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SOBRE O MANIFESTO DOS PIONEIROS DA EDUCAÇÃO NOVA, SEUS PRINCIPAIS

REPRESENTANTES E SUA BASE LIBERAL

Adnilson José da Silva


Pedagogo. Mestre em Educação.
Professor do Departamento de Pedagogia (DEPED)
da Universidade Estadual do Centro-Oeste – UNICENTRO
(Guarapuava, PR)

O estudo das teorias filosóficas da educação brasileira não pode se deter ao elenco e descrição de correntes e
doutrinas da filosofia ligadas à dinâmica educacional nesse país, mas sim, analisar a conjuntura que
privilegiou cada proposta educacional, hegemônica ou não, a partir de seu embasamento filosófico e de sua
organicidade com as políticas educacionais estatais e com as propostas de reforma e de antítese revolucionária
. Isso remete ao estudo da política e da economia, áreas que são consideradas transversalmente entre os
fundamentos da educação em cursos de formação docente.
Este artigo se dedica ao estudo da Escola Nova, cujas defesas foram formalmente apresentadas, no Brasil, em
1932, por um grupo de intelectuais de orientação liberal através do Manifesto dos Pioneiros da Educação
Nova. Esse documento defendeu a importância da educação para o progresso nacional brasileiro em bases
democráticas e urbano-industriais em um período caracterizado pela implantação de um novo projeto nacional
de desenvolvimento, o qual incluiu estratégias econômicas para a substituição de importações, e radicalização
política. Foram bases liberal e pragmatista que caracterizaram a Escola Nova como a proposta pedagógica
ideal para o novo projeto nacional de desenvolvimento brasileiro.
A Escola Nova propôs maior atenção aos processos de aprendizagem do que aos produtos/conteúdos até então
valorizados, fazendo assim clara oposição e crítica ao tradicionalismo pedagógico, que até então era
hegemônico e marcado por uma cultura educacional que os escolanovistas acusaram de verbalista e
enciclopédica. O escolanovismo foi animado por experiências e descobertas na área de educação ocorridas
nos Estados Unidos da América, sobretudo graças ao trabalho do filósofo John Dewey, que entendia que o
processo educativo formal precisava ter finalidade prática, preparando os indivíduos para agirem
concretamente na sociedade.
Serão considerados, neste trabalho, aspectos relacionados à matriz ideológica liberal do escolanovismo, ao
nascedouro europeu e estadunidense da Escola Nova, ao contexto brasileiro da década de 1930 e aos maiores
teóricos da Escola Nova desde o norte-americano John Dewey até os brasileiros Anísio Teixeira, Fernando de
Azevedo e Lourenço Filho. Receberá especial atenção o documento emblemático Manifesto dos Pioneiros da
Educação Nova.
Entre outras referências para esse estudo conjuntural, estão as contribuições de Celso Furtado, Luiz Carlos
Bresser Pereira, Dermeval Saviani .....

O liberalismo como base ideológica da Escola Nova


O estudo do liberalismo exige distinguir duas de suas constituições: o liberalismo político e o liberalismo
econômico.
Na arena política, o liberalismo surgiu como uma corrente defensora da liberdade do indivíduo frente ao
Estado, limitando e descentralizando o poder. Dessa maneira, o liberalismo se constituiu como um golpe
contra o absolutismo e deu impulso à formação dos estados modernos europeus e americanos durante os
séculos XVIII e XIX, pois “opôs-se ao poder centralizado (na pessoa do Rei) e deu origem à democracia
liberal, que representou um grande avanço em relação às monarquias absolutas” (BRUM, 1999, p. 26).
Por sua vez, a idéia de liberdade que embasa o liberalismo econômico distoa daquela inicialmente defendida
no campo político; nesse caso, defende-se que a economia deve ser conduzida por um jogo livre das leis de
mercado, as quais seriam absolutas e naturais. O principal nome do liberalismo econômico é Adam Smith
(1723 – 1790), para quem “o mundo seria melhor – mais justo, racional eficiente e produtivo – se nele
reinasse, soberana, a livre iniciativa, se as atitudes econômicas dos indivíduos (e suas relações) não fossem
limitadas por regulamentos e monopólios, estatais ou corporativos” (MORAES, 2000, p. 7). Percebe-se, com
isso, que um dos principais eixos do liberalismo é a ação individual, a qual foi considerada por Adam Smith
em seu livro A Riqueza das Nações como um fator de garantia da organização, da harmonia e do bem
coletivo, pois segundo ele “os interesses e os sentimentos privados dos indivíduos os induzem a converter seu
capital para aplicações que, em casos ordinários, são as mais vantajosas para a sociedade” (SMITH, 1983, p.
104). Sucintamente, Argemiro Brum explica que os eixos básicos do liberalismo são sete, a saber:

a) o individualismo (confere primazia absoluta ao indivíduo, deixando o coletivo ou social relegado a um


plano secundário); b) a liberdade de pensamento e de expressão; c) a livre iniciativa, desembaraçada dos
empecilhos da ação do Estado; d) a propriedade privada dos meios de produção; e) a livre concorrência; f) um
Estado reduzido (o “Estado mínimo”), apenas responsável pela manutenção da ordem interna e da segurança
externa. (BRUM, 1999, p. 27)

É preciso considerar que o liberalismo e o capitalismo são intimamente relacionados, pois sem a liberdade de
mercado o capitalismo seria impossível. A primeira defesa de liberdade em favor do capitalismo se relaciona a
uma suposta disposição natural para as trocas comerciais (SMITH, 1983). Advogando que os homens
precisam ser livres para a prática natural do comércio, Adam Smith ataca o Estado como instituição cuja ação
pode frustrar essa liberdade e até mesmo impedir o progresso coletivo:

Sem qualquer intervenção da lei, os interesses e os sentimentos privados das pessoas naturalmente as levam a
dividir e distribuir o capital de cada sociedade entre todas as diversas aplicações nela efetuadas, na medida do
possível, na proporção mais condizente com o interesse de toda a sociedade. (SMITH, 1983, p. 104)

