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ISSN 2525-7374

Volume 33 | Número 1 | Jan-Mar 2018

BRASPEN
JOURNAL
Volume 33 | Número 1 | Janeiro-Março/2018
BRASPEN JOURNAL

Brazilian Society of Parenteral


and Enteral Nutrition
ISSN 2525-7374

BRASPEN Journal Volume 33 – número 1


Janeiro/Março de 2018

Publicação Oficial
Brazilian Society of Parenteral Sociedade Brasileira de Nutrição Parenteral e Enteral (SBNPE)
and Enteral Nutrition Federación Latinoamericana de Nutrición Parenteral y Enteral (FELANPE)
Indexada na base de dados LILACS – Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde

Editora Chefe: Silvana Paiva Orlandi


Maria Cristina Gonzalez   Universidade Federal de Pelotas, Faculdade de Nutrição (Pelotas, RS,
  Programa de Pós-graduação em Saúde e Comportamento,   Brasil)
  Universidade Católica de Pelotas (Pelotas, RS, Brasil)
Simone Vasconcelos Generoso
Editora Executiva:   Universidade Federal de Minas Gerais, Departamento de Nutrição
Lilian Mika Horie   (Belo Horizonte, MG, Brasil)
  GANEP Educação (São Paulo, SP, Brasil)
Enfermeiros
MEMBROS DO CONSELHO EDITORIAL: Leticia Faria Serpa
Antonio Carlos Ligocki Campos   Hospital Alemão Oswaldo Cruz (São Paulo, SP, Brasil)
  Universidade Federal do Paraná, Departamento de Cirurgia do Setor de Maria Isabel Pedreira de Freitas
  Ciências da Saúde (Curitiba, PR, Brasil)
  Universidade Estadual de Campinas, Faculdade de Enfermagem
Dan Linetzky Waitzberg   (Campinas, SP, Brasil)
  Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, Departamento
  de Gastroenterologia (São Paulo, SP, Brasil) Suely Itsuko Ciosak
  Universidade de São Paulo, Departamento de Enfermagem em Saúde
José Eduardo de Aguilar Siqueira do Nascimento   Coletiva (São Paulo, SP, Brasil)
  Universidade Federal de Mato Grosso, Departamento de Clínica Cirúrgica
  (Cuiabá, MT, Brasil) Bióloga
Raquel Susana Matos de Miranda Torrinhas
Maria Isabel Toulson Davisson Correia   Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, Departamento
  Universidade Federal de Minas Gerais, Departamento de Cirurgia
  (Belo Horizonte, BH, Brasil)   de Gastroenterologia (São Paulo, SP, Brasil)

EDITORES ASSOCIADOS NACIONAIS EDITORES ASSOCIADOS INTERNACIONAIS

Médicos Alessandro Laviano


  University of Rome (Roma, Itália)
Alessandra Miguel Borges
  Centro de Pesquisas Oncológicas de Florianópolis (CEPON) Andrew Ukleja
  (Florianópolis, SC, Brasil)   Department of Gastroenterology at Cleveland Clinic Florida (Weston,
  Florida, Estados Unidos)
Carlos Antonio Bruno da Silva
  Universidade de Fortaleza, Diretoria do Centro de Ciências da Saúde Carla Prado
  (Fortaleza, CE, Brasil)   University of Alberta (Alberta, Canadá)
José Raimundo Araujo de Azevedo Carol Ireton Jones
  Hospital São Domingos, Serviço de Terapia Intensiva (São Luis, MA, Brasil)   Nutrition Therapy Specialist, Carrollton, Texas (Carrollton, Texas,
  Estados Unidos)
Melina Gouveia Castro
  Hospital Mario Covas (São Paulo, SP, Brasil) Gordon Jensen
  University of Vermont College of Medicine (Burlington, Vermont,
Odery Ramos Júnior   Estados Unidos)
  Universidade Federal do Paraná, Disciplina de Gastroenterologia e
  Faculdade Evangélica de Medicina do Paraná, Disciplina de Nicolas Velasco
  Gastroenterologia (Curitiba, PR, Brasil)   Pontifical Catholic University of Chile (Santiago, Chile)
Paulo Roberto Leitão de Vasconcelos Luiza Kent Smith
  Universidade Federal do Ceará, Faculdade de Medicina (Fortaleza, CE, Brasil)   University of Saskatchewan (Saskatoon, Saskatchewan, Canada)
Roberto Carlos Burini Paula Alves
  Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, Departamento   Instituto Portugues de Oncologia do Porto de Francisco Gentil
  de Saúde Pública (Botucatu, SP, Brasil)   (IPOPFG-E.P.E) (Porto, Portugal)
Roberto José Negrao Nogueira Remy Meier
  Universidade Estadual de Campinas, Faculdade de Ciências Médicas   Medical University Hospital Liestal (Liestal, Switzerland)
  (Campinas, SP, Brasil) Robert Martindale
Pediatria   Oregon Health & Science University (Eugene, Oregon, Estados Unidos)
Mario Cicero Falcão Stephen McClave
  Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, Departamento   University of Louisville (Louisville, Kentucky, Estados Unidos)
  de Pediatria (São Paulo, SP, Brasil)
Vanessa Fuchs
Rubens Feferbaum   Universidad ANAHUAC and UNAM (Cidade do México, México)
  Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, Departamento
  de Pediatria (São Paulo, SP, Brasil) COMITÊ CONSULTIVO
José Vicente Spolidoro Joel Faintuch
  Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Faculdade   Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, Departamento
  de Medicina, Departamento de Pediatria (Porto Alegre, RS, Brasil)   de Gastroenterologia (São Paulo, SP, Brasil)
Nutricionistas Steven B. Heymsfield
Cristina Martins   Pennington Biomedical Research Center (Baton Rouge, Louisiana,
  Fundação Pró-Renal Brasil (Curitiba, PR, Brasil)   Estados Unidos)
Diana Borges Dock Nascimento Secretária:
  Universidade Federal de Mato Grosso, Departamento de Nutrição Vanice Silva de Oliveira Freitas
  (Cuiabá, MT, Brasil)
Revisora Científica:
Graziela Ravacci Rosangela Monteiro
  Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, Departamento
  de Gastroenterologia (São Paulo, SP, Brasil) Projeto Gráfico, Diagramação e Revisão:
Criativa Comunicação e Editora
Mariana Raslan Paes Barbosa
  Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul Impressão:
  (Campo Grande, MS, Brasil) Pontograf
Faintuch J & Ramos O

Brazilian Society of Parenteral and Enteral Nutrition


www.sbnpe.com.br

Presidente:  Comitê de Fonoaudiologia: 


Diogo Oliveira Toledo Maria de Fatima Lago Alvite

Vice-Presidente:  Comitê da Criança e do Adolescente 


Haroldo Falcão Ramos Cunha
José Vicente Noronha Spolidoro
Primeiro Secretário: 
Melina Gouveia Castro Comitê de Reabilitação Intestinal: 
Silvio Jose de Lucena Dantas
Segundo Secretário: 
Gilmária Millere Tavares Comitê de Assistência Domiciliar: 
Denise Philomene Joseph Van Aanholt
Primeiro Tesoureiro: 
Ivens Augusto Oliveira de Souza 
Membros do Comitê Educacional:  
Segundo Tesoureiro: José Eduardo Aguilar Nascimento
Arnaldo Aires Peixoto Junior Robson Freitas de Moura
Odery Ramos Junior
Comitê de Defesa Profissional:
Sérgio Henrique Loss
Maria Isabel T. Davisson Correia
Guilherme Duprat Ceníccola
Comitê de Farmácia:  Cristiane Comeron Gimenez Verotti
Lívia Maria Gonçalves Barbosa Dirce Akamine
Márcia Antunes
Comitê de Nutrição:
Karla Lopes Pereira Gomes
Leticia Fuganti Campos
Maria Izabel Pedreia de Freitas
Comitê de Enfermagem:  Mariade Fatima Lago Alvite
Cláudia Satiko Takemura Matsuba Ana Maria Furkim

Sociedade Brasileira de Nutrição Parenteral e Enteral


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Rev Bras Nutr Clin 2014; 29 (2): XX-XX


2
Sumário

Editorial/ Editorial
Diga Não à Desnutrição…........................................................................................................................................................................... 1
Say No to Malnutrition
Diogo Oliveira Toledo

Artigos Originais/Original Articles

Concentrações de vitamina D em crianças e adolescentes com encefalopatia crônica não evolutiva, relação com a
condição nutricional................................................................................................................................................................................... 3
Vitamin D concentrations in children and adolescents with chronic non-evolutionary encephalopathy, relationship with
nutritional status
Tiago Donizeti Bertolacini da Silva, Fabíola Isabel Suano de Souza, Roseli Oselka Saccardo Sarni

Associação entre o estado nutricional e a presença de toxicidade gastrointestinal em pacientes com câncer de mama................. 9
Association between nutritional status and the presence of gastrointestinal toxicity in patients with breast cancer
Ellen Maria Custodio dos Santos, Laura Mata Lima da Silva, Eduila Maria Couto Santos, Larissa dos Santos Souza

Análise do conhecimento e consumo de alimentos fontes de fósforo por pacientes portadores de insuficiência renal
crônica em tratamento dialítico.............................................................................................................................................................. 15
Analysis of knowledge and consumption of food sources of phosphorus by patients with chronic renal failure in dialysis treatment
Laura Cristina Monteiro Felix, Valeska Carla Morais de Medeiros, Viviane Bressane Claus Molina

Intolerância à lactose e sua relação com a atividade da doença inflamatória intestinal.................................................................... 21


Lactose intolerance and its relation to the activity of the inflammatory bowel disease
Alana Maria Cidral, Bruna Nayara Buzzi, Bruno Lorenzo Scolaro, Clarice Maria Specht, Cristina Henschel Matos, Everson
Fernando Malluta, Sueli Bobato, Claiza Barretta

Risco nutricional de pacientes críticos utilizando o NUTRIC Score...................................................................................................... 26


Nutritional risk of critically ill patients using the NUTRIC Score
Tamara Becker, Maria Cristina Zanchim, Adaize Mognon , Larry Rodrigues de Campos Junior , Taíne Paula Cibulski, José Afonso
Correa, Daiana Argenta Kümpel

Pacientes pediátricos hospitalizados: evolução do estado nutricional e fatores associados............................................................ 32


Hospitalized pediatric patients: evolution of nutritional status and associated factors
Virginia A. Ribeiro, Thaisy C. H. S. Alves, Lílian B. S. Fatal

Uso de indicadores antropométricos para avaliação da adiposidade corporal em idosos no sul do Brasil..................................... 39
Using of the anthropometrics indicators to evaluate of body adiposity in the elderly in Southern Brazi
Vanessa da Silva Sopeña, Bruna Celestino Schneider, Andreia Morales Cascaes, Alexandre Emidio Ribeiro Silva, Silvana Paiva Orlandi

Fatores associados à não utilização de suplemento antianêmico por gestantes de alto risco de Alagoas, Brasil........................... 43
Associated factors to non-use of antianemic supplementation by high risk pregnant women in Alagoas, Brazil
Raphaela Costa Ferreira, Luiz Gonzaga Ribeiro Silva Neto, Marilene Brandão Tenório, Alane Cabral Menezes de Oliveira

Interações fármaco-nutrição enteral em unidade de terapia intensiva: determinação de prevalência e significância clínica....... 49
Drug-enteral nutrition interactions in intensive care unit: determination of prevalence and clinical significance
Débora Lima Barbosa, Soraida Sozzi Miguel, Rita de Cássia Azevedo Couto Cornélio, Mariana Macedo Alvim,
Carolina Fraga Paiva, Ludmila de Souza Caputo
Rev Bras Nutr Clin 2014; 29 (2): XX-XX
3
Faintuch J & Ramos O

Terapia nutricional enteral em uma Unidade de Terapia Intensiva: prescrição versus infusão......................................................... 54
Enteral nutritional therapy on Intensive Therapy Unit: prescription versus infusion
Mayara Ribeiro de Mendonça, Gleyciane Guedes

Terapia nutricional enteral: relação entre percentual de dieta prescrito e administrado e intercorrências associadas em
58
hospital público de Salvador-BA.............................................................................................................................................................
Enteral nutritional therapy: relationship between the percentage of prescribed and administered diet and associated complications in a
public hospital of the city of Salvador-BA
Aline Luquini Santos, Thaisy Cristina Honorato Santos Alves

Alta frequência de síndrome metabólica e sua relação com o baixo consumo alimentar de proteínas em mulheres com
diagnóstico de diabetes gestacional prévio..........................................................................................................................................64
High frequency of metabolic syndrome and its relation to low dietary intake of protein in women with previous gestational diabetes
Mário de Almeida Pereira Coutinho, Rosália Gouveia Filizola, Expedicto Afonso de Macedo, Maria da Conceição Rodrigues
Gonçalves, Luiza Sonia Rios Asciutti, Azamor Cirne de Azevedo Filho, Maria José de Carvalho Costa, Christiane Carmem Costa do
Nascimento, Carla Patrícia Novaes dos Santos Fechine

Relação entre gordura corporal e maturação sexual de adolescentes............................................................................................... 70


Relationship between body fat and sexual maturation of adolescents
Milena Silva Gentil, Carolina Cunha de Oliveira, Heloisa Mendonça Bernini Soares da Silva

Adesão ao tratamento dietético em portadores de diabetes mellitus assistidos pela estratégia saúde da família........................ 76
Adherence to dietary treatment in patients with diabetes mellitus assisted by family health strategy
Tallita Barbosa Monteiro dos Santos, Betânia de Jesus e Silva de Almendra Freitas

Artigo Especial / Special Article

Campanha “Diga não à desnutrição”: 11 passos importantes para combater a desnutrição hospitalar........................................... 86
Campaign “Say no to malnutrition”: 11 important steps to fight hospital malnutrition
Diogo Oliveira Toledo, Silvia Maria Fraga Piovacari, Lilian Mika Horie, Liane Brescovici Nunes de Matos, Melina Gouveia Castro,
Guilherme Duprat Ceniccola, Fabiano Girade Corrêa, Ivens Willians Silva Giacomassi, Ana Paula Noronha Barrére, Leticia Fuganti
Campos, Cristiane Comeron Gimenez Verotti, Claudia Satiko Takemura Matsuba, Rodrigo Costa Gonçalves, Haroldo Falcão, Rogério
Dib, Thais Eliana Carvalho Lima, Ivens Augusto Oliveira de Souza, Maria Cristina Gonzalez, Maria Isabel Davidson Correia

Artigo de Revisão / Review Article

Uso terapêutico adjuvante de probióticos no efeito tardio da radioterapia pélvica: a retocolite ulcerativa................................. 101
Therapeutic adjunctive use of probiotics in the late effect of pelvic radiotherapy: ulcerative colitis
Juliana Dalapicula do Amaral, Angela Regina Binda da Silva de Jesus

Instruções aos Autores / Instructions for Authors.................................................................................................... 107

Rev Bras Nutr Clin 2014; 29 (2): XX-XX


4
E
Editorial

Diga Não à Desnutrição


Say No to Malnutrition

Nesta primeira edição do BRASPEN Journal de 2018, gostaríamos de dar as


boas-vindas aos nossos pesquisadores e convidar a todos que ainda não submeteram
seu artigo para publicação em nossa revista a participar.
Em especial nesta edição vamos lançar a campanha: Diga Não à Desnutrição,
com os onze passos para combate a esta epidemia que só cresce no nosso País.
Estamos há 20 anos da publicação do IBRANUTRI, que revelou 50% de pacientes
desnutridos à internação e nada foi feito para modificar o cenário. O objetivo desta
campanha é reduzir as taxas de desnutrição por meio de uma série de ações que
incluem triagem, diagnóstico, manejo e tratamento da desnutrição. Para facilitar a
maneira de difundir este conhecimento, foi desenvolvido um método mnemônico
com a palavra “DESNUTRIÇÃO”, abordando cada letra inicial de maneira simples,
desde o conceito até o tratamento da desnutrição.
Além disso, esta edição contará com artigos na área de avaliação nutricional,
gravidez e pediatria, com destaque para o artigo de avaliação das concentrações de
vitamina D em crianças com encefalopatia crônica. Destacamos, também, artigo
que aborda a importância da avaliação da composição corporal no estágio final de
maturação sexual.
Não deixe de enviar artigos para publicação em nossa Revista, e contribua para
difusão da pesquisa no Brasil!

Diogo Oliveira Toledo


Presidente da SBNPE/BRASPEN

BRASPEN J 2018; 33 (1): 1


1
CITE OS ARTIGOS DO BRASPEN JOURNAL NAS SUAS PUBLICAÇÕES.
AS CITAÇÕES ROBUSTECERÃO NOSSAS CHANCES DE INDEXAÇÃO.

BRASPEN J 2018; 33 (1): 1


2
A Artigo Original
Vitamina D em crianças e adolescentes com encefalopatia crônica não evolutiva

Concentrações de vitamina D em crianças e


adolescentes com encefalopatia crônica não
evolutiva, relação com a condição nutricional
Vitamin D concentrations in children and adolescents with chronic non-evolutionary encephalopathy,
relationship with nutritional status

RESUMO
Tiago Donizeti Bertolacini da Silva¹
Fabíola Isabel Suano de Souza² Objetivo: Descrever as concentrações de vitamina D em crianças e adolescentes com encefalopatia
Roseli Oselka Saccardo Sarni3 crônica não evolutiva (ECNE). Relacionar, nesses pacientes, as concentrações de vitamina D com
as de paratormônio, cálcio, fósforo e fosfatase alcalina e com a condição nutricional. Método:
Foi realizado estudo transversal, com pacientes portadores de ECNE. Dados coletados: idade,
causa da ECNE, morbidades associadas, uso de medicamentos e suplementos, reabilitação e
exposição solar; peso, estatura e nível de comprometimento funcional. Coletaram-se 15 mL de
sangue para determinação das concentrações de 25-OH-D3, fósforo, cálcio, fosfatase alcalina
e paratormônio. Resultados: Entre os 20 pacientes, 13 (65%) eram do sexo masculino, 14
(70%) pré-púberes e a mediana de idade foi 6,4 anos. A principal causa da ECNE foi a anóxia
perinatal em 11 (55%) e a maioria dos pacientes tinha importante comprometimento funcional.
Baixa estatura e magreza foram as alterações mais comuns, atingindo 11 (55%) e 6 (30%) dos
pacientes, respectivamente. Valores de 25-OH-D3 < 20 ng/mL foram observados em 3 (15%)
pacientes. Crianças que utilizaram gastrostomia para terapia nutricional tinham concentrações
mais elevadas de 25-OH-D3 em comparação às que usavam exclusivamente a via oral para
oferta de dieta. As concentrações de 25-OH-D3 se associaram de forma inversa e estatisticamente
significante com o escore ZIMC. Conclusões: A deficiência de vitamina D foi observada em 15%
dos pacientes com ECNE avaliados e não se associou com outros marcadores do metabolismo
ósseo. As concentrações de 25-OH-D3 foram superiores nos pacientes com gastrostomia e se
correlacionaram de forma inversa com o escore ZIMC.

ABSTRACT
Objective: To describe the concentrations of vitamin D in children and adolescents with cerebral
palsy (CP). To relate, in these patients, vitamin D concentrations with those of parathyroid hormone,
Unitermos:
Vitamina D. Paralisia Cerebral. Estado Nutricional. calcium, phosphorus and alkaline phosphatase and with nutritional status. Methods: A cross-
sectional study was performed with patients with CP. Data collected: age, cause of CP, associated
Keywords: morbidities, use of medications and supplements, rehabilitation and sun exposure; weight, height
Vitamin D. Cerebral Palsy. Nutritional Status. and level of functional impairment. 15 mL of blood was collected for determination of 25-OH-D3,
phosphorus, calcium, alkaline phosphatase and parathyroid hormone concentrations. Results:
Endereço para correspondência: Among the 20 patients, 13 (65%) were male, 14 (70%) were prepubescent and the median age
Roseli Oselka Saccardo Sarni was 6.4 years. The main cause of CP was perinatal anoxia in 11 (55%) and most patients had
Rua Renê Zamlutti 94/52 – Vila Mariana – São Paulo, significant functional impairment. Low stature and thinness were the most common alterations,
SP, Brasil – CEP: 04116-260 reaching 11 (55%) and 6 (30%) of the patients, respectively. 25-OH-D3 values < 20 ng / mL
E-mail: rssarni@gmail.com
were observed in 3 (15%) patients. Children who used gastrostomy for nutritional therapy had
Submissão: higher concentrations of 25-OH-D3 compared to exclusively oral use for dietary supplementation.
10 de fevereiro de 2017 Concentrations of 25-OH-D3 were inversely and statistically significantly associated with BMIZ
score. Conclusions: Vitamin D deficiency was observed in 15% of patients with assessed CP and
Aceito para publicação: were not associated with other markers of bone metabolism. 25-OH-D3 concentrations were
4 de maio de 2017 higher in gastrostomy patients and correlated inversely with the BIMZ score.

1. Acadêmico do 5º ano do Curso de Medicina da Faculdade de Medicina do ABC, Santo André, SP, Brasil.
2. Professora Auxiliar do Departamento de Pediatria da Faculdade de Medicina do ABC. Professora Adjunto do Departamento de Pediatria da
Escola Paulista de Medicina/Universidade Federal de São Paulo (EPM-UNIFESP), São Paulo, SP, Brasil.
3. Professora Titular Livre Docente do Departamento de Pediatria da Faculdade de Medicina do ABC. Médica Assistente do Departamento de
Pediatria da Escola Paulista de Medicina/Universidade Federal de São Paulo (EPM-UNIFESP), São Paulo, SP, Brasil.

BRASPEN J 2018; 33 (1): 3-8


3
Silva TDB et al.

INTRODUÇÃO e adolescentes com ECNE. São escassos os trabalhos na


A encefalopatia crônica não evolutiva (ECNE) envolve um literatura abordando esse tema, por isso, o objetivo desse
grupo de doenças neurológicas caracterizadas por alterações estudo é descrever as concentrações de vitamina D, parator-
na função motora (finas e/ou grosseiras), associadas ou não mônio, cálcio, fósforo e fosfatase alcalina nessas crianças e
a comprometimento cognitivo e de locomoção1. Sua etio- adolescentes com ECNE e relacionar as concentrações de
logia varia conforme a faixa etária. A causa mais frequente vitamina D com a condição nutricional.
em crianças é a encefalopatia hipóxico-isquêmica e em
adolescentes traumas e tumores de sistema nervoso central2. MÉTODO
Crianças e adolescentes com ECNE têm maior risco de Foi realizado estudo transversal, no período de julho
apresentar desnutrição energético proteica e carência de de 2015 a junho de 2016, com crianças e adolescentes
micronutrientes3. São fatores de risco para essa situação:
de 2 a 19 anos portadores de ECNE, acompanhados no
menor ingestão por via oral (disfagia), maior número de infec-
ambulatório da Disciplina de Clínica Pediátrica da Facul-
ções respiratórias (aspiração), aumento do gasto energético
dade de Medicina do ABC (FMABC), em Santo André, SP.
(epilepsia), alterações gastrintestinais (refluxo gastroesofágico
Os responsáveis foram convidados a participar do projeto
e constipação intestinal) e interação droga-nutriente (uso
por telefone, ou no momento da consulta de seus filhos no
de anticonvulsivantes que aumentam a excreção renal de
ambulatório. Foram incluídos os pacientes cujos responsáveis
vitamina D, folato e vitamina B12).
concordaram em participar do estudo e assinaram o Termo
Recentemente, estudos sugeriram que a saúde óssea de Consentimento Livre e Esclarecido. O projeto foi apro-
dessas crianças e adolescentes também está prejudicada, vado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da FMABC, sob o
com maior risco de osteopenia, osteoporose e fraturas4. número 1.308.763.
São descritos os seguintes fatores como relacionados a essa
Foram excluídos as crianças e adolescentes com outras
situação: prematuridade; deficiência de vitamina D; menor
doenças crônicas associadas (nefropatias, endocrinopatias,
consumo de macronutrientes e micronutrientes (cálcio,
hepatopatias e síndrome de má absorção), os com alte-
fósforo, magnésio, zinco e vitamina D); imobilização; baixa
rações cromossômicas, aqueles em uso de medicamentos
exposição solar e uso crônico de medicamentos, tais como
como hormônio de crescimento e tireoidiano, assim como
anticonvulsivantes, corticosteroides e diuréticos.
aqueles com quadro infeccioso ou inflamatório no momento
Ainda não há protocolos bem definidos para o diagnós- da coleta dos dados.
tico e tratamento da doença óssea na ECNE, por isso, a
prevenção e intervenção precoces são fundamentais para
se evitar a progressão para um quadro mais grave, como as Dados Coletados
fraturas. O exame considerado padrão-ouro para avaliação 1) Dados gerais: foi aplicado questionário pré-codificado
da massa óssea é a dupla emissão de feixes de raio-X (DXA), contendo informações sobre antecedentes obstétricos
entretanto, ele só pode ser realizado a partir de 6 anos de (peso, comprimento e condições de nascimento), pessoais
idade e os padrões de referência utilizados não atendem às e mórbidos; familiares; nível socioeconômico; escolari-
particularidades da população com ECNE, como redução dade materna; condições de entorno e hábitos de vida
na massa magra, baixa estatura e deformidades ósseas4. diária (se está em reabilitação, uso de medicamentos,
Os marcadores bioquímicos, apesar da menor acurácia, suplementos vitamínicos e minerais – tipo e dose, prática
podem ser utilizados para avaliar o metabolismo ósseo, de atividade física e exposição solar).
especialmente nessa população de risco. Os mais utilizados 2) Avaliação do estadiamento puberal: foi realizado por
na prática clínica são as dosagens de vitamina D, cálcio, meio dos critérios de Marshall & Tanner6.
paratormônio (PTH), fósforo e fosfatase alcalina4. 3) Avaliação da condição nutricional: foram obtidos os
A vitamina D é reconhecida como um pró-hormônio dados de peso, em balança tipo plataforma, estando
envolvido no metabolismo ósseo e funcionamento dos os pacientes apenas com roupas íntimas, e de estatura,
sistemas imunológico, endócrino e cardiovascular. A maior com estadiômetro vertical ou horizontal graduado em
parte da vitamina D circulante advém da síntese cutânea milímetros. Para as crianças que não ficam em pé, o
por ação dos raios ultravioleta e, um percentual menor, da peso foi obtido com a criança no colo da mãe e depois
ingestão dietética. Na hipovitaminose D, pode haver aumento descontado o peso da mesma; e a estatura foi estimada
das concentrações de PTH (hiperparatireoidismo secundário), por meio das fórmulas que consideram segmentos
fosfatase alcalina e redução do fósforo plasmático5. [comprimento joelho/calcanhar: E=(2,69xCJ) + 24,2±
A manutenção da saúde óssea é fundamental para a (1,1)]. Esses dados foram utilizados para cálculo do
qualidade de vida e para a adequada reabilitação de crianças índice de massa corporal (ZIMC) e estatura/idade (ZE)
BRASPEN J 2018; 33 (1): 3-8
4
Vitamina D em crianças e adolescentes com encefalopatia crônica não evolutiva

na forma de ­escore Z. Os pontos de corte utilizados para Uso de via alternativa de alimentação (gastrostomia) foi
o diagnóstico antropométrico foram os propostos pela constatada em 7 (35%) das crianças e adolescentes, sendo
Organização Mundial de Saúde7. que 5/7 (71,4%) e 2/7 (11,8%) usavam a gastrostomia
4) Classificação do nível de comprometimento funcional: (GTM) associada à via oral e de forma exclusiva para oferta
foi utilizada a Classificação da Função Motora Grossa da dieta, respectivamente. 17 em 20 (85%) dos pacientes
(Gross Motor Function Classification System - GMFCS) faziam reabilitação regularmente (fisioterapia – 75%, fonote-
para ECNE, baseando-se no movimento iniciado volunta- rapia – 65%, terapia ocupacional – 30%, equoterapia - 10%
riamente, enfatizando particularmente o sentar e o andar8. e hidroterapia – 10%).
5) Avaliação laboratorial: foram coletados 15 mL de sangue Quanto à condição nutricional, baixa estatura e magreza
periférico, no período da manhã, após jejum de 8 horas. foram as alterações mais comuns, atingindo 11 (55%) e 6
As amostras foram acondicionadas em tubos secos e foto- (30%) dos pacientes, respectivamente. Apenas 2 crianças
protegidos, refrigeradas e, imediatamente, transportadas tinham sobrepeso. Não houve diferença estatisticamente
para o Laboratório, onde foram centrifugadas (1500 significante em relação à condição nutricional (ZIMC e ZEI)
rpm por 10 minutos) e aliquotadas. Destas alíquotas foi e o uso ou não de gastrostomia.
realizada a dosagem plasmática de: Os anticonvulsivantes foram os medicamentos mais
a. Vitamina D: 25-OH - vitamina D25 (OH) D3 por utilizados nessa população - 15 (75%). Uso de suplemento
eletroquimioluminescência. Valores abaixo de 20 ng/ medicamentoso contendo vitamina D isolada ou associada
mL foram considerados como deficiência9. Marcadores a outras foi observado em 6 (30%) das crianças e adoles-
do metabolismo de vitamina D: paratormônio (PTH) por centes. A dose variou de 400 a 800 UI ao dia de vitamina
imunofluorimetria (referência: 11 a 67 pg/mL), cálcio D. Exposição solar regular foi referida em 13 (65%) dos
ionizado (colorimétrico, referência: 4,0 – 5,4 mg/dL), pacientes. Essa exposição acontecia pela manhã, em média
fósforo (colorimétrico, referência: 2,7 a 4,5 mg/dL) e quatro vezes por semana e por volta de 34,0±18,9 minutos.
fosfatase alcalina (colorimétrico, referência < 1100 U/L). Na Tabela 1, estão apresentadas as médias dos valores
b. Função renal: ureia (colorimétrico), creatinina (colori- de vitamina D, PTH, cálcio e fosfatase alcalina dos pacientes
com ECNE. Foram observados valores de 25-OH-D3 < 20
métrico) e ácido úrico (colorimétrico).
ng/mL em 3 (15%) pacientes. Em comum, essas crianças
c. Marcadores inflamatórios: proteína-C-reativa ultrassen-
foram classificadas pela GMFCS como nível V, recebiam
sível (PCR-us, imunoturbidimetria, referência: < 3 mg/dL). dieta exclusivamente por via oral, usavam pelo menos duas
A análise estatística foi feita com os dados digitados em classes de anticonvulsivantes e não tomavam nenhum tipo
tabela do Excel (Microsoft®) e foram analisados no Pacote de suplemento medicamentoso de vitamina D.
Estatístico SPSS 24.0 (IBM®). Utilizou-se o teste do Qui- Não foram observados valores elevados de PTH, fosfatase
quadrado ou Exato de Fisher para comparação das variáveis alcalina e nem baixos de fósforo na população estudada
qualitativas, e o teste de t-Student e correlação de Pearson (Tabela 1).
para as variáveis contínuas. O nível de significância adotado
Crianças que utilizaram gastrostomia para terapia nutri-
foi de 5%.
cional tinham concentrações mais elevadas de 25-OH-D3 em
comparação às que usavam exclusivamente a via oral para
RESULTADOS receber dieta (44,0±10,5 vs. 30,7±13,7 ng/mL; p=0,040)
Foram incluídas 20 crianças e adolescentes com ECNE. (Figura 1). Não houve diferença dos níveis de 25-OH-D3 em
Destes, 13 (65,0%) eram do sexo masculino, 14 (70%) pré- relação à exposição solar, uso de suplemento medicamentoso
púberes e a mediana de idade foi 6,4 anos (1,7;17,9 anos). de vitamina D e uso de medicamentos anticonvulsivantes.
A renda per capita das famílias foi de R$ 340,00±161,00 e
7 (35%) das mães tinham menos de 8 anos de escolaridade.
Tabela 1 – Descrição dos valores de vitamina D (25-OH-D3), paratormônio,
A principal causa da ECNE foi a hipóxia perinatal 11 fosfatase alcalina, cálcio e fósforo dos pacientes com ECNE.
(55%) e a maioria dos pacientes [16 (80%)] tinha impor- Média Desvio Mínimo-
tante comprometimento funcional (IV e V). Uma criança Padrão Máximo
era abrigada e os demais tinham a mãe como cuidadora 25-OH-D3 ng/mL 35,5 13,9 8,7 – 59,1
principal. As morbidades associadas à ECNE mais comu- Paratormônio pg/mL 32,1 15,0 4,9 – 66,2
mente observadas foram as deformidades ósseas (coluna e
Fosfatase alcalina U/L 348,9 107,1 150,2 – 571,2
articulações) 8 (40%); doença do refluxo gastroesofágico 6
Cálcio mg/dL 9,7 0,45 8,8 – 10,8
(30%); constipação intestinal 9 (45%); epilepsia 8 (40%); e
Fósforo mg/dL 5,0 0,82 3,7 – 6,9
disfagia 3 (15%).
BRASPEN J 2018; 33 (1): 3-8
5
Silva TDB et al.

Figura 1 - Comparação das concentrações de vitamina D (25-OH-D3) em crianças e adolescentes com ECNE que usavam ou não gastrostomia.
* Nível de significância do teste t-Student (p=0,040)

Figura 2 - Correlação entre as concentrações de vitamina D (25-OH-D3) e escore Z do índice de massa corporal nas crianças e adolescentes com ECNE.
Nível de significância da correlação de Pearson (r=-0,516; p=0,020).

BRASPEN J 2018; 33 (1): 3-8


6
Vitamina D em crianças e adolescentes com encefalopatia crônica não evolutiva

As concentrações de 25-OH-D3 se associaram de Mesmo nos pacientes com concentrações de vitamina D


forma inversa e estatisticamente significante com o ZIMC (r consideradas insuficientes, não houve alteração dos demais
=-0,516; p=0,020) (Figura 2). Não houve associação da marcadores do metabolismo ósseo. A elevação do parator-
25-OH-D3 com as demais variáveis laboratoriais estudadas mônio consequente à deficiência de vitamina D pode ocorrer
(PTH, cálcio, fósforo, fosfatase alcalina), com o ZEI e nem mais tardiamente, especialmente em crianças mais jovens,
com o tempo de exposição solar. conforme mencionado em estudo recente16.
As crianças e adolescentes avaliados apresentavam
DISCUSSÃO intenso comprometimento da condição nutricional, com
mais da metade destes com diagnóstico de desnutrição
Em crianças e adolescentes com ECNE, a frequência e/ou baixa estatura. Não houve diferença na condição
de hipovitaminose D foi baixa e não se associou com a nutricional segundo o uso ou não de gastrostomia. O
suplementação medicamentosa, exposição solar ou uso acometimento do estado nutricional associado à ECNE
de anticonvulsivantes. O uso de gastrostomia associou-se é multifatorial. A dificuldade e incoordenação à deglu-
com maiores concentrações de 25-OH-D3. Possivelmente, tição são fatores importantes, pois podem comprometer
porque, apesar da presença nesta população de vários a ingestão e elevar o número de infecções pulmonares,
fatores de risco para deficiência de vitamina D, a oferta mais especialmente por aspiração17. Infelizmente, por vezes,
adequada de macro e micronutrientes (incluindo vitamina há atraso no encaminhamento para atendimento multi-
D) por meio das dietas enterais completas industrializadas, profissional e terapia nutricional especializada por via
fornecidas gratuitamente pelo Sistema Único de Saúde, oral, sondas ou estomias, o que contribui para a elevada
administradas pela GTM, de forma isolada ou combinada, frequência de desnutrição.
atuou de forma a prevenir tal carência10.
Podem ser consideradas limitações desse estudo a
Além disso, o fato dos pacientes estudados estarem sob ausência de avaliação da ingestão dietética de macro
cuidados intensivos da família, médico, equipe multidisci- e micronutrientes, de medidas de composição corporal
plinar e realizarem atividades de reabilitação pode explicar e o tamanho amostral, por se tratar de um estudo
o pequeno percentual de deficiência de vitamina D encon- unicêntrico.
trado nessa população. Metanálise publicada em 2013
visando avaliar o efeito da terapia nutricional administrada
por gastrostomia ou jejunostomia comparativamente à via CONCLUSÃO
oral exclusiva em crianças com paralisia cerebral concluiu A deficiência de vitamina D foi observada em 15%
pela inexistência de estudos randômicos de boa qualidade dos pacientes com ECNE avaliados. As concentrações de
metodológica que permitam afirmar sua superioridade11. 25-OH-D3 foram superiores nos pacientes com gastrostomia
Estudo conduzido com 51 crianças com paralisia cerebral e se correlacionaram de forma inversa com o escore ZIMC.
encontrou concentrações médias de 25-(OH)-D3 seme- Entretanto, as alterações dos níveis de 25-OH-D3 não se
lhantes às por nós observadas e sem relação com a densidade associaram com outros marcadores do metabolismo ósseo,
mineral óssea avaliada por densitometria. O estudo não como PTH, cálcio, fósforo e fosfatase alcalina.
avaliou as concentrações da vitamina em função da terapia
nutricional empregada12. Outro estudo conduzido com 18 REFERÊNCIAS
crianças com paralisia cerebral demonstrou concentrações
1. Strauss D, Kastner T, Ashwal S, White J. Tubefeeding and morta-
insuficientes de vitamina D em proporções similares às obser- lity in children with severe disabilities and mental retardation.
vadas em crianças saudáveis13. Pediatrics. 1997;99(3):358-62.
2. MacLennan AH, Thompson SC, Gecz J. Cerebral palsy: causes,
Houve associação inversa das concentrações de pathways, and the role of genetic variants. Am J Obstet Gynecol.
25-OH-D3 com o ZIMC. Sabe-se que a vitamina D e o tecido 2015;213(6):779-88.
adiposo interagem entre si de forma complexa. A vitamina 3. Bell KL, Samson-Fang L. Nutritional management of children
with cerebral palsy. Eur J Clin Nutr. 2013;67(Suppl 2):S13-6.
D age na adipogênese e em situações especiais, como no
4. Houlihan CM. Bone health in cerebral palsy: who's at risk and
caso da obesidade, pode ter efeito anti-inflamatório sistêmico what to do about it? J Pediatr Rehabil Med. 2014;7(2):143-53.
e local14. Uma possível explicação para essa associação 5. Lee JY, So TY, Thackray J. A review on vitamin D deficiency
seria a modificação na composição corporal descrita em treatment in pediatric patients. J Pediatr Pharmacol Ther.
2013;18(4):277-91.
indivíduos com paralisia cerebral, que apresentam aumento 6. Marshall WA, Tanner JM. Variations in pattern of pubertal
da massa gorda e redução da massa magra15, o que pode changes in girls. Arch Dis Child. 1969;44(235):291-303.
explicar tal associação. Futuros estudos utilizando medidas 7. Onis M, Onyango AW, Borghi E, Siyam A, Nishida C, Siek-
mann J. Development of a WHO growth reference for school-
mais apropriadas de composição corporal podem elucidar aged children and adolescents. Bull World Health Organ.
melhor tal achado. 2007;85(9):660-7.

BRASPEN J 2018; 33 (1): 3-8


7
Silva TDB et al.

8. Oliveira AIA, Golin MO, Cunha MCB. Aplicabilidade do Sistema children and adolescents with neuromuscular disorders and
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9. Su Z, Narla SN, Zhu Y. 25-Hydroxyvitamin D: analysis and Clin Nutr Metab Care. 2015;18(4):367-73.
clinical application. Clin Chim Acta. 2014;433:200-5. 15. Walker JL, Bell KL, Stevenson RD, Weir KA, Boyd RN,
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Osteoporos Int. 2015;26(1):141-50. 17. Erasmus CE, van Hulst K, Rotteveel JJ, Willemsen MA, Jongerius
13. Razmdjou S, Seufert J, Rensing-Zimmermann C, Kirschner PH. Clinical practice: swallowing problems in cerebral palsy.
J, Korinthenberg R. Differential analysis of bone density in Eur J Pediatr. 2012;171(3):409-14.

Local de realização do trabalho: Departamento de Pediatria da Faculdade de Medicina do ABC, Santo André, SP, Brasil.

Financiamento: Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (PIBIC) – CNPq. Processo: 158814/2015-0.

Conflito de interesse: Os autores declaram não haver.

Apresentado no Congresso Brasileiro de Nutrologia Pediátrica – Belém – PA, em 30 de setembro de 2016.

BRASPEN J 2018; 33 (1): 3-8


8
A Artigo Original
Estado nutricional e toxicidade gastrointestinal em pacientes com câncer de mama

Associação entre o estado nutricional e a


presença de toxicidade gastrointestinal em
pacientes com câncer de mama
Association between nutritional status and the presence of gastrointestinal toxicity in patients with
breast cancer

RESUMO
Ellen Maria Custodio dos Santos¹
Laura Mata Lima da Silva² Introdução: O câncer de mama é o tipo de câncer mais prevalente em mulheres no mundo e
Eduila Maria Couto Santos³ no Brasil. Mulheres com câncer de mama e excesso de peso podem ter a dose quimioterápica
Larissa dos Santos Souza¹ superestimada, causando um aumento do risco de toxicidade. Objetivo: Associar o estado
nutricional e a presença de toxicidade gastrointestinal em mulheres com câncer de mama de
um hospital de Recife/PE. Método: Estudo do tipo série de casos e abordagem quantitativa,
realizado com mulheres com câncer de mama em tratamento quimioterápico. A avaliação do
estado nutricional foi realizada por meio dos parâmetros antropométricos (peso, altura, Índice
de Massa Corporal - IMC, circunferência do braço – CB, e circunferência do pescoço - CPesc) e
da Avaliação Subjetiva Global Produzida pelo Paciente (ASG-PPP). A toxicidade gastrointestinal
foi avaliada pela presença dos sintomas náusea, vômito, diarreia, constipação e mucosite. Para
análise estatística, foi utilizado o teste Qui-quadrado. Resultados: Foram avaliados 20 pacientes,
em sua maioria com idade maior que 60 anos (60%), procedentes da capital do estado (65%), de
etnia branca (45%), apresentando pelo menos uma comorbidade (65%). De acordo com o IMC,
60% (n=12) da amostra encontravam-se com excesso de peso, 90% (n=18) apresentavam risco
cardiovascular segundo a CPesc e apenas 10% apresentaram diagnóstico de desnutrição pela
avaliação da ASG-PPP. 60% das pacientes apresentavam sintomas gastrointestinais. Ao relacionar
o estado nutricional com a presença de sintomas gastrointestinais, observou-se que nenhuma das
variáveis apresentou associação significativa. Conclusões: O estado nutricional não se mostrou
como um determinante da presença de toxicidade gastrointestinal.

ABSTRACT
Introduction: Breast cancer is the most prevalent type of cancer in women worldwide and in Brazil.
Unitermos:
Women with breast cancer and being overweight may have an overestimated chemotherapy dose,
Quimioterapia. Sobrepeso. Efeito Colateral. Câncer.
causing an increased risk of toxicity. Objective: To associate the nutritional status and presence of
Keywords: gastrointestinal toxicity in women with breast cancer at a Recife / PE hospital. Methods: Case-type
Chemotherapy. Overweight.Drug-Related Side Effects study and quantitative approach, carried out with women with breast cancer undergoing chemo-
and Adverse Reactions. Cancer. therapy. The evaluation of nutritional status was performed using the anthropometric parameters
(weight, height, Body Mass Index - BMI, circumference of the arm– CA, and circumference of the
Endereço para correspondência: neck - CN) and the Patient-Produced Global Subjective Assessment (PPGSA). Gastrointestinal
Ellen Maria Custodio dos Santos toxicity was assessed by the presence of nausea, vomiting, diarrhea, constipation and mucositis.
Segunda Travessa Tancredo Neves, 99– Vitória de The chi-square test was used for statistical analysis. Results: Twenty patients (60%) from the
Santo Antão, PE, Brasil – CEP:55608-282 state capital (65%), white (45%), with at least one comorbidity (65%) were evaluated. According
E-mail:ellencustodio.s@hotmail.com
to the BMI, 60% (n=12) of the sample were overweight, 90% (n=18) presented cardiovascular
Submissão: risk according to CN and only 10% presented a diagnosis of malnutrition by the PPGSA evalua-
16 de maio de 2017 tion. 60% of the patients had gastrointestinal symptoms. When the nutritional status was related
to the presence of gastrointestinal symptoms, it was observed that none of the variables had a
Aceito para publicação: significant association. Conclusions: The nutritional status was not shown to be a determinant of
5 de agosto de 2017 the presence of gastrointestinal toxicity.

1. Nutricionista residente do Hospital dos Servidores do Estado, Recife, PE, Brasil.


2. Nutricionista, Coordenadora do programa de residência do Hospital dos Servidores do Estado, Recife, PE, Brasil.
3. Professora do Centro Acadêmico de Vitória de Santo Antão, Núcleo de Nutrição, Universidade Federal de Pernambuco, Recife, PE, Brasil.

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9
Santos EMC et al.

INTRODUÇÃO pescoço (CPesc) e pela aplicação da Avaliação Subjetiva


O câncer de mama é o tipo de câncer mais prevalente Global Produzida pelo Paciente (ASG-PP). Os pacientes
em mulheres no mundo e no Brasil, apresentando cerca de que deambulavam foram pesados e medidos. As mulheres
25% casos novos por ano e estimativa de 57.960 casos novos acamadas tiveram peso estimado de acordo com a fórmula
previstos para o ano de 2016. Os fatores de riscos fortemente proposta por Lee e Nieman3, que utiliza como parâmetros
associados ao desenvolvimento do câncer de mama são altura do joelho (AJ), circunferência do braço (CB), idade
idade avançada, utilização de hormônios exógenos e alguns e raça e para determinar a altura estimada foi utilizada a
eventos reprodutivos, como menarca precoce e menopausa equação de Chumlea et al.4.
tardia. Todavia, sabe-se que fatores ligados ao estilo de vida e O IMC foi calculado com os dados de peso e altura,
os genéticos também têm relação importante em sua gênese1. segundo a fórmula: Peso (kg)/Altura (m2). Para a classifi-
O tratamento antineoplásico no câncer de mama cação do estado nutricional segundo o IMC, considerou-se
está associado a efeitos colaterais indesejáveis (náuseas, os critérios da OMS para adultos5 e o de Lipschitz6 para
vômitos, mucosite, estomatite, entre outros) que podem idosos. Para a CB, foi obtido o percentual de adequação para
refletir diretamente no estado nutricional, levando à perda classificação do estado nutricional por meio da fórmula: CB
de peso corporal. Por outro lado, estudos demonstram que obtida (cm) x 100/ CB percentil 50, considerando os valores
pacientes com câncer de mama submetidos ao tratamento de referência do NHANES III7, e a classificação foi realizada
quimioterápico cursam com ganho de peso, o qual pode de acordo com o preconizado por Blackburn & Thornton8.
ser explicado pela redução da atividade física, aumento do A aferição da CPesc foi realizada no ponto médio do
consumo alimentar e a utilização de alguns medicamentos, pescoço utilizando uma fita métrica inextensível e flexível.
como os corticosteroides2. Para a classificação, foram utilizados os valores ≤34 cm
Em adição, pacientes com câncer de mama com excesso para ausência de risco cardiovascular e >34 cm para risco
de peso podem ter a dose quimioterápica superestimada, cardiovascular em mulheres9. Todos participantes também
uma vez que se utiliza do peso atual para determinação foram avaliados por meio da ASG-PPP, que consiste em um
do cálculo da dose e, assim, causar um aumento do risco questionário autoaplicativo, dividido em duas partes. Na
de toxicidade, dentre elas, a gastrointestinal2. No entanto, primeira, o paciente responde, descrevendo sua alteração de
poucos estudos examinaram a relação entre a toxicidade e peso, da ingestão alimentar, sintomas relacionados ao câncer
o excesso de peso em pacientes com câncer submetidos à e alterações da capacidade funcional. Na segunda parte,
quimioterapia. respondida pelo profissional que aplica o questionário, as
questões são baseadas nos fatores associados ao diagnóstico
Diante do exposto, esse estudo tem como objetivo avaliar
que aumentam a demanda metabólica e o exame físico. O
a associação entre o estado nutricional e a presença de toxi-
estado nutricional dos pacientes foi classificado da seguinte
cidade gastrointestinal em mulheres com câncer de mama
maneira: A – Bem nutrido, B – Moderadamente desnutrido
submetidas ao tratamento quimioterápico ambulatorial.
ou suspeito de desnutrição e C – Gravemente desnutrido10.
A toxicidade gastrointestinal dos quimioterápicos
MÉTODO manifesta-se como náuseas e vômitos, mucosite, diarreia e
Estudo do tipo série de casos e abordagem quantitativa constipação intestinal. Sendo assim, formam estabelecidos
na clínica de quimioterapia do Hospital dos Servidores do alguns critérios para avaliação desses sintomas nos pacientes.
Estado (HSE-PE), localizado em Recife – PE, em 2016. A presença de náuseas e vômitos foi identificada naqueles
A amostra foi composta por pacientes do sexo feminino pacientes que apresentaram tais sintomas após 24 horas ou
com diagnóstico confirmado de câncer de mama, idade até 5 dias da última sessão quimioterápica realizada. Foram
igual ou superior a 20 anos, com realização de, no mínimo, considerados com diarreia aqueles pacientes que apresen-
duas sessões de quimioterapia no HSE-PE. Os critérios de taram fezes semipastosas ou líquidas, com frequência igual
exclusão foram: pacientes com amputação de membros ou maior que três vezes por dia. Para serem classificados
superiores e inferiores, portadores de ascite e/ou edema no com constipação, considerou-se a presença de dois ou mais
momento da avaliação antropométrica e aqueles incapazes sintomas a seguir: menos de 3 movimentos intestinais por
de prestar informação e que estavam sem acompanhante no semana, fezes endurecidas ou fragmentadas, esforço para
momento da abordagem. evacuar, sensação de esvaziamento incompleto, sensação
A avaliação do estado nutricional foi realizada por meio de obstrução anorretal ou necessidade de manobra manual
dos seguintes parâmetros antropométricos: Peso (kg) e Altura para facilitar a evacuação.
(m) para posterior cálculo do Índice de Massa Corporal Além disso, só foram considerados aqueles pacientes que
(IMC), circunferência do braço (CB) e circunferência do desenvolveram os sintomas após início da quimioterapia.
BRASPEN J 2018; 33 (1): 9-14
10
Estado nutricional e toxicidade gastrointestinal em pacientes com câncer de mama

A presença de mucosite oral foi feita com base na escala Tabela 1 – Características demográficas e clínicas de mulheres com câncer
de Escala de Toxicidade Oral da Organização Mundial de mama em tratamento quimioterápico ambulatorial de um hospital de
de Saúde na qual é possível avaliar os sinais objetivos e Recife-PE, 2016.
subjetivos como a presença de vermelhidão ou eritema, N=20
Variáveis
desenvolvimento de úlceras, habilidade de deglutir e sensi- N (%)
bilidade da mucosa. Idade (anos)
A construção do banco de dados foi realizada no 20 – 59 8 (40)
programa Excel e as análises estatísticas no programa > 60 12 (60)
Statistical Package for Social Sciences (SPSS), versão 13.0. Procedência
Os dados foram apresentados na forma de frequência. As Recife/RMR 13 (65)
comparações entre as proporções foram realizadas por meio Zona da Mata 1 (5)
do teste Qui-quadrado. Foram considerados significativa- Agreste 5 (25)
mente associados os fatores para os quais o valor de p for
Outros 1 (5)
inferior a 0,05.
Raça
O estudo foi submetido ao Comitê de Ética em Pesquisa
Branca 9 (45)
do hospital Agamenon Magalhães – HAM, sob o número
Negra 6 (30)
62340416.1.0000.5197. Participaram da pesquisa os parti-
Parda 5 (25)
cipantes que concordaram em assinar o Termo de Consenti-
mento Livre e Esclarecido (TCLE), de acordo com os critérios Comorbidades
da resolução 466∕12 do Conselho Nacional de Pesquisa. Presença 13 (65)
Ausência 7 (35)
Número de sessões
RESULTADOS
2–5 7 (35)
O estudo foi constituído por 20 pacientes do sexo femi-
6 – 10 8 (40)
nino em tratamento quimioterápico, com concentração
11 – 16 5 (25)
maior na faixa etária acima de 60 anos (60%). A maior parte
Realização de Cirurgia
das mulheres foi procedente da capital do estado e região
metropolitana (65%) e a etnia mais prevalente foi a branca Sim 9 (45)
(45%). Quanto às comorbidades, 65% (n=13) apresentavam Não 11 (55)
pelo menos uma comorbidade, sendo as mais prevalentes RMR=Região metropolitana de Recife

hipertensão (55%) e diabetes (35%).


No momento da coleta, apenas um quarto da amostra já Tabela 2 – Estado nutricional de mulheres com câncer de mama em tra-
tamento quimioterápico ambulatorial de um hospital de Recife-PE, 2016.
tinha realizado onze ou mais sessões de quimioterapia, com
N=20
um número considerável de mulheres em início do tratamento Variáveis
(Tabela 1). Verificou-se que os quimioterápicos utilizados N (%)
foram paclitaxel (90%) e adriamicina (10%). IMC
Eutrofia
Os indicadores do estado nutricional estão apresentados
Desnutrição 7 (35)
na Tabela 2. Nota-se que 60% (n=12) da amostra encontra-
se com excesso de peso, de acordo com o IMC, 90% (n=18) Excesso de peso 1 (5)
das mulheres apresentavam risco cardiovascular segundo a Circunferência do braço 12 (60)
CPesc e apenas 10% apresentou diagnóstico de desnutrição Eutrofia
pela avaliação da ASG-PPP. Desnutrição 8 (40)
Com relação à prevalência de sintomas gastrointesti- Excesso de peso 3 (15)
nais, de um total de 20 pacientes, 12 (60%) apresentavam Circunferência do pescoço 9 (45)
toxicidade gastrointestinal e, destes, 7 (58,3%) relataram Sem risco CV*
toxicidade intestinal (constipação/diarreia), como pode ser Com risco CV* 2 (10)
visto na Figura 1. ASG-PPP† 18 (90)
Ao relacionar o estado nutricional com a presença de Eutrofia
sintomas gastrointestinais, observou-se que nenhuma das Risco nutricional/desnutrição leve 18 (90)
variáveis apresentou associação estatisticamente significativa, IMC=Índice de Massa Corporal; CV=Cardiovascular;ASG-PPP=Avaliação Subjetiva Global
como pode ser visualizado na Tabela 3. Produzida Pelo Paciente

BRASPEN J 2018; 33 (1): 9-14


11
Santos EMC et al.

Figura 1 - Frequência de sintomas gastrointestinais relatados por mulheres com câncer de mama em tratamento quimioterápico ambulatorial de um hospital de Recife-
PE, 2016.

