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INDIcE

DoAutor ................................................................................................................................ . XIX


Principais Estudos e Artigos ...................................................................................................... . XXI
Prefácio .................................................................................................................................. . XXV
Nota do Autor à 2" Edição ....................................................................................................... . XXVII
Prefácio à 1" Edição ................................................................................................................. . XXIX
Nota de Apresentação à 1" Edição ............................................................................................. . XXXI
Abreviaturas mais Usadas ........................................................................................................ . XXXIII

Título I
O OBJETO DO DIREITO TRIBUTARIO INTERNACIONAL

Capítulo I - Limites das leis........................................................................................................ 3


§ 1° A distinção entre âmbito de incidência e âmbito de eficácia das leis no espaço.................... 3
A) As simações internacionais como objeto do Direito Tributário Internacional................. 3
B) A distinção entre âmbito de incidência e âmbito de eficácia das leis tributárias no espaço.. 4
C) Alcance da distinção no Direito Internacional Privado e no Direito Público
Internacional.................................................................................................................... . 7
§ 2° Os linútes do âmbito de incidência das leis......................................................................... 9
A) Limites heterônomos.................................................................................................... 9
B) Limites autônomos ....................................................................................................... 12
§ 3° Os limites do âmbito de eficácia das leis ............................................................................. l3
§ 4° A conexão com o ordenamento.......................................................................................... 15
A) A concepção clássica do princípio da territorialidade ..................................................... 15
a) Territorialidade em sentido positivo e em sentido negativo ....................................... 16
b) Territorialidade em sentido pessoal e em sentido real................................................ 17
c) Territorialidade em sentido material e em sentido formal.......................................... 18
B) Crítica da concepção clássica......................................................................................... 19

Capítulo II - Concurso de leis ............................................................................. ........................ 21


Seção I - Dupla tributação........................................................................................................... 21
§ 1° Identidade do fato ............................................................................................................. 22
A) A regra das quatro identidades ...................................................................................... 22
B) O problema da identidade dos sujeitos. Dupla tributação jurídica e econônúca.............. 24
§ 2° Pluralidade de normas................................................................................ ....................... 25
A) Dupla tributação internacional e interterritorial ............................................................ 25
r\11M" >] Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

B) Concurso de competências e dupla tributação............................................................... 26


C) Concurso aparente e dupla tributação virtual ................................................................ 27
D) Duplicação de pretensões.................................................................... ......................... 28
E) Concurso, conflito e cúmulo de pretensões............................................................ ........ 29
Seção II - Evasão fiscal internacional, conflito negativo e dupla não tributação ............................ 30

Título 11
CONTEÚDO E NATUREZA DO DIREITO TRIBUTÁRIO INTERNACIONAL

Capítulo I - Espécies e tipos de normas....................................................................................... 37


§]O Espécies de normas.................................................................................. .......................... 37
A) Normas de fonte interna e de fonte internacionaL........................................................ 37
B) Normas de conflitos e normas materiais ........................................................................ 37
C) Normas substanciais e normas instrumentais: o Direito Tributário Internacional em
sentido formal.............................................................................................................. 40
§ 2° Tipos de normas substanciais: normas de delimitação, de colisão, de repartição,
de cumulação e de atenuação ................................................................................... ... ...... 41

Capítulo 11 - Natureza do Direito Tributário Internacional.......................................................... 45


§ l° Delimitação do problema................................................................................................... 45
§ 2° Teoria das normas materiais espacialmente autolimitadas ................................................... 45
§ 3° A nossa posição ................................................................................................................. 48
A) Localização dos fatos e delimitação do âmbito de incidência ......................................... 48
B) Natureza de normas de conflitos ................................................................................... 49
C) Unilateralidade ............................................................................................................. 55
D) Caráter internacional.................................................................................................... 59
§ 4° Conclusões ........................................................................................................................ 62

Título 111
As FONTES DO DIREITO TRlBUTÁRIO INTERNACIONAL

Capítulo I - Tratados internacionais ............................................................................................ 67


Seção I - As convenções internacionais contra a dupla tributação................................................. 67
§ 1° Conceito e evolução........................................................................................................... 67
A) Evolução histórica ........................................................................................................ 67
B) A Convenção Modelo da OCDE relativa a impostos sobre a renda e o capital............... 71
C) As Convenções celebradas pelo Brasil........................................................................... 72
§ 2° O procedimento de celebração dos tratados ....................................................................... 74
§ 3° Relações com a ordem interna ........................................................................................... 76
A) O problema em geral .................................................................................................... 76
a) As concepções gerais sobre as relações entre direito internacional e direito interno:
a querela morusmo-dualismo.................................................................................... 78
b) Os sistemas de vigência do direito internacional na ordem interna: transformação,
cláusula geral de rec-epção automática plena e procedimento de transposição............ 80
c) O lugar das convenções internacionais na hierarquia das fontes do direito................. 81
B) A doutrina e a jurisprudência anteriores à Constituição de 1988 .................................. 82
a) A doutrina................................................................................................................ 82
índice

b) A jurisprudência....................................................................................................... 83
§ 4° A superioridade hierárquica dos tratados em relação à lei em face da Constituição de 1988... 84
A) Adoção do sistema mouista pelo § 2° do art. 5° ............................................................ 85
B) A expressa superioridade hierárquica dos tratados em matéria de direitos e garantias..... 86
C) Apreciação direta dos tratados pelos tribunais............................................................... 89
D) Impossibilidade de revogação por ato do Poder Legislativo de ato da competência
conjunta do Chefe do Estado e do Congresso Nacional................................................ 89
E) O art. 98 do Código Tributário Nacional e a superada classificação dos tratados em
tratados de natureza contratual e de natureza normativa ............................................... 91
a) A supremacia hierárquica.......................................................................................... 91
b) A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça baseada na distinção entre tratados
normativos e tratados-contratos: crítica.................................................................... 92
F) Natureza não transformatória do referendo do Congresso Nacional e da promulgação
pelo Chefe do Estado........................................................................... ........................ 96
G) A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal............................................................. 101
a) A tese da paridade hierárquica.................................................................................. 10 1
b) Os novos rumos da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal em matéria de
hierarquia de tratados de direitos humanos............................................................... 104
H) As nossas conclusões .................................................................................................... 107
§ 5° Os tratados internacionais e os tributos estaduais e municipais ........................................... 108
§ 6° O princípio do "efeito negativo" dos tratados.................................................................... III
§ 7° Âmbito de aplicação .......................................................................................................... ll2
A) Quanto às pessoas......................................................................................................... 112
a) O princípio da relatividade dos tratados.................................................................... ll2
b) Situações triangulares: o princípio da relatividade dos tratados e os estabelecimentos
permanentes em matéria de juros ............................................................................. ll3
c) Entes sem personalidade jurídica .............................................................................. ll5
d) A cláusula "sujeito a imposto" .................................................................................. ll9
e) Cláusula do beneficiário efetivo................................................................................ 120
f) Exclusão de certas pessoas......................................................................................... 121
B) Quanto aos impostos.................................................................................................... 121
a) Considerações gerais ................................................................................................ 121
b) A questão da contribuição social sobre o lucro (CSL)............................................... 123
C) Quanto ao território ..................................................................................................... 127
D) Quanto à sucessão de Estados....................................................................................... 129
E) Quanto ao tempo ......................................................................................................... 130
a) Vigência e denúncia.................................................................................................. 130
b) A competência para a denúncia. ............... ..... ........ ..... ..... ............. ...... ................ ...... 131
§ 8° Interpretação. O problema das qualificações......... ........... ............. ............. ..................... .... 134
A) Interpretação dos tratados contra a dupla tributação e o § 2° do artigo 3° do
Modelo OCDE ............................................................................................................ 134
B) Natureza dos "Comentários" da OCDE ........................................................................ 136
C) Definições .................................................................................................................... 137
D) O problema das qualificações.............................................. ................................. ... ..... 140
a) A qualificação como problema autônomo do da interpretação ... ..... ....... ................... 140
b) A teoria da competência qualificatória cumulativa ....... .................... ......................... 146
c) A nossa teoria........................................................................................................... 148
(i) Competência qualificatória exclusiva do Estado da fonte quanto ao
conceito-quadro ............................... ...... ..... ......................................... ............... 148
-nili Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

(ii) Competência qualificatória exclusiva da /ex situationis quanto aos


pressupostos................................................... ............................ ........................ 149
(iii) Competência qualificatória exclusiva do Estado da residência............................. 151
(iv) Síntese............................................................................................................... 156
E) Qualificação e aplicação de leis estrangeiras ................................................................... 157
a) Qualificação, questão prévia e substituição................................................................ 157
b) Qualificação e devolução ou reenvio......................................................................... 160
SeçÍÚJ II - Tratados de outra natureza sobre matéria tributária...................................................... 161

Capítulo 11 - Outras fontes internacionais ................................................................................... 163


§ l° Costume............................................................................................................................ 163
§ 2° Jurisprudência. Procedimento amigável. Arbitragem.......................................................... 164
A) O procedimento amigável............................................................................................. 164
B) A fase arbitral................................................................................................................ 166
C) Natureza jurídica dos acordos mútuos........................................................................... 167
D) Arbitragem................................................................................................................... 169
§ 3° Direito Comunitário.......................................................................................................... 171
§ 4° Mercosul............................................................................................................................ 177

Capítulo IJI - Fontes internas...................................................................................................... 183

Título IV
Os ELEMENTOS DE CONEXÃO
Capítulo I - Os elementos de conexão em geral........................................................................... 187
§ 1° Conceito e espécies ............................................................................................................ 187
§ 2° Os elementos de conexão nos impostos sobre a renda e o capital........................................ 189
A) Os princípios da fonte e da residência ........................................................................... 189
B) Os princípios da universalidade e da territorialidade; obrigação tributária limitada e
ilimitada.. ..................................................................................................................... 192
§ 3° Os elementos de conexão nos impostos sobre transmissões a título gratuito ....................... 193
§ 4° Os elementos de conexão nos impostos sobre o consumo .................................................. 197
A) Os princípios de origem e de destino ............................................................................ 197
B) Impostos sobre produtos industrializados e sobre circulação de mercadorias.................. 201
C) Impostos sobre serviços ................................................................................................ 203
~~ ........................................................................................................................... ~
b) ICMS sobre serviços de transporte e de comunicação ............................................... 207

Capítulo II - Os elementos de conexão subjetivos....................................................................... 209


SeçÍÚJ I - Nacionalidade............................................................................................................... 209
§ ro O problema da tributação dos estrangeiros ........................................................................ 209
§ 2° A nacionalidade nas convenções contra a dupla tributação ................................................. 210
§ 3° Princípio da não discriminação.......................................................................................... 212
A) Elemento objetivo ........................................................................................................ 212
B) Elemento subjetivo.................................... ................................................................... 214
§ 4° A nacionalidade no sistema norte-americano...................................................................... 217
Seção II - Residência e domicílio ................................................................................. ····· ......... ·· 218
§ 1° Residência e domicílio. Noções objetiva e subjetiva............................................................ 218
§ 2° O estatuto de residente no Direito brasileiro ...................................................................... 221
fndice • •

A) Pessoas físicas ............................................................................................................... 221


a) Aquisição da residência............................................................................................. 221
b) Perda da residência.................. ............. ........ ........... ... .................................... .......... 222
B) Pessoas jurídicas ............................................................................................................ 225
§ 3° Residência e domicílio nas convenções contra a dupla tributação ....................................... 225
A) Dupla residência de pessoas físicas ................................................................................ 225
B) Dupla residência de pessoas jurídicas...... .................................................... ................... 228
Capítulo III - Os elementos de conexão objetivos ....................................................................... 231
§ l° A fonte dos rendimentos: fonte de produção e fonte de pagamento ................................... 231
§ 2° Os elementos de conexão reais: a regralocusreisitae ........................................................... 233
§ 3° Estabelecimento permanente: remissão .............................................................................. 234

Capítulo IV - Elisão fiscal e elementos de conexão ...................................................................... 235


§ 1° Conceito e natureza da elisão fiscal internacional................................................................ 235
§ 2° Os instrumentos da elisão fiscal internacional.................................... ..................... ............ 239
A) Os paraísos fiscais e os regimes fiscais preferenciais: práticas de concorrência fiscal
prejudicial.......................................................................................................................... 239
a) Considerações preliminares.................. ............................................... ..................... 239
b) As políticas relativas à concorrência fiscal prejudicial................................................. 241
(i) A política da OCDE............................................................................................ 243
(ii) A política da União Europeia ............................................................................. 245
c) Os auxílios do Estado de natureza fiscal............... ........ ... ........ ...... ........... ..................... 249
B) Os países com tributação favorecida e regimes fiscais privilegiados
na legislação brasileira........................................................................................................ 251
a) O conceito de países com tributação favorecida.................. ...... ................................ 251
b) O conceito de países com regime fiscal privilegiado............................. ..................... 254
c) As modalidades de regime fiscal privilegiado e a distinção relativamente ao conceito
de tributação favorecida ........................................................................................... 255
d) Consequências fiscais comuns a países de tributação favorecida e com regime fiscal
privilegiado............................................................. ................................................. 257
e) Aplicação exclusiva da alíquota agravada de retenção na fonte aos países de
tributação favorecida................................................................................................ 259
(i) Autonomia do art. 24-A em relação ao art. 24..................................................... 260
(ii) O elemento histórico: o texto original do projeto de conversão da MP 413/08... 260
(iii) A técnica da remissão por absorção ................................................................... 262
(iv) Vinculação do conceito de regime fiscal privilegiado à política de concorrência
fiscal prejudicial................................................................................................. 263
C) Estruturas e tipos societários.................................................................................... ..... 264
a) Sociedades-base ........................................................................................................ 264
b) Sociedades holding.................................................................................................... 265
(i) Natureza ............................................................................................................. 265
(ü) Regimes favoráveis quanto a dividendos e ganhos de capital............................... 269
c) Outras figuras societárias .......................................................................................... 272
d) A questão da substância ........................................................................................... 274
§ 3° Elisão fiscal subjetiva ......................................................................................................... 277
A) Elisão fiscal e domicílio das pessoas físicas..................................................................... 277
B) Elisão fiscal e domicílio das pessoas jurídicas: imposto de saída e treaty shopping ............ 279
a) Imposto de saída ...................................................................................................... 279
b) Treaty shopping.......................................................................................................... 279
t3
......=-... Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier
------------'
§ 4° Elisão fiscal objetiva..................................... ...................................... ................................ 283
A) Elisão fiscal objetiva por divisão, acumulação e transferência de rendimentos ...... ... ....... 283
B) Acumulação de rendimentos e transparência fiscal internacional........... ......................... 284
C) Elisão fiscal objetiva por transferência indireta de lucros entre empresas
interdependentes.......................................................................................................... 289
a) Generalidades sobre preços de transferência.............................................................. 289
b) O regime dos preços de transferência na Lei nO 9.430/96......................................... 294
(i) Considerações preliminares ................................................................................. 294
(ii) O princípio at arm's length ................................................................................. 296
(iii) O elemento de estraneidade .............................................................................. 296
(iv) Âmbito subjetivo .............................................................................................. 297
(a) O conceito de pessoa vinculada ................................................................... 297
(b) O conceito de país de tributação favorecida................................................. 299
(c) O conceito de regime fiscal privilegiado....................................................... 300
(v) Âmbito objetivo ................................................................................................. 302
(vi) Regime tributário.............................................................................................. 302
(a) Considerações preliminares.......................................................................... 302
(b) Operações comerciais ativas................................................ ... ..................... 304
(i) Os métodos ........................................................................................... 304
(ii) O princípio da tipicidade dos métodos .................................................. 307
(iii) O princípio da delimitação negativa do âmbito objetivo de aplicação
do regime: o caso dos intangíveis .............................................. ........... 308
(iv) O princípio da prevalência do método mais favorável ao contribuinte... 310
(v) Limitações à liberdade de utilização dos métodos .................................. 311
(vi) A comparação entre preços internos e preços externos como pressuposto
necessário do arbitramento................................................................... 313
(vii) Consequências tributárias .................................................................... 315
(c) Operações comerciais passivas..................................................................... 315
(i) Os métodos ........................................................................................... 315
(ii) A substituição do método PRL pelo método PVL................................ 318
(iii) Os princípios da tipicidade dos métodos, da delimitação negativa do
âmbito objetivo e da prevalência do método mais favorável ao
contribuinte......................................................................................... 321
(iv) Limitações à liberdade de utilização dos métodos ................................. 322
(v) Consequências tributárias ............................................................... ....... 322
(d) Operações financeiras .............................................................................. ... 322
(vii) O princípio at arm's length e a predeterminação legal do preço objetivo ............ 323
c) O regime dos preços de transferência à luz do art. 9° da Convenção Modelo da
OCDE e dos tratados internacionais......................................................................... 327
d) O regime da lei interna em face do regime convencional......................... ....... ........... 330
D) Preços de transferência e acordos de repartição de custos .............................................. 332
a) Preliminares.............................................................................................................. 332
b) Conceito e natureza dos acordos de repartição de custos........................................... 333
(i) Características essenciais...................................................................................... 333
(ii) A determinação dos custos rateáveis ................................................................... 335
(iii) Os métodos de rateio ........................................................................................ 336
c) Espécies.................................................................................................................... 337
(i) Contratos de compartilbamento de custos ........................................................... 337
índice • •

(ii) Contratos de prestação de serviços intragrupo .................................................... 339


(iii) Contratos de contribuição para os custos........................................................... 341
d) O problema dos "preços de transferência" ............................ .................................... 342
e) A dedutibilidade dos custos rateados ........................................................................ 344
f) Tributação na fonte sobre os pagamentos efetuados ao exterior................................. 345
E) Subcapitalização........................................................................................................... 346
a) Considerações preliminares....................................................................................... 346
b) Requisitos................................................................................................................ 348
(i) Residência no exterior ......................................................................................... 348
(ii) Qualificação do credor ....................................................................................... 348
(a) Existência da vinculação com e sem participação societária............................ 348
(b) Residência do credor em país com tributação favorecida ou com regime
fiscal privilegiado........................................................................................ 349
(iii) Endividamento excessivo................................................................................... 351
c) Consequências .......................................................................................................... 352
d) Tratados contra a dupla tributação............................................................................ 353
§ 5° A reação à elisão fiscal internacional................................................................................... 354

Título V
REGIME INTERNO EM MATÉRIA DE IMpOSTO
SOBRE A RENDA

Capítulo I - Residentes no país................................................................................................... 365


Seção I - Pessoas físicas. O princípio da universalidade ................................................................ 365
Seção II - Pessoas jurídicas. Do princípio da territorialidade ao princípio da universalidade ......... 366
§ 1° Os princípios da territorialidade e da universalidade........................................................... 366
§ 2° O princípio da territorialidade na legislação revogada......................................................... 368
§ 3° O princípio da universalidade.... ........................................................................................ 371
A) Atividade direta ............................................................................................................ 371
B) Atividade indireta através de filiais e sucursais no exterior.............................................. 372
§ 4° O regime de transparência fiscal internacional das coligadas e controladas no exterior ........ 372
A) l° período: a Lei nO 9.249/95 ....................................................................................... 372
a) A transparência fiscal internacional e a tributação extraterritorial.............................. 372
b) Os obstáculos........................................................................................................... 374
(i) Incompatibilidade com a exigência da disponibilidade da renda constante do
art. 43 do Código Ttributário Nacional............................................................... 374
(ii) Incompatibilidade com os tratados contra a dupla tributação.............................. 377
(a) A incompatibilidade genérica do regime da lei brasileira com o art. 7° dos
tratados.................................................................................... ..................... 377
(b) A incompatibilidade com os tratados na doutrina e na jurisprudência
internacional................................................................................................. 381
(c) A incompatibilidade do regime da lei brasileira com cláusulas especiais de
certos tratados.............................................................................................. 385
(d) Cláusulas excepcionais de compatibilização................................................... 387
B) 2° período: a Instrução Normativa nO 38/96 e o conceito de "disponibilização" ............ 388
C) 3° período: a Lei nO 9.532/97....................................................................................... 389
a) O conceito de disponibilização ................................................................................. 389
b) As hipóteses de equiparação à disponibilização ......................................................... 392
em Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

(i) Revogação sistemática das equiparações da Instrução Normativa nO 38/96.......... 392


(ii) Novo alcance das mesmas hipóteses na Instrução Normativa nO 213/02 ............. 393
(iii) A questão do "emprego" ................................................................................... 394
c) A tributação de dividendos em face dos tratados internacionais................................. 397
d) A equiparação de operações de concessão e crédito à disponibilização de lucros........ 398
D) 4° período: a Lei Complementar nO 104/01 e o art. 74 da MP nO 2.158(35-01 ............ 400
a) Incompatibilidade do art. 74 da MP nO 2.158-35/01 com o novo § 2° do art. 43
do CTN ................................................................................................................... 400
(i) A manutenção do requisito da disponibilidade .................................................... 400
(ii) A distinção entre disponibilidade e controle........................................................ 403
(iii) A distinção entre disponibilidade e equivalência patrimonial.............................. 404
b) llegitimidade constitucional da ficção equiparadora de lucros apurados a lucros
disponibilizados....................................................................................................... 408
c) Violação do princípio da não retroatividade pelo § único do art. 74 da
MP nO 2.158-35/01 ................................................................................................. 412
E) O art. 74 da MP nO 2.158-35/01 e os tratados contra a dupla tributação....................... 416
(i) Considerações preliminares ................................................................................. 416
(ii) A questão do dividendo ficto.............................................................................. 416
(iii) A questão das controladas indiretas ................................................................... 418
F) Outras questões............................................................................................................ 423
a) A questão da dedutibilidade de juros de empréstimos concedidos por coligadas e
controladas no exterior............................................................................................. 423
b) A compensação de prejuízos auferidos no exterior.................................................... 425
c) A compensação do imposto pago no exterior............................................................ 427
d) A compensação do imposto retido na fonte sobre rendimentos pagos a filial,
sucursal, controlada ou coligada no exterior ............................................................. 429
e) O conceito de equivalência patrimonial da IN nO 213/02 e a variação cambial do
investimento estrangeiro .......................................................................................... 429
f) A taxa de câmbio para fins de conversão dos lucros ........................................ ....... .... 432

Capítulo 11 - Residentes no exterior............................................................................................ 435


Seção I - O imposto de renda na fonte sobre residentes no exterior............................................. 435
Subseção I - Regime geral do imposto de renda na fonte............................................................. 436
§ 1° Hipótese de incidência....................................................................................................... 436
A) O conceito de rendimentos e ganhos de capital............................................................. 437
B) O conceito de fonte e sua localização ............................................................................ 439
a) As conexões cumulativas, fonte de produção e fonte de pagamento, para os
rendimentos em geral............................................................................................ ... 439
b) A conexão exclusiva fonte de produção, no caso de ganhos de capital....................... 440
C) Aspecto temporaL......................................................................................................... 441
a) O conceito de percepção do rendimento................................................................... 441
b) O caso das despesas incorridas e não pagas............................................................... 443
§ 2° Base de cálculo................................................................................................................... 445
§ 3° Sujeito passivo................................................................................................................... 447
§ 4° Alíquotas ........................................................................................................................... 448
§ 5° Isenções............................................................................................................................. 450
§ 6° Natureza: a incidência exclusiva na fonte como substituição tributária................................ 451
A) Imposto de renda na fonte como antecipação e como incidência exclusiva..................... 451
B) O conceito de substituição tributária............................................................................. 452
índice MiiiiM

C) A exclusão da responsabilidade do contribuinte na substituição tributária...................... 453


Subseção II - Dos rendimentos em especial.............. ................ .............................. .......... ............ 456
§ 1° Ganhos de capital relativos a investimentos diretos em moeda estrangeira.......................... 456
A) Hipótese de incidência.................................................................................................. 456
a) A questão antes do artigo 4° do Decreto-Lei nO 1.401, de 7 de maio de 1975.......... 456
b) A questão após o artigo 4° do Decreto·Lei nO 1.401, de 7 de maio de 1975............. 458
B) Base de cálculo ............................................................................................................. 459
a) O custo de aquisição como elemento essencial do ganho de capita!........................... 459
b) Custo de aquisição e registro de investimento estrangeiro......................................... 461
c) Alienação de participações societárias em parte registradas e em parte não
registradas no Banco Central do Brasil..................................................................... 464
d) Liquidação parcial de investimento estrangeiro......................................................... 465
§ 2° Outros ganhos de capital ................................................................................................... 467
§ 3° Investimentos estrangeiros nos mercados fmanceiro e de capitais....................................... 469
A) Considerações preliminares ........................ ............................................... .................... 469
a) A distinção entre o regime geral de equiparação a residentes no Brasil e o regime
especial de investimentos sujeitos às normas do Conselho Monetário Nacional......... 469
b) Registros.................................................................................................................. 470
c) Modalidades de investimento admitidos pelo Conselho Monetário Nacional............. 471
B) Aplicações de renda fIxa ................................................................................................ 472
C) Aplicações de renda variável- ganhos líquidos.............................................................. 474
D) Aplicações indiretas por meio de fundos e clubes de investimentos ............................... 477
a) Considerações gerais: transparência fIscal e tributação monofásica ............................ 477
b) Fundos de conversão - capital estrangeiro ................................................................ 479
c) Fundos de investimento de curto praw e de longo praw.......................................... 480
d) Fundos de investimento imobiliário ......................................................................... 482
e) Fundos de investimento em participações c afIns ...................................................... 483
§ 4° Dividendos ........................................................................................................................ 485
A) A supressão de incidência do imposto quanto a residentes no exterior pela
Lei nO 9.249/95............................................................................................................ 485
B) Convenções contra a dupla tributação: remissão........................................................... 486
§ 5° Incorporação de lucros e reservas ao capital social.............................................................. 486
§ 6° Juros ................................................................................................................................ 486
A) A distinção entre juros de operações fInanceiras e juros de fInanciamentos .................... 486
B) Não incidência sobre variação cambial.......................................................................... 487
C) Benefícios fiscais: remissão............................................................................................ 488
D) Juros nas compras de bens a praw................................................................................ 489
a) O art. 11 do Decreto-Lei nO 401/68 ......................................................................... 489
b) Natureza jurídica de imposro de renda retido na fonte.............................................. 490
c) Impossibilidade de caracterizar o devedor dos juros como contribuinte em face dos
arts. 43 e 45 do CTN ................................................................................................... 492
d) A dedutibilidade, pelo devedor, do imposto incidente sobre os juros por ele retido... 493
(i) A evolução legislativa .......................................................................................... 493
(ii) A distinção entre contribuinte, responsável em substituição do contribuinte e
fonte pagadora................................................................................................... 495
e) Inexistência de base legal para a vedação de reajustamento .......... .............................. 497
E) Convenções contra a dupla tributação: remissão............................................................ 498
§ 7° Juros sobre capital próprio................................................................................................. 499
A) Natureza substancial de dividendos sujeitos a regime tributário especial........................ 499
_M,M Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

B) Convenções contra a dupla tributação ........................................................................... 501


§ 8° Serviços em geral....................................................................................... ........................ 502
A) Narnreza dos pagamentos de serviços não pessoais........................................................ 502
B) A tributação dos serviços na lei interna.......................................................................... 503
a) O período anterior ao Decreto-Lei nO 1.418/75 ....................................................... 503
b) O art. 6° do Decreto-Lei nO 1.418/75 ...................................................................... 504
c) O art. 7° da Lei nO 9.779/99 .................................................................................... 506
C) Convenções contra a dupla tributação: remissão........................................................... 506
§ 9° Serviços técnicos, de assistência técnica e administrativa e royalties.............. ........................ 506
A) As alíquotas aplicáveis................................................................................................... 506
B) A previsão da instirnição de contribuição de intervenção no domínio econômico
(CIDE-Remessas) e a redução da alíquota do imposto de renda na fonte...................... 507
a) A incidência da CIDE-Remessas .............................................................................. 507
b) A distinção entre serviços em geral, serviços técnicos e de assistência técnica e
administrativa e royalties ........................... ........................................................ .... .... 512
c) Convenções contra a dupla tributação....................................................................... 515
§ 10° Programas de computador ................................................................................................ 515
A) Direito interno ............................................................................................................. 515
B) Convenções contra a dupla tributação ........................................................................... 519
Seção II - Equiparação a pessoas jurídicas domiciliadas no Brasil................................................. 520
§ 1° Filiais de sociedades estrangeiras ......................... ............................. .................................. 520
A) O conceito de funcionamento de sociedade estrangeira no Brasil.................................. 520
B) Narnreza jurídica das filiais de sociedades estrangeiras ................................................... 524
a) No Direito Privado................................................................................................... 524
b) No Direito Tributário .................................................................... ....................... ... 526
c) A personalidade jurídico-tributária das filiais de sociedades estrangeiras .................... 530
C) Os princípios da independência da tributação e da separação contábil........................... 53J
a) O princípio da territorialidade das despesas .............................................................. 532
b) O princípio da conexão efetiva e a rejeição da força atrativa...................................... 533
D) Relações filial-matriz: eliminação do imposto de renda na fonte sobre o lucro
automaticamente atribuído à matriz........................ ................................... ................... 535
§ 2° Comissários e representantes de residentes no exterior ....................................................... 537
A) Os negócios celebrados com interposição de pessoas..................................................... 537
B) Comissão e representação.............................................................................................. 539
C) As figuras do nuntius e do mediador: delegação de assinarnra ................... ............... ..... 541
D) Âmbito de aplicação: operações relativas a mercadorias ................................................ 543
E) Realização das operações no país................................................................................... 543

Título VI
REGIME CONVENCIONAL EM MATÉRIA
DE L\1POSTO SOBRE A RENDA

Capítulo I - Classificação das normas convencionais.................................................................... 547

Capítulo II - Normas de reconhecimento de competência ........................................................... 551


Seção I - Reconhecimento de competência exclusiva primária do Estado da residência................. 551
§ 1° Lucros das empresas em geral.................................................... ........................................ 551
A) O princípio do estabelecimento permanente ................................................................. 551
índice

B) Conceito de estabelecimento permanente...................................................................... 552


a) Estabelecimentos reais: instalações fIxas .................................................................... 552
b) Estabelecimentos pessoais: representantes dependentes ............................................ 555
C) Subsidiárias .................................................................................................................. 557
D) Assimilação a uma empresa independente..................................................................... 558
E) Comércio eletrônico...................................................................................................... 560
F) Prestação de serviços..................................................................................................... 563
a) A sujeição das remunerações de serviços ao art. 7° .................................................... 563
b) O Ato Declaratório nO 1/00: crítica .......................................................................... 565
G) Comparação com o regime interno............................................................................... 570
§ 2° Lucros de empresas de navegação ...................................................................................... 571
§ 3° Profissões independentes.................................................................................................... 573
§ 4° ProfIssões dependentes....................................................................................................... 575
§ 5° Professores e esmdantes ..................................................................................................... 578
§ 6° Pensões e anuidades privadas ............................................................................................. 579
§ 7° Capital........................................................................................................................ ....... 581
Seção II - Reconhecimento de competência cumulativa ilimitada do Estado da fonte................... 581
§ 1° Rendimentos imobiliários ........ ...................... .................................................................... 581
§ 2° Ganhos de capital .......................................... .................................................................... 582
§ 3° Remuneração de diretores.................................................................................................. 584
§ 4° Artistas e desportistas ........................................................................................................ 585
§ 5° Rendimentos atribuídos excepcionalmente à competência cumulativa do Estado da fonte .. 586
§ 6° Rendimentos não expressamente mencionados ..... ........ ........................ ............................. 587
Seção III - Reconhecimento de competência cumulativa limitada do Estado da fonte .................. 587
Subseção I - Dividendos .............................................................................................................. 588
§ 1° O conceito de dividendos................................................................................................... 588
A) O conceito em geral...................................................................................................... 588
B) O caso das bonificações................................................................................................. 590
§ 2° Tributação pelo Estado da fonte......................................................................................... 591
A) Os pressupostos de aplicação do regime convencional................................................... 591
B) Os limites do poder de tributar do Estado da fonte ....................................................... 592
a) Redução de alíquota................................................................................................. 592
b) O problema da tributação extraterritorial dos dividendos ......................................... 594
c) O regime especial das fIliais ..................................................................................... 594
d) Cláusulas antiabuso ........................... ....................................................................... 595
§ 3° Tributação pelo Estado da residência ................................................................................. 596
A) Dividendos de fonte estrangeira recebidos por residentes no BrasiL............................. 597
B) Dividendos de fonte brasileira recebidos por residentes de outros Estados..................... 598
Subseção II - Juros....................................................................................................................... 601
§ 1° O conceito de juros............................................................................................................ 601
A) Generalidadees.............................................................................................................. 601
B) O caso dos "juros negativos" ......................................................................................... 603
C) Alienação de aplicações fInanceiras................................................................................ 605
D) Juros de capital próprio ................................................................................................ 607
§ 2° Tributação pelo Estado da fonte......................................................................................... 608
A) Os pressupostos de aplicação do regime convencional................................................... 608
a) Pressupostos relativos ao devedor............................................................................. 608
b) Pressupostos relativos ao credor............................................................................... 609
B) Os limites do poder de tributar do Estado da fonte: isenção e redução de alíquota........ 611
MM- Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier
§ 30 Tributação pelo Estado da residência.................................................................................. 613
A) Exceção do estabelecimento permanente ....................................................................... 614
B) Regime de atenuação .................................................................................................... 614
a) Juros de fonte estrangeira recebidos por residentes no Brasil..................................... 614
b) Juros de fonte brasileira recebidos por residentes de outros Estados.......................... 615
Subseção III - Royalties................................................................................................................. 616
§ la O conceito de royalties............................................... ......................................................... 616
A) Generalidades ............................................................................................................... 616
B) A distinção entre contrato de knuw-huw e de prestação de serviços ................................. 620
C) A distinção entre contratos de "assistência técnica e serviços técnicos" e contratos de
prestação de serviços..................................................................................................... 625
D) Computer software ......................................................................................................... 628
§ 2 0 Tributação pelo Estado da fonte................................... .............................................. ........ 630
A) Definição de fonte ........................................................................................................ 630
B) Os limites ao poder de tributar do Estado da fonte....................................................... 631
§ 30 Tributação pelo Estado da residência.................................................................................. 633
A) Exceção de estabelecimento permanente ....................................................................... 634
B) Regime de atenuação .................................................................................................... 634
a) Royalties de fonte estrangeira recebidos por residentes no Brasil................................ 635
b) Royalties de fonte brasileira recebidos por residentes em outros Estados.................... 636
Seção IV-Reconhecimento de competência exclusiva primária do Estado da fonte ..................... 637
§ 10 Remunerações e pensões públicas........................................................... ................. .......... 637

Capítulo III - Normas de limitação de competência .................................................................... 639


Seção I - Normas de limitação de competência dirigidas ao Estado da residência ......................... 639
§ la Método de isenção............................................................................................................. 641
A) Exclusão de competência e isenção.............................. ..................... ... ............. ............. 641
B) Isenção integral e isenção com progressividade.............................................................. 642
C) Isenção e dupla não tributação...................................................................................... 643
§ 2 0 Método de imputação........................................................................................................ 644
A) Imputação integral e imputação ordinária ..................................................................... 645
B) Imputação ordinária efetiva e proporcional................................................................... 647
C) Crédito presumido (matching credit) e crédito fictício (tax sparing) ............................... 647
D) Imputação direta e indireta................................................................................ ........... 650
§ 30 Outros métodos................................................................................................................. 651
Seção II - Normas de limitação de competência dirigidas ao Estado da da fonte .......................... 652

Título VII
COMPETÊNCIA INTERNACIONAL E
RELEVÂNCIA DE ATOS PÚBLICOS ESTRANGEIROS

Capítulo I - O problema em geral............................................................................................... 657

Capítulo II - Assistência na troca de informações, notificação e execução de créditos tributários.. 661


§ la Troca internacional de informações .................................................................................... 661
A) Conceito e natureza ...................................................................................................... 661
B) Fontes........................................................................................................................... 663
C) Características e modalidades........................................................................................ 665
índice .iM

D) Âmbito ........................................................................................................................ 666


E) Fundamentos do pedido e da sua recusa legítima .......................................................... 667
a) Considerações gerais................................................................................................. 667
b) A questão do segredo bancário e profissional............................................................ 668
F) Confidencialidade ou sigilo fiscal............. ..................................................................... 672
G) As convenções celebradas pelo Brasil ............................................................................ 672
§ 2° Notificação e execução de créditos tributários estrangeiros ................................................. 674

Bibliografia ................................................................................................................................ 677

Índice Remissivo.................................................................................................. .......... ............ 723


Do AUTOR

LIVROS
a) Publicados no Brasil
· Do procedimento administrativo, São Paulo 1976.
· Do lançamento no Direito tributário brasileiro, São Paulo 1977 (3 a ed., Rio de Janeiro 2005).
· Direito Tributário Internacional do Brasil, São Paulo 1977.
· IncorporaçiW de sociedades e imposto de renda, São Paulo 1978.
· Os princípios da legalidade e da tipicidade da tributaçiW, São Paulo 1978.
· Estatuto jurídico dos portugueses no Brasil, Rio de Janeiro 1979.
· Administradores de sociedades (regime tributário da remuneraçiW - prestaçiW e aprovaçiW das contas),
São Paulo 1979.
· Direito tributário e empresarial - Pareceres, Rio de Janeiro 1982.
· Pareceres de Direito tributário, São Paulo 1986.
· Estudos sobre o imposto de renda, Belém 1988.
· Temas de Direito tributário, Rio de Janeiro 1991.
· Do Lançamento: teoria geral do ato, do procedimento e do processo tributário, Rio de Janeiro 1997.
· Direito Tributário Internacional do Brasil (6a ed), Rio de Janeiro 2004.
· Tipicidade da tributaçiW, simulaçiW e norma antielisiva, São Paulo 2001.
· Princípios do processo administrativo e judicial tributário, Rio de Janeiro 2005
b) Publicados em Portugal
· Beneficios fiscais à exportaçiW: limites e perspectivas, Lisboa 1969.
· Portugal e a integraçiW econômica europeia, Coimbra 1970.
· Política orçamental e economia de mercado: a experiência americana do apósguerra, Lisboa 1970.
· Subsídios para uma lei de defisa da concorrência, Lisboa 1970.
· Aspectos fondamentais do contencioso tributário, Lisboa 1972.
· Conceito e natureza do acto tributário (dissertação de doutoramento), Coimbra 1972.
· Economia de mercado e justiça social, Lisboa 1973.
· Manual de Direito Fiscal I, Lisboa 1974 (reimpressão em 1981).
· Direito Tributário Internacional, Coimbra 1993, 2a edição, 2005 (com a colaboração de Clotilde
Celorico Palma e Leonor Xavier), Coimbra 2007.
c) Publicados no estrangeiro
· The Taxation ofForeign Investment in Brazil, Deventer (Kluwer) 1980.
· Ilimposition des investissements étrangers au Brésil, Paris 1983.
· Derecho Tributário Internacional: conceptos fondamentales, Buenos Aires 2005.
d) Em co-autoria
· Estatuto dos beneficios fiscais (esboço de um projeto), Lisboa 1969.
e) Como organizador
· ALBERTO XAVIER!lVES GANDRA DA SILVA MARTINS (org.), Estudos jurídicos sobre Investimento
Internacional, São Paulo 1980.
PRINCIPAIS ESTUDOS E ARTIGOS

a) Publicados no Brasil:
· Notas sobre o problema das nulidades no Direito Tributário, Revista de Direito Tributário 2 (1977),
226.
· Validade das cláusulas em moeda estrangeira nos eontratos internos e internacionais in XAVIER/MARTINs,
Estudos jurídicos sobre investimento internacional, São Paulo 1980, I.
· Liberdade fiscal, simulaçik e fraude no Direito Tributário Brasileiro, Revista de Direito Tributário
11/12 (1980),284.
· A distinçik entre sociedades nacionais e estrangeiras para efeitos societários, fiscais e cambiais, Boletim de
Estudos Jurídicos do Investimento Internacional 7 (1980), 13.
· Problemas jurídicos de filiais de sociedades estrangeiras no Brasil e de sociedades brasileiras no exterior,
Boletim de Estudos Jurídicos do Investimento Internacional 16 (1980), 12; e Revista de Direito
Mercantil 9 (1980), 76.
· A natureza jurídica do processo tributário, Resenha Tributária 1982,239.
· A distinçik entre fornecimentos a curto e longo prazo para efeitos do imposto de renda, Revista de Direito
Tributário 23/24 (1983),104.
· Vícios do balanço - sua rectiftcaçik e consequências, Revista dos Tribunais 72 (1983),43.
· Imposto de renda - arbitramento de lucros - pressupostos e limites, Revista de Direito Tributário 27/28
(1984),76.
· A dupla inconstitucionalidade do art. 18" do Decreto-Lei 2323/87. Vwlaçik dosprincípios da anterioridade
e da nik retroactividade, Revista de Direito Tributário 40 (1987), 54.
· Consequências fiscais da locaçik de equipamentos eprestaçik de serviços no Brasil por sociedade estrangeira,
Revista de Direito Tributário 42 (1987), 32.
· IOC - Princípio da legalidade - Diseriminaçik arbitrária, Revista de Direito Tributário 46 (1988), 63.
· IR - Cômputo do ganho de capital na alienaçik de participações societárias por residentes no exterior em
caso de investimento "misto", Revista de Direito Tributário 49 (1989), 18.
· IOF -Inconstitucionalidade das novas incidências do IOF em geral e sobre o ouro em especial, Revista de
Direito Tributário 52 (1990), 97.
· Contribuinte e responsável no imposto de renda sobre juros pagos a residentes no exterior, Revista de
Direito Tributário 55 (1991),82.
· A contagem dos prazos no lançamento por homologaçik, RDDT 27 (1997), 7.
· A execuçik fiscal nos tributos de lançamento por honwlogaçik, RDDT 25 (1997),7.
· Aspectos fiscais de "cost-sharing agreement", RDDT 23 (1997), 7;
· Natureza jurídico-tributária dos "juros sobre capital próprio" face à lei interna e aos tratados
internacionais, RDDT 21 (1997), 7.
· Natureza jurídica e âmbito de incidência da compensaçik financeira por exploraçik de recursos minerais,
RDDT 29 (1998), 10.
· Os métodos de tributaçik da renda externa das pessoas jurídicas no Direito Comparado e o artigo 25 da
Lei 9249/95, in Estudos de Direito Tributário em homenagem à memória de Gilberto de Ulhôa
Canto, Rio de Janeiro 1998, 21-26.
I tzID I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

· Regime tributário das remunerações pela aquisição ou exploração de obras audiovisuais pagas a produtores
ou distribuidores residentes no exterior, RDDT 37 (1998), 7-16.
· O imposto de renda na fonte e os serviços internaeionais - análise de um caso de equivocada interpretação
dos arts. 7" e 21 dos tratados, RDDT 49 (1999), 7.
· Inexistência jurídica e inconstitucionalidade da denúncia do tratado contra a dupla tributação entre o
Brasil e Portugal, RDDT 48 (1999), 7.
· As entidades fechadas de previdência privada como instituições de assistência social, RDDT, 52 (2000),
19-45.
· Consórcio: natureza jurídica e regime tributário, RDDT, 64 (2001), 7-26.
· Do prazo de decadencia em matéria de "draw-back" suspensão, in LUIZ EDUARDO SCHOUERI (coord.),
Direito Tributário, vol. I, São Paulo 2003, 527-54l.
· Da inconstitucionalidade da exigência de garantia como condição de admissibilidade de recursos no processo
administrativo em geral e no processo administrativo fiscal em particular, RDDT, 10 1 (2004), 7-35.
· A questão da apreciação da inconstitucionalidade das leis pelos ót;gãos judicantes da Administração
Fazendária, RDDT, 103 (2004), 17-44.
· Dupla não tributação, RTFp' 58 (2004),269-275.
· Prazos de decadência: âmbito de aplicação dos arts. 150, § 4°, e 173, I, do CTN, Revista Tributária e de
Finanças Públicas, 55 (2004), 105-114.
· A tributação do IPI sobre cigarros, RDDT, 118 (2005),9-28.
· Do direito ao crédito de IPI nas aquisições de insumos sujeitos a alíquota zero, RDDT, 120 (2005), 11-25.
· Regime constitucional das isenções e incentivos fiscais às exportações: o caso do ICMS. Do direito à
utilização integral de saldo aeumulado de créditos de ICMS como corolário da imunidade das exportações,
in HELENO TAVEIRA TÔRRES (coord.), Tratado de direito constitucional tributário, estudos em
homenagem a PAULO DE BARROS CARVALHO, São Paulo 2005,597-623.
· Pressupostos e limites de aplicação dos métodos de apuração dos preços de transferência da Lei nO 9.430/96
face ao art. 9" dos Tratados contra a dupla tributação, RDTI, 1 (2005), 17-36.
· Incorporação de ações - natureza jurídica e regime tributário, in RODRIGO R. M. DE CASTRO/LEANDRO
S. DE ARAGÃO (org.), Sociedade Anônima, São Paulo 2006.
· A alienação de aplicações financeiras face ao tratado Brasil-Japão, RDDT, 139 (2007), 7-12.
· O conceito de autolançamento e a recente jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, in Luís
EDUARDO SCHOUERI (coord.), Direito Tributário, homenagem a PAULO DE BARROS CARVALHO, São
Paulo 2008, 561-573.
· O princípio da não discriminação no MERCOSUL, in HELENO TAVEIRA TÔRRES (coord.), Direito
Tributário InternacionalAplicado, São Paulo 2008, v.5, 1017-103l.
· Responsabilidade tributária de sucessores na alienação de estabelecimento, RDDT, 167 (2009), 7-17,
· Troca internacional de informações: as novas tendências, in VALDIR DE OLIVEIRA ROCHA (coord.),
Grandes questões atuais do direito tributário, São Paulo 2009, v. 13,9-25
· Unconstitutionality ofthe taxation ofthe individual rural employer, in BURANELLO et alia (coord.),
Agribusiness Law, São Paulo, 2010, 995 ss.

b) Em co-autoria: :
· O ISS das sociedades de serviços profissionais e a Lei Complementar nO 116/03, in VALDIR DE OLIVEIRA
ROCHA, O ISS e aLC 166, Dialética, São Paulo 2003, 9-18 (em col. com Roberto Duque Estrada).
· Alcance da não incidência da contribuição para ofondo de universalização dos serviços de telecomunicações
prevista no parágrafo único do art. 6° da Lei nO 9.998/00, 495, in HELENO TAVElRA TÔRRES (coord.),
Serviços públicos e direito tributário, São Paulo 2005, 496-533 (em col. com Helena A.L. Xavier).
· Países com tributação favorecida e regimesfiscaisprivilegiados, RDDT 168 (2009),7-17. (em col. com
Roberto Duque Estrada e Renata Emery)
· A exoneração do ICMS nos serviços de transporte de mercadorias exportadas e oprincípio do país do destino,
in ANTONIO PEREIRA DE CARVALHO/GERMAN SAN MARTÍN FERNANDEZ, Estudos em homenagem a
JosÉ EDUARDO MONTEIRO DE BARROS - Direito Tributário, São Paulo, 2010, 71 ss (em col. com
Renata Emery).
· Subcapitalização, RDDT, nO 176 (2010), 7 ss. (em colaboração com Renata Emery).
Principais Estudos e Artigos I tZDD I

c) Publicados em Portugal:
· O processo administrativo gracioso, O Direito 99 (1967), 16 (Separata).
· As desigualdades internacionais e a integraftW econômica. IntroduftW ao estudo das relações entre comércio
internacional e desenvolvimento econômico, Revista da Faculdade de Direito de Lisboa XXII (1970)
(Separata) .
· A natureza jurídica da associaçtW à Comunidade Econômica Europeia, Coimbra 1970.
· O negôcio indirecto em Direito Fiscal, Cadernos de Ciência e Técnica Fiscal 1971 (Separata).
· IntroduftW ao Direito Tributário Internacional, Boletim do Ministério da Justiça 320 (1982)
(Separata) .
· As sucursais de sociedades estrangeiras no direito brasileiro (aspectos tributários e cambiais), in Estudos
- XX Aniversário do Centro de Estudos Fiscais, Lisboa 1983 (Separata).
· O problema das qualificações no Direito Tributário Internacional, in Estudos - Comemoração do XXX
Aniversário do Centro de Estudos Fiscais, Lisboa 1993, 69 (Separata).

d) Publicados no estrangeiro:
· n fenomeno deU' astrattezza nell'atto di accertamento tributaria, Rivista di Diritto Finanziario e
Scienza delle Finanze XXXIV (1975), 225 (Separata).
· Tipicidad y legalidad en el derecho tributaria, Revista de Derecho Financiero y de Hacienda Publica,
Madrid 120 (1975).
· Régime fiscal des emprunts concédés par des banques étrangers, Intertax 1978, 440.
· Aspectsgénéraux des investissements directs au Brésil, Fiscalité Européenne 4 (1978), 49.
· The compensation oflosses in internationalgroups (IFA Congress Copenhagen) , Cahiers de Droit Fiscal
International LXIV (1979), 195.
· Transfert de bénéfices provenant d'operations financiêres, Fiscalité Européenlle 5 (1981), 28.
· Problemi di Diritto Costituzionale nell'ordinamento tributaria brasiliano, Rivista di diritto e pratica
tributaria LIII (1982),417 (Separata).
· O principio da legalidade no Brasil, in El Principio de Legalidad en el Derecho Tributario. Simpósio,
Montevideo 1986, 227.
· li problema delle qualificazioni nel diritto tributaria, Rivista di Diritto Tributario 5 (1994), 523 ss.
· EI problema de las calificaciones en derecho tributaria internacional, Revista de Derecho y Hacienda
Publica (1994),663 ss.
· The taxation in Portugal of non-residents without permanent establishment, in Corso di Diritto
Tributario Internaziollale (coord. VICTOR UCKMAR), Milão 1999, 147 ss.
PREFÁCIO

Passadas duas décadas da chegada de Alberto Xavier ao Brasil, não é difícil ver as razões de seu su-
cesso. Jurista consagrado, advogado prestigioso, conferencista aplaudido, escritor respeitado, dotado de
qualidades humanas admiráveis e excepcional sociabilidade. Quem ostenta sobejamente - embora sem
jactância - tais predicados só poderia obter a singular posição hoje desfrutada por esse amigo, colega,
companheiro e, sempre, mestre.
O:mviveu - despertando sua admiração e amizade, além de espírito de coleguismo - com Rubens
Gomes de Sousa, Aliomar Baleeiro, Ulhôa Canto, Souto Borges, Paulo Barros Carvalho, A. R. Sampaio
Dória, Roque Carrazza e demais mestres do nosso direito tributário.
Com rígida formação europeia, adaptou-se ao Brasil e seu clima cultural e científico com surpre-
endente facilidade e rapidez. Em brevíssimo tempo, passou a exercer a advocacia, familiarizando-se com
o nosso estilo de desempenho profissional de modo a tornar-se exemplo de advogado sóbrio, arguto e
eficiente, situando-se entre os melhores dos nossos melhores.
Enquanto viveu em São Paulo, foi professor do curso de Pós-Graduação em Direito Tributário da
Faculdade de Direito da Universidade Católica, por nós dirigido. Deixou entre seus colegas docentes e
seus alunos a mais excelente imagem do professor correto, exato, sério, exigente, eficiente. Tanto contri-
buiu para o prestígio da Faculdade de Direito da Universidade Católica - lecionando também nos seus
memoráveis cursos de especialização e examinando em concursos de mestrado e doutorado - que seu
nome continua a figurar como integrante do seu quadro docente, a despeito de, domiciliado no Rio, já
não poder prosseguir enriquecendo nossas atividades docentes. Certamente, tal deliberada decisão dos
professores da área de direito público da Universidade Católica de São Paulo deve-se - como é o meu caso
- à consciência da honra que para nós significa ostentar o nome de Alberto Xavier nos nossos quadros.
Alberto Xavier é exemplo típico - no mais alto nÍvel- da continuidade ou comunidade cultural Bra-
sil-Portugal. Vive, trabalha, leciona, escreve entre nós como um dos nossos, ao mesmo tempo que, sem
esforço, sem necessidade de nenhuma alteração de comportamento, atua como profissional em Portugal.
De sua contribuição - vasta e ampla - para a nossa doutrina e evolução do nosso pensamento cien-
tífico, no setor tributário, devem ser salientadas duas pérolas, notáveis pelo conteúdo e pela influência que
aqui tiveram: o livro Princípws de legalidade e tipicidade da tributaçiW e este Direito tributárW internacional.
Seu preciso, conciso, sintético, equilibrado e paradigmático livro sobre a legalidade estrita veio su-
prir uma deficiência nossa, até então grave. Não tínhamos uma monografia cuidando do tema, embora
ele não fosse ausente em artigos, pareceres ou capítulos de alguns livros brasileiros. Foi Alberto Xavier
quem sintetiwu, com objetividade, clareza e rigor científico, as bases fundamentais do tema, nesse tra-
tamento monográfico que, por si só, já justificaria - por sua excelência, precisão, concisão e objetividade
- o renome e o altíssimo conceito de que o insigne professor justamente desfruta.
r á este Direito tributárW internacwnal, primeiro livro jurídico sobre o assunto, no Brasil, com
lastro doutrinário e adequado tratamento dogmático, foi original aporte à nossa doutrina e às nossas
elaborações legislativas, doutrinárias e jurisprudenciais. O livro tornou-se obrigatório. Não se pode
Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

cogitar do tema, academicamente, nem pretender estudar nenhuma questão tópica de direito tributário
internacional sem referir-se ao livro de Alberto Xavier, suas teses e colocações.
A internacionalização da economia - tornada realidade que se não pode ignorar - bem como a
crescente e inexorável abertura do mercado brasileiro para o exterior fazem cada dia mais importante o
direito internacional tributário. Já não se pode pensar em dialogar com importadores e exportadores ou
negociar em nenhum ramo do comércio negligenciando os aspectos tributários internacionais.
Aí a importância também prática do livro de Alberto Xavier, que cuida, como na primeira edição,
das categorias universais da colocação geral dos temas, em função dos princípios e das normas pertinentes
e que, agora, amplia o campo material de abrangência de sua atenção também para o direito da Comuni-
dade Econômica Europeia e demais realidades que se impõem no hodierno cenário jurídico mundial.
Esta edição é muito mais que o aperfeiçoamento e a atualização da primeira. É, verdadeiramente,
uma obra inteiramente repensada, sistematizada e redigida de novo. É, sobretudo, um trabalho magis-
tral de um cientista maduro, expandindo seus invejáveis dotes científicos, servidos por generosa cultura
geral e especial, esplêndida inteligência e apurado senso jurídico.

Rio de Janeiro, julho de 1993

GERALDO ATALIBA
NOTA DO AUTOR À 2a EDIÇÃO

O livro que ora se publica é simultaneamente a 2" edição do Direito Tributário Internacional
do Brasil, publicado em 1977, e um livro novo. Segunda edição, pois a obra mantém identidade de
objeto, de propósito e de estrutura; livro novo, pois raros foram os capítulos que não foram reescritos
por inteiro, seja pela necessidade de considerar a evolução do direito positivo e novas contribuições da
doutrina, seja pela necessidade de revisão de pontos de vista do autor, seja ainda pela maior ênfase posta
na construção dogmática deste ramo do Direito, deliberadamente inspirada no Direito Internacional
Privado e que conduziu, entre outros pontos, ao aprofundamento do estudo da natureza das respectivas
normas e à reelaboração da teoria da qualificação, da aplicação da lei estrangeira e da fraude à lei.
A reformulação quase integral deste livro deve-se, na verdade, à profunda evolução do Direito Tri-
butário Internacional, tanto em geral quanto no Brasil em particular, nos dezesseis anos que medeiam
entre a primeira e a atual edição.
No plano da doutrina, correspondendo aliás a um excepcional surto de interesse que se revela nos
nossos dias por este ramo do Direito, foram entretanto produzidas, além de monografias de qualidade,
obras gerais de grande relevo, de que é justo sublinhar, na Alemanha, o Doppelbesteuerungsabkommen
- Kommentar, de KLAus VOGEL, e o Steuerrecht internatWnal tiitiger Unternehmen, obra coletiva coor-
denada por MóssNER; nos Estados Unidos, a U.S. International TaxatWn, de KUNZ e PERONI; no Reino
Unido, a Double TaxatWn de BAKER; na França, Les impôts dans les affaires internationales, de GOUTHIERE,
o Droit Fiscal International, de PLAGNET, e o Droit Fiscal International, de GEST e TIXIER; na Suíça, o
Droit Fiscal International, de RIVIER; na Itália, La tassazione dei reddito transnazionalle, de GARBARINO, e
a Doppia imposizione internazionale, de ANNA MlRAULO; e, em Portugal, a dissertação de doutoramento
de MANUEL PIRES, Da dupla tributação jurídica internacWnal sobre o rendimento.
Acresce que o Modelo de Convenção para eliminar a dupla tributação sobre o rendimento e o
capital da OCDE e respectivos Comentários foram objeto de profundas revisões em 1977 e 1992, que
incorporam as tendências mais recentes da fiscalidade internacional.
No plano do direito interno brasileiro, a legislação do imposto de renda relativa a transações in-
ternacionais - embora não tenha sofrido revisão sistemática e abrangente - foi objeto de modificações
significativas, entre as quais se salienta a eliminação do imposto suplementar de renda, a introdução e pos-
terior extinção do imposto sobre o lucro líquido, a eliminação do regime de indedutibilidade de royalties e
despesas de assistência técnica, a suspensão do beneficio pecuniário sobre juros de empréstimos externos.
Também se multiplicou o número das convenções contra a dupla tributação assinadas pelo Brasil,
que hoje perfazem vinte e duas, das quais apenas onze consideradas na 1" edição.
Todos estes pontos se conjugaram para que o presente livro não pudesse ser uma simples atualiza-
ção ou um mero aperfeiçoamento do anterior, tendo-se transformado em obra integralmente repensada,
sistematizada e redigida.
A obra refere-se à legislação em vigor em julho de 1993.

Rio de Janeiro, julho de 1993

ALBERTO XAVIER
PREFÁCIO À la EDIÇÃO

Aí por 1972, apareceu nas livrarias brasileiras e foi parar às mãos dos interessados no Direito
Financeiro um conspícuo volume de 650 páginas sob o título de Conceito e Natureza do Ato Tributário,
da autoria de ALBERTo PINHEIRO XAVIER, cujos títulos não conhecíamos, mas compreendemos que era
um estudioso de Portugal, a julgar pelo fato de haver sido lançado por uma editora da veneranda Coim-
bra. As obras anteriores do Autor formavam um rol de 12 títulos a partir de 1967, sinal de que deveria
tratar-se provavelmente dum moço.
"Ato Tributário" era a nova designação do Código de Processo das Contribuições e Impostos, de
Portugal, para o nosso vetusto e ainda atual "lançamento", da consagrada linguagem legal e adminis-
trativa luso-brasileira. O importante é que a leitura da alentada monografia revelava um tributarista de
prol, amadurecido sob a influência da literatura especializada alemã e suíça. Tínhamos, em Portugal,
uma competência já lucidamente afirmada por um livro opulento e sério. Lembro-me de que,no ano
imediato, incluí essa obra na bibliografia da reedição dum livro didático meu, que é intencionalmente
discreto na utilização das obras estrangeiras pelo notório contraste com o nosso Direito Positivo.
Eis senão quando, irrompida em 1974 a revolução que encerrou o longo reinado salazarista, então
esmagado não só por seu anacronismo em relação aos ventos políticos do mundo após a 2 a Grande
Guerra, mas também pelos problemas coloniais da África, devoradores de sangue e de dinheiro, muitos
intelectuais da nação-mãe buscaram asilo no Brasil como defesa contra a intolerância, quase sempre
sombra inevitável das grandes convulsões institucionais.
Dentre eles figurava ALBERTO XAVIER, que se fixou em S. Paulo, como professor e consultor fis-
cal, integrando-se rapidamente no círculo dos tributaristas brasileiros, que o acolheram fraternalmente
com simpatia e apreço intelectual. Isso lhe valeu de carta de naturalização pelo menos como cidadão da
cultura brasileira.
Um fato surpreendeu a todos: - a juventude do prof. XAVIER, um rapaz de 30 e poucos anos, em
contraste com a profundidade de sua obra.
Terá pela frente toda uma vida para, com o espírito sazonado, produzir tudo de útil e de elevado
que se deve esperar e exigir de sua capacidade promissora e fecunda.
E ALBERTO XAVIER acaba de confirmar essa responsabilidade - savoir oblige - com o novo livro
que redigiu no Brasil e que a Ed. Resenha Tributária acaba de pôr nas vitrines das livrarias - Direito
Tributário Internacional do Brasil-, aliás com ótima apresentação gráfica.
O leitor à antiga talvez estranhe o título - " ... Internacional do Brasil". Não se excluirão as pala-
vras do cabeçalho? Se é do Brasil, não pode ser internacional- dirá.
O Autor solidamente prova o contrário.
Há um Direito Tributário Internacional, mas para quem não se limitar às generalidades meramen-
te expositivas e acadêmicas ele há de ser analisado do ângulo do Direito Nacional de determinado país.
A legislação positiva deste ou seus tratados e convenções internacionais marcam os limites e a posição
das normas de Direito Internacional realmente em vigor. O Direito que vale e obriga como tal.
Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

o prof. ALBERTO XAVJER parte do princípio geral da aplicação da lei tributária no espaço, enfim,
da territorialidade dela.
Mas desse "óbvio" distingue três critérios de estudo da territorialidade: a) em sentido positivo e
negativo; b) em sentido real e pessoal; e c) em sentido material e formal.
Depois de examinar as fontes, a começar pelas convenções contra a bitributação ou pluritributa-
ção internacionais, salienta que o Brasil, numa política nacionalista, protecionista e algo isolacionista,
se alheou do movimento mundial desde as duas Grandes Guerras, em prol dos acordos para conciliação
de interesses do comércio externo, sobretudo em relação aos países limítrofes e aos investidores e toma-
dores de capitais. E registra o recente impulso nacional em busca de convenções, muito embora nosso
país não adote a cláusula de "transformação" ou de "ordem de execução" das normas internacionais em
Direito Interno.
Prosseguindo, estuda a pluritributação e a evasão fiscal internacional, dissecando as várias com-
plicações desse problema, inclusive os chamados "paraísos fiscais", como Luxemburgo, Liechtenstein,
Panamá etc., c as medidas para combatê-los.
A segunda parte da obra é dedicada à "hipótese das normas de conflitos", demorando-se no exa-
me dos elementos de conexão, domicílio, inclusive o estatuto de residente no Direito brasileiro, fontes
dos rendimentos (produção e pagamento) etc. etc.
Na terceira parte, cuida do mandamento das normas de conflitos.
Em estilo transparente e agradável de ler-se, o douto tributarista não se esquece nunca de co-
locar os problemas à luz da legislação positiva do Brasil, penetrando nas controvérsias do período
pós-revolucionário quando não só se multiplicaram diplomas relativos ao comércio internacional e
convenções, mas também litígios que agitaram o Supremo Tribunal, como os das remessas de juros e
vários outros.
A obra de ALBERTO XAVJER é de alto quilate, preencheu um vácuo em nossa literatura fiscal e chega
em momento oportuno, porque, embora riquíssima em bibliografia e em base científica, fornece sub-
sídios à solução de inúmeros problemas práticos suscitados pelo desenvolvimento do país nos últimos
quinze anos com inevitáveis fricções de caráter internacional ou multi nacional.
A produção do professor ilustre de S. Paulo em nosso clima honra o Direito brasileiro e, graças
a Deus, não ficará nesse grande livro. Outro já tem em preparo como um dos volumes dum tratado
coletivo do Direito Tributário de nosso país.
Temos certeza de que essa obra futura (talvez para ser lançada em 1977) será da mesma lavra
primorosa do Ato TributárW e do Direito TributárW Internacional do Brasil. Os bons artistas excedem-se
a si mesmos.
Os brasileiros iniciaram-se em Finanças, há 140 anos, com a Sintelologia do velho e luminoso
FERREIRA BORGES. Pouco depois, viram aparecer em modesta editora do Rio, em 1814, o Compêndio de
Direito Financeiro, de J. J. DA SILVA MAiA, que, embora deputado à Constituinte de 1824 e ministro de
Pedro I, era nascido em Portugal. ALBERTO XAVIER tem bons antecedentes nessa honrosa colaboração
luso-brasileira.

Rio de Janeiro, abril de 1977

AUOMAR BALEEIRO
NOTA DE APRESENTAÇÃO À 1a EDIÇÃO

O livro que agora se publica tem uma dupla raiz: a vida universitária e a experiência do autor no
campo da advocacia internacional de negócios.
A regência de Cursos de Pós-Graduação em Direito Tributário na Pontifícia Universidade Católi-
ca de São Paulo propiciou estreito contato com uma dinâmica equipe renovadora dos estudos desta dis-
ciplina jurídica. Aos debates quase diários com Geraldo Ataliba e Paulo de Barros Carvalho se deveu a
ideia de conceber este livro sob a perspectiva de uma teoria geral das normas tributárias internacionais;
e nesses mesmos debates se me radicou a ideia de que tais normas são normas de conflitos, de natureza
análoga às de Direito Internacional Privado, cujo instrumental técnico-dogmático poderia rasgar pers-
pectivas fortemente inovadoras no estudo deste capítulo do Direito.
A feição pragmática que o livro apresenta, em certas passagens, resulta do propósito deliberado
de pôr à prova os conceitos teóricos em face das realidades concretas que se me foram deparando ao
longo da minba experiência de assessoria jurídica de investimentos estrangeiros. Propósito que exprime
a convicção de que as construções teóricas devem ser indutivamente elaboradas a partir dos regimes
jurídicos, e só são válidas na medida em que os permitem explicar.
Não escondo que foram muitas as dificuldades encontradas para a elaboração deste livro, já ad-
venientes do acesso a fontes de informação bibliográfica, já resultantes da complexibilidade própria
da matéria, em relação à qual um esforço de construção jurídica global ainda se não encontrava feito,
inobstante contribuições valiosas em capítulos isolados.
Deixo aqui consignados os meus agradecimentos ao Dr. Brandão Machado que, com a gene-
rosidade que é seu timbre, me facultou preciosos elementos de informação bibliográfica. E registro a
gentileza do Dr. Ormezindo Ribeiro de Paiva pela revisão crítica do original a que acedeu proceder.

São Paulo, abril de 1977

ALBERTO XAVIER
ABREVIATURAS MAIS USADAS

BIFD .............................. Bulletin for International Fiscal Documentation, Amsterdam (publicação do


International Bureau ofFiscal Documentation)
CCTF ............................. Cadernos de Ciência e Técnica Fiscal (Portugal)
CDFI ............................. Cahiers de Droit Fiscal International
Comentários ................... Comentários do Comité Fiscal da OCDE à Convenção Modelo de OCDE
(V. Modelo OCDE) sobre o rendimento e o capital
CST. ............................... Coordenação do Sistema de Tributação
CTF ............................... Ciência e Técnica Fiscal, Boletim da Direcção Geral das Contribuições e Im-
postos, Ministério das Finanças (Lisboa)
CTN ............................... Código Tributário Nacional
Enc. del Dir.................... Enciclopedia deI Diritto (Milão)
IBFD .............................. International Bureau ofFiscal Documentation
IFA ................................. I nternational Fiscal Association
IN .................................. Instrução Normativa
Modelo OCDE ............... Modelo de convenção tributária rdativa ao rendimento e ao capital, versão de
2008
Modelo OCDE-ISD ....... Modelo de convenção da dupla tributação em matéria de sucessões e de doações
NMC Positions ............... Non-Member Countries' Positions (observações dos Estados não membros da
OCDE ao texto do Modelo e aos Comentários)
RBDTFP ........................ Revista Brasileira de Direito Tributário e Finanças Públicas
RABDT. ......................... Revista da Associação Brasileira de Direito Tributário
RDTI ............................. Revista de Direito Tributário Internacional
RET ............................... Revista de Estudos Tributários
RFDT ............................ Revista Fórum de Direito Tributário
RJT ............................... Revista Jurídico-tributária
RTFP ............................. Revista Tributária e de Finanças Públicas
RDDT ........................... Revista Dialética de Direito Tributário
RDT .............................. Revista de Direito Tributário (São Paulo)
RTFP ............................. Revista Tributária e de Finanças Públicas (até o nO 29 RT - CDTFP)
RIR ................................ Regulamento do Imposto de Renda (Decreto nO 3000, de 26.3.1999)
SRF ................................ Secretaria da Receita Federal
,
TITULO r

o OBJETO DO DIREITO
TRIBUTÁRIO INTERNACIONAL
CAPÍTULO I
LIMITES DAS LEIS

§ 10 A DISTINÇÃO ENTRE ÂMBITO DE INCIDÊNCIA E


ÂMBITO DE EFICÁCIA DAS LEIS NO ESPAÇO

A) As situações internacionais como objeto do Direito Tributário Internacional


O Direito Tributário Internacional tem por objeto situações internacionais (cross-
border situations) , ou seja, situações da vida que têm contato, por qualquer dos seus
elementos, com mais do que uma ordem jurídica dotada do poder de tributar.
Escapam, assim, ao seu objeto, as situações puramente internas) cujos aspectos ou
elementos se realizam integralmente no âmbito de um só Estado, seja ele o Estado do
órgão de aplicação do direito (situações internas nacionais) ou um Estado estrangeiro
(situações internas estrangeirasJl. Assim, não respeita ao Direito Tributário Interna-
cional a tributação da compra e venda de ações de uma sociedade com domicílio no
Brasil, em que vendedor e comprador são brasileiros domiciliados no Brasil e em que
o pagamento é feito em moeda corrente nacional. Também não respeita ao Direito
Tributário Internacional a tributação da sucessão de cidadão belga, domiciliado na
Bélgica, cujos únicos bens são imóveis localizados na Bélgica e cujos herdeiros são
cidadãos belgas residentes na Bélgica.
A natureza internacional da situação decorre da sua conexão com mais do que
um ordenamento. Pense-se na tributação de empresa de navegação marítima cuja
sede social esteja no Panamá, cuja administração efetiva esteja em Londres, cujo capi-
tal social seja controlado por residentes nos Estados Unidos e cujos lucros advenham
de tráfego marítimo realizado nas Ilhas gregas. Ou na tributação de um maestro, de
nacionalidade alemã, residente na Áustria e que aufere remunerações por concertos
executados em terceiros países. Ou na tributação de brasileiro que transferiu residên-

1 Alguns autores denominam estas situações, no Direito Internacional Privado, como relativa-
mente internacionais (por oposição às absolutamente internacionais). É que, embora monolocali-
zadas num Estado estrangeiro, podem ser objeto de valoração por outro Estado para efeitos de
reconhecimento de direitos adquiridos. Cfr. BAPTISTA MACHADO, Lições de Direito Internacional
PrivacW (4a ed.), Coimbra 1990, 10-12. Como, porém, este último problema não se coloca no
Direito Tributário Internacional, preferimos usar a expressão situaçtfu interna estrangeira.
Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

cia para Portugal, mas que continua a auferir rendimentos de imóveis que possui no
Brasil. Ou na tributação de dividendos auferidos por holding com sede no Luxem-
burgo, pagos por subsidiária com sede na Austrália e que exerce a sua atividade de
mineração na Nova Zelândia, através de estabelecimento estável neste país.
Em todos estes casos, a situação da vida se encontra plurilocalizada, pois que
vinculada ao ordenamento de mais do que um país por elementos de conexão que
tendem a referi-la a mais do que um Estado - a sede da empresa de navegação, a
nacionalidade ou domicílio do maestro, o lugar do exercício da atividade, o lugar da
situação dos imóveis, o lugar da fonte pagadora dos dividendos.
Ora, o Direito Tributário Internacional surge precisamente porque uma ou alguma
das características ou aspectos da situação internacional pode funcionar como conexão
suscetível de desencadear a incidência e a aplicação das leis tributárias internas de mais
do que um Estado. Assim, pode a lei fiscal da Nova Zelândia aplicar-se aos rendimentos
obtidos por não residentes se a atividade produtiva for realizada no seu território; mas
pode também a lei australiana entender que as suas leis tributárias se aplicam às socie-
dades nela domiciliadas, abrangendo os lucros realizados quer no seu território, quer no
exterior (v.g. na Nova Zelândia); e pode a lei do Luxemburgo adotar idêntica solução,
abrangendo no campo de incidência das suas leis fiscais os lucros das suas subsidiárias
no exterior (v. g. na Austrália). Pode a lei portuguesa considerar tributáveis os rendi-
mentos de todas as pessoas físicas residentes em Portugal (v.g. do cidadão brasileiro),
incluindo os auferidos no exterior; e pode a lei brasileira aplicar-se aos rendimentos
de imóveis localizados no Brasil. Pode a lei fiscal alemã pretender tributar os seus na-
cionais, ainda que residentes no exterior (v. g. na Áustria), como pode a lei austríaca
aplicar-se aos rendimentos mundiais das pessoas físicas residentes na Áustria, ainda que
estrangeiros, como pode a lei do país onde o maestro executou o concerto considerar
tributáveis os rendimentos auferidos em função de a atividade ter sido realizada no seu
território. Pode a lei inglesa aplicar-se a todas as empresas de navegação que tenham
direção efetiva no Reino Unido, embora a sede estatutária noutro país, como pode a lei
do Panamá tributar todas as sociedades que nele tenham sede estatutária, ainda que por
atividades realizadas no exterior, como pode a lei fiscal grega tributar o lucro de ativida-
des exercidas no território da Grécia, ainda que por estrangeiros não residentes.
Em todos os exemplos acima apresentados, como vários ordenamentos tributá-
rios se consideram com vocação para se aplicar a uma mesma situação da vida inter-
nacional, por esta se encontrar "plurilocalizada" no espaço, em função dos diversos
elementos de conexão adotados por cada um desses ordenamentos, ocorre uma dupla
ou plúrima tributação.

B) A distinção entre âmbito de incidência


e âmbito de eficácia das leis tributárias no espaço
O Direito Tributário Internacional respeita, em primeira linha, ao problema do
âmbito de incidência e ao âmbito de eficácia das leis tributárias no espaço.
Título I I Capo I I Limites das Leis

A questão relativa ao âmbito de incidência (Geltungsraum, domaine de validité) ,


para usar a terminologia de GUGGENHEIM2, reporta-se a saber se (e em que termos) a
norma tributária interna pode abranger na sua previsão pessoas, coisas e fatos locali-
zados no território de outro Estado.
Por sua vez, a questão relativa ao âmbito de eficácia (Wirkungsraum, sphere
d)éjficacité) respeita a saber se (e em que termos) a norma tributária interna é suscetível
de ser coercitivamente aplicada em território estrangeiro e se, inversamente, uma lei tri-
butária estrangeira é suscetível de ser coercitivamente aplicada em território nacional.
A dicotomia da questão atrás referida corresponde, na terminologia do Direito
norte-americano, à distinção entre a Jurisdiction to prescribe - "the capacity o[ a State
under internationallaw to make a rule o[law" - e a Jurisdiction to enforce - "the capacity
o[a State under internationallaw to enforce a rule o[law, whether this capacity be exercised
by the Judicial or executive branch"3.
Pela nossa parte, preferimos adotar a distinção entre esfera de incidência e esfera
de eficácia das leis, mais próxima das nossas raízes culturais e linguísticas. Preferi-
mos a expressão âmbito de incidência à de âmbito de validade (domaine de validité,
Geltungsraum, Geltungsbereich), pois este último conceito é tradicionalmente ligado
à apreciação do valor jurídico de um ato, inclusive normativo, em face de um outro,
de nível hierárquico superior, enquanto no problema em causa trata-se de saber qual
o universo de situações sobre as quais pode recair (incidir) a previsão de uma nor-
ma. Também preferimos a expressão esfera de eficácia (Wirkungsraum) à de esfera
de aplicação (Anwendungsbereich), de que fala ZITTELMANN\ pois este conceito tem
amplitude para abranger fenômenos tais como o cumprimento espontâneo da norma
pelos particulares ou até a subsunção operada por órgãos de aplicação do direito,
sem que dessa subsunção resultem efeitos autoritários (como sucede nas hipóteses
de aplicação de leis estrangeiras às chamadas questões prévias)S, enquanto no proble-
ma em causa trata-se de saber qual a extensão territorial dos poderes de império dos
órgãos internos de aplicação das leis tributárias nacionais 6 .

2 Cfr. GUGGENHEIM, Lehrbuch des Vollkerrechts, I, Basel1948, 331; ID., Traité de Droit Inter-
national Public, I, Geneve 1953, 369. "Extensão da lei", por oposição à "eficácia da lei" no
espaço, na terminologia de BERLIRI, Corso istituzionale di Diritto Tributario, Milão 1980, 103;
GARBARINO, La tassazione deI reddito transnazionale, Pádua 1990, 107.
3 Cfr. AMERICAN LAW lNSTITUTE, Restatement. Second, Foreign Relations Law ofthe United States,
1964 (revisto em 1988); MARTHA, The Jurisdiction to Tax in International Tax Law, Deventerj
Boston 1989, 59 sS.; F. A. MANN, The doctrine ofjurisdiction in International Law, in ID.,
Stndies in International Law, Oxford 1973, 1 (6 ss.); lo., The doctrine ofinternational jurisdic-
tion revised after twenty years, Récueil des Cours 186 (1984 - Ill), 20 (20 e 55).
4 Cfr. Geltungsbereich und Anwendungsbereich der Gesetze, in Festgabe der Juristischen
Fakultiit for KarlBet;IJbohm, Bonn 1929, 219.
5 Cfr. infra, 157.
6 Cfr. MARCELLO CAETANO, Manual de Ciência Política e Direito Constitucional, I, Coimbra
1989 (reimpressão), 127-128; JORGE MlRANDA,ManualdeDireito Constitucional, In, Coim-
bra 1983, 183 sS.
Miii Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Também não adotamos, neste contexto, a expressão âmbito de competência das


leis, acolhida por reputados cultores do Direito Internacional Privad0 7, pois de com-
petência só pode falar-se perante um concurso de leis, que as normas de conflitos vi-
sam a dirimir designando a norma competente, enquanto a delimitação do âmbito de
incidência é logicamente anterior à verificação da existência de um concurso, embora
o possa pressupor; por outro lado, preferimos reservar a expressão "competência"
para exprimir a esfera de poderes dos órgãos executivos de aplicação do direito, tanto
administrativos quanto judiciários.
O problema do âmbito de incidência das leis tributárias respeita ao âmbito do
poder legislativo do Estado, à atividade tributária em abstrato, para utilizar a expres-
são de ALEssr 8 ; o problema do âmbito de eficácia das leis tributárias refere-se ao âm-
bito do poder executivo (administrativo ou judicial) do Estado, à atividade tributária
em concreto.
Aplicando a tradicional distinção da teoria geral do Direito Tributário, pode
dizer-se que o primeiro respeita ao Direito Tributário substancial enquanto o segun-
do se integra no Direito Tributário formal 9•
É certo que o âmbito de incidência e o âmbito de eficácia andam, via de regra,
de mãos dadas - são "irmãos siameses" -, pois de nada adiantaria a um Estado alargar
o âmbito de incidência das suas leis a ponto tal que não lhe fosse possível assegurar-
lhes eficácia coercitiva, pois - para usar a expressão de HOBBES - "all cavenants without
the swords are butwords"lO.
Mas também é verdade que, não raro, os dois círculos não coincidem, ficando
por vezes o âmbito da incidência aquém do âmbito de eficácia - pense-se na tributa-
ção de pessoas jurídicas apenas em função de lucros produzidos no território do país,
quando o imposto eventualmente devido por lucros realizados no exterior poderia
ser coativamente exigido sobre os bens da pessoa localizados no território do Estado
que o instituísse; ou, inversamente, ficando o âmbito da incidência para além do
âmbito de eficácia - figure-se lei que tributasse o lucro na compra e venda de bens
situados fora do seu território por pessoas que nele não são residentes.
Acresce que, dogmaticamente, os dois tipos de problemas se situam em terre-
nos distintos: o âmbito de incidência concerne ao tema dos limites das leis no espaço
e é objeto do Direito de Conflitos em sentido estrito; o âmbito de eficácia concerne
ao tema da competência internacional dos órgãos internos de aplicação do Direito,

7 Cfr. BAPTISTA MACHADO, Âmbito de eficácia e âmbito de competência das leis, Coimbra 1970,
passim; ANTÔNIO DE MOURA BORGES, Convenções sobre dupla tributaç/ÚJ internacional, Teresina/
São Paulo 1992,44.
8 Cfr. ALESSI/STAMMATI, Istituzioni di Diritto Tributario, Turim s.d., 29 ss.
9 Sobre esta distinção, efr. ALBERTO XAVIER, Manual de Direito Fiscal, I, Coimbra 1981 (reim-
pressão), 19-20.
10 A doutrina italiana refere-se, por vezes, a um "princípio de efetividade": cfr. SACCHETTO,
Tutela all'estero dei crediti tributari dello Stato, Pádua 1978, 101; GARBARINO, La tassazione,
cit., 139 e nota; G. A. MICHEL!, Corso di Diritto Tributario (8 a ed.), Turim 1992, 71.
Título I I Capo I I Limites das Leis _

jurisdicionais ou administrativos (no mesmo plano da competência internacional


dos tribunais em matéria de processo civil ou penal) ou ao tema da relevância de atos
púhlicos estrangeiros (no mesmo plano do reconhecimento de sentença estrangeira ou
de ordens ou decisões de autoridades administrativas estrangeiras).

C) Alcance da distinção no Direito Internacional Privado


e no Direito Público Internacional
o problema do âmbito de incidência e do âmbito de eficácia das leis tributárias
no espaço não se distingue, na sua essência, de idêntico problema no Direito Privado
ou noutros ramos do Direito Público.
É certo que no Direito Internacional Privado moderno se admitem soluções
liberais que não são aceitáveis no Direito Tributário Internacional: a solução dos
conflitos de leis através da remissão para leis estrangeiras, aplicáveis e executáveis,
como tais, em paridade com as leis do foro, pelos órgãos nacionais de aplicação do
direito; o reconhecimento automático de sentenças estrangeiras ou de atos de direito
público estrangeiro em matéria privada. E isto porque, neste ramo do direito, existe
um tal grau de integração das ordens jurídicas que permitiu a ERNST ISAY falar numa
verdadeira Rechtsgemeinschaftll.
Ao invés, o Direito Tributário Internacional (como o Direito Penal Internacio-
nal, o Direito Internacional Administrativo, o Direito Internacional da Concorrência
e outros capítulos do OJfentlichen Kollisionsrechts de que fala NIEDERER) nunca resolve
um concurso de normas tributárias (penais, administrativas etc.) pela remissão para
uma lei estrangeira competente, suscetível de aplicação qua tale pelos órgãos nacio-
nais de aplicação do Direito; como não admite o reconhecimento automático de de-
cisões estrangeiras para o efeito de execução de créditos tributários estrangeiros por
tribunais nacionais; como não admite a prática de atos administrativos (fiscalizações,
vistorias, notificações) por autoridades públicas estrangeiras; nem a força vinculante,
em território nacional, de atos de autoridade praticados em país estrangeiro. E isto
porque, no âmbito do Direito Público, não existe (ou não existe ainda) a Rechtsge-
meinschaft, no sentido que ISAY atribuiu a esta expressão12 .

11 efr. ERNST ISAY, Zwischenprivatrecht und Zwischenverwaltungsrecht, in FC ZITTELMANN,


1923,289.
12 Sobre o princípio da territorialidade no Direito Público em geral, cfr. GERHARD KEGEL/
IGNAZ SEIDL-HoHENVELDERN, Zum Territorialitatsprinzip im internationalen éiffentlichen
Recht, in Konflikt und Ordnung. Festschrift for Murad Ferid zum 70. Geburtstag, Munique
1978,233. No Direito Penal, ver D. OEHLER, Internationales Strafrecht, Munique 1983; J. J.
DIEZ SANCHEZ, El Derecho Penal Internacional (ambito espacial de la ley penal), Madrid 1990,
29 SS.; FURTADO DOS SANTOS, Direito Internacional Penal e Direito Penal Internacional. Apli-
cação da lei penal estrangeira pelo juiz nacional, Boletim do Ministério da Justiça 92 (1960),
159; TULLIO TREVES, La giurisdizione dei diritto penale intemazionale, Pádua 1973. No Direito
W:M Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

A diferença de soluções dadas pelos dois ramos do Direito deve ser, porém, ma-
tizada. Por um lado, não só existem diversos setores do Direito Internacional Privado
cobertos por normas unilaterais, como fortes correntes do pensamento contemporâ-
neo advogam a generalização do método unilateralista para a solução dos conflitos
privadosl 3 . Por outro lado, o dogma de que no Direito Tributário Internacional (ao
contrário do Direito Privado Internacional) nunca se aplicam leis tributárias estran-
geiras não resiste, por exemplo, à constatação de que, para aplicação das convenções
contra a dupla tributação, pelo país do foro, torna-se necessário aplicar leis estrangeiras
(até tributárias) que regulam os pressupostos de aplicação da norma convencional:
é o que sucede quando, para saber se um membro do conselho de administração de
uma sociedade alemã, residente na Alemanha, é tributável no Brasil pelos honorários
que aqui lhe foram pagos, se aplica a lei alemã para decidir sobre a residência alemã
da pessoa ou sobre a sua qualidade de membro do conselho de administração. É certo
que a aplicação da lei estrangeira não vai ao ponto de fundamentar, no país do foro, a
exigência de uma pretensão tributária estrangeira; mas ainda que neste fenômeno se
descortine uma simples "tomada em consideração" (prise en considération) Berücksichti-
gung) ou aplicação "indireta", ou "em sentido fraco", certo é que ele revela não ser tão
radical a distância dentre os tipos de soluções dadas pelos dois ramos do Direito l4 .
Acresce que a integração progressiva das economias tem revelado, recentemente,
a existência de esforços integrados, que configuram embriões de uma Rcchtsgemeins-
chaft, mesmo no campo do Direito Público, designadamente o Tributário, e de que é
exemplo paradigmático a Comunidade Europeia. E daí que tendam a aceitar-se, cada
vez com maior liberalismo, trocas de informações automáticas entre autoridades fis-
cais, bem como a cooperação das autoridades de um Estado para a execução coerciva
de créditos tributários estrangeiros. Até a presença física de autoridades estrangeiras
em território nacional, para a realização de investigações, fiscalizações e outras exi-
gências instrutórias em matéria tributária já é aceite pelos países signatários da Con-
venção Nórdica. E não custa prever que cedo ruirá o princípio de que os órgãos pú-
blicos nacionais não podem executar créditos tributários de Estados estrangeirosl 5 •
Não é também logicamente impossível admitir que, em certa comunidade de
Estados, os conflitos tributários internacionais sejam resolvidos por normas que es-
colham uma lei estrangeira competente para disciplinar o crédito tributário e atribuí-

Administrativo, cfr. VOGEL, Der rdumliche Anwendungsbereich der Verwaltungsrechtnorm,


Frankfurt/Berlim 1965; AFONSO RODRIGUES QUETRÓ, Eficácia espacial das normas de Direito
Administrativo, Direito Administrativo I (1980), 87. No Direito Internacional da Concor-
rência, cfr. ISABEL JALLES, Extraterritorialidade e comércio internacional, Venda Nova 1988.

13 Cfr. FERRER CoRRETA, Considerações sobre o método do Direito Internacional Privado, Coimbra 1982;
ID., Direito Internacional Privado - alguns problemas, Coimbra 1991 (2a reimpres5ão), 129 55.
14 Cfr. infra, 156 55.; BÜHLER, Principios de Derecho Internacional Tributario (trad.), Madrid
1968,100.
15 Cfr. infra, 67455.
Título I I Capo I I Limites das Leis e·h

lo a um desses Estados, em função de elementos de conexão uniformemente adota-


dos por via de convenção multilateral ou de imposição de autoridade supraestatal,
como que se de um direito de conflitos "interterritorial" se tratasse.
Tudo isto vem para demonstrar que a radical diversidade de atitudes do Direito
Internacional Privado e do Direito Público Internacional não tem a amplitude sufi-
ciente para lhes retirar a identidade de natureza: ou de Direitos de Conflitos, vocaciona-
dos para solucionar idêntico problema de fundo, referente ao âmbito de incidência das
leis internas; ou de Direitos da Competência Internacional) vocacionados para solucio-
nar idêntico problema de fundo, referente ao âmbito de eficácia das leis internas l6 .

§ 2° OS LIMITES DO ÂMBITO DE INCIDÊNCIA DAS LEIS

A) Limites heterônomos

O primeiro problema que se suscita a respeito do âmbito de incidência das leis


consiste em saber se existem limites estabelecidos pelo Direito Internacional Público
à atividade legislativa dos Estados no que concerne às pessoas, coisas ou fatos abran-
gidos pelas previsões normativas das suas leis tributárias.
A doutrina tradicional, tanto do Direito Internacional Público quanto do Direi-
to Tributário, propende a afirmar a inexistência de limites heterônomos, de Direito
Internacional, à competência dos Estados para legislar em matéria de impostos. E
isto com base no conceito de soberania fiscal, que seria simples aspecto da soberania do
Estado em geral. Nesta linha de orientação, a ilimitação dajurisdiction to prescribe em
matéria de impostos, isto é, da jurisdiction to tax, seria um simples corolário lógico
do caráter ilimitado da própria soberania l7 .
Coube porém, a J. S. MAlrrHA sublinhar, com todo o rigor, a petição de princípio
em que esta afirmação assenta, ou seja, o caráter ilimitado da soberania fiscal, pois ela
coloca na sombra os próprios limites da soberania do Estado, em face do Direito Inter-
nacional Público. Ora, esses limites automaticamente demarcam os limites da jurisdiction
to prescribe taxes, isto é, da margem de liberdade legislativa dos Estados em matéria de
tributosl 8 •
Ora, a função primária do Direito Internacional Público é a de demarcar as esfe-
ras de validade das diversas ordens nacionais, determinando a quem, como e quando

16 efr. GAETANO MORELLl, Derecho Procesal Civil Internacional (trad.), Buenos Aires 1953, 1 sS.
17 efr. KNECHTLE, Basic Problems ofInternational Tax Law, Deventer 1979, 34.
18 efr. J. S. MARTHA, The Jurisdiction to Tax, passim. A limitação da soberania fiscal em função
dos fins do Estado já fora bem sublinhada por PEDRO SOARES MARTINEZ, Manual de Direito
Fiscal, Coimbra 1983, 78.
. . . . Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

as leis nacionais dos Estados soberanos se podem aplicar J9 • Uma vez efetuada pelo
Direito Internacional esta atribuição de furisdictions, as leis nacionais são livres de
definir o seu âmbito de incidência. A soberania é uma pré-condição da furisdiction,
de tal modo que esta existe até onde a primeira existir e, inversamente, perde o seu
título onde aquela cessar20 •
Da mesma forma que o Estado tem, como elementos, a população e o territó-
rio, assim também a soberania se distingue numa soberania pessoal (Personalhoheit)
e numa soberania territorial (Gebietshoheit); a soberania pessoal é o poder de legislar
sobre as pessoas que, pela nacionalidade, se integram no Estado, seja qual for o ter-
ritório em que se encontrem; a soberania territorial é o poder do Estado de legislar
sobre pessoas, coisas ou fatos que se localizam no seu território.
Sendo estas as duas facetas da soberania, o Direito Internacional Público reco-
nhece automaticamente aos Estados o poder de tributar até aos limites onde ela se
estende, mas recusa-lhes tal poder na medida em que esses limites forem ultrapas-
sados, de tal modo que, se um Estado tributar estrangeiros em função de situações
que não tenham qualquer conexão com o seu território, estará violando o Direito
Internacional, com todas as consequências que daí advêm, desde a invalidade da lei à
responsabilidade internacional21 •
Há casos em que a violação da soberania ocorre de modo direto e frontal. As-
sim, por exemplo, um Estado não pode retroativamente exigir tributos durante um
período em que não exercia efetivamente a soberania num certo território, como
pretendeu a Venezuela em relação ao território do Orinoco, ocupado por governo
revolucionário de 1902 a 1903 (caso Santa Clara Estates Company). Como não pode
exigir tributos fundados na nacionalidade em relação a pessoas que perderam a cida-
dania por casamento ou naturalização (caso Lucienne d)Hotel) 22.
Mas na grande generalidade das hipóteses, a violação da soberania não surge de
modo ostensivo, mas em virtude da escolha arbitrária ou artificiosa de um elemento
de conexão, pessoal ou real.
O problema delicado que se coloca para traçar os limites em causa está precisa-
mente em identificar qual a conexão relevante com o Estado para definir a nacionali-

19 "Das Volkerrecht ist die Ordnung, welche die Machtkreise der verschiedenen Staaten gege-
neinander abgrenzt"; cfr. ZITTELMANN, Geltungsbereich undAnwendungsbereich, 225; MANN,
The doctrine ofjurisdiction, 8.
20 Cfr. MANN, The doctrine ofinternationaljurisdiction, 20; ID., The doctrine ofjurisdiction, 9:
"Jurisdiction is coextensive with sovereignty, that it reaches as far as, but no further, than
sovereignty" .
21 Cfr. PEDRO SOARES MARTINEZ, Manual de Direito Fiscal, 79; ISABEL JALLES, Extraterritori-
alidade e comércio internacional, 217. Esta violação, porém, não ocorreria na emanação de
normas de Direito Internacional Privado, atenta a competência concorrente dos Estados e
a vocação universal das suas normas. Cfr. PIERRE MAYER, Droit International Privé et Droit
International Public sous I'angle de la notion de compétence, in Rcvue Critique de Droit In-
ternationalPrivé 68 (1979), L
22 Cfr. MARTHA, The Jurisdiction to Tax, 14 e 72.
Título I I Capo I I Limites das leis

dade (sobretudo das pessoas jurídicas) ou a localização de uma dada situação da vida
no território. Por outras palavras: qual a liberdade da própria lei interna para traçar
os contornos do elemento de conexão que fundamenta o seu poder de tributar23 .
É, por exemplo, pacífico que a residência da pessoa no território de um Estado
legitima o poder tributário deste. Pode, porém, o Estado considerar uma pessoa resi-
dente sem que esta tenha uma presença física relevante no seu território? O Honey affair
ilustra bem este ponto. Honey era um cidadão norte-americano cuja mulher e fIlha
passavam uma temporada em Frankfurt (então Prússia) e às quais remetia mensalmen-
te uma certa quantia. Honey nunca saíra dos Estados Unidos nem tinha bens na Prús-
sia. As autoridades fiscais de Frankfurt tentaram construir a situação de Honey como
de residente na Prússia, em função das remessas financeiras que para ali efetuava24 •
Também não oferece dúvidas que a localização da fonte de produção ou pagamen-
to no território de um Estado legitima o poder de tributar desse mesmo Estado. Mas
o que é exatamente a fonte? O caso Frank W Ross ajuda a esclarecer a questão. Frank
Ross era um cidadão residente no Canadá que nunca residiu, teve negócios ou possuiu
bens nos Estados Unidos. Ross era acionista de uma sociedade estrangeira (Ross Corpo-
ration) - da qual recebia dividendos - a qual, por sua vez, participava no capital de uma
empresa norte-americana. O Fisco norte-americano pretendeu tributar os dividendos
recebidos por Ross dessa sociedade estrangeira (Ross Corporation) - com o fundamento
de que, indiretamente, a fonte donde provinham os dividendos se situava nos Estados
Unidos. Situação similar ocorreu no caso Lord Forres) inglês, também titular de ações
em sociedade estrangeira, por sua vez acionista de sociedade norte-americana: neste
caso, o U. S. Board ofTax Appeals reconheceu a falta de jurisdiction to tax dos Estados
Unidos porque (Çneither the question ofdomicile ofthe recipient nor the situs ofthe property,
or income therefrom) is here involved) for these petitioners are residents ofEngland) the stocks
are kept there) and the dividends there paid and receivedJJ25 •
Outro exemplo. É aceite sem discussão o poder de tributar do Estado onde se
realizou o lucro numa transação comercial. Mas o que significa lugar de realização do
lucro? No caso Chas. J. T#bb) uma pessoa jurídica norte-americana, fabricante de tape-
tes, comprava lã na Índia, através de um agente. Toda a operação de fabricação e ven-

23 Cfr. sobre este tema W ALTER RUDOLF, Über territoriale Grenzen der Steuergesetze, in
Recht und Wirtschaft in Geschichte und Gegenwart. Festschrift for Johannes Biirmann zum 70.
Geburtstag, 1975, 769; MANN, The doctrine ofjurisdiction, 40, baseando ajurisdiction na
"closeness of connection".
24 Cfr. MARTHA, The Jurisdiction to Tax, 90. É interessante notar que, precisamente para coibir
este tipo de abusos, o Modelo OCDE define "residente" como a pessoa sujeita a imposto em
razão do domicílio, residência, sede da administração ou outro critério de natureza similar,
mas não inclui uma pessoa sujeita a imposto exlusivamente em função de rendimentos de
fontes ou de capital situados num Estado (art. 31).
25 Cfr. MARTHA, op. cit., 157. Foi também para impedir este tipo de abuso de conexões que o
Modelo OCDE [art. 10 (5)] proibiu a tributação extraterritorial dos dividendos em hipóte-
ses similares aos casos citados no texto.
MtM Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

da se realizava fora do território da Índia, com exceção da compra e venda de matéria


prima. Seria esta conexão suficiente para fundar o poder tributário da Índia com base
no local de realização do lucro, não tendo a fabricação e a venda sido aí efetuadas 26 ?
Mais um exemplo. Não sofre dúvida que os Estados têm o poder de tributar as
pessoas jurídicas neles domiciliadas, pelos lucros por elas realizados, ainda que fora
do território nacional, ou seja, numa base ilimitada. Uma sociedade alemã era titular
de 99% das ações de uma sociedade incorporada sob as leis do Japão e domiciliada
no Japão. O Fisco alemão pretendeu tributar o lucro da subsidiária japonesa, também
numa base ilimitada, invocando a chamada teoria do ór;gão) que, na prática, consiste
em tratar como pessoa jurídica domiciliada na Alemanha uma pessoa jurídica domi-
ciliada no exterior com o fundamento de que o controle é exercido na Alemanha27 .
Todos estes casos revelam que a causa que determina eventuais violações aos limi-
tes da soberania situa-se precisamente na fragilidade ou artificialismo do elemento de
conexão escolhido pela lei interna: uma remessa financeira equiparada à residência; a
fonte de produção do lucro de uma subsidiária equiparada à fonte de produção do lucro
da matriz; o lugar da compra de matéria-prima equiparado ao lugar de produção do lu-
cro; o lugar de domicílio do acionista controlador equiparado ao lugar de domicílio de
subsidiária estrangeira. Verifica-se assim uma violação do princípio da não transativida-
de das leis, segundo o qual a qualquer fato só deve aplicar-se, em princípio, uma lei que
com ele esteja em contato 28 , violação essa decorrente de um abuso de conexão proibido
pelo Direito Internacional Público (uma vdlkerrechtliche Miflbrauchverbot, para usar a
expressão de MóssNER, ou um excess offurisdiction, como se lhe refere MANN 29).

B) Limites autônomos

São de duas ordens os limites autônomos ao âmbito de incidência das leis tribu-
tárias internas: as limitações unilaterais, autoestabelecidas pelo próprio legislador, e
as limitações decorrentes de convenção ou tratado internacional.
Exemplo das primeiras é a norma de direito interno brasileiro que limita a tri-
butação das pessoas jurídicas domiciliadas no país aos lucros realizados em território
nacional.

26 Cfr. MARTHA, op. cit., 163; MANN, The doctrine ofJurisdiction, 102. Determina o § 5° do art.
7 do Modelo OCDE que não serão atribuídos lucros a um estabelecimento permanente em
razão da simples compra de bens ou mercadorias.
27 Cfr. MARTHA, op. cit., 175 ss.
28 Cfr. BAPTISTA MACHADO, Lições de Direito Internacional Privado, 54. ..
29 Cfr. MbsSNER, Der Begriff des internationalen Steuerrechts in der neueren Literatur, Osterrei-
chische Zeitschrift fur Ciffentliches Recht 25 (1974),259; MANN, The doctrine ofjurisdiction
in International Law, 5. Outra ordem de limites heterônomos é constituída pelo Direito
Comunitário, de natureza supranacional, na parte em que as fontes de direito das Comuni-
dades Europeias estabelecem restrições ao poder legislativo dos Estados-membros em maté-
ria tributária. Cfr., sobre este ponto, infra) 171 S5.
Título I I Capo I I Limites das Leis ••

As normas das convenções contra a dupla tributação limitam o âmbito de inci-


dência das leis de um modo relativo) isto é, não impedem o legislador de formular o
âmbito de incidência das leis tributárias internas em geral do modo que bem enten-
der. Simplesmente, exigem que tais leis não se apliquem ou só se apliquem de certo
modo às pessoas, coisas ou fatos sujeitos ao âmbito de aplicação do tratado. Não se
trata de limites genéricos à formulação das leis, mas de limites relativos à sua incidên-
cia em casos concretos.

§ 3° OS LIMITES DO ÂMBITO DE EFICÁCIA DAS LEIS

O que se afirmou em relação aos limites do âmbito de incidência das leis (juris-
diction to prescribe) vale também no que respeita aos limites do âmbito de eficácia das
leis Ú'urisdiction to enforce) .
Todos estão de acordo em que as autoridades públicas de um Estado não podem
exercer as suas prerrogativas de autoridade noutro Estado: não podem aí realizar
diligências instrutórias (exames à escrita, vistorias, avaliações); não podem aí fazer
intimações ou exigências tributárias; não podem aí promover a execução de créditos
tributários do Estado a que pertencem30 •
Mas uma coisa é a prática de atos no território de Estado estrangeiro - clara-
mente vedada pelo Direito Internacional Público -, outra é a produçiW de efeitos nesse
Estado de atos de autoridades públicas praticados no próprio Estado em que tais au-
toridades se integram31 . Por isso se coloca a questão de saber em que medida e até que
ponto esta produção de efeitos viola os limites da soberania territorial dos Estados.
Esta questão coloca-se essencialmente em relação aos atos que se traduzem em
ordens) emitidas por autoridades administrativas ou jurisdicionais, tendo por obje-
to a prestação de informações ou a apresentação de documentos relevantes para a
instrução de procedimento administrativo ou de processo judicial em matéria de
impostos. Nos Estados Unidos - onde a questão tem sido particularmente discutida,
dada a fundamentação do poder tributário no princípio da nacionalidade e o grau
elevado de internacionalização da sua economia-, trata-se dos summons editados por
autoridades administrativas (o InternaI Revenue Service) e das subpoena editadas por
autoridades judiciais, e que, por sua vez, se distinguem em subpoena ad testificandum
e em subpoena duces tecum 32 .

30 efr. WALTER RUDOLF, Über territoriale Grenzen, 784 ss.; MANN, The doctrine ofjurisdiction,
lU.
31 efr. HANS-JÜRGEN SCHLOCHAUER, Die extraterritoriale Wirkung von Hoheitsakten, Frankfurt-
am-Main 1962. Sobre estes pontos, em matéria de direito antitrust) ver ISABEL JALLES, Ex-
traterritorialidade e comércio internacional, 242 ss.
32 efr. LEVINE, La lutte contre fJévasion fiscale de caractere international en rabsence et en présence
des conventions internationales) Paris 1988, 145 SS.; MANN, The doctrine ofjurisdiction, 117.
-'8 Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Quanto a este tipo de atos, há que distinguir o âmbito pessoal de eficácia, ou seja,
as pessoas que podem ser deles destinatários e o âmbito objetivo de eficácia, ou seja, os
elementos de informação ou prova que podem ser exigidos.
No que concerne ao âmbito pessoal de eficácia, tem-se entendido que a sobera-
nia pessoal legitima ordens dadas em território nacional a nacionais de um país, ainda
que residentes em território estrangeiro. É esta, aliás, a regra vigente nos Estados
Unidos, após a Lei Walsh de 1964 (hoje codificada nos arts. 1.783 e 1.784 do Título
28 do Código Judiciário dos Estados Unidos).
No que concerne a estrangeiros, o âmbito de eficácia tem que delimitar-se em
função da soberania territorial, exigindo-se assim uma conexão relevante com o terri-
tório. Se se tratar de um residente, não se colocam dúvidas quanto à legitimidade da
ordem, em face do Direito Internacional Público. Se, porém, se tratar de não residen-
te, a validade da ordem pressupõe uma conexão relevante com o território. Assim,
por exemplo, foi considerada legítima subpoena notificada por tribunal americano à
sucursal de Nova York do Banco de Tóquio, pois apesar de este ser pessoa jurídica
estrangeira domiciliada no Japão, tinha nos Estados Unidos um estabelecimento
permanente através do qual exercia a sua atividade bancária. Mas já extravasaria os
limites da soberania territorial ordem que tivesse por destinatário subsidiária inde-
pendente domiciliada no exterior, ainda que a ordem fosse dada à sociedade-mãe
residente no país; ou ordem que tivesse por destinatário a sociedade controladora
domiciliada no exterior, ainda que fosse dada à subsidiária residente no país 33 •
A questão do âmbito de eficácia objetiva coloca-se na hipótese inversa, ou seja,
de pessoas nacionais ou residentes de um Estado e em que o objeto da ordem res-
peita a meios probatórios localizados em território estrangeiro. É exatamente o que
ocorreu com subpoena dirigida ao First National City Bank para apresentar documen-
tos da sua sucursal na Alemanha; com a ordem dirigida à agência de Miami do Bank
ofNova Scotia para que a agência de Nassau apresentasse elementos de prova em seu
poder; ou com a ordem dada ao First National Bank of Chicago para que exibisse do-
cumentos relativos a contas bancárias abertas por residentes na Grécia na sua agência
de Atenas. Em todos estes casos, os destinatários das ordens reagiram alegando vio-
lação dos limites da soberania territorial do Estado, violação essa tanto mais grave
quanto envolveria violação de leis estrangeiras referentes ao sigilo bancári034 •
Os exemplos atrás referidos mostram bem os conflitos de interesses entre os Es-
tados envolvidos: o Estado interessado na plena investigação fiscal de pessoas sobre
as quais tem o poder de tributar ou que dispõem no exterior de meios de informação,
diretamente ou através de outras pessoas jurídicas sobre as quais têm controle; e o
Estado em que se localizam as sucursais ou subsidiárias de sociedades estrangeiras, ou
em que se localizam os documentos ou demais meios de prova. Os conflitos podem
agudizar-se quando a produção desses meios de prova respeite a matérias sensíveis,

33 Cfr. LEVINE, op. cit., 152; MANN, op. cit., 119.


34 Cfr. LEVINE, op. cit., 15355.; MANN, op. cit., 122, 135.
Título I I Capo I I Limites das leis 41.+

como a proteção do segredo bancário, de segredos industriais ou de outras informações


estratégicas, em que, para atender às exigências de um Estado, sob pena de sanções,
o cidadão seja compelido a violar as leis de outro Estado, incorrendo igualmente em
penalidades. Daí a existência de C<blocking statutes)) (leis de blocagem) ou "contralegisla-
ção", que proíbem a comunicação de certas informações às autoridades estrangeiras35 .
Em zona tão cheia de matizes, não é possível definir, em abstrato, os limites da
soberania territorial do Estado, que só a apreciação caso a caso pelos tribunais poderá
fixar, ponderando a intensidade da conexão invocada36 •
Além dos limites heterônomos, também o âmbito de eficácia das leis é objeto de
limites autônomos, ou limites que as próprias leis internas a si mesmas estabelecem
nas regras definidoras da competência internacional das autoridades administrati-
vas ou judiciais; e de limites decorrentes de tratados, em que se fixam os termos e
condições em que podem ser trocadas informações ou dada assistência para serem
executados créditos estrangeiros.

§ 4° A CONEXÃO COM O ORDENAMENTO

Como atrás se viu, o poder de tributar (jurisdiction to tax) baseia-se na soberania


do Estado, e, como esta tem duas vertentes - uma pessoal (baseada na nacionalidade)
e outra territorial (baseada no território), assim também a tributação se pode basear
num princípio da pessoalidade ou num princípio da territorialidade 37 •

A) A concepção clássica do princípio da territorialidade


Raros são os Estados modernos que tributam os seus nacionais residentes no es-
trangeiro - a exemplo dos Estados Unidos e das Filipinas - e daí que a aplicação espa-
cial das leis tributárias, como, aliás, da generalidade das leis de direito público, como
as penais e as administrativas, tenha sido encarada pela doutrina predominantemente
sob a ótica do princípio da territorialidade3 8 • De harmonia com o entendimento

35 Cfr. ISABEL JALLES, Extraterritorialidade e comércio internacional, 89 ss., especialmente no


domínio da legislação antitrust.
36 Dentro dos limites heterônomos incluem-se, como já se disse, as fontes do Direito Co-
munitário que regem, por exemplo, a assistência administrativa dos Estados-membros na
cobrança de tributos: cfr. infra 171 ss. e 674 ss.
37 Sobre o Personalitiitsprinzip e o Territorialitiitsprinzip no Direito Penal Internacional, cfr. D.
OEHLER, Internationales Strafrecht, 127 ss.
38 LAMOUCHE, Essai sur la territorialité de Hmpôt, Alger 1927; ALEssr, Intorno alla nozione di
ente territoriale, Rivista Trimestrale di Diritto Pubblico 1960, 290; STEVE, Sulla tutela in-
ternazionale della pretesa tributaria, Rivista di Diritto Finanziario e Scienza delle Finanze I
(1940),241; CLAUDIO SACCHETTO, Territorialità (diritto tributario) , Enc. delDir. XLIV (1992),
Im I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

comum e tradicional deste princípio; as leis tributárias apenas se aplicariam aos fatos
ocorridos no território da ordem jurídica a que pertencem, independentemente de
outras características que eventualmente pudessem concorrer na situação em causa,
como a nacionalidade, o domicílio ou a residência do sujeito passivo.
Todavia, como agudamente observou ALFREDO AUGUSTO BECKER39, a doutrina
tradicional tem aceitado como fundamento "óbvio" a tese da territorialidade, sem que
se tenha realizado um necessário aprofundamento da análise dos fenômenos da inci-
dência e da eficácia da lei tributária no espaço, fenômenos que se encontram ainda
isuficientemente estudados no plano jurídico, como também já o reconheceram A. D.
GIANNINI 40 e NIBOYEy41.
A análise do correto significado do princípio da territorialidade das leis fiscais
pressupõe a necessária distinção de três critérios, à luz dos quais pode ser formulado
o mencionado princípio, a saber: (a) territorialidade em sentido positivo e em senti-
do negativo; (b) territorialidade em sentido real e em sentido pessoal; (c) territoria-
lidade em sentido material e em sentido formal.

a) Territorialidade em sentido positivo e em sentido negativo


Comecemos pela distinção entre o sentido positivo e o sentido negativo da
territorialidade, cujos contornos se encontram já desenhados na obra pioneira de
MAxlME CHRÉTIEN 42 •
Em sentido negativo) o princípio da territorialidade limita-se a significar que as
leis fiscais estrangeiras não se aplicam no território do país em causa, ou seja, que
os órgãos de aplicação do direito de cada Estado apenas aplicariam as suas próprias
regras tributárias, jamais podendo desencadear a produção dos efeitos previstos nas
leis tributárias estrangeiras.
Em sentido pos/tivo) o princípio da territorialidade significa que as leis tributárias
internas se aplicam no território nacional, de um modo generalizado, inclusive aos
que não são nacionais do respectivo Estado43 .

303; HERZFELD, Probleme des internationalen Steuerrechts unter besonderer Berücksichtigung des
Territorialproblems und des QJtalifikationsproblems (diss.), Heidelberg 1932 [também em Viertel-
jahresschrift for Steuer-und Finanzrecht VI (1932) vol. 2, 43J; KLAUS VOGEL, Der rdumliche
Anwendungsbereich, passim; AKruR K. MORDHORST, Der latein-amerikanische Grundsatz der Ter-
ritorialitdt der Besteuerung und seine Gestaltung in den Deutsch-Brasilianischen Beziehungen, Ham-
burg 1983; ENGELSCHALKjFucKjet al., Steuern aufausliindische Einkünfte, Munique 1985.

39 Cfr. A. A. BECKER, Teoria Geral do Direito Tributário (3" ed.), São Paulo 1998, 282.
40 Cfr. A. D. GIANNINI,I concetti fondamentali dei diritto tributario, Turim 1956, 51.
41 Cfr. NlBOYET, TraitédeDroitInternationalPrivé, IV, Paris 1947,7 e 118.
42 Cfr. M. CHRÉTIEN, A la recherche du Droit International Fiscal Commun, Paris 1955, 68.
43 Neste sentido o utiliza ERNST BLUMENSTEIN, Sistema di Diritto delle Imposte (trad. it.), Milão
1954, 101. É esta também a formulação de JOSEPH STORY, apud MANN, The doctrine ofjuris-
diction, 20.
. -
Título I I Capo I I Limites das Leis MiM

No que respeita ao sentido negativo, a afirmação tem de ser recebida com sérias
reservas pois, como adiante se verá44 , a lei estrangeira pode aplicar-se para integrar
os pressupostos de aplicação da lei interna, ou seja, a questões prévias (por exemplo, a
residência, a nacionalidade, a condição de diplomata), embora nunca os órgãos na-
cionais de aplicação do Direito possam atribuir às leis fiscais estrangeiras o seu efeito
típico de constituir crédito tributário estrangeiro.
Por sua vez, entendido em sentido positivo, o princípio da territorialidade de-
sempenha apenas a função de excluir que a nacionalidade constitua, por si só, um
elemento capaz de fundamentar ou de afastar a tributação, mas já não oferece um
critério positivo de determinação das situações da vida que, estando conexas por
qualquer dos seus elementos com mais de uma ordem jurídica, possam reentrar no
âmbito de aplicação das leis tributárias internas.
O referido critério não pode, pois, deixar de traduzir-se na exigência de um
"mínimo de conexão" das situações em causa com o território nacional, isto é, não
pode deixar de proceder a uma delimitação objetiva das situações que, mercê dessa
conexão, podem ser disciplinadas pelas leis tributárias internas.

b) Territorialidade em sentido pessoal e em sentido real


Primitivamente, parece ter-se entendido ser da essência da territorialidade respeitar
a conexão com o território aos elementos materiais da aludida situação da vida, ou seja,
aos aspectos reais ou objetivos dos fatos tributários, como o local da situação dos bens, o
local do exercício de uma atividade, o local da fonte de produção ou pagamento de um
rendimento, o local do estabelecimento permanente. Mas a sucessiva desmaterialização
dos pressupostos, por um lado, e a tendência marcada para a personalização dos impos-
tos, por outro, levaram a que as legislações passassem a adotar como elementos relevan-
tes de conexão com o território, não já aspectos objetivos, mas elementos da situação
tributária internacional diretamente ligados aos aspectos subjetivos do tributo, desde que
diversos da nacionalidade, como a sede, o domicílio ou a residência do contribuinte.
Como a situação tributária internacional se pode encontrar relevantemente co-
nexa com o território pelos seus elementos objetivos ou pelos seus elementos subjeti-
vos, assim também o princípio da territorialidade se exprime umas vezes como uma
territorialidade real, outras como uma territorialidade pessoal.
Mas não raro a doutrina delimitou o verdadeiro alcance do princípio à primeira
das mencionadas acepções, distinguindo um critério territorial ou princípio da rea-
lidade (critério europeu e latino-americano) de um critério pessoal ou princípio da
pessoalidade (critério anglo-saxônico)45. Neste contexto, o critério territorial corres-
ponderia ao principio da fonte (Ursprungsprinzip), como em seguida se verá.

44 Cfr. infra, 157 sS.


45 O Personalprinzip de que fala BÜHLER, Internationales Steuerrecht (IStR) und Internationales
Privatrecht (IPR), Amsterdam 1960,42. Cfr. ainda K. VOGEL, Der raumlicheAnwendungs-
QB I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

c) Territorialidade em sentido material e em sentido formal


Cumpre, todavia, ter presente que qualquer das mencionadas formulações do
princípio da territorialidade respeita ao âmbito espacial de incidência da lei, ou seja,
à esftra de aplicação espacial dos comandos gerais e abstratos contidos nas normas
tributárias. O aludido princípio recorta, pois, de entre as situações tributárias in-
ternacionais, aquelas que serão abrangidas pelas leis fiscais internas, mediante o
processo técnico da escolha do elemento ou elementos de conexão com o território
a que respeita.
Desta acepção do princípio da territorialidade - que podemos designar por
material - importa distinguir uma outra, que já não respeita ao âmbito espacial de
incidência do comando (jurisdiction to prescribe), mas sim ao âmbito da sua eficácia ou
execução coerciva (jurisdiction to enforce). O princípio da territorialidade em sentido
formal significa precisamente que as leis tributárias só são suscetíveis de execução
coerciva no território da ordem jurídica em que se integram46 •
Pode a lei brasileira, pela escolha do domicílio ou da sede do sujeito passivo
como conexão relevante, tributar os lucros auferidos no estrangeiro ou os imóveis ali
situados; só que o crédito tributário decorrente dessa lei não poderá ser coercitiva-
mente executado no exterior.
É precisamente esta distinção entre um princípio material e um princípio formal da
territorialidade que permite explicar as relações que mantêm com a noção de soberania.
O conceito material de territorialidade, respeitando à posição abstrata da norma,
à delimitação do âmbito espacial dos comandos tributários, não afeta a soberania dos
Estados estrangeiros, com cuja esfera territorial estejam igualmente conexos outros
elementos da situação tributária internacional47 • Mas, se as soberanias não são ofen-
didas pela formulação de comandos gerais e abstratos que prevejam e disciplinem
fatos ocorridos em território estrangeiro, já o são pela prática de atos que envolvam o
exercício de poderes de autoridade no que toca à sua aplicação, ou seja, o lançamento,
a fiscalização e a cobrança do crédito tributário criado por aqueles comandos48 .

bereich, 115; G. BISCOTIINI, I profili tributari delta circolazione degli uomini e delle cose, in ID.,
DirittoAmministrativo Internazionale, Tomo II, Pádua 1966, 361; PEREZ DE AYALA/EuSEBIO
GONZALEZ, Curso de Derecho Tributario (6a ed.), I, Madrid 1991, 87-88.

46 A distinção, que foi formulada por HERZFELD, Probleme des internationalen Steuerrechts, 427,
e posteriormente inmída por M. CHRÉTIEN,A la recherche, cit., 21-22 (referindo-se à criação
e aplicação das decisões), foi objeto de formulação mais rigorosa por STEVE, Sulta tutela
internazionale delta pretesa tributaria; M. UDINA, Il Diritto Internazionale Tributario, Pádua
1949, 84; e KLAus VOGEL, art. Gebietshoheit no Evangelischcs Staatslexikon, 783. Cfr. tam-
bém KNECHTLE, Basic Problems, 40 ss.; SACCHETTO, Territorialità, 305 ss.; R. M. DE MOURA
RAMos, Da lei aplicável ao contrato de trabalho internacional, Coimbra 1990, 277.
47 Isto também já tinha sido bem sublinhado por A. A. BECKER, Teoria Geral, 257.
48 Cfr. K. VOGEL, Der raumliche Anwendungsbereich, 123. Ver também ISABEL JALLES, Extrater-
ritorialidade e comércio internacional, 43.
~.'C
.•. ·
. .· Título I I Capo I I Limites das Leis
~.

Ao contrário da extraterritorialidade em sentido material49 , uma extraterritoria-


lidade em sentido formal constituiria, pois, violação de soberaniaso .
Não deve, contudo, perder-se de vista que o princípio formal da territorialidade
conduz normalmente à escolha pelas várias leis nacionais de critérios de conexão que per-
mitam que a disciplina das situações tributárias internacionais por elas formulada possa
atingir os resultados práticos a que visam, ou seja, a cobrança efetiva do impostoSl .

B) Crítica da concepção clássica


Seja, porém, qual for o sentido que se atribua ao princípio da territorialidade,
certo é que ele se revela hoje insuficiente para constituir um critério de delimitação
de competências quanto às questões tributárias internacionais.
Com efeito, a territorialidade no seu sentido restrito, ou seja, a territorialidade as-
sente numa conexão real, pode, quando muito, funcionar em sistemas tributários pouco
evoluídos, assentes em impostos reais, cujos tipos legais sejam constituídos por objetos
materiais ou por relações concretas facilmente localizáveis. De um modo geral, as hi-
póteses de incidência dos tributos fundiários, dos impostos de consumo, dos impostos
aduaneiros, isto é, a existência de um prédio, o consumo de bens, a passagem pela linha
de fronteira, não só não oferecem dificuldades de localização, como se verificam exclu-
sivamente no território de um só Estado. E, sendo assim, o princípio da territorialidade
fundamenta de modo bastante a delimitação da competência tributária dos Estadoss 2 •
O desenvolvimento de formas tributárias mais aperfeiçoadas, como as inciden-
tes sobre a renda global ou o patrimônio, suscitam, porém, maiores dificuldades, pois
os seus pressupostos perdem o caráter material concreto para se transformarem, num
processo de sucessiva desmaterialização, em realidades abstratas e complexas cuja co-

49 Certo setor da doutrina prefere reservar a expressão "ultraterritorialidade" para descrever o


fenômeno pelo qual as leis se aplicam a fatos ocorridos fora do território nacional, usando
a expressão "extraterritorialidade" para aludir à subtração de partes do território do Estado
ao pleno exercício dos poderes que lhes respeitariam. Cfr. MORTATI, Istituzioni di Diritto
Pubblico, Pádua 1962, 113; GARBARINO, La tassazione, 115 sS. Esta u1traterritorialidade das
°
normas de direito público não se confundiria, porém, com "princípio da universalidade"
do ordenamento do Estado que seria característica do Direito Privado.
50 Cfr., em sentido análogo, GERD W ROTHMANN, Considerações sobre extensão e limites do
poder de tributar, in Estudos Tributários, São Paulo 1974, 219.
51 Este o fundamento do princípio da "pertença econômica" das situações aos territórios, for-
mulado por SCHANZ, Die Doppelbesteuerung und der Volkerbund, Finanz Archiv II (1923),
353, que aludia a um processo de objetivação (Verdinglichung) do Direito Fiscal. Trata-se
de problema análogo ao que no Direito Internacional Privado leva à escolha das conexões
conducentes à aplicação da ordem jurídica que beneficie da maior proximidade ou da melhor
legitimação (the nwst significant connection). Cfr. DINO JARACH, El hecho imponible (2 a ed.),
Buenos Aires, s.d., 208. Sobre o chamado "princípio da efetividade", ver supra, 6, nota 10.
52 GARBARINO, La tassazione, 101; MANN, The doctrine ofjurisdiction, 28.
_J.. Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

nexão com um dado território se apresenta em termos duvidosos, geradora de con-


flitos potenciais. Com efeito, enquanto nos sistemas tributários mais simples, a um
fato imponível corresponde em regra apenas um território, nos modernos sistemas
fiscais, a um único pressuposto pode corresponder mais do que um território S3 , dada
a pluralidade de conexões que podem fundamentar a sua localização territorial.
A invocação do princípio da territorialidade já não constitui, pois, critério su-
ficiente para a imputação de um dado fato tributário a um determinado território:
tornam-se indispensáveis critérios suplementares que determinem, para cada tipo de
situação, de modo positivo, a conexão relevante e que, quanto às realidades imate-
riais ou incorpóreas, definam a sua localização ou "sede"s4.
Por outro lado, uma acentuada tendência no sentido da personalização do im-
posto, em ordem a adequá-lo mais intimamente à capacidade contributiva indivi-
dual, revelou a insuficiência das conexões reais que passam a cumular-se ou a ver-se
substituídas por conexões pessoais, como a residência, a sede ou o domicílio, para
não falar da nacionalidade dos sujeitos passivos. Ora, continuar a falar-se de um prin-
cípio da territorialidade, quando os critérios de ligação ao território não são já reais,
mas pessoais, significa pelo menos uma radical alteração do sentido tradicionalmente
conferido ao conceito e, indubitavelmente, uma quebra do seu valor dogmático.
Se o princípio da territorialidade material se limita à exigência de uma qualquer
conexão da situação da vida internacional com o território, tenha ela natureza real ou
pessoal, para que as leis deste tenham aplicaçãosS, então ele deixa de funcionar como cri-
tério positivo quanto ao âmbito de aplicação das leis internas, para desempenhar tão só
uma dupla função negativa: impedir o arbítrio resultante da tributação por um Estado
de situações que com ele não têm qualquer conexão (a viJlkerrechtliche Miflbrauchverbot
de que fala MbsSNERS6 ) e afastar a nacionalidade como exclusivo elemento de conexão.
E daí que a doutrina contemporânea reconheça, como VOGEL e KNEcI-fné 7, que o
princípio da territorialidade, pela ambiguidade do seu sentido, tem hoje pouca valia na
construção dogmática do Direito Tributário Internacional, o qual radica os seus alicerces
nos princípios - estes de conteúdo preceptivo mais denso - da residência e da fonte.

53 Cfr. K. VOGEL,DerrdumlicheAnwendungsbereich, 114; SACCHETTO, Territorialità, 313; VíTOR


FAVEIRO, Noções fondamentais de Direito Fiscal Português, I, Coimbra 1984, 625 ss., referindo-
se a "leis de competência localizada"; CARLOS PAMPLONA CORTE-REAL, Curso de Direito Fiscal,
I, Lisboa 1982, 141 ss. Sobre o problema, numa perspectiva mais ampla, cfr. MARlA ISABEL
JALLES, A plurilocalização e a deslocalização espacial das situações jurídicas internacionais,
Revista de Direito e Economia 1 (1975),65.
54 No sentido que os estatutários e SAVIGNY imprimiram à expressão. Cfr., também, A. MARQUES
DOS SANTOS, As normas de aplicação imediata no Direito Internacional Privado, lI, Coimbra
1991,770.
55 Cfr. K. VOGEL, DerrdumlicheAnwendungsbereich, 120.
56 Cfr. MÓSSNER, Der Begriff, 263.
57 Cfr. K. VOGEL, OnDouble Taxation Conventions (trad.), Deventer 1997, 10; KNEcHTLE,Basic
Problems, 36 e nota 88; MANN, The doctrine ofjurisdiction, 31; A. MARQUES DOS SANTOS,As
normas de aplicação imediata, lI, 778.
CAPÍTULO II
CONCURSO DE LEIS

SEÇÃO I
DUPLA TRIBUTAÇÃO

Dupla tributação é um conceito com que no Direito Tributário se designam os


casos de concurso de normas! .
Como se sabe, há concurso de normas quando o mesmo fato se integra na previsifu
de duas normas diferentes. Assim, há concurso de normas em Direito Tributário quando
o mesmo fato se integra na hipótese de incidência de duas normas tributárias materiais
distintas, dando origem à constituição de mais do que uma obrigação de imposto.
Importa, pois, estudar separadamente os dois requisitos do conceito: a identi-
dade do fato e a pluralidade de normas 2 .

1 Cfr. ARMIN SPITALER, Das Dappelbesteuerungsprablem bei den direkten Steuern, Reichenberg
1936,132.
2 É vasta a literatura sobre dupla tributação internacional. Dos clássicos destacamos: PAUL
GUGGENHEIM, Ilimpasitian des successians en Drait Internatianal et le prableme de la dauble impa-
sitian, Genêve 1928; SPITALER, Das Dappelbesteuerungsprablem, cit.; J. P. NIBOYET, Les daubles
impasitians au paint de vue juridique, Reueil des Cours 31 (1930), 5; EDWIN SELIGMAN, La
dauble impasitian et la caapératian fiscale internatianale, Reueil des Cours 20 (1927),463; UGO
BAssANo, Appunti sulla doppia imposizione internazionale, Rivista Italiana di Diritta Finan-
ziaria I (1937), 227; H. DORN, Diritto finanziario e questioni fondamentali sulla doppia
imposizione, Rivista di Diritta Finanziaria e Scienza del/e Finanze I (1938), 115; HOORN JR.,
Bitributação - uma tentativa de definição, in BRANDÃO MACHADO (org.), Direita Tributária:
estudas em hamenagem aa Praf Ruy Barbasa Nagueira, São Paulo 1984, 305; MARCO VITALE,
Doppia imposizione (dir. int.), Enc. deI Dir. XIII (1964),1007; GABRIELE SALVIOLI, La dap-
pia impasiziane nel diritta internazianale, Nápoles 1914; DAMERVALLE, La solution théorique
du problême des doubles impositions, Revue de Science et de Législatian Financiere 1937;
WILHELM WENGLER, Beitriige zum Prablem der internatianalen Dappelbesteuerung, Berlim/
Leipzig 1935; R. BRUNET, Les doubles impositions, Revue de Science et de Législatian Fi-
nanciere 1913, 361; ALFONSO COLARUSSO, Le dappie impasiziani nei rapparti internazianali,
Pádua 1930; GIOVANNI FASOLIS, Le dappie impasiziani, Città di Castello 1914; MARIo PUG-
LIESE, Ilimpasiziani del/e imprese di carattere internazianale, Pádua 1930; PHILIPPE LAVAGNE,
La questian des daubles impasitians, Paris 1930; G. KORN-DIETZ, Dappelbesteuerung, Stuttgatt/
Berlim 1954. Mais recentemente, o tema tem sido abordado com especial profundidade pe-
Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

§ 10 IDENTIDADE DO FATO

Como se disse, para haver concurso de normas (e portanto dupla tributação) é in-
dispensável que se verifique a identidade do fato. Quando se não está perante o "mesmo
fato", quando normas distintas recaem sobre fatos diversos, não há dupla tributação.
Mas o que é a identidade do fato? De que critérios se deve socorrer o intérprete
para individualizar juridicamente um fato no mundo naturalístico é questão que tem
feito correr rios de tinta na teoria geral do Direito, embora não tenha sido ainda ob-
jeto de análise aprofundada no Direito dos Impostos.

A) A regra das quatro identidades

o fato tributário, tal como é modelado pelas normas, é um fato de estrutu-


ra complexa, constituído por diversos aspectos - um aspecto material, um aspecto
subjetivo, um aspecto espacial, um aspecto temporal3 • Será necessária uma absoluta
identidade entre todos os referidos aspectos ou bastará um (ou alguns) deles como
elemento de individualização (os Individualisierungsmomente, de que fala LENr4)?
A doutrina que se tem ocupado da construção do conceito de dupla tributação
formulou - na sequência das obras pioneiras de SrITALER e GUGGENHEIM - a regra
das quatro identidades . Segundo ela, para que se possa falar em identidade do fato
(e portanto em dupla tributação), seria necessária (i) a identidade do objeto, (ii)
a identidade do sujeito, (iii) a identidade do período tributário e (iv) a identidade
do impostos. Por outras palavras: seria necessária, em princípio, a justaposição das

las doutrinas alemã, austríaca e suíça: ARNO SCHULZE-BRACHMANN, Doppelbesteuerung, Stut-


tgart 1963; ID., Doppelbesteuerung, Handworterbuch des Steuerrechts und der Steuerwis-
senschaften 1,252; KARL TEICHNER, Intemationales Steuerrecht, Stuttgart 1976; WOLFGANG
MERSMANN, Internationale Doppelbesteuerung, in Handbuch der Finanzwissenschajt, Iv,
Tübingen 1965, 89; E. FRITSCH, Das Internationale Steuerrecht, Viena 1964; ERNST HÓHN,
Doppelbesteuerungsrecht, Berna/Stuttgart 1973; VOLKER KLUGE, Das deutsche Intemationale
Steuerrecht (3 a ed.), Munique 1992; ARNOLD KNECHTLE, Grundfragen des internationalen
Steuerrechts, Basel 1976. Na Itália, ver ANNA MIRAULO, Doppia imposizione internazionale,
Milão 1990. Uma excelente obra de conjunto é a da professora espanhola ALEGRIA BORRÁS,
La doble imposición: problemas juridico-intemacionales, Madrid 1974. Em Portugal, veja-se a
monografia de MANUEL PIRES, Da dupla tributação jurídica internacional sobre o rendimento,
Lisboa 1984. Entte nós, cfr. ANTÔNIO DE MOURA BORGES, Convenções sobre dupla tributação
internacional, Teresina/São Paulo 1992.

3 Cfr. GERALDO ATALIBA, Hipótese de incidência tributária, São Paulo 1973, 106 ss.; PAULO DE
BARROS CARVALHO, Teoria da norma tributária (2 a ed.), São Paulo 1981, 113 ss.; ALBERTO
XAVIER, Manual de Direito Fiscal, I, Lisboa 1981 (reimpressão), 247 ss.; HELENO TORRES,
Pluritributação internacional sobre as rendas de empresas, São Paulo 2001, 402.
4 LENT, Die Gesetzkonkurrenz im bürgerlichen Recht und Zivilprozess, 1912.
5 Cfr. SPITALER, Das Doppelbesteuerungsproblem, passimj GUGENHEIM, Ilimposition des successions,
passimj HÓHN, Doppelbesteuerungsrecht, 30 ss.; HARALD SCHAUMBURG, Internationales Steuer-
Título I I Capo 11 I Concurso de Leis -IM
hipóteses de incidência das normas tributárias em concurso, considerando todos os
critérios, aspectos ou elementos em que os tipos legais se podem decompor.
Não cabe nos limites deste estudo uma análise dos inúmeros problemas que
suscita a verificação da efetiva identidade do objeto, do sujeito, do período ou do
imposto, os quais aliás foram objeto de importante estudo de HANs FLICK6 • Inte-
ressa, isso sim, ressaltar que a averiguação da identidade pressupõe, por vezes, um
problema de "adaptação" (Anpassung, Angleichung) , entendido este conceito com o
significado específico que assume na Teoria Geral do Direito de Conflitos? E isto
é assim porque as normas em concurso provêm de ordenamentos distintos, inspi-
rados por princípios porventura diversos, utilizando técnicas e conceitos diferentes
também, de tal sorte que a comparação não pode ater-se a critérios formais rígidos.
Assim, por exemplo, a questão de saber se as normas concorrentes respeitam a "idên-
tico tributo" deve ser cuidadosamente examinada, não bastando a denominação das
espécies em causa, antes sendo imprescindível a análise e comparação dos respectivos
aspectos materiais e bases de cálculo ou demais características que contribuam para a
definição da sua verdadeira natureza substancial8 •
Note-se ainda que o requisito da identidade do período só é exigível nos im-
postos periódicos por natureza, como o imposto sobre a renda e o capital, não se
aplicando aos impostos sobre a transmissão de bens a título gratuito ou sobre o
consumo, em que - como bem salienta RUPPE - sobreleva o critério da identidade do
objeto, ou seja, a identidade da transmissão do bem ou da mercadoria9 •

recht: Auflensteuerrecht, Doppelbesteuerungsrecht, Colônia 1993, 424 SS. GILBERT TIXIER/JEAI'


KEROGUES, Droit Fiscal Intemational. Pratique Française, Paris 1974, 16 sS.; GUY GEST/GIL-
BERT TIXIER, Droit Fiscal Intemational (2 a ed.), Paris 1990,23 sS.

6 H. FUCK, Gleichheit von Steue'lfegenstand und Bemessungsgrundlage im intemationalen Steu-


errecht, Steuer und Wirtschaft 1961, 615. Cfr. ainda MERSMANN, Intemationale Doppelbes-
teuerung, cit., 91 sS.; KLAus EBLING, Unilaterale Maflnahmen gegen die internationale Dop-
pelbesteuerung bei den Steuern von Ertrag, Mainz 1970, 33; KNECHILE, Grundfragen, cit., 30
SS.; KLUGE, Das deutsche Internationale Steuerrecht, cit., 9 sS.; M. PIRES, Da dupla tributaçiÜJ,
cit., 38 SS.; MOURA BORGES, Convenções, cit., 64 sS.
7 KEGEL, Internationales Privatrecht, 106 SS.; SCHRODER, Die Anpassung von Knllisions-und Sach-
normen, Berlim 1961; J. BAPTISTA MACHADO, Problemas na aplicação do direito estrangeiro
- adaptação e substituição, in ID., Obra Dispersa, I, Braga 1991, 685.
8 HOHN, por exemplo, entende que podemos estar perante "impostos análogos" no concurso
de um imposto de renda (Einkommensteuer) com um imposto sobre o lucro imobiliário
(Grundstückgewinnsteuer) ou um imposto sobre transferências de capital a título gratuito
(Schenkungsteuer). Mas já essa identidade não existirá entre um imposto ordinário (orden-
tliche Steuer) e um imposto consignado (Zwecksteuer): cfr. Doppelbesteuerungsrecht, cit., 3.
Como diz KLUGE, não importa tanto a Gleichheit como a Gleichartigkeit dos impostos: cfr.
Das deutsche Internationale Steuerrecht, cit., 11; M. PIRES, Da dupla tributaçiÜJ, 57 sS.
9 Cfr. HANs GEORG RUPPE, Internationale Probleme auf dem Gebiet der Umsatzbesteuerung
(relatório geral), CDFI LXVIII-b (1983), 67.
Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

B) O problema da identidade dos sujeitos. Dupla tributação jurídica e econômica


Divergências específicas tem suscitado, porém, a regra da identidade dos su-
jeitos. Alguns autores entendem que esta regra não é essencial à caracterização do
conceito de dupla tributação, que se bastaria com as três restantes "identidades". Para
esta corrente, a definição de dupla tributação deve ser encarada à luz de um critério
geral de valoração fornecido pelo próprio Direito Tributário - e esse critério deve
ser um critério objetivo, deduzido do princípio constitucional da capacidade contri-
butiva. O que caracterizaria a identidade do fato, segundo UDINAlO , seria o elemento
objetivo ou aspecto material da hipótese de incidência, de tal modo que se verificaria
concurso de normas e dupla tributação ainda que o elemento subjetivo, o sujeito,
fosse diferente. Assim, existiria verdadeiro concurso se o mesmo rendimento fosse
tributado por normas tributárias distintas, das quais uma o atinge na sociedade,
pessoa jutídica onde se gerou, e outra no sócio a quem foi distribuído, e, em geral,
sempre que o mesmo fato (ou aspecto material do fato) é tributado cada vez que
muda de titular, operando-se assim o que se tem designado por dupla tributação por
discriminação de contribuintes.
Inclinamo-nos para a tese oposta - que aliás recolhe a maioria dos sufrágios da
doutrina, seguindo SPITALER - e que exige, para a existência de dupla tributação, a
identidade do sujeito, distinguindo assim a dupla tributação jurídica (Doppelbesteu-
erung) - em que essa identidade se verifica - e a dupla imposição econômica ou sobre-
posição de impostos (Doppelbelastung) - em que a identidade do objeto coexiste com a
diversidade dos sujeitos ll .
Exemplo de dupla tributação econômica internacional ocorre numa situação
em que duas sociedades interdependentes residentes em dois Estados distintos se
atribuem rendimentos não dedutíveis num deles e tributáveis no outro.
Também a verificação da identidade dos sujeitos não pode efetuar-se com rígidos
critérios formais, suscitando-se sérias dificuldades nos casos conhecidos na doutrina
como de pessoas vinculadas (verbundene Personen) - marido e mulher, proprietário e
usufrutuário, sociedade civil e seus sócios -, os quais devem ser apreciados à luz de
cada ordenamento jurídico em presença 12 •

10 MANLIO UDINA, Il Diritto Internazionale Tributario, Pádua 1949,252 ss.


11 Cfr. SPITALER, Das Doppelbesteuerungsproblem, 92 SS.; KNECHTLE, Grundfragen, 25; A. BOR-
RÁs, La doble imposición, 26; A. JACQUEMlNjC. PARMENTIER, La double imposition économique
des bénéfices des societés et les mesures d'allêgement, Louvain 1968. A matéria referente a dupla
tributação econômica não cabe nos quadros do Direito Tributário Internacional, a não ser
nos precisos termos em que se repercute no tratamento dos dividendos pagos a residentes
no exterior. Vejam-se as críticas a este conceito em HELENO TÔRREs, A pluritributação inter-
nacional, 412 ss.
12 Cfr. HÓHN, Doppelbesteuerungsrecht, 31; FLICK, Das EifOrdernis der Subjektidentitiit bei Dop-
pelbsteuerungmormen, Steuer und Wirtschaft 37 (1960) I, 239; KNECHTLE, Basic Problems in
InternationalFiscalLaw (trad.), Deventer 1979, 32.
Título I I Capo 11 I Concurso de Leis

§ 20 PLURALIDADE DE NORMAS

Além da identidade do fato, o conceito de dupla tributação exige ainda a plura-


lidade de normas.

A) Dupla tributação internacional e intertemtorial

As normas em concurso devem pertencer a ordenamentos tributários distintos,


dando origem a uma "colisão de sistemas fiscais" - quer esses ordenamentos corres-
pondam a Estados soberanos - e temos a dupla tributação internacional - ou cor-
respondam a espaços fiscais autônomos dentro do mesmo Estado, como os Estados
federados, os cantões, as regiões ou territórios - e temos a dupla tributação intertem-
torial (interestadual, intercantonal, inter-regional etc.).
Se este último fenômeno é análogo na sua essência ao que se registra na esfera
internacional, já se reveste de especialidade a técnica adequada para a sua solução.
Com efeito, nos ordenamentos plurilegislativos, o poder central pode impor a ado-
ção de regras de conflitos próprias de cada sistema, tendentes a eliminar a dupla tri-
butação ou - mantendo embora a diversidade dessas regras nas relações com terceiros
- adotar um sistema único especial de normas de conflitos para reger os concursos de
pretensões provenientes de situação conexa com mais do que um espaço fiscal dentro
do próprio Estado. E essa imposição tanto pode decorrer de dispositivos constitucio-
nais, ao jeito brasileiro; da legislação ordinária, como é a solução mais frequentemen-
te adotada; ou ainda das decisões do poder judiciário, a exemplo do modelo suíço13.
A diferença de método radica em que, nas relações entre Estados soberanos, não
há uma terceira autoridade que lhes seja superior e que delimite definitivamente o
poder tributário de cada um; as pretensões fiscais geram-se a partir de cada ordena-
mento soberano, limitando-se as convenções a consignar regras destinadas a repartir
os poderes em concurso ou a atenuar ou eliminar os efeitos do respectivo cúmulo.
Mas se o Estado, unitário ou federal, puder delimitar antecipadamente o poder
tributário de cada um dos ordenamentos que o compõem, atribuindo a cada um o
direito exclusivo de tributar certos fatos pela fixação precisa de elementos de conexão,
o problema da dupla tributação nem chega a suscitar-se. Ao adotar o método da atri-
buição de competências exclusivas, impede-se que, em face da lei, chegue a formar-se um

13 Sobre o trabalho do tribunal federal suíço com vista à elaboração de normas de conflitos
intercantonais, ver KNECHTLE, Basic Problems, 28; WALTER RYSER, Introduction au Droit Fis-
cal International de la Suisse, Berna 1980, 26 SS.; IRENE BLUMENSTEIN, Die interne Regelung
des internationalen Steuerrechts in der Steuergesetzgebung des Bundes und der Kantone,
Archives de droit fiscal suisse I -9, 1 e 65; R. VON SALIS, Die Schweiz und die internationale
Doppelbesteuerung, Schweizerisches Jahrbuch for Internationales Recht IV (1948); HANS
HUBER, Das interkantonale Doppelbesteuerungsrecht als Richterrecht, in Festschrift for Irene
Blumenstein, Bern 1966,43.
Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

concurso real de normas, pois o seu âmbito espacial de incidência fica definitivamente
circundado por estas regras especiais de conflitos, em termos de excluir o concurso l4 .
No Brasil, os diversos impostos estaduais e municipais são dotados de conexões
com o território destes entes políticos, pelo que dificilmente se gerarão fenômenos
de dupla tributação interterritoriaF5. Todavia, o art. 102 do Código Tributário Na-
cional admite a vigência da legislação tributária do Estado, do Distrito Federal e dos
Municípios "fora do respectivo território, nos limites em que lhe reconheçam extra-
territorialidade os convênios de que participem, ou do que disponham esta ou outras
leis de normas gerais expendidas pela União". E não deve esquecer-se, neste contex-
to, que uma das funções próprias das leis complementares consiste precisamente na
solução dos conflitos tributários entre os diversos entes políticosl 6 •

B) Concurso de competências e dupla tributação


Não basta que os sistemas em colisão sejam distintos: é ainda necessário que
os ordenamentos em presença sejam paritários, isto é, provenientes de entes situados
num mesmo "nível de governo", resultando o concurso de pretensões da conexão do
fato com mais do que um território.
Todavia, razões históricas levaram a formular, no Brasil, conceito mais amplo de
dupla tributação, o qual abrangeria não apenas os casos atrás referidos (dupla tributação
horizontal), como ainda aqueles em que a pluralidade de pretensões decorre da exigên-
cia simultânea de impostos iguais ou da mesma natureza por diversos entes colocados
em distintos "níveis de governo", todos com jurisdição sobre o mesmo território - as-
sim, por exemplo, se a União e o Estado exigissem, ambos, tributo idêntico sobre o
mesmo fato (dupla tributação vertical); e bem assim aqueles casos em que as entidades
tributantes não estão situadas em idêntico nível nem estão entre si ordenadas - v.g. uma
divisão e uma autarquia local de outra divisão (dupla tributação diagonal ou oblíqua)l7.
Na doutrina brasileira clássica, estes conceitos moldaram-se sobre a dogmática
das modalidades possíveis de discriminação de rendas entre as diversas pessoas polí-
ticas. Quando tal discriminação se efetuasse sob a forma de atribuição de competência
privativa) não se deveria falar em dupla tributação, mas sim em invasão de competência;

14 Cfr. NIBOYET, Les doubles impositions, 52.


15 O antigo adicional ao imposto de renda da União, da competência dos Estados (Consti-
tuição Federal, art. 155, II), gerou situações de dupla tributação, pois, na ausência de lei
complementar que defma com clareza um único elemento de conexão relevante, os diversos
Estados têm adotado elementos de conexão conflitantes, como a sede ou domicílio da em-
presa e o lugar do estabelecimento.
16 Ver a monografia fundamental de JosÉ SOUTO MAIOR BORGES, Lei complementar tributária,
São Paulo 1975; ver ainda BERNARDO RIBEIRO DE MORAES, Doutrina e prática do imposto sobre
serviços, São Paulo 1975,48.
17 Cfr. M. PIRES, Da dupla tributação, 92 e 116.
Título I I Capo 11 I Concurso de Leis ••

quando, porém, a Constituição Federal permitisse a existência de competências concor-


rentes, ocorreria, então, a verdadeira figura da dupla tributação, a qual aliás poderia
ser eliminada por critérios predeterminados, destinados a evitar a cumulatividade das
imposições, como a prevalência automática dos tributos federais sobre os estaduais 18 •
Certo é, porém, que a Constituição vigente fez perder apoio normativo a esta
visão tradicional, pois com a eliminação da figura da competência concorrente deixou
de se poder falar em dupla tributação no sentido vertical. Por outro lado, a constru-
ção teórica e dogmática do instituto da dupla tributação foi haurir as suas raízes na
problemática dos conflitos de leis no espaço, no princípio da territorialidade, isto é,
nas questões referentes aos concursos de normas interterritoriais, tendo sido sempre
alheia à matéria de delimitação dos diversos poderes tributários concorrentes dentro
de um mesmo território, ou seja, aos concursos intraterritoriais. Ora, apenas pode
perturbar a análise jurídica de uma realidade associá-la a uma outra, que lhe é afim
pelos seus efeitos econômicos, mas que dela se distancia pelo perfil jurídico.
Preferimos, assim, reservar o conceito de dupla tributação aos concursos de
normas de natureza interterritorial, denominando de concurso de competências os casos
em que a pluralidade de pretensões advenha da pluralidade de entes públicos com
jurisdição no mesmo território.

C) Concurso aparente e dupla tributação virtual

Para que se verifique dupla tributação, é necessário que ambas as normas em


presença se apliquem no caso concreto, dando origem ao nascimento de duas preten-
sões tributárias. Mas se o mesmo fato recai na esftra de incidência de duas normas,
não havendo, porém, aplicação concreta de ambas, ou havendo apenas aplicação de

18 Cfr., sobre a concepção clássica, A. R. SAMPAIO DÓRIA, Princípios constitucionais tributários e


a cláusula "due process oflawJ>, São Paulo 1964, 114 ss., onde se chama a atenção para o fato
de, enquanto nos Estados Unidos a preocupação dominante respeitar à dupla tributação
horizontal, no Brasil todo o sistema constitucional se ter articulado para obviar a dupla
tributação vertical. E daí que, nos Estados Unidos, o conceito de dupla tributação se tenha
sempre restringido a uma acepção horiwntal. Cfr. HARDING, Double Taxation ofProperty and
Income, Cambridge Mass. 1933, 42 sS.; Roy BLOUGH, Tax Rclations among Governmental
Units, Nova Iorque 1937. Ver ainda JosÉ AFONSO DA SILVA, Curso de Direito Constitucional
Positivo, I, São Paulo 1976, 254 SS.; SAMPAIO DÓRIA, Discriminação de rendas tributárias, São
Paulo 1972; BERNARDO RIBEIRO DE MORAES, Sistema constitucional tributário na Constituição
de 1969, São Paulo 1973,200 SS.; FÁBIO FANUCCHI, Curso de Direito Tributário Brasileiro (3'
ed.), 1975,44; ALIOMAR BALEEIRO, Discriminação de rendas, Rio de Janeiro 1953; AMILCAR
DE ARAÚJO FALCÃO, Direito Tributário Brasileiro, Rio de Janeiro 1960, 224; DAGOBERTO LIBE-
RATO CANTIZANO,A nova discriminação de rendas, Porto Alegre 1963; PEDRO MANSO CABRAL,
Discriminação de rendas, Salvador 1960; CARLOS ALBERTO CARVALHO PINTO, Discriminação de
rendas, São Paulo 1941; GILBERTO DE ULHÓA CANTO, Temas de Direito Tributário, lII, Rio de
Janeiro 1964, 199; MrGUEL SEABRA FAGUNDES, verbete Bitributação, in Repertório Enciclopé-
dico do Direito Tributário, VI, Rio de Janeiro, 37 (141 ss.).
-$:+ Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

uma, fala-se então em dupla tributação virtual ou in thesi, para a distinguir da dupla
tributação efotiva ou in praxi. Na dupla tributação efetiva ocorre um concurso real de
normas; na dupla tributação virtual, o concurso é meramente aparente.
O conceito de dupla tributação virtual reconduz-se juridicamente a um caso de
"concurso aparente de normas". Tal como no concurso real, um mesmo fato recai
na previsão de duas normas tributárias pertencentes a ordenamentos distintos. Só
que, por força de determinadas regras existentes à época da ocorrência dos fatos, a
aplicabilidade de uma delas é excluída por força da exclusiva aplicabilidade da outra.
E daí que, ao contrário do que sucede na dupla tributação efetiva, em que ocorre um
concurso real de normas, dada a inexistência de mecanismos que paralisem a eficácia
de uma delas, na dupla tributação virtual o concurso é meramente aparente, porque
não chegou sequer originariamente a formar-se I9 •
No concurso aparente em que a dupla tributação virtual consiste, a aplicabilida-
de exclusiva de uma das normas em concurso resulta de regras especiais inseridas em
ordenamentos plurilegislativos ou em tratados contra a dupla tributação.
Nos primeiros, o sistema central de normas de conflitos pode proibir - e via de regra
proíbe - a própria dupla tributação virtual, só por si geradora de insegurança jurídica20 •
Mas também nas relações entre Estados soberanos ligados entre si por conven-
ções contra a dupla tributação, a dupla tributação virtual que existiria, caso ambos
ordenamentos fossem aplicados isoladamente, não se converte em efetiva nos casos
em que as normas convencionais reconheçam apenas a um deles competência exclusi-
va, criando assim um obstáculo ao concurso real de normas. Este, porém, formar-se-
á se as convenções consagrarem a competência cumulativa de ambos os Estados.
Um outro traço tem sido apontado para caracterizar a dupla tributação relevante
ou efetiva: é o resultado do concurso de pretensões traduzir-se numa sobreca'l'lJa tribu-
tária, isto é, dar origem à formação de um encargo fiscal mais elevado do que aquele
que resultaria da aplicação exclusiva da mais elevada das pretensões em concurs02 1 •

D) Duplicação de pretensões
Não pode confundir-se o fenômeno consistente na aplicação de duas normas
distintas com outro, bem diverso, e que se cinge ao âmbito do direito interno - o
da pluralidade de aplicações da mesma norma (Doppelvorschreibung). Ao contrário do
que se passa na dupla tributação, não há concurso de pretensões, mas sim uma só

19 efr. ANTÓNIO BAIÃO DO NASCIMENTO, Do concurso de normas, Lisboa 1971, 45 S5.


20 efr. WALTER RYSER, Dix leçons introductives au Droit Fiscal, Bem 1974, 77; KNECHTLE,
Grundfragen, 31 55.; ID., Basic problems, 30; RlvrER, Droit Fiscal Suisse (Le Droit Fiscal Inter-
national), Neuchatel 1983, 38; M. PIRES, Da dupla tributação, 68 55.
21 efr. ALFRED PHILIPP, Befreiungssystem mit Progressionsvorbehalt und Anrechnungsveifahren.
Probleme des Zwischenstaatlichen Steuerrechts, Viena 1971, 10; GEST{TDUER, Droit FiscalInter-
national, 23.
Título I I Capo " I Concurso de Leis I ai>

pretensão duplamente exigida (Mehrheit der Anspruchsgrundlagen, na terminologia


de LARENZ22 ). Trata-se aqui do instituto da duplicação) vedado pelo princípio ne bis in
idem 2 3, o qual se coloca no plano da atividade tributária concreta ou secundária, na
terminologia de ALESSI, e não no da atividade abstrata ou primária24 •

E) Concurso) conflito e cúmulo de pretensões


A dupla tributação traduz-se, como se viu, num concurso real de normas (Nor-
menkonkurrenz). Ora, como estas normas são normas obrigacionais, reguladoras de
obrigações de imposto, o concurso de normas dá lugar a um concurso de pretensões
(Anspruchskonkurrenz) que são os créditos tributários delas derivados.
Já se afirmou que a dupla tributação envolve um conflito de normas, mas o
asserto é inexato.
Segundo LARENZ25 , podem distinguir-se três casos típicos de concurso real: ou
há uma aplicação cumulativa das duas normas, produzindo-se tanto a consequência
jurídica de uma como a da outra; ou o sujeito cuja esfera jurídica é afetada pelas
consequências jurídicas das duas normas, pode optar por uma delas (aplicação alter-
nativa); ou as consequências jurídicas das duas normas se excluem reciprocamente,
pelo que apenas uma das normas em concurso pode ser aplicada.
Só neste último caso se pode falar em "conflito de normas", enquanto uma delas
exclui a aplicação da outra quando ambas concorrem sobre a mesma situação concreta.
Ora, na figura da dupla tributação não se verifica uma contradição lógica das
normas em concurso, em termos de exclusão recíproca, mas uma aplicação autônoma
e independente de que resulta a produção conjunta das consequências jurídicas de
ambas. Verifica-se, pois, a figura do concurso real cumulativo, do cúmulo de normas ou

22 LARENz,Allgemeiner Teil des deutschen bürgerlichen Rechts, Munique 1967, 271 sS.
23 Cfr. GAETANO ARDIZZONE, li principio dei "ne bis in idem JJ neWimposizione diretta, Rivista di
Diritto Finanziario e Seienza delle Finanze 1972, 116 e 275. Sobre o "ne bis in idem JJ , efr.
BERLIRl, La legge dei registro, 1960, 221; GE~TILLI, La doppia imposizione: alcune conside-
razione di diritto interno, in UCKMAR/et aI., Il reddito di impresa nel nuovo testo unico, Milão
1988,293. Sobre esta distinção, ver entre nós A. R. SAMPAIO DÔRlA, Princípios constitucionais
tributários e a cláusula "due process oflaw JJ , cit.) 125; PÉRSIO OLIVEIRA LIMA, Bitributação na
doutrina do Direito Tributário, RDP 25 (1973), 129 (130 ss.).
24 Discordamos, assim, de BERNARDO RrnEIRO DE MORAES, que reserva o conceito de "bis in
idem" para esta última modalidade: cfr. Sistema constitucional tributário na Constituição de
1969) São Paulo 1973, 511 sS. M. PIRES, Da dupla tributação, 93. Cfr. ainda PIETRO AoONNI-
NO, Doppia imposizione (diritto interno), Enc. delDir. xm (1964),1015 SS.; VITOR FAVEI-
RO, Noções fondamentais de Direito Fiscal Portugu~s) I, Coimbra 1984, 641, nota; FRANCISCO
R. PARDAL, Duplicação de colecta: algumas notas, Revista de Direito Administrativo 2 (1960),
81 SS.; ANTÔNIO MANUEL CARDOSO MOTA, A eliminação da dupla tributação internacional,
CTF 157/158 (1972), 58.
25 Cfr. LARENz, op. e loco cit., e a excelente monografia de ANTÔNIO BAIÃO DO NASCIMENTO, Do
concurso de normas, cit.) passim.
Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier ..====-
. . . . . . ..
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do cúmulo de pretensões (Anspruchshaufung), na terminologia de GEORGIADES 26 . É a


atenuação ou eliminação desse cúmulo que constitui o objeto das medidas tendentes
a evitar a dupla tributação.

SEÇÃO II
EVASÃO FISCAL INTERNACIONAL, CONFLITO NEGATIVO
E DUPLA NÃo TRIBUTAÇÃO

A expressão "evasão fiscal internacional" é uma expressão ambígua e multiface-


tada com a qual se designam fenômenos distintos.
Numa primeira acepção, ela exprime os atos ilícitos pelos quais o contribuinte
viola os deveres decorrentes de uma relação jurídico-tributária com elementos de
estraneidade, trate-se de deveres materiais, como o dever de cumprir, ou de deveres
instrumentais, como o de apresentar declarações verdadeiras ou o de manter escritu-
ração regular.
Numa segunda acepção, ela englobaria, além da tax evasion propriamente dita, a
figura da tax avoidance ou elisão fiscal internacional, que se traduz na prática de atos
lícitos pelos quais os particulares, influenciando voluntariamente os elementos de
conexão, procuram evitar a aplicação de certo ordenamento tributário.
A evasão fiscal internacional, na primeira acepção, não oferece especialidade
digna de relevo na teoria do ilícito fiscal. Enfim, a elisão fiscal internacional corres-
ponde à figura da fraude à lei fiscal internacional, pelo que o seu tratamento dogmá-
tico deve ser elaborado nos quadros do elemento de conexão.
Completamente distinto do conceito de evasão fiscal é o conceito jurídico de
dupla não tributação (cedouble non-taxation» <TJoppel-Nichtbesteuerung))) que respeita
ao fenômeno pelo qual, nas relações entre dois ou mais Estados, cujas leis tributárias
são potencialmente aplicáveis a uma certa situação da vida, esta não é efetivamente
abrangida por nenhuma delas.
A dupla não tributação jurídica pode ocorrer nas relações entre dois ou mais Es-
tados, quer estes estejam ligados entre si por tratados tributários ou não. Na inexistên-
cia de tratado tributário, a dupla não tributação resultará da inexistência, em ambos
os Estados em presença, de normas tributárias que se considerem aplicáveis a uma
determinada situação de vida (conflito negativo ou vácuo de nonnas, Nonnenmangel).
Na existência de um tratado tributário entre os Estados em presença, a dupla
não tributação pode resultar das próprias regras convencionais. Um primeiro tipo de
disposições nesse sentido existirá quando a dupla não tributação é objeto da vontade

26 Cfr. GEORGIADES, Die Anspruchskonkurrenz in Zivilrecht und Zivilprozessrecht, 1968; ver


ainda EBLlNG, Unilaterale Maflnahmen, cit., 58. Neste sentido, M. PIRES, Da dupla tributa-
ção, cit., 78 ss.
-
~,~',,',,:,',:-- , " Título I I Capo 11 I Concurso de Leis

expressa convergente dos dois Estados, como sucederá quando ambos estabelecem
que nenhum dos dois tributará certo tipo de rendimento ou capital: é, por exemplo,
o que ocorre no caso do tratado entre o Brasil e a Holanda, segundo o qual as boni-
ficações (bonus shares) não são tributáveis nem pelo Estado da fonte nem pelo Estado
da residência (Protocolo, item 3)27.
O segundo tipo de disposições convencionais que pode dar origem ao fenôme-
no da dupla não tributação resulta da existência de normas de repartição de compe-
tência tributária entre os Estados em presença que conduzam ao reconhecimento da
competência exclusiva de um deles para tributar certo rendimento, seja ele o Estado
da residência ou o Estado da fonte. Consequência automática do reconhecimento da
competência exclusiva de um Estado é a exclusão da competência do outro Estado, a
qual é vulgarmente denominada, ainda que erroneamente, de isençã028 •
Exemplos desta última hiI;ótese é, por exemplo, o caso do art. 11, parágrafo 3 b)
do Tratado entre o Brasil e a Austria, segundo o qual "os juros da dívida pública, de
títulos ou debêntures emitidos pelo governo de um Estado contratante ou qualquer
agência (inclusive uma instituição fmanceira) de propriedade daquele governo e pagos
a um residente do outro Estado contratante só são tributáveis no primeiro Estado". Sucede
que a lei interna austríaca isenta de imposto de renda na fonte os juros em causa.
Quando uma norma convencional atribui a um Estado a competência exclusiva
para tributar uma certa situação, proibindo ipso iure que o outro exerça os seus pode-
res tributários, o fenômeno da dupla não tributação pode ocorrer em razão de duas
causas distintas:
(i) ambos os Estados estão de acordo em reconhecer que apenas um deles
tem competência exclusiva, mas este Estado não a exerce efetivamente em
razão de disposição de sua lei interna (dupla não tributação por razões de lei
interna);
(ii) o Estado de residência interpreta as disposições do tratado como conce-
dendo competência exclusiva ao Estado da fonte, mas este último inter-
preta as mesmas disposições do tratado no sentido de que esta não lhe
atribui a referida competência exclusiva (dupla não tributação por conflito de
interpretação) .
No que concerne à dupla não tributação por razões de lei interna ainda há que
distinguir consoante o fundamento da não aplicação da lei interna, a qual pode de-
rivar de: (i) imunidade constitucional, vedando a taxação de certas pessoas ou bens;
(ii) não incidência, no sentido da inexistência de disposição expressa que especifica-

27 Dispõe referido item do Protocolo o seguinte: "3. Com referência aos artigos 10 e 23: fica
entendido que o valor das ações emitidas por uma companhia de um Estado Contratante, e
recebidas por um residente no outro Estado Contratante, não está sujeito a imposto de renda
em qualquer dos Estados."
28 Cfr. ALBERTO XAVIER, Direito Tributário Internacúmal do Brasil (5" ed.), São Paulo, 54, 541, 665.
la I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

mente tribute uma certa situação; (iii) isenção, a qual por sua vez se pode dividir em:
a) objetiva, se subtrair da tributação normal um bem ou rendimento; b) subjetiva,
se exclui certas pessoas de tributação em função da natureza delas, de uma forma
temporária ou permanente, sendo que em certos casos a isenção de certas pessoas
não exclui a imposição da tributação a outras que com ela estão ligadas (caso das
(1Jartnerships» transparentes).
No que concerne à dupla não tributação em razão de conflitos de interpretação,
importa observar que tais conflitos respeitam, via de regra, não tanto à interpretação
das regras dos tratados em si mesmas consideradas, mas à qualificação, em face dessas
regras, de certas figuras jurídicas do direito interno dos Estados em presença. Um
bom exemplo deste conflito é dado pelos próprios Comentários da OCDE aos arts.
23-A e 23-B, parágrafos 32.6 e 32.7, quando comentam o conflito de qualificação
a respeito da alienação da participação numa partnership, que tanto pode ser vista
como alienação de ações tributável apenas no Estado da residência como ser qualifi-
cada como transmissão de bens móveis integrantes de estabelecimento permanente,
tributável no Estado da fonte.
Em 1999, ano da publicação do chamado Partnership Report, o objetivo de evitar
a dupla não tributação foi pela primeira vez afirmado pelo Comitê fical da OCDE.
Na sequência desta afirmação foi introduzido um novo § 4° ao art. 23-A da
Convenção Modelo da OCDE que assegura ao Estado da residência o direito de não
aplicar o método de isenção se o Estado da fonte interpreta o tratado no sentido de
não se considerar tributariamente competente.
Pode afirmar-se que para o Brasil a dupla não tributação não é considerada um
objetivo a alcançar através das convenções tributárias. Com efeito, não só tal obje-
tivo não consta do título ou de qualquer outra passagem dos textos convencionais,
mesmo os celebrados a partir de 1999 (que se referem apenas à dupla tributação e à
evasão fiscal), como também o Brasil favoreceu ativamente a adoção de cláusulas de
matching credit e de tax sparing, as quais privilegiam o efeito de incentivo econômico
ao investimento estrangeiro e não o objetivo de contrariar a dupla não tributação29 •

29 N as Convenções destinadas a evitar a dupla tributação da renda, a serem firmadas pelo Brasil
com países integrantes do Mercado Comum do Sul (Mercosul), será incluída cláusula pre-
vendo a concessão de crédito do imposto de renda sobre lucros e dividendos recebidos por
pessoa jurídica domiciliada no Brasil que deveria ser pago no outro país signatário, mas que
não haja sido em decorrência de lei de vigência temporária de incentivo ao desenvolvimento
econômico, nacional, regional ou setorial (Lei nO 10.637/02, art. 55, e IN 244/02, art. 2°).
Este crédito, observadas as demais condições gerais de concessão e outras que vierem a
ser estabelecidas em legislação específica, somente será admitido quando os lucros ou divi-
dendos disribuídos provenham, diretamente, de atividade desenvolvida no país estrangeiro
signatário, relativa aos setores: (i) industrial, exceto da indústria de cigarro e bebidas em
geral, inclusive os concentrados destas; (ii) agrícola, de florestamento ou pesqueira (Lei nO
10.637/02, art. 55, e IN 244/02, art. 2°, §).
Título I I Capo 11 I Concurso de Leis ..

Outro argumento que revela não ser a dupla não tributação objetivo relevante
dos tratados brasileiros está na expressa ressalva que o Brasil (embora na sua con-
dição de Estado não membro) estabeleceu ao novo § 4° do art. 23-A do Modelo
OCDE, parágrafo esse que, como se viu, consagra na sua máxima extensão possível
uma política em prol da prevenção da dupla não tributação 3o •

30 Dispõe referido § 4° do art. 23-A o seguinte. «The prllVisions ofparagrapb I sball not apply to
income derived or capitalawned by a resident of a Contracting State wbere tbe otber Contracting
State applies tbe prllVisions of tbe Convention to exempt sucb income or capital from tax or applies
tbe provisions ofparagrapb 2 ofArticle 10 or 11 to sucb incame. JY
I

TITULO II

CONTEÚDO E NATUREZA DO DIREITO TRIBUTÁRIO


INTERNACIONAL
CAPÍTULO I
ESPÉCIES E TIPOS DE NORMAS

§ 10 ESPÉcIES DE NORMAS

A) Normas de fonte interna e de fonte internacional

Sendo o objeto do Direito Tributário Internacional constituído pelas situações


da vida conexas com mais do que um ordenamento tributário soberano (situações
internacionais), o seu conteúdo é constituído por todos os tipos de normas que res-
peitam a tais situações, seja qual for a sua fonte (interna ou internacional), a sua
natureza (direta ou indireta) e a sua função (substancial ou instrumental).
No que concerne à fonte, incluem-se no Direito Tributário Internacional tanto
as normas de produção interna quanto as normas de produção internacional, em que
ocupam lugar preponderante os tratados contra a dupla tributação.

B) Normas de conflitos e normas materiais

No que concerne à natureza, o Direito Tributário Internacional contém normas


indiretas ou de conflitos (normas de conexão); mas também abrange normas de regu-
lação direta ou material.
Exemplo de norma de conflitos interna é a que estabelece que as pessoas físicas
residentes no Brasil serão tributadas em função da totalidade dos seus rendimentos,
tanto produzidos no Brasil como no exterior; ou a que determina que as pessoas
jurídicas residentes no Brasil serão tributadas exclusivamente em função dos lucros
produzidos em território nacional; ou a que estabelece que os residentes no exterior,
tanto pessoas físicas quanto pessoas jurídicas, são tributáveis exclusivamente em fun-
ção dos rendimentos produzidos no Brasil.
Exemplos de normas de conflitos internacionais são as normas constantes dos
tratados contra a dupla tributação que estabelecem que os royalties auferidos no terri-
tório de um Estado por pessoa residente noutro Estado são tributáveis exclusivamen-
te por este último; ou as que determinam que, sendo uma pessoa física considerada
residente de ambos os Estados, prevalece a residência do Estado em que tem habita-
ção permanente.
Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Trata-se de normas que definem o âmbito de incidência das leis tributárias inter-
nas dos Estados, delimitando-o unilateral ou bilateralmente, mas sem que determi-
nem, por si sós, o modo como a simação da vida em causa será tributada.
Ao invés, as normas de regulação direta ou material pressupõem resolvido o
problema do seu âmbito de incidência e ditam diretamente a disciplina substancial
de uma simação da vida com elementos de estraneidade.
Exemplos de normas materiais internas são as que estabelecem que os rendi-
mentos e ganhos de capital pagos a residentes no exterior estão sujeitos a um impos-
to de 15% retido na fonte e calculado sobre o rendimento bruto; as que determinam
que as filiais de empresas estrangeiras são tributáveis do mesmo modo que as pessoas
jurídicas domiciliadas no país; as que permitem, no cálculo do imposto de renda das
pessoas físicas, a dedução dos impostos pagos no exterior.
Exemplos de normas materiais internacionais são as disposições das convenções
contra a dupla tributação que, após resolvido o problema da atribuição de competên-
cia (cumulativa ou exclusiva) a um Estado, por normas de conflitos delas constantes,
determinam de modo direto como a tributação se deve operar: assim, por exemplo, a
que estabelece que na determinação do lucro de um estabelecimento permanente de-
vem ser considerados os que este obteria se se tratasse de empresa independente; as
que estabelecem limites ao poder de tributar do Estado da fonte, fixando desde logo
a alíquota máxima aplicável; as que estabelecem limites ao poder de tributar do Es-
tado da residência, regulando as condições em que este deve reconhecer isenção do
rendimento estrangeiro, ou conceder um crédito por imposto pago no estrangeiro!.
Da mesma forma como no Direito Internacional Privado coexistem, a par das
normas de conflitos em sentido técnico, normas materiais 2 - e isto tanto provenien-
tes de fontes internas como de fontes internacionais -, assim também o Direito Tri-
butário Internacional compreende normas de conflitos e normas materiais, tanto de
origem interna como de origem internacional.
Como toda a norma jurídica, também a norma de conflitos do Direito Tributá-
rio, tanto de fonte interna quanto de fonte internacional, se decompõe numa previsão
e numa estatuição. Mas ela comporta algumas peculiaridades que interessa assinalar3 •
A previsão da norma de conflitos do Direito Tributário Internacional - o seu
Tatbestand ou facti-species - abrange dois elementos logicamente distintos: o conceito-
quadro e o elemento de conexãé.

1 Cfr. MóssNER, Der Brgriffdes Internationalen Steuerrechts in der neueren Literatur, Osterreichische
Zeitschrifr fur óffentliches Recht 25 (1974),255 (271, nota 103, e 277), admitindo a coexistên-
cia dos dois tipos de normas e sugerindo, para as normas materiais, a expressão steuerrechtliches
Fremderecht; KWGE, Das deutsche Internationale Steuerrecht (3" ed.), Munique 1992, 5.
2 Cfr. FERNÁNDEz ROZAS/SÁNCHEZ LORENZO, Curso de Derecho Internacional Privado, Madrid
1991,88 ss.
3 Cfr. ARNOLD KNECHTLE, Grundfragen des Internationalen Steuerrechts, Base! 1976, 68; ID.,
Basic Problems in lnternational Fiscal Law (trad.), Deventer 1979, 62.
4 Cfr. BAPTISTA MACHADO, Âmbito de eficácia e âmbito de competência das leis, Coimbra 1970,
191 ss. e 376 ss. A nossa análise inspira-se, porém, na construção de BETTI, Problematica
Título 11 I Capo I I Espécies e Tipos de Normas

o conceito-quadro exprime o próprio fato que é objeto da defInição do âmbito de


incidência espacial da lei interna, operada pela norma de conflitos. O elemento de cone-
xão (momento di collegamento, regle de rattachement, Anknüpfongspunkt) é o instrumen-
to técnico através do qual aquela defInição atua e consiste na ligação do fato descrito
no conceito-quadro à ordem jurídica que, em defInitivo, se irá aplicar à questão.
Assim, por exemplo, a hipótese da norma de conflitos que determina que as pes-
soas jurídicas serão tributadas pelos lucros realizados no território nacional comporta
um núcleo fatual descrito por um conceito-quadro - "lucros realizados por pessoas ju-
rídicas" - e um elemento de conexão - "produção do lucro no território nacional"5. Ou-
tro exemplo: a norma de conflitos que estabelece que os royalties auferidos por não
residente podem ser tributados pelo Estado da fonte comporta um conceito-quadro
- percepção de royalties por não residente - e um elemento de conexão - a localização
da fonte pagadora desse rendimento.
VerifIcada a previsão normativa, segue-se necessariamente a sua estatuição ou
consequência. Como é próprio de toda a norma de conflitos - e daí a sua caracte-
rização como norma indireta -, o seu comando preceptivo traduz-se na designação
de uma dada lei (ou ordem jurídica) aplicável, e não numa regulamentação direta de
direito material. Esta designação é, por assim dizer, o conteúdo necessário, mínimo,
imprescindível de toda a norma de conflitos de Direito Tributário Internacional, pois
a sua essência está precisamente na delimitação do âmbito espacial de incidência das
leis, na defInição dos limites das leis tributárias internas 6 •
Todavia, se as normas de conflitos se esgotam numa estatuição que apenas
abrange este momento, as normas materiais têm consequência de mais amplo conte-
údo, pois, uma vez efetuada a referida delimitação, como momento primário, pelas

dei Diritto Internazionale, Milão 1956, 165 ss. Naquilo que designamos genericamente por
"conceito-quadro", VOGEL ainda distingue o Objekttatbestand (o objeto a que se aplica a
regra, tal como rendimento, lucro, capital etc.) e o Metatatbestand (as características do ob-
jeto relevantes para a aplicação da lei, designadamente a indicação da fonte de que provêm:
rendimentos de propriedade imobiliária, lucros de empresas etc.). Destes se distingue ainda
o elemento de conexiW, seja referido a características do sujeito passivo (nacionalidade, residên-
cia) ou da transação ou evento (lugar do imóvel etc.). Cfr. OnDouble Taxation Conventions
(trad.), Deventer 1997 (cit. Double Taxation), 29. Sobre o elemento de conexão na estrutura
da norma, ver KNECHTLE, Basic Problems, 62. M. PIRES, Da dupla tributaçiW jurídica inter-
nacional sobre o rendimento, Lisboa 1984,472, distingue o objeto da conexiW do elemento de
conexiW. Na terminologia de FERRER CORREIA, o objeto da conexão é precisamente defmido
pelo conceito-quadro: cfr. Direito Internacional Privado - alguns problemas, Coimbra 1991
(2 a reimp.), 140.

5 Que a hipótese das normas de conflito é distinta da hipótese das normas materiais está muito
bem salientado em IRINEU STRENGER, Teoria Geral do Direito Internacional Privado, São Paulo
1973,270 sS.
6 Cfr. K. VOGEL, Der raumliche Anwendungsbereich der Verwaltungsrechtsnorm, Frankfurt/Ber-
lim 1965, 275.
4lD I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

normas de conflitos, comportam ainda providências de regulamentação direta da


simação tributária internacional.
As normas do Direito Tributário Internacional podem, assim, ter um duplo
objeto: o problema do âmbito espacial de incidência das leis -limites das leis -, que é
objeto de normas de conflitos em sentido técnico; e o problema da solução dos casos
de aplicação cumulativa das leis, em virmde da sobreposição dos respectivos âmbitos
de incidência - o concurso de leis -) que é objeto de normas materiais.
O problema do limite das leis é um problema logicamente antecedente, um
problema primário ou de primeiro grau, em relação ao do concurso de leis. E isto
porque a própria questão de saber se existe concurso pressupõe preliminarmente re-
solvido o problema da determinação do âmbito de incidência das normas em causa.
A heterogeneidade da origem, da namreza e das funções destas normas não pre-
judica a homogeneidade do seu objeto - as simações da vida conexas com mais do que
um ordenamento tributário, homogeneidade esta que permite reuni-las num corpo
autonomizável de regras, para efeitos dogmáticos -, corpo esse que é precisamente o
Direito Tributário Internacional.

C) Normas substanciais e normas instrumentais:


o Direito Tributário Internacional em sentido formal
No que toca ao critério da função, o Direito Tributário Internacional abrange,
ao lado das normas substanciais (materiais ou de conflitos), normas instrumentais
que integram o chamado Direito Tributário Internacional em sentido formal e que se
simam, não já na esfera de delimitação da competência legislativa dos Estados em
presença, mas de delimitação da eficácia das leis no espaço, mediante a prática de atos
de império pelos órgãos nacionais de aplicação do direito.
Um primeiro grupo de normas respeita à definição da jurisdição ou competência
dos órgãos nacionais - administrativos ou judiciais - para amarem relativamente a
questões ligadas, por qualquer de seus elementos, a mais do que uma ordem jurídica.
Nelas se incluem as questões referentes à evenmal competência dos tribunais ou au-
toridades fiscais nacionais para aplicarem leis tributárias estrangeiras ou para executar
coercivamente créditos tributários estrangeiros; ou ainda as que respeitam à questão
de saber se é legítima em território estrangeiro a prática de atos administrativos típi-
cos da "atividade tributária em concreto", na terminologia de ALESSI, tais como a rea-
lização de investigações, exames à escrimração, vistorias, avaliações ou notificações.
Um segundo grupo de normas abrangidas no Direito Tributário Internacional
em sentido formal ou instrumental respeita à questão de saber em que termos e em
que medida atos concretos de execução da lei (administrativos ou jurisdicionais),
praticados em certo Estado, podem produzir os seus efeitos típicos no território de
outro Estado. São exemplos a questão de saber se o Fisco de um país estrangeiro
pode solicitar diretamente informações a contribuinte residente noutro Estado, se
Título 11 I Capo I I Espécies e Tipos de Normas

pode aí notificá-lo diretamente de pretensão tributária que lhe seja exigível ou se


pode invocar run título executivo (decisão administrativa irrecorrível ou sentença
judicial) para executar em país estrangeiro run crédito tributário de que seja titular.
A solução prevalecente na atual fase de convívio entre os Estados é a da inadmissi-
bilidade da produção automática dos efeitos jurídicos típicos de tais atos de direito
público, sendo, por isso, necessárias medidas de assistência administrativa ou judici-
ária (Amtshilfe) Rechtshilfe) pelas quais determinado Estado pratica, à solicitação do
outro, os atos administrativos (por exemplo, notificações, pedidos de informações)
ou judiciais requeridos (por exemplo, execução forçada de créditos), mas sempre em
obediência aos procedimentos previstos pelas leis internas dos Estados solicitados.
Exemplo de normas instrrunentais internas deste tipo são as que determinam
que as notificações ou ordens judiciais ou administrativas podem ser dirigidas a resi-
dentes no território nacional, abrangendo docrunentos situados no exterior.
Exemplos de normas instrrunentais internacionais são as constantes dos tratados
que regulam em que condições se podem efetuar trocas de informações entre as autori-
dades administrativas de ambos os Estados, ou as que regem as condições em que pode
ser executado no tertitório de run Estado o crédito tributário de run Estado estrangeiro.
Tais normas ocupam no Direito Tributário Internacional posição paralela às
que, no Direito Internacional Privado, respeitam à competência internacional dos
tribunais e outros órgãos públicos, bem como ao reconhecimento de sentenças e atos
públicos estrangeiros 7 •

§ 2° TIPOS DE NORMAS SUBSTANCIAIS: NORMAS DE DELIMITAÇÃO, DE COLISÃO,


DE REPARTIÇÃO, DE CUMULAÇÃO E DE ATENUAÇÃO

Julgamos ser possível, em face do que se afirmou, ensaiar uma tentativa de


tipologia de normas do Direito Tributário Internacional, que tome como critério a
formulação e a amplitude da respectiva estatuição.
Um primeiro tipo de normas de conflitos cinge-se a definir unilateralmente o
âmbito espacial de incidência do ordenamento tributário, sem tomar posição quanto
a run concutso eventualmente decorrente da aplicação crunulativa deste ordenamento
com a de outro ou outros que se considerem igualmente interessados na mesma situ-
ação concreta. É o que se passa com as normas de conflitos de fonte interna, que pro-
pomos se denominem normas de delimitação (Grenznormen) rules oflimitation of /aw) 8.
Um segundo grupo de normas de conflitos - este agora constante de tratados
contra a dupla tributação - também se restringe ao problema dos limites das leis,
não versando sobre o problema do concurso de leis. Mas, ao invés do que sucede

7 Cfr. ISABEL DE MAGALHÃES COLLAÇO, Da qualificação em Direito Internacional Privado, Lisboa


1964,12.
8 Cfr. K. VOGEL, Double Taxation, cit., 20.
4B I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

com as normas do primeiro tipo (normas de delimitação), não se cinge a definir os


casos em que o ordenamento interno é aplicável, antes decide em tese qual dos dois
ordenamentos potencialmente interessados na tributação se aplica à situação con-
creta. Ainda estas são verdadeiras normas de conflito unilaterais) no sentido de que
nunca determinam a aplicação direta da lei estrangeira no Estado a que pertencem9 .
Mas distinguem-se das primeiras (normas de delimitação), pois enquanto nestas a
unilateralidadeé introversa) independente portanto dos demais ordenamentos, nas
segundas a unilateralidade é extroversa) isto é, resulta da definição do âmbito espacial
de um ordenamento frente a outro ordenamento distinto. Propomos, por isso, sejam
designadas como normas de colisão (Kollisionsnormen) expressão que bem se ajusta à
definição do âmbito de incidência de leis, umas frente às outras, em concurso lO •
As normas de colisão podem, por sua vez, revestir duas modalidades, consoante
reconheçam a competência exclusiva de um dos ordenamentos ou, ao invés, reconhe-
çam a competência cumulativa dos dois.
Para o primeiro subtipo de normas de colisão, a definição a que nos referimos
opera em duas direções distintas. Para a ordem jurídica designada como aplicável, ela
traduz-se num reconhecimento de competência; para a ordem jurídica declarada inapli-
cável, ela redunda numa exclusão de competência e, portanto, na configuração de um
caso de não incidência (que não de isenção). São normas deste subtipo as normas
convencionais que estabelecem que certo tipo de rendimento "será exclusivamente
tributável num Estado" ["shall only be taxable ( ... )", "ne sont imposables que ( ... )"].
Propomos, por isso, sejam designadas normas de repartição (Verteilungsnormen) Zutei-
lungsnormen) distributive rules)!l.
As normas de repartição, dissemo-lo, cingem-se apenas ao problema dos limites
das leis, não tendo por objeto um caso de concurso de leis. Pode todavia perguntar-se
se ainda aqui não se estará prevenindo um concurso de leis, pela repartição antecipa-
da e abstrata do poder de tributar entre os ordenamentos virtualmente interessados.
Entendemos que não pode falar-se nestes casos em concurso de leis, a não ser no sen-

9 Como muito bem observa A. MARQUES DOS SANTOS, "a diferença entre os dois tipos de regras
continua a subsistir, ainda que um tratado entre os Estados interessados estabeleça uma dis-
ciplina comum convencional para certas situações jurídicas, sob uma forma aparentemente
bilateral ( ... ); se há aqui um aspecto comum relativamente ao DIP - que é o de saber qual
dos dois direitos estaduais é aplicável, em função do elemento de conexão constante da regra
pactuada entre os dois Estados -, toda a semelhança cessa aí ( ... ), de modo que os órgãos de
aplicação do direito dos dois Estados apenas aplicam a sua própria lei e nunca recorrem à lei
estrangeira": cfr. As normas de aplicação imediata no Direito Internacional Privado, II, Coim-
bra 1991, 780. No mesmo sentido, TILLMANNS, in MóssNER/et ai., Steuerrecht international
tdtiger Unternehmen, Colônia 1992, 123 (163).
10 Empregamos assim esta expressão no seu sentido estrito, tal como ARNO SCHULZE-BRACH-
MANN, K1Jllisionsnorm) Handwijrterbuch des Steuerrechts und der Steuerwissenschaft I, 670, em-
bora reconheçamos que ela é, via de regra, usada para caracterizar a norma de conflitos em
geral, na tradição de KAHN e NIEMAYER. Cfr. MAGALHÃES COLLAÇO, Da qualificação, 13.
11 Cfr. K. VOGEL, Double Taxation, 27; MóssNER, Der Begriff, 274-275.
Título 11 I Capo I I Espécies e Tipos de Normas

tido de concurso meramente virtual ou aparente. É certo que as normas de repartição


o têm por objeto, prevenindo-o. Mas, precisamente porque o previnem, elas cortam
cerce a possibilidade de o concurso se formar efetivamente, tornando-se pois desne-
cessário adotar qualquer providência ulterior. VOGEL afirma que se trata de "normas
completas" pois contêm em si mesmas a solução definitiva do problema12 •
Um segundo subtipo de normas de colisão, ao invés de operar uma repartição
de competências tributárias entre os dois Estados em presença, reconhece a ambos
competência cumulativa. São normas deste tipo as normas convencionais que estabe-
lecem que certas classes de rendimentos, além de poderem ser tributadas pelo Estado
da residência, "podem ser tributadas (... )" ("may be taxed", "sont imposables") pelo
Estado da fonte. Propomos sejam designadas por normas de cumulação.
Ao contrário das normas de repartição, as normas de cumulação ou reconheci-
mento de competência cumulativa são "incompletas" ou "abertas", na terminologia
de VOGEL, pois permitem a formação de um concurso real de pretensões sem lhe da-
rem por si mesmas uma solução, que deve ser encontrada num outro tipo de normas,
a que a seguir nos referiremos.
O terceiro tipo de normas de Direito Tributário lnternacional- também dima-
nadas de fontes internacionais - oferece de peculiar o fato de a sua consequência não
se esgotar num reenvio ou remissão) indicativo da lei aplicável (exclusiva ou cumulati-
vamente)' como sucede nos dois tipos anteriores. Sem dúvida que pressupõem este
momento, mas, como da delimitação ou da repartição por elas operada resultou um
concurso real de pretensões - por no caso se ter reconhecido a competência de mais
de um ordenamento para regular a hipótese -, torna-se agora necessário arvorar o
próprio concurso, num segundo momento lógico) em objeto de específica disciplina
normativa, limitando os poderes tributários que resultaram para ambos os Estados
das normas de reconhecimento de competência cumulativa.
Enquanto as normas de delimitação e de colisão (na sua dupla modalidade de
repartição e de cumulação) são normas de conflitos que respeitam ao problema da
definição de competência, este último tipo de normas respeita à limitação da compe-
tência, tal como previamente definida pelas primeiras. São as normas de limitação de
competência. Tais normas já não revestem a natureza de normas de conflitos, mas de
normas materiais de solução de conflitos13 •

12 Cfr. K. VOGEL, Double Taxation, 30. SCHAUMBURG também adota a distinção entre vollstan-
dige e unvollstandige Vérteilungsnormen, in Internationales Steuerrecht, Colônia 1993, 524. A
terminologia faz lembrar a distinção de WOLFF entre volkommene e unvolkommene Konflik-
tsnorm; cfr. BÜHLER, Internationales Steuerrecht (IStR) und Internationales Privatrecht (IPR) ,
Amsterdam 1960,24, nota.
13 No âmbito das normas internas (Auflensteuerrecht), KNECHTLE também distingue as normas
de delimitação das normas de atenuação, denominando as primeiras de normas externas
em sentido amplo e as segundas de normas externas em sentido estrito: cfr. Basic Problems,
149-150. As normas de limitação de competência seriam, na terminologia de SCHAUMBURG,
kollisionsauflOsende Normen, por oposição às kollisionsbegrnndende Normen. Cfr.lnternationales
Steuerrecht, 4 sS.
~ I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier . .-=__________......1

As normas materiais de limitação de competência, tanto internas como conven-


cionais, operam, no que concerne ao Estado da residência, através dos "métodos"
clássicos da isenção ou da imputação; e, no que concerne ao Estado da fonte, por via
da redução quantitativa das alíquotas aplicáveis. Tendo em vista o seu efeito redutor
no que concerne ao concurso de normas e pretensões, propomos se designem nor-
mas de atenuação.
Enfim, o quarto e último tipo de normas de Direito Internacional Tributário
são as normas materiais de regulamentação direta que ditam a disciplina substancial das
situações da vida dotadas de elementos de estraneidade. É o caso das normas de fonte
interna que, por exemplo, disciplinam o modo como são tributados os não residentes,
as filiais de empresas estrangeiras ou as subsidiárias de empresas nacionais com sede
no exterior.
Das considerações precedentes resulta, em síntese, a seguinte classificação das
normas de Direito Tributário Internacional:

CLASSIFICAÇÃO DAS NORMAS DE DIREITO TRIBUTÁRIO INTERNACIONAL

Normas de
delimitação (internas)

Normas de conflitos
• Normas de repartição
ou de reconhecimento de
Normas de colisão competência exclusiva
(internacionais) • Normas de cumulação
Normas substanciais ou de reconhecimento de
competência cumulativa

Normas de regulamentação direta (internas)


Normas de limitação de competência ou atenuação
(internacionais)

Normas de competência internacional


Normas
instrumentais

1 Normas sobre a relevância de atos públicos estrangeiros


CAPÍTULO II
NATUREZA DO DIREITO TRIBUTÁRIO INTERNACIONAL

§ 10 DELIMITAÇAo DO PROBLEMA

A discussão em torno da natureza do Direito Tributário Internacional, que de


seguida examinamos, foi frequentemente prejudicada, diga-se desde já, por não se
haver distinguido preliminarmente as várias espécies de normas que o integram,
conduzindo assim a generalizar a todas as normas deste ramo do Direito conclusões
que são apenas válidas para uma ou outra das suas espécies.
Para maior clareza na identificação do problema, importa desde logo sublinhar
que a discussão em causa respeita apenas a uma das espécies de normas do Direito
Tributário Internacional que atrás referimos: as que designamos por "normas de de-
limitação" de fonte interna (Grenznorrnen). A controvérsia cinge-se, pois, a este tipo
de normas, não abrangendo as normas diretas ou materiais, as normas de conflitos de
fonte internacional (normas de colisão), nem as normas instrumentais.

§ 2 0 TEORIA DAS NORMAS MATERIAIS ESPACIALMENTE AUTOLIMITADAS

No sentido de que as normas em causa revestem a natureza de normas ma-


teriais pronuncia-se certo setor da doutrina, de que cumpre salientar, pela atenção
que expressamente dedicaram ao problema, OTHMAR BÜHLER, SPITALER e VOGEL
(na Alemanha), BERLIRI e SACCHETTO (na Itália), SAINZ DE BUJANDA (na Espanha) e
PAMPLONA CORTE-REAL (em POrtugal)l. Para estes autores, as normas que definem o
elemento de conexão relevante, bem como as que procedem à sua concretização, não

1 OTIMAR BÜHLER, Internationales Steuerrecht (IStR) und Internationales Privatrecht (IPR),


Amsterdam 1960,passim; SPITALER, Das Doppelbesteuerungsproblem bei den direkten Steuern,
Reichenberg 1936, 561 (§ 122); K. VOGEL, Der raumliche Anwendungsbereich der Vérwal-
tungsrechtsnorm, Frankfurt/Berlim 1965,passim; ID., OnDouble Taxation Conventions (trad.),
Deventer 1997 (cit. Double Taxation), 20; BERLIRI, Principii di Diritto Tributario, II, tomo I,
Milão 1957, 247; SAINZ DE BU)ANDA, Concepto dei hecho imponible, in ID., Hacienda y Derecho,
IV, Madrid 1966,262 (330 ss.); SACCHETIO, Territorialità (diritto tributario), Enc. dei Dir.
Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

teriam sequer autonomia no que toca às normas internas que definem os tipos legais
dos diversos tributos 2 •
De harmonia com esta orientação, tais normas disciplinam os pressupostos tri-
butários, ou seja, o conjunto de fatos cuja verificação dá origem ao nascimento da
obrigação de imposto, de tal modo que todos os preceitos que por uma ou outra
forma concorrem para a delimitação ou caracterização desses fatos se integrariam
substancialmente nas hipóteses ou tipos legais que os preveem.
Ainda segundo aqueles autores - em especial BERLIRI e SAINZ DE BUJANDA -,
o fato tributário é uma realidade complexa, constituída por elementos objetivos e
subjetivos, cuja delimitação jurídica compete à lei efetuar. Ora, o elemento objetivo
do fato tributário é suscetível de ser encarado sob vários aspectos: um aspecto mate-
rial, em que se traduz o fato objetivamente considerado; um aspecto temporal, que
respeita ao tempo juridicamente relevante para a própria individualização do fato;
um aspecto quantitativo, que se traduz nos critérios de medição do objeto material
do tributo; e, finalmente, um aspecto espacial, que se reporta à definição do espaço ou
território em que o fato se verificou.
Sendo assim, a delimitação da esfera de incidência da norma tributária, isto é,
a definição genérica de quais os fatos a que ela se aplicará em função da sua localiza-
ção, integrar-se-ia substancialmente na própria norma tributária material, do mesmo
modo que nela se incluem as normas reguladoras do aspecto temporal, como as que
definem o período do imposto. A delimitação da esfera de incidência espacial da
norma tributária não passaria, pois, de uma delimitação do próprio fato eleito pela
norma como pressuposto tributário ou hipótese de incidência. Tal delimitação teria,
é certo, a função específica de determinar a incidência das normas tributárias no
território e, por essa via, a extensão territorial do poder tributário do Estado; mas
essa função em nada contenderia com a sua integração substancial na própria norma
definidora do fato tributário.
Para KIAus VOGEL, as normas em causa nem sequer como puras normas de
delimitação do ordenamento interno se poderiam construir, integrando um sistema,
ao contrário do que sucede no Direito Internacional Privado. É que, enquanto este

XLIV (1992), 303 (318); ID., Tutela all'estero dei crediti tributari dello Stato, Pádua 1978,
143 ss.; CARLOS PAMPLONA CORTE-REAL, Curso de Direito Fiscal, I, Lisboa 1982, 149-150.

2 Esta corrente de pensamento é, no plano do Direito Tributário, irmã gêmea da orientação


daqueles que, como QUADRI, SPERDUIT e PILENKO, concebem a regra de conflitos do Direito
Internacional Privado como regra destituída de autonomia, sendo simples parte integrante
das normas materiais, as quais seriam sempre constituídas por três elementos: um núcleo
material, o espaço e o tempo. O fato de os elementos espaço e tempo não serem explicita-
mente referidos no enunciado de cada norma material, mas serem considerados em sepa-
rado, dever-se-ia a puras razões de técnica legislati,:a. Sobre esta orientação e sua crítica (à
qual aderimos de pleno), cfr. BAPTISTA MACHADO, Ambito de eficácia e âmbito de competência
das leis, Coimbra 1970,262 ss.
11 I Capo 11 I Natureza do Direito Tributário Internacional

pode ser considerado um metadireito, uma metalinguagem jurídica, uma vez que as
suas normas, ao decidirem a aplicabilidade das normas materiais, apareceriam estru-
turalmente superiores às regras cujo âmbito de aplicação determinam, as regras de
delimitação do direito tributário (e do direito administrativo em geral) não revelam
entre si a existência de qualquer unidade sistemática, apresentando-se completamente
dependentes das regras materiais cujo campo de aplicação tratam. Faltar-lhes-ia, pois,
a "incomunicabilidade" com as normas de direito material que seria timbre do direi-
to internacional privado e que permitiria erigi-Ias num sistema que se apresentasse
dotado de autonomia em face do sistema das regras de direito material respectivo
Destas considerações decorreria que a delimitação do âmbito de aplicação es-
pacial das normas administrativas (entre as quais as tributárias) não pode constituir
objeto de uma disciplina científica autônoma - o direito administrativo internacional
- na medida em que faltariam àquelas os pressupostos mínimos da sua existência
teórica: um método próprio e um objeto de conhecimento indisputáveP.
Do pensamento dos citados autores decorre que o aspecto ou conexão espacial
previsto pela norma é uma condição, entre outras, para que às situações em causa se
aplique a estatuição contida na norma interna, não tendo por fim indicar um critério
para identificar a ordem jurídica que há de fornecer a norma material destinada a
regular, na ordem do foro, aquele tipo de situação.
Uma variante desta corrente foi formulada recentemente por CARLO GARBARINO,
que parte da distinção entre "normas formais", cuja função consiste na localização do
rendimento com elementos de estraneidade (sourcing ruIes) e "normas substanciais",
que ditam diretamente a respectiva disciplina material (taxing ruIes). O autor adver-
te, todavia, que as primeiras não são "formais" no sentido que esta expressão ganhou
no Direito Internacional Privado, como sinônimo de normas de conflitos, ou seja,
normas com base nas quais é operada a escolha entre dois ou mais ordenamentos
para efeito de determinar a lei aplicável ao caso concreto. A designação de "normas
formais" deve ser entendida no sentido de que elas não respeitam à tributação do
rendimento, mas tão somente à sua localização. Elas não são, por conseguinte, regras
de conflitos bilaterais perfeitas, nos termos do princípio da paridade entre a Iex flri
e o ordenamento estrangeiro; antes fazem parte do ordenamento tributário interno
relativo às relações internacionais, o qual é composto por normas complexas que
contêm, além das normas formais localizadoras, também normas substanciais ou
materiais. Tais normas complexas, conclui GARBARINO, são similares às chamadas
"normas unilaterais introversas" ou "normas de aplicação necessária", no sentido de
que a norma formallocalizadora torna aplicável a norma substancial impositiva. Em
suma, o que caracterizaria tais normas complexas é a ausência de reenvio ao direito
estrangeiro e a operação combinada dos dois tipos de normas4 •

3 Seguimos de perto a exposição do pensamento deste Autor em R. M. MOURA RAMos, Da lei


aplicável ao contrato de trabalho internacional, Coimbra 1990, 275-276.
4 Cfr. GARBARlNO, La tassazione dei reddito transnazionale, Pádua 1990, 8 e 156-157.
~ I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Adotando uma terminologia corrente no direito norte-americano, poder-se-ia


dizer que, para a concepção destes autores, as normas de delimitação internas são
meramente spatially conditioned internal rules, não envolvendo, portanto, um proble-
ma de choice oflaw 5 • Noutras palavras: seriam normas de aplicação necessária e imediata,
verdadeiras normas materiais que, traçando elas próprias os pressupostos da sua apli-
cação no espaço, se declaram obrigatoriamente aplicáveis a certas situações, internas
ou internacionais, independentemente dos critérios gerais de aplicação fornecidos
pelo Direito de Conflitos.

§ 3° A NOSSA POSIÇÃO

A) Localização dos fatos e delimitação do âmbito de incidência

Embora as suas formulações apresentem algumas analogias com as dos autores


citados, GERALDO ATALIBA6 e PAULO DE BARROS CARVALH0 7 - aos quais se devem,
entre nós, as investigações mais profundas sobre a estrutura das normas tributárias -
colocam o problema em termos mais precisos.
Também para eles o aspecto espacial (na terminologia do primeiro) ou o crité-
rio espacial (na linguagem do segundo) são componentes necessários e essenciais da
hipótese de incidência dos tributos. Mas esgotam o alcance dessa realidade normativa
na indicação das circunstâncias de lugar relevantes para a configuração do fato impo-
nível, sem pretenderem ir mais além, ou seja, sem pretenderem definir automatica-
mente o âmbito de incidência espacial das leis, que é realidade distinta. Uma coisa,
na verdade, é a ubiquação dos fatos imponíveis (para usar a expressão de GERALDO
ATALIBA), outra a determinação, entre as várias leis potencialmente em conflito, da
lei aplicável a um dado fato imponível, conexo por qualquer dos seus aspectos com
mais do que uma ordem jurídica.
A apontada distinção é desenhada, com a nitidez de contornos que lhe é peculiar,
por PAULO DE BARROS CARVALHO: "Há quem lhe atribua (ao critério espacial) apenas

5 Cfr., sobre esta distinção, a exaustiva monografia de ANTÓNIO MARQUES DOS SANTOS, As nor-
mas de aplicação imediata no Direito Internacional Privado, 2 vols., Coimbra 1991; N USSBAUM,
Principies of Private International Law, Oxford 1943, 70-73; DE NOVA, I conflitti di legge
e Ic norme con apposite delimitazione della sfera di efficacia, Diritto Internazionale 1959,
13; FERNÁNDEZ ROZASjSANCHEZ LORENZO, Curso de Derecho Internacional Privado, Madrid
1991,406 ss.; FERRER CoRREIA, Direito Internacional Privado - alguns problemas, Coimbra
1991 (2 a reimp.), 60 ss.; R. M. MOURA RAMos, Da lei aplicável, 665 e a ampla bibliografia aí
citada. Na mesma tendência de assemelhar as normas que delimitam o âmbito de aplicação
no espaço das leis penais às normas de aplicação necessária, integra-se T. TREVES, Lagiuris-
dizione nel diritto penale internazionale, Pádua 1973, 93-94.
6 Cfr. GERALDO ATALIBA, Hipótese de incidência tributária, São Paulo 1973, 108 ss.
7 Cir. PAULO DE BARROS CARVALHO, Teoria da norma tributária (la ed.), São Paulo 1974, 118 ss.
......_ _ _ _ _ _Título 11 I Capo 11 I Natureza do Direito Tributário Internacional MA-
a qualidade de delinear os limites dentro dos quais se faz cogente a norma jurídica.
Seria, por assim dizer, o âmbito territorial de aplicação das leis. Esta visão, sobre-
modo simplista, parece reduzir injustamente a dimensão desse critério, tornando-o
singelo indicador, quase sempre implícito, do campo de validade da proposição jurí-
dico-normativa, o que implica indisfarçável empobrecimento daquela realidade 8".
Linha de orientação semelhante parece ter sido seguida por ALFREDO AUGUSTO
BECKER, ao distinguir os elementos da hipótese de incidência - núcleo e elementos
adjetivos - das "coordenadas de tempo e lugar" que condicionam a sua realizaçã09 •
Apesar dos matizes que separam estas teses, a elas é comum a ideia de que uma
coisa é a determinação do local onde um fato juridicamente ocorreu, outra coisa - bem
distinta - é a determinação da ordem jurídica competente para a sua disciplina. A
posição teórica assumida quanto às normas que regem o primeiro problema (as nor-
mas formais localizadoras ou "sourcing rules", na terminologia de GARBARINO) não
envolve, por si só, igual tomada de posição quanto às normas que regem o segundo.
Por isso, o fato de se reconhecer natureza material às primeiras - enquanto aspectos
da hipótese de incidência - não envolve atribuição de igual natureza às segundas,
sobre as quais aliás não se pronunciaram explicitamente os citados autores, deixando
a questão em aberto.

B) Natureza de normas de conflitos


Posto este esclarecimento preliminar, podemos iniciar a crítica à teoria da natu-
reza material das normas de delimitação.
Muito embora os autores que a sustentam nem sempre tenham tomado clara,
direta e frontal posição quanto ao problema de saber se as normas que consideramos
revestem ou não a natureza de normas de conflitos, pode concluir-se - sobretudo
através de algumas passagens da obra de BÜHLER - que a rejeição dessa tese radica
nos pressupostos por eles acolhidos quanto à natureza destas mesmas normas.
Com efeito, BÜHLER parece acolher-se à sombra da tese, de larga aceitação nas
doutrinas alemã e italiana, segundo a qual nem todas as questões internacionais, isto
é, as que se encontram conexas com mais do que uma ordem jurídica, são objeto de
normas de conflitos. Estas apenas surgiriam quando a regulamentação da questão
internacional se traduzisse na sua submissão a uma norma ou conjunto de normas
estrangeiras, desenvolvendo quanto a estas a função específica de as "nacionalizar".
Como as normas tributárias internas nunca designam uma lei estrangeira para dis-

8 Op. cit., 119. PAULO DE BARROS CARVALHO reconhece - e bem - que "o critério espacial das
hipóteses tributárias é fértil repositório de dados importantes, estando, pois, por merecer
exame mais aprofundado de parte dos estudiosos". Cfr. também HELENO TORRES, Pluritri-
butaçiW internacional sobre as rendas de empresas, São Paulo 1997,92.
9 Cfr. BECKER, Teoria Geral do Direito Tributário (3 a ed.), São Paulo 1998, 328 sS.
!i!!> I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

ciplinar uma situação, ainda que internacional, limitando-se a definir as condições


espaciais de aplicabilidade do direito interno, nunca poderiam revestir - na lógica da
tese em causa - a natureza de normas de conflitoslO.
Não é este, evidentemente, o lugar oportuno para apreciar a validade da referida
tese, cuja crítica se encontra de resto já feita 11. Cumpre apenas salientar que, para quem
entenda - de harmonia com a doutrina hoje dominante - que as normas de conflitos
podem remeter a regulamentação da questão internacional, quer para leis estrangeiras,
quer para as leis internas do foro, o problema em análise subsiste nos termos iniciais.
BÜHLER, que dedica o seu ensaio a demonstrar as diferenças (óbvias) entre Di-
reito Internacional Privado e Direito Tributário Internacional, acaba por esgrimir
quixotescamente contra um moinho de vento. O verdadeiro problema em debate
- e que BÜHLER não ataca de frente - consiste em saber se o caráter unilateral das
normas do Direito Tributário Internacional é suficiente para lhes retirar a natureza
de normas de conflitos (Rechtsanwendungsnonnen) , convertendo-as do mesmo passo
em normas materiais (Sachnonnen). Ora, este ponto já tinha sido colocado com toda
a precisão e rigor por ERNST ISAY, em estudo admirável publicado cerca de quarenta
anos antes do de BÜHLER 12 •
Um dos dados que importa ter presente para a dilucidação do referido problema
consiste desde logo na autonomia flnnal das normas fiscais que defmem o âmbito de
incidência espacial da ordem tributária interna. Poderá dizer-se - e o argumento é
inegavelmente poderoso - que a autonomia formal de um preceito não prejudica a
unidade substancial da norma, resultando apenas de razões de técnica legislativa que,
para tornar mais clara a interpretação e mais fácil a aplicação da lei, desmembrou
o mesmo comando substancial em preceitos formalmente autônomos. A verdade,
porém, é que a especialidade da estrutura destas normas, construídas com vista à
escolha de um elemento de conexão e à definição dos critérios da sua localização
territorial, permite ao menos duvidar da sua integração substancial nas normas tri-
butárias materiais definidoras da hipótese de incidência dos tributosl 3 •
E esta dúvida mais se adensa pela verificação de que, em numerosos casos, o
elemento de conexão designado pelas referidas normas não respeita, ao menos direta-
mente, ao próprio fato tributário descrito no tipo legal e que constitui o pressuposto

10 Parece ser este também o fundamento da afirmação de CARLOS PAMPLONA CORTE-REAL,


segundo o qual não é admissível que a função das normas de direito público possa ser outra
que não seja a de definir a extensão da soberania territorial fiscal: cfr. Curso de Direito Fis-
cal, I, Lisboa 1982, 152. O que equivaleria a restringir a natureza de normas de conflitos às
normas de Direito Internacional Privado e a recusar tal natureza ao Direito Administrativo
Internacional, ao Direito Penal Internacional etc.
11 Cfr. ISABEL DE MAGALHÃES COLLAÇO, Direito Internacional Privado, I, Lisboa 1963, 285 ss.
12 Cfr. ISAY, Zwischenprivatrecht und Zwischenverwaltungsrecht, in FC Zl7TELMANN, 1923,
289 (303).
13 Todavia o critério formal é valorizado por juristas da craveira de KEGEL, Internationales
Privatrecht (2" ed.), Berlim 1964,22.
-=====-~ _Título 11 I Capo 11 I Natureza do Direito Tributário Internacional MiM

da obrigação tributária. Assim, quando a lei elege a sede de uma sociedade comercial
como elemento de conexão bastante para legitimar o Estado onde ela se localiza a
tributar os lucros por ela auferidos, ainda que no estrangeiro, designa como ponto de
conexão um elemento estranho ao tipo legal tributário, mesmo que neste se pretenda
incluir - o que aliás é teoricamente discutível- o aspecto subjetivo. Dizer-se que, por
esta forma, se está delimitando a hipótese de incidência subjetiva do tributo, para o
caso específico das sociedades comerciais, é não só atribuir a esta hipótese um sentido
que se afasta largamente do seu sentido originário, como sobrecarregar inutilmente
o tratamento dogmático da tipicidade tributária. Mais: quando a lei determina, por
exemplo, que em certo país estão sujeitos ao imposto de renda os tripulantes de navios
e aeronaves com registro ou matrícula nesse mesmo país, está decididamente a desig-
nar como elemento de conexão um fato - o local do registro ou matrícula da aeronave
- que é de todo em todo estranho ao tipo legal do imposto de renda 14 • E o fato de a lei
presumir juris et de jure que este local é o da sua residência não pode levar a esquecer
que é o fato indiciante e não o indiciado que funciona como o real ponto de conexão.
Ora, se existem casos em que os elementos de conexão não se integram em ne-
nhum dos aspectos do tipo legal, é quanto basta para afirmar que as normas que os
designam não procedem a uma delimitação espacial desse mesmo tipo, integrando-se
neste, antes desempenham uma diversa e autônoma função.
No sentido da autonomia destas normas frente aos preceitos que integram a
hipótese de incidência dos tributos, aponta o art. 101 do Código Tributário Nacio-
nal, ao estabelecer que "a vigência, no espaço e no tempo, da legislação tributária
rege-se pelas disposições legais aplicáveis às normas jurídicas em geral, ressalvado o
previsto neste Capítulo". Tais normas integram-se, pois, nos dois grandes sub-ramos
do Direito de Conflitos, respectivamente o Direito Intertemporal e o Direito Interespa-
cial Comum - por sua vez integrados no campo geral e introdutório do direito, no
capítulo das fontes -, cujos princípios fundamentais se aplicam, salvo na existência
de derrogações especiais em razão da matéria a disciplinar.
Temos para nós - na esteira do caminho rasgado, vai já quase um século, por
SAVIGNY - que o Direito Interespacial e o Direito Transitório se apresentam como
duas manifestações do mesmo grande problema: o problema dos limites das leis. Tais
unidade e autonomia - consagrada no volume VIII do System des heutigen romischen
Rechts - vieram a ser sucessivamente reforçadas nas obras de LASSALLE, BATIlFOLL,
QUADRI e muitos outros, de que importa salientar, em Portugal, BAPTISTA MACHADO,
e, no Brasil, HAROLDO V ALLADÃO e IRINEU STRENGER.
Para esta corrente, à qual aderimos, o Direito Interespacial e o Direito Tran-
sitório são direitos de conexão, direitos sobre o direito, ius supra iura, Recht über Recht,
cujas normas pertencem à categoria das normas de aplicação do direito (Rechtsanwen-

14 Quanto à distinção entre conexões fatuais e conexões reais ou pessoais (e indiretamente


fatuais), colocadas já fora dafattispecie, ver JOÃo BAPTISTA MACHADO, Âmbito de eficácia e
âmbito de competência das leis, 120, 126, 134.
Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

dungsnormen), as quais têm por função determinar as leis aplicáveis a certas relações
jurídicas, definindo a sua localização temporal ou espacial, através de adequados
elementos de conexão, mas não ditar uma disciplina material 15 •
Desta sorte, os Direitos de Conflitos integram um sistema de segundo grau,
cuja autonomia se alicerça, já em razões axiológicas - os valores que os norteiam
colocam-se num plano diverso dos que inspiram as soluções de direito material-, já
em razões de índole semântica, posto tais Direitos utilizarem uma metalinguagem,
empregando conceitos de segundo grau.
Nesta visão das coisas, o espaço e o tempo não são aspectos integrantes das
hipóteses normativas ou, pelo menos, não o são necessariamente: ressalvamos os
casos - que configuram verdadeiras normas materiais autolimitadas - em que as cir-
cunstâncias de tempo e de lugar tenham sido expressamente reclamadas pela hipótese
normativa, que as fez abranger no seu querer material. Em geral, porém, a questão
do âmbito de aplicação espacial e temporal de uma dada norma jurídica é questão
que se coloca em horizonte de indagação bem distinto do da concretização da hipó-
tese normativa. Nesta última, tem-se em vista localizar um certo fato; naquela outra,
tem-se em mente circunscrever o campo de aplicação de uma lei. No primeiro caso,
versa-se da localização dos fatos; no segundo, da definição dos limites das leis.
Como muito bem observa MIGUEL GALVÃO TELLES, "a delimitação temporal e
espacial da vigência (se é que a delimitação espacial tem alcance equivalente ao da deli-
mitação temporal) - o tempo que as normas "duram" e o espaço em que o fazem - re-
presenta um prius relativamente à definição da sua aplicabilidade aos fatos, que se apura
através de uma qualquer relação destes com o tempo e com o espaço de vigência I6".
Na verdade, a fundamentação da autonomia lógica do Direito de Conflitos, de-
pois de ter sido tentada na teoria gradualista da escola de Viena, de KELSEN e MERKL
(Stufenbau der Rcchtsordnung), tem sido mais recentemente alicerçada na teoria dos
graus semânticos (Theorie der semantischen Stufen) de STANISLAW LÉSNIEWSKI, AURED
TARSKI e RUDOLF CARNAP.
À primeira corrente aderiram E. ISAY e NEUMEYER, reconhecendo às normas de
conflitos caráter "supraordenado" em relação às normas materiais]7. A segunda, por
sua vez, inspirou BAPTISTA MACHADO, em Portugal, e KLAUS VOGEL, na Alemanha,

15 Cfr. ERNST ISAY, Zwischenprivatrecht und Zwischenverwaltungsrecht, 291; BAPTISTA MACHADO,


Lições de Direito Internacional PrivaM (4 a ed.), Coimbra 1990, 39-40; lo., Conflitos de leis,
in lo., Obra dispersa, I, Braga 1991, 829. Expressamente neste sentido, quanto ao direito
intertemporal, consulte-se a obra lapidar de SAMPAIO DÓRIA, Da lei tributária no tempo, São
Paulo 1968, passim; ver ainda IRINEU STRENGER, Teoria Geral M Direito Internacional PrivaM,
São Paulo 1973, 56 e 326 SS.; HAROLDO VALLADÃO, Direito Internacional PrivaM, Rio de
Janeiro 1974, 5 ss. e 215.
16 Cfr. o brilbante ensaio Inconstitucionalidade pretérita, in Nos dez anos da Constituição, Lisboa
1987,267 (278, nota 14).
17 Ver as observações de MÓSSNER, Der Beg1iff des Internationalen Steuerrechts in der neueren
Literatur, Osterreichische Zeitschrift fiir offentliches Recht 25 (1974),255 (268).
-======-__ Título 11 I Capo 11 I Natureza do Direito Tributário Internacional ••

que recusam o qualificativo de supraordenação, posto se colocarem no mesmo grau


hierárquico, mas lhes reconhecem o caráter de metajuridicidade (Metarechtsnormen)
por oposição a Obfektrechtsnormen) 18.
A razão pela qual a norma de conflitos de Direito Tributário Internacional,
conquanto unilateral, não reveste a natureza de norma material (ao contrário do que
sustenta BÜHLER) resulta da autonomia do seu objeto e função, que se deixa refletir
na autonomia formal dos correspondentes preceitos.
Como bem observa BAPTISTA MACHADO (em lúcidas reflexões que, embora vi-
sando ao Direito Internacional Privado, calçam como uma luva ao Direito Tributário
Internacional), "o Direito de Conflitos é um direito de conexão" e "a função de
conexão é a função típica da norma de DIP". "Portanto, a conexão (concreta) é o
facto que produz a dita 'consequência' de Direito de Conflitos. Não se trata de um
facto jurídico como qualquer outro, por isso mesmo que o seu efeito se não traduz
numa alteração das situações jurídicas subjectivas (constituição, modificação ou ex-
tinção de uma relação jurídica), mas apenas na determinação do sistema normativo
pelo qual se deverá determinar o efeito jurídico do facto ou situação de facto em
causa. É, pois, uma dupla circunstância que caracteriza o tipo de justiça próprio do
Direito de Conflitos, bem como o seu modo de atuação: por um lado, depender a
'consequência jurídica' não dos factos como tais, mas da sua 'localização'; por outro
lado, consistir essa consequência jurídica, não numa alteração no mundo das situa-
ções jurídicas subjectivas originada pelos factos de cuja 'localização' se trata, mas na
atribuição da competência para regular esses factos a um dado sistema de normas".
Donde se segue, no pensamento do mesmo autor, que "a valoração jurídico-material
dos factos da vida" (o regime de tributação, diríamos nós) "não é com o Direito de
Conflitos, mas com a lei por ele designada como competente: Direito de Conflitos e
Direito Material situam-se em planos distintos e aquele deve abstrair, em princípio,
das soluções dadas por este aos casos da vida I9".
As normas materiais são normas de conduta, regulae agendi, que visam a atribuir
direitos ou impor deveres de natureza tributária, enquanto as normas de conflitos são
regulae decidendi, que se limitam a fixar critérios para definir o âmbito de incidência
das leis no espaço, sendo portanto normas sobre os limites das leis 20 •
Afigura-se-nos também inadmissível a caracterização das normas em causa
como normas de aplicação necessária e imediata, normas autolimitadas Dl] spatialIJ
conditioned internaI rules.

18 Cfr. K. VOGEL, Der riiumliche Anwendungsbereich, 24655., sem que, porém, tenha extraído a
conclusão que se impunha quanto ao Direito Tributário Internacional. Como diz BAPTISTA
MACHADO, "nos termos da regra do sentido semântico toda a proposição que fala de si mesma,
porque pertence simultaneamente a dois graus semânticos, carece de sentido (figurativamente:
ninguém se tira da água puxando pelos próprios cabelos; ou ainda: ninguém pode saltar por
cima da própria sombra)": dT. Âmbito de eficácia e âmbito de competência das leis, 261.
19 Cfr. BAPTISTA MACHADO, Lições, 44-46.
20 Cfr. BAPTISTA MACHADO, Lições, 157.
-iN Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier
As nonnas de delimitação do Direito Tributário Internacional são verdadeiras nor-
mas de conflitos, pois, apesar da sua natureza unilateral, têm por função resolver um
conflito entre sistemas jurídicos, ou seja, dispor sobre a competência de um sistema
jurídico em bloco, ainda que tão só sobre o sistema do foro. Ao invés, as normas de
aplicação necessária e imediata são regras materiais que prescrevem o seu âmbito de
aplicação no espaço, independentemente e à margem das nonnas de conflitos do sistema
em que se inserem. Como observa RUI MOURA RAMos, "o sistema conflitual, que repar-
te as competências normativas (ou melhor, que reconhece aos vários sistemas uma área
de atuação própria, um âmbito de competência), é assim colocado entre parênteses, ou
seja, ultrapassado, por critérios normativos a que o legislador reconhece esse caráter de
essencialidade. Daí que se possa dizer que eles prevalecem sobre o mecanismo conflitual,
no sentido de que a sua atuação, a verificar-se, é independente da competência do siste-
ma, resultando apenas deles próprios e do que determinem, expressa ou implicitamente,
sobre o seu âmbito de aplicação. É essa mesma indiferença e prioridade em relação ao
sistema conflitual que contribui para que sejam aplicados independentemente deste pro-
cesso da regulamentação (típico e comum) das relações privadas plurilocalizadas. O que
significa (como também se reconheceu) que tais leis são aplicadas de imediato, isto é,
que a sua aplicação dispensa o passo intennédio que é dado pela regra de conflitos que
em primeiro lugar designa como aplicável um determinado ordenamento jurídico2I ".
Ora, as normas de delimitação do Direito Tributário Internacional não operam à
margem, com indiferença ou independentemente do sistema de conflitos, subtraindo-
se à sua esfera de influência, antes constituem o cerne deste mesmo sistema, no domí-
nio do seu objeto, traçando o âmbito de incidência espacial das normas materiais des-
se sistema, que só podem considerar-se aplicáveis uma vez dado o "passo intermédio",
consistente em saber se as regras de conflitos do sistema assim o permitem.
Concluímos assim que as normas internas que respeitam ao âmbito de inci-
dência no espaço das normas de Direito Tributário (Grenznonnen) são verdadeiras
normas de conflitos, filiando-nos a uma corrente que conta com a autoridade de
KARL NEUMEYER, ERNST ISAY e NIBOYET 22 , além de estar subjacente às construções

21 Cfr. MOURA RAMos, Da lei aplicável, 665-666; ver também A. MARQUES DOS SANTOS, As
normas de aplicação imediata, lI, 697 ss.
22 Cfr. KARL NEUMEYER,Internationales Verwaltungsrecht, IV; Zurique/Leipzig 1936, 133 S.; ERNST
ISAY, Internationales Finanzrecht, StuttgartfBerlim 1934, 16 sS.; ID., Zwischenprivatrecht und
Zwischenverwaltungsrecht, 289; NrnOYET, Les doubles impositions au point de vue juridique, Recuei!
des Cours 31 (1930),5 (44 ss.); ID., Traité de DroitInternationalPrivé, VI, vol.l, Paris 1949,9.
Mas isto não significa aceitarmos o seu enquadramento no Direito Internacional Privado, como
pretende boa parte da doutrina latino-americana, pois entendemos que o DIP é apenas um dos
capítulos do Direito de Conflitos, de objeto mais amplo. Cfr. ROMERO DEL PRADO, Manual de
Derecho Internacional PrivatW, Buenos Aires 1944, I, 93 ss., e lI, 1.047 ss.; ENNIS, Derecho Inter-
nacionalPrivatW, Buenos Aires 1953,571 ss.; VALENZUELA,Manual de Derecho Internacional, I,
Santiago 1950, 311 ss.; entre nós, OSCAR TENÓRIO, Direito Internacional PrivatW (4a ed.), Rio
de Janeiro 1955,471 ss. Foi com base neste conceito amplo (mas só com base nele) que NI-
BOYET afirmou a inserção do Direito Tributário Internacional no Direito Internacional Privado.
Título 11 I Capo 11 I Natureza do Direito Tributário Internacional

elaboradas pela generalidade da doutrina suíça23 e de contar com o apoio de boa


parte da doutrina alemã24 •

C) Unilateralidade

Em nosso entender, a qualificação das normas em causa como verdadeiras nor-


mas de conflitos decorre claramente da sua função, que se traduz na regulamentação
da questão tributária internacional pela definição dos casos em que a ordem tributá-
ria interna é competente para a disciplinar. As referidas normas não contêm, pois, a
regulamentação material das questões a que respeitam; antes se caracterizam - como
todas as normas de conflitos - pelo processo indireto por que as visam disciplinar, e que
se traduz na referência a um complexo de normas materiais 25 .
Duas características as distinguem, porém, das normas de conflitos próprias da
vida privada internacional, ou seja, das normas de Direito Internacional Privado 26 ,
características estas que entre si se coordenam e completam.

23 Justo é salientar que coube à doutrina suíça o mérito de haver sublinhado a namreza de nor-
mas de conflitos (Knllisionsrecht) que revestem as regras elaboradas pelo Tribunal Federal, as
quais, como direito supraestadual, tendem a eliminar a dupla tributação intercantonal. Reco-
nhecer identidade de namreza às normas - internas ou internacionais - que tendem ao mesmo
escopo nas relações internacionais da Confederação representava apenas dar um simples passo
adiante, aliás imposto pela mais elementar lógica jurídica. Cfr. ERNST BLUMENSTEIN, Sistema di
Diritto delle Imposte (trad.), Milão 1954, 74 SS.; HANS HUBER, Das interkantonale Doppelbes-
teuerungsrecht als Richterrecht, in Festschrift for Irene Blumenstein zum 70. Geburtstag, Bern
1966, 43; W ALTER RYSER, Dix leçons introductives au Droit Fiscal, Bern 1974; ERNST HÓHN,
Doppelbesteuerungsrecht, BernjSmttgart 1973, 197 SS.; ARNOLD KNECHfLE, Grundfragen des
internationalen Steuerrechts, Basel1976, 67 SS.; JOSEPH HENGGELLER, Das internationale Steu-
errecht der Schweiz, Basileia 1938; MAX IMBODEN, Internationales Steuerrecht, Schweizerisches
J ahrbuch fur Internationales Recht VII (1950), 299; JEAN MARC RNIER, Droit Fiscal suisse. Le
Droit Fiscal International, Neuchatel 1983; R. VON SALIS, Die Schweiz und die internationale
Doppelbesteuerung, Schweizerisches Jal1rbuch fur Internationales Recht IV (1948).
24 Cfr. VOLKER KLUGE, Das deutsche Internationale Steuerrecht (3' ed.), Munique 1992, 5; ARNo
SCHULZE-BRACHMANN, J(nllisionsnorm, Handworterbuch des Steuerrechts und der Steuerwis-
senschaften 1,670 (reservando, porém, este conceito para as normas de fonte internacional).
Em Portugal, aderem à qualificação como normas de conflitos ViTOR FAVEIRO, Noções fim-
damentais de Direito Fiscal Português, vol. I, Coimbra 1984, 639 SS.; NUNo SÁ GOMES, Curso
de Direito Fiscal, Lisboa 1980 (lições policopiadas), 469 ss. Expressamente contra, CARLOS
PAMPLONA CORTE-REAL, Curso de Direito Fiscal, 149 sS. Contra, também, HELENO TORRES,
Pluritributação internacional sobre as rendas de empresas (2' ed.), São Paulo 2001, lIO sS.
25 Cfr. ISABEL DE MAGALHÃES COLLAÇO, Da qualificação em Direito Internacional Privado, Lisboa
1964,16 sS.; JosÉ DE OLIVEIRA AsCENSÃO, O Direito. Introdução e teoriageral (6" ed.), Coim-
bra 1991, 500, qualificando as normas de conflitos como regras formais de remissão.
26 Entendida esta expressão na sua acepção restrita de direito de conflitos próprio da vida
privada. Na acepção ampla - em que o DIP é usado em sinonímia com "direito de confli-
tos" - também engloba as normas tributárias de conflitos. Sobre a comparação entre DTI e
DIP, a obra de síntese é o ensaio magistral de BÜHLER, Internationales Steuerrecht (IStR) und
!im I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier _:_ _ _ _ _ _ _ _.......

Em primeiro lugar, como neste particular observou justamente BÜHLER27 , a nor-


ma de Direito Internacional Privado não tem como função operar uma repartição
de soberanias, disciplinando um seu conflito atual ou potencial; antes se confina a
proceder a uma delimitação de competências legislativas que, por si só, não põe em
causa os poderes soberanos dos Estados. Mas se a função própria da norma de confli-
tos privada se esgota na delimitação da esfera de incidência das leis, já o mesmo não
sucede com a norma tributária de conflitos.
É que a conexão de uma questão tributária internacional com a ordem interna não
se limita a atribuir a esta competência legislativa; antes tem como natural consequência
a criação, em favor do respectivo Estado, de um direito de crédito que é o tributo.
Da aplicabilidade ou não das leis materiais tributárias internas resultará em fa-
vor do respectivo Estado a existência ou inexistência de uma pretensão tributária,
que releva inegavelmente do campo do direito público. Mas, sendo assim, a norma
tributária de conflitos tem por função não só disciplinar um concutso de normas
potencialmente aplicáveis, pertencentes a ordenamentos distintos (e daí que ISAY se
referisse a um Zwischenverwaltungsrecht ou Zwischensteuerrecht28 ), mas também dis-
ciplinar unilateralmente um potencial conflito de interesses públicos decorrentes de
um concurso de pretensões impostas pelo poder soberano dos Estados.
Como muito bem observa ANTÓNIO MARQUES DOS SANTOS, "a razão teórica que
explica esta diferença capital entre o modo de determinação da aplicação no espaço
do direito público e a delimitação do âmbito espacial de direito privado reside no
facto de - diferentemente do que acontece com este último -, relativamente ao pri-
meiro, o Estado não ser um simples medianeiro entre interesses contrapostos, mas
ser antes ele próprio uma parte directamente interessada29".
Subjacente ao pensamento da corrente que criticamos, parece estar a ideia de
que, em matéria de direito público, não faria sentido o conceito de "conflito de leis",
porque não caberia às normas que procedem à delimitação do âmbito de incidência
das leis de direito público o qualificativo de "regras de conflitos". Assim, por exem-
plo, CARLOS P AMPLONA CORTE-REAL afirma não ser legítimo reconhecer, em nível
normativo interno, a existência de qualquer conflito internacional de competências
quando está em jogo a soberania de um Estado, de que o Direito Fiscal, como ranlO
do direito público, é também expressão. Não existindo conflito - conclui o autor -,
as normas tributárias internas não têm de resolvê-lo, antes se circunscrevem a demar-
car as fronteiras da soberania fiscal estadual 30 .

Internationales Privatrecht (IPR) , cit., cujas conclusões, porém, nem sempre podemos acom-
panhar. Veja também KNECHTLE, Basic Problems in International Fiscal Law (trad.), Deventer
1979,67 ss.

27 Cfr. BÜHLER, Internationales Steuerrecht, 21; MÓSSNER, Der Begriff, 267.


28 Cfr. ISAY, Zwischenprivatrecht und Zwischenverwaltungsrecht, 289.
29 Cfr. A. MARQUES DOS SANTOS, As normas de aplicação imediata, II, 781.
30 Cfr. Curso de Direito Fiscal, I, 152.
Título 11 I Capo 11 I Natureza do Direito Tributário Internacional

o equívoco desta observação reside, porém, em entender que o objeto das nor-
mas de conflitos consiste na resolução de um "conflito internacional de competên-
cias", orientação hoje superada pela doutrina e em face da qual nem sequer as normas
do Direito Internacional Privado revestiriam aquela natureza. O Direito Público In-
ternacional (e dentro dele o Direito Tributário Internacional) respeita a um conflito
de leis precisamente nos mesmos termos que o Direito Internacional Privado, con-
flito este que constitui o pressuposto e fundamento das respectivas regras. Como
ensina ISABEL DE MAGALHÃES COLLAÇO, "a norma de Direito Internacional Privado
(tal como a de Direito Tributário Internacional, acrescentamos nós) pressupõe a
existência de ordenamentos jurídicos autônomos, dotados de vigência própria, para
além do ordenamento em que ela mesma se insere; pressupõe, como afirma BETTI,
senão um 'conflito' de leis num sentido jurídico preciso, ao menos um 'concurso' de
ordenamentos. A norma de conflitos não pode realmente conceber-se num mundo
dominado em exclusivo pela ordem jurídica estadual a que pertence ... "31.
A pluralidade de ordenamentos estaduais autônomos, bem como o seu poten-
cial concurso, é o pressuposto de toda e qualquer norma de conflitos, seja de direito
público ou privado. E daí a admissibilidade de um verdadeiro "direito público de
conflitos" (o offentliches KJlllisionsrecht de NIEDERER) ao lado do direito de conflitos
em matéria privada. Uma coisa, porém, é reconhecer a existência de um verdadeiro
conflito ou concurso de leis; outra - bem distinta - é reconhecer a admissibilidade de
um de entre os vários processos teoricamente admissíveis de solução de tais conflitos,
consistente na remissão para ordenamentos estrangeiros.
Precisamente porque a aplicabilidade da norma tributária tem por consequência
necessária a criação de um direito subjetivo público para o Estado da ordem jurídica a
que essa lei pertence, a norma de conflitos nunca elege uma lei estrangeira para regu-
lar a questão na ordem interna. Não - repita-se - porque a aplicação da lei estrangeira
ofenda, em si mesma, a soberania do Estado, mas porque esta fica inegavelmente
afetada pelo exercício no seu território da pretensão patrimonial de direito público
que daquela lei inexoravelmente decorre 32 . E daí o caráter exclusivamente unilateral
das normas tributárias de conflitos (einseitige Kollisionsnormen).
Como ressalta MOURA RAMos, "o esforço mais consequente de fundamentação
desta posição fica a dever-se a KARL NEUMEYER. O ponto de partida da tese deste
Autor é o reconhecimento da necessidade dos Estados de estabelecer limites à apli-
cabilidade das ordens jurídicas respectivas, o que resultaria da existência de ordens
jurídicas criadas pelos Estados para vigorar no seu território. Só que, enquanto no
domínio do direito civil, o Estado, para além de delimitar a competência do sistema
respectivo, designa qual a ordem jurídica a que se hão-de ir buscar as soluções ma-

31 Cfr. Direito Internacional Privado, lI, 71 e 72. Sobre a possibilidade de conflitos em matéria
de Direito Público, cfr. PÉREz-BEVIÁ, La aplicación dei Derecho Publico extranjero, Madrid
1989,52 ss.; JosÉ DE OLIVEIRA ASCENSÃO, O Direito. Introdução e Teoria Geral, SOL
32 Cfr. KWGE, Das deutsche Infernationale Steuerrecht, 3.
Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

teriais de regulamentação nos casos em que ele próprio não pretenda aplicar a sua
ordenação, já no domínio do direito público uma tal dupla função dos comandos de-
limitadores se revelaria impossível, e isto porque os comandos deste sector do direito
conteriam necessariamente a relacionação com um Estado determinado, não poden-
do pois um outro Estado pretender interferir com o respectivo domínio de aplicação,
pois isso contraria regras elementares do Direito Internacional Público. Por isso as
regras delimitadoras do âmbito de aplicação espacial do direito público seriam uni-
laterais, ao passo que, no domínio do direito privado, elas já seriam bilaterais, por
desempenharem a dupla função referida: para além de circunscreverem o âmbito do
próprio sistema, determinam o campo de aplicação dos demais"33.
A unilateralidade essencial à norma tributária de conflitos resulta, assim, direta-
mente do princípio da territorialidade entendido em sentido formal 34 .
Mas, como com todo o rigor observou NIBOYET, o caráter exclusivamente uni-
lateral da norma tributária de conflitos não prejudica a sua natureza de verdadeira
norma de conflitos, pois nela se verifica o seu elemento mais característico: a regula-
mentação da questão internacional por um processo indireto e que, no caso, se traduz
em definir as condições de aplicabilidade das normas materiais tributárias internas,
ou seja, delimitando o seu âmbito de incidência no espaç035.
Como diz ISABEL DE MAGALHÃES COLLAÇO, em observações que igualmente se
ajustam ao Direito Tributário Internacional, "o que há de verdadeiramente caracterís-
tico na norma de conflitos e a distingue dos restantes processos de regular as relações
privadas internacionais consiste em ela ser uma norma de regulamentação indirecta,
uma norma que regula relações interindividuais através da designação de dada ordem
local, de entre aquelas com que a questão está conexa, como competente para fornecer
a respectiva regulamentação material. O que caracteriza a norma de conflitos de leis
é assim o facto de ela lançar uma ponte entre certo tipo de questão e dada ordem de-
signada competente (Pontifex, chamou RAAPE ao legislador do Direito Internacional
Privado). Mas há mais. A norma de conflitos, sendo uma norma indirecta, caracteriza-
se ainda, dentro desta classe de normas, por operar uma remissão - como quer que se
construa teoricamente este fenômeno - para dada ordem jurídica local, seja ela sempre
uma ordem estrangeira, ou também eventualmente a própria ordem estadual interna36".

33 Cfr. R. M. MOURA RAMos, Da lei aplicável, 274-275.


34 Cfr. supra, IR
35 Cfr. NIBOYET, Traité de Droit International Privé, IV, Paris 1947, 11655. e VI, vaI. I, 1949,
12455.; ID., Les doubles impositions au point de vue juridique, Recueil des Cours 31 (1930-
I), 5 (52-57); NEUMEYER, Internationales Verwaltungsrecht, IV, Zurique(Leipzig 1936, 179;
ERNST ISAY, Internationales Finanzrecht, 355. Cfr. também K. EBLING, Unilaterale Maflnah-
men gegen die internationale Doppelbesteuerung bei den Steuern vom Ertrag, Mainz 1970, pas-
sim. Certo setor da doutrina sustenta que as normas de colisão unilaterais em matéria de
direito público revestem necessariamente a natureza de normas materiais: cfr. VOGEL, Der
riiumlicheAnwendungsbereich, 27655.,31055.; MÓSSNER, Der Begriff, 271.
36 Cfr. Lições, I, 282; ID., Da qualificação, 19.
....._ _ _ _ _ . Título 11 I Capo 11 I Natureza do Direito Tributário Internacional

Como bem salientou MbsSNER, o caráter unilateral da norma de colisão não


significa a inaplicabilidade por natureza do direito estrangeiro 37 •
Quando dizemos que no Direito Tributário Internacional não ocorre a aplica-
ção da lei estrangeira através de processo similar ao da choice oflaw do Direito Inter-
nacional Privado, referimo-nos à aplicação da lei tributária material estrangeira, ou
seja, das normas que regulam e preveem a constituição de obrigações tributárias de
que sejam credores Estados estrangeiros.
Mas isto não significa que os órgãos nacionais de aplicação do direito não devam,
por vezes, recorrer a leis estrangeiras para o efeito de caracterizar os pressupostos de
aplicação de certas normas tributárias internacionais. Assim, por exemplo, quando
se aplica a norma convencional que define que, no caso de uma pessoa ser residente
em dois Estados, prevalece a residência de um deles, a questão prévia de saber se essa
mesma pessoa é também residente de país estrangeiro deve ser julgada à luz do direito
estrangeiro. Outro exemplo: quando da aplicação da norma convencional que estabe-
lece que os rendimentos imobiliários são apenas tributáveis no país onde tais bens se
localizam, a qualificação do bem como imobiliário deve ser efetuada à luz da lei es-
trangeira do país da respectiva localização. E os exemplos poderiam multiplicar-se 38•
Em todos estes casos, porém, a aplicação da lei estrangeira nunca concerne à
questão de fundo referente à obrigação tributária em si mesma considerada, mas a
uma questão prévia (Voifrage). Apesar disso, ERNsT ISAY considera que as normas em
causa revestem, tal como no Direito Internacional Privado, a natureza de normas
bilaterais (zweiseitige Kf)llisionsnormenJ3 9 , muito embora, em nossa opinião, esta bila-
teralidade deva ser entendida em termos de bilateralidade enfraquecida quando com-
parada com a bilateralidade típica das normas de conflitos, pois jamais tem o condão
de determinar a aplicação direta da lei estrangeira à questão de fund0 40 •

D) Caráter internacional
A discussão que se trava quanto à questão de saber se as normas de Direito Tri-
butário Internacional têm verdadeira natureza internacional circunscreve-se, obvia-
mente, às normas tributárias de fonte interna (de conflitos, materiais ou instrumen-
tais), pois a natureza internacional das fontes externas, como as convenções contra a
dupla tributação, jamais foi contestada. E, dentro das fontes internas, concentraram

37 Cfr. Der Begriff, 272.


38 Cfr. infra, 15755.
39 Cfr. ERNST ISAY, Zwischenprivatrecht und Zwischenverwaltungsrecht, 289 (298).
40 Sobre a aplicabilidade do Direito Público estrangeiro, ver o excelente en5aio de J. A. PÉREZ-
BEVIÁ, La aplicacion deI Derecho Publico extranjero, e R. M. MOURA RAMos, Da lei aplicável ao
contrato de trabalho internacional, 267 55.; A. MARQUES DOS SANTOS, As normas de aplicação
imediata, lI, 785 55.
Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

a atenção dos autores as normas de delimitação, pela afinidade que têm com as regras
de conflitos do Direito Internacional Privado.
Para a corrente de pensamento segundo a qual a função da norma tributária de
conflitos, embora se traduza imediatamente na disciplina indireta das relações tribu-
tárias entre um Estado e um ou mais sujeitos, em virtude de uma situação jurídica
conexa por qualquer dos seus elementos com mais do que uma ordem tributária,
resolve-se mediatamente na disciplina de um conflito de soberanias ou, se se preferir,
dos interesses públicos decorrentes dos poderes soberanos dos Estados - então pare-
ce inegável a sua natureza internacional41 •
A natureza internacional do direito de conflitos, em matéria tributária, decor-
reria, pois, com toda a clareza da sua função mediata) uma vez que a delimitação de
competências legislativas, a disciplina de conflitos de soberania ou de interesses pú-
blicos estaduais, inscreve-se por certo no domínio das relações entre Estados (Zwis-
chensteuerrecht) domínio em que todos estão de acordo em reconhecer natureza in-
ternacional, seja qual for a orientação - monista ou dualista - perfilhada.
Mas, se inegavelmente internacional quanto ao objeto e à função mediata, já
maiores dúvidas se podem suscitar quanto à sua função imediata, precisamente aque-
la que mais incisivamente determinará a sua natureza.
Traduzindo-se esta função na disciplina indireta de relações tributárias entre Es-
tados e indivíduos originadas em situações da vida conexas com mais do que uma
ordem tributária, a natureza das normas de delimitação será declaradamente interna)
para todos quantos perfIlhem uma concepção dualista das relações entre direito inter-
nacional e direito interno42 • Com efeito, para todos quantos entendem que o Direito
Internacional, por natureza, é o direito regulador das relações entre Estados, o Estado,
ao definir pela norma tributária de conflitos as situações a que pretende aplicar as suas
leis materiais, está a desempenhar uma função que lhe é própria e que imprime caráter
interno às normas por que essa função se exerce43 • Na lógica desta orientação, não
poderia, pois, falar-se em questões tributárias internacionais ou em Direito Tributário
Internacional, mas tão só em questões tributárias com "elementos de estraneidade" ou
em Direito Tributário externo - o Auflensteuerrecht de que fala BÜHLER44- , reservando

41 Cfr. ISAY, Internatíonales Finanzrecht) passim; HERZFELD, Probleme des Internatíonalen Steuer-
rechts unter besonderer Berücksichtigung des Territorialitiitsprinzips und des Qualifikatwnsprob-
lems, Heidelberg 1932, passim; LIPPERT, Handbuch des Internatwnalen Finanzrechts) Viena
1929; E. FRITSCH, Das Internationale Steuerrecht, Viena 1964; UDINA, II Diritto Internazi-
onale Tributario, Pádua 1949; GARELLI, Diritto Internazwnale Tributaria, Turim 1899. Cfr.
sobre este tema, ISABEL DE MAGALHÃES COLLAÇO, Lições, I, 290 ss. e II, 62.
42 Cfr. HEINZ WAGNER, Monimus und Dualismus: eine methodenkritische Betrachtung zum
Theorienstreit, Archiv des offintlichen Rechts 89 (1964), 212 (212 ss.); ISABEL DE MAGALHÁEs
COLLAÇO, Lições, I, 297 ss.
43 Cfr. D. ANZlLOTI1, Corso di Diritto Internazwnale, voi. III, Roma 1928, 50 ss.
44 Cfr. BÜHLER, Internatwnales Steuerrecht (IStR) und Internatwnales Privatrecht (IPR), 17 ss.
Veja-se também Armo SCHULZE-BRACHMAN,Auflensteuerrecht, Handworterbuch des Steuer-
-=====_ Título" I Capo " I Natureza do Direito Tributário Internacional

a expressão Direito Tributário Internacional em sentido técnico às normas de fonte


internacional - o Doppelbesteuerungsrecht a que se refere SCHAUMBURG45 •
Não é, obviamente, possível formular aqui a crítica dos pressupostos em que
assenta esta orientação 46 . Bastará apenas sublinhar - na esteira de LORENZ VON STEIN,
de VON STACHAU e VON MOHL - que, para quem parta de uma noção diversa de Direi-
to Internacional, entendido como o direito próprio da sociedade internacional (Lehre
von der internationalen Gemeinschaft), esta natureza não poderá ser negada ao Direito
Tributário de conflitos 47 •
Dentro desta perspectiva se tem distinguido, com toda a nitidez, o campo das
relações privadas internacionais - objeto do Direito Internacional Privado - do ter-
reno das relações entre os Estados - conteúdo do Direito Internacional Público.
Mas, nesta classificação, a doutrina tem, por vezes, omitido um terceiro setor, o das
relações entre Estados e indivíduos, relações que ainda se integram na sociedade in-
ternacional, entendida como o complexo das relações que se verificam por sobre as
fronteiras dos Estados (cross-border situations).
Ora, as relações entre os Estados e os indivíduos que se estabelecem em virtude
de situações tributárias internacionais têm, segundo o mesmo critério, natureza inter-
nacional e constituem o objeto do Direito Tributário de conflitos, como bem observou
LIPPEru48 • Assim, a par do Direito Internacional Público e do Direito Internacional Pri-
vado, surge o Direito Tributário Internacional ou, como outros preferem, o Direito In-
ternacional Tributário, que, de harmonia com opinião dominante, é capítulo do Direito
Administrativo Internacional e que reveste natureza similar à do Direito Penal Interna-
cional49 - ou seja, a de um djfentliches KoUisionsrecht, para usar a expressão de NIEDERER.

rechts und der Steuerwissenschaften I, 102. No mesmo sentido, M. CHRÉTIEN,A la recherche


du Droit International Fiscal Commun, Paris 1955, 1.

45 Cfr. SCHAUMBURG, Internationa/.es Steuerrecht, Colônia 1993, 3 e 423, o qual, porém, consi-
dera ambos os domínios fazendo parte do Direito Tributário Internacional.
46 Que se encontra formulada, em termos de raro equilíbrio, no ensaio de VICENTE MAROTTA
RANGEL, Os conflitos entre o Direito Interno e os Tratados Internacionais, Revista da Facul-
dade de Direito da Universidade de São Paulo LXII (1967), fasc. 11 (separata).
47 "Leis de objeto internacional" chama-lhes M. CHRÉTIEN,A la recherche, 67. Cfr. KLAus Vo-
GEL, Der rdumliche Anwendungsbereich, 155. Aderem a esta qualificação, além de HERZFELD
e LIPPERT, GUGGENHEIM, Ilimposition des successions en Droit International et /.e prob/.eme de la
double imposition, Geneve 1928, 12; VAN HOORN, Unilaterale Maflnahmen gegen die Doppel-
besteuerung, 1956, 105 SS.; KNECIITLE, Basic Problems, 11; RIVIER, Droit Fiscal suisse (Le Droit
Fiscal International), Neuchatel1983, 32.
48 Cfr. LIPPERT, Handbuch des Internationalen Finanzrechts, 11-12; MbsSNER, Der BegrijJ, 277.
49 Nessa perspectiva mais ampla, o fenômeno foi encarado nas monografias de HERZFELD,
ISAY E VOGEL. Veja-se, sobre os dois conceitos (amplo e restrito) de "internacional", KLUGE,
Das deutsche Internationa/.e Steuerrecht, 1-2; A. KNECIITLE, Grundfragen, 12 SS.; SCHULZE-
BRACHMANN, Internationales Steuerrecht, Handw6rterbuch des Steuerrechts und der Steuer-
wissenschaften I, 604; ARNDT RAuPAcH, Internationales Steuerrecht in der Rechtsprechung des
Bundesfinanzhoft, Deutsche Steuer-Zeitung 1975, 388; BÜHLER, Internationa/.es Steuerrecht,
34; MbsSNER, Der BegrijJ, 275 sS.
Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Alguns autores têm distinguido, na esteira de ISAY e UDINA, o Direito Inter-


nacional Tributário do Direito Tributário Internacional, atendendo à origem a ao
objeto dos seus preceitos: enquanto o primeiro seria constituído por normas de ori-
gem internacional e tendente a regular as relações entre Estados em matéria tributá-
ria (zwischenstaatliches Steuerrecht), o segundo seria constituído por normas internas,
tendo por objetivo disciplinar questões conexas por qualquer dos seus elementos
com mais de uma ordem tributáriaS 0.
É evidente o preconceito dualista que está na origem desta distinção. Com efeito,
à luz desta visão, as normas de origem internacional nunca regulariam como tal as
questões tributárias internacionais, independentemente, portanto, da sua "transforma-
ção" em direito interno, limitando a sua eficácia a disciplinar relações interestataiss1 .
Para quem não aceitar a perspectiva dualista de encarar as relações entre direito
internacional e direito interno, também não poderá ser acolhida a distinção acima
referida, pelo menos nos termos em que é formulada. Se as normas de fonte inter-
nacional podem não só reger relações interestatais, mas também - e como tal - as
relações que intercedem entre Estados e indivíduos surgidas de situações "com ele-
mentos de estraneidade" (cross-border situations; grenzüberschreitende Sachverhalten) ,
então cumpre reconhecer que o referido critério de distinção perde a sua validade.
O Direito Tributário Internacional - definido pelo seu objeto - compreende,
pois, o complexo das normas tributárias de conflitos, quer sejam reveladas por fontes
internas, quer por fontes internacionais s2 .

§ 4° CONCLUSÕES

Em face das considerações precedentes, torna-se já possível extrair algumas con-


clusões fundamentais acerca da natureza do Direito Tributário Internacional.
Como vimos, a unidade deste ramo do Direito é dada pelo seu objeto - situa-
ções da vida tributária internacional, ou seja, situações conexas por qualquer dos seus
elementos com mais do que um ordenamento tributário.
Mas com esta homogeneidade do objeto coexiste uma heterogeneidade de na-
tureza das normas que o regulam. Heterogeneidade quanto à fonte, pois nela se
incluem tanto normas de produção internacional quanto normas de produção in-
terna. Heterogeneidade quanto à matéria, pois a par das normas substanciais rela-
tivas ao problema do âmbito de incidência das leis existem normas instrumentais
relativas ao problema do âmbito de eficácia das leis e que se integram num Direito

50 efr. VITOR FAVEIRO, Noções fundamentais, I, 622.


51 Sobre o preconceito dualista da "transformação", cfr. V MAROITA RANGEL, Os conflitos, cit.,
85 e 97 s.
52 Sobre a identidade de natureza das normas, independentemente da origem da sua fonte,
vejam-se as observações de HAROLDO V ALLADÃO, Direito Internacional Privado, 57.
""-_ _ _ _ _ •. Título 11 I Capo 11 I Natureza do Direito Tributário Internacional

de Competência Internacional das autoridades nacionais de aplicação das leis fiscais


(administrativas ou judiciais) ou num Direito regulador da relevância de atos públi-
cos estrangeiros. Heterogeneidade quanto à própria natureza das normas, pois ao
lado de regras materiais, que disciplinam diretamente as situações da vida tributária
internacional, existem regras indiretas, formais, que se limitam a definir o âmbito de
aplicação no espaço dos ordenamentos tributários em causa53 •
Ora, estas últimas - tanto as normas de delimitação de origem interna quanto as
normas de colisão, decorrentes dos tratados contra a dupla tributação - revestem a na-
tureza de normas de conflitos unilaterais, posto esgotarem a sua função na disciplina
de uma situação internacional através da remissão para um dado ordenamento apli-
cável, ainda que tal remissão jamais opere para lei estrangeira. E isto pelo processo
técnico de lançar uma "ponte" (através do elemento de conexão) entre dada questão
da vida e esse ordenamento, pelo que também o legislador do Direito Tributário
Internacional é um Pontiftx, para usar a expressão de RAAPE 54 •
Esta construção permite apreender a profunda identidade de natureza entre as
normas de delimitação (internas) e as normas de colisão (internacionais) como verda-
deiras regras de conflitos que são, permitindo assim um tratamento dogmático homo-
gêneo. Discordamos veementemente de VOGEL, quando afirma que às Grenznormen
faltaria qualquer unidade sistemática que permitisse erigi-Ias num sistema dotado de
autonomia em face das regras de direito material respectivo, por lhes faltar a "inco-
municabilidade" característica das verdadeiras regras de conflitos. Donde se seguiria
a impossibilidade de constituírem objeto de uma disciplina científica autônoma, por
lhes faltar um método próprio e um objeto de conhecimento indisputável.
Ora, ao invés, a sua natureza de regras de conflitos permite abordá-las sob a
perspectiva científica do Direito de Conflitos - e, em especial, do Direito Comum de
Conflitos, que é o Direito Internacional Privado. Embora, como atrás se viu, sejam
fundas as diferenças entre o direito de conflitos da vida privada internacional e da
vida tributária internacional, tal não obsta a que esta seja examinada com o recurso
ao portentoso arsenal científico, às poderosas ferramentas dogmáticas aperfeiçoadas
e desenvolvidas ao longo de séculos pelo Direito Internacional Privado.
Foi precisamente a ausência do recurso científico ao repositório conceitual do
Direito Internacional Privado que explica a pobreza dogmática de inúmeros estudos
de Direito Tributário Internacional, quando comparados com o grau de refinamento
e sofisticação que o Direito tributário interno já goza nos nossos dias.
Foi o não ter-se explorado adequadamente a teoria do elemento de conexão que
explica que a problemática da localização dos fatos tributáveis e sua repercussão na
determinação do âmbito de incidência das leis tenha sido relegada à condição subal-
terna de mero elemento espacial do tipo tributário. Foi ainda a ausência de recurso à
construção científica do elemento de conexão que permite, ainda hoje, a repetitiva e

53 Sobre esta tipologia de normas, vide in supra, 37 sS.


54 efr. MAGALHÃES CoLLAÇO, Lições, I, 282; ID., Da qualificação, 19.
qm I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier n._:________.....

simplória afirmação de um nebuloso e multifacetado princípio da territorialidade. E


só essa ausência explica que a análise do fenômeno da elisão fiscal internacional não
tenha sido dogmaticamente enquadrada na teoria da fraude à lei no tocante à liber-
dade de localização e deslocalização voluntária do elemento de conexão.
Foi a ausência de recurso à teoria da qualificação, elaborada no Direito Inter-
nacional Privado, que permite ainda hoje a parte da doutrina confundi-la, pura e
simplesmente, com o problema da interpretação dos tratados por via de recurso
subsidiário à lei interna dos Estados. Tem sido a omissão de recurso às teorias da
aplicabilidade do Direito Público estrangeiro e da questão prévia que ainda explica
a afirmação - decididamente inexata - que os órgãos nacionais de aplicação das leis
tributárias jamais aplicam leis estrangeiras, inclusive fiscais.
Como foi a negligência em aprofundar a teoria da devolução que fez esquecer
que a aplicabilidade de normas estrangeiras, reclamadas pelas convenções contra a
dupla tributação, pode envolver o passo intermédio de recurso a normas de conflitos
estrangeiras que apontem eventualmente para terceiros ordenamentos.
Pode, pois, concluir-se que uma das não menores consequências do reconheci-
mento de idêntica natureza de normas de conflitos às normas de delimitação e de co-
lisão do Direito Tributário Internacional está em submetê-las - como já preconizava
DALIMIER55 - ao instrumental dogmático do Direito Internacional Privado, em tudo
que com ele se não revelar incompatível.

55 Cir. Droit Fiscal Internacional français,]uris Classeur de Droit International, fase. 302 (1955).
I

TlTULOIII

As FONTES DO DIREITO TRIBUTÁRIO INTERNACIONAL


CAPÍTULO I
TRATADOS INTERNACIONAIS

SEÇÃO I
As CONVENÇÕES INTERNACIONAIS
CONTRA A DUPLA TRIBUTAÇÃO

§ 10 CONCEITO E EVOLUÇÃO

A) Evolução histórica
Dentro das fontes internacionais do Direito Tributário, os tratados ocupam lugar de
primordial relevo. De há muito, com efeito, se celebram convenções internacionais que,
versando embora essencialmente matérias de outra natureza, contemplam, acidental ou
acessoriamente, disposições tributárias: basta pensar nos acordos de comércio, nos que
visam à formação de uniões aduaneiras ou wnas de comércio livre, nos que regulam
os portos marítimos, os aeroportos, a viação rodoviária, a navegação aérea, o trânsito
e baldeação, o serviço postal, a emigração, a proteção de investimentos, a cooperação
cultural, científica ou militar, ou as convenções relativas às imunidades diplomáticas e
consulares ou ao regime fiscal das organizações internacionais e seus empregados!.
Ao lado destes, porém, surgiram tratados de conteúdo especificamente tributário,
visando a eliminar ou atenuar a dupla tributação e a evasão fiscal, ou ainda procuran-
do disciplinar a colaboração administrativa entre Estados em matéria de impostos 2 •
Estes tratados são, via de regra, tratados bilaterais. Os tratados coletivos ocu-
pam no Direito Tributário Internacional um lugar decididamente secundári03 .

1 Sobre estes tratados, principalmente relevantes em matéria aduaneira, cfr. M. CHRÉTIEN,A la


recherche du Droit International Fiscal Commun, Paris 1955, 151 ss.; BORIS GOMBAC, Les Zones
Franches en Europe, Bruxelas 1991.
2 BÜHLER, Les accords internationaux concernant la double imposition et l'tfvasion fiscale, Récueil
des Cours I (1936),437; VICTOR UCKMAR, I trattati internazionali in materia tributaria, in
In (org.), Corso di Diritto Tributaria Internazionale, Pádua 1999, 73.
3 Todavia, alguns exemplos merecem referência especial: (i) Conven5ão celebrada em 6 de
abril de 1922, entre os países da antiga monarquia austro-húngara (Austria, Hungria, Itália,
Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Com os tratados bilaterais fiscais, não devem confundir-se as convenções-tipo) que


se limitam a traçar um modelo que as partes deverão seguir, como é o caso dos "Mo-
delos de convenção destinados a evitar as duplas tributações", elaborados pela Orga-
nização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) em 1963 (revisto
em 1977, 1992, 1995, 1997,2000,2005 e 2008) e em 1966 (revisto em 1982), res-
pectivamente para os impostos sobre o rendimento e o capital e para o imposto sobre
sucessões e doações4 • Tal figura reveste a natureza jurídica de mera recomendaçãoS.
É relativamente recente o movimento no sentido da celebração de tratados so-
bre a dupla tributação; e o fato não é de estranhar se se atender ao predomínio duran-
te muito tempo exercido pelas formas imobiliárias da riqueza e à menor intensidade
das relações econômicas internacionais, o que determinava uma reduzida frequência
de casos em que a mesma manifestação de riqueza se encontrava submetida a mais
do que um ordenamento tributário.
Só a partir da la Guerra Mundial se começam, na verdade, a estipular conven-
ções tendentes a eliminar duplas tributações entre países europeus, sob os auspícios
da Liga das Nações. O Tratado entre a Alemanha e a Itália, de 1925, foi o primeiro
de uma longa série que o tomou por modelo (cerca de 20 tratados até ao início da 2 a
Guerra Mundial)6. A Liga das Nações desenvolveu notável trabalho precursor nesta

Polônia, Romênia e Iugoslávia), que não chegou a ter aplicação prática; (ii) Convenção de
Brazaville, de 15 de outubro de 1957 (Chade, Gabão, República do Congo e República
Centro-Mricana); (iii) Convenção geral de cooperação fiscal entre os Estados-membros da
Organização Comum Mricana, Malgache e das Maurícias (Fort Lamy), de 29 de janeiro de
1971, extinta em 1985; (iv) Convenção do Grupo Andino, de 16 de novembro de 1971
(Bolívia, Colômbia, Equador, Peru, Venezuela); (v) Convenção entre os Estados do Con-
selho da União Econômica Árabe, Cairo, 3 de dezembro de 1973 (Jordânia, Sudão, Síria,
Iraque, Koweit, Egito e Iémene); (vi) Convenção da Comunidade Econômica dos Países do
Oeste da África (ECOWAS, Benin, Gâmbia, Gana, Guiné, Guiné Bissau, Costa do Marfim,
Libéria, Mali, Mauritânia, Níger, Nigéria, Senegal, Serra Leoa, Togo e Burkina Fasso; (vii)
Convenção de Miskolade, 27 de maio de 1977 (Hungria, República Democrática Alemã,
Mongólia, Romênia, Tchecoslováquia, União Soviética, Polônia); (viii) Convenção de Ulan-
Bator, de 19 de maio de 1978, entre os signatários da precedente. Pela importância das
economias envolvidas, merece referência especial o tratado multilateral em matéria de im-
posto sobre a renda entre a Dinamarca, Noruega, Suécia, Finlândia e Islândia - Convenção
Nórdica - (celebrado em 1984 e revisto em 1987 e 1989): cfr. N. MATISON, Is the Multi-
lateral Convention a Solution for the Future? Comments with Reflections on the Nordic Experi-
ence, Intertax 1985, 212. Sobre convenções multilaterais, ver M. PIRES, Da dupla tributação
jurídica internacional sobre o rendimento, Lisboa 1984, 480 S5.

4 Veja-se o Modelo de Convenção de dupla tributação em matéria de sucessões e doações e o


relatório do Comitê dos Assuntos Fiscais da OCDE, de 1982: CTF 357 (1990), 89 e 358
(1990),220.
5 Cfr. BÜHLER, Principios de Derecho Internacional Tributario (trad.), Madrid 1968, 51 ss. e 69; K.
VOGEL, OnDouble Taxation Conventions (trad.), Deventer 1997 (cit. Double Taxation) , 17-18.
6 Cfr. SELIGMAN, La double imposition et la coopération fiscale internationale, Récueil des Cours
20 (192 7-V), 463; MITCHELL B. CARROL, La prévéntion de la double imposition et de t>évasion
Título 111 I Capo I I Tratados Internacionais I (SI!)

matéria sob a presidência de MrrcHELL B. CARROLL. Um primeiro Draft Model de


tratado foi elaborado em 1928 e amplamente remodelado no Modelo de Convenção
Bilateral aprovado no México em 1943 e, posteriormente, pelo Modelo de Londres
de 1946.
A partir da 2 a Guerra Mundial, o movimento intensifica-se e são celebradas
numerosas convenções, agora com predomínio para os países anglo-saxônicos, já
em virtude da internacionalização progressiva da economia norte-americana, no âm-
bito das relações entre a Inglaterra e os países do Commonwealth. A corrente de
investimentos internacionais para um e outro lado do Atlântico e o movimento de
integração econômica europeia, no quadro de uma política mundial de liberalização
do comércio, conduziram à aceleração do fenômeno, impulsionado pela Câmara de
Comércio Internacional, e deram origem à criação do Comitê Fiscal da OCD E (a que
sucedeu o Comitê de Assuntos Fiscais), ao qual se deve a elaboração das Draft Conven-
tions atrás referidas. Por seu turno, a Comunidade Econômica Europeia e a Associa-
ção Europeia de Comércio Livre prepararam a celebração de tratados multilaterais a
serem subscritos pelos seus respectivos membros 7 •
A tendência no sentido da atenuação, por via convencional, das duplas tributa-
ções não se tem circunscrito ao mundo industrializado. Também os países em vias de
desenvolvimento têm celebrado convenções entre si e com os países desenvolvidos,
estas últimas objeto de estudos especiais pela Organização das Nações Unidas, que
culminaram na elaboração da Convenção-Modelo de 1980, reformulada em 2006
(The UN Model) em matéria de impostos sobre o rendimento e o capitaIS.
N a verdade, os trabalhos do "Grupo ad hoc de Peritos em Convenções fiscais" da
Organização das Nações Unidas tiveram como pano de fundo a crítica generalizada,
por parte dos países menos desenvolvidos, no sentido de que o Modelo OCDE, em-
bora adequado aos interesses recíprocos dos países industrializados, já se não ajustava
às características de desigualdade de nível de progresso econômico nas relações ente
o mundo industrializado e os países menos desenvolvidos.

fiscale. Vingt ans de progres sous les auspices de la Societé des Nations, Genêve 1939; COLARUSSO,
Le doppic imposizioni nei rapporti internazionali, Pádua 1930,47.