Em 1789, Bentham teria descrito os mecanismos de concorrência e as benesses que pode proporcionar
aos que se sobressaem em sua dinâmica:

A livre concorrência equivale a uma recompensa que se concede àqueles que fornecem as melhores
mercadorias pelos preços mais baixos. Ela oferece uma recompensa imediata e natural, que uma multidão de
rivais alimenta a esperança de conseguir, e atua com maior eficácia que um castigo distante, do qual cada um
talvez espere escapar. (apud MORAES, 2000, p. 8)

Ao tratar do engajamento de nações inteiras à ordem liberal, David Ricardo (1772 – 1823) substitui os sujeitos
(presentes no pensamento de Smith) pelos países e amplia a defesa do livre comércio para o âmbito
internacional. Segundo ele,

Num sistema comercial totalmente livre, cada país naturalmente dedica seu capital e seu trabalho à atividade
que lhe seja mais benéfica. Essa busca de vantagem individual está admiravelmente associada ao bem
universal do conjunto dos países. Estimulando a dedicação ao trabalho, recompensando a engenhosidade e
propiciando o uso mais eficaz das potencialidades proporcionadas pela natureza, distribui-se o trabalho de
modo mais eficiente e mais econômico, enquanto pelo aumento geral de volume de produtos difunde-se o
benefício de modo geral e une-se a sociedade universal de todas as nações do mundo civilizado por laços
comuns de interesse e de intercâmbio. Este é o princípio que determina que o vinho seja produzido na França
e em Portugal, que o trigo seja cultivado na América e na Polônia, e que as ferramentas e outros bens sejam
manufaturados na Inglaterra. (RICARDO, 1982, p. 104)
Ao tratarem de Liberalismo e educação em Dewey, Vanessa Jaqueline da Silva e José Carlos Araújo
consideram expressões do pensador estadunidense que apresentam as mudanças conceituais do liberalismo
desde a liberdade de pensamento defendida por John Locke até a restrição dessa liberdade ao universo
comercial com base em Adam Smith. Contudo, o foco se estabelece nas contribuições de Bentham, para quem
o liberalismo deveria ser uma base jurídica para liberdades individuais; com base nesse aspecto, Dewey
defende que a liberdade individual de sujeitos bem politizados evitariam irresponsabilidades e prejuízos
sociais, apresentando, assim, o liberalismo coletivista em oposição ao liberalismo individualista até então
predominante. SILVA e ARAÚJO afirmam que os adeptos do liberalismo coletivista “defendiam que o
Estado era o responsável pela criação de instituições onde os indivíduos pudessem desenvolver plenamente
suas potencialidades” (2005, p. 8), o que se apresenta como justificativa da base liberal coletivista para a
Escola Nova de Dewey.
O liberalismo coletivista é ético; contrariamente, o liberalismo individualista é utilitarista. O liberalismo
coletivista trouxe respostas que o liberalismo individualista (de base economicista) não conseguiu apresentar,
sobretudo as vinculadas ao problema da liberdade e da democracia: segundo Dewey, ao contrário do que se
pensava antes a liberdade não é absolutamente individual, e muito menos redutível a ações econômicas, mas
sim, a base coletiva para desenvolvimentos individuais com conjugação entre racionalidade e emoção.

A Escola Nova a partir de seu nascedouro europeu e estadunidense


Ver as raízes do escolanovismo em DI GIORGIO
As raízes do escolanovismo datam da última década do século XIX. Em 1899 foi fundado o Bureau
International des Écoles Nouvelles, e vinte anos depois foram divulgadas as características gerais das escolas
que adotavam os princípios escolanovistas, os quais passaram a ser observados por educadores de várias
partes do mundo.
Cristiano Di Giorgio faz uma síntese da história da Escola Nova e de seus principais personagens observando
que as comunidades escolares reproduziam as dinâmicas da vida social. Segundo ele, as experiências iniciais
do escolanovismo tinham “em comum o fato de terem sido executadas em internatos situados no campo, onde
se procurava que a educação se desse misturada com a vida dos alunos, onde se realizavam atividades como
criação de animais, jardinagem, etc., todas elas planejadas no sentido de serem educativas” (DI GIORGIO,
1989, p. 27).
Um das primeiras experiências pedagógicas segundo os fundamentos da Escola Nova foi concebido por
Helena Parkhurst e chamado de Plano Dalton, pois foi implementado na cidade de Dalton, em Massachussets,
nos Estados Unidos. Nesse plano, os alunos seguiriam planos individuais de estudos definidos em um sitema
de contratos; os professores providenciariam os materiais necessários aos seus alunos e os acompanharia À
semelhança de um sistema de tutoria. Por prever ações individuais e pestuos ap artir de referncial
bibliográfico, o Plano Dalton foi acusado de trair ideais escolanovistas de iniciativa, cooperação e afinidade
com o cotidiano dos alunos.
Outros nomes importantes da Escola Nova foram os dos médicos Ovide Decroly e Maria Montessori. Ao
privilegiarem processos biológicos e psicológicos da aprendizagem, são contados entre os escolanovistas que
defenderam que a educação deveria deixar uma base predominantemente filosófica em benefício de uma base
científica.
A metodologia proposta por Decroly considerava a articulação das disciplinas curriculares em torno de
centros de interesse das crianças, o que o levou a ser criticado em círculos escolanovistas que não aceitavam
os currículos tradicionais. O pensamento pedagógico de Decroly foi considerado como característico da
transicção da Escola Tradicional para a Escola Nova.
Ao atribuir valor fundamental à infância, Maria Montessori apresenta uma das mais fortes características da
Escola Nova: a organização do meio escolar de acordo com as características físicas e psíquicas próprias da
infância e a utilização de material lúdico para alfabetização, aprendizagem matemática e estudos de história.
A discípula de Montessori, Libienska, defendeu a educação religiosa desde a infância, pois acreditava que as
crianças eram capazes de sentir a religiosidade de maneira mais pura do que os adultos, os quais tendiam a
manter com a religiosidade uma atitude racional.
Outros expoentes da Escola Nova são “Kilpatrick, discípulo de Dewey”, “Claparède, criador do conceito de
‘educação funcional’, que montou o Instituto Jean-Jacques Rousseau, na Universidade de Genebra”, e
“Ferrière, durante bom tempo coordenador do Bureau Iternational des Écolas Nouvelles”. (DI GIORGIO,
1989, p. 37 – 38)
Cabe ainda destacar um dos mais conhecidos pedagogos do século XX, Celestien Freinet. Ele se esforçou para
“superar a ligação da Escola Nova com as camadas dominantes, para usar seus princípios e deles fazer uma
pedagogia popular, colocando no centro de sua metodologia a questão do trabalho” (DI GIORGIO, 1989, p.
38). As críticas contra Freinet o acusam de um ruralismo extremado e de um irracionalismo exagerado; além
de desincentivar “a ida de crianças ao cinema” por considerar que as atividades na cidade eram geralmente
nocivas, Freinet atribuía “pouquíssimo valor ao raciocínio lógico, racional, ordenado” defendendo o incentivo
a um “saber espontâneo e principalmente o sentimento e a sabedoria de vida” (DI GIORGIO,1989, p. 38).
Finalmente, o maior sistematizador da Escola Nova: o filósofo estadunidense John Dewey (1859 – 1952).
Para melhor compreender o seu propósito pedagógico, é necessário considerar o processo de desenvolvimento
econômico e social que ocorrera nos Estados Unidos da América, cujas influências marcaram profundamente
desde os ordenamentos institucionais até as agendas pessoais e familiares entre o final do século XIX e início
do século XX:
os efeitos da revolução industrial já são amplamente sentidos, tanto na vida moral quanto na vida pessoal. Os
progressos da ciência beneficiando uma tecnologia nova, propiciaram o advento dos transportes, da luz
elétrica e de todo equipamento que mudou radicalmente a qualidade de vida, sobretudo nos centros urbanos.
A mulher se dirigiu ao trabalho e nunca mais saiu das oficinas, das fábricas e dos escritórios. (AGUIAR
NETO e SERENO, 1999, p. 68)