DISCUSSÃO
Tabela 3 – Associação do estado nutricional com a presença de toxicidade
gastrointestinais em mulheres com câncer de mama em tratamento quimio- Estudo realizado com mulheres com diagnóstico de
terápico ambulatorial de um hospital de Recife-PE, 2016.
câncer de mama atendidas ambulatorialmente em uma
Sintomas GI† Valor p*
Estado instituição pública destinada a servidores do estado de
nutricional Sim Não
Pernambuco, apresentando-se em sua maioria idosas, proce-
N (%) N (%)
IMC‡ dentes da capital e região metropolitana e com presença de
comorbidades.
Eutrofia 4 (33,3%) 3 (37,5%)
Desnutrição – 1 (12,5%) 0,418 A idade é apontada como um fator de risco para o
desenvolvimento do câncer de mama. Acredita-se que
Excesso de peso 8 (66,7%) 4 (50,0%)
mulheres com maior idade, principalmente acima dos 50
CB§
anos sejam mais predispostas. Georges et al.11 encontraram
Eutrofia 4 (33,3%) 4 (50,0%)
prevalência parecida - 76,7% da sua amostra tinham idade
Desnutrição 2 (16,7%) 1 (12,5%) 0,757 superior a 60 anos. Esse resultado também pode refletir o
Excesso de Peso 6 (50,0%) 3 (37,5%) perfil de pacientes atendidos no hospital, já que a maior
CPesc|| demanda é de idosos.
Sem risco CV¶, 1 (8,3%) 1 (12,5%) 0,653 Nesse estudo grande parte da amostra relatou presença
Com risco CV¶, 11 (91,7%) 7 (87,5%) de comorbidades, sendo as mais prevalentes hipertensão
ASG-PPP** e diabetes. Semelhante ao identificado por Facina12, que
Bem nutrido 11 (91,7%) 7 (87,5%) 0,653 também evidenciou como doenças crônicas mais frequentes
Risco de desnutrição 1 (8,3%) 1 (12,5%) hipertensão e diabetes. Ressaltando que a maior prevalência
da hipertensão e diabetes está associada a fatores de risco
Perda de peso 1 mês
como excesso de peso, baixo consumo de frutas e verduras,
Sim 7 (58,3%) 2 (25,0%) 0,157
sedentarismo, tabagismo e consumo abusivo de álcool.
Não 5 (41,7%) 6 (75,0%)
Quanto ao estado nutricional, verificou-se que a maioria
Perda de peso 6 meses
das mulheres apresentou excesso de peso, corroborando
Sim 9 (75,0%) 3 (42,9%) 0,182
com os achados de Ferreira et al.13, em estudo realizado no
Não 3 (25,0%) 4 (57,1%) Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Uberlândia,
Ingestão alimentar no qual 70% da amostra apresentaram excesso de peso.
Sem mudanças 5 (41,7%) 6 (75,0%) Valores menores foram descritos por Chen et al.14, em seu
Mais que o normal 3 (25,0%) 2 (25,0%) 0,162 estudo, em que apenas 39,1% das mulheres tiveram diag-
Menos que o normal 4 (33,3%) – nóstico nutricional de sobrepeso ou obesidade.
† Teste Qui-quadrado. GI=Gastrointestinal; IMC=Índice de Massa Corporal; CB=Circunferência
do braço. CPesc=Circunferência do pescoço; CV=Cardiovascular; ASG-PPP=Avaliação Subje-
Embora o IMC não seja útil para distinguir massa magra e
tiva Global Produzida Pelo Paciente gorda, bem como definir a distribuição de gordura corporal,
BRASPEN J 2018; 33 (1): 9-14
12
Estado nutricional e toxicidade gastrointestinal em pacientes com câncer de mama

tem sido um instrumento utilizado para diagnosticar sobre- o cálculo da dose terapêutica em pacientes com excesso
peso e obesidade em mulheres com câncer de mama devido de peso pode culminar em aumento da toxicidade2. Vários
ao seu efeito sobre o prognóstico e desenvolvimento da profissionais reduzem a dose empiricamente com o objetivo
doença. Mulheres com IMC elevado têm um risco maior de de evitar superestimação. Mas, ainda existe muita incerteza
desenvolver câncer de mama, como também uma resposta quanto ao estabelecimento da dose em pacientes com
menor ao tratamento realizado14. excesso de peso.
Nessa pesquisa, quase toda amostra teve presença de No presente trabalho, o estado nutricional não demons-
risco cardiovascular por meio da avaliação da CPesc. Por trou associação com a presença de sintomas gastrointestinais.
se tratar de uma medida antropométrica pouco usada, não Facina12, em estudo com mulheres com cânceres de mama,
foram encontrados estudos que utilizassem a CPesc em ovário e útero, também não identificou essa associação, o
pacientes com câncer de mama. Vale ressaltar que recen- que pode ser explicado por alguns fatores. Pacientes com
temente a CPesc foi descrita como método eficaz para dife- excesso de peso podem ter alteração na distribuição e elimi-
renciar obesos e não obesos15. Estudo realizado na Turquia16 nação das drogas.
com adultos, de ambos sexos, verificou que 85,1% dos O fígado é considerado o principal órgão de liberação,
homens e 38,8% das mulheres tiveram CPesc elevada. Ainda sendo que o acúmulo de gordura no mesmo, que normal-
nesse estudo, a CPesc correlacionou-se positivamente com o mente está presente em pacientes com excesso de peso, pode
peso, IMC, circunferência da cintura e quadril, sugerindo-se interferir no fluxo sanguíneo e distribuição das drogas. Além
o uso dessa medida simples para identificação de indivíduos disso, destacam-se outras alterações fisiológicas do obeso,
com sobrepeso e obesidade. como aumento do volume sanguíneo, do débito cardíaco,
No presente estudo, de acordo com ASG-PPP, a maior do tamanho dos órgãos e do tecido adiposo, alteração da
parte da amostra foi classificada como bem nutrido, resul- filtração glomerular e mudanças das proteínas carreadoras
tado positivo, uma vez que a desnutrição pode influenciar de drogas, afetando assim a concentração da droga20.
diretamente no tratamento quimioterápico, levando a um
aumento do risco de infecções, maior incidência de efeitos
CONCLUSÃO
colaterais e diminuição da sobrevida do paciente17. Dados
diferentes foram encontrados por Khoshnevis et al.18. Em Em conclusão, observou-se maior prevalência de excesso
seu estudo 47% dos pacientes foram classificados como de peso em detrimento do diagnóstico de desnutrição.
bem nutridos, 29% com desnutrição moderada e 24% como Entretanto, o estado nutricional não se mostrou como um
gravemente desnutridos, mas esta amostra foi constituída determinante da presença de toxicidade gastrointestinal.
por pacientes com diferentes tipos de cânceres que estavam Estes resultados reforçam a importância da avaliação nutri-
realizando tratamentos distintos (quimioterapia, radioterapia cional e acompanhamento clínico destas mulheres, a fim
ou cirurgia). de evitar outras complicações, particularmente as doenças
A quimioterapia é um tratamento que pode levar ao cardiovasculares.
desenvolvimento de efeitos colaterais indesejados como a Nota-se a escassez de estudos na área, sugerindo-se a
presença de sintomas gastrointestinais. Garces et al.19, em continuidade do trabalho, permitindo avaliação de outros
estudo realizado com mulheres com câncer de útero em parâmetros antropométricos e clínicos.
tratamento quimioterápico sob uso das drogas carboplatina
e paclitaxel, identificaram como sintomas gastrointestinais REFERÊNCIAS
mais prevalentes náuseas e vômitos (83,2%), constipação
1. Brasil. Ministério da Saúde. Instituto Nacional de Câncer José de
e diarreia (38%) e mucosite (20,2%). Valores diferentes Alencar Gomes da Silva - INCA. Tipos de câncer mama.[acesso
foram identificados no presente estudo, cujos sintomas mais 2016 Abr 14]. Disponível em: http://www2.inca.gov.br/wps/
frequentes foram constipação e diarreia, corroborando com wcm/connect/tiposdecancer/site/home/mama
os resultados de Facina12, no qual 58,6% das mulheres que 2. Kirjner AE, Pinheiro RL. Interferência da obesidade no trata-
mento quimioterápico em mulheres com câncer de mama. Rev
estavam realizando o quinto ciclo de quimioterapia apresen- Bras Cancerol. 2007;53(3):345-54.
taram diarreia ou constipação. 3. Lee RD, Nieman DC. Nutritional assessment. 2ª ed. St Louis:
Mosby; 1995.
Para determinação da dose quimioterápica, existem 4. Chumlea WC, Guo SS, Steinbaugh ML. Prediction of stature
diversas equações disponíveis que utilizam o peso atual, from knee height for black and white adults and children with
ideal ou área de superfície corporal. Segundo a diretriz application to mobility-impaired or handicapped persons. J Am
da Sociedade Americana de Oncologia Clínica (ASCO), Diet Assoc. 1994;94(12):1385-8.
5. World Health Organization - WHO. Physical status: the use
deve-se utilizar o peso atual para o cálculo. Entretanto, and interpretation of anthropometry. Geneva: World Health
alguns estudos sugerem que a utilização do peso atual para Organization;2000.

BRASPEN J 2018; 33 (1): 9-14


13
Santos EMC et al.

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2016;21(7):2209-18. 2013;10(8):451-9.

Local de realização do trabalho: Hospital dos Servidores do Estado-PE, Recife, PE, Brasil.

Conflito de interesse: Os autores declaram não haver.

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14
A Artigo Original
Consumo de fósforo por pacientes com insuficiência renal crônica em tratamento dialítico

Análise do conhecimento e consumo de


alimentos fontes de fósforo por pacientes
portadores de insuficiência renal crônica em
tratamento dialítico
Analysis of knowledge and consumption of food sources of phosphorus by patients with chronic renal
failure in dialysis treatment

RESUMO
Laura Cristina Monteiro Felix1
Valeska Carla Morais de Medeiros1 Introdução: O controle inadequado no consumo de fósforo é correlacionado com o aumento do
Viviane Bressane Claus Molina2 risco da morbi e mortalidade em pacientes com doença renal crônica (DRC) dialítica. O ­ bjetivo:
Avaliar o conhecimento e o consumo de alimentos fontes de fósforo por estes pacientes. Método: A
pesquisa foi desenvolvida entre julho e agosto de 2016, com 51 pacientes que faziam hemodiálise
em uma clínica situada no município de Campinas-SP, mediante a aplicação de um questionário
para obter dados de sexo, idade, escolaridade, tempo de diálise, tratamento medicamentoso e
presença de comorbidades, além da avaliação do consumo de fósforo por meio de um questio-
nário de frequência de alimentos. Resultados: Os resultados demonstraram o predomínio da
doença entre adultos e idosos do sexo masculino, sendo a hipertensão arterial sistêmica (HAS) e
diabetes mellitus (DM) as principais comorbidades. O teste estatístico Qui-quadrado demonstrou
que a escolaridade não interferiu no conhecimento quanto aos alimentos fontes de fósforo e no
de consumo alimentar. Houve consumo deficiente de carnes, ovos e leguminosas e excessivo de
laticínios, refrescos em pó, molhos, bolos prontos, hambúrgueres e refrigerantes à base de cola.
Conclusão: Avaliar o conhecimento e os hábitos alimentares na fase dialítica direciona as ações
Unitermos:
Insuficiência Renal Crônica. Hemodiálise. Conheci- educativas do nutricionista, permitindo a adequação de suas condutas.
mento. Ingestão Alimentar. Fósforo.
ABSTRACT
Keywords: Introduction: The inadequate control in phosphorus intake is correlated with increased risk of
Renal Insufficiency, Chronic. Renal Dialysis. Knowled- morbidity and mortality in patients with chronic renal disease (CKD). Objective: To evaluate the
ge. Food Intake. Phosphorus. knowledge and consumption of food sources of phosphorus by these patients. Methods: The rese-
arch was developed between July and August of 2016, with 51 patients undergoing hemodialysis
Endereço para correspondência: in a clinic located in the city of Campinas-SP, through the application of a questionnaire to obtain
Laura Cristina Monteiro Felix data on sex, age, schooling, dialysis time, drug treatment and presence of comorbidities, as well
Rua Arnaldo Pivi, 94 – Vila Josefina – Jundiaí, SP, as the evaluation of phosphorus intake through a food frequency questionnaire. Results: The
Brasil – CEP: 13210-520 results showed the predominance of the disease among adults and elderly males, with systemic
E-mail:icmfelix@hotmail.com
arterial hypertension (SAH) and diabetes mellitus (DM) being the main comorbidities. The results of
Submissão: the Chi-Square statistical test showed that the schooling did not interfere in the knowledge about
5 de junho de 2017 food sources of phosphorus and food consumption. There was poor consumption of meat, eggs
and legumes and excessive dairy, soft drinks, sauces, ready-made cakes, burgers and cola-based
Aceito para publicação: soft drinks. Conclusion: To evaluate the knowledge and eating habits in the dialysis phase directs
28 de agosto de 2017 the educational actions of the nutritionist, allow the adequacy of their behaviors.

1. Nutricionista graduada pelo Centro Universitário Padre Anchieta, Jundiaí, SP, Brasil.
2. Especialista em Nutrição Hospitalar em Cardiologia pelo Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da ­Universidade
de São Paulo e Professora do Centro Universitário Padre Anchieta, Jundiaí, SP, Brasil.

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15
Felix LCM et al.

INTRODUÇÃO encontrado nos aditivos encontra-se na forma de sal, que é


Atualmente, a doença renal crônica (DRC) atinge cerca altamente absorvido pelo intestino, podendo chegar a 100%5.
de 10% da população mundial. Pressupõe-se que afete um A recomendação diária de fósforo é de 700 mg/dl para
a cada cinco homens e uma a cada quatro mulheres, com adultos saudáveis, de acordo com a Recommended Dietary
idade média de 75 anos1. Allowances10, e uma concentração de 3,5 mg/dl para
Dados da Sociedade Brasileira de Nefrologia indicam pacientes com DRC11. Contudo, os níveis séricos de fósforo
que 100 mil pessoas fazem diálise no Brasil, sendo que podem ser elevados ligeiramente após uma refeição rica
existem 750 unidades cadastradas no país e 35 apenas na neste mineral. Logo, o controle da ingestão para pacientes
cidade de São Paulo. Os números demonstram ainda que com DRC se faz necessário, porém com cautela, de forma a
70% dos pacientes que fazem diálise descobrem a doença não provocar redução excessiva da sua concentração sérica,
tardiamente1. visto que a hipofosfatemia pode indicar ingestão insuficiente
de proteína12.
A nutrição desempenha um papel fundamental na terapia
das doenças renais2. A intervenção nutricional não visa O controle inadequado do fósforo é correlacionado com
apenas controlar os sintomas da síndrome urêmica, mas o aumento do risco da morbi e mortalidade por doenças
também as doenças correlacionadas como hiperparatireoi- cardiovasculares, aterosclerótica, hiperparatireoidismo e
dismo secundário, desnutrição e várias alterações meta- doença óssea8, principalmente em pacientes dialíticos. Os
bólicas3. Na terapia hemodialítica, a dietoterapia é capaz níveis de fósforo sérico podem ser controlados por uma
de manter ou recuperar o estado nutricional do indivíduo, combinação de fatores, como: diminuição da ingestão,
garantindo evolução clínica mais favorável4, uma vez que redução na absorção intestinal com quelantes e avanço na
o paciente apresenta distúrbios no metabolismo de energia eliminação pela diálise.
e de macronutrientes, como, por exemplo, aumento do Existe também a preocupação de que o fósforo pode
catabolismo proteico, resistência à insulina e alteração no induzir ações sobre o miocárdio, induzindo fibrose. Esta
metabolismo das lipoproteínas5. evidência clínica tem ligação com a hiperfosfatemia com as
A deterioração progressiva da DRC leva à retenção de hipertrofias do ventrículo esquerdo, tanto na DRC como na
várias substâncias. Uma delas é o fósforo, que em estado doença renal terminal13.
normal é excretado pelos rins, porém, no estado patológico A verificação da ingestão do consumo alimentar em
leva o paciente à hiperfosfatemia. A hiperfosfatemia é um doentes renais crônicos em diálise constitui uma ação prática
distúrbio comum em pacientes com DRC, que tem como e eficiente no cotidiano do nutricionista, desse modo, faz-se
consequência a perda da habilidade dos rins de excretar necessária a aplicação de instrumentos que demonstram a
fósforo6. ingestão energética e proteica, a fim de proporcionar uma
O fósforo é um mineral essencial presente em nosso orga- intervenção nutricional adequada3,14.
nismo e tem como funções ser o maior componente dos ossos Hoje, a doença renal é considerada um problema de
e dos dentes, ajudar a manter pH normal e está envolvido em saúde pública, em razão das altas taxas de morbidade e
muitos processos metabólicos7, como transporte de energia, impacto negativo na qualidade de vida desta população.
composição da membrana celular e do material genético5. O controle dietético faz parte do tratamento e prevenção de
Este mineral é encontrado naturalmente nos alimentos, complicações da DRC, destacando-se o controle no consumo
na forma de fosfato orgânico, especialmente em fontes de de alimentos fontes de fósforo. Sendo assim, caracterizar o
proteína de origem animal, como carnes, ovos, peixes e hábito alimentar e o conhecimento dessa população são de
aves8. No entanto, alguns alimentos que não são conside- fundamental importância para que se planejem intervenções
rados fontes de proteína também contêm quantidade consi- nutricionais mais efetivas.
derável de fósforo, como cereais, nozes, grãos e cerveja. O O objetivo deste trabalho foi avaliar o conhecimento e o
fósforo presente nestes cereais está, na sua maioria, na forma consumo de alimentos fontes de fósforo por pacientes porta-
de ácido fítico, tornando a biodisponibilidade relativamente dores de insuficiência renal crônica em tratamento dialítico.
baixa, já que o organismo humano não produz fitase. Assim,
apesar do teor elevado de fósforo em algumas plantas,
tem-se uma baixa absorção9. MÉTODO
O fósforo também é o principal componente de muitos Trata-se de um estudo transversal, realizado em uma
aditivos usados para melhorar a cor, sabor e propiciar clínica de hemodiálise situada no município de Campinas-SP,
retenção de umidade em alimentos, encontrados em embu- que possui 100 pacientes regularmente cadastrados e conta
tidos, produtos à base de carne semiprontos, queijos proces- com uma equipe multidisciplinar composta por nefrologista,
sados e produtos instantâneos, entre outros. Este fósforo enfermeiro, nutricionista, psicólogo e assistente social.
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16
Consumo de fósforo por pacientes com insuficiência renal crônica em tratamento dialítico

Para participar da pesquisa, o paciente deveria ter ficou constituída por 51 pacientes com tempo médio de
idade superior a 18 anos, realizar sessões crônicas de tratamento na clínica de 29,1 (±25,6) meses, sendo 28
hemodiálise (três vezes por semana com duração média (54,9%) do sexo masculino e 23 (45,09%) do sexo femi-
de 4 horas cada) e assinar o Termo de Consentimento nino. A idade média dos pacientes foi de 56,3 (±14,95)
Livre e Esclarecido. anos, porém ressalta-se que 66% da amostra possuíam
A coleta de dados ocorreu entre os meses de julho e idade entre 50 e 79 anos.
agosto de 2016, utilizando um questionário com informações Quanto ao nível de escolaridade, verificou-se que
relativas a sexo, idade, escolaridade, tempo de diálise, trata- 24 (47,06%) dos pacientes haviam cursado até o ensino
mento medicamentoso e presença de comorbidades, sendo fundamental, 16 (31,37%), o ensino médio e 6 (11,76%),
o consumo de fósforo avaliado por meio de um questionário o ensino superior.
de frequência de alimentos. Em relação às afecções crônicas, verificou-se maior
O questionário de frequência alimentar continha incidência de hipertensão arterial (HAS) e diabetes mellitus
perguntas relativas ao consumo diário, semana, mensal, (DM), acometendo 82% e 25%, respectivamente. Outras
anual e nunca, de leite e derivados, carnes e ovos, além afecções como lúpus eritematoso sistêmico (LES), hipotireoi-
dos embutidos, leguminosas, oleaginosas e preparações dismo, dislipidemia, doenças cardiovasculares, doença renal
prontas, produtos estes escolhidos tendo como critério suas policística, doenças ósseas, trombofilia, hepatite C, litíase,
concentrações de fósforo. Os alimentos foram separados pancreatite, retinopatia diabética, colecistopatia, gota e reti-
por permitidos (produtos lácteos, o grupo das carnes e nopatia bilateral também foram citadas. Vale destacar que 2
ovos e leguminosas, com exceção da soja) e proibidos (os dos 3 pacientes com idade inferior a 30 anos tinham como
alimentos industrializados, oleaginosas e soja). Os alimentos afecção base, que desencadeou a DRC, o LES.
permitidos foram classificados em consumo insuficiente, Quanto aos medicamentos mais utilizados pelos
adequado e excessivo, em que insuficiente é o consumo de pacientes, foram citados os antianêmicos (76,47%), antiar-
1 vez, adequado 3 vezes e excessivo igual ou maior que 4 rítmico (64,70%) e os anti-inflamatórios não esteroides
vezes na semana. Já os alimentos proibidos foram conside- (29,41%) - ácido acetilsalicílico.
rados como adequado o consumo de 1 vez na semana e
Com relação ao conhecimento sobre os alimentos fontes
excessivo 2 ou mais.
de fósforo, 29 (56,9%) pacientes sabiam referir os sintomas
O conhecimento dos pacientes foi avaliado com da hiperfosfatemia, 29 (56,9%) citaram corretamente os
perguntas sobre alimentos ricos em fósforo e os sintomas alimentos fontes deste mineral, sendo que 10 (19,6%)
da hiperfosfatemia. confundiram com fontes de potássio. Além disto, observou-se
Os resultados foram registrados em porcentagens e que o conhecimento quanto aos alimentos fontes de fósforo
apresentados em gráficos. Para analisar se o conhecimento não interferiu na frequência de consumo de alimentos, não
de alimentos fontes de fósforo e a escolaridade estavam apresentando resultados significativos, conforme a análise
associados, usou-se o teste estatístico Qui-quadrado de estatística.
Pearson, e os dados quantitativos foram apresentados O teste estatístico Qui-quadrado mostrou que a escolari-
como média e desvio padrão, mediana e valores mínimo dade não interferiu significativamente no conhecimento dos
e máximo. pacientes sobre as fontes de fósforo e seus efeitos.
O projeto de pesquisa foi submetido à aprovação Quanto à frequência alimentar, verificou-se que, dos
do Comitê de Ética em Pesquisa do Centro Universitário alimentos permitidos, os lácteos eram os mais consumidos
Padre Anchieta – UNIANCHIETA, sob o número CAAE
entre a população estudada, sendo inclusive encontrados
55238116.5.0000.5386.
alguns excessos no consumo de produtos, como leite, marga-
rina, creme de leite e iogurte.
RESULTADOS Em contrapartida, produtos cárneos e leguminosas foram
Foram compilados os dados de 100 pacientes frequen- consumidos em quantidade insuficiente pelos pacientes,
tadores da clínica, de ambos os sexos, sendo excluídos inclusive alguns alegaram desconhecer leguminosas, como
aqueles que não se enquadraram nos critérios pré- grão de bico, vagem e ervilha (fresca).
determinados, os que se recusaram a participar, os que Referente ao consumo dos alimentos proibidos, por conter
possuíam déficit cognitivo necessário para responder o uma alta concentração de fósforo e baixo valor nutricional,
questionário e aqueles que estavam em isolamento devido observou-se que alimentos como bolos prontos, molhos,
à bactéria Klebsiella pneumoniae carbapenemase (KPC). refrescos em pó, biscoitos recheados e refrigerantes foram
Considerando os critérios citados anteriormente, a amostra os mais consumidos excessivamente (Figura 1).
BRASPEN J 2018; 33 (1): 15-20
17
Felix LCM et al.

Figura 1 - Consumo de alimentos proibidos pelo paciente portadores de Insuficiência Renal Crônica dialítica. Campinas, SP, 2016.

DISCUSSÃO semelhante aos que completaram o ensino médio ou


No presente estudo, foi avaliado que a maior parte dos superior, como também citado por Nerbass et al. 19.
pacientes com DRC em tratamento dialítico eram do sexo Acredita-se que esse fato possa ter ocorrido devido à
masculino, dado que corrobora as informações na literatura presença da equipe multiprofissional na clínica onde se
e no inquérito da Sociedade Brasileira de Nefrologia sobre realizou a pesquisa, a qual acompanha mensalmente os
os pacientes com doença renal crônica em tratamento pacientes por meio de exames bioquímicos e orientações
dialítico15,16. nutricionais de fácil entendimento. Isso comprova a
importância da qualidade e da regularidade dos aten-
Ao analisar as doenças associadas à DRC, a HAS e DM
dimentos oferecidos aos pacientes.
foram as mais apontadas, bem como no censo 2014 da
Sociedade Brasileira de Nefrologia e em outros estudos1,15,16. Estudos realizados em outros países demonstraram
O LES foi a causa de DRC em duas mulheres jovens em fase que os programas educacionais têm impacto significa-
reprodutiva deste estudo que, de acordo com a literatura, tivo sobre os conhecimentos e a adesão dos pacientes
apresentaram manifestações clínicas específicas para o no tratamento da hiperfosfatemia 19. Os pacientes que
acometimento por esta afecção17. compreenderam as consequências da hiperfosfatemia
mantêm a fosfatemia sérica mais baixa do que aqueles
A maioria dos pacientes estudados tinha idade acima de
com desconhecimento 20.
50 anos, sendo justificado pelo fato que a filtração glome-
rular cai entre 0,08 ml por ano a partir dos 40 anos, com Ao serem questionados quanto às consequências da
isto, aumenta a fragilidade do sistema renal e o paciente hiperfosfatemia, verificou-se que a maioria dos pacientes
perde a possibilidade de manter a homeostase renal diante as conhecia, mas não sabia que elevadas concentrações de
do estresse18. No idoso, há diminuição importante do fluxo fósforo poderiam aumentar o risco de morte. Na pergunta
renal, devido ao aumento da defensão intra-renal, perda sobre os alimentos ricos em fósforo, a maioria citou correta-
da capacidade de autorregulação que acarreta incapaci- mente os alimentos, porém, uma porcentagem afirmou que
dade, bem como no momento da hipertensão, quanto da alimentos ricos em potássio eram fontes de fósforo.
hipotensão. Estudos realizados com pacientes dialíticos A diálise não se mostra eficaz na remoção do excesso de
demonstram que há elevada prevalência de adultos e idosos fósforo do plasma. Por este motivo, o cálculo para ingestão
em tratamento15,19. adequada deste mineral é fundamental. Contudo, a reco-
Verificou-se que o nível de escolaridade não influen- mendação de uma dieta hiperproteica, devido à presença de
ciou no conhecimento quanto aos sintomas e alimentos caquexia e perda de massa magra, para pacientes em diálise,
fontes de fósforo, uma vez que os pacientes que possuíam contribui para a elevação, tornando a oferta adequada deste
apenas o ensino fundamental obtiveram desempenho nutriente um desafio3.
BRASPEN J 2018; 33 (1): 15-20
18
Consumo de fósforo por pacientes com insuficiência renal crônica em tratamento dialítico

O tratamento nutricional, visando à oferta de dieta refrescos em pó, molhos, bolos prontos, hambúrgueres e
adequada em energia, proteína e fósforo, associado refrigerantes à base de cola.
à diálise adequada e à terapêutica medicamentosa, é A escolaridade não interferiu no conhecimento sobre
fundamental para auxiliar no controle e na prevenção da fontes alimentares de fósforo e destaca-se a importância
hiperfosfatemia3. da assistência constante de uma equipe multiprofissional
No tratamento conservador, a recomendação dietética e programas eduAvaliar o conhecimento e os hábitos
inicial é baseada na restrição de proteínas, reduzindo-se alimentares na fase dialítica direciona as ações educa-
pela metade o consumo de laticínios e carnes, e com a tivas do nutricionista, permitindo a adequação de suas
piora da função renal a dieta se torna mais restritiva6. Em condutas.
troca da ingestão de proteínas de origem animal, o paciente
deve ingerir comprimidos de aminoácidos e cetoácidos para
REFERÊNCIAS
suprir as necessidades diárias de ingesta proteica, visando
1. Brasil. Ministério da Saúde. Doença renal crônica atinge 10%
retardar a progressão da doença renal e, consequentemente,
da população mundial. 2015 [Internet]. [citado 2016 Nov
a entrada em diálise6. 23]. Disponível em: http://www.brasil.gov.br/saude/2015/03/
No presente estudo, o consumo de carnes, ovos e doenca-renal-cronica-atinge-10-da-populacao-mundial
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leguminosas foi insuficiente na maioria dos pacientes Barueri: Manole; 2014.
entrevistados, podendo ser justificado pelo tratamento 3. Pinto, DE, Ullmann LS, Burmeister MM, Antonello ICF, Pizzato
dietético que antecedeu a diálise, ou por medo, ou por falta A. Associations between energy, protein, and phosphorus intakes
in patients with chronic kidney disease on hemodialysis. J Bras
de conhecimento. Além disto, alguns lácteos e alimentos Nefrol. 2009;31(4):269-76.
considerados proibidos como, por exemplo, o refrigerante 4. Koehnlein EA, Yamadae NA, Giannasi ACB. Avaliação do estudo
a base de cola, foram consumidos excessivamente pelos nutricional de pacientes em hemodiálise. Acta Sci Health Sci.
entrevistados. 2008;30(1):65-71.
5. Cuppari L, Avesani CM, Kamimura MA. Nutrição na doença
Este comportamento condiz com o relatado na literatura, renal crônica. Barueri: Manole; 2013.
uma vez que a aceitação do tratamento está intimamente 6. Sociedade Brasileira de Nefrologia – SBN. Nutrição. [aces-
sado 2016 Out 16 [Internet]. Disponível em: http://sbn.org.br/
relacionada com a aceitação da própria doença e não tanto publico/nutricao/
com outros fatores. A aceitação da doença caracteriza-se 7. The Kidney Club Newsletter. Columbus: Abott Nutrition; 2012.
pela forma singular de cada indivíduo lidar com as situações 8. Uribarri J. Phosphorus additives in food and their effect in dialysis
patients. Clin J Am Soc Nephrol. 2009;4(8):1290-2.
críticas da vida e com o impacto que estas provocam no seu
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para identificação e quantificação das vezes que consome nutrição e dietoterapia. 12ª ed. Rio de Janeiro: Elsevier; 2013.
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As concentrações séricas de fósforo, que não foram 1):S1-S6.
dosadas para este estudo, poderiam complementar a análise 13. Nadkarni GN, Uribarri J.Phosphorus and the kidney: what is
dos resultados. known and what is needed. Adv Nutr. 2014;5(1):98-103.
14. Lou-Arnal LM, Arnaudas-Casanova L, Caverni-Muñoz A,
Vercet-Tormo A, Caramelo-Gutiérrez R, Munguía-Navarro P,
et al.; Grupo de Investigación ERC Aragón. Hiddensources of
CONCLUSÃO
phosphorus: presence of phosphorus-containingadditives in
Foram avaliados homens e mulheres com doença renal processedfoods. Nefrologia. 2014;34(4):498-506.
15. Nisio JM, Bazanelli AP, Kamimura MA, Lopes MGG, Ribeiro
crônica, a maioria entre 50 e 79 anos, com tempo médio de FSM, Vasselai P, et al. Impacto de um programa de educação
tratamento de 2,5 anos. O DM e a HAS foram as comorbi- nutricional no controle da hiperfosfatemia de pacientes em
dades mais prevalentes. hemodiálise. J Bras Nefrol. 2007;29(3):152-7.
16. Sesso RC, Lopes AA, Thomé FS, Lugon JR, Martins CT.
Os indivíduos portadores de DRC hemodialéticos da Inquérito Brasileiro de Diálise Crônica 2014. J Bras Nefrol.
presente pesquisa apresentaram um consumo deficiente 2016;38(1):54-61.
de carnes, ovos e leguminosas, provavelmente devido ao 17. Klumb EM, Silva CAA, Lanna CCD, Sato EI, Borba EF, Brenol
JCT, et al. Consenso da Sociedade Brasileira de Reumatologia
tratamento dietético da fase conservadora, que antecede para o diagnóstico, manejo e tratamento da nefrite lúpica. Rev
a diálise. Observou-se o consumo excessivo de laticínios, Bras Reumatol. 2015;55(1):1-21.

BRASPEN J 2018; 33 (1): 15-20


19
Felix LCM et al.

1 8. Almeida MIC, Cardoso MS, Garcia CPC, Oliveira JRF, pacientes hiperfosfatêmicos em hemodiálise. J Bras Nefrol.
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Local de realização do trabalho: Clínica Nefrocamp, Campinas, SP, Brasil.

Conflito de interesse: Os autores declaram não haver.

BRASPEN J 2018; 33 (1): 15-20


20
A Artigo Original
Intolerância à lactose e Doença Inflamatória Intestinal

Intolerância à lactose e sua relação com a


atividade da doença inflamatória intestinal
Lactose intolerance and its relation to the activity of the inflammatory bowel disease

RESUMO
Alana Maria Cidral1
Bruna Nayara Buzzi1 Introdução: As doenças inflamatórias intestinais (DII) são caracterizadas como afecções do
Bruno Lorenzo Scolaro2 intestino, clinicamente divididas em Retocolite Ulcerativa (RCUI) e Doença de Crohn (DC). A má
Clarice Maria Specht3 absorção da lactose é um fator que pode influenciar a intensidade e a presença dos sintomas
Cristina Henschel Matos4 gastrointestinais nas DII. A sensibilidade à lactose ocorre devido a uma deficiência da hidrólise
Everson Fernando Malluta5
Sueli Bobato6 de lactose pela borda em escova no intestino delgado. O presente estudo objetivou avaliar a
Claiza Barretta7 intolerância à lactose e sua relação com a atividade da DII. Método: Foram avaliados indivíduos
diagnosticados com esta afecção, assistidos pela Clínica de DII da Unidade de Saúde Familiar
e Comunitária (USFC) de Itajaí/SC, no período de novembro de 2015 a agosto de 2016. Para a
avaliação da atividade da doença, foram utilizados exames decalprotectina fecal, ferritina, PCR e
VHS. Além destes marcadores, índices clínicos de classificação da atividade também foram apli-
cados. A intolerância à lactose foi avaliada a partir de curva glicêmica de 30, 60 e 90 minutos.
A administração da lactose foi realizada via oral, na dose de 2 g/kg do paciente, sem exceder a
dose máxima de 50 g. Para avaliar a frequência do consumo de lácteos, foi aplicado um questio-
nário de frequência alimentar. Resultados: O presente estudo contou com uma amostra de 50
pacientes. Destes, 70% (n=35) eram do sexo feminino, a média de idade foi de 48 anos±12,56
e 64% (n=32) eram tolerantes à lactose. Quanto ao diagnóstico, 62% (n=31) tinham DC e 40%
(n=20), padrão de acometimento em íleo terminal. Verificou-se que 26% (n=13) dos intolerantes
à lactose estavam em remissão da doença. Conclusões: Não foram observadas diferenças esta-
tísticas entre os índices clínicos e bioquímicos de atividade da doença e a tolerância à lactose.

ABSTRACT
Unitermos: Introduction: Inflammatory bowel diseases (IBD) are characterized as bowel diseases, clinically
Doença de Crohn. Intolerância à Lactose. Colite divided into ulcerative colitis (ICU) and Crohn’s disease (CD). Lactose malabsorption is a factor
Ulcerativa. that can influence the intensity and presence of gastrointestinal symptoms in IBD. Lactose sensi-
tivity occurs due to a deficiency of lactose hydrolysis by the brush border in the small intestine.
Keywords: The present study aimed to evaluate lactose intolerance and its relationship with IBD activity.
Crohn Disease. Lactose Intolerance. Colitis, ­Ulcerative. Methods: Individuals diagnosed with this disease were evaluated, assisted by the USII Clinic of
the USFC of Itajaí / SC, from November 2015 to August 2016. For the diagnosis of the disease,
Endereço para correspondência:
fecal calprotectin, ferritin, PCR and VHS. In addition to these markers, clinical indexes of activity
Claiza Barretta
Rua Lauro Muller, 1034/402 – Fazenda – Itajaí, SC, classification were also applied. Lactose intolerance was evaluated from a 30, 60 and 90 minutes
Brasil – CEP: 88301-401 glycemic curve. Lactose administration was administered orally at the dose of 2 g / kg of the patient,
E-mail: claizabarretta@yahoo.com.br without exceeding the maximum dose of 50 g. To evaluate the frequency of dairy consumption,
a food frequency questionnaire was applied. Results: The present study had a sample of 50
Submissão: patients, of whom 70% (n=35) were female, mean age was 48 years±12.56 and 64% (n=32)
6 de junho de 2017 were tolerant to lactose. Regarding the diagnosis, 62% (n=31) had CD, and 40% (n=20) had a
pattern of involvement in the terminal ileum. It was found that 26% (n=13) of lactose intolerants
Aceito para publicação: were in remission of the disease. Conclusions: No statistical differences were observed between
14 de setembro de 2017 clinical and biochemical indexes of disease activity and lactose tolerance.

1. Acadêmica do Curso de Nutrição da Universidade do Vale do Itajaí (UNIVALI), Itajaí, SC, Brasil.
2. Médico, Mestre em Saúde e Meio Ambiente. Professor do departamento de Clínica Cirúrgica da Universidade do Vale do Itajaí (UNIVALI/SC),
coordenador do Ambulatório de Doenças Inflamatórias Intestinais, Itajaí, SC, Brasil.
3. Enfermeira, Mestre em Saúde e Gestão do Trabalho, Professora do Curso de Medicina da Universidade do Vale do Itajaí (UNIVALI/SC), integrante
do Ambulatório de Doenças Inflamatórias Intestinais, Itajaí, SC, Brasil.
4. Nutricionista, Mestre em Engenharia de Produção, Professora do Curso de Nutrição da Universidade do Vale do Itajaí (UNIVALI/SC), integrante
do Ambulatório de Doenças Inflamatórias Intestinais, Itajaí, SC, Brasil.
5. Médico, Doutor em Ciências, área de concentração Gastroenterologia Clínica, Professor de Gastroenterologia da Universidade do Vale do
Itajaí (UNIVALI/SC), integrante do Ambulatório de Doenças Inflamatórias Intestinais, Itajaí, SC, Brasil.
6. Psicóloga, Mestre em Psicologia na área de concentração Processos Psicossociais, Saúde e Desenvolvimento Psicológico, Professora do Curso
de Psicologia da Universidade do Vale do Itajaí (UNIVALI/SC) e integrante do Ambulatório de Doenças Inflamatórias Intestinais, Itajaí, SC, Brasil.
7. Nutricionista, Mestre em Ciências Farmacêuticas, Professora do Curso de Nutrição da Universidade do Vale do Itajaí (UNIVALI/SC), integrante
do Ambulatório de Doenças Inflamatórias Intestinais, Itajaí, SC, Brasil.

BRASPEN J 2018; 33 (1): 21-5


21
Cidral AM et al.

INTRODUÇÃO O presente artigo foi aprovado pelo Comitê de Ética em


As doenças inflamatórias intestinais (DII) são caracteri- Pesquisa da Universidade do Vale do Itajaí (UNIVALI) (CEP/
zadas como sendo afecções do intestino diretamente asso- UNIVALI), sob parecer n°1.311.184, em 5 de novembro de
ciadas à inflamação crônica. Clinicamente, são divididas em 2015.
Retocolite Ulcerativa Idiopática (RCUI) e Doença de Crohn Os critérios de inclusão adotados foram: idade superior
(DC)1. A RCUI acomete o cólon e o reto e a DC afeta um a 18 anos, assinar o Termo de Consentimento Livre e Escla-
ou mais segmentos do tubo digestivo2. recido, possuir diagnóstico de DII, Teste de Tolerância à
A patogênese das DII é complexa e multifatorial, envol- Lactose, Calprotectina Fecal, Ferritina, Velocidade de Hemos-
vendo diversos fatores: genético, microbiano e imunológico3. sedimentação (VHS) e Proteína C Reativa (PCR) coletados na
Além disso, os hábitos alimentares, estilo de vida e o uso de mesma fase da doença.
drogas ilícitas e lícitas podem estar associados ao apareci- A coleta de dados foi realizada em forma de entrevista
mento da doença4. após o término das consultas no ambulatório, por meio de
A incidência e a prevalência de DII têm progredido nos países um formulário semiestruturado que contemplava as caracte-
desenvolvidos, girando em torno de 50 a 70 casos/1.000.000 rísticas socioeconômicas (identificação, faixa etária, gênero,
por ano, ocorrendo um crescimento no número de casos novos com quem reside, estado civil, profissão, escolaridade e
em países em desenvolvimento, sendo considerada uma doença renda), hábitos de vida e saúde (histórico familiar de DII,
mundial5. As DII acometem pessoas de diferentes classes socio- tabagismo), diagnóstico de DII, atividade da doença e teste
econômicas, idade, sexo e nacionalidade6. de tolerância à lactose, considerando Intolerante à lactose:
quando a elevação da glicemia em qualquer dos períodos
O quadro clínico mais encontrado nas DII é diarreia,
não ultrapassar 20 mg/dL em relação à Basal e Normal:
sangue nas fezes, vômito, dor abdominal e náuseas5. Os
quando a elevação for entre 20 a 25 mg/dL na glicemia em
sintomas gastrointestinais decorrentes das DII, especialmente
relação à Basal de acordo com os parâmetros do Laboratório
nos períodos de atividade da doença, podem levar a uma
Escola de Análises Clínicas (LEAC/UNIVALI)9.
redução da ingestão alimentar, afetando o estado nutri-
cional dos pacientes no momento em que suas necessidades Para realização do teste de tolerância à lactose, utilizou-se
nutricionais têm um aumento devido às consequências da a curva glicêmica, que constitui em verificar a concentração
atividade inflamatória7. de glicose no sangue dos pacientes em jejum de 8 a 10 h
Outra consequência que pode ser ocasionada pela e nas novas amostras de sangue colhidas em 30, 60 e 90
atividade inflamatória é a sensibilidade à lactose, que ocorre minutos. A administração da lactose foi realizada via oral,
quando há uma deficiência da hidrólise de lactose pela borda na dose de 2 g/kg do paciente, sem exceder a dose máxima
em escova no intestino delgado, sendo a enzima responsável de 50 g.
chamada de lactaseflorizinahidrolase (LPH), resultando em A avaliação da atividade da doença por meio do
uma deficiência na hidrólise da lactose em monossacarídeos: parâmetro bioquímico foi realizada a partir dos exames de
glicose e galactose. A atividade da lactaseflorizinahidrolase calprotectina fecal, PCR, ferritina e VHS. Os critérios para
pode ser ainda reduzida como um resultado de mecanismos a avaliação da calprotectina fecal foram negativo (< 50
independentes de predisposição genética, incluindo um ug/g), indeterminado (50,1 a 150 ug/g) e positivo (> 150,1
pequeno crescimento bacteriano, doença celíaca, DC ou ug/g). Para fins estatísticos, foram categorizados em positivo
infecção enterite induzida por drogas3. e negativo. O PCR e o VHS foram considerados reagentes
Dentre alguns sintomas da intolerância à lactose, com valores > 0,6 mg/dL e 10 mm, respectivamente. A
destacam-se fezes amolecidas, diarreia, flatulências, dor e ferritina foi classificada de acordo com o gênero, para o
distensão abdominal, e em alguns casos vômito8. sexo feminino os valores dentro da normalidade entre 11 e
306,8 ng/mL e para o sexo masculino entre 23,9 e 336,2 ng/
Devido ao envolvimento das DII com o trato gastroin-
mL. Os valores de referência considerados para tais exames
testinal e seus efeitos sobre a ingestão alimentar, o presente
seguiram o protocolo do LEAC/UNIVALI. Para fins estatísticos,
estudo objetivou avaliar a intolerância à lactose e sua relação
os exames de PCR, VHS e ferritina foram categorizados em
com a atividade da DII.
normal e acima.
Para verificar a atividade das doenças, foi utilizado o
MÉTODO
índice de atividade proposto por Harvey & Bradshaw10 para
Trata-se de um estudo quantitativo e descritivo com indiví- DC, no qual pontuações < 5 equivalem à fase de remissão,
duos assistidos pelo ambulatório de DII da Unidade de Saúde entre 5 e 7 a atividade leve, entre 8 e 16 a atividade mode-
Familiar e Comunitária (USFC) de Itajaí/SC, no período de rada e > 16 a atividade severa. Já para os pacientes com
novembro de 2015 a agosto de 2016. RCUI, o índice utilizado foi o escore Mayo parcial proposto
BRASPEN J 2018; 33 (1): 21-5
22
Intolerância à lactose e Doença Inflamatória Intestinal

por Turner et al.11, o qual classifica pontuações < 2 em fase


Tabela 1 – Características dos pacientes atendidos na Clínica de Doenças
de remissão, entre 2 e 4 atividade leve, entre 5 e 7 atividade Inflamatórias intestinais (DII) de uma Unidade de Saúde Familiar e Comu-
moderada e > 7 a atividade severa. nitária (USFC) – Itajaí, 2016.
Para investigar o consumo de lácteos, foi aplicado Total de pacientes
um questionário de frequência alimentar que continha os Características n %
seguintes alimentos: leite, iogurte, requeijão, queijo e prepa- Gênero
rações que continham leite (bolos, pães, massas, etc.) e, Feminino 35 70
respectivamente, as frequências de consumo, sendo avaliado
Masculino 15 30
de forma dicotômica: consome e não consome.
Idade 48,2 ±12,56
Os dados coletados foram tabulados com os programas
Diagnóstico
Microsoft Excel® e Word® e a análise estatística realizada a
Retocolite Ulcerativa 19 38
partir do STATA13.0®. Para as variáveis categóricas, foram
calculadas as frequências absolutas e relativas e analisadas Doença de Crohn 31 62
pelo teste χ2 ou teste exato de Fischer e as variáveis quanti- Local de acometimento
tativas pelo teste de Pearson. Ceco 1 2
Cólon 17 34
RESULTADOS Íleo Terminal 20 40
Reto 12 24
O presente estudo contou com uma amostra de 50
pacientes. Destes, 70% (n=35) eram do sexo feminino, com Histórico Familiar
média de idade de 48 anos±12,56. A maioria dos pacientes Sim 7 14
eram tolerantes à lactose (64%) e 86% (n=43) dos avaliados Não 43 86
relataram não possuir histórico familiar de DII. Tabagismo
A Tabela 1 demonstra as principais características dos Sim 2 4
indivíduos incluídos no estudo. Não 48 96
Em relação ao diagnóstico, a DC prevaleceu na maioria Tolerante 32 64
dos avaliados (62%) e 36% do total de pacientes (n=18) Intolerante 18 36
apresentaram intolerância à lactose.
Quanto ao local de acometimento, 40% (n=20) e 34%
(n=17) possuíam DII com padrão de acometimento em íleo Tabela 2 – Atividade da doença, de pacientes atendidos na Clínica de
terminal e cólon, respectivamente, sendo que 41% e 40% Doenças Inflamatórias intestinais (DII) de uma Unidade de Saúde Familiar
e Comunitária (USFC) – Itajaí, 2016. Saúde Familiar e Comunitária (USFC)
desses eram intolerantes à lactose. – Itajaí, 2016.
O presente estudo verificou que 61% (n=11) dos into- Total de pacientes Intolerância Valor de p
lerantes consumiam leite, iogurte 48 % (n= 8), queijo 50% Atividade da doença n % n %
(n= 9), requeijão 33% (n=6) e 67% (n=12) consumiam
Atividade 7 14 5 10 0,639
preparações que continham leite.
Remissão 25 50 13 26
Quando relacionado à atividade da doença com a into-
Calprotectina
lerância à lactose, verificou-se que 26% (n=13) estavam em
remissão e eram intolerantes à lactose, conforme demonstra Positivo 21 42 8 16 0,145
a Tabela 2. Negativo 11 22 10 20
Na Tabela 2, estão apresentados os marcadores bioquí- PCR
micos utilizados para avaliar a atividade da DII (calprotectina, Acima 4 8 2 4 0,885
PCR, VHS e ferritina). Pode-se observar que dos intolerantes Normal 28 56 16 32
à lactose, 32% estavam com PCR dentro dos parâmetros VHS
normais, 26% com a ferritina e 22% com VHS dentro da Acima 19 38 7 14 0,164
normalidade.
Normal 13 26 11 22
Neste estudo, não houve diferença estatística quando
Ferritina
relacionada a tolerância à lactose com a atividade da doença
Acima 6 12 5 10 0,459
(p=0,639), calprotectina (p=0,145), PCR (p=0,885), VHS
(p=0,164) e ferritina (p=0,459). Normal 26 52 13 26

BRASPEN J 2018; 33 (1): 21-5


23
Cidral AM et al.

DISCUSSÃO De acordo com Diestel et al.19, na fase ativa da doença,


No presente estudo, a maioria dos pacientes avaliados sugere-se a exclusão de produtos lácteos, considerando
eram do sexo feminino, com média de idade de 48 anos e que o leite produz desconfortos intestinais por meio da
não relataram antecedentes familiares de DII. Em um estudo fermentação da lactose, mesmo que o paciente não
similar, Rosa et al.12 avaliaram 48 pacientes com DII com possua intolerância, além de ser um motivo de confusão
média de idade de 40 anos, sendo que 66% (n=31) eram do diagnóstica. Na fase de remissão, pode-se reintroduzir
sexo feminino, e 19% (n=9) apresentavam história familiar leite e derivados, quando compravada tolerância à lactose
positiva para DII. pelo paciente.

A literatura refere que as DIIs não possuem discriminação A calprotectina fecal encontrava-se negativa em 20%
de sexo, entretanto, a tendência é as mulheres se preocu- (n=10) dos pacientes intolerantes à lactose. A calprotectina
parem mais com a saúde e buscarem mais assistência médica é uma proteína antimicrobiana liberada no intestino frente a
que os homens, o que pode justificar a maior prevalência de uma exposição da mucosa a uma inflamação, sendo assim,
mulheres nesse estudo13,14. um excelente marcador inflamatório intestinal que, quando
elevado, pode indicar que a DII está em atividade20.
Em relação ao diagnóstico de DII no presente estudo, a
maioria dos pacientes apresentou DC e 36% dos pacientes Pôde-se observar que 32% (n=16) dos intolerantes
eram intolerantes à lactose. Embora a DII seja relatada estavam com o marcador PCR, e VHS 22% (n=11) normais.
como uma afecção que confere danos no intestino e como Em contrapartida, Viesi et al.1, com o objetivo de estimar a
consequência pode acarretar deficiências das dissaca- prevalência de má absorção de lactose e de positividade
ridases, como, por exemplo, a lactase15, os achados do para marcadores inflamatórios em pacientes com DII, veri-
presente estudo não demonstraram prevalência de into- ficaram que 50% (n=18) dos participantes do estudo eram
lerância nos pacientes com DII. O reduzido tamanho da intolerantes à lactose e estavam com os marcadores VHS e
amostra e ausência de controle para outras variáveis pode PCR acima do normal.
ter influenciado o resultado.
Quanto ao local de acometimento, a maioria dos CONCLUSÃO
pacientes estudados possuía DII com padrão de acometi-
Identificou-se que a maioria dos pacientes era tolerantes
mento em íleo terminal e cólon, respectivamente, sendo que
à lactose apresentavam DC com padrão de acometimento
41% e 40% desses eram intolerantes à lactose. Nolan-Clark
em íleo terminal e encontravam-se em fase de remissão
et al.16, em estudo com 165 pacientes com DC, com a fina-
da doença, com base nos sinais e sintomas e nos exames
lidade de investigar se o consumo de produtos lácteos tinha
de calprotectina fecal, ferritina, PCR e VHS. Verificou-se,
relação com a atividade da doença e o local de acometi-
também, que os tolerantes à lactose consumiam com maior
mento, observaram que 50% dos indivíduos (n=82) estavam
frequência leite, queijo e preparações que continham leite.
em remissão, 33% e 30% tinham acometimento no íleo e
no cólon, respectivamente, dados que corroboram com o Diante do exposto, conclui-se que não houve associação
presente estudo. Ainda puderam perceber que 7% (n=11) estatisticamente significativa entre os índices clínicos e
dos indivíduos tinham intolerância à lactose e 25% (n=41) bioquímicos de atividade da doença e a tolerância à lactose
sentiam desconforto gastrointestinal quando consumiam nesse estudo.
algum tipo de produto lácteo. É importante ressaltar que o fato da maioria dos pacientes
O presente estudo verificou que 61% (n=11) dos intole- estar em fase de remissão da doença, além do tamanho da
rantes consumiam leite e 67% (n=12) consumiam prepara- amostra, podem ter sido fatores que contribuíram com os
ções que continham leite. resultados encontrados.
Lopes et al.17, em estudo com 65 indivíduos com DII, com
o objetivo de verificar o consumo de lácteos, observaram que REFERÊNCIAS
53% (n=34) dos pacientes restringiram o consumo de leite 1. Viesi JHZ,Narciso-Schiavon JL, Schiavon LL. Prevalência de
e derivados após o diagnóstico da DII, a fim de amenizar má absorção de lactose e de marcadores sorológicos de doença
os desconfortos gastrointestinais. Em estudo realizado celíaca em pacientes com doença inflamatória intestinal. Rev
Soc Bras Clin Med. 2013;11(3):232-7.
por Bueno-Hernández et al.18 com o objetivo de avaliar a 2. Santos GM, Silvia LR, Santana GO. Repercussões nutricionais
relação do consumo de leite e derivados com sintomatologia em crianças e adolescentes na presença de doenças inflamatórias
em indivíduos com DII, verificou-se que 41% (n=95) dos intestinais. Rev Paul Pediatr. 2014;32(4):403-11.
pacientes consumiam leites e derivados e tinham presença 3. Eadala P, Matthews SB, Waud JP, Green JT, Campbell AK. Asso-
ciation of lactose sensitivity with inflammatory bowel disease–
de desconfortos gastrointestinais, uma vez que apresentavam demonstrated by analysis of genetic polymorphism, breath gases
sensibilidade ao leite. and symptoms.Aliment Pharmacol Ther. 2011;34(7):735-46.

BRASPEN J 2018; 33 (1): 21-5


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Intolerância à lactose e Doença Inflamatória Intestinal

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2014;28(3):324-8. Pharmacol Ther. 2013;38(1):44-51.

Local de realização do trabalho: Universidade do Vale do Itajaí (UNIVALI), Itajaí, SC, Brasil.

Conflito de interesse: Os autores declaram não haver.

BRASPEN J 2018; 33 (1): 21-5


25
A Artigo Original
Becker T et al.

Risco nutricional de pacientes críticos utilizando o


NUTRIC Score
Nutritional risk of critically ill patients using the NUTRIC Score

RESUMO
Tamara Becker¹
Maria Cristina Zanchim²
Introdução: Na avaliação nutricional do paciente crítico devem-se utilizar instrumentos vali-
Adaize Mognon³ dados, considerar a gravidade da doença e a função gastrointestinal. Esses fatores devem ser
Larry Rodrigues de Campos Junior4 verificados, pois servem para identificar pacientes que podem se beneficiar de uma terapia
Taíne Paula Cibulski5 nutricional especializada. Por isso, a triagem nutricional é o primeiro passo para a estratificação
José Afonso Correa6 de pacientes com risco nutricional para a instituição precoce de uma terapia nutricional segura
Daiana Argenta Kümpel7 e planejada. Método: Estudo exploratório, prospectivo realizado com pacientes internados no
Centro de Terapia Intensiva (CTI) do Hospital São Vicente de Paulo, Passo Fundo-RS, no período
de agosto a setembro de 2016. Foram incluídos pacientes admitidos na CTI, nas primeiras 24
horas de internação. Os dados foram coletados utilizando a ferramenta de risco nutricional
denominada NUTRIC Score, bem como variáveis demográficas: sexo e idade, variáveis clínicas:
data de internação, data de admissão e alta da CTI e número de comorbidades. A heteroge-
neidade dos pacientes foi analisada, a fim de entender a influência dos dados demográficos
nos resultados, pelo teste t de Student, correlação linear simples e análise variância (ANOVA).
Resultados: Foram incluídos no estudo 28 pacientes críticos, prevalecendo o gênero feminino,
com média de idade de 55,75±15,47 anos. Os principais motivos de admissão na unidade
de terapia intensiva foram os traumas e politraumas (35,7%), sendo que 64,3% dos pacientes
apresentaram duas ou mais comorbidades associadas. Na pontuação final do NUTRIC Score,
prevaleceu a pontuação alta (67,9%), indicando risco nutricional. Dentre os pacientes avaliados,
73,7% (14) dos pacientes com pontuação alta no NUTRIC Score, classificados em risco nutricional,
foram a óbito (p=0,025).Conclusões: Observou-se elevada prevalência de risco nutricional entre
os pacientes críticos estudados, confirmando a importância do acompanhamento nutricional
adequado. O NUTRIC Score se mostrou uma ferramenta de fácil aplicação para triagem de
pacientes críticos em unidade de terapia intensiva.

ABSTRACT
Unitermos: Introduction: In the nutritional evaluation of a critical patient, one must use validated instru-
ments; consider the severity of the disease and the gastrointestinal function. These factors must
Unidade de Terapia Intensiva. Avaliação Nutricional. be checked because they serve to identify patients that can benefit from a specialized nutritional
Cuidados Críticos.Terapia Nutricional. Mortalidade. therapy. Hence, the nutritional triage is the first step to the stratification of patients with nutritional
risk for the early institution of safe and planned nutritional therapy. Methods: An exploratory,
Keywords: prospective study performed with hospitalized patients at the Intensive Care Unit (ICU) of the
Intensive Care Unit. Nutrition Assessment. Critical Hospital São Vicente de Paulo, Passo Fundo-RS, in the period from August to September 2016.
Care.Nutrition Therapy. Mortality. Patients admitted to the ICU were included, using the nutritional risk tool named NUTRIC Score,
as well as demographic variables: sex and age; clinical variables: date of hospitalization, date
Endereço para correspondência: of admittance and discharge from the ICU, and the number of comorbidities. The heterogeneity
Tamara Becker of patients was analyzed, with the purpose of understanding the influence of demographic data
Rua Guaporé 363E – Centro – Chapecó, SC, Brasil in the results, by the t of Student test, simple linear correlation and variance analysis (ANOVA).
– CEP: 89802-300 Results: Were included in the study 28 critical patients, prevailing the female gender, with and
E-mail: nutricionistatamara@gmail.com age average of 55.75±15,47 years. The main admission reasons at the intensive care unit were
trauma and multiple trauma (35.7%), being that 64.3% of the patients presented two or more
associated comorbidities. At the final NUTRIC Score, prevailed the high punctuation (67.9%)
Submissão: indicating nutritional risk. Between the analyzed patients 73.7% (14) with high NUTRIC Score,
14 de junho de 2017 classified in nutritional risk, died (p=0.025). Conclusions: High prevalence of nutritional risk in
the studied critical patients was observed, confirming the importance of the adequate nutritional
Aceito para publicação: follow-up. The NUTRIC Score proved itself an easy to use triage application in critical patients in
6 de setembro de 2017 intensive care unit tool.

1. Nutricionista. Especialista em Saúde do Idoso pelo Programa de Residência Multiprofissional da Universidade de Passo Fundo, Chapecó, SC, Brasil.
2. Nutricionista. Mestre em Envelhecimento Humano pela Universidade de Passo Fundo (UPF). Nutricionista da Equipe Multiprofissional de Terapia
Nutricional do Hospital São Vicente de Paulo. Docente do curso de Nutrição da UPF, Passo Fundo, RS, Brasil.
3. Nutricionista. Residente em Saúde do Idoso pelo Programa de Residência Multiprofissional da Universidade de Passo Fundo, Passo Fundo, RS, Brasil.
4. Acadêmico de Medicina da Universidade Comunitária da Região de Chapecó (UNOCHAPECO), Chapecó, SC, Brasil.
5. Nutricionista. Especialista em Atenção ao Câncer pelo Programa de Residência Multiprofissional da Universidade de Passo Fundo. Nutricionista
do Instituto do Câncer Hospital São Vicente, Passo Fundo, RS, Brasil.
6. Farmacêutico. Mestre em Ciências Farmacêuticas pela Universidade do Vale do Itajaí. Farmacêutico da farmácia ambulatorial do Hospital São
Vicente de Paulo. Docente do curso de Medicina da Universidade Federal Fronteira Sul, Passo Fundo, RS, Brasil.
7. Nutricionista. Mestre em Envelhecimento Humano pela Universidade de Passo Fundo (UPF). Tutora do Programa de Residência Multiprofissional
Integrada em Saúde do Idoso e Atenção ao Câncer da UPF. Nutricionista docente do curso de Nutrição da UPF, Passo Fundo, RS, Brasil.

