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O PARADOXO DO AMOR AO PRÓXIMO COMO A SI MESMO *

Romildo do Rêgo Barros

“Eu recuo de amar o meu próximo como a mim mesmo, na medida em que há nesse horizonte algo
que participa de não sei que intolerável crueldade. Nessa direção, amar meu próximo pode ser a via mais
cruel”1.
“Podemos nos fundar nisto, que a cada vez que Freud para, como que horrorizado, diante da
conseqüência do mandamento do amor ao próximo, o que surge é a presença dessa malvadeza
fundamental que habita nesse próximo. Mas desde então ela habita também em mim. E o que me é mais
próximo do que esse cerne em mim mesmo que é o do meu gozo, do qual não ouso me aproximar? Pois
desde que me aproximo -é este o sentido do Mal-Estar na Civilização- surge essa insondável
agressividade diante da qual eu recuo, que eu retorno contra mim, e que vem, no lugar mesmo da Lei
desvanecida, dar o seu peso ao que me impede de ultrapassar uma certa fronteira no limite da Coisa” 2.

O mandamento amarás o teu próximo como a ti mesmo pode ser discutido em relação com a noção
freudiana do narcisismo das pequenas diferenças. Em um certo sentido, esta forma de narcisismo é uma
espécie de manifestação, no plano do fenômeno, do paradoxo do amor ao próximo, posto que revela que
a aproximação do outro implica, a partir de um determinado ponto, a ruptura daquilo que justamente fazia
dele um semelhante. É nesse ponto limite da proximidade que começa a intolerância em relação ao outro.
Freud o constatou em Moisés e a religião monoteísta, quando escreveu que “a intolerância das massas
se exterioriza com mais intensidade frente a diferenças pequenas que frente a diferenças fundamentais” 3.
O próximo, portanto, é igualmente um estranho, na mesma medida em que é próximo. Mais ainda,
ele se torna estranho justamente quando a sua proximidade chega a um certo limite, ameaçando tornar-se
absoluta, e aí se teria um gozo sem mediação. É o que diz Lacan: “a resistência diante do mandamento
amarás o teu próximo como a ti mesmo e a resistência que se exerce para entravar seu (do homem, de
todo homem) acesso ao gozo são uma só e mesma coisa4.

O preceito do amor ao próximo, amplamente comentado e criticado por Freud em O mal-Estar na


civilização5, vem do Antigo Testamento, mais precisamente do Levítico 19, 18: “não te vingarás e não
guardarás rancor contra os filhos do teu povo. Amarás o teu próximo como a ti mesmo. Eu sou Iahweh”6.
O cristianismo radicalizou esse preceito, como se lê no Sermão da Montanha: “ouvistes o que foi
dito: amarás o teu próximo e odiarás o teu inimigo. Eu porém vos digo: amai os vossos inimigos e orai
pelos que vos perseguem”7.
Há aqui uma inclusão dos inimigos no campo do próximo, o que é, de certa forma, uma
interpretação do que está escrito no Levítico, já que não consta nesta passagem que se devam odiar os
inimigos: a interpretação consiste em concluir que os inimigos são aqueles que não fazem parte dos “filhos
do teu povo”. Ora, esta questão é um tanto complexa no Antigo Testamento, a definição de quem é
exatamente o meu próximo, ou meu irmão, ou meu inimigo, ou mesmo o estrangeiro8. Certamente que
*
Este trabalho é um resumo das anotações feitas para algumas aulas do seminário sobre o narcisismo, que
coordenei na EBP-RJ nos anos 1996-1997.
1
Lacan, J.: Le Transfert, Éd. du Seuil, pág. 229.
2
Lacan, J.: L’Éthique de la Psychanalyse, pág. 219.
3
Freud, S.: Moisés y la religión monoteísta, Amorrortu, Vol. XXIII, pág. 87 e nota 29.
4
Lacan, J.: L’éthique de la psychanalyse, Éd. du Seuil, pág. 228.
5
Freud, S.: El malestar en la cultura, Amorrortu, XXI, pág. 106.
6
Conforme versão da Bíblia de Jerusalém, Edições Paulinas. Fora da tradição judaico-cristã, podemos encontrar
sinais da presença desse preceito, como, por exemplo, em Cícero (ano 43 AC), que o critica no seu De Amicitia,
por considerar que se pode amar o amigo mais do que se ama a si próprio: L'Amitié, Ed Arléa, 1991, pág. 52.
7
Mateus 5, 43. Várias outras passagens do Novo Testamento reproduzem esse preceito: Marcos 12, 29; Lucas 10,
26; João 13, 34; Epístola de São Paulo aos Romanos 13, 8; e Epístola aos Gálatas 5, 14. Seria interessante -não
é o objetivo deste trabalho- se acompanhar a evolução do preceito no Novo Testamento, e se tentar entender que
diferença surge no momento em que o ama o teu próximo como a ti mesmo se torna, a partir de uma palavra do
Cristo, amai-vos uns aos outros como eu vos amei (João 13, 34).
8
Em sua tese de doutorado, recentemente defendida, Betty Fuks trata dessa questão, e nos lembra que o próprio
termo hebreu tem uma raiz etimológica comum com o estrangeiro.

