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Entrevista ao neuropediatra e escritor Reportagem com quem teve de sair de casa

NUNO LOBO ANTUNES IDENTIFICA FOMOS VER COMO VIVEM OS


OS SINAIS DE ALERTA NAS CRIANÇAS PROFISSIONAIS DE SAÚDE NOS HOTÉIS

www.sabado.pt N.º 834 – SEMANAL – 23 A 29 DE ABRIL DE 2020 – €3,50 (CONT.)

ANSIEDADE
DEPRESSÃO
DOR CRÓNICA
Como vencer os efeitos
perigosos da quarentena
Adultos, idosos e adolescentes estão mais do que nunca
em risco. Os especialistas e a ciência têm soluções

+
ESPECIAL
AS 8 ESTRATÉGIAS
PARA DORMIR MELHOR

INVESTIGAÇÃO OS GASTOS MILIONÁRIOS DO SNS E DAS AUTARQUIAS COM A PANDEMIA


Sumário 23 ABRIL 2020
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36 42
AS DOENÇAS QUE O QUE FAZER PARA
PODEM AUMENTAR DORMIR MELHOR
Ansiedade, depressão, stress As preocupações, o que come
pós-traumático, obesidade ao jantar, a forma como se
e diabetes. Problemas que senta a ver televisão, se faz
poderão crescer após sema- exercício físico: tudo pode
nas em isolamento influenciar o seu sono

70
MÉDICOS E ENFER-
MEIROS MUDARAM-
-SE PARA HOTÉIS
PARA PROTEGEREM
OS FILHOS E
OUTROS FAMILIA-
RES. ELES CONTAM
AS SUAS HISTÓRIAS
MIGUEL BALTAZAR

3
23 ABRIL 2020
Sumário www.sabado.pt
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Portugal
A Semana
16 Polémica A guerra das máscaras:
material é desviado à chegada a Portugal
18 Justiça Tribunal engana-se e não
reconhece erro
28 Entrevista José Pedro Marques: o
historiador diz que Portugal é o reino
da maledicência e da inveja

Portugal
52 Solidariedade Chamadas para
apoio à Covid-19 pagam IVA ao fisco
54 Números Como é possível baterem
tantas vezes errado?

48
56 Almanaque Quando os políticos dão
mau exemplo em tempos virais

REPORTAGEM: O GRANDE NEGÓCIO Mundo


58 Propaganda Como a China usa poli-
DOS CENTROS DE TESTE AUTÁRQUICOS ticamente a generosidade na pandemia

D.R.
Sociedade
Ganham os privados, pagam as câmaras: o hospital de campanha de Ovar só teve 68 Diários do Coronavírus Flores,
cinco doentes e proliferam os pontos de rastreio, um bom negócio para os laboratórios móveis, aulas: histórias de mudanças

Desporto
Entrevista GPS 76 Futebol O Porsche de Baía e os dentes
PÃODEMIA partidos: as histórias de Cândido Costa

RECEITAS COM DIFE- GPS


RENTES GRAUS DE 90 Vinhos Dona Matilde e a nova abor-
dagem às vinhas velhas, sem barricas
DIFICULDADE PARA 92 Cinema Os Irmãos Willoughby:
ADERIR À GRANDE diversão garantida para toda a família
96 Séries The Last Dance: o adeus de
MODA DO MOMENTO Michael Jordan à NBA em 10 capítulos
98 Música Entrevista a Laura Marling
101 Miúdos Crianças entrevistam
artistas em nova série digital
102 Pets Adotar, ou não, um animal
de estimação em tempos de quarentena
104 Shopping Dia da Mãe: sugestões
de prendas para quem merece tudo
SERGIO LEMOS

64 www.sabado.pt
“OS ABUSOS VÃO CRESCER” Saúde
O neuropediatra Nuno Lobo Antunes aborda O custo dos medicamen-
os maiores problemas do confinamento tos contra a Covid-19
Os atuais são baratos, mas
as reservas podem esgotar
Opinião
Primeira pessoa
Um interno nos cuidados
intensivos do Curry Cabral
Desde março que este médico

34
JOSÉ
60
NUNO
80
JOÃO
114
JOÃO
trata os doentes de Covid-19

PACHECO ROGEIRO PEDRO PEREIRA


PEREIRA GEORGE COUTINHO

6 Bastidores 17 Octávio Ribeiro 75 Pedro Marta Santos Enfermeiros


8 Editorial 47 António José Vilela 89 Ângela Marques travam protesto
12 A Semana 57 Carlos Rodrigues Lima 106 Policiário

4
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Opinião 23 ABRIL 2020
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BASTIDORES B

A obrigação de ficar em Marcas do


casa, em isolamento, está
a deixar marcas: depressão,
ansiedade, dor crónica são
isolamento
A
algumas das doenças que quarentena forçada que esta-
a quarentena potencia. mos a viver deixa marcas – fí-
Nesta edição explicamos-lhe sicas e mentais. Ansiedade,
como as identificar e, depressão, dor crónica ou obesidade e
sobretudo, como as vencer diabetes são algumas das patologias já

RICARDO MEIRELES
– e ainda lhe preparámos identificadas pelos especialistas que a
um dossiê especial sobre jornalista Susana Lúcio entrevistou
como dormir melhor à noite para escrever o tema de capa desta
edição. Nesse processo, como todos
estão em teletrabalho, acabou por co- B g
nhecer mais das suas vidas pessoais Confissões futebolísticas O ex-futebolista
Cândido Costa
do que aconteceria normalmente: das Para ilustrar a entrevista a Cândido num direto para
brincadeiras das crianças, às dificul- Costa, o editor executivo Carlos Torres a TV, depois de
dades em decidir almoços e jantares. combinou fotografar o ex-futebolista à ser fotografado
pela SÁBADO,
Mas organizou um dossiê completo janela de sua casa, no Furadouro. Mas após o fim do
sobre como estas doenças afetam quando o repórter fotográfico Ricardo cerco sanitário
crianças, adultos e idosos – e a melhor Meireles lá chegou, ele preferiu fazer em Ovar. É a
mulher, Cidália,
forma de as vencer. as fotos na marginal, em frente à praia. grávida de seis
Afinal, o agora comentador desportivo meses, que
ia entrar em direto na televisão, via lhe serve de
camerawoman
Skype, para dar conta de como estava
a decorrer o levantamento do cerco
sanitário em Ovar. A mulher de Cândi-
do Costa, Cidália, grávida de seis me-
ses, foi com ele para o ajudar. Ela é que
segurava no telemóvel, enquanto ele
falava. Antes disso, Cândido Costa
contou à SÁBADO muitas histórias da
sua carreira. Como a estreia no Derby
County, quando, devido a um pontapé
q
MIGUEL BALTAZAR

violento, partiu (e engoliu) três dentes.


Ou quando Vítor Baía, no fim de um Com o País
em estado
treino no FC Porto, lhe disse que preci- de emergência,
sava que ele lhe fosse lavar o carro. se nas próximas
g Cândido Costa pegou na chave do semanas tiver pro-
A jornalista B blemas em comprar
Raquel Lito Porsche e lá foi, a pensar: “Fogo, sou a sua SÁBADO saiba
esteve com Jornalista e conselheira jogador do FC Porto e vou lavar o car- onde fazê-lo em
os profissionais Um outro efeito do isolamento é a difi- ro ao meu guarda-redes.” www.sabado.pt
de saúde que
foram alojados culdade em dormir. Quando a subedi-
em hotéis. Aqui tora Vanda Marques começou à pro- B
a entrevistar cura de pessoas com problemas de Entender a “pãodemia”
o enfermeiro !
Carlos Noguei- sono, a tarefa não parecia fácil. Mas No GPS as jornalistas Catarina Moura e
ra, com as devi-
das distâncias
desde que foi decretado o estado de Filipa Teixeira deixaram de ir à pada- k
emergência que os casos começaram ria para perceber o fenómeno do pão
a aparecer. Tantos que nem foi possí- feito em casa. Para isso pediram a três SÁBADO
investigação
vel falar com todos. E foi já munida de padeiros receitas de pão para todos os
uma série de técnicas aconselhadas tipos de cozinheiros: dos iniciados aos Faça a sua
parte.
por especialistas que a jornalista aca- mais experientes. E partilham-nas Nós tratamos
bou, não só a recolher testemunhos, consigo. Tal como a indicação de que do resto
mas também a partilhar com os seus há boas padarias que continuam aber- Envie as suas
B denúncias para
entrevistados conselhos para dormir tas, caso a cozinha não seja para si. o nosso email:
Chefe de Redação melhor – os mesmos que pode en- Boa semana e proteja-se – a si e investigacao@saba-
Nuno Tiago Pinto contrar nesta edição. aos outros. W do.cofina.pt

6
Fique em casa
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Do diretor

EDITORIAL E pa na sua maior crise pelo menos

A maior
desde a II Guerra Mundial. É, sem
Não tenhamos ilusões. dúvida, a maior crise deste século

crise do
Nenhum país aguenta tanto mas, muito provavelmente, a dos úl-
tempo parado, muito menos timos dois séculos e meio, como

século
Portugal, que tem uma afirma Adam Tooze, um prestigiado
economia débil, vínculos historiador britânico, da Universida-
laborais muito precarizados, de de Colúmbia, para quem a velo-
uma grande fratura social cidade e a magnitude deste furacão

U
e económica e níveis de ma das características da económico é algo “nunca visto de-
rendimento individual que crise que vivemos é a radi- baixo do Sol”.
estão na cauda da Europa cal modificação do tempo Quando chegamos às previsões
histórico. O passado recente parece do FMI, na semana passada, onde
que foi há décadas e o presente não vai já a escalada dos números…
vive-se a uma velocidade insusten- Quando a esmagadora maioria dos
tável. Para já não falar naquilo que países ainda está de quarentena e i
hoje se pode considerar futuro. O alguns prepararam um regresso O 25 de Abril
futuro que queremos é depois de lento à normalidade possível, a pre- no parlamento:
amanhã, já não é no sentido clássi- visão mais negra do FMI, que admite a celebração
deveria ser
co de ser um tempo projetado mui- a possibilidade de uma nova onda mais contida,
tos anos, décadas à nossa frente. do vírus no próximo inverno, apon- com menos
Quem se lembra do que aconteceu ta para uma caída do PIB mundial gente e sem
em fevereiro? Alguém se lembra do na ordem dos 8%. Na versão mais a raiva
peticionária
que se discutia na política caseira? otimista, se tudo correr um pouco que por aí anda
Vagamente a incerteza de ver viabi- melhor, a quebra do PIB mundial – um trágico
lizado o Orçamento do Estado e de será de 3%. Ou seja, não morremos espetáculo
ter uma crise política pela frente. mas ficamos num estado de parali-
Muito vagamente a eutanásia e as sia económica e social por dema-
guerras de alecrim e manjerona en- siados anos.
tre a direção do Livre e a deputada Entre a emergência sanitária e a
Joacine Moreira. O Luanda Leaks e emergência económica não há es-
uma frente de esquerda parlamen- colha. Tanto se morre de uma como
tar contras as comissões da banca. de outra. Talvez por isso, o Governo
Mas, para chegar lá, é necessário português, como o espanhol, o no-
pesquisar um pouco. Instantanea- rueguês, o alemão e tantos outros,
mente, apenas ficaram as penas de começa a preparar a construção da
Isabel dos Santos. Enfim, era o tem- nova normalidade. É cedo? Talvez
po antes de coronavírus, o novo seja. Há muitos riscos? Sem dúvida.
A.C. do nosso calendário. Mas isso Mas não tenhamos ilusões. Nenhum
era em fevereiro. Alguém se lembra
que foi no dia 2 de março que a
OCDE publicou as suas primeiras
previsões sobre os efeitos da pan-
demia e para os cenários que elas
apontavam? Na realidade, já passou
uma eternidade.
Por esse março longínquo na nos-
sa memória coletiva, a OCDE previa
uma quebra de 0,5% no crescimento
mundial da economia e excluía um
cenário de recessão. O cenário não
era ainda pandémico e todas as
análises estavam centradas na ilu-
são de que o coronavírus estava
confinado à China e dificilmente
ANTÓNIO COTRIM/LUSA

afetaria o resto do mundo. Onze dias


E depois tudo mudou. A OMS decretou
Diretor a pandemia, o vírus galopou o pla-
Eduardo Dâmaso neta e em 15 dias submergiu a Euro-

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23 ABRIL 2020
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cial e profissional para que tudo nos


corra pelo melhor possível. Acate-
mos as regras de higiene básica e de
distanciamento social sob pena de
não nos ajudarmos a nós próprios
nem aos muitos milhares para
quem é evidente que esta crise não
vai acabar bem. Não vai acabar
país aguenta tanto tempo parado, bem para muitos trabalhadores a E
muito menos Portugal, que tem recibo verde, que vão demorar a Celebrar Abril sem povo
uma economia débil, vínculos labo- reencontrar um emprego, para Mais do que vencer em abril para
rais muito precarizados no setor muitos pequenos e médios empre- conquistar a liberdade de maio, é
privado, uma grande fratura social sários que não vão reabrir, para as essencial ganhar a liberdade para
e económica e níveis de rendimen- muitas famílias enlutadas e para todo o tempo que aí vem. Para o ve-
to individual que estão na cauda da muitos jovens que veem o seu futu- rão e para o inverno. Para trabalhar
Europa. Quem é que acredita que os ro dramaticamente interrompido, e para, mais tarde, nos divertirmos
atuais níveis de lay-off, atingindo sem a certeza de saber onde e em segurança. Com prudência, in-
mais de 1 milhão de trabalhadores, quando irão reencontrá-lo. teligência, resiliência e um ânimo
não se transformarão num desem- que nos faça reconquistar a alegria
prego gigantesco à medida que o de viver. Tudo isso é muito mais
tempo vai passando?! E que Segu- importante, não do que o nosso 25
rança Social aguenta isso? A portu- de Abril, mais do que uma celebra-
guesa dificilmente será. Por isso, ção oficial da revolução. Uma cele-
confiemos um pouco e, sobretudo, bração sem povo, cheia de discur-
aceitemos a disciplina como valor sos ocos e arrebatados de antifas-
ordenador da nova convivência so- cismo arrogante e serôdio, sobre a
alegada legitimidade abrilista de
cada um, como se o 25 de Abril fos-
se propriedade dos partidos e per-
sonalidades que ali estarão.
Esta longa noite escura que se
abate sobre nós não se combate
com discursos mas com ações. E a
ação, neste caso, recomendaria
uma celebração muito mais conti-
da, com muito menos gente e, so-
bretudo, sem esta raiva peticionária
que por aí anda, transformando
uma dimensão social, histórica,
económica e política incontornável
do País, que é o seu património de-
mocrático genético, num joguete de
grupos de influência ideológica à
esquerda e à direita.
Gosto demais do 25 de Abril para
entrar nesse trágico espetáculo.
Celebrem o 25 de Abril como qui-
serem, mas não venham dar prédi-
cas ao povo sobre distanciamento
social e disciplina cívica. E não es-
queçam: esta celebração é a de
meia dúzia de figuras do regime.
Não é a festa popular que todos nós
merecíamos. W

9
A semana
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Manifeste-se, mas com segurança


Israel pode servir de paradigma às novas manifestações. Nesta praça, em
Telavive, a 19 de abril, as pessoas protestaram – mantendo a distância de
segurança – contra as “medidas antidemocráticas” do governo para conter
o coronavírus. Um exemplo de como poderá ser o 1º de Maio em Portugal?
FOTO JACK GUEZ/AFP
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Treinar ao sol de Havana sem sair de casa


O cubano Alejandro Lopez pratica artes marciais no telhado do seu prédio,
em Havana. Com o adiamento das grandes provas desportivas, como os Jogos
Olímpicos, há milhões de atletas em todo o mundo a treinar em casa. Em
Cuba, onde há apenas mil casos de coronavírus (e 36 mortes), há mais de
6 mil turistas que não conseguiram sair da ilha e permanecem em hotéis.
FOTO YAMIL LAGE/AFP
A semana

H
á mais de uma semana
A NOTÍCIA

SA
que as trabalhadoras

ÚD
do lar e da unidade de

E.
Ag
cuidados continuados

MA
O E necim or do
de Ferreira do Alentejo estão

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RIA
sem usar máscaras cirúrgicas.

do

sta en Paí

LD
“Uma situação de alto risco para

do to d s, q
elas e para os utentes”, diz o

ES
VIA
provedor da Misericórdia local,

est e m ue

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“que se deve ao facto de a nossa

áa
última encomenda de equipa-

DO
uer
mento de proteção individual ter

INT
req teria mbém
sido desviada à chegada a Por-

ER
uis is d
tugal, ao abrigo do estado de

IOR
emergência”. Em Moura, a rotu-

ita e p estão

DO
ra só não é ainda total porque

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ta

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nos últimos dias a administração

ÍS
ivi oteçã a so
do lar conseguiu adquirir algum

l
material avulso numa loja chi-

me o i frer
r
nesa daquela cidade alentejana.

ra d nte ndi
“Foi assim que nos safámos”, re-
conhece a provedora, “mas o

má vidu m a “
que conseguimos comprar é

sca al a nov
muito irrisório para as nossas
necessidades”.

ras os t a p
É ao nível local que os efeitos da

co
chamada “guerra das máscaras”, q

en rab irat
que está a afetar fortemente as Desvio

com alh aria


relações comerciais entre esta- Máscaras para a Santa Casa

as
dos, se faz sentir com maior exu- da Misericórdia de Ferreira do

en ador ” no
Alentejo foram desviadas
berância. “É aqui, no terreno, que ao abrigo do estado

da
se percebe que as coisas estão a de emergência

da es do s aero
falhar”, diz à SÁBADO Francisco
Ganhão. Para o presidente do Se-

s p s la po
cretariado Regional de Beja da

or
União das Misericórdias Portu-
guesas “a situação é realmente
grave e já ninguém se entende

res rtos
quando é o próprio Estado a des-
viar as encomendas das peque-
nas unidades de apoio aos idosos.
Os fornecedores estão a demorar
muito tempo nas entregas, tempo
de que nós já não dispomos”. e
O caso do “desvio” de máscaras
“não afeta apenas os lares do sadequado e arriscado”, constata
Alentejo”, acrescenta Francisco Olímpio Raposo.
Ganhão, “o problema existe em A encomenda, que a Farma+
todo o País, principalmente nos reconhece ter sido alvo de requi-
territórios do Interior”. Em Fer- sição civil ao abrigo do estado de
reira do Alentejo, segundo o pro- de”. Há mais de uma semana que emergência, era proveniente da
vedor Olímpio Raposo, a enco- as cerca de 40 colaboradoras dos China e continha igualmente ma-
menda de mil máscaras que tinha serviços de apoio social da Santa teriais destinados aos hospitais de
sido feita através da empresa Casa da Misericórdia de Ferreira Évora e do Barreiro. Já no caso de
Farma+, de Vila Nova de Famali- do Alentejo estão a acompanhar Moura, o atraso na entrega das
cão, e cuja entrega estava previs- os utentes sem equipamento de três mil máscaras que a Miseri-
ta para 3 de abril, “ainda não nos proteção individual ou com re- córdia reservou junto do impor-
foi entregue porque foi confisca- curso a máscaras fabricadas em tador Lab52 – Medical Supplies,
da pelo Serviço Nacional de Saú- casa, “o que é absolutamente de- segundo a provedora Alice Pláci-

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23 ABRIL 2020 23 ABRIL 2020
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Sobe&Desce
do, “deve-se à guerra internacio-
nal que está instalada por causa
da pandemia do coronavírus. E
quem mais sofre com ela são as
pessoas mais vulneráveis, como é
o caso dos nossos idosos”. No lar
Octávio Ribeiro
da Santa Casa da Misericórdia de Jornalista
Moura estão alojados 136 utentes,
que são assistidos por oito deze-
nas de profissionais. g
A encomenda em falta no lar de Manuela Eanes
Moura, igualmente proveniente Antiga primeira-dama
q da China, integra um lote de cer- Reagiu com fron-
Gato e rato ca de 600 mil máscaras que a talidade e bom sen-
Para garantir a chegada das Lab52 “espera receber há mais de so ao excesso de
mercadorias ao destino três semanas”. Segundo Armindo pessoas que Ferro
as empresas importadoras
têm de alterar o itinerário Silva, gerente desta empresa im- Rodrigues sonha
de transporte com frequência portadora do Porto, “para garan- juntar no parla-
tir a segurança da mercadoria, te- mento: se as come-
mos de alterar o itinerário de morações do 25 de Abril impli-
transporte quase de hora a hora. carem riscos, não irá! Talvez
Os fornecedores não se respon- ainda prevaleça a sensatez que
sabilizam pela passagem em al- reduza riscos para ilustres que
guns aeroportos, nomeadamente já não eram crianças em 1974.
o de Frankfurt”.
À falta de voos diretos para Por- g
tugal, a solução encontrada para Eduardo V. Rodrigues
este caso concreto foi a realiza- Autarca de Vila Nova de Gaia
ção de uma escala em Istambul Uma semana de-
que, entretanto, fechou o tráfego pois de a CMTV ter
aéreo, fazendo deslocar a carga noticiado o primei-
para Bruxelas. A partir da capital ro caso positivo no
sm

belga, as máscaras compradas Lar de Santa Isabel,


pela Lab52 vão ser transportadas utentes e funcioná-
em camiões até ao Porto. “Espe- rios ainda não esta-
ramos que agora não fique pelo vam testados. Avançou ele. Há
caminho, retida em França ou em 51 infetados. A filiação socialista
Espanha. É que o espírito comu- não lhe calou a justa indigna-
nitário morreu de todo. Hoje so- ção. Muitos autarcas estão a
im e da euro

mos uma espécie de inimigos co- dar provas de coragem, inde-


po

muns europeus”, lamenta Armin- pendência e competência.


rta s uni peus

ásc

do Silva: “Isto para nem falar na


do

especulação em torno dos preços


das transportadoras. Um frete i
res dade Por P

como o nosso, que em janeiro Rómulo Mateus


pri

custava 15 mil euros, hoje não se Diretor-geral das Prisões


O seu olhar sobre
vad de cu lo Bar

consegue por menos de 91 mil


dólares. É claro que isso se vai re- o braço repressivo
s
os. ida riga

da justiça é mais de
.

fletir nos preços das máscaras, o


ara

que é mau, uma vez que os nos- reinserção do que


O q dos

sos compradores são as peque- de reclusão. Mas


au

ue con

nas Misericórdias do Interior. São nestes tempos de


elas as grandes prejudicadas com pandemia, ter um
est

esta espécie de pirataria dos tem- Rómulo generoso na


á a tinua

pos modernos.” libertação de presos provoca


alarme social. O excesso de
afe dos

A SÁBADO pediu esclarecimen-


tos à Direção-Geral da Saúde, boa vontade tenderá a gerar
tar

mas não obteve resposta até ao vítimas inocentes.


s o

fecho desta edição. W

17
A semana

JUSTIÇA
CRIME. ESTÁ DETIDO EM COIMBRA HÁ NOVE MESES

Tribunal engana-se e
não reconhece erro
Em 2012, Paulo Silva foi condenado a dois anos
de cadeia. A pena foi suspensa na condição de
pagar 960 euros à Santa Casa. No fim do prazo,
pagou – mas em 2019 foi preso na mesma.
Por Alexandre R. Malhado

É
um caso insólito. Em outubro quaisquer veículos motorizados”
de 2018, o tribunal judicial de durante quatro meses.
Reguengos de Monsaraz or- Volvidos dois anos, Coelho da
denou a prisão de um homem Silva não pagou as prestações
condenado a dois anos de pena sus- como combinado, mas acabou
pensa por ele não ter cumprido o re- por pedir ao Ministério Público
quisito de pagar 960 euros à Santa (MP) para saldar a dívida de
Casa da Misericórdia local (SCMR). O uma só vez. O MP deu-lhe cinco
problema é que… o homem já tinha dias para pagar tudo – e assim o fez.
pago o valor – e nem um recurso ou Quatro anos depois, o tribunal avan-
um habeas corpus o conseguiram tirar çou para a revogação da suspensão,
do Estabelecimento Prisional de como se Coelho da Silva nunca tives-
Coimbra (EPC), onde cumpre a pena se pago: “O arguido não comprovou
desde julho de 2019. nos autos a entrega da quantia de h
A sentença em primeira instância foi 960 euros à SCMR”, lê-se no despa- Justiça cega
dada a 24 de maio de 2012. Paulo cho, a que a SÁBADO teve acesso. Os tribunais
Coelho da Silva, 44 anos, foi condena- não aceitaram
a revisão da
do a dois anos de prisão por um crime MP concorda mas não importa medida, apesar
de condução perigosa, dois de injúria Coelho da Silva pediu ao Supremo de Paulo Coelho
agravada e um por resistência e coa- Tribunal de Justiça (STJ) um recurso da Silva ter pago
ção sobre funcionário. De acordo com extraordinário da revisão do despacho a quantia a que
a sentença, estavam em causa factos de revogação da suspensão da pena. foi condenado
ocorridos um ano antes: quase abal- Um parecer do MP contraria o argu-
roou um carro da GNR em ultrapassa- mento do tribunal: “Alegou o recor-
gens perigosas e, ao ser parado pelas rente que o despacho impugnado as-
autoridades, chamou-os de “monte de sentou em fundamento de facto não
merda” e agrediu-os. A pena ficaria verdadeiro – o incumprimento da
suspensa mediante “a obrigação de obrigação de entregar à SCMR a
entregar à SCMR a quantia de 960 eu- quantia de 960 euros, condicionante
ros em 24 prestações mensais de 40 da suspensão da execução da pena.
euros” e a “inibição de conduzir (…) E, de facto assim sucedeu, como

18
23 ABRIL 2020
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PUB
consta dos autos, mais constando do
recibo que a entrega do valor mencio-
nado foi realizada pelo arguido”, lê-se.
No entanto, todas as tentativa de re-
visão da decisão de revogação foram
malsucedidas. O MP considerou que
“os motivos do recurso não se enqua-
dram no fundamento legal invocado,
porquanto não constituem facto novo
nem novo meio de prova”. “O recurso
de revisão não é o meio processual
próprio para remediar a alegada injus-
tiça da decisão impugnada”, lê-se. E o
Supremo anuiu: “A revisão de senten-
ça transitada em julgado é admissível
quando se descobrirem novos factos
ou meio de prova.” Coelho da Silva foi
detido pela GNR de Soure no dia 18 de
julho de 2019.
O tribunal também sustentou a deci-
são de revogação da execução da
pena com a “prática de outros crimes
durante o período de suspensão”. De
acordo com o seu registo criminal,
Coelho da Silva reincidiu em crimes
de resistência e condenação sobre
funcionário (28/2/2014) e injúria agra-
vada (28/2/2014), cometendo ainda
outras infrações como condução em
estado de embriaguez (4/6/2015),
ameaça agravada (31/5/2012), furto na
forma tentada (2/2/2013) e dano quali-
ficado (14/3/2014).
A defesa ainda interpôs um pedido
de habeas corpus, argumentando a
nulidade da audiência de revogação da
suspensão. “O arguido não faltou à au-
diência por desleixo ou incúria, mas
sim porque desconhecia a sua realiza-
ção”, lê-se. De acordo com a defesa, a
GNR tentou notificar o indivíduo em
cinco ocasiões, sem sucesso. “E não foi
tentada qualquer outra forma de noti-
ficação, designadamente por via pos-
tal”, lê-se ainda. Citando o artigo 333º
do Código Penal (CP), uma audiência é
nula se, “no despacho que determinou
a realização de tal audiência, não
mencionou a dispensabilidade ou
indispensabilidade” do arguido. O
Supremo não aceitou a argumentação
frisando que, aquele artigo do CP, “res-
peita à fase da audiência de julgamen-
to” e que “não é equiparável” a uma
revogação da suspensão da execução
de uma pena. W
D.R.

19
Iniciativas Sábado 23 ABRIL 2020
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20
Quem diria que seria preciso chegar
a isto para o Mundo relembrar o real valor
dos jornalistas profissionais.
E, de repente, o Mundo ficou diferente.

A pandemia que assola o Planeta deixou bem claro que informações corretas, tratadas, produzidas

por jornalistas e empresas de comunicação profissionais são bens de primeira necessidade.

Para a proteção das nossas famílias não nos servem boatos e rumores disfarçados de verdade.

Os timelines das redes sociais não servem, nunca serviram, para informar. O áudio enviado pelo vizinho,

pelo cunhado, não é uma reportagem, não é matéria jornalística. Desde o tempo de Gutenberg é assim,

mas parecia andar a ser esquecido. O alarme tocou, a realidade bateu às nossas portas.

Em Portugal, e em todo o Mundo, são os jornalistas profissionais que estão nas ruas, nas redações,

nos estúdios. A arriscar o contágio. A fazer diretas. A dar voz às populações. A falar com

especialistas confiáveis. A cobrar dos governos respostas. Ainda bem que existe esta profissão,

esta atividade. Não precisa aplaudir. Basta nunca mais esquecer o seu valor.

Quando tudo voltar ao normal, não se esqueça


o valor do jornalismo profissional não tem preço.

Fotografia: Luis Vieira / Movephoto


A semana

AS FRASES F
António Costa
“A primeira prioridade foi conter
a pandemia sem matar a
F
Luís Filipe Menezes
“Sou um polícia implacável da
quarentena. Por agora, a nossa
economia. A nova prioridade boia de salvação”
agora é reanimar a economia Ex-líder do PSD, Nova Gente
sem descontrolar a pandemia”
Primeiro-ministro, Expresso
F
Marcelo Rebelo de Sousa F
F “Somos um milagre vivo Kylie Jenner, empresária e lifestyler,
Manuel Alegre há quase nove séculos. Se isto a explicar porque desapareceu durante
“Os capitães de Abril, é um milagre, o milagre a gravidez, Los Angeles Times
chama-se Portugal”
neste momento, são os
profissionais de saúde”
Presidente da República, conferência
de imprensa “Preparei-
-me de
Poeta e ex-deputado, i

forma
F Rui Vitória
Jorge Sampaio “Não vai ser fácil
“Temos de aproveitar este choque
exógeno que ninguém esperava
nem antecipou para sair mais
voltarmos a ver tão cedo
o estádio da Luz, de positiva e
fortes, mais decididos a proteger
um modelo social mais inclusivo”
Alvalade ou do Dragão
com 50 mil nas sem stress.
Não andei
Ex-Presidente da República, Público
bancadas”
Treinador de futebol, TSF

F
Francisco Calheiros
a mostrar
“Em agosto e setembro, se
abrirem as fronteiras, e com a minha
muitos cuidados, podemos
pensar na vinda de espanhóis”
Presidente da Confederação do Turismo
barriga ao
de Portugal, Expresso
mundo”
F
Ciara, cantora, Instagram
“A vida de uma
grávida em
tempos de F
Covid-19 é Daniel Oliveira
interessante. “Enjoo-me com o ‘vai ficar tudo
bem’, que nos trata como crianças”
O Russ [marido] Colunista, Expresso

teve de ficar
no carro a ver F
a ecografia Júlio Isidro
“Se não me tivesse
por FaceTime” casado seria, possivel-
FOTOS GETTYIMAGES

mente, o solteirão mais


conhecido do País”
Apresentador, Caras

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23 ABRIL 2020
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F
Mario Vargas Llosa,
escritor, El País

“Um chinês
come um
morcego
e provoca
uma pande-
mia que
aterroriza
o mundo.
Nenhum
país estava
preparado
para um
desafio
semelhante”
F F
António Guterres Júlia Palha
“Uma vacina pode ser a única “Gosto de inspirar as mulheres
ferramenta que permite a sentirem-se confiantes nos
o retorno do mundo a um seus corpos e a serem felizes”
sentimento de normalidade” Atriz, TV Guia
Secretário-geral da ONU, Diário Notícias

F
F Wayne Rooney
Humberto Pedrosa “Ronaldo é implacável na
“A TAP só precisa de área, mas Messi tortura
socorro do Estado” antes de te matar”
Acionista da TAP, Negócios Futebolista, The Sunday Times

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23 ABRIL 2020
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SÓNIA BENTO

INSÓLITO
!
! Casa sinistra coberta
Lâmina 26 anos de bonecas na fachada
dentro da cabeça A Avenida Iztacalco 9, na
Um chinês, de 76 anos, Cidade do México, foi um dos
da zona rural de Haiyan, endereços mais pesquisados
em Qinghai, sobreviveu no Google Maps, depois de as
depois de lhe ter sido fotos de um edifício assusta-
removida da cabeça a dor e coberto de bonecas se
lâmina de uma faca, tornarem virais. Tudo come-
enferrujada, com 10 cm. çou com um vídeo da casa,
O homem havia sido es- partilhado no TikTok.
faqueado na cabeça, em
1994, num assalto, e des-
de então tinha perdido !
a visão do olho direito. Fantasmas ajudam
ao confinamento
1. Na ilha de Java, na Indonésia,
! encontraram uma solução bizar-
Procura mulher ra para impedir que as pessoas
limpa e sem germes saiam de casa em plena pande-
“Homem saudável, mia do coronavírus: puseram
atraente e bem empre- “fantasmas” a circular nas ruas.
gado” procura mulher 2. Os assustadores fantasmas
“livre de germes, saudá- são jovens voluntários que ten-
FOTOS D.R.

vel e limpa, que queira tam ajudar as aldeias a manter


um relacionamento mo- os habitantes confinados.
nogâmico”. É o que se lê ! 3. E parece que tem funciona-
em folhetos espalhados
por Nova Iorque, em A casa de banho de Banksy do. Um elemento dos voluntários
diz que não se vê ninguém na
tempos de pandemia. O misterioso artista de rua britânico revelou no Insta- rua e as pessoas já não permane-
gram a sua última obra, em plena pandemia do corona- cem em grupo depois das ora-
ções noturnas.
vírus. Banksy mostrou uma visão do seu confinamento
e partilhou uma série de fotos da sua casa de banho
repleta de esboços de ratos, que já apareceram nas suas !
obras anteriores. Na legenda escreveu: “A minha mulher Cubículos de praia
pandémicos
odeia quando eu trabalho em casa.” Os ratos aparecem A empresa italiana Nuova
a derrubar o espelho, pendurados no cordão do auto- Neon criou umas caixas de
clismo ou a pisar um tubo de pasta de dentes. acrílico transparente, com 2
metros de altura e 4,5 metros
de largura, para instalar nas
! ! praias, permitindo às pessoas
UMA ITALIANA DE 60 ANOS FOI MULTADA Stick de hóquei com manterem a distância segura.
EM 400 EUROS, EM ROMA, POR ROMPER A 170 anos vale milhões
Um stick de hóquei em pa-
QUARENTENA IMPOSTA NO PAÍS, QUE É UM tins, com cerca de 170 anos,
DOS MAIS AFETADOS PELO CORONAVÍRUS. foi avaliado em 3,5 milhões
O QUE MAIS IRRITOU OS AGENTES FOI A de euros. Um casal norte-
JUSTIFICAÇÃO DA MULHER: ELA DISSE -americano, do estado de
Vermont, tem o stick desde
À POLÍCIA QUE TINHA 1980, depois de o ter encon-
SAÍDO PARA trado em casa da avó de um
PASSEAR A deles. Agora quiseram saber
TARTARUGA. quanto valia e vão leiloá-lo.