Diante de tais mudanças Dewey entendeu que a educação escolar deveria proporcionar às crianças uma
capacidade de ação mental e instrumental suficiente para apreenderem a realidade dinâmica da primeira
metade do século XX e para intervirem nela. Caberia também à escola socializar as crianças, salvaguardando-
as, assim, de prejuízos ligados ao individualismo característico da cultura industrial.
A proposta pedagógica de Dewey se assentava no pragmatismo e no liberalismo; no caso do pragmatismo,
Dewey percebia nessa corrente filosófica um fundamento para uma educação capacitadora para ações
condizentes tanto com a industrialização quanto com as estratégias de racionalização e práticas de
recuperação econômica pós-1929; o liberalismo proporcionaria uma liberdade individual para aprender por
meio de experiências e interesses pessoais, bem ao contrário do que previam os currículos uniformes e
impositivos da educação tradicional.
Incluir citações de DEWEY

A conjuntura brasileira e o processo de modernização industrial do país


Considerando-se que a Escola Nova se apresentou como um modelo pedagógico que daria suporte a uma
proposta de superação da política tradicional, atacando estratégicamente a escola tradicional, convém saber
quais eram as características do tradicionalismo político e econômico que caracterizavam o Brasil até então,
bem como verificar as características do tradicionalismo pedagógico.
A respeito da política tradicional, segundo Luiz Carlos Bresser Pereira tratava-se de uma
política de clientela, em que a classe dominante troca os votos do povo por promessas de recompensa,
geralmente por promessas de emprêgo público. E o pequeno número de eleitores e seu caráter totalmente
dependente da classe dominante tornam fácil a realização dessa barganha. Por outro lado, produzindo para
exportar, em benefício direto do capitalismo internacional, que goza de tôdas as vantagens e deixa uma
pequena parcela (embora perfeitamente suficiente para um alto nível de vida) para a oligarquia dominante,
esta oligarquia conta com o apoio do capitalismo internacional. Em outras palavras: nosso sistema de
produção e comércio interessava diretamente às nações industrializadas, que auferiam tôdas as vantagens da
troca de produtos industrializados por primários. Por isso mesmo essas nações apoiavam, davam mão forte ao
domínio da classe que dirigia êsse sistema e lhe ofereciam algumas vantagens. (PEREIRA, 1970, p. 30,
seguindo normas ortográficas de então)

Diante desse relato, se percebe o quanto o capital internacional se beneficiava das ações comerciais brasileiras
já no período anterior à década de 1930, comprando matérias-primas a preços módicos e vendendo produtos
industrializados com grande valor agregado.
A crise econômica de 1929, causada pela quebra da Bolsa de Nova Iorque, contribuiu para a alteração dessa
conjuntura. Como os produtos importados se tornaram mais caros, criou-se no Brasil um ambiente mais
favorável para a industrialização do país:
o Govêrno Vargas, que já contava em seu seio com representantes dos industriais brasileiros de então, baixa
um decreto proibindo as importações de maquinarias para todas as indústrias consideradas em estado de
superprodução. Visava com isso proteger especialmente a indústria têxtil, de há muito instalada no Brasil.
Novos investimentos, em novos setores, foram instalados. AS fábricas geralmente começavam como oficinas.
O pequeno capital necessário era na maioria das vêzes levantado entre os membros da própria família. Com o
reinvestimento dos lucros, porém, logo se expandiam. Dedicando-se inicialmente a indústrias de bens de
consumo que exigiam equipamentos simples (indústria alimentícia, indústria de artigos de higiene e limpeza,
perfumaria, indústria farmacêutica, indústria metalúrgica ligeira,etc.) muitos dêsses equipamentos já podiam
ser fabricados no Brasil. Dessa forma, em 35 a produção industrial brasileira já era 27 por cento maior do que
a de 1929 e 90 por cento maior do que a e 1925. Entre 20 e 29 foram criados 4.697 estabelecimentos
industriais contra 12.232 no decênio seguinte. Estava lançado o desenvolvimento industrial brasileiro.
(PEREIRA, 1970, p. 39, seguindo normas ortográficas de então)

