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Biografia de Malcom X | O brilho e as sombras de Malcolm X

Escrita por Manning Marable magnetiza não só por preencher lacunas da


trajectória de um dos líderes mais importantes da História, mas também por
mostrar as nuances e estruturas de uma nação racista.
A irradiante biografia do grande líder negro Malcolm X, que sai agora no
Brasil, mescla o fervo da paixão e as minúcias do raciocínio. O autor,
Manning Marable, baila justamente nas lacunas da clássica autobiografia
de X, assinada também por Alex Haley, que depois ficaria famoso por sua
obra Negras Raízes. Os buracos no clássico livro de Haley foram a
motivação para décadas de pesquisas do historiador Marable e seus
estudantes, nos vários centros de estudos da diáspora africana que criou ou
coordenou. Sua versão biográfica, Malcolm X – Uma vida de reinvenções,
mantém o brilho da figura que canalizou o autoreconhecimento e a raiva de
milhares de mentes jovens nos EUA, no Brasil e no mundo, rapaziada que
viveu o livro de Haley com as veias, arquitetando o futuro, muitos deles
banhados também na cultura política hip hop nos últimos 30 ou 40 anos.
O livro magnetiza pelas nuances e estruturas de uma nação racista, pela
vida fulgurante de Malcolm e também por encontrarmos uma atmosfera de
cumplicidade de luta na escrita, que ao mesmo tempo não o exime de suas
posturas infelizes e erros crassos. Ou seja, é reflexão com afeto e senso
crítico num livro que tem cara de romance, daqueles que até sabemos o
final, mas mergulhamos em sua força e mistério. A profundidade da
pesquisa nos detalhes genealógicos e biográficos de Malcolm cruza-se aos
contextos de humilhação, de combate e de dignidade conquistada pelos
negros dos EUA, enquanto esse país regia conflitos externos e definia
destinos no que qualificou como seus quintais pelo mundo.
Com maestria, Marable entrelaça também considerações específicas sobre
preceitos muçulmanos, heresias da Nação do Islã e poder religioso.
Esmiúça o aparato da mídia oficial e a constituição de práticas policiais e
investigativas dos EUA, apresentando também os percalços das
independências nacionais e espinhosas questões pós-coloniais no então
chamado terceiro mundo, com quem Malcolm X buscou se alinhar nos seus
últimos meses de vida após abandonar a nação do islã, num equilibrismo de
gênio político, anunciando que a questão negra nos EUA já havia muito
superava a alcunha de luta por direitos civis, sendo uma batalha por básicos
direitos humanos em tempo de extermínio. Vemos como, reverenciado em
vários países africanos, recebido como chefe de Estado em algumas
capitais e equilibrando-se entre muitas rivalidades árabes e muçulmanas,
Malcolm estabeleceu uma postura que em nada rima com a imagem de
demagogo destemperado que vigorou até os anos 1990, orquestrada pela
CIA e FBI (que ainda não abrem seus arquivos sobre ele) e também pela
mídia oficial, imagem regenerada e consertada com o rapto de sua figura
pelo hip-hop, quando ele renasce como líder negro que também atende
apelos multiculturais.
Malcolm X em uma conferência nos Estados Unidos, em 1964: uma das
muitas das quais ele participou em suas vertiginosas viagens para debater
com negros sedentos por guias e com brancos desconfiados da perda de
seus privilégios e do que chamavam de ódio racial que vinha com as
variadas plataformas negras (Herman Hiller / World Telegram)
Dentre a enorme coerência de seu projeto e trajetória, foram muitas as
contradições de Malcolm. As encruzilhadas fulminantes do seu caminho
compassado às farpas do povo preto se deram em diferentes contextos de
segregação violenta, seja no sul das forcas e linchamentos, no Harlem
miserável, organizado e festivo ou em outras capitais, industriais como
Detroit ou mais tranquilas como Boston, unificadas num racismo virulento
que carimbou marcas na mente e nos corpos de milhões de pessoas.
Demonstrando o quanto o conhecimento adquirido nas esquinas, bares e
cortiços urbanos o levava a ser reconhecido pela massa pobre e à
desconfiança dos moderados, destacando o medo que vogava nos campos
do Sul, apresentando os desejos das famílias negras consideradas de classe
média e suas pouco melhores condições de estudo, Manning explora
melhor a compreensão das diferenças polarizadas entre Martin Luther King
e Malcolm X, inclusive trazendo às páginas o único encontro por acaso
entre as duas figuras, apesar de um frequentar o discurso e as entrevistas do
outro, nem sempre marcados pela cortesia.