7 Cfr. a exposição detalhada desta evolução em ALEGRIA BoRRAs, La doble imposición: problemas
juridico-internacionales, Madrid 1974, 109 e 163; M. PIRES, Da dupla tributaçÍÚJ, 183 ss.; FRAN-
CISCO NEVES DORNELLES, A dupla tributaçÍÚJ internacional da renda, Rio de Janeiro 1979,27
ss.; JEAN-CLAUDE MARTINEZ, Les conventions de double imposition, Paris 1986; VITOR FAVEIRO,
Noções fondamentais de Direito Fiscal português, I, Coimbra 1984, 645 ss.; GARBARlNO, La tas-
sazione dei reddito tranmazionale, Pádua 1990, 16 SS.; AmÔNIO DE MOURA BORGES, Convenções
sobre dupla tributaçÍÚJ internacional, Teresina/São Paulo 1992, 111 55. Para uma apreciação geral
desta evolução, ver JAN CHRISTIAANSE, Recentes progressos no Direito Tributário Internacio-
nal, in Estudos em homenagem a G. DE ULHÔA CANTO, São Paulo 1988,428 (428 ss.).
8 Cfr. ONU, Convenções fiscais entre países desenvolvidos e países em via de desenvolvimento (trad.
port.) , Lisboa 1970; ID., Manual for the Negotiation ofBilateral Tax Treaties between Deveioped
and Deveioping Countrics, Nova York 1979,
f.ID I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Estes últimos advogam o reforço do princípio da fonte, em relação ao princípio


da residência, reforço que se refletiria no alargamento da noção de estabelecimento
permanente, na aceitação mais ampla do princípio da força atrativa, na maior flexi-
bilidade quanto às alíquotas aplicáveis pelo Estado da fonte e no alargamento dos
poderes tributários deste último em matéria de lucros de empresas de navegação, de
serviços independentes e de ganhos de capital9 .
Neste contexto se inseria o projeto de Convenção de Cooperação Fiscal, elabo-
rado em 29 de janeiro de 1971, no âmbito da OCAM (CommonAfrican) Malgach
andMauricienne 0'0anisation) , que foi extinto em 1985.
E nesta mesma linha de orientação se coloca a importante Decisão nO 40, de
novembro de 1971, da Comissão do Grupo Andino - uma sub-região da ALALC,
que abrange o Chile, a Colômbia, o Peru, a Venezuela, a Bolívia e o Equador -, a
qual constitui um dos mais firmes documentos em defesa do princípio da fonte. A
mencionada Decisão nO 40 aprovou dois textos distintos: uma convenção para evitar
a dupla tributação entre os países-membros, que oferece a peculiaridade do seu ca-
ráter multilateral; e uma convenção-modelo para evitar a dupla tributação entre um
país-membro e um país situado fora da sub-região 1o •
Refira-se, enfim, a existência de um Modelo de Convenção contra a dupla tri-
butação intra-asiático, assinado em 1987 pelos membros da Associação das Nações
do Sudeste Asiático (ASEAN).

9 Cfr. JosÉ DANIEL DINIZ, Acordos para evitar a dupla tributação entre países desenvolvidos e
países em desenvolvimento, Projeção 1-8 (1976), 38 (38 ss.); International Tax Review (se-
tembro de 1990), 31 ss.; FRANCISCO NEVES DORNELLES, O modelo da ONU para eliminar
a dupla tributação da renda e os países em desenvolvimento, in Estudos em homenagem a G.
DE ULH6A CANTO, São Paulo 1988, 195 (195 ss.); A,'lTÔNIO DE MOURA BORGES, Convenções
sobre dupla tributação internacional entre estados desenvolvidos e estados em desenvolvi-
mento, RDDT 8 (1996), 21; K. VOGEL, Importância do Direito Tributário Internacional
para os países em desenvolvimento, in Estudos em homenagem a G. DE ULH6A CANTO, São
Paulo 1988,470; MOURA BORGES, Convenções, cit., 143 ss.; ALFREDO ESCRIBANO MARTÍNEZ,
Los trabajos de la ONU y de la OCDE en materia fiscal, in XX Semana de Estudios de Derecho
Financiero, Madrid 1973,285; ROQUE GARCIA MULLL'l, Tratados impositivos entre países desar-
rollados y países en desarrollo, RDT 23/24 (1983), 26.
10 Cfr. Fiscal Harmonization in theAndean Countries, Amsterdam 1975, pubI. pelo International
Buteau ofFiscal Documentation, com estudos de ATCHABAHIAN, V ALDÉS CoSTA, PIEDRABUENA
RrCHARD, FRANÇOIS GENDRE, HANSMAN e SIRn.LE, e a bibliografia especializada citada naque-
le volume, 117; V ALDÉS COSTA, La experiencia latinoamericana en la imposición internacio-
nal, in ID., Estudios de derecho tributario latinoamericano, Montevideo 1982, 283; ID., Estudios
de derecho tributario internacional, Montevideo 1978, 13 ss.; DORNELLES, A dupla tributação,
69 ss.; CARMEN AnELA LÓI'EZ DE LA ROCHA, Territorialidad y e!usión de impuestos, RDT
5 (1978), 35; CARLOS ARAuz y ARAuz DE ROBLES, La empresa multinacional a la luz del
pacto andino, in XXI Semana de Estudios de Derecho Financiero, Madrid 1974, 591; CARLOS
L. DENTONE, Consideraciones sobre el problema planteado por la asistencia técnica en el
seno de los países integrantes de la ALALC,DRT 3 (1978),245. J. V. TROYA JARAMILLO, La
fiscalidad internacional en la comunidad anclina, in VICTOR UCKMAR (org.), Corso di Diritto
Tributaria Internazionale, Pádua 1999, 805.
Título 111 I Capo I I Tratados Internacionais

Certos países adotaram projetos de Modelo para servirem de orientação em fu-


turas negociações: é o caso dos Estados Unidos (The 2006 U S. Model) e da Holanda
(The 1987 Netherlands Model) li.

B) A Convenção Modelo da OCDE relativa a impostos sobre a renda e o capital

O fato de a generalidade das convenções celebradas pelo Brasil obedecerem, na


suas linhas mestras, ao modelo de Convenção da OCDE justifica que se lhe faça uma
referência especial.
Esta tem a sua origem nos trabalhos desenvolvidos pelo Comitê Fiscal da Orga-
nização Europeia de Cooperação Econômica (OECE), encarregado de apresentar um
projeto de convenção destinado a eliminar as duplas tributações sobre o rendimento e o
patrimônio. Este mandato foi confirmado quando da criação, em 1961, da Organização
de Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), que substituiu a primeira.
Em 1963, foi finalmente divulgado o Projeto de Convenção (Draft Convention)
e respectivos comentários interpretativos, ambos revistos em 1977 e objeto de "re-
comendação" pelo Conselho daquela Organização (de 11 de abril de 1977) (Model
Convention) .
O trabalho entretanto desenvolvido pelo Comitê Fiscal conduziu à publicação,
em 1992, de um novo Modelo de Convenção e respectivos comentários (Model Tax
Convention), o qual- ao contrário das versões anteriores - pretende ter um caráter
evolutivo, sujeito a revisões periódicas (on going revision process). Após terem sido
efetuadas alterações em 1994, 1995, 1997, 2000, 2003 e 2005, a versão atualizada
do Modelo data de junho de 2008.
Salvo referência expressa em contrário, é a esta nova versão e seus comentários
que nos reportamos ao longo desta obra I2 •

11 K. VAN R.AAD, 1963 and 1977 OECD Model Income Tax Treaties and Commentaries (2 a ed.),
Deventer/Boston 1990; ID., The Netherlands Model Income Tax Treaty, Intertax 1988, 241;
ROBERT J. PATRICK JR., A Comparison ofthe United States and OECD Model Income Tax
Conventions, Law and Policy in International Business 10-2 (1978), 613; R. DOERNBERG/K.
VAN RAAD, The 1996 U. S. Model Tax Income Convention, Haia 1997; HARRY A. SHANNON,
Die Doppelbesteuerungsabkommen der USA, Munique 1987; A. MIRAuLO, Doppia imposizione
internazionale, Milão 1990, 151 ss.; STANLEY KATz,Interpretation ofDouble Taxation Conven-
tions, CDFI LXXVlll-a (1993), 615 (619). Cfr. HELENO TÓRRES, Pluritributaçtfu internacio-
nal sobre as rendas de empresas, São Paulo 2001, 498.
12 O título da Convenção Modelo, a partir de 1992 - Model Tax Convention on Income and
Capital - não contém, como nos Modelos anteriores (1963 e 1977), nenhuma referência
específica à dupla tributação, por se ter reconhecido que a sua amplitude era maior, abran-
gendo o fenômeno da evasão fiscal, da assistência administrativa, da não discriminação, e até
(como mais recentemente) a prevenção da dupla não tributação. Cfr. supra, 30 ss. Cfr. JosÉ
MARÍA TOVILLAS MORÁN, Estudio de/Modelo de Convenio sobre Renta y Patrimonio de la OCDE
de 1992, Madrid 1996; Cfr. MICHAEL LANG, Avoidance ofdouble non-taxation, Viena 2003.
flJ I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

É importante salientar que foi decidido a possibilidade de Estados não mem-


bros da OCDE participarem na revisão sistemática do Modelo, fazendo consignar os
seus pontos de vista e ressalvas (Non Member Countries Positions - NMCP). Faremos
referência neste livro, quando oportuno, às observações formuladas pelo Brasil.
A Convenção Modelo da OCDE (tal como a das Nações Unidas) encontra-se sis-
tematizada em sete capítulos. Os capítulos I e II regulam os requisitos para a aplicação
do tratado. O capítulo III - de longe o mais importante - contém as regras de distri-
buição de competência no que concerne aos impostos sobre o rendimento, classificado
este por tipos ou classes, à semelhança do que sucede nos sistemas de tributação cedu-
lar. O capítulo IV ocupa-se das regras de distribuição de competência no que respeita
aos impostos sobre o capital. O capítulo V determina as consequências das regras dos
capítulos III e Iv, facultando aos Estados a escolha entre os métodos da isenção e da
imputação. O capítulo VI contém disposições adicionais sobre não discriminação, pro-
cedimento amigável, troca de informações e privilégios de funcionários diplomáticos e
consulares e regras sobre extensão do tratado a partes do território. EnfIm, o capítulo
VII contém disposições [mais sobre entrada em vigor e cessação do acordo.

C) As Convenções celebradas pelo Brasil

Mercê de uma política de certo modo nacionalista e protecionista e do seu re-


lativo isolamento, o Brasil manteve-se durante longos anos alheado do movimento.
A sua progressiva abertura à liberdade de comércio internacional e ao investimento
estrangeiro infletiram, porém, esta tendência13 •
É necessário distinguir as convenções gerais e as que respeitam à matéria espe-
cífIca, como a relativa à dupla tributação das empresas de navegação.
Eis a lista dos tratados gerais celebrados pelo Brasil, que seguem de perto o mo-
delo fornecido pela OCDE, vigente à data da respectiva celebração:
1) África do Sul (Decreto Legislativo nO 301/06; Decreto nO 5.922/06; Por-
taria nO 433/06);
2) Argentina (Decreto Legislativo nO 74/81; Decreto nO 87.976/82; Portaria
nO 22/83; Ato Declaratório nO 6/90);
3) Áustria (Decreto Legislativo nO 95/75; Decreto nO 78.107/76; Portaria
nO 470/76);
4) Bélgica (Decreto Legislativo nO 76/72; Decreto nO 72.542/73; Portarias
nO' 271/74 e 71/76); Decreto nO 6.332/07; Portaria nO 140/08);
5) Canadá (Decreto Legislativo nO 28/85; Decreto nO 92.318/86; Portarias
nOs 199/86 e 55/88);

13 Ver a descrição da posição do Brasil nas negociações para evitar a dupla tributação, em
FRANCISCO DORNELLES, Acordos para eliminar a dupla tributação da renda, RDT 3 (1978),
251; JosÉ DANLEL DINIZ, Acordos para evitar a dupla tributação da renda: a posição do Brasil,
Projeção 1-2 (1975), 8.
Título 111 I Capo I I Tratados Internacionais

6) Chile (Decreto Legislativo nO 331/03; Decreto nO 4.852/03; Portaria


nO 285/03);
7) China (Decreto Legislativo nO 85/92; Decreto nO 762/93);
8) Coreia (Decreto Legislativo nO 205/91 e Decreto nO 354/91; ADI nO 3/06);
9) Dinamarca (Decreto Legislativo nO 90/74; Decreto nO 75.106/74; Porta-
rias nOs 68/75 e 70/76);
10) Equador (Decreto Legislativo nO 4/86; Decreto nO 95.717/88);
11) Espanha (Decreto Legislativo nO 62/75; Decreto nO 76.975/76; Portaria
nO 45/76);
12) Filipinas (Decreto nO 241/91; Decreto Legislativo nO 198/91);
13) Finlândia (Decreto nO 2.465/98; Ato Declaratório nO 12/98; Decreto Le-
gislativo nO 35/97);
14) França (Decreto Legislativo nO 87/71; Decreto nO 70.506/72; Portarias nOs
287/72 e 20/76; Parecer Normativo nO 55/76);
15) Hungria (Decreto Legislativo nO 13/90; Decreto nO 53/91);
16) Índia (Decreto Legislativo nO 214/91; Decreto nO 510/92);
17) Israel (Decreto Legislativo nO 931/05; Decreto nO 5.576/05; Portaria
nO 1/06);
18) Itália (Decreto Legislativo nO 77/79; Decreto nO 85.985/81; Portarias nOs
203/81 e 226/84);
19) Japão (Decretos Legislativos nOs 43/67 e 69/76; Decretos nOs 61.899/67
e 81.194/78; Portaria nO 92/78; Parecer Normativo nO 38/70 e 662/71;
Parecer Normativo COSIT nO 3/95; Ato Declaratório nO 2/80);
20) Luxemburgo (Decreto Legislativo nO 78/79; Decreto nO 85.051/80; Por-
tarias nOs 413/80 e 510/85);
21) México (Decreto Legislativo nO 58/06; Decreto nO 6.000/06; Portaria nO
38/07; ADI nOs 1/07 e 22/08);
22) Noruega (Decreto Legislativo nO 50/81; Decreto nO 86.710/81; Portarias
nOS 25/82 e 227/84; Decreto Legislativo nO 4/96 (Protocolo Suplementar);
Decreto nO 2.132/97);
23) Peru (Decreto Legislativo nO 500/09; Decreto nO 7.020/09);
24) Portugal (Decreto Legislativo nO 188/01; Decreto nO 4.012/01; Portaria
nO 28/02);
25) Reino Unido dos Países Baixos (Decreto Legislativo nO 60/90; Decreto
nO 355/91);
26) República Tcheca (Decreto Legislativo nO 11/90; Decreto nO 43/91);
27) República Eslovaca (Decreto Legislativo nO 11/90 e Decreto nO 43/91);
28) Suécia (Decreto Legislativo nO 93/75; Decreto nO 77.053/76; Portarias nOS
44/76 e 5/79; Parecer Normativo nO 37/74; Ato Declaratório nO 28/78;
Troca de Notas MRE - DO 03/01/86; Decreto Legislativo nO 57/97);
29) Ucrânia (Decreto Legislativo nO 66/06; Decreto nO 5.779/06; Portaria nO
198/06).
. M Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Até a presente data l4 foi referendada pelo Congresso Nacional a Convenção


com a Rússia (Decreto Legislativo nO 376/07), mas ainda não promulgada.
Por outro lado, foram assinadas as Convenções com Trinidad e Tobago (em
23.07.08) e Venezuela (em 14.02.2005), mas ainda não referendadas.
A convenção com a Alemanha, promulgada pelo Decreto nO 76.988/76, foi de-
nunciada em 29 de dezembro de 2005 (Decreto nO 5.654/05), deixando de produzir
efeitos a partir de 1° de janeiro de 2006.
O tratado com o Paraguai (que, além da dupla tributação em matéria de im-
posto de renda, versava também sobre matéria aduaneira) chegou a ser referendado
pelo Congresso Nacional (Decreto Legislativo nO 972/03). No entanto, o mesmo
foi rejeitado, em bloco, por unanimidade, pelo Senado paraguaio em 9 de agosto de
2004, sobretudo em razão de questões alfandegárias.
As convenções contêm, por vezes, logo após o próprio texto do acordo, um
protocolo anexo, que delas faz parte integrante e que tem o mesmo valor jurídico ls .
Tais protocolos têm, em geral, por objeto, esclarecer e precisar certas disposições da
convenção, dissipando dúvidas a que podem dar origem em face da legislação interna
de um ou de ambos os Estados contratantes.
A par dos tratados gerais, o Brasil celebrou acordos especiais para evitar a du-
pla tributação das empresas de navegação marítima e aérea com o Chile (DOU de
13.8.76), Colômbia (28.6.71), Estados Unidos da América (5.3.29), Reino Unido
(DOU de 16.1.68, acordo aprovado pelo Decreto nO 6.797/09), Suíça (DOU de
10.10.56) e Venezuela (Decreto nO 86.354, de 9.9.81)16.
Até o presente momento, o Brasil não celebrou nenhuma convenção relativa
a impostos sobre sucessões e doações, nem relativa à assistência na notificação ou
cobrança de créditos tributários estrangeiros.

§ 2° O PROCEDIMENTO DE CELEBRAÇÃO DOS TRATADOS

O art. 21, inciso I, da Constituição, entrega à competência da União "manter re-


lações com Estados estrangeiros e participar de organizações internacionais". No que
concerne à celebração de tratados, convenções e atos internacionais, ela é da compe-
tência privativa do Presidente da República, mas fica sujeita a referendo do Congresso
Nacional (art. 84, inciso VIII), sendo certo que é da competência exclusiva deste "re-

14 Junho de 2010.
15 efr. K. VOGEL, Double Tax Treaties and their Interpretation, International Tax & Business
Lawyer 4 (1986), 17 e 29 (separata). •
16 Os tratados especiais sobre a matéria celebrados com a Africa do Sul, a Argentina, a Itália,
a Alemanha e a França foram revogados e substituídos pelos tratados gerais contra a dupla
tributação celebrados com estes países.
Título 111 I Capo I I Tratados Internacionais

solver definitivamente sobre tratados, acordos ou atos internacionais que acarretem


encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional" (art. 49, inciso I).
O procedimento de celebração dos tratados comporta três fases: a fase prepara-
tória ou das negociações, a fase constitutiva ou da celebração e a fase integrativa de
eficácia, ou da promulgação.
A fase preparatória ou das negociações inicia-se com a intervenção de agentes do
Poder Executivo e termina com a autenticação, ou seja, o ato pelo qual as partes
declaram concluído o processo de formulação do acordo e que tem como objetivo
prático fixar o texto que será submetido a ratificação. A autenticação pode revestir a
modalidade de rubrica (parafatura) initialling) ou de assinatura ad referendum, por
agentes munidos de Cartas de Plenos Poderes l7 •
A assinatura do tratado não cria, por si, o vínculo convencionaF8. O consen-
timento que se expressa pela assinatura reporta-se apenas à "redação do projeto con-
vencional, e é apenas prenunciativo da expressão da vontade de assumir o vínculo"19,
refletindo a mera intenção do Governo de prosseguir no procedimento de celebração
do tratado, notadamente de o submeter a referendo e a ratificação.
A fase constitutiva ou da celebração inicia-se com o referendo do Congresso N acio-
nal, o qual tem por objeto o texto autenticado e por conteúdo autorizar o Presidente
da República a ratificar o tratado. O referendo limita-se à alternativa da permissão
ou rejeição da ratificação, não sendo admissível qualquer interferência no conteúdo
do tratad020 . O referendo do Congresso Nacional reveste, assim, a natureza de uma
autorização para ratificação. A reiterada prática constitucional brasileira revela que a
forma adotada para o referendo é o decreto legislativo 21 .
Por seu turno, a ratificação é o ato unilateral pelo qual o Presidente da Repúbli-
ca, devidamente autorizado pelo Congresso Nacional, confirma um tratado e declara
que este deverá produzir os seus devidos efeitos. Constitui pois "o ato unilateral com
que o sujeito de direito internacional, signatário de um tratado, exprime definiti-
vamente, no plano internacional, sua vontade de obrigar-se"22. Caracterizado pela
liberdade que o Poder Executivo tem quanto à opção de praticá-lo ou nã0 23 , o ato

17 Veja-se, JosÉ FRANCISCO REZEK, Direito Internacional Público (2 a ed.), São Paulo 1991, 37 sS.,
40 sS., 44 S.
18 Cfr. J. F. REZEK, op. cit., 43.
19 Cfr. J. F. REZEK, ibidem.
20 À exceção, bem entendido, como observa J. F. REZEK, op. cit., 72-73, da possibilidade de
aditar ou suprimir reservas. Esta possibilidade não se traduz, porém, numa possibilidade de
interferir autonomamente no conteúdo do tratado, mas apenas num modo de condicionar a
eficácia do próprio referendo do Congresso. Com efeito, como todo ato jurídico, este pode
ser dado em termos absolutos ou condicionais - por exemplo, sujeito à condição suspensiva
de o Governo opor como reservas as restrições constantes do referendo ou de desabonar
reservas antes por ele formuladas, conforme for o caso.
21 Cfr. J. F. REZEK, op. cit., 70.
22 Cfr. J. F. REZEK, op. cit., 54.
23 Cfr. J. F. REZEK, op. cit., 55, 69. Cfr. no mesmo sentido FRANCISCO DE AsSIS MACIEL TAVARES,
Ratificação de tratados internacionais, Rio de Janeiro 2003, 44 e 79.
Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

de ratificação deve ser expresso e tem caráter formal, tomando a forma externa de
instrumento de ratificaçéÚJ, assinado pelo Presidente da República e referendado pelo
Ministro das Relações Exteriores.
A troca dos instrumentos de ratificaçiÚJ fixa o momento da entrada em vigor do
tratado na ordem jurídica internacional, pois é precisamente nesse momento que se
consuma o consensus 24 •
A terceira e última fase do procedimento de celebração dos tratados é a fase in-
tegrativa da eficácia, que abrange a promulgação e a publicação.
A promulgaçéÚJ, por decreto do Presidente da República, é o ato jurídico de na-
tureza meramente interna, pelo qual o Governo torna pública a existência de um
tratado por ele celebrado e constata o preenchimento das formalidades exigidas para
a sua conclusão. A promulgaçéÚJ está sujeita a publicaçéÚJ no Diário Oficial, produzindo
efeitos ex tunc com relação às datas previstas no tratado para a vigência deste (Parecer
Normativo CST nO 3/79)25.
Note-se, por fim, que, em matéria tributária, só o tratado é forma adequada
de vinculação externa do Estado brasileiro. Os meros acordos) acordos executivos ou
de forma simplificada ("agreements in simplified flrm") , não sujeitos a ratificação do
Presidente da República, só poderão atuar, quando muito, em matéria subtraída ao
princípio da legalidade, ou seja, em matéria estritamente regulamentar26 •

§ 3° RELAÇÕES COM A ORDEM INTERNA 27

A) O problema em geral

O problema da relevância dos tratados na ordem interna desdobra-se em duas


questões distintas: (i) a de saber quais as condições em que as normas internacionais

24 Sobre o procedimento de celebração de tratados cfr. J. F. REZEK, op. cit., 53; ARAMINTA DE
AZEVEDO MERCADANTE, Alguns aspectos do Direito Internacional Público na Constituição
Brasileira, Notícia de Direito Brasileiro 1975, 49; CELSO DE ALBUQUERQUE MELLO, Direito
Constitucional Internacional (2 a ed.), Rio de Janeiro 2003,26955.; A. P. CACHAPUZ DE ME-
DEIROS, O poder de celebrar tratados, Porto Alegre 1995, 45755.; MARIÀNGELA AruOSI, Confli-
tos entre tratados internacionais e leis internas, Rio de Janeiro/São Paulo 2000,passim; MOURA
BORGES, Convenções sobre dupla tributação internacional) Teresina/São Paulo 1992) 118 ss.;
GARBARlNO, La tassazione dei reddito transnazionale, Pádua 1990,48755.; DURANTE, Trattato
(dir. vig.), Enc. delDir. XLIV (1992),1.368 (1.375 55.).
25 Sobre a eficácia da publicação, ver MANUEL DIEZ DE VELASCO, Instituciones de Derecho Inter-
nacional Publico (9a ed.), Madrid 1991, 194.
26 Cfr. CHAYET, Les accortis en jimnc simplifiée, Annuaire Français de Droit Internationall957, 4 ss.
27 Este § foi baseado no artigo em coautoria com HELENA DE ARAÚJO LOPES XAVIER, Superiori-
dade hierárquica em relação à lei face à Constituição Federal de 1988, RDT 66 (1996), 30
ss. O texto foi alterado, em vários pontos, na atual edição deste livro, para atender a elemen-
tos doutrinários e jurisprudenciais supervenientes.
Título 111 I Capo I I Tratados Internacionais

ganham relevância, isto é, se se "incorporam" ou "transpõem" na ordem interna; e


(ii) a de determinar qual o valor hierárquico na ordem interna das normas interna-
cionais que aí ganharam relevância, ou seja, se valem na ordem interna como normas
internacionais ou como simples normas de direito intern028 •
Embora se trate de questões conceitualmente distintas, elas se encontram pro-
fundamente interligadas. Com efeito, as correntes que entendem que os tratados
internacionais valem, na ordem interna, como tal, têm como corolário lógico a res-
pectiva superioridade hierárquica, na medida em que, só podendo ser modificados,
revogados ou denunciados pelos mecanismos próprios do Direito dos Tratados, são
inatingíveis por leis internas supervenientes. Ora, é precisamente nesta "força de re-
sistência passiva" que a hierarquia consiste29 .
Ao invés, para as correntes que só admitem a vigência dos tratados internacio-
nais uma vez transformados em lei interna, a paridade hierárquica também se impõe
como corolário lógico, pois o tratado passaria a vigorar com a mesma força da lei
transformadora. Pode, todavia, admitir-se conceitualmente a existência de sistemas
que exijam uma transformação prévia e individualizada, mas inobstante confiram
força hierárquica superior à norma convencional, objeto da transformação.
Deve preliminarmente dizer-se que causa estranheza a própria discussão do pro-
blema da superioridade hierárquica das fontes internacionais de produção do direito,
tendo em vista o princípio do direito consuetudinário pacta sunt serranda, que tem
como corolário a regra consagrada no art. 27 da Convenção de Viena sobre o Direito
dos Tratados de 1969, já ratificada e promulgada, embora tardiamente, pelo Brasil30,
segundo a qual nenhum Estado pode invocar as suas normas internas para se eximir ao
cumprimento das suas obrigações internacionais. Princípio esse que, aliás, corresponde
a uma regra de senso comum, pois de pouco ou nada valeria a celebração de um tratado
se as suas disposições pudessem ser legitimamente modificadas ou revogadas por ação

28 Cfr. ISABEL DE MAGALHÃES COLLAÇO, Direito Internacional Privado, I, Lisboa 1966, 317.
29 Cfr. neste sentido JosÉ SOUTO MAIOR BORGES, Isenções em tratados internacionais de impostos
dos Estados-membros e municípios, in CELSO ANTONIO BANDEIRA DE MELLO (org.), Direito Tri-
butário. Estudos em homenagem a GeraldoAtaliba, São Paulo 1997, 176. Discordamos assim da
opinião de MARCIANO SEABRA DE GODO! quando afirma ser admissível o monismo com paridade
hierárquica entre tratado e lei. Cfr. Os tratados ou convenções internacionais para evitar a dupla
tributação e sua hierarquia normativa no Direito Brasileiro, in Luís EDUARDO SCHOUERI (org.),
Direito Tributário. Homenagem aAlcidesJm;ge Costa, vaI. ll, São Paulo 2003, 989, nota 31. Se o
tratado é recebido "como tal", apenas também como tal pode ser revogado ou modificado, ou
seja, pelo mecanismo próprio do Direito dos Tratados e não pela superveniência de lei interna.
30 O depósito do instrumento de ratificação da Convenção de Viena foi efetuado pelo Brasil
junto ao Secretário-Geral da ONU em Nova York em 25 de setembro de 2009. Como o
art. 84 da Convenção estabelece sua entrada em vigor para o Estado ratificante no trigésimo
dia após a ratificação, o Brasil está obrigado no plano internacional desde 25 de outubro de
2009. No plano interno a referida Convenção foi referendada pelo Congresso Nacional pelo
Decreto Legislativo nO 496/2009 e promulgada pelo Decreto nO 7.030, de 14 de dezembro
de 2009, pelo Presidente da República. Esta Convenção foi assinada pelo Brasil, em 23 de
maio de 1969, e submetida ao Congresso em 22 de abril de 1992.
tU$iJ Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

direta e unilateral de um dos Estados contratantes, sem obediência aos mecanismos


próprios de denúncia ou renegociação previstos no Direito Internacional Público.
A tese da paridade hierárquica entre tratado internacional e lei interna (à qual
a teoria dualista deu a explicação dogmática mais acabada) serve, evidentemente,
aos interesses dos Estados que não desejam um constrangimento duradouro à livre
expressão da sua soberania interna: quer tais Estados obedeçam a uma concepção to-
talitária do Direito (de que o século XX foi pródigo em manifestações, de inspiração
nacional-socialista ou soviética), quer tais Estados invoquem peculiaridades da sua
tradição constitucional (como os Estados Unidos e o Reino Unido), para, porven-
tura em prossecução de interesses pragmáticos de grandes potências, legitimarem o
"intentional override" dos seus compromissos internacionais31 •
Compreende-se, por isso, que no mundo contemporâneo aberto e globalizado
a derrocada das ideologias totalitárias tenha debilitado as teses dualistas (em apogeu
nos anos 1930) e conduzido a grande maioria dos Estados democráticos a acatar,
por força de disposição constitucional expressa ou de construção jurisprudencial,
a concepção monista com primado do direito internacional, até na sua forma mais
aperfeiçoada manifestada através de cláusulas gerais de recepção plena.
Como em seguida se verá, o Brasil não ficou imune à influência de ideologias
autoritárias de vários espectros políticos, mas todas convergentes à afirmação de um
"nacionalismo soberano e autárquico", se não hostil, pelos menos reservado em rela-
ção à plena supremacia do Direito Internacional.
Caberia à Constituição de 1988 - progressista, liberal e democrática - ter defi-
nitivamente sepultado a concepção dualista, não sem uma resistência tenaz de certos
setores da doutrina e da jurisprudência, inclusive das mais altas Cortes, ainda não
conformadas com a opção claramente tomada pela nova ordem constitucional32 •

a) As concepçõesgerais sobre as relações entre direito internacional


e direito interno: a querela monismo-dualismo
A existência de duas ordens jurídicas, a nacional e a internacional, e a possibili-
dade de a norma de direito internacional poder regular qualquer matéria suscitam a
questão de saber o que acontece se uma determinada questão for regulada simultane-

31 Cfr. BAKER, Double Taxation, 52 ss.


32 Como bem adverte SACHA CALMON NAVARRO COÊLHO, Tratados internacionais em matéria
tributária (perante a Constituição Federal do Brasil de 1988), RDT 59 (1992), 180 (181),
referindo-se aos "pregoeiros da prevalência da legislação interna sobre a derivada dos acor-
dos e convenções, com base no avelhantado, e no particular, deletério conceito de soberania".
Veja-se o excelente estudo de GEORGE GALINDO sobre as causas da resistência destes setores às
posições internacionalistas. Tratados internacionais de direitos humanos e constituição brasileira,
Belo Horizonte 2002, 363 ss.; SÉRGIO ANDRÊ ROCHA, Treaty override no ordenamento jurí-
dico brasileiro, São Paulo 2007; AGOSTINHO TOFFOLI TAVOLARO, Treaty Override - Tratados
x Lei interna, RDTI 8 (abr.j2008), 15.
Título 111 I Capo I I Tratados Internacionais ••

amenteJ mas em termos diversos, por uma norma interna e por uma norma interna-
cional. Poderá a eventual antinomia ser resolvida por um critério hierárquico?
Este problema consiste afinal em saber se entre a ordem jurídica nacional e in-
ternacional há ou não relações sistemáticas e, em caso afirmativo, de que tipo.
A rejeição de uma necessidade de "convivência" entre ordem jurídica nacional
e internacional conduziria à cisão da personalidade jurídica do Estado, que poderia
apresentar uma "caraJJ no exterior e outra no domínio interno, como uma bifronte
cabeça de Jano, conforme melhor lhe conviesse. Esta situação constituiria não só um
absurdo jurídico rejeitado pela consagração constitucional do Estado como ente uno,
ainda que diferenciado nas suas estruturas internas de atuação - cfr. arts. 1°, 2°, 3° e
4° da Constituição -, como possibilitaria, por exemplo, que a República Federativa do
Brasil, no plano externo, sustentasse rigorosa defesa dos direitos humanos e repudiasse
o terrorismo e o racismo - cfr. o art. 4°, incisos II e VIII, da Constituição - e, no plano
interno, violasse sistematicamente os direitos fundamentais dos seus cidadãos decor-
rentes de tratados internacionais - cfr. os §§ 2° e 3°33 do art. 5° da Constituição.
Uma tal situação é, porém, hoje, objeto de firme rejeição, a qual tem por base
não só a solidez e a maturidade secular de uma cultura de direito constitucional
assente no aperfeiçoamento e desenvolvimento dos sistemas de autovinculação do
Estado e de que o princípio da proibição do venire contra factum proprium é um mero
corolário, mas também a vocação internacionalista da República Federativa do Brasil,
proclamada no art. 4° da Constituição, em que sobrelevam os princípios da igualdade
entre os Estados, da solução pacífica dos conflitos e da cooperação entre os povos.
Vejamos, pois, como à luz da nossa ordem jurídica se coloca a querela entre as
teses que, classicamente e na ausência de normas constitucionais expressas, eram co-
locadas em abstrato: a tese dualista e a tese monista. Para a tese dualista, a diversidade
absoluta quanto às fontes, entre direito internacional e direito interno, impedia que
a norma internacional vigorasse na ordem interna, antes de ser transformada em lei
interna34 . Para a construção monista, o direito constitui uma unidade de que a ordem
interna, como a ordem internacional, constituem meras manifestações. Esta constru-
ção comportava duas variantes, consoante, em caso de conflito entre as ordens inter-
na e internacional, se desse prevalência à norma interna ou à norma internacional.

33 Já posteriormente à presente edição desta obra a Emenda Constitucional nO 45/2004 acres-


centou um § 3° ao art. 5°, segundo o qual "os tratados e convenções internacionais sobre
direitos humanos que forem aprovados em cada Casa do Congresso Nacional, em dois tur-
nos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às Emendas
Constitucionais". Na revisão legislativa, esta obra limita-nos a referenciar a disposição, não
sendo possível a sua análise aprofundada.
34 Sobre a tese dualista, desenvolvida por TRIEPEL, Vdlkerrecht und Landesrecht, 1899 (1958,
reimpressão), III ss., veja-se RrCCARDO MONACO, Diritto Internazionale Pubblico (2" ed.),
Turim 1971 (1989, reimpressão), 210 e ss., e a bibliografia aí citada; MANUEL DIEZ DE VE-
LASCO, Instituciones de Derecho Internacional Publico (9" ed.), Madrid 1991, 185 sS.
!jlD I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

No primeiro caso, falava-se de monismo com primado do direito interno; no segundo, de


monismo com primado do direito internacional 35 •
Para o monismo de direito internacional, a diversidade entre direito internacional
e direito interno não impede a coexistência e vigência autônoma, mas articulada, de
ambos, de tal modo que entre eles é possível estabelecer relações sistemáticas. A esta
luz, a repercussão na ordem jurídica interna de normas constantes de tratados faz-
se a título de vigência plena destas e não já a título da sua transformação material em
direito interno, como sustenta a solução dualista36 •

b) Os sistemas de vigência do direito internacional na ordem interna: transformação,


cláusula geral de recepção automática plena e procedimento de transposição
Como se compreende, cada uma das teses abstratas quanto ao tipo de relações
existentes entre o direito interno e o direito internacional tem em si embutida a res-
posta a dar à questão de saber como é que o direito internacional vigora na ordem
interna dos Estados.
Assim, como se disse já, para os dualistas há uma rejeição absoluta, por parte
do direito interno, quanto à vigência do direito internacional na ordem interna, de
tal modo que o conteúdo de uma norma internacional só vigorará na ordem interna
se for reproduzido por uma fonte interna. Por esta razão, a norma internacional não
vigora como tal, mas apenas como norma interna, mediante prévia transformação ou
ordem de execução 37 .

35 Cfr., por todos, GONÇALVES PEREIRA/FAUSTO DE QUADROS, Manual de Direito Internacional


Público (3 a ed.), Coimbra 1993, 81 SS., que observam que a questão abstrata tem vindo a
perder relevância, pois passou a receber solução expressa pelo direito internacional conven-
cional e pelos textos constitucionais. Na ausência destes, a opção por uma ou outra posição
andava intimamente ligada à posição que se houvesse assumido quanto ao fundamento do
direito internacional. Assim, os dualistas ou monistas com primado do direito interno são
voluntaristas. Já os monistas com primado do direito internacional têm uma posição antivo·
luntarista (normativistas, sociologistas, jusnaturalistas).
36 É esta a visão mais atual do problema. Cfr. PARTSCH, Die Anwendung des Vólkerrechts im
innerstaatlichen Recht Überprüfung der Transformationslehre, in Relatórios da Deutschen
Gesellschaft for Vdlkerrecht, 1964; BERNHARDT, Bundesverfassungsgericht und vólkerrechtli-
che Vertrage, in Bundesve1fassungsgericht und Grundgesetz, II, 1976, 154 ss.; RUDOLF GEI-
GER, Grundgesetz und Vdlkerrecht, 1985, 181 ss. Cfr. entre nós, VICENTE MAROTTA RANGEL,
Os conflitos entre o Direito Interno e os tratados internacionais, Revista da Faculdade de
Direito da Universidade de São Paulo LXII (1967), fase. II (separata),passim.; MAluÂNGELA
ARJOSI, Conflitos entre os tratados internacionais e as leis internas, Rio de Janeiro 2000; MIRTÓ
FRAGA, O conflito entre tratado internacional e norma de Direito Interno, Rio de Janeiro 2001;
PATRÍCIA HENRIQUES RIBEIRO,As relações entre o Direito Internacional e o Direito Interno, Belo
Horizonte 2001; GEORGE GALINDO, Tratados internacionais de direitos humanos e constituição
brasileira, cit., 9 ss.
37 Cfr. ANDRÉ GONÇALVES PEREIRA/FAUSTO DE QUADROS, Manual de Direito Internacional
Público, 94.
Título 111 I Capo I I Tratados Internacionais

Para os monistas com primado do direito internacional, os Estados reconhecem


a plena vigência na ordem interna do direito internacional - e notadamente tam-
bém do direito internacional convencional - enquanto tal. Nos sistemas monistas
a recepção do direito internacional tanto pode ser automática, através da chamada
cláusulageral de recepção automática plena) que torna os tratados selfexecuting dotados
de eficácia direta e aplicabilidade imediata, como sucede com as normas de Direito
Comunitário na União Europeia38 , como pode ser mediata, condicionando a eficácia
dos tratados na ordem interna a atos e formalidades de direito interno, de que são
exemplos a promulgação ou a publicação, desde, porém, que o tratado seja recebido
como tal, mantendo a sua natureza própria e não se transformando em lei interna.
Para usar uma linguagem metafórica, tais formalidades teriam o significado de um
mero "visto" de entrada na ordem nacional, com funções de publicidade e de controle
prévio da própria constitucionalidade, mas não assim a de um ato de "naturalização".
Já o monismo com primado do direito interno conduz à negação pura e simples
do direito internacional - assim se identificando com os dualistas -, pois parte, tal
como estes, de uma ideia de recepção individual ou transformação material, para justi-
ficar o caráter paritário de ambos. O monismo de direito interno é uma manifestação
do voluntarismo uniestadual (de ZoRN, WENZEL e JELLINEK, e da doutrina soviética)
que vai contra a letra expressa do art. 27 da Convenção de Viena sobre o Direito dos
Tratados, de 1969, segundo o qual, como vimos, nenhum Estado pode invocar as suas
normas internas para se eximir ao cumprimento das suas obrigações internacionais.

c) O lugar das convenções internacionais na hierarquia das fontes do direito39


Questão diversa, mas que é corolário lógico da anterior, é a de saber qual o lugar
das convenções internacionais na hierarquia das fontes de direito brasileiro40 •
De acordo com a teoria dualista da transformação (Transformationslehre) 41, o Di-
reito Internacional Público convencional, depois de transformado, assumiria o grau

38 Cfr. infra, 171 ss.


39 No Reino Unido, como a Coroa não pode "produzir" direito e como o Parlamento não
participa do treaty-making power, desenvolveu-se a concepção de que os selfexecuting treaties
terão de ser objeto de umAct ofParliament: veja-se REZEK, Direito Internacional Público) cit.)
62; ANDRÉ GONÇALVES PEREIRA/FAUSTO DE QUADROS, Manual) 98 nota 1 e bibliografia aí
citada; BAKER, Double Taxation) 5255., refere que esta tradição constitucional tem legitimado
o intentional uverride de tratados por lei do Parlamento. Sobre a prática do treaty override nos
Estados Unidos, cfr. Luís EDUARDO SCHOUERI, Validade das normas internas contrárias a dis-
positivos de acordos de bitributação no direito e na prática norte-americana, RT (CDTFP)
3, (1993), 2 ss.
40 Cfr. ANDRÉ GONÇALVES PEREIRA/FAUSTO DE QUADROS, Manual) 85 sS., 94 ss. e 96.
41 Que corresponde à visão da tese dualista e do monismo com primado do direito interno:
veja-se FRITZ OSSENBÜHL, Die Quellen des Verwaltungs rechts, in HANS-UWE ERICHSEN/
WOLFGANG MARTENS (org.), Allgemeines Verwaltungsrecht (8" ed.), BerlimjNova York 1988,
63 (127).
Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

hierárquico do respectivo ato interno que operasse tal transformação, muito embora,
como se disse, seja possível conceber em tese sistemas que, apesar de exigirem uma
transformação prévia e individualizada, atribuam maior força hierárquica à norma
internacional transformada42 •
Já, porém, para a corrente monista que aceita a vigência do direito internacional
convencional, como tal, na ordem interna, seja automática, seja através de prévio
procedimento de incorporação ou transposição, a superioridade hierárquica dos tra-
tados impõe-se logicamente. É que, só podendo estes ser modificados, denunciados
ou revogados pelos mecanismos próprios do Direito dos Tratados, não são atingíveis
por leis internas supervenientes, em relação às quais opõem uma "força de resistência
passiva", que é da essência da primazia de aplicação.

B) A doutrina e a jurisprudência anteriores à Constituição de 1988

a) A doutrina

À teoria dualista da transformação aderia entre nós parte substancial da doutri-


na anterior à vigência da Constituição Federal de 1988 43 .
Em sentido contrário se pronunciava outra escola de pensamento, que represen-
tava a longa tradição da doutrina brasileira, a qual aderiu a uma visão monista, com
primado do direito internacional44 •

42 Note-se ainda que, em matéria tributária, só o tratado é forma adequada de vinculação exter-
na do Estado brasileiro. Os meros acordos, de forma simplificada (agreements in simplified flrm),
não sujeitos a ratificação do Presidente da República, só poderão atuar, quando muito, em
matéria subtraída ao princípio da legalidade, ou seja, em matéria estritamente regulamentar:
Cfr. CHAYET, Les accords en forme simplifiée, Annuaire Français de Droit International1957,
4 ss.
43 Cfr. LUIS DA GAMA E SILVA, A Ordem Pública em Direito Internacional Privado, São Paulo
1944. No Direito Tributário, sustentaram a equivalência entre tratado e lei, admitindo a
revogabilidade do primeiro pela segunda, GERALDO ATALIBA, Apontamentos de Ciência das
Finanças, Direito Financeiro e Tributário, São Paulo 1969, 110; SAMPAIO DÓRIA, Da lei tribu-
tária no tempo, São Paulo 1968,41 ss.; BERNARDO RIBEIRO DE MORAES, Sistema constitucional
tributário na ConstituiçiW de 1969, São Paulo 1973, 157; VLADIMIR ROSSI LOURENÇO, Trata-
dos, convenções internacionais e tributação, RDT 37 (1986), 167, considerando o decreto
legislativo (instrumento de transformação) do mesmo nível hierárquico que a lei ordinária;
JosÉ ALFREDO BORGES, Tratado internacional em matéria tributária como fonte de direito,
RDT 27/28 (1984), 162, onde o autor, baseado numa concepção monista, com primado
do Direito Interno, chega a afirmar a inconstitucionalidade do art. 98 do Código Tributário
Nacional; JosÉ FRANCISCO REZEK, Direito dos Tratados, Rio de Janeiro 1984,464 ss.
44 Cfr. FlI.ADELFO AzEVEDO, Os tratados e os interesses privados em face do Direito Brasileiro, Bo-
letim da Sociedade Brasileira de Direito Internacional 1, 12-29; OSCAR TENORIO, Lei de IntroduçiW
ao Código Civil Brasileiro (2 a ed.), Rio de Janeiro 1955, citando CAMPOS BOTELHO P. ROCHA;
H. V ALLADÃo, Fontes de Direito Internacional Privado e conflitos entre as fontes internacio-
nais e as internas, Rcv. da Fac. de Dir. de Pelotas 1962, 46-47; Parecer da Procuradoria Geral
Título 111 I Capo I I Tratados Internacionais

MAROTIA RANGEL, defensor do primado da norma convencional refere outros


autores no mesmo sentido. Para além de ACCIOLY, eram já partidários deste entendi-
mento PEDRO LESSA, FILADELFO AzEVEDO, VICENTE RÁo e CARLOS MAxIMILIAN045 . E
nesta mesma orientação se insere ALBUQUERQUE MELLO.

b) A Jurisprudência

A jurisprudência brasileira orientou-se inicialmente no sentido de que não só


um tratado revogava as leis anteriores 46 , como também um tratado permanecia em
vigor e era aplicável, não obstante haver uma lei posterior contrária a elé7 •
A tendência subsequente da jurisprudência foi, porém, a de um "verdadeiro
retrocesso" nesta matéria48 , marcado pelo Acórdão do Supremo Tribunal Federal
proferido no Recurso Extraordinário na 80.004 (1978), em matéria de lei uniforme
sobre títulos de crédito, que decidiu que uma lei revoga o tratado anterior. Como,
porém, agudamente observa ainda ALBUQUERQUE MELLO, "a grande maioria dos vo-
tos está fundamentada em autores antigos e dualistas, como é o caso de TRIEPEL".
O referido acórdão incorre porém no equívoco, bem sublinhado por REZEK49 , de
confinar o cerne do problema a uma questão de expressão da vontade do legislador,
esquecendo que se é certo que esta se manifesta autônoma - "contra" o Executivo -
e substancialmente na aprovação de uma lei, na aprovação de um tratado ela dá-se,

da Fazenda, Revista de Direito Administrativo 55, 337; ALIOMAR BALEEIRO, Direito Tributário
Brasileiro (lO' ed.), Rio de Janeiro 1981, 411; HILDEBRANDO ACCIOLY, Manual de Direito
Internacional Público (3' ed.), São Paulo 1956,22-23; MAROTIA RANGEL, Os conflitos entre
o Direito Interno e os tratados internacionais, Revista da Faculdade de Direito da Universidade
de São Paulo LXII (1967), que refere ainda outros autores no mesmo sentido, como PEDRO
LESSA, FILADELFO AzEVEDO, VICENTE RÁo e CARLOS MAxIMILIANO; JOSÉ CARLOS FALEIRO, A
supremacia dos acordos internacionais sobre a legislação interna, in Comentários ao Código
Tributário Nacional, vaI. lII, São Paulo 1977, 71 SS. e a jurisprudência aí citada (84).

45 Vide nota 44.


46 Cfr. caso da União Federal V. Cia. Rádio Internacional do Brasil (1951; Apelação cível nO
9587), apud ALBUQUERQUE MELLO, Curso de Direito Internacional Público (9' ed.), I, Rio de
Janeiro 1992, 89.
47 Cfr. Acórdão do STF de 1914, no Pedido de Extradição nO 7, de 1913; e Acórdão do STF
na Apelação cível nO 7872, de 1943 (com base no voto de Filadelfo de Azevedo), apud CELSO
ALBUQUERQUE MELLO, Curso, 89; veja-se ainda Frr.ADELFO DE AzEVEDO, Os tratados e os
interesses privados em face do Direito brasileiro, Boletim da Sociedade Brasileira de Direito In-
ternacional 1(1945),12-29 (apud J. E REZEK, Direito Internacional Público, 106, nota 51).
48 A expressão é de ALBUQUERQUE MELLO, Curso, 90.
49 Direito Internacional Público, 106. Veja-se ainda uma interessante análise dos votos individuais
dos diversos Ministros em Luís EDUARDO SCHOUERI, Acordos de bitributação e lei interna - in-
vestimentos na llha da Madeira - Efeitos da Lei nO 9.249/95, RDDT 17 (1997), 98 S5. Cfr. ainda
GABRIEL FRANCISCO LEONARDOS, Tributação da transferência de tecnologia, Rio de Janeiro 1997,
62; MIRTÔ FRAGA, O conflito entre trataclo internacional e norma de Direito Interno, cit., 105 55.
11 I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

como atrás se viu, a título não autônomo - enquanto mero elemento do processo de
formação de uma vontade alheia e mais ampla que é a do próprio Estado e, por isso,
em articulação com a do Executivo - e em termos formais e externos.
Por outras palavras, enquanto na lei a vontade do Legislativo, enquanto órgão
do Estado, vale como parâmetro em relação aos atos do Executivo e do Judiciário, no
tratado é a vontade da União, do Estado no seu conjunto, que vale como parâmetro
da ação do conjunto dos seus órgãos legislativo, executivo e judiciário. A vontade
manifestada nos tratados não é a vontade do Legislativo, mas a vontade da própria
União enquanto tal e por isso nela participam conjuntamente Legislativo e Executi-
vo, qualquer que seja a matéria.
Assim, a par de acórdãos que reconhecem claramente a supremacia dos tratados
em relação à lei interna50 , subsistem setores da jurisprudência que continuam de cos-
tas viradas para a nova Constituiçã051 .

§ 4° A SUPERIORIDADE HIERÁRQUICA DOS TRATADOS EM RELAÇÃO


À LEI EM FACE DA CONSTITUIÇÃO DE 1988
São sete os argumentos fundamentais em que assenta a nossa tese da superiorida-
de hierárquica dos tratados em face da lei interna perante a Constituição de 1988:
(i) a Constituição Federal consagrou expressamente o sistema monista em maté-
ria de direitos e garantias (art. 5°, § 2°), o que significa que os tratados valem
na ordem interna "como tal" e não como leis internas em que se tivessem
"transformado", pelo que apenas são suscetíveis de revogação ou denúncia
pelos mecanismos próprios do direito dos tratados, pelo que são dotadas da
"resistência passiva" que é da essência da superioridade hierárquica;
(ii) os tratados internacionais em geral, tal como os tratados sobre direitos
humanos que não se enquadrem nos requisitos do § 3° do art. 5° da Cons-
tituição, têm caráter supralegislativo, mas infraconstitucional;
(iii) os Tribunais aplicam os tratados como tal e não como lei interna em que se
tivessem "transformado";
(iv) a celebração dos tratados é ato da competência conjunta do Chefe do Po-
der Executivo e do Congresso Nacional (art. 84, VIII, e art. 49, I), não
sendo portanto admissível a sua revogação, total, parcial ou denúncia por
ato exclusivo do Poder Legislativo;

50 Cfr. Acórdão do Tribunal Regional Federal da Terceira Região, de 6 de novembro de 1991,


Apelação em mandado de segurança nO 37 738-SP (900338037-6), Relatora LÚCIA FIGUEI-
REDO (relativo à prevalência do GATT), e Acórdão do Tribunal Regional Federal da Primeira
Região, de 25 de novembro de 1992, Remessa ex officio nO 90 01 16334-3-BA, Relator
TOURINHO NETO (relativo à prevalência do Acordo de Alcance Parcial nO 12 - Brasil/peru).
51 Veja-se JACOB DOLINGER, As soluções da Suprema Corte Brasileira para os conflitos entre o Di-
reito Interno e o Direito Internacional: um exercício de ecletismo, Revista Forense 343 (1996).
Título 111 I Capo I I Tratados Internacionais I @

(v) o art. 98 do Código Tributário Nacional- que é lei complementar que se


impõe ao legislador ordinário - é expresso ao estabelecer a superioridade hie-
rárquica dos tratados tributários, sendo inadmissível restringir essa superiori-
dade apenas a algumas espécies ou modalidades, não distinguidas por lei;
(vi) nem o decreto legislativo, que formaliza o referendo do Congresso Nacio-
nal, nem o decreto do Presidente da República, que formaliza a promulga-
ção, têm o alcance de transformar o tratado em lei interna.
(vii) a inexistência de uma cláusula geral de recepção automática e a conse-
quente necessidade de um procedimento de transposição condicionador
da eficácia dos tratados na ordem interna não é incompatível com a visão
monista e seus corolários enunciados nas alíneas anteriores.

A) Adoção do sistema monista pelo § 2° do art. 5°


o argumento fundamental em que se apoiava a orientação jurisprudencial fa-
vorável à paridade de tratamento hierárquico entre lei e tratado desapareceu na nova
Constituição. Aduzia ela, com efeito, "que,faltante na Constituição do Brasilgarantia
de privilégio hierárquico do tratado internacional sobre as leis do Congresso, era inevitável
que a Justiça devesse garantir a autoridade da mais recente das normas, porque pari-
tária a sua estatura no ordenamento jurídicos2 ".
A verdade, porém, é que a Constituição Federal de 1988 dispõe hoje expressa-
mente sobre a matéria.
Duas disposições de caráter especial apontam inequivocamente no sentido da
superioridade hierárquica dos tratados. Uma é a que consta do art. 178, segundo a
qual "a lei disporá sobre a ordenação dos transportes aéreos, aquáticos e terrestres,
devendo, quanto à ordenação do transporte internacional, observar os acordos firmados
pela União, atendido o princípio da reciprocidade". Outra é o art. 52 do ADCT, que
estabelece que as vedações a que se refere, em matéria de mercado financeiro, não se
aplicam às autorizações resultantes de acordos internacionais.
Ora, seria absurdo entender que o "dever de observância" ou de "aplicabilidade"
se restringisse na ordem constitucional ao setor dos transportes internacionais e ao
setor fmanceiro.
A par destas disposições de âmbito especial, uma outra de maior relevo e alcance
é a que consta do § 2° do art. 5°:

52 Observa - e bem - HAMILTON DIAS DE SOUSA que "a interpretação que resulta na conclusão
pela paridade normativa das normas dos tratados com as leis ordinárias tem por causa, a
meu ver, o fato de tais intérpretes não terem se detido na análise dos dispositivos sobre
tratados como contidos na Carta Constitucional de 1988". Cfr. Tratados internacionais -
OMC e Mercosul, RDDT 27 (1997), 34. Muito bem observa PATRÍCIA HENRIQUES RIBEIRO,
referindo-se ao § 2° do art. 5°, que "este dispositivo parece ter sido esquecido pela prática
nacional". Cfr. As relações entre o Direito Internacional e o Direito Interno) cit., 210.
r:m I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

"Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decor-
rentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacio-
nais em que a República Federativa do Brasil seja parte".
Este preceito reconhece, assim, a emergência de direitos subjetivos e garantias
individuais para os brasileiros e estrangeiros residentes no país, diretamente dos tra-
tados internacionais em que a República Federativa seja parte.
Ora, se os tratados (pelo menos os relativos a direitos e garantias) são recebidos
na ordem interna como tratados e não como leis internas, isso significa que só podem
ser celebrados, revogados ou denunciados pelos mecanismos que lhes são próprios e
não pelos mecanismos que valem para as leis internas. É precisamente nesta impossi-
bilidade de a lei ordinária interna revogar ou denunciar um tratado internacional que
consiste a "resistência" inerente à supremacia hierárquica deste último.
Tendo reconhecido a validade dos tratados, como tal, e a necessária obediência
das suas disposições por leis ordinárias, o direito brasileiro rejeitou a figura da "trans-
formação", expressa ou implícita, mediante lei que tivesse paridade hierárquica com
as demais leis ordinárias 53 •
Como já se viu, o ato de referendo do Congresso Nacional não tem a natureza
jurídica de lei de transformação ou ordem de execução. Com efeito, a fase interna do
processo de celebração do tratado, ou seja, a fase da consulta ao parlamento como
preliminar da ratificação, e a própria ratificação são anteriores à consumação do con-
sensus, e só esta assinala o nascimento do novo direito internacional convencional.
O direito brasileiro consagra, pois, a visão monista, pela qual o direito interna-
cional convencional vigora na ordem interna brasileira, na sua qualidade de direito
internacional.

B) A expressa superioridade hierárquica dos tratados em matéria de direitos egarantias

Mas o § 2° do art. 5° tem ainda um alcance mais amplo do que a simples decla-
ração de que os tratados relativos a direitos e garantias são recebidos "como tal" na
ordem nacional e não como leis internas. Com efeito, ao estabelecer que os direitos
e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e
dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República
Federativa do Brasil seja parte, revela claramente que as normas constantes dos trata-
dos internacionais prevalecem sobre as normas internas nas matérias em causa.
Na verdade, se o Estado brasileiro assegura, em nível constitucional, a vigência
de direitos e garantias decorrentes dos tratados internacionais, isso significa que ele
próprio tem o dever de conformar a sua ordem interna com o direito convencional, não
podendo, assim, emitir leis infraconstitucionais contrárias às normas daquele.

53 CELSO RIBEIRO BASTOS reconhece, e bem, a superação da tese dualista. Cfr. Comentários à
Constituição do Brasil, 2° vaI., São Paulo 1989, 396.
Título 111 I Capo I I Tratados Internacionais M:tM

A expressão segundo a qual os direitos e garantias constitucionais "não excluem"


os direitos e garantias decorrentes dos tratados significa que os tratados são veículo
adequado para a criação de normas com o status de direitos e garantias, isto é, de
normas que, sendo previstas com a finalidade de proteção de interesses essenciais do
cidadão, devem ser observadas pela legislação ordinária.
O fato de os tratados poderem ser fonte de normas com as quais as leis ordi-
nárias se devem conformar não conduz necessariamente a que lhes seja atribuída
dignidade constitucional. A esta atribuição chegaram alguns autores, apoiados na
leitura de disposição análoga da Constituição portuguesa54, bem como uma corrente
do Supremo Tribunal Federal (CELSO DE MELLO, PELuso). Mas ela se enfraqueceu
após a introdução de um novo § 3° ao art. 5° da Constituição de 1988 pela Emenda
Constitucional nO 45, de 8 de dezembro de 2004, nos termos da qual "os tratados
e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada
casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respec-
tivos membros, serão equivalentes à emendas constitucionais".

54 Comentando disposição da Constituição porruguesa similar ao § 2° do art. 5°, GONÇALVES PE-


REIRA/FAUSTO DE QUADROS afirmam: "A. C. P. ao dizer que 'os direitos fundamentais consagra·
dos na Constituição não excluem quaisquer outros constantes das regras aplicáveis do Direito
Internacional' (art. 16, § 1°) está, ainda que implicitamente, a conceder grau supraconstitu·
cional a todo o Direito Internacional dos Direitos do Homem, tanto de fonte consuetudiná-
ria como convencional. De fato, a expressão 'não excluem' não pode ter alcance meramente
quantitativo: ela tem de ser interpretada como querendo significar também que, em caso
de conflito entre as normas constitucionais e o Direito Internacional em matéria de direitos
fundamentais, será este que prevalecerá". Cfr. Manual de Direito Internacional Público, 117.
Cfr. CANÇADO TRINDADE, Tratado de Direito Internacional dos Direitos Humanos, Porto Alegre
2003; VALÉRIO DE OUVEIRA MAzzuou, Curso de Direito Internacional Público (2 a ed.), 2007,
682 ss.; FLÁVIA PIOVESAN, Direitos Hu1tUtnos e o Direito Constitucional Inte17tacional, São Paulo
1996, 82-103; BETINA GRUPPENMACHER, Tratados internacionais sobre direitos humanos e
tributação, in Luís E. SCHOUERI (coord.), Direito Tributário (homenagem a PAULO DE BARROS
CARVALHO), São Paulo 2008, 824 ss.; GEORGE GALINDO, Tratados internacionais de direitos hu-
manos e Constituição brasileira, cit.,passim, espec. 283 ss.; EUVAL DA SILVA RAMos, Os tratados
sobre direitos humanos no direito constitucional brasileiro pós-emenda constitucional 45/04,
in ALBERTO DO AMARAL JÚNIORjLILIANA JUBILUT (org.), O STF e o Direito Internacional dos Di-
reitos Humanos, São Paulo 2009,147 ss.; Luís ROBERTO BARROSO, Constituição e tratados in-
ternacionais: Alguns aspectos da relação entre direito internacional e direito interno, in C. A.
MENEZES DIREITO/A. A. CANÇADO TRINDADE/A. C. ALVES PEREIRA (coord.), N!JVas perspectivas
do direito internacional contemporâneo, Estudos em homenagem ao Professor CELSO DEALBUQUER-
QUEMEuo, Rio de Janeiro 2008, 185; CARMEN TIBÚRCIO, Fontes do direito internacional: Os
tratados e os conflitos normativos, in C. A. MENEZES DIREITO/A. A. CANÇADO TRINDADE/A.
C. ALVES PEREIRA (coord.), ibidem; OSWALDO ÜTHON DE PONTES SARAIVA FILHO, O Direito
internacional e o sistema tributário brasileiro, RFDT, nO 25, 2007, 9 ss. Veja as observações
críticas de SÉRGIO ANDRÉ ROCHA, A inserção das convenções para evitar a dupla tributação
da renda no ordenamento jurídico brasileiro, RIFP, nO 76, 2007, 238 ss. Cfr. nota 29. Cfr.
ainda AGOSTINHO TAVOLARO, Treaty Override - Tratados x lei interna, RDTI, nO 8, 2008,15
ss., espec. 42-43.
fm) I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Após a referida Emenda ficou claro que apenas as normas convencionais inter-
nacionais que obedeçam cumulativamente ao requisito material de versarem sobre
"direitos humanos" e ao requisito formal de obedecerem a procedimento legislativo
e a quórum especial passam a revestir a força hierárquica de norma constitucional
derivada.
Assim, nos termos dos §§ 2° e 3° do art. 5° as normas convencionais sobre
"direitos humanos" que não obedeçam aos referidos requisitos (inclusive as que já
haviam sido incorporadas ao direito brasileiro antes da Emenda nO 45/04) e as nor-
mas sobre "direitos e garantias" que eventualmente se não caracterizem como "direi-
tos humanos" não revestem status constitucional, por expressa opção da própria lei
constitucional derivada, mas nem por isso deixam de dever ter força supralegislativa.
Este o pensamento de Ministros do Supremo Tribunal Federal, como SEPÚLVEDA
PERTENCE, GILMAR MENDES e MENEZES DIREITO.
Ora, esta força supralegislativa que não se alça aos cumes da constitucionalidade
outra coisa não é que a superioridade hierárquica dos tratados de onde promanam
tais direitos e garantias, situados em degrau intermédio entre a lei ordinária e a lei
constitucional.
Esta superioridade hierárquica não deve ser interpretada literal e limitativamen-
te como privilégio circunscrito ao referido grupo de normas, pois a expressão "não
excluem" do § 2° tem um significado declaratório, pretendendo sublinhar que os
tratados internacionais são, em geral, fontes de direitos que devam ser observados
pelas leis ordinárias inclusive em matéria de direitos e garantias.
E não faria sentido que fosse de outro modo, pois a matéria de direitos e ga-
rantias, especialmente delicada e sensível, poderia prestar-se a que a Constituição,
originária e derivada, se reservasse o monopólio de sua outorga e reconhecimento.
Seria, na verdade, um contrassenso atribuir-se superioridade hierárquica a um trata-
do versando sobre direitos e garantias e reconhecer-se um mero status paritário aos
tratados tendo por objeto as demais matérias.
A especificidade dos tratados que versam sobre "direitos e garantias" não está
na sua superioridade hierárquica, comum a todos os tratados, mas na existência de
uma cláusula geral de recepção automática plena, enquanto os demais necessitam de
um procedimento especial de incorporação ao direito interno. É o que decorre do
próprio § lOdo art. 5°, segundo o qual as normas definidoras dos direitos e garantias
fundamentais (internas ou internacionais) têm aplicação imediata.
Apesar de expresso apenas no que concerne a "direitos e garantias", não vemos,
pois, razão para restringir a superioridade hierárquica dos tratados a este terreno,
já que ela decorre de outros elementos do sistema, como são a própria concepção
internacionalista da ordem jurídica brasileira consagrada no preâmbulo e no art. 4°,
as disposições expressas do art. 178, que conduz ao dever de observância do tratado
pela lei interna, as disposições que aludem à validade dos tratados "como tal", por
contraposição à "lei", a necessária participação do Chefe do Poder Executivo na sua
celebração e a determinação expressa do art. 98 do Código Tributário Nacional.
Título 111 I Capo I I Tratados Internacionais

Daqui resulta claramente que, em nossa opinião, os tratados internacionais em


geral têm caráter supralegislativo, mas infraconstitucional, exceto em matéria de di-
reitos humanos, caso em que têm a força hierárquica de emendas constitucionais se
obedecerem aos requisitos do § 3° do art. 5° da Constituição.

C) Apreciação direta dos tratados pelos tribunais

Em matéria de competência do Poder Judiciário a Constituição estabelece no


art. 105, inciso IlI, que aos juízes federais competem processar e julgar "as causas
fundadas em tratado ou contrato da União com Estado estrangeiro ou organismo
internacional"; no art. 105, inciso lII, alínea b) determina que compete ao Superior
Tribunal de Justiça julgar, em recurso especial, quando a decisão recorrida contrariar
tratado ou lei federal, ou negar-lhes vigência; e no art. 102, inciso lII, alínea b) dispõe
que compete ao Supremo Tribunal Federal julgar, em recurso extraordinário, quando
a decisão recorrida "declarar a inconstitucionalidade do tratado ou lei federal".
Estas disposições reconhecem, a par da supremacia hierárquica da Constituição
sobre os tratadossS, que os tribunais têm competência para apreciar direitos subjeti-
vos emergentes diretamente dos tratados internacionais. Ora, se os direitos decorrem
diretamente dos tratados, isto significa que eles têm a sua origem em normas inter-
nacionais, não previamente convertidas em leis internas. É que, caso esta conver-
são existisse, não faria sentido a clara dicotomia que a Constituição estabelece entre
"tratado ou lei federal" ao prever a possibilidade de ambos serem contrariados por
decisões judiciais e a possibilidade de ambos ofenderem a Constituiçã056 •
Daqui decorre que os tratados são fonte imediata de direitos e obrigações para
os seus destinatários, podendo ser invocados, como tal, perante os tribunais tão logo
eficazes em face da ordem interna e que, consequentemente, à interpretação dos seus
preceitos são aplicáveis as regras de hermenêutica que vigoram quanto aos tratados e
não as que respeitam à legislação interna de cada Estado contratante.

D) Impossibilidade de revogação por ato do Poder Legislativo de ato da competência


conjunta do Cheft do Estado e do Congresso Nacional
O art. 21, inciso I, da Constituição, entrega à competência da União "manter re-
lações com Estados estrangeiros e participar de organizações internacionais". No que
concerne à celebração de tratados, convenções e atos internacionais, ela é da compe-

55 Com ressalva dos tratados sobre direitos humanos que obedeçam ao § 3° do art. 5°.
56 Cfr. também neste sentido SACHA CALMON NAVARRO CoÊLHO, que adere à teoria monista
com primado do direito internacional: As contribuições para a seguridade e os tratados inter-
nacionais, RDDT 26 (1997), 80 ss.; HELENa TÔRRES,A pluritributação internacional, 577.
Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

tência privativa do Presidente da República, mas fica sujeita a referendo do Congresso


Nacional (art. 84, inciso VIII), sendo certo que é da competência exclusiva deste "re-
solver definitivamente sobre tratados, acordos ou atos internacionais que acarretem
encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional" (art. 49, inciso I).
A Constituição Federal consagra, assim, o sistema segundo o qual "a voz exter-
na do Estado é, por excelência, a voz do seu chefe"57. Como salienta ainda REZEK,
se é certo que, por um lado, "a condução efetiva da política exterior somente lhe
incumbe, em regra, nas repúblicas presidencialistas (... )", certo é também, por outro
lado, que, mesmo até em regimes parlamentares e "( ... ) no que estritamente concer-
ne, porém, ao direito dos tratados, a representatividade ilimitada do Chefe de Estado
não sofre desgaste ( ... )".
Temos assim que, mesmo em regimes parlamentares, em que os Chefes de Estado
não governam, o seu poder de representação externa do Estado é de uma importância
sem paralelo, ao ponto de se poder afirmar que "a autoridade do Chefe de Estado no
domínio da celebração de tratados internacionais não conhece limites: ele ostenta, em
razão do cargo, idoneidade para negociar e firmar o acordo, e ainda para exprimir -
desde logo, ou mediante ratificação ulterior - o consentimento estatal defrnitivo"58.
Importa, no entanto, explicitar melhor em que consistem e como se articulam
reciprocamente, por um lado, esta plenitude da representatividade exterior por parte
do Chefe do Estado e, por outro lado, a limitação constitucional dos poderes deste
decorrente da sujeição dos seus atos a referendo do Congresso Nacional.
Se o procedimento de celebração dos tratados pressupõe a intervenção conjunta
de dois poderes - o executivo, a título de negociação e ratificação - e o legislativo, a
título de referendo -, não pode admitir-se que a cessação dos seus efeitos, por revo-
gação ou denúncia dos mesmos, se processe sem a colaboração conjunta dos mesmos
poderes que participaram da sua celebraçãd9 •
A revogação de um tratado por obra de lei ordinária interna, da competência
exclusiva de um desses poderes - o legislativo -, teria o alcance de um verdadeiro
"golpe de Estado", retirando da destruição dos efeitos de um ato jurídico a interven-
ção de um órgão sem o qual tal ato não poderia ter sido celebrado.
E não se diga que a impossibilidade de tal revogação por ato exclusivo do Con-
gresso significaria retirar-lhe os poderes soberanos que lhe competem no exercício
de poder legislativo, pois tais poderes já foram exercidos, a título de referendo, na
fase da celebração do tratado, mecanismo este que representa uma autolimitação em
matéria de revogação ou denúncia.
Nem tão pouco se diga que o Chefe do Estado colaboraria na feitura da lei revo-
gatória, através do mecanismo da "sanção", pois neste ato jurídico o Presidente não
manifesta a sua vontade de modo juridicamente paritário ao do Congresso, eis que o

57 Cfr. J. F. REZEK, op. cit., 36.


58 Cfr. J. F. REZEK, op. cit., 36 s.
59 Sobre o caso especial da denúncia, cfr. infra, 130 ss.
Título 111 I Capo I I Tratados Internacionais .i.
veto é reversível, podendo ser rejeitado pelo voto da maioria absoluta dos Deputados
e Senadores, em escrutínio secreto, sendo então o projeto objeto de promulgação
obrigatória pelo Presidente da República (CF, art. 66, §§ 4° e 5°)60.

E) O art. 98 do Código Tributário Nacional e a superada classificação dos tratados em


tratados de natureza contratual e de natureza normativa

a) A supremacia hierárquica
A conclusão de que os tratados têm supremacia hierárquica sobre a lei interna é
confirmada, em matéria tributária, pelo art. 98 do Código Tributário Nacional, que, em
preceito declaratório, dispõe que "os tratados e as convenções internacionais revogam ou
modificam a legislação tributária interna e serão observados pela que lhes sobrevenha".
Observe-se, em homenagem à exatidão, que é incorreta a redação deste preceito
quando se refere à "revogação" da lei interna pelos tratados tributários. Com efeito,
não se está aqui perante um fenômeno ab-rogativo, já que a lei interna mantém a
sua eficácia plena fora dos casos subtraídos à sua aplicação pelo tratado. Trata-se,
isso sim, de limitação da eficácia da lei que se toma relativamente inaplicável a certo
círculo de pessoas e situações, limitação esta que caracteriza precisamente o instituto
da derrogação e decorre da relação de especialidade entre tratados e leis 61 •
Observe-se, enfim, que o art. 98 do Código Tributário Nacional, tendo natu-
reza de lei complementa'l; contém um comando adicional ao legislador ordinário, que
veda a este qualquer desobediência ao tratad06 2 •

60 Veja-se, neste sentido, HUGO DE BRITO MACHADO, Tratados e convenções internacionais em


matéria tributária, RDDT 93 (2003), 3l.
61 Cfr. SALVATORE PUGLIATTI, Ab-rogazione, Enc. dei Dir. I (1958), 141 (145 ss.); MARlO PA-
TRONO, Legge (vicende della), Enc. dei Dir. XXIII (1973), 904 (920 ss.); entre nós, FÁBIO
FANUCCHI, Curso de Direito Tributário brasileiro (4a ed.), I, São Paulo 1976, 139; JosÉ CAR-
LOS FALEIRO, A supremacia dos acordos internacionais, 82; MOURA BORGES, Convenções, 141;
HELENO TÔRREs, Pluritributação internacional sobre as rendas das empresas, cit., 2001, 579;
Luís EDUARDO SCHOUERI, Planejamento fiscal através de acordos de bitributação, 34; Cfr. Lu-
CIANO AMARO, Os tratados internacionais e a contribuição social sobre o lucro, in VALDIR DE
OLIVEIRA ROCHA (org.), Grandes questões atuais de Direito Tributário, São Paulo 1997, 158;
ID., Direito Tributário brasileiro, São Paulo 1997, 169 ss.; ACCIOLY, Manual de Direito Inter-
nacional Público (3 a ed.), São Paulo 1956,22-23.
62 Sobre a natureza substancial de lei complementar do art. 98 do cru, cfr. SACHA CALMON
NAVARRO COÊLHO, Tratados internacionais em matéria tributária (perante a Constituição
Federal do Brasil de 1988),RDT 59 (1992), 180 (185): "( ... ) o Ministro REZEK, que per-
tenceu à Suprema Corte, pôde dizer que o art. 98 construiu no domínio tributário uma regra
de primado do Direito Internacional sobre o Direito Interno (Tratado e Legislação Interna
em Matéria Tributária -ABDF nO 22). HANs KELSEN, corifeu da teoria monista, que dava
primazia aos Direitos das Gentes sobre os Direitos Nacionais, ficaria finalmente satisfeito.
O Ministro REZEK indubitavelmente está certo". Cfr. ainda Luís EDUARDO SCHOUERl, Plane-
@ I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier .)

Nem se diga que o art. 98 estaria exorbitando, inconstitucionalmente, das suas


funções de lei complementar, limitando sem título legítimo o Poder Legislativo,
quando a verdade é que ele se insere de pleno na função atribuída pelo art. 146 da
Constituição de regular as limitações constitucionais ao poder de tributar, uma das
quais é precisamente a que resulta da supremacia hierárquica dos tratados, consagra-
da por todo o sistema constitucional, como adiante se demonstrará.

b) A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça baseada


na distinção entre tratados normativos e tratados-contratos: crítica
A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça tem adotado uma interpreta-
ção restritiva do art. 98 do Código Tributário Nacional, sustentando que se aplicaria
apenas à modalidade de tratados que designa "tratados-contratos", por contraposição
aos "tratados normativos" [(como considera ser o Acordo Geral sobre Tarifas e Co-
mércio (GATT) e a Convenção de Organização Internacional do Trabalho (OIT)63].
Parte essa jurisprudência da premissa (a nosso ver inexata) de que a Constitui-
ção é omissa no que concerne à eventual supremacia hierárquica dos tratados, pelo
que o art. 98 do Código Tributário Nacional estaria invadindo ilegitimamente ma-
téria de competência constitucional exclusiva, conduzindo a uma "iníqua restrição à
competência primeira do Poder Legislativo".
O Superior Tribunal de Justiça, decerto inspirado no pensamento dualista de que
ocorre uma prévia "transformação" do tratado em lei interna, concebe as relações entre
lei ordinária e tratado em termos paritários e, por conseguinte, submetidas às regras

jamento fiscal através de acordos de bitributação - Treaty Shopping, 103; NATANAEL MARTINS,
Tratados internacionais e matéria tributária, RDT 54 (1990), 105,passim; MARIA DO CARMO
PUCCli'lI CAMINHA, Os tratados internacionais tributários e a eficácia de suas normas no or-
denamento jurídico brasileiro, RTFP 41 (2001),41 SS.; HUGO BRITO MACHADO, Tratados e
convenções internacionais, cit., 27 SS.; MARCIANO SEABRA DE GaDO!, Os tratados..., 999 ss.

63 Cfr. (i) Acórdão do Superior Tribunal de Justiça, de 3 de novembro de 1993, Recurso especial na
25.363-2 - Rio de Janeiro, Relator Ministro HÉLIO MOSIMANN; (ii) Acórdão do Superior Tri-
bunal de Justiça, de 15 de dezembro de 1993, Recurso especial na 37.065-5jR, Relator Ministro
DEMÓCRITO REINALDO; (iii) Acórdão do Superior Tribunal de Justiça, de 23 de fevereiro de 1994,
Recurso especial n" 41.147 -5jPR, Relator Ministro DEMÓCRITO REINALDO; (iv) Acórdão do Su-
perior Tribunal de Justiça, de 29 de novembro de 1993, Recurso especial na 34.025-5-PR, Relator
Ministro CESAR ASFOR ROCHA; (v) Acórdão do Superior Tribunal de Justiça, de 29 de novembro de
1993, Recurso especial na 35.774-8-RS, Relator Ministro CESAR AsFOR ROCHA; (vi) Acórdão
da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, de 15 de dezembro de 1993, Recurso especial
na 37.065-5-PR, Relator Ministro DEMÓCRITO REINALDO; (vi) Acórdão da Primeira Turma do
Superior Tribunal de Justiça, de 23 de fevereiro de 1994, Recurso especial nO 41 147-5-PR (93
003 3045-4), Relator Ministro DEMÓCRITO REINALDO; (viii) Acórdão da Primeira Turma do
Superior Tribunal de Justiça, de 18 de março de 1999, Recurso Especial nO 196.560(RJ, Rela-
tor Ministro DEMÓCRITO REINALDO; e (ix) Acórdão da Primeira Turma do Superior Tribunal de
Justiça, de 12 de mao de 2005, Relator Ministro JOÃo ÜTÁVIO DE NORONHA.
Título 111 I Capo I I Tratados Internacionais I (fi)

gerais de solução de antinomias do ordenamento jurídico, ou seja, os critérios crono-


lógico e de especialidade, a que se refere o art. 2° da Lei de Introdução ao Código Civil.
Em assim sendo, a citada jurisprudência conclui que para se dar uma interpreta-
ção do art. 98 do Código Tributário Nacional "conforme à Constituição" é necessá-
rio entender que o seu âmbito de aplicação se restringe aos tratados contratuais, mas
não assim aos tratados-lei ou tratados normativos.
Esta é também a posição defendida, na doutrina, por JACOB DOLTNGER64 .
A ausência de fimdamento desta corrente resulta, em primeiro lugar, de que a
própria lei não procedeu à qualquer distinção dentro do âmbito dos "tratados ou
convenções" - e embora esta máxima de hermenêutica não tenha valor absoluto -,
em linha de princípio "ubi lex non distinguit" não é lícito ao intérprete distinguir.
Acresce que a referência da lei a "tratados" ou "convenções" visa apenas a aludir
às duas expressões sinônimas de emprego equivalente na linguagem diplomática, não
podendo entender-se como se reportando à dicotomia tratados-contratos e tratados
normativos, pois tal não corresponde, nem entre nós, nem noutros países, a qualquer
tradição terminológica65 •
Diga-se ainda que uma correta interpretação do art. 98 jamais poderia admitir que
a expressão "serão observados pela (legislação tributária interna) que lhes sobrevenha"
se refere a "tratados-contratos", pois que os contratos não são "observados" pelas leis
posteriores, as quais devem, isso sim, respeitar os direitos adquiridos que deles decor-
rem. Mas tal respeito é uma regra de direito intertemporal, relativa à aplicação das leis
no tempo e que já se encontra reconhecida nos princípios constitucionais da proteção
do direito adquirido e do ato jurídico perfeito e da irretroatividade das leis tributárias,
não tendo qualquer cabimento na matéria versada pelo art. 98. A "legislação tributária
interna" a que se refere o art. 98 é constituída por normas jurídicas e estas devem obser-
var não contratos, mas outras normas jurídicas, de força hierárquica prevalente, as quais
só podem ser as constantes de tratados normativos, a aceitar-se a dicotomia em causa.
E nem se diga que esta interpretação se traduz numa interpretação inconstitu-
cional do art. 98, com o ar~ento de que conduziria a uma limitação da competên-
cia do Poder Legislativo. E que, como atrás já se demonstrou, tal limitação decorre
hoje da interpretação sistemática do próprio texto constitucional66 .
Enfim, a dicotomia tratados-contratos e tratados normativos não tem hoje qual-
quer validade científica, nem jamais foi invocada na doutrina a respeito da discus-
são sobre a força hierárquica dos tratados em relação à lei interna. Também não se

64 Cir. DOLINGER, AB soluções da Suprema Corte brasileira para os conflitos entre o Direito
Interno e o Direito Internacional... , Revista Forense 334 (1986), 7l sS.
65 Cfr. J. F. REZEK, op. cit., 15-16.
66 Veja-se também NATANAEL MARTINS, Tratados internacionais em matéria tributária, RDT
54 (1990), 105,passim. No mesmo sentido, veja-se, por último, SACHA CALMON NAVARRo
COÊLHO, Tratados internacionais em matéria tributária (perante a Constituição Federal do
Brasil de 1988), RDT 59 (1992), 180 (186).
Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

conhecem no direito comparado sistemas constitucionais que tenham acolhido esta


classificação para os efeitos em causa.
'1\ distinção entre tratados contratuais e tratados normativos vem padecendo de
uma incessante perda de prestígio". Esta é a asserção lapidar de JosÉ FRANCISCO RE-
ZEK67 , corroborada aliás em termos unânimes pela doutrina juspublicista contempo-
rânea, nacional e estrangeira68 .
A fragilidade desta classificação dos tratados é que dela não decorrem efeitos
jurídicos distintos para cada uma das espécies de contratos identificados. Na verdade,
as normas de direito internacional e de direito interno relativas à validade, eficácia,
interpretação e extinção dos tratados não dependem da designação a estes dada no
âmbito de uma determinada classificaçã069 •
Já KELSEN 70 apontava como pleonasmo a expressão tratados normativos) uma vez
que, como REZEK observa?!, "todos o são, dos mais transcendentes pactos universais
às avenças de comércio que os Estados concluem aos pares. O que pode variar, em
verdade, é o feitio de execução das normas convencionais - menos, porém, à luz do
direito que sob um enfoque econômico, político ou histórico. Acresce que um dos
dois polos dessa classificação, o tratado contratual) é algo que talvez nunca se encon-
tre em estado de pureza. Mesmo nas avenças bilaterais voltadas para a singela troca
de bens ou serviços, é usual que marque presença o elemento 'normativo' ( ... )".
Como aliás salienta REZEK noutro passo da sua obra 72, "a produção de efeitos
de direito é essencial ao tratado, que não pode ser visto senão na sua dupla qualidade
de ato jurídico e de norma. O acordo formal entre Estados é o ato jurídico que pro-
duz a norma, e que, justamente por produzi-la, desencadeia efeitos de direito, gera

67 Direito Internacional Público (2 a ed.), São Paulo 1991,29.


68 No mesmo sentido, CELSO DE ALBUQUERQUE MELO, Curso de Direito Internacional Público
(9 a ed.), I, Rio de Janeiro 1992, 164-165; ANDRÉ GONÇALVES PEREIRA/FAUSTO DE QUADROS,
Manual de Direito Internacional Público (3 a ed.), Coimbra 1993, 182; SILVA CUNHA, Direito
Internacional Público (5 a ed.), Coimbra 1991, 188-190; AzEVEDO SOARES, Lições de Direito
Internacional Público (4 a ed.), Coimbra 1988, 154; MANUEL DíEZ DE VELASCO, Instituciones
de Derecho Internacional Público (9 a ed.), I, Madrid 1991, 126.
69 Neste sentido, veja-se RICCARDO MONACO, Manuale di Diritto Internazionale Pubblico (2 a
ed.), Torino 1971 (reimpressão 1989), 96, que justamente salienta a inexistência de progres-
sos científicos em relação a algumas classificações tentadas no passado (cfr. op. e loco cit., com
notas 40 e 41 e bibliografia aí citada). Também REZEK, op. cit., 26, ao observar que "aqui
se estudam tão só aqueles esquemas classificatórios que, em certa medida, irão contribuir
para o melhor entendimento de aspectos da gênese, da vigência ou da extinção dos tratados
internacionais", mais não faz que registrar o valor meramente heurístico, mas não hermenêu-
tica, dos esquemas classificatórios dos tratados e, em especial, da classificação entre tratados
contratuais e tratados normativos (op. cito 31).
70 Principies ofInternational Law, Nova York 1952,320 (apudJ. F. REzEK,DireitoInternacional
Público) cit., 30).
71 Cfr J. F. REZEK, Direito Internacional Público, 30-3l.
72 Cfr. J. F. REZEK, Direito Internacional Público) 19.
Título 111 I Capo I I Tratados Internacionais .~.

obrigações e prerrogativas, caracteriza enfim, na plenitude de seus dois elementos, o


tratado internacional".
O "tratado contratual" tende a criar, é certo, regras especiais para as relações entre
os países signatários, mas tais regras não perdem com isso o seu caráter normativo.
A crítica decisiva e definitiva quanto à falta de sentido jurídico-dogmático desta
classificação reside, porém, na constatação de que inexiste qualquer hierarquia entre
tratado-lei e tratado-contrato 73 •
Esta distinção tem, pois, um valor meramente indicativo e auxiliar da interpre-
tação do próprio tratado, nada dizendo, porém, quanto aos problemas próprios do
direito dos tratados, notadamente quanto à vigência dos tratados na ordem interna
brasileira e quanto ao seu lugar na hierarquia das fontes de direito brasileiro que aqui
nos ocupam.
Bastaria esta asserção para se concluir pela insubsistência da orientação juris-
prudencial que tem tentado ancorar nesta classificação não só o fundamento jurídico
para o lugar que atribui aos tratados "normativos" na hierarquia das fontes de direito
brasileiro, como também uma interpretação restritiva do art. 98 do Código Tributário
Nacional. A verdade, porém, é que esta orientação peca gravemente por não tomar
em consideração no seu raciocínio as disposições inovatórias da Constituição Federal
de 1988 em matéria de vigência de tratados, que concluem pela superioridade hierár-
quica dos tratados em geral, sem admitir qualquer distinção quanto à sua natureza.
Muito embora discordemos da validade da distinção entre tratados normativos
e tratados contratuais, a verdade é que mesmo a jurisprudência restritiva do Superior
Tribunal de Justiça confirma a prevalência de aplicação dos tratados contra a dupla
tributação, eis que estes constituem exemplo flagrante de "tratados contratuais", ver-
sando sobre assuntos específicos nas relações bilaterais entre dois Estados.
Mais recentemente o Superior Tribunal de Justiça, no Acórdão da Primeira Tur-
ma proferido no REsp nO 426.945-PR, de 22 de junho de 2004, de que foi relator
o Ministro JosÉ DELGADO, afastou-se radicalmente da orientação que até então vinha
trilhando (expressa paradigmaticamente no voto vencido do Ministro TEOR! ZAVAS-
CKI) e que agora se alega (não sem razão) ter sido "construída antes da Constituição
de 1988 e não se adequa ao momento atual".
Referido Acórdão afirma, na sua ementa, que "os direitos fundamentais globa-
lizados, atualmente, estão sempre no caminho do impedimento da dupla tributação.
Esta vem sendo condenada por princípios que estão acima até da própria norma
constitucional"; e, numa drástica mudança da interpretação tradicional, concluiu que
"o art. 98 do Código Tributário Nacional permite a distinção entre os chamados tra-
tados-contratos e tratados-leis. Toda a construção a respeito da prevalência da norma
interna com o poder de revogar os tratados, equiparando-os à legislação ordinária,
foi feita tendo em vista os designados tratados-contratos, e não os tratados-leis".

73 ALBUQUERQUE MELLO, Curso, cit., 165.


@li) I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Conquanto de formulação pouco clara e assente em bases científicas precárias,


este Acórdão teve o mérito de denunciar o arcaísmo da visão até então prevalecente
no STJ, abrindo as portas para uma reconsideração que tenha em conta as realidades
e exigências do mundo contemporâneo, reconsideração esta que aliás também se
começa a desenhar no Supremo Tribunal Federal, como adiante se verá.

F) Natureza não transformatória do reftrendo do


Congresso Nacional e da promulgação pelo Cheft do Estado
Como atrás se viu, o procedimento de formação dos tratados no Direito Cons-
titucional brasileiro e, em particular, a fase da celebração revelam que se trata de wn
processo simultaneamente internacional e interno (art. 21, I, art. 84, VIII, e art. 49,
I, da Constituição Federal).
O momento mais relevante para o direito interno condensa-se na intervenção
do Congresso e traduz a participação do Poder Legislativo - a par do Executivo - no
treaty-making power brasileiro. Esta participação é, como também já se referiu, ante-
rior ao momento internacional do consensus. Situando-se, assim, em fase lógica e cro-
nologicamente anterior à conclusão do tratado, não pode ter o significado de "trans-
formação" deste em direito interno, nem tampouco de "veículo de incorporação"74.
Antes da troca de instrwnentos de ratificação, o objeto do referendo é wn mero pro-
jeto e, como tal, insuscetível de transformação ou ordem de execução.
O significado da intervenção do Congresso é bem diferente e visa a garantir
a repartição de competências materiais entre legislativo e executivo, operada pela
Constituição. Esta repartição, em nível interno, tem por critério o princípio da re-
serva de lei. Em nível de atuação internacional, ficou salvaguardada pela exigência
constitucional de participação sistemática e articulada do Executivo e do Congresso
no treaty-making power, o que previne, em matérias como a tributária, que o tratado
possa representar wna invasão inconstitucional na esfera reservada à competência
do legislativ0 75 . Trata-se, repita-se, de wna intervenção de "controle prévio", que se
traduz numa simples autorização para ratificação e não nwna "ordem de execução"

74 Como pretende HELENO TÕRRES, Tratados e convenções internacionais em matéria tribu-


tária ... , RDDT 86 (2002), 39.; JosÉ SOUTO MAIOR BORGES, Isenções em tratados interna-
cionais de imposto dos Estados-membros e municípios, in CELSO A. BANDEIRA DE MELLO
(org. ), Direito Tributário - Estudos em homenagem a Geraldo Ataliba, São Paulo 1997, 167 ss.,
espec. 170. Cfr. BETINA GRUPENMACHER, Tratados internacionais em matéria tributária e ordem
interna, São Paulo 1999, 74.
75 Inobstante a Constituição exigir o referendo do Congresso Nacional apenas para acordos
ou atos internacionais "que acarretem encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio
nacional", entendemos que ele é necessário em todos os casos que o tratado versa domínios
abrangidos pelo princípio da legalidade. Veja-se sobre o tema HELENa TÔRRES, Pluritributa-
ção internacional, 564, nota.
Título 111 I Capo I I Tratados Internacionais I Iif}

produtora de normas jurídicas internas por reenvio receptício às normas internacio-


nais constantes dos tratados 76 •
. Verifica-se, assim, que o Congresso não ratifica tratados, quer porque a Consti-
tuição lhe não confere, em parte alguma, voz exterior, como também porque, assim
sendo, não lhe seria possível vir a confirmar (ou ratificar) algo em que anteriormente
não houvesse participado, nem ao menos por assinatura77 .
Também não pode querer ver-se uma participação ativa do Congresso na com-
petência para a celebração de tratados no ato de referendo. É que, como salienta RE-
ZEK, com sua precisão e rigor de análise, "a ratificação é tão discricionária quão livre
o Estado soberano para celebrar tratados internacionais"78 e é sabido que é prática
disseminada o prolongamento no tempo de situações em que o parlamento referenda
um texto para ratificação, sem que no entanto esta venha a ocorrer, ou seja, sem que
se consume o consenso.
A participação do legislativo na formação da vontade do Estado sobre o com-
prometimento exterior é, assim, estritamente formal e externa à própria substân-
cia da vontade: formal porque não participa da cena diplomática da negociação e
autenticação; externa porque o referendo não vincula à consumação do consenso,
mantendo-se intacta a liberdade do governo quanto ao estabelecimento ou não de
compromisso internacional com o conteúdo por ele e só por ele definido.
Uma vez dada a aprovação parlamentar, ela é irretratável após a ratificação. Ato
unilateral e discricionário, esta é também irretratável, impondo-se às partes o com-
promisso assumido, o qual só poderá ser denunciado unilateralmente de acordo com
as regras prefixadas.
Embora concordemos com SOUTO MAIOR BORGES quando sustenta que o refe-
rendo do Congresso Nacional não incorpora, por transformação, o tratado no direi-
to interno, discordamos da caracterização daquele ato como ato de "homologação",
requisito de eficácia plena de ato anteriormente existente e válidd9 .
Para nós, o referendo do Congresso não tem por objeto um tratado anterior-
mente existente e válido, mas apenas um projeto, um texto assinado, mas ainda não
ratificado. Não é, por isso, ato de homologação "a posteriori", mas ato de autorização
"a priori" para a prática de um outro ato - a ratificação - que, esse sim, conclui o pro-
cedimento de celebração dos tratados e que é a manifestação da vontade de obrigar-

76 Ao contrário do que sucede no direito italiano, em que o mesmo ato - a autorização parla-
mentar - desempenha a dupla função de autorização de ratificação e ordem de execução: cfr.
R. MONACO, Manuale di Diritto Internazionale Pubblico, 234 SS.; ENZO CANNIZARO, Tratatto
internazionale (adattamento al), Enc. deI Dir. XLIV (1992), 1394; GARllARINO, La tassazione
deI reddito transnazionale, Pádua 1990, 508. E ao contrário também do que sucede no direi-
to britânico, como consequência direta de aí o treaty-making power constimir prerrogativa
exclusiva da Coroa.
77 Neste sentido, veja-se J. E REZEK, op. cit., 53.
78 Op. cit., 55.
79 Cfr. Isenções em tratados internacionais..., 167 sS.
Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

se. Não se trata, pois, de requisito de eficácia, mas de requisito de validade. Tratado
ratificado sem o prévio referendo do Congresso é ato nulo e não ato ineficaz80 .
Também não pode vislumbrar-se na promulgação do tratado, por decreto do
Presidente da República, uma transformação ou ordem de execução.
A promulgação do tratado (ou da lei) não se insere na fase constitutiva do
procedimento, atinente à validade da fonte de produção do direito, mas sim na fase
integrativa da eficácia, para usar a terminologia de SANDULU81 • A promulgação é um
ato de controle jurídico ou formal, de competência do Presidente da República, no
que concerne à regularidade do procedimento adotado, ato de controle este que é
necessário à eficácia da norma promulgada, mas não à sua existência e validadeB 2 .
Não pode vislumbrar-se na promulgação um ato de transformação, introdução
ou ordem de execução, pois trata-se de requisito que é também exigido quanto às leis
internas emanadas do Congresso Nacional, competindo privativamente ao Presiden-
te da República "sancionar, promulgar e fazer publicar as leis ... " (art. 84, inciso IV),
promulgação essa que não altera ou transforma a natureza originária dessa mesma
lei 83 • Acresce que a promulgação do tratado não é objeto de expressa exigência cons-
titucional, mas simples prática reiterada das instituições políticas.
Também a publicação, no jornal oficial, é requisito de eficácia do tratado (con-
ditio iuris). Mas a promulgação publicada não é ato discricionário que o Presidente
da República possa livremente praticar ou deixar de praticar - como seria se tives-

80 Assim afirma a ementa da decisão proferida nos autos da Medida Cautelar na Ação Direta
de Inconstihlcionalidade nO 1.480 (relator Ministro CELSO DE MELLO): "O exame da vigente
Constihlição Federal permite constatar que a execuçíW dos tratados internacionais e a sua in-
corporaçíW à ordem jurídica interna decorrem, no sistema adotado pelo Brasil, de um ato sub-
jetivamente complexo, resultante da conjugaçíW de duas vontades homogêneas: a do Congresso
Nacional, que resolve, definitivamente, mediante decreto legislativo, sobre tratados, acordos ou
atos internacionais (CF, art. 49, I) e a do Presidente da República, que, além de poder celebrar
esses atos de direito internacional (CF, art. 84, VIII), também dispõe - enquanto Cheft de
Estado que é - da competência para promulgá-los mediante decreto". Cfr. RT] (179), 495.
81 Cfr. também SOUTO MAIOR BORGES, op. cit., 166 ss.
82 Cfr. GOMES CANOTILHO, Direito Constitucional, Coimbra 1992, 741 e 960; JosÉ AFONSO DA
SILVA, Curso de Direito Constitucional Positivo (10 a ed.), São Paulo 1995, 500. A ementa da
decisão proferida nos autos da Medida Cautelar na ADIN nO 1480 afirma: "o iter procedi-
mental de incorporação dos tratados internacionais - superadas as fases prévias da celebraçíW
da convenção internacional, de sua apruvaçíW congressional e da ratificaçíW pelo Chefe de
Estado - conclui-se com a expedição, pelo Presidente da República, de decreto, de cuja edição
derivam três eftitos básicos que lhe são inerentes: (a) apromulgaçíW do tratado internacional;
(b) a publicaçíW oficial de seu texto; e (c) a executoriedade do ato internacional, que passa,
então, e somente entíW, a vincular e a obrigar no plano do direito positivo interno".
83 LUIS EDUARDO SCHOUERI sustenta que a promulgação não tem o condão de transformar o
tratado em Direito Interno, pois este manteria a sua nahlreza própria, aderindo à chamada
teoria da execução (Vollzugstheorie) , de VOGEL, de MENZEL e IpSER, segundo a qual teria o al-
cance de "ordem de aplicação" (Anwendungsbefthl), ou seja, de liberar a aplicação, no interior
do Estado, da norma de Direito Internacional, sem por isso modificar seu fundamento de
validade, seus destinatários e seu contexto sistemático. Cfr. Planejamento fiscal ... , cit., 35.
Título 111 I Capo I I Tratados Internacionais

se a natureza de ordem de execução - mas um ato devido nos termos de um dever


funcional.
E tanto assim é que a eficácia da promulgação e da publicação posterior à data
da entrada em vigor do tratado na ordem internacional retroage a esta última84, o
que é clara demonstração de que ele vigora como fonte internacional e não como
fonte interna.
A falta de publicação ou de promulgação não pode ser invocada como justifi-
cação de incumprimento, pelos Estados, das suas obrigações convencionais, como
resulta do art. 27 da Convenção de Viena. Se é certo que tratado não publicado não
é oponível aos particulares, no sentido de lhes exigir obrigações, a verdade é que estes
podem invocá-lo para exigir direitos que deles decorram 85 •
Não deve invocar-se a necessidade da publicação (ou promulgação) para a efi-
cácia dos tratados na ordem interna como manifestação de um entorse à pureza do
princípio monista (o chamado "monismo moderado"), pois da essência do princípio
monista, como se disse, é apenas que os tratados valham como tal, mantendo a sua
natureza, e não a dispensa de formalidades internas para a sua eficácia plena (como
sucede nos sistemas de recepção automático, por via de cláusula geral).
Aliás, os autores de inspiração dualista, que insistem em ver nos atos internos
de referendo ou de promulgação instrumentos de "transformação" dos tratados em
lei interna, não conseguem explicar por que é que um tratado internacional, ainda
que referendado e promulgado, só entra em vigor a partir de procedimentos exigidos
pelo direito internacional público, eventualmente posteriores aqueles atos, e ainda
por que é que perde a sua força internamente, quando é denunciado ou revogado nos
termos do direito internacional86 •
Quando o Supremo Tribunal Federal nega a previsão no sistema constitucional
brasileiro dos princípios do efeito direto e da aplicabilidade imediata dos tratados está
apenas a afirmar que estes não são incorporados automaticamente por via cláusula ge-
ral de recepção plena, e que portanto não são eficazes na ordem internaantes de cum-
pridas certas formalidades prescritas no direito interno, sem com isso concluir que os
tratados, após o cumprimento dessas formalidades, vigorem na ordem interna como
leis internas e não como tratados (como seria a conclusão da concepção dualista).
Assim afirma a ementa do Agravo Regimental em Carta Rogatória nO 8.27987 :
(Procedimento constitucional de incorporação de convenções internacionais em geral e
de tratados de integração (Mercosul)
"A recepção dos tratados internacionais em geral e dos acordos celebrados pelo
Brasil no âmbito do MERCOSUL depende, para efeito de sua ulterior execução

84 Como corretamente afirma o Parecer Nonnativo CST nO 3/79.


85 Cfr. MANUEL DIÉZ DE VELASCO, Instituciones de Derecho Internacional Público (9a ed.), tomo
I, Madrid 1991.
86 Cfr. LUIS EDUARDO SCHOUERl, Planejamento fiscal ... , cit., 32.
87 Diário da Justiça 10.8.2000.
mm I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier ._:_~_ _ _ _ _ _ _.....

no plano interno, de uma sucessão causal e ordenada de atos revestidos de caráter


politico-jurídico, assim definidos: (a) aprovação, pelo Congresso Nacional, me-
diante decreto legislativo, de tais convenções; (b) ratificação desses atos interna-
cionais, pelo Chefe de Estado, mediante depósito do respectivo instrumento; (c)
promulgação de tais acordos ou tratados, pelo Presidente da República, mediante
decreto, em ordem a viabilizar a produção dos seguintes efeitos básicos, essenciais
à sua vigência doméstica: (1) publicação oficial do texto do tratado e (2) execu-
toriedade do ato de direito internacional público, que passa, então - e somente
então - a vincular e a obrigar no plano do direito positivo interno. Precedentes.
«O sistema constitucional brasileiro não consagra o principio do efeito direto e nem o
postulado da aplicabilidade imediata dos tratados ou convenções internacionais
'1\ Constituição brasileira não consagrou, em tema de convenções internacionais
ou de tratados de integração, nem o princípio do efeito direto, nem o postulado
da aplicabilidade imediata. Isso significa, de jure constituto, que, enquanto não se
concluir o ciclo de sua transposição, para o direito interno, os tratados internacio-
nais e os acordos de integração, além de não poderem ser invocados, desde logo,
pelos particulares, no que se refere aos direitos e obrigações neles fundados (prin-
cípio do efeito direto), também não poderão ser aplicados, imediatamente, no
âmbito doméstico do Estado brasileiro (postulado da aplicabilidade imediata).
"O princípio do efeito direto (aptidão de a norma internacional repercutir, des-
de logo, em matéria de direitos e obrigações, na esfera jurídica dos particulares)
e o postulado da aplicabilidade imediata (que diz respeito à vigência automática
da norma internacional na ordem jurídica interna) traduzem diretrizes que não
se acham consagradas e nem positivadas no texto da Constituição da República,
motivo pelo qual tais princípios não podem ser invocados para legitimar a inci-
dência, no plano do ordenamento doméstico brasileiro, de qualquer convenção
internacional, ainda que se cuide de tratado de integração, enquanto não se
concluírem os diversos ciclos que compõem o seu processo de incorporação ao
sistema de direito interno do Brasil. Magistério da doutrina.
"Sob a égide do modelo constitucional brasileiro, mesmo cuidando-se de tra-
tados de integração, ainda subsistem os clássicos mecanismos institucionais de
recepção das convenções internacionais em geral, não bastando, para afastá-los,
a existência da norma inscrita no art. 4 0 , parágrafo único, da Constituição da
República, que possui conteúdo meramente programático e cujo sentido não
torna dispensável a atuação dos instrumentos constitucionais de transposição,
para a ordem jurídica doméstica, dos acordos, protocolos e convenções celebra-
dos pelo Brasil no âmbito do Mercosul".
A doutrina acima exposta exige algumas observações. A primeira está em que
no denominado "ciclo de transposição para o direito interno" incluem-se requisitos
relativos à própria existência do tratado na esfera internacional, como é o caso da
ratificação, e requisitos relativos à sua validade, como o referendo, que não respeitam
à "transposição" do direito: o primeiro, porque sem ele o tratado não existe, e o se-
Título 111 I Capo I I Tratados Internacionais I 1liD

gundo, porque, sendo um ''primus'' em relação ao tratado, uma simples autorização


para ratificar, não pode transpor o que até então é mero projeto.
O chamado problema da "transposição" só pode respeitar, pois, à promulgação,
que é inegavelmente um requisito, não de validade, mas de eficácia do tratado. Po-
rém, dizer-se que sem a promulgação o tratado não é eficaz na ordem interna não
conduz à aceitação da teoria dualista da transformação, pois a promulgação não tem
o condão de transformar o tratado em direito interno, limitando-se a imprimir eficá-
cia plena a um ato que mantém inalterada a sua natureza de fonte internacional88 •

G) A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal

a) A tese da paridade hierárquica

Na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal merece especial relevo, pelo seu


caráter doutrinário, o voto do Ministro CELSO DE MELLO, que serviu de base à emen-
ta da decisão proferida nos autos da Medida Cautelar na Ação Direta de Inconsti-
tucionalidade nO 1.48089 , que versava sobre disposições do Decreto Legislativo nO
68/92, que aprovou a Convenção nO 158 da Organização Internacional do Trabalho
(OIT) e o Decreto nO 1855/96, que promulgou esta mesma Convençã090 • Aliás, a
este voto faz expressa referência, como precedente, a ementa do Agravo Regimental
em Carta Rogatória nO 8.279.
Começa a ementa por afirmar - e com razão - que "é na Constituição da Repú-
blica - e não na controvérsia doutrinária que antagoniza monistas e dualistas - que se
deve buscar a solução normativa para a questão da incorporação dos atos internacio-
nais ao sistema de direito positivo interno brasileiro".
O voto do Ministro CELSO DE MELLO parte do pressuposto que a Constituição
de 1988 é omissa no que concerne a eventuais relações de hierarquia entre fontes
internacionais e fontes internas para concluir pela paridade normativa entre atos inter-
nacionais e infraconstitucionais do direito interno, com os seguintes corolários:

88 Neste sentido GEORGE GALINDO, Tratados internacionais, 156.


89 Publicado no Diário da Justiça de 18.5.0l.
90 Note-se, porém, que referido jugado - aliás prejudicado em razão da denúncia unilateral da
Convenção nO 158/0IT, em 20 de dezembro de 1996, formalizada pelo Decreto nO 2.100,
da mesma data - versava sobre um tratado normativo, tendo por objeto matéria trabalhista
que consagra uma recomendação ao legislador interno, no que concerne às indenizações
imotivadas. Trata-se, pois, de situação completamente diversa do caso dos tratados contra
a dupla tributação, de natureza contratual (ainda que se admita a validade dessa já superada
distinção), versando sobre matéria tributária, em que a prevalência sobre a lei interna é ex-
pressamente assegurada por norma de lei complementar (art. 98 do CTN) e consagrando
normas especiais de tributação, exclusivamente aplicáveis às relações entre pessoas residentes
nos Estados contratantes.
MI"jl Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

(i) Os tratados ou convenções internacionais, uma vez regularmente incorpora-


dos ao direito interno, situam-se, no sistema jurídico brasileiro, nos mes-
mos planos de validade, de eficácia e de autoridade em que se posicionam
as leis ordinárias, havendo, em consequência, entre estas e os atos de direito
internacional público, mera relação de paridade normativa;
(ii) No sistema jurídico brasileiro, os atos internacionais não dispõem de prima-
zia hierárquica sobre as normas de direito interno. A eventual precedência
dos tratados ou convenções internacionais sobre as regras infraconstitucio-
nais de direito interno somente se justificará quando a situação de antino-
mia com o ordenamento doméstico impuser, para a solução do conflito, a
aplicação alternativa do critério cronológico ("lex posterior derogat legi priori")
ou, quando cabível, do critério da especialidade.
Desta concepção "horizontal" ou paritária das relações entre tratado e lei interna
resultam como corolários, por um lado, a subordinação hierárquica dos tratados à
Constituição e, por outro lado, a insuscetibilidade de os tratados invadirem matéria
constitucionalmente reservada à lei complementar.
"O poder Judiciário - fundado na supremacia da Constituição da República
- dispõe de competência, para, quer em sede de fiscalização abstrata, quer no
âmbito do controle difuso, efetuar o exame de constitucionalidade dos tratados
ou convenções internacionais já incorporados ao sistema de direito positivo
interno. Doutrina e Jurisprudência.
''No sistema jurídico brasileiro, os tratados ou convenções internacionais es-
tão hierarquicamente subordinados à autoridade normativa da Constituição da
República. Em consequência, nenhum valor jurídico terão os tratados interna-
cionais, que, incorporados ao sistema de direito positivo interno, transgedirem,
formal ou materialmente, o texto da Carta Política.
"O primado da Constituição, no sistema jurídico brasileiro, é oponível ao prin-
cípio pacta sunt servanda, inexistindo, por isso mesmo, no direito positivo na-
cional, o problema da concorrência entre tratados internacionais e a Lei funda-
mental da República, cuja suprema autoridade deverá sempre prevalecer sobre
os atos de direito internacional público.
"Os tratados internacionais celebrados pelo Brasil- ou aos quais o Brasil venha
a aderir - não podem, em conseguência, versar matéria posta sob reserva cons-
titucional de lei complementar. E que, em tal situação, a própria Carta Política
subordina o tratamento legislativo de determinado tema ao exclusivo domínio
normativo da lei complementar, que não pode ser substituída por qualquer ou-
tra espécie normativa infraconstitucional, inclusive pelos atos internacionais já
incorporados ao direito positivo interno".
A verdade é que a premissa que todas estas proposições assentam reside ex-
clusivamente na alegada "omissão" da Constituição sobre uma eventual relação de
hierarquia entre fontes nacionais e internacionais, não se tendo o Supremo Tribunal
Título 111 I Capo I I Tratados Internacionais

Federal debruçado nem sobre o alcance do § 2° do art. 5° da Constituição, nem


sobre os demais argumentos atrás expostos que revelam uma manifesta tomada de
posição da Constituição em favor da supremacia hierárquica dos tratados 9 !.
É especialmente surpreendente que o Supremo, não tendo chegado ao ponto
de acolher a teoria dualista pura, que exige a transformação do direito internacional
em direito interno, não se tenha apercebido que a preservação da natureza própria
do direito internacional conduz automaticamente à sua primazia de aplicação, pela
singela razão de que só pode ser revogado ou modificado pelos seus mecanismos
próprios e nunca por leis internas.
Tendo, porém, acolhido - sem maiores aprofundamentos - o caráter paritário
das relações entre tratado e lei interna, o Supremo concluiu logicamente que as an-
tinomias eventualmente existentes entre estas duas fontes, não podendo ser resolvi-
das pelo critério hierárquico, só poderiam sê-los pelos demais critérios admitidos em
Direito, ou seja, o critério cronológico ("lex posterior derogat legi priori") e o critério da
especialidade ("lex specialis derogat legi priori")92.
A estes acresce ainda o critério da competência, segundo o qual a esfera reservada
pela Constituição a certas fontes de direito (como é o caso da lei complementar) não
pode ser invadida pelas demais (entre as quais os tratados, na doutrina do Supremo)
sob pena de invalidade por invasão de competência.
É importante salientar que, no que respeita especificamente aos tratados contra a
dupla tributação, o critério da especialidade ("a lei nova que estabeleça disposições gerais
ou especiais a par das já existentes não revoga, nem modifica a lei anterior" - art. 2°,
§ 2°, da Lei de Introdução ao Código Civil) conduzirá via de regra à prevalência de
aplicação (Anwendungsvorrang) do tratado93 , tendo em vista este versar exclusivamente
sobre uma de entre as várias espécies de situações abrangidas pelas leis internas94 •
A possibilidade de prevalência de lei ordinária sobre tratado pelo critério cro-
nológico, independentemente de uma revogação ou denúncia do mesmo, dá porém
lugar a uma situação jurídica ambígua, em que uma norma convencional que perma-

91 Cfr. neste sentido HELENa TÓRREs, Pluritributação internacional, 57l.


92 Cfr. RrCCARDO GUASTINI, 11 fonti dei diritto e I'interpretazione, Milão 1993,412. Manifestando
posição crítica à posição do Supremo, cfr. PATRÍCIA HENRlQUES RIBEIRO, As relações entre o
Direito Internacional e o Direito Interno, cit., 159; MIRTó FRAGA, O conflito entre tratado inter-
naeional e lei interna, cit., 128; JosÉ CARLOS DE MAGALHÃES,A equiparação dos tratados inter-
naeionais à lei interna pelo STF, in ID., O Supremo Tribunal Federal e o Direito Internaeional:
uma análise crítica, Porto Alegre 2000, 57 ss.
93 Sobre a técnica da prevalência de aplicação, cfr. GOMES CANOTILHO, Direito Constitucional
(5 a ed.), Coimbra 1991, 916, nota, citando GEIGER, Grundgesetz und Viilkerrecht, 245 ss.
94 Cfr. MARCIANO SEABRA DE GODO! afirma que "sendo assim, ainda que se possa lamentar,
desde um ponto de vista pessoal, que adotemos no Brasil a tese da paridade hierárquica,
não se pode considerar que com isso estejamos adotando uma postura 'atrasada' e em de-
sarmonia com a tendência geral dos países desenvolvidos". Cfr. Os Tratados... , 996. O certo,
porém, é que esta jurisprudência se coloca nas antípodas da Convenção de Viena sobre o
Direito dos Tratados.
Nu" Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

nece válida e eficaz no plano das relações entre os Estados signatários é desaplicada
pelos tribunais de um deles.
A simples potencialidade deste conflito - geradora de manifesta distorção jurí-
dica - não nos parece compatível nem com as proclamações de princípios internacio-
nalistas da nossa Constituição nem com um Estado democrático, aberto e internacio-
nal, sobretudo após ter ratificado e referendado a Convenção de Viena sobre Direito
dos Tratados, aceita com o valor de direito consuetudinário, que proclama que "uma
parte não pode invocar as disposições do seu direito interno como justificativa para
o inadimplemento de um tratado 95 ".

b) Os n(JfJOS rumos da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal em matéria de


hierarquia de tratados de direitos humanos
No Recurso Extraordinário nO 466.343-1- São Paulo, o Supremo Tribunal Fe-
deral veio a decidir, por unanimidade, pela inadmissibilidade absoluta da prisão civil
do alienante fiduciário e do depositário infiel em face da Convenção Americana de
Direitos Humanos - Pacto de São José da Costa Rica.
Discutiu-se essencialmente se os tratados internacionais que versam sobre direi-
tos humanos revestem ou não status constitucional, em face dos §§ 2° e 3° do art.
5° da Constituição.
O Supremo abandonou pela primeira vez a tese da rigorosa paridade hierárqui-
ca entre tratado e lei ordinária, reservando à categoria dos tratados sobre direitos hu-
manos um lugar especial nos degraus da hierarquia normativa, dividindo-se porém
os votos quanto à precisa determinação desse lugar.
Uma corrente (CELSO DE MELLO, PELUSO) sustenta que referidos tratados re-
vestem a natureza de normas materialmente constitucionais, incluindo os celebrados
pelo Brasil antes do advento da EC nO 45/2004, todas integrando um "bloco de
constitucionalidade" e dotadas de supremacia e precedência em relação ao ordena-
mento doméstico.
Outra corrente, liderada pelo voto do relator GILMAR MENDES 96 , e apoiada por
CARLOS BRITTO e MENEZES DIREITO, sustenta que, dentro dos tratados sobre direitos
humanos, apenas ascendem à dignidade constitucional aqueles que, após a Emenda
Constitucional nO 45, de 2004, obedecem aos requisitos do § 3° do art. 5°, caso
em que teriam o valor hierárquico das emendas constitucionais, de tal modo que
os demais tratados, não revestindo embora valor constitucional, seriam dotados de

95 O voto do Ministro LEITÃO DE ABREU, no infelizmente célebre RE 80.004, sustentou que a lei
posterior, não podendo revogar o tratado, "afasta-lhe a aplicação". O eufemismo é evidente.
96 Retomando tese já aventada pelo Ministro SEPÚLVEDA PERTENCE no RHC 79785-7-RJ, rela-
tivo ao princípio do duplo grau de jurisdição em face da Convenção Americana de Direitos
Humanos. Cfr. ainda GILMAR MENDES, INOCÊNCIO MÁRTIRES COELHO, PAULO GUSTAVO Go-
NET BRANCO, Curso de Direito Constitucional, São Paulo 2007, 670.
-
~
...'.•......
.' Título 111 I Capo I I Tratados Internacionais .'I~.

"supralegalidade", posicionando-se em lugar intermédio entre as leis ordinárias e as


leis constitucionais97 •
Muito embora no que concerne aos demais tratados não tenha sido alterada a
posição anterior do Supremo, o certo é que de toda as discussões, de alto nível cientí-
fico sobre o tema, ressaltou uma nítida constatação de que a interpretação tradicional
da Constituição em matéria das relações entre direito internacional e direito interno
não se encontrava totalmente ajustada às novas realidades da vida internacional, ne-
cessitando um esforço de "revisitação crítica".
À sensibilidade jurídica de GILMAR MENDES não passou despercebido que o
reconhecimento de uma posição supralegislativa, mas infraconstitucional, talvez não
devesse ficar circunscrita à categoria especial dos tratados sobre direitos humanos
que não obedecessem aos requisitos do § 3° do art. 5°, devendo porventura ser alar-
gada a todo e qualquer tratado internacional, precisamente porque é essa posição in-
termediária a que melhor se ajusta à Convenção de Viena sobre Direito dos Tratados
e às experiências constitucionais mais progressivas da Europa e da América Latina.
Reveste-se, por isso, a nosso ver, de uma importância doutrinária ímpar a parte
conclusiva do seu voto no RE 466.343-l.
Após ressaltar que "os Estados Modernos são 'Estados Constitucionais Coope-
rativos' (HABERLE), que demandam a manutenção da boa-fé e da segurança dos com-
promissos internacionais, ainda que em face da legislação infraconstitucional, pois
seu descumprimento coloca em risco os benefícios de cooperação cuidadosamente
articulada no cenário internacional", prossegue:
"Importante deixar claro, também, que a tese da legalidade ordinária, na medida
em que permite às entidades federativas internas do Estado brasileiro o descumpri-
mento unilateral de acordo internacional, vai de encontro aos princípios interna-
cionais fixados pela Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados, de 1969, a
qual, em seu art. 27, determina que nenhum Estado pactuante 'pode invocar as dis-
posições de seu direito interno para justificar o inadimplemento de um tratado'.
''Ainda que a mencionada convenção ainda não tenha sido ratificada pelo Bra-
sil98 , é inegável que ela codificou princípios exigidos como costume interna-
cional, como decidiu a Corte Internacional de Justiça no caso Namíbia (Legal
Consequences for States if the Continued Presence ofSouth Africa in N amíbia (South
ll-ést Africa) notwithstanding Security Council Rcsolution 276 (1970) First Advi-
so1)' Opinion, ICJ Reports 1971, p. 16, §§ 94-95.
"( ... )
"Portanto, parece evidente que a possibilidade de afastar a aplicação de normas
internacionais por meio de legislação ordinária (treaty override), inclusive no

97 Cfr. o Acórdão do STJ de 7 de outubro de 2008, REsp. nO 755.479, relatora Ministra DE-
NISE ARRUDA, com ampla discussão deste tema.
98 Esta Convenção já foi, porém, ratificada pelo Brasil em 25 de setembro de 2009 e referen-
dada pelo Decreto nO 7.030, de 14 de dezembro de 2009.
Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

âmbito estadual e municipal, está defasada com relação às exigências de coo-


peração, boa-fé e estabilidade do atual cenário internacional e) sem sombra de
dúvidas) precisa ser revista por essa Corte" (grifos nossos).
Aponta ainda o Ministro GILMAR MENDES para diversas referências na Consti-
tuição de 1988 que prestigiam a relevância preponderante da ordem jurídica interna-
cional para o direito interno.
"O texto constitucional admite a preponderância das normas internacionais so-
bre normas infraconstitucionais e claramente remete o intérprete para realidades
normativas diferenciadas em face da concepção tradicional do direito interna-
cional público.
"Refiro-me aos arts. 4°, parágrafo único, e 5°, §§ 2°, 3°, e 4°, da Constituição
Federal, que sinalizam para uma maior abertura constitucional ao direito inter-
nacional e, na visão de alguns, ao direito supranacional.
'1\lém desses dispositivos, o entendimento de predomínio dos tratados inter-
nacionais em nenhum aspecto conflita com os arts. 2°, 5°, lI, e § 2°, 49, I, 84,
VIII, da Constituição Federal.
"Especificamente, os arts. 49, I, e 84, VIII, da Constituição Federal, repetidos com
redação similar desde a Constituição de 1891 (respectivamente arts. 34, 12°; e 48,
16° da CF/1891), não demandam a paridade entre leis ordinárias e convenções
internacionais. Ao contrário, indicam a existência de normas infraconstitucionais au-
tônomas que não precisam ser perfiladas a outras espécies de normativos internos."
Noutra passagem do seu voto o Ministro se coloca abertamente contra a tese
dualista da transformação.
"Ora, se o texto constitucional dispõe sobre a criação de normas internacionais
e prescinde de sua conversão em espécies normativas internas - na esteira do en-
tendido no RE 71. 154/PR, ReI. Min. Oswaldo Trigueiro, Pleno,DJ 25.8.1971
- deve o intérprete constitucional inevitavelmente concluir que os tratados in-
ternacionais constituem, por si sós, espécies normativas infraconstitucionais dis-
tintas e autônomas, que não se confundem com as normas federais, tais como
decreto legislativo, decretos executivos, medidas provisórias, leis ordinárias ou
leis complementares.
"Tanto é assim que o art. 105, III, "a", da Constituição Federal, reserva a possi-
bilidade de interposição de recurso especial contra decisão judicial que 'contrariar
tratado ou lei federal, ou negar-lhes vigência'. Note-se que a equiparação entre 'tra-
tado' e 'lei federal' no mencionado dispositivo não indica paridade com 'lei federal
ordinária', mesmo porque o termo 'lei federal' contempla outras espécies normati-
vas, como decreto, lei complementar, decreto-legislativo, medida provisória etc.
''Na verdade, a equiparação absoluta entre tratados internacionais e leis ordi-
nárias federais procura enquadrar as normas internacionais em atos normati-
vos internos, o que não tem qualquer sustentação na estrutura constitucional.
Constitui 'solução simplista' à complexa questão da aplicação das normas inter-
Título 111 I Capo I I Tratados Internacionais

nacionais, conforme já apontara o saudoso Min. PHILADELPHO DE AZEVEDO no


julgamento de 11.10.1943 (Apelação Cível nO 7.872/RS).
"Como exposto, o tratado internacional não necessita ser aplicado na estrutura
de outro normativo interno nem ter status paritário com qualquer deles, pois tem
assento próprio na Carta Magna, com requisitos materiais e formais peculiares.
"Dessa forma, à luz dos atuais elementos de integração e abertura do Estado
à cooperação internacional, tutelados no texto constitucional, o entendimento
que privilegie a boa-fé e a segurança dos pactos internacionais revela-se mais fiel
à Carta Magna."
Este voto doutrinário do Ministro GILMAR MENDES deve ser considerado como
um marco histórico na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal sobre a matéria,
não só porque denuncia o anacronismo da posição ainda hoje prevalecente, mas ainda
porque revelou os vícios teóricos que lhe estão subjacentes e, fmalmente, porque ao
reconhecer, por enquanto apenas para certa categoria de tratados especiais, uma po-
sição hierárquica infraconstitucional, mas supralegislativa, acabou por viabilizar que a
evolução da jurisprudência da Casa venha consagrar a referida orientação quanto aos
tratados em geral, que é, aliás, a que melhor se coaduna com a Convenção de Viena.

H) As nossas conclusões

Em face do anteriormente exposto - e inobstante forte corrente jurisprudencial


em contrári099 - podemos concluir, no que concerne à relevância dos tratados na
ordem interna, que:
a) a Constituição Federal consagrou o sistema monista, o que significa que os
tratados valem na ordem interna "como tal" e não como leis internas em
que se tenham "transformado", apenas sendo suscetíveis de revogação ou
denúncia pelos mecanismos próprios do direito dos tratados, consequente-
mente apresentando em relação a leis internas supervenientes a "resistência
passiva", que é precisamente da essência da sua superioridade hierárquica;
b) os tratados internacionais, em geral, tal como os tratados sobre direitos
humanos que não se enquadrem nos requisitos do § 3° do art. 5° da Cons-
tituição, têm caráter supralegislativo, mas infraconstitucional;
c) os tribunais aplicam os tratados como tal e não como lei interna (arts. 102,
III, b), 105, III, a), 109, III) em que se tenham transformado;
d) a celebração dos tratados é ato da competência conjunta do Chefe do Po-
der Executivo e do Congresso Nacional (arts. 84, VIII, e 49, I), não sendo

99 Note-se que mesmo esta jurisprudência salvaguarda sempre a prevalência de aplicação dos
tratados contra a dupla tributação, quer pelo seu caráter "contratual", quer pelo caráter "es-
pecial". Não se conhece, com efeito, nenhum caso em que o Poder Judiciário tenha recusado
a aplicação de tratado desta natureza por revogação de lei posterior.
fImJ I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

portanto admissível a sua revogação, total, parcial ou denúncia, por ato


exclusivo do Poder Legislativo;
e) o art. 98 do Código Tributário Nacional- que é lei complementar que se
impõe ao legislador ordinário - é expresso ao estabelecer a superioridade hie-
rárquica dos tratados tributários, sendo inadmissível restringir essa superiori-
dade apenas a algumas espécies ou modalidades, não distinguidas por lei;
j) nem o decreto legislativo, que formaliza o referendo do Congresso Nacio-
nal, nem o decreto do Presidente da República, que formaliza a promulga-
ção, têm o alcance de transformar o tratado em lei interna.
g) a inexistência de uma cláusula geral de recepção automática e a conse-
quente necessidade de um procedimento de transposição condicionador
da eficácia dos tratados na ordem interna não é incompatível com a visão
monista e seus corolários enunciados nas alíneas anteriores.

§ 5° OS TRATADOS INTERNACIONAIS E OS TRIBUTOS ESTADUAIS E MUNICIPAIS

Coloca-se a questão de saber se a União pode celebrar tratados internacionais


em matéria de tributos dos Estados e Municípios ou se deverá restringir-se aos tribu-
tos de sua competência própria.
A dúvida tem a sua raiz no princípio da autonomia, constante do art. 18 da
Constituição Federal, segundo o qual "a organização político-administrativa da Re-
pública Federativa do Brasil compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os
Municípios, todos autônomos, nos termos desta Constituição".
Com efeito, a autonomia pressupõe um exclusivo do poder legislativo no que
concerne aos interesses próprios de cada ente político, notadamente em matéria tribu-
tária. Exclusivo esse que tem como corolário a regra do art. 151, III, da Constituição,
que veda à União "instituir isenções de tributos da competência dos Estados, do Dis-
trito Federal ou dos Municípios", considerada uma conquista em relação a experiências
constitucionais passadas em que a União era livre de outorgar isenções de tributos de
outros entes políticos, liberdade essa reputada ofensiva do princípio autonomístico.
Ora, já se afirmou, esta vedação de instituição de isenções pela União deve
operar não apenas no que concerne à via da lei federal, mas também no que toca à
via dos tratados internacionais. O que significa, por outras palavras, que os tratados
internacionais (por terem a interveniência exclusiva da União) não poderiam, em
caso algum, prever a isenção de tributos estaduais e municipais, notadamente as
exigidas por políticas regionais de integração econômica, como as relacionadas com
o MERCOSULloo.

100 Cfr. ALCIDES JORGE CoSTA, O ICMS na Constituição, RDT 46, 170; ESTEVÃO HORVATH/
NELSON FERREIRA DE CARVALHO, Tratado internacional, em matéria tributária, pode exonerar
Título 111 I Capo I I Tratados Internacionais -"P'
Esta argumentação não se apercebe, porém, da dupla qualidade que a União
reveste neste contexto, ou seja, o seu "caráter bifronte", para usar a imagem suges-
tiva de SOUTO MAIOR BORGES lOl • A União é pessoa jurídica de direito público interno,
mas não pessoa jurídica de direito internacional público. A personalidade internacional
cabe, isso sim, à República Federativa do Brasil, "formada pela União indissolúvel
dos Estados e municípios e do Distrito Federal" (art. 10 da Constituição).
Ora, é essa unidade indissolúvel (o Estado federal) que é representada organi-
camente, nas relações com os Estados estrangeiros e as organizações internacionais,
por um dos seus elementos constitutivos (a União) em virtude de uma competência
exclusiva expressamente atribuída pelo art. 21, inciso I, da Constituição Federal.
Nas relações internacionais, a União atua, não nas suas vestes de pessoa de di-
reito público interno, autônoma em relação aos Estados e aos Municípios, mas nas
vestes de órgão da República Federativa do Brasil- pessoa jurídica de direito interna-
cional público - e, por conseguinte, de todos os seus elementos componentes, entre
os quais os Estados e os Municípios.
A voz da União, nas relações internacionais, não é a voz de uma entidade com
interesses próprios e específicos, potencialmente conflitantes com os dos Estados e
dos Municípios, mas a voz de uma entidade que a todos eles engloba - a República
Federativa do Brasil. E é assim porque, por razões de unidade do sistema federativo,
a Constituição vedou aos Estados e Municípios, privados de personalidade jurídica
de Direito Internacional, a possibilidade de manterem relações com Estados sobera-
nos e organizações internacionais, atribuindo a representação dos seus interesses, no

tributos estaduais?, RDT 64, 262 ss. Na jurisprudência ver o Acórdão do STJ, Ia Turma,
REsp. nO 90.871-PE, ReI. Min. JosÉ DELGADO, DJU de 20.10.97,52.977.

101 Cfr. JosÉ SOUTO MAIOR BORGES, Isenções em tratados internacionais, cit., 171; JosÉ AFONSO DA
SILVA, Curso de Direito Constitucional Positivo (6 a ed.), 426; SACHA CALMON NAVARRO CoÉLHO,
As contribuições para a seguridade e os tratados internacionais, RDDT 26 (1997), 72; LUCIA-
NO AMARo, Direito Tributário brasileiro, São Paulo 1997, 174 ss.; VALDIR DE OLIVEIRA ROCHA,
Tratados internacionais e vigência das isenções por eles concedidos, em face da Constituição
de 1988, Repertório 1GB de Jurisprudência nO 5, 83-84; MAluA DO CARMO PUCCINI CAMINHA,
Os tratados internacionais tributários e a eficácia de suas normas no ordenamento jurídico
brasileiro, RTFP 41 (2001),45 ss.; EMERSON DRIGO DA SILVA, O relacionamento entre tratados
internacionais e lei interna no Brasil: a problemática de tratados internacionais que versam
sobre tributos estaduais ou municipais, RTFP 49 (2003), 9 SS.; HELENO TÔRREs, Tratados e
convenções internacionais em matéria tributária e o federalismo fiscal brasileiro, RDDT 86
(2002),46 SS.; HUGO DE BRITO MACHADO, Tratados e convenções internacionais em matéria trio
butária, cit., 32 SS.; MARCELO MARQUES RONCAGLIA, As isenções "heterônomas" em face do
Tratado do Gasoduto Brasil-Bolívia, in HELENO TÔRREs (org.), Direito Tributário Internacional
Aplicado, São Paulo 2003, 501. OSWALDO ÜTHON DE PONTES SARAIVA FILHO, Afmal, trata-
do internacional pode ou não isentar tributos estaduais, distritais e municipais?, RFDT 18
(nov.-dez,f2005), 67; SERGIO ANDRÉ R. G. DA SILVA, Possibilidade jurídica da concessão de
isenções de tributos estaduais e municipais por intermédio de tratado internacional, RDDT
113 (2005), 116; CARMEN TIBURCIO, Tratados internacionais e isenções a tributos estaduais e
municipais, RDE 11 (jul.-set./2008), 407.
.,nM Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

plano internacional, à União. Com toda a coerência, o art. 5°, § 2°, da Constituição,
reconhece a qualidade de parte dos tratados internacionais à República Federativa do
Brasil e não à União, revelando que esta atua como mero órgão da pessoa jurídica de
direito internacional público, que é a República Federativa do Brasil.
Quando o Presidente da República, ao abrigo dos incisos VII e VIII do art. 84
da Constituição, mantém relações com Estados estrangeiros, acredita seus represen-
tantes diplomáticos e celebra tratados, convenções e atos internacionais, não atua
como Chefe do Poder Executivo de uma pessoa de direito público interno (Chefe do
Governo Federal), mas como órgão de uma pessoa jurídica de direito internacional
público, competente para disciplinar qualquer dos seus interesses, sejam eles do con-
junto ou de cada um dos elementos que compõem a Federação (Chefe do Estado).
As limitações ao poder de tributar e de isentar, como as do art. 151, TIl, só
devem, por conseguinte, operar no âmbito das relações internas entre os elementos
componentes da Federação, por via da lei federal, mas não assim no âmbito das rela-
ções internacionais, por via de tratado.
Bem observa SOUTO MAIOR BORGES que as isenções de impostos estaduais e
municipais eventualmente previstas em tratado internacional não são verdadeiras
isenções hererônomas, mas autônomas, cuja única característica é a plurilateralidade
da sua instituição 102 .
A doutrina que acabamos de expor foi consagrada pelo Plenário do Supremo
Tribunal Federal no Recurso Extraordinário nO 229.096-0 (Dl de 11.4.08) em que
se discutia isenção de tributo estadual pelo tratado do GATT103.

102 Cfr. Isenções em tratados internacionais, cit., cujo pensamento acompanhamos. Consideramos
perfeito o Parecer da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFNjCAj863j93) quando
afirma: '~sim não se pode confundir as limitações da União como pessoa jurídica de direito
público interno, e enquanto representante da Federação, com sua atuação no concerto das
N ações na qualidade de legítima representante da República Federativa. ( ... ). O previsto
no art. 151, In, CFj88, é vedação explícita às isenções heterônomas no âmbito das compe-
tências das pessoas jurídicas de direito público interno (União, Estados, Distrito Federal e
Municípios), não estabelecendo conflitos no aspecto do Direito Internacional, pois ali todos
os entes da Federação respondem juntos pelo ato emanado; (... ). Não há se falar em invasão
de competência nos casos de isenções estaduais ou municipais concedidas através de trata·
dos internacionais, vez que a República Federativa do Brasil, indubitavelmente, é também
composta por Estados e Municípios. ( ... ). Alguns doutrinadores sustentam a tese de que a
concessão de isenções de impostos estaduais ou municipais em tratados é inconstitucional
em virtude do art. 151, III, CFj88. Na verdade, estes caem num enleio jurídico quando
tratam de duas situações diferentes como se uma só fossem, abstraindo o princípio basilar da
Federação e baseando-se na mera interpretação literal de um dispositivo isolado da Consti-
tuição Federal."
103 Cfr. Os comentários de SÉRGIO ANDRÉ ROCHA a este acórdão, in Isenção de tributos estadu·
ais e municipais via tratado internacional e efeitos do art. 98 do CTN: Análise da Decisão do
RE nO 229.096·0, inRDDT, 160, janeiro 2009,84 ss.; HUGO DE BRlTO MACHADO, Tratados
internacionais e isenções de tributos estaduais e municipais, RDDT (2009) 164, 66 ss.
Título 111 I Capo I I Tratados Internacionais

§ 6° O PRINCÍPIO DO "EFEITO NEGATIVO" DOS TRATADOS

Um dos problemas fundamentais nas relações entre os tratados de dupla tri-


butação e a lei interna consiste em saber se tais tratados têm uma fonção positiva de
atribuir aos Estados em causa pretensões tributárias que neles tenham o seu funda-
mento direto, ainda que tais pretensões não encontrem suporte na lei interna; ou
se têm uma simples fonção negativa de delimitar, por via convencional, pretensões
tributárias dos Estados cujo fundamento seja a respectiva lei interna.
A orientação unânime da doutrina é no sentido de que os tratados de dupla
tributação desempenham uma função negativa, como corolário do princípio da le-
galidade ou tipicidade da tributação, segundo o qual nenhum tributo pode ser exi-
gido senão com base na lei lo4 . Como muito bem diz ARNOLD KNECHTLE, «the conflict
rules ofDTAs can only leave the taxing power unchanged) restrict it) or repress it) but they
cannot enlm;ge it or initiate itJJl05 • Em fórmula similar, KLAUS VOGEL sublinha que
«a tax treaty neither generates a tax claim that does not otherwise exist under domestic
law nor expands the scope or alters the type of an existing claim (". y)106. E no mesmo
sentido BAKER conclui CCthe treaty comes only to relieve from tax which might otherwise
have been imposed»107.
Assim, para que exista tributação válida, não basta a existência de uma norma
convencional que a permita; é ainda necessária a existência de uma norma interna que
a imponha. E daí que seja necessária uma investigação em duas fases: uma primeira,
consistente em verificar se existe uma lei interna que fundamente a tributação; em
caso afirmativo, uma segutJda, na qual se apure se tal pretensão foi eventualmente
limitada por norma convencional lOS .

104 Cfr. KNECHTLE, Basic Problems in International Fiscal Law (trad.), Deventer 1979, 175;
BAKER, Double Taxation, 7 sS.
105 Cfr. KNECHTLE, Basic Problems, 174 e 65.
106 Cfr. VOGEL, Double Taxation, 27.
107 Cfr. BAKER, Double Taxation, 9.
108 Cfr. WIDMER, Die neueren schweizerischen Doppelbesteuerungsabkommen, apud KNECHTLE, Ba-
sic Problems, 184; DEBATIN, l*sen undAnwendung der Doppelbesteuerungsabkommen, Alillen-
wirtschaftsdienst des Betriebs-Beraters 1962, 61 (61 e 67); KNECHTLE, Basic Problems, 184,
referindo-se a "two-stage examination"; BÜHLER, Principios, 82; RrVIER, Droit Fiscal suisse. Le
Droit Fiscal International, Neuchatel 1983, 106. Na França, fala-se num "princípio de não
agravação": cfr. GOUTInERE, Les impôts dans les affaires internationales, Paris 1991, 138-139.
O Conselho de Estado francês chegou mesmo a considerá-lo princípio consuetudinário do
direito internacional: cfr. J. C. MARTINEZ, Les conventions, 70 ss., que se refere a um princípio
de "subsidiariedade"; CARTOU, Droit Fiscallnternational et Européen (2 a ed.), Paris 1986,29;
GUY GESTjGILBERT TIXIER, Droit Fiscal International (2 a ed.), Paris 1990,65 sS.; M. PIRES,
Da dupla tributaçíW, 45 e 460 SS.; FANTOZZI, Diritto Tributario, Turim 1991, 168.
I iI6 I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

§ 7° ÂMBITO DE APLICAÇÃO

o âmbito de aplicação de tratados de dupla tributação pode ser examinado de


quatro ângulos distintos: quanto às pessoas, quanto aos impostos, quanto ao territó-
rio e quanto à sucessão de Estados109 •

A) Quanto às pessoas

a) O princípio da relatividade dos tratados


o âmbito de aplicação dos tratados contra a dupla tributação, no que concerne
às pessoas) é definido em função do critério da residência e não da nacionalidade llo ,
ao invés do que sucedia anteriormente por influência da Sociedade das Nações l l l .
Diz, na verdade, o art. lOdo Modelo OCDE que "a presente convenção aplica-se às
pessoas residentes de um ou de ambos os Estados contratantes"ll2.
Assim, por exemplo, um brasileiro residente em país com o qual o Brasil não ce-
lebrou tratado de dupla tributação (por exemplo, a Suíça) não poderá invocar os tra-
tados celebrados pelo Brasil em terceiro país nos quais tenha interesses. Inversamente,
um nacional de Estado que não tenha celebrado tratado com o Brasil (por exemplo,
um suíço) poderá invocar os tratados celebrados pelo Brasil com terceiro Estado, des-
de que residente no Brasil. Por força do princípio da relatividade dos tratados, as pessoas
só se prevalecem da convenção se forem residentes num dos Estados contratantes JJ3 .
Do princípio da relatividade dos tratados resulta um tratamento discriminatório
no que tange às formas jurídicas de organização de atividades empresariais, de vez

109 Cfr. JosÉ MARIA DE LA VILLA GIL, Ambito de los convenios de doble imposicion, in ID. (org.),
Relacionesfiscales internacionales) Madrid 1987, 101; &'IDRÉ DE SOUZA CARVALHO, O escopo
subjetivo de aplicação dos acordos para evitar a dupla tributação: a residência, in HELENO
TAVEIRA TÔRREs (org.), Direito Tributário InternacionalAplicado, vol. V, São Paulo 2008, 155.
110 Exceção a esta regra são os preceitos relativos à não discriminação (art. 24° do Modelo) que
se aplicam a "nacionais" dos Estados contratantes, e as regras sobre troca de informações
(art. 26°) que não estão limitadas pelo art. 1°: cfr. VOGEL, Double Taxation) 87.
111 VOGEL refere que os tratados celebrados nos anos vinte adotavam sempre o princípio da
nacionalidade e que o então chefe das negociações alemãs, DORN, não conseguiu fazer preva·
lecer a sua opinião de que o tratado entre a Alemanba e a Itália deveria aplicar-se a todos os
residentes, ainda que não nacionais. Também o Modelo OCDE·ISD restringe o âmbito de
aplicação das Convenções às sucessões e doações das pessoas domiciliadas, à data da morte
ou da doação, num dos Estados contratantes (art. 1°).
112 Exceção a esta regra é a representada pela Convenção entre o Brasil e as Filipinas, país que,
tal como os Estados Unidos, adota o princípio da nacionalidade. Nos termos do Protocolo
(item 1), as Filipinas reservam-se o direito de tributar os seus cidadãos, ainda que não resi-
dentes, mas o Brasil não estará obrigado a conceder crédito por este imposto.
113 Sobre o princípio da relatividade dos tratados e sua não aplicação a estabelecimentos perma-
nentes, cfr. BAKER, Double Taxation) 76 ss.
Título 111 I Capo I I Tratados Internacionais

que as subsidiárias de empresa domiciliadas num terceiro Estado podem invocar os


dispositivos convencionais aplicáveis ao país onde elas próprias (porque dotadas de
personalidade jurídica) têm domicílio, mas não assim as filiais ou sucursais da mesma
empresa, meros estabelecimentos permanentes que, por não serem "pessoas", não
gozam do estatuto de residente, não se podendo beneficiar da proteção do tratado 1l4 •
Por sua vez, o titular desse estabelecimento pode invocar a aplicação do tratado so-
mente se ele próprio for residente de um dos Estados contratantes ll5 •

b) Situações triangulares: oprincipio da relatividade dos tratados


e os estabelecimentos permanentes em matéria de furos
A limitação do alcance do princípio da relatividade dos tratados a "pessoas resi-
dentes" conduz a que estes não se apliquem às relações entre estabelecimentos perma-
nentes situados nos dois Estados contratantes, mas pertencentes, um deles ou ambos,
a pessoas residentes em terceiro Estado; nem tampouco às relações entre uma pessoa
residente num Estado contratante e um estabelecimento permanente localizado no
outro Estado contratante, mas pertencente a pessoa residente em terceiro Estado.
Mas também conduz, por outro lado, a que os tratados se apliquem às relações entre
duas pessoas residentes em ambos os Estados contratantes, ainda que tais relações
respeitem a estabelecimentos permanentes situados em terceiros Estados.
Estas situações têm sido designadas por "situações triangulares", ou seja, situ-
ações em que um residente de um Estado (Estado R) tem um estabelecimento per-
manente noutro Estado (Estado P) que aufere rendimentos de um terceiro Estado
(Estado S). O Comitê dos Assuntos Fiscais da OCDE publicou um relatório sobre
estas situações, na qual se desaconselha a aplicação do tratado P-S aos estabeleci-
mentos permanentes (com o consequente entorse ao princípio da relatividade), na
medida em que tal aplicação favoreceria práticas de "treaty shopping". A tais situações
deveria aplicar-se apenas o tratado R_SI16.
A verdade, porém, é que, na generalidade das convenções celebradas pelo Brasil,
o princípio da relatividade dos tratados comporta uma derrogação importante em
matéria de juros, não no sentido ampliativo de permitir a aplicação do tratado a esta-

114 Cfr. J. VAN HOORN, Diffirences in Tax Treatment between Local and Foreign Industries and Ef
fects oflnternational Treaties (relatório geral), CDFI LXIII-b (1978), 15.
115 Cfr. VOGEL, Double Taxation, 88; J. M. RIVlER, Le Droit Fiscal International, 27-28.
116 Cfr. BAKER, op. cit., 396; SCHAUMBURG, Internationales Steuerrecht, Colônia 1993, 613;
OCDE, Comentários, art. 24, § 51-54; OCDE, Triangular Cases (Report Adopted by OECD
Council on 23 July 1992); IRENE J. J. BURGERS, Commentary onArticle 70fthe OECDModel
Treaty, in The Taxation ofPermanent Establishements, IBFD 1994,41; Roy ROHATGI, Basic
International Taxation, London(fhe HaguejNew York 2002,545 ss.; &'lA PAULA DOURADO,
Do case "Saint-Gobain" ao caso "Mettalgesellschaft": o âmbito do princípio da não discrimi-
nação do estabelecimento estável no tratado da Comunidade Europeia e a cláusula da Nação
mais favorecida, RDT 86 (2003), 7 ss.
Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

belecimentos permanentes de pessoas residentes em terceiros Estados, mas no senti-


do restritivo de fazer depender a aplicação do tratado não exclusivamente em função
da residência do devedor e do credor, mas cumulativamente em função da localização
do estabelecimento permanente no próprio país de residência do credor.
Dispõe, por exemplo, o § 6° do art. 11 da Convenção com os Países Baixos que
"a limitação de alíquota do imposto prevista no § 2° não se aplica aos juros prove-
nientes de um Estado contratante, pagos a estabelecimento permanente de empresa
de outro Estado contratante, situado em terceiro Estado"1l7.
Trata-se de um pressuposto relativo ao credor dos juros e que consiste em que
o beneficiário dos juros deve ter no Estado contratante não apenas a sua residência,
mas também o seu estabelecimento permanente, de tal modo que as disposições das
convenções relativas à redução de alíquotas não se aplicam aos juros pagos aos esta-
belecimentos permanentes que as empresas residentes no primeiro Estado tenham
em terceiros Estados.
Note-se que este pressuposto cumulativo (residência e estabelecimento) não
consta da Convenção-Modelo da OCDE (art. 11), em nenhuma das suas versões
(63,67 e 92), pelo que se deve entender que esta dupla exigência é fruto de uma po-
lítica deliberada e sistematicamente adotada pelo Brasil nas suas relações tributárias
com terceiros países.
De harmonia com o Modelo da OCDE, prevalece o princípio da relatividade
dos tratados, na sua pureza, inclusive em matéria de juros, pelo que os tratados se
aplicam se o devedor e o credor dos juros forem residentes nos dois Estados con-
tratantes, ainda que os juros sejam atribuídos a um estabelecimento permanente do
credor localizado em terceiro Estado. Por outras palavras: o que interessa é apenas
a residência das pessoas jurídicas envolvidas na operação de crédito, sendo absolu-
tamente irrelevante o Estado de localização do estabelecimento permanente, mero
patrimônio separado sem personalidade jurídica.
A única convenção celebrada pelo Brasil que segue o modelo da OCDE, não
tendo exigido o duplo requisito cumulativo relativo ao credor dos juros (residência e
estabelecimento), foi a Convenção com o Japão, cujo art. 10 (não modificado neste
ponto pelo protocolo promulgado pelo Decreto nO 81.194, de 9 de janeiro de 1978)
não formula a dupla exigência atrás referida.
Significa isto que o tratado entre o Brasil e o Japão, em matéria de juros, aco-
lheu de pleno o princípio da relatividade dos tratados, aplicando-se a operações de
crédito em que o devedor e o credor sejam residentes no Brasil e no Japão, sendo
irrelevante o Estado da situação do estabelecimento permanente.
Ora, foi precisamente isto que reconheceu - e bem - o Ato Declaratório (Nor-
mativo) CST nO 2/80.
Este ato pode decompor-se em duas proposições:

117 Vejam-se, por exemplo, disp?sições idênticas no art. 11, nO 6, das Convenções com a Suécia,
Tchecoslováquia, Noruega, India e França.
Título 111 I Capo I I Tratados Internacionais .,~.

uma primeira, segundo a qual "aos juros pagos a agência de banco japonês,
situada em terceiro Estado, aplica-se a Convenção entre os Estados Unidos
do Brasil, atualmente República Federativa do Brasil, e o Japão, destinada
a evitar a dupla tributação em matéria de impostos sobre rendimentos";
uma segunda, segundo a qual "como corolário, esta não se aplica aos juros
pagos aos estabelecimentos permanentes, situados no Japão, de pessoas
jurídicas com sede em terceiros países".
A primeira proposição é consequência direta e lógica do princípio da relativi-
dade dos tratados, pois o que releva é a residência do banco credor (Japão) e não o
Estado em que se localiza uma sua agência a quem os juros sejam atribuiveis.
A segunda proposição é também consequência direta e lógica do princípio
de relatividade dos tratados, pois que a localização no Japão de agência do banco
domiciliado em terceiro país não é elemento de conexão relevante para o âmbito
subjetivo de aplicação do tratado, elemento esse que é exclusivamente a residência
das partes 118.
O caráter aparentemente excepcional do regime descrito no Ato Declaratório
(Normativo) CST nO 2/80 resulta de, na generalidade das convenções brasileiras,
se ter aberto, em matéria de juros, uma derrogação ao princípio da relatividade dos
tratados. Mas, encarado à luz deste princípio e do Modelo da OCDE, que o adota,
longe de ser excepcional, confirma-o e reitera-o.
A generalidade das convenções assinadas pelo Brasil (com a única exceção da
Convenção com o Japão), conquanto não siga a pureza do Modelo da OCDE no
que concerne à cláusula de redução da alíquota sobre os juros, mantém intocado o
princípio da relatividade dos tratados em todos os outros aspectos, reconhecendo a
aplicabilidade das demais disposições do tratado às relações entre uma pessoa domi-
ciliada num Estado e um estabelecimento permanente localizado em terceiro Estado
pertencente a pessoa jurídica domiciliada no outro Estado contratante.

c) Entes sem personalidade jurídica

Segundo o art. lOdo Modelo OCDE, para que alguém esteja sujeito ao tratado
é necessário que seja uma pessoa residente de um ou de ambos os Estados contratan-
tes, definindo o art. 3°, § 1°, alínea "a", como "pessoa" um indivíduo, uma sociedade
ou outra entidade coletiva (body ofpersons). Daí terem surgido discussões a respeito
da aplicação dos tratados a certas figuras - como as sociedades de pessoas ou partner-
ships - que, embora em certos direitos (como o francês, o suíço e o espanhol) tenham
personalidade jurídica própria, noutros ordenamentos (como o alemão, o austríaco e

118 ''Firstly, the permanent establishment in State A Df an enterprise may not take advantage Df State
A treatiesj this is an appiication Df the principie Df the reiative effict Dftreaties". cfr. PHILIP BAKER,
op. cit., 395.
I 1m I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

o holandês) são "transparentes" (jlow-through), isto é, não são tratadas como entida-
des separadas, sendo os seus lucros tributados diretamente junto dos sóciosll 9 •
E o caso das Limited Liability Companies dos Estados Unidos (US LLC), de que
se tornaram especialmente conhecidas as formadas em Delaware, as Limited Liability
Partnerships do Canadá (LP) e do Reino Unido (LLP) e certas cooperativas holan-
desas (CV).
O Brasil considera as convenções aplicáveis às partnerships, por entender que
elas são dotadas de personalidade jurídica no Direito brasileiro I2°.
Outras "organizações" têm suscitado controvérsia na doutrina quanto à sua confi-
guração como "pessoa" para efeitos dos tratados: é o caso, por exemplo, das joint-ven-
tures, "clubes" ou "fundos de capital" (fundações, trusts) , onde a posição de membros
ou beneficiários corresponde à dos sócios. O mesmo se diga dosgroupements dJintérêt
économique previstos no regulamento da CE nO 2.137/85, de 25 de julho de 1985 121 •
Dois outros tipos de entes não personificados suscitam delicados problemas
quanto à aplicação das convenções de dupla tributação.
Um primeiro é constituído por entidades de investimento coletivo (como os nossos
fundos de investimento em participações (FIP), fundos de condomínio de capital
estrangeiro, carteiras de valores mobiliários, clubes de investimento, os Fonds Com-
muns de Placement - FCP - franceses, as Regulated Investment Companies - RIC - dos
Estados Unidos, os OPCVM luxemburgueses - os Real Estate Investment Trusts -

119 Cfr. KLAUS MANKE, Personengesellschaften und DBA - Abkommensberechtigung und Ab-
kommenschutz, in K. VOGEL (org.), Grundfragen des Internationalen Steuerrechts, Colônia
1985, 195; EGON SCHLÜTIER, Personengesellschaft oder Korperschaft - Aktuelle Qualifika-
tionsfragen, in K. VOGEL (org.), Grundfragen, 215 ss.; BRIGITIE KNOBBE-KwK, "Qualifika-
tionskonflikte" im internationalen Steurrecht der Personengesellschaften, Recht der internationalen
Wirtschaft 1991, 306; A. H. M. DANIELs,Issuesin InternationalPartnership Taxation, Deventer
1992; OCDE, TheApplication ofthe OECD Moelel Tax Convention to Partnerships, Paris 1999;
OCDE, Comentários, art. P, §§ 2 a 6.7; GILES DALIMIER, Les sociétés des personnes et les
coentreprises en droit fiscal international, CDFI LVIII (1973), lI/I 72; SANFORD H. GOLDBERG,
The N ature of a Partnership, in Essays on lnternational Taxation, 15, Deventer/Boston 1993,
155; JÜRGEN KILLIUS, Common Law Trusts: New Developments affecting the German Tax
- Status of Grantors and Beneficiaries, in Essays on International Taxation, 15, Deventer/
Boston 1993, 239; CELSO CLÁUDIO DE HILDEBRANDO GRISI FILHO/RoDRIGO MAITIO DA SIL-
VEIRA, O uso de Partneships no planejamento tributário internacional, RDTI 6 (2007),9;
RODRIGO MAITIO DA SILVEIRA, Aplicação de tratados internacionais contra a bitributação: quali-
ficação ele Partnership Joint Véntures, vol. I, São Paulo 2006.
120 Cfr. OCDE, art. I", NMCP, § 2°. Cfr. sobre a matéria o Partnership Report da OCDE, de
1999, hoje incluído nos Comentários à Convenção Modelo. Cfr. a Convenção com o México
(Protocolo, item 1 a) e a Convenção com a Bélgica.
121 Cfr. K. VOGEL, Double Taxation, 89 ss.; GOUTHIERE, Les impôts, 345; DUCCINI, Approche fiscale
eles contrats internationaux, Paris 1985, 111; RIVIER, Le Droit Fiscal International, 118; BAKER,
Double Taxation, 78 ss. Sobre o problema da "qualificação" em matéria de partnerships, cfr.
VOGEL, Double Taxation, 96 ss. e 181 ss.; G. SASS, Les aspects fiscaux du Groupement Européen
d'Intêrét Economique (G.E.I.E.), Fiscalité Européenne 1986-4,43; A. MIRAuLO, Doppia impo-
sizione, 319; Euo BLASIO, Pianificazione fiscale internazionale, Milão 1992, 149 ss.
Título 111 I Capo I I Tratados Internacionais .".

REIT). Tais organismos têm de comum tratar-se de compropriedades indivisas de


valores mobiliários e recursos financeiros, sendo destituídos de personalidade jurídi-
ca e "transparentes" para efeitos fiscais. Assim, o fato de se localizarem num determi-
nado país, sendo aí administrados por sociedade gestora ou entidade depositária, não
lhes permite invocar a aplicação das convenções celebradas por esse país, dado não
revestirem a natureza de "pessoas residentes". A aplicação dos tratados deverá, pois,
examinar-se ao nível de cada um dos titulares das "partes" de tais fundos, a quem os
rendimentos ou ganhos de capital se reputam diretamente atribuídos, sendo irrele-
vante a localização da entidade pela qual "transitam"122.
O fato de os tratados em geral definirem a expressão "pessoa" como sendo cons-
tituída, além das pessoas físicas e das sociedades, por um "grupo de pessoas" (body 01
persons) não é suficiente, por si só, para o reconhecimento de personalidade jurídica
aos fundos de investimento. Este reconhecimento compete sempre à lei interna do país
em que o fundo se constiui, cingindo-se o tratado à sua função negativa de estabelecer
limites que aquela não pode ultrapassar. Assim, se a lei interna reconhecer a personali-
dade jurídica dos fundos, ela terá respeitado o tratado, já que este é um agrupamento
de pessoas, embora não seja uma sociedade. Mas, se não reconhecer, tal fato não basta
para que ela seja considerada pessoa por força direta e imediata do tratado123 •
Um segundo tipo é formado pelos trusts (fideicomissos) constituídos à sombra
das leis de países que admitem esta figura jurídica do direito anglo-saxão. O trust
é, na sua essência, um desmembramento da propriedade (entre propriedade legal
e propriedade fiduciária) que se opera por um ato (deed 01 trust) pelo qual alguém
(settlor) confia um bem ou conjunto de bens a outrem (trustee) com a finalidade de
fazer beneficiar um terceiro (cestui que trust).
O artigo 2° da Convenção da Haia de 1985, sobre a lei aplicável aos Trusts e ao
seu reconhecimento, define o trust nos seguintes termos:
"For the purposes 01 this Convention) the term C(trust)) refers to the legal relationships
created - inter vivos ar on death - by a person) the settlo'!; when assets have been placed
under the contrai ala trustee for the benefit ala beneficiary ar for a specified purpose.
A trust has the following characteristics:
a) the assets constitute a separate fund and are not a part 01 the trustee)s own estate;

122 Cfr. IFA, The Taxation of Investment Funds, CDFI LXXXII-b (1997), 910; The Taxation
ofInvestment Funds, CDFI LXXXII-b (1997), 910; OCDE, Comentários, art. 10, §§ 67.1
a 67.7 e art. 13, §§ 28.9 a 28.11 (versão de 2008), considerando em especial o caso dos
REIT; OCDE, Report on the Taxation ofCollective Investment Vehicles, 2009; JOÃo FRANCISCO
BIANCO, Os fundos de investimento no exterior e os tratados internacionais, in ROBERTO
QUIROGA MOSQUERA (coord.), O Direito Tributário e o Mercado Financeiro e de Capitais) Di-
alética, São Paulo 2009, 247 sS.; JOÃo VICTOR GUEDES SANTOS, Fundos de investimento e
tratados contra a dupla tributação: tratamento dos ganhos e rendimentos de não residentes)
in ROBERTO QUIROGA MOSQUERA, ibidem, 255 sS.
123 Cfr. em sentido diverso JOÃo FRANCISCO BIANCO, Os fondos de investimento no exterior e os
tratados internacionais) cit., 247 sS.
Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

b) title to the trust assets stands in the name ofthe trustee or in the name ofanother
person on behalfofthe trusteej
c) the trustee has the plJWer and the duty, in respect of which he is accountable, to
manage, employ or dispose of the assets in accordance with the terms of the trust
and the special duties imposed upon him by law. "
O trust tem, pois, como características essenciais: (i) os bens objeto do trust
formam um patrimônio específico que, apesar de transferidos para a propriedade do
trustee, formam um massa separada do resto do seu patrimônio; (ii) o trustee assume
a obrigação de gerir e dispor os bens transferidos pelo settlor, segundo as condições
impostas pelo trust e pela lei.
A dificuldade existente para a introdução do instituto do trust no direito brasileiro
encontra-se na inexistência de um conceito de dualidade da propriedade, ao contrário dos
sistemas de onde o trust se origina. No trust, coexistem direitos paralelos de propriedade,
concebendo-se da parte do trustee um direito de propriedade meramente formal, uma
vez que os bens objeto do trust não se confundem com o restante de seu patrimônio. Po-
rém, no direito brasileiro, em que os direitos reais são considerados taxativos, por força
de um princípio de tipicidade, não existe semelhante direito limitado de propriedade 124•
Ainda que certos países não admitam esta figura no seu direito interno, podem, po-
rém, reconhecer a validade dos efeitos de um trust estrangeiro l25 • Como, porém, o trust é
destituído de personalidade jurídica, não pode qualificar-se como "pessoa residente" para
efeitos de aplicação das convenções contra a dupla tributação. Uma complicação adicio-
nal resulta de o "beneficiário" (cestui que trust) não ser, à luz da generalidade dos países, o
verdadeiro "proprietário" ou "titular" dos rendimentos em causa, pelo que a aplicação da
convenção lhe pode ser recusada, na ausência de disposição específica que o preveja.
Algumas convenções recentes contra a dupla tributação resolvem expressamente
alguns problemas suscitados pelo hibridismo do trust, ou equiparando o trust a pes-
soa residente (no Estado em que está domiciliado o trustee) , ou aplicando o tratado
em função da residência de cada um dos beneficiários de um trust simples 12ó .

124 Cfr. VERÔNICA FREIRE E ALMEIDA, A tributação dos trusts, Coimbra 2009; ARNOLDO WALD, Al-
gumas considerações a respeito da utilização do "Trust" no Direito brasileiro. Revista de Direito
Mercantil 99 (jul.-set.), RT (1995), 109; MELHlM NAIMER CHALHUB, Trust: Breves Conside-
rações sobre sua adaptação aos sistemas jurídicos de tradição romana, RI 790 (ago./2001),
79-113; ID., Trust: Perspectivas do Direito Contemporâneo na Transmissão da Propriedade paraAd-
ministração de Investimentos e Garantia, Rio de Janeiro 2001; RODRlGO MAIrro DA SILVEIRA, O
tratamento fiscal do trust em situações internacionais, RDTI 2 (2006), 151; CARLOS EDUARDO
COSTA M. A. TORO, Reflexos fiscais do uso do trust e os limites ao planejamento tributário,
RDIJ7 (2007), 9.
125 Veja-se a Convenção Internacional da Haia, de 1 de julho de 1985, tendo por objeto ore·
conhecimento de trusts por países de direito civil. Note·se que vários Estados de direito civil
conhecem a figura do trust: é o caso da Venezuela, Québec, Mônaco, Suíça e Panamá.
126 É o que sucede, respectivamente, nas convenções entre a França e o Canadá e entre a Fran-
ça e os Estados Unidos. Cfr. FRANS SONNEVELDT/HARRlE L. VAN MENS, The Trust. Bridge
or Abyss between Common and Civil Law Jurisdiction, Amsterdam 1992; FRANÇorS TRlPET,
Título 111 I Capo I I Tratados Internacionais

Entre nós, a Convenção com o Peru considera o fideicomisso como pessoa


residente em um Estado (Protocolo, item 1) e a Convenção com o México somente
quando os rendimentos que obtenha sejam tributáveis nesse Estado como rendimen-
tos dos seus beneficiários (Protocolo, item 1).

d) A cláusula «sujeita a imposto»


Como se viu, o art. lOdo Modelo OCDE determina que, para que alguém es-
teja sujeito ao tratado, é necessário que seja uma "pessoa residente de um de ambos
os Estados contratantes".
Examinamos atrás o conceito de pessoa; no que concerne ao conceito de resi-
dente, o art. 4° do Modelo OCDE estabelece que "para os efeitos desta Convenção
o termo 'residente de um Estado contratante' significa qualquer pessoa que, segundo
as leis desse Estado, esteja aí sujeita a imposto em razão do seu domicílio, residência,
sede de direção ou outro critério de natureza similar ( ... )".
Certos Estados têm interpretado a expressão "liable to tax" como significando
não apenas a sujeição potencial a imposto, mas a sujeição efetiva l27.
Tal interpretação tem como consequência recusar a aplicação dos benefícios dos
tratados a pessoas que, muito embora sejam formalmente domiciliadas no outro
Estado, não sejam neste tributadas efetivamente em razão de isenções objetivas ou
subjetivas ou de outras causas similares. Tal recusa de aplicação teria como propósi-
to evitar a dupla não tributação, propósito esse arvorado pela OCDE, desde 1999,
como um dos objetivos dos tratados tributários.

Trusts patrimoniaux anglo-saxons et Droit Fiscal français, Paris 1989; AVERY JONEs/et al., The
Treatment ofTrusts under the OECD Model Convention, British Tax Review 1990, 41; JÜRGEN
KILLlUS, Common Law Trusts: New Developments affecting the German Tax - Status of
Grantors and Beneficiaries, in Essays on Intemational Taxation, 15, Deventer/Boston 1993,
239; ANDREW J. BAKER, Use ofTrusts in International Tax Strategies, in DENNIS CAMPBELL
(org.), Intemational Tax Planning, 1995, 241; MAURlZIO LUPOI, Introduzione ai Trusts, Milão
1994. GIUSEPPE CORASANITI, li modello OCSE di convenzione bilaterale contro la doppia
imposizione e i trusts, in VICTOR UCKMAR (org.), Corso di Diritto Tributaria Internazionale,
Pádua 1999, 445, LORENZO DE ANGELIS, Trust e fiducia nell'ordinamento italiano, in VICTOR
UCKMAR (org.), ibidem, 459; TULIO ROSEMBUJ, Derecho Fiscal Internacional, Barcelona 2001,
160 sS. Note-se que a constituição do trust envolve sérios problemas nos países em que
existem impostos sobre doações ou sobre o patrimônio, notadamente quanto à questão de
saber qual é o transmitente e a transmissão relevante, se a transferência inicial de bens para
o trustee ou se a transferência de bens do trust para os beneficiários. Cfr. Modelo OCDE-
ISD, Comentários, art. 1°, §§ 15 e ss. OECD, International TaxAvoidance and Evasion - Four
Related Studies, Paris 1987; BAKER, Double Tàxation, 90 sS.; RrvIER, Le Droit Fiscal Interna-
tional, 118; SCHAUMBURG, Internationales Steuerrecht, Colônia 1993, 598 sS.; Luís EDUARDO
SCHOUERl, Planejamento fiscal através de acordos de bitributaçáa - Treaty Shopping, São Paulo
1995,156.

127 Cfr. OCDE, Comentários, art. 4°, §§ 8.2 e 8.3.


i!m I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

De harmonia com a sistemática do Direito brasileiro a expressão "sujeita a im-


posto" das cláusulas dos tratados similares ao art. 4°, § 1°, do Modelo OCDE, signi-
fica que, de harmonia com as regras gerais de incidência de um determinado imposto
(no caso, o imposto de renda), certa entidade é considerada "contribuinte" (tax-
payer) ou seja, é idônea a figurar como sujeito passivo. Referida expressão não tem
o significado de exigir uma tributação efetiva, admitindo-se que um contribuinte,
"sujeito a imposto" pelas regras gerais de incidência, se beneficie de isenção objetiva
ou subjetiva. "Sujeito a imposto" significa, em suma, suscetível de tributação.
Tenha-se ainda presente que o Brasil não adota a prática, frequente noutros Es-
tados, de exigir certificado de residência no outro Estado como condição de aplicação
do tratado. Por conseguinte, menos ainda exige, como condição de aplicação do trata-
do, a prova de que as pessoas tenham sido efetivamente tributadas no outro Estado.

e) Cláusula CÚJ beneficiário efetivo


Certas convenções exigem como requisito de aplicação do tratado que, além da
residência num dos Estados contratantes, a pessoa em causa seja o beneficiário efetivo
(beneficialowner) dos rendimentos, notadamente dos juros, royalties e dividendos. Esta
exigência é, aliás, recomendação do Modelo OCDE, na versão de 1977, com vista a
evitar a modalidade de abuso de convenção (treaty shopping), consistente em colocar ar-
tificialmente, num país abrangido pelo tratado, um titular de direito a rendimentos que
não é o seu real beneficiário, o qual por seu turno é domiciliado em terceiro país 128 .
A expressão "beneficiário efetivo", desconhecida da generalidade dos países de
civilla~ tem a sua origem no Direito inglês, onde visa a excluir, de certos efeitos, o
proprietário legal que age como trustee para outrem. Mas, segundo a Comissão de
Assuntos Fiscais da OCDE, o conceito não se restringe às hipóteses de nominee ou
agente, podendo abranger casos similares, tais como os de uma conduit company que,
embora seja o titular- formal de certos ativos, tem poderes tão limitados que revelam
tratar-se de mero fiduciário ou administrador atuando por conta das partes interessa-
das, notadamente os sócios da conduit company 129.
Mesmo, porém, nas Convenções que não adotam o conceito de beneficiário
efetivo, a sua aplicabilidade depende de que a pessoa residente seja o "beneficiário",
isto é, o titular do direito ao rendimento.

128 Cfr. CHARL DU TOIT, Beneficiai Ownership ofRoyalties in Bilateral Tax Treaties, Amsterdam 1999;
HELMUT BECKER, Erschleichung der Abkommensberechtigung durch Zwischenpersonen, in
K. VOGEL (org.), Grundfragen, 171.
129 OECD, International Tax Avoidance and Evasion - Fonr Related Studies) Paris 1987; OCDE,
Comentários, art. 10°, § 12.1, art. 11, § 8.1; art. 12, § 4.1. BAKER, Double Taxation) 90 ss.;
RIVIER, Le Droit Fiscal International) 118; SCHAUMBURG, Internationales Steuerrecht) Colônia
1993, 598 ss.; Luís EDUARDO SCHOUERl, Planejamento fiscal através de acordos de bitributação -
Treaty Shopping, São Paulo 1995, 156; HELENO TÔRRES, Direito Tributário Internacional, 372.
Título 111 I Capo I I Tratados Internacionais I D I

As Convenções não são, pois, aplicáveis em função do domicílio ou residência


de meros mandatários, como sucede com os "pay agents" em operações frnanceiras
coletivas, de que participam, em regime de sindicato ou consórcio, uma pluralidade
de bancos credores. Nestas circunstâncias, a aplicabilidade ou não do tratado deve
aferir-se individualizadamente em face da residência ou domicílio de cada um dos
credores, os quais aliás são os únicos que poderão beneficiar-se de eventuais créditos
de imposto. A figura do ''pay agent" é, assim, absolutamente irrelevante, exceto no
que concerne à tributação da remuneração pelos seus próprios serviços.

j) Exclusão de certas pessoas


Anote-se que certas convenções excluem do seu âmbito de aplicação certas ca-
tegorias de pessoas, ainda que residentes num dos Estados contratantes: é o caso da
Convenção com o Luxemburgo, que não se aplica às sociedades holding residentes do
Luxemburgo, por gozarem de tratamento fiscal especial (arts. 1° e 2°)130.
Um caso especial de exclusão de certas pessoas do âmbito de aplicação dos trata-
dos é dado pela cláusula de "não cumulação de benefícios", segundo a qual as pessoas
que gozam de certas vantagens fiscais em face da legislação interna do seu país de
residência não podem prevalecer-se cumulativamente dos benefícios outorgados pelo
tratado.
Exemplo desta cláusula consta do item 9 do Protocolo à Convenção com Portu-
gal (2000), segundo o qual "fica entendido que os benefícios desta Convenção não
serão atribuídos a qualquer pessoa que tenha direito a benefícios fiscais relativos ao
imposto sobre o rendimento de acordo com os dispositivos da legislação e de outras
medidas relacionadas com as Zonas Francas da Ilha da Madeira, da Ilha de Santa
Maria, de Manaus, a SUDAM e a SUDENE ou a benefícios similares àqueles con-
cedidos, disponíveis ou tornados disponíveis segundo qualquer legislação ou outra
medida adotada por qualquer Estado contratante".

B) Quanto aos impostos

a) Considerações gerais
De harmonia com o art. 2°, § 1°, da Convenção Modelo da OCDE, as con-
venções contra a dupla tributação em matéria de impostos sobre a renda e a fortuna

130 Cfr. DELVAUX/REIFFERS, Les societés holding au Luxembourg, Paris 1964. Anota LUÍS EDUARDO
SCHOUERI que os tratados celebrados pelo Brasil não excluíram do seu âmbito de aplicação os
"centres de coordination" belgas nem as "non resident (JfIJned investment companies" do Canadá.
Cfr. Luís EDUARDO SCHOUERI, Planejamento fiscal através de acordos de bitributaçiW - TreaPy
Shopping, São Paulo 1995, cit., 144.
Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

aplicam-se, em princípio, aos tributos que revestem aquela natureza substancial, in-
dependentemente da sua denominação (nomen iuris), da pessoa de direito público
que é seu titular ou do método adotado para a sua cobrança.
Assim, as convenções abrangem, em princípio, os impostos sobre o rendimento
total, sobre a fortuna total, ou sobre parcelas do rendimento ou da fortuna, incluindo
os impostos sobre os ganhos derivados da alienação de bens mobiliários ou imobi-
liários, os impostos sobre o volume dos salários pagos pelas empresas (payroll taxes)
Lohnsummensteuer) bem como os impostos sobre as mais-valias J31 .
A natureza da pessoa de direito público titular do imposto também não influi
no âmbito de aplicação dos tratados, os quais abrangem tributos cobrados pelos Es-
tados federais, Estados federados, subdivisões políticas, cantões etc J32 .
Enfim, a técnica de cobrança do tributo também não releva para efeitos da sua
subordinação às convenções, que tanto se aplicam aos tributos lançados como adi-
cionais como aos tributos retidos na fonte.
À luz destes critérios gerais - indicados pelo art. 2° do Modelo OCDE -, os
Estados contratantes elaboram, via de regra, uma lista dos impostos atuais a que
a Convenção se aplica, lista que se reveste de caráter meramente declaratório, não
tendo alcance limitativo. Por parte do Brasil, todas as convenções definem a regra
de que se aplicam ao imposto federal sobre a renda, com exclusão das incidências
sobre remessas excedentes e atividades de menor importância. A expressa exclusão
do imposto suplementar de renda, bem como da tributação agravada prevista no
art. 44 da Lei nO 4.131/62, resulta do seu caráter extrafiscal, com objetivos cam-
biais, que não se adapta à filosofia dos acordos de dupla tributação, os quais têm
em vista atenuar os efeitos do cúmulo da fiscalidade ordinária, normal, dos Estados
em concurso J33 •
Em ordem a evitar que a modificação da legislação interna pudesse afetar o hm-
cionamento normal dos acordos, as convenções preveem a sua aplicação a impostos
foturos de natureza idêntica ou análoga (a Ver;gleichbarkeit der Steuer, a que se refere
TILLMANNS 134 ) que venham a acrescer aos atuais ou substituí-los.

131 Mas já não abrangem impostos indiretos, impostos sobre sucessões e doações, contribuições
de segurança social, royalties pela extração de recursos naturais. Cfr. BAKER, Double Taxation)
114 ss. Por sua vez, de harmonia com o Modelo OCDE-ISD (art. 20 ) , as convenções rela-
tivas aos impostos sobre sucessões e doações abrangem os impostos incidentes, por morte,
sobre a massa da herança, sobre as quotas hereditárias, direitos de transmissão ou os impos-
tos sobre doações mortis causa. São considerados impostos sobre as doações os impostos
incidentes sobre as transmissões inter vivos em virtude da gratuitidade total ou parcial da
transmissão.
132 O Brasil formulou reserva a esta abrangência e pretende adotar definição de imposto de
renda compatível com a sua Constituição, cfr. OCDE, art. 10, NMC Positions, §§ 2 0 e 6 0.
133 Cfr. a 1 a edição deste livro (São Paulo 1977), 206-207. Referidos impostos foram extintos
pela Lei na 8.383, de 31 de dezembro de 1991.
134 Cfr. TILLMANNS, in MbssNER/et al., Steuerrecht, 123 (130). Cfr. também o art. 20 , na 4, do
Modelo OCDE-ISD.
Título 111 I Capo I I Tratados Internacionais

DALIMIER135 propõe os seguintes critérios de aplicação desta regra: "Se uma lei
interna suprime um imposto incluído no convênio e o substitui por um imposto
novo, que tenha outra denominação, mas que seja da mesma natureza que o an-
tigo, o convênio se aplicará a este novo imposto; se se cria um imposto novo ou
um imposto que acresce aos já existentes, mas formando o prolongamento daqueles
(sobretaxas, taxa adicional), o novo instrumento fiscal segue o destino do imposto a
que está anexo; se a lei interna cria um novo imposto não relacionado com nenhum
outro, convém analisar os caracteres próprios deste imposto, para ver se sim ou não
é 'imposto idêntico ou análogo"'.

b) A questão da contribuição social sobre o lucro (CSL)

Em face destas considerações pode afirmar-se que as convenções celebradas pelo


Brasil são aplicáveis à contribuição social sobre o lucro, instituída pela Lei nO 7.689/88,
nos termos do art. 195, l, da Constituição, que confere à União Federal o poder de
instituir tributos. É que, na verdade, ela é, na sua substância, um adicional ao im-
posto de renda, distinguindo-se apenas pela sua destinação, vinculada à finalidade es-
pecífica da seguridade social. Ora, a natureza dos tributos deve identificar-se no fato
gerador e na base de cálculo (substancialmente idênticos aos do imposto de renda
propriamente dito) e não na sua denominação ou destino, como esclarece o art. 4°
do Código Tributário Nacional.
Da identidade de natureza entre a contribuição social sobre o lucro e o imposto
de renda das pessoas jurídicas resulta que a legislação reguladora deste último deve
considerar-se aplicável subsidiariamente em tudo quanto não tenha sido objeto de
disciplina específica estabelecida por lei e que respeite exclusivamente à primeira.
Manifestações deste princípio geral são as regras constantes do art. 4° da Lei nO
7.689/88, segundo o qual os contribuintes da contribuição social, tal como os do
imposto de renda, são as pessoas jurídicas domiciliadas no País e as que lhes são equi-
paradas pela legislação tributária; e dos arts. 28 a 30 da Lei nO 9.430/96 que aplicam
à contribuição social sobre o lucro as mesmas normas de apuração da base de cálculo
e de pagamento estabelecidas para o imposto de renda das pessoas jurídicas.
O último passo, no sentido da plena identificação entre o imposto de renda
e a contribuição social sobre o lucro líquido (CSL), foi dado pela Medida Provi-
sória nO 1858-7, de 29 de julho de 1999136 , que aplicou à contribuição social o
princípio da universalidade (world-wide income) que até então vigorava apenas em
matéria de imposto de renda, sendo a contribuição social governada pelo princí-
pio da territorialidade.

135 Cfr. G. D ALIMIER, Conventions intemationales en matiêre fiscale (relatives aux doubles impositions),
Juris Classeur de Droit International353 (1955), 11; M. PIRES, Da dupla tributação, 448; J. C.
MARTINEZ, Les conventions de double imposition, 46 ss.; MOURA BORGES, Convenções, cit., 131 ss.
136 Atualmente Medida Provisória nO 2.158-35/01.
I p I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

A partir desta Medida Provisória nenhuma diferença substancial remanesce entre


o imposto de renda e a referida contribuição, a não ser a destinação constitucionalmente
estabelecida dos recursos que, conforme já se verificou, é irrelevante para a definição da
natureza jurídica do tributo, de harmonia com o art. 4° do Código Tributário Nacional.
Inobstante a CSL ser uma "contribuição com fim específico" à luz da tipologia
de tributos consagrada na Constituição Federal, a sua estrutura, em face das regras do
CTN, é de um imposto que, por incidir sobre o lucro das pessoas jurídicas, está abran-
gido nos tratados contra a dupla tributação em matéria de imposto de renda l37 •
Na doutrina esta também é a opinião majoritária, que destacamos, pela sua cla-
reza, a de LUCIANO AMAR0 138 :
"Em suma, a circunstância de, no tratado, identificar-se como imposto visado o
imposto sobre a renda e proventos de qualquer natureza, não limita o âmbito
de aplicação das normas convencionais ao tributo que assim continue sendo
designado pela legislação interna; se, após firmado o tratado, for criada nova
figura tributária que seja substancialmente semelhante àquele imposto, as normas
convencionais - por expressa disposição que os tratados soem prescrever - es-
tendem-se às novas figuras.
"Dessa forma, nas hipóteses em que a norma convencional aplicar-se ao imposto
de renda interno, será ela igualmente aplicável à contribuição social sobre o lu-
cro, dado que esta exação é substancialmente semelhante, se não se quiser afirmar
que, substancialmente, ela é idêntica ao imposto de renda. Há, é verdade, trata-
dos firmados pelo Brasil após a criação da contribuição sobre o lucro que (talvez
pela lei da inércia) continuam referindo como 'imposto visado' o imposto de
renda, sem explicitar a contribuição sobre o lucro. Entretanto, se esses mesmos
tratados preveem a aplicação das normas convencionais aos imposto idênticos
ou substancialmente semelhantes àquele, que a ele acresçam, parece-nos lógico
que a contribuição sobre o lucro deva entender-se acrescida."
Importa distinguir consoante a Convenção contra a dupla tributação tenha sido
celebrada pelo Brasil anteriormente ou posteriormente à instituição da CSL.

137 Que a CSL tem idêntica natureza à do imposto de renda foi reconhecido pelo Acórdão (unâ-
nime) n° lUI-Y5.1102 da 1" Câmara do Primeiro Conselho de Contribuintes, no qual se lê a
seguinte passagem: "Essa conclusão se aplica, inclusive, à CSLL, uma vez que o § 4° do art.
2° da Convenção determina sua aplicação a quaisquer impostos substancialmente semelhantes
que forem criados, seja por adição aos impostos já existentes, seja em sua substituição. E este é
exatamente o caso da Contribuição Social sobre o lucro líquido, substancialmente semelhante ao
imposto de renda, tendo ambos como ponto de partida o lucro líquido do exercício." (grifos nossos)
138 Cfr. LUCIANO AMARo, Os tratados internacionais e a contribuição social sobre o lucro, in V AL-
DIR DE O. ROCHA (org.), Grandes questões atuais de Direito Tributário, São Paulo 1997, 155 ss.;
veja-se, ainda, HELENILSON CUNHA PONTES, A contribuição social sobre o lucro e os tratados para
evitar a dupla tributação sobre a renda, ibidem, 41 ss.; SACHA CAlMON NAVARRO CoÉLHO, As
contribuições para a seguridade e os tratados internacionais, RDDT 26, 72; HELENO TÔRRES,
A pluritributação internacional sobre as rendas de empresas, São Paulo 2001, 615.
Título 111 I Capo I I Tratados Internacionais Iç I

Quanto às convenções celebradas anteriormente) entendemos que as suas dispo-


sições são automaticamente aplicáveis à CSL por força da cláusula residual contida
em disposições idênticas ao art. 2°, § 4°, da Convenção Modelo da OCDE, que
preveem a sua aplicação a quaisquer tributos idênticos ou substancialmente semelhantes
que forem posteriormente introduzidos.
Quanto às convenções celebradas posteriormente à instituição da CSL (dez/1988)
a grande generalidade dos tratados continuou a omitir uma referência explícita a re-
ferido tributo.
Uma das razões que levaram a este silêncio consiste no fato de a CSL não ter
como contribuintes residentes no exterior, pelo que ele não contempla retenções na
fonte sobre pagamentos a não residentes. Ora, a redução de alíquotas nesses paga-
mentos constitui a parte mais relevante das Convenções contra a dupla tributação.
Outra das razões justificativas do silêncio está no fato de que até 1999 a CSL era
meramente territorial, como já se disse, tendo apenas passado a consagrar o princípio da
universalidade ou do worldwide income, pelo qual são tributáveis os lucros e rendimen-
tos auferidos no exterior, a partir da MP nO 1858-7/99 (atual MP nO 2.158-35/01).
A introdução do princípio da universalidade permite, pois, sustentar que as
convenções celebradas posteriormente à entrada em vigor da CSL, mas anteriores à
consagração do princípio da universalidade, aplicam-se também automaticamente à
CSL, por força da cláusula residual equivalente à disposição do art. 2°, § 4°, da Con-
venção Modelo OCDE, pois a consagração daquele princípio constitui a previsão de
um fato gerador novo (lucro ou rendimento no exterior) equiparável à instituição de
tributo em adição àquele já existente.
Resta finalmente examinar o caso das convenções celebradas posteriormente à
adoção do princípio da universalidade em matéria de CSL, no ano de 1999.
Dentre estas convenções duas aludem expressamente à CSL139.
(i) O art. 2°, nO 1, alínea "a", do Protocolo ao Tratado com Portugal de 2000
(Decreto nO 4.012, de 13.11.2000), determina:
"Fica entendido que nos impostos visados no art. 2°, nO 1, alínea a) está
compreendida a contribuição social sobre o lucro líquido (CSL), criada
pela Lei nO 7.689, de 15 de dezembro de 1988."
(ii) O art. XII do Protocolo anexo à Convenção Adicional ao Tratado com a
Bélgica (Decreto nO 6.332, de 31.12.2007), que dispõe: "Fica entendido
que os impostos visados no art. 2°, § 2°, b) compreendem a Contribuição
Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), criada pela Lei nO 7.689, de 15 de
dezembro de 1988."140

139 Idêntica disposição constava do art. IOdo Protocolo ao Tratado com o Paraguai (Decreto Le-
gislativo nO 972, de 16.12.03). Esta convenção, porém, foi rejeitada pelo Senado do Paraguai.
140 O item "a" do Protocolo ao Tratado com Trinidad e Tobago estabeleceu dispositivo análogo,
segundo o qual: "Para fins do § IOdo art. 2°, a expressão 'Impostos Brasileiros' compreende
também a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSL), instituída pela Lei nO 7.689,
M.1M Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

As citadas disposições contidas nos protocolos anexos aos tratados com Portu-
gal e a Bélgica têm caráter meramente declaratório interpretativo, visando apenas a es-
clarecer a real extensão do art. 2° e não a ampliar o âmbito de aplicação do tratado.
E tanto isto é verdade que o texto dos referidos protocolos dispõe que ''fica
entendido que nos impostos visados no art. 2°, nO 1, alínea a) está compreendida a
contribuição social sobre o líquido". Fosse a intenção do tratado acrescer ou esten-
der a sua aplicação à CSL teria previsto que "as disposições do art. 2°, nO 1, alínea
a) aplicam-se também à CS"C', em lugar de utilizar-se do termo «está compreendida a
contribuição social sobre o lucro líquido".
Aliás, as disposições dos protocolos têm via de regra caráter interpretativo, ex-
teriorizando o entendimento dos países contratantes sobre a aplicação de regras da
convenção, e não o condão de modificar as disposições da própria convenção para
ampliar ou restringir o seu conteúdo.
Neste sentido é importante observar que as citadas convenções poderiam ter opta-
do por incluir a CSL no art. 2° do tratado que trata dos impostos visados. Porém, apenas
se referiram ao "imposto federal sobre a renda", termo genérico adotado pelo tratado
para designar o tributo (ou tributos) incidente(s) sobre a renda de competência federal,
meramente esclarecendo no protocolo que o mesmo inclui (compreende) a CSL.
Por tal razão, ainda que as demais convenções celebradas a partir de 1999 não
contenham esclarecimento similar, as mesmas conclusões são aplicáveis, pois o Go-
verno brasileiro, em ato de natureza interpretativo, já afirmou que o imposto federal
sobre a renda "compreende" não só o imposto de renda como a contribuição social
sobre o lucro, de natureza idêntica, sendo inimaginável que uma "interpretação"
oficial possa ser válida para um país (por exemplo, a Bélgica ou Portugal) e descon-
siderada para outro.
Aliás, no caso da Bélgica, a convenção original foi celebrada antes da instituição
da CSL, tendo o Governo brasileiro declarado perante um Estado sua interpretação
oficial no sentido de que a CSL está por ela abrangida.
As conclusões acima ainda mais se reforçam nos casos específicos dos tratados
com o Chile, Portugal, África do Sul e Peru, que contêm uma cláusula (art. 2°, § 2°)
segundo a qual "consideram-se impostos sobre a renda os que gravam a totalidade
da renda ou qualquer parte da mesma 141 ".

de 15 de dezembro de 1988". Também o Decreto nO 6.797, de 17.03.2009, que promulga o


Acordo com o Reino Unido em matéria de dupla tributação sobre transporte marítimo e aé-
reo, determina que a isenção alcance "todos os impostos abrangidos pela legislação do imposto
de renda federal assim como de quaisquer impostos federais semelhantes ou contribuições
sobre a renda ou lucros que são, ou poderão vir a ser exigidos no Brasil, aí incluíCÚJs o Imposto
sobre a Renda de Pessoa Jurídica (IRPJ) e a ContribuiçiúJ Social sobre o Lucro LíquiCÚJ (CSLL).

141 Esta cláusula corresponde, na sua essência, ao § 2° do art. 2° da Convenção Modelo da


OCDE, que via de regra não é introduzida nas convenções brasileiras, exceto nos casos da
África do Sul e do Chile (Decreto nO 4852, de 2.10.03).
Título 111 I Capo I I Tratados Internacionais M.W

Ora este é precisamente o caso da CSL, que incide sobre a totalidade da renda das
pessoas jurídicas, assim entendido o lucro líquido auferido no Brasil e no exterior.

C) Quanto ao território

As convenções contra a dupla tributação seguem a regra constante do art. 29 da


Convenção de Viena sobre o direito dos tratados, segundo a qual "um tratado será
obrigatório para cada uma das partes pelo que respeita à totalidade do seu território,
salvo se uma intenção diversa dele se deduz ou dele conste de modo diferente".
Importa observar que algumas convenções contêm dispositivos que em uns casos
promovem a extensão do âmbito de aplicação territorial, em outros casos procedem à
exclusão de certas frações do território nacional de uma das partes contratantes.
No sentido da exclusão podem citar-se os casos da Convenção com a Dinamarca
- que exclui as Ilhas Faroe e a Groenlândia; com a Noruega - que exclui Spitzbergen,
Jan Mayen e os territórios noruegueses fora da Europa; das Convenções celebradas
pelos Estados Unidos com terceiros países, que excluem Porto Rico, as Ilhas Virgens
e Guam.
As convenções em que se prevê a exclusão de certas áreas territoriais contem-
plam, via de regra, um mecanismo convencional destinado a promover o alargamen-
to futuro do seu âmbito territorial de aplicação, em condições a fixar por acordo con-
substanciado em troca de notas diplomáticas ou segundo outro processo conforme as
respectivas disposições constitucionais (art. 28 do Modelo OCDE).
Um problema peculiar é suscitado pela extensão do poder de tributar as zonas
marítimas que, segundo o Direito Internacional Público, não são parte integrante do
território do Estado.
No que concerne aos espaços marítimos, a Lei nO 8.617/93, em estrita obedi-
ência à Convenção de Montego Bay de 1982 (Decreto nO 1.530, de 22 de junho de
1995) e à Constituição Federal de 1988 (art. 20, V e XI), proclamou que "a sobera-
nia do Brasil estende-se ao mar territorial, ao espaço aéreo sobrejacente, bem como
ao seu leito e subsolo" (art. 2°), definindo o mar territorial como "uma faixa de doze
milhas marítimas de largura, medidas a partir da linha de baixo-mar do litoral con-
tinental e insular brasileiro, tal como indicada nas cartas náuticas de grande escala,
reconhecidas oficialmente no Brasil".
No que concerne à zona contígua, à zona econômica exclusiva e à plataforma
continental a lei manteve-se fiel ao regime da Convenção de Montego Bay, outorgan-
do, no que concerne às duas últimas áreas, "direitos de soberania para fins de explo-
ração e aproveitamento dos recursos naturais" (art. 7°). Mas especificamente no que
concerne à zona econômica exclusiva o art. 8° reconhece que "o Brasil, no exercício
de sua jurisdição, tem o direito exclusivo de regulamentar a investigação científica
marinha, a proteção e preservação do meio marinho, bem como a construção, opera-
ção e uso de todos os tipos de ilhas artificiais, instalações e estruturas".
11m I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier ,_=_-________ ...1

Em face do Direito Público brasileiro, o conceito de soberania está indissociavel-


mente ligado ao de território e este se restringe, no que concerne ao elemento marítimo,
ao mar territorial. Sendo as demais wnas marítimas extraterritoriais, a elas não se esten-
de a soberania brasileira plena, sendo apenas exercitáveis certos direitos exclusivos.
Os conceitos consagrados pela Convenção de Montego Bay e pela Lei nO
8.617/93 vieram a refletir-se nos tratados contra a dupla tributação celebrados pelo
Brasil a partir da sua entrada em vigor - como é o caso dos tratados com o Canadá,
a Coreia, a Hungria e a Tchecoslováquia.
Neles se inclui uma cláusula segundo a qual o termo "Brasil" designa o terri-
tório da República Federativa do Brasil, isto é, a terra firme continental e insular e
respectivo espaço aéreo, bem como o mar territorial e o leito e subsolo desse mar,
dentro do qual, em conformidade com o Direito Internacional e com as leis brasilei-
ras, o Brasil possa exercer seus direitos".
Todavia, o tratado com o Reino Unido dos Países Baixos define de modo mais
amplo o conceito de Brasil, de modo a abranger "qualquer área marítima além do
mar territorial, incluindo o leito do mar e o subsolo, na medida em que nessa área
o Brasil, de conformidade com o Direito Internacional, exerce direitos em relação à
exploração e ao aproveitamento dos recursos naturais".
Esta mesma cláusula foi adotada nos Tratados celebrados com Portugal em
2000 com Finlândia e com Israel.
Trata-se de espaços nos quais o Brasil exerce "direitos de soberania" limitados,
nos termos da Convenção de Montego Bay, conquanto não integrem o território
nacional.
O alcance desta cláusula não é o de uma tentativa de extensão ilegítima do
âmbito territorial do Estado, revelador de um fenômeno de creeping jurisdiction) um
lento resvalar para a sujeição à jurisdição nacional de áreas que, em princípio, não a
integram l42 •
Significa apenas que, nas relações bilaterais entre os dois Estados signatários
de convenção contra a dupla tributação, o exercício de atividades econômicas por
residentes de um deles nas áreas marítimas onde o outro exerce direitos de soberania
de conteúdo econômico, tais atividades podem ficar submetidas à disciplina de con-

142 Diversos Estados - como os Estados Unidos e a França - não hesitaram em considerar as
plataformas continentais como elemento do território para efeitos fiscais; e isto em nome de
uma soberania que, não sendo pessoal nem territorial (em sentido técnico), MARTHA propõe
seja denominada de soberania funcional. Cfr. MARTHA, The Jurisdiction to Tax in International
Law: Theory and Practice of Legislative Fiscal Jurisdiction, Deventer/Boston 1989, no ss.;
JosÉ LUIS DE AZCÁRRAGA, El concepto de plataforma continental ante el derecho tributario,
in XX Semana de Estudios de Derecho Financiero, Madrid 1973, 777; J. C. MARTINEZ, Les con-
ventions, 48 ss.; A. MlRAULO, Doppia imposizione, 230. Entre nós veja-se o excelente estudo
de ANDRÉ DE SOUZA CARVALHO, Do conceito de estabelecimento permanente e as atividades
negociais móveis realizadas na plataforma continental, in HELENO TORRES (coord.), Direita
Tributário InternacionalAplicada, lI, 539 ss.
Título 111 I Capo I I Tratados Internacionais I Im I

venção, notadamente para efeitos de caracterização de estabelecimento permanente e


do princípio da não discriminação 143 •
Dizemos "podem ficar" pois, de harmonia com o princípio do efeito negativo
dos tratados, estes não formulam diretamente pretensões fiscais, restringindo-se a
limitar eventualmente as pretensões decorrentes de lei interna. Ora, caso a lei interna
não alcance instalações ou atividades exercidas nos espaços extraterritoriais, as referi-
das cláusulas não terão nenhum significado prático.
Outro ponto delicado - agora no que respeita ao espaço aéreo (este parte do ter-
ritório do Estado) - concerne às chamadas Flight Information Rcgions (FIR). Trata-se
de área internacionalmente atribuída a um país específico, região na qual este deve
fornecer informações sobre voos no tráfego aéreo regional, serviços esses que podem
ser objeto de tributação. Ora, a questão surge quando a FIR extravasar dos limites
do espaço aéreo l44 •
Novos e complexos problemas tributários internacionais podem suscitar-se em
decorrência de atividades exercidas no espaço, tais como o lançamento de foguetes e
naves espaciais, a presença permanente de satélites com tripulação humana e o exercí-
cio de atividades industriais em satélites. Os comentários da OCDEI45 observam que,
no momento presente, nenhum país se arroga o poder de tributar tais atividades, por
não as considerar exercidas no seu território; mas se tal sucedesse as regras atuais da
Convenção Modelo seriam suficientes para eliminar eventuais duplas tributações.

D) Quanto à sucessão de Estados

O problema da aplicação dos tratados quanto aos Estados suscita-se, em es-


pecial, na hipótese de sucessão de Estadosl 46 • O art. 34 da Convenção de Viena
em matéria de sucessão de Estados em relação aos tratados, de 1978, estabelece:
"Quando uma parte ou partes do território do Estado se separam para formar um ou
mais Estados, quer o Estado predecessor continue ou não a existir, qualquer tratado
em vigor à data da sucessão de Estados em relação ao território integral do Estado
predecessor continua em vigor com relação a cada sucessor. Todavia, isto não se
aplica se (a) o Estado em causa acorda de outro modo; (b) ou resulta do tratado ou
se estabelece de outro modo que a aplicação do tratado quanto ao Estado sucessor

143 Assim, por exemplo, a Convenção entre os Estados Unidos e o Canadá, no artigo V, referen-
te ao estabelecimento permanente, inclui um § 4°, segundo o qual "the use ofan instal-lation
or drilling rig or ship in a Contracting State to explore for or exploit natural resources constitutes a
permanent establishment if, but oniy if, such use is for more than three months in any twelve-month
period".
144 MARTHA, op. cit.) 138-139, cita o casoPanAmerican WorldAiryways Inc. V. the Queen) em que
se contestou a cobrança de fees pelo Canadá, nesta hipótese.
145 Art. 7°, § 4.
146 Cfr. ANDRÉ GONÇALVES PEREIRA, Da sucessão dos Estados quanto aos tratados, Lisboa 1962.
••1.+ Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

seria incompatível com o objeto e propósito do tratado ou modificaria radicalmente


as condições para a sua aplicação".
Na época atual, o problema voltou a ganhar grande relevância prática, em
virtude da reunificação da Alemanha, da desintegração da União Soviética, da
Tchecoslováquia e da Iugoslávia, bem como da transferência da soberania sobre
Hong Kong l47 .

E) Quanto ao tempo

a) Vigência e denúncia
No que concerne ao âmbito de aplicação temporal dos tratados contra a dupla
tributação, importa distinguir a vigência da eficácia. De harmonia com o art. 29 do
Modelo OCDE (que inspira a generalidade das convenções assinadas pelo Brasil), a
entrada em vigor ou início da vigência ocorre no momento em que se verifica a troca
dos instrumentos de ratificação 148 • O início da eficácia pode ser, porém, diferido para
momento posterior, o qual pode ser diverso em cada um dos Estados e em função da
natureza dos impostos em causa ou da técnica da sua arrecadação.
Assim, por exemplo, o art. XXVIII, § 2°, da Convenção com a Argentina, deter-
mina que "a Convenção entrará em vigor na data dos instrumentos de ratificação e as
suas disposições serão aplicadas: I - no que concerne aos impostos retidos na fonte,
às importâncias pagas no ou depois do l° dia de janeiro do ano-calendário imedia-
tamente seguinte àquele em que a Convenção entrar em vigor; II - no que concerne
aos outros impostos de que trata a presente Convenção, ao período-base que comece
no ou depois do 1° dia de janeiro do ano-calendário imediatamente seguinte àquele
em que a Convenção entrar em vigor".

147 No que concerne ao Tratado entre o Brasil e a República socialista da Tchecoslováquia,


o Ministério das Relações Exteriores reconheceu a respectiva vigência no que concerne à
República Eslovaca (nota verbal de 5.6.02). A Alemanha já adotou a posição de considerar
que a Federação Russa é o legítimo sucessor da URSS em todos os direitos e obrigações deco-
rrentes do tratado contra a dupla tributação entre a Alemanha e a URSS. O tratado é também
aplicável às Repúblicas que aderiram à Confederação dos Estados Independentes. Ao invés,
o tratado não seria aplicável aos Estados bálticos (Estônia, Letônia e Lituânia). A Alemanha
também considera que o Tratado com a Iugoslávia é aplicável aos quatro Estados resultantes
da cisão: Eslovênia, Croácia, Bósnia-Herzegovina e o resto da Iugoslávia. A França, todavia,
entende que o Tratado franco-iugoslavo não é aplicável às três Repúblicas secessionárias. As
Convenções com a China não se aplicam a Hong Kong, que mantém um sistema fiscal sepa-
rado. Cfr. International Taxation, maio de 1992, 13; BAKER, Double Taxation, 55.
148 Ou num prazo contado a partir daquele momento: por exemplo, 30 dias, como sucede na
Convenção com a Bélgica. As Convenções indicam também o lugar onde será efetuada a
troca dos instrumentos de ratificação. Cfr. HELENa TORRES, Pluritributaçtfu internacional
sobre as rendas de empresas, São Paulo 2001, 629.
Título 111 I Capo I I Tratados Internacionais

A vigência dos tratados, que são celebrados por prazo indeterminado, extingue-
se pela denúncia por qualquer dos Estados contratantes, a qual deverá ocorrer por
via diplomática e com um período de antecedência ftxado no próprio tratado (via de
regra seis meses), a contar do término de um ano-calendário.
Os tratados preveem, porém, um período mínimo de vigência, dentro do qual a
denúncia não é admitida.
Em função do princípio da segurança jurídica, especialmente relevante em ma-
téria tributária, os tratados consagram uma vacatio legis especial, determinando o di-
ferimento da cessação de vigência destas normas para o ano civil subsequente, desde
que o pré-aviso ocorresse seis meses antes desse mesmo mês.
Trata-se, em matéria de tratados internacionais, de manifestação do mesmo prin-
cípio que, no que toca às leis internas, conduz à formulação do princípio da anteriori-
dade, constante do art. 150, li, b) da CF, que veda a cobrança de tributos no mesmo
exercício ftnanceiro em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou, ou
à formulação do princípio da vacatio legis especial, em matéria de contribuições sociais,
constante do art. 195, § 6°, da CF, segundo o qual estas só poderão ser exigidas após de-
corridos 90 dias da data de publicação da lei que as houver instituído ou aumentado.
Que a vacatio legis prevista nos tratados constitui manifestação do mesmo princí-
pio de segurança jurídica que os referidos princípios constitucionais (aliás reconhecidos
como "direitos e garantias individuais" pelo Supremo Tribunal Federal) resulta de,
como já foi mencionado, a denúncia de um tratado, pela extinção de normas especiais
mais favoráveis, ter signiftcado idêntico ao de uma instituição ou aumento de tributo.
Como os destinatários das normas convencionais são os cidadãos particulares
residentes em ambos os Estados contratantes, a eles (e não apenas ao outro Estado
contratante) se dirige em primeira linha a garantia do pré-aviso.
A garantia do pré-aviso pressupõe a publicação do ato de cessação de vigência da
norma (a denúncia), publicação esta que funciona como prazo a quo do pré-aviso,
para efeito da contagem de vacatio legis de seis meses.

b) A competência para a denúncia


Compete ao Direito Constitucional de cada Estado (e não ao Direito Interna-
cional Público) deftnir qual o órgão ou órgãos competentes para praticar o ato de
denúncia do tratado internacional l49 .

149 O único caso de denúncia de tratado contra a dupla tributação, de iniciativa do Brasil, foi o
Tratado celebrado com Portugal em 1971, aliás o primeiro tratado daquela natureza celebra-
do pelo Brasil, razão pela qual merece análise aprofundada Veja-se sobre a matéria ALBERTO
XAVIER, Inexistência jurídica e inconstitucionalidade da denúncia do tratado contra a dupla
tributação entre o Brasil e Portugal,RDDT 48 (1999), 7 ss.; PAULO BORBA CASELLA e RALPH
SAPOZVIK, A revogação do Decreto 69.393/71 e os tratados no Direito Tributário brasileiro,
in VALDIR DE OLIVEIRA ROCHA (org.), Grandes questões atuais do Direito Tributário, 3° vaI.,
I!J I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

No Brasil, o art. 84 da CF estabelece que "compete privativamente ao Presi-


dente da República: "( ... ) VIII - celebrar tratados, convenções e atos internacionais,
sujeitos a referendo do Congresso Nacional", sendo ainda de assinalar que esta com-
petência é indelegável aos Ministros de Estado (art. 84, parágrafo único).
Por sua vez, o art. 49, I, da CF, em plena simetria com o art. 84, VII, estabelece
que "é de competência exclusiva do Congresso Nacional: I - resolver definitivamente
sobre tratados, acordos ou atos internacionais que acarretem encargos ou compromis-
sos gravosos ao patrimônio nacional".
Na trilogia "tratados, acordos ou atos internacionais", a denúncia integra-se no
conceito de "ato internacional", por ter caráter unilateral, enquanto as expressões
"tratados e acordos" se referem a atos bilaterais. Por força de disposição expressa
do art. 84, VII, os atos internacionais unilaterais (como a denúncia do tratado) são
também de competência privativa do Presidente da República e pressupõem também
o referendum do Congresso Nacional.
O referendo do Congresso Nacional tem - já o vimos - a natureza jurídica de
uma autorização (controle prévio) do Poder Legislativo para que o Poder Executivo
ratifique o tratado e, simetricamente, para que o denuncie.
Como já atrás se afirmou, o referendo do Congresso "não tem por objeto um
tratado anteriormente existente e válido, mas apenas um projeto, um texto assina-
do, mas ainda não ratificado. Não é, por isso, ato de homologação a posteriori, mas
ato de autorização a priori para a prática de um outro ato - a ratificação - que, esse
sim, conclui o procedimento de celebração dos tratados e que é a manifestação de
vontade de obrigar-se. Não se trata, pois, de requisito de eficácia, mas de requisito
de validade. Tratado ratificado sem o prévio referendo do Congresso é ato nulo e
não ineficaz".
Os mesmos princípios relativos às relações entre referendo e ratificação (ato
positivo) aplicam-se, por simetria lógica, às relações entre referendo e denúncia (ato
negativo), pelo que tratado denunciado sem o prévio referendo do Congresso é ato
nulo e não simplesmente ineficaz.
Que a denúncia, como ato unilateral extintivo de um tratado bilateral, exige
também o referendo do Congresso Nacional é simples corolário lógico do princípio
geral de Direito de que a competência para destruir os efeitos de um ato jurídico
pertence a quem tem competência para os produzir l50 . Com efeito, se a Constituição
exige o concurso do Poder Legislativo e do Poder Executivo para a prática de um

São Paulo 1999, 257 ss. No que concerne à denúncia, pela Alemanha, do Tratado com o
Brasil cfr. GERD W ROTHMANN, A denúncia do acordo de bitributação Brasil-Alemanha e suas
consequências, in Grandes questões atuais do Direito Tributário, 9° vol., São Paulo 2005, 146.

150 É o que afirma expressamente o art. 95, 2, da Constituição espanhola: "Para a denúncia dos
tratados e convênios internacionais se utilizará o mesmo procedimento previsto para a sua apro-
vação no artigo 94." É esta também a solução consagrada na Constituição argentina de 1994.
Título 111 I Capo I I Tratados Internacionais I tI8 I

tratado internacional, a destruição dos seus efeitos apenas por ato de um dos Poderes
equivaleria a verdadeiro "golpe de Estado" inconstitucional 151 •
No que diz respeito especificamente a tratados que versem sobre matéria tri-
butária, a necessária intervenção do Congresso Nacional, por via de referendum, é
corolário do princípio da legalidade da tributação, que exige, no domínio tributário,
lei emanada do Poder Legislativo (art. 150, I, da CF).
A exigência de referendum, no que concerne à denúncia de tratado tributário, é
tanto ou mais relevante do que para a sua própria celebração. É que, tendo a denúncia
um efeito extintivo de normas especiais limitadoras do poder tributário de cada Estado
contratante, a cessação de vigência destas normas mais favoráveis tem o alcance de "ins-
tituição ou aumento" de tributo, para os quais o art. 150, I, da CF, exige lei formal.
Aliás, não se vislumbra situação que mais requeira a necessária intervenção do
Congresso do que a denúncia de um tratado tributário, que é a "Magna Carta" das
relações econômicas entre dois Estados soberanos. Ora, sendo a denúncia um ato de
ruptura unilateral, praticado ultima ratio, em caso de impasse de negociação, é estri-
tamente indispensável que o Congresso exerça a competência exclusiva que lhe é atri-
buída pelo art. 41, I, da CF, de "resolver definitivamente sobre tratados, acordos ou atos
internacionais", dando a última palavra no sentido de autorizar ou não a denúncia.
Denúncia unilateral pelo Poder Executivo, não precedida de autorização refe-
rendária do Congresso, é ato de rebelião contra o princípio da interdependência dos
Poderes e, por isso, "golpe de Estado" inconstitucional152.
Em função do princípio da segurança jurídica, especialmente relevante em ma-
téria tributária, o próprio Tratado consagrou uma vaeatio legis especial, determinan-
do o diferimento da cessação de vigência destas normas para o ano civil subsequente,
desde que o pré-aviso ocorresse seis meses antes desse mesmo mês.
Trata-se, em matéria de tratados internacionais, de manifestação do mesmo
princípio que, no que toca às leis internas, conduz à formulação do princípio da
anterioridade, constante do art. 150, III, b) da CF, que veda a cobrança de tributos
no mesmo exercício frnanceiro em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou
aumentou, ou à formulação do princípio da vacatio legis especial, em matéria de con-
tribuições sociais, constante do art. 195, § 6°, da CF, segundo o qual estas só poderão

151 A questão da competência para a denúncia de tratado foi objeto da ADI/1625 (relativa à
denúncia, pelo Brasil, da Convenção da OIT nO 158) que ainda se encontra em julgamento,
sendo que já votaram no sentido do necessário referendo do Congresso os Ministros MAURÍ-
CIO CORRÊA, CARLOS BRTITO e JOAQUIM BARBOSA e, em sentido contrário, NELSON JOBIM.
152 No caso da denúncia do Tratado com Portugal, esta não foi precedida de manifestação pú-
blica da vontade dos órgãos competentes para exprimir, no plano interno e internacional,
a vontade do Estado brasileiro: a do Presidente da República, na forma de decreto de pro-
mulgação pública da denúncia; e a do Congresso Nacional, na forma de decreto legislativo
devidamente publicado. A denúncia é nula ou até mesmo juridicamente inexistente, tanto
no plano internacional quanto no plano interno, pois .o ato jurídico em que se traduz não foi
praticado pelos órgã.os competentes para exprimir a vontade do Estado brasileiro.
MUM Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

ser exigidas após decorridos 90 dias da data de publicação da lei que as houver ins-
tituído ou aumentado.
Que a vacatio legis do art. XXIX do Tratado constitui manifestação do mesmo prin-
cípio de segurança jurídica que os referidos princípios constitucionais (aliás reconheci-
dos como "direitos e garantias individuais" pelo Supremo Tribunal Federal) resulta de,
como já foi mencionado, a denúncia de um Tratado, pela extinção de normas especiais
mais favoráveis, ter significado idêntico ao de uma instituição ou aumento de tributo.
Como os destinatários das normas convencionais são os cidadãos particulares
residentes em ambos os Estados contratantes, a eles (e não apenas ao outro Estado
contratante) se dirige em primeira linha a garantia do pré-aviso.
A garantia do pré-aviso pressupõe a publicação do ato de cessação de vigência da
norma (a denúncia), publicação esta que funciona como praw a quo do pré-aviso,
para efeito da contagem de vacatio legis de seis meses.

§ 8 0 INTERPRETAÇÃO. O PROBLEMA DAS QUALIFICAÇÕES

A) Interpretação dos tratados contra a dupla tributação


e o § 2° do art. 3° do Modelo OCDE
São poucas as especialidades de que se reveste a problemática da interpretação
dos tratados relativos à dupla tributação internacional l5 3, tanto mais que não vigora
entre nós regra semelhante à existente na ordem jurídica francesa, segundo a qual a
aplicação e interpretação das cláusulas fiscais dos tratados internacionais excedem a
competência dos tribunais administrativos quando, em virtude de obscuridade ou

153 Cfr. M. CHRÉTIEN, Application et inrerprération des clauses fiscales des conventions internatio-
nales, Revue de Science et de Législation Hnanciêre 1948; J. MICHEL, Interprétation judiciaire des
conventions de double imposition et necessité ou opportunité d'une jurisdiction ftscale internationale,
CDFI XII (1958); VAN HourE, Principies of Interpretation in Internai and International Tax
Law, Amsterdam 1968; SAINZ DE BUJANDA, La interpretación, en Derecho espanol, de los tra-
tados internacionales para evitar la doble imposición, in ID., Hacienda y Derecho, II, Madrid
1962, 179; FEDERICO MARIA GIULIANI, La interpretazione delle convenzioni internazionali
contra le doppie imposizioni sui redditi, in VICTOR UCKMAR (org.), Corso di Diritto Tributaria
Internazionale, Pádua 1999, 289; HANs FLICK, Zur Auslegung von Normen des Internatio-
nalen Steuerrechts, in Um der Auslegung und Anwendung der Steuergesetze. FestschriJt aus
Anlafl des 60. Geburtstages von Pro! Armin Spitaler, Stutrgart 1958, 151; LENz, li interprétation
des traités de double imposition (relatório geral), CDFI XII, 15; A. RAUPACH, Internationales
Steuerrecht in der Rechtsprechung des Bundesftnanzhoft, Deutsche Steuer-Zeitung 1975, 388
(390); VOGEL, Double tax treaties and their interpretation, International Tax & Business La-
wyer 4 (1986), separata, passim; RAINER PROKISCH, A interpretação dos tratados de dupla
tributação, Fisco 68 (1994),21; M. PIRES, Da dupla tributação, 454 ss.; FRANK ENGELEN, In-
terpretation ofTax Treaties under International Law, Amsterdam 2004; DANIEL VITOR BELLAN,
Interpretação dos tratados internacionais em matéria tributária, in HELENO TAVEIRA TÔRRES
(org.), Direito Tributária Internacional Aplicado, vol. III, São Paulo 2005, 605.
Título 111 I Capo I I Tratados Internacionais

ambiguidade da norma, se suscitem dúvidas do tribunal, caso em que semelhante


questão revestiria caráter político, devendo reclamar-se parecer vinculante do Minis-
tério dos Negócios Estrangeiros, atuando como "jurisconsulto"154.
Assim, os tratados internacionais que versam matéria fiscal devem ser interpre-
tados de acordo com a doutrina geral da interpretação dos tratados e das normas
tributárias, tendo particularmente em atenção o disposto nos arts. 31 e 32 da Con-
venção de Viena, Convenção essa que é geralmente considerada como declaratória
de direito internacional consuetudinárioIS;. Emanação direta deste princípio geral é
que a interpretação autêntica de um tratado, por via normativa, só pode fazer-se por
mútuo acordo das partes interessadas, acordo aliás previsto no art. 25, § 30, do Mo-
delo OCDE. Menção especial deve ser feita aos comentários aos Modelos OCDE, já
que o próprio Conselho daquele organismo atribui relevante valor interpretativo aos
referidos Modelos, aplicável, por conseguinte, aos tratados que neles se basearam156 .
De acordo com o art. 31 da Convenção de Viena, os tratados deverão ser inter-
pretados de boa-fé, de harmonia com o significado comum a ser dado aos termos do
tratado "no seu contexto" e "à luz do seu objeto e propósito". O contexto compre-
ende, além do texto (incluindo preâmbulo e anexos), qualquer acordo relacionado
com o tratado que tiver sido celebrado pelas partes em conexão com a conclusão do
tratado, bem como qualquer instrumento elaborado por uma ou mais partes em co-
nexão com a conclusão do tratado e aceite pelas outras partes como instrumento rela-
cionado com o tratado. Juntamente com o contexto, a interpretação dos tratados deve
considerar qualquer acordo subsequente entre as partes relativo à interpretação do
tratado ou à aplicação das suas disposições, qualquer prática subsequente na aplica-
ção do tratado que estabeleça um acordo das partes relativo à sua interpretação, bem
como quaisquer regras relevantes de direito internacional aplicáveis às relações entre
as partes. Por sua vez, o art. 32 da Convenção de Viena acrescenta que é legítimo o
recurso a meios de interpretação suplementar, incluindo os trabalhos preparatórios e
as circunstâncias da sua celebraçãol 57 .

154 Cfr. GOUTHIERE, Les impôts, 135, dando conta de jurisprudência recente que enfraquece esta
regra; J. C. MARTINEZ, Les conventions, 54 SS.; GEST(TIXlER, Droit Fiscal International, 97;
BAKER, Double Taxation, 25.
155 Cfr. BAKER, Double Taxation, 22.
156 HUGH J. AULT, The role of the OECD commentaries in the interpretation of tax treaties,
in Essays on International Taxation, 15, Deventer/Boston 1993, 69; BAKER, Double Taxation,
29; VOGEL, Double 1àxation, 43, GOUTHIERE, Les impôts, 134-135; RrVIER, Le Droit Fiscal
International, 101; M. PlRES, Da dupla tributaçiW, 456; KWGE, Das deutsche Internationale
Steuerrecht (3 a ed.), Munique 1992, 224.
157 Cfr. LUIS BARBOSA RODRIGUES, InterpretaçiW de tratados, Lisboa 1990, 98; GARBARINO, La
tassazione, 527 e 538 55.; HELENO TORRES, PluritributaçiW internacional sobre as rendas de
empresas, São Paulo 2001, 649.
• •',,:1 Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

B) Natureza dos Comentários da OCDE

Muito se tem discutido qual a natureza jurídica e a relevância interpretativa dos


Comentários à Convenção Modelo da OCDE elaborados pelo Comitê de Assuntos
Fiscais daquela organização l58 .
Um ponto é inquestionável: tratando-se de textos preparados e elaborados
consensualmente por peritos designados pelos governos dos Estados-membros, eles
constituem uma séria "referência interpretativa", para usar a expressão do próprio
Comitê l59 , referência essa especialmente importante nos países que não dispõem de
mecanismos de consulta vinculante (advanced rulings).
O caráter consensual desses Comentários não deve, porém, levar (salvo se me-
taforicamente) a considerá-los "acordos multilaterais entre as Administrações dos
vários países l60", nem tão pouco vinculantes para essas Administrações e muito me-
nos para os tribunais. A isso se opõe o caráter técnico-opinativo e não dispositivo do
documento e sobretudo o princípio da legalidade, avesso a aceitar a força vinculante
de texto não elaborado pelos órgãos constitucionais competentes.
Acresce que os referidos Comentários são marcados pelo fato de provirem de orga-
nismo "tecnocrático", destituído de imparcialidade, posto que constituído por represen-
tantes do Poder Executivo dos vários Estados, sem nenhuma participação de personali-
dades independentes, designadas pelo Poder Judiciário ou Legislativo ou por associações
empresariais (um "clube de governos" como já foi designado). E isto para não falar no
papel decisivo das grandes potências econômicas na formação do "consenso".
Sem prejuízo do reconhecimento da qualidade técnica dos Comentários, afigu-
ra-se-nos desmesurada a importância que lhe pretende atribuir o próprio Comitê,
chegando ao ponto de sugerir que os novos Comentários tenham "efeito ambulató-
rio", aplicando-se a Convenções celebradas antes de sua elaboração ou revisão 161 • O
que já levou algumas vozes a sustentar que o informalismo da revisão dos Comentá-
rios conduz, na realidade, a uma revisão disfarçada do próprio Modelo.
O peso interpretativo dos Comentários não pode, pois, ir além do que se reco-
nhece à melhor doutrina.

158 Cfr. SJOURD DOUMA(FRANK ENGELEN (eds), The legal status of the OECD Commentaries,
IBFD, Amsterdam, 2008; DAVID A. WARD(et al, The Interpretation of Income Tax Treaties
with Particular Reforence to the Commentaries on the OECD Modcl, IBFD (2006); HUGH J.
AULT, The role of the OECD commentaries in the interpretation of tax treaties, in Essays on
International Taxation, 15, Deventer(Boston 1993,69; BAKER, Double Taxation, 29; VOGEL,
Double Taxation, 43, AURORA RIRES RIBES, Convenios ... , cit., 161 ss.; E ENGELEN, Interpreta-
tion ... , 455; IGOR M. SANTIAGO, Direito Tributário Internacional ... , cit., 85 ss.; HANS PIJL, Os
Comentários da OCDE como fonte do Direito Internacional e o papel do Poder Judiciário,
RDTI (2006), 203.; MICHAEL Lfu'-'G(FwRIAN BRUGGER, O Papel dos comentários da OCDE
na interpretação dos acordos de bitributação, RDT19 (2008),203.
159 Cfr. OCDE, Comentários, Introdução, § 29.3.
160 Cfr. SALDANHA SANCHES, Os limites do planeamento fiscal, Coimbra 2006, 404.
161 Cfr. OCDE, Comentários, Introdução, §§ 33 a 36.1.
Título 111 I Capo I I Tratados Internacionais

o valor dos Comentários surge, naturalmente, ainda mais relativizado no que


concerne às convenções celebradas por Estados não membros da OCDE.
Também não se lhes pode atribuir o significado de "contexto" para efeitos do art.
31 da Convenção de Viena sobre Direitos dos Tratados, tendo em vista o caráter ge-
nérico, paradigmático e, portanto, não vinculante do próprio objeto dos Comentários,
que não é um tratado, nem um acordo conexo com o mesmo. Pelas mesmas razões,
também não podem ser considerados meio suplementar de interpretação, na modali-
dade de trabalhos preparatórios, para efeitos do art. 32 da referida Convenção.
Assim, o fato de uma das partes de um tratado não adotar a interpretação dos
Comentários não permite à ourra parte alegar violação de tratado, ilícita em face do
Direito Internacional Público.
Enfim, é interessante assinalar que certas Convenções atribuem, num ou noutro
ponto específico, eficácia vinculante aos Comentários através da técnica da remissão
por absorção. Assim, por exemplo, no Protocolo à Convenção entre Portugal e os
Estados Unidos, itens 7 e 13, as partes obrigam-se a interpretar a expressão "rendi-
mento da exploração de navios e aeronaves no tráfego internacional" e "instalação
fixa" de harmonia com os aludidos Comentáriosl62 •
Nenhuma cláusula deste tipo se encontra nas convenções brasileiras.

C) Definições

Nas convenções contra a dupla tributação, atendendo à complexidade ou am-


biguidade de certas noções, o próprio tratado elabora definições de vários conceitos
jurídicos, como as constantes do art. 3° do Modelo OCDE, que se refere a "pessoas",
"sociedade", "empresa de um Estado contratante", "tráfego internacional", "autori-
dade competente", "nacionais".
O § 2° do art. 3°, na versão de 1977 (reproduzido pela generalidade das con-
venções assinadas pelo Brasil), estabelece que "para a aplicação do presente Acordo
por um Estado contratante qualquer expressão que não se encontre de outro modo
definida terá o significado que lhe é atribuído pela legislação desse Estado contratan-
te relativa aos impostos que são objeto do presente acordo, a não ser que o contexto
imponha interpretação diferente 163".

162 Cfr. MARrA MARGARIDA C. MESQUITA, Convenções sobre dupla tributaçiÚJ, Lisboa 1998, 23, nota.
163 A versão dada pela revisão de 1995 é a seguinte: "As regards the application ofthe Convention
at any time by a Contracting State, any term not defined therein shall, unless the context otherwise
requires, have the meaning that it has at that time under the law of that State for the purposes of
the taxes to which the Convention applies, any meaning under the applicable tax laws of that State
prevailing over a meaning given to the term under other laws of that State". A mesma regra está
consagrada no § 2° do art. 30 do Modelo OCDE-ISD. Este preceito radica as suas origens no
Tratado entre os Estados Unidos e o Reino Unido de 1945, onde foi pela primeira vez ado-
tado. Cfr. AVERY JONES, Interpretation ofdouble taxation conventions, CDFI LXXVIII-a (1993),
Im I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Apesar da modesta sobriedade dos comentários da OCDE a este preceito l64 ,


parte da doutrina, liderada por VOGEL, atribuiu-lhe o significado amplo de uma
general renvoi clause, que deveria presidir tanto à interpretação do tratado quanto ao
problema da qualificação e que teria como consequência legitimar a aplicação subsi-
diária, pelo Estado que aplica o tratado, do seu direito interno.
Em nossa opinião, o alcance deste preceito é muito mais restrito. Em primeiro
lugar, reporta-se exclusivamente ao problema da interpretação dos tratados, não sendo
invocável no que concerne ao autônomo problema da qualificação, como de seguida
melhor se demonstrará. Basta notar que o texto do § 2° do art. 3° apenas autoriza
o recurso subsidiário ao direito interno no que se refere à "definição" de expressões,
conceitos ou termos e não à sua aplicação perante situações concretas. O § 2° do art.
3° refere-se à definiçiUJ de termos e não à subsunçiUJ de casos concretos nesses termos.
Em segundo lugar, apenas autoriza o recurso subsidiário ao direito interno
quando uma determinada expressão não se encontra definida no tratado (versões de
1977 e 1992) ou não se encontra definida de outro modo (versão de 1963)165, don-
de se conclui pela sua ilegitimidade em todos os casos em que as expressões estejam
definidas no próprio tratado ou noutro lugar. Ora, além dos termos definidos no art.
3°, sob a epígrafe "definições gerais", e que já referimos, os tratados contêm inúme-
ras outras definições, como as de "residente" (art. 4°), "estabelecimento permanen-
te" (art. 5°), "bens imobiliários" (art. 6°), "dividendos" (art. 10), "juros" (art. 11),
"royalties" (art. 12), "profissão liberal" (art. 14), "pensões" e "anuidades" (art. 19),
conceitos e expressões estas que demarcam domínios em que o recurso subsidiário
ao direito interno é ilegítimo 166 .
Em terceiro lugar, o § 2° do art. 3° não reenvia genericamente para o direito
interno do Estado que aplica o tratado, como um todo, mas apenas para a "legislação
relativa aos impostos que são objeto do presente acordo", significando isto que a
definição de expressões não definidas no tratado só poderá ser obtida a partir das leis

597 (607). Sobre a recente discussão em torno do próprio conceito de "aplicação" da con-
venção (aliás irrelevante para a tese que sustentamos), cfr. VOGELjPROKISCH, Interpretation of
double taxation conventions, 55 (78); AVERY JONES, Interpretation, cit., 597 (609). A remissão
para o direito interno foi recentemente criticada por ALBERT RADLER, no relatório RUDlNG, o
qual propõe, em caso de divergência de interpretação, o recurso a um conselho de consultores
da Comunidade Europeia. Cfr. MARIA CELESTE CARDONA, O papel dos acordos sobre dupla
tributação na internacionalização da economia, inA InternacionalizaçiUJ da Economia e a Fiscali-
dade - XXX Aniversário do Centro de Estudos Fiscais, Lisboa 1993, 226, e o número especial
dedicado a este relatório pela EC Tax Review 1 (1992).

164 "This paragraph provides a general rule ofinterpretation in respect of terms used in the Convention
but not defined therein": OCDE, Comentários, art. 30, § 20, § 11.
165 "Not otherwise defined" (63), "not defined therein" (77 e 92).
166 Significaúva a este respeito é a posição dos Comentários da OCDE ao art. 11 do Modelo que
introduz uma definição exausúva de juros, sem fazer referência ao direito interno: "in the Model
Convention references to domestic /aws should as for as possible be avoided" (cfr. § 30, § 21).
Título 111 I Capo I I Tratados Internacionais .".

fiscais e, dentro destas, das leis especificamente reguladoras do imposto sobre a renda
e o capital l67 .
Em quarto e último lugar, o recurso subsidiário ao direito interno é excluído
quando o "contexto" impuser interpretação diferente.
A expressão "contexto", utilizada nas convenções, tem um significado mais amplo
que a mesma expressão na Convenção de Viena: esta última abrange apenas o "contexto
interno", enquanto nos tratados contra a dupla tributação o contexto é constituído em
particular pela intenção das partes contratantes quando assinaram o tratado, bem como
pelo significado dado aos conceitos pela legislação do outro Estado - o que, de harmonia
com os Crnnentários da OCDE, representa uma "referência implícita ao princípio da reci-
procidade em que as Convenções se baseiam"i68. Mas já nos parece que - apesar do seu
relevo interpretativo - os Crnnentários da OCDE não possam ser invocados como "con-
texto", especialmente quanto aos Estados que não fazem parte desta Organização169 •
Seja, porém, como for, o certo é que o controle exercido pela cláusula "except the
context otherwise requires", virtualmente exclui a aplicação do direito interno, tornan-
do-o um fenômeno marginal, de último recurso l70 .
De tudo isto resulta que o § 2° do art. 3° não reveste o alcance de uma cláusula ge-
ral de reenvio para o direito interno, como regra subsidiária de interpretação e aplicação
do tratado, como pretende VOGEL171, antes estabelece o círculo excepcional de hipóteses
restritas, em que o direito fiscal interno pode ser utilizado para defmir expressões não
definidas no tratado, como, por exemplo, "lucro" ou "controle direto ou indireto"172.
Envolvendo o § 2° do art. 3° uma remissão subsidiária para o direito fiscal in-
terno, duas questões se podem logo colocar.
Uma primeira respeita a de saber se essa remissão abrange as demais convenções
contra a dupla tributação assinadas por esse Estado e que fazem igualmente parte da
sua ordem jurídica. A resposta afirmativa afigura-se-nos mais correta, sempre, po-
rém, com a ressalva de o contexto poder apontar num sentido diferente l73 .

167 A nova redação do art. 3° (2) do Modelo, dada na versão de 1995, esclarece que "any mean-
ing under the applicable tax laws of that state prevailing over a meaning given to the term under
other laws ofthat state". Veja-se também o art. 30, nO 2, da Convenção com Portugal: "preva-
lecendo a interpretação resultante desta legislação fiscal, na definição dos respectivos efeitos
tributários, sobre a que decorra de outra legislação deste Estado".
168 Cfr. OCDE, Comentários, art. 30, § 12.
169 Cfr., sobre estes pontos, AVERY JONES, Ilinterprétation des traités fiscaux: un exemple spécifique,
l'article 3 (2) duModele OCDE (I), Fiscalité Européenne 1985-3, 2I.
170 Cfr. BAKER, Double Taxation, 34.
171 Cfr. VOGEL, Double Taxation, 54, segundo o qual este preceito representa urna solução parcial
para o problema da qualificação.
172 Como opina a volkerrechtsfreundliche These representada por GLORIA e KNOBBE- KEUK, apud
KLUGE, Das deutsche Internationale Steuerrecht, 227.
173 Um protocolo ao tratado belga-holandês (1970) prevê que a residência deve ser determinada
em função do direito interno completado pelos tratados. Cfr. AVERY JONES, Ilinterprétation,
Fiscalité Européenne 1985-3,21 (73, nota 21).
Dm) I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Uma segunda questão respeita a saber se o direito interno aplicável é o direito vigen-
te à data da celebração do tratado, como pretende a concepção estática) ou se é o direito
vigente à data em que este se aplica, como sustenta a concepção dinâmica ou evolutiva.
O ponto é bem ilustrado no caso The Queen Melford Developments Inc.) em que
se discutiu, no Canadá, se despesas de garantia bancária deveriam ser qualificadas
como juros, como admitia a legislação posterior, mas não a vigente à data da cele-
bração do tratado. A Corte Suprema do Canadá adotou a concepção estática, com
o fundamento de que o resultado da interpretação evolutiva pode ser similar a um
poder de modificar o tratado 174 • Este argumento - "superficially attractive", no dizer
de BAKER 175 - confunde o fenômeno do "treaty overriding" através de disposições
internas conflitantes com as de um tratado, com a alteração do significado de certas
expressões operada pela lei interna, caso em que não se configura conflito. Por outro
lado, o próprio § 2° do art. 3° não estabelece qualquer restrição à escolha das leis
internas aplicáveis, pelo que se nos afigura abrir as portas para uma interpretação
evolutiva, aliás mais conforme com a teoria geral da interpretação das leis. Enfim, é
esta a concepção que melhor harmoniza direito interno e convenção contra a dupla
tributação, correspondendo mais de perto ao escopo e propósito dos mesmos. Este
tem sido também o entendimento da jurisprudência norte-americana e alemã176 , re-
centemente consagrado na versão dada em 1995 ao § 2° do art. 3°177.

D) O problema das qualificações

a) A qualificação como problema autônomo do da interpretação


O problema das qualificações refere-se - como bem observou BAPTISTA MA-
CHADO - a uma operação que tem lugar em todos os ramos do direito e consiste na
subsumibilidade de um quid (objeto da qualificação) num conceito utilizado por
uma norma (fonte da qualificação). "Qualificar um certo quid é determiná-lo como
subsumível a um conceito, por aplicação desse mesmo conceito: é verificar ou cons-
tatar com certo dado as notas ou características que formam a compreensão de certo

174 Cfr. BAKER, Double Taxation, 36 ss. Como reação a esta decisão, o Congresso do Canadá
publicou o Income Tax Conventions InterpretationAct, em 1984, que consagra expressamente
a teoria da interpretação "ambulatória": cfr. DÉRYfWARD, Interpretation of double taxation
conventions, CDFI LXXVIII-a (1993), 259 (284); HELENO TORRES, PluritributaçM interna-
cional sobre as rendas de empresas, São Paulo 2001, 657.
175 Cfr. BAKER, op. cit., 37.
176 Cfr. BAKER,Op. cit., 28-39; AVERY JONES, Ilinterprétation, Fiscalité Européenne 1985-3,21 (51
ss.); GARBARlNo, La tassazione, 550 e ss. Sobre a posição da Courde Cassation da Bélgica, tam-
bém favorável à interpretação ambulatória, cfr. PEETERS, Interpretation ofdouble taxation conven-
tions, CDFI LXXVIII-a (1993), 221 (241); SCHAUMBURG,Internationales Steuerrecht, 575.
177 OCDE, Comentários, art. 3°, § 2°, § ll.
Título 111 I Capo I I Tratados Internacionais .".

conceito. É um problema que se põe no momento da aplicação da norma jurídica.


Logo, a qualificação do quid, por subsunção no conceito, ou por aplicação deste àque-
le, pressupõe que determinemos primeiro a extensão e compreensão do dito conceito
- pressupõe, por outras palavras, a prévia interpretação do conceito I78".
Que a qualificação respeita ao momento da aplicação e não da interpretação do
direito foi exposto, com rara clareza e elegância, por ISABEL DE MAGALHÃES COLLAÇO.
'1\0 estudar a problemática da interpretação de determinadas categorias de concei-
tos técnico-jurídicos, não se há-de esquecer, por certo, que a interpretação de dado
conceito, em si mesma considerada, se não confunde com aquela operação que se
traduz em subsumir nesse conceito um certo substracto concreto - ou seja, com a
qualificação de algo à luz desse conceito. Em princípio, não parece difícil distinguir
os planos em que hão-de mover-se essas duas actividades. A interpretação cifra-se em
definir por via geral e abstracta todos os possíveis conteúdos de um dado conceito,
enquanto a qualificação, incidindo sobre um quid concreto e traduzindo-se por uma
decisão de espécie, contende já com a aplicação da norma de direito"179.
Se é certo que a peculiar natureza do Direto Internacional Privado - envolvendo
remissão para direito estrangeiro aplicável como tal - imprimiu particular relevância
ao referido problema, em termos de fazer dele uma questão extremamente comple-
xa, quase inextrincável, não é menos verdade que, na doutrina do Direito Tributário
Internacional, ele se apresenta em termos ainda mais imprecisos e nebulosos 180.
Embora reconheçamos que interpretação e aplicação do direito são operações
interdependentes, como que de solução circular, envolvendo fases sucessivas de ade-
quação das normas à realidade, nem por isso pomos em causa que a interpretação é
um fenômeno conceitualmente distinto da aplicação, precedendo-a logicamente l81 .
Concordamos com BAPTISTA MACHADO e ISABEL DE MAGALHÃES COLLAÇO quando
afirmam que a qualificação de um quid pressupõe a prévia interpretação do conceito

178 BAPTISTA MACHADO, Lições de Direito Internacional Privado (4a ed.), Coimbra 1990, 111-
112. Alguns autores anglo-saxônicos entendem que a expressão "qualification", de inspiração
francesa, não se ajusta bem à língua inglesa, preferindo as expressões "characterization" ou
"categorization": cfr. DÉRYjWARD, Interpretation of double taxation conventions, CDFI LXX-
VIII-a (1993), 259 (279, nota); AVERY JONES, Interpretation of double taxation conventions,
loco cit., 597 (608); DANIEL VITOR BELLAN, O instituto da qualificação no Direito Tributário
Internacional, RDDT 120 (2005), 43; PAULO CALIENDO, Do conflito de qualificações no
Direito Internacional Tributário, in HELENO TAVElRA TÔRREs (org.), Direito Tributário In-
ternacionalAplicado, vol. V, São Paulo 2008,33.; SÉRGIO ANDRÉ ROCHA, A qualificação no
Direito Tributário Internacional, RDTI 8 (2008), 129.
179 Cfr. ISABEL DE MAGALHÃES COLLAÇO, Da qualificação em Direito Internacional Privado, Lisboa
1964, 142-143; também 30 e 218.
180 W ARENDT, Zum Qualifikationsproblem im deutschen internationalen Steuerrecht, Steuer und
Wirtschaft I (1959), 381; VON POSERjGRoss-NAEDLITZ, Der Qualiftcationskonflikt bei DBA,
Munique 1972; SPITALER, Das Doppelbesteuerungsproblem bei den direkten Steuern, Reichen-
berg 1936, 561 sS.
181 Cfr. ISABEL DE MAGALHÃES CoLLAÇO, Da qualificação, ll.
Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

utilizado pela fonte qualificadora. E por isso entendemos (ao contrário de opinião
tradicionalmente aceita) que não respeita ao problema da qualificação a regra, atrás
examinada, constante das convenções contra a dupla tributação, e inspirada no § 2°
do art. 3° do Modelo OCDE, segundo a qual, "para a aplicação do presente acordo
por um Estado contratante, qualquer expressão, que nele não se encontre definida,
terá o significado que lhe é atribuído pela legislação desse Estado contratante relativa
aos impostos que são objeto do presente acordo, a não ser que o contexto imponha
interpretação diferente". Esta regra coloca-se ainda na fase interpretativa do concei-
to aplicável, ou seja, no que concerne à determinação do seu significado e alcance,
permitindo o recurso subsidiário a conceitos da lei fiscal interna com o propósito
exclusivo e bem delimitado de definir expressões não definidas no tratado.
Ora, o problema da qualificação suscita-se num momento logicamente poste-
rior: o de saber se uma determinada situação concreta da vida tributária internacional
é subsumível num conceito constante da previsão normativa, conceito este que já
se encontra previamente interpretado. Respeita, pois, ao momento da subsunção ou
aplicação do direito e não ao momento da sua interpretação.
Se a situação da vida é questão definida por conceitos fáticos, descritivos, o
problema da qualificação não chega sequer a suscitar-se. Assim, por exemplo, deter-
minar o lugar onde se situa um imóvel, onde é faticamente exercida uma atividade, se
uma pessoa é atleta ou estudante não envolve, via de regra, o recurso a uma operação
intermédia, adicional, no processo de aplicação do conceito ao caso concreto l82 .
Também entendemos que a questão da qualificação não se distingue da mera
subsunção quando o conceito a aplicar ao caso concreto - embora seja um conceito
jurídico - é fornecido pela própria lei (ou por grupo ou sistema de leis da mesma
natureza), como sucede, por exemplo, quando se aplica certa lei fiscal interna a uma
reserva ou provisão que ela própria define.
A questão da qualificação só surge com verdadeira autonomia no processo sub-
suntivo, quando o conceito jurídico utilizado por certa lei seja objeto de defmição po-
tencialmente distinta por outra lei ou complexo de leis de natureza heterogênea, quer
se integrem no mesmo ordenamento jurídico ou pertençam a ordenamento distinto.
A primeira hipótese é a que ocorre no clássico problema da relevância dos "con-
ceitos de direito civil" utilizados pelas leis fiscais, caso em que uma mesma situação
da vida pode ser objeto de uma dupla valoração - a valoração dada pelas leis civis

182 Não ignoramos a fluidez da distinção entre questões de fato e questões de direito, peJo que o
que acima se afirmou tem um caráter meramente tendencial. Assim, por exemplo, a regra se-
gundo a qual não são tributáveis peJo país da fonte os rendimentos do trabalho dependente
se o trabalhador nele não permanecer por mais de 183 dias parece conter um conceito fático,
descritivo. Mas na realidade não é assim, pois ele pode ser objeto de regras jurídicas distintas
aplicáveis pelos diversos países, notadamente quanto ao caráter contínuo ou interpolado,
quanto ao cômputo dos períodos de férias etc. Ver, sobre este problema, BAKER, Double
Taxation, 304 ss. Sobre a distinção entre conceitos descritivos e conceitos técnico-jurídicos,
cfr. ISABEL DE MAGALHÃES COLLAÇO, Da qualificação, 59.
Título 111 I Capo I I Tratados Internacionais

internas e a valoração dada por conceito homólogo do Direito Fiscal. Quando se


pergunta se, num caso concreto, uma subscrição de capital é tributável a título de
alienação de bens do ativo permanente, é necessário valorá-Ia, primeiro, em face do
conceito de alienação do direito civil e, posteriormente, verificar se este conceito é
enquadrável no conceito de alienação do direito tributário (que pode excluir casos de
alienação que não determinem realização de ganho de capital).
A segunda hipótese é a que ocorre nas normas de Direito Tributário Internacional
que utilizam conceitos jurídicos fornecidos por leis estrangeiras, sejam tais normas uni-
laterais ou convencionais. A doutrina circunscreve tradicionalmente o problema à aplica-
ção dos tratados de dupla tributação, mas - embora mais rara e limitadamente - ele pode
surgir no âmbito das normas unilaterais internas. Pense-se, por exemplo, na norma do
Direito Fiscal português que sujeita a tratamento distinto os não residentes, consoante
sejam pessoas nsicas ou jurídicas. Se, num caso concreto, se apresentar um trust ou uma
partnership estrangeira, vai ser necessário perguntar às respectivas leis de organização se
são pessoas jurídicas ou uma pluralidade de pessoas nsicas. De novo estamos perante
uma dupla valoração da mesma situação concreta que envolve dois momentos distintos:
primeiro, saber qual o regime do trust ou da partnership em causa, e, segundo, qualificar
este regime nos conceitos internos de personalidade jurídica singular ou coletiva.
Reconhecemos, porém, que é no domínio dos tratados internacionais contra a
dupla tributação que o fenômeno ganha maior dimensão, pois estes definem os seus
pressupostos de aplicação aos casos concretos através de conceitos jurídicos, tanto no
que respeita ao conceito-quadro, definidor de vários tipos de rendimentos, tais como
"juros", "dividendos", "pensões", como no que respeita aos demais pressupostos, tais
como "residência", "pessoa", "nacionalidade de pessoa jurídica", "agente dotado de esta-
tuto independente", "empresa de navegação", "membro de conselho de administração".
Também nestes casos, o problema da qualificação consiste em verificar se uma certa
situação concreta da vida é subsurnível num conceito do tratado, para o que é preciso
valorá-la à luz de regras jurídicas que permitam ao órgão de aplicação do direito decidir
se se está perante um caso de juros, de royalties, de pensão, de residência, de pessoa, de
pessoa nacional, de agente dotado de estatuto independente - e assim por diante.
Repita-se mais uma vez que não está aqui presente uma questão de interpre-
tação do tratado. O Tratado Brasil-Espanha (art. 30), por exemplo, define o termo
"pessoa" como uma pessoa física e uma sociedade e defme, por sua vez, "sociedade"
como qualquer pessoa jurídica ou qualquer entidade que, para fins tributários, seja
considerada pessoa jurídica. Imagine-se que é colocada em tribunal brasileiro a ques-
tão de saber se estão sujeitos ao Tratado Brasil-Espanha os dividendos pagos por so-
ciedade brasileira a uma sociedade em comandita espanhola. Para tanto, é necessário
saber se esta sociedade é considerada "sociedade" para efeitos do tratado, ou seja, se
tem personalidade jurídica ou, embora não a tendo, em geral, é considerada pessoa
jurídica para fins tributários. A questão que se coloca não respeita à interpretação
do tratado em si mesmo - dúvidas nenhumas tem o intérprete sobre o significado e
alcance do conceito "sociedade". O que está em causa é saber se, no caso concreto, a
IB I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

sociedade a quem foram pagos os dividendos é uma sociedade em comandita e, caso


afirmativo, se tem personalidade jurídica para efeitos fiscais.
Outro exemplo: o Tratado entre o Brasil e a Dinamarca (art. 16) estabelece que as
remunerações de direção e outras remunerações similares que um residente de um Es-
tado contratante recebe, na qualidade de membro do conselho de diretores ou de qual-
quer conselho de uma sociedade residente do outro Estado contratante, são tributáveis
nesse outro Estado. Imagine-se que é suscitada a questão de saber se este preceito é
aplicável aos honorários de um consultor jurídico brasileiro de uma empresa dinamar-
quesa e que faz parte de um "comitê consultivo" dessa empresa. Também aqui o intér-
prete não tem dúvidas sobre a interpretação do tratado propriamente dita - nem sobre
o conceito de remuneração de direção ou similar, nem sobre o conceito de conselho
de sociedade. O que está em causa, isso sim, é determinar no caso concreto a natureza da
remuneração recebida pelo consultor e a natureza do "comitê" de que este faz parte.
Hipóteses similares, em que o problema da qualificação se apresenta com toda
a nitidez com relação ao conceito-quadro, são as seguintes: os juros cuja taxa exceda
a taxa corrente de mercado devem qualificar-se como juros ou como distribuição de
lucros (disfarçada)? A remuneração de uma debênture com cláusula de participação
nos lucros deve ser qualificada como juro ou como dividendo? Os valores restituídos
aos sócios em caso de dissolução de uma sociedade dão lugar a dividendo ou a ganho
de capital? A remuneração paga ao chefe de orquestra pela execução de um concerto
deve ser qualificada como royalty ou como remuneração de trabalho independente? A
remuneração por renúncia a um direito de locação ou arrendamento de bem imóvel
pode ser qualificada como rendimento imobiliário? A emissão de bonificações ou
ações gratuitas configura rendimento equiparável a dividendo?
Ora, para decidir estas questões torna-se necessário recorrer a um ordenamento
interno) uma vez que o tratado por si só não permite a sua aplicação imediata ao caso
concreto, pois não só não declara se as comanditas espanholas são pessoas jurídicas,
ou se os conselhos consultivos são órgãos de sociedade, como não poderia determi-
nar se, no caso concreto) a sociedade ou o conselho em causa revestem aquela natureza.
E daí que, nestas hipóteses, se torne necessária uma operação adicional, intermédia,
de qualificação da situação da vida perante um dado ordenamento.
Veja-se bem que, em todos estes casos, a especificidade do problema da qualificação
está na existência de uma dupla valoração de situações da vida à luz de leis integradas em
grupos heterogêneos - as leis internas e os tratados -, envolvendo - assim - dois momen-
tos distintos: um primeiro, de caracterização da situação concreta da vida em face da lei
interna, com vista a determinar a sua natureza jurídica; e um segundo, de caracterização
do conceito de direito interno (no qual a situação da vida se subsume) em face do concei-
to jurídico utilizado pelo tratado. Podemos designar o primeiro momento como qualifi-
cação primária e o segundo momento como qualificação secundária) utilizando a termino-
logia de ROBERTSON, embora não exatamente no sentido adotado por este autorl83 .

183 Cfr. BAPTISTA MACHADO, Lições, 129.


I Título 111 I Capo I I Tratados Internacionais I ~ I

Como observa ISABEL DE MAGALHÃES COLLAÇO, "o que importa em todo o caso
deixar bem firmado é que a qualificação, em sentido rigoroso, sob o conceito que
na norma de conflitos de tipo ITI designa o objecto da conexão, é necessariamente o
resultado de um processo complexo, repartido por fases diversas, uma vez que a re-
condução duma situação concreta da vida a esse conceito supõe que tal situação foi já
individualizada, caracterizada ou 'qualificada' por recurso a dada norma material I84".
Tem, pois, razão BAPTISTA MACHAD0 185 quando (com considerações válidas tam-
bém para o Direito Tributário Internacional) critica ROBERTO AGO, que concebe o
problema da qualificação como simples subsunção de situações de fato a conceitos
jurídicos. É que, embora esta concepção explique bem a primeira fase do proces-
so qualificatório (qualificação primária), já não resolve a segunda fase (qualificação
secundária), em que se qualificam, já não situações fáticas, mas conceitos jurídicos
de direito interno em conceitos de direito convencional. No Direito Internacional
Privado, a qualificação põe em contato normas de conflitos internas com normas
materiais estrangeiras; no Direito Tributário Internacional, a qualificação põe frente
a frente a regra de colisão convencional com um dos dois direitos materiais internos
dos Estados a que o tratado se aplica. Da mesma maneira que alguém já afirmou que
o problema da qualificação em Direito Internacional Privado consiste em "meter o
material jurídico estrangeiro nas gavetas do sistema nacional"186, poderá simetrica-
mente dizer-se que o mesmo problema no Direito Tributário Internacional está em
"colocar o material jurídico interno nas gavetas dos tratados"187.
A qualificação primária tem por objeto situações fáticas; a qualificação secundá-
ria tem por objeto "regras de direito" ou "conceitos jurídicos".
A especificidade do problema das qualificações em matéria de tratados contra a
dupla tributação não está na questão (comum às normas unilaterais) de C011W qualifi-
car; mas sim na determinação de quem deve qualificar. É que, visando os tratados uma
delimitação da competência para tributar, não poderiam deixar de resolver, de uma
ou de outra forma, o problema de determinar qual dos Estados (ordenamentos) tem
competência para qualificar.
Mais precisamente, o problema central da qualificação consiste em determinar
a quem o tratado atribuiu competência qualificatória) se a ambos os Estados em pre-
sença, cumulativamente) atribuindo a cada um competência autônoma para qualificar

184 efr. Da qualificação, 108: "Na verdade, uma coisa será pretender que entre A e B se estabele-
ceu, por exemplo, uma relação jurídica de arrendamento, à face dos preceitos materiais desta
ou daquela ordem jurídica, e outra coisa será sustentar que essa concreta relação jurídica de
arrendamento deve ter-se por uma relação creditória, para o efeito de poder ser subsumida
na norma de conflitos que se reporta a relações de crédito. Do ponto de vista do direito de
conflitos só a respeito desta última operação pode em rigor falar-se de qualificação."
185 efr. BAPTISTA MACHADO, Lições) 117.
186 efr. MELCHIOR, apud BAPTISTA MACHADO, op. cit.) 127.
187 SIGF1UED WIDMANN refere-se a "Subsumtion eines Abstralctums unter ein anderes Abstrak-
tum": cfr. Zurechnungsanderungen und Umqualifikationen durch das nationale Recht in
ihrem Verhaltnis zum DBA-Recht, in K. VOGEL (org.), Grundfragen, 236 sS.
Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

uma mesma situação em face das respectivas leis internas, ou se apenas a um deles, ex-
clusivamente, de modo tal que o outro Estado deveria acatar automaticamente a qua-
lificação dada pelo primeiro em face da sua lei interna e de harmonia com o tratado.
A doutrina tradicional coloca o problema da qualificação nos seguintes temos: na
medida em que o tratado, por si mesmo, não resolva o problema, oferecendo uma defini-
ção expressa, existem três soluções possíveis: (i) cada Estado, aplicando o tratado, quali-
fica os termos do tratado de acordo com as exigências da lei doméstica: qualificação pela
!exJari; (ii) ambos os Estados qualificam os termos do tratado consistentemente de acordo
com a lei do Estado de que deriva o rendimento: qualificação pelo Estado da flnte 188 ; (iii)
ambos os Estados tentam estabelecer uma qualificação consistente através do contexto do
tratado: qualificação autônoma. Ainda não previamente discutida, mas igualmente plausí-
vel' é (iv) uma qualificação consistente de acordo com a lei do Estado da residência 189 •
Discordamos, em vários pontos, desta formulação.
Desde logo, porque o tratado nunca pode, por si só, resolver o problema da
qualificação, pois este - já se afirmou - não respeita ao momento interpretativo, mas
ao momento subsuntivo de uma situação concreta (objeto da qualificação), valorada
à luz de um ordenamento interno (fonte de qualificação).
Em segundo lugar, porque a qualificação autônoma, nada mais sendo que uma
"interpretação comum" de conceitos formulados diversamente pelas ordens nacio-
nais, à luz do contexto do tratado, não é uma solução para o problema da qualifica-
ção, que lhe é logicamente posterior.
Em terceiro lugar, porque a solução da competência qualificatória cumulativa, pres-
suposta pela corrente da !exfori, é sempre inadmissível, como a seguir se demonstrará.
Em quarto e último lugar, porque a questão de saber se a competência qualifica-
tória pertence ao Estado da fonte ou ao Estado da residência não pode ser colocada
como se de duas soluções alternativas se tratasse. A essência da nossa tese reside
precisamente em reconhecer que só existem competências qualificatórias exclusivas e que
estas variam consoante a natureza das questões que são o seu objeto.

b) A teoria da competência qualificatória cumulativa


Uma corrente da doutrina inclina-se no sentido da existência de uma compe-
tência qualificatória cumulativa, tanto do Estado da fonte quanto do Estado da re-
sidência, de tal modo que cada um dos Estados pode e deve qualificar o conceito

188 VOGEL observa que esta solução é, por vezes, erroneamente referida como lex causae; todavia,
de acordo com a terminologia do DIP, lex causae é o sistema legal aplicável a um caso par-
ticular, pelo que em Direito Tributário Internacionallex causae é idêntica à lex firi: cfr. Double
Taxation, 54. Embora terminologicamente concordemos que a dicotomia lex firi e lex causae
não se enquadra bem na sistemática do DTI, a identificação necessária, afirmada por VOGEL,
entre a lei aplicável e a do órgão de aplicação do direito, revela bem o pensamento do autor,
segundo o qual não é admissível a atribuição de competência qualificatória ad aliud ius.
189 efr. VOGEL, Double Taxation, 54.
Título 111 I Capo I I Tratados Internacionais M'fl!!
do tratado de acordo com a sua lei interna (lex flri) - e isto quer no que se refere
ao conceito-quadro, quer no que concerne aos demais pressupostos de aplicação da
norma convencional. É esta a posição defendida, em última análise, por V OGEL e pela
jurisprudência do Bundesfinanzhofi citada por esse autor l90 .
Tome-se o seguinte exemplo: tem-se em vista qualificar o pagamento de uma
quantia em dinheiro por um Estado (da fonte) a um residente no outro Estado, como
sendo uma remuneração do trabalho ou uma pensão. O Estado da fonte qualificou o
pagamento como remuneração do trabalho nele exercido e tributou-o. Por sua vez, o
Estado da residência qualificou autonomamente o mesmo rendimento como pensão
e tributou-o de novo. Outro exemplo é dado pelo célebre caso Pierre Boulez - com-
positor e chefe de orquestra residente na Alemanha, que efetuou concertos nos Es-
tados Unidos. O Fisco alemão qualificou a remuneração como royalty tributável na
Alemanha e não tributável nos Estados Unidos; o Fisco norte-americano qualificou
a mesma remuneração como pagamento de serviços de trabalho independente, tribu-
tável nos Estados Unidos. Se, ao invés, a Alemanha qualificasse a remuneração como
pagamento de serviço independente e os Estados Unidos como royalty, não teria havi-
do qualquer tributação, pois na Convenção Estados Unidos-Alemanha os royalties são
apenas tributáveis no Estado da residência e os serviços independentes são tributáveis
no país onde foram prestados. Donde se vê que um sistema de qualificação cumu-
lativa conduz a conflitos de qualificação, positivos ou negativos, os quais conduzem,
respectivamente, à dupla tributação (cúmulo) ou à ausência de tributação (vácuo).
Tentaremos demonstrar que, ao contrário, a correta interpretação dos tratados
contra a dupla tributação conduz sempre à atribuição de uma competência exclusiva a
um dos Estados, única solução que está de harmonia com o "objeto e o propósito"
desses tratados, que é o de evitar a dupla tributação e a evasão fiscal, fenômenos estes
aos quais um sistema de dupla qualificação cumulativa pode abrir as portas. Ora,
nos termos do art. 31 da Convenção de Viena, o object and purpose do tratado é um
dos pilares em que assenta a sua interpretação, pelo que deverá dar-se preferência à
solução que a eles melhor se adequar l91 .

190 VOGEL, Double Taxation, cit., 51 ss. Ver também EGON SCHLÜITER, Personengesellschaft oder
Kórperschaft? Aktuelle QualifIkationsfragen, in K. Vogel (org.), Grundfragen, 215 (231
ss.); FANTOZZI, Diritto Tributario, 169.
191 Esta é a posição defendida no estudo de AVERY JONES, li interprétation, várias vezes citado,
estudo no qual colaboraram juristas do peso de PIERRE FONTANEAU, RAOUL LENZ, MARTIN
ELLlS e outros. Cfr. ainda AVERY JONES, lnterpretation of double taxation conventions, CDFI
LXXVIII-a (1993), 597 (607 ss.). Esta é também a posição defendida no Canadá por DÉRY/
WIUill,Interpretation ofdouble taxation conventions, CDFI LXXVIII-a (1993), 259 (281 ss.);
e parece ser também a posição adotada na Dinamarca pelo "Assessment Council" como in-
forma MICHELSEN, lnterpretation of double taxation conventions, CDFI LXXVIII-a (1993),
295 (309) e na Bélgica, pela Corte de Cessação, que aplicou a lei francesa para qualifIcar uma
permuta de ações por títulos da dívida pública, como informa BAKER, Double Taxation, 35.
Por sua vez, as recomendações do AMERlCAN LAW INSTlTUTE sobre interpretação dos trata-
dos sugerem que, quando os demais elementos interpretativos se revelam insufIcientes, "the
I d I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Acresce que o sistema de competência qualificatória exclusiva se nos afigura


encontrar-se expressamente acolhido pelos tratados, em disposições específicas, distintas
das do § 2° do art. 3° do Modelo OCDE que, repita-se mais uma vez, respeita apenas
ao problema prévio da interpretação e é ininvocável em matéria de qualificação.

c) A nossa teoria

(i) Competência qualificatória exclusiva do Estado da fonte quanto ao conceito-quadro

Há que distinguir, neste domínio, os conceitos referentes ao conceito-quadro da


norma de conflitos (e que descrevem os vários tipos de rendimentos a que a conven-
ção se aplica) dos demais pressupostos de aplicação da norma convencional l92 .
No que concerne aos conceitos referentes ao conceito-quadro, as convenções
consagraram a solução de atribuir competência qualificatória exclusiva ao Estado em
que se localiza a referida fonte de produção ou pagamento. É o que decorre do § 3°
do art. 10 do Modelo, segundo o qual o termo dividendos abrange os rendimentos
de ações ou assemelhados aos rendimentos de ações pela legislação tributária do Esta-
do contratante em que seja residente a sociedade que os distribuir. Embora o Modelo (na
versão de 1977) não explicite esta regra para juros (porque pretendeu dar uma defi-
nição "cerrada"), as Convenções brasileiras dispõem, em matéria de juros, que este
conceito compreende rendimentos que pela legislação tributária do Estado contratante
de que provenham sejam assemelhados aos rendimentos de importâncias emprestadas.
Também em matéria de rendimentos imobiliários, se estabelece que a expressão bens
imobiliários é definida de acordo com a legislação do Estado contratante em que os bens
em questão estiverem situados. Esta última regra (art. 6°, § 2°, do Modelo OCDE),
longe de ser uma regra excepcional, como pretende a chamada teoria da lex flri ou
da competência qualificatória cumulativa, insere-se na regra geral, segundo a qual a

term will generally begiven the meaning aecorded by the dmnestic law of the source country": cfr. The
American Law Institute Federal Tax Project. International Aspects or United States Incame Taxa-
tion II; Proposals on United States Incame Tax Treaties (ALI Report), 1992, recomendação nO 9.
Temos para nós que o objetivo dos tratados, evitar a dupla tributação e a evasão fiscal, assume
no Direito Tributário Internacional a mesma força e relevância que o princípio da harmonia
jurídica internacional no Direito Internacional Privado: cfr. FERRER CORREIA, Direito Interna-
cional Privado - alguns problemas, Coimbra 1991 (2a reimp.), 111 ss.; BÜHLER, Princípios, 222.

192 Não aceitamos a posição de BAPTISTA MACHADO, segundo a qual o problema da qualificação
respeita apenas ao conceito-quadro e não aos demais pressupostos. Esta ideia está subjacente
também em VOGEL, quando afirma que a caracterização do status de uma pessoa à qual o
tratado se aplica é um problema de estrutura lógica distinta, que propõe seja designado por
"substituição", na terminologia de LEWALD, ou "classificação" (Einordnung) , como sugere o
Bundesfinanzhof cfr. VOGEL, Double Taxation, 52-53 e 90.
Título 111 I Capo I I Tratados Internacionais I 0!0 I

competência qualificatória em relação aos tipos de rendimentos pertence exclusiva-


mente ao Estado da fonte I93.
Corolário desta regra é que o Estado da residência deve aceitar a qualificação
do Estado da fonte, sendo-lhe vedado proceder à "nova qualificação", autônoma, em
face do seu ordenamento interno. Ora, é precisamente a esta conclusão que condu-
zem as disposições convencionais que, ao regularem a atuação do Estado da residên-
cia, no que concerne à eliminação da dupla tributação, o obrigam a conceder isenção
ou crédito de imposto quanto aos rendimentos que, de acordo com a Convenção, possam ser
tributados no Estado da fonte (art. 23 do Modelo). Significa isto que, se de harmonia
com a convenção e a legislação interna do Estado da fonte foi corretamente interpre-
tada a convenção e qualificada a situação da vida, a outorga de isenção ou de crédito
de imposto é automática, não pressupondo ou envolvendo nova e autônoma qualifi-
cação pelo Estado da residência.
Mas aquela outorga já não é obrigatória se ocorrer, não um verdadeiro confli-
to de qualificações, mas um mero conflito de interpretação dos fatos ou da norma
convencionaP94.

(ii) Competência qualificatória exclusiva da lex situationis quanto aos pressupostos

Mais absurdas seriam ainda as consequências da teoria da competência qualifi-


catória cumulativa no que concerne aos demais pressupostos de aplicação da norma
convencional. Também aqui a regra geral é a atribuição de competência qualificatória
exclusiva; só que essa atribuição não é feita necessariamente ao Estado da fonte do
rendimento, mas sim ao Estado com vocação natural para regular a situação, vocação
essa que varia consoante o tipo de situação em causa. Referimo-nos à competência
da lex situationis para exprimir a lei do Estado com vocação para regular um tipo de
situação, pressuposto como condição de aplicação de normas convencionais 195 .
Alguns exemplos ajudarão a esclarecer este ponto.