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Risco nutricional de pacientes críticos pelo NUTRIC Score

INTRODUÇÃO a setembro de 2016. Foram incluídos pacientes admitidos


Há décadas é reconhecida a forte relação da desnutrição na CTI, nas primeiras 24 horas de admissão e excluídos
como desfecho clínico negativo no paciente grave. Este fato pacientes menores de 18 anos, aqueles com diagnóstico
é atribuído ao binômio formado por gravidade do paciente, confirmado de morte encefálica, pós-operatórios de cirurgias
inanição, hipermetabolismo e hipercatabolismo, que pode cardíacas, reinternações, e aqueles com dados incompletos
contribuir para a alta frequência de desnutrição encontrada nos prontuários da instituição.
nos pacientes internados em unidades de terapia intensiva Os dados foram coletados utilizando a ferramenta de
(UTI). A prevalência da desnutrição em UTI varia de 38% a triagem de risco nutricional denominado NUTRIC Score
70%, podendo chegar a 100% e sua presença está associada modificado4, bem como variáveis demográficas: sexo e idade;
ao aumento da morbidade e mortalidade1. variáveis clínicas: data de internação, data de admissão e
A avaliação nutricional no paciente crítico apresenta alta da CTI; e, também, o número de comorbidades classi-
limitações, pois os métodos tradicionais, como antropo- ficadas conforme a Classificação Internacional de Doenças
metria, testes bioquímicos e a medida dos compartimentos (CID 10) e estratificada em: Traumas e politraumas, doenças
corporais sofrem grande interferência, prejudicando sua gastrointestinais, neoplasias, alterações pulmonares, altera-
interpretação. Dentre as alterações que ocorrem, estão a ções neurológicas e outras. Os dados do APACHE II e SOFA
alteração do peso corpóreo, pela maior retenção de líquido foram calculados a partir das informações laboratoriais e
no espaço extracelular, o edema e medidas de pregas e fisiológicas registradas nos prontuários.
circunferências2. Devido à falta de dados a respeito da interleucina 6 (IL-6),
O manejo do paciente em situação crítica deve consi- uma vez que esta não é coletada rotineiramente na unidade
derar a avaliação do risco nutricional por instrumentos de terapia intensiva de estudo, a Proteína C Reativa (PCR), que
validados, a avaliação da gravidade da doença e a função também é utilizada como indicador de infecção, foi coletada
gastrointestinal. Esses fatores devem ser identificados, pois nos registros dos pacientes, porém não incluída no escore. A
servem também para identificar pacientes que podem se pontuação NUTRIC foi calculada sem a IL6 como sugerido
beneficiar de uma terapia nutricional especializada, além e validado por Heyland et al.5. Os indivíduos foram classifi-
de monitorar a evolução do suporte nutricional. Por isso, a cados em alta pontuação (5 – 9), indicando risco nutricional,
triagem nutricional é o primeiro passo para a estratificação associação com piores resultados clínicos (mortalidade e
de pacientes com risco nutricional para a instituição precoce ventilação) e maior probabilidade de se beneficiar de uma
de uma terapia nutricional segura e planejada1. terapia nutricional agressiva, ou baixa pontuação (0 – 4),
A única proposta de triagem desenvolvida para UTI até o sugerindo baixo risco nutricional.
momento, que leva em conta índices de gravidade, é conhe- Os dados foram tabulados em planilha eletrônica do
cida como Nutrition Risk in Critically Ill - NUTRIC Score1. programa Microsoft Office Excel® 2010 e analisados esta-
O NUTRIC Score é o primeiro sistema de escore validado tisticamente no programa Statistical Package for the Social
para a identificação de pacientes críticos em risco nutricional Sciences® (SPSS) vs 22.0. A heterogeneidade dos pacientes
e com tendência de se beneficiar de uma terapia nutricional foi analisada, a fim de entender a influência dos dados demo-
agressiva. Esse instrumento utiliza fatores de risco que podem gráficos nos resultados, pelo teste t de Student, correlação
ser modificados pela terapia nutricional na UTI, considerando linear simples e análise variância (ANOVA).
que nem todos os pacientes têm o mesmo risco de sofrer O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa
eventos adversos com repercussão no estado nutricional. da Universidade de Passo Fundo, sob o número 1.619.552,
Suas variáveis de controle são o Acute Physiology and Chronic respeitando todos os aspectos legais e éticos. O Termo
Health Evaluation (APACHE II), o Sequential Organ Failure de Consentimento Livre e Esclarecido foi dispensado pelo
Assessment (SOFA), a idade, o número de comorbidades e respectivo comitê por este ser um estudo observacional com
o total de dias de internação antes da UTI3. coleta de dados em prontuários.
Diante do exposto, esse estudo tem como objetivo avaliar
o risco nutricional de pacientes críticos através da ferramenta RESULTADOS
NUTRIC Score.
Foram incluídos no estudo 28 pacientes críticos,
prevalecendo o gênero feminino, com média de idade de
MÉTODO
55,75±15,47 anos, mínima de 28 e máxima de 88 anos.
Estudo exploratório e prospectivo com pacientes inter- Antes da admissão na CTI, 78,6% dos pacientes ficaram
nados no Centro de Terapia Intensiva (CTI) do Hospital São internados mais do que um dia em outras unidades de inter-
Vicente de Paulo, Passo Fundo-RS, no período de agosto nação ou emergência do hospital.
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27
Becker T et al.

Os principais diagnósticos de internação na CTI foram


Tabela 1 – Características demográficas e clínicas dos pacientes críticos
o trauma e politrauma, sendo que 64,3% dos pacientes de acordo com o NUTRIC score (n=28).
apresentaram mais que duas comorbidades associadas.
Variável N %
Nas escalas prognósticas APACHE II e SOFA prevaleceram
pontuações altas dos índices, com valores maiores que 28 Gênero
pontos e maiores ou iguais a 10 pontos, respectivamente. Feminino 17 60,7
Na pontuação final da ferramenta NUTRIC Score Masculino 11 39,3
prevaleceu a pontuação alta, classificando como risco Idade
nutricional em 67,9%, indicando também associação com < 50 10 35,7
piores resultados clínicos (mortalidade e ventilação) e maior
50 -59 6 21,4
probabilidade de se beneficiar de uma terapia nutricional
agressiva. 60 - 75 11 39,3

Observou-se, também, a prevalência de uso de venti- > 75 1 3,6


lação mecânica entre os pacientes (82,1%) e saída da CTI Dias de internação antes da CTI
com desfecho clínico óbito (53,6%). A Tabela 1 demonstra 0 - <1 6 21,4
as principais características demográficas e clínicas da
≥1 22 78,6
amostra.
Diagnóstico admissional
Ao se correlacionar as variáveis demográficas e clínicas
Trauma e politrauma 10 35,7
com a pontuação do NUTRIC Score, verifica-se associação
estatisticamente significativa para as variáveis, idade, Outros 5 17,9
APACHE II, SOFA e número de comorbidades (p≤0,05), Neoplasias 4 14,3
conforme detalha a Tabela 2. Alterações neurológicas 4 14,3
Associando-se as variáveis com as categorias, pontu- Alterações gastrointestinais 3 10,7
ação alta e baixa do NUTRIC Score, constatamos que existe
Alterações pulmonares 2 7,1
diferença estatisticamente significativa para as variáveis
APACHE, SOFA, número de comorbidades e PCR (p≤0,05). Número de comorbidades
Já a idade, gênero, dias de internação e o uso de ventilação 0-1 10 35,7
de mecânica não apresentaram associação estatisticamente ≥2 18 64,3
significativa (p>0,05), conforme evidenciado na Tabela 3. APACHE II
Dentre os pacientes avaliados que apresentavam pontu- < 15 4 14,3
ação alta no NUTRIC Score, 73,7% (14) foram a óbito. Já
15 - < 20 7 25,0
os pacientes que receberam alta para a enfermaria 88,9%
(8) apresentaram pontuação baixa. 20 - 28 7 25,0

Quando associada a prevalência de pacientes com ≥ 28 10 35,7


pontuação alta no NUTRIC Score com a ocorrência de SOFA
óbito, observamos uma correlação significativa (p=0,025). <6 3 10,7
Já a associação da alta pontuação com o uso ou não de
6 - < 10 8 28,6
ventilação mecânica (p=0,761) e número de dias antes da
≥ 10 17 60,7
internação na CTI (p=0,632), não mostrou relação com a
alta ou óbito dos pacientes do estudo. Classificação NUTRIC Score
Pontuação Alta 19 67,9
DISCUSSÃO Pontuação Baixa 9 32,1
Uso de ventilação mecânica
Os pacientes em estado crítico devem ser avaliados do
ponto de vista nutricional logo após a admissão, para que Sim 23 82,1
sejam identificados prontamente aqueles para quais a terapia Não 5 17,9
nutricional possa ser mais benéfica3. Motivo da saída da CTI
A desnutrição é comum no ambiente de terapia intensiva Alta para a enfermaria 13 46,4
e ferramentas antropométricas de rastreio podem ser, muitas
Óbito 15 53,6
vezes, impróprias para pacientes críticos, principalmente
APACHE II=Acute Physiology and Chronic Health Evaluation; SOFA=Sequential Organ Failure
pelas mudanças significativas de fluidos6. Assessment; CTI=Centro de terapia intensiva

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28
Risco nutricional de pacientes críticos pelo NUTRIC Score

Em nossa pesquisa, a maioria dos pacientes estava em


Tabela 2 – Associação das variáveis demográficas e clínicas dos pacientes
críticos com a pontuação do NUTRIC Score (n=28). ventilação mecânica. No estudo inicial de validação do
Variáveis Total (n=28) p
NUTRIC Score, observou-se que o escore foi fortemente
associado com o uso de ventilação mecânica entre os sobre-
Idade (anos) 55,8±15,5 0,001
viventes de 28 dias5. Kos et al.11, que também aplicaram o
Gênero (Feminino/Masculino) 17 (60,7)/11 (39,3) 0,680
NUTRIC Score e pesquisaram ainda o prognóstico nutricional
Dias de internação antes da CTI 4,0 (1,0–7,0) 0,351
em pacientes idosos, encontraram grande prevalência
APACHE II 23,5 (15,3–29,0) < 0,001 (70,7%) de pacientes em ventilação mecânica.
SOFA 11,5 (8,3–13,0) < 0,001
O óbito prevaleceu como principal desfecho clínico dentre
Número de comorbidades 2,0 (1,0–3,0) 0,005 os pacientes (53,6%), assim como pesquisado por Heyland
Uso de ventilação mecânica 23 (82,1) 0,194 et al.5 na primeira validação do escore em 2011, verificando
PCR 42,3 (17,0–97,3) 0,121 mortalidade em 53% dos pacientes, confirmando, ainda, que
APACHE II=Acute Physiology and Chronic Health Evaluation; SOFA=Sequential Organ Failure a mortalidade aumenta juntamente com o NUTRIC Score.
Assessment; PCR=Proteína C Reativa; CTI=Centro de terapia intensiva.
Valores descritos em: média, ± desvio padrão (DP), mediana (desvio interquatílico (dq) e n (%). Já na segunda validação do escore, sem o uso da IL-6,
observou-se que a taxa de mortalidade foi de 71% para os
pacientes com a pontuação máxima no escore.
A pontuação NUTRIC sem os níveis de IL-6 foi validada
Tabela 3 – Associação das variáveis demográficas e clínicas dos pacientes
críticos com a pontuação alta e baixa do NUTRIC Score (n=28). e pode ser usada normalmente para identificar pacientes em
risco4. Neste estudo, assim como em outros, a IL-6 não foi
Variáveis Pontuação alta Pontuação baixo p
(n=19) (n=9) considerada na avaliação devido a sua indisponibilidade10,12.
Idade (anos) 60,8±14,8 45,0±11,0 0,15 Um desses estudos propôs que a PCR seja incorporada
ao NUTRIC Score como um biomarcador inflamatório em
Gênero (Feminino/ 11 (57,9)/8 (42,1) 6 (66,7)/3 (33,3) 0,671
Masculino) pacientes criticamente doentes, podendo melhorar assim o
Dias de internação 4,0 (1,0–6,0) 2,0 (0,5–8,5) 0,791 desempenho dessa ferramenta12.
antes da CTI Diferenças estatisticamente significativas foram cons-
APACHE 28,0 (23,0–30,0) 15,0 (11,0–17,0) < 0,001 tatadas para as variáveis APACHE II, SOFA, número de
SOFA 13,0 (11,0–14,0) 8,0 (6,0–9,0) 0,001 comorbidades e PCR quando associada às variáveis do
Número de 3,0 (2,0–4,0) 1,0 (1,0–2,0) 0,003 estudo (idade, gênero, dias de internação antes da CTI,
comorbidades APACHE, SOFA, número de comorbidades, uso de ventilação
Uso de ventilação 17 (89,5) 6 (66,7) 0,235 mecânica e PCR) e a pontuação final do NUTRIC. Rosa et
mecânica
al.13 obtiveram também uma correlação significativa entre o
PCR 57,7 (33,7–112,4) 24,4 (7,8–48,0) 0,018
score e o número de comorbidades (p≤0,001).
APACHE II=Acute Physiology and Chronic Health Evaluation; SOFA=Sequential Organ Failure
Assessment; PCR=Proteína C Reativa; CTI=Centro de terapia intensiva. Valores descritos em: Em nosso estudo, a ocorrência de óbito se correlacionou
média, ± desvio padrão (DP), mediana (desvio interquartílico (dq) e n (%).
com a pontuação alta (>5) do NUTRIC Score e algumas
pesquisas corroboram com este achado. Ceniccola et al.14,
em seu estudo, aplicaram o NUTRIC Score em pacientes
Neste trabalho, prevaleceu o gênero feminino, média de vítimas de trauma, sendo que 36% apresentaram risco
idade de 55,8 anos e os principais motivos de internação nutricional; observaram que a oferta de quilocalorias ficou
foram os traumas e politraumas. Um estudo realizado em em menos de 70% do valor calórico planejado e que estes
15 UTIs de Portugal, diferentemente do estudo em questão, pacientes apresentaram mortalidade de 50%. A partir disso,
obteve média de 64 anos; 64,8% eram homens; diagnósticos concluiu-se que pacientes críticos em risco nutricional podem
de internação primária: respiratórios (23%), sepse (20,2%) se beneficiar do recebimento de 70% ou mais da meta caló-
e trauma (14,6%); a variável “duas ou mais comorbidades” rica planejada.
foi observada em 34,4% dos pacientes7.
Heyland et al.5, na validação original do NUTRIC,
Para as escalas APACHE II e SOFA, prevaleceram os encontraram associação estatisticamente significativa entre a
valores máximos dos índices, semelhantes aos valores de adequação nutricional e sobrevida em 28 dias em pacientes
outros estudos, nos quais as pontuações médias do APACHE de alto risco com pontuação alta. Mukhopadhyay et al.8
II foram de 27,38 e SOFA de 7 pontos7. verificaram, também, que a alta pontuação juntamente com
A porcentagem de pacientes classificados em risco nutri- a menor adequação nutricional se associou à mortalidade
cional pelo NUTRIC Score foi superior a outros estudos em prevista, não sendo observado significância no grupo com
que a porcentagem se manteve entre 26% e 57%7,9,10. pontuação baixa. Mendes et al.7 mostraram ainda que a
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29
Becker T et al.

pontuação alta foi associada a maior mortalidade de 28 são difíceis de se obter porque dependem do contato com os
dias. Diferentemente dos demais estudos, a validação do membros da família, podendo ser inconsistentes.
NUTRIC para a população brasileira realizada por Toledo et Além dos estudos, as principais recomendações que
al.15 revelou que o escore médio foi de 3,2 e a mortalidade emergem acerca da avaliação de risco são de que antes
foi de 32,4%, não se associando estatisticamente. do início da terapia nutricional, independentemente da via
Existem algumas divergências nos estudos em relação ao utilizada, uma determinação do risco nutricional deve ser
NUTRIC e sua associação com o óbito e sua capacidade de realizada utilizando não somente a antropometria tradicional,
identificação de risco nutricional. O “risco nutricional” é um mas também pontuações validadas em todos os pacientes
termo amplo que engloba a identificação de pacientes nos admitidos nas unidades hospitalares19,20. A adequada tera-
quais a desnutrição pode se desenvolver como resultado da pêutica no paciente criticamente enfermo pode resultar
doença crítica e os pacientes que já estão desnutridos no ainda numa melhor evolução, maior sobrevida e menor
momento da internação na UTI. Obviamente, essa diferen- custo hospitalar21.
ciação se dá também pela inclusão de populações altamente
heterogêneas16.
CONCLUSÃO
Um estudo recente comparou a Avaliação Subjetiva
Global (ASG), uma avaliação institucional e o NUTRIC Score, Diante dos resultados, pode-se assegurar que a maior
sendo observado que o NUTRIC tem uma capacidade redu- parte dos pacientes críticos apresenta risco nutricional,
zida de identificar pacientes em risco nutricional, porém ele confirmando, portanto, a importância do acompanhamento
foi superior na predição do desfecho clínico do paciente9. nutricional adequado em unidades de terapia intensiva.
Uma mudança de paradigmas importante pode ocorrer O NUTRIC Score mostrou-se uma ferramenta de fácil apli-
na forma de avaliar os parâmetros para a determinação de cação e triagem de pacientes críticos, desde que as demais
risco nutricional, desnutrição e incorporação adicional de variáveis – como o APACHE II e SOFA – estejam disponíveis
gravidade da doença. Os escores de risco nutricional mais quando admitidos em UTI. O escore também foi eficaz como
recentes podem alcançar esses paradigmas, pois abrangem preditor de mortalidade nos pacientes em risco nutricional.
estas propostas em relação às pontuações tradicionais, Considerando a importância do adequado estado nutri-
melhorando, portanto, a intervenção nutricional17. cional para a evolução clínica positiva do paciente crítico,
Cada ferramenta possui sua limitação na avaliação do a aplicação de ferramentas, dentre elas, o NUTRIC Score,
risco nutricional, porém independentemente da ferramenta torna-se de suma importância para o diagnóstico nutricional
utilizada, a otimização do suporte nutricional em pacientes da população, que pode se beneficiar de uma interferência
críticos com risco nutricional é importante para atenuar as nutricional apropriada.
complicações e os resultados adversos18.
Heyland et al.5 observaram que, enquanto a maioria dos REFERÊNCIAS
métodos de rastreio nutricional em pacientes hospitalizados
1. Moraes MF, Lima FCA, Luz AMA. Risco nutricional em pacientes
podem ser complicados e demorados e, portanto, não são graves. In: Toledo D, Castro M, eds. Terapia nutricional em UTI.
rotineiramente realizados, a pontuação NUTRIC é uma Rio de Janeiro: Rubio; 2015. p.9-17.
ferramenta prática, fácil de utilizar, com base em variáveis 2. Nunes ALB, Koterba E, Alves VGF, Abrahão V, Correia MITD;
Sociedade Brasileira de Nutrição Parenteral e Enteral. Asso-
que são fáceis de se obter em unidades de terapia intensiva. ciação Brasileira de Nutrologia. Terapia Nutricional no Paciente
Em um estudo, o NUTRIC Score passou por uma análise Grave. In: Associação Médica Brasileira e Conselho Federal de
feita por profissionais de quatro unidades de terapia inten- Medicina. Projeto Diretrizes. São Paulo: Rubio; 2011.
3. Ceniccola GD, Abreu HB. Ferramentas tradicionais de
siva onde ele foi traduzido e adaptado para a linguagem avaliação nutricional adaptadas à unidade de terapia intensiva.
portuguesa. Uma dificuldade apontada foi a obtenção de In: Toledo D, Castro M, eds. Terapia nutricional em UTI. Rio
todos os dados necessários para o cálculo, porém, os autores de Janeiro: Rubio; 2015. p.19-24.
4. Rahman A, Hasan RM, Agarwala R, Martin C, Day AG, Heyland
apontaram o escore como uma ferramenta fácil e clara de
DK. Identifying critically-ill patients who will benefit most
entender, além de ser prático e rápido de aplicar13. from nutritional therapy: further validation of the "modi-
Uma das limitações deste estudo foi idêntica ao encontrado fied NUTRIC" nutritional risk assessment tool. Clin Nutr.
2016;35(1):158-62.
por Heyland et al.5, não sendo possível se obter os níveis de IL-6, 5. Heyland DK, Dhaliwal R, Jiang X, Day AG. Identifying critically
além da dificuldade na coleta dos índices APACHE II e SOFA ill patients who benefit the most from nutrition therapy: the
na rotina das unidades, limitando a utilidade do NUTRIC. Este development and initial validation of a novel risk assessment
estudo aponta, ainda, que a ferramenta não contém variáveis tool. Crit Care. 2011;15(6):R268.
6. Ridley E, Gantner D, Pellegrino V. Nutrition therapy in critically
nutricionais tradicionais, como o Índice de Massa Corporal ill patients- a review of current evidence for clinicians. Clin Nutr.
(IMC) e história alimentar, porém, na prática essas variáveis 2015;34(4):565-71.

BRASPEN J 2018; 33 (1): 26-31


30
Risco nutricional de pacientes críticos pelo NUTRIC Score

7. Mendes R, Policarpo S, Fortuna P, Alves M, Virella D, Heyland 14. Ceniccola GD, Cavalcanti SATQ, Lima FC, Lautero JR. Avaliação
DK; Portuguese NUTRIC Study Group. Nutritional risk asses- do efeito da oferta de quilocalorias em pacientes críticos vítimas
sment and cultural validation of the modified NUTRIC score in de trauma em risco nutricional pelo NUTRIC. Rev Bras Ter
critically ill patients-A multicenter prospective cohort study. J Intensiva. 2015;27(Suppl 1):S23.
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Local de realização do trabalho: Universidade de Passo Fundo, Passo Fundo, RS, Brasil.

Conflito de interesse: Os autores declaram não haver.

BRASPEN J 2018; 33 (1): 26-31


31
A Artigo Original
Ribeiro VA et al.

Pacientes pediátricos hospitalizados: evolução do


estado nutricional e fatores associados
Hospitalized pediatric patients: evolution of nutritional status and associated factors

RESUMO
Virginia A. Ribeiro1
Thaisy C. H. S. Alves2 Objetivo: Avaliar a evolução do estado nutricional de pacientes pediátricos durante a hospitali-
Lílian B. S. Fatal3 zação e fatores associados. Método: Coorte prospectivo de 72 pacientes com idade entre 0 e 9
anos. Dados antropométricos incluíram peso, estatura e circunferência do braço. O diagnóstico
nutricional foi determinado a partir do índice de peso/idade para todas as crianças, peso/estatura
para menores de 5 anos e índice de massa corporal/idade para maiores de 5 anos. Os resultados
foram apresentados como média, ± desvio-padrão ou mediana. Considerou-se diferença estatis-
ticamente significante quando p<0,05. Teste t de Student foi utilizado para amostras dependentes
pareadas, análise de variância ANOVA para medidas repetidas e correlação linear de Pearson
para análise de correlações. Resultados: Do total da amostra, 52% (n=37) apresentaram ganho
ponderal ao longo do internamento, sendo a média de 0,51 kg e mediana de 0,38 (DP±0,62),
enquanto 45% (n=32) apresentaram perda ponderal, com média de -0,75 kg e mediana de
-1,85 (DP±0,79), sendo a perda mais prevalente nos pacientes com idade superior a 60 meses
(41%). Houve correlação fracamente positiva (r=0,26) entre o tempo de internação e a perda
ponderal. Diagnóstico de doença aguda, idade superior a 60 meses e perda ponderal foram
fatores associados a maior tempo de internação; ganho ou manutenção de peso associados a
menor tempo. Conclusão: O acompanhamento da evolução do estado nutricional das crianças
durante a hospitalização é fundamental para o entendimento dos principais fatores associados,
Unitermos: possibilitando intervenções precisas e coerentes.
Estado Nutricional. Transição Nutricional. Desnutrição
Infantil. ABSTRACT
Objective: To evaluate the evolution of the pediatric patients nutritional status during the hospita-
Keywords:
lization and associated factors. Methods: Prospective cohort study of 72 patients aged between 0
Nutritional Status. Nutritional Transition. Child
­Malnutrition. and 9 years. Anthropometric data included weight, height and arm circumference. The nutritional
diagnosis was determined from the weight / age index for all children, weight / height for children
Endereço para correspondência: under 5 years and body mass / age index for children older than 5 years. Results were presented
Thaisy Cristina Honorato Santos Alves as mean ± standard deviation or median. Statistically significant difference was considered when
Universidade do Estado da Bahia. Departamento p<0.05. Student’s t-test was used for paired dependent samples, ANOVA variance analysis for
Ciências da Vida. Colegiado de Nutrição. Rua Silveira repeated measures and Pearson’s linear correlation for correlation analysis. Results: Out of the
Martins, 2555 – Cabula – Salvador, BA, Brasil – CEP: total sample, 52% (n=37) presented a weight gain during hospitalization, with a mean of 0.51
41150-000. kg and a median of 0.38 (SD±0.62) and 45% (n=32) presented a weight loss, with a mean of
E-mail: tcalves@uneb.br; thaisyhonorato@yahoo. -0.75 kg and a median of -1.85 (SD±0.79), being the most prevalent loss in patients over 60
com.br
months (41%). There was a weakly positive correlation (r=0.26) between hospitalization time and
Submissão: weight loss. Diagnosis of acute illness, age greater than 60 months and weight loss were factors
8 de agosto de 2017 associated with longer hospitalization time; weight gain or maintenance were associated with less
time. Conclusion: Monitoring the evolution of children’s nutritional status during hospitalization
Aceito para publicação: is fundamental for the understanding of the main associated factors, allowing for precise and
30 de outubro de 2017 coherent interventions.

1. Nutricionista Residente em Nutrição Clínica pela Residência Multiprofissional em Saúde/ Universidade do Estado da Bahia, Salvador, BA, Brasil.
2. Mestre em Alimentos, Nutrição e Saúde pela Escola de Nutrição-Universidade Federal da Bahia. Docente do curso de Nutrição da Universidade
do Estado da Bahia, Salvador, BA, Brasil.
3. Mestre em Medicina e Saúde Humana pela Escola Baiana de Medicina e Saúde Pública. Docente do curso de Nutrição da Universidade do
Estado da Bahia, Salvador, BA, Brasil.

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32
Pacientes pediátricos: estado nutricional e fatores associados

INTRODUÇÃO todos os pacientes admitidos no período entre janeiro e


A desnutrição constitui um importante problema de saúde maio de 2016.
pública em todo o mundo e serve como um indicador de Foram incluídos todos os pacientes com idade de 0 a
prognóstico dos pacientes hospitalizados1.  A internação 9 anos e 11 meses, hospitalizados por motivos clínicos e/
hospitalar frequentemente culmina em piora do estado nutri- ou cirúrgicos na enfermaria pediátrica, em uso de dieta via
cional de pacientes pediátricos. Embora a prevalência exata oral e/ou terapia nutricional enteral via sonda ou ostomias e
de desnutrição em crianças hospitalizadas seja extremamente cuja avaliação antropométrica foi realizada pelo menos duas
difícil de ser quantificada, estudos sugerem que cerca de 50% vezes ao longo do internamento. Cada paciente foi incluído
tenham comprometimento do estado nutricional2. apenas uma vez no estudo, ainda que possa ter acontecido
A cada ano, mais de 200 mil crianças morrem antes dos uma readmissão durante o período de realização do mesmo.
5 anos nas Américas em consequência da desnutrição e Devido à grande variedade de doenças como causa
doenças preveníveis, segundo estatísticas da Organização de internação, optou-se por dividi-las em dois grandes
Pan-Americana de Saúde (OPAS). Cerca de 20 a 30% das grupos para análise da doença de base: doenças agudas e
crianças gravemente desnutridas vão a óbito durante o trata- crônicas. Foram classificadas em doenças agudas: diarreias
mento nos serviços de saúde desses países3. infecciosas, hérnias, apendicite, infecções de vias aéreas
No Brasil, entre 1989 e 2006, de acordo com a Pesquisa superiores e inferiores, encefalopatia, intoxicações exógenas
Nacional de Saúde e Nutrição (PNSN) e a Pesquisa Nacional e traumas. E em doenças crônicas: neurotoxoplasmose,
de Demografia e Saúde da Criança e da Mulher (PNDS), hidrocefalia com dreno, anomalias anorretais e outras
houve redução significativa da desnutrição, quando compa- doenças de evolução lenta e duração prolongada ou com
rado déficit de peso para idade, em crianças com idade recorrência frequente por tempo indeterminado.
inferior a 5 anos, passando de 7,1% para 1,7%4. Os dados antropométricos de cada paciente foram cole-
Entretanto, a Comissão Nacional de População e Desen- tados até 48 horas após a admissão e, a cada 7 dias, até a
volvimento (CNPD) apresentou posicionamento ressaltando alta hospitalar. Não foram incluídos os pacientes com idade
a necessidade da realização da PNDS no ano de 2016. O superior a 9 anos e 11 meses, portadores de neuropatias ou
objetivo é coletar dados para análise de indicadores que qualquer síndrome genética que não possibilitasse a aferição
permitem acompanhar o sistema público de saúde, visto que ou fidedignidade das medidas antropométricas, em uso
a desnutrição continua a ser um relevante problema de saúde de terapia medicamentosa que modificasse a composição
pública no país, principalmente nas regiões Norte e Nordeste, corporal ou aqueles cujos responsáveis se recusaram a
com consequências graves no crescimento, desenvolvimento assinar o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).
e sobrevida das crianças5. A avaliação nutricional foi realizada na admissão consi-
Adicionalmente, o país vive um período de transição derando os parâmetros antropométricos de peso, estatura e
nutricional, caracterizada pela diminuição da prevalência de circunferência do braço (CB). O peso foi aferido em balança
desnutrição concomitante ao aumento das taxas de sobrepeso pediátrica digital com capacidade total de 15 kg e variação
e obesidade, que, assim como a desnutrição, apresenta conse- de 10 gramas para crianças menores de 2 anos e em balança
quências no desenvolvimento e sobrevida das crianças e associa- digital de plataforma com capacidade total de 300 kg e
se a várias doenças crônicas não transmissíveis a longo prazo6. variação de 100 gramas para as crianças maiores de 2 anos.
As crianças menores de 2 anos foram pesadas completa-
Logo, é de suma importância conhecer e acompanhar o
mente sem roupa e, as maiores de 2 anos, com roupas leves
estado nutricional de crianças hospitalizadas, para melhor
e sem sapatos e colocadas no centro da balança.
compreender os fatores relacionados ao maior tempo de
internação hospitalar e, com isso, melhorar o manejo da A estatura foi aferida com um antropômetro portátil
terapia nutricional para manutenção e/ou recuperação do vertical com um lado fixo e outro móvel, com extensão
estado nutricional do paciente. Assim sendo, o objetivo do máxima de 250 centímetros e precisão de 1 milímetro,
presente trabalho foi avaliar a evolução do estado nutricional ficando a criança deitada em um local plano com o topo da
de pacientes pediátricos durante o internamento hospitalar cabeça colocado na parte fixa e o comprimento estabelecido
e seus fatores associados. com o corpo bem esticado. A altura das crianças maiores
de 2 anos foi mensurada com um antropômetro vertical
móvel com extensão máxima de 200 centímetros e precisão
MÉTODO
de 1 milímetro. As crianças eram colocadas descalças com
Estudo de coorte prospectivo, realizado na enfermaria os calcanhares juntos à haste vertical do antropômetro, a
pediátrica de um hospital público de grande porte em cabeça em postura ereta, os braços soltos do corpo e as
Salvador-BA. A amostra de conveniência foi constituída por mãos voltadas para as coxas.
BRASPEN J 2018; 33 (1): 32-8
33
Ribeiro VA et al.

A CB foi realizada por meio de uma fita inelástica, com Os resultados foram apresentados como média, ± desvio-
precisão de 0,1 cm, no ponto médio entre o acrômio e o padrão ou mediana. As diferenças foram consideradas como
olecrano, no braço não dominante, estando o indivíduo na estatisticamente significantes quando a probabilidade de
posição ereta, com os braços relaxados ao longo do corpo7. falsa rejeição da hipótese nula era inferior a 5% (p<0,05).
A aferição das medidas antropométricas foi realizada em Para isso, utilizou-se o teste t de Student para amostras
duplicata; quando houve uma variação não aceitável, foi dependentes (pareadas), a análise de variância ANOVA para
realizada uma terceira medida. A medida final foi a média medidas repetidas e a correlação linear de Pearson para
das duas medidas mais próximas. análise de correlações.
O diagnóstico nutricional foi estabelecido por meio dos O estudo obteve aprovação no Comitê de Ética e Pesquisa
indicadores antropométricos: peso/idade (P/I) para todas da Universidade do Estado da Bahia – UNEB, sob registro n°
as crianças, peso/estatura (P/E) para menores de 5 anos e 1.339.860 e todos os pais e/ou responsáveis pelas crianças
índice de massa corporal/idade (IMC/I) para maiores de 5 assinaram o TCLE na admissão.
anos, expressos em unidades de desvio padrão (escore z)
relativos ao padrão estabelecido pela Organização Mundial RESULTADOS
de Saúde (OMS)8. Os indicadores antropométricos foram
Do total de 71 crianças acompanhadas, 56,3% (n=40)
avaliados no programa ANTHRO® para menores ou iguais a
eram do sexo masculino e 43,7% (n=31) do sexo feminino.
5 anos e ANTHO PLUS® para maiores de 5 anos de idade8.
Observou-se predominância da faixa etária inferior a 12 meses
Devido à grande variedade de classificações para o (39%), seguida pela faixa etária entre 12 e 60 meses (33,8%)
estado nutricional proposto pela OMS, adaptamos os e maiores que 60 meses (26,7%). A mediana do tempo de
diagnósticos nutricionais respeitando os seguintes critérios: internamento foi 9 dias (1-77 dias). O motivo da internação
para o indicador P/I, classificou-se: desnutrição energético por doença aguda foi mais prevalente (67,6%; n=48), sendo
proteica (DEP) grave: < escore z -3; DEP: ≥ escore z- 3 que os diagnósticos mais frequentes foram broncopneumonias,
e < escore z -2; Eutrofia: ≥ escore z-2 e ≤ escore z+2; pneumonia e outras afecções do trato respiratório (35,4%);
e excesso de peso: > escore z + 2. Para o indicador de seguidos por apendicites de fase IV/ apendicectomias (20,8%)
P/E, foram considerados os critérios a seguir: DEP grave: < e pós-operatório de hernioplastias ou herniorrafias (10%).
escore z -3; DEP: ≥ escore z- 3 e < escore z -2; Eutrofia: ≥
Das crianças internadas por doenças crônicas, as hidro-
escore z-2 e ≤ escore z+1; Risco de Sobrepeso: > Escore
cefalias com dreno e as neurotoxoplasmoses foram as mais
z + 1 e ≤ escore z + 2; Sobrepeso: > Escore z + 2 e
prevalentes (43,47%), seguidas das doenças hepáticas
≤ escore z + 3; e Obesidade: > Escore z + 3 e para o
(13%). Em relação à via de administração da dieta, a via
indicador IMC/I considerou-se: DEP grave: < escore z -3;
oral foi mais prevalente em todo o período, seguida pela
DEP: ≥ escore z- 3 e < escore z -2; Eutrofia: ≥ escore z-2
via enteral e ostomias. Quando analisada a adequação da
e ≤ escore z+1; Sobrepeso: > Escore z + 1 e ≤ escore NEE, verificou-se que ao longo do período houve oscilação
z + 2; Obesidade: > escore z + 2 e ≤ escore z + 3; e na prevalência em relação à adequação das necessidades
Obesidade grave: > Escore z + 3. nutricionais energéticas em um percentual importante de
Estratificou-se o tempo de internamento de acordo com crianças (Tabela 1).
os dias de hospitalização: 1 a 6 dias; 7 a 13 dias; 14 a 21 A classificação do estado nutricional na admissão hospi-
dias; 21 a 27 dias e acima de 28 dias. talar apontou prevalência de pacientes eutróficos (66,2%),
O cálculo das necessidades nutricionais energéticas foi seguidos pelo grupo de pacientes desnutridos (25,3%),
estabelecido utilizando o método da Food and Agriculture sendo que desses, 7% eram desnutridos graves; e daqueles
Organization (FAO)/OMS9 para todas as crianças, sendo com excesso de peso (8,5%). O diagnóstico nutricional foi
padronizado o nível moderado de atividade física para estabelecido levando-se em consideração o escore z peso
crianças acima de 12 meses. O cálculo da ingestão alimentar para idade (P/I) e, posteriormente, comparado com o escore
foi feito com base no recordatório alimentar de 24 horas e z P/E para menores de 5 anos e IMC/I para maiores de 5
reavaliado a cada 7 dias. anos de idade (Tabela 2).
Em relação à avaliação da composição corpórea total foi Em relação à evolução ponderal, considerou-se a dife-
utilizada a CB, cuja adequação foi estabelecida a partir da rença entre o peso da alta e o da admissão para determinar
tabela de percentis e circunferência média do braço (mm), ganho, perda ou manutenção de peso durante a hospita-
como proposto por Frisancho10. A interpretação dos percentis lização. Do total da amostra, 52% (n=37) demonstraram
foi realizada conforme recomendação da Sociedade Brasi- ganho ponderal ao longo do internamento, sendo a média de
leira de Pediatria (SBP)11, considerando-se como adequados 0,51 kg, a mediana de 0,38 (DP±0,62), enquanto 45,07%
valores de CB entre os percentis P5-P95. (n=32) apresentaram perda de peso no período, com média
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34
Pacientes pediátricos: estado nutricional e fatores associados

Tabela 1 – Características demográficas e dietoterápicas da amostra na admissão e ao longo do internamento.


Admissão 1 a 6 dias 7 a 13 dias 14 a 20 dias 21 a 27 dias > 28 dias
n=71 % n=30 % n=19 % n=10 % n= 8 % n= 4 %
Idade
< 12 meses 28 (39%) 11 (37%) 9 (47%) 3 (30%) 4 (50%) 1 (25%)
12 – 60 meses 24 (34%) 6 (20%) 9 (47%) 3 (30%) 3 (38%) 3 (75%)
> 60 meses 19 (27%) 13 (43%) 1 (6%) 4 (40%) 1 (12%) --
Sexo
Masculino 40 (56%) 16 (54%) 11 (58%) 5 (50%) 4 (50%) 3 (75%)
Feminino 31 (44%) 14 (46%) 8 (42%) 5 (50%) 4 (50%) 1 (25%)
Via de Administração da Dieta
Oral 48 (68%) 21 (70%) 10 (53%) 6 (60%) 5 (62,5%) 1 (25%)
Enteral 10 (14%) 7 (23%) 4 (21%) 3 (30%) 1 (12,5%) 1 (25%)
Ostomia 2 (3%) 1 (3%) 1 (6%) 1 (10%) 1 (12,5%) 1 (25%)
NPT 1 (1%) – – – – –
Zero 3 (4%) – – – – –
Terapia mista 4 (6%) – – – – –
Não informado 3 (4%) 1 (3%) 5 ( 26%) – 1 (12,5%) 1 (25%)
Adequação das NEE
> 100 % – 15 (50%) 8 (42%) 4 (40%) 1 (12,5%) 3 (75%)
75-100% – 11 (37%) 6 (31%) 4 (40%) 4 (50%) –
50- 75% – 3 (10%) 1 (6%) 2 (20%) 2 (25%) –
< 50% – 1 (3%) 4 (21%) – 1 (12,5%) 1 (25%)
n= número; NEE=Necessidades Energéticas Estimadas; NPT=nutrição parenteral total

Tabela 2 – Comparação entre os diagnósticos nutricionais quando considerados os índices de P/I, P/E e IMC/I na admissão hospitalar.
P/I P/E p P/I IMC/I p
Diagnóstico
(< 5 anos) (< 5 anos) (>5 anos) (> 5 anos)
n % n % n % n % n % n%
DEP grave 6 (11%) 2 (4%) 0,07 – – –
DEP 11 (21%) 4 (8%) 0,60 2 (11%) 1 (5%) 0,85
Eutrofia 30 (58%) 31 (59%) 0,07 16 (84%) 15 (80%) 0,40
Risco de Sobrepeso – 7 (13%) – –
Sobrepeso – 4 (8%) – 1 (5%)
Excesso de Peso 5 (10%) – 0,19 1 (5%) – 0,28
Obesidade – 4 (8%) – 1 (5%)
Obesidade grave – – – 1 (5%)
Total 52 (100%) 52(100%) 19 (100%) 19 (100%)
* Não se aplica/ -- nenhum paciente/ Teste: Análise de variância ANOVA para medidas repetidas.
n=número; P/I=peso para idade; P/E=peso para estatura; IMC/I=índice de massa corpórea para idade; p=nível de significância; DEP=desnutrição energético proteica

de -0,75 kg, a mediana de -1,85 (DP±0,79), os demais A análise do estado nutricional na admissão dos pacientes
pacientes apresentaram manutenção do peso. A prevalência que perderam peso durante a hospitalização mostrou que
de perda de peso foi maior nos pacientes com idade superior 56% estavam eutróficos, 25%, desnutridos, 16%, com excesso
a 60 meses (41%), seguidos por aqueles com idade inferior de peso e 3%, com desnutrição grave em relação ao índice
a 12 meses (34%) e, por último, 12-60 meses (25%). P/I. A perda ponderal média ao longo do internamento foi
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35
Ribeiro VA et al.

maior naqueles que estiveram internados por mais de 28 dias valores baixos (abaixo do P5), em 17% (n=12); e elevados
e que haviam sido admitidos com diagnóstico de doenças (acima de P95), em 12% (n=8).
agudas e idade superior a 60 meses. Não houve relação A CB estava adequada em aproximadamente 63% (n=46)
entre déficits ponderais na admissão e maior tempo de inter- dos pacientes com diagnóstico de eutrofia para o índice
namento. Houve correlação fracamente positiva (r=0,26) P/I na admissão. Dos pacientes desnutridos, os valores da
entre o tempo de internação e a perda ponderal (Tabela 3). CB estavam adequados em 33% dos pacientes e baixos
Os pacientes admitidos com DEP grave não sofreram em 25% das crianças com o mesmo diagnóstico. Entre os
modificação em seu estado nutricional no decorrer do pacientes com DEP grave, os valores da CB estavam baixos
período de internação; entre os admitidos com DEP, 31% em 100% dos casos. Nos pacientes com excesso de peso, a
estavam com DEP grave na alta hospitalar, 50% perma- CB apareceu com valores elevados em 83% dos pacientes
neceram com DEP e 15% se tornaram eutróficos. Entre os estudados. Observou-se correlação fortemente positiva
eutróficos, 98% permaneceram eutróficos e 2% evoluíram (r=0,99) entre a adequação da CB e o índice P/I, dados
com DEP; dos pacientes com excesso de peso 83% perma- não apresentados em tabela.
neceram com esta condição, enquanto 17% se tornaram
eutróficos quando analisado o índice P/I.
DISCUSSÃO E CONCLUSÃO
A análise da evolução nutricional, de acordo com o diag-
nóstico antropométrico da admissão segundo o z escore peso Foram acompanhadas 71 crianças nesse estudo,
para idade (P/I), mostrou não haver diferença estatisticamente observou-se maior prevalência do sexo masculino e predo-
significante (p>0,05), conforme teste t Student (Tabela 4). minância da faixa etária inferior a 12 meses, resultados
A análise de variância de Kruskal-Wallis foi realizada com semelhantes aos encontrados em outros estudos5,12,13.
a finalidade de comparar os valores do ∆% calculado (∆%= Durante todo o período de hospitalização, observou-se
Z P/I depois – Z P/I antes / Z P/I antes x 100) dos grupos de predomínio da via oral para administração da dieta, seguido
desnutridos, de eutróficos e com excesso de peso. pela via enteral e ostomias. Ao longo do internamento,
Quando avaliada a CB de forma independente, observou- notou-se uma inadequação das NEE em um percentual
se adequação de seus valores em 48% (n=34) das crianças; importante de crianças. O desequilíbrio entre a necessidade

Tabela 3 – Análise da perda ponderal média ao longo do internamento


1 a 6# 7 a 13# 14 a 20# 21 a 27# > 28# r*
Perda Ponderal Média - 0,76 - 0,17 - 0,98 - 0,21 - 1,85 0,26
(0,41) (0,089) (0,26) (0,23) (1,72)
Total 16 5 7 2 2
( ) ± desvio-padrão da perda ponderal média/ *Correlação de Pearson/ # Dias de internamento

Tabela 4 – Análise da evolução nutricional dos grupos de desnutridos, de eutróficos e excesso de peso segundo o escore z P/I.
Estado Nutricional Inicial (a) Final (b) ∆ teste t
Student
n % n % ((b-a)/a)*100
DEP grave 5 7% 9 13% 4,35% 0,77
(z <= -3) (-4,82±1,27) (-5,03±0,89)
DEP 13 18% 8 11% 3,6% 0,62
(-1 <= z < 3.0) (-2,50±0,32) (-2,59±0,57)
Eutrofia 47 66% 49 69% 19,14% 0,67
(2 < z < -1) (-0,47±0,99) (-0,56±0,98)
Excesso de peso 6 8% 5 7% -7,30% 0,70
(z >= 2) (3,15±1,02) (2,92±1,06) 7%
Total Geral 71 100% 71 100% -
( )=escore z médio ± desvio-padrão do índice peso para idade/ =Análise de variância de Kruskal- Wallis; DEP=desnutrição energético proteica

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36
Pacientes pediátricos: estado nutricional e fatores associados

e a ingestão de nutrientes essenciais relaciona-se com ou agudos dos pregressos ou crônicos. Identifica situações
desnutrição e excesso de peso1. em que a criança apresenta um peso corporal abaixo ou
Na admissão, foram observados diagnósticos nutri- acima dos valores de referências esperados para idade e
cionais extremos de DEP grave, DEP e excesso de peso, sexo. Por não considerar a medida da altura, não é capaz
resultado similar ao encontrado em outros estudos14-17. de identificar a causa da alteração do estado nutricional
O fenômeno descrito como transição nutricional mostra quando essa ocorre.
a possibilidade de uma mesma população apresentar A variação da faixa etária de 0 a 9 anos e 11 meses em
desnutrição e excesso de peso18. Estudos apontam que nossa casuística constituiu uma limitação do presente estudo,
crianças que são acometidas pela desnutrição crônica considerando que os parâmetros P/I, A/I, P/E e IMC/I utili-
podem potencialmente se tornar obesos na vida adulta18,19. zados na avaliação do estado nutricional são normalmente
Ambos, desnutrição e excesso de peso, podem comprometer divididos por faixa etária de 0 a 5 anos e acima de 5 anos
o crescimento e desenvolvimento cognitivo, aumentar o de idade. A casuística, resultado da admissão hospitalar no
risco de infecções, prolongar a cicatrização de feridas e o período proposto, de muitas crianças que não preencheram
tempo de internação hospitalar1. os critérios de inclusão no estudo, pode ter também consti-
O índice P/E possui caráter complementar e é capaz de tuído um fator de limitação.
detectar a desnutrição aguda, sendo altamente sensível para Porém, a relevância do estudo se mantém, por se mostrar
o sobrepeso20. Ao analisar o índice P/E em relação ao P/I um feito inédito em um hospital público de grande porte
para os pacientes com idade inferior a 5 anos na admissão, em uma a capital da região Nordeste do Brasil. Revela-se
constatou-se que aproximadamente um terço da população como um passo inicial a ser ampliado, por meio da reali-
desnutrida (35%, n=6) tem desnutrição aguda, enquanto zação de pesquisas adicionais com uma maior amostra de
que para 65% dos desnutridos segundo P/I, o índice P/E pacientes, a fim de obter resultados que complementem
apontou risco de sobrepeso e sobrepeso, subestimando a nossos achados iniciais.
prevalência de desnutrição. Deste modo, o acompanhamento da evolução do
O ganho ou manutenção do peso durante a hospitali- estado nutricional das crianças durante a hospitalização
zação foi fator associado ao menor tempo de internação. foi fundamental para o entendimento dos principais fatores
Os diagnósticos de doenças agudas, idade superior a 60 associados. Percentual importante de crianças apresentou
meses e a perda ponderal foram fatores associados ao maior perda ponderal durante a realização deste estudo. Os fatores
tempo de internação, mesmo que com correlação fracamente associados a uma evolução não desejada do estado nutri-
positiva, o que talvez possa ter associação com o tamanho da cional foram a idade superior a 60 meses, diagnóstico de
amostra do estudo. Estudo realizado em Alagoas encontrou doenças agudas e maior perda ponderal média.
associação positiva entre déficits ponderais na admissão e
maior tempo de internamento13; o mesmo não foi encontrado AGRADECIMENTOS
em nosso estudo.
À coordenação do Serviço de Nutrição do hospital onde
Percentual relevante de crianças admitidas com DEP o estudo foi realizado; aos nutricionais e residentes de
evoluíram com DEP grave ao longo do internamento, Nutrição da enfermaria pediátrica; à equipe de estagiários
mostrando piora no estado nutricional segundo índice P/I. que participaram da coleta de dados.
Estudo realizado em Fortaleza, que objetivou avaliar o
estado nutricional na admissão e na alta hospitalar, mostrou
resultado em parte divergente, com as crianças desnutridas REFERÊNCIAS
permaneceram com seu estado nutricional inalterado e, entre 1. Pileggi VN, Monteiro JP, Margutti AV, Camelo JS Jr. Prevalence
as eutróficas, cerca de 9% evoluíram para DEP3. of child malnutrition at a university hospital using the World
Health Organization criteria and bioelectrical impedance data.
A medida da CB é um marcador sensível para a avaliação Braz J Med Biol Res. 2016;49(3):e5012.
nutricional pois representa a reserva de tecido adiposo e 2. Sermet-Gaudelus I, Poisson-Salomon AS, Colomb V, Brusset
MC, Mosser F, Berrier F, et al. Simple pediatric nutritional risk
muscular. No presente estudo, observou-se forte relação score to identify children at risk of malnutrition. Am J Clin Nutr.
entre a CB e o diagnóstico nutricional segundo índice P/I, 2000;72(1):64-70.
indicando que, na impossibilidade de se usar as medidas 3. Rocha GA, Rocha EJ, Martins CV. The effects of hospitali-
zation on the nutritional status of children. J Pediatr (Rio J).
usuais como peso e estatura, esta pode ser utilizada como 2006;82(1):70-4.
marcador confiável para avaliação do estado nutricional. 4. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde.
O índice de P/I foi adotado como indicador do estado Departamento de Atenção Básica. Manual Instrutivo para Imple-
mentação da Agenda para Intensificação da Atenção Nutricional
nutricional neste estudo. Esse índice reflete a situação global, à Desnutrição Infantil. Portaria Nº 2.387, de 18 de outubro de
não diferenciando os comprometimentos nutricionais atuais 2012. Brasília: Ministério da Saúde; 2013.

BRASPEN J 2018; 33 (1): 32-8


37
Ribeiro VA et al.

5. Magalhães EA, Martins MALP, Rodrigues CC, Moreira ASB. 14. Oliveira AF, Oliveira FLC, Juliano J, Ancona-Lopez F. Evolução
Association between length of hospital stay and evolution of nutricional de crianças hospitalizadas e sob acompanhamento
nutritional status of children admitted to a university hospital. nutricional. Rev Nutr. 2005;18(3):341-8.
Demetra. 2013;8(2):103-14. 15. Joosten KF, Zwart H, Hop WC, Hulst JM. National malnutrition
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2002;78(6):491-6. 2010;44(2):257-65.

Local de realização do trabalho: Universidade do Estado da Bahia, Salvador, BA, Brasil.

Conflito de interesse: Os autores declaram não haver.

BRASPEN J 2018; 33 (1): 32-8


38
A Artigo Original
Indicadores antropométricos para avaliação da adiposidade em idosos no sul do Brasil

Uso de indicadores antropométricos para


avaliação da adiposidade corporal em idosos no
sul do Brasil
Using of the anthropometrics indicators to evaluate of body adiposity in the elderly in Southern Brazi

RESUMO
Vanessa da Silva Sopeña1
Bruna Celestino Schneider2 Introdução: A composição corporal e sua distribuição sofrem mudanças conforme a idade. Por
Andreia Morales Cascaes3 isso, avaliar o uso de indicadores antropométricos para avaliação da adiposidade corporal em
Alexandre Emidio Ribeiro Silva3
Silvana Paiva Orlandi2 idosos é de extrema importância. Método: Trata-se de um estudo transversal, realizado com 108
idosos cadastrados em 11 unidades básicas de saúde do município de Pelotas-RS integrantes da
Estratégia Saúde da Família. Para a avaliação nutricional, foram aferidos: altura, peso, circunfe-
rência da cintura e circunferência do quadril. O percentual de gordura corporal (%GC) foi veri-
Unitermos: ficado por bioimpedância (BIA) e pelo índice de Adiposidade Corporal (IAC) calculado conforme
Idosos. Antropometria. Tecido Adiposo. Impedância proposto por Bergman et al. Resultados: Os idosos apresentaram médias %GC, verificado pelos
Bioelétrica.
dois indicadores BIA e IAC, acima do recomendado (38,5 e 35,6, respectivamente). Conclusão:
Keywords: São necessárias mudanças no estilo de vida destes idosos, incentivando o consumo alimentar
Elderly. Anthropometry. Body Fat. Bioelectric Impedance. saudável e a pratica de atividade física.

Endereço para correspondência:


Silvana Paiva Orlandi ABSTRACT
Universidade Federal de Pelotas. Departamento de Introduction: The body composition and distribution changing with the age; then, to verify the
Nutrição, sala 228. using of the anthropometrics indicators to evaluate the body adiposity in elders is important.
Rua Gomes Carneiro, 1 – Pelotas, RS, Brasil – CEP Methods: This is a cross sectional study with 108 elders of the 11 basics units of health in Pelotas-
96010-620
E-mail: silvanaporlandi@gmail.com RS, members of the Family Health Strategy. For nutritional evaluate was measurement: height,
weight, waist circumference and hip circumference. The body fat percentage (BF%) was measured
Submissão: by bioimpedance (BIA) and body adiposity index (BAI) proposed by Bergman et al. Results: The
21 de agosto de 2017
elders showed BF% means, verified for both indicators BIA and BAI, above the recommendation
Aceito para publicação: (38.5 and 35.6, respectively). Conclusion: Changes are necessary in life style these elders,
14 de novembro de 2017 encouraging healthy food consumption and physical activity practical.

1. Nutricionista. Graduada pela Faculdade de Nutrição, Departamento de Nutrição, Universidade Federal de Pelotas. Pelotas, RS, Brasil.
2. Graduação em Nutrição. Doutorado em Epidemiologia. Faculdade de Nutrição, Departamento de Nutrição, Universidade Federal de Pelotas,
Pelotas, RS, Brasil.
3. Graduação em Odontologia. Doutorado em Epidemiologia. Faculdade de Odontologia, Departamento de Odontologia Social e Preventiva,
Universidade Federal de Pelotas, Pelotas, RS, Brasil.