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23 ABRIL 2020
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RITA BERTRAND

OBITUÁRIO
Gene Deitch (1924-2020)
Ilustrador e realizador de episódios um boneco vermelho a guerrear BEM-DIS- revolucionou-a, tornando-a uma
de Tom & Jerry e Popeye, trocou a com um azul, parábola do conflito POSTO, NO produtora respeitada de curtas de
prosperidade na América pela in- Israel-Palestina, foi lido como pró- SEU ÚLTIMO animação modernas, com persona-
certeza em Praga, onde acabou por -soviético: “Ninguém entendeu o fil- POST NO FA- gens que rapidamente se populari-
morrer a 17 de abril, aos 95 anos me e foi banido sem explicações.” CEBOOK ES- zaram, como Tom Terrific, Sidney
CREVEU QUE the Elephant ou Flebus.
De Chicago a Praga OS ELMOS Em 1958 abriu a sua própria em-

“O
que eu gostava mesmo era Nascido Eugene Merrill Deitch a 8 de MEDIEVAIS presa e um cliente fez-lhe uma pro-
de ser músico. Acho que os agosto de 1924, em Chicago, iniciou IAM VOLTAR posta: financiaria o seu projeto de
músicos são mágicos”, con- a carreira a seguir ao liceu, em 1942, A SER MODA sonho, o tal Munro que lhe valeu o
fessou Gene Deitch, chamando a como desenhador técnico de Óscar, se ele ajudasse a reabilitar os
atenção para uma das suas curtas aviões, em Los Angeles, pas- seus estúdios na Checoslováquia
menos conhecidos, com bonecos a sando, após a Segunda comunista. Deitch aceitou ir por 10
tocar jazz, num documentário sobre Guerra Mundial, a dias e acabou por lá ficar o resto da
a sua vida e obra, ao lado da mu- assistente da dire- vida, tendo sido o único america-
lher, Zdenka Najmanova, sua pro- ção de arte da Rá- no a viver no território até à tran-
dutora ao longo das últimas cinco dio CBS, que con- sição para a democracia, em
décadas, seu grande amor e um dos ciliou com uma 1989. “Todos achavam estranho
motivos para se mudar para Praga, colaboração ter um visto que me permitia
apesar da carreira de sucesso que como ilustrador entrar e sair quando queria,
tinha nos Estados Unidos. da The Record mas o mistério não era gran-
Foi uma decisão difícil. “Sabia que Changer, uma de. Eu trazia dinheiro e isso
alguém ia sofrer, mas era o que revista de jazz. interessava ao regime”, lem-
desejava”, sublinhou, referindo-se à O seu traço es- brou, nas suas memórias, For
ex-mulher e aos três filhos – hoje to- tilizado chamou the Love of Prague.
dos ligados à animação – que dei- a atenção da Uni- Foi lá que realizou Munro e tra-
xou na América. “A opção era sofrer ted Productions of balhou mais de 50 anos, nos estú-
eu. Há momentos assim, em que to- America (UPA), em- dios Bratri v Triku, criando curtas
das as opções têm reversos.” presa recente, fundada de autor, mas também produzindo
A verdade é que não se imaginava por dissidentes da Disney, (abaixo do preço de mercado, claro)
“a fazer o mesmo dia após dia, para que o contratou em 1946, para os Estados Unidos – primeiro a
sempre”. Já chegava de produções quando estava a arrancar. série com o boneco trapalhão Nud-
em série, em quantidade industrial: Não foi logo reconhecido e nik, um original seu, e alguns episó-
“Adaptar belos livros ilustrados, cada em 1949 mudou-se para De- dios de Popeye, o Marinheiro, para
um com o seu traço, foi o que tornou troit, onde fez os primeiros a Paramount; depois, para a MGM, 13
a minha vida interessante. Se tivesse anúncios para a produtora da episódios de Tom & Jerry, que se tor-
ficado nos Estados Unidos, talvez General Motors, mas a UPA naram de culto por alterarem consi-
estivesse na Pixar, a fazer longas de foi lá buscá-lo em 1951, deravelmente o estilo dos originais
êxito mundial, mas eu nunca quis ser dando-lhe o lugar de de Bill Hanna e Joe Barbera, em
rico e famoso, fui sempre apaixona- diretor criativo dos Hollywood. A razão era óbvia: toda a
do por contar histórias de forma seus estúdios nova- sua equipa checa desconhecia por
económica e artística, com esta -iorquinos. Em pou- completo o gato e o rato tão famosos
equipa incrível, nesta cidade que co tempo tornou-se do outro lado da cortina de ferro.
amo. Fui muito feliz a fazer peque- o mais aclamado Morreu a 17 de abril, na sua amada
nos filmes para crianças pequenas.” criador de animações Praga, e não foi de Covid-19, embora
Foi com um deles – Munro, sobre televisivas para esse tenha sido o tema do seu último
um miúdo de 4 anos que vai parar anúncios, firmando post no Facebook: bem-disposto,
ao exército – que ganhou um Óscar a fama da empresa. como era seu hábito, escreveu
para Melhor Curta-Metragem, em Daí passou para a que a grande
1961. Foi nomeado mais duas vezes histórica Terrytoons, moda do sécu-
e, não fosse a aversão americana ao a casa do Super Rato, lo XXI ia ser o
comunismo, talvez tivesse ganho de então da CBS e em regresso aos elmos
novo em 1969 com The Giants: com declínio acelerado, e da Idade Média. W
LUIS GRAÑENA

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23 ABRIL 2020
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INDISCRETOS Ricardo: 58 milhões


em oportunidade
! novo, porque o tribunal adminis-
NEM A PANDEMIA trativo da ilha já tinha anulado
TRAVA O CONCURSO dois concursos anteriores. A MU-
À terceira talvez seja de vez. SAMI publicou o concurso inter-
Ricardo Rodrigues (celebrizado nacional, em plena pandemia,
por ter em tempos levado dois a 30 de março, com um valor de !
gravadores dos jornalistas da
SÁBADO), agora à frente da
58 milhões de euros e um prazo
de três meses para apresentação Rita: + de €2.195
associação de municípios
de São Miguel (MUSAMI)
de candidaturas. Isto,
quando corre uma
oportunos
lançou de novo o concur- petição na ilha Com a TAP a afundar-se na crise,
so para uma incineradora para travar a diretora de comunicação da em-
de resíduos na ilha. De a polémica obra. presa, Rita Tamagnini, mudou-se
para o gabinete do ministro da tu-
tela, Pedro Siza Vieira. Nomeada
adjunta a 23 de março, optou pelo
salário do “posto de trabalho de
origem” numa empresa agora em
lay-off. Apenas podemos supor
que seja mais do que os 2.195
euros de um adjunto de ministro.
A assessora já trabalhou com Tei-
xeira dos Santos e Mário Centeno.

Fernando: €20 mil


inoportunos
A Câmara Municipal de Lisboa,
! liderada por Fernando Medina,
Tiago e companhia: pagou 20 mil euros ao Financial
Times por uma “reportagem so-
agora com mais 25 euros por dia bre a economia da cidade de Lis-
boa”. O contrato foi publicado a 6
O Jornal de Notícias, aten- ceu estes detalhes e conti- de abril, mas é de novembro de
to, já noticiou que o minis- nuou a publicar despachos 2019. Quanto à economia de Lis-
tro da Educação, Tiago de subsídios de alojamento boa, segue dentro de momentos.
Brandão Rodrigues, passou para quem não tem casa Os 20 mil euros é que já foram.
a receber subsídio num raio de 150 km Pelo menos ajudaram a impren-
de deslocação – a de Lisboa. Foram sa, vá lá, mas estrangeira.
decisão foi publica- contemplados, para
da a 30 de março já, os secretários de
em Diário da Re- Estado Jorge Del-
pública. São 25 eu- gado (Infraestrutu-
ros por dia. Mas ras), Fernando
Tiago não está sozi- Mendes (Planea-
nho. Em abril e mento), e os chefes
mesmo com o estado de gabinete do mi-
de emergência e uma nistro da Educação e
crise por resolver, o do secretário de Es-
Governo não esque- tado da Mobilidade.

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O CARTOON
Por Vasco Gargalo

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A semana

ENTREVISTA
É historiador e romancista – e o facto de ser isso tudo é usado
para o criticarem, diz. É especialista em escravatura e uma voz
ativa contra pedidos de desculpa e devoluções de património.
Por Marco Alves (texto) e Mariline Alves (fotos)

JOÃO PEDRO MARQUES

“Portugal é o reino
da maledicência
e da inveja”

F
oi professor de História, F camente restituir? Não estou a ver.
depois historiador e mais “As pessoas A proposta foi apresentada mas foi
tarde escritor de romances raramente chumbada no parlamento. Acho
históricos. Aos 70 anos, elogiam que a coisa vai ficar por aqui.
João Pedro Marques parece estar os outros.
mais em forma do que nunca. Pre- Normalmente Já utilizou em artigos e entrevistas
para livros e coletâneas, envolve- criticam e, a expressão “extrema-esquerda”
-se em discussões nos jornais com muitas vezes, associada a este tema. É para si
outros colunistas e não hesita em pela calada” evidente que é primeiramente
dar a sua opinião de especialista – uma questão política/partidária?
uma opinião sem falinhas mansas Cultural talvez. Política também, no
e pouca falsa modéstia. sentido em que de facto há uma
cultura de esquerda – sobretudo
A questão sobre a devolução extrema-esquerda – que é milena-
de património vai abrandar rista, neste sentido: há uma aspira-
ou estamos no início? ção a repor e a ressarcir a justiça, a
Como estas discussões em Portugal igualdade sobre a Terra, que Cristo
são sempre um reflexo do que se virá uma segunda vez à Terra,
passa fora, se lá a questão conti- reporá a justiça, vai reinar em paz
nuar a colocar-se, e se calhar vai durante mil anos (daí o termo mile-
continuar, aqui haverá um eco. Mas Escravatura narista) e vai recompensar os justos
é um eco um bocadinho pálido, É um especialista. e punir os bandidos e os maus, e só
Defende que não
porque a problemática francesa, se pode pedir
depois é que é o fim dos tempos.
por exemplo, é diferente da nossa. desculpa por prá- Isto baseia-se no Apocalipse, um
Mesmo admitindo esse princípio ticas de há 300 dos textos do Novo Testamento. Há
teórico de restituição, o que é que anos e que eram um grande milenarismo no pensa-
há aqui em Portugal para hipoteti- legais na altura mento de extrema-esquerda, esta

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23 ABRIL 2020
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F ideia de restituição está profunda-


“Nos tempos mente ligada a isso, de que final-
que correm, mente agora vamos pôr justiça nas
eu estou injustiças do passado.
bastante mais
próximo da E isso será possível?
direita Não é possível. Alguns dos homens
do que da de cada época tentaram o melhor
esquerda” possível pôr justiça na injustiça, nas
brutalidades daquele seu passado.
A séculos de distância é impossível
fazer uma coisas dessas, e even-
tualmente nem sequer é desejável.

Está a fazer uma associação en-


tre uma crença religiosa e um
setor do espectro político a que
não associamos a religião?
Pois. Vou fazer-lhe uma analogia
que pode ser útil. Há muita gente de
direita, eventualmente de extrema-
-direita, que pensa a economia se-
j gundo padrões marxistas, sem se-
João Pedro quer se aperceber disso e sem sequer
Marques (pai da
humorista Joana ter lido Karl Marx. Mas alguns prin-
Marques) vai cípios do marxismo estão a tal pon-
lançar uma to disseminados na nossa cultura
coletânea de 40
a 50 dos seus ocidental atual (a convicção de que
artigos na a história humana se explica priori-
imprensa tariamente por razões económicas;
o conceito de meios de produção;
etc.) que todos os usamos mesmo
sem nos apercebemos disso. A
mesma coisa se passa com o mile-
narismo. A extrema-esquerda tem
uma quantidade de aspetos que são
análogos aos aspetos religiosos.
Pense-se na frequência com que,
na extrema-esquerda, houve dog-
mas, hereges, perseguições e pur-
gas, e o entendimento do partido
como algo que está acima da pes-
soa e que deve ser objeto de vene-
ração, etc. Daí haver tanta similitu-
de entre os partidos comunistas e
certas organizações religiosas.

Tem posicionamento político?


Tenho, claro. Não sou filiado em
nenhum partido, voto de acordo
F com a minha consciência em cada
“Há uma momento. Nos tempos que correm,
teimosia, um eu estou bastante mais próximo da
bocadinho direita do que da esquerda.
tacanha, em
relação ao que Pareceu-lhe adequada a reação
produzem os do deputado do Chega à pro-
historiadores posta do Livre, de sugerir a
estrangeiros” própria devolução da deputa- Q

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Q da ao seu país de origem? Aqui há uns tempos, Onésimo


Não, é um disparate, é uma daque- Teotónio de Almeida relatou
las coisas panfletárias, disparata- num livro a ignorância que
das. Aliás, foi censurado universal- grassa internacionalmente so-
mente. São daquelas coisas que se bre os Descobrimentos portu-
dizem em conversa de café, um gueses. E que isso se deve a vá-
círculo de amigos à volta de uma rios fatores, desde logo os nos-
bica. Provavelmente também não sos livros são parcamente tra-
pensou naquilo a fundo. duzidos. Passa-se o mesmo com
o século XVIII, com a nossa pre-
Passaram 10 anos desde a estreia sença em África, com a questão
como romancista. Seis livros da escravatura?
depois, não se terá arrependido. Menos. Da mesma forma que há
O arrependimento foi não ter poucos historiadores portugueses
começado mais cedo? lidos lá, aqui em Portugal há uma
Eu tinha uma carreira de historia- espécie de teimosia, um bocadinho
dor que me preenchia. E era inves- tacanha, ou antiquada talvez, não
tigador. Quando isso se tornou di- quero ofender ninguém, há uma ig-
fícil ou impossível de prosseguir, norância em relação ao que produ-
por razões várias, achei que tinha zem os historiadores estrangeiros.
de procurar outra atividade. Saí, Um colega meu chegou a dizer que
pedi reforma antecipada e experi- eram maus. É um exagero. Há óti-
mentei escrever um romance his- mos historiados ingleses e norte-
tórico. A ideia inicial [do livro Os -americanos a escrever sobre a
Dias da Febre] era escrever um presença portuguesa em África, ou
artigo científico sobre a epidemia sobre os Descobrimentos.
da febre amarela, e pensei “mas g Uma pessoa ser um historiador
ninguém vai ler”, como acontece Estreou-se nos com algum reconhecimento inter- Mas essa resistência é por ques-
romances históri-
com os artigos científicos que an- cos em 2009 com nacional – e nacional – e ser capaz tões técnicas? Veem por exem-
dam perdidos e encafuados numa um livro passado de escrever romances históricos plo que na bibliografia não tem
revista científica qualquer. Porque em Lisboa duran- que também tiveram algum reco- suficientes fontes portuguesas,
te... uma epidemia
é que não faço disto o palco de de febre amarela nhecimento, acho que isso é bom. logo, não deve estar bom?
um romance passado nesta altura? Ser romancista não é uma coisa Não, porque alguns desses historia-
Foi assim. menorizante. Escrever um roman- dores conhecem muito bem a do-
ce histórico de bom nível é dificíli- cumentação portuguesa. Hoje há
O que é que os seus colegas mo, exige grande domínio da épo- imensa coisa que está na Internet,
historiadores acharam da sua ca. Portanto, se me pergunta o que mas há uns anos não, e os norte-
mudança de carreira? os meus colegas historiadores -americanos tinham financiamento
[Gargalhada] Bom, sabe que Portu- acham, não me estou a lembrar de suficiente para chegar aí a um ar-
gal é o reino da maledicência e da nenhum que se tenha pronunciado. quivo e mandarem microfilmar
inveja. Muita gente não se pronun- caixas inteiras de documentos, que
ciou. Aliás, em Portugal as pessoas Há pouco falava da inveja e da levavam para os EUA. Alguns vie-
pronunciam-se pouco sobre os ou- maledicência portuguesa. É uma ram cá estudar a nossa documen-
tros e raramente elogiam os outros. pessoa deste tempo, mas tam- tação e alguns são ótimos. Joseph
Normalmente criticam, e muitas bém especialista no Portugal de C. Milner, que morreu recentemen-
vezes pela calada e de forma indi- há três séculos. Acha que há uma te [1939-2019], falava e lia portu-
reta e de viés. Agora, nos últimos maneira de ser portuguesa que guês, e tem o melhor estudo que
dois a três anos, não sei se está a se mantém? existe sobre o tráfico de escravos
par disso, estive envolvido num É muito semelhante, sim. Estava a em Angola [Way of Death: Mer-
debate público, escrevi dezenas de fazer a pergunta e sabe o que me chant Capitalism and the Angolan
artigos, sobre várias coisas, mas so- ocorreu? Eça de Queiroz. Se ler Eça Slave Trade, 1730–1830; O Cami-
bretudo sobre a relação de Portugal Mudança de Queiroz, de há cento e tal anos, nho da Morte: Capitalismo Mer-
com a escravatura. Houve várias Depois dos encontra lá os portugueses de ago- cante e Comércio de Escravos em
críticas, mais nas redes sociais, e romances históri- ra, com a sua mesquinhez, a sua Angola]. E nunca é citado, ou é
cos, vai lançar
muitas delas atacavam-me pelo inveja, maledicência, também com pouco. Há uma renitência em re-
um livro futurista.
facto de ser romancista. “Este his- “Deve chamar-se o seu sentido de humor, a sua ma- correr aos historiados estrangeiros.
toriador que é romancista, é mais O Prazer de Guiar, landrice, está lá isso tudo. Se ler as Portanto as coisas ficam fechadas
romancista que historiador”, e tal. é um romance coisas do século XIX encontra lá o sempre no mesmo cadinho, sem-
Isto é típico da inveja nacional. sobre a liberdade” português atual. pre no mesmo círculo vicioso. W

30
Pense por si.


 
   

 
  
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     



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Opinião

A LAGARTIXA O
Ciclos más
demográficas, com esses países mal-
ditos. Se há qualidade a realçar é a de
E O JACARÉ notícias/ boas
uma melhor governação da crise,
mas comparável ao que fizeram ou-
Os portugueses não são mais tros governos europeus. Não todos,
heróis do que os italianos notícias mas bastantes para também não
e os espanhóis, mesmo criar novas excepcionalidades.
com números diferentes. É interessante observar o ciclo boas/ Portugal é um país pequeno, com
E no Norte estamos mais más notícias na comunicação social. a população desigualmente distri-
parecidos, descontadas Analisando com cuidado, muitas ve- buída, com um serviço universal de
as diferenças demográficas, zes não há assim grande diferença cuidados médicos, e um país onde
com esses países malditos entre o que se passa nas “más” e o há uma fácil impregnação por slo-
que se passa nas “boas”, a não ser a gans que oscilam entre o catastro-
prevalência de um outro conflito, fista e o lamechas. Um País que é
que é o que se está a agravar: entre
os “amigos da saúde” e os “amigos
da economia”. A comunicação social
é muito sensível à novidade e, depois
de dias e dias de Covid-19, sabe que
há um esgotamento de atenção e
quer novidade. E a novidade é a
“economia” e, para a “economia”
abrir, são precisas boas notícias. O
problema com este ciclo é a sua rá-
pida politização, com a esquerda no
primeiro lado e a direita no segundo.

O
Só faltava
o patriotismo,
o “milagre
português”,
as qualidades
excepcionais
dos portugueses
Não tenho muita paciência para o
patriotismo pandémico, que a partir
de cima, do Presidente, e vindo por
aí abaixo, acha que há uma qualquer
excepcionalidade na forma como os
portugueses responderam à crise e
que isso vem da “nossa história”, das
qualidades inerentes à “alma lusa”.
Na verdade, os portugueses não são
mais heróis do que os italianos e os
espanhóis, mesmo com números di-
ferentes. E no Norte estamos mais
parecidos, descontadas as diferenças
O
Professor
José Pacheco Pereira
SUSANA VILLAR

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tão sensível ao medo como às drogas, e foi preciso que a Covid-19 da sobre o “milagre” português. Nem
conspirações das redes sociais. tenha chegado a um centro de refu- sobre o que se passa “lá fora” e muito
Acresce que a comunicação social giados (durante algum tempo des- menos sobre o que se passa “cá den-
escrutina pouco, e preferiu ter uma crito como um motel), para encon- tro”. O mundo em cor-de-rosa é
cobertura casuística, este lar, aque- trarmos a realidade que não quere- sempre altamente provável.
le centro, aquela rua vazia, aquela mos ver. Sabemos pelas estatísticas
fila disciplinada de supermercados. da polícia que há centenas de esta-
E não vai aos sítios onde nunca vai, belecimentos encerrados à força, O
a não ser que haja um crime e toca
e foge, até porque são sítios hostis e,
mas não sabemos onde nem por-
quê. Sabemos também que há mui- Em vez de lhes
nalguns casos, perigosos para uma
câmara de televisão. Prefere, aliás,
tas empresas a funcionar quase nor-
malmente, mais do que as descri-
baterem palmas
as paisagens rústicas para preten- ções sobre a paralisia da economia paguem-lhes
der que cobre o País.
E por isso sabemos pouco sobre o
admitem. A verdade é que sabemos
muito menos do que precisamos mais
que se passa entre os ciganos, o que para fazer uma avaliação equilibra-
se passa nos bairros mais degrada- Baterem palmas aos “heróis” da
dos das periferias urbanas, no Ja- pandemia é justo. Mas há uma forma
maica, no Cerco do Porto, em Setú- mais eficaz para premiar esses “he-
bal, como é que evoluiu o tráfico de róis” do que com palmas. É, em rela-
ção aos que têm salários de miséria,
aumentar-lhes o salário. É o caso dos
elos mais desprotegidos da cadeia,
os trabalhadores da limpeza, os au-
xiliares, mesmo algumas classes que
trabalham nos hospitais e nas enfer-
marias. Querem efectivamente agra-
decer-lhes, melhorem a sua vida
quando acabar este período sinistro.

O
Hong Kong
Nós ligamos muito pouco a Hong
Kong, até porque quem sabe mais do
que se passa está em Macau e tem re-
ceio de falar. Em ambos os casos a
censura e o medo são reais e o que
sobrava de democracias débeis, mais
em Hong Kong do que em Macau,
onde não há nenhuma, está a desapa-
recer. As prisões que têm sido feitas
em Hong Kong são não só um instru-
mento de intimidação, como o apagar
da gente incómoda como acontece na
China, um país onde ser preso é mui-
tas vezes desaparecer. Devemos mui-
to a Hong Kong, a frente mais dura da
democracia nos últimos anos. Convi-
nha não os esquecer. W

Texto escrito segundo


o anterior acordo ortográfico

35
Destaque DOSSIÊ

C OR
OVID
O 1NAVÍRUS
9

OS RISCOS. ANSIEDADE, DEPRESSÃO, DOR CRÓNICA E INSÓNIAS

OS DISTÚRBIOS
DA QUARENTENA…
…E COMO PODE
PROTEGER
A SUA SAÚDE
Estudos científicos mostram
que o isolamento social – como
aquele que estamos a viver
– é muito perigoso para a saúde
física e mental. Os efeitos nocivos
ocorrem durante e após a
quarentena e podem atingir
quase toda a gente, adultos,
idosos, adolescentes e
crianças. Nove investigadores
e especialistas revelaram
à SÁBADO os sinais
de alarme e os conselhos
essenciais para derrotar
este inimigo invisível.
Por Susana Lúcio
ISTOCK

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N
uma das últimas e o ébola. “Os estudos registaram
vezes que Maria sintomas psicológicos como distúrbio
Luísa de Lima saiu emocional, depressão, stress, tristeza,
à rua para ir às irritabilidade, insónia, sintomas de
compras viu algo stress pós-traumático, raiva e exaus-
novo nas poucas tão emocional”, lê-se no The
pessoas com psychological impact of quarantine
quem se cruzou. “Aproximei-me da and how to reduce it: rapid review of
bancada dos frescos no supermer- the evidence (o impacto psicológico
cado e estava lá outra pessoa, que se da quarentena e como reduzi-lo:
afastou de imediato”, conta à SÁBA- uma revisão rápida da evidência),
DO a professora catedrática no ISC- publicado em fevereiro passado na
TE, Instituto Universitário de Lisboa. revista Lancet.
“Estamos a ficar com medo uns dos A interação social é mesmo uma
outros. Já éramos um País com um necessidade biológica e a sua ausên-
baixo nível de confiança, mas agora cia pode até ser letal. Foi o que tam-
temo que a quarentena torne o bém concluiu em 2017 a médica
medo mais crónico.” norte-americana Julianne Holt-
O medo e várias doenças associa- -Lunstad, depois de comparar o
das. No último mês aprendemos que risco de morte prematura de quem
os outros podem ser um perigo para vive só com o de quem tem hábitos
a nossa saúde por causa da Covid- de vida pouco saudáveis. “A ausên-
-19. Para evitá-la, mandaram-nos fi- cia de interação social tem um risco
car em quarentena, que restringísse- que é comparável e, em muitos ca-
mos os contactos sociais, que nos sos, excede outros fatores de risco
afastássemos de parte da família e como fumar mais de 15 cigarros por
que nos fechássemos em casa. Já há dia, obesidade, sedentarismo e po-
pessoas e famílias que estão assim luição atmosférica”, concluiu no es-
há quase dois meses. Uns com doses tudo The potential public health re-
de ansiedade cada vez maiores, ou- levance of social isolation and lone-
tros a dormirem pior que nunca, liness: Prevalence, epidemiology,
gente a tranquilizantes, com dese- and risk factor (a potencial relevân-
quilíbrios alimentares ou com doen- cia na saúde pública do isolamento
ças que já tinham fora de controlo. social e da solidão: prevalência, epi-
Os estudos científicos e os especia- demiologia e fator de risco). Pior que
listas não têm dúvidas: o isolamento tudo isto é que nenhum destes estu-
é perigoso e as sequelas prolongam- dos avaliou isolamentos tão longos
-se bem após a quarentena. Mas há como o que estamos a viver.
estratégias que pode e deve seguir
para proteger a sua saúde. A DEPRESSÃO E A ANSIEDADE
h A solidão e o medo do contágio já
NOS ADULTOS fizeram disparar em Portugal as
OS RISCOS E SOLUÇÕES vendas de ansiolíticos e antidepres-
h “Nós precisamos de nos relacio- sivos para 2,2 milhões de embala-
nar com os outros. A ausência de gens em março, mais 28% do que
interação social pode provocar an- no mesmo mês do ano passado.
siedade, depressão e em alguns ca- “As pessoas estão a precisar desta
sos stress pós-traumático”, explica a compensação”, reconhece Renata
professora e investigadora em Psico- Benavente, da Ordem dos Psicólo-
logia Social, Maria Luísa de Lima. gos. “É certo que os mais vulneráveis
Tudo sintomas que já foram identifi- poderão vir a sofrer de ansiedade e
cados por investigadores da universi- de depressão.”
dade britânica King’s College of Lon- Boca seca, batimentos cardíacos
don quando analisaram 24 estudos acelerados, tremores e pensamentos
efetuados sobre os efeitos da qua- negativos persistentes são alguns
rentena em grupos de pessoas que dos sinais de uma crise de ansieda-
tinham estado em contacto com de. “Agora, a ansiedade é agravada
doenças contagiosas como a SARS pela incerteza: não sabemos se va- Q

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Destaque DOSSIÊ

C OR
OVID
O 1NAVÍRUS
9

g
Maria Luísa Lima
DOSSIÊQUANDO SE

É licenciada em Psicologia e professora


doutorada (com agregação) no ISCTE-
C
TRABALHA O V I D
EM CASA
DURANTE A
PANDEMIA
HÁ QUE
ACEITAR A
OR O NAVÍRUS
19
g
Renata Benavente
Doutorada em Psicologia Clínica
pela Faculdade de Psicologia da
para o fim da quarentena, porque
não há uma perspetiva temporal”,
recomenda Renata Benavente.
E deve estabelecer novas rotinas
diárias que incluam teletrabalho,
lazer e exercício físico.
-IUL. Faz investigação em questões
associadas à perceção de riscos
DIMINUIÇÃO Universidade de Lisboa, especializou-se
em proteção de crianças e menores
O EXCESSO DE PESO
DA PRODUTI- h O isolamento e a ansiedade
VIDADE levam muitas vezes ao consumo de
alimentos de conforto, como bata-
Q mos adoecer e quando isto vai consumo de notícias a uma hora por tas fritas e chocolate. Foi o que con-
acabar”, acrescenta. dia. É uma das primeiras conclusões cluiu, em 2015, o professor de Psi-
As consequências vão depender do apontadas pelo estudo que a Escola cologia Jordan D. Troisi, da Univer-
que cada um viveu e irá experimen- de Medicina da Universidade do sidade de Buffalo, EUA, quando
tar nos próximos meses. Quem tem Minho está a realizar sobre os efeitos analisou os diários de cerca de 200
profissões na área da Saúde, perdeu Estudos da quarentena e que contou com estudantes universitários escritos
amigos ou familiares ou passou por A Ordem dos mais de 2.000 participantes. “Evitar durante períodos de solidão e isola-
um internamento corre mais risco de Psicólogos está modos de transmissão da informa- mento. A maioria recorreu a ali-
sofrer de ansiedade, depressão ou a apoiar mais ção alarmista e bloquear a difusão mentos ricos em sal e açúcar para
stress pós-traumático. Para além de uma dezena de mensagens falsas e sensacionalis- se sentir melhor emocionalmente
disto, as dificuldades financeiras que de projetos de tas ajuda muito a evitar o risco de e não porque tinha fome, refere o
já se fazem sentir também vão agra- investigação desenvolvimento do stress pós-trau- estudo Threatened belonging and
var a saúde mental – de recordar científica rela- mático”, garante Pedro Morgado, um preference for comfort food among
que durante a última crise económi- cionados com dos autores do estudo. the securely attached (pertença
ca se registou um aumento de 22,6% a pandemia “Não vale a pena planear projetos ameaçada e preferência por ali-
de suicídios no País.
Curiosamente, trabalhar em casa é
até um fator protetor da saúde men-
tal, conforme confirma um estudo da
Universidade do Minho. Mas com
filhos pequenos pode ser um drama.
“Há que aceitar que é impossível ter
a mesmo produtividade que se tinha
antes”, avisa Renata Benavente. As
crianças estavam habituadas a rece-
ber atenção em casa e agora os pro-
genitores não estão tão disponíveis.
“A situação piora dependendo das
condições da casa. Se cinco pessoas
partilham duas assoalhadas, o risco
de stress intenso é maior.” As consequências vão
O QUE FAZER? depender do que cada um
h “Nunca estive tanto tempo no
WhatsApp como agora”, salienta a viveu e irá experimentar
psicóloga social Maria Luísa Lima,
autora do livro Nós e os Outros: O nos próximos meses
Poder dos Laços Sociais. As redes
sociais são um dos antídotos contra
os efeitos nocivos da quarentena e
os portugueses estão a fazer uso
deles. Na primeira semana de
quarentena, o tráfego de Internet
disparou cerca de 70%.
Para gerir a ansiedade e ajudar a
focar no esforço coletivo e nos resul-
tados positivos, como o decréscimo
ISTOCK

do número de infetados. Mas limite o

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A QUASE
AUSÊNCIA DE
ATIVIDADE
g g FÍSICA PODE g
Pedro Morgado Alexandra Bento AUMENTAR O Pedro Morouço
Psiquiatra e vice-presidente da Escola Doutorada em Ciências do Consumo NÚMERO DE Doutorado em Ciências do Desporto
de Medicina da Universidade do Minho, Alimentar e Nutrição e docente PESSOAS pela Universidade da Beira Interior,
é especialista em estudos sobre stress convidada na Universidade Católica, é a é professor adjunto do Instituto
e distúrbios obsessivos bastonária da Ordem dos Nutricionistas
COM DOR Politécnico de Leiria. Já ganhou vários
e assessora de nutrição na ARS do Norte CRÓNICA prémios internacionais de investigação

mentos de conforto entre quem tem privilegiando os hortícolas. Para O médico receia ainda que alguns
vinculação segura), publicado na quem estava no processo de perder doentes reumáticos agravem a sua
revista Appetite. peso, será mais complicado fazê-lo situação clínica. Ou por medo de
“É uma oportunidade para comer fechado em casa. Deve continuar a Abusos irem às consultas ou porque os espe-
melhor em casa, assim não saímos ser acompanhado pelo nutricionista A GNR registou cialistas estão a fazer consultas por
da quarentena com um aumento nas através de teleconsulta. uma diminui- videochamada. “Não estamos a fazer
doenças crónicas como a diabetes, a ção de 26% as primeiras consultas porque para
obesidade e a hipertensão”, avisa a A DOR CRÓNICA de denúncias isso é necessário mexer nos doentes,
bastonária da Ordem dos Nutricio- h A quase ausência de atividade de violência avaliar as articulações e isso não é
nistas, Alexandra Bento. Apesar de física durante a quarentena pode doméstica em possível agora.”
deslizes, a nutricionista acredita que aumentar o número de pessoas com março, o que
quem tinha bons hábitos alimentares dor crónica – que já atinge 40% dos pode indicar a A AMEAÇA DA DIABETES
irá mantê-los. Mas o conceito portugueses. “Estou muito preocu- dificuldade de h Alimentação rica em sal, açúcar e
também é verdade para os restantes. pado”, diz Pedro Morouço, fisiologis- pedir ajuda das gorduras e a inatividade física pode
ta do exercício e professor no Institu- vítimas fecha- conduzir à diabetes tipo 2. A doença,
O QUE FAZER? to Politécnico de Leiria. “A taxa de das em casa com maior incidência nos homens,
h A bastonária recomenda a inges- pessoas que faziam exercício físico afeta 13% dos portugueses mas este
tão de sopa ao almoço e ao jantar. em Portugal é de 6%. Uma imensi- número pode crescer. “Quem já é
“Agora temos tempo para a fazer”, dão limitava-se à atividade física da pré-diabético pode tornar-se dia-
sublinha. E até cinco peças de fruta rotina diária: correr para o autocarro, bético depois da quarentena”, ad-
por dia, uma forma de substituir os subir as escadas no metro. Agora mite Davide Carvalho, que preside
alimentos de conforto. Mas deve nem isso pode fazer.” à Sociedade Portuguesa de Endo-
pesar-se regularmente. “Se há um Para além de reduzir a ansiedade, crinologia, Diabetes e Metabolismo.
aumento de peso, deve-se reduzir o exercício físico é fulcral na preven- Excessos A doença fragiliza o sistema imuni-
as porções de alimentos que se colo- ção e na redução da dor crónica. Vários estudos tário e torna o organismo mais vul-
ca no prato”, diz a nutricionista. Faça “Quando os músculos não trabalham apontam para nerável à infeção do novo corona-
um planeamento das refeições, perde-se massa muscular, ganha-se uma ligação en- vírus. Por isso, cerca de 20% dos in-
massa gorda e as articulações ficam tre a ansiedade fetados com Covid-19 são diabéti-
mais sobrecarregadas”, avisa Pedro e o aumento do cos. “O prognóstico também é mais
Morouço. Mais: as articulações ne- consumo de reservado: a taxa de mortalidade é
cessitam de movimento para perma- calorias e de de 8% para os diabéticos e de 0,9%
necerem saudáveis, “não as usar produtos pro- para a população em geral”, salien-
pode levar à sua degeneração”. cessados, ricos ta o endocrinologista.
Os efeitos serão mais graves nas em açúcar e sal A quarentena pode aumentar os
mulheres. Elas têm maior tendência casos de descompensação dos dia-
para sofrer de osteoporose, sobre- béticos. “É necessário que tenham o
tudo após a menopausa e o impac- nível de açúcar no sangue o mais
to nas articulações, conseguida normal possível e para isso é preciso
através da atividade física, beneficia jogar com a alimentação, o exercício
a densidade óssea. Mas o perigo A IDEIA É físico e monitorizar para ajustar a
não está apenas aqui. O teletraba- MOVIMEN- medicação. Não é fácil”, admite
lho em cadeiras e mesas que não TAR-SE O Davide Carvalho.
estão adaptadas ao computador MÁXIMO QUE
provoca tensões musculares. “É PUDER. DE O QUE FAZER?
muito provável que aumentem os 45 EM 45 h A ideia é movimentar-se o máxi-
casos de dores das costas”, diz Luís MINUTOS mo que puder. “Pode-se colocar um
Miranda, presidente da Sociedade FAÇA AGA- alarme de 45 em 45 minutos para
Portuguesa de Reumatologia. CHAMENTOS fazer movimentos com cada um Q

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Destaque DOSSIÊ

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OVID
O 1NAVÍRUS
9

Q dos pés, elevando-os, mesmoDOSSIÊ


sentado no sofá. Ou fazer agacha-
mentos, apoiado numa cadeira”,
explica Pedro Morouço. Quem já
treinava duas, três vezes por sema-
na deve manter a rotina com meia
hora de exercícios mais intensos,
C OR O 1NAVÍRUS
-se. “É útil deixá-los tentar resolver
os conflitos sozinhos”, esclarece a
OVID 9
psicóloga, mas intervenha se a dis-
cussão se tornar mais física.