1
não se trata de uma comunidade de sangue, de filhos de uma mesma raiz, digamos, biológica, mas de um
outro tipo de comunidade, que se define por alguma participação comum, ou por um significante-mestre
que se compartilha.
Conhecemos o comentário que faz Freud em O mal-estar na civilização: o preceito é absurdo,
porque o próximo é indigno do meu amor; e, no final das contas, se amamos indistintamente o próximo
nosso amor perde o seu valor, porque não escolhe o seu objeto: “meu amor, para mim, é algo de valioso,
que não devo jogar fora sem reflexão”9. Em uma passagem anterior, Freud tentara encontrar uma medida
mais razoável para o amor, dizendo que “não contradiria aquele grandioso mandamento se ele rezasse:
‘ama o teu próximo como teu próximo te ama’”10.
Talvez haja ironia nesta frase de Freud, porque, pelo menos à primeira vista, considerar o amor do
outro como a medida do nosso amor seria algo como instaurar a paranóia generalizada, na qual a
necessária dessemelhança, a diferença mais discreta entre o amor dado e o recebido, seria assumida pelo
sujeito como objeto de perseguição. É um pouco o que Cícero, criticando essa mesma medida, chamou
de “cálculo meticuloso entre receitas e despesas”11.
Freud, como se sabe, distingue duas situações nas quais o próximo pode merecer o meu amor12:
quando é comparável a mim, e neste caso eu me amo nele, ou quando me é tão superior que eu amo nele
o meu ideal13. O amor ao próximo, portanto, depende do plano identificatório em que eu próprio me situo:
ele será objeto de identificação como eu ideal no primeiro caso, e como ideal do eu no segundo. O que
fica excluído, de qualquer forma, é que eu ame o outro a partir do que ele é, fora da dialética significante
na qual se constituem o sujeito, o outro e o objeto.
Lacan, por sua vez, vai pôr o acento, não somente no próximo, mas também no si mesmo: se não
se pode amar o próximo como a si mesmo, é porque o si mesmo não é tão amável assim. Lacan acompanha
nisto Paul Valéry, autor do verso que diz “o eu é odioso”14. A questão para Lacan -por exemplo, no
seminário sobre A Ética da Psicanálise- é de como entender o preceito no seu limite, isto é, no ponto a
partir do qual a equivalência imaginária entre eu e o outro, que faz com que o amor ao próximo seja, no
final das contas, uma maneira de eu me amar e me proteger contra o gozo, se esgota, e o outro aparece,
não mais como a imagem de mim mesmo, como o molde a partir do qual me apreendo, mas, pelo contrário,
como a exterioridade que ele é e que eu também sou, por conseguinte, para mim mesmo. A frase de
Valéry, “o eu é odioso”, se completa portanto com a de um outro poeta, Rimbaud, segundo o qual “eu é
um outro”.
É muito difícil se pensar em um coletivo que não postule, de alguma forma, o amor entre os seus
membros como o cimento que garante a sua manutenção. Não somente porque não podemos imaginar um
grupo relativamente estável que se manteria a partir do ódio que cada um sente por todos os outros -o
ódio, como um sentimento que se dirige ao ser, é algo que tende a dissolver os laços sociais, que são
discursivos-, como também porque o amor nos parece ser a única maneira de se estruturar, no campo da
linguagem, uma economia do falo, isto é, uma espécie de circulação que, ao invés de ter como ponto de
partida um montante a ser distribuído entre todos, seria pelo contrário fundada na falta do objeto, e teria
por princípio o dever de dar o que não se tem.
Quando Freud diz que amar ao próximo como a si mesmo é excessivo, é uma exigência impossível
de ser atendida, está situando esse amor como algo que confina com a dissolução do sujeito. Como diz
em O mal estar na civilização, “nada vai mais fortemente contra a natureza original do homem”15. O
seu repúdio não se deve, portanto, à simples idéia do amor, nem do próximo, e nem do si mesmo. Freud
reage ao fato de que o preceito situa o si mesmo como medida do próximo, e vice-versa. Isto quer dizer
que o próximo, o Nebenmensch freudiano, não é o semelhante, uma vez que a sua proximidade é
justamente o que revela e amplia a dessemelhança. Isto mostra que o amor ao próximo, chegado ao seu