BRASPEN J 2018; 33 (1): 39-42


39
Sopeña VS et al.

INTRODUÇÃO com o uso de parâmetros antropométricos e realizar a


Conforme o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística comparabilidade dos métodos de BIA e IAC para avaliação
(IBGE), há no Brasil cerca de 20 milhões de idosos, em torno da gordura corporal nesta população.
de 10% da população brasileira1. Envelhecer é um processo
natural que desencadeia mudanças físicas, psicológicas e MÉTODO
sociais, e um dos aspectos mais afetados para esses indiví-
Trata-se de um estudo transversal descritivo, cuja coleta
duos é a saúde2.
de dados ocorreu entre os meses de abril a dezembro de
A composição e a distribuição corporal sofrem 2015. A população alvo deste estudo são os idosos com 60
mudanças conforme a idade. Em idosos, indivíduos com anos ou mais de idade cadastrados em 11 unidades básicas
60 anos ou mais, há uma diminuição da massa muscular, de saúde do município de Pelotas-RS que fazem parte da
podendo ocorrer aumento da massa gorda, acúmulo de Estratégia Saúde da Família-RS.
gordura central e diminuição de gordura nos membros
Estes idosos foram avaliados em um estudo realizado em
superiores e inferiores, e, em decorrência desse processo,
desencadear doenças cardiovasculares, hipertensão, 2009/2010 sobre saúde bucal. No início de 2015, esses
dentre outras3. idosos foram convidados a participar do presente estudo.
Foram aplicados questionários para a obtenção das informa-
A avaliação nutricional em idosos não deve ser baseada
ções sociodemográficas (sexo, estado civil e raça) e realizada
somente no peso ou no índice de massa corporal (IMC),
avaliação nutricional.
uma vez que estes delimitam constatar a perda de massa
magra, como também a redistribuição de gordura corporal Os questionários e os exames foram realizados nas
que ocorre nesses indivíduos4. unidades de saúde ou no domicílio do idoso. Na avaliação
nutricional, foram aferidas as medidas de altura, peso, circun-
Há inúmeros métodos para a avaliação da compo-
ferência da cintura e circunferência do quadril.
sição corporal, entretanto alguns deles, como o DEXA, a
pesagem hidrostática e o BodPod®, possuem limitações As técnicas propostas pela Organização Mundial de
para serem utilizados na população em geral, tais como Saúde 8 foram utilizadas para a avaliação nutricional.
elevado custo, problemas com o deslocamento de equipa- Aferiu-se altura com estadiômetro da balança mecânica
mentos e dificuldades de utilização. Logo, para se tornar para adultos. Estimou-se a circunferência da cintura com a
acessível para a maioria dos indivíduos, é necessário o uso utilização de fita métrica no ponto mais estreito da região
de métodos mais simples e de baixo custo, como medidas entre o tórax e o quadril, já a circunferência do quadril foi
de pregas cutâneas, bioimpedância (BIA) e indicadores estimada com fita métrica ajustada no plano horizontal, onde
antropométricos5. a medição ocorre ao nível do ponto de maior circunferência
da região glútea.
A medição de pregas cutâneas e a BIA são métodos que
vêm sendo amplamente usados, porém, apresentam um custo Com a balança digital de análise corporal modelo
médio e algumas limitações. No caso das pregas cutâneas SLIMTOP-180 ACTLIFE da marca Balmak, uma balança de
é essencial que o avaliador seja treinado e padronizado BIA, obteve-se o peso corporal e o percentual de gordura
para atingir uma medida precisa e exata, e, além disso, o corporal (%GC). O IAC foi calculado conforme Bergman et
instrumento precisa ser de boa qualidade. Já no caso da al.7 propuseram por meio da seguinte fórmula:
BIA é necessário um preparo que inclui jejum, não realizar
atividade física horas antes do teste, entre outros aspectos
que dificultam a logística de utilização6.
Sendo assim, Bergman et al.7 propuseram um método Os dados foram digitados no programa Excel e posterior-
simples que utiliza medidas antropométricas de fácil mensu- mente exportados para o pacote estatístico STATA 12.0. Para
ração para a estimativa da adiposidade corporal. Esse a descrição das variáveis contínuas, utilizou-se a média com
método baseia-se nos dados referentes a altura e a circun- seu respectivo desvio padrão e, para as variáveis categóricas,
ferência do quadril e é denominado Índice de Adiposidade o número absoluto e a frequência relativa.
Corporal (IAC). O IAC apresentou boa correlação com dados As variáveis sociodemográficas e o IMC foram apre-
de gordura corporal obtidos pelo DEXA, no entanto, foi sentados em percentual e as variáveis antropométricas
desenvolvido e validado com a população norte-americana, foram descritas por meio de média e desvio padrão da
não se conhecendo, até o momento, sua aplicabilidade para amostra em geral e por sexo. Avaliou-se a correlação entre
outras populações7. as medidas do percentual de gordura corporal (%GC)
Dessa maneira, o objetivo deste trabalho é avaliar e obtidas pela balança de BIA e o IAC utilizando correlação
descrever o estado nutricional de idosos do sul do Brasil, de Pearson.
BRASPEN J 2018; 33 (1): 39-42
40
Indicadores antropométricos para avaliação da adiposidade em idosos no sul do Brasil

O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa A média da circunferência da cintura no sexo feminino foi
da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Pelotas de 95,1±1,2 e, no sexo masculino, 98,6±2. Apresentam-se
(UFPel), protocolo: 38487014.3.0000.5317, e todos os acima da faixa considerada normal para ambos os sexos,
participantes assinaram um Termo de Consentimento Livre maior do que 80 cm para mulheres e do que 94 cm para
e Esclarecido (TCLE). homens. Na BIA, a média do %GC obtida foi de 40,9±0,9
nas mulheres e de 31,9±1,8 nos homens; já pelo IAC, a
média encontrada foi de 37,6±0,7 nas mulheres e 29,8±0,7
RESULTADOS
nos homens, apresentando baixa correlação entre os métodos
Participaram deste estudo 108 idosos. A maioria era do (r=0,66).
sexo feminino (73,2%), branca (66%) e sem companheiro
(58,5%). Ao utilizar o IMC, observou-se que 38,9% dos idosos
DISCUSSÃO
apresentavam sobrepeso e 32,4% obesidade (Tabela 1).
Na Tabela 2, encontra-se a descrição das variáveis antro- Foram utilizados dois métodos para medir o %GC: BIA
pométricas e de gordura corporal de acordo com o sexo. e IAC, sendo este último um método relativamente novo,
Quanto às mulheres, a média do peso apresentado foi de desenvolvido em uma população mexicano-americana e
66,5 kg (DP 1,4), e quanto aos homens, foi de 73 kg (DP validado em uma população afro-americana. No presente
2,2). Referente à média do percentual de gordura corporal, estudo, os valores do %GC obtidos pelo IAC subestimaram
as mulheres apresentaram um valor superior ao dos homens os valores encontrados pela balança de BIA, não sendo
(40,9±0,9 e 31,9±1,8, respectivamente). evidenciada boa correlação entre os métodos.
Salienta-se como limitação deste estudo a impossibilidade
de utilização de um método de referência para composição
Tabela 1 – Descrição da amostra de acordo com variáveis sociodemográ- corporal, que possibilitaria a comparação dos métodos
ficas e nutricionais. Pelotas, 2015.
utilizados com um valor designado padrão ouro.
Variável N (%)
Com relação ao estado nutricional entre os idosos anali-
Sexo (n=108)
sados, 71,3% apresentaram excesso de peso. Quanto à
Feminino 79 (73,2) média da circunferência da cintura, foi encontrado um valor
Masculino 29 (26,8) acima do recomendado, o que caracteriza risco à saúde,
Estado Civil (n=106) já que a centralização da gordura corporal parece melhor
Sem companheiro 62 (56,4) predizer as complicações em idosos9. Resultados similares
Com companheiro 44 (43,6) foram encontrados em diferentes regiões do país3,4,10. Silva
Cor de Pele (n=103) et al.11 observaram 72,7% de idosos com excesso de peso
Branca 68 (66,0)
e a média circunferência da cintura de 92,6 cm, acima da
faixa recomendada.
Não Branca 35 (34,0)
Em relação ao %GC, Eickemberg et al.12 encontraram
IMC (kg/m²) (n=108)
nos idosos média de 37,2% no sexo feminino e de 27,5% no
Desnutrição 2 (1,9)
masculino. Silva et al.13 observaram média de 38,18% nas
Eutrofia 29 (26,8)
mulheres e de 27,98% nos homens. Valores semelhantes ao
Sobrepeso 42 (38,9) do presente estudo.
Obesidade 35 (32,4)
Goodman-Gruen & Barrett-Connor14 analisaram uma
IMC=índice de massa corporal
média inferior em relação ao %GC, 26,9% em mulheres
e 19,7% em homens, e de circunferência da cintura, 80,3
Tabela 2 – Descrição das variáveis antropométricas e de gordura corporal cm em mulheres e 95,0 cm em homens, encontrados neste
na amostra geral e de acordo com o sexo. (n=108) Pelotas. 2015. estudo. Essa diferença pode ser causada pela modificação
Variável (dp) Geral (dp) Feminino (dp) Masculino dos hábitos alimentares ao longo dos últimos anos, provo-
Peso (kg) 68,5 (13,1) 66,5 (1,4) 73,0 (2,2) cando alterações significativas do peso corporal e distribuição
Circunferência 96,7 (11,8) 95,1 (1,2) 98,6 (2,0) da gordura, aumentando, assim, a prevalência de sobrepeso
da Cintura (cm) e obesidade da população15.
Circunferência 103,6 (10,2) 104,2 (1,2) 101,3 (1,1)
do Quadril (cm)
CONCLUSÃO
BIA (%) 38,5 (9,5) 40,9 (0,9) 31,9 (1,8)
IAC (%) 35,6 (7,1) 37,6 (0,7) 29,8 (0,7) A composição e distribuição corporal sofrem mudanças
BIA=bioimpedância; IAC=índice de adiposidade corporal ao longo da vida. Geralmente, em pessoas com 60 anos

BRASPEN J 2018; 33 (1): 39-42


41
Sopeña VS et al.

ou mais, há diminuição de massa muscular e aumento de 5. Rezende F, Rosado L, Franceschinni S, Rosado G, Ribeiro R,
massa gorda. Esse processo acontece com mais intensidade Marins JCB. Revisão crítica dos métodos disponíveis para
avaliar a composição corporal em grandes estudos populacionais
em mulheres do que em homens. Os idosos são mais susce- e clínicos. Arch Latinoam Nutr. 2007;57(4):327-34.
tíveis a complicações de saúde, portanto, necessitam de uma 6. Monteiro AB, Fernandes Filho J. Análise da composição corporal:
atenção intensificada. uma revisão de métodos. Rev Bras Cineantropom Desemp Hum.
2002;4(1):80-92.
Conforme analisado neste estudo, o %GC nos diferentes 7. Bergman RN, Stefanovski D, Buchanan TA, Sumner AE,
métodos ficou acima do recomendando em ambos os sexos, Reynolds JC, Sebring NG, et al. A better index of body adipo-
assim como o peso, visto que menos de um terço da amostra sity. Obesity (Silver Spring). 2011;19(5):1083-9.
8. World Health Organization - WHO. Physical status: the use and
apresentava IMC adequado. Houve maior deposição de interpretation of anthropometry. Geneva: World Health Organi-
gordura na região central do corpo, observada pela circunfe- zation; 1995.
rência da cintura, a qual pode desencadear diversas doenças 9. Visscher TL, Seidell JC, Molarius A, van der Kuip D, Hofman
por ser a mais nociva ao organismo. A, Witteman JC. A comparison of body mass index, waist-hip
ratio and waist circumference as predictors of all-cause mortality
O excesso de peso está cada vez mais frequente na among the elderly: the Rotterdam study. Int J Obes Relat Metab
população. Dado o exposto, são necessárias mudanças Disord. 2001;25(11):1730-5.
nos hábitos alimentares e de vida dos idosos, enfatizando 10. Leite-Cavalcanti C, Rodrigues-Gonçalves MC, Rios-Asciutti
LS, Leite-Cavalcanti A. Prevalência de doenças crônicas e
a importância de se atentar as escolhas dos alimentos, de estado nutricional em um grupo de idosos brasileiros. Rev Salud
manter um peso saudável e de aderir uma vida ativa, dentre Pública. 2009;11(6):865-77.
outras, por meio de campanhas, de ações em postos de 11. Silva EM, Gouveia VSR, Santos CKC, Oliveira FGP. Estado
nutricional e dados bioquímicos de idosos acompanhados por um
saúde e em grupos de convivência, para incentivar e escla-
núcleo de apoio à saúde da família no agreste de Pernambuco.
recer os benefícios desses cuidados na saúde. Rev Baiana Saúde Pública. 2015;39(2):295-308.
12. Eickemberg M, Oliveira CC, Roriz AKC, Fontes GAV, Mello AL,
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2005;3(2):163-8. 2007;88(4):452-7.

Local de realização do trabalho: Universidade Federal de Pelotas, Pelotas, RS, Brasil.

Conflito de interesse: Os autores declaram não haver.

BRASPEN J 2018; 33 (1): 39-42


42
A Artigo Original
Não utilização de suplemento antianêmico por gestantes de alto risco

Fatores associados à não utilização de suplemento


antianêmico por gestantes de alto risco de
Alagoas, Brasil
Associated factors to non-use of antianemic supplementation by high risk pregnant women in Alagoas,
Brazil

Raphaela Costa Ferreira1


RESUMO
Luiz Gonzaga Ribeiro Silva Neto² Introdução: Apesar das estratégias e da implementação de guias e políticas para o combate
Marilene Brandão Tenório2 à anemia carencial terem sido adotadas há bastante tempo, a sua prevalência no país vem se
Alane Cabral Menezes de Oliveira3 mantendo elevada, especialmente em grupos especiais, sendo esta carência considerada um
problema de saúde pública. Assim, o objetivo desse estudo foi avaliar a prevalência e os fatores
associados à não utilização de suplemento antianêmico por gestantes de alto risco de Alagoas.
Método: Estudo transversal, realizado com gestantes assistidas no hospital universitário de Maceió,
sendo estudadas variáveis socioeconômicas, de estilo de vida, antropométricas, e investigado o
uso de suplementação ferrosa, com utilização da regressão de Poisson, e resultados expressos em
razão de prevalência (RP) e intervalos de confiança (IC) de 95%. Resultados: Foram estudadas
210 gestantes na faixa etária de 13 a 43 anos de idade. O não uso de suplemento ferroso foi
referido por 37,6% das mesmas, estando associado (gestantes que não utilizavam suplementação
profilática versus gestantes que utilizavam suplementação profilática) ao baixo peso na gravidez,
sendo, essa variável fator de proteção para esta condição (RP=0,47; IC de 95%= 0,24 a 0,93;
p=0,030). Conclusão: A não utilização da suplementação antianêmica por parte de gestantes
de alto risco de Alagoas é um problema de magnitude elevada, tornando evidente a necessidade
Unitermos: de aumentar a cobertura da suplementação antianêmica entre elas.
Gravidez de Alto Risco. Suplementação Alimentar.
Ferro. Estado Nutricional. ABSTRACT
Introduction: Although strategies and the implementation of guidelines and policies to combat
Keywords:
Pregnancy, High Risk. Supplementary Feeding. Iron. deficiency anemia have been adopted for a long time, their prevalence in the country has remained
Nutritional Status. high, and this deficiency is considered a public health problem. Thus, the objective of this study was
to evaluate the prevalence and factors associated with the non-use of antianemic supplementation
Endereço para correspondência: by high risk pregnant women in Alagoas. Methods: A cross-sectional study was carried out in a
Alane Cabral Menezes de Oliveira group of pregnant women assisted at a university hospital in Maceió. Socioeconomic, lifestyle,
Faculdade de Nutrição, Universidade Federal de anthropometric variables were studied, and the use of ferrous supplementation with Poisson
Alagoas. Campus A. C. Simões, BR 104 Norte, Km regression was investigated and results were expressed as prevalence (RP) and 95% confidence
96,7 – Tabuleiro dos Martins – Maceió, AL, Brasil – intervals (CI). Results: A total of 210 pregnant women were studied in the 13-43 age group. The
CEP: 57072-970. non-use of a ferrous supplement was reported by 37.6% of the patients, being associated with
E-mail: alanecabral@gmail.com
low weight in pregnancy (pregnant women who did not use prophylactic supplementation versus
Submissão: pregnant women who used prophylactic supplementation), and this variable was a protective
3 de outubro de 2017 factor for this condition (PR = 0.47, 95% CI = 0.24 to 0.93, p=0.030). Conclusion: The non-use
of antianemic supplementation by high-risk pregnant women in Alagoas is a problem of high
Aceito para publicação: magnitude, making evident the need to increase the coverage of anti-anemic supplementation
20 de dezembro de 2017 among them.

1. Pós-graduanda em Ciências da Saúde da Universidade Federal de Alagoas, Maceió, AL, Brasil.


2. Pós-graduando em Nutrição pela Faculdade de Nutrição da Universidade Federal de Alagoas, Maceió, AL, Brasil.
3. Professora adjunta da Faculdade de Nutrição da Universidade Federal de Alagoas, Maceió, AL, Brasil.

BRASPEN J 2018; 33 (1): 43-8


43
Ferreira RC et al.

INTRODUÇÃO MÉTODO
Segundo dados da Organização Mundial da Saúde Trata-se de um estudo transversal, realizado no hospital
(OMS), 1,6 bilhão de pessoas, aproximadamente 24,8% da universitário localizado na capital do estado de Alagoas. Para
população mundial, são acometidas pela anemia, com uma o cálculo amostral, considerou-se como variável desfecho a
prevalência de 22,7% em países desenvolvidos e 52% em prevalência de 78,8% de não utilização de suplemento ferroso
países subdesenvolvidos1,2. No Brasil, além dos dados sobre no estado de Alagoas, segundo Ferreira et al.14; um nível de
a prevalência nacional serem escassos, especialmente em confiança de 90% e um erro amostral de 5%, o que adicio-
gestantes, e centralizados em algumas regiões, existem dife- nado de 10% para compensar perdas, seriam necessárias
renças metodológicas para a classificação dos valores, difi- 200 gestantes para o estudo. O cálculo amostral foi realizado
cultando a estimativa precisa da prevalência desta carência com auxílio do programa STATCALC do EPI INFO versão 7.
nutricional. Contudo, foi desenvolvido um estudo de revisão Foram estudadas gestantes com diagnóstico de alto
acerca da prevalência de anemia em gestantes nos últimos risco, ou seja, aquelas com idade ≤ 19 anos ou ≥ 35 anos
40 anos no país, sendo observados números elevados de de idade, e/ou com diagnóstico de doenças crônicas e/ou
gestantes anêmicas, o que caracteriza essa situação como específicas da gestação e/ou ainda por intercorrências que
um problema de saúde pública3. elevam o risco na gravidez, e incluídas aquelas internadas no
Dada a importância do combate à anemia gestacional hospital, no período de setembro de 2012 a julho de 2013.
e, consequentemente, às complicações tanto para a mãe Foram excluídas aquelas gestantes com estado clínico grave
quanto para o feto e recém-nascido3-5, em meados da e aquelas internadas em trabalho de parto.
década de 1980 o Ministério da Saúde do Brasil implantou A seleção das gestantes participantes do estudo foi feita
a suplementação terapêutica e profilática de ferro a pela identificação no livro de registros no posto da enfer-
gestantes, como opção para controlar essa deficiência magem, localizado na maternidade do hospital. Foram estu-
nutricional. Em 1992, o País assumiu compromisso junto às dadas variáveis socioeconômicas, de estilo de vida, antropo-
Nações Unidas de reduzir, até o ano 2000, a prevalência métricas, e investigado o uso de suplementação antianêmica
de anemia ferropriva nesse grupo em 1/3 dos valores (variável dependente das análises), informação obtida no
encontrados em 19906,7. momento da entrevista, quando a gestante era questionada
No ano de 2013, foi lançada uma Diretriz sobre a se utilizou ou não suplemento ferroso na gravidez.
suplementação de ferro e ácido fólico para gestantes, Para avaliação antropométrica, foram realizadas medidas
reforçando a importância da suplementação oral diária e de peso e altura utilizando balança digital com estadiômetro.
contínua desse mineral como parte da assistência pré-natal8. Os dados foram utilizados para cálculo do Índice de Massa
Adicionalmente, desde 2004 existe no país o programa de Corporal (IMC), considerando pontos de corte estabelecidos
fortificação de farinhas de trigo e milho com ferro e ácido por Atalah et al.15 e preconizados pelo Ministério da Saúde
fólico9. De maneira complementar, em 2005 foi adotada do Brasil16. Foi investigado, também, ganho de peso durante
a suplementação profilática do mineral, conforme esta- a gravidez segundo a idade gestacional no momento da
belecido pelo Programa Nacional de Suplementação de entrevista, considerando as recomendações de meta ponderal
Ferro (PNSF)10. estabelecidas pelo Institute of Medicine (IOM)17.
Apesar dessas estratégias e da implementação de guias As variáveis independentes estudadas foram: faixa etária
e políticas para o combate à anemia carencial terem sido (≤ 19 anos/ 20-34 anos/ ≥ 35 anos); procedência (interior
adotadas há bastante tempo, a prevalência de anemia no do estado/ capital); renda familiar mensal R$ (< 1 salário
país vem se mantendo elevada. Uma das justificativas para mínimo/ ≥ 1 salário mínimo); beneficiária de programa
isso é a baixa utilização/adesão à suplementação com sais governamental (sim/não); número de membros no domicílio
de ferro, como discutido por diversos autores11-13. (<5/ ≥ 5); escolaridade em anos de estudo (<4 / ≥ 4); cor
Desta forma, estudos que visam avaliar o uso da suple- da pele referida (preta/branca ou parda); união estável (sim/
mentação de ferro, bem como os fatores associados à sua não); tratamento na água para beber (sim/não); hábito etilista
não utilização, são extremamente importantes para avaliar (ingestão regular de bebida alcoólica, independentemente do
os programas governamentais e nortear o país na imple- tipo ou quantidade) (sim/não); hábito tabagista (uso regular
mentação de estratégias no combate à anemia. Além disso, de um ou mais cigarros por dia) (sim/não); estado nutricional
pesquisas dessa natureza são escassas no estado de Alagoas classificado pelo IMC gestacional e ganho ponderal no
e na gestação de alto risco. Assim, o presente estudo teve período gestacional.
como objetivo avaliar a prevalência e os fatores associados No estudo foi utilizada a regressão logística múltipla de
à não utilização de suplemento antianêmico por gestantes Poisson com estimativa robusta da variância visando iden-
de alto risco de Alagoas. tificar preditores da não utilização de suplemento ferroso
BRASPEN J 2018; 33 (1): 43-8
44
Não utilização de suplemento antianêmico por gestantes de alto risco

(variável dependente). Foram testadas no modelo ajustado Tabela 1 – Caracterização da amostra estudada segundo variáveis de-
as variáveis que na análise bruta apresentaram significância mográficas, socioeconômicas, estilo de vida e antropométricas. Maceió,
menor que 20% (p<0,20). A magnitude das associações AL, 2013.
entre as variáveis independentes e a variável-desfecho Variáveis* n %
Idade (anos)
foi expressa em Razão de Prevalência (RP) e Intervalo de
Confiança (IC95%), considerando significativo p<0,05. Os ≤ 19 anos 70 33,3
dados foram processados utilizando-se o Stata versão 13.0. 20-34 anos 115 54,8

O presente estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em ≥35 anos 25 11,9
Pesquisa do Centro Universitário CESMAC (Centro de Estudos Procedência
Superiores de Maceió), processo nº 1396/2012. Todas as Capital 104 49,6
participantes do estudo, após terem sido informadas sobre Interior 106 50,4
a pesquisa, concordaram em participar e assinaram um Renda familiar mensal
Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. No caso das < 1 salário mínimo 73 39,2
adolescentes, o consentimento foi dado pelo responsável ≥ 1 salário mínimo 113 60,8
legal da menor. Beneficiária de programa do governo
Sim 90 42,9
RESULTADOS Não 120 57,1

Foram estudadas 210 gestantes na faixa etária de 13 a Número de membros no domicílio


43 anos de idade, com média de idade de 24,62 (±7,71) < 5 membros 49 23,3
anos, com 45,2% delas nos extremos de idade reprodutiva ≥ 5 membros 161 76,7
(33,3% com idade ≤ 19 anos e 11,9% com idade ≥ 35 Escolaridade (anos de estudo)
anos). A maioria (50,4%) era proveniente do interior do < 4 anos 103 54,1
estado, 39,2% apresentavam renda familiar mensal menor ≥ 4 anos 93 45,9
que um salário mínimo, mais de 50% delas tinham menos Tratamento na água de beber
de 4 anos de estudo, 76,6% tinham mais de 5 membros no Sim 37 18,1
domicílio e 42,85% recebiam algum beneficio do governo Não 168 81,9
(Tabela 1). A doença mais presente no grupo estudado foi União estável
a pré-eclâmpsia, com frequência de 24,76%, seguida do Sim 132 62,9
trabalho de parto prematuro (TPP) (17,6%), infecção do trato
Não 78 37,1
urinário (ITU) (15,7%), diabetes (9,5%) e aminiorrrexe (9%). Cor da pele referida
O não uso de suplemento ferroso foi referido por Não negra 197 93,8
37,6% das gestantes, estando associado (gestantes que Negra 13 6,2
não utilizavam suplementação profilática versus gestantes
Hábito tabagista
que utilizavam suplementação profilática) ao baixo peso
Sim 13 6,2
na gravidez, que se apresentou como fator de proteção
para esta condição (RP=0,47; IC a 95%= 0,24 a 0,93; Não 197 93,8
p=0,030). Foram incluídas no modelo ajustado, conforme Hábito etilista
modelo hierárquico previamente estabelecido: idade ≤ 19 Sim 25 11,9
anos; idade ≥ 35 anos; beneficiária do governo; tratamento Não 185 88,1
na água de beber e hábito tabagista (Tabela 2). Estado nutricional (IMC/idade gestacional)
Baixo peso 39 18,8
DISCUSSÃO Eutrofia 62 29,8
Excesso de peso 107 51,4
A gestação é um período vulnerável à anemia ferropriva
Ganho ponderal na gestação
pelo aumento das necessidades desse mineral devido ao
Insuficiente 98 52,7
crescimento fetal e placentário, o que torna necessária a
Adequado 22 11,8
utilização de suplemento profilático. Entretanto, o que se Excessivo 66 35,5
percebe é que grande parte desse público não adere ao trata- * Para algumas das variáveis estudadas, os somatórios dos “n” de suas respectivas categorias
mento, ocasionando o surgimento de repercussões futuras18, não atinge o total de casos da amostra (n=210), já que: 24 gestantes não souberam/ não
quiseram informar a renda familiar; 14 gestantes não quiseram informar a escolaridade; 5
confirmado nesse estudo no qual mais de 1/3 das gestantes gestantes não informaram o tratamento de água para beber; 18 gestantes não souberam
informar/ não lembravam o seu peso pré-gestacional e 5 gestantes não puderam ser pesadas.
estudadas referiu não fazer uso de suplemento antianêmico. IMC=índice de massa corporal

BRASPEN J 2018; 33 (1): 43-8


45
Ferreira RC et al.

Tabela 2 – Caracterização da amostra estudada segundo variáveis demográficas, socioeconômicas, estilo de vida e antropométricas. Maceió, AL, 2013.
Variáveis* Não uso de suplemento RP bruta p*** RP ajustada p****
ferroso** (IC95%) (IC 95%)
n=79 (37,6%)
Idade (anos)
≤ 19 anos 30 (44,1) 1,29 (0,91; 1,83) 0,151 1,11 (0,78; 1,57) 0,551
20-34 anos 36 (52,9) 1,00 1,00
≥35 anos 2 (2,9) 0,38 (0,15; 0,95) 0,038 0,42 (0,17; 1,02) 0,058
Procedência
Capital 34 (46,3) 1,00 0,943
Interior 35 (50,7) 1,01 (0,71; 1,44)
Renda
< 1 salário mínimo 24 (40,7) 1,12 (0,73; 1,64) 0,549
≥ 1 salário mínimo 35 (59,3) 1,00
Beneficiária do governo
Sim 27 (39,1) 1,00 0,171 1,00 0,372
Não 42 (60,9) 1,29 (0,89; 1,87) 1,17 (0,82; 1,67)
Número de membros no domicílio
< 5 membros 15 (21,7) 1,00 0,320
≥ 5 membros 54 (78,3) 0,79 (0,49; 1,25)
Escolaridade (anos de estudo)
< 4 anos 30 (53,6) 1,08 (0,73; 1,61) 0,692
≥ 4 anos 26 (46,4) 1,00
Tratamento na água de beber
Sim 7 (10,4) 1,00 0,056 1,00 0,155
Não 60 (89,6) 1,87 (0,98; 3,56) 1,57 (0,84; 2,91)
União estável
Sim 41 (59,4) 1,00 0,624
Não 28 (40,6) 1,09 (0,77; 1,55)
Cor da pele referida
Não negra 67 (97,1) 1,00 0,305
Negra 2 (2,9) 0,59 (0,21; 1,62)
Hábito tabagista
Sim 1 (1,4) 0,19 (0,03; 1,29) 0,090 0,25 (0,37; 1,65) 0,150
Não 68 (98,6) 1,00 1,00
Hábito etilista
Sim 8 (11,6) 0,83 (0,46; 1,52) 0,554
Não 61 (88,4) 1,00
Estado nutricional atual segundo o IMC
Baixo peso 7 (8,9) 0,42 (0,21; 0,84) 0,015 0,47 (0,24; 0,93) 0,030
Eutrofia 27 (34,1) 1,00 1,00
Excesso de peso 45 (57,0) 1,25 (0,88; 1,78) 0,217
Ganho ponderal
Insuficiente 39 (57,3) 1,21 (0,83; 1,78) 0,304
Adequado 7 (11,1) 1,00
Excessivo 22 (31,6) 0,88 (0,58; 1,33) 0,547
* Para algumas das variáveis estudadas, os somatórios dos “n” de suas respectivas categorias não atinge o total de casos da amostra (n=210), já que: 24 gestantes não souberam/ não quiseram
informar a renda familiar; 14 gestantes não quiseram informar a escolaridade; 5 gestantes não informaram o tratamento de água para beber; 18 gestantes não souberam informar/ não lembravam
o seu peso pré-gestacional e 5 gestantes não puderam ser pesadas; **Percentual referente à coluna, e não à variável independente; ***Regressão de Poisson bruta; ****Regressão de Poisson
ajustada, p<0,05 como significativo. IMC=índice de massa corporal

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46
Não utilização de suplemento antianêmico por gestantes de alto risco

Este fato é de relevância epidemiológica, visto que a (n=32/39) referiram fazer uso de suplementação. Estudos
suplementação de ferro é vista pela maioria dos autores como têm demonstrado a relação entre estado nutricional compro-
sendo uma medida tanto de prevenção quanto de tratamento metido na gestação e uma maior prevalência de anemia4.
para a anemia, uma vez que muitas das mulheres na idade Portanto, pode-se considerar, na presente pesquisa, que
reprodutiva já iniciam suas gestações com deficiências de aquelas gestantes com baixo peso usavam mais suplemen-
ferro, devido aos baixos estoques corporais deste mineral8. Os tação ferrosa quando comparadas àquelas eutróficas, por já
sais ferrosos ofertados oralmente são rapidamente absorvidos apresentarem quadro de anemia e estarem em tratamento
e bastante eficazes em corrigir baixo níveis de hemoglobina antianêmico (variável não estudada) e/ou pelo fato de terem
e normalizar os estoques de ferro corporal. a informação da importância do uso da suplementação
Entretanto, o ferro na sua forma ferrosa apresenta devido ao risco de anemia que apresentam. Apesar disso,
algumas desvantagens, como efeitos colaterais que acabam de forma contrária, há certo tempo vem sendo discutido o
limitando o seu uso e efetividade, comprometendo, assim, o grande paradoxo entre a anemia e a obesidade, como parte
sucesso terapêutico. Outra possível justificativa é o fato de que do processo de transição nutricional em todo mundo23.
muitas gestantes deixam de aderir ao uso de sulfato ferroso Vitolo et al.20, estudando gestantes na cidade de São
ou ácido fólico devido à ausência de sintomas decorrentes do Leopoldo, RS, encontraram a baixa escolaridade como fator
estado de anemia19. A utilização dos suplementos contendo associado à não utilização de suplemento profilático de ferro. Os
ferro também esbarra na oferta precária destes pelos serviços autores alegaram que a escolaridade exerce papel fundamental
públicos e na baixa escolaridade da gestante20. no contexto da adesão às atitudes vinculadas ao adequado
No estudo de Elert et al.21, realizado com parturientes estado de saúde e nutrição. Na presente pesquisa, variáveis rela-
de um hospital público do sul do Brasil, mais de 80% das cionadas a condições socioeconômicas desfavoráveis, incluindo
mulheres estudadas relataram fazer uso de suplemento a baixa escolaridade, não se associaram a não utilização de
ferroso em algum momento da gestação. Entretanto, o aban- suplementação profilática, o que pode ser decorrente de dois
dono da suplementação foi relatado por quase 40% delas, a fatores: o hospital ser público, e a população estudada pertencer
maioria por iniciativa própria, seguida pela melhora autor- a uma classe social menos favorecida, e assim boa parte delas
referida do quadro de anemia; pela presença de sintomas apresentar semelhanças quanto às características socioeconô-
como: desconforto gastrointestinal e constipação intestinal, micas avaliadas. César et al.24, estudando a prevalência e os
bem como por esquecimento e também por dificuldade fatores associados à suplementação com sulfato ferroso entre
financeira. Fatores que também podem ter contribuído para gestantes residentes no município de Rio Grande, RS, também
a não utilização da suplementação por parte de algumas não encontraram associação entre o uso da suplementação
gestantes dessa pesquisa. ferrosa com variáveis socioeconômicas, como a escolaridade
No estudo de Rocha et al.22, realizado com um grupo materna e a renda familiar.
de gestantes de Viçosa, MG, foi verificado que 35,7% das Como a gestação de alto risco compromete de forma
gestantes avaliadas referiram não utilizar suplemento de mais acentuada a saúde materna-fetal, provocando maiores
ferro, frequência essa semelhante ao encontrado neste estudo chances no aparecimento de comorbidades, como a própria
(37,6%). De forma contrária, Ferreira et al.14, estudando condição de anemia ferropriva, é imprescindível que a
gestantes da região semi-árida de Alagoas, observaram que assistência pré-natal dada a este grupo seja intensificada,
cerca de 78,8% das mulheres estudadas não faziam uso de podendo desta forma identifi­car este tipo de situação, de
suplementação antianêmica. maneira a impedir um resultado desfavorável.
Todavia, os autores afirmam que não têm como esclarecer A utilização da suplementação rotineira de ferro auxilia na
o motivo dessa constatação, pois fatores como indisponibi- redução da mortalidade materno-fetal e de doenças infec-
lidade do suplemento nos serviços, sua não distribuição por ciosas, assim como em casos de baixo peso e prematuridades
parte dos funcionários ou distribuição sem as devidas orien- dos recém-nascidos. No entanto, a falta de conhecimento
tações, o não comparecimento das gestantes às consultas dos benefícios do uso da suplementação, bem como falta de
ou sua não adesão à prescrição podem ser fatores relacio- esclarecimento de possíveis efeitos colaterais que a mesma
nados ao problema. As gestantes da presente pesquisa não possa acarretar, faz com que ocorra baixa frequência da
foram questionadas quanto à razão da não utilização da utilização do suplemento25.
suplementação, porém imagina-se que são semelhantes às Pode-se considerar como limitações da pesquisa: (1) o tipo
relatadas anteriormente. de estudo, transversal, logo a situação apresentada refere-se
No presente estudo, o baixo peso na gestação foi o fator ao período de coleta de dados; (2) o uso de suplementação
protetor para a utilização de suplemento profilático, sendo foi baseado exclusivamente no relato da gestante, portanto,
que a maioria das gestantes que apresentavam baixo peso podem existir vieses de informação e (3) deve-se considerar o
BRASPEN J 2018; 33 (1): 43-8
47
Ferreira RC et al.

fato da amostra estudada ser procedente de um único local, [acesso 2015 Fev 19]. Disponível em: http://portal.anvisa.gov.
o que restringe a extrapolação dos resultados encontrados. br/documents/10181/2718376/RDC_344_2002_COMP.pdf/
b4d87885-dcb9-4fe3-870d-db57921cf73f
Estudos longitudinais e de base populacional são neces- 10. Brasil. Ministério da Saúde. Portaria Nº 730 de 13 de maio de
sários para melhor definição do problema, uma vez que a 2005. Institui o programa Nacional de Suplementação de Ferro,
destinado a prevenir a anemia ferropriva e dá outras providên-
identificação e o controle desses fatores de forma precoce cias. Brasília: Ministério da Saúde; 2005.
reduzem o impacto de possíveis intercorrências gestacionais. 11. Souza AI, Batista Filho M, Bresani CC, Ferreira LO, Figueiroa
JN. Adherence and side effects of three ferrous sulfate treatment
regimens on anemic pregnant women in clinical trials. Cad Saúde
CONCLUSÃO Pública. 2009;25(6):1225-33.
12. Cançado RD, Lobo C, Friedrich JR. Tratamento da anemia ferropriva
A não utilização da suplementação antianêmica por por via oral. Rev Bras Hematol Hemoter. 2010;32(Suppl. 2):114-20.
parte de gestantes de alto risco de Alagoas é um problema 13. Azeredo CM, Cotta RMM, Silva LS, Franceschini SCC,
Sant´Ana LFR, Lamounier JA. A problemática da adesão na
de magnitude elevada, tornando evidente a necessidade de
prevenção da anemia ferropriva e suplementação com sais de
aumentar a cobertura da suplementação antianêmica entre ferro no município de Viçosa (MG). Ciênc Saúde Coletiva.
elas. Contudo, ter baixo peso na gravidez apresentou-se como 2013;18(3):827-36.
fator de proteção para a utilização de suplemento ferroso. 14. Ferreira HS, Moura FA, Cabral Junior CR. Prevalência e fatores
associados à anemia em gestantes da região semi-árida do Estado
Mediante essa situação, observa-se que há extrema neces- de Alagoas. Rev Bras Ginecol Obstet. 2008;30(9):445-51.
sidade de conduzir uma ampliação nos esforços para reali- 15. Atalah SE, Castillo LC, Castro SR, Aldea PA. Propuesta de um
nuevo estándar de evaluación nutricional em embarazadas. Rev
zação contínua de uma assistência educativa, objetivando o Méd Chile. 1997;125(12):1429-36.
uso do suplemento durante toda a gestação, e promover o 16. Brasil. Ministério da Saúde. Orientações para coleta e análise de
conhecimento das mulheres sobre anemia, sendo estratégias dados antropométricos em serviços de saúde. Norma Técnica
essenciais para melhorar a utilização de suplemento de ferro. do Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional-SISVAN.
Série G. Estatística e Informação em Saúde. Brasília: Minis-
tério da Saúde; 2011 [acesso 2018 Fev 19]. Disponível em:
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/orientacoes_coleta_
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Local de realização do trabalho: Hospital Universitário Professor Alberto Antunes, Maceió, AL, Brasil.

Conflito de interesse: Os autores declaram não haver.


BRASPEN J 2018; 33 (1): 43-8
48
A Artigo Original
Interações fármaco-nutrição enteral em UTI

Interações fármaco-nutrição enteral em unidade


de terapia intensiva: determinação de prevalência
e significância clínica
Drug-enteral nutrition interactions in intensive care unit: determination of prevalence and clinical
significance

RESUMO
Débora Lima Barbosa1
Soraida Sozzi Miguel2 Introdução: Determinar a prevalência de interações fármaco-nutrição enteral potenciais e
Rita de Cássia Azevedo Couto Cornélio3 analisar a significância clínica das mesmas em uma unidade de terapia intensiva de um hospital
Mariana Macedo Alvim4 de ensino. Método: Estudo transversal, que analisou prescrições eletrônicas de pacientes da
Carolina Fraga Paiva5
Ludmila de Souza Caputo5 unidade de terapia intensiva de um hospital de ensino, avaliando a prescrição de medicamentos
com foco nas potenciais interações fármaco-nutrição enteral, entre 2 de maio e 30 de junho de
2016. A classificação dos medicamentos foi determinada pela Anatomical Therapeutic Chemical
Classification. A busca e a classificação das interações foram realizadas com base no sistema
Micromedex®. Resultados: Foram analisadas prescrições diárias de 53 pacientes, totalizando
610 prescrições. A prevalência de potenciais interações fármaco-nutrição enteral foi de 8,1% do
total de medicamentos prescritos por sonda de nutrição enteral. Houve 98 ocorrências em 15%
dos pacientes avaliados. Os grupos de fármacos mais prescritos foram 53% grupo C e 18% grupo
N. O número de interação por paciente variou de 1 a 2. Ressalta-se que, das quatro interações
fármaco-nutrição potenciais, 100% foram classificadas como moderadas, com valor clínico 2,
consideradas altamente significativas. Conclusão: Os fármacos administrados pela sonda de
nutrição enteral são prescritos com frequência na unidade de terapia intensiva, apresentando
elevada quantidade de interações fármaco-nutrição potenciais, sendo que todas as interações
Unitermos: potenciais identificadas são altamente significativas.
Preparações Farmacêuticas. Nutrientes. Terapia
Nutricional. Cuidados Críticos. Unidades de Terapia ABSTRACT
Intensiva. Interações de Medicamentos.
Introduction: To determine the prevalence of potential enteral drug-nutrition interactions and
Keywords: to analyze their clinical significance in an intensive care unit of a teaching hospital. Methods:
Pharmaceutical Preparations. Nutrients. Nutrition This cross-sectional study analyzed the electronic prescriptions of patients in the intensive care
Therapy. Critical Care. Intensive Care Units. Drug unit of a teaching hospital, evaluating the prescription of drugs with a focus on the potential
Interactions. drug-enteral nutrition interactions between May 2 and June 30, 2016. The classification of the
drugs was determined by the Anatomical Therapeutic Chemical Classification. The search and
Endereço para correspondência: classification of the interactions were performed based on the Micromedex® system. Results:
Débora Lima Barbosa Daily prescriptions of 53 patients were analyzed, totaling 610 prescriptions. The prevalence of
Rua Dr. João Pinheiro 415/301 – Jardim Glória – Juiz potential drug-enteral nutrition interactions was 8.1% of the total drugs prescribed by enteral
de Fora, MG, Brasil – CEP: 36015 040 nutrition tube. There were 98 occurrences in 15% of the patients evaluated. The most prescribed
E-mail: deboralima03@hotmail.com
drug groups were 53% C group, and 18% N group. The number of interactions per patient ranged
Submissão: from 1 to 2. It was emphasized that of the four potential drug-nutrition interactions, 100% were
10 de outubro de 2017 classified as moderate, with clinical value 2, considered highly significant. Conclusion: Drugs
administered by the enteral nutrition probe are frequently prescribed in the intensive care unit,
Aceito para publicação: presenting a high amount of potential drug-nutrition interactions, and all potential interactions
18 de dezembro de 2017 identified are highly significant.

1. Especialização em Residência Multiprofissional em Intensivismo, Urgência e Emergência - Faculdade de Ciências Médicas e da Saúde de Juiz
de Fora; Serviço de Farmácia do Hospital e Maternidade Therezinha de Jesus, Juiz de Fora, MG, Brasil.
2. Mestrado em Agroquímica - Universidade Federal de Viçosa, Viçosa, MG, Brasil; Coordenadora e Professora da Faculdade de Ciências Médicas
e da Saúde de Juiz de Fora, Juiz de Fora, MG, Brasil.
3. Mestrado em Saúde Brasileira - Universidade Federal de Juiz de Fora, Juiz de Fora, MG, Brasil.
4. Mestrado em Saúde Coletiva - Universidade Federal de Juiz de Fora, Juiz de Fora, MG, Brasil.
5. Especialização em Residência Multiprofissional em Intensivismo, Urgência e Emergência - Faculdade de Ciências Médicas e da Saúde de Juiz
de Fora, Juiz de Fora, MG, Brasil.

BRASPEN J 2018; 33 (1): 49-53


49
Barbosa DL et al.

INTRODUÇÃO Dessa forma, o farmacêutico clínico pode colaborar


A maioria dos pacientes internados em Unidades de por meio dos seus conhecimentos e prática na resolução
Terapia Intensiva (UTI) está submetida à alimentação por ou prevenção de problemas que podem interferir na
meio da Nutrição Enteral (NE), caracterizada pela sonda farmacoterapia9.
inserida no interior do trato gastrointestinal, com a finalidade O objetivo do presente estudo foi determinar a preva-
de manter e recuperar o estado nutricional do paciente1,2. lência de interações fármaco-nutrição enteral potenciais e
Os pacientes críticos são mais vulneráveis ​​aos danos analisar a significância clínica das mesmas em uma unidade
causados pelos medicamentos, devido à fase aguda da de terapia intensiva (UTI) de um hospital de ensino.
doença, polifarmácia, e ao uso de drogas intravenosas.
Além do mais, ainda estão passíveis de ocorrer problemas MÉTODO
relacionados aos medicamentos, que podem ser: efeitos
O estudo foi desenvolvido no Serviço de Farmácia do
adversos, interações medicamentosas, erros de adminis-
Hospital Maternidade Therezinha de Jesus, Juiz de Fora (MG),
tração, toxicidade, dosagem subterapêutica, e falhas/atrasos
no aprazamento. Estes riscos elevam a morbimortalidade dos centro de referência ao atendimento de pacientes do Sistema
pacientes críticos e aumentam significativamente os custos Único de Saúde (SUS), que disponibiliza uma capacidade
de cuidados à saúde3. instalada de 50 leitos de UTI: 20 adulto I, 20 adulto II, 10
Neonatais10. O Serviço de Farmácia do hospital estudado
Dentre os medicamentos que são administrados por sonda
já realizava avaliação clínica dos pacientes internados em
de nutrição enteral (SNE) não há descrição em suas bulas
UTI, porém no momento da pesquisa encontrava-se em fase
para ser administrado por esta via, ou seja, eles não estão
de reestruturação.
listados no resumo das características do produto, pois não
há avaliação dos fabricantes e das agências reguladoras para O estudo, de caráter transversal, avaliou a prescrição de
esta via. Sendo assim, a administração de medicamentos medicamentos com foco nas interações fármaco-nutrição
via SNE apresenta riscos que precisam ser avaliados, dentre enteral potenciais (IFNP) na UTI adulto II do hospital. A
eles, a potencial interação fármaco-nutrição, a ocorrência de pesquisa foi desenvolvida por meio da análise de prescrições
distúrbios gastrintestinais e a obstrução de sondas4-6. eletrônicas, totalizando 35 dias de coleta de prescrições,
realizadas nos dias em que o farmacêutico residente se
Devido aos riscos, torna-se necessário avaliar a adminis-
encontrava na UTI.
tração simultânea denutrição enteral e medicamentos a um
paciente. Um dos principais fatores analisados na adminis- Foram selecionadas as prescrições relativas a pacientes
tração de medicamentos por sonda é o risco potencial de internados na UTI adulto II, entre 2 de maio a 30 de junho
interação fármaco-nutrição, que pode afetar a farmacociné- de 2016, que atendiam aos seguintes critérios de inclusão:
tica ou farmacodinâmica de um medicamento ou nutriente. ter utilizado SNE ao longo da internação e pelo menos um
O efeito causado pela alteração na cinética ocorre durante medicamento prescrito por esta via, idade do paciente acima
as fases de absorção, distribuição, metabolismo ou excreção, de 18 anos e com tempo de permanência na UTI de pelo
e quando ocorre na dinâmica, altera o efeito clínico ou menos 24 horas. Os critérios de exclusão foram contrários
fisiológico do medicamento7. à inclusão dos pacientes no estudo. É importante ressaltar
Em 2014, a Sociedade Americana de Nutrição Paren- que o presente estudo considerou como SNE tanto sonda
teral e Enteral (ASPEN) por meio do Standards of Practice nasoentérica quanto nasogástrica.
for Nutrition Support Pharmacists, definiu as atribuições do Foi utilizada a Anatomical Therapeutic Chemical Clas-
farmacêutico como parte da equipe assistencial no cuidado sification (ATC) para demonstrar o grupo de medicamentos
com o paciente em Terapia Nutricional. Dentre as recomen- mais utilizado pela SNE11. A busca e a classificação, quanto
dações, destacam-se: avaliar o estado de funcionamento à gravidade e à documentação das interações fármaco-
gastrointestinal, participar na avaliação da educação dos nutrição enteral, foram realizadas com base no sistema
profissionais de saúde e recomendar fármacos para ação Micromedex ®. O software classifica as interações em
adjunta à terapia de suporte nutricional8. relação à gravidade em cinco categorias (contraindicado,
O farmacêutico necessita avaliar alguns fatores relevantes importante, moderada, secundária e desconhecida), e ao
na administração dos medicamentos por sonda. É preciso nível de evidência científica (excelente, boa, razoável e
analisar o sítio de absorção do fármaco, pesquisar se existe desconhecida)12.
algum efeito da NE na absorção do medicamento, além As IFNP encontradas também foram classificadas de
do tipo de material da sonda e a sua posição no sistema acordo com o valor clínico, que relaciona a gravidade do
digestivo. A partir desta avaliação, verificar a necessidade de efeito e a documentação das interações determinadas pelo
substituição do medicamento para outra forma farmacêutica9. Micromedex13. Classificou-se o valor clínico de 1 a 5, sendo
BRASPEN J 2018; 33 (1): 49-53
50
Interações fármaco-nutrição enteral em UTI

utilizadas as seguintes recomendações: (1) evitar combina-


Tabela 1 – Interações fármaco-nutrição potenciais, classificadas de acordo
ções; (2) usualmente evitar combinações; (3) minimizar o com valor clínico, gravidade e documentação.
risco; (4) nenhuma ação é requerida; e (5) não há interação. IFNP Valor clínico Gravidade Documentação N (%)
Foram consideradas IFNP altamente significativas as que
Varfarina 2 Moderada Boa 16 (1,43%)
atendiam a condição de valores clínicos 1 ou 2.
Levotiroxina 2 Moderada Boa 7 (0,62%)
Os dados foram coletados e transcritos para planilha
Fenitoína 2 Moderada Boa 40 (3,66%)
eletrônica, submetidos à análise estatística descritiva no
Microsoft Office Excel®, utilizando medidas de tendência Hidralazina 2 Moderada Boa 35 (3,22%)
IFNP=Interação fármaco-nutrição potencial. N=número de ocorrências.
central e de dispersão para as variáveis quantitativas. Para
comparação entre especialidades médicas, ocorrência de
IFNP, e prevalência entre os meses de pesquisa foi realizado A prevalência de IFNP nos dias analisados foi de 8,1%
a análise de proporções pelo teste do Qui-quadrado. A do total de medicamentos prescritos por SNE. Foram 98
significância estatística adotada foi de 5%. ocorrências em 15% (8) dos pacientes avaliados. No mês
O trabalho foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa de maio, foi observada uma prevalência de 8,9% (71) e em
do hospital, com parecer número 1.576.428. O Termo de junho 6,4% (27). Não houve diferença estatística entre a
Consentimento Livre e Esclarecido foi dispensado por se prevalência de ocorrência de IFNP (p=0,129), ou seja, a
tratar de revisão de dados, dificultando a localização dos prevalência ocorreu de forma similar nos meses analisados.
pacientes para assinatura, inclusive pelo fato do hospital Destas 98 IFNP, 4 foram de tipos diferentes. O número
atender pacientes de outros municípios e ainda por ser de interação por paciente variou de 1 a 2, com média de
unidade crítica, sendo frequente o óbito, deixando a respon- 1,1 ocorrências de IFNP por paciente. Os pacientes com
sabilidade de assinatura aos parentes próximos, os quais menor ocorrência de IFNP (abaixo de 1,1) tiveram tempo de
nem sempre conseguem ser localizados no prazo destinado internação na UTI semelhante àqueles com maior ocorrência
a coleta de dados. de IFNP (31,2±7,8 dias e 28,7±4,9 dias, respectivamente).
As quatro IFNP e o número de ocorrências nas prescrições
RESULTADOS estão representados na Tabela 1. As IFNP mais frequentes
ocorreram com fenitoína (quatro pacientes apresentaram a
A amostra estudada compreendeu prescrições diárias de
interação pelo menos uma vez) e hidralazina (três pacientes
53 pacientes ao longo do tempo de permanência na UTI, apresentaram a interação pelo menos uma vez).
totalizando 610 prescrições analisadas. Em relação aos
Já a ocorrência de IFNP foi classificada de acordo com
pacientes, 51% eram do sexo masculino. A faixa etária variou
a especialidade. Não houve diferença estatística significativa
de 20 a 90 anos, com média de 66±18 anos, sendo que 79%
entre a ocorrência de IFNP por especialidade (p=0,340), ou
dos pacientes tinham 60 anos ou mais. Considerando toda
seja, a ocorrência de IFNP aconteceu de forma similar entre
a amostra, foi dispensado um total de 1.207 medicamentos
os pacientes da UTI estudada.
para serem administrados pela SNE, havendo 58 fármacos
diferentes. O período de permanência dos pacientes na UTI As frequências das ocorrências de IFNP foram classifi-
variou de 4 a 106 dias, com média de 24±20 dias. Os cadas de acordo com a gravidade, documentação e valor
pacientes avaliados receberam entre 1 e 10 medicamentos clínico. Ressalta-se que todas as interações registradas
tiveram valor clínico 2, consideradas altamente significativas.
prescritos via SNE, com média de 3,0±1,9.
No período estudado, a admissão na UTI por especiali-
dade demonstrou que a clínica médica foi responsável pela DISCUSSÃO
maior parte das internações- 70% (37/53) dos pacientes, No presente estudo, observou-se que dos medicamentos
seguida pelo serviço de cardiologia - 11% (6/53), serviço prescritos pela SNE, 8,1% apresentaram IFNP e ocorreram em
de pneumologia - 9% (5/53) e para cada especialidade de 15% dos pacientes, sendo 100% das IFNP classificadas como
cirurgia geral, gastroenterologia, ginecologia, ortopedia, e moderada/boa de valor clínico 2. Destaca-se que todas as
urologia -4% (2/53). interações foram altamente significativas (valor clínico 1 e 2).
Os grupos de fármacos mais prescritos por SNE de No estudo, foi encontrada uma média de 3,0±1,9 medi-
acordo com a classificação ATC, considerando o número de camentos por SNE prescritos por paciente, porém não foram
pacientes que os utilizaram foram: 53% grupo C (aparelho encontrados estudos que demonstrassem a média de medica-
cardiovascular), 18% grupo N (sistema nervoso), 12% grupo mentos SNE/paciente, sendo um valor importante para demons-
B (sangue e órgãos hematopoéticos) e 6% grupo A (aparelho trar o quanto de medicamentos o paciente recebe pela SNE.
digestivo e metabolismo). Em relação aos grupos de medicamentos prescritos, foi
BRASPEN J 2018; 33 (1): 49-53
51
Barbosa DL et al.

encontrado um resultado diferente do estudo realizado por 50% para 45,7% quando a hidralazina foi administrada
Reis et al.14, em sete hospitais de ensino no Brasil, cujo grupo após uma refeição-padrão ou em bolus de um produto
encontrado com maior percentual foi o B - 32,3%, seguido nutricional entérico12.
pelos grupos N - 19,3%, A - 15,0% e C- 14,2%. Esta dife- Já com o fármaco varfarina o mecanismo provável de
rença pode ser devido à maior ocorrência de prescrição de interação é desconhecido. Estudos descreveram o desenvol-
varfarina em relação ao presente estudo, em que houve maior vimento de resistência da varfarina em pacientes que rece-
prescrição de hidralazina, e pode ser atribuída ao perfil de beram NE concomitantemente, mesmo quando se utilizam
pacientes internados na UTI. produtos contendo baixo teor de vitamina K. Nestes casos,
A prevalência de IFNP foi de 8,1% do total de medica- o tempo de protrombina aumentou para níveis terapêuticos
mentos prescritos por SNE, resultado semelhante ao encon- desejados após a interrupção da nutrição. Portanto, é reco-
trado por Reis et al.14, que identificaram prevalência de 6,6% mendado a pausa da nutrição e monitorização do tempo
nas prescrições de 24 horas e 7,6% nas prescrições de 120 de protrombina12,14.
horas. Porém, na literatura pesquisada, não foram localizados Em relação à levotiroxina, as formulações à
mais estudos de prevalência de IFNP em pacientes críticos, base de soja aumentam a sua excreção fecal. Uma
o que não permitiu mais comparações. medida preventiva para evitar essa ocorrência é evitar
Os pacientes com menor ocorrência de IFNP tiveram formulações à base de soja e monitorar a função
tempo de internação na UTI semelhante àqueles com maior tireoidiana, devido ao risco de hipotireoidismo 12,17 .
ocorrência de IFNP, porém este resultado pode requerer uma A respeito da pausa da dieta, em um estudo realizado em
coleta de dados por um maior período, e, assim, constatar uma UTI de um hospital particular de grande porte, no Rio de
se há alguma influência no tempo de internação destes Janeiro (RJ), observou-se 33,14% administradas sem pausa, o
pacientes. que significou administração concomitante do medicamento
Este resultado é semelhante ao encontrado por Alvim et com a NE. Esse fato demonstra que a recomendação de
al. , em um hospital de ensino em Juiz de Fora (MG), no qual
13 pausa da dieta ainda não está difundida de tal forma que
não houve diferença no tempo de internação em pacientes faça parte da rotina de cuidado ao paciente.
com interações medicamentosas fármaco-fármaco. Neste Para que o manejo da IFNP realmente seja efetivo, é de
estudo, os pacientes com menor ocorrência de interação suma importância o trabalho multidisciplinar. A atuação
medicamentosa (abaixo de 2,6) tiveram tempo de internação do farmacêutico clínico junto aos enfermeiros, médicos e
na UTI semelhante àqueles com maior ocorrência de inte- nutricionistas torna-se essencial para a definição de estra-
ração medicamento (9,04±7,2 dias e 15,08±13,75 dias). tégias que se adequem à rotina de prescrição e adminis-
Apesar de ser interações de diferentes tipos, foi o único tração de medicamentos em pacientes com SNE. Além da
estudo encontrado comparando interações medicamentosas incorporação da prática da pausa da NE, a equipe deve
e tempo de internação. estar atenta para a monitorização clínica e laboratorial
O medicamento fenitoína, encontrado como o mais do paciente, a fim de constatar o alcance terapêutico dos
prevalente durante o estudo, quando administrado concomi- medicamentos administrados via SNE, conforme descrito
tantemente à nutrição enteral reduz sua biodisponibilidade, em estudos.
causando dosagens subterapêuticas. Além disso, é um Para pacientes que estão recebendo nutrição enteral
fármaco de índice terapêutico estreito e um potente indutor contínua, de acordo com recomendações necessárias, pode
enzimático que acarreta em potenciais interações medi- ser requerida a interrupção antes e depois da administração
camentosas, sendo assim, recomenda-se a determinação de medicamentos. Assim, para que não aconteça nenhum
dos níveis plasmáticos para monitorar possíveis interações comprometimento nutricional do paciente, o tempo de pausa
e realizar o manejo de ajuste de dose quando necessário, da dieta deve ser reduzido15,18.
porém nem todos os hospitais realizam a dosagem do A ASPEN recomenda a interrupção da nutrição enteral
fármaco, sendo imprescindível a atenção da equipe nas 30 minutos antes e 30 minutos após a administração de
recomendações de pausa da dieta15,16. medicamentos que apresentam IFNP. Contudo, em muitos
A hidralazina tem sua redução da concentração estudos, é sugerida uma interrupção de 1-2 horas antes e
plasmática máxima, o que pode implicar na ausência da 1-2 horas após a administração do fármaco19.
resposta anti-hipertensiva. Desta forma, em pacientes em O estudo apresenta algumas limitações. Apesar de clas-
uso de hidralazina e NE é necessário um maior controle sificar as interações de acordo com a gravidade e o nível de
dos níveis pressóricos. De acordo com estudos realizados, evidência, a real ocorrência da interação não foi investigada
as concentrações séricas máximas caíram de 80% para na pesquisa. Por fim, trata-se de estudo em centro único, com
46,2% e a área sob a curva concentração-tempo caiu de a inclusão de pequeno número de pacientes.
BRASPEN J 2018; 33 (1): 49-53
52
Interações fármaco-nutrição enteral em UTI

A realização diária do gerenciamento da terapia medi- 6. Matysiak-Luśnia K, Lysenko Ł. Drug administration via enteral
camentosa pelo farmacêutico clínico é indispensável para feeding tubes in intensive therapy - terra incognita? Anaesthesiol
Intensive Ther. 2014;46(4):307-11.
viabilizar o monitoramento das prescrições e rotinas de 7. Hoefler R, Vidal J. Conselho Federal de Farmácia. Admi-
administração de medicamentos de acordo com a clínica do nistração de medicamentos por sonda. Farmacoterapêutica.
paciente, além de colaborar para a implantação de ações 2009;14(3-4):1-6.
8. Carvalho AMR, Oliveira DC, Neto JEH, Martins BCC, Vieira
em prol da segurança do paciente. VMSF, Silva LIMM, et al. Análise da prescrição de pacientes
Recomenda-se a interação do farmacêutico com a equipe utilizando sonda enteral em um hospital universitário do Ceará.
Rev Bras Farm Hosp Serv Saúde.2010;1(1):1-24.
multiprofissional na elaboração de protocolos e educação
9. Tucker A, Ybarra J, Bingham A, Blackmer A, Curtis C, Mattox
continuada aos profissionais que lidam com os pacientes T, et al.; Standards of Practice for Nutrition Support Pharma-
em uso de sonda de nutrição enteral. O atendimento da cists Task Force; American Society for Parenteral and Enteral
equipe ao paciente deve sempre atentar para os horários Nutrition. American Society for Parenteral and Enteral Nutrition
(ASPEN) standards of practice for nutrition support pharmacists.
dos medicamentos e das refeições ofertadas, a fim de que Nutr Clin Pract. 2015;30(1):139-46.
cada paciente tenha sua prescrição de acordo com sua 10. Hospital e Maternidade Therezinha de Jesus [Internet]. Apresen-
necessidade, podendo beneficiá-los com melhor aprovei- tação [acesso 2016 Dez 13]. Disponível em: http://www.hmtj.
org.br/o-hospital/apresentacao/apresentacao.php
tamento da terapêutica, além da melhoria das condições
11. WHO Collaborating Centre for Drug Statistics Methodology
nutricionais, o que levará ao alcance do objetivo terapêutico [Internet]. Anatomical Therapeutic Chemical (ATC) Classifi-
do medicamento. cation and Defined Daily Doses (DDD). [acesso 2017 Jan 2].
Disponível em: http://www.whocc.no/atc_ddd_inde
12. Micromedex® Diseasedex - General Medicine [Internet].
CONCLUSÃO Interações medicamentosas. [acesso 2017 Jan 2]. Dispo-
nível em: http://www.micromedexsolutions.com/micro-
Conclui-se que os fármacos administrados pela sonda de medex2/librarian/PFDefaultActionId/evidencexpert.
nutrição enteral são prescritos com frequência na unidade de ShowDrugInteractionsResults
13. Alvim MM, Silva LA, Leite IC, Silvério MS. Eventos adversos
terapia intensiva, apresentando grande número de interações por interações medicamentosas potenciais em unidade de terapia
fármaco-nutrição potenciais, sendo que todas as identificadas intensiva de um hospital de ensino. Rev Bras Ter Intensiva.
são altamente significativas. 2015;27(4):353-9.
14. Reis AMM, Carvalho EFL, Faria LMP, Oliveira RC, Zago KSA,
Cavelagna MF, et al.Prevalência e significância clínica de intera-
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2. Santos AFL, Carvalho AC, Silva IS, Oliveira SA.Conhecimento Uncertainty and inaccuracy of predicting CYP-mediated in vivo
do enfermeiro sobre o cuidado na administração da nutrição drug interactions in the ICU from in vitro models: focus on
enteral e parenteral. Rev Interd. 2013;6(4):44-50. CYP3A4. Intensive Care Med. 2009;35(3):417-29.
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Hosp Serv Saúde. 2012;3(1):19-22. 2004;39(3):225-37.
5. Basso AP,Pinheiro MS.Avaliação dos medicamentos prescritos 19. Magnuson BL, Clifford TM, Hoskins LA, Bernard AC. Enteral
para pacientes submetidos à terapia nutricional enteral no CTI. nutrition and drug administration, interactions, and complica-
Rev Bras Farm Hosp Serv Saúde. 2014;5(1):12-8. tions. Nutr Clin Pract. 2005;20(6):618-24.