FOBIAS E REGRESSÃO
h Para a psicóloga, o mais difícil
mas é de prever uma quebra física. será regressar à escola. “Poderá
“A resistência aeróbica deve dimi- ocorrer um recuo das autonomias
nuir, isto é, vai sentir-se mais can- que já tinham adquirido.” As crianças
sado a fazer treinos que antes não que tinham dificuldade em separar-
o cansavam”, conclui. -se dos pais vão voltar a não querer
ficar na escola. Entre os mais in-
NAS CRIANÇAS E fluenciáveis poderão surgir compor-
NOS ADOLESCENTES tamentos obsessivos ao perigo da
OS RISCOS E AS SOLUÇÕES Covid-19. “É preciso estar atento se
h Estas semanas começaram por as crianças lavam as mãos de forma
ser umas férias da Páscoa antecipa- exagerada, quando não há essa
das e prolongadas, mas as saudades necessidade.”
dos amigos e o cansaço de estar em
casa podem afetar as crianças. “A O QUE FAZER? tacto diário, se for possível. “Os jo-
reação à quarentena é mais hetero- h Deve-se explicar às crianças que gos online com os colegas também
génea neles”, explica a psicóloga o vírus é invisível, mas não está per- podem ser uma forma de interagi-
Raquel Raimundo. A ansiedade dos manentemente no ar e que, estando rem.” Para isso estabeleça regras e
pais e o medo são sentidos pelos em casa, não é necessário lavar saliente que o maior acesso aos
filhos. “Aprendemos mais com as muitas vezes as mãos. Evite ter a gadgets é temporário e será altera-
ISTOCK

ações dos outros do que com as pa- televisão ligada o dia inteiro com in- do após o fim da quarentena.
lavras e quando não há concordân- formação perturbadora sobre a pan-
cia entre os dois seguimos mais as demia. Se é prejudicial para a saúde ADOLESCENTES: A SOLIDÃO
ações”, explica a psicóloga. Os pais Comida mental dos adultos, é pior para os h “Estão numa fase em que o con-
são modelos de comportamento e A alimentação mais novos. E defina novas rotinas, flito com os pais é maior porque es-
se estão tristes e ansiosos, devem tem o potencial com períodos de brincadeira, exer- tão a lutar por maior autonomia”,
reconhecê-lo e explicar o que estão de induzir ou cício físico e uma pausa para que explica Raquel Raimundo. Por um
a sentir aos filhos. “Pode ser uma melhorar o possam brincar sozinhos. lado é natural que se isolem ainda
forma de ensinar a gerir emoções.” comportamen- Para evitar birras no regresso à mais no quarto e é necessário que os
Fechados em casa, é de esperar to ansioso escola, há que estimular o contacto pais aceitem esse afastamento. “Vai
mais conflitos. “É natural que façam com os amigos através de video- ser difícil para os adolescentes vive-
mais birras, estejam mais irritáveis e, chamadas e redes sociais. “A rela- rem este período”, confirma Olívia
em alguns casos, que seja mais difícil ção com os pares é central no de- Ribeiro, professora no ISPA – Insti-
adormecerem à noite”, enumera a senvolvimento das crianças. É com tuto Universitário. “Acreditam ser
psicóloga, autora do programa para as outras crianças que aprendem super-heróis e será até complicado
crianças Devagar se Vai ao Longe. competências físicas, cognitivas e mantê-los fechados em casa.” Co-
Para quem tem mais filhos, as dis- inter-relacionais”, explicita Raquel mo os adultos, haverá adolescentes
cussões entre irmãos vão agudizar- Raimundo. Recomenda-se um con- mais vulneráveis à ansiedade e à
depressão. Os sinais são reveladores:
demasiado tempo fechado no quarto
isolado de todos; insónias e uma ob-
sessão pelas últimas informações so-
bre a pandemia. Para os que tinham
poucos amigos, o confinamento vai
OS agravar a solidão que já sentiam.
CONFLITOS “Durante a quarentena a solidão
COM CRIAN- social poderá ser colmatada através
g ÇAS TENDEM g das redes sociais, mas a solidão
Luís Cunha Miranda A AUMENTAR Davide Carvalho emocional – mais íntima, provocada
Médico reumatologista, integra o QUANDO Preside à Sociedade Portuguesa de pela dificuldade de expormos as
Colégio de Reumatologia da Ordem dos Endocrinologia, Diabetes e Metabolismo.
médicos e preside à Sociedade Portugue- ESTAMOS É chefe de departamento do Hospital de nossas fragilidades – não. Não é fácil
sa de Reumatologia. Tem no currículo FECHADOS S. João e professor da Faculdade de partilhar intimidade com um ecrã”,
diversos estudos sobre esta área EM CASA Medicina da Universidade do Porto diz a investigadora na área do isola-

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AS FAMÍLIAS agora nem isso têm. “Penso que é


DEVEM por essa razão que muitos não es-
PLANEAR OS tão a cumprir a quarentena. Sentem
CONTACTOS necessidade de sair de casa”, expli-
À DISTÂNCIA ca a psicóloga Renata Benavente.
COM OS IDO- As redes sociais não são uma alter-
SOS. COM nativa. Em 2018, 65,6% dos portu-
VÁRIOS TE- gueses com mais de 65 anos não
LEFONEMAS usavam a Internet, de acordo com a
POR DIA Obercom – Observatório da Comu-
nicação, muitos não têm computa-
dores e, se tiverem smartphones,
têm dificuldade em usar ferramen-
tas como a videochamada. “Tem de
ser a família mais próxima a tomar
a iniciativa e a promover o contac-
Diários to”, aconselha Renata Benavente.
Escrever todos Ainda assim, parecem ser os que
Permita um maior contacto dos os dias (e várias
vezes ao dia)
melhor estão a lidar com a quarente-
na. Cerca de 53% dos homens com
adolescentes com os é uma das
soluções para
mais de 60 anos nunca ou quase
nunca sentiu tristeza, desespero,
amigos através das redes sociais diminuir o
stress em
ansiedade ou depressão na última
semana, de acordo com o estudo
quarentenas Diários de uma Pandemia, realizado
prolongadas pelo Instituto de Saúde Pública da
de apetite e insónias podem ser si- Universidade do Porto e do Instituto
nais da violência psicológica nas re- de Engenharia de Sistemas e Com-
mento social nos adolescentes. Não des sociais que pode levar à de- putadores, Tecnologia e Ciência, em
há dados em Portugal, mas estima- pressão e ao suicídio. que se entrevistaram 3.432 pessoas.
-se que o número de adolescentes Já 57,5 % dos inquiridos entre os 16 e
que sofrem de solidão seja seme- NOS IDOSOS os 39 anos revelaram ter sentido es-
lhante ao dos Estados Unidos, cerca OS RISCOS E AS SOLUÇÕES sas emoções. Os investigadores justi-
de 20%. “Pensava-se que a solidão h Nove em cada 10 idosos seguidos ficam a reação com a experiência de
era um problema dos idosos, mas nos centros de saúde do Norte admi- vida dos mais velhos, que inclui dita-
verificou-se que a prevalência nos tiam sofrer de solidão, num estudo duras e revoluções.
adolescentes é o dobro.” do CINTESIS – Centro de Investiga- NASA
ção em Tecnologias e Serviços de Vários estudos O QUE FAZER?
O QUE FAZER? Saúde, em parceria com a ARS Nor- com astronau- h A psicóloga recomenda que as
h Permita um maior contacto dos te, publicado o ano passado na revis- tas concluíram famílias planeiem os contactos: de
adolescentes com os amigos atra- ta científica Family Medicine & Pri- que os manhã liga um dos filhos, à tarde
vés das redes sociais, mas esteja mary Care Review. Para alguns, o problemas outro, e à noite um dos netos, por
atento a mais um risco: o cyber- único contacto que tinham com ou- psicológicos exemplo. “Ficam com a ideia de que
bullying. Tristeza, falta de energia e tros era na visita diária à mercearia, são inevitáveis estão atentos ao seu bem-estar.”
Para que os níveis de stress não se
agudizem, é importante ter atenção
à despensa e garantir que os bens
essenciais não faltem. Mas como
todos os outros, os idosos poderão
ver o ponteiro da balança subir. As
AS DOENÇAS doenças crónicas são mais preva-
CRÓNICAS lentes depois dos 65 anos e é essen-
ATACAM cial manter uma alimentação equi-
g g MAIS DEPOIS librada. A bastonária da Ordem dos
Raquel Raimundo Olívia Ribeiro DOS 65 ANOS. Nutricionistas, Alexandra Bento,
Doutorada em Psicologia da Educação É professora doutorada do Instituto É ESSENCIAL telefona aos pais todos os dias para
e mestre em Stress e Bem-Estar, Universitário de Ciências Psicológicas,
preside à Delegação Regional do Sul Sociais e da Vida (ISPA) e investigadora UMA BOA saber se estão a comer bem. “Temos
da Ordem dos Psicólogos e é especialista em isolamento social ALIMENTA- de os sensibilizar, apesar de não
consultora da Gulbenkian e depressão na adolescência ÇÃO estarem connosco.” W

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Destaque DOSSIÊ

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O 1NAVÍRUS
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COMO DORMIR EM TEMPOS


DOSSIÊ
O V I D DE 1PANDEMIA
9
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AS MUDANÇAS
PARA UMA BOA
NOITE DE SONO
A luz da manhã, o que come ao jantar ou a meio da noite,
como se senta a ver televisão, se escreve as suas
preocupações e se faz exercício físico: tudo tem influência na
forma como dorme. Não dormir até lhe pode comprometer
o sistema imunitário. Saiba o que fazer. Por Vanda Marques

À
s 4h da manhã, Carla fez h
ALEXANDRE AZEVEDO

o que nunca imaginou. Carla Martinho


acorda várias
Ainda de madrugada de- vezes durante
sistiu de tentar adorme- a noite. Já chegou
cer – já se tinha levantado duas ve- a levantar-se
às 4h da manhã e
zes – saiu da cama e foi para a co-

1 VOLTAR À ROTINA
foi arrumar a casa
zinha. Começou a tirar a loiça da sor de música já estava há mais de
máquina e a arrumá-la. Depois se- duas semanas em casa, mas quan-
parou a roupa escura da clara, para do fez a partilha não esperava que h O sol já nasceu e ainda não pre-
a lavar, e organizou a despensa. houvesse reações. De repente, qua- gou olho. A dentista de 24 anos,
“Nunca imaginei fazer isto a estas se 80 likes e 16 comentários de Ecaterina Ursu, dá voltas na cama e
horas. Mas quando não consigo amigos com o mesmo problema. quando não adormece, recorre às
dormir, prefiro levantar-me e co- “É um mal generalizado”, escrevia séries e filmes. “Às vezes são 8h da
meçar o dia às 4h da manhã.” uma amiga. Enquanto outro dizia: manhã quando adormeço. Depois
A consultora imobiliária, de 40 “Basta espreitar pela janela às 2h durmo duas horas e acordo. Desde
anos, viu o seu trabalho congelar, o da manhã para ver as luzes.” que fiquei em isolamento, sem tra-
filho de 16 anos ficar sem escola, e É normal que numa situação de balhar, que durmo mal.” A jovem
só o marido continua a trabalhar. “ÀS VEZES estado de emergência perante uma vive com a tia e duas primas. Nas-
Desde março, que não dorme bem. SÃO 8H DA pandemia o sono se ressinta. “A an- ceu na Moldávia, mas veio peque-
Não é caso único. Às 2h24, já de- MANHÃ siedade é inimiga do sono”, diz a psi- na para Portugal com os pais, que
pois de muitas tentativas de ador- QUANDO cóloga Helena Rebelo Pinto. Para hoje vivem em França. “Acho que
mecer, Samuel agarrou-se ao tele- ADORMEÇO. voltar a dormir descansado, há coi- como sei que no dia seguinte não
móvel. Entrou na sua página de Fa- DEPOIS sas tão simples, como escrever numa vou fazer nada, também não
cebook e escreveu: “O meu sono DURMO folha de papel o que o preocupa e chateia não dormir.”
não está a cumprir quarentena, sai DUAS HORAS apanhar luz solar durante 30 minu- Mas o sono é um assunto sério,
sempre durante a noite!” O profes- E ACORDO” tos, que fazem toda a diferença. como explica o presidente da Asso-

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Sono dos mais novos


Tenha atenção às mudanças
provocadas pela quarentena
Com 7 anos, Francisca já acor-
dou de noite a gritar. Inês, a mãe,
conta que ela repete a mesma per-
gunta: “Quando é que isto acaba?
Quando é que vejo as minhas ami-
gas?” As mudanças têm sido difí-
ceis. “Estarmos em quarentena é
óbvio que afeta as crianças. Ficam
mais irritadas, frustradas, têm
medo e outros até dizem estar de-
sesperados. Todos estes fatores
são prejudiciais ao bom sono das
crianças”, explica a psicóloga infan-
til Bárbara Ramos Dias. O que fa-
zer? “Ter horários a cumprir, tare-
fas em casa, tempo em família e
para os amigos. Ajudá-los a organi-
zar o tempo
A PRIVAÇÃO é crucial”
DE SONO
TEM IMPLI-
CAÇÕES NA
MEMÓRIA E quado favorecem alterações no “sis- ta, o aspeto mais importante agora
TEM CONSE- tema cardiovascular, respiratório e que estamos fechados em casa é a
QUÊNCIAS imunitário”. O que quer isto dizer? regularidade. “A hora de acordar e
CARDIOVAS- “Pessoas que não durmam bem e de deitar deve ser a mesma que pra-
CULARES que estejam ansiosas, stressadas e ticamos em condições normais. É
emocionalmente instáveis, têm importante que se mantenham os
maior risco cardiometabólico [maior horários das refeições, que devem
h
propensão para ter diabetes, doen- ser feitas à mesa e não na cama
ças cardíacas ou AVCs],A Cs edfsdf fdfgdf
menor nem no sofá. E devemos vestir outra
gdsfhg sdkjbkjdh
i competência imunitária,kjdhv o que neste
kjhvds roupa que não seja o pijama.”
Joaquim Moita, caso em particular –gjgjhgjh
iminência da
csd ghjgcs Mas qual é o impacto destas alte-
presidente da sdf jhgvs adhjgvk
Associação Portu- infeção pelo SARS-Cov-2, agente rações no sono? “Essa rotina ajuda a
sd fsdf sdfjhv fs
ciação Portuguesa do Sono (APS), guesa do Sono, que causa a Covid-19 – é muito re- sincronizar a ordem do sono: o ciclo
Joaquim Moita. “Não há nada no or- defende que dor- levante.” (ver caixa) noite-vigília. Mesmo em confina-
mir bem é meio
ganismo que funciona bem quando caminho andado Para contrariar esta falta de sono, mento temos de separar o dia da
há privação de sono. Ter um sono para lidar melhor temos de recorrer a uma palavra noite, e a semana do fim de sema-
inferior a sete horas tem implica- com a pandemia que por vezes nos cansa: rotinas. na”, diz a psicóloga Ana Allen Go-
ções na memória e na solidificação Acabar com elas foi um dos primei- mes. É o nosso relógio biológico
das aprendizagens. A privação de ros erros que Ecaterina cometeu. que avisa o cérebro se é para acor-
sono tem consequências cardiovas- Nas primeiras duas semanas conse- dar ou dormir. Trocar os ritmos
culares, como hipertensão mais fre- guiu mantê-las, mas desistiu. “No perturba o ciclo de sono e de vigília
quente, risco de enfarte do mio- início acordava e tinha objetivos (estar acordado), aquilo a que se
cárdio e de arritmias, e ainda pro- para o dia. Aproveitei para fazer chama ritmo circadiário.
blemas metabólicos, como a dia- coisas que não tinha tempo quan-
betes.” O especialista revela ain-
da que existe uma relação com a
maior probabilidade de se ter
do estava a trabalhar, como arru-
mações. Depois de ficar tudo
tratado, fiquei com mais
2 LONGE DO QUARTO
Ecaterina Ursu sabe que o sono lhe
cancro da mama nas mulheres, e tempo livre e entrou o abor- tem complicado a vida, e até pediu
cancro na próstata nos homens. recimento.” Até a vontade ajuda a um amigo psiquiatra que lhe
SÉRGIO AZENHA

Miguel Meira e Cruz, diretor do de ler livros parece ter falou da importância das rotinas e
Centro Europeu do Sono, defende desaparecido. ainda de como o quarto é funda-
que a ansiedade e o sono inade- Mas, como frisa Joaquim Moi- mental. “Sei que o ambiente deve Q

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Destaque DOSSIÊ

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C
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Q ser acolhedor e que não devoDOSSIÊ


passar muito tempo no quarto du-
1
O professor de
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música, Samuel
rante o dia e que não devia ter lá o Amaro, deita-se
computador...” Ter distrações no cada vez mais
quarto é um grande erro, defendem tarde. Quando
acorda a meio da
os especialistas. Dulce Neutel, neu- noite, agarra-se
rologista na Unidade de Medicina do ao telemóvel
Sono do Hospital CUF Descobertas,
esclarece que o quarto deve ter 2
pouca luz, ser fresco e não ter obje- A psicóloga Helena
Rebelo Pinto alerta
tos que distraiam: computador e te- para a importância
levisão, por exemplo. Ana Allen Go- de apanhar luz
mes, psicóloga, professora na Uni- solar todos os dias
versidade de Coimbra e membro da
APS, deixa ainda outra nota impor-
tante: “Para quem tem de fazer toda
a vida no quarto, pode tentar reser-
SAMUEL AMARO

var a cama só para o sono e criar


um ambiente visual que separe o dia
da noite. Por exemplo, sentar-se na
cadeira e não na cama quando está
a trabalhar ou a ver TV ou colocar
uma colcha diferente em cima da
cama durante o dia, que é retirada
à noite. Usar um biombo, se o tiver,
ou uma cortina que tape a mesa de
trabalho durante a noite, ou até
arrumar o material de trabalho à
noite para que não esteja visível à “A luz é muito importante para
hora de dormir.” sincronizar o nosso sono. A radia-
ção azul é muito rica. Faz-nos acor-
Conselhos dar mais e ajuda a libertar uma sé-
h “Adormeça e acorde todos os dias rie de hormonas como a dopamina,
à mesma hora. Mesmo estando em a adrenalina e a orexina que nos
casa poderá ser boa ideia colocar o mantêm acordados. E também se-
JOÃO MIGUEL RODRIGUES

despertador para se levantar”, aponta rotonina, que é um antidepressivo


a neurologista Dulce Neutel. muito bom”, explica Joaquim Moita.

3 LUZ ?
DO SOL, CLARO
2
Conselhos
h Helena Rebelo Pinto diz que quem
não tem varanda e não pode sair à rua,
h Prescrição médica: “Se quer dor- Quando chega à cama, agarra-se ao deve aproveitar as janelas. “Por exem-
mir, desligue o telemóvel pelo telemóvel e vai vendo de tudo: de plo, comecei a tomar o pequeno-almo-
menos uma hora antes de dormir.” notícias sobre a pandemia a vídeos ço junto à janela. A luz é a base do
O grande motivo é a luz. “A radiação engraçados, como o de uma pessoa sono. Se não tivermos luz durante o dia,
azul, que está presente nos a pé na A1, explica o professor de como é que o cérebro se organiza?”
smartphones, tablets ou computado- música. Se não for o smartphone, é
res, tem um efeito terrível, porque
inibe a produção de melatonina, a
hormona do sono. Como a luz da “A LUZ DOS
a televisão. Aliás, vê séries atrás de
séries. O ciclo vicioso só melhorou
quando arrancaram as aulas no dia
4 SESTA? NÃO E NÃO
h Vendedor de automóveis e ciclis-
manhã que dá a informação ao cére- TELEMÓVEIS 14 de abril. A rotina de ter de as pre- ta amador, quando Joaquim Concei-
bro que é de dia”, diz Joaquim Moita. INIBE A parar, falar com os alunos, tem aju- ção teve de travar a fundo na sua ro-
Mas é a essa ferramenta que Sa- PRODUÇÃO dado Samuel a dormir melhor. O tina, o sono saiu prejudicado. No iní-
muel Amaro recorre sempre que o DE MELATO- facto de ter de acordar mais cedo e cio do isolamento social, até conse-
sono teima em não chegar. Quer seja NINA, A de apanhar luz da manhã também guiu estar ocupado. Na sua vivenda
a televisão, o computador ou o tele- HORMONA ajuda. Aliás, os especialistas alertam no Feijó arrumou o quintal, mas fi-
móvel. “Simplesmente não tenho DO SONO”, que mesmo em confinamento, deve- cou com dores nas costas. Nessa al-
vontade de ir dormir. Por isso, vou DIZ JOAQUIM mos apanhar pelo menos 30 minu- tura, teve de se resguardar em casa e
adormecendo cada vez mais tarde.” MOITA tos de sol. Todos os dias. iniciou um hábito que lhe tem rou-

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UM grandes arrumações em casa. “Como


CONSELHO: tenho uma casa grande, mantenho a Sistema imunitário
ESCOLHA cabeça ocupada. Planeio limpezas
A privação do sono pode
UMA HORA gerais: varandas, janelas. Tento can-
enfraquecer as nossas defesas
DO DIA sar-me para dormir melhor.”
DESTINADA Miguel Meira e Cruz está a
ÀS PREOCU- Conselhos coordenar um estudo – junta-
PAÇÕES E h “Há exercícios físicos que pode fa- mente com o imunologista
REGISTE-AS zer em casa, como arrumações ou lim- Masaaki Miyazawa, da Kindai
NUM PAPEL pezas. Não deve estar muito tempo sen- University, em Osaka, Japão, e
tado”, diz Helena Rebelo Pinto. E dá o com David Gozal, da Universi-
seu exemplo: “Sou grupo de risco, não dade de Missouri, nos Estados
posso sair. Faço caminhadas no corre- Unidos – sobre como “as alte-
dor, exercícios de braços e de pernas.” rações no relógio biológico
h Dulce Neutel alerta que o exercício (uma estrutura de células ner-

46%
dos adultos
físico não pode ser feito demasiado tar-
de. “Tente fazer pelo menos meia hora
de exercício na maior parte dos dias
vosas que impõe um tempo
interno ao nosso organismo,
nomeadamente relacionado
com mais de 25 (mas termine pelo menos duas a três com o horário individual de
anos dorme horas antes de ir para a cama).” sono e de vigília) determinam
menos de seis alterações estruturais nas pro-
bado as noites: as sestas depois de
almoço. “A hora de adormecer pro-
longou-se e ainda outro dia adorme-
horas por dia,
segundo um
inquérito da
6 PREOCUPAÇÕES?
ESCREVA, ESCREVA
teínas das membranas das
células sobre as quais o vírus
(SARS-Cov-2) atua, facilitando
ci às 5h da manhã. Sabe, é que não Sociedade h As cinco horas que dorme são ou dificultando a sua entrada
gosto dos programas da manhã e o Portuguesa de interrompidas umas três vezes. Quer e, por isso, o seu potencial de
que dá à noite na televisão é mais Pneumologia seja por algum barulho ou pelos fi- infeção”.
apelativo. Fico num ciclo vicioso.” lhos pequenos que lhe aparecem na O coordenador da Unidade
Helena Rebelo Pinto, professora cama. A tranquilidade do sono aca- de Sono do Centro Cardiovas-
na Universidade Católica, sublinha bou a 16 de março, quando se viu cular, da Universidade de Lis-
que a sesta é um ladrão do sono. “A obrigada a encerrar a sua guest hou- boa, revela ainda que “uma das
não ser em circunstâncias especiais, 3 se no Porto e um turismo rural em conclusões preliminares que
como a privação de sono em dias A neurologista Viana do Castelo. Joana Marinho, de podemos retirar é que, prova-
Teresa Paiva, que
anteriores, normalmente não é trabalha na área do 36 anos, é formada em Economia velmente o potencial de viru-
bom”, remata. Joaquim Moita con- sono desde 1983, mas sempre trabalhou em hotelaria. lência e de gravidade resultan-
corda: “A sesta não é fundamental. diz que o exercício Em 2017, decidiu abrir um projeto te da infecção, depende do
físico não deve ser
Sestas depois do jantar no sofá são feito à noite próprio. Agora está tudo fechado. momento do dia em que o
proibidas. Porque quando tenta “Não sei como será o futuro. Quando indivíduo é contaminado”.
adormecer na cama, tem dificulda- comecei a receber os emails das
de porque já esteve a dormitar.” contas, comecei a hiperventilar…”
Sabe que tem de criar estratégias

5 EXERCÍCIO? SIM
Se juntarmos a este hábito, o facto de 3
para descansar, mas não está a
resultar. “Custa-me a adormecer.
Tenho feito meditação e oiço uma
mos aconselhar que escolham uma
hora do dia destinada às preocupa-
ções e que as registem num papel.”
Joaquim quase ter parado de fazer música mais calma. Só que antes Mas afinal para que serve este exer-
exercício físico, encontramos os adormecia em cinco minutos, ago- cício? “Para pensar antecipadamen-
dois motivos para ter comprome- ra… Passa a música toda e conti- te naquilo que vai aparecer à noite.
tido o seu descanso. “Costumo nuo acordada.” É uma estratégia que diminui a pro-
fazer duas ou três vezes por Joana tem dois filhos (de 4 babilidade de as preocupações
semana spininig. Agora a pre- e 7 anos) e conta que durante ocorrerem ao deitar.”
guiça apoderou-se de mim.” o dia mantém-se mais bem- Teresa Paiva, neurologista, diz que
Teresa Paiva, neurologista -disposta, mas tem dias em as preocupações são contrárias ao
especialista no sono, revela que que a paciência fica por um sono. Daí a importância de as retirar
o exercício é essencial para o sono. fio e já desatou a chorar com dessa hora. “Há duas coisas que aju-
“Somos feitos para andar e feitos a tensão. A meditação e o dam a que isto piore: não saber rela-
para ter exercício. Não dormimos mindfullness ajudam, mas a psi- tivizar a sua situação face a outras
efetivamente bem sem ele.” É o que cóloga Ana Allen Gomes deixa muito piores ou não aceitar a reali-
Carla Martinho tenta fazer. Além de outra estratégia: “Às pessoas com dade.” Então o que fazer? “Pensa-
caminhadas, está a dedicar-se a um quadro de insónia costuma- rem que não é por se preocupa- Q

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Destaque DOSSIÊ

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Q rem que vão resolver os assun- DOSSIÊ


tos.” Além disso, alerta que não aju-
da nada estar constantemente a ler
informações sobre a pandemia. Joa-
na confessa que o faz constante-
mente. “Sei que é mau estar sempre
a procurar notícias no telemóvel.”
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Allen Gomes diz que ficar na cama é
inútil. “Não é possível forçarmo-nos a
dormir. Não exercemos controlo so-
bre o sono. Se não conseguimos dor-
mir, devemos levantarmo-nos para
não associarmos a cama a essa expe-
riência desagradável. Devemos esco-
Dulce Neutel diz que se deve evitar lher atividades relaxantes, como ler
notícias ao fim do dia. um livro. Se usarmos o telemóvel,
devemos baixar a luz.”
Conselhos h Tânia Tavares, de 37 anos, já ten-
h Teresa Paiva defende que para redu- Joana Marinho tou de tudo. Passou de adormecer
zir a ansiedade deve “ir à procura de teve de fechar a por volta das 22h30 para arrastar-se
afetos”. Como telefonar aos amigos que sua guest house até à 1h da manhã. Só adormece a
e agora só dorme
não vê há muito tempo. Além disso, pro- cinco horas por ver televisão. Mas o pior é o que se
curar programas alegres, e não tragé- noite segue. Acorda a meio da noite e fica
dias. “Temos de nos rir.” na cama a remoer. “A cabeça não
h Ana Allen Gomes diz que pode ter para. Sou trabalhadora independen-
junto da mesa de cabeceira um caderno te. Tenho um salão de estética e até
para apontar preocupações novas que fico a pensar que me podem roubar
surjam de noite e que poderá pensar os equipamentos que lá tenho. Não
FOTOS D.R.

nelas no dia seguinte. acordo cansada, acordo preocupa-


da.” Para não fazer barulho e acor-

7 ÁLCOOL
E CALORIAS A MAIS,
“O CONSUMO
DE
no estômago e aumento da ocorrên-
cia de refluxo gastroesofágico (azia).
dar o marido, que é estivador, e os
dois filhos – um de 10 anos e outro
de 3 – não se levanta. Fica com o
NEM PENSAR ALIMENTOS Isto pode direta ou indiretamente coração a bater mais depressa e às
h Quando Alexandra Barbosa acor- CALÓRICOS exacerbar, por exemplo, quadros de voltas. “Tenho medo de ficar doente.
da a meio da noite, levanta-se e vai PODE LEVAR apneia do sono ou prejudicar o seu Tenho dois filhos asmáticos, são gru-
direta à cozinha. Acredita que comer A MÚLTIPLOS controlo, mas também causar insó- po de risco. Além disso, preocupa-
lhe dá mais sono, mas não é isso que DESPERTA- nia durante a noite e outras altera- -me não saber quando é que vou
acontece. A empregada doméstica, RES” ções mais ou menos claras que são voltar a trabalhar…”
de 45 anos, ficou sem trabalho nas fatores de disfunção do sono.” Helena Rebelo Pinto reforça que fi-
seis casas que lhe faziam o salário e Joaquim Moita alerta ainda que não car na cama é o pior que se pode fa-
agora espera por melhores dias. “Sei se deve comer uma hora antes de zer. “Se acordarem durante a noite,
que me vai faltar o dinheiro. Tenho dormir. Motivo? “A temperatura do levantem-se e distraiam-se um bo-
um crédito do carro, ando com tudo organismo para absorver os alimen- cadinho, há sempre uma gaveta para
certinho. Mas vai tudo por água tos deve ser de 37,5o. Ora, essa tem- arrumar.” A psicóloga alerta que ficar
abaixo.” Casada, com um filho ado- peratura é incompatível com o sono. na cama a sofrer por não dormir, só
lescente, o marido, manobrador de A nossa temperatura interna central piora. “Quem dorme mal ganha um
máquinas, ainda está a trabalhar. tem de arrefecer para permitir o ódio ao sono e ninguém quer dormir
Tem medo que ele fique doente, adormecimento. Se comer, aumenta com um inimigo.”
sempre que sai, por isso a comida é Dulce a temperatura devido à digestão e É assim que Tânia trata o sono. Mas
um refúgio. “Passo a vida a comer. Neutel a temperatura é inimiga do sono.” conta que da próxima vez que isso
Estou a entrar um pouco em pânico. alerta que com lhe acontecer vai tentar levantar-se.
Nem acredito que esta noite acordei privação de Conselhos Aliás, uma vez já o fez e resultou. Às
– acordo várias vezes – e fui comer sono ficamos h Ter cuidado com o café, que pode 5h da manhã enviou emails à sua
um pão com chouriço.” mais impulsi- ficar no sistema durante seis horas e contabilista, coisas que tinham fica-
Como alerta o presidente da Asso- vos. “Esta altera- prejudicar o sono. Beber bebidas alcoó- do por tratar, depois voltou para a
ciação Portuguesa de Cronobiologia ção deve-se à licas à noite também perturba o sono cama e adormeceu. Sempre a pensar
e Medicina do Sono, Miguel Meira e maior sensibili- REM (quando ocorrem os sonhos). que quando acordar, o mundo já terá
Cruz, o papel da alimentação tem dade que o voltado à normalidade.
sido negligenciado. “O consumo de
alimentos muito calóricos perto da
hora de dormir é contraproducente
lobo frontal tem
à privação de
sono – o maior
8 INSÓNIAS?
LEVANTE-SE
Conselhos
h Não deve ir para a cama a não ser
ao sono e a dificuldade na digestão responsável h Um erro recorrente: acordamos a que se sinta com sono. E se não ador-
de alimentos mais pesados pode pelo comporta- meio da noite e ficamos às voltas na mecer em 20 minutos, deve levantar-se.
levar a múltiplos despertares bem mento social cama a pensar – “Se não me levantar, h Se tiver insónia, levante-se e fique
como ao aumento da secreção ácida adequado” adormeço.” Errado. A psicóloga Ana a pé 10 minutos. W

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Opinião 23 ABRIL 2020
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INSTANTÂNEOS
(OU QUASE)
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Desliguem-nos Não e não Ferro fundido
Nisto das aulas à O discurso é: não O presidente
distância houve quem deixar ir os velhos ao do parlamento
ficasse surpreendido supermercado, não os vê-se como arauto
com a bestialidade deixar contactar com da liberdade. Mas
de certos alunos. Sim, os filhos, não os deixar o tom e os tiques
com ou sem novas sair de casa. Caminhar petulantes soam-me
pedagogias, são na rua? Ui, não. O cada vez pior.
sacanas. Felizmente melhor é que fiquem Alguém lhe lembre
basta um clique para em casa sabe-se lá de que a
desaparecerem. Nas quanto tempo. Se um discordância não é
aulas presenciais, não se dia me fizerem isto, fascismo, nunca foi.
consegue. Mas devia. mando-os à merda.

c c c
O patriota Estamos aqui Embirrações
O Rio, que devia ser O programa da SIC Confesso que estou
alternativa, decidiu (com a Alexandra farto de ver padeiros,
suspender as ideias e Lencastre plastificada) chefs, bombeiros,
as críticas em época é anunciado como um costureiras, pescadores,
de emergência. Nada hino da solidariedade. polícias e outros
como uma boa união Pois, um hino a marcas transformados em
nacional sempre a e produtos, a putos heróis nas TV e jornais.
pensar no País. E o queques solidários e a São só padeiros e afins
Costa lá continua a atores que vão às casas que estão a trabalhar.
passear pelas TV. de velhas no Restelo. Heróis são outra coisa.

c c c
Clubite Rica proteção O filme
Agora (e só agora, Já não é quem quer, Dragged Across
claro!) há juízes mas quem se pode Concrete: só o vi agora na
do Benfica. Jornalistas proteger (e proteger TV. Tem uma miúda
do FC Porto. os outros). Cinco branca vítima de bullying
Procuradores e PJ do frascos de gel, 25 de negros, assassinos
Sporting. Políticos do máscaras, duas de impiedosos e diálogos
Belenenses. E isso é bico de pato e luvas como já não se veem no
visto como impeditivo custaram-me 150 cinema. Além de Gibson,
de ajuizar, investigar, euros na farmácia. Vaughan e Kittles (sim,
denunciar, decidir. o do True Detective).

O
Diretor-adjunto
António José Vilela

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REPORTAGEM. COMO FUNCIONAM E QUEM PAGA OS TESTES

UMA SUPER-
-PPP POR
TODO O PAÍS
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Quase metade dos


exames à Covid-19
é feita por privados.
O SNS pode já ter gasto
10 milhões de euros. Mas
ninguém sabe qual é a
fatura do Governo e das
autarquias - a Câmara
de Ovar não explica os
gastos num hospital
de campanha que só
recebeu 5 doentes.
Por Alexandre R. Malhado

S
entada numa cadeira de
plástico, Andreia Fragoso
cerrava os punhos de nervo-
sismo. O primeiro teste à Co-
vid-19 tinha dado positivo e, naquela
ampla (e vazia) sala do Centro de
Congressos do Estoril, a técnica do
laboratório Germano de Sousa pre-
parava-se, de zaragatoa na mão,
para fazer a segunda avaliação à jo-
vem de 19 anos. A própria acreditava
estar infetada: “Trabalho num lar
onde já faleceram algumas pessoas
devido a esta doença. Eles tentam
esconder isso”, explicou à SÁBADO
no centro de testagem aberto pelo
município de Cascais. Os sintomas
também são suspeitos: é “uma gripe
que se confunde com asma” e muito
cansaço, descreveu. “Nos primeiros
dias senti-me péssima. Até cheguei a
ficar quatro dias ‘sem respirar’ e com
perda de olfato.”
O primeiro teste foi feito num hos-
pital público, mas o seu médico en-
viou-a para o privado para o segun-
do rastreio. “Disse-me que era mais
rápido e eficaz aqui”, afirma. Andreia
j Fragoso é uma das milhares de pes-
Em Cascais,
a autarquia soas que o Serviço Nacional de Saú-
alugou o gigan- de (SNS) tem encaminhado para o
tesco centro privado, numa simbiose público-pri-
de conferências
do Estoril, mas vada que tornou Portugal um dos 20
com a pré-mar- países que mais diagnósticos faz por
ALEXANDRE AZEVEDO

cação (para os milhão de habitantes. Contudo, o


utentes não
se cruzarem) o preço pode sair caro: dados faculta-
aspeto é este dos pelo Ministério da Saúde à SÁ-
BADO revelam que 48% dos testes Q

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O mistério de Ovar
O custo do hospital é secreto.
E só teve cinco doentes
O hospital de campanha de
Ovar, no Arena Dolce Vita,
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No Seixal,
a autarquia
OR
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tinha tudo
entrou em funcionamento dia preparado
ALEXANDRE AZEVEDO
13 de abril. Em uma semana, as a 27 de março.
38 camas só receberam um to- Ministério
e laboratório
tal de cinco doentes, confirmou atrasaram-se
fonte da autarquia.
Os valores do negócio estão a
causar incómodo na terra. O PS Q em Portugal foram feitos por labo- “NÃO NOS pandemia desta magnitude”, explica
local não sabe quanto custou. ratórios privados, quase metade do DEU LUCROS o médico que já presidiu à Assem-
“Já ouvimos vários valores dife- universo global. Até ao dia 18 de [A TESTA- bleia Municipal de Cascais pelo PS. E
rentes. 100 mil euros? 150 abril, foram feitos 235.878 testes. GEM] MAS garante que não lucrou com o surto:
mil? 200 mil euros? Mesmo Ora, se o SNS tem de pagar aos pri- NÃO FIZE- “Deixámos de ter outro tipo de doen-
enquanto vereador, não sei. O vados 87,95 euros por cada teste a MOS LAY- tes e a nossa atividade principal é
PS Ovar já enviou um pedido utentes que encaminha, o custo para -OFFS”, agora o combate à pandemia. Não
formal à autarquia”, explicou à o erário público ronda já os 10 mi- APONTA O nos deu lucros, mas não fizemos
SÁBADO o vereador socialista lhões de euros. DONO DOS lay-offs. A Covid-19 serviu para pa-
Artur Duarte. Um dos principais laboratórios pri- LABORATÓ- gar ordenados e manter empregos.”
“Solicitamos, o quanto antes, vados na linha da frente é o de Ger- RIOS
que nos seja facultada a infor- mano de Sousa. É responsável por GERMANO Testar, testar, testar
mação sobre todas as medidas “mais de um terço” de todos os testes DE SOUSA Não havia qualquer fila à porta do
tomadas partir do dia 17 de privados, revela à SÁBADO o próprio imponente Centro de Congressos do
março de 2020, síntese dos Germano de Sousa, maçon do GOL, Estoril quando a SÁBADO lá chegou
fundamentos que lhes deram ex-bastonário da Ordem dos Médicos a 17 de abril, pelas 11h. A resposta
origem e respetivos impactos e presidente do conselho de adminis- para a falta de aparato estava no ho-
financeiros das mesmas”, lê-se tração deste laboratório. Desde dia 9 mem solitário à porta, que controla a
na carta dos socialistas, a que a de março até 15 de abril, fizeram entrada: “Todos os testes são pré-
SÁBADO teve acesso, enviada 36.110 testes por todo o País, tendo
a 18 de abril. 60% a 70% sido encaminhados pelo
A escolha do Arena Dolce Vita público. “O SNS nunca podia estar i
para hospital de campanha é preparado para isto. Seria de doidos Viseu
Na sede da segurança
polémico por outros motivos. se o SNS estivesse pronto para uma social podem ser fei-
De acordo com os socialistas, a tos até 144 testes/dia
diocese do Porto ofereceu para i
o efeito a Casa de São Paulo, Barreiro
com 53 quartos e 128 camas. Pagou já 49.500
“Não se percebe como é que se euros ao
gastou 100 mil euros ou mais. Labocentro
por serviços
Havia alternativas mais bara- de testes
tas”, disse o mesmo vereador.
A SÁBADO enviou um con-
junto de perguntas ao gabinete
RUI DA CRUZ

do presidente da câmara de
Ovar, Salvador Malheiro, mas
não obteve resposta.
O concelho este- h
ve sujeito a um Torres
cerco sanitário Vedras
para controlar a A autarquia
epidemia. instalou o pon-
to de rastreio
no Centro de
RUI MINDERICO