9
Freud, S., O Mal-Estar na Civilização, Imago, XXI, pág. 130.
10
Idem, ibidem, pág. 107.
11
Cícero: L’Amitié, Éd. Arléa, pág. 52.
12
Freud, S.: El malestar en la cultura, Amorrortu, Vol. XXI, pág. 131.
13
Cícero: op. cit., pág. 29, também aponta o aspecto ideal do amor:: "quem quer que olha um amigo verdadeiro, é
um outro si mesmo que vê, mas ideal".
14
Valéry, P.: Pensamentos: ”Le moi est haïssable” e, mais adiante, “si le moi est haïssable, aimer son prochain
comme soi-même devient une atroce ironie” .
15 Freud, S.: El malestar en la cultura, Amorrortu, vol. XXI, pág. 106.

2
limite, tem uma impossibilidade interna, que Lacan formulou da seguinte maneira no seminário sobre a
ética da psicanálise:
“A resistência diante do mandamento amarás o teu próximo como a ti mesmo e a resistência que
se exerce para entravar seu (do homem, de todo homem) acesso ao gozo são uma só e mesma coisa16.
Como pano de fundo para entendermos esta frase, temos o termo que Lacan usou para descrever a
atitude de Freud diante do preceito do amor ao próximo: “horror”17. Este afeto anuncia um encontro com
o impossível, indica um limite entre a significação do desejo e o que não tem significantes. O horror de
Freud, portanto, não se dá diante do amor, simplesmente, do amor como suplência, como um recurso de
que se dispõe para conciliar coisas incompatíveis, mas diante do que há de impossível no amor ao próximo
como a si mesmo. Esse impossível significa que a aproximação excessiva do outro desfaz a montagem
especular, pela qual ambos, o outro e eu, nos mantínhamos no plano do imaginário.
Isto significa que esse amor desemboca no gozo, e não exatamente no amor tal como o entendemos,
como “significação do desejo”, ou, para usar a expressão que usa Lacan no seminário X, no amor como
“sublimação do desejo”18. Quer dizer, o como a si mesmo revela uma dimensão estranha que se acha
além dos limites do amor, revela um registro outro, que constitui um “problema”, no dizer de Lacan: “...o
gozo do meu próximo, seu gozo nocivo, seu gozo maligno, é ele que se propõe como o verdadeiro
problema para meu amor”19. Acrescente-se a isto, naturalmente, que, tratando-se do próximo, o seu gozo
maligno é o meu próprio.
Trata-se, portanto, de algo impossível, e não contingente. Isto esclarece -ao mesmo tempo em que
revela a sua insuficiência- a lógica do esquema óptico de Lacan20, que estamos talvez habituados a pensar
como uma montagem que visa explicar, no final das contas, uma percepção.
Uma percepção, por definição, tende à Gestalt, à configuração, ou aos “complexos-perceptivos”21,
segundo a expressão que Freud usa no Projeto. Nesse texto, Freud explica de que forma um objeto pode
ser percebido e se tornar accessível à memória e ao juízo. Ele parte de um paradoxo, tratando justamente
do exemplo da percepção, por parte do sujeito, de um outro ser humano, que é ao mesmo tempo
semelhante e desconhecido. Isto é, o próximo, o Nebenmensch22, como objeto de percepção, é assimilado
de maneira paradoxal, pelo fato de que a sua inteireza formal não é tudo: há algo no próximo que o sujeito
não pode incluir na configuração, quer dizer, há algo que não é semelhante:
“ Os complexos perceptivos emanados desses seus semelhantes serão, então, em parte novos e
incomparáveis -como, por exemplo, seus traços, na esfera visual-; mas outras percepções visuais -o
movimento das mãos, por exemplo- coincidirão no sujeito com a lembrança de impressões visuais muito
semelhantes, emanadas de seu próprio corpo, que estão associadas a lembranças de movimentos
experimentados por ele mesmo. Outras percepções do objeto também -se, por exemplo, ele der um grito-
evocarão a lembrança do próprio e, com isso, de suas próprias experiências de dor. Desse modo, o
complexo do ser humano semelhante se divide em duas partes, das quais uma dá a impressão de ser uma
estrutura que persiste coerente como uma coisa (‘als Ding’), enquanto que a outra pode ser
compreendida por meio da atividade da memória -isto é, pode ser reduzida a uma informação sobre o
próprio corpo” 23.
Quando se trata, porém, não mais da percepção do outro, ou da sua imagem, a partir da qual eu
moldo a minha própria e que serve de matriz do meu eu, mas do amor do outro -na sua dupla direção, de
mim para o outro ou deste para mim-, entra em cena um objeto que escapa à Gestalt, e que no entanto
está na base da constituição da imagem e do eu. E, se além de se incluir o amor, se prescreve o dever de
amar o próximo como a si mesmo, fica esvaziada a dimensão do dom presente no amor, que somente se
mantém se o que se dá é justamente o que não se tem, como o sabe qualquer amante. Estamos aqui,
naturalmente, em um plano que vai além da agressividade imaginária ou da inveja.

