Sunteți pe pagina 1din 50

XI Congresso Brasileiro de Sociologia

1 a 5 de setembro de 2003, Unicamp, Campinas-SP

Grupo de trabalho: (04) Desigualdades Sociais

“O Desemprego na Contemporaneidade: novas e


velhas questões”

Davisson C. C. de Souza
O desemprego na contemporaneidade: novas e velhas questões
(Davisson C. C. de Souza)1

Considerações Iniciais

O objetivo principal deste artigo é discutir o problema do desemprego na contemporaneidade com


base na atualidade dos conceitos de superpopulação relativa (latente, flutuante e estagnada) e exército
industrial de reserva, ambos cunhados por Karl Marx na segunda metade do século XIX, e o de massa
marginal, desenvolvido por José Luís Nun na década de 1960, após uma releitura da obra marxiana.
Para tanto, temos como ponto de partida no item 1 (“Sobre os conceitos de superpopulação
relativa, exército industrial de reserva e massa marginal)” o capítulo XXIII d‟O Capital (“A Lei Geral da
Acumulação Capitalista”) no qual Marx aponta a relação entre a acumulação capitalista e a criação e
manutenção de uma população sobrante. Atualmente, a discussão sobre o desemprego omite esta
referência ou sequer a leva em consideração. A proposta deste trabalho é mostrar que a funcionalidade da
população sobrante à acumulação do capital continua presente em nossos dias.
Em seguida, apresentaremos o conceito de massa marginal desenvolvido por José Luis Nun. Em
um artigo de 1969 intitulado “Superpoblación relativa, ejército industrial de reserva y masa marginal”, o
autor afirma que o conceito marxiano de exército industrial de reserva é mais apropriado para a
compreensão do desemprego no capitalismo competitivo, já que Marx tinha como base para a sua
construção teórica a Inglaterra anterior a 1875. Assim, o autor, ao estudar a realidade da América Latina,
aponta a insuficiência desta categoria para a compreensão do capitalismo monopolista dependente.
Segundo Nun, o exército industrial de reserva é sempre funcional, já que, como o próprio Marx aponta,
cumpre o papel de “produto e alavanca da acumulação capitalista”. Como alternativa Nun cria o conceito
de massa marginal que, ao contrário da funcionalidade do exército industrial de reserva, baseia-se na
afuncionalidade ou na disfuncionalidade com relação ao mercado de trabalho.
Um ano depois, em 1970, Fernando Henrique Cardoso publica um texto em que refuta a leitura
que Nun faz de Marx no que diz respeito aos conceitos de superpopulação relativa e exército industrial
de reserva, bem como a categoria de massa marginal criada por ele. Em seguida, Nun debate com
Cardoso reforçando sua análise inicial e respondendo às críticas que este o havia feito. Esta polêmica
também será apresentada neste trabalho.

1
Mestrando em Sociologia pela Universidade de São Paulo (USP). Tema de pesquisa: Sindicato dos Metalúrgicos de
Campinas e Região e o desemprego nos governos neoliberais. Orientadora: Prof. Dra. Heloísa H. T. de Souza Martins
(Departamento de Sociologia – FFLCH/USP).
1
Após décadas de discussões, Nun retoma suas elaborações teóricas para debater o desemprego
contemporâneo à luz dos conceitos marxianos e da sua tese da massa marginal. No item 2 (“O
desemprego contemporâneo e a atualidade dos conceitos de Marx e Nun”) apresentaremos a importância
das categorias desenvolvidas por estes autores para um estudo do desemprego, principalmente em países
de capitalismo periférico e dependente, como é o caso da América Latina. Para tanto, também nos
reportaremos sobre as características atuais do desemprego.
Por último, no item 3 (“Por uma abordagem sociológica do de, discutiremos sobre os temas que
consideramos essenciais para a análise do desemprego na atualidade: o desemprego como uma construção
socialmente condicionada por interesses de classe; a abordagem normativo-institucional, subjetivo-
biográfica e materialista dialética do desemprego; a seletividade do desemprego como um recurso
inevitável da apropriação capitalista da força de trabalho; a empregabilidade (de ferramenta analítica à
apropriação ideológica escamoteadora); as medidas do desemprego e seus resultados estatísticos e
políticos; o desemprego e as políticas públicas na tentativa de humanizar o capital; e, por último, o papel
das redes sociais na experiência subjetiva do desemprego e da procura de trabalho e a necessidade de
estratégias de classe.

1) Sobre os conceitos de superpopulação relativa, exército industrial de reserva e massa marginal.

Nesta primeira parte do trabalho trataremos do essencial das categorias de superpopulação


relativa, exército industrial de reserva e massa marginal. Apresentaremos um breve resumo do capítulo
XXIII d‟O Capital, em que Marx expõe sua análise sobre as relações entre a acumulação do capital e a
geração de um excedente populacional. Em seguida, faremos o mesmo com o artigo em que José Nun
apresenta sua tese da massa marginal, com a crítica de Fernando Henrique Cardoso e com a resposta ao
comentarista.

1.1) Marx e os conceitos de superpopulação relativa e exército industrial de reserva

O tema geral do capítulo XXIII d‟O Capital é a análise da relação entre o processo de acumulação
do capital e a geração de um excedente populacional. O ponto de partida de Marx (1979) é o estudo da
composição do capital e as modificações que experimenta durante o processo de acumulação.

2
Marx considera a composição do capital sob dois aspectos: do valor e da matéria que funciona no
processo de produção. A partir do primeiro ponto de vista, o capital se divide em constante (valor dos
meios de produção) e variável (valor da força de trabalho) e é determinado pela proporção entre um e
outro. A partir do segundo, pode ser dividido em meios de produção e força de trabalho viva. Neste caso,
a composição é determinada pela relação entre a massa dos meios de produção e a quantidade de trabalho
necessária para serem empregados. O autor define a primeira como composição segundo o valor, e a
segunda como composição técnica. Marx acrescenta que existe uma estreita relação entre ambas, sendo
que a composição segundo o valor é determinada pela composição técnica. É por isso que chama a
primeira de composição orgânica do capital.2
A partir desta conceituação inicial, Marx passa a explorar as relações presentes na composição
orgânica do capital. Para todos os casos analisados, o autor toma como pressuposto que a força de
trabalho só pode ser vendida se mantêm os meios de produção como capital, reproduz seu valor e
proporciona a geração de capital adicional (o trabalho não pago mediante o salário). Marx ainda
acrescenta que é necessário que a venda da força de trabalho seja contínua e a reprodução do capital
constantemente ampliada e em escala crescente para que se processe a dinâmica da acumulação.
Resumindo sua idéia Marx afirma que no capitalismo “(...) a relação entre capital, acumulação e
salários é apenas a relação entre trabalho gratuito que se transforma em capital e o trabalho adicional
necessário para pôr em movimento esse capital suplementar” (Marx: 1979; p. 721).
Assim, segundo Marx a elevação dos salários fica sempre limitada a manter intactos os
fundamentos do modo-de-produção capitalista e assegurar a sua reprodução em escala crescente e
ampliada. O autor afirma inclusive que “(...) tem de ser assim num modo de produção em que o
trabalhador existe para as necessidades de expansão dos valores existentes, ao invés de a riqueza material
existir para as necessidades de desenvolvimento do trabalhador” (ibidem; p. 722).
Em seguida, a partir de uma exaustiva análise da relação entre o capital variável e absoluto, Marx
apresenta os conceitos de acumulação, concentração e centralização do capital.
Segundo o autor, a acumulação é a reprodução simples dos meios de produção, enquanto a
concentração é sinônimo de reprodução em escala ampliada. No entanto, a centralização significa a
concentração de capitais já formados, ou, nas palavras de Marx, “(...) a expropriação do capitalista pelo
capitalista, a transformação de muitos capitais pequenos em poucos capitais grandes” (ibidem; p. 727).
Segundo Marx, o processo de centralização se diferencia dos demais porque “(...) pressupõe apenas
alteração na repartição dos capitais que já existem e estão funcionando” (ibidem; p. 727), não estando

2
Segundo Marx, os diferentes tipos de capitais aplicados em um setor se diferem também pela sua composição. Assim, a média
das composições define a composição do capital global empregado; e a média geral das composições médias dos diversos
setores define a composição capital de um país.
3
limitado “(...) pelo acréscimo absoluto da riqueza social ou pelos limites absolutos da acumulação”
(ibidem; p. 727). Marx afirma que o capital se acumula nas mãos de um só (ou de poucos), porque
escapou das mãos de muitos, o que provoca uma alteração no agrupamento quantitativo dos elementos
componentes do capital social.
A partir deste ponto, Marx analisa a relação entre o processo de acumulação, concentração e
centralização, e a composição orgânica do capital. Primeiramente, constata que “o capital adicional
formado no curso da acumulação atrai, relativamente à sua grandeza, cada vez menos trabalhadores [e] o
velho capital periodicamente reproduzido com nova composição repele, cada vez mais, trabalhadores que
antes empregava” (ibidem; p. 730). E assim, o capital altera qualitativamente sua composição,
aumentando sua parte constante às custas da variável.
Marx constata também que a redução da parte variável do capital provoca a aparência de um
crescimento absoluto da população trabalhadora. No entanto, segundo o autor, faz parte da dinâmica da
acumulação capitalista a produção constante de uma “(...) população trabalhadora supérflua relativamente,
isto é, que ultrapassa as necessidades médias da expansão do capital, tornando-se, desse modo, excedente”
(ibidem; p. 731).
A partir de então, Marx explora as condições da geração deste excedente populacional e sua
relação com o processo de acumulação do capital. Segundo o autor, “(...) a população trabalhadora, ao
produzir a acumulação do capital, produz, em proporções crescentes, os meios que fazem dela,
relativamente, uma população supérflua. Esta é uma lei da população peculiar ao modo capitalista de
produção” (ibidem; pp. 732-733).
E assim, Marx chega à conclusão de que “(...) se uma população trabalhadora excedente é produto
necessário da acumulação ou do desenvolvimento da riqueza no sistema capitalista, ela se torna por sua
vez a alavanca da acumulação capitalista, e mesmo condição de existência do modo de produção
capitalista. Ela constitui um exército industrial de reserva disponível, que pertence ao capital de maneira
tão absoluta como se fosse criado e mantido por ele. Ela proporciona o material humano a serviço das
necessidades variáveis de expansão do capital e sempre pronto para ser explorado, independentemente dos
limites do verdadeiro incremento da população” (ibidem; pp. 733-734).
Um outro fator explicitado por Marx diz respeito ao trabalho em excesso de parte da classe
trabalhadora que, segundo ele “(...) engrossa as fileiras de seu exército de reserva, enquanto inversamente
a forte pressão que este exerce sobre aquela, através da concorrência, compele-a ao trabalho excessivo e a
sujeitar-se às exigências do capital” (ibidem; p. 738). E assim, este “(...) torna-se fonte de enriquecimento
individual dos capitalistas e acelera ao mesmo tempo a produção do exército industrial de reserva numa
escala correspondente ao progresso da acumulação social” (ibidem; pp. 738-739).

4
Em seguida Marx passa a explorar a “funcionalidade” presente na geração do exército industrial
de reserva. Basicamente, a função deste para Marx se dá em dois níveis: o controle do nível salarial, a
desmobilização da luta do trabalhadores, e a conseqüente permissão de um maior grau de arbítrio
patronal. Primeiramente, o autor afirma que “em seu conjunto, os movimentos gerais dos salários se
regulam exclusivamente pela extensão e contração do exército industrial de reserva, correspondentes às
mudanças periódicas do ciclo industrial (ibidem; p. 739). Para o autor, portanto, não são “(...)
determinados pelas variações do número absoluto da população trabalhadora, mas, pela proporção
variável em que a classe trabalhadora se divide em exército da ativa e exército da reserva, pelo acréscimo
e decréscimo da magnitude relativa da superpopulação, pela extensão em que ora é absorvida, ora é
liberada” (ibidem; p. 739).
Em segundo lugar Marx afirma que “durante os períodos de estagnação e de prosperidade média, o
exército industrial de reserva pressiona sobre o exército de trabalhadores em ação, e durante o período de
superprodução e paroxismo, modera as exigências dos trabalhadores” (ibidem; pp. 741-742).
Sendo assim, sob o capitalismo, a superpopulação relativa tem a função de manter o
funcionamento da lei da oferta e procura de trabalho dentro de limites condizentes com os propósitos de
exploração e de domínio do capital.
Por fim, Marx explora a relação entre o capitalista e os trabalhadores diante da geração do
excedente populacional. “Quando os trabalhadores descobrem que quanto mais trabalham mais produzem
riquezas para os outros, quanto mais cresce a força produtiva de seu trabalho, mais precária se torna sua
função de meio de expandir o capital: quando vêem que a intensidade da concorrência entre eles mesmos
depende totalmente da pressão da superpopulação relativa: quando, por isso, procuram organizar uma
ação conjunta dos empregados e desempregados através dos sindicatos etc., para destruir ou enfraquecer
as conseqüências ruinosas daquela lei natural da produção capitalista sobre sua classe, então protestam em
altos brados o capital e seu defensor, o economista político, contra a violação da „eterna‟ e, por assim
dizer, „sacrossanta‟ lei da oferta e da procura. Todo entendimento entre empregados e desempregados
perturba o funcionamento puro dessa lei” (ibidem; p. 743).
Por último, Marx apresenta três tipos de superpopulação relativa (flutuante, latente e estagnada),
podendo fazer parte dela os desempregados e os parcialmente empregados.
Na forma flutuante, os trabalhadores são atraídos ou repelidos de maneira cíclica, seja pelo
aumento, estagnação ou decréscimo da produção, mediante o incremento de capital constante em
detrimento do variável.
Na segunda forma, a latente, “(...) a produção capitalista se apodera da agricultura ou nela vai
penetrando, diminui, à medida que se acumula o capital que nela funciona, a procura absoluta da

5
população trabalhadora rural. Dá-se uma repulsão dos trabalhadores que não é contrabalançada por maior
atração, como ocorre na indústria não-agrícola” (ibidem; p. 745).3
A terceira categoria analisada por Marx é a estagnada, constituída por “(...) parte do exército de
trabalhadores em ação, mas com ocupação totalmente irregular” (ibidem; p. 746). Segundo o autor, esta
parcela da população sobrante “(...) proporciona ao capital reservatório inesgotável de força de trabalho
disponível” (ibidem; p. 746).
Finalmente, Marx analisa o sedimento da superpopulação relativa que, segundo ele, “vegeta no
inferno da indigência, do pauperismo” (ibidem; p. 746). Segundo o autor, excluindo “os vagabundos, os
criminosos, as prostitutas, o rebotalho do proletariado em suma” esta parcela superpopulação relativa é
constituída por três categorias: (i) os aptos para o trabalho; (ii) os órfãos e filhos de indigentes; e (iii) os
degradados, desmoralizados, incapazes de trabalhar. Em uma só palavra, Marx afirma que estes “(...) são
notadamente os indivíduos que sucumbem em virtude de sua incapacidade de adaptação, decorrente da
divisão do trabalho; os que ultrapassam a idade normal de um trabalhador, e as vítimas da indústria, os
mutilados, enfermos, viúvas etc., cujo número aumenta com as máquinas perigosas, as minas, as fábricas
de produtos químicos etc.” (ibidem; p. 746). Segundo o autor, esta categoria, denominada pauperismo,
“(...) constitui o asilo dos inválidos do exército industrial de reserva. Sua produção e sua necessidade se
compreendem na produção e na necessidade da superpopulação relativa, e ambos constituem condição de
existência da produção capitalista e do desenvolvimento da riqueza” (ibidem; p. 747). Assim, segundo
Marx, quanto maior a riqueza social, e conseqüentemente a magnitude absoluta do proletariado, tanto
maior o exército industrial de reserva, pois “a força de trabalho disponível é ampliada pelas mesmas
causas que aumentam a força expansiva do capital. A magnitude relativa do exército industrial de reserva
cresce portanto com as potências da riqueza, mas, quanto maior esse exército de reserva com relação ao
exército ativo, tanto maior a massa da superpopulação consolidada, cuja miséria está na razão inversa do
suplício de seu trabalho. E, ainda, quanto maiores essa camada de lázaros da classe trabalhadora e o
exército industrial de reserva, tanto maior, usando a terminologia oficial, o pauperismo. Esta é a lei geral,
absoluta, da acumulação capitalista.” (ibidem; p. 747).
Esta lei, segundo o autor, produz um efeito danoso sobre a sorte da classe trabalhadora, como
assim explicitou: “(...) dentro do sistema capitalista, todos os métodos para levar a produtividade do
trabalho coletivo são aplicados às custas do trabalhador individual; todos os meios para desenvolver a