Local de realização do trabalho: Hospital e Maternidade Therezinha de Jesus, Juiz de Fora, MG, Brasil.

Conflito de interesse: Os autores declaram não haver.

BRASPEN J 2018; 33 (1): 49-53


53
A Artigo Original
Mendonça MR & Guedes G

Terapia nutricional enteral em uma Unidade de


Terapia Intensiva: prescrição versus infusão
Enteral nutritional therapy on Intensive Therapy Unit: prescription versus infusion

RESUMO
Mayara Ribeiro de Mendonça1
Gleyciane Guedes2 Introdução: Atualmente, a literatura sugere que a introdução precoce adequada da Terapia
Nutricional Enteral (TNE) pode reduzir consideravelmente a incidência de infecções e o tempo
de permanência hospitalar. No entanto, os pacientes em terapia intensiva frequentemente apre-
sentam inadequações no suporte nutricional, tanto pela sub ou superestimação das necessidades
energéticas diárias quanto pela introdução tardia da TNE e interrupções para procedimentos.
Objetivos: Monitorar a adequação da TNE na unidade de terapia intensiva (UTI) visando à
melhoria da qualidade da assistência nutricional, analisar a prescrição e o administrado de calorias
e proteínas, verificar a adequação calórico-proteica entre o recomendado e o prescrito, identificar
quaisas consequências dessa administração para o paciente, e observar quais fatores interferem
para o adequado aporte na nutrição enteral. Método: Estudo documental, exploratório, em
caráter quantitativo e qualitativo desenvolvido em uma UTI adulto no ano de 2017. Participaram
da amostra pacientes acima de 18 anos com TNE exclusiva. Resultados: Foram analisados 22
pacientes internados na UTI de um hospital público do município de João Pessoa, PB, sendo 86%
do sexo masculino e 14% do sexo feminino. A idade dos pacientes variou de 18 anos a 87 anos,
com média de 51 anos. A quantidade média das proteínas recomendadas por pacientes no período
foi superior aos percentuais ideais, porém, na adequação proteica entre a quantidade infundida
e a prescrita, os valores ficaram aquém desses percentuais ideais. O percentual da média de
adequação energética entre a infundida versus a prescrita ficou acima da recomendação, porém
a maioria dos pacientes (86%) recebe uma quantidade aquém da recomendada. Sendo assim,
tanto na adequação energética quanto em relação aos valores do aporte proteico há uma enorme
disparidade entre a dieta infundida e a prescrita, sendo infundido ao paciente menos da metade
do recomendado. A adequação do volume infundido também demonstrou estar abaixo da metade
do recomendado. Conclusão: Os pacientes do hospital público de João Pessoa apresentaram
déficit de ingestão calórica e proteica no período analisado.

ABSTRACT
Introduction: Current literature data suggest that early introduction of Enteral Nutritional Therapy
(NER) can significantly reduce the incidence of infections and length of hospital stay. However,
intensive care patients often present inadequacies in nutritional support, either by sub- or overes-
timation of daily energy needs, by the late introduction of NER and discontinuation of procedures.
Unitermos: Objectives: To monitor the adequacy of the NIC in the intensive care unit (ICU) aiming at improving
Terapia Nutricional. Estado Nutricional. Necessidades the quality of nutritional assistance, analyzing the prescription and administration of calories and
Nutricionais. Unidade de Terapia Intensiva. proteins, checking protein caloric adequacy between recommended and prescribed, identifying
which consequences of this administration for the patient, to observe which factors interfere with
Keywords: the adequate intake in enteral nutrition. Methods: Quantitative and qualitative documentary
Nutrition Therapy. Nutritional Status. Nutritional exploratory study developed in an adult ICU in the year 2017. Patients above 18 years of age
Needs. Intensive Care Units. with exclusive enteral nutritional therapy participated in the study. Results: Twenty-two patients
admitted to the ICU of a public hospital in the city of João Pessoa, PB, 86% male and 14% female.
Endereço para correspondência: The patients’ ages ranged from 18 years to 87 years, with an average of 51 years. It was observed
Mayara Ribeiro de Mendonça that the mean number of proteins recommended by patients in the period was higher than the
Rua Bel. Irenaldo de A. Chaves, 201, Bl J, Apto 50 – ideal percentages, but in the protein adequacy between the infused quantity and the prescribed
João Pessoa, PB, Brasil – CEP: 58036-460 quantity the values ​​are below these ideal percentages. The percentage of the average energy
E-mail: mayararmnutri@gmail.com adequacy between the infused versus the prescribed one was above the recommendation, but the
majority of the patients (86%) receive an amount less than recommended. Thus, both in energy
Submissão adequacy and in relation to the values ​​of protein intake there is a huge disparity between the
4 de abril de 2017 infused and prescribed diet, and the patient is infused less than half of the recommended one.
The adequacy of infused volume was also found to be below the recommended half. Conclusion:
Aceito para publicação The patients of the public hospital of João Pessoa presented a deficit of caloric and protein intake
17 de julho de 2017 during the analyzed period.

1. Bacharel em Nutrição, Faculdade Internacional da Paraíba (FPB), João Pessoa, PB, Brasil.
2. Graduação em Nutrição pela Faculdade Internacional da Paraíba (FPB). Pós-graduada em Nutrição Clínica pela Faculdade Integrada de Patos
(FIP), Preceptora de estágio em Nutrição Clínica, pela FPB, João Pessoa, PB, Brasil.

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Terapia nutricional enteral em UTI: prescrição vs. infusão

INTRODUÇÃO Os objetivos deste trabalho foram monitorar a adequação


Um tema cada vez mais discutido é o conceito de da TNE na UTI visando à melhoria da qualidade da assis-
controle de qualidade dos cuidados em terapia intensiva. tência nutricional, analisar a prescrição e o administrado
de calorias e proteínas, verificar a adequação calórico-
Atualmente, o suporte nutricional é visto como mais uma
proteica entre o recomendado e o prescrito, identificar quais
ferramenta terapêutica destes cuidados, tendo um papel
as consequências dessa administração para o paciente e
fundamental no manejo do paciente quando a ingestão
observar quais fatores que interferem no adequado aporte
oral não é possível1.
na nutrição enteral.
A terapia nutricional no paciente crítico visa fornecer os
substratos necessários para atender à demanda dos diferentes
nutrientes, assim como proteger os órgãos vitais e amenizar a Referencial Teórico
proteólise, levando em consideração que a terapia nutricional Terapia Nutricional Enteral
precoce no paciente internado em uma Unidade de Terapia A TNE constitui um conjunto de procedimentos terapêu-
Intensiva (UTI) visa à diminuição do estresse fisiológico e a ticos adotados para manutenção ou recuperação do estado
manutenção da imunidade2. nutricional do paciente por meio de nutrição enteral (NE) com
Pacientes graves com uma evolução prolongada e impossibilidade parcial ou total de manter a via oral como
complicada apresentam uma intensa resposta metabó- rota de alimentação, devendo ser adotada sempre que o
lica, geralmente caracterizada por hipermetabolismo, trato gastrointestinal estiver funcionante3.
com importante catabolismo proteico. Desta forma, estes Dados existentes na literatura sugerem que a introdução
pacientes apresen­tam alto risco de depleção do estado precoce e adequada da TNE pode reduzir conside­ravelmente
nutricional, o que pode agravar ainda mais sua condição a incidência de infecções e o tempo de perma­nência hospi-
clínica1. talar. Entretanto, pacientes em terapia inten­siva frequente-
A atuação da equipe multidisciplinar de terapia nutricional mente apresentam inadequações no suporte nutricional, tanto
(EMTN) é fundamental e tem sido relacionada a melhores pela sub ou superestimação das necessi­dades energéticas
resultados para o paciente crítico. Para a obtenção de bons diárias quanto pela introdução tardia da TNE e interrupções
resultados, a EMTN deve assegurar o suporte precoce e para procedimentos1.
adequado ao paciente e supervisionar a terapia nutricional A prescrição de TNE é um processo complexo, que
desde a prescrição até a administração2. implica conhecimento clínico (avaliação de doença de base)
De acordo com o que foi citado acima, surgem dois e nutricional. Com um esforço multidisciplinar, deve-se buscar
questionamentos: uma prescrição dietética adequada, assim como a infusão
da NE em doses plenas, a fim de alcançar os benefícios
1) Qual a importância da adequada ingestão de nutrientes
que a mesma pode proporcionar. Tão importante quanto a
e energia no paciente na UTI? Mostrar a importância de
prescrição adequada da TNE é a certeza de que o paciente
como uma adequada ingestão de nutrientes e energia
estará recebendo a dieta prescrita3.
pode promover a saúde, diminuição do estresse fisiológico
e desnutrição, assim como relatar os fatores que impedem
o adequado aporte nutricional enteral e comparar a Adequação da Ingestão de Nutrientes em Pacientes
adequação, prescrição e oferta energética para saber Críticos
se o que o paciente recebe supre as suas necessidades Apesar da importância da adequada ingestão de
energéticas. nutrientes e energia, os pacientes internados em UTI frequen-
2) Quais os fatores que podem interferir nesse adequado temente recebem um valor energético inferior as suas neces-
aporte nutricional? Acredita-se que pacientes em terapia sidades, devido a fatores que impedem o adequado aporte
inten­siva frequentemente apresentam inadequações no nutricional enteral à intolerância da dieta (vômitos, diarreia,
resíduo gástrico, distensão abdominal, etc.), os associados
suporte nutricional, tanto pela sub ou superestimação
às práticas de rotina de enfermagem (manipulação do
das necessi­d ades energéticas diárias, quanto pela
paciente, administração de medicamentos, etc.) e outras
introdução tardia da terapia nutricional enteral (TNE) e
rotinas (procedimentos, exames)4.
interrupções para procedimentos. Diversos estudos têm
sido con­duzidos com o intuito de analisar a prescrição
e o administrado de calorias e proteínas, verificar a Recomendações Nutricionais
adequação calórico proteica entre o recomendado e o As necessidades calóricas nos pacientes graves podem
prescrito. Outro ponto em investigação são os fatores que ser realizadas utilizando-se fórmulas (“de bolso” ou equações
mais contribuem para a interrupção da TNE. de autores diversos) ou calorimetria indireta. A adequada
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55
Mendonça MR & Guedes G

oferta de calorias na fase aguda para pacientes graves seria paciente, o valor prescrito e o valor infundido, com resul-
de 20 a 25 kcal/kg/dia. Após 4 a 7 dias, deve-se atingir 25 tados significativos, como demonstra a Tabela 2. A mesma
a 30 kcal/kg/dia, na maioria dos casos. Já a oferta para demonstra que a quantidade que está sendo infundida e
o aporte proteico é de 1,2 a 1,5 g/kg/dia quando o cata- prescrita para os pacientes é aquém das suas necessidades
bolismo é moderado, e 1,5 a 2,0 g/kg/dia nos pacientes energéticas.
hipercatabólicos5. Deste modo, podemos observar, de acordo com análise
dos exames laboratoriais frequentes dos pacientes, que há
MÉTODO declínios no estado nutricional dos mesmos, demonstrando
que 93,75% apresentaram anemia, ocasionando uma defi-
Foi realizado um estudo documental, em caráter qualita- ciência de ferro; 81,25% apresentaram infecções causadas
tivo e quantitativo, por meio da coleta de dados a partir de por bactérias e 50% apresentaram-se com desnutrição,
fichas de anamneses e semiologia que foram utilizadas no podendo assim piorar o seu quadro clínico, propiciando
decorrer da pesquisa, onde esses dados foram transferidos outras doenças que estão associadas a pacientes em estado
para o programa Excel, submetido à avaliação do Comitê crítico. Pôde-se verificar, também, que todos os pacientes
de Ética em Pesquisa conforme a Resolução 466/12 do analisados deixaram de receber a dieta diária por pelo menos
Conselho Nacional de Saúde (CNS), prezando pelo sigilo duas horas sem a devida justificativa.
das informações e tornando-as públicas.
Foram identificadas 3 tipos de dietas prescritas, sendo a
Foi realizado em uma UTI de um hospital público do dieta com densidade calórica de 1.5 a mais utilizada dentre
município de João Pessoa, PB. Foram incluídos, na pesquisa elas, com 81,82% dos casos analisados, por ser uma dieta
22 pacientes adultos, com idade entre 18 e 87 anos, de do tipo polimérica, hipercalórica e hiperproteica mantendo o
ambos os sexos. trato gastrointestinal do paciente em funcionamento, seguida
por uma dieta com a densidade calórica de 1.2, uma dieta
RESULTADOS E DISCUSSÃO do tipo normocalórica, hiperproteica e rica em fibras, com
13,64% dos casos, e outra com a densidade 1.0, do tipo
O presente estudo analisou os pacientes com a média
oligomérica nutricionalmente completa, normocalórica,
de idade de 51 anos, sendo a maioria do sexo masculino, e
hiperproteica contendo baixo teor de lipídios, com 4,55%
demonstrou que, em um determinado período, a quantidade
(Tabela 3).
média das proteínas nos pacientes foi superior aos percen-
tuais ideais, que giram em torno de 95% a 105%, porém
na adequação proteica entre a quantidade infundida e a Tabela 1 – Médias de adequação energética e de aporte calórico.
prescrita, as estatísticas apontaram valores aquém desses Idades 51 anos
percentuais ideais.
Gênero M - 86% F - 14%
Baseando-se no conceito de Waitzberg6, a ingestão entre
Proteína 110,26 %
o prescrito e o recebido de calorias deverá ser maior ou igual
Adequação Proteica Infusão/Prescrição 48,9%
a 60%, no entanto, foi relatado no estudo que a média de
adequação energética demonstrou um percentual acima Adequação Energética kcal Infusão/Prescrição 76,58%
da recomendação, como demonstra a Tabela 1, porém as Adequação Volume 48,04%
estatísticas apontam que a maioria dos pacientes (cerca de M=masculino; F=feminino

86%) recebem uma quantidade aquém da recomendada,


assim como outros 14% recebem uma quantidade igual ou
Tabela 2 – Necessidade do paciente, valor prescrito e valor infundido.
superior à recomendada.
Necessidade Prescrição Infusão
Sendo assim, tanto na adequação energética quanto
aos valores do aporte proteico, há uma enorme dispari- Calórica 1.531,00 1.523,92 1.111,87
dade entre a dieta infundida e a prescrita, sendo, neste Proteica 87,92 110,26 53,92
parâmetro, infundido ao paciente menos da metade do
recomendado. A adequação do volume infundido também
demonstrou estar abaixo da metade do recomendado Tabela 3 – Tipos de dieta prescritas.
(Tabela 1).
Forma de utilização %
Confirmando o mencionado no item anterior em relação Proteína 1.0 4,55
à necessidade energético-proteica do paciente segundo a
Proteína 1.2 13,64
sua situação clínica, foi feito um comparativo para melhor
identificação dos declínios, relacionando a necessidade do Proteína 1.5 81,82

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Terapia nutricional enteral em UTI: prescrição vs. infusão

O paciente de UTI apresenta elevado índice de cata-


Tabela 4 – Motivo de internações.
bolismo proteico, e seu adequado aporte nutricional
Tipo de Internações %
pode melhorar o prognóstico e auxiliar na modulação
Trauma 13,64 da resposta ao estresse (catabolismo). Portanto, constata-
AVC 31,82 se que deve ser inserida na equipe multidisciplinar do
TCE 40,91 hospital uma equipe de terapia nutricional enteral para
Tentativa de Suicídio 4,55 que possa ser feito um melhor monitoramento dessas infu-
sões, uma vez que tais pacientes apresentam limitações
Convulsão 4,55
de ingestão e absorção dos nutrientes, o que os coloca
Artrite 4,55
em risco nutricional e clínico.
AVC=acidente vascular cerebral; TCE=traumatismo cranioencefálico

REFERÊNCIAS
Foram analisados os motivos das internações e cons- 1. Cartolano FDC, Caruso L, Soriano FG. Terapia nutricional
tatou-se que o mais frequente foi o traumatismo cranio- enteral: aplicação de indicadores de qualidade. Rev Bras Ter
encefálico, com 40,91%, seguido do acidente vascular Intensiva. 2009;21(4):376-83.
2. Domingues LCC, Silva MJV, Silveira EA. Terapia nutri-
cerebral - 31,82%, trauma por motivos gerais - 13,64%, cional enteral em pacientes críticos: uma revisão de litera-
e tentativa de suicídio, convulsão e artrite, com 4,55% tura [Trabalho de Conclusão de Curso – Pós-Graduação].
cada (Tabela 4). Goiânia: curso de Pós-graduação em Nutrição Clínica e
Esportiva (CEEN), Pontifícia Universidade Católica de
Goiás; 2016. [acesso 2018 Mar 9]. Disponível em: http://
www.cpgls.pucgoias.edu.br
CONCLUSÃO
3. Fontoura CSM, Cruz DO, Londero LG, Vieira RM. Avaliação
De acordo com os dados analisados e apresentados nutricional de paciente critico. Rev Bras Ter Intensiva.
2006;18(3):298-306.
neste estudo, conclui-se que os pacientes do hospital público 4. Detregiachi CRP, Quesada KR, Marques, DE. Comparação
de João Pessoa apresentaram com um déficit de ingestão entre as necessidades energéticas prescritas e administradas a
calórica e proteica no período analisado, contribuindo pacientes em terapia nutricional enteral. Medicina (Ribeirão
Preto). 2011;44(2):177-84.
para a involução dos pacientes em estado crítico de UTI. 5. Franzosi OS, Abrahão CLO, Loss SH. Aporte nutricional e
Esta inadequação de ingestão proteica e calórica, se não desfechos em pacientes críticos no final da primeira semana
revertida, é prejudicial a estes pacientes,acarretando diversas na unidade de terapia intensiva. Rev Bras Ter Intensiva.
2012;24(3):263-9.
complicações clínicas, afetando diretamente o estado de 6. Waitzberg DL. Nutrição oral, enteral e parenteral na prática
saúde e, consequentemente, a alta do paciente. clínica. São Paulo: Atheneu; 2009.

Local de realização do trabalho: Faculdade Internacional da Paraíba, João Pessoa, PB, Brasil.

Conflito de interesse: Os autores declaram não haver.

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A Artigo Original
Santos AL & Alves TCHS

Terapia nutricional enteral: relação entre percentual


de dieta prescrito e administrado e intercorrências
associadas em hospital público de Salvador-BA
Enteral nutritional therapy: relationship between the percentage of prescribed and administered diet
and associated complications in a public hospital of the city of Salvador-BA

Aline Luquini Santos1 RESUMO


Thaisy Cristina Honorato Santos Alves2 Introdução: A terapia nutricional enteral geralmente é implementada visando manter ou
melhorar o estado nutricional do paciente que possui trato gastrointestinal funcionante, porém,
com dificuldade ou impossibilidade de ingestão alimentar via oral. Método: Estudo longitudinal
quantitativo, observacional e prospectivo, realizado nas enfermarias clínicas de um hospital público
da cidade de Salvador-BA, entre setembro de 2013 e maio de 2014. Incluídos pacientes adultos
e idosos em uso de terapia nutricional enteral exclusiva. Diariamente, ocorreu a coleta dos dados
relacionados ao volume de dieta enteral infundido e as intercorrências associadas à infusão
insuficiente da dieta. A análise dos dados foi realizada utilizando o software SPSS for Windows.
Resultados: Foram incluídos 51 pacientes, sendo 56,9% do sexo masculino e 66,7% idosos. Os
pacientes receberam volume de dieta enteral inferior ao prescrito em mais de 50% dos casos
e volume considerado muito baixo em 29,9%, quando avaliadas as divergências entre volume
prescrito e administrado. Foi possível listar como principais intercorrências para a administração
insuficiente de dieta enteral: jejum como preparo para exames ou procedimentos; problemas
relacionados à bomba de infusão; ausência de dieta disponível no reservatório de armazenamento,
porém, surpreendentemente, na maioria dos casos não houve motivo aparente para adminis-
tração inadequada do volume prescrito de dieta enteral. Conclusões: Pacientes hospitalizados
recebem frequentemente volume de dieta enteral inferior ao prescrito pelo nutricionista, o que
sugere a necessidade de buscar soluções práticas para minimizar intercorrências que interferem
na administração da dieta enteral prescrita.

ABSTRACT
Introduction: The enteral nutrition therapy is generally implemented focusing at maintaining or
Unitermos: improving the nutritional state of a patient who has a functioning gastrointestinal tract but displays
Terapia Nutricional. Nutrição Enteral. Hospitalização.
problems or impossibility of oral feeding. Methods: Quantitative, observational and prospective
Keywords: longitudinal study carried out in the clinical wards of a public hospital in the city of Salvador,
Nutrition Therapy. Enteral Nutrition. Hospitalization. Bahia, between September 2013 and May 2014. It included adult and elderly patients in an
exclusive enteral nutritional therapy. The data related to the volume of infused enteral diet and
Endereço para correspondência: to the complications associated with insufficient infusion of the diet were collected. Data analysis
Thaisy Cristina Honorato Santos Alves was performed using the SPSS software for Windows. Results: Fifty-one patients were included:
Universidade do Estado da Bahia – Departamento 56.9% were male and 66.7% were elderly. The patients received a volume of enteral diet lower
Ciências da Vida – Colegiado de Nutrição. Rua Sil- than prescribed in more than 50% of the cases and a volume considered very low in 29.9%, when
veira Martins, 2555, Cabula – Salvador, BA, Brasil – the differences between prescribed and administered volume were evaluated. It was possible to
CEP: 41150-000 take account of as main complications for the insufficient administration of enteral diet: fasting as
E-mail: thaisyhonorato@yahoo.com.br
preparation for exams or procedures; problems related to the infusion pump; absence of available
Submissão: diet in the storage reservoir; however, surprisingly in most cases there was no apparent reason
18 de julho de 2017 for inadequate administration of the prescribed volume of enteral diet. Conclusions: Hospita-
lized patients often receive a lower enteral diet volume than prescribed by the nutritionist, which
Aceito para publicação: indicate the necessity to seek practical solutions in order to minimize complications that hinder
2 de outubro de 2017 the administration of the prescribed enteral diet.

1. Nutricionista. Especialista em Nutrição Clínica pela Universidade do Estado da Bahia. Pós-graduada em Fitoterapia, Salvador, BA, Brasil.
2. Nutricionista. Mestre em Alimentos, Nutrição e Saúde. Pós-graduada em Nutrição Clínica. Docente Auxiliar do Curso de Nutrição da Univer-
sidade do Estado da Bahia, Salvador, BA, Brasil.

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Relação entre percentual de dieta prescrito e administrado e intercorrências associadas

INTRODUÇÃO O percentual de dieta administrada foi estabelecido por


Terapia Nutricional Enteral (TNE) é definida como um meio da relação entre volume administrado e volume pres-
conjunto de procedimentos terapêuticos para manutenção ou crito pelos nutricionistas para o paciente. O volume prescrito
recuperação do estado nutricional do paciente por meio da foi verificado no mapa diário de nutrição e na etiqueta da
nutrição enteral1. Esse tipo de terapia é indicado quando o dieta enteral. O volume administrado foi determinado por
trato gastrointestinal está total ou parcialmente funcionante, meio da verificação direta diária das bolsas de dieta insta-
porém o paciente apresenta alguma impossibilidade de ladas para os pacientes. Foi considerado muito baixo volume
ingestão por via oral ou a quantidade de alimentos ingerida de dieta enteral administrado inferior a 60% do prescrito,
torna-se insuficiente para proporcionar nutrição adequada baixo volume entre 60% e 79,99% do volume prescrito, bom
para o mesmo2. Desse modo, a TNE é fundamental para volume entre 80% e 100% do volume prescrito e excedente
minimizar agravos provocados pela desnutrição hospitalar volume superior a 100% do prescrito.
e manter o funcionamento corporal3. A presente pesquisa se iniciou com um estudo piloto, que
consistiu na coleta completa de dados durante 4 semanas
A prevalência de desnutrição em pacientes hospitalizados
subsequentes. O tamanho das amostras foi definido para
no Brasil é alta e correlaciona-se com maior tempo de
garantir o sucesso da pesquisa e oferecer certa segurança esta-
permanência hospitalar4. A desnutrição e perda de massa
tística em relação à representatividade dos dados, observando-
muscular são recorrentes no meio hospitalar e responsáveis
se fatores essenciais, como amplitude do universo da amostra,
por consequências indesejáveis, como aumento do tempo
ou a população a ser pesquisada e nível de confiança.
de internação e risco de morbimortalidade, gerando impacto
negativo na qualidade de vida dos pacientes5,6. Adicional- A pesquisa foi baseada em um levantamento por
mente, quanto maior tempo de internamento, mais elevado amostra simples aleatória dos prontuários, contemplando 51
será o risco de agravar a desnutrição2. pacientes. Adotou-se uma margem de erro máxima de dois
pontos e considerou nível de confiança de 95%. O banco
Ainda que o paciente esteja em uso da TNE, há situações
de dados foi construído utilizando-se o programa Microsoft
que podem ocasionar redução no aporte nutricional, levando Office Excel versão 2007. Os dados foram analisados
o indivíduo hospitalizado à desnutrição. Intercorrências, como utilizando Software SPSS for Windows. Análise estatística
pausas na dieta enteral para realização de exames e outros descritiva foi utilizada em cada variável. Diferenças entre as
procedimentos, acarretam em volume infundido inferior médias de variáveis numéricas foram analisadas com testes
ao prescrito, ocasionando redução do aporte calórico7. O paramétricos ou não paramétricos quando adequado. A
presente estudo visa comparar o volume prescrito e admi- associação entre variáveis categóricas foi avaliada com o
nistrado de dieta na TNE e as intercorrências associadas à teste Qui-quadrado. Foi adotado em todas as análises nível
administração de dieta enteral. de significância de 5% (p<0,05).

MÉTODO RESULTADOS
Estudo realizado entre setembro/2013 e maio/2014, Avaliou-se um total de 51 pacientes. As características
longitudinal, quantitativo, observacional e prospectivo, descritivas da amostra encontram-se listadas na Tabela 1.
incluindo pacientes adultos e idosos, de ambos os sexos, De acordo com o cálculo de adequação entre volume
internados nas enfermarias clínicas de um hospital público de dieta prescrita semanalmente para os pacientes e volume
da cidade de Salvador-BA. de fato administrado a eles, foi possível observar que, dos
Constitui subprojeto de um projeto maior submetido e 51 pacientes que permaneceram na primeira semana do
aprovado pelo Comitê de Ética da Universidade do Estado estudo, a maioria recebeu volume baixo ou muito baixo de
da Bahia com número de Parecer: 218.433. Foi conside- dieta enteral. O mesmo ocorreu nas semanas subsequentes.
rada essencial assinatura do Termo de Consentimento Livre Pode-se observar ainda que, em média, no decorrer do
e Esclarecido (TCLE) pelos pacientes ou responsáveis para estudo, 70,2% dos pacientes receberam volume inferior a
iniciar a coleta dos dados. O acompanhamento dos pacientes 80% do volume prescrito pelo nutricionista (Figura 1).
no estudo se iniciou no momento de introdução da terapia As principais intercorrências que contribuíram para baixa
nutricional enteral ou admissão na enfermaria, e o término administração de dieta enteral foram: 18,9% jejum para
no momento da suspensão da terapia nutricional enteral exames ou outros procedimentos; 11% problemas relacio-
exclusiva, alta da enfermaria ou óbito. O acompanhamento nados à bomba de infusão. Contudo, na maioria dos casos
dos pacientes nesse estudo totalizou, no máximo, de 4 (24,4%), surpreendentemente, não se encontrou um motivo
semanas para cada paciente, tempo suficiente para avaliar aparente para a administração de dieta enteral abaixo do
administração da terapia nutricional e fatores associados. volume prescrito (Figura 2).
BRASPEN J 2018; 33 (1): 58-63
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Santos AL & Alves TCHS

Tabela 1 – Características dos pacientes internados em uso de TNE exclusiva nas enfermarias de clínica médica e cirúrgica de um hospital público. Sal-
vador/BA, 2014 (n=51).
Características N %
Sexo
Feminino 22 43,1
Masculino 29 56,9
Faixa Etária
Adulto 17 33,3
Idoso 34 66,7
Motivo da introdução da TNE
Dificuldade ou impossibilidade de alimentação via oral 42 82,4
Outras causas 09 17,6
Tempo de permanência no estudo
Até 1 semana 22 43,8
>1 a 2 semanas 11 21,6
>2 a 3 semanas 05 9,8
> 3 a 4 semanas 13 25,5
Enfermidade de base do internamento hospitalar
Doenças do trato gastrointestinal (TGI) 15 29,4
Doenças do TGI e cardiovasculares 03 5,9
Outras 33 64,7
Via de administração de dieta
Sonda nasogástrica ou nasoenteral 46 90,2
Gastrostomia 05 9,8
Tipo de dieta
Polimérica 48 94,1
Oligomérica 03 5,9
n=número de pacientes; %=frequência relativa dos pacientes.

Figura 1 - Percentual de dieta administrado de acordo com as semanas de permanência no estudo. Salvador/BA, 2014 (n=51).

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Relação entre percentual de dieta prescrito e administrado e intercorrências associadas

Observa-se nos gráficos boxplot (Figura 3) que, em todas apresentaram volumes médios de ingestão entre 90 e 100%
as semanas de estudo, os pacientes que apresentaram maior do volume prescrito. Realizou-se a associação entre a quan-
quantidade de intercorrências invariavelmente receberam os tidade de intercorrências e o volume de dieta administrado
menores volumes de dieta em relação ao prescrito. Por sua com o teste Qui-quadrado. Entretanto, não foi possível
vez, os pacientes com menor quantidade de intercorrências observar relação estatisticamente significante (p<0,05).

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
Figura 2 - Percentual de intercorrências associadas à administração inadequada da Terapia Nutricional Enteral. Salvador/BA, 2014 (n=51).
1=Jejum para exames ou outros procedimentos; 2= Problemas relacionados à bomba de infusão de dieta; 3=Ausência de dieta disponível no reservatório de dieta; 4=
Exteriorização acidental da sonda ou retirada da sonda pela equipe de enfermagem; 5=Obstrução da sonda; 6=Problemas do TG; 7=Recusa do paciente; 8=Estado
clínico grave do paciente; 9=outras causas; 10=Ausência de causa aparente.

Intercorrências – Semana 1 Intercorrências – Semana 2

Intercorrências – Semana 3 Intercorrências – Semana 4

Figura 3 - Boxplots da relação entre quantidade de intercorrências e percentual de dieta administrado em cada semana de permanência no estudo. Salvador/BA, 2014.
PercDietaSem= Percentual de dieta administrado na semana.

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Santos AL & Alves TCHS

DISCUSSÃO náusea/vômito e demora na instalação do frasco por indis-


Notou-se, no presente estudo que mais da metade dos ponibilidade na unidade.
pacientes recebeu volume de dieta enteral inferior ao pres- Fora do Brasil estudos também evidenciam tendência
crito, sendo que um percentual considerável desses recebeu à administração de dieta abaixo do volume prescrito para
volume considerado baixo ou muito baixo, o que pode pacientes hospitalizados. Estudo realizado em UTI do Centro
acarretar em piora do estado nutricional para o paciente Médico Acadêmico de Midwest (Estados Unidos), com 68
em uso da TNE. Diversos estudos brasileiros encontraram pacientes de idade superior a 18 anos, em uso de TNE,
resultados similares. concluiu que as duas principais causas para oferta de volume
Estudo realizado com 152 indivíduos adultos, que ​​incluiu infundido de dieta enteral inferior a 90% do prescrito foram
36 pacientes em enfermaria e 116 pacientes em Unidade extubação e jejum para procedimentos13.
de Terapia Intensiva (UTI), concluiu que 20% dos pacientes Um estudo realizado com 35 pacientes adultos em
tiveram inadequação entre prescrição e recebimento de estado crítico em uso de TNE exclusiva por, no mínimo, 72h
terapia nutricional enteral e que as principais causas para o e, máximo, 7 dias em UTI, mostrou que apenas 54,3% das
não recebimento de dieta enteral conforme o prescrito são (em dietas encontravam-se adequadas quando comparada às
ordem decrescente): problemas logísticos operacionais, estase calorias prescritas. O artigo concluiu que houve relevantes
gástrica e perda acidental da sonda de alimentação enteral8. inadequações calóricas entre calorias prescritas e recebidas.
Outro estudo, que avaliou 93 pacientes de ambos os Os principais motivos para interrupção da dieta enteral
sexos, com idade superior a 18 anos, observou que, em foram presença de resíduo gástrico elevado e realização
média, 81,6% do volume prescrito foi infundido. Dentre as de exames14.
causas para interrupção de dieta destacam-se complicações Sendo assim, os estudos citados foram concordantes
gastrointestinais e pausa para extubação9. quanto à nutrição enteral frequentemente não ser adminis-
Um estudo realizado com 85 pacientes adultos em UTI trada de forma plena segundo a prescrição do nutricionista,
de um hospital brasileiro considerou pacientes em uso de o que está diretamente associado a diversas intercorrên-
nutrição enteral exclusiva e concluiu que cerca de 40% do cias. Vale ressaltar que cerca de 40 a 50% dos indivíduos
volume de dieta enteral prescrito não foram administrados. internados em hospitais apresentam desnutrição, o que
Os principais motivos para interrupção da dieta foram: está diretamente associado ao tempo de permanência e
náuseas, vômitos, distensão abdominal, constipação, compli- morbidade7,15,16.
cações clínicas, realização de procedimentos diagnósticos e A presente pesquisa chegou a resultados compatíveis com
transição para via oral7. outros estudos, contudo, obteve um achado não relatado
Por sua vez, estudo realizado em UTI e enfermarias do na literatura: a ausência de causa aparente relacionada
hospital de Muriaé (MG), com 68 pacientes adultos e idosos à infusão da dieta enteral, o que reforça a necessidade
que receberam nutrição enteral exclusiva, avaliou 494 pres- de trabalhar no meio hospitalar questões como cuidado e
crições durante o período de análise, sendo que 88 (17,3%) humanização do enfermo, considerando que o prejuízo na
delas apresentaram algum tipo de interferência na infusão infusão de dieta acarreta em déficit clínico e nutricional do
de dieta enteral. As principais causas para baixa infusão de paciente hospitalizado.
dieta foram pausa para realização de exames e procedi- É importante salientar que o estudo foi realizado em enfer-
mentos cirúrgicos, instabilidade hemodinâmica, prescrição marias, diferente da maioria dos estudos frequentemente reali-
não executada e diarreia10. zados em UTI devido ao monitoramento constante do paciente
Outro estudo similar, realizado com 27 pacientes adultos nesse local. No presente estudo, o monitoramento foi registrado
e idosos de um hospital particular do centro de São Paulo, exclusivamente pela equipe do estudo, o que exigiu atenção
observou que o volume infundido foi significantemente menor minuciosa aos detalhes envolvidos na terapia nutricional.
que o volume prescrito em toda amostra, nos cinco dias de Alguns fatores constituíram-se limitantes à realização
acompanhamento. A principal intercorrência na adminis- desse estudo, como falta de equipos no hospital durante
tração da dieta enteral foi diarreia, seguida de procedimentos algumas semanas, que impossibilitou recebimento de dietas
de enfermagem e bomba de infusão11. por diversos pacientes, dificultando a aferição dos volumes de
Cervo et al.12, cujo estudo avaliou 46 pacientes adultos dieta administrada. O treinamento pormenorizado da equipe,
e idosos, internados na UTI e Clínica Médica, verificaram assim como a tomada de decisões precisas em tempo hábil,
que o volume ingerido foi inferior ao volume estimado e, em minimizou a maioria das limitações supracitadas.
alguns casos, a diferença mostrou-se estatisticamente signi- A redução do aporte calórico e de nutrientes devido aos
ficante. Segundo o artigo, a dieta enteral não foi infundida percalços na administração da dieta enteral é uma possível
por pausa para higiene corporal, exames e procedimentos, causa da desnutrição hospitalar. Portanto, os resultados
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62
Relação entre percentual de dieta prescrito e administrado e intercorrências associadas

sugerem a necessidade de buscar soluções práticas preven- 7. Assis MCS, Silva SMR, Leães DM, Novello CL, Silveira CRM,
tivas e corretivas, a fim de minimizar inconsistências na Mello ED, et al. Nutrição enteral: diferenças entre volume,
calorias e proteínas prescritos e administrados em adultos. Rev
administração da dieta enteral e possibilitar aporte nutricional Bras Ter Intensiva. 2010;22(4):346-50.
adequado ao paciente hospitalizado. 8. Martins JR. Fatores determinantes na inadequação entre pres-
crição e recebimento de terapia nutricional enteral em pacientes
hospitalizado [Dissertação de mestrado]. São Paulo: Universi-
AGRADECIMENTOS dade de São Paulo, Faculdade de Medicina; 2012.
9. Ribeiro LMK, Oliveira Filho RS, Caruso L, Lima PA, Damas-
À equipe do hospital onde realizou-se a pesquisa, a todos ceno NRT, Soriano FG. Adequação dos balanços energético
os estudantes e profissionais da Universidade do Estado da e proteico na nutrição por via enteral em terapia intensiva:
Bahia que tornaram o projeto possível, à professora Clelia quais são os fatores limitantes? Rev Bras Ter Intensiva.
2014;26(2):155-62.
Dantas, pelo auxílio estatístico. 10. Nunes GR, Resende FR, Silva DCG. Análise comparativa do
volume de dieta enteral prescrito com o volume de dieta infun-
dido em pacientes internados em um hospital do município de
REFERÊNCIAS Muriaé (MG). Rev Cient Faminas. 2015;11(2):23-32.
1. Brasil. Ministério da Saúde. Agência Nacional de Vigilância 11. Simões SAR, Kutz NA, Barbosa MC, Porto EF, Salgueiro
Sanitária. Resolução da Diretoria Colegiada – RDC/Anvisa Nº MMHAO. Dieta enteral prescrita versus dieta infundida. Rev
63, de 06 de julho de 2000. Dispõe sobre Este Regulamento Fund Care Online. 2017;9(3):688-95.
Técnico fixa os requisitos mínimos exigidos para a Terapia de 12. Cervo AS, Magnago TSBS, Carollo JB, Chagas BP, Oliveira
Nutrição Enteral. Brasília: Diário Oficial da União da República AS, Urbanetto JS. Adverse events related to the use of enteral
Federativa do Brasil; 2000. nutritional therapy. Rev Gaúcha Enferm. 2014;35(2):53-9.
2. Cuppari L. Guia de nutrição: clínica no adulto. 3ª ed. São Paulo: 13. Kozeniecki M, McAndrew N, Patel JJ. Process-related barriers to
Manole; 2014. p. 527-61. optimizing enteral nutrition in a tertiary medical intensive care
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Terapia nutricional enteral em pacientes críticos: qual o papel 14. Martins TF, Campêlo WF, Vasconcelos CMCS, Henriques EMV.
do enfermeiro nesse processo? COORTE-Rev Cient Hosp Santa Avaliação da terapia nutricional enteral em pacientes críticos
Rosa. 2014;(4):53-9. de uma unidade de terapia intensiva. Rev Bras Promoç Saúde.
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5. Duarte A, Marques AR, Sallet LHB, Colpo E. Risco nutricional dida? Rev Bras Nutr Clín. 2008;23(1):21-5.
em pacientes hospitalizados durante o período de internação. 16. De Luis DA, Izaola O, Cuellar L, Terroba MC, Cabezas G,
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trition in hospitalized patients. Rev Nutr. 2016;29(3):329-36. 2006;50(4):394-8.

Local de realização do trabalho: Local de realização do estudo: Hospital Geral Roberto Santos (HGRS) – Secretaria de Saúde do
Estado da Bahia (SESAB), Universidade do Estado da Bahia (UNEB), Salvador, BA, Brasil.

Financiamento: FAPESB – Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia/ Programa Institucional de Bolsas de Iniciação
Científica (PIBIC) Bolsa: PIBIC/FAPESB - Pedido Nº 2270/2013

Conflito de interesse: Os autores declaram não haver.

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63
A Artigo Original
Coutinho MAP et al.

Alta frequência de síndrome metabólica e sua


relação com o baixo consumo alimentar de
proteínas em mulheres com diagnóstico de
diabetes gestacional prévio
High frequency of metabolic syndrome and its relation to low dietary intake of protein in women
with previous gestational diabetes

RESUMO
Mário de Almeida Pereira Coutinho1
Rosália Gouveia Filizola2 Introdução: Nesta pesquisa, examinou-se a ocorrência de síndrome metabólica, diabetes mellitus e
Expedicto Afonso de Macedo3 obesidade e as suas relações com o consumo habitual de macro e micronutrientes e grupos de alimentos,
Maria da Conceição Rodrigues Gonçalves4 em mulheres com antecedentes de diabetes mellitus gestacional (DMG). Método: O estudo envolveu
Luiza Sonia Rios Asciutti5 110 pacientes atendidas no ambulatório de diabetes gestacional de um hospital universitário localizado
Azamor Cirne de Azevedo Filho6 em uma cidade do Nordeste do Brasil, das quais 49 completaram todas as etapas da investigação.
Maria José de Carvalho Costa7 No período pós-parto entre 6 meses e 4 anos, as pacientes recrutadas para uma primeira consulta
Christiane Carmem Costa do Nascimento8 responderam questionários acerca dos seus antecedentes clínicos, hábitos alimentares e do nível de
Carla Patrícia Novaes dos Santos Fechine9 atividade física e submeteram-se à aferição do peso e altura, realização de exame de bioimpedância
e exames laboratoriais, a serem apresentados na segunda consulta. Resultados: A prevalência de
síndrome metabólica foi elevada, totalizando 49% das pacientes; a de diabetes mellitus foi de 16%; e de
disglicemias de 65%, porcentagens próximas àquelas encontradas em estudos realizados durante cinco
anos após a gestação ou por períodos mais longos. Do total das pacientes, 45% estavam com sobrepeso
Unitermos: e 28% obesas. Após análise estatística, observou-se relação entre a prevalência de síndrome metabólica
Síndrome X Metabólica. Obesidade. Diabetes Gesta- e menor ingestão de proteínas (p=0,05), quando os macro e micronutrientes foram ajustados pelo peso.
cional. Alimentação. Conclusão: Não houve relação entre o consumo alimentar habitual e a ocorrência de diabetes mellitus
e obesidade e a frequência de síndrome metabólica nas pacientes com diagnóstico prévio de DMG foi
Keywords: elevada, sendo sua ocorrência associada à menor ingestão de proteínas.
Metabolic Syndrome X. Obesity. Diabetes, Gestatio-
nal. Feeding. ABSTRACT
Introduction: In this research, we examined the occurrence of metabolic syndrome, diabetes mellitus
Endereço para correspondência: and obesity and its relations with the habitual consumption of macro and micronutrients and food groups
Carla Patrícia Novaes dos Santos Fechine in a group of women with a history of gestational diabetes mellitus (GDM). Methods: The study involved
110 patients attending the gestational diabetes outpatient in a university hospital located in a city in the
Av. Hilton Souto Maior, 6501, Condomínio Porta do
Northeast of Brazil, of which 49 completed all stages of the investigation. In the postpartum period between
Sol – Portal do Sol – João Pessoa, PB, Brasil – CEP: 6 months and 4 years, the patients recruited for an initial consultation, answered questionnaires about
58046-600 their medical history, eating habits and level of physical activity and underwent measurement of weight
E-mail: carlafechine@hotmail.com; carla.novaes@ and height, conducting examination bioimpedance and laboratory tests, to be presented in the second
unipe.br query. Results: The prevalence of metabolic syndrome was high, amounting to 49% of patients, diabetes
mellitus was 16% and 65% dysglycemias, similar percentages to those found in studies conducted for five
Submissão years after pregnancy or for longer periods. Of the total patients, 45% were overweight and 28% obese.
24 de agosto de 2017 After statistical analysis, a relationship was found between the prevalence of metabolic syndrome and
lower protein intake (p=0.05), when the macro and micronutrients were adjusted by weight. Conclu-
Aceito para publicação sion: The frequency of metabolic syndrome in patients with a previous diagnosis of GDM is high and its
11 de novembro de 2017 occurrence was associated with a lower intake of proteins.

1. Graduado em Medicina; Mestre em Ciências da Nutrição e médico da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), João Pessoa, PB, Brasil.
2. Graduada em Medicina e Pós-Doutora em Endocrinologia e Metabologia; Professora da UFPB; Programa de Pós-graduação em Ciências da
Nutrição, Departamento de Nutrição, Centro de Ciências da Saúde, NIESN – Núcleo Interdisciplinar de Estudos em Saúde e Nutrição/Univer-
sidade Federal da Paraíba, João Pessoa, PB, Brasil.
3. Médico do Hospital Santa Paula-SP, João Pessoa, PB, Brasil.
4. Graduada em Nutrição e Doutora em Produtos Naturais e Sintéticos Bioativos, Programa de Pós-graduação em Ciências da Nutrição, Depar-
tamento de Nutrição, Centro de Ciências da Saúde, NIESN – Núcleo Interdisciplinar de Estudos em Saúde e Nutrição/Universidade Federal da
Paraíba, João Pessoa, PB, Brasil.
5. Graduada em Nutrição e Pós-Doutora em Nutrição; Programa de Pós-graduação em Ciências da Nutrição, Departamento de Nutrição, Centro
de Ciências da Saúde, NIESN – Núcleo Interdisciplinar de Estudos em Saúde e Nutrição/Universidade Federal da Paraíba, João Pessoa, PB, Brasil.
6. Graduado em Engenharia de Minas e Engenharia Civil, Doutor em Engenharia Mecânica, Professor Adjunto do Departamento de Finanças e
Contabilidade do Centro de Ciências Sociais Aplicadas da Universidade Federal da Paraíba, Campus I, João Pessoa, PB, Brasil.
7. Graduada e Pós-Doutora em Nutrição, Professora associada da Universidade Federal da Paraíba. Departamento de Nutrição; Programa de
Pós-graduação em Ciências da Nutrição, Departamento de Nutrição, Centro de Ciências da Saúde, NIESN – Núcleo Interdisciplinar de Estudos
em Saúde e Nutrição/Universidade Federal da Paraíba, João Pessoa, PB, Brasil.
8. Graduada em Nutrição e Mestre em Ciências da Nutrição; Professora da Faculdade Mauricio de Nassau, João Pessoa, PB, Brasil.
9. Graduada em Fisioterapia e Mestre em Ciências da Nutrição; Professora do Centro Universitário de João Pessoa (UNIPE), João Pessoa, PB, Brasil.

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64
Síndrome metabólica e diabetes gestacional

INTRODUÇÃO (aparelho Maltron BF-907, de responsabilidade da equipe de


A síndrome metabólica (SM) é caracterizada por um pesquisadores do Departamento de Nutrição – Programa de
conjunto de fatores de risco que condicionam um aumento Pós-graduação em Ciências da Nutrição)10 e solicitaram-se
no aparecimento de doenças cardiovasculares e endocri- exames laboratoriais pertinentes (perfis glicêmico e lipídico).
nológicas. No seu universo estão as alterações do metabo- Na consulta subsequente, foram apresentados os exames
lismo glicídico, hipertensão arterial e aumento dos valores laboratoriais, dadas as orientações finais e iniciado o trata-
de lipídios séricos1. A SM se associa a um aumento dos mento, quando necessário.
casos de diabetes tipo 2 (DM2) e da incidência de afecções A análise do valor médio do consumo de macro e
cardiovasculares, como infarto agudo do miocárdio, acidente micronutrientes e das porções foi processada por meio
vascular cerebral, entre outras1,2. do aplicativo Dietsys, versão 4.012. A SM foi definida
O sobrepeso e obesidade na gravidez são acompanhados pela presença de pelo menos três dos seguintes critérios:
de um aumento da incidência de diabetes mellitus gesta- cintura abdominal > 88 cm para mulheres, colesterol
cional (DMG), e este fato, associado aos hábitos alimentares HDL < 50 mg/dL em mulheres, triglicerídeos > 150 mg/dL,
prejudiciais, vem ocasionando um aumento na ocorrência pressão arterial acima de 130/85 mmHg e glicemia de
de DM2 nas mulheres com passado de DMG2,3. Diante do jejum > 100 mg/dL11,12. As pacientes foram estratificadas
exposto, esta pesquisa teve como objetivo principal avaliar em grupos de acordo com o número de fatores de risco para
a relação da frequência de SM, obesidade, intolerância à SM: o primeiro grupo com até 2 componentes da síndrome
glicose e diabetes mellitus tipo 2 com o consumo alimentar e o segundo grupo com 3 ou mais componentes (3 ou mais
habitual atual de macro e micronutrientes em um grupo de componentes definem a SM).
mulheres com DMG prévio.
Análise Estatística
MÉTODO Na análise estatística, primeiramente foi realizada uma
estatística descritiva, representada pela frequência simples,
A casuística do estudo foi composta por 110 pacientes utilizando-se medidas de posição como tendência central e
atendidas no ambulatório de Diabetes Gestacional do de dispersão (média, desvio padrão e porcentagem) quanto
Hospital Universitário Lauro Wanderley – Universidade aos fatores de risco para SM, Obesidade, DM e Pré-diabetes.
Federal da Paraíba, João Pessoa, PB, sob demanda espon- Posteriormente, compararam-se as médias dos dois grupos,
tânea, das quais, 49 completaram todas as etapas do estudo. com e sem SM, quanto ao consumo de macro e micronu-
Foram elegidas as pacientes com idade entre 18 e 45 anos trientes e grupos de alimentos. A comparação entre médias
no período pós-parto, com intervalo mínimo de 6 meses da foi realizada com e sem ajuste para o peso da paciente.
data do parto e máximo de 4 anos.
Como apenas duas das variáveis estudadas seguiram
O estudo foi aprovado pelo comitê de ética em pesquisa a distribuição normal, conforme os testes Shapiro-Wilk,
do hospital sob número CAAE Nº 0211.0.426.126-11 e não foi adequado utilizar o teste paramétrico t, que exige
todas as pacientes assinaram o Termo de Consentimento Livre o pressuposto de normalidade da distribuição, mas, o teste
e Esclarecido. Foram excluídas as pacientes com diabetes não paramétrico de Mann-Whitney como alternativa, para
tipo 2, hepatopatia crônica, insuficiência renal, insuficiência comparação entre as médias dos dois grupos. Adotou-se nível
cardíaca, doença tireoidiana, as que usavam glicocorticoides de significância de 5% (p=0,05) para o teste. Foi utilizado
e as que não realizaram todas as etapas do estudo. o programa estatístico SPSS Statistics 17.0 para análise da
O diagnóstico de diabetes gestacional baseou-se nos comparação entre médias.
critérios do ambulatório4. Foi realizado recrutamento das
pacientes por telefone, de acordo com o banco de dados
RESULTADOS
do ambulatório. Na primeira consulta, foram preenchidas
as fichas clinicas, com dados pessoais, antecedentes fisioló- De um total de 110 pacientes atendidas no ambula-
gicos e patológicos. Ainda nesta consulta, foram realizadas tório de DMG, 62 compareceram à primeira consulta e 49
aferições antropométricas tais como peso e altura para o chegaram ao final do estudo; as demais foram excluídas por
cálculo do índice de massa corporal (IMC) e circunferência da não completarem todas as etapas. As características totais
cintura (CC)5, além da aferição da pressão arterial, e foi ainda da amostra referente aos resultados encontrados foram
preenchido o Questionário Quantitativo de Frequência de apresentadas em grupos, de acordo com a presença ou
Consumo Alimentar (QQFA), validado para a população femi- ausência de SM (Tabela 1).
nina do município6-8, com auxílio de um álbum de desenhos No que se refere ao peso, a maioria das pacientes
de alimentos para uniformização do tamanho das porções9. apresentou sobrepeso (Figura 1). A circunferência abdo-
Nesta primeira consulta, realizou-se, também, a análise minal média estava elevada, e os valores da bioimpe-
do percentual de gordura por meio de bioimpedância dância também estavam acima do preconizado para o
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65
Coutinho MAP et al.

sexo feminino. As pacientes sem SM tiveram um percen- Do total das pacientes, a maioria apresentou valores de
tual de gordura de 34,6% (±4,4%), enquanto as com SM CC acima do normal e de HDL elevado, e menos de 50%
tiveram um percentual de 40% (±5,7%). Quanto à ocor- apresentavam pressão, triglicerídeos e glicemia de jejum
rência de SM, a maior parte da amostra apresentava três elevado. Ao se compararem as médias do consumo de
ou mais fatores de risco associados à mesma (Figura 1). macro e micronutrientes entre os grupos das pacientes com

Tabela 1 – Características das pacientes com e sem síndrome metabólica: comparação entre as médias.
Variáveis Sem síndrome metabólica Com síndrome metabólica p-valor
média (± desvio padrão) média (± desvio padrão)
Idade (anos) 31±5,6 35±5,2 0,15
Pressão Arterial Sistólica (mmHg) 115±11 126±13 0,01
Pressão Arterial Diastólica (mmHg) 76,6±7,6 84,3±99 0,07
Peso (kg) 65±8,3 74±13 0,07
Altura (cm) 158±6,6 156±6,5 0,78
Índice de massa corporal (kg/m2) 25,9±3,0 30,3±4,6 0,23
Circunferência Abdominal (cm) 89,2±8,2 98,3±9,2 0,02
Colesterol Total (mg/dL) 188±32 188±42 0,91
Colesterol LDL (mg/dL) 118±33 111±34 0,23
Colesterol HDL (mg/dL) 50±13 39±7,4 0,03
Triglicerídeos (mg/dL) 102±46 198±157 0,003
Glicemia de Jejum (mg/dL) 91±13 126±58 0,009
Glicepia Pós-prandial (mg/dL) 83,6±15,6 129±71,3 0,006
Hemoglobina Glicosilada (%) 5,82±0,34 6,76±2,42 0,07
Teste Oral de Tolerância à Glicose (mg/dL) 131±28 134±29 0,28
Bioimpedância (% de gordura) 34,6±4,4 39,9±5,72 0,03
Teste de Mann-Whitney (significância p=0,05)

Figura 1 - Estratificação quanto à distribuição do número de fatores de risco para a síndrome metabólica, da ocorrência de pré-diabetes e diabetes da classificação do
índice de massa corporal (IMC).
João Pessoa - PB, Brasil, 2013

BRASPEN J 2018; 33 (1): 64-9


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Síndrome metabólica e diabetes gestacional

e sem SM, não foram encontradas diferenças significativas Quanto aos índices glicêmicos, a maioria das pacientes
entre os grupos, de modo que as composições das dietas apresentou alterações no perfil glicêmico, estando apro-
quanto a calorias totais, proteínas, gorduras totais, carboi- ximadamente metade das pacientes com pré-diabetes
dratos, cálcio, vitamina A, gordura saturada, colesterol, fibras (Figura 1). Não foram encontradas relações do consumo
alimentares, zinco e betacaroteno foram semelhantes. Foram de macro e micronutrientes e grupos alimentares com a
também semelhantes as porções consumidas dos grupos dos ocorrência de DM2 (Tabela 4).
vegetais, de frutas e sucos de frutas e de gorduras, óleos,
doces e salgadinhos (Tabela 2).
DISCUSSÃO
Quando comparado o consumo de nutrientes propor-
cionalmente ao peso, observou-se menor consumo de Do total de pacientes, 49% se enquadravam na defi-
proteínas no grupo que apresentou SM (p=0,05) (Tabela 3). nição de SM com 3 ou mais fatores de risco. Em outros

Tabela 2 – Comparação entre as médias do consumo de macro e micronutrientes e grupos de alimentos das pacientes com e sem síndrome metabólica.
João Pessoa-PB, Brasil, 2013
Grupo sem SM Grupo com SM p-valor
média (± desvio padrão) média (± desvio padrão)
Calorias Totais (kcal) 2266,50 (±691,25) 2259,86 (±813,86) 0,84
Proteínas (g) 92,48 (±37,50) 86,27 (±28,98) 0,67
Gorduras Totais (g) 94,86 (±34,26) 91,22 (±36,58) 0,72
Carboidratos (g) 266,97 (±85,14) 281,72 (±117,13) 0,84
Cálcio (mg) 816,27 (±348,24) 824,03 (±311,08) 0,87
Vitamina A (RE) 3308 (±1984) 3811 (±2763) 0,66
Gordura Saturada (g) 32,06 (±12,14) 31,02 (±12,07) 0,86
Colesterol (mg) 486,62 (±221,24) 472,02 (±267,44) 0,70
Fibras Alimentares (g) 16,18 (±6,75) 18,20 (±7,40) 0,2
Zinco (mg) 12,39 (±7,16) 11,32 (±4,39) 0,95
Betacaroteno (mcg) 12400 (±12927) 12935 (±7754) 0,18
Grupo dos Vegetais (porções) 3,21 (±2,54) 3,60 (±1,90) 0,32
Frutas e sucos de frutas (porções) 2,23 (±1,16) 3,12 (±2,67) 0,20
Gorduras, óleos, salgadinhos (porções) 3,65 (±1,59) 3,27 (±1,81) 0,24
Teste de Mann-Whitney (significância p=0,05)

Tabela 3 – Comparação entre as médias do consumo de macro e micronutrientes proporcionalmente ao peso das pacientes com e sem síndrome meta-
bólica. João Pessoa-PB, Brasil, 2013
Grupo sem SM média Grupo com SM média p-valor
Calorias Totais (kcal) 34,85 (±10,25) 30,22 (±9,26) 0,12
Proteínas (g) 1,41 (±0,52) 1,15 (±0,35) 0,05
Gorduras Totais (g) 1,46 (±0,52) 1,22 (±0,45) 0,07
Carboidratos (g) 4,11 (±1,29) 3,75 (±1,31) 0,17
Cálcio (mg) 12,42 (±4,88) 11,13 (±3,91) 0,38
Vitamina A (RE) 51,67 (±32,11) 11,13 (±3,91) 0,83
Gordura Saturada (g) 0,49 (±0,17) 0,41 (±0,16) 0,14
Colesterol (mg) 7,45 (±3,26) 6,29 (±3,31) 0,25
Fibras Alimentares (g) 0,25 (±0,11) 0,24 (±0,08) 0,78
Zinco (mg) 0,18 (±0,10) 0,15 (±0,04) 0,13
Betacaroteno (mcg) 195,21 (±2,08) 173,31 (±96,5) 0,53
Teste de Mann-Whitney (significância p=0,05)

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Coutinho MAP et al.