193 Em sentido análogo se orientam os Comentários ao Modelo OCDE-ISD, quando sugerem


uma cláusula modelo, segundo a qual "se, em virtude da legislação de um Estado contra-
tante, um direito ou uma participação forem considerados como um bem não previsto nos
arts. 5° ou 6°, ao passo que, de acordo com a legislação do outro Estado contratante, este
direito ou participação forem considerados como estando contemplados por um destes ar-
tigos, a natureza do direito ou da participação é determinada de harmonia com a legislação do
Estado que não o do domicílio do de cujus ou do doador": Comentários, art. r, § 24.
194 Esta orientação viria a ser consagrada nos Comentários aos arts. 23-A c 23-B sob a desig-
nação de new approach (parágrafos 32.1 a 32.8). Exemplo de conflito de interpretação pode
surgir da interpretação restritiva dada pelo Brasil ao art. 7° dos tratados de modo a excluir os
serviços do seu campo de aplicação. Cfr. SÉRGIO ANDRÉ ROCHA, A qualificação, cit., 143 ss.
195 O que corresponde a aplicar no Direito Tributário Internacional o princípio da maior
proximidade ou da competência mais próxima (Niiherberechtigungsprinzip) reconhecido no
Direito Internacional Privado. Cfr. FERRER CORREIA, Direito Internacional Privado - alguns
problemas, 118-119.
Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Trata-se de aplicar no Brasil a disposição do tratado Brasil-Holanda que esta-


belece que este se aplica apenas aos rendimentos auferidos por pessoas residentes
nesses países, a um caso em que um pagamento de rendimento é feito a pessoa física
que alega ser residente na Holanda por outra que alega ser residente no Brasil. Qual
a ordem jurídica competente? Evidentemente que a ordem jurídica brasileira para
determinar se a pessoa que paga os rendimentos é residente no Brasil e a ordem ju-
rídica holandesa para determinar se a pessoa que aufere os rendimentos é residente
na Holanda (lex CÚJmitilii). A adoção do critério da lexfori conduziria ao absurdo de
determinar a residência holandesa em face dos critérios jurídicos brasileiros.
Trata-se de aplicar no Brasil as disposições do tratado Brasil-Canadá que es-
tabelecem que o tratado apenas se aplica a rendimentos pagos a sociedades com
personalidade jurídica para efeitos tributários, num caso em que um pagamento de
dividendos é feito a um trust canadense. Qual a ordem jurídica competente para
determinar se o trust canadense tem personalidade tributária e se, no caso concreto,
a figura jurídica em causa reveste a natureza de um trust. Evidentemente que a lei
canadense 196 . A aplicação da lex flri conduziria ao absurdo de determinar a natureza
jurídica de um instituto pela aplicação da lei brasileira que até o desconhece.
Trata-se de aplicar no Brasil as disposições do tratado Brasil-Bélgica que estabe-
lece a proibição de discriminação contra pessoas "nacionais" de um Estado e definem
a nacionalidade das pessoas jurídicas em função do país à sombra de cujas leis se
constituíram, num caso em que uma empresa belga alega tratamento discriminatório
no Brasil. Qual a lei competente para qualificar a nacionalidade da sociedade em
causa? Evidentemente que a lei belga, à luz da qual se alega ter sido incorporada (lex
patriae). De novo, a aplicação cega da lex flri conduziria ao absurdo de determinar a
nacionalidade de uma sociedade estrangeira em face dos critérios da lei brasileira 197 .

196 Cfr., neste sentido, os Comentários da OCDE ao art. 3°, § 1°, § 3°: "In adition the term (com-
pany) covers any other taxable unit which is treated as a body corporate according to the laws of the
contracting State in which it is O1;ganised.)) Foi suscitada na Bélgica a questão de saber como
deveria ser qualificada uma partnership holandesa, tendo em vista que, segundo a lei belga,
a partnership tem personalidade jurídica e é autonomamente tributável, mas não assim se-
gtmdo a lei holandesa, que a considera transparente, tributando diretamente os seus sócios.
O Cour d' Appel de Bruxelas decidiu que a Administração fiscal belga deveria reconhecer o
estauuo fiscal de entidades estrangeiras, de harmonia com a legislação do país em que se
constimíram: cfr. decisão nO 1780, de 30 de janeiro de 1967, in European Taxation 8 (1968),
30. Esta é também, na doutrina alemã, a posição de KNOBBE-KEUK, ''Qualifikationskonflikte))
im internationalen Steuerrecht der Personengesellschaften, Recht der internationalen Wirtschaft
1991,306-316, apud GREIF, in MbssNERjet aI., Steuerrecht, 419.
197 Segundo os Comentários da OCDE (art. 3°, § 8): "Obvious/y, in determining what is meant
by «the nationals ofa Contracting State», in relation to individuais, reforence must be made to the
sense in which the term is usually employed and each State's particular rules on the acquisition or
loss ofnationality." No caso Oppenheimer v. Cattermole, discutia -se uma exoneração do tratado
para pensões pagas por fundos públicos alemães em função da nacionalidade da pessoa. O
Tribunal inglês declarou aplicável a lei alemã para defmir a nacionalidade: cfr. AVERY JONES,
Ilintélprétation, cit., 21 (51).
Título 111 I Capo I I Tratados Internacionais

Trata-se de aplicar no Brasil as disposições do tratado Brasil-Finlândia, segundo


as quais os lucros das empresas de navegação são apenas tributáveis no Estado em
que estiver situada a sede da direção efetiva da empresa, num caso em que certa em-
presa, com sede na Finlândia, alega ser empresa de navegação. Qual a lei competente
para determinar se, em face dos seus estatutos e outras características relevantes,
aquela empresa pode ser qualificada como empresa de navegação? Decerto a lei fin-
landesa, na qualidade de lex societatis.
Das considerações e exemplos precedentes pode, pois, concluir-se que certo tipo
de situação que configure um "pressuposto" de aplicação do tratado e que seja descri-
ta por um conceito jurídico deve ser exclusivamente qualificada pela ordem jurídica
que com ela tenha mais estreita conexão (lex situationis), conexão essa que há de ser
descoberta por esforço interpretativo do próprio tratado.
Assim, por exemplo, a nacionalidade de uma pessoa deve ser qualificada pela lei
do país cuja nacionalidade se invoca; a residência de uma pessoa, pela lei do país cuja
residência se invoca; a qualificação de um ente como sociedade deve ser feita em face
das leis do país à sombra das quais se incorporou; e assim por diante.
Não se trata aqui de saber (como muitos colocam a questão) se a qualificação é
feita pela lex flri ou pela lex causae) e isto porque enquanto esta dicotomia é válida no
Direito Internacional Privado não o é no Direito Tributário Internacional. Neste, os
tratados determinam desde logo (explícita ou implicitamente) qual é a lei competente
para qualificar uma situação descrita por conceito jurídico. Lei aplicável é, quanto ao
conceito-quadro, a lei do Estado da fonte do rendimento e, quanto aos demais pres-
supostos, a lex situationis) de tal modo que dizer que ela é a lex flri ou lex causae é de
todo irrelevante, pois tal qualificação depende do ordenamento em que se localiza o
órgão de aplicação do direito: é claro que se a lex situationis for a mesma da do órgão
de aplicação do direito ela será a lex flrij se for a lei do outro Estado, será a lex causae.
Tais caracterizações, repita-se, não refletem a natureza da lei aplicável, mas apenas
uma questão de perspectiva, pelo que devem ser abandonadas.
Note-se que uma mesma norma de tratado pode envolver aplicação sucessiva de
leis distintas, consoante a natureza das questões em causa. Assim, por exemplo, saber
se um pagamento de dividendos feito no Brasil a sociedade domiciliada na França e
incorporada na Holanda está sujeito a um tratamento fiscal discriminatório num cer-
to país envolve a aplicação do direito brasileiro quanto à qualificação do rendimento,
a aplicação do direito francês quanto à qualificação da residência e a aplicação do
direito holandês quanto à qualificação da nacionalidade.

(iii) Competência qualificatória exclusiva do Estado da residência


Vimos até agora os casos de competência qualificatória nas situações em que o
tratado atribui competência tributária cumulativa ao Estado da residência e ao Estado
da fonte, e este último aplica a norma convencional que lhe atribui tal competência.
Concluímos que este Estado deve qualificar as situações descritas no conceito-quadro
I 0i6 I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

(tipos de rendimentos) à luz da sua lei interna e os demais pressupostos de aplicação à


luz da lex situationis, ou seja, da lei com vocação natural para reger tais situações.
Significa isto que ao Estado da residência não é também atribuída competên-
cia qualificatória? A doutrina da lex flri, admitindo uma competência qualificatória
cumulativa, não hesitará em responder afirmativamente, abrindo com isso as portas a
um conflito de qualificação. A doutrina da qualificação pelo Estado da fonte (AVERY
JONES e outros) entende que a este Estado cabe sempre uma competência qualificató-
ria exclusiva, devendo o Estado da residência acatá-la automaticamente.
A nossa tese, ao invés, admite que o Estado da residência tem, também, com-
petência qualificatória exclusiva quanto às normas convencionais que lhe são especi-
ficamente dirigidas. E quais são essas normas? São precisamente aquelas que - ins-
piradas nos arts. 23-A e 23-B do Modelo OCDE - impõem ao Estado da residência
a obrigação de adotar os "métodos" da isenção ou da imputação. Tenha-se presente
que, nas hipóteses em que a convenção atribui competência tributária cumulativa ao
Estado da residência e ao Estado da fonte, a este cabe a tributação primária, devendo
o Estado da residência limitar-se a extrair as consequências dessa tributação, outor-
gando isenção ou crédito de imposto - tributação secundária.
Atente-se na redação do art. 23-A do Modelo OCDE, que regula o método da
isenção: "Quando um residente de um Estado contratante aufere rendimento ou de-
tém capital que, de acordo com as disposições desta Convenção, pode ser tributado
em outro Estado contratante, o Estado primeiramente referido deve, ressalvadas as
disposições dos §§ 2° e 3°, isentar de imposto esse rendimento ou capital".
Para aplicar este preceito, o Estado da residência deve resolver os seguintes pro-
blemas de qualificação: (i) no caso concreto, o titular do rendimento ou do capital é
nele residente?; (ii) no caso concreto, configura-se rendimento ou capital que possa
ser tributado no outro Estado?; (iii) em caso afirmativo, qual o montante desse ren-
dimento ou capital tributável?
O primeiro - determinação da residência do titular do rendimento - deve ser
resolvido pela sua própria lei interna, não por ser o Estado da residência, mas por ser
o da lex situationis, lex domitilii, lei esta que deve ser igualmente aplicada pelo Estado
da fonte, pois é a única com competência para o efeito. Mas já o segundo e o tercei-
ro problemas devem ser resolvidos em face da lei interna do Estado da fonte, por-
que respeitam ao conceito-quadro, ou seja, à qualificação do rendimento em causa.
Acresce que só a lei do Estado da fonte pode dizer se a situação concreta é subsumível
num tipo de rendimento que pode ser tributado nesse Estado e definir o montante
do rendimento tributável em função das deduções por essa mesma lei admitidas l98 .

198 Não se nos afigura correta a afirmação dos Comentários, OCDE, art. 23°, § 1° A, § 39: "The
amount ofincome to be exempted from tax by the State ofresidence is the amount which, but for the
Convention, would be subjected to domestic income tax according to the domestic /aws goveming
such taxo It may, therefore, differ from the amount of income subjected to tax by the State ofsource
according to its domestic laws. JJ
Título 111 I Capo I I Tratados Internacionais Ip I

Dir-se-á que, na prática, o problema é irrelevante, tendo em vista que, para a


obrigação do Estado da residência de reconhecer a isenção, basta a possibilidade legal
de o rendimento ser tributado no Estado da fonte, ainda que tal poder não tenha sido
efetivamente exercido por este Estado 199 •
O argumento, porém, não é certeiro. Se, em face da situação concreta - objeto
de qualificação pela lei do Estado da fonte -, ela não pode ser tributada por este
Estado, falta o pressuposto de aplicação do art. 23-A e, por conseguinte, nenhuma
obrigação existe para o Estado da residência de reconhecer a isenção.
Tome-se, como exemplo, um caso em que se aprecia, no Estado da fonte, se a
venda de um ativo de uma sociedade para seu sócio por preço inferior ao do mer-
cado reveste a natureza de uma distribuição de lucro ou se é um rendimento não
expressamente previsto no tratado. Se o órgão de aplicação do direito do Estado da
fonte reconhecer que é um lucro distribuído, tal rendimento "pode ser" tributado
nesse Estado e o Estado da residência deve acatar essa qualificação. Mas se, ao invés,
se reconhecer que é "outro rendimento", então não poderá ser tributado no Estado
da fonte, caso o tratado adote a regra do art. 21 do Modelo OCDE, segundo o qual
CCitems of income of a resident of a Contracting State) whenlWer arising) not dealt with in
the foregoing Articles of this Convention) shall be taxable only in that State».
Assim, ainda que uma qualificação operada à luz da lei do Estado da residência
apontasse no sentido de que esse rendimento podia ser tributado no outro Estado
(vg. por se tratar de distribuição de lucros), caso em que o Estado da residência devia
conceder uma isenção (mesmo na hipótese de o poder tributário não ser efetivamen-
te exercido), o fato de o Estado com competência qualificatória exclusiva ter conclu-
ído pela ausência do poder de tributar (qualificação negativa) dlWolve a plenitude do
poder de tributar ao Estado da residência.
Caso não se respeitasse a competência qualificatória exclusiva do Estado da fon-
te para determinar se a situação concreta era por ele tributável (ou seja, caso se atri-
buísse competência qualificatória ao Estado da residência para definir esta questão
à luz dos seus próprios critérios), ocorreria um caso de dupla não tributação, não
desejado pelo "escopo e propósito" do tratado: não tributação pelo Estado da fonte
porque, julgado tributariamente competente à luz dos critérios do Estado da residên-
cia, não se julgava como tal, em face dos seus próprios; não tributação pelo Estado
da residência, obrigado a conceder a isenção para os casos em que o outro Estado
(segundo os critérios do primeiro Estado) pode tributar20o •

199 Cfr. OCDE, Comentários, art. 23°, § 1° A, § 34: "The State ofresidence must accordingly give
exemption whether or not the right to tax is in effect exercised by the other State. This method is
regarded as the mostpractical one since it relieves the State ofresidence from undertaking investiga-
tions of the actual taxation position in the other State. »
200 É certo que uma dupla não incidência também ocorreria na hipótese de o Estado da fonte se
reconhecer competente e não tributar efetivamente o rendimento, em função de disposição
isencional do seu regime interno. Mas a situação não é comparável àquela em que o próprio
Estado da fonte não se reconhece competente. Na primeira situação, a isenção outorgada
I Dir3 I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Vejamos agora o que sucede em face da norma do art. 23-B do Modelo OCDE
que consagra o método de imputação: "Quando um residente de um Estado contra-
tante aufere rendimento ou possui capital que, de acordo com as disposições desta
Convenção, possa ser tributado no outro Estado Contratante, o Estado primeira-
mente mencionado concederá: (a) como dedução do imposto sobre o rendimento
desse residente, um montante igual ao imposto de renda pago no outro Estado; (b)
como dedução do imposto sobre o capital desse residente, um montante igual ao
imposto sobre o capital pago no outro Estado."
Tal como em relação ao método de isenção, a qualificação da situação da vida,
necessária para determinar se o rendimento em causa "pode ser tributado" no Estado
da fonte, deve ser decidida à luz dos critérios internos desse Estado.
Uma vez resolvida esta questão, duas outras devem ainda ser decididas: a de
saber se o imposto em causa é um imposto de renda ou sobre o capital e, em caso
afirmativo, se tal imposto foi "pago".
No que concerne à primeira questão, entendemos que a competência qualifica-
tória exclusiva da natureza do imposto pago ao Estado da fonte pertence ao Estado
da residência, pois tal imposto representa uma dedução do seu próprio imposto.
Embora, via de regra, os impostos aos quais a convenção se aplica estejam listados
taxativamente na própria convenção, estas preveem também a sua aplicação a im-
postos idênticos ou substancialmente similares, vigentes após a data da assinatura da
convenção. Suscita-se, pois, o problema de saber se o tributo cobrado pelo Estado da
fonte se pode qualificar como "imposto sobre a renda" ou "imposto sobre o capital";
ou, ainda, de saber se os juros moratórios, os juros compensatórios e as penalidades
se integram no conceito de imposto201 •
A segunda questão a que se aludiu - a de saber se o imposto de renda foi
"pago" - parece, à primeira vista, uma simples questão de fato, que não suscita um
verdadeiro problema de qualificação. Um exemplo revela que não é assim. No caso
Continental Illinois Corporation) Citizens and Southern Corporation, discutiu-se no Tax
Court dos Estados Unidos o efeito no "tax credit" norte-americano do regime de be-
nefício pecuniário instituído pelo Decreto-Lei nO 1.411, de 31 de julho de 1975 202 •
De harmonia com este diploma, o Governo do Brasil atribuía aos tomadores de

pelo Estado da residência, mesmo no caso de não exercício efetivo do poder de tributar pelo
Estado da fonte, tem em vista não neutralizar a isenção concedida por este último.

201 Cfr., sobre a qualificação dos impostos suscetíveis de serem creditados nos Estados Unidos,
PAUL McDill'-'IELjHUGH AULT, Introduction to United States International Taxation, Deventer
1977, 71; ELlZABETIl OWENS, The Foreign Tax Credit, Harvard 1961. Cfr. GARBARlNO, La
tassazione, 453, segundo o qual a prestação compulsória estrangeira é qualificada mediante a
aplicação das categorias dogmáticas internas do Estado da residência, mas tendo em consi-
deração também os critérios do outro ordenamento.
202 Este benefício peamiário, revogado pela Lei na 9.430/96, foi objeto de amplo exame na Ia
edição deste livro: cfr. Direito Tributário Internacional do Brasil (Ia ed.), São Paulo 1977, 171 ss.
Título 111 I Capo I I Tratados Internacionais

empréstimos externos wn benefício consistente na imediata devolução em dinheiro


de wn certo percentual do imposto de renda na fonte sobre juros pagos a residentes
no exterior - e cujo ônus econômico o tomador tivesse suportado. Alguns bancos
americanos pretenderam creditar-se da totalidade do imposto "pago", considerando
que a posterior devolução de parte do dinheiro era wn fenômeno financeiro distinto,
tendo o pagamento, em sentido técnico-jurídico, ocorrido pela totalidade. O Tax
Court entendeu, porém, que a simultaneidade das operações não permitia cindi-Ias;
antes conduzia a confirmar unitariamente como pagamento apenas a diferença entre
o imposto pago e o benefício devolvid0 203 .
Também nesta hipótese se nos afigura evidente a competência qualificatória
exclusiva do Estado da residência.
Em inúmeras convenções, a obrigação do Estado da residência de conceder
isenção ou crédito de imposto está condicionada à ocorrência de certos pressupostos,
definidos por conceitos jurídicos. Assim, por exemplo, o art. 24 da Convenção entre
o Brasil e a Alemanha (denunciado) estabelecia que, para os fins de concessão do cré-
dito de imposto, o imposto brasileiro será considerado como sendo de 25% no caso
dos dividendos pagos a wn residente da República Federal da Alemanha que possua
no mínimo 10% do capital com direito a voto, da sociedade brasileira, e de 20% em
todos os demais casos. O art. XXII (§ 4°) da Convenção entre o Brasil e o Canadá
dispõe que "os dividendos recebidos por wna sociedade residente do Canadá de wna
sociedade residente do Brasil serão isentos de imposto no Canadá se a sociedade que
receber os dividendos detiver wna participação de pelo menos 10% na sociedade
pagadora dos dividendos e se os lucros que deram origem aos dividendos foram pro-
venientes do exercício de wna atividade empresarial no Brasil ou em outro país com
o qual o Canadá tenha concluído wna convenção de dupla tributação ( .. .)". Outro
exemplo: o art. 24 (§ 2°), "b", da Convenção entre o Brasil e o Luxemburgo, estabele-
ce que: "Com ressalva do disposto na alínea 'c', quando wna sociedade residente do
Luxemburgo detiver, desde o início de seu exercício social, de forma contínua, wna
participação direta de pelo menos 25% do capital de wna sociedade residente no
Brasil, os rendimentos provenientes dessa participação e a própria participação são
isentos de imposto no Luxemburgo. A isenção se aplica igualmente quando as parti-
cipações acwnuladas de diversas sociedades residentes no Luxemburgo atinjam pelo
menos 1/4 do capital da sociedade residente do Brasil e quando uma das sociedades

203 A sentença foi publicada na RDT 52 (1990), 165. Nesta sentença, foi também discutida,
como questão prévia, se, em face do direito brasileiro, os credores estrangeiros de juros são
legalmente obrigados para com o Fisco brasileiro, pois só no caso de essa obrigação existir
a lei norte-americana concede o "tax credit". Também para a administração italiana, por
imposto "pago" no estrangeiro deve entender-se aquele que, uma vez pago, não é suscetível
de repetição. A definitividade respeita ao pagamento e não ao lançamento. Neste sentido, as
retenções por conta não teriam caráter "definitivo". efr. M. lNGROSSO, 11 credito d>imposta,
Milão 1984, 221; GARBARlNO, La tassazione, 458; A. PISTONE, La normativa interna, in PIS-
TONE (org.), Diritto Tributariolnternazionale, 79 (35).
m I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

residente do Luxemburgo detiver em cada uma das outras sociedades residentes do


Luxemburgo uma participação superior a 50%".
Dos exemplos atrás referidos resulta que se suscitam delicados problemas de
qualificação no tocante às seguintes questões: qual a base de determinação de um
dado percentual do capital: o capital total ou o capital com direito de voto?; qual o
título jurídico da participação: titularidade plena ou simples usufruto de ações?; qual
o significado de participação indireta?; como determinar se certa atividade é uma ati-
vidade empresarial?; qual o início do exercício social?; como se define a forma contí-
nua da detenção?; como se computa a participação acumulada?; partes beneficiárias,
bônus de subscrição, debêntures conversíveis configuram participação no capital?
À luz de que ordem jurídica se devem qualificar as situações da vida que são
objeto das citadas questões? Tendo em vista que todas estas situações foram erigidas
pelos tratados como pressupostos da sua aplicação, no que concerne às obrigações
de conceder isenção ou crédito de imposto pelo Estado da residência, a este deve
competir exclusivamente a respectiva qualificação.

(iv) Síntese

É, pois, chegado o momento de resumir os pontos essenciais da nossa tese.


O primeiro é o de que o problema da qualificação não se suscita, no Direito Tri-
butário Internacional, apenas no que se refere às normas convencionais, constantes de
tratados de dupla tributação, podendo também ocorrer no que toca às normas internas.
O segundo é o de que o problema da qualificação pressupõe logicamente a pré-
via solução do problema da interpretação do tratado.
O terceiro é de que o art. 3°, § 2°, do Modelo OCDE (e disposições similares
das convenções), respeita exclusivamente ao problema da interpretação do tratado,
não sendo invocável em matéria de qualificação.
O quarto é o de que é sempre inadmissível a existência de competências qualifi-
catórias cumulativas, por esta solução dar origem a conflitos (positivos e negativos)
de qualificação - conflitos estes que são incompatíveis com o escopo e objeto das
convenções: precisamente, os de evitar a dupla tributação e a evasão fiscal.
O quinto é o de que as convenções contêm regras específicas, explícitas ou im-
plícitas - distintas do art. 3°, § 2°, do Modelo OCDE - que atribuem competência
qualificatória exclusiva a um dos dois Estados, em função da natureza da questão a
que respeita. Assim, a competência qualificatória relativa aos tipos de rendimentos
que constituem o conceito-quadro da norma de conflitos é sempre atribuída exclu-
sivamente ao Estado da fonte; a competência qualificatória exclusiva relativa aos
demais pressupostos de aplicação pertence ao Estado da lex situationis) seja este o
Estado da fonte ou da residência; a competência qualificatória exclusiva do Estado
da residência é-lhe atribuída no que concerne aos pressupostos das normas que lhe
são especialmente dirigidas, ou seja, as relativas à obrigação de conceder isenção ou
crédito de imposto.
Título 111 I Capo I I Tratados Internacionais Ip I

E) Qualificação e aplicação de leis estrangeiras

a) Qualificação, questão prévia e substituição


Da teoria da competência qualificatória exclusiva decorre, como corolário, a sus-
cetibilidade de relevância de leis estrangeiras (inclusive leis tributárias estrangeiras) para
os órgãos nacionais de aplicação do direito. Tal ocorrerá sempre que o Estado da resi-
dência acate automaticamente a qualificação efetuada pelo Estado da fonte, que passa
a funcionar como pressuposto de aplicação das regras reguladoras do método de isen-
ção ou imputação. E tal ocorrerá sempre que o órgão de aplicação do direito, tanto do
Estado da residência quanto do Estado da fonte, aplicar lcge situationis estrangeiras,
ou seja, sempre que seja competente lei estrangeira para regular um dos pressupostos
de aplicação do tratado, refira-se ele ao conceito-quadro ou aos demais pressupostos.
Em rigor, só pode falar-se em aplicação das leis estrangeiras, como tal, inclusive
leis tributárias, no tocante aos simples pressupostos de aplicação da norma, como su-
cederá nos casos em que o órgão de aplicação do direito aplica a lei do Luxemburgo
para saber se um trust luxemburguês é uma "pessoa", ou a lei dos Estados Unidos
para saber se uma sociedade é nacional deste país.
Quanto à qualificação dos tipos de rendimento descritos pelo conceito-qua-
dro, vimos já que a respectiva competência pertencia exclusivamente ao Estado da
fonte, que portanto aplica apenas leis internas nacionais. A aceitação automática,
pelo Estado da residência, da qualificação dada pelo Estado da fonte não envolve,
em rigor, aplicação de lei estrangeira, mas acatamento, para efeitos de aplicação
do tratado, de um ato jurídico de Estado estrangeiro que aplicou as suas próprias
leis nacionais, trate-se de ato administrativo, de lançamento do imposto ou de ato
judicial. Teoricamente, o problema não respeita à aplicação de lei estrangeira, mas
ao reconhecimento dos efeitos jurídicos no âmbito interno de ato de autoridade
pública estrangeira 204 .
O problema da aplicação da lei estrangeira no Direito Tributário Internacional
apresenta alguma analogia com o problema da questão prévia no Direito Internacio-
nal Privado, tal como foi apresentado por WENGLER, e daí que ISAY e BÜHLER já alu-
dissem (embora sem aprofundar) à possibilidade da sua aplicação no que respeitava
às Vorfragen. Trata-se aqui, é certo, da determinação do conteúdo de um conceito
prejudicial contido na norma material aplicável à questão principal. Todavia, há que
notar duas particularidades: em primeiro lugar, não se coloca, em rigor, uma questão
prévia (ou seja, objeto de norma de conflitos autônoma da que regula uma questão
principal), mas sim da concretização de pressupostos que concorrem paritária e si-
multaneamente para o mesmo efeito - a aplicação de certa norma convencional -,
pressupostos esses contidos na própria norma e não numa norma autônoma; em
segundo lugar, esta concretização, no Direito Tributário Internacional, não envolve -

204 Cfr. BAPTISTA MACHADO, Lições de Direito Internacional Privado, 297.


Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

como a questão prévia do Direito Internacional Privado - um problema de choice of


law, mas de aplicação da lex situationis material vocacionada para esse efeito.
A doutrina tem usado, para designar este fenômeno, as expressões "consultar",
"considerar", "tomar em consideração" o direito estrangeiro (prise en considération)
recognition) Berücksichtigung) Beachtung) aplicação indireta). Como, porém, bem ob-
serva PÉREz-BEVIÁ, "a expressão 'tomar em consideração' é vaga e pouco determi-
nante, já que o verdadeiro problema é de reconhecer efeitos às regras estrangeiras,
sob qualquer forma. Neste sentido, pelo resultado a conseguir, a 'tomada em consi-
deração' lato sensu viria a confundir-se com a 'aplicação', já que as leis não foram feitas
para ser tomadas em consideração, mas para ser aplicadas"205.
Acresce que - como agudamente observa MOURA RAMos - os casos em que as
normas de direito público estrangeiro são tidas em conta no Estado do foro não são
meras hipóteses de referência pressuponente ou de referência condicionante. '1\0
contrário, as normas estrangeiras de direito público são hoje objecto da mera aplica-
ção por parte do Estado do foro, no sentido de que são os próprios critérios de deci-
são nele contidos que funcionam como parâmetros de avaliação das situações que no
foro se suscitam, não se limitando pois a condicionar a produção de consequências
jurídicas previstas pelas normas da lex flri"206.
Quando, nestes casos, ocorre a aplicação de lei estrangeira, esta respeita à lei
estrangeira como tal, que não se limita, assim, a ser tomada em consideração, como
um puro dado de fato, inserido na premissa menor do silogismo subsuntivo, como
pensam alguns autores no Direito Internacional Privado, que adotam a doutrina da
referência pressuponente ou da Begriffiverweisung207 . Com efeito, há verdadeira aplica-
ção de lei estrangeira porque é atribuída "relevância jurídica", para efeitos de aplica-
ção do tratado pelos órgãos nacionais, à situação jurídica qualificada à sua sombra
(nacionalidade, residência, personalidade), ou seja, ao produto de uma valoração
da lei estrangeira. O fato de esta lei (ad quem) não produzir, na ordem interna, os
seus efeitos típicos, mas apenas os efeitos pretendidos pela norma convencional (a
quo), não transforma o objeto da qualificação numa questio facti. Trata-se sempre de
verdadeira aplicação da lei estrangeira reguladora de questio Júris, podendo, quando

205 Cfr. La aplicación deI Derecho Público extranfero, Madrid 1989, 75. Na terminologia anglo-
saxônica, distingue-se a recognition (ou application) do enforcement da lei estrangeira, para
distinguir a aplicação coercitiva da não coercitiva (PÉREz-BEvIÁ, op. cit., 8 e 74). WENGLER
alude à distinção entre &chtsfors01;ge durch Ví:rweisung e Rcchtsfors01;ge durch Berechtigung,
apud MOURA RAMos, Da lei aplicável ao contrato de trabalho internacional, Coimbra 1990,
94, nota; ver também op. cit., 301; A. MARQUES DOS SANTOS,As normas de aplicação imediata
no Direito Internacional Privado, II, Coimbra 1991, 801. Tenha-se ainda presente que, em
certos ordenamentos, é admissível a aplicação das leis penais estrangeiras, como tal. Cfr.
PÉREz-BEvIÁ, op. cit., 85 ss.; MOURA RAMos, op. cit., 301, e sobretudo TULLlo TREvEs, La
giurisdizione nelDiritto Penale Internazionale, Pádua 1973,passim.
206 Cfr. Da lei aplicável, 305.
207 Cfr. BAPTISTA MACHADO, Lições, cit., 75 ss. e 287 ss.
Título 111 I Capo I I Tratados Internacionais

muito, as particularidades do fenômeno justificar a expressão "aplicação indireta",


o que conduziria a atribuir às normas tributárias de conflitos uma "bilateralidade
enfraquecida''2os.209.
Enfim, a alegação de que a lei estrangeira se inseriria na premissa menor do
raciocínio subsuntivo parte de uma visão simplista do processo de aplicação da lei,
que não se reduz necessariamente à singela subsunção de fatos a normas; antes pode
envolver um percurso gradativo de aplicação de uma pluralidade de normas destina-
das a preencher os diversos pressupostos de aplicação de outra ou outras, relevantes
para a decisão do caso concreto.
A verdade, porém, é que a aplicação das leis estrangeiras - notadamente das
leis fiscais -, embora relevante para a aplicação do tratado e, portanto, das leis fiscais
internas, nunca pode desencadear o efeito típico de elas próprias constituírem obri-
gações tributárias de cujo titular seja o Estado a que as leis estrangeiras pertencem.
Em tal caso - mas só em tal caso - se poderia dizer que a aplicação de lei estrangeira
envolveria um "conflito de soberanias"21o.
Também o fenômeno em causa não se identifica com o da substituição do Direito
Internacional Privado, pois este respeita, na formulação de LEWALD, à questão de sa-
ber se se pode substituir a uma relação de direito interno, considerada pela lei interna
como condição prejudicial de um efeito jurídico determinado, uma relação análoga
de direito estrangeiro211 . Ora, no Direito Tributário Internacional, tem-se em vista
identificar a ordem jurídica competente para qualificar um pressuposto de aplicação
do tratado, definido no próprio tratado.

208 Note-se que a norma de lei estrangeira competente para qualificar certo conceito jurídico
pode remeter para outra norma do mesmo ordenamento, caso o conceito jurídico que tem
por objeto envolva a qualificação de outro conceito jurídico. É, por exemplo, o que ocorrerá
com a lei norte-americana de 1975 que autorizou um estrangeiro não residente, casado com
um cidadão ou residente americano, a optar por ser tributado como residente nos Estados
Unidos. Neste caso, a qualificação como "residente" pressupõe uma qualificação prévia rela-
tiva ao status de casado da pessoa em causa. Podemos falar, nestes casos, numa qualificação
de segundo grau.
209 Cfr. supra, 4, 7.
210 Enfim, não deixaremos de sublinhar que também no domínio do reconhecimento de efeitos
de atos de autoridade pública estrangeira - objeto de normas instrumentais concernentes
à eficácia das leis tributárias no espaço - pode ocorrer o fenômeno da aplicação de lei es-
trangeira, como precursoramente observou ISAY. Com efeito, para que a decisão estrangeira
- judicial ou administrativa - produza efeitos num certo país, é necessária a verificação de
certas condições, como a "competência" do órgão que a emitiu, a regularidade formal do ato
e o seu caráter "definitivo", condições estas cuja ocorrência só pode ser aferida por aplicação
do direito estrangeiro. Cfr. ISAY, Zwischen privatrecht und Zwischenverwaltungsrecht, in FG
ZITIELMANN 1923,289 (345); BÜHLER, Internationales Steuerrecht (IStR) und Internationales
Privatrecht (IPR) , BIFD XI (separata XIII), Amsterdam 1960, 46-47.
211 Cfr. Rêgles genérales de conflits de !ois, Recueil des Cours 1939-III, 132. Sobre esta figura,
pode ver-se ainda ANTONIO MARQUES DOS SANTOS, Breves considerações sobre a adaptaçiW em
Direito Internacional Privado, Lisboa 1989, 530.
MI#.M Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

b) Qualificação e devolução ou reenvio


Outro problema que suscita a relevância da lei estrangeira no Direito Tributário
Internacional consiste em saber se a referência à lei estrangeira como lei competente
para qualificar certa simação da vida é dirigida apenas à lei material estrangeira (tri-
butária ou não tributária) ou à lei estrangeira como "um bloco", incluindo as regras
de conflitos desse ordenamento.
Tome-se, como exemplo, a regra convencional segundo a qual uma empresa es-
trangeira (por exemplo, pormguesa) reputa-se ter um estabelecimento permanente
num Estado (por exemplo, o Brasil), se neste Estado age através de uma pessoa que
ama por conta dessa empresa, desde que esta não goze de um status de agente inde-
pendente e tenha poderes para concluir contratos em nome da empresa. De harmonia
com a nossa tese, a lei brasileira é competente para a qualificação do conceito-quadro,
ou seja, o lucro tributável do estabelecimento permanente. Todavia, a lei competente
para decidir se a pessoa em causa age "por conta" da empresa, se se trata de agen-
te ou não, se tem ou não status independente, se tem ou não poderes para obrigar
contramalmente a empresa, é a lei do país a que esta pertence (lex societatis) , no caso,
Pormgal. Se a simação em causa for puramente interna pormguesa - empresa por-
mguesa, agente pormguês, contrato de agência celebrado em Pormgal - nenhuma
questão adicional se suscita: é a lei pormguesa material e só ela que vai decidir sobre
a qualificação das referidas questões. Pode, todavia, suceder que a simação da vida à
qual a ordem pormguesa se aplica tenha elementos de estraneidade, seja uma simação
internacional, como sucederá, por exemplo, se o agente em causa for de nacionalidade
indiana, residente na Bélgica, e o contrato de agência tiver sido celebrado na Itália.
Pois bem. O Direito de Conflitos pormguês estabelece que a lei competente
para regular as obrigações provenientes de negócios jurídicos, bem como a substân-
cia destes, é a lei da residência habimal comum das partes e, na sua falta, a lei do lugar
de celebração (Código Civil, art. 78). Assim, no nosso exemplo, o direito pormguês
indicaria a lei italiana (lei do lugar de celebração) para qualificar a simação em causa
como agente independente.
Já quanto ao requisito da existência de poderes para obrigar a empresa, o Di-
reito de Conflitos pormguês dispõe que a existência, extensão, efeitos e extinção
dos poderes representativos são regulados pela lei do Estado em que os poderes são
exercidos (Código Civil, art. 39), ou seja, no caso, a própria lei brasileira.
Na hipótese em causa, o órgão de aplicação do direito teria, assim, que aplicar
a lei brasileira no que tange à qualificação do conceito-quadro - lucro de empresa
estrangeira -, a lei italiana, para quem o direito pormguês de conflitos operou uma
transmissão de competência para qualificar a substância do negócio e, de novo, a lei
brasileira (lex flri), para quem o direito de conflitos pormguês retornou a competência
para a,Preciar os poderes de representação.
E assim que pode surgir o problema do reenvio ou devolução no Direito Tribu-
tário Internacional, o qual assenta no princípio segundo o qual sempre que uma lei
estrangeira é aplicável o Estado do foro deve aplicá-la tal como ela seria aplicada pelo
Título 111 I Capo I I Tratados Internacionais I D.iB

sistema jurídico do Estado competente - incluindo portanto as suas próprias regras


de conflitos. Como bem diz K.EGEL, "só quem decida exatamente como no estrangei-
ro de fato se decide aplica efetivamente o direito estrangeiro"212.
Note-se que a aplicação do direito estrangeiro, por força do direito privado de
conflitos internos, pode ocorrer não só por determinação de normas convencionais,
mas também de normas tributárias internas.
Assim, por exemplo, a lei fiscal interna que permita que do imposto de renda
das pessoas físicas sejam deduzidas despesas de sustentação de "dependentes" e de-
fina estes por vínculos de parentesco pode desencadear a aplicação de normas de di-
reito internacional privado do foro, as quais, por seu turno, designem lei estrangeira
como competente para definir, na situação concreta em causa, a existência e validade
de vínculos de parentesco.

SEÇÃO II
TRATADOS DE OUTRA NATUREZA SOBRE MATÉRIA TRIBUTÁRIA

Como já se referiu, ao lado dos tratados relativos à dupla tributação e evasão


fiscal existem outros tratados que versam sobre matéria tributária, a título principal
(tratados referentes à colaboração administrativa entre Estados em matéria de im-
postos, à harmonização das legislações tributárias dos Estados contratantes) ou a tí-
tulo acessório (como sucede nos acordos que regulam portos marítimos, aeroportos,
navegação marítima e aérea, serviço postal, emigração, telecomunicações, comércio
internacional, proteção de investimentos, cooperação cultural, científica, técnica ou
militar e ainda nas convenções relativas às imunidades diplomáticas e consulares ou
ao estatuto fiscal das organizações internacionais e de seus empregados).
A heterogeneidade destes tratados não permite, porém, um tratamento dogmáti-
co unitário, pelo que nos limitamos, por razões sistemáticas, a esta singela referência.

212 Apud BAPTISTA MACHADO, Lições, cit., 186.


CAPÍTULO II
OUTRAS FONTES INTERNACIONAIS

§ l° COSTUME

o costume é, como se sabe, fonte autônoma de produção jurídica no Direito


Internacional (art. 38, nO 1, "b", do Estatuto do Tribunal Internacional da Haia).
Todavia, apenas uma regra conseguiu reunir, em matéria de impostos, os requisitos
geralmente exigidos da longa consuetudo e da opinio iuris vel necessitatis: a que estabele-
ce a isenção dos representantes diplomáticos quanto aos impostos diretos do Estado
em que estão acreditados l .
Duas outras regras começaram a ganhar foros de costume internacional: a da
tributação exclusiva das sociedades de navegação marítima e aérea no lugar da resi-
dência da sociedade; e aquela segundo a qual o cidadão de um Estado só pode ser
submetido a imposto, por razão de atividade empresarial noutro Estado, quando aí
tivesse constituído estabelecimento estável (princípio do estabelecimento permanen-
te). Todavia, as críticas de que uma e outra destas normas têm sido recentemente
objeto por parte de países em vias de desenvolvimento parecem afetar a necessária
convicção da sua obrigatoriedade2.

1 M. VAN DEN VEN, Diplomatic tax pririleges. Past, present, future, International Tax Review
1988, 306; DE NOVA, ~agente diplomatico e l'immunitá tributaria, Rivista di Diritto Finan-
ziario e Scienza delle Finanze II (1942), 1; P. MICHAUD, Rigime fiscal des étrangers en France et
des français à l'étranger - Imposition des membres des corps diplomatiques ou consulaires. Conven-
tions de Vienne, Paris 1973; FLORENCIO GÓMEZ TARRAGONA, Tributación de los funcionarias
de los organismos internacionales, in XX Semana de Estudios de Derecho Financiero, Madrid
1973,831; FERNANDO DE LEMUS CHÁVARRI, Régimen fiscal de las misiones y de los agentes
diplomáticos acreditados en Espafía, in XX Semana de Estudios de Derecho Financiero, Ma-
drid 1973, 793. Todavia, para KNECHILE, nem esta regra teria esse caráter, pois o costume
não seria fonte de direito internacional tributário, por força do princípio da legalidade: cfr.
Grundfragen des Internationalen Steuerrechts, Basel 1976, 156; BÜHLER, Principios de Derecho
Internacional Tributario (trad.), Madrid 1968, 52. Quanto aos agentes consulares, ver a Con-
venção de Viena sobre relações consulares, promulgada pelo Decreto nO 61.078, de 26.7.67.
Veja-se ainda o art. 27 (renumerado para art. 28 após 2002) do Modelo OCDE.
2 Cfr. MAxrME CHRÉTIEN, A la rechcrche du Droit Intcrnational Fiscal Commun, Paris 1955, 224 ss.
p I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

§ 2° JURISPRUDÊNCIA. PROCEDIMENTO AMIGÁVEL. ARBITRAGEM

A jurisprudência do Tribunal Internacional de Justiça em matéria de impostos


não tem sido numerosa, de vez que perante aquele tribunal só podem litigar Estados,
enquanto as questões tributárias opõem sobretudo os contribuintes aos seus Estados
respectivos 3 • Por esta razão, tem sido sugerida a criação de um Tribunal Internacio-
nal Fiscal, de competência especializada, que se ocupasse dos litígios emergentes de
tratados coletivos contra a dupla tributação.
O certo é, porém, que na atual fase de evolução do Direito Tributário Interna-
cional apenas vigoram acordos bilaterais sobre a eliminação da dupla tributação, que
preveem a resolução das questões por eles suscitadas através de um processo amigá-
vel, conduzido em nível ministerial.

A) O procedimento amigável

O procedimento amigável4, previsto e regulado no art. 25 do Modelo OCDE, na


versão revista em 19775, desdobra-se em três espécies distintas, em função do seu objeto:

3 Conhecem-se quatro decisões do Tribunal da Haia sobre matéria fiscal: a primeira respeitou
à isenção fiscal de um imóvel, alegada por súditos da Alemanha, França e Grã-Bretanha
contra o Japão (sentença de 20 de maio de 1905); a segunda referiu-se à licitude da união
aduaneira entre a Alemanha e a Áustria, impugnada pela Sociedade das Nações (5 de setem-
bro de 1931); a terceira reportou-se ao diferendo entre a França e a Suíça sobre a Zona de
Genebra, quanto aos limites da soberania estadual em matéria tributária e aduaneira (7 de
junho de 1932); a quarta teve por objeto o litígio entre os Estados Unidos e a França sobre
a isenção fiscal de súditos americanos residentes em Marrocos (1952). Ver MAXIME CHRÉ-
TIEN, Le probleme des reglements jurisdictionnels des litiges internationaux d'ordre fiscal,
Journal de Droit International Privé et de la Jurisprudence Comparée 1951, 30 e 508; BÜHLER,
Principios, 56; J. MICHEL, Interprétation judiciaire des conventions de double imposicion et neces-
sité ou opportunité d'une jurisdiction fiscale internationale, CDFI XII (1958); REMO DOMINICI,
Le regole per la risoluzione dei confliui in materia di doppia imposizione internazionale, in
VICTOR UCKMAR (org.), Corso di Diritto Tributaria Internazionale, Pádua 1999, 921.
4 TrrrEL, Das Verstandigungsveifahren nach dem Doppelbesteuerungsabkommen, Berlim 1964;
MÜLHAUSEN, Das Verstandigungsveifahren im deutschen Internationalen Steuerrecht, 1976; GLO-
RIA, Das steuerliche Verstandigungsveifahren und das Rccht aufdipWmatischen Schutz, 1988; AVERY
JONES, Mutual agreement - procedure and practice, CDFI 1981,66; ID., The legal nature ofthe
mutual agreement procedure under the OECD Model Convention, British Tax Review (1979),
333 (334 ss.); CARLOS P ALAO T ABOADA, El procedimiento amistoso en los convenios internacionales
para evitar la doble imposición, Hacienda Publica Espaííola 16 (1977), 309; GARBARlNO, La
tassazione dei reddito transnazionale, Pádua 1990, 569; ADAMIjLEITA, La procedura amichevole
nelle convenzioni bilaterali contro la doppia imposizioni, Rivista di Diritto Tributaria I (1992),
349; IGOR MAULER SANTIAGO, Métodos de solução dos conflitos fundados em convenção con-
tra a dupla tributação internacional, in Direito Tributária InternacionalAplicada (coord. HELENO
TÔRRES), IIl, 2005, 672 SS.; JOACHIM ENGLISCH, German experience on alternative modalities
of tax conflits solution and the application of mutual tax agreements, in HELENO TAVEIRA
TÔRRES (org.), Direito Tributária InternacionalAplicada, vaI. V, São Paulo 2008,561.
5 E ainda, em termos similares, no art. 11 do Modelo OCDE-ISD.
Título 11/ I Capo 1/ I Outras Fontes Internacionais

(i) Oprocedimento amigável individual ou em sentido estrito, previsto nos §§ 1° e 2° do


art. 25, tem por objeto a apreciação de um caso individual, por iniciativa de um contri-
buinte, residente num Estado contratante (ou "nacional", se o fundamento for a cláusula
da não discriminação), nos casos em que considere existir tributação "não conforme com
o tratado", consistindo no direito de apresentar o seu caso à autoridade competente do
Estado de que é residente (ou nacional); (ii) o procedimento amigável interpretativo,
previsto na primeira frase do § 3° do art. 25, tem por objeto a resolução de dificuldades
ou dúvidas resultantes da interpretação do tratado; e (iii) o procedimento amigável inte-
grativo, previsto na segunda frase do § 3° do art. 25 (introduzida na revisão de 19776 ),
tem por objeto a eliminação da dupla tributação em casos não previstos na convenção.
Às cláusulas que preveem estas três modalidades, BAKER denomina respectiva-
mente de specific case provision) de interpretative provision e de legislative provision7 • O
procedimento amigável individual ou em sentido estrito pressupõe a iniciativa do
contribuinte a respeito de um caso concreto (Steuerentlastungsanspruch na doutrina
alemã), enquanto os procedimentos interpretativos e integrativos são de iniciativa
exclusiva e oficiosa das autoridades competentes, tendo por objeto uma pluralidade
indeterminada de casos (Vertragserfüllungsanpruch) 8.
O procedimento amigável é um procedimento autônomo, preventivo, bilateral
e informal.
É autônomo) na medida em que o exercício da pretensão processual em que se
baseia deriva diretamente da convenção internacional, não se confundindo nem de-
pendendo dos meios de defesa dos contribuintes previstos na legislação interna, de
modo que o recurso ao procedimento amigável não depende de se terem esgotado
os meios, administrativos ou judiciais, oferecidos pela lei interna dos Estados em pre-
sença. O § P do art. 25, na versão de 1977, tornou claro este ponto, ao estabelecer
que o procedimento independe dos remédios oferecidos pelas leis internas, pelo que
é admissível a cumulação de processos em paralel09 •
É preventivo) enquanto ele não visa apenas a fazer cessar os efeitos de um caso de du-
pla tributação efetiva; antes se pode basear na simples possibilidade de dupla tributação.
O procedimento amigável é bilateral. No caso de a autoridade competente não
dispor de meios para dar uma solução satisfatória à pretensão do contribuinte, isto é,

6 E por isso não previsto em numerosos tratados celebrados pelo Brasil antes dessa data.
7 Cfr. BAKER, Double Taxation Agreements and International Tax Law, Londres 1994) 414 sS.
8 Cfr. MENCK, in MÓssNER/et a!., Steuerrecht international tdtiger Unternehmen, Colônia
1992,382.
9 Cfr. VOGEL, On Double Taxation Conventions, Deventer 1998 (cit. Double Taxation) 1368;
GOUTHrERE, Les impôts dans les affaires internationales, Paris 1991, 798; GUY GEST/GILBERT
TIXIER, Droit Fiscal International (2 a ed.), Paris 1990, 107 SS.; RrvIER, Droit Fiscal suisse. Le
Droit Fiscal International, Neuchatell983, 301; BAKER, Double Taxation, cit., 419. Todavia,
certos países, como os Estados Unidos e a Bélgica, exigem a exaustão dos remédios internos.
Sobre as dificuldades decorrentes da coexistência destas ordens dos processos, cfr. OCDE,
Comentários, art. 25, parágrafo 28 (2008).
Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

no caso de se revelarem inadequadas soluções unilaterais, a solução do caso deve ser ob-
tida por acordo amigável com a autoridade competente do outro Estado contratante.
A bilateralidade do procedimento amigável respeita apenas à sua segunda fase,
já que a primeira (fase interna) - aberta pela reclamação do contribuinte - se situa no
plano das relações entre este e a autoridade competente do Estado da residência. Só
no caso de este Estado, por sua iniciativa, não poder, unilateralmente, dar satisfação
à pretensão do reclamante, se abre a via à segunda fase do procedimento (fase inter-
nacional), que é o processo amigável propriamente dito.
Este procedimento não exprime o exercício de uma função jurisdicional dos Es-
tados, pois estes não se encontram obrigados a concluir por uma decisão que repre-
sente a solução do conflito no caso concreto, mas apenas a negociar, com diligência,
uma solução amigável, podendo, porém, não chegar a um acordo. Trata-se de uma
obrigação de meios e não de resultados 10, de um pactum de contrahendo que obriga as
partes a negociar mas não a atingir um acordo l l .
Enfim, o procedimento amigável tem caráter informal. As autoridades compe-
tentes podem comunicar-se diretamente entre si, sem necessidade de recurso à via di-
plomática. Não existem prazos nem formalidades preestabelecidos 12 e fica exclusiva-
mente reservado ao livre critério das autoridades a vantagem de se criar uma comissão
composta por representantes das autoridades competentes dos Estados contratantes,
a fim de permitir trocas de impressões orais 13 •
Seja como for, o certo é que o informalismo do procedimento amigável não
pode dispensar, em caso algum, as garantias essenciais dos contribuintes, como o
direito de ser ouvido (diretamente ou por representante, oralmente ou por escrito),
o direito de ser assistido por conselho técnico e o direito de acesso ao dossier.

B) Afase arbitral
Na revisão da Convenção Modelo de 2008 foi introduzido um novo § 5° ao
art. 25 que prevê a possibilidade de recurso à arbitragem na hipótese de, no âmbito

10 Cfr. BAKER,Double Taxation, 417; VOGEL, Double Taxation, 1.366-1.367.


11 Cfr. GARBARlNO, La tassazione, 589.
12 O texto da Convenção Modelo revisto, em 1977, prevê, contudo, um praw de três anos
contados da notificação da primeira medida que envolva uma tributação não conforme à
convenção. Por sua vez, a parte final do § 2° do art. 25° (também introduzida na versão de
1977) dispõe que os acordos obtidos através de procedimento amigável deverão ser cumpri-
dos independentemente dos limites temporais das leis domésticas dos Estados contratantes
referentes a prescrição ou decadência. Sobre a contagem do praw de três anos cfr. OCDE,
Comentários, art. 25, parágrafo 25 (2008). Idênticas soluções foram adotadas no Modelo
OCDE-ISD, art. 3°, §§ 1° e 2°. Sobre as ressalvas do Brasil quanto a estes pontos, cfr.
OCDE, art. 25, NMC Positions, parágrafos 1 e 2.
13 Sobre o informalismo e flexibilidade do procedimento amigável, ver OCDE, Comentários,
art. 25, parágrafos 40 e 41 (especialmente no que concerne a preços de transferência).
Título 111 I Capo li I Outras Fontes Internacionais .,.

de um procedimento amigável, as autoridades competentes não terem conseguido


chegar a um acordo no prazo de dois anos e a questão não ter sido ainda decidida por
tribunal judicial ou administrativo de qualquer dos Estados.
Nesta hipótese, a pessoa que deu origem ao procedimento pode requerer a ins-
tauração de um nova fase pela qual se solicita uma decisão independente para apre-
ciar a questão ou as questões não decididas. Trata-se de direito subjetivo dessa pessoa
suscetível de desencadear, por si só, o mecanismo arbitral, independentemente de
autorização das autoridades fiscais de ambos os Estados.
Como observam os Comentários da OCDE, a arbitragem constitui apenas uma
fase do procedimento amigável em que se insere, não representando, pois, uma moda-
lidade alternativa de solução de conflitos emergentes de aplicação das Convenções14 •
A decisão arbitral será implementada por acordo mútuo das autoridades admi-
nistrativas e, caso obtenha a concordância da pessoa diretamente afetada, torna-se
vinculante para ambos os Estados, devendo ser observada independentemente de li-
mites temporais de prescrição e decadência fixados nas leis internas desses Estados.
Um anexo ao Comentário da OCDE contém um modelo de acordo mútuo em
que as autoridades competentes se podem basear para reger em detalhe o funciona-
mento do processo arbitral.

C) Natureza jurídica dos acordos mútuos

Uma das mais complexas questões que suscita o procedimento amigável é o da


natureza jurídica dos acordos mútuos entre as autoridades competentes de ambos os
Estados, especialmente no que concerne ao seu efeito vinculante perante os contri-
buintes e os tribunais, já que não há razão para se discutir o seu efeito vinculante entre
as próprias autoridades competentes, tendo em vista a sua natureza convencional ls .
A análise do problema deve, obviamente, ser feita à luz do direito positivo de
cada Estado envolvido. Em países (como o Brasil) em que não é constitucionalmente
admitida qualquer restrição à apreciação pelo Poder Judiciário de lesão de direitos
individuais, o acordo mútuo não terá a força de precludir o recurso aos tribunais.
Nem um acordo mútuo posterior à sentença de um tribunal transitada em julgado
poderá ser executado em sentido diversol 6 •

14 Cfr. Comentários, art. 25, parágrafo 5. Não cabe, pois, o recurso à arbitragem na hipótese de
ter sido concluído um acordo mútuo, uma vez que ela pressupõe "questões não resolvidas".
15 Cfr. RIVIER, Le Droit Fiscal International, 308.; HELENO TORRES, Pluritributaçáo interna-
cional sobre as rendas de empresas, São Paulo 2001, 693; SÉRGIO ANDRÉ ROCHA, Solução de
divergências hermenêuticas nos tratados internacionais tributários, RDTI, nO 10, 2008, 187
ss., espec. 207 sS.
16 Todavia, certos países, como a Suécia, a Suíça, o Japão, a Holanda, a Bélgica, a Alemanha
e a Grécia, permitem a execução de acordo posterior, contrário à sentença transitada em
julgado. Cfr. AVERY JONES, The legal nature ofthe mutual agreement, 341.
Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

No que concerne aos acordos mútuos de caráter interpretativo (proferidos no


âmbito de procedimento amigável interpretativo ou até de procedimento amigá-
vel individual), a opinião dominante é que, embora não sejam vinculantes para os
tribunais, devem obrigatoriamente ser levados em consideração como elemento de
interpretação do tratado l7 . E isto até por força do disposto no art. 31 (3), "a" e "b"
da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados, segundo o qual devem ser le-
vados em conta, na sua interpretação, "qualquer acordo subsequente entre as partes
referente à interpretação do tratado ou à aplicação das suas disposições", bem como
"qualquer prática subsequente na aplicação do tratado que estabeleça o acordo das
partes relativo à sua interpretação".
Mais difícil é a determinação da eficácia dos acordos mútuos de caráter integrativo,
previstos na segunda parte do § 30 do art. 25 do Modelo OCDE e que têm por objeto
a eliminação da dupla tributação em casos não previstos na Convenção. Mais uma vez o
problema tem de ser examinado em face do direito interno de cada Estado contratante,
pois numerosos Estados relutam em atribuir às autoridades administrativas poderes
para alargar o âmbito de um tratado, sem obedecer ao procedimento normal para a sua
aprovação ou dos respectivos protocolos. E daí que tais Estados (como o Reino Unido)
não prevejam nas suas convenções a figura do procedimento amigável integrativoI B•
Na doutrina suíça, RAOUL LENZ e WIDMER inclinam-se para a eficácia vinculante
dos acordos integrativos, baseados na legitimidade da delegação concedida às auto-
ridades administrativas pelos corpos legislativos dos Estados contratantes l9 ; posição
contrária é adotada pela generalidade da doutrina alemã, pela Corte de Cassação ita-
liana e pelo Conseil dJEtat francês, para os quais tais acordos revestem, em razão dos
próprios limites constitucionais da delegação de poder legislativo ao poder executivo,
a natureza de simples Vérwaltungsvorschrift20 ou de simple accord administratipl .

17 Esta é a posição adotada pelo Supremo Tribunal Administrativo sueco, pelo Conseil d'État
francês e pelos tribunais ingleses. Veja BAKER, Double Taxation, 421 ss., e os comentários à
decisão do caso IRC v. Commerzbank e IRC v. Banco do Brasil SA. O Conselho de Estado
francês (em arrêt de 13 de maio de 1983) não se considerou vinculado por acordo amigável
franco-americano sobre o lugar de residência de um contribuinte que o declarava residente
na França, quando o tribunal entendeu que o critério do centro de interesses vitais conduzia
a considerá-lo residente nos Estados Unidos. O tribunal não se declarou competente para
"anular" o acordo, mas julgou independentemente dele. Cfr. GOUTHIÉRE, Les impóts, 806;
GEST(TlXIER, Droit Fiscal Intemational, lll-ll2; VOGEL/PROKI5CH, Interpretation of double
taxation conventions (relatório geral), CDFI LXXVIII-a (1993), 55 (70 ss.), referindo o caso
especial da Noruega, país em que os acordos são vinculantes para os tribunais.
18 Cfr. neste sentido a posição do Brasil. OCDE, art. 25, NMC Positions, parágrafo 3.
19 Cfr. LENZ, L'interprétation des traités de double imposition (relatório geral), CDFI XII, 15
(28); WIDMER, Die Auslegung der Doppelbesteuernngsabkommen, CDFI XLII, 268. Contra,
porém, RIVIER, Le Droit Fiscal Intemational, 313.
20 Cfr. VOGEL, Double Taxation, 1383; KNECHTLE, Basic Problems in Intemational Fiscal Law
(trad.), Deventer 1979,140, vê nestes acordos uma expressão da equidade no Direiro Inter-
nacional Público.
21 Cfr. GOUTHIÉRE, Les impóts, 806; ADAMI/LEITA, La procedura amichevole, 408 S5.
Título 111 I Capo 11 I Outras Fontes Internacionais .,&+
Referidos acordos - que do ponto de vista do Direito Internacional Público são
"meros acordos de forma simplicada" (agreements in simplified form, accords en forme
simpZifiée 22 ) - não necessitariam, entre nós, de obedecer ao formalismo do procedi-
mento de celebração dos tratados. Mas por isso mesmo não podem atuar na zona
submetida constitucionalmente ao princípio da legalidade ou reserva de lei. Caso o
façam - como seria a integração de casos não previstos no tratado -, não terão efeito
vinculante para os contribuintes nem para os tribunais 23 .
A OCDE tem preconizado a maior exploração do procedimento dos acordos
mútuos (MAP) para a celebração de acordos prévios em matéria de preços de trans-
ferência (Advance Pricing Agreements - APA), de caráter bilateral ou até multilateral,
envolvendo não apenas o contribuinte e a respectiva Administração fiscal, mas as
diversas Administrações fiscais com jurisdição sobre a empresa multinacional: são os
chamados "MAP APAS"24.

D) Arbitragem
Não faltam vozes que proclamam a vantagem de uma mais acentuada juris-
dicionalização do procedimento amigável, cujo julgamento deveria ser confiado a
comissões mistas paritárias, constituídas por representantes designados por ambas
as administrações fiscais, podendo ouvir os contribuintes interessados e com a facul-
dade de consultar um organismo internacional: foi o que preconizou a IFA na reso-
lução de Basileia de 1960. Ou até a institucionalização de um procedimento solene
de arbitragem ou procedimento judicial internacional, de que resultariam decisões
obrigatórias para os dois Estados em conflito, conforme sugeriu - anos após - a
mesma IFA (Congresso de Rotterdam, 1969)25.
Dentro desta linha de orientação, merece especial menção a recente Convenção
contra a dupla tributação entre a Alemanha e a Suécia, que prevê a aplicação da
Convenção Europeia para a Solução Pacífica de Conflitos, de 29 de abril de 1957, e,

22 C. CHAYET, Les accords en fonne simplijiée, Annuaire Français de Droit Internationall957, 4 ss.
23 Cfr. GARBARlNO, La tassazione, 597.
24 Cfr. OCDE, Transftr Pricing Cuide/ines..., IV - 41 ss. Veja-se o anexo introduzido a estes
Cuidelines, em 1999, AN - 19 e ss.
25 Veja-se a avaliação crítica do sistema de procedimento amigável, com sugestões para o seu
aperfeiçoamento, em OCDE, Transftr Pricing and Multinational Enterprises, 27 ss.; STROUD/
MASTERS, Transftr Pricing, 86; BAKER, Double Taxation, 427; DUCCINI, Approche fiscale des con-
trats internationaux, Paris 1985, 65. Sobre arbitragem, ver AGOSTINHO TOFFOLI TAVOLARO,
A solução dos conflitos de dupla tributação jurídica internacional, in Estudos em homenagem
a G. DE ULH6A CANTO, 1988, 1; G. LINDENCRONA!N. ArrsoN, Arbitration in Taxation, De-
venter 1981; MANUEL PIRES, Procedimento arbitral- CEE, CTF 357 (1990), 8; DAVID R.
TILLINGHAST, The Choices ofIssues to be submitted to Arbitration, in Essays on International
Taxation, 15, Deventer/Boston 1993, 349; MARIO ZÜGER, Arbitration under Tax Treaties.
Improving Legal Protection in International Tax Law, Amsterdam 2001.
Mri.M Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

por conseguinte, a submissão ao Tribunal Internacional de Justiça ou a um Tribunal


Arbitral, cujas decisões seriam vinculantes 26 •
Também o aditivo de 28 de setembro de 1989 à convenção franco-alemã criou
um novo artigo (25-A) que completa o art. 25, relativo ao procedimento amigável,
e que prevê a intervenção facultativa de uma comissão de arbitragem se os dois Es-
tados não conseguirem um acordo amigável num praw de 24 meses. A iniciativa da
arbitragem é facultativa, a comissão é constituída por três membros, sendo dois de-
signados por cada Estado e o terceiro escolhido por comum acordo; as suas decisões
têm força vinculante 27 •
O recurso a um processo arbitral foi ainda previsto na Convenção Multilate-
ral para eliminação da dupla tributação em matéria de ajustamento de lucros de
empresas associadas, convenção essa decorrente da Diretiva da Comissão da CE
(nO 90/436), de 29 de novembro de 197628 . Esta convenção - adotada em 23 de
julho de 1990 - prevê a intervenção de uma comissão (composta por um presiden-
te, escolhido pelos outros membros entre lista de personalidades independentes,
dois representantes de cada autoridade competente e um número par de persona-
lidades independentes escolhidas por comum acordo) cuja decisão não é, porém,
vinculante. Por isso, GOUTHIERE afirma que se trata de comissão consultiva e não de
verdadeira comissão arbitraF9. Todavia - e este ponto é importante -, ainda que os
Estados não acolham a recomendação da comissão, têm a obrigação de, num prazo
de seis meses, tomar uma decisão que elimine a dupla tributação. Não se trata aqui
de uma simples obrigação de meios, como no procedimento amigável, mas de uma
obrigação de resultado, que consagra um verdadeiro direito das empresas à elimi-
nação da dupla tributaçã0 30 .
A Convenção Arbitral goza de precedência hierárquica sobre os tratados bilate-
rais, na parte em que se refere ao procedimento amigável.
Mais recentemente a OCDE recomendou o estudo da aplicação da arbitragem
como fórmula para eliminação da dupla tributação em matéria de preços de trans-
ferência 31 •

26 Cfr. GUTIENTAGjMI5BACK, Resolving Tax Treaty Issues: a Novel Solution, BIFD 1986, 350.
27 Cfr. GOUTIliERE, Les impôts, 811 e 812. Veja International Taxation, maio de 1992, 32.
28 Cfr. SA55, Effectiveness of Current Competent Authority procedures for Relief of International
Double Taxation, Intertax 1988, 111; OCDE, Transftr Pricing andMultinational Enterprises,
20 55.; STROUDjMAsTERS, Transftr Pricing, 85; LICCARDI, La normativa convenzionale, in
PI5TONE (org.), Diritto Tributaria Internazionale, 191 (260 ss.).
29 Cfr. GOUIHIERE, Les impôts, 811 SS.; MANUEL PIRES, Procedimento arbitral - CEE, CTF 357
(1990),8.
30 Cfr. GOUTHIERE, Les impôts, 815.
31 Cfr. OCDE, Transftr Pricing Guidelines..., IV - 55.
-===. Título 111 I Capo 11 I Outras Fontes Internacionais

§ 30 DIREITO COMUNITÁRIO

A expressão "Direito Comunitário"32 tem sido utilizada na doutrina para expri-


mir o conjunto de normas relativas às três Comunidades Europeias 33 - a Comunidade
do Carvão e do Aço (CECA)34, a Comunidade Econômica Europeia (CEE) e a Co-
munidade Europeia de Energia Atômica (EURATOM)35 - para as quais os Estados-
membros transferiram, por delegação, poderes normativos próprios de cujo exercício

32 É hoje imensa a bibliografia sobre o Direito Comunitário ou Direito Europeu. Para uma
visão de conjunto, veja-se a monografia de FAUSTO DE QUADROS, Direito das Comunidades
Europeias e Direito Internaeional Público, Lisboa 1991; JOÃo MOTA DE CAMPOS, Direito Comu-
nitário, 2 vols., Lisboa 1983; ID.,A Ordem Constitucional Portuguesa e o Direito Comunitária,
Braga 1981; THOMAS OPPERMANN, Europarecht, Munique 1991; FRANCO ROCCATAGLIATA, 11
diritto tributario comunitario, in VICTOR UCKMAR (org.), Corso di Diritto Tributaria Inter-
nazionale, Pádua 1999; 657. Entre nós veja-se MARIA TERESA DE CÁRCOMO LOBo, Manual de
Direito Comunitário, Curitiba 200 L
33 Apesar da existência de três entidades jurídicas distintas, utiliza-se hoje a expressão UniíW
Europeia (EU), no singular, por determinação do Tratado de Maastricht.
34 Instituída pelo Tratado de Paris, de 18 de abril de 1951 (extinto em 23 de julho de 2002).
35 Instituídas pelos Tratados de Roma, de 25 de março de 1957, subscrito pela Alemanha,
Bélgica, França, Itália, Luxemburgo, Países Baixos. Em 22 de janeiro de 1972, firmaram-se
em Bruxelas os instrumentos relativos à adesão do Reino Unido, Holanda, Dinamarca e No-
ruega (não ratificado por este último país). Em 10 de janeiro de 1981, efetuou-se a adesão da
Grécia, e em 12 de junho de 1985, a adesão de Portugal e Espanha. Em 25 de junho de 1994
foi assinado o tratado de adesão da Áustria, Finlândia e Suécia. Em 16 de abril de 2003 foi
assinado o tratado de adesão de dez novos membros: Chipre, Eslováquia, Eslovênia, Estô-
nia, Hungria, Letônia, Lituânia, Malta, Polônia e República Tcheca. Os Tratados institutivos
das Comunidades Europeias foram objeto das seguintes alterações: (i) O Tratado de fusão,
assinado em Bruxelas em 8 de abril de 1965, que institui um Conselho único e uma Comis-
são única das três Comunidades Europeias; (ii) O Ato Único Europeu (AUE), assinado no
Luxemburgo e em Haia, que entrou em vigor em 10 de julho de 1987 e prevê as adaptações
a introduzir para completar o Mercado Interno; (iii) O Tratado da União Europeia (UE),
assinado em Maastricht em 7 de fevereiro de 1992. O Tratado de Maastricht não eliminou
as Comunidades existentes, contudo alterou a designação da Comunidade Econômica Euro-
peia (CEE) para Comunidade Europeia (CE) que, em conjunto com as outras comunidades
(CECA e EURATOM), constituem o 10 pilar da União Europeia (pilar comunitário). Os 2 0
e 30 pilares, Política Externa e Segurança Comum (PESC) e Cooperação Policial e Judiciária
em matéria penal, respectivamente, em conjunto com o pilar comunitário, constituem a base
em que assenta a União Europeia (UE). Dessa forma o Tratado de Maastricht passou a de-
signar a comunidade, em todos os seus aspectos e de forma integrada, por União Europeia
(UE); (iv) O Tratado de Amsterdam, assinado em 2 de outubro de 1997, alterou os Trata-
dos da UE, CE, CECA e EURATOM, atribuindo números (em vez de letras) aos artigos
do Tratado da UE; (v) O Tratado de Nice, assinado em 26 de fevereiro de 2001, introduziu
novas alterações nos Tratados da UE e CE, modificando o modo de funcionamento das
instituições e tornando a votação por maioria qualificada a regra (em vez da unanimidade)
em muitas áreas de decisão da UE; (vi) Novas alterações serão provavelmente introduzidas
nos Tratados na sequência da Convenção sobre o Futuro da Europa e do Tratado de Adesão
dos dez novos Estados-membros, cuja assinatura foi efetuada em 16 de abril de 2003, com
entrada em vigor em 10 de maio de 2004.
I q I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

decorrem normas com efeitos diretos no ordenamento de cada um destes Estados.


E isto quer tais normas decorram dos tratados constitutivos das comunidades e suas
modificações (Direito originário ou Primdrrrecht, para utilizar a terminologia de Os-
SENBÜHL), quer sejam produzidas pelos seus órgãos (Conselho e Comissão), com o
objetivo de desenvolver e aplicar as regras constantes dos tratados (direito derivado
ou Sekunddrrecht) e que se revelam sob três formas distintas: os regulamentos, de
alcance geral e diretamente aplicáveis em cada Estado-membro, independentemente
de qualquer medida de recepção; as diretivas, que têm como destinatários os Estados-
membros e cujo conteúdo consiste na fixação de resultados a atingir, deixando porém
àqueles a escolha dos meios e das formas; e as decisões que, tal como os regulamentos,
são obrigatórias em todos os seus elementos mas, ao contrário destes, têm destina-
tários determinados 36 .
As normas comunitárias gozam de aplicabilidade e eficácia direta. A aplicabi-
lidade direta consiste em tais normas aplicarem-se nos Estados-membros, de modo
uniforme, independentemente de qualquer ato de recepção nos respectivos direitos
internos; a eficácia direta consiste em tais normas serem fontes imediatas de direitos
e obrigações para os seus destinatários - Estados-membros e particulares -, podendo
ser diretamente invocadas pelos particulares frente aos órgãos judiciários dos Esta-
dos-membros.
Embora as diretivas (ao contrário dos tratados e dos regulamentos) contenham
uma simples obrigação de resultado, requerendo em princípio normas internas de
execução -, o Tribunal de Justiça reconheceu também o "efeito direto" tanto às dire-
tivas de liberalização (livre circulação de trabalhadores, liberdade de estabelecimento
e prestação de serviços) quanto às diretivas de harmonização 37 •
Como observa AZEVEDO SOARES, "a necessidade de produção de um eftito idênti-
co em todo o espaço integrado da comunidade obriga a que o juiz nacional dê sempre
preferência ao direito comunitário derivado, desaplicando o direito estadual com
aquele conflituante. Em poucas palavras, diz-se habitualmente que o direito comuni-
tário tem primado sobre o direito interno e esta qualidade é-lhe reconhecida por todas
as jurisdições dos Estados-membros da Comunidade Europeia"38.

36 Na CECA, as decisões gerais, prescritas nos arts. 14 e 15 do respectivo tratado, têm natureza
equivalente à dos regulamentos da CEE. Entre elas merecem especial relevo as que fIxam a
alíquota, lançamento e cobrança do tributo CECA. Cfr. FRITZ OSSENBÜHL, Die Quellen des
Verwaltungsrechts, in HAi'\lS-UWE ERlCHSENfWoLFGANG MARTENS (org.),Allgemeines lkrwal-
tungsrecht (8 a ed.), BerlimfNova York 1988,63 (124); A. AMATUCCI, La normativa comu-
nitaria quale fonte per l'ordinamento tributaria interno, in VICTOR UCKMAR (org.), Corso di
Diritto Tributario Internazionale, Pádua 1999, 717.
37 Sobre a aplicabilidade e efIcácia diretas, ver FAUSTO DE QUADROS, op. cit., 410 ss.; SACCHETTO,
Contenuto ed efficacia imediata negli orginamenti degli Stati membri delle disposizioni fIs-
cali del tratatro C.E.E., Rivista di Diritto Finanziario e Scienza deUe Finanze 1969, 329.
38 Cfr. AZEVEDO SOARES, Lições de Direito Internacional Público, 76 e 91, 102. Veja-se a aprofun-
dada análise crítica do nO 3 do art. 8° em ANDRÉ GONÇALVES PEREIRA/FAUSTO DE QUADROS,
Manual de Direito Internacional Público, (3 a ed.), Coimbra, 1993, 124 S5.
Título 111 I Capo 11 I Outras Fontes Internacionais

Os tratados institutivos das Comunidades e as disposições comunitárias seif


executing impõem-se (têm preferência) aos atos legislativos internos com base no
princípio da especialidade ou da competência prevalente. "Quando o princípio da espe-
cialidade não é suficiente a doutrina mais recente afirma a superioridade do direito
comunitário, traduzida na força ativa dos regulamentos comunitários (podem revo-
gar e modificar leis) e na resistência passiva dos mesmos relativamente a leis posterio-
res internas (não podem ser revogados nem modificados) 39".
O Direito Comunitário Europeu refere-se ao fenômeno tributário sob dois
ângulos bem distintos40 : um primeiro respeita aos poderes tributários das próprias
Comunidades, ou seja, às relações jurídicas tributárias de que as Comunidades são
sujeitos ativos - é o Direito Comunitário Tributário próprio; um segundo respeita à
disciplina dos poderes tributários dos Estados-membros, estabelecendo limitações
aos seus poderes legislativos, tendo em vista a "harmonização" dos diversos regimes
jurídico-tributários estaduais - é o Direito Comunitário Tributário interestatal.
No que concerne ao primeiro ângulo do problema, importa salientar que as
Comunidades (ao contrário de outras organizações internacionais, financiadas por
contribuições dos Estados-membros, de natureza voluntária ou pactícia41 ) são titula-
res de tributos próprios, ou seja, tributos em relação aos quais lhes pertence a compe-
tência normativa, a atividade administrativa tributária e a titularidade das receitas42 •
Os "recursos próprios" das Comunidades43 classificam-se em dois grupos distintos.
Num primeiro grupo, em que se incluem as contribuições sobre o açúcar, o
imposto sobre vencimentos e salários dos funcionários 44 , e o prélevement sobre a pro-

39 Cfr. A. A. BECKER, Teoria Geral do Direito Tributária (3 a ed.), São Paulo 1998, 282.
40 Sobre Direito Tributário Comunitário, cfr. DOMINIQUE BERLIN, Droit Fiscal Communautaire,
Paris 1988; RAMÓN FALCON Y TELLA, Introduccion ai Derecho Financiero y Tributaria de las
Comunidades Europeas, Madrid 1988; ver também LOUIS CARTOU, Droit Fiscal International
et Europeén (2 a ed.), Paris 1986; DIONISIO MARTINEZ, Las fuentes del Derecho Tributaria de
las Comunidades Economicas Europeas, in XIX Semana de Estudios de Derecho Financiero,
Madrid 1972, 749.
41 Cfr. DEcLEvA, La contribuzione internazionale, Annali della R. Università di Trieste 1936.
42 Sobre os poderes tributários de entes supranacionais, cfr. BÜHLER, Principios, 29 a 39. Um
caso recente de poderes tributários próprios é o da Intcrnational Seabed Authority, prevista
na Convenção de Montego Bay de 1987 e que pode lançar imposto de produção sobre ativi-
dades no leito marítimo e no solo e subsolo oceânico. Cfr. MARTHA, The Jurisdiction to Tax in
International Law, DeventerjBoston 1989, 133.
43 Decisão de 21 de abril de 1970, substimída pela Decisão de 7 de maio de 1985; Decisão de
17 de março de 1988.
44 Cfr. o art. 3° do Protocolo sobre Imunidades e Privilégios, anexo ao Tratado de Bruxelas,
de 8 de abril de 1965. Algo de muito semelhante se passa na ONU, cuja Assembleia, nas
Resoluções nO 239, de 18 de novembro de 1948, e nO 359, de 10 de dezembro de 1948, es-
tabeleceu uma contribuição sobre os salários dos próprios funcionários em substimição dos
impostos devidos nos países de origem. Cfr. UDINA, Il trattamento tributaria dei funzionari
internazionali, FS RUDoLF LAuN 1953,279.
Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

dução do carvão e do aç045 incidente sobre as empresas produtoras destas matérias,


são disciplinados, geridos e arrecadados pelas próprias Comunidades, sem qualquer
intervenção dos Estados-membros.
Num segundo grupo, em que se incluem os direitos aduaneiros sobre a tarifa
exterior comum e os impostos niveladores agrícolas na importação, a tributação an-
tidumping e a tributação compensadora, as faculdades normativas no que concerne
à ftxação da alíquota e à titularidade das receitas são atribuídas às Comunidades,
aplicando-se quanto ao mais o direito interno dos Estados-membros, notadamente
no que concerne à atividade administrativa de lançamento e cobrança.
Ao lado destes tributos próprios, a Comunidade detém ainda um direito de
participação no IVA (Imposto sobre o Valor Acrescentado) dos Estados-membros,
aos quais pertence, porém, o poder normativo, a titularidade e a administração do
tributo, ftcando posteriormente obrigados a transferir os recursos.
O Direito Tributário Comunitário próprio nada tem a ver com o Direito Tribu-
tário Internacional, de vez que não tem por objeto situações conexas com mais do
que um ordenamento dos Estados-membros. Neste sentido - mas só neste sentido
-, tem razão Mbssner quando aftrma que o Direito Tributário Comunitário não é
Direito Tributário Internacional46 •
Já no que concerne aos tributos próprios dos Estados-membros, os poderes nor-
mativos das Comunidades têm por objeto estabelecer regras - de acatamento obrigató-
rio por todos os Estados-membros - cujo objetivo reside na harmonização das respec-
tivas legislações ftscais internas: no que respeita aos tributos indiretos, o fundamento
destes poderes radica expressamente no art. 93 do Tratado de Roma, enquanto, para
os impostos diretos, a harmonização não se encontra expressamente contemplada, mas
resulta dos arts. 94 a 97, que contemplam a harmonização das legislações em geral47 .
Os princípios básicos que norteiam a elaboração do Direito Comunitário Tri-
butário são: oprincípio da não discriminação 48 , que consiste em proibir a diferença de

45 As imposições CECA foram extintas com o termo de vigência do Tratado CECA em


31.12.2002.
46 Cfr. MÓSSNER, Der Begriff des Internatwnalen Steuerrechts in der neueren Literatur, Ósterre-
ichische Zeitschrift fur offendiches Recht 25 (1974),255 (278).
47 Adota-se a numeração dos artigos da versão consolidada pelo Tratado de Amsterdam. Cfr.
MANUEL PIRES, Harmonização fiscal face à internacionalização da economia. Experiências
recentes, in A Internacwnalizaçtfu da Economia e a Fiscalidade - XXX Aniversário do Centro
de Esnldos Fiscais, Lisboa 1993, 11 (15 ss.); M. H. DE FREITAS PEREIRA, Fiscalidade das em-
presas e harmonização fiscal comunitária. Balanço e perspectivas, inA Internacionalizaçtfu da
Economia e a Fiscalidade - XXX Aniversário do Centro de Esmdos Fiscais, Lisboa 1993, 51
(55 ss.); M. ANGELES SÁNCHEZ JIMÉNEZ, La doble imposición internacional en la Unión Europea,
Madrid 1995, 77; JosÉ MANUEL CALDERÓN CARRERO, La doble imposición internacional en los
convenios de doble imposición y en la unión Europea, Pamplona 1997.
48 Assim, por exemplo, foi considerado contrário a este princípio o regime francês consistente
em recusar o "avoir fiscal" relativo a dividendos distribuídos às sucursais em França de so-
ciedades residentes de outros países da Comunidade Europeia. Cfr. GOUTHlÉRE, Les impóts,
Título 111 I Capo 11 I Outras Fontes Internacionais

tratamento fiscal entre os produtos nacionais e os outros produtos similares dos Es-
tados-membros (art. 90) e é corolário do princípio mais amplo que proíbe qualquer
discriminação em função de nacionalidade (art. 12); e oprincipio da liberdade de esta-
belecimento (art. 43), donde resultam as proibições de restrições fiscais à liberdade de
circulação de mercadorias e à livre circulação de pessoas49 •
Observa CASALTA NABAIS que as proibições decorrentes dos referidos princípios
têm dado origem a uma harmonização fiscal das legislações fiscais tanto pela via po-
sitiva, isto é, de adoção de regulamentos e diretivas, como pela via negativa, através
de jurisprudência do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias (TJCE), sendo
de salientar que, enquanto em matéria de tributação do consumo operou sobretudo
a primeira, no que respeita à tributação direta tem operado sobretudo a segunda. O
TJCE tem protagonizado, assim, uma "harmonização fiscal pela negativa", desempe-
nhando papel "demolidor" dos aspectos dos sistemas fiscais nacionais incompatíveis
com o direito comunitárioS°.
Dentro do grupo de normas que integram o Direito Tributário Interestatal, en-
quanto umas versam sobre situações tributárias puramente internas - como é o caso
da harmonização do regime dos impostos sobre o valor acrescentado (Diretiva de
11 de abril de 1967 e 6 a Diretiva nO 77/338, de 17 de maio de 1977); da harmoni-
zação dos impostos indiretos sobre a reunião de capitais; dos direitos de aporte em
sociedades de capitais (Diretiva de 16 de julho de 1969, Diretiva de 9 de abril de
1973, Diretiva de 7 de novembro de 1974 e Diretiva de 10 de junho de 1985); da
harmonização da estrutura das alíquotas do NA e da harmonização dos impostos
especiais de consumo (tabaco, álcool e produtos derivados de petróleo) -, outras têm
especificamente como objeto situações tributárias internacionais. São precisamente es-
tas últimas que constituem objeto do Direito Tributário Internacional Comunitário,
designação na qual a expressão "internacional" respeita ao objeto da norma - uma
situação conexa com mais do que uma ordem jurídica - e a expressão "comunitário"
à respectiva fonte de produção de origem comunitária.

831. Sobre a Diskriminierungsverbot, cfr. OPPERlvlANN,Europarecht, 393; SCHAUMBURG,Inter-


nationales Steuerrecht, 3 sS.; SACCHEITO, Non-discrimination Rules in International Taxation,
CDFI LXXVIII-b (1993), 489 (502 ss.).

49 Veja-se numa análise da jurisprudência do Tribunal de Justiça da Comunidade Europeia


no que se refere à incompatibilidade de leis internas e Direito Comunitário em matéria de
imposto de renda, in SERVAAS VAN THIEL, EU Case Law on Income Tax (parte 1), Amster-
dam 2001. Cfr. EKKEHART RElMER, Os efeitos das liberdades fundamentais do Tratado da
Comunidade Europeia sobre o Imposto de Renda nos Estados-Membros da Comunidade,
in Luís EDUARDO SCHOUERI (org.), Direito Tributário. Homenagem a Alcides J01;ge Costa, vol.
II, São Paulo 2003, 919 sS.; cito PEDRO M. HERRERA MOLlNAjBELÉN GARCÍA CARRETERO,
Imposición directa, no discriminación y libertades comunitarias, in HELENO TÔRREs (org.),
Direito Tributário InternacionalAplicado, São Paulo 2003, 143.
50 Cfr. Estudos de Direito Fiscal, Coimbra, 2005, 167 sS.
M . Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Também no Direito Tributário Internacional Comunitário deparamos com nor-


mas substanciais e com normas instrumentais.
São exemplos de normas substanciais: (i) as que, em matéria de IVA, tendem a
substituir o princípio do país do destino pelo princípio do país de origem; (ii) as que
estabelecem um regime fiscal comum aplicável às sociedades-mãe e sociedades afili-
adas de Estados-membros diferentes (Diretiva nO 90/435, de 23 de julho de 1990,
alterada pela Diretiva nO 2003/123/CE, de 22 de dezembro); (iii) as que estabelecem
um regime fiscal comum aplicável às fusões, cisões e aportes de ativos e troca de ações
de sociedades pertencentes a Estados-membros diferentes (Diretiva nO 90.434, de 23
de julho de 1990, alterada pela Diretiva nO 2005/19/CE, de 17 de fevereiro); (iv) as
que preveem um regime fiscal comum aplicável aos pagamentos de juros e royalties
efetuados entre sociedades matrizes e subsidiárias de Estados-membros diferentes
(Diretiva nO 2003/49, de 3 de junho, alterada pela Diretiva nO 2004/66/CE, de 26 de
abrilS1 ); e (v) as que preveem um regime fiscal comum quanto à consideração, pelas
empresas, de prejuízos incorridos nas suas subsidiárias e estabelecimentos estáveis
situados noutro Estado-membro (Proposta de Diretiva de 24.01.91).
São exemplos de normas instrumentais: (i) as constantes do projeto de conven-
ção multilateral de 23 de julho de 1990, tendo em vista regular o procedimento ami-
gável e o processo arbitral em matéria de preços de transferência; e (ii) as que preve-
em assistência mútua no domínio dos impostos diretos e sobre prêmios de seguros
e o NA (Diretiva nO 77/799/CEE, de 19 de dezembro de 1977, e Regulamento nO
1798/2003 do Conselho, de 7 de outubro de 2003).
O Direito Comunitário (tratados institutivos e disposições dotadas de aplica-
bilidade direta) tem prevalência ou primazia de aplicação (Anwendungsvorrang) rela-
tivamente à legislação nacional dos Estados-membros. Essa primazia traduz-se na
desaplicação da lei nacional e consequente aplicação da norma comunitária com ela
colidente, mas não necessariamente na sua ab-rogaçã05 2 •
N o que concerne especificamente aos tratados (entre os quais os relativos à
dupla tributação), o Direito Comunitário tem também primazia de aplicação no
que respeita aos tratados celebrados entre os Estados-membros após a entrada em
vigor de norma com eles antinômica. Já no que concerne a tratados celebrados entre
Estados-membros celebrados anteriormente ao Tratado, e existindo colisão, dispõe o
art. 234° do Tratado que "os Estados-membros em causa recorrerão a todos os meios
adequados para eliminar as incompatibilidades verificadas. Caso seja necessário, os
Estados-membros auxiliar-se-ão mutuamente para atingir essa finalidade, adotando,
se for caso disso, uma atitude comum". Quanto aos novos tratados celebrados entre
Estados-membros e terceiros Estados, impende sobre o Estado-membro a obrigação

51 ALBERT RAnLER, Comment on the Interest Directive Proposal, in VICTOR UCKMAR (org.),
Corso di Diritto Tributaria Intemazionale, Pádua 1995, 743.
52 Cfr. GOMES CANOTILHO, Direito Constitucional e teoria da ConstituiçiÚJ (7a ed.), 2003, 822 55.
Título 111 I Capo 11 I Outras Fontes Internacionais I (f.f) I

de corrigir o conflito (art. 5°), podendo no entanto o Estado terceiro, não vinculado
pelo Direito Comunitário, aplicá-ld 3 .
Às relações entre tratados e fontes secundárias, aplicam-se mutatis mutandis as
mesmas considerações.
Observa MARrA CELESTE CARDONA que a expansão progressiva dos mecanis-
mos comunitários de harmonização das leis fiscais internas - Diretivas e Convenções
multilaterais - conduz naturalmente a que os tratados bilaterais percam o seu peso
relativo como instmmentos de eliminação das duplas tributações nas relações en-
tre os Estados-membros da Comunidade. E cita como exemplos a Diretiva relativa
às relações entre sociedades-mãe e sociedades afiliadas domiciliadas noutro Estado-
membro ("Parent Subsidiary") , bem como a Convenção Multilateral de Arbitragem,
as quais se sobrepõem, respectivamente, aos regimes convencionais bilaterais refe-
rentes a dividendos e ao procedimento amigável.
Por outro lado, nas relações entre cada Estado-membro da Comunidade e ter-
ceiros Estados, a negociação de tratados bilaterais contra a dupla tributação tende a
ser objeto de estreita coordenação pela Comissão, como forma de definir previamen-
te uma política comum nessa matéria, que evite distorções e discriminações 54.

§ 4° MERCOSUL

O MERCOSUL é uma organização internacional constituída pelo Tratado de


Assunção, celebrado em 26 de março de 1991 pela Argentina, pelo Brasil, pelo Para-
guai e pelo Umguai, tendo por objetivo o estabelecimento de um Mercado Comum,
que se denominará "Mercado Comum do Sul" (MERCOSUL )55.
O Direito originário do MERCOSUL é constituído, além do Tratado de Assun-
ção, pelo Protocolo de Brasília para a solução de controvérsias, de 17 de dezembro
de 199p6, e pelo Protocolo de Ouro Preto sobre a estmtura institucional do MER-
COSUL, de 17 de dezembro de 199457 •
O Protocolo de Ouro Preto atribuiu ao MERCOSUL personalidade jurídica de
Direito Internacional (art. 34) e definiu as suas fontes jurídicas (art. 41), a saber: (i)
o Tratado de Assunção, seus protocolos e os instmmentos adicionais ou complemen-
tares; (ii) os acordos celebrados no âmbito do Tratado de Assunção e seus protoco-
los; (iii) as Decisões do Conselho do Mercado Comum, as Resoluções do Gmpo
Mercado Comum e as Diretrizes da Comissão de Comércio do MERCOSUL (que

53 Cfr. MARIA MARGARIDA C. convenções sobre dupla tributação, cit., 35 55.


MESQUITA,As
54 Cfr. MAluA CELE5TE O papel dos acordos sobre dupla tributação na internacionalização
CARDONA,
da economia, 22855.; BAKER, Double Taxation, 5855.
55 Promulgado pelo Decreto nO 350 de 21.11.91.
56 Promulgado pelo Decreto nO 992 de 10.09.93.
57 Promulgado pelo Decreto nO 1.901 de 9.5.94.
Mil:_ Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

constituem o Direito Derivado proveniente dos órgãos com capacidade decisória, de


natureza intergovernamental).
O MERCOSUL não reveste a natureza de uma organização supranacional, sus-
cetível de produzir um Direito Comunitário similar ao da Comunidade Europeia,
sendo tão somente uma clássica organização intergovernamental, através da qual se
opera um fenômeno horizontal de "coordenação" entre Estados e não um fenômeno
vertical de "integração" numa entidade supraestatal.
Com efeito, no MERCOSUL não se vislumbra nenhuma das característicias
essenciais do fenômeno de supranacionalidade: a superioridade hierárquica do poder
supranacional sobre o poder estatal; a transferência definitiva de poderes soberanos
dos Estados-membros em benefício da entidade supranacional; a autonomia do po-
der supranacional em relação ao poder político dos Estados-membros; e a indepen-
dência no exercício do poder supranacional em relação ao poder estatal58 •
Ao invés, nele se verificam todos os traços distintos das chamadas "organiza-
ções intergovernamentais"59: os órgãos deliberativos são constituídos por represen-
tantes dos Estados-membros, designados pelos respectivos governos e submetidos
às instruções destes (assim sucede nos três órgãos do MERCOSUL produtores de
fontes de direitos); as decisões e deliberações que constituem o Direito Derivado
da organização dirigem-se aos Estados-membros e não aos cidadãos destes Estados
(as Decisões do Conselho de Mercado Comum, as Resoluções do Grupo Mercado
Comum e as Diretrizes da Comissão de Comércio do MERCOSUL são obrigatórias
para os "Estado-partes", como estabelecem os arts. 9°, 15 e 20 do Protocolo de Ouro
Preto); a regra da votação é a de unanimidade e não a de maioria ("as decisões dos
órgãos do MERCOSUL serão tomadas por consenso e com a presença de todos os
Estados-partes", diz o art. 37 do Protocolo de Ouro Preto )60.
No que concerne às relações do Direito Derivado do MERCOSUL com a or-
dem interna de cada um dos Estados-partes, o art. 42 do Protocolo de Ouro Preto
determina que "as normas emanadas dos órgãos do MERCOSUL, previstas no art.
2° deste Protocolo, terão caráter obrigatório e deverão, quando necessário, ser incor-
poradas aos ordenamentos jurídicos nacionais mediante os procedimentos previstos
pela legislação de cada país".
Consequência direta da natureza intergovernamental e não supranacional do
MERCOSUL é que as suas fontes derivadas não gozam da aplicabilidade e eficácia di-
reta de que beneficiam as suas congêneres europeias, pese embora a norma programá-

58 Cfr. FAUSTO DE QUADROS, Direito das Comunidades Europeias e Direito Internacional Público,
Lisboa 1984, 158 ss.
59 Anglicismo deplorável, mas de uso generalizado. "Organizações interestatais" é melhor
português.
60 Sobre a distinção entre organizações intergovernamentais e supranacionais, cfr. A"lDRÉ GON-
ÇALVES PEREIRA/FAUSTO DE QUADRos,Manual de Direito Internacional Público (3 a ed.), Coim-
bra 1993,421.
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~
..•.'..• '.' -- Título 111 I Capo 11 I Outras Fontes Internacionais

tica do § único do art. 4° da Constituição, segundo o qual "a Repúlica Federativa do


Brasil buscará a integração econômica, política, social e cultural dos povos da América
Latina, visando à formação de uma comunidade latino-americana de nações".
A este respeito é categórica a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal.
Assim afirma a ementa do Agravo Regimental em Carta Rogatória nO 8.27961 :
"A recepção de acordos celebrados pelo Brasil no âmbito do MERCOSUL está
sujeita à mesma disciplina constitucional que rege o processo de incorporação, à
ordem ,Positiva interna brasileira, dos tratados ou convenções internacionais em
geral. E, pois, na Constituição da República, e não em instrumentos normativos
de caráter internacional, que reside a definição do iter procedimental pertinente
à transposição, para o plano do direito positivo interno do Brasil, dos tratados,
convenções ou acordos - inclusive daqueles celebrados no contexto regional do
MERCOSUL - concluídos pelo Estado brasileiro. Precedente: ADI 1.480-DF,
ReI. Min. CELSO DE MELLO.
"Embora desejável a adoção de mecanismos constitucionais diferenciados, cuja
instituição privilegie o processo de recepção dos atos, acordos, protocolos ou
tratados celebrados pelo Brasil no âmbito do MERCOSUL, esse é um tema que
depende, essencialmente, quanto à sua solução, de reforma do texto da Consti-
tuição brasileira, reclamando, em consequência, modificações de jure constituen-
do. Enquanto não sobrevier essa necessária reforma constitucional, a questão da
vigência doméstica dos acordos celebrados sob a égide do MERCOSUL con-
tinuará sujeita ao mesmo tratamento normativo que a Constituição brasileira
dispensa aos tratados internacionais em geral.
«Procedimento constitucional de incorporaçiW de convenções internacionais em geral e
de tratados de integraçiW (MERCOSUL)
'1\ recepção dos tratados internacionais em geral e dos acordos celebrados pelo
Brasil no âmbito do MERCOSUL depende, para efeito de sua ulterior execu-
ção no plano interno, de uma sucessão causal e ordenada de atos revestidos de
caráter político-jurídico, assim definidos: (a) aprovação, pelo Congresso Nacio-
nal, mediante decreto legislativo, de tais convenções; (b) ratificação desses atos
internacionais, pelo Chefe de Estado, mediante depósito do respectivo instru-
mento; (c) promulgação de tais acordos ou tratados, pelo Presidente da Repú-
blica, mediante decreto, em ordem a viabilizar a produção dos seguintes efeitos
básicos, essenciais à sua vigência doméstica: (1) publicação oficial do texto do
tratado e (2) executoriedade do ato de direito internacional público, que passa,
então - e somente então - a vincular e a obrigar no plano do direito positivo
interno. Precedentes.
«O sistema constitucional brasileiro não consagra o principio do efeito direto e nem o
postulado da aplicabilidade imediata dos tratados ou convenções internacionais

61 Diário da Justiça de 10.8.2000.


mm I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

''A Constituição brasileira não consagrou, em tema de convenções internacionais


ou de tratados de integração, nem o princípio do efeito direto, nem o postula-
do da aplicabilidade imediata. Isso significa, de jure constituto, que, enquanto
não se concluir o ciclo de sua transposição, para o direito interno, os tratados
internacionais e os acordos de integração, além de não poderem ser invocados,
desde logo, pelos particulares, no que se refere aos direitos e obrigações neles
fundados (princípio do efeito direto), também não poderão ser aplicados, ime-
diatamente, no âmbito doméstico do Estado brasileiro (postulado da aplicabi-
lidade imediata).
"O princípio do efeito direto (aptidão de a norma internacional repercutir, des-
de logo, em matéria de direitos e obrigações, na esfera jurídica dos particulares)
e o postulado da aplicabilidade imediata (que diz respeito à vigência automática
da norma internacional na ordem jurídica interna) traduzem diretrizes que não
se acham consagradas e nem positivadas no texto da Constituição da República,
motivo pelo qual tais princípios não podem ser invocados para legitimar a inci-
dência, no plano do ordenamento doméstico brasileiro, de qualquer convenção
internacional, ainda que se cuide de tratado de integração, enquanto não se
concluírem os diversos ciclos que compõem o seu processo de incorporação ao
sistema de direito interno do Brasil. Magistério da doutrina.
"Sob a égide do modelo constitucional brasileiro, mesmo cuidando-se de tra-
tados de integração, ainda subsistem os clássicos mecanismos institucionais de
recepção das convenções internacionais em geral, não bastando, para afastá-los,
a existência da norma inscrita no art. 4°, parágrafo único, da Constituição da
República, que possui conteúdo meramente programático e cujo sentido não
torna dispensável a atuação dos instrumentos constitucionais de transposição,
para a ordem jurídica doméstica, dos acordos, protocolos e convenções celebra-
dos pelo Brasil no âmbito do MERCOSUL."
A Decisão do Conselho do Mercado Comum nO 23, de 29 de junho de 2000,
esclareceu as situações em que os atos normativos do MERCOSUL não necessitam
ser incorporados ao ordenamento jurídico do Estado-parte, por tratarem do funciona-
mento interno da organização, e em que são incorporados sem necessidade de referen-
do do Poder Legislativo, por versarem matéria de competência do Poder Executivo.
Importa ainda salientar que, para garantir a vigência simultânea nos Estados-
partes do Direito Derivado, a Secretaria Administrativa do MERCOSUL informará
a cada Estado-parte quando todos os demais tiverem informado sua incorporação
aos respectivos ordenamentos jurídicos internos, sendo que a vigência ocorrerá nos
30 dias subsequentes à comunicação (Protocolo de Ouro Preto, art. 40).62

62 SÉRGIO ANDRÉ R. G. DA SILVA, Integração econômica e harmonização da legislação tributária,


Rio de Janeiro 2003, espec. 82 e ss.; ANA CR1STINA PAULO PEREIRA, Direito Institucional e
material do MERCOSUL, Rio de Janeiro 2001; PATRÍCIA HENRIQUES RIBEIRO, As relações
entre o Direito Internacional e o Direito Interno: conflito entre o ordenamento brasileiro e normas
Título 111 I Capo 11 I Outras Fontes Internacionais .i:'.

do Mercosul, Belo Horizonte 2001; MARcus RECTOR TOLEDO SILVA, Mercosul e personalidade
jurídica internacional, Rio de Janeiro 1999; CARLOS EDUARDO CAPUTO BASTOS, O processo
de integração do Mercosul e a questão da hierarquia constitucional dos tratados, in Estu-
dos da Integraçlfu, vaI. 12, Brasília 1997; MARrA TERESA CÁRCOMO LOBO, Ordenamento ju-
rídico comunitário, Belo Horizonte 1997; fuRODO PABST, Mercosul. Direito da Integraçlfu,
Rio de Janeiro 1997; ARMANDO ALVARES GARCIA JÚNIOR, Conflito entre normas do Mercosul
e Direito Interno: como resolver o problema?: o caso brasileiro, São Paulo 1997; IVES GANDRA DA
SILVA MARTINS (org.), Tributaçlfu no Mercosul (2 a ed.) (Pesquisas Tributárias, Nova Série, 3),
São Paulo 2002; SAULO JOSÉ CASALI BAHIA, A supranacional idade no Mercosul, in CELSO
BASTOS/C. FINKELSTEIN (org.), Mercosul: lições do período da transitoriedade, São Paulo 1998,
195 SS.; ARMANDO GARCIA ALVAREZ, Conflito entre normas do Mercosul e Direito Interno, in
CELSO BASTOS/C. FINKELSTEIN (org.), Mercosul: lições do periodo da transitoriedade, São Paulo
1998, 31 sS.; LUIZ OLAVO BAPTISTA, Inserção das normas do Mercosul no Direito brasileiro,
in LUIZ OLAVO BAPTISTA/I. R. FRANCO DA FONSECA (org.), O Direito Internacional no terceiro
milênio, São Paulo 1998, 390 SS.; OTÁVIO AUGUSTO CANÇADO TRINDADE, A incorporação das
normas do Mercosul ao direito brasileiro e a segurança jurídica regional, in C. A. MENEZES
DIREITO / O. A. CANÇADO TRINDADE / A. C. ALVES PEREIRa (Coord.), Novas perspectivas do
direito internacional contemporâneo, Estudos em homenagem ao Professor CELSO DEALBUQUER-
QUE MELLO, Rio de Janeiro 2008, 229.
CAPÍTULO III
FONTES INTERNAS

As fontes internas do Direito Tributário Internacional não apresentam qualquer


especialidade em relação às fontes do Direito Tributário em geral, notadamente no
que concerne aos princípios da legalidade e da tipicidade da tributação l .
Faz-se aqui esta singela referência remissiva, por razões de simetria e clareza.

1 efr. ALBERTO XAVIER, Manual de Direito Fiscal, Lisboa 1981 (reimpressão), 105 ss.; ID., Os
princípios da legalidade e da tipicidade da tributação, São Paulo 1977,passim.
I

TITULO IV

OS ELEMENTOS DE CONEXÃO
CAPÍTULO I
Os ELEMENTOS DE CONEXÃO EM GERAL

§ 10 CONCEITO E ESPÉCIES

o elemento de conexão I é um dos instrumentos nucleares em torno do qual


se articula toda a estrutura da norma de conflitos. Integrado na hipótese da norma
de conflitos - desempenhando a função de "lançar a ponte" (na célebre terminolo-
gia de RAAPE) entre o fato descrito pelo conceito-quadro e o ordenamento jurídico
aplicável -, a verdade é que a sua influência também se faz sentir na estatuição da
norma, pelo que nos situamos no grupo daqueles que pensam ser tal elemento
"bifrontal", no sentido de que ocupa posição em ambos os setores da proposição
normativa.
O elemento de conexão é o elemento da previsão normativa que, determinan-
do a "localização" de uma situação da vida num certo ordenamento tributário, tem
como efeito típico determinar o âmbito de aplicação das leis desse ordenamento a
essa mesma situação.
Os elementos de conexão consistem nas relações ou ligações existentes entre as
pessoas, os objetos e os fatos com os ordenamentos tributários, distinguindo-se em
subjetivos, se se reportam às pessoas (como a nacionalidade ou a residência), ou obJe-
tivos, se se reportam às coisas e aos fatos (como a fonte de produção ou pagamento

1 O conceito de "elemento de conexão" (Anknüpfongspunkt) - elaborado pela teoria geral do


Direito de Conflitos [cfr. IRlNEU STRENGER, Teoria Geral do Direito Internacional Privado, São
Paulo 1973, 267 ss.; HAROLDO V ALLADÃO, Direito Internacional Privado (4a ed.), I, Rio de
Janeiro 1974,254]- deve ser também aplicado no Direito Tributário Internacional, por ser
dotado de maior rigor técnico-dogmático. Afora uma ou outra obra isolada, que transpôs
para o nosso domínio aquele conceito (e justo é sublinhar a de VON SCHANz), grande parte
da doutrina continua a utilizar noções desprovidas de precisão científica como as de "vincu-
lação política ou econômica" (allégeance économique et sociale), popularizada por GRIZIOTTl,
Ilimposition fiscale des étrangers, Recueil des Cours IV (1926), 5. Cfr. TlXIER/KEROGUES, Droit
fiscal international. Pratique française, Paris 1974, 14; GUY GEST/GILBERT TIXIER, Droit Fiscal
International (2 a ed.), Paris 1990, 120 ss. Ver, porém, as observações críticas de PÉREZ DE
AYALA!EUSEBIO GONZÁLEZ, Curso de Derecho Tributária (6 a ed.), I, Madrid 1991, 87; KLUGE,
Das deutsche Internationale Steuerrecht (3 a ed.), Munique 1992, 13-14; FÀNTOZZI, Diritto
Tributaria, Turim 1991, 163.
I mm I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

da renda, o lugar do exercício da atividade, o lugar da situação dos bens, o lugar do


estabelecimento permanente, o lugar de celebração de um contrato)2.
Nem sempre, porém, a lei ou as convenções utilizam uma única conexão nas suas
previsões normativas, sendo frequentes os casos de pluralidade de conexões. Fala-se
então de conexão complexa ou múltipla, por contraposição à conexão simples ou única.
A conexão complexa ou múltipla pode revestir três modalidades: subsidiária,
alternativa e cumulativa3 •
N a conexão subsidiária, a norma prevê duas ou mais conexões, estabelecendo que
uma delas (secundária) só se aplicará na falta ou impossibilidade da conexão primá-
ria. Exemplo característico é a norma do art. 4° do Modelo OCDE segundo a qual,
em caso de conflito de residências, uma pessoa deve ser considerada residente no Es-
tado em que tem uma habitação permanente (conexão primária); se tiver habitação
permanente nos dois Estados ou não tiver em nenhum será considerada residente no
Estado onde tenha o centro dos seus interesses vitais; e, ainda subsidiariamente, no
Estado onde permanecer habitualmente ou de que for nacional.
Na conexão alternativa, a norma prevê duas conexões como igualmente aptas para
produzir o mesmo efeito. Exemplo nítido é a norma da lei interna portuguesa que con-
sidera como residentes em Portugal as sociedades que tenham em Portugal a sua sede
estatutária ou a sua direção efetiva. E a norma convencional que estabeleça que conside-
ram-se provenientes de um Estado os juros em que o devedor tenha residência ou em que
possua estabelecimento permanente, mesmo que tenha residência num terceiro Estado.
Na conexão cumulativa, a norma prevê dois ou mais elementos de conexão cuja
ocorrência se deve verificar simultaneamente para que certo efeito se produza. É o
que se passa com a norma convencional que estabelece que a convenção apenas se
aplica se o beneficiário dos juros tiver num certo Estado simultaneamente a sua resi-
dência e o seu estabelecimento permanente, de tal modo que ela não se aplica aos ju-
ros pagos aos estabelecimentos permanentes que as empresas residentes no primeiro
Estado tenham em terceiros Estados.
Uma outra classificação separa os elementos de conexão variáveis ou móveis dos
elementos de conexão invariáveis ou fixos. Os primeiros são suscetíveis de mudar no
tempo e no espaço (como a nacionalidade, a residência, a sede), ao contrário dos
últimos (lugar de celebração de um contrato, lugar de situação dos imóveis). E daí
que a possibilidade de existência de uma "sucessão de estatutos no tempo" envolva
a necessidade de fixação do momento temporal relevante4: pense-se, por exemplo,
numa sociedade que transferiu a sua sede de um país abrangido por tratado contra
a dupla tributação para outro país dele excluído. Por sua vez, a suscetibilidade de

2 Cfr. MÓSSNER, in MÓssNER/et aI., Steurrecht international tiitiger Unternehmen, Colônia


1992,42.
3 Cfr. ISABEL DE MAGALHÃES CoLl.AÇO, Direito Internacional Privado, II, Lisboa 1959,20 SS.;
ID., Da qualificaçlÚJ em Direito Internacional Privado, Lisboa 1964, 19 ss.
4 Cfr. ISABEL DE MAGALHÃES COLLAÇO, Lições, II, 38.
Título IV I Capo I I Os Elementos de Conexão em Geral

"deslocalização", no espaço, do elemento de conexão está na origem de um complexo


problema, tradicionalmente identificado como de evasão ou elisão fiscal internacio-
nal, e que apresenta fundas analogias com o problema da fraude à lei no Direito
Internacional Privado.
São frequentes os casos em que a lei se utiliza da técnica das presunções ou ficções
para definir elementos de conexão caracterizados pelo recurso a um conceito mais
amplo. São exemplos as normas (frequentes noutros ordenamentos, mas não no bra-
sileiro) segundo as quais um serviço se considera prestado no território do domicílio
do prestador ou do domicílio do beneficiário; um tripulante de navio ou aeronave se
considera residente no território em que se localiza a direção efetiva da empresa que
os explora; um membro do agregado familiar se considera residente no território em
que reside o chefe de família; um juro se considera proveniente do território em que
se localizam os bens dados em garantia do crédito. Em todos estes casos, o verda-
deiro elemento de conexão não é constituído pelo conceito de lugar da prestação do
serviço, da residência do titular do rendimento ou da fonte do rendimento, mas pelos
conceitos que serviram de base à presunção ou à ficção: o domicílio do prestador do
serviço ou do seu adquirente; a direção efetiva da empresa, a residência do chefe de
família ou o lugar da situação dos bens dados em garantia.

§ 2° OS ELEMENTOS DE CONEXÃO NOS IMPOSTOS SOBRE A RENDA E O CAPITAL

A) Os princípios da fonte e da residência


A dupla tributação internacional resulta essencialmente da diversidade dos ele-
mentos de conexão adotados pelas normas tributárias de conflitos.
E não só diversidade na sua identidade, mas também diversidade pelo seu con-
teúdo: tanto pode haver dupla tributação do mesmo rendimento, por dois Estados
adotarem elementos de conexão distintos - como o local da produção da renda e a
residência do beneficiá-rio -, como por, adotando embora o mesmo elemento - por
exemplo, a residência -, imprimirem a este conceito um sentido diverso, de tal modo
que o mesmo sujeito pode ser tido por residente simultaneamente em ambos os Es-
tados em concursos.
Vamos apenas considerar a primeira hipótese, ou seja, a diversidade de elemen-
tos de conexão, quanto à qual se trava hoje ainda um conflito entre dois grandes prin-
cípios que se arrogam validade geral em matéria de tributação da renda e da fortuna:

5 Isto corresponde à distinção formulada por KAHN entre os conflitos patentes ou expressos
das normas de conflitos (ausdrückliche Gesetzkollisionen) e os conflitos dos conceitos de cone-
xão (Kollisionen der Auknüpfongsbegriffe): apud ISABEL DE MAGALHÃES CoLLAÇO, Da qualifica-
çífu, 35, nota.
_P!.i Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

o princípio da fonte (source principIe) Ursprungsprinzip) Quellenprinzip) e o princípio


da residência (residence principIe) Wóhnsitzprinzipj6.
Em face de wn movimento internacional de capitais, importa distinguir o país
onde se situa a empresa ou o receptor de wn investimento e onde se obtém a renda
produzida pelos capitais - o país da fonte - e o país onde reside o titular dos fundos for-
necidos e que aufere a renda dos capitais investidos no exterior - o país da residência.
A discussão em torno de qual o princípio que deveria preponderar na formula-
ção das leis fiscais partiu, via de regra, da premissa segundo a qual o país da fonte é
o país menos desenvolvido, importador de capitais, enquanto o país da residência é
o país industrializado, exportador de capitais.
Se o princípio da territorialidade, na sua acepção mais restrita de territorialidade
real ou critério territorial7 , fosse universalmente respeitado, conduziria à atribuição
exclusiva do direito de tributar ao país da fonte e obrigaria o país da residência a
isentar (ou declarar fora do âmbito de incidência dos seus tributos) os rendimentos
produzidos fora do seu território, ainda que nele auferidos pelos seus residentes: a
dupla tributação internacional, se não por completo eliminada, seria com certeza wn
fenômeno de muito mais reduzidas proporções.
Não é isto, porém, o que sucede. Ninguém põe hoje em dúvida o direito do
país da fonte de tributar a renda (ou a fortuna) nele produzida, por evidentes razões
ligadas à forte conexão entre ele e a produção do fato tributárioS. Mas isto não tem
impedido que os países da residência se arroguem também o direito de tributar os
rendimentos auferidos no exterior pelos seus residentes, invocando essencialmente
cinco ordens de razões.
A primeira - e talvez a mais forte - é a que resulta do princípio da igualdade.
Os países exportadores de capitais, mais desenvolvidos, adotam em regra um impos-
to pessoal de alíquota progressiva sobre a renda global líquida das pessoas físicas.
Ora, se não tributassem os rendimentos auferidos de fonte estrangeira, violariam o

6 Cfr. ENDRISS, UVhnsitz-oder Ursprungsprinzip?, Colônia 1967; A. SPITALER, Das UVhnsitz-


und das Ursprungsprinzip im Doppelbesteuerungsrecht, Berlim 1963; KNECHTLE, Grundfragen
des Internationalen Steuerrechts, Basileia 1976,43; MbssNER, Der Begriff des Internationalen
Steuerrechts in der neueren Literatur, Osterreichische Zeitschrift fUr offentliches Recht 25
(1974),255 (280); TROMAS MENcK, Tifklteinkommen und Territorialitiit der Besteuerung nach
deutschem Recht und in deutscher Sicht, in ENGELSCHALK/FLIcK/et ai., Steuern aufausliindische
Einkünfte, Munique 1985, 28; HEIKO MEYER, Die Vermeidung internationaler Doppel-und
Minderbesteuerung auf der Grundlage des Ursprungsprinzips, Gottingen 1970; Kl.AUS VOGEL,
UVrldwide vs. source taxation of income - A review and reevaluation of arguments, Interna-
tional Tax Review 8-11 (1988),216 (separata).
7 Cfr. supra, 17.
8 Mas durante muito tempo prevaleceu o primado do país da residência. Foi a necessidade de
ajuda ao mundo subdesenvolvido e de livre circulação de capitais que conduziu os países an-
glo-saxônicos - onde o princípio da residência é regra fundamental- a reconhecer ao país de
origem não um direito exclusivo, mas um prior right. Cfr. ROYAL COMMISSION ON TAXATION
de 1955, 187, e a Resolução de Nápoles (1957) da Câmara de Comércio Internacional.
Título IV I Capo I I Os Elementos de Conexão em Geral I 8iD I

princípio (muitas vezes constitucionalmente consagrado) da igualdade, no sentido


da não discriminação entre os seus residentes, dos quais uns - os que só auferem
réditos produzidos internamente - seriam mais gravosamente tratados. Quer dizer:
os princípios em que assentam os impostos pessoais sobre a renda - igualdade e pro-
gressividade - conduzem em linha reta à tributação da renda global do contribuinte,
sem distinção de origens e fronteiras e, portanto, ao princípio da universalidade ou
do rendimento mundial (world-wide-income)9.
A esta razão acresce uma segunda: se é certo que o país da fonte pode com jus-
tiça invocar a proteção que confere à empresa produtora do rendimento no seu terri-
tório, não o é menos que o país da residência também outorga proteção e vantagens
aos que nele residem, os quais justificam uma imposição dos seus réditos globais. E
isto seria verdade não só quanto às pessoas físicas, mas também quanto às pessoas ju-
rídicas, mormente sociedades, quando têm no seu território a direção efetiva, a "alma
de empresa". Não se poderá mesmo afirmar - diz-se - que é nessa direção efetiva e
não no país da fonte que os rendimentos são produzidos?
Terceiro argumento: é frequente que o país da fonte, para atrair capitais estran-
geiros, lhes conceda significativos estímulos fiscais, designadamente isenções; se o
país da residência não tributar o rendimento de fonte estrangeira, verificar-se-á uma
injustificada "evasão" de imposto.
A quarta e quinta razões já se não prendem diretamente a uma justificação
doutrinária geral, mas à defesa de interesses e a objetivos de política econômica:
a não tributação dos rendimentos de fonte estrangeira representa uma intolerável
perda de receitas para o tesouro do país da residência e é um estímulo à exportação
de capitais, pois que os rendimentos da sua aplicação no estrangeiro são menos se-
veramente tributados do que os de produção interna (no caso de moderação fiscal
do país da fonte) 10.
Seja, porém, como for, o certo é que existe hoje um consenso quanto à igual
legitimidade dos dois critérios de conexão com o território que justificam a tributa-
ção por um dado Estado - a residência do contribuinte e a fonte do rendimento -, si-
tuando-se as divergências quanto à maior ou menor amplitude do conceito de fonte,
ou seja, quanto aos critérios que permitem "localizar" a fonte num dado território! I.
Assim, por exemplo, certas legislações não se contentam com o critério da fonte para
fundamentar a tributação dos não residentes, limitando-se a tributá-los apenas na

9 Cfr. SHULZE-BRACHMANN, Totalitiits-oder Territorialitiitsprinzip?, Steuer und Wirtschaft 1964,


589.
10 Cfr. KWGE, Das deutsche Internationale Steuerrecht, 45 sS.; M. PIRES, Da dupla tributação
jurídica internacional sobre o rendimento, Lisboa 1984, 237.
11 É neste sentido que o problema se coloca hoje nos países latino-americanos que, tradicio-
nalmente, defendiam uma posição radical a favor da tributação exclusiva pelo país da fonte.
Cfr. V ALDÉS COSTA, Enrwicklung und theoretische Fundierung des Territorialitatsprinzips in
Lateinamerik, in ENGELSCHALK/FLICK, Steuern auf ausliindische Einkünfte, 44. Ao problema
da "Quellenlokalisierung", refere-se ENGELSCHALK, in ENGELSCHALK!FLICK, op. cit., 74 sS.
Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

hipótese em que disponham de um estabelecimento permanente no seu território.


Fala-se então no princípio do estabelecimento permanente (Betriebstatteprinzip) que
exprime uma formulação restrita do princípio de fonte 12 .
Problema deste distinto - embora com ele conexo - reside em saber qual a ex-
tensão do poder de tributar, uma vez constatada uma conexão pessoal ou objetiva
com o território. A esta questão respondem os princípios da universalidade e da terri-
torialidade) como de seguida se verá.

B) Os princípios da universalidade e da territorialidade;


obrigaçiÚJ tributária limitada e ilimitada
Enquanto os princípios da fonte e da residência dizem quais são as conexões
relevantes para fundamentar o poder tributário de um Estado, eles não respondem
diretamente à questão de saber qual a extensiÚJ desse poder, isto é, até onde se estende
o âmbito de incidência das leis tributárias internas 13 •
Embora conceitualmente várias combinações de critérios sejam possíveis, certo
é que os sistemas fiscais modernos tendem, quando adotam o elemento de conexão
residência, a estabelecer uma obrigação tributária ilimitada (unbeschrankte Steuerpfli-
cht) , no sentido de que o residente de um país, seja pessoa física ou pessoa jurídica,
é tributável por todos os seus rendimentos, tanto de fonte interna quanto de fonte
externa: e daí que se fale num princípio da universalidade ou do world-wide-income
(Universalitiitsprinzip) lVelteinkommenJull-tax liability) imponibilité illimitée) que con-
duziria, assim, a uma extensão "extraterritorial" da lei interna.
Simetricamente, os mesmos sistemas fiscais tendem a impor uma obrigação
tributária limitada (beschrankte Steuerpflicht) aos não residentes, submetendo a im-
posto apenas os rendimentos decorrentes de fontes localizadas no seu território 14 •
Fala-se, em tais casos, de um princípio da territorialidade em sentido restrito ou da

12 Cfr. ampla discussão destes princípios, segundo critérios extrajurídicos de oportunidade e


conveniência, em M. PIRES, Da dupla tributaçM, 260 ss.
13 MORDHORST observou (e bem) que os princípios da fonte e da residência respondem ao
problema da conexão (Anknüpfong) mas não ao da extensão (Umfang) do poder de tributar:
cfr. Der latein-amerikanische Grundsatz der Territorialititt der Besteuerung und seine Gestaltung
in der deutsch-brasiliannischen Beziehungen, Hamburgo 1953, 50.
14 Cfr. KNECHTLE, Basic Problems in International Fiscal Law (trad.), Deventer 1979, 36; THOMAS
MENCK, Welteinkommen und Territorialirat der Besteuerung nach deutschem Recht und in
deutscher Sicht, in ENGELSCHALKjFucK, Steuern auf ausldndische Einkünfte) cit., 29; FRANZ
WASSERMEYER, Die beschrankte Steuerpflicht, in K. VOGEL (org.), Grundfragen des Interna-
tionalen Steuerrechts, 1985, 49; MÓSSNER, in MÓssNER/et aI., Steuerrecht international tdtiger
Unternehmen, 42; SCHAUMBURG, Internationales Steuerrecht, 58 ss. Em Espanha, contrapõe-
se a "obrigação pessoal", de caráter ilimitado, à "obrigação real" dos não residentes, de
caráter limitado. Cfr. CARMONA FERNÁNDEz, Fiscalidad de los no residentes según la doctrina
administrativa, Bilbao 1992, 7.
Título IV I Capo I I Os Elementos de Conexão em Geral Mpg_
fonte, mas sem grande rigor científico, pois estes conceitos, válidos para descrever
o elemento de conexão relevante, não exprimem terminologicamente o oposto do
princípio da universalidade, que respeita não ao fundamento da tributação mas à
amplimde do poder de tributar.
Se a tributação "limitada" dos não residentes é de regra no mundo moderno
(por se entender que o Estado da fonte não pode, em face do Direito Internacional
Público, estender o âmbito espacial das suas leis a rendimentos auteridos no exterior
por pessoas que não residam no seu território), certo é que o princípio da residên-
cia não anda necessariamente associado ao princípio da universalidade. Pode, na
verdade, a lei dispor que também os residentes são tributáveis exclusivamente em
função dos rendimentos de fonte interna, o que redunda em renunciar a tributar os
rendimentos de origem externa e a estabelecer uma obrigação limitada para os seus
residentes ou certas classes deles. É esta a solução consagrada por numerosos países
latino-americanos; é esta a solução adotada por certos Estados quanto a residentes
que sejam pessoas jurídicas, coexistindo então o princípio da territorialidade, que a
estas é aplicável, com o princípio da universalidade, vigente em relação às pessoas
físicas - é o que se passa notadamente no Brasil e na França.

§ 3° OS ELEMENTOS DE CONEXÃO NOS IMPOSTOS


SOBRE TRANSMISSÕES A TÍTULO GRATUITO

Em matéria de impostos sobre transmissões a tímlo gramito (sucessões e doa-


ções), defrontam -se dois princípios fundamentais, consoante a relevância do elemen-
to de conexão adotado: o princípio do domicílio, segundo o qual o Estado teria o poder
de tributar a totalidade das transmissões patrimoniais efemadas por pessoas nele
residentes (domicílio do de cujus ou do doador) ou efemadas em favor de beneficiários
nele residentes (domicílio do beneficiário), independentemente do território em que se
localizam os bens ou direitos objeto da transmissão; e o princípio do Zocus rei sitae,
segundo o qual o Estado teria o poder de tributar exclusivamente as transmissões
patrimoniais relativas a bens e direitos localizados no seu território, sendo irrelevante
o domicílio do transmitente ou do beneficiário 1s .
O princípio do domicílio conduz, quanto à extensão da obrigação de imposto, a
um princípio da universalidade ou da tributabilidade ilimitada, abrangendo portanto bens
e direitos simados no exterior; ao invés, o princípio do Zocus rei sitae conduz a um prin-
cípio da territorialidade (em sentido estrito) ou da tributabilidade limitada, restringindo
os poderes tributários dos Estados aos bens e direitos localizados no seu território.

15 Por vezes com a ressalva de bens imóveis situados no estrangeiro (Dinamarca, Bélgica, Lu-
xemburgo). Raros países (Estados Unidos e Turquia) consagram o direito de tributar os seus
nacionais, ainda que domiciliados no exterior.
p I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

A verdade, porém, é que na época atual a generalidade dos Estados adota com-
plexos sistemas em que se incorporam regras inspiradas em ambos os princípios.
Assim, a generalidade dos países consagra o regime de tributar os não residentes em
relação aos bens e direitos localizados no seu território. Mas esses mesmos países
consagram a regra de tributar a totalidade das transmissões efetuadas por transmi-
tentes nele domiciliados, incluindo as de bens localizados no exterior l6 . Outros países
- como a Áustria, a Alemanha e o Japão - dão igualmente relevância ao domicílio
do beneficiário para consagrar o princípio da universalidade, caso em que também
se abrangem bens localizados no exterior transferidos por transmitente também do-
miciliado no exterior.
O modelo de Convenção de dupla tributação relativo às sucessões e doações,
elaborado pela OCDE em 1982, adotou como regra geral o principio do domicílio do
de cujus ou do doado't; ao qual fazem exceção os bens imobiliários e os bens mobiliários
pertencentes a um estabelecimento estável ou a uma instalação fixa, cuja tributação é
da competência exclusiva do Estado do locus rei sitae 17 •
No Brasil- onde o imposto sucessório causa mortis atingia apenas os imóveis,
revestindo assim caráter estritamente real e territorial I8-, a própria Constituição de
1969 se encarregara de dissipar quaisquer dúvidas, determinando que o tributo com-
pete ao Estado onde está situado o imóvel, ainda que a transmissão resulte de suces-
são aberta no estrangeiro (art. 23, § 2°). Esta posição, a um tempo simples e radical,
esteve na origem de o Brasil - ao contrário de tantos outros países - não ter ainda
assinado qualquer convenção internacional tendente à eliminação da dupla tributa-
ção neste domínio.

16 Cfr. GUGGENHEIM, Ilimposition des successions en Droit International et le problême de la double


imposition, Genêve 1928; PAUL POULTEAU, Dessuccessions dans le Droit Fiscal International, Paris
1932; CLAUDE BONVON, Les conventions suisses de double imposition en matiere d'impôts sur les
successions, Lausanne 1960; WOLFE D. GOODMAN Q. c., International double taxation ofinhe-
ritances and giftes (relatório geral), CDFI LXX-b (1985), 15; SCHAUMBURG, Internationales
Steuerrecht, 224 sS.; OCDE, Ilimposition des personnes physiques sur la fortune, les mutations et les
gains en capital, Paris 1979, 86; MAruA ÁNGELES SÁNCHEZ JIMÉNEZ, La doble imposiciôn inter-
nacional en materia de sucesiones y donaciones, Granada 1991; MANUEL URlARTE ZULUETA, Los
problemas internacionales en el impu esta sobre las sucesiones, in XX Semana de Estudios de
Derecho Financiero, Madrid 1973, 527; A. PISTONE, La normativa interna, in PISTONE (org.),
Diritto Tributario Internazionale, 19 (166 S5.); CARLOS P AMPLONA CORTE-REAL, A dupla tribu-
taçiÚJ internacional das sucessões e doações, CTF 325/327 (1986), 53 (especialmente 65 e ss.).
17 Cfr. TIXIER/KEROGUES, Droit Fiscal International, 173; GEST/TIXIER, Droit Fiscal Intematio-
nal, 401 SS.; GOUTHIÊRE, Les impôts dans les affaires intemationales, Paris 1991,465.
18 Daí que nem sequer se tenham suscitado os complexos problemas que noutros ordena-
mentos se levantam quanto à localização dos bens móveis. Mas nem sempre foi assim, pois
anteriormente à Constituição de 1967 o tributo abrangia bens corpóreos móveis (além dos
incorpóreos), pelo que se presumiam situados no local do domicílio do de cujus (mobilia se-
quuntur personam). Cfr. A. R. SAMPAIO DÓRIA, Princípios constitucionais tributários e a cláusula
"due process of law", São Paulo 1964, 150 sS.; ID., DiscriminaçiÚJ de rendas tributárias, São
Paulo 1972, 125 e 197.
Título IV I Capo I I Os Elementos de Conexão em Geral

A Constituição de 1988 permitiu alargar o âmbito de incidência deste imposto


aos bens móveis, títulos e créditos, determinando que em tais casos o imposto com-
pete ao Estado onde se processar o inventário, ou arrolamento, ou tiver domicilio o
doador, ou ao Distrito Federal (art. 155, § }C, lI). Por sua vez, o inciso III do § 1°
do mesmo artigo determinou que "terá a competência para a sua instituição regula-
da por lei complementar: a) se o doador tiver domicílio ou residência no exterior;
b) se o de cujus possuía bens, era residente ou domiciliado ou teve o seu inventário
processado no exterior".
No que concerne a este imposto há, pois, que distinguir os bens imóveis dos
bens móveis.
No que respeita a bens imóveis e respectivos direitos, a única conexão relevante
é o locus rei sitae: o imposto é devido ao Estado da situação dos bens, ainda que a
herança tenha sido aberta no exterior, ou o doador, o donatário, o herdeiro ou o le-
gatário sejam domiciliados no exterior. Vigora aqui o princípio da territorialidade no
seu sentido estrito.
No que respeita a bens móveis, títulos e créditos, a lei l9 adotou como conexão princi-
pal o lugar do processamento da sucessão (no caso de sucessões) e do domicz1io do doador, de
tal modo que são estes lugares que determinam a competência tributária do Estado.
Discutiu-se na doutrina e na jurisprudência sobre se, com o alargamento do cam-
po de incidência do imposto em questão, os Estados e o Distrito Federal poderiam, na
ausência de disposição de lei complementar deftnidora de normas gerais em matéria de
legislação tributária (art. 146, III, da Constituição Federal), legislar sobre a matéria, insti-
tuindo em concreto os impostos sobre transmissão de bens móveis, títulos e créditos 20 •
A resposta tem sido positiva21 , baseada na autorização constante do art. 34, § 3°,
do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, segundo o qual, "promulgada
a Constituição, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão edi-
tar as leis necessárias à aplicação do sistema tributário nacional nela previsto", bem
como na competência concorrente conferida aos Estados pelo art. 24, § 3°, da Consti-
tuição Federal, sempre que inexistir lei federal sobre normas gerais.
Já, porém, no tocante à lei complementar referida no inciso III do § IOdo art.
155, necessária para instituir o imposto nas hipóteses em que o doador tiver domi-
cilio ou residência no exterior ou em que o de cujus possuía bens, era residente ou
domiciliado ou teve o seu inventário processado no exterior, nem a autorização do
art. 34, § 3°, do ADCT, nem a competência concorrente do art. 24, § 3°, da Consti-
tuição, podem ser invocadas para fundamentar a existência de um direito dos Estados

19 Referimo-nos, a título de exemplo, à Lei nO 1.427, de 13 de fevereiro de 1989, do Estado do


Rio de Janeiro.
20 Cfr. REGINA CELI PEDROTII VESPERO FERNANDES, Impostos sobre Transmissifu Causa Mortis e
Doaçifu - ITCDM (2 a ed.), São Paulo 2005, 51 sS.
21 Cfr. Recurso Extraordinário 236.931-Sp' ReI. Min. ILMAR GALvÃo; Cfr. REGINA CELI PE-
DROTII VESPERO FERNANDES, op. cit., 55
I mIi) I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

e do Distrito Federal de legislar imediatamente sobre a matéria, sem a interposição


necessária da lei complementar.
É que, repare-se bem, não se está aqui perante a lei complementar no seu papel
constitucional de veiculadora de "normas gerais", atribuído pelo inciso UI do art.
146, mas sim na sua imprescindível função de "norma sobre competência", confe-
rido pelo inciso I do mesmo artigo, reguladora, por via preventiva, de conflitos de
competência, em matéria tributária, entre os entes políticos da União.
Se é admissível o exercício supletivo pelos Estados, de uma competência con-
corrente em matéria de "normas gerais", já não o é em matéria de "conflitos de
competência" em que a competência normativa não é concorrente, mas privativa da
União, na forma de lei complementar, pois só esta, de âmbito de validade geral, é
suscetível de prevenir a formação de concursos de pretensões dos diversos Estados e
do Distrito Federal potencialmente envolvidos na situação.
Com efeito, nas hipóteses em questão, a Constituição faz depender a própria
existência da competência impositiva dos Estados e do Distrito Federal da edição de
uma lei complementar prévia reguladora dos limites para seu exercício pela definição
precisa de quais as conexões atributivas da competência de cada um dos entes polí-
ticos potencialmente envolvidos numa situação. E isto decerto para evitar os gravís-
simos conflitos de competência22 que certamente adviriam se cada um dos Estados
fosse livre para estabelecer os elementos de conexão que bem entendesse, gerando
uma pluralidade de incidências sobre o mesmo fato gerador.
A escolha de qual Estado é titular de competência tributária é, pois, uma ques-
tão prévia relativa à aplicação da lei material reguladora da tributação, de tal maneira
que a ausência da primeira envolve necessariamente a ineficácia da segunda, impe-
dindo a vigência da mesma até à sua publicação.
Em 1989 foi apresentado no Senado Federal o Projeto de Lei Complementar
na 154/1989, designado como Projeto de Lei Complementar na 23/1991 na Câma-
ra dos Deputados, com a finalidade de "regular a competência para instituição do
Imposto sobre Transmissão causa mortis e doação de quaisquer bens ou direitos nas
condições previstas no inciso lU do § IOdo art. 155 da Constituição".
Referido Projeto, no entanto, foi rejeitado por unanimidade pela Comissão de
Constituição e Justiça e de Cidadania da Câmara dos Deputados e definitivamente
arquivado em 25 de agosto de 2003 23 •

22 A questão da necessidade de uma lei complementar prévia para dirimir conflitos de com·
petência foi amplamente debatida no Supremo Tribunal Federal em matéria do adicional
estadual do imposto sobre a renda (AIR), tendo o Tribunal afirmado a impossibilidade da
cobrança sem prévia lei complementar, por se tratar de lei materialmente indispensável à
dirimência de conflitos de competência entre os Estados da Federação, não bastando, para
dispensar sua edição, os permissivos inscritos no art. 24, § 3°, da Constituição, e no art. 34,
e seus pará~fos, do ADCT (RE nO 136.215-4jRJ).
23 O parecer do Relator Deputado Luiz Antônio Fleury afirma, em conclusão: "A análise crite-
riosa do Projeto de Lei Complementar nO 23, de 1991, demonstra que a proposição, além de
Título IV I Capo I I Os Elementos de Conexão em Geral .i.
Não obstante, a generalidade das legislações estaduais tem, ainda que inconsti-
tucionalmente, disciplinado a matéria, como sucede, por exemplo, na lei paulista24,
na lei fluminense2 5 e na lei gaúcha 26 •

§ 4° OS ELEMENTOS DE CONEXÃO NOS IMPOSTOS SOBRE O CONSUMO

A) Os princípios de origem e de destino


Ao instituírem seus tributos indiretos, deparam os Estados com os problemas
suscitados pela conexão dos fatos sobre que incide a tributação com mais do que
uma ordem jurídica, à semelhança do que nos impostos diretos sucede. Quanto aos
impostos indiretos relativos a transações de mercadorias, suscita-se desde logo a
questão de saber como disciplinar as transações internacionais, isto é, aquelas que se
traduzem em importações e exportações 27 .

conter falhas de redação, não observou a boa técnica legislativa e, quanto ao mérito, falhou
ao tentar regular a competência tributária em apreço. A esses vícios, acrescenta-se o vício
supremo da inconstitucionalidade."

24 Arr. 4° da Lei nO 10.705/2000.


25 Art. 9° da Lei nO 1.427/1989. No Estado do Rio de Janeiro, no caso de a sucessão se processar
no exterior ou de o doador ou o de cujus ser residente no exterior ou ainda de o de cujus possuir
bens no exterior (ainda que a sucessão se processe no Brasil), a lei adotou como elemento de
conexão subsidiário o domictlio do beneficiário (donatário, herdeiro ou legatário), de tal modo
que, se tal domicílio se localizar no Brasil, a competência corresponde ao Estado respectivo.
Concretizada esta conexão, a obrigação de imposto abrange a totalidade dos bens móveis, tí-
tulos e créditos, ainda que situados no exterior, vigorando assim o princípio da universalidade.
26 Art. 3° da Lei nO 8.821/1989.
27 Sobre o princípio da territorialidade nos impostos sobre consumo, cfr. J. G. XAVIER DE
BASTO, A tributaçíW do consumo e a sua coordenaçíW internacional, Lisboa 1991, cspec. 75
ss.; MARIA TERESA LEMOS, Problemas internacionais do quadro da tributaçíW geral das vendas
de bens e prestações de serviços, CTF 304/306 (1984),411; ID., O tratamento das exportações
no imposto sobre o valor acrescentado, CTF 313/315 (1985), 7; ENRlcO FAZZINI, Il principio di
territorialità nel tributo sul valore aggiunto, Pádua 1995; HANs GEORG RUPPE, Internationale
Probleme auf dem Gebiet der Umsatzbesteuerung (relatório geral), CDFI LXVlII-b (1983),
67; TIXIER/KEROGUES, Droit Fiscal International, 73; GUY GEST/GILBERT TIXIER, Droit Fiscal
International, 429 ss.; CARTOU, Droit Fiscal International et Européen (2 a ed.), Paris 1986, 95;
B. PLAGNET, Droit Fiscal International, 59; RAMÓN FALCÓN y TELLA, Introduccion ai Derecho
Financiero y Tributaria de las Comunidades Europeas, Madrid 1988, 125; PIERRE GUIEU, The
Sixth Council Directive on Válue Added Tax, Deventer 1977; CARLOS DE ALMEIDA SAMPAIO, A
harmonizaçíW fiscal nas Comunidades Europeias - o IVA e o modelo económico português, Lisboa
1984; ANTONIO DORSA, L'imposizione sul valore aggiunto, Verona 1967, 49; A. MlRAULO,
Doppia imposizione internazionale, Milão 1990, 50 ss. e 103 ss.; KLUGE, Das deutsche Inter-
nationale Steuerrecht, 209; F. A. VAN ALPHEN, La double imposition dans le domaine des impôts
sur le chijfre d'a./faires, CDFI XXVIII, 161; MAURICE CAILLEZ, Les doubles impositions interna-
I mm I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Os impostos de consumo sobre as transações são geralmente lançados no país


consumidor, revertendo em benefício dos Estados nos quais são consumidos os bens
sobre que incidem. Precisamente por isso, o país de origem, isto é, o país no qual
o bem foi produzido, procede normalmente à restituição ou isenção do imposto no
momento da exportação; e por razões simétricas o país do destino, onde o bem irá
ser consumido, institui um encargo compensatório sobre as mercadorias importadas,
em ordem a colocá-las ao menos em pé de igualdade com os produtos nacionais 2B •
O sistema assim descrito - adotando o princípio do "país do destino" (Bestim-
mungsland-Prinzip) - permite, pela eliminação da dupla tributação e da evasão fiscal,
evitar perturbações nas condições da concorrência, conduzindo a que um mesmo
consumo ou uma mesma transação sejam tributados apenas uma vez e que as merca-
dorias estrangeiras suportem o mesmo encargo fiscal que as mercadorias nacionais.
Relacionam-se, pois, entre si, de um modo indissociável, o "princípio da tri-
butação do país do destino" com o "princípio da não discriminação" em razão da
nacionalidade.
Mas se, de um lado, o Estado do destino estabelece tributos compensatórios
mais gravosos do que os que incidem sobre produtos nacionais, e se - de outro lado
- os Estados de origem conferem, a título de reembolso, importâncias superiores
aos impostos que oneram as mercadorias exportadas, falseiam-se do mesmo passo as
condições de concorrência, criando disparidades "artificiais" no comércio internacio-

tionales en matiere de taxes sur le chijfre d'affaires, CDFI XXVIII, 170; M. GUERRA/G. TOM-
MASIN, Ilimposta sul valore aggiunto nei rapporti economici internazionali, Milão 1974; J. R.
KAUFFMANN, Le régime fiscal de l'importation et de l'exportation de marchandises, CDFI XLVII
(1962),122; MURATORI, Nuovo indirizzo giurisprudenziale in tema d'eguaglianza tributaria
fra prodotti nazionali e prodotti provenienti di paesi aderenti ai GATT, Diritto e Pratica
Tributaria II (1972); M. PROUZET, I;application territoriale du systeme commun del'IVA,
Rcvue du Marché Commun 1971, 294; WERNER SCHUBERT, Internationale Doppelbesteuerung
bei der Umsatzteuer, CDFI XVII, 191; GAETANO STAMMATI, Les doubles impositions interna-
tionales en matiere de taxes sur le chijfre d'affaires, CDFI XXVIII, 222; PlERA FILIPPI, I;imposta
sul valore aggiunto nei rapporti internazionali, in VICTOR UCKMAR (org.), Corso di Diritto
Tributario Internazionale, Pádua 1999, 157; MAURÍCIO A. PLAZAS VEGAS, La territorialidad
dei IVA. Aspectos internacionales, in VICTOR UCKMAR/ALEjANDRO C. ALTAMlRANOjHELENO
TAVEIRA TÔRRES (org.), Impuestos sobre el comercio internacional, Buenos Aires, 2003, 353;
PIERA FILIPPI, La territorialidad en el impuesto al valor agregado, in ibidem, 377; GUILHERMO
O. TEIJEIRO, Estudios sobre la aplicación espacial de la ley tributaria, cit., 113 ss.; FABIO LUIZ
GOMES, Manual sobre o IVA nas comunidades europeias: os impostos sobre o consumo no Mercosul,
Curitiba 2006.

28 Nestes impostos, são totalmente irrelevantes elementos de conexão como o lugar da assi-
namra dos contratos, o lugar onde o pagamento é efemado, a namreza da moeda utilizada
para o pagamento, a nacionalidade ou domicílio das partes. Cfr. GOUTHIioRE, Les impóts,
358; GAETANO AADIZZONE, In tema di principio di paritá di trattamento tributario rispetto a
prodotti provenienti da Stati aderenti al Gatt, Rivista di Diritto Finanziario e Scienza delle Fi-
nanze 1973-4; 1975-lI; SACCHETTO, Non-discrimination rules in international taxation, CDFI
LXXVIII-b (1993),489 (506).
Título IV I Capo I I Os Elementos de Conexão em Geral -p,'
nal. Discriminando-se na tributação indireta interna contra a mercadoria estrangeira
e beneficiando-se a exportação nacional, criam-se fatores que influenciam as trocas
comerciais, diversos dos custos comparados, das vantagens relativas ou das dotações
de fatores produtivos, que estão na base de um puro sistema de livre câmbio.
Por isso - e tal como sucedera com os impostos aduaneiros - os acordos inter-
nacionais relativos à liberalização do comércio têm procurado naturalmente evitar
as distorções que os sistemas tributários internos possam provocar nos circuitos "es-
pontâneos" das mercadorias.
O Acordo Geral sobre as Tarifas e o Comércio (GATT) (Lei nO 313, de 30 de
julho de 1948, e Decreto Legislativo nO 43, de 20 de junho de 1950) proíbe qual-
quer forma de subsídio ou subvenção às exportações que tenham como resultado
situar o preço de venda à exportação do produto, abaixo do preço comparável pedido
aos compradores do mercado interno para produto similar (art. XVI, § 4°); e entre
tais formas foi entendido que se incluía a restituição, no que respeita à exportação,
de somas superiores às efetivamente cobradas num ou em vários estádios, sobre esses
produtos, sob a forma de impostos indiretos ou de imposições na importaçã029 .
A Organização Mundial do Comércio (OMC), que veio substituir o GATI, dis-
tingue três tipos de subvenções: as que são proibidas, que integram a red box, aquelas
que, em princípio, são permitidas, ou seja, as que integram agreen box, e aquelas que
são suscetíveis de contestação, mas que eventualmente poderão ser permitidas e que
integram ayelluw box. As subvenções que são absolutamente proibidas são as subven-
ções às exportações e às medidas que privilegiem os produtos internos em relação
aos produtos provindos de concorrência externa. Ultimamente têm sido proferidas
diversas decisões que interferem com a área fiscal, notadamente decisões relativas a
subvenções às exportações, a direitos de importação, a taxas ou impostos sobre bebi-
das, a impostos sobre a produção de fIlmes estrangeiros num determinado país etc30 •
Importa distinguir os casos em que, em matéria de tributação indireta das tran-
sações internacionais, os Estados praticam o chamado "método do reembolso" da-
queles em que adotam o "sistema da isenção", cumprindo salientar desde já que a
opção por um ou outro destes sistemas depende do tipo de imposto sobre o valor das
transações vigente em cada país.
Com efeito, nos países onde exista um imposto sobre o valor das transações
de tipo polifásico, quer se trate de um imposto cumulativo ou em cascata, quer se
trate de um imposto sobre o valor acrescentado, a mercadoria em causa, antes de ser

29 ANTONIO UCKMAR, Aspetti fiscali nelle regole della organizzazione mondiale dei commercio
(OMC;wTO), in VICTOR UCKMAR (org.), Corso di Diritto Tributario Internazionale, Pádua
1999,843; WASHINGTON JUAREZ DE BRITO FILHO, O Gatt como norma de Direito Interna-
cional Tributário, in HELENO TAVEIRA TÔRRES (org.), Direito Tributário Internacional Apli-
cado, vaI. Iv, São Paulo 2007, 63l.
30 Sobre as limitações em sede de tributação direta decorrentes da OMC, cfr. RICARDO DA
PALMA BORGES/PEDRO INFANTE MOTA, National Report Portugal, in MICHAEL LANG (org.),
WTO and Direct Taxation, Linde, 2005, 563 a 610.
_1.1._ Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

exportada, já foi normalmente objeto de uma ou mais imposições, correspondentes


ao vários estádios do seu circuito produtivo e comercial, anteriores à exportação. E
porque assim é o país de origem deverá restituir na exportação os impostos previa-
mente percebidos sobre o produto.
Nos países que adotam uma tributação da despesa de tipo monofásico, inci-
dindo o imposto apenas num momento ou fase do circuito produtivo e mercantil,
o sistema geralmente adotado é o da isenção. Porque a exportação é realizada, via
de regra, pelo fabricante ou pelo atacadista, não se verifica qualquer fase anterior do
circuito sobre a qual tenha incidido o imposto (salvo a hipótese de o imposto recair
sobre o fabricante e a exportação ser efetuada pelo atacadista). Se o imposto recai so-
bre o varejista, nem sequer se pode falar em isenção, pois sendo a exportação anterior
àquele momento situa-se fora do âmbito da incidência do imposto; se recai sobre o
produtor ou atacadista, então a lei isenta expressa e formalmente as transações por
este realizadas que se traduzam em exportações.
Em vésperas da entrada em vigor do mercado interno em 1993, voltou a ganhar
força o princípio da origem (Ursprungsland-Prinzip) segundo o qual a competência para
a tributação das transações internacionais caberia ao país de origem, o que conduz a
tributar as exportações, tratadas como qualquer transação interna, e a exonerar as im-
portações, evitando-se assim a existência de controles que pressupõem a manutenção
de "fronteiras fiscais" entre os países (border tax adjustments) Ausgleich der Steuerbelas-
tung an den Grenzen) , pois não se torna necessária qualquer restituição nas exportações
nem imposição de compensações nas importações. Eliminando-se estes controles, os
sistemas fiscais dos países em causa seriam entre si comunicantes e contínuos, como
se de um mercado único se tratasse. É este o regime que se pensa adotar de futuro na
Comunidade Europeia, onde vigoraria nas relações internas dentro do espaço integra-
do, ou seja, entre os Estados-membros, aplicando-se, porém, o princípio do destino
nas relações desse espaço com o resto do mundo (princípio de origem restrito) .
Quando os impostos em causa incidam sobre serviços, a concretização do prin-
cípio da territorialidade envolve a adoção de sofisticados elementos de conexão que
permitam a localização dos serviços prestados por residentes de um país a residentes
de outro país 3 1, como adiante se verá.
Em face da diversidade de problemas relacionados com a passagem ao princípio
da origem, a Comissão passou a traçar em 1996 as linhas gerais de mll novo sistema
comum do IVA. Para esse efeito, propôs a definição de um lugar único de tributação
para todas as operações praticadas pelos sujeitos passivos 32 • Em junho de 2000, a

31 Cfr., sobre este ponto, a 6a Diretiva da CEE sobre o IVA, bem como F. KAISER, La taxe sur
la valeur ajoutée et les prestations de services internationaux, Deventer 1983; H. G. RUPPE, In-
ternationale Probleme, cit.) 79.
32 Sobre esta matéria vide TERESA LEMOS, Linhasgerais do novo sistema comum do IVA, CTF, 382
(1996); ANTÓNIO CARLOS DOS SANTOS/MÁRIO ALBERTO ALEXANDRE, O IVA comunitário na
encruzilhada: Rumo a um novo sistema comum?, CTF, 397 (2000).
Título IV I Capo I I Os Elementos de Conexão em Geral

Comissão apresentou uma comunicação em que expôs o seu programa estratégico


para melhorar o funcionamento do sistema do NA no mercado interno.
De acordo com esta nova estratégia, prevê-se um programa de ação com quatro
objetivos essenciais, tendo em vista uma abordagem pragmática deste imposto: a
simplificação e a modernização das regras existentes, uma aplicação mais uniforme e
uma nova prática de cooperação administrativa.
Esta estratégia parte da constatação de que, a curto prazo, atentas as reservas
dos Estados-membros, seria pouco provável alcançar progressos significativos relati-
vamente à adoção de um sistema comum do NA assente na tributação na origem.
Na sua Comunicação de 2003, a Comissão vem salientar que a ideia de um local
único de tributação é o objetivo fmal, falando, a propósito, do regime do NA baseado
no princípio da origem. Neste contexto, temos assistido ultimamente à enfatização de
duas ideias-chave: o alargamento de um sistema de balcão único (one stop shop) a diversas
situações para além do caso do comércio eletrônico 3\ e a alteração das regras de localiza-
ção das prestações de serviços para o local onde se encontra o adquirente dos mesmos,
com um aumento das situações de reversão da dívida tributária (rererse charge) 34.
Poderá parecer paradoxal que, relativamente à localização das prestações de serviços
(o único domínio em que se aplica como regra geral, desde a aprovação da 6 a Diretiva
da CE, de 17 de maio de 1977, o princípio da origem), a Comissão tenha vindo propor
uma passagem sucessiva ao princípio do destino. Contudo, não está em causa um aban-
dono do princípio da origem, mas sim assegurar em simultâneo a existência de um local
único de tributação no interior da União e uma simplificação do sistema comum.

B) Impostos sobre produtos industrializados e sobre circulação de mercadorias


No Brasil (em obediência, aliás, ao art. XVI do Acordo Geral sobre Tarifas e
Comércio - GATT), acolheu-se o princípio do destino, de tal modo que os dois im-
postos sobre o valor acrescentado - o imposto sobre produtos industrializados (IPI),

33 O regime especial de "balcão único" encontra-se atualmente previsto na Diretiva sobre os


serviços prestados por via eletrônica (Diretiva nO 2002j38jCE, de 7 de maio), relativamente
a operadores de países terceiros não estabelecidos na União Europeia que prestem serviços
eletrónicos a particulares aí localizados. Fundamentalmente, de acordo com este sistema, per-
mite-se ao operador a escolha de um Estado-membro de identificação, embora as suas opera-
ções sejam localizadas em diversos Estados-membros e tratadas de acordo com as respectivas
disposições fiscais. O operador cumpre as suas obrigações de registro, declarativas e de paga-
mento junto do Estado-membro de identificação, nas condições estabelecidas pelo Estado-
membro de destino, que recebe as suas receitas através de um sistema de redistribuição. Este
sistema funciona essencialmente por via eletrônica. A Comissão tem vindo a propor a sua
extensão a outros domínios, tais como os das agências de viagens e das vendas a distância.
34 Cfr. CLOTILDE CELORICO PALMA, A harmonização comunitária do Imposto sobre o Valor
Acrescentado - Quo Vadis?, Revista de Ciências Empresariais e Jurídicas do Instituto Superior
de Contabilidade e Administração do Porto (ISCAP) , nO 5 (2005) (separata).
q I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

de competência da União, e o imposto sobre operações relativas à circulação de mer-


cadorias e certos serviços de transporte e de comunicação (ICMS), de competência
dos Estados - não incidem sobre produtos industrializados destinados ao exterior,
aliás por força de imunidade constitucional (art. 153, § 3°, III, e art. 155, § 2°, X
"a")35. Simetricamente, o art. 155, § 2°, IX, "a", estabelece que o ICMS incidirá so-
bre a entrada de bem ou mercadoria importada do exterior. O mesmo se diga do IPI,
por força do art. 46, I, do CTN.
O objetivo fimdamental do princípio do país do destino - que a transação in-
ternacional seja tributada apenas uma vez no país importador, com a consequente
exoneração absoluta das imposições já sofridas no país de origem, correspondentes
aos estágios anteriores à exportação - foi entre nós atingido, em matéria de ICMS,
pela combinação dos dois métodos consagrados no Direito Comparado: o método
da isenção, que se tornou necessário formular expressamente, pois a exportação se
traduz, em princípio, numa saída de mercadorias de um estabelecimento, saída essa
genericamente abrangida na hipótese de incidência do ICMS; e o método do reem-
bolso, que entre nós assumiu a forma de manutenção dos créditos correspondentes a
imposições anteriores já sofridas pela mercadoria exportada, impostos esses que são
"reembolsados" (usamos a palavra em sentido econômico) pela outorga do direito à
sua utilização, pelo contribuinte, mediante compensação com operações tributáveis,
ressarcimento em espécie ou forma similar.
Importa deixar bem claro que a simples exoneração das exportações na saída do
estabelecimento do exportador (conquanto necessária para evitar mais uma incidência
do ICMS) não atingiria por si só o objetivo nuclear do princípio do país do destino,
pois não assegura a total exoneração das imposições incidentes nas fases anteriores à ex-
portação. Para que esta exoneração total do ciclo econômico opere no país de origem,
torna-se tecnicamente indispensável a manutenção dos créditos referentes a operações
anteriores. É o que determina, quanto ao ICMS, o art. 20, § 3°, da Lei Complementar
nO 87/96, ao abrigo do art. 155, § 2°, inciso XII, alínea1) da Constituição de 1988.
Note-se que as regras em causa nada têm a ver com o princípio da não cumu-
latividade, que seria compatível com o estorno dos créditos referentes a operações
anteriores à exportação não tributadas; antes são corolário lógico de outro princípio
distinto e autônomo - o princípio da tributação exclusiva pelo país do destino, o qual, ao
invés, exige a manutenção de tais créditos como forma de assegurar a total exoneração
de imposições fiscais no país de origem 36 •

35 A Lei Complementar nO 87, de 13 de setembro de 1996, veio determinar que a não incidên-
cia do ICMS abrange "produtos primários e produtos industrializados semielaborados ou
serviços". (art. 30, lI).
36 Bem observou FRANCISCO CALDERARO que "o ressarcimento ou manutenção do crédito na ex-
portação nada tem a ver com a 'não cumulatividade', sendo apenas mais uma expressão do
'princípio da tributação apenas no país do destino', ativamente utilizado como suporte de toda
política brasileira de exportação. Com efeito, só cabe falar em direito a crédito para não tornar o
imposto cumulativo, quando a saída do produto seja tributada, o que não ocorre na exportação,
Título IV I Capo I I Os Elementos de Conexão em Geral I mil

C) Impostos sobre serviços


Também no que concerne às transações internacionais de serviços colocam-se
delicados problemas de conexão territorial. A 6 a Diretiva da Comissão da Comuni-
dade Europeia37 prevê um complexo sistema de conexões para localizar num dado
território os serviços que devem considerar-se tributáveis por cada Estado-membro,
como o lugar do domicílio ou sede do prestador de serviços, o lugar de execução ou
utilização do serviço e o lugar do domicílio do beneficiário. Em princípio, o IVA não
incide num Estado-membro se, embora o prestador de serviços esteja nele domici-
liado ou estabelecido, o beneficiário está estabelecido fora da CE, ou o beneficiário
está estabelecido na CE e aí sujeito a imposto. O imposto também não incide num
Estado-membro se o prestador de serviços não está nele estabelecido e o beneficiário,
embora estabelecido nesse Estado, utiliza o serviço fora dele, ou se o beneficiário
também não está nele estabelecidd8 .

a) ISS

A sistemática de tributação pelo ISS das prestações internacionais de serviços


foi radicalmente inovada pela Lei Complementar nO 116/03, a qual deu execução à
regra introduzida no art. 156, § 30, II, da Constituição, pela Emenda Constitucional
nO 3, de 18 de março de 1993.
Referido preceito constitucional passou a dispor que:
"§ 30 Em relação ao imposto previsto no inciso III do caput deste artigo, cabe
à lei complementar:
"( ... )
"II - excluir da sua incidência exportações de serviços para o exterior."

onde o problema não é de cwnulação mas sim ressarcimento através da manutenção do crédi-
to". Cfr. ICM - imunidade na exportação de produtos industrializados, RDT 9/10 (1979), 155
(169); cfr., no mesmo sentido, FABIO FANUCCHI, Curso de Direito Tributário Brasileiro (3 a ed. ), ll,
São Paulo 1975, 138 a 167; RUY BARBOSA NOGUEIRA!PAULO ROBERTO NOGUEIRA, Direito Tribu-
tárioAplicado e Comparado, Rio de Janeiro 1977, 260; ALCIDES JORGE O:lSTA,ICM -Estrutura
na Constituiçífu e na lei complementar, São Paulo 1977, 119; A. R. SAMPAIO DÓRIA, Imunidades
tributárias e impostos de incidência plurifásica, não cwnulativa, RDT 5 (1978),67.

37 A Diretiva n° 2006/112/CE, do Conselho, de 28 de novembro, publicada em 29.12.2006,


vem reformular, por razões de clareza e racionalidade, a 6 a Diretiva, atendendo às diversas
alterações que lhe foram introduzidas. A reformulação da 6 a Diretiva é essencialmente de
natureza formal, passando-se de 53 artigos a 414.
38 Para maiores desenvolvimentos desta matéria no âmbito da União Europeia, cfr. ALBERTO
XAVIER, Direito Tributário Internacional (2 a ed.), Coimbra 2007, 250 ss.; B. PLAGNET, Droit
Fiscal International, 266; XAVIER DE BRITO, A tributaçífu do consumo e a sua coordenaçífu inter-
nacional, 172; A. MIRAULO, Doppia imposizione, 193 ss.
Si» I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

A Lei Complementar nO 116/03 veio tratar da tributação das prestações interna-


cionais de serviços nos arts. 1° (importação) e 2°, I e parágrafo único (exportação),
nos seguintes termos:
"Art. 1° O Imposto Sobre serviços de Qualquer Natureza, de competência dos
Municípios e do Distrito Federal, tem como fato gerador a prestação de servi-
ços constantes da lista anexa, ainda que esses não se constituam como atividade
preponderante do prestador.
"§ 1° O imposto incide também sobre o serviço proveniente do exterior do País
ou cuja prestação se tenha iniciado no exterior no País.
'fut. 2° O imposto não incide sobre:
"I - as exportações de serviços para o exterior do País;
"( ... )
"Parágrafo único. Não se enquadram no disposto no inciso I os serviços desen-
volvidos no Brasil, cujo resultado aqui se verifique, ainda que o pagamento seja
feito por residente no exterior."
Assim, a Lei Complementar nO 116/03, ao dar eficácia ao comando constitucio-
nal acima citado, nada mais fez que consagrar, de forma inequívoca, embora media ta,
o princípio do destino em matéria de ISS, segundo o qual as importações de serviços
são tributadas e as exportações exoneradas de tributação 39 •
Comentando as inovações introduzidas pela Lei Complementar nO 116/03 no
domínio das prestações internacionais de serviços, MrSABEL ABREU MACHADO DERZI
afirma que:
':-\ Lei Complementar nO 116/03 altera para melhor o citado Decreto-Lei, exo-
nerando as exportações e fazendo incidir o imposto nas importações de ser-
viços. Como sabemos, em mercados não integrados, adota-se o princípio do
destino. A Lei Complementar nO 116/2003, nessa parte, foi correta. Manteve o
princípio do destino nas prestações de serviço internacionais. Ela exonera totalmente
do ISS as exportações) submetendo as importações à incidência do tributo) para isso
elegendo a competência do Município onde se localizar o estabelecimento do tomador.
Crescendo a mundialização e surgindo novas formas de prestações de serviços
(como o comércio eletrônico), é necessário estabelecer um tratamento equâni-
me, em que sejam os serviços importados sujeitados aos mesmos tributos que
incidem sobre a prestação dos serviços nacionais. Como se sabe, a incidência do
ISS nas importações de serviços não tem nenhum objetivo protecionista, mas é
fenômeno necessário de isonomia e de equidade, nos mercados não completa-
mente integrados. É que a tendência universal adotada no mercado internacional é
aquela de desoneração das exportações) de tal modo que os produtos e serviços exporta-

39 Cfr. HELENO TAVElRA TàRRES, Prestações de serviços provenientes do exterior ou cuja presta-
ção se tenha iniciado no exterior, in O ISS na Lei Complementar nO 116/2003 e na Constituição,
cit., 280 ss.
Título IV I Capo I I Os Elementos de Conexão em Geral

dos chegam ao país do destino livres de todo imposto. Seria agressivo à regra da livre
concorrência e aos interesses nacionais pôr em posição desfavorável a prestação
de serviços nacionais, que sofrem a incidência do ISS"40.
Comparando o sistema da Lei Complementar nO 116/03 com o da lei anterior
- Decreto-Lei nO 406, de 31 de dezembro de 1968 -, verifica-se que esse último
diploma não continha normas que dispusessem especificamente acerca da tributação
das prestações de serviços internacionais, pelo que seu regime tributário decorria
diretamente das regras gerais de incidência do ISS.
Estas regras - previstas no art. 12 do Decreto-Lei nO 406/68 - estabeleciam nor-
mas de definição da competência tributária, segundo as quais o ISS seria devido ao
município onde se situasse o estabelecimento prestador e, na falta deste, ao do domi-
cilio do prestador de serviços. A única exceção eram os serviços de construção civil,
em relação aos quais o ISS era recolhido ao município onde se efetuasse a obra de
engenharia.
Assim, segundo as normas da lei anterior: (i) o ISS não incidia nas importações
de serviços, uma vez que os estabelecimentos prestadores de serviços estão no exte-
rior; e (ii) o ISS incidia sobre as exportações, pois abrangia os serviços realizados por
prestadores domiciliados no Brasil, ainda que os beneficiários residam no exterior4 1 •
Postas estas considerações preliminares, importa examinar os elementos adota-
dos pela Lei Complementar nO 116/03 para a definição de "exportação", não sujeita
à incidência do imposto.
É da essência do conceito de exportação tratar-se de um negócio jurídico relati-
vo a bens ou serviços celebrado entre pessoas domiciliadas ou residentes em territó-
rios sujeitos a um ordenamento jurídico-fiscal distinto.
Muito embora não tenha definido pela via positiva o conceito de exportação de
serviços, a lei complementar limitou-se nesta matéria a uma proposição negativa, con-
sistente em recusar tal natureza às operações que, tendo sido desenvolvidas no Brasil,
tenham o seu resultado produzido também no território deste país.
Configurará, em princípio, exportação toda e qualquer prestação de serviços de
que o tomador seja residente ou domiciliado no exterior, independente do local de
seu desenvolvimento ou execução.
Assim, tanto configura exportação a hipótese em que o prestador tenha executa-
do integralmente os serviços no Brasil como a hipótese em que esta tenha se limitado
no país a dar início à prestação de serviços, completando-os no exterior, como, ainda,
a de tê-los executado integralmente em território estrangeiro.

40 Cfr. MISABEL ABREU MACHADO DERZI, O aspecto especial do Imposto Municipal sobre Ser-
viços de Qualquer Narureza, 67-68, in O ISS na Lei Complementar nO 116/2003 e na Consti-
tuição, Coleção de Direito Tributário, Série Barão de Ramalho, IASp' voI. 2 (Coord. HELENO
TAVEIRA TÔRRES).
41 Para maiores desenvolvimentos, cfr. ALBERTO XAVIER, Direito Tributário Internacional do Bra-
sil (5 a ed.), Rio de Janeiro 1998, 236-237.
p I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Só não configura exportação, nos termos e para os efeitos do art. 2°, I, da Lei
Complementar nO 116/03, a prestação de serviços pactuada entre um residente e um
não residente, cuJo resultado se verifique no Brasil.
O alcance desta expressão deve ser interpretado no sentido de dar eficácia ao
comando constitucional (art. 156, lI, § 3°) que conferiu à lei complementar a atri-
buição de consagrar, em matéria de tributação pelo ISS da exportação de serviços
(à semelhança do que já sucedia em matéria de IPI e ICMS), o principio do país de
destino, segundo o qual o bem ou serviço devem submeter-se à tributação no local
onde ele é consumido e não no local onde é produzido.
Interpretada à luz deste princípio, a expressão "cujo resultado aqui se verifique"
só pode ser entendida como se referindo ao local onde se verifica o respectivo consumo ou uti-
lização do bem imaterial em que o serviço se traduz 42 •
E tal local é precisamente o local onde é satisfeita a necessidade que levou o toma-
dor do serviço a proceder à respectiva contratação.
Interpretação distinta, no sentido de considerar que resultado do serviço respeita
à "conclusão" de sua execuçã04 3, conduziria ao absurdo de só poder haver exportação
de serviços se houvesse a concomitante "exportação do exportador".
Com efeito, segundo tal interpretação, apenas serviços "concluídos" no exterior
- o que envolveria, necessariamente, a deslocação do prestador dos serviços para o
exterior - dariam lugar à aplicação da regra de não incidência de que trata o art. 2°,
I, da Lei Complementar nO 116/03.

42 Neste exato sentido, veja-se JOÃo LUIZ COELHO DA ROCHA: ''Nesse critério da LC 116,
a utilidade do serviço deve ser desfrutada no exterior do Brasil, para que sua receita seja
dispensada do ISSQN, não bastando para qualificar a exportação isenta o fato de ser pago
com valores remetidos para o Brasil." Cfr. O novo trato legal do imposto sobre serviços e
os problemas que permanecem, in Revista Dialética de Direito Tributário 99, 81. Parece-nos
chegarem à conclusão análoga, embora em termos não inteiramente coincidentes, e utili-
zando uma terminologia diferente, relacionada à produção de "efeitos", GABRIEL LACERDA
TROIANELLI e JULIANA GUEIROS, quando afirmam que, "para que haja efetiva exportação do
serviço desenvolvido no Brasil, ele não poderá aqui ter consequências ou produzir efeitos.
A contrário senso, os efeitos decorrentes dos serviços exportados devem ser produzir em
qualquer outro país que não o Brasil". Cfr. O ISS e a exportação e importação de serviços,
in ISS - Lei Complementar 116/2003, MARCELO MAGALHÃES PEIXOTO c IVEs Gfu'lDRA DA SILVA
MARTINS (org.), Curitiba 2004,201; SERGIO ANDRÉ ROCHA, O resultado do serviço como
elemento da regra de incidência do PIS/Cofins-importação e da regra exonerativa do ISS
sobre exportações, RDDT 155 (2008), 110; GERMAN SAN MARTÍN FERNÃNDEZ, O ISSQN
(Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza) incidente sobre importação de serviços e
o alcance da expressão "cujo resultado se verifique no país" e a isenção (heterônoma) na
exportação prevista na LC nO 116/2003, RDTI 6 (2007), 37. Cfr. Luís EDUARDO SCHOUERI,
ISS sobre a Importação de Serviços do Exterior, RDDT nO 100, São Paulo 2004, 47; ROQUE
ANTONIO CARRAZA, ISS - Serviços de Reparação de Turbinas de Aeronaves para Destinatá-
rios no Exterior, Não Incidência - Exegese do art. 2°, I e seu parágrafo único da Lei Com-
plementar nO 116/03, RDT nO 93, 2005, 24 ss.
43 Este foi o entendimento do STJ no REsp. nO 831.124.
Título IV I Capo I I Os Elementos de Conexão em Geral I mf)

Por outras palavras, a não incidência apenas se aplicaria às hipóteses em que ao


menos a fase conclusiva da prestação dos serviços se realizasse no exterior.
Em todas as outras circunstâncias, em que o prestador dos serviço desenvolva
e conclua suas atividades no Brasil, os serviços estariam sujeitos a impostos, o que
frustraria a diretriz constitucional de adoção do princípio do destino pela exonera-
ção da exportação de serviços, dada à inverossimilhança das situações em que a não
incidência operaria.
Semelhante interpretação deve ser, pois, rejeitada, eis que conduziria inevita-
velmente à declaração da inconstitucionalidade da restrição "cujo resultado aqui se
verifique"44, consequência essa que se evitará mediante a interpretação por nós sus-
tentada, que respeita a prevalência da interpretação confonne a Constituição".
Com efeito, na interpretação da expressão polissêmica ou plurissignificativa "re-
sultado do serviço" deve dar-se preferência à interpretação que melhor se harmonize
com o contexto constitucional em que se insere, ou seja, de harmonia com o principio
do destino em matéria de prestação internacional de serviços, para o qual aponta ine-
quivocamente o art. 156, § 3°, lI, da Constituição.
A Lei Complementar nO 116/03 passou a submeter o ISS às "importações de
serviços", dispondo no § lOdo art. lOque "o imposto incide também sobre o serviço
proveniente do exterior do País ou cuja prestação se tenha iniciado no exterior". Nes-
te caso, a responsabilidade pelo recolhimento cabe ao tomador ou ao intermediário
(art. 6°, § 2°) e o imposto é devido ao Município onde estiver localizado o respectivo
estabelecimento (art. 3°, inciso 1).45
Simetricamente ao que sucede em relação às exportações, também o conceito
de importação envolve a verificação cumulativa de a atividade ser exercida no Brasil
(ainda que iniciada no exterior) e o preço ser pago por pessoa domiciliada no Brasil.
Pode, pois, concluir-se que, tal como sucede com a circulação internacional de
mercadorias, na circulação internacional de serviços optou-se pelo principio do destino,
tributando-se as "importações" de serviços em que os beneficiários são residentes no
Brasil e exonerando-se as "exportações" promovidas por prestadores no Brasil.

b) ICMS sobre serviços de transporte e de comunicação


Isto porém não sucede no que concerne aos serviços integrados no ICMS - ser-
viços de transporte interestadual e internacional e de comunicação -, pois, quanto a
estes, o imposto incide "ainda que as prestações se iniciem no exterior" (Constituição

44 A essa consequência parecem chegar MARrA DE FÁTIMA RIBEIRO e AFONSO HENRIQUE PREWTO
CASTELANO, Tendências internacionais sobre a prestação de serviços e as inovações da Lei
Complementar 116/03, in MAGALHÃES PEIXOTO, MARCELO/MARTINS, IVES GANDRA, ISS-Lei
Complementar 116/2003, Curitiba 2004, 480, nota 3.
45 Cfr. HELENO TÔRRES, Prestações de serviços provenientes do exterior ou cuja prestação se tenha
iniciado no exterior, in O ISS na Lei Complementar nO 116/2003 e na Constituição... , 280 ss.
•.m:M Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Federal, art. 155, II). Assim, o imposto incide sobre serviços prestados no exterior
ou cuja prestação se tenha iniciado no exterior (Lei Complementar nO 87/96, art. 2°,
§ 1°, II), cabendo este ao Estado onde estiver situado o estabelecimento destinatário
do serviço (art. 155, IX, "a"). Por sua vez, excluem-se os serviços da incidência do
imposto nas exportações para o exterior (art. 155, XII, § 2°, "e", e art. 3°, II, in fine,
da Lei Complementar nO 87/96), bem como preveem-se casos de manutenção de
crédito (art. 155, XII, § 2°, "f", e art. 20, § 3°, da Lei Complementar nO 87/96). Em
suma: cobra-se imposto na importação dos serviços e exonera-se sua exportação, de
acordo com o princípio do destino.
CAPÍTULO II
Os ELEMENTOS DE CONEXÃO SUBJETIVOS

SEÇÃO I
NACIONALIDADE

§ 10 O PROBLEMA DA TRIBUTAÇÃO DOS ESTRANGEIROS

As tentativas de fundamentação do poder de tributar baseadas na ideia de na-


cionalidade!, ou seja, nwna concepção personalista da soberania (Personalhoheit) não
conseguiram impor-se na doutrina, apesar da autoridade de BALDO, na qual mais ou
menos explicitamente se fundavam 2, e do ambiente histórico particularmente propí-
cio ao seu desenvolvimento, sobretudo na Alemanha. Fora deste país (onde encon-
trou o apoio de STAHL, BLUNTSCHU, RAu e HELFERICH), apenas conseguiu recolher
os sufrágios de SANTI ROMANO e de V ANONI 3 •
A prática generalizada em todos os Estados, de tributar os estrangeiros residentes
no seu território e a abstenção, igualmente geral, de submeter ao imposto nacionais

1 Cfr. P. MICHAUD, Regime fiscal des étrangers en France et des français à l'étranger, Paris 1973; S.
DAIRAINEs, Les étrangers et les sociétés étrangêres en France, Paris 1957; MICHEL, Les étrangers
en France et l'impôt, Paris 1927; ALLIX, La condition des étrangers au point de vue fiscal, Recueil
des Cours In (1937), 545 (560); V. UCKMAR, La tassazione degli stranieri in Italia, Pádua
1955, 59; GRIZIOTTI, Ilimposition fiscale des étrangers, Recueil des Cours IV (1926), 5 (26
ss. ); REHDANS-SELLE, Die Besteuerung der Ausliinder im deutschen Reich, Berlim 1927; A.
HEINING, Besteuerung der Ausliinder, Colônia s.d.; ALBRECHT, The Taxation of Aliens - under
International Law, in British Tear Book ofInternational Law, 1952, 145 (148); COLARUSSO, Le
doppie imposizioni nei rapporti internazionali, Pádua 1930, 14.
2 Para BALDO, sendo o tributo uma expressão da soberania e respeitando esta exclusivamente
aos súditos, afastava-se liminarmente a tributação dos estrangeiros, ainda que residentes no
território estadual: "et ideo si forensis possiderit in territorio unius civitatis, sibi non posset imponi
collectas quia pro rebus persona non est subieta".
3 Cfr. VANONI, Operi Giuridiche, I, Milão 1961, 73 ss. A verdade, porém, é que foi nesta con-
cepção que se baseou a lei do imposto de renda (EinkommensteuellJesetz) prussiana de 1891,
ao declarar, logo no seu art. 1°, que contribuintes pelo imposto sobre a renda são os súditos
prussianos, e quanto aos quais a obrigação fiscal no país de origem subsistia inclusivamente
nos dois anos seguintes ao abandono de domicílio.
iIID I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier ....~

residentes no estrangeiro, não poderia deixar de estar presente no espírito dos autores.
Com efeito, ou se resignavam a admitir que a tributação dos estrangeiros constituía
uma derrogação ao princípio da nacionalidade (derrogação de amplitude suficiente
para fazer duvidar da validade do princípio), ou procuravam justificar aquela tributa-
ção noutro princípio - o "do ut des"4, a vinculação econômica, a participação na vida
estadual, a supremacia de fato - e com isto se quebrava a unidade do princípio.
Em face das concepções hoje dominantes (com a ressalva dos Estados Unidos
e das Filipinas, em matéria de impostos sobre o rendimento e dos Estados Unidos e
da Turquia, em matéria de impostos sobre as sucessões e doações), a nacionalidade
é irrelevante para efeitos de delimitação do poder tributário dos Estados, vigorando
antes conexões subjetivas ou objetivas, relacionadas com a soberania territorial do
Estado. O princípio da igualdade entre cidadãos e estrangeiros quanto aos fatos veri-
ficados no território de um dado Estado decorre, na verdade, dos princípios da igual-
dade e da capacidade contributiva, que apenas consideram como fundamento legítimo
de um desigual tratamento tributário a desigualdade de capacidade econômica, com
total abstração de outros critérios pessoais, considerados arbitrários. Devem, pois,
à luz destes princípios, consagrados pelas Constituições na generalidade dos países,
considerar-se inconstitucionais quaisquer leis que prevejam um tratamento fiscal dis-
criminatório atendendo à nacionalidade dos contribuintess.
A história e o direito comparado revelam, porém, diversos casos de discriminação
contra estrangeiros: assim, as leis de certos Estados americanos (Yowa, Washington) e
da Bulgária apenas tributavam a sucessão de estrangeiros. Também na França e na Bél-
gica se submeteram a tributos agravados os nacionais de Estados de moeda revalorizada
e que podiam adquirir mercadorias em condições mais vantajosas: o caso aqui é, porém,
mais complexo, posto a discriminação se não fundar em razões puramente pessoais.

§ 2° A NACIONALIDADE NAS CONVENÇÕES CONTRA A DUPLA TRIBUTAÇÃO

Para as Convenções contra a dupla tributação, o termo "nacionais" designa to-


das as pessoas físicas que tenham a nacionalidade de um Estado contratante, bem
como todas as pessoas jurídicas, sociedades de pessoas e associações constituídas de

4 Era assim que MANCINI harmonizava esta derrogação com o princípio da nacionalidade, na
construção que expôs na Câmara dos Deputados, ao discutir a lei que instimía o imposto
sobre a riqueza mobiliária: para os nacionais, a obrigação de imposto é uma obrigação nam-
ral, para os estrangeiros, simplesmente acidental, enquanto contrapartida de serviços que o
Estado não é obrigado a prestar sem compensação. Cfr. V ANONI, op. cit., 76. Cfr. também M.
PIRES, Da dupla tributação jurídica internacional sobre o rendimento, Lisboa 1984, 255.
5 Cfr., à luz da Constimição de 1946, A. R. SAMPAIO DÓRIA, Princípios constitucionais tributários
e a cláusula "due process oflaw JJ , São Paulo 1964, 217 ss., onde se ressalva a simação dos es-
trangeiros não residentes.
Título IV I Capo 11 I Os Elementos de Conexão Subjetivos IO

acordo com a legislação em vigor num Estado contratante (art. 24, nO 2, do Modelo
OCDE, na versão de 1963, e 1977 e art. 3°, nO 1, alínea "b", na versão de 1992; art.
10, nO 2, do Modelo OCDE-ISD).
A determinação da nacionalidade das pessoas físicas deve fazer-se à luz da lei do
Estado cuja nacionalidade se invoca.
Quanto às pessoas jurídicas, importa sublinhar que a sua nacionalidade resulta
da lei da respectiva constituição, não sendo por isso relevantes os outros critérios fre-
quentemente adotados pelas legislações internas, como o da sede social, da direção
efetiva, da origem dos capitais ou da nacionalidade das pessoas que detêm o controle
da sociedade6 •
Significa isto que, em matéria de nacionalidade das pessoas jurídicas, as Con-
venções optaram pela teoria da incorporação, predominante nos países de common law.
De harmonia com esta orientação, a nacionalidade da pessoa jurídica é dada pela law
ofincorporation; e esta não é necessariamente a lei do lugar onde se procedeu à consti-
tuição da sociedade, mas sim a lei de acordo com a qual (underwhich) a constituição
se efetuou. E isto por influência da full faith and credit clause que, nos direitos anglo-
saxônicos, impõe reconhecer a manifestação do poder publicístico de outros Estados,
entre os quais se inclui - ainda de harmonia com os mencionados direitos - o poder
de criação de entes jurídicos.

6 O direito brasileiro concede a nacionalidade brasileira às sociedades que cumulativamente


obedeçam ao duplo requisito de (i) terem-se organizado na conformidade da lei brasileira e
(ii) terem sua sede no País (Lei de Introdução ao Código Civil, art. 11; art. 60 do Decreto
nO 2.627, de 26.10.40): "São nacionais as sociedades organizadas na conformidade da lei
brasileira e que têm no país a sede de sua administração". Veja-se também o art. 1.126 do Có-
digo Civil de 2002: "É nacional a sociedade organizada de conformidade com a lei brasileira
e que tenha no País a sede de sua administração." Cfr., sobre a nacionalidade das sociedades
em geral, FABIO KONDER COMPARATO, O poder de controle na sociedade anônima, São Paulo
1976, 385 SS.; RUBENS GOMES DE SOUSA, Pareceres - Imposto de Renda, 11, São Paulo 1975,
44-45; BULHÕES PEDREIRA,Imposto sobre a rmda - pessoas jurídicas I, Rio de Janeiro 1979, 11;
ALFREDO LAMY FILHO/I. L. BULHÕES PEDREIRA,A lei das SA., Rio de Janeiro 1992,420 SS.;
PINTO FERREIRA, Capitais estrangeiros e dívida externa do Brasil (2 a ed.), Rio de Janeiro 1991,
383; LEFEBVRE D'OVIDIO, La nazionalità delle società commerciali, Milão 1939; FRANCESCO
CAPOTORTI, La nazionalità delle società, Napoli 1953; ALBERTO XAVIER, A distinção entre
sociedades nacionais e estrangeiras, in ID., Direito Tributário e Empresarial - Pareceres, Rio
de Janeiro 1982, 341; HELENO TÕRRES, A pluritributação internacionaL, 156; ID., Direito
Tributário Internacional, 393 SS.; ANTÕNIO MARQUES DOS SANTOS, Algumas reflexões sobre a
nacionalidade das sociedades em Direito Internacional Privado e em Direito Internacional Público,
Coimbra 1985; TITO BALLARlNo, La nazionalità delle società e la condizione delle società
straniere, in AAVv, Igrandi problemi della società per azioni nelle legislazione vigenti, 11, Pádua
1976, 1574; VOGEL, On Double Taxation Conventions, Deventer 1997, 1292-1293; GOUT-
HIÉRE, Les impôts dans les affaires internationales, Paris 1991, 747; GARBARINO, La tassazione
dei reddito transnazionale, Pádua 1990, 184 sS.; A. PISTONE, La normativa interna, in ID.
(org.), Dirito Tributario Internazionale, 19 (31 ss.); MÓSSNER, in MÓssNER/et aI., Steuerrecht
international tlitiger Unternehmen, Colônia 1992, 57; SCHAUMBURG, Internationales Steuer-
recht: Auflensteuerrecht, Doppelbesteuerungsrecht, Colônia 1993, 178 sS.
I Q I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Importa, pois, ter presente que, em face das Convenções - e ao invés do que no
direito interno sucede -, são realidades juridicamente distintas sociedades estrangeiras e
sociedades residentes no exterior: as primeiras são as constituídas de acordo com as leis em
vigor num país estrangeiro, seja qual for o seu domicílio; as segundas são as domici-
liadas no exterior, independentemente da respectiva "lei de incorporação". Assim, por
exemplo, uma sociedade incorporada segundo as leis holandesas, com sede estatutária
na França e com direção efetiva no Reino Unido, será considerada, para efeitos da Con-
venção, como de nacionalidade holandesa; mas a conexão holandesa já não poderia ser
invocada para os efeitos de determinar a aplicação subjetiva de um tratado em função
da residência ou domiCi1io, caso em que prevaleceria a conexão francesa ou inglesa 7•
Do conceito de sociedade estrangeira deve distinguir-se o de sociedade off-shore,
que designa as sociedades que, tendo embora a sua sede num país, exercem a sua
atividade própria exclusivamente no estrangeiro, como sucede com as foreign business
corporations do Canadá, as sociétés de domicile suíças, as overseas trade corporations in-
glesas e as foreing personal holding corporations dos Estados Unidos 8 • Com o conceito
de sociedade estrangeira, tal como deftnido nas convenções entre a dupla tributação,
não deve, também, confundir-se o conceito de sociedade de capital estrangeiro, que
designa as sociedades cujo capital social é detido majoritariamente por residentes no
exterior, nem o conceito de sociedade estrangeira de capital nacional, que se refere a
subsidiárias de sociedades brasileiras9 •

§ 30 PRINCÍPIO DA NÃO DISCRIMINAÇÃO

A) Elemento objetivo
o princípio da não discriminação ou da igualdade de tratamento tem a sua
fonte no art. 24 do Modelo OCDE, o qual foi reproduzido em todas as Convenções
assinadas pelo Brasil lO •

7 Sobre o domicílio ou residência das sociedades, cfr. infra, 225.


8 Cfr. infra, 284 ss.
9 Cfr. BÜHLER, Principios de Derecho Internacional Tributaria (trad.), Madrid 1968, 41 5S.; PUG-
LIESE, Ilimposizione delle imprese di carattere internazionale, Pádua 1930, 12. Ver também o
art. 10 do Modelo OCDE-ISD.
10 O aludido princípio (que aliás é bem anterior às modernas convenções sobre a dupla tributa-
ção, remontando aos acordos consulares e de comércio do século XIX) só recentemente tem
sido objeto de análise doutrinária aprofundada. Cfr. A. RAUPACH, Diskriminierungsverbot und
Gleichhandlungsklauseln in Doppelbesteuerungsabkommen, AuBenwirt-schaftsdienst des Betriebs-
Beraters 1966,85; OCDE, Double Taxation, comentários ao art. 24; OCDE, Application and
Interpretation ofArticle 24 (Non Discrimination) , relatório de 2007 e fonte dos novos comen-
tários na versão de 2008; K. VAN R1\AD, Non-discrimination in International Tax Law, Deventer
1986; ID., Issues in the Application ofTax Treaty Non-discrimination Clauses, BIFD 1988, 347;
Título IV I Capo 11 I Os Elementos de Conexão Subjetivos

No princípio da não discriminação, podemos distinguir um elemento objetivo-


que é o seu conteúdo - e um elemento subjetivo - respeitante ao círculo de pessoas
sujeitas ao seu âmbito de aplicação.
Traduz-se o conteúdo ou elemento objetivo do princípio da não discriminação
no fato de os "estrangeiros" (incluindo os apátridas) não ficarem sujeitos, num dado
Estado, a nenhuma tributação ou obrigação correspondente diferente ou mais onerosa
do que aquelas a que estiverem ou puderem estar sujeitos os nacionais desse Estado
que se encontrem na mesma situação. A identidade da situação - de direito e de fato -
é, assim, o pressuposto necessário da aplicação do princípio, devendo, em cada caso,
ser examinado com a maior cautela l l .
O princípio da não discriminação é corolário do princípio geral da igualdade no
que tange ao critério da nacionalidade!2. Da mesma forma que este consiste na obri-
gação de tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, assim também o
princípio da não discriminação proclama a irrelevância da nacionalidade para fundar
um tratamento desigual entre sujeitos que se apresentem objetivamente em situa-
ção idêntica, ficando vedada qualquer discriminação tributária, quer esta se traduza
numa tributação "mais onerosa", quer numa mera tributação "diferente".
Por outro lado, a discriminação proibida é apenas a que se funda na nacionalidade,
mas não assim a que se baseia na residência, considerada ctitério legítimo de tratamento
fiscal diferenciado. Isto mesmo resulta de a nova versão do art. 24, dada em 1992, ter
acrescentado à expressão anterior "nas mesmas circunstâncias" a frase "em particular no
que respeita à residência"13. Assim, por exemplo, não violou o princípio da não discri-
minação um imposto alemão sobre o capital (Kapitalverkehrsteuer, abolido desde 1990)

JAMES G. O'BRIEN, The Non-discriminationArticle in Tax Treaties, Law and Policy in Internatio-
nal Business 1978, 545; ADONINO, Non-discrimination Bules in Intemational Taxation (relatório
geral), CDFI LXXVIII-b (1993), 19; CLAUDIO SACCHETTO, Non-discrimination Bules in Inter-
national Taxation, CDFI LXXVIII-b (1993),489; FABRlZIO AMATUCCI, La discriminazione di
tratramento nel modello OCSE (art. 24), in VICTOR UCKMAR (org.), Corso di Diritto Tributario
Intemazionale, Pádua 1999,403; KLUGE, Das deutsche Intemationale Steuerrecht (3 a ed.), Mu-
nique 1992, 284; SCHAUMBURG, Intemationales Steuerrecht, Colônia 1993, 36 ss.; JESÚS SANTA-
BÁRBARA RUPÉREZ, La no discriminacion fiscal, Madrid 2001; ALESSANDRA OKUMA, Princípio da
não discriminação e a tributação das rendas de não residentes no Brasil, in HELENO TÓRREs
(org.), Direito Tributário IntemacionalAplicado, São Paulo 2003, 255.

11 Veja-se, por exemplo, a bem fundada decisão do New Zealand Court oiAppeal, no caso CIK
vs. UnitedDominions Trust, interpretando a expressão "in the same circunstances", apud BAKER,
Double Taxation Agreements and Intemational Tax Law, Londres 1994, 388.
12 Cfr. A. R. SAMPAIO DÓRIA, Princípios constitucionais tributários e a cláusula «due process oi
law", 133.
13 Cfr. OCDE, Comentários, art. 24, parágrafos 3, 9,17 e os exemplos constantes dos parágra-
fos 20 e ss (2008). Todavia, os Estados Unidos reservam-se o direito de tratar diferenciada-
mente os cidadãos não residentes dos demais não residentes, já que tributam os primeiros
segundo o princípio da universalidade (cfr. op. cit., parágrafo 62). Veja-se, quanto a este
ponto, a posição reticente do Brasil: OCDE, NMC Positions, 1 e 3.
I ÃD9 I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

incidente sobre sucursais de empresas não residentes, mas não sobre sucursais de empre-
sas alemãs l4 . Mas já violou o referido princípio a lei francesa que isentava de imposto o
ganho de capital na alienação de imóvel residencial por cidadãos franceses, residentes ou
não residentes, não reconhecendo, porém, a isenção para estrangeiros não residentes 15 .
Também entendemos que não violava o princípio da não discriminação l6 a apli-
cação de alíquota de 15%, anteriormente vigente, a dividendos pagos a não residen-
tes, nacionais de Estados que celebraram convenções contra a dupla tributação com
o Brasil, pois, apesar de este imposto não atingir os residentes no Brasil, a discrimi-
nação não se baseia na nacionalidade do contribuinte, mas apenas na sua residência.
Ora, a verdade é que um residente e um não residente - seja qual for a sua naciona-
lidade - não se encontram na "mesma situação"l?
A razão de ser da formulação do princípio por uma via negativa (não discrimi-
nação), em vez de por uma via positiva (igualdade de tratamento), reside apenas em
não fechar as portas a que um determinado Estado, por razões de diversa índole, polí-
ticas, econômicas ou sociais, designadamente de atração de investimento estrangeiro,
outorgue um tratamento mais favorável a pessoas de nacionalidade estrangeira l8 .

B) Elemento subjetivo
No que concerne ao elemento subjetivo, importa salientar que o mencionado
princípio tanto se aplica a pessoas ftsicas como a pessoas jurídicas l9 • Quanto a estas
últimas, o art. 24 tanto se aplica às pessoas jurídicas constituídas em conformidade

14 Cfr. VOGEL, Double Taxation, 1316; ID., Supl. 94, 138-139.


15 Cfr. BAKER, Double Taxation, 389, citando decisão do Tribunal Administrativo de Nice; Vo-
GEL, Double Taxation, 1290-1291; GOUTHIERE, Les impôts, 761 ss., observa a tendência dos
tribunais no sentido de condenar "discriminações insidiosas" que, aparentemente baseadas
num critério de residência, funcionam de fato em detrimento de estrangeiros.
16 Ao contrário de que sustenta LUIZ MÉLEGA, As convenções para evitar a dupla tributação em
matéria de imposto sobre a renda e a Lei nO 8.383/91, Repertório 1GB de Jurisprudência 12
(1992),234.
17 O Superior Tribunal de Justiça, no REsp. nO 426.945-PR julgou (criticavelmente) que o
princípio da não discriminação consagrado em tratado contra a dupla tributação (no caso,
Suécia) vedava a incidência do imposto de renda na fonte sobre o lucro líquido previsto
no art. 35 da Lei nO 7.713, de 1988, cujos contribuintes fossem residentes no exterior do
qual estavam isentos os residentes no Brasil. O art. 73-D do Tratado da União Europeia
(Tratado de Maastricht) estabelece que a proibição de todas as restrições aos movimentos de
capitais entre os Estados-membros e entre Estados-membros e países terceiros não prejudica
o direito desses Estados de aplicarem as disposições pertinentes de seu Direito Fiscal que
estabeleçam uma distinção entre contribuintes que não se encontrem na mesma situação, no
que se refere ao lugar de residência ou ao lugar em que o capital é investido.
18 Cfr. GOUTHIERE, Les impôts, 749.
19 Importa ter presente que os Estados do Golfo Pérsico (Arábia Saudita, Kuwait, Emirados
Árabes Unidos) têm oposto ressalvas à aceitação do princípio da não discriminação em rela-
ção à pessoas físicas estrangeiras. Cfr. GOUTHIERE, Les impôts, 745.
Título IV I Capo 11 I Os Elementos de Conexão Subjetivos I_ I

com a legislação de um terceiro país como ao estabelecimento permanente de uma


empresa domiciliada no exterior, assim como às empresas cujo capital pertença ou for
controlado, total ou parcialmente, direta ou indiretamente, por uma ou várias pessoas
residentes no exterior. Por outras palavras: tanto se aplica (i) às sociedades estrangeiras
(art. 24, § 2°, alínea "b"), (ii) às filiais de sociedades domiciliadas no exterior (art. 24,
§ 4°), como (iii) às subsidiárias de sociedades domiciliadas no exterior (art. 24, § 4°).
Assim, na medida em que vigora o aludido princípio, o Estado não poderá in-
troduzir discriminações entre o tratamento fiscal das sociedades estritamente nacio-
nais e o tratamento fiscal das sociedades estrangeiras, suas filiais e subsidiárias.
Note-se ainda que o princípio da não discriminação tem como critério a na-
cionalidade, como conexão autônoma, independente da residência, de tal sorte que
(ao contrário do que sucede com as demais disposições dos tratados) ele pode ser
invocado por quem possuir a nacionalidade de um dos Estados contratantes, ainda
que nele não seja residente2°.
Por força do princípio da não discriminação, os estabelecimentos permanentes e as
sociedades cujo capital pertencer ou for controlado, total ou parcialmente, direta ou in-
diretamente, por um ou mais residentes no exterior - ou seja, na terminologia do direito
interno, as filiais e as subsidiárias de sociedades estrangeiras - não ficarão sujeitas num
Estado a nenhuma tributação ou obrigação correspondente diversa ou mais onerosa do
que aquelas a que estiverem ou puderem estar sujeitas as outras empresas desse mesmo
Estado. É a Tfrbot der Betriebstdttendiskrimisnierung de que fala a doutrina alemã21 .
Verifica-se, assim, não só uma equiparação dos estabelecimentos permanentes
a empresas independentes - ideia aliás já contida, como princípio geral, no art. 7°, §
2°, do Modelo OCDE -, mas também uma equiparação dos referidos estabelecimen-
tos e sociedades pertencentes ou controladas por residentes no exterior a estabeleci-
mentos e sociedades pertencentes ou controladas por residentes no país.
Qual, porém, o alcance dessa equiparação? Ela respeita, sem dúvida, à generali-
dade das regras atinentes à definição e determinação do lucro tributável da empresa,
como as referentes à dedução de despesas operacionais, de amortizações e provisões,
de reporte de prejuízos, bem como à alíquota do imposto. Em nossa opinião, ela
abrange ainda o direito aos incentivos fiscais previstos no direito interno de um dado
país e que visem a estimular setores ou regiões objetivamente considerados.
Todavia, têm-se suscitado sérias dúvidas quanto à compatibilidade de certos regi-
mes jurídicos de direito interno relativos às filiais, com o princípio da não discrimina-
ção, assim como quanto à obrigação de estender às filiais (estabelecimentos permanen-
tes) certos regimes próprios das sociedades, em homenagem àquele mesmo princípio.

20 Note-se que, também diferentemente do que sucede com as demais disposições dos tratados,
o princípio da não discriminação abrange tributos de qualquer espécie e natureza e não apenas
os abrangidos pelo tratado (Modelo, art. 24, § 6°): cfr. VOGEL, Double Taxation, 1.335 SS.;
GOIJTl-IlÍRE, Les impóts, 747 e 751.
21 efr. SCHAUMBURG, Internationales Steuerrecht, 39.
I Q I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

A questão da compatibilidade tem-se colocado relativamente a três questões


distintas: (i) à indedutibilidade de determinadas despesas, designadamente royalties e
technical fies, pagos à matriz no exterior22 ; (ii) à tributação, por retenção na fonte a
título de lucro automaticamente distribuído à matriz, dos lucros realizados pela filial,
ainda que não remetidos para o exterior23 ; (iii) aos regimes de subcapitalização24 •
O problema da existência ou não de uma obrigação de estender aos estabelecimen-
tos permanentes certos preceitos referentes a sociedades tem-se colocado sobretudo
quanto às regras que, no plano do direito interno, visam a atenuar a dupla imposição
econômica dos dividendos quando distribuídos entre sociedades (regra ne bis in idem,
Schaehtel-Privileg). Poderão aplicar-se às relações matriz-filial as mesmas regras que
disciplinam as relações entre sociedades juridicamente distintas, ainda que coligadas?
Trata-se de um tema quanto ao qual ainda não se conseguiu um acordo. Uns
invocam que essa aplicação é decorrência necessária do princípio geral da assimilação
a empresa independente. Outros, porém, alegam que essa assimilação tem como
limites a unidade da pessoa jurídica e ainda que essa equiparação acabaria por privile-
giar indevidamente as sociedades que detivessem participações em estabelecimentos
permanentes localizados no exterior, relativamente às que detivessem participações
em sociedades, ao menos nos casos em que a distribuição dos lucros da filial à matriz
não sofresse retenção de imposto na fonte, ao invés do que sucede com a distribuição
dos lucros de uma sociedade para outra que participa no seu capital.
Como, porém, a solução deste problema não pode ser dada em tese geral, antes
depende das particularidades de ambos os direitos positivos em contato, compete às
convenções bilaterais a declaração de uma eventual incompatibilidade com o princí-
pio da não discriminação, bem como a descoberta dos meios técnicos adequados a
superar este conflito2S .

22 O § 50 do art. r do Modelo OCDE - introduzido na versão de 1977 e renumerado como


§ 4° na versão de 1992 - dispõe que os juros, royalties e outros desembolsos pagos por uma
empresa de um Estado contratante a um residente do outro Estado contratante devem, para
efeito de determinação do lucro tributável, ser dedutíveis nas mesmas condições em que o
seriam se tivessem sido pagos a um residente do primeiro Estado. Cfr. o art. 24, § 30, das
Convenções com Portugal, África do Sul, Bélgica (tu.), Israel, México e Ucrânia. Veja-se a
posição do Brasil in OCDE, art. 24, NMC Positions, parágrafo 6. Cfr. GournlioRE, Les impôts,
759. Sobre o regime brasileiro de indedutibilidade de royalties (revogado pela Lei nO 8.383,
de 31.12.91), cfr. a 1a edição deste livro, São Paulo 1977, 290 ss.
23 Cfr. BAKER, Double Taxation, 396. Sobre a férbot der Betriebstiittendiskriminierung, ver KLUGE,
Das deutsche Intemationale Steuerrecht, 285. Ver a declaração de não incompatibilidade nos
Protocolos às Convenções com a África do Sul (item 6), Israel (item 2), México (item 9) e
Ucrânia (item 3).
24 Declarados não incompatíveis nas Convenções com a África do Sul (Protocolo, item 6),
Chile, Israel (Protocolo, item 3), Peru e Portugal.
25 Cfr. OCDE, Comentários, art. 24, parágrafos 33 e ss. Sobre este tema veja-se o excelente
estudo da jurisprudência do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias de ANA PAULA
DOURADO, Do caso 'Saint-Gobain' ao caso 'Metallgeselschaft: o âmbito do princípio da não
discriminação do estabelecimento estável no tratado da Comunidade Europeia e a cláusula
Título IV I Capo 11 I Os Elementos de Conexão Subjetivos ID I

Refira-se, enfim, o caso especial em que o estabelecimento permanente é detido


por pessoa física residente no exterior. Precisamente para evitar uma situação privile-
giada, decorrente do cúmulo de deduções, derivado em parte da aplicação do prin-
cípio da não discriminação no país do estabelecimento e da aplicação das deduções
pessoais no país de residência do seu titular, as Convenções - na esteira do Modelo
OCDE - declaram que o mencionado princípio não pode ser interpretado no sentido
de obrigar um Estado contratante a conceder aos residentes do outro Estado con-
tratante as deduções pessoais, os abatimentos e reduções de impostos em função do
estado civil ou encargos familiares concedidos aos seus próprios residentes.
Uma rigorosa neutralidade dos estabelecimentos permanentes exije ainda: (i)
que em relação aos dividendos, juros e royalties recebidos por estabelecimentos per-
manentes localizados num certo país seja assegurado o tratamento de lucros de em-
presas (previsto no art. 7° do Modelo OCDE), não incidindo o imposto de renda na
fonte sobre não residentes; (ii) que em relação aos rendimentos de origem estrangei-
ra obtidos pelos estabelecimentos permanentes seja assegurado um tax credit similar
ao concedido a entidades residentes 26 ; e (iii) que sejam assegurados aos estabeleci-
mentos permanentes os benefícios das convenções celebradas com terceiros países,
notadamente o aproveitamento do tax credit relativo a juros, dividendos e royalties de
origem estrangeira que lhes sejam pagos 27 .

§ 4° A NACIONALIDADE NO SISTEMA NORTE-AMERICANO

o princípio da nacionalidade desempenha ainda nos nossos dias uma importan-


te função secundária no sistema jurídico-tributário norte-americano: neste sistema, a
extensão da obrigação tributária aos rendimentos provenientes de todos os países do
mundo (e a consequente aplicação do tax credit) verifica-se apenas quanto aos citizens
ofthe U.SA., de tal modo que os alien apenas estão sujeitos a este regime se forem
considerados residents in the U.SA.

da nação mais favorecida, RDT 86 (2003), 7 SS.; AUGUSTO FANTOZZI, li principio comuni-
tario di nondicriminazione nell'imposizione sul reddito, RDT 86 (2003), 27 sS.

26 O Tribunal de Justiça da Comunidade Europeia decidiu que, não concedendo às sucursais e


agências estabelecidas na França de sociedades de seguros residentes noutros Estados-membros,
nas mesmas condições que às sociedades de seguros residentes na França, o regime de crédito
fiscal (avoir fiscal) relativamente aos dividendos de sociedades francesas recebidos por essas
sucursais e agências, a França violava o princípio da não discriminação. Cfr. M. H. DE FREITAS
PEREIRA, Fiscalidade das empresas e harmonização fiscal comunitária. Balanço e perspectivas,
inA InternacionalizaçiúJ da Economia e a Fiscalidade - XXX Aniversário do Centro de Estudos
Fiscais, Lisboa 1993, 51 (58); ÜTMAR THóMMEs, Influence of EEC-law, in lRENE BURGERS/
R1JKELE BETTEN (org.), The Taxation ofPermanent Establishments, Amsterdam 1993, 13 sS.
27 Cfr. OCDE, Comentários, art. 24, parágrafos 67 e ss.
I 6 I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

De harmonia com a nova regulamentação introduzida pelo Tax Refonn Act de


1984, um estrangeiro (alien) é considerado um resident alien se foi legalmente ad-
mitido nos Estado Unidos como residente permanente (green card test) ou se esteve
presente nos Estados Unidos pelo menos 183 dias durante um período de três anos
(substantial presence test).
Enquanto os citizens e os alien residents estão sujeitos ao princípio do world-wide-
income, os non-resident aliens só são tributados em razão da renda efetivamente cone-
xa com um comércio ou negócio nos Estados Unidos, bem como pelo rendimento
fIxo e determinado, derivado de fontes situadas nos Estados Unidos 28 •

SEÇÃO II
RESIDÊNCIA E DOMICÍLIO

§ 10 RESIDÊNCIA E DOMICÍLIO. NOÇÕES OBJETIVA E SUBJETIVA

Os conceitos de residência ou domicílio ocupam posição fulcral no Direito Tri-


butário Internacional, porventura só comparável à da nacionalidade em matéria de
conflitos de leis privadas.
Importa desde logo salientar que as noções de domicílio ou residência de que
agora nos vamos ocupar gozam de autonomia relativamente a idênticos conceitos
utilizados noutros ramos do Direito, como o direito civil, administrativo, do traba-
lho ou internacional privado, cada um dos quais os modelam tendo em vista os seus
interesses e objetivos próprios 29 .
Mais: a noção de residência ou domicílio para efeitos de delimitação da esfera
de incidência das normas tributárias de cada Estado é igualmente distinta da noção
de domicílio tributário de direito interno, a que se refere o art. 127 do Código Tribu-
tário Nacional - e que é um domicílio especial pelo qual a lei refere a um lugar bem
determinado o exercício de direitos e o cumprimento dos deveres estabelecidos pelas
normas tributárias, localizando o sujeito passivo com vista a fIxar a circunscrição ter-
ritorial em cuja área se situem os serviços de administração fazendária competentes
para a prática de atos relativos à situação fIscal do contribuinte30 •

28 Cfr. J. D. KUNTzjR. J. PERONI, U.S. International Taxation, vol. I, BostonjNova York 1992,
AI-21 e BI-02; RALPH WINGER, US Income Taxation ofNon-resident Alien Individuais: A
Search for Principies, in Essays on International Taxation, 15, DeventerjBoston 1993,423;
RICHARD L. WINSTON, Doing business in the United States, Miami 2009,151 ss. A tributação
em função da nacionalidade é também adotada pelas Filipinas.
29 Cfr. art. 7° da Lei de Introdução ao Código Civil e art. 70 do Código Civil de 2002, segundo o
qual "o domicílio da pessoa natural é o lugar onde ela estabelece a sua residência com ânimo de-
fmitivo". Cfr. IRINEU STRENGER, Teoria Geral do Direito Internacional Privado, São Paulo 1973,
276 ss.; ALIOMAR BALEEIRo,Direito Tributário Brasileiro (6 a ed.), Rio de Janeiro 1976, 42l.
30 Cfr. GAZZERRO, Il domicilio e le notificazioni fiscali, Milão 1971.
Título IV I Capo 11 I Os Elementos de Conexão Subjetivos te,
Certos ordenamentos tributários distinguem os conceitos de domicílio e de re-
sidência, imprimindo-lhes regimes jurídicos distintos. Muito embora um exame do
direito comparado revele existirem tantas definições quantas as legislações em pre-
sença, a todas elas é comum a ideia de que o domicílio é um elemento de conexão
mais forte que a residência, dando origem a obrigações tributárias mais extensas,
distinguindo-se desta por exigir uma presença duradoura num dado território, acom-
panhada da efetiva intenção de aí permanecer (animus manendi) 31.
Assim, por exemplo, o direito inglês - que atribui um relevo todo especial à
noção de domicile of origin, dificultando o acesso ao domicile of choice - distingue os
seus residentes domiciliados e os seus residentes não domiciliados, aplicando aos
primeiros o princípio do world-wide-income, e tributando os segundos apenas pelos
rendimentos externos remetidos para o seu território (remittance basis) 32.
O conceito de domicílio no direito inglês constrói-se a partir das noções de domi-
cile oforigin e de domicile ofchoice: a primeira respeita a todos os nacionais britânicos,
nascidos no Reino Unido; a segunda, ao país com o qual a pessoa estabeleceu os laços
mais estreitos, tornando-o sua "pátria de adoção". Quem tem domicile oforigin no Rei-
no Unido conserva-o mesmo se desloca a sua residência para o exterior, enquanto não
cortar seus laços com o Reino Unido e estabelecer ligação mais estreita com outro país.
Mas, inversamente, um estrangeiro, mesmo residente no Reino Unido, não adquire aí
o seu domicílio, enquanto mantém ligações pessoais com o seu país de origem.
Também o direito francês distingue a simples residência habitual do domicílio,
que se adquire tendo na França, alternativamente, o foyer ou lugar de permanência ha-
bitual, o local de exercício de atividade profissional não acessória, ou o centro dos inte-
resses econômicos. Também aqui o alcance da distinção está em restringir aos residen-
tes domiciliados o âmbito de aplicação do princípio da universalidade, sujeitando os
residentes não domiciliados à tributação apenas dos rendimentos de fonte francesa 33 .

31 BULHÓES PEDREIRA, Imposto de Renda, 1969 (l.03 e l.U), distingue vários graus da pre-
sença física de uma pessoa num território: a pousada, lugar onde se encontra em trânsito, a
morada, onde habita com maior estabilidade, a residência, caracterizada pela permanência e
o domicílio, que resulta do caráter deftnitivo da residência. O autor reconhece, porém, que,
para efeitos ftscais, foi adotada a residência como critério relevante. Sobre o conceito de
domicílio ftscal no direito comparado, ver PIERRE FONTANEAu/et aI., La notion de résident,
Fiscalité Européenne na esp. 1977, 3, e Diritto e Pratica Tributaria 3 (1978), 878; GruSEPPE
MAruNO, La residenza, in VICTOR UCKMAR (org.), Corso di Diritto Tributaria Internazionale,
Pádua 1999, 207 sS.
32 Finance Act 1974. Ver European Taxation, vol. 14, na 10, 1974, e a decisão da Court ofAp-
peals, Civil Division, Buswell vs. Inland Revenue Commissioners (1974), STC 266, a respeito do
conceito de "domicile of choice". Ver ainda European Taxation, vol. 14, na 12, 1974, e o caso
da Duquesa de Portland [CIR Duchess ofPortland, 54; Tax cases, 648, (650), 1981]; N. D.
BOOTH, Residence, Domicile and UKTaxation, Londres 1987.
33 Cfr. GOUTHrilRE, Les impôts, 377, referindo-se à reforma introduzida pela lei de 29 de dezem-
bro de 1976 (art. 4° B do CGI); BERNARD PLAGNET, Droit Fiscal International, Paris 1986,
87; GUY GESTjGILBERT TIX1ER, Droit Fiscallnternational (2 a cd.), Paris 1990, 179 sS.
tl4D I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier -=::
Outro grupo de sistemas jurídicos não separa as noções de domicílio e residên-
cia, usando-as em sinonímia e empregando mais frequentemente o último termo.
Mas ainda dentro dele ocorre separar as legislações que acolhem uma concepção
subjetivista das que optaram por uma concepção objetivista da residência.
As noções subjetivistas de residência não se limitam a exigir a permanência
física num dado local (corpus); vão mais além, reclamando a intenção de o sujeito se
tornar residente de um certo país (animus). A aquisição da residência resulta, pois,
da conjugação do corpus e do animus, da union ofact and intent34 • Esta conjugação é
objeto de uma apreciação (teste de residência) por parte das autoridades fiscais, que
se socorrem de diversos critérios e presunções, cumulativas ou alternativas, que
as habilitem a decidir. Assim, por exemplo, a distinção entre um residente e uma
pessoa em trânsito (transient) depende da conexão entre o seu comportamento e as
suas intenções, reveladas em atos tais como estabelecer um negócio, deslocar bens
pessoais e família, participar na vida social e religiosa local ou matricular os filhos
nas escolas locais 35 .
Ao invés, as noções objetivistas contentam-se com a presença física de uma
dada pessoa num certo território, fixando a duração necessária para que a estadia se
converta em residência.
Certos ordenamentos jurídicos (mas não o brasileiro) consagram ainda concei-
tos especiais de residência, como o de residência de dependência - pelo qual os mem-
bros de um agregado familiar se reputam, por ficção, terem a sua residência no país
em que reside qualquer das pessoas a quem cabe a sua direção, independentemente
da sua residência efetiva; e o de residência alat;gada, mais frequente nos impostos
sobre sucessões ou doações, pelo qual, também por ficção, uma pessoa pode ser con-
siderada domiciliada no país em que residiu durante certo número de anos anteriores
à sua morte, caso seja nacional desse país 36 •
Note-se que o conceito de domicílio 37 , em matéria de impostos sobre suces-
sões e doações, reveste-se de algumas peculiariedades decorrentes sobretudo de tal
conexão se reportar, não a um período de tempo, como no imposto de renda, mas
a um momento preciso - a data da morte do de cujus ou do doador ou a data da
doação.

34 No direito italiano, o conceito de residência fiscal identifica-se com o de domicílio civil,


que também comporta um elemento objetivo (a concentração dos negócios e interesses)
e wn elemento subjetivo (a intenção de operar tal concentração em certo lugar dotado das
características da "principalidade" e da "estabilidade"). Cfr. GARBARINO, La tassazione, 178;
A. PISTONE, La normativa interna, in ID. (org.), Diritto Tributario Internazionale, 19.
35 Cfr. S. I. ROBERrfW C. W ARREN, Current Problems in Federal Taxation: Income Taxation of
Non-residentAliens andForeign Corporations, Nova York 1953.
36 Cfr. Modelo OCDE-ISD, Comentários, art. 4°, parágrafo 12.
37 Mais frequentemente usado que o de residência. Cfr. Modelo OCDE-ISD, Comentários, art.
4°, parágrafo 1.
Título IV I Capo 11 I Os Elementos de Conexão Subjetivos IB I

§ 2° O ESTATUTO DE RESIDENTE NO DIREITO BRASILEIRO

A) Pessoas físicas

a) Aquisição da residência
A distinção entre pessoas residentes e não residentes no território nacional é de
importância decisiva para defInir a extensão das respectivas obrigações tributárias. Com
efeito, enquanto os não residentes, sejam pessoas físicas ou jurídicas, estão apenas sujeitos
a imposto quanto aos rendimentos provenientes de fontes simadas no Brasil, estando
assim sujeitos ao regime da "tributabilidade limitada" (beschrankte Steuerpflicht), os re-
sidentes são tributáveis em função do seu rendimento mundial, quer se trate de pessoas
físicas ou jurídicas - regime da "tributabilidade ilimitada" (unbeschrankte Steuerpflicht).
A lei brasileira não contém uma defInição expressa do conceito de residência, no
que concerne às pessoas físicas, resultando este conceito da interpretação conjugada
dos arts. 16 e seguintes do RIR com o art. 682 do mesmo diploma38 . De harmonia
com os referidos preceitos, o direito brasileiro acolheu uma noção de residência que
se sima a meio caminho entre a noção meramente objetiva, que se contenta com o
simples corpus, e a noção subjetiva, que exige a presença cumulativa dos dois requi-
sitos, o corpus e o animus.
O estamto de residente adquire-se, alternativamente, pela permanência dura-
doura no território nacional com visto temporário, sejam quais forem as intenções
do sujeito (elemento material), ou pela intenção de residência no Brasil, expressa pela
posse do visto permanente (elemento formal).
De harmonia com o art. 12 da Lei nO 9.718, de 27 de novembro de 1998 (art.
18 do RIR), as pessoas físicas que transferem residência para o território nacional
com visto permanente adquirem o estamto de residente a partir da data da chegada,
que a Instrução Normativa SRF nO 208, de 27 de setembro de 2002, identifIca com
a consignada no passaporte pela autoridade local competente (art. 19).
Também se considera residente no Brasil a pessoa física proveniente do exterior
que ingressar no país, com visto temporário para permanência duradoura ou estável,

38 Note-se que nos referimos exclusivamente à noção de residência para efeitos fiscais que, em
si mesma, é independente da noção de residência para fins administrativos genéricos e cuja
aquisição, conservação e perda obedece a regulamentação autônoma, constante da legislação
de estrangeiros. Assim, uma pessoa pode ser considerada fiscalmente residente no exterior,
em virtude dos critérios da Convenção contra a dupla tributação, sem que isso importe a
extinção do status de residente no Brasil, notadamente do visto de residência permanente,
podendo por exemplo exercer as funções (como as de administrador de sociedade comercial)
que exijam tal requisiro. Cfr. ALBERTO XAVIER, Tributação da remuneração de administra-
dores com dupla residência, in ID., Direito Tributário e Empresarial- Pareceres, Rio de Janeiro
1982, 173. Cfr. por último MARY ELBE QUEIROZ, Imposto sobre a renda e proventos de qualquer
natureza, Barueri 2003; Sobre a noção de residência para efeitos de controle de câmbios, ver
CLAUDIO BISCARETTI Dl RUFFlA, Alcune osservazioni in tema di "residenza" ai frni valutari,
Diritto e Pratica Tributaria 1981-II, 1007.
I 6 I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

(i) para trabalhar, com vínculo empregatício ou (ii) por qualquer outro motivo aqui
permanecer por período superior a cento e oitenta e três dias, consecutivos ou não,
contado, dentro de um intervalo de doze meses, da data de qualquer chegada.
Caso, porém, antes do decurso dos 183 dias, a pessoa física portadora de visto
temporário passe a trabalhar com vínculo empregatício ou obtenha visto permanen-
te, adquirirá, nas respectivas datas, o status de residente fiscal (IN nO 208/02, art. 2°,
lII, "b", 3).
No que concerne ao cômputo do prazo de 183 dias deve observar-se que se
"( ... ) dentro de um período de doze meses, a pessoa física não completar 184 dias
consecutivos ou não, de permanência ao Brasil, novo período de até doze meses será
contado da data do ingresso seguinte àquele em que se iniciou a contagem anterior"
(IN nO 208/02, art. 2°, parágrafo único).
Ao declarar a irrelevância das "saídas temporárias" para efeitos de interrupção
do prazo de 183 dias, a Lei nO 9.718/98 modificou não só o prazo da legislação
anterior - doze meses - mas também a orientação anterior da Administração fiscal,
consignada no Parecer Normativo CST nO 182/71, segundo o qual "o cidadão por-
tador de visto temporário que entra e sai e torna a entrar no território nacional com
novo visto, desde que qualquer um dos estágios isoladamente não alcance o período
de doze meses, deverá ser considerado como não residente no Brasil (... )"39.
As pessoas que adquirem residência no Brasil, por qualquer das modalidades
acima referidas, passam a ser imediatamente tributadas no Brasil em relação aos fatos
geradores ocorridos a partir da data da aquisição da residência, devendo comunicar
essa nova condição a suas fontes pagadoras.
Todavia, para os que adquiriram (ou readquiriram) o status de residente no
Brasil a lei contempla (generosamente) a isenção de imposto de renda sobre o ganho
de capital auferido na alienação, liquidação ou resgate de bens localizados no exte-
rior ou representativos de direitos no exterior, bem assim de aplicações financeiras,
adquiridos a qualquer título, na condição de não residente (art. 24, § 6°, da Medida
Provisória nO 2.158-35, de 24 de agosto de 2001).

b) Perda da residência

A pessoa física residente no Brasil que se retirar em caráter permanente do ter-


ritório nacional no curso do ano-calendário fica obrigada a apresentar declaração de
saída definitiva do País, em relação ao período em que tenha permanecido na con-
dição de residente no Brasil no ano-calendário da saída, bem como as declarações

39 Era esta também a posição da Câmara Superior dos Recursos Fiscais: "É claro que os doze
meses eleitos pela lei brasileira para caracterizar ou descaracterizar o estatuto de residente
no Brasil hão·de ser ininterruptos. Se interrompidos por viagem, recomeça-se a contagem
a partir da data da retirada ou do reingresso no País". Acórdão CSRF/01.0.153, de 23 de
abril de 1991. Cfr. Câmara Superior de Recursos Fiscais. Imposto de Renda. Jurisprudência,
1.2-10, Resenha Tributária 1982, 2618.
Título IV I Capo 11 I Os Elementos de Conexão Subjetivos

correspondentes ao ano-calendário anterior, devendo recolher em quota única, até a


data prevista para a entrega das declarações atrás referidas, o imposto nelas apurado,
e os demais créditos não quitados, cujos prazos para pagamento são considerados
vencidos nesta data, se praw menor não estiver estipulado na legislação tributária.
A declaração de saída definitiva deve ser apresentada até o último dia útil do
mês de abril do ano-calendário da saída definitiva, caso esta ocorra até 31 de março,
ou até 30 dias contados da data da saída nas demais hipóteses.
O imposto apurado na declaração de saída definitiva é calculado mediante a uti-
lização dos valores da tabela progressiva mensal, vigente no ano-calendário da saída,
multiplicados pelo número de meses em que a pessoa fisica tiver permanecido na con-
dição de residente no Brasil, no ano-calendário em questão (IN nO 208/02, art. 9°)40.
Os rendimentos percebidos de fontes situadas no Brasil após a entrega de de-
claração de saída definitiva do País ficarão sujeitos, a partir desta data, ao regime
tributário dos não residentes (art. 10).
A Lei nO 12.249, de 11 de junho de 2010, veio estabelecer um regime especial
para as pessoas físicas residentes ou domiciliadas no Brasil que transferirem a sua
residência para país ou dependência com tributação favorecida ou regime fiscal pri-
vilegiado (arts. 24 e 24-A da Lei nO 9.430/96).
Nestes casos, a perda da residência no Brasil não ocorre automaticamente, mas
apenas quando se comprovar uma de duas condições alternativas: (i) ser residente de
fato no país de tributação favorecida ou sob regime fiscal privilegiado, nele permane-
cendo mais de cento e oitenta e três dias, consecutivos ou não, dentro de um período
de até doze meses ou a sua família ter nesses territórios sua residência habitual e a
maior parte do seu patrimônio; (ii) estar sujeito ao imposto sobre a totalidade dos
rendimentos do trabalho e do capital e pagar efetivamente esse impost041 •
Trata-se da figura de residência fiscal ala'/;gada, conhecida no direito comparado
como mecanismo para contrariar práticas elisivas de deslocalização de residência de
pessoas fisicas para zonas de baixa tributação, através da presunção de manutenção
da residência originária42 •
Nas saídas temporárias, os rendimentos percebidos nos primeiros doze meses con-
secutivos de ausência serão tributados pela sistemática de tributação universal aplicável
aos residentes no Brasil, enquanto os rendimentos percebidos a partir do 13° mês conse-
cutivo de ausência estarão sujeitos à sistemática de tributação dos residentes no exterior.
No que concerne às saídas em caráter temporário, em que a pessoa fisica perma-
neça no exterior por mais de doze meses consecutivos, incide a obrigação de decla-
ração de saída definitiva do País, bem como a obrigação de recolher em quota única
o imposto apurado (art. 11).

40 Sobre a natureza desta declaração e da certidão de quitação de tributos federais, cfr. HELENa
TÔRRES, A pluritributaçéúJ internacional..., 136 sS.
41 Regime introduzido pela Medida Provisória nO 472, de 15 de dezembro de 2009.
42 efr. infra.
_}$_ Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Nem sempre a transferência efetiva de residência para o exterior importa na perda


do estatuto de residente no Brasil. Há casos em que a lei impõe a sua conservaçéÚJ. É o
que se passa com os domiciliados no Brasil que estiverem no exterior e que receberem
rendimentos de trabalho assalariado, em moeda estrangeira, de autarquias ou reparti-
ções do governo brasileiro situadas no Brasil ou no exterior, em virtude de um fenôme-
no análogo ao da extraterritorialidade. O imposto, na fonte e na declaração, tem como
base de cálculo 25% do total dos rendimentos do trabalho assalariado recebidos (Lei
na 9.250/95, art. 50, RIR, arts. 17 e 18 da Instrução Normativa na 208/02, art. 17).
Noutros casos, atendendo à forte conexão da atividade desenvolvida com o país
da nacionalidade, a lei permitia que os brasileiros que transferissem residência para
o exterior optassem pela manutenção do estatuto de residente no Brasil. O benefício
restringia-se, porém, a cidadãos nacionais e a rendimentos do trabalho, os quais
eram classificados como não tributáveis no Brasil. É o que sucedia com estudantes
(RIR/94, art. 17 e art. 40, XXXII) e com assalariados de pessoas jurídicas conexas
com o Brasil (RIR/94, art. 16 e art. 40, XXXI), devendo notar-se que a exoneração
concedida aos primeiros tinha a sua duração limitada a quatro anos.
As isenções acima referidas foram mantidas pelo art. 30 da Lei na 7.713/88,
mas posteriormente revogadas pelo art. 42 da Lei na 9.250/95, pelo que tanto os
assalariados expatriados quanto os estudantes são tributáveis nos termos gerais, ou
seja: dutante os primeiros doze meses de ausência são tributados como residentes
no Brasil e a partir do décimo terceiro mês de ausência (ou da data da declaração de
saída definitiva do País) são tributados como residentes no exterior.
É importante salientar que as pessoas físicas consideradas residentes no exterior
(quer residentes no Brasil que tenham transferido residência para o exterior e tenham
perdido a residência no Brasil, quer residentes no exterior que tenham solicitado
transferência de residência para o Brasil e ainda não tenham adquirido residência
no Brasil) ficam sujeitos no Brasil ao imposto de renda em duas modalidades: a) o
imposto de renda na fonte sobre residentes no exterior, quanto a rendimentos em
geral e b) o mesmo regime de tributação dos residentes no Brasil quanto aos (i) ren-
dimentos de aplicações financeiras; (ii) ganhos líquidos auferidos em operações rea-
lizadas em bolsas de valores, de mercadorias, de futuros e assemelhados; (iii) ganhos
líquidos auferidos na alienação de ouro, ativo financeiro, e em operações realizadas
nos mercados de liquidação fututa, fora de bolsa; (iv) rendimentos auferidos em
operações de swap; e (v) ganhos de capital na alienação de bens e direitos em virtude
do princípio de equiparação, que vigora quanto a estes tipos de rendimentos43 (Ins-
trução Normativa na 208/02, arts. 26 e 28).44
Note-se, enfim, que os servidores diplomáticos de governos estrangeiros, servi-
dores de organismos internacionais de que o Brasil faça parte e servidores estrangei-
ros de embaixada, consulado e repartições oficiais de outros países no Brasil, embora

43 Cfr. infra.
44 Cfr. MARY ELBE QUEIROZ, Imposto sobre a venda, cit., 212 55.
Título IV I Capo 11 I Os Elementos de Conexão Subjetivos

gozem de isenção quanto aos rendimentos do trabalho, são considerados como resi-
dentes no exterior quanto a outros rendimentos produzidos no país (art. 22 do RIR;
Instrução Normativa nO 208/02, art. 23)45.

B) Pessoas Jurídicas

O art. 124, inciso I, do RIR, dispõe que consideram-se pessoas jurídicas para
efeitos de tributação pelo imposto de renda, além de outras entidades, "as pessoas
jurídicas de direito privado domiciliadas no país, sejam quais forem seus fms, nacio-
nalidade ou participantes no capital".
Ao contrário do que sucede com as pessoas físicas, a lei fiscal não definiu expres-
samente o conceito de domicílio das pessoas jurídicas relevante para efeitos tributários,
pelo que este coincide com o conceito de direito privado que o identifica com o lugar
onde funcionam a diretoria e administração, ou onde elegem domicílio especial no seu
estamto ou ato constimtivo (statutory seat) - art. 75, Iv, do Código Civil de 200246 .
O conceito de sociedade domiciliada no Brasil não deve confundir-se com o
de sociedade brasileira, pois a nacionalidade brasileira das sociedades depende da
obediência ao duplo requisito de se terem organizado na conformidade da lei brasi-
leira e terem sua sede no país (Lei de Introdução ao Código Civil, art. 11, Decreto
nO 2.627, de 26 de oumbro de 1940, art. 60 do Código Civil de 2002, art. 1.126).
Assim, uma sociedade domiciliada no Brasil, por aqui ter a sua sede, pode ser consi-
derada estrangeira se constituída à sombra de lei estrangeira47 •

§ 3° RESIDÊNCIA E DOMICÍLIO NAS CONVENÇÕES CONTRA A DUPLA TRIBUTAÇÃO

A) Dupla residência de pessoas físicas

As Convenções contra a dupla tributação assinadas pelo Brasil seguem neste


ponto muito de perto o art. 4° do Modelo OCDE, adotando como sinônimos os

45 Em relação ao caso de funcionários brasileiros do Banco Mundial, residentes no exterior, cfr.


Parecer Normativo nO 3, de 28 de agosto de 1996. Note-se, ainda, que foi revogada, a partir
de l° de janeiro de 1989 (Lei nO 7.713/88, art. 3°, § 5°, e art. 57), a isenção temporária
de rendimentos de fonte situada fora do território nacional, recebidos por pessoas físicas de
nacionalidade estrangeira que transferirem a sua residência para o Brasil, prevista nos §§ 5°
e 6° do art. 14 do RIR/80. Ver IN SRF nO 2, de 7.1.93, art. 2°, item XXIX.
46 Cfr. BULHÕES PEDREIRA, Imposto sobre a renda - pessoas jurídicas, I, 1979, 23; CAIO MÁRIo DA
SILVA PEREIRA, Instituições de Direito Civil, I, Rio de Janeiro 1980, 331-332; G. MArsro, Brevi
riflessioni sul concetto di residenza fiscale di società ed enti nel Diritto Interno e Convenzionale,
Diritto e Pratica Tributaria 1988, 1.358; LICCARDI, La disciplina dcgli enti non residenti, in UCK-
MARjMAGNANI/MARoNGill (org.), li reddito di impresa nel nuuvo testo unieo, Milão 1988, 697.
47 Cfr. supra.
1,6 I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

conceitos de domicílio e residência. A qualificação como residente pertence ao direi-


to interno dos Estados interessados, a qual tem apenas por limite a natureza da co-
nexão adotada, que deve ser o domicílio, a residência, a sede da direção ou qualquer
outro critério de natureza análoga. Deste preceito se pode concluir pela ilegitimidade
da caracterização de alguém como residente pelo só fato de nesse Estado se encontrar
a fonte da renda ou a fortuna 48 •
Como a caracterização de certa pessoa física como residente depende do direito
interno de cada um dos Estados em presença, pode acontecer que ambos os Estados
considerem a mesma pessoa49 residente em ambos os Estados: são os casos de "dupla
residência" (dual residence) 50.
Assim, por exemplo, um francês portador de visto de residência permanente no Bra-
sil e que tenha uma habitação permanente na França será considerado residente simulta-
neamente no Brasil e na França, pois ambos os requisitos são decisivos para atrair a sua
qualificação como residente, respectivamente, no primeiro e no segundo país; o mesmo
se diga de "expatriado" brasileiro que exerce atividade profissional na Alemanha, o qual
conserva a residência fiscal no Brasil durante os primeiros doze meses de ausência e pode
adquirir a residência alemã ao fim dos primeiros seis meses de presença naquele país.
Na ausência de uma Convenção contra a dupla tributação, ambos os Estados
podem pretender tributar a mesma pessoa pelo seu rendimento mundial, ou seja,
ilimitadamente, posto que cada um deles considera que ela é residente no seu terri-
tório. A função das Convenções neste domínio é, precisamente, a de - partindo do
pressuposto de uma dupla residência em face dos critérios do direito interno - definir
qual das duas residências prevalecerá para efeitos tributários, escolhendo uma (resi-
dência escolhida) em detrimento da outra (residência preterida).
O primeiro corolário desta regra consiste em que, no sistema convencional, a
residência fiscal só pode ser uma (princípio da unicidade da residência), de tal modo
que, se em face dos critérios da Convenção, uma pessoa for considerada fiscalmente
residente num Estado, passa a ser automaticamente "não residente" no outro, ainda
que o estatuto de residente lhe seja atribuído pela lei interna deste último sl . Deste
princípio decorre que tal pessoa não será mais obrigada a apresentar sua declaração

48 Regime idêntico é adotado pelo Modelo OCDE-ISD que também exclui a possibilidade de
alguém ser considerado residente num Estado pelo fato de a sucessão ou doação estar sujeita
a imposto, nesse Estado, apenas relativamente aos bens aí situados. Cfr. GOUTHIÊRE, Les im-
pôts, 458. Ver ainda OCDE, Comentários, art. 4°, § l°, parágrafo 8 (introduzido em 1992).
49 A análise da residência deve ser feita pessoa por pessoa, ainda que casadas, pelo que é frequente
a existência de "casais mistos", sendo um dos membros considerado residente num país e o
outro, noutro. Cfr. GOUTHIERE, Les impôts, 382. As Convenções sobrepõem-se portanto aos
regimes internos que eventualmente consagrem, por ficção, a residência por dependência de
uma pessoa no país de residência de qualquer dos outros membros do agregado familiar.
50 Cfr. JOHN AVERY JONEs/et al.) La double résidence des persOlmes physiques. ~interprétation
de cetre notion dans la Convention Modele de l'OCDE, Fiscalité Européenne 1981-4, 3, e
1982-1,3.
51 Cfr. GOUTHIÊRE, Les impôts, 389.
Título IV I Capo 11 I Os Elementos de Conexão Subjetivos -ii-
de imposto no Estado de residência "preterida", ficando sujeita ao sistema de tribu-
tação, por retenção na fonte, incidente sobre não residentes.
O segundo corolário consiste em que a determinação da residência prevalente esgo-
ta os seus efeitos em matéria tributária, de tal modo que o país de "residência preterida"
deve considerar a pessoa em causa residente para a generalidade dos demais efeitos, sem-
pre que a residência seja considerada requisito de goro de direitos civis ou políticos52 .
Tenha-se, enfim, presente que a determinação da única residência fiscalmente
relevante reveste a natureza de uma questtúJ prévia na sistemática da aplicação dos
tratados de dupla tributação. Com efeito, sendo o âmbito de aplicação pessoal destes
definido em função do estatuto de residente de um dos Estados contratantes, torna-
se necessário, em caso de dúvida ou conflito, decidir preliminarmente a qual dos
Estados em presença uma cena pessoa está ligada pelo vínculo de residência.
Precisamente porque a competência para a definição da residência pertence aos di-
versos direitos internos, as convenções contra a dupla tributação organizaram um siste-
ma de conexões subsidiárias para escolher a única residência fiscalmente relevante no caso
de a mesma pessoa ser considerada residente por ambos os Estados contratantes53 .
Assim, quando uma pessoa física for considerada residente em ambos os Estados
contratantes, será tida por residente naquele em que possua "habitação permanente".
Se possuir habitação permanente em ambos os Estados, será considerada residen-
te naquele em que mantiver "mais estreitas relações pessoais e econômicas (centro
de interesses vitais)". Se não puder ser determinado este último Estado ou se não
possuir habitação permanente em nenhum deles, será considerada residente naquele
onde tenha "permanência habitual". Se permanecer habitualmente em ambos ou não
permanecer habitualmente em nenhum deles, a residência corresponde ao Estado da
sua "nacionalidade". Enfim, se essa mesma pessoa for nacional de ambos os Estados,
ou se não for nacional de nenhum deles, caberá às autoridades competentes solucio-
nar a questão por comum acordo.
Os conceitos de "habitação permanente", de "centro de interesses vitais" e de
"permanência habitual", pela imprecisão dos seus contornos, não se prestam a uma
definição, pelo que a sua aplicação a um caso concreto depende das circunstâncias
específicas que lhes sejam peculiares 54.

52 Cfr. ALBERTO XAVIER, Tributação da remuneração de administradores com dupla residência, cit.,
173 (181 ss.).
53 Note-se que a Convenção Brasil-Japão não contém um regime de conexões subsidiárias,
estipulando que, no caso de dupla residência, a questão será resolvida por comum acordo. O
Modelo OCDE-ISD consagra no art. 4° conexões subsidiárias idênticas.
54 Cfr. os comentários e exemplos de jurisprudência em GOU1HIÊRE,Lesimpóts, 391 sS.; OCDE,
Comentários ao art. 4° (§ 2°), parágrafos 9 SS.; HÓHN, Doppelbesteuerungsrecht, BernjStut-
tgart 1973, 128 sS.; A. BoRRÁs, La doble imposicwn: problemas juridico-internacionales, Madrid
1974,41; VOGEL, Double taxation, 245; ID., Supl. 94, 12 SS.; GESTfTIXIER, Droit Fiscal In-
ternational, 187 sS.; M. PIRES, Da dupla tributação, 230; RIVIER, Droit Fiscal suisse. Le Droit
Fiscal International, Neuchatell983, 124-125.
@ I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Trata-se de um conjunto de "testes" que deve ser aplicado em ordem serial, se-
gundo a precedência constante do art. 4° do Modelo OCDE, de tal modo que é,
por exemplo, ilegítimo o recurso ao mútuo acordo quando a questão já podia ser
resolvida pelo critério do centro de interesses vitais 55 •
O caráter exaustivo destes critérios de conexão subsidiária e sua vocação para
decidir as situações mais complexas levou alguns autores a designarem-nos como um
verdadeiro sistema de "quebra-laços" (tie breakerj56.

B) Dupla residência de pessoas jurídicas


Tal como quanto às pessoas físicas, pode suceder que mais do que uma ordem
jurídica considere uma pessoa jurídica localizada no seu território (dual resident com-
panies), tornando-se assim necessário fIxar um critério de preferência na repartição
dos poderes tributários. É o que sucederá, por exemplo, a uma sociedade incorpo-
rada sob as leis de um dos Estados dos Estados Unidos, sendo, porém, controlada
e gerida no Reino Unido. E é também o que sucederá quando a Austrália considera
domiciliada no seu território sociedades incorporadas em jurisdições estrangeiras,
mas que são controladas por residentes da Austrália57 •
São os chamados "residence-residence conflicts", por oposição aos "residence-source
conflicts" .
No âmbito das relações internacionais, as Convenções contra a dupla tributação
estabelecem que prevalecerá o critério do local da "direção efetiva" (place of effecti-
ve managemen0 siege de direction effictive)58, entendendo-se por este o lugar onde os
negócios são dirigidos ou fIscalizados, isto é, onde são praticados os atos de gestão
global da empresa (center oftop leveI management). Assim se evita a relevância das sedes
fIctícias, como sucede com os Briejkastendomizile (domicílios postais) e com as "so-
ciedades de domicílio" (Domizilgesellschaften) , frequentes na Suíça e no Liechtenstein,
que não exercem no respectivo território qualquer atividade empresarial relevante5 9 .

55 Cfr. BAKER, Double Taxation, 129, citando decisão do Conseil d'État francês. Sobre a "ordem
de precedência", cfr. VOGEL, Double Taxation, 246.
56 Cfr. VOGEL, Double Taxation, 224.
57 Cfr. OCDE, ControlledForeign Company Legislation, Paris 1996, 13.
58 O caráter exclusivo da residência prevalente foi claramente explicitado na nova redação do § 3°
do art. 4° do Modelo, na versão de 1995. Ver Comentários ao art. 4° (§ 3°), parágrafos 22 e ss.
59 J. H. SCHIPPER, The Liability to Tax ofNon-resident Companies: a Comparative Study in Fiscal
Law, Haia 1958; ROBERT COUSIN, Corporate Residence and International Taxation, Amster·
dam 2002; G. MARINI, Residenza, in VICTOR UCKMAR (org.), Corso di Diritto tributario
Internazionale, cit., 220 SS.; ARNOLD KNECHTLE, Grundfragen des Internationalen Steuer-
rechts, Basel 1976, 115 SS.; SCHAUMBURG, Internationales Steuerrecht, Colônia 1993, 846;
JEAN,PIERRE LEU, Les revenus ftscalement privilegiés des sociétés de base, Genêve 1968; BAKER,
Double Taxation, 131; Roy SAUNDERS, Principles ofTax Planning, Londres 1978, 15; ROBERT
COUZIN, Corporate Residence and International Taxation, Amsterdam 2002.
Título IV I Capo 11 I Os Elementos de Conexão Subjetivos

As dificuldades na solução de conflitos em matéria de dupla residência de pes-


soas jurídicas são hoje multiplicadas pelas novas tecnologias de comunicação que
permitem a tomada de decisões por diretores residindo em países diferentes median-
te videoconferências ou através da Internet, bem como a existência de lugares de ad-
ministração efetiva, de natureza móvel, como as "aeronaves executivas" das empresas
multinacionais.
Deverão ser analisadas em face das características do caso concreto, considerando,
por exemplo, o local de reunião da diretoria, do exercício da atividade dos principais
executivos, da sede da empresa, da guarda dos livros contábeis, da lei reguladora da
sociedade ...
A solução do conflito naturalmente se inclinará em favor do Estado com o qual
for mais forte a conexão econômicaóo •

60 Cfr. OCDE, The Impact Df the Communications Revolution on the Application of "Place of Ef
fective Manegement" as a Tie-Breaker Rule, junho de 2001. Cfr. Materiais on International
& EC Tax Law (ed. KEES VAN RAAD), vol. 1,2003,626 ss. V. OCDE, Comentários, art. 4°,
parágrafo 24.1 (2008). Ver a reserva do Brasil in NMCP, art. 4°, parágrafo 12. Entre nós,
a Convenção com o Peru estabelece que, em caso de conflito de residências e não sendo
possível o acordo mútuo, a pessoa em causa não terá direito a nenhum dos benefícios ou
isenções tributárias contemplados na Convenção (art. 4°, par. 3°).
CAPÍTULO III
Os ELEMENTOS DE CONEXÃO OBJETIVOS

§ 10 A FONTE DOS RENDIMENTOS: FONTE DE PRODUÇÃO E FONTE DE PAGAMENTO

Ao lado dos elementos de conexão subjetivos - como o domicílio e a residência -,


existem os que respeitam diretamente ao próprio fato tributário ou à base de cálculo e
que são os elementos de conexão objetivos.
Variam os elementos de conexão objetivos conforme os tributos em causa e,
mesmo dentro de um tributo dado, conforme os sistemas fiscais. Assim, por exem-
plo, nos impostos prediais, o elemento de conexão dominante é o lugar da situação
do imóvel (locus rei sitae); nos impostos sucessórios pode ser o lugar da abertura da
herança ou da situação dos bens, e assim por diante.
No imposto de renda, o elemento de conexão fundamental é o lugar da situação
da fonte dos rendimentos, pois é ele que vai permitir a repartição, dentro dos rendi-
mentos globais de uma pessoa, física ou jurídica, entre aqueles que se submetem, ou
não, à aplicação de um dado ordenamento tributário (locus flntis). Assim, entre nós,
a localização da fonte no território nacional delimita o âmbito da obrigação dos não
residentes, como adiante melhor se verá.
No sentido econômico, a fonte equivale ao "capital" (em sentido amplo) donde
brota a renda tributada, pelo que esta se localiza no lugar em que é exercida a ativi-
dade, em que são utilizados os fatores de produção ou em que se situam os bens ou
direitos de que provémI.
A par da noção clássica de fonte da renda, entendida como fonte da sua produção,
fonte econômica ou fonte objetiva, a doutrina elaborou uma noção afim, que é a de fon-
te do seu pagamento, fonte financeira ou fonte subjetiva. É fácil de verificar, porém, que
só aparentemente estes conceitos são espécies de um gênero comum pois, enquanto
no primeiro caso existe um nexo causal direto entre a renda e o fato que a determina,
no segundo a expressão fonte não está ligada a uma ideia de causalidade, mas sim à
de origem dos recursos que representam renda para o respectivo beneficiário, ou seja,

1 Cfr. GARBARlNO, La tassazione dei reddito transnazionale, Pádua 1990, 231. Sobre o conceito
de "fonte efetiva", cfr. HELENO TORRES, Pluritributaç/ÚJ sobre as rendas de empresas, São Paulo
2001,120.
.i. Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

numa acepção idêntica à que se utiliza em matéria de retenção do imposto pela fonte
pagadora, através do mecanismo da substituição tributária.
A fonte objetiva do rendimento, propriamente dita, é um conceito econômico
que respeita à sua produção; a fonte subjetiva de pagamento é um conceito financeiro
que respeita à sua realização 2 •
Esta ambiguidade no uso da expressão fonte foi bem observada por BULHÕES
PEDREIRA, que alertou para a necessidade de distinguir com clareza as noções de fonte
da renda, no sentido de origem da renda - que é a atividade de produção - e de fonte
de pagamento - que é a pessoa que paga o rendimentd.
Antes da vigência da Lei nO 9.249/95, que adotou o princípio da universalida-
de, a lei brasileira formulava o princípio da territorialidade relativamente às pessoas
jurídicas, em função do local da "produção do lucro", e identificava este local como
o local do "exercício das atividades" das quais aquele decorre. Assim, a regra básica
é de que se consideravam produzidos no país os lucros derivados de atividades no
território nacional4 • Estabeleceu-se assim uma conexão entre os conceitos de "ativi-
dade" e de "fonte de produção" do lucro.
Não há dúvida que os conceitos básicos da antiga legislação brasileira em ma-
téria de imposto de renda das pessoas jurídicas - local de produção do lucro e local
do exercício da atividade produtora - aludiam ao critério da fonte da renda e não
da fonte de pagamento. Concordamos com BULHÕES PEDREIRA quando afirma que
as expressões "rendimento produzido no país", "rendimento derivado de atividade
exercida no país", "rendimento derivado de fonte nacional" e "rendimento que pro-
mana de fonte nacional" são sinônimass.
Todavia, em matéria de imposto de renda na fonte sobre residentes no exterior, a
lei (art. 682 e 685 do RIR) usou os conceitos de rendimentos "provenientes de fon-
tes situadas no país" e de rendimentos "pagos por fontes situadas no país" na acep-
ção, respectivamente, de fonte de produção e de fonte de pagamento, como adiante
melhor se verá6 • Assim, ressalvados certos casos, como os ganhos de capital, os ren-
dimentos auferidos por não residentes têm a sua fonte no Brasil se cumulativamente

2 Sobre a distinção entre "rendimento produzido" c "rendimento realizado", GILBERTO DE


ULHÓA Cfu'-'TO, Temas de Direito Tributário, I, Rio de Janeiro 1964, 17-18 e 83; Estudos e
Pareceres de Direito Tributário, São Paulo 1975, 24 s. e 80 SS.; RUBENS GOMES DE SOUSA,
Pareceres - Imposto de Renda, 11, São Paulo 1975, 51 SS.; Ruy BARBOSA NOGUEIRA, Direito
Tributário Comparado, São Paulo 1971, 27; BULHÓES PEDREIRA, Imposto de Renda, Rio de
Janeiro 1969, 281; M. PIRES, Da dupla tributação jurídica internacional sobre o rendimento,
Lisboa 1984, 238.
3 Cfr. BULHÕES PEDREIRA, Imposto sobre a renda - pessoas jurídicas, I, Rio de Janeiro 1979, 207.
4 ARNO SCHULZE-BRACHMAN chega erigir o lugar do exercício da atividade à categoria de
"princípio" (Tiitigkeits-Prinzip): cfr. Kollisionsnorm, Handwürrerbuch des Steuerrechts und
der Steuerwissenschaften 1,670 (671).
5 Imposto sobre a Renda, cit., 209.
6 Cfr. infra, 439 SS.
Título IV I Capo 111 I Os Elementos de Conexão Objetivos

foram economicamente produzidos no Brasil e se aqui têm domicílio ou residência


os devedores desses mesmos rendimentos, ou seja, as suas "fontes pagadoras".
Perante a desmaterialização dos principais fatos tributários e a interdependência
econômica e jurídica que os liga - não é fácil determinar qual a localização da fonte
dos diversos tipos de rendimentos. O direito positivo brasileiro não consagrou um
conjunto sistemático e orgânico destas regras - ao invés do que sucede com as source-
ofincome rules do direito norte-americano? -, pelo que a determinação do lugar da
fonte de cada tipo de rendimento deve ser efetuada, caso a caso, em face do direito
positivo interno e convencional.
Certos ordenamentos jurídicos (mas não o brasileiro) adotam a técnica das pre-
sunções ou ficções para definir a localização da fonte dos rendimentos: é o que sucede
com as normas que reputam obtido um royalty no país em que se encontra registrado
o direito de que provém; as que reputam obtido um juro no país em que foi celebra-
do o contrato de empréstimo ou em que se localiza o bem dado em garantia do cré-
dito. Tais conexões - de todo em todo alheias à procedência econômica ou financeira
do rendimento - são conexões autônomas, só por ficção se pretendendo reconduzir
ao conceito de fonte de produção ou pagamento.

§ 2° OS ELEMENTOS DE CONEXÃO REAIS: A REGRA LOCUS REI SITAE

Os elementos de conexão reais são elementos objetivos que respeitam a coisas,


definindo o âmbito de aplicação dos tributos direta ou indiretamente relacionados a
bens móveis e imóveis, em função da sua localização (lex rei sitae) 8 .
Os tributos que arvoraram as coisas como conceitos integrantes da respectiva
hipótese de incidência configuram do mesmo passo a sua localização como elemento
de conexão no que respeita à sua aplicação no espaço.
Assim, segundo a Constituição, aplicam-se as leis tributárias brasileiras aos bens
situados no Brasil, independentemente da nacionalidade ou residência do sujeito pas-
sivo nos seguintes tributos: contribuição de melhoria (art. 145); imposto da União
sobre a propriedade territorial rural (art. 153, inciso VI e § 4°); imposto estadual
sobre transmissões causa mortis e doações, de quaisquer bens e direitos (art. 155,
inciso I); imposto municipal sobre a propriedade predial e territorial urbana, bem

7 Cfr. J. D. KUNTZjR. J. PERONI, US. International Taxation, I, BostonjNova York 1992, I,


A 2.03; KLIMOWSKY, The "Source oflncome" in Municipal and International Taxation, BIFD
14 (1960), 66 (66 e 77). Sobre estes métodos no direito norte-americano, quanto às mixed
sources, cfr. JORDANjBISCHELjSMITH, The Taxation ofEnterprises with Permanent Establishments
abroad. United States Taxation ofa Foreign Entreprise carrying on Business in the U S. through a
Permanent Establishment, CD FI LVIII -a (1973), 95 (101-102).
8 Cfr. IRINEU STRENGER, Teoria geral do Direito Internacional Privado, São Paulo 1973, 278-279.
I fim I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

como transmissão inter vivos, a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis (art.
156, incisos I e II).
O elemento de conexão locus rei sitae tem relevância não só nos tributos em que
as coisas são elemento constitutivo do próprio tipo legal, mas também naqueles em
que - embora não constituam o cerne da hipótese de incidência - podem com ele
encontrar-se intimamente conexos: é o caso dos impostos sobre a renda e o capital,
de vez que a renda pode ser imputada a coisas móveis ou imóveis, assim como o
capital pode estar nelas corporizado.

§ 30 ESTABELECIMENTO PERMANENTE: REMISSÃO

O estabelecimento estável ou permanente é um dos mais importantes elementos


de conexão objetivos no Direito Tributário Internacional. Por razões sistemáticas e
de clareza de exposição, procede-se, porém, à remissão do seu estudo para momento
ulterior, em que se efetivará o exame do seu regime à luz das disposições unilaterais
referentes às filiais de sociedades estrangeiras e em face dos preceitos constantes das
convenções contra a dupla tributação que especificamente lhes respeitam9 •

9 Cfr. infra, 551 ss.


CAPÍTULO IV
ELISÃO FISCAL E ELEMENTOS DE CONEXÃO

§ 10 CONCEITO E NATUREZA DA ELISÁO FISCAL INTERNACIONAL

A expressão elisão fiscaP internacional (tax avoidance) não pode ser assimilada ao
conceito de evasão fiscal (tax evasion), pois não está em causa, necessariamente, um
ato ilícito pelo qual o contribuinte viola a sua obrigação tributária (conexa com mais
do que uma ordem jurídica), prestando falsas declarações ou recusando-se ao seu
cumprimento, mas sim a prática de atos (em princípio) lícitos, praticados no âmbito
da esfera de liberdade de organização mais racional dos interesses do contribuinte,
em face de uma pluralidade de regimes fiscais de ordenamentos distintos. Trata-se,
em suma, de evitar a aplicação de certa norma ou conjuntos de normas através de
atos ou conjuntos de atos que visem a impedir a ocorrência do fato gerador da obri-
gação tributária em certa ordem jurídica (menos favorável) ou produzam a ocorrên-
cia desse fato noutra ordem jurídica (mais favorável).
O caráter mais favorável da ordem jurídica escolhida não se traduz necessaria-
mente numa ausência de tributação, podendo os objetivos do contribuinte satisfazer-
se com uma tributação mais moderada. E daí que o fenômeno não se restrinja à hipó-
tese de um conflito negativo de ordenamentos tributários que, em virtude da definição
ou conteúdo dos elementos de conexão acolhidos pelas suas regras de conflitos, se
não reconhecem com vocação para submeter a tributo uma certa situação da vida
com elementos de estraneidade.
O fenômeno da elisão fiscal internacional assenta, assim, num duplo pressupos-
to: a existência de dois ou mais ordenamentos tributários, dos quais um ou mais se
apresentam, em face de uma dada situação concreta, como mais favoráveis que o
outro ou outros; a faculdade de opção ou escolha voluntária pelo contribuinte do
ordenamento tributário aplicável, pela influência voluntária na produção do fato ou
fatos geradores em termos de atrair a respectiva aplicaçã0 2 •

Boa expressão portuguesa, do latim elidere, eliminar, suprimir, também utilizada na gramática.
2 Cfr., sobre evasão e elisão fiscal internacional, em geral, ALFONSO SCHMID, Die internationale
Steuerjlucht-Maglichkeiten und Bekdmpfungsmethoden, St. Gallen 1961; PIERRE LEVINE, La
lutte contre l'évasion ftscale de caractêre international en l'absence et en présence de conventions
MJiM Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

É precisamente a esta faculdade voluntária de opção ou escolha racional que se


referem as expressões "planejamento fiscal" (tax planning), "montagens fiscais" ou
"engenharia fiscal".
A essência da figura da elisão fiscal reside precisamente nesta faculdade de elei-
ção da ordem tributária aplicável, não por uma via direta (como sucede no Direito
Internacional Privado em matéria de contratos), incompatível com o princípio da
legalidade em matéria de tributos, mas pela via indireta de "localizar" certo fato ou
fatos num dado ordenamento ou território, exercendo uma influência voluntária no
elemento de conexão da norma de conflitos, em termos tais que o fato jurídico em que
este se traduz arraste a aplicação do ordenamento mais favoráveP.
As modalidades de elisão fiscal internacional podem classificar-se em função da
natureza do elemento de conexão utilizado: a elisão fiscal é subjetiva se opera através
de um elemento de conexão subjetivo, como a residência ou o domicílio do contri-
buinte; a elisão fiscal é objetiva se opera através de um elemento de conexão objetivo,
como o local onde se situa a fonte de produção ou de pagamento de um rendimento,
designadamente o local do exercício da atividade, ou o local de instalação de um
estabelecimento permanente.
A elisão fiscal objetiva pode ainda desdobrar-se em várias espécies, consoante
o objetivo do contribuinte em influenciar o elemento de conexão em causa: uma
primeira espécie tem por fim dividir o rendimento, distribuindo-o entre territórios
fiscais distintos; uma segunda espécie tem por objetivo acumular o rendimento, fi-
xando-o em território fiscalmente mais favorável, de tal modo que a tributação seja
diferida (tax deferral) para a eventualidade de o rendimento ser distribuído; enfim
uma terceira espécie tem como finalidade transferir o rendimento de um ordenamen-
to para outro que lhe conceda tratamento mais favorável.
O problema da natureza jurídica da elisão fiscal internacional não se coloca em
termos diversos dos da elisão fiscal no direito interno: trata-se da prática de ato ou

internationales) Paris 1988; P. ADONNINO, La pianificazione fiscale internazionale, in VICIOR


UCKMAR (org.), Corso di Diritto Tributaria Internazionale, Pádua 1999,41; V UCKMAR, La
evasión fiscal internacional, in AAVv, Seis Estudios sobre Derecho Constitucional e Internacional
Tributaria, Madrid 1980, 193 (195 ss.); Roy SAUNDERS, Principies of Tax Planning, Londres
1978. Em Portugal, Luís MANUEL TELES DE MENEZES LEITÃO, Evasão e fraude fiscal interna-
cional, in A. Internacionalização da Economia e a Fiscalidade - XXX Aniversário do Centro de
Estudos Fiscais, Lisboa 1993, (299) 328 (o qual defende uma noção abrangente de evasão
fiscal internacional, independente da licitude ou ilicitude dos meios empregados - posição
da qual discordamos pelas razões expostas no texto).

3 Sobre a possibilidade de influenciar voluntariamente a localização do elemento de conexão


no Direito Internacional Privado, veja-se o artigo de MARIA ISABEL JALLES, A plurilocalização
e a deslocalização espacial das situações jurídicas internacionais, Revista de Direito e Economia
1 (1975), 65. RODRIGO MAITTO DA SILVEIRA. A relevância dos elementos de conexão no
planejamento tributário internacional, in PEDRO ANAN J R. (org.), Planejamento ftscal- Aspec-
tos teóricos e práticos, vol. II, São Paulo 2009, 307.
Título IV I Capo IV I Elisão Fiscal e Elementos de Conexão -i-
conjunto de atos (operações), no âmbito da esfera de liberdade concedida aos par-
ticulares pelo princípio da estrita legalidade ou tipicidade da tributação, e que têm
como efeito a aplicação de regime tributário menos oneroso do que se aplicaria sem
que tal ato ou conjunto de atos tivesse sido praticado.
A peculiaridade que o fenômeno reveste na esfera internacional é que tal ato ou
conjunto de atos visa a atuar, direta ou indiretamente, no elemento de conexão da
norma de conflitos, em termos de arrastar a aplicação do regime fiscal mais favorável,
seja ele decorrente de tratado ou de direito interno estrangeiro.
E, assim como no plano interno, também no plano internacional o negócio
fiscalmente menos oneroso pode ser de exclusão como ser simplesmente redutiv04 •
No primeiro caso, o contribuinte coloca-se em situação tal que o fato tributário não
recai sob o âmbito de aplicação de qualquer das normas potencialmente aplicáveis,
podendo então falar-se em conflito negativo de leis. Mas no segundo caso o contribuin-
te pretende apenas colocar-se sob a incidência de um tipo legal cujas consequências
fiscais sejam menos onerosas, localizando o fato imponível no território ou territó-
rios mais adequados para o efeito.
Pelas mesmas razões que valem para o direito interno - e que expusemos detida-
mente noutro estudoS -, a elisão de direito internacional não pode confundir-se nem
com a figura da simulação, nem com a da fraude, nem com a do abuso de direito. Com
a simulação, porque nesta há sempre uma divergência entre a vontade real e a vontade
declarada, enquanto na figura em causa os efeitos dos atos jurídicos correspondem
precisamente à vontade real de quem os praticou; com afraude, porque nesta há uma
violação direta e frontal das normas jurídicas (falsas declarações, falso balanço, opera-
ções fictícias etc); com o abuso de direito, por não estar em causa um direito subjetivo
cujo exercício seja antissocial ou danoso, mas uma esfera de liberdade do particular na
escolha dos meios oferecidos pelo direito para a realização dos seus interesses.
Pode, porém, suceder que, para obtenção dos seus fins, as partes celebrem negó-
cios jurídicos indiretos, ou seja, utilizem estruturas negociais típicas de direito interno
ou estrangeiro para atingir fins que lhes são atípicos.
A figura da ''fraus legis" - como bem observou GIOVANNI GIACOBBE6 - não é
específica do Direito Privado, antes se pode revelar em todos os setores do ordena-
mento jurídico, caracterizando-se por dois traços fundamentais: evitar a aplicação de
regra imperativa (proibitiva ou preceptiva) de certo ordenamento mediante a prática
de atos ou conjunto de atos, em si mesmos lícitos, que simultaneamente não confi-
guram o pressuposto da aplicação da norma "fraudada" e desencadeiam a aplicação
de regime jurídico mais favorável para os interesses das partes.

4 Cfr. ALBERTO XAVIER, O negócio indireto em Direito Fiscal, Lisboa 1971, 27.
5 Cfr. ALBERTO XAVIER, Tipicidade da tributaçiW, simulaçiW e norma antielisiva, São Paulo 2001;
ID., Liberdade fiscal, simulação e fraude no Direito Tributário Brasileiro, in ID., Direito
Tributário e Empresarial - Pareceres, Rio de Janeiro 1982, 3.
6 Cfr. Frode alia legge, Enc. dei Dir. xvm (1969), 73; ver também ANTÓNIO MENEZES COR-
DEIRO, Nota breve sobre a fraude à lei, in Estudos - XXX Aniversário do Centro de Estudos
Fiscais, Lisboa 1993, 123 ss.
Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

A semelhança do instituto da fraude à lei no Direito Internacional Privado com


o instituto da elisão fiscal no Direito Tributário Internacional resulta de em ambos os
casos o propósito de evitar a aplicação de certa norma se poder realizar mediante uma
alteração dos elementos de conexão que a ordem jurídica em que se integra tal norma
designa como relevantes para a sua aplicação. A fuga à norma proibitiva de direito
privado ou à norma tributária ocorre pelo meio específico da alteração das condições
de fato ou de direito de que resulta, nas relações privadas ou fiscais internacionais,
a designação da ordem competente para reger dada questão? E isto precisamente
porque é na medida em que as conexões das normas de conflitos (tanto do Direito
Internacional Privado quanto do Direito Tributário Internacional) são situáveis ou
deslocáveis por ação das partes - como tão bem ilustrou MARIA ISABEL JALLESB -
que os interessados podem influenciar voluntariamente o domicílio da pessoa física,
transferindo-o, a sede da pessoa jurídica, o lugar de instalação do estabelecimento
permanente, o local de produção da renda, o lugar da abertura da herança etc.
E daí que se suscite a questão comum a ambos os ramos do Direito: "poderão
então as partes, manejando os elementos de conexão como alavancas de comando,
determinar a seu arbítrio a lei aplicável?; ou poderão as partes, 'internacionalizando'
artificialmente a sua 'situação', aproveitar-se das normas de conflitos para beneficia-
rem da aplicação da lei que lhes for mais vantajosa?"9.
Da mesma forma que no Direito Internacional Privado se encontram soluções
para declarar, em cenos casos, ineficazes atuações que configurem a "fuga de uma
ordem jurídica para outra"IO, assim também a evolução recente do Direito Tributário
Internacional revela reações que contrariam a liberdade absoluta de os particulares mo-
delarem, localizarem ou deslocalizarem as conexões relevantes para efeitos tributários.
Tais reações não podem, porém, revestir a mesma natureza em ambos os setores
do Direito, dadas as limitações constitucionais decorrentes dos princípios da legali-
dade e da tipicidade da tributação.
Não deixará de anotar-se que uma das complexidades e, do mesmo passo, fra-
gilidades, da tentativa de aplicação da teoria da fraude à lei ao fenômeno da elisão
fiscal internacional consiste na pressuposição de que existe uma conexão "normal" ou
"natural" para reger uma dada situação, conexão essa às quais os particulares tentam
escapar pela atividade fraudatória.
Ora, a reação contra a fraude à lei vem precisamente dos ordenamentos jurídicos
que a si próprios se consideram "normalmente" competentes para tributar uma dada
situação, competência essa que resultaria da necessária aplicação das suas leis fiscais,

7 Cfr. ISABEL DE MAGALHÃES COLLAÇO, Lições de Direito Internacional Privado, 11, Lisboa 1959,
277; JUAN OTERO CASTELLÓ, El fraude de ley fiscal internacional, in XXII Semana de Estudios
de Derecho Financiero, Madrid 1974, 620.
8 Cfr. ISABEL JALLES, A plurilocalização e a deslocalização espacial, cit., passim.
9 Cfr. BAPTISTA MACHADO, Lições de Direito Internacional Privado (4a ed.), Coimbra 1990, 273-
274.
10 Cfr. BAPTISTA MACHADO, op. cit., 275.
Título IV I Capo IV I Elisão Fiscal e Elementos de Conexão

caso o elemento de conexão não tivesse sido (do ponto de vista desse ordenamento)
"artificialmente manipulado".

§ 2° OS INSTRUMENTOS DA ELlSÁO FISCAL INTERNACIONAL

Os instrumentos da elisão fiscal internacional são os meios de que o sujeito


se utiliza para atingir os resultados em vista, podendo classificar-se em função dos
pressupostos da figura. Os instrumentos relativos ao ordenamento mais favorável
(ou a um certo segmento dele) são facultados pelos paraísos fiscais ou pelos regimes
fiscais preferenciais consagrados em países ou territórios de fiscalidade "normal"; os
instrumentos pelos quais se concretiza a escolha do ordenamento ou regime jurídico
aplicável são os atos jurídicos de cuja prática, isolada ou em conjunto com outro ou
outros ("operações"), resulta a fixação ou localização do elemento de conexão em
certo território, tais como a celebração de contratos em que se estipulem preços de
transferência, a constituição de sociedades-base, a interposição de holdings, etc. Pela
sua relevância, dedicaremos especial atenção aos tipos societários mais frequentemente
utilizados na prática internacional.