3
Marx considera então que “(...) parte da população rural encontra-se sempre na iminência de transferir-se para as fileiras do
proletariado urbano ou da manufatura e na espreita de circunstâncias favoráveis a essa transferência (manufatura aqui significa
todas as indústrias não agrícolas). Está fluindo sempre esse manancial da superpopulação relativa. Mas, seu fluxo constante
para as cidades pressupõe no próprio campo uma população supérflua sempre latente, cuja dimensão só se torna visível
quando, em situações excepcionais, se abrem todas as comportas dos canais de drenagem. Por isso, o trabalhador rural é
rebaixado ao nível mínimo de salário e está sempre com um pé no pântano do pauperismo” (ibidem; p. 745-746).
6
produção redundam em meios de dominar e explorar o produtor, mutilam o trabalhador, reduzindo-o a um
fragmento de ser humano, degradam-no à categoria de peça de máquina, destroem o conteúdo do seu
trabalho transformado em tormento; tornam-lhe estranhas as potências intelectuais do processo de
trabalho na medida em que a este se incorpora a ciência como força independente desfiguram as
condições em que trabalha, submetem-no constantemente a um despotismo mesquinho e odioso,
transformam todas as horas de sua vida em horas de trabalho e lançam sua mulher e seus filhos sob o rolo
compressor do capital. Mas, todos os métodos para produzir mais valia são ao mesmo tempo métodos de
acumular, e todo aumento da acumulação torna-se, reciprocamente, meio de desenvolver aqueles
métodos. Infere-se daí que, na medida em que se acumula o capital, tem de piorar a situação do
trabalhador, suba ou desça sua remuneração. A lei que mantém a superpopulação relativa ou o exército
industrial de reserva no nível adequado ao incremento e à energia da acumulação acorrenta o trabalhador
ao capital mais firmemente do que os grilhões de Vulcano acorrentavam Prometeu ao Cáucaso. Determina
uma acumulação de miséria correspondente à acumulação de capital. Acumulação de riqueza num pólo é
ao mesmo tempo acumulação de miséria, de trabalho atormentante, de escravatura, ignorância,
brutalização e degradação moral, no pólo oposto, constituído pela classe cujo produto vira capital”
(ibidem; pp. 748-749).

1.2) Nun e a tese da massa marginal

Aproximadamente cem anos após Marx ter apresentado os conceitos de superpopulação relativa e
exército industrial de reserva, José Luis Nun (1969) elabora a sua tese da massa marginal. Sem negar os
conceitos marxianos e a dinâmica do processo de geração do excedente populacional, Nun propõe uma
reelaboração dialética daquilo que Marx considerou essencial na relação entre a acumulação do capital e a
sorte da classe trabalhadora.
Para justificar a revisão dos conceitos marxianos o próprio Nun faz uma consideração importante
“la práctica teórica es el campo por excelencia de sistemas de realimentación particularmente fecundos.
Categorías elaboradas en otras épocas y para otros contextos sirven para aproximarse a nuevas situaciones
y la reflexión específica acerca de éstas permite volver sobre aquéllas para aclararlas y para enriquecerlas,
poniendo a prueba las potencialidades del paradigma que las sustenta” (Nun: 1969; p. 178).
Já no início do artigo Nun sustenta que O Capital é uma obra inconclusa que analisa de maneira
parcial a teoria regional da instância econômica do modo de produção capitalista em sua fase

7
competitiva.4 A partir desta premissa o autor faz uma crítica à assimilação corrente das categorias de
superpopulação relativa e exército industrial de reserva dos autores de sua época (entre eles Paul Sweezy
e Oskar Lange). Desse modo, Nun observa que “Desde el título – „Producción progresiva de una
superpoblación relativa o ejército industrial de reserva‟ [...] -, el apartado 3 de su capítulo XXIII parece
identificar dos de las nociones mencionadas al comienzo, lo que ha inducido a la mayoría de los
comentaristas de la obra a considerarlas como sinónimos” (ibidem; p. 180).
Em outra passagem o autor afirma que “esta asimilación resulta, sin embargo, incorrecta: no sólo
se trata de dos categorías distintas sino que se sitúan a diferentes niveles de generalidad. Mientras el
concepto de ejército industrial de reserva corresponde a la teoría particular del modo de producción
capitalista, los conceptos complementarios de „población adecuada‟ y de „superpoblación relativa‟
pertenecem a la teoría general del materialista histórico” (ibidem; p. 180).5
Desse modo, a tese que Nun se propõe a apresentar é de que a assimilação incorreta dos conceitos
marxianos tem levado a confundir “(...) los procesos específicos que generan una población excedente con
los efectos que ésta provoca en el sistema” (ibidem; p. 185).6
A partir de então, Nun passa a expor as razões que considera importante para repensar o conceito
de exército industrial de reserva. O ponto de partida inicial do autor para esta revisão é de que Marx teve
como objeto principal em sua obra a instância econômica do modo-de-produção capitalista em sua fase
competitiva, tendo como referencial empírico a Inglaterra anterior a 1875, “(...) en que esta fase llega a su
apogeo y el capitalismo constituye sobre todo un negocio de empresarios individuales en pequeña escala,
estrechamente subordinados a los avatares del mercado” (ibidem; p. 196). Segundo Nun, este contexto
histórico obrigou Marx a pensar exclusivamente na parcela funcional da superpopulação relativa, o que
não se verifica no capitalismo monopolista, quando o excedente populacional pode ser visto do ponto de
vista da afuncionalidade ou disfuncionalidade.

4
Para defender esta idéia, Nun diferencia, inclusive, os conceitos de modo-de-produção e formação sócio-econômica: “(3) Se
sigue de lo expuesto que el campo conceptual del materialismo histórico comprende: (a) una teoría general de los elementos
invariantes y de las determinaciones comunes a todos los modos de producción; (b) teorías particulares sobre cada modo de
producción a otro; y (c) teorías regionales corespondientes a cada uno de los niveles que articula el modo de producción
(ibidem; p. 179).
5
O autor afirma que na própria obra O Capital, Marx deixou algumas pistas para se pensar nesta diferenciação quando diz que
“cada modo de producción tiene sus propias leyes de crecimiento de la población y de la superpoblación, sinónimo esta última
de pauperismo” (ibidem; p. 182).
6
Para defender este argumento, Nun apresenta o que segundo ele são as duas principais causas desta confusão. Para o autor
“una se conecta con la evolución misma del pensamiento de Marx, quien en rigor usa el concepto de ejército industrial de
reserva en dos etapas distintas del desarrollo de sus análisis económicos, lo que ha sido fuente de ambigüedades. La otra se
vincula a una tendencia bastante difundida a reducir las totalidades complejas conque trabaja a procesos simples entre dos
contrarios” (ibidem; p. 185).

8
No entanto, Nun observa que tanto na fase competitiva quanto na monopolista vigora a lei de
superpopulação, variando apenas seu caráter e seus efeitos. Daí a necessidade de se repensar a categoria
de exército industrial de reserva.
A parte não-funcional da superpopulação relativa foi caracterizada pelo autor como massa
marginal: “(...) este concepto – lo mismo que el de ejército industrial de reserva – se sitúa a nivel de las
relaciones que se establecen entre la población sobrante y el sector productivo hegemónico. La categoría
implica así una doble referencia al sistema que, por un lado, genera este excedente y, por el otro, no
precisa de él para seguir funcionando” (ibidem; p. 201).
Nun ainda cita Trotsky, que, ao analisar a desocupação de 1930 nos países capitalistas avançados,
dizia: “el actual ejército de desocupados ya no puede ser considerado como un „ejército de reserva‟, pues
su masa fundamental no puede tener ya esperanza alguna de volver a ocuparse, por el contrario, esta
destinada a ser engrosada con una afluencia constante de desocupados adicionales‟” (ibidem; p. 201).
No entanto, o próprio Nun afirma que apesar de a massa marginal constituir o elemento central da
fase monopolista, isto não quer dizer que seja o único, pois as empresas hegemônicas monopolistas
coexistem com pequenas e médias empresas que operam de maneira mais próxima ao estado competitivo.
Assim, segundo o autor “(...) se superponen y combinan dos procesos de acumulación cualitativamente
distintos, que introducen una diferenciación cresciente en el mercado de trabajo y respecto a los cuales
varía la funcionalidad de excedente de población. De esta manera, los desocupados pueden ser, a la vez,
un ejército industrial de reserva para el sector competitivo y una marginal para el sector monopolístico.
Pero, además, la mano de obra sobrante en relación a este último no necesariamente carece de empleo ya
que puede estar ocupada en el otro sector. Es decir que una baja tasa de desocupación resulta compatible
con la existencia de una superpoblación relativa a la gran industria, categorizable como ejército de reserva
y/o como masa marginal” (ibidem; p. 202).
Segundo Nun, o exemplo clássico de desenvolvimento pleno do capitalismo analisado por Marx é
a Inglaterra, onde a superpopulação relativa tendeu a atuar como exército industrial de reserva. No
entanto, para Nun as diversas circunstâncias históricas não previstas por Marx contribuíram para tornar
possível o questionamento desta congruência ao modelo teórico.
Nun afirma que “(...) la acción concurrente y compleja de todas estas circunstancias – y de otras,
como la lucha obrera y la legislación social – la que entre 1860 y 1920, en el contexto de un capitalismo
competitivo en pleno desarrollo, redujo la superpoblación relativa de Inglaterra a límites que la hicieron
estrechamente funcional para la economía en su conjunto” (ibidem; p. 207).
Segundo Nun, do mesmo modo que a Inglaterra é o exemplo clássico do capitalismo competitivo,
os Estados Unidos o são para o caso do capitalismo monopolista, à medida em que evidencia a aparição

9
de um enorme contingente de marginalizados. Entretanto, preocupado em entender as formações sócio-
econômicas latinoamericanas, o autor apresenta a problemática do desenvolvimento desigual e
combinado. Segundo o autor, esta “(...) permite entender por qué, en ciertas formaciones económica-
sociales, el capitalismo industrial traba mucho antes que en otras, desde luego, de barreras absolutas o
metafísicas sino de las condiciones concretas de posibilidad que la propia dialéctica del sistema fija a su
evolución en determinados contextos [...]. Por eso, la misma distinción enter límites internos y externos –
útil por su valor heurístico – debe ser entendida en un sentido puramente analítico: la dependencia
neocolonial respecto a centros imperialistas o el mantenimiento de formas productivas anteriores sólo
pueden aparecer como frenos „externos‟ al desarrollo cuando se toman por criterio de referencia las leyes
teóricas de movimiento del „modo de produción‟ capitalista” (ibidem; p. 211).
A partir deste ponto, Nun apresenta alguns dos obstáculos que, segundo ele, impedem o
crescimento “igual” do capitalismo nos diversos países da América Latina, entre eles as descontinuidades
do processo de acumulação primitiva e o colonialismo tecnológico. Nun chega a afirmar que “En lo que
concierne al capital, la inserción dependiente de los países del área en el mercado mundial como
productores de alimentos y de materias primas ha hecho que el pillaje abierto, primero, y el comercio
exterior, después, actuasen como verdaderas bombas de extracción de plusvalía operadas desde las
metrópolis” (ibidem; p. 212).
Aprofundando sua análise a respeito dos entraves do capitalismo dependente latinoamericano, Nun
afirma que “(...) en muchos lugares, el capital comercial acaba por penetrar el proceso de producción,
redefiniendo el régimen preexistente y originado formas híbridas de relación salarial. Lo que aquí interesa
es que éste es el reverso genérico de la „expropriación parcial o fallida‟, que perpetúa mecanismos
precapitalistas de explotación de la mano de obra con los cuales se conecta provechosamente – de manera
directa o indirecta – el sector hegemónico de la economía. [...] Indudablemente, su concetración en el caso
nacional inglés y un tratamiento insuficiente de la interación dialéctica que se establece entre áreas
desarrolladas y subdesarrolladas [...] llevaron a Marx suponer que la generalización del trabajo „libre‟ era
el correlato inevitable de la hegemonia del capital industrial y a subestimar, en consecuencia, la
posibilidad de que éste hallase ventajoso subordinarse otras formas productivas” (ibidem; pp. 213-214).
A problemática latinoamericana do capitalismo desigual e combinado, dependente e periférico
provoca um efeito negativo para a força de trabalho e condiciona a manutenção de formas produtivas
tradicionais e à dependência neocolonial.
Neste contexto, segundo Nun, “(...) el Estado ha intervenido de manera „defensista‟, consolidando
la dirección del proceso: por una parte, las políticas proteccionistas „asimétricas‟ [...] han subsidiado las
industrias sustitutivas de importaciones mientras preserbavan las causas estructurales de su ineficiencia;

10
por la otra, los permisos para traer equipos desde el exterior, al implicar una rebaja considerable de las
tasas de interés – y, frecuentemente, liberaciones impositivas -, estimularon la introducción de
maquinarias incluso con fines especulativos” (ibidem; p. 216).
Nun acrescenta ainda o papel que o imperialismo norte-americano exerce sobre a América Latina.
Segundo ele, “los efectos deformantes de esta penetración son numerosos y van desde el debilitamiento
del proceso de acumulación que resulta de las cuantiosas remesas al extranjero [...] hasta la
„internalización‟ de las trabas al comercio exterior emergente de las prohibiciones de exportar que
imponen las casas matrices a sus filiales y subsidiarias (...)” (ibidem; pp. 217-8). Assim, “En rigor, la
actual hegemonía norteamericana se va apoyando cada vez menos en las formas tradicionales de
dominación – que, desde luego, subsisten – y cada vez más en las notables ventajas que le concede a sus
representantes una brecha científica y tecnológica en constante incremento (...)” (ibidem; p. 218).
A partir do exposto, Nun apresenta uma síntese daquilo que considera essencial para explicar a
pouca importância da indústria latinoamericana como fonte de emprego, ao contrário dos países
capitalistas centrais: (i) o atraso agrário; e (ii) a dificuldade de geração de tecnologias próprias
(colonialismo tecnológico)7.
Após fazer uma breve contextualização do capitalismo dependente na América Latina, Nun
apresenta aqueles que considera fazer parte da massa marginal: “(a) una parte de la mano de obra
ocupada por el capital industrial competitivo; (b) la mayoría de los trabajadores que se „refugian‟ en
actividades terciarias de bajos ingresos; (c) la mayoría de los desocupados; y (d) la totalidad de la fuerza
de trabajo mediata o inmediatamente „fijada‟ por el capital comercial” (ibidem; p. 224). Os demais
componentes dos grupos a, b e c fazem parte do exército industrial de reserva, por produzir os efeitos
diretos e indiretos desta categoria. Entretanto, Nun afirma que o corte analítico a que se propõe não deve,
de maneira alguma, prejudicar os estudos concretos, de tal modo que é possível se verificar uma parcela
da classe trabalhadora que transita entre uma e outra categoria.
Desse modo, afirma Nun que “(...) una proporción de esa masa marginal – correspondiente a los
grupos b, c y d – es, a la vez, conceptualizable como un ejército industrial de reserva respecto al mercado
de trabajo del capital industrial competitivo. Aún en este caso, sin embargo, la baja capacidad de
absorción del sector obliga a plantear nuevamente, según el país, el problema de la funcionalidad de esa
población sobrante, reintroduciendo la categoría de masa marginal a un nivel más bajo” (ibidem; p. 224).
Assim, o autor apresenta o conceito de modo que possa ser usado no sentido amplo, no que se
refere ao mercado de trabalho do capital industrial monopolista, ou restrito, baseado na análise do

7
No entanto, Nun afirma que “(...) el capital imperialista sea monopolista no excluye, desde luego, la existencia del capital
monopolista local. Pero es relativamente débil o está ligado a aquél. Esta circunstancia y la necesidad de simplificar la
exposición, me llevan a no distinguirlos pues ello no altera el argumento” (ibidem; p. 220n.).
11
mercado de trabalho competitivo. Dessa maneira, a opção depende, afirma Nun, “(...) de las
características del contexto como de los intereses del observador. Así, sea que se estudien situaciones de
muy bajo desarrollo, sea que se quiera poner el énfasis en los grupos más desposeídos, o sea que se desee
contrastar específicamente el trabajo asalariado con otras formas de explotación de la mano de obra,
convendrá el uso restringido del concepto” (ibidem; p. 224).
Resumindo, Nun afirma que o conceito de massa marginal, em contraste com o de exército
industrial de reserva, indica um baixo grau de “integração ao sistema”, devido ao desenvolvimento de um
capitalismo periférico que, ao combinar diversos processos de acumulação em um contexto de
“estancamiento crónico”, gera uma superpopulação relativa não-funcional no que diz respeito às formas
produtivas hegemônicas8.
Nun termina o artigo afirmando que tanto um modo-de-produção como uma formação sócio-
econômica interrelaciona dialeticamente três instâncias: a econômica, a jurídico-política e a ideológica.
Segundo o autor, “la superpoblación relativa es un emergente del nível económico que implica
necesariamente a los otros dos. Por lo tanto, importa indagar de qué manera la estructura global inhibe o
sobredetermina su no funcionalidad” (ibidem; p. 226).