Educação
Ambiental do
município

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-marcados e à vez.” O visor do seu tam os movimentos de quem chega. negativo num espaço de até 48 horas.”
tablet mostra uma lista de 171 pes-
soas agendadas para o dia, algumas
encaminhadas pelo SNS, outros do
49
mil euros
As voluntárias da autarquia atendem
escudadas por uma barreira de acríli-
co; a equipa de limpeza borrifava to-
No mesmo dia, a Germano de Sou-
sa abriu o primeiro centro no Seixal,
localizado no Centro de Recursos do
laboratório Germano de Sousa, que é o preço das as superfícies tocadas pelos uten- Movimento Associativo. Foi uma luta
gere o centro. “A fila desta manhã da instalação tes para as desinfetar; o segurança para o presidente do município, Joa-
era quase de 50 pessoas. Quase che- do centro geria as entradas, de forma a que ne- quim Santos: “A câmara tinha tudo
gava ao casino!”, dizia com humor. de testes (sem nhum utente se cruzasse com outro. preparado desde 27 março. O atraso
Os números não enganam. Desde sair do carro) As quatro salas D do centro de con- foi da responsabilidade do Ministério
que abriu a 23 de março, foram feitos da Póvoa gressos, que outrora serviram para da Saúde e da parceria que têm com
naquele espaço 3.865 testes. “Temos de Varzim reuniões empresariais e coffee este laboratório”, explicou.
capacidade máxima diária de 400 breaks, agora são lugares de rastreio
testes e já chegámos a ter um pico de da Covid-19. A sala, que pode rece- Testes sem sair do carro
301. Fazemos em média cerca de 150 ber pelo menos 40 pessoas, tem sido O centro de rastreio recebe exclusi-
a 200 testes diários, de sexta a sába- apenas ocupada pela técnica e o vamente casos do SNS. Para já, têm
do”, explica à SÁBADO o presidente utente. O procedimento demora 30 por dia – mas a procura vai levar
da Câmara de Cascais, Carlos Carrei- pouco menos de um minuto: coloca- a autarquia a aumentar para 40 já
ras. Entre a abertura dos centros, o -se a zaragatoa pela fossa nasal cer- para a semana. As vagas dos primei-
material que encomendaram da Chi- “SE NÃO ca de 10 centímetros até à rinofarin- ros dias já estavam ocupadas: “Des-
na e o aluguer de um avião para a FOSSEM OS ge, “onde há maior concentração de de dia 26 de março, a unidade da
recolha, a autarquia já investiu cerca TESTES NOS amostra biológica”, explica Regina Torre da Marinha, no Seixal, já tinha
de 6 milhões de euros na pandemia PRIVADOS Barbosa, do laboratório Germano de analisado 633 pessoas”, revela à SÁ-
– e Carreiras prevê chegar aos 10 SERIA UMA Sousa. Para ser bem feito “tem de ir BADO Alexandre Tomás, diretor
milhões. Nas contas do autarca, Cas- CATÁSTROFE bem lá ao fundo”, o que não é fácil: executivo do Agrupamento de Cen-
cais poderá vir a ter uma perda de EPIDEMIO- “Grande parte da anatomia do nariz tros de Saúde Almada-Seixal.
receita de dezenas de milhares. LÓGICA”, DIZ não é perfeita. Torna-se difícil se Foi um trabalho de equipa: a autar-
No interior do centro de congressos, ROQUE DA uma pessoa tiver desvios nasais, si- quia garantiu o espaço, a segurança,
o ambiente parece ser retirado de um CUNHA, DO nusites, rinites, adenoides inflama- o equipamento informático e a lim-
filme de ficção científica. Trabalha- SINDICATO das...” É por isso que, para estes ras- peza, enquanto o laboratório fornece
dores vestidos de branco, com os res- INDEPEN- treios, um teste não basta. “Para se os testes e todo o processo de reco-
petivos equipamentos de proteção DENTE DOS ter a certeza de que é negativo, é lha das amostras e análise. “Devere-
individual da cabeça aos pés, aten- MÉDICOS aconselhado que dois testes deem mos ter aqui 7 mil euros mensais.
Mas primeiro devemos tratar da saú-
de das pessoas, depois fazem-se as
h
contas”, diz o líder do município.
Braga
A autarquia De norte a sul, estão montados
fez um pontos de rastreio por todo o País:
contrato de ARS Norte (21) ; ARS Centro (15);
111.170 euros ARSLVT (38); ARS Alentejo (10); ARS
em materiais
Algarve (13). Além dos centros fixos,
relativos
LUÍS VIEIRA/MOVEPHOTO

j à Covid-19 existem operações drive-through, só


Lisboa de carro, como acontece na Póvoa
BRUNO COLAÇO

A câmara investiu de Varzim, que trabalha com o labo-


88 mil euros em
máscaras ratório privado Synlab. Três dias
depois de inaugurar a 13 de abril, já a
capacidade tinha esgotado: “No pri-
j meiro dia realizámos 50 testes. No
Gondomar segundo, 65. A partir de quarta-feira,
Os testes fazem-se no pavilhão mul- realizámos 100 testes por dia. No fim
tiusos municipal, mas só 40/dia. A lis-
ta de espera atingiu os 1.200 utentes de semana, 60 por dia”, revelou fon-
te da autarquia. Numa só semana fi-
zeram 535 testes.
RICARDO PONTE

“Isto é uma das provas de que o


SNS não estava preparado para lidar
com esta pandemia. Se não fossem
DAVID CABRAL SANTOS

g os testes nos privados seria uma ca-


Pombal tástrofe epidemiológica”, concluiu
JOSÉ REIS

Na Expocentro, os testes Jorge Roque da Cunha, líder do Sin-


fazem-se sem sair do carro dicato Independente dos Médicos. W

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DOAÇÕES (AINDA) COM IVA C


FINANÇAS. O IMPOSTO QUE NÃO PODE DESAPARECER
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Televisões angariaram já €1,5 milhões para comprar máscaras, alimentos e hospital de


campanha. O Estado cobrou 23% de imposto porque as regras europeias não permitem fazer diferente.
Por Sara Capelo

N
a tarde de domingo, 12 de
abril, as estrelas da TVI apre- E na compra de bens...
sentaram um programa espe- ...há isenção? As Finanças
cial de angariação de fundos para os fizeram alterações recentes
mais afetados com a pandemia.
Quando esta maratona de cinco ho-
ras terminou, a contagem ultrapassa-
va os 258 mil euros (e a recolha conti- SOLIDARIEDADE: 1 EURO + IVA
€565 mil
Um empresário decidiu
nua: à hora de fecho desta edição ul- doar essa verba para a compra
trapassava os 474 mil). A cada cha- de ventiladores (20), que vai
mada doa-se um euro mais IVA (de oferecer a hospitais do Norte.
23%). O mesmo valor e o mesmo im-
posto cobrado nas campanhas dos
outros canais generalistas. A linha,
montada pela SIC com a Federação
Mais 4
Quando recebeu a fatura da
Portuguesa de Futebol, conseguiu um empresa alemã, percebeu que,
pouco mais de 594 mil euros (para a com os €105 mil euros que lhe
doação de material de proteção). A estão a ser cobrados de IVA,
RTP e a Cruz de Malta chegaram aos compraria mais quatro.
437 mil euros (que incluem os valores
doados numa conta) para um hospital
de campanha. Ao todo, os três canais
juntaram pelo menos 1,5 milhões de
140%
Paulino Brilhante Santos diz
euros com a solidariedade dos portu- à SÁBADO que as alterações
gueses – mais IVA: é que não existe feitas pelo Governo nas últimas
isenção nestas chamadas, pelo que o semanas permitem isentar esta
Estado encaixou milhares de euros. compra – e, como houve uma
À SÁBADO, o Ministério das Finan- majoração para quem faça doa-
ças explica que este é um “imposto ções nesta fase, o empresário
de matriz europeia” e qualquer Esta- pode deduzir 140% em IRC. Um
do-membro está “condicionado”. No cidadão comum terá dedução
caso das chamadas solidárias, “não semelhante em IRS.
existe quadro legal que permita a
aplicação de isenção do IVA”.
É de facto assim, explicam o advo-
gado Paulino Brilhante Santos, da grandes incêndios de junho e outu-
Valadas Coriel e Associados, e o fis- bro. O problema era o mesmo. E o
calista Tiago Caiado Guerreiro: “As argumento também: as regras euro-
alterações teriam que ser negociadas peias não permitiam avançar com a
com a União Europeia e levam tem- ser cobrado – ainda que as Finanças “ERA PRECI- isenção. Na altura, depois de ser alvo
po. A ideia é que o imposto seja se- refiram que, como o valor arrecada- SO HAVER de contestação, as Finanças decidi-
melhante – idealmente igual – entre do vai para a receita geral do Estado, VONTADE ram canalizar “integralmente” o valor
os países europeus, porque têm rela- “irá servir para financiar os cuidados POLÍTICA do imposto obtido nas campanhas
ções económicas. Claro que um Esta- de saúde prestados pelo SNS”. PARA telefónicas e em concertos solidários
do, se quiser negociar, vai negociar. ISENTAR”, para a proteção civil e o apoio às víti-
Era preciso haver políticos com von- Concertos e obras de Pedrógão DIZ TIAGO mas dos incêndios. E consignou o IVA
tade para isentar”, conclui Caiado Esta é uma perspetiva diferente da CAIADO arrecadado pelas despesas de re-
Guerreiro. Ou seja, o imposto tem de que foi seguida em 2017, depois dos GUERREIRO construção para o fundo Revita. W

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Opinião 23 ABRIL 2020
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CONVIDADO
Os demónios são sempre os mesmos,
desde que o mundo é mundo, e nós
nele. Pode ser que alguns só deem
por isso agora, mas a vida “normal”
é apenas uma distração

Apetece-me
um quadro
de Hopper
CERTO DIA (há pouco, por agora),
um amigo escreveu-me, a saber de
mim, e, lá pelo meio do texto, aludiu
aos dias em que para levar a vida fa-
zem falta muitos ombros. Terá sido
domingo, se bem me lembro, do-
mingo dito de Páscoa – o dia de,
para muitos, acreditar no impossí-
vel; e que inveja dessa crença. E jul-
go que, no mesmo dia, curiosamen- outros, é certo, mas muito. Não tanto mim, um consolo, porque encontro
te, li num jornal que por estes dias como do irresistível apelo sedutor nele compreensão. E reconhecimen-
de “confinamento” (significante feio, pelo abismo (a vida fulgurante num to. E por isso me surpreende a recen-
só por si, mesmo sem ir ao significa- instante que foge) de um Caravaggio, te descoberta de Hopper. O confina-
do) têm sido feitas muitas referên- ou dos deuses e diabos (doces e mento não traz, neste particular, nada
cias aos quadros de Hopper, sobre- amargos) vindos das entranhas de de novo. Novos demónios são os ve-
tudo em posts e afins. Fiquei sur- um Bacon, et cetera. Mas gosto mui- lhos demónios, os demónios são
preendido, não pelas certeiras pala- to, e nunca me fez impressão aquela sempre os mesmos, desde que o
vras sobre ombros (que aliás logo serena, conquanto severa, represen- mundo é mundo, e nós nele. Pode ser
pedi licença para usar, pois tamanha tação da solidão e da estagnação, a que alguns só deem por isso agora,
beleza afiada e crua lhes achei), mas impossibilidade de comunicação, as mas a vida “normal” é apenas uma
pela descoberta digital de Hopper. paisagens desertas, as cenas melan- distração – mas muito importante,
Não sabia que o pintor andava a ca- cólicas, gente junta mas apartada; e sim, vital, sem dúvida – dessa funda
lar fundo por aí –, mas também não tudo iluminado por uma luz estra- verdade do pintor norte-americano.
admira, pois eu, em boa verdade, nha, a luz do silêncio. Hopper é para Silêncio. São precisos muitos ombros
desconheço muito sobre o mundo mim, sobretudo, silêncio. Um silên- para levar a vida, mas no fim do dia, e
digital e não frequento; e, quando cio servido por cores suaves, um si- no fim dos dias, é nos ombros de cada
oiço posts, ainda me ocorre em pri- lêncio que se adivinha rodeado de um de nós que ela carrega. Não nos
meiro lugar a imagem de um objeto ruído, um silêncio pontuado por ten- iludamos. Hopper não é triste. Ho-
de betão, metal ou madeira que ser- tativas de pontes, conversas, olhares. pper é um consolo. Apetece-me, ago-
ve para uma (ou mais) de três coisas: Um silêncio íntimo, que grita, que é ra como sempre, reconhecer-me na-
sinalizar ou orientar a marcha, er- cheio, redondo e intenso, quase físi- quela compreensão. Só isso já que-
guer fios que servem a comunicação co, mas que em volta só tem e en- bra, e muito, o peso ensurdecedor do
ou bater com a cabeça. Se calhar os contra vazio. Aquele vazio, desolado, silêncio. Melhor só talvez a crua
posts também servirão, mais coisa do balcão do que dizem ser o mais constatação de Pessoa/Campos de
menos coisa, para o mesmo; mas famoso quadro de Hopper. que não há mais metafísica senão
O voltemos ao Hopper. Mas Hopper não é triste. Hopper é chocolates. “Pudesse eu comer cho-
Advogado Eu sempre gostei muito dele, desde realista. É o que é, é assim que as coi- colates com a mesma verdade com
Rui Patrício que o descobri. Não tanto como de sas são. Não é? E Hopper é, para que comes!” W

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A
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flutuação nos números
alertou a Direção-Geral da
Saúde (DGS): como é que,
em 24 horas, o número de
novos casos desceu de 750 para 181?
Graça Freitas assumiu essa descon-
C Flutuação

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OR O 1NAVÍRUS
erranteO V I D 9
Menos casos ao
fim de semana?
As 2.as são dias
de boas notícias
fiança na conferência de imprensa,
ao fim da manhã de 17 de abril: “Per-
abril
29 15%
guntámos praticamente a todo o País março
se isto corresponderia à realidade. E
é um número fiável”, “certo e confir-
750
novos
domingo

mado”. Noutra declaração, a minis- infetados


tra da Saúde, Marta Temido, acres-
centou um dado que talvez ajude a
compreender variações nos novos
30
março
infetados ou nos testes realizados:
são várias as fontes de dados a que 18
abril
7%
17
recorrem. No caso dos testes, a in-
formação chega do “público, dos pri- segunda
vados e da academia”.
“Sempre que é necessário mais
abril
663 31
março
alguma coisa, é feito mais um novo
sistema. São décadas a funcionar as-
sim. É natural que agora estejamos
181 novos
infetados 16 %
terça
neste pântano de informação”, expli- novos
ca Pedro Pereira Rodrigues, investi- infetados
gador do CINTESIS (Centro de Inves-
tigação em Tecnologias e Serviços
da Saúde) e professor da Faculdade COMUNICAÇÃO. AS FRAQUEZAS DO BOLETIM DIÁRIO

DADOS QUE
de Medicina do Porto.

Um País, nove sistemas


h “Portugal tem inúmeros siste-
mas de informação: para a vigilân-

NEM DO AVESSO
cia epidemiológica, para a mortali-
dade. Depois, dentro do hospital há
um ecossistema (um gere as ima-
gens, outro as análises laborato-
riais). E estes não falam entre si: se

FAZEM SENTIDO
uma mesma pessoa tiver um regis-
to num e noutro não conseguimos
ligá-los”, descreve o especialista
em Saúde Pública André Peralta
Santos. Um outro médico desaba-
fou que o trajeto de um doente Co-
vid no seu hospital estava regista- Sete casos em Lisboa e 483 no Norte? Doentes no continente
do em nove bases de dados. contados na Madeira? A culpa é do “pântano” de sistemas.
Ricardo Mexia, da Associação Na-
cional de Médicos de Saúde Pública, Por Sara Capelo
nunca contabilizou tantas, mas assu-
me a “vulnerabilidade”: “É difícil
concatenar a informação das diver-
sas fontes e assegurar que as coisas morreu um rapaz de 14 anos no UMA CARTA vamos inscrever [esta morte] no
batem certo. Houve uma fase em hospital de Santa Maria da Feira, a ABERTA RE- boletim” porque na altura da mor-
que as contagens estavam a ser fei- DGS não definiu que a causa tives- VELOU “IN- te o jovem tinha morrido com
tas de forma manual.” se sido Covid-19, apesar de estar CONSISTÊN- Covid – apesar de a causa ter sido
infetado. A 30 de março, Graça CIAS” E “RE- uma meningite. A 18 de abril,
Morrer de ou com? Freitas disse que, “seguindo o cri- TROCESSOS” reforçou: “Não estamos a contar a
h Quando, ainda em março, tério português, provavelmente NOS DADOS causa básica da morte, mas o

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j drigues. “Mas não de tal forma que


Só o boletim não justifique” que, a 11 de abril, se te-
chega. Investiga-
dores tentam pes- nham registado 483 casos novos no
car dados e expli- Norte e apenas sete em Lisboa e
cações de concei- Vale do Tejo. O que terá ocorrido?
tos nas conferên-
cias de imprensa
O que Registar várias vezes
aconteceu a O dobro h Apenas como “exercício de es-
peculação”, Miguel Monteiro supõe
12 de abril? dos casos que “pode acontecer por falta ou
em Ovar?
7 casos
positivos em Tendência
atraso nos testes”. “Mas nenhum
destes exercícios pode levar-nos
a uma conclusão, porque não há
Lisboa e Vale
do Tejo 101 infetados
dizia o
presidente
Filipe Charters
de Azevedo de-
tetou nos dados
uma estratégia consolidada que
nos diga como interpretamos os
dados dos testes.” O investigador
da câmara da Covid uma pertence ao Data Science for Social
velha marca da Group, um grupo que numa carta
casos estatística: os aberta (também assinada pela

483
positivos
no Norte 55 infetados números ao fim
de semana são
mais baixos
ANMSP e o CINTESIS) se propôs a
ajudar a DGS a resolver as “incon-
sistências” e os “retrocessos” na
reportava publicação dos dados.
a DGS Outra tese aponta de novo para o
desencontro dos sistemas de registo.
Desde a criação do Trace-Covid (que
tal como o nome em inglês indica
permite aos profissionais fazerem o
acompanhamento dos infetados), há
evento terminal.” Será? Para a es- Na Madeira, apesar dos 51 casos clínicos que não terão percebido que
tatística oficial da DGS, a vítima registados pelas autoridades regio- têm de continuar a fazer registos no
mortal com Covid mais nova con- nais, o boletim da DGS registava 59. SINAV, o sistema de notificação de
tinua a estar acima dos 39 anos. Aconteceu também os madeirenses doenças infetocontagiosas. “Antes [do
Esta não é só uma questão semânti- com residência fiscal na ilha serem Trace-Covid], a vigilância era feita em
ca. E tem até influência no desenho contabilizados como estando infeta- Conceito papel, telefonemas ou folhas Excel.
da estratégia futura de regresso à nor- dos ali apesar de terem sido testados A DGS não expli- Ter este novo sistema veio colmatar
malidade pré-pandemia, refere Filipe no continente. E somam-se as quei- cou se os dados uma falha, pode é não estar a haver
Charters de Azevedo: “Precisamos de xas dos autarcas de que os números dos testes se re- novos registos”, explica Pedro Pereira
saber se os que morrem, morrem ‘de recolhidos pelas autoridades locais ferem à quanti- Rodrigues.
Covid’ ou morrem ‘com Covid’ para demoram dias a ser atualizados. O dade realizada Esta notificação de uma doença
saber se a letalidade é alta ou baixa. E autarca de Vale de Cambra, José Pi- ou ao número contagiosa, como a Covid-19, “é fun-
não o conseguimos com estes núme- nheiro, reportou que os dados que a de pessoas tes- damental para conseguirmos contro-
ros – e isso assusta-me”, diz o espe- autoridade local de saúde recolhia tadas, avisa Pe- lar a transmissão do vírus, porque é
cialista em modelação estatística. eram o dobro dos cerca de 50 publi- dro M. Teixeira a única maneira de colocar os
cados no boletim da DGS – e foi as- casos positivos em isolamento. Sem
Adoecer onde não se mora sim durante vários dias. Em Ovar, os essa notificação, toda a parte das
h Na “identificação por concelhos, dados difundidos por Salvador Ma- medidas de saúde pública fica cega e
o pântano ainda é maior”, diz Pe- lheiro chegaram a ter uma divergên- não consegue atuar para com todos
dro Pereira Rodrigues. É que parte cia de 143 infetados (10 de abril). A os casos suspeitos”, conclui André
da informação divulgada pela DGS DGS justificou com o fator temporal: COM TANTOS Peralta Santos. Com um sistema úni-
no boletim diário refere-se aos ca- quem está no terreno, esclarece An- SISTEMAS DE co e em rede, “identificaríamos mais
sos por administrações regionais de dré Peralta Santos, recebe a infor- REGISTO rápido quando se começasse a ver
saúde (ARS). Mas divulga também a mação “com maior atualidade” do DIFERENTES, muitos casos a ocorrer num local
informação por concelhos. Ora, não que os serviços centrais, em Lisboa. “É NATURAL (como Ovar ou Câmara de Lobos) e
existe uma correspondência direta “Aqui no Norte há muitas autar- QUE AGORA poderíamos intervir sobre o proble-
entre uma e outra: Santa Maria da quias que estão a testar de forma au- ESTEJAMOS ma”, acrescenta Ricardo Mexia, há
Feira, por exemplo, está na ARS do tónoma (os lares, os profissionais de NUM PÂNTA- seis anos à frente da ANMSP e que re-
Norte apesar de pertencer ao distri- saúde) e isso pode dar uma diferença NO DE IN- corda que esta é uma exigência que
to de Aveiro (ARS Centro). nos números”, diz Pedro Pereira Ro- FORMAÇÃO” vem já dos seus antecessores. W

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Lição 1: O que não fazer

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g g g
Confiança (a mais) Duas cabeças a pensar Distanciamento? O que é?
No início de março, já se falava Diz o ditado que pensam melhor Dois dias depois desta foto, o
em distanciamento social. A mi- do que uma: mas nem Graça Governo decidiu fechar as escolas
nistra e o seu secretário de Esta- Freitas nem Marta Temido do País. Não fossem as crianças
do desconheciam o conceito pensaram bem neste momento partilhar uma aguinha no recreio...

Não olhes para o que eu faço


Polémica por um 25 de Abril em cerimónia composta? Isso é o menos. Quem dá conselhos também
deve dar o exemplo, mas nessa matéria temos sido um desastre: um festim de proximidade social

Lição 2: Mais um pequeno erro


j
Menos de Passou bem?
1 metro, sempre? Na conferência de imprensa em
Rio saiu para reduzir o que anunciou que não haveria au-
número de deputados las para praticamente ninguém,
na sua bancada: por o primeiro-ministro terminou com
trás dos colegas e jun- um aperto de mão ao ministro da
tinho. Na bancada do Educação, Tiago Brandão Rodri-
Governo acontece gues. Aulas não, mão sim?
o mesmo, a menos
de um metro e sem
máscara: a tal que nos Não, não passou bem
transportes públicos Percebendo o erro, António Costa
será obrigatória filmou um sketch em que pedia
para todos... desculpa e esfregavam os dois as
mãos com álcool-gel. Foi pior a
emenda: o ideal é lavar as mãos;
gel, só quando isso não é possível.
Em São Bento não há torneiras?

Lição 3: A fazer tudo mal Lição 4: Uma selfie, claro


Onde estão...
1 2 O ESTRANHO De novo, Graça e Marta: destemidas, em selfie com
ESTILO DE portugueses em fim de quarentena, em fevereiro.
UMA SÓ LUVA Eles tinham estado em quarentena, mas elas não.

Se António Costa ti-


ver Covid-19, o saco
que levou para casa
leva coronavírus. A
monoluva que foi ao
nariz onde mais terá
Levar a mão à Tocar na carteira
cara e ao nariz e no saco com ainda tocado a se-
mesma mão guir? Esperemos que
esteja bem de saúde.

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Crónica 23 ABRIL 2020
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VÁ LÁ porta é a que respeita escrupulosa-


mente o instante pelo qual passa-
portugueses confinada à habitação,
puxando pela imaginação para se
À SUA VIDA mos”. E se o momento é de recolhi-
mento, a cerimónia do 25 de Abril
desdobrar entre a ocupação de
tempo e o teletrabalho – mais as
A 25 de Abril de 1974, os capitães também deveria entrar no espírito crianças, já agora… – não custaria
de Abril salvaram a República. do atual abril. Como até, aliás, refe- muito conceber uma cerimónia
A 25 de Abril de 2020, os profissionais riu João Soares, esta poderia ser original, mais condizente com o in-
de Saúde tentam salvar um País e oportunidade para repensar o con- feliz período que atravessamos, do
precisam da colaboração de todos, ceito da celebração, que se arrasta que insistir num modelo que tre-
até do presidente da Assembleia há anos temperada apenas com bo- sanda a mofo, com o habitual “vai
da República las de naftalina, sem trazer nada de usar da palavra Sua Exª...”. Porque
novo às gerações que não viveram não, por exemplo, convidar para as
Abril, mas que devem mantê-lo na galerias sobreviventes da Covid-19,
memória. como um sinal de esperança para o
Com um vírus a dizimar centenas futuro? Não, tudo tem ainda que
de vidas, a infetar milhares e a con- passar pelos “convidados institu-
finar milhões, faltou prudência ao cionais”, pelo protocolo, pelo sala-
parlamento, sobretudo ao presi- maleque de uma velha República
dente, Ferro Rodrigues, que mais que ainda não percebeu a necessi-
não fez do que se comportar como dade de atualizar determinados
todos os que, apesar do recolhi- conceitos.
mento ser atualmente a melhor Com uma birra parlamentar, Ferro
C arma de combate à Covid-19, têm Rodrigues desbaratou anos de união

Chamem de sair de casa para dar uma volti-


nha junto ao mar.
à volta do 25 de Abril de 1974, pese
embora as diferenças quanto ao

o Otelo, pá! Estando a grande maioria dos rumo dos acontecimentos. Mas, da
esquerda à direita, é inquestionável
o valor e a importância para a Histó-
UNS TELEFONEMAS para Otelo ria portuguesa da revolução levada
Saraiva de Carvalho e mais al- a cabo pelos capitães de Abril. Ora,
guns dos seus camaradas da- Abril, o de 1974, merece mais do
quele tempo poderiam ter re- que uma birra de um presidente do
solvido a polémica sobre a parlamento que, a todo custo, pare-
cerimónia de comemoração ce querer desfilar e discursar.
do 25 de Abril. É que, ao con- No fundo, ter plateia, fa-
trário de Ferro Rodrigues, que zer uma prova de
gosta de fazer as coisas “à ca- existência em tem-
nelada”, a tal malta de 74 poderia pos conturbados,
pensar e executar um plano para quer do ponto de
um festejo digno da data, num vista da Saúde Pú-
tempo em que o País está a ser blica, quer quanto
vítima de uma pandemia e se ao crescimento des-
apela ao recolhimento dos sa ameaça de estima-
cidadãos. ção para a esquerda, que é
É óbvio que uma data o populismo. Ora, o populis-
como o 25 de Abril mo tem tido em Ferro Rodri-
tem que ser cele- gues o melhor adubo para o
brada, mais do seu crescimento.
que pela efemé- Sim, o 25 de Abril pode e
ride em si, pela deve ser festejado, difundido.
mensagem que Porém, se a 25 de Abril de
transmite às gera- 1974 estávamos nas mãos dos
ções mais novas capitães de Abril, a 25 de Abril
– “fascismo nun- de 2020 estamos nas mãos dos
C ca mais!” –mas, profissionais de Saúde e da ciên-
Subdiretor como realçou cia. Os primeiros salvaram a Repú-
Carlos Valter Hugo Mãe blica, os segundos estão a tentar
Rodrigues no Jornal de Notí- salvar o País e precisam da colabo-
Lima cias, “a união que im- ração de todos. W

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CHINA. O PAÍS LANÇOU UMA OPERAÇÃO PARA FICAR BEM NA FOTOGRAFIA

XI, O GRANDE
PROPAGANDISTA
AO SEU DISPOR Doações, mas cobertas pelos media;

O
milhares de contas de Twitter a

s amigos são para as oca- pre sale el sol” – também em canto-
siões”, escreveu no Twitter nês. E, um pouco por todo o mundo,
Zhang Jun, o embaixador
espalhar a verdade; beneméritos a ajuda chinesa, mais do que o valor
chinês junto das Nações alegadamente independentes; e a das suas exportações de crise, tem
Unidas. E acrescentou: “Faremos tido enorme cobertura mediática.
tudo o que pudermos para ajudar ou-
diplomacia a jurar que não é por Os gestos de boa vontade multipli-
tros países a lutar contra a Covid-19.” interesse, porque “os amigos são caram-se. Pequim anunciou que
A mão amiga chinesa está convosco: enviaria dois milhões de máscaras
esta é a nova linguagem do spin in-
para as ocasiões”. cirúrgicas para a Europa, mais 200
ternacional chinês. Depois de muitas Por Maria Henrique Espada mil de outros tipos de máscaras e 50
críticas à forma como subestimou o mil kits de teste. Ursula von der
vírus e depois os números, a China de Leyen, a presidente da Comissão
Xi Jinping procura um melhor papel MAIS DE 10 comprado à China equipamento mé- Europeia, naturalmente, agradeceu.
na crise do coronavírus. MIL CONTAS dico num valor total 10 mil vezes aci- Não só o Estado chinês, mas múlti-
Em março, quando um comboio FALSAS OU ma do que chegou por carris. Mas a plas empresas – note-se que em
partiu de Yiwu em direção a Madrid ROUBADAS mensagem não se perde nesses deta- qualquer empresa com dimensão
contendo 110 mil máscaras, a propa- NO TWITTER lhes: nos caixotes do comboio vinha mínima tem um delegado do partido
ganda oficial chamou-lhe um “ponto TÊM ESPA- escrito “Ánimo, toreros”, “difundir el junto de si – anunciaram donativos
de viragem” na luta contra a doença LHADO amor” e “despues de la lluvia siem- para fora da China. O mais notório
do outro lado do mundo e na cons- DESINFOR- foi Jack Ma, o fundador do site Ali-
trução de uma nova “rota da seda da MAÇÃO baba, que anunciou uma onda de
saúde” – ainda que, como fez notar 0s seis dias fatais ajudas através da Fundação Alibaba
a The Economist, o valor da ajuda As más notícias para a China e da Fundação Jack Ma. Além de
não passasse os 50 mil dólares. A continuam a surgir oferecer meio milhão de testes e um
China tem-se desdobrado em esfor- milhão de máscaras aos EUA, o em-
ços de ajuda aos países mais afeta- O guião chinês de controlo in- presário divulgou que a sua ajuda
dos, enviando equipas, equipamento França terno rápido e ajuda externa conti- chegará aos 54 países africanos.
e fazendo sempre, a par e passo, a chamou o nua a ser desafiado: dia 15, a Asso- A Huawei, por exemplo, ajudou
publicitação de cada ação: tudo é do- embaixador ciated Press teve acesso a docu- Nova Iorque, Canadá e Holanda
cumentado, filmado e difundido. A chinês para um mentos que revelam que as auto- (que está a ponderar que política
ajuda será muita, mas, como nota puxão de ridades chinesas, Xi Jinping entre adotar nas redes 5G em que a com-
também a revista, será uma gota de orelhas: diplo- elas, foram informadas do peri- panhia é parte interessada).
água face ao valor das exportações matas partilha- go de pandemia iminente no dia Em Portugal, os donativos da
comerciais chinesas de material mé- ram fake news 14 de janeiro, mas mantiveram EDP/China Three Gorges vinham
dico – a maior parte a preço de mer- sobre como a Wuhan sem restrições e espera- com um cartaz em que se lia, em
cado – que entre o início de março e França lida mal ram seis dias para o admitir. português e em carateres chineses,
4 de abril atingiram 1,45 mil milhões com a epide- “A união faz a força”. O detalhe da
de dólares ao nível global. Quando o mia, face ao mensagem nunca é esquecido.
tal comboio chegou, já Espanha tinha sucesso chinês Mas a campanha de relações públi-

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cas desenrola-se em várias frentes. dos Negócios Estrangeiros Zhao Li- OS DONATI- bre o blitz humanitário e o lugar
E nem todas transparentes. No fim jian, a partilharem a teoria da ori- VOS VÊM que a China agora tenta ocupar
de março, o consórcio de jornalismo gem americana do vírus: teriam COM com ele, o New York Times citava o
americano Propublica publicou uma sido um militares americanos de MENSAGEM: exemplo das declarações do econo-
extensa investigação em que monito- visita a Wuhan em outubro que “ÁNIMO mista italiano (e ex-subsecretário
rizou cerca de 10 mil contas de Twit- teriam trazido o vírus para a China. TOREROS” de Estado da Economia) sobre as
ter, todas falsas ou roubadas aos legí- PARA ambições geopolíticas ocultas nesta
timos titulares, orquestradas numa Ultrapassar o mau começo ESPANHA, “A generosidade: “Não sei nem me in-
gigantesca campanha. Faziam todas O facto de a ajuda poder ter segun- UNIÃO FAZ A teressa. (...) Se alguém está preocu-
o mesmo: difundir propaganda das intenções não lhe retira a eficá- FORÇA” PARA pado por a China estar a fazer de-
chinesa, mesmo a mais delirante e cia. A este propósito, num artigo so- PORTUGAL mais, há espaço para os outros paí-
incluindo teorias da conspiração. ses o fazerem também. Isto é o que
Mas a maioria das mensagens eram os outros países deviam fazer.”
– e são – até mais simples: limitam- A China talvez precisasse de o fa-
-se a enfatizar que enquanto o Oci- zer. Apesar do aparente sucesso no
dente se debate agora com proble- domínio da pandemia, tem crescido
mas, o sistema chinês obteve um a perceção não só de uma operação
enorme sucesso no combate à pan- de encobrimento inicial, mas tam-
demia. Como a China bloqueia bém a de que os números chineses
internamente o Twitter, a campa- foram e continuam a ser manipula-
nha, em inglês e chinês, destina- dos. No início de abril soube-se que
-se mesmo a olhos ocidentais, a CIA entregou à Casa Branca um
ou, quando muito, à comunidade relatório com essa informação. Ora,
chinesa expatriada. Muitas destas esta menorização em duas frentes
contas, num sinal ainda mais não é indiferente: não só atrasou a
óbvio do alinhamento com a preparação para a pandemia, tam-
nomenclatura chinesa, também bém fora da China, como alterou a
começaram (ainda em janeiro) perceção da sua real perigosidade.
por propagar críticas aos Sexta-feira, as autoridades de
estudantes de Hong Kong em Wuhan acrescentaram 1.290 mor-
protesto contra a China. tos por Covid-19 ao total da cidade
E a própria diplomacia chinesa, – e esta foi a quarta mudança des-
que tanto se indignou com a desi- de janeiro na forma como são con-
gnação de “vírus chinês” usada tados os mortos. Ao mesmo tempo
por Donald Trump, usou dos sucedem-se notícias com números
mesmos métodos, com diários alarmantes de urnas a saí-
oficiais chineses e até rem dos crematórios da cidade, mi-
com o porta-voz lhares acima dos oficiais. A história
do Ministério de como Li Wenliang, o primeiro
médico a lançar o alerta, foi obriga-
do a retratar-se correu mundo. E
se a China veio a reabilitá-lo, não
desiste do controlo sobre a forma
como a narrativa da crise é trans-
mitida: a semana passada decidiu
que todas as publicações académi-
cas que se debrucem sobre a ori-
gem do vírus têm de passar pelo
escrutínio prévio das autoridades
q políticas. As notícias de material
Xi Jinping (máscaras, sobretudo) defeituosos
Presidente da China desde enviado para vários países assim
2013, e vitalício desde 2018, como atrasos na entrega de mate-
no congresso de 2017
afirmou que a China deve rial já pago também não ajudaram
aproximar-se do centro do – e levaram as autoridades a reagir,
palco internacional e dar impondo critérios mais rígidos de
“maiores contribuições certificação às empresas. A China
para a humanidade” não gostou de fazer de vilão. Tenta
agora ser o herói da crise. W

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Opinião

RELATÓRIO O arma biológica é injuriosa e difamató-

MINORITÁRIO Falar claro ria, desmentida pelos factos e logica-


mente impossível.