A) Os paraísos fiscais e os regimes fiscais preferenciais:


práticas de concorrência fiscal prejudicial

a) Considerações preliminares
Os ordenamentos fiscais que isentam certos fatos que deveriam "normalmente"
tributar, de harmonia com os princípios gerais comumente aceitos em países mais
desenvolvidos, ou os tributam a alíquota "anormalmente" baixal l- via de regra para
atrair capitais estrangeiros -, são considerados refugios, oásis ou paraísos fiscais J2 •

11 É a "tributação inferior" (Minderbesteuerung) de que fala BÜHLER, Principios de Derecho In-


ternacional Tributario, Madrid 1968, 226.
12 Cfr. MILTON GRUNDY, Tax Havens, Londres 1972 (há tradução francesa, Les refuges fiscaux,
1972); G. MARlNO, I "paradisi fiscali"; Problematichee prospettive, in VICTOR UCKMAR
(org.), Corso di Diritto Tributario Internazionale, Pádua 1999, 573; IFA -Limits on the Use of
Law-Tax Regimes by Multinational Businesses: Current Measures and Emerging Trendes, CDFI
LXXXVI-b (2001), 959. O tema já fora abordado, mas não do ponto de vista jurídico, por
ALAIN VERNAY, Les paradis fiscaux, Paris 1968; EDOUARD CHAMBOST, Nouveau guide des paradis
fiscaux, Paris 1982. Ver ainda WALTER H. DIAMOND/D. B. DIAMOND, TaxHavensofthe UVrld,
Nova York 1974; MARSHALL J. LANGER, How to use Foreign Tax Havens, 1975; BARRY SPITZ,
Tax Haven Encyclopedia, 1976; A. SUMPTION, Taxation ofOverseas Income and Gains, Londres
1975; M. SOLLY, Anatomy of a Tax Haven - The Isle ofMan, 1975; WILLIAM G. GIFFORD,
International Tax Planning, Washington 1974; Euo BLASIO, Pianiftcazione fiscale inter-
nazionale, Milão 1992; JosÉ MANUEL GARCIA-MARGALLO YMARFIL, Los Paraisos Fiscales, in
MJi.' Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier
Estes territórios de regime fiscal privilegiado (como lhes prefere chamar a adminis-
tração fiscal francesa) 13, regimes fiscais claramente mais favoráveis (como conhecidos
em Portugal) ou países de tributação favorecida (como são denominados no Brasil)
têm como característica comum a não incidência de imposto de renda sobre pessoas
jurídicas cujo capital seja detido por não residentes e exerçam exclusivamente a sua
atividade fora do território em questão, também não incidindo via de regra imposto
de renda na fonte sobre os dividendos distribuídos aos seus sócios ou sobre os ren-
dimentos pagos a terceiros.
Todos estes territórios têm ainda de comum legislação societária e financeira
flexíveis, liberdade cambial absoluta, além de eficiente sistema de comunicações e
estabilidade política e social J4 .
A verdade é que todos os Estados são, de certo modo, paraísos fiscais, no que
tange a setores ou vantagens específicas que oferecem: recorre-se ao Panamá e à Li-
béria para o desenvolvimento da marinha mercante; ao Luxemburgo e à Holanda,
em razão do regime especialmente favorável das sociedades holding e da colocação
de empréstimos externos; ao Liechtenstein, pelas vantagens que oferecem as suas
sociedades, fundações eAnstalten à organização das fortunas privadas; à Suíça, pelos
níveis moderados de tributação e pelo segredo bancário; ao Uruguai, pela liberdade
cambial irrestrita, abrangendo moedas inconversíveis. Mas o certo é que os Estados
Unidos, país de elevado nível de tributação, oferecem também a vantagem específica
de não tributar os juros pagos aos residentes no exterior, que detêm depósitos ban-
cários, encorajando assim a permanência desses fundos na sua economia. E daí que,
por ironia, já se tenha afirmado que os dois maiores paraísos financeiros-fiscais do
mundo são duas ilhas: a ilha de Manhattan e Londres, capital de uma ilha.
As vantagens proporcionadas pelos territórios de regime fiscal privilegiado multi-
plicam-se quando se encontram (excepcionalmente) abrangidos por convenções con-
tra a dupla tributação: é o caso de Malta, de Chipre, das Antilhas Holandesas (tratado
de dupla tributação com a Holanda) 15 e da Ilha da Madeira (abrangida pelos tratados
de dupla tributação assinados por Portugal). Pode, assim, cumular-se o benefício da
isenção de imposto de renda sobre o lucro das sociedades e sobre o lucro distribuído

XXII Semana de Estudos de Derecho Financiero, Madrid 1974, 313; BORlS GOMBAC, Les Zones
Franches en Europe, Bruxelas 1991; ROBERT EFFROS (org.), Emet;ging Financiai Centers - Le-
gal and Institucional Framework, Washington 1982; JosÉ SANTACANA, El mundo de los paraisos
fiscales (2 a ed.), Barcelona 1992; FEDER1CO G. SCARLATA, Global Tax Planning and Offihore
Opportunities, Helsingborg 1995; SOL PICCIOTTO, International Business Taxation, Londres
1982, 117; RICARDO E. RlVEIRO, Paraísos fiscales: Aspectos tributários y societários, Buenos
Aires, 2003; MAluA TERESA BARBOT VEIGA DE FARIA, Paraísos fiscais: formas de utilização e
medidas de combate à evasão fiscal, CTF, 409/410 (2003), 87.

13 Cfr. GOUTHIERE, Les impóts, 645 ss.


14 Cfr. LEVlNE, La lutte contre l'tfvasion fiscale, 64 ss.
15 Veja-se um exemplo de fimcionamcnto da Convenção entre a Holanda e as Antilhas Holan-
desas, em GOUTHJ!óRE, Les impóts, 663; LEVINE, La lutte, 55.
Título IV I Capo IV I Elisão Fiscal e Elementos de Conexão

aos sócios, com o benefício da redução das alíquotas quanto aos rendimentos que lhes
forem pagos por residentes em países signatários dos tratados em causa16 •
A qualificação genérica de refugio fiscal pode hoje atribuir-se a um número ainda
vasto de países e territórios, na sua grande maioria qualificados como regimes fiscais
prejudiciais na União Europeia ou como regimes fiscais preferenciais ou paraísos fis-
cais pela OCDE, por exemplo: na Europa, as Ilhas Anglo-Normandas (Jersey, Guern-
sey, Man), Andorra, Gibraltar, Luxemburgo, Liechtenstein, Mônaco, Suíça, Chipre,
Malta; na América do Norte e América Central, as Antilhas Holandesas, Bermudas,
Ilhas Cayman, Ilhas Virgens Britânicas (BVI), Panamá; na América do Sul, Uruguai;
na África, Libéria; na Ásia e Oceania, Hong-Kong, Novas Hébridas, Nauru.
Relativamente à identificação deste tipo de regimes, conclui-se de uma análise
de direito comparado que, para efeitos de aplicação de medidas de controle da con-
corrência fiscal prejudicial, existem três tipos de soluções: uma definição em termos
comparativos de países e territórios que poderão ser considerados como paraísos
fiscais, uma definição absoluta e uma enumeração casuisticamente por listas ("listas
negras" e "listas cinzas").

b) As políticas relativas à concorrência fiscal prejudicial

A matéria relativa aos chamados "paraísos fiscais" tem sido nos últimos anos ob-
jeto da atenção de organizações internacionais com vistas a restringir as suas conse-
quências negativas no que concerne à alegada "erosão" das receitas fiscais dos países
mais industrializados.
Esta atenção não se tem restringido, porém, aos territórios classicamente consi-
derados de nula ou baixa tributação, abrangendo também "regimes fiscais preferen-
ciais" concedidos por países ou territórios de elevados níveis de tributação, mas que
têm igualmente por efeito a referida "erosão" das receitas fiscais de outro ou outros
Estados, em termos de estes poderem considerar que tais regras, analogamente aos
paraísos fiscais, têm por consequência uma "concorrência fiscal prejudicial".
Como já se observou, em certos países de tributação normal, em razão de uma
"fiscalidade de geometria variável"l?, existem zonas do seu território sujeitas a re-
gimes fiscais privilegiados: é o que sucede (ou sucedia recentemente) com os "cen-
tros de coordenação" na Bélgica; com o Intemational Financiai Services Centre de
Dublin, na Irlanda; com o Centro Financeiro Internacional de Trieste, na Itália; com
a Zona Especial Canária, na Espanha; com o Centro Internacional de Negócios ou
Zona Franca da Ilha da Madeira, em Portugal l8 .

16 efr. LEVINE, La lutte, 78.


17 efr. TULIO ROSEMJluJ, Derecho Fiscal Internacional, cit., 240.
18 efr. BORIS GOMBAC, Les Zones Franches en Europe, passim; GOUTHIÊRE, Les impôts dans les affai-
res internationales, Paris 1991, 653.
I PJf.I I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Referidas práticas têm sido consideradas, por alguns, como modalidades de "eli-
são" ou "evasão", já não praticados pelos contribuintes, mas pelos próprios Estados
nas suas relações recíprocas, práticas essas que legitimariam medidas de retorsão dos
outros Estados com fundamento na autotutela dos seus interesses fiscais19.
Foi sobretudo a partir dos anos 1980 que se registrou uma tendência generaliza-
da de introdução de regimes fiscais preferenciais ou privilegiados, essencialmente no
tocante à constituição de centros fmanceiros, sociedades holding, centros de coorde-
nação, de serviços, atividades de resseguros etc. 20 A generalização deste tipo de regi-
mes traduziu-se numa resposta dos países a uma crescente integração, acompanhada
de uma ausência de coordenação.
Com efeito, muitos desses regimes foram abolidos ou alterados, em sequência
dos trabalhos sobre a concorrência fiscal prejudicial, levados a efeitos na União Eu-
ropeia e na OCDE.
Assim sucedeu com o Internacional Financial Services Centre de Dublin, na Ir-
landa, com o Centro Financeiro Internacional de Trieste, na Itália, e com o Centro
Internacional de Negócios ou Zona Franca da Ilha da Madeira, em Portugal, profun-
damente modificados pelos mesmos motivos.
Importa, no entanto, ter em consideração que alguns destes regimes foram au-
torizados pela Comissão das Comunidades Europeias, como auxílios de Estado sob
a forma fiscal compatíveis com a política de concorrência, visando temporariamente
objetivos de desenvolvimento regional. 21

19 Na expressão de Tuuo ROSEMBUJ, Derecho Fiscal Internacional, cit., 224 ss.; Roy ROHATGI,
Basic International TtlXation, 569.
20 Estes regimes fiscais caracterizaram·se, no essencial, pela redução da alíquota do imposto so-
bre as sociedades, tendo em vista a atração de investimento estrangeiro. Sobre este aspecto,
veja-se SÍLVIA GIANNINI, Mercado interno e fiscalidade: aspectos económicos, CTF, 401 (2001).
Relativamente à tributação das sociedades na União Europeia, vide ANA PAULA DOURADO,
A tributação dos rendimentos de capitais: A harmonização na Comunidade Europeia, CCTF,
176 (1996); PAULA PEREIRA, A tributação das sociedades na União Europeia. Entraves fiscais ao
mercado interno e estratégias de atuação comunitária, Coimbra, 2004; GABRIELA PINHEIRO, A
fiscalidade direta na União Europeia, Porto, 1998.
21 Cfr. BORIS GOMBAC, Les Zones Franches en Europe, passim; GOUTHIERE, Les impôts, 653; GEOR·
GE MARTÍN LOPEz, Competencia fiscal prejudicial y ayudas de Estado en la Union Europea, Valên-
cia, 2006. Cfr. ANTÔNIO DE MOURA BORGES, Considerações sobre o combate à concorrência
tributária internacional prejudicial, RFDT 12 (2004), 53; CLOTILDE CELORICO PALMA, O
controle da concorrência fiscal prejudicial na União Europeia - Ponto de situação dos tra·
balhos do Grupo do Código de Conduta, in J. L. SALDANHA SANCHES/ANTÓNIO MARTINS
(org.), Homenagem a José Guilherme Xavier de Basto, Coimbra 2006, 127; ID., O controlo
da concorrência fiscal prejudicial. Principais medidas conjuntas e unilaterais adoptadas por
Portugal, RFDT 26 (2007), 143; Luz MARiA RUIBAL PEREIRA, La compatibilidad de los re-
gímenes fiscales privilegiados en la Unión Europea con los criterios contenidos en el Código
de Conducta y las normas sobre ayudas de Estado, in MARíA TERESA SOLER ROCH/FERNANDO
SERRANO ANTóN (org.), Las medidas antiabuso en la normativa interna espanola y en los conve-
nios para evitar la doble imposiciôn internacional y su compatibilidad con el Derecho Comunitario,
Título IV I Capo IV I Elisão Fiscal e Elementos de Conexão I• I

(i) A política da OCDE


No âmbito da OCDE o primeiro trabalho de grande alcance sobre esta matéria,
elaborado por sugestão dos países do (então) G-7, foi o Relatório de 9 de abril de
1998, denominado Harmful Tax Competition: An Emerging Global Issue, aprovado
com a abstenção do Luxemburgo e da Suíça, por motivos ligados ao segredo bancá-
rio (doravante "Relatório").
O Relatório é estruturado em três capítulos, onde trata, respectivamente, dos
efeitos do fenômeno da globalização em nível dos sistemas fiscais, dos fatores iden-
tificativos dos paraísos fiscais e dos regimes fiscais preferenciais e das recomendações
aprovadas para combatê-los. O Relatório consagra a chamada "regra dos três R": os
países devem remove'!; rever e refrear os regimes fiscais preferenciais.
Quanto aos critérios identificadores dos paraísos fiscais, são basicamente aponta-
dos quatro fatores-chave:
(i) Tributação nula ou mínima dos rendimentos.
De notar que este fator é apresentado, simultaneamente:
- como uma condição necessária para a identificação dos paraísos fiscais, podendo
ser suficiente para a respectiva qualificação enquanto tal caso se combine com o fato
de a jurisdição em apreço se apresentar, ou ser reconhecida, como um local em que os
contribuintes se podem evadir à tributação nos respectivos países de residência;
- como ponto de partida para a classificação de uma jurisdição como tal, deven-
do ser confirmado pela verificação cumulativa de outros critérios;
(ii) Falta de uma troca efetiva de informações, consagrada, quer legislativamen-
te, quer através de práticas administrativas que conduzam a tal resultado;
(iii) Falta de transparência relativamente às disposições legais ou administrativas;
(iv) Ausência de atividades econômicas substanciais, traduzida na falta de de-
terminação de que a atividade econômica desenvolvida seja relevante, o
que redunda na atração de investimentos por motivos estritamente fiscais.
Tal como o Relatório salienta, a importância de cada um dos fatores-chave, depen-
de, em grande parte, do contexto particular, pelo que deverá ser aferida casuisticamente.
No que se reporta aos fatores identificativos dos regimes fiscais preferenciais dos
países-membros, são de difícil destrinça dos fatores identificativos dos paraísos fis-
cais, persistindo uma zona cinza de difícil delimitação. Assim, temos como fatores-
chave de identificação dos regimes fiscais preferenciais:
(i) Alíquotas de tributação efetivas nulas ou mínimas. Este fator é visto como
um ponto de partida necessário para determinar se um regime fiscal é ou
não nocivo, devendo, contudo, ser conjugado com a verificação de um ou
alguns dos outros fatores-chave previstos;

Madrid 2002, 207. Cfr. também, sobretudo sobre os trabalhos da OCDE, JACQUES MALHERBE,
Harmfol Tax Competition and the Future ofFinancial Centres in the European Union, Intertax,
30 (2002).
Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

(ii) Regimes ring fencing, ou seja, parcial ou totalmente isolados dos mercados
domésticos do país em causa. O ring fencing pode assumir diversas formas,
como, vg., o fato de, implícita ou explicitamente, excluir os residentes dos
benefícios concedidos ou proibir as empresas que beneficiam do regime de
operar no mercado nacional;
(iii) Falta de transparência, quer em nível da concepção do regime, quer em nível da
respectiva aplicação prática (aspectos legislativos e práticas administrativas);
(iv) Falta de uma troca efetiva de informações quanto aos contribuintes que
beneficiam do regime.
Relativamente aos regimes fiscais preferenciais, o Relatório indica ainda outros
fatores a ter em consideração para efeitos da respectiva qualificação enquanto tal,
como, por exemplo, a definição artificial da base tributável; o não acolhimento dos
princípios internacionais de fixação dos preços de transferência, concretamente das
Diretrizes da OCDE de 1995 22 ; a isenção do pagamento de imposto no país de resi-
dência, relativamente aos rendimentos estrangeiros; a existência de níveis de alíquotas
ou de bases tributáveis negociáveis; a existência de regras sobre confidencialidade; o
fato de a medida fiscal ser o motivo principal para a decisão do exercício da atividade;
o rácio entre as atividades desenvolvidas e o volume do investimento e do rendimento
obtido; e a falta de uma rede ampla de convenções para evitar a dupla tributação.
Note-se que o Relatório prevê que na avaliação de um regime como pre-
ferencial se tenham em consideração os respectivos efeitos econômicos, dado se
considerar existirem motivos extrafiscais que poderão justificar a existência e ma-
nutenção de certos regimes. É neste sentido, aliás, que deverão ser interpretados os
respectivos §§ 27° e 80° a 84°.
Quanto aos paraísos fiscais, o Relatório prevê a elaboração de uma lista para o
efeito, bem como a existência de contramedidas, firmes e adequadas, suscetíveis de
constituírem uma relevante fonte dissuasória do desenvolvimento de novos paraísos
fiscais. Neste contexto, as recomendações preveem já algumas sanções aplicáveis,
como, por exemplo, a denúncia, pelos países-membros, das convenções celebradas
com tais jurisdições, equacionando-se igualmente a possibilidade de restrição das
deduções de pagamentos efetuados a entidades domiciliadas em paraísos fiscais, a
aplicabilidade de regras específicas em matéria de preços de transferência e de subca-
pitalização e a eventualidade de aplicação de medidas extrafiscais.
O leque das contramedidas ou medidas defensivas, aplicáveis aos paraísos fiscais
constantes da lista, tem sido uma problemática analisada na OCDE, tendo-se enten-
dido que deverão ser aplicadas de forma coordenada.
Os paraísos fiscais foram classificados em cooperantes e não cooperantes. São coo-
perantes os que se comprometem com a OCDE a adotar os princípios do Relatório,
em especial a trocar informações, de acordo com o modelo OCDE de troca de infor-

22 OECD, Transfer Pricing Guidelines For MultinaeionalEnterprises and TaxAdministrations, 1995.


Título IV I Capo IV I Elisão Fiscal e Elementos de Conexão

mações de 2002 (Model Agreement on Exchange oflnformation on Tax Matters). Estes


"paraísos fiscais" não constam da lista, que assim fica reduzida aos "paraísos fiscais
não cooperantes", relativamente aos quais serão aplicadas as referidas sanções 23 .
Os "relatórios de progresso" elaborados periodicamente pelo Forum Global da
OCDE classifica países e territórios em três categorias: (i) jurisdições que já imple-
mentaram substancialmente o padrão fiscal internacionalmente aceite; (ii) jurisdições
que se comprometeram a implementar esse padrão, mas ainda não o fizeram (distin-
guindo-se neste grupo os paraísos fiscais propriamente ditos e "outros centros finan-
ceiros"); e (iii) jurisdições que não se comprometeram à referida implementação.
No último relatório esta última categoria, que até muito recentemente incluía
Andorra, o Liechtenstein e o Mônaco, já não abrange nenhum país ou territóri024 .
Tal fato deve-se à forte reação internacional contra a manutenção do sigilo ban-
cário que se seguiu à crise financeira de setembro de 2008 e que levou a uma pressão
no sentido da adoção generalizada do padrão da OCDE em matéria de troca de
informações 25 .

(ii) A política da União Europeia


A regulação da concorrência fiscal prejudicial no âmbito da União Europeia foi
objeto de um Código de Conduta no Domínio da Fiscalidade das Empresas aprovado
pelo Conselho da União Europeia e os representantes dos governos dos Estados-mem-
bros reunidos no Conselho ECOFIN de 10 de dezembro de 1997 ("Código")26.
Referido Código não tem caráter juridicamente vinculante, sendo apenas um
"compromisso político", insuscetível de afetar os direitos e obrigações dos Estados-
membros (soft-law).
Ao contrário do Relatório da OCDE, que restringe o seu âmbito de aplicação
aos setores financeiro e de serviços, o Código abrange a fiscalidade das empresas em
geral, reportando-se às "medidas que tenham ou sejam suscetíveis de ter uma incidên-
cia sensível na localização das atividades econômicas na Comunidade" (ponto A).
Com efeito, esta maior amplitude justifica-se tendo presente que a integração
econômica plena no âmbito da União Europeia pressupõe a eliminação, no grau mais
amplo possível, de todos os fatores que afetam a concorrência, notadamente regimes
fiscais especialmente favoráveis que sejam concedidos por lJl11 Estado-membro para
atrair atividades econômicas para o seu território em detrimento dos demais.

23 As listas dos paraísos fiscais consta dos Relatórios de progresso dos trabalhos do Fórum da
OCDE para as Práticas da Concorrência Fiscal Prejudicial, disponíveis no site da OCDE
24 Julho de 2009.
25 Cfr. infra, 661 ss.
26 Este documento (também conhecido por Código Monti) bem como o relatório do grupo
"Código de Conduta" de 1999 encontram-se publicados nos Cadernos de Ciência e Técnica
Fiscal nO 185, Centro de Estudos Fiscais, Lisboa 2000.
r~.;\1 Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

o Código aplica-se exclusivamente no domínio da fiscalidade direta, mais con-


cretamente à tributação das pessoas jurídicas, sendo excluídas a tributação indireta
das pessoas jurídicas e a tributação das pessoas físicas e restando uma certa indefmi-
ção quanto ao domínio da parafiscalidade.
No contexto da fiscalidade direta das pessoas jurídicas, pretende-se combater as
medidas fiscais prejudiciais, abrangendo as disposições legislativas, regulamentares e
as práticas de natureza administrativa que tenham ou sejam suscetíveis de ter uma
incidência sensível na localização das atividades econômicas no seio do espaço co-
munitário, englobando-se igualmente no conceito de atividades econômicas todas as
atividades exercidas dentro do mesmo grupo de sociedades.
N a acepção do previsto no ponto B do Código, deverão considerar-se como
potencialmente prejudiciais as medidas que prevejam um nível de tributação efetivo,
incluindo a alíquota zero, significativamente inferior aos normalmente aplicados no
Estado-membro em causa27 , sendo que tal nível de tributação pode resultar da taxa
nominal de imposto, da base de cálculo ou de qualquer outro fator pertinente. O Có-
digo prevê, a título meramente exemplificativo, cinco critérios de avaliação da prejudi-
cialidade das medidas e uma cláusula de exclusão da prejudicialidade (pontos B e G).
Quanto aos critérios de aplicação do Código, concretamente ao processo de ava-
liação das medidas como potencialmente prejudiciais, preveem-se cinco critérios ge-
néricos, não taxativos nem cumulativos, aos quais foram aditados, no desenrolar dos
trabalhos no Grupo do Código de Conduta, entretanto constituído, dois subcritérios.
Consequentemente, para se aferir se uma medida é prejudicial na acepção do
Código, há que ter em consideração, nomeadamente, os seguintes critérios (previs-
tos no ponto B):
1. Se as vantagens são concedidas exclusivamente a não residentes ou para
transações realizadas com não residentes, ou
LA Se as vantagens são concedidas a não residentes ou para transações reali-
zadas com não residentes (critério adicionado pelo Grupo do Código de
Conduta);
2. Se as vantagens são totalmente isoladas da economia interna, sem incidên-
cia na base fiscal nacional, ou
2.A Se as vantagens são parcialmente isoladas da economia interna, sem inci-
dência na base fiscal nacional (critério adicionado pelo Grupo do Código
de Conduta e que segue o critério adotado no relatório da OCDE para as
práticas fiscais prejudiciais);

27 O Código de Conduta não se aplica a medidas de caráter geral, em que a alíquota geral de
tributação em matéria de imposto sobre as sociedades de um país, como o caso da Estônia,
seja de 0%, ou da Irlanda, em que a alíquota geral é de 12,5%.
Título IV I Capo IV I Elisão Fiscal e Elementos de Conexão

3. Se as vantagens são concedidas, mesmo que não exista qualquer atividade


econômica real, nem qualquer presença econômica substancial, no Estado-
membro que proporciona essas vantagens fiscais;
4. Se o método da determinação dos lucros resultantes das atividades internas
de um grupo multinacional se afasta dos princípios geralmente aceites em
nível internacional, notadamente das regras aprovadas pela OCDE;
5. Se as medidas fiscais carecem de transparência, notadamente quando as
disposições legais não sejam aplicadas de forma menos rigorosa e não
transparente em nível comunitário.

o ponto G do Código, no seu primeiro parágrafo, determina que durante o


processo de avaliação se deverão apreciar os efeitos das medidas fiscais sobre os ou-
tros Estados-membros, tendo em consideração os níveis de tributação efetiva das
atividades em causa em toda a Comunidade.
Releve-se que, nos termos do último parágrafo do ponto G, inserto no Código
por intervenção das delegações portuguesas e espanholas, se determina que, desde
que as medidas fiscais sejam utilizadas para apoiar o desenvolvimento econômico
de regiões específicas, se deverá igualmente avaliar se as mesmas são proporcionais
e orientadas para os objetivos pretendidos, sendo neste contexto prestada "especial
atenção" às características e condicionalismos particulares das regiões ultraperiféricas
e das pequenas ilhas.
Em conformidade com o previsto no Código (nos pontos C e D), os Esta-
dos-membros deverão desmantelar (rollback) e congelar (standstill) as medidas
prejudicais.
Para efeitos de aplicação dos princípios do Código foi constituído em 1998 o
Grupo do Código de Conduta da Fiscalidade das Empresas ou Grupo Primarol0 28 ,
que tem levado a efeito diversos trabalhos, entre os quais se destaca o "Relatório
Primarolo", que contém 66 medidas "qualificadas como prejudiciais"29.
Tendo em vista que as medidas abrangidas pelo Código de Conduta poderão
sê-lo igualmente pelas normas do Tratado da União Europeia relativas aos auxílios
de Estado, o Código, no seu ponto J, estabelece que a Comissão deverá publicar as
diretrizes para aplicação das regras relativas a tais auxílios às medidas que respeitam
à fiscalidade direta das empresas.
A análise do regime do Código revela a existência de diferenças significativas
com o Relatório OCDE, que a seguir esquematicamente se apresentam 30 •

28 Do nome da sua presidente, a britânica DAWN PRIMAROLO.


29 O relatório final do Grupo, mais conhecido como Relatório Primarolo, foi entregue ao Con-
selho Ecofin de 29 de Novembro de 1999 - Relatório final do Grupo Código de Conduta
para o Ecofm de 29 de Novembro de 1999 (SN 4901/99, de 23 de novembro).
30 Cfr. ANTONIO CARLOS DOS SANTOS e CLOTILDE CELORICO PALMA, A regulação internacional
da concorrência fiscal prejudicial, CTF 395, 35.
@ Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Código de Conduta Relatório OCDE

Natureza jurídica Compromisso político Recomendação

Serviços financeiros e outras


Âmbito material Fiscalidade das empresas prestações de serviços com grande
mobilidade geográfica

Além da DE, territórios depen-


Países de OCDE e cláusula de
dentes e associados e cláusula
compromisso de incentivar países
Âmbito geográfico de compromisso de adoção dos
não membros a se associarem aos
princípios do Código em nível
princípios do Relatório
internacional

Leis, regulamentos e práticas


Leis, regulamentos e práticas
Medidas abrangidas administrativas, não necessaria-
administrativas
mente de natureza fiscal

• Nível de tributação efetiva,


incluindo a taxa zero, significa-
• Nível de tributação baixo,
tivamente inferior ao nível que
Fatores identificativos incluindo a taxa zero, nos ren-
se aplica às mesmas situações
dimentos relevantes
das medidas prejudiciais • Ring fencing
a ter em consideração na • Ring fencing
• Falta de transparência
• Falta de transparência
avaliação • Falta de atividades econômicas
• Ausência de troca efetiva de
reaIS
informações relevantes
• Determinação dos lucros segwl-
do os critérios da OCDE

• Base tributável definida artifi-


• Níveis de tributação efetiva das cialmente
atividades na Comunidade - • Determinação dos lucros com
Efeitos das medidas nos outros base nos critérios da OCDE
Estados-membros • Os rendimentos estrangeiros
• Proporcionalidade das medi- são geralmente isentos?
das e direcionamento para os • Existência de regras confiden-
Outros fatores a ter em
objetivos pretendidos caso se ciais
consideração na avaliaçao
destinem a apoiar o desenvol- • A medida fiscal é O motivo prin-
vimento econômico de regiões cipal para a decisao do exercício
específicas de atividades?
• Especial atenção às especificida- • Relação entre as atividades
des das regiões ultraperiféricas desenvolvidas e o volume do
e das pequenas ilhas investimento e do rendimento
obtido

Standstill e eliminaçao das medi-


Standstill e eliminação das medi-
Formas de atuaçao das prejudiciais. Regra dos três R
das prejudiciais
- Refrear, Rever e Remover
Título IV I Capo IV I Elisão Fiscal e Elementos de Conexão

c) Os auxílios de Estado de natureza fiscal


O mecanismo dos auxílios de Estado representa uma importante limitação à
atuação dos Estados-membros em matéria fiscal. De acordo com o Tratado da União
Europeia, prevê-se uma proibição genérica de princípio à concessão de auxílios de
Estado. O atual art. 87 do Tratado (antigo art. 92) determina no seu nO 1 que, "salvo
disposição em contrário, são incompatíveis com o mercado comum, na medida em
que afetem as trocas comerciais entre os Estados-membros, os auxílios concedidos
pelos Estados ou provenientes de recursos estatais, independentemente da forma
que assumam, que falseiem ou ameacem falsear a concorrência, favorecendo certas
empresas ou certas produções".
Os auxílios de Estado podem assumir diversas formas, entre elas a forma fiscal 31 •
O legislador comunitário não definiu o que se entende por auxílio de Estado, tarefa
da qual se incumbiu a doutrina e a abundante jurisprudência do Tribunal de Justiça das
Comunidades. Contudo, na sua Comunicação sobre a aplicação das regras relativas aos
auxílios estatais às medidas que respeitam à fiscalidade direta das empresas 32 , a Comissão
entende que, para que uma medida seja qualificada como auxílio de Estado nos termos
do Tratado, tem que preencher cumulativamente quatro critérios, a saber: (i) deve con-
ferir aos seus beneficiários uma vantagem que diminua os encargos que normalmente
oneram os seus orçamentos33 ; (ii) a vantagem deve ser concedida pelo Estado ou atra-
vés de recursos estatais; (iii) a medida deve afetar a concorrência e as trocas comerciais
entre os Estados membros; (iv) e a medida deve ser específica ou seletiva, no sentido de
favorecer certas empresas ou certas produções, isto é, deve dirigir-se a alvos específicos
(certas empresas, setores, regiões, produções ou atividades), como por exemplo as pe-
quenas e médias empresas, as medidas de apoio à investigação e desenvolvimento ou ao
ambiente, as medidas de promoção do desenvolvimento regional34 .

31 Sobre esta matéria cfr. ANTóNIO CARLOS DOS SANTOS, Auxz7ios de Estado e fiscalidade, Coim-
bra, 2003; MANUEL MARTINS, Auxílios de Estado no Direito Comunitário, Lisboa, 2002; FER-
NANDO AURÉLIO ZILVETl, Subsídios fiscais no Direito Tributário Internacional, RDTI, nO 6
(2007),23 ss.
32 Comunicação 98/C 384/03, de 10 de dezembro de 1998.
33 Tal vantagem pode ser concedida através de uma redução da carga fiscal da empresa sob
diversas formas, designadamente uma redução da base de cálculo (deduções derrogatórias,
amortizações extraordinárias ou aceleradas, inscrição de reservas no balanço etc.), uma re-
dução total ou parcial do montante do imposto (isenção, crédito de imposto etc.) e um
adiamento, uma anulação ou um reescalonamento excepcional da dívida fiscal.
34 Importa, a este propósito, distinguir os auxílios fiscais das medidas fiscais de caráter geral. A
aplicação pela Irlanda da alíquota geral de imposto sobre as sociedades de 12,5% é considerada
pela Comissão como uma medida de política fiscal geral e não como um aux:ílio de Estado, pois
não tem carácter seletivo: não se destina diretamente a um setor, nem a uma região, a uma em-
presa ou a certas empresas, sendo aplicável a todo o território irlandês. Pode, se produzir fortes
distorções de concorrência, ser questionada, mas com base nas normas do Tratado relativas à
harmonização das legislações, nomeadamente, nos artigos 96 e 97 do Tratado. Contudo estas
normas nunca foram utilizadas para este efeito, sendo duvidoso que o venham a ser.
Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Em conformidade com a jurisprudência do Tribunal de Justiça das Comunidades,


configura-se como um auxílio de Estado toda a medida destinada a isentar, total ou par-
cialmente, as empresas de um determinado setor dos encargos derivados da aplicação do
sistema geral, sem que tal isenção se justifique pela natureza ou economia do sistema35 •
Ou seja, a Comissão e a jurisprudência delimitaram o conceito de ajuda de Es-
tado de uma forma tão ampla que abrange não apenas as subvenções ou subsídios a
fundo perdido ou reembolsáveis, mas medidas ou ações tão díspares como a boni-
ficação de juros, as garantias pessoais (fianças) ou as transferências de fundos para
empresas públicas. Este conceito abrange igualmente a despesa fiscal, em especial, os
incentivos, benefícios e perdões fiscais.
Como exceções pontuais à proibição geral das ajudas de Estado, o art. 87, nos seus
nOS 2 e 3, vem, respectivamente, enunciar taxativamente as situações em que tais auxí-
lios "são compatíveis com o mercado comum" e em que "podem ser compatíveis com
o mesmo mercado comum". São situações excepcionais, nas quais a Comissão tem a
possibilidade de, automaticamente ou por intervenção discricionária, aprovar certos
auxilios ou regimes de auxilios setoriais, regionais, horizontais, após análise casuística,
tendo em conta a sua conformidade com o direito comunitário em geral, o cumprimen-
to dos parâmetros estabelecidos nas suas comunicações, orientações e linhas diretrizes
sobre a matéria, o respeito de certos princípios ou critérios por ela adotados (interesse
comunitário, transparência, subsidiariedade, proporcionalidade) e um balanço econô-
mico, ainda que muito menos exaustivo do que em matéria de legislação antitrust. As
ajudas em causa poderão ser auxílios ao investimento ou ao funcionamento, destinados
a diminuir as despesas correntes das empresas e com caráter excepcional.
Para que um auxílio seja considerado compatível com o mercado comum, deverá
ser notificado pelo Estado-membro à Comissão, para que esta o autorize. Só após essa
autorização é que o regime poderá entrar em vigor, ou seja, a autorização da Comissão é
condição de eficácia do regime de auxílios de Estado. Os auxílios não notificados são consi-
derados ilegais, sendo os Estados-membros obrigados a recuperar junto das empresas be-
neficiárias tais auxílios, bem como os declarados incompatíveis com o mercado comum.
Os regimes de auxílios existentes estão sujeitos a um exame permanente pela
Comissão em colaboração com os Estados-membros, que devem para o efeito fazer
entrega de relatórios anuais sobre os regimes existentes.
Os auxílios de Estado têm sido apresentados como uma quarta via destinada a
combater a concorrência fiscal prejudicial. Em sequência dos atos então adotados, so-
bretudo da referida Comunicação da Comissão sobre auxílios de Estado e fiscalidade
direta, a Comissão procedeu a um reexame dos auxílios de Estado em vigor de forma a
analisar a sua compatibilidade com o mercado comum, atendendo aos efeitos produzi-
dos e aos objetivos econômicos alcançados, tendo levado a cabo uma extensa interven-
ção contra aqueles que se afiguravam como ilegais ou incompatíveis com o Tratado.

35 Acórdão do Tribunal de Justiça de 2 de julho de 1974, Itália/Comissão, processo 173/73,


Coletânea, 1974,709.
Título IV I Capo IV I Elisão Fiscal e Elementos de Conexão

Contrariamente ao que acontece com o Código de Conduta, que é um texto de


natureza política, um compromisso político, o regime dos auxílios de Estado é um
regime jurídico previsto no Tratado. Como os critérios subjacentes ao Código de
Conduta e aos auxílios de Estado têm muitos pontos de contato, a verdade é que a
Comissão encontrou na aplicação deste regime um meio de dar eficácia jurídica a um
documento essencialmente político, como é o Código.
Constituem exemplos de aplicação do regime de auxílios de Estado os regimes
da Zona Franca da Madeira, o regime espanhol da Zona Especial Canária (ZEC), o
regime belga dos Centros de Coordenação, as antigas medidas irlandesas do aeropor-
to de Shanon e das docas de Dublin e as "holding 1929" do Luxemburgo.

B) Os países com tributação favorecida e


regimes fiscais privilegiados na legislação brasileira

a) O conceito de países com tributação favorecida


o Brasil consagrou pela primeira vez a expressão "país com tributação favore-
cida" na Lei na 9.430/96, em matéria de preços de transferência, com a fmalidade
de submeter a esse regime as operações que, inobstante não sejam efetuadas com
"pessoas vinculadas" a pessoas jurídicas domiciliadas no Brasil, sejam residentes ou
domiciliadas nos chamados "paraísos fiscais"36.
O art. 24 da referida lei defme "país com tributação favorecida" (designação
dada na epígrafe desta disposição) como aquele país "que não tribute a renda ou que
a tribute à alíquota máxima inferior a vinte por cento", acrescentando o § lOque,
"para efeito do disposto na parte final deste artigo, será considerada a legislação tri-
butária do referido país, aplicável às pessoas físicas ou às pessoas jurídicas, conforme
a natureza do ente com o qual houver sido praticada a operação"37.
Por sua vez, o § 3° do mesmo artigo (introduzido pela Lei na 10.451, de 10.5.02)
acrescenta que, "para caracterização do país ou dependência com tributação favorecida,
considerar-se-á, separadamente, a tributação do rendimento do trabalho e do capital"38.

36 efr. ALBERTO XAVIER, ROBERTO DUQUE ESTRADA, RENATA EMERY, Países com tributação fa-
vorecida e regimes fiscais privilegiados, in RDDT 168, 2009, 7 sS.; HELENa TORRES, Ope-
rações com países de tributação favorecida - Algumas reflexões, in VALDIR DE O. ROCHA
(coord.), Grandes questões atuais do direito tributário, 13° vol., São Paulo 2009, 153 sS.
37 A Instrução Normativa nO 243/02 esclarece, no seu art. 39, § 3°, que, "na aplicação do dis-
posto neste item, a alíquota efetiva de tributação, no país de residência da pessoa física ou
jurídica, será determinada comparando-se a soma do imposto pago sobre o lucro, na pessoa
jurídica e na sua distribuição, com o lucro apurado de conformidade com a legislação brasi-
leira, antes dessas incidências".
38 A lei afirma que o nível de tributação do país em causa seja determinado conforme a legisla-
ção aplicável à "natureza do ente" com o qual tiver sido praticada a operação. Entendemos
I ~ I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier <I

ALei nO 10.451, de 10 de maio de 2002, veio estender no seu art. 4° a aplicação


automática do regime de preços de transferência para além dos países de tributação
favorecida, às operações efetuadas com países com sigilo societário, assim considerados
aqueles "cuja legislação interna oponha sigilo relativo à composição societária de
pessoas jurídicas ou à sua titularidade".
Esta extensão insere-se na tendência mundial no sentido de considerar como ele-
mento relevante para a qualificação de uma jurisdição como "paraíso fiscal" não apenas o
nível de tributação efetiva, mas também a opacidade das operações que nele se realizam.
ALei nO 11.727/08 veio introduzir um novo § 4° ao art. 24 da Lei nO 9.430/96,
segundo o qual "considera-se também país ou dependência com tributação favore-
cida aquele cuja legislação não permite o acesso a informação relativa à composição
societária de pessoas jurídicas, à sua titularidade ou à identificação do beneficiário
efetivo de rendimentos atribuídos a não residentes".
Com este novo § 4° a hipótese do país com sigilo societário (mais aperfeiçoada
na sua redação que a do art. 4° da Lei nO 10.451/02, por abranger também a identifi-
cação do beneficiário efetivo) deixou de ser uma categoria autônoma para passar a ser
uma simples espécie de país com tributação favorecida, que doravante passou a aco-
lher tanto as situações de baixa ou nula tributação quanto as de opacidade societária.
Os países ou dependências de tributação favorecida e sigilo societário constam
de enumeração taxativa (black list) da Instrução Normativa nO 1.037, de 4 de junho
de 2010 (ver ainda o Ato Declaratório Executivo nO 11, de 24 de junho de 2010).
São eles: I - Andorra; II - Anguilla; III - Antígua e Barbuda; IV - Antilhas Ho-
landesas; V - Aruba; VI - Ilhas Ascensão; VII - Comunidade das Bahamas; VIII-
Bahrein; IX - Barbados; X - Belize; XI - Ilhas Bermudas; XII - Brunei; XIII - Cam-
pione D'Italia; XIV - Ilhas do Canal (Alderney, Guernsey, Jersey e Sark); XV - Ilhas
Cayman; XVI - Chipre; XVII - Cingapura; XVIII - Ilhas Cook; XIX - República
da Costa Rica; XX - Djibouti; XXI - Dominica; XXII - Emirados Árabes Unidos;
XXIII - Gibraltar; XXIV - Granada; XXV - Hong Kong; XXVI - Kiribati; XXVII
- Lebuan; XXVIII - Líbano; XXIX - Libéria; XXX - Liechtenstein; XXXI - Macau;
XXXII - Ilha da Madeira; XXXIII - Maldivas; XXXIV - Ilha de Man; XXXV - Ilhas
Marshall; XXXVI - Ilhas Maurício; XXXVII - Mônaco; XXXVIII - Ilhas Montserrat;
XXXIX - Nauru; XL - Ilha Niue; XLI - Ilha Norfolk; XLII - Panamá; XLIII - Ilha
Pitcairn; XLIV - Polinésia Francesa; XLV - Ilha Queshm; XLVI - Samoa America-
na; XLVII - Samoa Ocidental; XLVIII - San Marino; XLIX - Ilhas de Santa Helena;

que esta consideração apenas se aplica se o regime tributário mais favorável do país estran-
geiro for definido em função de características subjetivas da entidade em causa (por exemplo,
uma isenção que atinja todos os rendimentos de uma certa pessoa, em função do seu objeto),
mas não em função de características objetivas, dependendo da narureza dos rendimentos
auferidos, como é o caso das holdings (como as brasileiras), isentas ou menos tributadas em
relação aos dividendos, ou o caso de sociedades tributadas em relação à generalidade dos
rendimentos, mas não assim em relação aos rendimentos de origem externa (como sucedia
no Brasil antes da abolição do princípio da territorialidade).
Título IV I Capo IV I Elisão Fiscal e Elementos de Conexão

L - Santa Lúcia; LI - Federação de São Cristóvão e Nevis; LII - Uha de São Pedro e
Miguelão; LIII - São Vicente e Granadinas; LIV - Seychelles; LV - Uhas Solomon;
LVI - St. Kitts e Nevis; LVII - Suazilândia; LVIII - Suíça; LIX - Sultanato de Omã;
LX - Tonga; LXI - Tristão da Cunha; LXII - Ilhas Turks e Caicos; LXIII - Vanuatu;
LXIV - Uhas Virgens Americanas; LXV - Uhas Virgens Britânicas.
Referida lista reveste natureza taxativa, como aliás é a praxe internacionalmente
adotada pela grande generalidade dos países que consagram esta metodologia.
Já se defendeu a natureza meramente exemplificativa dessa lista, em homena-
gem ao princípio da legalidade, arvorado em valor supremo, que conduziria à pree-
minência incondicional da lei sobre os atos normativos da Administraçã0 39 •
Porém, nesta matéria o princípio da legalidade tem de ser temperado, através de
um processo de ponderação de valores, de modo a que as soluções adotadas atendam
também a outros valores relevantes do ordenamento constitucional.
Um deles reside nos princípios da proteção da confiança e da boa-fé, manifesta-
ções da segurança jurídica igualmente inerente ao Estado de Direito e que conduz ao
caráter aut(J)Jinculante dos atos normativos da Administração Pública, pois é com a in-
terpretação da lei a que deram publicidade, com fms de padronização e uniformização,
que os particulares contam para formar as suas expectativas e fundar as suas condutas.
Outro valor que aponta na mesma solução é o princípio hierárquico da Admi-
nistração Pública, pelo qual os órgãos administrativos de aplicação da lei (em ma-
téria tributária, os órgãos de lançamento) estão vinculandos aos atos normativos da
própria Administração, não podendo deles desvincular-se recorrendo ''per saltum" à
própria lei, de modo a "reinterpretar" o que as autoridades administrativas compe-
tentes já tinham interpretado por atos normativos internos.
Desta dupla fonte de autovinculação não decorre a irrevogabilidade ou imuta-
bilidade das "fontes internas" infralegais (respeitadas, porém, a proteção das expec-
tativas), mas sim a proibição do venire contra factum proprium, isto é, de os órgãos de
aplicação do direito, através de atos primários, agirem em desrespeito à interpretação
normatizada da Administração, ainda que com fundamento na preeminência da lei40 •
Uma outra ordem de princípios conduz também à necessidade de uma lista
taxativa no caso peculiar de qualificação de regimes jurídicos de lei estrangeira. Ofen-
deria, na verdade, os princípios da proporcionalidade, da razoabilidade e da proteção
de confiança colocar sobre os ombros do contribuinte o fardo da prova de leis estran-

39 Cfr. ANA CLÁUDIA UTUMI, Países com tributação favorecida no Direito brasileiro, in HELENO
TORRES (coord.), Direito Tributário Internacional Aplicado, São Paulo 2003, espec. 236 ss.
Trata-se, porém, de posição minoritária na doutrina. A Administração fiscal já se pronunciou
no sentido da taxatividade; Cfr. as Decisões sobre consulta da 7a RF 49/00 e 8a RF 143/00.
Ver ainda as Soluções de Consulta nO 19/01, nO 85/01, nO 136/02 e nO 37/03.
40 Sobre o complexo problema doutrinário da solução das antinomias normativas pelo critério
hierárquico, veja-se a monografia exaustiva de PAULO OTERO, Legalidade e administração
pública: o sentido da vinculação pública à juridicidade, Coimbra 2007, espec. 690 sS.
-fi- Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier
geiras, estendendo a estas a presunção de pleno conhecimento que os ordenamentos
jurídicos estabelecem em relação às leis nacionais.

b) O conceito de países com regime fiscal privilegiado


A Lei nO 11.727/08 introduziu duas disposições novas na Lei nO 9.430/96, a
par do art. 24: um art. 24-A e um art. 24-B, que dispõem o seguinte:
''Art. 24-A. Aplicam-se às operações realizadas em regime fiscal privilegiado as
disposições relativas a preços, custos e taxas de juros constantes dos arts. 18 a
22 desta Lei, nas transações entre pessoas físicas ou jurídicas residentes e domi-
ciliadas no País com qualquer pessoa física ou jurídica, ainda que não vinculada,
residente ou domiciliada no exterior.
"Parágrafo único. Para efeitos deste artigo, considera-se regime fiscal privilegia-
do aquele que:
"I - não tribute a renda ou a tribute à alíquota máxima inferior a 20%
(vinte por cento);
"H - conceda vantagem de natureza fiscal a pessoa física ou jurídica não
residente:
- sem exigência de realização de atividade econômica substantiva no
país ou dependência;
- condicionada ao não exercício de atividade econômica substantiva
no país ou dependência;
"IH - não tribute, ou o faça em alíquota máxima inferior a 20% (vinte por
cento), os rendimentos auferidos fora de seu território;
"IV - não permita o acesso a informações relativas à composição societátia,
titularidade de bens ou direitos ou às operações econômicas realizadas."
''Art. 24-B. O Poder Executivo poderá reduzir ou restabelecer os percentuais
de que tratam o caput do art. 24 e os incisos I e HI do parágrafo único do art.
24-A, ambos desta Lei.
"Parágrafo único. O uso da faculdade prevista no caput deste artigo poderá
também ser aplicado, de forma excepcional e restrita, a países que componham
blocos econômicos dos quais o País participe."
Finalmente o art. 30 da Lei nO 11.941, de 27 de maio de 2009 (Lei de conver-
são da Medida Provisória nO 449, de 3 de dezembro de 2008), deu nova redação ao
art. 24-A, atrás citado, que passou a vigorar com a seguinte redação:
''Art. 24-A ............... .
"Parágrafo único. Para os efeitos deste artigo, considera-se regime fiscal privile-
giado aquele que apresentar uma ou mais das seguintes características:
" "
Com esta redação a lei tornou claro, em preceito de alcance interpretativo, que
os requisitos indispensáveis à caracterização de um país como de regime fiscal pri-
Título IV I Capo IV I Elisão Fiscal e Elementos de Conexão

vilegiado são de verificação alternativa e não cumulativa) bastando para o efeito a


verificação de apenas um deles. Esta declaração ajusta-se, aliás, plenamente ao que já
decorria da melhor interpretação do texto original.
Para melhor compreensão, segue o artigo 24-A em sua redação atual na integra.
'~. 24-A. Aplicam-se às operações realizadas em regime fiscal privilegiado as
disposições relativas a preços, custos e taxas de juros constantes dos arts. 18 a
22 desta Lei, nas transações entre pessoas físicas ou jurídicas residentes e domi-
ciliadas no País com qualquer pessoa física ou jurídica, ainda que não vinculada,
residente ou domiciliada no exterior.
"Parágrafo único. Para os efeitos deste artigo, considera-se regime fiscal privile-
giado aquele que apresentar uma ou mais das seguintes características (Redação
dada pela Lei nO 11.941, de 2009).
"I - não tribute a renda ou a tribute à alíquota máxima inferior a 20%
(vinte por cento);
"lI - conceda vantagem de natureza fiscal a pessoa física ou jurídica não
residente:
"a) sem exigência de realização de atividade econômica substantiva
no país ou dependência;
"b) condicionada ao não exercício de atividade econômica substanti-
va no país ou dependência;
"IlI - não tribute, ou o faça em alíquota máxima inferior a 20% (vinte por
cento), os rendimentos auferidos fora de seu território;
"IV - não permita o acesso a informações relativas à composição societária,
titularidade de bens ou direitos ou às operações econômicas realizadas."

c) As modalidades de regime fiscal privilegiado e a distinção


relativamente ao conceito de tributação favorecida
Podemos discernir quatro modalidades de regime fiscal privilegiado, que aliás já
se encontravam catalogadas nos estudos da OCDE e da União Europeia41 •

41 Na OCDE os critérios que conduzem à qualificação como regime fiscal privilegiado são (i) a
taxa de tributação efetiva nula ou mínima, (ii) a adoção dos chamados regimes "ring fencing)),
pelo qual os benefícios são apenas aplicáveis a não residentes e a operações realizadas fora
do mercado nacional; (iii) a falta de transparência no que concerne aos aspectos legislativos e
às práticas administrativas; (iv) a falta de uma troca efetiva de informações relativamente aos
contribuintes que beneficiam do regime. No Código de Conduta da União Europeia a ca-
racterização de uma medida como potencialmente prejudicial depende de avaliação efemada
de harmonia com cinco critérios não cumulativos, nem taxativos, constantes do ponto B, a
saber: (i) se as vantagens são concedidas exclusivamente a não residentes ou para transações
realizadas com não residentes; ou (ii) se as vantagens são total ou parcialmente isoladas da
economia interna, sem incidência na base fiscal nacional: ou (iii) se as vantagens são con-
cedidas mesmo que não exista qualquer atividade econômica real nem qualquer presença
econômica substancial no Estado-membro que proporciona essas vantagens fiscais; ou (iv)
Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

A primeira modalidade é a nula ou baixa tributação: coincide ela com o núcleo origi-
nal do conceito de país com tributação favorecida, só que agora o grau de tributação não
visa qualificar a jurisdição tributante, mas o regime aplicável à operação objetivamente tri-
butável, ainda que por país que não possa ser considerado como de tributação favorecida.
A segunda modalidade é o ring fencing, assim denominados os regimes que con-
cedem tratamento fiscal preferencial a não residentes (qualquer "vantagem", note-se,
e não necessariamente uma nula ou baixa tributação), isolando as operações benefi-
ciadas do mercado interno, protegido como que por um "anel". A vantagem pode
ser concedida seja considerando irrelevante o fato de ser exercida ou não no país em
causa atividade econômica substantiva (alínea a), seja condicionada ao não exercício
nesse país dessa mesma atividade econômica substantiva (alínea b).
A terceira modalidade é a territorialidade, assim entendido o regime pelo qual os
rendimentos (ou certos rendimentos) não são tributados ou o são em alíquota máxima
inferior a 20% por terem sido auferidos fora do território de um dado país (territoria-
lidade plena e territorialidade mitigada ou tributação favorecida da renda externa).
Quanto a esta modalidade convém observar que ela apenas pode ser considera-
da como regime fiscal privilegiado se o fundamento da não tributação (ou da tributa-
ção reduzida) é a origem externa do rendimento, não sendo possível considerar como
de regime fiscal privilegiado os casos em que as leis internas de determinados países
isentam (ou tributam menos gravosamente) certas categorias de rendimentos, inde-
pendentemente da sua origem (p. ex., dividendos isentos, sejam de origem interna,
sejam de origem externa).
A quarta e última modalidade é a opacidade, consistente no fato de não ser permi-
tido o acesso a informações relativas à composição societária, titularidade de bens ou
direitos ou às operações econômicas realizadas. A opacidade, que a lei já considerava
característica dos países com tributação favorecida, surge agora como modalidade au-
tônoma de regime fiscal privilegiado, alargado à "opacidade objetiva" (relativa à pró-
pria operação), por contraposição à "opacidade subjetiva" (relativa aos sujeitos).
Uma comparação entre os conceitos de país com tributação favorecida e de
regimes fiscais privilegiados revela, desde logo, que enquanto o primeiro qualifica
subJetivamente as entidades tributantes, o segundo qualifica obJetivamente as operações
tributáveis, seja qual for a natureza do ente tributante.
Note-se também que das quatro modalidades de regime fiscal privilegiado duas
referem-se a atributos que também caracterizam os países com tributação favorecida
(o baixo nível da tributação e a opacidade), enquanto que outras duas (ring fencing e
territorialidade) não são critérios adequados para definir uma entidade política como
dispondo de uma "tributação favorecida".

se o método de determinação dos lucros resultantes das atividades internas de um grupo


multinacional de empresas se afasta dos princípios geralmente aceites em nível internacional,
nomeadamente das regras aprovadas pela OCDE; ou (v) se as medidas fiscais carecem de
transparência, inclusive quando as disposições legais sejam aplicadas de forma menos rigo-
rosa e não transparente em nível administrativo.
Título IV I Capo IV I Elisão Fiscal e Elementos de Conexão MiM

Veremos adiante por quê.

d) Consequências fiscais comuns a países de tributação


favorecida e com regime fiscal privilegiado
o direito positivo atribui as seguintes consequências à qualificação tanto como
país de tributação favorecida quanto como país com regime fiscal privilegiado.
(i) aplicação das disposições relativas a preços de transferência às transações
com pessoas físicas ou jurídicas, ainda que não vinculadas, neles residentes
ou domiciliadas (Lei nO 9.430/96, art. 24-A);
(ii) regime especial de perda de residência no Brasil para pessoas físicas resi-
dentes ou domiciliadas no Brasil que transferirem sua residência para país
em dependência com tributação favorecida ou regime fiscal privilegiado
(Lei nO 12.249, de 11 de junho de 2010, art. 27);
(iii) regras especiais de subcapitalização quanto a juros pagos ou creditados por
fonte situada no Brasil a pessoas físicas ou jurídicas neles residentes ou domi-
ciliadas (Lei nO 12.249, de 11 de junho de 2010, art. 25);
(iv) regras especiais de dedutibilidade de pagamentos efetuados, direta ou in-
diretamente, a pessoas físicas ou jurídicas neles residentes ou domiciliadas
(Lei nO 12.249, de 11 de junho de 2010, art. 26).
As matérias referidas nos itens (i) (ii) e (iii) serão tratadas e desenvolvidas nos
capítulos próprios42 .
Agora comentar-se-á apenas a norma constante do art. 26 da Lei nO 12.249/2010
que respeita à dedutibilidade para fins de IRPJ e CSL das importâncias pagas, credi-
tadas, entregues, empregadas ou remetidas a qualquer título, direta ou indiretamen-
te, a pessoas físicas ou jurídicas residentes ou constituídas no exterior e submetidas
a um tratamento de país ou dependência com tributação favorecida ou sob regime
fiscal privilegiado.
Referido preceito submete a dedutibilidade destas despesas a três requisitos de
verificação cumulativa.
O primeiro consiste na identificação do efetivo beneficiário da entidade no exte-
rior, destinatário dessa importância, assim considerada a pessoa física ou jurídica que,
simultaneamente: a) não tenha sido constituída com o único ou principal objetivo
de economia tributária; e b) auferir esses valores por sua própria conta e não como
agente, administrador fiduciário ou mandatário por conta de terceiro.
Trata-se de exigência inspirada nos mesmos motivos antielisivos que estão na
base de cláusula de beneficiário efetivo introduzida nas convenções contra a dupla

42 Cfr. respectivamente supra, 222 (transferência de residência), infra, 297 (preços de transfe-
rência) e infra, 346 (subcapitalização).
-li:- Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

tributação por recomendação da OCDE como forma de contrariar práticas de treaty


shvpping pela utilização de conduit companies4 3 •
O segundo requisito consiste na comprovação da capacidade operacional da pessoa
física ou entidade no exterior que realizar a operação. A constatação da substância da
entidade estrangeira deverá naturalmente ter em conta a adequação dos meios mate-
riais e humanos de que dispõe à específica atividade exercida pela entidade em causa.
Finalmente o terceiro requisito de dedutibilidade consiste na comprovação docu-
mental do pagamento do preço respectivo e do recebimento dos bens, direitos ou utiliza-
ção do serviços, exigindo-se assim a efetividade das prestações recíprocas das partes.
A Lei nO 12.249, de 11 de junho de 2010, inovando relativamente à versão
inicial da Medida Provisória nO 472/09, veio esclarecer que o preceito em causa não
se aplica ao pagamento de juros sobre o capital próprio e que a comprovação da capa-
cidade operacional é dispensada no caso de operações que não tenham sido efetuadas
com o único e principal objetivo de economia tributária e ainda em que a beneficiária
das importâncias pagas a título de juros seja subsidiária integral, filial ou sucursal de
pessoa jurídica remetente domiciliada no Brasil e tenha seus lucros tributados na for-
ma do art. 74 da Medida Provisória nO 2.158-35, de 24 de agosto de 200l.
O art. 26 da Lei nO 12.249/2010 consagra, assim, um sistema que se aparenta à
sistemática da inversão do ônus da prova, constante do art. 238-A do Código Fiscal
francês (CGI), e que impõe ao residente na França que faça pagamentos a domicilia-
dos em paraíso fiscal o ônus da prova da realidade e normalidade da operação44 •

43 Cfr. infra 279.


44 Pelo seu caráter paradigmático, refira -se em especial a Lei francesa (art. 238-A do Code Gé-
néral des Impôts) que adota a técnica da inversão do ônus da prova, no caso de pagamentos
efetuados por pessoas nsicas ou jurídicas sujeitas à tributação francesa, de juros, ruyalties, re-
muneração de serviços ou qualquer outro pagamento, quando o beneficiário for domiciliado
ou estabelecido num Estado ou território de fiscalidade privilegiada. Em tais casos, o Fisco
só aceita a dedutibilidade de tais despesas se o contribuinte provar o caráter real das ope-
rações em causa e que as remunerações não apresentam um caráter anormal ou exagerado.
Note-se que o simples fato de a operação ser realizada em território de fiscalidade privilegia-
da dispensa a prova de um vínculo de dependência entre as empresas, exigido pelo art. 57 do
Code General des Impôts quando a transação se realiza entre Estados de regime fiscal similar,
cfr. o estudo exaustivo deste preceito em J. -J. CASTAGNÉDE, Précis de ftscalité internationale
(2 a ed.), 2006, no ss. NEuER, Fraude ftscale internationale, 99 SS.; TIXIER/KEROGUES, Droit
Fiscal International, 1974, 55 ss.; GESTjTIXIER, Droit Fiscal International, 453 ss.; PIERRE
FONTANEAU, La lurte contre l'évasion fiscale internationale, Diritto e Pratica Tributaria 3
(1976), 507 ss.; GOUTHIIóRE, Les impôts, 674 ss.; B. PLAGNET, Droit Fiscal International, 135;
CARTOU, Droit Fiscal International, 276; DUCCINI, Approche ftscale des contrats internationaux,
Paris 1985, 32; R. SAUNDERS, Principies ofTax Planning, 49. Na Itália, ver MAISTO, Il regime
tributario delle operazione intercorrenti tra imprese residenti e società estere soggerte a re-
gime fiscale privilegiato, Rivista di Diritto Tributario I (1991), 757; R. CoRDEIRO GUERRA,
Il nuovo regime delle operazioni con società domiciliate in paesi a bassa fiscalità, Rivista di
Diritto Tributario I (1992), 277.
Título IV I Capo IV I Elisão Fiscal e Elementos de Conexão &fll
e) Aplicação exclusiva da alíquota agravada de retenção
na fonte MS países de tributação favorecida
Coloca-se a questão de saber se o conceito de regime fiscal privilegiado, intro-
duzido pelo art. 24-A e definido no seu parágrafo único teria resultado em uma am-
pliação indireta das hipóteses de aplicação da alíquota agravada (25%) do imposto
de renda na fonte, previstas na legislação tributária para as operações com residentes
em país de tributação favorecida.
No que concerne aos rendimentos emgeral, o art. 8° da Lei n° 9.779, de 19 de
janeiro de 1999, dispõe que:
'1\rt. 8° Ressalvadas as hipóteses a que se referem os incisos V, VIII, IX, X e XI
do art. l° da Lei nO 9.481, de 13 de agosto de 1997, os rendimentos decorrentes
de qualquer operação, em que o beneficiário seja residente ou domiciliado em
país que não tribute a renda ou que a tribute à alíquota máxima inferior a 20%
(vinte por cento), a que se refere o art. 24 da Lei nO 9.430, de 27 de dezembro
de 1996, sujeitam-se à incidência do imposto de renda na fonte à alíquota de
25% (vinte e cinco por cento )."
No mesmo sentido dispõe o § 4° do art. lOdo Decreto nO 6.761, de 5 de feve-
reiro de 2009:
"Os rendimentos mencionados nos incisos I a V do caputJ recebidos por pessoa
física ou jurídica residente ou domiciliado em país ou dependência que não tri-
bute a renda ou que a tribute à alíquota inferior a vinte por cento, a que se refre
o art. 24 da Lei nO 9.430, de 27 de dezembro de 1996, sujeitam-se ao imposto
sobre a renda na fonte à alíquota de vinte e cinco por cento (Lei nO 9.279, de 19
de janeiro de 1999, art. 8° e Lei nO 11.727, de 23 de junho de 2008, art. 22)."
A regra de que os pagamentos efetuados a "paraísos fiscais" se submetem à alí-
quota de 25% comporta duas ordens de exceções: (i) estão sujeitos à alíquota de 15%
os pagamentos de a) despesas com instalação e manutenção de escritórios comerciais
e de representação, de armazéns, depósitos ou entrepostos; b) despesas de arrenda-
mento mercantil de bens de capital; c) juros de empréstimos externos por prazo igual
ou superior a 15 anos nas condições do inciso VIII; d) juros, comissões, despesas e
descontos decorrentes de colocação no exterior de títulos de crédito internacionais;
(ii) por sua vez estão sujeitos à alíquota zero, a) juros de desconto de cambiais de
exportação e respectivas comissões, e b) juros e comissões relativos a créditos desti-
nados ao financiamento de exportações.
No que concerne aos ganhos de capital de residentes em país ou dependência
com tributação favorecida, a que se refere o art. 24 da Lei nO 9.430/96, só mais tarde
passaram a estar sujeitos à alíquota de 25% (art. 47 da Lei nO 10.833/07), ressalva-
dos os relativos a investimentos estrangeiros, individuais ou coletivos, no mercado
de renda variável, oriundos de país que tribute a renda à alíquota inferior a 20%, o
qual sujeitar-se-á às mesmas regras estabelecidas para os residentes ou domiciliados
no País (art. 16 da MP nO 2.189-49/01).
-u.- Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Veremos agora que a introdução do art. 24-A não afetou quaisquer das hipóte-
ses de aplicação de alíquota agravada do imposto de renda na fonte de residentes no
exterior, por quatro razões, que a seguir se expõem.

(i) Autonomia do art. 24-A em relaçtfu ao art. 24

A primeira razão consiste em que o art. 24-A não modificou o texto do art. 24
da Lei nO 9.430/96, mas estabeleceu regra nova, a par da já existente. Isto mesmo
se conclui pela própria leitura do seu caput, em que é introduzido o conceito novo
de regime fiscal privilegiado para fins (inicialmente) exclusivos de aplicação das regras
de preços de transferência, tanto que faz remissão apenas aos arts. 18 a 22 da Lei nO
9.430/96, sem se referir ao art. 24.
E tanto se trata de um dispositivo legal autônomo em relação ao art. 24 que tal
artigo foi introduzido como art. 24-A. Ora, segundo a técnica legislativa, a repetição
do número de um artigo acrescido de uma letra maiúscula representa precisamente a
introdução de novo dispositivo legal, sem implicar a renumeração dos artigos subse-
quentes, pela razão lógica de que eventual renumeração conduziria a distorções caso
outras leis fizessem remissão ao artigo renumerado.
É o que decorre da Lei Complementar nO 95, de 26 de fevereiro de 1998, com
as alterações introduzidas pela Lei Complementar nO 107, de 26 de abril de 2001,
que dispõe sobre a elaboração, a redação, a alteração e a consolidação das leis e cujo
art. 12, UI, "b", dispõe:
''A alteração da lei será feita:
I -mediante reprodução integral em novo texto, quando se tratar de alteração
considerável;
U - mediante revogação parcial;
UI - nos demais casos, por meio de substituição, no próprio texto, do dispositivo
alterado, ou acréscimo de dispositivo novo, observadas as seguintes regras:
a) revogado;
b) é vedada) mesmo quando recomendável) qualquer renumeraçtfu de artigos
e de unidades superiores ao artigo) referidas no inciso V do art. 10) devendo
ser utilizado o mesmo número do artigo ou unidade imediatamente anterior,
seguido de letras maiúsculas) em ordem alfabética) tantas quantas forem su-
ficientes para identificar os acréscimos; ( .... )"

(ii) O elemento histórico: o texto original do projeto de converstfu da MP 413/08

A segunda razão pela qual entendemos que o art. 24-A não teve o alcance de
modificar o conceito de país de tributação favorecida, contido no art. 24 da Lei nO
9.430/96, de modo a conduzir à aplicação da alíquota agravada de retenção na fonte
(25%) também a países com regime fiscal privilegiado, reside no elemento histórico
Título IV I Capo IV I Elisão Fiscal e Elementos de Conexão

da hermenêutica e decorre do processo legislativo que culminou na aprovação do


texto final da Lei nO 11.727/08.
Ao texto original do projeto de conversão da Medida Provisória nO 413/08, poste-
riormente convertida na atrás referida Lei nO 11.727/08, foi acrescentado o art. 22 por
proposta do Ministério da Fazenda, que inicialmente continha a seguinte redação:
'1\rt. 22. O art. 24 da Lei nO 9.430, de 27 de dezembro de 1996, passa a vigorar
acrescido dos seguintes parágrafos:
"Art. 24 .................................................................... .

"§ 4° Considera-se também país ou dependência com tributação favorecida


aquele cuja legislação não permita o acesso a informações relativas à composição
societária de pessoas jurídicas, à sua titularidade ou à identificação do benefici-
ário efetivo de rendimentos atribuídos a não residentes.
"§ 5° O disposto neste artigo aplica-se também a regime fiscal privilegiado que
apresente, alternativamente, as seguintes características:
I - não tribute a renda ou a tribute à alíquota efetiva inferior a 20% (vinte
por cento);
II - conceda vantagem de natureza fiscal a pessoa física ou jurídica não
residente:
a) sem exigência de realização de atividade econômica substantiva no
país ou dependência;
b) condicionada ao não exercício de atividade econômica substantiva
no país ou dependência;
III - não tribute, ou o faça em alíquota efetiva inferior a 20% (vinte por
cento), os rendimentos auferidos fora de seu território;
IV - não permita o acesso a informações relativas à composição societária,
titularidade de bens ou direitos ou às operações econômicas realiza-
das." (NR)
Posteriormente, a proposta original do Ministério da Fazenda foi alterada, ten-
do constado no texto final aprovado pelo Congresso Nacional a atual redação do art.
23 da Lei nO 11.727/08, que em lugar de introduzir vários novos parágrafos ao art.
24 acrescentou um novo artigo (art. 24-A) à Lei nO 9.430/96.
O mero exame comparativo do texto original proposto pelo Ministro da Fa-
zenda e aquele aprovado pelo Congresso Nacional demonstra que na proposta
original pretendia-se de fato ampliar o conceito de país de tributação favorecida
contido no art. 24 da Lei nO 9.430/96, com a introdução não só do § 4°, mas tam-
bém do § 5°, segundo o qual "o disposto neste artigo aplica-se também a regime fiscal
privilegiado . .. "
Já no texto final aprovado pelo Congresso Nacional, e com exceção da modifica-
ção introduzida pelo novo § 4°, o conceito de país de tributação favorecida permane-
ceu inalterado, uma vez que se optou por introduzir uma nova disposição legal, a par
-li1 Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

do art. 24 já existente, na qual criou-se o conceito novo e autônomo de regime fiscal


privilegiado para o fim de estender àqueles casos as disposições relativas a preços, custos e
taxas de juros constantes dos arts. 18 a 22 da Lei nO 9.430/96.
Veja-se mais uma vez que o art. 24-A sequer faz referência ao art. 24 que, com
redação bastante similar, prevê que "as disposições relativas a preços, custos e taxas
de juros, constantes dos arts. 18 a 22, aplicam-se, também, às operações efetuadas
por pessoa física ou jurídica residente ou domiciliada no Brasil, com qualquer pessoa
física ou jurídica, ainda que não vinculada, residente ou domiciliada em país que não
tribute a renda ou que a tribute à alíquota máxima inferior a vinte por cento".
Trata-se, pois, de uma norma autônoma que visou a estender a aplicação das
regras de reajustamento de preços também às operações com beneficiário que se en-
quadre no conceito de regime fiscal privilegiado, conceito este que não se confonde com
o conceito de país com tributação favorecida nem visa a modificá-lo.

(iii) A técnica da 1'emissão por absorção


A terceira razão pela qual o art. 24-A não tem o alcance de ampliar as hipóteses
de alíquota agravada de retenção na fonte de residentes no exterior está em que os
dispositivos legais que preveem tal agravamento o fazem não através do recurso a um
conceito genérico e indeterminado de país com tributação favorecida, mas geralmente
por expressa remissão ao art. 24 da Lei nO 9.430/96, regra que, como se viu, não se
confunde com a do novo art. 24-A, nem foi por ela alterada.
Trata-se da bem conhecida técnica da remissão por absorção, através da qual um
preceito legal se apropria do conteúdo de um outro, limitando-se a remeter para o
dispositivo que o contém.
Este é o caso, por exemplo, dos rendimentos em geral, a que se refere o art. 8°
da Lei nO 9.779/99, segundo o qual "ressalvadas as hipóteses a que se referem os
incisos V, VIII, IX, X e XI do art. 10 da Lei nO 9.481, de 13 de agosto de 1997, os
rendimentos decorrentes de qualquer operação, em que o beneficiário seja residente
ou domiciliado em país que não tribute a renda ou que a tribute à alíquota máxima
inferior a vinte por cento, a que se refere o art. 24 da Lei nO 9.430, de 27 de dezembro
de 1996, sujeitam-se à incidência do imposto de renda na fonte à alíquota de vinte e
cinco por cento".
Idêntica técnica foi adotada pelo art. 47 da Lei nO 10.833/03 em matéria de
tributação de ganhos de capital de residente no exterior, cujo texto dispõe que: "( ... )
o ganho de capital decorrente de operação, em que o beneficiário seja residente ou
domiciliado em país ou dependência com tributação favorecida, a que se refere o art.
24 da Lei nO 9.430, de 27 de dezembro de 1996, sujeita-se à incidência do imposto de
renda na fonte à alíquota de 25% (vinte e cinco por cento)".
Assim, para que as alíquotas agravadas passassem a incidir também sobre as ope-
rações sujeitas a regime fiscal privilegiado seria necessária previsão legal expressa que
assim o determinasse, o que, como se viu, não ocorreu com a Lei nO 11.727/08.
Título IV I Capo IV I Elisão Fiscal e Elementos de Conexão

o mesmo se diga, por maioria de razão, do regime especial de equiparação a


residentes no país do investimento estrangeiro a que se refere o art. 16 da MP nO
2.189-49/2001 (regra aplicável aos investimentos estrangeiros abrangidos pela Re-
solução CMN nO 2.689, de 26 de janeiro de 2000), disposição essa que nem sequer
faz menção ao art. 24 da Lei nO 9.430/96.
Note-se, por fim, que sempre que a lei quis submeter à mesma disciplina fiscal
tanto os países com tributação favorecida quanto os de regime fiscal privilegiado fê-
lo de modo expresso, como sucede nas hipóteses previstas na Medida Provisória nO
472, de 15 de dezembro de 2009 (convertida na Lei nO 12.249/2010).

(iv) Vinculação do conceito de regime fiscal privilegiado


à política da concorrência fiscal prejudicial
A estas três razões de ordem técnica e formal subjaz uma quarta, ainda mais
forte, de índole substancial, que a todas sobreleva: é a de que a consagração do con-
ceito de regime fiscal privilegiado como conceito jurídico autônomo do de país com
tributação favorecida e não como simples espécie ou modalidade deste resulta de
este ter sido construído precisamente como instrumento de combate às práticas de
concorrência fiscal prejudicial (harmful tax competition), enquanto o de tributação fa-
vorecida visou a compensar o Estado da fonte de uma tributação insuficiente no país do
beneficiário dos rendimentos.
No combate à concorrência fiscal prejudicial os Estados visam a evitar que os
lucros e outros rendimentos se deslocalizem para outros Estados em função de uma
taxação objetivamente mais favorávelJ erodindo as receitas dos que se consideram po-
tencialmente mais legitimados para as auferir. Esta taxação mais favorável pode de-
correr de uma tributação efetiva mais baixa, mas pode também decorrer de um regi-
me de ring ftncing ou da adoção de um princípio de territorialidade quanto a lucros
ou certos outros rendimentos.
E daí que a própria OCDE recomende a adoção de medidas especiais de reação
contra estes regimes na área de transferpricing, por se justificar uma política corretiva das
distorções introduzidas na formação de preços objetivos de mercado (armJs length).
São ainda razões de concorrência fiscal prejudicial relacionadas com uma tribu-
tação objetivamente mais favorável de certos países e territórios que levaram a Me-
dida Provisória nO 472, de 15 de dezembro de 2009, a introduzir medidas de reação
às práticas em que tal concorrência se traduz, como é o caso da subcapitalização (art.
25), da dedução de pagamentos (art. 26) e da transferência de residência de pessoas
físicas (art. 28).
Já, porém, os atributos de ring ftncing ou de territorialidade (próprios dos re-
gimes fiscais privilegiados) não são adequados para caracterizar um país como de
tributação favorecida, para efeitos de agravamento de alíquota de retenção na fonte.
No que concerne ao ring ftncing porque a vantagem dos não residentes se refere mais
Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

aos rendimentos a eles pagos por determinada sociedade e não aos rendimentos por
esta recebidos, potencialmente sujeitos a tributação plena; no que concerne à terri-
torialidade, plena ou mitigada, porque se trata de medidas de política econômica de
livre opção de Estado soberano, que por si sós não devem ser invocadas pelo Estado
da fonte como um fator de discriminação da tributação na fonte.
Esta a razão de fundo que ilumina os demais motivos pelos quais o conceito
de regime fiscal privilegiado não é aplicável para efeitos de determinar a alíquota
agravada de retenção na fonte de residentes no exterior ou para afastar a aplicação do
regime especial de tributação dispensado aos investidores estrangeiros sob o abrigo
da Resolução CMN nO 2.689/00.
A Instrução Normativa nO 1.037, de 4 de junho de 2010, modificada pela Ins-
trução Normativa nO 1.045, de 23 de junho de 2010, procedeu, no seu art. 2°, a uma
enumeração taxativa de quais os regimes que reputa abrangidos no conceito de "regi-
me fiscal privilegiado" (cfr. ainda o Ato Declaratório Executivo nO 10, de 24 de junho
de 2010, tal como o fez, no art. 1°, em relação ao conceito de "país com tributação
favorecida". Ofenderia, na verdade, os princípios da proporcionalidade, da razoabili-
dade e da proteção de confiança colocar sobre os ombros do contribuinte o fardo da
prova de leis estrangeiras, estendendo a estas a presunção de pleno conhecimento que
os ordenamentos jurídicos estabelecem em relação às leis nacionais.

C) Estruturas e tipos societários

Examinemos agora os tipos e estruturas societárias proporcionados pela genera-


lidade ou por certos países ou territórios de tributação favorecida ou de regime fiscal
privilegiado e de que os particulares se socorrem como instrumento de planejamento
fiscal internacional.

a) Sociedades-base

Comecemos pelas sociedades-base (regimes headquarters), conceito que pressupõe


os seguintes requisitos: trata-se de sociedades estrangeiras, ou seja, instaladas em país
diverso do da sociedade-mãe; o país de domicílio é um país de tributação inferior;
são controladas por pessoas físicas ou jurídicas, domiciliadas noutro país; e exercem
a sua atividade operacional num terceiro país4s .
A instituição das sociedades-base assenta no desdobramento de uma mesma ati-
vidade, ciclo ou processo produtivo por diversos territórios sujeitos a ordenamentos

45 Cfr. ANNAMARIA RArAKKO, Base Company Taxation, Deventer/Boston 1989; H. DEBATIN, Die
internationalen Basisgesellschaften, DStZ, 52 (1964-1), 9; BERNHARD GROSSFELD, Basisgesell-
schaften im internationalen Steuerrecht, Tübingen 1974; PETER STADLER, Die Besteuerung der
Basisgesellschaften in der Schweiz unter besonderer Beriicksichtigung der Domizil- und Hilftgesell-
schaften, Sr. GaIlen 1970; PENNERA, Basisgesellschaften im franziisischen Recht, Frankfurt 1976.
Título IV I Capo IV I Elisão Fiscal e Elementos de Conexão I $jlj): I

tributários distintos (dos quais uns mais favoráveis ao contribuinte), de tal sorte que
a tributação global do conjunto será inferior à que resultaria se a mesma atividade
se desenvolvesse integralmente dentro das fronteiras de um só Estado46 • Esse des-
dobramento pode efetuar-se através da criação de simples filiais (branches), ou por
intermédio de subsidiárias dotadas de personalidade jurídica própria.
Essas sociedades (sociedades-base) ou desenvolvem um aspecto parcial do pro-
cesso produtivo global- subjetivando uma parte do fato tributário complexo -, ou
centralizam os resultados obtidos por outra ou outras, pertencentes ao mesmo gru-
po. Tais atividades parciais podem ser parte do processo de fabricação (sociedades de
montagem nas Bahamas e ilhas do Canal), a comercialização de produtos, a presta-
ção de serviços, o controle de marcas e patentes, a emissão de empréstimos (Luxem-
burgo), o seguro das empresas do grupo (captive offshore insurance company]47, ou o
transporte marítimo (sociedades de navegação da Libéria ou das Bermudas).
Costumam distinguir-se as sociedades-base típicas das atípicas. As primeiras são
aquelas cujo domicílio se fIxa em país de baixa tributação, diverso dos países onde se en-
contram domiciliadas a sociedade-mãe e a sociedade-operadora. As segundas são aque-
las cuja empresa-operadora funciona no Estado da sociedade-mãe a que pertence.
A tributação mais moderada no país de instalação, por vezes aliada à dedutibilida-
de das despesas, pagas a tais sociedades (a título de juro, frete, remuneração de serviço)
ou à tributação mais suave dos lucros a elas atribuídos (como é o caso das collapsible
corporations que acumulam receitas a título de juros, rendas, lucros, durante vários anos,
e depois se extinguem, sendo os seus acionistas tributados à taxa mais moderada, que
grava os ganhos de capital), permite a obtenção de fortes economias de imposto.

b) Sociedades holding

(i) Natureza
Muito se tem discutido a respeito do conceito de sociedade holding. Enquanto
uns (como as doutrinas norte-americana, francesa e italiana), fiéis à terminologia
internacional dos negócios e à raiz etimológica da expressão anglo-saxônica, a carac-
terizam como a sociedade que é titular, que detém (do inglês, to hold) participações
no capital de outra sociedade, ainda que não relevantes ou duradouras, outros (na
esteira da Companies Act inglesa de 1948) preferem reservar esta expressão para as
hipóteses em que, através dessa participação, a sociedade participante controla a so-

46 Cfr. ALBERTO MARTINEZ GENIQUE, La problematica fiscal de la empresa multinacional, in


XXII Semana de Estudios de Derecho Financiero, Madrid, 1974, 183.
47 As sociedades de seguros cativas, são usadas para contornar certas legislações que proíbem o
"autosseguro". Tais sociedades "cativas", isto é, controladas pela sociedade-mãe, localizam-se
em territórios que as permitem (Guernsey, Bahamas), assegurando assim a dedutibilidade
dos prêmios pagos pelos residentes em países de fiscalidade elevada, bem como a isenção dos
lucros da sociedade.
I ~ I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

ciedade ou sociedades investidas, enquanto outros ainda (como as leis suíça e luxem-
burguesa) preferem reservá-la para os casos em que a holding seja pura, isto é, tenha
por objeto exclusivo participações noutras sociedades (por oposição às holding mistas
que exercem paralelamente atividades operacionais, de natureza agrícola, industrial
ou de serviços)48.
A participação de sociedades no capital social de outra ou outras ("sociedades
operacionais" - operating companies - que exercem diretamente uma atividade empre-
sarial) não é fenômeno que tenha surgido sem resistências, como recordam ALFREDO
LAMY FILHO e BULHÕES PEDREIRA49 •
A esta ambiguidade conceitual alia-se a diversidade terminológica, proveniente
das tradições e leis de diversos países que se referem - por vezes tendo apenas em
vista certos tipos especiais de holding - a "sociedades de participação", "sociedades
financeiras", "sociedades de investimento", "sociedades controladoras", "sociedades
de administração de participações sociais", "holdings de controle"50.
A especificidade da figura da holding decorre do fato de ser uma "sociedade-sócia",
ou seja, uma sociedade cujo patrimônio se encontra investido, no todo ou em parte, em
participações noutras sociedades - e isto independentemente de através da holding se
exercer ou não o controle das sociedades investidas ou participadas. Com efeito, os pro-
blemas fundamentais relativos ao exercício do poder de controle não dependem necessa-
riamente da natureza jurídica do controlador, que pode ser uma pessoa singular ou um
grupo de pessoas singulares, enquanto os que constituem o cerne do problema relativo

48 O poder do controle nas sociedades anônimas Holding e Investment Trust Società collegate e con-
trollate, I grandi problemi della società per azioni nelle legislazioni vigenti, GOUTHIERE/A. CHAR-
VERlAT/PH. JANIN, Les holdings, Paris 1995; IBFD, The International Cuide to the Taxation of
Holding Companies, IBFD, Amsterdam; Roy ROHATGI, Basic International Taxation, 238.
49 "A participação de wna companhia como acionista de outra surgiu nos Estados Unidos. Na
primeira metade do século XIX nenhuma lei geral reconhecia às companhias capacidade ju-
rídica para possuir ações, o que era então considerado impróprio e perigoso. A aquisição de
ações dependia de autorização de lei estadual especial, que em regra somente era concedida em
caráter excepcional e de modo restrito - para determinadas espécies e quantidades de ações.
Posteriormente, o privilégio de possuir quaisquer ações foi concedido a algwnas companhias,
como as constituídas, entre 1868 e 1872, por charters do Estado da Pensilvânia, inclusive a
Pennsylvania Company - o exemplo mais antigo de holding pura (cujo ativo é constituído ap-
enas de ações e não explora atividade produtiva). O Estado de Nova Jersey promulgou - em
1888 - a primeira lei autorizando qualquer companhia registrada no seu território a incluir
no objeto social a propriedade de ações e foi imitado - entre 1892 e 1899 - pelos Estados de
Nova York, Connecticut, Pennsylvania e Delaware - e até 1929 por mais 33 Estados (cfr. BON-
BRIGHT e MEANS, 1954, v. 7,403-4). Na Europa Continental as sociedades comerciais eram
tradicionalmente concebidas como associações de comerciantes individuais (nas sociedades em
nome coletivo) ou desses comerciantes com aplicadores de capital financeiro (nas sociedades
em comandita), e não se conhecia a participação de wna sociedade comercial em outra, que
somente veio a ser admitida na França a partir de decisão jurisprudencial em 1878 (GÉGOUT,
1929, p. 22)": cfr. A lei das SA., Rio de Janeiro 1992, 77.
50 Cfr. VALENTINO VULPETTI, Società finanziaria, Enc. dei Dir. XLII (1990), 1.113 ss.
Título IV I Capo IV I Elisão Fiscal e Elementos de Conexão &.i+

ao regime de tributação respeitam à natureza jurídica da entidade participante no capital


da sociedade operacional, que é uma pessoa jurídica, uma "sociedade-sócia"S!.
A visão clássica da personalidade jurídica, organicista e "antropomórfica", que
a concebe como um ente real distinto dos seus sócios, com os quais poderia manter
relações jurídicas precisamente nos mesmos moldes com que as manteria com ter-
ceiros independentes, tende a não ver qualquer especificidade na figura da holding, a
qual teria personalidade jurídica distinta das sociedades operacionais em cujo capital
participa, patrimônio independente, constituído por participações sociais, que não
se confundem com os patrimônios das sociedades participadas e capital próprio,
consistente nas ações ou quotas que ela própria emite e que têm indivualidade e leis
de circulação próprias em relação às ações ou quotas das sociedades operacionais que
constituem o seu próprio patrimônio.
Todavia, de há muito se vem reconhecendo que a pessoa jurídica não é a forma
de uma realidade social pré-normativa, que é sempre e só constituída por homens. O
que sucede é que a lei muitas vezes dita uma disciplina peculiar para certa categoria
de relações entre homens, disciplina que se traduz na sua unificação e na sua impu-
tação a uma entidade abstrata, dada a necessidade de imaginar um titular de direitos
e deveres distinto das pessoas singulares. A noção de pessoa jurídica é por isso e por
natureza uma noção funcional e relativa: funcional, porque a referida disciplina nor-
mativa de relações entre homens é ditada para que estes prossigam determinados fins
de um modo mais conveniente e racional; relativa, porque, sendo funcional, ela pode
valer para determinados fins ou efeitos, mas não valer quanto a outrosS 2 •
Ora, é precisamente o caráter instrumental, funcional ou relativo da personali-
dade jurídica que não permite ignorar, no fenômeno da holding, a unidade econômica
subjacente entre holding e sociedade operacional, especialmente em caso de holdings
puras, suavizando o rigor da visão clássica de duas pessoas jurídicas totalmente inde-
pendentes e podendo mesmo conduzir à "desconsideração da personalidade jurídica"
seja da holding, seja das sociedades em que esta participas3 .

51 Cfr. BERARDINO LlBONATTI, Holding e Investment Trust, Milão 1959, 17-18; ASCARELLl, Saggi
di Diritto Commerciale, Milão 1955, 268; FÁBIO KONDER COMPARATO, O poder de controle nas
sociedacle anônimas, São Paulo 1977, 124.
52 Sobre a visão instrumental da personalidade jurídica, especialmente em matéria de socie-
dades, e a crítica à concepção clássica, ver ASCARELLl, Saggi di diritto comerciale, Milão 1955,
168 sS., 151; LrnONKIT!, Holding e Investment Trust, cit., 220 SS.; BERLE e MEANs, TheModern
Corporation and Private Property, Nova Iorque 1984; FÁBIO KONDER COMPARATO, O poder de
controle nas sociedades anônimas, São Paulo 1977, 248 SS.; JVAN M. DOBSON, El abuso de la
personalidadjurídica (en el derechoprivado), Buenos Aires 1991, 1 sS.
53 A doutrina da desconsideração da personalidade jurídica, "disregard of the corporate entity",
"lifting the veil of the corporate entity" ou do "Durchgriff' é criação jurisprudencial que, em
certos casos concretos, atribui diretamente à sociedade-mãe controladora as consequências
jurídicas de atos praticados pelas sociedades controladas, designadamente em matérias de
responsabilidade por dívidas. Veja-se PEDRO CoRDEIRO, A desconsideração da personalidade
mI Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

o fenômeno não passara despercebido ao gênio jurídico de VIVANTE que já em


artigo publicado em 1935 54 observava que, embora formalmente distinto, o patri-
mônio da holding é substancialmente formado pelos mesmos bens que constituem o
patrimônio da sociedade em que a holding participa. Donde o grande jurista concluir
que o patrimônio da holding não passa de um "duplicado" das ações ou quotas das
sociedades operacionais. E alertava para os riscos de as participações de sociedades
no capital de outras sociedades darem origem a "patrimônios fictícios", suscetíveis
de multiplicação ao infinito.
Embora lhe introduza algumas ressalvas, LIBONATTI - autor de magistral mono-
grafia sobre a figura da holding - segue na mesma linha do seu antecessor, ao reco-
nhecer que o problema fundamental daquela figura é a dúplice aplicação da disciplina
jurídica das sociedades (uma vez com referência à sociedade operacional, outra vez
com referência à sociedade holding) quando estão em causa os mesmos bens 55 •
Pode o patrimônio da holding ser juridicamente independente, para certos efei-
tos, dos patrimônios das sociedades em que ela participa, mas isso não deve fazer
perder de vista que o valor das suas participações sociais outro não é que o valor pro-
porcional dos patrimônios das sociedades participadas. É que - sublinha LIBONATTI
- o patrimônio da holding, "sociedade-sócia", deve ser avaliado como "patrimônio de
sócio" e não autonomamente, independentemente da sociedade operacional. Tanto
assim que o patrimônio líquido das duas sociedades, tomadas em conjunto, no caso
de holdings puras, é apenas igual ao patrimônio da sociedade operacionaJ56.
Como corolário deste princípio de unicidade patrimonial 57 , resulta que as ações
ou quotas emitidas pela holding, embora não sejam em rigor meros "duplicados"
das ações ou quotas emitidas pelas sociedades operacionais, como pretendia suges-
tivamente VIVANTE, visto gozarem de autonomia jurídica, não são representativas
de "bens novos" (como sucede nas sociedades operacionais), mas de frações de pa-
trimônios por sua vez consistentes em frações de patrimônios - os das sociedades
operacionais - em que os "bens novos" se situam.
Tais ações são "ações de segundo grau", para usar sugestiva expressão de As-
CARELLl, por sua vez representativas de "bens de segundo grau" que são as próprias

jurídica das sociedades comerciais, in FDL, Nl!Vas perspectivas do Direito Comercial, Coimbra
1988,289 ss. Veja-se ainda JUAN M. DOBSON, EI abuso de la personaiidad jurídica, cit., passim.

54 Cfr. VIVANTE, Le società finanziarie (holding) e le laro responsabilità, Rivista di Diritto Com-
merciaie 1(1935),185.
55 Cfr. LIBONATTI, Holding e Investment Trust, cit., 39.
56 Cfr. LIBONATTI, Holding e Investment Trust, cit., 49.
57 Reconhecer a unicidade patrimonial (a wirtschaftliche Einheitjuristiche Einheit da doutrina
alemã) não significa necessariamente reconhecer juristiche Einheit, conduzindo apenas a
atenuações do seu rigor. Cfr. o clássico SERICK, Rechtsform und Realitiit juristischer Personen,
Tübingen 1955; JUAN M. DOBSON, Ei abuso de ia personaiidad jurídica (en ei derecho privado),
Buenos Aires 1991,419 ss.
Título IV I Capo IV I Elisão Fiscal e Elementos de Conexão

ações das sociedades operacionais 58 • Trata-se de ações emitidas em virtude de uma


"substituição de títulos" (o Effiktensubstitution a que se refere LIEFMANN 59 ), através da
qual novos títulos são emitidos com base num patrimônio por sua vez representado
por outros títulos e aos quais quadraria bem a expressão "títulos de substituição".
O regime jurídico das holdings não é, pois, mero corolário radical da teoria
da independência absoluta de personalidades jurídicas; antes convive com o reco-
nhecimento da realidade de uma unidade econômica e patrimonial subjacente. Se
em certos aspectos prevalece a plena personalidade e independência patrimonial da
holding em relação à sociedade participada, já para outros se dá maior relevância à
constatação de que a holding, especialmente a holding pura, outra coisa não é que um
"espelho" em que se refletem as sociedades operacionais em que participa.
Destes últimos são exemplos a adoção do método de equivalência patrimonial
(equity accounting) na declaração do balanço da holding, cujos investimentos devem
ser avaliados em função do patrimônio das suas participadas, independentemente do
seu custo de aquisição; a adoção de regimes fiscais mais suaves para a tributação de
"intercompany dividends", tendo em vista a identidade econômica do lucro distribuí-
do; e os regimes que, em caso incorporação ou fusão de sociedades operacionais por
sociedades holdings, determinam que essas operações se traduzam por extinção de
participações sociais e não por aumentos de capital60 •

(ii) Regimes favoráveis quanto a dividendos eganhos de capital


Como se viu, uma das principais consequências da natureza da sociedades hol-
ding reside na existência de uma verdadeira dupla tributação econômica dos lucros
distribuídos por outras sociedades, eis que tais lucros, muito embora auferidos por
entidade com personalidade jurídica distinta daquela que os distribui, têm a sua ori-
gem nestes mesmos lucros, pelo que, do ponto de vista econômico, não constituem
manifestação autônoma de capacidade contributiva.
A necessidade de exonerar total ou parcialmente as distribuições inter-societá-
rias de lucros torna-se ainda mais preemente quando entre a empresa operacional e o
beneficiário final da renda se interpõe não apenas uma holding, mas uma pluralidade
de holdings em cadeia vertical.

58 Cfr. AsCARELLI, Riflessioni in tema di titoli azionari, personalità giuridica e società fra soci-
età, Banca, Borsa e Titoli di Credito I (1952),425 ss. (expressão que depois foi adotada pela
Corte de Cassação italiana); ID., Saggi di Diritto Commerciale, Milão 1955, 239.
59 Apud LIBONATTI, Holding e Investiment Trust, cit., 74.
60 Cfr., sobre estes pontos, JosÉ A. ENGRÁCIA AN11JNES, Osgrupos de sociedades, Coimbra 1993,
163 sS.; ANTONIO LOVISOLO, Gruppo di imprese e imposizione tributaria, Pádua 1985; FEDERlCO
PEPE, Holdings,gruppi e bilanci consolidati, Milão 1974,passim. DAVID MÜLCHI PANÍCO, ALFONSO
GARRIDO PICóN, Régimen fiscal de las sociedades holding, in JosÉ A. RODRlGUEZ lNDARZAjÁN-
GEL FERNÁNDEZ PRIETO (org.), Fiscalidad y planificación fiscal internacional, Madrid 2003, 265.
_ ••M Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Tenha-se presente que referida exoneração das distribuições inter-societárias de


dividendos pode ocorrer quer a sociedade operacional e sociedade holding se situem
num mesmo país (dupla tributação econômica interna), quer se situem em países dis-
tintos (dupla tributação econômica internacional).
Nesta última hipótese, enquanto alguns Estados (como Portugal e o Reino Uni-
do) adotam o método da imputação, tributando plenamente o lucro da holding, mas
permitindo a dedução, como crédito, do imposto pago pela sociedade operacional
incidente sobre a parcela do lucro que foi objeto da distribuição, a grande generali-
dade dos países, especialmente europeus, adota o método da isençã061 , método este
que no domínio das distribuições inter-societárias de lucros é vulgarmente conhecido
pelas expressões participation exemption, "privilégio de holding» (holding privilege) ou
"privilégio de afiliação" (Schachtelprivileg)62.
Via de regra os mesmos países que outorgam uma participation exemption quanto
a dividendos exoneram também os ganhos de capital na alienação das participações
societárias detidas pela holding, tendo em vista que tais ganhos de capital são predomi-
nantemente imputáveis a lucros das sociedades participadas ainda não distribuídos.
São essencialmente quatro os requisitos exigidos no Direito comparado para
que as participações societárias se qualifiquem para a outorga da isenção (qualifYing
participations): um período mínimo de detenção da participação societária (minimum
holding period); um percentual mínimo de participação no capital da sociedade parti-
cipada; a submissão da sociedade participada a um mínimo de tributação (liability to
tax); e o relativo à natureza da renda auferida pela participada.
Tais requisitos são estabelecidos ou em leis específicas que versam sobre socieda-
des holding (como é o caso, na Espanha, das Entidades de Tenencia de T-álores Extran-
feros - ETVE, em Portugal, das Sociedades Gestoras de Participações Sociais - SGPS e no
Luxemburgo, no que concerne às Holdings de 192963 ) ou são estabelecidos nos termos

61 Merece especial referência como pioneiro nesses regimes a Holanda, cfr. M. J. ELLISjD. JUDCH,
The Participation Exemption in the Netherlands, Deventer 1979; GouTHIl;RE, Les impôts, 296; P.
G. M. ADRIAANSEN, New Dutch Participation Exemption Regime, RDTI 5 (2007), 155; DA-
VIDE M. PARRILLI, La Riforma della Participation Exemption Olandese alla Luce, in HELENO
TAVElRA TÔRRES (org.), Direito Tributário InternacionalAplicado, voI. V, São Paulo 2008, 824.
62 Cfr. KNECHTLE, Basic Problems in International Fiscal Law, Deventer 1979, 105; SCHAUMBURG,
Internationafes Steuerrecht, Colônia 1993,228 sS.; Roy ROHATGI, Basic International Taxa-
tion, 488 SS.; WIN EYNATTEN, Regimes de sociedades holdings europeias: estudo comparado,
RDTI8 (abr.-/2008), 185; TIAGO CASSIANO NEVES, Estratégia de internacionalização e so-
ciedades holding na Europa: aspectos práticos e comparativos, RDTI 2 (2006), 281.
63 No Luxemburgo, em virtude de uma lei de 1929, as sociedades holding estão isentas de
imposto sobre o lucro decorrente de dividendos recebidos das sociedades em cujo capital
participam, de imposto sobre ganhos de capital na alienação das participações societárias e
de imposto retido na fonte sobre dividendos distribuídos aos seus sócios. Dentre essas socie-
dades incluem-se as holdings bilionárias, que se caracterizam por poder também exercer ativi-
dades de holding no setor financeiro. Todavia, tendo em vista a benevolência deste regime,
numerosos países (entre os quais o Brasil) têm recusado abranger tais holdings (chamadas
Título IV I Capo IV I Elisão Fiscal e Elementos de Conexão

da legislação geral sobre participation exemption nos países 'Jue não têm legislação
especial privativa de holdings) como é o caso da Holanda, da Austria, da Bélgica e do
Luxemburgo (no que concerne às "sociétés de participation financiere" - SOPARFI)64.
No que concerne ao requisito do período mínimo de detenção, ele é dispensado
na Holanda e na Bélgica e fIxado, no que toca a dividendos6 S, em um ano, na Dina-
marca, no Luxemburgo, na Espanha, na Suíça, na Áustria.
No que respeita ao requisito do percentual de particir,ação, ele vai de 5% na Bélgica,
na Holanda e na Espanha até 10% no Luxemburgo e na Austria e na Dinamarca, sendo
que certos países, como a Bélgica e o Luxemburgo, dispensam referido requisito desde
que o investimento exceda um certo valor (p. ex.: no Luxemburgo 1.200.000 euros para
a isenção de dividendos e 6.200.000 euros para a isenção do ganho de capital).
Quanto ao requisito da sujeição da subsidiária a imposto, a Suíça o dispensa,
sendo certo, porém, que é muito distinto o nível de tributação mínimo exigido. Com
efeito, enquanto alguns países, como a Holanda, se contentam com um mínimo de
tributação efetiva (p. ex.: 0,1%), outros, como a Espanha, exigem a sujeição a um
imposto sobre as pessoas jurídicas a alíquota comparável à do país em causa, excluin-
do, consequentemente, subsidiárias localizadas em paraísos fIscais.
No que concerne ao requisito da natureza da renda obtida pela sociedade par-
ticipada, certos países excluem da isenção dividendos cuja origem é lucro de certa
natureza: assim, por exemplo, a Holanda recusa a isenção a rendimentos de portfolio
investments; a Áustria sujeita a imposto os rendimentos de natureza passiva (pro-
venientes de juros, locação de bens móveis ou venda de participações); a Espanha
também tributa os rendimentos de natureza passiva se forem preponderantes (85%
ou mais); e a Dinamarca tributa os dividendos de certas financiai companies.
Um regime muito importante de exoneração da dupla tributação econômica
dos dividendos foi consagrado no âmbito da União Europeia pela Parent Subsidiary

holdings de 1929) no campo de aplicação dos tratados contra a dupla tributação por eles cele-
brados com o Luxemburgo. Por esta razão (e para se conformar com as diretrizes da Comu-
nidade Europeia em matéria de retenções na fonte), este país adotou um novo regime para
as sociedades de participações financeiras (SOPARFI), que faz depender o regime isencional
de certos requisitos, como a participação no capital da sociedade investida não ser inferior a
10% do seu capital e esta participação ser detida por um período mínimo de 12 meses con-
tados da data do encerramento do balanço. Sobre o regime das SOPARFI luxemburgucsas,
adotado por regulamento grão-ducal de 24 de dezembro de 1990, cfr. WARNER, Luxembou'flJ
in International Tax Planning, Amsterdam 1996.

64 Em resultado dos trabalhos do Grupo do Código de Conduta da Fiscalidade das Em-


presas e do Fórum da OCDE para as Práticas da Concorrência Fiscal Prejudicial, estes
regimes, com exceção do regime português das SGPS, foram qualificados como pre-
judiciais, tendo sido alterados. Fundamentalmente, as alterações introduzidas visaram
aproximar o tratamento entre não residentes e residentes, de forma aos regimes deixa-
rem de ser ring fencing.
65 Quanto aos ganhos de capital, os mesmos períodos são exigidos. A Dinamarca requer, porém,
três anos por inteiro.
M1j1 Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Directive (Diretiva nO 90j435jCEE), que outorga isenção de tributação de dividen-


dos nas relações entre sociedades domiciliadas nos Estados-membros, desde que a
holding tenha uma participação mínima de 25% no capital da subsidiária, a subsidi-
ária esteja sujeita a imposto sem a possibilidade de optar por um regime tributário
especial e revista uma das formas societárias especialmente previstas 66 .
Tenha -se presente que os requisitos da Parent Subsidiary Directive podem ser re-
duzidos nas legislações internas europeias (como é o caso da lei interna da Holanda,
que exige apenas um percentual de 5%, de participação), mas nunca ampliados. E
ainda que a Diretiva nO 2003j123jCE, de 22 de dezembro, prevê que a percentagem
mínima de participação, para se reconhecer a qualidade da sociedade-mãe e de socie-
dade afiliada, deverá ser reduzida, gradualmente, de 25% para 10%, até 2009.
Independentemente das desonerações decorrentes da legislação interna ou co-
munitária, há ainda a considerar as desonerações outorgadas por via dos tratados
contra a dupla tributaçã0 67 •

c) Outras figuras societárias


A linguagem corrente em matéria de fiscalidade internacional utiliza-se de di-
versos conceitos relativos às estruturas societárias mais frequentemente utilizadas no
planejamento tributário internacional, conceitos esses que não designam modali-
dades societárias definidas em função de critérios científicos, mas sim em razão das
funções práticas que elas exercem.
Assim, por exemplo, a expressão sociedade off-shore designa a sociedade cons-
tituída num determinado país, mas cujo controle é detido exclusivamente por não
residentes desse país e exerce a sua atividade exclusivamente fora do território do
país em causa. Trata -se das sociedades características dos regimes de ring fencing, ou
seja, aqueles que concedem tratamento fiscal preferencial a não residentes, isolando
as operações beneficiadas do mercado interno, protegido como que por um "anel",
como é o caso típico das SAFIS do Uruguai e das sociedades dos Centros Interna-
cionais de Negócios da Ilha da Madeira e das Ilhas Canárias.
Por sua vez, a expressão conduit companies ("empresas-canal") alude ao papel me-
ramente redistributivo das entidades em causa, limitando-se a ser o canal de trânsito de
rendimentos auferidos por uma sociedade em direção ao beneficiário [mal dos mesmos.
Outras denominações referem-se à natureza da atividade que constitui objeto
social de certas empresas como, por exemplo, a prestação de serviços intragrupo, ou
seja, a atribuição a uma certa entidade da função de prestar serviços em benefício de
uma pluralidade de empresas integradas num grupo multinacional' sejam esses ser-
viços de caráter administrativo, financeiro ou comercial. É este precisamente o caso

66 Cfr. LOYENS LEFÉBVRE RADLER, The Parent-Subsidiary Directive and Intemational Tax Plan-
ning, Amsterdam 1992.
67 Cfr. infra, 596 ss.
Título IV I Capo IV I Elisão Fiscal e Elementos de Conexão MiN

dos centros de coordenação (Bélgica, Luxemburgo, País Basco e Navarra), dos centros
de distribuição e dos centros de serviços da Bélgica, bem como das sociedades financeiras
intragrupo da Holanda68 • A particularidade destes regimes está em que a base de cál-
culo é definida em termos presumidos ou estimados, o que tem por vezes levado à
sua consideração como medidas de concorrência fiscal potencialmente lesivas.
Quando dentro de um grupo de sociedades uma determinada entidade exerce
funções em caráter privativo e exclusivo para empresas desse mesmo grupo, usa-se
normalmente a expressão sociedades cativas, das quais são exemplos, em matéria de
crédito, os captive banks, e, em matéria de seguros, as captive off-shore insurance com-
panies. As sociedades de seguros cativas são usadas para contornar certas legislações
que proíbem o "autosseguro". Tais sociedades localizam-se em territórios que as
permitem (Guernsey; Bahamas e Gibraltar), assegurando assim a dedutibilidade dos
prêmios pagos pelos residentes em países de fiscalidade elevada, bem como a isenção
dos lucros da sociedade receptora.
Dentro das sociedades de serviços, merecem menção especial as sociedades de
faturação (invoicing companies) - que intervêm na venda ou compra de produtos por
conta da sociedade-mãe, não raro manipulando os preços com vista a transferir lu-
cros para territórios de fiscalidade privilegiada; e ainda as sociedades de artistas (rent-
a-star company) utilizadas por titulares de rendimentos não comerciais (artistas, des-
portistas, escritores), tendo por objeto deslocar a receita proveniente da atividade
de prestação de serviços para países de baixa fiscalidade, evitando a sua transferência
para o país da residência69 •
Uma figura jurídica frequentemente utilizada como instrumento de planeja-
mento fiscal é o Anstalt previsto pela legislação do Liechtenstein e que - embora
dotado de personalidade jurídica - não é uma sociedade, antes se aparenta ao trust
do direito anglo-saxã0 70 • O Anstalt é constituído por um fundador (cuja identidade
não é revelada, garantindo-se o pleno anonimato), o qual designa os beneficiários do
capital ou do rendimento, que tanto pode ser ele próprio como terceiros. Além da
isenção do imposto sobre o rendimento, o mecanismo de designação de beneficiá-
rios pode ser utilizado para elidir as regras das leis civis que estabelecem ordens de
precedência sucessória7 ] •

68 Estas medidas foram avaliadas como prejudiciais no Relatório de novembro de 1999 do


Grupo do Código de Conduta ("Relatório Primarolo"), tendo sido alteradas em sequên-
cia dos trabalhos deste grupo. Também em sequência destes traballios foi expressamente
vedado o exercício de "atividades do tipo 'serviços intragrupo', designadamente centros de
coordenação, de tesouraria e de distribuição" no novo regime da Zona Franca da Madeira
(art. 34, nO 8, do EBF).
69 Cfr. LEVINE, La lutte contre l'évasion fiscale, 47. Sobre as "rent-a-star companies", ver os casos
do jogador de box sueco Johansson e do cantor norte-americano Nat Iúng Cole, em GEST/
TIXIER, Droit Fiscallnternational (2 a ed.), Paris 1990, 532-533.
70 Sobre o qual cfr. supra, 164.
71 Sobre o Anstalt, cfr. W NUENER, Company Law and Taxation in the Principalty of Liechten-
stein, Vaduz 1981; MARKUS WAJ.'1GER, Taxation in Liechtenstein, in DENNIS CAMPBELL (org.),
I ~ I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

d) A questão da substância

A questão de saber se uma dada entidade se reveste ou não de "substância" tem


sido discutida em Direito Tributário Internacional para verificar se a utilização pelos
contribuintes de uma certa estrutura jurídica corresponde a uma realidade ou se, pelo
contrário, representa um caso de simulação relativa por interposição fictícia de pesso-
as, hipótese em que o Fisco teria o direito de desconsiderar a entidade "interposta".
Dispõe, com efeito, o art. 167, § JO, do Código Civil, que "haverá simulação
nos negócios jurídicos quando: I - aparentarem conferir ou transmitir direitos a pes-
soas diversas daquelas às quais realmente se conferem ou transmitem"72.
Nestes casos, existem dois atos jurídicos (o simulado e o dissimulado) perten-
centes ao mesmo tipo negocial, pelo que a simulação incide não sobre a natureza do
negócio ou sobre o seu valor, mas sobre o elemento subjetivo) visto a pessoa a quem
realmente interessa o negócio dissimulado, correspondente à vontade real, não ser a
que figura de modo ostensivo no negócio simulado.
Ao Fisco compete o dever de prova da simulação, socorrendo-se de todos os
meios instrutórios disponíveis, desde documentos das partes (em especial as "contra-
declarações", contre lettres) cartas de ressalva, reservas, side letters) a depoimentos de
terceiros, a presunções simples ou ad hominis, suficientes para demonstrar a verdade
material quanto à existência de uma divergência entre a verdade real e a verdade de-
clarada e de seus motivos.
Ora, precisamente uma das presunções ou indícios que, em tese, pode conduzir
à prova da simulação residiria na alegada ausência de substância da pessoa jurídica
utilizada pelas partes como sujeito de uma dada operação.
A expressão "substância da pessoa jurídica" não se encontra consagrada no Di-
reito positivo brasileiro, nem é habitual na nossa jurisprudência.
Na prática internacional ela generalizou-se como uma manifestação da doutrina
conhecida como da prevalência da substância sobre a forma (substance over flrm),
tradicional nos países anglo-saxônicos.
É certo que de há muito se encontra superada a visão clássica da pessoa jurídica,
organicista e "antropomórfica", que a concebe como um ente real, similar às pessoas
naturais.
É hoje ponto assente que a pessoa jurídica não é a pura forma de uma realidade
social pré-normativa, que é sempre e só constituída por homens. O que sucede é
que a lei muitas vezes dita uma disciplina peculiar para certa categoria de relações

International Tax Planning, 1995, 103. Sobre outras modalidades de sociedades-base, quan-
to ao objeto, como ftnance companies, intangible property holding companies, trading companies,
cfr. ANNAMARIA RArAKKO, Base Company Taxation, 20 ss.; ROY ROHATGI, Basic International
Taxation, 242 ss.

72 efr. ALBERTO XAVIER, Tipicidade da tributaçiÜJ, simulaçiÜJ e norma antielisiva, São Paulo 2001,
52 ss.
Título IV I Capo IV I Elisão Fiscal e Elementos de Conexão I@ I

entre homens, disciplina que se traduz na sua unificação e na sua imputação a uma
entidade abstrata, dada a necessidade de imaginar um titular de direitos e deveres
distinto das pessoas físicas. A noção de pessoa jurídica é por isso e por natureza uma
noção funcional e relativa: funcional, porque a referida disciplina normativa de rela-
ções entre homens é ditada para que estes prossigam determinados fins de um modo
mais conveniente e racional; relativa, porque, sendo funcional, ela pode valer para
determinados fins ou efeitos, mas não valer quanto a outros 73 .
Ora, é precisamente à luz do caráter instrumental, funcional ou relativo da per-
sonalidade jurídica que deve ser examinada a questão da substância.
Substância é conceito que exprime a relação de adequação da estrutura da em-
presa às funções que constituem seu objeto social.
É evidente que os meios humanos e materiais adequados ao exercício, por uma
pessoa jurídica, de uma função de pura holding não são comparáveis aos necessários
ao exercício de uma atividade industrial: enquanto a holding é um puro centro abstra-
to de imputação de direitos, a atividade industrial requer um estabelecimento, isto é,
um complexo de pessoas e bens organizado para o exercício da empresa (art. 1.142
do Código Civil), que é a atividade econômica de produção ou circulação de bens ou
serviços (art. 966 do Código Civil).
A adequação dos meios em relação à função deve, pois, ser examinada, não de uma
forma genérica, mas sempre caso a caso, em função da natureza da empresa em causa.
A sua ausência poderá ser invocada como indício, prova indireta, de simulação
por interposição fictícia de pessoas.
Também a jurisprudência e a doutrina internacionais têm revelado forte tendên-
cia no sentido de exigir o requisito de substância como prova do exercício de uma
dada atividade econômica.
Caso paradigmático nesse sentido foi o célebre caso Cadbury Schweppes, submetido
à apreciação do Tribunal de Justiça da União Europeia, no qual este decidiu que a insta-
lação pelo Grupo Cadbury de duas subsidiárias na Irlanda, embora com o objetivo de se
beneficiarem de um regime fiscal mais favorável, não podia ter um tratamento fiscal dis-
criminatório (leis CFC) sob pena de violar o direito ou liberdade de estabelecimento.
Tal liberdade só cessaria onde houvesse aquilo que o Tribunal definiu como um
"wholly artificial arrangement".
Esta última expressão tem sido interpretada e desenvolvida em vários países
membros da União Europeia no sentido de significar que uma genuína atividade
econômica é exercida através de um estabelecimento englobador de recursos mate-
riais e humanos (substância organizacionalj74.

73 Sobre a visão intrumcntal da personalidade jurídica, especialmente em matéria de socieda-


des, e a crítica à concepção clássica, ver AsCARELLI, Saggi di diritto comerciale, Milão 1955,
168 ss; 151; LIBONATI,Holding e Investment Trust, Milão 1959, 220 ss; FÁBIO KONDER COM-
PARATO, O poder de controle nas sociedades anônimas, São Paulo 1977,248 ss.
74 Cfr. sobre a matéria JACQUES MALHERBE, Controlled Foreign Corporations in the EU after
Cadbury Schweppes, in Tax Management International Journal, dezembro 2007.
@ I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

É também o conceito de substância que está na origem do conceito de "substan-


tive business operations" requerido para que uma determinada entidade não seja consi-
derada mera conduit companYJ constituída para um "uso impróprio" dos tratados 75 •
Um caso de alegada interposição fictícia examinado na nossa jurisprudência
ocorreu com uma trading no âmbito do comércio internacional.
Trata-se de acórdão da 5 a Câmara do Primeiro Conselho de Contribuintes
(acórdão n° 105-11.084, de 25 de junho de 2008), de que foi relator o Conselheiro
WILSON FERNANDES GUIMARÃEs, cuja ementa, entre outras partes, afirma:

"EXPORTAÇÕES PARA PESSOAS VINCULADAS - INEXISTÊNCIA. SI-


MULAÇÃO - As declarações de vontade de mera aparência, reveladoras da
prática de ato simulado, uma vez afastadas, fazem emergir os atos que se buscou
dissimular. No caso vertente, em que a contribuinte construiu de forma artifi-
ciosa operações de exportação para empresas sediadas em países que adotam
tratamento fiscal favorecido, o abandono da intermediação inexistente impõe a
tributação das receitas omitidas, resultante da diferença entre o montante efeti-
vamente pago pelo destinatário final e o apropriado contabilmente pela forne-
cedora do produto."
Neste caso, uma empresa brasileira fabricante de certo produto industrial vendia
bens por ela fabricados a sociedades controladas domiciliadas em países de tributação
favorecida, as quais, por seu turno, revendiam os mesmos produtos aos clientes no
exterior, considerados "importadores finais".
O Fisco alegou omissão de receitas, caracterizada por subfaturamento praticado
em operação simulada, eis que a intermediação dos negócios pelas empresas off-shore
seria apenas formal, encobrindo vendas diretas da fabricante brasileira aos importa-
dores finais.
A alegação da simulação baseou-se em diversos indícios, dentre os quais: (i) o
fato de as empresas intermediárias serem sociedades off-shore localizadas em paraísos
fiscais, onde é corrente a prática das "centrais de refaturamento" (reinvoicing centers);
(ii) tais sociedades intermediárias não terem instalações próprias, corpo operacional
efetivo, funcionando em escritórios de prestadores de serviços; (iii) os serviços de
assistência técnica aos clientes serem efetivamente fornecidos pela empresa controla-
dora brasileira; (iv) inexistência de contratos escritos de venda formalizados entre a
empresa brasileira e as controladas estrangeiras; (v) as mercadorias serem objeto de
remessa física direta para os importadores finais, sem transitar pelas intermediárias;
(vi) os documentos das referidas controladas serem emitidos no Brasil e oriundos de
funcionários da empresa brasileira, mandatários das "intermediárias", que não teriam
recebido remunerações destas, mas somente da empresa brasileira.

75 OCDE, Comentários, Comentário ao Artigo to, § 13; e OCDE Double taxation conventions
and the use of conduit companies.
Título IV I Capo IV I Elisão Fiscal e Elementos de Conexão

o Acórdão não considerou que cada um dos alegados indícios fosse, por si só,
suficiente para comprovar a simulação, mas que a comprovação da existência desta
resultaria da sua apreciação em conjunto.
O Acórdão concluiu pela simulação de intermediação de terceiras empresas com o
intuito de encobrir uma venda direta da empresa brasileira para os seus clientes no
exterior.

§ 3° ELISÁü FISCAL SUBJETIVA

A elisão fiscal subjetiva opera, como se viu, através dos elementos de conexão
subjetivos, tais como a residência ou domicílio do sujeito passivo.

A) Elisão fiscal e domiCIlio das pessoas fisicas


É o que sucede quando uma pessoa física, para escapar à tributação elevada do
seu país de residência, transfere o seu domicílio para país de tributação mais reduzi-
da. Dada a extrema dificuldade de se provar a "fraude", consistente na ausência de
motivos "reais" para a referida transferência, certas legislações tentam coibir as prá-
ticas de expatriação fiscal mantendo a tributação baseada no seu domicílio originário
por um certo período de tempo, como se existisse um "direito de sequela".
Um exemplo clássico de expatriação fiscal consiste na transferência de domicílio
de países de forte tributação para a Suíça, de modo a beneficiar do regime de tribu-
tação a forfait dos estrangeiros domiciliados neste país e que aí não exercem atividade
lucrativa, os quais são tributados em função das suas despesas, estimadas em cinco
vezes o valor locativo da sua residência 76 •
Certos ordenamentos jurídicos determinam, como cláusula antiabuso, a per-
manência do estatuto de residente, para a generalidade ou apenas para certos efeitos
fiscais, ainda que o contribuinte tenha transferido o seu domicílio para o exterior (do-
micílio ala1lJado) 77. Assim, por exemplo, a Holanda conserva o seu direito ao imposto
sucessório quanto aos seus nacionais que abandonaram o domicílio nos últimos dez
anos. Paralelamente, o capital transfer tax inglês atinge, durante três anos, conside-
rando domiciliadas na Inglaterra as pessoas que criaram no exterior o seu domicile of
choice. E na Alemanha mantém-se a sujeição quanto aos ganhos de capital realizados
sobre certas participações acionárias, bem como quanto ao imposto de renda (além
do imposto sobre a fortuna e as sucessões e doações) relativo a rendimento que não
seja de fonte externa, desde que o sujeito (a) resida num país de baixa tributação
(mais do que um terço mais baixa que na Alemanha); (b) tenha estado sujeito a

76 Cfr. IFA, The Tax Treatment ofTransftr ofResidence by Individuais, CDFI LXXXVII-b (2002),
643; I.-I. NEUER, Fraude fiscale internationale et répréssion, Paris 1986, 202; WALTER RY5ER,
Introduction au Droit Fiscal International de la Suisse, Bem 1980, 64 5S.
77 Cfr. supra, 222 ss.
I @ I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

responsabilidade fiscal ilimitada pelo menos em cinco dos dez anos anteriores à emi-
gração; (c) tenha tido a cidadania alemã ao longo desses cinco anos; e (d) mantenha
interesses econômicos substanciais na Alemanha. Ocorrendo todos estes requisitos,
verifica-se a extended limited tax liability (erweiterte beschriinkte Steuerpflicht) pelos dez
anos seguintes à emigração, no que concerne aos rendimentos não considerados de
fonte estrangeira, os quais entram no cômputo do rendimento mundial para efeito
de tributação progressiva. É a figura da "responsabilidade fiscal alargada"78.
O direito comparado revela também que a rigidez da fronteira conceitual que
separa os residentes dos não residentes se tem atenuado pela adoção de regimes fis-
cais contemplando situações intermediárias, como as dos não residentes temporários ou
dos residentes não habituais.
Referidas situações respeitam a sujeitos residentes de um certo Estado que, du-
rante certo período, se tornam residentes noutro Estado, regressando depois ao país
onde eram inicialmente residentes. O segundo Estado pode autorizar aos "residentes
não habituais" um tratamento tributário mais favorável do que dos puros residentes,
consistente em o primeiro poder arrogar-se o direito de tributar certos rendimentos e
ganhos de capital pelos "não residentes temporários" durante o período de expatria-
ção, após o retorno, de modo a evitar deslocalizações de domicílio com finalidades
meramente elisivas 79 .
Também no Brasil se consagrou um regime de domicílio "alargado" para as pes-
soas físicas residentes no Brasil que transferirem sua residência para país ou dependência
de tributação favorecida ou com regime fiscal privilegiado (art. 27 da Lei nO 12.249, de
11 de junho de 2010). Tal regime consiste na manutenção da residência brasileira salvo
se ocorridos certos requisitos cuja prova incumbe ao interessad080 .
Outra modalidade de tributação no sentido de contrariar "abusos" na trans-
ferência de residência, por parte de pessoas físicas, está num exit tax aplicável aos
ganhos de capital "latentes" nas participações societárias possuídas por pessoas físicas
que transferem definitivamente a sua residência para fora do país. Esta é a solução
adotada pela Holanda, pela Áustria e pela Dinamarca81 •

78 Cfr. os comentários ao § 2° da Auflensteue1J]esetz, em BREZING/KRABBE, Auflensteuerrecht -


Kommentar, 279 ss.; VOGEL, OnDouble Taxation Conventions, Deventer 1991,152; SCHAUM-
BURG, Internationales Steuerrecht, Colônia 1993, 140 ss.; WILKE, Lehrbuch des internationalen
Steuerrechts (4" ed.), Herne/Berlim 1992, 155 ss.; GOUTHIÊRE, Les impóts, 387; KWGE, Das
deutsche internationale Steuerrecht (3" ed.), Munique 1992, 55; Roy SAUNDERS, Principles of
Tax Planning, 28; Modelo OCDE-ISD, Comentários, art. 4°, parágrafo 12. Regime similar
foi adotado em Espanha, pela Lei nO 40, de 9.12.98, e em Itália pela Lei nO 448 de 23.12.98.
Cfr. TULIO ROSEMBUJ, Derecho Fiscal Internacional, Barcelona 2001, 37.
79 Cfr. por exemplo, o regime estabelecido em Portugal pelo Decreto-Lei nO 249/2009, de 23
de setembro.
80 Cfr. supra, 222.
81 Cfr. G. MARlNO, I "paradisi fiscali": problematiche e prospettive, in V. UCKMAR, Corso di
Diritto Tributario Internazional, cit., 580.
Título IV I Capo IV I Elisão Fiscal e Elementos de Conexão

B) ElisiÚJ fiscal e domicílio das pessoas jurídicas:


imposto de saída e treaty shopping

Também o domicílio das pessoas jurídicas (a sua sede estatutária, direção efetiva
ou país de incorporação) pode ser escolhido ou deslocalizado com o propósito exclu-
sivo de evitar a sujeição a um certo ordenamento tributário ou atrair a aplicação de
regime tributário mais favorável.

a) Imposto de saída
o chamado "imposto de saída" (exit tax), previsto em algumas legislações eu-
ropeias, visa a restringir a liberdade de deslocação das empresas, e que envolve a livre
escolha quer do local para o início da atividade, quer do local mais conveniente para
continuá-la.
Os obstáculos respeitam à deslocalização das mais-valias não realizadas da socie-
dade de uma para outra jurisdição.
O exit tax é uma medida interna destinada a proteger as receitas fiscais do Es-
tado de residência de uma sociedade, penalizando a mudança de sede ou fenômeno
análogo, pela ereção de uma "muralha fiscal" apenas transponível pelo pagamento
prévio do imposto sobre os ganhos de capital potenciais (diferença entre valores de
mercado e contábeis) que se consideram ficticiamente realizados pelo próprio ato de
deslocalizaçã0 82 •
Via de regra, idêntico regime se aplica à cessação de atividade em certo territó-
rio de um estabelecimento permanente de entidade não residente, ou à transferência,
por qualquer título material ou jurídico, para fora desse território, de elementos
patrimoniais que se encontrem afetos ao estabelecimento estável.
A "realização presumida" dos ativos não desencadeia apenas os seus efeitos ao
nível da pessoa jurídica, podendo ainda conduzir à tributação dos sócios pela diferen-
ça entre o valor do patrimônio líquido avaliado a valor de mercado (marketvalue) da
sociedade a essa data e o preço de aquisição das respectivas partes sociais.

b) Treaty shopping
Tendo presente que os tratados contra a dupla tributação se aplicam às pessoas
que sejam residentes dos Estados contratantes, a residência num desses Estados pode
ser obtida com o propósito exclusivo de aproveitar o regime mais favorável de um

82 Ver o esrudo aprofundado dos exit tax em GruSEPPE MELIs, ProfIli sistematici de! "tranferi-
menta" della residenza fiscale delle socità, in HELENa T ÔRRES (coord.), Direito Tributário In-
ternacionalAplicado, vaI. II, 2004, 438 ss. Sobre a compatibilidade desta medida antiabuso
específica com as liberdades comunitárias, ver o caso Lasteyrie du Saillant, comentado por
SALDANHA SANCHES, Os limites do planeamento fiscal, 321.
B I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

tratado que, de outro modo, não abrangeria a entidade em causa. Fala-se em tal caso
da treaty shopping, de uso impróprio ou de abuso das convenções83 •
Pense-se, por exemplo, numa pessoa física residente em Mônaco e que detém
investimentos em sociedade alemã. Mônaco e a Alemanha não têm entre si tratado
de dupla tributação. Tal pessoa constitui uma holding na Suíça com o propósito ex-
clusivo de se beneficiar da aplicação do tratado entre a Alemanha e a Suíça, que prevê
uma redução da alíquota de retenção na fonte sobre os dividendos.
A reação contra as práticas de treaty shopping tem-se manifestado, em nível inter-
nacional, pela inclusão, em certos tratados, dos muitos variados tipos de cláusulas.
Dentre elas a mais comum é a que limita a sua aplicação do Tratado à hipó-
tese de a pessoa residente ser necessariamente o beneficiário efttivo do rendimento,
excluindo assim do seu âmbito nominees, agentes ou conduit companies ("empresas
condutoras" ou "empresas-canal"), isto é, entidades que sejam meros canais de re-
transmissão de rendimentos, sem outro objeto real. Alguns dos tratados celebrados
mais recentemente pelo Brasil já contemplam esta ressalva no que tange a dividen-
dos, juros e royalties.
Os Comentários da OCDE - na versão revista em 1992 - sugerem aos Estados-
membros uma pluralidade de cláusulas alternativas tendentes a contrariar as práticas de

83 Cfr. BECKERjWURM (org.), Treaty Shopping, Devcnter, 1988; Luís EDUARDO SCHOUERI, Pla-
nejamento fiscal através de acordos de bitributaçÍÜJ - Treaty Shopping, São Paulo, 1995, passim;
HELENO TÔRRES, Direito Tributário Internacional, cit., 320 ss.; OCDE, Double Taxation
Conventions and the Use ofConduit Companies ("Conduit Company Rcport"), in OCDE,
International Tax Avoidance and Evasion - Four Related Studies, Paris, 1987; ver também o
Base Companies Report, de 1986; Tax Treaty Override, de 1989; e o Harmfol Tax Competition,
de 1998. SCHAUMBURG, Internationales Steuerrecht, 594 ss.; P. PISTONE, I:abuso delle conven-
zioni internazionali in materia fiscale, in VICTOR UCKMAR (org.), Corso di Dirittto Tributario
Internazionale, Pádua, 1999, 483; TULIO ROSEMIlUJ, Treaty Shopping: e! abuso de tratado,
in VICTOR UCKMAR (org.), Corso di Diritto Tributario Internazionale, Pádua, 1999, 543;
STEF VAN WEEGHELjSTTBIlE DUHOT, The Improper Use ofTax Treaties (Kluwer), 1998; P. H.
J. ESSERSjG. BONTjE. KEMMEREN, The Compatibility ofAnti-Abuse Provisions in Tax Treaties
with EC Law (Kluwer), 1998; PETER CUS SONS, Harmonization and Treaty Shopping in the
OECD, in DENNIS CAMPIlELL (org.), International Tax Planning, 1995, 225; SOL PICCIOTrO,
International Business Taxation, Londres, 1992, 160; Roy ROHATGI, Basic International Taxa-
tion, 362 ss.; ADOLFO ATCHABAHIAN, Derecho Tributario Internacional, cit., 557; GIUSEPPE
MEUS, Profili sistematici de! "trasferimento" della residenza fiscale delle società, in HELENO
T AVElRA T ÔRRES (org.), Direito Tributário Internacional Aplicado, vol. II, São Paulo, 2004,
437. Vejam-se interessantes exemplos de treaty shopping, em GESTjTIXIER, Droit Fiscal Inter-
national, 547 ss. e MENEZES LEITÃO, EvasÍÜJ e fraude fiscal internacional, 322 ss. Pode, porém,
a tentativa de localização de domicílio ser contrariada se um exame cuidadoso dos fatos e
circunstâncias revela que a direção efetiva da subsidiária não se encontra no seu país de resi-
dência, mas no Estado de residência da sociedade-mãe, podendo até chegar-se ao ponto de
dizer que esta constimi ruTI estabelecimento permanente da subsidiária do (local de direção)
do qual sejam atribuíveis os lucros. Cfr. OCDE, Comentários, art. l.0, §§ 10.1 e 10.2. Com
o fenômeno do treaty shopping não se confunde o chamado rule shopping, ou seja, os casos em
que, no âmbito de um tratado que "normalmente" lhes seria aplicável, as partes se utilizam
"artificialmente" de certa ou certas regras objetivas em função de critérios de qualificação.
Título IV I Capo IV I Elisão Fiscal e Elementos de Conexão

uso impróprio dos tratados através de conduit companies. Tais cláusulas podem consis-
tir em reservar a aplicação dos tratados às sociedades que sejam controladas direta ou
indiretamente por residentes do Estado em causa (look-through approach) 8\ em excluir
expressamente do âmbito de aplicação dos tratados certos tipos de sociedades que, de
acordo com as leis internas, gozem de estatuto similar ao dos não residentes (exclusion
approach); em condicionar a aplicação das cláusulas do tratado que concedem isenções
ou reduções de imposto num dos Estados ao fato de o rendimento em causa estar efe-
tivamente sujeito a tributação no outro Estado (subject-to-tax approach) 85; em excluir
a aplicação de cláusulas do tratado que concedam isenção ou redução de imposto a
sociedades residentes nesse Estado, mas controladas por não residentes, nos casos em
que mais de 50% do rendimento sejam utilizados para pagar créditos de tais pessoas,
inclusive juros, royalties, publicidade, despesas de viagem etc (channel approach).
Os mesmos Comentários sugerem, no entanto, a atenuação do rigor das cláu-
sulas atrás referidas de modo a não penalizar casos de boa-fé, notadamente nas hipó-
teses em que as operações forem motivadas preponderantemente por razões econô-
micas substanciais e não para obter benefícios do tratado (general bona fide provision);
em que as empresas exercem no outro Estado negócios com substância real (activity
provision); em que a redução de imposto pretendida não é maior do que o imposto
efetivamente exigido pelo Estado contratante de que a sociedade é residente (amount
of tax provision); em que as ações da sociedade estão cotadas em bolsas de valores
(stock-exchange provision). Os mesmos Comentários sugerem, finalmente, excluir das
restrições estabelecidas para os não residentes os residentes de outros países com
quem o Estado em causa tenha celebrado tratados contra a dupla tributação (alter-
native reliefprovision) 86.
Grande parte destas cláusulas parciais podem integrar-se numa cláusula ampla
de limitação de beneficios, cujo objetivo é evitar que pessoas, que não são residentes
dos dois Estados contratantes, tenham acesso aos benefícios de um tratado pela uti-
lização de uma entidade que de outro modo se qualificaria como residente de um
desses Estados. O acesso ao Tratado seria, assim, reservado a "pessoas qualificadas".
A OCDE sugere um modelo de cláusula deste tipo, inspirado no art. 22 do
Modelo norte-americano de 1996. Seriam consideradas pessoas qualificadas as pessoas
físicas; as entidades governamentais; as sociedades cotadas na bolsa; e as sociedades
controladas direta ou indiretamente pelo menos em 50% por pessoas que tenham
direito à aplicação ao Tratado. Preveem-se, porém, cláusulas de salvaguarda relativas

84 Cfr. o art. 25 da Convenção em Israel e o art. 28, § 2°, da Convenção na África do Sul.
85 Cfr. art. I", § 2°, da Convenção com o México.
86 Cfr. OCDE, Comentários, art. 1°, parágrafos 12 a 29; Luís EDUARDO SCHOUERl, Planejamen-
to fiscal através de acordos de bitributaçéW - Treaty Shopping, São Paulo 1995, 140 SS.; HELENO
TÔRRES, Direito Tributário Internacional, cit., 362. Cfr. também FER<'1ANDO SERRANO ANTÔN,
Las medidas anti abuso en los convenios para evitar la doble imposición internacional y su
compatibilidad con las medidas anti abuso de carácter interno y el derecho comunitario, in
HELENO TÔRRES (org.), Direito Tributário InternacionalAplicado, São Paulo 2003, 157.
mp I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

à natureza empresarial da atividade da empresa (business income) e a outras circuns-


tâncias relevantes 87 .
Outros tipos de cláusulas inserem-se no contexto da reação às práticas de con-
corrência lesiva e têm por objetivos excluir do âmbito de aplicação do tratado certos
tipos de entidades ou certos tipos de rendimentos.
Assim, por exemplo, pode estipular-se a não aplicação do tratado a entidades
que gozem, num Estado, de regime fiscal preferencial limitado a sociedades contro-
ladas por não residentes 88 •
Como pode também ajustar-se a sua não aplicação a rendimentos tributados
de modo preferencial (e em relação ao qual seja restringida a troca de informações)
resultante de atividades cujo exercício não exija presença substancial no Estado, tais
como a atividade bancária, de shipping, financeira, seguradora, de comércio eletrô-
nico, centros de coordenação ou originadoras de "rendimentos passivos", tais como
dividendos, juros e royalties89 .
Finalmente, a OCDE refere ainda, como modalidades de cláusulas antiabuso,
estipulações que recusam a aplicação dos tratados a hipóteses em que a transmissão
do direito a dividendos, juros e royalties tenha obedecido ao propósito principal de
obter as vantagens concedidas no que respeita à redução de alíquotas90 ; e estipulações
que recusam a aplicação dos tratados a regimes especiais concedidos por um Estado
a rendimentos externos após a assinatura do Tratado.
No plano interno, determinadas legislações tipificaram certos negócios fiscal-
mente menos onerosos, denominando-os genericamente, ainda que de maneira im-
própria, de abuso de convenções fiscais internacionais (Abkommensmiflbrauch), com
o propósito de os submeter a uma especial disciplina preventiva ou repressiva.
Nesta linha de orientação se insere a Lei suíça de 14 de dezembro de 1962,
referente aos chamados "abusos de convenções fiscais". Trata-se aqui de evitar que as
vantagens decorrentes de uma convenção contra a dupla tributação sejam aprovei-
tadas por pessoas que, em princípio, estariam fora do círculo dos seus destinatários,
mas que "abusivamente" criaram condições formais para que ela lhes fosse aplicável.
Tais condições traduzem-se na criação de um "diafragma", cuja razão de ser não
tem qualquer fundo substancial; antes obedeceu ao propósito de auferir vantagens
fiscais: se tal diafragma consiste num fiduciário ou numa fundação familiar, o abuso
presume-se iuris et de iure; se se trata de sociedade, apenas se configura o abuso caso
se verifique uma condição suplementar, a não distribuição dos "lucros adequados".

87 Cfr. OCDE, Comentários, art. 1°, § 20; P. PISTONE, I.:abuso delle convenzione internazionale
in materia fiscale, in V UCKMAR, Corso di Diritto Tributario lnternazionale, cit., 53; T. ROSEN-
EU), Treaty shopping: el abuso de tratado, in V UCKMAR, ibidem, 557 ss.
88 Cfr. OCDE, Comentários, art. 1°, § 21.2.
89 Cfr. OCD E, Comentários art. 10, § 21. 3. Cfr. art. 28, § 10, da Convenção com a África do
Sul, e o art. 27, § 2°, da Convenção com o Peru.
90 Cfr. OCDE, Comentários, art. I", § 21.4. Veja as repercussões desta cláusula nos métodos
de eliminação da dupla tributação. OCDE, Comentários, art. 23-A e 23-B, § 31.3.
Título IV I Capo IV I Elisão Fiscal e Elementos de Conexão

A ocorrência de abuso dá ao fisco suíço o direito de ignorar a personalidade jurídica,


mas exclusivamente para o efeito de lhe recusar as vantagens da convenção, ficando
assim intacta para os demais efeitos de direit091 •
O abuso surge caracterizado nessas legislações pela ocorrência simultânea de
dois requisitos: as sociedades em causa (base companiesJ sociétés dJinvestissement) terem
no exterior a fonte principal dos seus rendimentos e não distribuírem dividendos de
forma habitual, antes deixarem acumular os lucros no seu patrimônio.

§ 4° ELISÁO FISCAL OBJETIVA

A) Elisão fiscal objetiva por divisãoJ acumulação e transferência de rendimentos


A elisão fiscal objetiva concretiza-se através do elemento objetivo da norma de
conflitos, fundamentalmente a "fonte de produção" da renda, visando a impedir a
sua configuração jurídica92 ou imputá-la, total ou parcialmente, a território de regi-
me fiscal mais favoráveL
A elisão fiscal objetiva pode distinguir-se em várias espécies, consoante o ob-
jetivo do contribuinte em influenciar o elemento de conexão em causa: dividir o
rendimento, distribuindo-o entre territórios fiscais distintos; acumular o rendimento
em território fiscalmente mais favorável; transferir o rendimento de um para outro
ordenamento menos oneros093 .

91 Quelques réfléxions sur les mesures unilatérales prises par la Suisse contre I'utilisation abusive
des traités préventift de la double imposition. Some Rejlections on the Unilateral Measures taken
by Switzerland against the Abuse of Treaties for the Avoidance of Double Taxation, Intertax 2
(1975),60; ID., Measures taken by Switzerland against the Improper Use ofDouble Taxa-
tion Treaties, Publication ofthe International Bulletin ofFiscal Documentation 19 (1963),21;
ID.,Introduction au Droit FiscalInternational de la Suisse, Berne 1980, 184 ss.; MAx WIDMER,
Die schweizerischen Maflnahmen gegen den Miflbrauch von Doppelbesteuerungsabkommen, Steu-
er und Wirtschaft XL (1963), 381; A. KNECHTLE, Grundfragen des Internationalen Steuerre-
chts, Basel1976, 128 ss. Ao abrigo da legislação suíça de 1962, quatro indivíduos alemães
eram sócios de uma partnership suíça que detinha todas as ações de uma sociedade suíça. Esta
última detinha ações em sociedade domiciliada em Portugal. A companhia suíça pretendeu a
restituição do imposto retido em excesso sobre os dividendos, invocando o tratado Portugal-
Suíça. Esta restituição foi recusada porque pessoas não abrangidas no Tratado tinham inte-
resse relevante, negando-se assim a aplicação do Tratado à partnership. Cfr. BAKER, Double
TaxationAgreements and International Tax Law, Londres 1991,62.
92 É o que sucede nos casos em que uma Convenção fiscal exija a presença de um estabelecimento
permanente como requisito de tributação e o contribuinte impede que este se exteriorize. Assim,
por exemplo, uma sociedade com sede na Suíça e que pretende distribuir um produto na
França, em vez de instalar neste país um estabelecimento estável, organiza uma rede de agen-
tes ou representantes dependentes, apoiada por centros de serviços auxiliares e preparatórios
(marketing, publicidade). A respeito desta montagem, já se falou num estabelecimento estável
"estilhaçado" (éclaté) ou "submarino". Cfr. I.-I. NEUER, Fraude fiscale internationale, 209.
93 Cfr. ANNAMARlA RAPAKKO, Base Company Taxation, 16-17.
I p I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

A divisão do rendimento opera-se através da prática pela qual se procura criar ele-
mentos de conexão que permitam a sua imputação a diversos territórios, elementos
de conexão sem os quais os rendimentos seriam imputados a um único ordenamen-
to. É o que sucede, por exemplo, quando um artista que realiza espetáculos em vários
países, neles auferindo rendimentos, em vez de os submeter à tributação no seu país
de residência, constitui uma ou mais sociedades (rent-a-star company) que auferem
os rendimentos de fonte estrangeira. É também o que sucede no chamado sistema de
split-payroll, pelo qual os salários dos quadros dirigentes de um grupo de empresas,
em vez de serem pagos pela matriz, para a qual prestam efetivamente serviço, são pa-
gos pelas subsidiárias e sucursais instaladas noutros países, com o objetivo de reduzir
o impacto da progressividade ao nível das pessoas físicas e de aumentar as despesas
dedutíveis em países em que tal se revele vantajoso.
A acumulação de rendimentos opera-se pela via da constituição de uma sociedade-
base em países de fiscalidade privilegiada, com o objetivo de nela concentrar os lucros
do grupo, de modo a diferir a tributação no país de domicílio dos sócios (pessoas
físicas ou jurídicas), para o momento em que os lucros lhes forem distribuídos. Tal
diferimento (tax deferral) apresenta a vantagem da flexibilidade quanto ao momento
mais oportuno para a distribuição tributável, que pode ser, por exemplo, o período
em que o sócio - pessoa jurídica - apresentar prejuíws fiscais compensáveis 94 •

B) Acumulação de rendimentos e transparência fiscal internacional

É sobretudo contra a prática de acumulação de rendimentos que se dirigem as


legislações para prevenir e reprimir, unilateralmente, o "abuso dos paraísos fiscais"
(anti tax haven measuresj9s.
O movimento iniciou-se nos Estados Unidos, em 1934, com a legislação que auto-
riwu a tributação das foreign personal holding companies. Mas foi em 1962 que o Congres-
so veio dificultar fortemente a utilização, por cidadãos norte-americanos, da generalida-
de das vantagens que oferecem os trusts e companhias dos países de baixa tributação.
A tendência alastrou-se aos países da Comunidade Econômica Europeia, salien-
tando-se, pelo rigor das suas provisões, aAuflensteue'flfesetz alemã de 8 de setembro
de 1972 (AStG) , fortemente inspirada pela legislação norte-americana de 196296 •

94 Cfr. ANNAMARIA RAPAKKO, Base Company Taxation, 53 ss.; MAGNIN, IJimputation des bénéfices
accumulés, nouvelle arme contre l'évasion fiscale internationale, Genebra 1971; LANG/ArGNER/
SCHEUERLE/STEFANER (eds.), CFC Legislation, Tax Treaties and EC Law, Kluwer, 2004.
95 Cfr. MARSHALL J. LANGER, Tax Haven5 and Tax Policies in the European Community, Tax
Haven Review 1976, 1 55. C. PENNERA, La lutte contre l'évasion fiscale il1tcrnationale en Ré-
publique Fédérale d'Allemagne, ReJlue des Sociétés 3 (1976).
96 Sobre a Auflensteue1lfesetz, ver HAl'lS FLlCKjWASSERMEYER/BECKER, KfJmmentar zum Auflens-
teuergesetz, Colônia 1973; G. WÓHRLE,Auflensteue1lfesetzI&mmentar, Smttgart 1973; KLAus
BREZING/HELMUT KRABBE/GERHARD LEMPENAU/JÓRG MÓSSNER/BERNDT RUNGE, Auflens-
teuerrecht - KDmmentar, Herne/Berlim 1991; WOLFGANG LIPPS, Auflensteuerrecht, Berlim
1986; ID., Auflensteuerrecht (Grundrifl for Studium und Praxis) , Baden-Baden 1987.
L-_ _ _ _ _ _ _ _ _ _:: Título IV I Capo IV I Elisão Fiscal e Elementos de Conexão IB I

As medidas adotadas traduzem-se essencialmente em, por ficção legal, "descon-


siderar" a personalidade jurídica das sociedades cuja constituição ou funcionamento
tenha sido ou seja inspirada predominantemente por razões de ordem fiscal, consi-
derada "transparente" (pass-through entity) em termos de permitir a tributação dos
respectivos sócios, como se tivessem auferido diretamente os lucros, sem aguardar
pelo momento da distribuição dos lucros entretanto acumulados.
Foi a reforma Kennedy de 1962 que levou mais longe, em matéria tributária, a
doutrina do piercing the reil ofthe corporate entity. As disposições (designadas Subpart
F do Internai Rcvenue Code) visaram, na verdade, a combater a forma de elisão fiscal
decorrente da utilização de dois tipos de sociedades: as flreign personal holding compa-
nies, ou seja, sociedades constituídas no exterior cuja renda seja integrada, ao menos
em 90%, por "renda passiva" - juros, aluguéis, royalties - e em que mais de 50% das
ações sejam possuídas, direta ou indiretamente, por cinco pessoas físicas sujeitas ao
imposto de renda norte-americano; e as controlled flreign corporations (CFC), socie-
dades cujas receitas sejam constituídas por lucros de comercialização ou de serviços
e em que mais de 50% das ações pertençam a cidadãos norte-americanos, possuindo
cada um pelo menos 10% do direito de vot097 •
Em ambos os casos a lei determinou o afastamento da regra do diferimento do
imposto (tax deferral) incidente sobre as rendas obtidas no exterior por subsidiárias
de sociedades norte-americanas, corolário da separação das suas personalidades ju-
rídicas, segundo o qual tais rendas só serão tributadas, junto dos acionistas, quando
os lucros lhes forem efetivamente distribuídos sob a forma de dividendos. Ora, nos
casos acima referidos, os acionistas serão tributados independentemente da distribui-
ção do lucro, isto é, por lucros que juridicamente ainda se inserem na titularidade da
sociedade, cuja personalidade é assim "desconsiderada" para efeitos fiscai s98.
Providência de certo modo análoga é a constante da lei alemã relativamente
às fundações familiares (Familienstiftungen) com sede e administração no exterior e
que sejam detidas em mais de 50% pelo fundador e seus familiares. Também estes
últimos, residentes na Alemanha, podem ser aí tributados mesmo por rendimentos
não distribuídos 99 .

97 E daí as legislações que nela se inspiraram passarem a ser denominadas de "Subpart F" ou do
tipo "CFC".
98 USo International TaxationBase Company TaxationInternational Business Taxation111; PHlLIP
A. STOFFREGENjSTEWART R. LIPELES, United States Antiavoidance Measures affecting Multi-
national Corporations, in DENNIS CAMPBELL (org.), International Tax Planning, 1995,251;
ALEXANDER, Foreign Personal Holding Companies and Foreign Corporations that are Personal
Holding Companies, Yale Law Journal1958, 1173; A. RADo, United States Taxation ofForeign
Investment: the New Approach, Amsterdam 1963, 32; BÜHLER, Principios, 186; SCHAUMBURG,
Internationales Steuerrecht, 288; E. SAc'1Z GADEA, Transparencia fiscal internacional, Madrid
1996; TULIO ROSEMBUJ, Derecho Fiscal Internacional, Barcelona 2001, 174 sS.
99 Veja o § 15 da Atillensteuergesetz. Cfr. BREZING/KRABBE, Auflensteuerrecht - Kommentar,
663; SCHAUMBURG, Internationales Steuerrecht, 244 sS.
Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Conforme atrás já se referiu, aAuflensteuellfesetz prevê a tributação, na Alemanha,


de sociedades constituídas no exterior, mas controladas por residentes nesse país, dis-
tinguindo a este respeito três tipos: as sociedades operadoras (Leistungsgesellschaften),
as sociedades holding (Holdingsgesellschaften) e as sociedades de pura administração
(Vermijgensverwaltungsgesellschaften). Enquanto os dois primeiros tipos seguem o regi-
me comum, situando-se fora da jurisdição do fisco alemão, a última categoria sujeita-
se a um Durchgriff, ficando os seus acionistas sujeitos pro rata a imposto na Alemanha,
como se tivessem recebido diretamente os lucros acumulados. A razão de ser deste
regime discriminado resulta do reconhecimento de que as verdadeiras holdings exer-
cem uma função úpica de controle e direção, economicamente relevante, enquanto
as sociedades de pura administração (de carteira de títulos, imóveis, exploração de
patentes) são meramente passivas, intermediárias (Zwischengesellschaften) , inspirando-
se predominantemente em motivos de elisão fiscal 1oo • O Durchgriff opera quanto à
Zwischengeshllschaft se esta está sujeita a baixa tributação (inferior a 30% do lucro) e
se é controlada em mais da metade do capital por residentes na Alemanha.
De harmonia com a lei alemã, só está sujeito ao regime atrás citado o rendimento
passivo, este sendo definido por via negativa, como não sendo rendimento ativo, ou
seja, o decorrente da agricultura e florestamento, indústria, bancos e seguros, vendas
e similares 101 • Assim, são rendimentos passivos os provenientes de dividendos, juros,
royalties e aluguéis, podendo a lei desconsiderar este fato se não representam mais de
10% da receita bruta da empresa.
O movimento tem-se alastrado de tal modo que grande parte dos Estados-mem-
bros da OCDE adotaram legislações do tipo CFC como instrumento de preservação de
receitas fiscais ameaçadas pela migração de "atividades geograficamente móveis"102.

100 Cfr. O. WILSER, Der Durchgriffbei Kapitalgesellschaften in Steuerrecht, Heidelberg 1960, 134;
BELLSTEDT, Beteiligungen an ausldndischen Zwischengesellschafen nach dem Auflensteuer;gesetz,
Frankfurr-am-Main 1972, 242; VON BECKERATH, Der Durchgriff im deutschen Auflensteuer-
recht, 1978; H. DEBATlN, Die Basisgesellschaft in der Wértung, Steuer und Wirtschaft 1967,
313; MAGNIN, Ilimputation des bénéftces accumulés, nouvelle arme contre l'évasion fiscale inter-
nationale, Genêve 1971. Sobre o § 14 da Auflensteuer;gesetz, ver BREZING/KRABBE, Auflens-
teuer;gesetz - Knmmentar, 621 ss.
101 Cfr. SCHAUMBURG, Internationales Steuerrecht, Colônia 1993, 315 ss.; WILKE, Lerhbuch des
internationalen Steuerrechts, 164 ss.; ANNAMARIA RAPAKKO, Base Company, 136 ss. A lei
alemã introduziu o conceito de companhia de investimento estrangeiro passivo (Lei de 14 de
fevereiro de 1992), que prevê também a presunção automática de distribuição de rendi-
mentos e a eliminação da isenção relativa a intercompany dividends, quanto a sociedades
instaladas em país de baixa tributação, ainda que não controladas por residentes na Ale-
manha, bastando que estes sejam titulares de 10% ou mais das ações: cfr. International
Taxation (maio 1992),17.
102 Cfr. OCDE, ControlledForeign Company Legislation, PaSis 1996. Entre eles Estados Unidos,
Espanha e Suécia. Não têm legislação do tipo CFC a Austria, a Bélgica, a Holanda, o Lu-
xemburgo e a Suíça. Muito embora de natureza diferente, a reavaliação obrigatória a valores
de mercado previsto na lei holandesa tem consequências similares às de um regime CFC.
Veja-se o exame destas legislações em TAÍSA MACIEL, TributaçÍÚJ de lucros das controladas e coli-
Título IV I Capo IV I Elisão Fiscal e Elementos de Conexão

o exame do Direito Comparado revela que enquanto umas legislações atri-


buem maior relevância ao fato de a sociedade intermediária estar localizada em
território de baixa tributação, independentemente da natureza do rendimento por
ela auferido (o chamado jurisdictional approach) na terminologia da OCDE), outras
(Canadá, Estados Unidos) atribuem preponderância à natueza do rendimento, pre-
tendendo alcançar imediatamente certas classes de renda, especialmente os "rendi-
mentos passivos", independentemente do local de domicílio da sociedade interme-
diária (transactional approach) 103.
O primeiro modelo pressupõe a caracterização dos "territórios-alvo" (target
territories) via de regra os paraísos fiscais, seja pelo método das listas (black) white
e white/gray lists) seja pela exigência de uma alíquota mínima de tributação efetiva
comparável ao do país de domicilio da sociedade controladora.
O segundo modelo, por sua vez, pressupõe a determinação dos rendimentos em
relação aos quais ocorrerá a imputação automática (os "rendimentos contaminados"
ou tainted income), os quais são via de regra considerados rendimentos passivos (juros,
royalties etc.), por oposição aos rendimentos ativos ou empresariais.
A verdade, porém, é que tanto as legislações que se inspiraram num modelo
quanto no outro acabaram por se influenciar reciprocamente com vistas a aperfeiçoar
os seus mecanismos, de tal modo que hoje é praticamente impossível descortinar um
caso que obedeça, na sua pureza, a um tipo único. Assim, a tendência predominante
é de as legislações "CF C" atingirem os rendimentos passivos auferidos por socieda-
des controladas instaladas em território de baixa tributação lO4 •
Às complexas regras atrás referidas há ainda a acrescentar as que respeitam à de-
finição dos vínculos de controle ou coligação que permitem a imputação, bem como
à determinação da parcela do lucro imputável.
São também frequentemente concedidas isenções de modo a conceder um tra-
tamento menos severo às CFC que distribuam um certo percentual dos lucros por
ano; que tenham por objeto genuínas atividades empresariais; que manifestamente
não tenham propósito de elisão fiscal; que estejam cotadas na bolsa etc.
Como se verá, a lei brasileira, em matéria de sociedades controladas e coligadas
no exterior, adotou um sistema que se afasta do tipo CFC, de caráter excepcional e
finalidade antielisiva, pois pretende atingir a totalidade do lucro das sociedades con-
troladas ou coligadas no exterior, independente da natureza dos rendimentos que o
integram e do nível de tributação do país ou território de seu domicílioIOo. Falta-lhe,
pois, o elemento antielisivo e o caráter de providência excepcional, em relação ao
regime geral de tributação de controladas e coligadas, que supõe a distribuição de

gadas estrangeiras, Rio de Janeiro 2007,38 ss.; JOÃo FRANCISCO BrANCO, Transparência fiscal
internacional, São Paulo 2007, 28 ss.

103 Cfr. OCDE, Controlled) Foreign Company Legislation, Paris 1996,passim.


104 Cfr. J. F. BrANCO, op. cit.) 25 ss.
105 Cfr. infra, 372 ss.
Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

resultados. Semelhante sistema é apenas adotado, além do Brasil, pela Nova Zelân-
dia I06. A total inexistência de um elemento "abusivo" relacionado ou com o território
de domicílio ou com a natureza do rendimento leva mesmo a afirmar que não se trata
de uma lei "CFC".
Nesta sistemática o instituto perde as suas características antielisivas para se
tornar num instrumento antidiferimento, destinado a assegurar a neutralidade da
exportação de capitais até às suas últimas consequências 107 •
Os regimes de tributação em causa têm sido explicados na doutrina de diversos
modos: (i) ou como desconsideração da personalidade jurídica das controladas ou
coligadas estrangeiras, que permitiria ao Fisco nacional "levantar o véu" da perso-
nalidade jurídica destas sociedades para atingir diretamente os seus lucros (piercing
the veil approach) teoria da desconsideração ou do Durchgrijf); (ii) ou como uma pre-
sunção legal de distribuição da totalidade do lucro auferido por aquelas sociedades
(fictive ou deemed dividend approach ou teoria do dividendo ficto); (iii) ou como uma
desconsideração do seu próprio domicílio estrangeiro, presumindo-as domiciliadas
no país da sociedade controladora ou coligada; (iv) ou ainda - como nos parece cien-
tificamente mais correto - recorrendo à ideia de "transparência fiscal internacional"
(pass-through entity) das sociedades controladas e coligadas estrangeiras, segundo a
qual o lucro destas não lhes é imputado para efeitos fiscais, devendo apenas tributar-
se os sócios na proporção em que estes participam naquele lucro J08 .
Tanto a teoria de desconsideração da personalidade jurídica quanto a da trans-
parência fiscal internacional têm de comum permitir à lei ignorar o intermediário
formal representado pela pessoa jurídica estrangeira "aparente" (disregarding, pier-
cing the veil ou lifting the veil of the corporate entity - na terminologia anglo-saxônica
- ou penetrando - Durchgriff- na personalidade jurídica da sociedade - na expressão
alemã), para atingir diretamente os seus sócios. Na verdade, sendo a personalidade
jurídica uma criação do direito, um simples instrumento de prossecução coletiva dos
interesses dos sócios, como agudamente o revelou ASCARELLI, tal criação só deve ser
consagrada e respeitada na medida em que ela não se revelar, em si mesma, antijurídi-
ca. E sendo a personalidade jurídica realidade meramente instrumental não repugna
que ela seja considerada para certos fins e desconsiderada para outro ou outros.
A nuança entre uma e outra concepção está em que, enquanto o regime de
transparência fiscal é obra da lei, a técnica da desconsideração aUla casuisticamente

106 Cfr. OCDE, ControlledForeing Corporations) cit.) 12,31. A Nova Zelândia não aplica, porém,
a sua legislação a poucos países taxativamente incluídos numa "lista cinza". T AÍSA MACIEL, op.
cit., 56 ss.
107 J. M. ALVlUDÍ CID, El régimen juridico de transparencia fiscal internacional ... ) cit.) 117.
108 Cfr. FALCON Y TELLA, Analisis de la transparencia tributaria) Madrid, 1984, 186 ss.; TULlo
ROSEMBUJ, Transparcncia fiscal internacional. Aspectos críticos (separata da Revista de la EC01W-
mia Social y de la Empresa, 27/28); ID., De1·echo Fiscal Internacional, Barcelona, 2001, 174 ss.
Título IV I Capo IV I Elisão Fiscal e Elementos de Conexão

por decisão do juiz109 • Certo, porém, é que o superamento da personalidade jurídica


(e a consequente "transparência fiscal internacional") como técnica de combate à
elisão fiscal internacional só é possível nos ordenamentos que contenham disposições
que especificamente o autorizem. Nos demais, a questão deverá ser resolvida à luz
das regras do direito interno que eventualmente delimitem a liberdade de utilização
dos instrumentos facultados pelo direito com o fim de minorar o ônus fiscal.
Ao contrário do que frequentemente se afirma, estes regimes não são corolário
do princípio da universalidade) que, exigindo a tributação do rendimento mundial
das pessoas físicas ou jurídicas (world-wide-income), apenas conduz à tributação dos
lucros efetivamente distribuídos pelas sociedades participadas estrangeiras, mas não à
tributação dos lucros acumulados destas últimas, que são rendimentos próprios delas
e não rendimentos das suas investidoras.
Os regimes em causa consagram, ao contrário, uma verdadeira tributação extra-
territorial) pois atingem rendimentos de pessoa jurídica estrangeira, tratando-a como se
fosse mero estabelecimento permanente destituído de personalidade jurídica, alargando
os poderes tributários do Estado de domicílio de sociedade controladora em termos di-
ficilmente conciliáveis com as regras básicas dos tratados contra a dupla tributação llo .

C) Elisão fiscal objetiva por transferência indireta de lucros


entre empresas interdependentes

a) Generalidades sobre preços de transferência


A prática denominada de preços de transferência consiste na política de preços
que vigora nas relações internas de empresas interdependentes e que, em virtude
destas relações especiais, pode conduzir à fixação de preços artificiais, distintos dos
preços de mercado 111.

109 Cfr. neste sentido FALCON y TELLA,Analisis de la transparencia tributaria, Madrid, 1984, 186
sS.; J. M. ALMUDÍ CID, El régimen juridico de transparencia fiscal internacional) cit.) 145; J. F.
BIANCO, Transparência fiscal internacional) cit., 23.
110 Cfr. TULIO ROSEMBUJ, Derecho Fiscal Internacional, Barcelona 2001, 203; ID., Transparência
fiscal, 21 refere-se a wna ultraterritorialidade ofonsiva.
III ALAN STROUP/COLIN MAsTERs, Transfer Pricing, Londres 1991; SOL PICCIOITO, International
Business Taxation) Londres 1992, 171 SS.; MAISTo, 11 "transfer price)) nel diritto tributaria ita-
liano e comparato, Pádua 1985; ID., Transfer Pricing in the Absence of Comparable Market
Prias (relatório geral), CDFI LXXVII-a (1992),19; SERGIO CARBONE, Pressuposti soggetivi
e profili contrattuali della disciplina del "prezzo dei trasferimenti internazionali di ricchezza"
nei recenti sviluppi dell'ordinamento italiano, Diritto e Pratica Tributaria 1981-1, 421; MA-
RIA TERESA BARBoT VEIGA DE FARIA, Preços de transferência. Problemática geral) inA Inter-
nacionalizaçífu da Economia e a Fiscalidade - XXX Aniversário do Centro de Estudos Fiscais,
Lisboa 1993, 397; JILL PAGAN/SCOIT WILKIE, Transfer Pricing Strategy in a Global Economy,
Amsterdam 1992; FELIPE JESÚS CARRION HERRERO, El problema de la transferencia de bene-
tiO Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

ficios, in XXII Semana de Estudios de Derecho Financiero, Madrid 1974, 373 sS.; rnTER.<'-'ATIO-
NAL CHAMBER OF COMMERCE, Multinational Enterprise: International Tax Consequences ofIn-
ternaI Pricing Policies, BIFD 6 (1975); WOLFGANG RITTER, Allocation of Expenses in
InternationalArm)s Transactions ofRelated Companies (relatório geral), CDFI LX-b (1975),
1; FRANCESCA BALZANI, Il transfer pricing, in VICTOR UCKMAR (org.), Corso di Diritto Tribu-
tário Internazionale) Pádua 1999, 589; BELLSTEDT, Die Besteuerung international verflochtener
Gesellschaften, Colônia 1973; BAUMHOFF, in MÓssNER/et al., Steuerrecht, 259; H. E. BACH-
MANN, Ilaspect fiscal des ventes internationales entre sociétés affiliées, Berna 1950. É amplíssima
a bibliografia brasileira em matéria de preços de transferência. Além dos estudos citados ao
longo do texto, merece especial referência a monografia pioneira de Luís EDUARDO SCHOU-
ERI, Preços de transftrência no direito tributário brasileiro) São Paulo 1999 (2' ed. 2006), bem
como a de PAULO AYRES BARRETO, Imposto sobre a renda e preços de transftrência, São Paulo
2001. Quanto a artigos de revista, cfr. ANTONIO CARLOS RODRIGUES DO AMARAL, Bases glo-
bais do imposto de renda e Transfer Pricing no Brasil, RT (CDTFP) 17 (1996), 109; ID., O
preço de transferência e critérios de comparabilidade, in Luís EDUARDO SCHOUERI!VALDIR
DE OLIVEIRA ROCHA (org.), Tributos e preços de transftrência, 2° voi., São Paulo 1999, 61; ID.,
O preço de transferência (transfer pricing) no Mercosul- II Jornada Tributária do Mercosul,
RT (CDTFP) 22 (1998),206; ID., O preço de transferência no Brasil e a experiência inter-
nacional, in Tributos e preços de transftrência, São Paulo 1997, 9; ALEXANDRE SICILIANO BOR-
GES, Preços de transferência e E-Commerce, in Luís EDUARDO SCHOUERI (org.), Internet. O
Direito na era virtual, São Paulo 2000, 211; FÁBIO JUNQUEIRA DE CARVALHO/MARIA INÊS
MURGEL, Preços de transferência - presunção de evasão fiscal e inexistência de indicação do
método para determinação dos preços, in Tributos e preços de transftrência, cit., 2° voi., São
Paulo 1999, 143; GERD W ROTHMANN, O método do preço de revenda e a produção local,
in ibidem, 155; PAULO BORBA CASELLA!THELMA PEREZ SOARES CORREA/RALPH SAPOZNIK,
Preço de transferência: "Interface" entre direito interno e direito internacional, in ibidem,
277; EDISON CARLOS FERNANDES, Tratamento convencional entre Brasil e Argentina sobre
preço de transferência, in DEJALMA DE CAMPOS (org.), O sistema tributário e o Mercosul, São
Paulo 1998, 124; ID., Preço de transferência no Mercado Comum do Sul, in Tributos e preços
de transftrência, cit., 2° voi., São Paulo 1999, 85; LUCIANA ROSANOVA GALHARDO, Preços de
transferência - limites à fiscalização, in ibidem, 243; JosÉ ARTUR LIMA GONÇALVES, Certos
aspectos da disciplina dos preços de transferência em face do Ordenamento Constitucional
Brasileiro, in ibidem, 217; MIGUEL HIW NETO, Preços de transferência e valor aduaneiro - a
questão da vinculação à luz dos princípios tributários, in ibidem, 257; RICARDO MARIZ DE
OLIVEIRA, Preço de transferência - o método do custo mais lucro - o conceito de custo - o
método do custo mais lucro e as indústrias de alta tecnologia - como conciliar dispêndios
intensivos, em pesquisas e desenvolvimento, com esse método, in ibidem, 293; ELEN PEIXOTO
ORSINI, O princípio "Arm's Length" e a Legislação Interna Brasileira, in ibidem, 117; ID.,
Acordos internacionais e preço de transferência, RDT 79 (2001), 279; ADILSON RODRIGUES
PIRES, Controle do preço de transferência e as operações de comércio exterior, in ibidem, 9;
JOÃo DÁCIO ROLlM, A adoção pelo direito brasileiro da análise econômica dos preços de
transferência e (des) vantagens dos acordos antecipados de preços, in ibidem, 209; ID., As
presunções da Lei 9.430/96 e os casos especiais nos preços de transferência, in Tributos e
preços de transftrência, São Paulo 1997, 39; ORDÉLIO AZEVEDO SETTE!JOÃO RUGGERO LOPEz,
Preço de transferência, in O sistema tributário e o Mercosul, cit., São Paulo 1998, 131; AGOS-
TINHO TOFFOLI TAVOLARO, Tributos e preços de transferência, in ibidem, 23; HELENO TAVEIRA
TORRES/ANA CLAUDIA AKJE UTUMI, O controle fiscal dos preços de transferência e os meios
de prova admitidos para a definição de preços e custos médios, in ibidem, 165; RICARDO
LOBO TORRES, O princípio arm's length, os preços de transferência e a teoria da interpretação
do Direito Tributário, RDDT 48 (1999), 122; ALMIR ROGÉRIO GONÇALVES, Conceitos, re-
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Paulo de Barros Carvalho, São Paulo 2008, 833; MAURO SILVA, A utilização do Acordo de
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preços de transferência (legalidade e uso de presunções no arbitramento da base de cálculo
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método. Um caso: limites ao uso do PRL-60 na importação), in OCTAVIO CAMPOS FISCHER
(org.), Tributos e direitos fundamentais, São Paulo 2004, 95; MARCELO ALVARES VICENTE, Do
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menos lucro no caso de agregação de valor no País. Confronto entre a Lei nO 9.430/1996 e
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BATO, Margens predeterminadas: um caso de confronto entre a praticabilidade e a capacidade
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VEIRA BENTO, As regras brasileiras de preços de transferência e o princípio arm's length -
Uma análise multidisciplinar, RDTI, nO 2, ano 1, São Paulo 2006, 103 sS.; PAULO DE BAR-
ROS CARVALHO, Preços de transferência no Direito Tributário Brasileiro, RDTI, nO 3, ano 1,
Título IV I Capo IV I Elisão Fiscal e Elementos de Conexão .'FM
A figura da transferência indireta de lucros (transfer pricing) pressupõe uma diver-
gência entre o preço efetivamente estipulado e o preço "justo", "normal" ou "objeti-
vo", entendendo-se por este o que seria fixado entre empresas independentes, atuan-
do em circunstâncias análogas (arm)s length price) cláusula dealing at arm)s length.
Quando as empresas interdependentes se localizam em diversos Estados - como
é o caso das empresas multinacionais - a possibilidade de introduzir distorções arti-
ficiais nos preços das suas operações pode conduzir à atrofia dos lucros tributáveis
num dos Estados em presença e à correlativa hipertrofia dos lucros tributáveis noutro
ou noutros, sem que o mesmo fenômeno corresponda à função efetivamente desem-
penhada pela empresa que o aufere.
Importa, porém, salientar que as eventuais "deslocações" de lucros nas rela-
ções internacionais não obedecem necessariamente a motivos fiscais, podendo ser
influenciadas por outros fatores, como a existência num dos territórios em presença
de incentivos financeiros, restrições cambiais, acionistas minoritários, pressões sala-
riais, exigências de crédito, que podem conduzir a que na estratégia empresarial do
conjunto se prefira a alocação de lucros num do que noutro dos territórios em causa.
E também não pode ignorar-se que outras ordens de motivações, que não fiscais, se
contrapõem às práticas de deslocação artificial de lucros, por via de preços, tais como
as relacionadas com a performance da unidade em causa, em que são interessados os
administradores e os acionistas minoritários.
Seja, porém, como for, o certo é que os Estados desejam legitimamente prote-
ger a atrofia artificial das suas receitas fiscais, pelo que se generalizaram medidas no
sentido de que, nas relações internacionais entre empresas interdependentes, devem
prevalecer os preços objetivos, de mercado, estipulados "at arm)s length" sobre os
preços efetivamente praticados ao sabor dos interesses estratégicos dos grupos.
Em face do seu grau de rigor, ganharam aceitação internacional critérios adota-
dos pelo Fisco norte-americano (U.s. Treasury) nas Regulations under Section 482 IRe
(1968). Assim, o preço objetivo pode determinar-se, em primeiro lugar, pelo método
do preço comparável entre partes independentes ("comparable umcontrolled price ap-
proach"), que consiste em confrontar o preço efetivo com o praticado em transação
comparável entre pessoas independentes. Caso não existam transações comparáveis,
utiliza-se o método do preço de revenda ("resale price method"), que consiste em partir
do preço a que o comprador revende, a pessoas não relacionadas, os bens que com-
prou pela transação em causa, e em subtrair deste preço uma percentagem apropriada

(2006), 185 SS.; RAFAEL M. MALHEIRO, Limites à atuação dos agentes fiscais na eleição de
um parâmetro de preço de transferência nos casos de inércia do contribuinte, RDTI, na 3
(2006), 205 SS.; RAFAEL MACEDO MALHEIRO, Controle de preços de transferência sobre
operações financeira e registro do contrato no BACEN, RDTI, ano 3, nO 8 (2008), 211
sS.; LUIS EDUARDO SCHOUERI, Considerações sobre o princípio arm)s length e os secret compa-
rables, Homenagem a PAULO DE BARROS CARVALHO, Direito Tributário, São Paulo 2008,
834 SS.; RAFAELLE Russo, The Application of the Arm's Length Principie Intra-Company
Dealings: Back to the Origins, RDTI, 2005, 133 sS.
., I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

a tírulo de margem de lucro, sendo o montante assim obtido o preço imputável ao


vendedor. O método CCcost-plus)) ou o preço de aquisição majorado, por sua vez, consiste
em tomar por base o preço de aquisição dos bens para o vendedor e em obter o preço
de venda imputável ao vendedor. O método do rendimento standard (commensurate
with income standard) , baseia-se na "análise funcional" do rendimento, tendo em vista
o papel, as responsabilidades e os riscos das empresas envolvidas ll2. Em qualquer dos
casos, o Fisco norte-americano (e a prática tem-se generalizado em outros países ll3 )
admite margens de segurança (safe havens) que tenham em vista ponderação de inte-
resses não fiscais na fixação das condições de preço nos vários casos concretos.
A prática internacional tem sido fortemente influenciada pelos estudos da
OCDE dedicados à análise dos métodos mais adequados para a determinação da
regra at arm)s length 1l4 •

b) O regime dos preços de transferência na Lei nO 9.430/96

(i) Considerações preliminares


Antes da entrada em vigor da Lei na 9.430, de 27 de dezembro de 1996, a
prática de preços artificiais nas relações internacionais não era contemplada de modo
específico, podendo apenas ensejar a aplicação do regime de distribuição disfarçada
de lucros prevista nos arts. 464 e seguintes do RIR.
Com efeito, as alienações ou aquisições de bens (exportações e importações)
a pessoas ligadas, por valor notoriamente inferior ou superior ao de mercado, bem
como qualquer outro negócio com pessoa ligada em condições de favorecimento,
já eram consideradas presunções de distribuição disfarçada de lucros, que somente
podiam ser elididas pela prova de que o negócio foi realizado no interesse da pessoa
jurídica e em condições estritamente comutativas em que a pessoa jurídica contrata-
ria com terceiros.

112 Cfr. A. SHORT, Le projet américain de réglements concernant fIxation de prix entre sociétés
imbrinquées, La Fiscalité du Marché Commun 1957, 534; H. DAVID ROSENRLOOM, O regi-
me americano sobre preços de transferência: Benchmarks e Hallmarks, in HELENO TAVElRA
TÔRRES (org.), Direito Tributário InternacionalAplicado, vol. UI, São Paulo 2005, 327.
113 RefIra-se também, pelo seu grau de detalhe e rigor, a disciplina alemã de transferência de
preços, constante da carta do Ministro das Finanças, de 13 de fevereiro de 1983, e que
contém os princípios administrativos para o exame da alocação do rendimento, em casos de
empresas internacionalmente ligadas (Vérwaltungsgrundsdtze for der Prüfong der Einkunftsa-
bgrenzung bei international verbundene Unternehmen). Cfr. BELLSTEDT, International Transac-
tions 1l:tx Act and Administration, Principies on Income Allocation (trad. do original alemão
Auflensteue':!fesetz und Verwaltungsgrundsdtze zu Verrechnungspreisen) , Colônia 1987.
114 São fundamentais os três relatórios do Comitê de Assuntos Fiscais da OCDE: Transftr Pric-
ing and Multinational Entreprises, Paris 1979; Transftr Pricing and Multinational Entreprises:
three Taxation Issues, Paris 1984 e Transftr Pricing Cuidelines for Multinational Enterprises and
TaxAdministrations, Paris 1996.
Título IV I Capo IV I Elisão Fiscal e Elementos de Conexão

Nos casos de distribuição disfarçada de lucros, o elemento de favor (a diferença


entre o valor pactuado e o valor de mercado) não é dedutível na pessoa jurídica que
efetuar o pagamento, mas o lucro distribuído de modo disfarçado não será tributado
como rendimento da pessoa ligada, em virtude da isenção dos lucros e dividendos
distribuídos a residentes no exterior operada pelo art. 10 da Lei nO 9.249/95.
Deve, pois, reconhecer-se que a figura de distribuição disfarçada de lucros não
se revelava suficientemente adequada para a disciplina tributária dos preços de trans-
ferência nas relações internacionais ll5 .
As regras de valoração aduaneira, expressas no acordo do GATI, contêm tam-
bém dispositivos que têm por fim estabelecer o preço normal dos produtos importa-
dos em operações com partes vinculadas, contemplando uma sequência de métodos
para a determinação do preço normal. A verdade, porém, é que o seu âmbito de apli-
cação é limitado às importações de bens tangíveis e as suas regras não têm por fim
identificar transferências artificiais de lucros, pelo que são igualmente inadequadas à
disciplina dos preços de transferência ll6 •
A sistemática introduzida pela Lei nO 9.430/96 - embora influenciada em certos
pontos pela experiência norte-americana e da OCDE - dela se afasta em dois traços
essenClalS.
O primeiro consiste em submeter a uma disciplina unitária as relações inter-
nacionais entre empresas interdependentes - objeto exclusivo da generalidade das
legislações sobre preços de transferência - e as relações internacionais entre empresas
independentes, mas uma das quais localizada em territórios de tributação favorecida
ou com regime fiscal privilegiado que, na generalidade dos países, são reguladas pela
técnica distinta da inversão do ônus de prova, cabendo ao contribuinte a demonstra-
ção de que os pagamentos efetuados se baseiam em preços reais de mercado ll7 .
O segundo traduz-se em que, enquanto a política de "transfer price" adotada com
base nas recomendações da OCDE e da experiência norte-americana não assenta numa
presunção de artificialismo dos preços praticados entre empresas interdependentes,
cabendo às autoridades fiscais demonstrar que o preço efetivo não corresponde a um
preço at arm)s length e corrigir, consequentemente, o lucro, a lei brasileira estabelece
a prevalência automática do "preço objetivo" (calculado por critérios legalmente pre-
determinados) no caso de existência de relações de vinculação e operações com parte
domiciliada em país de tributação favorecida ou regime fiscal privilegiado, indepen-
dentemente de uma investigação administrativa das circunstâncias do caso concreto.

115 JosÉ GUILHERME FERRAZ DA COSTA, Distribuição disfarçada de lucros e preços de transferên-
cia: uma análise comparativa e evolutiva, RTFP 63 (2005), 192.
116 Cfr. PAULO ROBERTO ANDRADE, Valoração aduaneira e preços de transferência no Brasil -
uma comparação objetiva, RDTI, nO 1, São Paulo 2005, 121 SS.; MIGUEL HILÚ NETO, O elo
jurídico entre a valoração aduaneira e os preços de transftrência, in EDISON CARLOS FERNANDES
(coord.), Preços de transftrência, São Paulo 2007, 63 sS.
117 Cfr. supra.
Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

(ii) O princípio at arm's length

A Lei nO 9.430/96 parte do princípio de que, nas situações a que se aplica, o


preço relevante para efeitos tributários não é o preço real e efetivo estipulado pelas par-
tes, mas um preço hipotético que visa a atender interesses outros das partes e que não
teria sido pactuado caso entre elas não existissem relações especiais resultantes ou de
laços de vinculação ou da localização em certos territórios ou da utilização de certos
regimes tributários privilegiados.
Ao contrário das legislações que, seguindo as recomendações da OCDE, se ba-
seiam na pureza do princípio at ann)s length, a fIxação do preço objetivo não é fruto
de uma atividade administrativa que eventualmente recuse o preço efetivo, em face
das características do caso concreto, mas sim de uma detenninação da própria lei, que
desde logo estabelece os critérios para a sua fIxação.
Embora desempenhando um diverso papel, o princípio at ann)s length encon-
tra-se também na essência da disciplina dos preços de transferência introduzida pela
Lei nO 9.430/96, tanto que a aplicação das suas normas tem como ponto de partida
a divergência entre a médias dos preços praticados no mercado e aqueles praticados
nas operações com pessoas vinculadas. É ainda o princípio at ann)s length o que está
na raiz dos métodos adotados para o arbitramento dos preços1l8.
O caput do art. 19 da Lei nO 9.430/96 estabeleceu como ponto de partida para
a aplicação das regras de arbitramento a divergência entre os custos, despesas e en-
cargos relativos a bens, serviços e direitos exportados e a média ponderada do valor
de mercado dos mesmos.
Muito embora o caput do art. 18 não tenha reproduzido fórmula similar, o pri-
meiro dos métodos a que tal dispositivo recorre consiste precisamente no Método
dos Preços Independentes Comparados (PIC) e que corresponde à média aritmética
dos preços de bens, serviços ou direitos, idênticos ou similares, apurados no mercado
brasileiro ou de outros países, em operações de compra e venda, em condições de
pagamento semelhantes. Sendo inferior ou coincidindo o preço praticado com aque-
le arbitrado segundo o método PIC, fIca evidente tratar-se de operação realizada at
ann)s length, donde nenhuma consequência pode resultar para o contribuinte.

(iii) O elemento de estraneidade

O elemento de estraneidade consiste em que o regime de preços de transferência


apenas vigora nas relações entre pessoas jurídicas domiciliadas no Brasil e pessoas

118 Cfr. Luís EDUARDO SCHOUERI, Preços de transferência no Direito Tributário brasileiro (2 a ed.),
São Paulo 2006, 3755.; PAULO MARCELO DE OLIVEIRA BENTO, As regras brasileiras de preços
de transferência e o princípio arm's length - Uma análise multidisciplinar, RDTI, nO 2, ano
1, São Paulo 2006,10355.; RAFAELLE Russo, The Application ofthe Arm's Length Principle
Intra-Company Dealings: Back to the Origins, RDTI, 2005, 133 55.
Título IV I Capo IV I Elisão Fiscal e Elementos de Conexão

físicas ou jurídicas residentes ou domiciliadas no exterior, não se aplicando, pois, às rela-


ções puramente internas entre pessoas físicas ou jurídicas domiciliadas no Brasil.

(iv) Âmbito subjetivo


O âmbito subjetivo da figura dos preços de transferência é ainda definido em
função de requisitos atinentes à entidade residente ou domiciliada no exterior, com
a qual a pessoa jurídica brasileira realiza a operação em causa. Com efeito, para que
a esta operação seja aplicável a disciplina do art. 18 e seguintes da Lei nO 9.430/96
é necessário que, alternativamente, a parte residente no exterior seja "pessoa vin-
culada" ou, muito embora não o sendo, seja domiciliada em "país com tributação
favorecida" ou a operação que deu causa à aplicação das regras tenha sido realizada
"em regime fiscal privilegiado".

(a) O conceito de pessoa vinculada


O art. 23 da Lei nO 9.430/96 define como "pessoa vinculada" à pessoa jurídica
domiciliada no Brasil.
"I - a matriz desta, quando domiciliada no exterior;
"lI - a sua filial ou sucursal, domiciliada no exterior;
"lII - a pessoa física ou jurídica, residente ou domiciliada no exterior, cuja par-
ticipação societária no seu capital social a caracterize como controladora ou
coligada, na forma definida nos §§ l° e 2° do art. 243 da Lei nO 6.404, de 15
de dezembro de 1976;
"IV - a pessoa jurídica domiciliada no exterior que seja caracterizada como sua
controlada ou coligada, na forma definida nos §§ 1° e 2° do art. 243 da Lei nO
6.404, de 15 de novembro de 1976;
"V - a pessoa jurídica domiciliada no exterior, quando esta e a empresa domi-
ciliada no Brasil estiverem sob controle societário ou administrativo comum ou
quando pelo menos dez por cento do capital social de cada uma pertencer a uma
mesma pessoa física ou jurídica1l9 ;

119 Para efeito do inciso V considera-se que a empresa domiciliada no Brasil e a domiciliada no
exterior estão sob controle societário comum quando uma mesma pessoa física ou jurídica,
independentemente da localidade de sua residência ou domicílio, seja titular de direitos de
sócio em cada uma das referidas empresas, que lhe assegurem, de modo permanente, pre-
ponderância nas deliberações sociais daquelas e o poder de eleger a maioria dos seus admi-
nistradores (Instrução Normativa nO 243/02, art. 2°, § 1°, I). Considera-se que a empresa
domiciliada no Brasil e a domiciliada no exterior estão sob controle administrativo comum
quando: (a) o cargo de presidente do conselho de administração ou de diretor-presidente
de ambas tenha por titular a mesma pessoa; (b) o cargo de presidente do conselho de admi-
nistração de uma e o de diretor-presidente de outra sejam exercidos pela mesma pessoa; (c)
uma mesma pessoa exercer cargo de direção com poder de decisão, em ambas as empresas
(Instrução Normativa nO 243/02, art. 2°, § 1°, II).
I p I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

"VI - a pessoa física ou jurídica, residente ou domiciliada no exterior, que, em


conjunto com a pessoa jurídica domiciliada no Brasil, tiver participação societária
no capital social de uma terceira pessoa jurídica, cuja soma as caracterizem como
controladoras ou coligadas desta, na forma defInida nos §§ 1° e 2° do art. 243 da
Lei nO 6.404, de 15 de novembro de 1976;
"VII - a pessoa física ou jurídica, residente ou domiciliada no exterior, que seja
sua associada, na forma de consórcio ou condomínio, conforme defInido na
legislação brasileira, em qualquer empreendimento!20;
"VIII - a pessoa física residente no exterior que for parente ou afIm até o tercei-
ro grau, cônjuge ou companheiro!2! de qualquer de seus diretores ou de sócio
ou acionista controlador em participação direta ou indireta;
"IX - a pessoa física ou jurídica, residente ou domiciliada no exterior, que goze
de exclusividade, como seu agente, distribuidor ou concessionário, para a com-
pra e venda de bens, serviços ou direitos!22;
"X - a pessoa física ou jurídica, residente ou domiciliada no exterior, em relação
à qual a pessoa jurídica domiciliada no Brasil goze de exclusividade, como agen-
te, distribuidora ou concessionária, para a compra e venda de bens, serviços ou
direitos."
A Instrução Normativa nO 243/02 (art. 2°, § 5°) acrescenta a estas hipóteses o
caso de "interposta pessoa", estabelecendo que o regime de preços de transferência
também se aplica às operações efetuadas por meio de interposta pessoa, não caracte-
rizada como vinculada à empresa no Brasil, por meio da qual esta opere com outra,
no exterior, caracterizada como vinculada123.
Como se vê, o conceito de "pessoa vinculada", para efeitos de preços de trans-
ferência, é substancialmente mais amplo que o de "pessoa ligada", para efeitos de
distribuição disfarçada de lucros.

120 Na hipótese do inciso VII as empresas serão consideradas vinculadas somente durante o
período de duração do consórcio ou condomínio no qual ocorrer a associação (Instrução
Normativa nO 243/02, art. 2°, § 2°).
121 Para efeito do inciso VIII considera-se companheira de diretor, sócio ou acionista contro-
lador da empresa domiciliada no Brasil, a pessoa que com ele conviva em caráter conjugal,
conforme o disposto na Lei nO 9.278/96 (Instrução Normativa n° 243/02, art. 2°, § 30).
122 Nas hipóteses dos incisos IX e X (I) a vinculação somente se aplica em relação às operações
com os bens, serviços ou direitos para os quais se constatar a exclusividade; (11) será conside-
rado clistribuidor ou concessionário exclusivo a pessoa física ou jurídica titular desse direito
relativamente a uma parte ou a todo o território do País, inclusive do Brasil; (iii) a exclusi-
vidade será constatada por meio de contrato escrito ou, na inexistência deste, pela prática de
operações comerciais, relacionadas a um tipo de bem, serviço ou clireito, efetuadas exclusi-
vamente entre as duas empresas ou exclusivamente por interméclio de uma delas (Instrução
Normativa nO 243/02, art. 2°, § 4°).
123 Sobre o conceito de interposta pessoa, cfr. UCKMAR/GIULIANI, Interposition in Italian Taxa-
tion on Internal and International Transactions, in Essays in International Taxation, Deven-
ter/Boston 1993, 387, espec. 394.
Título IV I Capo IV I Elisão Fiscal e Elementos de Conexão

Em primeiro lugar, enquanto o nexo de "ligação" próprio do conceito de dis-


tribuição disfarçada apenas respeita aos deslocamentos patrimoniais ocultos de uma
sociedade para com seus sócios e administradores (incluindo parentes destes), o nexo
de "vinculação", próprio do conceito de preços de transferência, abrange também as
transferências patrimoniais ocultas dos sócios para as sociedades.
Em segundo lugar, enquanto o nexo de "ligação" na distribuição disfarçada de
lucros não abrange pessoas alheias a um vínculo direto ou indireto na estrutura do
capital da outra parte (salvo os administradores e seus parentes), o nexo de "vincu-
lação" nos preços de transferência abrange relações de interdependência alheias à
participação no capital, como as que resultam da associação em empreendimento, na
forma de consórcio ou condomínio, bem como da qualidade de agente, distribuidor
ou concessionário exclusivo.
Em terceiro lugar, no que respeita especificamente ao "vínculo familiar", en-
quanto no instituto da distribuição disfarçada de lucros este se restringe aos cônjuges
e parentes até 30 grau, ou afins, dos administradores de sociedades, na figura dos
preços de transferência o nexo de vinculação existe ainda no tocante aos parentes
ou afins até o 30 grau (ou ainda "companheiro"), além dos diretores, dos sócios ou
acionista controlador em participação direta ou indireta.
Não pode deixar de criticar-se a excessiva extensão do conceito de pessoa vincu-
lada, especialmente tendo em vista a automaticidade dos efeitos que essa qualificação
produz, ou seja, a prevalência sobre o preço efetivo de um preço legalmente predeter-
minado, independentemente de uma averiguação das características do caso concreto.
O círculo das pessoas vinculadas, para efeitos de lei, extravasa em muito o âm-
bito a que se aplicam os tratados contra a dupla tributação, seguindo o Modelo
OCDE, como em seguida melhor se verá. E, pela lógica do próprio regime, deveria
restringir-se a reais relações de influência dominante 124 , suscetíveis de afetar a objetivi-
dade dos negócios, que não se verificam necessariamente nos casos de simples coli-
gação de empresas, de participação conjunta em sociedades coligadas, de consórcios
ou de condomínios temporários.

(b) O conceito de país de tributação favorecida


Ainda que a outra parte, residente no exterior, de operação realizada por pes-
soa jurídica domiciliada no Brasil, não seja "pessoa vinculada", o regime da Lei nO
9.430/96 aplica-se sempre que tal parte seja pessoa física ou jurídica residente ou
domiciliada em "país com tributação favorecida".
Como se disse, a lei brasileira afastou-se da experiência internacional relativa a
relações com países e territórios de baixa tributação (de que é exemplo paradigmático
o art. 238-A do Código francês dos impostos), pois aquela não as submete ao regime

124 Cfr., sobre este conceito, PIERO VILLANI, Preço de transferência de bens entre empresas afi-
liadas e seu controle no Direito italiano, RDT 51 (1990),32 sS.
M.I.I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

dos preços de transferência, mas de uma inversão do ônus da prova, de modo que
a dedutibilidade das despesas só é aceita se o contribuinte provar o caráter real das
operações em causa e que as remunerações não apresentem um caráter anormal ou
exagerado 11S •
A matéria relativa aos conceitos de países com tributação favorecida e regimes
fiscais privilegiados na legislação brasileira já foi tratada, de modo amplo, noutra
passagem deste livro, em que se examinaram os instrumentos da elisão fiscal interna-
cional, para o qual se remete o leitor l26 .
Correndo embora o risco de repetição, não pode deixar neste lugar de se desta-
car os aspectos mais relevantes daqueles conceitos para efeitos específicos de preços
de transferência, para os quais aliás foram entre nós formulados.
O conceito de país com tributação favorecida comporta duas espécies:
- os países que não tributam a renda ou que a tributam à alíquota máxima infe-
rior a vinte por cento (art. 24 da Lei nO 9.430/96 e §§ 1° e 3° introduzida pela Lei
nO 10.451, de 10.05.02).
- os países com sigilo societário, assim considerados aqueles "cuja legislação in-
terna oponha sigilo relativo à composição societária das pessoas ou à sua titularieda-
de (art. 4° da Lei nO 10.451, de 10.05.02) ou "à identificação do beneficiário efetivo
de rendimentos atribuídos a não residentes" (§ 4° do art. 24 da Lei nO 9.430/96,
introduzido pela Lei nO 11.727/08).
A baixa tributação e a opacidade passaram, pois, a ser duas modalidades equi-
valentes de tributação favorecida para a generalidade dos efeitos, notadamente do
regime de preços e transferência127.

(c) O conceito de regime fiscal privilegiado


Como atrás já se referiu, ao estudar a origem do conceito de regime fiscal pri-
vilegiado, a Lei nO 11.727/08 introduziu um novo art. 24-B na Lei nO 9.430/96,
segundo o qual:
'1\.plicam-se às operações realizadas em regime fiscal privilegiado as disposições
relativas a preços, custos e taxas de juros constantes dos arts. 18 a 22 desta Lei,
nas transações entre pessoas físicas ou jurídicas residentes e domiciliadas no País
com qualquer pessoa física ou jurídica, ainda que não vinculada, residente ou
domiciliada no exterior."
O art. 24-A, assim, adotou o conceito inovador de regime fiscal privilegiado, ao
qual estendeu a aplicação das regras de preços de transferência, por inspiração nos
estudos da OCDE e da União Europeia.

125 efr. supra.


126 efr. supra, 251 55. e a ampla bibliografia aí citada.
127 efr. a lista taxativa destes países e territórios consta da Instrução Normativa nO 1.037, de 4
de junho de 2010.
Título IV I Capo IV I Elisão Fiscal e Elementos de Conexão .".

Uma comparação entre os conceitos de país com tributação favorecida e de


regimes fiscais privilegiados revela, desde logo, que, enquanto o primeiro qualifica
subjetivamente as entidades tributantes, o segundo qualifica objetivamente as opera-
ções tributáveis) seja qual for a natureza do ente tributante.
São quatro as modalidades de regime fiscal privilegiado.
- nula ou baixa tributação: coincide ela com o núcleo original do conceito de
país com tributação favorecida, só que agora o grau de tributação não visa a qualifi-
car a jurisdição tributante, mas a operação objetivamente tributável, ainda que por
país que não possa ser considerado como de tributação favorecida.
- ring flncing, assim denominados os regimes que concedem tratamento fiscal
preferencial a não residentes (qualquer "vantagem", note-se, e não necessariamen-
te uma nula ou baixa tributação), isolando as operações beneficiadas do mercado
interno, protegido como que por um "anel". A vantagem pode ser concedida seja
por considerar irrelevante o fato de ser exercida ou não no país em causa atividade
econômica substantiva (alínea a), seja condicionada ao não exercício nesse país dessa
mesma atividade econômica substantiva (alínea b).
- territorialidade) assim entendido o regime pelo qual os rendimentos (ou certos
rendimentos) auferidos fora do território de um dado país não são tributados (ter-
ritorialidade plena) ou o são por alíquota máxima inferior a 20% (territorialidade
mitigada ou tributação favorecida da renda externa).
- opacidade) consistente no fato de não ser permitido o acesso a informações
relativas à composição societária, titularidade de bens ou direitos ou às operações
econômicas realizadas. A opacidade, que a lei já considerava característica dos países
com tributação favorecida, surge agora como modalidade autônoma de regime fiscal
privilegiado, alargado à "opacidade objetiva" (relativa à própria operação), por con-
traposição à "opacidade subjetiva" (relativa aos sujeitos).
Das quatro modalidades de regime fiscal privilegiado duas referem-se a atribu-
tos que também caracterizam os países com tributação favorecida (o baixo nível da
tributação e a opacidade), enquanto que outras duas (ringfoncing e territorialidade)
não são critérios adequados para defmir uma entidade política como dispondo de
uma "tributação favorecida".
O conceito de regime fiscal privilegiado é, pois, um conceito jurídico autônomo
do de país com tributação favorecida e não simples espécie ou modalidade deste, pois
foi construído com o propósito específico de constituir um instrumento de combate
às práticas de concorrência fiscal prejudicial (harmful tax competition) enquanto o de
tributação favorecida visou a compensar o Estado da fonte de uma tributação insufi-
ciente no país do beneficiário dos rendimentos.
Como também já se esclareceu, no combate à concorrência fiscal prejudicial
os Estados visam a evitar que os lucros e outros rendimentos se deslocalizem para
outros Estados em função de uma taxação objetivamente mais favorável, erodindo
as receitas dos que se consideram potencialmente mais legitimados para as auferir.
Esta taxação mais favorável pode decorrer de uma tributação efetiva mais baixa, mas
Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

pode também decorrer de um regime de ring fencing ou da adoção de um princípio


de territorialidade quanto a lucros ou certos outros rendimentos 128 •
E daí que a própria OCDE recomende a adoção de medidas especiais de reação
contra estes regimes na área de transfer pricing, por se justificar uma política corretiva das
distorções introduzidas na formação de preços objetivos de mercado (arm)s length).
Como já tivemos ocasião de salientar, o alto grau de complexidade das modali-
dades de regime fiscal privilegiado não permite que o novo art. 24-A seja autoapli-
cável, carecendo para sua aplicação da elaboração pela Administração fiscal de lista
taxativa dos regimes em vigor nos países que reputa estarem abrangidos no conceito
de "regime fiscal privilegiado", tal como ocorre em relação ao conceito de "país com
tributação favorecida". Assim o fez a Instrução Normativa nO 1.037/2010.
Isto porque ofenderia os princípios da proporcionalidade, da razoabilidade e da
proteção de confiança colocar sobre os ombros do contribuinte o fardo da prova de
leis estrangeiras, de que não tem conhecimento, aplicáveis às operações praticadas
com pessoas no exterior, com quais pode até mesmo não guardar qualquer vínculo
societário ou de outra natureza129 .

(v) Âmbito objetivo


o âmbito objetivo do regime dos preços de transferência é definido em função
da natureza das operações a que é aplicável.
O referido regime é aplicável a dois tipos de operações: operações comerciais e
operações financeiras. A operações comerciais) tanto ativas (venda ao exterior de bens,
serviços ou direitos) como passivas (aquisição ou importação do exterior de bens,
serviços e direitos). E a operações financeiras) igualmente tanto ativas como passivas
(mútuos concedidos e mútuos recebidos por pessoa jurídica domiciliada no Brasil).
Ao invés, a própria lei subtrai do regime dos preços de transferência as opera-
ções passivas relacionadas com a aquisição ou transferência de tecnologia (royalties e
assistência técnica, científica, administrativa ou assemelhada) que, nos termos do §
9° do art. 18 da Lei nO 9.430/96, permanecem subordinados às condições de dedu-
tibilidade constantes da legislação fiscal vigente.

(vi) Regime tributário

(a) Considerações preliminares


A lei brasileira ao estabelecer os métodos para a aferição do preço parâmetro
teve por clara inspiração os estudos da OCDE, constantes do relatório entitulado

128 Cfr. supra, 255 ss.


129 Cfr. ALBERTO XAVlER/RoBERTO DUQUE ESTRADA/RENATA EMERY, Países com tributação favo-
recida e regimes fiscais privilegiados, RDDT, vaI. 168, 7 ss.
Título IV I Capo IV I Elisão Fiscal e Elementos de Conexão

Transfer Pricing Guidelines for Multinational Enterprises and Tax Administrations, que
preveem como métodos clássicos de apuração dos preços de transferência o dos pre-
ços independentes comparados (Comparable Uncontrolled Price Method) , o do preço
de revenda (Resale Price method) e o do custo mais margem (Cost Plus Method). Tais
métodos, como se verá, foram aqueles acolhidos pela lei, com a particularidade de
que no Brasil as margens aplicadas nesses métodos foram prefIxadas pelo legislador,
enquanto que nos países que seguem a metodologia proposta pela OCDE essas mar-
gens são defInidas caso a caso, considerando as práticas de mercado em função do
ramo de atividade e do produto individualmente considerado.
A prefIxação legal de margens tem sido objeto de severas críticas por parte
da doutrina, devido à possibilidade de que se verifIque em certos casos verdadeira
incompatibilidade com a margem de mercado real e efetivamente utilizada em de-
terminados ramos de atividade, o que resultaria indiretamente numa tributação do
patrimônio da pessoa jurídica, vedada pelo art. 43 do CTN.
Reconhecendo esta realidade, a Medida Provisória nO 478/09, que entretanto
perdeu efIcácia, trouxe uma importante inovação ao introduzir um art. 19-A à Lei
nO 9.430/96, no qual autoriza o "Ministro de Estado da Fazenda a fIxar margens de
lucro diferentes por setor ou ramo de atividade econômica para fIns de apuração dos
preços parâmetros relativos aos métodos de que tratam os arts. 18 e 19".
Tal autorização não se confunde com aquela estabelecida no art. 20 da mesma
Lei, que permite que o Ministro da Fazenda, em circunstâncias especiais, altere as
margens prefIxadas na legislação, a qual permaneceu em vigor, muito embora tal
dispositivo jamais tenha sido aplicado,
Para além dos métodos clássicos ou tradicionais apontados pela OCDE em seu
relatório e que foram adotados pela legislação brasileira, aquela Organização tam-
bém enumera em suas ''guidelines'' o método de divisão de lucros (profit split me-
thod), que consiste na repartição dos lucros da operação entre as partes envolvidas,
considerando as funções por elas desempenhadas; e o método da margem líquida
operacional (transactional net mat;gin method) que consiste em comparar a margem
líquida da operação com aquela normalmente adotada em operações com partes não
relacionadas ou por terceiros negociando em condições de mercado.
O relatório da OCDE também se refere em tese ao método de alocação de lu-
cros globais (global flrmulary apportionment) que consiste na consolidação dos lucros
de todas as empresas pertencentes a um mesmo grupo multinacional para poste-
rior alocação dos lucros por entidade, conforme fórmula previamente estabelecida
pelas administrações fIscais. Este método é o único que não se baseia no princípio
arm)s length, e, apesar de certos doutrinadores o consideraram como mais próximo
da realidade econômica, tem sido expressamente rejeitado pelos países membros da
OCDEI30.

130 efr. Tranfer Pricing Guidelines for Multinatwnal Enterprises and Tax Administratwns, cit., IH-
24, item 3.74.
Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier _:_:_ _ _ _--"

Tais métodos não foram também acolhidos pela legislação brasileira, que, dis-
tanciando-se da experiência internacional, preferiu reconhecer um rol taxativo de
métodos para a aferição do preço parâmetro, vedando ao contribuinte o recurso à
eleição de outros métodos, ainda que mais compatíveis com as suas atividades ou
com certas operações em virtude de suas características singulares.
O estudo das legislações estrangeiras sobre preços de transferência, no entanto,
tem demonstrado que os métodos tradicionais não são aplicáveis ou adequados a
certas realidades ou operações, quer seja pela impossibilidade de se estabelecer um
parâmetro válido de comparação com operações com partes independentes, pela ine-
xistência de dados e informações confiáveis disponíveis, quer seja pelo alto grau de
integração das partes vinculadas, quer ainda porque tais métodos não consideram as
funções desempenhadas por cada parte e os objetivos visados pela operação submeti-
da às regras de preços de transferência, o que pode conduzir a resultados artificiais.
É o que se verifica quando a empresa controladora concentra as aquisições mun-
diais de certos insumos que são por ela revendidos às suas subsidiárias nos mais di-
versos países. A função desempenhada pela controladora nestes casos pode visar, por
exemplo, à obtenção de vantagens comerciais e à redução de custos pela compra em
escala dos insumos utilizados por suas subsidiárias locais. Toda a vantagem esperada
nesta estrutura poderá ser eliminada se, ao aplicar os métodos tradicionais, as vendas
realizadas pela controladora às suas subsidiárias tiverem o tratamento idêntico de
operações realizadas no mercado, retirando assim a verdadeira essência econômica da
estrutura para artificialmente criar um resultado ao nível da controladora.
Tais situações têm levado parte da doutrina a suscitar discussões quanto à pró-
pria adequação e conveniência de se adotarem regras de preços de transferência, pois
em lugar de coibir transferências artificiais de lucros entre empresas pertencentes ao
mesmo grupo essas regras têm, em determinados casos, resultado na produção de
lucros artificiais, distanciando-se da realidade econômica dos negócios.

(b) Operações comerciais ativas

(i) Os métodos
No que concerne às operações comerciais ativas, a Lei determina, no seu art.
19, que haverá arbitramento das receitas quando o preço médio da venda dos bens,
serviços e direitos, nas exportações, for inferior a 90% do preço médio praticado na
venda dos mesmos bens, serviços ou direitos, no mercado brasileiro, durante o mes-
mo período, em condições de pagamento semelhantes l3l .

131 Exceção importante é representada pelos casos de "conquista de novos mercados", em re-
lação aos quais a Instrução Normativa nO 243/02 estabeleceu, no seu art. 30, o seguinte
regime: "As exportações para empresa vinculada, com o objetivo de conquistar mercado, em
outro país, para os bens, serviços ou direitos de produção no território brasileiro, poderão
Título IV I Capo IV I Elisão Fiscal e Elementos de Conexão

Caso o preço de venda seja inferior ao limite de 90%, o arbitramento tomará


por base o valor apurado segundo um dos seguintes métodos:
"I - Método do Preço de Vénda nas Exportações - PVEx: definido como a média
aritmética dos preços de venda nas exportações efetuadas pela própria empresa,
para outros clientes, ou por outra exportadora nacional de bens, serviços ou di-
reitos, idênticos ou similares, durante o mesmo período de apuração da base de
cálculo do imposto de renda e em condições de pagamento semelhantes;
"lI - Método do Preço de Vénda por Atacado no País de Destino, Diminuído do Lucro
- PVA: definido como a média aritmética dos preços de venda de bens, idênticos
ou similares, praticados no mercado atacadista do país de destino, em condições
de pagamento semelhantes, diminuídos dos tributos incluídos no preço, cobra-
dos no referido país, e de margem de lucro de quinze por cento sobre o preço
de venda no atacado;
"III - Método do Preço de Vénda a VáreJo no País de Destino, Diminuído do Lucro - PVV:
definido como a média aritmética dos preços de venda de bens, idênticos ou simila-
res, praticados no mercado varejista do país de destino, em condições de pagamento
semelhantes, diminuídos dos tributos incluídos no preço, cobrados no referido país,
e de margem de lucro de trinta por cento sobre o preço de venda no varejo;
"IV - Método do Custo de Aquisição ou de Produção mais Tributos e Lucro - CAP:
definido como a média aritmética dos custos de aquisição ou de produção dos
bens, serviços ou direitos, exportados, acrescidos dos impostos e contribuições
cobrados no Brasil e de margem de lucro de quinze por cento sobre a soma dos
custos mais impostos e contribuições."
Em relação a todos estes métodos há que salientar a extrema dificuldade de
aplicação do critério da "identidade" ou "similaridade" dos bens e serviços, especial-

ser efetuadas a preços médios inferiores a 90% dos preços médios praticados no Brasil, in-
dependentemente de arbitramento das respectivas receitas, desde que: (i) os bens, serviços
ou direitos, objeto da exportação, não tenham sido comercializados no país de destino, pela
própria empresa exportadora ou por qualquer outra a ela vinculada, localizada em qualquer
parte do mundo; (ii) os bens, serviços ou direitos sejam revendidos aos consumidores, por
preço inferior ao de qualquer bem, serviço ou direito, idêntico ou similar, comercializado no
país de destino; (iii) efetuadas com observãncia das condições fixadas em plano específico de
exportação, previamente aprovado pela Coordenação Geral do Sistema de Tributação - CO-
SIT; (iv) fique demonstrado, no plano de exportação, que a empresa vinculada, domiciliada
no país de destino, não terá lucro com as operações e, se houver previsão de prejuízos para
a empresa no Brasil, em virtude do preço a ser praticado, o prazo previsto para sua recupe-
ração. A IN 243/02 determina que este regime não se aplica às exportações que tiverem por
destino país com tributação favorecida ou cuja legislação interna oponha sigilo (art. 30, §
4°). Cfr. GILBERTO DE CASTRO MOREIRA JUNIOR, Controle fiscal dos preços de transferência
na exportação e conquista de novos mercados, 197, in EDISON CARLOS FERNfu'JDES (coord.),
Preços de transftrência, São Paulo 2007, 497 S5.
_ I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

mente no que respeita a bens e serviços não massificados, de tecnologia inovadora ou


em que estejam presentes aspectos de imagem ou de reputação I32 .
Os métodos adotados para o arbitramento do preço das exportações podem
agrupar-se em duas categorias: (i) a primeira consiste naqueles que têm por base a
comparabilidade dos preços e condições de pagamentos dos bens, direitos ou serviços
e que se distinguem consoante a comparação seja realizada com operações próprias
do contribuinte, realizadas com partes independentes (PVEX) ou operações de ter-
ceiros, em transações realizadas no mercado de destino (PVA ou PVV); e (ii) a se-
gunda que abrange os métodos que têm como base o custo unitário do bem, direito
ou serviço exportado, ao qual se acrescem os tributos incidentes mais uma margem
prefixada de 15%.
A primeira categoria de métodos eleitos pela norma enfrenta em certos casos o
problema de não se terem dados e informações disponíveis com base nos quais se pos-
sa estabelecer uma comparação válida e confiável para fms de arbitramento do preço
parâmetro. É que muitas empresas apenas realizam operações com partes vinculadas
no exterior, portanto, não passíveis de utilização para o estabelecimento do critério de
comparabilidade pelo método PVEX. E os métodos do PVA e PVV enfrentam como
obstáculo a inexistência em grande parte dos casos de dados disponíveis com base nos
quais possam evidenciar os valores praticados em operações no mercado de destino.
Em grande parte dos casos tais informações são confidenciais e não são tornadas
públicas, até mesmo por questões estritamente concorrenciais. Muitas vezes a subsi-
diária brasileira sequer consegue obter tais informações de sua própria controladora
no exterior.
A Instrução Normativa nO 243/02 estabelece em seu art. 29 a possibilidade de
que a comprovação dos preços seja efetuada também com base em: (i) publicações
ou relatórios oficiais do governo do país do comprador ou vendedor ou declaração
da autoridade fiscal desse mesmo país, quando com ele o Brasil mantiver acordo,
para evitar a dupla tributação ou para intercâmbio de informações; (ii) pesquisas efe-
tuadas por empresa ou instituição de notório conhecimento técnico ou publicações
técnicas, onde se especifique o setor, o período, as empresas pesquisadas e a margem
encontrada, bem assim identifique, por empresa, os dados coletados e trabalhados.
Observe-se que em muitos casos não existem publicações ou relatórios técnicos
ou oficiais do governo do país estrangeiro disporúveis e, tal como no Brasil, a obtenção
de declarações por parte das autoridades fiscais estrangeiras enfrenta demoras e dificul-
dades de natureza burocrática. Resta ao contribuinte, por fim, socorrer-se do oneroso
expediente de encomendar pesquisas de empresas ou instituições de notório conheci-
mento técnico para evidenciar o cumprimento das regras de preços de transferência.

132 "Para efeito desta Instrução Normativa, dois ou mais bens, em condições de uso na finalidade a
que se destinam, serão considerados similares quando, simultaneamente: I - tiverem a mesma
natureza e a mesma função; Il - puderem substituir-se mutuamente, na função a que se desti-
nem; III - tiverem especificações equivalentes (art. 28 da Instrução Normativa na 243/02)."
Título IV I Capo IV I Elisão Fiscal e Elementos de Conexão

Em face das dificuldades enfrentadas pelo contribuinte para aplicar as regras de


preços de transferência nas circunstâncias atrás referidas, não pode o Fisco utilizar-se
dos seus amplos e privilegiados recursos e acessos a informações de terceiros, para
praticar o arbitramento do preço baseado nos métodos em causa.
O arbitramento com base nos métodos que têm por fundamento a compara-
bilidade dos preços só é, pois, válido, em face de princípios essenciais do Estado de
Direito, como a segurança jurídica e a proteção da confiança se o contribuinte tiver
acesso aos mesmos dados e informações tomados como base para o estabelecimento
do preço parâmetro em igualdade de condições l33 .
Poder-se-ia dizer, em princípio, ser o método CAP um método residual, pois apa-
rentemente aplicável a toda e qualquer situação não coberta pelo métodos anteriores.
Tal afirmação, contudo, não é exata, pois a aplicação do método CAP (custo de
aquisição ou de produção mais tributos e leis) não se revela apropriada em todos os
casos em que não é possível estabelecer-se um custo unitário para o objeto da ope-
ração de exportação. Normalmente é o que se verifica em relação a certos direitos,
passíveis de infinitos fracionamentos ou multiplicáveis, como é o caso das licenças de
exibição de filmes, das licenças de software etc.
Nestes casos, o custo de produção do bem (i.e., filme, software) objeto da con-
cessão de direitos de exploração ou utilização é definido e invariável com o tempo,
fazendo-se, porém, a exploração econômica do mesmo por meio da concessão de
licenças a terceiros que são reproduzidas a um universo a priori não identificável e
passível de alargamento com o tempo.
Pode, pois, se verificar em determinado caso a impossibilidade de aplicação de
quaisquer desses métodos, seja pela impossibilidade de se estabelecer um critério de
comparação, seja pela impossibilidade de se identificar validamente um custo unitá-
rio, conduzindo, portanto, à conclusão de que nestes casos não há arbitramento de
preços possível de ser determinado.

(ii) O princípio da tipicidade dos métodos


Em matéria de operações comerciais ativas (e também nas passivas, como ve-
remos) vigora o princípio da tipicidade dos métodos, segundo o qual as técnicas de de-
terminação de preços objetivos são exclusivamente as enumeradas taxativamente no
catálogo legal, constituindo um numerus clausus, de tal modo que nem o Fisco nem
os contribuintes se podem socorrer validamente de outras metodologias, ainda que
cientificamente baseadas.

133 Assim julgou o Ac CC 105-09551 de 5.3.09: "Inaplicável o método PIC, por unilateralidade
de dados disponíveis somente ao Fisco, com grave desrespeito ao princípio do contraditório
e fundamentação em dados subjetivos, sem aferição em consistência objetiva de similaridade
de produtos, de acordo com a legislação aplicável."
Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier ......._:_ ........_ _......

o princípio da tipicidade apresenta inconvenientes e vantagens. Do ponto de


vista da justiça material e da capacidade contributiva, o caráter predeterminado dos
critérios e o impedimento a que o arm/s length price seja objeto de um amplo dever de
investigação do Fisco, segundo o princípio inquisitório e da verdade material, pode
conduzir no caso concreto, em face das peculiaridades da conjuntura econômica, da
natureza da empresa, do lucro ou do serviço, a resultados tão ou mais afastados da re-
alidade objetiva do mercado que o preço efetivamente praticado. A verdade, porém,
é que, do ponto de vista da certeza do direito e da segurança jurídica, é um forte limi-
tador do subjetivismo da Administração, protegendo o contribuinte de uma ampla
discricionariedade técnica (ou margem de livre apreciação) decorrente da liberdade
probatória em matéria delicada e controversa.

(iii) O principio da delimitação negativa do âmbito objetivo


de aplicação do regime: o caso dos intangíveis
Um corolário do princípio da tipicidade dos métodos é a delimitação negativa
das operações a que se aplica o regime dos preços de transferência.
Muito embora a letra do art. 19 da Lei nO 9.430/96 se refira à venda de "bens,
serviços ou direitos", sem qualquer restrição, a verdade é que a consagração de um
princípio de tipicidade, ao invés de uma cláusula geral at arm)s length, aplicável a todo
e qualquer tipo de exportação, faz com que certas categorias de bens, serviços e direitos
fiquem excluídos do regime legal em razão da inaplicabilidade estrutural e intrínseca de
qualquer um dos métodos típicos para a determinação dos seus preços objetivos.
Na verdade, os métodos de preços de transferência tipificados pela legislação bra-
sileira, muito embora não tenham restringido a sua aplicação a bens, direitos ou ser-
viços amplamente comercializáveis, foram claramente concebidos para tais situações,
tendo sempre como base preços no mercado de varejo, no mercado atacadista, preços
no mercado brasileiro ou de outros países, preços de revenda; e as informações nas
quais baseia a definição do preço parâmetro são aquelas disponíveis em publicações
ou relatórios oficiais do governo, pesquisas efetuadas por empresa ou instituição de
notório conhecimento técnico ou publicações técnicas. Tais métodos são estrutural-
mente inadequados para operações com bens que não são amplamente comercializá-
veis e que enfrentam obstáculos insuperáveis na sua aplicação, como já referimos.
É precisamente este o caso dos bens intangíveis, das participações societárias e da
própria problemática dos cost sharing que várias leis estrangeiras submetem ao regi-
me de preços de transferência, porque admitem, seguindo as orientações da OCDE,
que o Fisco e o contribuinte indiquem os métodos mais convenientes à demonstra-
ção de que o valor praticado é justo, não se limitando a um rol taxativo de técnicas
previamente estabelecido.
No que concerne em especial aos intangíveis, os critérios de comparabilidade
revelam-se especialmente difíceis de determinar, em face da singularidade de muitos
deles, pois em rigor exigem ter por objeto o mesmo bem e que ocorram idênticas
Título IV I Capo IV I Elisão Fiscal e Elementos de Conexão M!.E'
condições contratuais (prazo de eventual uso ou exploração de direito, área geográfi-
ca coberta pela licença ou número de vezes em que o direito em que ela consiste pode
ser utilizada) e de pagamento.
É o que ocorre, por exemplo, nas licenças de exibição de flimes. Nenhuma com-
paração possível pode ser estabelecida entre um sucesso de bilheteria, voltado para
o público juvenil, e um filme culto de autor. Ou entre um filme de recente exibição
nos cinemas, que foi sucesso de bilheteria, cuja licença é concedida a certo canal de
televisão para exibição inédita e com exclusividade, e outro filme que, muito embora
tenha sido igualmente sucesso de bilheteria, foi exibido no cinema há décadas e na
TV por inúmeras vezes. A maior ou menor valorização do filme licenciado ocorre em
função de suas características individuais, do momento em que é exibido, aspectos
específicos do contrato, número e período de exibições e tantos outros que muitas
vezes impedem a identidade ou até a similaridade.
Por outro lado, os principais fatores que influenciam os preços praticados em ope-
rações com intangíveis não são passíveis de ajuste pelas normas brasileiras, o que pode
implicar substancial discrepância e divergência entre os preços praticados em operações
com pessoas não vinculadas e por outras empresas que atuam num mesmo setor, resul-
tando, por isso, na impossibilidade de adequada comparação dos preços134.
A questão acerca da comparabilidade de preços para a adoção de regras de pre-
ços de transferência, em especial em matéria de intangíveis, é matéria amplamente
discutida na doutrina estrangeira e especificamente no âmbito da OCDE.
Os estudos atualmente em curso naquela instituição sobre os critérios de com-
parabilidade de preços, para fins de aplicação das regras de preços de transferência
(Comparability: Public Invitation to Comment on a Series ofDraft Issues Notes), têm por
fim auxiliar os contribuintes no processo de comparação de preços e apontam como
principal problema a necessidade de adoção de critérios de ajustes de preços com o
fim de eliminar discrepâncias resultantes de condições especiais de negociação ou do
produto, permitindo a efetiva comparabilidade dos preços (características do bem ou
serviço, análise funcional, termos contratuais, circunstâncias econômicas, estratégias
comerciais) .
Nas Transfer Pricing Guidelines for Multinational Enterprises and Tax Administra-
tions da OCDE a problemática da aplicação das regras de preços de transferência às
operações com intangíveis é discutida, sendo apontada a dificuldade de adoção dos
métodos tradicionais (preços médios comparados, custo mais margem etc.) e propos-
ta a aplicação de métodos alternativos como o transactional proftt method, segundo o
qual se propõe a comparação do lucro obtido na operação com o lucro aputado por
empresas não vinculadas em operações similares ou transactional net ma'flJin method
em que se propõe a comparação da margem líquida auferida na operação com a mar-
gem auferida por empresas não vinculadas em operações similares.

134 É notadamente o curso de grande parte dos ajustes previstos nos arts. 9° a 11 da Instrução
Normativa nO 243/02, essencialmente concebidos para bens tangíveis, mercadorias.
iJli) I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Se estas discussões são de grande relevância nos sistemas que permitem uma
ampla e livre investigação do preço at arm)s length, eles não têm aplicação em face da
lei brasileira, uma vez que as regras de preços de transferência estabelecem critérios
objetivos segundo um princípio de tipicidade, não sendo possível adotar-se outro
que não aqueles taxativamente previstos em lei.
Assim, por exemplo, no que respeita ao método do PRL a sua inaplicabilidade
pode resultar objetivamente do fato de que eventual intangível tenha sido adquirido
para uso ou exploração pela própria empresa adquirente e não para sua revenda ou
utilização na produção de bens, direitos ou serviços por ela comercializáveis. Já no
que concerne ao método CPL, a sua inaplicabilidade pode decorrer do fato de que
certos intangíveis não possuem custo unitário que lhes seja atribuível.
Da incompatibilidade dos métodos previstos na legislação em vigor com as
características específicas de certos intangíveis resulta, pois, automaticamente, uma
delimitação negativa do âmbito de aplicação do regime, dada a impossibilidade de o
Fisco proceder ao arbitramento 135 .

(iv) O princípio da prevalência do método mais favorável ao contribuinte


Outro princípio fundamental neste domínio é o princípio da prevalência do mé-
todo mais favorável ao contribuinte consagrado no § 4° do art. 19 da Lei nO 9.430/96,
segundo o qual na hipótese de utilização de mais de um método será considerado o
menor dos valores apurados.
Caso, porém, os valores apurados segundo os métodos da lei sejam inferiores
àqueles constantes dos documentos de exportação, prevalecerão os preços de venda
constantes destes documentos (§ 6°)136, não podendo o contribuinte se beneficiar

135 ELIDIE PALMA BIFANO, Apuração de preços de transferência em intangíveis, contratos de pres-
tação de serviços, intragrupo e cost sharing agreements, in Luís EDUARDO SCHOUERI (org.),
Tributos e preços de transferência, 3° vo1., São Paulo 2009, 28 ss.; ELlETE DE LIMA RIBEIRO
MALHEIRO, Preços de transferência - intangíveis, serviços e cost-sharing, in ibidem, 48 ss.;
GABRIEL LACERDA TROIANELLl, Preço de transferência: intangíveis, acordos de repartição de
custos e serviços de grupo, in ibidem, 75; YARIV BRAUNER, O valor segundo o espectador: a
avaliação de intangíveis para fms de preços de transferência, in ibidem, 267; Luís EDUARDO
SCHOUERI, Considerações sobre o princípio Arm's Length e os Secret Comparables, Home-
nagem a Paulo de Barros Carvalho, Direito Tributário, São Paulo 2008, 834 ss.
136 A Instrução Normativa nO 243/02 estabelece safo harbour ao considerar satisfatória a com-
provação, nas operações com empresas vinculadas, quando o preço ajustado, a ser utilizado
como parâmetro, divirja, em até cinco por cento, para mais ou para menos, daquele constan-
te dos documentos de importação ou exportação, caso em que nenhum ajuste será exigido
da empresa na apuração do imposto de renda, e na base de cálculo da CSLL (art. 35). Outro
safo harbour consta do art. 36 daquela Instrução Normativa ao estabelecer que a pessoa
jurídica, cuja receita líquida de exportações, no ano-calendário, não exceder a 5% do total
da receita líquida no mesmo período, poderá comprovar a adequação dos preços praticados
nessas exportações exclusivamente com os documentos relacionados com a própria opera-
ção. Nenhum dos safo havens se aplica, porém, às operações com paraísos fiscais (art. 37).
Título IV I Capo IV I Elisão Fiscal e Elementos de Conexão

do preço arbitrado, pois neste caso terá ele de fato apurado um lucro com base nos
valores efetivamente praticados na operação.
Trata-se de uma solução ponderada que visa a mitigar o risco de eventual injus-
tiça provocada pela predeterminação dos critérios, conducente à fIxação de preço de
exportação superior ao realista no caso concreto e assim a uma tributação descon-
forme com a capacidade contributiva e com o próprio conceito de renda, tal como
defInido no art. 43 do CTN.
Referido princípio baseia-se numa equivalência jurídica dos métodos facultados
pela lei, cada um dos quais considerado tecnicamente idôneo para a determinação de
um preço parâmetro, de tal modo que a prevalência do método mais favorável miti-
ga, em defesa do contribuinte, as áleas do recurso a um método porventura menos
adequado ao caso concreto.
Se existe sempre um elemento de risco de afastamento da verdade no uso de
critérios legais, a verdade é que a oferta por lei de uma pluralidade de métodos e
a prevalência do mais favorável, se não atinge na perfeição o princípio da verdade
material, na pureza da sua fIsionomia original, pelo menos assegura o que a doutrina
alemã denomina de "maior verossimilhança" (die grosste "Wahrscheinlichkeij) ou um
princípio da" verdade material aproximada" (anniihernde materielle "Wahrheit) 137.

(v) Limitações à liberdade de utilização dos métodos

A Medida Provisória na 478/09 veio estabelecer uma severa restrição ao direito


à escolha, pelo contribuinte, do método que conduzir a um preço parâmetro mais
favorável, através da inclusão de um novo art. 19-B à Lei na 9.430, de 1996.
O caput do art. 19-B dispõe que '1\ opção por um dos métodos previstos nos arts. 18 e
19 será efetuada na Declaração de Informação Econômica Fiscal da Pessoa Jurídica (DIPJ)
e não poderá ser alterada pelo contribuinte uma vez iniciado o procedimento fiscal".
E o § 10 acrescenta: "a autoridade fiscal responsável pela verifIcação poderá de-
terminar o preço parâmetro, com base nos documentos de que dispuser, e aplicar um
dos métodos previstos nos arts. 18 e 19, quando o sujeito passivo:
"I - não indicar, precedentemente ao início do procedimento fIscal, o método
de apuração escolhido, observado o disposto no caput deste artigo;
"II - não apresentar os documentos que deem suporte à determinação do preço
praticado nem as respectivas memórias de cálculo para apuração do preço parâ-
metro, segundo o método escolhido;
"III - apresentar documentos imprestáveis ou insufIcientes para demonstrar a
correção do cálculo do preço parâmetro pelo método escolhido.

137 Cfr. ALBERTO XAVIER,Do lançamento no Direito Tributário brasileiro (3 a ed.), São Paulo, 135;
SPITALERjPAULICK, H. H. S., Prel § 160, nota 17 d; § 240, nota 5. FELIX, Ermessensaussübung
im Steuerrecht, Düsseldorf, 1955, 24-25.
I • I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

o § 2°, finalmente, dispõe que:


'1\ utilização do método de cálculo de preço parâmetro deve ser consistente por
bem, serviço ou direito, durante todo o ano calendário, observado o disposto
no caput deste artigo."
Não é compatível com a equivalência jurídica dos métodos dos preços de trans-
ferência como meios alternativos (embora exclusivos) de descoberta da verdade ma-
terial definir o momento temporal da sua utilização pelo contribuinte, nem tornar
irrevogável a opção então feita. Ao contribuinte deve ser dada plena liberdade de uti-
lização de outros métodos a qualquer tempo, ficando o Fisco vinculado ao resultado
mais favorável ao contribuinte.
E isto porque um ajuste de resultado só é legítimo se ficar comprovada uma di-
vergência entre o preço praticado e preço parâmetro, seja qual for o método utilizado
para a determinação deste último e o momento da sua utilização.
Por outro lado, permitir ao Fisco a livre escolha de um método, a seu exclusivo
critério, pelo só fato de o contribuinte não ter efetuado a opção num dado momento
ou de não apresentar documentos suficientes do método adotado representa igual-
mente uma ilegítima exoneração do seu dever de investigação oficiosa da verdade ma-
terial' sem que esteja previamente demonstrada a impossibilidade de sua apuração l38 •
Os princípios essenciais do Estado de Direito não podem ser atropelados em
nome de uma alegada eficiência ou maior praticabilidade administrativa, restringin-
do, sem fundamento proporcional e razoável, a liberdade probatória inerente aos
princípios inquisitórios e da verdade material, que são em última análise corolários
do princípio maior da legalidade de tributação 139 •
As restrições em causa não chegaram a entrar em vigor, em virtude da perda da efi-
cácia da Medida Provisória nO 478/09, que não foi convertida em lei no prazo do art. 62,
§ 3°, da Constituição, suscitando complexos problemas de sucessão de leis no tempo.

138 Exemplar, neste sentido, o Ac CC 107.094~1 de 25.6.2008 "DOS MÉTODOS DE APU-


RAÇAO DOS PREÇOS DE TRANSFERENCIA E DOS EVENTUAIS AJUSTES. Mes-
mo quando a fiscalização não aponta o método de apuração dos preços de transferência, os
auditores fiscais encarregados da verificação deverão utilizar o método mais favorável ao
contribuinte ou demonstrar a impossibilidade de aplicação de outros métodos passíveis de
utilização nas operações praticadas (. .. )".
139 Cfr. ALBERTO XAVIER, Do lançamento no Direito Tributário brasileiro (3" ed.), Rio de J ;meiro 2005,
131 ss. Cfr. ainda RICARDO MARIZ DE OLIVEIRA, Métodos de apuração dos preços de transferên·
cia no Brasil: efeitos da escolha de um método e possibilidade de indicação de métodos diversos.
Consequências da fatal de indicação de métodos, in Luís EDUARDO SCHOUERl (coord.), Tributos
e Preços de Transferência) 3° vol., São Paulo 2009,155 ss.; RAFAEL M. MALHEIRO, Limites à atua-
ção dos agentes fiscais na eleição de um parâmetro de preço de transferência nos casos de inércia
do contribuinte, RDTI, nO 3 (2006),205 ss.; ELEN PEIXOTO ORSINI, Elementos complementares
da prava e procedimentos de fiscalização - uma visão) in EDISON CARLOS FERNANDES (coord.), Pre-
ços de transferência, São Paulo 2007,227 S5.; DIEGO ALEJANDRO CoSTA MARCHANT, Elementos
complementares de prova e procedimento da fiscalização - outra visão, in ibidem) 261 ss.
Título IV I Capo IV I Elisão Fiscal e Elementos de Conexão .P'
(vi) A comparação entre preços internos e
preços externos como pressuposto necessário do arbitramento

Ao contrário do que sucede em matéria de importações, em que o recurso ao ar-


bitramento é automático (art. 18 da Lei nO 9.430/96), não dependendo de uma fase
prévia de demonstração dos pressupostos, no caso das operações comerciais ativas o
Fisco não pode socorrer-se diretamente dos mecanismos de arbitramento resultantes
das presunções legais do art. 19 da Lei nO 9.430/96, sem que previamente, numa
primeira fase, tenha, analítica e fundamentadamente, demonstrado a ocorrência dos
seus pressupostos de aplicação.
Tais pressupostos são, na verdade, corolário do caráter excepcional do arbitra-
mento, que por sua vez resulta da preferência da lei pela prova direta como forma de
revelação da verdade material.
Os pressupostos de aplicação do arbitramento constam do caput do art. 19 e
ocorrem "( ... ) quando o preço médio de venda dos bens, serviços ou direitos, nas
exportações efetuadas durante o respectivo período de apuração da base de cálculo
do imposto de renda, for inferior a noventa por cento do preço médio praticado na
venda dos mesmos bens, serviços ou direitos, no mercado brasileiro, durante o mes-
mo período, em condições de pagamento semelhantes".
Coloca-se a questão de saber se, para efeitos de comparação com os preços mé-
dios de exportação, devem apenas considerar-se as vendas, no mercado interno, a pes-
soas não vinculadas ou se, ao invés, pode estar abrangida a totalidade das vendas.
Caso se devessem considerar apenas as vendas no mercado interno a pessoas
não vinculadas, não seria possível o raciocínio comparativo do art. 19, em caso de
inexistência de tais operações. Poderia então argumentar-se no sentido de que o Fisco
poderia socorrer-se diretamente de qualquer dos métodos de apuração das receitas de
exportações constantes dos quatro incisos do § 3° do mesmo art. 19.
A correta interpretação do art. 19 leva à conclusão de que, para efeitos da apu-
ração prévia de comparação entre preços externos e preços internos, não é exigido
o requisito da independência das partes, sendo por conseguinte legítimo considerar
todas as vendas no mercado interno, inclusive vendas a pessoas vinculadas. Aliás,
sequer faria sentido limitar as vendas no mercado interno àquelas feitas às partes
independentes, já que sobre as operações com pessoas vinculadas incidem as regras
de distribuição disfarçada de lucros, que permanecem em vigor e são aplicáveis nas
operações domésticas e que por si sós têm o condão de coibir eventual artificialismo
que pudesse comprometer tais operações.
Na verdade, a regra constante do § 8° do art. 19, segundo o qual "( ... ) somente
serão consideradas as operações de compra e venda praticadas entre compradores e
vendedores não vinculados" é exclusivamente aplicável para efeitos do disposto no § 3° do
mesmo artigo. Ora, a aplicação dos métodos do § 3° já pressupõe que o Fisco tenha
comprovado que o preço de venda nas exportações a pessoas vinculadas é inferior ao
limite de 90% de que trata o caput do art. 19.
I e I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Neste sentido é categórica a redação do próprio § 30:


"Verificado que opreço de vendas nas exportações é superior ao limite de que trata este
artigo, as receitas das vendas nas exportações serão determinadas tomando-se
por base o valor apurado segundo wn dos seguintes métodos (... )."
Significa isto que a desconsideração das operações de compra e venda entre
pessoas vinculadas é apenas aplicável para a apuração dos preços em cada um dos mé-
todos do § 30, que consideram os preços de venda, ou seja, para efeitos de determi-
nação: (i) dos preços de venda nas exportações efetuadas pela própria empresa, para
outros clientes, ou por outra exportadora nacional de bens, serviços ou direitos, idên-
ticos ou similares (PVEX.); (ii) dos preços de venda de bens, idênticos ou similares,
praticados no mercado atacadista do país de destino, em condições de pagamento
semelhantes, diminuídos dos tributos incluídos no preço, cobrados no referido país,
e de margem de lucro de quinze por cento sobre o preço de venda no atacado (PVA);
e (iii) dos preços de venda de bens, idênticos ou similares, praticados no mercado
varejista do país de destino, em condições de pagamento semelhantes, diminuídos
dos tributos incluídos no preço, cobrados no referido país, e de margem de lucro de
trinta por cento sobre o preço de venda no varejo (PVV).
Em primeiro lugar, procede-se à comparação entre preços internos e externos, con-
siderando operações entre pessoas vinculadas e não vinculadas, e somente no caso de
se constatar que os preços externos são inferiores em mais de 90% aos preços internos
poderá, então, numa segunda fase, aplicar-se os métodos do § 30 (caso em que apenas se-
rão consideradas operações entre pessoas não vinculados, conforme determina o § 80).
N a operação prévia de comparação a que se refere o caput do art. 19, não é apli-
cável a restrição do § 80, sendo legítima a consideração de vendas internas a pessoas
vinculadas, mesmo porque se assim não fosse seria inócuo o sistema da lei no caso de
inexistirem no mercado interno vendas para pessoas independentes. Com efeito, tal
inexistência tornaria impossível, em detrimento do Fisco, a própria comparação que
é o pressuposto necessário da aplicação do regime de preços de transferência.
Revela por isso wn absoluto desvio em relação à sistemática da Lei nO 9.430/96
a transformação do § 8 0 do art. 19 num § 30 do art. 14 da Instrução Normativa nO
243/02 14°, que, por ter ilegalmente substituído a expressão "para efeito do disposto
no § 30" por "para efeito do disposto neste artigo" (o art. 14 cujo conteúdo não é
idêntico ao do § 30 do art. 19, mas ao do seu caput) , criou por wn artifício redacional
a ilusão enganatória de que a restrição do § 8 0 se aplicaria também ao caput do art. 19
e seus §§ 10 e 2°, o que não é o caso.
E tanto não é aplicável a redação que o Chefe do Poder Executivo, por ato
normativo anterior, mas de valor hierárquico superior ao da Instrução Normativa nO
243/02 (o Decreto nO 3.000/99, que aprovou o Regulamento do Imposto de Ren-
da - RIR/99), manteve-se estritamente fiel à letra e ao espírito da Lei nO 9.430/96,
utilizando idêntica ordenação e sistematização à da lei, dispondo no § 8 0 do art. 240

140 Da mesma forma dispunha a Instrução Normativa nO 32/01, art. 14, § 30.
Título IV I Capo IV I Elisão Fiscal e Elementos de Conexão .~.

que <<para efoito do disposto no § 3° somente serão consideradas as operações de compra


e venda praticados entre comprador e vendedor não vinculados".
Ao proceder dessa forma a Instrução Normativa nO 243/02 insinuou a confusão -
que a lei não permite - entre o papel do caput do art. 19 como safo harbour e como mé-
todo de transferprice. A função do caput do art. 19, repita-se, é de definir as condições
em que é permitido um arbitramento da receita de exportação. Caso fosse uma norma
de preço de transferência exigiria a comparação entre vendas externas para pessoas vin-
culadas e vendas externas para pessoas niÚJ vinculadas, de harmonia com o método CUP
(comparable uncontrolled price), recomendado em primeira linha pela OCDE.
Concluimos, portanto, que é legítimo comparar o preço médio das exportações
para pessoas vinculadas com o preço médio da totalidade das vendas internas, in-
cluindo as vendas a pessoas vinculadas, comparação esta que permite concluir que,
na hipótese de os preços de exportação não serem inferiores a 90% dos preços inter-
nos, não há que se proceder a qualquer arbitramento.
Embora severamente criticada por alguns setores por desviar-se de padrões in-
ternacionais, optando pela rigidez da utilização de um numerus clausus de métodos
probatórios predeterminados legalmente, o certo é que este sistema tem apresentado
as vantagens da praticabilidade e da segurança jurídica, reduzindo ou eliminando a
discricionariedade e o subjetivismo da Administração fiscal na sua função de apura-
ção de preços objetivos.
Em contrapartida, porém, deu-se o ensejo a que a prefixação dos critérios pro-
batórios, notadamente das margens, conduza à apuração de preço ou custo superior
ao que seria aplicável se respeitados os valores de mercado. Nestas hipóteses, a apli-
cação das margens predeterminadas, sem as adequadas correções, pode conduzir a
uma ilegítima tributação de patrimônio, não se cingindo, como obriga o art. 43 do
Código Tributário Nacional, a taxar uma variação patrimonial positiva.

vii) Consequências tributárias


A consequência tributária do arbitramento do preço reside em adicionar ao lucro
tributável a diferença entre as receitas escrituradas e as receitas arbitradas. A adição é fei-
ta exclusivamente para fms fiscais, sem que afete as condições do negócios efetivamente
realizado, os documentos da operação ou a escrituração comercial do contribuinte.
No que concerne às pessoas físicas residentes no Brasil, o preço arbitrado deverá
ser considerado para efeitos de apuração de ganho de capital (art. 24, § 2°, II) e o pre-
ço dos serviços prestados será considerado rendimento tributável (art. 24, § 2°, III).

(c) Operações comerciais passivas

(i) Os métodos

No que respeita às operações comerciais passivas, a Lei nO 9.430/96 consagrou


no seu art. 18 três métodos: (i) o método dos preços independentes comparados
I am I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

("PIC"); (ii) O método do custo de produção mais lucros ("CP~'); e (iii) o método
do preço de revenda menos lucro ("PRr;').
Dispõe, na verdade, o art. 18 da Lei nO 9.430/96 que:
"Os custos, despesas e encargos relativos a bens, serviços e direitos, constantes
dos documentos de importação ou de aquisição, nas operações efetuadas com
pessoa vinculada, somente serão dedutíveis na determinação do lucro real até o
valor que não exceda ao preço determinado por um dos seguintes métodos:
I - Método dos Preços Independentes Comparados - PIC: definido como a
média aritmética dos preços de bens, serviços ou direitos, idênticos ou similares,
apurados no mercado brasileiro ou de outros países, em operações de compra e
venda, em condições de pagamento semelhantes;
II - Método do Preço de Revenda menos Lucro - PRL: definido como a média
aritmética dos preços de revenda dos bens ou direitos, diminuídos:
a) dos descontos incondicionais concedidos;
b) dos impostos e contribuições incidentes sobre as vendas;
c) das comissões e corretagens pagas;
d) da margem de lucro de:
1. sessenta por cento, calculada sobre o preço de revenda após deduzidos
os valores referidos nas alíneas anteriores e do valor agregado no País,
na hipótese de bens importados aplicados à produção;
2. vinte por cento, calculada sobre o preço de revenda, nas demais hi-
póteses.
III - Método do Custo de Produção mais Lucro - CPL: definido como o custo
médio de produção de bens, serviços ou direitos, idênticos ou similares, no país
onde tiverem sido originariamente produzidos, acrescido dos impostos e taxas
cobrados pelo referido país na exportação e de margem de lucro de vinte por
cento, calculada sobre o custo apurado."
Tal como em relação aos métodos de preços de transferência nas operações ativas,
também os métodos aplicáveis às operações passivas podem ser subdivididos entre aque-
les que têm por base o valor de mercado dos bcns importados (PIC) e aqueles que têm
por base o valor de custo dos mesmos, acrescido de uma margem presumida (CPL).
Valem aqui também as considerações atrás expendidas a respeito dos conceitos
de "identidade" e "similaridade" e a respeito do caráter porventura artificial e irrea-
lista de margens de lucro predeterminadas genericamente.
No que concerne ao método do preço de revenda menos lucro (PRL) a seguir
serão comentadas as relevantes alterações legislativas a que foi submetido em virtude
da sucessão no tempo de medidas provisórias que o tinham como objeto.
Com efeito, a Medida Provisória nO 478, de 29 de dezembro de 2009, em nova
redação ao art. 18 da Lei nO 9.430/96, atrás citado, nos seguintes termos:
Título IV I Capo IV I Elisão Fiscal e Elementos de Conexão ••

"Os custos, despesas e encargos relativos a bens, serviços e direitos, constantes


dos documentos de importação ou de aquisição, nas operações efetuadas com
pessoa vinculada, somente serão dedutíveis na determinação do lucro real até o
valor que não exceda ao preço determinado, observadas as condições previstas
no presente dispositivo, por um dos seguintes métodos:
"r - Método dos Preços Independentes Comparados - PIC: definido como a média
aritmética ponderada dos preços de bens, serviços ou direitos, idênticos ou si-
milares, apurados no mercado brasileiro ou de outros países, em operações de
compra e venda, empreendidas pela própria interessada ou por terceiros com
não vinculadas, em condições de pagamento semelhantes;
"lI - Método do Custo de Produção mais Lucro - CPL: definido como o custo mé-
dio ponderado de produção de bens, serviços ou direitos, idênticos ou similares,
no país onde tiverem sido originalmente produzidos, acrescido dos impostos e
taxas cobrados pelo referido país na exportação e de margem de lucro de vinte
por cento, calculada sobre o custo apurado.
"lIr - Método do Preço de Vénda menos Lucro - PVL: definido como a média
aritmética ponderada dos preços de venda no País dos bens, direitos ou serviços
importados e calculado conforme a metodologia a seguir:
a) preço líquido de venda: a média aritmética ponderada dos preços de
venda do bem, direito ou serviço produzido, diminuídos dos descon-
tos incondicionais concedidos, dos impostos e contribuições sobre as
vendas e das comissões e corretagens pagas;
b) percentual de participação dos bens, direitos ou serviços importados
no custo total do bem, direito ou serviço vendido: a relação percen-
tual entre o custo médio ponderado do bem, direito ou serviço im-
portado e o custo total médio ponderado do bem, direito ou serviço
vendido, calculado em conformidade com a planilha de custos da
empresa;
c) participação dos bens, direitos ou serviços importados no preço de
venda do bem, direito ou serviço vendido: aplicação do percentual de
participação do bem, direito ou serviço importado no custo total, apu-
rada conforme a alínea "b", sobre o preço líquido de venda calculado
de acordo com a alínea "a";
d) margem de lucro: a aplicação do percentual de trinta e cinco por cento
sobre a participação do bem, direito ou serviço importado no preço de
venda do bem, direito ou serviço vendido, calculado de acordo com a
alínea "c";
e) preço parâmetro: a diferença entre o valor da participação do bem,
direito ou serviço importado no preço de venda do bem, direito ou
serviço vendido, calculado conforme a alínea "c", e a "margem de lu-
cro", calculada de acordo com a alínea "d".
• I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier .•-_:_:_ _ _ _ _ _ _ _---'

(ii) A substituição do método PRL pelo método PVL


A Medida Provisória nO 478/09 substituiu o método do PRL pelo PVL, que
tem por base valor de mercado do bem, direito ou serviço no qual o bem direito ou
serviço importado se integrou como insumo (PVL). Diferentemente das modalida-
des anteriores, esta metodologia tem como fator de medida dos preços de transferên-
cia o valor de mercado do bem, direito ou serviço produzido no Brasil e não do bem
importado que nele se integrou durante o processo de produção.
O antigo método PRL, substituído pelo atual PVL, apresentava contornos si-
milares nos casos de valor agregado local, mas a sua sistemática suscitou desde sem-
pre diversas discussões 14l .
Inicialmente, a Instrução Normativa nO 38/97, sob o pretexto de regulamen-
tar a Lei nO 9.430/96, estabeleceu em seu artigo 4°, § l°, uma vedação à utiliza-
ção do método do PRL quando o bem, serviço ou direito tivesse sido adquirido
para emprego, utilização ou aplicação, pela própria empresa importadora, na
produção de outro bem, serviço ou direito. O artigo 4°, § 1°, da Instrução Nor-
mativa nO 38/97, amparado em uma interpretação literal do termo "revenda",
acabou por criar verdadeira restrição ao método previsto no inciso II do art. 18
da Lei nO 9.430/96.

141 Cfr. GILBERTO DE CASTRO MOREIRA JUNIOR, Preço de transferência: método PRL e a IN
SRF 243/2002, RDT-APET 5 (2005), 187; MARCOS VINICIUS NEDER, A aplicação do
método PRL (20) de preços de transferência nas importações promovidas pela indústria
de medicamentos, in HELENO TAVElRA TÔRRES (org.), Direito Tributário InternacionalApli-
cado, vol. V, São Paulo 2008,315; VICTOR BORGES POLIZELLI, Parâmetros para a definição
de valor agregado e interpretações possíveis da Lei nO 9.959/2000 quanto ao Método PRL
de preços de transferência, RDTI 2 (2006),203; MARCO ANTÔNIO BEHRNDT, O reconhe-
cimento (tácito) da inconstitucionalidade da regra de apuração do PRL 60% prevista na
IN 243/02 pela Administração, RDTI 9 (2008), 161; FERNANDO NEITO BOITEUX/ ELZA
ANTONIA BOITEUX, Preços de transferência na importação de bens: a exclusão do método
preço de revenda menos lucro - PRL, em casos determinados, in Grandes questões atuais do
Direito Tributário, vol. 8, São Paulo 2004, lU; ROBERTO MOREIRA DIAS/SANDRA MÔKICA
BENEDEITI DE MELO, Preços de transferência na importação. Formas possíveis e planeja-
mento tributário. Inconstitucionalidade do parágrafo 5° do art. 18 da Lei nO 9.430/96,
RDDT 139 (2007), U9; RICARDO KRAKOWIAK, Preços de transferência: o método PRL e
as despesas com frete, seguro e imposto de importação, in Luís EDUARDO SCHOUERI (org.),
Tributos e preços de transferência, 3° vol., São Paulo 2009, 148 ss.; GILBERTO DE CASTRO
MOREIRA JUNIOR, Método do preço de revenda menos lucro no caso de agregação de valor
no país. Confronto entre a Lei nO 9.430/1996 e a Instrução Normativa nO 243/2002, in
ibidem, 93 ss.; RICARDO MAROZZI GREGORJO, Preços de transferência: urna avaliação da
sistemática do método PRL, in ibidem, 170 ss.; DANIEL PERIN, Comentários sobre a aplica-
ção do método PRL-60%, in EDISON CARLOS FERNANDES (coord.), Preços de transferência,
São Paulo 2007, 141 ss.; GUILHERME KWCK, A possibilidade de alteração dos percentuais
do método PRL, in ibidem, 309 ss.
Título IV I Capo IV I Elisão Fiscal e Elementos de Conexão

Esta interpretação foi fortemente criticada pela doutrina e a ilegalidade da res-


trição ao método do PRL foi por fim reconhecida em diversos julgados do Conselho
de Contribuintes.
Esta discussão tornou-se ultrapassada com a edição da Medida Provisória nO
1.924/99, posteriormente convertida na Lei nO 9.959, de 27 de janeiro de 2000, cujo
art. 2° alterou a redação da alínea "d" do inciso II do art. 18 da Lei nO 9.430/96,
estabelecendo que "d) da mat;gem de lucro de: 1. sessenta por cento) calculada sobre opreço
de revenda após deduzidos os valores referidos nas alíneas anteriores e do valor agregado no
País) na hipótese de bens importados aplicados à produção; 2. vinte por cento) calculada sobre
o preço de revenda) nas demais hipóteses".
A nova redação da alínea "d" do inciso II do art. 18 da Lei nO 9.430/96, dada
pela Lei nO 9.959/00, ao estabelecer margens diferenciadas para a aplicação do mé-
todo do PRL para os casos de mera revenda e para os casos de emprego do bem,
serviço ou direito importado na produção nacional, acabou por implicitamente reco-
nhecer a aplicabilidade do método desde a sua origem a este último caso, na esteira,
aliás, do entendimento adotado pela própria OCDE.
A nova metodologia, contudo, também foi objeto de críticas e divergências na
doutrina quanto à sua correta forma de cálculo e aplicação.
Por um lado, a literalidade do nO 1 da alínea "d" do inciso II do art. 18 da Lei
nO 9.430/96 conduzia ao resultado ilógico e incompatível com a prática de preços de
transferência de considerar que, quanto maior o valor agregado local, maior a parti-
cipação do bem, serviço ou direito importado na produção local. Por outro lado, essa
interpretação poderia se justificar com base em uma política de incentivo a indústria
nacional.
A seu turno, o termo "valor agregado", introduzido pela Lei nO 9.959/00, con-
duziu, em face da ausência de definição legal, a interpretações diversas quanto ao seu
alcance, com reflexos diretos na determinação do preço parâmetro.
A forma de cálculo da metodologia também foi objeto de grandes divergên-
cias. A interpretação literal, em muitos casos adotada pelo Fisco, conduzia por
vezes a um resultado ilógico, pelo qual quanto menor o valor e representatividade
do bem, direito ou serviço importado em relação ao produto final produzido no
Brasil, maior o preço parâmetro adotado como limite de dedutibilidade. Tal dis-
torção resultava do fato de a margem de lucro presumida de 60% ser calculada em
qualquer caso sobre o custo total do produto produzido no Brasil, fosse o bem
importado de grande valor (i.e., uma turbina de avião) ou imaterial (i.e., uma
simples lâmpada).
A interpretação alternativa defende que a metodologia do PRL, para ser capaz
de determinar o preço arm)s length) só pode ser aplicada se considerar a proporção
do custo do bem, direito ou serviço importado em relação ao valor daquele pro-
duzido no Brasil. Contra esta interpretação, no entanto, se colocava o fato de que
inexistia qualquer disposição legal ou ato normativo que autorizasse tal proporcio-
nalização.
-+l.i Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier
o art. 61, II, da Medida Provisória nO 472, de 15 de dezembro de 2009, revo-
gou o art. 2° da Lei nO 9.959/00 que estabelecia margens diferenciadas de 20% e
60% para o PRL consoante a destinação do bem, direito ou serviço importados.
A Medida Provisória nO 476, de 23 de dezembro de 2009, revogou o art. 61,
II, da Medida Provisória nO 472/09, e restabeleceu a vigência do art. 2° da Lei nO
9.959/00, retornando, assim, ao regime anterior.
A Medida Provisória nO 478, de 29 de dezembro de 2009, aboliu o método do
PRL, adotando em sua substituição o PVL, cujo objetivo foi precisamente o de in-
troduzir a metodologia de proporcionalização a que atrás nos referimos. Nos termos
do inciso II! do art. 18 da Lei nO 9.430/96, o preço parâmetro para fins do método
do PVL deveria corresponder à parcela do preço de venda do bem, direito ou serviço
produzido no Brasil proporcionalmente imputável ao bem, direito ou serviço impor-
tado da qual seria descontada uma margem presumida de 35%.
O método do PVL seria aplicado por etapas. Numa primeira se identificaria o
percentual que corresponde à participação do bem, direito ou serviço importado no
custo do produto produzido no Brasil, percentual este que numa segunda etapa será
aplicado sobre o valor de mercado do bem (direito ou serviço) localmente produzi-
do, determinado pela média ponderada do seu preço de venda nas operações reali-
zadas pela pessoa jurídica importadora, exclusivamente com partes não vinculadas,
empreendidas no período de apuração (§ 3° do art. 18) e, deduzidos os descontos
incondicionais, dos impostos e contribuições sobre as vendas e das comissões e cor-
retagens pagas l42 .
Pode-se dizer que o valor assim determinado corresponderia,grosso modo, ao
valor de mercado proporcionalmente imputável ao bem, direito ou serviço importa-
do, do qual seria deduzida, numa terceira etapa, o montante correspondente a 35%
daquele valor para então se chegar ao preço parâmetro.
Diferentemente do método do PRL, a metodologia do PVL não manda que
seja excluído do cálculo o valor agregado local, podendo se concluir que o legislador
pretendeu que este estivesse compreendido na margem de lucro presumida de 35%.
Apesar de a margem ser nominalmente inferior àquela de 60% estabelecida segundo
a metodologia do PVL, em termos econômicos a nova margem lhe é em muito supe-
rior, pois além de incidir sobre o valor de mercado proporcionalizado do bem direito
ou serviço importado, dele não se exclui o valor agregado.
N a metodologia do PVL só não haverá ajuste se, além das margens de lucros
praticadas serem extremamente altas, a proporção com que o bem, serviço ou direito
importado participe no produto final também seja bastante elevada, caso contrário a
aplicação do método do PVL necessariamente importará em ajuste.
A Medida Provisória nO 478/09 manteve a exclusão dos royalties e das despesas
com assistência técnica, científica, administrativa ou assemelhada do âmbito de apli-

142 Trata-se das mesmas deduções que a legislação já autorizava ao abrigo do método do PRL.
Título IV I Capo IV I Elisão Fiscal e Elementos de Conexão

cação das regras de preços de transferência na importação, por força do § 9° do art.


18 da Lei nO 9.430/96, permanecendo subordinados às condições de dedutibilidade
constantes da legislação vigente.
É que a lei fiscal brasileira já submete as despesas dessa natureza a rigorosos li-
mites de dedutibilidade (arts. 352 a 355 do RIRj99; arts. 52 e 71 da Lei nO 4.506/64
e 74 da Lei nO 3.470/58, com suas modificações posteriores), pelo que o legislador
considerou não haver sentido em estabelecer outros limites através da instituição de
regras de preços de transferência.
A lei optou por preservar os limites da legislação então em vigor, os quais
são objeto de severas críticas por parte da doutrina, em lugar de substituí-los por
novos limites, eventualmente mais compatíveis com as práticas internacionais e a
realidade mais aberta da economia brasileira que admitem, por exemplo, a plena
dedutibilidade de despesas relativas às operações de transferência de tecnologia
quando realizadas em condições at arm)s length, enquanto que a lei em vigor fixa
limites àquela dedução, mesmo que o negócio seja praticado em condições de
mercado.
Muitas das disposições introduzidas pela Medida Provisória nO 478/09 já cons-
tavam da Instrução Normativa nO 243/02, mas foram convertidas em disposições
legais com o evidente intuito de afastar discussões acerca da sua legalidade. Isto mes-
mo pode ser concluído com base na exposição de motivos da Medida Provisória nO
478/09 cujo item 20.1 estabelece que "visando instituir, em dispositivo legal, essas
medidas que hoje constam apenas em Instrução Normativa, propõe-se a alteração
da redação do art. 18 da Lei nO 9.430, de 27 de dezembro de 1996, com o intuito
de reduzir a litigiosidade que a matéria tem suscitado, garantindo maior eficácia aos
controles de preços de transferência".

(iii) Os princípios da tipicidade dos métodos) da delimitação negativa do âmbito objetivo


e da prevalência do método mais favorável ao contribuinte
Tanbém em matéria de operações comerciais passivas vigoram os princípios da
tipicidade dos métodos e o da prevalência do método mais favorável ao contribuinte.
O princípio da tipicidade dos métodos, vimo-lo já, proclama que as formas de
determinação de preços objetivos relevantes para efeitos fiscais são exclusivamente as
enumeradas taxativamente no catálogo legal, constituindo um numerus clausus, de tal
modo que nem o Fisco nem o contribuinte se podem socorrer de outras metodolo-
gias ainda que tecnicamente idôneas.
Por sua vez, o princípio da prevalência do método mais favorável ao contribuinte,
constante do § 4° do art. 18 da Lei nO 9.430/96, segundo o qual na hipótese de uti-
lização de mais de um método será considerado dedutível o maior valor apurado.
Acrescenta, porém, o § 5° que se os valores apurados segundo os métodos men-
cionados neste artigo forem superiores ao de aquisição, constantes dos respectivos
documentos, a dedutibilidade fica limitada ao montante deste último.
MiM Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

(iv) Limitações à liberdade de utilização dos métodos


Valem também em relação às operações comerciais passivas as considerações atrás for-
muladas a respeito do novo art. 19-B da Lei nO 9.430, de 1996, introduzido pela Medida
Provisória nO 478/09, a qual, no entanto, perdeu sua eficácia pelas razões atrás expostas.

(v) Consequências tributárias


As consequências tributárias deste regime consistem em que: (i) a parcela dos cus-
tos que exceder ao valor determinado nos termos da lei deverá ser adicionada ao lucro
líquido, para determinação do lucro real (§ 7°); e (ii) a dedutibilidade dos encargos de
depreciação ou amortização dos bens e direitos fica limitada, em cada período de apu-
ração, ao montante calculado com base no preço determinado na forma da lei (§ 8°).
No que concerne às pessoas físicas residentes no Brasil, o valor arbitrado será
considerado como custo de aquisição para efeitos de apuração de ganho de capital na
alienação do bem ou direito (art. 24, § 2°, I).

(d) Operações financeiras


o regime de preços de transferência nas operações financeiras passivas apenas
se aplica a pagamentos decorrentes de contratos não registrados no Banco Central do
Brasil, de tal modo que, no que se refere aos contratos registrados, prevalecem os
valores constantes do registro. E isto porque se entendeu que, com relação a opera-
ções submetidas ao controle prévio das autoridades monetárias e cambiais, compete
a estas avaliar a normalidade das remunerações pactuadas.
A Instrução Normativa nO 243/02 considera operações financeiras aquelas de-
correntes de contratos, inclusive os de aplicação de recursos e os de capitalização de
linhas de crédito, celebrados com pessoa física ou jurídica residente ou domiciliada
no exterior não registrados no Banco Central do Brasil, cuja remessa ou ingresso de
principal tenha sido conduzido em moeda estrangeira ou por meio de transferência
internacional em moeda nacional (art. 27, § 7°).
O regime de preços de transferência constante do art. 22 da Lei nO 9.430/96
consiste, nas operações passivas, em restringir a dedução dos juros pagos ou cre-
ditados até o montante que não exceda ao valor calculado com base na taxa libor,
para depósitos em dólares dos Estados Unidos da América pelo prazo de seis meses,
acrescida de três por cento anuais a título de spread, proporcionalizados em função
do período a que se referir os jurosI43-144.

143 Nos pagamentos de juros em que a pessoa física ou jurídica remetente assuma o ônus do
imposto, o valor deste não será considerado para efeito do limite de dedutibilidade (cfr. IN
243/02, art. 27, 5").
144 Trata-se de limite presuntivo cuja revisão se impõe, tendo em vista a crise financeira interna-
cional de 2008/2009 que provocou uma drástica redução das taxas de juros internacionais.
Título IV I Capo IV I Elisão Fiscal e Elementos de Conexão

Nas operações ativas, a pessoa jurídica mutuante, domiciliada no Brasil, deverá


reconhecer como receita financeira correspondente à operação, no mínimo, o valor
apurado nos termos acima descritos.
A consequência tributária deste regime consiste: (i) nas operações passivas,
em adicionar ao lucro tributável o valor dos encargos que exceder o limite atrás
referido; e (ii) nas operações ativas, em adicionar ao lucro tributável a diferença
da receita.
No que concerne às pessoas físicas residentes no Brasil os juros presumidos se-
rão considerados rendimento tributável (art. 24, § 2°, IV)145.

(vii) O princípio at arm's length e a predetenninação legal do preço objetivo


A Lei nO 9.430/96 parte do princípio de que, nas situações a que se aplica, o
preço relevante para efeitos tributários não é o preço real e efetivo estipulado pelas
partes, mas um preço objetivo que, hipoteticamente, teria sido pactuado entre as partes,
caso entre elas não existissem relações especiais resultantes ou de laços de vinculação
ou da localização em certos países e territórios.
Ao contrário das legislações que, seguindo as recomendações da OCDE, se
baseiam no princípio at ann)s length, a fixação do preço objetivo não é fruto de uma
atividade administrativa que recuse o preço efetivo, em face das características do
caso concreto, mas sim de uma detenninação da própria lei, que desde logo estabelece
os critérios para a sua fixação.
Com efeito, importa começar por observar que a lei fiscal emprega a expressão
arbitramento em três acepções distintas: uma primeira, no sentido de uma avaliação
de iniciativa do Fisco, através de provas diretas; uma segunda, no sentido de uma ava-
liação também de iniciativa do Fisco, baseada em métodos indiciários, como é o caso
do arbitramento dos rendimentos de pessoas físicas mediante utilização dos sinais
exteriores de riqueza (RIR, art. 846) ou da determinação da receita bruta omitida
(Lei nO 8.846/94, art. 6°); uma terceira, no sentido de uma definição por lei da base
de cálculo, definição essa baseada em presunções, como sucede com a tributação de
pessoas jurídicas com escrituração imprestável, em que a própria lei define uma base
de cálculo substitutiva do lucro real, calculada em função da receita.

145 Cfr. ELIDIE PALMA BIFfu'lO, Anotações sobre regras de preços de transferência em contratos
de mútuos, RDTI 9 (2008), 107; ROBERTO FRANÇA DE VASCONCELLOS, Reflexos financeiros
e cambiais dos preços de transferência, in Luís Eduardo Schoueri (org.), Tributos e preços de
transferência, 3° vol., São Paulo 2009, 196 SS.; ROBERTO QUIROGA MOSQUERA / RODRlGO
DE FREITAS, Reflexos financeiros dos preços de transferência: conceito de registro no Banco
Central nas operações de mútuo "Inbound" e Outbound", in ibidem, 228 ss.; RAFAEL MACE-
DO MALHEIRO, Controle de preços de transferência sobre operações financeira e registro do
contrato no BACEN, RDTI, ano 3, nO 8 (2008),211 ss.; ARTHUR RIDOLFO, Controle fiscal
das transações financeiras, in EDISON CARLOS FERNfu'lDES (coord.), Preços de transferência,
São Paulo 2007, 211 sS.
Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Nos dois primeiros sentidos, o arbitramento corresponde a uma atividade admi-


nistrativa, de natureza instrutória, distinguindo-se apenas pelo tipo de prova adotado
para a determinação do valor: a prova direta ou a prova indiciária.
No terceiro sentido, o (talvez impropriamente denominado) "arbitramento" é
efetuado pelo próprio legislador na definição da base de cálculo, independentemente
de uma atividade administrativa de determinação dos valores em concreto.
O arbitramento administrativo (seja na forma de avaliação direta ou por adoção
de métodos indiciários) é sempre uma prova subsidiária em relação às declarações dos
contribuintes, como resulta do art. 148 do Código Tributário Nacional, que apenas
o permite "sempre que sejam omissos ou não mereçam fé as declarações ou os es-
clarecimentos prestados, ou os documentos expedidos pelo sujeito passivo ou pelo
terceiro legalmente obrigado".
Por outro lado, é uma providência instrutória que está submetida aos princípios
da ampla defesa e do contraditório, pois no caso de o contribuinte não aceitar a
avaliação administrativa fica sempre ressalvada, nos termos do mesmo art. 148, uma
"avaliação contraditória, administrativa ou judicial".
N os casos de arbitramento legal - como sucede em matéria de preços de
transferência nas operações comerciais ativas e passivas e nas operações financei-
ras - a lei adota uma base de cálculo substitutiva da base de cálculo primária, que
é o "preço efetivo" da operação. A base de cálculo substitutiva já não é o "preço
efetivo", mas uma realidade diferente - o "preço paramétrico" que hipotetica-
mente teria sido obtido.
No arbitramento da receita de exportação a lei prevê, pois, uma base de cálculo
principal ou de primeiro grau e outra subsidiária, ou de segundo grau, que se substitui à
primeira, desde que demonstrado o pressuposto essencial de aplicação do art. 19 da
Lei nO 9.430/96: as operações serem efetuadas com pessoas vinculadas ou localizadas
em países de tributação favorecida ou que oponham sigilo societário.
Em matéria de receita de exportação arbitrada, a aplicação de base de cálculo
presumida, secundária ou substitutiva, pressupõe, além do referido pressuposto ge-
nérico, ainda a prévia declaração do seu pressuposto específico de aplicação: o preço médio
da venda dos bens, serviços ou direitos ser inferior a noventa por cento do preço
médio praticado na venda dos mesmos bens, serviços ou direitos, no mercado bra-
sileiro, durante o mesmo período, em condições de pagamento semelhantes. Assim,
o procedimento administrativo de arbitramento em matéria de exportações reveste
natureza bifásica, ao invés do que sucede em matéria de importação, em que o Fisco
pode considerar imediatamente a base legalmente arbitrada. Num primeiro momen-
to parte-se da base de cálculo principal ou de primeiro grau - que é a receita efetiva
de exportação, demonstrada em face da escrituração do contribuinte; num segundo
momento compara-se esta receita efetiva com a que resultaria do preço médio prati-
cado na venda dos mesmos bens no mercado brasileiro.
O abandono da receita efetiva e sua substituição por uma outra base de cálculo
só é permitido caso a autoridade administrativa prove que a receita efetiva foi inferior
Título IV I Capo IV I Elisão Fiscal e Elementos de Conexão

a noventa por cento da receita que seria obtida pela aplicação às mesmas operações
do preço médio de venda no mercado interno.
Os métodos de determinação dos "preços parâmetro" constam de regras de
natureza substantiva e não procedimental ou probatória, eis que se referem à prede-
terminação da base de cálculo em abstrato e não a uma reconstituição casuística de
base de cálculo em concreto l46 .
No caso não se verifica o arbitramento administrativo como meio de prova
(indiciário ou não) mas sim a substituição da prova, por força da própria lei, me-
diante a adoção de bases de cálculo substitutivas que, por normas dispositivas
de direito material - por ficção legal - colocam as novas bases de cálculo (os
"preços parâmetro") no lugar e nas vezes das bases reais e efetivas (os "preços
efetivos") .
Com efeito, não está em causa a veracidade da escrituração das receitas de ex-
portação efetiva, como sucederia no caso de arbitramento por imprestabilidade da
escrituração. O que está em causa é apenas a escolha pela lei de uma base de cálculo
diferente do preço efetivo quanto a uma determinada categoria de operações: as
realizadas com pessoas vinculadas ou domiciliadas em territórios de tributação favo-
recida ou em regime fiscal privilegiado.
Certos métodos de determinação de preços paramétricos envolvem a considera-
ção de "margens de lucro" predeterminados por lei.
É certo que o § 2° do art. 21 da Lei nO 9.430/96 - respeitante à apuração dos
preços médios tanto em matéria de importações como de exportações - estabelece
uma presunção legal relativa ao dispor que "admitir-se-ão margens de lucro diversas
das estabelecidas nos arts. 18 e 19, desde que o contribuinte as comprove, com base
em publicações, pesquisas ou relatórios elaborados de conformidade com o disposto
neste artigo"147.
Todavia, o direito à prova pelo contribuinte não deveria restringir-se a esse ele-
mento componente do preço (margem de lucro), mas abranger todos os elementos
relevantes para demonstrar a legitimidade da prevalência do preço efetivo sobre o
preço paramétrico, bem como as provas idôneas, sem quaisquer restrições legais l4s .