Tabela 4 – Comparação entre as médias do consumo de macro e micronutrientes e grupos de alimentos das pacientes com e sem diabetes mellitus.
João Pessoa-PB, Brasil, 2013.
Grupo sem DM média Grupo com DM média p-valor
Calorias Totais (kcal) 2279 (±768) 2180 (±653) 0,957
Proteínas (g) 91,15 (±34,25) 80,67 (±28,96) 0,499
Gorduras Totais (g) 93,46 (±34,79) 91,13 (±39,01) 0,850
Carboidratos (g) 275 (±106) 265 (±69) 0,871
Cálcio (mg) 830 (±319) 764 (±331) 0,499
Vitamina A (RE) 3452 (±2013) 4083 (±3934) 0,808
Gordura Saturada (g) 31,43 (±11,4) 32,16 (±15,55) 0,903
Colesterol (mg) 489 (±243) 429 (±249) 0,589
Fibras Alimentares (g) 16,98 (±7,5) 18,15 (±4,53 ) 0,387
Zinco (mg) 12,34 (±6,23) 9,45 (±3,43) 0,199
Betacaroteno (mcg) 12653 (±11346) 12716 (±5945) 0,482
Grupo dos Vegetais (porções) 3,3 (±2,1) 3,7 (±2,6) 0,903
Frutas e sucos de frutas e sucos de frutas 2,6 (±2,1) 2,9 (±1,4) 0,213
Gorduras, óleos, doces e salgadinhos (porções) 3,5 (±1,6) 3,0 (±1,8) 0,365
Teste de Mann-Whitney (significância p=0,05)

estudos nos quais se investigou SM após DMG, a frequência insulina e história familiar de diabetes, bem como a níveis
foi de 7,9% nas mulheres chinesas13, 16% na Finlândia, de elevados de TG, hemoglobina glicada e consumo energético
acordo com os critérios do ATP III14. No presente estudo, a aumentado19. Dados semelhantes foram observados, como
prevalência foi elevada e se aproximou da Índia, de 60% nas o aumento do IMC pré-gestacional e o diagnóstico de DMG
pacientes com antecedentes de DMG prévio, nas mulheres foi o maior fator de risco para o desenvolvimento de SM no
sadias essa prevalência foi de 26%15, e foi semelhante aos período pós-parto20; especialmente nos casos de sobrepeso
resultados encontrados por Puhkala et al.16 em que após e obesidade associados com DMG precoce.
sete anos da gestação com ocorrência de DMG, 50% das No presente estudo, apenas 27% das pacientes estavam
mulheres monitoradas desenvolveram SM, corroborando com dentro da faixa normal do IMC, 45% estavam com sobrepeso
o relato de que obesidade e alterações metabólicas estão se e 28% na faixa de obesidade, contudo, não foram encon-
tornando doenças de países em desenvolvimento. tradas diferenças significativas quanto ao consumo total de
Quanto aos fatores de risco da SM, uma proporção elevada macro e micronutrientes entre os grupos das pacientes com
das pacientes apresentou alteração da PA (30,6%), da CC e sem SM. Mulheres com história de DMG relatam ingestões
(73,4%), HDL, triglicerídeos e GJ (65%, 28,5% e 42,8%, respec- dietéticas significativamente mais altas de calorias, proteína e
tivamente)17. Comparando-se esses resultados com um estudo gordura, com nenhum aumento correspondente no consumo
realizado na Finlândia, essas frequências foram semelhantes de fibra dietética ou minerais e vitaminas21.
para o aumento da CC (≥ 80 cm em 72% das pacientes), infe- Consequentemente, o aumento do consumo calórico e
rior para GJ elevada (≥ 5,6 mmol / L em 19%), e bem inferior alimentar de mulheres com DMG anterior está associado
para redução do colesterol HDL (≤ 1,3 mmol/L em 50%)16. com obesidade, resistência à insulina e pressões arteriais
A média da glicemia de jejum e da hemoglobina glicada mais elevadas, fatores relacionados a SM. Observou-se que
estava acima dos limites considerados normais5, e 65% o consumo de calorias totais, proteínas, gorduras totais,
das pacientes apresentavam alterações do perfil glicêmico, carboidratos, cálcio, vitamina A, gordura saturada, colesterol,
aproximadamente metade com pré-diabetes (49%) e 16% fibras alimentares, zinco e betacaroteno foram semelhantes.
com diabetes franco. Merabet & Reguig20 observaram que a estimativa da
Esses resultados corroboram com o estudo realizado no ingestão de alimentos apresentou um desequilíbrio qualita-
EUA, em que 5 a 10% das mulheres já apresentavam DM2 tivo, a ingestão proteica foi de 19,65% nas mulheres repre-
imediatamente após a gestação e 35 a 60% com chance sentadas principalmente por proteínas vegetais, a ingestão de
de apresentarem DM2 nos próximos 10 a 20 anos18. Em lipídios foi caracterizada por um menor consumo de ácidos
mulheres com antecedentes de DMG, a ocorrência de graxos monoinsaturados e poli-insaturados, aumento no
DM2 também parece estar relacionada ao IMC elevado, consumo de ácidos graxos saturados e menor concentração
a alterações na função das células beta e na dosagem de em cálcio, magnésio e em fibras.
BRASPEN J 2018; 33 (1): 64-9
68
Síndrome metabólica e diabetes gestacional

Na pesquisa de associação entre o consumo de nutrientes, 7. Lima FELL, Slater B, Latorre MRDO, Fisberg RM. Validade de
um questionário quantitativo de frequência alimentar desenvol-
quando ajustado ao peso das pacientes, observou-se maior vido para população feminina no nordeste do Brasil. Rev Bras
ingestão de proteínas nas mulheres sem SM. Caracterizando Epidemiol. 2007;10(4):483-90.
ação protetora da proteína e refletindo na menor ocorrência 8. Lima FELL, Latorres MRDO, Costa MJC, Fisberg RM. Diet and
cancer in Northeastern Brazil: evaluation of food and food group
dessa síndrome. Foi demonstrado que a ingestão de proteína consumption in relation to breast cancer. Cad Saúde Pública.
de origem vegetal foi inversamente associada à incidência 2008;24(4):820-8.
de SM e positivamente correlacionada com a ingestão de 9. Asciutti LSR, Rivera MAA, Costa MJC, Imperiano E, Arruda
MS, Bandeira MG, et al. Manual de porções média em tamanho
fibra, vitaminas E e C, o que pode explicar efeitos benéficos real: baseado no programa Dietsys. João Pessoa: UFPB; 2005.
na prevenção de doenças crônicas22. 10. Maltron. Operating Manual BF-907. Rayleigh: Maltron Interna-
tional; 1998.
No entanto, o consumo mais elevado de proteína animal 11. Expert Panel on Detection, Evaluation, and Treatment of High
pode ser independentemente associado a um maior risco de Blood Cholesterol in Adults. Executive Summary of The Third
Report of The National Cholesterol Education Program (NCEP)
incidência de SM. Não houve relação entre SM e a quan- Expert Panel on Detection, Evaluation, And Treatment of High
tidade de porções consumidas dos grupos dos vegetais, Blood Cholesterol In Adults (Adult Treatment Panel III). JAMA.
das frutas e sucos de frutas e das gorduras, óleos, doces e 2001;285(19):2486-97.
12. Grundy SM, Cleeman JI, Daniels SR, Donato KA, Eckel RH,
salgadinhos. Faz-se pertinente mencionar que este estudo é Franklin BA, et al.; American Heart Association; National Heart,
inédito no Brasil no que se refere ao seu objetivo. Lung, and Blood Institute. Diagnosis and management of the
metabolic syndrome: an American Heart Association/National
Heart, Lung, and Blood Institute Scientific Statement. Circula-
tion. 2005;112(17):2735-52.
CONCLUSÃO 13. Tam WH, Yang XL, Chan JC, Ko GT, Tong PC, Ma RC, et al.
Progression to impaired glucose regulation, diabetes and meta-
Constatou-se frequência bastante elevada de SM em bolic syndrome in Chinese women with a past history of gesta-
mulheres com diagnóstico de DMG prévio e também tional diabetes. Diabetes Metab Res Rev. 2007;23(6):485-9.
de alterações no perfil glicêmico, obesidade e diabetes 14. Puhkala J, Kinnunen TI, Vasankari T, Kukkonen-Harjula K,
Raitanen J, Luoto R. Prevalence of metabolic syndrome one
mellitus, corroborando com a hipótese de que o número year after delivery in Finnish women at increased risk for
de casos de obesidade e de alterações metabólicas está gestational diabetes mellitus during pregnancy. J Pregnancy.
ultrapassando em muito a desnutrição nas populações 2013;2013:139049.
15. Krishnaveni GV, Hill JC, Veena SR, Geetha S, Jayakumar MN,
de países em desenvolvimento. Neste estudo observou- Karat CL, et al. Gestational diabetes and the incidence of diabetes
se associação inversa entre a ingestão de proteínas e a in the 5 years following the index pregnancy in South Indian
women. Diabetes Res Clin Pract. 2007;78(3):398-404.
ocorrência de SM quando se avaliou a ingestão de macro 16. Puhkala J, Raitanen J, Kolu P, Tuominen P, Husu P, Luoto R.
e micronutrientes ajustada ao peso, indicando efeito Metabolic syndrome in Finnish women 7 years after a gestational
protetor da proteína para essa síndrome. Mais estudos diabetes prevention trial. BMJ Open. 2017;7(3):e014565.
17. Rice MM, Landon MB, Varner MW, Casey BM, Reddy UM,
são necessários, com número maior de participantes, para Wapner RJ, et al.; Eunice Kennedy Shriver National Institute
confirmação deste resultado. of Child Health and Human Development (NICHD) Maternal-
Fetal Medicine Units Network (MFMU). Pregnancy-associated
hypertension in glucose-intolerant pregnancy and subsequent
metabolic syndrome. Obstet Gynecol. 2016;127(4):771-9.
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excessive gestational weight gain, adverse pregnancy prevent type 2 diabetes in women with a history of gestational
outcomes, and future metabolic syndrome. Semin Perinatol. diabetes. BMC Pregnancy Childbirth. 2011;11:23.
20. Merabet DH, Reguig KB. Nutritional and metabolic profile in
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3. Hakkarainen H, Huopio H, Cederberg H, Pääkkönen M, Vouti- Food Nutr Sci. 2016;7(3):155-62. DOI: 10.4236/fns.2016.73017
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Cancer Institute; 1988. Nutr. 2017;36(6):1540-8.

Local de realização do trabalho: Hospital Universitário Lauro Wanderley / Universidade Federal da Paraíba (UFPB), João Pessoa, PB, Brasil.
Conflito de interesse: Os autores declaram não haver.

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A Artigo Original
Gentil MS et al.

Relação entre gordura corporal e maturação


sexual de adolescentes
Relationship between body fat and sexual maturation of adolescents

RESUMO
Milena Silva Gentil1
Carolina Cunha de Oliveira2 Introdução: O excesso de peso é um problema de saúde crescente no púbico adolescente,
Heloisa Mendonça Bernini Soares da Silva3 principalmente na puberdade, sendo um importante fator de risco para o desenvolvimento de
doenças, assim como na idade adulta. Diante disso, a avaliação do estado nutricional, da compo-
sição corporal e da maturação sexual são indispensáveis na investigação do estado de saúde de
adolescentes. Objetivo: Analisar a associação entre estado nutricional, composição corporal e
maturação sexual em adolescentes. Método: Trata-se de um estudo transversal, conduzido com
185 adolescentes de 10 a 15 anos de idade, de uma escola pública de Lagarto-SE. Avaliaram-se
o peso corporal e a altura para o cálculo do Índice de Massa Corporal (IMC), as dobras cutâneas
tricipital e subescapular, visando estimar o percentual de gordura corporal (%GC), a circunferência
da cintura e o estágio de maturação sexual. Para análise dos dados, foram utilizados estatística
descritiva, teste Qui-quadrado e regressão linear múltipla. Resultados: A prevalência de excesso de
peso foi de 23,3%, sendo superior entre o sexo feminino (26,4%). Quanto à composição corporal,
66,5% dos adolescentes apresentaram elevado %GC, também superior entre meninas (82,1%;
p<0,001). Além disso, verificou-se associação entre excesso de peso com excesso de gordura
corporal e obesidade abdominal (p<0,001). Observou-se que o %GC sofreu maior influência
do IMC e idade entre os meninos e do IMC e estágio maturacional entre as meninas (p<0,001).
Ao relacionar o estado nutricional e a maturação sexual, 48,8% dos indivíduos com excesso de
peso estavam no pico de velocidade de crescimento. Conclusões: A puberdade exerce influência
significativa na composição corporal de adolescentes, sendo imprescindível sua avaliação durante
o atendimento nutricional, principalmente no sexo feminino, em virtude da notável associação
entre estágio final de maturação sexual e excesso de peso.

ABSTRACT
Introduction: The excess weight is a health problem growing among adolescent pubic, especially
Unitermos: at puberty, being an important risk factor for the development of diseases, as well as adulthood.
Adolescente. Composição Corporal. Puberdade. Therefore, the evaluation of nutritional status, body composition and sexual maturation are
Tecido Adiposo. Estado Nutricional. indispensable at the investigation of the health status of adolescents. Objective: Analyze the
association between nutritional status, body composition and sexual maturation in adolescents.
Keywords: Methods: This is a cross-sectional study, conducted with 185 adolescents aged 10 to 15 years,
Adolescent. Body Composition. Puberty. Adipose from a public school at Lagarto-SE. The anthropometric evaluation included weight and height
Tissue. Nutritional Status. for the calculation of the Body Mass Index (BMI); tricipital and subscapular skinfolds, aiming to
estimate the percentage of body fat (%BF); waist circumference; and stage of sexual maturation.
Endereço para correspondência:
Descriptive statistics, Chi-square test and multiple linear regression were used for data analysis.
Carolina Cunha de Oliveira
Av. Universitária Governador Marcelo Déda Chagas, Results: The prevalence of excess weight was 23.3%, being higher among girls (26.4%). Regarding
13 –São José, Lagarto, SE, Brasil–CEP: 49400-000 body composition, 66.5% of adolescents presented a high %BF, also higher among girls (82.1%,
E-mail: carol_cunh@yahoo.com.br p<0.001). Besides that, there were an association between excess weight with excess GC and
abdominal obesity (p<0.001). It was observed that the %BF had a greater influence of BMI and
Submissão: age among boys and BMI and maturational stage among girls (p<0.001). When relating nutri-
5 de setembro de 2017 tional status and sexual maturation, 48.8% of excess weight individuals were at peak of growth
velocity. Conclusions: The puberty exerts a significant influence on the body composition of the
Aceito para publicação: adolescents, and it is evaluation during nutritional care is essential, especially in females, due to
22 de novembro de 2017 the remarkable association between the final stage of sexual maturation and overweight.

1. Pós-graduanda em Nutrição Clínica pela Universidade Estácio de Sá. Nutricionista graduada pela Universidade Federal de Sergipe – Campus
Universitário Professor Antônio Garcia Filho, Lagarto, SE, Brasil.
2. Doutora em Medicina e Saúde pela Universidade Federal da Bahia. Professora da Universidade Federal de Sergipe – Campus Universitário
Professor Antônio Garcia Filho – Departamento de Nutrição, Lagarto, SE, Brasil.
3. Mestranda em Ciências Aplicadas à Saúde pela Universidade Federal de Sergipe.Nutricionista graduada pela Universidade Federal de Sergipe
– Campus Universitário Professor Antônio Garcia Filho, Lagarto, SE, Brasil.

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70
Gordura corporal e maturação sexual de adolescentes

INTRODUÇÃO Para a coleta dos dados, utilizou-se um questionário


O sobrepeso e a obesidade são problemas de saúde padronizado e pré-codificado, aplicado por equipe devida-
crescentes na população hebiátrica no decorrer dos anos. Os mente treinada e supervisionada, o qual continha questões
referentes às características sociodemográficas, antropomé-
indivíduos com excesso de peso apresentam maior risco de
tricas e maturacionais.
desenvolver diabetes, dislipidemia, doenças cardiovasculares,
percepção negativa da qualidade de vida e risco aumentado As medidas antropométricas foram mensuradas
de morbimortalidade na idade adulta1. segundo técnicas recomendadas por Lohman et al.5 O
peso corporal (kg) e a altura (m) foram verificados com
Diante disso, a avaliação do estado nutricional e da
o auxílio de balança digital portátil (marca Filizola®) e de
composição corporal são temas indispensáveis na investi-
estadiômetro portátil (marca SECA ®), respectivamente.
gação do estado de saúde de adolescentes. Dentre os indi-
O IMC (peso/altura²) foi analisado pelo indicador IMC/
cadores utilizados, o Índice de Massa Corporal (IMC) avalia
idade, e o estado nutricional classificado em percentil (P),
a massa corporal total, sendo o mais utilizado na prática
sendo: magreza (IMC/I < P3), adequado (IMC/I ≥ P3
clínica. Todavia, não fornece informações sobre a gordura
e < P85), sobrepeso (IMC/I ≥ 85 e ≤ 97) e obesidade
corporal (GC), especialmente em crianças e adolescentes, em
(IMC/I > P97)6.
função da maturação biológica. Em contrapartida, a espes-
sura das dobras cutâneas (DC) tem sido considerada mais A CC (cm) foi aferida utilizando-se fita inelástica e flexível
fidedigna em predizer a GC, em razão da sua capacidade de Cescorf®e classificada conforme proposto por Taylor et al.7,
estimar a gordura subcutânea. Outro importante indicador que estabeleceram o P80 como ponto de corte para identi-
é a circunferência da cintura (CC), que se relaciona mais ficar excesso de gordura na região abdominal.
precisamente à gordura visceral do que à GCT2. A composição corporal foi avaliada através das
Durante a puberdade, surgem variações no percentual dobras cutâneas tricipital (DCT) e subescapular (DCSE)
de GC (%GC), ocorrendo diferenças na composição e distri- (mm), utilizando adipômetro Lange®. Para a determinação
buição da GC entre os sexos, devido à ação de hormônios do %GC foram utilizadas as equações de Slaughter et al.8.
que induzem um dimorfismo sexual acentuado, com os O %GC foi classificado, segundo o sexo em: meninos –
meninos apresentando maior ganho de massa muscular em baixo (< 11%), ótimo (≥ 11% e < 21%) e alto (≥ 21%);
relação ao ganho de massa gorda e as meninas apresen- meninas – baixo (< 16%), ótimo (≥ 16% e < 26%) e
tando maior ganho de massa gorda, naturalmente decorrente alto (≥ 26%) 9.
do desenvolvimento sexual e reprodutivo1. Para o estadiamento puberal seguiu-se o protocolo de
Em virtude da alta prevalência de excesso de peso na autoavaliação descrito por Tanner10. Os estágios de matu-
adolescência, verificada em pesquisas como a Pesquisa de ração sexual foram classificados em estágio 1: pré-púbere;
Orçamentos Familiares (POF)3 (20,5%) e a Pesquisa Nacional estágio 2: púbere inicial; estágio 3: pico da velocidade de
de Saúde do Escolar (PeNSE)4 (23,7%), e sua associação crescimento (PVC)10.
com morbidades na fase adulta, justifica-se a realização de Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em
estudos que avaliem o estado nutricional e a composição Pesquisa da Universidade Federal de Sergipe (UFS), parecer
corporal de adolescentes brasileiros, bem como os fatores nº 745.543/2014. A participação no estudo foi em caráter
intrínsecos que interferem na manutenção de um estado voluntário, mediante assinatura ou impressão digital do
nutricional adequado. responsável pelo adolescente no Termo de Consentimento
Ademais, não existem pesquisas que abordem tais fenô- Livre e Esclarecido (TCLE).
menos e influências em adolescentes no município de Lagarto, As análises estatísticas foram realizadas com o auxílio
assim como no estado de Sergipe, tornando-se imprescindível do programa Statistical Package for the Social Science
essa investigação. Desse modo, o presente estudo objetivou (SPSS), versão 20.0. No sentido de caracterizar a popu-
analisar a associação entre estado nutricional, composição lação estudada, as variáveis foram expressas por meio
corporal e maturação sexual em adolescentes. de análise descritiva dos dados. Para verificar a presença
de associação entre as variáveis, aplicou-se o teste Qui-
quadrado de Pearson. Foram determinados modelos de
MÉTODO
regressão linear múltipla ajustados por sexo para avaliar
Trata-se de um estudo de caráter transversal, compreen- a relação do IMC, idade e estágio maturacional na esti-
dendo uma amostra por conveniência de 185 adolescentes, mativa de excesso de GC. Foram incluídos no modelo
de ambos os sexos, com faixa etária entre 10 e 15 anos, múltiplo variáveis com p<0,20 por meio do stepwise
estudantes de uma escola da rede pública municipal de forward. Para todos os testes, foi considerado nível de
ensino, da zona urbana de Lagarto-SE. significância de 5%.
BRASPEN J 2018; 33 (1): 70-5
71
Gentil MS et al.

RESULTADOS Quanto à composição corporal, 66,5% dos adoles-


Os resultados obtidos da amostra indicam maior preva- centes apresentaram elevado %GC, sendo mais prevalente
lência de eutrofia (73,5%), seguida por excesso de peso entre o sexo feminino (82,1%; p<0,001). O acúmulo de
(23,3%). Ao comparar os sexos, observou-se que as meninas gordura abdominal foi verificado em 15,1% dos adoles-
apresentaram maior percentual de sobrepeso (21,7%), centes, mostrando-se também superior entre as meninas
enquanto nos meninos a obesidade foi mais predominante (17,9%) (Figura 1). O excesso de peso apresentou asso-
(7,6%)(p=0,166) (Tabela 1). De modo geral, as meninas ciações estatisticamente significantes com o excesso de
apresentaram maior percentual de excesso de peso (26,4%) gordura corporal e a obesidade abdominal (p<0,001)
do que os meninos (19,0%) (Figura 1). (Tabela 2).

Tabela 1 – Estado nutricional, composição corporal e maturação sexual de adolescentes residentes em Lagarto, SE, 2017.
Variáveis Total Masculino Feminino p
(n=185) (n=79) (n=106)
n (%) n (%) n (%)
IMC/Idade
Magreza 6 (3,2) 1 (1,3) 5 (4,7)
Eutrofia 136 (73,5) 63 (79,7) 73 (68,9) 0,166
Sobrepeso 32 (17,3) 9 (11,4) 23 (21,7)
Obesidade 11 (6,0) 6 (7,6) 5 (4,7)
% GC
Baixo 8 (4,3) 8 (10,1) –
Ótimo 54 (29,2) 35 (44,3) 19 (17,9) <0,001
Elevado 123 (66,5) 36 (45,6) 87 (82,1)
CC
Adequada 157 (84,9) 70 (88,6) 87 (82,1) 0,220
Obesidade abdominal 28 (15,1) 9 (11,4) 19 (17,9)
Estágio maturacional
Pré-púbere 36 (19,5) 32 (40,5) 4 (3,8)
Púbere inicial 80 (43,2) 38 (48,1) 42 (39,6) <0,001
PVC 69 (37,3) 9 (11,4) 60 (56,6)
IMC=Índice de Massa Corporal; % GC=percentual de gordura corporal; CC=circunferência da cintura; PVC=pico de velocidade de crescimento.

Figura 1 - Dimorfismo sexual nos percentuais de excesso de peso, excesso de GC e obesidade abdominal de adolescentes residentes em Lagarto, SE, 2017.
GC=gordura corporal

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72
Gordura corporal e maturação sexual de adolescentes

Tabela 2 – Correlação entre estado nutricional e as variáveis %GC, CC e estágio maturacional de adolescentes residentes em Lagarto, SE, 2017.
Variáveis Sem excesso de peso Excesso de peso p
(n=142) (n=43)
n (%) n (%)
%GC
Sem excesso 61 (43) 1 (2,3) <0,001
Excesso 81 (57) 42 (97,7)
CC
Adequada 141 (99,3) 16 (37,2) <0,001
Obesidade abdominal 1 (0,7) 27 (62,8)
Estágio maturacional
Pré-púbere 29 (20,4) 7 (16,3)
Púbere inicial 65 (45,8) 15 (34,9) 0,202
PVC 48 (33,8) 21 (48,8)
Masculino
Pré-púbere 25 (39,1) 7 (46,7)
Púbere inicial 32 (50,0) 6 (40) 0,784
PVC 7 (10,9) 2 (13,3)
Feminino
Pré-púbere 4 (5,1) –
Púbere inicial 33 (42,3) 9 (32,1) 0,244
PVC 41 (52,6) 19 (67,9)
% GC=percentual de gordura corporal; CC=circunferência da cintura; PVC=pico de velocidade de cresci-mento

Tabela 3 – Contribuição das variáveis IMC, idade e estágio maturacional no %GC de adolescentes residentes em Lagarto, SE, 2017.
Modelo de ordem de entrada Gordura corporal
das variáveis β R R² p
Masculino
Modelo 1 0,772 59,7 <0,001
Constante -21,789
IMC 2,267
Modelo 2 0,840 70,6 <0,001
Constante 3,852
IMC 2,375
Idade -2,119
Feminino
Modelo 1 0,631 39,8 <0,001
Constante 5,650
IMC 1,134
Modelo 2 0,650 42,3 <0,001
Constante 3,060
IMC 1,023
Estágio maturacional 1,897
IMC=Índice de Massa Corporal; % GC=percentual de gordura corporal

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73
Gentil MS et al.

Dados obtidos sobre o estágio maturacional revelam que puberdade ocorre um rápido aumento da GCT, entretanto,
48,1% dos meninos se consideravam no estágio maturacional o %GC aumenta mais lentamente no sexo masculino como
púbere inicial e 56,6% das meninas no estágio púbere no PVC resultado do aumento simultâneo na massa livre de gordura,
(Tabela 1). Dos indivíduos com excesso de peso, 48,8% foram influenciado principalmente pela testosterona, enquanto as
classificados como púberes no PVC. A maioria das meninas com meninas apresentam maior tendência em acumular GC.
excesso de peso considerou-se púbere no PVC (67,9%), enquanto Apesar disso, em ambos os sexos, é necessário que haja um
a maior parte dos meninos com excesso de peso referiram estágio determinado depósito de gordura para que ocorra o estirão
maturacional pré-púbere (46,7%) (Tabela 2). do crescimento16,17.
Conforme demonstrado na análise de regressão linear No Estudo Longitudinal Fels 17, foram retratadas as
múltipla, que visou determinar a capacidade das variáveis diferenças de composição corporal na puberdade: para o
em explicar o %GC dos adolescentes, constata-se que, para sexo feminino, os níveis de GCT aumentaram em uma taxa
o sexo masculino, o modelo 2 foi capaz de explicar em até relativamente constante com média de, aproximadamente,
70,6% a variabilidade do acúmulo de GC, indicando que 5,5 kg aos 8 anos de idade e 15 kg aos 16 anos, após o
ao elevar o IMC obtém-se acréscimo no %GC, ajustado pela qual a taxa de crescimento diminuiu consideravelmente;
idade (p<0,001). Para o sexo feminino, o modelo com IMC para o sexo masculino, houve aumento da GCT com média
e estágio maturacional obteve maior percentual de carac- de, aproximadamente, 5 kg aos 8 anos para 11 kg aos 14
terização da variabilidade da GC (42,3%), sugerindo que anos, decrescendo para 9 kg aos 16 anos e, posteriormente,
o aumento do IMC e do estágio de maturação sexual pode estabilizou-se.
exercer influência no acréscimo de GC (p<0,001) (Tabela 3). Nessa perspectiva, Cintra et al.1 verificaram que, entre os
indivíduos de 12 a 15 anos, o %GC foi significativamente
DISCUSSÃO maior nas meninas (p<0,001). Concordando com esse
resultado, Pelegrine et al.18 demonstraram que as meninas
Foram constatadas elevadas prevalências de excesso
apresentaram médias mais elevadas do somatório de duas
de peso e GC, especialmente no sexo feminino. O excesso
DC e %GC (p<0,05), assim como outros autores11,19,20. Em
de GC se relacionou de maneira diferente entre os sexos e
relação ao acúmulo de gordura abdominal, alguns estudos
estágio maturacional, com as meninas apresentando maior
também observaram percentual de obesidade abdominal
predominância durante o estágio púbere no PVC, e os
maior em meninas, o que os autores atribuíram ao consumo
meninos no período pré-púbere.
alimentar e ao estilo de vida11,21,22.
A prevalência de excesso de peso observada no presente
Considerando as informações apresentadas e que parte
estudo revelou-se semelhante às apresentadas na PeNSE4
dos eventos puberais não se relaciona à idade cronológica,
(23,7%) e na POF3 (20,5%) e nas investigações de Gordia et
considera-se fundamental a classificação do estágio matu-
al.11 (25%), em Lapa-PR, Toral et al.12 (21%), em Piracicaba-
SP, e Pinto et al.13 (20,4%), em Recife-PE. Além disso, maior racional, visando à interpretação e à correlação entre os
percentual de excesso de peso entre o sexo feminino também diversos fenômenos da puberdade, o estado nutricional e a
foi constatado por alguns autores3,13,14. Contrariando esses composição corporal de adolescentes.
resultados, a POF3 (21,5%), Ribeiro et al.15 (30,9%) e Gordia Além disso, constatamos que as meninas apresentaram
et al.11 (31,6%) revelaram que o excesso de peso esteve mais maior percentual de excesso de peso durante o PVC,
presente entre o sexo masculino, contudo, esse achado pode enquanto os meninos apresentaram no período pré-púbere.
não estar diretamente relacionado ao excesso de GC, mas ao Nos meninos, verificou-se que, quanto maior era o IMC,
excesso de massa magra, que também aumenta rapidamente maior era o %GC, corrigido pela idade; e nas meninas notou-
entre meninos na puberdade11. se que quanto maior eram o IMC e o estágio maturacional,
Nosso estudo observou associação entre excesso de peso maior era o %GC.
e excesso de GC (p<0,001). Tais resultados estão relacio- Frignani et al.23 verificaram que, entre os estágios de matu-
nados ao processo de maturação sexual, no qual ocorrem ração sexual, os meninos pré-púberes apresentaram %GC e
mudanças no padrão de secreção de alguns hormônios, índice de adiposidade corporal mais elevados, enquanto as
em virtude da ativação do eixo hipotalâmico-hipofisário- meninas nos estágios mais avançados de maturação sexual
gonadal, que desencadeia a secreção de esteroides sexuais, apresentaram maiores médias de GC e índice de adiposidade.
principalmente a testosterona nos meninos e o estradiol nas Em estudo transversal, Minatto et al.19 observaram que o
meninas, provocando alterações na distribuição e no %GC %GC apresentou-se maior em meninos pré-púberes (25,1%),
e na concentração de massa magra16. enquanto as meninas aumentaram o %GC no decorrer do
Ademais, as meninas apresentaram maior %GC avanço dos estágios de maturação sexual; no entanto, não
(p<0,001) e obesidade abdominal. No decurso da houve diferença estatística entre os estágios no sexo feminino.
BRASPEN J 2018; 33 (1): 70-5
74
Gordura corporal e maturação sexual de adolescentes

Corroborando aos resultados, Cintra et al.1 observaram 5. Lohman TG, Roche AF, Martorell R. Anthropometric standardiza-
tion reference manual. Champaign: Human Kinetics books; 1998.
que meninos púberes e pós-púberes apresentaram menor 6. World Health Organization - WHO. Multicentre Growth Refe-
%GC do que as meninas nos mesmos estágios maturacionais rence Study Group. Length/height-for-age, weight-for-age,
(p<0,001). Os autores encontraram diferença significativa weight-for-length, weight-for-height and body mass index-for-
age. Geneva: World Health Organization; 2006.
no %GC relacionado à maturação sexual apenas entre as 7. Taylor RW, Jones IE, Williams SM, Goulding A. Evaluation of
meninas, que manifestaram aumento da GC com o avanço waist circumference, waist-to-hipratio, and the conicityindex
do desenvolvimento puberal. as screening tools for high trunk fat mass, as measured by dual
energyX-ray absorptiometry, in children aged 3-19y. Am J Clin
Na investigação de Ribeiro et al. 15, realizada com Nutr. 2000;72(2):490-5.
escolares de 10 a 15 anos, constatou-se que houve maior 8. Slaughter MH, Lohman TG, Boileau RA, Horswill CA, Stillman
RJ, Van Loan MD, et al. Skinfold equations for estimation of body
presença de sobrepeso nos meninos no estágio pré-púbere fatness in children and youth. Hum Biol. 1988;60(5):709-23.
(30,5%) e no início do processo de maturação. Pinto et al.13 9. Lohman TG. The use of skinfold to estimate body fatness on chil-
encontraram que o excesso de peso foi mais prevalente nos dren and youth. J Phys Educ Recreat Dance.1987;58(9):98-103.
10. Tanner J. Growth at adolescence. 2nd ed. Oxford: Blackwell
estágios finais de maturação sexual, especialmente entre as Scientific Publications; 1962.
meninas (p<0,05). 11. Gordia AP, Quadros TMB, Campos W. Avaliação do excesso de
gordura corporal em adolescentes: utilização de diferentes indi-
A impossibilidade de utilização das equações para cadores antropométricos. Acta Sci Health Sci. 2011;33(1):51-7.
predizer o %GC dos meninos de cor de pele não branca 12. Toral N, Slater B, Silva MV. Consumo alimentar e excesso
e de avaliar a presença de puberdade precoce, devido à de peso de adolescentes de Piracicaba, São Paulo. Rev Nutr.
2007;20(5):449-59.
ausência de informações sobre esses aspectos no banco de 13. Pinto ICS, Arruda IKG, Diniz AS, Cavalcanti AMTS. Prevalência
dados, foram algumas limitações desse estudo. de excesso de peso e obesidade abdominal, segundo parâmetros
antropométricos, e associação com maturação sexual em adoles-
centes escolares. Cad Saúde Pública. 2010;26(9):1727-37.
CONCLUSÕES 14. Oliveira JR, Frutuoso MFP, Gambardella AMD. Associação entre
maturação sexual, excesso de peso e adiposidade central em
Constatou-se elevada prevalência de excesso de peso, em crianças e adolescentes de duas escolas de São Paulo. J Hum
Growth Dev. 2014;24(2):201-7.
virtude do excesso de GC, com acúmulo de gordura abdominal, 15. Ribeiro J, Santos P, Duarte J, Mota J. Association between
principalmente entre as meninas. Evidencia-se que a puber- overweight and early sexual maturation in Portuguese boys and
dade exerce influência significativa na composição corporal girls. Ann Hum Biol. 2006;33(1):55-63.
16. Barbosa KBF, Franceschini SCC, Priore SE. Influência dos está-
de adolescentes, sendo imprescindível sua avaliação durante o gios de maturação sexual no estado nutricional, antropometria
atendimento nutricional, especialmente entre o sexo feminino, e composição corporal de adolescentes. Rev Bras Saúde Mater
Infant. 2006;6(4):375-82.
visto a notável associação entre estágio final de maturação 17. Siervogel RM, Demerath EW, Schubert C, Remsberg KE,
sexual e excesso de peso. Este estudo apresenta uma impor- Chumlea WC, Sun S, et al. Puberty and body composition. Horm
tante contribuição para a compreensão das características do Res. 2003;60(Suppl 1):36-45.
18. Pelegrine A, Silva DAS, Silva JMFL, Grigollo L, Petroski
excesso de peso em adolescentes, fornecendo subsídios para EL. Indicadores antropométricos de obesidade na predição de
a formulação de estratégias de prevenção da obesidade e de gordura corporal elevada em adolescentes. Rev Paul Pediatr.
complicações associadas, inclusive na fase adulta. 2015;33(1):56-62.
19. Minatto G, Petroski El, Silva DAS. Gordura corporal, aptidão
muscular e cardiorrespiratória segundo a maturação sexual em
adolescentes brasileiros de uma cidade de colonização germâ-
REFERÊNCIAS nica. Rev Paul Pediatr. 2013;31(2):189-97.
1. Cintra IP, Ferrari GL, Soares AC, Passos MA, Fisberg M, Vitalle 20. Oliveira PM, Silva FA, Oliveira RMS, Mendes LL, Pereira Netto
MS. Body fat percentiles of Brazilian adolescents according to M, Cândido APC. Associação entre índice de massa de gordura
age and sexual maturation: a cross-sectional study. BMC Pediatr. e índice de massa livre de gordura e risco cardiovascular em
2013;13:96. adolescentes. Rev Paul Pediatr. 2016;34(1):30-7.
2. Kriemler S, Puder J, Zahner L, Roth R, Meyer U, Bedogni 21. Castro JAC, Nunes HEG, Silva DAS. Prevalência de obesidade
G.Estimation of percentage-body fat in 6- to 13-year-old chil- abdominal em adolescentes: associação entre fatores sociodemo-
dren by skinfold thickness, body mass index and waist circumfe- gráficos e estilo de vida. Rev Paul Pediatr. 2016;34(3):343-51.
rence. Br J Nutr. 2010;104(10):1565-72. 22. Cavalcanti CBS, Barros MVG, Menêses AL, Santos CM, Azevedo
3. Brasil. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE. AMP, Guimarães FJSP. Obesidade abdominal em adolescentes:
Pesquisa de Orçamentos Familiares – POF 2008-2009. Antro- prevalência e associação com atividade física e hábitos alimen-
pometria e estado nutricional de crianças, adolescentes e adultos tares.Arq Bras Cardiol. 2010;94(3):371-77.
no Brasil. Rio de Janeiro: IBGE; 2010. 23. Frignani RR, Passos MAZ, Ferrari GLM, Niskier SR, Fisberg M,
4. Brasil. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE. Pesquisa Cintra IP. Curvas de referência do índice de adiposidade corporal
Nacional de Saúde do Escolar – PeNSE 2015. Coordenação de Popu- de adolescentes e sua relação com variáveis antropométricas. J
lação e Indicadores Sociais. Rio de Janeiro: IBGE; 2016. Pediatr. 2015;91(3):248-55.

Local de realização do trabalho: Universidade Federal de Sergipe – Campus Universitário Professor Antônio Garcia Filho, Aracaju, SE, Brasil.

Conflito de interesse: Os autores declaram não haver.


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A Artigo Original
Santos TBM & Freitas BJSA

Adesão ao tratamento dietético em portadores de


diabetes mellitus assistidos pela estratégia saúde
da família
Adherence to dietary treatment in patients with diabetes mellitus assisted by family health strategy

RESUMO
Tallita Barbosa Monteiro dos Santos1
Betânia de Jesus e Silva de Almendra Freitas2 Objetivo: Avaliar a adesão ao tratamento dietético em portadores de diabetes mellitus assistidos
pela estratégia saúde da família, verificando a existência de associação entre o tipo de diabetes
mellitus e as práticas alimentares, condições socioeconômicas e aspectos clínicos relativos à doença.
Método: Estudo transversal com abordagem quantitativa e qualitativa. A população compreendeu
os usuários portadores de diabetes mellitus atendidos pelo Programa Saúde da Família em um
posto de saúde do bairro Dirceu Arcoverde, na cidade de Teresina, PI, que aceitaram participar
da pesquisa. Resultados: Amostra constituída por 40 portadores de diabetes que contemplaram
os critérios de inclusão. Houve predominância do sexo feminino (n=40; 67,5%), a adoção de
dieta específica para diabético foi estatisticamente superior em ambos os tipos de portadores de
Unitermos: DM (p=0,022), assim como o uso de alimentos diet (p=0,028). Conclusão: Constatou-se melhor
Adesão ao Tratamento. Consumo Alimentar. Dia- adesão ao tratamento dietético nos portadores de Diabetes Mellitus tipo I. Concluiu-se, ainda,
betes Mellitus. Estado Nutricional. Estratégia Saúde que os portadores de diabetes mellitus recebiam orientação médica e nutricional relacionada à
da Família.
afecção, mas fatores socioeconômicos e culturais, aspectos pessoais e o acesso aos serviços de
Keywords: saúde poderiam exercer influência sobre o seguimento de autocuidado.
Medication Adherence. Food Consumption. Diabetes
Mellitus. Nutritional Status. Family Health Strategy. ABSTRACT
Objective: To evaluate the adherence to dietary treatment in patients with diabetes mellitus
Endereço para correspondência: assisted by the family health strategy, verifying the existence of an association between the type
Tallita Barbosa Monteiro dos Santos
of diabetes mellitus and dietary practices, socioeconomic conditions and clinical aspects related
Graduação em Nutrição pela Universidade Federal
do Piauí – UFPI to the disease. Methods: Cross-sectional study with quantitative and qualitative approach. The
Conjunto Morada Nova 1 – Quadra 8 – Bloco 3 – Apt population comprised the patients with diabetes mellitus treated by the Family Health Program
201 – Teresina, PI, Brasil –CEP: 64023-124 at a health clinic in the neighborhood of Dirceu Arcoverde in the city of Teresina, PI, who agreed
E-mail: tallita.monteiro@hotmail.com to participate in the Research. Results: The sample consisted of 40 patients with diabetes who
considered the inclusion criteria. There was a predominance of females (n=40, 67.5%), the adoption
Submissão:
of a specific diet for diabetics was statistically superior in both types of DM patients (p=0.022), as
5 de dezembro de 2017
well as the use of diet foods (p=0.028). Conclusion: It was concluded that patients with diabetes
Aceito para publicação: mellitus received medical and nutritional guidance related to the disease, but socioeconomic and
14 de fevereiro de 2018 cultural factors, personal aspects and access to health services influence on self-care.

1. Nutricionista graduada pela Universidade Federal do Piauí (UFPI), Pós-graduanda em Nutrição em Pediatria: da Concepção à Adolescência
pelo Instituto de Pesquisas, Ensino e Gestão em Saúde, Teresina, PI, Brasil.
2. Nutricionista. Doutorado em Ciências Médicas pela Universidade Estadual de Campinas; Mestrado em Ciências e Saúde pela Universidade
Federal do Piauí (UFPI); Especialização em Nutrição Clínica pelo Centro Universitário São Camilo - Campus Pompeia; Graduação em Nutrição
pela UFPI; Departamento de Nutrição UFPI, Teresina, PI, Brasil.

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76
Tratamento dietético em portadores de diabetes assistidos pela ESF

INTRODUÇÃO referentes à saúde, como tempo de diagnóstico da doença e


O diabetes mellitus (DM) é uma das mais importantes uso de medicação9.
doenças crônicas em esfera mundial, com alta prevalência Acredita-se que o desconforto psicossocial conduz a um
em todas as idades, aumentando a incidência de doenças impacto na capacidade de o portador iniciar e manter as
cardiovasculares e complicações em longo prazo e limitação condições básicas da automonitorização. Para muitos, o
da vida do portador. A doença requer cuidados especiais e tratamento pode se mostrar desconfortável, desrespeitoso,
exige do paciente comportamento disciplinar, obediência na frustrante, preocupante, podendo levar à omissão das doses
terapêutica e conhecimento do tratamento1. de insulina, à não observação e não cumprimento do plano
Segundo estimativas da Organização Mundial de Saúde alimentar estabelecido. Mediante isto, percebe-se a impor-
(OMS), o número de portadores da doença em todo o mundo tância de investigar a adesão dos pacientes diabéticos ao
pode alcançar 350 milhões, em 2025. No Brasil, são cerca tratamento dietético e, caso necessário, agir para promover
de 6 milhões de portadores. Um indicador macroeconômico a mudanças positivas neste quadro.
ser considerado é que o diabetes cresce mais rapidamente em O objetivo deste artigo foi avaliar a adesão ao tratamento
países pobres e em desenvolvimento, acarretando um impor- dietético em portadores de diabetes mellitus assistidos pela
tante impacto negativo devido à morbimortalidade precoce estratégia saúde da família, verificando a existência de asso-
que atinge pessoas ainda em plena vida produtiva, onerando ciação entre o tipo de DM e as práticas alimentares, condições
a previdência social e contribuindo para a manutenção do socioeconômicas e aspectos clínicos relativos à doença.
ciclo vicioso da pobreza e da exclusão social2.
O portador de DM apresenta risco para o desenvolvimento MÉTODO
de graves complicações, de natureza aguda ou crônica, que,
somadas ao processo de envelhecimento, poderão afetar Estudo do tipo transversal com abordagem quantitativa
suas habilidades para o autocuidado, de forma transitória e qualitativa. A população compreendeu 60 usuários porta-
ou definitiva, o que ocasiona maior complexidade do regime dores de DM atendidos pelo Programa Saúde da Família em
terapêutico e maiores chances de baixa adesão ao tratamento3. um posto de saúde do bairro Dirceu Arcoverde, na cidade
de Teresina, PI, em 2016. Quarenta portadores de diabetes
O tratamento do DM visa à manutenção do controle
atenderam aos critérios de inclusão (17 portadores de DM
metabólico e compreende a terapia não medicamentosa e
tipo I e 23 portadores de DM tipo II).
medicamentosa. A terapia nutricional, baseada na orientação
e no estabelecimento de um plano alimentar individualizado, Os critérios de inclusão foram: idade maior que 18 anos,
associada à prática de exercício físico, é considerada terapia sem restrição de sexo; os participantes deveriam ter capacidade
de primeira escolha para o controle do DM e seus benefícios de compreensão e comunicação verbal e suas funções cogni-
têm sido evidenciados na literatura4. tivas preservadas para responder às questões relativas aos
hábitos alimentares, aceitarem participar da pesquisa mediante
O tratamento do DM é complexo e difícil de ser realizado,
assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.
gerando dificuldade no controle da doença5. Um dos fatores
fundamentais que aumentam a complexidade do tratamento O trabalho foi aprovado pela Fundação Municipal de
é a baixa adesão. Estudos demonstram que a DM se encontra Saúde (FMS) de Teresina, bem como foi solicitada à diretoria
entre as doenças que apresentam baixas taxas de adesão, da instituição participante a autorização para a execução
principalmente por sua natureza crônica, que gera demandas da pesquisa. A pesquisa foi ainda submetida ao Comitê de
para o autocuidado6. A baixa adesão compromete a eficácia Ética em Pesquisa da Universidade Federal do Piauí, sendo
de tratamentos longos e como consequência surge um aprovada com o número CAAE 41979614.5.0000.5214.
problema crucial para a saúde desta população: a diminuição Após a aprovação iniciou-se a coleta de dados no Posto de
da qualidade de vida7. Saúde em questão.
O portador de diabetes que não cumpre corretamente a
terapia medicamentosa não alcançará o controle glicêmico, Avaliação do Consumo Alimentar
desencadeando complicações micro e macrovasculares, A avaliação do consumo alimentar foi realizada por
como: infarto agudo do miocárdio, acidente vascular encefá- meio da aplicação de Recordatório 24h em três ocasiões (2
lico, insuficiência renal, retinopatias e amputações, podendo durante a semana e 1 no final de semana), compreendendo
levar até mesmo à morte8. dois dias alternados durante a semana e um dia no final de
Diversos fatores são descritos na literatura como contri- semana (sábado ou domingo). No momento da entrega dos
buintes para a modulação da adesão ao tratamento de DM. formulários, foram fornecidas orientações sobre: prepara-
Dentre eles, estão o seguimento de dietas, práticas de ativi- ções, porcionamento, medidas caseiras e horários em que as
dade física, características socioeconômicas, demográficas e mesmas eram consumidas.
BRASPEN J 2018; 33 (1): 76-85
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Santos TBM & Freitas BJSA

Também foi aplicado o Questionário de Frequência kg/m² excesso de peso, 25 a 29,9 kg/m² pré-obesidade,
Alimentar (QFA). O QFA constou de uma lista de 19 ≥ 30,0 kg/m² obesidade.
alimentos nas anamneses de linha de base. Este instrumento
é importante para o conhecimento dos hábitos alimentares da
Avaliação da Adesão ao Tratamento Dietético
população, sendo considerado um método de avaliação da
Adotou-se Questionário específico proposto por Barbosa
ingestão dietética prático, informativo e essencial em estudos
et al.10 para avaliar a adesão ao tratamento nutricional para
epidemiológicos que relacionam a dieta com a ocorrência de
o DM, o qual foi construído a partir de recomendações para
doenças crônicas.
o tratamento nutricional do diabetes propostas pela American
As quantidades de energia e macronutrientes foram calcu- Diabetes Association (ADA)11, pela Sociedade Brasileira de
ladas pelo programa “Nutwin”, versão 1.5 do Departamento Diabetes4, e complementadas pelo Guia Alimentar para a
de Informática em Saúde da Universidade Federal de São População Brasileira.
Paulo. As informações nutricionais dos alimentos não encon-
A Sociedade Brasileira de Diabetes (SBD) que estabelece
trados no programa foram inseridas a partir dos dados da
valores de 2132 kcal para energia, carboidratos correspon-
Tabela Brasileira de Composição de Alimentos e da Tabela de
dendo a 50-60% do VET, no mínimo 130 g/dia e máximo
Composição de Alimentos do Instituto Brasileiro de Geografia
de 266 g/dia. A indicação de ingestão diária de proteína é
e Estatística, de forma que todos os alimentos apresentassem
de 15% a 20% do valor calórico total ou 80 g/dia. Já para
informação nutricional. Para verificar a adequação da ingestão
lipídios de 25-30% ou 59,2 g/dia, para minimizar o risco de
alimentar dos macronutrientes, foi utilizada a faixa de distri-
complicações metabólicas4.
buição aceitável de macronutrientes e energia, contida nas
Dietary Reference Intakes (DRIs) Institute of Medicine of The O instrumento constava de questões acerca do consumo de
alimentos sem açúcar, fruta isolada, preparações com açúcar
National Academies, dos EUA.
habitualmente consumidas, alimentos fonte de carboidratos
complexos e sem açúcar (diet/zero), consumo per capita de sal,
Avaliação Nutricional açúcar e óleo; ingestão de água, de porções de frutas, verduras
Os sujeitos incorporados à pesquisa foram submetidos e legumes; consumo de gordura aparente das carnes e pele
à avaliação nutricional, utilizando-se os parâmetros: peso, de frango, bem como a frequência em que esses alimentos
altura, circunferência da cintura (CC). eram consumidos.
O peso corporal foi aferido em balança eletrônica digital Os questionários de avaliação dos hábitos alimentares
portátil marca Plena (Brasil), com capacidade de 150 kg e foram analisados separadamente, sendo a meta proposta
sensibilidade de 100g, instalada em local afastado da parede, de seguimento de > 50% das orientações recomendadas
com superfícies planas, firmes e lisas. A estatura foi medida para portadores de DM segundo o Guia Alimentar. Consi-
com um antropômetro marca Seca®, graduado em centíme- derou-se como boa adesão à orientação quando > 50%
tros e com barra de madeira vertical e fixa, para posiciona- dos hábitos alimentares recomendados eram seguidos. A
mento sobre a cabeça do indivíduo, estando os participantes adesão parcial foi definida quando havia a melhora dos
descalços, como os pés unidos, em posição ereta, olhando hábitos alimentares, mas não se atingia a meta proposta
para frente. O peso e a estatura foram medidos três vezes (> 50%). Quando < 50% das orientações eram seguidas,
para cada participante, sendo então obtida a média dessas classificou-se como baixa adesão e não se detectou melhora
medidas. O peso foi medido em quilogramas e a estatura nos hábitos alimentares.
em centímetros.
Para a medição da circunferência da cintura, o paciente foi Análise Estatística
posicionado em pé, mediante a utilização de uma fita métrica Os dados foram organizados em um banco de dados
(2 m) não extensível posicionada na linha natural da cintura, no programa Microsoft Office Excel 2011®, a aplicação do
que é a região mais estreita entre o tórax e o quadril, no ponto teste t de Student para a comparação de médias e teste qui
médio entre a costela e a crista ilíaca. A leitura foi realizada quadrado para comparação de variáveis categóricas, sendo
no momento da expiração.  considerado significativo p valor<0,05. Os resultados foram
A OMS estabelece como ponto de corte para risco apresentados em tabelas com as respectivas médias e desvios
cardiovascular aumentado medida de circunferência padrão de cada variável estudada.
abdominal igual ou superior a 94 cm em homens e 80 cm
em mulheres. Foram adotados os padrões de referência
RESULTADOS
estabelecidos pela OMS em 2004 para o índice de massa
corporal (IMC) em que o ponto de corte refere < 18,5 kg/m² A pesquisa inclui 40 portadores de diabetes, cujo perfil
para baixo peso, 18,5 a 24,9 kg/m² para eutrofia, ≥ 25,0 socioeconômico está exposto na Tabela 1. Os resultados
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Tratamento dietético em portadores de diabetes assistidos pela ESF

demonstraram que o sexo feminino (p=0,033) e renda de de IMC compatíveis com sobrepeso, sugerindo que o
2 a 4 salários mínimos (p=0,024) foram estatisticamente irregular acompanhamento nutricional em 60,9% deles,
superiores (p=0,033) entre os portadores de DM tipo 1 e poderia contribuir para erros alimentares que conduziriam
DM tipo 2 estudados. ao excesso de peso.
A classificação do estado nutricional (Tabela 2) demonstrou Os dados expostos na Tabela 3 demonstraram que
predominância de eutrofia entre os portadores de DM1 (70,6%). as variáveis peso, altura e IMC não deferiram entre os
Os mesmos podem ser explicados pelo frequente acompa- portadores de diabetes mellitus tipo 1 e 2. No entanto, o
nhamento nutricional em 58,8% destes portadores. Contudo, parâmetro circunferência da cintura mostrou-se superior
entre os portadores de DM2, 34,8% apresentaram valores estatisticamente em portadores de DM tipo 2 (p=0,049).