A tese de que o Estado


chinês desencadeou uma
sobre a China Injuriosa: acusaria de guerra contra a
humanidade uma nação antiga, mem-
bro da ONU, com relações diplomáti-
guerra biológica, através da cas em todos os países do mundo. Isto

A
Covid-19, é injuriosa descoberta da origem exata do fica dito, independentemente das crí-
e difamatória, não tem vírus SARS-CoV-2 não é, neste ticas ao regime de Pequim, que são
qualquer base factual, momento, uma prioridade. muitas, profundas e conhecidas.
e representa uma Mas virá a sê-lo, na ordem político-so- Sem factos: na verdade, todas as
impossibilidade lógica. cial e económica que se segue. análises feitas à estrutura do vírus, co-
Mas há muito a esclarecer, Na verdade, não será possível olhar a municadas pelos centros de estudo es-
por parte de Pequim República Popular da China com olhos pecializado e combate a doenças, dos
de normalidade, sem que haja um es- EUA, Coreia do Sul, Taiwan e Alema-
clarecimento absoluto, transparente e nha, afirmam ser o mesmo a combi-
independente de tudo o que se passou. nação de diversos elementos presen-
Isto é ainda mais importante para tes no VIH e na malária, em anteriores
Portugal, um dos países da União Eu- coronavírus, e aparentando uma cons-
ropeia com importantes investimentos trução “natural”, não laboratorial nem
chineses em diversos setores da eco- manipulada.
nomia e finanças. Ilógica: iria um Estado bioagressor
Falemos sem papas na língua. A pos- começar por exterminar a sua pró-
sibilidade de a China, como Estado, ter pria população, infetar 83 mil almas
desencadeado uma ofensiva com uma de uma das zonas mais desenvolvi-
das do país, e matar cerca de 5 mil?
Iria esse mesmo Estado, empenhado
no projeto Rota da Seda e no co- Q

O j
Os acidentes
acontecem
Ninguém razoável diz que o vírus foi
feito nos laboratórios de Hebei. Mas
poderia estar lá armazenado, assim
como animais doentes, para estudo.
Parece normal: os centros de nível
de segurança 4 contêm os agentes pa-
togénicos mais letais. Sem os mesmos,
não poderíamos nem compreender
nem combater as epidemias.
Vital é evitar acidentes. Em abril de
2004, Shigeru Omi, diretor da OMS
para o Pacífico Ocidental, tinha alerta-
do para a necessidade de rever os pro-
tocolos de segurança nos institutos de
pesquisa de Wuhan.
Por outro lado, sabe-se agora que,
no mercado de Huanan, não se ven-
diam morcegos.
O
Politólogo Claro que o comércio destes, como
guloseima, prolifera em muitos países.
REUTERS

Nuno Rogeiro
nrogeiro@gmail.com Mas é outra história. W

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vasta nos países com maiores comu- tão de todos esses estava ligada ao
nidades, ou populações turísticas flu- chamado “mercado húmido” de Hua-
tuantes, de origem chinesa. nan, em Wuhan, nas margens do
No dia 17 de novembro de 2019, ter- Yang-Tsé. Parecia também ser essa a
-se-á detetado, em Wuhan, o chama- teoria da professora Shi Zhengli, a in-
do “doente zero”. A 16, segundo a pro- vestigadora do IVW que mais se dedi-
fessora Ai Fen, chegou o primeiro teste cara ao estudo das infeções através de
laboratorial, no Hospital Central da ci- morcegos. Estes animais são sempre a
REUTERS

dade. Nos quatro dias seguintes, regis- chave: direta ou indiretamente estive-
taram-se 60 casos, nesta capital da ram na origem do Hendra (1994), Ni-
Q mércio global, na venda externa rica província de Hebei. A 30, o Institu- pah (1998), SARS (2002), MERS (2012)
dos seus produtos e tecnologias, des- to Virológico de Wuhan (IVW) recebe e ébola (2014).
truir os mercados, as pessoas e os ca- a primeira amostra do vírus, e três dias Mas há dois meses, o professor Xiao
pitais de que precisa para se desen- depois descobre o seu genoma. Botao, da Universidade Tecnológica
volver? Iria a China correr o risco de A 9 de janeiro de 2020, o vírus e a do Sul da China (UTSC), sediada em
se precipitar numa das maiores crises doença são integrados na base na- Guangzhou, publica uma extensa in-
da sua história recente, com queda de cional de dados médicos. Dois dias vestigação, na qual afirma que, entre
6,8% do PIB, e a primeira retração depois, Pequim comunica o caso à as hipóteses de origem do vírus, tem
económica em quase 40 anos de mo- OMS. Mas esta anuncia, três dias a se- de se tomar em conta a possibilidade
dernização? guir, que não há transmissão entre laboratorial.
Dito isto, porém, existe um direito à humanos. No dia 20, com ar grave, Xi E explica que, além do IVW, existiam
verdade. Sempre no domínio dos fac- Jinping revela a epidemia, já com 3 em torno da praça de peixe de Huanan,
tos, é indesmentível que o vírus seja mil vitimados. nada menos do que três centros de
originário de território chinês. E que A tese comum, na altura, era a de análise virológica, um deles a menos
preexistiu à infeção na Europa, mais que o vírus nasce da transmissão do de 300 metros do mercado. W
morcego ao humano, através de um
intermediário animal, provavelmente
o pangolim ou a cobra, e que a inges-

O h O
Nossa vizinha, Melhores filmes
a lepra de sempre
Com o bunker feito gabinete empresa- Alguns dos melhores filmes de sem-
rial, estúdio de produção, polo de se- pre, em digital: Laranja Mecânica,
minários e clínica de recuperação para 2001, e Barry Lyndon, de Kubrick.
o meu desafortunado António, a praga Apocalypse Now, a trilogia O Padri-
parecia algo trágico e opressor, mas nho, O Vigilante, de Coppola. Tudo
ainda distante. Bons Rapazes, Taxi Driver e Silêncio,
Até serem infetados dezenas de mi- de Scorsese (na foto). La Dolce Vita e
REUTERS

grantes, empacotados num miserável Amarcord, de Fellini. O Cálice Sagra-


albergue de fortuna, não muito longe do, A Vida de Brian, dos Python. A
do nosso centro familiar e laboral. j Paixão de Cristo, de Mel Gibson, An-
Desgraçados que, durante meses, to- nie Hall de W. Allen, Lawrence da
caram nas maçanetas das mesmas Arábia, A Ponte do Rio Kwai, de Lean.
portas, fizeram as mesmas compras, A Morte de Estaline, de Iannucci. O
frequentaram os mesmos sítios públi- Trono De Sangue, Os Sete Samurais e
cos que a minha tribo. Kagemusha, de Kurosawa. China-
Atrair estrangeiros sem lhes dar con- town de Polanski, O Sétimo Selo de
dições, nem verificar o seu estado, é Bergman, Alexandre Nevsky de
TIAGO PETINGA/LUSA

construir a desumanidade, ao som da Eisenstein. Leviathan, de Zvyagintsev,


Internacional. O Duelo de Ridley Scott. Em Busca da
A esse respeito, há um Portugal des- Perfeição, de D. Chazelle e O Idiota,
conhecido, e terrível, por revelar. W de Georges Lampin. W

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DOAÇÕES. MINISTÉRIO DA SAÚDE ESTÁ A COMPILAR DADOS

A
COMOAS
marca de relógios Swatch
diz que “vai ficar tudo
bem”. Os trabalhadores
do Millennium BCP can-
tam que “vai correr bem”. As Far-
mácias de Portugal – que parecem
citar os britânicos The Smiths ao di-

MARCAS
zer que “há luzes que nunca se apa-
gam” – garantem também que “va-
mos vencer a Covid-19”. Há, depois,
quem agradeça. A Unilever – um
dos maiores anunciantes do País e
distribuidora de marcas como a

LIDAM
Olá, a Knorr, a Lipton – diz “obriga-
do” às “forças de vendas que an-
dam na rua por todos”. A operadora
de autoestradas Brisa também diz
“obrigado” a “todos os que, pela
nossa saúde e segurança, estão no
terreno”. O Continente segue o


“obrigado” “a quem fica afastado
para nos mantermos unidos”, en-

COMA
quanto a Galp agradece a quem fica
em casa e a quem trabalha. O que
está a acontecer?
Há duas coisas diferentes na pu-
blicidade que nos bombardeava até

CRIS
a nossa vida mudar com a pande-
mia do novo coronavírus. A primei-
ra: há muito menos. A quebra de
28% no tempo de publicidade em
televisão no início de abril e as pre-
visões de queda superiores a 40%
nas receitas dos media tradicionais
são bem visíveis. A segunda mu-
dança não é menor e tem que ver
com o tom. Entre justificações, nin- Agradecem aos consumidores e aos trabalhadores,
guém no meio parece gostar muito
do resultado: o publicitário João anunciam iniciativas e doações, mas receiam os
Wengorovius chama-lhe uma “xa- danos que uma má decisão ou um anúncio mal
ropada”, Diogo Anahory reconhece
que “muitas campanhas não se di- interpretado possam ter na sua imagem.
ferenciam umas das outras e isso é Por Bruno Faria Lopes
a antítese do que deve ser a boa pu-
blicidade” e Carlos Coelho admite
que se nota “o peso do contexto”.
Com os criativos em teletrabalho e
as sessões fotográficas ou de roda-
gem de filmes congeladas, a maior
parte do trabalho recorre a ima- q
gens de um banco de imagens ou Todos no mesmo tom
simplesmente a letras garrafais so- Muitas marcas canalizaram
bre um fundo plano. Mas há outra investimento para as redes
sociais e o online. A publicidade
razão para a uniformidade: os exterior, nos múpis, é muito
anunciantes foram apanhados de uniforme e emocional
surpresa por algo inédito e nin-
guém quis arriscar. “Numa situação
dramática como a que estamos a
viver, todo o cuidado é pouco: um

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deslize ou uma piada mal interpre-


tada pode revelar-se um pesadelo
sem fim nas redes sociais ou no
domínio das relações públicas”,
explica Diogo Anahory, diretor da
agência BAR Ogilvy.
Desapareceram o humor e a criati-
vidade, pelo menos por enquanto –
e as letras garrafais substituem as
pessoas que já não podem aparecer
abraçadas ou próximas. No seu lu-

MIGUEL BALTAZAR
gar, as empresas preferiram mensa-

MIGUEL BARREIRA
gens emocionais: “obrigado”, “isto
vai passar” e “estamos consigo” (o 1 2
que abrange o jogo online, incluindo
o da Santa Casa) são os três eixos 3
mais comuns. Mas não só. “Este é um
momento de pertinência e, mais do E a seguir?
que as palavras emocionais muito Abraços na publicidade
iguais, o que fala mais alto é o com- não são para breve
portamento”, diz o consultor João
Wengorovius. São as ações que dão No início da pandemia, as
força à mensagem da propaganda. empresas eliminaram o risco
da sua publicidade. Mas e na
A publicidade chata – e a má fase seguinte? O regresso
O Modelo Continente, por exemplo, cheio de incertezas a uma

MIGUEL BALTAZAR
anunciou um aumento de 20% na nova normalidade dará mais
remuneração-base dos trabalhado- margem para arriscar, mas
res no ativo. A Brisa não pôs nenhum nada será como antes, diz Car-
dos 900 trabalhadores que estão em los Coelho. Aglomerados de
casa (um terço do total) com horário pessoas e abraços, por exem- 1 aos acionistas, o que “vai cair mal”,
reduzido ou rotativo em lay-off. O plo, serão pouco prováveis. “Obrigado” tem nota Wengorovius. O pedido do Pin-
sido um dos eixos
Licor Beirão, que tipicamente comu- das campanhas go Doce – que, como outras grandes
nica com humor, largou as piadas e cadeias de retalho, atrai por vezes
anunciou que vai fabricar álcool para 2 atenção mediática devido às rela-
gel desinfetante, tal como a Super Correio da Manhã e a CMTV) a doa- “Vamos vencer” é ções contratuais leoninas com os
uma das mensa-
Bock. A cervejeira e a Destilaria Le- ção de equipamentos médicos, más- gens comuns fornecedores – aos senhorios das
vira produziram 18 mil litros de ál- caras e material de proteção em la- suas lojas para pagar menos renda
cool-gel para as mãos a partir do ál- res e reduções cirúrgicas nas tarifas 3 é outro exemplo.
cool que sobrou do fabrico da cerve- para profissionais de saúde, mas vai Sem sessões Lá fora têm sido vários os exem-
fotográficas, as
ja sem álcool, volume que distribuí- avançar com a distribuição de quase marcas recorrem plos dos limites da publicidade para
ram por “cerca de 12 unidades hos- 700 milhões de euros em dividendos a bancos de ima- a defesa de uma marca – mesmo
pitalares desde Coimbra, Aveiro e gens ou a letras da que tem relevância e utilidade.
e ilustração
Porto”, explica Miguel Araújo, diretor Depois de ter sido das primeiras
de comunicação da Super Bock. O 4 marcas de luxo mundiais a anun-
Ministério da Saúde está a compilar Muitas marcas ciarem o fabrico de álcool para gel
repetiram a men-
os donativos feitos por empresas sagem oficial das desinfetante, a LVMH (dono da
(várias anunciaram a doação de ven- autoridades Louis Vuitton) avançou com a in-
tiladores) e pessoas, diz fonte oficial. tenção de não pagar renda em vá-
Se esta publicidade pode nem rias lojas e é uma das empresas no
aquecer, nem arrefecer – Wengoro- meio da polémica por causa da dis-
vius diz que sem algo de útil a comu- NÃO PAGAR tribuição dos lucros de 2019 pelos
nicar a mensagem perde eficácia, RENDA OU acionistas – o seu presidente, Ber-
Anahory lembra que é importante DISTRIBUIR nard Arnault, o homem mais rico de
“não desaparecer nesta altura” –, já LUCROS França, anunciou que não receberá
a má publicidade tende a ficar na MATA A BOA salário em abril e maio e cortou um
MIGUEL BALTAZAR

cabeça das pessoas e arruína rapida- VONTADE terço na proposta de distribuição


mente o efeito da propaganda. A 4
GANHA COM de lucros. Não deverá chegar para
EDP anunciou (em parceria com o ANÚNCIOS melhorar a imagem. W

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Entrevista
NUNO LOBO ANTUNES
O neuropediatra diz que ninguém pode dizer com honestidade
o que a pandemia e o confinamento vão trazer às famílias. É tudo
novo e ainda é muito cedo. Mas avança com algumas previsões.
Por Marco Alves (texto) e Bruno Colaço (fotos)

“O abuso de
crianças vai
naturalmente
crescer”

h
Nuno Lobo
Antunes, 65 anos,
diz que houve
uma grande
quebra no
número de
consultas

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N
uno Lobo Antunes falou
com a SÁBADO ao tele-
fone, às 9h da manhã
de um dia de semana.
O médico está em teletrabalho,
assim como a restante equipa do
seu centro de psicologia, o PIN
Progresso Infantil. E isso inclui
consultas à distância, por compu-
tador. “Há um conjunto de regras.
Ser no sítio da casa onde se tem
um número reduzido de itens pes-
soais, as pessoas apresentarem-se
vestidas de maneira profissional.
O técnico tem de dar as consultas
em tempos em que os filhos ou
outras obrigações familiares não
interfiram.”

Vamos demorar tempo a perce-


ber as consequências desta coisa
nova de ficar semanas e meses
fechados em casa?
Para já é uma situação completa-
mente nova, nunca foi experimen-
tada por gerações. Outro aspeto é
a incerteza que ainda está instala-
da sobre a duração e o impacto
socioeconómico. E depois há um
outro aspeto crucial, que é surgir
num contexto de desenvolvimento
tecnológico novo. Creio que é
impossível alguém afirmar com
honestidade intelectual quais vão
ser as consequências.
Quando diz desenvolvimento
tecnológico novo, está a referir-
-se ao ensino à distância?
Apesar de as pessoas estarem dis-
tantes fisicamente podem conti-
nuar em contacto social, ainda
que virtual. É uma clausura, mas
com meios de comunicação. Por
outro lado, há uma abundância de
comunicação que é uma espada
de dois gumes – pela chuva de in-
formação, mas também pela alter-
nância entre a esperança e a Q

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Q desilusão que se vão seguindo


dia após dia.
Perspetiva alguma alteração
nas famílias? Ou será algo
apenas de curto prazo?
Tenho alguma dúvida que para
a generalidade das pessoas tenha
DOSSIÊ

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j
O médico diz que
as aulas à distân-
cia mostram uma
diferença de sta-
tus entre os estu-
dantes. Isso pode
ser um problema

algum efeito duradouro. Há dois


polos. O número de vítimas de
violência doméstica sobe consi-
deravelmente, alguns números
apontam até 30%. A ansiedade
em relação ao futuro económico,
o desemprego e tudo mais, pode
ser muito mau. Mesmo o abuso de
crianças naturalmente vai crescer.
Que tipos de abusos?
Todos. Uma em cada quatro rapa-
rigas nos EUA é vítima de abuso
sexual quando chega aos 18 anos e
o agressor é com frequência um
membro da família. O empobreci-
mento, a dificuldade de deslocação
ou de arranjar alojamento alterna-
tivo aumenta a violência domésti-
ca. Há um lado negro da epidemia.
Por outro lado, cria oportunidades
de as pessoas terem as refeições
juntas, dia após dia, fazerem mais
jogos em conjunto, os pais ajuda-
rem mais nos trabalhos de casa e
na aprendizagem. Portanto, depen-
dendo das famílias, vai criar apro-
ximações, noutros casos mais dis-
torções e mais conflito.
Que comportamentos são sinais
de que uma criança está a ficar
saturada do isolamento?
Irritabilidade, alterações do sono,
alterações do apetite, ataques de
pânico, perguntas sistemáticas e
repetitivas relacionadas com o
bem-estar, angústia em relação ao
que pode acontecer com pessoas pais controlarem a sua ansiedade seja adequada à idade da criança.
que são próximas, nomeadamente – os miúdos têm antenas muito Manter na medida do possível a
os avós, e medos de separação, sensíveis para aquilo que se passa serenidade dentro de casa. Colo-
mesmo dentro de casa. Diria que com os adultos. Outro aspeto é car as crianças na criação daquilo
são alguns dos sinais. manter as rotinas, sobretudo horas que é um ambiente seguro, fazer
Qual é o mais preocupante? das refeições, banho e atividades crer que também estão a ajudar
Diria que os ataques de pânico são tão parecidas quanto possível com quando lavam as mãos com cui-
mais portadores de sofrimento, F o que se fazia antes da epidemia. dado, que tomam precauções e
até porque eventualmente têm “O ensino Depois, haver limites para o tem- que o facto de estarem em casa e
outras manifestações somáticas e à distância po em que se vê notícias e em que não poderem estar com os amigos
podem levar os pais a uma situa- veio trazer se tem conversas sobre a epide- é a sua colaboração para o bem-
ção complicada de decisão: levo um certo mia. Na presença das crianças -estar de todos.
ao hospital ou não levo. As pes- alívio aos evitar conversas de adultos em Que faixa etária pode ser mais
soas não o querem fazer agora. alunos com relação à estabilidade económica suscetível de desenvolver
O que é que os pais podem fazer? défice de e financeira da família. Depois, in- sequelas deste isolamento?
Primeiro, diria que os próprios atenção” formar com verdade de forma que Diria que a adolescência, porque

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há um conjunto de coisas que pro- têm sentido um certo alívio. Evi- Há algum tempo saiu um artigo no
vocam desilusões significativas. dentemente que miúdos com hi- The New York Times [College ma-
Miúdos que fazem anos nesta altu- peratividade, sobretudo mais pe- de them feel equal. The virus ex-
ra e não podem celebrar com os quenos, em apartamentos com posed how unequal their lives are;
amigos. As viagens de finalistas. pouco espaço e muitas pessoas, o A faculdade fê-los sentirem-se
Há um conjunto de perdas. Depois caso muda de figura – ao haver Passeios iguais. O vírus expôs como as suas
uma certa ansiedade, que é curio- mais confinamento há também higiénicos? vidas são desiguais] que mostrava
sa, que tenho vindo a assistir, que mais probabilidade de conflito. Sim, mas como as videoconferências reve-
se prende com a criação de grupos As crianças devem continuar a com cautelas, lavam as diferenças de status
– como acontece nos recreios, sua medicação nesta altura? especialmente entre estudantes. Isso é um pro-
mas desta vez de forma virtual. Há miúdos para quem, em período adolescentes. blema real, faço muitas consultas
Será que me convidam para o gru- de férias, não fará sentido serem “Têm enorme por Skype e percebo como um
po de WhatsApp da turma ou não? medicados – aqueles que são dificuldade enorme número de pessoas prefe-
Ou do grupo mais popular. Esse predominantemente atentos, sem em cumprir o re meios mais simples como o
tipo de exclusões ou integrações é grande agitação motora e sem distanciamento WhatsApp. Mesmo tendo o Skype
interessante. Outros casos, e estou grande impulsividade. Outros, em social” instalado, torna-se difícil, não es-
a pensar na minha filha, que tem que além dos aspetos da atenção, tão habituados. Há uma certa ver-
14 anos, que diz que sente que isto a agitação motora e a impulsivida- gonha de não conseguirem domi-
é a antecipação de um mundo que de podem ser fatores altamente nar as tecnologias, estamos a falar
os adultos denunciavam com as perturbadores para o próprio, que de pessoas de classe média. Se eu
alterações climáticas, com o au- muitas vezes se sente pouco capaz pensar nas minhas famílias do in-
mento da temperatura, em que as de se autocontrolar e de gerar terior, do Alentejo, Beiras, nas do
pessoas tinham de se proteger. enormes tensões dentro da família. Norte, têm imensas dificuldades
Isso gera muita angústia. Em todas As crianças medicadas devem e isso provoca uma grande
as idades isto provoca medo, re- ter ensino à distância diferente? desigualdade de oportunidade.
ceios, ansiedade. Depois há fatores O problema do ensino a distância Está em teletrabalho?
de ordem individual, porque há é muito semelhante ao do ensino Estou, tal como toda a minha
miúdos mais suscetíveis de sentir em geral: é praticamente impossí- equipa. Evidentemente que houve
stress e ansiedade. vel individualizar estratégias. Mas uma quebra significativa no núme-
Quando isto tudo passar, podem em termos teóricos, naturalmente ro de consultas. Mas não é igual
ficar traumas como medo de ir à as crianças com défice de atenção para todas as faixas etárias. Os téc-
rua, ou comportamentos obses- deveriam ter sessões mais curtas, nicos que trabalham com adultos
sivos como a lavagem das mãos? com mais espaço de recuperação. Consultas mantiveram a lista intacta. Quem
Seguramente isso é possível, mas Há relatos de alunos que estão a online trabalha com adolescentes teve
acho que seria mais a exacerba- ter muito melhores resultados Em 2019, o uma quebra mínima. Com crianças
ção de traços pré-existentes para no ensino à distância. Isso sur- centro de Nuno muito pequenas, aí torna-se mais
os quais esta situação será um ga- preende-o? Lobo Antunes difícil, mas mesmo assim há mui-
tilho. Mas sim, antecipa-se que Posso imaginar que possa haver acompanhava tos que se mantêm através do
em crianças com personalidades maior suporte da parte dos pais. à distância 682 apoio de suporte aos pais.
obsessivas, possa haver um acrés- Talvez alguns se sintam mais pessoas (sobre- Sente que se está a exigir aos
cimo de perturbações dentro da atraídos pelo trabalho através das tudo crianças e adultos a mesma produtividade
linha obsessivo-compulsiva. novas tecnologias. Se me pergun- adolescentes) em teletrabalho e que isso está a
Doenças como o défice de aten- tar se vamos passar para um ensi- gerar irritação e frustração?
ção podem ser potenciadas pelo no à distância, não acho, porque Tenho falado com muitos pais que
ensino à distância, por os alunos as pessoas sentem falta do con- estão em teletrabalho, é muito
estarem a ter uma aula fora do tacto físico, pessoal, sobretudo os difícil, às vezes têm de fazer uma
ambiente de escola? adolescentes. Sinto que começa a gestão em que cada um dos côn-
Nem tanto. As exigências de con- haver uma saudade, um desejo juges se responsabiliza uma parte
centração, de obediência a estru- que acabe rapidamente para se do dia pelas crianças e o outro na
turas rígidas, elementos distrato- poderem abraçar. A escola não é outra parte. Ainda estamos num
res (conversas com outros cole- só o ensino, é também convívio, F certo princípio, há um período de
gas), exigências de controlo, tudo interação social, crescimento “Há uma adaptação aos confinamentos. Há
isso é bastante menor. Portanto, interpessoal. O que se passa no ansiedade quem defenda que só ao fim de
estão a funcionar num ambiente recreio é tão importante para a virtual. três meses é que as pessoas estão
onde o nível de exigência e de formação dos jovens e das crian- Será que verdadeiramente adaptadas a um
focagem é menor. Com bastante ças como é o tempo de aula. me convidam novo estilo de vida. Isso é muito
mais descompressão, diria. Por- Muitas crianças não têm com- para o grupo tempo. Portanto ainda estamos
tanto não tem sido um problema, putador. Vamos ter muitas de WhatsApp longe de percebe as consequên-
pelo contrário, bastantes miúdos estigmatizadas? da turma?” cias desta nova forma de viver. W

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HISTÓRIAS DE VIDAS EM SUSPENSO

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Diário
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Coron s do
avírus
São 15 toneladas de flores deitadas ao lixo
todas as semanas, conta Sofia. A sua empresa
Sofia, 32 ANOS, FLORISUL não tem a quem as vender. Já Joaquim parou
AS FLORES NÃO ESPERAM POR MELHORES DIAS
de fazer móveis à espera de melhores dias.
h Quando vi os vídeos das flores a irem para
o lixo… emocionei-me bastante. Chorei. Era um Só Luís continua a construir moradias e Tiago
camião carregado. Para ter uma ideia, estamos não parou de estudar e pode ter de voltar às
a deitar fora 15 toneladas de flores por sema-
na. Deitamos num aterro no nosso terreno. aulas presenciais. Como a pandemia mudou
Custa muito. Ainda por cima estamos na o dia a dia destas quatro pessoas. Por Vanda Marques
primavera e as estufas estão lindas. A flor
está na sua melhor qualidade… Mas não
temos outra hipótese.
O meu avô começou a empresa há 51 anos.
Era uma coisa pequena e mais tarde mudou-se
para o Montijo. Hoje em dia faturamos cerca de à mão de 250 mil pés, por semana. Não pode-
5 milhões de euros por ano. Mas as coisas es- mos dispensar os funcionários porque o traba-
tão complicadas. Para a minha mãe é difícil ver lho é o mesmo. Desde 1 de abril que temos
o que o pai construiu assim… Ela tem receio de os trabalhadores em lay-off parcial. Ou seja,
que não se consiga levar tudo a bom porto. só trabalham da parte da manhã.
Ainda pensámos em não destruir as flores, Ainda temos alguns clientes, mas são poucos.
mas implica logística, gastos e não só. As doa- Temos uma faturação de 10% porque só aque-
ções iriam promover a deslocação das pes- les que já trabalhavam online é que continua-
soas e não é isso que se quer agora. Já fize- ram. O resto parou. As floristas fecharam a porta.
mos alguns donativos para lares. Mas com to- As igrejas estão fechadas e não há procissões.
dos os cuidados, ou seja, veio cá a diretora do Também não há casamentos nem funerais...
lar e levou as flores. Nunca tivemos uma situação assim. Nem na cri-
Como isto não é uma fábrica, não podemos se. Nessa altura, houve uma quebra, mas era di-
parar de apanhar as flores. Temos 25 tipos, en- ferente. Por exemplo, em vez de se oferecer um
tre rosas, gerberas, margaridas e tulipas. Se perfume, dava-se dois pezinhos de flor. Ou en-
não as apanharmos, vamos prejudicar a planta tão, não se comprava um ramo de 40 euros,
da qual nascem. Por isso, mesmo que seja mas um de 10. Agora não há prendas… Há dias
para deitar fora, não podemos parar como em que estamos com mais ânimo, outros em
uma fábrica. Continuamos a fazer a apanha que entra o desespero. Mas isto há de passar.

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Joaquim, 58 ANOS, ADMINISTRA-


DOR DA ANIMOVEL
ESCOLHER O LAY-OFF
h Nunca é uma decisão fácil de se tomar.
Isto mexe um bocado com a pessoa. Mas ti-
nha de ser eu a comunicá-la. Nos dias ante-
riores estava preocupado: e se uma pessoa
fica infetada? Tivemos reunião de administra-
ção e decidimos o que fazer. Expliquei a to-
dos os 80 colaboradores que o mais impor-
tante é não termos ninguém doente. Além
disso, disse-lhes que se seguíssemos o cami-
nho que estávamos a traçar – de meter férias
para assegurar os vencimentos no fim do
mês e depois passar para o lay-off – a em-
presa ia conseguir manter-se sustentável.
As pessoas aceitaram bem. Até porque
a partir do momento em que tínhamos
material para sair – dois camiões
cheios e parados – e os nossos clien-
tes estavam todos fechados não ha-
via alternativa. Somos uma empresa
(de móveis) com 95% de exporta- Tiago, 17 ANOS , ESTUDANTE DO 12.º ANO
ções. Desde o dia 1 de março que FICAR À PORTA DA FACULDADE?
me comecei a aperceber de que h Estou muito frustrado porque o Governo
isso ia acontecer. Os países mudou as regras a meio do jogo. Achava que
para onde exportamos – Fran- podia fazer melhoria das notas para subir a
ça, Suíça, Bélgica, Luxemburgo minha média e, a três meses de o fazer, tro-
– estavam a fechar. Luís, 41 ANOS, PEDREIRO E SÓCIO-GERENTE caram-me as voltas. Investi tempo e dinheiro
Sou administrador desta em- DA EMPRESA LUÍS M. DIAS e não o posso fazer. Tenho média de 17,5,
presa há 20 anos e já temos MAIS FALÊNCIAS DO QUE MORTOS mas preciso de mais de 18 para entrar em
passado por muitas coisas, h Não parei de trabalhar, até porque não pos- Medicina. Vou fazer exames de Física e Quí-
mas isto nunca me passou so trazer a obra para casa. Temos de ir. O betão mica, de Biologia e Geologia e de Matemáti-
pela cabeça. Em 2008, com a nunca parou. Trabalho como pedreiro há 21 ca A, que são de ingresso na faculdade. Mas
crise, quando a coisa começou anos, tenho um negócio próprio há 11 e faço estas notas deixaram de contar para a minha
a correr mal aqui dentro fomos moradias há três anos. Subcontrato trabalhado- média interna. Ou seja, esta alteração – an-
para fora. Agora desta vez só se res e não notei grandes mudanças. Estou a tra- tes contavam – faz com que a minha média
formos para a Lua. Porque é o balhar em duas moradias e não parei. Só outra interna [média do secundário] não possa ser
mundo inteiro nesta situação. obra está mais demorada para arrancar porque alterada se tiver melhores notas nos exames
Nós estamos com esperança de o banco está atrasado a aprovar. Tirando isso, do que na disciplina. Conheço mais colegas
que as coisas vão melhorar. Se tudo normal. Quando disserem para parar, aí na mesma situação e eles criaram uma peti-
houver uma vacina, isso dá mais paramos. Até lá temos de aguentar. Só noto ção que também já assinei. Já temos mais
confiança às pessoas. Mas repa- menos pedidos de orçamento. de 7 mil assinaturas e espero que chegue
re, o mobiliário não é um setor Na obra, temos o cuidado de não estarmos ao parlamento. Esta medida desvaloriza o
de primeira necessidade. Não sa- sempre juntos. Mas não precisamos de andar a esforço dos alunos.
bemos como as pessoas vão reagir aquecermo-nos uns nos outros, não é? Somos Tenho tido aulas online e acho que vamos sair
depois disto acabar. Agora vou pôr quatro a seis pessoas na obra e fazemos nove prejudicados. Sinto que a matéria está menos
10 pessoas a trabalhar, para reorgani- horas por dia. No carro só vão dois, por exem- consolidada. O nível de concentração em aulas
zarmos a empresa, e espero que em plo. O resto vai lá ter de transportes públicos. online não é o mesmo. Estou à espera de ter
maio isto melhore. Já tenho clientes na Quando chego a casa, tenho o cuidado de aulas presenciais de Português e Matemática
Suíça a pedir material. Tenho esperan- deixar a roupa numa zona à parte, mas isso já em maio. Não é fácil estar em casa e não ver
ça, mas estou apreensivo. fazia. De outro modo sujava tudo. Não me as- os amigos. Falamos muito nas redes sociais.
susta ficar doente. Se tiver de apanhar, aconte- Mas é outra realidade.
ce… Não conheço nenhum colega que tenha Também tenho ajudado a tomar conta da mi-
estado doente. Ouvi falar de um – estou sempre nha irmã de 3 anos, porque os meus pais estão
a tentar ouvir as histórias para saber como es- em teletrabalho. Não é fácil… O espírito é de
tão as coisas – mas deu negativo. Sabe, no fim desânimo por causa destas mudanças. Se só
disto tudo vai haver mais falências do que mor- contar a prova de ingresso à faculdade, não sei
tos. Eu já sobrevivi a uma crise e sei trabalhar. se é suficiente para conseguir entrar… E não é
Acho até que esta situação veio fazer uma lim- justo mudarem as regras.
peza, porque andavam por aqui muitos a achar
que este negócio era só mel. Assim, espanta al-
gum pessoal indesejável da construção.

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ugue, id tempus
dolor. Etiam orci
magna, euismod
eget tempus sed,
congue id mau-
ris. Nunc gravida
sem
MIGUEL BALTAZAR

REPORTAGEM. A VIDA DOS PROFISSIONAIS QUE LUTAM CONTRA A COVID-19 sobre a pandemia deixam-no mais

ISOLADOS DA
ansioso (já lhe basta a dureza do
serviço de Medicina Intensiva); e
tenta reviver os tempos de profes-
sor de educação física aos 20 e

FAMÍLIA EM HOTÉIS
poucos anos. “Faço aulas diárias
por videochamada, com quatro
amigos e duração de 30 minutos.
São boas para a mente”, conta à
SÁBADO, enquanto levanta pesos
Para reduzir o risco de contágio, a enfermeira Ana Moreira deixou de dois quilos cada.
a filha, de um ano, com o marido. Já a mulher de Carlos Nogueira,
“Estou motivado”
professora, passou a gerir a família sozinha. Por Raquel Lito Dali só sai para ir buscar o peque-
no-almoço ao hall, cortesia do ho-
tel (devidamente embalado por
doses, com película aderente): há
snacks fitness, fruta, fatias de pão

A
bolha de isolamento fa- “VOU ESTAR forma Rooms Against Covid para de ló, croissants e sandes. Da má-
miliar de Carlos Nogueira AQUI UM oferecer alojamento a profissionais quina de café por cápsulas retira a
é alcatifada, com 28 m2 MÊS, TALVEZ de saúde –, o enfermeiro de 51 anos melhor parte da refeição, segundo
de cores suaves que o MAIS”, PREVÊ sente-se confortável (e dorme bem). o próprio. Leva o tabuleiro para o
ajudam a recarregar baterias para O ENFERMEI- Fora dos turnos de oito horas a quarto, com a rádio a passar um
“a missão”: o combate ao novo co- RO CARLOS acompanhar os casos mais críticos hit da sua adolescência: Purple
ronavírus. Naquele quarto, um dos NOGUEIRA, da Covid-19, no Hospital de Santa Rain (1984), de Prince.
40 do 15º piso do Marriott Lisboa – INSTALADO Maria, é ali que escreve à mão umas Raramente se cruza com alguém
o hotel de quatro estrelas entrou em NO MAR- quantas reflexões sobre o contexto; no corredor, onde estão alojados
lay-off e desde abril está na plata- RIOTT vê televisão q.b., porque as notícias mais 14 profissionais de saúde do

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co que adere ao sistema de ensino MARTA – mas protege-se. A assistente


online. Emociona-se ao falar dela: RATINHO É operacional (antes designada au-
“Tem sido uma valente, está lá com ASSISTENTE xiliar de ação médica) das urgên-
eles e gere tudo sozinha.” OPERACIO- cias do hospital de São José, 23
Enfermeiro com 25 anos de expe- NAL EM SÃO anos, sabe de cor o processo do
riência – lidou com a gripe A e Le- JOSÉ. SAIU põe-e-tira do equipamento de
gionella –, Carlos refere que o DE CASA proteção individual (EPI), enquan-
novo coronavírus é pior e o afasta- PARA to aponta para a testa: “Notam-se
mento da família um mal necessá- PROTEGER as marcas da viseira.”
rio para protegê-los do eventual A MÃE, Meticulosa sem saltar etapas (ao
contágio. Optou pelo hotel mais ASMÁTICA mínimo descuido, sobretudo a re-
próximo do hospital para onde foi tirar o EPI, pode ficar infetada),
transferido (veio do Pulido Valen- Marta revela a maior preocupação:
te), de modo a reforçar as equipas a mãe, asmática, assistente opera-
j Covid. A mudança hospitalar e de cional no Curry Cabral, hospital
O enfermeiro teto deu-se no início de abril. Elo- número um no combate à Covid-
Carlos Nogueira,
51 anos, aproveita gia o imponente lobby – apesar das -19. “Quis protegê-la. Sinto-me
as pausas no luzes apagadas para poupança de mais segura assim.”
hospital de Santa energia – e o conforto das instala- “Assim” significa o isolamento de
Maria para o
exercício físico e a ções. As refeições compra-as fora: Marta num hotel a 500 metros do
escrita. Está no “Encomendo num restaurante da São José, o My Story Hotel Tejo (a
Marriott Lisboa Pontinha, onde o meu primo é só- acolher 11 profissionais do referido
cio-gerente. Como peixe, carne as- hospital e à espera de mais quatro,
sada, bacalhau assado.” Elmar através do Rooms Against Covid ),
Bem nutrido e hidratado, resiste Derkitsch desde 31 de março. Ali montou es-
melhor às maratonas de pé com o O Marriott taminé com micro-ondas para
fato de proteção, enquanto regista Lisboa mantém aquecer refeições. O minibar con-
as frequências cardíacas, respira- 35 elementos serva iogurtes, queijo, fruta e a co-
tórias e avalia o estado neurológi- do staff em mida caseira que recolhe – de fu-
co dos ventilados (se estão reativos funções (de um gida e com precauções – na casa
ou não). Uma parte dos 11 interna- total de 250). O da mãe e na de uma amiga em
mesmo hospital (vão chegar 10 nos dos está em coma induzido. “Eles diretor do hotel Odivelas. Reveza-se nos menus
próximos dias). “Vou estar aqui um não estão sozinhos. Desde que eu frisa: “Podemos com a colega do quarto ao lado, de
mês, talvez mais.” E sublinha: estou lá, tivemos 16 doentes e cin- ajudar” quatro em quatro dias: “Na Páscoa,
“Estou motivado. Tenho empenho co deles foram transferidos em comemos cabrito feito pelo irmão
em prol do que é necessário.” respiração espontânea.” dela.” Mas no topo das preferên-
Mais difícil é estar longe dos filhos Já Marta Ratinho garante à SÁ- cias estão as sopas, os purés de le-
adolescentes (de 15 e 18 anos) e da BADO não ter medo do vírus (fez gumes da mãe.
mulher, professora do ensino bási- o teste a 3 de abril e deu negativo) Comidas pastosas são o prato do

10
euros
dia dos doentes: Marta dá-lhes as
refeições, muda-lhes as fraldas e
repõe o material (agulhas, sistemas
Comparticipa- de soro) na prestação de auxílio
ção do Turismo aos enfermeiros. Daqui o seu senti-
de Portugal por do prático, que aplica no quarto de
cada diária de hotel. Limpa-o duas vezes por se-
hotel aberto mana e muda a roupa da cama.
para esta Nestas circunstâncias, a maioria
finalidade dos hotéis protocolados para o
efeito incumbe os hóspedes da
limpeza dos quartos. Estes deixam
a roupa suja à porta, em sacos se-
lados; o staff recolhe-os e entrega,
j do mesmo modo, a lavada. “As su-
A assistente jas vão para a lavandaria a tempe-
Marta Ratinho, raturas elevadas. Temos dispensa-
23 anos, trouxe dores de gel desinfetante em todas
o micro-ondas de
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casa para aque- as áreas afetas à circulação de


cer as refeições hóspedes, no total são 30. A Pa- Q

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j
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Sofia Silva,
com suspeitas.” Equipada com o
fato descartável, sente os movi-
41 anos,
mudou-se para mentos comprometidos – o que lhe
o Marriott a 7 de dificulta as tarefas. “Imagine tirar a
abril. É assistente tensão [arterial] a um doente e ter
em Santa Maria
uma máscara, um avental, dois pa-
res de luvas, uma bata, uns óculos,
uma viseira.” Por isso, quando se
desinfeta, sai do serviço e regressa
ao hotel sente-se exausta. “Às

140
Quartos
vezes até adormeço sentada. Não
estar preocupada de contaminar
alguém é um descanso.”
Disponíveis Foi o receio de pôr em perigo
para profissio- dois familiares com quem partilha
nais de saúde um T4 que a levou a isolar-se no
Q daria Portuguesa oferece sandes em três hotéis hotel, desde 6 de abril. “A minha
e croissants, vamos buscá-los às Operação em rede do Porto; mais vida mudou, é muito difícil para
8h e deixamos junto da máquina 175 em aloja- mim saber os dias da semana. Es-
Rooms Against Covid faz a
de café”, explica o diretor de ope- mentos locais tou em Santa Maria há uma sema-
ponte entre hotéis e hospitais
rações da rede My Story Hotels, da cidade, na, vim do Pulido Valente.” Sem fi-
Alfredo Tavares. A supervisora de A plataforma online segundo a lhos e sem namorado, a profissio-
copa do Marriott, Alexandrina Rooms Against Covid foi criada autarquia nal de saúde leva o isolamento à
Brás, da equipa (35) que se man- pelo #tech4COVID19. A Associa- letra e há dois meses que não vai
tém em funções prevê mudanças ção da Hotelaria de Portugal à terra natal, em Castelo Branco.
no serviço de pequenos-almoços: (AHP) juntou-se à iniciativa para “Sinto muita falta da família, mas
“Teremos de adaptá-los com do- a operacionalizar: faz a ponte esta é a minha profissão.”
ses mais individuais. A Covid trou- entre os hotéis disponíveis (60)
xe o medo.” Elmar Derkitsch, dire- e os pedidos dos hospitais. “Te- Músicas e vídeos de motivação
tor-geral do Marriott mostra os mos 150 quartos ocupados”, diz Cada porta do corredor do piso
avisos na ala exclusiva a estes hós- à SÁBADO Cristina Siza Vieira, dois do hotel Vila Galé Ópera, em
pedes: “Higienize as mãos antes de CEO da AHP. Alcântara, tem um papel afixado
utilizar a estação de buffet; evite com a função do hóspede: há o
tossir; coloque a loiça suja no local serviço de urgência Covid (porque
designado.” Assegura que quando Alfredo o profissional de saúde hospedado
terminar o protocolo – não há da- “Falo com eles por videochamada”. Tavares trabalha na área); o intensivos Co-
tas concretas, provavelmente no Mas durante o fim de semana, nas É diretor de vid (pelos mesmos motivos); a enó-
fim de maio –, a zona será vedada folgas, abre exceção ao confina- operações da
“para limpeza geral, com uma em- mento de hotel. Regressa a casa rede My Story
presa especializada”. para estar com o namorado, tam- Hotels. O maior
bém ele profissional de saúde. que têm na
Escapes com treinos online Não levar trabalho para casa é o Baixa (My Story
Sofia Silva, 41 anos, é assistente lema de Ana Margarida. Assim que Hotel Tejo)
operacional na área da saúde e sai do hospital de Santa Maria serve São José h
vive em Setúbal, perdendo mais de desliga mesmo: vai correr nas Os enfermeiros
três horas diárias em transportes imediações, em circuitos de 40 Ana Moreira e
Pedro Almeida
públicos para chegar ao hospital de minutos; às compras de fruta no no lobby do
Santa Maria. Dias depois do Mar- supermercado perto do hotel Mar- “SE ME DIS- hotel Vila Galé
riott abrir portas aos profissionais riott, onde está instalada; ou faz SESSEM HÁ Ópera. Pedro
compõe e toca
de saúde envolvidos no combate treinos online de GAP (exercícios DOIS MESES
ao coronavírus, a 7 de abril mu- para glúteos, abdómen e pernas), QUE IRIA
dou-se para lá. Além de estar a 850 durante uma hora. Importante é DEIXAR A
metros do trabalho, protege a mãe, ocupar a cabeça, salienta. MINHA FI-
que é de um grupo de risco (diabé- Aos 26 anos, a enfermeira para a LHA, DIRIA:
tica). “Somos vizinhas, coloco as área Covid (nas urgências com 17 ‘JAMAIS’”,
compras no elevador e ela retira-as camas de divisórias) orgulha-se do DIZ ANA MO-
com cuidado, de luvas”, conta. trabalho na primeira etapa, de ras- REIRA, EM
VITOR CHI

Os filhos, de 17 e 21 anos, estão treio: “Estamos oito horas por dia ISOLAMEN-
em casa do pai (Sofia está separada). a receber doentes confirmados ou TO FAMILIAR

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g de Pedro Almeida, da mesma idade


ugue, id tempus de Ana e com a função de gestor
dolor. Etiam orci
magna, euismod Team Covid afixada à porta do
eget tempus sed, quarto. Por precaução saiu de casa,
congue id mau- porque vivia com uma amiga as-
ris. Nunc gravida
sem mática. É enfermeiro com 10 anos
de experiência, mas também músi-
co, fotógrafo e dinamizador de
equipas nas horas vagas. “Tentar,
cair, levantar, recomeçar. Nunca
desistir. Juntos somos mais fortes”,
é uma das frases motivacionais que
repetem. Leem-nas no terraço do
piso térreo do hotel, espaço amplo
com vista para a ponte 25 de Abril.
Ao fundo da receção impõe-se
um piano de cauda que não inti-
mida Pedro. O enfermeiro faz um
pequeno recital, em rigor de uma
só música que canta com entusias-
mo. It’s Gonna Be Okay é um hino
à resiliência. Anda a compô-lo
com calma. “Estou a trabalhar na
j letra quase desde que entrei para
FOTOS MIGUEL BALTAZAR

Ana Margarida, aqui, a 25 de março.”