146 Cfr. ALBERTO XAVIER, Do lançamento no Direito Tributário (3" ed.), São Paulo 2005,136 sS.
147 A Portaria nO 95, de 30 de abril de 1997, no seu art. JO estabelece que "as alterações de
percentuais de que tratam o artigo 18, II e 1I1, e o artigo 19, caput, e incisos lI, 11I e IV
de seu § 3°, todos da Lei nO 9.430, de 1996, serão efetuadas em caráter geral, setorial ou
específico, de ofício ou em atendimento à solicitação de entidade de classe representativa de
setor da economia, em relação aos bens, serviços ou direitos objeto de operações por parte
das empresas representadas, ou, ainda, em atendimentos à solicitação da própria empresa
interessada. Cfr. ainda o art. 32 da Instrução Normativa nO 243/02. Veja-se ainda HELENO
TÔRRES, Direito Tributário Internacional, cit., 292 sS.
148 No que concerne às restrições em matéria de provas, cfr. HELENO TÔRRES/A.,"A CLAUDIA AKIE
UTUMI, O controle fiscal dos preços de transferência e os meios de prova admitidos para a
definição de preços e custos médios, in Tributos e preços de transferência, 2° vol., São Paulo
1989,167 SS.; IGOR MAULER SANTIAGOjVALTER LOBATo, Margens predeterminadas: um caso
I mi.I I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Em matéria de operações financeiras, a lei não se socorreu do instituto do


"arbitramento legal", tendo adotado uma ficção legal) segundo a qual os juros
relevantes só podem ser os predeterminados na forma da lei, sem oferecer ao
contribuinte a oportunidade de demonstrar que juros eventualmente superiores
ou inferiores podem ser "objetivos" em face das circunstâncias específicas do caso
concreto.
A presunção legal absoluta (ou quase absoluta), inerente à prevalência au-
tomática dos preços paramétricos sobre os preços reais, conduz à determinação
de uma base de cálculo (ou de elementos desta) distinta da prevista na lei no que
concerne ao imposto de renda e que é a renda real, baseada nos preços reais e
efetivos.
Esta consequência é, porém, conflitante com os princípios da legalidade e da
tipicidade da tributação, dos quais é corolário que a base de cálculo dos tributos seja
determinada de harmonia com o princípio da verdade material, sendo apenas legíti-
mo o recurso ao arbitramento a título subsidiário e nas estritas condições previstas
no art. 148 do Código Tributário Nacionap49.
Acresce que, em matéria de imposto de renda, o mecanismo preswltivo do "ar-
bitramento legal" pode conduzir à tributação de realidade distinta da permitida por
lei complementar (o art. 43 do Código Tributário Nacional) - e que é o acréscimo
patrimonial real do contribuinte -, sendo, por conseguinte, constitucionalmente ile-
gítimo por este fundamento adicional.
É verdade que os institutos dos "ajustes", das "divergências toleráveis" e das
"alterações de margens de lucro" são mecanismos redutores do caráter artificial das
presunções, aproximando os preços paramétricos da realidade.
Estes institutos, aliados à faculdade concedida ao contribuinte de optar pelo méto-
do que lhe seja mais benéfico, são porventura mais confortáveis para o contribuinte do
que wna discussão com o Fisco a respeito de qual é o preço arm)s length) discussão esta
eivada de uma ampla margem de livre apreciação e, portanto, de insegurança jurídica.
Ora, a segurança jurídica é tanto mais relevante quanto é certo que o nosso
sistema jurídico não assegura a vinculatividade dos acordos celebrados com o Fisco
(Advance Pricing Arrangements - APA) pelo qual este, sob consulta do contribuinte,

de confronto entre a praticabilidade e a capacidade contributiva? Exigências constitucionais


para sua adoção, in Luís EDUARDO SCHOUERl (org.), Tributos e preços de transferência, 30 vol.,
São Paulo 2009, 10755.; Luís EDUARDO SCHOUERI, Margens predeterminadas, praticabilida-
de e capacidade contributiva, in ibidem, 119 55.

149 efr. PLÍNIO J. MARAFON, Preços de transferência, in VALDIR DE OLIVEIRA ROCHA (org.),
Tributos e preços de transferência, cit., 74; IVES GANDRA DA SILVA MARTINS, Preços de trans-
ferência, ibidem, 36; RICARDO MARIZ DE OLlVElRA, Tributos e preços de transferência,
ibidem, 85 sS.; JosÉ ROBERTO PISANI/LuCIANA ROSANOVA GALHARDO, Preços de transferên-
cia - presunções tributárias - acordos internacionais - valorização aduaneira, RDDT 21
(1997),66ss.
~., Título IV I Capo IV I Elisão Fiscal e Elementos de Conexão ••

se compromete a respeitar uma dada metodologia de avaliação de preços em deter-


minada empresa ou setor de economia150 .
Não nos repugna, pois, que neste quadro sejam estabelecidos, por presunção,
elementos de determinação de preços paramétricos. Certo é, porém, que tais pre-
sunções só devem ser relativas) sem qualquer restrição à liberdade de o contribuinte
provar a objetividade dos preços efetivamente praticados, pois caso contrário será
ofendido o princípio fundamental da verdade material (corolário do princípio da
legalidade de tributação).

c) O regime dos preços de transfirência à luz do art. 9" da


Convenção Modelo da OCDE e dos tratados internacionais
A figura dos preços de transferência encontra-se disciplinada no art. 9 0 do Mo-
delo OCDE, de que se não afastam as diversas convenções assinadas pelo Brasil. Es-
tabelece, assim, este preceito: "Quando: a) uma empresa de um Estado contratante
participa direta ou indiretamente da direção, controle ou capital de uma empresa do
outro Estado contratante, ou b) as mesmas pessoas participarem direta ou indireta-
mente da direção, controle ou capital de uma empresa de um Estado contratante e de
uma empresa do outro Estado contratante e, em ambos os casos, as duas empresas
estiverem ligadas, nas suas relações comerciais ou financeiras, por condições aceitas
ou impostas que difiram das que seriam estabelecidas entre empresas independentes,
os lucros que, sem essas condições, teriam sido obtidos por uma das empresas mas
não o foram por causa dessas condições, podem ser incluídos nos lucros dessa em-
presa e tributados como tal".
Em face deste preceito, são requisitos essenciais deste instituto: (a) o elemento
de estraneidade; (b) o nexo de interdependência; (c) a obtenção de vantagem anor-
mal; (d) o nexo causal entre a vantagem e a interdependência.
O elemento de estraneidade significa que as empresas, quanto às quais se veri-
fica o nexo de interdependência, devem encontrar-se submetidas a ordenamentos
tributários distintos, isto é, pertencerem a Estados diversos, de tal modo que a
distribuição indireta de lucros puramente intraestatal situa-se fora do âmbito de
aplicação das convenções, sendo apenas objeto da legislação interna eventualmente
aplicável.
O nexo de interdependência pressupõe que as empresas sejam juridicamente in-
dependentes, ou a estas assimiladas, como os estabelecimentos estáveis. Tal como se
encontra defmido nas convenções, este nexo é mais amplo do que o resultante da
visão tradicional que o cingia ao vínculo jurídico de filiação, mas também não vai ao
ponto (como nas legislações francesa e belga) de presumir interdependência sempre

ISO Cfr. HELENa TÓRRES, op. cit., 312 SS.; FRANCESCA BALZANI, IJ transfer pricing, in V UCKMAR,
Corso... ) cit., 636.
F4:1 Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

que haja uma "comunidade de interesses" com caráter duradouro l51 . A interdepen-
dência desdobra-se, na verdade, em duas realidades: a estrutura da ligação entre as
empresas e a natureza dessa ligação, a qual deve ser consequência da primeira.
Quanto à estrutura, exige-se a participação de uma empresa na direção, controle
ou capital de outra (transferências verticais entre sociedades controladas ou coligadas),
ou que as duas empresas se encontrem, no que tange à sua direção, controle ou ca-
pital, submetidas à participação comum de outra ou outras (participação indireta,
transferências horizontais entre empresas interligadas, sociedades irmãs). Note-se
que as convenções não se limitam a definir a estrutura de interdependência pela
participação no capital, podendo esta exercer-se por via da direção ou do controle.
E ainda que através do reconhecimento do controle indireto se disciplinam situações
triangulares, que envolvam operações entre pessoas que não dependem uma da ou-
tra, mas que dependem ambas de uma terceira ou de um mesmo grupo ("sociedades-
irmãs" ou "interligadas") 152.
Não se chegou, porém, ao extremo de adotar a chamada "teoria do triângulo"
(Dreieckstheorie) da jurisprudência alemã, segundo a qual se presume, por ficção, que
as vantagens beneficiam igualmente a sociedade-mãe, que posteriormente as redistri-
bui à outra subsidiária.
Importa, ainda, salientar que no conceito do Modelo se não abrangem as hi-
póteses de interdependência decorrentes do controle exercido sobre duas ou mais
empresas pelos membros de uma mesma família.
Não basta, porém, a existência de uma estrutura deste tipo. É necessário que
dela decorram vínculos de cuja natureza resulte uma interdependência real. Que vín-
culos são esses 1 As próprias convenções respondem: as duas empresas devem estar li-
gadas, nas suas relações comerciais ou financeiras, por condições aceitas ou impostas
que difiram das que seriam estabelecidas entre empresas independentes.
O traço decisivo do conceito de distribuição indireta de lucro radica na obtenção
de uma vantagem anormal. Essa obtenção pressupõe, em primeiro lugar, a prática de
uma operação de que decorra uma vantagem e, em segundo lugar, que essa vantagem
se possa considerar anormal.
As operações em causa não se traduzem, como já se viu, numa distribuição dire-
ta, visível, aparente, de lucros, mas sim em operações que concorrem para a formação
do lucro da sociedade localizada em país de menos onerosa tributação, quer se trate
de venda de mercadorias, de prestação de serviços, de realização de empréstimos, da
cessão ou concessão de direitos incorpóreos.
Ao contrário do que sucede com a figura da distribuição disfarçada de lucros,
definida pelo nosso direito interno, a vantagem tanto pode ser atribuída pela so-
ciedade subsidiária a outra que participe nos seus lucros, caso em que ocorre uma

151 Sobre a noção de communauté d'intérêts, ver B. JADAUD, Ilimpôt et les groupes de sociétés, Paris
1970,29055.
152 Cfr. RIVIER, Droit Fiscal suisse. Le Droit FiscalInternational, N euchatel 1983, 210.
Título IV I Capo IV I Elisão Fiscal e Elementos de Conexão Mj'

distribuição oculta de lucros (verdeckte Gewinnausschüttungen), como pode ser atri-


buída, em sentido inverso, pela sociedade-mãe à sua subsidiária, caso em que ocorre
. uma contribuição oculta (verdeckte Einlagen), como ainda pode ser atribuída a uma
terceira entidade, ligada por vínculo triangular l53 .
A vantagem atribuída pode revestir duas modalidades possíveis: ou traduz-se
numa despesa ou perda, ou traduz-se num "ganho não realizado".
Para poder caracterizar-se como distribuição indireta de lucros, a vantagem obtida
deve ser anormal. Mas o que é vantagem anormal? Juridicamente podemos defini-la
como aquela que não tem contrapartida objetivamente equivalente. A inexistência desta
contrapartida depende, porém, da comparação com o comportamento hipotético de
duas empresas independentes, dealing at artn)s length) ou seja, com o open market price.
Ao adotarem o princípio do preço de plena concorrência, as convenções rejeitaram
do mesmo passo os chamados princípios da proporcionalidade, da tributação unitária
ou global, segundo o qual o lucro imputável a cada uma das unidades de um grupo eco-
nômico deve repartir-se, pelas suas partes integrantes, conforme a contribuição propor-
cional de cada uma em função de critérios, tais como as vendas, ativos ou salários1 54 .
A divergência entre o preço efetivo e o preço objetivo pode ocorrer nas ven-
das de mercadorias, na cessão de marcas e patentes (superroyalties), nos acordos de
contribuição para despesas de investigação e pesquisa (cost sharing agreements), nas
prestações de serviços, na fixação do juro de operações flnanceiras l55 .
Enfim, a vantagem anormal deve estar ligada por um nexo causal à relação de
interdependência entre as empresas, de tal modo que o regime das convenções não se
aplica se a vantagem decorre de outras causas, como restrição do direito interno do
país da sede da subsidiária ao pagamento de certo tipo de remuneração à matriz156 .
Apurada a existência de uma transferência indireta de lucros, o art. 9° do Mo-
delo OCDE atribui aos fiscos interessados o direito de reintegração dos lucros (realloca-
tion), isto é, de incluir no lucro da empresa, tributando-a como tal, a vantagem que
esta indiretamente atribuiu a outra. E pode fazê-lo recusando a dedutibilidade de
uma despesa ou perda, bem como incluindo um ganho que a empresa anormalmente
deixou de realizar.
Importa sublinhar que, ao contrário do que em numerosas legislações internas
sucede, o Modelo não criou presunções de distribuição indireta, pelo que o encargo
da prova compete sempre às administrações fiscais.

153 Cfr. RIvIER, Le Droit Fiscal International, 207.


154 MARIA TERESA VEIGA DE FARlA, Preços de transferência. Problemática geral, 419 sS.
155 Cfr. GOUTHIERE,Lesimpôts, 712 ss.; RIvIER,LeDroitFiscallnternational, 194.
156 A vantagem não realizada pode ser o fato de a sociedade controladora estrangeira não auferir
royalties pelo uso de marca pela sua subsidiária. Todavia, não se nos afigura existir o nexo causal
se o não pagamento pela empresa brasileira decorre de restrições internas à dedutibilidade e
remissibilidade de royalties, hoje revogadas. Sobre o conceito de "vantagem anormal", ver J.
J. NEUER, Fraude fiscale internationale, 71 SS.; ADONNlNO, La nozione di "valore normale", in
UCKMAR/MAGNANI/MARoNGIU,Il reddito di impres nel nuovo testo unico, Milão 1988, 265.
U I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Convém também ter presente, neste contexto, que as convenções inspiradas no


Modelo de 1963 não são expressas em impor uma consideração internacional das reti-
ficações a que procedem, a qual se deveria traduzir num ajustamento de condutas dos
fiscos interessados (o movimento reflexo a que se refere DEBATIN ou o ajustamento secun-
dário, a que alude BAKER I57 ), de tal modo que à inclusão do lucro na empresa do Es-
tado A, ao abrigo do art. 9° da Convenção, se seguisse a exclusão do mesmo lucro na
empresa do Estado B. Existe, portanto, latente o risco de uma dupla tributação l58 .
Precisamente para evitar este resultado, o parágrafo 2° do art. 9° do Mode-
lo OCDE, introduzido na versão de 1977, impõe ao outro Estado a obrigação de
efetuar os ajustamentos adequados, devendo, se necessário, consultar as entidades
competentes do outro Estado l59 .
Tenha-se finalmente presente que as disposições convencionais baseadas no art.
9° do Modelo OCDE não autorizam, por si sós, o Fisco de um dado país a proceder
à reintegração de lucros, se tal não lhe for permitido pela respectiva legislação interna.
Trata-se de consequência do princípio do "efeito negativo" dos tratados, segundo o
qual estes não podem criar obrigações que não existam em face da lei interna l6o .
Os sistemas de reintegração dos lucros indiretamente distribuídos, apesar de reco-
nhecerem a interdependência das empresas, baseiam-se ainda na individualidade jurí-
dica de cada uma, traduzindo-se na imputação a cada unidade do lucro adequado, ou
seja, o que hipoteticamente seria obtido, caso a interdependência não existissel 61 .

d) O regime da lei interna em face do regime convencional

É importante examinar as semelhanças e diferenças entre o regime unilateral


dos preços de transferência definido pela Lei nO 9.430/96 e o regime convencional
constante de disposições similares à do art. 9° da Convenção Modelo da OCDEI62.

157 Cfr. BAKER, Double Taxation, 218 55.; RIVIER, Le Droit Fiscal International, 209; J. J. NEuER,
Fraude fiscale international, 89 55.
158 Cfr. HELENO TÔRREs, Pluritributaçifu internacional sobre as rendas de empresa, 416.
159 O Brasil reserva-se o direito de não inserir este parágrafo nas suas Convenções. Cfr.OCDE,
NMCJs Positions, parágrafo 1.
160 Sobre o efeito negativo dos tratados, cfr. supra, 154. Este efeito foi reconhecido na Ale-
manha em matéria de ajustamento de lucros, por decisões do Bundesfinanzhof de março de
1980 e janeiro de 1981. Cfr. BAKER, Double Taxation, 213; A. MIRAULO, Doppia imposizione
internazionale, Milão 1990, 332 ss.; A. PISTONE, La normativa interna, in PISTONE (org.),
Diritto Tributariolnternazionale, 19 (109 ss.).
161 Cfr. YVES NOEL, La dmtble imposition internationale résultant des redressements comptables entre soci-
étés apparentées et son élimination. Étude de droit américain et de droit suisse, Lausanne 1990, 16 ss.
162 Cfr. Luís EDUARDO SCHOUERI, Preços de transferência e acordos de bitributaçifu, 68 SS.; PAULO
BORBA CASELLA/et aI., Preços de transferência, Interface entre Direito Interno e Direito In-
ternacional, in VALDIR DE OLIVEIRA ROCHA (org.), Tributos e preços de transferência, São Paulo
1997, 283 SS.; ORDÉLIO AzEVEDO SErrE e JOÃO RUGGERO LOPEZ, A Legislação Brasileira
sobre Preços de Transferência e os Acordos Internacionais para evitar a bitributação, in MARIA
Título IV I Capo IV I Elisão Fiscal e Elementos de Conexão

Tanto O regime interno quanto o convencional se aplicam exclusivamente a rela-


ções internacionais, ou seja, entre residentes num país e residentes no exterior.
Todavia, enquanto o regime convencional, no que concerne ao âmbito de aplica-
ção subjetiva, exige sempre um nexo de vinculação (ou interdependência), o regime
interno aplica-se mesmo entre partes não vinculadas, desde que uma esteja localizada
em território de tributação favorecida ou de regime fiscal privilegiado. Consideramos
que este aspecto do regime unilateral não é aplicável sempre que o país de tributação
mais favorecida ou de regime fiscal privilegiado em que esteja domiciliado o residen-
te no exterior esteja abrangido por Convenção contra a dupla tributação celebrada
com o Brasil, devendo as distorções de preços eventualmente existentes ser corrigidas
de harmonia com os princípios e métodos da Convenção.
No que concerne aos requisitos subjetivos, o conceito convencional de "inter-
dependência" é mais restrito que o conceito interno de "vinculação", pois, enquanto
o primeiro abrange apenas a participação na direção, controle ou capital, o segundo
vai além destas realidades, abrangendo a participação em empreendimento comum
e relações comerciais exclusivas. Também neste ponto, nas relações com Estados sig-
natários de tratado, prevalecerão as disposições convencionais em relação a todos os
casos de "vinculação" definidos pela Lei nO 9.430/96 e que ultrapassam o círculo das
relações de "interdependência".
No que concerne aos requisitos objetivos, a obtenção de uma vantagem anor-
mal nunca resulta de presunção, absoluta ou relativa; antes deve ser objeto de prova
direta pela Administração fiscal em função do princípio at arm)s length. Mais uma
vez será o regime convencional e não o unilateral o aplicável nas relações com países
signatários de tratado.
Importa agora examinar se o art. 9° dos tratados contra a dupla tributação esta-
belece qualquer limitação no que concerne aos métodos utilizados como parâmetros
de determinação do preço objetivo ou preço estabelecido "à distância de um braço",
mais especificamente os métodos adotados pela Lei nO 9.430/96.
Uma primeira observação respeita à incompatibilidade com os tratados da utili-
zação de presunções absolutas ou relativas, eis que o tratado impõe às Administrações
fiscais um dever de prova direta das eventuais divergências entre os preços praticados
entre pessoas vinculadas e não vinculadas.
E certo que alguns métodos alternativos, previstos na Lei nO 9.430/96, não con-
têm em si mesmos presunções absolutas ou relativas, como sucede em matéria de

AUGUSTA MACHADO DE CARVALHO (org.), Estudos de Direito Tributário em homenagem à memó-


ria deGILBERTO DE ULH6A CAl\'TO, Rio de Janeiro 1998, 267 a 275 (274); ALBERTO XAVIER,
Pressupostos e limites de aplicação dos métodos de apuração dos preços de transferência da
Lei nO 9.430/96 face ao art. 9° dos Tratados contra a Dupla Tributação,RDTI 1 (2005), 17;
GUSTAVO BRlGAGÃo/BRUNO LYRA, Transfer Pricing - Regras brasileiras frente aos tratados in-
ternacionais, in HELENO TAVElRA TÔRRES (org.), Direito Tributário Internacional Aplicado, vol.
IV, São Paulo 2007, 433.
Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

importações com o Método dos Preços Independentes Comparados - PIC ou, em


matéria de exportações, com o Método do Preço de Venda nas Exportações - PVEx.
O método PIC, como se viu, refere-se à média aritmética dos preços de bens, ser-
viços ou direitos, idênticos ou similares, apurados, no mercado brasileiro ou de outros
países, em operações de compra e venda, em condições de pagamento semelhantes.
Por sua vez, o método PVEx refere-se à média aritmética dos preços de venda
nas exportações efetuadas pela própria empresa, para outros clientes, ou por outra
exportadora nacional de bens, serviços ou direitos, idênticos ou similares, durante o
mesmo período de apuração da base de cálculo do imposto de renda e em condições
de pagamento semelhantes.
Um e outro método permitem ao Fisco considerar imediatamente como parâ-
metro relevante uma dive1lJência externa entre o preços das operações praticadas entre
duas pessoas vinculadas com o preço praticado em operações realizadas por outros
importadores ou exportadores, com outras pessoas não vinculadas, seja no mercado
brasileiro, seja no mercado internacionaJl63.
Ora, o art. 9° não permite a realização de tais comparações externas, restringindo
o seu âmbito de aplicação à hipótese de uma dive1lJência interna entre os preços pra-
ticados pelo mesmo importador ou exportador nas suas relações com pessoas vincula-
das e nas sua relações com terceiros não vinculados.
Esta afirmação resulta do requisito de aplicação do art. 9°, consistente no nexo
de causalidade, e segundo o qual apenas podem ser incluídos nos lucros e tributados
como talos lucros "que teriam sido obtidos por uma das empresas, mas não oforam
por causa dessas condições" (condições diferentes das que seriam estabelecidas entre
empresas independentes).

D) Preços de transferência e acordos de repartição de custos

a) Preliminares

Uma das razões das dúvidas e perplexidades que se têm suscitado a respeito dos
"cost sharing agreements" resulta de nos países anglo-saxônicos onde o fenômeno se
desenvolveu a realidade ter sido objeto de estudos predominantemente descritivos e
práticos que não consideram as peculiaridades e sutilezas das categorias dogmáticas
dos direitos de raíz latina continental.
E daí que, sob a denominação abrangente de "cost sharing", fossem examinados
fenômenos que, conquanto similares em vários de seus aspectos, apresentam confi-
guração jurídica pluriforme, que revela ser impossível atribuir um tratamento jurí-

163 Sobre a distinção entre relações internas e externas, cfr. VOGEL, op. cito (3 a ed.), 1997, 530. O
Conselho de Contribuintes tem se manifestado, porém, em sentido desfavorável à existência
de conflito. Cfr., por exemplo, Acórdão nO 108-09763, de 13.11.08.
-======- Título IV I Capo IV I Elisão Fiscal e Elementos de Conexão

dico-tributário único aos diversos esquemas contratuais elaborados pela vontade das
partes para proceder à divisão, entre elas, de certos dispêndios de interesse comum.
Nesta nova edição tivemos a preocupação de sistematizar, corrigir e clarificar
o que já vinha de edições anteriores e que deixou de corresponder com precisão às
reflexões sobre a matéria que a experiência dos últimos anos amadureceu.

b) Conceito e natureza dos acordos de repartição de custos

(i) Características essenciais


O tema dos "acordos de repartição de custos" tem sido estudado no quadro
mais amplo da problemática dos "preços de transferência" nas relações entre empre-
sas associadas e que tem em vista assegurar que os preços das vendas de mercadorias
e serviços, no âmbito de um grupo, sejam, para efeitos fiscais, equivalentes aos que
seriam fixados entre empresas independentes, atuando em circunstâncias análogas,
de harmonia com a cláusula dealing at arm)s length l64 .
Os acordos de repartição de despesas são, neste contexto, um dos métodos pos-
síveis de determinação dos preços e custos nas relações entre empresas interligadas,
os quais foram objeto de amplo exame por dois relatórios da Comissão de Assuntos
Fiscais da OCD E: o Relatório de 1979, denominado Transfer Pricing and Multina-
tionalEnterprises (Paris, 1979), doravante designado Relatório de 1979; o Relatório
de 1984, Transfer Pricing and Multinacional Enterprises: Three Taxation Issues (Paris,
1984), doravante designado Relatório de 1984.
Estes relatórios foram objeto de revisão e compilação pelo Relatório de 1995,
Transfer Pricing Guidelines for Multinational Enterprises and Tax Administrations (Pa-
ris, 1995), doravante designado Relatório de 1995, no qual se incluiu em 1997 um
capítulo dedicado aos cost contributions agreements (CCA). Referido relatório foi atu-
alizado em 1999, pela inclusão de um anexo referente a acordos prévios sobre preços,
nos termos de procedimentos de acordo mútuo (MAP APA).
É importante sublinhar o especial valor interpretativo destes documentos, na
medida em que exprimem uma convergência de opinião das Administrações fiscais
dos países mais desenvolvidos.

164 Sobre estes acordos, além das obras citadas no texto, cfr. ELIDIE PALMA BIFANO, Apuração de
preços de transferência em intangíveis, contratos de prestação de serviços, intragrupo e cost
sharing agreements, in Luís EDUARDO SCHOUERI (org.), Tributos e preços de transferência, 3°
vol., São Paulo 2009, 28 SS.; ELIETE DE LIMA RrnEIRO MALHEIRO, Preços de transferência-
intangíveis, serviços e cost-sharing, in ibidem, 48 SS.; GABRIEL LACERDA TROIANELLI, Preço de
transferência: intangíveis, acordos de repartição de custos e serviços de grupo, in ibidem, 75;
LÍVIA DE CARLI GERMANO, Regime tributário dos contratos de compartilhamento de custos e
despesas, in HELENO TAVEIRA TÔRRES (coord.), Direito Tributário Internacional Aplicado, Vol.
III, São Paulo 2005, 792 sS.
Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Como o próprio Relatório de 1979 reconhece l6 5, com exceção dos Estados Uni-
dos, é recente a experiência da generalidade dos países em matéria de acordos de re-
partição de custos, em termos de sentirem a necessidade de elaborar normas específi-
cas no concernente à dedução dos referidos pagamentos a título de despesas, nem ao
regime aplicável às receitas de um centro de pesquisas situado no seu território l66 .
No Brasil, embora exista alguma jurisprudência administrativa sobre rateio de
despesas no âmbito de relações puramente internas, não existem disposições legais
específicas, decisões jurisprudenciais no tocante às relações internacionais.
Com efeito, entre nós, o Ato Normativo nO 116/93 do INPI limitou-se a prever
a suscetibilidade de averbação no INPI de "contrato de participação nos custos de
pesquisa e desenvolvimento tecnológico que estabeleçam fluxo de tecnologia entre em-
presas domiciliadas no País, adiante denominadas receptoras, e centros de pesquisa, ou
empresa com capacidade de geração de tecnologia, no País ou no exterior, adiante de-
nominadas fornecedoras, inclusive entre empresas com vinculação societária entre si".
O Ato Normativo nO 120/93 do mesmo INPI reiterou que o INPI averbará, além dos
atos ou contratos que impliquem ou contenham dispositivos relativos a licenciamento
de propriedade industrial e transferência de tecnologia, também os atos ou contratos
"de compartilhamento de custos e/ou cooperação em programas de pesquisa e desen-
volvimento, franquia, serviços de assistência técnica, científica e semelhantes".
Todavia, referidos Atos Normativos foram revogados expressamente pelo Ato
Normativo nO 135/97, o qual, porém, deixou de prever expressamente a necessidade
de averbação dos cost-sharing agreements.
São as seguintes as características dos "acordos de repartição de custos"167:
(i) têm por objeto serviços prestados em caráter individual, mas através de
estrutura que serve de forma comum ao grupo ou serviços que atribuem
aos seus destinatários um benefício ou vantagem coletivo ouglobal, de forma
que a despesa ou custo para manutenção da estrutura coletiva ou para a
prestação do serviço coletivo visa o interesse de todos, indistintamente, em
conjunto l68 ;
(ii) a retribuição dos serviços pode ser objeto de contrato bilateral ou plurilate-
ralJ caso em que intervêm o prestador e os diversos beneficiários;
(iii) por se tratar de uma estrutura que presta serviços à coletividade do gru-
po, normalmente os contratos de repartição de custos não têm por objeto
um serviço isolado, mas serviços variados em caráter duradouro, prestados
numa base continuativa, e não instantâneos ou limitados no tempo, como
os serviços isolados ou individualizados;

165 § llO.
166 Sobre a posição de algumas administrações fiscais, como a alemã e a italiana, cfr. MAISTO, Il
"transfer price» nel diritto tributario italiano e comparato, Pádua 1985, 250 ss.
167 Cfr. MArSTO, op. cit., 231 ss.
168 Cfr. BAUMFHOFF, in MÓ55NER, Steuerrechtinternational tiitiger Unternehmen, Kbln 1992, 354 S5.
Título IV I Capo IV I Elisão Fiscal e Elementos de Conexão .i~.

(iv) a remuneração dos serviços normalmente não pressupõe o seu uso efetivo,
mas a simples colocação à disposição da estrutura comum ou do serviço cole-
tivo, ou seja, a atribuição de um benefício ou vantagem potencial, remune-
rada num sistema de "partido" ou "avença" (on call);
(v) a determinação da vantagem individual e a consequente medida de repar-
tição dos custos é feita, na maior parte dos casos, por métodos indiretos, por
estimativa baseada em certos critérios, e não por uma determinação direta
da vantagem auferida, como sucede nos serviços individualizados.
No que concerne à estrutura jurídica dos acordos plurilaterais, tanto podem
existir acordos em que todos os participantes contratam em conjunto o serviço em be-
nefício de todos, determinando a quota-parte de cada um na despesa global, quanto
acordos em que a despesa é incorrida ou contratada por um só participante em nome
próprio, mas no interesse dos demais, que se obrigam a reembolsá-lo posteriormente.
A ambas as modalidades é comum o elemento de o critério da divisão do custo
ser fIxado "forfetariamente", diferenciando-se apenas por no primeiro caso haver
descentralização do pagamento e no segundo uma centralização do pagamento.

(ii) A determinação dos custos rateáveis


A questão preliminar que suscitam as situações a que nos referimos consiste na
determinação de quais são os custos que devem ser suportados exclusivamente pela
entidade que realiwu a despesa (Sociedade-Mãe ou Centro de Serviços do Grupo) e
aqueles que podem ser transferidos para as demais sociedades do grupo.
Considera-se que são ônus exclusivo da Sociedade-Mãe aqueles que o Relatório
de 1984 designa como "despesas do acionista" e que se referem às despesas incorri-
das para gerir e proteger os seus próprios investimentos, como é o caso dos encargos
contraídos com vista à preparação da assembleia dos acionistas, à consolidação dos
resultados dos membros do grupo, ou a título de despesas de administração, com
vista ao fornecimento dos meios de financiamento necessários à expansão deste l69 •
Ao invés, podem ser transferidos os custos das atividades exercidas em benefício
de uma ou de diversas empresas associadas, bem como das atividades de que podem
beneficiar, segundo graus distintos, a Sociedade-Mãe (ou o Centro de Serviços do
Grupo), o grupo no seu conjunto, ou uma ou várias empresas associadas, em parti-
cular (ônus coletivo) .
O critério de suscetibilidade de transferência reside assim na existência de um
benefício efetivo ou potencial para a empresa do grupo, em contrapartida do custo
assumido, para que esta possa legitimamente efetuar a respectiva dedução para efei-
tos do imposto de renda.

169 § 33 ss. Ver exemplos de Gesellschafter-Auftvand, em BAUMHOFF, in MÓSSNER, Steuerrecht


international tiitiger Unternehmen, Kóln, 350.
M . Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

(iii) Os métodos de rateio

A experiência internacional revela que a determinação dos preços de serviços


intergrupo pode realizar-se por métodos diretos ou por métodos indiretos.
Pelo método direto apenas são consideradas as remunerações por serviços concre-
tos e específicos faturados individualizadamente e que correspondem a um benefício
concreto da sociedade associada em causa.
Todavia, o método direto tem sido criticado por não conseguir abranger os servi-
ços de grupo ou coletivos em que, inobstante não existir um faturamento direto e indivi-
dualizado, é inegável a existência de benefícios para as diversas sociedades integrantes
do grupo, em contrapartida das atividades desenvolvidas e dos custos incorridos pelo
prestador. Como diz o Relatório de 1984, certas administrações "consideram tam-
bém que seria economicamente errado imputar integralmente a uma sociedade as
despesas suportadas, num dado momento, relativas a serviços que lhe são prestados,
quando os trabalhos em causa e as despesas daí resultantes dão origem a conheci-
mentos e a uma experiência posteriormente postos à disposição de uma outra socie-
dade do grupo. Daí que o método direto só seja verdadeiramente aplicável no plano
prático em relação a serviços específicos prestados a uma sociedade e suscetíveis de
interessar apenas a esta"170.
Com efeito, nos serviços coletivos ou de grupo a parte do valor do benefício
recebido por cada sociedade do grupo só pode ser determinada de forma aproxima-
da ou estimada (pauschaliertes Abrechnul1fJssystem) 17l, como é o caso, por exemplo,
das atividades de promoção de vendas levadas a efeito em nível central (como seja
a participação em feiras internacionais ou a inserção de publicidade na imprensa
internacional) que são suscetíveis de afetar o volume de produção ou das vendas das
diversas subsidiárias.
Nestes casos torna-se necessário recorrer, como última ratio, aos métodos indire-
tos, assim denominados por não existir uma relação direta entre o custo do serviço
prestado e sua remuneração em função do benefício recebido 172.
São três os principais métodos indiretos conhecidos na expetiência internacional173 :
a) o método da repartição de custos, que consiste na imputação e repartição dos
custos entre as empresas do grupo com base numa estimativa das vanta-
gens decorrentes, para cada uma, de tais despesas;
b) o método de financiamento do custo ou da fórmula fixa de repartição, que con-
siste na imputação e repartição dos custos entre as empresas associadas
com base num elemento de natureza geral de atividade das empresas inte-
ressadas, via de regra, o volume de negócios ou faturamento;

170 § 52.
171 Cfr. SCHAUMBURG, op. cit., 828.
172 Sobre a questão de saber se o método indireto do Kostenumlage tem caráter subsidiário ou pa-
ritário em relação ao método direto, cfr. BAUMFHOFF, in MÓSSNER, Steuerrecht... , cit., 379 ss.
173 Cfr. RaATÓRlO DE 1984, § 45.
Título IV I Capo IV I Elisão Fiscal e Elementos de Conexão

c) O método da ma1JJem de lucro consistente em aplicar uma margem de lu-


cro, que inclua as despesas centrais, ao preço dos produtos vendidos pela
Sociedade-Mãe às afiliadas.
O método da fórmula fixa de repartição adota diversos parâmetros objetivamen-
te apropriados para a medição do benefício individual entre os quais o faturamento,
o lucro, a folha de pagamento, o capital da empresa, o patrimônio, o maquinário. O
mais adotado é, sem dúvida, o volume de faturamento l74 .

c) Espécies

(i) Contratos de compartilhamento de custos

Os contratos de compartilhamento de custos são contratos inominados celebra-


dos entre duas ou mais empresas (via de regra integradas num mesmo grupo econômi-
co) pelo qual uma ou mais empresas ("comparticipantes") se obrigam a assumir uma
quota-parte dos custos necessários à fruição de bens ou direitos ou à realização de ati-
vidades do interesse comum de todos, sendo que os custos inerentes a essa fruição ou
exercício são incorridos apenas por uma (Centro de Custos), à qual é exclusivamente
imputável a obrigação do respectivo pagamento, por ela realizado em nome próprio.
O compartilhamento de custos tanto pode ter por objeto a fruição de bens e
direitos (como é o caso do direito à fruição de coisa imóvel remunerado por alu-
guéis l75 ) de titularidade de uma empresa, mas colocada à disposição das demais,
como o exercício de atividades consistentes em atividades-meio de uma dada empre-
sa, não constitutivas do seu objeto social, mas de que os comparticipantes pretendem
beneficiar.
Distintos dos contratos de compartilhamento de custos são os contratos de contri-
buição para os custos ("cost contribution agreements - CCA"), adiante mais bem exami-
nados, pelos quais duas ou mais entidades acordam em repartir entre si os custos e os
riscos de produzir, desenvolver ou adquirir quaisquer bens, direitos ou serviços, de
acordo com o critério da proporção das vantagens ou benefícios que uma das partes
espera vir a obter da sua participação no acordo, nomeadamente do direito de utilizar
os resultados alcançados em projetos de pesquisa e desenvolvimento (intangíveis)
sem o pagamento de qualquer contraprestação adicional.
A especificidade destes contratos está em que as contribuições referem-se a um
pool para investimento comum (cujos resultados serão partilhados no futuro em fun-
ção dos benefícios individuais esperados) e não à reposição de custos correntes em
função dos custos efetivos já incorridos.

174 efr. SCHAUMBURG, Intemationales Steuerrecht, cit., 829; BAUMHOFF, op. cit., 359.
175 Mas também de móveis, computadores, propagandas contratadas, marcas, processos etc.
I gm I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

É apenas nos casos que o compartilhamento tem por objeto os custos de uma
estrutura funcional de serviços em que o Centro de Custos se refere a atividades-meio,
de caráter instrumental, que se torna necessária a distinção dos contratos a que res-
peita em relação aos contratos de prestação de serviços "intragrupo".
No contrato de compartilhamento de custos importa separar com toda a clareza
as relações externas que se estabelecem exclusivamente entre o Centro de Custos e as
pessoas físicas ou jurídicas beneficiárias dos pagamentos por ela realizados (p. ex.
despesas com pessoal ao abrigo de contratos de trabalho) e as relações internas> emer-
gentes dos próprios contratos de compartilhamento de custos, pelas quais se estabe-
lece a comunidade do ônus econômico da estrutura funcional, mediante a assunção,
por cada uma das partes, da obrigação de contribuir, na proporção que lhe compete,
para a realização da despesa comum.
N a lógica deste modelo contratual, os recursos fmanceiros entregues à parte
que deve realizar a totalidade das despesas no âmbito das relações externas revestem
uma natureza contributiva> no sentido de que são entregues ao Centro de Custos os
fundos necessários para o cumprimento da obrigação própria de cada parte de compar-
ticipar na despesa comum.
O fenômeno tem certas analogias com o instituto do mandato sem represen-
tação, de que é exemplo paradigmático o contrato de comissão, e que se traduz em
alguém agir em nome próprio, mas por conta e ordem de terceirosl 76 . Neste instituto
o mandante (comitente) deve fornecer os fundos necessários para que o mandatário
possa cumprir as ordens, bem como ressarci-lo das despesas que este fez por adian-
tamento 177, dispondo o art. 706 do Código Civil que "o comitente e o comissário
são obrigados a pagar juros um ao outro; o primeiro pelo que o comissário haver
adiantando para cumprimento de suas ordens; e o segundo pela mora na entrega dos
fundos que pertencerem ao comitente"178.
Fenômemo similar ao de uma conta corrente de débitos e créditos ocorre no
contrato de compartilhamento de custos. Num como noutro instituto os recursos
são adiantados ou ressarcidos nas relações internas (pelos comparticipantes ou pelo
mandante) a título de cumprimento da obrigação própria da assunção de parte do
ônus econômico do negócio jurídico praticado pelo único sujeito que figura nas rela-
ções externas (o Centro de Custos ou o mandatário sem representação).
Todavia, no caso da figura de compartilhamento de custos a dissociação das
relações externas e internas não resulta de um mandato propriamente dito, com ou
sem representação, mas do próprio contrato de compartilhamento, que tem como
finalidade uma simples divisão de custos e não a atribuição de um encargo ou tarefa
a terceiro.

176 Cfr. PESSOA JORGE, Do mandato sem representação> Lisboa 1961.


177 Como afirmava expressamente o art. 166 do Código Comercial.
178 Cfr. JosÉ HENRIQUE LONGO, Natureza jurídica do ressarcimento no rateio de despesas, in
RDDT, na 77, 2002, 68 ss. espec. 71.
Título IV I Capo IV I Elisão Fiscal e Elementos de Conexão

A entrega de fundos a título comparticipativo é por vezes designada como "res-


sarcimento" ou "reembolso", mas a expressão não é inteiramente correta, uma vez
que ela só se aplica às hipóteses em que referida entrega é feita em momento pos-
terior à realização efetiva das despesas pelo Centro de Custos, não sendo, porém,
adequada para descrever os casos em que os recursos são entregues em momento
anterior, caso em que ocorre não um ressarcimento, mas um adiantamento.
Seja, porém, a entrega dos recursos anterior ou posterior à realização das despe-
sas comuns pelo Centro de Custos, o certo é que a entrega dos recursos financeiros
pelos comparticipantes tem como título jurídico o cumprimento de uma obrigação
própria de que o Centro de Custos é credor, na parte proporcional que a cada um
compete, crédito esse que resulta de o contrato de compartilhamento reconhecer que
a despesa comum deve ser cumprida na sua totalidade apenas pelo Centro de Custos,
no âmbito das relações externas.
É também certo que os recursos entregues pela totalidade dos comparticipantes
correspondem rigorosamente aos custos incorridos pelo Centro de Custos em nome
próprio para a manutenção da estrutura de uso comum, sem qualquer elemento que
acresça a tal custo, razão pela qual a expressão "ressarcimento", frequentemente utilizada,
exprime precisamente a ideia de equilíbrio econômico, de mera recomposiçtfu patrimonial.
É precisamente a assunção pelas várias partes das despesas de um certa estrutura
como despesas comuns que imprime a esta modalidade contratual uma natureza
"cooperativa", de comunidade de uso, isto é, de umpool, como especialmente sublinha
a doutrina a1emã179 •
É da essência da concepção de pool o predomínio atribuído à unidade econômica
do conjunto das empresas que constituem o grupo econômico sobre a pluralidade
das personalidades jurídicas do Centro de Custos e dos comparticipantes, o que con-
duz a conceber as sociedades controladas, ainda que juridicamente independentes,
como simples "divisões" ou "departamentos" de uma entidade unitária.
É, pois, um corolário da prevalência da concepção unitária, baseada na substân-
cia econômica (economic entity theory), sobre a concepção atomística, assente na forma
jurídica180.

(ii) Contratos de prestaçtfu de serviços intragrupo


Os contratos de compartilhamento de custos distinguem-se dos contratos de
prestação de serviços intragrupo, muito embora mantenham com eles algumas afini-
dades, já atrás referidas ao tratar das características comuns aos diversos tipos de
acordos de repartição de custos.

179 Sobre o Pool-gedanke, efr. SCHAUMBURG, lnternationales Steuerrech, Colônia, 1993, 826; BAU-
MHOFF, in MÓSSNER, Steurrecht international tdtiger Unternehmen, Colônia, 1992, 355.
180 Sobre a separate accounting theory e a economic entity theory, efr. MAISTO, 11 "tranftr pricing)) nel
diritto tributario italiano e comparato, Pádua 1985, 25 sS.
M'._ Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Com efeito, no âmbito de um grupo de empresas é também possível que seja


vontade das partes a adoção de modelo alternativo consistente em centralizar numa
só entidade (Centro de Serviços) toda a estrutura funcional dirigida à execução de
serviços para as demais empresas dele integrantes (Cintragroup services»), tal como
sucede nos contratos de compartilhamento de custos.
A diferença essencial em relação a estes últimos está em que nestes se atribui à
referida entidade centralizadora a função de prestar os serviços numa base profissional)
como se se tratasse de uma empresa independente, relacionada com as demais empresas
do grupo por relações contratuais ao abrigo do art. 593 e seguintes do Código Civil.
Nos contratos de compartilhamento de custos não há um verdadeiro contrato
de prestação de serviços, pois o fim ou a causa que anima a vontade das partes não
é a execução de serviços, mas a obtenção de economias de escala) pela mera repartição
de custos das atividades-meio que são exercidas pelo Centro de Custos, mas que os
comparticipantes pretendem utilizar como serviços próprios (serviços internos ou
"in-house services") , embora comuns l81 •
A profissionalização que ocorre nos contratos de prestação de serviços intra-
grupo consiste precisamente em converter as atividades-meio (no modelo de contrato
de compartilhamento de custos) em atividades-fim) arvoradas em objeto social da
empresa prestadora, a serem exercidas profissionalmente, mediante relações bilaterais
com as diversas empresas do grupo, que passam a ser concebidas não como cotitu-
lares de uma estrutura comum, mas como clientes) em cujo interesse exclusivo os
serviços são prestados.
Tal profissionalidade) inerente ao contrato de prestação de serviços, caracteriza-se
pelo fim lucrativo) pela inexistência de subordinação foncional e independência técnica
(sendo as empresas solicitantes tratadas como clientes) e pela responsabilidade pela
efetividade e qualidade dos serviços prestados, com os riscos a ela inerentes.
Neste modelo contratual, os pagamentos efetuados ao Centro já não revestem
natureza contributiva da comparticipação nos custos, mas sim natureza sinalag-
mática 182, contraprestacional de preço de prestação de serviços, de que os custos da
estrutura são meros componentes, natureza essa que não é perdida na hipótese
de o preço ser estritamente calculado para cobrir o custo, sem margem de lucro
("mark-up") 183.

181 Cfr., no mesmo sentido, LUCIANA ROSANoVA GALHARDO, Rateio de despesas no Direito Tribu-
tário, São Paulo 2004; NATANAEL MARTINS, Rateio de custos/despesas entre empresas sob
controle comum - tratamento tributário aplicável, in Planejamento Fiscal - Teoria e Prática
(coord. VALDIR DE OLIVEIRA ROCHA), São Paulo 1995, 141; ELÍDIE P. BIFANO, Apuração
de preços de transfen~ncia em intangíveis, contratos de prestação de serviços intragrupos -
cost sharing agreements, in Tributos e Preços de Transftrência, 3° vol., São Paulo, 2009 (coord.
SCHOUERl) 44.
182 Cfr. NATANAEL MARTINS, O contrato de rateio de despesas e suas implicações tributárias,
Direito 1Jibutário) homenagem a ALCIDES JORGE COsDI, 11, São Paulo 2003,739.
183 Cfr. ELÍDIE BIFANO, op. cit., 47.
Título IV I Capo IV I Elisão Fiscal e Elementos de Conexão .iM

Tenha-se presente que a natureza de preço provém do caráter profissional, con-


traprestacional, sinalagmático, do modo de execução do serviço (prestação de serviço
profissional mediante contraprestação consistente em preço versus execução de ativi-
dade-meio interna sem preço, e com assunção de custos comuns).
Os serviços intragrupo tanto podem ter caráter individualizado) se prestados
em termos bilaterais e específicos a uma empresa do grupo, do mesmo modo que
poderiam ser prestados por terceiro independente, ou serem serriços coletivos ou de
grupo) que se caracterizam pelo caráter coletivo da vantagem que propiciam a todas
as partes das empresas que o integram.
Quando os serviços têm caráter coletivo torna-se necessário imputar a cada em-
presa do grupo a parte proporcional que lhe compete através de métodos indiretos
ou estimativos (a fiJ1fait). Essa imputação contratual constitui objeto de um acordo
de rateio) que suscita problemas similares aos do contrato de compartilhamento de
custos no plano da dedutibilidade das despesas com o respectivo pagamento.
Mas a tais casos não quadra bem o conceito de cost-sharing) pois não está em causa
uma alocação de custos em comum, mas uma divisão de uma despesa de interesse co-
mum, que tem a natureza jurídica de preço, podendo ou não coincidir com o custo.

(iii) Contratos de contribuição para os custos


Os problemas específicos dos cost contribution arrangements (CCA)184 no que
respeita a despesas de pesquisa e desenvolvimento foram amplamente analisados no
Relatório de 1979 e posteriormente ampliados para abranger a generalidade das
formas de propriedade intangível em 1997.
Um acordo de contribuição para os custos é um contrato celebrado no âmbito
de um grupo multinacional de empresas tendo por objeto repartir os custos e os riscos
do desenvolvimento, produção e obtenção de ativos, serviços ou direitos, bem como
definir a natureza e a extensão dos interesses de cada participante nessas atividades.
É da essência dos acordos de contribuição para os custos a formação de um
pool de recursos e tecnologias tendo como contrapartida uma quota-parte de direitos
relativos ao intangível produzido, quer tais direitos se configurem como propriedade
em sentido jurídico ou meramente econômico.
Muito embora o seu objeto possa ser mais amplo, o certo é que o campo predo-
minante dos CCA tem sido o das despesas de pesquisa e desenvolvimento (R & D).
O Relatório de 1979 já observava que o financiamento dos trabalhos de pesquisa
e desenvolvimento, via de regra longos e dispendiosos, tanto pode ser realizado ao final
do processo, mediante contratos de licença onerosa do uso do bem incorpóreo produ-
zido em decorrência dos referidos trabalhos; ou, em alternativa, mediante compartição

184 Também por vezes denominados acordos de fmanciamento de despesas (cost-fonding agree-
ments).
I • I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

nas despesas de pesquisa e desenvolvimento, a serem repartidas entre os componentes


do grupo, mesmo anteriormente à produção do bem incorpóreo em causa l85 •
O critério de rateio é, via de regra, proporcional à utilização prevista dos resulta-
dos das pesquisas, sendo que, em contrapartida, os comparticipantes poderão utilizar
gratuitamente os bens incorpóreos realizados.
Repare-se que enquanto nos contratos de compartilhamento de custos o objeto
da repartição é um custo certo, atual e efetivo, nos acordos de contribuição para os
custos o próprio valor do custo é objetivo de uma estimativa "a flifait"186.
Tendo em vista a imprecisão dos critérios que levam a definir a proporção entre
contribuições e expectativas de lucros, a OCDE elaborou as seguintes recomendações
para efeitos de aplicação do critério at arm)s length l87 : os acordos devem incluir como
participantes apenas as empresas que esperam obter benefícios mútuos, direta ou indi-
retamente, da atividade objeto do CCA e não apenas para executar uma parcela dessa
atividade; o acordo deve especificar a natureza e a extensão da vantagem (beneficiaI in-
terest) de cada participante nos resultados da atividade; nenhum pagamento adicional
às contribuições deverá ser feito para a vantagem obtida através do CCA; as quotas
de contribuições deverão ser determinadas por métodos que reflitam a partilha dos lu-
cros esperados; o acordo deve prever pagamentos compensatórios, de modo a refletir
alterações nas expectativas de lucros; o acordo deve contemplar ajustes a serem feitos
em razão da entrada ou retirada de partes de CCA ou da terminação deste.

d) O problema dos «preços de transferência»


A principal particularidade a anotar em matéria de pagamentos de compartici-
pação nos custos efetuados nas relações internacionais está na questão de saber se a
eles se aplicam as disposições da lei interna em matéria de preços de transferência.
Pode liminarmente dizer-se que, não tendo os acordos de compartilhamento a
natureza de uma prestação de serviços, não se poderá falar de uma receita de exporta-
ção ou venda de serviços, nem de sua importação ou compra dos mesmos.
Que não se trata de receita já foi afirmado quando se demonstrou o caráter
comparticipativo e não contraprestacional dos recursos recebidos pela entidade com
funções de Centro de Custos. E que não se trata de uma exportação ou venda de ser-
viços deriva ainda de, nos casos de compartilhamento de custos, não se vislwnbrar
uma verdadeira prestação de serviços exercida em termos profissionais independen-
tes, com ânimo lucrativo e caráter sinalagmático.
Do estrito ponto de vista jurídico não temos dúvida em afirmar que aos casos
de contrato de compartilhamento de custos não se aplicam as regras internas em
matéria de preço de transferência, pois também aqui o art. no do Código Tributá-

185 Cfr. Relatório de 1979, § 100.


186 Cfr. BRUNO GOUTHIÉRE, Les impôts dans les affaires intemationales, cit., 715.
187 § 8.40.
Título IV I Capo IV I Elisão Fiscal e Elementos de Conexão _'E'
rio Nacional se aplica como princípio hermenêutico conducente à prevalência dos
conceitos de direito privado.
A verdade, porém, é que nas relações internacionais a prática das administrações
fiscais em matéria de preços de transferência, na generalidade dos países, não esta-
belece fronteiras nítidas entre os casos de prestação de serviços propriamente dita e
compartilhamento de custos de uma estrutura de serviços.
Com efeito, no estudo mais relevante da OCDE sobre esta matéria l88 se faz
uma contraposição dicotômica entre os serl'iços intragrupo (intragroup serl'ices) de um
lado, examinados no Capítulo VII, e os acordos de contribuição para os custos (cost-
contribution agreements-CCA), estudados no Capítulo VIII. Desta dicotomia parece
resultar que a OCDE visualiza modelos comparticipativos apenas em matéria de
investimentos para produção, desenvolvimento ou aquisição de bens, direitos ou ser-
viços, realizados em pool, enquanto que toda a execução de serviços correntes recairia
no conceito de serviços intragrupo, independentemente do modo de execução de tais
serviços, isto é, quer sejam prestados profissionalmente, através de contrato, quer se
limitem a uma execução material no âmbito de um centro de custos 189 .
Esta manifesta simplificação, em face da pureza dos princípios jurídicos, pode
explicar-se pela circunstância de que enquanto na ordem jurídica brasileira a carac-
terização como receita e o modo de execução dos serviços têm repercussões na de-
limitação da hipótese de incidência de tributos de competência de entes políticos
distintos (as "receitas" tributadas pelo PIS/COFINS, de competência da União, e
as "prestações de serviço" tributadas pelo ISS, de competência dos Municípios), já
para efeitos do imposto de renda, ao qual os Guidelines da OCDE exclusivamente se
referem, a distinção carece de relevância prática.
Acresce que todas as preocupações em redor dos preços de transferência no âm-
bito internacional decorrem da necessidade de assegurar uma repartição equitativa
da matéria tributável entre os diversos Estados, o que explica a tendência para tratar
de modo análogo a execução de serviços em sentido econômico, independentemente
da forma jurídica do seu modo de execução.
Vêm estas considerações apenas para explicar a forte probabilidade de nas rela-
ções entre dois Estados surgirem conflitos de qualificação em face de um contrato de
compartilhamento de custos, o qual estaria, do ponto de vista brasileiro, exonerado
das imposições das regras de preços de transferência enquanto, da perspectiva do
outro Estado, a mesma realidade pode ser encarada como um serviço intragrupo
submetido àquelas regras.

188 Transfir Pricing Cuidelines for Multinational Enterprises and Tax Administrations, Paris 1996.
189 Observam os Cuidelines da OCDE no seu item 8.7 que os CCA podem também abranger
a produção ou aquisição de serviços, não estando limitada ao desenvolvimento comum de
bens de propriedade intangível, e acrescenta no item 8.8 que "o que distingue as contribui-
ções para um CCA de um serviço intragrupo é que as contribuições têm como finalidade
serem retribuídas pelos lucros esperados pela colocação em comum (pooling) dos recursos.
-ss- Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

o certo é, porém, que nos casos em que se esteja diante de um verdadeiro con-
trato de prestação de serviços intragrupo com pessoa vinculada residente no exterior
(ou domiciliada em território de tributação favorecida ou beneficiária de regime fis-
cal privilegiado), o preço deve ser fixado em termos objetivos (at arm/s lenght) pela
utilização de qualquer dos métodos previstos no art. 19 da Lei nO 9.430/96 19°.

e) A dedutibilidade dos custos rateados

A questão da dedutibilidade dos dispêndios efetuados ao abrigo de acordos de


repartição de custos, em qualquer das suas modalidades, tem que ser examinada em
face dos requisitos gerais de dedutibilidade das despesas estabelecido no art. 299
do RIR, segundo o qual "são operacionais as despesas não computadas nos custos,
necessárias à atividade da empresa e à manutenção da respectiva fonte produtora",
acrescentando o § lOque "são necessárias as despesas pagas ou incorridas para a rea-
lização das transações de operações exigidas pela atividade da empresa".
Pronunciando-se sobre estes dispositivos, o Acórdão da Câmara Superior de
Recursos Fiscais/01-0.900 esclareceu o seguinte:
"IRPJ - Despesas Operacionais - Dedutibilidade - Necessidade - Comprovação
- O art. 191 do RIR/80, ao estabelecer que são operacionais as despesas não
computadas nos custos, necessárias à atividade da empresa e à manutenção da
respectiva fonte produtora, criou na área do imposto de renda o que comumente
se denomina de cláusula geral. Isto significa que o legislador evitou baixar norma
exemplificativa ou, muito menos, taxativa. Se a pessoa jurídica consegue provar,
por qualquer meio lícito de prova, que o gasto existiu e se trata de despesa normal
ou usual no tipo de transações, operações ou atividades da empresa, ainda que
mediante simples notas fiscais simplificadas, não há como se glosar tal gasto".
A dedutibilidade das despesas pressupõe, pois, a demonstração da necessidade
da despesa e da razoabilidade do critério de determinação do respectivo valor.
O Conselho de Contribuintes tem também admitido a dedutibilidade de des-
pesas previstas "forfetariamente" em acordos de rateio. Embora a jurisprudência se
refira apenas a casos ocorridos na esfera interna, os mesmos princípios deverão ser
aceitos au nível das relações internacionais, apenas com as adaptações eventualmente
decorrentes de legislação sobre "preços de transferência"191.

190 Cfr. VICTOR BORGES POLIZELLI, Tratamento dos serviços na legislação brasileira de preços de
transferência, in Tributos e Preços de Transferência, 3° vol., EDUARDO SCHOUEIU (coord.), São
Paulo 2009, 257 5S.
191 São exemplos desta jurisprudência os acórdãos nO' 103-21911, 101-92565, 101-95958, 107-
0396, 101-95777, 101-85.030, 203-09723, 103-08.605. Cfr. NATANAEL MARTINS, Rateio
de custos/despesas entre empresas sob controle comum - tratamento tributário aplicável, in
Planejanunto Fiscal. Teoria e Prática, coord. WALDIR DE OLIVEIRA ROCHA, ed. Dialética, 1995,
141 55.
-===:=-' ,- Título IV I Cap, IV I Elisão Fiscal e Elementos de Conexão

A jurisprudência administrativa tem arvorado ainda como requisitos da deduti-


bilidade (i) a prova documental da efetividade do serviço, não admitindo, como deveria,
a dedutibilidade de serviços potenciais l92 ; e (ii) a adequação do critério de rateio à na-
tureza da atividade exercida 193.

J) Tributação na fonte sobre os pagamentos efetuados ao exterior


Coloca-se a questão de saber se estão sujeitos a imposto de renda na fonte os
pagamentos feitos por empresas brasileiras a residentes no exterior ao abrigo dos
acordos de repartição de custos.
Há que distinguir neste caso os pagamentos efetuados a título de compensação
por serviços prestados daqueles efetuados a título de contribuição.
É que, enquanto nos acordos de contribuição para os custos se pode dizer que
o pagamento reveste a natureza econômica de uma contribuição de capital para o
pool, nos acordos de serviços intragrupo o pagamento tem a natureza de um preço de
prestação de serviços.
No primeiro caso não está em causa o pagamento de um rendimento, provento
ou ganho a residente no exterior, mas uma prestação contributiva, o que configura
simples transferência de capital, para usar a terminologia de BULHÓES PEDREIRA e que
não estão por natureza sujeitas a tributação de qualquer espécie.
No segurIdo caso há, porém, o pagamento de um preço de prestação de servi-
ços, de natureza contraprestacional. Tal natureza não é perdida pelo fato de referido
pagamento não incluir qualquer margem de lucro l94 •
O único entendimento oficial das autoridades fiscais nesta matéria consiste na
Solução de Consulta nO 462, de 29 de novembro de 2006, do seguinte teor:
"REMESSAS AO EXTERlOR - Contrato de Compartilhamento de Custo de
Serviços Globais. A fim de cumprir as obrigações assumidas em contratos de
custos/despesas compartilhados, pode a empresa líder do grupo utilizar-se de
prepostos ou terceiros contratados para realizar as referidas atividades, rece-
bendo de cada empresa beneficiada, mediante rateio das despesas, o valor por
elas devido, na proporção do benefício recebido. Mesmo nas hipóteses em que
os recursos são remetidos pela empresa beneficiária a título de reembolso, exis-
tem beneficiários finais, residentes ou domiciliados no exterior, dos recursos
remetidos, a exemplo das pessoas (físicas ou jurídicas) que prestarão os serviços
assumidos pela empresa líder. Por essa razão, as importâncias pagas, creditadas,

192 Cfr. Acórdão nO 103-08.605.


193 Cfr. Acórdão nO 101-84.435.
194 No caso dos acordos de prestação de serviços intragrupo o que se poderia discutir é se tal
preço pode caracterizar-se como um rendimento, para efeitos da incidência do imposto de
renda na fonte, tendo em vista o conteúdo não remuneratório, mas meramente ressarcitório
do preço e o caráter interno e não profissional da prestação.
u I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

entregues, empregadas ou remetidas por fonte situada no País à empresa líder


(pessoa jurídica domiciliada no exterior), a título de remuneração pela prestação
contínua de serviços nas áreas: financeira e organizacional, de recursos huma-
nos, de gerenciamento de risco, de padrões e política, e de estratégia e desenvol-
vimento, na proporção utilizada, a partir de 10 de janeiro de 2002, sujeitam-se à
incidência do imposto de renda na fonte à alíquota de 15% (quinze por cento),
por configurarem 'assistência administrativa e semelhante' prestada por residen-
te ou domiciliado no exterior".
Verifica-se, pois, que referida decisão não fez a necessária distinção entre as di-
versas modalidades possíveis de acordos de rateio de custos, separando os casos de
compartilhamento de custos, em que os pagamentos têm a natureza contributiva,
não tributável, dos acordos de prestação de serviços intragrupo, em que se pactuou
um preço tributável.

E) Subcapitalização

a) Considerações preliminares
No exercício da sua liberdade quanto à escolha da melhor estrutura de finan-
ciamento de uma empresa, se o recurso a capitais próprios dos sócios, mediante ca-
pitalização, ou se o recurso a capitais de terceiros, mediante endividamento, podem
os empresários tomar em consideração uma pluralidade de fatores relevantes para
o caso concreto, como a natureza da atividade, a fase em que o empreendimento se
encontra e o custo comparativo dos capitais 195 •
Entre referidos fatores podem também influenciar a decisão os ônus fiscais in-
cidentes sobre as modalidades alternativas de financiamento, especialmente em sis-
temas jurídicos em que os juros têm um tratamento tributário menos oneroso do
que os dividendos, considerado o efeito combinado da dedução do imposto sobre o
lucro da pessoa pagadora (existente nos juros e não nos dividendos) com os tributos
incidentes na fonte e na pessoa jurídica receptora.
São diversas as técnicas pelas quais podem ser evitadas práticas tendentes a am-
pliar artificialmente as despesas relativas a juros, de modo que estcs sc bcneficiem
de tratamento fiscal eventualmente mais favorecido quando comparado com o dos
lucros distribuídos.
Uma primeira consiste na verificação da "razoabilidade" do montante dos juros,
em face do valor de mercado, no quadro dos preços de transferência, recusando-se a

195 efr. HELENO TÔRRES, Direito Tributário Internacional - Planejamento tributário e operações
transnacionais, São Paulo 2001,511 55.; IVENS HENRIQUE HÜBERT, Subcapitalização de em-
presas: delineamento e tratamento nos âmbitos societário e tributário, in HELENO TAVEIRA
TÔRRES (org.), Direito Tributário Internacional Aplicado, vaI. II, São Paulo 2004,56355.
Título IV I Capo IV I Elisão Fiscal e Elementos de Conexão I iiEllt1

dedutibilidade do "excesso" em face do critério objetivo de um "at ann)s lenght inte-


rest" ou outro critério legalmente fIxado. É a técnica utilizada no art. 9° da Conven-
ção Modelo da OCDE e, no direito interno, no art. 22 da Lei nO 9.430, de 1996.
Uma segunda técnica baseia-se na "qualifIcação" da operação subjacente como
crédito ou capital, em face das circunstâncias do caso concreto, e tem, por exemplo, apli-
cação nos "instrumentos fmanceiros híbridos", que apresentam ora aspectos de crédito,
ora aspectos de capital, como sucedem com as debêntures remuneradas com participa-
ção nos lucros ou as ações ou direitos de fruição, em certos ordenamentos jurídicos.
Nas circunstâncias acima, as autoridades podem, no âmbito da sua atividade
de interpretação dos tratados, das leis e dos fatos, "requalifIcar" (recharactenze) um
contrato, aparentemente de crédito, como um aporte de capital.
A fIgura da subcapitalização ou capitalização insufIciente (thin capitalization)
na lei brasileira distingue-se das técnicas anteriores por, abstraindo do exame das
circunstâncias do caso concreto, recusar a dedutibilidade dos juros, por via de pre-
sunção ou fIcção legal, pelo simples fato de ter sido ultrapassado um dado coefIciente
de endividamento em relação ao capital próprio (debt/equity ratioj196. Não se trata,
pois, de evitar a "deslocação de receitas" de um para outro sujeito, situado ou não
no mesmo território, mas de evitar a "influência voluntária no regime das receitas"
de uma certa modalidade para outra, sujeita a regime eventualmente menos oneroso,
ainda que na titularidade do mesmo sujeito.
Precisamente porque no Brasil não se verifIca o pressuposto que tem levado certos
países a adotarem o regime fIscal da subcapitalização - tratamento mais benéfIco de
juros do que de dividendos (exonerados de retenção na fonte e isentos de tributação,
na pessoa jurídica brasileira receptora, ex vi do art. 10 da Lei nO 9.249/95)197 - e ainda
porque o recurso a capitais próprios foi convenientemente estimulado com a fIgura
dos juros sobre capital próprio, a lei não adotou qualquer providência fIscal relativa à
capitalização insufIciente até à Medida Provisória nO 472, de 15 de dezembro de 2009,
convertida na Lei nO 12.249, de 11 de junho de 2010. Contudo, a utilização generali-
zada dos empréstimos para fInanciar as atividades de empresas, por vezes com capital
irrisório, conduziu à convicção de que tal instrumento estaria sendo utilizado para
fIns de economia de imposto, pela simples substituição do capital por empréstimos
que permitiriam à empresa gerar despesas com juros, dedutíveis para fIns de apuração
do IRPJ e da CSLL (34%), sendo tais rendimentos tributáveis na fonte à alíquota de
15%, quando pagos ou creditados a residentes no exterior.
Esta constatação levou o Fisco a alegar o artifIcialismo das despesas com juros,
incorridas com o único fIm de erodir a base de cálculo do imposto de renda e da

196 Cfr. IFA, International aspects ofthin capitalization, CDFI, LXXXI-b (1996), 831; OCDE,
Thin Capitalization (Report), 1986.
197 Enquanto os juros pagos a residentes no exterior são dedutíveis e tributados por retenção na
fonte a uma alíquota de 15%, os dividendos "exportados" não são dedutíveis e são isentos
de retenção na fonte.
Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

contribuição social sobre o lucro, substituindo a tributação sobre a renda das pessoas
jurídicas por uma tributação na fonte substancialmente inferior.
Esta é a razão pela qual os arts. 24 e 25 da Lei nO 12.249, de 11 de junho de
2010, pretenderam evitar a utilização do endividamento junto de entidades "vincu-
ladas não residentes" ou entidades residentes "em países de tributação favorecida"
ou beneficiárias de "regime fiscal privilegiado" como meio de redução artificial do
lucro tributável das empresas para efeitos do imposto de renda das pessoas jurídicas
(e da CSL). Recorre-se à definição de um coeficiente de endividamento, tido como
normal para a generalidade das empresas, o qual, uma vez ultrapassado, faz com que
os juros correspondentes às dívidas "em excesso" sejam qualificados como despesas
não necessárias, logo indedutíveis.

b) Requisitos
São três os requisitos fundamentais da figura da subcapitalização: (i) o elemento
de estraneidade, consistente na necessária residência do credor no exterior; (ii) a qua-
lificação do credor, alternativamente consoante a sua relação com o devedor (pessoa
vinculada) ou ao regime tributário a que está submetido, quer seja em razão do seu
domicílio em país ou dependência de tributação favorecida, quer seja por gozar de
um regime fiscal privilegiado; e (iii) a existência de um "endividamento excessivo".

(i) Residência no exterior

Do requisito da estraneidade resulta desde logo que o regime de subcapitali-


zação não se aplica em situações puramente internas, mesmo as estabelecidas entre
um devedor residente no Brasil e um estabelecimento permanente (filial, agência,
representante) de credor domiciliado no exterior l98 .

(ii) Qualificação do credor

(a) Existência de vinculação com e sem participação societária


o conceito de "vinculação" adotado como requisito do art. 24 é o constante do
art. 23 da Lei nO 9.430, de 1996, relativo aos preços de transferência. Caso não exista

198 Na União Europeia a aplicação do regime de subcapitalização a empresas não residentes foi
julgada em desconformidade com as regras comunitárias, concretamente com os princípio da
não discriminação e do direito de estabelecimento, tal como o TJCE decidiu, em 12 de dezem-
bro de 2002, relativamente a disposições similares existentes na Alemanha, no caso "Lankhost-
Hohorst GmbH" (Processo C-324jOO). Com esta decisão os países europeus passaram a de-
terminar que o regime de subcapitalização não é aplicável no caso de endividamento perante
entidades residentes nos próprios países ou em outro Estado-membro da União Europeia. Cfr.
SALDANHA SANCHES, Os limites do planeamento fiscal, Coimbra, 2006, 302 ss.
~. Título IV I Capo IV I Elisão Fiscal e Elementos de Conexão

vinculação, no sentido da referida disposição legal, e não recaia o credor no âmbito


do art. 25, os juros serão plenamente dedutíveis, independentemente do rácio de
endividamento.
Coloca-se então a questão de saber qual o alcance da expressão pessoa vinculada
empregada no art. 24 da Lei nO 12.249/2010, tendo em vista que este dispositivo re-
mete para a defmição constante do art. 23 da Lei nO 9.430/96, sem qualquer ressalva.
Em face da redação original da Medida Provisória suscitaram-se dúvidas sobre
se o espírito e a letra da lei permitiriam abranger relações de vinculação que não en-
volvessem a detenção de participações societárias, tendo em vista que apenas no caso
de sócio controlador ou coligado haverá uma participação no patrimônio líquido
que permita apurar um rácio de endividamento em relação ao capital próprio 199 .
Na versão que acabou por ser consagrada na Lei nO 12.249/2010 o legislador
explicitou, sem margem para dúvidas, que pretendia abranger todo o tipo de rela-
ções de vinculação previstas na lei, quer estas se traduzissem ou não em participações
societárias.
A distinção entre os dois grupos de relações de vinculação - com e sem a deten-
ção de participação societária na pessoa jurídica residente no Brasil- produz os seus
efeitos quanto ao cálculo do rácio de endividamento, como em seguida se verá.

(b) Residência do credor em país com tributação favorecida


ou com regime fiscal privilegiado
No que respeita ainda ao requisito da qualificação do credor, relativo à definição
do âmbito subjetivo do instituto, o art. 25 da Lei nO 12.249/2010 prevê a aplicação
das regras de subcapitalização, ainda que inexista relação de vinculação, desde que a
parte residente no exterior seja domiciliada "em país com tributação favorecida" ou
beneficiária de "regime fiscal privilegiado".
O conceito de país ou dependência de tributação favorecida encontra-se previsto
no art. 24 e seu § 4° da Lei nO 9.430/96, segundo os quais:
'1\s disposições relativas a preços, custos e taxas de juros, constantes dos arts. 18
a 22, aplicam-se, também, às operações efetuadas por pessoa física ou jurídica
residente ou domiciliada no Brasil, com qualquer pessoa física ou jurídica, ainda
que não vinculada, residente ou domiciliada em país que não tribute a renda ou
que a tribute à alíquota máxima inferior a vinte por cento."
"§ 4° Considera-se também país ou dependência com tributação favorecida
aquele cuja legislação não permita o acesso a informações relativas à composição
societária de pessoas jurídicas, à sua titularidade ou à identificação do benefici-
ário efetivo de rendimentos atribuídos a não residentes."

199 Cfr., neste sentido ALBERTO XAVIER/RENATA EMERY, Subcapitalização, RDDT nO 176 (2010),
755.
@ I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Tal conceito foi regulado pela Instrução Normativa na 1.037/2010 que veiculou
a lista dos países ou dependências, que, no entendimento das autoridades fiscais,
recaem no âmbito do art. 24 e seu § 4 0 da Lei na 9.430/96.
O conceito de regime fiscal privilegiado encontra-se previsto no parágrafo
único do art. 24-A da Lei na 9.430/96, segundo o qual:
"( ... ) Para os efeitos deste artigo, considera-se regime fiscal privilegiado aquele
que apresentar uma ou mais das seguintes características:
I - não tribute a renda ou a tribute à alíquota máxima inferior a 20% (vinte
por cento);
U - conceda vantagem de natureza fiscal à pessoa física ou jurídica não
residente:
a) sem exigência de realização de atividade econômica substantiva no país
ou dependência;
b) condicionada ao não exercício de atividade econômica substantiva no
país ou dependência;
UI - não tribute, ou o faça em alíquota máxima inferior a 20% (vinte por
cento), os rendimentos auferidos fora de seu território;
IV - não permita o acesso a informações relativas à composição societária, ti-
tularidade de bens ou direitos ou às operações econômicas realizadas."
Sobre estes conceitos não nos deteremos, pois já foram por nós objeto de exame
aprofundad0 20o •
Apenas duas observações.
A primeira diz respeito à distinção fundamental que se deve traçar entre o con-
ceito de regime fiscal privilegiado e o de país de tributação favorecida. É que, em re-
lação a este último, a lei estabeleceu como critério um patamar mínimo de tributação
dos lucros abaixo do qual o país ou "dependência" de residência da pessoa jurídica se
qualificaria como de tributação favorecida. O primeiro conceito, porém, respeita ao
regime tributação aplicável à pessoa não residente ou à operação praticada, conside-
rados de forma individualizada.
Assim, uma pessoa jurídica pode ser domiciliada em país que não se qualifique
como de tributação favorecida, por o imposto de renda incidir à alíquota superior a
20%, mas ainda assim a operação individualmente considerada poderá ter sido pra-
ticada por regime fiscal privilegiado caso: (i) tenha sido tributada à alíquota máxima
inferior a 20% (vinte por cento); (ii) a pessoa não residente goze de vantagem de na-
tureza fiscal sem a exigência de realização de atividade econômica substantiva no país
ou dependência ou condicionada ao não exercício desta atividade; (iii) não tribute, ou
o faça em alíquota máxima inferior a 20% (vinte por cento), os rendimentos auferidos
fora de seu território; ou (iv) não permita o acesso a informações relativas à composi-
ção societária, titularidade de bens ou direitos ou às operações econômicas realizadas.

200 efr. supra, 25155.


Título IV I Capo IV I Elisão Fiscal e Elementos de Conexão

A segunda consideração que se nos afigura relevante é a de que tais conceitos,


devido à sua complexidade, não são automaticamente aplicáveis, necessitando de
um ato administrativo que venha a identificar quais, no entendimento da autoridade
fiscal, seriam os regime fiscais privilegiados, a exemplo do que ocorre com o conceito
de país de tributação favorecida e com fundamento nos mesmos princípios.

(iii) Endividamento excessivo


o "endividamento excessivo" supõe uma comparação entre um numerador (o en-
dividamento ou debt capital) e um denominador (patrimônio líquido, capital próprio ou
equity capital), de forma que se o rácio ou coeficiente for superior a 2.1 será considerado
"excessivo", ou, como diz a lei norte-americana, haverá um excessive interest expense.
No caso do credor qualificado como pessoa vinculada com participação societária,
o valor do endividamento, verificado por ocasião da apropriação dos juros, está sujeito
a um duplo limite: (i) não ser superior a duas vezes o valor da participação da vinculada
no patrimônio líquido da pessoa jurídica residente no Brasil (limite individual); (ii) o
valor do somatório dos endividamentos com pessoas vinculadas no exterior não ser
superior a duas vezes o valor do somatório das participações de todas as vinculadas no
patrimônio líquido da pessoa jurídica residente no Brasil (limite global).
No caso de credor qualificado como pessoa vinculada, mas sem detenção de
participação societária, tanto o limite individual quanto o limite global do endivida-
mento foram fixados em duas vezes o valor do patrimônio líquido da pessoa jurídica
residente no Brasil (inciso H).
No caso da pluralidade de credores, há que distinguir a hipótese de todos eles
serem vinculados sem participação societária, caso em que o limite global será de
duas vezes o valor do patrimônio líquido da pessoa jurídica residente no Brasil (§§
5° e 6°), da hipótese em que pelo menos um dos credores é titular de participação
societária, caso em que o limite global será de duas vezes o valor do somatório das
participações de todas as vinculadas no patrimônio líquido da pessoa jurídica resi-
dente no Brasil (inciso IH).
No caso do credor não sujeito a relações de vinculação, mas domiciliado em país
de tributação favorecida ou com regime fiscal privilegiado, tanto o limite individual
quanto o limite global do endividamento (somatório dos endividamentos com todas
as entidades situadas naqueles países) foram fixados em 30% do valor do patrimônio
líquido da investida (art. 25) e não do valor da participação da investidora, dado
nesses casos poder não existir uma relação de vinculação.
Assim, por exemplo, se o valor do patrimônio líquido da sociedade investida é
de 100 e o valor da participação do investidor domiciliado na França na sociedade
investida é de 70, o limite individual do endividamento é de 140, mas se o investidor
for domiciliado nas Bahamas esse limite é de 30.
O patrimônio líquido a ser considerado para efeitos dos arts. 24 e 25 abrange
capital social, reservas de capital, ajustes de avaliação patrimonial, reservas de lucros,
Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

ações em tesouraria e prejuízos acumulados (art. 178, § 2°, inciso III, e art. 182 da
Lei das S.A., alterados pelas Leis nOS 11.638/2007 e 11.941/2009).
De acordo com o § lOdos arts. 24 e 25, "para efeito do cálculo total de endi-
vidamento a que se refere o caput deste artigo, serão consideradas todas as formas
e prazos de financiamento, independentemente de registro do contrato no Banco
Central do Brasil", dispondo por sua vez o § 2° dos mesmos artigos que "aplica-se
o disposto neste artigo às operações de endividamento de pessoa jurídica residente
ou domiciliada no Brasil, em que o avalista, fiador, procurador ou qualquer interve-
niente for pessoa vinculada" (nos casos do art. 24) ou "for residente ou constituída
em país de dependência com tributação favorecida ou sob regime fiscal privilegiado"
(nos casos do art. 25).
Este preceito como que imputa presuntivamente a concessão de empréstimo à
entidade garantidora, conduzindo assim a aplicar o rácio de endividamento em rela-
ção à sua participação no patrimônio líquido. Trata-se de medida destinada a coibir
o expediente clássico do "back to back loan".
Afigura-se-nos, porém, que ultrapassa os limites da proporcionalidade e da ra-
zoabilidade aplicar cega e mecanicamente esta presunção, que chega até a ser absurda
quando nelas abrange um mero "procurador" ou "qualquer interveniente".
Também afigura-se-nos criticável que os rácios do dobro ou de 30% sejam fixa-
dos por lei para toda e qualquer empresa por ficção legal e presunção legal absoluta
uniforme, não se prevendo coeficientes diferenciados consoante o tipo de atividade,
como sucede em várias legislações estrangeiras, em que multiplicador substancial-
mente mais elevado é adotado, por exemplo, para as instituições financeiras.
Por outro lado, numerosas legislações estrangeiras mitigam a rigidez do siste-
ma de presunções, admitindo que o contribuinte possa comprovar que o eventual
excesso apurado presuntivamente podia ter sido obtido com o mesmo nível de endi-
vidamento em condições análogas a uma entidade independente, tendo em conta o
tipo de atividade, o setor em que se insere, a dimensão e outros critérios pertinentes
e tomando em conta um perfil de risco da operação que não pressuponha o envolvi-
mento das entidades com as quais tem relações especiais 20l •

c) Consequências

Como se disse, a não verificação dos requisitos exigidos para que a despesa com
juros seja considerada necessária conduz à apuração de um "excedente", de tal modo
que os juros a ele relativos serão considerados despesa não necessária e, consequen-
temente, indedutíveis para fins de imposto de renda e da CSL.
O caput dos arts. 24 e 25 ressalvam expressamente que os preceitos em causa
se aplicam "sem prejuízo do disposto no art. 22 da Lei nO 9.430, de 1996", o qual,

201 Cfr., por exemplo, o art. 67 do Código do IRC (Imposto sobre o Rendimento das Pessoas
Coletivas) em Portugal.
Título IV I Capo IV I Elisão Fiscal e Elementos de Conexão '41tH
em matéria de preços de transferência, estabelece um limite quantitativo para a de-
dutibilidade de juros pagos a pessoas vinculadas quando decorrentes de contrato não
registrado no Banco Central do Brasil. Significa isto que, no domínio específico a
que respeitam, as disciplinas dos preços de transferência e da subcapitalização são de
aplicação cumulativa, ficando assim os juros em causa sujeitos a uma dupla ordem de
limitações à sua dedutibilidade.
Significará isto que a lei atribui aos juros indedutíveis, por ficção ou presun-
ção legal, a naUlreza de lucros distribuídos (constructive dividends» como sucede em
certas legislações estrangeiras? A lei apenas determina a indedutibilidade, pelo que a
assimilação a lucro distribuído restringe-se apenas a esse efeito, junto ao devedor, e a
mais nenhum outro, junto ao credor. A lei recusou a dedutibilidade de uma despesa,
mas não mudou a naUlreza do rendimento. Os "juros excessivos" devem continuar
a ser qualificados como juros para todos os efeitos, designadamente a incidência de
retenção na fonte.
A recusa de dedutibilidade da despesa, por um lado, combinada com a tributa-
ção na fonte dos juros, por outro, acabaria por criar injustificada dupla tributação da
renda, além de resultar em exceção injustificada ao princípio do emparelhamento de
receitas e despesas aplicável em matéria de imposto de renda e CSL.

d) Tratados contra a dupla tributação

Quanto à questão de saber se o regime da subcapitalização se aplica nos casos


em que o não residente é domiciliado num país com o qual Brasil celebrou conven-
ção contra a dupla tributação, entendemos que este regime não é compatível nem
com o art. 9° nem com o art. 24 da Convenção Modelo.
Com efeito, o nosso regime assenta num critério quantitativo fixo e predetermina-
do (apurando por ficção legal ou presunção absoluta o coeficiente de endividamento),
com total abstração do princípio at arm>s lenght e das circunstâncias do caso concreto,
ao contrário do que exige o art. 9°202 dos tratados inspirados no Modelo OCDE203.
Entendemos também que o regime de subcapitalização não é compatível com
o princípio da não discriminação constante do art. 24 do Modelo OCDE, por tratar
de forma diferenciada o endividamento excessivo perante credores residentes e não
residentes, não admitindo, quanto a financiamentos prestados por estes, a dedutibili-
dade dos juros na parte considerada em excesso. Tais dispositivos contradizem clara-
mente não só o espírito do princípio, como o disposto no art. 24, § 4°, do Modelo
OCDE, que proíbe a distinção de tratamento entre juros pagos a credores residentes
e a não residentes nas mesmas condições, ao estabelecer que o Estado da fonte deve
permitir a dedução, para efeitos da determinação do lucro tributável, dos juros (além

202 Cfr. ALBERTO XAVIER, Direito Tributário Internacional (6a ed.), Rio de Janeiro, 2003, 396 55.
203 Cfr. OCDE, Comentários, art. 9°, par. 3°.
MitrA Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

de outros rendimentos) pagos por uma empresa residente num Estado contratante a
uma pessoa residente no outro Estado contratante.
Importa neste sentido referir o comentário do parágrafo 74 ao art. 24, § 4°, do
Modelo OCDE, segundo o qual "o § 4° não impede o país do mutuário de aplicar
as suas regras internas sobre subcapitalização, na medida em que sejam compatíveis
com o § IOdo art. 9° ou com o § 6° do art. 11", acrescentando-se que, "todavia,
se tal regime resultar de regras que não são compatíveis com os artigos referidos e
aplicáveis apenas a credores não residentes (com exclusão dos credores residentes), a
aplicação deste regime é interdita nos termos do § 4°".
Tenha-se presente que o regime de indedutibilidade de juros tem como conse-
quência uma tributação mais onerosa da empresa brasileira (e não dos seus sócios)
em função da residência do credor. Os §§ 4° e 5° do art. 24 da Convenção Modelo
apresentam-se, pois, como um simples corolário do princípio geral contido no § 1°.
Das convenções brasileiras, apenas contêm disposições idênticas ao referido §
4° as Convenções com a África do Sul, Bélgica, Chile, China, Coreia, Israel, México,
Peru, Portugal e Ucrânia.
A verdade, porém, é que as Convenções com a África do Sul, o Chile, Israel,
Peru e Portugal consagram em Protocolos declaração de que as convenções não im-
pedem os Estados contratantes de aplicar as disposições das respectivas leis internas
sobre subcapitalização.
Mora esses casos em que foi estabelecida uma ressalva expressa (tanto as Conven-
ções que não contemplam o corolário expresso do § 4° quanto as que o contêm e não
formularam ressalvas) deve entender-se que a incompatibilidade pode ser invocada.

§ 5° A REAÇÃO À ELISÃO FISCAL INTERNACIONAL

Já anteriormente nos ocupamos do conceito de elisão fiscal internacional20\ mas


não é demais recordar, nas suas linhas mestras, o que então se escreveu.
O fenômeno da elisão fiscal internacional assenta num duplo pressuposto: a
existência de dois ou mais ordenamentos tributários, dos quais um ou mais se apre-
sentam, em face de uma dada situação concreta, como mais favoráveis que o outro
ou outros; a faculdade de opção ou escolha pelo contribuinte do ordenamento tribu-
tário aplicável, pela influência voluntária na produção do fato ou fatos suscetíveis de
determinar a respectiva aplicação.
É precisamente a esta faculdade voluntária de opção ou escolha racional que se
referem as expressões "planeamento fiscal" (tax planning) "montagem fiscal", "ar-
quitetura", "engenharia fiscal" ou similares.
A essência da figura da elisão fiscal reside precisamente nesta faculdade de eleição
da ordem tributária aplicável, não por uma via direta (como sucede no Direito In-

204 efr. supra, 235.


Título IV I Capo IV I Elisão Fiscal e Elementos de Conexão M{M

ternacional Privado em matéria de contratos), incompatível com o princípio da le-


galidade em matéria de tributos, mas pela via indireta de "localizar" certo fato ou
fatos num dado ordenamento ou território, exercendo uma influência voluntária no
elemento de conexão da norma de conflitos, em termos tais que o fato jurídico em
que este elemento se traduz arraste a aplicação do ordenamento mais favorável, seja
ele decorrente de tratado ou de direito interno estrangeiro.
E daí que se suscite a questão, comum ao Direito Internacional Privado e ao
Direito Tributário Internacional: "poderão então as partes, manejando os elementos
de conexão como alavancas de comando, determinar a seu arbítrio a lei aplicável?".
Ou poderão as partes, 'internacionalizando' artificialmente a sua situação, aproveitar-se
das normas de conflitos para se beneficiarem da aplicação da lei que lhes for mais
vantajosa?"
Como também já atrás observamos, a reação contra a elisão vem precisamente
dos ordenamentos jurídicos que a si próprios se consideram (porventura com al-
guma arrogância ou avidez) "normalmente" competentes para tributar uma dada
situação, competência essa que resultaria da necessária aplicação das suas leis fiscais,
caso o elemento de conexão não tivesse sido (também do ponto de vista desse orde-
namento) "artificialmente manipulado".
Coloca-se a questão de saber qual a reação dos ordenamentos jurídicos cujas
normas tributárias se viram frustradas de aplicação pelo comportamento "elisivo" ou
"abusivo" das partes. Tal como sucede no Direito Internacional Privado, o objetivo
pretendido é tornar ineficazes ou inoponíveis em face de uma ordem jurídica os atos
em que se traduz tal comportamento; só que o Direito Tributário não cura do valor
jurídico dos atos na esfera das relações entre os particulares, mas tão somente da sua
relevância para efeitos estritamente fiscais.
É certo que alguns atos ou operações podem ser inválidos perante o direito
privado, em razão de simulaçiÚJ (sham transactions). Em tais casos a generalidade dos
ordenamentos jurídicos atribui ao Fisco a faculdade de ver reconhecida a ineficácia
desses atos e, por consequência, restaurada a realidade que visam a encobrir.
Sucede, porém, que nos comportamentos elisivos não ocorre, em geral, a figura
da simulação, pois as partes pretendem exatamente aquilo que ostensivamente reali-
zaram, não existindo qualquer divergência entre a vontade real e a vontade declarada.
Só que o resultado que realmente pretendem redunda numa economia de imposto
obtida por atos ou conjuntos de atos (step hy step transactions) em si mesmo válidos,
mas reputados ardilosos, engenhosos, oblíquos, indiretos ou abusivos.
A prevenção da elisão fiscal internacional opera-se, em regra, pela via das cláusu-
las especiais antielisivas205 (por contraposição às cláusulas gerais antielisão ou antia-

205 Temos as mais sérias reservas doutrinárias ao conceito de norma antielisiva, apenas definível
em função da sua frnalidade, no plano pré-jurídico, pois a impropriamente designada "eli-
são" mais não é que uma esfera de liberdade que pressupõe a ausência de norma tipificadora,
um espaço livre de lei. Ver ALBERTO XAVIER, Tipicidade da tributação) simulação e norma an-
tielisiva) São Paulo 2001,passim.
Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

buso) em que a conduta que se pretende evitar é tipificada de modo expresso, quer
nas leis internas) quer nos tratados internacionais.
Tivemos já, no lugar próprio, ocasião de estudar algumas destas normas, de
que são exemplo, no Direito interno, as que, pela técnica das presunções ou ficções,
consideram alguém como sendo ainda residente num país quando já transferiu o seu
domicílio para um território de baixa tributação ("responsabilidade fiscal alargada"
para combater um "abuso de domicílio"); as que determinam a inversão do ônus da
prova quanto à existência e razoabilidade de despesas feitas em favor de residentes
em paraísos fiscais; as que determinam a desconsideração da personalidade jurídica
ou a transparência fiscal internacional de sociedades-base domiciliadas em paraísos
fiscais, como forma de prevenir o diferimento da tributação; as que consagram pre-
sunções legais em matéria de subcapitalização ou de preços de transferência, a fim de
evitar a criação artificial de despesas financeiras ou a manipulação também artificial
de preços entre pessoas que entre si mantêm relações especiais de influência.
Também nos dedicamos ao estudo de normas convencionais que têm marcado
caráter antielisivo, destinadas a prevenir o chamado "abuso" ou "uso impróprio dos
tratados", de que constituem exemplos as cláusulas tendentes a cercear a prática do
treaty shopping, restringindo os requisitos de aplicação dos tratados apenas a certas
categorias de residentes num certo país (cláusulas do beneficiário efetivo, cláusulas
de exclusão, cláusulas de limitação de benefícios etc. )206 ou contrariando as práticas
do chamado rule shopping, pela recusa de aplicação do tratado a certos tipos de ren-
dimentos quando a criação ou transmissão dos direitos e eles relativos obedeça ao
propósito exclusivo de se beneficiar do regime convencional mais favorável 207 .

206 Cfr. OCDE, Comentários, artigo l°, par. 7° ss.


207 OCDE, Comentários, artigo l°, par. 21.4. Sobre o tema veja GAETANO CASERTANO, Le c1au-
sole antiabuso nelle convenzioni contro le doppie imposizioni, in Sistemi fiscali a confronto.
Modelli stranieri nella riforma dei sistema fiscale italiano, Milão 1998,43; PASQUALE PISTONE,
"Cabuso delle convenzioni internazionali in materia fiscale) in VICTOR UCKMAR (org.), Corso di
diritto tributario internazionale) Pádua 1999,483; PHILIP BURGEss, Normas tributarias para
la prevención de la e!usión internacional, in II Coloquio Internacional de Derecho Tributario,
Buenos Aires 2000, 453; MARco AURELIO GRECO, Normas tributarias para la prevención de
la e!usión internacional, in ibidem, 395; FERNANDO SERRANO ANTÓN, Las medidas antiabu-
so en los convenios para evitar la doble imposición internacional y su compatibilidad con
las medidas antiabuso de carácter interno y el Derecho Comunitario, in HELENO TÓRRES
(org.), Direito Tributário Internacional Aplicado, São Paulo 2003,157; PEDRO M. HERRERA
MOLINA/JAvIER MARTÍN FERNÁNDEZ, El fraude a la ley tributaria en e! Derecho espanol, in
MARÍA TERESA SOLER ROCHjFERNANDO SERRANO ANTÓN (org.), Las medidas antiabuso en
la normativa interna espafiola y en los convenios para evitar la doble imposición internacional y
su compatibilidad con el Derecho Comunitario, Madrid 2002, 19; JosÉ MANUEL ALMUDÍ CID,
La normativa contra la e!usión fiscal internacional en los Estados Unidos, in ibidem, 239;
ADOLFO J. MARTÍN JIMÉNEZ, Las medidas antie!usivas/antiabuso internas y los convenios para
la eliminación de la doble imposición, in ibidem, 109; FRANCISCO ALFREDO GARCÍA PRATS,
Las medidas tributarias antiabuso y eI Derecho Comunitario, in ibidem, 163; FÉLIX ALBERTO
VEGA BORREGO, Medidas antiabuso y convenios de doble imposición, in JosÉ A. RODRÍGUEZ
Título IV I Capo IV I Elisão Fiscal e Elementos de Conexão lêJifJJ

Problema mais delicado suscita-se precisamente na inexistência de regras legais


do tipo das atrás referidas. E isto porque o Direito Tributário, enquanto dominado
pelos princípios da legalidade e da tipicidade da tributação (por sua vez, emanação
do princípio da segurança jurídica), resiste à utilização de técnicas de combate à
elisão, como o recurso à analogia ou a utilização de cláusulas gerais que recorram a
conceitos indeterminados.
Convictos da impossibilidade de tipificar legalmente todos os comportamentos
elisivos imagináveis, certos países tentaram elaborar "cláusulas gerais" tão amplas
que a todos abrangessem, sejam tais cláusulas de origem judicial ou legal.
Não é este o lugar próprio para discutir a legitimidade constimcional das cláusu-
lasgerais antielisivas, questão sobre a qual nos temos pronunciado reiteradamente no
sentido de sustentar a incompatibilidade da aplicação analógica a que tais cláusulas
conduzem com os princípios da legalidade e da tipicidade da tributaçã0208 •
Entendemos, porém, que por vezes se encontra mal colocada a questão se saber
se as normas gerais antielisivas - aí onde vigorem, legitimamente ou não - conflitam
com os tratados internacionais contra a dupla tributaçã0 209 •
É que a norma antielisiva respeita a uma questéÚJ prévia de Direito interno, logica-
mente antecedente à da subsunção no tratado, questão essa que consiste em saber se
determinado ato ou negócio jurídico praticado ou celebrado por particulares é ou não
eficaz perante a Administração tributária. Assim, se um determinado ato, revestindo
uma certa namreza que conduzia à sua qualificação numa determinada disposição con-
vencional (por exemplo, dividendo) é declarado inoponível vis a vis do Fisco, este deve-
rá requalificá-Io e extrair as consequências dessa requalificação em face do tratado.
É certo que a desconsideração de um ato ou negócio jurídico, por um dos Es-
tados em presença, não acompanhada necessariamente de um movimento reflexo
no outro, pode conduzir a um "conflito de qualificações" e, portanto, a uma dupla
tributação, cuja eliminação é um objetivo do tratado, enquanto a supressão da elisão
fiscal certamente não o é.
Mas esta ponderação não pode conduzir a negar a cada um dos Estados o poder
de interpretar os fatos, atos e negócios a que as suas leis se aplicam, nem de deci-
dir sobre o seu valor jurídico, pelo que o problema deve ser resolvido pelas regras

ONDARZA/ÁNGEL .FERNÁNDEZ PRIETO (org.), Fiscalidad y planificación fiscal internacional, Ma-


drid 2003, 401.

208 Cfr. ALBERTO XAVIEr, Tipicidade da tributaçíW, simulaçíW e norma antielisiJ'a, cito Sobre o estudo
das GAAR (General Anti Avoidance Rules), no Direito Comparado ver GRAEME S. COOPER
(org.), Tax Avoidance and the Rule ofLaw, Amsterdam 1997; PASQUALE PrsToNE, Abuso dei
diritto e e/usione fiscale, Pádua 1995; IFA, Form and Substance in Tax Law, CD.FI LXXXVII-a
(2002),669.
209 OCDE, Comentários, artigo 1°, par. 9.1 e 22 55.; I.FA - How dome5tic antiavoidance rules
effect double taxation convention5, in Proceedings of a Seminar held in Toronto, Canada, in
1994 during the 48'h Congress of the lnternational Fiscal Association, vol. 19c., The Hague 1995.
I p I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

destinadas a dirimir conflitos de qualificação, notadamente as que reconhecem uma


competência qualificatória exclusiva e não cumulativa, como temos defendido.
Os tratados não são, pois, agredidos, em si mesmos, pelas normas gerais an-
tielisivas do Direito interno, já que a sua aplicação pressupõe resolvida a questão
da existência, validade e eficácia dos atos ou negócios jurídicos que dão origem aos
rendimentos a que tais tratados se aplicam, só ocorrendo em momento logicamente
posterior. A "desaplicação" do tratado por um dos Estados contratantes não será,
pois, direta, mas meramente consequencial.
Tenha-se presente que a generalidade das normas gerais antielisivas não distin-
guem consoante os atos ou negócios a que se aplicam respeitem a situações puramen-
te internas ou a situações internacionais plurilocalizadas21o (cross-border transactions); e
daí a sua relevância no Direito Tributário Internacional.
Resta finalmente examinar a questão de saber se, para além das normas especiais
antielisivas, se pode admitir que os tratados contra a dupla tributação contenham,
ainda que implicitamente, uma cláusula geral que autorize os Estados contratantes
(ambos ou um deles) a recusar a sua aplicação se esta foi provocada "artificialmente"
por conduta não expressamente tipificada em cláusula específica, nem declarada ine-
ficaz por norma interna antielisiva. Estar-se-ia nestas hipóteses perante um abuso do
próprio tratado e não da lei interna, e, segundo alguns, a legitimidade para desconsi-
derar operações cuja finalidade preponderante consista na obtenção de benefícios dos
tratados decorreria do objeto e propósito das convenções, bem como de obrigação
de interpretá-los de boa-fé, conforme determinam os arts. 26 e 31 da Convenção de
Viena sobre o Direito dos Tratados 211 .
A "desaplicação" do tratado ocorreria, nestes casos, de modo direto e imediato
por elisão da própria norma convencional e não de modo meramente consequencial,
como vimos suceder no caso de declaração de ineficácia de ato jurídico interno com
reflexos na convençã02 ]2.
Apenas dois tratados celebrados pelo Brasil consagram, é certo, de modo ex-
presso, uma cláusula geral antiabuso. Assim, por exemplo, o art. 28, § 1°, do Tratado
com o México, dispõe que "as autoridades competentes de ambos os Estados con-
tratantes poderão negar os benefícios desta Convenção, quando assim o acordarem
nos termos do art. 25 da mesma, a qualquer pessoa em relação a qualquer operação
se, em sua opinião, a outorga dos benefícios da Convenção constitui um abuso desta
Convenção, considerando seu objeto e fim". E o art. 25, § 2°, da Convenção com

210 Cfr. supra, 3.


211 Cfr. OCDE, Comentários, artigo I", par. 9.3 a 9.6. Sobre a evolução do pensamento do
Comité de Assuntos Fiscais da OCDE, a partir das revisões aos Comentários ao artigo 10
operadas em 1992 e 2003, num sentido marcadamente "pró-governamental", ver W ARD, op.
cit., 398-9; ID.jet ai, The Interpretation oflncome Tax Treaties with Párticular Reference to the
Commentarieson the OECDModel, IBFD (2006), 5 ss.
212 Raros são os autores que colocam o problema nos seus precisos termos. Ver DAVID A. W ARD,
Abuse of tax treaties, in Essays on International Taxation, 1993, 397 ss.
Título IV I Capo IV I Elisão Fiscal e Elementos de Conexão .~i!'

Israel, determina que "uma autoridade competente de um Estado contratante poderá


negar os benefícios da presente Convenção a qualquer pessoa, e com relação a qual-
quer transação se, em sua opinião, a concessão de tais benefícios constitui um abuso
da Convenção em conformidade com seus fms (... )213".
Cremos, porém, que é ir longe demais pretender a existência de uma cláusula ge-
ral antielisiva embutida implicitamente em todos os tratados contra a dupla tributação
e que pudesse conduzir à recusa da sua aplicação por um Estado, mesmo na ausência
de normas especiais antielisivas, pela invocação de um motivo exclusivo ou prepon-
derante de economia de imposto pelos particulares, motivo esse - note-se - que não
conduziu à aplicação de cláusula geral antiabuso de Direito interno, seja em razão de
sua inexistência, seja em razão da ausência de pressupostos de sua aplicação.
Invoca-se, por vezes, a cláusula de boa-fé consagrada na Convenção de Viena
sobre Direito dos Tratados, seja no art. 26 - pacta sunt servanda - segundo a qual
"cada tratado em vigor vincula ambas as partes e deve ser cumprido por eles de boa-
fé" - seja ainda no art. 31 - "um tratado deve ser interpretado de boa-fé, de acordo
com o sentido usual que deve ser dado aos termos do tratado no seu contexto e à luz
do seu objeto e propósito".
A cláusula de boa-fé desempenha, pois, uma dupla função no Direito dos Trata-
dos: uma, relativa ao modo de cumprimento do acordo pelas partes - os Estados
contratantes; outra, relativa à interpretação dos próprios acordos214 •
Ora, a boa-fé na primeira das aludidas funções - pacta sunt servanda - nada tem
a ver com o problema da elisão fiscal, que respeita às relações dos particulares com
os Estados (que devem ser honestas, leais e razoáveis) e não às relações dos Estados
entre si. Não podemos acompanhar o raciocínio de VOGEL quando alega que seria ir-
racional exigir que os Estados cumpram as suas obrigações convencionais de boa-fé,
e, portanto, sem abuso de direito, e, simultaneamente, permitir que os particulares
possam exercer de modo abusivo os direitos que lhes são outorgados pelos trata-
dos 2ls . É que a boa-fé é um standard de comportamento entre pessoas vinculadas por
obrigações recíprocas, padrão esse que decorre da celebração de um ato jurídico (o
tratado) de que os cidadãos particulares não são partes, mas meros destinatários. A
elisão respeita a um comportamento do particular perante o Estado, o qual é regido,
em primeira linha, pelo Direito Constitucional desse Estado.
Também como regra de hermenêutica não vemos como seja possível invocar a
boa-fé para efeitos de combate à elisão, pois este não é, defmitivamente, nem o objeto)
nem o propósito dos tratados. O objeto e o propósito dos tratados é, isso sim, evitar

213 São numerosos os casos de Estados que salvaguardam expressamente nos Protocolos anexos
aos tratados a aplicação de cláusulas gerais antiabuso (ver os Tratados da Alemanha com a
Bélgica, Finlândia e Nova Zelândia; o Tratado da Itália com os Emirados Árabes etc.).
214 Cfr. FRANK ENGELEN, Interpretation ofTax Treaties under International Law, IBFD (2004),
124 sS.; 133 ss.; e 461 sS.
215 Cfr. supra.
q I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

a dupla tributação e também prevenir a evasão fiscal (os quais figuram no título dos
próprios convênios), sendo que a expressão tax evasiony usada na versão inglesa do
Modelo OCDE refere-se a figura distinta da elisão fiscal (tax avoidancey abus de droit) ,
caracterizada pela violação direta e frontal das normas tributárias. Também não pode
invocar-se o fenômemo da dupla não tributação, distinto da figura da elisão fiscal e
em relação à qual não existe consenso de que seja um dos objetivos dos tratados 2 16 .
Que não pode admitir-se (ao menos na atual fase da evolução do Direito Inter-
nacional Público) a existência de uma cláusula geral antielisiva implícita nos tratados
contra a dupla tributação é bem demonstrado pela própria prática dos Estados e de
organizações internacionais, como a própria OCDE, que vêm generalizando e aper-
feiçoando, de modo sistemático, a utilização de cláusulas antielisivas específicas 217 •
Seja, porém, como for, uma cláusula deste tipo, explícita ou implícita, é incons-
titucional em face do ordenamento jurídico brasileiro.

216 Cfr. supra.


217 Cfr. sobre esta matéria ADOLFO J. MARTÍN JIMÉNEZ, Medidas antielisivasjantiabuso internas
y las convencions par la eliminación de la doble imposición, in MAR1Á TERESA JOLER ROCHj
FERNANDO SERRfu'lO ANTÓN, Las medidas antiabuso ... , cit., 109 sS.; J. M. ALMUDÍ CID, El
régimen jurídico de transparencia fiscal internacional, cit., 320 ss.
TÍTULO V

REGIME INTERNO EM MATÉRIA


DE IMpOSTO SOBRE A RENDA
No título anterior, ocupamo-nos da previsão da norma tributária de conflitos,
estudando o seu aspecto mais saliente, que é o elemento de conexão. Importa agora
debruçarmo-nos sobre a respectiva estatuição que, como se viu, contém a indicação
da norma aplicável a uma determinada situação jurídica plurilocalizada.
Pela diversidade das suas técnicas e dos seus objetivos, torna-se indispensável
analisar separadamente a disciplina unilateral e a disciplina convencional dos limites
e dos concursos de leis. Começamos pela primeira.
Em matéria de imposto de renda, a sistemática das normas de conflitos pressu-
põe uma distinção básica entre pessoas domiciliadas no exterior e pessoas domicilia-
das 110 país. Por sua vez, obriga a separar, dentro destas últimas, as pessoas físicas e
as pessoas jurídicas.
As pessoas - físicas ou jurídicas - domiciliadas no exterior apenas serão tributadas
quanto aos rendimentos de fonte nacional. O que significa que as normas tributárias in-
ternas apenas se aplicam aos fatos descritos no conceito-quadro "rendimentos" cujo
elemento de conexão (lex toci fontis) esteja situado no território do país.
As pessoas físicas e as pessoas jurídicas domiciliadas no país serão tributadas pela
totalidade dos seus rendimentos, seja qual for o local da sua produção, de tal sorte
que as normas tributárias internas se aplicam aos fatos cujo elemento de conexão
subjetivo (residência) esteja situado no território do país, embora o elemento de
conexão objetivo (fonte) esteja situado no exterior, podendo ocorrer assim um caso
de "extraterritorialidade"] .
Como se vê, a disciplina interna dos limites espaciais de aplicação das leis, atra-
vés de normas de delimitaçã0 2 , faz sugestivamente lembrar a técnica dos estatutários,
do período pré-savignyano, que delimitavam, dentro de uma ordem jurídica dada,
tantas esferas de aplicação quanto os "estatutos" a que elas se referiam.

1 Antes da Lei nO 9.249/95, que adotou o princípio da universalidade, as pessoas jurídicas


domiciliadas no país eram tributadas pelos rendimentos de fonte nacional, de tal sorte que as
normas tributárias internas se aplicavam apenas aos fatos cujo elemento de conexão "fonte"
se localizasse no território do país.
2 efr. supra, 41.
CAPÍTULO I
RESIDENTES NO PAÍS

SEÇÃO I
PESSOAS FÍSICAS. O PRINCíPIO DA UNIVERSALIDADE

N o Direito Tributário brasileiro, é o principio da universalidade (da totalidade,


da tributabilidade ilimitada ou do world-wide-income) que governa a tributação das
pessoas físicas l . O princípio da universalidade - cujas origens remontam à lei do im-
posto de renda prussiana, de 24 de julho de 1891, e ao imposto de renda americano
de 1913 2 - encontrava-se entre nós acolhido, no que tange às pessoas físicas, pelo
art. 21 do Regulamento do Imposto de Renda - RIR/8D, segundo o qual "entrarão
no cômputo do rendimento bruto, nas cédulas em que couberem ( ... ) VIII - os ren-
dimentos recebidos no exteriO'l; transferidos ou não para o Brasil) ainda que decorrentes de
atividade desenvolvida ou de capital situado no exterior, ressalvado o disposto nos arts.
13, parágrafos 2 e 4, e 14, parágrafos 5 e 6".
O mesmo princípio foi mantido na reforma que aboliu a tributação cedular, dis-
pondo o § 4° do art. 3° da Lei nO 7.713, de 22 de dezembro de 1988, consolidado
no art. 38 do RIR, que "a tributação independe da denominação dos rendimentos,
títulos ou direitos, da localização, condição jurídica ou nacionalidade da fonte, da ori-
gem dos bens produtores da renda e da forma de percepção das rendas ou proventos,
bastando para a incidência do imposto, o benefício do contribuinte por qualquer
forma e a qualquer título"3.
A respeito deste dispositivo legal, importa observar, em primeiro lugar, que, de
harmonia com a lógica do princípio da universalidade, torna-se irrelevante o local em
que se encontra a fonte de produção ou a fonte de pagamento da renda. Assim, o fato
de a fonte de produção ou de pagamento localizar-se no exterior (por exemplo, por

1 Todavia, era o regime territorial que vigorava até o Decreto-Lei nO 1.168, de 22.3.39. Cfr.
BULHÕES PEDREIRA, Imposto de Renda, Rio de Janeiro 1969, 283; MARY ELBE QUEIROZ, Im-
posto sobre a renda, cit., 178 SS.
2 Cfr. OITMAR BÜHLER, Principios de Derecho Internacional Tributaria (trad.), Madrid 1968,
220-221.
3 Cfr. HENRY TILBERY, O novo imposto de renda no Brasil, São Paulo 1989, 39.
Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

aí terem sido desenvolvidas atividades, por aí se encontrar situado o capital ou por aí


residir o devedor dos rendimentos) não impede a tributação no Brasil dos respectivos
rendimentos, uma vez que o elemento de conexão relevante é o domicz1io do contribuinte.
Além da "localização" da fonte, são também irrelevantes a sua "nacionalidade" ou "con-
dição jurídica", por esta última expressão devendo entender-se que a tributação incide
seja qual for a natureza jurídica da fonte pagadora, seja ela pessoa física, pessoa jurídica
ou entidade a ela equiparada, como um estabelecimento permanente. À irrelevância
da "forma de pagamento" já aludia a legislação anterior, ao proceder à distinção entre
rendimentos "recebidos" e rendimentos "transferidos"; a expressão rendimentos recebidos
significa rendimentos aufiridos,ganhos no exterior isto é, provenientes de fontes locali-
zadas no exterior. Estes rendimentos tanto podem ser conservados no exterior como ser
transferidos, creditados ou pagos no Brasil, não ficando, nestes últimos casos, isentos de
tributação, ao contrário do que sucede noutros sistemas, como o do Reino Unido, em
que, para os residentes não domiciliados, vigora o princípio da remittance basis4.
A pessoa física que receber de fontes situadas no exterior, rendimentos e ganhos
de capital que não tenham sido tributados na fonte, no país, fica sujeita ao regime de
tributação definitiva, quanto a ganhos de capital, de tributação separada, quanto à ati-
vidade rural e de recolhimento mensal, quanto aos demais rendimentos (arts. 8° e 25
da Lei nO 7.713, de 22 de dezembro de 1988; Instrução Normativa SRF nO 208, de 27
de setembro de 2002, arts. 14, 15 e 16), devendo notar-se que o imposto pago no ex-
terior poderá ser compensado na apuração do valor mensal a recolher e na declaração.
Uma atenuação ao princípio da universalidade consiste na outorga unilateral do
crédito de imposto, desde que exista reciprocidade, ou seja, na faculdade de ser deduzido
do imposto progressivo, apurado na declaração de ajuste anual, o imposto de renda
cobrado pelo país de origem, desde que não passível de restituição ou compensação
naquele país. A imputação prevista no art. 103 do RIR não é integral, mas ordinária,
visto que não pode exceder a diferença entre o imposto calculado sem a inclusão da-
queles rendimentos e o imposto devido com a inclusão dos mesmos rendimentos 5 •

SEÇÃO II
PESSOAS JURÍDICAS. Do PRINCÍPIO DA TERRITORIALIDADE AO
PRINCÍPIO DA UNIVERSALIDADE

§ 1° Os PRINCípIOS DA TERRITORIALIDADE E DA UNIVERSALIDADE

A plena compreensão do novo sistema de tributação da renda externa das pesso-


as jurídicas domiciliadas no Brasil, introduzido pela Lei nO 9.249, de 26 de dezembro
de 1995, pressupõe algumas considerações preliminares sobre os diversos métodos
conhecidos no Direito Comparado.

4 Cfr. INSRF na 208/02, art. 16, aludindo a rendimentos "transferidos ou não para o País".
5 efr. INSRF na 208/02, art. 16 § 6 0 •
Título V I Capo I I Residentes no País

De harmonia com o princípio da territorialidade6 , anteriormente vigente no Brasil,


nenhuma renda cuja fonte de produção se localize no exterior recai no âmbito de incidên-
cia do imposto de renda das pessoas jurídicas: nem a renda obtida diretamente através de
uma atividade funcional (o exercício do próprio objeto social) ou de uma atividade jurí-
dica (o exercício de direitos a rendimentos, tais como juros, rayalties e dividendos), nem
a renda obtida indiretamente através de uma organização de pessoas e bens localizada no
exterior, quer se trate de filiais ou sucursais, sem personalidade jurídica, quer se trate de
sociedades controladas ou coligadas, com individualidade jurídica própria.
Em certos países, como na França, o princípio da territorialidade aplica-se ape-
nas às filiais ou sucursais, consideradas como simples parte da matriz, conduzindo a
não reconhecer nem os ganhos nem as perdas incorridas no exterior, sem prejuízo de
tributação dos lucros efetivamente distribuídos pelas controladas e coligadas estabe-
lecidas no exterior7 •
No polo oposto ao princípio da territorialidade situa-se o princípio da universa-
lidade (ou do world-wide-income), segundo o qual toda a renda da pessoa jurídica deve
ser tributada no país de domicílio, incluindo a renda externa, seja esta decorrente de
atividade funcional ou jurídica, seja esta obtida através de filiais ou de subsidiárias8 • No

6 Na sua acepção mais restrita, relacionada com a conexão ao país da fonte, no sentido em
que KI..AUS VOGEL fala num ursprüngliche Bedeutung des Territorialprinzips: cfr. Der raumliche
Anwendungsbereich der Verwaltungsrechtsnorm, Frankfurt/Berlim 1965, 12l.
7 Cfr. S. N. FRoMMEL, Imposición de Filiales, Sucursales y Subsidiarias (tradução espanhola),
Madrid 1981,passim.
8 Sobre o sistema do domicílio, ver o estudo de Direito Comparado de CARLO DEGLI ABBATI,
La tassazione dei reddito delte società di capitali negli Stati membri delta Comunità Economica
Europea, Pádua 1973. A França permanece com um regime de em matéria de pessoas ju-
rídicas, pelo qual só são tributáveis em França os lucros das empresas exploradas em Franca.
Lucros e perdas, tanto de subsidiárias quanto de estabelecimentos, não são considerados. Foi,
porém, introduzido um regime pelo qual, mediante autorização do Governo, as sociedades
domiciliadas podem ter em consideração os resultados das suas empresas no exterior, con-
troladas direta ou indiretamente. Podem optar por dois regimes: o do lucro mundial e o do
lucro consolidado. No regime do lucro mundial, os lucros e as perdas obtidos através dos
estabelecimentos estáveis adicionam-se, compensando-se, com os lucros e as perdas registra-
das na matriz, no território do domicílio desta. O regime do lucro consolidado vai ainda mais
longe, posto permitir o adicionamento e compensação das subsidiárias controladas (expÚJita-
tions indirectes), mesmo que por 50%, promovendo assim o reconhecimento fiscal da uni-
dade do grupo de empresas e não apenas da pessoa jurídica, como sucede no primeiro caso.
Cfr. GUY GEST/GILBERT TIXIER, Droit FiscalInternational (2 a ed.), Paris 1990, 344 ss.; GOUT-
HIERE, Les impôts dans les affaires internationales, Paris 1991, 89-90; B. PLAGNET, Droit Fiscal
International, Paris 1986, 116 ss.; DUCCINI,Approche ftscale des contrats internationaux, Paris
1985,23; GERHARD LAULE, The Effict ofLosses in one Country on the Income Tax Treatment in
other Countries of an Enterprise or ofAssociated Enterprises engaged in International Activities
(relatório geral), CDFI LXIV-b (1979), 15; GUGLIELMO MAISTO, Imposizione dei redditi
prodotti all'estero e competitività internazionale, Diritto e Pratica Tributaria 1981-I, 1135;
AVERY JONES, Does the UK give Credit for Tax on a Permanent Establishment abroad?, in
Essays on International Taxation, 15, Deventer/Boston 1993, 69. Outros países concedem
a I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

que respeita às subsidiárias, com personalidade jurídica própria, a lógica do princípio da


universalidade conduz à tributação dos dividendos por esta distribuídos, que são renda
efetiva da sociedade controladora, mas não dos lucros acumulados ou retidos na subsi-
diária, que são renda própria desta, não tornada disponível para a controladora. Este é o
sistema adotado, via de regra, pela generalidade dos países mais desenvolvidos9 .

§ 2° O PRINCíPIO DA TERRITORIALIDADE NA LEGISLAÇÃO REVOGADA

Ao contrário do que sucede com a generalidade dos países exportadores de


capitais, que adotam o sistema do domicílio, da renda mundial (world-wide-income),
ou da imponibilidade ilimitada (unbeschrdnkte Steuerpflicht), pelo qual também as
pessoas jurídicas são tributadas no respectivo país de residência por todos os ren-
dimentos auferidos, independentemente do local da sua produção, o Brasil adotava
tradicionalmente, em matéria de imposto de renda das pessoas jurídicas, o principio
da territorialidade, pelo qual apenas ficavam sujeitos a tributo os rendimentos produ-
zidos no âmbito do seu território.
Este princípio decorria do art. 268 do RIR/80, segundo o qual "o lucro prove-
niente de atividades exercidas parte no país e parte no exterior somente será tributado
na parte produzida no país»; e do art. 157, § único, do mesmo diploma, que dispunha
que "a escrimração deverá abranger todas as operações do contribuinte, bem como
os resultados apurados anualmente em suas atividades no território nacional"lO.
A origem histórica do princípio da territorialidade, no que concerne à tributa-
ção das pessoas jurídicas no Brasil, foi exposta por BULHÕES PEDREIRA l l : "O imposto
de renda brasileiro, desde sua implantação, em 1924, adotou o critério territorial
para definir os sujeitos passivos do imposto, que são apenas as pessoas físicas e ju-
rídicas residentes ou domiciliadas no País. Quanto à definição da renda sujeita ao
imposto, a legislação também sempre adotou o critério territorial na tributação das
pessoas jurídicas domiciliadas no País e das pessoas físicas e jurídicas residentes ou
domiciliadas no exterior; apenas para as pessoas físicas residentes no País passou - a

um regime especialmente favorável a certos tipos de sociedades que efetuam investimentos


externos, considerados de particular relevância. É o caso do Reino Unido (Overseas Trading
Corporations), dos Estados Unidos (*stern Hemisphere Trading Corporations) e do Canadá
(Foreign Business Corporations). Cfr. J. L. STOLK, Die Besteuerung multinationaler J(onzerne ais
Einheit, St. Gallen 1972; S. BIANCHI, Steuerprobleme international verflochtener Gesellschaften,
Steuer und Wirtschaft 1964, 413.

9 Cfr. S. N. FROMMEL, cit., 23 ss.


10 Cfr. GILBERTO DE ULHÔA CANTO, Estudos e Pareceres de Direito Tributário, São Paulo 1975,
367 ss.
11 Cfr. Imposto de Renda - pessoa jurídica, I, Rio de Janeiro 1979, 204. Cfr. Também o Parecer
Normativo CST nO 62/75.
Título V I Capo I I Residentes no País .,m.
partir de 1939 - a adotar o critério político. As primeiras Leis sobre o imposto (nO'
4.625, de 1922, e 4.783, de 1923) e o RIR de 1924 adotavam o critério da terri-
torialidade para todas as hipóteses de incidência, definindo como tributáveis apenas
os rendimentos produzidos no País (RIR/24, arts. 1°, 15,20, a, e 59). A expressão
"atividades exercidas no País" foi introduzida pela Lei nO 4.984, de 31 de dezembro
de 1925 (art. 18), e a expressão "rendimento derivado de fontes nacionais" surgiu
em nossa legislação no art. 38 do RIR, de 1926 (Decreto nO 17.389), ao disciplinar
a tributação dos rendimentos de atividades exercidas parcialmente no País".
Todavia, o Decreto-Lei nO 2.397, de 22 de dezembro de 1987, afastando-se
radicalmente desta orientação, pretendeu submeter as pessoas jurídicas brasileiras ao
princípio da universalidade, dispondo no seu art. 7° que "serão computados no lucro
real das pessoas jurídicas de direito privado domiciliadas no País os resultados obti-
dos no exterior, diretamente ou através de filiais) sucursais) agências ou representações».
E acrescentava o § único que "o imposto de renda pago no exterior será considerado
redução do imposto de renda brasileiro, mas a redução não poderá implicar imposto
menor que o que seria devido sem a inclusão dos resultados obtidos no exterior".
Indo ainda mais longe, o Decreto-Lei nO 2.413, de 10 de fevereiro de 1988,
procurou também atingir os resultados obtidos não só através de filiais, mas também
de subsidiárias no exterior, determinando no art. 15 a revogação do art. 7° do Decre-
to-Lei nO 2.397/87 e a sua substituição pelo art. 8° do novo diploma, segundo o qual
"serão computados no lucro real das pessoas jurídicas de direito privado, domicilia-
das no País, os resultados obtidos no exterior, diretamente ou através de subsidiárias,
filiais, sucursais, agências ou representações".
Tais diplomas visaram assim aplicar às pessoas jurídicas o regime da universalida-
de, ou seja, do lucro mundial, à semelhança das legislações norte-americana e inglesa.
Mas foram ainda mais longe que estas, pois enquanto a "mundialização" adotada nes-
tes países abrange apenas os resultados das "explorações diretas", através de sucursais,
o Decreto-Lei nO 2.413/88 procurou atingir os resultados das "explorações indiretas",
através de subsidiárias, à semelhança do regime do lucro consolidado previsto na lei fran-
cesa, que, porém, só o admite a título excepcional e a requerimento do contribuinte 12 •
Dois meses passados após a entrada em vigor deste preceito, foi ele expressa-
mente revogado pelo art. 11 do Decreto-Lei nO 2.429, de 15 de abril de 1988, que
assim restabeleceu na sua plenitude o princípio da territorialidade, segundo o qual
não estão sujeitos a imposto no Brasil os resultados auferidos no exterior pelas pes-
soas jurídicas, diretamente ou através de subsidiárias ou filiais13.

12 efr.GOUTHIERE, Les impóts, 273 sS.; B. PLAGNET, Droit Fiscal International, 148 sS.
13 O art. 11 acrescentava ainda que "a tributação dos resultados das atividades de navegação
marítima, aérea, de outros transportes e meios de comunicação em países estrangeiros con-
tinuará regida pelas disposições do art. 63 da Lei nO 4.506, de 30 de novembro de 1964".
Sobre a discussão a respeito de saber se a revogação dos citados diplomas teria ou não o
alcance de restabelecer o princípio de territorialidade, cfr. a 4 a edição desta obra, 309 sS.
Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Com efeito, na consolidação operada pelo RIR/94, o princípio da territorialida-


de foi formalmente reiterado através de preceitos que reproduziram os já citados arts.
268 e 157, § único, do RIR/80 (respectivamente os arts. 337 e 197, § único).
Tal princípio aplicava-se também à contribuição social sobre o lucro líquido, haja
em vista o disposto no art. 57 da Lei nO 8.981, de 20 de janeiro de 1995 (na nova
redação da Lei nO 9.065, de 20 de junho de 1995), segundo a qual "aplicam-se à con-
tribuição social sobre o lucro (Lei nO 7.689 de 1988) as mesmas normas de apuração
e de pagamento estabelecidas para o imposto de renda das pessoas jurídicas, inclusive
no que se refere ao disposto no art. 38, mantidas a base de cálculo e as alíquotas pre-
vistas na legislação em vigor, com as alterações introduzidas por esta lei".
O art. 7° do Decreto-Lei nO 2.397/87 e o art. 8° do Decreto-Lei nO 2.413/88
(hoje revogados) procederam à distinção entre atividades exercidas no exterior direta
e indiretamente: no primeiro caso, é a própria pessoa jurídica domiciliada no Brasil
que exerce, no exterior, a totalidade ou parte da sua atividade, independentemente de
urna organização de pessoas e bens; no segundo caso, a atividade é exercida através
de subsidiárias (dotadas de personalidade jurídica) ou de filiais, sucursais, agências
ou representações (estabelecimentos permanentes sem personalidade jurídica).
A atividade direta no exterior comporta três modalidades básicas: o exercício
pela própria pessoa jurídica, em território estrangeiro, da atividade de produção de
bens e serviços que constitui o seu objeto social; a cessão do uso de fatores de produ-
ção para atividades de produção exercidas em território estrangeiro, mediante paga-
mento de juros ou royalties, rendimentos esses que se consideram produzidos no ex-
terior; a alienação de bens ou direitos situados no exterior, de que decorram ganhos
de capital. A primeira modalidade corresponde ao conceito de atividade funcional; as
duas últimas, ao de atividade jurídica.
O princípio da territorialidade envolvia os seguintes corolários:
(a) Não tributação dos rendimentos e ganhos de capital decorrentes de ativi-
dade jurídica e funcional obtidos no exterior, ou seja, imputáveis a fontes
pagadoras domiciliadas no exterior14 ;
(b) Nas atividades mistas, exercidas parcialmente no Brasil e no exterior, só
eram tributáveis os resultados atribuíveis à parte exercida no BrasiF5;
(c) Não tributação dos lucros imputáveis à atividade indireta no exterior atra-
vés de filiais e sucursais estrangeiras, ainda que transferidos para o Brasil
(Parecer Normativo CST nO 62/75)16;
(d) Não tributação dos lucros imputáveis à atividade indireta no exterior através
de controladas e coligadas constituídas ou domiciliadas no exterior, dispondo
o art. 23, § único, do Decreto-Lei nO 1.598/77, na redação do Decreto-Lei
nO 1.648/75, art. 1°, inciso N (art. 332, § único, do RIR), que "não serão

14 Cfr. ALBERTO XAVIER, Direito Tributário Internacional do Brasil (4a ed.), 313 ss.
a
15 Cfr. ALBERTO XAVIER, op. cit., (4 ed.), 31l.
a
16 Cfr. ALBERTO XAVIER, op. cit., (4 ed.), 315 ss.
Título V I Capo I I Residentes no País -"i
computados na determinação do lucro real as contrapartidas de ajuste do
valor do investimento ou de amortização do ágio ou deságio na aquisição,
nem os ganhos ou perdas de capital derivados de investimentos em socieda-
des estrangeiras coligadas ou controladas que não funcionem no país"17.

§ 3° O PRINCÍl'IO DA UNIVERSALIDADE

Inovando radicalmente na matéria e rompendo uma antiga tradição, a Lei nO


9.249/95 aboliu o princípio de territorialidade no que toca ao imposto de renda das
pessoas jurídicas, consagrando em sua substituição o princípio da universalidade, ao
dispor no caput do art. 25 que "os lucros, rendimentos e ganhos de capital auferidos
no exterior serão computados na determinação do lucro real das pessoas jurídicas
correspondente ao balanço levantado em 31 de dezembro de cada ano"18.
Neste dispositivo, enquanto a expressão "rendimentos e ganhos de capital" se
aplica à atividade direta no exterior, o conceito de "lucros" reporta-se à atividade in-
direta exercida através de filiais, sucursais, controladas ou coligadas no exterior (cfr.
Instrução Normativa nO 213, de 7 de outubro de 2002, art. 1°, §§ 1° e 2°).
Este alargamento do âmbito de incidência do imposto de renda das pessoas
jurídicas não atingiu inicialmente a contribuição social sobre o lucro líquido (CSLL)
criada pela Lei nO 7.689/88, que se manteve exclusivamente territorial. O certo,
porém, é que a partir da Medida Provisória nO 1.838-7, de 29 de julho de 1999,
também esta contribuição passou a reger-se pelo princípio da universalidade.

A) Atividade direta

Ao contrário do que sucedia ao abrigo do princípio de territorialidade, passaram


a ser tributáveis os rendimentos e ganhos de capital imputáveis a atividades exercidas
diretamente no exterior no âmbito de uma atividade fUncional (exploração do próprio
objeto social) ou de uma atividade jurídica (com a consequente tributação de juros,
royalties, lucros, dividendos pagos por sociedades não controladas ou coligadas, imputá-
veis a fontes localizadas no exterior). É o que resulta do caput do art. 25, atrás citado.
Note-se que este regime é apenas aplicável às pessoas jurídicas domiciliadas no
Brasil e não às filiais ou sucursais de sociedades estrangeiras instaladas no Brasil, as
quais são apenas tributáveis em relação aos lucros produzidos no Brasil, pois não
faria sentido tributar universalmente uma filial de sociedade estrangeira, quando a
matriz é também tributada universalmente no seu país de domicílio.

17 efr. ALBERTO XAVIER, op. cit., (4a ed.), 318 S8.


18 TACIANA STANISLAU AFONSO BRADLEY ALVES, O princípio da renda mundial no Direito brasilei-
ra, in HELENa TÔRRES (arg.), Direito Tributário IntemacionalAplicado, São Paulo 2003, 605.
I EfI;J I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier . - ~_ _......;.;....._ _ _ _ _....

B) Atividade indireta através de filiais e sucursais no exterior

Os lucros das filiais e sucursais estrangeiras são adicionados integralmente ao


lucro líquido, para determinação do lucro real correspondente ao balanço levantado
no dia 31 de dezembro de cada ano (art. 25 da Lei nO 9.249/95). Esta regra viria a
ser modificada pela Instrução Normativa nO 38/96 (art. 2°, § 1° e § 2°), no sentido
de que a adição apenas deveria ocorrer no ano-calendário em que tivessem sido dis-
ponibilizados para a pessoa jurídica domiciliada no Brasil, ou seja, em que tivessem
sido creditados ou pagos à matriz.
Certo é, porém, que a Lei nO 9.532/97 (art. l°, § l°, a) considerou tais lucros
disponibilizados na data do balanço no qual tiverem sido apurados, fazendo coinci-
dir necessariamente o momento da "disponibilização" com o momento da apuração,
já que, não tendo as filiais personalidade jurídica para efeitos de Direito privado, elas
não praticam um ato comparável ao da distribuição de dividendos praticado pelas
sociedades coligadas ou controladas.
A verdade é que os rendimentos auferidos e as despesas incorridas pelas filiais
estrangeiras não são registrados direta e imediatamente na escrituração da matriz bra-
sileira, antes são considerados sinteticamente para efeitos de apuração de um resultado
líquido no seu próprio balanço, resultado esse que será adicionado ao da matriz brasi-
leira (art. 1°, §§ 1° e 4°, da Instrução Normativa nO 213/02), não ocorrendo, porém,
o fenômeno da "distribuição" de lucros, dada a inexistência de personalidade jurídica.
Note-se que, ao contrário do que sucede com as filiais ou sucursais de socieda-
des estrangeiras no Brasil, entidades às quais a lei interna brasileira atribui personali-
dade jurídica para efeitos estritamente fiscais l9 , as filiais de sociedades brasileiras no
exterior não gozam, em face da lei fiscal brasileira, de personalidade jurídica própria,
sendo-lhes, porém, aplicável a teoria da autonomia patrimonial e da separação contábil
que vigora em relação aos estabelecimentos permanentes em geral.

§ 4° O REGIME DE TRANSPARÊNCIA FISCAL INTERNACIONAL DAS COLIGADAS E


CONTROLADAS NO EXTERIOR

A) 1" período: a Lei nO 9.249/95

a) A transparência fiscal internacional e a tributação extraterritorial

Em matéria de sociedades controladas e coligadas no exterior, o art. 25 da Lei


nO 9.249/95 veio dispor nos seus §§ 2° e 3° que os lucros auferidos por controladas
e coligadas no exterior, de pessoas jurídicas domiciliadas no Brasil, serão computados

19 efr. ALBERTO XAVIER, Direito Tributário Internacional do Brasil (6a ed.), Rio de Janeiro 2004,
639 ss.
Título V I Capo I I Residentes no País .'1'
na apuração do lucro real mediante adição ao respectivo lucro líquido, na proporção
da participação da pessoa jurídica no capital da controlada ou da coligada.
E o § 6° do mesmo artigo determinava que "os resultados da avaliação dos investi-
mentos no exterior, pelo método da equivalência patrimonial, continuarão a ter o trata-
mento previsto na legislação vigente, sem prejuízo do disposto nos §§ 1°, 2° e 3°", dis-
posição esta corretamente interpretada pelo art. 11 da Instrução Normativa nO 38/96 no
sentido de que "a contrapartida do ajuste de investimento no exterior, avaliado pelo mé-
todo da equivalência patrimonial, não será computada na determinação do lucro real".
Trata-se de disposição que visa a esclarecer que, se os lucros das controladas e
coligadas estrangeiras são diretamente adicionados ao lucro líquido da controladora
brasileira, estes mesmos lucros não podem ser novamente considerados como ele-
mentos da equivalência patrimonial que os reflete, sob pena de dupla tributaçã020 .
É importante salientar que este sistema de tributação vai mais longe que o prin-
cípio da universalidade, na pureza dos seus contornos, pois manda adicionar ao lucro
da sociedade domiciliada no Brasil a totalidade do lucro obtido pelas controladas ou
coligadas no exterior, na proporção da participação no capital social destas, ainda que
tais lucros tenham sido integralmente retidos e não distribuídos. Assim sendo, o im-
posto brasileiro atingiria renda que não é da própria sociedade brasileira, mas renda
de titularidade jurídica de sociedades estrangeiras independentes. Trata-se, portanto,
de um sistema de "universalidade ampliada" de tributação extraterritorial ou ultrater-
riorial de ultraterriorialidade ofensiva, no dizer de ROSEMBU]21.
O sistema de transparência fiscal internacional consagrado na Lei nO 9.249/95
era, porém, aplicável a todas e quaisquer sociedades estrangeiras controladas ou coli-
gadas, sem as ressalvas e limitações restritivas das leis estrangeiras "antiabuso", nota-
damente as de tais sociedades se localizarem em países de baixa tributação e de a sua
renda ser essencialmente "passiva", ou seja, não produtiva ou não operacional, pelo
que não revestia a natureza de um "regime CFC" propriamente dito, de aplicação
excepcional, mas de uma modalidade técnica de tributação de alcance geraJ22.
E daí que JOÃo FRANCISCO BIANCO e Luís EDUARDO SCHOUERI afirmem que ela
ofende o princípio da proporcionalidade, dada a inadequação e a desnecessidade dos
meios adequados (legislação contendo regra genérica e não restrita a certos territó-
rios e rendimentos) para atingir os fins antielisivos em vista23 .

20 Trata-se de norma de não incidência, de alcance declaratório, e não de isenção, como susten-
ta (aliás na lógica da sua tese) ANDRÉ MARTINS DE ANDRADE, op. cit., 159. Cfr. também J. F.
BrANCO, Transparência fiscal internacional, cit., 62.
21 TULlo ROSEMBUJ, Transparencia fiscal internacional. Aspectos críticos (separata da Revista de la
Economia Social y de la Empresa 27/28); ID., Derecho Fiscal Internacional, Barcelona 2001, 174 sS.
22 Cfr. ANDRÉ MARTINS DE ANDRADE, A tributação universal de renda empresarial, op. cit., 136.
Sobre as CFC em geral já nos debruçamos no capítulo deste livro dedicado à elisão fiscal
internacional (cfr. supra) para o qual remetemos.
23 Cfr. J. F. BJANCO, Transparência fiscal internacional, cit., 80 sS.; L. E. SCHOUERI, Transparência
fiscal, proporcionalidade e disponibilidade, RDDT, nO 142, 2007, 39 sS.
I @ I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

A adição direta ao lucro de sociedade brasileira do lucro das controladas e coli-


gadas no exterior, independentemente de este ter sido distribuído ou não (designada
na lei inglesa sobre as Controlled Foreign Corporations como apportionment offoreign
accumulated income) representa, pois, a concepção das sociedades estrangeiras como
"sociedades fiscalmente transparentes", cuja personalidade jurídica é desconsiderada
ex lege para efeitos fiscais, de tal modo que os seus lucros se consideram automatica-
mente distribuídos para as sociedades brasileiras, que passarão a ser tributadas numa
arising basis e não numa distribution basis.
Desta adição imediata do lucro de controlada ou coligada estrangeira decorre
logicamente a não tributação dos dividendos eventualmente distribuídos, já que estes se
encontram incluídos no lucro que foi previamente adicionado, independentemente
de distribuição. E daí que, para evitar a dupla tributação dos mesmos lucros, todas
as leis estrangeiras que consagram uma tributação automática sejam expressas em
estatuir a exclusão dos dividendos efetivamente distribuídos de uma nova tributação
na sociedade receptora.
Aliás, a exclusão da tributação dos dividendos distribuídos é pacificamente ado-
tada pela generalidade dos países que adotam o sistema das controlled foreign corpora-
tions. Também na Lei nO 9.249/95 não há previsão legal expressa para a tributação
autônoma dos dividendos distribuídos por controladas ou coligadas estrangeiras 24 .

b) Os obstáculos

(i) Incompatibilidade com a exigência da disponibilidade


da renda constante do art. 43 do Código Tributário Nacional
Como se viu, pelo sistema da Lei nO 9.249/95, uma vez apurados os lucros das
controladas e coligadas no exterior, serão eles adicionados ao lucro líquido da pessoa
jurídica controladora ou coligada domiciliada no Brasil, na proporção da participa-
ção societária detida por esta no capital social da sociedade domiciliada no exterior,
considerada "transparente", independentemente, pois, da sua efetiva distribuição ou
de qualquer outro ato equivalente que caracterize o efetivo ingresso daqueles resul-
tados no patrimônio da sociedade domiciliada no País.
Assim, as pessoas jurídicas domiciliadas no País que detenham participações em
controladas ou coligadas no exterior terão seus resultados tributáveis acrescidos por
lucros em relação aos quais não têm ainda plena disponibilidade econômica ou jurí-
dica, o que contraria o texto do Código Tributário Nacional, que, ao definir em seu
art. 43 o fato gerador do imposto de renda, delimitou a sua hipótese de incidência
àquelas situações em que o contribuinte tenha adquirido a disponibilidade econômica
ou jurídica de renda e proventos de qualquer natureza. Consequentemente, não podia

24 efr. neste sentido Luís EDUARDO SCHOUERl/MIGUEL HlLU NETO, op. cit., 128.
Título V I Capo I I Residentes no País IB I

o legislador ordinário incluir na definição dos elementos que irão constituir a renda
do contribuinte para compor a base de cálculo do imposto qualquer situação que
contrarie aquela regra, isto é, que não se caracterize como renda disponível, econô-
mica ou juridicamente25 •
Ora, é inequívoco que os lucros auferidos pelas pessoas jurídicas, enquanto não
forem objeto de atos que formalizem a sua retirada do respectivo patrimônio, con-
tinuam a pertencer a esta pessoa jurídica e não a seus acionistas ou sócios. Estes
têm, é certo, uma expectativa de direito sobre aqueles lucros, os quais porém não se
transferem para os respectivos patrimônios enquanto não praticados os atos jurídicos
adequados à deslocação jurídica dos lucros do patrimônio das sociedades estrangeiras
para o patrimônio da sociedade brasileira.
Não se verificando qualquer ato jurídico da pessoa jurídica estrangeira que de-
termine a transferência dos lucros da sociedade para os seus sócios ou acionistas, es-
tes não terão adquirido o direito de dispor daqueles valores, pelo que não podem os
mesmos ser tributados, por não configurarem renda disponível, mas renda potencial,
ou seja, uma mera expectativa.
Questão similar foi objeto de manifestação do Supremo Tribunal Federal, o
qual, ao julgar parcialmente inconstitucional a incidência do imposto sobre o lucro
líquido instituído pela Lei nO 7.713/88, reconheceu a indisponibilidade dos lucros
ainda não distribuídos e, por conseguinte, a impossibilidade da incidência do impos-
to de renda sobre aqueles resultados como uma antecipação do imposto dos acionis-
tas de pessoas jurídicas domiciliadas no País 26 •

25 ANTONIO CARLOS GARCIA DE SOUZA/GILBERTO DE ULH6A Cfu'lTo/lVAN DE PORTO ALEGRE


MUNIZ, in Cadernos de Pesquisas Tributárias 11 (1986),40.
26 RE 172.058-1 SC, em decisão de 30 de junho de 1995, do Plenário do STE A decisão em
referência aplica-se na sua integralidade à hipótese ora analisada, extraindo-se do voto do
Ministro MARCO AURÉLIO, relator naquele processo, passagens que não permitem a exis-
tência de dúvidas quanto ao momento em que os sócios das pessoas jurídicas adquirem a
disponibilidade sobre os lucros por estas auferidos: "Ora, a ordem jurídica revela-nos que
a aquisição da disponibilidade, quer econômica ou jurídica dos lucros líquidos das pessoas
jurídicas, não ocorre, quanto ao sócio, acionista ou quotista, na data da apuração, ou seja,
do encerramento do período-base. É que a legislação vigente - Lei nO 6.404/76 - afasta
a automaticidade indispensável a que se possa cogitar da aquisição da disponibilidade. À
assembleia geral ordinária da sociedades anônimas compete deliberar sobre a destinação
do lucro líquido do exercício e a distribuição dos dividendos (inciso II do art. 132), sendo
que, juntamente com as demonstrações financeiras do exercício, os órgãos da administração
apresentarão à assembleia geral ordinária proposta sobre a destinação acertada ao lucro lí-
quido do exercício. Pois bem, diante do contexto legal supra, impossível é dizer da aquisição
da disponibilidade jurídica pelos acionistas com a simples apuração, e na data respectiva,
do lucro líquido pelas pessoas jurídicas. O encerramento do período-base aponta-o, mas o
faz relativamente a situação que não extravasa o campo de interesses da própria sociedade.
Ocorre, é certo, uma expectativa, mas, enquanto simples expectativa, longe fica de resultar
na aquisição da disponibilidade erigida pelo art. 43 do Código Tributário Nacional como
fato gerador. Em outra passagem, analisa o Ministro Relator a possibilidade de atuar-se no
I &Im I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

o art. 35 daquela lei criou uma nova incidência sobre o lucro produzido pela
pessoa jurídica, quer distribuído, quer não, considerando que tal nova incidência é de
conta do sócio - verdadeiro contribuinte - e não da sociedade - mera fonte pagadora
responsável, e considerando ainda que tal nova incidência é devida exclusivamente
na fonte, não se incluindo portanto no rendimento bruto tributável junto às pessoas
físicas. Considerou, assim, como rendimento do sócio não só o lucro distribuído pela
sociedade, mas também os lucros não distribuídos que permanecem na titularidade
da pessoa jurídica e que podem nunca vir a ser distribuídos 27 •
Rigorosamente o mesmo que sucede com o regime de transparência fiscal inter-
nacional, que incide sobre o sócio e recai sobre lucros cuja destinação ainda é incerta.
Com efeito, o Supremo Tribunal Federal declarou a inconstitucionalidade do
art. 35 da Lei nO 7.713/88, no que concerne às sociedades anônimas, por enten-
der que a destinação do lucro depende sempre de deliberação de Assembleia Geral,
não configurando disponibilidade jurídica e econômica a simples apuração do lucro
liquido, pela sociedade, na data do encerramento do balanço. Todavia, referido pre-
ceito não padeceria de inconstitucionalidade quando aplicado ao titular da empresa
individual e ao sócio quotista, mas neste último caso somente quando o contrato
social previsse, por si só, a disponibilidade imediata, quer econômica, quer jurídica,
do lucro líquido apurado.
É evidente a aplicação do mesmo raciocínio desenvolvido pelo Supremo Tribu-
nal Federal à obrigatoriedade contida na Lei nO 9.249/95 de se incluir no lucro tri-
butável de pessoas jurídicas domiciliadas no Brasil os lucros apurados em sociedades
controladas ou coligadas domiciliadas no exterior. É que, num como noutro caso,
está-se diante de tributação de lucros ainda não tornados disponíveis aos contribuin-
tes em face da ausência de um requisito essencial: o ato formal da sociedade geradora
dos lucros, por intermédio de seu órgão competente, tendo por objeto atribuir, me-
diante deliberação social, os lucros a seus sócios ou acionistas 28 .

campo da presunção do auferimento da renda pelos acionistas na data da apuração do lucro


líquido: "Descabe, na hipótese, partir para o campo da presunção, equiparando a apuração
do lucro líquido à aquisição da disponibilidade pelos sócios. É que o recurso a tal método
normativo - da presunção legal - pressupõe harmonia com os princípios norteadores do
direito, especialmente do direito constitucional e, mais do que isso, também com os princí-
pios lógicos da identidade, não contradição e do terceiro excluído. Os lucros apurados em
balanço de pessoa jurídica integram o patrimônio desta e não dos sócios, já que estes, con-
siderados isoladamente, deles não dispõem, quer sob o ângulo econômico, quer até mesmo
sob o jurídico".

27 Para maiores desenvolvimentos sobre o 1LL, veja-se a 4 a edição deste livro, 1998, 389 ss.
28 Cfr. JOÃo DODSWORTH CORDEIRO GUERRA, A sujeição tuJ imposto sobre a renda, no Brasil, do
lucro auferido no exterior por pessoas jurídicas brasileiras e suas filiais, coligadas e controladas,
ABDF (1996), 57 sS.; Luís EDUARDO SCHOUERJ/MIGUEL HIW NETO, Sobre a tributação dos
"lucros disponibilizados" do exterior, in VALDIR DE OLIVEIRA ROCHA (org.), Imposto de Ren-
da - alterações fodamentais, vol. 2, São Paulo 1998, 122. Não vislumbramos que a diferença
~
......•...•..... Título V I Capo I I Residentes no País
~

o
regime de transparência fiscal internacional, isto é, de tributação por adição
automática dos lucros das coligadas e controladas estrangeiras, independentemente
da declaração de dividendos pelos órgãos deliberativos da controlada ou coligada
estrangeira, que os tornem disponíveis para seu sócio ou acionista, no Brasil, conduz
a que, na verdade, se tribute não a renda da pessoa jurídica brasileira, mas um ganho
de sua controlada ou coligada, pessoa jurídica estrangeira, que só se traduzirá em
renda da pessoa jurídica brasileira se e quando lhe for atribuído por ato da controlada
ou coligada no exterior.
É, pois, evidente a incompatibilidade deste regime com o art. 43 do Código
Tributário Nacional, com eficácia de lei complementar e, portanto, com força hierár-
quica superior à da lei ordinária.

(ii) Incompatibilidade com os tratados contra a dupla tributação

(a) A incompatibilidade genérica do regime da lei brasileira com o art. 7" dos tratados
O regime de transparência fiscal internacional, criado pela Lei nO 9.249/95, re-
velava-se também incompatível com os tratados contra a dupla tributação celebrados
pelo Brasil, com base em considerações igualmente aplicáveis ao art. 74 da Medida
Provisória nO 2.158-35/01, como adiante se verá29 •
O art. 7° dos referidos tratados (que seguem a redação do art. 7° da Conven-
ção Modelo da OCDE) dispõe, no seu § 1°, que "os lucros de uma empresa de um
Estado Contratante só podem ser tributados nesse Estado, a não ser que a empresa
exerça sua atividade no outro Estado Contratante por meio de um estabelecimento
permanente aí simado. Se a empresa exercer sua atividade deste modo, os seus lucros
podem ser tributados no outro Estado, mas unicamente na medida em que forem
imputáveis a esse estabelecimento permanente".
Estabelecimento permanente é, nos termos do art. 5°, § 1°, dos tratados (se-
guindo também o art. 5° da Convenção Modelo da OCDE) "uma instalação fixa
onde a empresa exerça toda ou parte da sua atividade", compreendendo notadamen-
te um local de direção, uma sucursal, um escritório, uma fábrica, uma oficina, uma
mina ou uma pedreira.
São, pois, "estabelecimentos permanentes", para efeito dos tratados, as sucur-
sais ou filiais destituídas de personalidade jurídica própria.

apontada por A.,"DRÉ MARTINS DE ANDRADE, baseado na sistemática de imposto de renda na


fonte, altere os dados do problema, pois sempre o sócio será tributado por lucros que po-
dem nunca vir a ser distribuídos. efr. Os limites da tributação universal da renda e a ADI nO
2588, RFDT, nO 29, 2007, 24 sS. efr. ainda J. F. BIANco, Transparência fiscal internacional,
cit., 87 ss., sublinhando a identidade de situações.

29 efr. infra, 416.


I D I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Aplicando este preceito ao caso de uma empresa brasileira (EB) que tenha, por
exemplo, em Portugal, uma filial (FP) ou controlada (CP), podem extrair-se as se-
guintes conclusões:
a) O Brasilpode tributar os lucros da FP, por esta constituir um estabelecimen-
to permanente no exterior (P frase, 2 a parte, do § 1°);
b) Portugalpode tributar os lucros da FP unicamente na medida em que forem
imputáveis a esse estabelecimento (2 a frase do § 1°);
c) Só Portugal ("competência exclusiva") pode tributar os lucros auferidos em
Portugal pela Cp, pois CP é empresa portuguesa (1 a frase, 1a parte, do § 10);
d) O Brasil não pode tributar os lucros auferidos em Portugal pela Cp, pois só
pode tributar estabelecimentos permanentes no exterior e não entidades
com personalidade jurídica própria existentes no outro Estado.
A confirmar esta última afirmação está o § 6° do art. 5° dos tratados, segundo o
qual "o fato de uma sociedade residente de um Estado Contratante controlar ou ser
controlada por uma sociedade residente do outro Estado Contratante ou que exerce
a sua atividade nesse outro Estado, quer seja através de um estabelecimento estável,
quer de outro modo, não é, por si, bastante para fazer de qualquer dessas sociedades
estabelecimento permanente da outra".
Os conceitos de "empresa de um Estado Contratante" e "empresa do outro
Estado Contratante" usados no art. 7° significam, nos termos do art. 3°, § 1°, alínea
f, "respectivamente, uma empresa explorada por um residente de um Estado Con-
tratante e uma empresa explorada por um residente do outro Estado Contratante".
Quando as empresas adotam a forma jurídica de sociedade ou qualquer outra que
as permita qualificar como "pessoas" e, por consequência, como "pessoa residente",
para efeitos do art. 4°, ela é automaticamente considerada "empresa do Estado de
residência"30. Assim, por exemplo, a sociedade domiciliada em Portugal, controlada
por empresa brasileira, é considerada "empresa portuguesa", só podendo ser tribu-
tada por Portugal.
É isto o que resulta também dos Comentários da OCDE (art. 5°, parágrafo 7°,
item 40):
"It is generally accepted that the existence of a subsidiary company does not) or itselj;
constitute that subsidiary company a permanent establishement ofits parent company.
This flllows from the principle that) for the purpose oftaxation) such a subsidiary com-
pany constitutes an independent legal entity".
O art. 7° § 1° contém, na sua primeira parte, uma norma de reconhecimento de
competência exclusiva do país em que se encontra domiciliada a sociedade controlada,
como resulta claramente da expressão literal "só podem ser tributados"3! , ao invés da

30 Cfr. KLAUS VOGEL, On Double Taxation Conventions, 1997, 184.


31 Cfr. sobre as normas de reconhecimento de competência exclusiva, infra, 55] ss.
Título V I Capo I I Residentes no País -H!-
segunda parte do mesmo parágrafo que contém uma norma de competência cumulativa
se se tratar, não de pessoa jutídica independente, mas de estabelecimento permanente.
Como recorda OTIMAR BÜHLER32 , referida cláusula teve a sua origem em impe-
dir a aplicação, no âmbito das relações internacionais, da chamada "teoria do órgão"
(O;;gantheorie) consagrada em vários países europeus nas primeiras décadas do sé-
culo XX por influência da jutisprudência e da lei alemã de 1934, que concebiam os
grupos de sociedades, baseados numa relação de controle ou domínio, como uma
unidade, operando-se na controladora uma consolidação dos ganhos e perdas do
grupo. E daí as sociedades controladas serem consideradas meros "órgãos" do con-
junto, sendo desconsiderada ou mesmo recusada a sua personalidade jurídica.
Como é natural, a tentativa de aplicação desta doutrina à esfera internacional
conduziria a uma deslocalização dos poderes tributários dos Estados onde se situam
as empresas controladas para o Estado de sociedade controladora, conduzindo a uma
plúrima tributação dos mesmos lucros.
Assim, sobretudo por influência dos países anglo-saxônicos, que sustentavam a
individualidade jutídica e a tributação autônoma das subsidiárias, sutgiu a regra de
reconhecimento de competência exclusiva ao Estado de localização destas, constante
já do Modelo Bilateral de Convenção Tributária da Liga das Nações (Modelo de
Londres de 1946) como uma verdadeira "cláusula antiórgão"33.
O objetivo da cláusula de competência exclusiva está, pois, em afirmar a su-
premacia do princípio da separação (Trennungsprinzip) sobre a teoria do órgão, em
matéria de controladas e subsidiárias em geral, e impedir que os Estados de domicílio
das controladoras tomem em consideração, por qualquer forma ou técnica legislati-
va, os lucros das controladas ou coligadas estrangeiras como base de cálculo dos seus
próprios tributos incidentes sobre as sociedades-mãe.
Não é demais insistir em que a cláusula de competência exclusiva do art. 7°
dos tratados constitui o "coração" dos tratados contra a dupla tributação. Sem ela,
qualquer tratado fica privado de sentido, pois abre as portas a uma guerra fiscal entre
Estados, permitindo que a riqueza tributável em uma delas seja objeto de pretensões
fiscais cumulativas de outras, invasivas de soberania estrangeira. É o que ocorreria se
os Estados Unidos pudessem tributar naquele país os lucros das subsidiárias brasilei-
ras, o Brasil pudesse tributar os lucros das suas controladas na Dinamarca, e até ad
inftnitum em todos os elos de uma cadeia vertical de controle.
A incompatibilidade com os tratados contra a dupla tributação decorre ainda de a
sistemática por eles adotada apenas prever um mecanismo de eliminação da dupla tribu-

32 Cfr. BÜHLER, Princípios de Derecho Internacinal Tributário, trad. esp., Madrid, 1968, 133 ss.;
FROMMEL, op. cit., 50 a 1Ol.
33 Dispunha o artigo VIII que os lucros não distribuídos por uma companhia que tem o seu
domicílio fiscal em um Estado Contratante não estarão sujeitos a nenhum imposto no outro
Estado Contratante em razão do fato de os lucros não distribuídos representarem, no todo
ou em parte, rendimento derivado do território do outro Estado.
Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

tação dos lucros distribuídos quando a tributação ocorre no momento da distribuição,


tendo esta como fato gerador, como sucede com o art. 10 combinado com o art. 23.
Essa sistemática não prevê, porém, que a tributação ocorra em momento anterior ao da
distribuição efetiva, quando ainda são lucros não distribuídos pela pessoa jurídica estran-
geira, pelo que a dupla tributação neste caso não tem no tratado sistema de eliminação,
que fica exclusivamente ao sabor da vontade das leis internas dos Estados em causa.
Por outro lado ainda a desaplicação da regra de competência tributária exclusi-
va, atribuindo às subsidiárias o mesmo tratamento fiscal dos estabelecimentos per-
manentes (filiais ou sucursais) traduz-se na desconsideração da sua personalidade
jurídica e, com isso, na violação do art. 3° que define o conceito de "pessoa", não
permitindo que um Estado desconsidere a personalidade jurídica outorgada pelo
ordenamento jurídico do Estado estrangeiro do território da constituição da subsidi-
ária, desde que conforme com aquela definiçãd 4 •
Infringiria, por isso, frontalmente, os tratados qualquer tentativa de aplicação
de preceito legal que determinasse a adição à base de cálculo do imposto (lucro
líquido da sociedade brasileira, contribuinte de um Estado) dos lucros próprios da
sociedade controlada domiciliada em outro Estado contratante, pois tal significaria
o Brasil arrogar-se uma competência tributária cumulativa, quando o tratado é ex-
presso em atribuir ao Estado de domicílio da controlada ou coligada no exterior uma
competência tributária exclusiva 35 •
Note-se, porém, que os tratados contra a dupla tributação não proíbem que no
Brasil sejam tributados dividendos distribuídos por empresas estrangeiras a sócios
domiciliados no Brasil.
Com efeito, nos termos da repartição dos poderes tributários dos diversos Es-
tados operada pelas convenções contra a dupla tributação que seguem o modelo da
OCDE, procedeu-se a uma nítida distinção entre os lucros das empresas e os dividendos
por elas distribuídos. Enquanto os lucros das empresas estão sujeitos à regra da atri-
buição de competência tributária exclusiva ao país de domicílio da empresa que os
obteve (art. VII da Convenção Modelo), com a consequente exclusão de competên-
cia do país de domicílio da sociedade que participa no seu capital, os dividendos estão
sujeitos à regra de atribuição de competência tributária cumulativa do país de domi-
cílio da empresa que os distribui (país de fonte) e do país de domicílio da empresa
quc os aufcrc (país de residência).
E isto porque o lucro da empresa estrangeira, dotada de personalidade jurídica
própria, é renda dessa mesma empresa e não da sua controladora, enquanto o dividen-
do distribuído, tendo embora a sua fonte na empresa estrangeira, é renda do sócio.

34 Cfr. Luís EDUARDO SCHOUERI, Transparência fiscal internacional, proporcionalidade e disponibi-


lidade, cit., 45; HELENO TAVElRA TORRES, Lucros auferidos por meio de controladas e coliga-
das no exterior, Direito Tributário Internacional Aplicado, lII, 2005, 137 ss.
35 Cfr. Luís EDUARDO SCHOUERl, Acordos de bitributação e lei interna - investimentos na Ilha
da Madeira - efeitos da Lei nO 9.249/95,RDDT 17 (1997), 110 ss.
Título V I Capo I I Residentes no País I mil I

Daí que as convenções contra a dupla tributação permitem que tanto o Estado
de fonte quanto o Estado de residência exerçam os seus poderes tributários no que
concerne aos dividendos, embora com limitações para ambos: o Estado de fonte
não poderá tributar a uma alíquota que exceda o limite convencionado e o Estado
da residência deverá eliminar a dupla tributação ou pelo método da isenção ou pelo
método da imputação, conforme dispuser o tratado.
Por isso não pode haver dúvidas de que os tratados contra a dupla tributação
autorizam a tributação dos dividendos distribuídos por sociedades controladas ou
coligadas, determinando apenas a obrigação para o Brasil de reconhecer em relação
a esses dividendos um crédito de imposto ou a sua isençã0 36 •

(b) A incompatibilidade com os tratados na doutrina e na jurisprudência internacional

A questão da compatibilidade dos regimes de transparência fiscal internacional


com os tratados contra a dupla tributação só muito recentemente chamou a atenção
da doutrina e da jurisprudência estrangeira precisamente porque as legislações que os
consagram, quase sempre de caráter excepcional e antiabusivo, tinham apenas como
alvo controladas domiciliadas em países ou territórios de baixa tributação, que em
geral não celebram tratados daquela natureza. Apenas em anos mais próximos passa-
ram a abranger regimes fiscais preferenciais ou privilegiados adotados em países de
tributação normal e signatários de ampla rede de tratados.
Tenha-se presente que esta discussão teve por objeto legislações do tipo CPC
puro, de natureza antielisiva, e não regimes de tributação automático de caráter ge-
ral, como o da lei brasileira, que abstrai tanto da natureza do território de domicílio
da controlada quanto do rendimento auferido.
No sentido de incompatibilidade da legislação do tipo CPC com os tratados
contra a dupla tributação, pronunciaram-se diversos juristas e tribunais.
No Reino Unido PHILIP BAKER37 afirma:
"The issue also arises with respect to controlled flreign company «CPC») legislation
which attributes the income of a subsidiary to its parent and taxes the parent on that
income. lVhere the subsidiary is a resident of a treaty state) prima facie this violates
Article 7."
Este é também o ponto de vista suíço, expresso a respeito da legislação austra-
liana sobre controlled flreign entities 38 •

36 efr. a este respeito o Ato Declaratório na 6 da SRF, de 30 de janeiro de 1997, relativo ao


anterior tratado com Portugal (1971), bem como nossos comentários na edição anterior
deste livro, na pp. 364 e ss.
37 efr. Double Taxation (2" ed.), cit.) 82.
38 efr. T. DWYER, The CPC Tax Vérsus Double TaxAgreements, 1991, Butterworths Week:ly Tax
Bulletin (Austrália), par. 813.
I @liA I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier . _~_ _ _ _ _ _ _ _ _---1

Na França, o Conseil dJEtat confirmou o julgado da Corte de Apelação de Paris,


que havia decidido ser o art. 209°-B do Code Général des ImpôtsJ incompaúvel com a
convenção franco-suíça contra a dupla tributação (caso Schneider)J sendo tal entendi-
mento aplicável a todos os tratados contra a dupla tributação assinados pela França
que seguem a Convenção Modelo da OCDE39.
A questão foi debatida, de modo amplo, na Espanha, em face do regime de
"transparência fiscal internacional" adotado pela Lei nO 43/1995, de 27 de dezem-
bro, sobre o imposto de sociedades, tendo a generalidade dos doutrinadores opinado
pela sua incompatibilidade com os tratados contra a dupla tributaçã040 .
No mesmo sentido se pronunciou a esmagadora maioria dos relatores nacionais
da obra coletiva CFC LegislationJ Tax treaties and EC Law, coordenada por LANG,
EIGNER, SCHEUERLE e STEFANER (2004)41.
Um argumento em favor da compatibilidade das legislações do tipo CFC com
os tratados internacionais, invocado nos Comentários da OCDE (art. 7°, § 13),

39 Conseil d'Etat 28 de Junho, SA Schneider Electric.


40 Cfr. ESTANISLAO RODRÍGUEZ-PONGA SALAMANCA, Transparencia fiscal internacional; JOAQUIM
DE ARESPACOCHAGA, Planificación Fiscal Internacional, Madrid, 1996, 89; LUIS ALBERTO MAL-
VÁREZ PASCUAl.I, La nueva regulacion dei impuesto sobre sociedades - Regimenes speciales, vol.
11, Madrid 1996, 255. No mesmo sentido VELASCO PLAZAS, 1Jibutacion internacional en el
projecto de ley dei impuesto sobre sociedades (comunicação ao V Congresso Nacional de Econo-
mia); TULIo ROSEMBUJ, Transparência ..., 11 ss. e Derecho Fiscal Internacional, cit., 203 sS.; J.
M. ALMuDÍ CID, El régimen jurídico de transparencia fiscal internacional, cit., 322 ss.
41 Tem sido também discutida a compatibilidade das regras CPC com os princípios de Direito
Comunitário que regem a União Europeia. Está em causa principalmente a questão de saber
se o tratamento diferenciado entre residentes e não residentes afeta os princípios da liberdade
de estabelecimento, da livre circulação de capitais, do abuso de direito, da não discrimina-
ção e da proporcionalidade, tais como formulados na jurisprudência do Tribw1a1 de Justiça
das Comunidades. No tocante à eventual incompatibilidade das disposições CPC do Reino
Unido com as regras e os princípios comunitários, sobretudo com o disposto nos arts. 43°
e 49° do Tratado, tenha-se presente a decisão do TJCE no Caso Cadbury Schweppes. Neste
caso, o TJCE concordou com grande parte das conclusões do Advogado-Geral, concluindo
que as legislações nacionais, como a do Reino Unido, relativa às sociedades estrangeiras
controladas, estão genericamente em conformidade com o Tratado, na medida em que pros-
sigam o objetivo legítimo de combater a fraude ou a evasão fiscal. Todavia, estas regras serão
contrárias aos arts. 43° e 48° do TCE, quando se apliquem a expedientes que não constituam
"expedientes puramente artificiais". Tal como o TJCE salientou, são fatos determinantes para
aferir da existência de tais expedientes saber se o contribuinte tem uma intenção subjetiva de
obter uma vantagem fiscal estabelecendo-se noutro Estado-membro, se existe um estabele-
cimento no Estado-membro que prossiga atividades econômicas e se esse estabelecimento
dispõe de uma existência física em termos de instalações, pessoal e equipamento. Contudo,
conforme salienta, a questão de determinar se algum expediente em particular é "puramente
artificial" deve ser resolvida nos tribunais domésticos caso a caso. Relativamente à legislação
CPC do Reino Unido, são ainda relevantes os seguintes casos: Processo C-201/05, Caso The
Test Claimants in the CFC and Dividend Group Litigation e Processo C-203/05, Caso UJdafone
2. Cfr. SALDA<'1HA SANCHES, Os limites do planeamento, 439 ss. Para maiores esclarecimentos
cfr. ALBERTO XAVIER, Direito Tributário Internacional (2 a ed.), Coimbra 2007, 427 ss.
Título V I Capo I I Residentes no País Mi:g_

alega que não se estaria tributando as sociedades estrangeiras, mas as investidoras


nacionais, embora com referência aos lucros das primeiras. E acrescenta-se: "O im-
posto cobrado por um Estado sobre os seus próprios residentes não reduz os lucros
das empresas do outro Estado e não se pode, por conseguinte, dizer que foi lançado
sobre esses lucros".
Tal argumento colide, porém, com a letra e o espírito dos tratados, que têm
por fim impedir a dupla tributação do mesmo lucro, ainda que nas mãos de dois
sujeitos passivos distintos, reservando a competência tributária exclusiva ao Estado
de domicílio das participadas. Acresce que a tributação dos lucros das participadas
estrangeiras, consideradas "transparentes", equivale à desconsideração da persona-
lidade jurídica destas últimas, desconsideração esta que os tratados não consentem,
tanto mais que eles próprios definem o conceito de pessoa como "uma pessoa física,
uma sociedade ou qualquer outro agrupamento de pessoas", não sendo possível a
um Estado recusar unilateralmente a personalidade jurídica de uma sociedade regu-
larmente constituída no outro Estado. Enfim, a argumentação em causa conduziria
a que o alcance efetivo da primeira parte do § la e art. 70 (aliás, o "coração" dos
tratados tributários) ficasse esvaziado de conteúdo, pois não se concebe num mun-
do moderno e civilizado que um Estado se possa arrogar a tributação dos lucros de
sociedade estrangeira, que não seja pela adição de seu valor à base de cálculo do im-
posto incidente sobre a sociedade nele domiciliada, pois de contrário isso significaria
o exercício extraterritorial de poderes públicos, como o lançamento e a arrecadação,
ofensivos da soberania do Estado estrangeiro. Em que casos se poderá verificar a ab-
surda hipótese, invocada pelos Comentários da OCDE, de o imposto de um Estado
reduzir os lucros do outro?
Outra linha de argumentação no sentido de que os tratados seriam compatíveis
com as legislações CFC consiste em sustentar que essas legislações, na sua essência,
consagram uma presunção ou ficção de distribuição de dividendos, dividendos esses
cuja tributação é permitida pelo Modelo OCDE, em termos cumulativos, ao Estado
de residência do titular.
Daqui decorreria a pretensa legitimidade da tributação de um "dividendo fictí-
cio", tal como construído pelos regimes CFC.
E isto porque, como já se disse, enquanto o lucro da empresa estrangeira, do-
tada de personalidade jurídica própria, é rendimento dessa mesma empresa e não da
sua participante (Trennungsprinzip), o dividendo, tendo embora a sua fonte na em-
presa estrangeira, é rendimento próprio da sociedade que participa no seu capital.
O referido argumento parte do princípio - em si mesmo exato - de que nos
termos da repartição dos poderes tributários dos Estados operada pelas convenções
contra a dupla tributação, que seguem o modelo da OCDE, procedeu-se a uma níti-
da distinção entre os lucros das empresas e os dividendos por elas distribuídos. Enquan-
to os lucros das empresas estão sujeitos à regra da atribuição de competência tributária
exclusiva ao país de domicílio da empresa que os obteve (art. 70 da Convenção Mo-
delo), com a consequente exclusão de competência do país de domicílio da socieda-
I e I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

de que participa no seu capital, os dividendos estão sujeitos à regra de atribuição de


competência tributária cumulativa do país de domicílio da empresa que os distribui
(país de fonte) e do país de domicílio da empresa que os aufere (país de residência)
(art. 10 da Convenção Modelo).
A premissa não autoriza, porém, as conclusões, em razão de dois obstáculos
decisivos.
O primeiro é de que a letra dos tratados (em conformidade, aliás, com o Mode-
lo OCDE) se refere a dividendos "pagos", expressão esta que revela a vontade de o
regime de competência cumulativa nele consagrado apenas se aplicar a rendimentos
efetivamente destacados do patrimônio das sociedades e transferidos para o de seus
sócios, não permitindo uma interpretação ampla, sem suporte em nenhum elemen-
to hermenêutico, segundo a qual o conceito convencional de dividendo seria de tal
sorte largo que abrangeria lucros imputados abstratamente por presunção ou ficção
legal operada pela lei interna.
O segundo reside em que é ilegítimo o emprego, por uma fonte de direito como
a lei interna, do mecanismo das ficções legais (como aconteceria no caso presente,
em que se alega a existência de um "dividendo ficto") para invadir a esfera de compe-
tência de outra fonte, o tratado, delimitada em razão da hierarquia ou da especialida-
de, com vista a evitar de modo indireto ou oblíquo a prevalência da sua aplicação.
Tem-se ainda alegado que o § 5° do art. 10 do Modelo OCDE seria incompatível
com as legislações CFC: "Quando uma sociedade residente de um Estado Contratante
obtiver lucros ou rendimentos provenientes de outro Estado Contratante, esse outro
Estado não poderá exigir nenhum imposto sobre os dividendos pagos pela sociedade,
exceto na medida em que esses dividendos forem pagos a um residente desse outro
Estado ou na medida em que a participação geradora dos dividendos estiver efeti-
vamente ligada a um estabelecimento permanente situado nesse outro Estado, nem
sujeitar os lucros não distribuídos da sociedade a um imposto sobre os lucros não dis-
tribuídos, mesmo que os dividendos pagos ou os lucros não distribuídos consistam,
total ou parcialmente, em lucros ou rendimentos provenientes desse outro Estado".
Quanto a este argumento concordamos com os Comentários da OCDE (art.
10, § 37), segundo os quais o § 5° do art. 10 trata apenas de tributação na fonte,
não tendo qualquer implicação no país de residência, além de que trata apenas de
tributação da companhia e não do acionista.
Os Comentários da OCDE ao art. l° da Convenção Modelo (art. l°, §§ 22 e
ss., com remissão ao art. 7°, § 13, e art. 10, § 7°) concluem, desde a versão de 1993,
pela compatibilidade dos regimes CFC com o Modelo OCDE, e afirmam que, em
consequência, não se torna necessário clarificar a referida compatibilidade por via de
disposição convencional expressa.
E acrescentam - com considerações extrajurídicas de política legislativa - que
os referidos regimes visam a manter a equidade e a neutralidade dessas leis num am-
biente internacional caracterizado por muito diversos níveis de tributação. Assim,
tais regimes deveriam ser adotados para atingir o referido objetivo, não devendo
Título V I Capo I I Residentes no País .i:~.

ser aplicados quando o rendimento por eles tributável estiver sujeito à tributação
comparável à do país de residência do contribuinte. Acolhe assim a chamada J'uris-
dictional approach.
Seja, porém, como for, o certo é que os Comentários da OCDE, não obstante
a sua respeitabilidade, mais não são do que um documento que exprime o entendi-
mento preponderante das Administrações fiscais dos Estados-membros, não sendo
vinculante nem para os cidadãos nem para os tribunais42 •
Acresce que, do ponto de vista jurídico, a argumentação neles expendida, além
de sumária4 3, reflete ostensivamente o unilateralismo do ponto de vista "pró-gover-
namental", sendo notória a sua fragilidade científica, como atrás se apontou.
Isto levou vários países a exprimirem reservas formais ao referido entendimen-
to, como a Bélgica, afirmando categoricamente a existência do conflito. A Irlanda e
a Holanda sustentam não ser possível defender a conformidade in abstracto, de tal
modo que só em face das circunstâncias do caso concreto se poderia configurar um
abuso. Ideia similar foi expressa pela Suíça. Para além do plano puramente jurídico
da interpretação dos tratados existentes, pode até admitir-se que, mediante cláusula
expressa de um tratado, ambos os Estados reconheçam uma derrogação à regra de
competência exclusiva do art. 7 0 em casos excepcionais e por concretas razões an-
tielisivas, como é o caso das legislações CFC propriamente ditas, que apenas abran-
gem certos territórios e certos tipos de rendimentos. E talvez seja até neste sentido
político que a OCDE tem afirmado, em termos mais ou menos felizes, se não uma
verdadeira compatibilidade, pelo menos a possibilidade de coexistência a título de
regime excepcional. Esta compatibilidade é, porém, ininvocável em face de uma le-
gislação, como a brasileira, que contém a disciplina regra de tributação automática
de sociedades controladas estrangeiras, sendo destituída de caráter excepcional ou
finalidade antielisiva. E, em termos gerais, não pode ser pretendida na ausência de
cláusula convencional expressa, dada a inexistência de um princípio geral antiabuso
implícito nos tratados contra a dupla tributação.

(c) A incompatibilidade do regime da lei brasileira


com cláusulas especiais de certos tratados

Além da incompatibilidade genérica do regime de tributação automática do art.


25 da Lei na 2.949/95 (e do art. 74 da Medida Provisória na 2158-35/01) com o art.
70 dos tratados, existem ainda incompatibilidades específicas com outras cláusulas
convencionais consagradas apenas em tratados celebrados com certos países.

42 Cfr. supra, 136. Cfr. sobre os Comentários da OCDE, TAÍSA MACIEL, Tributaç/ÚJ dos lucros das
controladas e coligadas estrangeiras, Rio de Janeiro 2007, 13955.
43 "Actually the Commentary expressed the differentviews ofthe administrations ofthe OECD coun·
tries without providing many arguments» (destaque nosso). Cfr. LANG e outros, CFC Legis-
lations .. ., cit., 29.
+:1. Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

É O que se passa com a cláusula de intributabilidade de lucros não distribuídos,


prevista especificamente nos Tratados com a Dinamarca e com as Repúblicas Tcheca
e Eslovaca (art. 23, § 5°), segundo a qual "os lucros não distribuídos de uma socie-
dade anônima de um Estado Contratante cujo capital pertencer ou for controlado,
total ou parcialmente, direta ou indiretamente, por um ou mais residentes de outro
Estado Contratante não são tributáveis no último Estado"44.
Trata-se de simples corolário implícito do § lOdo art. 7°, pois os lucros não dis-
tribuídos de uma sociedade controlada domiciliada num Estado são lucros próprios
desta e não renda da sua controlada domiciliada no outro Estado. A reafirmação
solene deste princípio na cláusula relativa aos métodos para a eliminação da dupla tri-
butação veio dissipar dúvidas que pudessem existir sobre se a competência tributária
exclusiva do país de domicI1io de uma sociedade podia ser abalada pela existência de
uma relação de controle com sociedade de Estado estrangeiro.
Outro tipo de cláusula com a qual o regime brasileiro de transparência fiscal
internacional é incompatível é a cláusula de isenção de dividendos distribuídos a
sociedades brasileiras por sociedades estrangeiras.
Esta cláusula encontra-se prevista nos Tratados com a Áustria (art. 23, § 2°), a
Argentina (art. XXIII, § 2°), o Equador (art. XXIII, § 2°), a Espanha (art. 23, § 4°)
e a Índia (art. 23, § 3°). O Tratado com a Áustria exige que a sociedade brasileira
possua no mínimo 25% do capital da distribuidora; os Tratados com a Argentina e o
Equador fixam esse percentual em 10%; os Tratados com a Espanha e a Índia exigem
apenas como condição que os dividendos sejam tributáveis no país da fonte.
Trata-se, na verdade, de incompatibilidade lógica entre a lei interna e o tratado,
pois a isenção do dividendo não pode coexistir com a tributação dos lucros que lhe
deram origem. Esta incompatibilidade se evidencia pelo fato de que os dividendos,
cuja isenção é assegurada pelo tratado, já terão sido tributados quando distribuídos,
a título de lucros automaticamente adicionados, e o imposto de renda na fonte even-
tualmente cobrado pelo país de origem sobre os dividendos não será suscetível de
neutralização por crédito de imposto, conduzindo assim à dupla tributação que o
tratado tem precisamente por fim evitar.
A incompatibilidade atrás referida é reforçada pelas disposições da Convenção de
Viena sobre o Direito dos Tratados, segundo as quais uma parte não pode invocar as dis-
posições do seu direito interno para justificar o inadimplemento de um tratado (art. 27) e
um tratado deve ser interpretado de boa-fé à luz do seu objetivo e finalidade (art. 31)45.
No que concerne ao requisito exigido pelas Convenções com a Espanha e a Ín-
dia de que os dividendos "sejam tributáveis" nestes países, a expressão deve ser inter-

44 A disposição do tratado com a então Tchecoslováquia não alude à exigência de tratar-se de


"sociedade anônima", a qual nos parece apenas basear·se numa interpretação restritiva da
versão em língua portuguesa.
45 Em casos análogos os Comentários da OCDE consideram que disposições deste tipo cons-
tituem "obstrução do tratado". Comentários, art. 10, §§ 5° e 3°.
Título V I Capo I I Residentes no País ._1
pretada no sentido da suscetibilidade de tributação de harmonia com o tratado e não
no da sua tributação efetiva, uma vez que o objetivo de evitar a dupla não tributação,
quando aplicável, apenas a impede quando decorrente de conflitos de interpretação
de tratados e não de razões de lei interna46 •
Daí considerarmos ilegal a interpretação do Ato Declaratório Interpretativo da
Secretaria da Receita Federal nO 6, de 2002, que, por exigir uma tributação efetiva,
recusa o direito à isenção prevista no tratado com a Espanha na hipótese de dividen-
dos distribuídos por "Entidades de Tenencia de fálores Extranjeros-ETVE".

(d) Cláusulas excepcionais de compatibilização


Tendo em vista a incompatibilidade de princípio do regime de transparência
fiscal internacional com os tratados contra a dupla tributação, certas convenções
introduzem, por vezes, cláusulas de derrogação a esse princípio, afirmando que
nas relações recíprocas entre os dois Estados o referido regime pode ser aplicado
legitimamente.
No que concerne às convenções brasileiras, o único caso é constituído pela Con-
venção com o México, cujo art. 28, § 3°, dispõe:
'1\5 disposições da presente Convenção não impedirão que um Estado Contra-
tante aplique as disposições de sua legislação nacional relativa a capitalização
insuficiente ou para combater o diferimento, incluída a legislação de sociedades
controladas estrangeiras (legislação CFC) ou outra legislação similar."
Tendo em vista a afirmação, por vezes feita, de que o princípio de não discri-
minação vedaria a aplicação dos regimes de transparência fiscal internacional, outras
convenções celebradas pelo Brasil, como as da África do Sul (art. 24, Protocolo, item
6, alíneaj) e do Peru (art. 24, Protocolo, item 5, alínea d), esclarecem que as dispo-
sições do art. 24, relativo à não discriminação, não impedem um Estado Contratante
de aplicar as disposições da sua legislação interna a respeito das sociedades controla-
das no exterior, do tipo CFC ou similar.
N a verdade, em face dos precisos termos do art. 24 dos tratados que seguem o
Modelo OCDE, tanto no § 1° quanto no § 2°, não pode afirmar-se que a legislação
brasileira em causa preveja uma tributação diferente ou mais onerosa das sociedades
brasileiras controladoras de empresas estrangeiras em função da nacionalidade ou da
residência dos titulares do capital da investidora brasileira.
Trata-se, pois, de preceitos meramente declaratórios ou interpretativos que ve-
dam às partes invocar este argumento nas suas relações recíprocas, embora não im-

46 efr. supra, 30 e infra, 643 ss (com referência à nova versão do art. 23, A Convenção Mode-
lo). No mesmo sentido cfr. JosÉ HENRIQUE LONGO, O lucro de subsidiária no exterior e o
tratado internacional, in Tributação e processo - IV Congresso Nacional de Estudos Tributá-
rios, São aula 2007, 312 sS.
+:1:1 Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier
peçam de alegar uma eventual incompatibilidade baseada em outros princípios não
ressalvados nos protocolos, como a regra da competência exclusiva do art. 7°.

B) 2° período: a Instrução Normativa nO 38/96 e o conceito de "disponibilização»

Em face das inúmeras perplexidades e discussões suscitadas pelos arts. 25 e se-


guintes da Lei nO 9.249/95, veio a ser editada a Instrução Normativa do Secretário
da Receita Federal nO 38, de 27 de junho de 1996.
Conforme resulta do preâmbulo desta Instrução Normativa, o objetivo da sua
edição consistiu em tentar compatibilizar o regime dos arts. 25, 26 e 27 da Lei nO
9.249, de 26 de dezembro de 1995, com o art. 43 do Código Tributário Nacional,
diploma de força hierárquica superior ao da lei ordinária.
Com este objetivo, a Administração fiscal viu-se forçada a modificar radical-
mente o sistema da lei, por via de mero ato administrativo, estabelecendo no seu art.
2° o diftrimento da tributação dos lucros das sociedades estrangeiras para o momento
em que forem "disponibilizados" para a controladora ou coligada brasileira, assim
considerados os "lucros pagos ou creditados" (§ lOdo art. 2°).
Com a renúncia à tributação imediata dos lucros acumulados no exterior antes
de "disponibilizados" e com a fixação do momento temporal da sua tributação por
ocasião de sua "disponibilização", pretendeu-se compatibilizar o regime de tributação
dos lucros de controladas e coligadas no exterior com o requisito da "disponibilidade
econômica e jurídica da renda" constante do art. 43 do Código Tributário N acional47 .
Sucede, porém, que esta inovação por via de mero ato administrativo não as-
sentava em qualquer base legal, pois - como atrás se viu - a Lei nO 9.249/95 não
continha a previsão expressa de incidência do imposto sobre lucros distribuídos ou
"disponibilizados"48.

47 Na Exposição de Motivos da Medida Provisória 1.602/97 (posteriormente convertida na Lei nO


9.532/97), o Ministro da Fazenda declarou: "O artigo lOdo projeto refere-se às hipóteses em
que os lucros auferidos por filiais, sucursais, controladas ou coligadas de empresas brasileiras no
exterior são considerados disporuveis para investidora no Brasil. Essa defInição é importante do
ponto de vista tributário, tendo em vista que o fato gerador do imposto de renda, na hipótese
desses rendimentos, ocorre com a disponibilização dos lucros auferidos no exterior". Também
no Congresso Nacional, o relator do projeto de lei de Conversão da medida provisória em
lei, deputado ROBERTO BRANT, afirmou: "O artigo 10 resolve um problema de ordem jurídica
constatado na execução da recente e complexa legislação sobre a matéria, aprovada pela Lei nO
9.249, de 26 de dezembro de 1995. Verificou-se que o fato gerador do imposto de renda, na
hipótese desses rendimentos, ocorre com a disponibilização dos lucros auferidos no exterior".
48 Sob o caráter de atos secundários, cuja normatividade depende dos atos de natureza primá-
ria (como as leis e as medidas provisórias) a que se vinculam por nexo de acessoriedade e
dependência, cfr. Ag. Reg. na ADI 365/DF, relator Min. CELSO DE MELLO: em caso de des-
conformidade a sanção é a ilegalidade e não a inconstitucionalidade. Cfr. neste sentido Luís
EDUARDO SCHOUERI/MIGUEL HlLU NETO, op. cit., 128 ss. ( ... ).
Título V I Capo I I Residentes no País Mi:P'

Também sem qualquer base legal a Instrução Normativa nO 38/96 enumerou, por
ficção, cinco hipóteses de equiparação a atos de disponibilização de lucros, a saber:
(a) extinção de empresa brasileira e consequente transmissão do patrimônio da
sociedade estrangeira (art. 2°, § 4°, da Instrução Normativa nO 38/96);
(h) encerramento de atividades da controlada ou coligada no exterior (art. 2°,
§ 5°, da Instrução Normativa nO 38/96);
(c) absorção do patrimônio de sociedades estrangeiras por sociedades brasilei-
ras em virtude de incorporação, fusão ou cisão (art. 2°, § 7°, da Instrução
Normativa nO 38/96);
(d) absorção do patrimônio da controlada ou coligada por empresa sediada no
exterior (art. 2°, § 3°, da Instrução Normativa nO 38/96); e
(e) alienação da participação societária em controlada ou coligada no exterior
(art. 2°, § 9°, da Instrução Normativa nO 38/96)40.
A Instrução Normativa nO 38/96 deu origem a uma situação de profunda ambi-
guidade e incerteza, pois, por um lado, recusava a aplicação do único sistema legal-
mente vigente (o da adição automática ao lucro líquido) e, por outro lado, criava um
novo fato gerador - a "disponibilização" do lucro - sem lei que o previsse.

C) 3° período: a Lei nO 9.532/97

a) O conceito de disponibilização

Com a entrada em vigor da Lei nO 9.532, de 10 de dezembro de 1997, a siste-


mática de tributação dos lucros no exterior veio a ser novamente alterada.
Dispõe, na verdade, o art. 1° da referida lei que "os lucros auferidos no exterior,
por intermédio de filiais, sucursais, controladas ou coligadas serão adicionados ao
lucro líquido, para determinação do lucro real correspondente ao balanço levantado
no dia 31 de dezembro do ano-calendário em que tiverem sido disponibilizados para
a pessoa jurídica domiciliada no Brasil".
Trata-se de alteração legislativa que, essencialmente, visou dar força de lei à
regulamentação já constante da Instrução Normativa nO 38/96, que, inovadora e,
portanto, ilegalmente, introduziu o conceito de "disponibilização".
Importa, pois, analisar o conceito jurídico de "disponibilização" de lucros obti-
dos por sociedades estrangeiras, originariamente introduzido pela Instrução Norma-
tiva nO 38/96, mas hoje consagrado legalmente pela Lei nO 9.532/97.
Para que um lucro se considere "disponibilizado" em favor do sócio ou acionista
torna-se necessário, em primeiro lugar, que se tenha constituído em face daquele o
direito ao lucro ou dividendo, ou seja, que a titularidade do direito ao lucro se transfira
da esfera jurídica da sociedade para a esfera jurídica do sócio. Lucros acumulados,
retidos na sociedade, não são lucros "disponíveis" para os sócios, não podendo, pois,
ser tributados junto a eles.
éJm) I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Com efeito, existem na esfera jurídica do sócio ou acionista dois tipos de situ-
ações jurídicas subjetivas no que tange aos lucros sociais: o direito a participar nos
lucros sociais e o direito ao dividendo49 •
O "direito aos lucros" ou direito a participar nos lucros sociais encontra-se pre-
visto no art. 109, I, da Lei nO 6.404, de 15 de dezembro de 1976, como um dos
"direitos essenciais" dos acionistas, que tem sua origem na lei e do qual não podem
ser privados nem pelo estatuto social nem pela assembleia geral. Tal direito, porém,
não reveste a natureza de um direito de crédito, mas sim de um direito em ver rigo-
rosamente observadas as regras legais de apuração e destinação dos lucros 50 • Esta si-
tuação jurídica foi definida entre nós por LUIZ GASTÃO PAES DE BARROS LEÃES como
um "direito expectativo", na terminologia de PONTES DE MIRANDA, ou seja, aquele
cujo titular está habilitado à aquisição de um outro, o "direito expectado".
Desta situação se distingue claramente o "direito ao dividendo", quer se trate de
direito à distribuição de parte do lucro (dividendo obrigatório, estatutário ou legal),
quer se trate de direito ao pagamento do dividendo declarado. Neste caso estamos
diante de um verdadeiro direito de crédito do acionista perante a sociedade, tendo
por objeto uma prestação pecuniária. Como muito bem observa FÁBIO CoMPARATO,
enquanto o direito genérico aos lucros sociais engendra a impugnação de contas e,
eventualmente, a pretensão de ver decretada a nulidade de lançamentos aprovados
por assembleia geral, o direito específico ao dividendo redunda numa pretensão de
cobrança, como autêntico crédito que é.
Pressuposto do direito ao dividendo é que tenha havido deliberação do órgão
competente da sociedade no sentido da distribuição. O art. 205 da Lei nO 6.404/76
determina que "a companhia pagará o dividendo das ações nominativas à pessoa
que, na data do ato de declaração do dividendo, estiver inscrita como proprietária ou
usufrutuária da ação".
Deste preceito resulta que o fato gerador do direito ao dividendo é o "ato de
declaração do dividendo", ou seja, a deliberação da companhia (através do seu ór-
gão competente) que colocou as importâncias em causa à disposição dos acionistas,
transformando assim um "direito expectativo" ou um "crédito eventual" num verda-
deiro direito de crédito, tendo por objeto uma prestação patrimonial certa, líquida e
determinada. Que este é um direito de crédito como qualquer outro é hoje reconhe-
cido pela generalidade das doutrinas nacional e estrangeira.
Importa não confundir a constituição do direito ao dividendo - que ocorre na
data em que se verifica a "declaração do dividendo" por deliberação da companhia -
com a exigibilidade de tal direito, que pode ficar diferida para momento ulterior, caso
se tenha previsto que o pagamento não seja feito imediatamente, mas num prazo fixo
ou parceladamente, desde que dentro do exercício social em que foi declarado (cfr. o

49 Cfr. FÁBIO COMPARATO, Nuvos ensaios e pareceres ck direito empresarial, Rio de Janeiro 1981, 153.
50 Cfr., entre nós, BARROS LEÃEs, Do direito do acionista ao dividendo, São Paulo 1969, 309;
EGBERTO LACERDA TEIXEIRA, Das sociedades anônimas no direito brasileiro, vol. 2, 588.
Título V I Capo I I Residentes no País

art. 205, § 3°, que prevê o prazo supletivo de 60 dias no silêncio da deliberação da
assembleia geral)51.
Significa isto que para que possa incidir o imposto de renda, nos termos do art.
43 do Código Tributário Nacional, não basta a constituição do direito ao dividendo:
é ainda necessário que esse direito seja disponível jurídica e economicamente para o
seu titular.
Compete, naturalmente, ao legislador ordinário determinar, em relação a cada
modalidade de imposto de renda, qual o momento em que a renda se considera
disponível, de modo a desencadear o nascimento da obrigação tributária. No que
concerne especificamente ao imposto de renda sobre lucros auferidos por coligadas e
controladas no exterior, a Lei nO 9.532/97 foi expressa em definir o momento tem-
poral da incidência como a data do pagamento ou crédito.
O "pagamento" ou o "crédito" do lucro ou dividendo são, pois, os atos jurídicos
suscetíveis de desencadear o nascimento da obrigação tributária, por exprimirem,
cada um deles, a "disponibilização", ou seja, a aquisição da disponibilidade jurídica e
econômica da renda, a que se refere o art. 43 do Código Tributário Nacional.
O § 2° do art. 1° da Lei nO 9.532/97 dispõe que se considera pago o lucro quan-
do ocorrer (i) o crédito do valor em conta bancária, em favor da controladora ou
coligada no Brasil; (ii) a entrega, a qualquer título, a representante da beneficiária;
(iii) a remessa, em favor da beneficiária, para o Brasil ou para qualquer outra praça;
(iv) o emprego do valor, em favor da beneficiária, em qualquer praça, inclusive no
aumento de capital da controlada ou coligada, domiciliada no exterior.
As três primeiras modalidades de pagamento representam meras modalidades
fáticas de transferência de recursos financeiros, as quais porém só se podem configu-
rar juridicamente como pagamento se foram realizadas a título de extinção da obri-
gação correspondente ao direito de crédito do sócio sobre o lucro ou dividendo.
Já, porém, a quarta e última modalidade não respeita o conceito de renda do
art. 43 do Código Tributário Nacional como acréscimo patrimonial disponível, pois
num aumento de capital de sociedade por incorporação de lucros ou reservas não
ocorre um acréscimo patrimonial do sócio, cujo investimento mantém inalterado
o seu valor, ocorrendo apenas uma substituição de natureza qualitativa de contas
do patrimônio líquido da sociedade investida, pela conversão de lucros em capital.
Por outro lado, com o aumento de capital, os lucros capitalizados não se tornam
disponíveis para o sócio, enquanto este mantiver a titularidade das ações ou quotas
decorrentes do respectivo aument0 52 .
A alínea a do § 2° do art. 1° da Lei nO 9.532/97 determina que se considera
creditado o lucro quando ocorrer a transferência do registro de seu valor para qual-
quer conta representativa de passivo exigível da controlada ou coligada domiciliada
no exterior.

51 Cfr. MODESTO CARVALHOSA, Comentários, cit., 721.


52 Cfr. neste sentido Luís EDUARDO SCHOUERljMIGUEL HlLU NETO, op. cit., 132.
M.W Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Significa isto que, para a lei, o crédito se verifica na data da constituição do direito
ao dividendo, pois é precisamente no momento que surge o direito de crédito do só-
cio em relação ao lucro que se constitui, em contrapartida, a obrigação de o pagar, a
cargo da sociedade, que a contabiliza no seu passivo exigível.
Entendemos que também este preceito não se harmoniza com a exigência da
disponibilidade jurídica e econômica da renda, constante do art. 43 do Código Tri-
butário Nacional, pois esta não existe em relação a direitos de créditos existentes ou
constituídos, mas ainda inexigíveis, por entretanto não ter ocorrido o seu vencimen-
t0 53 • Deve aliás dizer-se que o conceito de "rendimentos creditados", tradicional na
linguagem da legislação do imposto de renda (especialmente em matéria de tribu-
tação na fonte), não é utilizado para significar o momento de constituição de um
direito de crédito, ou o consequente registro contábil, mas sim para exprimir um
facere de uma entidade, consistente na atividade específica de colocar os recursos cor-
respondentes a um crédito vencido à livre e efetiva disposição do beneficiári054 .

b) As hipóteses de equiparação à disponibilização

(i) Revogação sistemática das equiparações da Instrução Normativa nO 38/96


Decerto por ter reconhecido que não se compatibilizam com as exigências do
art. 43 do Código Tributário Nacional, a Lei na 9.532/97 não acolheu as equipara-
ções à disponibilização de lucros de certas situações já anteriormente enumeradas na
Instrução Normativa na 38/96, a saber:
(a)extinção de empresa brasileira e consequente transmissão do patrimônio da
sociedade estrangeira (art. 2 0, § 4 0, da Instrução Normativa na 38/96);
(b) encerramento de atividades da controlada ou coligada no exterior (art. 2 0 ,
§ 50, da Instrução Normativa nO 38/96);
(c) absorção do patrimônio de sociedades estrangeiras por sociedades brasilei-
ras em virtude de incorporação, fusão ou cisão (art. 2 0 , § 7°, da Instrução
Normativa na 38/96);
(d) absorção do patrimônio da controlada ou coligada por empresa sediada no
exterior (art. 20, § 3°, da Instrução Normativa na 38/96); e
(e) alienação da participação societária em controlada ou coligada no exterior
(art. 2°, § 9 0, da Instrução Normativa na 38/96).
O simples fato de tais hipóteses não terem sido expressamente consagradas por
uma lei cujo objetivo foi o de atribuir força de lei a uma regulamentação anterior
notoriamente ilegal revela claramente o intuito revogatório da omissão.

53 Cfr. Luís EDUARDO SCHOUERIjMIGUEL HILU NETO, op. cit., 133.


54 Cfr. neste sentido GILBERTO DE ULHÔA CA"ITO, Estudos e pareceres de Direito Tributário, São
Paulo 1975, 376 55.
Título V I Capo I I Residentes no País -p,'
A revogação dos §§ 3°, 4°, 5°, 7° e 9° do art. 2° da Instrução Normativa nO
38/96 pela Lei nO 9.532/97 foi expressamente confirmada pelo RIR/99, cujo art.
394, §§ 3° e 4°, ao enumerarem as hipóteses em que os lucros consideram-se dis-
ponibilizados, não fazem qualquer menção às demais hipóteses de disponibilização
suprarreferidas, tornando, assim, evidente que a interpretação do próprio Poder Exe-
cutivo é de que a revogação efetivamente ocorreu55 .

(ii) Novo alcance das mesmas hipóteses na Instrução Normativa nO 213/02

Surpreendentemente, a Instrução Normativa nO 213, de 7 de outubro de 2002


(editada na sequência da Medida Provisória nO 2.158-35/01), voltou a considerar
os atos de disponibilização rejeitados pela Lei nO 9.532/97 como hipóteses de dis-
ponibilização.
Como a Instrução Normativa nO 213/02 interpreta o art. 74 da Medida Provi-
sória na 2158-35/01 que, como adiante se verá, reinstituiu o sistema de tributação
automática previsto no art. 25 da Lei n ° 9.249/95, os atos nela previstos deixaram
de ter o significado de "atos de disponibilização", como aliás o não tinham na pureza
do art. 25 da Lei nO 9.249/95, tendo sido apenas introduzidos em virtude da distor-
ção criada pela Instrução Normativa nO 38/96), já que esta ocorrerá necessariamente
por ocasião da apuração anual.
Por outras palavras: atos jurídicos, tais como a distribuição formal de dividen-
dos, outros atos de pagamento ou crédito, bem como a capitalização de lucros, dei-
xaram de produzir, por si só, o nascimento da obrigação tributária relativa aos res-
pectivos montantes, eis que os lucros a que respeitam ou já foram apurados e assim
tributados em momento lógico e cronologicamente anterior ou, tratando-se de lu-
cros do exercício em curso, serão necessariamente tributados ao final desse exercício,
no balanço de 31 de dezembro.
No caso específico da alienação de participações societárias, sua inclusão no rol
de equiparações da Instrução Normativa nO 213/02 (art. 2°, § 6°) deve ser entendida
com o significado e alcance de uma antecipação da própria apuração da totalidade do
lucro da controlada ou coligada estrangeira.
A razão de ser desta "antecipação" está em que nesta hipótese (bem como nas
hipóteses de encerramento de atividades, incorporação, fusão ou cisão, absorção do
patrimônio por empresa sediada no exterior, liquidação) altera-se a identidade do
sujeito passivo no final do período, razão pela qual o Fisco procurou garantir um
mecanismo que tornasse efetiva a tributação, que poderia ver-se definitivamente frus-
trada se à época da apuração o contribuinte fosse um residente no exterior, fora do
alcance da lei fiscal brasileira.

55 Sobre a ilegalidade das hipóteses de equiparação, HUMBERTO ÁVIlA, O Imposto de Renda, a


Contribuição Social sobre o Lucro e os Lucros Auferidos no Exterior, in Grandes QuestõesAtuais
do Direito Tributário, 70 vol., VALDIR DE OLIVEIRA ROCHA (coord.), São Paulo 2003, 215 sS.
ém9 I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Ocorrendo esta alteração da identidade do sujeito passivo, torna-se necessário


proceder como que a um "corte temporal", de modo a separar com nitidez o período
em que os lucros da controlada ou coligada no exterior eram atribuíveis ao sujeito pas-
sivo "originário", do período em que os lucros foram formados já sob a titularidade
do "novo" sujeito passivo, isto é, o período imediatamente subsequente às operações
que produziram a alteração da identidade do sujeito passivo. Os lucros corresponden-
tes ao primeiro período deverão ser considerados para fins de determinação do lucro
real e da base de cálculo da CST, do alienante, sujeito passivo originário no balanço
levantado em 31 de dezembro do ano-calendário em que ocorrer a alienação.

(iii) A questão do «emprego»


Merece especial destaque a discussão a respeito do alcance da expressão "empre-
go do valor (do lucro) em favor da beneficiária" como fenômeno apto a configurar
"disponibilização" dos lucros das controladas e coligadas no exterior e, por conse-
guinte, desencadear sua tributação no Brasil, em face do disposto pelo art. 1°, § 2°,
da Lei nO 9.532/97.
Isto porque as autoridades administrativas de lançamento têm reiteradamente
invocado o conceito de "emprego" para considerar nele abrangidas operações da
mais diversa natureza, tais como: a extinção de obrigações da empresa brasileira para
com seu acionista mediante a entrega de participações societárias em controlada no
exterior; a conferência ao capital de empresa brasileira de participações societárias em
controlada e coligada no exterior; a venda de participações societárias em sociedades
no exterior etc.
Tem sido intensa a divergência quanto à matéria na jurisprudência administrati-
va, havendo, de um lado, acórdãos consagrando entendimento no sentido de que a ex-
pressão "emprego" não pode ser interpretada de forma tão ampla de modo a abarcar
operações que não importem destinação do lucro ao sócio56 e, de outro lado, acórdãos
que consagraram uma interpretação ampliativa de referida expressão, no sentido de
que o conceito de "emprego" alcança toda e qualquer operação que importe no "uso
do valor adicionado dos lucros auferidos no exterior, para quaisquer fins"57.
Conforme já se referiu, a alínea b do § lOdo art. 1° estabeleceu que os lucros
auferidos no exterior se consideram disponibilizados no momento em que, em alter-
nativa, forem creditados ou pagos.
O crédito em conta representativa de obrigação da empresa no exterior verifica-
se quando ocorrer a transferência do registro do valor dos lucros para qualquer conta
representativa de passivo exigível da controlada domiciliada no exterior (alínea a do
§ 2°).

56 Cfr. Acórdão nO 103-22.330, no mesmo sentido o Acórdão nO 103-22.45l.


57 Cfr. Acórdão nO 101-94.747, no mesmo sentido o Acórdão nO 101-95.476.
Título V I Capo I I Residentes no País

Por sua vez, a lei determinou que o pagamento do lucro poderá ocorrer sob
quatro modalidades distintas: (i) o crédito em conta bancária; (ii) a entrega; (iii) a
remessa; (iv) o empregd 8 •
Se procedermos a uma análise lógica dos vários elementos em que se desdobra a
proposição normativa que define o modo pelo qual se efetua o pagamento dos lucros,
fácil se torna distinguir a ação ou conduta) o suJeito ativo, o sujeito passivo e o objeto.
O obJeto é constituído pelos próprios lucros da coligada ou controlada no
exterior, sobre os quais incide a ação do sujeito ativo, com vistas a promover a sua
disponibilização.
O sujeito ativo (autor da conduta de disponibilização, disponibilizador) é a pessoa
jurídica domiciliada no exterior, titular do lucro, que executa a ação ou conduta em
que a disponibilização se traduz.
Sujeito passivo é a pessoa jurídica domiciliada no Brasil, controladora ou coligada do
sujeito ativo, que a lei qualifica expressamente como a beneficiária da disponibilização.
Por fim, a ação ou conduta que tem por efeito a disponibilização consiste em qua-
tro modalidades de facere do sujeito ativo, que caracterizam o pagamento do lucro, as
quais são, repita-se, o crédito em conta bancária) a entrega, a remessa e o emprego.
Esta análise lógica da norma jurídica em questão permite-nos definir o paga-
mento do lucro como o ato jurídico do sujeito ativo que tem como objeto os seus próprios lu-
cros e por efeito transferir o respectivo valor para o sujeito passivo) beneficiário dos mesmos.
Com a prática deste ato - e como é próprio do pagamento - os lucros extin-
guem-se no patrimônio do sujeito ativo, inserindo-se o respectivo valor no patrimô-
nio do sujeito passivo, seu beneficiário.
Isto é assim em toda e qualquer das modalidade de pagamento do lucro, tendo
em vista o caráter paritário e simétrico que todas elas ocupam no § 2° do art. 1° da
Lei nO 9.532/92.
Repita-se: só pode falar-se de emprego do lucro na hipótese de ato jurídico pra-
ticado pelo sujeito ativo (controlada ou coligada no exterior), tendo por objeto os
lucros nele acumulados e por consequência a transferência do seu valor para o patri-
mônio do sujeito passivo, beneficiário da disponibilização (controladora brasileira).
Em face do conceito jurídico de emprego do lucro, pode concluir-se que ele não
ocorre nem na hipótese de extinção de obrigações por dação em pagamento, nem na
hipótese de subscrição de capital de uma sociedade brasileira mediante conferência
de participações societárias em controladora no exterior, e também no caso de alie-
nação de participações societárias em controladas no exterior, eis que em nenhum
deles se verifica a prática de atos pelo sujeito ativo (controlada no exterior) tendo por
objeto seus lucros e envolvendo a transferência do valor dos mesmos para o sujeito
passivo (controladora no Brasil) beneficiária da disponibilização.

58 efr. RICARDO MARIz DE OLIVEIRA, Os importantes conceitos de pagamento, crédito, remes-


sa, entrega, emprego da renda (a propósito do imposto de renda na fonte e de lucros de
controladas no exterior), in RFDT nO 22, juljago 2006, 27 ss.
Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

o pretenso argumento econômico que tem sido invocado por alguns 59 , para
fundamentar um conceito "amplo" de emprego, representa na verdade um sofis-
ma que se esboroa perante a clareza estelar dos textos legais. Tal sofisma consiste
em deliberadamente confundir emprego do lucro com o beneficio reflexo que para
um titular de participação societária resulta da existência de lucros na sociedade
participada.
A avaliação do investimento pelo método do patrimônio líquido ou da equiva-
lência patrimonial conduz, na verdade, a que o patrimônio da sociedade participada,
no qual os lucros acumulados no exterior se incluem, se reflita - como uma imagem
se reflete em um espelho - no patrimônio da sociedade participante.
Todavia, o benefício indireto ou reflexo da valorização das participações socie-
tárias é um fenômeno de natureza totalmente distinto, do ponto de vista jurídico,
do emprego do lucro, pois nada tem a ver, nem de longe, com uma modalidade de
pagamento do lucro.
Não negamos que tal valorização reflexa ou indireta corresponde a uma vanta-
gem econômica do sujeito que a aufere; simplesmente tal vantagem não foi tipificada
por lei como objeto de tributação.
E nem poderia ter sido na ordem jurídica brasileira, uma vez que ela não confi-
gura aquisição de disponibilidade econômica ou jurídica da renda, condição exigida
pelo art. 43 do Código Tributário Nacional para legitimar a tributação da renda.
Com todo rigor jurídico observa ROBERTO DUQUE ESTRADA:
"Deve-se também ter presente que, para que possa haver o emprego (ou quais-
quer das demais modalidades de pagamento) do lucro pela controlada ou coli-
gada estrangeira em favor da beneficiária brasileira, é imprescindível que tenha
ocorrido, num momento lógico e cronológico imediatamente anterior, a cons-
tituição de uma obrigação, para essa mesma controlada ou coligada estrangeira
em face dos titulares de seu capital, de distribuição de lucros, obrigação essa que
será extinta pelo pagamento (art. 304 e ss. do Código Civil).
"Poderia a obrigação em questão ser extinta por quaisquer das demais modali-
dades previstas pela lei civil- a dação em pagamento (arts. 356 a 359), a nova-
ção (arts. 360 a 367), a compensação (arts. 368 a 380), a confusão (arts. 381 a
384) e a remissão (arts. 385 a 388) -, mas a lei fiscal apenas erigiu o pagamento
como fato gerador da obrigação tributária de imposto de renda.
"Portanto, nunca haverá 'emprego de lucros' se a obrigação de distribuição dos
mesmos for extinta pela entrega de bens e direitos (dação em pagamento), pela
constituição de uma nova obrigação (novação), pela compensação de obriga-
ções recíprocas (compensação), em razão da reunião na mesma pessoa das qua-
lidades de credor e devedor (confusão) ou pelo perdão da dívida (remissão).

59 Cfr. Acórdão nO 108.08.765.


Título V I Capo I I Residentes no País Mp.M
"Emprego do valor (do lucro) só haverá quando a devedora da obrigação de
distribuição de lucros, em vez de depositá-los em conta bancária (alínea b, nO
1), entregá-los a representante da credora (alínea b, nO 2) ou remetê-los, em
favor da credora, para o Brasil ou para qualquer outra praça (alínea b, nO 3),
empregá-los, por conta e ordem da credora, para as finalidades que esta última
determinar como, por exemplo, para pagamento de uma dívida, para aquisição
de bens ou direitos de qualquer natureza, para integralização de aumento de
capital, para concessão de um empréstimo, para uma doação, etc. 60 ."
Diga-se ainda que nem o próprio Fisco poderá considerar como modalidade de
emprego a alienação (por via de subscrição de capital em bens) da participação socie-
tária em controlada e coligada no exterior, pois não faria sentido que essa operação
fosse tratada autonomamente pela Instrução Normativa nO 38/96, no seu art. 2°, §
9°, como hipótese de disponibilização de lucros, quando ela própria já previa, em
disposição autônoma (art. 2°, § 2°, II, d), o emprego do valor do lucro como forma
de "pagamento de lucros de coligadas e controladas no exterior"61.
Em suma: a adoção de um conceito amplíssimo de "emprego" por certa corren-
te da jurisprudência administrativa nada mais representa do que a atribuição a esse
conceito da função de uma cláusula geral de tributação dos lucros de controladas e
coligadas estrangeiras não disponibilizadas, que outra coisa não é que o recurso à
analogia rigorosamente vedado pelo princípio da legalidade6 2 •

c) A tributação de dividendos em face dos tratados internacionais


Como a matéria passou a ser objeto de lei, tornou-se legítima a tributação de
dividendos recebidos das controladas e coligadas no exterior, ressalvada eventual dis-
cussão quanto à constitucionalidade da discriminação de tratamento entre dividen-
dos externos (agora tributáveis) e dividendos pagos por entidades brasileiras quer a
residentes no Brasil, quer a residentes no exterior (não tributáveis, de acordo com o
art. 10 da Lei nO 9.249/95).
No que concerne a empresas instaladas em países que tenham celebrado trata-
dos contra a dupla tributação com o Brasil, importa observar que tais tratados não
impedem a tributação pelo Brasil de dividendos distribuídos por sociedades domi-
ciliadas nos outros Estados contratantes. O que os tratados impedem, isso sim, é a
tributação dos lucros acumulados e não distribuídos (art. VII).

60 Cfr. Tributação dos lucros de controladas e coligadas no exterior. A interpretação do conceito


de "emprego" do art. l°, § 2°, "b" e 4 da Lei nO 9.532/97. Análise da jurisprudência do
Conselbo de Contribuintes sobre a matéria, inRDTI nO 9, São Paulo 2008,184.
61 Cfr. ROBERTO DUQUE ESTRADA, op. cit., 194-195.
62 Cfr. ROBERTO DUQUE ESTRADA, cit., 194.
Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Por outro lado, se é certo que os tratados não se opõem à tributação de divi-
dendos distribuídos por sociedades estrangeiras, já não são compatíveis com a tribu-
tação de situações que não correspondem ao conceito convencional de dividendos
(rendimentos de ações)63, como é o caso da situação equiparada, por ficção, a lucros
disponibilizados constante do art. 1°, § 2°, alínea b, nO 4, da Lei nO 9.532/97, ou
seja, o emprego do valor dos lucros no aumento de capital da controlada ou coligada,
domiciliada no exterior.
Com efeito, a contrapartida da capitalização de lucros acumulados no exterior
não só não é um "rendimento de ações" e, portanto, um dividendo para efeitos con-
vencionais, como não representa um acréscimo patrimonial disponível para os sócios
(tal como exigido pelo art. 43 do Código Tributário Nacional), uma vez que o patri-
mônio líquido da sociedade estrangeira não sofreu qualquer variação quantitativa, mas
apenas qualitativa, pela substituição de conta de capital à conta de lucros ou reservas.

d) A equiparação de operações de concessão de crédito à disponibilização de lucros


A Medida Provisória nO 1.924, de 7 de outubro de 1999 (convertida na Lei
nO 9.959, de 27 de janeiro de 2000), veio estabelecer, em seu art. 3°, duas novas
modalidades de "disponibilização" dos lucros no exterior, acrescentando duas novas
alíneas c e d ao § lOdo art. 1° da Lei nO 9532/97, segundo o qual os lucros serão
considerados disponibilizados para a empresa no Brasil: (... )
"c) na hipótese de contratação de operações de mútuo, se a mutuante, coligada
ou controlada, possuir lucros ou reservas de lucros;
"d) na hipótese de adiantamento de recursos, efetuado pela coligada ou con-
trolada, por conta de venda futura, cuja liquidação, pela remessa do bem
ou serviço vendido, ocorra em prazo superior ao ciclo de produção do bem
ou serviço".
Acrescentou, ainda, dois parágrafos (6° e 7°) que tratam, respectivamente, dos
aspectos quantitativos do "valor considerado disponibilizado" e dos aspectos tempo-
rais das novas hipóteses de disponibilização, nos seguintes termos:
"§ 6° - Nas hipóteses das alíneas c e d do § 1° o valor considerado disponibili-
zado será o mutuado ou adiantado, limitado ao montante dos lucros e reservas
de lucros passíveis de distribuição, proporcional à participação societária da em-
presa no País na data da disponibilização.
"§ 7° - Considerar-se-á disponibilizado o lucro:
"a) na hipótese da alínea c do § 1°.
"1- na data da contratação da operação, relativamente a lucros já apu-
rados pela controlada ou coligada;

63 efr. infra, 588 ss.


Título V I Capo I I Residentes no País -Pé'
"2 - na data da apuração do lucro, na coligada ou controlada, relativa-
mente a operações de mútuo anteriormente contratadas;
"b) na hipótese da alínea d do § 10, em 31 de dezembro do ano-calendário
em que tenha sido encerrado o ciclo de produção sem que haja ocor-
rido a liquidação".
Trata-se, na verdade, de uma equiparação a distribuição de dividendos de operações
de crédito concedidas pelas controladas ou coligadas no exterior a empresa no Brasil,
quer se trate de operações de crédito financeiro, isto é, autônomas, como é o caso do
mútuo, quer se trate de operações de crédito mercantil, ou seja, vinculadas a uma opera-
ção comercial subjacente, como é o caso do adiantamento por conta de venda futura.
Em qualquer dessas hipóteses, o principal das quantias mutuadas ou adiantadas
(mas, neste caso, apenas na hipótese de a liquidação ocorrer em prazo superior ao
ciclo de produção do bem ou serviço) é tributado imediatamente no Brasil, como se
se tratasse de dividendo distribuído.
Salta aos olhos a manifesta violação do art. 43 do Código Tributário Nacional,
que apenas permite à lei ordinária a tributação de acréscimos patrimoniais efetivos e
disponíveis.
Com efeito, nas operações de crédito atrás referidas não ocorre qualquer acrésci-
mo patrimonial, uma vez que os valores creditados são simultaneamente registrados
no ativo, como caixa, e no passivo, como exigibilidade de valor rigorosamente idên-
tico, correspondente à obrigação de restituir as quantias mutuadas ou de entregar o
bem ou serviço cuja entrega futura foi contratada.
Trata-se, por conseguinte, de inconstitucional tributação sobre a renda ou capital.
Note-se, ainda, que referida equiparação reveste natureza similar às equipara-
ções em matéria de distribuição disfarçada de lucros, aplicáveis às relações internas.
Trata-se, na verdade, de uma tentativa de aplicação às relações internacionais de
modalidade já prevista, em matéria de relações internas, pelo art. 60 do Decreto-Lei
na 1.598/77, que presumia uma "distribuição disfarçada de lucros no negócio pelo
qual a pessoa jurídica: (... ) V - empresta dinheiro a pessoa ligada se, na data do em-
préstimo, possuir lucros acumulados ou reservas de lucros" (consolidado no art. 432,
V, do Regulamento do Imposto de Renda, aprovado pelo Decreto na 1.041, de 11
de janeiro de 1994, RIR/94).
O art. 433 do RIR/94 veio, porém, esclarecer que "o disposto no inciso V do
art. 432 não se aplica nos negócios de mútuo de que trata a alínea e do inciso I do
art. 396", ou seja, mútuos entre "( ... ) pessoas jurídicas coligadas, interligadas, con-
troladoras e controladas ou associadas por qualquer forma, bem como dos créditos
da empresa com seus sócios ou acionistas".
A verdade é que na consolidação do RIR, operada pelo Decreto na 3.000, de 26
de março de 1999, a presunção anteriormente constante do inciso V do art. 432 já
não figura na enumeração taxativa de presunções de distribuição disfarçada de lucros
atualmente constante do art. 464 do RIR/99.
M"ialWI Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Significa isto que, no âmbito das relações internas, o empréstimo por pessoa
jurídica que dispõe de reservas ou lucros acumulados deixou de ser equiparado pre-
suntivamente a um dividendo distribuído e isto, decerto, porque o próprio Poder
Executivo que procedeu à consolidação reconheceu a incompatibilidade dessa equi-
paração com o art. 43 do Código Tributário Nacional, pois na hipótese em causa
nenhum acréscimo patrimonial se produz para o beneficiário do empréstimo.
Ora, as mesmas razões que estiveram na base do reconhecimento da incom-
patibilidade desse regime com o art. 43 do Código Tributário Nacional no âmbito
interno são precisamente as mesmas que conduzem à conclusão de também serem
incompatíveis com aquele preceito as novas equiparações constantes das alíneas c e d
do § IOdo art. 1° da Lei nO 9.532/97, introduzidas pelo art. 3° da Medida Provisória
nO 1.924/99.

D) 4° período: a Lei Complementar nO 104/01 e o art. 74


da Medida Provisória nO 2.158/35-01

a) Incompatibilidade do art. 74 da Medida Provisória nO 2.158-35/01


com o novo § 2° do art. 43 do Código Tributário Nacional

(i) A manutenção do requisito da disponibilidade


Em 27 de julho de 2001, foi editada a Medida Provisória nO 2.158-3464 , cujo
art. 74 dispõe o seguinte:

64 Referido preceito foi introduzido na 34a edição da Medida Provisória nO 2.158 e reprodu-
zido na sua última versão (35 a ) de 24 de agosto de 2001 (atualmente vigente nos termos
do art. 2° da EC nO 32, de 11 de setembro de 2001) à qual respeita a ADI 2588-1/DF,
pelo que, doravante, iremos nos referir apenas a esta última reedição. Além das três mo-
nografias dedicadas ao tema (TAÍSA OLIVEIRA MACIEL, Tributaçtfu dos lucros das controladas
e coligadas estrangeiras, Rio de Janeiro, 2007; JOÃo FRANCISCO BIANco, Transparência fiscal
internacional, São Paulo, 2007; ANDRÉ MARTINS DE ANDRADE,A tributaçtfu universal da renda
empresarial, Belo Horizonte, 2008) veja-se ainda: ANTONIO CARLOS RODRIGUES DO AMARAI/
DOUGLAS YAMASHITA, Norma antielisão: tributação de lucros no exterior. Disponibilidade
de renda e tratados internacionais, in Luís EDUARDO SCHOUERI (org.), Direito Tributário,
homenagem a ALCIDES JORGE COSTA, vol. 11, São Paulo 2003, 893; PEDRO ANAN JUNIOR,
Inconstitucionalidade da tributação dos lucros auferidos no exterior - Medida Provisória
nO 2.158-35/01 e Instrução Normativa SRF nO 213/02, RDDT 93 (2003), 69; ELIANA
KARSTEN ANCELES, Transparência fiscal internacional (Controlled Foreing Corporations -
CFC): uma visão analítica à luz da sistemática jurídico-tributária brasileira, RFDT 8 (mar./
abro 2004), 77; ANDRÉ MARTINS DE A'lDRADE, Consequências possíveis da ADI nO 2.588,
RFDT 32 (mar.-abr./2008), 89; ID., Os limites de tributação universal da renda e a ADI nO
2.588, RFDT, nO 29, 2007, 9 ss.; HUMBERTO ÁVILA, O imposto de renda, a contribuição
social sobre o lucro e os lucros auferidos no exterior, in VALDIR DE OLIVEIRA ROCHA (org.),
Grandes questões atuais do Direito Tributário, vol. 7, São Paulo 2003, 215; MARCIO ÁVILA, A
ADln 2.588/DF e a tributação dos lucros oriundos do exterior, RTFP 64 (set.-out./2005),
Título V I Capo I I Residentes no País Mi,"

"Para fins de determinação da base de cálculo do imposto de renda pessoa jurí-


dica e da CSLL, nos termos do art. 25 da Lei nO 9.249, de 26 de dezembro de
1995, e do art. 21 desta Medida Provisória, os lucros auferidos por controlada
ou coligada no exterior serão considerados disponibilizados para a controladora
ou coligada no Brasil na data do balanço no qual tiverem sido apurados, na
forma do regulamento.
"Parágrafo único. Os lucros apurados por controlada ou coligada no exterior
até 31 de dezembro de 2001 serão considerados disponibilizados em 31 de de-
zembro de 2002, salvo se ocorrida, antes dessa data, qualquer das hipóteses de
disponibilização previstas na legislação em vigor."

11; MARCO ANTÔNIO BEHRNDT, Análise de norma inaugural da tributação em base universal
no Brasil e as decisões do Conselho de Contribuintes, RDTI 7 (dez.-j2007), 223; ELIDIE
PALMA BIFANO, Investimentos em sociedades coligadas e controladas, ágio e o imposto so-
bre a renda, in EURICO MARCOS DINIZ DE S.A.NTIjFERNANDO AURELIO ZILVETI (org.), Direito
Tributário: tributação empresarial, São Paulo 2009,203; FERNANDO NETTO BOITEUX, As so-
ciedades coligadas, controladoras, controladas, e a tributação dos lucros obtidos no exterior,
RDDT 105 (2004),20; SACHA CALMON NAVARRO COÉLHO, MISABEL DERZI, Tributação pelo
IRPJ e pela CSLL de lucros auferidos por empresas controladas ou coligadas no exterior -
inconstitucionalidade do art. 74 da Medida Provisória nO 2.158·35jOl, RDDT 130 (2006),
135; PAULO FALEIRO FERREIRA, O instituto das Controlled Foreing Corporations - CFC e o
ordenamento jurídico brasileiro, RIDT 3 (jan.-jun.j2005), 233; JAYR VIÉGAS GAVALDÃO JR.,
Considerações acerca da transparência fiscal internacional e do descompasso da legislação
brasileira, in MARCELO MAGALHÃES PEIXOTO (org.), Planejamento tributário, São Paulo 2004,
295; MARCIANO SEABRA DE GODOI, O imposto de renda e os lucros auferidos no exterior,
in VALDIR DE OLIVEIRA ROCHA (org.), Grandes questões atuais do Direito Tributário, vol. 6,
São Paulo 2002, 275; JosÉ HENRIQUE LONGO, O lucro de subsidiária no exterior e o tratado
internacional, in Tributação e processo - IV Congresso Nacional de Estudos Tributários, São
Paulo 2007, 291; CIRO CESAR OLIVEIRA, Extensão do princípio da universalidade para fins
de tributação pelo imposto de renda das pessoas jurídicas (IRPJ), RDTI 5 (2007),9; RICAR-
DO MARIZ DE OLIVEIRA, Lucros de coligadas e controladas no exterior e aspectos de elisão e
evasão fiscal no Direito brasileiro e no internacional, RDDT 102 (2004), 95; CLÓVIS P ANZA-
RINI FILHO, RAFFAELE Russo, A compatibilidade entre as regras de CFC e os tratados inter-
nacionais, RDTI 3 (jun.-j2006), 9; HELENILSON CUNHA PONTES, A tributação dos lucros do
exterior e os tratados para evitar a dupla tributação da renda, in ADILSON RODRIGUES PIRESj
HELENO TAVEIRO TÔRRES (org.), Princípios de Direito Financeiro e Tributário - Estudos em ho-
menagem ao Professor RICARDO LOBO TORRES, Rio de Janeiro 2006, 863; JOÃo DÁCIO ROLIM,
GILBERTO AYRES MOREIRA, Tributação de lucros auferidos no exterior e limites relativos de
normas antielisivas, RDTI 3 (jun.·j2006), 103; RAPHAEL PALMIERI SALOMÃO, Os lucros das
empresas nos tratados internacionais destinados a evitar a dupla tributação da renda e do ca-
pital, RDTI 8 (abr.·j2008), 97; Luís EDUARDO SCHOUERI, Transparência fiscal internacional,
proporcionalidade e disponibilidade: considerações acerca do art. 74 da Medida Provisória
nO 2.158-35, RDDT 142 (2007), 39; HELENO TAVEIRA TÔRRES, Lucros auferidos por meio
de controladas e coligadas no exterior, in HELENO TAVEIRA TÔRRES (org.), Direito Tributário
InternacionalAplicado, vol. III, São Paulo 2005, 105; ERICSON AMARAL, Da conexão entre
a tributação de lucros de controladas e coligadas no exterior, o CPC 02 e a desconsideração
dos planejamentos tributários internacionais, in SERGIO ANDRÉ ROCHA (coord.), Direito Tri-
butário, Societário e a Reforma da Lei das S/A, vol. lI, São Paulo 2010.205 sS.
§j$ I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

As considerações que atrás se formularam a respeito da incompatibilidade do


sistema de tributação extraterritorial com o art. 43 do Código Tributário Nacional
não são alteradas em face do novo § 2° deste preceito introduzido pela Lei Comple-
mentar nO 104/01 que dispõe: ''Na hipótese de receita ou de rendimento oriundos
do exterior a lei estabelecerá as condições e o momento em que se dará sua disponibili-
dade, para fins de incidência do imposto referido neste artigo".
Tenha-se desde já presente que o § 2° do art. 43 do CTN, ao dispor sobre recei-
tas ou rendimentos oriundos do exterior, manteve-se fiel ao conceito constitucional
de renda, não abandonando o requisito da disponibilidade para fins de incidência do
imposto constante do caput do art. 43, pelo que também a renda de origem externa,
tal como a renda de origem interna, é apenas tributável quando da aquisição de dispo-
nibilidade econômica ou jurídica.
O § 2° do art. 43 limita-se, na verdade, a permitir à lei ordinária que estabeleça
as "condições" e o "momento" em que se dará a disponibilidade.
Não temos dúvidas de que a lei ordinária (art. 74 da Medida Provisória nO
2.158-35/01) teria obedecido rigorosamente ao referido novo § 2° se se tem limita-
do a estabelecer as "condições" e o "momento" em que se dá a disponibilização de
lucros no exterior.
Com efeito, essa disponibilização pode ocorrer em virtude de um procedimento
ou ato complexo que pode desdobrar-se no tempo em várias etapas ou fases. Assim,
por exemplo, ocorre, em primeiro lugar, a deliberação da sociedade no sentido de
declaração do dividendo, a qual, por si só, já transfere os lucros da titularidade da so-
ciedade para a dos sócios, de tal modo que estes deixam de se integrar no patrimônio
líquido daquela para passarem ao seu passivo exigível. Pode ocorrer, também, que
o vencimento da obrigação de pagar os lucros já declarados ocorra num momento
subsequente, o que se dará sempre que os dividendos não sejam pagos à vista. Pode
também ocorrer que os dividendos sejam colocados à disposição dos sócios, mas não
sejam por estes recebidos, ou que, sendo recebidos, não sejam internados cambial-
mente em seu país de residência, ou que lhes tenha sido dado destino, por conta e
ordem do acionista, antes do seu recebimento.
Aqui, sim, a lei ordinária teria liberdade de escolher o momento temporal em
que, nestas diversas fases do processo de disponibilização, o lucro seria reputado
como disponibilizado para efeitos tributários.
Todavia, o art. 74 da Medida Provisória nO 2.158-35/01 extrapolou o permis-
sivo da lei complementar, eis que considerou disponibilizados por ficção legal lucros
que, na verdade, disponibilizados não são.
Na tentativa de justificar a equiparação de lucros apurados a lucros disponibi-
lizados, o Poder Executiv0 65 recorreu aos argumentos de que o poder de controle,

65 Os argumentos aqui referidos são os que constam das manifestações da Advocacia Geral
da União (AGU) e da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN) nos autos da ADI
nO 2588-1.
Título V I Capo I I Residentes no País

bem como o método da equivalência patrimonial, já permitia configurar a disponi-


bilidade para os sócios dos lucros acumulados das sociedades estrangeiras por eles
controladas ou a eles coligadas.

(ii) A distinção entre disponibilidade e controle


Um argumento no sentido de que a disponibilidade não exigiria necessariamen-
te um ato jurídico de transferência do patrimônio da sociedade para o patrimônio
dos sócios consiste na afirmação de que o simples fato da apuração do lucro seria por
si só suficiente para torná-lo "disponível" para os sócios, eis que a transferência patri-
monial efetiva dependeria exclusivamente de um ato de vontade destes. E isto quer o
sistema jurídico aplique ou não aos lucros das controladas o método do patrimônio
líquido ou equivalência patrimonial.
Este o fundamento da velha teoria alemã do órgão (Organtheorie) tão criticada
por OrrMAR BÜHLER.
Deve desde logo começar por observar-se que o referido argumento não é apli-
cável às sociedades coligadas, pelo que a tributação dos lucros destas pela sistemática do
art. 74 não encontra qualquer sustentação na argumentação dos próprios defensores
da sua legitimidade constitucional, como aliás bem observado no voto da Ministra
ELLEN GRACIE na ADI nO 2588-l.
Mesmo no que concerne às sociedades controladas, o argumento em causa tem um
elemento de sofisma, vez que ambiguamente confunde asuscetibilidade (potencial) de
deliberação pela controladora no sentido da distribuição de lucros da controlada com
a aquisição (efetiva) da disponibilidade jurídica e econômica dos lucros da controlada
por parte da controladora. Ou seja: confunde a disponibilidade ao nível da sociedade
com a disponibilidade ao nível do sócio.
Nunca é demais frisar que, de harmonia com a dicção literal do art. 43 do CTN,
o fato gerador do imposto de renda não é a disponibilidade potencial de renda, mas
a aquisição desta mesma disponibilidade, aquisição essa que pressupõe a inserção
efetiva de um valor novo (a renda) no patrimônio do sócio.
Por outro lado, o argumento em causa parte do princípio equivocado de que o
sócio controlador é sempre livre juridicamente de distribuir, a título de dividendo,
o lucro legalmente suscetível de distribuição (este o caráter "potestivo", para usar a
linguagem dos defensores da opinião em causa).
Tal liberdade, porém, não existe ilimitadamente.
O parágrafo único do art. 116 da Lei nO 6.404/76 dispõe que "o acionista
controlador deve usar o poder com o fim de fazer a companhia realizar o seu objeto
e cumprir sua função social, e tem deveres e responsabilidades para com os demais
acionistas das empresas, os que nela trabalham e para com a comunidade em que
atua, cujos direitos e interesses deve lealmente respeitar e atender".
Ora, estes limites à discricionariedade do acionista controlador (além dos limites
estatutários e derivados de acordos de acionistas) podem levá-lo - e essa é a experiên-
5 I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

cia de todos os dias - a renunciar à distribuição de dividendos para formar reservas


com vistas a investimentos futuros, para implementação de planos de alcance social
ou para adotar iniciativas de interesse comunitário. Em nenhuma dessas hipóteses a
destinação do lucro da sociedade, conquanto apurado em balanço, tem repercussão
no patrimônio dos sócios, pelo que se pode definitivamente concluir que a existência
de poder de controle não é, por si só, condição para que se configure a aquisição de
disponibilidade da renda por parte dos sócios66 •

(iii) A distinção entre disponibilidade e equivalência patrimonial


Um outro argumento no sentido da inexistência de incompatibilidade com o re-
quisito da "disponibilidade" muito de perto ligado ao primeiro consiste na afirmação
de que o fenômeno da equivalência patrimonial, aplicável às sociedades controladas e
coligadas estrangeiras, já se repercute no patrimônio da sociedade brasileira investi-
dora em termos de configurar aquisição de disponibilidade jurídica e econômica da
renda consistente nos lucros apurados pelas sociedades estrangeiras, independente-
mente da sua distribuição efetiva67 .
Enquanto o argumento do controle vislumbra o fundamento de disponibili-
dade legitimadora da tributação no mero poder de vontade do sócio controlador, o
argumento da equivalência patrimonial vê esse fundamento no fato de o método de
patrimônio líquido considerar que aquela equivalência já é parte integrante do lucro
da controladora brasileira, independentemente de um ato de distribuição.
Foi precisamente este argumento que levou a Instrução Normativa nO 213, de
7 de outubro de 2002, a proceder à distinção (não prevista na lei) entre os investi-
mentos avaliados pelo método da equivalência patrimonial) em relação aos quais se
aplicaria o regime de tributação automática por ocasião de apuração do lucro (art.
7°) e os investimentos avaliados pelo custo de aquisição) em que a tributação só in-
cidiria por ocasião de disponibilização por pagamento ou crédito (art. 8°). Trata-se
evidentemente de mais uma disposição casuística, ad hoc, contendo uma distorção
para tentar artificialmente salvaguardar a legitimidade da tributação dos lucros das
controladas e coligadas no exterior.
O método da equivalência patrimonial, método de patrimônio líquido ou equity
method, consta do art. 248, I, da Lei nO 6.404/76, e consiste na avaliação dos inves-
timentos relevantes de uma sociedade em sociedades coligadas ou controladas em
função do valor do patrimônio líquido destas últimas.
Tenha-se presente que o resultado de equivalência patrimonial não se limita a
refletir a participação no lucro líquido das investidas, abrangendo também outras

66 No mesmo sentido cfr. J. F. BIANCO, Transparência fiscal internacional, cit., 88-89.


67 Este argumento invocado pela AGU na ADI nO 2588-1 foi acolhido pelo Ministro NELSON
JOBIM e posteriormente retomado e aptofundado na dissertação de ANDRÉ MARTINS DE fu'lDRA-
DE, A tributação universal da renda empresarial, Belo Horizonte 2008,passim, espec. 158 ss.
Título V I Capo I I Residentes no País .!.~.

modificações no patrimônio líquido que não se refletem na sua demonstração de


resultados, notadamente nas reservas de capital68 .
A figura de equivalência patrimonial destina-se essencialmente a que o balanço
das sociedades, para efeitos societários, reflita contabilmente o valor dos investimen-
tos pelo valor que tem a cada momento nas sociedades investidas e não meramente
pelo custo original pelo qual foram adquiridos.
O referido método contábil faz assim que o patrimônio das sociedades inves-
tidoras seja como que um "espelho" no qual se refletem as mutações positivas ou
negativas do patrimônio das sociedades investidas, já que as participações societárias
em que se traduzem nada mais são do que "bens de segundo grau" representativos
do patrimônio das primeiras.
Esta apropriação reflexa das variações no patrimônio líquido das "sociedades-
filhas" nas "sociedades-mãe" assenta na consolidação econômica do grupo de empre-
sas, desconsiderando, de certo modo, a sua individualidade jurídica69 •
Tanto não ocorre a coincidência entre resultado de equivalência patrimonial e
lucro das controladas ou coligadas, que a própria Lei na 9.249/95, não obstante ter
determinado a adição ao lucro líquido da sociedade brasileira dos lucros das socie-
dades controladas e coligadas estrangeiras, dispôs expressamente no § 6 0 do art. 25
que "os resultados da avaliação dos investimentos no exterior, pelo método da equi-
valência patrimonial, continuarão a ter o tratamento previsto na legislação vigente,
sem prejuízo do disposto nos §§ la, 20 e 30".
Ora, o tratamento previsto na legislação vigente é o da não tributação, estabele-
cendo o art. 23, § único, do Decreto-Lei nO 1.598/77, na redação do Decreto-Lei na
1.648/78, que "não serão computados na determinação do lucro real as contraparti-
das de ajuste do valor do investimento ( ... ) em sociedades estrangeiras controladas e
coligadas que não funcionem no País".
O método da equivalência patrimonial é um simples método da avaliação do
investimento para efeitos societários, conforme resulta da formulação literal do art.
248 da Lei na 6.404/76, avaliação esta que não tem caráter definitivo, flutuando ao
longo do tempo no sentido ascendente ou descendente, conforme os resultados das
empresas participadas.
E daí que a lei determine que o resultado líquido positivo da equivalência patrimo-
nial seja considerado parcela não realizada do lucro líquido do exercício (art. 197, §§ la
e 20 , da Lei na 6.404/76, com as modificações das Leis nOs 10.303/01 e 11.638/07).
Salta à vista que semelhante método, conquanto útil para efeitos societários,
não poderia sem mais ser adotado para efeitos fiscais no que concerne à tributação
dos sócios investidores. É que, enquanto os lucros das sociedades investidas não

68 Cfr. EUSEU MARTINS, in MODESTO CARVALHOSA, Comentários à Lei das Sociedades Anônimas,
vol. 4, tomo II, São Paulo 1998, 50.
69 Cfr. EUSEU MARTINS, op. cit.) 47 ss. e JosÉ LUIZ BULHÕES PEDREIRA, Finanças e Demonstrações
Financeiras da Companhia, Rio de Janeiro 1989, 686 ss.
_ I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

forem realizados, os acréscimos ou diminuições do valor do patrimônio líquido das


investidas são meramente potenciais e flumantes, de tal modo que um aumento da
equivalência patrimonial num dado período pode ser anulado por decréscimo equi-
valente no período subsequente, sem que tal fenômeno se tenha chegado a repercutir
de modo efetivo no patrimônio dos sócios.
Por outras palavras, o método da equivalência patrimonial pode revelar, para
efeitos de avaliação, um aumento do patrimônio dos sócios, mas o que de modo al-
gum revela é, para efeitos de tributação, a aquisição pelo sócio da disponibilidade da
renda própria das sociedades controladas e coligadas enquanto não ocorrer um ato
jurídico de transferência patrimonial efetiva, a título de lucro distribuído.
Nem se diga que o fato de a sociedade investidora poder distribuir dividendos
à conta de equivalência patrimonial (lucros a realizar) configuraria disponibilidade
jurídica ou econômica dos lucros das sociedades controladas e coligadas estrangeiras
por parte da investidora brasileira.
A tese segundo a qual a equivalência patrimonial constimi o verdadeiro objeto
de tributação pelo art. 74, enquanto renda própria disponível da controladora bra-
sileira, constituindo um imposto sobre a produção do lucro e não sobre a sua distri-
buição, enfrenta desde logo o obstáculo de o próprio teor literal do art. 25 da Lei
nO 9.249/95 (para o qual o art. 74 remete expressamente como fonte reguladora de
determinação da base de cálculo do imposto de renda e da CSLL) ser categórico ao
esclarecer no seu § 6° que "os resultados da avaliação dos investimentos no exterior,
pelo método da equivalência patrimonial, continuarão a ter o tratamento previsto
na legislação vigente, sem prejuízo do disposto nos §§ 1°, 2° e 3°", disposição esta
corretamente interpretada pelo art. 11 da Instrução Normativa nO 38/96 no sentido
de que "a contrapartida do ajuste de investimento no exterior, avaliado pelo método
da equivalência patrimonial, não será computada na determinação do lucro real".
O objeto da tributação, segundo a Lei nO 9.249/95, era o próprio lucro das
controladas e coligadas no exterior, que para o efeito deveriam ser adicionados à base
de cálculo do imposto incidente sobre a controladora brasileira, na proporção de sua
participação.
Arvorar, pois, como objeto da tributação uma realidade que a própria lei de-
terminou não fosse nela considerado, como a equivalência patrimonial, representa
forçar a realidade normativa para lhe imprimir um significado e alcance que não
tem. Tal assimilação jamais foi feita pela lei, representando inovação de mero ato
administrativo a Instrução Normativa nO 213, que, à semelhança da sua antecessora,
Instrução Normativa nO 38, exorbitou do terreno da fiel execução da lei, que consti-
mcionalmente lhe compete, com o propósito manifesto de imprimir ao texto legal a
fisionomia recomendada pelo advogado da União como a mais adequada para criar
uma aparência de legitimidade constimcional.
O objeto da tributação do art. 74 não é, pois, a equivalência patrimonial, mas
o lucro não distribuído da sociedade estrangeira, e este é, por definição,jiscalmente
indisponível para a sociedade brasileira controladora ou coligada.
Título V I Capo I I Residentes no País MI.r.

o argumento para o qual a base de tributação do art. 74 seria a própria equi-


valência patrimonial registrada na sociedade controladora e, por si só, geradora de
disponibilidade de renda, baseia-se, num vício lógico, um clássico paralogismo lin-
guístico de fácil identificação - o chamado "paralogismo ex homonymia", que cria
uma aparência de verdade lógica pela utilização de expressão polissêmica, em que
conceitos diferentes designados pela mesma palavra são empregados no mesmo silo-
gismo como se significassem a mesma coisa 70 •
Mais especificamente utiliza-se a mesma expressão "disponibilidade", que em
direito é suscetível de várias acepções para designar tanto a disponibilidade do lucro
para efeitos societários quanto para efeitos fiscais. A verdade, porém, é que, enquan-
to a disponibilidade societária respeita às relações entre sócio e sociedade e pode ter por
objeto tanto lucros realizados quanto não realizados) a disponibilidade fiscal respeita às
relações entre Fisco e sociedade e só pode ter objeto lucros realizados.
A disponibilidade no sentido do poder abstrato de distribuir um lucro é concei-
to distinto da disponibilidade no sentido da percepção concreta e efetiva do lucro ou
da aquisição do direito incondicional à sua percepção.
Este é um corolário do princípio da realização em matéria de imposto de
renda, segundo o qual a lei complementar (art. 43 do Código Tributário Nacio-
nal) permite ao legislador ordinário tributar, não todo e qualquer acréscimo de
patrimônio, mas apenas os acréscimos em relação aos quais o contribuinte tenha
adquirido a disponibilidade econômica ou jurídica, isto é, a aquisição da posse
da moeda ou a verificação de todas as condições necessárias para a sua aquisição
incondicionaFI.
Ora, a verdade é que, se na equivalência patrimonial ocorre o fenômeno de
disponibilidade societária) já não se verifica a disponibilidade fiscal da sociedade contro-
ladora em relação aos lucros não distribuídos das suas controladas e coligadas 72 •

70 "O aspecto fundamental a ressaltar, com respeito ao tema, é que o ingresso no patrimônio do
investidor, correspondente à receita de equivalência patrimonial, configura, na sistemática
do ordenamento jurídico brasileiro, o concomitante aufcrimento de renda por parte deste,
visto que se traduz em acréscimo patrimonial que passou a sua titularidade, vale dizer, com
respeito ao qual adquiriu (o investidor) disponibilidade, que) no caso, é tanto econômica quanto ju-
rídica}) (p. 159). E adiante: "Em princípio, o sócio controlador, pessoa física ou jurídica, de
determinada sociedade, pode ser tributado pelo recebimento de dividendos (dividends tax) e
pode também ser tributado como decorrência da mera apuração dos lucros por parte da sociedade de
que participa como controlada (corporate tax). Cfr. MARTINS DE ANDRADE, A tributação universal
da renda empresarial) cit., 162. Cfr. também 176/177.
71 Este é o significado da expressão, sedimentado e consagrado na doutrina e na jurisprudência
brasileira. Cfr. SACHA CAL\10N NAVARRO CoÊLHO / MlSABEL DERZI, Tributação pelo IRPJ e pela
CSLL de lucros auferidos por empresas controladas ou coligados no exterior - inconstitucio-
nalidade do art. 74 da Medida Provisória nO 2158-35/01, in RDDT nO 130,2006,144, recor-
dando a clássica e autorizada lição de BULHÕES PEDREIRA, Imposto sobre a Renda - Pessoa Jurídica,
1,1979,196 sS.; Luís EDUARDO SCHOUERl, Transparênciafiscal internacional) cit., 45-46.
72 Cfr. J. F. BIANCO, Transparência fiscal internacional) cit., 61 ss, 83 sS.
g I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Uma coisa é o legislador societário permitir ao acionista controlador, no plano


do Direito Privado, distribuir a mera expectativa flutuante de lucros em que a equi-
valência patrimonial, no fundo, se traduz, confiando na sua consistência; outra bem
distinta é o legislador fiscal, no plano do Direito Público, impor ao contribuinte a
tributação imediata do que pode tornar-se na realidade simples quimera de acrésci-
mo patrimonial, se a expectativa de lucro a realizar não se realizar efetivamente.
Esta tributação, ao menos no Direito brasileiro, é inadmissível.

b) Ilegitimidade constitucional da ficção equiparadora de lucros


apurados a lucros disponibilizados
Ainda, porém, que nem o poder de controle nem a equivalência patrimonial
configurem "disponibilidade", no sentido fiscal, como atrás largamente se demons-
trou, pode perguntar-se se o novo § 2° do art. 43 do Código Tributário Nacional
pode ser interpretado no sentido de conferir ao legislador ordinário uma liberdade
tão ampla que lhe permitisse estabelecer hipótese da disponibilidade presumida ou
ficta, ou seja, de casos que embora não representem aquisição de disponibilidade se-
gundo as regras gerais assim fossem considerados pela lei fiscal para o caso específico
de investimentos no exterior.
Não é este, porém, repita-se, o alcance do § 2°, que se limita a permitir ao legisla-
dor ordinário estabelecer as condições e o momento em que se dará a disponibilidade, sem
que em parte alguma se admita a abstração do próprio conceito de disponibilidade.
As "condições e o momento" em que se dá essa disponibilidade já tinham sido
aliás legitimamente estabelecidas pela lei ordinária.
No que concerne especificamente ao imposto de renda sobre lucros auferidos
por coligadas e controladas no exterior, a Lei nO 9.532/97 foi expressa em definir o
momento temporal da incidência como a data do pagamento ou crédito (art. 1° da
Lei nO 9.532/97).
O § 2° do art. 1° da Lei nO 9.532/97 dispõe que se considera pago o lucro quan-
do ocorrer (i) o crédito do valor em conta bancária, em favor da controladora ou
coligada no Brasil; (ii) a entrega, a qualquer título, a representante da beneficiária;
(iii) a remessa, em favor da beneficiária, para o Brasil ou para qualquer outra praça;
(iv) o emprego do valor, em favor da beneficiária, em qualquer praça, inclusive no
aumento de capital da controlada ou coligada, domiciliada no exterior.
Se é legítimo à lei ordinária, em face do novo § 2° do art. 43 do CTN, estabe-
lecer as condições e o momento em que se dará a disponibilidade da renda externa,
já não obedece ao permissivo da lei complementar o fato de o art. 74 da Medida
Provisória nO 2.158-35/01 ter considerado que os lucros das controladas e coligadas
estrangeiras se consideram disponibilizados na data da respectiva apuração.
Considerar que a apuração dos lucros é uma forma de disponibilidade nada mais
é que a utilização do expediente jurídico da ficção legal no sentido de considerar equi-
valente a uma determinada realidade uma outra que lhe é intrinsecamente diferente.
Título V I Capo I I Residentes no País

A problemática da utilização da ficção legal para contornar normas imperativas


de grau hierárquico superior foi objeto de estudo magistral por GILBERTO DE ULHÔA
CANTO, que versou, entre outras, questão análoga à que agora se discute, mais espe-
cificamente a de saber se é legítimo o emprego de presunção em matéria de imposto
de renda para tributar pessoa física por via reflexa da pessoa jurídica73 •
GILBERTO DE ULHÔA CANTO começa por observar que as presunções e as ficções
fazem parte do processo gnoseológico figurativo, pois em ambas chega-se a uma rea-
lidade legal que não coincide com a realidade fenomenológica conhecida através dos
meios de percepção direta. Na presunção toma-se como sendo a verdade de todos os
casos aquilo que é a verdade da generalidade dos casos iguais, em virtude de uma lei
de frequência ou de resultados conhecidos, ou em decorrência da previsão lógica do
desfecho. Na ficção, para efeitos pragmáticos, a norma atribui a determinado fato,
coisa, pessoa ou situação características ou natureza que no mundo real não existem,
nem podem existir, enquanto na presunção a regra é estabelecida dentro dos limites
da realidade possível inferida de fatos semelhantes já ocorridos e que, portanto, são
não só possíveis como até prováveis.
Aplicando estes ensinamentos de GILBERTO DE ULHÔA CANTO ao caso do art. 74
da Medida Provisória na 2.158-35/01, pode concluir-se que a afirmação segundo a
qual os lucros de sociedades estrangeiras se reputam disponibilizados no momento
da sua apuração reveste a natureza de uma ficção legal, pois equipara a uma determi-
nada realidade - a disponibilidade de lucros - uma outra - a apuração do lucro - que
consabidamente não tem aquele efeito.
Ao utilizar-se do expediente da ficção legal da equiparação do "lucro apurado"
a "lucro disponibilizado", o art. 74 da Medida Provisória na 2.158-35/01 excedeu a
permissão da lei complementar, que se limitava a autorizar a lei ordinária a definir as
condições e o momento da disponibilidade, mas não a abstrair do conceito de dispo-
nibilidade - ínsito ao próprio conceito constitucional de renda - ou a desconsiderá-
lo, substituindo-o por um conceito distinto, como é o de apuraçã0 74 •

73 Cfr. Presunções no Direito Tributário, in IVES GANDRA DA SILVA MARTINS (org.) Cadernos de
Pesquisas Tributárias 9 (1984), 1 ss. Sobre ficções e presunções, veja-se na literatura mais
recente LEONARDO SPERB DE PAULA, Presunções e ficções no Direito Tributário, Belo Horizon-
te 1997; Iso CHAITZ SCHERKERKEWITZ, O uso das presunções e ficções no Direito Tributá-
rio, RTFP 31,84 sS.
74 Cfr. nesse sentido o RE nO 117.887-6/S1', assim ementado: "CoNSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO.
IMpOSTO DE RENDA. RENDA - CONCEITO. Lei nO 4.506, de 30.XI.64, art. 38, CF/46, art. 15,
IV; CF/67, art. 22, IV; EC 1/69, art. 21, IV CTN, art. 43. I - Rendas e proventos de qual-
quer natureza: o conceito implica reconhecer a existência de receita, lucro, proveito, garrho,
acréscimo patrimonial que ocorrem mediante o ingresso ou o auferimento de algo, a título
oneroso. CF, 1946, art. 15, IV; CF/67, art. 22, IV; EC 1/69, art. 21, IV CTN, art. 43; II-
Inconstitucionalidade do art. 38 da Lei 4.506/64, que institui adicional de 7% de imposto
de renda sobre lucros distribuídos; III - RE conhecido e provido".
• I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier 'I
Com efeito, tais procedimentos caracterizam desrespeito à hierarquia constitu-
cional das fontes de produção do Direito que seria subvertida pela via oblíqua das
presunções e ficções legais.
Esta a lição de GILBERTO DE ULHÔA CANT0 75 :
"2.14. É, pois, evidente que o legislador não pode, através de ficções, elaborar
regras que ele não poderia expedir de forma direta, porque em desacordo com
as disposições constitucionais e, no caso do Brasil, também com as leis comple-
mentares elaboradas nos termos e para os fins prescritos no § IOdo art. 18 da
Constituição Federal".
Acrescenta o mesmo autor 76 :
"2.18. Sucede que o Código Tributário Nacional contém disposições diversas,
no Livro II, que definem o fato gerador, o sujeito passivo, e a constituição,
exclusão, suspensão e extinção do crédito tributário. E no Livro I ele define os
fatos geradores, os contribuintes e as bases de cálculo de cada um dos impostos
do sistema. Portanto, considerando que o CTN, como lei complementar nas
matérias mencionadas, o § IOdo art. 18 da Constituição Federal, tem hierarquia
superior à das leis tributárias da União, dos Estados e dos Municípios, resulta
lógica a inferência de que estas não podem definir aqueles elementos de maneira
oposta à adotada no CTN, nem de forma direta (por exemplo, dizendo que o
imposto sobre a transmissão de bens imóveis ou sobre direitos imobiliários tem
como fato gerador a transmissão da propriedade de embarcações), nem indireta
(como definindo, para fins da referida incidência, as embarcações como bens
imóveis), ou dizendo que constitui fato gerador do imposto de renda a perda
de disponibilidade sobre determinado rendimento ou parcela de receita bruta, o
que seria violação expressa do conceito do Código Tributário Nacional de que
aquele fato gerador é a aquisição de disponibilidade, ou, indiretamente, afirman-
do que se considera aquisição de disponibilidade a perda extraordinária de bens
patrimoniais" .
E assim conclui seu pensamento:
"2.20. Isso posto, parece-me que se deve concluir que o legislador não pode,
mediante o emprego de ficções ou presunções, expedir normas que ele não po-
deria formular de modo direto. Ora, se ele não pode expedir leis que desobedeçam a
prescrições constitucionais e/ou de leis complementares, é claro que não o pode mediante
ficções. O legislador tributário pode, entretanto, recorrer às ficções e às presun-
ções, sempre que a verdade legal por esse meio declarada não esteja, expressa
ou implicitamente, em desacordo com a verdade legal enunciada pela norma
superior" .

75 Op. cit., 8.
76 Cfr. op. cit., 10.
Título V I Capo I I Residentes no País Mil-
Esta é igualmente a posição defendida pela melhor doutrina brasileira, como GUSTA-
vo MrGUEZ DE MELL077, HUGO DE BRITO MAcHADo7S e YONNE DOLÁCIO DE OLIVEIRA79 •
Esta é também a doutrina do Supremo Tribunal Federal, formulada por voto do
Ministro OCTÁVIO GALLOTTI, num caso em que se discutia a legitimidade da ficção do
art. 93 do Decreto-Lei nO 37/66, referente ao imposto de importação so .
"Partindo-se da premissa de ser defesa, ao legislador ordinário, a utilização de
qualquer expediente legal que tenha por efeito frustrar, atenuar ou modificar a
eficácia de preceitos constitucionais, há de concluir-se que a equiparação preco-
nizada pelo Dec.-Lei 37/66, ao ampliar, por um artifício, o conteúdo da regra
constitucional, afrontou a própria natureza e o fundamento do gravame tribu-
tário, em detrimento dos pressupostos enunciados na Constituição".
Aplicando os princípios gerais assim formulados ao caso concreto da tributação
presuntiva da pessoa física por via reflexa da pessoa jurídica, GILBERTO DE ULHôA
CANTOSl formula as seguintes observações que calçam como uma luva à ficção equi-
paradora de "apuração" a "disponibilização" do lucro constante do art. 74 da Medida
Provisória nO 2.158-35/0l.
"5.3. Muito embora se possa admitir como lógico que os resultados líquidos au-
feridos pelas pessoas jurídicas de fins econômicos se destinam, em última instân-
cia, àqueles que detêm o seu capital social, é preciso não esquecer a nítida separa-
ção que existe entre a empresa e os seus sócios. Na verdade, a grande importância
da ficção legal da personalidade jurídica reside em tornar possível a separação de
parte do patrimônio da pessoa física, junto com as partes dos patrimônios de
outras, formar o patrimônio social afetado, único a responder pelas obrigações
desta última. Foi a partir dessa realidade legal que se construiu a teoria da tribu-
tação das pessoas jurídicas como entes distintos dos seus participantes.
"5.4. Portanto, quando se diz que do mero fato de ser estabelecido que a pes-
soa jurídica auferiu lucro se pode inferir desde logo que seus sócios adquiriram
disponibilidade, mesmo jurídica, sobre esses lucros, está-se a desconsiderar que
juridicamente os lucros e as reservas pertencem à sociedade até que sobrevenha
decisão, pelo órgão e na forma legais, no sentido de serem eles distribuídos aos
seus sócios ou acionistas, já que temos, em verdade, contribuintes distintos: a
pessoa jurídica quanto ao lucro que realiza, e seus sócios quanto às parcelas de
tais lucros sociais que lhe são distribuídas.
"5.5. O caso é, assim, justamente o mesmo de todas as situações específicas an-
tes examinadas: não é possível presumir a ocorrência do fato gerador do impos-

77 Cfr. Presunções no Direito Tributário, Cadernos de Pesquisas Tributárias 9, cit., 122.


78 Ibidem, 263.
79 Ibidem, 364
80 Cfr. RE nO 104.306, Pleno, D. J. 18.04.86, ReI. Min. OcrÁVIO GALLOI1.
81 Cfr. op. cit., 27 sS.
Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

to de renda para os sócios a partir da circunstância de se ter materializado o fato


gerador da pessoa jurídica com referência ao lucro que esta auferiu. Também
não se cogita de ficção, pois nenhuma norma de lei afirma a ocorrência do fato
gerador para os sócios nas circunstâncias analisadas: de resto, mesmo que hou-
vesse lei estabelecendo tal ficção ela não poderia prevalecer, por ser contrária ao
conceito de fato gerador do imposto de renda constante do art. 43 do CIN".
GILBERTO DE ULHÔA CANTO S2 conclui as suas considerações no sentido de que:
"( ... ), em que não cabe desconsiderar a diferença de personalidades e patrimô-
nios das pessoas jurídicas e de seus sócios, ou atribuir demasiada força à ideia de
que a destinação final dos resultados financeiros está nos seus sócios, já que são
estes que decidem, à sua conveniência, quando e como promover a separação
dos lucros sociais; a lei não pode tomar a decisão por eles e em lugar deles para
efeitos de cobrança de imposto, porque se o fizer estará instituindo tributo sem
ocorrência do fato gerador previsto no CIN".
Não se diga, como alguns defensores da tese oposta, que o art. 74 da Medida
Provisória nO 2.158-35/01 não teria consagrado uma ficção legal ilegítima, mas tão
somente o "momento temporal" do fato gerador do imposto de renda, momento
esse que teria sido apenas antecipado para a fase da apuração do lucro.
O argumento tem um elemento de sofisma, salvo o devido respeito, eis que o
momento temporal do fato gerador respeita à definição do momento em que a lei
considera ocorrido o fenômeno a que respeita e, portanto, pressupõe que este já te-
nha ocorrido ou, pelo menos, que a sua ocorrência já tenha sido iniciada.
O que a lei não pode sem adentrar no terreno da ficção legal é, a pretexto de fi-
xar o momento temporal do fato gerador, definir que ele já se produziu quando a sua
produção ainda não teve início ou pode nunca chegar a verificar-se. É precisamente o
que ocorre com o fenômeno da apuração do lucro, que é o momento lógico e crono-
logicamente anterior ao da disponibilização do lucro e que, sendo embora condição
necessária, não é, porém, suficiente, já que o lucro apurado pode ser capitalizado e
jamais devolvido em benefício dos sócios.
Deve, pois, reputar-se constitucionalmente ilegítima, por ofensa ao novo § 2°
do art. 43 do CIN, a ficção legal do art. 74 da Medida Provisória nO 2.158-35/01,
pelas razões já atrás longamente apontadas.

c) Violação do princípio da não retroatividade pelo § único


do art. 74 da Medida Provisória nO 2.158-35/01
O parágrafo único do art. 74 da Medida Provisória nO 2.158-35/01 estabelece
que "os lucros apurados por controlada ou coligada no exterior até 31 de dezembro

82 efr. op. cit., 29.