A estratégia de substituição de importações foi adotada como ação-chave para evitar esse quadro desfavorável
à economia nacional e deflagrar, assim, um novo e revolucionário projeto nacional de desenvolvimento.
Pereira apresenta os novos sujeitos do cenário econômico nacional teorizando que geralmente
o desenvolvimento será iniciado no momento em que o poder político estiver predominantemente ou
exclusivamente nas mãos de um grupo de classe média constituído seja de empresários burgueses, seja de
políticos ou militares nacionalistas, seja de políticos e intelectuais comunistas. No primeiro caso enquadram-
se todos os países industriais da área capitalista, além de países que estão ainda em nos primeiros passos do
seu desenvolvimento, como o Brasil. (PEREIRA, 1970, p. 24-25, seguindo normas ortográficas de então)

Fica evidente a mudança de atores nesse cenário econômico: as oligarquias agrárias tradicionais deram lugar à
classe média burguesa e industrial. Mas é importante considerar que toda essa mudança não ocorreu
imediatamente, em apenas um ano (ou pouco mais do que isso). O período em que se deu a instalação da
Escola Nova no Brasil se caracteriza como a conclusão da longa transição de uma sociedade tradicional para
um modelo urbano-industrial. De acordo com Pereira, esse processo de transição se estendeu desde meados do
século XIX até 1930. Dermeval Saviani observa que “a burguesia industrial assimilara, na década de 1920, a
orientação taylorista-fordista” que deu suporte ao desenvolvimento industrial brasileiro. (SAVIANI, 2007, p.
191) Importa destacar que esse longo processo se caracterizou como um desenvolvimento político e
econômico. Segundo Bresser Pereira, esse tipo de desenvolvimento só começa quando
a sociedade tradicional entra em crise, quando os critérios racionais começam a superar os tradicionais,
quando o capital passa a ter mais importância do que a terra, quando a competência começa a sobrepor-se ao
sangue, quando a lei se impõe aos costumes, quando as relações impessoais e burocráticas começam a
substituir as de caráter pessoal e patrimonial, quando a sociedade bivalente de senhores e servos, de
aristocratas e plebeus, começa a dar lugar a uma sociedade plural, quando o poder político deixa de ser o
privilégio de uma oligarquia claramente definida e começa a se tornar cada vez mais difuso, quando a
economia de base agrícola tradicional começa a dar lugar a uma economia industrial e moderna, quando a
unidade de produção básica não é mais a família, mas a emprêsa, e depois não é mais a emprêsa familiar, mas
a emprêsa burocrática, quando os métodos de trabalho tradicionais cedem lugar aos racionais, quando a
produtividade e a eficiência se transformam em objetivos básicos das unidades de produção, e quando o
desenvolvimento econômico se torna o objetivo das sociedades, quando o reinvestimento se torna uma
condição de sobrevivência para a emprêsas, quando, enfim, o padrão de vida começa a aumentar de forma
automática, autônoma e necessária. (PEREIRA, 1970, p. 24, seguindo normas ortográficas de então)

No entendimento de Dermeval Saviani,


do ponto de vista da análise histórica global do modo de produção capitalista e, portanto, da teoria decorrente
dessa análise, o desenvolvimento do capitalismo implicou o deslocamento do eixo da vida societária do
campo para a cidade e da agricultura para a indústria, ocorrendo, inclusive, um progressivo processo de
urbanização do campo e industrialização da agricultura. (SAVIANI, 2007, p. 191)

Ainda para Saviani, o resultado político de toda essa conjuntura foi a instalação de um Estado que “se pôs
como agente, no plano governamental, da hegemonia da burguesia industrial”. (SAVIANI, 2007, p. 193)
O modelo pedagógico combatido pela Escola Nova era identificado como resquício medieval na educação,
“educação adaptada a uma sociedade estática, que formava indivíduos unicamente capazes de reproduzir o já
existente, indivíduos sem iniciativa própria, indivíduos todos iguais. Como tal, os seus métodos consistiriam
sobretudo na decoração e memorização, na repetição. O seu objetivo seria apenas a padronização”. (DI
GIORGIO, 1989, p. 16, com grifo do original)
Uma das análises mais lúcidas da Escola Tradicional foi feita por George Snyders. Segundo ele, trata-se de
uma proposta pedagógica que tem uma proposta de apresentação de modelos que representam as mais
elevadas realizações científicas e artísticas de toda a humanidade. Contudo, segundo Snyders, a Escola
Tradicional peca quando esvazia o cotidiano das crianças de valor pedagógico, e mais, quando considera as
próprias crianças como suspeitas de distorcerem a verdade que, via de regra, seria alcançada e sintetizada
apenas pelos adultos.
Ao final desse artigo serão consideradas também as críticas à Escola Nova; por ora, convém conhecer um
pouco mais sobre os fundamentos e sujeitos do escolanovismo.