Tabela 1 – Perfil socioeconômico dos portadores de Diabetes Mellitus (DM), assistidos pelo Programa Saúde da Família, Teresina, PI, 2016.
Variáveis Características DM 1 DM2 Total p-valor
N % N % N %
Sexo Masculino 6 35,3 7 30,4 13 32,5
Feminino 11 64,7 16 69,6 27 67,5 0,033*
Faixa Etária (anos) De 18 a 29 anos 12 70,6 - - 12 30,0
De 30 a 39 anos 5 29,4 2 8,7 7 17,5
De 40 a 49 anos - - 9 39,1 9 22,5 0,605
De 50 a 60 anos - - 12 52,2 12 30,0
Estado Civil Solteiro (a) 12 70,6 8 34,8 20 50,0
União Estável 1 5,9 3 13,0 4 10,0
Casado (a) 4 23,5 8 34,8 12 30,0 0,425
Viúvo (a) - - 4 17,4 4 10,0
Reside com Irmãos 2 11,8 3 13,0 5 12,5
Família 14 82,4 19 82,6 33 82,5 0,07
Outros 1 5,8 1 4,4 2 5,0
Religião Católico 10 58,8 2 8,7 12 30,0
Evangélico 5 29,4 16 69,6 21 52,5
Testemunha de Jeová - - 5 21,7 5 12,5 0,311
Nenhuma 2 11,8 - - 2 5,0
Nível de Instrução Não sabe ler e escrever - - 1 4,4 1 2,5
Ensino Fundamental Incompleto 1 5,9 6 26,1 7 17,5
Ensino Fundamental Completo 1 5,9 10 43,4 11 27,5
Ensino Médio Incompleto - - - - - -
Ensino Médio Completo 4 23,5 5 21,7 9 22,5
Ensino Superior Incompleto 10 58,8 - - 10 25,0 1,004
Ensino Superior Completo 1 5,9 1 4,4 2 5,0
Ocupação Comércio 4 23,5 2 8,7 6 15,0
Indústria - - 02 8,7 2 5,0
Estudante 13 76,5 - - 13 32,5
Aposentado - - 15 65,2 15 37,5
Pensionista - - 2 8,7 2 5,0 1,302
Autônomo - - 2 8,7 2 5,0
Renda < 1 Salário Mínimo 2 11,8 06 26,1 8 20,0
2 a 4 Salários Mínimos 15 88,2 17 73,9 32 80,0 0,024*
> 4 Salários Mínimos - - - - -
p-valor = Test Qui-quadrado / *p≤0,05 diferença significativa

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Santos TBM & Freitas BJSA

A Tabela 4 expõe que, entre os portadores de DM tipo 1 Ao analisar os hábitos alimentares (Tabela 7), verificou-
e 2, a adoção de dieta específica (p=0,022) e de alimentos se que a presença dos hábitos de “beliscar alimentos entre
diet (p=0,028) foram estatisticamente superiores. refeições” e “comer na frente da televisão” (p=0,032 e
Os resultados expostos na Tabela 5 demonstraram que p=0,044, respectivamente) foram superiores estatisticamente
o consumo de vegetais 2 vezes por semana (p=0,034) e de em portadores de DM tipo 2.
leite desnatado 3 vezes por semana (p=0,022) foram estatis- A Tabela 8 apresenta o consumo per capita de sal
ticamente superiores entre os portadores de DM tipos 1 e 2. (p=0,025) e óleo (p=0,023) estavam superiores estatisti-
As concentrações dietéticas médias de energia, macro- camente em portadores de DM tipo 2 e muito superiores
nutrientes e fibras expostas na Tabela 6 não apresen-taram às quantidades recomendadas pela Pirâmide Alimentar
diferença significativa entre os portadores de DM 1 e 2. Adaptada.

Tabela 2 – Perfil Nutricional, segundo IMC, dos Portadores de Diabetes Mellitus (DM), assistidos pela Estratégia Saúde da Família, Teresina, PI, 2016.
Variáveis Características DM 1 DM2 Total p-valor
N % N % N %
Estado Nutricional Desnutrição 2
Eutrofia 12 706 6 261 18 45,0
Sobrepeso 3 176 8 348 11 27,5 0,316
Obesidade Grau I - - 6 261 6 15,0
Obesidade Grau II - - 3 130 3 7,5
Obesidade Grau III - - - - - -
IMC=índice de massa corporal; p-valor = Test Qui-quadrado / I≥0,05 sem diferença significativa

Tabela 3 – Medidas antropométricos dos portadores de Diabetes Mellitus (DM) atendidos pela Estratégia Saúde da Família, Teresina, PI, 2016.
Variáveis DM1 DM2 p-valor*
Peso médio (kg±DP*) 53,5(±) 8,6 65,2 (±) 5,7 0,300
Altura média (m±DP*) 1,60(±) 0,1 1,58 (±) 1,25 0,220
IMC média (kg/m²±DP*) 23,5 (±) 3,9 28,2 (±) 2,6 0,370
Circunferência da Cintura (cm±DP*) 68,1 (±) 6,3 98,5 (±) 1,21 0,049*
IMC=índice de massa corporal; DP=desvio padrão; p-valor = Test t / *p≤0,05 diferença significativa

Tabela 4 – Orientações nutricionais adotadas por portadores de Diabetes Mellitus (DM), assistidos pela Estratégia Saúde da Família, Teresina, PI, 2016.
Variáveis Características DM 1 DM2 Total p-valor
N % N % N %
Adoção de dieta com Sim 14 82,4 17 73,9 31 77,5
orientação específica Não 3 17,6 6 26,1 9 22,5 0,022*
Uso de Alimentos Sim, Totalmente 11 64,7 10 43,5 21 52,5
Integrais Sim, Parcialmente 4 23,5 8 34,8 12 30,0 0,071
Não 2 11,8 5 21,7 7 17,5
Uso de adoçante Sim, Totalmente 14 82,4 15 65,2 29 72,5
Sim, Parcialmente 2 11,8 4 17,4 6 15,0 0,052
Não 1 5,8 4 17,4 5 12,5
Uso de Alimentos Diet Sim 15 88,2 13 56,5 28 70,0 0,028*
Não 2 11,8 10 43,5 12 30,0
p-valor = Test Qui-quadrado / *p≤0,05 diferença significativa

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Tratamento dietético em portadores de diabetes assistidos pela ESF

Tabela 5 – Frequência de consumo alimentar por portadores de Diabetes Mellitus (DM), assistidos pela Estratégia Saúde da Família. Teresina,
PI, 2016.

Variáveis Características DM 1 DM2 Total p-valor

N % N % N %

Consumo de vegetais Não consome - - - -


1 vez por semana - - - - - -
2 vezes por semana 16 94,2 18 78,3 34 85,0 0,034*
3 vezes por semana 1 5,8 5 21,7 6 15,0

Consumo de Carnes Não consome - - - - -


Brancas 1 vez por semana 1 5,8 2 8,7 3 7,5 0,061
2 vezes por semana 10 58,8 16 69,6 26 65,0
3 vezes por semana 6 35,4 5 21,7 11 27,5

Consumo de Carnes Não consome 2 11,8 - - 2 5,0


Grelhada 1 vez por semana - - - - - - 0,064
2 vezes por semana 7 41,2 20 86,9 27 67,5
3 vezes por semana 8 47,0 3 13,1 11 27,5

Consumo de Alimentos Não consome 2 11,8 - - 2 5,0


Ricos em Fibras 1 vez por semana 7 41,2 12 52,2 19 47,5
2 vezes por semana 5 29,4 1 4,3 6 15,0 0,077
3 vezes por semana 3 17,6 10 43,5 13 32,5

Consumo de Não consome 15 88,2 13 56,5 28 70,0


Refrigerantes 1 vez por semana 2 11,8 8 34,8 10 25,0 0,056
2 vezes por semana - - 2 8,7 2 5,0
3 vezes por semana - - - - - -

Consumo de Leite Des- Não consome - 1 4,3 1 2,5


natado 1 vez por semana - - - - - - 0,022*
2 vezes por semana - - - - - -
3 vezes por semana 17 100,0 22 95,7 39 97,5
p-valor = Test qui-quadrado / *p≤0,05 diferença significativa

Tabela 6 – Concentrações dietéticas médias de energia, macronutrientes, frações lipídicas e fibras, consumidos pelos portadores de diabetes mellitus (DM)
assistidos pela Estratégia Saúde da Família, Teresina – PI, 2016.

Energia/Nutrientes Variáveis Média / Desvio Pdrão p-valor*

DM1 DM2

Energia (kcal) 1975/±668 2052/±610 0,21

Carboidrato (g) 240,2/ ±128,4 265,4/±100,2 0,15

Proteína (g) 64,3/ ±29,0 69,2/±27,5 0,52

Lipídio (g) 52,3/ ±24,5 56,7/±26,1 0,21

Ags (g) 13,5/±8,4 13,8/±8,2 0,17

Agp (g) 7,6/±6,5 7,9/±6,2 0,10

Agm (g) 14/ ±7,6 14,5/±8,4 0,21

Colesterol (mg) 286,4/±195,0 298,6/±205,1 0,37

Fibras (g) 23,7/±14,1 29,3/±13,9 0,52

** p-valor = Test t / p≥0,05 sem diferença significativa. AGM = ácidos graxos monoinsaturados; AGP = ácidos graxos poli-insaturados; AGS =
ácidos graxos saturados.

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Santos TBM & Freitas BJSA

Tabela 7 – Análise dos Hábitos Alimentares de portadores de Diabetes Mellitus (DM), assistidos pela Estratégia Saúde da Família. Teresina, PI, 2016.
Hábitos Alimentares Características DM 1 DM2 Total p-valor
N % N % N %
Número de refeições 3 - -29,4 7 30,4 7 17,5
diárias 5 5 70,6 3 13,1 8 20,0 0,067
6 12 13 56,5 25 62,5
Mastigar bem os ali- Sim 14 82,4 7 30,4 21 52,5
mentos Não 3 17,6 16 69,6 19 47,5 0,162
“Beliscar” alimentos Sim 2 11,8 14 60,9 16 40,0
entre refeições Não 15 88,2 9 39,1 24 60,0 0,032*
Comer na frente da Sim 1 5,9 13 56,5 14 35,0
televisão Não 16 94,1 10 43,5 26 65,0 0,044*
Consumo de alimentos Doce 1 5,9 5 21,7 6 15,0
açucarados Sorvete 3 17,6 2 8,7 5 12,5
Biscoito Recheado 1 5,9 3 13,1 4 10,0
Refrigerante 2 11,8 10 43,4 12 30,0 0,111
Não Consome 10 58,8 3 13,1 13 32,5
Pele do frango Sem a pele 15 88,2 10 43,5 25 62,5
Sempre retira 2 11,8 10 43,5 12 30,0
Nunca retira - - - - - - 0,058
Retira as vezes - - 3 13,0 3 7,5
Gordura aparente das Não come carne com 15 88,2 10 43,5 25 62,5
carnes gordura 11,8 3 13,0 5 12,5
Sempre retira 2 - - - - - 0,139
Nunca retira - - 10 43,5 10 25,0
Retira as vezes -
p-valor = Test Qui-quadrado / *p≤0,05 diferença significativa.

Tabela 8 – Consumo per capita diário da ingestão de alimentos dos portadores de Diabetes Mellitus (DM), assistidos pela Estratégia Saúde da Família.
Teresina, PI, 2016.
Consumo per capita diário Valor recomendado Média / Desvio Padrão p-valor*
DM 1 DM2 N
Sal (g) Até 6,0 5,3/8,8 10,7/5,9 0,025*
Açúcar (g) 27,5 a 55 13,98/6,6 37,9/8,9 0,078
Óleo (ml) 8,11 a 16,22 3,0/6,4 20,4/8,7 0,023*
p-valor = Test t / *p≤0,05 diferença significativa

DISCUSSÃO A variável idade é de grande importância para


A prevalência do sexo feminino neste estudo (p=0,033) melhorar a elaboração de um programa educativo com
encontrou respaldo em estudo de Assunção & Ursine12, os estratégias de aprendizagem voltadas para o público
quais constataram proporção de mulheres portadoras de específico, de acordo com o tipo de diabetes mellitus
DM quase três vezes maior que a de homens. Desta forma, apresentada 13.
pode-se sugerir uma maior preocupação das mulheres com A baixa renda constatada de 2 a 4 salários mínimos
sua própria saúde e mais frequente acesso aos serviços de (p=0,024) no presente estudo pode ser um fator limitante
saúde. Isso porque, desde a perspectiva da divisão sexual ao seguimento ao plano alimentar prescrito para o diabético
do trabalho, a tarefa de providenciar assistência médica à e pode refletir a predominância de estudantes e aposen-
família é vista como atributo feminino, vindo a aumentar o tados na amostra, grupos que ainda não estão inseridos
contato da mulher com o serviço de saúde e garantindo-lhe no mercado de trabalho ou apresentam renda reduzida,
acesso facilitado. constituída de proventos de aposentadoria. Resultados
BRASPEN J 2018; 33 (1): 76-85
82
Tratamento dietético em portadores de diabetes assistidos pela ESF

semelhantes foram encontrados por Medeiros et al.14 em um Os portadores de DM do Tipo 1 e 2 realizavam 6


estudo realizado com 69 portadores de diabetes mellitus, refeições ao dia (62,5%), porém os portadores de DM do
no qual 58,5% apresentaram renda entre 2 a 4 salários tipo 1 apresentam hábitos alimentares mais saudáveis,
mínimos. Segundo Bosi et al.15, não há associação entre vez que mastigavam bem os alimentos (82,4%), não
baixa renda e a ocorrência de DM, porém, sabe-se que a consumiam alimentos açucarados (58,8%), consumiam
renda influencia principalmente na aquisição de gêneros frango sem pele (88,2%) e não consumiam carne com
alimentícios mais saudáveis, visto que a maior parte dos gordura (88,2%).
produtos diet apresentam um custo financeiro maior que A alta taxa de adesão encontrada no presente estudo
os comuns. pelos portadores de DM tipo 1 pode ser explicada pelo
Os valores médios de IMC sinalizavam para eutrofia fato de que a maioria dos entrevistados participava de
entre os portadores de DM1 e sobrepeso entre os porta- grupos de diabéticos e estava motivada com o trata-
dores de DM2, compatibilizando-se com Fagundes16 e mento proposto, além da preocupação dos mesmos
Faustino et al.17. O excesso de peso e a localização predo- com os picos de hipoglicemia advindos das aplicações
minantemente no abdome da gordura exercem grande da insulina.
influência na sensibilidade à insulina e estão diretamente A relação encontrada entre motivação e adesão ao
associados ao desenvolvimento do DM2, HAS e compli- tratamento em pacientes diabéticos está em acordo com
cações cardiovasculares. outros estudos que afirmam que a motivação é uma das
Apesar dos sujeitos apresentarem frequência de consumo estratégias para melhorar a adesão ao tratamento em
2-3 vezes por semana de vegetais e leite desnatado, o pacientes diabéticos, juntamente com a prontidão para a
número de porções diárias não satisfaz as recomendações modificação do estilo de vida, aceitação da doença e apoio
das DRI: 4 porções/dia, e 3-4 porções/dia, respectivamente. familiar. Santos et al.21 também preconizaram a necessidade
Tal achado demonstra o baixo consumo de fibras, vitaminas da adoção de uma intervenção motivadora dos pacientes,
e minerais, que poderiam desempenhar importante papel familiares, médicos e das pessoas que convivem com os
no controle glicêmico e do estresse oxidativo. portadores de DM, requisitos fundamentais para um bom
Estes dados corroboram com achado de Overby et controle da doença.
al. , que constataram consumo mais frequente de frutas e
18 Opondo-se aos resultados atuais, Assunção & Ursine12
hortaliças pelos indivíduos diabéticos, porém ainda abaixo indicaram que 76% dos entrevistados receberam orienta-
da recomendação das DRIs de frutas e hortaliças por dia. ções dietéticas, porém, apenas metade desses seguiram-nas
A redução do consumo de frutas e hortaliças está sendo nos últimos 15 dias. O mesmo foi observado no estudo de
observada na população em geral, podendo contribuir Cazarini et al.22, no qual apenas 33,3% dos pacientes com
para o aumento da prevalência das doenças crônicas no DM entrevistados adotavam tratamento medicamentoso e
Brasil e no mundo. dieta. Segundo Fagundes16, os pacientes que apresentam
O consumo alimentar dos diabéticos neste estudo DM dificilmente seguem o tratamento proposto pelos
mostrou adequação quanto ao recomendado pela Socie- profissionais de saúde, sendo que as taxas de não adesão
dade Brasileira de Diabetes (SBD)4. Opondo-se ao resul- variam de 40 a 90%.
tado atual, estudo realizado por Batista et al.19, com 156 Alinhando-se ao estudo atual, Cotta et al.23 identificaram
pacientes com hiperglicemia no município de Viçosa/MG, hábitos alimentares inadequados, representados pelo
encontrou percentuais para energia, carboidratos, lipídios elevado per capita diário de sal, açúcar e óleo, demons-
e proteínas superiores estatisticamente aos valores preco- trando assim a necessidade de ações de intervenção por
nizados pela ADA11. parte do serviço de saúde, voltadas para essa população.
Em um estudo realizado por Pereira et al.20 com 380 A integração da equipe multiprofissional do PSF no
pacientes diabéticos, verificou-se consumo moderado de desenvolvimento de atividades interdisciplinares em grupo,
fibras, representado pelo baixo consumo de leguminosas além de orientações individuais e aos familiares relacio-
e frutas, no que se opõe ao resultado agora apresentado. nadas à reeducação nutricional, assim como o desenvolvi-
Araújo et al.8 preconizam que o consumo rotineiro de fibras mento de estratégias que estimulem a mudança de hábitos
da população brasileira não atinge a meta, e os diabéticos alimentares e estilo de vida da população em geral, podem
incluem-se neste perfil. As fibras são de extrema impor- contribuir para melhor adesão dos pacientes ao plano não
tância, pois estas proporcionam saciedade ao indivíduo e, medicamentoso.
consequentemente, auxiliam no bom controle glicêmico. A adoção desses hábitos alimentares por pacientes com
Portanto, o incentivo ao consumo diário de fontes alimen- DM é importante em vista de sua influência sobre o controle
tares de fibras é prioritário para os diabéticos. glicêmico e a prevenção de doenças cardiovasculares. Sua
BRASPEN J 2018; 33 (1): 76-85
83
Santos TBM & Freitas BJSA

adoção pode resultar em redução de 1 a 2% nos níveis de 3. Seley JJ, Weinger K. The state of the science on nursing-
hemoglobina glicada2. Além disto, o controle da quantidade best practices for diabetes self-management. Diabetes Educ.
2007;33(4):616-8.
e do tipo de carboidratos consumidos é relevante para o
4. Sociedade Brasileira de Diabetes. Algoritmo para o tratamento do
controle da glicemia pós-prandial e, consequentemente, diabetes tipo 2: atualização 2011(Posicionamento Oficial SBD
para evitar o desenvolvimento de complicações advindas n. 3). São Paulo: Sociedade Brasileira de Diabetes; 2011.
do DM11. 5. Costa JA, Balga RSM, Alfenas RCG, Cotta RMM. Promoção da
saúde e diabetes: discutindo a adesão e a motivação, e indivíduos
O grande desafio dos profissionais de saúde e dos
diabéticos participantes de programas de saúde. Ciênc Saúde
programas assistenciais existentes ainda é a adesão ao Coletiva. 2011;16(3):2001-9.
tratamento e a motivação de diabéticos, sendo de extrema 6. Gomes-Villas Boas LC, Foss MC, Foss-Freitas MC, Torres HC,
relevância a necessidade de buscar mecanismos possíveis de Monteiro LZ, Pace AE. Adesão à dieta e ao exercício físico
seguimento pelos usuários dos serviços e monitorização pela das pessoas com diabetes mellitus. Texto Contexto Enferm.
equipe de saúde, evitando assim o abandono ao tratamento 2011;20(2):272-9.
7. Pontieri FM, Bachion MM. Crenças de pacientes diabéticos
e o agravamento da enfermidade. Desta forma, estudos
acerca da terapia nutricional e sua influência na adesão ao trata-
mais aprofundados em relação à adesão ao tratamento mento. Ciênc Saúde Coletiva. 2010;15(1):151-60.
dietético devem ser realizados, pois é um componente 8. Araújo MFM, Gonçalves TC, Damasceno MMC, Caetano JA.
importante no cuidado à saúde, redução de complicações Aderência de diabéticos ao tratamento medicamentoso com
e melhora da qualidade de vida do portador de DM. hipoglicemiantes orais. Esc Anna Nery.2010;14(2):361-7.
9. Peyrot M, Barnett AH, Meneghini LF, Schumm-Draeger PM.
Insulin adherence behaviours and barriers in the multinational-
CONCLUSÃO Global Attitudes of Patients and Physicians in Insulin Therapy
study. Diabet Med. 2012;29(5):682-9.
Os portadores de DM Tipo I e II eram predominante- 10. Barbosa JHP, Oliveira SL, Seara LT. Produtos da glicação avan-
mente do sexo feminino, apresentavam renda 2 a 4 salários çada dietéticos e as complicações crônicas do diabetes. Rev Nutr.
mínimos e eram assíduos ao acompanhamento médico, 2009;22(1):113-24.
devido à necessidade da receita para aquisição da medi- 11. American Diabetes Association (ADA). Diagnosis and Clas-
sification of Diabetes Mellitus. Diabetes Care. 2010;33(Suppl
cação gratuita, mas não assíduos ao acompanhamento
1):S62-69.
nutricional. 12. Assunção TS, Ursine PGS. Estudo de fatores associados
Predominou sobrepeso e alto risco de doenças metabó- à adesão ao tratamento não farmacológico em portadores
licas pelo indicador circunferência da cintura nos portadores de diabetes mellitus assistidos pelo Programa Saúde da
Família, Ventosa, Belo Horizonte. Ciênc Saúde Coletiva.
de DM tipo 2, sugerindo a necessidade de recomendações
2008;13(Suppl.2):2189-97.
nutricionais com vistas à perda ponderal. 13. Faria AS, Bellato R. A vida cotidiana de quem vivencia a condição
O consumo dietético de energia, macronutrientes, crônica do diabetes mellitus. Rev Esc Enferm. 2009;43(4):752-9.
frações lipídicas e fibras estava em conformidade aos 14. Medeiros CCM, Bessa GG, Coura AS, França ISX, Sousa FS.
padrões estabelecidos pela SBD e não diferiu entre os Prevalência dos fatores de risco para diabetes mellitus de servi-
dores públicos. Rev Eletr Enferm. 2012;14(3):559-69.
diabéticos Tipo I e II. Entretanto, alguns hábitos alimen- 15. Bosi PL, Carvalho AM, Contrera D, Casale G, Pereira MA,
tares inadequados foram encontrados entre os portadores Gronner MF, et al. Prevalência de diabetes mellitus e tole-
de DM tipo II, como: elevado consumo per capita de sal e rância à glicose diminuída na população urbana de 30 a 79
óleo, “beliscar” alimentos entre refeições, comer na frente anos da cidade de São Carlos, São Paulo. Arq Bras Endocrinol
da televisão. Constatou-se melhor adesão ao tratamento Metab.2009;53(6):726-32.
16. Fagundes CN. Perfil epidemiológico de portadores de hipertensão
dietético nos portadores de DM tipo I.
arterial sistêmica e de diabetes mellitus atendidos na atenção
Concluiu-se, ainda, que os sujeitos recebiam orientação básica em saúde do município de Florianópolis (SC) [Disser-
médica e nutricional relacionada à afecção, mas fatores tação de mestrado]. Florianópolis: Universidade Federal de
socioeconômicos e culturais, aspectos pessoais e o acesso Santa Catarina, Centro de Ciências da Saúde; 2013.
17. Faustino EB, Azevedo EB, Silva PMC, Sales SS, Barros WPS.
aos serviços de saúde exercem influência sobre o segui-
Diabetes mellitus: busca ativa em portadores de obesidade.
mento de autocuidado. Cogitare Enferm. 2011;16(1):110-5.
18. Overby NC, Margeirsdottir HD, Brunborg C, Andersen LF, Dahl-
Jørgensen K.The influence of dietary intake and meal pattern on
REFERÊNCIAS
blood glucose control in children and adolescents using intensive
1. Moreira AM, Chiarello PG. Atenção nutricional: abordagem insulin treatment. Diabetologia. 2007;50(10):2044-51.
dietoterápica em adultos. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 19. Batista MCR, Priore SE, Rosado LEFPL, Tinôco ALA, Frances-
2008. 220p. chini SCC. Avaliação dietética dos pacientes detectados com
2. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. hiperglicemia na “Campanha de Detecção de Casos Suspeitos
Departamento de Atenção Básica. Caderno de atenção básica: de Diabetes” no município de Viçosa, MG. Arq Bras Endocrinol
Diabetes Mellitus. Brasília: Brasil. Ministério da Saúde; 2013. Metab. 2006;50(6):1041-9.

BRASPEN J 2018; 33 (1): 76-85


84
Tratamento dietético em portadores de diabetes assistidos pela ESF

20. Pereira GAB, Archer RLB, Ruiz CAC. Avaliação do grau de 22. Cazarini RP, Zanetti ML, Ribeiro KP, Pace AE, Foss MC.
conhecimento que pacientes com diabetes mellitus demonstram Adesão a um grupo educativo de pessoas portadoras de diabetes
diante das alterações oculares decorrentes dessa doença. Arq mellitus: porcentagem e causas. Medicina (Ribeirão Preto).
Bras Oftalmol. 2009;72(4):481-5. 2002;35:142-50.
2 1. Santos MA, Silva AFS, Oliveira-Cardoso EA, Mastropietro 23. Cotta RMM, Batista KCS, Reis RS, Souza GA, Dias G, Castro
AP, Voltarelli JC. Impact of autologous hematopoietic FAF, et al. Perfil sociossanitário e estilo de vida de hiper-
stem cell transplantation on the quality of life of type 1 tensos e/ou diabéticos, usuários do Programa de Saúde da
diabetes mellitus patients. Psicol Reflex Crít. 2011;24(2): Família no município de Teixeiras, MG. Ciênc Saúde Coletiva.
264-71. 2009;14(4):1251-60.

Local de realização do trabalho: Universidade Federal do Piauí (UFPI), Teresina, PI, Brasil.

Conflito de interesse: Os autores declaram não haver.

BRASPEN J 2018; 33 (1): 76-85


85
A Artigo Especial
Toledo DO et al.

Campanha “Diga não à desnutrição”: 11 passos


importantes para combater a desnutrição hospitalar
Campaign "Say no to malnutrition": 11 important steps to fight hospital malnutrition

Diogo Oliveira Toledo1


RESUMO
Silvia Maria Fraga Piovacari1 A desnutrição é frequentemente encontrada no ambiente hospitalar. Muitas vezes negligen-
Lilian Mika Horie2 ciada, apesar de afetar desfavoravelmente a saúde da população, a desnutrição apresenta
Liane Brescovici Nunes de Matos3 como principais complicações: pior resposta imunológica, atraso no processo de cicatrização,
Melina Gouveia Castro4 risco elevado de complicações cirúrgicas e infecciosas, maior probabilidade de desenvolvimento
Guilherme Duprat Ceniccola5 de lesões por pressão, aumento no tempo de internação e do risco de mortalidade. Fora isso,
Fabiano Girade Corrêa6 acarreta considerável aumento dos custos hospitalares. A taxa de desnutrição varia entre 20 e
Ivens Willians Silva Giacomassi7 50% em adultos hospitalizados e durante a hospitalização esta condição piora progressivamente
Ana Paula Noronha Barrére1 principalmente em idosos e pacientes críticos. Em 1998, o inquérito brasileiro, conhecido como
Leticia Fuganti Campos8
Cristiane Comeron Gimenez Verotti9 IBRANUTRI, avaliou 4 mil pacientes internados na rede pública hospitalar de vários estados
Claudia Satiko Takemura Matsuba10 brasileiros, confirmando a prevalência da desnutrição em 48,1% dos pacientes. Há 20 anos, estes
Rodrigo Costa Gonçalves11 dados foram publicados e o cenário permanece imutável até os dias atuais, pois, em 2016, outro
Haroldo Falcão12 estudo (com aproximadamente 30.000 pacientes) corroborou a manutenção da alta prevalência
Rogério Dib1 de desnutrição em pacientes hospitalizados. A identificação precoce da desnutrição, bem como
Thais Eliana Carvalho Lima9 o manejo, por meio de ferramentas recomendadas, possibilita estabelecer a conduta nutricional
Ivens Augusto Oliveira de Souza13 mais apropriada e melhora do desfecho nestes pacientes.O objetivo desta campanha é reduzir
Maria Cristina Gonzalez14 as taxas de desnutrição por meio de uma série de ações que incluem a triagem, o diagnóstico,
Maria Isabel Davidson Correia15
o manejo e o tratamento da desnutrição. Para facilitar a maneira de difundir este conhecimento,
foi desenvolvido um método mnemônico com a palavra “DESNUTRIÇÃO”, abordando cada
letra inicial de forma simples, desde o conceito até o tratamento da desnutrição. Desta forma,
o método garante uma integração interdisciplinar, além de averiguar os principais aspectos do
cuidado geral do paciente desnutrido.

ABSTRACT
Malnutrition is often found in the hospital environment. Often overlooked, malnutrition has the
Unitermos: following major complications: poor immune response, delayed healing, high risk of surgical
Desnutrição. Fatores de Risco. Hospitalização. Brasil. and infectious complications, increased probability of development of pressure lesions, increased
length of hospital stay and mortality risk. Apart from this, it entails a considerable increase in
Keywords: hospital costs. The malnutrition rate varies between 20 and 50% in hospitalized adults and during
Malnutrition. Risk Factors. Hospitalization. Brazil. hospitalization this condition progressively worsens mainly in elderly and critically ill patients. In
1998, the Brazilian survey, known as IBRANUTRI, evaluated 4,000 patients hospitalized in the
Endereço para correspondência: public hospital network of several Brazilian states, confirming the prevalence of malnutrition in
48.1% of the patients. Twenty years ago, these data were published and the scenario remains
Diogo Oliveira Toledo
unchanged until the present day, because, in 2016, another study (with approximately 30,000
Av. Albert Einstein, 627 – São Paulo, SP, Brasil patients) corroborated the maintenance of the high prevalence of malnutrition in hospitalized
CEP: 05652-900 patients. Early identification of malnutrition, as well as management, through recommended tools,
E-mail: diogootoledo@gmail.com makes it possible to establish more appropriate nutritional management and improvement of the
outcome in these patients. The objective of this campaign is to reduce malnutrition rates through
Submissão: a series of actions including screening, diagnosis, management and treatment of malnutrition.
5 de fevereiro de 2018 To facilitate the way of disseminating this knowledge, a mnemonic method was developed with
the word “MALNUTRITION”, addressing each initial letter in a simple way, from concept to treat-
Aceito para publicação ment of malnutrition. In this way, the method guarantees an interdisciplinary integration, besides
2 de março de 2018 investigating the main aspects of the general care of the malnourished patient.

1. Hospital Israelita Albert Einstein, São Paulo, SP, Brasil.


2. Oncologistas Associados, São Paulo, SP, Brasil.
3. Hospital São Luiz Itaim, São Paulo, SP, Brasil.
4. Hospital Estadual Mario Covas, São Paulo, SP, Brasil.
5. Instituto Hospital de Base do Distrito Federal, Brasília, DF, Brasil.
6. Instituto Brasiliense de Nutrologia – IBRANUTRO, Brasília, DF, Brasil.
7. Instituto de Assistência Médica ao Servidor Público Estadual, São Paulo, SP, Brasil.
8. Programa de Pós-Graduação em Clínica Cirúrgica da Universidade Federal do Paraná, Curitiba, PR, Brasil.
9. Sociedade Brasileira de Nutrição Parenteral e Enteral - BRASPEN, São Paulo, SP, Brasil.
10. Hospital do Coração – HCOR, São Paulo, SP, Brasil.
11. Hospital de Urgências de Goiânia, Goiânia, GO, Brasil.
12. Hospital Samaritano Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, RJ, Brasil.
13. Hospital Sírio-Libanês, São Paulo, SP, Brasil.
14. Universidade Católica de Pelotas, Pelotas, RS, Brasil.
15. Hospital Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, MG, Brasil.

BRASPEN J 2018; 33 (1): 86-100


86
Diga não à desnutrição

INTRODUÇÃO ainda, que houve aumento de 2007 para 2008 de 28% e


de 2008 para 2010 de 34%, no tocante à taxa de pacientes
A desnutrição é definida como o estado resultante da
admitidos com deficiência nutricional9. Estes altos índices
deficiência de nutrientes que podem causar alterações na
de comprometimento nutricional podem ser evitados se
composição corporal, funcionalidade e estado mental com
o cuidado nutricional ganhar a devida atenção! Assim, o
prejuízo no desfecho clínico. Pode ser causada por fatores de
diagnóstico precoce da desnutrição, bem como o adequado
privação alimentar, doenças, idade avançada, isolados ou
“manejo”, é necessário, com o intuito de prevenir o status
combinados1. Esta condição é frequentemente encontrada
deficitário ou evitar o agravamento.
no ambiente hospitalar2. Muitas vezes negligenciada, apesar
de afetar desfavoravelmente a saúde da população, a desnu- Desta forma, o objetivo desta campanha é reduzir as taxas
trição apresenta como principais complicações: pior resposta de desnutrição por meio de uma série de ações que incluem
imunológica, atraso no processo de cicatrização, risco elevado triagem, diagnóstico, manejo e tratamento da desnutrição.
de complicações cirúrgicas e infecciosas, maior probabilidade Para facilitar a maneira de difundir este conhecimento, foi
de desenvolvimento de lesões por pressão, aumento no tempo desenvolvido método mnemônico com a palavra “DESNU-
de internação e do risco de mortalidade. Fora isso, acarreta TRIÇÃO”, abordando cada letra inicial de forma simples,
considerável aumento dos custos hospitalares3. desde o conceito até o tratamento da desnutrição, conforme
registrado no Quadro 1.
Trata-se de um dos maiores problemas de saúde pública
em países subdesenvolvidos e, também, em nações desenvol- Os 11 passos do combate à desnutrição serão descritos
vidas. A taxa de desnutrição varia entre 20 e 50% em adultos detalhadamente nos tópicos abaixo.
hospitalizados, sendo de 40 a 60% no momento da admissão
do paciente, isso em países latino-americanos. Durante a
hospitalização, pacientes idosos, críticos ou aqueles subme- Quadro 1 – Método mnemônico dos 11 passos para o combate à
­desnutrição.
tidos a procedimentos cirúrgicos apresentam maior risco de
desnutrição, com importante impacto econômico4,5. D Determine o risco e realize a avaliação nutricional
Uma revisão sistemática, publicada por Correia et al.6 E Estabeleça as necessidades calóricas e proteicas
em 2016, avaliou 66 publicações latino-americanas (12 S Saiba a perda de peso e acompanhe o peso a cada 7 dias
países, aproximadamente 30.000 pacientes) e confirmou a N Não negligencie o jejum
manutenção da alta prevalência de desnutrição em pacientes U Utilize métodos para avaliar e acompanhar a adequação
hospitalizados. Dado semelhante foi publicado em 1998, ­nutricional ingerida vs. estimada
extraído do inquérito brasileiro, difundido mundialmente T Tente avaliar a massa e função muscular
e conhecido como IBRANUTRI7. Este estudo, promovido e
R Reabilite e mobilize precocemente
realizado pela Sociedade Brasileira de Nutrição Parenteral e
Enteral (BRASPEN), avaliou 4 mil pacientes internados na rede I Implemente pelo menos dois Indicadores de Qualidade
pública hospitalar de vários estados brasileiros e do Distrito Ç Continuidade no cuidado intra-hospitalar e registro dos dados
Federal. A prevalência da desnutrição foi de 48,1%, sendo em prontuário
que 12,6% dos pacientes apresentavam desnutrição grave à Acolha e engaje o paciente e/ou familiares no tratamento
e 35,5%, moderada. As regiões Norte e Nordeste tiveram O Oriente a alta hospitalar
maior prevalência, chegando a 78,8% na cidade de Belém do
Pará. Há 20 anos estes dados foram publicados e o cenário
permanece imutável até os dias atuais. D - Determine o risco e realize a avaliação
A identificação precoce da desnutrição, por meio de ferra- nutricional
mentas validadas, possibilita estabelecer conduta nutricional Referencial teórico
mais apropriada e o grande desafio é evitar a piora do quadro Existem muitos métodos de triagem nutricional que
e tentar recuperar o estado nutricional. Os crescentes conheci- se adequam a várias situações clínicas, contudo, alguns
mentos entre os profissionais de nutrição e da saúde em geral, são questionáveis do ponto de vista de validação. Por
aliados aos avanços significativos em nutrição, têm proporcio- esta razão, as taxas de risco nutricional são distintas
nado atendimento direcionado e especializado ao paciente conforme o método utilizado, podendo variar entre 20%
hospitalizado, o que está associado a melhorias nos desfechos8. e 80% 10, 11.
A Associação Britânica de Nutrição Enteral e Parenteral Um elemento que dificulta o reconhecimento do paciente
(BAPEN) mostrou dados realizados durante a “Semana de desnutrido é que ele atualmente não é mais caracterizado
Triagem Nutricional” em 2007, 2008 e 2010 que indicaram apenas por um indivíduo com baixo índice de massa
que um em cada três pacientes chegam ao hospital apresen- corporal (IMC), uma vez que indivíduos obesos também
tando algum risco nutricional. Tais estudos demonstraram, podem estar desnutridos. Para isso, os fatores de risco
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Toledo DO et al.

relevantes são a redução da ingestão alimentar recente, validadas. O nutricionista é, em geral, o responsável pela
a perda ponderal, o edema, a perda de massa magra e triagem nutricional na maioria dos hospitais. Quando o risco
de tecido adiposo e a redução da capacidade funcional. nutricional é identificado, preconiza-se realizar a avaliação
Observar precocemente esses fatores é essencial para nutricional.
reconhecer pacientes que se beneficiam de intervenção A triagem nutricional deve ser registrada nos prontuá-
nutricional guiada por metas12-14. rios dos pacientes em até 24h após a admissão hospitalar,
A Sociedade Americana de Nutrição Parenteral e deve ser repetida semanalmente em pacientes sem risco
Enteral (ASPEN) define a triagem nutricional como “um e que permanecem hospitalizados. Sugestões de métodos
processo para identificar indivíduos desnutridos ou em de triagem nutricional incluem a NRS 2002 e a MST, para
risco de desnutrição para determinar se a avaliação pacientes de enfermarias, e também o NUTRIC, para
nutricional é indicada”11. Assim, a triagem nutricional pacientes críticos.
representa o gatilho inicial desse processo, uma vez A avaliação nutricional é, em geral, atividade do nutri-
que os fatores de risco incluídos nessas ferramentas são cionista. Devem ser submetidos à avaliação nutricional os
preditores da desnutrição13. Ceniccola et al.12 apontaram pacientes em risco nutricional e aqueles com longo período
que pacientes em risco nutricional, pela NRS 2002, na de permanência hospitalar. A avaliação nutricional é um
admissão da UTI, tinham 14 vezes mais probabilidade de processo amplo e pode envolver vários aspectos, como
serem classificados como desnutridos.
carências de micronutrientes e até a obesidade, mas quando
A seleção de uma ferramenta de triagem nutricional deve se tem a finalidade de avaliar a desnutrição, podem ser
considerar a população alvo, a objetividade e a rapidez utilizadas ferramentas mais tradicionais a exemplo da AGS
de aplicação do método, uma vez que todos pacientes e também novos métodos como o proposto pela AND
internados devem ser triados. Para essa tarefa, é necessário em conjunto com a American Society of Parenteral and
contar com equipes interprofissionais de terapia nutricional. Enteral Nutrition (ASPEN), denominado de método AND-
Como exemplos de aplicação da triagem nutricional, a NRS ASPEN. Recordando que há proposta de unificação para o
200215 e aMalnutritionscreening tool (MST)16são ampla- diagnóstico nutricional em consenso de várias sociedades,
mente empregadas em enfermariase, mesmo com certas representada pelo grupo GLIM20.
limitações, podem também serúteis para pacientes críticos.
Nesses últimos, se destaca oNutritionRisk in theCriticallyIll
(NUTRIC) Score17, um método validado especificamente em E- Estabeleça as necessidades calóricas e proteicas
pacientes críticos. Uma das limitações do NUTRIC é que ele Referencial teórico
é composto de variáveis não tradicionalmente associadas à Necessidade Energética
desnutrição, mas à gravidade da doença. Escolher qual ferramenta utilizar no cálculo da necessi-
dade energética dos pacientes ainda é um grande desafio.
Após a triagem nutricional, os pacientes em risco e
Apesar do padrão ser a calorimetria indireta (CI), o alto custo
aqueles com longa permanência hospitalar devem ser
do equipamento torna o uso distante da prática clínica da
submetidos à avaliação nutricional para o adequado diag-
grande maioria dos profissionais. Existem poucos estudos
nóstico do seu estado nutricional. É definida pela Academy
of Nutrition and Dietetics (AND) como “um processo para comparando a CI com as equações preditivas em relação a
obter, verificar e interpretar os dados necessários para desfecho. Análise da literatura indicou que os estudos apre-
identificar problemas relacionados a nutrição, suas causas sentam grande heterogeneidade de pacientes e a maioria
e consequências”. A Avaliação Global Subjetiva (AGS) destes não é randomizada21.
é um exemplo de ferramenta validada e amplamente Dentre as equações preditivas disponíveis, todas apre-
utilizada em hospitais, tendo sido desenvolvida em 1987 sentam limitação e baixa acurácia quando comparadas à
e, desde então, é empregada com sucesso em diversos CI, apresentando assim grande probabilidade de hipo ou
grupos de pacientes18. Outros métodos de diagnóstico hiperalimentação. Um estudo que avaliou a acurácia das
mais recentes foram propostos pela ESPEN19 e pela AND- equações preditivas observou que 38% subestimaram e 12%
ASPEN13. Esse último é consideravelmente similar à AGS, superestimaram as necessidades energéticas em mais de 10%
pois inclui elementos semelhantes. Um grupo de trabalho quando comparadas à CI. Foram encontrados, ainda, valores
internacional denominado Global Leadership Initiative on de até 43% abaixo e 66% acima da necessidade medida por
Malnutrition (GLIM)20 visa unificar essas propostas para CI para determinado paciente22.
desenvolver ferramenta de diagnóstico universal. Finalmente, ao se comparar equações complexas com
regra de bolso, baseada no peso do paciente, em amostra
Abordagem prática de mais de 8.000 doentes graves não foi observada dife-
A triagem nutricional deve ser feita à admissão hospitalar rença na mortalidade, mas houve menor permanência em
por profissional de saúde treinado e utilizando ferramentas pacientes que utilizaram a regra de bolso para cálculo da
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Diga não à desnutrição

necessidade energética23. Portanto, parece razoável que, Quadro 2 – Sugestões de meta energética, baseadas na regra de bolso.
na ausência da CI, a regra de bolso seja utilizada, visto
Pacientes na Enfer- Fase inicial 25 a 30 kcal/kg
que, apresenta resultados razoáveis, é mais fácil e rápida
maria Fase de recuperação 30 a 40 kcal/kg
de ser realizada. Neste sentido, indica-se, em geral, entre
25 e 30 kcal/kg de peso atual (exceção para pacientes Pacientes na Fase Inicial 20 a 25 kcal/kg
UTI Fase de Recuperação 25 a 30 kcal/kg
obesos que devem ter o peso corrigido para o ideal).
Observação: Risco de Síndrome de Realimentação – iniciar com 15 kcal/kg

Necessidade Proteica
O músculo esquelético corresponde a 80% da massa Quadro 3 – Sugestões de meta proteica, baseadas na regra de bolso
celular corporal de um adulto jovem e saudável. A
lesão tecidual grave precipita tempestade de citocinas e Baixo catabolismo 1,0 a 1,2 g/kg
hormônios contrarregulatórios que aumentam drastica- Moderado catabolismo 1,2 a 1,5 g/kg
Pacientes na
mente o catabolismo muscular, liberando os aminoácidos Alto catabolismo 1,5 a 2,0 g/kg
Enfermaria
na corrente sanguínea que atuarão na regulação das Doença Renal Crônica sem 0,8 a 1,2 g/kg
respostas inflamatórias e imunológicas24. O catabolismo evento catabólico agudo
muscular, por sua vez, leva a rápida e grave atrofia da Sem Terapia Renal 1,2 a 2,0 g/kg
musculatura esquelética. Substitutiva Contínua
Em Terapia Renal 2,0 a 2,5 g/kg
Em pacientes graves, com alto catabolismo, a perda de Pacientes na UTI Substitutiva Contínua
massa muscular foi recentemente quantificada, por meio Obeso grau 1 e 2 2 g/kg peso ideal
da espessura do reto femoral por ultrassonografia, e varia
Obeso grau 3 2,5 g/kg peso ideal
de 15 a 25%, nos primeiros 10 dias de internação na UTI25.
Essas considerações corroboram as recomendações
atuais de necessidade de alta oferta proteica. Enquanto a S - Saiba a perda de peso e acompanhe o peso do
ingestão de proteínas recomendada para pessoas saudá- paciente pelo menos a cada 7 dias
veis gira em torno de 0,8 a 1,0 g/kg/dia, a recomendação Referencial teórico
proteica para o doente não obeso vai de 1,2 a 2,0g/kg/ A avaliação da porcentagem de perda de peso é
dia26. Dados clínicos preliminares apontam que ofertar importante preditor de risco nutricional. Além disso, o peso
até 2,5 g/kg/dia, principalmente em pacientes críticos, é corporal é considerado informação essencial na assistência
seguro27. Porém, são necessários estudos de alta qualidade direta ao paciente, porque reflete o somatório dos compo-
para avaliar qual seria realmente a oferta ideal. nentes corporais e, na maioria das vezes, é incorporado
Existem poucos estudos que comparam diferentes nas ferramentas de triagem nutricional e nos controles de
ofertas proteicas e o desfecho clínico. Um deles avaliou, cuidado interprofissional, seja na admissão hospitalar, em
prospectivamente, 113 pacientes internados em UTI e atendimentos ambulatoriais ou cuidados domiciliares30,31.
observou correlação entre a oferta proteica e a mortali- Por tratar-se de informação que pode influenciar na
dade, sendo que pacientes que receberam oferta proteica conduta terapêutica, este cuidado deve ser instituído como
de 1,5 g/kg/dia tiveram melhor sobrevida (p=0,011)28. rotina, no mínimo semanalmente, em pacientes hospitali-
Estudo multicêntrico observacional com pacientes críticos zados – além de indicativo do estado nutricional, o peso é
que permaneceram ≥4 dias (n=2828) ou ≥12 dias determinante para prescrição dietética e cálculos de estima-
(n=1584) destacou que o alcance de ≥ 80% da meta tiva de gasto energético, como as fórmulas de bolso, que
proteica foi associado com redução da mortalidade, tanto se baseiam em recomendações por quilo de peso. Avaliar o
em pacientes com tempo de internação mais ou menos peso, no mínimo, uma vez por semana é fundamental32-34.
prolongado29. Assim sendo, o esforço para atingir a meta Ainda, o peso é fundamental para o cálculo do IMC, que
proteica parece fazer diferença do desfecho final, espe- pode auxiliar na determinação do diagnóstico nutricional
cialmente do ponto de vista funcional dos pacientes em Vale ressaltar que o peso atual do paciente pode refletir
terapia nutricional (na verdade, isto representa quem está não somente o estado nutricional, mas também o estado de
a ser de fato tratado, contra os que não foram adequa- hidratação (presença de edema, ascite, entre outros – que
damente tratados). devem ser desconsiderados para definição do peso seco).
Em pacientes acamados, o método ideal para mensuração
Abordagem prática do peso é a maca balança, mas este equipamento é inexistente
Os quadros 2 e 3 sugerem regras de bolso para cálculo na imensa maioria dos hospitais brasileiros. Existem também
das necessidades energéticas e proteicas baseadas nas os métodos indiretos para estimar o peso, como as fórmulas
últimas diretrizes internacionais21,22,26,27. de estimativa, mas que apresentam limitações: poucas foram
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desenvolvidas para população brasileira e para diferentes Para a adesão ao protocolo de verificação do peso
faixas etárias. Em casos de restrição total ao leito ou na corporal, é imprescindível a participação da equipe inter-
presença de edema, a aferição de pregas cutâneas e de circun- profissional procurando incentivar o paciente, familiar e ou
ferências musculares pode também ser de difícil mensuração cuidador no acompanhamento deste cuidado.
e validação32,35. Outro método indireto para cálculo de peso
Pesquisas recentes apontam para a necessidade de
ideal é contemplando o IMC médio, que para adultos pode
empoderar os pacientes para apoiar na gestão do seu
ser considerado 22 kg/m2 e para idosos, 24,5 kg/m2.
autocuidado37.

Abordagem prática
A verificação correta do peso corporal auxilia no alcance N- Não negligencie o jejum
das metas do cuidado e é imprescindível para31: Referencial Teórico
O tempo excessivo de jejum dos pacientes durante a
• Fornecer dados fidedignos na avaliação e monitoramento
internação hospitalar foi identificado como importante fator
do estado nutricional e de hidratação do paciente;
de risco para desnutrição hospitalar38. Durante períodos de
• Auxiliar no cálculo das necessidades nutricionais, auxi-
jejum, ocorre redução da secreção de insulina e aumento
liando no plano terapêutico interprofissional;
da secreção de glucagon e catecolaminas, levando à glico-
• Estabelecer e monitorar o balanço para cálculo de doses genólise e lipólise. Quando se acrescenta a resposta ao
seguras de medicamentos, como antibióticos, sedativos estresse, o catabolismo é acelerado, levando à perda de
e hidratação;
massa muscular.
• Selecionar dispositivos acessórios utilizados na mobili-
Os principais motivos que levam ao jejum excessivo
zação precoce.
incluem pausas para exames e procedimentos diagnósticos,
A fim de assegurar o cumprimento de rotinas e fornecer interrupções antes ou após procedimentos cirúrgicos ou como
dados precisos e informação segura, a adoção de um
parte do controle de sintomas gastrointestinais (náuseas,
checklist (Quadro 4) pode auxiliar na adesão desta rotina36.
vômitos e diarreia) e espera de avaliação funcional da
deglutição39.
Quadro 4 – Checklist para aferição do peso corporal.
Recomendação Fundamentação da prática Abordagem prática
Relacionados à balança Todos os pacientes em jejum por mais de 48h devem
( ) Balança calibrada Equipamentos calibrados e precisos ser acompanhados com mais cuidado e a possibilidade
podem fornecer dados fidedignos e expor de indicação de vias alternativas de alimentação deve ser
em menor risco de erros no diagnóstico ou considerada, respeitando as particularidades de cada caso.
tratamento
( ) Desinfecção da A desinfecção correta do equipamento de
balança aferição pode minimizar riscos potenciais Abreviação do jejum antes de exames e procedi-
de infecção mentos diagnósticos
Relacionados ao paciente Não há diretrizes claras sobre o tempo necessário de
( ) Esvaziamento prévio Este cuidado permite menor variação de jejum antes da realização de exames diagnósticos40. Portanto,
da bexiga e jejum peso e facilita a comparação diária das recomenda-se que cada instituição elabore protocolos entre
medidas os setores envolvidos (UTIs, unidades de internação, endos-
( ) Horário pré-definido A rotina definida de horário pode auxiliar no copia, radiologia, cardiologia) para definição do tempo de
para verificação preparo do paciente e otimizar as ações de
enfermagem
jejum adequado a ser cumprido antes da realização de cada
( ) Posicionamento O posicionamento correto fornece dados
exame. É fundamental a comunicação efetiva entre os setores
correto do paciente e da mais confiáveis do hospital para o cumprimento dos tempos acordados e
balança redução de atrasos na programação. A comunicação efetiva
Relacionados à equipe de enfermagem com pacientes/familiares sobre tempo de jejum e horário de
( ) Familiaridade no uso O conhecimento prévio do equipamento e liberação da dieta é fundamental para garantir o cumpri-
dos equipamentos da rotina de controle permite a verificação mento dos prazos.
correta do peso corporal
( ) Comparação com O parâmetro anterior permite comparações
medida anterior e condutas terapêuticas mais eficientes Abreviação do jejum pré-operatório
( ) Uso de balança ade- O uso correto das balanças fornece dados Várias diretrizes de sociedades de Anestesiologia e o
quada para cada tipo de fidedignos e precisos projeto ACERTO apoiam a abreviação do jejum pré-opera-
paciente tório e recomendam manter jejum para sólidos por seis horas
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Diga não à desnutrição

antes da operação e jejum para líquidos claros (total de 200


Quadro 6 – Modelo de tempo de jejum para procedimentos mais comuns.
mL) até duas horas antes da anestesia para procedimentos
eletivos em adultos41-43. Reuniões científicas realizadas entre Exame/ Procedimento Jejum (horas)
EMTN, equipe de anestesia e de cirurgia podem contribuir Gastroenterologia Endoscopia digestiva alta 8
para o estabelecimento de protocolo institucional de abre-
viação do jejum. Proctologia Colonoscopia Avaliar o caso

Traqueostomia 1
Realimentação precoce no pós-operatório: Cirurgia Torácica Broncoscopia 4
Vários estudos sugerem que a realimentação oral e
Drenagem pleural 1
enteral precoce no pós-operatório melhora os desfechos
clínicos44. Em operações com anastomoses gastrintestinal, Cardiologia Ecocardiograma transe- 6
enteroentérica, enterocólica ou colorretal, a dieta oral ou sofágico
enteral deve ser iniciada no mesmo dia ou no primeiro dia
pós-operatório43.

Quadro 7 – Modelo de recomendações de jejum por tipo de alimento.


Controle adequado dos sintomas gastrointestinais
Alimento Jejum mínimo
O uso de medicamentos como procinéticos e antiemé-
(horas)
ticos, bem como evitar o uso desnecessário de opiáceos e
elaboração de protocolos institucionais de vômitos/gastro- Líquido sem resíduos 2
paresia auxiliam na redução da suspensão da dieta por Leite materno 4
tempo prolongado.
Fórmula infantil 6
A diarreia não deve ser motivo de interrupção automática
da dieta enteral26. Leite não materno 6

Dieta sólida leve 6


Obstrução e retirada acidental de cateteres Dieta sólida completa 8
Educação continuada da enfermagem nos cuidados com
acessos enterais, fixação adequada e fluxos bem estabele-
cidos nos casos de retirada acidental do cateter minimizam
U - Utilize métodos para avaliar e acompanhar a
tempo de jejum relacionados ao acesso enteral.
adequação calórica ingerida versus estimada
Abaixo, seguem sugestões de modelos de padroni-
Referencial Teórico
zação da campanha que devem ser discutidos e adaptados
conforme rotinas de cada instituição (Quadros 5 a 7): O grande desafio da nutrição hospitalar é encontrar
maneiras objetivas de mensurar a ingestão calórica dos
pacientes. O estudo de Kiss et al.45 avaliou pacientes com
Quadro 5 – Modelo de padronização de tempo de jejum para exames câncer de pulmão e verificou que o aconselhamento nutri-
radiológicos mais comuns. cional oral promoveu ganho de peso, melhor qualidade
Exame Sítio Jejum (horas) de vida e bem estar funcional, ressaltando a importância
Radiografias Abdome, coluna 4 do cuidado e da monitorização da ingestão alimentar
lombar
dos pacientes.
USG Abdome total 4
Pesquisas sugerem que ofertar mais de 50-65% das
USG doppler Artérias renais, aorta, 4
ilíacas, cava, aorta, necessidades energéticas diárias para pacientes graves
tronco cefálico, promove redução de mortalidade 26. Estudo com 7872
mesentéricas pacientes graves mostrou que, no grupo de pacientes que
TC com contraste ou Com sedação Padrão – 8 permaneceram na UTI sob nutrição enteral por 12 dias
RNM com contraste Aleitamento – 6
consecutivos, aqueles que tiveram maior oferta calórica
Colonoscopia virtual - TC 8
apresentaram menor mortalidade46. O déficit calórico de
Entero TC 8
pelo menos 4000 kcal na primeira semana de internação
Entero RM 6
levou a piores desfechos clínicos e, isto foi mais evidente
Colangio RM 8 nos extremos de IMC47.
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A realidade mostra que, em média, 60 a 80% ou


Quadro 8 – Sugestões de Protocolos de Monitoramento do Consumo
menos do alvo calórico dos pacientes em nutrição Oral51, 52.
enteral ou parenteral é ofertado. Essa diferença entre
1. Acompanhar a ingestão alimentar dos pacientes por meio do
infundido e prescrito, muitas vezes, é causada por registro do percentual da aceitação alimentar
pausas de infusão para exames, jejum para procedi-
- Nutricionista informar ao copeiro hospitalar sobre a necessidade
mentos e demora no início da terapia nutricional. Isso
em anotar a aceitação alimentar das principais refeições (desjejum,
ao longo da internação contribui para déficit calórico- ­almoço, lanche da tarde, jantar e a ceia) ao recolher a bandeja.
proteico cumulativo, desnutrição intra-hospitalar,
- Utilizar uma figura que demonstre a composição da bandeja e as por-
aumento do tempo de internação e também de custos
centagens da aceitação alimentar, classificando em excelente, ­adequada,
associados 26,47-50. regular/inadequada, baixa e recusa/muito baixa (ex. Figura 1).