No decorrer do livro de Marable, que não conseguimos largar, sentimos
cada pontada dos dilemas de Malcolm, o ministro mais famoso e grande
orador da Nação do Islã, em meio a urgência dos debates da questão racial
nos EUA, passeatas e ações comunitárias trazidas pelos febris movimentos
por direitos civis que cobravam definições e ações que o seu então líder
religioso Elijah Muhammad não tomaria, interessado em dólares, poder
imobiliário, comercial e em arrebanhar fiéis. Manning Marable, em ritmo
de romance, traz as muitas desavenças internas e a fidelidade interessada da
alta cúpula da seita que escondia os muitos casos de abuso sexual e filhos
ilegítimos de Elijah enquanto apostava em uma suposta imparcialidade
política que também evitaria problemas com a Justiça federal e manteria
mornos os escândalos morais que depois teriam seus segredos arriados. As
páginas centrais do livro mostram como essas divergências teológicas e
programáticas da seita com as diretrizes do Islã ortodoxo pesaram,
dilacerando e ao mesmo tempo fortalecendo Malcolm, até que se tornou
impossível para ele continuar na casa obedecendo à ordem de manter a
“separação entre espiritualidade e política”, já visado e combatido por
outros “irmãos”, e ser jurado de morte.
Essas passagens delicadas, que aconteciam no mesmo momento em que ele
se encontrava com Alex Haley para tecer a autobiografia, assim como o
que vem depois de sua saída da Nação, inclusive com o fracasso de manter
novas organizações funcionando, não poderia surgir no livro assinado pelos
dois. Mas Manning Marable, auxiliado por cartas, trechos de programas de
rádio, arquivos pessoais de fiéis e depoimentos colhidos décadas após a
turbulência dos anos 1960, mostra como foram muitas as berlindas que
acuaram Malcolm em sua trajetória crescente dentro da Nação do Islã.
Encontros dos líderes da seita inclusive com a linha de frente da Ku Klux
Klan, na intenção de frisar o separatismo total, foram duros de aceitar,
porém, ainda pesou mais a contínua posição fincada pela seita de manter
sua versão singular de surgimento do mundo, de seus profetas iluminados,
e não tomar partido ou sequer se pronunciar nas marchas e movimentos
políticos perante assassinatos coletivos e debates sobre integração racial de
forma contundente, como o espírito de Malcolm exigia.
Insustentável para ele, que atravessava o país em vertiginosas viagens para
debater com negros sedentos por guias e com brancos desconfiados da
perda de seus privilégios e do que chamavam de ódio racial que vinha com
as variadas plataformas negras. Desde a propalada “legítima defesa”,
sempre presente nos microfones de Malcolm X, até a incipiência das ideias
de ação afirmativa e de exigência por empregos, além do direito de votar,
tudo latejava no medo branco e escorria em forma de apoios quase sempre
tímidos ou de repressão policial ou mesmo paramilitar.
Marable destaca entre a grandeza excepcional de Malcolm os escorregões e
saltos entre uma fase e outra de sua vida, às vezes marcados por nítidas
mudanças de hábitos e de posicionamento, mas em outras passagens
equilibrados entre a ambiguidade e a dificuldade de manter a coerência
consigo mesmo e o rumo da luta negra. A escrita fluente e arrebatadora do
biógrafo, envolvendo tantas idades e os seus muitos nomes (Malcolm
Little, Detroit Red, Satan, Malcolm X e El-Hajj Malik El-Shabazz ), junto
às imagens e feitos públicos enfatizados por Malcolm com cada uma dessa
alcunhas, demarcam bem os limites e as quebras das fronteiras dos
territórios físicos e mentais do seu passo e também dos EUA e do mundo.
A biografia destoa do sensacionalismo e do celebritismo oco, apresentando
um Malcolm X que as fotos felizes e as narrativas recorrentes não abordam
ou preferem não comentar. Apenas chega a ser cansativo o imenso leque de
dados exposto ao final da obra sobre as muitas possibilidades do
assassinato de Malcolm. Nesse trecho, o livro parece se voltar aos
historiadores, apresentando inúmeros motivos, possibilidades e pessoas
envolvidas com a Nação do Islã e, diretamente ou não, com a morte de
Malcolm.