Título V I Capo I I Residentes no País I9 I

de 2001 serão considerados disponibilizados em 31 de dezembro de 2002, salvo se


ocorrida, antes desta data, qualquer das hipóteses de disponibilização previstas na
legislação em vigor".
Poucas palavras serão necessárias para demonstrar a inconstitucionalidade deste
parágrafo, de tal modo flagrante é a violação ao princípio constitucional da irretroati-
vidade da tributação consagrado no art. 150, lU, a, da Constituição, segundo o qual
é vedado "cobrar tributos em relação a fatos geradores ocorridos antes do início da
vigência da lei que os houver instituído ou aumentado".
O Código Tributário Nacional- que tem eficácia de lei complementar - resol-
veu todas as dúvidas que a aplicação do referido princípio poderia ensejar, desenvol-
vendo a específica função privativa das leis complementares, que é a de regularem as
limitações constitucionais ao poder de tributar (art. 146, inciso lI, da Constituição),
ao estabelecer:
a) que o critério definidor da aplicação retroativa das leis é o momento da
ocorrência do fato gerador, dispondo no art. 144 que "o lançamento repor-
ta-se à data da ocorrência do fato gerador da obrigação e rege-se pela lei
então vigente, ainda que posteriormente modificada ou revogada", sendo
apenas permitida a aplicação de legislação posterior à ocorrência do fato
gerador caso esta tenha "instituído novos critérios de apuração ou proces-
sos de fiscalização, ampliado os poderes de investigação das autoridades
administrativas ou privilégios, exceto, neste último caso, para o efeito de
atribuir responsabilidade tributária a terceiros";
b) que "o fato gerador da obrigação principal é a situação definida em lei como
necessária e suficiente à sua ocorrência" (art. 114);
c) que o momento da ocorrência do fato gerador, ou seja, o aspecto temporal da
hipótese de incidência, deve ser determinado de acordo com o art. 116, se-
gundo o qual, "salvo disposição da lei em contrário, considera-se ocorrido
o fato gerador e existentes os seus efeitos: I - tratando-se de situação de
fato, desde o momento em que se verificarem as circunstâncias materiais
necessárias a que produza os efeitos que normalmente lhe são próprios; II
- tratando-se de situação jurídica, desde o momento em que esteja defini-
tivamente constituída, nos termos de direito aplicável";
d) que a legislação tributária não se aplica a fatos geradores passados, aplicando-
se porém "imediatamente aos fatos geradores fUturos e aos pendentes, assim
entendidos aqueles cuja ocorrência tenha tido início, mas não estaria com-
pleta nos termos do art. 116" (art. 105).
Assim, a lei complementar oferece, nas quatro regras atrás citadas, todos os ele-
mentos necessários e suficientes para a aplicação do princípio da não retroatividade
da lei tributária: proíbe a aplicação desta lei a fatos geradores passados; define o
conceito de fato gerador; determina o momento da ocorrência do fato gerador; e,
no caso de esta se caracterizar como pendente, autoriza a aplicação imediata da lei
g I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

nova. Nenhum campo de liberdade resta, pois, à lei ordinária quanto à determinação
do seu âmbito de validade temporal.
O caráter retroativo da aplicação do art. 74 aos lucros apurados até 2001 resulta
de este ter criado um n(JfJO fato gerador e de ter determinado a tributação de fatos
ocorridos antes da entrada em vigor da nova lei, fatos esses que, conquanto conside-
rados fatos geradores pela nova lei, não o eram em face da lei anterior, à sombra da
qual se produziram.
O "novo fato gerador" criado pelo art. 74 da Medida Provisória nO 2.158-35/01
é a mera "apuração do lucro", sendo o seu momento temporal o do registro do lucro
no balanço de encerramento do exercício da controlada ou coligada estrangeira83 •

83 Já se discutiu se a expressão "balanço no qual tiverem sido apurados", utilizada no art. 74


da Medida Provisória nO 2.158-35, se refere exclusivamente ao balanço de encerramento do
período-base de incidência do imposto no país de domicílio da sociedade estrangeira, ou
se, ao invés, a expressão em causa é suficientemente ampla para abranger todo e qualquer
balanço, societário ou contábil, levantado no decurso daquele período, notadamente um
balanço especial levantado para efeitos de determinação do valor do investimento de so-
ciedade brasileira em sociedade controlada no exterior a ser aportado para a formação (ou
aumento) do capital de uma nova sociedade também domiciliada no exterior. Na sistemática
de tributação de lucros no exterior, torna-se necessário distinguir o momento no qual tais
lucros devem ser adicionados ao lucro líquido da sociedade brasileira e o momento no qual
eles devem ser, por esta, oferecidos à tributação, ou seja, o momento da adição e o momento da
tributação. Enquanto o "momento da tributação" é dado pela data do balanço da sociedade
brasileira, o "momento da adição" é dado pela data do balanço de apuração da sociedade
estrangeira. Ainda um outro argumento no mesmo sentido resulta do art. 6°, § 3°, da Ins-
trução Normativa nO 213, de 7 de outubro de 2002 - editada na sequência do art. 74 da
Medida Provisória nO 2.158- 35/01 -, segundo o qual a conversão em reais dos valores das
demonstrações financeiras deve ser apurada com base na taxa de câmbio "na data do encer-
ramento do período de apuração relativos às demonstrações financeiras em que tenham sido
apurados os lucros dessa filial, sucursal, controlada ou coligada". Ora, tal data corresponde
à data do balanço fiscal e não a de balanços intermediários eventualmente levantados me-
dia temporis. A referência expressa da lei (inciso I do § 2° do art. 25 da Lei nO 9.249/95) a
"exercícios fiscais" revela bem que o balanço de apuração é o balanço fiscal, ou seja, o balanço
que se refere ao período-base de incidência de imposto no país de domicílio da sociedade
estrangeira e não um balanço de efeitos meramente societários ou contábeis, como seria o
caso de um balanço especial para avaliação de investimento com o fim de realizar operação
de subscrição de capital. Um outro argumento, que aponta no mesmo sentido, consiste no
princípio da remissão para a lei brasileira no que concerne à demonstração da apuração dos
lucros, princípio esse constante do inciso I in fine do § 2° do art. 25 da Lei nO 9.249/95,
que expressamente determina que tal demonstração deve ser efetuada "segundo as normas
da legislação brasileira". Ora, uma das normas fundamentais da legislação brasileira no que
concerne à demonstração da apuração dos lucros é a que respeita à sua periodicidade e que
faz coincidir o período de apuração do lucro com o período de incidência do imposto, ou
seja, faz coincidir o balanço fiscal com o exercício fiscal. Aos argumentos de caráter literal atrás
referidos acresce ainda o argumento lógico-racional, pois o espírito de lei é de que a adição
do lucro de origem externa seja realizada ao lucro líquido da sociedade brasileira também
uma só vez por ano e não tantas vezes quanto os balanços de finalidades meramente contábeis
ou societárias eventualmente levantados pela sociedade estrangeira ao longo do exercício fis-
Título V I Capo I I Residentes no País

Ora, esta mera apuração do lucro no balanço não era considerada fato gerador
pela Lei anterior (a Lei nO 9.532/97), que considerava apenas como fato gerador a
disponibilização do lucro para a pessoa jurídica domiciliada no Brasil.
Dispõe, na verdade, o art. l° da Lei nO 9.532/97 que:
'2\rt. 1° Os lucros auferidos no exterior, por intermédio de filiais, sucursais, contro-
ladas ou coligadas serão adicionados ao lucro líquido, para determinação do lucro
real correspondente ao balanço levantado no dia 31 de dezembro do ano-calendário
em que tiverem sido disponibilizados para a pessoa jurídica domiciliada no Brasil.
"§ 1° Para efeito do disposto neste artigo, os lucros serão considerados disponibili-
zados para empresa no Brasil:
"( ... )
CCb) no caso de controlada ou coligada) na data do pagamento ou do crédito em conta
representativa de obrigação da empresa no exterior;
"( ... ).
"§ 2° Para efeito do disposto na alínea b do parágrafo anterior, considera-se:
CCa) creditado o lucro, quando ocorrer a transferência do registro de seu valor
para qualquer conta representativa de passivo exigível da controlada ou coligada
domiciliada no exterior;
CCb) pago o lucro, quando ocorrer:
1. o crédito do valor em conta bancária, em favor da controlada ou coligada no
Brasil;
2. a entrega, a qualquer título, a representante da beneficiária;
3. a remessa, em favor da beneficiária, para o Brasil ou para qualquer outra praça;
4. o emprego do valor, em favor da beneficiária, em qualquer praça, inclusive no
aumento de capital da controlada ou coligada, domiciliada no exterior".
Pela leitura do art. 1° atrás transcrito verifica-se que, em matéria de controladas
e coligadas no exterior, a lei arvorou o conceito de "disponibilização" em núcleo es-
sencial do fato gerador, definiu diversas hipóteses que considera de disponibilização,
hipóteses essas que, porém, não abrangem a simples "apuração" do lucro em balanço.
Por conseguinte, a mera apuração de lucro em balanço não era considerada, como
fato gerador, ao abrigo da legislação anterior à Medida Provisória nO 2.158-35/01.
Com efeito, o art. 114 do Código Tributário Nacional dispõe que "fato gerador
da obrigação principal é a situação definida em lei como necessária e suficiente à sua
ocorrência". Por sua vez, o art. 116 do mesmo Código dispõe que, "salvo disposição
de lei em contrário, considera-se ocorrido o fato gerador e existentes os seus efeitos:
I - tratando-se de situação de fato, desde o momento em que se verifiquem as cir-

cal. Finalmente, um argumento sistemático para corroborar a interpretação aqui sustentada


segundo o qual o balanço relevante para efeitos de adição é o balanço fiscal, resulta de que
é nesse balanço que deve ser apurado o imposto estrangeiro, que pode ser compensado com o
imposto brasileiro, nos termos do art. 26 da mesma Lei nO 9.249/95.
I _ I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

cunstâncias materiais necessárias a que produza os efeitos que normalmente lhe são
próprios; II - tratando-se da situação jurídica, desde o momento em que esteja definiti-
vamente constituída, nos termos de direito aplicável".
Ora, destes preceitos resulta que a mera apuração do lucro no balanço não era
considerada fato gerador pela lei antiga, pois muito embora fosse, em alguns casos,
necessária à sua ocorrência, nunca era suficiente) pois a tributação não existia antes do
momento, necessariamente ulterior, da disponibilização.
Por outro lado, em face do art. 116, sendo a disponibilização uma situação jurí-
dica, é evidente que ela não se encontra definitivamente constituída no momento da
mera apuração do lucro no balanço, pois pressupõe um ato lógica e cronologicamen-
te posterior de transferência do patrimônio da sociedade para o do sócio.
Dúvidas não podem, pois, subsistir de que a apuração do lucro não era conside-
rada fato gerador em face da lei anterior) pelo que a exigência efetuada por lei nova
quanto a fatos ocorridos no passado, que não eram então fatos geradores, caracteriza
ostensiva e clara retroatividade inconstitucional.

E) O art. 74 da Medida Provisória nO 2.158-35/01


e os tratados contra a dupla tributação

(i) Considerações preliminares

O art. 74 da Medida Provisória na 2.158-35/01 suscita as mesmas questões


relativas à sua compatibilidade com os tratados contra a dupla tributação que o art.
25 da Lei na 9.249/95 (para o qual aliás remete expressamente) suscitou desde a sua
entrada em vigor e que só não teve repercussões significativas nos tribunais tendo em
vista que a Instrução Normativa na 38/96, legalizada pela Lei na 9.532/97, pratica-
mente bloqueou a vigência do sistema de tributação extraterritorial, cuja efetividade
plena apenas veio a ocorrer com a entrada em vigor do art. 74 atrás referido.
São, com efeito, invocáveis tanto a incompatibilidade genérica com o art. 70 dos
tratados que seguem o art. 70 da Convenção Modelo da OCDE quanto as incompa-
tibilidades específicas com cláusulas especiais de tratados celebrados pelo Brasil com
certos países.
Remete-se aqui por inteiro para o que atrás se escreveu sobre essa matéria84 .

(ii) A questão do dividendo ficto

A única especificidade que a questão da compatibilidade dos tratados com o art.


74 faz surgir é quanto à questão de saber qual o objeto da tributação em face do novo
diploma legal e sua consequente qualificação à luz das disposições dos tratados.

84 efr. supra, 376 ss e 385 ss.


Título V I Capo I I Residentes no País .Ii.
A doutrina, na sua esmagadora maioria, continuou a manifestar-se no sentido
de que o objeto da tributação do art. 74 era precisamente o mesmo do art. 25 da Lei
nO 9.249/95, ou seja, os lucros das sociedades controladas e coligadas estrangeiras
que, através da adição ao lucro líquido da sociedade brasileira, passaram a constituir
base de cálculo do tributo sobre ela incidente.
Todavia, a teoria concebida em face de certas legislações estrangeiras de que a
tributação teria por objeto um dividendo ficto (deemed dividend) acabou tendo resso-
nância no Brasil baseada na própria expressão do legislador segundo a qual os lucros
das sociedades estrangeiras "serão considerados disponibilizados" para a sociedade
brasileira por ocasião da sua apuração no balanço.
Os defensores desta tese argumentam que, se tratando de um lucro ficticiamente
disponibilizado, a sua qualificação perante os tratados internacionais seria a de divi-
dendo, submetido ao art. 10 da Convenção Modelo, e não a de lucro, submetido ao
art. 7°85.
Tal qualificação arrastaria como consequência a plena competência tributária
do Brasil, pois enquanto o art. 7° contém uma cláusula de reconhecimento de com-
petência tributária excluviva do Estado de origem do lucro o art. 10 consagra uma
norma de reconhecimento de competência tributária cumulativa, tanto do país da
fonte quanto do país de residência 86 •
Esta construção não merece, porém, acolhimento por várias ordens de razões.
A principal crítica que deve ser dirigida a este entendimento está em que a lei
interna que fundamenta a tributação (o art. 25 da Lei 9.249/95, para o qual remete
o art. 74 da Medida Provisória nO 2158-35/01) não permite a referida construção,
eis que alude à adição ao lucro da pessoa jurídica brasileira dos próprios lucros au-
feridos por controladas e coligadas no exterior, independentemente de serem pagos
ou creditados. A ficção de disponibilização mais não significa do que a determinação

85 Esta interpretação foi adotada no Acórdão na 108-08-765, de 23.03.2006 por influência


do voto do Conselheiro JosÉ HENRIQUE LONGO, e tem sido posteriormente manifestada em
votos minoritários. Em artigo científico publicado posteriormente, o mesmo Conselheiro
reiterou o seu ponto de vista, sustentando que o art. 74 da Medida Provisória nO 2.158-
35/01 tem por objeto o lucro propriamente dito da controlada ou coligada no exterior,
mas logo acrescenta "que, para efeito da incidência do IRPJ e da CSL, e mediante alteração
do conteúdo do conceito, devem ser considerados como dividendos". Cfr. JosÉ HENRIQUE
LONGO, O lucro de subsidiária no exterior e o tratado internacional, in Tributação e processo
- IV Congresso Nacional de Estudos Tributários, São Paulo, 2007, 291. A tese já tinha sido
suscitada, no curso do julgamento, ainda que de forma não conclusiva, no Acórdão nO 101-
95.802, de 19.10.2006.
86 Cfr. O Acórdão nO 107-07.532, de 18.02.2004, do então Primeiro Conselho de Contribuin-
tes, apreciando a questão da compatibilidade da lei interna com o Tratado Brasil-Portugal,
concluiu precisamente no sentido de ser incompatível o regime do art. 25 da Lei na 9.249/95
°
em face da regra de competência exclusiva do art. 7° do Tratado e compatível regime do
art. 10 da Lei nO 9.532/97, em face da regra de competência cumulativa do art. 10 do mesmo
diploma.
Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

do momento temporal que esse cômputo se deve verificar, não tendo o condão de
alterar a natureza do objeto da tributação.
Que a lei interna trata de uma tributação de lucro e não de dividendos é con-
firmado pelo fato de os lucros serem computados pelos seus valores integrais, sem
dedução do imposto pago do país de origem. Ora, não se distribuem dividendos em
valor superior ao lucro disponível após a tributaçãoB 7 •
Ainda, porém, que a lei interna consagrasse a tributação de um "dividendo
ficto", não poderia ela prevalecer em face do conceito de dividendo consagrado nos
tratados contra a dupla tributação (art. 10, § 1°). A letra destes (em conformidade,
aliás, com a O:mvenção Modelo da OCDE) se refere a dividendos "pagos", expressão
que revela inequivocamente a vontade de o regime de competência cumulativa nela
consagrado apenas se aplicar a rendimentos efetivamente destacados do patrimônio
das sociedades e transferidos para o de seus sócios, não permitindo uma interpretação
ampla que abrangesse lucros não distribuídos imputados por mera ficção legal88 •
Acresce que a teoria geral do direito ensina ser ilegítimo o emprego, por uma
fonte de direito, do mecanismo das ficções ou presunções legais (como o dividendo
ficto) para invadir a esfera de competência de outra fonte, delimitada em razão da
hierarquia ou da especialidade (como sucede com os tratados), com vista a evitar,
de modo indireto ou oblíquo, a prevalência da sua aplicação. Nada mais fácil para
burlar as disposições dos tratados do que criar, por lei interna, ficções legais que
estabeleçam exatamente o contrário do disposto nos preceitos convencionais. E é
precisamente a este resultado que conduz a doutrina do dividendo ficto.
Não é demais recordar que a cláusula de competência tributária exclusiva do
país estrangeiro de domicílio da controlada ou coligada (e simetricamente de ex-
clusão de competência do país de sociedade investidora), constante do art. 7° da
Convenção Modelo da OCDE, é o "coração dos tratados". Sem ela estaria permitida
toda a sorte de guerra fiscal unilateral pelo qual os Estados se arrogassem o poder de
taxar empresas estrangeiras, invadindo espaços de soberania alheios.

(iii) A questão das controladas indiretas

Coloca-se ainda a questão de saber qual o alcance da proteção conferida pelo


art. 7° dos tratados nos casos em que a sociedade controlada no exterior detém par-
ticipações em outras controladas ou coligadas em terceiros Estados.

87 Cfr. art. 1°, § 7°, da Instrução Normativa nO 213/02. O art. 201 da Lei das S/A afirma que
a companhia pode pagar dividendos à conta de lucro líquido e o art. 191 dispõe que este é
o resultado do exercício que remanescer depois de deduzidas as participações do art. 190 e,
antes destas, os prejuíws acumulados e a provisão para o imposto de renda (art. 189).
88 Cfr. neste sentido J. F. BJANCO, Transparência fiscal internacional, cit., 152, 157.
Título V I Capo I I Residentes no País .'p'
Certos setores da jurisprudência administrativa já sustentaram que, "para fins
de aplicação do art. 74 da Medida Provisória nO 2.158-35, os lucros de controladas
indiretas consideram-se auferidos diretamente pela investidora brasileira, e sua tribu-
tação no Brasil não se submete às regras do tratado internacional firmado com o país
de residência da controlada direta"89.
De acordo com referido entendimento, a proteção conferida pelo art. 7° dos
tratados contra a dupla tributação limita-se aos lucros diretamente apurados pela
sociedade residente naquele País, não alcançando os lucros das suas próprias con-
troladas e/ou coligadas que, muito embora não distribuídos, eventualmente tenham
sido reconhecidos no balanço em razão da aplicação do método da equivalência
patrimonial
O entendimento em questão assenta nas seguintes premissas:
(i) o art. 25 da Lei nO 9.249/95 instituiu a tributação sobre o lucro das
controladas no exterior;
(ii) o conceito de sociedade controlada da legislação societária (art. 243, §
2°, da Lei nO 6.404/76) abrange qualquer sociedade na qual a contro-
ladora, diretamente ou através de outras controladas, exerça o poder
de controle;
(iii) o art. 16 da Lei nO 9.430/96 determina que "os lucros auferidos por
filiais, sucursais, controladas e coligadas no exterior, serão: I - consi-
derados de forma individualizada) por filial, sucursal, controlada ou
coligada" ;
(iv) o art. 7° dos tratados contra a dupla tributação (no caso concreto o
Tratado com a Espanha) proíbe a tributação pelo Estado de residência
(no caso o Brasil) dos lucros de sociedades residentes no Estado da
fonte (no caso a Espanha);
(v) como a adição ao lucro real da sociedade controladora no Brasil faz-se
diretamente sobre os lucros de todas as controladas, ainda que indi-
retas, referida proteção dar-se-á apenas sobre os lucros obtidos dire-
tamente pela sociedade residente no país que tenha celebrado tratado
contra a dupla tributação com o Brasil (no caso a Espanha), não alcan-
çando eventuais lucros das controladas indiretas, cuja suscetibilidade
de tributação dependerá da existência ou não de tratado com o respec-
tivo país de domicílio.
As premissas em que este entendimento assenta são, porém, equivocadas.
A afirmação segundo a qual o conceito de sociedade controlada, adotado pela
Lei nO 6.404/76, abrange não só as controladas diretas mas também as indiretas é
indiscutivelmente exata, mas daí a permitir a conclusão de que o art. 74 da Medida

89 efr. Acórdão nO 101-97.070, de 17 de dezembro de 2008. E esta tese é também defendida


por A'lDRÉ MARTINS DE ANDRADE,A tributação universal da renda empresarial, cit., 253 55.
6 I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier I

Provisória na 2.158-35 impõe a adição dos lucros das controladas indiretas ao lucro
líquido da controladora brasileira, para efeitos do art. 25 da Lei nO 9.249/95 (para
o qual remete o art. 74), vai uma grande distância, constituindo um salto lógico,
simplista e sedutor pela sua aparente literalidade, mas que o sistema jurídico não
admite.
Antes de mais, a expressão "controlada", utilizada no art. 74, não pode ser in-
terpretada de modo desgarrado, pois ela se encontra sistematicamente relacionada na
mesma proposição normativa com o conceito de "lucro disponibilizado".
Ora está bem de ver que lucro disponível é, por definição, aquele que a lei per-
mite à controlada disponibilizar à controladora brasileira, caso esta, no exercício do
seu poder de controle, delibere pela sua disponibilização. Com efeito, só em relação
a estes lucros se aplica a lógica do regime de transparência fiscal internacional, que
tributa imediatamente junto dos sócios os lucros que estes poderiam ter determinado
a distribuição, mas por ato de sua exclusiva vontade não o fizeram. Mas já não pode-
rão ser tributados nas mãos dos sócios lucros que, devido às circunstâncias do caso
concreto, poderão ser insuscetíveis de disponibilização, como sucede com os lucros
de controladas indiretas, notadamente na hipótese de serem absorvidos por perdas
de sociedades intermédias situadas em degraus ascendentes da cadeia de controle e
outras circunstâncias, como adiante se verá.
A questão de saber que lucros são disponibilizáveis para uma sociedade con-
troladora brasileira - se apenas os lucros da controlada indireta estrangeira ou se
também, per saltum, os lucros das controladas indiretas, por esta controladas - deve
ser resolvida em face do direito brasileiro. É o que determina o § 2°, inciso I, do art.
25 da Lei na 9.249/95 (para o qual remete o art. 74): '1\.s filiais, sucursais e contro-
ladas deverão demonstrar a apuração dos lucros que auferirem em cada um de seus
exercícios fiscais, segundo as normas da legislação brasileira".
Ora, a lei brasileira apenas permite a distribuição de lucros de uma sociedade a
quem for sócio (Código Civil, art. 997, VII, e art. 1007), sendo nula qualquer delibe-
ração que tenha como destinatários terceiros, inclusive os sócios de sócios 90 •
A regra segundo a qual os lucros auferidos por filiais controladas e coligadas no
exterior serão considerados de forma individualizada (art. 16 da Lei nO 9.430/96) sig-
nifica apenas que os prejuízos apurados por uma controlada ou coligada, no exterior,
somente poderão ser compensados com lucros dessa mesma controlada ou coligada
(Instrução Normativa nO 213/02, art. 4°, § 2°), não podendo consequentemente ser
compensados com lucros de outras controladas e coligadas no exterior, nem com lucros
da sociedade investidora domiciliada no Brasil (art. 25, § 5°, da Lei nO 9.249/95).
É o que também esclarece o § 5° do art. l° da Instrução Normativa nO 213/02,
segundo o qual, "para efeito de tributação no Brasil, os lucros serão computados na

90 Veja-se o art. 205 da Lei das S/A: "A companhia pagará o dividendo de ações nominativas à
pessoa que, na data do ato de declaração do dividendo, estiver inscrita como proprietária ou
usufrutuária da ação".
Título V I Capo I I Residentes no País -*li
determinação do lucro real e da base de cálculo da CSLL, de forma individualizada,
por filial, sucursal, controlada ou coligada, vedada a consolidação dos valores, ainda
que todas as entidades estejam localizadas em um mesmo país, sendo admitida a
compensação de lucros e prejuízos conforme disposto no § 5° do art. 4° desta Ins-
trução Normativa".
Vedou-se, pois, a consolidação horizontal.
No que concerne à consolidação vertical) os princípios do direito societário bra-
sileiro foram corretamente interpretados pelo § 6° do art. 1° da referida Instrução
Normativa nO 213, que dispõe que "os resultados auferidos por intermédio de outra
pessoa jurídica, na qual a filial, sucursal, controlada ou coligada no exterior, mantenha
qualquer tipo de participação societária, ainda que indiretamente, serão consolidados
no balanço da filial, sucursal, controlada ou coligada para efeito de determinação do
lucro real e da base de cálculo da CSLL da beneficiária no Brasil".
Significa isto que os lucros das controladas indiretas não podem ser adiciona-
dos per saltum ao lucro da sociedade brasileira; antes devem ser consolidados gradati-
vamente, por níveis ou degraus da cadeia vertical, em cada um dos quais serão consi-
derados como componentes do lucro de cada controladora intermédia, a ser apurado
de "forma individualizada". E assim sucessivamente na cadeia ascendente, até que a
consolidação opere no nível da primeira controlada direta estrangeira, quando então
o lucro (ou prejuízo) próprio desta será adicionado ao da controladora brasileira,
como determina o art. 74 da Medida Provisória nO 2.158-35.
Tal consolidação vertical se faz em reconhecimento, no plano fiscal, de que no
direito societário brasileiro não há uma participação direta da controladora no Brasil
nos resultados de controlada ou coligada indireta, mas apenas através da necessária
intermediação da pessoa jurídica interposta, pelo que os resultados individuais desta
têm de ser necessariamente considerados para efeitos de determinar a matéria tribu-
tável no Brasil9 ! .
Este é o sistema de reconhecimento do lucro numa cadeia vertical de participa-
ções consagrado pela lei brasileira e que deve ser obedecido no regime de transpa-
rência fiscal internacional.
Neste sistema, os lucros das controladas indiretas não podem ser considerados
disponibilizados per saltum para a controladora brasileira e junto a ela tributados,
pois tal tributação poderá estar incidindo sobre um resultado que jamais chegará às
mãos daquela controladora.
Tal ocorrerá na hipótese de existência de prejuízos ou perdas em sociedades
estrangeiras situadas em degraus mais elevados do elo societário, que absorverão
referidos lucros, e ainda na hipótese de o controlador brasileiro alienar a participação
na primeira controlada estrangeira, quando deixa ipso iure de ter qualquer vínculo

91 O § 6° da Instrução Normativa nO 213 não é, pois, mera "norma técnica de arrecadação",


como sustenta MARTINS DE ANDRADE (op. cit., 257), mas disposição que contém a única in-
terpretação possível da lei.
I ~ I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

jurídico com as controladas indiretas legitimador de wna disponibilização, eis que


sua relação societária passa necessariamente pela primeira controlada.
Note-se que a lei poderia ter determinado que a consolidação dos lucros das
controladas e coligadas estrangeiras operasse diretamente no balanço da controlado-
ra no Brasil, mas ao invés disso optou por consolidar os resultados ao nível da pri-
meira controlada estrangeira, afastando assim qualquer influência que os resultados
individuais da controladora brasileira pudessem ter sobre os resultados consolidados
da cadeia de participações no exterior.
Ao determinar, porém, a consolidação ao nível da controlada direta estrangeira
e não da controladora brasileira, a lei reconheceu que apenas os resultados dessa pri-
meira controlada (no qual se inserem os resultados das demais) é que são passíveis
de tributação no Brasil, pois só estes podem ser efetivamente disponibilizados sob
a forma de dividendos. Ora, como se disse, é apenas em relação aos lucros dispo-
nibilizáveis que se aplica o sistema de tributação automática do art. 74 da Medida
Provisória nO 2.158-35.
Logo, a tributação no Brasil de lucros de wna controlada indireta no exterior
per saltum da primeira controlada direta representa verdadeira ofensa ao art. 43 do
Código Tributário Nacional, na medida em que se está tributando o patrimônio da
controladora, tomando-se por base renda alheia, que no máximo constitui expectati-
va de renda para a controlada direta, mas jamais para a controladora no Brasil.
A incongruência lógica da interpretação para a qual deve ser feita a adição per
saltum dos lucros das controladas indiretas fica bem evidenciada pela circunstância
de que tais lucros seriam protegidos pelo tratado que protege a primeira controlada
direta, caso lhes tivessem sido efetivamente distribuídos, compondo então o lucro
próprio desta.
Assim, de harmonia com a referida interpretação, os mesmos lucros das contro-
ladas indiretas ficarão sujeitos a regimes de tributação distintos consoante tenham
sido distribuídos ou não para a sua controladora direta. Caso tivessem sido distribuí-
dos, passarão a ser considerados pelo Brasil como lucros da própria controlada direta
e, em virtude do art. 7° dos tratados, impedidos de serem tributados pelo Brasil
enquanto, por outro lado, se forem retidos na controlada indireta domiciliada num
terceiro Estado sem tratado com o Brasil (vg. Estados Unidos), poderão (sempre na
mesma interpretação) ser integral e imediatamente tributados pelo Brasil, indepen-
dentemente da sua efetiva distribuição.
Imagine-se agora que a controlada direta domiciliada num país com tratado
com o Brasil (vg. Espanha) tenha registrado prejuízos ao longo do exercício e que os
lucros da sociedade norte-americana sua controlada são distribuídos para neutralizar
as perdas, fazendo com que se registre wn resultado nulo.
Nesse caso, o Brasil terá tributado integral e antecipadamente wn lucro que
nunca lhe pertenceu e que jamais lhe pertencerá. O absurdo fala por si só.
É certo que algumas legislações CFC propriamente ditas permitem que o país
da sociedade controladora inclua na sua base tributável rendimentos auferidos por
Título V I Capo I I Residentes no País

controladas indiretas. Deve, porém, ter-se presente que tais legislações têm por ob-
jeto apenas certas classes de rendimentos, os "rendimentos passivos", e não, como a
lei brasileira, "lucros" em sentido técnico, os quais pela sua própria natureza só po-
dem ascender até à sociedade controladora por meio de distribuições às controladas
intermédias.
Pode, pois, concluir-se que o objeto exclusivo da tributação pelo art. 74 da
Medida Provisória nO 2.158-35 é o lucro da primeira controlada direta estrangeira,
após a consolidação vertical, de tal modo que, se esta estiver domiciliada em país sig-
natário de tratado, o art. 7° abrange a totalidade desse lucro sem qualquer distinção
quanto à sua origem.

F) Outras questões

a) A questão da dedutibilidade de juros de empréstirrws concedidos


por coligadas e controladas no exterior
O § 3° do art. 1° da Lei nO 9.532, de 10 de dezembro de 1997, na sua redação
original, determinava que "não serão dedutíveis na determinação do lucro real os
juros, pagos ou creditados a empresas controladas ou coligadas, domiciliadas no
exterior, relativos a empréstimos contraídos, quando, no balanço da coligada ou con-
trolada, constar a existência de lucros não disponibilizados para a controladora ou
coligada no Brasil".
O pressuposto em que assenta este regime é o de uma pretensa "desnecessidade"
de uma despesa financeira decorrente da tomada de um empréstimo por empresa
brasileira quando esta teria a alternativa de obter os recursos pretendidos por via da
disponibilização de lucros das suas controladas e coligadas no exterior.
O referido preceito legal viria a sofrer duas alterações.
A primeira pela Medida Provisória nO 1.924, de 7 de outubro de 1999 (conver-
tida na Lei nO 9.959, de 27 de janeiro de 2000), segundo a qual "não serão dedutí-
veis na determinação do lucro real e da base de cálculo da Contribuição Social sobre
o Lucro Líquido os juros, pagos ou creditados, incidentes sobre o valor equivalente
aos lucros não disponibilizados por empresas: I - coligadas ou controladas, domi-
ciliadas no exterior, quando estas forem as beneficiárias do pagamento ou crédito;
TI - controladas, domiciliadas no exterior, independente do beneficiário".
Referida alteração manteve o pressuposto da existência de lucros não disponibi-
lizados por controladas e coligadas no exterior, tendo porém estabelecido um limite
para o valor dos juros indedutíveis, consistente no valor dos juros calculados sobre os
lucros não disponibilizados. Por outro lado, alargou as hipóteses de indedutibilidade
ao caso em que o mutuante dos recursos fosse toda e qualquer empresa, no caso de
lucros não disponibilizados por controlada no exterior, enquanto que se os lucros
não disponibilizados pertencessem a simples coligadas no exterior a indedutibilidade
só se referiria aos empréstimos por elas próprias concedidos.
e I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

A segunda alteração do regime de indedutibilidade foi introduzida pela Medida


Provisória na 1.991-15/00 (atualmente prevista no art. 34 da Medida Provisória na
2.158-35/01 )92, que deu origem à seguinte nova redação: ''Não serão dedutíveis
na determinação do lucro real e da base de cálculo da Contribuição Social sobre o
Lucro Líquido os juros, relativos a empréstimos, pagos ou creditados a empresa con-
trolada ou coligada, independente do local de seu domicílio, incidentes sobre valor
equivalente aos lucros não disponibilizados por empresas controladas, domiciliadas
no exterior".
Tal alteração consiste essencialmente em restringir o âmbito da indedutibilidade
aos empréstimos intercompany, ou seja, concedidos por empresas controladas ou co-
ligadas, nacionais ou estrangeiras, e já não por todo e qualquer terceiro.
Por outro lado, o pressuposto de aplicação do preceito em causa também se
restringiu, na medida em que apenas considera relevante a existência de lucros não
disponibilizados por controladas estrangeiras 93 e já não assim por simples coligadas,
pois efetivamente só em tal caso pode valer a presunção de "desnecessidade" da des-
pesa ftnanceira em razão de uma pretensa liberdade de determinar a disponibilização
de recursos existentes em sociedades estrangeiras.
Tenha-se presente que o referido regime de indedutibilidade não se nos aftgura
compatível com o art. 43 do Código Tributário Nacional, na medida em que ele
introduz uma restrição artiftciosa ao conceito de renda enquanto acréscimo patrimo-
nial, conduzindo indiretamente à tributação do patrimônio.
Observe-se, por ftm, que o regime em causa não é suscetível de coexistir logi-
camente com a nova sistemática de tributação automática de lucros de controladas e
coligadas no exterior introduzida pelo art. 74 da Medida Provisória na 2158-35/01,
eis que, consagrando, por ftcção, a mera apuração do lucro como forma de disponi-
bilização, deixa de fazer sentido, em relação a controladas e coligadas, o conceito de
lucros não disponibilizados, único requisito legal para a aplicação da sistemática da
indedutibilidade estabelecida no art. 34 da Medida Provisória na 2.158-35/01.
Com efeito, o art. 34 da Medida Provisória na 2.158-35/01 em nenhum mo-
mento se referiu à disponibilização efetiva de recursos como requisito de dedutibili-
dade dos juros, donde conclui-se que referida sistemática não decorre de uma "desne-
cessidade" da despesa ftnanceira pela suposta possibilidade de obtenção dos recursos
por via da disponibilização de lucros das suas controladas e coligadas no exterior.

92 Cuja vigência foi mantida nos termos do art. 2° da EC nO 32/0l.


93 Entendemos que o conceito de empresas controladas refere-se exclusivamente aos casos em
que exista uma relação de controle direto. Com efeito, se a sistemática de indedutibilidade
assenta numa presunção de uma posterior disponibilidade dos lucros das sociedades estran-
geiras, essa presunção só pode ocorrer na relação em que seja possível uma distribuição, ou
seja, nas relações diretas entre uma sociedade participante e uma participada em que pode
existir um direito ao dividendo, pois, não é possível uma distribuição per saltum a título de
dividendo a pessoa que não participa diretamente do capital da própria sociedade que os
distribui.
Título V I Capo I I Residentes no País Mti-

A evolução legislativa do dispositivo em análise demonstra de forma inequívoca


que a sistemática da indedutibilidade dos juros de empréstimos com controladas
e coligadas sempre esteve inserida no bojo do regime de tributação dos lucros das
controladas e coligadas no exterior como mecanismo alternativo à tributação de tais
lucros, tanto que vinculado à simples existência de lucros "não disponibilizados",
sendo irrelevante tratar-se de uma disponibilização ficta ou efetiva.
Não se trata, portanto, de regra autônoma de não dedutibilidade, pois, como
visto, a efetiva disponibilização dos recursos financeiros não é fundamental à carac-
terização da despesa dedutível. Tal caracterização se faz única e exclusivamente com
base na existência de lucros não disponibilizados na forma da lei, sendo irrelevante
perquirir a necessidade ou não da despesa.
E que a indedutibilidade dos juros não é uma regra autônoma, mas mero me-
canismo encontrado pelo legislador para tributar por via transversa os lucros das
controladas e coligadas no exterior, evidencia-se pelo fato de tal dispositivo (i) ter
sido originalmente introduzido na legislação tributária concomitantemente com
a mudança no regime de tributação dos lucros no exterior produzida pela Lei nO
9.532/97; e (ii) de o mesmo ter como único requisito a existência de lucros não dis-
ponibilizados na forma da lei.
Ora, sendo um regime substitutivo de tributação dos lucros no exterior, uma vez
considerada indedutíveis as despesas com juros até o limite dos lucros, não há que se
pretender uma segunda tributação quando da sua efetiva disponibilização, pois isto
equivaleria a uma injustificada dupla tributação ou bis in idem.
Nem se fale de uma "indedutibilidade perpétua" dos juros enquanto não efe-
tivamente disponibilizados os lucros, pois uma vez considerada como indedutível a
despesa até o montante dos lucros há que se ter por totalmente tributado o lucro,
como se disponibilizado fosse.
Pretender considerar novamente como indedutíveis as despesas com juros seria
uma tributação inconstitucional do patrimônio da controladora, assentada em um
pressuposto, como visto, inverídico de desnecessidade da despesa financeira.
O art. 34 da Medida Provisória nO 2.158-35/01 não tem, portanto, caráter au-
tônomo ou aditivo em relação à tributação dos lucros no exterior, sendo mera tribu-
tação substitutiva daqueles lucros, pelo que a matéria tributável em seu fundamento
(os juros indedutÍveis) nunca pode exceder a matéria tributável de que eles são suce-
dâneo (os lucros não disponibilizados).

b) A compensação de prejuízos auferidos no exterior

Em matéria de operações externas de pessoas jurídicas brasileiras, a lei consagra


um método de tributação separada, isolando claramente duas esferas de tributação
independente - a esfera interna e a esfera externa - de tal modo que os "prejuízos e
perdas decorrentes das operações referidas neste artigo (no exterior) não serão com-
pensados com lucros auferidos no Brasil" (art. 25, § 5°).
I gm I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Todavia, as perdas incorridas no Brasil poderão absorver ganhos obtidos no


exterior, pois estes são adicionados ao lucro líquido no Brasil, quando disponibiliza-
dos, para efeitos de cálculo do lucro real, no qual as perdas brasileiras serão também
levadas em consideração.
A Instrução Normativa nO 38/96 veio pela primeira vez regulamentar o referido
regime, estabelecendo restrições adicionais não previstas em lei, mantidas pela Ins-
trução Normativa nO 213/02, que a substituiu.
No que concerne à atividade diretamente exercida no exterior por pessoas jurí-
dicas brasileiras, são indedutíveis do lucro real os prejuízos e as perdas de capital
incorridos no exterior, inclusive as decorrentes de alienação de filiais e sucursais e
de participações societárias em pessoas jurídicas domiciliadas no exterior (Instrução
Normativa nO 213/02, art.12).
Única exceção à regra da indedutibilidade é constituída pelos resultados líquidos
negativos, obtidos em operações de cobertura (hedge) realizadas em mercados de
liquidação futura, diretamente pela empresa, em bolsas no exterior (art. 17 da Lei nO
9.430/96; Instrução Normativa nO 213/02, art. 11).
No que concerne à atividade indiretamente exercida por coligadas e controladas) no
exterior, a lei estabelece que os lucros deverão ser considerados de forma individuali-
zada (Lei nO 9.430/96, art. 16), de tal modo que os prejuízos apurados por uma con-
trolada ou coligada, no exterior, somente poderão ser compensados com lucros dessa
mesma controlada ou coligada (Instrução Normativa nO 213/02, art. 4°, § 2°)9\ não
podendo consequentemente ser compensados com lucros de outras controladas e
coligadas no exterior, nem com lucros da sociedade investidora domiciliada no Brasil
(art. 25, § 5°, da Lei nO 9.249/95).
Todavia, no caso de participações indiretas das controladas ou coligadas no
exterior, os resultados auferidos pelas sociedades participadas são consolidados no
balanço da controlada ou coligada para efeito de determinação do lucro real da bene-
ficiária, no Brasil (Instrução Normativa nO 213/02, art. 1°, § 6°, art. 1°, § 8°)95.
Duas exceções a anotar à regra da indedutibilidade.
A primeira exceção é representada pelos resultados de aplicações financeiras de
renda variável no exterior, em um mesmo país, que poderão ser consolidados para
efeitos de cômputo do ganho (Instrução Normativa nO 213/02, art. 9°, § 1°).
A segunda exceção consiste na hipótese de empresa brasileira absorver patrimô-
nio de filial, sucursal, controlada ou coligada, no exterior, de outra empresa brasi-
leira, e continuar a exploração das atividades no exterior, a qual poderá compensar
os prejuízos acumulados pela referida filial, sucursal, controlada ou coligada, cor-
respondente aos períodos iniciados a partir do ano-calendário de 1996 (Instrução
Normativa nO 213/02, art. 4°, § 4°).

94 Esta compensação não obedece aos limites e restrições quantitativos e temporais constantes
do art. 15 da Lei nO 9.065/95.
95 Sobre esta simação, cfr. JOÃo DODSWORTH CORDEIRO GUERRA, op. cit.) 67.
Título V I Capo I I Residentes no País

No que conceme à atividade indiretamente exercida porfiliais ou sucursais no exterior, a


lei determina que os respectivos lucros serão considerados de fonna individualizada (Lei
nO 9.430/96, art. 16, I), estabelecendo, porém, a Instrução Normativa nO 213/02 que os
prejuízos de uma poderão ser compensados com os lucros de outra, desde que a matriz
no Brasil indique uma dessas filiais ou sucursais como entidade líder, na qual os resulta-
dos serão consolidados (art. 4°, § 5°), o que é corolário lógico do princípio da unidade
da pessoa jurídica. Já, porém, não tem qualquer fundamento legal a restrição a que a
consolidação apenas possa ser efetuada entre fIliais de um mesmo país (art. 4°, § 5°).
Em nossa opinião, as vedações à compensação de prejuízos auferidos no exte-
rior com lucros obtidos no Brasil (e também, em certos casos, com lucros obtidos no
exterior), aliada à plena tributação dos lucros obtidos no exterior, conduzem a uma
tributação "fragmentada" ou "segmentada" da renda, tributação esta inconstitucio-
nal, por distorção ao conceito de renda do art. 43 do Código Tributário Nacional e
por violação do princípio da globalidade, corolário do princípio da universalidade,
consagrado no art. 153, § 2°, inciso I, da Constituição Federal96 •

c) A compensação do imposto pago no exterior


O art. 26 da Lei nO 9.249/95 dispôs que "a pessoa jurídica poderá compensar
o imposto de renda incidente, no exterior, sobre os lucros, rendimentos e ganhos
de capital computados no lucro real, até o limite do imposto de renda incidente, no
Brasil, sobre os referidos lucros, rendimentos ou ganhos de capital"97.
Consagrou-se, assim, o chamado método da imputação ordinária, por contra-
posição à imputação integral, segundo o qual o Estado de residência não deduz o
montante total do imposto efetivamente pago no país de origem; antes submete a
dedução a um limite máximo: o limite correspondente à fração do seu próprio im-
posto correspondente aos rendimentos provenientes do país da fonte 98 .
O tax credit previsto na lei não se limita a atribuir à sociedade brasileira o direito
de deduzir do seu imposto de renda o imposto retido na fonte pelo país de origem
dos lucros antes permite deduzir não só o imposto retido na fonte, mas também o
imposto incidente sobre os lucros da sociedade donde esses dividendos provêm (in-
direct tax credit) underlying tax credit)99.
A matéria encontra-se hoje regida pela Instrução Normativa nO 213/02 nos
seguintes termos:
(a) considera-se imposto de renda o tributo que incida sobre lucros, inde-
pendentemente da denominação oficial adotada e do fato de o mesmo

96 efr. para maiores desenvolvimentos HELENa TÔRRES, A pluritributaçlÚJ internacional... ) 306


e 46l.
97 efr. Instrução Normativa nO 213/02, art. 14, § 10.
98 efr. infra, 645.
99 efr. infra, 650.
• I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

ser de competência de unidade da federação do país de origem (Ins-


trução Normativa nO 213/02, art. 14, § 1°);
(b) a compensação do imposto será feita de forma individualizada, por
controlada ou coligada, vedada a consolidação dos valores de impos-
tos correspondentes a diversas coligadas e controladas (art. 14, § 4°);
(c) tratando-se de filiais e sucursais, poderá haver consolidação dos tribu-
tos pagos, desde que localizadas no mesmo país (art. 14, § 5°);
(d) a filial, sucursal, controlada ou coligada, no exterior, deverá consolidar
os tributos pagos correspondentes a lucros, rendimentos ou ganhos
de capital auferidos através de outras pessoas jurídicas nas quais tenha
participação societária (consolidação vertical) (art. 14, § 6°);
(e) o imposto será sempre proporcional ao montante dos lucros, rendi-
mentos ou ganhos de capital que houverem sido computados na de-
terminação do lucro real (art. 14, § 7°);
(f) o tributo será considerado pelo valor efetivamente pago, não sendo
permitido o aproveitamento do crédito de tributo decorrente de qual-
quer benefício fiscal (art. 14, § 8°)100;
(g) o valor do tributo pago no exterior, a ser compensado, não poderá
exceder o montante do imposto e adicional, devidos no Brasil, sobre
o valor dos lucros, rendimentos e ganhos de capital incluídos no lucro
real (art. 14, § 9°);
(h) o tributo que não puder ser compensado em virtude de a pessoa ju-
rídica no Brasil, no respectivo ano-calendário, não ter apurado lucro
real positivo, poderá ser compensado com o que for devido, nos anos-
calendários subseqüentes (art. 14, §§ 15 a 19);
(i) o saldo do imposto de renda, pago no exterior, que exceder o valor
compensável com o imposto de rendo devido no Brasil, poderá ser
compensado com a CSLL devida em virtude da adição, à sua base
de cálculo, dos lucros, rendimentos e ganhos de capital oriundos do
exterior, até ao valor devido em decorrência dessa adição (art. 15).
No caso de uma cadeia vertical, poderão ser compensados com o imposto bra-
sileiro todos e quaisquer impostos estrangeiros incidentes e qualquer nível ou degrau
dessa cadeia (tier), seja na modalidade de imposto sobre o lucro apurado em balanço
(underlying tax), seja na modalidade de retenção na fonte (withholding tax), desde
que obviamente não sejam compensáveis entre si.
Trata-se de corolário lógico da regra que permite a consolidação vertical dos
resultados das sociedades estrangeiras. Assim, em plena simetria com o § 6° do art.
1° da Instrução Normativa nO 213/02, que estabelece que os resultados auferidos por
intermédio de outra pessoa jurídica, ainda que indiretamente, serão consolidados no

100 Ressalvados os casos de cláusulas de tax sparing ou matching credit previstas em tratado.
----
~
..... "-'
Título V I Capo I I Residentes no País

balanço da primeira controlada estrangeira, o § 6° do art. 14 da mesma Instrução


ordena a consolidação dos tributos pagos correspondentes a lucros, rendimentos ou
MM+

ganhos de capital auferidos por meio de outras pessoas jurídicas nos quais a mesma
controlada tenha participação.
Com efeito, só o integral emparelhamento de resultados e tributos em toda a
cadeia assegura o objetivo do art. 26 da Lei nO 9.249/95, que é o de conciliar a tri-
butação automática no Brasil dos resultados de sociedades estrangeiras consolidados
verticalmente com a eliminação unilateral de eventual dupla tributação.

d) A compensação do imposto retido na fonte sobre rendimentos pagos


a filial) sucursal) controlada ou coligada no exterior
Diferente da hipótese prevista no art. 26 da Lei nO 9.249/95 - que se refere ao
imposto pago pelas entidades domiciliadas no exterior (filial, sucursal, controlada,
coligada de pessoa jurídica domiciliada no Brasil) - é o caso previsto no art. 9° da
Medida Provisória nO 1.807, de 26 de janeiro de 1999 101 - que se refere ao imposto
de renda retido na fonte sobre rendimentos pagos às referidas entidades.
Referido preceito veio dispor que o imposto retido na fonte não compensado
em virtude de a beneficiária ser domiciliada em "país com tributação favorecida" (Lei
nO 9.430/96, art. 24) poderá ser compensado com o imposto devido sobre o lucro
real da matriz, controlada ou coligada no Brasil, quando os resultados da filial, sucur-
sal, controlada ou coligada, que contenham os referidos rendimentos, forem com-
putados na determinação do lucro real da pessoa jurídica no Brasil. A compensação
operar-se-á, porém, somente até o limite do imposto de renda incidente, no Brasil,
sobre os referidos lucros, rendimentos, ganhos de capital e receitas de prestação de
serviços (art. 9°, § único).
Assim, por exemplo, se um banco inglês efetuar um pagamento de juros a uma
controlada, nas Bahamas, de uma sociedade brasileira, o imposto retido na fonte na
Inglaterra e não compensado nas Bahamas em virtude de aquele país não tributar a
renda poderá ser compensado no Brasil com o imposto de renda devido pela contro-
ladora brasileira sobre os lucros da~êontroladas quando os mesmos forem adiciona-
dos para determinação do lucro real.

e) O conceito de equivalência patrimonial da Instrução Normativa nO 213/02


e a variação cambial do investimento estrangeiro
Como se viu, o emprego do conceito de equivalência patrimonial é inovação da
Instrução Normativa nO 213, de 7 de outubro de 2002, que estabeleceu dois regimes
diferentes para os lucros decorrentes de investimentos no exterior, conforme tais in-

101 Atualmente previsto no art. 9° da Medida Provisória nO 2.158-35/01.


Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

vestimentos sejam avaliados pelo custo de aquisição ou pelo método da equivalência


patrimonial: (i) quanto aos investimentos avaliados pelo custo de aquisição, os lucros
deles decorrentes são tributáveis no Brasil quando disponibilizados pela investida
domiciliada no exterior, mediante pagamento ou crédito (art. 8°); (ii) quanto aos
investimentos avaliados pelo método da equivalência patrimonial, o respectivo resul-
tado positivo deverá ser considerado no balanço levantado em 31 de dezembro do
ano-calendário para fIns de determinação do lucro real e da base de cálculo da CSLL
(art. 7°).
A utilização inovadora do conceito de equivalência patrimonial pela Instrução
Normativa nO 213/02 suscitou a questão de saber se ele pode conduzir a tributar
a totalidade do resultado de equivalência patrimonial contabilizado, independente-
mente da existência de lucros propriamente ditos, eis que tal resultado positivo pode
nascer mesmo na ausência de lucro operacional, em razão de uma simples variação
cambial positiva do investimento.
Com efeito, a Instrução CVM nO 170, de 13 de janeiro de 1992, veio estabe-
lecer no seu art. 2° que "será considerado como resultado operacional de equivalência
patrimonial o valor da diferença entre a variação cambial de investimento no exterior e a
correção monetária contabilizada à conta de investimento, na investidora ou contro-
ladora", tendo idêntica orientação sido consagrada pelo art. 16 da Instrução CVM
nO 247, de 27 de março de 1996, segundo o qual "a diferença verifIcada, ao fInal de
cada período, no valor do investimento avaliado pelo método da equivalência patri-
monial, deverá ser apropriada pela investidora como: I - receita ou despesa opera-
cional, quando corresponder: a) a aumento ou diminuição do patrimônio líquido da
coligada e controladora, em decorrência da apuração de lucro líquido ou prejuízo no
período ou que corresponder a ganhos ou perdas efetivos em decorrência da existên-
cia de reservas de capital ou de ajustes de exercícios anteriores; e b) a variação cambial
de investimento em coligada e controlada no exterior. ( ... )".
Destas disposições resulta que, em face da legislação societária brasileira, a va-
riação cambial de investimentos no exterior é considerada parte integrante o resul-
tado da equivalência patrimonial. Uma coisa é, porém, a variação cambial do inves-
timento estrangeiro ser considerada receita operacional para eftitos societários; outra,
completamente distinta, é ser considerada base de tributação no Brasil.
Tenha-se presente que o art. 25 da Lei nO 9.249/95 (o qual se mantém em vigor,
pois para ele remete expressamente o art. 74 da Medida Provisória nO 2.158-35/01)
dispõe, no § 6°, que "os resultados da avaliação dos investimentos no exterior, pelo
método da equivalência patrimonial, continuarão a ter o tratamento previsto na le-
gislação vigente, sem prejuízo do disposto nos §§ P, 2° e 3°".
Interpretando corretamente este dispositivo da Lei nO 9.249/95, a Instrução
Normativa nO 38/96 dispunha no art. 11 que "a contrapartida do ajuste de investi-
mento no exterior, avaliado pelo método da equivalência patrimonial, não será com-
putada na determinação do lucro real", acrescentando o seu parágrafo único que,
"para efeito do disposto neste artigo, os resultados positivos decorrentes do referido
Título V I Capo I I Residentes no País

ajuste, computados no lucro líquido da empresa no Brasil, poderão ser dele excluí-
dos, enquanto que os resultados negativos deverão ser a ele adicionados, quando da
determinação do lucro real".
A razão de ser da exclusão da equivalência patrimonial teve como objetivo evi-
tar a dupla tributação dos lucros das sociedades estrangeiras pela consideração si-
multânea desses lucros como tal e do seu reflexo por via da equivalência. Nenhuma
alteração legislativa subsequente ao art. 25, § 6°, da Lei n.o 9.249/95, permite a tri-
butação da equivalência patrimonial como tal, vez que a nova lei (art. 74 da Medida
Provisória nO 2.158-35/01) se refere apenas aos lucros das sociedades coligadas ou
controladas estrangeiras.
Sendo assim, a única forma de compatibilizar o disposto no art. 7° da Instrução
Normativa nO 213/02 com o art. 74 da Medida Provisória nO 2.158-35/01 (mas sem
com isto admitir legitimidade constitucional da tributação automática nele prevista)
é considerar que apenas seria tributável a receita de equivalência patrimonial que cor-
responder a aumento do patrimônio líquido da coligada e controlada em decorrência da
apuração de lucro líquido no período, pois é apenas esta parcela que reflete o conceito
de lucro da sociedade estrangeira a que se refere a lei.
Isto porque, repita-se mais uma vez, a existência ou não dos lucros é um fenô-
meno totalmente independente da apuração de um resultado positivo de equivalên-
cia patrimonial do investimento, pois pode haver casos em que há lucro sem variação
cambial e outros casos em que a variação cambial ocorre, ainda que a sociedade es-
trangeira não tenha operado, ou tenha operado com prejuízo. A incidência de impos-
to de renda em tal caso seria impossível, eis que, por inexistir acréscimo patrimonial,
ela traduzir-se-ia num verdadeiro imposto sobre o capital ou sobre o patrimônio,
notoriamente inconstitucional.
Bem andou, pois, a Administração fiscal quando, em soluções de consultas in-
dividuais, reconheceu que "a contrapartida de ajuste do valor do investimento em
sociedades estrangeiras, coligadas ou controladas, que não funcionem no país, decor-
rente de variação cambial, não será computada na determinação do lucro real"102.
Estes pronunciamentos apenas confirmam a ausência de base legal que ampare
a tributação da variação cambial de investimento no exterior, ausência essa que veio
a ser confirmada pela edição das Medidas Provisórias nOS 135/03 e 232/04.
Com efeito, o art. 46 da Medida Provisória nO 135/03 estabelecia que "a varia-
ção cambial dos investimentos no exterior avaliados pelo método da equivalência
patrimonial é considerada receita ou despesa financeira, devendo compor o lucro real
e a base de cálculo da CSLL relativos ao balanço levantado em 31 de dezembro de
cada ano-calendário". Tal dispositivo foi vetado por ocasião da conversão da referida
medida provisória na Lei nO 10.833/03, conforme a Mensagem nO 795, de 29 de

102 Cfr. Consultas da 9 a R.F. nOS 54 e 55, de 7 de abril de 2003, e 2 a R.F. nO 46, de 10 de no-
vembro de 2003.
I Em I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

dezembro de 2003, do Presidente da República, elaborada pelo Ministro da Fazenda,


onde se afirma:
"Não obstante tratar-se de norma de interesse da administração tributária, a
falta de disposição expressa para sua entrada em vigor certamente provocará di-
versas demandas judiciais, patrocinadas pelos contribuintes, para que seus efei-
tos alcancem o ano-calendário de 2003, quando se registrou variação cambial
negativa de, aproximadamente, quinze por cento, o que representaria despesa
dedutível para as pessoas jurídicas com controladas ou coligadas no exterior,
provocando, assim, perda de arrecadação, para o ano de 2004, de significativa
monta, comprometendo o equilíbrio fiscal."
A tentativa de se incorporar a variação cambial do investimento em sociedades
controladas e coligadas no exterior à base de cálculo do IRPJ e da CSLL foi reno-
vada na Medida Provisória nO 232/03, cujo art. 9° reproduzia o teor da disposição
anteriormente vetada pelo Presidente da República. No entanto, referida disposição
foi revogada quando da edição da Medida Provisória na 243/05.
O simples fato de o Presidente da República ter editado duas medidas provisó-
rias contemplando expressamente a tributação da variação cambial de investimento
estrangeiro confirma, em termos inequívocos, a inexistência de fundamento legal
para amparar sua tributação, eis que não só se reconheceu que tal tributação não era
consagrada em atos normativos anteriores (como o art. 74 da Medida Provisória nO
2.158-35/01), mas também porque ambas as disposições que previam a tributação
não chegaram a produzir efeitoslO 3 .

j) A taxa de câmbio para fins de conversão dos lucros


No que concerne à renda externa das pessoas jurídicas, a Lei nO 9.249/95 pro-
cedeu, no art. 25, à distinção entre, por um lado, "rendimentos e ganhos de capital",
correspondentes à atividade direta da pessoa jurídica no exterior, e, por outro lado,
"lucros", que correspondem ao exercício de uma atividade indireta, isto é, exercida
através de uma organização de pessoas e bens dotada de personalidade jurídica (so-
ciedades controladas e coligadas) ou privada dessa personalidade (filiais).
Os lucros, rendimentos e ganhos de capital auferidos no exterior são imputáveis
ao lucro líquido para efeitos de determinação do lucro real das pessoas jurídicas do-
miciliadas no Brasil, correspondentes ao balanço levantado em 31 de dezembro de
cada ano, na medida em que representem para a pessoa jurídica brasileira resultados
do seu exercício.

103 Este entendimento tem sido aplicado de forma consistente e unânime pela jurisprudência
administrativa, cfr. Acórdãos nO 101-95.302, de 8.12.2005; Acórdão nO 105-16.365, de
28.03.2007 e Acórdão nO 101-96.468, de 5.12.2007.
Título V I Capo I I Residentes no País -€C-
o próprio caput do art. 25 permite concluir que as várias modalidades de ren-
da externa - lucros, rendimentos e ganhos de capital - serão computadas no ano
em que forem auferidas. O momento do auferimento da renda condiciona, assim,
inexoravelmente, o momento para seu cômputo na escrituração da pessoa jurídica
brasileira.
Ora, tratando-se de renda auferida no exterior e, por conseguinte, em moeda
estrangeira, e sendo o cômputo na escrituração brasileira necessariamente feito em
moeda nacional, o próprio art. 25 da Lei nO 9.249/95 esclareceu os critérios que
deveriam presidir a conversão de uma em outra.
No que concerne aos rendimentos e ganhos de capital auferidos no exercício de
uma atividade direta, o inciso I do § lOdo art. 25 determina que "serão convertidos
em reais de acordo com a taxa de câmbio, para venda, na data em que forem conta-
bilizados no Brasil", data esta que naturalmente é aquela pela qual as regras jurídicas
brasileiras consideram o rendimento auferido.
Regra diversa teria que ser dada para os "lucros" resultantes de atividades indi-
retas de filiais, controladas e coligadas que - ao contrário dos rendimentos e ganhos
de capital, que têm um caráter analítico, isolado, individualizado - têm um caráter
sintético, isto é, representam a síntese de um somatório de elementos positivos e
negativos que concorrem para sua formação num certo período de tempo.
E daí o § 4° do art. 25 determinar que "os lucros a que se referem os §§ 2° e 3°
serão convertidos em reais pela taxa de câmbio, para venda, do dia das demonstra-
ções financeiras em que tenham sido apurados os lucros da filial, sucursal, controlada
ou coligada".
Repare-se bem que esse parágrafo não determinou a conversão em reais pela
taxa do dia em que se encerra o balanço da pessoa jurídica brasileira, mas sim no dia
das demonstrações financeiras estrangeiras, elaboradas no exterior, pelas empresas
estrangeiras, e que pode ser ou não coincidente com a data de fechamento do balan-
ço de empresa brasileira de que são filiais, controladas ou coligadas.
Como os rendimentos, ganhos de capital e lucros são componentes positivos
dos resultados da pessoa jurídica brasileira, a eles se incorporam definitivamente "em
reais", por cômputo ou inclusão, à taxa de câmbio vigente na data em que foram
auferidos.
A partir desse momento, tornam-se irrelevantes as flutuações de valor da moeda
estrangeira em que eles (lucros, rendimentos e ganhos de capital) foram auferidos,
uma vez que, feita a conversão para moeda nacional, eles tornaranl-se, definitiva e
imutavelmente, valores do patrimônio da empresa brasileira expressos em reais.
É certo que na sistemática da Instrução Normativa nO 38/96 e da Lei nO
9.532/97, como se viu, ocorreu uma dissociação no tempo entre a apuração do lucro
das controladas e coligadas no exterior e o momento da tributação, que só se verifica
por ocasião de disponibilização.
Uma coisa, na verdade, é a apuração ou determinação da base de tributação;
outra é a definição do momento em que ela pode ocorrer, sem que tal implique ne-
• I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

cessariamente a aplicação da taxa de câmbio vigente à data da incidência do imposto,


ou seja, à data para a qual foi diferido o momento temporal do fato gerador.
Com efeito, mesmo tendo em vista esta circunstância, a Instrução Normativa nO
38/96 e a Lei nO 9.532/97 não introduziram qualquer derrogação, restrição ou res-
salva ao § 4° do art. 25 da Lei nO 9.249/95, segundo o qual o lucro externo é sempre
convertido em reais à data do fechamento do balanço estrangeiro que o originou.
Aliás, que a base sobre a qual incide o imposto é a base histórica em reais à data
a que se refere o § 4° do art. 25 da Lei nO 9.249/95 resulta do próprio mecanismo
previsto pela Instrução Normativa n ° 38/96 e reiterado pela Instrução Normativa nO
213/02 no que concerne à compensação do imposto pago no exterior.
Dispõe, com efeito, o art. 14 da Instrução Normativa nO 213/02 que:
"O imposto sobre a renda pago no país de domicílio da filial, sucursal, controla-
da ou coligada e pago relativamente a rendimentos e ganhos de capital, poderão
ser compensados com o que for devido no Brasil.
"( ... )
"§ 2° O tributo pago no exterior, a ser compensado, será convertido em Reais
tomando-se por base a taxa de câmbio da moeda do país de origem, fixada
para venda, pelo Banco Central do Brasil, correspondente à data de seu efetivo
pagamento.
"( ... )
"§ 7° O tributo pago no exterior, passível de compensação, será sempre propor-
cional ao montante dos lucros, rendimentos ou ganhos de capital que houverem
sido computados na determinação do lucro real."
Ora, se o valor do tributo pago no exterior é convertido defmitivamente em
reais nwn dado momento histórico e compensável apenas na proporção em que
os lucros forem disponibilizados, isso significa necessariamente que esses mesmos
lucros não são influenciáveis pelas variações cambiais ocorridas entre a data em que
foram apurados (e convertidos em reais) e submetidos à tributação.
CAPÍTULO II
RESIDENTES NO EXTERIOR

SEÇÃO I
O IMPOSTO DE RENDA NA FONTE SOBRE RESIDENTES NO EXTERIOR

As pessoas domiciliadas no exterior, sejam pessoas físicas, sejam pessoas jurídi-


cas, apenas são tributáveis no Brasil pelos rendimentos que aqui tenham sido produ-
zidos, isto é, por rendimentos imputáveis a fontes nacionais.
Deste princípio geral - que é o princípio da territorialidade, na sua acepção de
princípio da fonte - decorrem duas consequências que convém examinar em separado.
A primeira, que podemos denominar negativa) é a não incidência do imposto
brasileiro sobre rendimentos produzidos no exterior, assim se entendendo os impu-
táveis a fontes localizadas fora do território nacional.
A segunda - de caráter positivo - é a tributação dos rendimentos produzidos no
Brasil.
Mas quanto a estes há que distinguir o regime de tributação em que os residen-
tes no exterior são considerados como tal, sujeitando-se a uma tributação definitiva
sobre os rendimentos provenientes de fontes nacionais, do regime de tributação pelo
qual os residentes no exterior são equiparados a pessoas jurídicas domiciliadas no Brasil,
sujeitando-se às mesmas regras que a estes são aplicáveis: é este último regime que
vigora para os não residentes que dispõem no Brasil de estabelecimentos permanen-
tes, na forma de filiais, sucursais ou representantes.
No primeiro caso, a lei considera os rendimentos auferidos pelos não residentes
isolada ou analiticamente, submetendo cada um, de per si, ao tratamento que lhe
for individualizadamente aplicável (juro, royalty, aluguel, dividendo, salário etc.): é
a isolierende Betrachtungsweise de que fala a doutrina alemã l . No segundo caso, a lei
considera os rendimentos auferidos pelos não residentes complexiva ou sinteticamente,

1 Cfr. MÓSSNER, in MóssNER/er ai., Steutm'echt international tdtiger Unternehmen, Colônia 1992,
116; K.LUGE, Das deutsche Internatúmale Steuerrecht (3" ed.), Munique 1992, 206; SCHAUMBURG,
Internationales Steutm'echt) Colônia 1993, 79, 93. Veja-se ainda STEFANO FroRENTINI, La tassazWne
dei non residenti, 1988; ERNESTO LrCCARDI, La disciplina degli enti non residenti, in UCKMAR/
MAGNANrjMARoNGIU (org.), n reddito di impresa nel nuuvo testo unico, Milão 1988, 697; HELENO
TÔRRES, Pluritributaçáo internacional sobre as rendas de empresa, São Paulo 2001, 325 a 330.
I gim I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

submetendo-os todos ao regime do lucro da empresa, apurado pela sistemática pró-


pria de apuração do lucro das pessoas jurídicas domiciliadas no Brasil, às quais são
equiparadas as filiais, sucursais e os representantes de empresas estrangeiras. A "equi-
paração" traduz-se exatamente na aplicabilidade do mecanismo sintético de apuração
do lucro, conceito este que, por um principio de absorção, faz perder autonomia aos
rendimentos que constituem os seus componentes ativos.
A linha divisória entre estes dois regimes reside em que, no segundo, além do
aspecto comum de se encontrar localizada a fonte de renda no território do Brasil, há
o exercício nesse mesmo território de uma atividade à qual são imputáveis os rendi-
mentos através de uma m;ganização de pessoas ou bens, e que permite afirmar que o
residente no exterior está "realizando negócios" (doing business) no Brasil2 •
Cabe obviamente ao direito positivo definir os casos em que o exercício de tal
atividade, pela sua natureza ou pela sua intensidade, justifica a opção pelo regime sin-
tético de equiparação a pessoa jurídica domiciliada no País, ao invés de pelo regime
analítico de simples retenção na fonte. Pode, porém, dizer-se, em linhas gerais, que
o regime de equiparação é o que melhor corresponde aos rendimentos de empresa ou
rendimentos comerciais resultantes da atividade de venda de bens e serviços, cujo lucro
só é possível de determinar, no seu conjunto, em face da contabilidade que demons-
tre as receitas e despesas da atividade global da empresa.

SUBSEÇÃO I
REGIME GERAL DO IMPOSTO DE RENDA NA FONTE

o regime "analítico" de retenção na fonte vigora para a generalidade dos rendi-


mentos e ganhos de capital atribuídos a residentes no exterior que não dispõem no
Brasil de sucursais, filiais ou representantes.

§ 10 HIPÓTESE DE INCIDÊNCIA

A hipótese de incidência do imposto de renda das pessoas físicas ou jurídicas do-


miciliadas no exterior encontra-se descrita genericamente no art. 682 do Regulamento

2 Semelhante a esta é a distinção, própria do direito inglês, entre fazer negócios "com o Reino-
Unido" e "no Reino Unido". O direito norte-americano procede a distinção análoga, sepa-
rando o investmentincome - sujeito apenas a um imposto na fonte - e o business income - sujeito
à tributação geral da renda das pessoas residentes. Cfr. HENRY B. JORDA."I/JONE E. BISCHEL/
ALAN H. SMITH, The Taxation of Entreprises with Permanent Establishments abroad. United
States Taxation of a Foreign Entreprise carrying on Business in the U.S. through a Permanent
Establishment, CDFI LVlII-a (1973), 95; J. S. PHILIPS/M. H. COLLINS, The Assessment and
Collection ofTaxfrom Non-residents (relatório geral), CDFI LXX-a (1985), 15. Sobre a defi-
nição de trade or bussiness within the United States, ver J. D. KUNTz/R. J. PERONI, U.S. Inter-
national Taxation, vol. lI, Boston/Nova York 1992, CI-79. Ver ainda PÉREZ, La tributación
de las rentas obtenidas sin mediación de establecimiento permanente por personas físicas no
residentes, RDT 39 (1987), 7 e POVEDA, Tributación de no residentes (2 a ed.), Madrid 1993.
Título V I Capo 11 I Residentes no Exterior .,.M
do Imposto de Renda, segundo o qual: "Estão sujeitos ao imposto na fonte, de acordo
com o disposto neste Capítulo, a renda e os proventos de qualquer natureza provenien-
tes de fontes situadas no País, quando percebidos: I - pelas pessoas físicas ou jurídicas
residentes ou domiciliadas no exterior; II - pelos residentes no País que estiverem au-
sentes no exterior por mais de doze meses, salvo os mencionados no art. 17; III - pela
pessoa física proveniente do exterior, com visto temporário, nos termos do § 10 do art.
19; IV - pelos contribuintes que continuarem a perceber rendimentos produzidos no
País, a partir da data em que for requerida a certidão, no caso previsto no art. 879.
Por sua vez, o art. 685 do mesmo Regulamento estabelece que "os rendimentos,
ganhos de capital e demais proventos pagos, creditados, entregues, empregados ou
remetidos, por fonte situada no País, a pessoa física ou jurídica residente ou domici-
liada no exterior, estão sujeitos à incidência na fonte: I - à alíquota de quinze por cen-
to, quando não tiverem tributação específica neste Capítulo, inclusive: a) os ganhos
de capital relativos a investimentos em moeda estrangeira; b) os ganhos de capital
auferidos na alienação de bens ou direitos; c) as pensões alimenúcias e os pecúlios; d)
os prêmios conquistados em concursos e competições; II - à alíquota de vinte e cinco
por cento: a) os rendimentos do trabalho, com ou sem vínculo empregaúcio, e os da
prestação de serviços; e b) ressalvadas as hipóteses a que se referem os incisos V, VIII,
IX, X e XI do art. 691, os rendimentos decorrentes de qualquer operação, em que o
beneficiário seja residente ou domiciliado em país que não tribute a renda ou que a
tribute à alíquota máxima inferior a vinte por cento, a que se refere o art. 245".

A) O conceito de rendimentos eganhos de capital

Da leitura dos preceitos atrás transcritos verifica-se que o núcleo ou aspecto obje-
tivo da hipótese de incidência do imposto de renda devido por residentes no exterior é
constituído pelos conceitos de "renda" e "proventos de qualquer natureza" usados no art.
682 ou "rendimentos", "ganhos de capital" e "demais proventos" usados no art. 685.
Todavia, as disposições legais que disciplinam o imposto sobre residentes no exte-
rior não contêm uma definição expressa do que deva entender-se por "rendimentos" ou
por "ganhos de capital», limitando-se a introduzir regras especiais para certas categorias
de proventos, referentes à alíquota aplicável ou à forma de retenção e recolhimento.
Na ausência de uma definição expressa, a doutrina entendia que tais conceitos
devam ser interpretados à luz das disposições que regem a hipótese de incidência do
imposto de renda das pessoas físicas, para as quais implicitamente remetem, median-
te a técnica da remissão por absorção.
Na verdade, a legislação brasileira do imposto de renda não continha uma de-
finição geral de renda tributável, aplicável simultaneamente às pessoas físicas e às
pessoas jurídicas3 •

3 efr. Para maiores desenvolvimentos sobre os fundamentos desta interpretação, a 6 a edição


deste livro e a bibliografia aí citada, 504 a 508.
• I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Deve dizer-se que o método de remissão, por absorção, para a legislação refe-
rente às pessoas físicas perdeu muito da sua importância prática após a extinção do
sistema de tributação cedular, operado pela Lei nO 7.713/88. Com efeito, naquele
sistema, os tipos de rendimentos tributáveis eram objeto de uma enumeraçtfu taxati-
va, cada cédula constituindo como que um catálogo fechado, de tal modo que se podia
sustentar que um residente no exterior só seria tributável quanto aos rendimentos
tipificados nas respectivas cédulas.
Sucede, porém, que a referida Lei adotou o princípio da universalidade da tribu-
taçtfu dos rendimentos e ganhos de capital4, isto é, abandonou o método da tipificação
taxativa para acolher o método da cláusula geral, pelo qual o imposto incide sobre o
rendimento bruto, sendo este constituído por CCtodo o produto do capital, do traba-
lho ou da combinação de ambos, os alimentos e pensões percebidos em dinheiro e
ainda os proventos de qualquer natureza, assim também entendidos os acréscimos
patrimoniais não correspondentes com os rendimentos declarados" (art. 3°, § 1°).
Por sua vez, os §§ 2° e 3° do art. 3° da mesma Lei integraram os ganhos de capital
no conceito de rendimento bruto e caracterizam-nos como o produto da alienação
de bem ou direito de qualquer natureza , através de qualquer título de alienação,
acrescentando o § 4° que "a tributação independe de denominação dos rendimen-
tos, títulos ou direitos, da localização, condição jurídica ou nacionalidade da fonte,
da origem dos bens produtores da renda e da forma de percepção das rendas ou
proventos, bastando para a incidência do imposto o benefício do contribuinte por
qualquer forma e a qualquer título". Refira-se ainda que o art. 51 da Lei nO 7.450,
de 23 de dezembro de 19855, estabeleceu que "ficam compreendidos na incidência
do imposto de renda todos os ganhos e rendimentos de capital, qualquer que seja a
denominação que lhes seja dada, independentemente da natureza, da espécie ou da
existência de título ou contrato escrito, bastando que decorram de ato ou negócio
que, pela sua finalidade, tenha os mesmos efeitos do previsto na norma específica de
incidência do imposto de renda".
Significa isto que o método da remisstfu por absorçtfu traduz-se, após a Lei nO
7.713/88, numa remisstfu para uma cláusula geral contendo o princípio da univer-
salidade da tributação dos rendimentos e ganhos de capital, pelo que o seu alcance
prático não é hoje o de delimitar os rendimentos e ganhos de capital tributáveis pelos
residentes no exterior - são todos - mas sim o de "absorver" as normas da legislação
reguladora das pessoas físicas que definam a determinaçtfu dos rendimentos e ganhos
de capital em causa.

4 efr. HENRY TILBERY, O novo imposto de renda no Brasil, São Paulo 1989, 37 e 38.
5 Sobre as discussões, nem sempre justificadas, que este preceito tem originado, cfr. a 5a edição
desta obra, 331 ss.
Título V I Capo 11 I Residentes no Exterior I c!BI I

B) O conceito de fonte e sua localização

a) As conexões cumulativas) fonte de produção e


fonte de pagamento) para os rendimentos em geral

O art. 682 do RIR/99 declara que a renda e os proventos de qualquer natureza


auferidos por residentes no exterior são tributáveis no Brasil apenas se "provenientes
de fontes situadas no País", consagrando assim o princípio da sua "tributabilidade
limitada". Por sua vez, o art. 685 do RIR/99 dispõe que estão sujeitos à incidência
do imposto os rendimentos, ganhos de capital e demais proventos pagos, creditados,
entre~es, empregados ou remetidos "por fonte situada no País".
E importante sublinhar que, enquanto o art. 682 utiliza a expressão "provenientes
de fontes situadas no País", o art. 685 usa o termo "pagas ... por fonte situada no Brasil".
A "proveniência" da fonte alude à fonte de produção, fonte econômica ou fonte ob-
Jetiva, que é a origem da renda, ou seja, a atividade, bem ou direito de que resulta; o
"pagamento" pela fonte alude à fonte de pagamento ,fonte financeira ou fonte subJetiva,
que é a pessoa que efetua o pagamento da renda ao seu titular.
A lei exige, pois, que estejam localizadas no Brasil cumulativamente a fonte de pro-
dução e a fonte de pagamento. A fonte de produção, porque é ela que estabelece a real
conexão econômica de renda com o território do país tributante; a fonte de pagamento,
pois para a natureza deste imposto, retido exclusivamente na fonte, é mais conveniente
que no país seja residente a pessoa que paga o rendimento tributável e que será conside-
rada fonte pagadora para efeitos de retenção e de recolhimento do imposto descontado
quando o rendimento for pago, creditado, remetido, empregado, ou entregué.
Assim, não é relevante, por si só, o local do exercício da atividade que dá origem
ao rendimento ou o local da utilização dos capitais ou da tecnologia cedida, pois
ainda que este seja o Brasil não haverá a incidência do imposto, caso no país não seja
domiciliado o devedor dos rendimentos. Também não basta,por si só) que o devedor
esteja aqui domiciliado para que o imposto incida quando o rendimento for imputá-
vel a atividades exercidas ou a capital e tecnologia utilizados em terceiros países.
Para que ocorra a incidência de imposto no Brasil, é necessário, repita-se, que no
Brasil se localizem cumulativamente a fonte de produção e a fonte de pagamento.
A única exceção a este requisito cumulativo, em matéria de rendimentos, é o
caso da remuneração da prestação de serviços prestados por residentes no exterior,
em relação aos quais a lei se contenta com a localização no Brasil da fonte depagamen-
to) declarando irrelevante o local de fonte de produção.
A "fonte pagadora", à qual o art. 45, § único, do Código Tributário Nacional,
permite a atribuição do papel de responsável tributário é a entidade à qual é imputá-

6 efr. Parecer Normativo CST nO 140/73, itens 4 e 7; BULHÕES PEDREIRA, Imposto de Renda
- pessoas jurídicas, I, Rio de Janeiro 1979, 207; cfr. ainda Parecer da Procuradoria Geral da
Fazenda Nacional, de 19 de dezembro de 1975, Resenha Tributária 1976, 217; HENRY TIL-
BERY, A tributação dos ganhos de capital, 228 ss.
g I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

vel juridicamente, como devedor, o pagamento e que, portanto, suporta o respectivo


ônus, sendo irrelevantes o local e a moeda em que este se realiza.

b) A conexão exclusiva fonte de produção, no caso de ganhos de capital

Destas considerações resulta que não estavam (e continuam não estando) sujei-
tos a imposto de renda no Brasil ganhos de capital decorrentes de operações realiza-
das entre um residente no exterior e um residente no Brasil, tendo por objeto bens ou
direitos localizadas no exterior, pois é sempre indispensável que a fonte de produção
esteja "situada no país". É o que bem reconhece a Instrução Normativa nO 208/02 ao
esclarecer que os ganhos de capital de residentes no exterior apenas são tributáveis se
relativos a bens ou direitos situados no Brasil (art. 26).
E resulta também que não estavam sujeitos a imposto de renda no Brasil ren-
dimentos ou ganhos de capital decorrentes de operações realizadas no exterior entre
não residentes, ainda que tenham por objeto bens ou direitos localizados no Brasil,
tais como ações, quotas e imóveis.
Com efeito, a lei brasileira considerava indispensável para a tributação de re-
sidentes no exterior, na generalidade dos casos, a localização no Brasil da fonte da
renda, no seu sentido financeiro de "fonte pagadora". Ora, num ganho de capital au-
ferido por um residente no exterior de outro residente no exterior, a fonte pagadora
localiza-se no país em que este último é residente e não no Brasil.
O fato de no Brasil se localizar o bem ou direito que é objeto da renda não era arvo-
rado pela lei brasileira como elemento de conexão suficiente para efeito de imposto de
renda, ao invés do que sucede, por exemplo, para efeito de imposto de transmissão. E
compreende-se que assim fosse, pois é a presença no território brasileiro da pessoa que
efetua o pagamento do rendimento (e não dos bens ou direitos sobre que versa a ope-
ração) que é essencial ao funcionamento eficiente do mecanismo da retenção na fonte.
O art. 26 da Lei nO 10.833, de 29 de dezembro de 2003, veio alterar radical-
mente os termos em que a questão se colocava entre nós, ao dispor:
"O adquirente, pessoa física ou jurídica residente ou domiciliada no Brasil, ou o
procurador, quando o adquirente for residente ou domiciliado no exterior, fica
responsável pela retenção e recolhimento do imposto de renda incidente sobre o
ganho de capital a que se refere o art. 18 da Lei nO 9.249, de 26 de dezembro de
1995, auferido por pessoa física ou jurídica residente ou domiciliada no exterior
que alienar bens localizados no BrasiF."
O art. 18 da Lei nO 9.249, de 26 de dezembro de 1995, por sua vez, estabelece
que "o ganho de capital auferido por residente ou domiciliado no exterior será apu-
rado e tributado de acordo com as regras aplicáveis aos residentes no País".

7 Referido preceito entrou em vigor em 1°.02.2004, ex vi do art. 93, rI, da Lei nO 10.833/03.
Título V I Capo II I Residentes no Exterior Iq

A principal inovação do art. 26 atrás citado está em que, ao contrário do que


sucedia no regime anterior, no caso de a operação ter por objeto bens localizados no
Brasil, incide imposto não só no caso de o adquirente ser domiciliado no Brasil (como
era até então), mas também na hipótese de o adquirente ser domiciliado no exterior.
Passaram, pois, a ser tributáveis operações totalmente realizadas no exterior,
entre residentes no exteri01; desde que o objeto da operação esteja localizado no Brasil.
Assim, passou a dar-se relevância exclusiva à fonte de produção ou fonte econômica,
com abstração da fonte de pagamento ou fonte financeira.
Este sistema não é originalidade do regime brasileiro, pois idêntico regime fiscal
é adotado em diversas legislações europeias, como a italiana, a portuguesa e a espa-
nhola, em que a apuração e o recolhimento do imposto devido no país de localização
do bem é atribuída a um representante do adquirente 8 •

C) Aspecto temporal

a) O conceito de percepção do rendimento

O aspecto temporal do fato gerador do imposto de renda na fonte incidente


sobre residentes no exterior ocorre no momento em que os rendimentos forem per-
cebidos pelo seu titular (art. 682 do RIR).
O conceito de percepção do rendimento representa, pois, no domínio desta mo-
dalidade de tributo, concretização do conceito de aquisição da disponibilidade econô-
mica ou jurídica da renda, arvorado pelo art. 43 do Código Tributário Nacional em
fato gerador do imposto de renda em geral.
A disponibilidade econômica da renda traduz-se no poder de dispor, efetivo e
atual, de quem tem a posse direta da renda; a disponibilidade jurídica caracteriza as
situações em que, embora o titular não tenha a posse direta da renda, esta foi coloca-
da à sua disposição pela fonte pagadora9 .
É importante frisar que a disponibilidade jurídica da renda não se confunde com
a aquisição nem com a exigibilidade do direito à renda. Pode ter-se constituído um

8 .Na Itália cfr. G. FALSTITA, Studi sulla tassazione delle pluSlJalenze, Milão 1991, 103; FRANCESCO
CARBONETTI, Plusvalenze realizzate da non residenti su quote o azioni di soeietà italiane, Dirit-
to e Pratica Tributaria 1981-1, 390; SILV1A P ANSlERl, Le nuove fattispeeie di territorialità delle
plusvalenze realizzate da non residcnti, Diritto e Pratica Tributaria 1981-1, 1097. Em Portugal
prevê-se a obrigação de o sujeito passivo não residente apresentar declaração de rendimentos
onde fará a apuração da mais-valia. Cfr. art. 97 do Código do Imposto sobre o Rendimento
das Pessoas Coleetivas (CIRC), efr. ALBERTO XAVIER, Direito Tributário Internacional, Coimbra
1993, 377 ss. Na Espanha a Lei nO 46/2002 veio expressamente estabelecer que se conside-
ram rendimentos obtidos em território espanhol, entre outros, os ganhos patrimoniais quan-
do se derivam de valores emitidos por pessoas ou entidades residentes em território espanhol
e quando se derivam de outros bens móveis, distintos dos valores, situados em território
espanhol ou de direitos que devem cumprir-se ou se exerçam em território espanhol.
9 Neste sentido, BULHÕES PEDREIRA, Imposto sobre a renda - pessoas jurídicas, I, 196 ss.
_ . ._ Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

direito e até ter-se tornado exigível, sem que exista disponibilidade, pois esta pressu-
põe sempre um facere do devedor da renda, ou fonte pagadora, que coloque o objeto
da obrigação na livre disposição do beneficiário. Assim, por exemplo, são existentes
e exigíveis mas ainda não disponíveis o direito a juros vencidos e não pagos ou o
direito a lucros distribuíveis mas ainda não distribuídos.
É precisamente com base nestas considerações que a legislação do imposto de
renda, após referir no art. 685 que o imposto incide sobre proventos "pagos, credi-
tados, entregues, empregados ou remetidos" (arts. 693, § único, 705, 706, 708, §
único do RlR) - reproduzindo fórmula advinda do Decreto-Lei nO 4.178, de 13 de
março de 194210 - determina que a retenção do imposto é obrigatória "na data do
pagamento, crédito, entrega, emprego ou remessa".
A lei enumera assim uma tipologia taxativa de atos suscetíveis de desencadear o
nascimento da obrigação tributária, por exprimirem, cada um deles, a aquisição de
disponibilidade jurídica e econômica da renda a que se refere o art. 43 do Código
Tributário Nacional.
Qualquer destes atos representa, na verdade, um facere da fonte pagadora con-
ducente a colocar os rendimentos à disposição do seu titular, devendo notar-se que
a respectiva enumeração não se reveste de caráter cumulativo, mas alternativo, de tal
modo que a obrigação tributária surge tão logo verificado o que primeiro ocorrer.
O simples vencimento da obrigação de pagamento da renda, conquanto ex-
prima o momento da exigibilidade do correspondente direito, não representa ainda
"percepção" do rendimento ou aquisição da disponibilidade jurídica, pelo que a ex-
pressão "creditar" não se confunde com o momento do vencimento, como com todo
o rigor e precisão demonstrou GILBERTO DE ULHOA CANTO Jl : "A forma verbal utiliza-
da pelo legislador não deixa qualquer dúvida quanto a só ser obrigatória a retenção
do imposto pela fonte quando esta agir por uma das maneiras pelas quais a lei prevê
a exteriorização do fato gerador, na espécie: pagar, creditar, empregar, remeter ou
entregar o rendimento. Trata-se de forma verbal ativa, que pressupõe umfacere por
parte da fonte, e que de maneira alguma se coaduna com a interpretação adotada pela
instância ministerial, que equipara a palavra crédito, com o sentido de lançamento
contábil a favor do titular da conta, à mesma palavra com o significado de direito ao
recebimento de uma prestação em dinheiro ou a este redutível. A exigibilidade de um
pagamento, tão logo ocorra o fato dele determinante, segundo a relação contratual
que lhe dá origem - como o vencimento de prazo - independe de qualquer atuação
da fonte. Ora, para fins de retenção do imposto, quis a lei que a obrigação respectiva
só surgisse em razão de atividade específica da fonte pagadora, de ato positivo seu,
qual seja: o creditar, o pagar, o empregar, o remeter ou o entregar o rendimento.
Quisesse a lei que o fato gerador da obrigação tributária em causa surgisse com o só
vencimento do prazo contratual, tê-lo-ia dito, sem dúvida, de forma clara, sem con-

10 Cfr. RUBENS GOMES DE SOUSA, Estudos de Direito Tributário, 12-13.


11 Cfr. Estudos e pareceres de Direito Tributário, 376 ss.
Título V I Capo 11 I Residentes no Exterior

dicionar a ocorrência do fato gerador a um ato positivo, um facere da fonte pagadora


do rendimento, como a forma verbal utilizada demonstra. Portanto, é inviável a inte-
ligência dada à palavra crédito para compreender tanto o registro contábil como o di-
reito de haver prestação contratual, pois a lei fala em creditar e não em crédito; e, se o
substantivo poderia ter o duplo sentido, o verbo não pode. [ ... ] Em realidade, ainda
que fosse lexicamente possível - que não é - atribuir-se ao verbo creditar significado
igual ao de vencimento da obrigação ou de sU1lfimento do crédito pelo decurso do prazo
contratual, ficariam vazios de conteúdo os demais verbos consignados no dispositivo
legal em tela, quais sejam: pagar, remeter, empregar e entregar. Guardada a ordem
cronológica em que tais fatos ocorrem, é de toda evidência que a ação decorrente
de qualquer dos quatro verbos acima enumerados só terá lugar depois de vencida a
dívida, ou seja, depois do decurso do prazo contratual. Assim, alçado o vencimento da
dívida à categoria de fato gerador da obrigação tributária respectiva, jamais se dará a
hipótese de qualquer dos atos de pagar, remeter, empregar ou entregar o rendimento
poder constituir exteriorização do fato gerador (como quer a lei) da obrigação tribu-
tária respectiva, porque o vencimento do débito lhes antecederá sempre".
Note-se que a obrigação tributária surge ainda que o pagamento tenha sido efe-
tuado no Brasil (em moeda nacional ou em depósito em conta de não residentes) ou
diretamente com recursos possuídos no exterior, não sendo necessária a sua remessa
cambial 12 • Ao invés, a remessa é integrante do tipo legal do imposto na fonte sobre
juros devidos na venda de bens a prazo 13 .
Tenha-se ainda presente que as remessas para o exterior dependem de prova do
pagamento do imposto devido (art. 716, parágrafo único, do RIR).

b) O caso das despesas incorridas e não pagas


Examina-se agora a questão de saber se incide o imposto de renda por ocasião
da escrituração contábil de despesas correspondentes a rendimentos devidos a resi-
dentes no exterior, incorridas de harmonia com o regime de competência, mas não
efetivamente pagas, ou por não se ter ainda verificado o respectivo vencimento, ou
por mora do devedor.
No que concerne ao imposto de renda das pessoas jurídicas nenhuma dúvida se
suscita quanto à escrituração das despesas, pois o regime de competência estabelece
que as despesas devem ser escrituradas na data em que foram incorridas, isto é, na
data em que se constituiu a obrigação correspondente, independentemente da data
do seu vencimento ou pagamento 14 .
A dúvida está, pois, em saber se o imposto de renda na fonte é devido no
momento em que as despesas são creditadas contabilmente por força do regime de

12 Cfr. HELENO TÓRRES, A pluritributaçiúJ internacional, 340.


13 Cfr. infra, 489 sS.
14 Cfr. o Parecer Normativo CST nO 58, de 2 de setembro de 1977.
a I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier -___
: _ _ _ _ _ _ _ _.....;J

competência ou se, ao invés, a incidência do imposto apenas ocorre ou no momento


em que a obrigação se vencer ou quando for efetivamente paga.
Que o simples "crédito contábil" da despesa não envolve uma "percepção do
rendimento" ou aquisição da disponibilidade jurídica e econômica da renda foi de-
monstrado com precisão e rigor por GILBERTO ULHÔA CANTaIS, conforme já atrás
se VIU.
Este ensinamento da melhor doutrina tem sido acolhido pela jurisprudência
do Conselho de Contribuintes que reiteradamente se tem pronunciado no sentido
de que o imposto de renda na fonte não incide enquanto a obrigação não estiver
vencida, ainda que creditada contabilmente como despesa para efeitos de imposto de
renda pessoa jurídica.
Na sequência do Acórdão da Câmara Superior de Recursos Fiscais (CSRFj01-
0.632), de 11 de abril de 1986, a jurisprudência administrativa tem-se orientado no
sentido de que, "enquanto o direito não puder ser exigido, tem-se direito de crédito,
mas não ainda disponibilidade jurídica de renda"16.
Mas se a jurisprudência do Conselho de Contribuintes é inequívoca em con-
siderar que o imposto de renda na fonte de residentes no exterior não incide antes
da exigibilidade do crédito, determinada pelo vencimento da obrigação, tal como
contratualmente ajustado entre as partes, já o mesmo não sucede no que concerne a
obrigações vencidas, embora não pagas.
Alguns acórdãos pronunciaram-se no sentido de que a disponibilidade jurídica
só ocorre no vencimento da obrigação, momento em que nasceria o direito à ação
para exigir o crédito, de tal modo que "enquanto o direito não puder ser exigido,
tem-se direito de crédito, mas não ainda disponibilidade jurídica de renda"17.
Outros, porém, trilharam caminho oposto, reconhecendo de modo mais ou me-
nos explícito o equívoco conceitual de equiparar poder de exigir e poder de dispor,
exigibilidade e disponibilidade, na acepção que tem no Direito Tributário brasileiro,
ex vi do art. 43 do Código Tributário Nacional, ou seja, a disponibilidade fiscal. Estes
conceitos não são sinônimos. Em matéria de direitos de crédito a disponibilidade re-
presenta uma faculdade jurídica mais forte do que a simples exigibilidade, pois supõe
que a realização efetiva do direito dependa da simples manifestação de vontade do
credor, independentemente de um ato do devedor l8 (incondicionalidade).
É precisamente o que sucede nos casos de mora credendi, em que a disponibili-
dade jurídica ocorre mesmo antes do pagamento, pois que o não cumprimento da

15 Cfr. Estudos e pareceres de Direito Tributário, São Paulo 1975, 376 ss.
]6 Cfr. ainda o Acórdão do Conselho de Contribuintes nO 103-07.602, de 13.10.96, e Ac. nO
101-77.766, de 13.06.88.
17 Ver o já citado Ac. CSRFjOl-0.632, de 11.4.86; Ac. nO 103-07.602, de 13.10.86.
18 "O crédito de rendimento só configura disponibilidade jurídica se incondicional, isto é, se
o recebimento do respectivo numerário depender exclusivamente do beneficiário... " (Ac.
CSRFjOl-0820), Cfr. ainda Acórdão nO 102-43815. Cfr. BULHÕES PEDRElRA,Imposto sobre a
Renda - Pessoa Jurídica, l, Rio de Janeiro 1979, 196 ss.
Título V I Capo 11 I Residentes no Exterior .i~.

obrigação no momento próprio se deve apenas ao fato de o credor, sem causa justi-
ficativa, recusar o pagamento que lhe foi oferecido ou não realizar os atos de coope-
ração necessários ao mesmo J9 . Exemplo clássico é o de os recursos serem colocados à
disposição do credor que, porém, os não levanta ou dá quitação.
Acresce ainda que a lei ordinária arvorou os conceitos da disponibilidade jurí-
dica e da disponibilidade econômica, em matéria de rendimentos de residentes no
exterior tributados por retenção na fonte em requisitos cumulativos, exigindo uma
efetiva "percepção" do rendimento em qualquer das modalidades típicas enumeradas
no art. 685 do RIR (pagamento, crédito, remessa, emprego, entrega) e entre as quais
não se inclui a mera exigibilidade da obrigação.
De resto, a opção legislativa por tributar os rendimentos apenas por ocasião da
sua percepção efetiva é a que melhor se adapta à natureza de um imposto retido na
fonte, que pressupõe um fluxo financeiro nas relações entre devedor e credor.
Aliás, que o vencimento não significa, por si só, aquisição de disponibilidade
jurídica, no sentido do art. 43 do Código Tributário Nacional, é a interpretação que
melhor se coaduna com o princípio constitucional da capacidade contributiva, de
que aquele preceito é reflexo e que não se compadeceria com a possibilidade de fazer
recair no credor o ônus tributário da inadimplência do devedor.

§ 2° BASE DE CÁLCULO

A base de cálculo do imposto de renda na fonte sobre residentes no exterior é


constituída pelo rendimento bruto, não se admitindo, assim, qualquer dedução das
despesas ou custos necessários à sua formação (RIR, art. 713). Três exceções a assi-
nalar: os rendimentos de imóveis, hipótese em que é permitido deduzir dos aluguéis
ou royalties, mediante comprovação, as despesas previstas no art. 50 do RIR (art.
705, § único )20; o arrendamento mercantil do tipo financeiro em que se permite a
exclusão do valor de cada parcela remetida que corresponder à amortização do bem
arrendado (Instrução Normativa nO 252/02, art. 6°, § 2°); os prêmios de resseguro
cedidos ao exterior, em que a base de cálculo corresponde a 8% do valor pago (Me-
dida Provisória nO 2.158-35/01, art. 26).
Coloca-se importante problema no que se refere à base de cálculo deste impos-
to, sempre que as partes pactuam que o rendimento será recebido pelo seu titular "lí-
quido" do imposto de renda na fonte por ele devido. A prática é comum em matéria
de juros de empréstimos externos, mas é generalizável a outros rendimentos, como
royalties e despesas de assistência técnica.
No que concerne ao imposto de renda na fonte sobre juros, as partes podem, no
domínio da sua liberdade contratual, pactuar que o respectivo encargo fmanceiro seja

19 Cfr. ANTUNES V ARELA, Direito das Obrigações, vaI. 2, Rio de Janeiro 1979, 157.
20 Cfr. Pareceres Normativos nO 422/70 e nO 487/70.
9 I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

por conta do credor - caso em que estipulam uma taxa bruta de juros (gross rate) - ou
por conta do devedor - caso em que estipulam uma taxa líquida de juros (net rate).
Quando se estipula uma taxa bruta, o credor aceita receber essa taxa uma vez
efetuada a retenção do imposto sobre os próprios juros devidos; ao invés, quando se
estipula uma taxa líquida de juros, o credor define desde logo o montante preciso que
quer receber, pelo que o imposto de renda não deverá ser retido dos próprios juros,
mas sim recolhido pelo responsável com base em recursos próprios.
Pode, desde logo, suscitar-se a questão de saber se este tipo de cláusula é válida
no direito brasileiro, na medida em que ela significa que não é obrigatória a retenção
do imposto e que portanto não é do interesse e ordem pública que o respectivo ônus
econômico seja suportado pela pessoa que a lei define como contribuinte.
Não temos dúvida em afirmar a absoluta validade destes pactos, no domínio do
imposto de renda2l .
É certo que o art. 123 do Código Tributário Nacional dispõe que "salvo dis-
posições da lei em contrário, as convenções particulares, relativas à responsabilidade
pelo pagamento dos tributos, não podem ser opostas à Fazenda Pública, para modi-
ficar a definição legal do sujeito passivo das obrigações tributárias correspondentes".
Este preceito deve ser interpretado no sentido de que, embora tais convenções sejam
válidas do ponto de vista do direito privado, elas não são oponíveis ao Fisco para
exonerar de responsabilidade a pessoa definida pela lei como sujeito passivo, contra
a qual reverterá sempre a execução forçada em caso de não pagamento voluntário,
de tal modo que a convenção esgota os seus efeitos nas relações bilaterais entre as
partes. Por outro lado, a lei é expressa em admitir a validade do acordo pelo qual a
fonte pagadora de um rendimento assume o encargo financeiro do seu pagamento,
mas faz daí deduzir certas consequências tributárias.
A primeira é a de que, sendo o ônus do imposto suportado por terceiro (a fonte
responsável) e não pelo próprio titular do rendimento (contribuinte), o valor do im-
posto representa rendimento adicional deste último, pelo que o imposto a ser recolhi-
do pela fonte não deve ser calculado apenas sobre o valor bruto do rendimento, mas
sobre este valor acrescido do valor do imposto não retido pela fonte. É o que resulta
do art. 725 do RIR, segundo o qual "quando a fonte pagadora assumir o ônus do
imposto devido pelo beneficiário, a importância paga, creditada, empregada, reme-
tida ou entregue, será considerada líquida, cabendo o reajustamento do respectivo
rendimento bruto, sobre o qual recairá o tributo ressalvados os casos a que se referem
os arts. 677 e 703, § único" (o reajustamento far-se-á de acordo com a fórmula ado-
tada na Instrução Normativa nO 15/01, art. 20).

21 Esta também é a orientação da jurisprudência administrativa: "Assunção do Ônus Tributá-


rio - Cláusula contratual, pactuada livremente pelas partes, como condição para a realização
de um negócio, pode prever a transferência do ônus financeiro da obrigação tributária do
sujeito passivo legalmente previsto, para outrem, sem que nessa avença particular possa ser
vista qualquer espécie de transação oponível à Fazenda Pública ou, mesmo, mera liberalidade
de quem aceitou assumir o ônus (Ac. CSRF/01-1.462/92 a 1.465/92 - DO 19.01.95)".
Título V I Capo II I Residentes no Exterior M,_
A segunda consequência é a de que o ônus financeiro assumido pela fonte pa-
gadora é considerado despesa dedutível na apuração do seu lucro tributável, não como
imposto de renda - que seria indedutível - mas como complemento do custo ou
despesa correspondente. É o que resulta do § 30 do art. 41 da Lei nO 8.981, de 20 de
janeiro de 1995, segundo o qual "a dedutibilidade, como custo ou despesa, de rendi-
mentos pagos ou creditados a terceiros abrange o imposto sobre os rendimentos que
o contribuinte, como fonte pagadora, tiver o dever legal de reter e recolher, ainda
que assuma o ônus do imposto" (art. 344, § 30, do RIR).
Da validade dos pactos que conduzem à fixação de uma taxa de juros líquida de
imposto de renda nos empréstimos externos, resulta que, se o devedor dos juros pro-
ceder indevidamente à retenção do imposto, o credor poderá acioná-lo no Brasil para
exigir o pagamento da diferença devida. E, caso este valor venha a ser efetivamente
recebido, o Fisco poderá exigir do responsável a diferença do imposto corresponden-
te ao valor dos juros reajustados.
Note-se que o fato de haver cláusula de juros líquidos ou cláusula de juros
brutos em nada afeta a situação jurídica da fonte (responsável) e do credor (contri-
buinte) perante o Fisco. Em ambos os casos, a responsabilidade pelo pagamento do
imposto é exclusiva da fonte, inexistindo qualquer vínculo jurídico entre o Fisco e o
credor dos juros, como adiante melhor se verá. A única diferença é que, enquanto no
caso de taxa bruta o credor é contribuinte econômico do imposto, vez que suporta o
respectivo encargo financeiro, no caso de taxa líquida o contribuinte econômico do
imposto é o próprio devedor dos juros, pois que o deverá pagar com recursos seus.
Pode assim concluir-se que, no caso de estipulação de taxa líquida de juros, o
credor é um contribuinte que não contribui: não contribui em sentido jurídico, pois
não é responsável pelo pagamento, e não contribui em sentido econômico, pois nada
paga efetivamente a título de imposto.

§ 30 SUJEITO PASSIVO

Como resulta do Código Tributário Nacional, o conceito de contribuinte é sem-


pre definido por referência ao conceito de fato gerador - visto que com ele pressupõe
uma relação direta e pessoal.
Assim sucede também no imposto de renda. Diz, com efeito, o art. 43 do Có-
digo Tributário Nacional que "o imposto, da competência da União, sobre a renda e
proventos de qualquer natureza, tem como fato gerador a aquisição da disponibili-
dade econômica ou jurídica: I - da renda, assim entendido o produto do capital, do
trabalho ou da combinação de ambos; II - de proventos de qualquer natureza, assim
entendidos os acréscimos patrimoniais não compreendidos no inciso anterior".
Ora, se nos termos do art. 121, inciso I, do mesmo Código, contribuinte é o
sujeito passivo que tenha relação pessoal e direta com a situação que constitua o
respectivo fato gerador, nada mais natural que o art. 45 tenha definido contribuinte
. , , : - Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

do imposto de renda como ((o titular da disponibilidade a que se refere o art. 43, sem
prejuízo de atribuir a lei essa condição ao possuidor, a qualquer título, dos bens pro-
dutores de renda ou dos proventos tributáveis". Com efeito, quem revela capacidade
contributiva no tocante a este imposto é a pessoa que realiza o fato gerador - aquele
que é titular da disponibilidade econômica ou jurídica da renda.
Dentro dos limites assim traçados pelo Código Tributário Nacional, a legislação
ordinária distingue três tipos fundamentais de contribuintes, submetendo cada um
deles a um regime jurídico autônomo: (a) as pessoas físicas residentes ou domici-
liadas no Brasil; (b) as pessoas jurídicas residentes ou domiciliadas no Brasil; (c) as
pessoas, físicas ou jurídicas, residentes ou domiciliadas no exterior.
Contribuintes do imposto de renda na fonte sobre residentes no exterior são,
por conseguinte, as pessoas físicas ou jurídicas titulares da disponibilidade econô-
mica ou jurídica da forma de renda que é objeto da tributação, como é o caso do
credor de juros de empréstimos externos, da sociedade estrangeira titular do direito
a dividendos, do titular do direito a royalties etc.
Além do contribuinte, o Código Tributário Nacional prevê a figura do responsável
em matéria de imposto de renda, estabelecendo no § único do art. 43 que "a lei pode
atribuir à fonte pagadora da renda ou dos proventos tributáveis a condição de responsá-
vel pelo imposto cuja retenção e recolhimento lhe caibam". A disposição está em plena
coerência com a definição de responsável dada nos arts. 121, inciso li, e 128 do mesmo
Código, pois que a fonte pagadora é um terceiro que - apesar de não ter relação direta
e pessoal com o fato gerador (dada pela titularidade da renda) - se encontra contudo
a este vinculado, vínculo que resulta do fato de ser ele que procede ao pagamento dos
rendimentos e proventos que constituem o fato gerador do imposto de renda22 .
Tenha-se presente, quanto ao imposto de renda relativo a residentes no exterior,
que a obrigação de retenção é da fonte pagadora, salvo no caso de aluguéis de imó-
veis, ou em casos em que o procurador não der conhecimento à fonte de que o titu-
lar do rendimento é residente no exterior, casos em que o responsável é o procurador
(arts. 685, § 2°, b) e 721 do RIR)23.

§ 4° ALÍQUOTAS

A alíquota normal do imposto de renda na fonte sobre residentes no exterior foi


estabelecida em 15% pelo art. 28 da Lei nO 9.249/95, que reduziu a alíquota normal
anteriormente vigente, de 25%.
A lei prevê, porém, casos de alíquota agravada e de alíquota reduzida.

22 Sobre os equívocos suscitados peJo emprego da expressão "contribuinte" em vez de "respon-


sável" ao caso de juros na compra de bens a prazo, cfr. infra, 452 ss.
23 No que concerne à responsabilidade nos regimes especiais de equiparação a residentes no
Brasil, cfr. a 6 a edição desta obra, 615.
Título V I Capo 11 I Residentes no Exterior MiM

Alíquota agravada é a alíquota de 25 % prevista para (i) rendimentos do trabalho com


ou sem vínculo empregatício e os de prestação de serviços (art. 70 da Lei na 9.779/99); e
(ii) rendimentos de que o beneficiário seja residente e domiciliado em país que não tribu-
te a renda ou a tribute a alíquota máxima inferior a 20% (art. 80 da Lei na 9.779/99).
Todavia, a regra de que os pagamentos efetuados a "paraísos fiscais" se submetem à
alíquota de 25% comporta duas ordens de exceções: (i) estão sujeitos à alíquota de 15%
os pagamentos de a) despesas com instalação e manutenção de escritórios comerciais e
de representação, de armazéns, depósitos ou entrepostos, b) despesas de arrendamento
mercantil de bens de capital, c) juros, comissões, despesas e descontos decorrentes de
colocação no exterior de títulos de crédito internacionais; (ii) por sua vez estão sujeitos à
alíquota zero; a) juros de desconto de cambiais de exportação e respectivas comissões, e
b) juros e comissões relativos a créditos destinados ao frnanciamento de exportações.
As alíquotas reduzidas distinguem-se, quanto à fonte, consoante a redução de-
corra de tratado contra a dupla tributação ou de lei.
Com as alíquotas agravadas ou reduzidas do regime geral de retenção na fonte
não devem confundir-se as alíquotas próprias dos regimes especiais de equiparação a
residentes no país: 20% nas operações de renda fixa, 15 % nos ganhos de capital na alie-
nação de bens e direitos e 20% nos ganhos líquidos nos mercados de renda variável.
São as seguintes as hipóteses sujeitas a alíquota zero 24 :
I) despesas com pesquisas de mercado, bem como aluguéis e arrendamentos de
estandes e locais para exposições, feiras e conclaves semelhantes, no exterior,
inclusive promoção e propaganda no âmbito desses eventos, para produtos
e serviços brasileiros e para promoção de destinos turísticos brasileiros;
II) contratação de serviços destinados à promoção do Brasil no exterior, por
órgãos do Poder Executivo Federal;
III) comissões pagas por exportadores a seus agentes no exterior;
IV) despesas de armazenagem, movimentação e transporte de carga e emissão
de documentos realizadas no exterior;
V) operações de cobertura de riscos de variações, no mercado internacional, de
taxas de juros, de paridade entre moedas e de preços de mercadorias (hedge);
VI) juros de desconto, no exterior, de cambiais de exportação e as comissões de
banqueiros inerentes a essas cambiais; e
VII) juros e comissões relativos a créditos obtidos no exterior e destinados ao
financiamento de exportações.
Os rendimentos mencionados nos incisos I a V ficam, porém, sujeitos à alíquota
de 25% se recebidos por pessoas físicas ou jurídicas domiciliadas em países de tribu-
tação favorecida. Já os mencionados nos inciso V e VII beneficiam da alíquota zero,
independentemente do domicílio do beneficiário.

24 efr. Decreto nO 6.761, de 5 de fevereiro de 2009, e as fontes legais nele referidas. Veja-se ain-
da a Instrução Normativa nO 252/02, com as alterações da Instrução Normativa nO 744/07.
Instrução Normativa nO 252 de 03.12.2002.
Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Também estão sujeitos à alíquota zero, como incentivo à inovação tecnológica,


as remessas efetuadas para o exterior destinadas ao registro e manutenção das marcas
e patentes (Decreto nO 4.195/02).
Causa perplexidade a adoção, pela lei, da técnica da alíquota zero, ao invés da
outorga de isenção. Do ponto de vista jurídico, de há muito se reconhece que os
princípios relativos às isenções, em sentido estrito, são igualmente aplicáveis a todos
os mecanismos que tenham um efeito exoneratório equivalente e que atuem, não na
delimitação do fato gerador, mas na base de cálculo ou na alíquota do impost025 •
Tratando-se de mera técnica legislativa formal, em tudo equivalente a uma isen-
ção, a sua adoção só pode explicar-se por motivos políticos, sinalizando o caráter
revogável e flexível dos benefícios outorgados.

§ 5° ISENÇÕES

As isenções do imposto de renda na fonte sobre residentes no exterior classifi-


cam-se em subjetivas e objetivas.
São subjetivas as isenções concedidas em função da natureza do sujeito que re-
cebe ou paga os rendimentos: é o caso dos rendimentos auferidos por governos
estrangeiros desde que haja reciprocidade (art. 688 do RIR); e o caso da isenção
das remunerações de serviços prestados por pessoas físicas residentes no exterior a
autarquias ou repartições do Governo brasileiro situadas fora do território nacional
(Lei nO 9.250/95, art. 29; RIR, art. 687).
Ao invés, são objetivas as isenções concedidas em função da natureza da ativida-
de ou da operação a que se referem, tais como: empréstimos e financiamentos externos:
quanto a juros cujo ônus tributário tenha sido assumido por pessoa jurídica de direito
público interno (Portaria nO 164/88); isenção quanto a juros devidos a agências de
governos estrangeiros, em razão da compra de bens a prazo, quando houver recipro-
cidade de tratamento (art. 704, I, RIR): isenção quanto a juros de certos títulos da
dívida externa do Tesouro Nacional (art. 704, II, III e N do RIR); serviços de teleco-
municações: isenção quanto a rendimentos pagos ou creditados pela contraprestação
de serviços de telecomunicações, por empresa de telecomunicação que centralize, no
Brasil, a prestação de serviços de rede corporativa de pessoas jurídicas (RIR, art. 689);
navegação aérea e marítima: isenção de companhias marítimas e aéreas domiciliadas
em países, que não tributem, em decorrência da legislação interna ou acordos inter-
nacionais, os rendimentos conferidos por empresas brasileiras que exercem o mesmo
tipo de atividade (Lei nO 9.430/96, art. 85); dividendos (art. 10 da Lei nO 9.249/95).

25 Cfr. SAINZ DE BUjANDA, Teoria jurídica de la exención tributaria, in Hacienda y Derecho, III,
Madrid 1963,425 55. Cfr. por último ArDNSO MUlULLO, El tipo cera en el sistema impositivo
espanol, Madrid 1998, espec. 133 55.
Título V I Capo 11 I Residentes no Exterior M?i.
Com as isenções não devem confundir-se casos de mera não incidência, constan-
tes de preceitos declaratórios da não tributabilidade dos valores em causa, de que são
exemplo as hipóteses referidas como "dispensa de retenção" pelo art. 690 do RIR,
tais como os valores, em moeda estrangeira, registrados no Banco Central do Brasil,
como investimentos ou reinvestimentos, retornados ao seu país de origem (pois con-
figuram retorno de capital e não ganho de capital) (PN nOS 99/71, 231/71 e 232/71);
o valor dos bens havidos, por herança ou doação, por residente ou domiciliado no
exterior (pois se trata de transferência de capital) (PN nO 80/72); as remessas para
dependentes no exterior (ADN nO 9/77); as diárias, ajudas de custo e reembolsos de
despesa, por terem natureza ressarcitória26 ; a cobertura de gastos pessoais, no exte-
rior, de pessoas físicas, residentes ou domiciliadas no país, em viagens de turismo,
negócios, serviço, treinamento ou missões oficiais (RIR, art. 690, VIII).

§ 6° NATUREZA: A INCIDÊNCIA EXCLUSIVA NA FONTE


COMO SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA

A) Imposto de renda na fonte como antecipação e como incidência exclusiva


Uma análise do direito positivo brasileiro revela que este conhece duas modali-
dades de regime de incidência na fonte: o imposto de renda na fonte como antecipa-
ção do devido na declaração e a incidência exclusiva na fonte, não raro permitindo que a
aplicação de um ou outro regime dependa da opção do contribuinte 27 .
O sistema de antecipação consiste em considerar o imposto de renda retido pela
fonte pagadora como um simples adiantamento daquele que será calculado em face
da declaração - único que se considera devido -, de tal modo que as retenções ante-
riormente efetuadas deverão ser deduzidas do imposto devido e, caso excedam este
último, restituídas ao contribuinte.
Ao invés, no sistema de incidência exclusiva abstrai-se em absoluto do imposto
calculado em face da declaração, de tal modo que as retenções efetuadas não são com
ele compensáveis, sendo portanto o imposto de renda na fonte o único que se considera
devido em relação aos rendimentos que o suportaram.
Pode, assim, dizer-se que, enquanto o imposto de renda na fonte como anteci-
pação tem caráter instrumental relativamente ao imposto apurado na declaração, o
imposto com incidência exclusiva tem caráter substitutivo ou liberatório.
Duas grandes ordens de razões têm levado o legislador ordinário a multiplicar as
hipóteses de incidência exclusiva, tanto na sua forma obrigatória quanto na opcional:
uma relacionada com a impossibilidade ou dificuldade de identificar o contribuinte

26 ATTlLA DE ANDRADE JUNIOR, O capital estrangeiro no sistema jurídico brasileiro, Rio de Janeiro
1979,176.
27 Sobre a distinção entre ritenuta d'acconto e ritenuta una tantum, veja-se GmsEPPE PIAZZA,
Ritenuta d'acconto e imposta sugli utili delle società, Milão 1963.
.~+. Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

ou de controlar os seus rendimentos globais (como sucede nos casos de beneficiários


não identificados, ou residentes no exterior); outra relacionada com o propósito de
dar um tratamento tributário mais favorável a certos tipos de rendimentos, subtrain-
do-os da incidência porventura mais elevada do imposto apurado na declaração (é o
que sucede com numerosas aplicações no mercado de capitais).

B) O conceito de substituição tributária


Os casos de retenção exclusiva na fonte enquadram-se na figura jurídica da subs-
tituição tributária, elaborada pelas doutrinas alemã e italiana (como instituto au-
tônomo em relação à "responsabilidade tributária" em sentido técnico) e que foi
amplamente acolhida na doutrina brasileira, que a concebe como uma modalidade
de responsabilidade.
A substituição tributária corresponde a um regime excepcional, que representa
um desvio lógico ao regime geral segundo o qual a mesma pessoa que tem capacidade
contributiva em relação a dado tributo é a referida na hipótese de incidência como
sujeito do fato gerador e é expressamente obrigada por lei à realização da prestação
tributária, cujo ônus financeiro deve também suportar28 .
Através da substituição tributária, este esquema normal é subvertido pelo fato
de a lei impor a realização da prestação tributária a um terceiro que passa a figurar na
relação jurídico-tributária, não ao lado do contribuinte, mas em lugar dele.
Já se disse que a palavra "substituição" só faz sentido num plano pré-jurídico,
no qual o legislador cogita de "substituir" o contribuinte por uma terceira pessoa que
venha a ocupar o seu lugar. Mas não assim no plano técnico-jurídico, uma vez que
para a lei não existem dois sujeitos passivos, ocupando um o lugar do outro, mas um
só sujeito passivo - o substituto, único que está obrigado perante o Fisco ao cumpri-
mento da obrigação tributária29 .
Esta observação deve, porém, ser acolhida em termos mais sutis. Se é certo que
a pessoa em relação à qual ocorreu o fato gerador do imposto não é sujeito passivo da
obrigação tributária, a verdade também é que ela não é irrelevante no regime jurídico
de substituição tributária. É que a obrigação de imposto, cujo sujeito passivo é o
substituto, não é uma obrigação distinta da do substituído por nascer de um fato
jurídico diverso, o pagamento de um crédito e não a sua percepção, como parece
defender ALLORlO. A obrigação mantém inalterada a sua identidade, de tal modo
que as condições legalmente determinantes do seu nascimento e conteúdo - isen-

28 Cfr. BERLIRl, Principi di Diritto Tributaria (la ed.), voI. II, tomo I, Milão 1952, 129. Sobre
a substituição tributária, vejam-se as recentes monografias de DANTE D'A,"GELO, Per un ag-
giornamento della figura delsostituto d'imposta, Milão 1991 (cujas conclusões não podemos
acompanhar), e LUIS M. ALONSO GONZALEZ, Sostitutos y retenedores en el ordenamiento tribu-
taria espanol, Madrid 1992.
29 Cfr. ALLORIO, Diritto Processuale Tributaria, Milão 1955, 191; PAULO DE BARROS CARVALHO,
Curso de Direito Tributária, São Paulo 1985, 180-181.
Título V I Capo 11 I Residentes no Exterior .w-
ções, deduções etc. - devem verificar-se quanto à pessoa do substituído e não em
relação ao substituto. O pagamento de um rendimento não determina a criação de
uma obrigação nova, mas a substituição, no seu lado passivo, do contribuinte, por
um terceiro (substituto). Como o substituto é o verdadeiro sujeito passivo da obri-
gação tributária, a ele incumbe efetuar o pagamento, revertendo contra ele eventual
execução fiscal.
Na pureza dos seus contornos doutrinários, o instituto da substituição tributá-
ria traduz-se na existência de uma única relação Jurídico-tributária entre o substituto e
o Fisco, com a consequente exclusão da responsabilidade do contribuinte, que não tem
com o Fisco qualquer relação jurídica: pode dizer-se que em tais casos a lei cria um
contribuinte que não contribui.
Rá quem pretenda alargar o conceito de substituição tributária de modo a
abranger todos os casos de retenção na fonte, inclusive aqueles em que a retenção
funciona como simples antecipação do imposto devido na declaração. Fala-se, nestes
casos, de uma substituição parcial, por oposição à substituição total 3D •
Entendemos, porém, que a diversidade de regimes jurídicos é tal que não se
justifica o enquadramento de fenômenos, profundamente distintos, numa deno-
minação comum: na retenção na fonte por antecipação, existe uma responsabilidade
cumulativa do responsável e do contribuinte, coexistindo duas relações jurídicas
autônomas; na retenção exclusiva na fonte, existe uma responsabilidade exclusiva do
responsável substituto, inexistindo qualquer relação jurídica entre o contribuinte
e o Fisco.
Entendemos, assim, que, nos casos de retenção por antecipação, a fonte pagado-
ra é responsável a título de agente de retenção e não de substituto tributário, seguindo
neste ponto a lição de DINO JARACH quando afirma: '1\ diferença fundamental entre
o agente de retenção e o substituto tributário consiste essencialmente no seguinte:
o agente de retenção tem em primeiro lugar a obrigação de reter e pagar ao Fisco a
soma retida; só o incumprimento de uma das obrigações referidas faz nascer a sua
responsabilidade patrimonial perante o Fisco. Ao contrário, no caso do substituto,
a obrigação de pagar o imposto incumbe direta e primordialmente ao substituto,
sem prejuízo do seu direito de reclamar a restituição do que pagou ao verdadeiro
contribuinte 3J " •

C) A exclusão da responsabilidade do contribuinte na substituição tributária

A doutrina italiana que elaborou o conceito de substituição tributária sempre


defendeu que é da essência desta figura a exclusão da responsabilidade do contribuinte.

30 Cfr. BERLIRI, Principi, lI, I, 139; BLUMENSTEIN, Sistema di Diritto delle Imposte, Milão 1954,
58, distingue entre uma substituição privativa (total) e cumulativa (parcial).
31 Cfr. DINO JARACH, Curso Superior de Derecho Tributario, Buenos Aires 1969,208; cfr. tam-
bém SAINZ DE BU)ANDA, Lecciones de Derecho Pinanciero, Madrid 1982, 238.
• I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

A. D. GIANNINI é categórico em afirmar que o substituto do imposto "não é um


terceiro na relação jurídico-tributária", mas "é ele próprio e ele somente o devedor do
imposto", é juridicamente o único devedor do tributo 32 •
E após colocar a questão de saber se o Fisco pode exigir o imposto, além do
substituto, do substituído (contribuinte), responde: "Parece-me que o caráter cogen-
te das disposições tributárias se afirma também neste caso e induz, portanto, a adotar
a solução negativa", pelo que "uma responsabilidade (subsidiária) do substituído só
seria admissível caso uma lei expressamente a previsse 33 ".
ALESSI e STAMMATI sustentam também que o substituto "no plano jurídico-for-
mal é o verdadeiro e único devedor do imposto, pelo que paga um débito que no plano
jurídico-formal é débito seu". E adiante: "Sob o plano jurídico-formal, repito mais
uma vez, o substituto é o verdadeiro e único sujeito passivo da relação tributária, o
que justifica o fato que a ele incumbem todos os deveres preparatórios, cujo descum-
primento envolve as respectivas sanções. Assim como justifica que sujeito à ação exe-
cutiva por falta de pagamento do débito de imposto seja o substituto. Resta a dúvida
de saber se o Fisco tem uma ação subsidiária no confronto do titular do rendimento
que constitui o fato gerador: parece preferível a opinião negativa, salvo apenas dispo-
sição da lei em contrári0 34".
ALLORIO é também categórico no sentido de que o contribuinte (substituído)
não desempenha qualquer papel no plano jurídico, não existindo qualquer relação
jurídica entre ele e o Fisco, pelo que o Fisco, na hipótese de não ter conseguido exe-
cutar o seu crédito contra o substituto, não poderá executar o substituído 35 •
A verdade, porém, é que noutros Direitos - como o espanhoJ36 e o português 37
- a lei prevê expressamente a responsabilidade subsidiária do contribuinte (substitu-
ído), peJo que nestes países não pode afirmar-se tão radicalmente quanto na Itália
que o substituto seja o único sujeito passivo do imposto. Aqui, sim, é necessário re-
conhecer que também existe uma relação jurídica entre o contribuinte (substituído)
e o Fisco, ocorrendo pois um caso de responsabilidade cumulativa.
Pode, porém, legitimamente pôr-se em dúvida se em tais casos se deve ainda
falar em substituição tributária, na acepção técnica do conceito, pois que em rigor
a ideia de substituição pressupõe a exclusão da responsabilidade do contribuinte.
Ocorreria apenas uma hipótese de responsabilidade cumulativa38 •

32 Cfr. Istituzioni di Diritta Tributaria (8 a ed.), Milão 1960, 109.


33 Cfr. op. cit., lll.
34 Cfr. Istituziani di Diritta Tributaria, Turim s.d., 79-80.
35 CIr. ALLORIO, Diritta Pracessuale Tributaria, 189 ss.
36 Cfr. SAINZ DE BU)ANDA, Leccianes de Derecha Financiera, 231; PÉREZ DE AYALA, Derecha Tribu-
taria, vol. I, Madrid 1968, 61.
37 Cfr. ALBERTO XAVIER, Manual de Direito Fiscal, I, Lisboa 1974 (reimpressão 1981),412-413.
38 Neste sentido, MATIAS CORTÊS DOMÍNGUEZ, Ordenamienta tributaria espafiol, 467 ss. Veja-se
ainda TULlo ROSEMBU), Derecha Fiscal Internacional, Barcelona 2001, 122 ss.
Título V I Capo 11 I Residentes no Exterior .~*.

o Direito brasileiro seguiu a orientação da doutrina italiana, segundo a qual,


nos casos de retenção exclusiva na fonte, a fonte pagadora é o único sujeito passivo,
inexistindo qualquer responsabilidade do titular do direito aos rendimentos (contri-
buinte substituído).
Esta conclusão decorre do fato de o art. 128 do Código Tributário Nacional
prever expressamente a hipótese de a lei atribuir a responsabilidade pelo pagamento
de um tributo a um terceiro, excluindo a responsabilidade do contribuinte; e ainda de,
ao contrário do que sucede noutras legislações, não existir qualquer disposição legal
que atribua ao contribuinte responsabilidade cumulativa (solidária ou subsidiária)
com a da fonte pagadora39 .
Do fato de a lei brasileira excluir a responsabilidade do contribuinte nos casos
de imposto de renda na fonte na modalidade de incidência exclusiva - em que ocorre
uma total substituição tributária -, decorrem as seguintes consequências, aplicáveis
tanto na hipótese de o contribuinte ser residente no país como residente no exterior.
Primeira: o Fisco não pode promover contra o contribuinte ação executiva,
ainda que em caso de insolvência ou falência do substituto, pelo que, na inexistência
de disposição legal que preveja sua responsabilidade cumulativa (solidária ou subsi-
diária), sempre poderá invocar a sua ilegitimidade processual.
Segunda: caso o imposto de renda na fonte tenha sido, por erro, recolhido a
maior, o contribuinte não tem legitimidade para solicitar a respectiva restituição por
via administrativa ou judicial. Esta legitimidade apenas compete ao sujeito passivo (art.
165 do Código Tributário Nacional), que é a pessoa obrigada ao pagamento do tribu-
to (art. 121), no caso, a fonte pagadora responsável40 . Isto, porém, não impede que, no
plano do direito privado, o contribuinte não possa exigir do substituto o ressarcimento
de eventuais prejuíws sofridos pelo eventual não exercício do direito de restituição.
Terceira e última: a lei não prevê qualquer mecanismo que permita ao contri-
buinte o pagamento direto e espontâneo do imposto que eventualmente não tenha
sido retido pela fonte pagadora ou que este reteve mas não recolheu. Caso, porém,
esse pagamento se viesse a realizar, seria considerado por lei pagamento por terceiro,
cujo valor poderia ser havido como rendimento tributável da fonte pagadora41 •

39 Cfr. RUBENS GOMES DE SOUSA, Compêndio de Legislação Tributária, Rio de Janeiro 1969,69;
HUGO DE BRITO MACHADO, Responsabilidade Tributária, Cadernos de Pesquisas Tributárias 5
(1980),70 (71); CARLOS DA ROCHA GUIMARÃES, Responsabilidade Tributária, Cadernos de
Pesquisas Tributárias 5 (1990),249 (256-257); PAULO DE BARROS CARVALHO, Curso de Direi-
to Tributário, São Paulo 1985, 139-194; BERNARDO RIBEIRO DE MORAES, Responsabilidade
Tributária, Cadernos de Pesquisas Tributárias 5 (1980),70 (349); ARNALDO BORGES, O sujeito
passivo da obrigação tributária, São Paulo 1981, 115 sS.
40 Cfr. RICARDO LOBO TORRES, Restituição dos tributos, Rio de Janeiro 1983, 141.
41 O Conselho de Contribuintes já decidiu que não se estende à beneficiária do rendimento
que suportou o ônus do imposto retido na fonte o descumprimento à legislação de regência
cometido pela fonte pagadora - pessoa jurídica, seja pela falta de recolhimento do valor des-
contado, não apresentação da DIRF e/ou de livros contábeis" (Ac. l° CC 102-20.575/83
- Resenha Tributária, Seção 1.2, Ed. 07/85, 158).
Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

SUBSEÇÃO II
Dos RENDIMENTOS EM ESPECIAL

Após termos analisado o regime geral do imposto de renda na fonte sobre resi-
dentes no exterior, importa examinar as peculiaridades de que este imposto se reveste
em relação a certos tipos de rendimentos.

§ la GANHOS DE CAPITAL RELATIVOS A INVESTIMENTOS


DIRETOS EM MOEDA ESTRANGEIRA

A) Hipótese de incidência

Para a plena compreensão do problema, tal como se coloca em face do direito


positivo vigente, torna-se necessária uma breve descrição da evolução legislativa so-
bre a matéria42 •

a) A questão antes do art. 4° do Decreto-Lei nO 1.401) de 7 de maio de 1975

Até à publicação do Decreto-Lei na 1.401, de 7 de maio de 1975, discutiu-se


se os ganhos de capital relativos a investimentos estrangeiros registrados no Banco
Central do Brasil estavam ou não sujeitos ao imposto de renda, tendo em vista que
as mais-valias na alienação de quotas ou ações se encontravam fora do campo de inci-
dência do imposto de renda das pessoas físicas residentes no Brasil- passando apenas
a ser tributadas a partir do Decreto-Lei nO 1.510, de 27 de dezembro de 1976.
A doutrina, na sua generalidade, pronunciava-se a favor da tese de que a não
incidência do imposto era igualmente extensiva aos residentes no exterior. E isto
com base no argumento de que, sendo o conceito de "rendimentos" utilizado na
hipótese de incidência do imposto de renda na fonte sobre residentes no exterior,
necessariamente coincidente com o de "rendimentos tributáveis" junto das pessoas
físicas residentes no país, em virtude do fenômeno da "remissão por absorção", a não
incidência que a estas beneficiava estendia-se automaticamente aos domiciliados no
estrangeiro. Era esta a opinião de TITO REZENDE, BULHÕES PEDREIRA, GILBERTO DE
ULHÔA CANTO, J. E. MONTEIRO DE BARROS e GUSTAVO MIGUEZ DE MELL0 43 •

42 Cfr. ATIlLA DE ANDRADE JUNIOR, O capital estrangeiro no sistema jurídico brasileiro, 172. Sobre
o regime especial dos ganhos de capital na alienação de bens e direitos não relativos a inves-
timentos estrangeiros registrados no Banco Central do Brasil, cfr. infra, 467 ss.
43 Sobre a remissão por absorção, cfr. supra) 508; TITO REZENDE, Imposto de Renda, 621, nota
283; J. L. BULHÕES PEDREIRA, Imposto de Renda, 1969,2.41 (03),20-23-30; GILBERTO DE
ULHÕA CANTO, Estudos e pareceres de Direito Tributário, 308-309; J. E. MONTEIRO DE BARROS,
Imposto de renda e ganhos de capital, in O Estado de São Paulo, 8 de agosto de 1971, 72;
GUSTAVO MIGUEZ DE MELLO, O lucro na venda de ações e a tributação da pessoa física pelo
imposto de renda, RDP 6, 210.
Título V I Capo 11 I Residentes no Exterior .W.
Todavia, o Fisco - após durante longo tempo ter acolhido igual entendimento -
passou a manifestar-se em sentido diferente, inobstante reconhecer a não incidência
do imposto sobre as mais-valias auferidas na alienação de participações societárias
por pessoas físicas residentes no Brasil.
Com efeito, o Parecer CST na 413, de 8 de dezembro de 1969 (DOU de 19 de
dezembro de 1969), consagrou o novo entendimento de que, quando o beneficiário
for pessoa física ou jurídica domiciliada no exterior, só os valores registrados em
moeda estrangeira no Banco Central do Brasil, como investimento, poderão retor-
nar independentemente do tributo na fonte a que se referia o art. 292, inciso 1°, do
Regulamento do Imposto de Renda, de 1966, então vigente.
Por sua vez, o Parecer SLTN na 224/70, em resposta à consulta da Confede-
ração das Associações Comerciais do Brasil, concluía que "qualquer remessa para o
exterior, a título de retorno de capital, só estará isenta do imposto a que se refere o
art. 292, inciso 1°, do Regulamento do Imposto de Renda (Decreto na 58.400-66),
até o valor, em moeda estrangeira, dos investimentos e reinvestimentos registrados
no Banco Central do Brasil, de acordo com o art. 30 , letras a a c, da Lei na 4.131 de
3 de setembro de 1962".
O Parecer Normativo de 12 de janeiro de 1971 reproduz igual doutrina: "Os
ágios ou lucros resultantes da alienação das quotas de capital de sociedade de res-
ponsabilidade limitada, quando percebidos por pessoas físicas, não estão sujeitos à
incidência do imposto de renda, salvo se o beneficiário for residente ou domiciliado
no exterior, caso em que só os valores, em moeda estrangeira, registrados no Banco
Central do Brasil, como investimentos ou reinvestimentos, é que poderão retornar
sem a incidência na fonte de que trata o art. 292, inciso 1°, do RIR".
O mesmo pensamento seria reiterado nos Pareceres Normativos CST nO' 231
e 232, ambos de 10 de março de 1971, segundo os quais "qualquer remessa para o
exterior a título de retorno de capital só estará isenta do imposto a que se refere o
art. 292, inciso l°, do Regulamento do Imposto de Renda (Decreto na 58.400-66),
até o valor, em moeda estrangeira, dos investimentos registrados no Banco Central
do Brasil, de acordo com o art. 3°, letras a a c, da Lei na 4.131, de 3 de setembro de
1962"; e ainda que "se o alienante, pessoa física ou jurídica, for residente ou domi-
ciliado no exterior, somente os valores em moeda estrangeira registrados no Banco
Central do Brasil, como investimento ou reinvestimento, é que poderão retornar sem
a incidência do imposto de renda na fonte prevista no art. 292, inciso la, do Regu-
lamento do Imposto de Renda em vigor".
A análise dos diversos pronunciamentos do Fisco, atrás citados, revela-nos, em
primeiro lugar, que a questão das mais-valias na alienação de quotas e ações só foi ex-
pressamente abordada no que tange a investimentos em moeda estrangeira registra-
dos no Banco Central, reinando o mais absoluto silêncio no que toca a investimentos
realizados por residentes no exterior em moeda nacional, insuscetíveis de registro.
Em segundo lugar, a posição do Fisco consolidou-se no sentido de que o valor
dos investimentos e reinvestimentos registrados em moeda estrangeira desempenha
I ~ I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

não só a função cambial de constituir o limite ao direito automático de retorno do


capital, mas também a função tributária de representar a base de cálculo do imposto
de renda sobre o ganho de capital na alienação de participações societárias, que seria
calculado sobre a diferença entre o preço da venda (ou melhor, seu contravalor em
moeda estrangeira) e os valores registrados, como investimento e reinvestimento
também em moeda estrangeira.
Cumpre salientar, em terceiro lugar, que a única disposição legal invocada pelo
Fisco em apoio de seus pareceres é o art. 3° da Lei nO 4.131, de 3 de setembro de
1962, segundo o qual "fica instituído, na Superintendência da Moeda e do Crédito,
um serviço especial de registro de capitais estrangeiros, qualquer que seja sua forma
de ingresso no País, bem como de operações financeiras com o exterior, no qual serão
registrados: a) os capitais estrangeiros que ingressarem no país sob a forma de in-
vestimento direto ou de empréstimo, quer em moeda, quer em bens; b) as remessas
feitas para o exterior como retorno de capitais ou como rendimentos desses capitais".
Independentemente de um juízo de valor sobre o acerto da solução preconizada pelo
Fisco, salta à vista a absoluta fragilidade da sua fundamentação jurídica, já que o pre-
ceito citado se limita a consagrar o registro de capitais estrangeiros, como condição
formal do exercício de direitos cambiais de remessa, nada dispondo sobre a forma de
calcular o imposto de renda sobre ganhos de capital relativos a esses investimentos.
E daí que a generalidade da doutrina que do tema então se ocupava tenha jus-
tamente acusado o Fisco de ter confundido critérios cambiais, relativos aos direitos
de remessa a título de retorno de capital, com critérios tributários de apuração do
ganho de capital44 •

b) A questão após o art. 4° do Decreto-Lei nO 1.401) de 7 de maio de 1975


Encontravam-se as coisas neste pé quando sobreveio o Decreto-Lei nO 1.401,
de 7 de maio de 1975, que introduziu a disciplina tributária das sociedades de in-
vestimento baseadas em recursos externos. Desgarrado do contexto em que se insere
(regime específico das sociedades de investimento), o art. 4° do referido diploma
estabeleceu a regra genérica de que "os ganhos de capital auferidos por residentes ou
domiciliados no exterior, relativos a investimentos em moeda estrangeira não abran-
gidos por este Decreto-Lei, continuam sujeitos à tributação na fonte à razão de 25%
(vinte e cinco por cento)".
A utilização da expressão "continuam sujeitos" revela bem que a lei pretendeu
imprimir caráter de interpretação autêntica à tese anteriormente defendida pelo fis-
co, segundo a qual a legislação anterior já autorizava a respectiva tributação. Todavia,
o mencionado preceito foi absolutamente omisso no que concerne à base de cálculo

44 efr., por todos, H. TILBERY, A tributaçãIJ dos ganhos de capital nas vendas de participações soci-
etárias pelas pessoas ftsicas, 81.
Título V I Capo 11 I Residentes no Exterior .W'
do imposto sobre os ganhos de capital em geral, ao invés do que sucedeu quanto
ao caso específico das ações das sociedades de investimento, em que arvorou o valor
constante do certificado de registro como parâmetro de apuração do tributo.
Na sequência do art. 4° do Decreto-Lei nO 1.401175, os Regulamentos do Impos-
to de Renda supervenientes (1975 e 1980) passaram a definir a hipótese de incidência
do imposto de renda na fonte dos residentes no exterior, já não como "rendimentos tri-
butáveis nos termos deste Regulamento", mas genericamente como "rendimentos, ga-
nhos de capital e demais proventos", estabelecendo que ficam sujeitos a imposto "quan-
do percebidos por pessoas físicas ou jurídicas residentes no exterior, inclusive os ganhos
de capital relativos a investimentos em moeda estrangeira" (art. 745, I, do RIRj94).
Não pode pois duvidar-se que, a partir da entrada em vigor do art. 4° do Decreto-
Lei nO 1.401/75, estão sujeitos ao imposto de renda os ganhos de capital de residentes
no exterior relativos a investimentos em moeda estrangeira, ou seja, decorrentes da
alienação de participações societárias registradas no Banco Central do Brasil.
Também não pode mais discutir-se que sofrem a incidência desse imposto, na
fonte, os ganhos de capital auferidos por residentes no exterior decorrentes da alie-
nação de participações societárias, mesmo que estas se exprimam apenas em moeda
nacional, não se beneficiando de registro no Banco Central do Brasil, uma vez que tais
ganhos se encontram incluídos na regra geral dos arts. 682 e 685, como bem inculca a
expressão "inclusive", utilizada no art. 685 do RIR, além de estarem abrangidos no in-
ciso II deste artigo que prevê "os ganhos de capital na alienação de bens ou direitos".

B) Base de cálculo

a) O custo de aquisiç/ÚJ como elemento essencial do ganho de capital


A base de cálculo do imposto devido por residentes no exterior referente a
ganhos de capital na alienação de participações societárias deve encontrar-se, no pró-
prio conceito de ganho de capital, consagrado na legislação do imposto de renda
aplicável às pessoas físicas residentes no país.
Esta conclusão - que já se depreendia do sistema anterior - foi consagrada, em
termos definitivos, pela Lei nO 9.249, de 26 de dezembro de 1995, cujo art. 18 esta-
belece que "o ganho de capital auferido por residente ou domiciliado no exterior será
apurado e tributado de acordo com as regras aplicáveis aos residentes no País".
Já atrás se demonstrou que a lei, ao definir o aspecto material ou objetivo da
hipótese de incidência do imposto de renda devido por residentes no exterior, se
limitava a utilizar as expressões "rendimentos", "renda ou proventos de qualquer
namreza", "ganhos de capital" e "ganhos de capital relativos a investimento em mo-
eda estrangeira", não contendo qualquer disposição complementar que precisasse a
compreensão e a extensão destes conceitos, nem definindo a forma da sua determi-
nação.
MI#.I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Com o objetivo de esclarecer o alcance do art. 18 da Lei nO 9.249/95, a Instru-


ção Normativa nO 218, de 27.9.02, do Secretário da Receita Federal, dispõe no seu
art. 26 4S que "a alienação de bens e direitos situados no Brasil realizada por não resi-
dente no exterior está sujeita à tributação definitiva sob a forma de ganho de capital,
segundo as normas aplicáveis às pessoas físicas residentes no País". Referida orien-
tação insere-se na velha tradição do nosso Direito Tributário, que sempre operou a
definição dos rendimentos e ganhos de capital dos residentes no exterior por uma
"remissão por absorção" para a disciplina do imposto de renda das pessoas físicas 46 •
O ganho de capital das pessoas físicas residentes no País é sempre determinado
pela diferença positiva entre o valor de alienação e o custo de aquisição (art. 3°, § 2°
,da Lei nO 7.713/88, art. 2°, § 7°, da Lei nO 8.383/91, e art. 17 da Lei nO 9.249/95).
Assim, haverá mera transferência de capital, não tributável, até o limite do custo de
aquisição e ganho de capital, tributável, na parte do preço de alienação que exceder
aquele limite.
Esta definição da lei corresponde plenamente ao conceito técnico e doutrinário
de ganho de capital, que exprime o aumento de valor de um bem que já se encontrava
previamente no patrimônio do seu titular, aumento esse que resulta da diferença en-
tre o preço pelo qual foi alienado ou liquidado e o preço pelo qual foi adquirid04 7 •
Na sistemática do art. 43 do Código Tributário Nacional, o ganho de capital
não é "renda" (no sentido de "produto de capital, do trabalho ou da combinação de
ambos", que se refere a um fluxo periódico, conforme a "teoria das fontes"), mas
um "provento", isto é, um "acréscimo patrimonial" não compreendido no conceito
estrito de renda48 .
Ora, o conceito de acréscimo patrimonial pressupõe, por natureza, a comparação
de valores em momentos distintos no tempo: o momento em que um bem ou direito
ingressou no patrimônio do seu titular e o momento em que dele se destacou por
alienação ou título similar. Pode, assim, dizer-se, sem sombra de dúvida, que é da
essência do conceito de ganho de capital a comparação entre preço de venda e custo
de aquisição.
A peculiaridade da base de cálculo do imposto de renda sobre ganhos de capital
na alienação de investimentos registrados no Banco Central reside em que, como
o custo de aquisição se realizou em moeda estrangeira) a determinação do ganho
realizar-se-á por comparação entre tal custo em moeda estrangeira e o contravalor
do preço de venda também em moeda estrangeira (Portaria do MF nO 550/94, art.
2°,§1°).
Esta foi a solução acolhida em termos ainda mais amplos pela Medida Provi-
sória nO 2.158-35, de 24 de agosto de 2001, cujo art. 24 regula o ganho de capital

45 Reproduzido hoje no art. 26 da Instrução Normativa na 208, de 27 de setembro de 2002.


46 efr. supra, 437.
47 efr. GASPARE F ALSITTA, Le plusralenze nel sistema dcll'imposta mobiliare, 6 55.
48 efr. RUBENS GOMES DE SOUSA, Pareceres - Imposto de Renda, UI, São Paulo 1976, 276 S5.
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decorrente da alienação de bens ou direitos e da liquidação ou resgate de aplicações


financeiras, de propriedade de pessoa física, adquiridos, a qualquer título, em moeda
estrangeira.
De harmonia com o § 5° do referido artigo "na hipótese de aplicação ou apli-
cação, por residente no País, com rendimentos auferidos originariamente em moeda
estrangeira, a base de cálculo do imposto será a diferença positiva, em dólares dos Esta-
dos Unidos, entre o valor de alienação, liquidação ou resgate e o custo de aquisição do
bem ou de direito, convertida para Reais, mediante a utilização do valor do dólar para
compra, divulgado pelo Banco Central do Brasil para a data de alienação ou resgate ou,
no caso de operação a prazo ou à prestação, na data do recebimento de cada parcela".
Referidas disposições expressamente previstas para as pessoas físicas residentes
no Brasil são automaticamente aplicáveis aos residentes no exterior ex vi do art. 18
da Lei nO 9.249/95, segundo o qual "o ganho de capital auferido por residente ou
domiciliado no exterior será apurado e tributado de acordo com as regras aplicáveis
aos residentes no País".

b) Custo de aquisição e registro de investimento estrangeiro

Coloca-se a questão de saber se o custo de aquisição em moeda estrangeira co-


incide necessariamente com o valor constante do registro do investimento junto do
Banco Central do Brasil.
É certo que o custo de aquisição coincide via de regra com os valores em moeda
estrangeira constantes do registro, pois as participações societárias ou foram compra-
das a residentes no Brasil, mediante o ingresso no país das divisas correspondentes
ao preço, ou foram subscritas mediante investimento inicial em divisas ou através de
aumentos de capital por incorporação de lucros ou reservas registráveis no Banco
Central como reinvestimentos.
Pode, assim, dizer-se que o registro exprime graficamente, via de regra, o preço
da aquisição das participações societárias, constituindo um documento probatório
do ganho de capital, similar ao que a escrituração mercantil representa para as pes-
soas jurídicas domiciliadas no Brasil.
Assim, o entendimento tradicional do Fisco, segundo o qual a base de cálculo
do imposto em causa é dada pelo valor do investimento e reinvestimento em moeda es-
trangeira constante do certificado de registro é, em princípio, correto, na medida em que
ele corresponde, via de regra) ao conceito de custo de aquisição, que é por sua vez da
essência do conceito de ganho de capital, como atrás já se demonstrou.
Este entendimento consta, por exemplo, da Portaria nO 217, de 7 de julho de
1987, segundo a qual a transferência para o exterior de capital registrado será pro-
cedida sem a incidência do imposto de renda na fonte quando a importância a ser
transferida não superar o capital registrado. E ainda mais especificamente da Por-
taria nO 550, de 3 de novembro de 1994, que estabelece que o ganho de capital
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corresponderá à diferença positiva, apurada em moeda estrangeira, entre o valor da


alienação do capital ou liquidação e o custo de aquisição da participação societária,
considerando como custo de aquisição os valores em moeda estrangeira constante
dos itens "investimento" e "reinvestimento" do certificado de registro emitido pelo
Banco Central do Brasil.
Deve, aliás, dizer-se que o critério do Fisco, ao eleger como base de cálculo o
preço do custo em moeda estrangeira - embora não tenha base em nenhuma disposi-
ção expressa da lei - corresponde à melhor interpretação do sistema no seu conjunto,
pois atribui ao registro expresso em moeda estrangeira um papel de meio probatório
de um acréscimo patrimonial na mesma unidade de valor em que o bem ou direito foi
adquirido pelo seu titular, ou seja, assegurando que a diferença entre transferência e
ganho de capital será calculada na própria moeda em que o investimento se realiwu.
Dissemos atrás que o critério tradicional do Fisco se afigurava via de regra cor-
reto. Qual a razão de ser desta ressalva?
É que pode suceder que, em determinadas circunstâncias, o valor do certificado
de registro não coincida com o preço da aquisição das participações societárias. Tal
fenômeno ocorrerá na hipótese de ter havido sucessão no registro) em virtude de aquisi-
ção das participações societárias detidas por um residente no exterior por uma pessoa
física ou jurídica também domiciliada no estrangeiro.
Em tais casos, o Banco Central do Brasil reconhece o registro em nome do novo
investidor residente no exterior, no qual se mantêm intactos os registros de investi-
mentos e reinvestimentos efetuados pelo anterior titular das participações societárias
e que exprimem o preço pelo qual adquiriu as participações ora alienadas.
Nesta hipótese, ocorre que o novo investidor adquirente das participações socie-
tárias sucede nos direitos de natureza cambial que a lei reconhecia ao investidor anterior,
representados no registro, notadamente no direito ao retorno de capital, de remessa de
lucros e de reinvestimento. Verifica-se, assim, um fenômeno similar ao de uma "circu-
lação" do registro, como título representativo de direitos de remessa cambial oponíveis
ao Banco Central do Brasil e nos quais sucede, na sua plenitude, o novo investidor.
Pode, porém, dizer-se que os valores registrados no Banco Central constituirão
a base de cálculo do imposto devido em caso de eventual alienação a terceiros pelo
novo investidor, adquirente das participações societárias? É óbvio que não, pois neste
caso, se o registro exprime o preço de aquisição pelo investidor inicial, já não expri-
me o custo de aquisição pelo novo investidor, que decorreu de uma operação de compra
e venda realizada entre dois domiciliados no exterior e cujo preço é absolutamente
independente dos valores constantes do registro.
Ora, o ganho de capital, em caso de alienação das participações societárias pelo
novo investidor a terceiros, tem que ser computado em relação a esse mesmo investidor,
ou seja, tem que se basear na diferença entre o preço de alienação e o efetivo preço de
aquisição) que é o preço pago realmente pelo novo investidor ao investidor anterior,
em contrapartida do qual se realiwu a aquisição das participações em causa e que
deverá provar-se por qualquer meio de prova admitido em direito.
Título V I Capo 11 I Residentes no Exterior M.

Dizer-se que, ainda neste caso, a base de cálculo do imposto seria dada pelo
registro, conduziria ao absurdo de comparar, em relação a um mesmo contribuinte,
o preço pelo qual vendeu participações societárias a um terceiro, não com o preço
pelo qual ele próprio as comprou, mas com o preço pelo qual foram adquiridas pelo
anterior proprietário.
Isto significaria afrontoso atropelo ao próprio conceito de ganho de capital- in-
dissociavelmente ligado ao de acréscimo patrimonial, constante do art. 43 do Código
Tributário Nacional- na medida em que se compararia um acréscimo de valor, não
com o patrimônio próprio preexistente (preço de aquisição efetivo), mas com o pa-
trimônio de um terceiro, o anterior investidor (valor do certificado de registro). Por
outras palavras: seria transformar um simples meio de prova de um custo de aquisição
(certificado de registro) no próprio objeto da prova (a base de cálculo do imposto).
Note-se, aliás, que não há qualquer incompatibilidade em reconhecer-se que,
na alienação de participações societárias de um residente no exterior para outro re-
sidente no exterior, há uma sucessão no registro para efeitos do exercício de direitos cam-
biais) mas não há qualquer sucessão para efeitos fiscais ligados à determinação do ganho de
capital. É que o critério administrativo do Fisco, de adotar como base de cálculo do
imposto os valores constantes do registro - se é válido na medida em que exprime o
preço de aquisição do investidor inicial que aliena as participações societárias -, não
pode sobrepor-se ao conceito de ganho de capital constante das leis do imposto de
renda, pelo qual este deverá exprimir a diferença entre o preço de alienação e o preço
de aquisição pelo próprio contribuinte) com total abstração do preço de aquisição pago
por anteriores titulares das mesmas participações societárias.
Repare-se - e este argumento é determinante - que o Código Tributário N acio-
nal apenas autoriza a legislação ordinária a instimir imposto de renda sobre acréscimos
patrimoniais, cujo valor constimi, por conseguinte, o "limite máximo" da base de
cálculo do tributo. Ora, se se adotasse como parâmetro para o cômputo dessa base de
cálculo o valor do registro, com abstração do efetivo custo de aquisição, poder-se-ia
exigir imposto de renda sobre quantia excedente ao acréscimo patrimonial, o que a lei
complementar categoricamente repele.
Merece, por isso, aplauso a orientação do Fisco, constante do art. 26 da Ins-
trução Normativa nO 208, de 27 de setembro de 2002 (mas que reproduz idêntica
regra da Instrução Normativa nO 73/98), segundo a qual "o valor de aquisição do
bem ou direito para efeito deste artigo deverá ser comprovado com documentação
hábil e idônea, usual para o tipo de operação de que houver resultado a aquisição",
acrescentando o § 4° que «não sendo possível comprovar o custo conforme o disposto no
parágrafo anterior, o valor de aquisição será, conforme o caso: I - apurado com base
no capital registrado no Banco Central do Brasil, relacionado à compra do bem ou
direito; TI - igual a zero, nos demais casos".
Significa isto que, de harmonia com a interpretação, aliás correta, da Secretaria
da Receita Federal, a prova do custo de aquisição deve fazer-se por documento ade-
quado que refUita o preço real da aquisição, de tal modo que apenas subsidiariamente,
_'IM Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier
na impossibilidade de prova direta documental, é legítima a consideraçao do valor de
investimento registrado no Banco Central do Brasil.
Aliás, a consideração do registro do investimento como o único meio de prova
admissível do custo de aquisição representaria um entorse inconstitucional ao princípio
da verdade material, que preconiza a admissibilidade de todos os meios de prova49 .
Tenha-se ainda presente que as referidas Instruções Normativas revestem ma-
nifesto caráter interpretativo, como aliás não poderia deixar de ser, tendo em vista o
princípio da legalidade da tributação e sua natureza infralegal, de meros atos admi-
nistrativos genéricos. Tratando-se de atos administrativos interpretativos, eles têm
caráter vinculante para a Administração e a força retroativa inerente às normas inter-
pretativas (art. 106, I, do Código Tributário Nacional), pelo que devem aplicar-se a
operações realizadas mesmo antes de sua entrada em vigor.

c) Alienação de participações societárias em parte registradas


e em parte não registradas no Banco Central do Brasil
Examina-se agora o caso, frequente na prática, em que os registros de que são
titulares os investidores estrangeiros que pretendem alienar a terceiros suas partici-
pações societárias apenas amparam uma determinada percentagem do capital social
da empresa receptora do investimento, de tal modo que a percentagem remanescente
não se encontra abrangida pela disciplina do capital estrangeiro, representando sim-
ples e comum investimento em moeda nacional.
As ações do capital social da empresa obedecem, assim, a um regime jurídico
misto: parte se encontra sob a tutela do estatuto de capital estrangeiro, parte obedece
à disciplina comum do capital nacional.
Como proceder então ao cálculo do imposto sobre o ganho de capital se o in-
vestidor decidir alienar a terceiros a totalidade das suas participações societárias?
A solução é só uma, imposta por lógica cartesiana. Na impossibilidade de se
individualizarem participações totalmente submetidas ao regime de capital estrangei-
ro e participações dele subtraídas, há que proceder à apuração da proporção que, no
conjunto da participação societária do investidor, está submetida ao regime jurídico-
fiscal do capital estrangeiro.
A esta se aplicará o critério atrás exposto para determinação do ganho de capital
auferido por residentes no exterior: assim, o imposto de renda incidirá sobre a dife-
rença entre a referida proporção do contravalor em moeda estrangeira do preço total
da alienação e idêntica proporção do preço de aquisição em moeda estrangeira so .

49 efr. ALBERTO XAVIER, Do lançamento: Teoria Geral do Ato, do Procedimento e do Processo Tri-
butário, 121 ss. Veja-se, no mesmo sentido, LUCIANA ROSANOVA GALHARDO e GIANCARLO
MATARAZZO, Ganho de capital - não residentes - garantias de investimentos estrangeiros no
Brasil, RDDT, 74 (2001), 96.
50 Apenas haveria a assinalar que a este custo inicial se somaria o custo das eventuais aquisições
posteriores, realizadas a título de compra ou subscrição (reinvestimentos).
Título V I Capo 11 I Residentes no Exterior MiS-

No tocante à parcela não submetida ao regime de capital estrangeiro, também


haverá que comparar a respectiva proporção do preço total da alienação com a idên-
tica proporção do preço de aquisição. A principal diferença em relação ao critério
aplicável à "parte estrangeira" da operação reside em que, neste caso, se comparam
preços de venda e de aquisição em moeda nacional- e já não em moeda estrangeira.
A aplicação do regime jurídico "misto" que atrás se descreveu - ou seja, do regi-
me jurídico-fiscal do capital estrangeiro e do capital nacional-, em função da propor-
ção das participações societárias que a ele se encontram respectivamente submetidas,
é o único que assegura o respeito do princípio - imposto por lei complementar - de
que o imposto sobre a renda apenas pode incidir sobre acréscimos patrimoniais.
Na verdade, se se aplicasse à operação no seu conjunto apenas o regime aplicável
ao capital estrangeiro, ou seja, se se comparasse o preço total da venda com os valores
constantes do certificado de registro, isso significaria desconsiderar em absoluto o custo
de aquisição de uma parte das participações societárias) com a consequente exigência de
imposto sobre valor excedente ao verdadeiro ganho de capital (acréscimo patrimo-
nial efetivo), o que não é admitido pelo Código Tributário Nacional 5l •
Esta conclusão, que já resultava do sistema anterior, foi formalmente consagrada
com o art. 18 da Lei nO 9.249/95, que submeteu os ganhos de capital de residentes
no exterior a idêntico regime ao dos ganhos de capital dos residentes no país, o qual
envolve sempre e necessariamente a consideração do custo de aquisição, seja este em
moeda estrangeira ou em moeda nacional.
O fato de o custo de aquisição poder ser atualizado até 31 de dezembro de
1995, deixando de estar sujeito à atualização os bens ou direitos adquiridos a partir
de 1° de janeiro de 1996 (art. 26 da IN 208/02), prende-se à abolição do mecanismo
de correção monetária pelo chamado "Plano Real".

d) Liquidação parcial de investimento estrangeiro


Reveste-se de certa complexidade a determinação da base de cálculo do im-
posto de renda na fonte sobre ganhos de capital no caso de liquidação parcial de

51 A idêntica proibição estaria submetida a qualquer tentativa de desconsiderar a correção mone-


tária do custo de aquisição, da parte das participações societárias em moeda nacional (quando
legalmente admitida), tentativa essa que na prática já se concretiwu em matéria de alienação de
imóveis, como informa HENRY TILBERY. Cfr. HENRY TILBERY, Lucro imobiliário das pessoas ftsicas,
São Paulo 1982, 152. Na verdade, é entendimento unãnime da doutrina e da jurisprudência que
a correção monetária não constitui renda, por não representar acréscimo de patrimônio, mas
simples técnica de manutenção de uma grandeza econômica original, expressa em unidades mo-
netárias nominais de diferente poder aquisitivo. Assim sendo, se o imposto fosse calculado como
a diferença entre o preço de venda (expresso em moeda de hoje) e o custo de aquisição (expresso
em moeda do período em que a aquisição se revelou), o imposto estaria incidindo sobre quantia
superior ao acréscimo patrimonial, pois este só existe na medida do eventual excedente do preço
de venda em relação ao preço de custo, expressos ambos em unidades monetárias constantes
e idênticas. Por outras palavras: o imposto não se limitaria a atingir a renda, mas amputaria o
próprio capital, o que - já o vimos - é vedado pelo art. 43 do Código Tributário Nacional.
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investimento estrangeiro, seja por venda parcial de participações societárias, seja por
redução do capital. Trata-se, na verdade, de saber se a base de cálculo é constituída
pelo investimento total em moeda estrangeira, ou pela proporção desse investimento
correspondente à fração do capital social alienado ou reduzido.
Um exemplo auxiliará a melhor compreensão do problema: suponhamos que
um investidor residente no exterior efetua um investimento de US$ 100.000,00, apli-
cando-o no capital de uma sociedade por ações, dividido em 100.000 ações. Se esse
investidor alienar mais tarde 50% das ações por US$ 70.000,00, o imposto incidirá
imediatamente sobre a diferença entre o preço de venda e o valor do investimento
reduzido pela proporção que sobre ele representavam as ações vendidas (50% de US$
100.000,00), ou seja, sobre um ganho de capital de US$ 20.000,00?; ou o imposto
só incidirá se e quando o preço de venda das sucessivas alienações parciais exceder o
valor total do investimento registrado, não incidindo portanto nas alienações parciais
enquanto tal valor não for excedido, como sucederia no exemplo acima?
Na primeira edição deste livro, designamos o primeiro critério como critério
da proporção (em que haveria redução do registro proporcional à percentagem das
participações alienadas e imediata determinação do eventual ganho de capital) e o
segundo como critério da diftrença (em que haveria redução do registro na medida
das divisas repatriadas, mas só haveria determinação do eventual ganho tributável
quando houvesse excesso do preço de venda em relação ao valor total do registro).
Também nessa edição, sustentamos o critério da diferença, tendo logo obtido a
adesão de HENRY TILBERY52 • Os argumentos fundamentais em que então nos basea-
mos eram dois: o caráter unitário do investimento estrangeiro registrado, de tal modo
que a obrigação tributária só deveria surgir se e quando o produto da liquidação do
investimento excedesse aquele limite; e a natureza jurídica do registro de capital es-
trangeiro, que seria a de um título representativo do investimento em moeda e não em
ações, de tal modo que ele só deveria ser reduzido na medida das divisas repatriadas e
não na proporção do investimento liquidado.
Após amadurecida reflexão, inclinamo-nos hoje para a solução contrária, essen-
cialmente em função do caráter causal e não abstrato do título em que o registro se
traduz. Com efeito, ele não autoriza o exercício dos direitos cambiais que declara,
para qualquer fIm ou em razão de qualquer fIm, isto é, independentemente de uma
causa típica; antes vincula os referidos direitos ao objetivo consagrado no título e daí
a estreita conexão com as ações ou quotas em que as divisas estrangeiras se materiali-
zaram, na forma de investimento diret05 3 • "

Sendo o destino da moeda estrangeira aplicar-se em participações em socieda-


des brasileiras, o registro do investimento e o registro das ações são realidades interdepen-

52 Cfr" H. TILBERY, A tributação dos ganhos de capital nas vendas de participações societárias pelas peso
soasftsicas, 96 ss.; no mesmo sentido, ATIlLA DE ANDRADE JUNIOR, O capital estrangeiro, 173.
53 Cfr. op. cit., 195 ss. Sobre o conceito de título causal, cfr. AsCARELLI, Teoria geral dos títulos de
crédito, São Paulo 1943, 29, 70 ss. e 415.
Título V I Capo 11 I Residentes no Exterior .@a
dentes, de tal modo que qualquer alienação de ações ou quota, ou redução do capital,
deve refletir-se automaticamente no registro do investimento. Os direitos societários
e os direitos cambiais titulados pelo certificado andam, assim, de mãos dadas.
Donde se segue que a incorporação num só e único título - o registro de in-
vestimento - não seja bastante para imprimir natureza unitária ao investimento es-
trangeiro registrado, investimento esse que é fracionável na mesma medida em que o
investimento societário é suscetível de redução ou alienação parcial.
Afigura-se-nos, por isso, correta a solução do problema consagrada na Portaria
do Ministro da Fazenda nO 217/87, cujo inciso I esclarece que "a transferência para o
exterior do capital registrado no Banco Central do Brasil em nome de pessoas físicas
ou jurídicas residentes, domiciliadas ou com sede no exterior, sob o título de inves-
timentos e reinvestimentos estrangeiros no país será procedida: (a) sem a incidência
do imposto na fonte, quando a importância a ser transferida não superar o valor
que for obtido pela aplicação do percentual representado pela participação alienada
ou liquidada sobre o total do capital registrado. Referido percentual será apurado
tomando-se por base a participação societária alienada ou liquidada em relação à par-
ticipação total do investidor no capital da empresa receptora do investimento estran-
geiro; (b) com a incidência do imposto sobre a parcela a ser transferida que exceder o
valor obtido na forma da alínea anterior". Por sua vez, o inciso II determina que "a
apuração e a demonstração da proporcionalidade mencionada no item anterior são
de responsabilidade do titular do registro, sendo obrigatória em qualquer operação
de que resultam alienações ou liquidações parciais de participações societárias, inclu-
sive mediante reduções de capital social das empresas receptoras de investimentos
estrangeiras". Idêntico regime viria ser consagrado pelo art. 4° da Portaria nO 550,
de 3 de novembro de 1994.

§ 2° OUTROS GANHOS DE CAPITAL

Os ganhos de capital de residentes no exterior que não se refiram a investimen-


tos diretos em moeda estrangeira regem-se pelo art. 18 da Lei nO 9.249/95, segundo
o qual, a partir de 1° de janeiro de 1996, o ganho de capital auferido por residente
ou domiciliado no exterior deve ser apurado e tributado de acordo com as regras
aplicáveis aos residentes no País.
Assim sucederá, por exemplo, nos casos em que residente no exterior aliena
imóvel localizado no Brasil ou participações societárias em moeda nacional.
Os conceitos de "apuração" e "tributação" reportam-se, respectivamente, à base
de cálculo e à alíquota e isenções, que são idênticas às que vigoram quanto aos resi-
dentes no país.
Assim, o ganho de capital será determinado pela diferença entre o valor de alie-
nação e o custo de aquisição, atualizado monetariamente até 1° de janeiro de 1996
(Instrução Normativa nO 208/02, art. 26), submetendo-se à alíquota de 15% (Lei nO
8.981/95, art. 21).
Mi§:M Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Importa ainda salientar que os ganhos de capital em investimentos realizados


nos mercados financeiros e de capitais, por residentes no exterior, são regulados pelo
regime específico destes mercados que será adiante examinad054 .
Conforme já se referius5, a lei brasileira, após durante longo período ter sub-
metido à incidência do imposto sobre ganhos de capital apenas as operações em que
o adquirente fosse residente no Brasil, passou a admitir a partir do art. 26 da Lei
na 10.833, de 29 de dezembro de 2003, que essa incidência ocorresse também em
operações entre não residentes, em que tanto o alienante como o adquirente fossem
residente no exterior.
Ao invés, pois, de se exigir, como anteriormente, que a conexão com o Brasil
operasse pela via de dois elementos cumulativos, a fonte de produção (localização do
bem ou direito) e a fonte de pagamento (o adquirente, devedor do preço), exigiu-se
apenas um único elemento, a fonte de produção, doravante arvorada em conexão
exclusiva.
Dispõe o parágrafo único do art. la da Instrução Normativa na 407, de 17 de
março de 2004, que "o responsável pela retenção e recolhimento do imposto de ren-
da de que trata o caput será: I - o adquirente, pessoa física ou jurídica residente ou
domiciliado no Brasil; ou II - o procurador, quando o adquirente for residente ou
domiciliado no exterior"56.
A ambiguidade do próprio art. 26 da Lei na 10.833/03 a respeito da definição
de quem é o verdadeiro contribuinte na hipótese do inciso II e a respeito da identi-
ficação da pessoa representada pelo procurador (o adquirente ou o alienante) levou
a fortes perplexidades da doutrina, chegando mesmo GERD WILL! ROTHMANN a sa-
lientar a ilegalidade de atribuição (o procurador do não residente) da condição de
responsável, a terceiro não vinculado ao fato gerador, desrespeitando assim o art. 128
do Código Tributário Nacional. E não escapou à crítica deste autor o hibridismo da
nova sistemática ("enigmático dispositivo"), que se aparta do regime de tributação
definitiva consagrado para a apuração dos ganhos de capital dos residentes no país
para se adaptar ao modelo de retenção na fonte com o qual naturalmente não se
ajustaS?

54 Cfr. infra, 469.


55 Cfr. supra, 440.
56 Sobe a figura do procurador de residente no exterior cfr. a Instmção Normativa nO 568, de
8 de setembro de 2005.
57 GERD WILLI ROTHMM'N, Tributação internacional sem sujeito passivo: uma nova modali-
dade do imposto de renda sobre ganhos de capital?, in VALDIR DE OLIVEIRA ROCHA (org.),
Grandes questões atuais do Direito Tributário, 10° vol., São Paulo 2006, 106; ID, Ganho de
capital obtido na venda de ativos por não residente no Brasil, Rcv. Inter. de Dir. Tribut.
8 (jul.-dez.j2007), 24; ID., Tributação dos ganhos de capital nas relações internacionais:
sujeito passivo fazendário, judicial ou legal?, RDTI 8 (abr.-j2008), 51; RICARDO FERREIRA
BOLAI", CAROLINA DOS SANTOS VrDIGAL, Tributação do ganho de capital auferido por não
residente na alienação de participação societária, RDTI 6 (ago.-j2007), 101; GUILHEIUvlE
CESAROTI, A tributação do ganho de capital nas operações entre não residentes prevista na
-==:=-.. . Título V I Capo 11 I Residentes no Exterior MI#I

A Lei nO 7.713/88 previa que, no caso de ganho de capital auferido por residen-
te ou domiciliado no exterior, o imposto será devido no momento da alienação do
bem ou direito (art. 33).
Esta regra foi reproduzida no § 2° do art. 685 do RIR, bem como no art. 27,
inciso II, da Instrução Normativa SRF n° 208/02.
Trata-se, porém, de interpretação equivocada por parte do Fisco, eis que tal re-
gra se deve considerar revogada a partir da Lei nO 9.249/95, cujo art. 18 determina
que o ganho de capital auferido por residente ou domiciliado no exterior será apura-
do e tributado de acordo com as regras aplicáveis aos residentes no País. Ora, estas
regras estabelecem que nas alienações a prazo o ganho de capital será tributado na
proporção de parcelas recebidas (Lei nO 7.713/88, art. 21)58.
Demais disso, a escolha do momento da alienação para tributar os ganhos de
capital não se conforma com o requisito da disponibilidade jurídica ou econômica de
renda, exigido pelo art. 43 do Código Tributário Nacional, pois - ao menos nas hipó-
teses da venda a prazo - o titular não adquiriu ainda o poder de dispor do preço.

§ 3° INVESTIMENTOS ESTRANGEIROS
NOS MERCADOS FINANCEIRO E DE CAPITAIS

A) Considerações preliminares
a) A distinção entre o regime geral de equiparação a residentes no Brasil e o regime
especial de investimentos sujeitos às normas do Conselho Monetário Nacional

A par do investimento estrangeiro direto, regido pela Lei nO 4.131, de 3 de se-


tembro de 1962 - e que atrás examinamos 59 -, a lei contempla diversas modalidades
de investimento realizado por investidores estrangeiros nos mercados financeiro e
de capitais, quer tais investidores sejam pessoas físicas ou jurídicas, fundos ou outras
entidades de investimento coletivo.
Em relação aos investimentos estrangeiros nos mercados financeiro e de capi-
tais, o art. 78 da Lei nO 8.981/95 estabelece, como regra geral, que os residentes ou

Lei nO 10.833/2003, RDDT 105 (2004),50; NATANAEL MARTINS, JUAN MANUEL CALONGE
MENDEZ, A tributação do ganho de capital auferido por não residente em operação com ou·
tro não residente tendo por objeto alienação de bem situado no Brasil infringe as disposições
legais referentes ao imposto de renda brasileiro?, RDTI 7 (dez.-/2007), 113; SIMONE DIAS
MUSA, MARCOS VINÍCIUS PRADO, A tributação de ganhos auferidos por não residentes na alie·
nação de bens localizados no Brasil- análise do artigo 26 da Lei nO 10.833/03, RDDT 156
(2008), 109; RENATO NUNES, Ganho de capital em investimentos estrangeiros - incidência,
apuração e sujeitos passivos do imposto sobre a renda, RDDT 154 (2008),92.

58 Cfr. RICARDO FERREIRA BOLAN/CAROLINA VIDIGAL, Tributação do ganho de capital auferido


por não residente na alienação de participações societárias, in RDTI, 2007, nO 6,101 ss.
59 Cfr. supra, 456 ss.
@ I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

domiciliados no exterior sujeitam-se às mesmas normas de tributação pelo imposto


de renda aplicáveis aos residentes ou domiciliados no país em relação aos (i) ren-
dimentos decorrentes de aplicações financeiras de renda fixa, (ii) ganhos líquidos
auferidos em operações realizadas em bolsas de valores, de mercadorias, de futuros
e assemelhadas, e (iii) rendimentos obtidos em aplicações em fundos de renda fixa e
de renda variável e em clubes de investimentos.
O parágrafo único do dispositivo em causa estende ainda o referido regime de
equiparação aos rendimentos e ganhos de capital decorrentes de aplicações financei-
ras, auferidos por fundos, sociedades de investimento e carteiras de valores mobiliá-
rios de que participem, exclusivamente, pessoas físicas ou jurídicas, fundos ou outras
entidades de investimento coletivo residentes, domiciliados ou com sede no exterior.
Sem prejuízo da referida regra geral, o art. 81 estabelece que os ganhos de capi-
tal ficam excluídos da incidência do imposto de renda quando auferidos e distribuí-
dos, sob qualquer forma e a qualquer título, inclusive em decorrência de liquidação
parcial ou total do investimento por fundos e entidades coletivas constituídos no
exterior que tenham por objetivo a aplicação de recursos nos mercados financeiro e
de capitais, e das quais participem pessoas físicas ou jurídicas residentes ou domici-
liadas no exterior, desde que atendidas as normas e condições fixadas pelo Conselho
Monetário Nacional.
O art. 16 da Medida Provisória nO 2.189-49, de 23 de agosto de 2001, por sua
vez, veio ampliar o âmbito subjetivo de aplicação do regime de tributação previsto
no art. 81 da Lei nO 8.981, de 20 de janeiro de 1995, prevendo que ele se aplica a
investidor residente ou domiciliado no exterior, individual ou coletivo, que realizar
operações financeiras no mercado de renda fixa ou de renda variável no país de acor-
do com as normas e condições estabelecidas pelo Conselho Monetário Nacional,
tendo a Medida Provisória nO 2.158-35, de 24 de agosto de 2001, acrescentado a
hipótese de operações em mercados de liquidação futura referenciados em produtos
agropecuários, nas bolsas de futuros e de mercadorias (art. 29)60.
O § 2° do art. 16 da Medida Provisória nO 2.189-49/01 e o § IOdo art. 29 da
Medida Provisória nO 2.158-35/01 61 estabeleceram, porém, que o regime de tribu-
tação previsto no art. 81 da Lei nO 8.981/95 não se aplica a investimentos oriundos
de país que não tribute a renda ou que a tribute a alíquota inferior a 20%, o qual se
sujeitará às mesmas regras estabelecidas para os residentes e domiciliados no país.

b) Registros
Tal como sucede com os demais investimentos estrangeiros no Brasil, os re-
cursos ingressados no País para investimento nos mercados financeiro e de capitais

60 O regime de equiparação tem a sua origem na Medida Provisória nO 1990-26, de 14 de


dezembro de 1999 (art. 17).
61 Estes preceitos têm a sua origem no art. 7° da Lei nO 9.959, de 27 de janeiro de 2000.
Título V I Capo /I I Residentes no Exterior -ti-
estão sujeitos a registro declaratório eletrônico (RDE) no Banco Central do Brasil,
registro esse que é o instrumento hábil para que se efetivem o retorno do capital
estrangeiro e as remessas de dividendos ou bonificações em dinheiro e de ganhos
de capital obtidos na liquidação dos investimentos (Circulares do Banco Central nO
2.963, de 26 de janeiro de 2000, e nO 2.975, de 29 de março de 2000).
Atendendo à peculiaridade da sua namreza jurídica, o registro é realizado no
módulo RDE-Portfólio, que abrange os investimentos externos nos mercados fman-
ceiros e de capitais, inclusive os investimentos externos em portfólio.
Os investidores a que se aplica a Resolução do Conselho Monetário Nacional
nO 2.689, de 27 de janeiro de 2000, que estabelece as condições a serem observadas
para fins de fruição da regra especial em matéria de tributação dos investimentos nos
mercados financeiro e de capitais, estão sujeitos a registro junto à Comissão de Valo-
res Mobiliários, nos termos da Instrução CVM nO 325, de 27 de janeiro de 2000.

c) Modalidades de investimento admitidas pelo Conselho Monetário Nacional


De harmonia com a Resolução CMN nO 2.689/00, acima mencionada, para
além dos investimentos efemados diretamente por pessoas físicas ou jurídicas, so-
mente são admitidos os realizados nos termos dos Regulamentos Anexos III e V à
Resolução nO 1.289, de 20 de março de 198762 .
O Regulamento Anexo l i à Resolução nO 1.289/87 respeita às carteiras de títulos
e valores mobiliários) que são recursos de propriedade de entidades de investimento estran-
geiro, que dispõem diretamente de carteira diversificada de títulos e valores mobiliários,
cuja administração conjunta compete à instituição estrangeira e ao banco de investi-
mento, corretora e distribuidora domiciliada no Brasil63 • Dentro das carteiras, há um
subtipo especial representado pelas carteiras de investidores institucionais estrangeiros, com
a peculiaridade de os seus proprietários serem investidores instimcionais estrangeiros,
tais como fundos de pensão, carteiras próprias de instimições financeiras, seguradoras
e fundos múmos de investimento constimídos no exterior. Em qualquer das modalida-
des, há a emissão, no exterior, de certificados representativos de títulos brasileiros.
Por seu mrno, o Regulamento Anexo V à Resolução nO 1.289/87 respeita aos
depositary receipts (DR's), que têm por objeto recursos ingressados no País para aqui-
sição de valores mobiliários emitidos por companhias abertas no Brasil (empresa pa-
trocinadora), sob a forma de emissão no exterior, por instituição depositária, banco
depositário ou banco emissor, de certificados representativos de ações ou outros va-

62 A partir da entrada em vigor da Resolução nO 2.689, ficam vedadas a emissão e colocação de


quotas de fundos de renda fixa-capital estrangeiro, de ações de sociedades de investimento
de capital estrangeiro (Anexo I) e quotas de fundos de investimentos-capital estrangeiro
(Anexo II).
63 efr. Resolução nO 1.877, de 22.10.91; Resolução nO 1.297, de 16.8.87 (revogada pela Re-
solução nO 1.485); Resolução nO 2.115, de 19.10.94
I 4fB I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

lores mobiliários que representem direitos a ações, com lastro em valores mobiliários
depositados em custódia específica no Brasil64 •
As carteiras de títulos e valores mobiliários são meros patrimônios especiais de um
investidor estrangeiro, sem personalidade jurídica; os depositary receipts são "títulos
substitutivos", negociáveis no exterior, de ações de companhias abertas de proprie-
dade de investidores estrangeiros 65 .
Em face das considerações acima, pode-se concluir que os investimentos estran-
geiros nos mercados financeiro e de capitais se beneficiam do regime especial estabe-
lecido pelo art. 81 da Lei nO 8.981/95 apenas na hipótese de atenderem às normas e
condições fixadas pelo Conselho Monetário Nacional .
Os investidores estrangeiros que não atendam a referidos requisitos ou sejam
residentes ou domiciliados em países que não tributem a renda ou que a tributem à
alíquota inferior a 20% sujeitam-se ao regime geral de equiparação aos residentes ou
domiciliados no Brasil, cujos aspectos essenciais são examinados a seguir.

B) Aplicações de renda fixa


Os rendimentos produzidos por aplicações financeiras de renda fixa, auferidos
por qualquer beneficiário, inclusive residente no exterior, estão sujeitos a imposto de
renda, na fonte, salvo nas hipóteses de aplicações realizadas ao abrigo da Resolução
nO 2.689/00 do Conselho Monetário Nacional, às quais se aplica o regime do art. 81
da Lei nO 8.981/95 (art. 4° da Lei nO 11.033/04)66.
São consideradas aplicações financeiras de renda fixa:
(i) as operações conjugadas que permitam a obtenção de rendimentos prede-
terminados, realizadas nas bolsas de valores, de mercadorias, de futuros e
assemelhados, bem como no mercado de balcão (Lei nO 8.981/95, art. 65,
§ 4°, ar?;

64 Cfr. Resolução nO 1.927, de 18 de maio de 1992, do Banco Central, que dá nova redação ao
Regulamento anexo V à Resolução nO 1.289, de 20 de março de 1987. Ver ainda Circular
do Banco Central nO 2.179/92 e Cartas Circulares nO, 2.277/92 e 2.285/92; Circular BCB
nO 2.728/96.
65 Sobre a natureza jurídica de figuras similares no direito comparado, veja-se a obra funda-
mental de LmoNATI, Holding e investment trust, Milão 1959, espec. 456 e 11
66 Cfr. ELImÉ PALMA BIFANO, O Mercado Financeiro e o Imposto sobre a Renda, São Paulo 2008,
211 ss; LUCIANA RosANOVA GALHARDO, Tributação dos Fundos de Investimento pelo Impos-
to sobre a Renda, in ROBERTO QUIROGA MOSQUERA (coord.), O Direito Tribntário e o Mercado
Financeiro e de Capitais, São Paulo 2009, 303 ss.
67 A Instrução Normativa nO 25/01 esclarece que se abrangem neste regime as operações rea-
lizadas nos mercados de opções de compra e de venda em bolsas de valores, de mercadorias
e de futuros (box), nos mercados a termo nas bolsas, em operações de venda coberta e sem
ajustes diários e nos mercados de balcão (art. 18, I).
Título V I Capo 11 I Residentes no Exterior

(ii) as operações de transferência de dívidas realizadas com instituições finan-


ceiras e demais instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do
Brasil (Lei nO 8.981/95, art. 65, § 4° e § 5° W 8 ;
(iii) os rendimentos auferidos pela entrega de recursos a pessoa jurídica sob qual-
quer forma e a qualquer título, independentemente de ser ou não a fonte
pagadora instituição autorizada a funcionar pelo Banco Central do Brasil e
em operações de empréstimos em ações (Lei nO 8.981/95, art. 65, § 4° c);
(iv) as operações de mútuo e de compra vinculada à revenda, no mercado se-
cundário, tendo por objeto ouro, ativo financeiro (Lei nO 8.981/95, art. 70
e Instrução Normativa nO 25/01, art. 21);
(v) as operações de reembolso ou devolução dos valores retidos referentes à
CPMF (Instrução Normativa nO 25/01, art. 18, IV)69;
(vi) os rendimentos predeterminados obtidos em operações conjugadas, reali-
zadas nos mercados de opções de compra e de venda em bolsas de valores,
de mercadorias e de futuros (box), no mercado a termo nas bolsas de va-
lores, de mercadorias e de futuros, em operações de venda coberta e sem
ajustes diários, e no mercado de balcão (Lei nO 11.033/04, art. 1°, § 5°).
Até 31 de dezembro de 2004, a alíquota do imposto de renda na fonte era de
20% (Lei nO 9.532/97, art. 35).
Em 1° de janeiro de 2005, passou a vigorar regime de alíquotas regressivas, que
foi estabelecido pelo art. 1° da Lei nO 11.033/04 (resultado da conversão da Medida
Provisória nO 206/04) com o objetivo de "criar condições que melhorem a estrutu-
ra do mercado frnanceiro e promovam um incentivo à poupança de longo prazo,
mediante concessão de estímulos tributários", além de "propiciar, para o Tesouro
Nacional, o alongamento do prazo médio e a redução dos custos da Dívida Pública"
(Exposição de Motivos nO 111/04 do Ministério da Fazenda).
A partir de então, os rendimentos auferidos em qualquer aplicação ou opera-
ção financeira de renda fixa ou de renda variável, mesmo no caso das operações de
cobertura (hedge), realizadas por meio de operações de swap e outras, nos mercados
de derivativos, sujeitam-se à incidência do imposto de renda na fonte às seguintes
alíquotas: (i) 22,5%, em aplicações com prazo de até 180 dias; (ii) 20%, em aplica-
ções com prazo de 181 dias até 360 dias; (iii) 17,5%, em aplicações com prazo de
361 dias até 720 dias; e (iv) 15%, em aplicações com prazo acima de 720 dias, sendo
referidos prazos contados a partir da data da aplicação.

68 A redação inicial da alínea b do § 4° do art. 65 da Lei nO 8.981/95 abrangia igualmente as


transferências de dívidas realizadas com pessoa jurídica não financeira. Ela foi, porém, modi-
ficada pelo art. 54 da Lei nO 9.069, de 20.06.1995, que restringiu a equiparação a operação
de renda fixa às transferências de dívidas realizadas com instituições financeiras autorizadas
a funcionar pelo Banco Central do Brasil.
69 Anteriormente tributadas à alíquota de 10%, como operações de renda variável, pelo art. 74
da Lei nO 8.981/95.
eraM Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

No caso dos fundos de investimentos, os rendimentos são tributados (i) semes-


tralmente, à alíquota de 15% (Lei nO 10.892/04, art. 3°); e (ii) por ocasião do resgate
das quotas, a alíquota complementar determinada de acordo com a tabela regressiva
acima referida. Nos fundos de investimentos com prazo de carência de até 90 dias
para resgate de quotas com rendimento, a incidência periódica do imposto de renda
na fonte ocorre na data em que se completar cada período de carência para resgate de
quotas com rendimento, sem prejuízo da alíquota regressiva complementar?O
A base de cálculo do imposto nas operações fInanceiras de renda fIxa é: (a) em
geral, a diferença positiva entre o valor da alienação, líquido do IOF, e o valor da
aplicação fInanceira (Lei nO 8.981/95, art. 65, § 1°); (b) nas operações conjugadas o
resultado positivo auferido no seu encerramento ou liquidação (Lei nO 8.981/95, art.
65, § 5°, a); (c) nas operações de transferência de dívida, a diferença positiva entre
o valor da dívida e o valor entregue à pessoa jurídica responsável pelo pagamento da
obrigação, acrescida do respectivo imposto sobre a renda retido (Lei nO 8.981/95,
art. 65, § 5°, b)).
A retenção deve ocorrer (i) por ocasião do recebimento dos recursos destinados ao
pagamento de dívidas, no caso de operação de transferência de dívidas (Lei nO 8.981/95,
art. 65, § 7°, a)); ou (ii) por ocasião do pagamento dos rendimentos ou da alienação do
título ou de aplicação, nos demais casos (Lei nO 8.981/95, art. 65, § 7°, b)).
É responsável pela retenção a pessoa jurídica que receber os recursos, no caso
de operações de transferência de dívidas, e a pessoa jurídica que efetuar o pagamento
do rendimento nos demais casos (Lei nO 8.981/95, art. 65, § 8°). O representante
legal não será responsável pela retenção e recolhimento do imposto de renda na fon-
te sobre aplicação fInanceira quando tal responsabilidade for legalmente atribuída a
terceiro (Lei nO 8.981/95, art. 79, § 1°).
Observe-se, por fIm, que a tributação das aplicações fInanceiras de renda fIxa é
uma tributação analítica, no sentido de que incide autonomamente sobre cada uma
das operações isoladamente consideradas, não se admitindo a compensação de per-
das eventualmente incorridas numa delas com os ganhos obtidos noutra ou noutras,
ainda que da mesma natureza.

C) Aplicações de renda variável-ganhos líquidos

Também no que concerne aos ganhos líquidos auferidos em operações realizadas


em Bolsas de Valores, de Mercadorias, de Futuros e assemelhados, como atrás se viu,
a lei determina que os residentes ou domiciliados no exterior sujeitam-se às mesmas

70 Referido regime de tributação não se aplica (i) aos nllldos e clubes de investimento em ações
cujos rendimentos são tributados exclusivamente no resgate das quotas, à alíquota de 15%;
e (ii) aos títulos de capitalização, no caso de resgate sem ocorrência de sorteio, cujos rendi-
mentos serão tributados à alíquota de 20%.
Título V I Capo 11 I Residentes no Exterior NR-
normas de tributação previstas para os residentes no País (Lei nO 8.981/95, art. 78, II),
salvo nas hipóteses de investimentos realizados ao abrigo da Resolução nO 2.689/00 do
Conselho Monetário Nacional, aos quais se aplica o regime do art. 81 daquela Lei 71 •
A lei submete a este regime de tributação:
(a) ganhos líquidos auferidos em operações realizadas nas Bolsas de Valores,
de Mercadorias, de Futuros e assemelhados;
(b) ganhos auferidos nas demais operações realizadas em mercados de liquida-
ção futura, fora de bolsa (Lei nO 9.430/96, art. 71);
(c) ganhos líquidos auferidos na alienação de ouro, ativo financeiro, fora de
bolsa (Lei nO 8.981/95, art. 72, § 3°, a);
(d) ganhos líquidos auferidos pelas pessoas jurídicas na alienação de participa-
ções societárias fora das bolsas (Lei nO 8.981/95, art. 72, § 3°, b).
Este regime de tributação não se aplica:
(a) aos ganhos de operações de renda variável realizados em bolsa, no mercado
de balcão organizado, ou através de fundos de investimento, para a carteira
própria de instituição financeira ou equiparada (Lei nO 8.981/95, art. 77,
III, Lei nO 9.065/95, art. l°, e Lei nO 9.249/95, art. 12);
(b) às alienações de participações societárias permanentes em sociedades co-
ligadas e controladas, e de participações societárias que permaneçam no
ativo da pessoa jurídica até o término do ano-calendário seguinte ao de
suas aquisições (Lei nO 8.981/95, art. 77, N; Lei nO 9.065/95);
(c) às operações de cobertura (hedge) realizadas em Bolsas de Valores, de Mer-
cadorias ou de Futuros e no mercado de balcão, considerando-se de co-
bertura (hedge) as operações destinadas, exclusivamente, à proteção contra
riscos inerentes às oscilações de preços ou de taxas, quando o objeto do con-
trato estiver relacionado com as atividades operacionais da pessoa jurídica
e destinar-se à proteção dos seus direitos e obrigações (Lei nO 8.981/95,
art. 77, V, e §§ l° e 2°).
Ao invés do que sucede na renda fixa, em que a tributação é analítica, a tribu-
tação dos ganhos líquidos em operações de renda variável é uma tributação sintética
restrita. Sintética porque, ao contrário da analítica, não incide sobre cada uma das
operações isoladamente consideradas, mas sobre o resultado líquido imputável a um
determinado período de tempo (mensal), como aliás também sucede na tributação
das filiais, sucursais e representantes de sociedades estrangeiras. Mas enquanto nestas
a tributação sintética é ampla, abrangendo toda e qualquer operação por eles realiza-
das, independentemente de sua natureza, como acontece com as pessoas jurídicas do-
miciliadas no Brasil, a tributação sintética dos ganhos líquidos é restrita) pois abrange
exclusivamente as operações efetuadas nos mercados de renda variável.

71 Cfr. ELlDIÉ PALMA BIFANO, o Mercado Financeiro e o Imposto sobre a Renda, cit., 237 55.
MM Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Assim, a base de cálculo é o ganho líquido, ou seja, o resultado positivo auferido


nas operações ou contratos liquidados em cada período mensal, admitida a "dedução
dos custos e despesas incorridos, necessários à realização das operações" (Instrução
Normativa nO 25/01, art. 23, § 3°).
As perdas relativas a operações de renda variável, para fins de apuração e paga-
mento do imposto mensal sobre os ganhos líquidos, poderão ser compensadas com
os ganhos líquidos auferidos, no próprio mês ou nos meses subsequentes, em outras
operações da mesma natureza realizadas em qualquer das modalidades operacionais
previstas naqueles artigos, exceto no caso de perdas em operações day trade (opera-
ções iniciadas e encerradas no mesmo dia), que somente serão compensadas com
ganhos auferidos em operações da mesma espécie (day trade) (Lei nO 8.981/95, art.
72, §§ 4° e 7°, e Instrução Normativa nO 25/01, art. 30).
A alíquota é de 20% nas operações de day trade e de 15%, nas demais operações
(Lei nO 11.033/04, art. 2°).
Desde 1° de janeiro de 2005, as operações realizadas em bolsas de valores, de
mercadorias, de futuros, e assemelhadas (exceto as de day trade) e no mercado de
balcão, com intermediação, tendo por objeto ações, ouro ativo financeiro e outros
valores mobiliários, exceto no que se refere ao exercício de opção, passaram a estar
sujeitas à incidência do imposto de renda na fonte, à alíquota de 0,005%.
Referido imposto incide sobre os seguintes valores: (i) nos mercados futuros, a
soma algébrica dos ajustes diários, se positiva, apurada por ocasião do encerramento
da posição, antecipadamente ou no seu vencimento; (ii) nos mercados de opções, o
resultado, se positivo, da soma algébrica dos prêmios pagos e recebidos no mesmo
dia; (iii) nos contratos a termo (a) quando houver a previsão de entrega do ativo
objeto na data do seu vencimento, a diferença, se positiva, entre o preço a termo e
o preço à vista na data da liquidação, (b) com liquidação exclusivamente financeira,
o valor da liquidação financeira previsto no contrato; e (iv) nos mercados à vista, o
valor da alienação, nas operações com ações, ouro ativo fmanceiro e outros valores
mobiliários neles negociados (Lei nO 11.033/04, art. 2°, § 1°).72
O valor do imposto retido na fonte acima referido pode ser utilizado pelo in-
vestidor não residente para: (i) deduzir do imposto sobre ganhos líquidos apurados
no mês; (ii) compensar com o imposto incidente sobre ganhos líquidos apurados
nos meses subsequentes; e (iii) compensar com o imposto devido sobre o ganho de
capital na alienação de ações (Lei nO 11.033/04, art. 2°, § 7°)73.

72 Fica dispensada a retenção do imposto cujo valor seja igual ou inferior a R$ 1,00 e, para fins
de tal limite, ocorrendo mais de uma operação no mesmo mês, realizada por uma mesma
pessoa, física ou jurídica, deve ser efetuada a soma dos valores de imposto incidente sobre
todas as operações realizadas no mês (Lei nO 11.033/04, art. 2°, §§ 4° e 5°).
73 Investidores residentes podem ainda utilizar o valor do imposto retido na fonte para com-
pensação na declaração de ajuste se, após as deduções sobre os ganhos líquidos mensais,
houver saldo de imposto retido.
Título V I Capo 11 I Residentes no Exterior MM

o responsável pela retenção do referido imposto na fonte é a instituição in-


termediadora que receber diretamente a ordem do cliente, a bolsa que registrou as
operações ou entidade responsável pela liquidação e compensação das operações, na
forma regulamentada pela Secretaria da Receita Federal do Ministério da Fazenda
(Lei nO 11.033(04, art. 2 0 , § 6°, e Instrução Normativa nO 25(01, art. 31, § 5°).
Do caráter sintético da tributação dos ganhos líquidos resulta que o mecanismo
de recolhimento não se realiza pelo método da retenção na fonte, cabendo a res-
ponsabilidade pela determinação e pagamento do imposto ao representante legal do
investidor estrangeiro.
Com efeito, os rendimentos auferidos em operações de day trade realizadas em
bolsas de valores, de mercadorias, de futuros e assemelhadas também se sujeitam à in-
cidência do imposto de renda na fonte, mas à alíquota de 1 %, sendo que referido im-
posto pode, igualmente, ser (i) deduzido do imposto incidente sobre ganhos líquidos
apurados no mês; ou (ii) compensado com o imposto incidente sobre ganhos líqui-
dos apurados nos meses subsequentes, se, após a dedução com os ganhos líquidos do
mês, ainda houver saldo de imposto retido (Instrução Normativa nO 25(01, art. 31).
O investimento estrangeiro nos mercados financeiros e de valores mobiliários
somente poderá ser realizado no País por intermédio de representante legal, previa-
mente designado dentre as instituições autorizadas pelo Poder Executivo a prestar
tal serviço, e que será responsável, nos termos do art. 128 do Código Tributário Na-
cional, pelo cumprimento das obrigações tributárias decorrentes das operações que
realizar por conta e ordem do representado (Lei nO 8.981(95, art. 79), acrescentando
o § lOque o representante legal não será responsável pela retenção e recolhimento
do imposto de renda na fonte sobre aplicações financeiras quando, nos termos da
legislação pertinente, tal responsabilidade for atribuída a terceiros.

D) Aplicações indiretas por meio de fondos e clubes de investimento


Além das aplicações de renda fixa e variável, merecem especial destaque, em
face das particularidades de seu regime de tributação, os investimentos estrangeiros
nas entidades de investimento coletivo localizadas no Brasil, notadamente os fundos
e clubes de investimento, que revestem a natureza de condomínios fechados e são
desprovidos de personalidade jurídica.

a) Considerações gerais: transparência fiscal e tributação monofásica


O regime tributário dos investimentos estrangeiros efetuados através de enti-
dades de investimento coletivo foi inicialmente disciplinado pela Lei nO 8.383, de
30 de dezembro de 1991, e subsequentemente reformulado pelo art. l° da Lei nO
8.849, de 28 de janeiro de 1994, e pelos arts. 78 e seguintes da Lei nO 8.981, de 20
de janeiro de 1995.
I ~ I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

o princípio geral que preside a este regime tributário é o da transparência das


entidades de investimento coletivo, inclusive das sociedades de investimento (únicas
que têm personalidade jurídica), de tal modo que os fluxos de renda transitam por
esses patrimônios especiais com uma tributação monofásica, impeditiva de uma dupla
tributaçãd4 •
A Lei nO 8.383/91 optou nos seus arts. 30 e seguintes por não tributar a pri-
meira fase) em que os rendimentos e ganhos de capital são creditados ao ente inter-
mediário (sociedade, fundo ou carteira) 75, tributando apenas a segunda fase) quando
a entidade de investimento coletivo atribui aos investidores residentes no exterior
os rendimentos e ganhos de capital, através de liquidação, remessa ou resgate, sob
qualquer forma, dos valores auferidos pela sociedade, fundo ou carteira.
O art. 1° da Lei nO 8.849/94 deu nova redação aos arts. 30 e seguintes da citada
Lei nO 8.383/91, tendo enveredado pela orientação oposta de tributar apenas a pri-
meira fase, deixando a segunda livre de imposto. Esta mesma orientação foi mantida
pela Lei nO 8.981, de 20 de janeiro de 1995.
No que concerne à fase de "atribuição" dos rendimentos e ganhos de capital aos
investidores estrangeiros há que distinguir os ganhos de capital e os rendimentos. Os
ganhos de capital, como anteriormente exposto, ficam excluídos da incidência do im-
posto de renda, desde que atendam às normas e condições fixadas pelo Conselho Mo-
netário Nacional (art. 81, § la, da Lei nO 8.981/95). Já os rendimentos submetem-se a
um imposto exclusivo na fonte, que será devido nos mesmos termos aplicáveis aos rendi-
mentos da mesma natureza auferido por residentes ou domiciliados no país, salvo no
caso de aplicação em fundos de investimento, os quais serão examinados a seguir.
No que concerne à fase de "distribuição" aos residentes no exterior, não incide
imposto tanto no que respeita aos ganhos de capital (art. 81, § l°) quanto no que
respeita aos rendimentos (art. 82, § 3°), dispondo expressamente o § 9° do art. 44
da Instrução Normativa na 25/01 que "os rendimentos e ganhos líquidos submeti-
dos à forma de tributação prevista nesta seção não se sujeitam a nova incidência do
imposto de renda quando distribuídos ao beneficiário no exterior".
É de salientar que na apuração do imposto consideram-se indedutíveis os preju-
íws apurados em operações de renda fixa e de renda variável (art. 81, § 4°).
A lei descreve, com rigor, os diversos aspectos da hipótese de incidência deste
imposto.
N o que concerne ao aspecto material, há que distinguir, mais uma vez, os rendi-
mentos e osganhos de capital: rendimentos são quaisquer valores que constituam remu-

74 RAMON FALCON y TELLA sustenta que de transparência verdadeira e própria só poderia falar-
se em relação a entes sem personalidade jurídica. Em relação aos demais casos, notadamente
de compropriedades de bens, a transparência é corolário direto da ausência de individualida-
de jurídica, pelo que melhor caberia a expressão "transparência imprópria": cfr. Analisis de la
transparencia tributaria, Madrid 1984, 307 ss.
75 Trata-se de mera afetação contábil, sem a natureza jurídica de verdadeiro pagamento.
Título V I Capo 11 I Residentes no Exterior

neração do capital aplicado, inclusive aquela produzida por títulos de renda variável,
tais como juros, prêmios, comissões, ágio e deságio, bem como os resultados positivos
auferidos em aplicações nos fundos e clubes de investimento, em operações de swap,
registradas ou não em bolsa, e nas operações realizadas em mercados de liquidação
futura, fora de bolsa com qualquer ativo (Lei nO 8.981/95, art. 81, § 2°, a, Lei nO
9.430/96, art. 71, § 1°, e RIR, art. 783, § 2°, I);ganho de capital é o resultado positi-
vo auferido nas aplicações realizadas em bolsas de valores, de mercadorias, de futuros
e assemelhadas (com exceção das operações conjugadas que permitam a obtenção de
rendimentos predeterminados), bem como nas operações com ouro, ativo financeiro,
fora da bolsa (Lei nO 8.981/95, art. 81, § 2°, b, e RIR, art. 783, § 2°, II).
No que respeita ao elemento temporal, a lei estabeleceu que o imposto será de-
vido por ocasião da cessão, resgate, repactuação ou liquidação de cada operação de
renda fixa, ou do recebimento ou crédito, o que primeiro ocorrer, de outros rendi-
mentos (art. 82).
A fonte retentora é a pessoa jurídica que efetuar o pagamento dos rendimentos
(Lei nO 9.430/96, art. 69, Medida Provisória nO 2.189-49, de 23 de agosto de 2001,
art. 16, § 1°) e, no caso de operações realizadas em mercados de liquidação futura,
fora de bolsa, a instituição administradora do fundo, sociedade de investimento ou
carteira (Instrução Normativa nO 25/01, art. 44).
No que concerne aos ganhos líquidos auferidos em operações realizadas em bol-
sa de valores, de mercadorias, de futuros ou assemelhados o responsável pela apura-
ção e pagamento do imposto é o representante legal do investidor estrangeiro dentre
instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil (Lei nO 8.981/95,
art. 78, Medida Provisória nO 2.189-49/01, art. 16, § 3°, I).
Não se aplicam ao investidor residente ou domiciliado no exterior, individual ou
coletivo, que realizar operações financeiras nos mercados de renda fixa ou de renda
variável no Brasil, de acordo com as normas estabelecidas pelo Conselho Monetário
Nacional, as regras de tributação previstas na Lei nO 11.033/04, que estabelecem
alíquotas regressivas especiais para rendimentos de operações ou aplicações de renda
fixa e variável (arts. 1° e 2°), bem como retenção do imposto de renda na fonte (à
alíquota de 0,005%) nas operações realizadas em bolsas de valores, de mercadorias,
de futuros e assemelhados (art. 4°).

b) Fundos de conversão - capital estrangeiro

Os fundos de conversão de capital estrangeiro não estão incluídos nas entidades


de investimento coletivo a que se refere o art. 81 da Lei nO 8.981/95, sendo objeto
de disciplina autônoma pelo art. 80 da mesma lei, que estabelece sistemática de tri-
butação na fase de distribuição, por ocasião do resgate.
Trata-se, pois, de um regime diferenciado em relação ao regime aplicável às de-
mais entidades estrangeiras de investimento coletivo, regulado no art. 81 da mesma
Lei nO 8.981/95, que atrás examinamos.
l,'f.~;:1 Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

A ambos é comum o princípio monofásico, segundo o qual o imposto apenas é


devido numa das fases do fluxo de rendimentos, ou na fase da atribuição ao fundo,
ou na fase da distribuição pelo fundo aos seus quotistas. Só que, enquanto a genera-
lidade das entidades de investimento coletivo são tributadas na fase de atribuição por
ocasião de "cada operação", não ocorrendo a incidência quando os rendimentos e
ganhos são distribuídos aos quotistas (arts. 81 e 82 da Lei nO 8.981/95), os fundos
de conversão de capital estrangeiro são apenas tributados na fase da distribuição, por
ocasião do resgate das quotas, não ocorrendo a incidência na fase em que os rendi-
mentos e ganhos de capital são atribuídos aos fundos.
A escolha da fase da atribuição para a tributação da generalidade das entidades
de investimento coletivo estrangeiro, em substituição à fase da distribuição (adotada
pela Lei nO 8.383/91), deveu-se, além da conveniência de antecipação de receita, ao
objetivo de evitar a forma de evasão consistente na possibilidade de transformação,
no âmbito do fundo, de rendimentos tributáveis em ganhos de capital isentos na
distribuição.
Pode, pois, colocar-se a questão de saber qual a razão pela qual o legislador de-
cidiu manter a escolha inicial da fase de distribuição para o caso especial dos fundos de
conversão-capital estrangeiro.
A razão está, ao nosso ver, na exigência constante do art. 26 da Instrução nO
157, de 21 de agosto de 1991, da Comissão de Valores Mobiliários (Fundos de
Privatização-Capital Estrangeiro), e do art. 29 da Instrução nO 227, de 23 de de-
zembro de 1994, da mesma autarquia (Fundo de Conversão-Capital Estrangeiro),
segundo a qual "os recursos correspondentes a cada investimento oriundo da con-
versão de créditos e títulos da dívida externa brasileira ficarão sujeitos a um prazo
mínimo de 12 (doze) anos de permanência no País, contado a partir da data da sua
efetiva conversão, findo o qual poderá ser retornado o valor apurado na liquidação
do investimento".
Foi precisamente a necessidade de fazer coincidir o momento da tributação com
o momento em que se adquire a disponibilidade econômica e jurídica da renda (neces-
sidade aliás decorrente do art. 43 do Código Tributário Nacional) que conduziu o
legislador a tributar os fundos de conversão apenas no momento do resgate, tendo
em vista a indisponibilidade decorrente da impossibilidade de liquidação do investi-
mento por longo período de tempo.
Pode pois concluir-se que os rendimentos e ganhos de capital auferidos ao longo
da vida de um fundo de conversão não estão sujeitos a imposto de renda na fonte,
por força de disposição expressa do § 2° do art. 80 da Lei nO 8.981/95, sendo apenas
tributáveis por ocasião de eventual resgate.

c) Fundos de investimento de curto prazo e de longo prazo


O art. 78, inciso UI, da Lei nO 8.981/95, determina que os residentes ou domi-
ciliados no exterior sujeitam-se às mesmas normas de tributação previstas para os re-
Título V I Capo 11 I Residentes no Exterior Nr:!.

sidentes ou domiciliados no País, em relação aos rendimentos obtidos em aplicações


em fundos de renda fIxa e de renda variável e em clubes de investimento.
A partir de 1° de janeiro de 2005, os fundos de investimentos passaram a ser
classificados, para fIns tributários, em nmdos de curto prazo e fundos de longo prazo, de
acordo com a composição de sua carteira, conforme seu prazo médio seja igual ou in-
ferior a 365 dias ou superior a tal período (Instrução Normativa nO 487/04, art. 1°).
Nas aplicações em fundos de investimento classifIcados como de longo prazo, a
incidência do imposto de renda na fonte sobre os rendimentos auferidos por qualquer
benefIciário, inclusive pessoa jurídica isenta, ocorre: (i) no último dia útil dos meses
de maio e novembro de cada ano (o chamado "come-quotas"), ou no resgate, se ocor-
rido em data anterior; e (ii) na data em que se completar cada período de carência
para resgate de quotas com rendimento ou no resgate de quotas, se ocorrido em outra
data, no caso de fundos com prazo de carência de até 90 dias. A alíquota do imposto
de renda sobre rendimentos auferidos em fundo de longo prazo é estabelecida regres-
sivamente em função do prazo da aplicação, sendo (i) 22,5%, para aplicações com
prazo de até 180 dias; (ii) 20%, para aplicações com prazo de 181 dias até 360 dias;
(iii) 17,5%, para aplicações com prazo de 361 até 720 dias; e (iv) 15%, para aplica-
ções com prazo acima de 720 dias (Instrução Normativa nO 487/04, arts. 2° e 3°).
Nos fundos de investimentos classifIcados como de curto prazo) os quotistas
sujeitam-se à incidência do imposto de renda na fonte, por ocasião do resgate, às
alíquotas de (i) 22,5%, em aplicações com prazo de até 180 dias; e (ii) 20%, para
aplicações com prazo acima de 180 dias (Instrução Normativa nO 487/04, art. 5°).
A base de cálculo do imposto de renda e as perdas incorridas em aplicações em ~
fundos de investimento são determinadas com base em um conceito de "valor refe-
rencial", representativo de um resultado intermediário com base no qual será expres-
so o resultado fInal de cada apuração (Instrução Normativa n° 575/05, art. 20 Y6.
A lei prevê a possibilidade de compensação das perdas apuradas no resgate
das quotas, com os rendimentos obtidos em cada período de incidência do im-
posto ou em resgate posteriores, no mesmo ou em outro fundo de investimento
administrado pela mesma pessoa jurídica, desde que a instituição administradora
mantenha sistema de controle e registro em meio magnético que permita a identi-
ficação, em relação a cada quotista, dos valores compensáveis (Lei nO 10.426/02,
art. 6°, Instrução Normativa nO 119/02, art. 4°, e Instrução Normativa nO 575/05,
art. 9°).
Considera-se perda a diferença negativa entre o valor do resgate e o valor da
aplicação acrescido dos rendimentos tributados anteriormente (Instrução Normativa
nO 119/02, art. 4°, § P).
No que concerne, especifIcamente, aos fundos de investimentos em ações, assim
considerados aqueles cujas carteiras sejam constituídas, no mínimo, por sessenta e

76 Cfr. Instrução Normativa nO 575/05, arts. 3° e 4°.


.i:•• Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

sete por cento de ações negociadas no mercado à vista de bolsa de valores ou enti-
dade assemelhada, a incidência do imposto de renda na fonte ocorre exclusivamente
por ocasião do resgate das quotas (Lei nO 9.532/97, art. 28, RIR, art. 744, § 6°, e
Instrução Normativa nO 487, art. r).
A Instrução Normativa nO 25/01 esclarece em seu art. 8°, § 3°, que estão in-
cluídas no limite de 67% os recibos de subscrição de ações e os Brazilian Depositary
Receipts (BDR) negociados no mesmo mercado 77 .
A base de cálculo do imposto é constituída pela diferença entre o valor de res-
gate e o valor de aquisição da quota, deduzido o IOE
O imposto de renda na fonte incide nos rendimentos auferidos nos fundos
de investimento em ações à alíquota de 15% (Lei nO 11.033/04, art. l°, § 3°, I,
e Instrução Normativa nO 487/04, art. 7°). Com vista a eliminar uma dupla tri-
butação, a lei isenta de tributação os rendimentos e ganhos líquidos de aplicações
financeiras e valores mobiliários integrantes das próprias carteiras dos fundos
(Lei nO 9.532/97, art. 28, § 10, a). Isenta também os juros sobre capital próprio
(art. 28, § 10, b).
As normas relativas aos fundos de investimento são aplicáveis, igualmente, aos
clubes de investimento, às carteiras administradas e qualquer outra forma de investi-
mento associativo ou coletivo (Lei nO 9.532/97, art. 33).
O imposto será retido pelo administrador do fundo de investimento ou pela
instituição administradora de clube de investimento ou qualquer outra forma de
investimento associativo ou coletivo, na data da ocorrência do fato gerador (Lei nO
9.532/97, arts. 32 e 33, e RIR, arts. 740 e 745).

d) Fundos de investimento imobiliário

Importa ainda fazer uma referência aos Fundos de Investimento Imobiliário regulados
pela Lei nO 8.668, de 25 de junho de 1993, e que constituem uma comunhão de recursos,
sem personalidade jurídica, destinados a aplicação em empreendimentos imobiliários78 •
No que concerne a estes fundos, há que distinguir duas sistemáticas de tributa-
ção, consoante a natureza dos rendimentos e ganhos de capital: uma, monofásica) que
prevalece em relação aos rendimentos obtidos na exploração do empreendimento, que
não são tributados quando percebidos pelo Fundo, mas somente quando distribuídos
aos quotistas, à alíquota de 20%; e uma bifásica, com tax credit) aplicável aos rendi-
mentos e ganhos líquidos auferidos pelos fundos em aplicações financeiras de renda

77 A mesma Instrução Normativa nO 25/01 estabelece que o limite de 67% deverá correspon-
der à média móvel dos percentuais diários apurados para um período de 40 dias úteis, pre-
vendo a fórmula matemática e certos critérios para efeito de determinação de referida média
(art. 8°, §§ 4° a 16).
78 Cfr. Instrução CVM nO 472/08; alterada pela CVM nO 478/09 Resolução BCB n°
2.248/96.
Título V I Capo 11 I Residentes no Exterior .i:'_
fIxa e de renda variável, que são tributados segundo as normas aplicáveis às pessoas ju-
rídicas submetidas a esta forma de tributação, inclusive em matéria de alíquotas, mas
compensáveis com o imposto devido na fase de distribuição (art. 752 do RIR).
No que concerne a residentes no exterior a lei determina a sua sujeição "à inci-
dência do imposto sobre a renda, nos termos da legislação aplicável a essa classe de
contribuintes", ou seja, a uma retenção de 20%, tanto no que respeita a rendimentos
e ganhos de capital distribuídos quanto ao ganho decorrente da alienação de quotas
ou da liquidação do fundo (art. P da Lei na 9.779, de 19 de janeiro de 1999, que
deu nova redação ao art. 17 da Lei na 8.668/93).

e) FuntWs de Investimento em Participações e afins

Resta examinar a tributação aplicável aos investimentos organizados sob a for-


ma de fundos que têm como objeto a aquisição de participações societárias em cará-
ter permanente79 .
O FunCÚJ de Investimento em Participações (FIP), regulado pela Instrução CVM na
391/03, se constitui sob a fonna de condomínio fechado, sendo uma comunhão de
recursos destinados à aquisição de ações, debêntures, bônus de subscrição, ou outros tí-
tulos e valores mobiliários conversíveis ou permutáveis em ações de emissão de compa-
nhias, abertas ou fechadas, participando do processo decisório da companhia investida,
com efetiva influência na defInição de sua política estratégica e na sua gestão, notada-
mente através da indicação de membros do Conselho de Administração (art. 20 ).
O Fundo Mútuo de Investimento em Empresas Emet;fJentes (FMIEE), por sua vez,
regulado pela Instrução CVM na 209/94, também é constituído sob a forma de con-
domínio fechado e consiste em uma comunhão de recursos destinados à aplicação
em carteira diversifIcada de valores mobiliários de emissão de empresas emergentes,
assim considerada aquela a companhia que, à época do primeiro investimento pelo
Fundo, apresente faturamento líquido anual, ou faturamento líquido anual conso-
lidado, inferiores a R$ 150.000.000,00, apurados no balanço de encerramento do
exercício anterior à aquisição dos valores mobiliários de sua emissão (art. 10)8°.
Além dos demais requisitos estabelecidos pela CVM, a carteira de investimento
dos FIP e dos FMIEE deve ser composta, no mínimo, em 67% por ações de socie-

79 Cfr. ANTONIO CARLOS MARCHETTI GUZMAN, Os Fundos de Investimento em Participações


como Instrumento de Desenvolvimento do Mercado de Private Equity no Brasil, e GUSTAVO
LIAN HADDAD, Questões Relacionadas ao Regime Tributário dos Fundos de Investimentos
em Participações (FIP) Aplicável a Investidores não Residentes, ambos in ROBERTO QUlRO-
GA MOSQUERA (coord.), O Direito Tributário e o Mercado Financeiro e de Capitais, São Paulo
2009,84 sS.
80 Adicionalmente aos referidos limites, é vedado ao FMIEE investir em sociedade cujo
controle acionário seja detido por grupo de sociedades, de fato ou de direito, cujo pa-
trimônio líquido consolidado seja superior a R$ 300.000.000,00 (Instrução CVM nO
209/94, art. l°, § 3°).
MW- Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier
dades anônimas, debêntures conversíveis em ações e bônus de subscrição (Lei nO
11.312, art. 2°, § 4°).
A CVM prevê ainda a criação de fundos específicos para investimento nos pró-
prios FIP e FMIEE, os quais foram denominados como Fundo de Investimento em
Quotas de Fundo de Investimento em Participações e Fundos de Investimento em Empre-
sas Emer;gentes (FIC). Segundo o art. 37, parágrafo único, da Instrução CVM nO
391/03, que também regulamenta os FIP, os FIC devem aplicar, no mínimo, 90% de
seu patrimônio em cotas de FIP, bem como em cotas FMIEE.
Ressalvada a particularidade acima, relativa à composição da carteira, os FIC en-
contram-se sujeitos às mesmas regras que os FIP, estabelecidas pela Instrução CVM
nO 391/03. Também em matéria tributária, o tratamento aplicável aos FIC é idêntico
ao dos FIP e dos FMIEE.
Todos os fundos acima referidos encontram-se sujeitos a registro e à supervisão
pela CVM.
A tributação do FIP, do FMIEE e do FIC é exclusivamente monofásica. Os ren-
dimentos percebidos pelo Fundo na exploração de seus investimentos e os ganhos
por ele obtidos na alienação de tais investimentos não são tributados. Toda a tributa-
ção fica diferida para o momento seguinte, relativo à distribuição de resultados pelo
Fundo aos seus quotistas.
Como regra geral, os rendimentos auferidos pelo quotista no resgate de quotas,
inclusive quando decorrentes da liquidação do Fundo, sujeitam-se ao imposto de
renda na fonte à alíquota de 15%, incidente sobre a diferença positiva entre o valor
de resgate e o custo de aquisição das quotas (Lei nO 11.312/06, art. 2°).
Todavia, a alíquota fica reduzida a zero no caso de rendimentos pagos, credi-
tados, entregues ou remetidos a quotistas residentes ou domiciliados no exterior,
individuais ou coletivos, que realizarem operações financeiras no País de acordo com
as normas e condições estabelecidas pelo Conselho Monetário Nacional (atualmente
previstas na Resolução nO 2.689/00), desde que não seja residente ou domiciliado
em país que não tribute a renda ou que a tribute à alíquota máxima inferior a 20%
(Lei nO 11.312/06, art. 3°).
Referido benefício não se aplica ao quotista titular de cotas que, isoladamente
ou em conjunto com pessoas a ele ligadas, represente 40% ou mais da totalidade das
quotas emitidas por um único FIP, FIC ou FMIEE, ou cujas quotas, isoladamente
ou em conjunto com pessoas a ele ligadas, lhe assegurem direito ao recebimento de
rendimento superior a 40% do total de rendimentos auferidos pelo Fundo (Lei nO
11.312/06, art. 3°, § JO). Ademais, o benefício de redução da alíquota para zero tam-
bém não se aplica ao Fundo que detiver em sua carteira, a qualquer tempo, títulos
de dívida em percentual superior a 5% de seu patrimônio líquido, ressalvados desse
limite debêntures, bônus de subscrição e títulos públicos.
Os ganhos auferidos por quotista residente ou domiciliado no exterior na alie-
nação de cotas são tributados à alíquota de 15% (i) como ganho líquido, quando
auferidos em operações realizadas em bolsa; e (ii) de acordo com as regras aplicáveis
Título V I Capo 11 I Residentes no Exterior MU-
aos ganhos de capital na alienação de bens ou direitos de qualquer natureza, quando
auferidos em operações realizadas fora de bolsa (Lei nO 11.312/06, art. 2°, § 1°).
Caso o Fundo não cumpra os limite de diversificação da carteira e as regras de
investimento constantes da regulamentação estabelecida pela CVM, os rendimentos
por ele distribuídos aos quotistas ficam sujeitos à tributação pelo imposto de renda
na fonte, às alíquotas gerais aplicáveis aos rendimentos de renda fixa.

§ 4° DIVIDENDOS

A) A supressão de incidência do imposto quanto a residentes no exterior pela Lei nO 9.249/95


O art. 10 da Lei nO 9.249/95 veio estabelecer que os lucros ou dividendos cal-
culados com base nos resultados apurados a partir do mês de janeiro de 1996, pagos
ou creditados pelas pessoas jurídicas tributadas com base no lucro real, presumido ou
arbitrado não estão sujeitos à incidência do imposto de renda na fonte, nem integra-
rão a base de cálculo do imposto de renda do beneficiário, pessoa física ou jurídica,
domiciliado no País ou no exterior81 .
Com a adoção deste regime, o Direito brasileiro eliminou radicalmente a du-
pla tributação econômica dos lucros, submetendo-os exclusivamente à tributação na
pessoa jurídica que os produziu, sem que ocorra nova incidência em razão da sua
distribuição aos sócios. Do mesmo passo tornou as holdings brasileiras absolutamen-
te transparentes, pois não só os dividendos não integram o seu lucro real, como as
distribuições ou redistribuições sucessivas não sofrem qualquer retenção na fonte 82 •
A pureza lógica do sistema foi ao ponto de eliminar a retenção na fonte na
distribuição de lucros a residentes no exterior, eliminando assim a discriminação
(embora legítima) de tratamento fiscal entre residentes e não residentes e criando um
forte atrativo ao investimento direto estrangeiro no país, dotado agora de substancial
vantagem comparativa relativamente a outros países importadores de capital.
O novo regime isencional só se aplica, porém, às distribuições de lucros apura-
dos a partir de 1° de janeiro de 1996, pelo que os dividendos originários de lucros
formados anteriormente a esta data continuam submetidos à retenção na fonte, nos
termos da legislação vigente à data da sua formaçã0 83 •

81 Sobre a evolução legislativa da tributação dos dividendos de residentes no exterior, cfr. a 5 a


edição desta obra, 463 sS.
82 Sobre o problema da dupla tributação econômica dos dividendos, ver HENRY TILBERY, Im-
posto de renda - pessoas jurídicas. Integração entre sociedade e sócios, São Paulo 1985, 32 ss.;
OCDE, Les systemes d'imposition des societés dans les pays membres de l'OCDE, Paris 1973; Lo-
VISOLO, Il sistema impositivo dei dividendi, Pádua 1980.
83 Este é o único imposto incidente sobre distribuição de dividendos, após o art. 76 da Lei na
8.383/91 ter abolido o imposto suplementar de renda relativamente aos triênios encerrados
posteriormente a 31 de dezembro de 1991. O imposto suplementar de renda foi introduzido
I §li I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

B) Convenções contra a dupla tributação: remissão


Sobre o tratamento tributário dos dividendos nas Convenções contra a dupla
tributação, remete-se para o título VI deste livro 84 •

§ 50 INCORPORAÇÃO DE LUCROS E RESERVAS AO CAPITAL SOCIAL

A isenção dos lucros e dividendos distribuídos a residentes no exterior operada


pelo art. 10 da Lei nO 9.249/95 conduziu à revogação automática do art. 71 da Lei
nO 7.799/89 (art. 700 do RIR). É que, não incidindo doravante a tributação sobre a
distribuição direta do dividendo, nenhuma razão subsiste para que a mesma ocorra
na sua distribuição indireta, por via de redução de capital.
Todavia, no que concerne às parcelas de lucros ou reservas de lucros apurados
até 31 de dezembro de 1995, não tributados em razão de sua capitalização, continua
a aplicar-se a lei anterior pelo que se sujeitarão à incidência do imposto na fonte, à
alíquota de 15%, quando ocorrer alienação de ações ou quotas, redução de capital
para restituição aos sócios, ou liquidação de empresas, antes de transcorrido o prazo
de cinco anos, contado da data da incorporação ao capital social85 .

§ 6° JUROS

A) A distinção entre Juros de operações financeiras eJuros de financiamentos


Em matéria de juros impõe-se, preliminarmente, proceder a uma distinção con-
soante os juros respeitem a operações financeiras no mercado de renda fixa (caso em
que, nos termos do art. 701 do RIR, ficam submetidos ao regime especial de equi-
paração a residentes no país, salvo se realizadas ao abrigo da Resolução nO 2.869/00

entre nós pela Lei nO 4.390, de 29.8.64, que deu nova redação ao art. 43 da Lei na 4.131/62,
segundo o qual "o montante dos lucros e dividendos líquidos efetivamente remetidos a pessoas
físicas e jurídicas, residentes ou com sede no exterior, fica sujeito a um imposto suplementar da
renda, sempre que a média das remessas em um triênio, a partir do ano de 1963, exceder a 12%
(doze por cento) sobre o capital e reinvestimentos registrados nos termos dos arts. 3° e 4° desta
lei". O imposto incidia à alíquota de 40%, se o excesso das remessas se sitnava entre 12% e 15%
dos lucros; de 50%, entre 15% e 25%; de 60%, acima de 25% dos lncros. O Decreto-Lei nO
2.073, de 20 de dezembro de 1983, voltou a dar nova redação ao art. 43 da Lei nO 4.131/62,
pela qual o fato gerador deixou de ser a remessa cambial, mas a "distribuição" dos lucros, ainda
que em moeda nacional. O imposto suplementar deixou, assim, de ser um tributo extrafiscal
sobre "remessas cambiais" para passar a revestir a mesma natnreza do imposto de renda na
fonte sobre distribuição de lucros, de que apenas representa uma tributação agravada. Sobre os
inúmeros problemas jurídicos suscitados por este imposto, cfr. a la edição deste livro, 202 ss.

84 efr. infra, 588.


85 Sobre a evolução legislativa, cfr. a 5a edição desta obra, 471 ss.
Título V I Capo 11 I Residentes no Exterior

do Conselho Monetário Nacional, às quais se aplica o regime do art. 81 da Lei nO


8.981/95)86 ou respeitem a demais situações, caso em que ficam submetidos ao regime
geral de retenção na fonte relativo a residentes no exterior, constante do art. 702 do
RIR que, sob o título de "rendimentos de financiamentos", dispõe que "estão sujei-
tas à incidência do imposto na fonte, à alíquota de quinze por cento, as importâncias
pagas, creditadas, entregues, empregadas ou remetidas a beneficiários residentes ou
domiciliados no exterior, por fonte situada no País, a título de juros, comissões, des-
contos, despesas financeiras e assemelhados".
Tenha-se presente que, enquanto a alíquota no que concerne às operações no
mercado de renda fixa é de 20%, já nos demais casos a alíquota foi fixada em 15%
ex vi do art. 28 da Lei nO 9.249/95 (alíquota esta agravada para 25% se o credor for
domiciliado em país de tributação favorecida ou que oponha sigilo societário).

B) Não incidência sobre variação cambial


Coloca-se a questão de saber se o imposto de renda na fonte em mútuos cele-
brados com residentes no exterior atinge igualmente as importâncias devidas a título
de variação cambial, nos casos em que tenha sido validamente pactuada cláusula de
correção cambial em contrato subjetivamente internacional, ao abrigo do Decreto-
Lei nO 857/69, e ainda que o mútuo tenha por objeto moeda nacional8 ?
A razão de ser da cláusula de paridade cambial reside em assegurar ao credor a
inalterabilidade do poder de compra dos recursos desembolsados, de modo a que o
reembolso do principal corresponda, rigorosamente, ao valor econômico dos recur-
sos inicialmente desembolsados. Ela aplica-se igualmente nos casos em que o objeto
do mútuo consiste em moeda nacional, pois a correção cambial visa precisamente
a manter a identidade do poder de compra, na moeda que originou inicialmente o
ingresso dos recursos no Brasil ou para a qual poderia ter sido convertida, imediata-
mente, se não fosse mutuada.
Sendo esta a razão de ser da cláusula de variação cambial, torna-se evidente que
os valores nominais em reais que acrescem aos valores mutuados, por força da referi-
da cláusula, não representam acréscimo do patrimônio do credor mas, tão somente,
a sua preservaçã088 .
Ora, de harmonia com o art. 43 do Código Tributário Nacional, com força de
lei complementar, hierarquicamente superior à lei ordinária, a renda é definida como

86 Cfr. supra, 472.


87 Sobre a validade desta cláusula, cfr. ALBERTO XAVIER, Validade das cláusulas em moeda es-
trangeira nos contratos internos e internacionais, in XAVIER/MARTINS, Estudos jurídicos sobre
investimento internacional, São Paulo 1980, 1 ss.
88 Nesse sentido, cfr. o Acórdão nO 106·8.029/96, de 12.06.1997, da 6 a Câmara do Primeiro
Conselho de Contribuintes, assim ementado: "Correção cambial (EX. 87/9) - inexigível o
imposto sobre a parcela de correção cambial das parcelas de amortização do principal na
liquidação de contrato de mútuo, no caso de beneficiário no exterior".
I @ I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

acréscimo patrimonial, ou seja, como variação patrimonial positiva, pelo que é ilegíti-
ma a tributação quando este pressuposto não ocorrer.
Com efeito, se um residente no exterior dispõe, em determinado momento, de
R$ 1,00 (um real) no Brasil que, nesse mesmo momento, pode ser convertido em
US$ 1,00 (um dólar norte-americano), e se, num momento subsequente, recebe, do
seu devedor, por força de cláusula válida de correção cambial, por exemplo, R$ 3,00
(três reais), os R$ 2,00 (dois reais) adicionais não representam renda do residente no
exterior, mas apenas reposição dos valores em moeda nacional necessários que lhe
assegurem, nesse momento sucessivo, o direito à obtenção de U$ 1,00 (um dólar
norte-americano) de que dispunha, ou de que poderia ter disposto, no momento em
que o mútuo foi concedido.
O fenômeno tem natureza substancialmente idêntica ao da correção monetária
de créditos decorrente de inflação interna, com a única diferença de o conceito de
variação cambial se aplicar aos créditos de residentes no exterior.
A jurisprudência dos tribunais superiores sempre foi no sentido de considerar
ilegítimas as distorções introduzidas na determinação da renda líquida ou do lucro
real (acréscimo patrimonial autêntico) pela manipulação governamental de índices
inflacionários.
Estes mesmos princípios não podem deixar de se aplicar aos residentes no ex-
terior, em relação aos quais vigora também a regra de que apenas são tributáveis,
ainda que pelo método da retenção na fonte, acréscimos patrimoniais ou variações
patrimoniais positivas, que correspondam ao conceito jurídico de renda consagrado
no art. 43 do Código Tributário Nacional.
Tenha-se também presente que no que concerne às pessoas físicas residentes no
Brasil, o § 4° do art. 25 da Lei nO 9.250/95 e o art. 11 da MP nO 2.189-49/01 estabele-
cem que é isento do imposto de renda o acréscimo patrimonial decorrente de variação
cambial, em reais, pela cotação cambial da compra em 31 de dezembro, dos saldos dos
depósitos em moeda estrangeira mantidos em instituições financeiras no exterior.
Assim, por razões simétricas às que conduzem à não tributação no Brasil da va-
riação cambial de recursos brasileiros no exterior, deve concluir-se pela não tributação
no Brasil, por retenção na fonte, da variação cambial de recursos de residentes no ex-
terior aplicados no Brasil e decorrentes de cláusulas cambiais, validamente pactuadas,
ao abrigo do Decreto-Lei nO 857/69, em contratos subjetivamente internacionais.

C) Benefícios fiscais: remissão

Em matéria de juros, já referimos as especialidades que respeitam à existência


de benefícios fiscais, tais como reduções de alíquota e isenções, pelo que remetemos
para o capítulo em que tratamos da matéria 89 •

89 efr. supra, 448 e 450.


Título V I Capo 11 I Residentes no Exterior .i:p_
D) Juros nas compras de bens a prazo

a) O art. 11 do Decreto-Lei nO 401/68

Até 1968 - quando a matéria não se encontrava especificamente regulamentada


- a jurisprudência inclinava-se no sentido de que não era devido imposto de renda
nos juros de financiamentos realizados por empresas estrangeiras a companhias bra-
sileiras, essencialmente por três ordens de razões. Em primeiro lugar, tais fmancia-
mentos decorriam de contratos celebrados no exterior - e estes contratos configura-
riam a fonte da renda, a qual, por se localizar fora do território do Brasil, não poderia
ser aqui tributada. Em segundo lugar, do ponto de vista da empresa brasileira, não se
verificaria um fenômeno de produção de renda, mas, pelo contrário, a realização de
um dispêndio, pelo que não podiam ser taxadas no Brasil. Enfim, alegava-se que tais
juros, devendo acrescer ao valor dos bens financiados, não poderiam ter o tratamen-
to de rendimentos, mas sim o de acréscimo de custos.
O art. II do Decreto-Lei nO 401, de 30 de dezembro de 1968, surgiu precisa-
mente para derrubar esta jurisprudência, até então pacífica.
Dispõe assim referido preceito legal: "Está sujeito ao desconto do imposto de
renda na fonte o valor dos juros remetidos para o exterior devidos em razão da
compra de bens a prazo, ainda quando o beneficiário do rendimento for o próprio
vendedor", acrescentando o § único que "para os efeitos deste artigo consideram-se
fato gerador do tributo a remessa para o exterior e contribuinte o remetente".
Encontra-se hoje definitivamente superada a orientação segundo a qual seria
ilegítima, em face do princípio da territorialidade, a tributação dos juros no caso dos
contratos de financiamento celebrados no exterior, fundada no fato de a fonte dos
rendimentos se situar fora do alcance das normas tributárias internas, delimitadas
espacialmente pelo princípio da territorialidade, internacionalmente consagrad090 •
Com efeito, o princípio da territorialidade está ligado à localização de fonte de
renda, e a fonte da renda é, em sentido econômico, o capital de que ela deflui e, em
sentido financeiro, o lugar de residência do devedor, pelo que a fonte dos juros se
situa no território onde foram investidos os fundos de que derivam ou onde reside o
devedor e não no lugar onde foi celebrado o ato jurídico em que se traduz a compra
e venda de bens a praz091 •

90 Cfr. Ruy BARBOSA NOGUEIRA, Parecer, Resenha Tributária (1970) 517; FABIO FANUCCHI, Al-
terações na legislação do imposto de renda, Resenha Tributária (1969), 14; GERALDO ATALI-
BA, Imposto de renda incidente sobre juros remetidos para o exterior, RT 60 (1971),48 sS.
91 No sentido da ininvocabilidade do princípio da territorialidade, naquela acepção, cfr. TFR,
AMS, 73643, de 21.11.73; Parecer Normativo CST nO 166, de 31.8.73, e CST nO 410, de
25.9.73. Na doutrina: GILBERTO DE ULHÔA CANTO, Estudos e pareceres de Direito Tributário,
34. No sentido defrnitivo da tributabilidade dos juros pagos a residente no exterior por fonte
residente no Brasil está a Súmula nO 586 do Supremo Tribunal Federal, segundo a qual "incide
imposto de renda sobre os juros remetidos para O exterior, com base em contrato de mútuo".
Q I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

A única dúvida que ainda hoje se suscita é a que respeita à dedutibilidade do


imposto incidente sobre os juros e a legitimidade da dedução do rendimento e res-
pectivo imposto reajustados, nos casos em que o devedor dos juros tenha assumido
contratualmente o ônus do imposto.
Tais dúvidas resultam exclusivamente no fato de o parágrafo único do art. 11
do Decreto-Lei na 401/68 ter qualificado expressamente a fonte pagadora dos juros
devidos na compra de bens a prazo como contribuinte) enquanto nos demais casos de
pagamento de juros a residentes no exterior a fonte pagadora ter sido sempre consi-
derada, unanimamente e sem hesitação, como responsável.
A orientação segundo a qual oimposto sobre os juros das compras de bens a
prazo é indedutível assenta exclusivamente na premissa de que a lei qualifica o deve-
dor dos juros como contribuinte; consequentemente, como a legislação do imposto de
renda veda a dedução do imposto devido pelo próprio contribuinte, tal consequência
se aplicaria igualmente ao imposto sobre os juros por este devidos em razão da com-
pra de bens a prazo.
A solução deste problema depende essencialmente da natureza jurídica do im-
posto previsto no art. 11 do Decreto-Lei na 401/68, pois já se duvidou de que ele seja
um verdadeiro imposto de renda, uma vez que, considerando a lei como contribuinte
o próprio devedor dos juros, estaria tributando não um acréscimo patrimonial, como
é próprio do imposto de renda, como de seguida se verá, mas um decréscimo patri-
monial, em que a despesa se traduz92 •
Ao invés, se a natureza jurídica do tributo em causa é a de um verdadeiro impos-
to de renda (como de seguida se verá), torna-se impossível aceitar a qualificação legal
do devedor dos juros como contribuinte, bem como aceitar as consequências que
resultam de tal qualificação, notadamente a indedutibilidade do imposto.

b) Natureza jurídica de imposto de renda retido na fonte


Não é possível hoje duvidar-se de que o imposto previsto no art. 11 do De-
creto-Lei na 401/68 é um verdadeiro imposto de renda, incidente sobre residentes no
exterior, na sua modalidade clássica de retenção na fonte, de estrutura rigorosamente
idêntica à do imposto de renda na fonte sobre os juros em geral.
Em primeiro lugar, nada no contexto em que tal dispositivo foi emanado per-
mite vislumbrar a intenção de criação de um tributo novo, sobre uma despesa, ao
abrigo da competência residual da União.
Bem observaram Ruy BARBOSA NOGUEIRA e ARNOLDO WALD 93 que o art. 11 do
Decreto-Lei na 401/68 não teve o alcance de instituir um novo tributo, posto que

92 Cfr., nesse sentido FABIO FANUCCHI, Curso de Direito Tributário Brasileiro (3" ed.), São Paulo
1975, 181.
93 Ruy BARBOSA NOGUEIRA, op. cit., 489 55.; Direito Tributário Comparado, São Paulo 1971, 15
55.; ARNOLDO WALD, Evolução jurisprudencial, sobre o imposto de renda referente a juros
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Título V I Capo 11 I Residentes no Exterior -fi-
para tanto lhe faltaria um elemento essencial, que é a alíquota, pelo que o referido
artigo se limitou a legislar sobre imposto já existente, o imposto de renda.
Que assim é resulta do próprio teor literal do mesmo artigo, que se refere ex-
pressamente a um "desconto do imposto de renda na fonte", não permitindo margem
para dúvidas de que é precisamente esta a natureza jurídica do tributo em causa.
Chega a causar surpresa que alguns intérpretes se tenham confinado à interpre-
tação literal da expressão "contribuinte", sem se aperceberem que com isto deixavam
de dar igual relevância à expressão literal "desconto do imposto de renda na fonte",
que com a primeira é logicamente incompaúvel.
Acresce que a natureza jurídica do imposto previsto no art. 11 do Decreto-Lei
nO 401/68, como verdadeiro imposto de renda retido na fonte, foi sempre acolhida
pelo próprio Fisco.
Em primeiro lugar, o simples fato de ter incluído o referido preceito legal nas
consolidações legislativas, denominadas "Regulamento do Imposto de Renda"94, no
mesmo capítulo em que se incluem os juros em geral, não deixa margem para hesita-
ções quanto à posição do Fisco a respeito da natureza da incidência em causa.
Em segwldo lugar, o Fisco sempre considerou aplicável a este imposto as con-
venções internacionais sobre dupla tributação da renda, consequência natural da sua
real natureza jurídica. Neste sentido é categórico o Parecer Normativo CST nO 94,
de 27 de maio de 1974, segwldo o qual "o imposto previsto no art. 11 do Decreto-
Lei na 401/68, por constituir-se em imposto de renda, é objeto dos tratados bilaterais
firmados pelo Brasil para a elisão da bitributação".
Idêntica orientação foi reiterada mais tarde pela Instrução Normativa nO 70,
de 15 de ourubro de 1982, nos seguintes termos: '~os juros, relativos à aquisição
financiada de bens, pagos a residentes ou domiciliados em país com o qual o Brasil
tenha firmado Convenção destinada a evitar a dupla tributação da renda, aplicam-se
as alíquotas nela previstas em detrimento das fixadas na legislação interna (". )".
Ainda no mesmo sentido, aponta definitivamente o entendimento de que as
isenções ou imunidades que beneficiem o remetente dos juros não o exoneram da
obrigação de retenção, o que claramente significa que o Fisco não os considera con-
tribuintes de imposto de renda, caso em que necessariamente as isenções e imunida-
des lhe aproveitariam 95 •

pagos a financiadores estrangeiros, Revista de Direito Mercantil XXII (1973-9), 26.


94 No RIR/99, art. 703 e § único; no RIR/94, art. 778; e no RIR/80, art. 556.
95 Veja-se, nesse sentido, o Parecer Normativo CST nO 103, de 3 de julho de 1974, segundo o
qual: "O gozo da isenção, total ou parcial, porque incidente sobre os resultados financeiros,
não elide a tributação na fonte dos juros remetidos para o exterior, ainda que este ônus re-
caia sobre o remetente isento. Competência para reconhecimento do favor fiscal na área da
SUDAM". Também no mesmo sentido, mais recentemente, estão as decisões da 9 a e da 6 a
Região Fiscal: (i) Decisão nO 9E97F006, de 8 de julho de 1997 (9 a RF): "IRF. Remessas de
juros ao exterior em decorrência de financiamento da compra de bens a prazo. Instituição de
assistência social sem fins lucrativos. Incidência - Incide o imposto de renda na fonte sobre
I @ I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

c) Impossibilidade de caracterizar o devedor dos juros como contribuinte


em face dos arts. 43 e 45 do Código Tributário Nacional
Chegados à conclusão de que o imposto sobre os juros nas compras de bens a
prazo é um verdadeiro imposto de renda na fonte, de natureza idêntica a do imposto
de renda na fonte sobre os juros em geral, fácil se torna concluir que a utilização do
conceito de "contribuinte" para caracterizar o remetente dos juros não passa de simples,
embora grosseiro, erro de técnica legislativa, carecedor de pronta interpretação corretiva.
É que, sendo tal imposto um imposto de renda, a lei ordinária não seria livre
para a definição do contribuinte, pois este se encontra predeterminado em lei com-
plementar - o Código Tributário Nacional.
Dispõe, na verdade, o artigo 43 do Código Tributário Nacional que: "O impos-
to, de competência da União, sobre a renda e proventos de qualquer natureza, tem
como fato gerador a aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica: "I - de ren-
da, assim entendido o produto do capital, do trabalho ou da combinação de ambos;
"II - de proventos de qualquer natureza, assim entendidos os acréscimos patrimo-
niais não compreendidos no inciso anterior". E o art. 45 do mesmo Código dispõe
que: "Contribuinte do imposto é o titular da disponibilidade a que se refere o art. 43,
sem prejuízo de atribuir a lei essa condição ao possuidor, a qualquer titulo, dos bens
produtores de renda ou dos proventos tributáveis", acrescentando o § único que: "A
lei pode atribuir à fonte pagadora da renda ou dos proventos tributáveis a condição de
responsável pelo imposto cuja retenção e recolhimento lhe caibam".
A simples leitura dos dispositivos em causa conduz à formulação de um silogis-
mo do qual não se pode escapar.
Ou o remetente dos juros é contribuinte em sentido técnico e, então, não se trata de
imposto de renda, mas de um imposto de natureza distinta, sobre decréscimo patrimo-
nial; ou o imposto em causa tem a natureza de imposto de renda retido na fonte, como é
a posição do Fisco, aliás correta, e, nesse caso, o remetente dos juros não é o contribuin-
te, pois não é o titular da disponibilidade a que se refere o art. 43 do Código Tributário

as remessas ao exterior, efetuadas por instituição de assistência social sem fins lucrativos, de ju-
ros decorrentes de financiamento da compra de bens a prazo, pois, embora o remetente goze
de imunidade tributária, os juros remetidos constituem rendimentos de terceiros. (ii) Decisão nO 61,
de 12 de março de 1998 (9" RF): "Remessa ao exterior. Juros na compra de bens. Entidade
irnlme. O valor remetido ao exterior a título de juros, devidos na compra de bens a prazo,
está sujeito à incidência do imposto de renda na fonte, ainda esta figure como instituição de
assistência social, de que trata o art. 150, VI, c, da CF/88. (iii) Decisão nO 96/98 (6a RF):
"Rendimentos pagos a residentes no exterior - Os rendimentos pagos, empregados ou reme-
tidos a residentes no exterior estão sujeitos ao imposto de renda na fonte, independentemente
de a fonte pagadora ser pessoa jurídica isenta, ainda que assuma o ônus do imposto"; (iv)
Decisão nO 171/03 (3" RF): "Remessa ao exterior, juros na compra de bens a prazo. Sujeitam-se à
incidência do imposto de renda na fonte as remessas de juros ao exterior decorrentes de financia-
mento na compra de bens a prazo efetuados por entidades sindicais de trabalhadores, pois embora
estas gozem de imunidade tributária os juros remetidos constituem rendimentos de terceiros".
Título V I Capo 11 I Residentes no Exterior .M
Nacional (o credor dos juros), mas sim o responsável, ao abrigo do parágrago único do
art. 45 do Código Tributário Nacional.
Não sendo possível insistir em qualificar o remetente dos juros como contri-
buinte em sentido técnico-jurídico, pois uma mera interpretação declarativa e cor-
retiva revela que a expressão foi utilizada em sentido impróprio e imperfeito para
designar o sujeito passivo responsável, importa examinar quais as consequências que
desta correta qualificação advêm no que concerne à dedutibilidade, pelo devedor, do
imposto incidente sobre os juros por ele retid096 •

d) A dedutibilidade) pelo devedo-;; do imposto incidente sobre os juros por ele retido

(i) A evolução legislativa


A evolução legislativa em matéria de imposto de renda no que concerne à dedu-
tibilidade de impostos devidos pelo sujeito passivo procurou resolver três problemas
distintos que a este respeito se colocam com autonomia: (i) em que período deve o
imposto ser deduzido, se naquele em que foi efetivamente pago ou naquele ao qual
deve ser apropriado segundo o regime de competência; (ii) se é ou não dedutível
o imposto retido na fonte pela fonte pagadora, na sua condição de responsável, no
que concerne a rendimentos pagos a terceiros; e (iii) sendo afirmativa a resposta à
questão anterior, se essa dedutibilidade se mantém quando a fonte pagadora assume
contratualmente o ônus do imposto.
A Lei nO 4.506, de 30 de novembro de 1964, no seu art. 50, limitou-se a dar
resposta à primeira das referidas questões, proclamando o princípio da dedução se-
gundo o regime de caixa, mas não deu resposta explícita aos demais problemas atrás
referidos, limitando-se a afirmar no § lOdo art. 50, de modo aliás ambíguo e impre-
ciso, que "não será dedutível o imposto de renda pago pela empresa, qualquer que
seja a modalidade de incidência".
A resposta ao segundo e ao terceiro problemas, atrás referidos, viria a ser dada
pelo art. 8° do Decreto-Lei nO 1.351, de 24 de outubro de 1974, porém com a parti-
cularidade de a solução nele consagrada não ser uma solução genérica, mas restringir-
se a juros pagos a residentes no exterior.
Dispôs, com efeito, o art. 8° do Decreto-Lei nO 1.351/74 que "o imposto de
renda incidente na fonte sobre juros, comissões, despesas e descontos remetidos,
creditados, pagos ou entregues a residentes ou domiciliados no exterior em decor-
rência de operações de crédito, quando a fonte pagadora assumir o ônus e efetivar o
recolhimento dentro do ano-base a que corresponde, será considerado acréscimo de
despesa financeira, dedutível na apuração do lucro operacional".

96 ANA CLÁUDIA UTUMI, A tributação dos empréstimos internacionais por imposto de renda, in
HELENO TAVElRA TÔRRES (org.), Direito Tributário InternacionalAplicado, vol. IV, São Paulo
2007, 223, espec. 231.
M€i- Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier
Foi O Decreto-Lei na 1.598, de 28 de dezembro de 1977, que veio dar uma
solução genérica aos três problemas atrás referidos, no seu art. 16, que estabelece o
seguinte:
"Os tributos são dedutíveis como custo ou despesa operacional no período-base
de incidência:
"I - em que ocorrer o fato gerador da obrigação tributária, se o contribuinte
apurar os resultados segundo o regime de competência; ou
"II - em que forem pagos, se o contribuinte apurar os resultados segundo o
regime de caixa.
"§ la - Na determinação do lucro real, a pessoa jurídica não pode deduzir como
custo ou despesa o imposto de renda de que for sujeito passivo como contri-
buinte ou como responsável em substituição ao contribuinte.
"§ 2 0 - A dedutibilidade, como custo ou despesa, de rendimentos pagos ou cre-
ditados a terceiros abrange o imposto sobre os rendimentos que o contribuinte,
como fonte pagadora, tiver o dever legal de reter e recolher, ainda que o contri-
buinte97 assuma o ônus do imposto.
"§3°_( ... )
"§4°_( ... )".
Abstraindo da questão relativa ao período de dedução do imposto, o Decreto-
Lei na 1.598/77 veio formular as seguintes regras básicas: (i) a pessoa jurídica não
pode deduzir, como custo ou despesa, o imposto de renda de que for sujeito passivo
como contribuinte ou como responsável em substituição do contribuinte; (ii) a pes-
soa jurídica pode deduzir o imposto incidente sobre os rendimentos pagos ou cre-
ditados a terceiros que, como fonte pagadora, tiver o dever legal de reter e recolher;
e (iii) a pessoa jurídica pode deduzir o imposto referido no item anterior, ainda que
tenha assumido o ônus do imposto.
O fundamento destas regras foi esclarecido por BULHÕES PEDRElRA98 com a
precisão e rigor que são timbre deste autor: "Nas incidências do imposto sobre ren-
dimentos em poder da fonte pagadora, a pessoa jurídica que paga o rendimento é
responsável pela retenção e pelo recolhimento do tributo, cujo encargo econômico
é do beneficiário do rendimento. O imposto é - por definição - parte do rendimen-
to pago pela pessoa jurídica, que tem o dever de deduzi-lo e recolhê-lo à União,
ao invés de pagar ao beneficiário o montante total do rendimento. Se, portanto, o
rendimento é dedutível como custo ou despesa operacional, a parte desse rendimento que
é retida e recolhida ao Tesouro também é dedutível. Assim, se a pessoa jurídica paga a
terceiros juros, aluguéis, royalties ou rendimentos do trabalho (assalariado ou au-
tônomo), todo o rendimento é dedutível - tanto a importância líquida paga ao
beneficiário quanto a parcela retida a título de imposto. A situação é diferente se a

97 Por contribuinte entenda -se a pessoa jurídica.


98 efr. Imposto de Renda Pessoa Jurídica, vaI. I, Rio de Janeiro, 451.
Título V I Capo 11 I Residentes no Exterior -u-
pessoa jurídica distribui lucros, dividendos ou participação a administradores, que
não são dedutíveis como custos ou despesas operacionais. A dedutibilidade não é
excluída pelo fato de a pessoa jurídica assumir o ônus do imposto, porque a própria
legislação tributária considera que, neste caso, a pessoa jurídica paga montante de
rendimento bruto que, diminuído do imposto sobre ele calculado, corresponde ao
líquido entregue ao beneficiário".
As referidas regras foram mantidas pelos §§ 2° e 3° do art. 7° da Lei nO 8.541,
de 23 de dezembro de 1992, bem como pelos §§ 2° e 3° do art. 41 da Lei nO 8.981,
de 20 de janeiro de 1995, hoje em vigor, consolidados nos §§ 2° e 3° do art. 344 do
RIR/99, nos seguintes termos:
"2° Na determinação do lucro real, a pessoa jurídica não poderá deduzir como
custo ou despesa o Imposto de Renda de que for sujeito passivo como contri-
buinte ou responsável em substituição ao contribuinte.
"3° A dedutibilidade, como custo ou despesa, de rendimentos pagos ou credi-
tados a terceiros abrange o imposto sobre os rendimentos que o contribuinte,
como fonte pagadora, tiver o dever legal de reter e recolher, ainda que assuma
o ônus do imposto".

(ii) A distinção entre contribuinte) responsável em substituição


do contribuinte e fonte pagadora
Se as referidas regras não suscitam hoje dúvidas relevantes no que concerne
ao imposto de renda na fonte retido sobre a generalidade dos rendimentos pagos a
terceiros residentes no exterior, incluindo os juros, o certo é que algumas resistências
ainda existem quanto ao caso específico do imposto incidente sobre os juros na com-
pra de bens a prazo, previsto no art. 11 do Decreto-Lei nO 401/68.
Tais resistências não passam, porém, de um anacronismo fundado na interpreta-
ção literal da expressão "contribuinte" utilizada por aquele diploma para qualificar o
remetente dos juros, expressão esta que, como já verificamos, não passa de grosseiro
erro técnico, dada a sua incompatibilidade com o conceito de contribuinte do impos-
to de renda, estabelecido em lei complementar.
Já de há muito a evidência do erro não passara despercebida à perspicácia jurí-
dica de AUOMAR BALEEIRO:
"Confusãogrosseira entre contribuinte e responsável ocorreu no Decreto-Lei nO 401/68:
batizou de contribuinte o devedor dos juros quando os remete ao credor deles no
estrangeiro. O mutuário ao remeter os juros fez uma despesa ao invés de auferir
uma disponibilidade. Poderia ser considerado responsável) jamais contribuinte. Nem a
remessa dos juros poderia ser fato gerador ao arrepio do artigo 93, I, do CIN99".

99 efr. Direito Tributário Brasileiro (10 a ed.), Rio de Janeiro 1986,468.


Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

A manifestação mais frisante desta orientação anacrônica100 encontra-se expressa


no Parecer Normativo CST nO 2, de 15 de janeiro de 1980, que afirma:
"O Decreto-Lei nO 1.598, de 26 de dezembro de 1977, em seu art. 16, regulou
diferentemente o assunto, para vedar a dedutibilidade do imposto de renda do
qual a pessoa jurídica seja sujeito passivo. E a pessoa jurídica é sujeito passivo
(Código Tributário Nacional, art. 121) como contribuinte ou como responsável.
"2.1 - Decorre do exposto que não é dedutível, por exemplo, o imposto de ren-
da calculado sobre os lucros da pessoa jurídica, nem o imposto pago sobre o valor
dos juros remetidos para o exterior em razão da compra de bens a prazo (art. 11 do
Decreto-Lei nO 401/68)".
Observe-se que este Parecer Normativo representa incompreensível retrocesso
em relação ao anterior Parecer Normativo CST nO 18, de 25 de abril de 1977, o qual
admitiu a dedutibilidade do imposto sobre juros de financiamento externo para a
compra de bens a prazo a partir de vigência do Decreto-Lei nO 1.351/74.
Muito embora não fundamentado de modo explícito, pode inferir-se que o
Parecer Normativo CST nO 2/80 continuou a basear-se na interpretação literal da
expressão "contribuinte" do Decreto-Lei nO 401/68 para enquadrar a situação na
regra da indedutibilidade do imposto pela pessoa jurídica que dele for sujeito passivo
como contribuinte ou responsável em substituição do contribuinte.
A afirmação do Parecer Normativo CST nO 2/80 é de uma notória superficia-
lidade, pois em momento algum alerta para a impropriedade técnica da expressão
"contribuinte" usada no Decreto-Lei nO 401/68, como também não distinguiu, como
devia, os conceitos de responsável em substituição do contribuinte, usado no § lOdo art.
16 do Decreto-Lei nO 1.598/77 (e hoje no § 2° do art. 41 da Lei nO 8.981/95), e o
de fonte pagadora, usado no § 2° do art. 16 do Decreto-Lei nO 1.598/77 (e hoje no §
3° do art. 41 da Lei nO 8.981/95).
Contribuinte para o art. 16 do Decreto-Lei nO 1.598/77 e para o art. 41 da Lei nO
8.981/95 é (e só pode ser) o titular da disponibilidade jurídica e econômica da renda.
Responsável em substituição do contribuinte, para os mesmos dispositivos legais, é (e
só pode ser) o terceiro que, nos termos do art. 128 do Código Tributário Nacional, deva
assumir a responsabilidade pelo crédito tributário nos mesmos termos e no lugar, ou em
vez, do contribuinte. Responsáveis em substituição do contribuinte são, por exemplo,
os sucessores ou os terceiros, aos quais a legislação do imposto de renda atribui essa fi111-
ção, autorizada pelos artigos 129 e ss. e 134 e ss. do Código Tributário Nacional.
Totalmente distinta é a situação da fonte pagadora, pois neste caso o responsável não
atua no lugar e em vez do contribuinte, pagando o crédito tributário nos precisos termos
em que este os devia pagar, limitando-se a efetuar uma retenção calculada sobre um ren-
dimento que, na condição de devedor, deve pagar a um terceiro, que é o contribuinte.

100 Veja-se, também, HIROMI HIGUCHljet al., Imposto de renda das empresas (25 a ed. l, São Paulo
2000,479.
Título V I Capo 11 I Residentes no Exterior .p.
Ora, se o devedor dos juros de financiamentos para compras de bens a prazo
não é contribuinte (por não ser o titular do rendimento), nem responsável em
substituição do contribuinte, mas simples fonte pagadora, aplica-se de pleno o § 3°
do art. 41 da Lei nO 8.981/95, consolidado no § 3° do art. 344 do RIR/99, se-
gundo o qual "a dedutibilidade, como custo ou despesa, de rendimentos pagos ou
creditados a terceiros abrange o imposto sobre os rendimentos que o contribuinte,
como fonte pagadora, tiver o dever legal de reter e recolher, ainda que assuma o
ônus do imposto".

e) Inexistência de base legal para a vedação de reajustamento

Torna-se igualmente visível o caráter anacrônico da interpretação segundo a


qual, no imposto de renda sobre juros devidos em razão de compras de bens a prazo,
não se pode aplicar o reajustamento.
Com efeito, o art. 703 do RIR/99 dispõe que "está sujeito à incidência do im-
posto de que trata o artigo anterior o valor dos juros remetidos para o exterior, devi-
dos em razão da compra de bens a prazo, ainda quando o beneficiário do rendimento
for o próprio vendedor", acrescentando o § único que, "para os efeitos deste artigo,
consideram-se fato gerador do imposto a remessa para o exterior e contribuinte, o
remetente, não se aplicando o reajustamento de que trata o art. 725".
O art. 725 do mesmo diploma reafirma tal vedação, nos seguintes termos:
"Quando a fonte pagadora assumir o ônus do imposto devido pelo beneficiário, a
importância paga, creditada, empregada, remetida ou entregue, será considerada lí-
quida, cabendo o reajustamento do respectivo rendimento bruto, sobre o qual recairá
o imposto, ressalvadas as hipóteses a que se reftrem os arts. 677 e 703, parágrafo único".
Se bem se reparar, a frase "não se aplicando o reajustamento", ainda hoje cons-
tante do parágrafo único do art. 703 do RIR/99 in fine, não tem qualquer base legal,
não constando do próprio art. 11 do Decreto-Lei nO 401/68, nem de nenhuma lei
posterior.
A pretensa vedação do reajustamento tem vindo a ser mecânica e cegamente re-
petida, sem que a lei, em momento algum, a tivesse afirmado, o que só pode explicar-
se como mais uma distorção da equivocada expressão "contribuinte", em má hora
utilizada pelo art. 11 do Decreto-Lei nO 401/68.
A origem desta arbitrária vedação é muito antiga, provindo do Parecer Nor-
mativo CST nO 116, de 31 de agosto de 1973. Afirma o item 9 desse Parecer que
o Decreto-Lei nO 401/68 "( ... ) elege, na forma autorizada pelo artigo 45, caput, in
fine, do Código Tributário Nacional, o remetente como contribuinte, atribuindo a
este, portanto, o ônus do imposto e, por via de consequência, excluindo o reajusta-
mento de que trata o art. 502 do Regulamento próprio".
Não se vislumbra qualquer lógica na afirmação segundo a qual o fato de o
remetente assumir o ônus do imposto excluir automaticamente a possibilidade de
reajustamento, salvo se se entender que o remetente é o contribuinte.
I • I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Esta vedação de reajustamento viria a ser reiterada na Instrução Normativa nO


70/82, que afirma, in fine, "( ... ) não cabendo reajustamento da base de cálculo, ainda
que o adquirente tenha assumido contratualmente o ônus do imposto".
De cega e mecânica repetição em repetição, chegou ao RIR/99, onde se alojou
(sem qualquer base legal, repita-se) aos arts. 703 e 725.
Trata-se de mera orientação administrativa, que teve sua origem no passado,
onde já foi fruto de interpretação equivocada, mas que se encontra definitivamente
superada desde o momento em que o art. 16, § 2°, do Decreto-Lei nO 1.598/72,
atribuiu alcance geral à regra específica em matéria de juros do art. 8° do Decreto-Lei
nO 1.351/77, e segundo a qual a dedutibilidade do imposto de renda pago a terceiros
residentes no exterior pela fonte pagadora se aplica ainda na hipótese de a fonte pa-
gadora ter assumido o ônus do imposto.
Não é demais recordar a pertinente observação de BULHÕES PEDREIRA, segundo
o qual "a dedutibilidade não é excluída pelo fato de a pessoa jurídica assumir o ônus
do imposto, porque a própria legislação tributária considera que, neste caso, a pessoa
jurídica paga montante de rendimento bruto que, diminuído do imposto sobre ele
calculado, corresponde ao líquido entregue ao beneficiário"lol.
A proibição do reajustamento não é lógica e juridicamente sustentável, porque
de duas uma: ou o imposto sobre juros nas compras de bens a prazo é um imposto de
renda e, então, o devedor dos juros não é contribuinte, mas fonte pagadora, caso em
que se aplica de pleno o § 3° do art. 41 da Lei nO 8.981/95, que permite a dedução do
imposto em ambas as hipóteses de o contribuinte assumir ou não o ônus tributário;
ou, se se recusa o reajustamento, o único fundamento possível reside na qualificação
do devedor dos juros como contribuinte, o que é incompatível com a natureza do
imposto em causa como imposto de renda, pacificamente aceito pelo FisCOl02-103.

E) Convenções contra a dupla tributação: remissão


Quanto ao tratamento tributário dos juros nos tratados contra a dupla tributa-
ção, remete-se para a parte VI deste livro 104 •

101 Cfr. BULHÕES PEDREIRA, Imposto sobre a renda, vaI. I, cit., 451.
102 Isto mesmo foi reconhecido pelo acórdão nO 105-07.072, da 5a Câmara do Primeiro Conse-
lho de Contribuintes (Recurso nO 98.219), que extrai as consequências lógicas da afirmação
nos seguintes termos: "Como visto, não se pode confundir a pessoa jurídica remetente dos
juros de que tratam o artigo 11 e seu parágrafo único do Decreto-Lei nO 401/68 (art. 556 e
§ único do RIR/80) com o contribuinte a que se refere o § IOdo artigo 16 do Decreto-Lei
nO 1598/77 (artigo 225, § 1°, do RIR/80)". Tais conclusões consubstanciaram-se na ementa
do acórdão: "São dedutíveis, na apuração do lucro real, as importâncias pagas a título de im-
posto de renda sobre remessas de juros para o exterior, relativo à compra de bens a praw".
103 Cfr. supra, 490 ss.
104 Cfr. infra, 601.
Título V I Capo 11 I Residentes no Exterior Mpp_
§ 7° JUROS SOBRE CAPITAL PRÓPRIO

A) Natureza substancial de dividendos sujeitos a regime tributário especial


O art. 9° da Lei nO 9.249, de 26 de dezembro de 1995, estabelece que "a pessoa
jurídica poderá deduzir, para efeitos de apuração do lucro real, os juros pagos ou
creditados individualizadamente a titular, sócios ou acionistas, a título de remunera-
ção de capital próprio, calculado sobre as contas do patrimônio líquido e limitados à
variação, pro rata dia, da taxa de juros a longo prazo - TJLP".
A determinação da verdadeira natureza jurídica deste instituto tem sido dificul-
tada pela manifesta impropriedade da expressão "juros sobre o capital próprio". Com
efeito, a remuneração que a pessoa jurídica paga ao seu titular, sócio ou acionista,
não tem a natureza de juro, pela singela razão que o conceito de juro é reservado a
"remunerações direta ou indiretamente referidas à concessão de crédito. Ora, as re-
munerações em causa não têm a sua origem numa operação de crédito, assim enten-
didas aquelas em que existe uma obrigação de restituição de somas entregues a título
de antecipação 1os . E que assim resulta de os pretensos "juros" serem calculados sobre
o patrimônio líquido (art. 178, § 2°, IIl, da Lei das S.A.) e não sobre uma conta do
passivo circulante ou não circulante, como sucederia se tivessem a natureza de juro.
O "juro sobre capital próprio" outra coisa não é que um resultado distribuível da
companhia sujeito a regime fiscal especial, resultado este suscetível de duas destinações
alternativas: distribuição efetiva aos sócios ou capitalização (imediata, por via de
aumento de capital, ou futura, por via de manutenção em reserva destinada a futuro
aumento de capital). No primeiro caso, ocorre a figura do dividendo, regulada nos
arts. 201 e seguintes da Lei das S.A.; no segundo, ocorre a figura do aumento de ca-
pital por capitalização de lucros ou reservas prevista no art. 169 da mesma Lei.
Bem andou, pois, a Deliberação CVM nO 207, de 13 de dezembro de 1996, ao
afirmar "que, no conceito do lucro da lei societária, remuneração de capital próprio,
paga/creditada aos acionistas, configura distribuição de resultado e não despesa",
donde resulta que "os juros pagos ou creditados pelas companhias abertas, a título
de remuneração de capital próprio, na forma do art. 9° da Lei 9.249/95, devem ser
contabilizados diretamente à conta de Lucro Acumulado, sem afetar o resultado do
exercício" .
O § 7° do art. 9° da Lei nO 9.249/95 estabelece que "o valor dos juros pagos ou
creditados pela pessoa jurídica, a título de remuneração de capital próprio, poderá ser
imputado ao valor dos dividendos de que trata o art. 202 da Lei nO 6.404, de 15 de
dezembro de 1976, sem prejuízo do disposto no § 2°". Ora, se o valor dos "juros"
pode ser imputado ao dividendo obrigatório, isso significa que eles próprios têm a
natureza substancial de dividendo.