Abordagem Prática
• Avaliar o risco nutricional do paciente, por meio de
instrumentos de triagem conforme passo 1;
• O serviço de nutrição hospitalar deve desenvolver
e padronizar manual de dietas contendo as dietas
hospitalares de rotina e as especializadas. Esse
manual é ferramenta primordial no cuidado nutri-
cional ao paciente internado. Direciona e auxilia
a equipe médica e interprofissional a conhecer e
entender melhor a dieta prescrita, já que não há
consenso sobre a nomenclatura das dietas ofere-
cidas nos hospitais. Ademais, fornece subsídios para
avaliar e acompanhar o que está sendo ingerido pelo
paciente 51;
• Identificar os pacientes que necessitam de monitora-
mento pelo nutricionista ou outro profissional da equipe
interprofissional assistencial quando apresentam acei-
tação alimentar insatisfatória;
• Utilizar ferramentas de fácil aplicação à beira-leito;
• Garantir prescrição dietética adequada para cada
Figura 1 - Sugestão de impresso para avaliar o percentual do consumo alimentar em unidade
paciente e assegurar plano de cuidado nutricional
hospitalar51.
personalizado. Padronizar o que é servido para o Obs: essa ferramenta também pode ser utilizada para anotação pelo próprio paciente, familiar
ou cuidador envolvido, desde que bem orientados e treinados (processo de empoderamento
paciente; do paciente e familiares/acompanhantes).
• Treinar a equipe interprofissional para aplicar as ferra-
mentas e realizar registros adequados no prontuário 2. Acompanhar a aceitação alimentar dos pacientes por meio do
do paciente; registro da ingestão alimentar

• Utilizar indicadores de qualidade, como medidas obje- - Registrar, em impresso próprio, o consumo alimentar da dieta via
tivas para avaliar o volume infundido versus prescrito oral, que pode/deve ser feito pelo próprio paciente e/ou familiares.
da nutrição enteral e parenteral; - Anotar dados sobre os alimentos/preparações e quantidades consu-
midas em cada refeição (desjejum, lanche da manhã, almoço, lanche
• Calcular a adequação calórica ofertada versus ingerida da tarde, jantar e ceia) ao longo do dia.
(Quadro 8). - Preencher o formulário continuamente durante o período de hospita-
As anotações servirão tanto para o/a nutricionista lização, ou por pelo menos 3 dias consecutivos para maior assertivi-
como também para outros membros da equipe interpro- dade na conduta a ser tomada.
fissional, uma vez que a alimentação do paciente é parte - Após o preenchimento, cabe ao nutricionista avaliar a aceitação
alimentar e realizar o cálculo da ingestão alimentar realizada pelo
integrante do tratamento, acompanharem o quadro do
paciente.
enfermo (Quadro 9)
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Diga não à desnutrição

do conhecimento da quantidade de gordura corporal e


Quadro 9 – Sugestão de Indicação de Terapia Nutricional26,51,53.
da massa magra em quilos, por meio de estimativa da
De acordo com os resultados, definir a indicação/prescrição de BE, é possível estimar o índice de massa magra (IMM) e o
TNO, TNE, TNP de acordo com os pontos a seguir: índice de gordura corporal (IGC)57 como indicado abaixo
- Paciente previamente desnutrido ou com risco nutricional ou com (Quadro 10):
demanda metabólica aumentada ou sarcopênicos ou com lesão de
pele ou oncológicos ou em preparo pré-operatório com aceitação oral
menor que 60%, indicar suplementação oral. Quadro 10 – Estimativa do índice de massa magra (IMM) e o índice de
gordura corporal (IGC).
- Se paciente com dieta oral e com suplementação oral apresen-
tar aceitação menor que 60% em 3 dias, indicar terapia nutricional IMC kg/m2= IMM kg/m2 + IGC kg/m2
enteral.
Sendo IMM = massa magra (kg)/altura2 (m) e IGC = gordura corporal
- Se paciente tiver impossibilidade de utilização do trato gastrointes- (kg)/altura2 (m)
tinal, principalmente com risco de desnutrição ou desnutrido indicar
nutrição parenteral precocemente. Se paciente sem risco nutricional,
pode-se aguardar até 7 dias para a indicação da nutrição parenteral.
A partir destes índices, obtêm-se mais informações
sobre a composição corporal do que por meio do IMC,
pois pode-se identificar miopenia (baixa muscularidade),
T - Tente avaliar a massa e a função muscular obesidade e obesidade sarcopênica, independentemente
Referencial teórico  do IMC.
As complicações associadas à desnutrição parecem
Existem diversas ferramentas de avaliação de função.
estar mais relacionadas às alterações funcionais que às da
Essas ferramentas permitem realizar tanto avaliações objetivas
composição corporal54,55. Neste sentido, a avaliação nutri-
quanto subjetivas. A função avaliada por meio da força do
cional ideal deve ter sensibilidade para detectar as alterações
da composição corporal e mudanças funcionais orgânicas aperto de mão é um dos fatores preditores de maior inter-
decorrentes da desnutrição. nação hospitalar, juntamente com o estado nutricional e a
ingestão alimentar58.
Vários métodos de avaliação nutricional têm sido
propostos. No entanto, nenhum indicador único pode ser
considerado como “padrão”. Todos apresentam limitações, Abordagem prática
sendo a mais importante o fato de serem influenciados por Para avaliação da composição corporal sugere-se utilizar
fatores independentes do estado nutricional56. 3 métodos disponíveis no ambiente hospitalar, conforme
A incorporação da avaliação da função fisiológica na Quadros 11 e 121.
avaliação nutricional pode redimensionar o diagnóstico de
desnutrição no paciente hospitalizado, passando a significar
marcador global de alteração do estado de saúde, não Quadro 11 – Métodos de avaliação da composição corporal.
sendo causado unicamente pela ingestão inadequada de Método Equipamento Valores de Comentário
nutrientes56. referência
Em pacientes desnutridos, ocorre perda preferencial- Espessura do Adipômetro 24,2±4,2 Por ser plano e estar
mente de massa muscular, constituída por fibras do tipo músculo adutor homens e fixado entre duas
II (de resposta rápida). A função de contração muscular, do polegar 19,4±3,9 estruturas ósseas, é
mulheres59 o único músculo que
porém, é muito mais prejudicada nas fibras do tipo I (de
permite a medida dire-
resposta lenta). A avaliação da massa muscular pode ser ta da espessura
feita de maneira subjetiva ou objetiva. Avaliação subjetiva
Circunferência Fita métrica Homens: A circunferência da
da massa muscular pode ser feita por meio da palpação
da panturrilha ≤34 cm panturrilha é método
dos principais grupos musculares do braço e da perna ou Mulheres: simples para avaliação
pedindo ao paciente que aperte a mão do examinador, ≤33 cm60 de perda muscular e
por exemplo. Por outro lado, apesar da importância da sarcopenia
massa muscular, as medidas objetivas para avaliação são Bioimpedância Aparelho de BE Consulte BE é método não
limitadas1. Os principais métodos disponíveis no ambiente elétrica (BE) de frequência Quadro 12 invasivo de estimativa
hospitalar para avaliar massa muscular são: espessura única ou multi- da composição cor-
do músculo adutor do polegar (EMAP), circunferência da frequencial poral, para melhor uso
­longitudinal
panturrilha (CP) e bioimpedância elétrica (BE)1. A partir
BRASPEN J 2018; 33 (1): 86-100
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Toledo DO et al.

R - Reabilite e mobilize precocemente


Quadro 12 – Valores de Índice de Massa Magra (IMM) e Índice de Gordura
Corporal (IGC). Referencial teórico
Hoje, a reabilitação física e mobilização precoce
IMC (kg/m2) Categorias IMM (kg/m2) IGC (kg/m2) constituem o pilar mais importante no combate à perda
Homens de massa magra65. Duas recentes meta-análises mostram
que melhoram a força muscular periférica e respiratória,
≥ 30 Muito alto Não aplicável ≥ 8,3
a capacidade física e funcionalidade, a qualidade de
25-29,9 Alto ≥ 19,8 5,2 - 8,2
20-24,9 Normal 17,5 -19,7 2,5- 5,1 vida, além de diminuir o tempo de ventilação mecânica
≤ 19,9 Baixo ≤ 17,4 ≤ 2,4 e de internação na UTI e no hospital66,67. A reabilitação e
mobilização precoce são muito seguras, com incidência
Mulheres
de apenas 0,6% de eventos adversos que necessitaram de
≥ 30 Muito alto Não aplicável ≥ 11,8 alguma intervenção68.
25-29,9 Alto ≥ 16,8 8,2 - 11,7
20-24,9 Normal 15,1 -16,7 4,9 – 8,1
≤ 19,9 Baixo ≤ 15,0 ≤ 4,8 Abordagem prática
Adaptado de Kyle et al.61
Para que sejam efetivas devem ser iniciadas o quanto
antes possível e utilizar recursos como treinamento
muscular respiratório, cicloergômetro e eletroestimu-
A função muscular pode ser avaliada subjetivamente lação 69. Além disso, aplicar protocolos progressivos
ou objetivamente. A avaliação subjetiva inclui perguntas que abranjam: exercícios no leito, sentar-se à beira
sobre modificações na atividade habitual do paciente, (sedestação) leito, treino de transferências, sedestação
como verificar se o paciente caminha ou se levanta da em poltrona, ficar em ortostatismo, treino de marcha e
cadeira ou como aperta sua mão. A força muscular deambulação, de maneira progressiva conforme o nível
é um dos itens que compõem a funcionalidade. A de consciência, Medical Research Council score (MRC),
campanha sugere duas ferramentas que são vastamente capacidade e reserva de cada paciente70-72.
utilizadas na literatura para avaliar objetivamente esse
componente:
I - Implemente pelo menos dois Indicadores de
a) Força do aperto de mão ou dinamometria de mão: Qualidade
avalia objetivamente a força de preensão palmar. O Referencial teórico
valor é expresso em quilos e pode ser correlacionado O controle da qualidade do cuidado em saúde é
com a força muscular global. Valores abaixo dos alicerçado em indicadores utilizados como ferramentas
cortes estabelecidos determinam piores desfechos de avaliação73. Um indicador é unidade de medida de
clínicos 55. Para realização da avaliação de dina- atividade específica ou uma medida quantitativa que pode
mometria, o paciente deve estar sentado com os ser usada como guia para monitorar e avaliar a qualidade
pés apoiados no chão, com o braço junto ao tórax, de importantes cuidados providos ao paciente, bem como
cotovelo fletido a 90° sem estar apoiado. Dinamô- as atividades dos serviços74.
metro preferencialmente na mão dominante, realizar Indicadores de qualidade em terapia nutricional (IQTN)
3 medidas e considerar a medida de maior valor 62. são importantes ferramentas de avaliação e monitora-
Os valores de corte que estratificam alteração de mento de qualidade da TN, ao identificar possíveis dificul-
força avaliado pelo dinamômetro para mulheres dades e falhas relacionadas aos protocolos de cuidados
e homens são: 20 kg e 30kg para pacientes de nutricionais providos ao paciente75.
enfermaria e 7 kg e 11kg para pacientes de UTI, Neste ano de 2018, os IQTNs completarão dez anos
respectivamente 63. de existência no Brasil. A história começou em 2008,
b) Teste da caminhada: solicite que o paciente caminhe quando a força-tarefa de nutrição clínica do International
no seu ritmo habitual uma distância de 4 metros, Life Science Institute - Brasil (ILSI - Brasil) publicou lista
previamente marcada em qualquer corredor, e verifique de 36 IQTNs e respectivas metas, propostas em consenso
o tempo gasto para este percurso. O paciente deve por grupo de quarenta e um especialistas brasileiros em
percorrer o trecho em tempo inferior a cinco segundos, TN, para atender diferentes diretrizes nacionais e inter-
caso contrário poderá ser classificado como tendo alte- nacionais da área75. No entanto, além da escassez de
ração funcional64. recursos humanos e materiais disponíveis nos hospitais
BRASPEN J 2018; 33 (1): 86-100
94
Diga não à desnutrição

brasileiros, a aplicabilidade clínica dos IQTNs propostos


Quadro 13 – Frequência de diarreia em pacientes com nutrição enteral.
vinha sido limitada devido ao elevado número de indi-
Objetivo estratégico Controle dos episódios de diarreia em
cadores 76. Neste sentido, em 2012, os TOP TEN foram pacientes com NE
propostos, a fim de viabilizar a execução destes, redu- Nome do indicador Frequência de episódios de diarreia em
zindo para dez indicadores de qualidade 77. pacientes com NE
Descrição Mensurar a taxa de ocorrência de diarreia
No ano de 2015, ainda foram criados indicadores de
(3 ou mais evacuações líquidas/dia) em
qualidade para terapia nutricional oral utilizando-se o pacientes com nutrição enteral
mesmo método aplicado aos TOP TEN78. Propósito/justificativa Conhecer a incidência de diarreia em pa-
cientes que fazem uso de nutrição enteral
Fato é que o Brasil é um país muito grande e hete- e tomar medidas preventivas e terapêuti-
rogêneo. Essa heterogeneidade se aplica também à TN, cas para diminuir esta complicação
haja vista que existem hospitais de alta complexidade que Fórmula A.) N° de pacientes em NE que apresen-
tam diarreia X100
contam com uma grande equipe de TN e também existem
N° de pacientes em NE
hospitais onde esta equipe é composta por número redu- B.) Por paciente
zido de profissionais. N° de dias com diarreia em NEX100
N° de dias de NE
A lista dos TOP TEN tem como primeiro indicador Unidade de medida Porcentagem
a avaliação do risco nutricional por meio da realização Fonte de dados Prontuário médico, ficha de seguimento
de triagem nutricional. No entanto, a triagem consta da TN
em portaria do Ministério da Saúde como item indis- Frequência Mensal
pensável em prontuário, há alguns anos79. Atualmente, Meta <10%
pensa-se se é realmente necessário monitorar o que já Responsável pela infor- Nutricionista, EMTN, equipe de enferma-
é obrigatório. Esta hipótese ganha força com o trabalho mação gem, equipe médica
avaliando IQTNs, publicado em 2017, em que se realizou Responsável pela tomada Chefe da EMTN
da decisão
a avaliação dos indicadores a partir da triagem, ou seja, Data de implementação
não se considerou a triagem um indicador de qualidade do indicador
e sim item obrigatório80.
No cenário atual, em que há hospitais de todos os
portes, e muitas vezes limitação de recursos humanos, Quadro 14 – Frequência de pacientes que recebem menos de 70% das
acredita-se cada vez mais na necessidade da redução necessidades prescritas
do número de IQTNs na rotina da prática clínica, para Objetivo estratégico Controle dos pacientes que recebem me-
nos de 70% das necessidades prescritas
viabilizar a aplicabilidade.
Nome do indicador Frequência de pacientes que recebem me-
nos de 70% das necessidades prescritas
Abordagem Prática Descrição Mensurar a taxa de ocorrência de pa-
cientes que recebem menos de 70% das
Neste sentido, a campanha sugere que ao menos dois necessidades prescritas
indicadores sejam aplicados rotineiramente. Um indi- Propósito/justificativa Conhecer a incidência e a razão dos pa-
cador que faça o monitoramento da terapia nutricional, cientes não receberem suas necessidades
prescritas
haja vista a discrepância entre necessidades nutricionais
Fórmula N° de pacientes em TN que recebem me-
e o que é realmente de fato ofertado 81 e outro indicador nos de 70% das necessidades prescritas
que controle as intercorrências relacionadas à TN, tais X100
como hiperglicemia, diarreia, constipação, infecção de N° de pacientes em TN
Unidade de medida Porcentagem
cateter venoso central, entre outas. Como sugestão,
Fonte de dados Prontuário médico, ficha de seguimento
propõe-se:
da TN
• Frequência de pacientes que recebem menos de 70% Frequência Mensal
das necessidades nutricionais prescritas; Meta <20%
• Frequência de pacientes com intercorrências relacio- Responsável pela infor- Nutricionista, EMTN, equipe de enferma-
mação gem, equipe médica
nadas à terapia nutricional.
Responsável pela tomada Chefe da EMTN
Uma ficha técnica (Quadros 13 e 14) pode ser utilizada da decisão
para aplicação dos indicadores e para padronização dos Data de implementação
dados. do indicador

BRASPEN J 2018; 33 (1): 86-100


95
Toledo DO et al.

C – Continuidade no cuidado intra-hospitalar e Abordagem prática


registro dos dados em prontuário Não deixe de consolidar no prontuário as informações
Referencial teórico clínicas relevantes para o bom acompanhamento do seu
Em 1974, Charles E. Butterworth publicou o clássico paciente. Algumas boas práticas são recomendadas pela
artigo “The Skeleton in the Hospital Closet” 82. Trata- campanha da BRASPEN, para o integrante da equipe
se do primeiro artigo que revela a terapia nutricional interdisciplinar:
(TN) como um processo a ser desenvolvido dentro dos
• Registrar dados antropométricos básicos como peso e
ambientes hospitalares. Butterworth deixou patente a
altura, tanto à admissão quanto evolutivamente;
importância do elemento informação para a melhor
assistência da terapia nutricional aos pacientes inter- • Assegurar sequência de informações que resista a
nados. No levantamento feito, até 56% dos pacientes mudanças de turnos frequentes, que aponte as entregas
não apresentavam registro de altura e 26% não tinham de cada profissional envolvido e que garanta o segui-
registro de peso. mento de cada processo. Uma sugestão seria a criação
de modelos de checklist nas transições de setores;
O prontuário é um documento de fundamental impor-
tância na assistência dos pacientes sob TN. Segundo o • Atentar para o percentual “aceitação de dieta oral”,
autor Moacyr Amaral Santos, pode-se entender por docu- sobretudo para os pacientes de risco - o lançamento do
mento a “coisa representativa de um fato”83. Do ponto percentual de aceitação nas folhas de balanço ou mesmo
de vista legal, o prontuário é documento obrigatório e na evolução da equipe assistencial pode ser importante
direito do paciente. Segundo o Artigo 87 do Código aliado no controle dos pacientes em risco nutricional;
de Ética Médica 84, o atendimento da equipe de saúde • Garantir que triagem nutricional de todos os pacientes
deve ser registrado em prontuário, com data e hora do hospitalizados seja periodicamente realizada e regis-
atendimento, contendo os dados clínicos relevantes. Em trada em prontuário; em pacientes com risco nutri-
relação à TN, os integrantes das Equipes Interdiscipli- cional, comunicar à equipe de terapia nutricional para
nares de Terapia Nutricional (EMTNs) têm a obrigação a realização da avaliação nutricional;
de registrar em prontuário a evolução e os procedimentos • Anotar como foram as últimas 24h, sinalizando as
realizados85. É fundamental que, nas anotações de pron- intercorrências relevantes, como glicemias, número
tuário, os lançamentos da EMTN descrevam como as de evacuações líquidas, volume e aspecto dos drenos
intervenções nutricionais se coadunam com o momento e cateteres, etc. Esse tipo de anotação comunica a
clínico do paciente. transição clínica de um dia para o outro e constitui
Informações consolidadas, além do aspecto de registro importante informação para compreender a evolução;
pontual, têm grande importância, pois significam formas • Reavaliar periodicamente as necessidades calóricas,
de mitigar o risco de descontinuidade de cuidados. A proteicas e de micronutrientes, adequando-as às neces-
descontinuidade da assistência - seja entre os turnos de sidades de cada momento clínico: as necessidades
atendimento, seja entre os setores - é realidade dentro na UTI não serão necessariamente as necessidades
dos hospitais, e o risco de interrupções dos processos do paciente de enfermaria. Atenção em especial para
assistenciais deve ser mitigado86. Nos últimos anos, ênfase as transições entre setores ou para as situações de
especial tem sido dada aos hand-offs ou documentos de descontinuidade de acompanhamento por parte da
transição entre unidades, e diversos modelos provenientes equipe interdisciplinar;
das diferentes realidades hospitalares em todo o mundo • Registrar qual meta calórica e proteica foi determinada
têm sido apresentados e utilizados87. para seu paciente, e o quanto da meta proposta foi
As EMTNs, como equipes envolvidas desde a admissão recebido;
até a alta, assumem papel de alta relevância pois são • Mitigar o risco de falhas de comunicação entre equipe
responsáveis pelo acompanhamento nutricional do médica, serviço de nutrição clínica/EMTN, médicos
paciente por todo o curso da hospitalização. A estratégia assistentes e paciente/responsável, sobretudo nas
nutricional, a cada transição deve ser especificada e transições entre unidades/setores. Se necessário,
documentada, preferencialmente em prontuário. O enten- complemente as informações de prontuário com um
dimento da noção de transitividade é de tal relevância que telefonema, ou uma conversa direta com a equipe
tem sido entendida como uma boa prática. Mais do que assistencial. Não deixe de registrar as atualizações
isso, tem sido requisito de qualidade a ser atendido pelos em prontuário. Folhas e fichas de transição podem
padrões de qualidade das agências certificadoras e por ser ferramentas úteis, mas não asseguram que a infor-
agências governamentais88,89. mação esteja bem descrita.
BRASPEN J 2018; 33 (1): 86-100
96
Diga não à desnutrição

A - Acolha e engaje o paciente e/ou familiares cuidadores e familiares, construindo um bom relaciona-
no tratamento mento durante o período de internação93,96. A habilidade
Referencial teórico de colocar-se no lugar do outro pode ser o grande dife-
A doença e a incapacidade são experiências comuns rencial para o atendimento de excelência, melhorando a
em ambiente hospitalar e frequentemente desencadeiam confiança acerca das informações transmitidas para maior
impactos negativos, como medo, ansiedade e depressão, engajamento e melhor desfecho clínico96,97.
que podem afetar diretamente a parte alimentar 90,91.
Compreender as alterações que ocorrem na vida do O - Oriente a alta hospitalar
paciente é primordial para o desenvolvimento de estraté- Referencial teórico
gias de acolhimento que favoreçam melhor comunicação A preparação para a alta só começa quando o paciente
e entendimento das oportunidades de intervenção91. já está clinicamente apto a deixar o hospital. Portanto,
O papel educacional da EMTN também deve ser tarefas que requerem tempo, como educar os pacientes
compreendido em sua complexidade, pois são as infor- com relação à nutrição, reconciliação medicamentosa,
mações transmitidas durante o período de internação que agendamento de acompanhamentos e organização do
garantem o engajamento do paciente na capacitação transporte, necessitam de planejamento98,99.A falta deste
para o autocuidado92,93. A triagem nutricional e anamnese planejamento de alta pode levar a readmissões e custos
adequadas, assim como o monitoramento e ajuste perió- mais elevados. Outro elemento importante do processo
dico dos nutrientes às diferentes situações clínicas, podem de alta é garantir que os pacientes e/ou familiares estejam
auxiliar na recuperação e diminuir potencialmente as rein- empoderados para gerenciar em casa e garantir a conti-
ternações. Abordagens que levam ao empoderamento dos nuidade do tratamento. Para ter desempenho eficaz no
pacientes e/ou responsáveis geram maior compreensão processo de alta hospitalar, o primeiro requisito é estabe-
da importância do tratamento nutricional92. lecer como meta a data de previsão da alta99,100.
A humanização no ambiente hospitalar evidencia que
a ciência e a tecnologia isoladamente não suprem a Abordagem prática
necessidade do paciente e de seus familiares, mas sim a Modelos estratégicos para este processo devem ser
totalidade da experiência deles durante e após o período estimulados e desenvolvidos conforme recursos próprios da
de internação94,95. instituição. Um exemplo é a de checklist simples para alta
hospitalar (Quadro 15).
Abordagem prática
• Acolher e engajar os pacientes e familiares no
autocuidado; Quadro 15 – Checklist para alta hospitalar.

• Promover atendimento humanizado, empático, ( ) Home Care / Equipamentos médicos organizado


entendendo as necessidades dos pacientes e seus ( ) Prontidão para saída avaliada
acompanhantes;
( ) Condição de cuidado pós agudo confirmada
• Utilizar técnicas de comunicação que aprimorem a
( ) Testes finais de diagnóstico realizados e resultados avaliados
capacidade de expressão e compreensão, evitando
informações desencontradas e utilização de meios e ( ) Ordens de alta escrita
linguagens não acessíveis; ( ) Reconciliação medicamentosa
• Manter alto o nível de engajamento dos pacientes ( ) Cuidados com relação a alimentação
por meio de estratégias de motivação e educação ( ) Família informada sobre cuidados pós-hospitalar e fornecido plano
nutricional; de orientações multidisciplinar
• Promover a adequada aceitação alimentar utilizando ( ) Acordado horário de transporte intra hospitalar
técnicas como aconselhamento, gastronomia hospi-
( ) Acordado transporte para casa / ambulância
talar, alimentos confort food, visitas de acolhimento e
oficinas de nutrição.
Em hospitais, o desenvolvimento de habilidades de As previsões de alta hospitalar devem ser acompanhadas
comunicação deve ser preocupação constante, em todas com a finalidade de otimizar o processo e fornecer as orien-
as áreas. Cada vez mais a tradicional relação distante, tações ao paciente/familiar/cuidador sobre a continuidade
neutra e livre de afetos com o paciente deve ser substi- dos cuidados no domicílio. Para o sucesso do processo, a
tuída por atitudes de acolhimento e vínculo com eles, seus equipe deve:

BRASPEN J 2018; 33 (1): 86-100


97
Toledo DO et al.

• Reconhecer barreiras do aprendizado e comunicação: 10. Lew CCH, Yandell R, Fraser RJL, Chua AP, Chong MFF, Miller
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Local de realização do trabalho: Sociedade Brasileira de Nutrição Parenteral e Enteral (SBNPE), São Paulo, SP, Brasil.
Conflito de interesse: Os autores declaram não haver.
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A Artigo de Revisão
Probióticos no efeito tardio da radioterapia pélvica: retocolite ulcerativa

Uso terapêutico adjuvante de probióticos no efeito


tardio da radioterapia pélvica: a retocolite ulcerativa
Therapeutic adjunctive use of probiotics in the late effect of pelvic radiotherapy: ulcerative colitis

RESUMO
Juliana Dalapicula do Amaral1
Angela Regina Binda da Silva de Jesus2 A radioterapia pélvica é uma das formas de tratamento para as mulheres acometidas de câncer do
colo uterino em todos os estágios. Suas radiações ionizantes agem diretamente no DNA celular,
tendo a possibilidade de cura, no caso do câncer cervico uterino. Devido aos efeitos colaterais
Unitermos: das radiações, acarreta danos às pacientes, que podem ser crônicos e um deles é a retocolite
Probióticos. Neoplasias do Colo do Útero. Retocolite ulcerativa, uma moléstia que acomete o intestino e o reto. Uma das formas de auxiliar a paciente
Ulcerativa. Radioterapia.
é o tratamento terapêutico adjuvante com probióticos, que restaura a microbiota intestinal e age
Keywords: como inibidor inflamatório. O objetivo da pesquisa é relatar a importância dos probióticos para
Probiotics. Uterine Cervical Neoplasms. Rectocolitis,
Ulcerative. Radiotherapy. que possam ser logo administrados às pacientes.

Endereço para correspondência:


Juliana Dalapicula do Amaral ABSTRACT
Centro Universitário do Espírito Santo (UNESC). Pelvic radiotherapy is one of the forms of treatment for women of cervical cancer affected at all
Rua José Antônio Ramos, s/n – Ibc – Colatina, ES,
Brasil – CEP: 29700-778 stages. Their ionizing radiation acts directly on the cell gene. Having the possibility of cure in the
E-mail: juliana.dalapicula@hotmail.com case of uterine cervix cancer. Due to the side effects of radiation causes damage to the patient,

Submissão: which can be chronic and one of them is right ulcerative colitis, a disease that affects the intes-
24 de setembro de 2016 tines and rectum. One way to assist the patient’s nutritional adjunctive therapeutic treatment
with probiotics, which restores the gut and acts as an inflammatory inhibitor. The objective of the
Aceito para publicação:
12 de dezembro de 2016 research is to report its importance to be immediately to patients.

1. Acadêmica do curso de Nutrição do Centro Universitário do Espírito Santo (UNESC), Colatina, ES, Brasil.
2. Doutora em Letras pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES); professora do Centro Universitário do Espírito Santo (UNESC), Colatina,
ES, Brasil.

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Amaral DP & Jesus ARBS

INTRODUÇÃO nutrientes,modulando o sistema intestinal,assim diminuindo


O câncer de colo uterino é a segunda causa de mortan- as bactérias patogênicas e suas toxinas.
dade de câncer na população feminina no Brasil e no A palavra probiótico significa “para a vida”6. Verificam-
mundo1. O tratamento é necessário para a melhora ou se os seguintes efeitos benéficos dos probióticos: síntese de
cura da doença e um deles envolve a radioterapia pélvica. vitaminas do complexo B e vitamina K; síntese de enzimas
Suas ondas ionizantes agem diretamente no DNA da célula digestivas (lactase, proteases e peptíades); mantêm e
maligna2. Há a possibilidade de cura do câncer, mas pode produzem metabólicos como ácidos e bacteriocinas, antago-
acarretar efeitos colaterais ao paciente, trazendo danos ao nistas contra agentes patogênicos; produção de inibidores da
intestino e ao reto, já que estes ficam posteriores ao útero, síntese de colesterol, assim reduzindo os níveis de colesterol
na região pélvica. Um efeito mais frequente é a retocolite total, LDL e triglicerídeos, diminuindo os riscos de doenças
ulcerativa, que pode ser crônica3. Essa moléstia atinge a cardiovasculares
mucosa do intestino e reto, provocando lesões frequentes4. Também favorecem a produção de AGCC e a desintoxi-
Face a isto, despertou-nos um interesse pelo estudo com cação hepática; ajudam na metabolização de medicamentos,
uso terapêutico adjuvante com probióticos para o alívio dos hormônios, metais tóxicos e xenofóbicos; colonização
sintomas, remissão e inibição das inflamações e lesões, visto intestinal; modulação imunitária; ação anticarcinogênica;
que a comunidade científica tem cada vez mais interesse em reestabelecem a atividade da barreira da mucosa, assim
uma alimentação equilibrada e nos hábitos nutricionais para como produção de anticorpos.
prevenção, melhora e cura de afecções de forma saudável Ainda fornecem substâncias antimicrobianas que agem
e natural. sobre uma vasta gama de patógenos; conversão de poten-
A meta do uso terapêutico adjunto com probióticos é ciais pré-carcinógenos em compostos menos perniciosos;
melhorar a qualidade de vida dos pacientes que fizeram ou melhoram o trato gastrointestinal; auxiliam no trato das
fazem o tratamento radioterápico pélvico e, consequente- doenças inflamatórias do intestino; infecções virais; disli-
mente, passam pelo efeito tardio, que é a retocolite ulcerativa, pidemias; intolerância à lactose e outros dissacarídeos;
embora a reversão dos danos dos efeitos radioterápicos e a combatem a diarreia; melhoram o trânsito intestinal; doenças
cura da retocolite ulcerativa seja um desafio aos profissio- alérgicas; sistema imunológico; infecção por Helicobacter
nais de saúde. Para a nutrição, obtivemos os estudos com pylori; no uso da recuperação da flora intestinal durante a
probióticos que relatam recuperação da microbiota intestinal, antibioticoterapia7.
melhora dos sintomas, remissão e inibição das inflamações Os probióticos são auxiliadores no tratamento da colite
no intestino. mucosa, bolsite, doença de Crohn e carcinoma de cólon;
A nutrição adequada e o uso adjuvante de probióticos na remissão da retocolite ulcerativa; equilíbrio da microbiota
contribui e auxilia beneficamente ao paciente, melho- genital feminina; controle da hipertensão arterial; controle da
rando seu estado nutricional, atuando na recuperação cárie dentária em crianças; manutenção da saúde gástrica8.
intestinal e mantendo a remissão da retocolite ulcerativa, Diversos metabólitos bacterianos são carcinogênicos,
além da prevenção de células tumorais e ser um protetor como, por exemplo, os fecapentanos, as nitrosaminas, as
antineoplásico. aminas, a amônia e outros. Por esta razão, surge o interesse
pelos probióticos que, ao modularem a microbiota intestinal,
Probióticos: Considerações Gerais podem decrescer as bactérias associadas à doença do colón.
De acordo com Badaró et al.5, nas últimas décadas, o Neste processo, surge a discussão sobre a etapa da carci-
interesse e a investigação terapêutica pelo uso de probi- nogêneas na qual os probióticos agem.
óticos vêm aumentando substancialmente, acompanhado Dentro da complexa microbiota intestinal, as bactérias
por uma constante evidência clínica a suportar os seus lactoacidófilas beneficiam este quadro, podendo incluir
benefícios. A aplicação da cultura probiótica como multi- alterações metabólicas da flora intestinal, alterações químico-
funcionais provedores de saúde vem crescendo, devido aos fisiológicas do cólon e ligação ou degradação de potenciais
estudos científicos. carcinógenos. O efeito carcinogênico é influenciado pela
Os probióticos são microrganismos, ou seja, bactérias, atividade das enzimas β-glucoronidase, nitrorredutase e
que vivem dentro de nossa microbiota intestinal. O seu azorredutase. Bifidobacterium spp. e Lacto-bacillus spp. têm
consumo tem uma longa história e seu potencial terapêutico. baixa atividade enzimática conversora de pré-carcinogênios
O intestino humano deixou de ser visto como apenas um tubo em carcinogênicos, ao contrário dos Bacteroides spp. e
digestivo e passou a ser reconhecido como mira principal das Clostridium spp. Desta forma, a redução de microrganismos
questões imunitárias. Com o bom funcionamento da micro- produtores de enzimas pró-carcinogênicas pode beneficiar
biota intestinal, estes microrganismos competem por nossos o hospedeiro9.
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Probióticos no efeito tardio da radioterapia pélvica: retocolite ulcerativa

No momento, é grande o grupo dos probióticos identi- risco cancerígenos. No Brasil e em outras partes do mundo,
ficados. Os mais utilizados são representados por estirpes o melhor método de combater as neoplasias tem por base o
dos generos Lactobacillus, Enterococcus e Bifidobacterium. uso da prevenção como arma indispensável. Vários estudos
A análise metagenomica de DNA probiótico revelou um epidemiológicos apontaram a prevenção primária e também
papel bastante uniforme da maioria dos membros deste a secundária como fatores na redução dos grandes índices
grupo, possuindo uma abundância de genes envolvidos de internação por neoplasias.
nos mecanismos das defensivas e hidratos de carbono, bem Para essas afecções de altas incidência e mortalidade, a
como quantidade quase nula de genes envolvidos na síntese prevenção na ação precoce é, sem dúvida, bem melhor que
de flagelos e quimiotaxia4. remediar, principalmente, quando se faz uso das terapias
Um estudo sobre os efeitos da ingestão de lactobacilos neoadjuvantes que poderiam ser dispensadas, em casos
acidófilos evidenciou um declive significativo na atividade selecionados, para não agregar incômodo emocional ao
das bactérias carcinógenas. Estas bactérias diminuem paciente por todos os impedimentos das iatrogenias inerentes
igualmente a contagem de outras espécies putrefativas, tais ao tratamento que objetiva a cura. Segundo Santos Junior13,
como coliformes, possivelmente envolvidas na produção é necessário encontrar os fatores preditivos que permitam
de promotores tumorais e pré-carcinogênicos; igualmente, escolher os pacientes com probabilidade de cura apenas com
a ingestão de Bifidobacterium longum e de Lactobacillus o tratamento cirúrgico. A radiação deveria ser aperfeiçoada e
casei10. aplicada em casos nos quais o tratamento cirúrgico exclusivo
A estimulação probiótica sobre os mecanismos epiteliais não seja suficiente.
do intestino resulta como fator protetor e restitui a barreira A radiação, uma forma terapêutica reconhecida em
epitelial do intestino danificada com estabilização das junções 1922 pelo Congresso Mundial de Oncologia2, danifica
celulares, a produção de substâncias bactericidas e proteínas o material genético da célula maligna. O tratamento é
protetoras e o bloqueio pela apoptose celular, feito pela composto de raio ou partículas ionizantes de alta energia,
citosina (inflamação intestinal)5. capazes de matar as células malignas nas regiões irra-
Ressaltam-se benefícios no trato da colite mucosa, colite diadas. Depois de finalizado o tratamento de radioterapia,
ulcerosa, diverticulite; colite antibiótica; aumento do valor são necessários controles clínicos periódicos, que têm por
nutritivo dos alimentos e melhor digestibilidade11. finalidade reavaliar condições clínicas do paciente, da
lesão tratada, e a detecção de eventuais efeitos colaterais
A Radioterapia no Tratamento do Carcinoma colo a médio e longo prazo14.
Uterino O câncer e suas sequelas impõem mudanças no cotidiano
Segundo Linard et al.12, o carcinoma do colo uterino é das mulheres. Essas mudanças foram ocasionadas por uma
a neoplasia mais frequente do sistema genital feminino no consciência dos limites impostos após o tratamento radio-
Brasil, sendo uma das doenças com maior mortalidade entre terápico, com incapacidade física para exercer atividades
as mulheres e considerado, nas últimas décadas, uma séria laborais rotineiras. Os limites impostos pela doença ou pelo
questão da saúde pública. tratamento traduzidos pelas alterações físicas acarretaram
Com base no documento World Cancer Report 2014 mudanças no cotidiano das mulheres12.
da International Agency for Research on Cancer (IARC), da Na radioterapia da pelve feminina, os locais críticos e
Organização Mundial da Saúde (OMS), é inquestionável de difícil proteção são as alças intestinais, a medula óssea
que o câncer é um problema de saúde pública, especial- hematopoiética pélvica, reto, bexiga e articulações coxofe-
mente entre os países em desenvolvimento, onde é espe- morais. Enquanto as doses recomendadas de tratamento dos
rado que, nas próximas décadas, o impacto do câncer na tumores são de 45 a 85 Gy (dose equivalente em frações
população corresponda a 80% dos mais de 20 milhões de de 1,8 Gy- EQD1,8), a dose tolerável pelas alças intestinais
casos novos estimados para 2025. No Brasil, os registros de não passa de 45 Gy, a dose tolerável pela medula óssea é
Câncer de Base Populacional (RCBP) fornecem informações de aproximadamente 20 a 35 Gy e as doses toleráveis por
sobre o impacto do câncer nas comunidades, configurando- reto e bexiga dependem dos volumes de cada órgão irra-
se uma condição necessária para o planejamento e a diado. O impacto da irradiação de alças intestinais acima
avaliação das ações de prevenção e controle de câncer1. destas doses pode levar a enterites graves, em algumas vezes
O carcinoma é decorrente de falhas no crescimento e letais. A toxicidade hematológica aguda pode levar a inter-
proliferação das células, responsáveis pelo funcionamento rupções do tratamento que prejudicam as chances de cura
do nosso organismo. É responsável por cerca de 13% no das pacientes. Retites e cistites graves podem comprometer
índice de óbitos no mundo, e esse índice vem crescendo a a qualidade de vida das pacientes e aumentar muito o custo
cada ano, devido à exposição dos indivíduos aos fatores de final do tratamento3.
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Realçam-se os órgãos mais comuns afetados e o reto, destes dados não terem significância estatística, este trabalho
a bexiga, o intestino e a medula óssea. Ocorrem diarreias abriu precedentes para a pesquisa dos efeitos benéficos dos
e cólicas abdominais e efeitos tardios incluem a retocolite probióticos, bem como dos seus produtos4.
ulcerativa3.
MÉTODO
Retocolite Ulcerativa e o Uso Terapêutico Adjuvan-
Trata-se de uma revisão bibliográfica, que buscou artigos
te com Probióticos
e publicações em sites com as palavras-chave retocolite
Santos Júnior15 define a retocolite ulcerativa como uma
ulcerativa, uso terapêutico probióticos, efeitos colaterais
afecção idiopática, que afeta o reto e as porções do colón,
da radioterapia pélvica, câncer colo de útero e benefícios
caracterizada por inflamações recorrentes que acomete a
probióticos. A busca foi feita no período de abril a maio
camada mucosa. As manifestações clínicas são sangramento
de 2016. Foram incluídos artigos que tratassem do tema
retal, muco e dor abdominal. É diagnosticada com história
envolvendo desde do tratamento de câncer colo uterino,
clínica e exame físico do paciente, incluindo o proctológico,
seus efeitos, e os estudos com probióticos, publicações em
radiológico, endoscópico, biópsia e colonoscopia. O trata-
língua portuguesa e inglesa.
mento para remissão deve ser feito com fármacos15.
Concentrou-se no efeito tardio da radioterapia, a retoco-
Já Guindi & Riddell16 descrevem a retocolite ulcerativa
lite ulcerativa. O objetivo da pesquisa é utilizar os probióticos
como uma afecção inflamatória atingindo o reto e o cólon.
como adjuvante na remissão da afecção.
A barreira de defesa culmina por toda a parede da mucosa
intestinal de forma contínua, destruindo a estrutura da
mesma, impedindo a absorção de nutrientes e formando RESULTADOS
abcessos. As lesões apresentam granulomas, úlceras e fístulas Conforme os estudos de Tursi et al.19, o uso de VSL#3, um
profundas. probiótico com 112.500 milhões de bactérias lácteas vivas,
Para Teixeira4, é uma doença limitada à camada mucosa associado à balsalazide, melhorava os sintomas, a aparência
do cólon. A localização mais frequente é o reto e pode-se endoscópica e a histológica, comparativamente ao uso de
estender proximamente de forma contínua. outros 5-ASA isoladamente, tendo sido demonstrado que
Polalowski17 enfatiza que é de extrema importância o bom a combinação dos 2 agentes era mais eficaz que qualquer
funcionamento intestinal e sua microbiota para a nutrição e um dos 5-ASA testados isoladamente, mesmo sendo, estes
defesa do organismo. últimos, usados em doses superiores.
Relata-se que os mecanismos de ação da intervenção Os autores admitiram que uma suplementação com
nutricional poderiam atuar na modulação dos mecanismos VSL#3 permite reduzir o escore em doentes com colite
de defesa imunológica e de citosinas da mucosa intestinal, ulcerosa que estão sob tratamento. Neste estudo, apesar
reduzir a estimulação antigênica, além de fornecer nutrientes de referir a existência a indução de remissão, o tratamento
para proporcionar reparação tecidual e manutenção do adjuvante com VSL#3 não mostrou uma melhora estatisti-
estado nutricional18. camente relevante.
Entre os cirurgiões, os probióticos mais prescritos são Diferenças nos resultados podem advir dos diferentes
iogurtes com probióticos, enquanto nos gastroenterologistas tratamentos utilizados ou diferentes estádios da doença na
o probiótico mais prescrito é o VSL#3. Esta alta percentagem amostra: enquanto no estudo de 2004 se incluíam apenas
de prescrições pode-se entender pela aparente segurança doentes que utilizavam 5-ASA (terapia de primeiro grau na
dos probióticos, pela fácil aceitação dos doentes em relação colite ulcerativa), em 2010 foram incluídos doentes em uso
a estes. Diferente me parece a atitude dos clínicos que de imunomoduladores (azatioprina e 6-mercapropurina). Isto
prescrevem probióticos, como VSL#3, que, para além de pode levantar a questão da eficácia do tratamento probiótico
terem um rigoroso controle de fabricação, tem já grau de estar ligada ao grau de gravidade da doença.
evidência terapêutica4. Bibiloni et al.20 demostraram resultado positivo da VSL#3
Há casos com pacientes tratados com fármacos junto com com a remissão de 53% dos doentes refratários à terapêu-
probióticos que proporcionaram uma melhora na remissão tica convencional para a colite ulcerosa.De acordo com
da colite ulcerativa. No ano de 2004, foi feito um estudo Sood et al.21, o VSL#3 levou a uma diminuição de 50% no
sobre bifidobactérias que concluiu que o índice de atividade UCDAI depois de 6 semanas de administração (32,5% com
do reto ou colite ulcerativa era mais baixo em doentes que VSL#3 versus 10% com o placebo) tendo levado à remissão
tomavam o leite fermentado do que no grupo controle. O clínica em quase metade dos pacientes dos estudos, após
primeiro grupo tinha ainda resultados mais baixos nos escores 12 semanas de administração (42,9% com VSL#3 versus
de índice de atividade endoscópica e histológica. Apesar 15,7% com placebo).
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104
Probióticos no efeito tardio da radioterapia pélvica: retocolite ulcerativa

Em um estudo, feito com crianças de 6, 12 meses, ou concentração mais elevada de bactérias benéficas vivas,
no momento de recaída, os escores histológicos e endos- encontrado nos Estados Unidos.
cópicos eram significativamente mais baixos na população Ressaltamos também os estudos de Matthes et al.23, sobre
que tomava VSL#3, relativamente ao grupo Probióticos na o menor tempo de remissão e melhoria, associando com
doença inflamatória intestinal. Este probiótico foi eficaz na os estudos de Ishikawa et al.24, que embora com bactérias
indução de remissão na colite ulcerativa em população probióticas diferentes tiveram bons resultados. Os probió-
pediátrica.Experiências com outros probióticos foram também ticos utilizados nestas pesquisas são encontrados no Brasil,
levadas a cabo para a remissão da Colite Ulcerativa branda em farmácia, desde que recomendado por nutricionista ou
e moderada22. médico, e em mercados também.
O uso de enemas de EcN foi testado em diferentes doses A cura da retocolite ulcerativa é um desafio aos cien-
para tentar uma remissão da colite ulcerosa. Este estudo tistas, bem como aos profissionais de saúde. Os estudos
mostrou que não houve diferença estatística na análise de
mostraram que o uso adjunto terapêutico dos probióticos
intenção de tratamento (ITT), no entanto, o tempo para a
com a associação dos fármacos reduz os escores do intestino,
remissão foi menor neste grupo. Estudos com Saccharomyces
recuperação da microbiota intestinal, melhora dos sintomas,
boulardii demonstram uma franca melhoria, confirmada
inibição das inflamações no intestino e faz a remissão da
endoscopicamente em doentes que tomam este probió-
retocolite ulcerativa na maioria dos pacientes.
tico associado à mesalazina. Apesar de todos fortemente
positivos, tratam-se apenas de open label studies com uma
amostra relativamente pequena23. CONCLUSÃO
A preparação probiótica com Propionibacterium freu- O consumo de probióticos é benéfico ao organismo
denreichii, isolado do queijo suíço, induziu um significante no reestabelecimento da microbiota intestinal. Os estudos
decréscimo da atividade clínica e endoscópica da colite ulce- científicos comprovam seu papel adjuvante nas escoriações,
rosa. Foram também medidas as concentrações em AGCC, inibição inflamatória e remissão da colite ulcerativa.
nomeadamente butirato, e foi detectado um aumento em
A importância nutricional dos probióticos, bem como seus
quase todos os pacientes, sugerindo que a melhora clínica
benefícios, prevenindo diversas afecções, desempenhando
e endoscópica, se deve à inibição de citocinas inflamatórias
de forma isolada funções específicas, além de defesas
pela ação do butirato na mucosa inflamada.
cancerígenas e ao decorrer de nossa vida, mostra que é
Segundo a Teixeira4, a grande maioria dos estudos reali- necessário consumi-los. Ressaltamos que o mais importante
zados para a manutenção da remissão da Colite Ulcerativa é a prevenção do câncer, com uma vida equilibrada com
usaram o probiótico E. coli de Nissle (EcN). Neles, este probi- hábitos nutricionais saudáveis livre de aditivos, formulações
ótico era comparado com a terapêutica com 5-ASA. Todos químicas e agrotóxicos; exercícios diários e exames feitos
os trabalhos foram unânimes em afirmar que EcN é, pelo periodicamente.
menos, tão eficaz como 5-ASA na manutenção da remissão
Os pacientes submetidos à radioterapia pélvica e acome-
da Colite Ulcerativa. Ishikawa et al.24 testaram a mistura
tidos por retocolite ulcerativa podem fazer uso da terapia
probiótica Yakult (bifidobacteria breve, Bifidobacteria bifidum
nutricional com probióticos, desde que prescritos e com
e Lactabacillus acidophilus) num pequeno estudo aberto,
comparando-a com terapia com mesalazina ou sulfalazina. acompanhamento médico e nutricional.
Este estudo mostrou a superioridade da mistura probiótica.
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Alencar Gomes da Silva (INCA). Estimativa 2016.Brasília:
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comprovaram, após dois meses e meio de uso do probi- 3. Castilho M, Pimentel LFC, Ferrigno R; Sociedade Brasileira de
óticos, melhora da afecção. Miele et al. 22 constataram Radioterapia. Tratamento de tumores ginecológicos com radio-
eficácia para as crianças. terapia. São Paulo: Sociedade Brasileira de Radioterapia;2014.
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Notamos que a terapia ajunta com probióticos é 4. Teixeira ARM. Probióticos na doença inflamatória intestinal
funcional, necessária e adjunta com exceção dos casos [Dissertação de mestrado]. Covilhã: Universidade da Beira
Interior: Covilhã; 2014.
severos. O probiótico usado nas pesquisas dos autores
5. Badaró ACL, Guttierres APM, Rezende ACV, Stringheta PC.
citados é o VSL#3, realçando que é um potente probiótico Alimentos probióticos: aplicações como promotores da saúde
que possui 112.500 milhões de bactérias lácteas, com a humana - Parte 2. Rev Dig Nutr. 2008;2(3):1-28.

BRASPEN J 2018; 33 (1): 101-6


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Local de realização do trabalho: Centro Universitário do Espírito Santo (UNESC), Colatina, ES, Brasil.

Conflito de interesse: Os autores declaram não haver.

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Instruções aos Autores

SUBMISSÃO DOS MANUSCRITOS

Os trabalhos podem ser submetidos pelo site do BRASPEN. especiais. Por favor, use espaçamento duplo em todo o texto e adicionar numeração de
O sistema de submissão utilizado pelo BRASPEN Journal é o OJS. O tutorial para linha em todas as páginas. Padrão Tipo 10 ou 12 pontos e espaçamento são preferidos ao
submissão de manuscritos encontra-se no tópico deste site em “Tutorial de submissão de espaçamento proporcional.
artigos científicos“.
4. Manuscrito
Critérios de autoria e contribuição individual Os manuscritos podem ser submetidos nos idiomas português, inglês e espanhol,
obedecendo à ortografia vigente, empregando linguagem fácil e precisa e evitando-se a
Sugerimos os autores a adotar os critérios de autoria dos artigos, de acordo com as informalidade da linguagem coloquial. Só serão aceitos artigos originais, de revisão sistemática
recomendações do International Committee of Medical Journal Editors. Dessa forma, apenas ou de revisão a convite do corpo editorial.
as pessoas que contribuíram diretamente para o conteúdo do estudo devem ser listadas Os manuscritos devem ser divididos em Introdução, Método, Resultados, Discussão e
como autores. Conclusão (Artigos Originais).
Os autores devem satisfazer os seguintes critérios, a fim de ser capaz de assumir a Os manuscritos não poderão exceder a 5.000 palavras (Artigos Originais) e 7.500 palavras
­responsabilidade pública pelo conteúdo do estudo: (Artigos de Revisão Sistemática) no total, incluindo Referências.
• Ter concebido e planejado as atividades que levaram ao estudo ou interpretados os É mandatória a inserção do item Conflito de Interesse imediatamente antes das Referências.
dados que ela apresenta, ou ambos; O número de referências não deve superior a 25 para Artigos Originais e 50 para Revisão
• Ter escrito o estudo ou revisado versões sucessivas e participou no processo de revisão; Sistemática.
• Ter aprovado a versão final. Agradecimentos sucintos são opcionais, entretanto, a indicação de financiamento da
As pessoas que não preencham os requisitos acima e que tiveram participação puramente ­pesquisa, o nome da agência financiadora e o número do processo são requeridos.
técnica ou de suporte geral devem ser mencionadas na seção de agradecimentos. Recomenda-se aos autores que, previamente à submissão de seu manuscrito, utilizem o
Na submissão, o tipo de contribuição de cada autor ao realizar o estudo e preparação check list correspondente à categoria de artigo:
do manuscrito nas seguintes áreas deve ser explicitado: • CONSORT (CONsolidated Standards of Reporting Trials) check list e fluxograma para
• Design de estudo ensaios controlados e randomizados, disponível em http://www.consort-statement.org/
• Coleta, análise e interpretação de dados • STARD (Standards for Reporting of Diagnostic Accuracy) check list e fluxograma para
• Elaboração e revisão final do manuscrito estudos de acurácia diagnóstica, disponível em: http://www.stard-statement.org/
• PRISMA (Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta-analyses)
Estrutura do Artigo check list e fluxograma para revisões sistemáticas, disponível em: http://www.prisma-
statement.org/
O BRASPEN JOURNAL adota os Requisitos de Vancouver - Uniform Requirements for • STROBE check list para estudos observacionais em epidemiologia, disponível em:
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Medical Journal Editors - “Vancouver Group”, disponíveis em www.icmje.org. A obediência às
instruções é condição obrigatória para que o trabalho seja considerado para análise. 5. Referências
a) Página de Rosto As referências dos documentos impressos e eletrônicos devem ser normalizadas de
b) Resumoe Abstracte Palavras-chaves (unitermos, keywords) em Português e Inglês acordo com o estilo Vancouver, elaborado pelo International Committee of Medical Journal
c) Manuscrito Editors, disponível em: http://www.icmje.org
d) Referências Títulos de periódicos devem ser abreviados de acordo com o List of Journals Indexed for
e) Tabelas e Figuras MEDLINE (disponível em: http://www.nlm.gov/tsd/serials/lji.html).
f) Lista para conferência (Check-List) As referências serão limitadas a 25 (Artigos Originais) e 50 (Artigos de Revisão, Siste-
mática).Com esses números reduzidos,cabe restringir ao máximo introduções históricas,
1. Página de Rosto metodologias pormenorizadas, discussões com revisão da literatura e citações repetitivas.
Deve assinalar o título do artigo, que não deve ultrapassar 200 caracteres. Os autores devem se concentrar nos achados centrais do protocolo e na sua comparação
Devem ser informados nome completo dos autores com respectivas titulações, e-mail e com a literatura recente, preferencialmente dos últimos 3-5 anos.
serviço ao qual estão vinculados (até três níveis hierárquicos institucionais e apresentado em As citações bibliográficas, no texto, devem ser sobrescritas e numeradas na ordem em
ordem decrescente, por exemplo, universidade, faculdade e departamento), cidade, estado que são citadas.
e país em que está localizada. Quando um autor é afiliado a mais de uma instituição, cada Caso haja até 6 autores, devem todos ser listados, sendo que para maior número, os
afiliação deve ser identificada separadamente. Quando dois ou mais autores estão afiliados primeiros 6 seguidos de et al. devem ser utilizados. Salvo circunstâncias excepcionais, não
à mesma instituição, a identificação da instância é feita uma única vez. Informar o nome e será admitida citação de resumo, comunicação pessoal, literatura comercial ou outras fontes
endereço completo do autor correspondente (não esquecer telefone, celular e fax). que não revistas e livros científicos, bem como artigos e portais eletrônicos reconhecidos.
Deve ser informada a instituição em que o trabalho foi desenvolvido. As afiliações não Nas citações de pesquisadores ao longo do texto, deve-se citar o primeiro autor, seguido
devem vir acompanhadas das titulações ou minicurrículos dos autores. da expressão “et al.” ou o autor único se for o caso, sempre com a respectiva referência
Caso o trabalho tenha sido apresentado em eventos científicos, como congresso ou em sobrescrito.
simpósios, devem ser mencionados: nome do evento, local e data da apresentação. Reproduzimos abaixo alguns exemplos mais comuns de referências empregadas nos
Acrescentar contagem de palavras do Resumo, e do Manuscrito, bem como número de artigos. Outros modelos podem ser acessados no site: http://www.nlm.nih.gov/bsd/­
Tabelas, Figuras e Anexos. uniform_requirements.html

2. Resumo e Palavras-chaves Modelos de referências


Os resumos devem ser estruturados (Introdução, Método, Resultados e Conclusões) e
não devem exceder a 300 palavras. – Artigo padrão
Nesta mesma página, devem ser incluídos 3 a 10 unitermos (palavras-chaves) que de- Burjonrappa SC, Miller M. Role of trace elements in parenteral nutrition support of the
finam o assunto do trabalho, assim com a respectiva tradução para o inglês (abstract and surgical neonate. J Pediatr Surg. 2012;47(4):760-71.
keywords). Esses unitermos podem ser consultados nos endereços eletrônicos: http://decs. – Artigo com mais de 6 autores
bvs.br/ que contém termos em português, espanhol ou inglês, ou www.nlm.nih.gov/mesh, Moriya T, Fukatsu K, Maeshima Y, Ikezawa F, Hashiguchi Y, Saitoh D, et al. The effect of
para termos somente em inglês. adding fish oil to parenteral nutrition on hepatic mononuclear cell function and survival after
intraportal bacterial challenge in mice. Surgery. 2012;151(5):745-55.
3. Formatação – Artigo cujo autor é uma organização
Os trabalhos devem ser apresentados em Microsoft Word (.doc / .docx). Utilizar letra Diabetes Prevention Program Research Group. Hypertension, insulin, and proinsulin in
tamanho 11 e fontes: Times, Times New Roman, Helvetica, Arial, e Symbol para caracteres participants with impaired glucose tolerance. Hypertension. 2002;40(5):679-86.

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107
– Livro padrão O sistema de avaliação é o duplo cego, garantindo o anonimato em todo processo
Braunwald E, Zipes DP, Libby P, Bonow R. A textbook of cardiovascular medicine. 8th de avaliação. A decisão sobre a aceitação do artigo para publicação ocorrerá, sempre
ed. Philadelphia: Saunders Elsevier; 2008. que possível, no prazo de três meses a partir da data de seu recebimento. As datas do
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Meltzer PS, Kallioniemi A, Trent JM. Chromosome alterations in human solid tumors. In: com o intuito de respeitar os interesses de prioridade dos autores. Assim que uma decisão
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2002. p.93-113. eletronicamente.
– Website O BRASPEN JOURNAL sugere aos seus revisores que sigam as diretrizes propostas
Brasil. Ministério da Saúde. DATASUS. Mortalidade para causas selecionadas – 2006 pelo COPE Ethical Guidelines for Peer Reviewers, disponível em: http://publicationethics.
[Internet]. Brasília; 2007 [citado 2010 jul. 16]. Disponível em: http://www2.datasus.gov. org/files/Ethical_guidelines_for_peer_reviewers_0.pdf
br/DATASUS/index.php
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secretaria, para verificar se está de acordo com as normas de publicação e completo. Após Devem, também, evitar nomes comerciais ou de empresas.
verificação estrutural inicial, será acusado o recebimento por e-mail com a devida numera- Fotos de pacientes só poderão ser incluídas mediante nome, documento e assinatura
ção, iniciando-se o processamento editorial. Todos os trabalhos são submetidos à avaliação do envolvido autorizando publicação, mesmo que os olhos estejam vendados ou o rosto
pelos pares (peer review) por pelo menos dois revisores selecionados dentre os membros desfocado.
do Conselho Editorial. A aceitação é baseada na originalidade, significância e contribuição
científica. Os revisores preenchem um formulário, no qual fazem uma apreciação rigorosa de Política para Registro de Ensaios Clínicos
todos os itens que compõem o trabalho. Ao final, farão comentários gerais sobre o trabalho A Revista Brasileira de Nutrição Clínica, em apoio às políticas para registro de ensaios
e opinarão se o mesmo deve ser publicado, corrigido segundo as recomendações. De posse clínicos da Organização Mundial de Saúde (OMS) e do International Committee of Medical
desses dados, o editor toma a decisão final. Em caso de discrepâncias entre os avaliadores, Journal Editors (ICMJE), reconhecendo a importância dessas iniciativas para o registro e
pode ser solicitada uma nova opinião para melhor julgamento. divulgação internacional de informação sobre estudos clínicos, em acesso aberto, somente
Quando são sugeridas modificações pelos revisores, as mesmas são encaminhadas ao aceitará para publicação artigos de pesquisas clínicas que tenham recebido um número
autor principal e, a nova versão encaminhada aos revisores para verificação se as sugestões/ de identificação em um dos Registros de Ensaios Clínicos validados pelos critérios estabe-
exigências foram atendidas. Em casos excepcionais, quando o assunto do manuscrito assim lecidos pela OMS e ICMJE, disponível no endereço: http://clinicaltrials.gov ou no site do
o exigir, o Editor poderá solicitar a colaboração de um profissional que não conste da relação PubMed ou registro na Plataforma Brasil (www.saude.gov.br/plataformabrasil). O número
do Conselho Editorial para fazer a avaliação. Todo esse processo é realizado por e-mail. de identificação deve ser registrado ao final do resumo.

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