, a de constatar aquilo que
democracia liberal, a socialista, a atual brasileira e tc ... Seriam, então, os está mais consolidado na área, tanto em relação à necessidade de se rea
conceitos propriamente ditos, considerados como representações de um lizarem seleções de conteúdos — o que já é feito de forma concreta e
objeto ou fenômeno histórico, por meio de suas características. diversificada na prática da organização escolar — quanto em relação às
considerações sobre os conceitos mais usuais na área de História. A
Para efeito dessa análise, estamos empregando a denominação partir dessas considerações é possível iniciar um debate construtivo pa
“conceito” na acepção mais ampla e abrangente. ra corrigir, confirmar, am pliar e sugerir outras possibilidades.
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