105 efr. SIMONEITO, I contratti di credito, Pádua 1953, 5755.; GALASSO, Contratti di credito e titoli
bancari, Pádua 1971; FRAGALI, Finanziamento (dir. priv.), Enc. dei Dir. XVII (1963), 605.
-i.I•1 Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier ._-_.._•• _ _ _ _......

Na figura em causa não ocorre em momento algum pagamento de juros em


sentido próprio. A taxa de juros de longo prazo é apenas um dos parâmetros para
o cálculo de importância dedutível para efeitos fiscais, -p<lrâmetro esse calculado sobre
as contas do patrimônio líquido (art. 9° caput, da Lei na 9.249/95), esclarecendo o
§ 2 0 do art. 29 da Instrução Normativa na 11/96 que, "para os fins do cálculo da
remuneração prevista neste artigo, não será considerado, salvo se adicionado ao lucro
líquido, para efeito de determinação do lucro real e de base de cálculo da Contribui-
ção Social sobre o lucro, o valor: a) da reserva de reavaliação de bens e direitos da
pessoa jurídica; b) da reserva especial de que trata o art. 428 do RIR/94".
Por outras palavras: a taxa de juros de longo prazo e o valor de patrimônio
líquido são apenas fatores para a determinação do limite máximo da dedução fiscal, mas
não são a fonte de que provêm as remunerações em causa, que são as fontes de que
se originam os resultados distribuíveis (lucros do exercício, lucros acumulados e re-
servas de lucros).
A dedutibilidade fiscal dos lucros distribuíveis (pagos como dividendos ou uti-
lizados para capitalização) está, pois, sujeita a um duplo limite: dela só podem bene-
ficiar os lucros (i) que não excedam a 50% dos lucros distribuíveis 106 ; e (ii) que não
excedam o limite decorrente de aplicação de taxa de juros a longo prazo sobre as
contas do patrimônio líquido.
O regime fiscal estabelecido pelo art. 9° da Lei nO 9.249/95 é, pois, um regime
fiscal opcional para os lucros distribuíveis que se enquadram no duplo limite atrás re-
ferido. Se os lucros efetivamente distribuídos ou capitalizados não excederem o duplo
limite atrás referido, a sua totalidade pode beneficiar-se da dedução fiscal, muito embo-
ra o contribuinte possa optar por submeter apenas parte ao regime de dedutibilidade,
ficando a outra parte sujeita ao regime comum. Se os lucros efetivamente distribuídos
ou capitalizados excederem o duplo limite, só poderão beneficiar da dedução fiscal até
o referido limite, ficando no remanescente sujeitos ao regime tributário geral.
É importante notar que o regime da dedução fiscal abrange tanto os lucros efe-
tivamente distribuídos a título de dividendos com os lucros destinados a aumento de
capital. A única diferença no tratamento tributário destes dois casos está em que, no
primeiro, o imposto de renda incidente na fonte será objeto de retenção por ocasião
do pagamento ou crédito aos beneficiários, enquanto no segundo ele é considerado
como ônus assumido pela pessoa jurídica, não sendo reajustável a base de cálculo
nem dedutível o imposto para efeitos de determinação de base do cálculo do imposto
de renda e da contribuição social sobre o lucro (art. 9°, § 9 0 , da Lei nO 9.249/95).
É também importante salientar que o regime de dedução fiscal é aplicável a todo
e qualquer tipo de dividendo distribuído, seja ele um dividendo percentual ou fixo,

106 Dispõe o § lOdo art. 9° da Lei 9.249(95, na redação do art. 78 da Lei 9.430/96, que "o
efetivo pagamento ou crédito dos juros fica condicionado à existência de lucros, computados
antes da dedução dos juros, ou de lucros acumulados e reservas de lucros, em montante igual
ao valor de duas vezes os juros a serem pagos ou creditados".
Título V I Capo 11 I Residentes no Exterior IB

facultativo ou obrigatório, máximo ou mínimo, e seja ele distribuído a todos os sócios


ou acionistas ou apenas a alguma ou algumas classes, notadamente preferenciais.
O regime fiscal opcional dos lucros distribuídos na forma de "juros sobre capital
próprio" caracteriza-se, pois, pela consideração (i) de que são dedutíveis W3. pessoa
jurídica que os paga, até certo limite, a título de despesa financeira; (ii) de que são
tributáveis na pessoa jurídica que os recebe, a título de receita financeira; e (iii) de
que são sujeitos a uma retenção na fonte, por ocasião de seu crédito ou pagamento,
retenção esta compensável com o imposto devido na declaração pela pessoa jurídica
tributável com base no lucro real ou com o imposto de renda na fonte sobre os lucros
que posteriormente redistribuir aos seus sócios a título de "juros sobre o capital pró-
prio" (e definitiva nos demais casos) (§ 3° e § 6° do art. 9° da Lei nO 9.249/95).
Este regime é totalmente distinto do regime geral dos lucros ou dividendos em
relação aos quais não seja ou não possa ser exercida a opção pelo regime especial e
que se caracteriza pela (i) indedutibilidade na pessoa jurídica que os distribui; (ii)
não integração na base de cálculo do imposto de renda do beneficiário, pessoa física
ou jurídica, domiciliado no País ou no exterior; e (iii) não sujeição a imposto de
renda na fonte (art. 10 da Lei nO 9.249/95).
Concluímos assim no sentido de que o art. 9° da Lei nO 9.249/95 não criou uma
nova figura jurídica de direito privado, tendo-se limitado a estabelecer um regime
fiscal opcional, até certo limite, dos lucros distribuíveis pela pessoa jurídicalO7 •
O art. 9° da Lei nO 9.249/95 não define especificamente qual o regime aplicável
aos residentes no exterior, mas a sua sujeição à retenção na fonte à alíquota de 15%
(art. 28 da Lei nO 9.249/95) decorre de cláusula geral constante do art. 685 do RIR,
segundo o qual estão sujeitos àquela alíquota a renda e os proventos de qualquer na-
tureza proveniente de fontes situadas no País quando percebidas pelas pessoas físicas
ou jurídicas residentes ou domiciliadas no exterior, "quando não tiverem tributação
específica", o que é precisamente o caso dos juros sobre capital próprio 108 •

B) Convenções contra a dupla tributação


Quanto ao tratamento tributário dos juros sobre capital próprio nos tratados
contra a dupla tributação, remete-se para o título VI deste livro J09 .

107 HELENO TAVElRA TÔRRES, Juros sobre capital próprio - Autonomia privada nos investi-
mentos societários e suas implicações em matéria tributária, RlDT 5 (2006),33; CRISTINA
CEZAR BASTIANELLO, Juros sobre o capital próprio. Natureza jurídica e tratamento conferido
pela lei interna e pelos tratados para evitar dupla tributação internacional firmados pela Re-
pública, in HELENa TAVElRA TÔRRES (org.), Direito Tributário IntemacionalAplicado, vaI. 111,
São Paulo 2005, 72l.
108 Cfr. a art. 13 da Instrução Normativa na 252/02. Caso os pagamentos sejam efetuados a
pessoa domiciliada em país de tributação favorecida, a alíquota é de 25 %.
109 Cfr. infra, 607.
-i". Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

§ 8° SERVIÇOS EM GERAL

A) Natureza dos pagamentos de serviços não pessoais


A plena compreensão da problemática relativa à tributação das prestações inter-
nacionais de serviços pressupõe a distinção prévia entre serviços pessoais - prestados
por pessoas físicas - e serviços não pessoais - prestados por pessoas jurídicas ou entida-
des a elas equiparadas, em regime de empresa.
A remuneração dos primeiros é considerada rendimento do trabalho, dependen-
te ou autônomo, conforme a existência ou não de uma relação de emprego, incluída
no imposto de renda das pessoas físicas.
Já no que toca, porém, ao pagamento dos serviços não pessoais, prestados em
regime de empresa, por pessoas jurídicas domiciliadas no exterior, não é aplicável a
conceituação como rendimento do trabalho, uma vez que a este é inerente a ligação
a uma entidade individual, subjetiva, personalizada.
O fenômeno tem natureza substancialmente idêntica à de uma importação de
bens ou mercadorias. Quanto a estas jamais se confundiu o pagamento do preço da
coisa importada com renda, pelo que nunca se pretendeu a incidência do imposto de
renda relativamente ao valor da importação.
Na verdade, uma coisa é "renda" - que corresponde a uma remuneração de um
fator de produção - outra coisa é "pagamento de capital", que corresponde a uma
transação que envolve troca de bens que integravam previamente o patrimônio das
partes em presença.
O produto da venda de bens não é renda, mas receita bruta operacional. A renda
- a haver - resultará da diferença entre as receitas das vendas e os custos ou perdas
necessários à produção dos bens vendidos, consistindo no lucro líquido tributável.
É certo que dentro do preço pago pela mercadoria importada, além dos custos
de produção, pode haver parcela de lucro realizado pela pessoa que, no exterior,
exporta essa mercadoria. Mas tal lucro resulta da produção de mercadoria no estran-
geiro, constituindo renda de fonte externa, obtida no exterior.
Isto - que nunca foi posto em causa quanto à importação de mercadorias - é
igualmente aplicável no que respeita à importação de serviços prestados por pessoas
jurídicas domiciliadas no exterior, em relação à qual o preço corresponde a um "paga-
mento de capital", a uma "receita bruta", provento ou ganho da empresa exportadora
e não a um "rendimento" atribuível a um fator de produção.
O fato de grande parte dos custos de produção das empresas estrangeiras pres-
tadoras de serviços ser constituída por salários pagos aos seus técnicos, também re-
sidentes no estrangeiro, em nada altera a identidade de natureza entre pagamento de
preço de importação de bens e pagamento de preço de importação de serviços, pois
não é possível confundir o "preço" - que é pagamento de capital recebido pela pes-
soa jurídica domiciliada no estrangeiro - com o "salário" que os empregados desta
recebem no exterior e que aí está sujeito a imposto.
Título V I Capo 11 I Residentes no Exterior Iu

Daqui resulta que o "preço" pago pela prestação de serviços (tal como o pre-
ço pela importação de mercadorias) não constitui renda, mas mera receita bruta,
pagamento de capital, da empresa estrangeira. A verdadeira renda será o eventual
"lucro" da empresa estrangeira e este só pode ser apurado no estrangeiro, em face
da comparação entre a totalidade das suas receitas operacionais e a totalidade dos
seus custos e despesas~
Os preços de venda de mercadorias e serviços constituem rendimentos de empresa
ou rendimentos comerciais, que só devem ser tributados de forma sintética no país de
domicílio do vendedor (salvo se este agir no outro país através de um estabelecimen-
to permanente) e não de uma forma analítica ou isolada, por retenção na fonte, no
país em que se localiza a fonte pagadora.

B) A tributação dos serviços na lei interna

a) O período anterior ao Decreto-Lei nO 1.418/75

Anteriormente à publicação do Decreto-Lei nO 1.418, de 3 de dezembro de


1975, discutiu-se energicamente a questão de saber se seriam tributáveis no Brasil
os pagamentos efetuados a residentes no exterior em razão de serviços totalmente
executados no exterior I 10 •
A razão de ser da dúvida resulta da própria ambiguidade da expressão "fonte",
pois - como já atrás se referiu - ela pode ser e é adotada no duplo sentido de "fonte
de produção" e de "fonte de pagamento". Ora, enquanto uns - como o antigo DIR
- sustentavam que para a tributação no Brasil era suficiente que a remessa para o seu
pagamento fosse realizada no Brasil, a doutrina e a jurisprudência então prevalecen-
tes davam preponderância ao critério econômico da fonte de produção. Segundo esta
corrente, identificando-se aquela com o local da prestação de serviços e sendo estes
integralmente realizados no exterior, não poderia haver tributação no Brasil, por os
rendimentos em causa não serem imputáveis a fontes aqui localizadas.
Foi de tal modo preponderante esta última orientação que a Súmula 585 do Su-
premo Tribunal Federal estabeleceu: "Não incide o imposto de renda sobre a remessa
de divisas para o pagamento de serviços prestados no exterior, por empresa que não
opera no Brasil".
Aliás, o próprio Fisco conformou-se com este entendimento, estabelecendo a
Portaria do Ministro da Fazenda nO 184, de 8 de junho de 1966, que "se os serviços

IlO Sobre o problema em face da anterior legislação, ver o exaustivo parecer de GILBERTO DE
ULHÔA CANTO, dado em 1967, mas revisto e publicado 110 volume Estudos e pareceres de
Direito Tributá/ia, 53 ss. Ver também EGBERTO LACERDA TEIXEIRA, Regime jurídico·fiscal da
tecnologia estrangeira no Brasil, Revista Forense 244 (1973), 346 (353 ss.); RUBENS GOMES
DE SOUSA, Pareceres - Imposto de Renda, lI, 51 ss.
a I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

previstos ( ... ) forem vendidos por empresas domiciliadas no exterior que não pos-
suam dependência no país e sejam produzidos pelas empresas vendedoras mediante
atividade exercida exclusivamente no exterior, o preço pago na importação do serviço
não constitui rendimento sujeito à tributação do imposto de renda". Certo é, porém,
que a referida Portaria subordinava a sua aplicação a certos requisitos substanciais
- os serviços constarem de uma enumeração taxativa - e formais - serem objeto de
contrato aprovado pelo Banco Central do Brasil.
Era correta a solução da Portaria nO 184/66, pois só o exercício no país da ati-
vidade de prestação de serviços, através de estabelecimento permanente, permite a
tributação de um "lucro de empresa" ou "rendimento de empresa" resultante da
comparação entre a totalidade das receitas e dos custos e despesas. Ao invés, se os
pagamentos efetuados se destinam a retribuir serviços realizados no exterior, eles
têm a natureza de preço, de receita operacional da empresa estrangeira, mas não de
rendimento.

b) O art. 6° do Decreto-Lei nO 1.418/75

o Decreto-Lei nO 1.418, de 3 de setembro de 1975, que outorgava diversos


incentivos fiscais a entidades domiciliadas no país que realizam venda de serviços
ao exterior, contém uma disposição - o seu art. 6° - nos termos da qual "o imposto
de 25% de que trata o art. 77 da Lei nO 3.470, de 28 de novembro de 1958, incide
sobre os rendimentos de serviços técnicos e de assistência técnica, administrativa e
semelhante derivados do Brasil e recebidos por pessoas físicas ou jurídicas residentes
ou domiciliadas no exterior, independentemente da forma de pagamento e do local e data
em que a operação tenha sido contratada) os serviços executados ou a assistência prestada».
Entretanto, a Portaria nO 184/66 era revogada pela Portaria nO 347, de 9 de setembro
de 1975.
Tornando irrelevante o local da prestação dos serviços em causa, passou a per-
mitir-se que o Brasil tribute serviços técnicos e de assistência técnica, administrativa
e semelhantes prestados no exterior, desde que o rendimento que os remunera seja
derivado do Brasil) isto é, pago por pessoas residentes ou domiciliadas no Brasil.
Retornou-se assim à antiga interpretação do DIR que defendia, em homena-
gem ao conceito de fonte do pagamento) a tributabilidade de tais proventos sempre
que pagos mediante remessa feita do Brasil, arvorando em "elemento de conexão"
com a ordem jurídica brasileira, não o lugar da produção do rendimento, mas o lugar
da origem dos fundos que irão remunerar os serviços.
Em face do disposto no art. 6° do Decreto-Lei nO 1.418/75 (consolidado no
art. 708 do RIR), a jurisprudência passou a considerar superada a Súmula 585,
considerando tributáveis na fonte os pagamentos devidos por prestação de serviços,
ainda que totalmente executados no exterior, notadamente serviços de advogado, de
agenciamento de compras, de projetos de engenharia, de noticiário jornalístico, de
transporte internacional, de turismo, de informações financeiras.
Título V I Capo 11 I Residentes no Exterior IB

Certo é, porém que, menos de seis meses decorridos da publicação do Decreto-


Lei nO 1.418/75, um novo diploma veio, ao menos em parte, retomar a linha da
tradição jurídica neste domínio, atenuando a fórmula, provisoriamente tentada, fun-
dada na ideia de fonte de pagamento, para regressar à técnica baseada no conceito de
fonte de produção.
Trata-se do Decreto-Lei nO 1.446, de 13 de fevereiro de 1976, que reafirma
a isenção do imposto de renda retido na fonte relativo aos rendimentos recebidos
do Brasil por residentes ou domiciliados no exterior correspondentes aos serviços a
que se refere o seu art. 2°, se preenchidos determinados requisitos, a saber: a) serem
prestados exclusivamente no exterior; b) serem contratados a preço certo ou a preço
baseado em custo demonstrado; c) serem relativos a projetos de relevante interesse
nacional, que tenham sido aprovados pelo Conselho de Desenvolvimento Industrial,
ou por outro órgão de desenvolvimento regional ou setorial da União; d) serem de-
correntes de contratos averbados no Instituto Nacional de Propriedade Industrial e
registrados no Banco Central do Brasil.
Por sua vez, a lista dos serviços a que se aplica o mencionado diploma e que
consta do seu art. 2° reproduz ipsis literis o rol já constante do inciso I da Portaria nO
184, de 8 de junho de 1966.
Todavia, o regime isencional do Decreto-Lei nO 1.446/76 foi objeto de revo-
gação expressa pelo art. 32 do Decreto-Lei nO 2.433/88, pelo que vigora hoje na
plenitude o art. 6° do Decreto-Lei nO 1.418, de 3 de novembro de 1975.
Em nosso entender tem sido atribuída ao art. 6° do Decreto-Lei nO 1.418/75
uma amplitude que ele não comporta, ou seja, de uma pretensão de tributação dos
serviços em geral, quando na verdade, pela sua própria formulação literal, ele abran-
ge apenas "serviços técnicos e de assistência técnica, administrativa e semelhantes".
Os demais serviços não abrangidos neste conceito não eram, em nossa opinião,
tributáveis, pois, como vimos, o respectivo pagamento não configura verdadeira ren-
da tributável do residente no exterior (apenas determinável no exterior em face da
comparação entre receitas e despesas) mas apenas preço, de idêntica natureza ao pre-
ço de importação de mercadoria estrangeira.
A norma do art. 6° do Decreto-Lei nO 1.418/75 reveste, por conseguinte, a na-
tureza de uma nonna excepcional, devendo aplicar-se nos seus precisos termos apenas
ao círculo restrito de serviços a que se refere.
E que serviços são esses? Como adiante veremos mais detalhadamente, trata-se
de serviços que têm caráter complementar ou instrumental em relação a contratos de
transferência de capital tecnológico, como é o caso dos contratos de know how. Ora, é
precisamente o caráter complementar ou instrumental desses serviços que conduziu
o legislador e dar-lhes o mesmo tratamento tributário da remuneração principal,
royalty, sujeita à retenção na fonte, e não o tratamento tributário de puro serviço,
apenas tributável no país de domicílio do prestador. Como é precisamente a mesma
razão que levou algumas convenções contra a dupla tributação celebradas pelo Brasil
a incluir expressamente, por via de protocolo, no conceito de royalties os serviços
Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

técnicos e de assistência técnica, precisamente os mesmos a que se refere o art. 6° do


Decreto-Lei nO 1.418/75 111 •
Entendemos, assim, que em relação aos demais serviços, situados fora do círculo
restrito dos serviços complementares e instrumentais de operações de transferência
de tecnologia, não incidia imposto de renda na fonte no Brasil ll2 .

c) O art. 7' da Lei nO 9.779/99


A incidência do imposto de renda na fonte sobre a generalidade dos serviços
- que não apenas os de serviços técnicos e de assistência técnica, administrativa e
semelhantes - viria, porém, a ser instituída pela Lei nO 9.779, de 19 de janeiro de
1999, cujo art. T determina que "os rendimentos do trabalho, com ou sem vínculo
empregatício, e os da prestação de serviços, pagos, creditados, entregues, emprega-
dos ou rendimentos a residentes ou domiciliados no exterior sujeitam-se à incidência
do imposto de renda na fonte à alíquota de 25%".
Não se vislumbra em que critério assenta a discriminação que conduz a que os
rendimentos do trabalho estejam sujeitos a um regime fiscal mais oneroso que o dos
rendimentos do capital fmanceiro, tecnológico e empresarial.

C) Convenções contra a dupla tributação: remissão

A questão de saber qual o regime de tributação dos serviços prestados por re-
sidentes nos países que tenham celebrado tratados contra a dupla tributação com o
Brasil será examinada quando estudarmos o conceito de "lucro de empresa", pelo
que nos limitamos aqui a esta singela remissão.

§ 9° SERVIÇOS TÉCNICOS, DE ASSISTÊNCIA TÉCNICA


E ADMINISTRATIVA E ROYALTIES

A) As alíquotas aplicáveis
Como atrás se viu, a lei previa especificamente a incidência do imposto de renda
na fonte sobre a remuneração de serviços técnicos e de assistência técnica, admi-
nistrativa e semelhantes, a alíquota idêntica à da generalidade dos rendimentos de
residentes no exterior.

lU efr. infra, 625 ss.


112 Bem andou, pois, o Ac. uno da 2 a T do STJ em 24.10.96 - R. Esp. 51.725- 7-SP (DJU
09.12.96, pp. 49.240) ao decidir que não incide o imposto de rcnda sobre a remessa de divi-
sas para o pagamento de "serviços noticiosos", por não se incluírem no conceito de serviços
técnicos e de assistência técnica, administrativa e semelhantes.
Título V I Capo 11 I Residentes no Exterior .i,t_

Quando a Lei nO 9.249/95 procedeu à redução dessa alíquota de 25% para


15% discutiu-se se, em relação aos serviços atrás referidos, se deveria aplicar a nova
alíquota geral ou se, pelo contrário, eles ficariam submetidos à alíquota especial de
25%, entretanto instimída pelo art. 7° da Lei nO 9.779/99 no que concerne aos ser-
viços em geral.
Na versão original do Decreto nO 3.000, de 26 de março de 1999, que aprovou
o Regulamento do Imposto de Renda, o Poder Executivo interpretou que se manti-
nha inalterada a alíquota de 15%. No entanto, na sua republicação de 17 de junho de
1999, o Decreto nO 3.000 passou a considerar que a alíquota aplicável a tais serviços
seria a de 25% (art. 708).
Por sua vez, no que concerne aos royalties há que observar que conquanto não
tenham sido, por lei, considerados exceção à regra geral da alíquota de 15 %, a verdade
é que o Ato Declaratório (Normativo) nO 5, de P de março de 1996, sem qualquer
fundamento legal, afirmou "( ... ) que estão sujeitas ao imposto de renda na fonte, à
alíquota de 25% (vinte e cinco por cento), as importâncias pagas, remetidas, credi-
tadas, empregadas ou entregues a residente ou domiciliado no exterior, por fonte
pagadora localizada no País, a titulo de pagamento de royalties, tais como os decor-
rentes da exploração de patentes de invenção, de modelos, desenhos industriais, uso
de marcas ou propagandas".
A ausência de fundamento legal do referido Ato Declaratório veio a ser reco-
nhecida pela Medida Provisória nO 1.459, de 21 de maio de 1996, que, para dissipar
definitivamente as dúvidas que suscitou tal ato administrativo, estabeleceu no seu
art. 3° que: "Fica reduzida para quinze por cento a alíquota do imposto de renda
incidente na fonte sobre as importâncias pagas, creditadas, entregues, empregadas ou
remetidas para o exterior a título de royalties de qualquer namreza".
Note-se que a expressão fica reduzida, resultante do contexto atrás referido, man-
teve-se nas demais reedições da Medida Provisória em causa, até à reedição nO 2.159-
70, de 24.8.2001, assim constando também do art. 710 do Regulamento do Imposto
de Renda, aprovado pelo Decreto nO 3.000, de 26 de março de 1999 (RIR/99).

B) A previsão da instituição de contribuição de intervenção no domínio econômico


(CIDE-Remessas) e a redução da aliquota do imposto de renda na fonte

a) A incidência da CIDE - Remessas


Em 30 de novembro de 2000, foi publicada a Medida Provisória nO 2.062-60 113
(reedição, sob nova numeração, da Medida Provisória nO 1.943-59/00), que acres-

113 As Medidas Provisórias nO, 2.062-61 e 2.062-62, respectivamente, de dezembro de 2000


e de janeiro de 2001, reproduziram, na íntegra, o art. 3° da Medida Provisória nO 2.062-
60/00. Tal Medida Provisória foi reeditada com o nO 2.159-70, de 24.8.01.
.1":_ Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

centou um § 1° ao art. 3°, prevendo um aumento da alíquota do imposto de renda


na fonte de residentes no exterior sobre royalties de 15% para 25% quanto a fatos
geradores ocorridos a partir de 1° de janeiro de 2001.
Dispôs, na verdade, referido preceito que: "Fica reduzida para quinze por cen-
to a alíquota do imposto de renda incidente na fonte sobre as importâncias pagas,
creditadas, entregues, empregadas ou remetidas ao exterior a título de royalties) de
qualquer natureza", acrescentando o § lOque, "relativamente aos fatos geradores
ocorridos a partir de 1° de janeiro de 2001, a alíquota de que trata o caput passa a ser
de vinte e cinco por cento".
Por seu turno, o § 2° do mesmo art. 3° aludiu, pela primeira vez, à projetada
instituição de uma contribuição da intervenção no domínio econômico, nos seguin-
tes termos: '1\. alíquota referida no parágrafo anterior e a aplicável às importâncias
pagas, creditadas, entregues, empregadas ou remetidas para o exterior a título de
serviços técnicos e de assistência técnica, administrativa e semelhantes, será reduzida
para quinze por cento, na hipótese de instituição de contribuição de intervenção no
domínio econômico incidente sobre essas mesmas importâncias".
Assim, caso viesse a ocorrer a instituição deste novo tributo, esta teria por efei-
to automático uma redução (para 15%) da alíquota do imposto de renda na fonte
(entretanto agravada para 25%), incidente sobre as importâncias pagas, creditadas,
entregues, empregadas ou remetidas ao exterior (i) a título de royalties de qualquer
natureza, bem como (ii) a título de serviços técnicos e de assistência técnica) administra-
tiva ou semelhantes.
Acrescentava o § 3° do referido art. 3° que a redução da alíquota do imposto de
renda na fonte aplicar-se-ia a partir do início da cobrança da referida contribuição, que viria
efetivamente a ser instituída por lei que entrou em vigor em 1° de janeiro de 2001.
Com efeito, em 29 de dezembro de 2000, foi publicada a Lei nO 10.168, cujo
art. l° instituiu "( ... ) o Programa de Estímulo à Interação Universidade-Empresa
para o Apoio à Inovação, cujo objetivo principal é estimular o desenvolvimento
tecnológico brasileiro, mediante programas de pesquisa científica e tecnológica coo-
perativa entre universidades, centros de pesquisa e o setor produtivo".
O art. 2° da Lei nO 10.168/00, dispôs que:
"Para fins de atendimento ao Programa de que trata o artigo anterior, fica ins-
tituída contribuição de intervenção no domínio econômico, devida pela pessoa
jurídica detentora de licença de uso ou adquirente de conhecimentos tecnológi-
cos, bem como aquela signatária de contratos que impliquem transferência de
tecnologia, firmados com residentes ou domiciliados no exterior.
"§ 1° Consideram-se, para fins desta Lei, contratos de transferência de tecno-
logia os relativos à exploração de patentes ou de uso de marcas e os de forneci-
mento de tecnologia e prestação de assistência técnica.
"§ 2° A contribuição incidirá sobre os valores pagos, creditados, entregues, em-
pregados ou remetidos, a cada mês, a residentes ou domiciliados no exterior, a
título de remuneração decorrente das obrigações indicadas no caput deste artigo.
Título V I Capo 11 I Residentes no Exterior I !lfml

"§ 3° A alíquota da contribuição será de dez por cento.


"§ 4° O pagamento da contribuição será efetuado até o último dia útil da quin-
zena subsequente ao mês de ocorrência do fato gerador".
A Medida Provisória nO 2.062-63, de 23 de fevereiro de 2001 11 \ ftxou dire-
tamente a alíquota do imposto de renda na fonte em 15%, sem qualquer alusão
explícita a um prévio aumento para 25%, seguido de redução automática, tal como
inicialmente previsto no art. 3° da Medida Provisória nO 2.062-60/00, nos seguintes
termos: «Fica reduzida para quinze por cento a alíquota do imposto de renda incidente
na fonte sobre as importâncias pagas, creditadas, entregues, empregadas ou remeti-
das ao exterior a título de remuneração de serviços técnicos e de assistência técnica,
e a título de royalties, de qualquer natureza, a partir do início da cobrança da contri-
buição instituída pela Lei nO 10.168, de 29 de dezembro de 2000".
A CIDE-Remessas foi, como se disse, criada com a finalidade de custear o apoio
à inovação, sendo os seus recursos destinados ao Fundo Nacional de Desenvolvimen-
to Científico e Tecnológico (art. 4°).
O domínio econômico sobre o qual recai a CIDE-Remessas é, pois, a área tec-
nológica tal como definida pela própria finalidade e domínio econômico a que res-
peita, donde pode concluir-se que a sua incidência está limitada àqueles negócios que
tenham conteúdo tecnológico e pelos quais se verifica a transferência de tecnologia.
E é isso que expressamente prevê o caput do art. 2° da Lei nO 10.168/00, se-
gundo o qual a contribuição é devida pela detentora de licença de uso ou adquirente de
conhecimentos tecnológicos, bem como aquela signatária de contratos que impliquem trans-
ferência de tecnologia, contratos esses que o parágrafo lOdo referido artigo tratou de
definir de forma limitativa como contratos de transferência de tecnologia os relativos à
exploração de patentes ou de uso de marcas e os de fornecimento de tecnologia e prestação de
assistência técnica.
Visando corrigir a limitação inicial contida no referido parágrafo lOdo art. 2°
da Lei nO 10.168/00, a Lei nO 10.332/01 deu nova redação ao parágrafo 2° daquele
artigo, acrescentando-lhe outros negócios pelos quais tipicamente se transfere tecno-
logia, a saber:
"A partir de ro de janeiro de 2002, a contribuição de que trata o caput deste arti-
go passa a ser devida também pelas pessoas jurídicas signatárias de contratos que

114 A Medida Provisória nO 2.062-63 teve na Medida Provisória nO 2.159-70, de 24 de agosto


de 2001, sua última reedição, pois com a promulgação da Emenda Constitucional nO 32, de
11 de setembro de 2001, "as medidas provisórias editadas em data anterior à da publicação
desta emenda continuam em vigor até que medida provisória ulterior as revogue explicita-
mente ou até deliberação definitiva do Congresso Nacional" (art. 2°). Como não houve nem
revogação expressa da Medida Provisória nO 2.159-70/01, nem deliberação definitiva a seu
respeito pelo Congresso Nacional, a eficácia dos seus arts. 3° e 4° permaneceu "congelada",
pelo que se manteve em vigor a redução da alíquota do imposto de renda na fonte sobre
serviços técnicos e de assistência técnica e royalties de qualquer natureza para 15%.
n I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

tenham por objeto serviços técnicos e de assistência administrativa e semelhantes a serem


prestados por residentes ou domiciliados no exterior, bem assim pelas pessoas
jurídicas que pagarem, creditarem, entregarem, empregarem ou remeterem royal-
ties, a qualquer título) a beneficiários residentes ou domiciliados no exterior".
Por sua vez, a mesma Lei, no seu art. 7°, estendeu a redução da alíquota do impos-
to de renda na fonte para 15% aos "serviços de assistência administrativa e semelhan-
tes", com fundamento na necessidade de fazer coincidir a base de incidência do imposto
de renda com a da CIDE, de modo a legitimar a concomitante redução do mesmo ll5 .
Com efeito, desde o início, a incidência da CIDE e a do imposto de renda na
fonte sobre residentes no exterior sempre tentaram andar atreladas, emparelhadas,
"de mãos dadas". Por um lado, a redução da alíquota do imposto de renda na fonte
ficou, desde a origem, condicionada à cobrança da CIDE. Por outro lado, quando
novas realidades passaram a estar sujeitas à CIDE (como é o caso dos serviços téc-
nicos e de assistência administrativa e semelhantes), o imposto de renda na fonte
incidente sobre os mesmos foi concomitantemente reduzido.
O alargamento da incidência aos contratos de serviços técnicos e de assistência adminis-
trativa e semelhantes resulta de estes serem negócios de conteúdo tecnológico, pelos quais
usualmente ocorre a transferência de tecnologia. E tanto assim é que também para fms
do imposto de renda estão eles sujeitos a regime tributário idêntico ao dos contratos de
assistência técnica (art. 708 do RIR), e nas convenções internacionais para evitar a dupla
tributação celebradas pelo Brasil as suas remunerações são qualificadas como royalties.
Já os royalties a que a lei alude correspondem a uma espécie de rendimento pela
qual se remuneram direitos de pesquisa e de uso ou exploração de invenções, proces-
sos e fórmulas de fabricação, que têm indubitavelmente natureza científica e tecnoló-
gica, justificando-se assim a an1pliação da hipótese de incidência da CIDE-Remessas.
A verdade, porém, é que o termo royalties não se limita a designar direitos de
natureza exclusivamente tecnológica, pois se aplica também a outros direitos que não
possuem qualquer conteúdo tecnológico ou científico, como é o caso dos direitos
autorais. Como o § 2° do art. 2° da Lei nO 10.168/00 emprega a expressão "royalties,
a qualquer título", poderia interpretar-se que neles estariam incluídos os direitos au-
torais, pois estes são assim classificados na legislação do imposto de renda (art. 22 da
Lei nO 4.506/64) que assim dispõe:
"Serão classificados como royalties os rendimentos de qualquer espécie decor-
rentes do uso, fruição, exploração de direitos, tais como:
a) direito de colher ou extrair recursos vegetais, inclusive florestais;
b) direito de pesquisar e extrair recursos minerais;
c) uso ou exploração de invenções, processos e fórmulas de fabricação e de mar-
cas de indústria e comércio;

115 Veja Exposição de Motivos. InterministeriaJ nO 005/MCT/MF, item 10.


Título V I Capo " I Residentes no Exterior Ip

d) exploração de direitos autorais) salvo quando percebidos pelo autor ou criador do


bem ou obra".
Ora, se é certo que os direitos autorais se qualificam como royalties, salvo quan-
do percebidos pelo autor ou criador do bem ou obra, nada na sistemática das CIDEs
permite concluir que o termo "royalties, a qualquer título", contido no parágrafo 2°
do art. 2° da Lei nO 10.168/00, designa todo e qualquer rendimento desta espécie,
ainda que desprovido de conteúdo tecnológico.
Tal interpretação não se apoia em qualquer razão lógica, pois pretende consi-
derar como fato gerador do tributo situação que se encontra flagrantemente fora do
domínio econômico a que respeita a CIDE-Remessas. Tenha-se sempre presente que
o fundamento da criação deste programa foi precisamente a necessidade de investi-
mentos e desenvolvimento tecnológico do Brasil, como, aliás, expresso na exposição
de motivos da referida Lei 1l6 .
Não é por outra razão que a CIDE-Remessas tem como fato gerador contratos
de fornecimento de tecnologia e prestação de assistência técnica, serviços técnicos e
de assistência administrativa e semelhantes, todos negócios que, como atrás se viu, se
inserem no domínio tecnológico.
O mero fato de o rendimento pago em contrapartida de um direito autoral se
qualificar como royalty para fins da legislação do imposto de renda não é, pois, su-
ficiente para que sobre tais rendimentos incida a CIDE-Remessas, uma vez que os
negócios tendo por objeto direitos autorais não têm conteúdo tecnológico) nem implicam
a transferência de tecnologia. Portanto, quando o parágrafo 2° do art. 2° da Lei nO
10.168/00 utiliza o termo royalties, a qualquer título) está se referindo logicamente
àquelas espécies de royalties relativas a negócios com conteúdo tecnológico, seja qual

116 "5 - Considerando-se os atuais cenários nacional e internacional de investimentos em pes-


quisa e desenvolvimento de novos produtos ou processos de fabricação, cabe ressaltar a
relevância e a importância do País dispor de instrumentos legais e eficazes para o apoio à
capacitação tecnológica das empresas. ( ... )
"14 - Dentro desse contexto, a presente proposta de Projeto de Lei tem por objetivo criar o
Programa de Estímulo à Integração Universidade-Empresa para o Apoio à Inovação, con-
forme dispõe o seu art. 1°.
"15 - No seu art. 2°, destina recursos para o financiamento de programas e projetos coo-
perativos entre universidades/institutos de pesquisa e empresas, voltados para a inovação de
produtos e processos, mediante a transferência dos mesmos ao Fundo Nacional de Desen-
volvimento Científico c Tecnológico - FNDCT. (... )
"17 - Os dispositivos concebidos neste Projeto de Lei complementam de forma significativa
os atuais instrumentos de apoio ao desenvolvimento tecnológico das cadeias produtivas e,
uma vez articulados com outros mecanismos já utilizados na promoção e estímulo do Setor,
certamente ajudarão as empresas brasileiras a atingir níveis tecnológicos mais compatíveis
com aqueles existentes nos demais países - com os quais competimos - constituindo-se, sem
sombra de dúvida, em um conjunto de providências fundamentais para a inserção dos nossos
produtos num mercado globalizado, trazendo resultados sustentados, sob o ponto de vista
econômico, a toda a sociedade brasileira."
I • I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

for o título jurídico da sua estipulação, como patentes de invenção, marcas, inven-
ções, fórmulas e outros de natureza científica ou tecnológica ll7 .
Que a CIDE-Remessas tem o seu campo de incidência circunscrito ao domínio
da tecnologia veio a ser confirmado pelo art. 20 da Lei nO 11.452, de 27.02.07 (que
acrescentou um novo § l°-A ao art. 2° da Lei nO 10.168/00), quando esclareceu
que a referida contribuição não incide sobre a remuneração pela licença de uso ou
de direitos de comercialização de programa de computador, salvo quando envolver a
transferência de tecnologia 118.
Muito embora a CIDE-Remessas seja tributo com fato gerador e base de cálcu-
lo idêntico ao do imposto de renda, dele se distingue, pois enquanto neste o contri-
buinte é o residente no exterior - o titular da manifestação de capacidade contributiva
em que consistem as remunerações tributadas, tendo, portanto, uma relação pessoal
e direta com a situação em que o fato gerador consiste (Código Tributário Nacional,
art. 121, parágrafo único, inciso I) -, sendo a fonte pagadora brasileira mera respon-
sável pela sua retenção, no caso da CIDE a pessoa jurídica brasileira é o verdadeiro
contribuinte, eis que sobre ela recai, em definitivo, o ônus financeiro do tributo.

b) A distinção entre serviços em geral) serviços técnicos


e de assistência técnica e administrativa e royalties

o fato de a lei interna ter submetido a alíquotas distintas os rendimentos das


prestações de serviços em geral (25%) e as remunerações a título de royalties, de
serviços técnicos e de assistência técnica, administrativa e semelhantes (15%), torna
indispensável que se estabeleça com nitidez as fronteiras que separam os conceitos
atrás referidos.
Aliás, essa necessidade de delimitação conceitual resulta ainda de as convenções
contra a dupla tributação submeterem a tratamento diferenciado os institutos em
causa, sujeitando uns (os serviços em geral) ao regime de "lucros de empresas" e os
outros ao de royalties.
A linha de fronteira que separa os serviços de assistência técnica dos "serviços
puros" em geral está em que, enquanto neste último caso a prestação de serviços é
o objeto principal do contrato, no primeiro a prestação de serviços é meramente ins-

117 Os royalties consistentes em direitos autorais relativos à veiculação, produção, licenciamento e


distribuição de obras cinematográficas e videofonográficas estão sujeitas a outra contribuição
de intervenção no domínio econômico, a Contribuição para o Desenvolvimento da Indústria
Cinematográfica Nacional - CONDECINE (arts. 82 e ss. da Medida Provisória nO 1.228-
1/015), Cfr. o Acórdão nO 302-38.763 da 2 a Câmara do 3° Conselho de Contribuintes.
118 Luis EDUAlU)O SCHOUERI/GU1LHERME CEZAROTI, A Cide-royalties e as remessas por licença
de distribuição e comercialização de programas de computador, RDDT 130 (2006),41;
ANDERsoN BITENCOURT SILVA, Cide-Royalties: aspectos genéricos e controvérsias atuais acer-
ca da contribuição de intervenção no domínio econômico instituída pela Lei nO 10.168/00,
RDDT 137 (2007), 7.
Título V I Capo 11 I Residentes no Exterior I• I

trumental relativamente ao objeto principal do contrato, que é a transmissão de uma


informação tecnológica (know-how, assim considerado o contrato que tem por objeto
a transmissão de informações tecnológicas preexistentes e não reveladas ao público,
na forma de cessão temporária ou definitiva de direitos, para que o adquirente as
utilize por conta própria, e sem que o transmitente intervenha na aplicação da tec-
nologia cedida ou garanta o seu resultado). No contrato de prestação de serviços em
geral, as partes querem a própria execução de um determinado serviço e não uma
"assistência" na aquisição de uma informação tecnológica; no contrato de assistência
técnica, as partes querem uma informação tecnológica através da prestação de um
serviço complementar ou instrumental à transmissão do know-how ll9 .
É este precisamente o conceito acolhido pela Administração Fiscal na Instrução
Normativa SRF nO 252/02, cujo art. 17, § 1°, II, b, afirma considerar-se "assistência
técnica a assessoria permanente prestada pela cedente de processo ou fórmula secreta
concessionária, mediante técnicas, desenhos, estudos, instruções enviadas ao País e
outros serviços semelhantes, os quais possibilitam a efetiva utilização do processo ou
fórmula cedido".
De natureza idêntica aos serviços de assistência técnica, também se contrapondo
aos "serviços puros", são os serviços administrativos e semelhantes) uma modalidade de
serviços de caráter complementar ou instrumental de uma transferência de tecnolo-
gia, que se caracterizam por ter por objeto a própria organização da empresa desti-
natária, com vista à sua racionalização e ao aumento de produtividade.
Mais complexa se nos afigura a caracterização do conceito de "serviços técni-
cos", com vistas à sua distinção dos "serviços puros" em geral.
Da regulamentação do INPI (Ato Normativo nO 135, de 15 de abril de 1997) e
da regulamentação do Banco Central do Brasil (Regulamento Anexo à Carta Circular
nO 2.795, de 15 de abril de 1998, art. 2°), resulta que a expressão "serviços técnicos",
quando utilizada isoladamente, se refere a serviços complementares às operações de
assistência técnica.
Este foi também o entendimento consagrado pelo Decreto do Presidente da Re-
pública nO 4.195, de 11.04.2002, em matéria de CIDE, cujo art. 10, II, considerou
os serviços técnicos especializados, juntamente com os serviços de assistência técnica,
como subespécie de um conceito de "prestação de assistência técnica"12o.
Não nos parece, pois, ter qualquer fundamento legal ou doutrinário a definição
de serviços técnicos dada pela Instrução Normativa SRF nO 252/02, segundo a qual

119 Esta matéria será objeto de novos desenvolvimentos quando se examinar a questão, em face
dos tratados contra a dupla tributação. Cfr. infra, 625; Cfr. ainda Luís EDUARDO SCHOUERI,
Royalties e assistência técnica ao exterior - Exigência da CIDE, Revista de Estudos Tributários
37 (mai./jun. 2004), 144; HELENO TAVElRA TÔRRES, Regime tributário da propriedade indus-
trial e transferência de tecnologia nos contratos de serviços técnicos e de assistência técnica, in
HELENO TAVEIRA TÔRRES (org.), Comércio internacional e tributaçiW, São Paulo 2005, 649.
120 Como, aliás, já anteriormente o fizera o Decreto nO 3.949/01, no seu art. 8°, II, revogado
pelo Decreto n" 4.195/02.
I liD9 I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

"considera-se serviço técnico o trabalho, obra ou empreendimento cuja execução de-


pende de conhecimentos técnicos especializados, prestados por profissionais liberais
ou de artes e ofícios" (art. 17, § 1°, II, a) 121.
Com efeito, a adoção do critério do conteúdo para definir o serviço técnico,
baseado na existência de conhecimentos profissionais, significa esvaziar de qualquer
sentido o próprio conceito de serviços puros (aliás sujeitos a alíquota mais elevada),
pois dificilmente se imagina qual o tipo de serviços em geral prestados por residentes
no exterior que não envolvem, por parte de quem os presta, um mínimo de conhe-
cimento especializado.
Aliás, semelhante critério rompe ab-ruptamente com a tradição de se incluir o
conceito de serviços técnicos, juntamente com os de assistência técnica, no âmbito
dos contratos de transferência de tecnologia, em relação aos quais teriam caráter
complementar ou instrumental, caráter esse que conduziu o legislador a submetê-los
a um regime de tributação idêntico ao das verdadeiras remunerações por transfe-
rência de tecnologia, não só no que respeita às alíquotas aplicáveis, mas também às
restrições à dedutibilidade em matéria de imposto de renda das pessoas jurídicas e de
contribuição social sobre lucra 122 •
A distinção entre serviços puros e serviços técnicos complementares de uma
transferência de tecnologia deve, pois, descortinar-se não na existência de conheci-
mentos especializados, mas sim no objeto do contrato: no contrato de prestação de
serviços, ainda que envolvam conhecimentos especializados, estes não se destinam a

121 E reiterado na Instrução Normativa nO 208/02, art. 37, § la.


122 Cfr. "Serviços técnicos - Somente estão sujeitas às restrições estabelecidas pelos arts. 354 e
355 do RIR/99 as somas das quantias devidas a título de remuneração que envolva transfe-
rência de tecnologia (assistência técnica, científica, administrativa ou semelhante). Em se tratan-
do de contratação de empresa domiciliada no Canadá, que colocará à disposição da consu-
lente técnicos especializados em sondagem, para que esta última execute serviços junto à
mineradora brasileira, aplica-se o disposto no art. 299 do mesmo Regulamento, que trata,
de forma genérica, da dedutibilidade das despesas operacionais, respeitados os requisitos
da necessidade e da usualidade (Dec. 7 a RF 274/98 e 124/99)"; cfr., ainda, "Prestação de
Serviços (Inspeção) - Somente estão sujeitas às condições e prazo estabelecidos pelo art. 234
e parágrafo 1° do RIR/80 as somas das quantias devidas a título de remuneração que envolva
transferência de tecnologia (assistência técnica, científica, administrativa ou semelhante. Dispên-
dios com outros serviços que não tenham referida classificação refogem às condições esta-
belecidas pelo ato legal, regendo-se pela regra geral de dedutibilidade dos dispêndios feitos
a título de prestação de serviços de inspeção comida no art. 191 do RIR/80" (Ac. 10 CC
101-88.916/95 - DO 08.03.96). Este conceito foi consagrado, ainda, pelo art. 365, § 3°,
do RIR/99, segnndo o qual: '\'\ dedutibilidade das importâncias pagas ou creditadas pelas
pessoas jurídicas, a título de alugnéis ou royalties, pela exploração ou cessão de patentes ou
pelo uso de cessão de marcas, bem como a título de remuneração que envolva transferência de
tecnologia (assistência técnica, científica, administrativa ou semelhantes, projetos ou serviços técni-
cos especializados), somente será admitida a partir da averbação do respectivo ato ou contrato
no Instituto Nacional de Propriedade Industrial - INPI, obedecidos o prazo e as condições
da averbação e, ainda, as demais prescrições pertinentes, na forma da Lei na 9.279, de 14
de maio de 1996".
Título V I Capo 11 I Residentes no Exterior

ser transmitidos ao contratante, mas meramente aplicados, por sua solicitação, ao caso
concreto123 •

c) Convenções contra a dupla tributação


As convenções contra a dupla tributação celebradas pelo Brasil não são apli-
cáveis à contribuição em causa. E isto porque tais convenções apenas se aplicam às
relações em que o contribuinte, sujeito passivo da relação jurídico-tributária, seja
residente em país signatário do tratado.
Ora, no caso da CIDE, como já se disse, a pessoa jurídica brasileira que efetua
os pagamentos sujeitos à sua incidência não é mera fonte pagadora (como no im-
posto de renda na fonte), mas o próprio contribuinte que suporta definitivamente o
ônus financeiro do tributo, tal como pretendido pela lei 124 •

§ 10° PROGRAMAS DE COMPUTADOR

A) Direito interno
A Lei nO 9.609, de 19 de fevereiro de 1998, definiu programa de computador
como "( ... ) a expressão de um conjunto organizado de instruções em linguagem
natural ou codificada, contida em suporte físico de qualquer natureza, de emprego
necessário em máquinas automáticas de tratamento da informação, dispositivos, ins-
trumentos ou equipamentos periféricos, baseados em técnica digital ou análoga, para
fazê-los funcionar de modo e para fins determinados" (art. 1°).

123 Exemplos de serviços não relacionados com tecnologia são os serviços enumerados pela Di-
retoria de Transferência de Tecnologia do INPI (DIRTEC) como não sujeitos a averbação:
(i) agenciamento de compras; (ii) serviços de logística (suporte ao embarque, tarefas admi-
nistrativas relacionadas à liberação alfandegária etc.); (iii) beneficiamento de produtos; (iv)
homologação e certificação de qualidade de produtos brasileiros, visando à exportação; (v)
consultoria na área financeira; (vi) consultoria na área comercial; (vii) consultoria na área
jurídica; (viii) consultoria visando à participação em licitações; (ix) estudos de viabilidade
econômica; (x) serviços de marketing; (xi) serviços realizados no exterior sem a presença
de técnicos da empresa brasileira e que não gerem quaisquer documentos e/ou relatórios;
(xii) serviços de manutenção de software sem a vinda de técnicos ao Brasil, prestados, por
exemplo, através de help-desk; (xiii) licença de uso de software sem o fornecimento de do-
cumentação completa em especial o código-fonte comentado, conforme art. 11 da Lei na
9.609/98; (xiv) aquisição de cópia única de software; e (xv) distribuição de software.
124 JOÃo FRANCISCO BIANCO, A Cide sobre Royalties e os tratados internacionais contra a dupla
tributação, in Grandes questões atuais do Direito Tributário, vaI. 8, São Paulo 2004, 242;
GUSTAVO HENRIQUE VASCONCELOS VENTURA, A Cide royalties e sua relação com os tratados
internacionais, in HELENa TAVEIRA TÔRRES (org.), Direito InternaeionalAplicado, vol. UI,
São Paulo 2005, 701.
I q I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Por sua vez, o art. 2° da mesma Lei manda aplicar aos programas de computa-
dor o regime de proteção das obras literárias previsto na legislação de direitos auto-
rais, notadamente na Lei nO 9.610, também de 19 de fevereiro de 1998.
A criação de wn programa de computador - tal como a criação da obra intelectual
no domínio literário e artístico - confere originariamente ao seu criador a autoria e a pro-
priedade do bem imaterial em que se traduz. A autoria ou "paternidade" é o fundamento
da aquisição originária, pelo autor, da titularidade do bem imaterial em que a obra inte-
lectual (o programa de computador) consiste, titularidade esta que tem, como corolário
no plano patrimonial, o direito exclusivo da respectiva exploração econôrnica125.
É o que resulta da Lei nO 9.610/98 (Lei de Direitos de Autor - LDA) que, após
estabelecer no art. 22 que "pertencem ao autor os direitos morais e patrimoniais so-
bre a obra que criou"126, dispõe no art. 28 que "cabe ao autor o direito exclusivo de
utilizar, fruir e dispor da obra literária, arústica ou científica".
Quer do ponto de vista jurídico o direito de autor possa ser concebido como um
direito real de propriedade sobre bem ou coisa imaterial, ou como um direito absolu-
to de exclusivo ou monopólio, a verdade é que, em qualquer das visões, aos terceiros
é vedada a exploração econômica de obra intelectual (o programa de computador),
sem consentimento do seu criador ou autor. Não vigora, pois, plenamente, nesta
matéria, o princípio da liberdade de iniciativa, uma vez que a lei reservou ao autor o
exclusivo ou monopólio da exploração deste tipo de bens.
A exploração econômica de obra intelectual pressupõe sempre uma atividade
lógica e cronologicamente subsequente ao ato de criação, atividade esta indispensável
para que a obra criada seja tornada apta ao seu destino, que é ser colocada à disposi-
ção dos seus destinatários finais, pois são estes que pagarão wna retribuição devida
pelas vantagens decorrentes da satisfação das necessidades propiciadas pela aquisição
ou fruição do bem em causa.
Os direitos patrimoniais sobre programa de computador são suscetíveis de
transmissão inter vivos (onerosa ou gratuitamente) ou mortis causa, caso em que ocor-
re a transftrência do conteúdo patrimonial do direito do autor sobre o programa de
computador, cuja titularidade se transfere de um titular originário para um titular
derivado ou, subsequentemente, de wn titular derivado para outro.
Sucede, porém, que o titular do programa de computador - como o de qual-
quer obra intelectual em geral - pode explorar economicamente o seu direito, não
transmitindo a titularidade do mesmo, mas limitando-se a autorizar a utilização do
bem econômico que a Lei reserva, em termos de monopólio ou exclusivo, ao próprio
autor (art. 29 da LDA).
É exatamente esta autorização da utilização da obra por terceiros que é consi-
derada na doutrina o núcleo essencial do contrato "primário" de direito de autor ou

125 efr. JosÉ DE OLIVEIRA ASCENSÃO, Direito Autoral (2" ed.), Rio de Janeiro 1997, 156.
126 Note-se, porém, que o § P do art. 2° da Lei nO 9.609/98 não atribui aos programas de
computadores a proteção plena quanto aos direitos morais.
Título V I Capo 11 I Residentes no Exterior I_ I

"contrato de exploração de direito de autor" que a Lei nO 9.609/98 caracteriza pela


designação genérica de "contrato de licença de uso de programa de computador".
A remuneração que o titular de licença de uso paga ao autor do programa de com-
putador a título de direito de autor não é a contraprestação pela cessão deste direito,
mas a contrapartida pela remoção de um limite Jurídico à livre iniciativa de exploração de
bens intelectuais e que decorre do monopólio ou exclusivo atribuído por lei ao autor ou,
segundo outros, do direito real de propriedade sobre a sua própria obra J27 • Assim, da
mesma forma que o construtor não pode, sem autorização do proprietário do terreno,
edificar um imóvel, assim também o licenciado não pode, sem autorização do autor,
explorar economicamente a obra deste. Mas, da mesma forma que a autorização de
edificação não envolve transmissão da propriedade do terreno, a autorização de uso
não envolve a transmissão do direito patrimonial de autor, que subsiste na titularidade
deste, dotado de "elasticidade" plena, de tal forma que, cessando os vínculos obrigacio-
nais "relativos", ele readquire a plenitude do seu conteúdo.
A Lei nO 9.609/98 prevê três modalidades de contrato de licença de uso de pro-
grama de computador.
Uma primeira modalidade consiste na licença para uso próprio ou licença de uso
em sentido estrito, pela qual o licenciado adquire a liberdade de aplicar o programa na
sua atividade profissional ou empresarial.
Uma segunda modalidade, de conteúdo econômico mais forte, atribui ao licen-
ciado, não o direito de uso próprio, mas o direito de proporcionar, mediante uma
atividade comercial, esse uso a terceiros. É o que se verifica nos contratos de licença
de direitos de comercialização previstos no art. 10 da referida Lei 128 •
Enfim, a lei prevê um terceiro grau de intensidade na utilização econômica do
programa de computador pelo licenciado, segundo o qual o uso abrange a própria
transferência da tecnologia do programa de computador, modalidade esta prevista no
art. 11 da mesma Lei. Nestes casos, de contrato de licença de uso de conhecimentos tec-
nológicos, a lei prevê, como requisito da sua eficácia em relação a terceiros, o registro
no INPI, bem como a entrega obrigatória "( ... ) por parte do fornecedor ao receptor
de tecnologia, da documentação completa, em especial do código-fonte comentado, me-
morial descritivo, especificações funcionais, diagramas, fluxogramas e outros dados
técnicos necessários à absorção de tecnologia" (art. 11, § Úllico)129.
O contrato de licença de uso de conhecimentos tecnológicos distingue-se, com
nitidez, de um contrato de transferência de titularidade do próprio direito ao pro-
grama de computador. Tais contratos são ainda meros contratos de licença, em que o
titular do direito autoral mantém a propriedade do programa, inobstante permitir

127 Sobre esta discussão, cfr. MARIO ARE, Beni immateriali, Enc. del Dir. V, 258 SS.; DE SANTIS,
Autore (diritto di), Enc. del Di1: Iv, 397 5S.
128 efr. CARLOS ALBERTO Bm"AR) Contratos de comercialização de software, in Novos contratos
empresariais, São Paulo, 39.
]29 É só sobre esta modalidade de contratos que o art. 20 da Lei na 11.452, de 27.02.07, per-
mite a incidência da CIDE.
I fim I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier ]

ao licenciado o livre acesso aos conhecimentos tecnológicos que contém, para que os
possa, eventualmente, absorver.
Por outro lado, tais contratos distinguem-se das outras duas modalidades de
contratos de licença: distinguem-se da licença de comercialização, porque neles não
está em causa a cessão do uso para terceiros em virtude de uma intermediação co-
mercial, e distinguem-se das licenças de uso stricto sensu, pois que estas limitam-se a
permitir o uso próprio, profissional, do programa, não incluindo, porém, para o
licenciado, uma transmissão do conteúdo da tecnologia que se mantém reservado.
Pode assim dizer-se que só no caso dos contratos de licença de uso com trans-
ferência de tecnologia de programa de computador, previstos no art. 11 da Lei nO
9.609/98, ocorre um verdadeiro contrato de know-how ou contrato de transferência
de capital tecnológico. Com efeito, só nestes tipos contratuais ocorre a transmis-
são de informações tecnológicas preexistentes, em si mesmas consideradas, na forma
de cessão temporária ou definitiva de direitos, para que o licenciado as utilize por
conta própria e sem que o transmitente da tecnologia intervenha na sua aplicação
ou garanta o seu resultado. Só nestes casos se pode falar de supplying know-how, por
contraposição a applying know-how, como sucede nos casos de simples licença para
uso próprio l3o .
Também não há uma transmissão de conhecimento tecnológico nos casos de
licença de comercialização, em que o intuito do licenciado não é o de absorver a tec-
nologia nem o de utilizar o software, mas meramente o de comercializar o programa
de computador.
Das considerações precedentes pode concluir-se que as remunerações corres-
pondentes às licenças de uso de programa de computador, em qualquer das suas três
modalidades, revestem a natureza de um royalty devido a título de direito autoral, nos
termos do art. 52, Iv, do RIR, ou seja, de rendimentos decorrentes de uso, fruição,
exploração de direitos, tais como ( ... ) "autorais, salvo quando percebidos pelo autor
ou criador do bem ou da obra" (caso em que a lei considera como rendimento do
trabalho não assalariado - art. 45, VII, do RIR).
Tendo em vista esta qualificação das remunerações em causa, a elas se aplica o
disposto no art. 710 do RIR, segundo o qual "estão sujeitas à incidência na fonte, à
alíquota de 15%, as importâncias pagas, creditadas, entregues, empregadas ou reme-
tidas para o exterior, a título de royalties a qualquer título".

130 Cfr. CABANELLAS DE LAS CUEVAS, Contratos de licencia y de transferencia de tecnologia en el


derecho privado, Buenos Aires 1994, 24; ANTÓNIO MARQUES DOS SANTOS, Transferência inter-
nacional de tecnologia, economia e direito. Alguns problemas gerais, CCTF 1984, 215. Veja-se
ainda MIGUEL TEIXEIRA DE ABREU, "Royalties JJ e transferências de tecnologia, Fisco 30 (1991),
23 (24); FRANÇorS MAGNIN, Know-how etpropriété industrielle, Paris 1974; RUGGIERO CAFARl
PANICO, Il transferimento internazionale di know how, Milão 1985; ALDO FRlGNANI, Factoring,
Leasing, Franchising, Vénture Capital, Leveredged by-out; Hardship Clause, Countertrade, Cash
and Carry, Merchandising, K'now how, Turim 1983, 508 55.; J. MASSAGUER, El contrato de
licencia de know how, Barcelona 1989, 70-71.
Título V I Capo 11 I Residentes no Exterior

A Portaria nO 181/89, de 28 de setembro, veio estabelecer que "serão tributados


na forma dos arts. 554 e 555, I, do Regulamento do Imposta sobre a Renda, apro-
vado pelo Decreto nO 85.450, de 4 de dezembro de 1980 - RIR/80, os rendimentos
correspondentes a direitos autorais pagos a beneficiários residentes ou domiciliados
no exterior na aquisição de programas de computadores -software, para distribuição e
comercialização no País ou para uso próprio, sob a modalidade de cópia única".
Referida Portaria, quando alude à "aquisição de programas de computadores",
encerra uma contradição lógica insanável. E que só existe royalty quando não ocorra a
aquisição do direito de propriedade intelectual em que o programa consiste, mas sim
um desmembramento desse direito, de tal modo que os direitos de uso, de fruição ou
de exploração sejam transferidos para terceiro mediante retribuição.
Ao invés, quando se trata de verdadeira aquisição de um software, não ocorre
qualquer desmembramento na titularidade do direito autoral, nem o adquirente re-
munera o direito de usar, fruir ou explorar este direita. Simplesmente adquire o objeto
que corporiza a obra sobre que recai o direito, seja qual for a fmalidade da aquisição.
É o que resulta com toda a clareza do já citado art. 37 da LDA (Lei nO 9.610/98),
quando estabelece que "a aquisição do original de uma obra, ou de exemplar, não
confere ao adquirente qualquer dos direitos patrimoniais do autor, salvo convenção
ao contrário entre as partes e os casos previstos nesta lei".
Não existindo, nesta hipótese, aquisição de direitos patrimoniais de autor, a im-
portância paga não configura rendimento pelo uso de direitos mas preço de contrato
de compra e venda.
O essencial, por conseguinte, não é o destino do programa - comercialização
ou uso próprio - nem a unidade ou pluralidade do objeto - cópia única ou cópias
múltiplas - mas o título jurídico sob o qual se efetua o pagamento: ou pagamento
de direitos autorais, caso em que há incidência do imposto de renda na fonte -, ou
pagamento de preço de "importação de mercadoria" (software de prateleira), caso em
que não incide o imposta l3l •

B) Convenções contra a dupla tributaçiW


Quanta ao tratamento tributário do software nos tratados contra a dupla tribu-
tação remete-se para a parte VI deste livro.

131 Parece-nos, portanto, ter adotado a melhor linha de orientação e as Decisões nO, 334/97,
22/98,47/98,291/98,418/98,78/99,302/99,358/99, 145/00, 184/00,276/00 e 161/01,
todas da 8 a Região Fiscal, segundo as quais "não estão sujeitas à retenção do imposto de
renda na fonte de que tratam os arts. 682 e 710 do RIR as remessas destinadas ao paga-
mento de aquisições de programa de computador software, quando se referirem a compra de
mercadorias para revenda. Tratando-se de pagamento de direitos autorais, haverá incidência
do imposto de renda na fonte" em sentido similar cfr. ainda Decisões nO' 214/05 (10a RF),
313/05 (7a RF), 225/05 (8" RF), 53/05 (7a RF), 14/05 (8 a RF), 41/04 (5 a RF).
q I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

SEÇÃO TI
EQUIPARAÇÃO A PESSOAS JURÍDICAS DOMICILIADAS NO BRASIL

Como já se esclareceu 132 , a lei, em certos casos, abandona o regime de retenção


na fonte para submeter certos residentes no exterior ao regime de equiparação a
residentes no país, e isto em função de ocorrer no território do Brasil o exercício de
uma atividade através de uma O'I;ganização de pessoas e bens à qual são imputáveis os
rendimentos e que leva ao reconhecimento de que o residente no exterior está "reali-
zando negócios" (doing business) no Brasil.
A equiparação traduz-se em deixar de tratar os rendimentos auferidos pelos
não residentes de um ponto de vista analítico ou isolado, taxando-os cada um de per
si com uma retenção na fonte sobre o seu valor bruto, para tratá-los de um modo
sintético ou complexivo, submetendo-os a todos ao conceito de lucro de empresa, isto
é, a um somatório de componentes positivos e negativos, apurado através da escritu-
ração mercantil. A noção de lucro de empresa, em virtude de um princípio de absorção)
engloba a pluralidade de rendimentos individualizados auferidos pelo residente no
exterior, os quais deixam de ser considerados com autonomia, de modo a que o im-
posto apenas incide sobre o resultado líquido apurado em balanço, exatamente como
sucede com as pessoas jurídicas domiciliadas no País.
O direito brasileiro submete ao regime de equiparação dois casos distintos: a) o
funcionamento no Brasil de sociedades estrangeiras através de filiais, que determina
a equiparação das filiais a pessoas jurídicas contribuintes do imposto de renda (art.
147, II, do RIR); b) o exercício no Brasil de atividades comerciais por comitentes
residentes no exterior, através de mandatários ou representantes, que determina a
equiparação dos comitentes a pessoas jurídicas contribuintes do imposto de renda
(art. 147, III, do RIR).
Em qualquer dos casos, a equiparação opera pela técnica da atribuição de perso-
nalidade jurídica, para efeitos tributários, pelo que - dada a existência de problemas
comuns - serão estudados em conjunto.

§ 10 FILIAIS DE SOCIEDADES ESTRANGEIRAS

A) O conceito de funcionamento de sociedade estrangeira no Brasil

A atribuição às filiais de sociedades estrangeiras do regime de equiparação a


pessoas jurídicas domiciliadas no Brasil tem, como pano de fundo, a disciplina ditada
pelo direito privado para as hipóteses de exercício isolado ou permanente, no territó-
rio nacional, de atividades de sociedades estrangeiras 133 .

132 Cfr. supra, 475 ss.


133 Sociedade estrangeira é aquela que não obedece aos requisitos da sociedade nacional, ou seja,
a que não é organizada da conformidade com a lei brasileira ou não tem a sua sede de ad-
Título V I Capo 1/ I Residentes no Exterior Iu I

o direito brasileiro reconhece automaticamente a personalidade jurídica das


sociedades estrangeiras nos termos da lei do pais em que se constituírem (art. 11 da
Lei de Introdução ao Código Civil); mas - ao contrário de outros ordenamentos -
não consagra o princípio da liberdade de estabelecimento, sujeitando à autorização
administrativa o exercício das suas atividades no país.
Dispõe, com efeito, o art. 1.134 do novo Código Civip34 que "a sociedade es-
trangeira, qualquer que seja o seu objeto, não pode, sem autorização do Poder Exe-
cutivo, ftmcionar no país, ainda que por estabelecimentos subordinados, podendo,
todavia, ressalvados os casos expressos em lei, ser acionista de sociedade anônima
brasileira 135".
Enquanto o fi.mcionamento no Brasil da própria sociedade estrangeira está sujeita
ao regime da autorização prévia, é plenamente livre a constituição de sociedades subsidi-
árias (ou controladas) de sociedades estrangeiras, salvo restrições excepcionais da lei.
O pressuposto essencial para a autorização governamental reside no conceito
de foncionamento l36 no país, conceito cuja fronteira com o simples exercício de direitos
subjetivos (tais como estar em juíw, celebrar contratos, participar do capital de outras
sociedades, auferir rendimentos), embora difícil de demarcar, é de fi.mdamental im-
portância' pois é ela que separa a "atividade funcional" (Handlungstatigkeit» sujeita
a controle administrativo, da "atividade jurídica" (Rechtstdtigkeit) livre.
De harmonia com EGBERTO LACERDA TEIXEIRA e J. A. TAVARES GUERREIRO, "fun-
cionar significa desenvolver plena e organicamente as atividades econômicas tenden-

ministração no Brasil (art. 1.126 do novo Código Civil). Cfr. ALBERTO XAVIER, A distinção
entre sociedades nacionais e estrangeiras, in ID., Direito Tributário e Empresarial- Pareceres,
Rio de Janeiro 1982, 341.

134 A matéria já se encontrava regnlada, em termos praticamente idênticos, pelo Decreto-Lei nO


2.627/40 (antiga Lei das Sociedades por Ações), cujos arts. 59 a 73 foram mantidos pelo
art. 300 da Lei na 6.404/76. Todavia, o novo Código Civil regulou por inteiro a matéria,
em termos que abrangem a totalidade dos tipos societários e não apenas as sociedades anôni-
mas. Cfr. ainda a Instrução Normativa DNRC de na 81, de 05.01.99, que regnlamenta a
produção do pedido de autorização.
135 A redação do art. 64 do Decreto-Lei na 2.627/40 utiliza as expressões "funcionar no país" por
si mesmas ou por filiais, sucursais, agências ou estabelecimentos que as repercutem". Note-se
que a expressão filial, no direito brasileiro, é sinônima de sucursal, enquanto noutros países,
como a França, Itália e Espanha, a filiale é uma sociedade com personalidade jurídica pró-
pria, equivalente à nossa subsidiária ou controlada. Note-se também que a doutrina consi-
dera como sinônimas as expressões filiais, sucursais, agências e estabelecimentos, exprimindo
apenas gradação quantitativa de prestígio ou projeção externa, ou o ramo de atividade a que
respeitam (por exemplo, agências no que concerne ao setor financeiro). Cfr. EGBERTO LACERDA
TEIXEIRA/J. A. TAVARES GUERREIRO, Das sociedades anônimas no direito brasileiro, I, São Paulo
1979,80.
136 Fausse notion claire, chamam TIXIER/KEROGUES a expressão análoga da lei francesa: Droit Fis-
cal International. Pratique jrançaise, Paris 1974,46. Sobre a natureza jurídica da autorização
governamental, cfr. HELENO TÔRREs,ApluritributaçiüJ internacional, 18955.
I B I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

tes à consecução do objeto social. Pressupõe um esforço de organização permanente


(o estabelecimento) que se exterioriza por uma série de atos ou de fatos vinculados
à exploração de certa atividade econômica. O vocábulo funcionar corresponde, na
terminologia do Direito Comparado, às expressões doing business, do direito anglo-
americano, e ao faire des affaires, do direito francês I3 7".
De nossa parte, entendemos que a distinção em causa deve considerar dois cri-
térios distintos: o critério da natureza da atividade e o critério do modo do seu
exercício.
No que concerne ao critério da natureza da atividade, há desde logo que separar
os atos típicos dos atos instrumentais. Os atos típicos, que exprimem o exercício do
objeto da sociedade estrangeira, são os únicos que podem caracterizar o seu fun-
cionamento no país. Ao invés, os atos meramente instrumentais que, não sendo atos
próprios do objeto social, visam a tutelar direitos ou administrar patrimônio (estar
em juízo, auferir rendimentos, realizar investimentos etc.) nunca poderão configurar
funcionamento no país.
O que caracteriza a atividade funcional, por contraposição à atividade jurídica,
não é só a natureza intrínseca da atividade, mas também o modo como é exercida.
O critério do modo de exercício diz respeito exclusivamente aos atos típicos e visa a
separar as hipóteses em que a empresa estrangeira exerce a sua atividade noutro país
de um modo empresarial, isto é, com habitualidade, através de um estabelecimento
nele localizado - caso em que configura funcionamento - das hipóteses em que a
empresa se limita a, de modo isolado e sem presença econômica no território, realizar
operações no país.
Assim, por exemplo, se um banco estrangeiro no exercício de sua atividade pró-
pria no seu país de domicílio conceder empréstimos a residentes no Brasil, ele não
estará exercendo uma atividade funcional, mas tão somente jurídica. Caso, porém,
tal banco destaque um capital para operar no Brasil e aqui, através de elementos
humanos e materiais, conceder empréstimos a residentes no Brasil, terá passado a
explorar a mesma atividade, mas agora em termos empresariais, com habitualidade
e através de um estabelecimento afetado a este fIm. Estará, pois, exercendo uma ati-
vidade funcional.
Diz-se que uma sociedade estrangeira exerce a atividade que constitui o seu ob-
jeto social noutro país (no caso o Brasil) quando ela a exerce em termos empresariais e
através de um estabelecimento posto ao serviço da atividade empresarial.
O requisito do exercício sob forma empresarial decorre do art. 966 do Código Ci-
vil, segundo o qual considera-se empresário quem exerce profissionalmente atividade eco-

137 Cfr. Das sociedades anônimas, cit., 80. Cfr. também GILBERTO DE ULHôA CANTO, Temas de
Direito Tributário, lI, Rio de Janeiro 1964, 180 55., com ampla indicação de bibliografia;
Ruy BARB05A NOGUEIRA, Revista de Direito Administrativo 27,412 55.; RUBENS GOMES DE
SOUSA, Pareceres - Imposto de Renda, lI, 48; BULHÕES PEDREIRA, Imposto de Renda, 1-21 (52);
HAROLDO VALLADÂO, Direito Internacional Privado (4" ed.), I, Rio de Janeiro 1974,445.
Título V I Capo 11 I Residentes no Exterior 4fi'
nômica organizada para a produção ou circulação de bens ou serviços. Por seu turno, o
conceito de profissionalidade envolve os requisitos da habitualidade e do escopo lucrativo.
O requisito do estabelecimento é corolário do requisito da forma empresarial e
decorre do art. 1.142 do Código Civil, que considera estabelecimento "todo comple-
xo de bens organizado, para exercício da empresa, por empresário ou por sociedade
empresária" .
A exigência do requisito do estabelecimento decorre das disposições que con-
sideram ser condição necessária para a autorização governamental para o funcio-
namento da sociedade estrangeira no Brasil a existência de um capital destinado às
operações no território nacional (arts. 1.134, § l°, IV; 1.135, § único, e 1.136, § P
e § 2°, do Código Civil; Instrução Normativa nO 81/99 do Diretor do Departamento
Nacional de Registro do Comércio, DNRC, de 05.01.1999).
A expressa exigência de um capital, bem como a referência no caput do art.
1.134 a "estabelecimentos subordinados" revela bem que é da essência do conceito
de funcionamento no Brasil a existência de um patrimônio de afetação especial (o es-
tabelecimento), destinado a ser o instrumento através do qual a empresa estrangeira
exerce no Brasil a sua atividade empresarial.
Assim, não poderá falar-se de funcionamento de sociedade estrangeira no Brasil
quando no Brasil a empresa estrangeira não dispõe de um patrimônio separado afeto
à exploração da sua atividade. É o que sucederá, por exemplo, se o Brasil é apenas
o local onde os membros da diretoria de uma sociedade estrangeira se reúnem para
deliberar a prática de atos jurídicos.
Esta análise da doutrina do direito mercantil ajusta-se bem à visão própria do
direito tributário, posto que só nos casos de "funcionamento" ou de atividade fun-
cional se pode conceber uma organização de pessoas e bens que seja o seu suporte ins-
titucional, organização essa dotada de capacidade contributiva própria, que permite
às normas tributárias configurá-la, por "ficção equiparadora", como pessoa jurídica
distinta. É precisamente a esta organização - ainda que de forma rudimentar - que
a lei fiscal alude com a expressão ampla "dependência de sociedade estrangeira" (art.
397 do RIR), que abrange as "filiais, sucursais, agências ou representações" das so-
ciedades estrangeiras autorizadas a funcionar no País (art. 147, II, e 398 do RIR).
Também só nos casos de "funcionamento" se verifica a realização no Brasil das
despesas ou custos necessários à obtenção dos rendimentos pagos por fontes brasi-
leiras, despesas ou custos esses cuja consideração conduz à tributação sintética de um
"lucro" e não à tributação analítica dos rendimentos.
Precisamente porque existe, através de certos tipos de estabelecimento (filiais,
sucursais, agências e representações), um grau intenso de penetração do não residente
na ordem territorial local, gerador de um "centro de custos e despesas", a lei determi-
na que todos os rendimentos por ele auferidos não devem ser tratados "isoladamen-
te", caso a caso (isolierende Betrachtungsweise) , mas "globalmente", como um lucro de
empresa, considerando-se os componentes positivos e negativos, como sucede com as
pessoas jurídicas domiciliadas no país. O conceito de lucro de empresa (business income,
I _ I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

por contraposição ao investiment income ou passive income) tem caráter "absorvente"


das categorias individuais de rendimentos (dividendos, juros, ganhos de capital), que
deixam de ser considerados com autonomia para compor sintética e unitariamente a
noção de lucro tributável: é o princípio da absorção do estabelecimento permanente 138 •
Ao invés, onde tais tipos de estabelecimentos não existam, os rendimentos auferi-
dos pelos não residentes são considerados isolada e analiticamente, um a um, pelo seu
valor bruto e sujeitos ao mecanismo de retenção na fonte a alíquota proporcional139 •
No direito interno brasileiro, nem todo o estabelecimento permanente está su-
jeito ao regime de equiparação a pessoa jurídica domiciliada no Brasil, mas tão so-
mente as filiais, sucursais, agências e representações de sociedades estrangeiras, de tal
modo que os demais tipos de estabelecimento permanente previstos nas convenções
de dupla tributação ou no direito comparado não têm força bastante para afastar o
regime geral de tributação isolada e analítica dos rendimentos de residentes no exte-
rior, através de retenção na fonte.
Aliás, é este último regime que se aplicará se a sociedade estrangeira aufere
lucros através de operações isoladas, obtidos sem que no país disponha de qualquer
estabelecimento.
Ao contrário do que sucede noutros ordenamentos, a lei interna brasileira não
se refere expressamente ao conceito de estabelecimento estável ou permanente, consa-
grado nas convenções contra a dupla tributação e por estas definido como "a insta-
lação fixa de negócios onde a empresa exerce a sua atividade". Referido conceito é
mais amplo que o de "dependência de sociedade estrangeira", pois embora esta seja,
inegavelmente, estabelecimento permanente, este pode assumir outras modalidades
que não se esgotam em filiais, sucursais, agências ou representações de sociedades
estrangeiras, tais como minas, pedreiras, canteiros de obras e construção etc. 140
Importa, porém, observar que se se verificarem todos os elementos que permi-
tem caracterizar o "funcionamento" de sociedade estrangeira no país ocorrerá a exis-
tência de uma "filial de fato", ainda que sem a obtenção de autorização e sem revestir a
forma por esta exigida, plenamente tributável como se de "filial de iure}) se tratasse.

B) Natureza jurídica das filiais de sociedades estrangeiras

a) No Direito Privado
As filiais, agências ou sucursais de sociedades estrangeiras, bem como as filiais,
agências ou sucursais de sociedades brasileiras no exterior não têm personalidade ju-

138 Convém distinguir o "princípio da absorção" do estabelecimento permanente, neste sentido,


do "princípio da força de atração", que respeita à inclusão no lucro de rendimentos obtidos
pelo residente no exterior, ainda que sem ser por intermédio do estabelecimento.
139 Cfr. GARRARINO, La tassazione dei reddito transnazionale, Pádua 1990, 187 ss.; A. MlRAULO,
Doppia imposizione internazionale, Milão 1990, 72 ss.
140 Cfr. infra, 552 ss.
Título V I Capo 11 I Residentes no Exterior I @fi) I

rídica distinta daquela de que são mero prolongamento, sendo o ponto pacificamente
reconhecido tanto na doutrina nacional (em contraposição às "subsidiárias" ou "socie-
dades-filhas", que têm individualidade jurídica diversa da matriz) como na doutrina
estrangeira (no tocante às branches do direito anglo-saxônio e às succursales do direito
francês, que se contrapõem às filiales, o equivalente das nossas subsidiárias).
TRAJANO MIRANDA V ALVERDE ensina: ''A diferença essencial está em que as socie-
dades-filhas gozam de autonomia jurídica, de personalidade, enquanto as agências,
sucursais ou filiais são extensões da organização, sociedade ou empresa principal. O
laço de subordinação existe juridicamente nas segundas e aparece publicamente, mes-
mo quando o sistema adotado na sua economia interna lhes atribua vida própria"141.
No mesmo sentido, EGBERTO LACERDA TEIXEIRA: ''As filiais, sucursais ou agências,
conforme acabamos de assinalar, constituem extensão da personalidade jurídica da
sociedade matriz, no estrangeiro. Distinta é a situação das subsidiárias"142. Também
RUBENS GOMES DE SOUSA afirma que "a filial no Brasil é a própria sociedade estran-
geira. Isto já decorre, aliás, da unidade da personalidade jurídica das sociedades, que
impediria atribuir à filial uma nacionalidade diversa da sua matriz143".
E a mesma orientação é acolhida pela doutrina estrangeira. Segundo YVON
LOUSSOUARN e J. B. BREDIN, le droit commercial interne oppose, de façon tres nette, les
notions de succursale (a nossa filial) et de filiale (a nossa subsidiária). La premiere n)est
qu)un établissement secondaire) qui peut être doté d)une certaine autonomie de fait) mais
n)est pas juridiquement indépendant de l'établissement principal) et surtout ne possede pas
la personnalité morale)). 51insi créé) la succursale d)une société étrangere n)est pas soumise
à un régime différent de celui de la société dont eUe est émanation. N)etant dotée d)aucune
vie juridique indépendante) et surtout ne possédant pas la personnalité morale) eUe releve)
sous réserve de l)application des lois de police française) de la !ex societatis et suit également
le sort de la maison mere sur le terrain de la jouissance des droitsl44".
Não sendo pessoas jurídicas distintas da matriz, as filiais, agências ou sucursais
(tanto de sociedades estrangeiras como de sociedades nacionais) revestem a natureza
jurídica de meros estabelecimentos comerciais. Com efeito, importa distinguir neste
caso a empresa, que é uma pessoa jurídica, e o estabelecimento, que é um simples con-
junto de coisas corpóreas e incorpóreas, de bens e serviços, organizado pelo comer-
ciante com vista ao exercício da sua atividade mercantiF45. Cada empresa pode ter
mais do que um estabelecimento, representando, cada um, uma unidade econômica.
As filiais, por não terem personalidade jurídica própria, não podem figurar como
partes em contratos de qualquer natureza. De harmonia com os ensinamentos da teoria

141 Cfr. Sociedades por Ações, 422.


142 Regime jurídico-fiscal dos capitais estrangeiros no país, RT 63 (1974),25 (34).
143 Pareceres - Imposto de Renda, II, 1976, 45.
144 Droit du Commerce International, Paris 1969, 330-333.
145 Cfr., sobre esta distinção, as monografias de FERRARA JUNIOR, Teoria giuridica dell'azienda,
Firenze 1949, e MARIO CASANOVA, Le imprese commerciali, Torino 1955.
.+~. Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

geral do direito, parte (ou sujeito do negócio) é a pessoa titular dos interesses cuja regu-
lamentação o contrato visa a prosseguir. Onde não exista sujeito, por carência de perso-
nalidade jurídica, como sucede nas filiais, não pode falar-se em parte de um contrato. Os
contratos referentes às filiais, designadamente os de empréstimo externo, têm sempre
como partes o único sujeito de direito efetivamente existente e que é a matriz l4ó •
As relações internas entre a matriz e a sucursal surgem de necessidades de econo-
mia e disciplina interna das organizações, podendo traduzir-se em movimentos de
dinheiro, de mercadorias ou de pessoas de um para outro estabelecimento de uma
pessoa jurídica. Todavia tais relações não revestem a natureza de relações jurídicas,
precisamente porque este conceito pressupõe logicamente a existência de dois sujei-
tos de direito, e, no caso, existe apenas um. Assim, onde se nos depara a aparência de
uma compra e venda, de um mútuo, de um depósito entre matriz e filial, está-se na
realidade perante figuras não contratuais, desprovidas de relevância jurídica. Trata-se
de meras transferências internas regidas pela disciplina interna da sociedade, mas que
não têm a tutela do direito. O fato de, por vezes, certas autoridades administrativas,
designadamente o Banco Central do Brasil, reconhecerem a forma de um emprésti-
mo, até titulado por nota promissória, entre filial e matriz, deve ter-se como simplifi-
cação administrativa, aliás imprópria, por não existirem instrumentos generalizados
que exprimam este tipo singular de relações l47 .

b) No Direito Tributário
Em face destas aparentes incongruências de regime, podem suscitar-se legitima-
mente fortes dúvidas quanto à verdadeira natureza jurídico-tributária da filial de so-
ciedade estrangeira. Se determinados traços do regime inclinam a adotar a teoria da
unidade da pessoa jurídica - e referimo-nos não só ao regime do direito privado, mas
ainda ao regime de retenção na fonte do imposto sobre lucros -, já outros caracteres
da disciplina normativa propendem o intérprete a reconhecer à filial uma subjetivi-
dade distinta da matriz, ao menos para efeitos fiscais - como é o caso da tributação
independente e da contabilidade separada.
Pela nossa parte, defendemos que a filial é um típico caso de patrimônio autôno-
mo de direito tributário. Não é este o lugar próprio para aprofundar e desenvolver a
teoria da separação patrimonial neste ramo do direito. Mas importa sublinhar que,

146 HELENa TÔRRES parece admitir a personalidade jurídica das filiais de sociedades estrangeiras
em face do país de instalação, muito embora não a tenham em face do país de residência da
matriz. Cfr. Pluritributação internacional, 199. Tal personalidade só caberia, porém, aos esta-
belecimentos permanentes, em sentido restrito, na terminologia do autor (sucursais e filiais),
mas não assim ao estabelecimento permanente em sentido amplo, ou seja, outras formas de
presença duradoura no país (cfr. op. cit., 249).
147 Cfr., neste sentido, T ARCÍSIO NEVIANI, Alguns problemas de correção monetária do patrimônio
líquido em filial de empresa sediada no exterior, Boletim de Estudos Jurídicos do Investimento
Internacional9j10 (set.-out. 1979).
Título V I Capo 11 I Residentes no Exterior -iM
se o conceito de patrimônio autônomo nasceu no direito civil para caracterizar o
conjunto de direitos e obrigações que, adentro do patrimônio geral de um sujeito de
direito, se encontravam vinculados a um regime especial de responsabilidade por dívi-
das l48 , ele pode igualmente aplicar-se noutros ramos do direito - como o tributário-,
mas agora para designar o complexo de direitos e obrigações que, adentro da esfera
patrimonial de uma mesma pessoa jurídica, se encontra submetido a um regime
tributário especial. Aqui, o que imprime a separação, ou autonomia, ao patrimônio
em causa não é a sua afetação especial, nem o caráter separado da sua administração,
nem a sua sujeição a um dado regime de responsabilidade por dívidas, mas o fato de
a lei submeter uma massa de bens e direitos a um tratamento fiscal unitário l49 .
A autonomia patrimonial de Direito Tributário - e que é vulgarmente designada
por "equiparação a empresa independente" - revela-se enquanto a lei submete a tribu-
tação independente os lucros que lhe são diretamente imputáveis, ao invés de tributar
a pessoa jurídica no seu conjunto ou de tributar analiticamente o residente no exterior
por cada um dos rendimentos isolados que auferir, através de retenção na fonte.
Em certos ordenamentos jurídicos, a autonomia patrimonial das filiais não con-
duz à atribuição da personalidade jurídica, para efeitos fiscais, de tal sorte que o contri-
buinte continua a ser o residente no exterior, só que tributado no país em que a filial se
situa através de uma metodologia idêntica à das pessoas jurídicas nele residentes 15o .
Entre nós, porém, a autonomia patrimonial foi ao ponto de o legislador ter atri-
buído às filiais persrmalidade jurídica para efeitos tributários, estabelecendo, por "ficção
equiparadora", que elas são crmsideradas pessoas jurídicas para efeitos da sua qualificação
como contribuintes do imposto de renda das pessoas jurídicas (art. 147, TI, do RIR)I5l.
Mas, com a mesma liberdade com que a lei criou a autonomia patrimonial, como
instrumento para a prossecução de certos fms, também ela pode recusar essa mesma
autonomia, na medida em que se revela prejudicial ou inadequada para os objetivos vi-
sados. Não repugna, por isso, que a equiparação da filial a empresa independente tenha
sido recusada, excepcionalmente, em matéria de tributação, por retenção na fonte, da

148 Ver a excelente exposição de MANUEL DE ANDRADE, Teoria geral da relação jurídica, I, Coim-
bra 1960, 217 ss.
149 A doutrina italiana predominante nega subjetividade tributária às filiais, pois o sujeito pas-
sivo é a sociedade domiciliada no exterior. Cfr. GARBARlNO, La tassazione, 225 e bibliografia
citada na nota 68;
A. MIRAULo,Doppia imposizione, 74; STEFANO FIORENTINI, La tassazione dei non residenti, 1988,
9; C. C. CARLI, La soggettività passiva delle società e degli enti non residenti, in UCKMARj
MAGNANIjMARoNGIU (org.), 11 reddito di impresa nel nuovo testo unico, Milão 1988, 713.
150 Sobre a autonomia patrimonial no Direito Tributário, cfr. R. FALCÓN y TELLA, Analisis de la
transparencia tributaria, 302 sS.; A. LOVÍSOLO, Le estabile organizazzione, in VICIOR UCK-
MAR (org.), Corso di Diritto Tributario lnternazionale, Pádua 1999, 270 ss.
151 Sobre a equiparação a pessoas jurídicas de organizações não personificadas pelo direito
privado, ver ENRICO POTITO, Soggetro passivo d'imposta, Enc. dei Dir. XLII (1990), 1226
(1242 ss.) e a bibliografia aí citada. Entre nós, cfr. SOUTO MAIOR BORGES, O fato gerador do
ICM e os estabelecimentos autônomos, Revista de Direito Administrativo 103, 133 ss.
I B I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

matriz, pelos lucros realizados pela filial- pois se entendeu que, neste caso, a tributação
deveria igualmente abranger os lucros levados a reservas, como se tivessem sido dire-
tamente auferidos pela matriz. A lei levanta assim o "véu" da personalidade jurídica,
desconsiderando, neste caso específico, a personificação da ftlial, no que concerne espe-
cificamente às relações com a matriz que se torna, assim, fiscalmente "transparente".
Como se vê, tal como o direito privado, também o direito fiscal conhece a figura
da autonomia patrimonial apenas relativa ou parcial, bem como o reconhecimento
de personalidade jurídica para certos efeitos (imposto de renda das pessoas jurídicas)
e não para outros (imposto de renda na fonte sobre residentes no exterior).
Retorna-se, no que concerne ao campo de incidência deste último imposto, ao
princípio da "unidade da pessoa jurídica" prevalecente no direito privado, segundo o
qual não pode falar-se em presunção de distribuição ou em distribuição automática,
pois neste caso - desprezando a lei a autonomia patrimonial da filial - não se verifica
qualquer "distribuição", mas sim uma realização direta do rendimento pela única enti-
dade que juridicamente é seu titular, a sociedade estrangeira domiciliada no exterior.
A "personalização" das filiais para efeitos tributários conduz a que as suas re-
lações com terceiros sejam equiparadas a verdadeiras relações jurídicas geradoras de
rendimentos tributáveis e despesas dedutíveis, como se a filial fosse uma entidade
juridicamente independente. Assim, por exemplo, admite-se que a filial seja titular
de investimento noutra sociedade, representado por participações societárias de que
resultam dividendos; possa conceder ou tomar empréstimos de que resultam juros,
respectivamente tributáveis e dedutíveis; possa ceder ou receber tecnologia remune-
rada mediante royalties l52 . Este é o pressuposto de que partem as convenções contra a
dupla tributação, que admitem relações jurídicas dos estabelecimentos permanentes
com terceiros e é este também o ponto de vista do direito brasileiro que, como vi-
mos, admite investimentos de filiais em sociedades controladas ou coligadas.
Mais complexo é o problema no que se refere às relações internas entre a filial e a
matriz, caso em que a "unidade da pessoa jurídica" rejeita a existência de verdadeiras
relações jurídicas, pois não pode haver relações consigo próprio.
Apesar de ser esta a realidade, em face do direito privado, parte da doutrina ale-
mã sustenta a tese de que a personificação ou, pelo menos, a autonomia patrimonial
das filiais valeria também no âmbito das relações internas, pois só uma equiparação
das relações internas a relações jurídicas permitiria assegurar o princípio da equi-
paração a empresa independente, especialmente nos casos em que uma convenção
internacional adotasse princípio similar ao do art. 7° do Modelo OCDE. Donde se
seguiria que os empréstimos, cessões de tecnologia, prestações de serviços entre filial
e matriz dariam lugar a juros, royalties e fies dedutíveis na parte da pessoa jurídica que

152 Cfr. MARIA DE LOURDES CORREIA E VALE, A tributaçÍÚJ das empresas, cit., 20 5S. (no direito
português); DUCCINI,Approche ftscale des contrats internatwnaux, Paris 1985, 87.
Título V I Capo II I Residentes no Exterior ID I

os paga e tributáveis na parte que os recebe. É a teoria da independência absoluta das


filiais, sustentada por BARR, BECKER e KLUGE I53 .
No polo oposto, situa-se a teoria da independência restrita, segundo a qual a
autonomia patrimonial tributável da filial não pode sobrepor-se às realidades jurí-
dicas decorrentes do direito privado, transformando em relações jurídicas simples
movimentos internos, donde se seguiria a indedutibilidade (e não tributabilidade)
de aparentes juros, royalties e demais rendimentos. Esta orientação tem o apoio, na
Alemanha, da jurisprudência do Bundesfinanzhof e, na doutrina, de RrrrER, WEBER
e VOGEL I54 .
É ela também acolhida na doutrina e jurisprudência francesas, que aludem a
"quase capital", "pseudojuros" e "pseudo royalties», recusando também a qualificação
como "dividendos" nas relações entre matriz e filial, pois não é esse o canal de subida
(remontée) dos lucros, que são diretamente "apreendidos" por esta l55 •
Pela nossa parte, entendemos que a teoria da independência absoluta é a que me-
lhor se coaduna com o direito brasileiro, tendo em vista, por um lado, a atribuição
de personalidade jurídico-tributária às filiais, o que lhes assegura individualidade
própria, mesmo nas relações com a matriz, e, por outro lado, a revogação do regime
de tributação na fonte da totalidade do lucro, ainda que não distribuído l56 •

153 Cfr. GOTIFRIED BARR, Gewinnermittlung ausldndischer Zweigbetriebe, Munique 1971; BECKER,
lhe Determination afIncame ufa Permanent Establishment ar Branch, Intertax 12 (1989); KID'
GE, Zur unmittelbaren Anwendung von DBA -Wmchriffien bei der Gewinnermittlung, Steuer und
Wirtschaft 294 (1975), 52. Parece ser este o ponto de vista da Administração fiscal italiana
que, interpretando a Normativa tributária sobre atividades com o exterior, equiparou luna
remessa de numerário a um verdadeiro múruo entre empresas independentes. Cfr. CARLO GAR'
BARINO, I redditi prodotti ali' estero mediante stabili organizzazioni, in AAVv, Operazioni ftscali
internazionali eftscalità, Milão 1987, 78; e ID., La tassazione, 226 ss. Vertambém, no Uruguai,
a posição de JOSE LUIS SHAW, El impuesto a las rentas de la industria y comercio, in V ALDÉS
COSTA!PEIRANO FACIO (org.), Manual de Derecho Financiero, III, Montevideo 1988, 157.
J 54 Cfr. artigos de RITIER e WEBER, citados em K. VOGEL, On Double Taxation Conventions
(trad.), Deventer 1997, 428.
155 Cfr. GOlJfHIERE, Les impôts, 153 ss., referindo, porém, que esta doutrina abre uma ressalva no
que toca às instituições financeiras, em relação às quais, pela peculiaridade do seu negócio, as
Administrações fiscais tendem a admitir a dedutibilidade (e tributabilidade) dos juros devidos
nas operações internas entre matriz e filial: cfr. IRENE BURGER, Taxation and Supervision of
Branches ofInternational Banks, Arnsterdam 1992; liA, Permanent Establishments ofBanks, In-
surance Companies and other FinanciaI Institutions, CDFI LXXXI-a (1996), 843; OCDE, The
taxation ofInternational Banking Enterprise, in Transfer Pricing and Multinacional Interprise,
Paris, 1984; ID, Atrribution of income to Permanent Estabilishement, Paris, 1994, Parte lI.
J56 O Acórdão da Câmara Superior de Recursos Fiscais 01.0.087, de 27 de junho de 1980,
concluiu pela indedutibilidade de juros e variações cambiais em operação financeira realizada
entre matriz estrangeira e sua filial brasileira, tendo em vista que o princípio da unidade da
pessoa jurídica torna inadmissível a figura do empréstimo e a estipulação de juros. Discutível,
porém, foi a aplicação ao caso concreto da doutrina do disregard da personalidade jurídica
para qualificar uma subsidiária como filial. Cfr. Câmara Superior de Recursos Fiscais. Im-
posto de Renda. Jurisprudência 1.2-6, Resenha Tributária 1980, 1641 ss.
!iIIi) I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

c) A personalidade jurídico-tributária das filiais de sociedades estrangeiras

Aprofundemos mais a natureza e as implicações da atribuição de personalidade


jurídica, para efeitos fiscais, às filiais de sociedades estrangeiras.
Como atrás se viu, o art. 146 do RIR dispõe que "são contribuintes do imposto
e terão seus lucros apurados de acordo com este Regulamento: I - as pessoas jurídicas;
II - as empresas individuais". E o art. 147 dispõe que "consideram-se pessoas jurídicas,
para efeito do disposto no inciso I do artigo anterior: I - ( .... ); II - as filiais, sucursais,
agências ou representações no País das pessoas jurídicas com sede no exterior; III - ( .... )".
Assim, como a lei "considera" - por ficção equiparadora - as filiais de sociedades
estrangeiras como pessoas jurídicas e declara que as pessoas jurídicas são contribuintes do
imposto, automaticamente se conclui que as referidas filiais são contribuintes do imposto.
De harmonia com o art. 121, § único, inciso I, do Código Tributário Nacional,
diz-se contribuinte o sujeito passivo da obrigação principal "quando tenha relação pes-
soal e direta com a situação que constitui o respectivo fato gerador". O que significa,
pois, que as filiais de sociedades estrangeiras, sendo contribuintes, são também sujeitos
passivos do imposto, isto é, "a pessoa obrigada ao pagamento de tributo ou penalidade
pecuniária", como define o art. 121, caput, do Código Tributário Nacional. E, sendo
sujeitos passivos do imposto, têm, por conseguinte, personalidade jurídico-tributária,
conquanto não tenham personalidade jurídica do ponto de vista do direito privado.
O problema da personalidade jurídica no Direito Tributário tem sido colocado
na doutrina a respeito de certas realidades que não gozam em geral de personalidade,
mas que recebem ou parecem receber um tratamento individualizado ou subjetivado
pelas normas fiscais: é o que sucede com os chamados "entes de fato" que dispõem de
uma certa unidade econômica, de uma certa autonomia patrimonial que, em princípio,
os torna suscetíveis de uma tributação unificada. E isto quer se trate de associações de
pessoas (sociedades de fato, consórcios, associações não reconhecidas), quer de orga-
nizações de bens (fundos de previdência, fundos de investimento, massa falida).
Essa suscetibilidade de uma tributação unificada concretiza-se em certos orde-
namentos jurídicos pela atribuição a tais entidades de uma individualidade jurídica
circunscrita ao terreno fiscal, o que levanta o problema da qualificação dogmática de
tal posição jurídica subjetiva l57 •
A pessoa jurídica não é a forma de uma realidade social pré-normativa, como
pretendia a teoria organicista e antropomórfica de GIERKE e desenvolvida por BERLE,
SERICK e DEsPAX. A realidade pré-normativa é sempre e só constituída por homens. O
que sucede é que a lei muitas vezes dita uma disciplina peculiar para certa categoria
de relações entre homens, disciplina que se traduz na sua unificação e na sua imputa-
ção a uma entidade abstrata, dada a necessidade de imaginar um titular de direitos e
deveres distinto das pessoas físicas. A noção de pessoa jurídica é por isso e por natu-

157 efr. ALBERTO XAVIER,Manual de Direito rzscal, I, Lisboa 1974 (reimpressão 1981), 355 ss. e
a bibliografia aí citada.
Título V I Capo 11 I Residentes no Exterior M.".

reza uma noção funcional e relativa: funcional, porque a referida disciplina normativa
de relações entre homens é ditada para que estes prossigam determinados fins de um
modo mais conveniente e racional; relativa, porque, sendo funcional, ela pode valer
para determinados fins ou efeitos mas não valer quanto a outros.
Assim é perfeitamente concebível que o Direito Fiscal adote quanto ao círculo
dos detentores de personalidade jurídica uma atitude diversa da do Direito Comum;
e isto porque as mesmas relações entre homens podem ser valoradas unitária e sub-
jetivamente para efeitos fiscais e serem-no apenas atomística e dispersivamente para
outro ou outros efeitos. E na verdade é precisamente isto o que sucede e em duas
direções ou sentidos distintos: nuns casos, o Direito Fiscal trata como pessoas jurídicas
relações que para a generalidade dos efeitos de direito não são concebidas unitária e
subjetivamente, como sucede precisamente com as filiais de sociedades estrangeiras, as
sociedades em conta de participação e as empresas individuais; noutros casos, o Direito
Fiscal despreza a personalidade jurídica com que a lei dotou certas relações para a ge-
neralidade dos efeitos, destruindo o véu dessa personalidade (disregarding ou piercing
the veil of corporate entity) que se torna por assim dizer "transparente", penetrando
diretamente (Durchgriff) nas pessoas físicas que constituem o seu substrato: é o que se
passa quando a lei fiscal despreza a personalidade jurídica das sociedades para tributar
exclusivamente os sócios, quando rompe o véu da personalidade jurídica das socieda-
des agrupadas para ditar uma disciplina unificada ao grupo, adotando a teoria do órgão
ou do balanço consolidado, quando ignora a entidade jurídica das sociedades-base para
tributar os sócios das sociedades matrizes mesmo por lucros não distribuídos.
Num sentido ou no outro é inegável o tratamento autônomo pelo Direito Fis-
cal da noção de personalidade jurídica, técnica instrumental, funcional e relativa que
utiliza à luz das valorações que lhe são próprias: e daí aceitarmos plenamente, no que
concerne às filiais de sociedades estrangeiras, o conceito de personalidade tributária)
como a suscetibilidade de ser sujeito da relação jurídico-tributária l58 .

C) Os princípios da independência da tributação e da separaçlÚJ contábil

Corolário da atribuição de personalidade jurídica, para efeitos fiscais, às socieda-


des estrangeiras é o princípio da independência da tributação das filiais - estabelecido
nos arts. 146 e 147 do RIR -, aliás acompanhado do princípio instrumental da con-
tabilidade separada - aflorado nos arts. 251, 397, 822 e 840 do mesmo diploma l59 •
Consagrou-se, assim, o chamado método direto, segundo o qual o lucro tributável
de cada dependência decorre da sua própria contabilidade, por oposição ao método
indireto - utilizado noutras legislações, como a suíça -, segundo o qual aquele lucro é

158 Cfr. TULlO ROSEMRUJ, Derecho Fiscal Internacional) Barcelona 2001, 84 sS.
159 Este princípio é conhecido pelas siglas ALISA (Ann)s length, separate accounting basis of
taxation).
I p I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

considerado como uma parcela do lucro global da pessoa jurídica, parcela essa apura-
da com o auxílio de critérios presuntivos de repartição do rendimento, como a cifra
de negócios, ou a massa salarial l6o •
Corolários do método direto são, por um lado, o princípio da territorialidade das
despesas - apenas são dedutíveis os custos e despesas realizadas pelas dependências loca-
lizadas no território (art. 397 do RIR)161 - e, por outro lado - o princípio da conexão
efetiva, segundo o qual apenas são considerados os lucros atribuídos à dependência
(effectively connected income) e não todo e qualquer lucro realizado no território, ainda
que não atribuível ao estabelecimento, como pretende o princípio da força atrativa l62 •

a) O principio da territorialidade das despesas


Vejamos, em primeiro lugar, o princípio da territorialidade das despesas, con-
sagrado no art. 397 do RIR, segundo o qual "as pessoas jurídicas domiciliadas no
exterior e autorizadas a funcionar no país somente poderão deduzir como custos ou
despesas aqueles realizados por suas dependências no território nacional, bem como:
I - as quotas de depreciação, amortização ou exaustão de bens situados no país; II -
as provisões relativas a operações de suas dependências no país".
J. L. BULHÕES PEDRElRA l63 sustenta que a restrição "no território nacional" não
se refere às despesas ou custos, mas às dependências das empresas domiciliadas no
exterior, pelo que seriam dedutíveis custos ou despesas, ainda que realizados no ex-
terior, mas desde que suportados pela dependência local. E baseia esta sua opinião
na diferente redação do art. 64 da Lei nO 4.506 - "despesas realizadas pelo estabele-
cimento de empresa estrangeira no território nacional", quando a legislação anterior
se referia a despesas "realizadas no território nacional". Assim - segundo o mesmo
autor -, "ainda que se trate de pagamento de bem ou serviço importado do exterior,
ou de rendimento pago a pessoas residentes ou domiciliadas no exterior, se a despesa
é realizada pela filial no país, pode ser computada na determinação do seu lucro ope-
racional". No mesmo sentido apontam numerosos Protocolos às convenções contra
a dupla tributação que reconhecem a dedutibilidade das despesas, quer estas sejam

160 Sobre a distinção entre métodos direto (ObjektmdfligeAusscheidung) e indireto (Quotenmdflige


Ausscheidung), ver HÓHN, Doppelbesteuerungsrecht, Bern/Stuttgart 1973, 276; MEERSMANN,
Die Ertragsbesteuerung inldndischer Betriebstdtten und Tochtergesellschaften ausldndischer Kapi-
talgesellschaften, 1966; KLUGE, Das deutsche Internationale Steuerrecht, 177 SS.
161 Cfr. GARBARINO, La tassazione, 161, segundo o qual as regras de localização não respeitam
exclusivamente ao rendimento bruto, mas também às despesas dedutíveis.
162 Cir. PIERRE TEL, Le régime fiscal des filiales et succursales de sociétés étrangeres, Bruxelles 1973;
MARIA DE LOURDES CORREIA E VALE,A tributação das empresas com estabelecimentos estáveis no
estrangeiro, CTF 179/180 (1973),7; A. SIMONI, La forza di attrazione della stabile organiz-
zazione, in UCKMAR/MAGNAN1/MARONGIU (org.), Il reddito di impresa nel nuovo testo unico,
Milão 1988, 745.
163 Cfr. Imposto de Renda, 6.38, 630 (3).
L Título V I Capo 11 I Residentes no Exterior IB I

realizadas no Estado em que o estabelecimento permanente estiver situado, quer


seja em qualquer outro lugar. Ao invés, não são dedutíveis despesas realizadas pela
matriz no exterior, ainda que a título de quota ideal de despesas gerais. Em suma: a
territorialidade em causa refere-se não ao lugar da realização da despesa, mas à sua
conexão com o estabelecimento localizado no território do país.
Note-se que a lei ditou critérios específicos de localização de certas despesas
de caráter predominantemente abstrato, por representarem imputações teóricas de
custos, como as depreciações e provisões, considerando-as realizadas no território
nacional se relativas a bens aqui situados ou referentes a operações imputáveis às
dependências que funcionam no país.

b) O princípio da conexão efetiva e a rejeição da força atrativa


O:lloca-se o problema de saber se às filiais podem ser imputados os resultados de-
correntes de operações realizadas no Brasil diretamente pelas sociedades matrizes domi-
ciliadas no exterior, em que não tenham tido qualquer interferência ou participação.
Muito embora nunca tenha tomado posição no problema por via de ato norma-
tivo, o Fisco - nalgumas decisões concretas - orientou-se no sentido de considerar
que toda e qualquer operação efetuada pela matriz, diretamente, no Brasil, deve ser
atribuída à sua filial neste país. E, se bem que não o tenha expressamente invocado,
pode deduzir-se do texto das mencionadas decisões que se baseou na ideia de unida-
de da pessoa jurídica para defender a regra da "força de atração" da filiaP64.
Devemos mencionar que a referida posição do Fisco não se apresenta firme e
categórica. Em primeiro lugar - como já se referiu -, nunca foi assumida em ato
normativo, ao contrário de diversos outros pontos do regime das filiais de sociedades
estrangeiras, detalhadamente examinados no Parecer Normativo CST nO 5/74, de 6
de março de 1974; em segundo lugar, as decisões que conhecemos são já antigas,
remontando a mais de uma dezena de anos; enfim, alguns pronunciamentos vul-
garmente invocados como representativos de tal opinião foram-no indevidamente,
e um seu exame atento revela não terem tratado do problema em causa (algumas
autuações respeitam, isso sim, a sociedades vinculadas a empresas no exterior por
contrato de representação, exclusiva ou não, e que recebem comissões pelas vendas
diretas realizadas, e em que o Fisco presumiu a interferência).
O nosso entendimento é em sentido contrário à mencionada posição do Fisco,
ou seja, o de que às filiais de empresas estrangeiras apenas são imputáveis os lucros
das operações por elas próprias realizadas, de tal modo que os resultados das vendas
diretamente efetuadas pela matriz, sem participação da filial, não podem ser atribuí-
dos a esta última. Baseamos este nosso entendimento em vários argumentos distin-
tos, que passamos a enunciar.

164 O princípio da force of attraction foi utilizado longamente nos Estados Unidos, mas depois
abandonado, após o Foreign Investors Tax Act de 1966.
I !!li I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier ··;1

Da combinação dos arts. 146, 147, inciso II, e 253 do RIR, resulta que as fi-
liais de empresas estrangeiras são consideradas pessoas jurídicas para efeitos fiscais
e, como tal, assimiladas a empresas independentes, devendo a respectiva tributação
basear-se nos lucros reais constantes da respectiva contabilidade. Admitindo-se a in-
dependência e autonomia da filial, consagrada numa contabilidade separada, não
podem ser-lhe imputadas operações realizadas pela matriz, registradas diretamente
na contabilidade própria desta última.
Este argumento mais se reforça tendo em vista a própria expressão verbal do
legislador, que se refere aos resultados obtidos no Brasil "por" dependências de em-
presas domiciliadas no exterior (RIR, arts. 397 e 398) ou "por intermédio" de filial,
sucursal ou agência do vendedor no país (Portaria nO 228, item 3, alínea d). Signi-
ficam estas expressões que, para que os resultados sejam atribuídos a tais dependên-
cias e nelas tributados, é necessário que as operações de que derivam tenham sido
realizadas através delas, isto é, em que elas tenham atuado como partes. Operações
diretamente realizadas pela matriz sem interferência da filial não podem considerar-
se realizadas "por" ela ou "por intermédio" dela 165 •
Outra razão em defesa deste ponto de vista pode extrair-se da comparação com
o regime dos comissários e representantes de pessoas domiciliadas no exterior, de-
talhado pela Portaria nO 228, de 8 de maio de 1974. Na verdade, os comissários de
comitentes domiciliados no exterior são tributados pelos lucros obtidos por seus
próprios meios e constantes de contabilidade separada, não prevendo a lei, nem
admitindo a jurisprudência, qualquer exceção a este regime, designadamente a im-
putação aos lucros do comissário de operações diretamente realizadas no Brasil pelo
próprio comitente, sem interferência do primeiro. Ora, tendo a lei equiparado o
regime jurídico das filiais e dos comissários, não há razão para aplicar às primeiras
conclusões que se negam quanto aos segundos.
Contra a posição que defendemos, poderia invocar-se que a faculdade de arbitra-
mento dos lucros (RIR, arts. 399 e 539) só se explicaria se os seus lucros não fossem
apenas os determinados segundo a contabilidade; antes abrangessem os decorrentes
da sua "força atrativa", designadamente os apurados em vendas diretas da matriz.
Não aceitamos, porém, esta argumentação. Em primeiro lugar, deve notar-se que o
art. 76 da Lei na 3.470/58 não prevê o arbitramento quanto às filiais, limitando-se a ad-
miti-lo quanto aos mandatários ou comissários de comitentes domiciliados no exterior.
Tal previsão consta apenas da Portaria n° 228, que neste ponto se pode reputar ilegal.
Independentemente, porém, deste ponto, a previsão de arbitramento não tem o
significado que, com aquele argumento, se lhe pretende emprestar. As regras sobre
arbitramento são normas de direito probatório e não de direito material, isto é, dizem
como fixar o quantum de certos fatos, mas não definem os próprios fatos a provar.
Por outras palavras: prevê-se o arbitramento como meio subsidiário de prova dos fa-

165 efr., em sentido similar, no direito italiano, GARIlARINO, La tassazione, 196 5S., aludindo à
necessidade de existência de um "nexo funcional".
Título V I Capo 11 I Residentes no Exterior -i-
tos que o contribuinte deveria registrar, mas que não apurou regularmente (art. 76, §
2°, da Lei nO 3.470/76), estabelecendo-se que, no caso especial de vendas realizadas
por intermédio de agentes ou representantes, tal arbitramento efetuar-se-á à razão de
20% do preço total da venda (art. 76, § 3°). Mas nem o art. 76 da Lei nO 3.470 nem
a Portaria nO 228 têm o alcance de defInir quais os resultados que o contribuinte deve
apurar regularmente. Em matéria de fIliais, esse alcance pertence aos arts. 398 e 253,
dos quais decorre a conclusão de que os lucros que a filial deve regularmente apurar
são aqueles que obteria como se fosse empresa independente. Só quanto a estes se
poderá proceder a arbitramento, em caso de irregularidade na sua apuração.
Vale, pois, dizer que não existe, no nosso direito positivo, uma presunção de
interferência da filial na obtenção dos lucros da matriz, de tal modo que se o Fisco
suspeitar de qualquer participação caber-lhe-á o encargo da prova.
A solução que defendemos é também a que se encontra consagrada em todas as
convenções destinadas a evitar a dupla tributação, subscritas pelo Brasil. Na verdade,
as disposições convencionais - seguindo neste particular o art. 7° do Modelo OCDE
- determinam que, no caso de uma empresa domiciliada num Estado contratante
exercer a sua atividade no outro Estado contratante por meio de um estabelecimento
permanente aí situado (e a filial é um caso típico de estabelecimento permanente), os
seus lucros serão tributáveis no outro Estado, "mas unicamente na medida em que
forem atribuíveis a esse estabelecimento permanente". Esta ressalva tem por objetivo
- de harmonia, aliás, com a interpretação oficiosa do texto, feita pela Comissão de
Assuntos Fiscais da OCDE - afastar definitivamente a teoria da "força de atração" e
consagrar a regra da assimilação a empresa independente l66 .

D) Relações filial-matriz: eliminação do imposto de renda na fonte sobre o lucro


automaticamente atribuído à matriz

Envolve difíceis problemas doutrinários o regime jurídico-tributário da atribui-


ção, à matriz, dos lucros auferidos pela filial. A lógica pura do princípio da tributação
independente e da contabilidade separada conduz, na verdade, a que a fIlial seja trata-
da, para efeitos tributários, com total autonomia, como se de pessoa jurídica distinta
se tratasse, mesmo nas relações com a matriz, de tal forma que de distribuição de
lucro apenas se poderia falar se e quando a filial formalmente creditasse ou pagasse
esse mesmo lucro à sede principal.
Mas se o princípio da tributação independente vale no que tange à tributação
dos lucros auferidos pela filial 167, já não era respeitado, pela legislação anteriormente
vigente, no que toca à tributação, na fonte, dos lucros atribuídos pela filial à matriz.

166 Cfr. infra, 558 sS.


167 E valia no que toca ao extinto imposto sobre lucros distribuídos, previsto no art. 227 do
RIR/75. Cfr. Parecer Normativo CST nO 5, de 6.3.74 (hoje superado).
I B I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Com efeito, o direito positivo consagrava o regime de que os lucros auferidos


pela filial eram ipso jure percebidos pela matriz (ou, para usar terminologia menos
correta, consagra a presunção de que os lucros eram automaticamente distribuídos à
matriz), invocando alguns autores o princípio da unidade da pessoa jurídical68 •
Dispunha, na verdade, o art. 757 do RIR/94 que "estão sujeitos à incidência
do imposto na fonte, à alíquota de quinze por cento, considerados automaticamente
percebidos pela matriz na data do encerramento do período-base, os lucros das fi-
liais, sucursais, agências ou representações, no País, de pessoas jurídicas com sede no
exterior", acrescentando o § único que "o imposto de que trata este artigo alcança,
igualmente, os rendimentos auferidos por comitentes domiciliados no exterior, nas
operações realizadas por seus mandatários ou comissários no Brasil".
Os preceitos regulamentares atrás citados resultavam da interpretação das auto-
ridades administrativas e da jurisprudência dos tribunais, conforme esclarece GILBER-
TO DE ULHÔA CANTO I69 : ']\ princípio, entendeu-se que os lucros apurados pelas filiais
de empresas estrangeiras no Brasil somente incorreriam no fato gerador do imposto
de distribuição (o correspondente à passagem do lucro ao seu beneficiário, no caso, à
matriz estrangeira) quando houvesse a exteriorização de uma das hipóteses discrimi-
nadas no acima referido art. 100, vale dizer, pagamento, crédito, emprego, remessa
ou entrega do lucro à matriz, mediante lançamento contábil ou ato expresso nesse
sentido. Mais recentemente, entretanto, formou-se jurisprudência, que hoje em dia
é pacífica, no sentido de que a filial, sendo mero prolongamento da personalidade
jurídica de sua matriz, e pois, não tendo autonomia deliberativa, o fato mesmo de
certo lucro ser evidenciado na conta de lucros e perdas do estabelecimento no Brasil,
não dependendo a disponibilidade jurídica sobre esse lucro, de qualquer deliberação
de assembleia ou outro órgão, deve-se ter como automático emprego na própria
filial, do lucro que não tenha sido entregue, remetido ou pago à matriz, nem sendo
mister, por outro lado, o crédito, pelas razões expostas. Em consequência de tal inter-
pretação, a consulente estaria normalmente sujeita, ao encerrar seu balanço e indicar
na conta de lucros e perdas os resultados do exercício, desde logo a dois impostos
sobre a renda: o correspondente à realização do lucro, ônus da filial, e o pertinente à
distribuição à matriz, por esta suportado afinal, mediante a dedução do efetivamente
remetido, mesmo que não incorresse, por meio de ato expresso, em qualquer dos
eventos relacionados no precitado art. 100, porquanto o emprego se presume pela
simples indicação do resultado na conta de lucros e perdas da filial".
Tratava-se de um branch tax (similar ao branch profits tax norte-americano intro-
duzido pela reforma de 1986), tipo de imposto instituído para compensar o Tesouro

168 Cfr. RUBENS GOMES DE SOUSA, Pareceres - Imposto de Renda, lI, 45 e 53. Sobre a evolução
histórica deste regime, cfr. ID., O imposto sobre a renda das sociedades estrangeiras, in ID.,
Estudos de Direito Tributário, São Paulo 1950, 11 55.; GILBERTO DE ULHÓA CANTO, Temas de
Direito Tributário, I, Rio de Janeiro 1955, 321 55.
169 Cfr. Temas de Direito Tributário, 322-323.
Título V I Capo 11 I Residentes no Exterior I WJ I

pelo fato de não haver nas relações entre a matriz e a filial uma verdadeira distribui-
ção de dividendo tributável, mas cuja alíquota é frxada em nível inferior ao que se
aplica nas relações entre matriz e subsidiária, pois a filial não pode escolher entre
a distribuição e a manutenção dos lucros em reserva l7O . A diferença essencial entre
o imposto brasileiro sobre filiais e o branch profits tax norte-americano é que este
apenas se aplica aos lucros não reinvestidos, atingindo apenas o dividend equivalent
amount, como forma de equiparar o tratamento fiscal entre sucursais e subsidiárias
de sociedades estrangeiras, enquanto o primeiro abrangia a totalidade dos lucros,
ainda que não "distribuídos", conduzindo assim a um tratamento menos favorável
das sucursais - o que de resto explica a aversão por esta fórmula no BrasiP71.
A isenção do imposto de renda na fonte sobre lucros e dividendos distribuídos a
residentes no exterior, consagrada pelo art. 10 da Lei nO 9.249/95, alterou radicalmen-
te o regime anterior, pois, cessada a incidência sobre lucros efetivamente distribuídos,
cessa igualmente sobre os lucros presumidamente distribuídos (RIR, art. 694)172.
Assim, as filiais ou sucursais de sociedades estrangeiras passam a ser tributadas
da mesma forma das subsidiárias, ou seja, só há incidência de imposto de renda no
contribuinte que produziu o lucro, não havendo nova tributação na sua atribuição
ou distribuição à matriz, no exterior.
Cessou, deste modo, o regime fiscalmente mais desfavorável a que historica-
mente estiveram submetidas no Brasil as filiais ou sucursais de sociedades estrangei-
ras e que foi causa da sua escassíssima utilização prática.

§ 2° COMISSÁRIOS E REPRESENTANTES DE RESIDENTES NO EXTERIOR

A) Os negócios celebrados com interposição de pessoas

O problema sobre o qual nos vamos agora ocupar respeita à determinação dos
casos em que uma venda internacional de mercadorias se pode considerar realizada
no Brasil e neste país auferido, total ou parcialmente, o lucro a ela imputável, tendo
por objeto problemática afim àquela que no Direito Internacional Privado se sus-
cita a propósito da determinação do lugar de celebração do contrato inter absentes.
Só que, enquanto aqui prevalece a perspectiva civilística que atende à relevância da
vontade e à formação do mútuo consenso - debatendo-se apenas se este se forma no

170 Cfr. GOUTHIERE, Les impôts dans les affaires internationales, Paris 1991, 155; J. D. KUNTZ/R.
J. PERON1, U.S. International Taxation, lI, C1-133.
171 Cfr. DEBATIN/ENDRES, The new US/German Double Tax Treaty, Munique 1990, 155 e 287.
172 Perde, assim, também o sentido o entendimento do Fisco (Portaria nO 842/79 e AND 11/79
e 34/79) de que os resultados da equivalência patrimonial de investimentos detidos por filial
ou sucursal integravam a base de cálculo do imposto de renda na fonte. Sobre a discussão
deste ponto, cfr. a 4 a edição deste livro, 432 ss.
I D I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

lugar da expedição da aceitação (Auflerungstheorie) ou no da recepção da aceitação


(Vernehmungstheorie) 173 -, no Direito Tributário Internacional tem-se em vista apurar
o lugar onde se produziu a renda no caso de vendedor e comprador serem domici-
liados em país diverso.
N o caso de a venda (exportação-importação) ser direta, isto é, sem auxílio de
intermediários, o contrato presume-se celebrado totalmente no exterior e a renda
imputada diretamente ao território do domicílio do vendedor.
Todavia, coloca-se a questão de saber se não haverá já alguma conexão relevante
com o país de domicílio do comprador, no caso de o vendedor aí atuar através de
intermediário (interposição negocial de pessoas). Em determinadas circunstâncias,
a conexão pode ser tão forte que leve o legislador a reconhecer que a venda se reali-
zou neste último país através de estabelecimento aqui localizado, estabelecimento de
caráter pessoal, por contraposição ao estabelecimento propriamente dito, de caráter
real 174• Assim procedendo, a lei presume que o lucro foi realizado no país em que tal
"estabelecimento" se situa e tributa-o como se ele fosse imputável a uma organização
de pessoas e bens equiparada, para efeitos fiscais, a empresa independente, ou seja,
como se fosse imputável a um patrimônio autônomo personificado, análogo à filial
da pessoa jurídica residente no exterior.
A análise do art. 76 da Lei na 3.470, de 28 de novembro del958, bem como
da Portaria na 228 que visou a esclarecer o seu alcance, e cujos dispositivos foram
reproduzidos nos arts. 398, 399 e 539 do RIR, conduz à conclusão de que a lei só
assimilou a estabelecimento permanente, tributável como empresa independente, os
casos de interposição negocial de pessoas que tecnicamente se caracterizam como
de comissão e de representação, excluindo porém deste regime as figuras afins do
núncio e do mediador.
E isto por entender que só naqueles casos se pode reconhecer a existência de
uma participação autônoma e distinta da pessoa domiciliada no exterior na ordem
tributária da residência do comprador, idônea para fundamentar a tributação local de
todos ou parte dos lucros imputáveis à operação, ao revés do que sucede nos casos
do núncio e do mediador que se limitam a auxiliar, sem autonomia, uma operação
realizada no exterior.
O art. 76 da Lei na 3.470, de 28 de novembro de 1958, determinou assim: "As
disposições legais que regulam a tributação dos lucros aplicados no território na-
cional pelas filiais, sucursais, agências ou representações das sociedades estrangeiras
autorizadas a funcionar no país, alcançam, igualmente, os rendimentos auferidos por
comitentes domiciliados no exterior, nas operações realizadas por seus mandatários
ou comissários no Brasil.
"§ 10 Para os efeitos deste artigo, o agente ou representante do comitente com
domicílio fora do país deverá escriturar os seus livros comerciais de modo que de-

173 efr. H. VALLADÃO, Direito Internacional Privado (4" ed.), I, Rio de Janeiro 1974, 358 ss.
174 Sobre o conceito de estabelecimento permanente pessoal, ver GARBARlNO, La tassazione, 212.
Título V I Capo 11 I Residentes no Exterior Mii'
monstre, além dos próprios rendimentos, os lucros reais apurados nas operações de
conta alheia, em cada ano.
"§ 2° Quando não forem regularmente apurados os resultados das operações de
que trata este artigo, será arbitrado o lucro, para os fins de tributação, na conformi-
dade da legislação em vigor.
"§ 3° No caso de serem efemadas vendas, no país por intermédio de agentes
ou representantes de pessoas estabelecidas no exterior, o rendimento tributável será
arbitrado à razão de 20% (vinte por cento) do preço total de venda, famrado direta-
mente ao comprador".
Foram numerosas as dificuldades suscitadas pela interpretação e aplicação deste
preceito, que fez correr rios de tinta175 • Precisamente para esclarecer as dúvidas dele
decorrentes, surgiu a Portaria nO 228 do Ministro da Fazenda, de 8 de maio de
1974, a qual introduziu a distinção entre vendas famradas direta e indiretamente
ao comprador no Brasil, subdistinguindo, na primeira hipótese, os casos em que os
intermediários (comissários, mandatários, agentes ou representantes) tenham ou não
poderes para obrigar contramalmente o vendedor.
Todavia, a flumação da terminologia da lei para designar os intermediários, bem
como a ausência de caráter técnico-jurídico da linguagem utilizada pela Portaria, ao
distinguir famramento direto e indireto, tornam imprescindível o recurso às catego-
rias já elaboradas pela teoria geral do direito para caracterizar os diversos casos de
interposição de pessoas na celebração de negócios jurídicos.

B) Comissão e representação
No caso da comissão (Código Civil de 2002, art. 693, que substimiu o art. 165
do Código Comercial revogado pelo CC de 2002), ocorre a figura da interposição
gestória, ou da representação indireta, a qual é objeto de um contrato de mandato,
mandato esse, porém, que não confere poderes de representação. Com efeito, o co-
missário celebra negócios em nome próprio, embora por conta alheia, ao invés do
representante, que celebra negócios em nome alheio. Na representação, os efeitos
jurídicos do contrato inscrevem-se diretamente na esfera jurídica do representado (e,
por isso, a Portaria nO 228 se refere a "famramento direto"), enquanto na comissão
os efeitos jurídicos do contrato são primeiro imputados ao comissário, o qual carece
de, ulteriormente, celebrar negócio translativo para que estes circulem para a esfera
jurídica do comitente (e daí a alusão a "famramento indireto")176.

175 Cfr. BULHÕES PEDREIRA, Imposto de Renda, 1.24 e 6.60; GILBERTO DE ULHÕA CANTO, Estudos
e Pareceres de Direito Tributário, 424 sS.
176 As convenções contra a dupla tributação aludem também ao comissário como representante
(independente), mas com manifesta impropriedade. Na comissão, não há verdadeira repre-
sentação (embora exista mandato), de tal sorte gue só poderá falar-se em representação in-
§ I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Pode colocar-se a questão de saber em que medida se explica que a atuação do


comissário determine a tributação do comitente. Tal tributação é facilmente explicá-
vel no caso do representante, pois este pratica atos em nome do representado, de tal
sorte que a renda obtida através de tais atos se insere diretamente na esfera patrimo-
nial do primeiro. A renda está na titularidade do representado, embora imputada a
um patrimônio autônomo seu, situado no país em que atua o representante.
Mas no caso da comissão os atos praticados pelo comissário, sendo praticados
nomine proprio, não deveriam - no rigor dos princípios civilísticos - fundar uma
tributação do comitente. Os lucros do comissário seriam tributados no Brasil, mas
os lucros do comitente - apenas realizados com a celebração de negócio translativo
- somente deveriam ser taxados no exterior. Todavia, a unidade econômica entre co-
mitente e comissário sobrelevou à separação das respectivas esferas jurídicas, condu-
zindo a assimilar o tratamento tributário dos atos praticados em nome alheio ao dos
atos praticados por conta de outrem. Sendo num e noutro caso os efritos econômicos
do negócio atribuídos ao mandante (comitente ou representado), a ele impôs a lei a
obrigação de imposto.
Comissário e representante são havidos, pela lei fiscal, como estabelecimentos
permanentes dos comitentes e representados (estabelecimento pessoal), gozando de au-
tonomia patrimonial e sendo tributados como se de empresa independente se tra-
tasse. Mas é o comitente residente no exterior que é equiparado, pela lei fiscal, a pessoa
jurídica (art. 147, lII, do RIR). Impõe-se, pois, a separação rigorosa entre o lucro
do comitente e do representado, por um lado (sujeito ao regime de tributação do
lucro das pessoas jurídicas domiciliadas no Brasil e à retenção na fonte sobre lucros,
em termos idênticos aos das filiais) e os rendimentos próprios do comissário e do
representante, por outro, pelo que a lei impõe a sua escrituração separada (RIR, art.
398, § único).
Nos casos de "faturamento indireto", ou seja, de remessa para o Brasil de merca-
dorias consignadas a comissários, para que estes as vendam no país por conta e ordem
dos comitentes, aplicam-se as seguintes regras: o lucro operacional do comitente será
a diferença entre o preço de venda no Brasil e o valor pelo qual a mercadoria tiver sido
importada, acrescido das despesas de operação que correrem por sua conta, inclusive
a remuneração dos serviços atrás referidos; o lucro operacional do comissário será a
diferença entre a remuneração recebida pelos seus serviços e os gastos e despesas de
operação que correrem por sua conta (art. 398, § único, a e b, do RIR).

direta, mediata ou imprópria. Cfr. M. ANDRADE, Teoria geral do negócio jurídico, lI, Coimbra
287,293; FERNANDO PESSOA JORGE, Do mandato sem representação, Lisboa 1961. Entre nós,
a obra clássica sobre a matéria é o estudo de ORLANDO GOMES, Do representante comercial,
Rio de Janeiro 1968, cujo alcance vai bem para além do simples comentário à Lei nO 4886
de 1965, relativa ao representante comercial. Sobre a figura do representante em matéria
de imposto sobre serviços, cfr. BERNARDO RlBEIRO DE MORAES, Doutrina e prática do imposto
sobre serviços, São Paulo 1975, 308 SS.
Título V I Capo 11 I Residentes no Exterior I €In I

No caso de representação, ou seja, de "faturamento direto", o lucro do repre-


sentado é fIxado presuntivamente em 20% do preço total de cada venda (arts. 399 e
539 do RIR)177.
Não se confunde com a comissão e a representação (não estando sujeito ao
regime fIscal destas) o contrato de concessão ou distribuição, poi o concessionário
atua em seu nome e por conta própria, adquirindo a propriedade das mercadorias
por compra ao fabricante ou ao fornecedor para depois as revender a terceiro. Aqui,
o lucro é exclusivamente imputado ao concessionário, no Brasil, e consiste no resul-
tado das vendas que realiza 178 .

C) As figuras do nuntius e do mediador: delegação de assinatura

Do regime que acabou de se descrever estão excluídos os casos de interposição


de pessoas na conclusão de negócios jurídicos que se não podem caracterizar nem
como comissão nem como representação, e dos quais os mais frisantes são o do nun-
tius e o do mediador. Ao contrário do que sucede com o representante - que substitui
a sua vontade à do dominus negotii -, gozando de autonomia e liberdade na iniciativa,
forma, oportunidade ou conteúdo do negócio -, o núncio é um simples instrumento
de transmissão da vontade do dominus, a qual já surgiu manifestada com todos os
elementos necessários à celebração do negócio.
A lei fIscal consagrou a fIgura do núncio, ao excluir do regime de arbitramento
o intermediário que não tem poderes para, no Brasil, obrigar contratualmente o ven-
dedor para com o adquirente (embora, com manifesta impropriedade técnica, conti-
nue a referir-se-Ihe como representante, o que não é). Em tais casos, a venda não se
reputa realizada no Brasil, pelo que o resultado da operação é diretamente imputado
ao país do vendedor. Em preceitos meramente declaratórios, a lei esclarece que não
descaracteriza a fIgura do núncio, não implicando atribuir-lhe poderes para obrigar
contratualmente o vendedor, o fato exclusivo de o vendedor participar no capital do
intermediário 179, nem o fato de este assinar eventualmente no Brasil contrato em
nome do vendedor (art. 539, § único, alíneas c e d, do RIR).

177 Cfr. J. L. BULHÕES PEDRElRA,Imposto de Renda, 1.24 (10). Sobre o caso especial de operações
de navio estrangeiro em território nacional, em que o armador deve constituir representante
legal no país, cfr. Instrução Normativa SRF 137/98.
178 Cfr. CLAUDINEU DE MELLO, Contrato de distribuiçéW, São Paulo 1987, 44 SS.; DUCCINI, Ap-
proche fiscale des contrats internationaux, 197; MARrA HELENA BRITO, O contrato de concesséW
comercial, Coimbra 1990,passim.
179 A jurisprudência administrativa já decidiu que "é necessário que fique provado, para fins
de arbitramento, na forma do art. 401 do RIR/80, que o agente ou representante no Brasil
tenha poderes para obrigar contratualmente o vendedor para com o adquirente situado no
Brasil. O fato exclusivo de o vendedor participar com 99,99% no capital do agente ou repre-
sentante no País não implica atribuir a este poderes para obrigar contratualmente o vende-
dor" (Ac. CSRF/01-967/89 - DO 06.07.90, e 968/90 - Resenha Tributária) jurisprudência-
I U I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Entendemos que configura um caso de nuntius a hipótese de mera delegação de


assinatura) em que um mandatário de pessoa residente no exterior se limita a dispor
de procuração para assinar atos jurídicos cujo conteúdo e cuja oportunidade não pode
influenciar, mas obtendo vantagens de celeridade negocial, enquanto se evitam remes-
sas e devoluções de documentos. O ato jurídico quanto ao qual ocorreu o "mandato
de assinatura" é imputável ao mandante, e, se este se encontra no exterior, o ato repu-
ta-se ter sido aí celebrado, ainda que assinado no Brasil. Desta sorte, mesmo a prática
reiterada de assinaturas de contratos, no Brasil, não configura "funcionamento" da
empresa estrangeira no Brasil, sujeito a autorização administrativa e gerador de um
regime fiscal de equiparação a pessoa jurídica domiciliada no BrasiPso.
Mesmo, porém, no caso em que a delegação de assinatura coexista com outros
poderes, só a prática habitual de atos jurídicos no território brasileiro caracteriza
exercício de atividade funcional, gerador de tributação, sendo irrelevantes os meros
"atos isolados".
Um outro caso de celebração subordinada de compra e venda, que também es-
capa ao regime da equiparação, é o mediador, o qual se distingue do representante e
do núncio, pois, enquanto estes atuam (com ou sem liberdade) na fase de declaração
negocial, o mediador intervém numa fase preparatória ou preliminar e que tende à
sua preparação 1S1 •
Um caso especial de mediador é o agente, que a doutrina tem distinguido do re-
presentante por não concluir negócios jurídicos, antes se limitar a promovê-los com
caráter de habitualidade numa certa área territorial IR2 .
Também a lei fiscal excluiu o mediador do regime de arbitramento, ao declarar
que este se não aplica "no caso de vendas em que a intervenção do agente ou represen-
tante tenha-se limitado à intermediação de negócios, obtenção ou encaminhamento
de pedidos ou propostas, ou outros atos necessários à mediação comercial, ainda que
estes serviços sejam retribuídos com comissões ou outras formas de remuneração,
desde que o agente ou representante não tenha poderes para obrigar contratualmente

CSRF 1.2.30, p. 8.512 e 8.544). No mesmo sentido, v. Ac. l° CC 105-3.190/89 (Resenha


Tributária, IR - Jurisprudência Administrativa 12.7,47).

180 Daí entendermos que "representantes de bancos estrangeiros" podem assinar no Brasil con-
tratos de empréstimos contraídos e aprovados no exterior, sem que tal prática configure
"funcionamcnto" ilegal do Banco 110 país ou suscite um problema "do art. 76".
181 Cfr. BETTI, Teoria general dei negocio jurídico, 423; ANTÔNIO CARVALHO NETO, Contrato de
mediaçtfu (P ed.), São Paulo 1965; ORLA.;'lDO GOMES, Contratos, Rio de Janeiro 1971, 386.
Sobre a figura da intermediação, mediação ou corretagem em matéria de imposto sobre
serviços, efr. BERNARDO RIBEIRO DE MORAES, Doutrina e prática do imposto sobre serviços, 306
ss. Ver também GILBERTO DE ULHÔA CANTO, Estudos e pareceres de Direito Tributário, 427 ss.
182 Cfr. PONTES DE MIRANDA, Tratado de Direito Privado, vol. XLIV, Rio de Janeito, 32; RUBENS
REQUIÃO, Do representante comercial, Rio de Janeiro 1977, 31. Em matéria de imposto sobre
serviços, vcr BERNARDO RIBEIRO DE MoRAES, op. cit., 308. Em Pomlgal, cfr. ANTONIO PINTO
MONTEIRO, Contrato de agência (anotaçtfu ao Decreto-lei nO 118/86, de 3 de Julho), Coimbra 1987.
-====-. Título V I Cap. 11 I Residentes no Exterior -iFi
o vendedor" (RIR, art. 539, parágrafo único, b). Também, nesta hipótese, a venda
não se reputa realizada no BrasiP83.
Em suma: o regime de equiparação a pessoa jurídica domiciliada no Brasil e de
arbitramento do lucro no caso de vendas diretas através de intermediário só se aplica
no caso de a lei reputar a venda realizada no Brasil. E a conexão fundamental para lo-
calizar no país a celebração do contrato é a existência de poderes desse intermediário
para obrigar contratualmente o vendedor.

D) Âmbito de aplicação: operações relativas a mercadorias


O regime atrás descrito vigora apenas para os rendimentos decorrentes de ope-
rações sobre mercadorias, na sequência da interpretação expressa da Portaria nO 228.
O texto original do art. 76 da Lei nO 3.470, de 28 de novembro de 1958, era, na
realidade, bem mais amplo, pois referia-se a operações em geral, sem se circunscrever
às operações relativas a mercadorias. Todavia, o § 3° desse artigo, ao reportar-se ex-
pressamente a vendas, inculcava já de certo modo que se reportava a coisas ou bens e
não a serviços; e ainda no mesmo sentido apontava a menção a "comissários", insti-
tuto ligado ao comércio de mercadorias.
Esta conclusão mais se reforça pela expressa referência do art. 398 do RIR a
"remessa de mercadorias", a "importador ou consignatário", pelo que, em nossa
opinião, o regime em causa não se aplica nas operações de outra natureza, tais como
operações financeiras ou venda de serviços, notadamente seguros.

E) Realização das operações no país


Para que as operações sejam tributáveis no Brasil não basta que no Brasil esteja
domiciliado o representante da sociedade estrangeira: é ainda necessário que as opera-
ções sejam realizadas no país. É o que decorre da referência feita a "resultados das ope-
rações realizadas por seus mandatários ou comissários no país" (arts. 147, ID, e 398).
Que deve entender-se por operações realizadas no País?
Entendemos que esta expressão se refere, não ao lugar da celebração do contra-
to, mas ao lugar onde se localiza a fonte de produção e pagamento do rendimento, ou
seja, o local de domicílio da pessoa destinatária da venda dos bens.
É o que resulta nitidamente do art. 539, § único, do RIR, quando esclarece que
uma venda considera-se efetuada no País "quando seja concluída, em conformidade
com as disposições de legislação comercial, entre o comprador e o agente ou repre-

183 É, por exemplo, o que sucede se uma sociedade estrangeira de seguros vende seguros a
clientes domiciliados no Brasil, através de intermediários sem poderes para obrigar referida
sociedade.
-i'M Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier
sentante do vendedor, no Brasil", de tal modo que o negócio nunca será considerado
realizado no País se ambas as partes contratantes forem domiciliadas no exterior.
Pode, pois, o representante estar domiciliado no Brasil o contrato ser celebrado
no Brasil, mas se as partes intervenientes não são residentes no Brasil, o negócio é
integralmente realizado no exterior, não sendo por conseguinte tributável no Brasil.
E compreende-se que assim seja, uma vez que, nesses casos, a transação ocorre
inteiramente fora da economia brasileira, não havendo nenhuma conexão relevante
que justifique a tributação pelo Brasil.
I

TITULO VI

REGIME CONVENCIONAL EM MATÉRIA


DE IMpOSTO SOBRE A RENDA
CAPÍTULO I
CLASSIFICAÇÃO DAS NORMAS CONVENCIONAIS

Vimos atrás l que as normas convencionais se podem distinguir em dois gran-


des subgrupos: um primeiro respeita à questão prévia de determinar a competência
tributária dos Estados em presença; um segundo grupo pressupõe resolvida esta
questão no sentido do reconhecimento da competência cumulativa de ambos os Es-
tados, estabelecendo regras que limitem o exercício da competência concorrente de
ambos, de modo a eliminar ou atenuar os efeitos da dupla tributação.
As primeiras são normas de reconhecimento de competência; as segundas são nor-
mas de limitação de competência.
Por sua vez, as normas de reconhecimento de competência podem distinguir-se
em normas de reconhecimento de competência exclusiva ou normas de reconhecimento de
competência cumulativa, conforme atribuam o poder de tributar certa situação apenas
a um dos Estados em presença (da residência ou da fonte) ou, ao invés, reconheçam
competência, não só ao Estado da residência, mas também ao Estado da fonte 2 •
Literalmente, as primeiras são formuladas através das expressões "somente se-
rão tributáveis", shall only be taxed, enquanto as segundas através das expressões "são
tributáveis", may be taxed.
Certos tipos de rendimentos são, na sua totalidade, objeto de atribuição exclusi-
va a um dos Estados em presença: exemplo característico é o dos lucros das empresas
de navegação atribuídos exclusivamente ao Estado em que se situa a direção efetiva
da empresa; ou o das remunerações dos diretores, via de regra atribuídas exclusiva-
mente ao Estado da fonte.

Cfr. supra, 41 ss.


2 As convenções contra a dupla tributação em matéria de impostos sobre sucessões e doações,
baseadas no Modelo OCDE-ISD de 1982, consagram o reconhecimento da competência
cumulativa do Estado do domicílio do transmitente e do Estado do locus rei sitae no que con-
cerne a bens imobiliários e bens móveis integrantes de estabelecimentos permanentes, sendo
em relação aos demais bens reconhecida competência exclusiva do Estado do domicílio. Cfr.
GUY GEST/GlLBERT TIXIER, Droit Fiscal International (2 a ed.), Paris 1990,403 ss.
Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

A grande maioria dos tipos de rendimentos é, porém, objeto de complexa regu-


lamentação que os atribui à competência exclusiva de um dos Estados em presença,
admitindo porém exceções em função de certas circunstâncias ou de certas modalida-
des especiais, caso em que se reconhece competência (cumulativa ou exclusiva) ao
outro ou outros. Exemplo é o caso do lucro das empresas em geral, atribuído à com-
petência exclusiva do Estado da residência, salvo [(unless (...), a moins que (...)] se fo-
rem imputáveis a estabelecimento permanente localizado no outro Estado; é o caso
dos rendimentos das profissões independentes, atribuídos à competência exclusiva
do Estado da residência, salvo se forem imputáveis a instalação fixa que o profissional
disponha no outro Estado; é o caso das pensões públicas, atribuídas à competência
exclusiva do Estado da fonte, salvo se o beneficiário for residente do outro Estado; e
os exemplos poderiam continuar.
Dada a conveniência de abordar a análise do problema em função de cada tipo
de rendimento - e tendo em vista que cada um deles comporta, via de regra, soluções
diferenciadas, agruparemos as normas em causa consoante o Estado a quem reconhe-
çam a competência exclusiva, em via de regra ou competência exclusiva primária.
Distinto do problema do reconhecimento de competência é a questão, logica-
mente subsequente, da limitação da competência, objeto do segundo grande tipo de
normas convenClOnalS.
O problema da limitação da competência só surge, porém, quando as convenções
tenham optado por um reconhecimento de competências cumulativas ao Estado da
residência e ao Estado da fonte, pois em caso de reconhecimento de competência ex-
clusiva a um deles o fenômeno do concurso de normas ou pretensões (em que a dupla
tributação se traduz) não chega sequer a surgir, ocorrendo um mero concurso aparente 3 •
Na sistemática das convenções contra a dupla tributação, as normas de limi-
tação da competência são dirigidas basicamente ao Estado da residência, ao qual
cabe acatar os limites ao seu poder de tributar, consagrados nos chamados "métodos
de eliminação da dupla tributação". Ou seja, ocorrido o fenômeno da competência
cumulativa de ambos os Estados, o Estado da residência deverá recorrer aos preceitos
(análogos aos dos arts. 23-A e 23-B do Modelo OCDE) que estabelecem o método
da isenção ou o método da imputação. Diz-se, por vezes, que neste caso cabe ao
Estado da fonte uma tributação primária (a primary right to tax), mas a expressão é
infeliz, pois alude apenas a um fenômeno cronológico 4 .
Mas existem também normas de limitação da competência dirigidas ao Estado da
fonte. Se é certo que a grande maioria das normas que admitem uma tributação exclusiva
ou cumulativa do Estado da fonte não lhe impõe qualquer limite ao seu poder de tribu-
tar, casos existem (especificamente os referentes a dividendos, juros e royalties) em que
são introduzidos limites quantitativos à alíquota do imposto sobre eles incidenté.

3 Cfr. supra, 27.


4 Cfr. M. PIRES, Da dupla tributaçiÜJ jurídica internacional sobre o rendimento, Lisboa 1984, 363.
5 Cfr., na página seguinte, a classificação das normas convencionais.
Título VI I Capo I I Classificação das Normas Convencionais .iP'
CLASSIFICAÇÃO DAS NORMAS CONVENCIONAIS

em favor do Estado
de repartição ou de da residência
reconhecimento de
competência exclusiva
Normas de colisão ou em favor do Estado
de reconhecimento de da fonte
competência de cumulação ou
de reconhecimento
de competência
cumulativa

Normas
convencwnats método de isenção
dirigidas ao Estado
da residência
método de
imputação
Normas de atenuação
ou de limitação de
competência

dirigidas ao Estado
da fonte { reduções de alíquota
CAPÍTULO 11
NORMAS DE RECONHECIMENTO DE COMPETÊNCIA

SEÇÃO I
RECONHECIMENTO DE COMPETÊNCIA EXCLUSIVA
PRIMÁRIA DO ESTADO DA RESIDÊNCIA

§ 1° LUCROS DAS EMPRESAS EM GERAL

A) O princípio do estabelecimento permanente


A regra geral constante do art. 7° do Modelo OCDE é a de que o direito de
tributar os lucros das empresas! é objeto de atribuição exclusiva ao Estado de que tais
empresas são residentes.
O princípio do estabelecimento permanente surge, pois, como uma derrogação à
referida regra geral, consagrando uma competência cumulativa do Estado da fonte; mas
somente se no seu território se encontra instalado um estabelecimento permanente e
unicamente na medida em que os lucros são imputáveis a esse estabelecimento.
Significa isto que o Estado da fonte é excepcionalmente autorizado a tributar os
resultados das atividades que se exercem no seu território com certa intensidade, cor-
porizada na instalação de um estabelecimento estável, de tal sorte que as atividades
meramente acidentais, ocasionais ou que não pressuponham uma base fixa escapam
à sua competência tributária2 •

1 Sobre o conceito de "empresa" ver VAN RAAD, The term "enterprise" in the Model Double
Taxation Conventions - seventy years of confusion, in Essays on International Taxation, 15,
Deventer/Boston 1993, 317.
2 Cfr. MAx BEAT LUDWIG, Ilimposition des entreprises ayant des établissements stables à l'etranger (re-
latório geral), CDFI LVIII-a (1973), 27 (29); KLUGE, Das deutsche Internationale Steuerrecht
(3 a ed.), Munique 1992,45 e 107; VOGEL, OnDouble Taxation Conventions: a Comentary to the
OCDE) UN- and US Model Conventions for the Avoidance ofDouble Taxation oflncome with parti-
cularreftrence to German Treaty Practice (trad.), Deventer 1997 (cit. Double Taxation) , 398; m.,
Supl. 94) 36; FRANCESCO TUNDO, I redditi d'impresa nel modeloo di convenzione OCSE (art.
70 ), in VICTOR UCKMAR (org.), Corso di Diritto Tributaria Internazionale, Pádua 1999, 307.
4iO+. Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier __
: _ _ _ _ _ _- '

Assim, por exemplo, o princípio do estabelecimento permanente impede a tributa-


ção dos lucros de uma empresa não residente pelo Estado da fonte, pelo simples fato de
os contratos terem sido nele celebrados, ou de nele se ter realizado fornecimento de mer-
cadorias ou serviços, ou de uma das partes na transação ter nele residência. E isto mesmo
que a lei interna permita a tributação de lucros auferidos por não residentes decorrentes
da prática de atos isolados, sem a presença de um estabelecimento permanente3 •
Com efeito, estabelece o art. 7° do Modelo OCDE, no seu parágrafo 1°, que
"os lucros de uma empresa de um Estado contratante só são tributáveis nesse Estado,
a não ser que a empresa exerça sua atividade no outro Estado contratante por meio
de um estabelecimento permanente aí situado. Se a empresa exercer sua atividade
na forma indicada, seus lucros serão tributáveis no outro Estado, mas unicamente na
medida em que forem atribuíveis a esse estabelecimento permanente".
O conceito de lucro tributável é definido pelas diversas legislações internas.
Como, porém, a noção geral de lucro de empresa abrange uma pluralidade de ren-
dimentos imputáveis a uma unidade de exploração - rendimentos esses sujeitos, por
vezes, a regimes tributários específicos (como é o caso dos dividendos, juros) regidos
por outros preceitos das convenções -, as convenções esclarecem que tais regimes
especiais não serão afetados pelo regime genérico dos lucros, traçado no art. 7° do
Modelo. É o que podemos designar por princípio da prevalência dos regimes especiais ou
do caráter residual da noção de lucro de empresa.
Mercê do seu caráter restritivo, o "princípio do estabelecimento permanente"
tem sido severamente criticado pelos países em vias de desenvolvimento, que prefe-
rem a maior amplitude fornecida pelo princípio da territorialidade, na sua acepção
de princípio da fonte, que lhes permita tributar lucros auferidos no seu território por
não residentes, ainda que aí não disponham de um estabelecimento. E daí que certas
convenções celebradas com estes países ou admitem a tributação independentemente
da existência de um estabelecimento ou, ao menos, alargam a definição de estabele-
cimento no sentido de aceitar, por exemplo, a tributação em razão da existência de
instalações de armazenagem ou de exposição de mercadorias4 •

B) Conceito de estabelecimento permanente

a) Estabelecimentos reais: instalações fixas

Na doutrina de meados do século passado, desenharam-se duas tendências


para a definição de estabelecimento permanentes: a teoria da realização, defendi-

3 Cfr. supra, 435 55.


4 Cfr. ONU, Convenções fiscais entre países desenvolvidos e países em vias de desenvolvimento, Lisboa
1971,2655.
5 K VOGEL, Die Betriebstiitte im nationalen (dcutschen) und intemationalen (dcutschen) Steuerrecht,
CDFI XXXIV (1957); KOLCK, Der Betriebstiittenbegriff im nationalen und intemationalen
- = = : = : ! ] t u l o VI I Capo 11 I Normas de Reconhecimento de Competência .~i'

da por CARROL 6 , para a qual só seriam estabelecimentos estáveis as instalações que


adquirem ou realizam diretamente um lucro, tendo portanto um caráter imediata-
mente produtivo; e a teoria da pertença econômica (wirtschaftliche Zugehorigkeit) econo-
mic allegeance) , sustentada por EHRENZWEIG 7 e MICHEL8 , para a qual bastaria, para
a existência de um estabelecimento, que as instalações se inserissem na economia de
um país, independentemente do seu caráter imediatamente produtivo.

Steuerrecht, Münster 1974; SHULZE-BRACHMANN, Betriebstdtte, Handwarterbuch des Steuer-


rechts und der Steuerwissenschaften I, 160; A. STORCK, Ausliindische Betriebstdtten um Ertrag
und Vermiigensteuerrecht, Deventer 1980; SCHIEBER Besteuerung von Auslandsbetriebstdtten, Co-
lônia 1979; M6ssNER, in M6ssNER/et al., Steuerrecht international tdtiger Unternehmen, Co-
lônia 1992, 75 ss.; SCHAUMBURG, Internationales Steuerrecht, Colônia 1993, 97 ss.; GIOVANNI
GIANOLA, Ilinterpretazione deZ diritto tributario -la sucursale e la stabile O1;ganizzazione neWordine
nazionale e internazionale, Pádua 1999; ANTONIO LOVISOLO, La "stabile organizzazione", in
VICTOR UCKMAR (org.), Corso di Diritto Tributario Internazionale, Pádua 1999, 233; GARCÍA
PRATS, El estabelecimiento pennanente: analisis juridico-tributario internacional de la imposición so-
cietaria, Madrid 1966; CARBONE, La nozione di "stabile organizazzione", in UCKMARjMAG-
NANI/MARONGlU (org.), n reddito di impresa nel nuuvo testo unico, Milão 1988, 731; A. A. SKAAR
(org.), Pennanent Establishment. Erosion of a Tax Treaty Principle, Deventer 1992; DALIMIER,
Conventions fiscales internationales: variations sur le thême de l'établissement stable,journal
de Droit International 1 (1976), 5; lRENE BURGERS/RrJKELE BErrEN (org.), The Taxation of
Permanent Establishments, Amsterdam 1993; HUSTON/WILLIAMS, Permanent establishments: a
planning primer, Deventer 1993; IFA - The attribution ofProfits to Pennanent Establishments,
CDFI vol. 91b (2006), 746; PAULO CALIENDO V DA SILVEIRA, Do conceito de estabeleci-
mentos permanentes e sua aplicação no Direito Tributário Internacional, in HELENO TÔRRES
(org.), Direito Tributário InternacionalAplicatÚJ, São Paulo 2003, 529; JOÃo FRANCISCO BIANCO,
O estabelecimento permanente na legislação do Imposto de Renda, in Grandes questões atuais
do Direito Tributário (9° vol.), São Paulo 2005, 298; ELIDIE PALMA BIFANO, O investimento fi-
nanceito o estabelecimento permanente, RDTI 8 (2008), 33; PAULO CALIENDO, Estabelecimen-
tos permanentes em Direito Tributário Internacional, São Paulo 2005; DIANA DE BARROS LOBO,
Breves noções sobre o conceito de estabelecimento permanente no Direito Tributário brasilei-
ro, RDTI 9 (2008), 51; MANOELA SILVA XAVIER, A atribuição de lucros em estabelecimentos
permanentes, in HELENO TAVEIRA TÔRRES (org.), Direito Tributário InternacionalAplicado, vol.
IV, São Paulo 2007, 325. Sobre o caso específico da indústria de petróleo, cfr. MÁRCIO ÁVILA,
Estabelecimento permanente na indústria do petróleo (estruturas onshore e offihore), RFDT 32
(2008), 97; ANDRÉ CARVALHO, Do conceito de estabelecimento permanente e as atividades
negociais móveis realizadas na plataforma continental, in HELENO TAVElRA TÔRRES (org.),
Direito Tributário InternacionalAplicatÚJ, vol. II, São Paulo 2004, 535. O conceito de estabele-
cimento estável (ou permanente) teve a sua origem no séc. XIX, em virtude da necessária dis-
tinção do negócio fixo de uma empresa - sujeito aos impostos gerais - do negócio ambulante,
submetido a um imposto especial. O critério do estabelecimento estável faz, porém, que não
fiquem em princípio sujeitos a impostos os lucros auferidos num país e que não sejam obtidos
através de estabelecimentos, como as entregas diretas de mercadorias com base em acordos
existentes, como é frequente no comércio de matérias-primas.

6 Cfr. M. B. CARROL, Méthodes de ventilation des revenus imposables. Ilimposition des entreprises
étrangêres et nationales, Geneve 1933.
7 Cfr. EHRENZWEIGjKoCH, Income Tax Treaties, Nova York 1949, 106.
8 Cfr. MICHEL, La notion d'établissement stable en droit fiscal international, CDFI I, 217.
Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Entre nós, as convenções sobre a dupla tributação - que seguem de perto o art.
5° do Modelo OCDE9 - consagram a teoria da pertença econômica, muito embora
lhe introduzam algumas limitações em nome da teoria da realização.
Com efeito, aí se define estabelecimento permanente "a instalação fixa de ne-
gócios em que a empresa exerça toda ou parte da sua atividade". São pois caracte-
rísticas do estabelecimento permanente a existência de uma instalação material, com
caráter de permanência, que esteja à disposição da empresa, a qual deve exercer a sua
atividade nesta instalação ou por meio desta instalação lO • Mas já não são requisitos
essenciais do conceito os atributos da produtividade ou da rentabilidade.
Nas convenções, à definição geral de estabelecimento permanente seguem-se
listas de exemplos e de exceções. Os exemplos abrangem um local de direção, uma
sucursal l l , um escritório, uma fábrica, uma oficina, uma mina, pedreira ou qualquer
outro local de extração de recursos namrais l2 e um estaleiro de construção ou de
montagem cuja duração exceda doze meses 13 •
Esta enumeração exemplificativa conterá uma presunção iuris et de jure de estabe-
lecimentos permanentes (a priori permanent establishments) , que dispensaria por si só a
verificação da integração dos vários exemplos no conceito geral, como pretende LENZ I4 ?
Não o entendemos assim. Os casos exemplificados só deverão ser considerados estabe-
lecimentos permanentes se obedecerem aos requisitos decorrentes da noção geral, que
se limitam a concretizar. Assim, um local de direção ou um escritório que não disponha
de instalações materiais permanentes não será tido por estabelecimento estável.
Anote-se que apenas a Convenção com a China se afasta do Modelo da OCDE
- seguindo, ao invés, o Modelo da ONU - quando considera existir estabelecimento

9 Idêntico conceito foi consagrado no art. 6° do Modelo OCDE-ISD.


10 Cfr. JEAN MARC RIVIER, Ilimposition des entreprises internationales, Lausanne 1964, 48; A.
BoRRÁs, La doble imposición: problemas jurídico-internacionales, Madrid 1974, 42 ss. Veja-se
uma detalhada análise casuística de modalidades de estabelecimentos permanentes nos Co-
mentários ao art. 5° da OCDE introduzidos em 2002, parágrafos 4.1 a 4.6,5.1 a 5.4, 6.1 a
6.4,25,26.1 e 27.1
11 A sucursal é um estabelecimento comercial que, na dependência de uma empresa principal
de que faz juridicamente parte, exerce de modo duradouro, em local separado, uma atividade
similar, gozando de certa autonomia econômica.
12 Como, por exemplo, poço de petróleo ou gás (art. 5°, § 2°,1; da Convenção com Portugal).
13 Veja-se a reserva do Brasil no que concerne ao requisito dos seis meses de duração. Cfr.
OCDE, art. 5°, NMC Position's, parágrafo 8. O período de duração varia consoante as con-
venções: e.g. 6 meses (México), 9 meses (Israel). Cfr. ALBERTO XAVIER, Consequências fiscais
da locação de equipamentos e prestação de serviços no Brasil por sociedade estrangeira, in
ID., Estudos sobre o imposto de renda, Belém 1988, 159 (parecer), em que examinamos se
um caso de locação de equipamentos de mergulho submarino para exploração de petróleo
poderia considerar-se um estaleiro de construção ou montagem para efeitos da Convenção
França-Brasil; DUCCINI, Approche fiscale des contrats internationaux, Paris 1985, 174.
14 Cfr. LENZ, Ilinterprétation des traités de double imposition (relatório geral), CDFI XLII. Este é
também o entendimento da Administração fiscal italiana. Cfr. ressalva ao parágrafo 43 dos
Comentários da OCDE, ao art. 5°.
VI I Capo 11 I Normas de Reconhecimento de Competência -.,..,.-

permanente, mesmo na ausência de instalação fIxa, no caso de "prestação de serviços,


inclusive de consultoria, por empresas de um Estado contratante, por intermédio de
funcionário ou do pessoal contratado no outro Estado contratante, desde que tais
atividades tenham sequência, em um mesmo projeto ou outro projeto a ele relacio-
nado, por um período ou períodos perfazendo mais de seis meses dentro de qualquer
período de 12 meses" (art. 5°, § 3, b)ls.
Constituem exceções ao conceito geral de estabelecimento permanente (negativer
Katalog, chamam-lhe HOHN e KLUGE I6 ; exclusionary list) chama-lhe BAKER 17) as instala-
ções utilizadas unicamente para armazenagem, exposição ou expedição de mercadorias
entregues à empresa (depósitos de mercadorias); os depósitos de mercadorias destina-
dos unicamente à armazenagem, exposição ou expedição de mercadorias (depósitos de
fornecimentos); os depósitos de mercadorias de uma empresa destinados unicamente
para fIns de transformação por outra empresa (depósito de transformação); uma insta-
1ação fIxa de negócios destinada exclusivamente à compra de mercadorias ou à reunião
de informações para a empresa (escritórios de compra); uma instalação fIxa de negó-
cios utilizada apenas para fIns de publicidade, obtenção de informações, investigação
científIca ou atividades análogas de caráter preparatório ou auxiliar l8 .
Todas estas exceções se baseiam na teoria da realização, que assim atenua a
pureza da doutrina da pertença econômica, que está na base do conceito geral de
estabelecimento permanente. É porque as referidas instalações não têm um caráter
produtivo direto, não lhes sendo diretamente imputável a realização de lucros ou
outros rendimentos, que os referidos preceitos as excetuam da noção de estabeleci-
mento permanente l9 .

b) Estabelecimentos pessoais: representantes dependentes

As empresas internacionais exercem frequentemente a sua atividade no estran-


geiro através de representantes. Não admira, pois, que se tenha procurado conferir a
estas pessoas a qualidade de estabelecimentos permanentes para fundar a tributação

15 efr. VOGEL,Double Taxation, 310-311.


16 efr. HÓHN, Doppelbesteuerungsrecht, BernjStuttgart 1973, 172; KWGE, Das deutsche Interna-
tionale Steuerrecht, 266.
17 BAKER, Double Taxation Agreements and International Tax Law, Londres 1994 (cit. Double
Taxation),145.
18 Ver o caso do escritório de banco espanhol na Suíça, que apenas recolhia informações
sobre a economia suíça e estabelecia contatos com clientes; e do escritório de jornal
para coleta de informações. efr. BAKER, Double Taxation) 147. "As atividades de caráter
preparatório ou auxiliar incluem, entre outras, a publicidade, o fornecimento de infor-
mações, as investigações científicas e a preparação para a concessão de empréstimos"
(México, Protocolo, item 2).
19 efr. HÓHN, Doppelbesteuerungsrecht, 171; BAKER, Double Taxation, 146; HELENO TORRES,
Pluritributaçáo internacional sobre as rendas de empresas, São Paulo 2001, 221, 228.
-,.i+ Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

de rendimentos através delas produzidos num dado território. Assim, as convenções


contra a dupla tributação assimilam aos estabelecimentos materiais ou reais, os esta-
belecimentos pessoais.
A distinção essencial a estabelecer neste domínio é a que separa os representan-
tes independentes dos representantes dependentes: os segundos são considerados
estabelecimentos estáveis, mas já não assim os primeiros. O que permite destrinçar
o representante independente do representante dependente é não só um critério ju-
rídico, mas também um critério econômico. O representante independente - comis-
sário - tem o seu estatuto derivado de um mandato sem representação, nos termos
do qual pratica atos jurídicos em nome próprio, embora por conta de outrem, e,
além disso, deve ser livre, do ponto de vista econômico, de organizar o seu trabalho,
escolher os seus empregados e a sua clientela, assumindo o risco empresarial, sendo
remunerado por uma comissão e ocorrendo ele próprio aos seus encargos. Ao invés,
o representante dependente deve ser juridicamente investido dos poderes que lhe per-
mitam celebrar contratos em nome da empresa20 (caso contrário não se estará perante
um estabelecimento permanente), devendo, além disso, depender economicamente
da empresa representada, estando submetido à sua direção, sendo remunerado por
salário fIxo e reembolsado dos seus encargos gerais 21 •
Os agentes independentes devem atuar no quadro normal das suas atividades
específIcas. Assim, se um comissário não só vende os produtos ou mercadorias da
empresa em seu próprio nome, mas também desempenha habitualmente, em relação
a esta empresa, o papel de representante permanente, dispondo de poderes necessá-
rios para celebrar contratos, será considerado por esta atividade particular como um
estabelecimento permanente, pois, na medida em que a exerce, sai do quadro habi-
tual de suas ocupações, ou seja, das de comissári0 2223 •

20 VOGEL cita opiniões segundo as quais os poderes de conclusão de contratos não devem ser
só examinados do ponto de vista do direito privado, mas também em face das circunstâncias
de fato, de modo a evitar técnicas de elisão fiscal. Cfr. Double Taxation, 33l.
21 Cfr. J. M. RIvIER, Ilimposition, 71 ss.; K. KUNZE, Der Begriff der Betriebstdtte und des stdndi-
gen U:rtreters, Mannheim 1963; ID., Der stdndige U:rtreter in Doppelbesteuerungsabkommen,
Internationale Wirtschafts-Briefe 1964, 5; D. L. W ALTER, Zur Frage der beschrdnkten Steuer-
pflicht ameri-kanischer Rechtsvertreter in der Bundesrepublik Deustschland, BIFD XVIII (1963-
5), 227; MÓSSNER, in MÓssNER!et al., Steuerrecht, 85; MUGE, Das deutsche Internationale
Steuerrecht, 172; SCHAUMBURG, Internationales Steuerrecht, Colônia 1993, 101 ss.; HÓHN,
Doppelbesteuerungsrecht, 177; A. BORRÁS, La doble imposición, 50 ss.
22 Cfr. OCDE, Comentários, art. 5°, § 6°, parágrafos 36 ss. Ver o caso do corretor de bolsa
com gestão autônoma de carteira de investimentos, citado por BAKER, Double Taxation, 148.
Veja-se ainda a abundante cosmética constante dos novos Comentários ao art. 5° da OCDE,
introduzidos em 2002, nos parágrafos 32, 32.1, 33.1 e 28.1 a 38.9.
23 Tratado Brasil-Alemanha (hoje denunciado): "Todavia, uma sociedade de seguros de
um Estado contratante será considerada como tendo um estabelecimento permanente
no outro Estado contratante, desde que, através de um representante, não incluído entre
as pessoas mencionadas no parágrafo 5° abaixo, receba prêmios ou segure riscos nesse
outro Estado".
VI I Capo 11 I Normas de Reconhecimento de Competência -.,.-

Ao lado dos representantes dependentes, um outro caso de estabelecimento


pessoal, não previsto na Convenção Modelo da OCDE, mas nos seus comentários
ao art. 5° (parágrafos 42.11 e 42.48), é o que consiste na execução de serviços por
empresa domiciliada no exterior através de indivíduos que permaneçam no Estado
da fonte por um período superior a 183 dias 24 •

C) Subsidiárias

Menção especial merecem as sociedades subsidiárias, quanto às quais convém


mais uma vez dissipar um equívoco terminológico: é que, na terminologia prevalente
nos países do continente europeu, se designam por filiais as sociedades que no nosso
direi to interno se qualificam como subsidiárias (subsidiary company) Tochtergesellschaft)
enquanto se reserva o termo sucursais precisamente para as dependências de socieda-
des estrangeiras que entre nós são denominadas filiais (branch) Niederlassung) 25.
Refira-se ainda que as sociedades subsidiárias não são consideradas, em princí-
pio, estabelecimentos permanentes das sociedades-mãe, à semelhança, aliás, do que
no direito interno sucede. Determina, com efeito, o § 70 do art. 5° do Modelo
OCDE que "o fato de uma sociedade que reside num dos Estados contratantes con-
trolar ou ser controlada por uma sociedade residente no outro Estado contratante
ou que aí exerce a sua atividade 26 não é só por si bastante para fazer de qualquer
destas sociedades estabelecimento permanente da outra". É que as subsidiárias, ao
contrário do que sucede com as simples filiais, constituem entidades juridicamente
independentes.
Ao afirmar que o estatuto de subsidiária "não é só por si bastante" para lhe
imprimir a qualidade de estabelecimento permanente, do mesmo passo se reconhece
que esta lhe pode ser conferida se ela atuar efetivamente como representante depen-
dente, isto é, se celebrar contratos em nome da empresa-mãe, a qual será tributada
pelos rendimentos a estes imputáveis27.
Inversamente, a sociedade-mãe não será considerada estabelecimento perma-
nente da subsidiária, exceto no caso de atuar como sua representante dependente.

24 Cfr. infra.
25 Cfr. PIERRE TEL, Le régime fiscal des filiales et succursales de sociétés étrangeres, Bruxelas 1973,
17 ss.
26 Quer seja através de um estabelecimento estável, quer de outro modo (cfr. art. 5°, nO 7, da
Convenção com Portugal).
27 O Acórdão CSRFj01-0.967, de 28 de novembro de 1989, rejeitou - e bem - tentativa de
tributação de uma sociedade brasileira detida em 99,9% por sociedade suíça com o funda-
mento exclusivo de que se trataria de uma "filial de fato". No caso, não tinham ocorrido ven-
das diretas por essa sociedade, nem esta dispunha de poderes para obrigar contratualmente
a controladora estrangeira. Cfr. Câmara Superior de Recursos Fiscais. Imposto de Renda.
Jurisprudência 1.2.30, Resenha Tributária 1992, 8512.
-,.i:1 Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Estas disposições visam, pois, a afastar a "teoria do órgão" neste domínio, pelo
que BÜHLER as designa por "cláusulas antiórgão" (Antimlfanschaftsklausel, antissingle-
entity clause) 28.

D) Assimilação a uma empresa independente


Tal como no direito interno sucede29 , as convenções contra a dupla tributação
consagram a autonomia patrimonial dos estabelecimentos permanentes, que se reve-
la através da tributação independente e da separação contábipo.
A determinação do lucro do estabelecimento opera-se através do método da
assimilação a uma empresa independente 3 I, e não através do método de repartição fra-
cionária32 • É o que decorre do § 2° do art. 7° do Modelo OCDE, segundo o qual,
"quando uma empresa de um Estado contratante exercer sua atividade no outro
Estado contratante através de um estabelecimento permanente aí situado, serão atri-
buídos em cada Estado contratante a esse estabelecimento permanente os lucros que
obteria se constituísse uma empresa distinta e separada, exercendo atividades idênti-
cas ou similares e transacionando com absoluta independência com a empresa de que
é um estabelecimento permanente".
Note-se, porém, que o método da assimilação a uma empresa independen-
te, embora coincidente em princípio com o método direto, vai ainda mais além,
pois, enquanto no primeiro os lucros são apurados em face da contabilidade das
empresas, no segundo têm-se em conta os que hipoteticamente seriam obtidos em
condições de independência total, constituindo assim um instrumento de combate
à forma de evasão fiscal que se traduz na distribuição indireta de lucros (transftr
pricing) entre matriz e filial, análogo ao que oferece o art. 9° para as relações entre
sociedades coligadas 33 • Daí que alguns autores, como VOGEL, aludam a uma "abso-
luta hipotética independência".
Deste regime decorrem, por si só, os necessários poderes de retificação contábil
e de reajustamento de que os Fiscos interessados se utilizarão para fazê-lo respeitar.

28 Cfr. BÜHLER, Princípios de Derecho Internacional Tributario (trad.), Madrid 1968, 240; Vo-
GEL, Double Taxation, 352. Sobre a teoria do órgão, cfr. ALBERTO XAVIER, Manual de Direito
Fiscal, I, Coimbra 1974, 378.
29 Cfr. supra, 53l.
30 Cfr. MUGE, Das deutsche internationale Steuerrecht, 266.
31 Cfr. J. M. RIVIER, Ilimposition, 132 ss.; Selbstlindigkeitsfiktion der Betriebstlitte, chama-lhe
KWGE, Das deutsche Internationale Steuerrecht, 178; SCHRÓDER, in MóssNER/et al., Steuerre-
chtinternational tlitiger Unternehmen, Colônia 1992, 123 (185).
32 O Tratado com a China é o único que admite, alternativamente ao método direto, o método in-
direto pelo qual o resultado do estabelecimento é apurado através do rateio do lucro da matriz.
33 Assim, por exemplo, já se julgou que nas sucursais alemãs de bancos estrangeiros as despesas
dedutíveis não eram apenas as reveladas na contabilidade, mas outras incorridas pela matriz
no benefício da sucursal. Cfr. BAKER, Double Taxation, 183.
· VI I Capo 11 I Normas de Reconhecimento de Competência -{iN
Consequência direta da assimilação a uma empresa independente é a rejeição
expressa do princípio da força atrativa do estabelecimento estável, restringindo-se a
tributação "unicamente aos (lucros) que forem atribuíveis ao estabelecimento per-
manente" (art. 7°, § l°, inftne)34.
Outro corolário do princípio da independência é a regra da dedutibilidade de
todas as despesas efetuadas para a consecução dos objetivos do estabelecimento per-
manente, incluindo as despesas de direção e os encargos gerais de administração,
ainda que tais despesas não tenham sido realizadas no território de localização do
estabeleciment035 . Ao invés do que exigem numerosos direitos internos - e entre eles
o nosso -, o direito convencional admite, quanto aos estabelecimentos permanentes,
a extraterritorialidade das despesas 36 •
Uma terceira consequência da "independência hipotética" conduz a que, para
efeitos de atribuição do lucro, nenhuma diferença exista entre a situação do estabe-
lecimento permanente e a de uma subsidiária com personalidade jurídica própria.
Assim, arranjos contratuais entre o estabelecimento permanente e a matriz (embora
inexistentes perante o direito civil) deveriam ser tratados, para efeitos fiscais, como
se se tratasse de verdadeiros contratos entre empresas independentes, com o conse-
quente reconhecimento de juros, royalties, aluguéis, comissões e outras remunerações
similares previstas em tais "contratos"37.

34 O princípio da força atrativa já foi por nós examinado à luz do direito interno: cfr. supra, 649
ss. Sobre o force-ofattraction rule no direito norte-americano e sua substituição pela regra
da effictive connection with a U.S. trade or business (decorrente do Foreign Investors Tax Act de
1966), ver HENRY B. JORDANjJONE BrscHELjALAN H. SMITH, The taxation of entreprises with
permanent establishments abroad. United States taxation ofa foreign enterpl"Íse carrying on business
in the U. S. through a permanent establishment, CDFI LVIlI-a (1973), 95 (97). O triunfo da
conexão efetiva sobre a força de atração resulta da prevalência dada à simplicidade e eficácia
dos métodos administrativos sobre os riscos da evasão fiscal. Cfr. OCDE, Comentários, art.
7°, § 1°, parágrafos 9 e ss. (versão de 2008), rejeitando enfaticamente a regra da força atra-
tiva. Cfr. OCDE, Attribution of Income to Permanent Establishements: Issues in International
Taxation, Paris, 1994; Report onAttribution ofProfits to Permanent Establishments, 2008.
35 Sobre a dedutibilidade de gastos suportados pela filial brasileira de banco estrangeiro com
administração, salário e treinamento de pessoal debitado pela matriz, cfr. o Acórdão nO 101-
91378 da 1a Câmara do Primeiro Conselho de Contribuintes, de 17 de outubro de 1997.
36 Veja-se o exame detalhado de diversos casos específicos em OCDE, Comentários, art. 7°,
§ 3°, parágrafos 16 a 24. Cfr. as Convenções com a África do Sul (Protocolo, item 1), o
Canadá (Protocolo, item 5); Chile (Protocolo, item 2); Coreia (Protocolo, item 2); Filipinas
(Protocolo, item 4); Hungria (Protocolo, item 3); Países Baixos (Protocolo, item 1); Tche-
coslováquia (Protocolo, item 1); México (Protocolo, item 3). Estas convenções declaram
irrelevante o lugar de realização da despesa.
37 Cfr. os autores citados em VOGEL, Double Taxation, 428, que também alude à doutrina mais
mitigada de uma "independência restrita", que tende a não considerar os "contratos presu-
midos" entre "partes" da mesma empresa. Certas Convenções consideram indedutíveis os
pagamentos em juros etc. (México, art. 7°, par. 3) e Ucrânia, art. 7°, par. 3). Veja-se ainda
OCDE, art. 7°, parágrafos 41 e ss (versão de 2008).
B I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier _._=....;..._ _ _ _ _ _ _ _--'

Com vistas a eliminar a potencial dupla tributação resultante dos poderes cor-
retivos unilaterais dos Fiscos do Estado de localização dos estabelecimentos perma-
nentes está prevista uma nova versão do § 3° do art. 7° do Modelo OCDE, de modo
a que o outro Estado contratante proceda aos adequados ajustamentos correlativos,
similar ao previsto no § 2° do art. 9°.

E) Comércio eletrônico

A especificidade do conceito de estabelecimento permanente em matéria de co-


mércio eletrônico (e-commerce) resulta de os produtos ou serviços poderem ser enco-
mendados, faturados e até entregues por meios eletrônicos, em termos tais que não só
os bens e serviços se desmaterializam (no chamado comércio eletrônico direto, tendo
por objeto produtos digitais), como também a localização dos compradores e vende-
dores se torna irrelevante, podendo ocorrer em qualquer ponto do "ciberespaço"38.
No comércio internacional de tipo clássico os bens físicos que constituem o
seu objeto são manufaturados e distribuídos através de estruturas visíveis, o que
permitiu a clássica distinção entre trading with a country e trading in a country. Só
neste último caso o vendedor domiciliado num Estado dispõe de um mínimo de
presença no outro Estado, constituída por uma organização que, se obedecer a
certas características, é caracterizada como estabelecimento permanente, o que le-
gitima o Estado de domicílio do comprador a tributar os lucros imputáveis a esse
estabelecimen t0 39 .
O conceito de estabelecimento permanente representou historicamente um
compromisso entre o Estado de residência do vendedor e o Estado de residência do

38 Cfr. OCDE, Pennanent Establishment and Other Tax Treaty Issues Related to Electronic Com-
merce, Paris 1998; ID., Technical Advisory Group discussion paper: Attribution of profit to
a permanent establishment involved in electronic commerce transactions, fevereiro 2001, in
KEES VAN RAAD (ed.), Materiais on Internacional & EC Tax Law, vol. 1, 2003, 574 ss. IFA,
Taxation of income derived from electronic commerce, CDFI LXXXV (2001); ROY ROHATGI,
Basic International Taxation, cit., 509 SS.; ANTONIO LOVISOLO, La stabile organizzazione, in
V UCKMAR (org.), Corso di Diritto Tributario Internazionale, Pádua 1999, 257 SS.; RUBEN O.
ASOREY, El impacto dei cibercomercio en los principios fiscales y en la libertad de comercio, ibidem,
869; BróRN WESTBERG, Cross-Border Taxation ofE-Commerce, IBFD, Amsterdam 2003; Luís
EDUARDO SCHOUERI, Imposto de renda e o comércio eletrônico, in ID. (org.), Internet: O Di-
reito na era virtual (2 a ed.), Rio de Janeiro 2001,39 SS.; ALEXANDRE SICILIANO BORGES, Preços
de Transferência e e-commerce, in SCHOUERI (org.), Internet - O Direito na era virtual, cit.,
ibidem, 211 SS.; REUVEN S. AVI-YONAH, A tributação internacional do comércio eletrônico,
RIDT na 6 (jul.-dez.j2006), 417; MARcos VINHAS CATÃO, JULIO JANOLIO, Novas tendências
da tributação sobre o comércio eletrônico, in HELENO TAVEIRA TÔRRES (org.), Direito Tribu-
tário InternacionalAplicado, vol. IV, São Paulo 2007, 301; CLÁUDIA LIMA MARQUES, Comércio
eletrônico e as relações de consumo: desafios e análise dos primeiros casos, in HELENO TAVEI-
RA TÔRRES (org.), Direito Tributário das Telecomunicações, São Paulo 2004,511.
39 Cfr. supra, 520.
"'-_ _ _ _ Título VI I Capo 11 I Normas de Reconhecimento de Competência .iSM

comprador (Estado da fonte), garantindo simultaneamente os interesses de ambos:


do primeiro, porque não permite a tributação pelo segundo na ausência de estabe-
lecimento permanente; do segundo, porque a existência de estabelecimento perma-
nente legitima o exercício dos seus poderes tributários.
Ora, no comércio eletrônico, a "invisibilidade" decorrente da nova fisionomia
dos instrumentos equiparáveis ao estabelecimento clássico constitui motivo de séria
preocupação, especialmente para os Estados da fonte, onde se localizam os compra-
dores, que receiam uma perda substancial das suas receitas fiscais.
Revestem-se, pois, de especial relevância os Comentários da OCDE a respeito
(dezembro de 2002) que representam o fruto de estudos aprofundados na matéria e
um compromisso dos mais variados interesses em presença40 .
A questão fundamental que se coloca desdobra-se em duas vertentes: a primeira
consiste em saber quais as realidades que poderiam ser consideradas, nos termos do
art. 5° da Convenção Modelo, como uma instalação fixa de negócios através da qual
a empresa exerce toda ou parte de sua atividade; a segunda consiste em saber se, ain-
da que tal instalação exista, ela não se limita ao exercício de atividades preparatórias
ou auxiliares, o que impediria a caracterização de tal instalação como estabelecimen-
to permanente para efeitos do citado art. 5°.
No que concerne à primeira questão parece ter-se atingido um consenso no
sentido de que a intervenção humana, através de pessoal do próprio vendedor ou
por ele terceirizado, não é requisito essencial para que um determinado equipa-
mento técnico (especialmente um servidor de rede, um web server) possa ser con-
siderado estabelecimento permanente, pelo que - em princípio - os equipamentos
automáticos poderiam revestir essa natureza (o que, aliás, já sucede na indústria de
extração de petróleo).
Torna-se preliminarmente necessário distinguir o equipamento de computador
que pode ser instalado em certo local e os dados e software que são usados pelo
equipamento ou estão nele armazenados. Assim, um web site) por exemplo, sendo
uma combinação de dados eletrônicos e software) não pode ser considerado estabe-
lecimento permanente, pois este pressupõe um caráter tangível, inerente à ideia de
"instalação fixa"41.
Não basta, porém, a mera presença de um web server no Estado da fonte para
que ele possa ser caracterizado como um estabelecimento permanente do vendedor
domiciliado noutro Estado: é ainda necessário que essa instalação esteja à disposição
desse vendedor, seja porque instalou o seu próprio servidor, seja porque o alugou ou
tomou de leasing de terceiros, de tal modo que não pode falar-se de estabelecimento

40 Veja os parágrafos 42.1 a 42.10 do art. 5°. Sobre a história destes trabalhos, cfr. MÁRIo
JosÉ SILVA, Tributação do comércio eletrônico no plano internacional - uma visão geral,
RTFP 38 (2001),9. Ver a reserva do Brasil em NMCP, art. 5°, parágrafo 23, em nome do
princípio da fonte.
41 OCDE, Comentários ...) art. 5°, par. 42.2.
Ri._ Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

permanente se o web site é "hospedado" pelo serrer de um provedor de serviços de


acesso à rede (ISP-PASI), via de regra alheio ao negócio do vendedor estrangeiro e
ao qual pertence a disponibilidade do serrer.
No caso de se concluir que o vendedor tem um serrer à sua disposição no país
da fonte, coloca -se a segunda questão acima mencionada, a de saber se o web serrer
se limita a desempenhar funções auxiliares ou preparatórias em relação ao objeto
principal da compra e venda ou se o objeto da transação é o próprio serviço (core
business) do web serrer.
N o primeiro caso o servidor não será considerado estabelecimento permanente,
pois ele constitui um simples instrumento da operação, desempenhando em matéria
de bens digitais funções análogas às que no comércio clássico cabem a uma encomen-
da postal ou telefônica, um catálogo ou um armazém42 •
Seja, porém, como for, os Comentários da OCDE consideram que um smart
serrer (através do qual um webtailer vende bens ou serviços digitalizados) muito pro-
vavelmente obedecerá ao test de estabelecimento local (por exemplo, a conclusão do
contrato com o cliente, o processamento do pagamento e a entrega dos produtos são
executados automaticamente através de equipamento aí localizado), sendo que tais
atividades não devem ser consideradas meramente preparatórias ou auxiliares.
Uma outra questão que se tem suscitado consiste em saber se o prestador de
serviços de acesso à rede (PASI) pode ser considerado um "estabelecimento pesso-
al", a título de representante dependente. A resposta é, via de regra, negativa pois o
provedor de serviços limita-se a permitir o acesso à Internet, não estando envolvido
no negócio acessado pelos seus clientes por meio dos seus sistemas, nem tendo, por
conseguinte, poderes para celebrar contratos.
A dificuldade de identificação no comércio eletrônico de verdadeiros estabe-
lecimentos permanentes, tal como definidos no art. 5° da Convenção Modelo da
OCDE, tem levado alguns Estados (como a Espanha e Portugal) a preconizar um
direito à tributação pelo Estado da fonte que prescinda da presença física nesse Es-
tado, bastando a existência de um fluxo contínuo e regular de transações, em que a
publicidade é especialmente destinada a clientes desse Estado, os serviços pós-venda
são prestados nesse Estado etc.
Uma outra reação às mesmas causas consiste na tentativa de recaracterizar os pa-
gamentos do e-commerce como royalties, tributáveis no Estado de fonte, e não como
"lucros de empresas", exclusivamente tributáveis no Estado de residência, salvo no
caso de existência de estabelecimento permanente43 .

42 Os Comentários (parágrafo 42.7) enumeram como atividades preparatórias um laço de co-


municações (como uma linha telefônica) entre vendedores e compradores, publicações, o
fornecimento de informaçõs através de um mirror server por razões de segurança etc.
43 Cfr. OCDE, Technical Advisory Group Report to the OECD CFA WP N° 1: Tax treary
characterisation issues arising from e-commerce, fevereiro 2001, in KEES VAN RAAD (ed.),
Materiais on International & EC Tax Law, vol. 1,2003,600 SS.
~ít~lo VI I Capo 11 I Normas de Reconhecimento de Competência .i.M

F) PrestaçéÚJ de serviços

a) A sujeiçéÚJ das remunerações de serJJiços ao art. 7"

As Convenções contra a dupla tributação assinadas pelo Brasil (seguindo aliás a


Convenção Modelo da OCDE) não assimilam a remuneração da prestação de servi-
ços a "rendimentos" isolados, sujeitos à retenção na fonte à alíquota reduzida, como
royalties ou "outros rendimentos"; antes os consideram receitas brutas integrantes do
conceito de "lucro de empresa" e, como tal, sujeitos à tributação exclusiva no país de
domicílio da empresa, com a única exceção de serem atribuíveis a estabelecimento
permanente localizado no país da fonte 44 •
Por isso, os Comentários da OCDE (na versão de 2002, art. 12, parágrafos 11.1
e 11.2) são claros ao considerar que as remunerações por prestação de serviços (por
oposição às remunerações no quadro das convenções de know-how) recaem, não no
âmbito do art. 12 - que se refere a royalties - mas no âmbito do art. 7°.
"11.1. In the know-how contract) one ofthe parties agrees to impart to the other, so
that he can use them for his own account) his special knowledge and experience which
remain unrevealed to the publico It is recognised that the grantor is not required to
play any part himself in the application of the formulas granted to the licensee and
that he does notguarantee the result thereof
cc11.2. This type of contract thus differs from contracts for the provision ofserJJices) in
which one of the parties undertakes to use the customary skills of his calling to execute
work himselffor the other party. Payments made under the latter contracts generally
fall under Article 745 ".
É importante sublinhar que o comentário referido - de grande peso interpreta-
tivo - considera que as remunerações por prestação de serviços não são qualificáveis
como royalties, ao abrigo do art. 12, ou "outros rendimentos", ao abrigo do art. 21,
mas sim como lucros de empresas, ao abrigo do art. 7°.
Assim, a tributação compete, em princípio, ao país de residência do prestador
de serviços, a não ser que este disponha, no país da fonte de pagamento, de um
"estabelecimento permanente". E isto porque - fora destes casos - só no país do do-
micílio, em face da contabilidade global da empresa, é possível determinar a eventual
existência de lucro tributável, em face da comparação entre a totalidade das receitas,
constituídas pelos preços das vendas de serviços, e os custos e despesas incorridos
para a sua produção.

44 Referido preceito alcança também as remunerações de serviços estipulados ao abrigo de


cost-sharing agreements, cfr. ALBERTO XAVIER, Aspectos fiscais de "cost-sharing agreement",
RDDT 23 (1997), 7.
45 Na versão anterior previa-se também a submissão ao art. 14 no caso de serviços autônomos
prestados por profissionais independentes. A omissão dos novos Comentários resulta da
eliminação do art. 14 do Modelo.
.i!fil Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

N a impossibilidade de conhecimento destes elementos, o país da fonte, caso


tributasse a totalidade do "preço", poderia tributar patrimônio e não rendimento.
De harmonia com estas premissas, as Convenções contra a dupla tributação,
celebradas sob o modelo da OCDE, afastaram-se da solução unilateral adotada por
certas leis internas (entre as quais, em parte, a brasileira), recusando a tributação na
fonte do preço de serviços empresariais importados pelo Estado da fonte de paga-
mento, precisamente porque tal preço não constitui, em si mesmo, "renda" suscetível
de tributação, mas receita correspondente a "pagamento de capital".
Esta qualificação é de resto a que melhor adere à natureza das remunerações em
causa, pois em princípio não existe qualquer razão lógica para tratar diferencialmente
as vendas de bens das vendas de serviços. Havendo em ambos os casos custos incorridos
para a sua tributação, o imposto deve incidir sobre o ganho efetivo, ou lucro, e não
sobre a totalidade do valor bruto da remuneração.
O art. 7° dos tratados consagra a regra segundo a qual os lucros de uma empresa
de um Estado Contratante só podem ser tributados nesse Estado, a não ser que a
empresa exerça a sua atividade no outro Estado Contratante por meio de um esta-
belecimento permanente aí situado. No caso de as empresas prestadoras de serviços
não disporem no outro Estado de um estabelecimento permanente (sucursal, filial,
agência, representação), o art. 7° impede a tributação da remuneração dos serviços
por esse Estad046 .
Esta foi a interpretação que vinha sendo adotada pela Administração fiscal brasi-
leira, em sintonia com as Administrações dos demais países, tendo até chegado a ser
publicado pronunciamento expresso, segundo o qual "não incide o imposto de renda
na fonte sobre os pagamentos a empresa francesa que não possua estabelecimento
permanente no Brasil, em decorrência da prestação de serviços técnicos que não
se enquadrem no conceito de know how" (Decisão da 9 a Região Fiscal, in DOU de
30.12.07). Na sua versão de 2008 os Comentários da OCDE47 observam que certos
Estados consideram legítima a tributação dos serviços executados no seu território,
ainda que não atribuídos a um estabelecimento permanente nela localizado. E isto
especialmente tendo em vista que vários tipos de serviços não requerem para a sua
execução uma instalação fixa de negócios no Estado onde são prestados, conquanto
envolvam uma atividade econômica substancial nesse Estado.
Existe, porém, um consenso, no Comitê de Assuntos Fiscais da OCDE, quanto
a considerar que os serviços não devem ser tributados num Estado pelo só fato de a
fonte de pagamento ter nele a sua localização, sendo os serviços prestados por não
residente fora do território desse Estado. Também não se reputa conexão relevante o
fato de os serviços serem usados no território de um Estado. E - ponto de grande re-

46 Cfr. LUCIANA ROSANOVA GALHARDO, Serviços técnicos prestados por empresa francesa e im-
posto de renda na fonte, RDDT 31 (1998),39 ss.
47 Novos parágrafos 42.11 a 42.48 aos comentários do artigo 5°. Ver as reservas do Brasil,
invocando o princípio de fonte de pagamento. Cfr. NMCp' par. 42
'"-_ _ _ _ _•. Título VI I Capo II I Normas de Reconhecimento de Competência -I-
levância - entende-se que a tributação, mesmo em casos excepcionais, só deve incidir
sobre o lucro e não sobre o rendimento bruto.
De harmonia com aquele Comitê, deveria sempre, através de cláusula alternati-
va, restringir-se a tributação excepcional dos serviços pelo Estado da fonte, na ausên-
cia de estabelecimento permanente, às hipóteses em que o indivíduo que os presta
permanece no território daquele Estado mais do que um certo período (183 dias) e
que a ele sejam imputáveis parte substancial (mais de 50%) dos rendimentos brutos
da empresa relacionados com as atividades no período.
Nos casos em que os limites atrás referidos tenham sido ultrapassados, presu-
me-se que os serviços foram prestados através de um estabelecimento permanente:
trata-se de uma nova hipótese de estabelecimento pessoal, a par dos representantes
dependentes, pelo que a tributação apenas poderá incidir sobre o lucro que lhe for
imputável e não sobre o rendimento bruto.

b) O Ato Declaratório nO 1/00: Crítica

Uma radical modificação da interpretação da Administração Fiscal brasileira


viria a ser formalizada, em caráter genérico48 , pelo Ato Declaratório (Normativo)
COSIT nO 1, de 5 de janeiro de 2000, que estabeleceu o seguinte:
"I - As remessas decorrentes de contratos de prestação de assistência técnica e
de serviços técnicos sem transferência de tecnologia sujeitam-se à tributação de
acordo com o art. 685, inciso lI, alínea a, do Decreto nO 3.000, de 1999.
"lI - Nas Convenções para Eliminar a Dupla Tributação da renda das quais o
Brasil é signatário, esses rendimentos classificam-se no artigo "Rendimentos
não Expressamente Mencionados" e, consequentemente, são tributados na for-
ma do item I, o que se dará também na hipótese de a convenção não contemplar
esse artigo.
"IlI - Para fins do disposto no item I deste ato, consideram-se contratos de
prestação de assistência técnica e de serviços técnicos sem transferência de tec-
nologia aqueles não sujeitos à averbação ou registro no Instituto Nacional de
Propriedade 1ndustrial- INPI e Banco Central do Brasil".
A divergência de orientações em causa respeita a um problema de qualificação,
consistente em saber em qual norma dos tratados se enquadra a remuneração pela
prestação de serviços que não envolvem, direta ou indiretamente, transferência
de tecnologia. Mais especificamente trata-se de saber se tais remunerações recaem
no âmbito de aplicação do art. 7°, referente a "lucros das empresas" ou se, pelo
contrário, se subsumem ao art. 22, referente a "rendimentos não expressamente
mencionados" .

48 É que esta mudança já vinha ocorrendo por força de Decisões individuais, em resposta a
consultas, tais como as Decisões nO' 47 e 144 da 8 a Região Fiscal, ambas de 1999.
.iaM Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

A orientação em que assentou o Ato Declaratório nO 1/00, segundo a qual os


serviços não se enquadrariam no artigo correspondente ao art. 7° da Convenção
Modelo da OCDE, que trata do "lucro de empresas", mas no art. 21 da mesma Con-
venção, que versa sobre "outros rendimentos", artigo esse que permite a tributação
pelo Estado da fonte, baseia-se ma argumentação que a seguir se transcreve: "( ... ) O
único objetivo do art. 7° da CM-OCDE é regular os casos em que existe um estabele-
cimento permanente da empresa estrangeira no outro país contratante. Se não existe
um estabelecimento permanente, fica totalmente sem sentido a invocação da regra
do art. 7° ( ... ). Com efeito, o art. 7° jamais seria aplicável à hipótese de pagamentos
pela prestação de serviços! Toda a estrutura do art. 7° demonstra que ele cuida da
apuração dos resultados de uma atividade fixa de um contribuinte de um país contra-
tante, que é exercida dentro do território do outro país contratante. Tais resultados
são apurados mediante o confronto de receitas e despesas, em um determinado espa-
ço de tempo. O único objetivo do art. 7°, no que diz respeito à inibição da autuação
do Fisco de um dos países contratantes, consiste na vedação de tributação dos lucros
auferidos no outro país 49 •
Deve, desde logo, dizer-se que esta afirmação representa posição absolutamente
isolada, não tendo nós conhecimento de que tenha sido defendida, no Brasil ou em
qualquer outro país, por estudioso da tributação internacional. O caráter isolado
da opinião não nos dispensa, porém, da obrigação de refutá-la. Não é exato que o
único objetivo do art. 7° seja regular os casos em que existe um estabelecimento de
empresa estrangeira no outro país contratante, como muito bem esclarece o grande
internacionalista inglês Pmup BAKERso .
''Article 7 has two distinct purposes. Firstly) it provides that) where an enterprise of
a Contracting State cames on business in the other state but has no permanent es-
tablishment there) the profits of the enterprise may not be taxed in that other state.
Secondly) where an enterprise does have a permanent establishment in the other state)
that other state may only tax so much ofthe profits as are attributable to that perma-
nent establishment. The OECD Commentary regards the latter ofthese two purposes
to be <the more importantpoint) (see paragraph 5) andArticles 7 (2)-(6) together
with much of the Commentary) are concerned with rules for attributing profits to a
permanent establishment. In practice) howevet; taxpayers and their advisers are ofien
more concerned with the complete treaty protection afforded by the first sentence of
Article 7 (1) where an enterprise has no permanent establishment in a Contracting
State. The two situations - where and enterprise has no permanent establishment and
where it has a permanent establishment - are dealt with separately below sp ,.

49 Cir. GABRIEL FRANCISCO LEONARDOS, O imposto de renda na fonte sobre os pagamentos ao ex-
terior por serviços técnicos: análise de um caso de renúncia fiscal do Brasil, RDDT 40,39 ss.
50 Cfr. Double Taxation Conventions and Internacional Tax Law (2 a ed.), Londres 1994, 174.
51 Grifas nossos.
~T~uIO VI I Capo 11 I Normas de Reconhecimento de Competência -i'.
Com efeito, o art. 7°, na sua redação sintética e precisa, contém duas normas
distintas: uma norma de atribuição de competência exclusiva e uma norma de atribui-
ção de competência cumulativa s2 • A norma de atribuição de competência exclusiva em
favor do Estado de residência aplica-se precisamente à hipótese em que a empresa do
Estado A não tem estabelecimento permanente no Estado B, como sucede na grande
generalidade das vendas internacionais de mercadorias e serviços, caso em que os
lucros das empresas vendedoras "só podem" ser tributados no respectivo Estado de
domicílio e "não podem", por conseguinte, ser objeto de tributação, notadamente
por via de retenção na fonte, no Estado B, onde se localiza o comprador. A norma
de atribuição de competência cumulativa, em favor do Estado de fonte (Estado B),
aplica-se precisamente à hipótese em que a empresa do Estado A tem estabelecimen-
to permanente, sem personalidade jurídica, no Estado B, caso em que os lucros das
empresas vendedoras imputáveis ao estabelecimento permanente "também podem"
ser tributados pelo Estado B, ocorrendo uma dupla tributação a ser resolvida pelos
métodos cabíveis da própria Convenção.
Em nossa opinião, a norma do art. 7° que atribui competência exclusiva ao
Estado de domicílio, na hipótese de inexistência de estabelecimento permanente, é o
"coração" de um tratado contra a dupla tributação. Sem a proteção que ela assegura
à liberdade de circulação internacional de mercadorias e serviços, todas as demais
cláusulas perdem grande parte do seu sentido.
KLAUS VOGEL53 observa que o art. 7° abrange a mais importante categoria de
rendimentos, o "lucro da empresa", observando que de longe a maior porção do
rendimento derivado da atividade econômica internacional entra nesta categoria. E,
contrariando expressamente a opinião segundo o qual o art. 7° não se aplicaria aos
serviços afirma, com referência ao caso de "lucros de empresas": "Traditionally) this
concept is centred around commerce) including banking and finance) and crafts and trades
and industry; more recently) the services sector has joined in".
Aliás o próprio art. 7°, § 7°, do Modelo OCDE, revela que se aplica aos preços
de venda de bens e serviços, como receitas componentes do lucro contábil, ao dis-
por que "quando os lucros compreenderem elementos de rendimentos especialmente
tratados noutros artigos da presente convenção, as respectivas disposições não serão
afetadas pelas deste artigo".
Trata-se do princípio de prevalência dos regimes especiais ou do caráter residual da
noção de lucro de empresa. Assim, se os elementos do lucro, isoladamente conside-
rados, têm um tratamento especial (como é o caso dos dividendos, dos juros e dos
royalties), aplicam-se as disposições específicas que lhes respeitam. Se não têm um
tratamento especial, como é o caso da venda de bens e serviços, aplica-se o art. 7°.
As razões pelas quais o art. 7°, no que concerne às prestações internacionais de
serviços, reserva a competência tributária exclusiva ao país de domicílio do prestador,

52 Sobre esta terminologia, efr. supra, 54755.


53 efr. KI.AUS VOGEL, OnDouble Taxation Conventions (3 a ed.), 406.
.ih:- Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

vedando a tributação na fonte pelo país em que se localiza o beneficiário, resultam


de o fenômeno ter natureza substancialmente idêntica à de uma importação de bens
ou mercadorias. Quanto a estas jamais se confundiu o pagamento do preço da coi-
sa importada com renda, pelo que nunca se pretendeu a incidência do imposto de
renda relativamente ao valor da importação. Na verdade, uma coisa é "renda" - que
corresponde a uma remuneração de um fator de produção -, outra coisa é "paga-
mento de capital", que corresponde a uma transação que envolve troca de bens que
integravam previamente o patrimônio das partes em presença. O produto da venda
de bens não é renda, mas receita bruta operacional. A renda - a haver - resultará da
diferença entre as receitas das vendas e os custos ou perdas necessários à produção
dos bens vendidos, consistindo no lucro líquido tributável. Pode, pois, concluir-se
que os preços de venda de mercadorias e serviços constituem rendimentos de empresa
ou rendimentos comerciais, que só devem ser tributados de forma sintética no país de
domicílio do vendedor (salvo se este agir no outro país através de um estabelecimen-
to permanente) e não de uma forma analítica ou isolada, por retenção na fonte, no
país em que se localiza a fonte pagadora.
Postas essas considerações, fácil se torna demonstrar o grave equívoco lógico
que consiste na afirmação segundo a qual, sendo o conceito de lucro consagrado na
lei brasileira, equivalente ao de um somatório sintético e global de receitas e despe-
sas, não seria aplicável à receita ou ao rendimento isolado, consistente no pagamento
dos serviços. Com efeito, na sistemática do art. 7°, o conceito de lucro de empresa
só é aplicável por definição no Estado de residência da empresa vendedora (de mer-
cadorias ou serviços), pois só neste Estado é possível a apuração sintética, em face de
um balanço, do resultado em que o lucro se traduz.
A única hipótese em que seria válida a afirmação suprarreferida é a da venda de
mercadorias ou serviços ser realizada pela empresa estrangeira através de um estabe-
lecimento permanente, localizado no Estado da fonte.
Aí, sim, é legítimo invocar o conceito da lei brasileira (arts. 247 e 248 do RIR)
para a determinação do lucro imputável a esse mesmo estabelecimento. A aplicação
do conceito de lucro da lei brasileira à empresa estrangeira, que não dispõe no país
da fonte de um estabelecimento permanente, conduz a uma alternativa logicamente
absurda, que põe a nu o sofisma em que se baseia. Com efeito, ou o art. 7° nunca
seria aplicável, pois a partir do Brasil nunca poderiam ser pagas remunerações glo-
bais e sintéticas, ou seja, nunca poderiam ser pagos "lucros", tornando o art. 7° uma
excrescência inútil no tratado; ou então, se se quisesse salvar algum sentido útil ao
art. 7°, ter-se-ia de concluir que ao Brasil seria legítima a tributação na fonte das im-
portações de mercadorias, pois os pagamentos em causa também não configurariam
"lucros", segundo o conceito da lei brasileira.
De harmonia com o Ato Declaratório nO l/DO, a remuneração dos serviços (inclu-
sive os de assistência técnica, quanto aos tratados que não tenham protocolo da equipa-
ração) estaria abrangida no art. 21 dos tratados brasileiros, que se refere a "rendimentos
não expressamente mencionados" ou "outros rendimentos". Com efeito, enquanto o
VI I Capo 11 I Normas de Reconhecimento de Competência . il
Modelo OCDE atribui a competência tributária exclusiva ao Estado de residência do ti-
tular destes rendimentos, as convenções brasileiras consagram uma competência cumu-
lativa do Estado da fonte, que pode, por conseguinte, submetê-las a uma retenção.
A premissa de que parte o raciocínio é, porém, inexata. A remuneração dos
serviços prestados por empresas não está abrangida no art. 21 - de caráter residual
- pela singela razão de que está abrangida no art. 7°. Assim o afirma a Comissão de
Assuntos Fiscais da OCDE, nos seus comentários à Convenção Modelo. Assim o
afirma KLAus VOGEL, PHILIP BAKER, BRUNO GOUTlUERE e muitos outros. Ao invés,
nenhuma, mas nenhuma voz se levantou até hoje, na comunidade científica interna-
cional, para sustentar a inclusão dos serviços no art. 2I.
"Outros rendimentos" abrangidos no art. 21 são rendimentos atípicos, inusuais
ou de pequena expressão, que não justificam um tratamento convencional separado,
à semelhança do que é reservado aos lucros, dividendos, juros, royalties, rendimentos
do trabalho dependente e independente, ganhos de capital e outros.
Vejam-se os exemplos citados por PHILlP BAKER: (i) pagamentos de seguridade
social dos Estados Unidos, (ii) ganhos de jogo; (iii) prêmio ganho na Disneylândia
por residente do Reino Unido; (iv) vantagem obtida por presidente de empresa
francesa autorizado a comprar um apartamento da companhia por preço inferior ao
de mercado; (v) pagamentos lump sum para ex-empregados; (vi) pagamentos a estu-
dantes não abrangidos no art. 20; (vii) pagamentos de swaps de taxa juros e de novos
produtos fl11anceiros 54 .
Vejam-se os exemplos citados por VOGEL, que observa ser o escopo do art. 21
"muito estreito": (i) anuidades de previdência social; (ii) pagamentos de manutenção
a parentes; (iii) indenizações que não sejam pela perda de rendimentos abrangidos;
(iv) resgate de plano de pensão; (v) prêmios artísticos e acadêmicos; (vi) lucros de
novos instrumentos financeiros, como derivativos, caso não estejam abrangidos nos
arts. 7° e 11; (vii) prêmios de jogo e loteria.
E conclui categoricamente KLAus VOGEL: "In contrast, Art. 21 does not apply to
items ofincome classifiable as business profits, within the meaning ofArt. 7 Me, such as
remuneration for technological services, for which there are in fact to some extent special
rules (see supra Art. 12, atnO 68) butwhich in the absence ofsuch special rules, come under
Art. J55".
O significado do art. 21 da Convenção-Modelo da OCDE consiste, como vimos,
em atribuir a competência tributária exclusiva, relativamente a "outros rendimentos",
ao Estado de residência. As convenções brasileiras não aceitam este modelo, tendo

54 Cfr. BAKER, Double Taxation Convention, cit., 349.


55 A opinião de KLAus VOGEL, segundo a qual o art. 21 não se aplica a serviços, inclusive de
assistência técnica, regulados pelo art. 7°, é de um peso decisivo, pois a sua obra, de conte-
údo e dimensão monumentais, representa um repositório exaustivo de Direito Comparado,
em que se analisa a doutrina e a jurisprudência dos diversos países-membros da OCDE, dele
não constando um só parecer ou decisão em sentido contrário.
-+l.M Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier
sido negociado o reconhecimento da competência cumulativa do Estado da fonte. A
ausência eventual desta cláusula (como sucede na Convenção com a França) não tem
qualquer alcance prático, pois, não existindo nenhuma limitação convencional quanto
aos rendimentos residuais, aplica-se diretamente a legislação interna de ambos os Esta-
dos, que tratarão os rendimentos atípicos em causa consoante seus próprios critérios.
Mas daqui não pode concluir-se que a legislação tributária interna brasileira
(art. 7° da Lei nO 9.779/99) se possa aplicar, sem limites, à remuneração dos serviços,
que não podem ser consideradas "outros rendimentos", pela singela razão de que são
regulados pelo art. JO, que impede a retenção na fonte pelo Estado de que provêm
os pagamentos 56 .
O TRF da 4 a Região já se pronunciou no sentido de que os serviços pagáveis a em-
presas signatárias de tratados contra a dupla tributação (como o Canadá e a Alemanha)
não estão sujeitos à retenção na fonte no Brasil por força do art. 7° dos tratados 57 •

G) Comparação com o regime interno

Da exposição anterior resultam as principais diferenças entre o regime unilateral


e o regime convencional em matéria de tributação dos lucros auferidos por estabe-
lecimentos permanentes. Convém, todavia, resumi-las. Em primeiro lugar, as con-
venções dão de estabelecimento permanente conceito - "instalação ftxa de negócios
em que a empresa exerce toda ou parte da sua atividade" - mais amplo que o de
"dependências" a que se refere o RIR (filiais, sucursais, agências ou representações
de sociedades estrangeiras58 ), abrangendo, para além destas, fábricas, oficinas, minas
e pedreiras, canteiros de construção.
Também varia a noção e regime dos "representantes". No direito convencional,
só há estabelecimento permanente pessoal se o representante é dependente, isto é, tem
poderes que lhe permitam concluir contratos em nome da empresa, e contratos sefa
de que natureza for, salva a mera compra de mercadorias. No direito interno, o re-
presentante dependente também é tributado como estabelecimento estável, mas isto
apenas no que tange a operações sobre mercadorias. Se, quanto a este aspecto, o direito
interno é mais restritivo que o convencional, já se revela mais ampliativo quanto ao
outro, pois admite a existência de estabelecimento estável no caso de representante
independente) na hipótese de faturamento indireto de mercadorias, isto é, de contrato
de comissão. Como já se salientou, o direito interno ultrapassou o critério jurídico

56 Cfr. HELENO TÔRRES, Princípio da territorialidade e tributação de não residentes no Brasil.


Prestações de serviços no exterior. Fonte de produção e fonte de pagamento, in ID. (org.),
Direito Tributário Internacional Aplicado, São Paulo 2003, 7I.
57 Acórdão em Embargos Infringentes nO 2002.71.00.006530-5jRS, de 4 de junho de 2009,
e Ap. Cív. 2002.71.00.006530-5-RS, de 4 de julho de 2007.
58 Cfr. supra, 520 ss.
VI I Capo 11 I Normas de Reconhecimento de Competência 4il.

da independência das pessoas jurídicas do comitente e do comissário, para considerar


o segundo mera "dependência" do primeiro, em razão da unidade econômica que se
encontra na base do negócio.
Outra diferença essencial, entre regime interno e internacional, é a que decorre
do "princípio do estabelecimento permanente". No regime interno, não havendo es-
tabelecimento permanente, pode a empresa domiciliada no exterior ser tributada se o
lucro por ela auferido se reporta a fonte localizada no Brasil. Ao invés, nas convenções
internacionais, a existência de estabelecimento permanente é o único critério de apli-
cação do princípio da territorialidade (que não já a mera localização no País da fonte
da renda). Assim, inexistindo o estabelecimento, não haverá tributação, por o lucro -
ainda que eventualmente "produzido" no país - não lhe poder ser "imputado".
Enfim, no que respeita às filiais, embora direito interno e convencional partam
de visão análoga, ou seja, da concepção de autonomia patrimonial e da consequente
tributação própria e distinta, divergem enquanto o primeiro apura os lucros segundo
a contabilidade efetiva e o segundo baseia-se na ideia de lucros hipoteticamente ob-
tidos por empresa independente.

§ 2° LUCROS DE EMPRESAS DE NAVEGAÇÃO

Os lucros das empresas de navegação marítima e aérea suscitam tradicional-


mente complexos problemas quanto à repartição do poder de tributar, enquanto
respeitantes ao tráfego internacional, expressão através da qual se denomina qualquer
viagem de navio ou aeronave explorado por uma empresa de um Estado contratante,
exceto quando efetuada exclusivamente entre lugares do outro Estado contratante.
Note-se que esta expressão é mais ampla que a sua acepção comum, pois com
ela se pretendeu reservar ao Estado da residência ou da direção efetiva o direito de
tributar as operações atinentes seja ao puro tráfego interno, seja às relativas ao tráfe-
go entre terceiros Estados; e permitir ao outro Estado contratante tributar o tráfego
efetuado exclusivamente dentro das suas fronteiras 59 .

59 Cfr. OCDE, Comentários, art. 30, parágrafos 50, 6 0 e os novos 6.1 a 6.3; D. HUND, The Deve-
lopment ofDouble Taxation Conventions with Particular Reflrence to Taxation oflnternationalAir
Transport, BIFD 1982, 111; M. CHRÉTIEN, Une espêce originale de traités fiscaux: les conven-
cions internationales sur les doubles impositions des entreprises maritimes et aériennes, Revue
de Science et de Législation Financiere 1951, 715; DE NOREAZ, De la double imposition des
sociétés de navigation maritime et aérienne, Revue Fiscale 1959, 395; G. PHlLIPPE, I.:incidence
des conventions suisses de double imposition sur les entreprises de navigation maritime et aé-
rienne,RevueFiscale 15 (1960),415; MAISTO, The "shipping and air transport" provision (Art.
8 0 ) in the Italy-Usa double taxation agreement, in Essays on International Taxation, 15, Deven-
ter/Boston 1993, 287; PIETRO ADONNJNO, Aspectos impositivos de las empresas de transporte
aéreo y marítimo, in HELENO TAVElRA TÓRRES (org.), Comércio internacional e tributaçifu, São
Paulo 2005, 455; ANDRÉS BLANCO, Tratamiento de las empresas de transporte aéreo y marí-
-tiM Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Assim, por exemplo, se uma empresa com domicílio na Noruega vende, no Bra-
sil, através de um seu agente, bilhetes para uma viagem entre pontos exclusivamente
localizados na Noruega, ou num terceiro Estado, como Portugal, o Brasil não pode
pretender qualquer tributação. Apenas o poderá fazer se a viagem em causa ocorrer
apenas dentro das fronteiras do Brasil, caso em que ficará descaracterizada como
sendo de tráfego internacional.
No que concerne às operações de tráfego internacional, os acordos e convenções
internacionais procederam à repartição do poder de tributar, reconhecendo o direito
exclusivo de tributação ao Estado da residência e/ou da direção efetiva, donde resulta
automaticamente a exclusão da competência do outro Estado contratantéo.
Utilizamos as expressões residência e/ou direção efetiva, pois ambas as conexões
têm sido utilizadas nos tratados celebrados pelo Brasil.
A conexão residência foi primeiramente adotada nos acordos bilaterais específi-
cos em matéria de navegação que o Brasil assinou com diversos países 61 .
Trata-se, porém, em todos estes acordos, de uma residência qualificada, enquan-
to se exige, além da localização da sede, outros atributos, como a constituição con-
soante as leis do país (Itália), ou que aí sejam também administradas e controladas
(Argentina, Grã-Bretanha e França)62.
Nas convenções gerais - celebradas ao abrigo do Modelo OCDE - adotou-se,
via de regra, a conexão sede da direção efetiva, com as únicas exceções do acordo com
o Japão, em que se consagrou a residência simples, e com as Filipinas, que admite
também o poder de tributar do Estado da fonte (cfr. art. 8° e Protocolo, item 5).

timo, in HELENO TAVEIRA TÔRRES, ibidem, 499. Entre nós, ver GILBERTO DE ULHÔA CANTO,
Temas de Direito Tributário, IIl, Rio de Janeiro 1964, 213 ss.; HELENO TAVEIRA TÔRRES,
Regime jurídico das empresas de transporte aéreo e marítimo e suas implicações fiscais, in
HELENO TAVEIRA TÔRRES (org.), Comércio internacional e tributação, São Paulo 2005, 395.

60 A lei brasileira consagra, desde 1943, uma isenção das companhias estrangeiras de navegação
marítima e aérea que operam no território do Brasil mediante filiais, agências, escritórios ou
qualquer outra modalidade de estabelecimento permanente. O art. 30 do Decreto-Lei nO 5.844,
de 23 de setembro de 1943, dispõe que "as companhias estrangeiras de navegação marítima e
aérea estarão isentas do imposto de renda se, no país de sua nacionalidade, as companhias bra·
sileiras de iguais objetivos gozarem da mesma prerrogativa". Sobre o âmbito desta isenção m.
Parecer Normativo CST nO 95, de 1 de julho de 1970, e nO 451, de 24 de novembro de 1970,
cfr. GILBERTO DE ULHÔA CANTO, Temas de Direito Tributário, vol. III, Rio de Janeiro 1964,213;
BULHÕES PEDREIRA, Imposto sobre a renda - pessoa jurídica, vol. I, Rio de Janeiro 1979, 121 S5.
61 Cfr. supra, 73.
62 Tais convenções deixam de aplicar-se em relação aos rendimentos abrangidos pelas conven-
ções contra a dupla tributação durante o período em que estas vigorarem. Ver, por exemplo,
art. 8°-4 da Convenção com a Argentina. Todavia, o Protocolo da Convenção com a China
(item 1) estabelece que o Acordo não prejudicará a aplicação do art. II ° do Acordo sobre
Transporte Marítimo celebrado com este país, em 23 de maio de 1979. Cfr. A. MIRAULO,
Doppia imposizione internazionale, Milão 1990, 306; LICCARDI, La normativa convenzionale,
in PISTONE (org.), Diritto Tributario Interna zionale, 191 (297 ss.).
~ftulo VI I Capo 11 I Normas de Reconhecimento de Competência -w
Algumas convenções visam a resolver a dúvida decorrente de a direção efetiva
de empresa de navegação marítima se situar a bordo de um navio, para estabelecer
que, neste caso, se reputará como país com competência tributária exclusiva aquele
em que se encontra o posto de registro desse navio ou, na sua ausência, o país da
residência da pessoa que explora o navi063 .
Diversas convenções abordam diretamente a hipótese de os lucros serem obti-
dos por uma empresa através da sua participação em formas jurídicas de cooperação
internacional, tais como os "acordos de pool», a associação não personalizada, joint
business ou international operating ageney. Como estas formas carecem de personalida-
de jurídica, não dando origem a um novo ente distinto dos participantes, revestindo
simples natureza contratual, os lucros seguem o mesmo regime dos provenientes da
exploração isolada, pelo que apenas são tributáveis no Estado em que estiver situada
a sede da direção efetiva da empresa64 •
Nem sempre é fácil identificar os lucros de empresas de navegação marítima e
aérea, atendendo à pluralidade de atividades que estas desempenham a título con-
corrente ou acessório. Tem-se entendido que seguem o regime desses lucros os pro-
venientes de atividades complementares ou conexas com as de transporte - como a
locação de navio ou aeronave, a venda de bilhetes, a exploração de serviços de ônibus
de ligação a portos ou aeroportos, a publicidade e a propaganda, ou o transporte de
mercadoria por caminhão entre um entreposto e um aeroporto ou porto, inclusive a
locação de contentores. Mas já seguem regime independente os lucros de atividades
autônomas - ainda que exercidas pela mesma empresa -, como a exploração de hotel
ou de estaleiro de construção naval65 •

§ 30 PROFISSÕES INDEPENDENTES

Em matéria de profissões independentes, as convenções contra a dupla tributa-


ção assinadas pelo Brasil reconhecem, em princípio, no seu art. 14, caráter exclusivo
ao direito de tributar do Estado da residência dos profissionais em causa66 •

63 Cfr. Convenção com Portugal, art. 8°, § 2°. Veja-se ainda a especialíssima regra de conexão
subsidiária na Convenção com a Noruega (art. 8°-4).
64 Cfr. a Convenção com Portugal, art. 8°, nO 3, sobre o caso de atividade de transporte aéreo
sob a forma de consórcio.
65 Cfr. OCDE, Comentários, art. 8°, parágrafos 4 S5., inclusive o novo 10.1. O art. 8°, § 2°
,da Convenção com o Peru, explicita como negócios acessórios o afretamento ou aluguel de
navio, barco ou aeronave, sem tripulação, bem como o aluguel de contêineres e respectivo
equipamento.
66 O art. 14 foi eliminado na revisão do Modelo operada em 2000 com o fundamento de que o
rendimento das profissões independentes era simples modalidade de business income e que o
conceito de instalação fixa era também simples modalidade de estabelecimento permanente.
Assim, esta matéria passaria doravante a ser regida pelo art. 7°. Por sua vez, foi aditado ao
I lIifm I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Esse direito cede o passo, em duas convenções - que neste particular seguem o
antigo art. 14 do Modelo OCDE: a do Japão (art. 13) e a de Portugal (art. 14) -,
ao Estado em que o profissional disponha, de forma habitual, de uma instalação fixa
para o exercício destas atividades. Se dispuser dessa instalação, os rendimentos serão
tributáveis no outro Estado (competência cumulativa), mas unicamente na medida
em que forem imputáveis a essa instalação fixa 67 •
O conceito de "instalação fixa" é o equivalente, no que tange às profissões in-
dependentes, do "estabelecimento permanente", em matéria de lucros comerciais e
industriais. Conforme os Comentários da OCDE, não se julgou oportuno definir
esta noção, mas ela tem em vista, por exemplo, o consultório de um médico, o atelier
de um arquiteto ou o escritório de um advogado. Em virtude da progressiva inter-
nacionalização das prestações de serviços independentes, é cada vez mais frequente
que as pessoas em causa disponham de instalações deste tipo em Estados diversos
daqueles em que residem: neste caso, esse Estado terá o poder de tributar os lucros
imputáveis àquela instalaçã068 •
Mas, tal como em relação ao conceito de estabelecimento permanente sucede, as
convenções exigem a conexão efetiva, rejeitando a teoria da força de atração.
N as demais convenções assinadas pelo Brasil, a conexão relevante para fundar
a tributação cumulativa do Estado da fonte não é a existência, no seu território, de
instalação fixa, mas a simples localização da fonte pagadora do rendimento - seja
ela estabelecimento permanente ou sociedade aí residente69 . Em face da redação
destes textos, pode concluir-se que esta conexão não funciona se a entidade em
causa for pessoa física, permanecendo neste caso a competência exclusiva do Esta-
do da residência.

art. 3° uma definição de business, segundo a qual inclui "o exercício de serviços profissionais
e outras atividades de caráter independente". O Brasil reserva-se o direito de manter o art.
14. Cfr. OCDE, art. 7°, NMC Positions, parágrafo 2.1.

67 A Convenção com Portugal (Protocolo, nO 6) dispõe que na eventualidade de, posterior-


mente à assinatura da presente Convenção, o Brasil concluir com um terceiro Estado não
situado na América Latina uma Convenção que limita - com relação aos rendimentos au-
feridos no art. 14, nO 1 - o poder de tributação do outro Estado contratante quer não seja
aquele em que for residente o beneficiário dos rendimentos, uma limitação idêntica será
automaticamente aplicada às relações entre o Brasil e Portugal.
68 Cfr. TIXIER/KEROGUES, Droit Fiscal International. Pratique française, Paris 1974, 118; OCDE,
Comentários, art. 14, parágrafo 4; MICHAux,An analysis ofthe notion "fixed base YJ and its rela-
tion to the notion ''Pennanent establishment" in the aCDE Model, Intertax 1987, 68; MAISTO,
Regime convenzionale dei redditi di lavoro autonomo e concetto di "instalazione fissa",
Diritto e Pratica Tributaria II (1981), 994, onde se examina o caso de um pintor cubano, re-
sidente na França e que dispunha de um atelier na Itália; GARBARlNO, La tassazione dei reddito
transnazionale, Pádua 1990, 342 ss. O conceito de instalação fixa é também consagrado no
art. 6°, § 6°, do Modelo OCDE-ISD.
69 N as Convenções com a África do Sul, a China, o México e Portugal, as conexões instalação
fixa (ou presença por mais de 183 dias) e fonte pagadora são alternativas.
Título VI I Capo 11 I Normas de Reconhecimento de Competência I !Iii!! I

Assim, nestas convenções, se um advogado brasileiro prestar serviços a cliente,


pessoa jurídica domiciliada na França, ainda que esse advogado nao disponha em ter-
ritório francês de escritório próprio, os rendimentos pagos pelo mencionado cliente
caem sob o âmbito do imposto francês.
A Convenção com o Chile admite ainda outra conexão alternativa que autoriza
a tributação pelo país da fonte - a circunstância do profissional, seus empregados ou
outras pessoas designadas por ela permaneçam ou as atividades prossigam no outro
Estado contratante por um período ou períodos que, no total, somem ou excedam
183 dias, dentro de um período qualquer de doze meses (art. 14, l.b). Neste caso,
somente pode ser tributada nesse outro Estado a parte da renda obtida das atividades
desempenhadas por uma pessoa nesse outro Estado.
Sob a epígrafe "profissões independentes", abrangem-se as profissões liberais e
outras atividades independentes de caráter análogo. As primeiras estão expressamen-
te definidas: incluem, em especial, as atividades independentes de caráter científico,
técnico, literário, artístico, educativo e pedagógico, bem como as atividades indepen-
dentes de médicos, advogados, engenheiros, arquitetos, dentistas e contadores.
Reportar-se-á este preceito apenas a pessoas físicas ou incluirá os casos em que
as profissões em causa sejam exercidas por sociedades? A mençao genérica a "resi-
dentes", efetuada pelas disposições em causa, sugere que se apliquem tanto a pessoas
físicas como jurídicas e, neste caso, seja qual for a forma por elas adotada 70 .

§ 4° PROFISSÕES DEPENDENTES

Em matéria de profissões dependentes, as convenções internacionais - seguindo


o art. 15 do Modelo OCDE - reconhecem, em princípio, a competência exclusiva do
Estado da residência 71 •
Se o emprego é exercido no Estado da residência do empregado, nenhum pro-
blema se suscita; se, porém, é exercido noutro Estado, importa proceder à repartição
dos poderes de tributar potencialmente interessados na situação.

70 Esta é a solução expressamente consagrada por numerosas convenções que admitem a exten-
são a sociedades em geral ou a sociedades civis: Alemanha (Protocolo, 5), Canadá (Protoco-
10,10), Coreia (Protocolo, 5), Dinamarca (Protocolo, 4), Equador, (Protocolo, 6), Espanha
(Protocolo, 6), Filipinas (Protocolo, 8), Hungria (Protocolo, 7), Itália (Protocolo, 6), Méxi-
co (Protocolo 7), Luxemburgo (Protocolo, 6) e Tchecoslováquia (Protocolo, 4).
71 Sobre esta matéria, SEVERINO DUARTE/MARIA ODETE OLIVEIRA, Sobre a tributação jurídica
internacional dos rendimentos do trabalho dependente, Fisco 33 (1991),31; cfr. também
JosÉ MARIA DE LA VILLA GIL, Rentas dei trabajo, in ID. (org) , Relaciones fiscales internaciona-
les, Madrid 1987, 173; SERVAAS VAN THIEL, Free Movement ofPersons and Income Tax Law,
Amsterdam 2002; GIOVANI PUOTI, I redditi di lavoro nel modello OCSE, in VICTOR UCKMAR
( org.), Corso di Diritto Tributario Internazionale, Pádua 1999, 331; fuJKELE BETTEN, Income
TaxAspects ofEmigration and Immigration oflndividuals, Amsterdam 1998.
4ttM Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Nesta hipótese, há que distinguir as "atividades duradouras", caso em que ocor-


re a competência tributária cumulativa (may be taxed) do Estado da fonte, das "ati-
vidades temporárias", caso em que o Estado da residência tem um poder exclusivo,
se se verificarem cumulativamente72 os seguintes três requisitos: (a) o beneficiário
permanecer no outro Estado durante um período ou períodos que não excedam, no
total, 183 dias do ano fiscal considerad0 7 3; (b) a remuneração for paga por emprega-
dor ou em nome de empregador que não é residente do outro Estado; (c) o encargo
das remunerações não couber a um estabelecimento permanente ou a uma instalação
fixa que o empregador tiver no outro Estado.
Através destes dois últimos requisitos, pretendeu-se esclarecer que a exclusi-
vidade do direito do Estado da residência cessa quando a "fonte de pagamento" se
localiza também no país em que a atividade é exercida (fonte da produçãoY4.
Simetricamente, o Estado em que o emprego é exercido terá competência cumu-
lativa se ocorrer alternativamente uma das seguintes três hipóteses: (a) o empregado
estiver presente mais de 183 dias; ou (b) a remuneração for paga por ou por conta de
empregador residente nesse Estado; ou (c) o empregador não residente tiver um es-
tabelecimento permanente ou instalação fixa que suporta a remuneraçã0 75 • Basta que
um destes requisitos seja preenchido para que o Estado em que o emprego é tempo-
rariamente exercido tenha o poder de tributar o salário decorrente desse empreg0 76 .
O requisito dos 183 dias foi redefinido na versão do Modelo OCDE de 1992,
pois, enquanto as versões anteriores (e as Convenções celebradas pelo Brasi~ que as
seguiram) reportavam o cálculo do período "ao ano oficial considerado", a versão atu-
al reporta-se "a qualquer período de doze meses que comece ou termine no ano fiscal
considerado'>77. Pretendeu-se, assim, superar as dificuldades suscitadas pelo fato de,
eventualmente, não coincidirem os exercícios frnanceiros de ambos os Estados contra-
tantes, situação esta que abria as portas a práticas elisivas consistentes em organizar a
produção de tal modo que os trabalhadores permanecessem nunl Estado nos últimos
5 meses e meio de um ano e nos primeiros 5 meses e meio do ano subsequente s.

72 E não alternativamente: OCDE, Comentários, art. 15, parágrafo 4°.


73 A regra dos seis meses justifica-se enquanto a generalidade dos países só concede o estatuto
de residente a partir desse período, passando então a taxar as pessoas a ele sujeitas. A Con-
venção com a Noruega chega ao detalhe de estabelecer que no total de 183 dias incluem-se
as suspensões normais do trabalho.
74 Cfr. PIERRE KERLAN, Problemes ftscaux posés par l)activité temporaire à l'étranger des employés des
entreprises à vocation internationale (relatório), CDFI LIX-b (1974), l.
75 No que eoncerne ao requisito do estabelecimento permanente, veja-se o caso do gerente ale-
mão de sociedade alemã que deriva rendimentos de sua sucursal na Suíça: efr. BAKER, Double
Taxation, 306.
76 Vejam-se exemplos de cômputo do praw nos Comentários da OCDE ao art. 15, parágrafo 5.1
(versão de 2008). Cfr. BAKER, Double Taxation, 303. Vejam-se os comentários deste autor sobre
os problemas suscitados, na interpretação da regra dos 183 dias, pelo conceito de período fiscal.
77 Cfr. a Convenção com Portugal, art. 15, § 2°, a.
78 Cfr. OCDE, Comentários, art. 15, parágrafo 4.
VI I Capo 11 I Normas de Reconhecimento de Competência -ji-
De harmonia com os Comentários da OCDE (versão de 1992), o critério de
cômputo do período é dos "dias de presença física", devendo contar-se parte do dia,
dia de chegada, dia de partida, sábados, domingos, feriados, dias de doença; e deven-
do excluir-se os dias de trânsito entre locais situados fora do território de exercício da
atividade, bem como férias passadas fora desse mesmo territóri0 79 •
O requisito relativo à residência do "empregador" suscita por vezes problemas
nas práticas denominadas de international hiring-out of labour, através das quais o
beneficiário final dos serviços que pretende contratar trabalhadores estrangeiros dis-
so encarrega um intermediário estabelecido no exterior que celebra os contratos de
trabalho em nome próprio, mas por conta e no interesse do primeiro. Nestes casos,
não incidirá imposto no país de exercício da atividade se o trabalho for executado em
período inferior a 183 dias. Os Comentários da OCDE sugerem que, na interpreta-
ção do conceito de "empregador", se dê prevalência à substância sobre a forma, de-
vendo entender-se como tal a pessoa que tenha direitos sobre o trabalho produzido e
suporte as responsabilidades e os riscos. Este critério poderá conduzir a caracterizar
como "empregador" o beneficiário [mal e não o intermediário estrangeiro so .
Os empregos exercidos a bordo de navio ou de aeronave são tributáveis no
Estado contratante em que estiver situada a sede da direção efetiva da empresa. As
Convenções com a Dinamarca e a Noruega introduzem elementos de conexão subsi-
diários: se não for possível determinar que a sede da direção efetiva de uma empresa
de navegação marítima está situada somente em um dos Estados contratantes, essas
remunerações são tributáveis no Estado em que o navio estiver registrado.
Por sua vez, a Convenção com a Noruega alarga o âmbito de aplicação deste
regime ao emprego exercido a bordo de navios de pesca em geral, assim como a ca-
sos em que a remuneração é paga a título de participação nos proventos obtidos nas
pescas dos tipos assinalados.
Outra regra especial prevista nos acordos com a Dinamarca e a Noruega refere-
se ao emprego a bordo de aeronaves, caso em que apenas é competente o Estado da
residência do empregado.
Importa notar que o disposto nas convenções aplica-se apenas a rendimentos do
trabalho, tributáveis à luz do direito interno dos países em causa, seja qual for a forma
do seu pagamento, incluindo os fringe benefitsS!, as overseas allmvances (compensação
paga nos EE.UU. para adaptação a novo teor de vida) e as ajudas de custo.
Mas não estão abrangidas pelo preceito as quantias pagas a título de reembolso,
como é frequente no que tange a despesas de manutenção dos empregados no exterior,
incluindo despesas de viagens, alojamento etc. (per diem) Ausldsung) , e cuja característica
fundamental resulta de o seu pagamento ser de conta do empregador e se efetuar me-

79 Op. cit.) art. 15, parágrafos 5° e 6°.


80 Op. cit., art. 15, parágrafo 8°.
81 Uso de casa ou automóvel, tírulos de clubes, seguro de saúde etc., cfr. OCDE, Comentários,
art. 15, parágrafo 2.1.
I e I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

diante apresentação de comprovação adequada (salvo naqueles direitos, como o alemão,


que dispensam a comprovação se as despesas se adequarem a uma tabela padrão)82.
A caracterização efetiva como remuneração ou reembolso só pode, porém, fa-
zer-se perante os textos contratuais e as circunstâncias do caso concreto 83 .
O tratamento tributário das stock options em face das convenções contra a dupla
tributação foi objeto de aprofundamento na versão dos Comentários de 2005 84 .

§ 5° PROFESSORES E ESTUDANTES

Um caso similar ao dos trabalhadores por conta de outrem que exercem uma "ati-
vidade temporária" num dos Estados é o dos professores e estudantes 85 . Mas, enquan-
to em relação àqueles, o Estado da fonte, ou seja, o país onde exercem a sua atividade,
só renuncia à tributação em favor da competência exclusiva do Estado da residência
em condições bem apertadas - o beneficiário não permanecer no país mais de 183 dias
e as remunerações serem pagas por pessoas domiciliadas no exterior -, no caso dos
professores e estudantes, convencionou-se um regime de isenção mais generoso.
É que a presença porventura prolongada de professores, pesquisadores e es-
tudantes num dado país fá-Ios-á adquirir o estatuto fiscal de residente, com a au-
tomática consequência (na generalidade dos países) da sua tributação com base no
princípio da universalidade (world-wide-income). Como, por seu turno, o país donde
provêm o professor e o estudante pode não lhes reconhecer a perda da sua condição
de residentes - atendendo ao caráter temporário da permanência no exterior - gerar-
se-ia uma dupla tributação, podendo ter por objeto o "rendimento mundial".
Para a eliminar, o Estado da residência atual e temporária do professor e do estu-
dante abre mão do seu direito de tributar - no que tange aos professores - quanto às
remunerações que receberem em consequência das suas atividades específicas - e no
que respeita aos estudantes - quanto às remunerações que receberem por emprego
exercido nesse Estado com a finalidade de ajudar os seus estudos ou a sua formação,
assim como quanto às quantias que receberem do exterior para fazer face à sua ma-
nutenção, educação ou treinamento.

82 Com as despesas de manutenção não devem confundir-se as "diárias", que são pagas em
moeda estrangeira ao licenciador de tecnologia e que representam o custo diário que para
este representa a ausência do empregado.
83 Cfr. ALBERTO XAVIER, Tributação de empregados brasileiros que prestam serviços na Alema-
nha, in ID.,Estudos sobre o imposto de renda, Belém 1988, 131 (142 ss.), em parecer em que exa-
minamos a aplicação do art. 15 da Convenção Brasil-Alemanha a funcionários de subsidiária
brasileira de empresa alemã transferidos para a Alemanha para prestarem serviços na matriz.
84 Cfr. art. 15, parágrafo 12 a 12.15.
85 Cfr. H6HN, Doppelbesteuerungsrecht, 205. Note-se que a Convenção Modelo apenas se refere
aos estudantes, mas não aos professores, pelo que a estes são aplicáveis os arts. 7° (anterior-
mente o art. 14) ou 15, conforme os casos.
- = = : : : : : 2 i t l J l o VI I Capo 11 I Normas de Reconhecimento de Competência Ri;'
A mencionada renúncia pressupõe, porém, a ocorrência de diversas condições,
muito variáveis de convenção para convenção, pelo que apenas se descreverá o re-
gime mais frequente. No que toca aos professores e pesquisadores) é necessário que (i)
tenham vindo a convite do Estado, universidade, estabelecimento de ensino supe-
rior, escola, museu ou outra instituição cultural, ou cumprindo programa oficial de
intercâmbio cultural; (ii) permaneçam no outro Estado por período não superior
a dois anos 86 ; e (iii) o fim exclusivo da estadia seja lecionar, proferir conferências
ou realizar pesquisas.
No que respeita aos estudantes) há que distinguir as condições necessárias à isenção
das remunerações decorrentes de emprego das respeitantes às quantias recebidas do ex-
terior: no primeiro caso, é necessário que o único fim da permanência seja o de se edu-
car ou realizar treinamentos, vigorando a isenção por um dado período de tempo8?; no
segundo, é necessário (i) que permaneça temporariamente na qualidade de estudante
de uma universidade, escola superior ou escola, de estagiário, ou beneficiário de bolsa,
ou prêmio concedido por uma organização religiosa, de caridade, científica ou educa-
cional; e ainda que (ii) o estudo ou pesquisa seja o fim primordial da sua presença.

§ 6° PENSÕES E ANUIDADES PRIVADAS

Em matéria de pensões e anuidades, as Convenções assinadas pelo Brasil ado-


tam soluções diferenciadas 88 •
Um primeiro grupo - fiel ao princípio consagrado no Modelo OCDE (art.
IS) - reconhece o direito exclusivo de tributar ao país da residência do beneficiário
(Bélgica, França, Finlândia, Japão, Portugal).
Um segundo grupo reconhece também o direito exclusivo de tributar ao país
da residência, mas só até certo limite de valor, ultrapassado o qual o país da fonte
tem também o poder de tributar (Canadá, Coreia, Espanha, Hungria, Itália, Luxem-
burgo, Portugal, Suécia, Tchecoslováquia), ou na condição de o pagamento não ser
efetuado por um residente no outro Estado ou por um estabelecimento permanente
nele instalado.

86 A Convenção com a Finlândia - art. 20 - exige que a permanência não exceda conjuntamen-
te 24 meses em, no máximo, três anos de calendário consecutivos e exclui da isenção pesqui-
sas que forem primordialmente realizadas para benefício particular da pessoa ou pessoas em
causa. Veja também a limitação de dois anos consecutivos nas Convenções com a África do
Sul e a Ucrânia.
87 Via?e regra, três anos. A Espanha faculta período superior (quatro anos), a França, Portugal
e a Austria, inferior (respectivamente dois anos, um ano e 183 dias do ano considerado). Via
de regra, a isenção só se aplica até determinado limite quantitativo.
88 O tratamento tributário das pensões, nas suas diversas modalidades, bem como das contri-
buições para esquemas estrangeiros de pensão, foi amplamente desenvolvido pelo Comitê de
Assuntos Fiscais da OCDE na versão dos Comentários de 2005 (art. 18, §§ 10 a 69).
-i:l.1 Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Um terceiro grupo reconhece o poder de tributar tanto do país da residência


quanto da fonte, independentemente de limites quantitativos (Áustria, Filipinas, Ín-
dia, Noruega).
Enfim, um quarto grupo - situado no pala oposto ao do primeiro - reconhece
o direito exclusivo de tributar ao país da fonte, ou seja, ao país de proveniência dos
rendimentos (Argentina, Dinamarca, Equador)89.
Nos dispositivos convencionais distingue-se, por vezes, as pensões das anuida-
des: pensões são os pagamentos periódicos efetuados depois da aposentadoria, em
consequência de um emprego anterior; as anuidades (ou rendas) são quantias deter-
minadas, pagas periodicamente ou em caráter vitalício, ou durante períodos de tem-
po determinados ou determináveis, em decorrência de um compromisso de efetuar
os pagamentos como contrapartida de uma prestação equivalente em dinheiro ou
avaliável em dinheiro.
Pode, por outras palavras, dizer-se que, enquanto a pensão decorre de um pré-
vio vínculo empregatício, a anuidade decorre de um vínculo obrigacional.
Em matéria de pensões pagas a um empregado em razão da cessação do em-
prego, podem suscitar-se sérios problemas de qualificação, já que as leis internas de
certos países as configuram como verdadeiras pensões, enquadráveis nos arts. 18 e
19 da Convenção-Modelo, enquanto noutros países são configuradas como a remu-
neração final do trabalho prestado, subsumível ao art. 15, e noutros países ainda são
vistas como um bônus ou liberalidade não tributável em imposto de renda90 .
Outro tipo de problema resulta das contribuições para esquema de pensões, pagas
no Estado de origem por empregados de empresas multinacionais que temporariamen-
te exercem a sua atividade noutro Estado e não pretendem perder direitos no seu país.
Para evitar duplas tributações neste tipo de situação, os Comentários da OCDE, na ver-
são de 1992, recomendam aos Estados-membros a adoção de cláusulas, nos seus trata-
dos bilaterais, segundo as quais as contribuições, pagas por um indivíduo que exerce a
sua atividade num Estado contratante, para um esquema de pensão organizado no ou-
tro Estado, sejam dedutíveis do imposto de renda cobrado pelo primeiro nos mesmos
termos e condições que as contribuições pagas para esquemas nele estabelecidos91 •
As pensões e outros pagamentos efetuados em virtude de um programa oficial
que integra o sistema de seguridade social de um Estado Contratante ou de uma de
suas subdivisões políticas ou uma autoridade local serão tributáveis somente nesse
Estado (África do Sul, Israel, México).
Anote-se, por fim, que as pensões pagas por entidades de direito público são
regidas pelo preceito (correspondente ao art. 19 do Modelo OCDE) referente a re-
munerações públicas.

89 Assim acontece com Portugal, mas somente no que respeita às pensões de seguridade social
(art. 18, nO 2).
90 Cfr. GCDE, Comentários, art. 18, parágrafo 30.
91 Cfr. GCDE, Comentários, art. 18, parágrafos 4° a 37.
- = = = = = = - - ! í t u l o VI I Capo 11 I Normas de Reconhecimento de Competência 4i:I '

§ 7° CAPITAL

Apesar de numerosos países europeus terem instituído impostos sobre o capital


ou o patrimônio, via de regra como complemento do imposto sobre a renda92, ape-
nas quatro convenções celebradas pelo Brasil contêm dispositivos regulando a maté-
ria: com a Alemanha, a Áustria, o Luxemburgo e a Noruega, todas aliás seguindo de
perto o art. 22 do Modelo OCDE.
As convenções aplicam-se apenas aos impostos sobre a posse ou propriedade de
capital especificados no art. 2° (como o Vermdgensteuer alemão), não abrangendo os
impostos sobre transferências de capital, como os impostos sobre doações e suces-
sões ou impostos de transrnissã093 .
A estrutura das normas convencionais sobre capital acompanha de perto a mes-
ma sistemática adotada quanto a ganhos de capital, pelo Modelo OCDE. A regra
geral é a competência exclusiva do Estado da residência do titular do capital, com três
exceções: os bens imóveis; os bens móveis integrados num estabelecimento perma-
nente; navios e aeronaves. As duas primeiras exceções dão lugar à competência cumu-
lativa do Estado da situação dos bens; a última, à competência exclusiva do Estado
onde se situa o lugar da direção efetiva da empresa.
Note-se que as Convenções com a Áustria e o Luxemburgo preveem uma rene-
gociação dos preceitos referentes a capital, na hipótese de o Brasil vir a instituir um
imposto sobre o capital (Protocolo, item 6).

SEÇÃO II
RECONHECIMENTO DE COMPETÊNCIA CUMULATIVA
ILIMITADA DO ESTADO DA FONTE

Estudaremos nesta seção as normas convencionais que, via de regra, reconhe-


cem desde logo competência cumulativa ao Estado da fonte, sem estabelecer qual-
quer limite quantitativo ao seu poder de tributar.

§ 1° RENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS

Em matéria de rendimentos imobiliários, as convenções contra a dupla tributação


assinadas pelo Brasil seguem de perto o art. 6° do Modelo OCDE, que garante a com-
petência cumulativa do Estado da fonte (may be taxed) , isto é, do Estado onde os bens
estiverem situados (locus rei sitae). E isto em virtude da forte conexão geralmente reco-
nhecida entre o Estado da situação dos bens e a fonte dos seus créditos fiscais. Deve,

92 É o caso da Alemanha, Áustria, Dinamarca, Finlândia, Holanda, Luxemburgo, Nomega, Es-


panha e Suíça, além dos impôts sur la flrtune adotados nos Cantões Suíços e na França: cfr.
OCDE, Taxation ofNet );[!éalth, Capital Transflrs and Capital Gains DfIndividuais, Paris 1988.
93 efr. OCDE, Comentários, art. 22, parágrafo 1.
I q I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

pois, entender-se que os rendimentos imobiliários são tributáveis pelo Estado da fonte,
quer sejam ou não imputáveis a estabelecimento permanente nele situad094 .
Em ordem à perfeita aplicação deste regime, as convenções procuram caracteri-
zar o conceito de rendimentos de bens imobiliários, começando por conferir à lex loci
rei sitae o encargo de definir o conceito de bens imobiliários. Todavia, as convenções
restringem a liberdade de qualificação dos direitos internos, mediante a imposição
de duas ordens de limites: limites positivos, que se traduzem na necessária conside-
ração como imóveis (ainda que os direitos internos assim os não qualifiquem) dos
acessórios da propriedade imobiliária, do gado e do equipamento utilizados nas ex-
plorações agrícolas e florestais, dos direitos a que se aplicam as disposições do direito
privado relativas à propriedade territorial, do usufruto de bens imobiliários e dos
direitos aos pagamentos variáveis ou fixos pela exploração, ou concessão de explora-
ção de jazidas minerais, fontes e outros recursos naturais; e limites negativos, que se
traduzem na exclusão do conceito de bens imobiliários dos navios, barcos e aerona-
ves, que seguem regime distinto.
A qualificação como rendimentos imobiliários não depende nem da natureza
jurídico-econômica da exploração, que tanto pode ser direta, como resultar de locação
ou arrendamento; e também não depende da natureza da pessoa do seu titular: seja
pessoa física ou empresa, inclusive no caso em que os bens estejam afetos ao exercício
de profissão liberal95 •
As convenções não se reterem aos rendimentos dos créditos com garantia imo-
biliária, aos quais é assim aplicável o regime jurídico dos juros. A Convenção com
a Noruega (art. 6°, parágrafo 5°) inclui, porém, um dispositivo segundo o qual os
juros de dívidas relacionadas com propriedades imobiliárias que o residente de um
Estado contratante tem no outro Estado contratante são, para o cômputo da renda
líquida, dedutíveis em condições idênticas às prevalecentes para os residentes desse
outro Estado contratante. Trata-se, pois, de obrigação imposta ao Estado da residên-
cia de autorizar a dedução dos juros, dedução essa que obedecerá ao mesmo regime
da dedução prevista no Estado da fonte para os seus próprios residentes.

§ 2° GANHOS DE CAPITAL

o art. 13 do Modelo OCDE acolhe o princípio geral de que os ganhos de capital


devem ser tributados exclusivamente no país da residência do alienante, contemplan-
do, porém, três exceções: (i) os ganhos de capital na alienação de bens imobiliários,

94 Cfr. OCDE, Comentários, art. 6°, parágrafo 4°. Ver também o art. 5° do Modelo OCDE-
ISD, que consagra idêntica definição de bens imobiliários. Cfr. ainda CARLOS CUBILLO V AL-
VERDE, Rentas immobiliarias de los no residentes, in J. VILLA GIL (org.), fulaciones ftscales
internacionales, Madrid 1987, 14l.
95 Cfr. OCDE, Comentários, art. 6°, parágrafo 3.
.....______ ...Tí_tulo VI I Capo 11 I Normas de Reconhecimento de Competência -i:.
que podem ser tributados no Estado em que os imóveis se localizam; (ii) os ganhos
de capital na alienação de bens móveis integrados no patrimônio de estabelecimento
permanente (ou base fIxa), incluindo os de alienação do próprio estabelecimento,
que podem ser tributados no Estado em que o estabelecimento se situa; e (iii) os
ganhos de capital na alienação de ações cujo valor derive, direta ou indiretamente, em
mais de 50%, de bens imóveis situados no outro Estado; (iv) os ganhos de capital na
alienação de navios, aeronaves e similares, que só podem ser tributados no país onde
se localiza a direção efetiva da empresa96 •
As Convenções assinadas pelo Brasil consagram idêntica solução à do modelo
atrás descrito, no que concerne à tributação dos ganhos relativos a bens imobiliários,
bens mobiliários integrados em estabelecimento permanente, navios e aeronaves.
Todavia, no que concerne aos ganhos de capital referentes à alienação de outros bens
(designadamente ações ou quotas, valores mobiliários, bônus, obrigações e outros
títulos), ao invés de reconhecerem o direito de tributação exclusivo do país da resi-
dência, optaram por admitir o poder de tributar de ambos os Estados contratantes97 •
Apenas a Convenção com o Japão acolhe o princípio da tributação exclusiva
pelo país da residência98 •
Assim, por exemplo, se uma pessoa domiciliada no Japão realizar no Brasil
uma venda de ações (não integradas em estabelecimento permanente aqui situado)
a comprador domiciliado no Brasil, fIcará apenas sujeita a imposto no Japão, não
podendo o Brasil tributar a operação pela retenção do imposto de renda na fonte.
Mas se o vendedor for residente, ainda por exemplo, na França, já o direito do Brasil
é inquestionável.

96 Note-se que, enquanto nos dois primeiros casos os ganhos "podem" ser tributados no país da
fonte (competência cumulativa), no terceiro "só podem" ser tributados no país de direção efetiva
(competência exclusiva). O Modelo OCDE usa as expressões "max be taxed" e "shall be taxed
only". Cfr. BAKER, Double Taxation, 284; J. L. JUAN y PENALOSA, Ganancias de capital. Outras
rentas. Patrimonio, in J. VILLA GIL (org.), &laciones ftscales intemacionales, Madrid 1987, 273.
97 A Convenção com a Áustria, Protocolo na 4, esclarece que "um Estado contratante não tem
o direito de tributar os ganhos recebidos por um residente do outro Estado contratante,
se tais ganhos forem obtidos na venda de ações ou quotas de uma sociedade que não seja
residente do primeiro Estado". A Convenção com Israel apenas atribui ao Estado da fonte
o poder de tributar ganhos de capital na alienação de ações de sociedade nele residente, se
o alienante detiver a propriedade, direta ou indiretamente, a qualquer tempo no período de
doze meses anterior à alienação de ações, dando direito a voto a 10% ou mais do direito de
voto da sociedade. O imposto não poderá, porém, exceder a 15% (art. 13, § 30 ). A Con-
venção com Portugal, Protocolo nO 6, estabelece que na eventualidade de, posteriormente à
assinatura da presente Convenção, o Brasil concluir com um terceiro Estado não situado na
América Latina uma Convenção que limite - com relação aos rendimentos previstos no art.
13, nO 4 - o poder de tributação de outro Estado contratante que não seja aquele em que
for residente o beneficiário dos rendimentos, uma limitação idêntica será automaticamente
aplicada às relações entre o Brasil e Portugal. Cláusula similar se encontra no item 4 do Pro-
tocolo à Convenção com a África do Sul.
98 Esta era também a regra da antiga convenção com a Noruega.
I p I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Mas onde se localiza a fonte dos ganhos do capital? As próprias Convenções


respondem: no lugar da situação do imóvel, se se tratar de alienação de bens imobi-
liários; no lugar da situação do estabelecimento permanente ou instalação fIxa, se se
tratar de alienação de bens mobiliários que deles tenham feito parte; no local onde
estiver situada a direção efetiva da empresa, nos ganhos provenientes da alienação de
navios e aeronaves.
Para distinguir os ganhos mobiliários dos imobiliários, as convenções remetem
para o preceito que nelas defIne estes últimos. Importa apenas salientar que a Conven-
ção com a França (art. 13, parágrafo 1°) assimila expressamente aos ganhos de capital
imobiliários os decorrentes da alienação de partes ou de direitos análogos numa socie-
dade cujo ativo é composto principalmente de bens imobiliários. Trata-se de revelação
da ideia de "transparência" da personalidade jurídica, pela qual os tratados "levantam
o véu" da entidade interposta, para atingir diretamente os imóveis alienados. Esta as-
similação, porém, não é possível na ausência de disposição convencional expressa99 •
As disposições convencionais aplicam-se apenas a ganhos de capital decorrentes
da alienação de bens, caindo assim fora do seu âmbito de aplicação todos os casos de
ganhos de capital ou mais-valias puramente potenciais, isto é, registrados indepen-
dentemente da sua realização efetiva 100.
Todavia, compete à lei nacional interna do Estado potencialmente interessado
determinar os casos em que o ganho de capital se reputa "realizado"lol.
Ressalvada esta particularidade, as convenções aplicam-se aos impostos inci-
dentes sobre ganhos de capital, tenham natureza genérica ou específIca e sejam quais
forem as particularidades do seu regime.

§ 3° REMUNERAÇÃO DE DIRETORES

A remuneração de diretores e pagamentos semelhantes pode ser tributada (may


be taxed) no Estado da residência da companhia onde for exercida a função de ad-
ministração, ou seja, no país da fonte dos rendimentos, ainda que o seu benefIciário
tenha residência noutro Estado (art. 16 do Modelo OCDE).

99 Cfr. OCDE, Comentários, art. 13, § l°, parágrafo 23. Sobre o caso dos fundos de investi-
mento imobiliário, veja OCDE, art. 13, parágrafos 28.9 e 28.11 (versão de 2008).
100 O Comentário da OCDE, art. 13, parágrafo 9°, afirma que "quando o aumento de valor do
capital e a reavaliação dos ativos são tributados, o princípio aplicável em caso de alienação de
tais ativos deve, em princípio, ser igualmente aplicado. Não se julgou necessário mencionar
expressamente tais casos neste artigo ou prever disposições especiais". Discordamos desta
interpretação. As Convenções são expressas ao referir-se a "alienação".
101 Cfr. OCDE, Comentários, art. 13, parágrafos 5° e 6°, que recorda as düvidas que ensejam
os casos de "substiruição de ativos", sobre os quais se pode consultar o excelente parecer de
GILBERTO DE ULHÔA CANTO, em Estudos e pareceres de direito tributdrio, 272 ss. e 343 ss.
VI I Capo 11 I Normas de Reconhecimento de Competência 41:;.
Referido preceito sobrepõe-se, assim, ao art. 15 do Modelo OCDE (trabalho
dependente), constituindo regra especial, dada a dificuldade de determinar o lugar
de exercício das funções de administração 102 .
Note-se ainda que o preceito se aplica tanto a pessoas físicas como a jurídicas; e
também que só abrange as remunerações percebidas em contrapartida dessas funções
e não as que eventualmente lhes sejam devidas pelo exercício cumulativo de outros
cargos na empresa, como os de assalariado, consultor etc. I03 .

§ 4° ARTISTAS E DESPORTISTAS

Também são tributáveis (may be taxed) no Estado em que as atividades forem


exercidas - Estado da fonte - os rendimentos obtidos pelos profissionais de espetáculo,
tais como artistas de teatro, de cinema, de rádio ou de televisão e músicos, bem como
os dos desportistas, pelo exercício nessa qualidade de suas atividades pessoais 104 •
Pouco importa que as pessoas em causa exerçam a profissão em termos de-
pendentes ou de independência, de tal modo que o art. 17 representa uma exceção
aos regimes gerais dos arts. 14 e 15. Assim, tais pessoas não podem invocar isenção
baseada no fato de não terem no Estado em que exercem a atividade estabelecimento
permanente ou de nele permanecerem menos de 183 dias.

102 Algumas Convenções esclarecem que o preceito é aplicável também aos membros do Con-
selho Fiscal: África do Sul (Protocolo, item 5); Canadá (Protocolo, item 10); Hungria (Pro-
tocolo, item 8); México (Protocolo, 8° b); Portugal (art. 16).
103 Cfr. H6HN,Doppelbesteuerungsrecht, 204. Cfr. a Convenção com as Filipinas (Protocolo, item
9) e a Convenção com a Bélgica (versão de 2007), que qualifica como trabalho dependente
sujeito ao art. 15 a atividade diária de direção ou de caráter técnico, bem como a ativida-
de pessoal como associado de sociedade que não seja sociedade por ações (art. 16, § 2°);
OCDE, Comentários, art. 16, parágrafos 1 e 2.
104 Luís EDUARDO SCHOEURl e MARTA OLlVEROS CASTELON, Tributação subjetiva na fonte de ar-
tistas e esportistas não residentes e o conceito de não discriminação: análise dos artigos 17 e
24 da Convenção Modelo OCDE à luz da recente jurisprudência europeia, dos acodos brasi-
leiros de bitributação e da Convenção Modelo OCDE de 2008, RDIT 10 (2008), 109. Cfr.
OCDE, Taxation ofEntertainers, Artists and Sportsmen, Issues in International Taxation, nO
2, Paris 1987; DANIEL SANDLER, The taxation ofinternational entertainers and athletes, 1995;
MARTIN GROSSMANN, Die Besteuerung des J(ünstlers und Sportlers im internationalen Verhéiltnis,
BernjStuttgart 1992; FERNANDO SERRANO ANTÓN, La fiscalidad internacional de los artistas
y desportistas profesionales. Especial referencia aI Modelo de Convenio OCDE, Normativa
Espanola y Comunitaria, in HELENO TAVElRA TÓRRES (org.), Direito Tributdrio Internacional
Aplicado, vol. IV; São Paulo 2007, 159. A versão da Convenção Modelo de 1977 substituiu
a expressão "desportistas" por "atletas", abrangendo futebolistas, golfistas,jockeys, jogadores
de tênis e cricket e corredores de automóveis. Segundo o relatório atrás citado, o art. 17
aplica-se a jogadores de bilhar e participantes de torneios de xadrez ou bridge, mas não a
conferencistas e ao staff de apoio, tais como produtores, diretores de filmes, coreógrafos,
pessoal técnico, que seriam regidos pelos arts. 14 e 15.
-i:18 Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

A heterogeneidade e multiplicidade dos tipos de remuneração dos artistas en-


volvem complexos problemas de qualificação. Assim, por exemplo, não são qualifi-
cáveis como remuneração de artistas ou desportistas a remuneração do empresário;
os royalties de propriedade intelectual, submetidos ao art. 12 do Modelo; os ('iCes» de
propaganda e patrocínio não diretamente relacionados com o espetáculo, bem como
os pagamentos por cancelamento de espetáculo, enquadráveis nos arts. r, 14 ou 15
do Modelo OCDE, conforme os casos 10S •
Outro tipo de problemas resulta de, em certos casos, a remuneração ser auferi-
da por uma entidade coletiva, tal como uma orquestra, um time ou clube, do qual
o artista ou desportista recebe um salário, independentemente de cada espetáculo
separado. Em tais casos o Estado em que a atividade foi exercida poderá tributar a
proporção do salário correspondente a cada exibição 106 •
Numerosas Convenções celebradas pelo Brasil preveem, seguindo o § 2° do art.
17 do Modelo OCDE, que, no caso de os rendimentos da atividade não serem atri-
buídos ao próprio artista ou desportista, mas a uma outra pessoa, tais rendimentos
podem ser tributados no Estado em que as atividades forem exercidas lO7 •
Semelhante dispositivo não constava da redação inicial do Modelo OCDE, mas
ele foi introduzido para contrariar a prática de uma forma típica de evasão, consis-
tente no pagamento da remuneração, não ao próprio artista, mas a um terceiro, uma
sociedade de artistas residente no exterior (rent-a-star company). Assim, na ausência de
disposição expressa, o rendimento não era tributado no país da fonte, como remune-
ração pessoal, nem podia ser tributado junto da empresa, como lucro, por lhe faltar
a conexão essencial do estabelecimento permanentelO8 •

§ 5° RENDIMENTOS ATRIBUÍDOS EXCEPCIONALMENTE


À COMPETÊNCIA CUMULATIVA DO ESTADO DA FONTE

Como atrás se viu, há casos em que os rendimentos são "primariamente", via de


regra, atribuídos à competência exclusiva do Estado da residência, mas que, em face

105 Cfr. OCDE, Comentários, art. 17, parágrafos 7° e 9°. Todavia, a Convenção com o México
considera incluídos no art. 17 os rendimentos obtidos de qualquer atividade pessoal relacio-
nada com sua reputação como artista desportista.
106 Cfr. OCDE, Comentários, art. 17, parágrafo 8°.
107 As Convenções com Portugal (art. 17, nO 3) e Israel (art. 17, parágrafo 3°), dispõem que
este regime não se aplica se as atividades exercidas num Estado contratante forem financia·
das principalmente através de fundos públicos do outro Estado contratante ou de uma das
suas subdivisões políticas ou administrativas ou autarquias locais ou ainda de entidades cujo
capital social seja detido majoritariamente por uma das referidas pessoas. Neste caso, os
rendimentos auferidos dessas atividades sõ podem ser tributados nesse outro Estado.
108 Cfr. P. BAKER, Double Taxation, 317; OCDE, Comentários, art. 17, parágrafo 11, sobre
o look-through approach.
'"------_.:..:..~
~Io VI I Capo " I Normas de Reconhecimento de Competência -1:.-
de certas circunstâncias especiais, são excepcionalmente atribuídos à competência
cumulativa do Estado da fonte.
É notadamente o caso de: (i) lucros das empresas imputáveis a estabelecimento
permanente noutro Estado; (ii) rendimentos de profissões independentes imputáveis
a instalação fixa noutro Estado ou pagos por fonte domiciliada noutro Estado; e (iii)
rendimentos de profissões dependentes, no caso de a atividade ser duradouramente
exercida noutro Estado.

§ 6° RENDIMENTOS NÃO EXPRESSAMENTE MENCIONADOS

A generalidade das convenções contra a dupla tributação celebradas pelo Brasil


consagram a regra de que os rendimentos não expressamente mencionados (ou "ou-
tros rendimentos") são tributáveis em ambos os Estados, ou seja, no Estado da residên-
cia do beneficiário e no Estado de onde proveem os rendimentos, não beneficiando,
assim, de qualquer tratamento tendente à atenuação da dupla imposição.
Exceção é constituída pela Convenção com o Canadá, que - aliás de acordo
com o art. 21 do Modelo OCDE - reconhece o direito exclusivo do Estado da
residência.
Certas Convenções esclarecem que, na hipótese de tais rendimentos serem obti-
dos através de um estabelecimento, prevalece a regra do art. 7° (África do Sul, Israel,
Ucrânia).
Note-se que o objeto destes preceitos não se restringe a outras formas de rendi-
mento provenientes de um Estado contratante, estendendo-se também a rendimen-
tos provenientes de terceiros Estados10 9 • Todavia, neste caso, é indiscutível a exclusi-
vidade do poder tributário do Estado da residência do beneficiário.