1.3) A crítica de Cardoso e a resposta de Nun

Posicionando-se contrário à leitura que Nun fez dos conceitos marxianos de superpopulação
relativa e exército industrial de reserva, bem como à elaboração de sua tese da massa marginal, no ano
de 1970 Fernando Henrique Cardoso escreve um texto criticando as teses daquele autor. Nas páginas
seguintes apresentaremos um resumo das críticas de Cardoso e da resposta de Nun publicada um ano mais
tarde.

1.3.1) A crítica de Cardoso

Uma das primeiras críticas que Cardoso (2001) direciona a Nun se refere ao fato de que este teria
partido, por um lado, de um corte epistemológico em Marx iniciado na época da redação dos Grundisse
(1856-1857) e, por outro, de um enfoque althusseriano que vê O Capital como uma elaboração teórica
parcial do capitalismo. Assim, para Nun, Marx teria exposto neste livro apenas a teoria regional da

12
instância econômica deste modo de produção em sua fase competitiva, sendo possível, todavia, ao
materialismo histórico a proposição de uma teoria geral dos elementos invariantes e das determinações
comuns a todos os modos de produção e às distintas teorias regionais que especificam cada formação
sócio-econômica particular.
Além desta crítica de ordem metodológica, Cardoso critica a diferenciação que Nun faz entre os
conceitos de superpopulação relativa e exército industrial de reserva, ao tratar o primeiro como uma
categoria pertencente à teoria geral do materialismo histórico e o segundo como um conceito específico
da teoria particular do modo de produção capitalista.
Cardoso critica o que, segundo ele, seria a insistência de Nun em submeter o conceito de exército
industrial de reserva a um corte epistemológico. Desse modo, afirma que no capítulo XXIII, nas seções
III („Produção Progressiva de uma Superpopulação Relativa ou de um Exército Industrial de Reserva‟) e
IV („Formas de Existência da Superpopulação Relativa. A Lei Geral da Acumulação Capitalista‟) Marx
desenvolve a idéia de que no modo-de-produção capitalista superpopulação relativa e exército industrial
de reserva são equivalentes.
Assim, segundo Cardoso, a diferença entre uma “teoria geral das populações” e a “teoria da
população específica do modo-de-produção capitalista” não encontra fundamento nos textos de Marx,
mas na interpretação althusseriana de seu método. Para o autor, este equívoco de Nun teria ocorrido pelo
seguinte: os textos de Marx nos quais está baseada esta interpretação se referem exclusivamente a modos
de produção anteriores ao capitalismo9. Metodologicamente, o equívoco de Nun deriva da distinção da
metafísica althsseriana entre as condições universais de realização das combinações possíveis entre meios
de produção e trabalhadores e a cada tipo particular de combinação a partir do modo-de-produção
concreto. Assim, partindo desta inspiração teórica, Nun teria tentado encontrar uma brecha para esta
formulação da “teoria geral da população” com os conceitos de população adequada e superpopulação
relativa como componentes da “teoria geral do materialismo histórico”. Desse modo, para Cardoso, as
interpretações que restringem o conceito de superpopulação relativa a certos e determinados modos de
produção são corretas, ao contrário de como havia pensado Nun.
Estas observações iniciais levam Cardoso a um questionamento: “(...) a qué se reduce la
pretendida „funcionalidad‟ del ejército de reserva en el capitalismo competitivo?” (Cardoso: 2001; p. 166)
O autor responde da seguinte maneira: “o se trata de una „necesidad‟ del proceso de acumulación o de un
tipo de análisis que no encuentra cabida en el enfoque dialéctico de Marx, pues él no estaba preocupado,
et, pour cause, com la „proporción de la población‟ adecuada al modo de producción, ni a los medios de

8
Entretanto, Nun afirma não haver uma marginalidade homogênea. O desenvolvimento desigual, combinado e dependente,
segundo ele, gera diferentes tipos de marginalizados, apesar de todos poderem ser classificados como massa marginal.
9
Cardoso se refere aos Grundisse, texto que tanto ele quanto Nun utilizam para fundamentar a sua argumentação.
13
empleo, sino precisamente con la perspectiva opuesta: con los requerimientos de la expansión del capital
que, a partir del „capitalismo avanzado‟ (en oposición a las situaciones en que barreras naturales o
sociales impedían la industrialización de la fuerza de trabajo), crea el excedente necesario de
trabajadores” (ibidem; p. 166).
Assim para Cardoso, Marx estaria fazendo a análise “(...) de un modo particular de producción que
crea un tipo de superpoblación relativa a la acumulación del capital, sino que veía las relaciones entre la
acumulación y la superpoblación desde una perspectiva dialéctica, esto es, como contradicción, y no se
preocupaba por las funciones de la superpoblación, sino desde esta misma perspectiva. No categorizaba el
ejército de reserva según la funcionalidad de la superpoblación, sino conforme a las contradicciones entre
acumulación y miseria” (ibidem; p. 169).10
Segundo Cardoso, para Marx a classe trabalhadora era constituída por dois grandes setores: o
exército de trabalhadores em atividade e o exército de trabalhadores em reserva. Desse modo o autor
critica o fato de que Nun cria o conceito de massa marginal, diferente do de exército industrial de
reserva, para qualificar o excedente de população no capitalismo monopólico, mas afirma que ambos são
gerados pela mesma lei: “sin embargo, aun si se aceptase esa salida metateórica, no se puede evitar el
problema conexo: el modo de producción que contiene el monopolio como forma básica de apropriación
contínua siendo, para Nun, capitalista. Está sujeto, por tanto, a la ley del valor y a la idea de que, en
último análisis, la acumulación creciente se liga a la explotación del trabajo y que aun si el „trabajo
necesario‟ disminuye relativamente, la miseria creciente será el polo opuesto, antagónico y necesario, de
este proceso, conforme se vio en los textos de Marx ya citados” (ibidem; pp. 176-7).11
Por fim, Cardoso explicita suas principais críticas ao conceito de massa marginal desenvolvido
por Nun. Primeiramente, afirma que o conceito de massa marginal não se insere no mesmo terreno do de
exército industrial de reserva, pois se refere a uma teoria da funcionalidade das populações e não à teoria
da acumulação. Em segundo lugar, o autor diz que, do ponto de vista epistemológico, este conceito
assume a conotação de um conceito heurístico e operacional e não a de uma contradição necessária. E
assim Cardoso apresenta sua crítica: “sin embargo, este procedimiento podría justificarse
operacionalmente sin mayores pretensiones, como medio para indicar una situación donde hay empleo
para todos aun con la expansión del sistema económico. Este punto de vista, del „escándalo de una

10
O autor lembra que “(...) puesto que el capital se acumula exponencialmente, la miseria crece proporcionalmente a la
acumulación así como el número de obreros en actividad disminuye relativamente, dado el aumento de la tasa orgánica de
composición del capital, aumentando, en consecuencia, la superpoblación relativa de trabajadores” (ibidem; p. 170).
11
Cardoso afirma inclusive que “la no observancia de este resultado implica una revisión fundamental del pensamiento de
Marx y no puede ser resuelta recurriendo a textos del propio Marx que habrían anticipado los rasgos del capitalismo
monopólico que lo tornarían compatible con una renovación permanente de la base técnica de producción, menor número
relativo de trabajadores incorporados y, al mismo tiempo, mejor nivel de vida creciente de los trabajadores” (ibidem; p. 177).

14
situación social‟, ha sido asumido por gobiernos, organismos internacionales y sociólogos. La „teoría de la
marginalidad‟ suele partir de él e insistir en los aspectos sociales de este problema. Pero, en el caso de
Nun, el concepto deja de ser operacional y de permitir sea la discripción de „una situación de consumo‟,
sea la previsión de una forma de comportamiento (mayor o menor integración social o política, por
ejemplo), pues son marginales tanto los empleados como los desempleados, estén de modo estable en esta
condición o no, desde que el observador fije su atención en el sector monopólico y observa, a partir de él,
a los otros sectores (ibidem; pp. 180-181).
Cardoso critica também o fato de Nun partir, sem maiores críticas, do pressuposto de que exista
realmente uma massa crescente sem ocupação.12 Em seguida, indaga se este crescimento não seria
incompatível com a visão de Marx. Por último, apresenta o seguinte questionamento: “si así fuese, ¿por
qué no decir claramente que la teoría marxista no da cuenta de esta situación y proponer otra explicación
para la acumulación?” (ibidem; p. 181). Cardoso argumenta que “(...) si fuesen verdaderas las tendencias
catastróficas del capitalismo monopólico en la creación de empleo, estas indicarían más bien que existe
una relación directa entre acumulación y superpoblación relativa, sin que hubiese necesidad de proponer
el concepto de „masa marginal‟. Este concepto solo se justificaría operacionalmente si fuese
empiricamente riguroso. Su validez teórica requeriría, además, que se pudiese definir en el plano
estructural la relación entre la masa marginal y la forma de acumulación existente, lo que no ha sido
hecho. Puesto que Nun creó un concepto inespecífico, esto es, que comprende individuos que se
relacionan de forma heterogénea con el proceso productivo y socialmente se colocan en niveles diferentes
(empleados, desempleados, no empleables etc.), la distinción entre ejército industrial de reserva y masa
marginal deja de justificarse, incluso operacionalmente” (p. 183).

1.3.2) A resposta de Nun

Em resposta à crítica de Cardoso, no ano seguinte, em 1971, Nun (2001) escreve um artigo
retomando suas teses iniciais e rebatendo as observações de seu comentarista. Primeiramente, expõe que
seu texto anterior procurava mostrar os motivos pelos quais prevalecia nas formações capitalistas
periféricas a tendência do capitalismo monopolista em cristalizar a irrelevância funcional de uma parte
considerável dos trabalhadores disponíveis.

12
Segundo Cardoso, “La relación entre el sector secundario y el terciario – aun en América Latina, para no hablar de los
Estados Unidos – indica un acentuado dinamismo del capitalismo monopólico para crear empleos”, ou ainda “(...) en el
capitalismo monopólico los efectos de disminuición del empleo originados en la primera tendencia son contrapesados por la
creación de empleos debida a la segunda tendencia” (ibidem; pp. 182-3).
15
Nun inicia o artigo retomando algumas de suas premissas iniciais: (i) primeiramente, de que seu
argumento se baseava em dois planos: o do modo-de-produção (plano abstrato-formal) e o da formação
sócio-econômica (plano real-concreto); (ii) segundo, o questionamento da assimilação habitual dos
conceitos marxianos; (iii) terceiro, as diferenças entre as fases competitiva e monopolista do capitalismo;
(iv) quarto, a apresentação da categoria de massa marginal, distinta da de exército industrial de reserva; e
(v) por último, a consideração do contexto das formações sócio-econômicas em geral e a dos países
capitalistas dependentes, em particular, buscando as determinações específicas da problemática da massa
marginal no caso concreto da América Latina.
Desse modo, Nun rebate os principais argumentos levantados contra ele por Cardoso e reforça
suas elaborações teóricas anteriores. Segundo o autor, “alterando mi texto – y El Capital – a su gusto,
Cardoso elige el modo de la exégesis para criticar mi „mala lectura‟ de Marx y aparece sosteniendo
succesivamente : (a) que los conceptos de superpoblación relativa y ejército industrial de reserva no son
distinguibles; (b) que sí lo son; (c) que el concepto de ejército industrial de reserva ya denota las
cuestiones a las que me refiero; (d) que no las denota; (e) que havría que probar empiricamente que esas
cuestiones son reales; (f) que quizá lo sean, pero entonces „por qué no decir claramente que la teoría
marxista no da cuenta de esta situación y proponer otra explicación para la acumulación?; (g) que mi
visón del desarrollo del capitalismo monopólico es optimista; (h) que mi visón de este desarrollo es
necesariamente catastrófica, e; (i) que, desde luego, la noción de masa marginal no sirve para nada” (Nun:
2001; p. 192).
Nun valida a tese segundo a qual o conceito de exército industrial de reserva é necessário para
referir-se apenas às relações funcionais que se estabelecem entre a população sobrante e o processo
produtivo que a gera. O autor argumenta que “desde un punto de vista teórico, tales relaciones deben
suponerse dominantes en la fase competitiva del modo de producción capitalista, dados los supuestos
concurrentes de un desarrollo igual y autónomo” (ibidem; pp. 212-213). Em seguida, afirma que esta
tendência se verificou principalmente na Inglaterra por vários motivos: um grande dinamismo do sistema
que, na segunda metade do século XIX, se consolida mediante a rápida conquista de mercados externos;
uma alta congruência entre o desenvolvimento tecnológico e as disponibilidades de força de trabalho; e
um impressionante fluxo emigratório principalmente entre 1812 e 1914.
Nun afirma inclusive que, no plano histórico concreto, a questão da marginalidade se torna
relevante nos Estados Unidos, país capitalista central e “modelo” do capitalismo monopolista, mas
adquire uma dimensão maior entre os países capitalistas periféricos, cujo desenvolvimento desigual,
combinado e dependente coloca na superfluidade boa parte da população excedente. Assim, “desde un
punto de vista teórico, la cuestión gana relevancia cuando el modo de producción capitalista ingresa a su

16
fase monopolística: por un lado, el proceso de acumulación se organiza en formas cualitativamente
diversas, que requieren un tratamiento diferenciado; por el otro, respecto de las que resultan hegemónicas
se debilita la importancia de los efectos „clásicos‟ de la superpoblación (...)” (ibidem; p. 214).
Segundo Nun, Cardoso ignora por completo alguns fatores: “Conviene insistir aquí en dos
observaciones fundamentales – que, según se verá, Cardoso ha elegido ignorar por completo: (1) como se
desprende de lo expuesto, tanto el ejército industrial de reserva como la masa marfinal son conceptos que
denotan antes relaciones que agentes o suportes de tales relaciones. Cuando Marx se refiere a estos
últimos toma una precaución metodológica significativa, que abona la legitimidad de mi lectura y que sus
intérpretes no han tenido en cuenta: los examina en tanto componentes de la superpoblación relativa y no
del ejército industrial de reserva, al punto que lo que llama la modalidad intermitente de la población
sobrante forma parte del ejército obrero en activo [e]; (2) Si bien es posible prever teóricamente sus tipos
principales, las categorías específicas que en cada formación económico-social integran la superpoblación
relativa – y que, por consiguiente, constituyen los suportes del ejército industrial de reserva y de la masa
marginal – solo pueden ser determinadas a partir del análisis concreto de situaciones concretas” (ibidem;
p. 125).
Para explicar o uso da categoria função, Nun explica que seu objetivo era “(...) develar en parte la
unidad contradictoria del objeto en examen, que siempre se liga a la totalidad compleja del modo de
producción (o, en su caso, de la formación económico-social) a través de relaciones funcionales y no
funcionales” (ibidem; p. 223). Para o autor, esta reflexão servia como suporte das teses sobre o conceito
de superpopulação relativa e do projeto de explorar sobre que condições a funcionalidade (ou a não
funcionalidade) destas relações tendiam a consituir o aspecto principal da contradição e quais são as
conseqüências que resultam a todos os níveis.
A respeito da questão posta por Cardoso (“Existe realmente uma massa crescente sem ocupação?”)
Nun lembra que conforme havia apresentado em seu artigo, a superpopulação relativa não compreende
somente os trabalhadores sem emprego. O autor recorda que, para Marx, a superpopulação relativa
intermitente forma parte do exército ativo, mas sob um trabalho muito irregular.13
Segundo Nun, Cardoso conclui seu artigo o criticando por haver criado o conceito de massa
marginal “(...) (a) cuya relación con la forma de acumulación existente no defino; (b) no operacionable ni
empiricamente riguroso; (c) „inespecífico‟; y (d) no apto para describir „una situación de consumo‟ ni para
prever formas de comportamento – „mayor o menor integración social o política, por ejemplo‟” (ibidem;
p. 237).