Entusiastas do escolanovismo no Brasil


Entre os pensadores brasileiros da primeira metade do século XX, Fernando de Azevedo, Anísio Teixeira e
Lourenço Filho são os que mais influenciaram as políticas educacionais dando-lhes matiz liberal. A seguir,
descreveremos sucintamente algumas idéias presentes na produção bibliográfica desses autores e que ajudam
a compreender melhor o sentido liberal do seu pensamento.
O nome mais ligado às reformas educacionais brasileiras ocorridas na primeira metade do século XX é o de
Anísio Teixeira. Ele defendeu que uma educação amparada em princípios científicos era imprescindível à
renovação pedagógica e à solução dos problemas brasileiros. Essa crença expressa o encantamento do autor
pela sociedade americana e por sua filosofia pragmatista presente no pensamento de John Dewey, de quem
Anísio era amigo. Sob a influência de Dewey, Anísio Teixeira defendeu uma filosofia com sentido
experimental, hipotética, que atendesse aos preceitos de uma sociedade em transformação e que atendesse
também aos interesses da vida material e prática. Assim, a educação deveria estar a serviço da convivência
nos moldes da democracia estadunidense e da utilidade, aprimorando as relações democráticas na medida em
que os interesses e capacidades individuais fossem respeitados.
Incluir citações de Anísio Teixeira
Incluir citações sobre Anísio Teixeira (SAVIANI – História das ...; DI GIORGIO)
Fernando de Azevedo, além de participar da elaboração do Manifesto dos Pioneiros, também se destaca por
um dos clássicos da educação brasileira: Cultura Brasileira. Essa obra, de acordo com Bomtempi Júnior
(2005), marca a influência do pensamento de Durkheim, cuja presença aparece através do uso do método
comparativo, na ênfase na causalidade histórica, na periodização, na interpretação do fenômeno educacional,
nas fontes oficiais e na forte presença do estado a partir do uso dessas fontes. Além disso, a concepção de
cultura como estrutura e comportamento dos grupos, bem como a concepção da sociedade analógica à dos
organismos vivos, remete à perspectiva funcionalista e integradora adotada por Durkheim. Essa perspectiva de
análise orientou uma interpretação da sociedade brasileira onde toda diferença é vista como empecilho à
integração nacional. Fica evidente, portanto, que o individualismo característico das tendências educacionais
liberais, e especialmente da Escola Nova, não é uma criação espontaneísta de seus teóricos, mas sim, um traço
que resulta do pensamento positivista europeu do século XIX; isso explica o modelo de inclusão escolanovista
baseado na adaptação a um modelo social previamente estabelecido e revela o quanto ele é intolerante às
diferenças.
Incluir citações de Fernando Azevedo
Incluir citações sobre Fernando Azevedo (SAVIANI – História das ...; DI GIORGIO)
Cabe observar que politicamente Fernando de Azevedo se aproximava mais da corrente liberal de direita,
enquanto Anísio Teixeira despertava admiração entre socialistas, o que lhe custou perseguição política. As
diferenças entre Anísio e Fernando residiam fundamentalmente nos modelos de democracia que defendiam: o
primeiro defendia uma democracia representativa pelas elites; o segundo, uma democracia participativa. No
Manifesto dos Pioneiros prevaleceu a posição de Fernando Azevedo, que foi o relator do documento.
Lourenço Filho em sua obra Introdução ao estudo da escola nova, segundo Gadotti, (1995) defende um ensino
ativo, baseado nos interesses da criança, desenvolvendo os hábitos democráticos através da cooperação e do
trabalho em grupo. Ele levanta a bandeira do ensino globalizado, da auto-educação e do estudo objetivo da
criança tendo em vista a cientifização do campo pedagógico. Percebe-se que tanto quanto Anísio, Lourenço
também defendia uma reformulação pedagógica em bases científicas. Sem discutir o mérito dessa sua defesa,
convém lembrar que é no ideário positivista que se encontra a tese de que “o método da ciência, por ser o
único válido, deve ser estendido a todos os campos de indagação e da atividade humana; toda a vida humana,
individual ou social, deve ser guiada por ele” (ABBAGNANO, 2003, p. 777).
Incluir citações de Lourenço Filho
Incluir citações sobre Lourenço Filho (SAVIANI – História das ...; DI GIORGIO)