26 anos, enfermeira
no hospital de Santa As áreas de circulação do Vila
Maria, está no hotel Galé Ópera são limitadas para os 20
Marriott desde o dia 6 hóspedes (dos hospitais São Fran-
cisco Xavier, Fernando Fonseca,
Hospital da Luz, Egas Moniz), à se-
loga Covid (trouxe vinho); a ioga renciados em Lisboa para o com- APÓS O SER- melhança dos outros hotéis. Só um
Covid (a mais zen); ou a cabeleirei- bate à pandemia) corta e pinta o VIÇO, ANA elevador está em funcionamento e
ra Sissi Covid, entre outros. De ca- cabelo às colegas ali instaladas. MARGARIDA o spa foi fechado. Mas há um bó-
belos percebe Ana Moreira, de 32 “Tenho tesouras e um secador CHEGA nus, enfatiza o diretor Luís Simões:
anos, que a par da carreira de en- profissional que seca num minuto, EXAUSTA AO “Disponibilizámos algum equipa-
fermagem que exerce no hospital porque a minha mãe é cabeleireira HOTEL: “ÀS mento do ginásio – bicicleta, halte-
São Francisco Xavier (um dos refe- e tem um salão”, conta. VEZES ATÉ res, máquina de remos –, numa
Esta é a parte divertida, que con- ADORMEÇO sala à parte só para eles. Têm ido,
trapõe à dolorosa: estar longe da SENTADA” são eles que higienizam o espaço.”
filha (fez 1 ano na passada sexta- Pedro Almeida pratica ali remo,
-feira, dia 17). “Se me dissessem há bicicleta e levanta uns pesos. “É
dois meses que iria deixar a minha importante para libertarmos ener-
filha, respondia: ‘Jamais.’ No entan- gias, porque o stress é muito”, ex-
to, foi uma decisão difícil mas to- plica. Garante ainda, até à data de
mada rapidamente.” fecho desta edição: “No nosso ser-
Tem sido penoso para a família, viço não temos ninguém do pes-
mas como tantas outras mães em soal que tenha sido infetado.”
situação semelhante, não se arre- No início era o medo, agora é o
pende de ter saído de casa. Tenta espírito de equipa que prevalece:
resguardá-los desde 16 de março, “Para conseguirmos ultrapassar
dias antes de conseguir hotel. “Fui isto e estarmos bem.” Ana acres-
para casa de uma amiga e colega. Luís centa: “Somos um bocadinho aqui
O marido dela foi para a mãe dele Simões os impulsionadores, mas às vezes
com o bebé. O meu foi para casa da O diretor do Vila apetece-me estar na minha bolha.
minha mãe com a bebé”, recorda. Galé Ópera tem Sentimos que as pessoas nos pro-
Ana compensa a distância de casa 25 quartos para curam muito para isso.” Pedro re-
com a proximidade aos colegas. profissionais de mata: “Porque veem a energia po-
Foram chegando ao hotel gradual- saúde, 20 deles sitiva. Só assim vai resultar, se esti-
mente, agora são 14 pelas contas ocupados vermos aqui nervosos é pior.” W

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DESIGN. CHAVES COM 1,5 METROS E GUARDANAPOS FEITOS DE MASSA


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COMER COM GARFO ERA PECADO OVID 9

A maioria dos objetos que tem em casa nestes tempos de quarentena (e não só)
tem uma história curiosa associada – estas são apenas algumas.
Por Sónia Bento

q
Chaves
As chaves nem sempre couberam
num bolso. As que abriam as enor-
mes portas de mármore e bronze
dos gregos e egípcios podiam atin-
gir um metro e meio de compri-
mento, e eram tão pesadas que se
carregavam por cima do ombro.

q q
Garfo Colchão
O utensílio com que come- Os romanos, que viviam com extra-
mos todos os dias já foi con- vagância, eram surpreendentemen-
siderado imoral, anti-higié- te espartanos quando se tratava
nico e uma ferramenta do dos seus quartos. Os pobres dor-
q diabo. Os primeiros garfos miam num colchão de palha que
Guardanapo de jantar foram usados pela encaixava numa moldura simples
Os primeiros guardanapos eram classe dominante no Médio de madeira. Os ricos tinham uma
pedaços de uma massa macia cha- Oriente e no Império Bizan- ficaram chocados e, armação em bronze ou prata, com
mada apomagdalie, usada na tino. Em 1004, Maria quando, dois anos de- um colchão de lã ou penugem. A
Grécia antiga. A massa era cortada Argyropoulina, sobrinha do pois, Maria morreu, víti- cama ficava num quarto a que cha-
em pequenos pedaços e enrolados imperador bizantino, que foi ma de peste, São Pedro mavam cubículo, um espaço
e amassados à mesa, para limpar a casada com o filho do doge Damião sugeriu que ela pequeno com janelas minúsculas
gordura dos dedos. No final da de Veneza, trouxe consigo tinha sido castigada, pelos que deixavam entrar pouca luz.
refeição eram atirados aos cães. um pequeno estojo de seus modos luxuosos e de
garfos dourados de duas não se dignar a tocar na
pontas, que usou no comida com os dedos, e
banquete do seu casa- proclamou que comer com
mento. Os venezianos garfo era castigo de Deus.

q
Prato
Na época medieval, em toda a Euro-
pa, os “pratos” eram cortados a par-
tir de grandes e redondos pães de
trigo, envelhecidos durante quatro
dias. Terminada a ceia, os que fica-
vam inteiros eram entregues aos
necessitados ou dados aos cães.

A
norte-americana Amy por dia já foi abominável, visto
Azzarito, especialista em OS EXCÊN- como um implemento do diabo”,
história do design, conta as q TRICOS diz a autora à SÁBADO que,
histórias curiosas por trás de obje- Toalha de mesa ROMANOS ao fim de dois anos e meio de
tos domésticos comuns, no seu li- Para os cavaleiros e as suas damas, o DORMIAM pesquisa, reuniu para este livro
vro The Elements of a Home. bom linho era sinal de estatuto social NUM CUBÍ- mais de 60 curiosidades sobre os
e mesmo as classes mais baixas
“A história do garfo é uma das mi- cobriam a mesa com uma toalha CULO ONDE objetos que utilizamos há séculos.
nhas favoritas. Este objeto de que branca porque se acreditava que os SÓ CABIA Esta é a seleção feita por Amy
nos servimos duas ou três vezes panos coloridos tiravam o apetite. A CAMA Azzarito. W

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Crónica www.sabado.pt
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SANTOS E...
Margaret Atwood, a jovem escritora canadiana pertencente ao maior grupo de risco deste
coronavírus (tem 80 anos), escreveu na velhinha Time a melhor imagem dos tempos que
O MORALISTA nos paralisam, um freeze-frame (na gíria do cinema chama-se, apropriadamente, um “para-
lítico”) da vida em suspensão: “Pensem em todas as coisas que têm esperança de que
Se a arte de amanhã tiver menos ainda existam no castelo do futuro enquanto saltam a cavalo para o outro lado de
sexo, desejo e fisicalidade do que a uma ponte movediça já erguida; depois de pensarem nisso, façam tudo o que
arte de ontem, poderá ser um espelho puderem, agora, para assegurar a existência futura dessas coisas.” Na lista
dos nossos cem dias de solidão, pessoal de iniciativas, a autora inclui entregas ao domicílio pelos seus
mas não fará justiça ao que fomos, restaurantes favoritos, encomendas online nas livrarias inde-
somos e queremos ser pendentes predilectas e assinaturas anuais das revis-
tas e jornais em que confia. Uma santa com
bons pecadilhos.

C a pop, o punk? Os quadros de Rubens ca para a temperatura Covid? Se Burt

A arte de amar encher-se-iam de esqueléticos queru-


bins e amantes por telepatia, O Beijo
Lancaster tivesse mantido a distância
de dois metros na fila para Deborah

à distância de Klimt terminaria com um juiz de


comarca a ordenar que a osculada se
atire do precipício para manter a cerca
Kerr em Até à Eternidade, a espuma
das ondas onde pasmosamente se en-
rolam seria hoje a espuma dos dias.
PARTINDO DO PRINCÍPIO de que sanitária, e os dedos humano e Divino O esquecimento é como uma troca
ainda haverá artistas daqui a um ano de O Dia do Juízo Final de Michelan- de papéis entre o passado e o futuro, e
(e espectadores com dinheiro para os gelo entrariam em estado de emer- a morte da sensualidade de um qua-
ver), como será a arte da pós-pande- gência depois de devidamente desin- dro ou de um livro é equivalente à
mia? Parem, olhem para trás e imagi- fectados com álcool-gel. destruição do Louvre ou ao incêndio
nem por segundos um mundo sus- Chega-se então à versão distópica de na Biblioteca de Alexandria. Se a arte
penso em confinamento retroactivo. O Ter Ou Não Ter de Howard Hawks, de amanhã tiver menos sexo, desejo e
Kiss de Prince transforma-se em com Lauren Bacall, sexy como uma fisicalidade do que a arte de ontem,
“Skype” (ou, na versão do émulo fadis- noite húmida de Julho, a suspirar o poderá ser um espelho dos nossos 100
ta de Herman José, “Instagrama-me “Basta assobiares” a um espavorido dias de solidão, mas não fará justiça ao
Todo”), o Every Breath You Take dos Bogart, que lhe responde, entredentes: que fomos, somos e queremos ser. E
Police converte-se em “Keep Your “O que querias que fizesse? Abraçar- talvez um dia todos os filmes desistam,
Fucking Social Distance” e o sensualís- -te?” Estaremos assim destinados a terminando em uníssono como E
simo Constant Craving de K. D. Lang versões curtas, censuradas ou alterna- Tudo o Vento Levou: “Frankly, my
renomeia-se “Constant Craving (For tivas do desejo, como descobre o cin- dear, I don’t give a damn.” W
Chocolat and Chips)”. Em que deserto quentenário Toto no clímax de Cinema
gelado dos sentidos jazeriam a Renas- Paraíso de Giuseppe Tornatore, imuta- Texto escrito segundo
cença, o Romantismo, o roman à clef, dos em totós, descendo da febre eróti- o anterior acordo ortográfico

Se não pode-
mos cair em indulgência e viajar até
Badajoz, Dubrovnik ou a Martinica, é sempre pos-
sível fazer excursões épicas a lugares que não existem.
Além da geografia de clássicos como A Ilha do Tesouro, de R. L.
Stevenson ou do acesso ao Dicionário de Lugares Imaginários de
Alberto Manguel, editado em Portugal pela Tinta da China, a empresa de
viagens e revista online Atlas Obscura sugere uma pesquisa prévia de mapas de
cidades, países e continentes fictícios, casos da célebre Terra de Oz de Frank L. Baum,
onde é impossivelmente possível passear no Reino dos Vegetais e na Nação das Gárgu-
las, ou da Ilha do Prazer dos Copos (este muito adequado ao nosso quotidiano), república
satírica engendrada por H. J. Lawrence nos momentos finais da Lei Seca nos EUA, com visitas
obrigatórias ao Estreito do Whisky ou ao farol da Ponta da Intoxicação.
C

...PECADORES
Jornalista
Pedro Marta
Santos

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h
Cândido Costa
fotografado para
a SÁBADO na
marginal do Fura-
douro. O ex-fute-
bolista, que com-
pleta 39 anos a 30
de abril, vive jun-
to àquela praia de
Ovar desde 1999

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FUTEBOL. AS HISTÓRIAS DE CÂNDIDO COSTA

“O BAÍA MANDOU-ME IR
LAVAR-LHE O PORSCHE”
Fartou-se de chorar ao ser rejeitado pelo FC Porto, mas vingou-se: foi campeão de juniores
pelo Benfica no estádio das Antas. Roubaram-lhe os dentes em Inglaterra. Fez o que lhe
diziam os ídolos. E foi “um burro” ao pedir a Mourinho para sair dos dragões. Por Carlos Torres

A
13 de março, Cândido Cos- “EU ERA O para uma realidade em que era o
ta estava nos Açores com a MAIOR DA troll; era gozado pela forma como
mulher, Cidália, quando se ALDEIA, MAS me vestia ou falava.” Com 16 anos,
começou a falar em decre- QUANDO FUI no liceu, conheceu Sandra, que iria
tar a emergência nacional. “Decidimos PARA LISBOA ser a sua mulher mais de 20 anos
interromper as férias. Curiosamente, PASSEI A SER (têm dois filhos). “Foi muito impor-
saímos de uma região onde não havia O TROLL. tante, porque ela, e a família dela,
um único caso de coronavírus e fomos ERA GOZA- ajudaram-me a manter um senti-
para o centro da epidemia”, conta à DO PELO mento de pertença.”
SÁBADO, por telefone, desde a sua SOTAQUE” Saiu do Benfica com 18 anos e mu-
casa no Furadouro, em Ovar – o con- dou-se para o Salgueiros, com a es-
celho esteve um mês em cerco sanitá- perança de seguir para o FC Porto –
rio. O antigo futebolista, de 38 anos, Jorge Mendes transferiu-o para os dra-
só saiu do concelho para ir com a g gões em seis meses. Houve um mo-
mulher, grávida de seis meses, fazer Vítor Baía mento decisivo para que isso aconte-
exames de rotina ao hospital de São Cândido Costa ingressou no FC Porto cesse. “Nos juniores, a época acabou
João, no Porto, ou para ir buscar os em 2000, um ano após o guarda- com um FC Porto-Benfica, e quem
-redes regressar do Barcelona.
dois filhos da anterior relação a casa Quando ele lhe disse para ir ganhasse era campeão. Fomos jogar
da ex-mulher, em Santa Maria da lavar o Porsche, nem hesitou ao campo nº 2 do estádio das Antas,
Feira. O agora comentador da TVI estavam lá os diretores todos a ver e
não aderiu à moda de ver jogos anti- i eu fiz uma exibição memorável.”
gos na televisão. “Não gosto, prefiro Não atingiu a sele-
ção principal, mas
estar ligado à realidade e não às coi- na areia”. “Senti-me com o orgulho tem 75 interna- FAZER TUDO O QUE
sas do passado.” Mas aceitou contar à ferido e tentei ir treinar ao FC Porto, cionalizações nas OS ÍDOLOS MANDAM
SÁBADO as histórias da sua carreira. para lhes mostrar que estavam enga- camadas jovens. h Ficou três épocas no FC Porto.
Foi campeão eu-
nados. Mas deram-me uma tampa.” ropeu de sub-18 Foi treinado por Fernando Santos,
A DESILUSÃO Foi para casa a chorar, mas aplicou- Octávio Machado e José Mourinho e
DO “BRINCA NA AREIA” -se mais na época seguinte, chegou ganhou um campeonato, duas Taças
h Começou a jogar futebol com 7 à seleção de sub-16 e acabou por ser de Portugal e uma Liga Europa. “No
anos, no clube da sua cidade, S. João contratado pelo Benfica. primeiro dia em que entrei no bal-
da Madeira. Com 14 anos, já era o neário pensei: ‘Não acredito que es-
grande craque da Sanjoanense. “Ti- O TROLL GOZADO tou ao lado destes gajos’; eu tinha os
nha técnica, velocidade, agressivida- PELO SOTAQUE cromos deles colados na mesa de ca-
de. Eu era um touro.” Nessa época, h Os primeiros tempos em Lisboa beceira. Apanhei figuras míticas,
sofreu uma grande desilusão, quan- foram complicados. “Parecia que ti- como Jorge Costa, Vítor Baía, Pau-
do soube que os olheiros do FC Por- nha descolado para sempre dos linho Santos, Aloísio, Domingos,
to, “o clube pelo qual andava à por- meus pais. Tinha tardes e noites em Deco…” Há um episódio com
RICARDO MEIRELES

rada na escola”, tinham optado por que pensava em desistir. Sentia- Vítor Baía, que recorda: “Aca-
um colega seu, não o escolhendo a -me fora do meu meio: antes eu bou o treino e ele: ‘Vai-me
ele por o considerarem um “brinca era o maior da aldeia, e passei ali à máquina dar um jeitinho ao Q
D.R.

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Q carro.’ Peguei na chave e lá fuiDOSSIÊ


la-
var-lhe o Porsche. Pensava: ‘Sou um
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O JOELHO REBENTADO
EM AROUCA
miúdo, tenho mais é de fazer o que h Uma lesão grave no Arouca preci-
os mais velhos mandam.’ E fui-me pitou-lhe o fim da carreira. “Tinha 31
embora a pensar: ‘Fogo, sou jogador anos e rebentei o joelho todo ao se-
do FC Porto e vou lavar o carro do gundo treino. O presidente fez um
meu guarda-redes.’” contrato comigo no papel e garantiu-
g -me que me dava o resto do dinheiro
O “PERFEITO IDIOTA” Cândido Costa
com os filhos,
na mão, mas a partir da lesão passou
h Na época 2002/03, em que o FC Gabriel, de 13 a arranjar formas de não me pagar
Porto ganhou a Taça UEFA, Cândido anos, e Rafael, absolutamente nada. O que se pas-
Costa foi falar com José Mourinho a de 17. Salvador sou ali foi uma desonestidade brutal.”
nasce em julho
pedir-lhe para sair a meio. Olhando Após uns meses no Tondela (aca-
para trás, arrepende-se dessa deci- h bava os treinos com o joelho incha-
são. “Fui um perfeito idiota. Como No Rapid do e a chorar com dores) e duas ex-
Bucareste
não estava a jogar com a regularida- (2010/11). “NÃO POSSO periências “por pura paixão” no fu-
de que queria, segui o meu instinto, Saiu da Ro- ESTAR tebol amador (S. João de Ver e Cesa-
sem me prender a ordenados. Essa ménia com SENTADO A rense), pendurou as botas em 2015.
salários
FOTOS D.R.

foi a parte boa. A parte má é que fui em atraso OLHAR PARA Ainda teve algumas experiências
burro e imaturo. As pessoas gosta- AS MINHAS como treinador – orientou as equi-
vam de mim no FC Porto, era sempre MEDALHAS pas femininas de Ovarense e Cesa-
convocado, era acarinhado pelos que tinha acabado de ganhar a Taça NA VITRINA. rense e foi adjunto de Ricardo Sousa
adeptos. Tomei uma decisão precipi- UEFA, e fui notícia nos tabloides, VEM AÍ O e Secretário em equipas masculinas
tada.” Nunca conseguiu voltar ao FC com fotos a puxar para o sex symbol. MEU TERCEI- –, mas não quer continuar por aí.
Porto. Em Portugal, ainda esteve duas Logo no jogo de apresentação, con- RO FILHO” Agora está empenhado em seguir o
épocas no Sp. Braga (com Jesualdo tra o Maiorca, treinado pelo Jaime caminho de comentador televisivo,
Ferreira), e quatro no Belenenses, Pacheco, num canto, vou a tentar ca- que iniciou há seis anos no Porto Ca-
sendo o ponto alto a chegada à final becear a bola, o capitão do Maiorca nal – em 2019 mudou-se para a TVI.
da Taça de Portugal, com Jorge Jesus faz uma bicicleta para aliviar e acer- i
(derrota por 1-0 com o Sporting). ta-me na boca, partiu-me três dentes Com Jesus, no
Belenenses. Em
O LADO NEGRO
da frente”. Como teve de fazer uma 2007, perderam DO COMENTADOR
OS DENTES ROUBADOS reestruturação óssea, andou sema- a final da Taça h “Tiro mais partido a fazer um
NO BALNEÁRIO nas com uma prótese provisória e foi de Portugal (1-0)
frente ao Sporting
programa de futebol, a narrar e co-
h As duas épocas em que jogou no alvo de muitas piadas. “Uma vez, no mentar um jogo, do que a treinar. Na
estrangeiro foram marcantes. Em treino, o central, o Dave Walton, que televisão sinto essa adrenalina que
2003/04, no Derby County, da II Liga era uma montanha de músculos, vi- sentia antes dos jogos, apesar de esta
inglesa, viveu um episódio caricato. rou-se para mim: ‘Ei, Da Costa, olha exposição ter um lado negro.” E qual
“Tinha chegado rotulado de menino para isto’. Andava com os meus é? “Há sempre ataques pessoais. Ten-
bonito e de jogador do Mourinho, dentes na mão. Foi ao meu cacifo to fazer o meu trabalho de forma
e roubou-me os dentes.” honesta, mas há perfeitos idiotas
Em 2010/11, no Rapid Buca- que vão para as redes sociais fa-
Miúdo deslumbrado reste, viveu uma má expe- zer críticas feias e ataques à mi-
Cândido acha que podia ter riência. “Percebi que na Ro- nha família e aos meus filhos. As-
tido uma carreira melhor ménia valia tudo menos ar- sumo que sou adepto do FC Por-
rancar olhos. Tive de trocar to, mas não tenho um discurso de-
“Não se pode dizer que não quatro vezes de apartamento. corado nem sou cartilhado.” É por
fui mais longe porque andava na As rendas eram da responsa- sentir que as pessoas podem can-
noite e só queria copos e mulhe- bilidade do clube e as pessoas sar-se dele ou deixar de lhe achar
res. Isso não é verdade. Mas tam- batiam-me à porta a pedir di- piada que continua a trabalhar como
bém não fui aquele craque que nheiro. E vim-me embora gestor de vendas na OHM Técnica,
prometia na formação. Como com quatro meses de ordena- a empresa de artigos de papelaria e
cheguei muito cedo ao FC Porto, dos em atraso. Nada era se- material de escritório do irmão, Ivâ-
ASF

se calhar deslumbrei-me. Tinha ta- guro, era só mentiras. O presi- nio. “Não é um ordenado de luxo, mas
lento e as portas foram-me aber- dente e dono do clube entrava garante-me o sustento se a parte liga-
tas, por isso é minha a responsa- pelo balneário adentro a distri- da ao futebol falhar. Não posso estar
bilidade de não conseguir mais.” buir notas de 500 euros, mas aqui sentado a olhar para as meda-
só dava a alguns, a mim nun- lhas que tenho na vitrina, porque vem
ca me calhou. Parecia que aí o meu terceiro filho – e o Sal-
estava num filme.” vador precisa de leitinho.” W

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25 CRIMES
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ALGUEM VAI TER DE OS RESOLVER.


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que o vão ajudar a resolver cada mistério.

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Opinião

CORAÇÃO, O Empurro e desloco móveis – que

CABEÇA E Inflação tipo de mobília se aproxima da mi-


nha caricatura? –, passo ao guarda-
-fatos e afasto as peças de roupa uma
ESTÔMAGO MAIS DO QUE O TERRITÓRIO de-
masiado vasto da Nação ou do País, o
a uma, apalpo os bolsos, à procura de
objectos esquecidos ou escondidos.
As casas são histórias. que nos define fundamentalmente é Volto a minha atenção para a secre-
Histórias dentro de histórias a casa que habitamos. tária de madeira que herdei do meu
que se cruzam, sobrepõem, Se isto é assim – se o que mais nos tio, ex-administrador colonial em
confundem. Histórias que define é esse espaço íntimo em que Moçambique, e que ainda cheira a
dizem muitas coisas sobre arrastamos as pantufas, tomamos função pública.
a nossa capacidade de banho, secamos o cabelo, escovamos Trabalho a papelada, classifico re-
nos inventarmos, de os dentes e despejamos o caixote do vistas, catálogos, recortes de jornais
ultrapassarmos os limites lixo –, como eu creio que é, as últi- antigos, fotos a cores, mas de há mui-
e desmentirmos o que mas semanas fizeram de mim outra to tempo, de há muitos anos, imagens
fomos anteriormente pessoa. Não porque tenha mudado de felicidade a contraluz, e dentro de
de casa, mas porque a relação que mim começa a ganhar terreno a me-
mantinha com ela se transformou ra- lancolia, a casmurra melancolia.
dicalmente. Vou até à janela, como quem ob-
A percepção da gaiola em que vi- serva o exterior (quando na verdade
vemos não é a mesma antes e depois olho apenas para o meu interior).
da quarentena. Quando passamos os Aquilo que vejo, através da minha
dias a olhar para quatro paredes, ro- própria imagem reflectida no vidro
deados de betão, vidro, plástico e duplo, parece-me arrancado de um
madeira, e decidimos enfim fazer ar- romance existencialista. Deixo-me
rumações, dominar a desorganiza- absorver pela escuridão do jardim lá
ção que se foi apoderando da casa, o fora, imerso em sossego e sombras
movimento da Terra não se altera, movediças. Faço perguntas sem res-
mas nós começamos a ver as coisas posta, ou sem uma resposta única, ou
de outra maneira, a criar uma ima- perguntas essencialmente irónicas,
gem desintegradora de nós próprios. cujas respostas são as próprias per-
Porque, enfim, toda a mudança no guntas: a quem é que somos mais
espaço é uma mudança no ser e toda leais, ao tipo que gostaríamos de ser,
a mudança no ser é uma mudança ao que temos sido até agora sem o
no espaço. conseguirmos evitar ou àquele que
Entro no quarto. Começo por revis- os outros julgam que somos? Qual é a
tar as mesas-de-cabeceira, uma de coisa mais honesta que podemos di-
cada lado da cama – que livros há ali, zer acerca de nós? Queremos verda-
que não abro há meses? –, abro as deiramente ser o que parecemos ser?
gavetas, começo a investigar o que há Podemos consolar-nos com a menti-
nelas, coisas com que as minhas ra e o engano? Estamos confortáveis
mãos e os meus olhos não contactam com o que somos, com o que quere-
há anos, mas que incorporam mo- mos e com o que fomos? Que muda-
mentos, instantes, memórias, segre- ríamos se nos fosse dado começar
dos do passado. Coisas sobrenaturais, tudo outra vez? Como imaginamos
que vivem numa dimensão diferente, que será o resto da nossa vida?
como envelopes de bancos, facturas,
recibos, folhetos de publicidade, ca-
dernos com anotações, molas de
roupa, uma radiografia dos pulmões,
uma fotografia tipo passe, carteiras
de fósforos, pequenas recordações
de viagens, uma ficha de casino, um
comando à distância avariado, como
um animal doméstico falecido. Coi-
sas sem uso e sem vida, que formam
O enredos estranhos entre si, um mun-
Escritor e sociólogo do às avessas inimigo da ordem e dos
João Pedro George sistemas totalizantes.

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Percebo, sem perceber nada, que fundo do que aquele absurdo tintei- terstícios, paradoxos e ambivalên-
não existe nada mais belo que o ro de cobre, que era do meu trisavô, cias, de encontrarmos uma síntese a
costume antigo de cobrir os sofás e abandonado e incompreendido partir do emaranhado inextricável
os móveis com lençóis quando se ia numa caixa que exala a cânfora dos de fragmentos e anfractuosidades
de férias ou se empreendia uma armários da avó Judite. que constituem a urdidura básica da
grande viagem, e nada mais pro- As casas são histórias. Histórias nossa personalidade, da nossa ma-
dentro de histórias que se cruzam, neira de ver o mundo e do nosso ní-
sobrepõem, confundem. Histórias vel de realidade.
que dizem muitas coisas sobre a Uma casa é difícil de entender, por-
nossa capacidade de nos inventar- que é demasiado imprevisível e im-
mos constantemente, de ultrapas- ponderável. Dentro de casa, uma
sarmos os nossos limites e desmen- pessoa pode enlouquecer, pode ar-
tirmos o que fomos anteriormente. ruinar-se, pode ser abandonada,
Em casa, quando lá fora não há pode acordar a meio da noite e, du-
nada, nem coisas, nem ruído, nem rante uma fracção de segundos, não
vida, apenas um daqueles silêncios saber se está ali ou noutro sítio. Ou se
nocturnos iguais aos da nossa pro- já chegámos àquele momento em
víncia, o universo tangível que nos que, como nos desenhos animados,
rodeia mostra-nos a impossibilidade caminhamos sobre o abismo, sem
de unificarmos todos os nossos in- terra debaixo dos pés.
Uma casa é muitas coisas ao mes-
mo tempo e quanto mais se caminha
para o seu interior, mais se conhece a
sua vastidão. Os objectos que a com-
põem são como um coro grego que
conhece as nossas vidas múltiplas, os
seus elementos incompatíveis, o de-
sejo de experimentar a verosimilhan-
ça das improbabilidades, de pensar
uma coisa, sentir outra e fazer tudo
diferente, só pelo prazer de questio-
nar aquilo que parece de uma solidez
inquebrantável.
Daqui a dois mil anos, quando os
antropólogos estudarem as nossas
casas, o que dirão de nós e dos nos-
sos cartões de crédito, da hipoteca
da casa, da contracção da economia,
dos paraísos fiscais e da capitaliza-
ção de juros, da carência de capital,
dos derivados financeiros e das enti-
dades gestoras, do Euribor, do
spread, do stock split, do swap, das
vendas associadas facultativas, das
sociedades de corretagem, dos siste-
mas de negociação multilaterais, das
unidades de participação de investi-
mento harmonizados?
Abandono a janela, percorro os dois
ou três metros que me separavam
das estantes, cheias de obras literá-
rias, ensaios e teorias que não consi-
go explicar exactamente. E lembro-
-me, não me perguntem porquê, que
Kafka morreu sem entender em que
consistia a inflação. W

Texto escrito segundo


MISS INÊS o anterior acordo ortográfico

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Cinema
Uma comédia animada
para toda a família: Os
Irmãos Willoughby p. 92

Séries
A ansiada série docu-
mental sobre Michael Jor-
dan chega à Netflix p. 96

Música
Falámos com Laura Mar-
ling sobre o novo Song
For Our Daughter p. 98

Shopping
Ideias de presentes para
o Dia da Mãe, que se ce-
lebra a 3 de maio p. 104

O PÃO NOSSO
DE CADA DIA
AMASSE-O
VOCÊ MESMO
Com a ajuda de especialistas, damos-lhe três receitas
com diferentes graus de dificuldade, para se juntar à
grande moda do momento. Há tempo de sobra, não é?