13
Segundo Nun, “no se trata únicamente, ahora, de considerar también el problema de la subocupación sino de hacerlo
teniendo en cuenta la fragmentación del mercado de trabajo industrial a que me referí, la cual resulta inabordable por medio de
estadísticas agregadas de ocupación y de ingreso” (p. 234).
17
Em seguida, Nun rebate as críticas e apresenta o argumento principal em defesa do conceito que
criou: “(...) un desarrollo capitalista desigual y dependiente que combina diversos procesos de
acumulación en el contexto de un estancamiento crónico genera una superpoblación relativa a la forma de
producción hegemónica que actúa, en parte, como ejército industrial de reserva y, en parte, como una
masa marginal. Lo que es importante es que la no funcionalidad de esta última está indicando un bajo
grado virtual de integración del sistema, un desajuste a resolver, cuya solución organiza modos de
integración social compatibles con el mantenimiento de la matriz de relaciones vigente” (ibidem; p. 241).

2) O desemprego contemporâneo e a atualidade dos conceitos de Marx e Nun

Após apresentar os conceitos que consideramos essenciais para o estudo do desemprego e da


marginalidade, tentaremos esboçar algumas reflexões sobre as relações capitalistas de produção na
contemporaneidade. No entanto, vale fazer uma ressalva do ponto de vista teórico e metodológico para
não cairmos na simples enumeração historicista do que vale e o que não vale atualmente nestas categorias.
Não era intenção nem de Marx nem de Nun apresentar uma tipologia definitiva de como seriam
constituídos o exército industrial de reserva e a massa marginal. Estes conceitos aparecem a partir (i) de
como são gerados (“produto e alavanca da acumulação capitalista”) e (ii) do papel que exercem na
dinâmica da capitalista (funcional, no primeiro caso e afuncional ou disfuncional, no segundo). Assim, ao
debater sobre os conceitos de superpopulação relativa latente, flutuante e estagnada, Marx apresentou as
categorias que, em seu tempo, possuíam mais vigor. Cabe a nós, pesquisadores contemporâneos, verificar
a validade de tais conceitos, assim como o de massa marginal, na nossa realidade social.
Apresentaremos em seguida a revisão que o próprio Nun fez de sua tese da massa marginal trinta
anos depois, assim como as idéias nossas sobre a validade de seu conceito e dos de Marx para
compreender a complexidade do fenômeno do desemprego na comtemporaneidade.

2.1) Nun diante dele mesmo: trinta anos depois...

Aproximadamente trinta anos depois da publicação do artigo em que apresenta a tese da massa
marginal, da crítica de Fernando Henrique e de sua resposta, Nun (2000) retorna às suas teses iniciais
para analisar o desemprego e a marginalidade contemporâneos.14

14
No começo do artigo Nun lembra que o século XX se encerrou com “(...) mais de 800 milhões de seres humanos
desempregados ou subempregados” (ibidem; p. 44).
18
De acordo com o autor “nos Grundisse, primeiro, e depois em O Capital, Marx elaborou as noções
de superpopulação relativa e exército industrial de reserva, as quais têm influído até hoje nas análises das
dinâmicas da acumulação capitalista e do emprego, embora muitas dessas análises costumem omitir esta
fonte ou nem sequer tenham consciências dela” (Nun: 2000; p. 45).
Nun lembra que o seu argumento de trinta anos anteriores partia de uma crítica à maneira pela qual
autores influentes como Oskar Lange e Paul Sweezy assimilavam estas categorias, apresentando-as como
análogas e desconsiderando a diferença entre “(...)a gênese de uma população excedente e os efeitos que
sua aparição provoca no sistema que lhe dá origem (...)” (ibidem; p. 46).
Segundo Nun, esta confusão foi gerada pelo fato de terem centrado suas análises no capítulo
XXIII d‟O Capital, onde Marx “(...) examina como é gerada a superpopulação relativa no modo de
produção capitalista e, ao mesmo tempo, trata dos efeitos funcionais que ela tem sobre a dinâmica da
acumulação em um estágio determinado, isto é, da medida em que opera efetivamente nesse caso como
um exército industrial de reserva” (ibidem; p. 46). Para Nun, o problema é que essa identificação
equivocada das duas noções lhes impediu de ver que a superpopulação pode produzir também efeitos não-
funcionais.
E assim, Nun esclarece que foi justamente para apresentar este outro efeito possível sobre a
superpopulação relativa (que pode ser, a depender das circunstâncias, afuncionais ou disfuncionais) que
criou o conceito de massa marginal. Em uma passagem assim descreve Nun: “(...) minha tese da massa
marginal buscou questionar o hiperfuncionalismo de esquerda, para o qual até o último camponês sem
terra da América Latina (ou da África) aparecia como funcional para a reprodução da exploração
capitalista. Procurei mostrar que em muitos lugares, ao contrário, crescia uma população excedente que,
no melhor dos casos, era simplesmente irrelevante para o setor hegemônico da economia e, na pior das
hipóteses, se convertia em perigo para sua estabilidade” (ibidem; p. 49).
Segundo Nun, na época em que escreveu os Grundisse e, mais tarde, O Capital, Marx vivia o
capitalismo industrial em sua fase competitiva, tendo como referencial empírico a Inglaterra antes de
1875, “(...) quando tal fase chegava ao seu apogeu e o capitalismo ainda constituía basicamente um
negócio de empreendedores individuais em pequena escala e estreitamente à mercê dos avatares do
mercado” (ibidem; p. 47).
Após retomar suas teses desenvolvidas na década de 1960, Nun aponta os motivos para não
considerar suficiente uma análise da superpopulação relativa baseada apenas na sua funcionalidade no
mundo atual: (i) primeiramente, por causa da passagem do capitalismo competitivo para o capitalismo
monopolista, que Marx antecipou mas não pôde analisar; (ii) segundo, por cinta da crescente

19
internacionalização do capital no final do século XX; e (iii) por último, pelas profundas modificações que
vêm ocorrendo por toda parte na estrutura ocupacional iniciadas há pelo menos cinqüenta anos.15
Por estes motivos, Nun volta ao tema da massa marginal. No entanto, o autor considera que “em
face dos diversos processos de acumulação que ora se superpõem e se combinam e que já não podem ser
concebidos como meros momentos de transição rumo a um único grande processo no qual todos
acabariam por se dissolver, os mecanismos de geração da superpopulação relativa se pluralizam e varia
também a funcionalidade de seus efeitos conforme o setor. É assim que os desocupados são o componente
mais dramático e visível desse processo, mas de modo algum o único. Em uma primeira e muito
esquemática aproximação, pode-se afirmar que tais desocupados podem atuar, ao mesmo tempo, como
um exército industrial de reserva no mercado de trabalho secundário (onde tende a operar o setor
competitivo) e como uma massa marginal no mercado primário (onde predomina com freqüência o setor
monopolístico), e que, ademais, a mão-de-obra redundante em relação a este último não necessariamente
carece de emprego, pois pode estar ocupada em outro segmento ou até mesmo, em situações de grande
atraso, fixada ainda à terra ou a alguma fonte de consumo” (ibidem; p. 48-49).
A partir de então, Nun passa a apresentar as três versões mais correntes que procuram explicar o
desemprego contemporâneo: a versão tecnológica, a filosófica e a sociológica. A primeira se inicia com a
seguinte questão: “(...) como se pode combinar a longo prazo um crescimento capitalista impulsionado
pela constante expansão da produtividade com uma efetiva garantia do direito ao trabalho a todos os
cidadãos?” (ibidem; p. 52). Esta versão considera que os avanços da automatização estão eliminando
sistematicamente os trabalhadores do processo produtivo. Jeremy Rifkin (1996)16 e sua tese do fim do
trabalho de tornou-se, segundo Nun, um dos expoentes mais conhecidos. A segunda versão parte de um
outro questionamento que se depreende da resposta negativa à primeira: “(...) como pode então
permanecer estruturada em torno do trabalho uma sociedade que já não tem condições de assegurar o
pleno emprego a seus membros?” (ibidem; p. 52). Segundo Nun um dos principais defesores desta tese é
Domenique Méda (1995)17, o qual responde a pergunta da seguinte forma: “(...) não pode, nem deve. Há
que desencantar o trabalho, libertá-lo de toda a carga utópica nele depositada ao longo dos dois últimos
séculos, para que possam assim se desenvolver outras atividades „com lógica radicalmente diferente‟,
„fontes de verdadeira autonomia e cooperação‟” (ibidem; p. 52).

15
Ao comentar este último fator, Nun afirma que a figura do “(...) operário industrial, chefe de família, com emprego estável e
remuneração satisfatória, hoje ele tende a ser cada vez mais uma mulher sem cônjuge que sustenta a família com um emprego
temporário e mal-remunerado no setor de serviços. Seja como for, o certo é que a indústria declinou claramente como
empregadora de mão-de-obra em face de um generalizado processo de expansão do setor terciário, tanto público quanto
privado. A conseqüência é que a estrutura ocupacional se tornou muitíssimo mais heterogênea e instável do que imaginaram
aquelas análises, fragmentando os mercados de trabalho e aduzindo enorme complexidade aos efeitos excedentes da população
sobre os movimentos da acumulação capitalista” (ibidem; p. 48).
16
RIFKIN, Jeremy – El fin del trabajo – Barcelona: Paidós, 1996.
20
Nun apresenta a crítica a estas interpretações da seguinte maneira: “(...) uma leitura atenta dessas
duas versões da tese do fim do trabalho faz perceber que apelam a um habitual recurso: radicalizar uma
idéia para torna-la mais provocativa. Que se deva „encantar‟ outros espaços que não o da produção não
significa que a produção (e vinculado a ela o trabalho) vá desaparecer, ao menos num futuro previsível.
Por isso, sobre o que no fundo estão falando é antes da crise da sociedade salarial, isto é, do trabalho
assalariado como pilar da coesão social. Dão a ênfase de Rifkin (1996) na expansão complementar da
economia do terceiro setor (o que na França se denomina „economia social‟), enquanto Méda (1995)
chega a afirmar que „o verdadeiro problema de nossa sociedade não é de maneira alguma a escassez de
trabalho, mas o fato de que carecemos de um modo convincente de distribuição de renda‟” (ibidem; p.
52).
Por fim, Nun trata do terceiro viés, definida por ele como „sociológica‟. Segundo esta versão, “(...)
o que está em jogo neste caso é a idéia do fim do trabalho assalariado estável e bem-remunerado como
perspectiva real e invencível para uma grande parte da mão-de-obra” (ibidem; p. 52), o que invalida as
duas primeiras visões.
Nun afirma que ele mesmo quando propôs uma revisão crítica da problemática da superpopulação
relativa e do exército industrial de reserva suas referências à política e à ideologia não foram sólidas
suficientemente para superar o economicismo produtivista da proposição original da questão. A partir
desta autocrítica, Nun desenvolve a idéia de que “o importante é advertir que os aumentos de
produtividade não geram necessariamente desocupação: tudo depende, de um lado, de como se os obtenha
e, de outro, de que exista ou não uma demanda global capaz de absorver o conseqüente crescimento da
produção. E isso já não constitui um efeito direto da mudança tecnológica, mas um resultado das políticas
macroeconômicas que se adotem e, finalmente, das correlações de força e do contexto social, político e
ideológico que prevaleçam. O que equivale a dizer que o efeito sobre o emprego de qualquer processo de
crescimento está longe de ser um fenômeno estritamente econômico” (ibidem; p. 56). Nun levanta
também os fatores de regulação das respectivas economias e até aos distintos significados culturais que se
atribuem à situação de desemprego como importantes variantes para uma abordagem do tema.
Nun considera que não se pode abandonar uma visão dominada pela fábrica, na qual “(...) um
conjunto bastante homogêneo de trabalhadores flutuava conforme as circunstâncias entre o emprego e o
desemprego, para um outro em que a demanda de mão-de-obra se encolhe cada vez mais e a desocupação
tecnológica se converte em destino inelutável de uma multidão cada vez maior de excluídos sociais”
(ibidem; p. 56).

17
MÉDA, Domenique – Le travail: une valeur en voie de disparition – Paris: Aubier, 1995.
21
Todavia, analisando novamente o caso da América Latina, Nun considera que a “irrelevância de
parte substancial da população excedente para a reprodução do setor capitalista que [hegemoniza] um
processo de desenvolvimento desigual e dependente” ainda está presente. Para o autor, este processo tem
sido reforçado pela “(...) grave crise da dívida externa e a pressão exercida pelos grandes interesses
transnacionais que se foram articulando em torno do chamado „Consenso de Washington‟ levaram em
quase todos os países a mudanças drásticas nos regimes sociais de acumulação vigentes” (ibidem; p. 58).18
Para Nun, a expressão mais evidente da atualidade do conceito de massa marginal é a diminuição
do emprego formal e a subutilização da mão-de-obra urbana. Além disso, o crescimento de “(...)
atividades informais (trabalhadores por conta própria, microempresas e serviços domésticos), de baixa
qualificação e remuneração e a descoberto de qualquer proteção social” (ibidem; p. 59) também tem
contribuído para aumentar o contingente de marginalizados.
Diante de tal quadro Nun observa que “em um tal contexto adquirem dimensão muito maior
minhas observações anteriores de que a marginalidade social excede sobejamente o problema do
desemprego” (ibidem; p. 59). Segundo o autor, “a taxa de desocupação aberta da América Latina, que
oscila em torno de 8%, e à primeira vista inferior à média dos países da União Européia, mas revela-se
altíssima quando se observa a quase totalidade dos latino-americanos sem trabalho carece dos seguros e
benefícios a que têm direito seus congêneres europeus. Além disso, mais da metade das pessoas ocupadas
hoje em dia nas cidades da região são trabalhadores não registrados, mal-remunerados, instáveis e não
têm nenhuma proteção social nem perspectivas reais de ascensão profissional. A isso acresce que as
reformas introduzidas no setor moderno/ formal em nome da flexibilização levaram a um barateamento do
custo da mão-de-obra, por meio da demissão de trabalhadores estáveis e da expansão do número de
trabalhadores sem contrato ou com contrato temporário – isto é, mediante uma precarização crescente do
emprego também no setor moderno/ formal” (ibidem; p. 59).
E assim, Nun afirma que os propósitos imediatos da elaboração da tese da massa marginal
continuam válidos: (i) pôr em evidência a relação estrutural entre os processos de acumulação capitalista
prevalecentes na América Latina e os fenômenos da pobreza e da desigualdade social; (ii) indicar a
heterogeneidade e a crescente fragmentação da estrutura ocupacional e suas conseqüências em termos de
formação de identidades sociais19; e (iii) chamar a atenção para os modos como incidia sobre a integração

18
Para Nun estas políticas se expressam através do enxugamento do Estado (com as privatizações e a redução dos gastos
públicos); a estabilidade econômica, por meio de persistente combate à inflação e maior disciplina fiscal à desregulamentação
dos mercados; e da abertura das economias ao comércio e às finanças internacionais que em nenhuma outra parte do mundo foi
tão abrupta e intensa. Tudo isso, para o autor, tem conferido absoluta prioridade ao investimento privado em detrimento do
público.
19
Segundo o autor, “(...) não é de somenos que a visão de Marx acerca da superpopulação relativa estivesse dominada pela
modalidade flutuante, o que o levava a supor que a maioria dos trabalhadores teria em algum momento de suas vidas essa
22
do sistema a necessidade de afuncionalizar os excedentes de população para evitar que se tornassem
disfuncionais, dando lugar, por exemplo, a mecanismos de dualização e de segregação que eram muito
menos resquícios de um passado ainda tradicional que expressões de um presente já moderno.