O Manifesto dos Pioneiros e a ofensiva contra a escola tradicional


O Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova foi dirigido ao povo e ao governo em defesa de uma
“Reconstrução Educacional no Brasil”, considerando-se para tanto a necessidade de se definir finalidades para
a educação com espírito democrático e forte base científica e axiológica. O documento trata da função do
Estado, do processo educativo e de pontos considerados nevrálgicos no sistema de ensino nacional (sobretudo
a formação em nível secundário). A seguir, se fará uma leitura panorâmica do Manifesto dos Pioneiros da
Educação Nova com apontamentos breves sobre aspectos considerados relevantes e pontuais para uma
introdução ao estudo do documento. Serão inseridos, ao longo do texto e em versais, excertos do Manifesto
respeitando-se as normas ortográficas então vigentes. Algumas abordagens de pontos específicos do
Manifesto se repetem porque se optou por seguir a ordem em que se apresentam no documento original. Este
é, portanto, um esforço de aproximação do Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova que não dispensa a
leitura integral do documento.
Ao abordar a tradição pedagógica brasileira os Pioneiros da Educação Nova, como foram chamados os
signatários do Manifesto, criticam a desarticulação entre a política educacional e outros setores sociais, mas
sobretudo o econômico. Afirmam que “é impossível desenvolver as forças econômicas ou de producção, sem
o preparo intensivo das forças culturaes e o desenvolvimento das aptidões á invenção e á iniciativa que são os
factores fundamentaes do accrescimo de riqueza de uma sociedade”, e ainda, que são “dissociadas sempre as
reformas econômicas e educacionaes, que era indispensável entrelaçar e encadear”.
A educação, para os Pioneiros, carecia de finalidade no projeto de uma nova sociedade, finalidade essa que se
revelaria e sustentaria em novos fundamentos filosóficos e científicos da educação. Aponta-se, no documento,
a “falta, em quase todos os planos e iniciativas, da determinação dos fins de educação (aspecto philosophico e
social) e da applicação (aspecto technico) dos methodos scientificos aos problemas de educação”.
Essa falta de objetivos educacionais refletiria uma falta de ideal nacional, como se percebe na afirmação de
que “Nunca chegamos a possuir uma ‘cultura propria’, nem mesmo uma ‘cultura geral’ que nos convencesse
da ‘existencia’ de um problema sobre objetctivos e fins da educação, uma vez que as reformas até então
empreendidas “não traziam (...) o polo magnífico de uma concepção de vida”.
A valorização do aspecto pragmático nesta proposta fica clara quando no Manifesto se admite que “um
educador póde bem ser um philosopho e deve ter a sua philosophia de educação; mas, trabalhando
scientificamente nesse terreno, elle deve estar tão interessado na determinação dos fins de educação, quanto
também dos meios de realizal-os”.
Ao defender um movimento de renovação educacional, os signatários do Manifesto deixam claro que seu
objetivo geral é “transferir do terreno administrativo para os planos politico-sociaes a solução dos problemas
escolares.
Considerando que
A maioria dos espiritos, tanto da velha quanto da nova geração ainda se arrastam, porém, sem convicções,
atravez de um labirintho de idéas vagas, fora de seu alcance, e certamente, acima de sua experiencia; e,
porque manejam palavras, com que já se familiarizaram, imaginam muitos que possuem as idéas claras, o que
lhes tira o desejo de adquiril-as
os Pioneiros defendem que a educação passe a ter um status de ciência, pois “Os trabalhos scientificos no
ramo da educação já nos faziam sentir, em toda a sua força reconstructora, o axioma de que se póde ser tão
scientifico no estudo e na resolução dos problemas educativos, como nos da engenharia e das finanças.
Atacando a pedagogia tradicional, os escolanovistas afirmam que “A educação nova não póde deixar de ser
uma reacção categórica, intencional e systematica contra a velha estructura do serviço educacional, artificial e
verbalista, montada para uma concepção vencida”.
Os Pioneiros assumem os fundamentos liberais de seu projeto político-pedagógico quando afirmam que
A educação nova, alargando a sua finalidade para além dos limites das classes, assume, com uma feição mais
humana, a sua verdadeira funcção social, preparando-se para formar a” hierarchia democrática” pela
“hierarchia das capacidades”, recrutadas em todos os grupos sociaes, a que se abrem as mesmas
opportunidades de educação.

À maneira liberal, a valorização do indivíduo pela Educação Nova “que, certamente pragmática, se propõe ao
fim de servir não aos interesses das classes, mas aos interesses do indivíduo”, é apresentado como preferível à
consideração do indivíduo tradicional, pois “a escola tradicional, installada para uma concepção burgueza,
vinha mantendo o individuo na sua autonomia isolada e estéril, resultante da doutrina do individualismo
libertario”. Isto porque

a escola socializada, reconstituída sobre a base da actividade e da produção (...) se organizou para remontar a
corrente e restabelecer, entre os homens, o espirito de disciplina, solidariedade e cooperação, por uma
profunda obra social que ultrapassa largamente o quadro estreito dos interesses de classe.

A superação das abstrações tradicionais levaria à utilidade da aprendizagem escolar para a vida, afinal,

a escola socializada não se organizou como um meio essencialmente social senão para transferir do plano da
abstracção ao da vida escolar em todas as suas manifestações, vivendo-as intensamente, essas virtudes e
verdades moraes, que contribuem para harmonizar os interesses individuaes e os interesses collectivos.

O papel do Estado contido no Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova é de zelar pela educação como uma
função essencialmente pública, pois a educação “rompeu os quadros do communismo familial e dos grupos
especificos (instituições privadas), para se incorporar definitivamente entre as funcções essenciaes e
primordiaes do Estado”. A família passa a ser parceira do Estado, que providencia à maneira keynesiana a
educação necessária ao desenvolvimento do país e que seja “uma educação commum, egual para todos”. Não
se defende, contudo, uma igualdade formal, e sim, democrática. Como a unidade nacional admite uma
descentralização, ela “não implica um centralismo esteril e odioso, ao qual se oppõem as condições
geographicas do paiz e a necessidade de adaptação crescente da escola aos interesses e ás exigencias
regionaes”.
Um intento de reforma com tal envergadura deveria contar com a segurança estatal para o seu financiamento,
pois considera-se que os meios materiais para a manutenção da educação pública
não podem reduzir-se ás verbas que, nos orçamentos, são consignadas a esse serviço publico e, por isto,
sujeitas ás crises dos erarios do Estado ou ás oscillações do interesse dos governos pela educação. A
autonomia econômica não se poderá realizar, a não ser pela instituição de um “fundo especial ou escolar”,
que, constituido de patrimonios, impostos e rendas proprias, seja administrado e applicado exclusivamente no
desenvolvimento da obra educacional, pelos proprios orgãos do ensino, incumbidos de sua direcção.

O processo educativo se assenta em bases científicas e democráticas, como se percebe na afirmação de que “o
estudo scientifico e experimental da educação, a libertaram do empirismo, dando-lhe um caracter e um
espirito nitidamente scientifico e organizado (...) numa serie fecunda de pesquizas e experiencias”, e ainda, de
que a Escola Nova não considera a educação como “uma funcção de superposição ou de accrescimo, segundo
a qual o educando é 'modelado exteriormente' (escola tradicional), mas uma funcção complexa de acções e
reacções em que o espirito cresce “de dentro para fora”.A Escola Nova, portanto, “substitue o mecanismo pela
vida (actividade funccional) e transfere para a creança e para o respeito de sua personalidade o eixo da escola
e o centro de gravidade do problema da educação”.
A importância da individualidade do aluno fica ainda mais clara quando se diz que “é uma reacção contra as
tendencias exclusivamente passivas intellectualistas e verbalistas da escola tradicional, a actividade que está
na base de todos os seus trabalhos, é a actividade espontanea, alegre e fecunda, dirigida á satisfacção das
necessidades do proprio individuo”.
Em linhas gerais, defende-se no Manifesto um plano de reconstrução educacional marcado pela articulação
entre os graus de ensino e entre as racionalidades técnica e humanística, a fim de se superar a dualidade na
formação escolar e, desta forma, colaborar para o fim da estratificação social. Didaticamente, valoriza-se a
observação, a pesquisa e a experiência como ações para a aprendizagem.
A reconstrução educacional contida no Manifesto alcança o nível universitário, que estivera até então a
serviço exclusivamente das chamadas profissões liberais, que seriam engenharia, medicina e direito. Os
Pioneiros defenderam que
Ao lado das faculdades profissionaes existentes, reorganizadas em novas bases, impõe-se a creação
simultanea ou successiva, em cada quadro universitario, de faculdades de sciencias sociaes e economicas; de
sciencias mathematicas, physicas e naturaes, e de philosophia e letras que, attendendo á variedade de typos
mentaes e das necessidades sociaes, deverão abrir ás universidades que se crearem ou se reorganizarem, um
campo cada vez mais vasto de investigações scientificas.