O livro reacende polêmicas sobre a homossexualidade do jovem Malcolm,
quando ele ainda era o autobatizado Detroit Red. As artimanhas do rapaz
em Detroit, para ganhar dinheiro agradando idosos ricos, bate de frente
com o silêncio que até então conduziu a questão. Além disso, uma
misoginia realçada pelo ascetismo, que propagava num comportamento
exemplar como ministro da Nação do Islã, é letra forte no livro e emerge
tanto nos encaminhamentos dentro das mesquitas da Nação do Islã como na
intimidade de seu casamento. Contrário ao personagem desenhado por
Spike Lee e colorido por Denzel Washington no cinema, o Malcolm
descrito por Marable se casou praticamente por evidentes necessidades
políticas. Nada haveria de harmonia no casamento com Betty Shabazz
desde as primeiras noites. O abandono de Betty, enquanto Malcolm traçava
seus itinerários constantes e suas viagens diárias por anos atravessando os
EUA e o mundo, é realçado na fadiga que derruba os dois em vários
momentos. Daí as muitas chacotas orquestradas internamente por seus
rivais sobre sua impotência sexual e a incapacidade de controlar um
casamento, galhofas crescentes dentro de um universo drasticamente
machista como a Nação do Islã, que buscava extrair das fofocas toda sua
força moral com intenção de controlar o crescimento de Malcolm perante o
país e solapar sua liderança dentro da seita, já que ele se tornava
nitidamente o “segundo” da casa, nome mais forte a herdar o poderio de
Elijah Muhammed.
São de espetar as passagens referentes ao nascimento de cada filha e a fuga
de Malcolm após cada parto, ainda mais quando hoje se vê circular como
imagem de bandeira as fotos dele sorridente com suas crianças. Se essas
questões já foram bastante propagadas até em algumas entrevistas de suas
filhas, o livro de Marable, ainda destoando da autobiografia famosa, mostra
também como as pelejas com racistas brancos, adversários dos movimentos
negros e desafetos da Nação do Islã aconteciam enquanto endurecia a
sempre delicada condição das finanças do casal. São trechos comoventes os
da luta por moradia que acomete a família, após o desligamento de
Malcolm da Nação do Islã e o processo de expulsão da residência que
ocupavam, propriedade da seita.
O famoso incêndio da sua casa em Nova Iorque, em meio a um processo
jurídico sobre os direitos de sua ocupação após anos de devotos ofícios de
Malcolm que não abriam espaço para nenhum outro tipo de trabalho e
renda, reflete o episódio de sua infância em Michigan que tanto marcaria a
sua vida e a degeneração mental de sua mãe, quando brancos queimaram
sua casa antecipando o desmoronamento de sua família, marcado ainda
pelo provável assassinato do pai, caso não investigado por uma polícia nem
um pouco interessada em desvendar o caso da morte suspeita de um negro
desobediente e seguidor do pan-africanismo de Marcus Garvey, que ainda
era forte referência e rastilho aceso em muitos bairros e associações de
cidades distintas. O incêndio, a morte do pai, a debilidade psíquica da mãe,
que passaria muitos invernos em sanatórios quase sem ver Malcolm e todas
as duras condições de sobrevivência dos irmãos Little, mais as passagens
de deslumbramento em Boston abrigado pela meio-irmã Ella, que o
influenciaria durante toda sua vida, seja arrumando confusões ou mesmo
bancando a última viagem ao continente africano, é detalhada por Manning
Marable também com muito mais clareza que no livro assinado com Alex
Haley. Aliás, outro mérito saboroso da obra é mostrar a intensa dificuldade
de Haley, um integracionista convicto que tentava equacionar as opiniões
radicais de Malcolm com as exigências e prazos editoriais. Muitas versões
trazidas pelo biografado para sua vivência na cadeia e nos guetos nova-
iorquinos não resistem à árdua pesquisa conduzida por Marable e hoje
parecem se entrosar perfeitamente à necessidade de Malcolm ocultar certos
vexames e passagens nada grandiosas, forjando (ou aumentando) uma
imagem de si como grande campeão diante das muitas adversidades, o que
não é de todo inverdade.
Mesmo após a volta das peregrinações no Oriente Médio e na África, que
causaram tanta transformação em sua noção espiritual e política do mundo,
quando mergulhou em prática e estudo de sua fé convivendo com diversos
teólogos e com o povo muçulmano, ao rever a fala de que os brancos
seriam demônios, Malcolm mantinha e propagava também a convicção que
não seriam eles que poderiam conduzir o processo antirracista nos EUA
nem em nenhuma outra parte do planeta. Com profunda desconfiança da
autopercepção e da pretensão dirigista dos brancos, ao fim de sua vida o
Malcolm que declarou ser possível a quebra das hierarquias raciais e o
convívio pacífico interrracial não aceitava que o racismo fosse aniquilado a
não ser pela primazia negra.