2.2) O que ainda é valido em Marx e Nun

O retorno a esta discussão sobre os conceitos de exército industrial de reserva e massa marginal é
fundamental para uma reflexão sobre a construção de novas categorias para se pensar o desemprego
contemporâneo, cada vez mais heterogêneo em sua forma e conteúdo. Desse mod, as indagações que
norteiam este trabalho são as seguintes: (i) quais são as formas atuais de aparição da superpopulação
relativa?; (ii) como aparece, em nossos tempos, o exército industrial de reserva e a massa marginal?
Nossa hipótese central é de que por mais que busquemos novas categorizações para o desemprego
o cerne da questão, explicitada por Marx e posteriormente por Nun, continua vigentes. Entretanto, vale
mencionar em que âmbito da problemática os conceitos destes autores ainda são válidos para explicar a
realidade social. Assim, pensemos no exército industrial de reserva e na massa marginal sob três
aspectos: como são gerados, a função social que cumprem e de que forma se expressam.
Pensando no primeiro aspecto, nossa hipótese é de que, na sociedade atual, as manifestações
contemporâneas do exército industrial de reserva e da massa marginal continuam tendo como um de seus
pilares a dinâmica da acumulação do capital. Sobre o segundo, afirmamos que estas manifestações têm
sempre um papel funcional, disfuncional ou afuncional. Com referência ao terceiro aspecto, duas
observações devem ser feitas: (i) a superpopulação relativa latente, estagnada e flutuante não dão conta
de explicar todas as formas de manifestação do desemprego, apesar de ainda existirem em nossa
sociedade; (ii) a massa marginal têm assumido cada vez mais uma formal afuncional, aumentando em
escala global o contingente de trabalhadores supérfluos à dinâmica capitalista. Argumentemos sobre cada
uma destas questões a partir das seguintes observações:

(i) a noção de exército industrial de reserva nos permite entender como, no modo-de-produção
capitalista, a geração de uma população sobrante assume a função particular de “produto e
alavanca do processo produtivo capitalista”;
(ii) a relação entre o processo de produção capitalista e a geração do exército industrial de reserva
constitui um elemento fundamental para a análise do desemprego contemporâneo, já que o

experiência da fábrica que ele considerava tão crucial para a configuração de suas solidariedades e antagonismos” (ibidem; pp.
23
atual nível de acumulação, concentração e centralização do capital têm se dado numa escala
sem precedentes;
(iii) concomitantemente a este processo, a população global em condições de desemprego de longa
duração ou recorrente20, subemprego21, informalidade22, precarização das relações de
trabalho23, pobreza24 e miséria tem se tornado cada vez maior;
(iv) à medida que exerce a “função” de controlar o valor da força de trabalho, permitindo um maior
grau de arbítrio patronal, o exército industrial de reserva continua sendo um conceito chave
para compreender os atuais entraves que o desemprego impõe sobre a ação organizada dos
trabalhadores;
(v) o conceito de exército industrial de reserva, tal como havia sido pensado por Marx, não é
suficiente para explicar a complexidade da superpopulação relativa atual. Como bem observa
José Luís Nun, Marx se atentou apenas para a sua parcela funcional, não desenvolvendo em
sua análise a parcela afuncional ou disfuncional em relação ao processo de acumulação
capitalista. É por isso que Nun cria o conceito de massa marginal;
(vi) a massa marginal assume uma relevância cada vez maior na sociedade atual dado o nível de
superfluidade de trabalhadores que, em condições de pobreza ou miséria absoluta, não logram
chance alguma de inserção no mercado de trabalho e, por conta disto, não exercem nenhuma
pressão sobre o movimento de expansão do capital.

Pelos motivos explicitados até aqui, consideramos os conceitos de exército industrial de reserva e
massa marginal fundamentais para o entendimento da questão do desemprego e da marginalidade atuais.
Porém, vejamos como o desemprego se constitui na sociedade contemporânea.
Até a década de 1980, especialmente nos países capitalistas centrais e periféricos industrializados,
o desemprego se configurava por seu caráter transitório de ajuste da oferta e demanda de emprego. Nestas
circunstâncias, os conceitos de desemprego friccional e desemprego estrutural se referiam justamente a
este aspecto de transitoriedade, já que ambos eram causados pela situação cíclica de crise conjuntural (e,

60-61).
20
Entende-se o desemprego recorrente aqui como a trajetória de ocupação precária – desemprego – inatividade a que se
submete uma grande dos trabalhadores no mundo contemporâneos.
21
Entendemos subemprego aqui como a subutilização da capacidade de trabalho.
22
Para uma análise das velhas e novas informalidades presentes no mercado de trabalho, ver SOUZA (1980) e NORONHA
(1991).
23
A precarização tem sido denominada por autores europeus “brasilianização”, para designar situações típicas das relações de
trabalho no Brasil que começaram a aparecer entre eles a partir da década de 1980.
24
Lucio Kowarick diferencia o pobre do desempregado, justamente para dizer que, em países capitalistas periféricos existe
uma fronteira muito tênue entre ambos, apesar de, estruturalmente, o primeiro se constituir como um problema muito maior
que o segundo (KOWARICK: 1975). Um outro autor que trabalhou a questão da pobreza latente nos países capitalistas
subdesenvolvidos foi Aníbal Quijano (QUIJANO: 1970).
24
ao mesmo tempo, expressão estrutural) da incorporação de novas técnicas e uso da força de trabalho no
capitalismo. Assim, ganhou importância entre os autores marxistas a referência à fração flutuante da
superpopulação relativa.
Desse modo, até esta época o desemprego era definido como privação involuntária e transitória
de trabalho formal, registrado e de jornada completa, mesmo havendo disponibilidade e procura ativa.
Foi justamente para expressar a parcela dos trabalhadores que tinham um trabalho informal, sem registro,
parcial, precarizado e outros tipos de subemprego que surgiu a categoria de ocupado, como uma
alternativa aos conceitos de empregado e desempregado. Para contemplar aqueles que não tinham um
trabalho, mas não exerciam uma procura ativa surgiu o conceito de inativo, que incluía também os
deficientes físicos, aposentados, donas-de-casa e crianças.
Em contrapartida ao uso destes conceitos apareceram as categorias de desemprego oculto pelo
trabalho precário e desemprego oculto pelo desalento. A justificativa era que, em ambos os casos,
omitia-se uma situação sobre o mercado de trabalho, seja através da precariedade ou da falta de
perspectiva na procura de emprego, com a finalidade política de abaixar a taxa de desemprego aberto.
Independente da conceituação parece-nos conveniente designar o primeiro como parte da superpopulação
relativa estagnada e o segundo, como constituinte da massa marginal afuncional.
Poderíamos ainda mencionar: o enorme contingente de trabalhadores do campo sujeitos a
migrações para as grandes metrópoles, constituintes da superpopulação relativa latente; o enorme
contingente de trabalhadores ilegais, como é o caso de imigrantes clandestinos (nos Estados Unidos e
Europa) e escravos e semi-escravos (na Ásia, África e América Latina)25; e a população pobre e miserável
presente em todo o globo que não tem nenhuma perspectiva de participação no mercado de trabalho, estes
últimos partes consideráveis da massa marginal afuncional.
No entanto, nos chama atenção duas formas atípicas de desemprego em que o caráter transitório
assume um novo papel. No primeiro caso, a alta rotatividade do trabalhador entre situações de
desemprego, ocupação e inatividade leva ao paroxismo a sua transitoriedade. No segundo, o aspecto
circunstancial da falta de trabalho perde o sentido através da permanência prolongada na situação de
desemprego. Chamamos este de desemprego de longa duração e aquele de desemprego recorrente.
Poderíamos inseri-los, respectivamente, nas categorias de massa marginal e superpopulação relativa
estagnada. Todavia, poderíamos também criar as categorias de superpopulação relativa não flutuante e
hiperflutuante. O que importa é que estes conceitos nos colocam diante de uma zona de fronteira entre o
exército industrial de reserva e a massa marginal e entre a superpopulação relativa flutuante e
estagnada. Ou seja, estamos diante de duas categorias híbridas que estabelecem um impasse para a

25
Para uma análise da escravidão contemporânea ver ESTERCI, FRY & GOLDENBERG (2001).
25
caracterização do problema. Segundo Nadya em seu texto Por uma Sociologia do Desemprego nas “(...)
condições do início dos anos de 1980, o trabalhador a par de „desempregado‟ se mantinha, por exemplo,
como „metalúrgico‟; ou seja, sua origem ocupacional seguia sendo provedora de auto-reconhecimento e
de reconhecimento pelos outros (notadamente pelo seu sindicato). Isto se tornava possível dada a crença
nas chances do retorno ao „setor de origem‟; e esta resultava da modalidade de estratégia de gestão do
trabalho, baseada no turn over dos trabalhadores. Tal construção subjetiva e o seu correlato institucional
perderam sentido nos anos de crise da década seguinte (a década de 1990) no Brasil” (pg. 109-110).
Desse modo, até a década de 1980 o desemprego se caracterizava como uma situação de falta de
trabalho involuntário e de curta duração. Mesmo em países como o Brasil onde a rotatividade se constitui
como um problema estrutural, os movimentos de saída eram compensados por constantes movimentos de
entrada. No entanto, os anos 1990 têm sido marcado por novos problemas: o desemprego de longa
duração e o desemprego recorrente. A perda da capacidade de um retorno efetivo ao setor de origem e,
mais do que isso, do retorno ao mercado de trabalho tem sido um problema cada vez maior. Assim, a
recorrência a momentos transitórios de desemprego em períodos de crise vem dando lugar a situações de
perda da capacidade de retorno.
Diante do que foi exposto até aqui, podemos tirar as seguintes conclusões:

(i) sob os aspectos como são gerados e a função social que cumprem, as categorias analíticas
pensadas por Marx e Nun continuam vigentes; pensando no aspecto de que forma se
expressam, os conceitos destes autores são atuais, mas hibridizados com situações novas do
mercado de trabalho;
(ii) os tipos de superpopulação relativa apresentados por Marx (flutuante, latente e estagnada)
não explicam totalmente a complexidade atual do desemprego;
(iii) o problema da marginalidade e do subesemprego tem sido maior do que o do desemprego,
principalmente nos países capitalistas periféricos. À medida que a quantidade de precarizados
e informais, parcela ativa do exército industrial de reserva (constituintes da superpopulação
relativa estagnada) e pobres e miseráveis se tornam cada vez maiores, a superpopulação
relativa (latente e flutuante) sofre um relativo decréscimo;
(iv) a superpopulação relativa se processa no âmbito da teoria geral do materialismo histórico, já
que todo modo-de-produção produz seu excedente populacional. Com isso, constatamos que a
forma como tem se constituído no capitalismo é histórica e, portanto, possível de ser alterada;
(v) o capitalismo na América Latina impõe restrições estruturais para a geração de emprego no
continente. É por isso que podemos dizer que o modo-de-produção capitalista nas formações

26
sócio-econômicas latinoamericanas tem se dado a partir de um desenvolvimento desigual e
combinado, gerando capitalismo dependente e periférico.

Tanto Marx quanto Nun estavam preocupados em explicar o papel estrutural da acumulação do
capital na geração de um excedente populacional: o primeiro através de uma teoria cíclica do capitalismo;
o segundo, através de uma teoria do subdesenvolvimento. No entanto, para uma compreensão atual do
desemprego e da marginalidade é preciso se considerar fatores não só de ordem econômica, mas também
de ordem política, jurídica, cultural e ideológica. Assim, o Estado, por exemplo, pode exercer uma
influência sobre o emprego de duas maneiras: estruturalmente, assegurando a propriedade privadas dos
meios de produção e o contrato de compra e venda da mercadoria força de trabalho, e portanto, o processo
de acumulação do capital; ou, conjunturalmente, propiciando a geração de emprego a partir de
determinadas políticas públicas, ou a eliminação de postos de trabalho, no caso de certas medidas
macroeconômicas.
Um outro veículo de pressão sobre o mercado de trabalho são os sindicatos e outros movimentos
sociais de trabalhadores que, através do acirramento da luta de classes, podem, por um lado, comprimir a
extração da mais-valia através do combate pelo fim das horas extras e da redução da jornada de trabalho
e, por outro, iniciar um efetivo processo de tomada e controle dos meios de produção.
Desse modo, a análise contemporânea do desemprego e da marginalidade precisa levar em conta
uma multiplicidade de fatores, bem como a diversidade dos atores sociais e das instituições em questão.
No entanto, os conceitos de superpopulação relativa, exército industrial de reserva e massa marginal são
o ponto de partida para a afirmação do caráter estrutural da dinâmica da acumulação capitalista na geração
da enorme população sobrante presente no mundo atual.

3) Por uma abordagem sociológica do desemprego

A abordagem econômica do desemprego, pautada essencialmente na análise de dados estatísticos,


vem predominando há décadas nas interpretações sobre o tema. No entanto, as hipóteses atuais acerca do
fenômeno se aproximam cada vez mais das premissas sociológicas: (i) o desemprego é uma construção
social; (ii) o desemprego atinge desigualmente os diferentes grupos sociais; e (iii) o desemprego varia em
uma determinada sociedade diferentemente no tempo.
Estes e outros aspectos dos quais trataremos aqui não podem ser explicados por análises
meramente quantitativas, pois lidam especificamente com questões clássicas da Sociologia, como a

27
observação dos fenômenos sociais a partir dos critérios de estratificação e da variação espacial e temporal
para a construção social dos problemas. Desse modo, é preciso pensar sociologicamente o desemprego, já
que este não é um simples indicador a ser medido objetivamente.
Entretanto, até a década de 1980 houve um verdadeiro esvaziamento da questão do desemprego na
Sociologia. Boa parte desta lacuna foi proporcionada pelo fato de que a Sociologia do Trabalho não
manteve uma devida comunicação com as questões da subjetividade e das relações entre trabalho e
desemprego. Ou seja, os estudos do trabalho não prestaram atenção no “mundo dos sem-trabalho”.
Sem entrar na discussão epistemológica sobre a fragmentação do conhecimento, o estabelecimento
de uma Sociologia do Desemprego se faz preciso, não no sentido de criar uma nova compartimentação no
campo das Ciências Sociais reconhecida institucionalmente pela comunidade acadêmica, mas de propor
uma abordagem sociológica do tema, capaz de dar conta não apenas de sua dimensão econômica, mas
também da social, política, cultural e ideológica.
De fato, esta preocupação não é nova na Sociologia. Em 1966, Raymond Ledrut (1966) publica
sua obra Sociologie du chômage. A questão central para o autor era pensar como é possível se fazer uma
sociologia do desemprego. Para Ledrut o desemprego não é um problema apenas de contabilidade, pois há
que se ver o contexto econômico e social no qual é produzido. Além disso, segundo o autor, a realidade é
composta pelas dimensões objetiva e subjetiva, o que a faz produzir sempre uma situação social típica.
Todavia, apesar de propor uma representação tipológica, Ledrut evidencia que a categorização do
desemprego é histórica.
Após este início, entretanto, a disciplina teve um longo período de estancamento, rompido apenas
no início da década de 1990, quando autores como Robert Salais (1990) e Christian Topalov (1990)
trouxeram a discussão sobre a construção social do desemprego, iniciando uma trajetória de estudo sobre
o tema que vem se estendendo até os dias de hoje, essencialmente na Europa. Seus principais
resultadosserão discutidos neste item.

3.1) O desemprego: uma construção socialmente condicionada por interesses de classe

Definido de maneira sociológica, o desemprego é um termo polissêmico. Assim, é preciso assumir


a discussão sobre esta problemática diferentemente da econometria (ao modo dos economistas). Em
termos durkheimianos, o fato social varia de sociedade para sociedade (Durkheim: 1977). Desse modo, se
o desemprego é um fato social, ele é construído socialmente, e não somente uma medida estatística.