No que diz respeito à educação superior, defende-se no Manifesto que as universidades precisam ser livres
para poderem “desempenhar a triplice funcção que lhe cabe de elaboraradora ou creadora de sciencia
(investigação), docente ou transmissora de conhecimentos (sciencia feita) e de vulgarizadora ou
popularizadora, pelas instituições de extensão universitaria, das sciencias e das artes”.
À universidade caberia a função de formar as elites através da seleção dos melhores, substituindo os critérios
econômicos pelo das aptidões naturais que poderiam ser desenvolvidas pela escolarização superior. A
universidade, “elevando ao maximo o desenvolvimento dos individuos dentro de suas aptidões naturaes e
seleccionando os mais capazes, lhes dá bastante força para exercer influencia effectiva na sociedade e affectar,
dessa forma, a consciencia social”.
O pragmatismo universitário característico das instituições de ensino superior estadunidenses, válido também
para escolas de outros níveis, fica claro na defesa de que
a consciencia do verdadeiro papel da escola na sociedade impõe o dever de concentrar a offensiva educacional
sobre os nucleos sociaes, como a familia, os agrupamentos profissionaes e a imprensa, para que o esforço da
escola se possa realizar em convergencia, numa obra solidária, com as outras instituições da communidade.

À maneira de conclusão, destacam-se dois aspectos interessantes do Manifesto dos Pioneiros da Educação
Nova, sendo o primeiro relativo a nomenclatura, portanto ligado inicialmente a forma textual e depois às
entrelinhas, e o segundo, de ordem ideológica, logo, referente antes às entrelinhas e somente depois ao
formato textual.
Observa-se que no documento usa-se a expressão “espírito” para designar o que hoje se chama de habilidade.
Assim, lê-se “espírito de synthese”, “espírito fácil de substituir os princípios”. Da mesma forma, é
freqüentemente reivindicado um “direito biológico”, uma finalidade biológica da educação em um processo
que com naturalidade biológica deve ser levado a termo. Identifica-se uma base positivista a animar tais
defesas, considerando-se pelo contexto o termo “biológico” como correspondente a natural e organicamente
inexorável.
Sobre o segundo aspecto supra referido, o documento não é homogêneo, como não o é o grupo dos seus 26
signatários. Segundo GHIRALDELLI Jr. (1996), os liberais elitistas liderados pelo relator do Manifesto dos
Pioneiros da Educação Nova, Fernando de Azevedo, e os liberais igualitaristas representados por Anísio
Teixeira, guardavam diferenças basilares de projeto social e educacional. De acordo com GHIRALDELLI Jr.,
“para Fernando de Azevedo a escola deveria ter um papel de formadora das elites, sendo que a educação
apenas rearranjaria os indivíduos na sociedade de acordo com suas aptidões”. (p. 43)
Já Anísio Teixeira, de acordo com o mesmo autor, defendia que “a escola deveria ser democrática, única,
capaz de servir como contraponto aos males e desigualdades sociais provocados pelo sistema capitalista”. (p.
42)
Considerando, com orientação histórico-crítica, que a defesa de direitos de pertença a uma elite com base em
critérios econômicos ou naturais é um dos “males e desigualdades sociais provocados pelo sistema capitalista”
a que se refere Guiraldelli Jr., depreende-se que Fernando de Azevedo aproximava-se mais da corrente liberal
da direita, enquanto Anísio Teixeira tinha a admiração dos socialistas (fato que lhe custou perseguição política
e exílio). O primeiro defendia uma democracia representativa pelas elites; o segundo, uma democracia
participativa. Prevaleceu, no Manifesto, a posição do seu relator.

Críticas ao escolanovismo
As teorias pedagógicas de orientação liberal foram alvo de pensadores marxistas, os quais viam na
escola um aparelho institucional cuja ação alienadora se colocava a serviço do ideário capitalista. Essas
teorias foram concebidas no campo da sociologia por teóricos europeus. Descrevem mecanismos sociais de
segregação, de alienação e de dominação, afirmando que a escola reproduz a segregação verificada no âmbito
da sociedade de classes. Essas diferenças de classe reproduzidas pela escola são caracterizadas pela posse dos
meios de produção pela burguesia dominante e da força de trabalho pelo proletariado dominado. Sem
apresentarem projetos político-pedagógicos, defendem que a superação do modelo educacional/escolar
segregador depende da superação da sociedade e classes. Nestas teorias, que privilegiam o enfoque político, a
escola não é isenta da sociedade, mas fruto dela.
No livro Escola e Democracia Dermeval Saviani apresenta as principais teorias que fazem a crítica da
educação liberal, que são as seguintes: o sistema de ensino como violência simbólica, de Pierre Bourdieu e
Jean-Claude Passeron_; a escola como aparelho ideológico do estado, de Louis Althusser_; e a escola dualista,
de Baudelot e Stablet_.