SEÇÃO III
RECONHECIMENTO DE COMPETÊNCIA CUMULATIVA LIMITADA DO
ESTADO DA FONTE

Examinaremos nesta seção as normas que atribuem, desde logo, como regra,
competência cumulativa ao Estado da fonte, distinguindo-se das estudadas na se-
ção anterior por estabelecerem um limite quantitativo ao poder tributário deste
Estado, limite este que se traduz na obrigação de estabelecer alíquotas não exceden-
tes a certo valor percentual. Tais normas são as que respeitam a dividendos, juros
e royalties.

109 Cfr. OCDE, Comentários, art. 21, parágrafo L


-i:l:+ Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier
SUBSEÇÃO I
DIVIDENDOS

§ 10 O CONCEITO DE DIVIDENDOS

A) O conceito em geral

As Convenções contra a dupla tributação assinadas pelo Brasil, seguindo neste


ponto muito de perto o art. 10 do Modelo OCDE, definem o conceito de "dividen-
dos" como os rendimentos provenientes de ações ou direitos de fruição, partes de
fundador ou de outros direitos de participação em lucros, com exceção de créditos,
bem como rendimentos de outras participações de capital, assemelhados aos rendi-
mentos de ações pela legislação tributária do Estado em que seja residente a socieda-
de que os distribuir llo .
O elemento nuclear em torno do qual se articulou o conceito convencional de
dividendo foi, pois, o de rendimento de uma participação de capital, assim entendida a
participação numa sociedade de capitais (joint stock companies). E isto é assim porque
na legislação da generalidade dos países da OCDE, apenas as sociedades de capitais
têm personalidade jurídica, não já as sociedades de pessoas (partnerships), caso em
que os lucros se reputam diretamente percebidos pelos sócios (partners) e não pela
sociedade.
Desde que, em face de um dado sistema jurídico, uma sociedade se possa caracte-
rizar como sociedade de capitais, dotada de personalidade jurídica distinta da dos seus
sócios, os rendimentos a estes distribuídos podem classificar-se como dividendos, seja
qual for a forma jurídica que revistam. No Direito Tributário Internacional, o termo
dividendos é, pois, mais compreensivo que no direito interno brasileiro, pois, enquan-
to neste assume a acepção restrita de rendimento das sociedades anônimas, naquele
abrange não só os lucros distribuidos por estas (companies limited by shares) sociétés
anonymes), mas também pelas sociedades em comandita por ações (limited partnerships
with share capital) sociétés en commandite par actions) e por sociedades por quotas de
responsabilidade limitada (limited liability companies) sociétés à responsabilité limitée) 111.

110 Cfr. A. LOVISOLO, li sistema impositivo dei dividendi) Pádua 1980, 101 ss.; FERNANDEZ PÉREZ,
Regimen tributaria de dividendos y canones en el marco de los convenios para evitar la
doble imposicion internacional suscritos por Espana, in J. VILLA GIL (org.), Relacionesfis-
cales intemacionales, Madrid 1987, 195; ESTHER GARCÍA MACHANCOSES, La tributación de los
beneficios percebidos por las matrices espanolas procedentes de las filiales en el estranjero, N avarra
2002; GIUSEI'PE CORASANITI, Dividendi, interessi, canoni e plusvalenzc nel modello OCSE,
in VICTOR UCKMAR (org.), Corso di Diritto Tributaria Intemazionale, Pádua 1999, 345.
111 Certos tipos de sociedades - como as cooperativas e as sociedades em comandita simples - ofe-
recem, via de regra, dificuldade de caracterização como sociedades de pessoas ou de capitais. A
solução deve procurar-se em cada direito positivo interno, tendo em vista o tratamento tri-
butário concedido. Certas Convenções consagram soluções específicas: assim, a Convenção
com Portugal considera "dividendos" os lucros auferidos pelo s6cio oculto nas sociedades
....._ _ _ _ _ .Título VI I Capo 11 I Normas de Reconhecimento de Competência -i:!'
Não basta, porém, que se trate de sociedade de capitais: é ainda necessário que
o rendimento provenha de uma participação societária nos lucros. Pouco importa a
modalidade concreta dessa participação - e elas são bem variáveis no direito com-
parado: direito de fruição, partes de fundador, quotas de capital e ações, nas suas
diversas espécies (ordinárias, preferenciais, de fruição )112. Mas é, em contrapartida,
indispensável que essa participação se não traduza num crédito contra a sociedade,
ainda que esse crédito tenha por objeto uma certa participação nos lucros. Assim,
não são dividendos para efeitos das Convenções os rendimentos das partes benefici-
árias e os juros das debêntures conversíveis.
Enfim, o conceito de dividendo pressupõe a existência de um rendimento sujeito
a tratamento fiscal similar ao rendimento das ações pelo país da residência da socie-
dade distribuidora. À luz deste critério, devem, pois, ser julgados os casos duvidosos,
como as bonificações (bonus shares) stock dividends) Freianteile), lucros na liquidação e
distribuições disfarçadas de lucros, que não configurem simples devolução de capital,
hipótese em que se está já para além do conceito de rendimento ll3 •

em conta de participação (art. 10, nO 3) e a Convenção com a Alemanha (mas só no caso da


Alemanha) os rendimentos recebidos por wn sócio comanditário proveniente da sua parti-
cipação na sociedade, nessa qualidade. Esta última referência tem em vista a figura, peculiar
aos direitos alemão e suiço, da stille Beteiligung, a qual, não raro, anda confundida com a
sociedade em comandita ou até com a sociedade de responsabilidade limitada. A especifici-
dade desta figura está em que se trata de wna sociedade comercial em que wn sócio geral
(Knmplementiir) tem responsabilidade ilimitada para com os credores e a função de dirigir
a empresa e representá-la em face de terceiros, enquanto outro sócio (IVimanditist) tem res-
ponsabilidade limitada à contribuição para o capital. Este último não é wn cotitular, mas um
simples investidor anônimo, e dai o fato de o lucro percebido ser tratado como dividendo.
Cfr. G. DALIMIER, Les sociétés de personnes et les coentreprises en droit fiscal international, CDFI
LVIII (1973), II, 172 SS.; KI..AUS MANKE, Personengesellschaften und DBA - Abkommens-
berechtigung und Abkommenschutz, in VOGEL (org.), Grundfragen, Colônia 1985, 195;
SCHAUMBURG, Internationales Steuerrecht, Colônia 1993,216,310,692.

112 Diversas convenções consideram expressamente como dividendos as distribuições relativas


a certificados de fundos de investimento (cfr. Alemanha, Protocolo, item 1; Argentina, Proto·
colo, item 4; Canadá, Protocolo, item 6; Equador, Protocolo, item 4; Filipinas, Protocolo,
item 6; Hungria, Protocolo, item 4; Itália, Protocolo, item 3). A Convenção com a China
qualifica como dividendos "quaisquer lucros de negócios, bem como os lucros obtidos por
wn estabelecimento permanente" (Protocolo, item 2). Sobre a qualificação dos "juros sobre
capital próprio", cfr. supra, 685 ss. Sobre as dúvidas de qualificação como dividendo das
remunerações pagas pelos Real State Investment Funds - REIT. Cfr. OCD E, Comentários ao
art. 9°, parágrafo 67.1, 67.7, 28.9 e 28.11 (versão de 2008).
113 As distribuições disfarçadas de lucros em beneficio de terceiros não são equiparáveis a divi-
dendos; mas mesmo em relação às distribuições em beneficio dos sócios tem-se discutido
a legitimidade da sua equiparação, defendendo alguns que se trataria de "rendimentos não
denominados": cfr. GOUTHIERE, Les impôts dans les affaires internationales, Paris 1991, 533;
RrvIER, Droit Fiscal suisse. Le Droit Fiscal International, Neuchatel 1983, 218; B. PLAGNET,
Droit Fiscal International, Paris 1986, 210-211.
M.pi.M Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier .~~
~
•....•.....•.

B) O caso das bonificações


As bonificações em geral, ou desde que obedecidos certos requisitos, são excluídas
do conceito de dividendos tributáveis por diversas Convenções: Canadá, art. XXII, § 6°;
Dinamarca, art. 23, § 6°; Itália, art. 23, § 5°; Luxemburgo, Protocolo, item 2; Norue-
ga, art. 24, § 6°; Países Baixos, Protocolo, item 3; Tchecoslováquia, art. 23, § 6°.
A razão de ser destas disposições convencionais resulta da diversidade de tra-
tamento jurídico que os diversos países dão à figura das ações bonificadas ou do
aumento de valor nominal das ações decorrentes da capitalização de lucros (bonus
shares) stock dividends) Freianteile).
A Convenção Modelo da OCDE orientou-se no sentido de não adotar uma
posição rígida sobre a matéria, limitando-se a permitir que os Estados Contratantes
aplicassem as disposições do art. 10, relativo a dividendos, caso as leis internas dos
países em causa assim qualificassem as ações bonificadas.
Sobre a possibilidade de as bonus shares serem consideradas dividendos pelas
legislações internas dos Estados Contratantes, vejam-se os Comentários do Comitê
Fiscal da OCDE (art. 10, item 28):
"Payments regarded as dividends may include not only distributions ofprofits deci-
ded by annual general meetings of shareholders) but also other benefits in money or
money 's worth) such as bonus shares) bonuses) profits on a liquidation and disguised
distributions ofprofits. The relieft provided in the Article apply so long as the State of
which the paying company is a resident taxes such benefits as dividends. It is imma-
terial whether any such benefits are paid out of current profits made by the company
or are derived) for example) from reserves) i.e. profits Dfprevious financiaI years. Nor-
mally) distributions by a company which have the effect of reducing the membership
rights) for instance) payments constituting a reimbursement of capital in any flrm
whateve1; are not regarded as dividends".
No que concerne à política brasileira de negociação de tratados contra a dupla
tributação, é importante salientar que enquanto alguns tratados são omissos quanto
à matéria (não restringindo, assim, a aplicabilidade das leis internas) outros tratados
tomaram posição expressa sobre o tratamento dos stock dividends.
Dentre esses últimos, há que distinguir dois grupos. Um primeiro grupo, cons-
tituído pelos Tratados com o Canadá (art. 23, § 6°), a Dinamarca (art. 23, § 6°), a
Itália (art. 23, § 5°), o Luxemburgo (Protocolo, item 2), a Noruega (art. 24, § 6°) e a
antiga Tchecoslováquia (art. 23, § 6°), proíbe a tributação das bonificações pelo Esta-
do de residência do acionista beneficiário dos stock dividends ou bonus shares) mas, em
contrapartida, permite que o Estado da fonte (ou seja, o Estado de domicílio da socie-
dade em relação a qual ocorreu o aumento de capital) tribute a referida operação.
Um segundo grupo, representado pelos Tratados com a Alemanha, hoje de-
nunciado (Protocolo, item 2) e a Holanda (Protocolo, item 3), em que se proíbe a
tributação da operação em causa quer pelo Estado de residência do beneficiário, quer
pelo Estado da fonte.
'-------
Titulo VI I Capo 11 I Normas de Reconhecimento de Competência .i'.
A orientação subjacente ao primeiro grupo de tratados consistiu em não to-
lher a liberdade do Brasil, enquanto país essencialmente importador de capitais e,
consequentemente, país da fonte dos stock dividendsJ de tributá-los caso assim fosse
decidido pela lei interna brasileira.
Esta orientação cedeu, porém, o passo no caso dos Tratados com a Alemanha
e com a Holanda, em que a vedação de tributar respeita tanto ao Estado da fonte
quanto ao Estado de residência do beneficiário, e isto talvez pela consideração de que
as ações bonificadas não representam rendimento em sentido próprio, ou seja, não
constituem disponibilidade jurídica ou econômica de renda.

§ 2° TRIBUTAÇÃO PELO ESTADO DA FONTE

A) Os pressupostos de aplicação do regime convencional

A aplicação do regime convencional, no que respeita à delimitação do poder de


tributar do país da fonte, depende de um duplo pressuposto: (i) quanto ao devedor,
a residência nesse país da sociedade distribuidora do dividendo e (ii) quanto ao cre-
dor, a inexistência, no país da fonte, de estabelecimento permanente pertencente ao
credor dos dividendos residente no outro Estado contratante.
Assim, a Convenção não se aplica se a sociedade pagadora é residente num ter-
ceiro país, embora tenha no país da fonte um estabelecimento ao qual seja imputável
a obrigação de pagar os dividendos. Exige-se, pois, uma conexão simples - a residência
- não se admitindo o sistema de conexão alternativa (residência ou estabelecimento),
previsto quanto a juros e royalties.
Como pressuposto relativo ao devedor, as Convenções designaram, como cone-
xão relevante para definir a fonte dos dividendos, a residência da pessoa jurídica que
os distribui, mas não o lugar do estabelecimento permanente.
Por sua vez, a aplicação da Convenção também exige, como pressuposto refe-
rente ao credor, a conexão da residência. Esta, porém, não prevalece se o benefici-
ário dos dividendos tiver apenas domicílio num país, mas possuir estabelecimento
permanente no mesmo Estado da residência do devedor, não se aplicando pois o
regime convencional dos dividendos, mas sim o dos lucros das empresas (art. 7° do
Modelo OCDE). Assim, os referidos dividendos não só não serão tributados no país
de residência da sociedade receptora, como também não serão tributados, isolada ou
analiticamente, no país de residência da sociedade distribuidora, a título de retenção
na fonte. Todavia, não pode falar-se (como quanto aos juros) em conexão cumulativa
(residência e estabelecimento), de vez que nada impede que a Convenção se aplique
aos dividendos distribuídos a estabelecimentos possuídos em terceiros Estados por
beneficiários residentes em Estados contratantes.
Em virtude destas regras, por exemplo, não se beneficiam do regime conven-
cional os dividendos pagos por uma sociedade brasileira à filial brasileira de uma so-
I e I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

ciedade francesa; mas já gozam dessa vantagem os dividendos clistribuídos por uma
sociedade brasileira à filial que uma sociedade francesa possua num terceiro Estado.
Note-se que certas Convenções mais recentes assinadas pelo Brasil- já inspiradas
no Modelo OCDE de 1977 - exigem que a pessoa residente num Estado contratante a
quem os clividendos são pagos seja o beneficiário efetivo (ver as Convenções com África
do Sul, Bélgica, Chile, China, Coreia, Equador, Filipinas, Hungria, Ínclia, Israel, Itália,
México, Noruega, Países Baixos, Portugal, Tchecoslováquia, Ucrânia).
Este requisito tem como finalidade impedir mecanismos de treaty shopping, recu-
sando a aplicação da Convenção se o residente num dos Estados, a quem os dividen-
dos são pagos, for um mero intermecliário, agente, nominee ou conduit company ll4.
Além dos pressupostos subjetivos, que resultam das conexões relativas ao credor
(beneficiário) ou devedor (distribuidor) dos dividendos, importa ainda mencionar
um pressuposto objetivo, relativo à natureza do fato tributário (ou tributo) que as
limitações convencionais abrangem. Com efeito, dispositivos inclusos em todas as
Convenções esclarecem que o regime nelas estatuído no art. 10 apenas é aplicável aos
dividendos distribuídos, não afetando a tributação da sociedade com referência aos lu-
cros que deram origem aos clividendos pagos. Pressupõe, assim, a clistinção, comum
nos sistemas tributários modernos, entre os lucros realizados pela pessoa jurídica -
tributados junto desta com o imposto sobre a sociedade - e o lucro por ela distribuído
- tributado junto do sócio, de forma mais ou menos integrada com a primeira fase
da tributação, mas em qualquer caso sempre desta independentell5 .

B) Os limites do poder de tributar do Estado da fonte

a) Redução de alíquota
O Modelo OCDE reconhece ao Estado da fonte a faculdade de tributar os divi-
dendos distribuídos pelas sociedades que nele tenham residência, sugerindo contudo

114 Cfr. OCDE, Comentários, art. 10, parágrafos 12 e 12.1. Exemplo de funcionamento desta
cláusula é o caso suscitado a respeito do Tratado de 1951, entre a Holanda e a Suíça, se-
gundo o qual cabe restituição do imposto de renda na fonte no pagamento de dividendos
da sociedade suíça à sua controladora holandesa, "desde que a relação das duas entidades
não tenha sido constiruída ou mantida principalmente para o fim de obter esta restituição".
Um tribunal suíço entendeu que este era o caso de uma "estrutura piramidal", pela qual
indivíduos da Saudi Arábia controlavam (via uma sociedade do Liechtenstein e outra das
Antilhas Holandesas) todas as ações da sociedade holandesa que, por sua vez, detinha 75%
da sociedade suíça. Cfr. P. BAKER, Double Taxation, 230.
115 Em certos casos, é difícil distinguir se o imposto incide sobre dividendos ou sobre os lucros,
dos quais aqueles se originaram. É notadamente o caso do advance corporation tax inglês,
calculado como fração do dividendo, que é uma forma de pré-pagamento do imposto de
sociedade sobre os lucros e também um crédito do acionista contra o seu imposto individual
de renda. Cfr. P. BAKER, Double Taxation, 228.
-==:=:..iit~lo VI I Capo 11 I Normas de Reconhecimento de Competência -iM
um limite máximo à alíquota aplicável: 15% do montante bruto dos dividendos, sal-
vo no caso especial de o beneficiário ser uma sociedade que detém diretamente pelo
menos 25% do capitalll6 (interesse substancial) da sociedade pagadora, caso em que a
alíquota máxima seria de 5%. A redução excepcional justifica-se pela necessidade de
evitar a dupla ou sucessiva tributação dos lucros distribuídos a pessoas jurídicas (in-
tercompany dividends) , em especial quando entre si mantêm relações de controladora
e subsidiária117.
Nas Convenções assinadas pelo Brasil, o país da fonte não prevê uma redução
excepcional de alíquota para o caso das subsidiárias, estipulando um limite máximo
uniforme, que é via de regra de 15%.
A esta regra fazem exceção: (i) a Convenção com a Argentina, que não prevê
qualquer limite; (ii) a Convenção com a Dinamarca, que prevê limite de 25%; (iii)
a Convenção com o Japão, que prevê limite máximo de 12,5% (Protocolo de 23 de
março de 1976)118; (iv) a Convenção com a Finlândia, de 1988, que prevê limite
de 10%; (v) as Convenções que restringem a aplicação do limite de 15% aos lucros
decorrentes de participações mínimas no capital da sociedade distribuidora (Canadá,
Luxemburgo) ou aos lucros atribuídos a certos beneficiários, sociedades (inclusive
de pessoas) - caso das Filipinas - ou sociedades de capital- caso da Suécia l19 ; (vi)
as Convenções com Portugal, Chile e Peru, que preveem uma alíquota de 10% se o
beneficiário efetivo for sociedade que detenha, diretamente, pelos menos 25% (20%
no caso do Peru) do capital da sociedade que paga os dividendos, durante um perí-
odo ininterrupto de dois anos; (vii) as Convenções que preveem, a par da alíquota
de 15%, uma alíquota de 10% se o beneficiário efetivo for sociedade que detenha
pelo menos 10% do capital total (Bélgica), do capital com direito de voto (México),

116 Sobre o conceito de "capital", cfr. OCDE, Comentários, art. 10, § 2°, parágrafo 14.
117 Sobre a distinção entre intercompany dividends e portfOlio dividends, cfr. VOGEL, Double Taxa-
tion, 583-584. O Brasil reserva-se o direito de tributar todos os dividendos a uma alíquota
uniforme, cfr. OCDE, art. 10, NMC Positions, parágrafo 2°.
118 Na redação primitiva da Convenção com o Japão, seguiu-se um regime um tanto distinto:
por um lado, a alíquota era inferior (10%); mas, por outro, o direito à redução surgia desde
logo condicionado ao fato de o beneficiário ser uma companhia que possuísse pelo menos
25% das ações com direito a voto da companhia distribuidora de tais dividendos, durante o
período de 6 meses imediatamente anterior ao fim do período contábil com o qual a distribui-
ção de lucros tenha relação (art. 9°, § 2°). Assim, os dividendos distribuídos a pessoas físicas
ou a pessoas jurídicas que não participem no capital da sociedade distribuidora, com o capital
mínimo referido, ficavam sujeitos às alíquotas normais prevalecentes em cada país. Note-se
que a exigência de um minimum holding period para a posse das ações tem em vista evitar a
forma de evasão que consistiria em adquiri -las primariamente com o objetivo de se beneficiar
da mencionada vantagem. Cfr. Parecer Normativo CST nO 38, de 21 de maio de 1970.
119 Na Convenção com a Suécia, a alíquota de 25% só está prevista para as sociedades de pes-
soas, aplicando-se, porém, a de 15% para as sociedades de capitais. Na Convenção com as
Filipinas, a alíquota de 15% só é aplicável se o beneficiário for sociedade, inclusive de pesso-
as. Nas Convenções com o Canadá e o Luxemburgo, a alíquota de 15% só é aplicável para
lucros derivados de participações de, no mínimo, 10% no capital.
Mil' Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier
ou 25% do capital total (Israel, África do Sul, Ucrânia) da sociedade que paga os
dividendos ..

b) O problema da tributação extraterritorial dos dividendos

Alguns países adotaram disposições que lhes permitem tributar, além dos di-
videndos distribuídos por sociedades neles residentes a beneficiários não residentes
(hipótese de tributação territorial), também os dividendos pagos pela sociedade be-
neficiária dos primeiros dividendos - não residente - aos seus sócios, igualmente não
residentes no primeiro Estado - se provenientes de lucros ou outros rendimentos ori-
ginados no primeiro Estado (caso em que a tributação dos dividendos se diz extra-
territorial). Neste exemplo, o Estado A tributaria os dividendos pagos pela sociedade
residente no Estado B a um residente nos Estados B ou C, desde que tais dividendos
provenham de lucros ou rendimentos obtidos no Estado A120.
Outras vezes, o Estado onde foram originados os lucros pretende tributar os
lucros não distribuídos por sociedades residentes noutro Estado que os auferirem
(tributação extraterritorial) 121.
Ambas estas modalidades típicas da tributação extraterritorial- que resultam da
sobrevalorização da conexão "lugar de realização do lucro" relativamente à residência
da sociedade que os aufere e distribui - foram vedadas no § 5° do art. 10 do Modelo
OCDE122.
Diversas Convenções preveem expressamente as duas modalidades de tributação
extraterritorial: "Quando uma sociedade de um Estado contratante receber lucros ou
rendimentos provenientes do outro Estado contratante, esse outro Estado não poderá
tributar os dividendos pagos pela sociedade a pessoas não residentes desse outro Esta-
do, ou sujeitar os lucros não distribuídos da sociedade a um imposto sobre lucros não
distribuídos, mesmo se os dividendos pagos ou os lucros não distribuídos consistirem
total ou parcialmente de lucros ou rendimentos provenientes desse outro Estado.

c) O regime especial das filiais

As Convenções contra a dupla tributação assinadas pelo Brasil (ao revés do Modelo
OCDE) dedicam-se especificamente a regulamentar o tratamento tributário das filiais

120 Ver as ressalvas propostas em OCDE, Comentários, art. 10, § 5°, parágrafo 35. EDUARDO
MADEIRA e TIAGO CASSIANO NEVES, RDTI9 (2008), 79.
121 Sobre a compatibilidade com o § 5° do art. 10 do Modelo das leis de certos países que, à
semelhança da Sub-Part F da legislação dos Estados Unidos, presumem automaticamente
distribuídos os lucros auferidos por sociedades-base no exterior, ver OCDE, Comentários,
art. 10, parágrafos 37 a 39.
122 É o caso das chamadas secondary withholding taxes, de que é exemplo a prevista na SeCo 861
(a), 2 (B) do Internai Revenue Code. Cfr. P. BAKER, Double Taxation, 233.
~UIO VI I Capo 11 I Normas de Reconhecimento de Competência .i~.

de sociedades residentes no exterior. E o fato deve-se, por certo, às particularidades do


Direito Tributário brasileiro, por nós já examinadas, no que tange às filiais de sociedades
estrangeiras, especialmente a regra (revogada a partir de 1° de janeiro de 1996) segundo
a qual se consideravam automaticamente atribuídos à matriz os lucros por elas realiza-
dos, com a consequência da incidência do imposto de renda na fonte sobre a totalidade
dos lucros, quer estes tenham ou não sido efetivamente remetidos para o exterior l23 .
O regime via de regra adotado consistia em reduzir para 15%124 a alíquota
máxima do imposto na fonte, incidente sobre o montante bruto dos lucros do esta-
belecimento permanente, determinado após o pagamento do imposto de renda de
sociedades, referente a esses lucros.
Particularidade a apontar consta da Convenção com a Espanha, onde expres-
samente se estipulou (art. 10, § 5°, in fine) que o imposto brasileiro retido na fonte
somente será aplicável quando os lucros forem efetivamente transferidos para o exte-
rior, derrogando assim o chamado princípio da "distribuição automática". Disposi-
ção similar se encontra na Convenção com a Bélgica (Protocolo 2007, item 5).
A Convenção com Portugal, já celebrada após a abolição do anterior regime das
filiais, esclarece que serão também considerados dividendos os lucros remetidos ou
pagos ou creditados por um estabelecimento estável situado num Estado Contratan-
te à empresa do outro Estado Contratante a que este pertence (art. 10, nO 6).
Outro aspecto relevante a apontar no que tange às filiais é que a generalidade
das Convenções é expressa no sentido de declarar que o mencionado regime interno
brasileiro não era conflitante com o princípio da não discriminação.
Até agora temos considerado o caso de filiais brasileiras de sociedades estran-
geiras. Porém, apenas uma Convenção trata do caso inverso - filiais de sociedades
brasileiras no exterior: trata-se da Convenção com a França, onde se estipulou (art.
X, parágrafo 8°, a) que o imposto francês retido na fonte não excederá 15% e incidirá
sobre uma base correspondente a 2/3 do montante dos lucros do estabelecimento
permanente, determinado depois do pagamento do imposto sobre as sociedades,
referente a esses lucros.

d) Cláusulas antiabuso
As Convenções mais recentes celebradas pelo Brasil contêm uma cláusula "an-
tiabuso" segundo a qual as disposições do art. 10 - referente a dividendos - não
se aplicarão se o principal propósito ou um dos principais propósitos de qualquer
pessoa envolvida com a instituição ou transferência das ações ou outros direitos em
relação aos quais o dividendo for pago tiver sido tirar vantagem do presente artigo

123 Cfr. supra, 535 ss.


124 Ou 25%, na convenção com ~ Dinamarca. Uma alíquota reduzida de 10% encontra-se pre-
vista nas Convenções com a Mrica do Sul, Israel e Ucrânia.
g I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

por meio de instituição ou transferência das ações (África do Sul, Israel, México,
Peru, Ucrânia), passando a aplicar-se a disposição do direito interno.
Trata-se de cláusula inspirada nos Comentários ao art. 1° da Convenção Mode-
lo, na parte relativa ao "uso impróprio dos tratados", e que tem por finalidade negar
os benefícios das disposições convencionais em matéria de redução de alíquota de
retenções na fonte l25.

§ 3° TRIBUTAÇÃO PELO ESTADO DA RESIDÊNCIA

Encontra-se comumente consagrado o direito de tributar os dividendos por


parte do Estado da residência do beneficiário, embora se admita - apenas com algu-
mas limitações - o direito do Estado da fonte, ou seja, do Estado onde está domici-
liada a sociedade distribuidora J26 •
O direito do país da residência não prevalece, porém, quando o beneficiário dos
dividendos tiver no outro Estado contratante, de que é residente a sociedade paga-
dora, um estabelecimento permanente a que estiver ligada a participação geradora
dos dividendos, pois neste caso serão aplicáveis as regras que disciplinam a tributação
dos lucros das empresas (Modelo OCDE, art. 7°). Assim, em razão da prevalência
da conexão estabelecimento permanente sobre a conexão residência, os dividendos
recebidos pela filial brasileira de uma sociedade residente na França não são tributa-
dos neste último país, como dividendos do acionista francês, mas sim no Brasil como
lucros do estabelecimento permanente.
É a chamada reserva de estabelecimento permanente (Betriebstiitten-vorbehalt) , de
que fala KLUGE 127 .
Também no direito convencional, vigora o princípio segundo o qual, existindo
um estabelecimento permanente, os rendimentos auferidos por um residente no ex-
terior deixam de ser tributados isolada e analiticamente, por retenção na fonte, para
passarem a ser tributados complexiva e sinteticamente, de tal modo que o conceito
de lucro da empresa, por umprincípio de absorção, faz perder a autonomia aos diversos
rendimentos que o integram, notadamente os dividendos128.
Repare-se que as Convenções exigem que a participação societária esteja efeti-
vamente ligada ao estabelecimento permanente, demonstrando, por mais uma via, o
repúdio do princípio da vis atractiva J29 •

125 Cfr. Comentários, art. l°, parágrafo 21.4.


126 As Convenções apenas se aplicam a "residentes", pelo que não se submetem ao regime con-
vencional os dividendos pagos a uma sociedade residente num Estado contratante por uma
sociedade residente em terceiro Estado.
127 Cfr. KLUGE, Das deutsche Internationale Steuerrecht, 275.
128 Cfr. supra, 520 ss.
129 Cfr. OCDE, Comentários, art. 10, parágrafo 31.
L...-_ _ _ _ __ Titulo VI I Capo 11 I Normas de Reconhecimento de Competência I SiiI I

Mesmo, porém, que o direito do Estado da residência não sofra aquela limita-
ção, podendo exercer-se plenamente, as Convenções preveem especiais regimes de
atenuação da dupla imposição decorrente de os dividendos já terem sido taxados no
país da residência da sociedade distribuidora, quer através do imposto sobre lucros
por elas realizados, quer mediante a retenção na fonte sobre os lucros distribuídos.
Esta atenuação é tanto mais importante na hipótese de a distribuição dos lucros
se efetuar, não a pessoa física, mas a uma ou mais pessoas jurídicas, podendo dar
origem a uma cadeia de tributações sucessivas (a chamada dupla tributação interso-
cietária internacional - DTII). Embora sejam extremamente variáveis as soluções e
as técnicas, desenha-se uma tendência geral para mitigar a multiplicidade das impo-
sições, em especial nos casos em que os lucros sejam decorrência da participação de
uma pessoa jurídica no capital de outra, reveladora de um interesse substancial. Tal
interesse - que só caso a caso pode ser definido - justifica soluções mais benévolas,
inspiradas na ideia de "transparência" fiscal das pessoas jurídicas ou de "unidade eco-
nômica" do grupo de sociedades (Durchgriffbesteuerung) 130.
Uma análise atenta das diversas Convenções assinadas pelo Brasil revela não só a va-
riedade dos métodos utilizados, como ainda - e este ponto é digno de registro - a assime-
tria das soluções adotadas. Assim, por exemplo, pode na mesma Convenção, o Estado A-
como Estado da residência - adotar o método da isenção integral quanto aos dividendos
provenientes do Estado B, e o Estado B - também como Estado da residência - adotar o
método da imputação ordinária quanto aos dividendos provenientes do Estado N31.
Daí que se justifique analisarmos separadamente o regime aplicado pelo Brasil,
enquanto Estado de residência, do regime aplicado - na mesma qualidade - pelas
outras partes contratantes.

A) Dividendos de fonte estrangeira recebidos por residentes no Brasil


Nas hipóteses em que o Brasil é o Estado de residência do titular do direito aos
dividendos, o método geralmente adotado é o da imputação ordinária, segundo o
qual será deduzido do imposto brasileiro incidente sobre os rendimentos desse resi-
dente um montante igual ao imposto sobre a renda pago no outro Estado contratan-
te. Todavia, o montante deduzido não poderá exceder a fração do imposto sobre a
renda, calculado antes da dedução, correspondente aos rendimentos que podem ser
tributados no outro Estado contratante.
Certas Convenções estabelecem regimes diferenciados concedendo o regime
mais favorável da isenção aos dividendos resultantes de "participações relevantes"
(no mínimo 10% ou 25% do capital da sociedade que os distribui) e aplicando, nos
demais casos, o método da imputação ordinária ou um crédito presumido.

130 efr. supra, 284 sS.


131 Sobre a complexidade e variedade de métodos e soluções quanto a dividendos, efr. P. BAKER,
Double Taxation, 163.
I B I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Uma particularidade a anotar nas Convenções celebradas com a Coreia e as Filipi-


nas: para efeitos da atribuição do crédito presumido nelas previsto, será levado em conta
o montante do imposto de sociedades que deveria ter sido pago se não houvesse sido isen-
to ou reduzido de acordo com medidas especiais de incentivo destinadas a promover o
desenvolvimento econômico (Coreia, Protocolo, item 7; Filipinas, art. 23, § 3)132.
A Convenção com Portugal é a única que permite a imputação do "crédito in-
direto" (underlying tax credit), ou seja, do imposto exigível de sociedade relativo aos
rendimentos de que se originaram os dividendos pagos (art. 23, § 30).

B) Dividendos de fonte brasileira recebidos por residentes de outros Estados

Vejamos agora as hipóteses em que o Brasil é o Estado de proveniência dos


dividendos.
Umas Convenções adotam um único método, seja ele o da isenção (Argentina,
Tchecoslováquia), da isenção com progressividade (Espanha), da imputação ordinária
(Dinamarca, Portugal)133, ou o do crédito presumido (Coreia, Filipinas, Hungria).
Mas a grande maioria aplica regimes mistos, concedendo tratamento mais fa-
vorável (isenção ou maior crédito presumido) para as participações relevantes, sejam
estas definidas como um percentual mínimo no capital total (ou votante) da socie-
dade distribuidora dos dividendos, sejam definidas indiretamente pelos requisitos da
lei interna que asseguram o direito à isenção, caso as sociedades receptora e distribui-
dora fossem residentes do mesmo país (Bélgica e Suécia)134.
Anote-se a particularidade de as Convenções com a Coreia e as Filipinas consi-
derarem também, para efeitos de matching credit, o imposto de sociedades que deveria
ter sido pago se não houvesse sido isento ou reduzido de acordo com incentivos para
promover o desenvolvimento econômico (Coreia, Protocolo, 7; Filipinas, art. 23, §
3). Em sentido similar, a Convenção com a Hungria (art. XXIII, § 30) dispõe que,
"quando o imposto geral brasileiro de sociedades incidente sobre os lucros de que
se originam os dividendos pagos for reduzido ou eliminado, a República Popular da
Hungria deduzirá ainda do imposto húngaro um montante correspondente ao impos-
to brasileiro de sociedades que teria sido pago se referido imposto não houvesse sido
reduzido ou eliminado, levando em conta o imposto brasileiro sobre dividendos".

132 Ver quadro na página seguinte.


133 "Fica entendido que, se o método destinado a eliminar a dupla tributação econômica dos di-
videndos de fonte estrangeira atualmente previsto na lei portuguesa vier a ser substituído pelo
método do crédito indireto, o novo método aplicar-se-á automaticamente aos dividendos pagos
por sociedades residentes no Brasil a sociedades residentes em POffilgal" (Protocolo, nO 7).
134 A Convenção com o Luxemburgo (art. 24) estabeleceu que a isenção se aplica também quando
"as participações acumuladas de diversas sociedades residentes do Luxemburgo atinjam pelo
menos 1/4 do capital da sociedade residente do Brasil e quando uma das sociedades residentes
do Luxemburgo detiver em cada uma das sociedades residentes do Luxemburgo uma partici-
pação superior a 50%". Sobre casos similares (quintet structure), cfr. P. BAKER, Double Taxation,
231. Sobre os group ofcompanies clause ou Konzern Klausel, m. VOGEL, Double Taxation, 550.
Título VI I Capo /I I Normas de Reconhecimento de Competência _

Anote-se ainda que a Convenção com o Canadá (art. XXII, § 2°) permite, para
efeitos de determinação do tax credit, considerar "um montante igual ao imposto
sobre a renda pago no Brasil, incluindo o imposto sobre a renda de sociedades e
qualquer outro imposto sobre a renda" (underlying tax credit). Em sentido similar, a
Convenção com o Japão (Protocolo, art. 4°) dispõe que o tax credit "levará em conta
o imposto brasileiro exigível da companhia que paga os dividendos" e que este im-
posto "deverá incluir o montante do imposto brasileiro que deveria ter sido pago se
não houvesse a isenção ou redução do imposto" (tax sparing). Também a Convenção
com a China estatui (art. 23, nO 2, b") que, no caso de o residente da China deter
mais de 10% das ações da empresa que realiza a distribuição dos dividendos, o crédi-
to "levará em conta o imposto de renda recolhido pela empresa no Brasil".

DIVIDENDOS DE FONTE ESTRANGEIRA RECEBIDOS POR RESIDENTES NO BRASIL

• África do Sul • França • Países Baixos


• Bélgica • Hungria • Peru
• Canadá • Israel • Porrugal
ImputaçiW ordinária • Chile • Japão • Suécia
• China • Luxemburgo • Thecoslováquia
• Dinamarca • México • Ucrânia
• Finlândia • Noruega

Imf.utafiW incluindo { • Porrugal


cridzto tndtreto • Peru

IsençiW { • Espanha

• Itália
Crédito presumido { • Corcia (*)
de 25% • Filipinas (**)

• Argentina participação mínima de 10%: isenção


{ outros casos: imputação ordinária

• Áustria
{ participação mínima de 25%: isenção
outros casos: imputação ordinária

Regime misto
• Equador
{ participação mínima de 10%: isenção
outros casos: crédito preswnido de 25%

• Índia
{ participação mínima de 10%: isenção
outros casos: imputação ordinária

(*) O maching credit de 25% inclui o imposto de renda de pessoa jurídica no caso de participaçiW mínima
de 10% (e ainda que "isenta))): Protocolo, item 1.
(**) Nas Filipinas, a participação mínima exigida é de 25%.
(B Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

DIVIDENDOS DE FONTE BRASILEIRA RECEBIDOS POR RESIDENTES DE OUTROS ESTADOS

Isenção • Argentina
{ • Tcliecoslováquia

Isenção com { • Espanha


progressividade

• África do Sul
• Chile
• China
• Dinamarca
• Israel
• Noruega
• UcrânIa

Crédito presumido • Coreia


de 25% • Filipinas
{ • Hungria

participação mínima de 25%: isenção


• Áustria
{ outros casos: crédito presumido de 25%

• Bélgica
{ requisiros de isenção segundo a lei belga: isenção
outros casos: imputação ordinária ou crédito presumido (temporário)

• Canadá
{ participação mínima de 10%, lucros de atividade empresarial: isenção
participação mínima de 10%; nos demais casos: crédito presumido de 25%
outros casos: imputação ordinária

Regimes
• Equador
{ participação mínima de 10%: isenção
outros casos: crédiro presumido de 25%

Mistos • Finlândia
{ participação mínima de 10% ( votante): isenção
outros casos: crédito presumido de 15%

• França
{ participação mínima de 10%: isenção (com limites)
outros casos: crédito presumido de 20%

• Índia
{ participação mínima de 10%: isenção
outros casos: imputação ordinária

• Itália
{ partcipação mínima de 10%: isenção
outros casos: crédito presumido de 25 %
L -_ _ _ _ _ __ . Tí.tulo VI I Capo 11 I Normas de Reconhecimento de Competência •

• México { participação mínima de 10%: imputação ordinária

• Japão
{ participação mínima de 10%: crédito presumido de 25%
outros casos: imputação ordinária

participação mínima de 25%: isenção


• Luxemburgo { outro casos: crédito presumido de 25%

Regimes
Mistos participação mínima de 10%: crédito ~resumido de 25%
• Países Baixos { outros casos: crédito presumido de 20 Yo

participação mínima de 25% por mais de dois anos: dedução de 95%


• Portugal aos dividendos
{

em caso de isenção segundo a lei sueca: isenção


• Suécia
{ outros casos: crédito presumido

SUBSEÇÃO li
JUROS

§ 10 O CONCEITO DE JUROS

A) Generalidades

O conceito de juros 135 , utilizado nas Convenções contra a dupla tributação ce-
lebradas pelo Brasil, é formulado de um modo um tanto descritivo, compreendendo
"rendimentos da dívida pública, de títulos ou debêntures, acompanhados ou não de
garantia hipotecária ou de cláusula de participação nos lucros, e de créditos de qual-
quer natureza, bem como qualquer outro rendimento que pela legislação tributária
do Estado contratante de que provenham sejam assemelhados aos rendimentos de
importâncias emprestadas".
Este conceito - que basicamente reproduz a versão original do art. 11 do Mo-
delo OCDE - foi posteriormente criticado pelo Comitê de Assuntos Fiscais daquela
organização que, na revisão de 1977, posteriormente mantida, preconizou uma re-
dação mais correta - que se pretende "exaustiva" -, segundo a qual o termo "juros"

135 Cfr. ALBERTO XAVIER, Régime fiscal des emprunts concédés par des banques étrangeres, Intertax
1978,440; B. RUNGE, Taxation ofthe intemational jlow ofinterest, Intertax 1978,427; J. L.
JUAN Y PENALOSA, Intereses, in J. VILLA GIL (org.) Relaciones fiscales intemacionales) Madrid
1987,255; A. L. DE SOUSA FRANCO, Nota sobre a dupla tributaçiÚJ de dividendos) juros e "roy-
alties))) CTF 156 (1971), 49; DORON HERMAN, Taxing Portfolio Income in Global FinanciaI
Markets, Arnsterdam 2002.
U I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

designa os rendimentos de créditos de qualquer natureza, acompanhados ou não


de garantias hipotecárias ou de uma cláusula de participação nos lucros do devedor
e, nomeadamente, os rendimentos dos fundos públicos, de títulos e de debêntures,
compreendidos os prêmios e bônus ligados a esses títulos. As penalizações por paga-
mento tardio não são consideradas como juros no sentido do presente artigo J36 .
A definição de juros deixaria, pois, de ser aberta) para passar a ser cerrada e
exaustiva, eliminando-se a remissão subsidiária para a lei interna e restringindo-
se, assim, a competência qualificatória do Estado da fonte aos precisos termos do
tratado '37 .
Na verdade, o elemento nuclear do conceito de juro é a contraprestação dos
créditos de qualquer natureza, limitando-se as proposições subsequentes a dissipar
eventuais dúvidas sobre a inclusão de certas figuras jurídicas dentro desse conceito
genérico. É o caso dos títulos da dívida pública; das partes beneficiárias e das debên-
tures com cláusula de participação nos lucros que, segundo certas interpretações,
poderiam estar sujeitas ao regime dos lucros ou dividendos' 38 ; dos créditos com
garantia hipotecária (para esclarecer não estarem submetidos ao artigo que versa
sobre rendimentos de bens imobiliários); e dos créditos concedidos pelos sócios à
própria sociedade.
Mas já não devem qualificar-se como juros, mas como "outros rendimentos" os
pagamentos realizados nos termos dos produtos financeiros derivativos, em que não
existe uma dívida subjacente, como é o caso dos swaps de taxas de juros139 •
A cláusula de remissão para a legislação interna do Estado da fonte, reconhe-
cendo eficácia no plano internacional à assemelhação que ela faça a juros de outros
rendimentos, tem designadamente a vantagem de esclarecer dúvidas quanto à apli-
cação deste preceito às comissões 140, despesas, descontos, deságios, anuidades, bo-
nificações, prêmios ou outros produtos de empréstimos que a lei interna brasileira
equipara a juros. Mas foi vivamente criticada pelo Comitê de Assuntos Fiscais, já em
razão da amplitude do preceito, já por motivos de segurança jurídica, já ainda por

136 As multas por pagamentos em atraso não são consideradas juros (China, Hungria). Veja-se
a reserva do Brasil quanto a esta cláusula in OCDE, art. 11, NMC Positions, parágrafo 5°.
13 7 No que concerne aos Tratados brasileiros, a definição cerrada se encontra apenas prevista nos
Tratados com a China e com a Ucrânia.
138 Todavia, os Comentários da OCDE, na versão de 1992, tendem a qualificar como dividen-
dos as remunerações de créditos nos casos de thin capitalization em que o credor partilhe os
riscos da compahia. Cfr. art. 10, parágrafo 25, e art. 11, parágrafo 19. Sobre o problema
em geral, ver MAlUA DOS PRAZERES RITO LOUSA, A tributação das filiais de empresas trans-
nacionais e a subcapitalização, in A Internacionalização da Economia e a Fiscalidade - XXX
Aniversário do Centro de Estudos Fiscais (colóquio), Lisboa 1993, 443.
139 Cf. OCDE, Comentários, art. 11, parágrafo 21.1 (acrescentado em 1995), art. 21, parágrafo
]O (versão 2008). lFA, Tax Treatment ofHybrid Financial Instmments in Cross-Border Transac-
tions, CDFI LXXXV-a (2000), 727.
140 Expressamente mencionadas na Convenção com o Canadá, Protocolo, item 7; Itália, Proto-
colo, item 4; Luxemburgo, Protocolo, item 3; Países Baixos, Protocolo, item 4.
-===:::::f!t~lo VI I Capo 11 I Normas de Reconhecimento de Competência Mij.,_
condenar, em princípio, que convenções internacionais procedam a remissões para o
direito interno 141 .
No que concerne aos juros moratórios, os Comentários da OCDE preconizam
a sua subtração ao regime dos juros, por entender que revestem mais a natureza de
indenização do credor do que de rendimento do capitaF42.
Semelhante restrição não existe nas Convenções celebradas pelo Brasil, pelo
que o problema deverá ser resolvido à luz dos conceitos do direito interno, até por
força da cláusula de remissão atrás mencionada. Ora, o direito positivo brasileiro
determina que os juros moratórios têm o tratamento tributário de juros, exceto
quando relacionados com o atraso no pagamento de rendimentos do trabalho as-
salariado ou de royalties, caso em que seguem o regime destes rendimentos, como
seus acessórios1 43 .
Apenas são considerados juros - para efeitos das Convenções - as remunerações
estipuladas até o limite que seria acordado at arm)s length, ou seja, na ausência de
relações especiais entre o devedor e o credor, ou entre ambos e terceiros, ficando o
excesso sujeito ao regime definido pela legislação interna de cada Estado ou a outros
preceitos da Convenção que se revelem eventualmente aplicáveis l44 •
As Convenções mais recentes celebradas pelo Brasil contêm uma cláusula anti a-
buso segundo a qual as disposições do art. 11 não serão aplicáveis quando as autori-
dades competentes acordarem que o crédito pelo qual se pagam os juros foi acordado
ou estabelecido com o principal propósito de tirar vantagem desse artigo, caso em
que se aplicarão as disposições do direito interno (África do Sul, México, Ucrânia).

B) O caso dos '<juros negativos))

A partir de 1977 a Convenção Modelo da OCDE foi objeto de modificação no


que respeita à cláusula de definição de juros, que passou a incluir nesse conceito os
"prêmio e preços" relativos a títulos governamentais, obrigações e debêntures (gover-
namental securities) bonds or debentures).

141 Cfr. OCDE, Comentários, art. 11, parágrafo 21; BAKER, Double Taxation, 251. O art. 11, nO
4, da Convenção com a China já não contém uma cláusula de remissão.
142 Cfr. OCDE, Comentários, art. 11, parágrafo 22. No que concerne a prêmios, ver op. cit.,
parágrafo 20.
143 Sendo o juro típica remuneração do capital, tem-se discutido se reentrariam no regime do
art. 11 as remunerações por outros serviços bancários acessórios, tais como fie por garantia
bancária. Em sentido negativo, ver VOGEL, Double Taxation, 739, citando decisão do Tribu-
nal Supremo do Canadá (Melfords Development Inc.); GOUTI-IlÊRE, Les impôts, 568 ss.
144 Por "relações especiais" devem entender-se não apenas as que resultam de um controle direto
ou indireto do capital, mas também as que resultam de parentesco, casamento e, em geral,
qualquer comunidade de interesses. Cfr. OCDE, Comentários, art. 11, parágrafo 33. O
"excesso" de juros pode ser condiderado um constructive dividend ou uma contribuição para
o capital. Cfr. VOGEL, Double Taxation, 758.
1I!i Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Os Comentários à Convenção Modelo (art. 11, parágrafo 30, item 20) assim
esclarecem o alcance da referida inovação:
"20. As regards, more particularly,government securities, and bonds and debentures,
lhe text jpecifies that premiums or prizes attaching trlereto constitute interest. Gme-
rally speaking what constitutes interest yielded by a loan security, and may properly be
taxed as such in the State ofsource, is all that the institution issuing the loan pays over
and above the amount paid by the subscribery that is to say, the interest accruing plus
any premium paid at redemption or at issue. It flllows that when a bond or debenture
has bem issued at a premium, the excess of the amount paid by the subscriber
over that repaid to him may constitute negative interest which should be de-
ducted from the interest that is taxable. On the other hand, any profit or loss
which a holder of such a security realizes by the sale thereof to another person
does not enter into the concept of interest. Such profit or loss may; depending
on the case, constitute either a business profit or a loss, a capital gain or a loss,
or income falling under Article 21." (grifos nossos)
Resta assim claro que para a nova versão da definição de juros apenas podem ser
considerados "juros negativos", dedutíveis do juro tributável para efeito de retenção
na fonte, o prêmio ou ágio pago pelo subscritor ao emitente no mercado primário,
mas já não assim a parte do preço de aquisição no mercado secundário que excede o
valor do principal.
Tal circunstância se deve ao fato de que, enquanto no mercado primário as cláu-
sulas do preço de subscrição e juros são estipuladas entre as mesmas partes, no contex-
to do mesmo contrato, o que pode levar à concepção unitária do proveito econômico
da operação de modo, aliás, a exonerar a operação do ônus de uma retenção na fonte
sobre a totalidade dos juros nominais.
Tais considerações não se aplicam, porém, no mercado secundário, em negocia-
ção estabelecida com terceiro independente, onde o netting das diversas prestações
patrimoniais não faz qualquer sentido.
Este é o entendimento autorizado de KLAus VOGEL 145 quando ressalta a diferen-
ça entre os chamados "juros negativos" (valores pagos pelo credor ao devedor), que
afetariam o montante de juros recebidos, de situações onde não há "juros negativos",
mas outras espécies de pagamento, a saber:
"On the other hand, it is not possible to reduce the amount of interest by deducting
expenses if the creditor acquired the debt-claim in the secondary market over par. In
that case, the creditOJ; rather than granting the debtor an excess amount, i.e., (negative
interest', may possibly have suffered a capitalloss". (grifas nossos)
Esta nova redação da cláusula de juros apenas se refletiu em poucos tratados
celebrados pelo Brasil, como é o caso do Tratado com o México, que assim dispõe:

145 Cfr. OnDouble Taxation Conventions (3 a ed.) (Kluwer), 1997,737 - item 64.
~:Tít~IO VI I Capo 11 I Normas de Reconhecimento de Competência '#'~.

"4. O termo "juros" usado no presente artigo significa os rendimentos de crédi-


tos de qualquer natureza, acompanhados ou não de garantias hipotecárias ou de
cláusula de participação nos lucros do devedor, e, em particular, os rendimentos
da dívida pública, de títulos ou obrigações, incluídos os ágios eprêmios relativos a esses
títulos, bem como quaisquer outros rendimentos que a legislação tributária do Es-
tado de que provenham assimile aos rendimentos de importâncias emprestadas".
Cláusulas com idêntica redação constam ainda dos Tratados com África do Sul,
Canadá, China, Finlândia e Ucrânia.
A verdade, porém, é que essa inovação não pode ser invocada para a interpreta-
ção da cláusula de tratados celebrados anteriormente à versão de 1977, que ignoram
por completo o conceito de "juro negativo". Mesmo em relação a tratados celebrados
posteriormente à nova versão da Convenção Modelo, adotada em 1977, esta não po-
derá ser aplicada se a cláusula convencional não consagrou expressamente a referida
solução.

C) Alienação de aplicações financeiras

Uma outra questão que se tem discutido a respeito do conceito de juros é se


reveste essa natureza ou a de ganho de capital o valor pago por adquirente de títulos
representativos de aplicações financeiras, negociadas antes do seu vencimento por
valor superior ao nominal, títulos esses que incorporam o direito a juros incorridos,
mas não vencidos.
A qualificação da remuneração pactuada em caso de alienação de aplicação fi-
nanceira antes do vencimento deve ser feita, não em abstrato, mas em face da relação
jurídica na qual figura como devedor um residente no Brasil.
No caso de títulos representativos de aplicações financeiras, há dois tipos de re-
lações jurídicas que é necessário distinguir: a relação jurídica obrigacional que origi-
nariamente se constituiu entre o emitente do título e o tomador, que tem por objeto
o dever do emitente de reembolso do capital e pagamento de juros (relação jurídica
de crédito); a relação jurídica que, num momento sucessivo, se estabelece entre o
vendedor e o comprador do título, pelo qual o primeiro cede ao segundo o crédito
que adquiriu em virtude da relação jurídica anteriormente referida, com os seus aces-
sórios que são os juros vincendos (relação jurídica de cessão de créditos).
Na primeira relação jurídica não há dúvida de que o objeto da atribuição pa-
trimonial a que está adstrito o devedor é, além do reembolso do principal, juro em
sentido próprio, ou seja, a remuneração que o obrigado deve pela utilização temporária
de certo capital.
Na relação jurídica de cessão de créditos ocorre uma compra e venda de um
título de crédito, que é a via pela qual se opera a cessão do direito de crédito contra
o emitente, cessão esta que abrange, por acessoriedade, a cessão do direito aos juros
entretanto decorridos.
_ I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Nesta segunda relação jurídica a obrigação do devedor da prestação patrimonial


que representa a contraprestação da venda do título ou da cessão dos direitos de cré-
dito tem a natureza jurídica de um preço. Esse preço, é certo, terá como fatores que
influenciam o seu montante o valor dos juros decorridos entre a data da emissão ou
do último vencimento até à data de aquisição. Mas isso não significa que o comprador
ou cessionário esteja a pagar ao vendedor ou cedente o principal e os juros (como su-
cederia na hipótese de pagamento por terceiro, com sub-rogação). E isto pela singela
razão de que a relação jurídica entre eles existente não é uma relação jurídica de cré-
dito, tendo por objeto o reembolso do principal e dos juros, mas uma relação jurídica
de cessão de crédito, tendo por objeto a aquisição dos direitos ao reembolso do principal
e ao pagamento de juros pelo emitente do título, aquisição essa em contrapartida de
um preço. Ora, se o objeto da obrigação da entidade devedora do rendimento (à face
do qual este deve ser qualificado) é um preço e não um reembolso de capital e nem
pagamento de juro, a prestação não pode ser qualificada como juro.
A interpretação contrária, que sustenta que o vendedor do título recebe o reem-
bolso do principal e os juros vincendos, pode tolerar-se em linguagem coloquial, mas é
insustentável juridicamente, pois confunde numa só duas relações completamente dis-
tintas: a que prende o verdadeiro devedor de juros - que é o emitente do título e só ele
- ao titular originário ou sucessivo do crédito que nele se incorpora; e a que prende o ce-
dente ao cessionário, em operação intermediária e anterior ao vencimento do crédito, na
qual o cessionário é devedor de um preço em contrapartida da aquisição de direitos.
Economicamente, o juro é um rendimento em sentido estrito, um fluxo peri-
ódico ou recorrente de riqueza que flui de um capital, que é um estoque da riqueza
existente em determinado ponto no tempo.
Ao invés, preço pela compra de um título por valor superior ao seu custo de
aquisição, valor este correspondente aos juros incorridos, não é um rendimento em
sentido estrito, antes se decompõe em duas parcelas: a parte do preço recebido que
corresponde ao capital aplicado na aquisição do bem é um pagamento de capital, que se
limita a repor, no patrimônio do alienante, o capital aplicado no bem alienado; a parte
do preço recebido que excede esse capital é umganho de capital ou mais-valia realizada,
que representa o aumento do valor de um bem que integra o patrimônio do alienante
(o título) em virtude de fluência do direito a juros decorridos até à data da alienação.
Do ponto de vista econômico, o preço de cessão de um título não pode ser consi-
derado nem parcialmente juro, pois o seu devedor (ao invés do emitente) não é fator de
produção que contribui para a formação da renda; no caso opera-se apenas uma "troca
de capital" no sentido de que, através da cessão, cedente e cessionário substituem nos
seus respectivos patrimônios direitos (créditos e dinheiro) que neles preexistiam.
Que o preço de cessão de direitos de crédito, na parte que excede ao valor no-
minal, reveste a natureza de ganho de capital e não de juro resulta de o próprio legis-
lador ter qualificado como ganho de capital o preço da alienação de bens ou direitos de
qualquer natureza (Lei nO 7.713/88, arts. 2° e 3°, e Lei nO 8.981/95, art. 21), sem
distinguir consoante tais obrigações tenham ou não, como acessórios, rendimentos
ou frutos vincendos.
VIICap. 11 'I,Normas de Reconhecimento de Competência -§t+

Também devem ser considerados ganhos de capital os ganhos na alienação de


participações societárias, não obstante na fIxação do valor da alienação possam ser
considerados os lucros ou dividendos futuros a que dão direito. E o mesmo se diga
da alienação onerosa de direitos reais sobre bens imóveis, em cujo preço pode estar
embutido o valor dê aluguéis futuros. Assim, da mesma forma como nos casos atrás
referidos há preço de compra de ações ou de imóveis - e não pagamento de dividendos
ou aluguéis -, assim também no ,caso de lítulosde aplicação fmanceira há preço de
comprados títulos-e não pagamento de juros. (,
Neste mesmo sentido' se pronunciàm os Comentários da OCDE nos quais 'se
afIrma expressamente: '\Por 'Outf01ado,qualquer ganho ou perda,que um titular
realize pela respectiva venda a outra pessoa não entra no conceito de juros. Referido
ganho ou perda pode, dependendo dos casos, constituir ou um lucro de empresa ou
prejuízo, um ganho ou perda de capital, ou outro rendimento previsto no art. 21"146.

D) Juro~décapitdl próprio

'Importa examinara caracterizaçãO da 'rernUrieração cOnsistente em juros de capital


próprio em causa 'para 'efeitos 'dos tratados contra a duplati'ibutação, nO' caso em que
o benefICiário seja residente rio' exterior em país que tenha celebrado' tratadO contra a
dupla tributação com 'O Brasil. Como vimos, a genetalidadê 'dos' tratados; iseguirido
aliás bMúdêlú' da' OCD E, considera da:essênéia do conceito de "júrcis" a existência de
temttneraçãode "créditos de qualquer n'át:'ureza",encjuallro O conceito de "dividendos"
teina sua nota essencial·no' fato 'de 'serem "rendiinentos de participações no capital".
Assim, na auSência de disposição cOnvenCional em contrário, a éorretaqualiliéação dos
"juros sobre capital próprio" para efeitos dos tratados seria a de "dividendos", vez que,
como se demonstrou, neles, não ,se verilip um crédito preexistente, sendo na verdade
lucros distribuíveis aos titulares do capital socÍal da pessoa jurídica pagadora147 .
,É nossa opinião que (sempre 'partindo do pressuposto de ausência de disposição
convencional em contrário) a subsunção direta dos "juros sobre capital próprio" no
conceito de dividendo, assim considerado. o rendimento de participações societárias,
sobrepõe-se às disposições convencionais que procedem a uma remissão subsidiária
para a lex flri, para o efeito de equipararem a juros "quaisquer outros rendimentos
assimilados aos rendimentos de importâncias emprestadas pela legislação fIscal do
Estado de que provêm os, rendimentos",
Uma importante consequência da caracterização como dividendo é que esta
qualificação é vinculante para O país de reSidência do benefIciário, que deverá assegu-
rar a estas remunerações as disposições convencicinais' que se aplicam aos çliv'idendos
(e não aos juros). '

146 Artig0 11, parágrafo 20, in fine.,


147 Cfr. supra, 499 e 55.
e I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier
A verdade, porém, é que a Convenção com POrhlgal estabeleceu no item 4 in
fine do Protocolo que, "para os efeitos do § 5° do art. 11, os juros pagos como 're-
muneração sobre o capital próprio', de acordo com a legislação tributária brasileira,
são também considerados juros".
A qualificação como verdadeiros juros (baseada na similitude do regime interno
de tratamento tributário, especialmente no que concerne à dedutibilidade) correspon-
de, aliás, a uma tendência da política brasileira de negociação das convenções tributá-
rias, pois ela se encontra reiterada nas Convenções firmadas com o Chile (Protocolo,
item 4), a Ucrânia (Protocolo, item 1), Israel (Protocolo, item 1), México (Protocolo,
item 4 a), África do Sul (Protocolo, item 2) e Peru (Protocolo, item 3)148.

§ 2° TRIBUTAÇÃO PELO ESTADO DA FONTE

A) Os pressupostos de aplicação do regime convencional

A aplicação do regime convencional, no que tange à delimitação do poder de tri-


butar do país da fonte, depende da ocorrência de diversos pressupostos, relativos uns
ao credor e outros ao devedor dos juros. Tais pressupostos concretizam-se através de
uma complexa combinação dos elementos de conexão residência e estabelecimento
permanente. Independentemente de maiores desenvolvimentos, podemos enunciar
que, via de regra, as Convenções exigem, relativamente ao credor, a residência e o
estabelecimento permanente como conexão cumulativa; e, relativamente ao devedor,
a residência ou o estabelecimento permanente como conexão alternativa 149 •

a) Pressupostos relativos ao devedor

Os pressupostos relativos ao devedor prendem-se de perto com o problema


da definição da fonte dos juros. Reputa-se que os juros têm a sua fonte no país de
que provêm; todavia, não é fácil determinar a proveniência dos juros atendendo ao
conflito potencial entre as duas conexões em princípio relevantes para o efeito: a

148 O mesmo se passa nas Convenções (ainda não promulgadas) com a Rússia (Protocolo, item
2), Trinidad e Tobago (artigo 11, parágrafo 4°) e Venezuela (Protocolo, item 2).
149 Na versão dos Comentários aprovada em 2005 foi aprofundado o estudo da situação em que
os Estados podem ter interesse em adotar, ao invés de uma conexão cumulativa, uma cone-
xão que assegure a competência tributária exclusiva do Estado de residência do beneficiário
dos juros. Poderia ser este o caso, por exemplo dos (i) juros pagos por Estados ou agências
estatais, incluindo bancos centrais; (ii) juros pagos por um Estado ou suas subdivisões polí-
ticas; (iii) juros pagos em financiamentos de programas de exportação; (iv) juros nas vendas
a crédito; (v) juros pagos a entidades isentas (p. ex. fundos de pensão). Cfr. Comentários,
art. 11, parágrafo 7.1 a 7.12.
VI I Capo 11 I Normas de Reconhecimento de Competência -§.p-
residência do devedor ou o lugar do estabelecimento permanente a que se encontra
ligada a obrigação do seu pagamento.
As Convenções brasileiras optaram pela solução das conexões alternativas: os
juros consideram-se provenientes de um Estado em que o devedor tenha residência
ou em que possua estabelecimento permanente, mesmo que tenha residência num
terceiro Estado 1so .
Assim, por exemplo, serão considerados provenientes do Brasil e tributados na
fonte, nos termos da Convenção com a Espanha, os juros devidos por uma sociedade
residente no Brasil ou por uma filial brasileira de uma sociedade residente no exte-
rior, seja na Espanha, seja em qualquer terceiro Estado.
Convém, todavia, ter presente que a simples residência do devedor funciona
como conexão relevante, ainda que este tenha contraído o empréstimo em proveito
de um estabelecimento permanente que possua em terceiro Estado e que suporte o
encargo efetivo dos juros. Pelo que, em rigor, esta situação dará provavelmente lugar
a uma dupla tributação dos juros, na fonte, seja no país da residência do devedor,
seja no país do estabelecimento permanente, a qual só será eliminada se o país da
residência renunciar a caracterizar-se como país da fonte dos juros, como admite a
OCDElSl.
Outro ponto delicado a abordar é a determinação da conexão efetiva dos juros
com o estabelecimento permanente do devedor. As Convenções exigem que através
do estabelecimento tenha sido contraída a obrigação que dá origem aos juros e lhe
caiba o respectivo pagamento. Assim, não se considera imputável ao estabelecimento
o empréstimo contraído pela matriz, ainda que o seu produto seja exclusivamente
destinado às necessidades daquele estabelecimento; por maioria de razão, não o será
se foi contratado pela matriz, sendo o seu produto repartido por diversos estabeleci-
mentos localizados em diversos países.
Evidentemente, os juros serão considerados como provenientes de um Estado
contratante quando o devedor for o próprio Estado, uma das suas subdivisões polí-
ticas ou uma de suas entidades locais.

b) Pressupostos relativos ao credor


São três os pressupostos relativos ao credor dos juros.
O primeiro pressuposto consiste em o beneficiário dos juros residente num
Estado contratante não possuir estabelecimento permanente, a que se ligue efeti-
vamente o crédito gerador dos juros, no outro Estado contratante de que os juros
provenham.

150 A Argentina considera os juros dela provenientes quando, no seu território, foram colocados
ou utilizados economicamente os capitais de que resultam (cfr. Protocolo, item 6), acolhen-
do assim, como elemento de conexão, o conceito da fonte de produção.
151 efr. OCDE, Comentários, art. 11, parágrafo 28; VOGEL, Double TaxationJ 751.
Q I Direito Tributário.lnternacionaldo Brasil I Alberto Xavier ,., '_"_'_ _ _ _ _ _ _ _ _--'

Vimos já que esta situaçã<.> representava,uma exceção ao direito de tributar do país


da residência. Por força de dispositivos convencionais expressos, ela representa também
um limite ao direito do Estado da fonte, posto que nesta hipótese o rendimento em cau-
sa é tributadócomolucro do estabelecimento permanente, não se procedendo à retenção
na fonte a título dejuros, No exemplo já citado, os juros recebidos pela filial brasileira de
um banco alemão não só não são tributados na Alemanha, como juros da matriz, como
também não são tributados no Brasil, a título de retenção na fonte sobre juros.
Osegundo8fessupostoconsiste em que o beneficiário dos juros deve ter no
Estado contratante não .apenas a sua residência, mas também o seu estabelecimento
permanente, de tal modo que as Convenções se não aplicam aos juros pagos aos es"
tabelecimentos permanentes que as empresas "residentes :no primeiro Estado tenham
em terceiros Estados. Como atrás se viu, trata-se de importante desvio' ao princípio
da ,relatividade dos tratados em matéria de juros (consagrado no. Modelo OCDE) e
que resulta de política deliberadamente' adotada pelo Brásil l52 ,
Assim, por exemplo, não se beneficiam da redução convencionaL de alíquota
os juros pagos ,pOl' uma sociedade brasileira à filial de um banco alemáosituada em
tereeiro Estado. Como também se'nãobeneficiam os juros pagos ,por uma sociedade
brasileira à filial alemã de um banco domiciliado num terceiro Estado J53 ,
, A única exceção <t notar éo caso do ,Japão (que; aliás, segue o modelo OCDE),
em que a Administração fiscal brasileira entendeu que a Gonvenção se aplica aos juros
pagos a agência de banco japonês situada em terceiro Estado, embora se não aplique
aos juros pagos aos estàbelecimentos permanentes, situados no Japão, de pessoas jurí-
dicas com sede em terceiros países (Ato Declaratório Normativo CST na 02/80).
O terceiro pressuposto - apenas previsto em algumas Convenções mais recentes,
já inspiradas no Modelo OCDE revisto em 1977- exige que a pessoa residente num
Estado contratante, a quem os juros são pagos, seja o beneficiário efetivo (ver ,Con-
venções coma África do Sul, Bélgica (Protocolo), Chile, China, Coreia, Equador,
Filipinas, Hungria, Índia, Israel, Itália, México, Noruega, Países Baixos, Portugal,
Tchecoslováquia, Ucrânia). Este requisito tem como finalidade impedir mecanismos
de treaty shopping, recusando notadamente a aplicação da Convenção se o residente

152 Cfr. supra, 113 ss. Neste preciso sentido é a reserva feita pelo Brasil, na sua qualidade de
Estado não membro da OCDE, ao âmbito de aplicação da cláusula de redução de alíquota de
juros: "Paragraph 4. Brazil reserves the right to provide that where interest is paid to a permanent
establishment ofa resident of the other Contraeting State situated in a third State, the limit on the
rate of taxation of imerest in paragraph 2 shall not apply".
153 Áustria (Portaria nO 470/76, item IV); Béigica (Portaria nO 271, de 3.6.74, item I1I); Canadá
(Portaria nO 199/86, item IV); China (art. 11°, § 8 0 ) ; Dinamarca (Portaria nO 68, de 24.2.75,
item IlI); Espanha (Portaria nO 45, de 4.2.76, item III); Finlândia (Portaria nO 223, de 7.5.74,
item IlI); França (Portaria nO 287, de 23.1 1.72, item lII); Itália (Portaria nO 203/81, item lII);
Luxemburgo (Portaria nO 413/80, .item IV); Noruega (Portaria nO 25/82, item IV); Portugal
(art. 11, nO 4); Suécia (Portaria nO 44, de 4.2.76, item lII); México (art. 11, item 7); Israel
(art. 11, item 7), África do Sul (art. 11, item 6), Ucrânia (art. 11, item 8). Veja-se a posição do
Brasil in OCDE, art. 11, NMC Positions, parágrafo 8°. Sobre esta cláusula efr. supra, 113.
VI I Capo 11·1 Normas déReconhecimento de Competência

em um dos Estados, a quem os juros são pagos, for,um mero intermediário,tal como
um agente, um nominee ou uma conduit companyI54 .. , " I'.. ,

Questão distinta desta é a que se coloca quando o.empré~timo é concedido por


um <<pool bancário" do qual o "chefe de fila" pode não ser residente num dos Estados
contratantes. Nestes casos, as Convenções deverão aplicar-se, ou não, em função da
identidade de cada um~ das institUições fmanceirasii1dividu'almente consideradas,
fazendo-se abstração da "convenção. de p001155.

B) Os limites do poder de. tributar do


. Estado da fonte: isenção e redução de alíquota
Os limites ao poder de tributar do Estado da fonte são de dois tipos distintos:
isenções e reduções de alíquota. ' ..
Encontra-se genericamente consagrada a isenção do imposto de renda na fonte
quanto aos juros da dívida pública pagos ao governo do outro Estado contratante, ou
a uma de suas subdivisões políti.càs,:ou a qualquer agência (inclusive uma instituição
financeira) de propriedade exdusiva daquele governo. Tais juros são exclusivamente
tributáveis no Estado credor l56 .
A outra modalidade de limite' aceito pelo Estado da fonte é a fixação de um
limite máximo à alíquota iricideriie §obre omontante'brutq dos jUfoSl57.
Quanto a este ponto, há que distinguir dois tipos de éonvenções.
Um primeiro tipo é constituído pelas Convenções que fixam uma alíquota má-
~ma genérica; sem prever quaisg~e! exceções, alíquota que, via de regra, é de 15%.
E o caso da Mrica do Sul, da Austria, da China, da Dinamarca, da Finlândia, de
Israel, do Japão, do México, da Noruega, de Portugal, da Suécia e da Ucrânia. Três
particularidades a anotar: na Convenção com a Noruega, a alíquota limite é de 25%,
a qual, coincidindo com a alíquota normal vigente no Brasil, não representa, do
ponto de vista brasileiro,qualquer.v:antagem efetiva; na Convenção com a Suécia, ao

154 Cfr. OCDE, Comentários, art. 11, parágrafos 8 ~ 8.1. No caso Aiken Industries v. C. I. R.,
o Tax Court dos Estados Unidos recusou à aplicação da Convenção E.U.-Honduras a um
empréstimo back to back que uma companhia das Bahamas concedeu, por via de uma sub-
sidiária nas Honduras, a uma subsidiária nos Estados Unidos. O tribunal julgou que esta
última tinha "pago" o juro à sua controladora indireta nas Bahamas, sendo a subsidiária das
Honduras um mero conduit. Cfr. VOGEL, Double Taxation, 723. Noutro caso, os E.E.U.U.
recusaram a isenção de retenção na 'fonte'· sobre os juros pagos por sociedade americana a
uma sociedade das Antilhas Holandesas que imediatamente os redistribuía aos seus acionis-
tas. Cfr. P. BAKER, Double Taxation, 184.' .
155 Cfr. GOUTHIÉRE, Les impôts, 569 ..
156 Diversas Convenções, em preceitos declaratórios, el1\;nciam 'as agêúcias governamehtais que
podem beneficiar da isenção. Veja-se, por exemplo, Austria (Protocolo, item 2). A Conven-
ção com Portugal (Protocolo, na 4).esdarece que a isenção em causa só se aplica se a insti-
tuição frnanceira governamental for a beneficiária efetiva dos juros.
157 A Convenção com a Argentina não éstabelece qualquer limite.
I _ I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

lado da alíquota normal de 15%, prevê-se um limite mais elevado para juros pagos
a pessoas físicas ou sociedades de pessoas; e na Convenção com o Japão a alíquota
máxima é de 12,5%, por força do Protocolo de 23 de março de 1976.

ALÍQUOTAS CONVENCIONAIS RELATIVAS A JUROS

• Noruega
25% • Suécia - se o beneficiado for sociedade
{
de pessoas ou pessoa física

• África do Sul
• Áustria
• Bélgica
• Canadá
• Chile
• China
• Coreia
• Dinamarca
• Equador
• Espanha
• Filipinas
• Finlândia
Juros em geral 15% • França
• Hungria
• Índia
• Israel
• Itália
• Luxemburgo
• México
• Peru
• Portugal
• Países Baixos
• Suécia (temporário)
• Tchecoslováquia
• Ucrânia

12,5% { • Japão

• Bélgica
• Canadá
• Coreia
Juros de financiamentos
• Espanha
bancários para a aquisição de
• França
equipamentos a longo prazo
• Hungria
(10%)
• Luxemburgo
• Países Baixos
• Tchecoslováquia
Título VI I Capo 11 I Normas de Reconhecimento de Competência IQ I

Um segundo tipo de Convenção fIxa igualmente uma alíquota máxima para a


generalidade dos juros, mas prevê adicionalmente uma alíquota ainda mais reduzida
(10%) para determinado tipo de juros que se pretendeu submeter a um regime privi-
legiado. Esta categoria especialmente benefIciada defIne-se em função de três classes
de requisitos: subjetivos, objetivos e temporais. Os requisitos subjetivos respeitam à
natureza do autor do empréstimo, que deve ser instituição fInanceira ou bancária
(Espanha) ou, mais restritivamente, estabelecimento bancário com participação de
organismo público de fInanciamento especializado (Bélgica, França). Os requisitos
objetivos respeitam ao objeto a que se destinam os financiamentos, os quais devem es-
tar relacionados com a aquisição de bens de equipamento (Espanha) ou, além destes,
de compra de equipamentos industriais, estudos, compra e instalação de unidades in-
dustriais ou científIcas ou fInanciamento de obras públicas (Bélgica, França). Enfim,
os requisitos temporais respeitam ao prazo mínimo por que o crédito ou empréstimo
deve ser concedido e que é de sete anos (salvo no caso da Espanha e da Tchecoslová-
quia, que é de 10 anos)J58.
A razão de ser destes regimes decorre de que - nas hipóteses em que um ven-
dedor concede um crédito ao comprador estrangeiro - os juros pagos pelo credor
são via de regra calculados para equilibrar os juros pagos pelo vendedor ao banco
que lhe concedeu o crédito. Como a operação fInanceira se equilibra sem margem
ou 'com margem reduzida, entendeu-se que a retenção na fonte à alíquota normal
representaria um ônus excessivo l59 .

§ 3° TRlBUTAÇÃO PELO ESTADO DA RESIDÊNCIA

As discussões a respeito da repartição internacional do poder de tributar os juros


não alcançaram a mesma radicalização que as relativas à matéria de royalties. É que,
enquanto nesta última ainda se mantém uma forte corrente no sentido favorável à
tributação exclusiva pelo país da residência J60 , já no que toca aos juros se reconhece
geralmente que, a par do direito inquestionável do país da residência, o país da fonte
pode apoiar a sua legitimidade para tributar em sólidas razões. Isto mesmo se refle-
te no Modelo OCDE que, enquanto em matéria de royalties prevê, no art.12, um

158 Nos termos da Convenção com a França, o prazo mínimo de 7 anos será contado a partir
da data da entrada em vigor do contrato de financiamento, conforme houver sido aprovado
pelas autoridades do Estado do beneficiário (Protocolo). Ainda quanto à França ver, no que
toca à atuação do Banco Francês do Comércio Exterior, o Parecer Normativo CST nO 55,
de 23.07.76.
159 Cfr. GOUTHÜiRE, Les impôts, 561; B. PIAGNET, Droit Fiscal International, 235-236.
160 É o caso do Modelo dos E.E.U.U. Cfr. VOGEL, Double Taxation, 714.
I • I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

direito exclusivo do país da residência, já admite quanto aos juros, no art. 11, uma
faculdade de tributaçã0 limitada, pelo país da fonte 1ó1 •
As Convenções brasileiras aceitam o direito do país da residência, mas também
consagram o direito - ainda que limitado - do país da fonte.

A) Exceção do eStabelecimento permanente


o direito do país da residência encontra como limite a circunstância de O bene-
ficiário dos juros ter no país de que eles provenham um estabelecimento permanente
ao qual se ligue efetivamente o crédito gerador dps juros. Neste caso, o direito do
país da residência cede o passo· ao Estado em que se encontra localizado o estabele-
cimento permanente e de onde provêm os juros, ficando estes sujeitos ao regime dos
lucros imputados ao dito estabelecimento. Por outras palavras: a conexão estabeleci-
mento permanente prevalece sobre a conexão residência.
Assim, por exemplo, os juros provenientes do Brasil recebidos pela filial brasilei-
ra de.
um banco alemão não são tributados na Alemanha, a .título. de juros; antes são
taxados no Brasil como lucros do estabelecimento permanente, nos termos do art. 7°
(reserva de estabelecimento permanente) Betriebstdttenvorbehalt) .
Importa sempre subliJ)har que o mencionado limite apenas funciona na hipóte-
se de conexão efetiva do crédito ao estabelecimento permanente, o que é mais uma
confirmação do repúdio genérico à antiga sistemática da força de atraçãol ó2 •
Certas convenções mais recentes equiparam ao estabelecimento permanente,
para estes efeitos, uma "instalação fixa" ao serviço de profissionais independentes, su-
jeitos ao regime do art. 14 do Modelo OCDE (China, Hungria, Tchecoslováquia).

B) Regime de atenuação

a) Juros de fonte estrangeira recebidos por residentes no Brasil


Nas hipóteses em que o Brasil éo Estado da residência do credor dos juros, o
método geralmente adotado é o da imputação ordinária, segundo o qual será dedu-
zido do imposto brasileiro incidente sobre os rendimentos desse residente um mon-
tante igual ao imposto sobre a renda pago no outro Estado contratante. Todavia, o
montante deduzido não poderá exceder a fração do imposto sobre a renda, calculado
antes da dedução, correspondente aos rendimentos que podem ser tributados no
outro Estado contratante. .

161 É interessante sublinhar que cerca de um terço dos Estados-membros da OCDE já não tri-
butam os juros na fonte.
162 Cfr. OCDE, Comentários, art. 11, ,parágrafo 24.
VI"ICap. UI Normas de Reconhecimento de Competência

Nas convenções celebradas mais recentemente, o Brasil admitiu conceder crédi-


tos presumidos (matching credit) 163.

b) Juros de fonte brasileira recebidos por residentes de outros Estados


Nas hipóteses em que o Brasil é o Estado de proveniência dos juros, as Conven-
ções atenuam a dupla tributação por diversas técnicas, conforme quadro abaixo.

JUROS DE FONTE ESTRANGEIRA RECEBIDOS


POR RESIDENTES NO BRASIL

• África do Sul
• Argentina
• Áustria
• Bélgica
• Canadá
• Chile
• China
• Dinamarca
• Finlândia
• França
Imputação ordinária • Hungria
• Israel
• Itália
• Japão
• Luxemburgo
• México
• Noruega
• Peru
• Portugal
• Países Baixos
• Suécia
• Ucrânia

Crédito presumido de 20% • Coreia

1 • Espanha

• Equador
Crédito presumido de 25% • Filipinas

1 • Índia

163 Ver quadra na págiria seguinte.


• I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

JUROS DE FONTE BRASILEIRA RECEBIDOS POR RESIDENTES DE OUTROS ESTADOS

• Bélgica
• Chile
• China
Imputação ordinária • Israel
• Noruega
• Peru
• Portugal
• Ucrânia

• Alemanha
• Canadá
• Corcia
Crédito presumido de 20% • Espanha
• França
• Japão
• Luxemburgo
• Países Baixos
• Suécia

• Áustria
• Dinamarca
• Equador
Crédito presumido de 25% • Filipinas
• Finlândia
• Hungria
• Índia
• Itália
• Tchecoslováquia

Isenção { • Argenti na

SUBSEÇÃO III
ROYALTlES

§ 10 O CONCEITO DE ROYALTIES

A) Generalidades
O conceito de royalties (redevances em francês, canones em castelhano), adotado
pelas convenções contra a dupla tributação, não se identifica precisamente, em todos
-=:===_T~uIO VI I Capo 11 I Normas de Reconhecimento de Competência 16M
os seus contornos, com a noção traçada pelo direito interno. Como já atrás se viuJ64 ,
à luz do direito interno, o royalty é urna categoria de rendimentos que representa a
remuneração pelo uso, fruição ou exploração de determinados direitos, diferencian-
do-se assim dos aluguéis que representam a retribuição do capital aplicado em bens
corpóreos, e dos juros) que exprimem a contrapartida do capital financeiro J65 .
No direito interno, os direitos que dão lugar à percepção de royalties são o di-
reito de colher ou extrair recursos vegetais, inclusive florestais; o direito de pesquisar
e extrair recursos minerais; o uso ou exploração de invenções, processos e fórmulas
de fabricação e de marcas de indústria e comércio; a exploração de direitos autorais,

164 Cfr. supra, 506 sS.


165 Cfr. BÓHME, Die Besteuerung des J(n!JW-how, 1967; }(NOPPE, Die Besteuerung der Lizenz- und
J(nmv-h!JW Tfrtrdge, 1972; KRÓGER, Forschungskosten, Erfmdungen, Lizenzen und Know-
how im Steuerrecht, 1969; C. J. CROWE, Tax treatment of the importation and exportation
of technology - lmow-how, patents, other intangibles and technical assistance, CDFI LX-a
(1975), 1; DAVID J. RACHOFSKy/RICHARD L. GOLDMANN, Tax treatment of the importation
and exportation of technology - know-how, patents, other intangibles and technical assistance,
CDFI LX-a (1975), 141; IFA, The taxation of income derived from the supply oftecnology,
CDFI LXXXII-a (1997), 860; CAPACCIOU, La tassazione delle rederances, Milão 1967; Coc-
co, Regime fiscale delle royalties corrisposte a società straniere, Diritto e Pratica Tributaria I
(1974),838; GAZZERRO, Note sul tratamento fiscale delle "redevances" e "royalties", Rivista
di Diritto Finanziario e Scienza delle Finanze I (1964); GARBARlNO, La tassazione, 369 SS.;
DUCCINI, Approche fiscale des contrats internationaux, 224; DENIS BORGES BARBOSA, TributaçiW
da propriedade industrial e do comércio de tecnologia, São Paulo 1984; GABRIEL FRANCISCO LE-
ONARDOS, TributaçiW da transferência de tecnologia, Rio de Janeiro 1997; FERNANDEZ PÉREZ,
Regimen tributario de dividendos y canones en el marco de los convenios para evitar la doble
imposicion internacional suscritos por Espaiía, in J. VILlA GIL (org.), Relaciones fiscales intema-
cionales, Madrid 1987, 195; PIEDRABUENA RICHARD, Treatment of royalties between developed
and developing countries, BIFD 10 (1973),407; J. SOPENA, La doble imposición intemacional
sobre los contratos de asistencia tecnica, Barcelona 1972; A.!;rEMIR, La tecnología y la empresa
multinacional, in XIX Semana de Estudios en Derecho Financiero, Madrid 1972, 117. Veja-se a
exposição de GILBERTO DE ULHÔA CANTO, Estudos e Pareceres de Direito Tributário, 363 ss., onde
se procura fazer a distinção entre a tranferência dekn!JW-how (realidade mais ampla) e prestação
de serviços de assistência técnica, apenas uma das modalidades pela qual aquela transferência
se processa. Veja-se ainda LUIZ MÉLEGA, Contrato de prestação de assistência técnica, Revista
de Direito Mercantil 19 (1975), 61; ANTÔNIO MARQUES DOS SANTOS, Transferência intemacional
de tecnologia, economia e direito. Alguns problemas gerais, Lisboa 1984; A. J. CARDOSO MOTA,
O know-how e o Direito Comunitário da concorrência, CTF 283/288 (1982), 103; J. M.
OLIVEIRA ANTuNES/I. A. COSTA MANSO, Relações intemacionais e transferência de tecnologia: o
contrato de licença, Coimbra 1993.; MARrA GABRIELA DE O. FIGUEIREDO DIAS, A assistência téc-
nica nos contratos de kn!JW-h!JW, Coimbra 1995; DANIEL VITOR BELLAN, Algumas considerações
sobre a tributação dos royalties pagos a beneficiários residentes ou domiciliados no exterior,
in HELENO TÔRRES (org.), Direito Tributário IntemacionalAplicado, São Paulo 2003, 357; RI-
CARDO PEREIRA RIBEIRO, ROBERTO FRANÇA DE VASCONCELLOS, A transferência internacional de
tecnologia e sua tributação, RDTI 6 (2007), 127; ARISTÓTELES MOREIRA FILHO, A aplicação
do princípio da territorialidade fiscal e o conceito de fonte na tributação da renda auferida
pelo não residente, no Brasil, a partir de operações de transferência de tecnologia, in HELENO
TAVEIRA TÔRRES (org.), Direito Tributário Intemacional Aplicado, vol. V, São Paulo 2008, 193.
• I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier"""

salvo quando percebidos pelo autor ou criador do. bem ou obra (art. 22 da Lei nO
4.506/64; art.' 17, § 10, I;.da Instrução Normativa SRF nO 252/02)166. Abrange, as-
sim, os royalties minerais e vegetais; os royalties industriais e os royalties intelectuaisl67.
" Nas convenções contra a dupla. tributação assinadas pelo Brasil, o conceito de
royalties designa as remunerações de qualquer natureza pagas pelo uso ou pela con-
cessão do US0 168 de direitos de autor sobre obras literárias, artísticas ou científicas
(inclusive os filmes cinematográficos, filmes ou fitas de gravação de programas de te-
levisão ou radiodifusão) - royalties intelectuais -, de patentes, marcas de indústria ou
de comércio; desenhos ou modelos, planos, fórmulas ou processos secretos - royalties
industriais -, bem como pelo uso ou concessão do uso de equipamentos industriais,
comerciais ou científicos e por informações correspondentes à experiência adquirida
no setor industrial, comercial ou científico (art. 12 do Modelo OCDE).
Da comparação de ambos os conceitos ressaltam algumas diferenças a assinalar.
Uma primeira dissemelhanç~ está em que a expressão royalties é utilizada não
apenas.para denominar as remunerações correspondentes às formas de propriedade
industrial (representadas por patentes, marcas, desenhos, modelos, planos, fórmulas
e processos secretos), antes engloba ainda outra realidade ligada à transferência de
tecnologia: a prestação de informações correspondentes à experiência adquirida.
A prestação de informações correspondente à experiência adquirida identifica-se
com o conceito de know-how I69 , ou seja, toda a informação técnica não divulgada,

166 E daí que a Administração Fiscal tenha recusado a aplicação da alíquota reduzida prevista na
anterior CDT com a ·Suécia (hoje revogada) a remunerações a título de assistência técnica.
Cfr.Parecer Normativo CST nO 37/74.
167 Sobre esta terminologia, cfr. PAULO DE PITTA E CUNHA, O tratamento tributário dos rendi-
mentos da propriedade industrial e intelectual, Rr:vista da Faculdade de Direito da Universida-
de de Lisboa vaI. XXII (1970), separata.
168 Distinto do uso ou da cessão do uso é a cessão do próprio direito, frequente em matéria de
patentes. O preço da cessão não tem natureza de royalty, mas de preço, gerador potencial de
ganho de capital. Cfr. OCDE, Comentários (2008), art. 12, parágrafo 8.2; GOUTH!iõRE, Les
impôts, 217. Como muito bem observa PlTTA E CUNHA, "a tributação dos royalties a título de
imposto sobre o rendimento deverá, em rigor, excluir do conceito as modalidades que cons-
tituam remuneração de venda, ·ato que comporta alienação de capital". E observa: "Quando,
porém, na venda de. patentes ou invenções, o preço estipulado, em lugar de ser fIxado numa
soma de dinheiro pagável imediatamente, corresponde a um pagamento em frações suces-
sivas, ou consiste na participação nos lucros da patente ou invenção vendida, verifIcam-se
prestações de caráter periódico ou recorrente, que difIcilmente se distinguem sob o plano da
aparência material, das redr:vances regularmente pagas pela concessão da licença de uso": cfr.
o tratamento tributário, cit., 10. No mesmo sentido, A. MlRAULO, Doppia imposizione, 94;
VALDÉS COSTA, Estudios de derecho tributario internacional, Montevideo 1978, 77 ss. Também
não se caracterizam como royalties os pagamentos para obter o direito exclusivo de distribui-
ção de um produto; visto não corresponderem a uma remarcação pelo uso ou direito de uso.
Cfr. Comentários, art. 12, parágrafo 11 (versão 2008).
169 Sobre a natureza não técnico-jurídica deste conceito, DAVID J. RACHOFSKy/RrCHARD L. GOL-
DMANN,. Tax treatment ofthe iinportation 'and exportation of technology - know-how, pa-
- = : : : = : " T í t u l o VI I ,Capo 11 I Normas de Reéonhecimento'de Competência

suscetível ou não ,de ser patenteada, que seja necessária para a -reprodução 'industrial
de um produto ou processo, diretamente e .sob as mesmas condições (definição da
Association des Bureaux pour la Protection de la Proprieté Industrielte). o que caracte-
riza, :pois,a conven~ão de know~how é o fato de uma das partes fornecer à outra o seu
especial conhecimento e experiência prévios, não divulgados, para que esta o use por
sua própria conta l70 . "

Uma outra diferença, conceitual a assinalar entre o regime interno.e o regime


convencional reside em que asremunerações.devidas pela exploração de jazidas; fon-
tes e outras· riquezas do solo ou das' florestas - royalties minerais e vegetais - não se
configuram como royalties para efeitos do art. 12; antes caem na alçada do art. 6°,
referente à tributação dos lucros imobiliários.
A locação de equipamentos (equipment renting). dá origem ao pagamento de aluguéis
submetidos ao regime do art. 12 do Modelo OCDE, nas suas primeiras versões e em
inúmeras Convenções celebradas pelo Brasil. Mas não assim as prestações que represen-
tem preço de compra (ou aluguel compensável com ela), as quais caem antes noutros
dispositivos çonvencionais, como os atinentes a ganhos de capital ou lucros de empre-
sas l71 •
O caso do leasing suscita dificuldades na separação entre preço de compra e ren-
dimento, pois nessa figma - quando seja estipulada opção de compra - reúnem-se
elementos típicos da locação com ingredientes próprios'da'compra e venda ("contra-
tos mistos"). Todavia, atendendo ao caráter principal do objetivo de locação sobre o
de venda, a Comissão de Assuntos Fiscais da OCDE inclinou-se para a caracterização
como royalties das remunerações pactuadas 172 .

tents, other intangibles and technical assistance, CDFI LX-a (1975), 141 (142); GILBERTO
DE ULHÔA CANTO, Estudos e Pareceres de Direito Tributário, 363.

170 Cfr. VOGEL, Double Taxation, 801. Cfr. OCDE, Comentários, art. lz, parágrafo 11 (2008). A
Convenção com a Argentina refere~se expressamente ao' uso ou concessão de uso de notícias
internacionais; HELENO TÔRRES, in HELENO TÔRRES (codrd. j; São Paulo 2005, 650 ss.
171 OCDE, Comentários, art. 12, parágrafo 9°; VOGEL,:Double TaXation, 789. Recentemente, a
Comissão de Assuntos Fiscais da OCDE afastou,se da orientação do Modelo de 77, sugerindo
que a locação de equipamento deixe de ser equiparada a royalty, devido à preponderância da
sua natureza financeira e à conveniência de não onerar os seus custos com retenção na fonte.
Cfr. GOUTHIERE, Les impóts, 217; RlvIER, Le Droit Fiscal Interizational, 243. Na sequêntia desta
orientação, o Modelo de 1992 exclui expressamente a locação de equipamentos, inclusive de
containers, do conceito de royalty, submetendo tais remunerações ao regime do lucro de em-
presas, constante dos arts. 5° e 7°. Cfr. OCDE, Comentários, art. 12, parágrafo 9". O Brasil
reserva-se o direito de considerar corno royalties os pagamentos por 'transmissão por satélite,
cabo, fibra ótica ou tecnologia similiar. OCDE, art. 12, NMCPositions, parágrafo 10.
172 Cfr. OCDE, Comentários, art. 12, parágrafo 11; OCDE, Trends in International Ta.xation.
The Taxation ofIncome derived from the Leasing ofIndustrial, Commercial and Scientific Equip-
ment, Paris 1985. Em certos casos, o art. 12 poderá aplicar-se à locação de containers rece-
bidos por empresa de navegação para conservação das mercadorias em terra após retiradas
do navio. Todavia, se esta locação for acessória do contrato de transporte marítimo, o ren-
Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier _ ~_ _ _ _ _.;;.:

Fenômeno similar ocorre nos contratos de franquia (franchising), cuja remune-


ração global envolve royalty propriamente dito pela concessão da marca, bem como
preço de serviços prestados 173 •
O âmbito de aplicação do art. 12 não é apenas dado pela definição das realida-
des a que se aplica - os royalties -, mas ainda por um limite de índole diversa, que
mais circunscreve o campo de incidência previamente recortado.
Na verdade, as Convenções só consideram sujeitos ao art. 12 os royalties cujo
quantitativo não ultrapasse o limite fixado at arm)s length, ou seja, aquele que seria
acordado entre o devedor e o credor na ausência de relações especiais entre devedor
e credor e/ou terceiro. O excedente a esse montante, suspeito de evasão fiscal, é
descaracterizado como royalty e excluído da Convenção ou submetido a outro dos
seus regimes (como o dos dividendos), conforme o caso. Justamente observam os
Comentários da OCDE que, no caso de as regras resultantes da respectiva legislação
nacional conduzirem cada um dos Estados contratantes a aplicar um artigo diferente
da Convenção para tributar esse excedente, será necessário recorrer ao procedimento
amigável previsto na Convenção para resolver esse conflito de qualificações l74 •
As Convenções com a África do Sul, o México, o Peru e a Ucrânia contêm cláu-
sula antiabuso segundo a qual as disposições relativas à tributação dos royalties pelo
Estado de fonte deixarão de aplicar-se quando as autoridades competentes acordarem
que os direitos pelos quais se pagam os royalties foram acordados ou estabelecidos
com o principal propósito de tirar vantagem dessas disposições, caso em que serão
aplicáveis as disposições do Direito interno do Estado da fonte.

B) A distinção entre contrato de know-how e de prestação de serviços


Os tratados contra a dupla tributação celebrados pelo Brasil (seguindo neste
ponto o Modelo OCDE) conceituam expressamente como royalties as remunerações
de qualquer natureza pagas "por informações correspondentes à experiência adquiri-
da no setor industrial, comercial ou científico".
É grande a ambiguidade que na doutrina e na legislação comparada rodeia os
conceitos de "contratos de prestação de serviços técnicos", "contratos de assistência
técnica" e "contratos de know-how", todos relacionados com uma ampla e brumosa
noção de "transferência de tecnologia".

dimento deverá ser classificado como lucro sujeito ao regime do art. 8° do Modelo OCDE
(cfr. Comentários de 1977, art. 12, parágrafo 11; OCDE, Trends in International Taxation:
The Taxation of Income derived from The Leasing of Containers, Paris 1985; BAKER, Double
Taxation, 268.

173 Cfr. GABRIEL FRANCISCO LEONARDOS, TributaçiW da transferência de tecnologia, Rio de Janeiro
1997,99 SS.
174 Cfr. OCDE, Comentários, art. 12, parágrafos 25-26.
Título VI I Capo II I Normas de Reconhecimento de Competência I (ti) I

E dizemos ampla e brumosa porque o conceito elástico de "transferência de


tecnologia" tem sido elaborado pela lei para finalidades muito distintas: umas ve-
zes, para disciplinar o regime de remessas cambiais relacionado com investimentos
estrangeiros; outras, para efeitos de legislação antitruste ou de defesa da concor-
rência!7\ outras, ainda, para efeitos tributários, de tal modo que pode afirmar-se,
sem hesitação, que não existe um conceito técnico uniforme que consiga unificar
as diversas acepções em que a expressão tem sido utilizada, tanto no que se refere
ao conceito de "tecnologia" propriamente dita quanto ao que se deva entender por
"transferência"! 76.
Tanto isto é verdade que a clássica trilogia capital embodied, human embodied
e disembodied technology se, do ponto de vista econômico, pode subsumir-se a um
conceito unitário, desdobra-se juridicamente em institutos insuscetíveis de serem re-
conduzidos a um núcleo homogêneo 177 •
O ponto fulcral é a distinção, para efeitos dos tratados, entre, por um lado, os
rendimentos derivados de prestação de informações resultantes de experiência acumulada -
inegavelmente sujeitos a uma retenção definitiva na fonte, ao abrigo do art. 12 das
convenções celebradas pelo Brasil (e correspondente ao art. 12 do Modelo OCDE)
- e, por outro lado, os rendimentos de prestação de serviços, livres de imposto no Brasil,
nos termos do art. 7° das mesmas convenções e do mesmo Modelo.
A distinção entre rendimentos de prestação de informações resultantes de expe-
riência acumulada e rendimentos de simples prestação de serviços, ainda que de con-
teúdo técnico, como os serviços de informática, de engineering ou similares (technical
fies), deve fazer-se em função do objeto do contrato.
O contrato de knlJW-how tem por objeto a transmissão de informações tecnológi-
cas preexistentes e não reveladas ao público, em si mesmas consideradas, na forma
da cessão temporária ou definitiva de direitos, para que o adquirente as utilize por
conta própria, sem que o transmitente intervenha na aplicação da tecnologia cedida
ou garanta o seu resultado I78 .
Ao invés, o contrato de prestação de serviços tem por objeto a execução de serviços
que pressupõem, por parte do prestador, uma tecnologia, a qual porém não se des-

175 Sobre este ponto de vista, no Direito Europeu, veja-se ANTÓNIO JosÉ CARDOSO MOTA, O
know-how e O Direito Comwlitário da concorrência, CCTF 283/288 (1982), 103.
176 Cfr. CABANELLAS DE LAS CUEVAS, Contratos de licencia y de transftrencia de tecnologia en el
derecho prhado, Buenos Aires 1994, 24.
177 Cfr. ANTÓNIO MARQUES DOS SANTOS, Transferência internacional de tecnologia, economia
e direito. Alguns problemas gerais, CCTF 1984, 215. Veja-se ainda MIGUEL TEIXEIRA DE
ABREU, "Royalties" e transferências de tecnologia, Fisco 30 (1991), 23 (24).
J78 Cfr. FRANÇOIS MAGNIN, Know-how et propriété industrielle, Paris 1974; RUGGIERO CAFARI
P ANICO, 11 transftrimento intemazionale di know how, Milão 1985; ALDO FRIGNANI, Factoring,
Leasing, Franchising, Uinture capital, Leveredged by-outj Hardship clause, Countertrade, Cash
and carry, Merchandising, Know how, Turim 1983, 508 sS.
Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

tina a ser transmitida, mas meramente aplicada ao caso' concreto mediante ideias,
concepções e conselhos baseados no estudo pormenorizado de um projeto 179 •
No contrato de know-how, transfere-se tecnologia; no contrato de prestação de
serviços, aplica-se tecnologia. Como bem diz PHlLIP BAKER,' no primeiro ocorresup-
plying know-how, no segundo applying know-how to guide the companyI80.
Assim, por exemplo, num contrato em que uma instituição financeira - cuja ativi-
dade não tem por objeto a produção de bens e serviços de informática - solicita a uma
empresa de consultores que estudem e preparem um programa informático adaptável
às suas necessidades, ela não quer adquirir o conhecimento técnico de como proceder
à elaboração desse programa, mas simplesmente que esse programa se concretiZe.
A distinção entre estas duas modalidades contratuais foi muito bem sublinha"
da por MASSAGUER: "En el contrato de licencia de know how, ellicenciante concede una
autorización para que ellicenciatario explote determinada información técnica secreta que
pertenece ai primero que) atai fin) pone a sua disposición; en el consulting engineering) la
empresa de consultoria usa de tal información técnica) no siempre secreta) de que dispone
para la prestación de un determinado servicio)pero no la pone a disposición dei cliente ni
autoriza sua explotación 181 ".
Em sentido semelhante se pronuncia KLAus VOGEL: "In contrast)the criterion
used to distinguish the provision of know-how from rendering advisory services is the con-
cept of <imparting). An adviser or consultant) rather than imparting his experience) uses
it himself. All that he imparts is a conclusion which he draws - inter alia - from hisown
experience. His obligation to observe secrets) or even his own interest in retaining his <means
ofprodution» will already prevent a consultant from imparting his experience. In contrast
to a person using his own know-how in providing advisory services) agranter ofknow-how
has nothing to do with the use the recipient makes on it) nor he is liable for it182".
Observa, com razão, BRUNO GOUTHrERE que um dos elementos que permite
distinguir os contratos de prestação de serviços dos contratos de know-how reside,na
natureza das informações fornecidas ou utilizadas: se estas são secretas, existe apriori,
transferência de savoirfaire; se, porém, a empresa se limita a utilizar a sua experiência
e os conhecimentos usuais da sua profissão, trata-se, em princípio, da realização de
uma prestação de serviços, submetida ao regime do lucro de empresas 183 .
Dizer-se que uma prestação de serviços de informática, de engineering, de consul-
toria financeira ou empresarial ou assemelhados envolve uma "transferência" de tecno-
logia é tão absurdo como pretender que tem por objeto uma "transmissão de know-how

179 Cfr. Contrats d'engineering, in Commission Droit et Vie des Affaires, Faculté de Droit de Liege,
1964; CABANELLAS DELAS CUEVAS, Contratos de licencia, cit., 19; GABRIEL FRANCISCO LEO-
NARDOS, Tributação da transferência de tecnologia, Rio de Janeiro 1997, 95' ss.
180 Cfr. PHILIP BAKER, Double Taxation, 27.
181 Cfr. J. MASSAGUER, EI contrato de licencia de know how, Barcelona 1989, 70-7I.
182 Cfr. VOGEL, Double Taxation, 790.
183 Cfr. GOUTHIERE, Les impôts, 224-244. Ver também JEAN MARC RIVLER, Le Droit Fiscal Intel·-
national, cit., 242.
~~ulo VI'I Cap." I Normas de Reconhecimento de Competêncià

um contrato pelo qual consultores jurídicos estudem a melhor forma de implàntação


de uma empresa, racionalizem as suas operações do ponto ,de vista fiscal, do controle
de câmbios e do Direito do Trabalho, ou preparem uma fusão ou cisão.
O fato d~ os serviço~ terem conteúdo técnico, por dependerem de c()nhecimen-
tos técnicos 'especializados, não deve, P9is, conduzir âo equívoco de. ver neleS um
veíêulo de trmsferência de tecnologi'a,' para efeitos tributários, muito embora essa
assimilação já tenha sido feita, noutros domínios, para .outros fins, notádarnente da
legislação <:te controle de cãmbios ou dt:defesa clacàncorrêncial84 .
Para efeitos tribut4rios, a remuneração do kn(JlJJ-h(JlJJ é UI1). rendimento de capi-
tal l8 5, ~a vez que retribui ~ capital te~nológi~o, previamente acumulado, que é
posto à disposição do be~eficiário, enquanto a remuneração da prestação de serviços
n~o pessoais é preço pela "venda" do serviço em si mesmO considerado e n~o retri-
buição de Um "fator de produção", de uma "tecnologia", cuja transmissão não é em
si objeto do contrato. . '. .. .'
E dafque" enquanto a contraprestação nos contratos dekn(JlJJ-h(JlJJ reveste a for-
ma de um lump sum 0 11 de um percentual do faturamento, da produção ou do lucro,
a contraprestação nos contratos deprestação de serviços de conteúdo técnico, como
os de engineering, de informatica ou similares; é fixada essencialmente com base no
custo demonstrad~ por critérios relativo~ ao trabalho désenvolvid~, como o número
de horas dispendidas l86 . Um contrato remunerado em função do' número dehoras dis-
pendidas não é, em princípio, uni contrato de knoiv-h(JlJJ, pois o tempo da execução
dos serviços não guarda qualquer relação com o benefício resultante da aquisição de
informações' resultantes' da experiência acumulada. . , . ,,'
Esta' diferença entre knaw-h(JlJJ e prestação de serViços foi, aliás, reconhecida
pelo Comitê de Assuntos Fiscais da OCDE nos comentários à Convenção Modelo
(versão de 2002)187: "In the kn(JlJJ-how contractjone ofthe partieS agrees to impart to
the iJthet; so that he can use them 'for his (JlJJn account)his speCial knowledge ando explrience
which r'emain unrevealed to the publico Itisrecognísed that·the grantoris not requiredto
play any part himselfin the application of the formulas granted to the licensee and that he
does notguarantee the result thereof This type of contrilit thus differs from contrticts for
the provisionof services) in which one ofthe parties undertakes to use the customary skills
of his calling to execute work himselffor the other party. Payments made under the latter
contraets fall under Article 7! " ,

184 Veja-se a crítica ~defillição de "serviço técnicd' preconiza&i pd~ In~t~çãoNo~marlva SRF
nO 252/02, supra, 603 ss. Cfr. ANTÓN10 MARQUÊS DOS SANTOS, Transferência internacional de
tecnologia, economia e direito, CCTF (1984), 228.
185 Cfr. BULHÕES PEDREIRA, Imposto de renda) cit.) 9-6.
186 Cfr. CABANELLAS DE ,LAS CUEVAS, Contratos de licencia) cit.; 466; GOUTHIERE, Les impôts) tit.,
,250; BULHÕES PEDREIRA, Imposto de Renda, .cit" 2-49. . "
187 Cfr. parágrafos 11,1 a l1.4,relativos ao art. 12.
I g I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Os Comentários da OCDE (parágrafo 11.3) indicam os seguintes critérios para


a distinção das duas modalidades contratuais.
"Contracts for the supply of know -how concern information of the kind described in
paragraph 11 that already exists or concern the supply ofthat type ofinformation after
its development or creation and include specific provisions concerning the confidentia-
lity of that information.
"In the case of contracts for the provision ofservices) the supplier undertakes to perform
services which may require the use) by that supplie1; of special knowledge) skill and
expertise but not the transftr of such special knowledge) skill or expertise to the other
party.
«In most cases involving the supply of know-how, there would generally be very little
more which needs to be done by the supplier under the contract other than to supply
existing information or reproduce existing material. On the other hand) a contract for
the performance ofservices would) in the majority of cases) involve a very much greater
level ofexpenditure by the supplier in order to perform his contractual obligations. For
instance) the supplie1; depending on the nature ofthe services to be rendered) may have
to incur salaries and wages for employees engaged in researching) designing) testing)
drawing and other associated activities or payments to subcontractors for the perfor-
mance ofsimilar services".
Exemplos de pagamentos que devem ser considerados como de remuneração de
serviços são os pagamentos por after-sales service, por serviços prestados pelo vende-
dor ao comprador ao abrigo de uma garantia, por pura assistência técnica, por listas
de clientes potenciais especificamente elaboradas para o comprador, por opinião dada
por engenheiro, advogado ou contador ou por conselho prestado, eletronicamente,
por técnicos, para comunicações eletrônicas.
Significa isto que a OCDE qualifica a remuneração dos contratos de prestação
de serviços em geral, não como royalties, mas como lucro de empresa, regulado no
art. 7°188.
E fá-lo com a consequência de recusar o poder de tributar do Estado da fonte,
salvo nas hipóteses em que o prestador de serviços nele disponha de instalação fixa
ou estabelecimento permanente.
Em face do que atrás se expôs, pode concluir-se que os traços distintivos da
convenção de know-how vis a vis do contrato de prestação de serviços são os seguin-
tes: (i) tem por objeto a transmissão de informações, conhecimentos ou experiências
próprias não divulgadas; (ii) o transmitente não intervém na aplicação da tecnologia
cedida, de tal modo que a aplicação das informações pelo cessionário se efetua por
conta própria; (iii) o transmitente não garante o resultado da tecnologia cedida;

188 A versão anterior dos Comentários considerava que se os serviços fossem realizados por
profissionais independentes a remuneração recairia no art. 14. A supressão de referências a
este artigo resulta de sua eliminação no novo Modelo. Cfr. supra, 573.
~í1:ulo VI I Capo 11 I Normas de Reconhecimento de Competência "1-
(iv) a remuneração da tecnologia não se baseia no custo demonstrado em função
de horas de trabalho, mas é fIxada por critérios relacionados com o faturamento, a
produção ou o lucro.

C) A distinção entre contratos de «assistência técnica e serviços


técnicos» e contratos de prestação de serviços

Feita a distinção entre contratos de know-how e de prestação de serviços em


geral, importa agora caracterizar os contratos de "assistência técnica e serviços técni-
cos", que com estes andam por vezes confundidos.
A questão reveste-se da maior relevância, pois os Protocolos de diversas Con-
venções celebradas pelo Brasil, submetem ao regime tributário dos royalties os "ser-
viços de assistência técnica e serviços técnicos", não obstante tais serviços não serem
explicitamente referidos na defInição de royalties dada no art. 12 das Convenções
citadas l89 .
A simples expressão "assistência" revela que a prestação de serviços que é objeto
do contrato em causa não tem caráter autônomo e independente, mas complementar
ou acessório de outra operação, prevista no mesmo contrato ou em contrato separado.
Assim sucede frequentemente nos contratos de venda de equipamentos industriais
ou de bens de capital em geral, que preveem cláusulas relativas ao assessoramen-
to na instalação, montagem e colocação em funcionamento dos bens vendidosl 90 . O
mesmo se aplica à venda de programas de computador para exploração comercial,
que preveem cláusulas relativas ao assessoramento na sua instalação e colocação em
funcionamento dos respectivos procedimentos.
Com efeito, em certos casos, a transmissão da informação resultante de expe-
riência adquirida, que é objeto do contrato de know-how, pode realizar-se instanta-
neamente pela mera cessão de direitos de uso, corporizados em plantas, manuais,
desenhos ou fórmulas l91 .

189 Cfr. GAB~IEt FRANCISCO Lr;ONARDOS, Tributação da transferência de tecnologia, cit., 95 ss. e
210 ss. (Africa do Sul, Argentina, Canadá, c;hile, China, Coreia do Sul, Dinamarca, Equa-
dor, Espanha, Filipinas, Holanda, Hungria, lndia, Israel, Itália, Luxemburgo, México, No-
ruega, Portugal, Tchecoslováquia, Ucrânia). A Convenção com o Peru considera também
abrangidos "os serviços digitais e empresariais, inclusive as consultorias" (Protocolo, item
4). O Brasil reserva-se o direito de incluir estas remunerações no conceito de royalties. Cfr.
OCDE, art. 12, NMC Positions, parágrafo 7°
190 Cfr. CABANELLAS DE LAS CUEVAS, Contratos de licencia y de transferencia de tecnologia en el dere-
cho privado, cit. 18.
191 Cfr. FRANÇOIS MAGNIN,IÚlow-how etpropriété industrielle, Paris 1974,44; CABANEtLAS DE LAS
CUEVAS, Contratos de licencia, cit., 64-65. MAGNIN cita, a tímlo de exemplo, que o know-how
relativo ao reator do avião de combate Mirage m S, fabricado, sob licença da sociedade
francesa Mareei Dassault, pela sociedade suíça Sulzer, estava contido em quarenta caixas de
grande dimensão, contendo 2.000 desenhos reproduzindo partes do reator; 10.000 notas
g I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

N outros casos,· porém, a transmissão da informação não· se esgota na simples


cessão. de direitos; antes exige complementarmente uma atividade continuada de
prestação de serviços, permanente ou periódica, pela qual a informação tecnológica
seja plenamente colocada à disposição do cessionário l92 • Ora, é precisamente nestes
casos que ocorre a figura que os Protocolos atrás referidos designam como "assistên-
cia técnica e serviços técnicos".
Esta relação de complemmtariedade ou instrumentalidade foi bem sublinhada
por FRANÇors MAGNIN, ao observar que "la transmission de t>éxpérience technique d)une
entreprise à une autre n)est pas nécessairement liée au transfert même de la personne ex-
périmentée. fl faut cependant bien observer que cette communication ne peut en principe
avoir lieu au profit des tiers que par le moyen de la prestation de services personnels) àst-à-
dire par ce qu)il est convenu d)appeler t>assistance technique"J93. E adiante: "ce transfert
se réalise normalement) a titre provisoire) dans ie cadre de cc quJil est convenu d)appeler
<l)assistance technique). fl revêt alors un caractêre complémentaire par rapport au transfert
des connaissances et des procédés qui ont été transmis à títre principal au bénéficiaire de
cette assistance. C)est ce que t>on désigne aux Etats-Unis par la nouvelle expression de <show
how» le <show how)venant ainsi compléter le <know-how"'194.
A assistência técnica distingue-se do contrato de prestação de serviços em geral,
pois enquanto neste último caso a prestação de serviços é o objeto principal do con-
trato, no primeiro, a prestação de serviços é meramente instrumental relativamente
ao objeto principal do contrato, que é a transmissão de uma informação tecnológica.
No contrato de prestação de serViços em geral, as partes querem a própria execução
de um determinado serviço e não uma "assistência" na aquisição de uma informação
tecnológica; no contrato de assistência técnica, as partes querem uma informação
tecnológica através da prestação de um serviço complementar ou instrumental 195 •

descrevendo o processo de fabricação das partes do reator; 40.000 desenhos representando


em pormenor as máquinas e instrumentos necessários à sua fabricação; 15.000 documentos
contendo a descrição de aparelhos diversos, indicação do material a utilizar etc. (cfr., K:now-
how et pmpriété industrielle, cit.) 97).

192 Cfr. GILBERTO DE ULHOA CANTO, Estudos e Pareceres de. Direito Tributário, São Paulo 1975,
364; ALDO FRIGNAN1, op. cit., 514. Ver, por último, a exceleme.monografia de MAR1A GABRIE-
LA FIGUElREDO DIAS, A assistência técnica nos contratos de know-how, Coimbra 1995; ANDREA
NOGUEIRA NEVES/FERNANDA JUNQUEIRA CALAZANS, in HELENO TAVEIRA TÔRRES (org.), vol.
III, São Paulo 2005, 763; HELENO TAVElRA TÔRRES, in HELENO TAVElRA TÔRRES (org.), São
Paulo 2005, 649.
193 Cfr. K:now-how et propriété industrielle, cit., Paris 1974,43.
194 Op. cit., 98.
195 VOGEL sublinha a necessidade. de distinguir "between advisory services (. .. ) and the services ren-
dered by the grantor of know,howwhen he does no more than continue to keep the recipient Df the
know -how informed of the most recent developments ,Dfknowledge in the specialist field concemed":
Double Taxations, cit.) 791. Cfr. também ROGER DUCCfNI, Approchejiscale des contrats intema-
tionaux, cit.) 226; Sobre Ipodalidades de assistência técnica, veja-se, JosÉ MANUEL OLIVEIRA
-=====_ Título VI I· Capo 11 1Normas de Reconhecimento de Competência +.iM

Como bem se salienta em parecer da-Administração fiscal espanhola, caracteriza


assistência técnica (na terminologia da lei brasileira) o fato de uma empresa colocar
pessoaliqualificadoà disposição do cliente, qmindo tal seja necessário para, própria a
transferência dos conhecimentos e experiênCias cedidos e não corresponda a. uma
obrigação de fazer que constitua o objeto principal do contrato, Nestes casos; a'em-
presá "não se obriga a: efetuar por meio do seu pessoal os correspondentes serviços,
mas unlcamente a facilitar os conhecimentos necessários c· informações de base l96 ".
No mesmo sentido se inclina a defmição de "assistência técnici", dada, para
efeitos da lei interna, pelo art. 17,§ 10,inCis6 lI, b, da Instrução Normativa SRF
nO 252/02, ~egundo o qual "considera-se assistência técnica a·.~ssessoria permanente
prestada pela cedente de processo ou fórmula secreta à concessionária mediante téc-
nicos, desenhos, estudos, instruções enviadas ao País e outros serviços semelhantes,
os quais possibilitem a efetiva utilização do processo ou fórmula cedida".
Ora, é preCisamente o caráter complementar ou instrumental da assistência téc-
nica relativamente à transmissão da informação resultante de experiência adquirida
que levou os Protocolos relativos a certas Convenções a submeter a respectiva re-
muneração ao mesmo regiille tributário da remuneração da própria transmissão da
informação, ou seja, a equipará-la a royalty.
Mas este mesmo fato, ou seja, a qualificação da rerrmneração por "assistência
ou serviços técnicos", como royalty, por complementariedadeou acessoriedade, leva
também a concluir que somente podem ser qualificados como de "assistênCia e ser-
viços técnicos", para efeitos das Convenções, aqueles contratos que - seja qual for a
sua denominação - tenham caráter complementar ou instrumental de contratos de trans-
ftr~ncia de capital tecnol6gico, não podendo de modo algum abranger os contratos em
que o objeto principal seja a prestação de serviços, ainda que de conteúdo técnico,
pois a remuneração destes não é, por natureza, royalty, mas rendimento de trabalho
autônomo (tratando-se de serviços pessoais) ou preço constitutivo de lucro de em-
presa (tratando-se de serviços não pessoais),
Em suma, só pode falar-se em "assistência e serviços técnicos" (ao menos no
sentido em que a expressão é utilizada pelos Protocolos de aplicação das Conven-
ções ), quando exista um nexo de complementanedade ou instrumentalidade em relação
a uma outra operação que aquela visa a "assistir" e que consista numa transmissão de
know-how em si mesmo considerado l97 .

ANTUNES/JOSÉ ANTONIO COSTA MANso, Relações internacionais e transftrência de tecnologia: o


contrato de licença, Coimbra 1993,67 ss.

196 Cfr. CARMONA FERNÁNDEz/et aI., Fiscalidad de no residentes según la doctrina administrativa,
cit., 274
197 Isto mesmo já foi reconhecido pela Administração fiscal, ao declarar que "não incide o
imposto de renda na fonte sobre os pagamentos a empresa francesa que não possua estabe-
lecimento permanente no Brasil, em decorrência da prestação de serviços técnicos que não
se enquadram no conceito de know-how (Decisão da 9" Região Fiscal, inDOU de 30.12.97),
IM:- Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

D) Computer software

Já nos referimos ao tratamento das remunerações de programa de computador


em face da lei internal98 , pelo que importa agora analisá-las em face das convenções
internacionais.
Os Comentários da OCDE começam por observar que software pode ser descri-
to como um programa, ou série de programas, contendo instruções para um com-
putador requeridos quer para o processo operacional do próprio computador (ope-
rational software) quer para a execução de outras tarefas (application software). Tal
software pode ser transferido através de uma variedade de meios, por exemplo, por
escrito ou por meios eletrônicos, numa fita ou num disco magnético, num disco laser
ou CD-Rom. Por seu turno, pode ser transferido como parte integrante do computer
hardware ou de forma independente disponível para uma pluralidade de hardware.
Acresce que a expressão computer software refere-se simultaneamente ao programa
que é objeto de direitos de propriedade intelectual (copyright) e ao meio no qual o
programa está incorporada, ou seja, a cópia do copyrighted program l99 .
A determinação da natureza jurídica dos pagamentos relativos a programas de
computador resulta, assim, da pluralidade de formas que podem revestir os negócios
jurídicos que os tenham por objeto, tendo em vista a extensão dos direitos adquiridos
pelo transmissário, pelo que importa distinguir aquelas que dão origem a royalties,
nos termos do art. 12 do Modelo OCDE (e das convenções que nele se baseiam),
daquelas cujo pagamento reveste outra natureza.
Tenha-se desde logo presente que a definição convencional de royalties aplica-se
exclusivamente às remunerações pagas "pelo uso ou pela concessão do uso de um
direito de autor sobre uma obra literária, artística ou científica", pelo que não serão
configuradas como royalties remunerações previstas em negócios relativos a compu-
ter software que não tenham por objeto o uso ou a concessão do uso do direito de
propriedade intelectual (copyright). Assim, por exemplo, não configura royalty, mas
rendimento do trabalho independente ou não assalariado, sujeito ao art. 1420°, a re-
muneração pelos direitos autorais explorados diretamente pelo autor ou criador do
bem ou da obra. Por sua vez, constitui rendimento comercial submetido ao art. 7°

cfr. LUCIANA ROSANOVA GALHARDO, Serviços técnicos prestados por empresa francesa e im-
posto de renda na fonte, RDDT 31 (1998),39 ss.

198 Cfr. supra, 515.


199 Cfr. OCDE, Comentários, art. 12, parágrafos 12.1 c 12.2; Roy ROHATGI, Basic Intemational
Taxation, 523 ss.; PAULO CALIENDO, Da tributação do software nos acordos internacionais
contra a dupla tributação da renda, in HELENa TAVEIRA TÔRRES (org.), Direito Tributário In-
temacionalAplicado, vol.lI, São Paulo 2004,387; FRANCISCO DE SOUSA DA CÂMARA, A tribu-
tação dos rendimentos do software obtidos por não residentes, in J. L. SALDfu'lHA Sfu'lCHESj
ANTÓNIO MARTINS (org.), Homenagem a José Guilherme Xavier de Basto, Coimbra 2006, 197.
200 Ou ao art. 7° conforme a mais recente versão do Modelo OCDE, após a supressão do art. 14.
...---------Título
-
VI I Capo 11 I Normas de Reconhecimento de Competência e

o pagamento pela aquisição e distribuição de cópias de programa, sem direito de o


reproduzir201 .
Também não configura royalty a remuneração pela cessão do próprio direito de
propriedade intelectual representado pelo software, caso em que o preço da cessão
não tem natureza de royalty, mas de elemento para o cômputo de um ganho de capi-
tal, sujeito ao art. 13, ou lucro de empresas sujeito ao art. 7°, pois o negócio tem por
objeto a alienação do próprio capital corporizado no direito definitivamente cedido,
não podendo portanto referir-se ao uso dos direitos.
Esta é a orientação da melhor doutrina202 . Esta é também a posição defendida nos
Comentários da OCDE203:
Objeto de royalties são, repita-se, apenas os casos de transmissão parcial de direi-
tos em que é apenas transferido o uso do direito de propriedade intelectual relativo
ao software, como sucede nos casos de licença de uso de direitos, pelos quais o licencian-
te, titular originário ou derivado dos direitos, os coloca à disposição de uma terceira
pessoa, para que esta os utilize para uso próprio ou para comercialização.
Mas já não configuram royalties para efeitos das convenções contra a dupla tri-
butação os pagamentos efetuados em negócio pelo qual alguém adquire de outrem
um software a título de compra e venda. É que também aqui não está em causa o "uso
de um direito" mas a aquisiçtW do objeto sobre que versa o próprio direito (a copy of
the copyrighted program ou program copy). Neste tipo de negócios o adquirente não
adquire do titular do direito de propriedade intelectual a totalidade ou parte dos seus
direitos, para efeitos de "uso" ou "concessão de uso", ao abrigo de um contrato de
licença ou cessão de direitos de comercialização, mas um programa específico para
seu uso pessoal ou profissional. Neste contexto o pagamento reveste a natureza de
rendimento comercial submetido ao art. 7°204.
A razão pela qual os pagamentos pela aquisição de software a pessoas jurídicas
residentes no exterior a título de compra e venda são considerados abrangidos pelo
art. 7° da Convenção Modelo, referente a "lucros de empresas", tal como o preço da
venda de bens e serviços, é que tais pagamentos não configuram em si mesmos "ren-
dimentos", mas receita bruta operacional do vendedor, que pode ou não dar origem

201 Cfr. OCDE, Comentários, art. 12, parágrafo 14.4 (2008).


202 Cfr. PAULO DE PITIA E CUNHA, O tratamento tributário dos rendimentos da propriedade in-
dustrial e intelectual, Revista da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa XXII (1970);
GOUIrIIERE, Les impôts dans les affaires uinternationales, Paris 1992, 217; ANNA MlRAULO, Do-
ppia imposizione internazionale, Milão 1990, 94; V ALDÉS COSTA, Estudios de Derecho Tributario
Internacional, Montevideo 1978, 77 ss.
203 Art. 12, parágrafos 15 e 16.
204 Apenas se deverá acrescentar que os Estados Unidos fizeram uma observação a este comen-
tário (cfr. art. 12, item 29), segundo a qual "in interpreting the definition of'royalty' in para-
graph 2 of the Artie/e, with respect to payments for software, it should be understood that where a
payment for the acquisition ofsoftware for the personal or business use of the purchaser is measured
by reforence to the productivity or use ofsuch software, that payment may represent a royalty under
theArtie/e". OCDE, Comentários, art. 12, parágrafo 29.
"1.1 Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier .,~ '.'_=____. . . .
a lucro do vendedor apurado em face do balanço levantado no seu país de domicí-
lio. Como observa PHILIP BAKER, "expenses incurred in the development of software are
often high; a withholding tax on gross royalties may substancially reduce the profit element
in software sales or licensing". Sendo o negócio relativo, não a mera transmissão par-
cial do direito ao uso, mas à alienação do objeto do próprio direito, em si mesmo
considerado, ele assimila-se a uma "importação mista de bens e serviços", devendo
submeter-se ao regime de "lucro de empresas" do art. 7° das Convenções.
Daqui decorre a consequência de que tais pagamentos não são tributáveis no
Brasil, exceto no caso de os transmitentes de software terem no Brasil um estabeleci-
mento permanente, aos quais tais pagamentos sejam imputáveis.
Os Comentários da OCDE (art. 12, parágrafos 17.1 e seguintes) consideram
que os princípios relativos ao software são também aplicáveis a transação que respei-
tem a outros tipos de produtos digitais, tais como imagens, sons ou texto. Serão, por
isso, considerados royalties os pagamentos feitos pela aquisição do direito de usar um
copyright num produto digital (por exemplo, a aquisição, por um editor, do direito de
reproduzir uma fotografia objeto de copyright para a incluir na capa de um livro).

§ 2° TRIBUTAÇÃO PELO ESTADO DA FONTE

A) Definição de fonte
Posto que as Convenções brasileiras reconhecem sempre ao país da fonte um
direito - ainda que limitado - de tributação, tornou-se necessário incluir uma dispo-
sição que expressamente determinasse qual o lugar da fonte dos royalties.
A regra geral é a de que os royalties têm a sua fonte no Estado em que o seu
devedor tiver residência (ou, claro, no Estado, sua subdivisão política ou autoridade
local que for o próprio devedor)205.
, Todavia, ao invés do que sucede para definir a competência do Estado da residên-
cia, as Convenções admitiram que os royalties podem ter a sua fonte num determinado
Estado - ainda que o seu devedor seja residente em terceiro país (ou no outro Estado
contratante), mas possua nessse Estado um estabelecimento permanente, ao qual seja
imputável a obrigação de os pagar. É, por exemplo, o caso de sociedade argentina que
possua no Brasil uma filial, à qual seja imputável a obrigação de pagar royalties a uma
sociedade domiciliada na França. Neste caso, considera-se que os royalties têm a sua fonte
no Brasil, o qual poderá tributá-los nos termos da Convenção celebrada com a França.

205 A Convenção com a Argentina considera provenientes deste país os royalties, quando no seu
território sejam colocados ou utilizados economicamente os bens cuja cessão os origina (cfr.
Protocolo, item 8), em virtude de a lei argentina adotar como elemento de conexão afonte
de produção da renda.
- = : = : : = ! í t u l o VI 1 Capo ,11·1 Normas de Reconhecimento de Competência 'M.
Por outras palavras: enquanto para definir o poder do Estado da residên-
cia as Convenções exigem a residência do beneficiário, não se bastando com o
estabelecimento permanente, já para definir o Estado da fonte as Convenções
usam, como elementos de conexão ahernativos, a residência e o estabelecimento
permanente ..

B) Os limites do poder de tributar do Estado da fonte


Uma vez definida a fonte dos royalties, importa analisar os limites que as Con-
venções traçam ao poder de tribUtação do Estado em, que ela se situa e que respeitam
à alíquota do imposto de \enda retido na fonte.
No que tange à alíquota do imposto de renda na fonte, as Convenções pre-
veem, viá de regra, um'alimitação da 'alíquota aplicável. Esta limitação não é nem
geral, nem uiliforme; antes varia conforme as categorias de rendimentos e os países
em causa. Um exame comparativo das diversas Convenções e das respectivas porta-
rias de aplicação revelam que (embora nem sempre) as alíquotas variam conforme
os royalties respeitem a (i) direitos de autor, (ii) flimes, (iii) marcas de indústria ou
comércio, (iv) outros royalties (v) ou ao caso especi;U de royalties pagos a sociedades
controladoras206 •
Apenas três observações em matéria de limitações de alíquota: uma para subli-
nhar que, nas hipóteses em que se denegou o direito a alíquota reduzida a royalties
pagos por residentes no Brasil a pessoas jurídicas no exterior, que detenhamo seu
controle direto ou indireto (caso da Dinamarca), as portarias de aplicação do respec-
tivo regime entenderam já existir controle'desdé que a sociedade em causa detenha
pelo menos 50% do capital com direito a voto. Trata-se de fruto de errônea interpreta-
ção do conceito de controle constante da lei interna brasileira, que se identifica com
o de maioria do capital votante, pelo que semelhante noção não poderá ser aplicada
fora do seu círculo específico de incidência.
Outra breve anotação para recordar que, na Convenção com a Espanha, se ad-
mitiu uma cláusula de nação mais favQrecida em matéria de redução de alíquotas.
Nos te~mos dessa cláusula (Protocolo, item 4),'na eventualidade de o Brasil, após a
assinatura da presente Convenção, reduzir o imposto sobre os royalties menCionados
no § 2°, b, do art.,l2, pagos por um residente doBrasil a um residente de um terceiro
Estado não localizado na América Latina, uma redução igual será automaticamente
~piid~ei a~ m;,posto 'sob~~ os royaltÚs pago~ a um resicient~ da Espanha que se e~­
contre em condições similares. ' ' ~

206 A alíquota normal, que hoje éde15%, era de 25% à época em que as mais antigas Conven-
ções foram celebradas.
I o I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Pagos a
Direitos
Filmes Marcas Outros controla-
de autor
dores
África do Sul 10 10 15 10 10
Argentina .. * * * *
Áustria 10 25 25 15 15
Bélgica 10 10 20 15 15
Canadá 15 15 25 15 25
Chile 15 15 15 15 15
China 15 15 25 15 15
Coreia 15 15 25 15 15
Dinamarca 15 15 25 15 25
Equador 15 15 25 15 15
Espanha 10 10 15 15 15
Filipinas 15 25 25 15 15
Finlândia 10 10 25 15 15
França 10 10 25 15 15
Hungria 15 15 25 15 15
Índia 15 15 25 15 15
Israel 10 10 15 10 10
Itália 15 15 25 15 15
Japão 15 15 25 12,5 12,5
Luxemburgo 15 25 25 15 15
Peru 15 15 15 15 15
Noruega 15 15 15 15 15
Portugal 15 15 15 15 15
Países Baixos 15 15 25 15 15
Suécia 15 15 25 15 15
Tchecoslováquia 15 15 25 15 15
Ucrânia 15 15 15 15 15

* sem limite

Cláusula similar se encontra nas Convenções com o México (Protocolo, item 5)


e Israel (Protocolo, item 2), sendo, porém, que a primeira não prevê a ressalva de o
terceiro país se localizar na América Latina.
VI I Capo II I Normas de Reconhecimento de Competência M'-
Uma última observação para anotar que, em matéria de películas cinematográfi-
cas 207 - apesar da redução convencional das alíquotas -, certas portarias de aplicação
preveem a retenção na fonte à alíquota normal de 25% com direito a restituição
posterior (veja-se a Portaria nO 92, de 15 de fevereiro de 1978, relativa à Convenção
com o Japão).

§ 30 TRIBUTAÇÃO PELO ESTADO DA RESIDÊNCIA

A questão de saber, em teoria, qual o Estado com maior legitimação para tri-
butar os royalties, tem sido objeto de sérias discussões, em que prevalecem razões
ligadas à defesa dos interesses dos diversos países ou grupos de países em causa. Do-
mina hoje a ideia de que o país de residência do credor dos royalties tem direito à sua
tributação, limitando-se a discussão ao problema de saber se esse direito tem caráter
exclusivo, ou se se deve admitir uma tributação, embora limitada, pelo país da fonte,
ou seja, da residência do devedor208 .
O Modelo OCDE orientou-se no primeiro sentido, preconizando no art. 12
que os royalties provenientes de um Estado contratante e pagos a uma pessoa residen-
te no outro Estado contratante só neste último são tributáveis. E daí que numerosos
países-membros (seguindo, de resto, a posição da Convenção Modelo das Nações
Unidas) tenham expressamente formulado reservas ao mencionado artigo, por não
poderem renunciar ao direito de tributar - embora dentro de certos limites - os royal-
ties cuja fonte neles se encontre situada209 •
Nas Convenções celebradas pelo Brasil, foi erigido em princípio que o fato de
o país da residência ter direito à tributação dos royalties não excluía o direito à tribu-
tação na fonte do país da origem do rendimento. Toda a sistemática das Convenções
brasileiras, neste particular, articula-se em torno da necessária harmonização das duas
pretensões em concurso.
Importa ter presente que, à semelhança do que em matéria de juros sucede, só
recaem sob o âmbito de aplicação das Convenções, as pessoas, físicas ou jurídicas,
residentes nos Estados contratantes. Mas já se não beneficiam do regime convencional
as pessoas residentes em terceiros países que se limitem a possuir num dos Estados
contratantes um estabelecimento permanente, como uma filial, ainda que os royalties
a este estejam efetivamente conexos.

207 O Parecer Normativo nO 175/73 equipara a filmes os videotapes importados.


208 Sobre as razões aduzidas de um e outro lado, veja-se o brilhante ensaio de EGBERTO LACER-
DA TEIXEIRA, Regime jurídico-fiscal da tecnologia estrangeira no Brasil, Revista Forense 244
(1973),346 (346 ss. e 352). Para referências ao direito comparado, cfr. C. J. CROWE, Tax treat-
ment ofthe importation and exportation oftechnowgy, 10 SS.; ENRIQUE PIEDRABUENA RrCHARD,
Treatrnent of royalties between developed and developing countries, BIFD 10 (1973), 407.
209 Ver a lista das reservas em OCDE, Comentários, art. 12, parágrafos 31 e ss.
e I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier.

As Convenções assinadas pelo Brasil; que já tomaram em consideração a versão


do Modelo OCDE de 1977 - exigem que o titular dos royalties residente num Estado
contratante seja também o seu beneficiário efttivo.
, Trata-se de preceito que visa a evitar mecanismos de treaty shopping através da
interposição de meros intermediários, agentes, nominees ou conduit companies.

A) Exceção de estabelecimento permanente


O direito à tributação do país da residência comporta apenas uma exceção. É o caso
de o beneficiário dos myalties, residente num dado Estado, possuir nó outro Estado de
que eles provêm üm estabelecimento permanente ao qual estejam ligados efetivamente
o direito ou bem que deu origem aos riryalties. Neste caso, o myalty emcabsa segue o
regime do art: 7°, ou seja, pa.ssaa ser considerado lucro do estabelecimento estável e tri-
butado em conformídade (reserva de estabelecimento estável) Betriebstiittenvorbehalt).
Note-se que as Convenções, ao aludirem à conexão efttiva, reiteram o princípio
da assimilação dos estabelecimentos permanentes a empresas independentes, com
o consequente repúdio da doutrina da força atrativa. Assim, 'se um residehte num
Estado perceber royalties proveniéntes de outro EstadO onde possua um estabeleci-
mento permanente, mas ao quil tais 'Yoyalties não sejam imputáveis, será tributado
pelo Estado da sua residência.
O texto do Modelo OCDE, na versão de 1977, assimilou a este caso a situação
em que um profissional liberal exerça' atividade no outro Estado através de· instalação
fLxa, à qual estejam conexos os direitos, caso em que se aplicaria o art. 14, que serefere
às profissões independentes (ou o art. 7, relativo aos lucros de empresas); Embora as
Convenções brasileiras nem sempre aludam expressamente a esta simação, julgamos que
a interpretação sistemática dos seus dispositivos já consente a mesma conclusã02 lO •

13) Regime de atCnua~ão'

'Para atenuar a dupla tributação sobre os royalties, decorrente do fato de estes já


haverem sido tributados na fonte, os Estados de residência adotam, em princípio, o
método da imputação.
Dois países preveem um tratamento diferenciado, consoante os royalties sejam per-
cebidos por sociedades que detenham até 50% do capital da sociedade pagadora ou mais
do que essa percentagem, atribuindo um crédito superior, na primeira hipótese, para con-
trabalançar o ônus adicional decorrente do regime da indedutibilidade211 : a Áustria isenta

210 Cfr. OCDE, Comentários, art. 12, parágrafos 4 e 4.1.


211 ,Que entre nós vigorou até a.Lei nO 8.383/91. Veja-se,por exemplo, o art. 12, § 4°, da Conven-
ção com a China.
VI ,,"Cap.'1I1 Normas de Reconhecimento.de Competência M'?_
os rvyalties abrangidos na primeira hipótese e concede um crédito de 25% nas outras; os
Países Baixos outorgam um crédito de 25%, na primeir~, e de 20%, na segunda.
. \ .. . . , .: " '. • ", '<1 ,(

1'; .

a) Royalties de fonte estrangeira recebidos por residentes no Brasil


Nas hipóteses em que o Brasil é o Estado da residência cio titular dos rvyalties, o mé-
todo geralmente adotado é o.da imputação ordinária, segundo o qual será deduzido do
imposto brasileiro incidente sobre os rendimentos desse residente um montante igual ao
imposto sobre a renda pago no outro Estado contratante. Todavia, o montante deduzido
não poderá exceder a fração do imposto sobre a renda, calculado antes da dedução, cor-
respondente aos rendimentos que podem ser tributados no outro Estado contratante.
Nas Convenções celebradas mais recentemente, o Brasil admitiu conceder cré-
ditos presumidos (matching credit). < '

ROYALTIES DE fONTE ESTRANGEIRA RECEBIDOS


POR RESIDENTES NO BRASIL

• África do Sul
• Argentina
• Áustria
• Bélgica
• Canadá
• Chile
• China
• Dinaolarca
• Finlândia
• França
Imputação 'ordinária • Hungria
• Israel
• Itália
• Japão
• Luxemburgo
". México
• Noruega
• Peru
• Portugal
• Países Baixos
• Suécia
• Ucrânia

Crédito presumido de 20% { ,. Corei a

• Equador
• Espanha
Crédito presumido de 25% • Filipinas
1 ,• índia
I _ I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

b) Royalties de fonte brasileira recebidos por residentes de outros Estados

Nas hipóteses em que o Brasil é o Estado de proveniência dos royalties, as Con-


venções atenuam a dupla tributação por diversas técnicas, conforme quadro abaixo.

ROYALTIES DE FONTE BRASILEIRA RECEBIDOS POR


RESIDENTES DE OUTROS ESTADOS

• África do Sul
• Chile
• China
Imputação ordinária • Israel
• Noruega
• Peru
• Portugal
• Ucrânia

• Alemanha
• Canadá
• Coreia
Crédito presumido de 20% • Espanha
• França
• Japão
• Países Baixos

• Áustria
• Dinamarca
• Equador
• Espanha
• Filipinas
• Finlândia
Crédito presumido de 25% • Hungria
• .Índia
• Itália
• Luxemburgo
• Países Baixos (*)
• Suécia
• Tchecoslováquia

• Áustria (*)
Isenção {
• Argentina

(*) Regime previsto para royalties pagos a sociedade que detenha no mínimo 50% do capital da so-
ciedade que paga os royalties, desde que estes sejam indedutíveis.
......_ _ _ _ _ _ _ _ _ . Título VI I Capo 11 I Normas de Reconhecimento de Competência I• I

SEÇÃO IV
RECONHECIMENTO DE COMPETÊNCIA EXCLUSIVA
PRIMÁRIA DO ESTADO DA FONTE

§ 1° REMUNERAÇÕES E PENSÕES PÚBLICAS

Vigora a regra geral (art. 19 do Modelo OCDE) da tributação exclusiva no Es-


tado da fonte quanto às remunerações pagas por entidades públicas a pessoas físicas,
em consequência de serviços prestados no exercício de funções públicas, sejam os
pagamentos periódicos ou não (lump sum)2J2.
Deve, porém, observar-se que o preceito não se aplicará se a entidade pública
pagadora atuar, em termos empresariais, ao abrigo do direito privado, e se a pessoa
em causa prestar serviços que não possam caracterizar-se como função pública, caso
em que se aplicarão os arts. 15,16 e 18 (ver, por exemplo, art. 19, § 3°, da Conven-
ção com a Espanha, e o art. 19, § 3°, da Convenção com Portugal)213'214.
Também não é relevante que o pagamento seja efetuado pelo próprio Estado ou
por qualquer outra entidade.
A regra da tributação exclusiva na fonte sofre, porém, algumas exceções. Assim,
certas Convenções não reconhecem tal exclusividade no caso de os serviços serem
prestados no outro Estado e o beneficiário do pagamento ser residente nacional do
outro Estado, ou apenas residente deste Estado - desde que não tenha adquirido a
qualidade de residente com a única finalidade de prestar aqueles serviços. Cessando
a regra da tributação exclusiva na fonte, as soluções podem variar: umas Convenções
reconheceram o direito exclusivo do outro Estado (da nacionalidade, residência ou
emprego); outras admitiram o direito concorrente de ambos os Estados.
Certas Convenções tratam separadamente os pagamentos governamentais com
a natureza de pensões: tais pensões só são tributáveis no Estado da fonte (Estado
pagador), salvo se o beneficiário for residente e nacional do outro Estado. Mas a este
regime fazem exceção as pensões de previdência social que apenas são tributadas no Estado
da residência do beneficiário ou no Estado de proveniência dos fondos.

212 Cfr. OCDE, Comentários, art. 19, parágrafo 5.l.


213 efr. HOHN, Doppelbesteuerungsrecht, 207.
214 Sobre a commercial activities exemption, efr. BAKER, Double Taxation, 337.
CAPÍTULO III
NORMAS DE LIMITAÇÃO DE COMPETÊNCIA

No capítulo anterior, debruçamo-nos sobre as normas de reconhecimento de


competência a um ou a ambos os Estados em presença. Resta agora examinar o
problema logicamente subsequente que se suscita quando, determinado um caso
de competência cumulativa, se torna necessário limitar o exercício dessa competência
com vista a eliminar ou atenuar o efeito do concurso de pretensões em que a dupla
tributação consiste. Como vimos, há normas de limitação de competência que se
dirigem ao Estado da residência e há normas de limitação de competência que se
dirigem ao Estado da fonte. Vamos estudá-las separadamente.

SEÇÃO I
NORMAS DE LIMITAÇÃO DE COMPETÊNCIA DIRIGIDAS
AO ESTADO DA RESIDÊNCIA

É hoje opinão geral que o ônus da eliminação da dupla tributação incumbe


basicamente ao país da residência. O país da fonte deve limitar-se, além da redução
de aliquotas em casos especiais (dividendos, juros e royalties), a respeitar escrupulosa-
mente o princípio da territorialidade, na sua acepção de princípio da fonte e a adotar
definições claras dos elementos de conexão, sobretudo a de estabelecimento perma-
nente, que não contribuam para a formação de cúmulos de pretensões.
E como pode o país da residência proceder para esse efeito? Essencialmente por
dois métodos distintos: o método da isenção (tradicionalmente adotado pelos países
do continente europeu) e o método da imputação (da preferência dos países anglo-
saxônicos) I.

1 Cfr. o esrudo fundamental de A. PHILIPP, Befreiungssystem mit Progressionsvorbehalt und Anre-


chnungsveifahren, Viena 1971; FLlCK, Methoden zur Ausschaltung der internationalen Doppel-
besteuerung bei den direkten Steuern, Finanz Archiv 21 (1961), 86; FELIX ESCHER, Die Metho-
den zur Ausschaltung der Doppelbesteuerung, Berna 1974; JÓRG MóssNER, Die Methoden zur
Vermeidung der Doppelbesteuerung - Vorzüge, Nachteile, akruelle Probleme, in K. VOGEL
qpm I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Note-se ainda que os referidos métodos são aplicáveis não só no campo dos
impostos sobre a renda e o capital, mas também em matéria de impostos sobre
transmissões a título gratuito (sucessões e doações), sendo ambos indiferentemente
recomendados pelo Modelo OCDE, referente a estes tributos (arts. 23-A e 23-B)2.
A obrigação do Estado de residência de aplicar os métodos da isenção ou da im-
putação existe em todos os casos em que wn dado rendimento "possa ser tributado
pelo Estado da fonte de acordo com as disposições da Convenção".
Esta obrigação pode suscitar, porém, conflitos de qualificação.
Se tais conflitos resultam de uma qualificação dada a um rendimento pela lei
interna do Estado da fonte distinta da que lhe daria o Estado da residência, este úl-
timo deve respeitar a qualificação do primeiro, considerando que o rendimento foi
tributado "de acordo com as disposições da Convenção".
Mas já assim não sucede se o conflito de qualificação resulta de o Estado de resi-
dência entender que o Estado da fonte interpretou equivocadamente uma disposição
convencional, tributando um rendimento que não estaria autorizado a tributar, caso
em que o Estado da residência não é obrigado a aplicar os métodos do art. 23, por

(org.), Grundfragen, Colônia 1985, 135 ss.; SCHAUMBURG, Internationales Steuerrecht, Colô-
nia 1993, 439 ss. Existe ainda um terceiro sistema que, porém, não tem hoje aplicação práti-
ca: é o método da divisão do produto. Segundo ele, apenas um dos Estados cobrará o tributo
na sua totalidade, procedendo em seguida à repartição com o outro Estado. Este método
pressupõe situações de vinculação a uma soberania comum ou uma relação de dependência
estreita, como no caso dos protetorados. Segundo TlX1ER/KEROGUES, Droit fIscal Internatio-
nal, Paris 1974, 130, este sistema vigorou no Tratado austro-alemão, de 23 de maio de 1922
(art. 3°), bem como nas relações entre a França e os Estados da África francófona. E ainda
vigora nas relações entre a França e a Suíça no que respeita aos trabalhadores fronteiriços.
Cfr. GOUTHIERE, Les impôts dans les affaires internationales, Paris 1991, 103 e 423. Cfr. ainda,
sobre o tema, J. M. CALDERÓN CARRERO, La doble imposiciôn internacional y los metodos para su
eliminación, Madrid 1997; MERCEDES FusTER GóMEZ, La doble imposiciôn internacional en las
inversiones directas en el exterior de empresas espanolas, Madrid/Barcelona 2001; ALEGRIA BOR-
RÁs, La doble imposición: problemas jurídico-internacionales, Madrid 1974, 69; EDUARDO ABRIL
ABADIN, Metodos para evitar Ia dobIe imposición internacional, in XX Semana de Estudios
de Derecho Financiero, Madrid 1973, 131; FELIX DE LUIS, Los metodos para evitar la doble
imposicion internacional, in J. VILLA GIL (org.), Relaciones fiscales internacionales, Madrid
1987, 289; BÜHLER, Principios de Derecho Internacional Tributario (trad.), Madrid 1968, 257;
a ampla exposição de M. PIRES, Da dupla tributacão jurídica internacional sobre o rendimento,
Lisboa 1984, 323 ss., sobre as vantagens e inconvenientes, do ponto de vista econômico e
financeiro, dos diversos métodos; ANTÓNJO MANUEL CARDOSO MOTA, A eliminação da du-
pla tributação internacional, CTF 157/158 (1972), 57 (especialmente 64 55.); DORNELLES,
A dupla tributação internacional da renda, Rio de Janeiro 1979, 11 ss.; B. PLAGNET, Droit
Fiscal International, Paris 1986, 57 ss.; VITOR FAVEIRO, Noções fondamentais de Direito Fiscal
português, I, Coimbra 1984, 655 ss.; CARLOS LOUREIRO, Problemas de eliminação da dupla
tributação - métodos de atenuação, Fisco 29 (1991), 25; JosÉ SILVA JORGE, Problemas de
eliminação da dupla tributação - métodos de atenuação, Fisco 29 (1991), 28 ss.

2 Cfr. GUY GEST/GILBERT TIXlER, Droit Fiscal International (2 a ed.), Paris 1990, 415; GOUTHIERE,
Les impôts, 471. OCDE-ISD, Comentários, art. 9°, parágrafos 1 e ss.
Título VI I Capo 111 I Normas de Limitação de Competência M,"
considerar que o rendimento em causa não foi tributado "de acordo com as disposi-
ções da Convenção"3 .

§ 10 MÉTODO DE ISENÇÃO

O método da isenção (Befreiungsmethode) Freistellungsmethode) apportionment) ,


como o próprio nome sugere, consiste em isentar do imposto devido no país da
residência os rendimentos de fonte estrangeira.

A) Exclusão de competência e isenção

Conforme já se deixou sublinhado4, as Convenções contra a dupla tributação


contêm normas cujo objeto consiste em atribuir competência exclusiva para tributar
certa situação apenas a um dos Estados em presença (shall be taxed only.. .).
Ora, tais normas operam por duas formas distintas: para a ordem jurídica desig-
nada como aplicável, elas traduzem-se num reconhecimento de competência exclusiva,
enquanto para a ordem jurídica declarada inaplicável traduzem-se numa exclusão da
competência. ALEGRIA BoRRAs refere-se a uma formulação positiva (ou método da
atribuição) e a uma formulação negativa (ou método da isenção em sentido estrito)5 .
Também MANUEL PIRES atribui preponderância à identidade dos objetivos das nor-
mas que reconhecem a competência exclusiva e das medidas estatuindo a isenção,
para lhes reconhecer idêntica natureza6 •
A verdade, porém, é que não devem confundir-se juridicamente os dois fe-
nômenos: a isenção pressupõe a competência de um dado Estado, representando um
limite (logicamente subsequente) ao exercício efetivo do poder de tributar; ao
invés, a exclusão de competência coloca-se em momento prévio, suprimindo pela
raiz o poder de tributar de um dos Estados em causa. Assim, em rigor, a figura
da isenção só cabe nos casos em que ocorre competência cumulativa, não nos casos

3 Cfr. OCDE, Comentários, art. 23, parágrafos 32.1 ss. Um bom exemplo desta última situação
é dado pela posição do Brasil, ao pretender tributar na fonte as remunerações de serviços,
contra o disposto no art. 7° das Convenções. Neste caso os Estados de residência dos presta-
dores de serviços não seriam obrigados a conceder a isenção ou o crédito, por considerarem
que o rendimento não foi tributado no Brasil "de acordo com as disposições da Convenção".
Este conflito de qualificação redundará, pois, numa dupla tributação. sobre os conflitos nega-
tivos, cfr. Comentários, art. 23, itens 56.1 a 56.3.
4 Cfr. supra, 41 ss. e 547 sS.
5 Cfr. A. BoRRÁs, La doble imposición, 71.
6 Cfr. Da dupla tributação) 331. Mas já concordamos com o autor, quando este sustenta que
as isenções previstas nos tratados são verdadeiras isenções e não casos de não incidência. Cfr.
op. cit., 349 sS.
I ~ I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

em que a competência é atribuída em termos exclusivos. Que a isenção pressupõe


a competência, sendo por isso conceitualmente distinta, prova-o claramente a
figura da isenção com progressividade, em que a competência tributária se exerce
efetivamente.

B) Isenção integral e isenção com progressividade

O método da isenção comporta duas modalidades: ou o rendimento não é tido


em consideração seja para que efeito for - e temos a isenção integral; ou o rendimen-
to, apesar de não ser tributado, é tomado em consideração, conjuntamente com os
de produção interna, para o efeito de determinar a alíquota progressiva aplicável à
renda global - e temos a isenção com progressividade, isenção qualificada ou método da
alíquota efetiva? É claro que este método só é relevante caso o imposto no Estado da
residência tenha caráter progressivo e não proporcional.
A "reserva de progressividade" (Progressionsvorbehalt) prevista no § 3° do art.
23 A do Modelo OCDE visa, pois, a evitar que a exoneração dos rendimentos de
fonte estrangeira limite a progressividade do imposto, colocando em situação de
desigualdade, menos favorável, contribuintes cuja única fonte de rendimentos seja
doméstica.
O método da isenção integral é previsto por alguns países no que concerne à ge-
neralidade dos rendimentos tributados no Brasil: é o caso do método da isenção com
progressividade consagrado por diversos Estados contratantes quanto à generalidade
ou quanto a certos rendimentos tributados no Brasil (com exceção de juros, royalties
e dividendos); é o caso da Áustria, da Bélgica, da França, da Hungria, de Israel, do
Luxemburgo, do México, da Noruega e de Portugal e Ucrânia.
Este último método foi também por vezes escolhido para atenuar a dupla impo-
sição dos dividendos distribuídos por sociedades residentes no Brasil, ou percebidos
no Brasil por sociedades residentes no exterior, como, em lugar próprio, se viu.

7 Cfr. HELENO TÔRRES, Pluritributação internacional sobre as rendas de empresas, São Paulo
2001, 433 ss.; J. VAN HooRN, Unilateral relief for international double income taxation
in The Netherlands, British Tax Repiew 2 (1976), 84 (85 ss.); KNECHTLE, Grundfi'agen
des Internationalen Steuerreehts, Base! 1976, 80; SCI-IAUMBURG, Internationales Steuerrecht,
Colônia 1993, 443. Fala-se de negatipe exemption ll'ith progression quando as perdas incor-
ridas no exterior são levadas também em conta para determinar a alíquota aplicável. Cfr.
BAKER, Double Taxation Agreements and International Tax Law, Londres 1994 (cit. Double
Taxation), 360 ss.; GOUTHIi,RE, Les impôts, 106; HELMUT KRABBE, Verlustberücksichtigung
bei Auslandseinkunften, in K. VOGEL (org.), Grundfragen, 1985,79; MÓSSNER,DieMeth-
oden, 149 ss.; TrLL\1ANS, in MÓssNER/et aI., Steuerrecht international tdtiger Unternehmen,
Colônia 1992, 123 (174).
Título VI I Capo 111 I Normas de Limitação de Competência Ig I

C) Isenção e dupla não tributação

Até muito recentemente 8 era preponderante a opinião segundo a qual a não


tributação pelo Estado que pratica o "método da isenção" não depende do fato de o
outro Estado ter efetivamente tributado o rendimento em causa (como ocorreria na
cláusula subject to tax). Basta que para tanto tenha poderes, para tanto, "de acordo
com as disposições desta Convenção" (art. 23-A, § 1°, do Modelo OCDE), sendo
irrelevante o seu não exercício efetivo, seja por ausência de previsão normativa, seja
em decorrência da atribuição de incentivos fiscais9.
A verdade, porém, é que a nova versão do art. 23-A da Convenção Modelo,
adotada em 2000, passou a consagrar um novo § 4°, segundo o qual "as disposições
do parágrafo 1° não se aplicarão ao rendimento obtido ou ao capital possuído por
um residente de um Estado Contratante quando o outro Estado contratante aplicar
as disposições da Convenção para isentar referido rendimento ou capital ou aplicar a
disposição do § 2° dos arts. 10 ou 11 ao referido rendimento".
Trata-se de disposição sugerida pelo Modelo aos Estados que pretendam pros-
seguir uma política no sentido de evitar o fenômeno da dupla não tributação 1o • O
alcance de referido § 4° está em exonerar o Estado da residência do dever de reco-
nhecer a isenção quanto a certos rendimentos numa dupla hipótese: a de o Estado
da fonte interpretar as disposições do tratado no sentido de que este não lhe atribui
competência tributária (caso em que esta seria "devolvida", a título subsidiário, ao
Estado de residência) e a hipótese de o Estado da fonte aplicar a certos rendimentos
(juros e dividendos) alíquotas reduzidas de retenção na fonte I I.
Até o momento o Brasil não adotou esta cláusula em nenhuma das suas Con-
venções, em razão de ter formulado ressalva expressa quanto a esta cláusula, embora
na sua qualidade de Estado não membro da OCDE.
Note-se que o novo § 4° do art. 23 apenas se aplica à dupla não tributação em
razão de conflitos de interpretação ou qualificação, mas não assim à dupla não tri-
butação por razões de lei interna. Quanto a esta modalidade, a orientação da OCDE
manteve-se inalterada no sentido que a obrigação de reconhecer a isenção, por parte
do Estado de residência, depende apenas da existência de uma competência tributária
do Estado da fonte, ainda que esta não tenha sido exercida efetivamente, pelo fato de
suas leis internas não tributarem aquele rendimento.
O § 34 dos Comentários aos arts. 23-A e 23-B do Modelo OCDE manteve-se
inalterado, como segue:
"The State of residence must accordingly exempt income and capital which may be
taxed by the other State in accordance with the Convention whether or not the right
to tax is in effect exercised by that other State. This method is regarded as the most

8 1999, data da publicação do OECD Partnership Report.


9 Cfr. M. PIRES, Da dupla tributaçiW, 341.
10 Cfr. supra, 30. Cfr. MICHAEL LANG, Avoidance ofDouble Non-Taxation, Viena, 2003.
II Ver OCDE, Comentários, arts. 23-A e 23-B, novos §§ 32.6, 32.7, 56.1, 56.2 e 56.3.
M"M Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

practical one since it relieves the State ofresidence from undertaking investigations of
the actual taxation position in the other State".
Foi precisamente em relação a uma situação de dupla não tributação por razões
de lei interna que se suscitou o único caso sobre o qual o Fisco brasileiro se manifes-
tou expressamente.
A questão surgiu a respeito da interpretação do § 4° do art. 23 do Tratado en-
tre o Brasil e a Espanha que estabelece o seguinte: "Quando um residente do Brasil
receber dividendos que de acordo com as disposições da presente Convenção sejam
tributáveis na Espanha, o Brasil isentará de imposto esses dividendos" (Ato Declara-
tório Interpretativo da Secretaria da Receita Federal nO 6, de 2002).
Sucede que a lei espanhola prevê a isenção de retenção na fonte dos dividendos
distribuídos a residentes no exterior por sociedades que revistam natureza de Entida-
de de Tenencia de Valores Extranjeros - ETVE.
O Fisco brasileiro considerou que a expressão "sejam tributáveis na Espanha"
pressupõe uma tributação efetiva, pelo que considerou não estar obrigado a reconhe-
cer a isenção prevista no citado § 4° do art. 23 do Tratado com a Espanha.
Consideramos que referida interpretação viola o Tratado entre o Brasil e a Es-
panha, que não contém nenhuma disposição tendente a evitar a dupla não tributação
por razões de lei interna. Como já se referiu, os Comentários da OCDE aos arts.
23-A e 23-B (parágrafo 34) não autorizam o Estado de residência a recusar a aplica-
ção do método de isenção em razão de isenção concedida pelo outro Estado l2 .
Importa, finalmente, anotar que a não tributação pelo Estado que pratica o "mé-
todo da isenção" não depende do fato de o outro Estado ter efetivamente tributado
o rendimento em causa (como ocorreria na cláusula subject to tax). Basta que para
tanto tenha poderes, sendo irrelevante o seu não exercício efetivo, seja por ausência
de previsão normativa, seja em decorrência da atribuição de incentivos fiscais J3 •

§ 2° MÉTODO DE IMPUTAÇÃO

No método da imputação (tax credit), o rendimento de fonte estrangeira não


é isento, de tal modo que o Estado da residência tributa a renda global do contri-
buinte, seja qual for a sua origem. Todavia, do montante do imposto assim apurado
deduz (credita) o imposto pago no país da fonte, desde que este imposto seja de
natureza equivalente à do imposto pago no país da residência.
O sistema de isenção considera a renda; o sistema de imputação, o imposto
sobre a renda 14.

12 efr. MICHAEL LANG, Avoidance ofDouble Non-Taxation, cito


13 efr. M. PIRES, Da dupla tributação, 34l.
14 efr. M. PIRES, Da dupla tributação, 338.
~~ .. Título VI I Capo 111 I Normas de Limitação de Competência .,~.

A) Imputação integral e imputação ordinária


Se o Estado da residência deduz o montante total do imposto efetivamente
pago no país de origem, dá-se uma imputação integral. Mas nem sempre vai tão longe
a generosidade do sistema, que submete a dedução consentida a um limite máximo:
o limite relativo à fração do seu próprio imposto correspondente aos rendimentos
provenientes do país da fonte - é a imputação ordinária. Como é fácil de se verificar, a
imputação ordinária conduzirá apenas a uma dedução parcial do imposto estrangeiro
se este for superior ao que o Estado da residência aplica aos mesmos rendimentos 1s .
A razão de ser deste limite está na atitude dos Tesouros nacionais, favorável a
anular o seu próprio imposto, mas desfavorável a reembolsar os seus contribuintes
de impostos pagos a Estados estrangeiros.
Note-se que o crédito de imposto estrangeiro representa um "rendimento adicio-
nal" tributável no país de residência, a acrescer ao rendimento que lhe deu origem.
Numa linguagem expressiva, pode dizer-se que o tax credit é como que um crédi-
to contra o Fisco utilizável como moeda de pagamento do imposto. Precisamente
porque representa rendimento adicional, é necessário, antes de proceder à dedução,
reajustar o rendimento bruto estrangeiro, acrescendo o seu valor à base de cálculo do
imposto do país de residência16 .
Precisamente para atenuar o rigor dos efeitos negativos deste método, alguns
países admitem que o crédito, em vez de ser calculado país por país (per country limi-
tation), seja apurado numa base global (lJVeralllimitation), permitindo, assim, uma
compensação entre excessos indedutíveis decorrentes dos países de alta fiscalidade
com os créditos derivados de Estados de fiscalidade moderada l7 .

15 Sobre a figura do "crédito de imposto", a monografia fundamental ainda é a de EUSABETH


A. OWENS, The Foreign Tax Credito A Study of the Credit for Foreign Taxes under United States
Income Tax Law, Harvard 1961. Ver ainda Almo SCHULZE-BRACHMANN, Anrechnung, Han-
dwiirterbuch des Steuerrechts und der Steuerwissenschaften I, 50; Mc DANIEL/AULT,Introduction
to United States International Taxation, Deventer 1977, 87 sS.; J. D. KUNTZ/R. J. PERONI,
U.S. International Taxation, I, BostonjNova York 1992, B4; MANuo INGROSSO, 11 credito
d'imposta, Milão 1984, 213 SS.; GARBARINO, La tassazione dei reddito transnazionale, Pádua
1990,443 SS.; HELENO TÔRRES, Pluritributação internacional sobre as rendas de empresas, São
Paulo 1997, 437 SS.; ANTONIO AMENDOLA, Análise do método do crédito de imposto como
medida unilateral para evitar a dupla tributação das empresas no Brasil, in HELENO TAVEIRA
TÔRRES (org.), Direito Tributário Internacional Aplicado, vol. V, São Paulo 2008, 257; JOÃo
VICTOR GUEDES SANTOS, FLÁVIA CAVALCANTI NOGUEIRA RODRIGUES, Compensação de im-
posto pago no exterior: a aplicabilidade de medidas unilaterais em casos de inobservância de
limitações contidas em tratado, RDTI 10 (2008), 85.
16 Cfr. GOUTHIERE, Les impôts, 111.
17 Cfr. HELENO TÔRRES, A pluritributação internacional... cit., 457.
e I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Igualmente para atenuar os efeitos da indedutibilidade do excesso do tax credit,


também se tem previsto o seu reporte para trás (carry back) ou para diante (carry
flrward) 18.
Em sentido oposto, não raras legislações restringem o crédito de imposto em
função da natureza da renda a que respeitam, permitindo apenas a compensação por
"cestas" (baskets) de renda de igual natureza l9 .
No que tange ao direito convencional, o método da imputação ordinária foi
também o adotado, via de regra, pelo Brasil, para atenuar a dupla imposição dos
rendimentos percebidos pelos seus residentes (com algumas exceções em matéria
de dividendos, em que adotou o método da isenção integral ou com reserva de
progressividade). Igualmente foi esta a solução consagrada para a generalidade dos
rendimentos provenientes do Brasil e percebidos pelos residentes (inclusive juros,
dividendos e royalties) de diversos Estados contratantes, como a África do Sul, Cana-
dá, Coreia, Dinamarca, Equador, Espanha, Filipinas, Finlândia, Índia, Israel, Itália,
Japão, México, Noruega, Portugal, Suécia e Ucrânia.
O método da imputação ordinária direta foi adotado pelo Brasil quanto às pes-
soas nsicas através de norma interna, unilateral, a qual vale mesmo na ausência de
convenção de dupla tributação, exigindo-se apenas a condição da reciprocidade 20 . É o
que resulta do art. 103 do RIR, ao estabelecer que "as pessoas nsicas que declararem
rendimentos provenientes de fontes situadas no exterior poderão deduzir do imposto
apurado, na forma do art. 86, o cobrado pela nação de origem daqueles rendimentos,
desde que: I - em conformidade com o previsto em acordo ou convenção internacio-
nal firmados com o país de origem daqueles rendimentos, quando não houver sido
restituído ou compensado naquele país; ou II - haja reciprocidade de tratamento em
relação aos rendimentos produzidos no Brasil", acrescentando o § lOque "a dedução
não poderá exceder a diferença entre o imposto calculado com a inclusão daqueles
rendimentos e o imposto devido sem a inclusão dos mesmos rendimentos".
Quanto às pessoas jurídicas a matéria se encontra contemplada no art. 395 do
RIR, que consagrou o método da imputação ordinária nos seguintes termos: "A
pessoa jurídica poderá compensar o imposto de renda incidente, no exterior, sobre
os lucros, rendimentos, ganhos de capital e receitas decorrentes da prestação de ser-
viços efetuada diretamente, computados no lucro real, até o limite do imposto de

18 Cfr. VOGEL, On Double Taxation Conventions: a Commentary to the aCDE, UN and US Model
Conventions for the Avoidance of Double Taxation of Income with Particular Reftrence to German
Treaty Praetice (trad.), Deventer 1997 (cit. Double Taxation), 1231; ID., Supl. 94, 123 ss. Na
França (cinco anos para a frente), Japão (cinco anos para a frente e para trás), Canadá (cinco
anos para a frente), Holanda (oito anos para a frente), Estados Unidos (einco anos para a frente
e dois anos para trás). Cfr. GIBSON, Limitations on the foreign tax credit, BIFD 1989,43.
19 Cfr. MERCEDES FUSTER GÓMEZ, La doble imposición internacional... ) cit.) 89.
20 Criticando o requisito da reciprocidade, por incompatível com o princípio da igualdade, efr.
HELENa TORRES, A pluritributação internacional... (2 a ed.), 2001, 463.
I Cap_ 111 I Normas de Limitação de Competência iN.
------ .. - Título VI

renda incidente, no Brasil, sobre os referidos lucros, rendimentos, ganhos de capital


e receitas de prestação de serviços21".

B) Imputação ordinária efetiva e proporcional


A imputação ordinária, por sua vez, ainda é suscetível de duas modalidades.
Numa, o limite da dedução, no primeiro Estado, do imposto pago no outro Estado,
consiste na fração do imposto sobre o rendimento do primeiro Estado, calculado
antes da dedução, correspondente aos rendimentos tributáveis no outro Estado. Na
outra, o limite da dedução no primeiro Estado, do imposto pago no outro Estado,
consiste na fração do imposto do primeiro Estado correspondente à participação des-
se rendimento no total dos rendimentos tributáveis no primeiro Estad022 •
Na primeira, toma-se em conta o imposto nacional sobre os rendimentos exter-
nos; na segunda, tem-se em consideração a proporção dos rendimentos externos na
renda total do sujeito passivo. Propomos, pois, a denominação, respectivamente, de
imputação ordinária efetiva e de imputação ordinária proporcional.
Um exemplo auxiliará a melhor compreensão dos institutos. Suponhamos um
brasileiro que auferiu 600 de renda, dos quais 500 no Brasil e 100 no exterior. Na
imputação ordinária efetiva, a dedução do imposto estrangeiro tem como limite a
fração do imposto brasileiro aplicável sobre os rendimentos externos (por hipóte-
se 30%), ou seja, 30 (30% x 100). Na imputação ordinária proporcional, a dedu-
ção do imposto estrangeiro tem como limite a fração do imposto brasileiro (30% x
600 = 180) correspondente à participação dos rendimentos externos na renda total
(16,66%), ou seja, 29,98 (16,66% de 180).
A imputação ordinária proporcional apenas se encontra consagrada num nú-
mero restrito de Convenções: o Brasil aplica-a quanto aos rendimentos provenientes
da Bélgica, da Finlândia e da França (embora estes países apliquem aos rendimentos
provenientes do Brasil o método da imputação ordinária direta). A África do Sul, a
Dinamarca e a Itália aplicam-na quanto aos rendimentos provenientes do Brasil.

C) Crédito presumido (matching credit) e crédito fictício (tax sparing)

Quer a imputação ordinária, quer a imputação integral tomam por base o im-
posto real e efetivamente pago no exterior. Todavia, duas novas modalidades surgi-
ram - sobretudo nas convenções fiscais entre países desenvolvidos e países em vias
de desenvolvimento - que se baseiam, respectivamente, num imposto presumido ou
num imposto fictício: o matching credit e o tax sparing.

21 Cfr. sobre este crédito de imposto estrangeiro, supra, 427.


22 Cfr. OCDE, Comentários, art. 23-B (1), parágrafo 62.
Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

o matching credit ou crédito de imposto presumido (lump-sum tax credit,pauschale


Steueranrechnung) consiste na atribuição de um crédito mais elevado do que o que re-
sultaria da aplicação da alíquota convencional ou de direito comum em vigor no país
da fonte. Assim, por exemplo, enquanto em certo país a alíquota normal de retenção
na fonte é de 25%, o crédito de imposto atribuído noutro país para a tributação dos
juros, dividendos ou royalties daquela fonte é calculado a uma alíquota de 30%.
O tax sparing ou crédito de imposto fictício (shadowing,phantom tax, notional
tax, ou imputação especial por isenção de imposto) consiste na atribuição de um
crédito correspondente ao imposto que teria sido pago no país de origem se não fos-
sem as medidas de exoneração com que neste se pretendeu incentivar o investimento
exterior. Assim se evita que o contribuinte deixe de beneficiar do efeito incitativo
concedido no país da fonte, cujo sacrifício financeiro, na ausência do crédito fictício,
acabaria por redundar em benefício exclusivo do país da residência23 •
Enquanto a cláusula de tax sparing pressupõe um incentivo preexistente que visa a
preservar, a cláusula de matching credit atribui o direito à dedução no Estado de residência
de um crédito fixado a foifait. Seja qual for a política fiscal do outro Estado, estabeleça ele
ou não um imposto reduzido ou até mesmo uma isenção: é este o significado da expres-
são "o imposto será sempre considerado como tendo sido pago à alíquota de ... ".
A política de tax sparing tem sido recentemente criticada pela OCDE, tendo o
Conselho desta organização aprovado em 23 de outubro de 1997 um relatório em
que são apontados alguns dos seus inconvenientes 24 • Ela é também tenazmente com-
batida pelos Estados Unidos, cujo Senado, aliás, recusou a ratificação do primeiro
tratado que a adotava: o Tratado entre os Estados Unidos e o Paquistão, de 1957.
Subjacente a estas críticas está a concepção segundo a qual o sistema fiscal de
cada país, em homenagem ao princípio da igualdade, deve ser neutro no que concer-
ne às decisões de investimento, quer este se realize no próprio país ou no estrangeiro.
Alega-se ainda que não está demonstrada a eficácia do estímulo em relação às deci-
sões empresariais e que ela se presta a abusos de planejamento fiscal.
Nas Convenções assinadas pelo Brasil, é frequente a figura do crédito de imposto
presumido em matéria de juros, dividendos e royalties. Numerosos Estados o conce-
dem (em proporção variável) quanto a juros e royalties; quanto a dividendos, o regime

23 Cir. GEST(TIXIER, Droit Fiscal International, 154 ss. Cir. um estudo comparativo em European
Taxation 12/1 (1972) e ainda ONU, Convenções fiscais sobre países desenvovídos e países em via de
desenvolvimento, 115 ss., onde se procede à ampla discussão das vantagens e inconvenientes
econômicos deste método; BOlDMAM, Some current issues with treaty tax sparing provision,
BIFD 39 (1989), 387; AMIco, The tax sparing clause, BIFD 43 (1989), 408; DORNELLES, A
dupla tributaçiW internacwnal da renda, 19; DAN THROOP SMITH, Tax Legislation in Capital-Ex-
porting Countries to encourage Investment in less Developed Countries, Amsterdam 1966; J-lARRy A.
SHANNON, Tax incentives and tax sparing, Intertax 1992/2, 84; ROY ROHATGI, Basic International
Taxation, 212; HELENO TÔRRES, PluritributaçiW internacwnal sobre as rendas de empresas, 464 ss.
24 Cfr. OCDE, Tax Sparing: A reconsideratwn, Paris 1997. Todavia, o Brasil reserva-se o direito
de estabelecer cláusulas de tax sparing e matching credit, cfr. OCDE, art. 23, NMC Positions,
parágrafos 1°, 3° e 4°.
Título VI I Capo 111 I Normas de Limitação de Competência ;'p;
é mais complexo, pois a par do matching credit há casos de isenção integral, de isenção
com progressividade e de imputação ordinária, como já se viu. Em contrapartida, o
Brasil apenas em raros casos prevê um matching credit quanto a juros e royalties: é o
que se passa com a Coreia, Equador, Espanha, Filipinas e Índia, porventura atenden-
do ao grau intermediário do estágio de desenvolvimento econômico destes países.
Também a figura do crédito de imposto fictício se encontra consagrada em certas Con-
venções assinadas pelo Brasil: com o Japão, a Bélgica, a Coreia, as Filipinas e a Hungria.
A Convenção com o Japão, no seu art. 22, § 2°, b, item (ii), na redação que
lhe foi dada pelo Protocolo de 23 de março de 1976, dispõe que, para efeitos da
concessão de crédito de imposto, o imposto brasileiro deverá incluir o montante do
imposto que deveria ter sido pago se não houvesse a isenção ou redução do imposto
de acordo com as medidas especiais de incentivo visando a promover o desenvolvi-
mento econômico do Brasil.
O art. 23, § 2°, b, da Convenção com a Bélgica, dispõe que, "todavia, no que
concerne aos referidos rendimentos que se beneficiam de uma imputação na Bélgica
em conformidade com a alínea precedente e que são pagos em razão de investi-
mentos que estejam diretamente ligados a projetos de desenvolvimento industrial,
comercial, turístico ou agrícola no Brasill, essa imputação será calculada como se o
imposto brasileiro tivesse sido pago a uma alíquota de 5% mais elevada que a alíquo-
ta efetivamente aplicada. Esta disposição aplicar-se-á igualmente quando o Brasil re-
nunciar, em virtude de sua legislação interna, a tributar os rendimentos em questão.
A imputação cessará de ser calculada como se o imposto brasileiro tivesse sido pago a
uma alíquota de 5% mais elevada no que concerne aos impostos belgas devidos sobre
rendimentos de períodos tributáveis que comecem a partir de 10 de janeiro de 2012.
A presente alínea não será aplicável aos "royalties indicados no art. 12, § 2°, b".
As Convenções com a Coreia, Filipinas e Hungria esclarecem que, para fins do
cômputo do crédito presumido atribuído a certos dividendos, a expressão "montante
do imposto exigível" inclui o montante do imposto de sociedades de um Estado con-
tratante que deveria ter sido pago se não houvesse sido isento ou reduzido de acordo
com as medidas especiais de incentivo, destinadas a promover o desenvolvimento
econômico (Coreia, Protocolo, item 7; Filipinas, art. 23-2; Hungria, art. XXIII-2).
O Brasil traçou uma política favorável à adoção de cláusulas de tax sparing nos
tratados que vierem a ser celebrados com países membros do MERCOSUL. Dispõe,
na verdade, a Instrução Normativa nO 244, de 18 de novembro de 2002 (art. 2°),
que "nas Convenções destinadas a evitar a dupla tributação da renda, a serem firma-
das pelo Brasil com países integrantes do Mercado Comum do Sul (Mercosul), será
incluída cláusula prevendo a concessão de crédito do imposto de renda sobre lucros e
dividendos recebidos por pessoa jutídica domiciliada no Brasil que deveria ser pago
no outro país signatário, mas que não haja sido em decorrência de lei de vigência
temporária de incentivo ao desenvolvimento econômico, nacional, regional ou seto-
rial'" acrescentando o parágrafo único que "o crédito referido no caput, observadas as
demais condições gerais de concessão e outras que vierem a ser estabelecidas em le-
E I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

gislação específica, somente será admitido quando os lucros ou dividendos distribuÍ-


dos provierem, diretamente, de atividade desenvolvida no país estrangeiro signatário,
relativa aos setores: I - industrial, exceto da indústria de cigarro e bebidas em geral,
inclusive os concentrados destas; li - agrícola, de florestamento ou pesqueira".

D) Imputação direta e indireta

Importa ainda distinguir a imputação direta da imputação indireta. Enquanto a


primeira consiste no direito atribuído ao investidor residente num dado país de dedu-
zir do seu imposto de renda o imposto retido na fonte pelo país de origem dos ren-
dimentos e que a ele respeita imediatamente, a segunda (indirect tax credit) traduz-se
na faculdade do investidor residente num país que aceite este método, de deduzir não
só o imposto retido na fonte sobre os dividendos, mas também o imposto incidente
sobre a sociedade distribuidora, incidente na parte em que este incide sobre os lucros
de que esses dividendos provêm (underlying tax credit ou imposto subjacente )25.
Esta última é, afmal, um reflexo, no plano internacional, da concepção mais vas-
ta segundo a qual o imposto sobre as sociedades é um simples complemento, pago
adiantadamente, do imposto devido pelos sócios.
Raros países aplicam, porém, nas suas relações com o Brasil, a imputação indire-
26
ta . A Convenção celebrada com o Japão, após o Protocolo de 23 de março de 1976,
estabelece (art. 22, § 2°, alínea a, ii) na nova redação) que o tax credit levará em conta
o imposto brasileiro exigível da companhia que paga os dividendos com relação aos
seus rendimentos, no caso de dividendos pagos por uma companhia residente no Brasil
a uma companhia residente do Japão que detenha pelo menos 10 por cento, quer das
ações com direito a voto, quer do total de ações emitidas pela companhia pagadora.
A Convenção com o Canadá prevê que o crédito de imposto concedido pelo Ca-
nadá será igual ao montante do imposto de renda pago no Brasil, incluindo o imposto
sobre a renda de sociedades e qualquer outro imposto sobre a renda (art. XXII, 2).
A consideração do imposto sobre o lucro produzido na sociedade é também
admitida nas Convenções com a China, Coreia, Filipinas, Hungria e PortugaJ27.

25 Como se vê, neste método, torna-se necessária uma coordenação entre o período dos di-
videndos e o exercício da geração dos lucros. Nos Estados Unidos e no Japão, presume-se
que os dividendos são distribuídos através dos últimos lucros realizados. Cfr. BAKER, Double
Taxation, 363; J. D. KUNTzjR. J. PERONI, U.S. Intemational Taxation, B4.09. Os Estados
Unidos admitem o crédito não só para as first-tier flreign corporation, mas também em certos
casos para as sociedades situadas no segundo ou terceiro nível na cadeia de participações, as
second-or-third-tier flreign corporation. Na Alemanha, veja-se TII.LMANNS, in MóssNERjet aI.,
Steuerrecht intemational tdtiger Untemehmen, 151; SCHAUMBURG, Intematio-nales Steuerre-
cht) Colônia 1993, 505 SS.; WILKE, Lerhbuch des intemationalen Steuerrechts, 73 sS.; MERCE-
DES FUSTER GÓMEZ, La doble imposición intemacional..., cit., 92 ss.
26 Cfr. KNECHTLE, Grundfragen, 134; Roy ROHATGI, Basic Intemational Taxation, 211.
27 Ver quadro na página seguinte.
Título VI I Capo 111 I Normas de Limitação de Competência _fi.
§ 3° OUTROS MÉTODOS

Além dos dois métodos clássicos atrás referidos - e que são os únicos conheci-
dos no direito brasileiro -, existem outras modalidades pelas quais os países exporta-
dores de capital favorecem os investimentos nos países em vias de desenvolvimento
e que tanto podem ser previstas por via unilateral como bilateral.
Dentro destas, a mais importante é inegavelmente o crédito por investimento, o
qual consiste numa dedução imediata, ao imposto devido, de uma parcela do investi-
mento efetivamente realizado no exterior. Esta figura tem sido utilizada nos Estados
Unidos e na Alemanha quanto a investimentos no exterior sob a forma de colocação
de valores de carteira ou de empréstim028 •

IMpUTAÇÃO DIRETA E INDIRETA

• Arpentina
Isenção integral
{ • Palses Baixos
• Tchecoslováquia

• Áustria
• Bélgica
Isenção com • França
progressividade • Hungria
• Luxemburgo
• Noruega

• África do Sul
• Canadá
• Chile
• China
• Coreia
Regime /(,licável • Dinamarca
à genera ,dade dos • Equador
rendimentos (com • Espanha
exceção de juros, ImJiutação • Fi~inas
dividendos e royalties) or inária direta • fi ândia
• India
• Israel
• Itália
• ~ão
• éxico
• Pormgal
• Suécia
• Ucrânia

• B~ica
{ Brasil em relação
{ • Fi ândia
• França
hl't~afão
or. tnana
proporcional { Outros países em
relação ao Brasil { • Dinamarca
• Itália

28 efr. DORNELLES, A dupla tributação internacional da renda, 23.


-SiM Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Um segundo método consiste na aplicação de uma alíquota proporcional reduzi-


da (jlat rate) aos rendimentos provenientes do exterior, mais não representando que
um compromisso entre a isenção integral e a tributação integral com imputação.
Assim, por exemplo, na Alemanha, as sociedades beneficiam de uma alíquota redu-
zida uniforme de 25% quanto a certos rendimentos provenientes do exterior, em
substituição da imputação do imposto estrangeiro.
A dedução do imposto estrangeiro assemelha-se ao método da imputação; mas, en-
quanto neste a dedução se faz do próprio imposto, naquele faz-se da renda tributável.
E esta precisamente a diferença entre a dedução por investimento (abatida da renda) e
o crédito por investimento, deduzido do impost029 •
Uma outra categoria de medidas consiste na provisão de investimento, a qual
consiste em permitir a dedução imediata de certas frações das quantias investidas,
acrescendo-as, porém, aos lucros tributáveis dos exercícios subsequentes. Tem-se, as-
sim, em vista imprimir caráter temporário a um estÍmulo análogo aos anteriormente
referidos, o qual tem economicamente a natureza de um empréstimo sem juro, igual
à importância do imposto cujo pagamento é diferido.
Note-se, enfim, que, enquanto algumas destas medidas são dependentes do vo-
lume do capital investido, outras têm já em vista o seu rendiment0 3o •

SEÇÃO II
NORMAS DE LIMITAÇÃO DE COMPETÊNCIA
DIRIGIDAS AO ESTADO DA FONTE

Como se viu, a grande generalidade das normas de reconhecimento de compe-


tência (cumulativa ou exclusiva) do Estado da fonte fazem-no em termos ilimitados,
ou seja, não introduzem limites quantitativos às alíquotas dos respectivos tributos,
cabendo ao Estado da residência "absorver" os efeitos desta tributação ilimitada, atra-
vés do recurso aos métodos facultados pelos arts. 23-A e 23-B do Modelo OCDE.
Todavia, em certos casos de reconhecimento de competência cumulativa - di-
videndos, juros e royalties -, as Convenções estabeleceram limites quantitativos ao
poder de tributar do Estado da fonte, consistentes em limites máximos às alíquotas
aplicáveis àquelas categorias de rendimentos.

29 Cfr. sobre o método da dedução HELENO TÔRRES, Pluritributaçáo internacional... , 470 ss.
30 Cfr. DIONISIO MARTINEZ, El credito tributario a la inversión (investment tax credit), Revista
de Derecho Financiero y de Hacienda Publica XX (1970), 161; ONU, Convenções fiscais entre
paises desenvolvidos e países em vias de desenvolvimento, 121 ss.; OCDE, Medidas fiscais para o
fomento dos investimentos privados nos países em vias de desenvolvimento (trad. port.), Lisboa
1967, 34 ss.; BRACEWELL-MILNES/HUISKAMP, Investment Incentives (A Comparative Analysis
ofthe Systems in the EEC, the USA and Sweden), Deventer 1977; DAN THRooP SMITH, Tax
Legislation in Capital-Exporting Countries to encourage Investment in less Developed Countries,
Amsterdam 1966.
Título VI I Capo III I Normas de Limitação de Competência MiM

Tais limites já foram por nós examinados no capítulo relativo aos rendimen-
tos em causa, pelo que apenas se faz referência ao problema por razões de ordem
sistemática.
Nota-se, todavia, a tendência para a generalização de exonerações de retenção na
fonte no quadro da Comunidade Europeia. Exemplo deste movimento é a exonera-
ção dos dividendos pagos pelas subsidiárias às matrizes, a partir de 10 de janeiro de
1992, em virtude da Diretiva de 23 de julho de 1990; e a exoneração dos juros e
royalties entre sociedades-mãe e subsidiárias, caso seja adotado o projeto de diretiva
apresentado pela Comissão em 23 de novembro de 199031 .

31 efr. GOUTHIERE, Les impôts, 252 e 858.


I

TITULO VII

COMPETÊNCIA INTERNACIONAL E RELEVÂNCIA


DE ATOS PÚBLICOS ESTRANGEIROS
CAPÍTULO I
O PROBLEMA EM GERAL

Conforme atrás se disse, existem no Direito Tributário Internacional normas


que não respeitam ao problema do âmbito de incidência das leis tributárias no espa-
ço, mas sim ao do seu âmbito de eficácia, ou seja, à esfera dentro da qual os órgãos
nacionais de aplicação do direito podem praticar atos de império tendentes à sua
aplicação e execução coativa no caso concreto (enforcement jurisdiction).
Tais normas revestem duas modalidades: as que definem a competência das
autoridades administrativas ou judiciais de dado Estado no que concerne a ques-
tões ligadas, por qualquer dos seus elementos, a mais do que um ordenamento
jurídico; e as que definem a eventual relevância na ordem interna de atos públicos
praticados por autoridades administrativas ou judiciais estrangeiras. Ambos os ti-
pos de normas - que entre si se encontram intimamente relacionadas, constituindo
as duas faces, interna e externa, de um mesmo problema de fundo - pertencem ao
Direito Tributário Internacional em sentido formal, posto se revestirem de natureza
instrumental, por contraposição às regras materiais e às regras de conflitos que di-
tam, respectivamente, de modo direto e indireto, a disciplina das questões da vida
tributária internacional!.
Também já atrás examinamos a questão dos limites impostos pelo Direito In-
ternacional Público à jurisdiction to enforce, em matéria tributária, tendo-se concluído
que - na fase atual da convivência entre os Estados - se considera violação da sobe-
rania o exercício extraterritorial da atividade tributária em concreto, no território de
outro Estado, não sendo aceitável a prática de atos de império em território estran-
geiro ou a produção automática no estrangeiro de efeitos de atos públicos das auto-
ridades nacionais, na ausência de disposições que prevejam uma assistência jurídica ou
administrativa (Rechtshi1fe, Amtshilfe) dos órgãos públicos do foro 2 •

1 Cfr. supra, 40; e E A. MANN, The doctrine of jurisdiction in International Law, in ID., Studies
in Intemational Law, Oxford 1973, 1 (ll O 55.); GIUSEPPE BI5COTI1NI, I.;efficacia degli atti
5traniere di impo5izione, in Studi in memoria di GUIDO ZANOBINI, IV; 1965, 77.
2 Cfr. supra, 13 55.
I D I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier ]

Torna-se necessário distinguir, na verdade, o exercício da própria atividade de


aplicação e execução das leis em território estrangeiro, da relevância, no território
nacional, de atos públicos estrangeiros.
No que concerne ao primeiro problema, o Direito Tributário não prevê ou
admite fenômenos, como a prática de atos de autoridade (investigações, exames,
auditorias) por autoridades públicas de um país no território de outro, nem a co-
municação e notificação de atos públicos, diretamente ou através de representantes
diplomáticos e consulares 3 .
No que concerne à relevância dos atos públicos em território estrangeiro, tam-
bém se não admite a produção dos seus efeitos típicos fora do território a que perten-
cem as autoridades em causa, havendo aqui que distinguir os atos de natureza pro-
cedimental, tendentes à obtenção de provas, dos atos que têm por objeto a própria
declaração e exigência de um crédito tributário.
Os primeiros traduzem-se em ordens e notificações de autoridades administra-
tivas ou judiciais tendentes à prestação de informações ou exibição de documentos
relevantes para a instrução de procedimentos administrativos ou processos judiciais
em curso num dado país. Tais ordens e notificações (de que são exemplo caracterís-
tico as summons e subpoenae do direito norte-americano)4 não são exequíveis fora do
território a que as autoridades pertencem, ou seja, no Estado estrangeiro em que
eventualmente resida o respectivo destinatário (ainda que nacional do Estado que
as emitiu) ou em que eventualmente se localizem as provas materiais (documentos)
por elas abrangidos 5. E daí que se tornem necessárias providências de cooperação
internacional de que constituem modelo os pactos referentes à troca de informações,
normalmente incluídos nas convenções contra a dupla tributação.
No que se refere aos atos públicos que têm por objeto formalizar a exigência de
um crédito tributário (ato administrativo de lançamento ou sentença judicial con-
denatória), é universalmente rejeitada a possibilidade da sua execução coerciva em
território estrangeiro, através do recurso às autoridades judiciais estrangeiras.
Trata-se de posição que ganhou fundas raízes no mundo anglo-saxônico e que se
encontra sintetizada nas sentenças dos juízes HARDWICK (1734) e MANSFIELD (1755),
segundo as quais "no country ever takes notice ofthe revenue laws of another"6. Da In-
glaterra, esta tradição passou para os Estados Unidos, onde os diversos Estados da

3 Ao invés do que sucede em matéria civil e comercial, ao abrigo da Convenção da Haia de


15 de novembro de 1965 (art. 8°) e 18 de março de 1970 (arts. 15 e 16). Cfr. MANN, The
doctrine ofjurisdiction, 115 ss. SACCHETO fala numa "colaboração passiva", referindo os casos
de postos aduaneiros estrangeiros, atuação extraterritorial de funcionários aduaneiros em
países limítrofes ou exercício de atividades de notificação por serviços consulares: cfr. Tutela
all'estero dei crediti tributari dello Stato, Pádua 1978, 211.
4 Cfr. supra, 13 ss.
5 Cfr. Mfu'lN, op. cit., 118, segundo o qual a subpoenae não é uma notice mas um command.
6 Curiosamente, a sentença do juiz HARDWICK referia-se a capitão de navio português que se
opunha à descarga de ouro, invocando a lei portuguesa que proibia a exportação deste metal.
Título VII I Capo I I O Problema em Geral Ig I

Federação inicialmente se recusaram a executar créditos tributários de outros Esta-


dos. Mais tarde, esta orientação viria a ser suavizada nas relações entre os Estados-
membros da Federação, em virtude da cláusula foll faith and credit, mas rigidamente
mantida em relação a Estados estrangeiros. Nos ordenamentos europeus, a tendência
esmagadora é no sentido da hostilidade à possibilidade de execução de pretensões
tributárias de Estados estrangeiros 7 •
A posição atual da doutrina a este respeito encontrou consagração na resolução
adotada pelo Instituto de Direito Internacional que - embora na sessão de Wiesba-
den de 1975, tenha adotado a resolução moderada, segundo a qual "o caráter público
atribuído a uma disposição de direito estrangeiro designado pela regra de conflitos
de leis não é obstáculo à aplicação desta disposição, sob a reserva fundamental da
ordem pública" - foi incisivo ao declarar, na resolução de Oslo de 1977, que, "na
medida em que, desde o ponto de vista do Estado do foro, o seu objeto está ligado
ao exercício do poder público, as pretensões na justiça de uma autoridade estrangeira
ou de um organismo público estrangeiro, fundadas em disposições do seu Direito
Público, deveriam ser, em princípio, consideradas como inadmissíveis 8".
A fundamentação teórica desta posição tem o seu mais saliente expositor em
MANN9 . Como observa MOURA RAMos, "para este Autor, as normas de direito pú-
blico estrangeiro apenas seriam de excluir quando o Estado estrangeiro pretendesse
através delas fazer valer um direito que não pudesse ser igualmente invocado por
uma pessoa privada. A natureza da pretensão constituiria assim a pedra de toque
da possibilidade ou não da aplicação do direito público estrangeiro: ele poderia ser
aplicado se se tratasse de tornar efetiva uma pretensão que não supusesse o caráter
público do reclamante, enquanto que já seria excluído que os tribunais do foro se
movimentassem para apreciar uma pretensão regis qua regis, em que o direito in-
vocado fosse garantido iure imperio ao Estado em causa. Assim, vistas as coisas, a
aplicabilidade do direito público estrangeiro seria possível, mas só quando ela não
implicasse a realização de atos que decorressem das prerrogativas soberanas do Esta-
do estrangeiro 10".
Posição similar foi defendida por G. VAN HECKE Il , segundo o qual os tribunais
deverão rejeitar uma pretensão derivada do ius imperii, não só quando formulada di-
reta e abertamente pelo Estado estrangeiro, mas também quando, embora formulada
por particular, a sua admissão envolvesse necessariamente a aplicação de uma prerro-

7 Cfr. SACCHETO, op. cit., 12; fuBRECHT, The enforcement oftaxation under internationallaw,
British Yearbook oflnternational Law 1953, 461. Algumas exceções a anotar: nos regimes
de tipo capimlar, como sucedeu no Egito, podiam cobrar-se impostos estrangeiros com o
auxílio de tribunais mistos; e também a Prússia podia executar os seus créditos tributários na
Áustria, mercê das ligações estreitas que uniam os dois Estados.
8 Cfr. PÉREZ· BEVIÁ, La aplicación deI Derecho Publico extranjero, Madrid 1989, 35-36.
9 Cfr. MANN, Conflicts oflaws and PubJic Law, Récueil des Cours 132 (1971-1), 182.
10 Cfr. MOURA RAMos, Da lei aplicável ao contrato de trabalho internacional, Coimbra 1990, 314.
11 Principes et méthodes de solution des conflits de lois, Récueil des Cours 126 (1969-1),489.
M§h.M Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

gativa soberana do Estado estrangeiro. Exemplo de pretensão indiretamente baseada


em atos de império estrangeiro foi dado pelos tribunais irlandeses, que rejeitaram
ação intentada pelo síndico de falência de uma sociedade escocesa contra o único
acionista que se havia apropriado do patrimônio da sociedade, sob a alegação de que
o Fisco britânico era o único credor da sociedade e que a ação do síndico tendia, por
consequência, à cobrança de um crédito tributário.
Pela nossa parte, parece-nos mais realista a posição de FRANCK 12 quando defen-
de a possibilidade de um Estado recorrer aos tribunais de outro Estado para obter a
execução de direitos tributários que a sua ordem jurídica lhe garante. Com efeito, tal
Estado apresenta-se perante o tribunal estrangeiro na simples posição de demandan-
te (uti singuli) , o que obviamente não representa ofensa à soberania do Estado a que
o tribunal pertence.
FRANCK refuta todos os motivos que servem de fundamento para rejeitar as
pretensões baseadas em atos de império de Estado estrangeiro, para concluir que
esta rejeição não se baseia nem na suposta territorialidade, nem na falta de regras de
conflitos que prevejam o modo de regular tais pretensões, nem na ordem pública
do Estado do foro, mas tão somente na falta de interesse dos órgãos judiciais de um
Estado em cooperar com os demais. Não se trata, pois, de um nicht-dürftn, baseado
na falta de competência, mas de um nicht-wollen.
E, com efeito, força é reconhecer que o Estado que decida imprimir executorie-
dade à pretensão tributária estrangeira não está com isso a aplicar direito estrangeiro,
nem a acatar a imperatividade de atos públicos estrangeiros, mas tão somente a de-
senvolver um procedimento previsto em normas internas para casos internos simila-
res, para a cobrança de crédito validamente constituído à sombra de leis estrangeiras
internacionalmente competentes para o efeito l3 .
Compartilhamos, com MOURA RAMos, a opinião de que o problema deverá
ser "desdramatizado". Embora este autor reconheça que a colaboração interestadual
ainda não atingiu ponto tão evoluído, não se lhe afigura que "se o Estado resolvesse
emprestar o seu concurso ao Estado estrangeiro, a posição em que se encontraria não
diferiria daquela em que se acha nos casos de assistência internacional. E aí, como se
sabe, o direito convencional tutela interesses de um Estado, que ele só tem na quali-
dade de soberano, através do aparelho judicial de um outro14".

12 Cfr. R. FRANCK, Óffentlichrechtliche Ansprüche fremder Staaten vor inlandischen Gerichten,


RabelsZ, v. 34 (1970), 5-6 ss., apud MOURA RAMos, Da lei aplicável, 300, nota 459.
13 Cfr. SACCHETro, Tutela aWestero, 150. Distinta seria a situação, se um Estado estrangeiro
solicitasse ao tribunal do outro Estado uma sentença declarativa da existência de um crédito,
em face das leis tributárias do primeiro. Cfr. op. cit., 176.
14 Da lei aplicável, 300-301, nota 458; A. MARQUES DOS SANTOS, As normas de aplicaçífu imediata
no Direito Internacional Privado, II, Coimbra 1991, 806 ss.; FANTOZZI, Diritto Tributario,
Turim 1991, 160; SACCHEITO, Tutela all'estero, 125 e nota.
CAPÍTULO II
ASSISTÊNCIA NA TROCA DE INFORMAÇÕES, NOTIFICAÇÃO
E EXECUÇÃO DE CRÉDITOS TRIBUTÁRIOS

§ 10 TROCA INTERNACIONAL DE INFORMAÇÕES

A) Conceito e natureza
o instituto da troca internacional de informações insere-se no quadro das me-
didas de assistência administrativa prestadas pelos Estados de modo a satisfazer pe-
didos formulados por outros Estados no sentido de obtenção de informações que,
localizando-se no exterior do seu território, não podem ser por eles diretamente ob-
tidas pela prática de atos de autoridade, em razão da força imperativa dos mesmos se
circunscrever ao ;lmbito desse território, já que uma extraterritorialidade em sentido
formal constitui violação de soberaniaI.

1 Cfr. ALBERTO XAVIER, Direito Tributário Internacional do Brasil (6" ed.), 836. Sobre troca de in-
formações, veja -se a monografia exaustiva de PIERRE LEVINE, La lutte contre l'evasion fiscale de
caractere international en l'absence et en présence de conventions internationales, Paris 1988; OCDE,
Échange de renseignements fiscaux entre les pays membres de I'OCDE, Paris 1994; ORGANIZAÇÃO DAS
NAÇÕES UNIDAS, International Cooperation in Tax Mi:ttters. Cuidelines for International Cooperation
against the Evasion andAvoidance ofTaxes, Nova York 1984; MENCK, in MÓssNER/et ai., Steuerrecht
international tiitiger Unternehmen, Colônia 1992, 386 ss.; SOL PICCIOITO, International Business
Taxation, Londres 1992,257 ss.; PIETRO AnDONNINO, Lo scambio di informazioni fra amminis-
trazioni finanziarie, in VICTOR UCKMAR (org.), Corso di Diritto tributario Internazionale, Pádua
1999, 891; HELENO TÔRRES, Pluritributação internacional sobre as rendas de empresas, São Paulo,
670 ss.; SÉRGIO AUGUSTO G. PEREIRA DE SOUZA, Intercâmbio de informações tributárias entre
administrações estrangeiras: Avanços atuais, conexões com o combate à lavagem de dinheiro e o
contexto brasileiro, RDDT96 (2003), 89. MARCUS ABRAHAM, O sigilo fiscal e os acordos interna-
cionais para o combate a evasão, a elisão e a sonegação fiscal, in HELENO TAVEIRA TÔRRES (org.),
Direito Tributário InternacionalAplicado, voI. V, São Paulo 2008,761; EDUARDO JOBIM, A troca de
informações no Direito Tributário Internacional, in HELENO TAVElRA TÔRRES (org.), Direito Tri-
butário Internacional Aplicado, voi. Iv, São Paulo 2007, 475; ID., A troca de informações no Di-
reito Tributário Internacional e seus reflexos nos direitos fundamentais dos contribuintes, RTFP
74 (2007), 225; BONl DE MORAES SOARES, O futuro da cooperação internacional em matéria fiscal
• I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

N a impossibilidade da exigência imperativa, por um Estado, de prestação de


informações a residentes do outro Estado, torna-se necessária a colaboração ativa do
Estado onde se localiza a informação pretendida, pela residência do sujeito que dela
dispõe ou por qualquer outra conexão relevante, de modo a que este último Estado
exerça os seus poderes administrativos próprios, no âmbito do seu território, no sen-
tido de obter a informação pretendida e de, posteriormente, a transmitir ao Estado
que nela tem interesse.
A expressão "troca" de informações não significa que cada informação prestada
por um Estado tenha como contrapartida uma outra informação prestada pelo outro
Estado, como que numa "do ut des" típico das permutas. "Troca" alude, isso sim, ao
caráter bilateral dos acordos que preveem este tipo de assistência administrativa, no
sentido de que idêntica obrigação de auxílio assiste a ambos os Estados, em idênticas
circunstâncias, e não apenas a um deles, mas sem que as prestações de auxílio, indivi-
dualmente consideradas, tenham uma contrapartida onerosa ou sinalagmática.
Trata-se de matéria governada por normas instrumentais que integram o Direito
Tributário Internacional em sentido formal e que se situam não já na esfera de delimi-
tação de competência legislativa dos Estados em presença (como na dupla tributação
internacional), mas na de delimitação de eficácia das leis no espaço, mediante a prá-
tica de atos de império pelos órgãos nacionais de aplicação do direito, especialmente
os atos administrativos necessários à fiscalização e lançamento de tributos 2 •
Muito embora as normas sejam de natureza distinta das que regulam as questões
relativas à dupla tributação - e que respeitam ao problema do concurso de leis -, o
certo é que elas frequentemente se encontram inseridas nos tratados contra a dupla
tributação, tendo em vista que uma das suas finalidades possíveis é a prevenção da
evasão fiscal. A verdade é que a matéria de troca de informações pode ser objeto de
acordos que a tenham como objeto exclusivo (TIEA - Tax Information Exchange
Agreements), como pode ainda decorrer de fontes puramente internas que, indepen-
dentemente de um tratado, estabeleçam as hipóteses em que um Estado se obriga
unilateralmente a prestar informações a outros, submetendo, porém, via de regra,
essa obrigação à condição de reciprocidade.
As disposições convencionais relativas à troca de informações não têm o alcance
de criar diretamente deveres na esfera jurídica dos particulares residentes nos Estados
contratantes. A sua função se esgota na atribuição aos próprios Estados da obrigação
de informar, cabendo a estes a obtenção das informações necessárias junto dos parti-
culares subordinados à sua esfera de jurisdição.

no Brasil: notas sobre a Convenção de Estrasburgo de 1988, RDTI 10 (2008), 51; AGOSTINHO
TAVOLARO, A troca de informações fiscais no contexto internacional, Revista Brasileira de Direito
Tributário e Finanças Públicas 3 (2007), 14.

2 Cfr. ALBERTO XAVIER, op. cit., 56.


~VII I Capo 11 I Assistência na Troca de Informações, Notificação ... ih"
Consequentemente, a assunção da obrigação de informar com a amplitude exi-
gida pelo tratado obriga implicitamente os Estados às eventuais modificações na sua
legislação interna necessárias para o cumprimento daquela obrigação.
A recusa de prestação de informações com base na existência de leis internas
(inclusive constitucionais) que tornem impossível aquela prestação constitui violação
do tratado, que permite ao outro Estado a sua denúncia e a invocação de responsa-
bilidade internacional.

B) Fontes

No que concerne às fontes internacionais em matéria de troca de informações,


importa sublinhar que os modelos a que, via de regra, obedecem os tratados que as
preveem sofreram recentemente significativas alterações 3 •
A nova política em matéria de troca de informações que se intensificou no início
deste século ganhou especial relevância com a eclosão da crise financeira de setembro
de 2008 e as declarações enfáticas e imperativas do G-20 em abril de 2009.
Trata-se de implacável combate ao segredo bancário e outras manifestações de
falta de transparência sobre a propriedade dos ativos, em especial nos chamados
centros frnanceiros e paraísos fiscais, qualificada como concorrência fiscal prejudicial
(harmful tax competition) desde o importante relatório da OCDE sobre a matéria4 •
Este combate tem sido conduzido em nome da defesa da integridade dos sistemas
fiscais, sufocados por vultosos encargos militares, de bem-estar social e agora de ma-
ciças ajudas ao sistema financeiro e ameaçados por distorções e vácuos propiciadores
de evasão. A isto acresce o clamor pela equidade no tratamento dos cidadãos, rompi-
da quando a poupança oculta de uns conduz à oneração de outros.
A "nova política" encontra-se essencialmente corporizada em documentos in-
ternacionais que exprimem o padrão considerado "ideal" neste domínio e cuja ino-
bservância coloca sob severa suspeição os Estados e territórios que com ele não se
conformem: o Modelo de Acordo da OCDE sobre troca de informações em matéria
fiscal de 2002; a nova versão do art. 26 da Convenção Modelo da OCDE sobre tra-
tados fiscais, introduzida na revisão de 2005 (especialmente os novos §§ 4° e 5°); a
nova versão do art. 26 da Convenção Modelo das Nações Unidas sobre dupla tribu-
tação entre países desenvolvidos e em desenvolvimento, adotada em 2006.
A Convenção Modelo da OCDE sobre troca de informações de 2002 contém
uma versão bilateral e uma outra multilateral, que visa a permitir que um Estado
celebre uma pluralidade de acordos bilaterais todos referidos a um tratado comum,

3 O parágrafo único do art. 199 do Código Tributário Nacional, acrescentado pela Lei Comple-
mentar nO 104/2001, estabelece (redundantemente) que: "A Fazenda Pública da União, na forma
estabelecida em tratados, acordos ou convênios, poderá permutar informações com Estados es-
trangeiros no interesse da arrecadação e da fiscalização de tributos".
4 Cfr. OCDE, Harmfol Tax Competition, Paris 1998.
_ I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

que lhes serve de fonte e de padrãoS. Não se trata, pois, em rigor de um verda-
deiro tratado multilateral, pois apenas são vinculantes os acordos bilaterais em si
mesmos considerados, mas de um tratado-quadro, contendo um pactum de modo
contrahendi6 .
O novo art. 26 da Convenção Modelo da OCDE, na sua versão oficial em in-
glês, assim estabelece:
''Artigo 26
"TROCA DE INFORMAÇÕES
"1. As autoridades competentes dos Estados Contratantes trocarão entre si as
informações que sejam previsivelmente relevantes para a aplicação das dispo-
sições da presente Convenção ou para a administração ou a aplicação das leis
internas dos Estados Contratantes relativas aos impostos de qualquer natureza
ou denominação cobrados em benefício dos Estados Contratantes ou das suas
subdivisões políticas ou autoridades locais, na medida em que a tributação nelas
prevista não seja contrária a esta Convenção. A troca de informações não é res-
tringida pelo disposto nos parágrafos 1° e 2.°
"2. As informações obtidas nos termos do parágrafo 1° por um Estado Contra-
tante serão consideradas confidenciais do mesmo modo que as informações ob-
tidas com base na legislação interna desse Estado, e só poderão ser comunicadas
às pessoas ou autoridades (incluindo tribunais e autoridades administrativas)
encarregadas do lançamento ou arrecadação dos impostos referidos no número
1 ou dos procedimentos declarativos ou executivos, ou das decisões de recursos
relativos a esses impostos, ou do seu controle. Essas pessoas ou autoridades
utilizarão as informações assim obtidas apenas para os fins referidos. Essas in-
formações poderão ser reveladas no decurso de audiências públicas de tribunais
ou em decisões judiciais.
"3. O disposto nos parágrafos 1° e 2° não poderá em caso algum ser interpreta-
do no sentido de impor a um Estado Contratante a obrigação:
a) De tomar medidas administrativas contrárias à sua legislação e à sua
prática administrativa ou às do outro Estado Contratante;
b) De fornecer informações que não possam ser obtidas com base na sua
legislação ou no âmbito da sua prática administrativa normal ou das
do outro Estado Contratante;

5 Este Modelo foi desenvolvido por grupo de trabalho do Fórum Global da aCDE, constituído
por representantes de membros da aCDE e delegados de Aruba, Bermudas, Bahrain, Ilhas Cay-
man, Chipre, Ilha de Man, Malta, Ilhas Maurícias, Antilhas Holandesas, Seicheles e San Marino.
Cfr. MES V fu'J RAAD (ed.), Materials on International & EC Tax Law, vaI. I, 2003, 547 ss.
6 "The nature of the multilateral version as more of a bundle of identical bilateral treaties rather than a
'true' multilateral agreements". Cfr. aCDE, Agreement, Comentários, parágrafo 115. A Conven-
ção está hoje (dezembro de 2009) em vigor em relação ao Azerbaij·ão, Bé?gica, Dinamarca, Finlândia,
França, Islândia, Itália, Holanda, Noruega, Pownia, Suécia, Ucrânia, Reino Unido e Estados Unidos.
~~ I Capo 11 I Assistência na Troca de Informações, Notificação ...

c) De transmitir informações reveladoras de segredos ou processos co-


merciais, industriais ou profissionais, ou informações cuja comunica-
ção seja contrária à ordem pública.
"4. Se forem solicitadas informações por um Estado Contratante em conformi-
dade com o disposto no presente Artigo, o outro Estado Contratante utilizará
os poderes de que dispõe a fim de obter as informações solicitadas, mesmo
que esse outro Estado não necessite de tais informações para os seus próprios
fms fiscais. A obrigação da frase anterior está sujeita às limitações previstas no
parágrafo 30, mas tais limitações não devem, em caso algum, ser interpretadas
no sentido de permitir que um Estado Contratante se recuse a prestar tais in-
formações pelo simples fato de estas não se revestirem de interesse para si, no
âmbito interno.
"5. O disposto no parágrafo 30 não pode em caso algum ser interpretado no sentido
de permitir que um Estado Contratante se recuse a prestar informações unicamente
porque estas são detidas por um banco, outra instituição fmanceira, um mandatário
ou por uma pessoa agindo na qualidade de agente ou fiduciário, ou porque essas
informações são conexas com os direitos de propriedade de uma pessoa".

C) Características e modalidades

Na sua fisionomia tradicional, o instituto da troca de informações apresenta as


características fundamentais de ser: (i) obrigatória, (ii) supletiva, (iii) provocada, (iv)
secreta e (v) especial.
Obrigatória) pois que a prestação de informações não é uma simples faculdade
das autoridades requeridas, mas sim uma obrigação convencional; supletiva) enquan-
to a legitimidade do próprio requerimento depende de se haver previamente tentado
exercer, sem êxito, os meios facultados pela legislação interna do Estado requerente;
provocada) na medida em que as informações não são prestadas espontaneamente,
de ofício, pelas autoridades, mas apenas por solicitação expressa das autoridades do
outro Estado contratante; secreta) posto que as informações em causa só podem ser
comunicadas às autoridades encarregadas do lançamento, cobrança ou julgamento
dos impostos no Estado requerente; especial) porquanto o pedido deve versar apenas
sobre um caso específico, tendo em vista a apuração dos fatos a ele referentes e não
sobre uma pluralidade de casos afins ou conexos.
No que respeita à iniciativa, as trocas de informações classificam-se em a pedido
(on request), automáticas e espontâneas. O art. 26 da Convenção Modelo da OCDE,
bem como o Modelo OCDE de Acordo de troca de informações, reporta-se exclusi-
vamente às informações "a pedido", isto é, dependentes da iniciativa de um Estado
interessado na sua obtenção.
Ao lado delas, a prática internacional conhece o fenômeno das injimnaçães automá-
ticas) de que é exemplo o Memorando de Entendimentos da OCDE, respeitante à cir-
B I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

culação internacional de informações, sob forma magnética ou eletrônica, sobre várias


categorias de rendimentos tendo a sua fonte num Estado e recebidas em outro ou ou-
tros. É também nesta modalidade que se incluem as informações sobre juros previstas na
Diretiva da União Europeia sobre poupanças (2003j48jEC, de 10 de julho de 2005).
Enfim, consideram-se espontâneas as informações que um Estado adquiriu atra-
vés de certa fiscalização e que, por serem do interesse de outro Estado, a este são
transmitidas, numa base casuística e independentemente de uma solicitação de sua
iniciativa 7 .
No que respeita aos meios instrutórios, a Convenção Modelo da OCDE não
prevê expressamente, mas admite práticas consagradas em experiências modernas de
colaboração internacional, como as fiscalizações simultâneas exercidas pelas autorida-
des de ambos os Estados, cada uma no seu território, dos assuntos de um mesmo
contribuinteS; as trocas de informações por tipo de indústrias (industry-wide) abrangen-
do todo um setor de economia (por exemplo, o farmacêutico ou o do petróleo)
e não contribuintes individualmente considerados; e as fiscalizações no exteri01) que
consistem na solicitação pelo Estado requerente da presença no Estado requerido de
representantes das autoridades fiscais do primeiro para colaborar, total ou parcial-
mente, em certa diligência instrutória, notadamente mediante entrevistas a indivídu-
os e exame de documentos, desde que com o consentimento do Estado requerido e
das pessoas envolvidas.
Note-se que, neste último caso, a colaboração de funcionários estrangeiros não
representa exercício extraterritorial de autoridade, ofensiva da soberania, pois não se
trata da prática de atos estrangeiros de direito público dotados de imperatividade e
executoriedade, mas tão somente de colaboração auxiliar e subordinada, em matéria
de prova, expressamente autorizada pelas autoridades nacionais 9 •

D)Âmbito

Há que distinguir o âmbito objetivo e o âmbito subjetivo: o primeiro respeita aos tri-
butos abrangidos pelo pedido de informações e às condutas a que ele se refere; o segun-
do diz respeito à delimitação do círculo de pessoas a que as informações concernem.
No que concerne aos tributos abrangidos pelas informações, há que observar
que eles não se restringem aos impostos contemplados pela convenção contra a du-

7 Cfr., por exemplo, o art. 26, § 2°, da Convenção entre o Brasil e Portugal.
8 O art. 26, § 4°, da Convenção com Portugal.
9 Sobre as fiscalizações no exterior, cfr. o art. 6° do Acordo OCDE sobre troca de informações e o
art. V, parágrafo 3°, alíneas c, d e J~ e art. VI do Tratado sobre Intercâmbio de Informações com
os Estados Unidos (ainda não vigente). Veja-se ainda o art. 26, § 4°, da Convenção com Portngal.
Não concordamos com a alegação de inconstitucionalidade de A. CARLOS RODRlGUES DO AMARAL
e HELENO T. TORRES, Inconstitucionalidade do Acordo para Intercâmbio de Informações Tribn-
tárias Brasil-Estados Unidos, Revista Brasileira de Direito Ii-ibutário 10 (set.-out./2008), 33 ss.
L-_ _ _ _ _ _ _--.:T:.:;ít:.:;u::::lo VII I Capo 11 I Assistência na Troca de Informações, Notificação... g

pia tributação em causa (como sucedia na versão do Modelo OCDE de 1963, nos
termos da chamada minor information clause); antes abrangem tributos de qualquer
natureza e denominação exigidos por um Estado e até suas subdivisões políticas e
autoridades locais (major information clauseJlo.
A matéria aduaneira encontra-se, porém, submetida a acordos especiais l l .
Quanto às condutas) o dever de informação abrange, no Modelo OCDE, qual-
quer tipo de matéria fiscal, sem que o Estado requerido possa restringir esse dever
a matéria considerada como "criminal" tanto pelo Estado requerente quanto pelo
Estado requerido (princípio chamado da "dupla qualificação", adotado tradicional-
mente na Suíça e no Luxemburgo). Significa isto, na prática, que o dever de informar
passa a abranger toda e qualquer conduta de evasão fiscal, ainda que não qualificada
como crime ou fraude em sentido estrito (a civil fraud por contraposição à criminal
fraud na terminologia anglo-saxônica).
Quanto ao âmbito subjetivo) as informações podem referir-se não apenas a resi-
dentes, mas também a pessoas não residentes no Estado requerido, uma vez que o §
1° do art. 26 declara que as informações não estão restritas ao art. la da Convenção
Modelo respeitante à esfera pessoal de aplicação dos tratados!2.

E) Fundamentos do pedido e de sua recusa legítima

a) Considerações gerais
o fundamento do pedido de prestação de informações é a "relevância previsí-
vel" (foreseable relevance) da informação para a parte requerente (art. 26, § 1°).
Esta relevância deve ser demonstrada através da identificação da pessoa fiscaliza-
da; do tipo de informação pretendido; do propósito fiscal para o qual é pedido; dos
fundamentos da convicção de que a informação requerida é possuída pelo Estado
requerido ou se encontre na posse ou no controle de pessoas estabelecidas no seu ter-

10 Cfr. VOGEI., Double Taxation, 1997, 1403; ID., Supl. 94, 155. Cfr. OCDE, Comentários, art. 26,
parágrafos 11.1 e 11.2. A Convenção Modelo da OCDE sobre troca de informações abrange
apenas impostos diretos sobre o rendimento, o capital, o patrimônio, as sucessões e doações. Veja,
porém, o ãmbito mais vasto do Acordo do Brasil com os Estados Unidos (ainda não vigente), que
abrange, além de imposto de renda, o IPI, O ITR, o IRF, o PIS, a COFINS e CSLL (artigo IH).
11 Em matéria aduaneira, são os seguintes os acordos em vigor que prcveem especificamente o in-
tercâmbio de informações: I - Acordo Multilateral sobre Cooperação e Assistência Mútua entre
as Direções Nacionais de Aduanas da América Latina, assim como Espanha e Portugal (COMU-
CAM); II - Acordo de Cooperação Administrativa Mútua para a Prevenção, a Pesquisa e a Re-
pressão às Infrações Aduaneiras entre Brasil e França; lU - Protocolo de Cooperação e Assistência
Recíproca entre as Administrações de Alfândegas do Mercosul relativo à Prevenção e Luta contra
os ilícitos Aduaneiros.
12 Cfr. VOGEl., Double Taxation, cit., J 413, advertindo que esta regra não se aplica aos tratados
celebrados anteriormente, ao abrigo do Modelo de 1963 (1431); MARIA MARGARIDA CoRDEIRO
MESQUITA, Troca de injimnações e cooperaç@ fiscal internacional, 342.
Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

ritório, bem como da identificação destas; da declaração de que o pedido é conforme


à lei e à prática administrativa do Estado requerente; e de que este esgotou todos os
meios disponíveis para obter a informação no seu território 13 •
São essencialmente quatro os motivos de recusa legítima da prestação de in-
formações pelo Estado requerido: (i) a tributação a que a informação respeita ser
contrária à convenção contra a dupla tributação (§ 1° in fine); (ii) a informação
supor medidas administrativas não previstas na lei e na prática quer do Estado reque-
rido, quer do Estado requerente; (iii) a informação não ser suscetível de obtenção à
sombra das leis ou da prática administrativa tanto do Estado requerido, quanto do
Estado requerente; (iv) a informação poder revelar qualquer segredo negocial, em-
presarial, industrial, comercial ou profissional ou ainda um processo comercial; e (v)
a revelação da informação ser contrária à ordem pública (§ 3°)14.
Mas já não constitui motivo legítimo de recusa de prestação de informações,
segundo o novo § 4° do art. 26 (introduzido em 2005), a alegação pelo Estado reque-
rido de que elas não são necessárias às pretensões fiscais do Estado requerente, o qual
tem legitimidade para as solicitar independentemente de um seu domestic interestls .
O instituto da troca de informações desvincula-se, assim, na "nova política",
de uma função instrutória ou probatória intimamente conexa a um certo procedi-
mento de lançamento em caso concreto para revestir um caráter de certo modo mais
"abstrato", posto ao serviço de uma pluralidade não especificada de finalidades, que
podem ir desde o aperfeiçoamento do sistema fiscal do Estado requerente até (e este
ponto é particularmente delicado) à sua colaboração com terceiros Estados que não
sejam parte do acordo.
A desnecessidade de existência de um interesse direto e imediato do outro Es-
tado Contratante não o dispensa, porém, de fundamentar o pedido numa relevância
previsível que justifique o ônus representado pela obrigação de prestação de infor-
mação pelo Estado requerido.

b) A questão do segredo bancário e profissional


Trata-se da clássica questão relativa aos limites legais eventualmente existentes à
obrigação de transmissão, por terceiros, do conhecimento de fatos obtidos em razão de
cargo, ofício, função, ministério, atividade ou profissão que a lei submeta à obrigação

13 Trata-se de requisitos exigidos no art. 5° do Acordo-Modelo OCDE de Troca de Informações,


mas que parece aplicável às convenções sobre dupla tributação. Veja também o art. 5°, parágrafo
4°, do Acordo de Troca de Informações Brasil-Estados Unidos (ainda não vigente).
14 Cfr. KLUGE, Das dcutsche Internationale Steurrecht (3 a ed.), Munique 1992, 330. O Bundesfinan-
zhof tem entendido que o segredo em causa é apenas o que tem valor econômico para terceiros e
cuja revelação pode causar dano à economia do país que presta informações. Cfr. BAKER, Double
Taxation Agreements and International Tax Law, Londres 1994, 444; Cfr. MARIA EDUARDA AzE-
VEDO, O segredo bancário, Lisboa 1989, 13.
15 OCDE, Comentários, art. 26, parágrafos 19.6 e ss.
Título VII I Capo 11 I Assistência na Troca de Informações, Notificação... g
~------------~--

de observância de segredo, limites estes que veriam consoante as esferas de interesse


público atingidas, criminal, processual civil, de investigação parlamentar ou fiscal l6 .
Inovação de grande relevo adotada em 2005 foi a inclusão de um novo § 5°
ao art. 26 da Convenção Modelo determinando a expressa vedação de o Estado re-
querido invocar o segredo bancário ou profissional, eventualmente protegido pelas
suas leis internas, como fundamento de recusa de fornecer informações em poder
das entidades titulares dessa prerrogativa estabelecidas no seu território l7 • Por outras
palavras: trata-se da inoponibilidade de leis internas consagradoras do sigilo em ma-
téria fiscal nas relações com Estado estrangeiro ao abrigo de tratado internacional.
Uma forte pressão da OCDE e de outros foros internacionais tem instado a
generalidade dos países a adaptar as suas leis internas de modo a poder cumprir com
a obrigação de informação em causa.
Abrange, por parte dos bancos e demais instituições financeiras, informações
financeiras, contábeis e transacionais relevantes, incluindo as relativas à identidade
do cliente e às partes das operações financeiras, que devem ser do conhecimento da-
quelas instituições, ao abrigo das regras know your customerl8 .
Abrange ainda amplo dever de informação sobre a estrutura jurídica da propriedade
de ativos por parte de toda e qualquer pessoa que atue na condição de agente fiduciário,
nominee ou manager, sem que possa invocar segredo profissional ou prerrogativa pessoal;
todos estes profissionais deverão revelar os titulares reais de estruturas jurídicas corporati-
vas ou contratuais de qualquer natureza, sócios, fundadores, settlors) frustees) ou beneficiá-
rios de fundações, situados em um ou mais elos de uma cadeia de participações l9 .

16 Veja-se, por exemplo, entre nós as limitações em matéria de processo civil (arts. 347 e 363 do CPC
e art. 229, l, do Código Civil). Em matéria fiscal dispõe o art. 197 do Código Tributário Nacional
que: "Mediante intimação escrita, são obrigados a prestar à autoridade administrativa todas as in-
formações de que disponham com relação aos bens, negócios ou atividades de terceiros: l-os tabe-
liães, escrivães e demais serventuários de oficio; II - os bancos, casas bancárias, Caixas Econômicas
e demais instiruições financeiras; III - as empresas de administração de bens; N - os corretores,
leiloeiros e despachantes oficiais; V - os inventariantes; VI - os síndicos, comissários e liquidatários;
VII - quaisquer outras entidades ou pessoas que a lei designe, em razão de seu cargo, ofício, função,
ministério, atividade ou profissão". "Parágrafo único. A obrigação prevista neste artigo não abrange
a prestação de informações quanto a fatos sobre os quais o informante esteja legalmente obrigado
a observar segredo em razão de cargo, ofício, função, ministério, atividade ou profissão". No que
respeita a informações relativas ao próprio contribuinte o art. 195 do mesmo Código dispõe que:
"Para os efeitos da legislação tributária, não têm aplicação quaisquer disposições legais excludentes ou
limitativas do direito de examinar mercadorias, livros, arquivos, documentos, papéis e efeitos comer-
ciais ou fiscais dos comerciantes, industriais ou produtores, ou da obrigação destes de exibi-los".
17 O Brasil reservou-se o direito de não incluir o novo § 5° nos seus tratados. Cfr. Non Member
Countries Positions, OCDE, Comentários, art. 26, parágrafo 2.3. Cfr. MENCK, in MóssNER/ et
aI., Steuerncht international tiitiger Unternehmen, 391; ETLERs, Das SteuC1;geheimnis ais Grenze des
internationalen Auskunftsverkehrs, Colônia 1989.
18 Cfr. a Lei Complementar nO 105, de 10 de janeiro de 2001, que regula o dever de sigilo das ins-
tituições financeiras e seus limites, notadamente nas suas relações com o Fisco (espcc. arts. 5° e
6°). Ver ainda o Decreto nO 4.489, de 23 de novembro de 2002.
19 Cfr. OCDE, ImprlJVing Access to Bank Information for Tax Purposes: the 2007 Progress Report.
Gim I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier • ,~_ _ _ _ _ _ _ _ _ _--'

Por sua vez, o privilégio de confidencialidade na relação advogado-cliente só é


invocável na medida em que a informação tenha sido transmitida para obter conse-
lho jurídico ou para utilização em processo pendente ou futuro. A condição de advo-
gado, por si só, não exonera do dever de informação dados na sua posse, desde que
lhe tenham sido transmitidos para outros efeitos, tais como atuar como procurador,
depositário ou nominee 20 •
As medidas atrás referidas abrangem apenas as informações sob pedido específi-
co, preciso e fundamentado, mas não assim as automáticas, continuando estritamen-
te vedadas as chamadas expedições de "pesca de informações" (fishing expeditions)
pelo exame indiscriminado de contas bancárias 21 .
A explícita ameaça das mais severas medidas de retaliação contra os países ou
territórios que resistirem a acolher o novo modelo - agravamento de retenções na
fonte, renegociação de tratados, restrições a ajudas financeiras por bancos regionais,
inclusão em listas negras -, aliada à necessidade de sobrevivência e defesa de repu-
tação, levou a que tenham sido desmanteladas, com surpreendente velocidade, as
últimas muralhas que ainda protegiam as zonas de opacidade financeira e jurídica.
Numerosos tratados bilaterais de troca de informações, seguindo o Modelo OCDE,
foram ou estão sendo negociados entre países da OCDE (por exemplo, Estados Uni-
dos, Reino Unido, Alemanha, Holanda, Países Nórdicos, Austrália, Nova Zelândia) e
paraísos fiscais (Uhas de Jersey, de Man e Guernesey, Antilhas Holandesas, Bermudas,
Bahamas, Uhas Virgens Britânicas, Uhas Cayman, entre outros) 22. Paradigmático neste
sentido é o tratado de troca de informações celebrado entre os Estados Unidos e o Lie-
chtenstein, em 8 de dezembro de 2008, para entrar em vigor em 2010 23 .
A Áustria, a Bélgica, o Luxemburgo e a Suíça retiraram as reservas formuladas
ao novo § 5° do art. 26 do Modelo OCDE e iniciaram conversações para renegociar
os seus tratados nas novas bases 24 .

20 Cfr. OCDE, Comentários, art. 26, parágrafos 19.3 e 19.4. Veja·se, entre nós, o inciso IX do art.
7° da Lei na 8.906, de 4 de julho de 1994 (Estatuto do Advogado e da OAB), que reconhece
como direito do advogado "recusar·se a depor como testemunha em processo no qual funcionou
ou deva funcionar, ou sobre fato relacionado com pessoa de quem seja ou foi advogado, mesmo
quando autorizado ou solicitado pelo constituinte, bem como sobre fato que constitua sigilo
profissional". Ver ainda o inciso II, alterado pela Lei nO 11.767/2008: "Ir - a inviolabilidade de
seu escritório ou local de trabalho, bem como de seus instrumentos de trabalho, de sua correspon·
dência escrita, eletrônica, telefônica e telemática, desde que relativas ao exercício da advocacia".
21 Cfr. OCDE, Comentários, art. 26, parágrafo 5.
22 Mais de 50 tratados foram assinados desde novembro de 2008, mais do que nos últimos dez anos.
23 O Liechtenstein celebrou também tratado com o Reino Unido e já iniciou negociações com a
Alemanha. Cfr. DAVID SPENCER/J. C. SHARMAN, International Cooperation,journal oflnternatio·
nal Taxation, fevereiro de 2008.
24 Em outubro de 2009 ArrIba, Áustria, Bégica, Bermudas, Ilhas Virgens Britânicas, Bahrein, Ilhas
Cayman, Luxemburgo, Mônaco, Antilhas Holandesas, São Marino e Suíça pasaram à categoria de
jurisdições que implementaram substancialmente o padrão internacional. Cfr. OCDE,Improvíng
the Acess to Bank Informatíon, cit.
~yll I Capo 11 I Assistência na Troca de Informações, Notificação ... • ".

o Liechtenstein, Andorra e Mônaco, anteriormente classificados como paraísos


fiscais não cooperativos, já se comprometeram em 2009 a acatar o padrão interna-
cionalmente aceite.
Mais recentemente, já na sequência da reunião do G-20, a Costa Rica, a Malá-
sia, as Filipinas e o Uruguai (os últimos "paraísos não cooperativos" integrantes da
"lista negra") abandonaram a "linha dura"25.
O objetivo de tais países e territórios é poderem ser considerados como tendo
"substancialmente implementado" o padrão OCDE de troca de informações, o que
se presume quando tenham celebrado tratados ou adotado mecanismos unilaterais
com, pelo menos, 12 países daquela Organizaçã026 , saindo então da "lista cinza".
Na sequência desta progressiva abertura do segredo bancário e da identidade dos
proprietários de ativos, diversos países adotaram medidas de informação voluntária
de haveres não declarados, visando a estimular a repatriação de fundos acobertados
em centros financeiros e paraísos fiscais. Umas dessas medidas revestiram a forma de
anistia, total ou parcial, exonerando de penalidades e tributando a alíquota reduzida
(Bélgica, Alemanha, Grécia, Itália, México, Portugal, Rússia, África do Sul), outras
limitaram-se à mitigação das multas e à garantia de não perseguição penal (Estados
Unidos, Reino Unido, Canadá, Irlanda).
A capitulação incondicional em matéria de sigilo anuncia o fim de uma era de
tolerância e um futuro crepuscular para os "paraísos fiscais" e centros financeiros que
apenas sobreviverão se baseados numa especialização e reputação profissional de alto
padrão ou na função auxiliar de veículos societários, mas doravante transparentes,
agilizadores de transações e estruturações internacionais.
Importa, porém, estabelecer limites rígidos para que o espírito inquisitório dos
sistemas fiscais mais vorazes não atropele os direitos fundamentais ao sigilo de dados,
à intimidade e à vida privada, que são inerentes ao Estado de Direito. Nem que se
deposite uma confiança sem limite nos escrúpulos e na ética dos funcionários recep-
tores da informação, porventura sujeitos à tentação de seu desvio para outros fins. A
corrupção e a intimidação, sob a máscara do Estado, são tanto ou mais temíveis que
a evasão fiscal 27 •

25 Assim, todas as 41 jurisdições identificadas como paraísos fiscais aceitaram o compromisso de


implementar os princípios de transparência e efetiva troca de informações.
26 LUIS MANUEL ALONSO GONzÁLEZ, EI control internacional sobre los países de baja tributación y
las regias de exclusión de las "listas negras": eI papel dei intercambio de información, in HELENO
TAVEIRA TÓRREs (org.), Direito Tributário InternacionalAplicado, vol. V; São Paulo 2008, 855.
27 O Supremo Tribunal Federal inclina-se para considerar que o segredo bancário, conquanto corolá-
rio do direito à inviolabilidade da intimidade e da vida privada, consagrado no inciso X do art. 5°
da CF, é um clireito relativo e não absoluto, não sujeito à reserva de jurisdição no que concerne à sua
quebra. Cfr. MIGUEL REALE / lVES GANDRA DA SILVA MARTINS, Sigilo bancário. Inconstitucionalida-
de do Decreto nO 4.489/2002, in Sigilo bancário e focal (Quartier Latin) São Paulo 2005, 43 ss.
I q I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier ..
F) Confidencialidade ou sigilo fiscal
As informações prestadas encontram-se protegidas pela salvaguarda da confi-
dencialidade ou segredo. Significa ela que as informações devem ser mantidas secretas
por parte das entidades fiscais do Estado requerente do mesmo modo que as obtidas
à sombra das leis internas do Estado requerido e só deverão ser reveladas às autori-
dades (incluindo tribunais e órgão administrativos) competentes para o lançamento,
arrecadação, execução ou supervisão de tributos, bem como de julgamento de recur-
sos em matéria tributária.
Trata-se aqui do "sigilo do Fisco" e não do "sigilo perante o Fisco" que, após
uma quebra, teria sido para este transferid028 .
As autoridades dos Estados contratantes só podem utilizar as informações para
os fins acima referidos, podendo, porém, revelá-las em processos judiciais públicos
ou em decisões judiciais (art. 26, § 2°). É estritamente vedada a transmissão das
informações a terceiros Estados, bem como a autoridades do Estado requerente que
prossigam outros interesses públicos, tais como a prevenção e repressão da lavagem
de dinheiro, da corrupção e do terrorismo, salvo se uma cláusula convencional ex-
pressamente o autorizar29 •

G) As Convenções celebradas pelo Brasil

As Convenções contra a dupla tributação celebradas pelo Brasil e amalmente em


vigor seguem a redação adotada pelo modelo OCDE, na sua versão tradicional, ante-
rior à revisão de 2005, dela apenas se afastando a Convenção com Portugal de 200l.
Esta Convenção vai bem mais longe que as demais convenções celebradas pelo
Brasil em matéria de troca de informações. Por um lado, ela prevê tal troca em caráter
espontâneo e automático) que não apenas provocado, quando: a) tiver motivos para
supor que houve pagamento a menos de imposto resultante da transferência artificial
de lucros dentro de um grupo de empresas; b) do uso de informações anteriormente
recebidas do outro Estado Contratante, surgirem novos danos ou antecedentes que
sejam de utilidade para a tributação nesse outro Estado Contratante; c) qualquer ou-
tra circunstância que leve à suposição de existência de perda de receitas para o outro
Estado Contratante (art. 26, § 2°).

28 Sobre o equilíbrio entre interesses do Estado e proteção do cidadão a obra fundamental é de


TONNY SCHENKGEERS, International Exchange oflnformation and the Protection ofTaxpayers,
Kluwer, 2009. Cfr. OSWALDO OTHON DE PONTES SARAIVA FILHO, O acesso direto em dados
bancários por parte do Fisco, a transferência do sigilo bancário para o sigilo fiscal, in Sigilo
bancário efiscal) cit., 131 SS.; MELISSA FOLMANN, Sigilo bancário efiscal, Curitiba 2004; PAULO
QUEZADO / ROGÉRIO LIMA, Sigilo bancário, São Paulo 2002.
29 Cfr. OCDE, Comentários, art. 26, parágrafo 12.3. Sobre o intercâmbio de informação sigilosa,
no âmbito da Adnúnistração Pública, ver entre nós o art. 198, § 2°, do CTN.
~V~I I Capo 11 I Assistência na Troca de Informações, Notificação ... iHM

Por outro lado, prevê-se a prestação periódica (anual) das seguintes informa-
ções, mediante prévia identificação do contribuinte, ou mesmo independente dela:
a) informações respeitantes aos lucros obtidos no seu território por pessoas jurídicas
ou estabelecimentos estáveis aí situados, a remeter à autoridade competente do Es-
tado Contratante onde esteja domiciliada a pessoa jurídica associada ou a matriz ou
sede; b) informações sobre os lucros declarados por pessoas jurídicas domiciliadas no
primeiro Estado Contratante relativos às operações desenvolvidas no outro Estado
Contratante por pessoas jurídicas associadas ou estabelecimentos estáveis; c) qual-
quer outro tipo de informação que acordem trocar (art. 26, § 3°).
Deve ainda notar-se que a Convenção com Portugal de 2001 é a única Convenção
celebrada pelo Brasil que autoriza representantes do Estado Contratante requerente a
terem acesso ao primeiro Estado mencionado para os fins de presenciarem, na condição
de observadores, a inquiração de pessoas e o exame de livros e registros que sejam realiza-
dos no Estado requerido (art. 26, § 4°), sendo também a única Convenção que prevê
a hipótese de fiscalizaçéÚJ simultânea, pela qual, por mútuo acordo, cada Estado fiscaliza
no seu território, a situação tributária de uma pessoa com pessoas que possuam interes-
ses comuns ou associados, a fim de trocar as informações relevantes que obtenham.
As Convenções com o Peru e a Venezuela (ainda não promulgada) contêm
cláusula que já prevê o acesso a informações bancárias e de representantes, agentes
ou fiduciários de titulares de ativos, submetendo porém o dever de prestação a "limi-
tações constitucionais e legais e a reciprocidade de tratamento", limitações essas que
não são contempladas no novo art. 26 do Modelo OCDE.
Uma obrigação de prestação de informações conforme à nova política da OCDE
encontra-se no Acordo entre o Brasil e os Estados Unidos para o Intercâmbio de
Informações relativas a tributos, celebrado em Brasília, em 20 de março de 2007,
mas que ainda não se encontra em vigor por não se ter completado o procedimento
constitucional para a celebração de tratados internacionais, que envolve o referendo
do Congresso Nacional, a ratificação e a promulgação pelo Chefe de Estado.
Referido acordo adota no seu clausulado mutadis mutandi o Modelo OCDE
sobre troca de informações, contemplando inclusive a previsão da prática de atos
e fiscalizações no território de um Estado por parte de autoridades fiscais do outro
Estado com o consentimento do primeiro 30 •

30 Cfr. MAURÍCIO BRAGA CHAPINOTI, Acordo entre o governo da República Federativa do Brasil
e o governo dos Estados Unidos da América para o intercâmbio de informações tributárias,
RDTI 8 (abr/2008), 83; ARNALDO DE MORAES GODOY, O acordo Brasil-Estados Unidos para
intercâmbio de informações tributárias, RFDT, nO 38, 2009, 37 ss. As críticas de ANTONIO
CARLOS RODRIGUES DO AMARAL e HELENa TAVEIRA TORRES (que nem sempre podemos acom-
panhar) seriam extensíveis ao próprio Modelo OCDE sobre troca de informações, acolhido
pela grande maioria da comunidade internacional e que adotam princípios e regras similares.
Cir. Inconstitucionalidades do Acordo para Intercâmbio de Informações Tributárias Brasil-
Estados Unidos, RBDT 10 (2008), 29 ss". O mesmo se diga do relatório do deputado REGIS
DE OLIVEIRA (Comissão de Finanças e Tributação) ao projeto de Decreto Legislativo nO 413,
de 2007, que aprova o texto do Acordo.
Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Já se alegou inconstitucionalidade formal deste tratado pelo fato de, pelo lado
brasileiro, ter sido assinado pelo Secretário da Receita Federal, quando o ato é da
competência própria do Presidente da República, nos termos do art. 84, VIII, da
Cpl. Cremos que se confunde, neste caso, a simples assinatura do acordo com a rati-
ficação. Enquanto esta última é indelegável, a primeira não o é, podendo ser efetuada
pelos Ministros das Relações Exteriores (como, aliás, é a prática dos tratados brasilei-
ros contra a dupla tributação), que tem poderes de representação por competência le-
gal, ou por qualquer outra autoridade, mas desde que possua Carta de Plenos Poderes
específica outorgada pelo Presidente da República (como é a praxe consagrada no art.
7° da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados). A existência ou não de ade-
quados poderes representativos pelo Secretário da Receita Federal é uma questão de
validade do ato, por razões de competência ou legitimidade, mas não uma questão de
inconstitucionalidade formal, que sucederia, sim, se o referido Secretário subscrevesse
o instrumento de ratificação, que é matéria de competência indelegável.

§ 2° NOTIFICAÇÃO E EXECUÇÃO DE CRÉDITOS TRIBUTÁRIOS ESTRANGEIROS

Além da troca de informações, certos tratados preveem uma modalidade mais


intensa de colaboração: trata-se da assistência na cobrança de tributos, pela qual um
Estado (o Estado requerido) procede à execução forçada, no seu território, de um
tributo devido ao outro (o Estado requerente), mediante os procedimentos previstos
na sua própria lei.
Via de regra, estes procedimentos só são desencadeados quando no Estado reque-
rente se esgotarem infrutiferamente todos os remédios e garantias jurídicas oferecidas ao
contribuinte, tratando-se, por conseguinte, de tributos devidos com caráter definitivo.
Algumas convenções preveem também a notificação por um Estado de decisões
fiscais e documentos análogos emanados de outro Estado, por conta deste últim0 32 •
Em 1981, o Comitê dos Assuntos Fiscais da OCDE elaborou um Modelo de
Convenção concernente à assistência administrativa mútua em matéria de cobrança
de créditos fiscais, tendo o Conselho daquela organização recomendado aos Estados-
membros a celebração de convenções bilaterais baseadas nesse modelo.
Em 1981, a OCDE elaborou um modelo de convenção concernente à assistência
administrativa mútua em matéria de cobrança de créditos fiscais, tendo o Conselho
daquela organização recomendado aos Estados-membros a celebração de convenções
bilaterais baseadas nesse modelo.
Por sua vez, em janeiro de 1988, o OCDE e o Conselho da Europa abriram
para assinatura uma Convenção Multilateral para mútua assistência em matéria fiscal

31 Cfr. A. C. RODRlGUES DO AMARAL/HELENO TORRES, op. cit., 31; no mesmo sentido, relatório
do dep. RÉGlS DE OLIVEIRA.
32 Cfr. RIVIER, Droit Fiscal suisse. Le Droit Fiscal Intemational, Neuchatel, 1983, 325; MENCK,
in MÓssNER/et ai., Steuerrecht, 400.
~ii!1 I Capo 11 I Assistência na Troca de Informações, Notificação ... MMW

(Convenção de Estrasburgo) a qual abrange todo e qualquer auxílio administrativo


mútuo que pode ser executado por autoridades públicas, administrativas ou judiciais,
salvo as relacionadas ao Direito Penal 33 •
No âmbito da União Europeia a Diretiva nO 76/308/CEE, de 15 de março (al-
terada pelas Diretivas nOS 79/1071/CEE, de 6 de dezembro; 2001/44/CE, de 15 de
junho; e 2002/94/CE, de 9 de dezembro), estabeleceu o regime de assistência relati-
va à cobrança de créditos em matéria de imposto sobre o valor acrescentado.
Com a revisão de 2002, foi introduzido na Convenção Modelo da OCDE um
novo art. 27, específico em relação à assistência mútua na cobrança de impostos
(renumerando consequentemente os arts. 27 e 30, como arts. 28 e 31), o qual vem
prever que "os Estados Contratantes prestam assistência mútua para fins da cobrança
dos respectivos créditos fiscais".
O § 1° deste artigo clarifica que a assistência mútua não é restringida aos re-
sidentes dos Estados Contratantes, nem aos impostos abrangidos pela Convenção,
podendo aplicar-se a um crédito fiscal de residente um terceiro Estado (art. 27, § 1°).
Para além disso, estabelece que os procedimentos para a aplicação prática dessa assis-
tência poderão ser resolvidos por comum acordo entre as autoridades competentes
dos Estados Contratantes.
Quanto às formas que a referida assistência pode revestir, os §§ 3° e 4° enun-
ciam as duas modalidades admissíveis. O § 3° vem enunciar as condições em que a
assistência mútua na cobrança de impostos pode ser prestada, estabelecendo a exi-
gência de dois requisitos cumulativos: (i) que para esse efeito o crédito fiscal deve
ser exigível segundo a legislação do Estado solicitante, e (ii) não poder, o respectivo
titular, naquele momento, evitar a sua cobrança segundo a legislação daquele Esta-
do. Por sua vez, o § 4° permite a adoção de medidas cautelares34 pelo outro Estado,
ainda que o crédito fiscal não seja suscetível de cobrança no primeiro Estado, ou seja,
devido por uma pessoa que tenha o direito de impedir a respectiva cobrança.
A expressão "crédito fiscal" não se resume aos impostos abrangidos pela Con-
venção, aplicando-se a qualquer "quantia devida a título de impostos de qualquer
natureza ou denominação cobrados em nome dos Estados Contratantes, das suas
subdivisões políticas ou autarquias locais, desde que a tributação correspondente
não seja contrária à Convenção ou a outro instrumento em vigor entre os Estados
Contratantes, aplicando-se também aos juros, penalidades administrativas e despesas
de cobrança ou de conservação relativas a esses impostos (§ 2°)".

33 Encontra-se publicado em CTF, 363 (1991),289 sS. O respectivo relatório explicativo está
publicado em CTF, 364 (1991), 244 ss. Em maio de 2009 15 países já tinham assinado esta
Convenção. efr. BaNI DE MORAES SOARES, O futuro da cooperação internacional em matéria
fiscal no Brasil: notas sobre a Convenção de Estrasburgo de 1988, RDTI 10 (2008), SI.
34 Por exemplo, o arresto ou o congelamento de ativos antes de um julgamento definitivo, de
forma a garantir a disponibilidade desses ativos na eventualidade de uma cobrança (OCDE,
Cfr. Comentários, art. 27, parágrafo 20).
I fi, I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

o § 3° regula ainda o modo de cobrança do crédito fiscal pelo outro Estado,


devendo essa cobrança ser efetuada de acordo com a legislação desse outro Estado,
aplicável em matéria de cobrança dos seus próprios impostos (exceto no que se refere
aos prazos de prescrição e à prioridade, tal como refere o § 5° desse artig0 35 ), como
se o crédito em causa constituísse um crédito fiscal desse outro Estado.
O art. 27 vem também estabelecer que a existência, validade ou montante de
um crédito fiscal de um Estado Contratante não podem ser avaliados pelos tribunais
ou organismos administrativos do outro Estado Contratante (§ 6°).
Quando, uma vez efetuado o pedido de assistência, se deixarem de verificar as
condições constantes dos §§ 3° e 4° que o originaram, as autoridades competentes
do primeiro Estado contratante deverão de imediato notificar as autoridades com-
petentes do outro Estado, devendo o primeiro suspender ou retirar o seu pedido,
consoante a opção do outro Estado (§ 7°).
Foram também considerados no art. 2 7 limites à obrigação de prestação de assistên-
cia por parte de um Estado Contratante. Assim, o Estado requerido pode recusar-se a
prestar essa assistência quando se trate de: a) tomar medidas administrativas contrárias
à sua legislação e à sua prática administrativa; b) tomar medidas que sejam contrárias à
ordem pública; c) prestar assistência, se o outro Estado não tiver tomado todas as me-
didas razoáveis de cobrança ou de conservação, consoante o caso, de que disponha por
força da sua legislação ou da sua prática administrativa; d) prestar assistência no caso
de os encargos administrativos que daí decorrem, para esse Estado, serem claramente
desproporcionados em relação aos benefícios que o outro Estado possa obter.
Refira-se ainda a importância do art. 25 (troca de informações) para a eficácia
dos procedimentos na cobrança de créditos fiscais. Com efeito, importa assegurar
não só a confidencialidade das informações prestadas, mas também que o art. 26 é
redigido de forma a permitir a troca de informações relativamente a todos os impos-
tos a que o art. 27 se aplica 36 •
Por fim, note-se que este artigo nem sempre será incluído nas convenções celebra-
das entre os Estados Contratantes. Caberá a estes decidir se, e em que medida, é que
existe conveniência na prestação de assistência ao outro Estad037 • Veja-se que das con-
venções celebradas pelo Brasil nenhuma das aprovadas já depois da introdução do novo
art. 27 ao Modelo OCDE contém essa cláusula, o que parece revelar uma posição hos-
til à execução coativa no seu território de pretensões de Direito Público estrangeiro.

35 OCDE, Cfr. Comentários, art. 27 §§ 22 e 23.


36 OCDE, Cfr. Comentários, art. 27, §§ 5° e 13.
37 Esta decisão é tomada, tendo em conta diversos fatores, como, por exemplo, a questão de
saber em que medida que a assistência em matéria de cobrança comporta benefícios equiva-
lentes e recíprocos para ambos os Estados, e se, e em que termos, os sistemas fiscais, as ad-
ministrações fiscais e as normas jurídicas dos dois Estados são análogas, designadamente no
que concerne à proteção dos direitos fundamentais dos contribuintes (OCDE, cfr. Comen-
tários, art. 27°, parágrafo 1). Sobre a posição dos Estados Unidos quanto a esta matéria, cfr.
LEVINE, La lutte contre l)évasion ftscale de caractere international, 17 ss.
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artigos ou obras coletivas - data e página; nas referências subsequentes, o tírulo
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,
INDICE REMISSIVO

A B

Abuso Bancos Estrangeiros


de Convenções (v. Treaty shopping), 279 empréstimos por filiais e subsidiárias, 113
de direito, 237 representantes, 541
Acordos (v. Convenções, Tratados) Beneficiário efetivo (Cláusula do), 120
especiais, 74 Bitributação (v. Dupla tributação)
mútuos, 167 Bonificações, 486, 590
de repartição de custos, 337
Acumulação de rendimentos, 283, 284
Agente, 541 C
Alienação de participações societárias (v. Ga-
nho de capital) Capital, 581
Alíquota (do imposto de renda na fonte), 448 CECA (v. Comunidades Europeias)
Alíquotas reduzidas (nas c.d.t.) CEE (v. Comunidades Europeias)
dividendos, 592 Centros de coordenação, 241
juros, 611 CIDE Remessas, 507
royalties, 631 Cláusula geral de recepção plena, 80
Âmbito de eficácia das leis, 4 Clubes de investimento, 477
Código de conduta, 245
Âmbito de incidência das leis, 4, 9
Comentários (da OCDE), 136
Anstalt, 273
Comércio eletrônico, 560
Anuidades, 579
Comissários (v. Representantes independentes)
Aplicações financeiras de renda fixa, 472
Compensação (v. Prejuíw)
Aplicações indiretas por fundos e clubes de
Compensação de imposto pago no exterior,
investimento, 477 365,427
Arbitragem, 166, 169 Competência qualificatória, 146
Arm's length price, 323 Compras de bens a prazo no exterior (ju-
Artistas, 585 ros),489
Assistência administrativa, 661 Computersoftware, 515, 628
Assistência técnica (v. Serviços) Conceito-quadro, 38, 39
Atividade Concorrência fiscal prejudicial, 239
direta (de pessoas jurídicas) no exterior, 37l Concurso
funcional (de sociedades estrangeiras), 520 aparente, 27
indireta (de pessoas jurídicas) no exterior, de competências, 26
372 de normas, 25
através de filiais, 372 de pretensões, 29
jurídica (de sociedades estrangeiras), 520 negativo, 30
Atletas, 585 Conduit companies, 280
Atos públicos estrangeiros, 657 Conexão (v. Elementos de conexão)
.,41 Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Confidencialidade (troca de informações), Direção efetiva, 228


672 Direito Comunitário, 171
Conflito Direito Europeu, 171
de pretensões, 29 Direito Tributário Internacional
de qualificação, 140 e Direito Comunitário, 174
Contexto (dos tratados), 135 e Direito Internacional Privado, 49
Contratos de compartilhamento de custos, em sentido formal, 40
337 natureza internacional, 59
Contratos de prestação de serviços intra- natureza unilateral, 55
grupo,339 Direitos de autor, 515, 628
Contratos de contribuição para os custos, 341 Diretores (remuneração), 584
Contratos de transferência de tecnologia, Disponibilização (de lucros), 389
512,620 ficções, 392, 408
Contribuição social sobre o lucro, 123 Disregard ofthe legal entity (v. Desconsidera-
Contribuinte (do imposto de renda na fonte), ção da personalidade jurídica)
445 Distribuição disfarçada de lucros (v. Transfe-
Controlled foreign company (CPC), 284 rência indireta)
Convenção arbitral, 170 Dividendos (imposto de renda na fonte), 485
Convenção de assistência administrativa, 674 Dividendos (nas c.d.t.)
Convenção de know-how, 620 conceito, 588
Convenção Modelo da OCDE, 67 distribuidos por filiais, 594
Convenções contra a dupla tributação tributação extraterritorial, 594
âmbito de aplicação, 112 de origem estrangeira, 597
celebradas pelo Brasil, 72 Domicílio (v. Residência)
conceito, 67 domicile of choice, 219
efeito negativo, 111 domicile of origin, 219
história, 67 elisão, 277
interpretação e qualificação, 134 Dupla não tributação, 30, 643
princípio da relatividade, 112 Dupla tributação
relevância na ordem interna, 76 conceito, 21
tributos estaduais e municipais, 108 econômica, 24
Convenções contra a dupla tributação das interterritorial, 25
empresas de navegação, 73, 571 nos impostos sobre o consumo, 197
Cost sharing agreement (v. contratos de repar- nos impostos sobre transmissões a título gra-
tição de custos, contratos de compartilha- tuito' 193
mento de custos e contratos de contribuição virtual, 27
para os custos), 332 Duplicação de pretensões, 28
Costume, 163 Durchgriff(v. Desconsideração da personalida-
Crédito de jurídica)
fictício (tax sparing), 647 E
por investimento, 651
presumido (matching credit) , 647
Efeito negativo (dos tratados), lU
Effectively connected income (v. Princípio da
D força atrativa) ,
Eficácia das leis (v. Ambito de eficácia das leis)
Delegação de assinatura, 541 Elementos de conexão
Denúncia (de c.d.t.), 130 conceito, 187
Desconsideração da personalidade jurídica, no imposto sobre transmissões a título gra-
284 tuito' 193
Despesas de assistência técnica (v. Royalties) nos impostos sobre o consumo, 197
Despesas incorridas e não pagas, 443 nos impostos sobre a renda e o capital, 189
Desportistas (v. Atletas) objetivos, 231
Devolução ou reenvio (e qualificação), 160 subjetivos, 209
índice Remissivo lij;.~l

Elisão fiscal internacional, 235 G


Empresas de navegação, 571
Empréstimos concedidos por bancos multi- Ganhos de capital
nacionais, 113 relativos a investimentos em moeda estran-
Empréstimos externos (v. Juros) geira, 456
Entes sem personalidade jurídica, 115 líquidos em operação de renda variável,
Entidades de investimento coletivo, 116,469 474
Equiparação a pessoa jurídica domiciliada nas c.d.t., 582
no Brasil, 520 Groupement d'intérêt éconmnique, 116
Equiparação a residentes no país (v. Regimes
especiais)
Estabelecimento permanente H
conceito, 552
princípio do, 551 Holdings, 265
Estrangeiros (tributação), 209
Estudantes, 578
EURATOM (v. Comunidades Europeias) I
Evasão fiscal internacional, 30
Execução de créditos tributários estrangei- Identidade
ros,674 do fato, 22
Exportação de serviços, 203 dos sujeitos, 24
Extraterritorialidade (v. Territorialidade), 15 Identidades (Regra das quatro), 22
da tributação dos dividendos, 594 Imposto
sobre circulação de mercadorias, 201
sobre o consumo (conexões), 197
F sobre produtos industrializados (conexões),
201
Filiais sobre serviços (conexões), 203
conexão efetiva, 533 transmissões a título gratuito (conexões),
de empresas brasileiras no exterior, 372 193
de sociedades estrangeiras (v. Atividade ju- Imposto de renda na fonte sobre residentes
rídica e funcional, v. Estabelecimento no exterior, 435
permanente) alíquotas, 448
ficção de atribuição automática do lucro, 535 isenções, 450
independência da tributação, 531 base de cálculo, 445
natureza jurídica, 524 hipótese de incidência, 436
Financiamentos (v. Empréstimos) natureza, 451
Fonte (v. Princípio da) sujeito passivo, 447
de pagamento, 231 Imóveis (nas c.d.t.), 581
de produção, 231 Importação de serviços, 203
situadas no país, 439 Imputação (v. Tax credit, v. Crédito de imposto)
Fontes do Direito Tributário Internacional, conceito, 644
67 direta, 650
Fontes supranacionais, 171 indireta, 650
Force ofattraction (v. Princípio da força atrativa) integral, 645
Funcionamento de sociedade estrangeira, 520 ordinária, 645
Fundos de conversão - capital estr:mgeiro, 479 pessoas físicas, 365
Fundos de investimento, 480 pessoas jurídicas, 425
Fundos de investimento imobiliário, 482 proporcional,647
Fundos de investimento em participações, Incidência das leis (v. Âmbito de incidência
483 das leis)
Fundos de investimentos de curto prazo e Incorporação de lucros e reservas ao capital,
longo prazo, 480 486
.,M Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Indirect tax credit, 650 Mediador, 541


Informações (v. troca de informações) MERCOSUL, 177
Instalação fixa (v. Estabelecimento pennanente) Método
Intangíveis (e preços de transferência), 308 CAl', 304
Investimentos em moeda estrangeira CPL,315
entidades de investimento coletivo, 469 da imputação (v. Imputação)
ganhos de capital, 456 da isenção (v. Isenção)
Investimentos nos mercados financeiros e de fixação de preços objetivos (v. Preços de
de capitais, 469 transferência)
Investimentos na bolsa (v. Bolsa) PIC, 315
Isenção (de imposto de renda na fonte), 450 PRL,315
Isenção com progressividade, 642 PVA,304
Isenção de tributos estaduais e municipais PVL,315
por tratado, 108 PVEX, 304
Isenção integral, 642 PVV; 304
Mútuo
entre empresas independentes e entre em-
presas ligadas (v. Juros)
J
Jurisdiction to enforce, 4
Jurisdiction to prescribe, 4 N
Jurisprudência, 164
Nacionalidade
Juros
das pessoas jurídicas, 210
benefícios (no imposto de renda na fonte),
em geral, 209
488
no sistema norte-americano, 217
nas c.d.t. (conceito), 601
Não discriminação
compras de bens a praw no exterior, 489
conceito, 210
de empréstimos concedidos por coligadas e
Normas
controladas no exterior, 423
de atenuação, 41
em operações de renda fixa, 474 de colisão, 41
sobre capital próprio, 499 de conflitos, 37
negativos, 603 de cumulação, 41
conceito, 601 espacialmente autolimitadas, 45
nas c.d.t., 601 de aplicação necessária e imediata, 48
de delimitação, 41
de fonte interna, 37
L de fonte internacional, 37
instrumentais, 40
Leasing, 616 de limitação de competência, 547
Leis estrangeiras (v. Aplicação de leis estran- de reconhecimento de competência, 547
geiras) de repartição, 547
Locação de equipamento, 616 materiais, 37
Lucro substanciais, 40
automaticamente atribuído pelas filiais, 535 unilaterais, 55
das empresas (nas c.d.t.), 551 Nuntius, 541
das empresas de navegação, 571

O
M
OCDE (v. Convenção Modelo)
Mandatários (v. Comissários, Representantes) Operações de renda fixa, 472
Mandato imperativo (v. Nuntius) Operações de renda variável, 474
Matching Credit (v. Crédito presumido) Operações na Bolsa, 474
índice Remissivo M.

P R

País Ratificação (de tratado), 74


com regime fiscal privilegiado, 254 Redução do capital (v. Ganho de capital)
de destino, 197 Referendo (de tratado), 96
de origem, 197 Regimes fiscais preferenciais, 239
de tributação favorecida (v. países de tribu- Regime fiscal privilegiado, 254
tação favorecida e países com regime fis- Remuneração de diretores, 584
cal privilegiado), 251 Remunerações públicas, 637
Paraísos fiscais, 239 Rendimentos
Participation Exemption, 269 conceito, 437
Partnerships (v. Sociedades de pessoas), 115 imobiliários, 581
Pensões, 579
não expressamente mencionados, 587
Personalidade jurídica (das filiais), 530
Representantes
Pessoas físicas
dependentes, 555
residentes no exterior, 435
residentes no país, 365 independentes (v. Comissários)
Pessoas jurídicas Residência (v. Domicílio)
residentes no exterior, 435 alargada, 277
residentes no país, 366 aquisição, 221
Pessoas vinculadas concepções objetivistas e subjetivistas, 218
e preços de transferência, 297 das pessoas jurídicas, 225
e subcapitalização, 348 nas c.d.t., 225
Planejamento fiscal, 235 perda, 222
Plataforma continental, 127 Responsável (no imposto de renda na fonte),
Preços de transferência, 289 447
Princípio ~ng~ing,243,254
da eficácia direta e imediata, 172 Royalties
da fonte, 189 conceito (nas c.d.t.), 616
da força atrativa, 533 IR fonte, 506
da não discriminação, 212
da origem, 197
da prevalência do método mais favorável, 310 S
da relatividade dos tratados, 112
da residência, 189 Serviços
da territorialidade, 15, 366 imposto de renda na fonte, 502
da tipicidade dos métodos, 307 nas c.d.t., 563
da universalidade, 365, 366
intragrupo, 339
do destino, 197
de assistência técnica, administrativa e se-
do domicílio do de cujus, 193
melhantes, 506, 625
do efeito negativo dos tratados, 111
do estabelecimento permanente, 551 técnicos, 506, 625
Prejuíws obtidos no exterior, 425 Sigilo (v. troca de informações)
Procedimento amigável, 164 Situações triangulares (nas c.d.t.), 113
Professores, 578 Soberania
Profissões dependentes, 575 fiscal,9
Profissões independentes, 573 Sociedades
Promulgação (de tratado), 96 de artistas, 585
Protocolos (às c.d.t.), 73 base, 264
estrangeiras, 210
holding, 265
Q offshore, 211
de pessoas, 115
Qualificações (Problema das), 134 Subcapitalização, 346
Questão prévia, 157 Subsidiárias (v. controladas e coligada)
I ma I Direito Tributário Internacional do Brasil I Alberto Xavier

Substância (da pessoa jurídica), 274 Treaty shopping, 279


Substituição (e qualificação), 157 Tributação extraterritorial, 372
Substituição tributária, 452 Troca de informações, 661
Sucessão de Estados (nas c.d.t.), 129 Trust, 117
Sujeito a imposto, 119

u
T
u.s. Model, 70
Tax credit (v. Imputação, Avoir fiscal, Crédito Underlying tax credit, 650
de imposto)
Tax planning (v. Planejamento fiscal)
Tax sparing (v. Crédito fictício) v
Teoria
monista,78 Variação cambial
dualista, 78 de investimento estrangeiro, 429
da realização, 552 de múmos, 487
da pertença econômica, 552 Venda de ações (v. Ganho de capital, v. Aliena-
do órgão, 11, 378 ção de participações societárias)
Territorialidade Venda de bens a prazo (v. juros)
das despesas, 532
em sentido formal, 18
em sentido material, 18 w
em sentido negativo, 16
em sentido pessoal, 17 lVorld-wide-income (v. Princípio da universali-
em sentido positivo, 16 dade)
em sentido real, 17
Tráfego internacional, 571
Transferência indireta de lucros, 289 z
Transparência fiscal internacional, 284,372
Tratados (v. Convenções) Zona econômica exclusiva, 128

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