28
O modo como se constituiu em certas realidades foi estudado por Salais (1990) e Topalov (1994).
Para estes autores, o desemprego é uma categoria recente, surgida no contexto do desenvolvimento da
sociedade industrial, do trabalho assalariado e do nascimento de instituições especializadas em políticas
públicas.
Segundo Topalov (1994), o próprio termo “desemprego” ainda não havia sido cunhado em fins do
século XIX. Falava-se em pobres, indigentes e mendigos para se referir àqueles que não podiam viver sem
instituições de ajuda. O verbo francês “chômer”, por exemplo, significava interrupção da atividade por
qualquer motivo, seja no descanso do domingo, seja em caso de greve, doença ou aposentadoria.
Para Salais (1990), a “invenção do desemprego” está estritamente ligada à emergência de uma
relação salarial apoiada tanto no contrato de trabalho, institucionalizado e mais coletivo, como nas
transformações do modo de produção industrial.
Segundo o autor, o desemprego é “inventado” porque tem uma datação, um contexto, sendo
possível apenas quando se torna “o outro” do trabalho assalariado. Desse modo, o desemprego é uma
construção social, um fenômeno recente, conseqüência da norma salarial regularizada, não podendo
existir sem ela.
A preocupação de Topalov (1994) era com o desenvolvimento do conceito de desemprego nos
anos 1870, quando foi possível esta construção histórica singular. No passado analisado pelo autor, o
desempregado passou a se diferenciar do vagabundo, pois este precisava ser punido, em uma época em
que o problema não era a falta de trabalho, mas o fato de que alguns não se adequavam a esta situação.
Segundo Topalov, nem sempre houve o desemprego, pois este só foi possível após o assalariamento.
Assim, este fenômeno possui uma localização determinada a partir do referencial do emprego e da ação
dos reformadores através de políticas sociais.
Para Salais (1990) e Topalov (1994) só faz sentido se falar em desemprego, no sentido moderno de
privação do emprego, se a relação salarial se institucionaliza, ou seja, se o mundo do não trabalho se
“disciplina”. Dessa maneira, é face ao trabalho assalariado que o desemprego se constitui como um
fenômeno historicamente determinado.26
No entanto, entendemos que o conceito de “construção social” utilizado por estes autores se
apresenta de maneira muito vaga e genérica. Dizer que algo é construído socialmente pressupõe uma
igualdade de participação dos diferentes indivíduos, instituições e grupos sociais nesta construção. Assim,
ao não problematizar a categoria com as relações de classe e a correlação de forças políticas nas suas
diferentes instâncias, este autores deixam de considerar que esta construção social é feita através de

26
Para Demazière (1995) e Maruani (2000), o desemprego está estritamente ligado ao direito ao trabalho, definido não por um
estatuto econômico e social, mas por um estatuto jurídico. Assim, não é necessário apenas ter tido uma relação assalariada.
29
disputas e interesses. Desse modo, poderíamos questionar, por exemplo, de que forma o reconhecimento
jurídico-institucional do desemprego estaria ligado ao controle social e político.
O desemprego é mais do que uma construção social. Ele também é uma construção política, ou,
para melhor dizer, é uma construção socialmente condicionada por interesses de classe, pois sua
constituição pressupõe um constante conflito entre as diferentes forças políticas, grupos sociais e
instituições, as quais participam de diferentes maneiras nesta elaboração.

3.2) Uma abordagem materialista dialética das dimensões normativo-institucional e subjetivo-


biográfica

Didier Demazière (1995) analisa o desemprego como uma articulação entre instituições de
regulação, estratégias individuais, reações à privação do emprego e dinâmicas identitárias. Desse modo, o
desemprego não se define somente como uma condição social objetiva (a privação do emprego), mas
como uma situação subjetiva, sentida de diferentes maneiras pelos indivíduos, e com um estatuto
reconhecido por instituições e regras. E assim, o autor afirma que o desemprego é uma condição que
supõe uma dialética entre os mecanismos sócio-econômicos, as reivindicações sociais e as lógicas
institucionais.
Para Demazière ser desempregado não significa apenas estar privado de emprego, mas ser
reconhecido como tal, poder legitimamente reivindicar um trabalho remunerado e fazer parte de uma
categoria social. Desse modo, o autor define o desemprego como uma construção social, constituída de
regras sociais e normas culturais.
Esta mesma idéia é apresentada por Maruani (2000). Da mesma forma, a autora afirma que o
desemprego não se explica pela privação involuntária e procura ativa de um emprego, mas pelo fato de o
indivíduo se declarar como desempregado. Segundo Maruani, a lógica da acepção contemporânea da
noção de desemprego é de que ele não é o inverso do emprego, mas o inverso do direito ao emprego.
E, por último, esta tese também é defendida por Nadya Guimarães (2000a). Segundo a autora,
“(...) a variação na significação do desemprego [...] se expressa tanto no plano normativo, das instituições
que intervêm, de maneira variável, junto às populações designadas como desempregadas quanto no plano
subjetivo, das experiências vividas pelas pessoas colhidas pela situação de desemprego. Com isto, estou
chamando a atenção para o fato de que uma sociologia do desemprego deve ter a responsabilidade de
analisar, conciliando, duas dimensões que são caras (porque constitutivas) da nossa tradição disciplinar:
por um lado, a construção institucional e normativa do fenômeno; por outro, a sua significação subjetiva,

30
tecida ao longo dos percursos no mercado de trabalho e resignificada pela interpretação subjetiva das
biografias individuais. Nesse sentido – e percebido em seu sentido sociológico forte – ser desempregado
significa ser institucionalmente reconhecido, contabilizado e considerado como tal, mas, ao mesmo
tempo, importa em, subjetivamente, definir-se, reivindicar-se e considerar-se como tal” (Guimarães:
2000a; p. 110).
Desse modo, é importante, nos estudos sobre o desemprego, levar em consideração não apenas a
institucionalização do problema, mas a internalização27 do mesmo. No primeiro, questionamos como o
desemprego existe para a sociedade; no segundo, como os indivíduos o representam internamente. Assim,
é importante frisar os fatores da regulação e da construção normativa e institucional do problema, bem
como os de ordem subjetivo-biográfica.
Tem-se historicamente uma cultura normativa sobre o mercado de trabalho. No entanto, fazendo-
se uma análise subjetiva, como podemos obrigar o indivíduo a se sentir desempregado? Ou seja,
precisamos pensar sobre a vigência de certos aspectos normativos do ponto de vista do sujeito.
Em algumas situações podemos até mesmo questionar se os indivíduos que não vivem sua
situação como desempregado podem ser contabilizados como tal. E assim, trazer a discussão subjetiva
pode levar às seguintes conseqüências teóricas: o conceito de desemprego ou perde parte de seu sentido
ou passa a ser uma franja ou estabelece a necessidade de teorizar sobre o trabalho.
No entanto, fazemos aqui a mesma crítica que fizemos à utilização do conceito de “construção
social”. Tanto a construção normativo-institucional quanto a subjetivo-biográfica estão sujeitas a dois
movimentos inevitáveis: (i) no plano político-ideológico, diríamos que esta construção perpassa por
representações e interesses surgidos a partir da correlação de forças políticas e das disputas no interior da
luta de classes; (ii) no plano econômico, podemos afirmar que esta construção, em última instância, não
pode ser considerada através de um feixe de relações ilimitadas, mas condicionada pelo movimento
estrutural do processo de acumulação capitalista.
Ademais, sem desconsiderar estas dimensões sociológicas, é preciso explicitar em que âmbito da
problemática elas se expressam. Assim, trabalhamos também com outros dois pares de opostos
considerados por nós variáveis constitutivas da tradição materialista dialética que defendemos:
conjuntural-estrutural e nacional-global. Dessa maneira, estaríamos tentando dar conta de pelo menos
mais quatro dimensões do problema:

(i) o desemprego é um fator estrutural do modo-de-produção capitalista, já que se constitui


como produto e alavanca da acumulação, concentração e centralização do capital;

31
(ii) o modo como ele se expressa é uma conjunção da multiplicidade de fatores (políticos,
econômicos, culturais e ideológicos) que devem ser analisados de modo conjuntural, a
partir das relações das diferentes formações sócio-econômicas com a estrutura do modo-
de-produção;
(iii) o desemprego se expressa diferentemente no capitalismo central e periférico, dada a
situação histórica de dependência do segundo pelo primeiro, o que proporciona o
desenvolvimento de um capitalismo desigual e combinado;
(iv) o desemprego se expressa diferentemente nas diversas formações sócio-econômicas
conforme a conjuntura política, econômica, cultural e ideológica e suas relações com o
desenvolvimento desigual e combinado de um capitalismo central ou periférico.

E assim, a partir do que foi exposto até aqui, podemos tirar as seguintes conclusões:

(i) o desemprego é uma construção socialmente condicionada por interesses de classe;


(ii) o desemprego se expressa nos planos normativo-institucional e subjetivo-biográfico
condicionados pela correlação de forças políticas presentes na formação sócio-econômica
em questão;
(iii) as diferentes formações devem ser observadas a partir do movimento dialético dos pares
estrutura (lei geral da acumulação capitalista) e conjuntura (contexto político, social,
cultural, ideológico e econômico, além do tipo de capitalismo – central ou periférico – em
questão).

3.3) A seletividade do desemprego: recurso inevitável da apropriação capitalista da força de trabalho

Segundo Maruani (2000) o desemprego contemporâneo é “massivo e seletivo, estrutural e


onipresente”, ou ainda “geral, mas desigual”. A autora explica que esta desigualdade e seletividade
presente nas formas contemporâneas do desemprego se explicam pelo fato de que este opera à maneira de
um decalque das desigualdades sociais mais tradicionais.

27
Neste contexto, o desemprego passa a ser largamente enfocado inclusive pela psicopatologia, que teoriza o modo como o
fenômeno afeta a vida sexual, afetiva e a saúde mental.
32
Assim, as diferenças de idade, gênero e categoria sócio-profissional explicam, em parte, as
desigualdades existentes no mercado de trabalho28. Segundo Nadya Guimarães (2000a) “(...) o
desemprego não apenas aumenta o seu volume e diversifica a sua forma, mas atinge desigualmente os
indivíduos segundo as suas características de sexo, idade, categoria sócio-profissional e escolaridade,
variáveis tão caras à análise sociológica e sócio-demográfica das desigualdades. Ou seja, o desemprego,
além de involuntário, como queria o nosso modelo clássico de cultura normativa do trabalho, é hoje
fortemente seletivo, visto que as chances de emprego estão desigualmente distribuídas entre os diferentes
grupos sociais” (Guimarães: 2000a; pp. 107-108). Em seguida, afirma que “mesmo tomando em conta
uma única sociedade, em diferentes momentos do tempo, tais formas também variam” (Guimarães:
2000a; p. 109).29
Esta seletividade do desemprego é mostrada por diversos autores quando estes analisam
determinadas categorias sociais. Para a questão de gênero, por exemplo, Maruani (2000), Hirata (2002) e
Guimarães (2001) mostram através de análises comparativas como a inserção de boa parte das mulheres
no mercado de trabalho se dá através do trabalho precário e menos remunerados que os dos homens
(mesmo quando executam a mesma função), bem como as especificidades da representação social que se
faz delas para a questão do desemprego.
No entanto, como afirma Maruani (2000) apesar de visível em todas as estatísticas de emprego,
esta seletividade é composta de uma certa invisibilidade social: o nível de desemprego “tolerável”, assim
como o grau de insegurança de emprego “admissível”, varia fortemente se tratamos de menos ou mais
jovens, de homens ou mulheres, diplomados ou operários.
Estes julgamentos perpassam pela construção social do imaginário de quem deve ser o ocupado, o
desempregado, o inativo e o empregado. Dessa forma, esta classificação é uma disputa permanente que
produz identidades coletivas. E é por isso que em algumas empresas se estabelece cotas de emprego para
certos grupos sociais.
Por exemplo, tem sido intolerável o desemprego para o jovem (mesmo se tratando de uma
inclusão subalterna ou precária) justificado pelo risco desta categoria se tornar marginal. Por outro lado, a
mulher é vista como uma força de trabalho suplementar (desse modo, a mulher solteira quer emprego para
comprar batom e a casada para ajudar o marido).
Ademais, há ainda a situação em que se confunde a gestação de formas atípicas e transitórias do
desemprego com o julgamento social de que “eles não deviam estar ali!”. Desse modo, cria-se uma

28
As categorias clássicas na representação de diferenças entre os grupos sociais são o sexo, a categoria sócio-profissional, a
idade e o nível de escolaridade. No Brasil, a região de procedência e a etnia são fatores a serem considerados também, dada a
diversidade populacional do país.
29
Para o caso brasileiro, há autores como Mattoso (1999) e Pochmann (1999) que mostram as nossas especificidades ao longo
dos anos até a da década de 1990.
33
expectativa sobre o papel desempenhado pelos diversos grupos sociais fora do mercado de trabalho.
Tomando novamente o exemplo dos jovens e das mulheres, podemos ter as seguintes situações: “lugar de
jovem é na escola” e “lugar de mulher é na cozinha”.
Portanto, o desemprego de determinados grupos sociais está estritamente ligado à representação
que se faz deste grupo. Assim, o “lugar social” dos jovens perpassa por uma fronteira entre o trabalho e a
escola; e o da mulher, entre o trabalho e o lar. Ou seja, através da expectativa que se tem desse grupo
social fora do mercado de trabalho. É por isso que reforçamos um outro aspecto antes mencionado: a
representação do desemprego está ligada à representação que se tem do trabalho.
No entanto, apesar do reconhecimento da importância do tema da seletividade do desemprego,
uma questão deve ser mencionada: a seleção deste ou daquele indivíduo para a ocupação de um
determinado posto de trabalho (pautada em suas qualidades adscritas e adquiridas, bem como dos fatores
externos não definidos por ele) só pode ser possível em uma sociedade onde, por definição, é preciso
haver uma população sobrante resultante daqueles que não foram escolhidos como o “povo eleito”.
É por isso que consideramos a seletividade um recurso inevitável da apropriação capitalista da
força de trabalho. Em uma sociedade onde o princípio não seja a valorização do capital a seletividade dá
lugar ao direito ao trabalho para todos. Isto só se faz possível quando os trabalhadores deixam de estar
disponíveis para os meios-de-produção para que estes passem a estar disponíveis para os trabalhadores.