83
Tema

Dos países em
que há confinamen-
to obrigatório
chegam histórias de
prateleiras de farinha
e fermento vazias

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NÃO É UMA
FEBRE, É
PÃODEMIA Com a quarentena surgiu a
moda de fazer pão em casa.
Perguntámos a padeiros o
que pensam disto e damos-
-lhe três receitas com três
níveis de dificuldade para
entrar nesta tendência.
Por Catarina Moura e Filipa Teixeira

MÁRIO ROLANDO é padeiro e controlo dá a quem está há um


está de férias. “Precisava de pa- mês em confinamento.
rar, ler, pensar, fazer trabalho Para Cristina Teixeira, da pa-
criativo. A vida de padeiro é daria Garfa, de Custóias, este
muito dura [fisicamente], nes- fenómeno é “espetacular”: “As
tes dois últimos anos não con- pessoas vão dar mais valor ao
segui ler nada”, conta o padeiro pão quando forem a uma pada-
da Padaria da Esquina, em Lis- ria, vão tentar perceber que fa-
boa. Para uns é um trabalho rinhas e fermentos são usados,
duro, para outros um brinde se levam açúcares. Vão ser
em tempos de quarentena. O consumidores mais atentos,
mundo está fechado em casa a observadores, conhecedores.”
fazer pão. Em muitos países a Desde que foi decretado o
farinha e o fermento esgotaram estado de emergência, come-
em dias – usá-los transfor- çaram a chover pedidos de
mou-se numa das tarefas que farinha e de massa-mãe (uma
mais serenidade e sensação de levedura natural), seguidos
de perguntas. “Já demos
workshops de fermentação
GETTYIMAGES

lenta para desmitificar o pro- Q

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Tema

Os pães
caseiros são
partilhados
nas redes
sociais com
o hashtag
#paodemia

“É um processo
longo de tentati-
GETTYIMAGES

va e erro”, diz
Cristina, padeira, q
sobre fazer pão.
Aconselha
quem começa MATEUS FREIRE
Q cesso e mostrar que fazer pão
assim dá muito trabalho. É um a usar primeiro PÃO PARA EXPERIENTES
processo longo de tentativa e fermento de pa- O pão do restaurante Faz Frio,
erro.” É preciso olhar, tocar, ou- deiro e só depois em Lisboa, é sempre elogiado
vir a massa, perceber como ela massa-mãe pela côdea crocante e pelo miolo
bate na bancada quando está a guloso. Mateus Freire não guar-
ser formada, diz Cristina, que da mistérios e revelou-nos a
aconselha quem começa a usar receita do seu pão, inspirada pelo
fermento de padeiro. q seu mestre, Vítor Claro. Se vive
em Lisboa, pode também
#PAODEMIA FILIPA GOMES encomendar este pão ao Faz
NAS REDES SOCIAIS Frio, que faz entregas em casa.
Cláudia Bicho não liga a redes PÃO PARA INICIADOS
sociais e portanto não se aper- A cozinheira do canal 24 Kitchen e autora de livros como Cozi- INGREDIENTES
cebeu do hashtag #paodemia nha com Twist [Casa das Letras] deu início ao hashtag #pãode- 1 kg de farinha T65
que aparece nas fotos de pães mia que circula há pouco mais de um mês. Esta é uma receita (para 1,5 kg de pão)
caseiros partilhadas nas redes. bastante simples e nem precisa de ser amassada – só misturada. 15 g sal fino
Algumas pessoas apareceram 20 g fermento de padeiro
na Micro Padaria, perto do Lar- INGREDIENTES 800 g água
go da Graça, em Lisboa, para 3 cháv. de farinha (cerca de 420 g)
comprar fermento porque tinha 1 cháv. e 1/4 a 1/2 de água (300-360 ml) PREPARAÇÃO
acabado nos mercados. “Expli- 1 c. café de fermento de padeiro seco Adicione numa cuba a farinha e
quei que só uso massa-mãe e 1 c. chá de sal o sal. À água acrescente o fer-
ofereço-a. Quem já conhece mento e dissolva-o bem. Verta a
mais ou menos, leva”, conta. PREPARAÇÃO água sobre a farinha e envolva —
Também Cláudia já foi padei- Misture tudo (comece por jun- no a 250° com uma panela lá amasse cerca de dois minutos.
ra em casa. Antes de abrir a pa- tar só 1 chávena e 1/4 e se dentro (de ferro, de preferên- Tape com película e deixe levedar
daria em 2018 tinha uma bolsa for necessário junte o resto) cia, e que tenha tampa). 12 horas no frigorífico. Depois de
de investigação em Biologia Ce- e deixe levedar de 8 a 12 ho- Assim que estiver escaldante, a massa estar lêveda, coloque-a
lular, em São Francisco, Estados ras (ou até 24 horas). passe a massa para dentro da sobre uma bancada, já polvilhada
Unidos, e havia dias em que só Quando esse tempo passar, panela, tape-a e leve-a ao for- com farinha. Polvilhe também
queria chegar a casa para fazer enfarinhe bem a bancada no por 30 minutos. com farinha a massa toda. Corte-
pão ou bolos. “Começas com (ou use papel vegetal, que fica Tire a tampa e deixe cozer -a com a forma pretendida (por
três ingredientes e acabas com mais fácil) e deite a massa. mais uns 10 minutos para uma exemplo, um pão comprido, como
uma coisa que podes comer e Puxe de fora para dentro algu- crosta bem crocante. os pães saloios) e coloque-a num
partilhar. É uma tarefa con- Q mas vezes até formar uma bo- tabuleiro de ir ao forno, previa-
linha. Vire a costura para baixo mente aquecido a 220 graus.
e deixe-a descansar, tapando- Coza durante 30 a 45 minutos.
-a, enquanto pré-aquece o for-

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Os pães mais
fáceis levam
fermento de
padeiro; os
mais complexos
levam
massa-mãe
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Q creta, dá para ser criativa e


será sempre comestível. Por ou-
tro lado, se queres experimentar
todos os dias, chegas ao fim da
semana com sete pães que não
conseguiste comer”, lembra os
tempos das experiências.
Na sua pequena padaria, os
clientes querem conselhos
sobre o processo do pão mas as A Terra Pão,
em Lisboa,
vendas não diminuíram, afirma. continua
“Muita gente faz o seu e compra “As pessoas têm a fazer pão
JOÃO CORTESÃO

outro”, conta, pensando nos muito tempo, de trigo, milho


pães especiais que faz a cada estão a planear e brioche
dia (à quinta-feira coze pão de o dia em casa
cerveja, à sexta de limão, fun-
cho e mel, por exemplo). te e partilhava com os vizinhos
e a comida está
na moda – tal
O PÃO UNE AS PESSOAS
quando não tinham.”
No meio da incerteza destes como o pão – +
É o alimento fundamental, mas dias, “é uma coisa que conse- desde há uns BOAS NOTÍCIAS:
não é por subsistência que estes guimos fazer e controlar”, cinco anos”, diz TAMBÉM
padeiros de improviso fazem acrescenta Mário Rolando. “Co- Mário Rolando,
pão. “As pessoas têm muito zinhar junta pessoas na cozinha. padeiro HÁ PÃO NAS
tempo, estão a planear o dia em
casa e a comida está na moda –
Portanto, fazer pão em casa é
bom. Tudo o que é viver é bom.
PADARIAS
tal como o pão – desde há uns Por isso comprem boas farinhas Os padeiros mais experientes
cinco anos”, diz Mário Rolando, que os moleiros e produtores continuam a fazer pão e as
que atribui a culpa à comunica- precisam.” W suas massas mais distintivas.
ção social que “transformou Em Lisboa, a Terra Pão, no Mer-
chefs e padeiros em estrelas de cado de Arroios, vende broas de
televisão”, afirma. milho e também os seus famo-
Já Cristina associa o fenómeno q sos brioches. Também o Isco, de
à tentativa de as pessoas se Alvalade, mantém a sua produ-
aproximarem das origens e da ANA FONSECA ção de pão e pastelaria (aten-
infância. “Até aos anos 70 não ção ao pain au chocolat ou aos
havia fermento químico, cada PÃO PARA AVANÇADOS bolos de cardamomo), vende a
padaria tinha as suas massas Ana Fonseca fala do pão com leveza, a mesma com que o sua própria manteiga e fiambre.
velhas (aqui no Norte são os amassa diariamente na Pão da Terra, em Matosinhos. Esta é A Pão Com Calma, em Arroios,
crescentes). A minha mãe, que a receita do seu trigo e centeio. Com uma boa massa-mãe (a continua a fazer os seus espe-
aprendeu a fazer pão com a Pão da Terra oferece este fermento natural) não há como falhar. ciais bretzel (em bolas ou na
mãe dela tinha sempre crescen- forma tradicional) e a Massa
INGREDIENTES Mãe, em Benfica, tem o seu pão
270 g de farinha de trigo 90% barbela.
(para 500 g de pão) No Porto, a Masseira continua
“Começas com 30 g de farinha de centeio com os fornos quentes e cheios
três ingredientes 60 g de fermento natural de pão artesanal e a Pão da Ter-
e acabas com 200 a 250 g de água ra vai juntando aos seus pães
uma coisa que 5 g de sal habituais experiências, como a
podes partilhar. É baguete de fermentação lenta.
PREPARAÇÃO A Peneira garante entregas no
uma tarefa muito Junte a farinha e a água numa uma bola e deixe-a no frigorífico Grande Porto, todos os sába-
concreta, dá para bacia, espere uma hora. Junte a 12 a 16 horas. Pré-aqueça o dos, dos pães de trigo e centeio
ser criativa e será massa-mãe e sal. Dê a volta à forno no máximo, vire o pão do e de packs de muffins e crois-
sempre comestí- massa a cada 30 minutos du- cesto para uma panela de ferro sants. Em Braga, a Nørre recebe
vel”, diz Cláudia rante 2 horas. Quando a massa ou para um tabuleiro, faça um encomendas através de Face-
Bicho, padeira tiver praticamente duplicado o corte no pão e coza por uns 40 book e telefone.
tamanho (o que, dependendo minutos a 220 graus.
da temperatura ambiente, pode
demorar 3 a 5 horas), forme

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opinião
Bom gosto, mau feitio

A PRIMEIRA
TELE-
CONSULTA ÂNGELA MARQUES

S
quilo em que a minha mãe consultas online que o meu
parecia acreditar) não era um pornográfico seguro de saúde
sintoma de Covid-19, pensei, me prometia (não sem antes
burguesa, “era só o que me ter lacrimejado por não poder
faltava”. Para aprender uma seguir um conselho amigo, o
lição sobre humildade, come- de usar um anel de ouro no lu-
cei a sentir o olho enfermo a gar da compressa, tendo-me
inchar enquanto o outro se
esbugalhava para ver as notí-
AS apercebido, assim, de que não
tenho um único anel de ouro,
cias do dia. CONSULTAS nem para efeitos terapêuticos).

em poder explorar as possibi-


As notícias não eram boas e
a imagem que o espelho me
ESTAVAM A As consultas estavam a fun-
cionar (surpreendi-me, não
lidades lúdicas da quarentena, devolvia também não. Com FUNCIONAR sei porquê). Telefonema para
eu mantinha o ritmo da vida
banal sem poder beneficiar
um doutoramento no Google
da vida, a minha mãe passa-
(SURPREENDI- lá, telefonema para lá e a mé-
dica queria levar a telessaúde
das suas sobras extraordiná- va-me a receita: compressas -ME, NÃO SEI às últimas consequências. As-
rias vulgarmente contratuali-
zadas como “uma cerveja ao
de água quente e uma ida à
farmácia se a água não se re-
PORQUÊ). sim, pedia-me fotografias do
hordéolo – ou calázio (do gre-
fim do dia”, “jantamos sex- velasse benta. Com um mes- A MÉDICA go khalázios), como preferis-
ta?”, “no sábado almoçamos
ao pé do mar” ou “domingo
trado em www, procurei as PEDIA-ME se. Com as fotografias em
anexo, enviei o email. De res-
há bola lá em casa”. Sem isso FOTOGRAFIAS posta, uma voz cândida com
para me colorir os dias, co-
meçava a recear não ter sobre
POR EMAIL olho para isto e para aquilo:
“Está tudo bem, como suspei-
que falar. Até que Deus olhou tava. Continue com as com-
para mim e, numa intenção pressas de água quente. Posso
clara de me sossegar, disse: ajudar em mais alguma coi-
“Minha filha, eu não te falha- sa?” Mais, Dra.? Não, obriga-
ria. Aceita este terçolho.” da. Está feito. W
Então, há dois dias comecei
a sentir uma dor ligeira num
olho. Depois de confirmar
com a Direção-Geral da Saú-
de que este (ao contrário da-

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Vinhos www.sabado.pt
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“vinho de pasto”, de consumo


Na margem doméstico, e um ou outro lote
norte do de Porto branco, pouco procu-
Douro, zona rado. À partida, pois, o negócio
da barragem
de Bagaúste, não augurava sucesso.
a quinta tem Contudo, o mercado mudou e,
28 ha de vinha, como diz o enólogo João Pissa-
com 20 e com ra, “passou a dar-se valor aos
60 a 80 anos vinho de mesa, que se tornaram
também ex-líbris do Douro,
com a sua elevada acidez, baixo
teor alcoólico e aromas expres-
sivos, dados pelo microclima”.
Portanto, aquelas vinhas ve-
lhas, com mais de 60 anos, “que
© O REVELADOR 2016

de início ameaçavam contrarie-


dades, acabaram por se mostrar
uma mais-valia”. O recém-lan-
çado branco Dona Matilde Re-
serva, da colheita de 2018, sa-

VINHAS VELHAS À
biamente estagiado sem recor-
rer a madeira, é disso a prova.
A €24, “é diferenciado, único,

FRENTE DO TEMPO
muito fresco e delicado”.
O seu trabalho, afiança, “é não
estragar o que a plantação dá”.
O que mais tem feito é, pois, es-
Dona Matilde é marca de elegância no Douro, contrariando o clássico perfil tudar a qualidade de cada par-
vinhateiro dos estágios em barricas. Falámos com o produtor Filipe Barros cela, ao detalhe, com um único
e o enólogo João Pissarra sobre este projeto vencedor. Por Rita Bertrand objetivo: manter a autenticida-
de daquele património histórico
vinhateiro, evitando ao máximo
a intervenção enológica e ex-
plorando cada cepa na sua es-
PARECIA loucura em 2006 de, nome que homenageia a pecificidade.
comprar de volta à empresa de mulher do fundador, em 1913, do De uma das muitas vinhas da
vinho do Porto Kopke, que a ex- famoso Porto Barros, avô de Ma- quinta, a sublime dos Calços
plorava desde os anos 50, a nuel Ângelo e bisavô de Filipe Largos, “daquelas que não há
Quinta do Enxodreiro, demarca- Barros, atualmente à frente da igual”, fez nascer o novo tinto
da em 1756, nos tempos do Mar- estratégia comercial da marca. da marca, sem taninos agrestes,
quês de Pombal, de onde hoje Os seus 28 hectares de vinha da colheita de 2017, também
vêm os magníficos Dona Matil- incluíam uma área considerável sem recurso a barricas. Custa
de castas brancas, expostas ao €28 em garrafeiras seleciona-
sol, junto ao rio, antigamente das e online.
encaminhadas para o chamado “É a assinatura da casa – vi-
nhos premium, estruturados
mas muito elegantes, nada do
que dantes estava na moda,
com elevada extração de fruta e
“É a assinatura madeira vincada, como o crítico
Manuel da casa – vinhos Robert Parker gostava. Hoje, até
Ângelo premium, ele procura vinhos diferentes
disso… e nós já os fazemos há
e Filipe
Barros, neto
estruturados, 10 anos”, remata Filipe Barros,
e bisneto mas muito satisfeito com o seu instinto,
do fundador elegantes, nada à frente do próprio tempo. W
da quinta, daquilo que
LUISA FERREIRA

são os admi-
nistradores dantes estava
da marca na moda”
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EGO

PERSONALIDADE
INTELIGÊNCIA www.sabado.pt

SOMBRA
STRESS
HORMONAS MEMÓRIA

GENÉTICA

INFÂNCIA
SONHOS

Coleção Neurociência & Psicologia

Parta à descoberta.
Todas as quintas-feiras, a partir de 19 de março.
Somos a nossa memória, ‘O cérebro e as emoções’, ‘O cérebro nasce ou faz-se?’ ou ‘O cérebro Todas as semanas

artístico’, são apenas alguns dos temas abordados nesta coleção de 58 livros que o vão guiar numa
expedição pelos caminhos do Ser, com destino ao Eu. Um projeto que reúne de forma apelativa
1 Livro
apenas
por

e rigorosa os temas essenciais da neurociência e da psicologia, com apresentação do professor


catedrático Alexandre Castro Caldas. Abra a cabeça e desfrute a viagem. 9.95 €
Promoção semanal às quintas-feiras de 19/03/2020 a 22/04/2021. PVP do 1.º livro GRÁTIS. PVP dos restantes livros 9,95€ Cont. (IVA incluído). PVP da coleção completa
composta por 58 livros 567,15€ Cont. (IVA incluído). Promoção limitada ao stock existente, de acordo com a disponibilidade em banca. Para mais informações, contacte
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Cinema

QUERIAM FICAR os irmãos, e o motivo é falta

SOZINHOS EM CASA..
de amor em casa. Não que
falte amor aos pais – o pro-
blema é que estes continuam
tão apaixonados como quan-
...e conseguiram-no. Os Irmãos Willoughby acaba de estrear na Netflix, com do se conheceram, vivem
Filomena Cautela, Rui Unas, Albano Jerónimo, Vasco Palmeirim, Soraia Tavares imersos um no outro, e, como
e Pedro Ribeiro a darem voz às personagens na versão portuguesa. A SÁBADO tal, nada sobra para as crian-
falou com o realizador e argumentista, Kris Pearn. Por Markus Almeida ças, verdadeiros danos cola-
terais dessa paixão.
É a primeira vez, dizemos ao
realizador, que o amor surge
OS IRMÃOS WILLOUGHBY é Lois Lowry (The Willoughbys, numa perigosa viagem à volta retratado como o vilão de uma
apenas o segundo filme de no original) sobre quatro do mundo, para assim cum- película. Kris Pearn, em cha-
animação original da Netflix, a irmãos que engendram um prirem o sonho de se torna- mada de Skype a partir de Los
plataforma de streaming onde plano para enviarem os pais rem órfãos. Vivem infelizes, Angeles, ri-se da ideia e des-
aterrou nesta quarta, 22 de
abril. Sem questionar as prio-
ridades do gigante que tem in- Filomena
vestido milhares de milhões “É uma espécie Cautela dá
de euros em novos conteúdos, de conto voz à ama
dos irmãos
antes saudando o arrepiar de preventivo Willoughby
caminho dado em 2019 com a de uns miúdos
estreia da sua primeira anima- que em vez de
ção (Klaus), conversámos com
o realizador e argumentista da
conquistarem a
animação, Kris Pearn. independência
O filme é a adaptação do fugindo de casa,
livro infantil homónimo de conseguem-na
livrando-se
dos pais”, diz
o realizador
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(a ama responsável pelas THOR CONTRA


crianças), Rui Unas (o pai Wil- A MÁFIA DA ÍNDIA
O REALIZADOR loughby) e Albano Jerónimo (o E DO BANGLADESH
O canadiano Kris gato narrador). A tarefa de dar
Pearn trabalha em voz aos irmãos coube a Vasco O QUE É QUE FAZEMOS quan-
animação há mais Palmeirim (Tim), Soraia Tava- do somos o maior barão de droga,
de 20 anos. Os res (Jane) e Pedro Ribeiro (os da segunda maior cidade da Índia,
Irmãos Willoughby gémeos Barnaby). Bombaim, e o nosso rival da capi-
é a sua segunda Sendo a comédia que é, hu- tal do Bangladesh, Daca, nos rapta
longa-metragem, mor não falta – muitas vezes o filho de 14 anos? Ora, contrata-
depois de Chovem na forma de piadinhas e tro- mos uma organização secreta de
Almôndegas 2 cadilhos divertidos. “Gostaria mercenários implacáveis, que por
de dizer que sou mais inteli- sua vez subcontrata o serviço a
gente do que isso, mas depois Tyler Rake, o anti-herói australiano
na prática acabo por recorrer com bom fundo interpretado por
muito a trocadilhos”, admite Chris Hemsworth.
em tom penitente. “É que eu Porque somos um barão de dro-
cresci numa quinta, e o que ga – e, portanto, gente sem escrú-
Jane, Tim e acontece é que tudo se trans- pulos –, em vez de manter o acor-
os gémeos forma em metáfora.” dado e pagar, esperamos que o
Barnaby: Kris Pearn leva 20 anos a mercenário cumpra com o resgate
eis os
irmãos trabalhar em departamentos para depois o matarmos. As coisas
FOTOS D.R.

Willoughby de arte de filmes e séries de não vão correr como queremos.


animação. Em 2013 estreou-se Tyler Rake: Operação de Resgate
na realização com Chovem Al- é um filme de ação carregado de
môndegas 2. Agora estreia-se cenas de suspense seguidas de
como argumentista, além de descargas descomunais de adrena-
culpabiliza os pais. “De certa também realizar. “Tenho es- lina em perseguições de carros,
forma, eles próprios são como crito ao longo de toda a minha porrada, tiroteios e explosões – Tyler
crianças egoístas que não carreira, na verdade, porque fará o que tiver de fazer para con-
aprenderam a partilhar o “É interessante ser um story artist punha-me seguir sair de Daca com o rapaz.
amor que os une”, diz. “Não é pensar que muitas vezes dentro da sala O filme assinala a estreia na rea-
que sejam maléficos.” Pois começámos a dos escritores, mas esta é a lização de Sam Hargrave, que co-
não, apenas olham para os trabalhar neste primeira vez em que estou ao meçou há 15 anos como duplo e
filhos como empecilhos e, filme há quatro leme do guião desde o início.” que evoluiu para coordenador de
como tal, nem pensam duas ou cinco anos É uma questão de usar a cenas de ação e de luta em
vezes perante a proposta de para que fosse ferramenta certa para a tarefa blockbusters como Thor: Ragna-
viajarem sem eles. visto em casa, específica, diz-nos. Ou seja, de rok ou Vingadores: Endgame, dos
“Aquilo por que os filhos resolver no estirador uns pro- irmãos Russo – os mesmos que
passam é uma espécie de con-
que agora é blemas e no processador de escreveram e produziram Tyler
to preventivo de uns miúdos o sítio onde texto outros. E se nenhuma Rake para ele realizar. Como é
que em vez de conquistarem a o público destas ferramentas pode algo bom ter amigos. WMA
sua independência fugindo de se encontra” contra a pandemia que varre o
casa, conseguem-na livrando- mundo, Pearn espera que pelo
-se dos pais através de uma menos Os Irmãos Willoughby
agência de viagens fictícia.” alegre um pouco as pessoas
Pearn fala em contos pre- final é feliz, como não podia “nestes tempos difíceis”. “É in-
ventivos porque depressa as deixar de ser, mas inesperado. teressante pensar que come-
crianças vão descobrir o dis- Ricky Gervais, que na mes- çámos a trabalhar neste filme
sabor de conseguir exatamen- ma semana vê chegar à Netflix há quatro ou cinco anos para
te o que se deseja. “O filme a segunda temporada da série que fosse visto em casa, que
não faz juízos de valor sobre After Life (dia 24), dá voz ao agora é o sítio onde o público
o conceito de família tradicio- gato que assume a figura de se encontra. O próprio tema –
nal”, diz Pearn, “mas há, claro, narrador da história. O elenco estarmos presos em casa com
esta ideia de os miúdos tenta- inclui nomes fortes da comé- a família – é capaz de ressoar
rem corrigir os seus erros.” O dia norte-americana como nas pessoas.” W
Will Forte e Maya Rudolph,
substituídos na versão portu-
guesa por Filomena Cautela

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Cinema www.sabado.pt
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O filme ven-
ceu o Grande
Prémio do Júri
em Sundan-
ce, entre mais
de 20 outros
prémios em
FOTOS D.R.

festivais
internacionais

UMA NOVA MANEIRA


rilha: “Normalmente tudo se di-
vide em esquerda e direita, pre-
to e branco... eu quis explorar os

DE FILMAR A GUERRA
tons de cinzento, típicos da
adolescência, um momento em
que ao mesmo tempo que que-
remos pertencer a um grupo,
Monos é uma obra original, sobre miúdos guerrilheiros tenciais que me interessam”, diz queremos expressar a nossa in-
no meio do mato. Não há bons nem maus, nem onde à SÁBADO Alejandro Landes, o dividualidade. As mudanças no
nem quando. “Isso já foi feito”, diz o autor, Alejandro autor, colombiano autodidata corpo são como a guerra, de
Landes. A estreia em Portugal é a 23 de abril. Por Rita Bertrand de 39 anos que antes fez um grandes contradições.”
documentário sobre Evo Mora- Com alcunhas – como é típico
les e uma aclamada docuficção nos grupos rebeldes – como Pé
sobre um caso real: um homem Grande, Rambo e Boom Boom,
que uma bala perdida deixa pa- os soldados de Monos não estão
PORQUE guerreamos? Quem “É um filme raplégico e decide chamar a ali a representar uma ideologia:
somos nós, enquanto espécie? de guerra mais atenção do Estado sequestran- “Não queria gerar empatia pelo
Como reagiríamos naquela si- contemporâneo. do um avião com duas grana- que a personagem pensa, só
tuação? Preferíamos não matar Se formos das escondidas na fralda. pelo que é, naquele momento.”
e permanecer prisioneiros? Não Com Monos, reafirma a sua Evitou, pois, “a engenharia
há respostas, mas as perguntas
à Síria ou ao originalidade ao abordar a ado- narrativa” habitual dos filmes
continuam a ressoar no espec- Afeganistão, lescência em contexto de guer- de guerra, que dizem “de que
tador depois do último plano de os conceitos lado devemos estar, quem são
Monos. “São as questões exis- de bem e mal DE ALEJANDRO LANDES os bons”, sublinha: “Monos é
não são assim Colômbia • Guerra • 102m
Com Sofia Buenaventura um filme mais contemporâneo.
tão claros” e Julián Giraldo Se formos à Síria ou ao Afega-
nistão, os conceitos de bem e
mal não são assim tão claros.”
Com paisagens monumentais,
o filme rompe com qualquer
conceito binário: “Não sabemos
onde e quando se passa, se é o
paraíso ou o inferno, se uma
personagem é homem ou mu-
lher. Quis abordar a guerra de
uma forma que nunca tinha vis-
Original, to, alegórica, quase de fantasia.”
Monos vive Os colombianos esgotaram as
de contrastes: salas, o júri do Festival de Sun-
a ação é dance premiou-o. Agora chega
bárbara, mas às plataformas de vídeo e vi-
as paisagens
são de uma deoclubes da TV portuguesa. W
beleza
paradisíaca

94
Fique em casa
e nós levamos-lhe a revista!
A informação credível mantém-nos mais seguros!

Esta quinta-feira, compre a SÁBADO


no quiosque digital e leia-a no computador,
tablet ou smartphone.
Compre a edição digital da SÁBADO e leia-a tal como é impressa mas com
ainda mais vantagens: as notícias podem ser lidas em vários formatos,
guardadas, comentadas ou até mesmo ouvidas.

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Séries

QUEM QUER
DANÇAR
COM MICHAEL
JORDAN?
Ele foi, sem discussão, o melhor jogador de basquetebol de
todos os tempos. The Last Dance, na Netflix, é sobre a época
de 1997/98, a última em que vestiu a camisola dos Bulls.
Por Ângela Marques

NA SANTÍSSIMA Trindade vância que Jordan teve na sua


americana, é difícil saber quem vida, na cidade de Chicago e na
é o Pai (Babe Ruth?), o Filho história do desporto.
(Muhamad Ali?) e o Espírito Durante meses houve expec-
Santo (bom, o Dennis Rodman tativa sobre a estreia da série,
não é com certeza…). No altar, que já tinha sido anunciada
sabemos quem não falta: como sendo uma crónica da-
Michael Jordan. quele último campeonato da
Durante a carreira – que co-
meçou ainda na Carolina do A parceria
Norte, no basquete universitá- Dezenas de de Miichael
rio, Michael “Air” Jordan fez a personalidades, Jordan com o
imprensa gastar as palavras incluindo Obama amigo Scottie
Pippen não
“astro”, “estrela”, “mágico”, “so- e Bill Clinton, re- foi esquecida
brenatural”. Na série documen- cordam a carrei-
tal de 10 partes que a Netflix
agora estreia, The Last Dance,
ra de Jordan e a
ele faz com que outras grandes importância que
GETTYIMAGES

personalidades, como Obama o astro teve na


ou Bill Clinton, fiquem sem elas, história do des-
as palavras, ao recordar a rele- porto mundial
NBA com a equipa-maravilha THE LAST
que corria atrás do seu sexto DANCE
título, os Chicago Bulls de • Já disponível
Netflix
Michael Jordan, Scottie Pippen
e Dennis Rodman. Quando a
pandemia estalou, a Netflix
anunciou: em vez de estrear em dados aqui). O homem que não
Junho, This Last Dance iria era um ser humano (“Aquilo
estrear em Abril. não era o Michael Jordan em
Milhões de fãs agradeceram campo, era Deus disfarçado”,
Dennis aos céus – os mesmos onde vi- disseram sobre ele) vive hoje na
Rodman ram Michael levitar e afundar Flórida e há poucos dias reve-
recorda o durante anos (batendo os seus lou à ABC News o que pode-
seu percur- próprios recordes, todos recor- riam os seus admiradores espe-
so ao lado
de Jordan rar do documentário: “As coisas
nos Chica- eram diferentes naquela altura.
go Bulls Eu pedia selos à minha mãe

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para lhe escrever cartas [na


série, a mãe de Jordan lê uma
carta que o filho lhe enviou no
tempo da universidade]. Não
havia Instagram nem Twitter.”
Mas, bom, isto é Jordan a ser
modesto: o que os fãs vão po-
der é rever centenas das suas
melhores jogadas, ouvir deze- Blanchett
nas das suas melhores tiradas é Schlafly,
(frente a jornalistas era tão que
charmoso quanto letal) e ainda transformou
dar algumas gargalhadas, a discussão
sobre
sobretudo com os comentários igualdade
de hoje dos protagonistas num ataque
daquele campeonato. à família
Em 10 partes de uma hora
cada, This Last Dance (que foi
feito a partir das filmagens que
uma equipa da ESPN fez) conta
a história do ano em que os
Bulls quiseram ganhar o sexto
campeonato. E logo nos primei- CATE BLANCHETT É A
ros episódios explica o título
que traz à cabeça. MELHOR ANTIFEMINISTA
No primeiro dia daquela tem-
porada, quando os jogadores
chegaram ao balneário, o trei-
DO MUNDO
nador tinha escrito no quadro: Mrs. America, na HBO, conta a história de Phyllis Schlafly,
“A última dança.” Já todos sa- que lutou contra a igualdade de direitos nos EUA
biam que aquele seria o último
ano de Phil Jackson como trei-
nador dos Chicago Bulls e que, QUEM IMAGINARIA ver agora disponível na HBO.
assim, esse seria também o últi- assim Cate Blanchett, toda “Quando me propuseram
mo ano de Michael Jordan na neoconservadora, a lutar este papel percebi que a
equipa (“Eu tinha praticamente contra a igualdade de géne- história era fascinante. Eu
casado com ele”, disse ao Mor- ro? Ela que é das atrizes que achava que sabia alguma
ning Show). O que não sabiam, mais denuncia as desigual- coisa sobre este período,
embora suspeitassem, era que dades da indústria cinema- mas descobri que não”,
Phil ia querer fazer daquele ano tográfica interpreta a mu- explicou a um canal de
um ano muito especial. lher que impediu a ratifica- televisão canadiano.
A administração tinha permi- ção da Emenda para a Blanchett tinha vontade de
Em 10 episódios tido que uma equipa de filma- Igualdade de Direitos nos descobrir mais. À ABC disse:
de uma hora gens acompanhasse o trajeto anos 70 nos EUA? Nem a “Foi desafiante, claro. Em
dos Bulls. Mas a administração mãe imaginou. termos de valores de vida
cada, a série era parte do problema – senão Foi a atriz (Elizabeth, O nós somos o oposto uma da
documental todo o problema – e se as ima- Senhor dos Anéis, O Hobbit, outra. Mas era isso: eu que-
recupera gens não o demonstrassem, o Blue Jasmine ou Carol) que ria perceber também o que é
imagens da documentário põe dezenas de o contou: até a mãe se per- que a assustava tanto na
época de 97/98 envolvidos a comentá-las. guntou por que razão ia in- ideia de as mulheres terem
para explorar as As tensões entre o diretor- terpretar o papel de prota- os mesmos direitos dos
polémicas que -geral dos Chicago Bulls, Jerry gonista de Mrs. America, a homens.”
rodearam aquele Krause, e o treinador da equipa, minissérie de nove episódios Partilhando o set com
campeonato Phil Jackson, estão no centro da grandes figuras da segunda
história mas, claro, a forma co- vaga do feminismo como
mo Michael Jordan explodia, pa- Shirley Chisholm (por Uzo
ra o bem e para o mal, no meio Aduba) e Gloria Steinem (por
disso é o que fará milhões de Rose Byrne) ela com certeza
pessoas carregarem no play. W descobriu. W AM

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Música

ESCREVER
É TENTAR
REPARAR ALGO
IRREPARÁVEL
No seu sétimo álbum, Lau-
ra Marling inventa uma
filha a quem expressar as
angústias e as esperanças
ENTREVISTA de uma nova fase de vida.
LAURA MARLING Song For Our Daughter, já
Com 30 anos, Laura Marling não tinha mui- disponível, é o seu traba-
to a provar na música. Desde os 16 a escre- lho mais exuberante.
ver e a cantar as suas próprias canções, já Por Pedro Henrique Miranda
angariou distinções dos mais conceituados
prémios musicais britânicos – o primeiro
dos quais aos 18, com Alas, I Cannot Swim
– e, disco após disco, elevou-se ao patamar
de compositora de topo da sua geração.
Ainda assim, após o penúltimo, Semper Qual é o sentido deste título?
Femina, de 2017, achou que a mudança Não é literal, porque não tenho mesmo
tardava: deixou os palcos por um tempo, uma filha, mas é o resultado de ter chega-
inscreveu-se num mestrado em Psicanálise do a uma idade em que os 17 anos já vão
e pôs-se a gravar, no seu apartamento lon- longe. É sobre pensar no que fazia nessa
drino, Song For Our Daughter, mais um idade e estar preparada para coisas para
exercício de sentimento, vulnerabilidade e as quais não estava na altura. O título em
primor autoral. Ao sétimo álbum, continua si é roubado a um livro da Maya Angelou,
a surpreender e a deixar-se surpreender: Carta para a Minha Filha, uma coletânea
pelo mundo moderno, por uma nova fase de experiências incidentais sobre como
de vida ou pela beleza a ser encontrada na agir neste mundo enquanto mulher.
simplicidade.
Algum desse sentimento transbordou
para o som?
Sim, grande parte do disco foi construída
em casa, antes de ir para um estúdio de-

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PSICANÁLISE
Marling iniciou um mestrado
na disciplina, que a ajudou
a compreender que “é a cente, e acho que isso preservou muita da
incapacidade de lidar com intimidade emocional. Depois acrescen-
as falhas que estimula támos muitos elementos, com os quais
o potencial criativo” tive o cuidado de não exagerar no passa-
do, como vocalizações de apoio e arran-
jos de cordas, que acho que enfatizaram
o sentimento e o dramatismo do disco.
SONG FOR OUR
Como evoluiu esse conceito de femini- DAUGHTER
Indie-folk • Ed. PIAS
lidade na sua música? Grátis em streaming
A minha escrita de canções evoluiu na
medida em que a minha habilidade au-
mentou, mas o meu interesse na feminili-
dade mantém-se: é só a consequência da
minha condição de mulher. Mas tem sido Quais as suas influências neste disco?
qualquer coisa viver nesta quinta onda do Principalmente a velha guarda: Paul Si-
reconhecimento cultural da mulher na mon, Tom Waits e Paul McCartney. Pen-
sociedade, dá muito que pensar. sei particularmente no Tom Waits e numa
canção dele, Alice, em que descreve um
O seu interesse pela Psicanálise patinador que crava o nome “Alice” no
também teve influência no disco? gelo e depois é engolido pelas fendas.
A maior parte do disco estava escrito an- Tenho um fascínio enorme por esse tipo
tes de começar o mestrado, mas há muito de escrita, que é muito sofisticada na me-
tempo que me interesso pelo assunto. dida em que é contida, discreta.
Acho que, mais do que afetar o conteúdo
das letras, a Psicanálise ensinou-me que Sente-se confortável na categoria de
o impulso da escrita é a tentativa de cantautora?
reparar algo irreparável, preencher um Percebo porque é que as pessoas tendem
vazio muito antigo em nós próprios. É a a categorizar, ainda que ache que essa
incapacidade de lidar com essa falha que palavra tenha uma conotação um bocado
estimula o potencial criativo. cinzenta. Eu não descreveria os nomes
que citei como cantautores, por exemplo,
Costuma escrever no particular ou no acho que transcenderam a limitação
universal? dessa categoria. Ainda assim, prefiro isso
Não sei, acho que não tento ir nem numa a ser chamada de artista folk ou, pior
direção nem na outra. Não penso em ainda, artista folk feminina.
quem está a ouvir ou para quem estou a
cantar, não gosto de investigar muito a Como gostaria que o disco fosse
minha escrita. recebido nesta altura de pandemia?
Não faço ideia, a não ser que gostaria,
quando tudo isto passar, de fazer a
digressão que sempre fiz, a cantar as
canções a solo. É o meu sétimo álbum, e
já lancei tantos que de certa forma é só
mais uma etapa – não é que o disco seja
descartável, mas não o lançaria nesta
altura se não fosse capaz de lidar com
Espero que o as consequências disso.
sentimento que
subsista no ouvinte O que gostaria que se retirasse deste
seja o de que a sua disco?
Espero que o sentimento que subsista no
experiência é com- ouvinte seja o de que a sua experiência é
preendida, porque é compreendida, porque é isso que gosto
isso que gosto de de sentir quando ouço música: que o meu
íntimo é, de certa forma, partilhado por
sentir quando ouço outros e, portanto, aceite. W
música: que o meu
íntimo é partilhado
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Música www.sabado.pt
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O álbum terá 12 canções em três


blocos. O primeiro feito em casa, de
onde saiu Lar, intimista. O segundo
Este é o meu lar,
criado na Zambujeira do Mar, con- Não quis fazer
uma boa porta
templativo. O terceiro mais roquei- um hino, o
de entrada para
ro, gravado em Toronto tema é anterior
o ambiente do meu
à pandemia. É
novo álbum
só uma canção

TENHO
simples, sem
pretensões

DITO
Por Rita Bertrand
Pela sua simplicida-
de, talvez as pessoas
simpatizem com este
Lar, como com o Pos-
tal dos Correios, mas
“NÃO QUIS não penso nisso, o pú-
blico é imprevisível
FAZER UM
HINO PARA
A PANDEMIA” Nunca incentivei
os meus filhos
Não foi propositado, mas Tim a serem músicos,
criou um tema sobre a vida são licenciados
caseira, que soa a banda sono- noutras maté-
ra do nosso estranho tempo. rias... mas o con-
O que diz ele sobre o seu Lar? O conceito do álbum tacto com o meio,
surgiu há um ano, desde miúdos,
depois de um con- levou a melhor
certo na Culturgest,
O NOVO álbum de Tim a solo, exatamente com
criado com os filhos Vicente (te- esta banda. Resul-
clas), de 27 anos, e Sebastião (ba- tou tão bem que
teria), de 30, Moz Carrapa (guitar- decidi aproveitá-la
ra) e Nuno Espírito Santo (baixo),
20-20-20, só sairá no outono, mas
o primeiro single já está nas plata- Os meus filhos supe-
formas digitais. raram-me. Eu come-
Chama-se Lar e já estava pronto cei a fazer música
antes da pandemia, mas parece sem saber, eles tive-
feito para estes tempos de confi- ram formação. Já
namento: intimista, fala das coisas me ensinaram muito
simples que fazem o músico, a
morar no Ribatejo, sentir-se “em
casa”: a lareira, o tempo sem pres-
sa, os cães a ladrar, as galinhas, o
piano e as guitarras. W
Vivo no campo há
20 anos, mas ago-
ra é mesmo uma
Esta é a minha face mais fami- bênção. Estou
liar, diferente da energia dos num confinamen-
Xutos e também longe do cariz to relativo, com Passo a manhã entre
popular d’Os Tais Quais uma rotina para a horta e o pomar, a
além das quatro podar, a limpar fo-
paredes, o que lhas, a tratar das gali-
LAR
ajuda muito nhas, e a tarde mais Single Sony Music
em casa, a tocar e a ler Streaming grátis
D.R.