16
Lacan, J.: L’Éthique de la psychanalyse, Éd. du Seuil, pág. 228.
17
Lacan, J.: L’Éthique de la psychanalyse, pág. 219.
18
Lacan, J.: A Angústia, inédito, aula de 20/03/1963.
19
Lacan, J.: Le Transfert, Éd. du Seuil, pág. 220.
20
Cf. Lacan, Remarque sur le rapport de Daniel Lagache, Écrits, Éd. du Seuil, pág. 674
21
Freud, S.: Obras Completas, Amorrortu, Vol. I, pág. 376-77.
22
Lacan chama a atenção para a importância dessa noção em L’Éthique de la psychanalyse, pág. 50.
23
Freud, S.: Obras Completas, Amorrortu, Vol. I, pág. 376-77.

3
Poderíamos tentar comparar as características do amor ao próximo como a si mesmo, que causou
horror a Freud, com as do amor sexual, do amor como atualização da pulsão erótica, do amor que Freud
trata fundamentalmente como repetição24.
Mas devemos antes dizer, também a partir de Lacan -que justamente por isso chamou este amor de
“inumano”25-, que o horror de Freud se deve a que o amor ao próximo como a si mesmo se situa fora da
diferença sexual, isto é, anula a dimensão sexuada dos parceiros26, a qual depende justamente de um objeto
que seja dessemelhante, que de alguma forma represente a diferença.
No seminário sobre a angústia, Lacan descreve a estrutura do encontro sexuado do ser falante:
“Eu te tomo por objeto por mim mesmo desconhecido de meu desejo, e assim te identifico (pelo
viés de uma metáfora) ao objeto que a ti mesmo falta, e, tomando-te por objeto do meu desejo, realizo
para ti o que procuras; por este meio tu cais na minha rede”27.
Isto é, a metáfora do meu desejo, que é mobilizada pelo objeto que não tenho, torna o parceiro -isto
é, faz com que ele passe a ser- aquilo que me falta: é o encontro, o único possível na esfera do desejo e
cuja moeda-padrão é o falo, entre uma subtração de ter com uma atribuição de ser. Esta frase ilustra
também o que Lacan chama, no seminário VIII, de “substituição”, através da qual o amado, o erômenos,
se torna amante, erastés, uma vez que, tomando o parceiro pelo que me falta, pelo objeto que não tenho,
na verdade “realizo para ti o que procuras”, isto é, mobilizo no parceiro a sua falta, e é a partir dessa
“metáfora que (se) engendra a significação do amor”28.
Neste sentido, podemos dizer que uma explicação para o horror de Freud, visto por Lacan, é ter de
alguma forma percebido que não há no amor ao próximo como a si mesmo uma separação entre ter e ser
(o objeto), que é a condição mínima para que haja metáfora, e realidade sexual.
Sem que se dê a extração do objeto, isto é, sem a necessária separação que permite ao sujeito
formular uma demanda, é que o próximo aparece como a Coisa, das Ding, como o núcleo do ser diante
do qual perde sentido se perguntar se se trata de mim ou do outro.
É o que leva Lacan a assimilar o gozo ao mal: “o gozo é um mal. (...) ele é um mal porque comporta
o mal do próximo. (...) Isto tem um nome -é o que se chama o além do princípio do prazer”29.

24
Jacques-Alain Miller se pergunta, na segunda conferência do seu Logica de la Vida Amorosa, Manantial, se não
podemos pensar não só no amor como repetição, mas também como invenção.
25
Ciatdo por Viltard, M., verbete Amour, em L’Apport Freudien, Éd. Bordas, Paris, 1993, pág. 25.
26
V. o comentário que faz Freud sobre a seguinte opinião de Schreber, segundo a qual o gozo na eternidade
obedece ainda à diferença entre os sexos: “a bem-aventurança masculina se situa mais alto do que a feminina,
pois esta última parece ter de consistir de preferência em um contínuo sentimento de voluptuosidade”. Ao
mesmo tempo, pensa Schreber, o gozo terreno é uma parte do gozo eterno: “é lícito conceber a voluptuosidade
como um fragmento de bem-aventurança que se concede antecipadamente ao homem e a outras criaturas
vivas”: Sobre um caso de paranóia descrito autobiograficamente, Amorrortu, Vol. XII, pág. 28 e 28n.
27
Lacan, J.: A Angústia, inédito, aula de 21/11/1962.
28
Lacan, J.: Le Transfert, Éd. du Seuil, pág. 67.
29
Lacan, J.: LÉthique de la Psychanalyse, pág. 217.

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