3.4) A empregabilidade: de ferramenta analítica à apropriação ideológica escamoteadora

A empregabilidade é um conceito desenvolvido desde Ledrut (1966) e pode ser definido como a
probabilidade que uma pessoa à procura de emprego logre obtê-lo. Na acepção do termo que
defenderemos aqui, “(...) a empregabilidade, mais que mera capacidade individual, [deve] ser apreendida
como uma construção social (...)” (Guimarães: 2002b; p. 286).
Segundo Nadya Guimarães (2002b) “(...) a chance de uma ação individual bem-sucedida na busca
do emprego tem os seus graus de liberdade definidos para além da vontade e da conduta individuais. Isto
porque – nos novos contextos produtivos, instabilizados por processos de acirrada competição entre
empresas e de intensa reestruturação organizacional – a trajetória ocupacional do trabalhador depende:
seja da apreciação conjuntural e socialmente variável dos atributos que o caracterizam; seja da sua
„qualificação social‟, de um capital (social) acumulado para, por meio de redes eficazes localizar e obter
colocação num posto de trabalho; seja de fatores estruturais absolutamente externos e não-manobráveis

34
por sua ação, como as estratégias locacionais e de investimento das firmas [...]” (Guimarães: 2002b; pp.
286-287).
Dessa forma, a empregabilidade passa por três instâncias: as características individuais, o valor
social e os fatores externos. Assim, as diferenças nas oportunidades passam por dois critérios: (i)
conforme o ciclo e; (ii) conforme certos atributos dos indivíduos e critérios do empregador 30. Nesse
sentido, as diferentes qualidades e qualificações nos colocam diante de uma procura assimétrica e na
escolha das oportunidades dos empregos disponíveis.
Os atributos individuais podem ser classificados ser vistos de duas formas: as qualidades
aquisitivas (julgadas a partir do desempenho) e as adscritas (vistas sob o juízo do outro, mas que o
indivíduo nasceu com ela). A primeira expressa a hierarquização através dos elementos cognitivo e
atitudinal. A última, através de qualidades subjetivas.
Dessa forma, a empregabilidade dos indivíduos passam também dos critérios atribuídos pelo
empregador que os recruta, o que maximiza ou minimiza suas chances. Assim, segundo Guimarães, “(...)
a empregabilidade passa a ser o resultado da interação entre estratégias, individuais e coletivas, tanto dos
que buscam o trabalho assalariado, quanto daqueles que os empregarão” (Guimarães: 2002; p. 287).
Desse modo, a empregabilidade é tecida no contexto da trajetória biográfica ocupacional dos
indivíduos a partir de seus diferentes investimentos e escolhas dentro do leque das opções possíveis.31
Assim, temos que levar em consideração as diferentes condutas dos indivíduos, ou seja, as suas
estratégias individuais e coletivas de ação.
Diante desse quadro no trato da questão, a formação profissional é vista por muitos como um fator
de luta contra o desemprego. De acordo com Freyssinet (1984), não se trata somente da formação como
um fator de reinserção profissional dos desempregados, porém, mais amplamente do que isso, da
formação como fator de redução da vulnerabilidade do desemprego, tanto para os jovens que ainda estão
no sistema educativo como para os que possuem um emprego.
O primeiro debate que Freyssinet apresenta diz respeito à função da formação profissional em um
contexto de desemprego massivo: é ela um instrumento de inserção profissional efetivo ou somente um
meio de gestão e camuflagem? A questão surge para o autor por conta das características das ofertas de
formação, pois a maioria delas não oferece alguma perspectiva séria sobre o mercado de trabalho.32

30
Desse modo, a conquista de um emprego novo não é apenas uma questão da dinâmica do ciclo, mas passa por critérios de
atribuição social das qualidades dos indivíduos bem como de suas características individuais. No entanto, não podemos
confundir a distribuição social do emprego a partir dos critérios sociais de empregabilidade e seletividade com a capacidade de
ampliação de empregos a partir da dinâmica capitalista.
31
Isto não quer dizer, no entanto, que não devemos fazer um debate político sobre o desemprego, já que existem medidas que
possibilitam uma intervenção sobre este problema.
32
A saída na requalificação é pouco provável. Estes cursos apresentam uma eficácia muito maior na reconstrução individual e
de ganhos para cidadania do que na conquista de empregos novos.
35
A segunda questão posta pelo autor nos parece ainda mais importante: o impacto final da formação
profissional é fator de redução do desemprego ou somente fonte de melhora da empregabilidade para
aqueles que se beneficiam dela?
Estas observações ilustram o que Freyssinet chama a atenção neste texto, pois verifica-se um
aumento do nível de escolaridade e qualificação profissional das empresas, sem que isso signifique um
aumento global no nível de emprego, gerando um enorme exército de desempregados ultraqualificados. É
por isso que o autor ainda afirma que a formação é um fator de ampliação das desigualdades face ao
emprego e ao desemprego, ou seja, é um fator de hierarquização profissional.
A empregabilidade pode ser expressa de duas formas. Numa primeira versão, o termo pode ser
visto a partir de uma visão individual33, onde se pressupõe a existência de postos de trabalho. No entanto,
podemos inverter a problemática e percebermos que a apropriação capitalista do capital social pode ter
como ponto de partida a existência do aumento do contingente de desempregados e precarizados.
No entanto, Guimarães (2000a) a empregabilidade é uma categoria que, no Brasil, chegou através
da política neoliberal34, e não da teoria acadêmica. Esta trajetória, diferente na Europa, nos colocou diante
da segunda interpretação, o que tem impedido a utilização do termo, no seu sentido de denúncia, por
partidos e movimentos sociais de esquerda e pelo sindicalismo combativo.
E assim o conceito de empregabilidade tem sofrido inúmeras críticas, já que esta tem sido
apresentado a partir do discurso da individualização do problema do desemprego, da auto-culpabilização
por parte do trabalhador e pelo discurso de que a requalificação profissional pode proporcionar emprego
para todos (o que pressupõe a existência ilimitada de vagas no mercado de trabalho).
Neste sentido, um dos efeitos da utilização ideológica do termo empregabilidade pelo
neoliberalismo é a introjeção da responsabilidade de sua construção pelos indivíduos desempregados. Em
tempos da chamada reestruturação produtiva, é comum a opinião de que é preciso haver uma intensa e
constante requalificação profissional, ou, para utilizarmos o jargão empresarial, a reciclagem do capital
social a fim de atender as novas demandas do mercado de trabalho. Desse modo, a atribuição a si mesmo
pela situação de desemprego é fruto do pensamento individualista apregoado pelo neoliberalismo.

3.5) As medidas do desemprego e seus resultados estatísticos e políticos

A medida do desemprego não é uma simples contagem daqueles que estão sem trabalho, aptos
para trabalhar e procurando emprego. Construção social e política, a definição do que é o emprego,

33
Ledrut (1966) falou em atributos valorativos socialmente. Com isso, queria dizer que os indivíduos também são pró-ativos.
36
desemprego, ocupação e inatividade perpassa por definições de cunho normativo-institucional, subjetivo-
biográfico e político-social. No entanto, muitos autores despolitizam o debate sobre a sua medida,
apresentando-a como uma mera enumeração quantitativa de dados objetivamente possíveis de ser
observados.
Maruani e Reynaud (1993), quando tratam das diferentes definições do desemprego do BIT
(Bureau international du travail) e da ANPE (Agence nationale pour l‟emploi) na França, expõem
algumas contradições da construção social deste fenômeno no âmbito dos interesses políticos. Assim, por
exemplo, as autoras afirmam que a definição do BIT exclui da categoria desempregados aqueles que
tenham trabalhado, mesmo muito pouco, na semana precedente à pesquisa (como é o caso, por exemplo,
dos trabalhadores precarizados), classificados como ativos ocupados, e aqueles que depois de um longo
tempo desempregados se desencorajam na procura de emprego, considerados como inativos. Na ANPE
estes dois grupos aparecem na categoria de desempregados de longa duração. A partir desta polêmica, as
autoras afirmam que diferentes definições produzem diferentes resultados estatísticos e, ao mesmo tempo,
políticos.
Em um outro trabalho, Maruani (2000) fala também que a inatividade, assim como o desemprego,
é uma convenção estatística. Se não, diz a autora, ela é uma “aberração sociológica”: uma mãe de família
de cinco filhos, dona-de-casa, é considerada como “inativa” ao passo que um desempregado sem trabalho
nem emprego é definido como “ativo”.35
Neste mesmo texto Maruani dá uma grande importância à correlação de forças políticas e às
representações de interesse na construção social do desemprego. Primeiramente, a autora afirma que o
estabelecimento de critérios para medir o desemprego não é neutro. Ele é o resultado de cálculos
econômicos, de opções políticas e de escolhas sociais. A definição que cada sociedade nos dá sobre o
desemprego, diz a autora, nos ensina tanto sobre o estado de seu déficit de emprego como sobre a
hierarquia social das situações de não-emprego e picos de tolerância do desemprego. Há, portanto, o que é
conveniente mostrar e o que é conveniente mascarar; as formas de não-emprego que se deve chamar de
desemprego e aqueles que se pode esquecer ou travestir; as categorias que têm ou não legitimamente
direito a um emprego.
Como já foi dito antes, as medidas do desemprego e o conceito atribuído a determinadas situações
do mercado de trabalho se expressam a partir de representações sociais. Dessa forma, Nadya Guimarães
(2002b) procurou entender porque entre França, Japão e Brasil, tomando o ano de 1998 como base, o

34
É através do governo no seu programa Planfor que o problema da empregabilidade chega até o Brasil.
35
Da mesma forma, porque é a expressão de uma visão social e política que podemos nos deparar com a idéia de que o
desemprego é coisa de preguiçoso ou que a empregada doméstica é inativa, pois passa pela procura episódica de emprego.
37
primeiro apresentava a taxa de desemprego aberto mais alta (10,9%); o segundo, a mais baixa (4,5%) e o
terceiro, uma situação intermediária (7,6%).
Na França, diz a autora, “(...) temos o exemplo de um contexto societal onde o desemprego é
fortemente institucionalizado. Ali, as instituições públicas de recolocação cobrem o território nacional
com uma malha fina, de há muito constituída [e] (...) as pessoas privadas de emprego tendem – animadas
pela forma como se institucionaliza o sistema de proteção social e de emprego – a se declarar como
desempregados, inscrevendo-se (tão logo rompe-se o vínculo de trabalho) junto à ANPE (Agence
Nationale pour l‟Emploi)” (Guimarães: 2002b; pp. 297-298).
Diferentemente da França, no Japão, a representação social que se faz do desemprego é muito
diferente. Segundo Guimarães, neste país, “(...) o desemprego é sem duvida menos institucionalizado, mas
por razões muito diferentes das que podem se considerar como características do caso brasileiro. É certo
que os níveis de desemprego foram sensivelmente reduzidos até muito recentemente. Ademais – e esta é
uma diferença notável -, a gestão do emprego estivera deferida às empresas (normalmente grandes
empresas), mais do que ao Estado. Só recentemente é que as grandes empresas passam a demitir em maior
escala, revertendo a política prévia de reter a mão de obra excedente, administrando sua alocação nas
redes de firmas cooperantes. Não sem razão, portanto, para os trabalhadores cultural e subjetivamente
construídos sob o signo do sistema de „emprego vitalício‟ – e que são quase exclusivamente os homens -,
a experiência do desemprego esteve (e ainda está) marcada pela vergonha social, pelo sofrimento
subjetivo da humilhação. Por isto mesmo, a inscrição nas agências de emprego é percebida como
desonrosa” (Guimarães: 2002b; p.299).
O Brasil, no entanto, tem características peculiares com relação aos dois países mencionados.
Vejamos o que diz Guimarães. “No Brasil, a institucionalização do desemprego foi, ao mesmo tempo,
fraca e recente: a debilidade da proteção social, das ajudas públicas aos desempregados, e o seguro-
desemprego conduziram a uma importante sub-declaração das situações de privação de emprego. Daí
resultou uma nebulosidade significativa sobre as fronteiras entre os estatutos sociais (emprego,
desemprego e inatividade), que se manifesta, inclusive, publicamente nas questões polêmicas em torno
dos números do desemprego” (Guimarães: 2002b; p. 296).36
Guimarães ainda afirma que, além disso, “as condições de emprego aqui são muito heterogêneas
indo desde espaços ocupacionais fortemente enquadrados por normas jurídicas e por uma proteção até
outros onde uma economia informal, submersa, ou que nome se queira dar, aparece como particularmente
desenvolvida e diversificada” (Guimarães: 2002b; p. 296).

36
A autora se refere à disputa entre o IBGE (que se baseia nas normas da OIT) e do DIEESE, que, além do desemprego aberto,
apresenta as categorias de desemprego oculto pelo desalento e pelo trabalho precário. A autora lembra que segundo esta
mensuração alternativa o desemprego no ano de 1998 no país seria de 18,3% e não de 7,6%.
38
Sendo assim, toda e qualquer forma de medir contém uma teoria sobre a medida cujos critérios de
contabilidade não são ingênuos. Estas representações sociais introduzem uma disputa política entre os
agentes. No entanto, as respostas a necessidades de conhecimento e intervenção para estabelecimento de
direitos não devem ser tratadas como interesses necessariamente maquiavélicos. Assim, a disputa entre o
DIEESE e o IBGE não pode ser considerada uma estratégia deliberada de obscurecimento do primeiro
diante da expressão de um dado portador da bondade e da revelação do segundo. É por isso que, a
princípio, toda metodologia de estudo ou medida do desemprego é repensável, por inviabilizar certas
formas de enxergar o problema.
A dinâmica e formas de expressão do desemprego se alteram. É por tais motivos que as diferentes
formas do desemprego não devem estabelecer medidas unívocas. Isto não só porque é construído
socialmente, mas porque há alterações no mercado de trabalho.
Um outro problema presente na categorização do desemprego é o da cognição institucionalizada,
em detrimento de se saber como o desempregado se sente diante de sua situação. Ou seja, não se pode
pensar que a classificação acadêmica ou institucional é melhor que a dos indivíduos, atribuindo-lhes
representações arbitrárias.
É preciso levar em conta, por exemplo o tipo de emprego que o indivíduo espera. Para muitos,
trabalho bom é o “de carteira assinada”, já que para muitos esta é vista como um passaporte para a
cidadania. A questão que permanece é: quem é o outro que o individuo almeja? Ou ainda, como os
indivíduos se classificam dada a trajetória que têm?
São também de extrema importância os estudos comparativos sobre o desemprego. No entanto, a
comparação ou não comparação deve partir do que pode ser generalizado. Ou seja, é preciso comparar a
partir da irredutibilidade. Dessa maneira, é preciso verificar o que há de comum e diferente nos territórios
analisados. Ou seja, a comparabilidade estabelece o terreno comum de eventos que ocorrem de maneiras
diferentes.

3.6) Desemprego e políticas públicas: tentativas (vãs) de humanizar o capital

O chamado Estado de Bem-Estar Social é uma experiência do pós-guerra. Assim, sua


institucionalização e a construção de sua arquitetura é um fenômeno da segunda metade do século XX. Só
a partir de então passa a se constituir como uma política pública. No entanto, política de bem estar é
diferente de política de emprego: a primeira tem um amplo poder de alcance para a construção da dita
cidadania; o segundo focaliza apenas a questão do desemprego através das agências provedoras de

39
benefícios aos desempregados, que se resumem no tripé agenciar a recolocação, requalificar e prover
rendimentos.
Para Gallie e Paugam (2000), nos Estados de Bem-Estar Social, boa parte das responsabilidades
familiares são transferidas para o Estado, onde a proteção é diferente entre os grupos sociais. No entanto,
para os autores, o Estado não é o único que se move frente aos problemas do mercado de trabalho. Assim,
constituiu-se um problema como pensar em formações sociais em que não se dá essa institucionalização.
É por isso que Gallie e Paugam classificam quatro formas de regime de bem-estar voltados para o
desemprego: (i) subprotective; (ii) liberal minimal; (iii) employment centred; e (iv) universalist.
Assim, a experiência do desemprego é, portanto, diferente segundo a lógica institucional do elo
entre o emprego e o desemprego, o estado, o mercado e a família. É por isso que em algumas sociedades o
emprego legítimo é daquele que teve trabalho. Em outras, há a exclusão do setor informal, dos jovens que
procuram o primeiro emprego ou dos autônomos. Nestes casos, inclusive, há uma tendência de o seguro-
desemprego atingir justamente aqueles que precisam menos.
Neste sentido, o “bom desempregado” para o recebimento dos benefícios é aquele que tinha uma
relação formal por um mínimo tempo. Isto joga fora boa parte das mulheres e, principalmente, dos jovens.
E desse modo, esta política, inadequada à medida, procura limitar para direcionar a um segmento que tem
maior reconhecimento social.
No caso brasileiro, por exemplo, há uma imensa elegibilidade para o recebimento do benefício. No
país, inclusive, a criação do FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador), bem como a regulamentação do
seguro-desemprego só se deu a partir da Constituição de 88.
No entanto, dois problemas se fazem presentes: primeiro, nem todos os países lograram do
desenvolvimento dos sistemas de welfare público; ademais, problemas recorrentes relacionadas ao
financiamento impôs uma seletividade, baseada em representações de quem deve ou não receber os
benefícios.
Segundo Freyssinet (1984) há dois tipo de políticas de intervenção estatal sobre o desemprego: as
políticas ativas e passivas. As ativas podem ser a criação de empregos, a formação profissional, a
regulação do mercado de trabalho, a defesa do emprego, o acompanhamento da reestruturação e o
crescimento econômico. As passivas podem ser a indenização aos desempregados ou a redução da
população ativa.
No entanto, a política de intervenção estatal esbarra em dois aspectos: por um lado, o Estado
burguês é, estruturalmente, o legitimador da propriedade privada dos meios de produção e do contrato de
compra e venda da força de trabalho (e, conseqüentemente, da acumulação do capital), o que,
inevitavelmente, limita seu papel na defesa do emprego para todos; por outro lado, toda e qualquer

40
política reformista que não atinja diretamente os pilares constitutivos do processo produtivo capitalista
tem uma limitação estrutural, cumprindo apenas a função de retardar o agravamento das contradições
sociais proporcionadas pelo capital com efeitos que, de certo, muitas vezes são positivos sobre o mercado
de trabalho, mas que , a partir de um contexto de crise ou estagnação, volta a gerar um excedente
populacional de dimensões maiores.
Poderíamos fazer uma crítica a cada uma das políticas de emprego do Estado. Entretanto, uma
delas nos chama a atenção por ser largamente apregoada como verdade absoluta tanto pelo
conservadorismo de direita quanto pela esquerda humanista: trata-se do papel do crescimento econômico
frente à geração de postos de trabalho.
Ora, em um país onde um dos maiores fiascos no campo das políticas macroeconômicas foi o
chamado “milagre econômico” durante a ditadura militar dos anos 1970 (que, inclusive, trazia como lema
“é preciso crescer o bolo para depois dividi-lo”) fica difícil acreditar no alcance de tal medida. O combate
ao desemprego não pode ter como premissa o crescimento econômico por dois motivos: primeiramente,
de nada adianta o crescimento econômico sem uma distribuição socialmente combinada de emprego e
renda (se não, este crescimento nada mais decide do que se as férias da burguesia serão com ou sem iate);
segundo, é possível haver uma melhor distribuição de renda e a geração de emprego sem crescimento
econômico através de mecanismo, como a redução da jornada de trabalho (sem redução salarial,
flexibilização ou qualquer tipo de precarização das relações de trabalho) que atinjam diretamente a taxa
de extração da mais-valia. Assim sendo, o crescimento econômico, se não for devidamente
contextualizado, serve apenas para escamotear os reais interesses de classe em manter sua dominação
política e poder de acumulação do capital.