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Miúdos www.sabado.pt
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MIÚDOS PERGUNTADORES
CHAMADOS À GALERIA DIGITAL
Não há espaço para questões herméticas, mas o lado poético sobressai quando crianças entrevistam artistas. Morgana
Morais, de 10 anos, por exemplo, quis saber se as esculturas de Pedro Figueiredo “têm coração”. É o novo projeto online
da Zet Gallery, em Braga. Por Rita Bertrand

A entrevista de Se gosta de arte,


Rodrigo Carvalho mostre aos seus
a Acácio Viegas filhos a série
OS VÍDEOS da iniciativa Agora é publicada
de vídeos
Pergunto Eu!, que põe crianças a 25 de abril
a entrevistar artistas represen-
de entrevistas
tados pela galeria bracarense, Agora Pergunto
ficam disponíveis a cada sába- Eu! As inscri-
do, no site, canal de YouTube e ções continuam
demais redes sociais da galeria. abertas,
Ideia de Helena Mendes Perei- à espera deles
ra, que a dirige: “Por um lado,
os miúdos são desafiados a pre-
parar a entrevista e a fazê-la.
Ficam entretidos e, ao mesmo respondeu “o ser humano”,
tempo, a aprender. Por outro, os enquanto a imagem ilustrava a
pais ajudam, tornando-se uma sua resposta, mostrando o seu
atividade para toda a família. E trabalho, mas o auge da con-
ainda promovemos os nossos versa de cinco minutos foi uma
artistas de forma diferente”. questão que provavelmente só
Iniciado com a pandemia e uma criança, na sua poética
previsto para durar até junho, inocência, colocaria: “As suas
o projeto tem tido tal sucesso, esculturas têm coração?”
contando já com meia centena Legendada em inglês e com
de inscrições de todo o País montagem dinâmica, a série já
(pelo email geral@zet.gallery), vai em três vídeos: a 11 de abril
que é capaz de se prolongar. surgiu Margarida Carvalho, por-
O processo é simples: após a tuense de 9 anos, a entrevistar a
inscrição, há conversa telefóni- pintora Cristina Troufa, e a 18,
ca com os pais, para garantir Ana Maria Baltar, de Coimbra,
que darão apoio à execução da com 10, falou com Xana Abreu,
entrevista, realizada com ferra- Cristina Troufa que cruza burlesco, família e
mentas digitais. Depois, a partir foi entrevistada fantasia em tinta acrílica.
de sugestões, os miúdos só têm por Margarida Segue-se o bracarense Rodri-
de escolher o artista com quem Carvalho go Carvalho, de 13 anos, com
mais se identificam. Acácio Viegas e as suas geome-
A primeira entrevista, online trias que evocam espiritualida-
desde 4 de abril, foi de Morgana des, disponível dia 25 de abril,
Morais, menina de Braga com Pedro Caridade (Braga, 10 anos)
10 anos, que entrevistou o es- às voltas com os retratos (e não
cultor Pedro Figueiredo. Come- só) a óleo e carvão de Juan Do-
çou por lhe perguntar o clássico mingues, online a 2 de maio, e a
“O que o inspira?”, ao que ele 9, Laura Fernandes, de 9 anos, e
Pedro Figueiredo Luís Canário Rocha, ambos de
falou com Guimarães, a trocar ideias sobre
Morgana Morais paisagens coloridas. W

101
Animais

NOVO AMIGO EM CASA? que a associação notou um


aumento de cerca de 30% nos
pedidos para adoção, uma

NÃO POR IMPULSO


situação em tudo similar à vi-
vida pela SOS Animal: “Senti-
mos um boom de procura por
Muitos resolveram adotar um animal para contornar o isolamento social. cães e gatos como nunca tí-
As associações aplaudem o gesto, mas deixam avisos: é preciso planeamento nhamos tido”, afirma desta
para que o bicho não vá novamente para a rua. Por Filipa Teixeira feita Sandra Duarte Cardoso,
presidente da SOS Animal.
Contudo, se o isolamento so-
cial atiçou a vontade de adotar,
SNIDER Rodrigues tem um O fotógrafo também deixou muitos cães e
novo companheiro em casa: João Azevedo gatos na rua. Maria Pinto Tei-
chama-se Kenny, é um border xeira aponta que nos primeiros
collie adulto, abandonado há Esta é uma prática transver-
criou o site Be quatro dias em que foi decla-
três anos e que agora partilha sal a praticamente todas as as-
My Friend para rado o estado de emer-
casa com ele, no Bonfim. sociações de animais, que an- ajudar associa- gência, a Animais de
“Estamos a ganhar confiança”, tes de darem um animal para ções e canis Rua contabilizou 15
conta o dono, que encontrou adoção fazem uma criteriosa a divulgarem
Kenny no site da iniciativa Be avaliação dos futuros tutores. os animais
My Friend (bemyfriend.pt), um Com o surgimento da pande- disponíveis
projeto do fotógrafo João Aze- mia, o procedimento tornou- para adoção
vedo para ajudar associações -se ainda mais criterioso: “Re- através de Há uma
e canis a divulgarem os seus cusamos 60% dos pedidos por
animais através da fotografia. considerarmos que são ado-
fotografias crescente
procura por
Para Snider, a adoção era uma ções por impulso ou sem con- animais de
ideia que já estava a ser pon- dições para garantir os cuida- estimação;
derada desde o início do ano, dos do animal no pós-Covid- as associa-
mas só nos últimos dias de -19”, diz Maria Pinto Teixeira, ções aju-
dam a dar
fevereiro resolveu contactar CEO da Animais de Rua. Des- o passo
o Centro de Recolha Oficial de que foi decretado o esta-
de Matosinhos para formalizar do de emergência,
o pedido: “Tive de preencher
um formulário para ficarem
a par das minhas rotinas.”

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animais abandonados em coló-


nias. E os números continuam
a aumentar: “Há dias foram
abandonadas duas caixas de
gatas com crias à porta do nú-
cia científica que o comprove.”
Também Sandra Duarte Car-
doso alerta para o aumento de
abandonos: “Atendendo a que
nos vamos deparar com uma
recessão, estamos apreensivos
com o que aí vem.”
Por isso, embora as associa-
6
1
CONSELHOS
PARA QUEM
PENSA ADOTAR
Pense no futuro: estar em casa
agora não significa que poderá
tratar do animal quando voltar à
4
Considere apadrinhar ou inscrever-
-se como Família de Acolhimento
Temporário (FAT): ao apadrinhar,
cleo do Porto. Houve algum ções sejam unânimes ao afir- rotina normal. Lembre-se que a contribui para os cuidados básicos
alarmismo, causado pelas notí- mar que é bom haver quem adoção é um projeto a longo prazo do animal e pode ir visitá-lo ao
cias de que os gatos poderiam queira adotar um animal, e requer disponibilidade profissio- abrigo e passeá-lo. Para incentivar,
ser transmissores do vírus, mas, aconselham que o passo seja nal, emocional e financeira. a Lagunitas oferece um kit com 24
como aliás a OMS já veio escla- dado de forma consciente e garrafas, copo, porta chaves e T-
recer, não há nenhuma evidên- não por impulso. “Estarmos 2 -shirt da marca a quem apadrinhar
agora em casa, em isolamento Tenha mais atenção aos aspetos um cão da SOS Animal durante o
social, não pode ser uma des- comportamentais que aos físicos: período de quarentena. Como FAT,
culpa para trazer uma nova o importante é que a personalida- ajuda as associações a educar e a
vida para o nosso lar e depois de do animal se adeque ao seu es- fazer com que os animais recupe-
descartá-la quando tudo vol- tilo de vida. Por exemplo, animais rem a confiança nos humanos. É
tar ao normal.” O animal, lem- mais novos requerem mais aten- uma boa opção se não tiver condi-
bra Sandra, “é um membro da ção e estímulos que mais velhos. ções para a adoção a longo prazo.
nossa família. Há que planear
bem a adoção”. W 3 5
Siga à risca os conselhos da OMS: Para avançar, vá a Adopta-me.pt, o
durante o período crítico da Covid- site criado em 2001 por Jorge Dio-
-19 não dê passeios em grupo e go e Susana Crespo: tem uma lista
limpe as patas e o pelo do animal de associações organizadas por
com uma solução à base de água distrito, incluindo ilhas, e anúncios
e sabão antes de entrar em casa. de animais disponíveis.

6
Se estiver em dificuldade, peça aju-
da: além das associações nacio-
nais Animais de Rua ou SOS Ani-
mais, há outras locais que ajudam
nos cuidados básicos, como ali-
mentação e veterinários, incluindo
descontos em clínicas parceiras.

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Estilo

TUDO PARA
A MELHOR MÃE
DO MUNDO
Vivemos tempos extraordinários – mas se os vivemos
é porque, à partida, as nossas mães nos permitiram
viver, não é? Assim, não nos esqueçamos delas neste
Dia da Mãe, que se há de comemorar a 3 de maio.
Estas são as nossas sugestões de presentes.
Por Ângela Marques

CARTEIRA
LONGCHAMP
A linha Roseau da
Longchamp tem carteiras
modernas como esta,
que pode encomendar
em www.longchamp.com
(portes de envio grátis).
€420

CHINELOS VESTIDO
LEMON JELLY SALSA
A Lemon Jelly é uma marca Florido como se espe-
vegan. Para que a sua mãe ra que seja o verão,
sonhe com um verão este vestido é ainda
ambientalmente responsável confortável, prático e
vá ao site da marca. elegante. Está disponí-
€59,99 vel no site da marca.
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BEACH PERFUME
NECESSAIRE PENHALIGON’S
HAVAIANAS Elisabethan Rose
Devolva à sua mãe é a nova versão
a esperança num de uma fragrância
verão que nos deixe clássica da Penhaligon’s
pelo menos ver de 1984. Exclusivo do
o mar. Vá a www.ha- site do El Corte Inglés.
vaianas-store.com. €163,90
€20

COLUNA
SONY
Gosta da sua mãe
ÓCULOS até debaixo de água?
DE SOL LEVI’S Essa é a mensagem
Com os olhos postos no futuro, desta coluna
a Levi’s propõe óculos para SRS-XB12 da Sony,
dias de sol. Disponíveis que promete não
em várias óticas online. meter água.
€89 €65

PERFUME
GOOD GIRL
Esta eau de parfum
da Carolina Herrera,
à venda no site da
Perfumes e Compa-
nhia, chama-se Good
Girl mas foi feita para
mulheres poderosas.
€87,68 (80 ml)

VERNIZES OPI
A nova coleção limita-
da de vernizes da OPI,
Mexico City, tem cores
vibrantes para deixar
as mãos elegantes.
TÉNIS CAMPORT Disponíveis no site
Chama-se Kik 1.0., tem gola www.lookfantastic.pt.
almofadada e alto amortecimento. €16,75
Disponível no site da marca, com
portes gratuitos até 30 de abril.
€90

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Passatempo
Opinião

por Inspetor Fidalgo

2091: NÚMERO
MÁGICO!
Não, não se trata de nenhuma profecia programada
para esse ano, mas tão só o número de detetives que
já responderam aos nossos desafios no Torneio SÁBADO
Policiário 2020, nas duas primeiras provas!

UM NÚMERO QUE
DEMONSTRA A FORÇA
e a vitalidade de um desporto que
mexe com as células cinzentas de
cada um de nós e nos coloca em
permanente desafio connosco mes-
mos e com os restantes detetives.
Verificamos com muito agrado o
regresso à competição de bastantes
confrades e detetives do passado,
muitos dos quais não competiam há xar aqui a nossa homenagem aos de-
décadas, a par com o surgimento de tetives, a todos e a cada um, pelo
muitos novos parceiros de caminha- empenho que puseram na decifra-
da, alguns dos quais nunca tinham, ção dos crimes propostos, quase
sequer, ouvido falar de Policiário. sempre muito bem resolvidos. Algu- ca, das situações relatadas. Com a
Cremos, pois, que estamos a con- mas distrações acabaram em pontos prática adquirida nas nossas investi-
seguir atingir o que sempre nos pro- perdidos, mas também é quando so- gações, aprendemos a ver os crimes
pusemos desde a primeira hora: mos apanhados em falta que mais com outros olhos, aprendemos a não
proporcionar uma atividade dife- aprendemos! aceitar as “opiniões” que certos jor-
rente, capaz de mexer com o cére- Mantendo-se esta situação de ter- nalistas e repórteres nos vão passan-
bro, em desafio permanente às nos- mos a obrigação moral e social, para do como sendo provas, que afinal
sas capacidades de leitura, interpre- além das questões legais, de ficarmos não passam de conjeturas. Um dete-
tação, análise cuidada e direciona- a maior parte do tempo em casa, para tive sabe “ler” o crime, separar o es-
da, poder de síntese e, finalmente, obstarmos à nossa contaminação e sencial, trabalhar a informação e en-
de escrita. Dificilmente encontrare- dos outros, de mais tempo dispomos contrar a correta linha de investiga-
mos um passatempo tão completo, para trabalharmos as nossas capaci- ção a seguir, em cada caso, não em-
mesmo sem contarmos com a an- dades dedutivas, desde logo lendo e barcando em soluções apresentadas
siedade da espera dos resultados analisando os desafios que publica- como pacotes encerrados.
das nossas investigações! mos, mas igualmente lendo bons ro- E já agora, caros detetives, porque
E por falarmos em resultados, com mances policiais, ou procurando nos não ensaiar a feitura de problemas
as pontuações das duas primeiras casos criminais que vão sendo publi- policiais? Porque não pegar numa
provas já publicadas no blogue SÁ- cados na nossa imprensa, os porme- situação vivida ou imaginada e des-
BADO POLICIÁRIO, em sabadopoli- nores e as dicas que nos permitem fa- envolvê-la como se de uma investi-
ciario.blogspot.com, queremos dei- zer uma análise diferente, mais críti- gação se tratasse? Um problema po-

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LITERATURA POLICIAL
HISTÓRIA DE SUCESSO — 5
Dissemos em certa altura, que o
policial americano, sobretudo no
momento em que apontou as suas croata; o islandês Arnaldur Indrida-
baterias para o romance de tipo son e o seu detetive Erlendur, que
“olho por olho”, com um realismo surge com dois filhos com problemas
que se apresentava como sangui- de droga; e principalmente Stieg
nário para os padrões da época, Larsson, jornalista sueco que morreu
sobretudo na Europa, sem qualquer em 2004, antes de poder assistir ao
respeito pela vida humana, com boom do policial nórdico e funcionou
Mike Hammer de Mickey Spilane ou como o primeiro grande autor nórdi-
Lew Archer de Ross Macdonald, te- co, com Lisbeth Salander e Mikael
ria perdido a corrida pela liderança Blomkvist, personagens centrais da
do policial. sua trilogia Millennium.
Se isso foi verdade em dado mo- Tentar entender os motivos para ta-
mento, sobretudo para o leitor euro- manha mudança do gosto de leitura
peu, mais virado para a decifração policial, é tarefa para sociólogos e cer-
pura e cavalheiresca pro- tamente terá razões objeti-
tagonizada, por exemplo, vas para tal crueza, mas
por Sherlock Holmes ou
por Poirot, com investiga- k provoca uma dor profunda
no leitor, que fica chocado
ções de fino recorte dedu- TAL CRUEZA e perturbado com as des-
tivo e elevado grau de inte- PROVOCA crições brutais e desprovi-
ligência, como estava lon- UMA DOR das de qualquer sentido de
ge da realidade quando al- PROFUNDA NO humanidade, em que as
guns anos depois emerge LEITOR, QUE vítimas são sujeitas a tor-
um tipo de literatura poli- FICA CHOCADO turas inimagináveis que
cial de uma violência ex- COM AS culminam inevitavelmen-
trema, a quebrar todos os DESCRIÇÕES te na sua morte. Não se li-
máximos de popularidade BRUTAIS mita, pois, à simples apre-
e de vendas em todos os sentação do crime, como
continentes, que ficou co- era usual, com os traços de
nhecido como “o policial nórdico”, violência q.b. para abrir a investigação,
curiosamente oriundo de países onde antes aplica uma dose de realismo sá-
o crime, praticamente, não existe! dico quase transformando cada caso
Destacamos, pela sua importância num manual de violência extrema.
licial não é mais do que um conto
i e pelo modo espetacular como sou- Podemos, claramente, entender que
em que não se chega ao fim. No mo- Escola nórdica beram impor um género que não re- haja objetivos políticos e sociais na es-
Da dinamarquesa
mento em que toda a informação Inger Wolf ao gistava a aceitação do leitor médio crita policial nórdica, porque temos lá
está transmitida, o autor interrom- aclamado Stieg europeu, o sueco Henning Mankell e a violência doméstica, o tráfico de
pe a narrativa e interroga os seus Larsson, dos o seu inspetor Kurt Wallander; a di- drogas, a corrupção, a imigração ile-
países nórdicos
leitores, que terão de continuar o chegam policiais namarquesa Inger Wolf e o seu ins- gal, o racismo ou a xenofobia e outras
raciocínio do autor! de grande sucesso petor Daniel Trokic, de ascendência realidades, contadas com uma cruel-
Simples? Nem por isso! Mas sem dade chocante, mas não deixa de sur-
tentarmos, nunca saberemos do que preender como numa parte do mundo
somos capazes! em que praticamente não ocorrem
O Inspetor Fidalgo fica à espera das crimes violentos, há uma corrente tão
tentativas em lumagopes- importante em qualidade e quantida-
soa@gmail.com e garante que todas de que segue esse tipo de escrita como
serão lidas e analisadas, discutidas regra e não, como mandaria a lógica,
com os seus autores e, passando os como exceção!
critérios relativos aos problemas Sem qualquer dúvida, podemos fa-
policiais, serão publicadas no torneio lar de mais uma escola, a juntar às
atual ou em futuros. que tradicionalmente dominaram o
Vamos escrever um problema romance policial durante mais de
policiário? W um século. W

107
Passatempo
Opinião

Quebra-cabeças 1 Dois irmãos (não importa se


Para os dias de quarentena, a SÁBADO
republica em várias partes os problemas
são dois rapazes, se um rapaz
da autoria de Manuela Vidal, Manuel e uma rapariga, se duas
Domingos e José Ribeiro Gonçalves
raparigas), filhos do mesmo

2
homem e da mesma mulher,
afirmam que não são irmãos.
Então o que são?

3
Eu moro numa urbanização com duas
ruas. Cada rua tem quatro casas em
banda, numeradas de Poente para
Nascente. Considerando que os números
de polícia da Rua Miguel Bombarda são
pares e os da Rua Júlio de Matos são
ímpares, pondere as seguintes premissas
e descubra a minha morada.
− A minha casa é branca;
− Na Rua Miguel Bombarda existe uma Os cães brancos são animais
casa cinzenta e na Rua Júlio de Matos ferozes. Todos os animais
existem duas; ferozes precisam de comida.
− A casa vermelha tem o n.º 3; Isto significa que:
− A casa azul confina a Nascente com − O meu cão é branco
a casa vermelha e a Poente com uma porque precisa de comida.
casa cinzenta; − Todos os cães brancos
− A casa com o n.º 8 é amarela e não precisam de comida.
confina com qualquer casa cinzenta; − Certos cães brancos não
− Existe uma casa cinzenta que confina precisam de comida.
a Nascente com a casa verde. − Alguns cães brancos não
são animais ferozes.
Qual destas frases está
correta?

4 Qual é o meio
de transporte
habitualmente
utilizado por estes
quatro amigos: Abílio,
Alcides, Anacleto
e Anastácio?
108
23 ABRIL 2020
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5
Lisa está sem agenda e precisa de telefonar para a
sua amiga Rute. Dos nove algarismos do número
do telefone de Rute, Lisa apenas se lembra dos
cinco primeiros na ordem correta. Sabe quais são
os últimos quatro e que estes não se repetem, mas
não se recorda da ordem. Qual é o maior número
de tentativas que Lisa precisa de fazer até

9
conseguir acertar no número de telefone de Rute?

6 Caetano decidiu escrever todos os


números de 6 a 16 na ordem correta. 10
Depois, a cada número, foi adicionando Quando os
os números vizinhos; primeiro fez ponteiros
somas com os anteriores e depois com das horas
os posteriores. Quantos resultados com e dos
números pares obteve? minutos de
um relógio
7 Se o
Diamantino,
ao ver-se ao
espelho, tocar
8
Um biólogo percebeu que
Que
animal
digital
estão sobre
o número
se
certa espécie de alga
na orelha unicelular demora 24 horas 12, que
esquerda, a duplicar-se. Para provar horas são?
será que a
imagem tocará
a sua teoria, colocou uma
alga num tubo de ensaio
esconde
também na
orelha
e, passados 10 dias, obteve
1.024 algas. Se o biólogo na alface
e na
iniciasse a experiência
esquerda? com duas algas, quantos
dias seriam necessários
para obter as mesmas
1024 algas?
cebola?
11 Norberto supõe que o seu relógio está 5 minutos atrasado,
mas, na verdade, está 10 minutos adiantado. Quando Norberto
chega a um encontro, pensa que está 15 minutos atrasado em
relação à hora combinada. Afinal, ele chegou na hora certa, 5
minutos atrasado, 5 minutos adiantado ou 10 minutos atrasado?

12
Numa promoção, o preço de um artigo foi
reduzido em 20%. Que percentagem deve
ser acrescida ao preço desse artigo
para que ele volte a ter o preço inicial?
109
110
SOLUÇÕES 1 Mentirosos ou… parvos! 2 Eu moro na Rua Miguel Bombarda, n.º 6. Através da segunda, da terceira
e da quarta premissa, e por exclusão de partes, verifica-se que a Rua Júlio de Matos inclui uma casa vermelha,
uma azul e duas cinzentas, com os números de polícia 1, 3, 5 e 7, como indica o quadro abaixo. Como cada rua
só tem quatro casas: a minha casa, a casa verde, a amarela e uma das casas cinzentas, só podem localizar-se na
Rua Miguel Bombarda. Assim e analisando a primeira, a quinta e a sexta premissa, e também por exclusão de
partes, deduz-se a ordem das casas e os números de polícia respetivos, sendo então fácil concluir que eu moro no n.º 6 dessa última rua. Rua Miguel Bombarda
3 A segunda frase: Todos os cães brancos precisam de comida. 4 BI-CI-CLE-TA. Obtém-se esta informação retirando as segundas sílabas dos dois primeiros
nomes e as terceiras sílabas dos dois últimos nomes 5 Lisa precisa de fazer 24 tentativas, no máximo, para marcar corretamente o número de telefone de Rute.
Poderá começar a sequência com qualquer dos 4 algarismos de que se recorda. No 2.° dígito, poderá colocar qualquer um desses algarismos com exceção do
que foi posto no 1.° dígito e, assim, sucessivamente, até sobrar um único algarismo para o último dígito. Logo, 4 x 3 x 2 x 1 = 24. 6 Nenhum. Antes e depois de um
número par está sempre um número ímpar Logo, o resultado da soma de dois números vizinhos é sempre um número ímpar. 6 + 7 = 13; 7 + 8 = 15; 8 + 9 = 17; 9 +
10 = 19; etc. 7 Considerando que os espelhos refletem sempre imagens simétricas, a imagem de Diamantino toca na orelha direita. 8 9 dias completos. Iniciando a
experiência com 2 algas, basta duplicar o número de algas obtidas no fim de cada dia. Assim: primeiro dia = 4; segundo dia = 8; terceiro dia = 16; quarto dia = 32;
quinto dia = 64; sexto dia =128, sétimo dia = 256; oitavo dia = 512; nono dia = 1024. 9 O Alce (alface; cebola). 10 Os relógios digitais não têm ponteiros 11 Norberto
chegou na hora certa. A soma entre o que ele pensa (5 minutos atrasado) e a realidade (10 minutos adiantado) e de 15 minutos. Ou seja, 10 + 5 = 15. 12 Para obter-
mos o preço inicial do artigo, devemos aumentar 25% ao preço que lhe foi atribuído quando estava em promoção (20% de desconto). 0,8xy = x y = x/0,8x y =
1,25x 13 O homem estava fardado de bombeiro. 14 Condor, andorinha ou codorniz. 15 Senhorita Silvana Sarmento. Sinto saudades suas. Sem si, sinto-me só. Sofro
silenciosamente 78 sem seu sorriso, sem sua subtil sensatez. Seus sentimentos sensibilizam-me, sua sensibilidade seduz-me. Sem segundos sentidos, sinto sensa-
ções secretas. Sonharei sossegado se sentir sentimentos semelhantes. Serei sempre seu servidor sincero. Serei sempre só seu. Silvério Sá Sousa Sacramento. 16
Guimarães 17 Porque sendo bimensal, na cidade da Guarda ou em qualquer outro lugar, sai duas vezes por mês, ou seja, 24 vezes por ano. O bimestral é que se
publica apenas de dois em dois meses. 18 A segunda afirmação: Nenhum animal simpático é sapo.
− Nenhuma tartaruga é simpática.
− Todos os animais simpáticos não são tartarugas.
− Nenhum animal simpático é tartaruga.
− Nenhum animal simpático é sapo.
− Alguns animais simpáticos são sapos.
e todos os sapos não são simpáticos, portanto:
18 Todas as tartarugas são simpáticas
vezes por ano? sempre; serei. sofrimento?
mais do que seis sensações; semelhantes;
sentimentos; só; segundos;
que voa com
bimensal sai
sensibilidade; subtil; menos, uma ave
um jornal sorriso; servidor; seu;
senhorita; silenciosamente;
Guarda, Indique, pelo
cidade da sonharei; saudades; si; sentir;
motivo, na na seguinte lista: Sousa;
todas as palavras constantes

14
17 Por que Complete a carta, utilizando
ele feito tal afirmação?
é bombeiro!” Porque terá
no centro? “Vê-se logo que o senhor
rigorosamente O Isidro serve-o e exclama:
que tem mar e um copo de água gelada.
portuguesa pede uma bica a escaldar
Qual a cidade do Isidro e, apressadamente,
Um homem entra no café
13
peculiar à sua apaixonada:
talentoso, escreveu uma carta
15 Silvério, um homem muito Quebra-cabeças

16
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Guia para salvar o seu emprego


Pensando nos serviços de saúde, públicos
ou privados (não sou médica nem enfer-
meira), o motivo que me levou a escrever
estas linhas tem a ver com perdas recen-
tes de familiares queridos. Preciso de
perguntar a quem sabe. Por que razão a
investigação sobre o cancro tem avança-
do tão pouco? Dizem-me que tem avan-
çado muito, mas esse muito é insuficien-
te para uma doença terrível que traz tan-
to sofrimento às pessoas. Porque é que as
equipas médicas das várias especialida-
des não coordenam o trabalho terapêuti-
co em relação ao doente? É como se
cada um visse a sua parte mas não visse
o doente como um todo. Sei que há
casos de sucesso, muitos, o que é de
valorizar. Mas há muitos casos de insu-
cesso que conduzem à morte (...). O
cancro não contagia, mas é muitas vezes
um inferno de onde não se sai, a não ser
L quando a morte chega. A terminar,
Maria José Correia acentuo o meu respeito por todos os que
Albergaria-a-Velha lutam para vencer a Covid-19 (...). W
(...) Além de todo o drama da saúde, esta pandemia está já a afetar-nos na
economia e no emprego. (...) Há muitos exemplos de gente solidária, que tem
reconvertido as suas fábricas e empresas para fazerem máscaras, fatos ou até Direito de resposta
para confecionar refeições para os profissionais de saúde (...). Infelizmente, Ao abrigo da Lei de Imprensa, e especifica-
como a História já nos mostrou, nas guerras há sempre quem se queira apro- mente nos termos dos respetivos artigos 24.º
veitar dos mais fracos e despeça trabalhadores sem dó nem piedade (...), lan- e seguintes, a Brisa vem exercer o direito de
çando para o desemprego milhares só para não ter um lucro tão elevado (...). retificação, relativamente ao texto publicado
na pág. 49, da edição de 16 de abril p.p., da
revista SÁBADO, e posteriormente publicado
no site www.sabado.pt, no dia 17 de abril, na
L L coluna de opinião Instantâneos (ou quase) 2,
Emanuel Caetano Paula Lobo intitulado Pergunta 5, e onde o autor, o dire-
Ermesinde Lisboa tor-adjunto António José Vilela, pergunta “Por-
Coisas que mudaram Que o sofrimento nos una que é que a Brisa não tem vergonha e não
deixa a mama do Estado (já anda publica-
Este vírus promete ser aquele que vai A pandemia Covid-19 tem gerado ondas mente a ameaçar pedir indemnizações invo-
inspirar mais medo e causar danos admiráveis de solidariedade. (...) Os pro- cando disposições contratuais) só um bocadi-
irreparáveis. No entanto, há coisas que fissionais de saúde têm sido de uma de- nho, só um bocadinho?”
mudaram com esta pandemia: afinal dicação comovente, de uma capacidade Esta pergunta, deselegante na forma, as-
sempre era possível baixar os preços espantosa para tratar, (...) organizar espa- senta em pressupostos errados acerca da Bri-
dos combustíveis, impedir os trabalha- ços e melhores condições para atende- sa, que não correspondem à verdade e que é
dores dos híper e supermercados de rem os doentes. Tão emocionante tam- importante retificar. A verdade é que 1) a Bri-
trabalhar ao domingo, viver sem arrui- bém a correção e o investimento daque- sa é um contribuinte líquido do Estado, 2) a
nar o ambiente e sobreviver sem o fu- les que estão a trabalhar em contacto di- receita da concessão Brisa depende exclusi-
tebol. Conclui-se agora que o Serviço reto com o público. (...) Os investigadores vamente das portagens recebidas do tráfego e
Nacional de Saúde é exemplar, os pro- não param! A ciência progride (...). É uma não de qualquer subsídio ou renda do Esta-
fessores já são bons e até os movimen- pandemia, facto que por si só justifica do, 3) o risco da atividade é integralmente su-
tos antivacinas suplicam por estas. muito, quase tudo... Penso que além dis- portado pela Brisa, com exceção dos chama-
Apesar de não poder evitar uma guerra so existem três causas principais: a gravi- dos riscos regulatórios, e 4) a Brisa não fez
civil pelo papel higiénico, o novo coro- dade da doença, o ser muitíssimo conta- qualquer ameaça, ou pedido de indemniza-
navírus tem operado milagres pois giosa e o desconhecimento do novo ví- ção, contra qualquer instituição pública, nem
consegue unir diferentes partidos polí- rus. Mas há também o desafio! Trata-se contra qualquer outra entidade. W
ticos, libertar reclusos, prender quem de uma luta em que é constantemente
quer sair de casa e até já há mais preciso: descobrir muito, aprender muito, Franco Caruso
portugueses a fazer exercício nas ruas. investir muito, dedicar-se muito! (...) Diretor de Comunicação

112
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Conselho de Administração Paulo Fernandes (Presidente),


João Borges de Oliveira, Luís Santana e Alda Delgado
Diretora Geral de Marketing Isabel Rodrigues
Diretor Geral Comercial Hernâni Gomes
Diretora Administrativa e Financeira Alda Delgado
Diretor-Geral Editorial Octávio Ribeiro
Diretores-Gerais Editoriais Adjuntos Armando Esteves Pereira e Alfredo Leite
Coordenador-Geral de Meios, Agenda e Planeamento Ricardo Tavares
Diretor do Departamento Gráfico Pedro Freire ,
Diretor de Circulação e Assinaturas João Ferreira de Almeida
Diretor de Informática Rui Taveira Relógio Haven
Diretor de Recursos Humanos Nuno Jerónimo
Diretora de Research Ondina Lourenço Tommy Hilfiger
Um relógio de inspiração clássica
Diretor Eduardo Dâmaso (eduardodamaso@sabado.cofina.pt)
Diretor-adjunto António José Vilela (antoniovilela@sabado.cofina.pt) é a proposta da Tommy Hilfiger
Subdiretor Carlos Rodrigues Lima (carloslima@sabado.cofina.pt)
Chefe de Redação Nuno Tiago Pinto (nunopinto@sabado.cofina.pt)
Watches & Jewelry para celebrar
Editores-executivos Carlos Torres (cstorres@sabado.cofina.pt);
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Redatora Principal Ana Taborda (anataborda@sabado.cofina.pt) dourado está disponível online,
Editores Ângela Marques (angelamarques@sabado.cofina.pt);
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Secretária da Direção Catarina Gonçalves (catarina@sabado.cofina.pt)
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Colaboram nesta edição André Santos, Eduardo Pitta, Filipa Teixeira,
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Open Infinity por causa da sua abertura que
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Circulação
Madalena Carreira (coordenadora) e Jorge Gonçalves
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Redação
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de primavera
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Falconeri
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A cor é a protagonista da
estação primaveril da marca
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em fibras naturais. Nos seus
Contribuinte 502 801 034 2745-553 Queluz tons mais vivos e intensos,
Principal Accionista Cofina SGPS, de Baixo
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Depósito Legal 210999/04 de Publicações, Lda.
Tiragem média no mês de Junho MLP: Media Logistics
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2739-511 Agualva, Cacém

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Crónica 23 ABRIL 2020
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CUIDADOS seja, perdemos para um caso termi-


nal de incompetência e para um país
abrileiros vêem fascistas em todo o
lado. Mas, em termos cognitivos e
INTENSIVOS que optou, veremos se acertadamen-
te, por não impor nenhum confina-
neurológicos, revelam a mesma pre-
disposição para a boçalidade.
Em países que rondam os 10 milhões de mento às massas. Julgava eu que o pior desta pande-
habitantes, só perdemos para a Bélgica Por outro lado, quando nos medimos mia eram os artistas variados que, di-
e para a Suécia, ou seja, perdemos para com países de riqueza per capita se- rectamente das suas casas, gostam de
um caso terminal de incompetência e melhante, é inquietante saber que, nas invadir as nossas para proporcionar
para um país que optou, veremos se mortes por milhão de habitantes, Por- “entretenimento”. Esqueci-me de ou-
acertadamente, por não impor nenhum tugal chega às 70 – mas a Grécia, com tro tipo de artistas: os “donos de Abril”,
confinamento às massas 10 milhões de habitantes, tem 10; a Re- que há 46 anos vivem dessa fantástica
pública Checa, também com 10 mi- mesada, sempre prontos a moraliza-
lhões, tem 17; e a Polónia, com o quá- rem os rústicos de que só eles sabem o
druplo da nossa população, não chega que é a democracia.
aos dois dígitos. Um dia, quando todos eles pertence-
C Com este cenário e um futuro que rem aos rodapés da história, podere-

Milagres ninguém adivinha quando o País re-


gressar à normalidade, o carnaval que
mos olhar para o 25 de Abril, e cele-
brá-lo, com serenidade e sem oportu-

nacionais vejo por aí não passa de uma piada de


mau gosto.
nismo ideológico. Até lá, é aguentar
estas cruzes da mesma forma que os
brasileiros aguentam a deles.
ANDA POR AÍ UMA ALEGRIA ma- TODO O MUNDO RI e insulta Jair Bol-
cabra com a nossa luta contra a Co- sonaro. Com um primitivismo imacu- AS TELEVISÕES enchem-se de co-
vid-19. O entusiasmo não se limita ao lado, o Presidente do Brasil não hesita mentadores e respectivas estantes. De
Presidente da República, para quem em considerar-se acima da ciência e tal forma que, suspeita minha, há uma
o País é simplesmente um “milagre”. do bom senso para fazer de conta que competição em curso para ver quem
Espalha-se por políticos, comentado- nada mudou com a crise do coronaví- tem as melhores lombadas.
res, portugueses lorpas e a senhora rus. E quem não concorda com ele, su- Um conselho: desistam. Para come-
que me vende os legumes. Não admi- gerindo maior recolhimento, só pode çar, a medalha já foi entregue (a José
ra que o PS esteja em alta nas sonda- ser comunista ou coisa pior. Se não Miguel Júdice). E, para acabar, as estan-
gens: com esta bebedeira colectiva, fossem os governadores estaduais, tes são tão primeira semana da quaren-
estranho que o dr. António Costa ain- que ainda vivem neste planeta, o Brasil tena! O que está a dar agora são qua-
da não tenha sido coroado rei. estaria condenado. E nós? dros, de preferência não figurativos.
Não sei de onde vem esta alegria. Nós temos vários Bolsonaros, que Se a coisa continua, não sei onde va-
Para começar, um País que caminha praticamente não se distinguem do mos parar. Comentadores com uma
para os mil mortos (no momento em original. O País está em estado de orquestra atrás? Bailarinas? Um par de
que escrevo) tem poucas razões para emergência? Está. Mas eles acham-se palhaços? É o velho problema da cul-
festejar. Sem falar do resto: a onda de acima do povaréu comum para come- tura como adorno: sabemos como co-
destruição económica que aí vem, e morar o 25 de Abril como se a realida- meça, nunca como acaba. W
que aliás já começou a fazer vítimas de (e a lei) não se lhes aplicasse. A úni-
com desempregados e lay-offs, de- ca diferença é que Bolsonaro vê co- Texto escrito segundo
via moderar os festejos. Pelo vistos, munistas em todo o lado e os nossos o anterior acordo ortográfico
não modera.
Mas regresso aos mortos. O País não
trilhou o caminho catastrófico da Bél-
gica, de Espanha ou de Itália? Verda-
de. Uma abençoada verdade. Mas
quando olhamos para o número de ví-
timas por milhão de habitantes, o pal-
co fica mais sombrio. Estamos na pri-
meira e mais lamentável parte da ta-
bela europeia (e até mundial). E, quan-
do estabelecemos comparações com
países demográfica ou economica-
mente próximos (ou ambos), somos
DAVID CABRAL SANTOS

C dos piores dos piores.


Politólogo, escritor Em países que rondam os 10 mi-
João Pereira lhões de habitantes, só perdemos
Coutinho para a Bélgica e para a Suécia, ou

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