O livro detalha contextos dos discursos célebres de Malcolm X, os “A bala
ou o voto” e “Mensagem às bases”. E hoje, 50 anos após o notório discurso
“Eu tenho um sonho”, de Martin Luther King, que bradava para 250 mil
pessoas na Marcha para Washington a bandeira da integração do povo
negro em plena luta por direitos civis, se a questão eleitoral já se parece
resolvida, ainda é berrante a disparidade ainda vigente entre a baixa renda
dos negros e os ganhos da população branca nos EUA, o que, com o
encarceramento em massa e a obstrução de direitos civis básicos aos pretos,
apresenta a triste condição humana dos negros dos EUA de Barack Obama.
Se Martin Luther King pronunciava a insignificância da raça, Malcolm
centrava sua voz no diferencial de ser negro, inclusive frisando o papel de
estopim eleitoral que seu povo teria diante das divisões dos votos dos
brancos entre republicanos e democratas. Provocava outras bases para a
distribuição da moeda e do poder nos EUA. Enfatizava suas críticas e
mesmo um desprezo à classe média negra, à qual acusava de não se
irmanar com os negros pobres contra o colapso das famílias afro-
americanas nos guetos.
Em tempos em que se advoga a tese de uma época “pós-racial” nos EUA,
principalmente balizada pelas eleições de Barack Obama, as novas faces e
sequelas do escravismo estão aí vívidas na maciça abordagem policial, no
acesso precário à educação e à saúde, quando desigualdades seguem
intocadas e privilégios ainda são constrangedores em diversas esferas
sociais com números trágicos banhados a lagrimas e sangue. Hoje, os EUA
veem a sua mortalidade infantil diminuir mas se manter gritante entre as
crianças negras. Os estereótipos continuam cavalares nas vitrines, nas listas
de procurados e nas telas, marcados pelo hedonismo do sexo e da violência
que impera nas imagens massificadas, como ressalta o grande sociólogo
Cornell West. Respeitados os contextos e a demografia gelada, sabe-se que
os EUA têm hoje mais negros presos do que negros escravos no século
XIX. E 80% dos réus não conseguem pagar por sua defesa nos tribunais.
Malcolm sempre se apresentava efusivo, satírico, elegante. Sua potência
como orador foi esplendorosa, mesmo num país de memória marcada por
grandes advogados e pregadores, locutores e líderes populistas. Ele
eletrizava comícios, estralava programas de rádio e abalava plateias,
mesmo as discordantes. Discursos preparados com antecedência ou
improvisados, com uma gama enorme de temas abordados, somavam-se à
sua presença sedutora, carismática e misteriosa. Porém, Manning Marable
nos enreda mostrando como o perfil e o histórico de Malcolm encaixava-se
também em outro dos tipos lendários, quase estereótipos, da cultura negra
popular dos EUA: além de orador, ele traçou para si (e carregou nas tintas,
quando conveniente) um passado como cafetão. Assim, lidando com uma
autoconstrução e uma exposição de si mesmo como exemplo pelo histórico
e pela postura inabalável, quase santificada em vida, suas ações remexiam
as feridas mais purulentas do país e conseguiam abalar a estima negra,
trazendo motivos para celebrarem a si mesmos e pensarem em autonomia.
O livro comove e instiga por mostrar a luta de Malcolm tentando conciliar
a sua luta específica e absolutamente sincera pelo povo negro com um
humanismo radical. Se ele, desde o princípio, se afirmava primeiro como
negro, um africano nascido nos EUA, e apenas depois como um
“americano”, essa identidade apresenta suas divergências, buscas e
reinvenções. O Malcolm ascético, disciplinado, rígido e até cruel na
manutenção do grupo que liderava, que angariava seguidores fiéis e
também rancores e desafetos assumidos, foi também capaz de gestos de
extrema generosidade com divergentes mais fracos, além da condução de
milhões de negros a uma nova visão de si mesmos e da amplitude de seus
destinos, influenciando em todos os movimentos negros que se seguiram
em qualquer canto do mundo, como embrião dos Panteras Negras ou como
referência primeira aos movimentos sociais em qualquer barraco latino-
americano.
Fonte:Revista Fórum.

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