Uma das mais contundentes críticas à Escola Nova é feita pelo brasileiro Dermeval Saviani, em seu livro
Escola e Democracia. Para ele o ideário escolanovista “ao mesmo tempo que procurava evidenciar as
‘deficiências’ da escola tradicional, dava força à idéia segundo a qual é melhor uma boa escola para poucos do
que uma escola deficiente para muitos”. (SAVIANI, 1997, p.22) O escolanovismo é classificado como uma
das teorias não-críticas da educação, ao lado da Educação Tradicional, contra a qual a Escola Nova se
levantou, e da Pedagogia Tecnicista que se instalou após a Escola Nova; a pretexto de combater diferentes
formas de marginalização_, tais teorias apresentam propostas político-pedagógicas fundamentadas apenas em
princípios técnico-científicos, em que a escola figura como instituição independente da sociedade; a
sociedade, aliás, funciona como um relógio (concepção positivista e liberal), cabendo à escola intervir para
fazer os ajustes necessários e, depois, retornar ao seu encastelamento tendo contribuído para a perpetuação das
diferenças de classes.
Na Escola Nova a marginalidade é caracterizada como sinônimo de diferença, no mesmo tempo em
que pretende explica-la pelo desajustamento e pela inadaptalidade de todas as formas (biopsicosociais); assim,
defende que cabe à escola ajustar os indivíduos à sociedade incutindo neles o sentimento de aceitação dos
demais e pelos demais. A abordagem é antes biopsicológica e depois, pretensamente, social. A respeito do
modelo de marginalidade que a Escola Nova apresenta como seu alvo de combate, Saviani ironiza:

Forja-se, então, uma pedagogia que advoga um tratamento diferencial a partir da “descoberta” das diferenças
individuais. Eis a “grande descoberta”: os homens são essencialmente diferentes; não se repetem; cada
indivíduo é único. Portanto, a marginalidade não pode ser explicada pelas diferenças entre os homens,
quaisquer que elas sejam: não apenas diferenças de cor, de raça, de credo ou de classe, o que já era defendido
pela pedagogia tradicional; mas também diferenças no domínio do conhecimento, na participação do saber, no
desempenho cognitivo. Marginalizados são os “anormais”, isto é, os desajustados e desadaptados de todos os
matizes. Mas a “anormalidade” não é algo, em si, negativo; ela é, simplesmente, uma diferença. Portanto,
podemos concluir, ainda que isto soe paradoxal, que a anormalidade é um fenômeno normal. Não é, pois,
suficiente para caracterizar a marginalidade. (SAVIANI, 1997, p. 20)

A Escola Nova negou a Tradicional e substituiu a ênfase nos conteúdos pela valorização dos processos de
aprendizagem. O efeito foi a implantação do escolanovismo em algumas poucas unidades escolares que
dispunham de condições materiais para abrigar a teoria. Na grande maioria das escolas brasileiras, de clientela
pobre, o escolanovismo não se implantou por falta de condições físicas e instrumentais; ademais perdeu-se o
que ainda se tinha como conteúdos:

provocando o afrouxamento da disciplina e a despreocupação com a transmissão de conhecimentos, acabou


por rebaixar o nível do ensino destinado às camadas populares as quais muito freqüentemente têm na escola o
único meio de acesso ao conhecimento elaborado. (SAVIANI, 1997, p. 22)

Resultou disso e da parca compreensão dos pressupostos da Escola Nova uma espécie de prática compassiva a
pretexto de uma inclusão escolar que logo causava uma exclusão social. Saviani denuncia que

paradoxalmente, em lugar de resolver o problema da marginalidade, a “Escola Nova” o agravou. Com efeito,
ao enfatizar a “qualidade do ensino” ela dslocou o eixo de preocupação do âmbito político (relativo à
sociedade em seu conjunto) para o âmbito técnico-pedagógico (relativo ao interior da escola), cumprindo ao
mesmo tempo uma dupla função: manter a expansão da escola em limites suportáveis pelos interesses
dominantes e desenvolver um tipo de ensino adequado a esses interesses. (SAVIANI, 1997, p. 22)

Em conjunto com as demais correntes liberais da educação, a Escola Nova concorreu para o
aprimoramento e continuidade
Referências bibliográficas:
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GHIRALDELLI Jr., Paulo. História da Educação. 2. ed. São Paulo: Cortez, 1992.
MORAES, Reginaldo C. Correa de. Liberalismo clássico: notas sobre suas história e alguns de seus
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Jornada do HISTEDBR: História e Historiografia da Educação: Abordagens e Práticas Educativas.
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Cultural, 1983.

_ Este artigo resulta de um trabalho apresentado no crédito Tendências Teóricas da Educação Brasileira,
do Programa de Mestrado em Educação da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG), em maio de
2004. Também contém elementos de outro artigo, em elaboração conjunta com a Professora Luciane Neuvald,
do Departamento de Pedagogia (DEPED) da Universidade Estadual do Centro-Oeste – UNICENTRO,
Campus Santa Cruz (Guarapuava, PR).
_ CONSIDERAÇÕES SOBRE OS TEÓRIOS E SUA OBRA
_ CONSIDERAÇÕES SOBRE OS TEÓRIOS E SUA OBRA
_ CONSIDERAÇÕES SOBRE OS TEÓRIOS E SUA OBRA
_ Segundo Saviani, na Educação Tradicional a marginalidade é identificada com a ignorância, logo,
marginalizado é o ignorante e a escola surge como antídoto à ignorância oferecendo à maneira de repasse
conteúdos factuais e procedimentais simples. O conteúdo é enciclopédico e tratado quantitativamente. Já para
a Pedagogia Tecnicista, marginalizado é o tecnicamente incompetente, o ineficiente e improdutivo; nesse caso
cabe à escola tornar os sujeitos tecnicamente eficientes para o sistema produtivo, em abordagem de flagrante
orientação econômica.

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