3.7) O papel das redes sociais na experiência subjetiva do desemprego e procura de trabalho e a
necessidade de estratégias de classe

Em seu clássico estudo já mencionado Ledrut (1966) afirma a importância da análise da


subjetividade e do risco do pauperismo. Segundo o autor, o desemprego tem sempre um efeito destrutivo,
já que impõe uma situação de humilhação e inferioridade ao desempregado. Também para Lazarsfeld
(1981) este está sempre sob a condição de sofrimento, negação, privação. Sob esta perspectiva o
desemprego pode ser pensado sempre como uma morte social ou a perda de identidade.
No entanto, por um lado, para Schehr (1999), é preciso também olhar também para a cultura, o
cotidiano (ou seja, outras dimensões da vida) para perceber como os desempregados vêem sua

41
experiência, pois só a dimensão do trabalho não dá conta. Por outro lado, Gallie e Paugam (2000)
afirmam que, a depender da lógica institucional e da proteção, há diferentes formas de desemprego.
Assim, nem sempre a experiência do desemprego constrói uma identidade de desempregado.
Quando isso acontece, podemos dizer que isto depende: (i) da forma de inserção a partir da trajetória
individual; (ii) da percepção de si como desempregado; (iii) se houve uma experiência longa de trabalho
formal.
O desemprego é tão visível quanto maior é o direito ao trabalho. Assim, geralmente, quanto mais
forte a experiência anterior de trabalho formal, estável, regular maior o auto-reconhecimento como
desempregado. Como vimos, na França, como há um forte sistema de proteção, o reconhecimento no
trabalho regular é forte.
Passando do tema da experiência subjetiva do desemprego para o da procura do trabalho, podemos
dizer que é cada vez mais presente o papel de redes sociais informais que se tornam cada vez mais
importantes na ausência de redes de proteção social.37 Assim, as instituições públicas, a agência de
emprego, a empresa e o jornal dão lugar, cada vez mais, à mobilização de capital social nas redes sociais
familiares, de vizinhança, étnicas ou religiosas. Estas redes, atadas a critérios de lealdade e aproximação
permanente, geram uma certa circulação de informações sobre o mercado de trabalho neste mesmo
circuito.
Em um trabalho de campo antropológico, Aubrée (1995) analisa os cultos afro-brasileiros e as
seitas petencostalistas e os comportamentos individuais e sociais que eles engendram nos seus fiéis. De
acordo com o autor, estes movimentos se constituem como “(...) sistemas que permitem, do ponto de vista
dos indivíduos, estratégias de inserção socioeconômica diferentes”. O autor afirma que tanto em um como
no outro, é possível se constatar uma clivagem entre duas categorias de indivíduos. Segundo Aubrée, “a
primeira utiliza diretamente os bens simbólicos e participa de sua reprodução para obter rendas. É o que
constitui o „circuito interno‟. Esse recebe do sistema mais do que ele lhe dá. Ele obtém, na pior das
hipóteses, sua subsistência (caso mais propalado entre os afro-brasileiros em Recife) e, na melhor, uma
real ascensão social (mais corrente entre os petencostalistas). As pessoas da segunda categoria se
beneficiam do auxílio mútuo próprio a cada uma das duas correntes e, em alguns casos, de redes criadas
graças à dimensão religiosa, para obter um emprego que lhes permitirá renovar sua participação no
sistema ao qual elas se ligaram. Aquelas não dão mais do que recebem no âmbito da sua comunidade
respectiva; elas constituem, do ponto de vista econômico, um dos elementos do „circuito interno‟”.
O autor explica, adiante, que “no caso dos petencostalistas, esses dois tipos de estratégias
individuais convergem para reforçar uma estratégia de grupo que, ainda que autônoma, é em todos os

42
pontos calcada sobre o modelo dominante de acumulação e favorece a entrada no que se convencionou
chamar de setor formal do emprego. Do lado dos afro-brasileiros observa-se uma situação heterogênea, na
qual o setor chamado de „informal‟ é mais largamente representado e onde a mobilidade social, quando
existe, se faz do „formal‟ para o „informal‟. Nessa corrente, as estratégias aparecem como tendo um
caráter muito mais individual ainda, no sentido de que elas são dificilmente recuperáveis pelo grupo, já
que o estabelecimento de um terreiro corresponde a um afrouxamento dos laços com a comunidade de
origem”.
E conclui dizendo que “os dois movimentos dão conta, cada um a seu modo, de práticas populares
„intersticiais‟ por meio das quais os indivíduos escapam, na maioria, das dificuldades que gostariam de
fazer pesar sobre eles o Estado e o capital. Estes „interstícios‟, tornados brechas à medida que aumenta a
incapacidade do Estado brasileiro de fazer face ao problema do emprego, apresentam - como se pôde ver
– similitudes no nível da pesquisa de soluções imediatas. Entretanto, na medida em que correspondem a
dois modos diferentes de relação com o sistema dominante, pode-se prever que, a longo prazo, tenham
papéis contraditórios no desenvolvimento de soluções mais globais”.
Este pode ser considerado um bom exemplo onde sendo o culto um ritual de circulação, há nele
também a circulação de informações sobre o mercado de trabalho, mesmo não sendo esta a principal
finalidade da rede social em questão.
Podemos nos questionar sobre a validade do conceito de redes sociais em grandes metrópoles,
onde, supostamente, haveria um contato face a face superficial. No entanto, podemos dizer que o tecido
metropolitano não é unívoco, mas uma tecitura, um território com sentido social diverso. Os indivíduos
mapeiam os espaços. Então, de certo modo, há uma segmentação e, portanto, a possibilidade efetiva de
constituição de redes sociais.
A partir do que foi exposto neste item podemos dizer que é preciso cada vez mais refletir sobre a
trajetória profissional, ou seja, estabelecer um histórico do percurso anterior dos indivíduos para
percebermos a complexidade das novas formas de alocação dos trabalhadores no mercado de trabalho.
Assim, faz-se necessário descrever a realidade a partir da dinâmica estrutural do mercado de
trabalho, assim como do estatuto do mercado de trabalho a partir das micro-experiências dos indivíduos,
como uma dinâmica estrutural se constrói a partir das experiências dos indivíduos. Como a estrutura pode
se „reduzir‟ a partir do ponto de vista individual, dos micro-processos (macro-micro). Neste sentido, a
dinâmica da estrutura a partir das trajetórias individuais, ela se faz através das experiências subjetivas dos
indivíduos. Sua importância se deve aos seguintes fatores: (i) afeta a medida; (ii) as relações entre
experiência e identidade não é evidente; e (iii) explicação sociológica.

37
Ver BOUDIEU (1980); DEGENNE & FORSÉ (1994); DEGGENE, FOURNIER, MARRY & MOURNIER (1991);
43
A análise longitudinal da experiência subjetiva pode ser uma alternativa para a reconstrução da
trajetória dos indivíduos a fim de problematizar melhor as questões do emprego e desemprego em cada
realidade social. No nosso caso, por exemplo, o percurso de indivíduos da indústria brasileira e do setor
petroquímico estudados por Nadya Guimarães (2002b) abre espaço para pensarmos no problema do
desemprego recorrente e seu par recorrência de empregos, quase sempre temporários ou precarizados. É o
início de uma teorização que ainda tem uma longa trajetória a percorrer.

Considerações Finais

Conforme procuramos mostrar neste artigo o desemprego é uma construção socialmente


condicionada por interesses de classe. Podendo se constituir como um exército industrial de reserva ou
como uma massa marginal, o contingente de desempregados deve ser analisado a partir de uma
abordagem normativo-institucional, subjetivo-biográfica, tendo também como pressuposto as premissas
do materialismo dialético para a compreensão: da relação entre o modo-de-produção e as diferentes
formações sócio-econômicas, bem como das amarras estruturais de dependência do capitalismo periférico
pelo capitalismo central. Há que se considerar, nesta relação, a conjuntura do desenvolvimento das forças
produtivas, assim como da multifacetada causalidade presente nas relações de produção, que engloba
fatores de ordem social, política, cultural e ideológica.
Diante de tal complexidade, o fenômeno do desemprego na contemporaneidade é seletivo,
privilégio que o capitalista tem quando se apropria da força de trabalho alheia. Os critérios de seleção são
preenchidos pela empregabilidade do trabalhador, composta por suas qualidades adscritas e adquiridas.
No entanto, deve-se considerar também a dinâmica do ciclo capitalista e verificar a existência de postos
de trabalho, para não cairmos na manipulação ideológica do termo apregoada pela pensamento neoliberal,
que escamoteia o fenômeno ao individualizar um problema que é de ordem social.
Por último, politizamos o debate sobre as medidas do desemprego e procuramos mencionar as
limitações presentes na elaboração de políticas públicas reformistas de combate ao desemprego. Sobre as
experiências subjetivas do desemprego e da procura de trabalho, percebemos o papel cada vez maior
exercido pelas redes sociais, como uma alternativa à pouca institucionalização de políticas de emprego e
auxílio aos desempregados.
No entanto, tanto como uma como a outra (as políticas públicas e as redes sociais) se trata de
medidas que não atingem os pilares da sociedade capitalista. Como mostramos em um trabalho anterior,

GRANOVETTER (1974 e 1973).


44
“(...) a única de maneira de acabar com o desemprego é romper com o processo social que o engendra –
acumulação do capital – e, portanto, com o próprio capitalismo. Qualquer medida de combate ao
desemprego que contemple apenas as suas causas conjunturais pode ter efeitos positivos sobre o mercado
de trabalho, mas não resolve o problema por completo” (SOUZA: 2001; p. 92). Faz-se necessário,
portanto, estratégias de classe que procure colocar abaixo as bases sociais do modo-de-produção para a
construção de um projeto emancipatório para além do capital, para usar a expressão de István Mészáros.

45
BIBLIOGRAFIA:

AUBRÉE, Marion – “Os Orixás e o Espírito Santo em socorro do emprego: duas estratégias de inserção
socioeconômica no Nordeste brasileiro” – In: Revista de Ciências Sociais, vol. 26, n.1/2, pp. 48-55
(1995).

BOURDIEU, Pierre – “Le Capital Social” – Actes de la Recherche en Sciences Sociales, no 31, 1980.

CARDOSO, Fernando Henrique – “1970: La crítica de F. H. Cardoso”, (originalmente publicado com o


título “Comentário sobre los conceptos de sobrepoblación relativa y marginalidad” na Revista
Latinoamericana de Ciencias Sociales, ELAS-ICIS, Santiago de Chile, núm. 1/2, pp. 57-76) – in
NUN, José Luis – Marginalidad y Exclusión Social – Buenos Aires: Fondo de Cultura Económica,
2001.

DEDECCA, Claudio S. – Racionalização Econômica e Trabalho no Caitalismo Avançado – Campinas,


Unicamp-IE, Coleção Teses, 1999.

DEGENNE, Alain; FORSÉ, Michel – Les Réseaux Sociaux – paris: Armand Colin, 1994.

DEGENNE, Alain; FOURNIER, Irene; MARRY, Catherine; MOUNIER, Lise – “Les relations sociales
au couer du marché du travail – in: Sociétés Contemporaines, no 5, março de 1991.

DEMAZIÈRE, Didier – Le Chômage du longue Durée – Paris: Presses Universitaires de France, 1995ª.

_________________ - Sociologie du chômage - Paris: Éditions La Decouverte (Collection Reperès),


1995b.

DURKHEIM, Émile – “Que é fato social?” – in: As Regras do Método Sociológico - São Paulo:
Companhia Editora Nacional, 1977.

ESTERCI, Neide – “A ilusão do trabalho livre” – in: ESTERCI, Neide; FRY, Peter & GOLDENBERG,
Mirian (orgs.) – Fazendo Antropologia no Brasil – Rio de Janeiro: DP&A, 2001.

46
Folha de São Paulo – “10 mil trabalhadores vivem em condição de escravidão” – A4, domingo, 6 de
outubro de 2002.

FREYSSINET, Jacques – Le chômage (pg. 88-119) – Paris: La Découverte, 1984.

GALLIE, Duncan; PAUGAM, Serge – Welfare regimes and the experience of unemployment in Europe –
Oxford: Oxford University Press, 2000.

GRANOVETTER, Mark S. - Getting a Job: a study on contacts and careers – Cambriege: Harvard
University Press, 1974.

_______________________ - “The strenght of weak ties”, American Journal of Sociology, 1973.

GUIMARÃES, Nadya A. – “Laboriosas, mas redundantes”(pp. 82-103), Estudos Feministas, vol. 9, n. 1,


2001.

_____________________. – “Por uma Sociologia do Desemprego” – Revista Brasileira de Ciências


Sociais, vol. 17, no 50, outubro de 2002a.

_____________________. – Caminhos Cruzados: estratégias de empresas e trajetórias de trabalhadores –


tese de livre-docência apresentada ao Departamento de Sociologia da Universidade de São Paulo,
2002b.

HIRATA, Helena – Nova Divisão do Trabalho? – São Paulo: Boitempo Editorial, 2002.

KOWARICK, Lucio – Capitalismo e Marginalidade na América Latina – Rio de Janeiro: Paz e Terra,
1975.

LAZARSFELD, Paul; YAHODA, Marie; ZEIZEL, Hans – Les Chômeurs de Marienthal – Paris: E. de
Minuit, 1981.

LEDRUT, Raymond – Sociologie du chômage – Paris: PUF, 1966.

47
MARUANI, Margaret – Travail et emploi des femmes – Paris, La Découverte, 2000.

___________________ - Les mécomptes du chômage (Primeira Parte: Les Frontières du chômage, pp.
07-74)– Paris: Bayard, 2002.

MARUANI, Margaret & REYNAUD, Emmanuèle – Sociologie de l‟emploi - Paris: Éditions La


Decouverte (Collection Reperès, no 132), 1993.

MARX, Karl – “A Lei Geral da Acumulação Capitalista” (cap. XXIII), in: O Capital (Livro Primeiro, vol.
II) – Rio de Janeiro: Ed. Civilização Brasileira, 1979 (pg. 712-827).

MATTOSO, Jorge – O Brasil Desempregado - São Paulo: Ed. Fundação Perseu Abramo, 1999.

MÉDA, Domenique – Le travail: une valeur en voie de disparition – Paris: Aubier, 1995.

NORONHA, Eduardo – “Informal, ilegal e injusto: percepções do mercado de trabalho no Brasil” –


comunicação apresentada no XXV Encontro Anual da ANPOCS, Caxambu, 16 a 20 de outubro de
2001.

NUN, José Luis – Marginalidad y Exclusión Social – Buenos Aires: Fondo de Cultura Económica, 2001.

_____________ – “1971: La respuesta a la crítica” (originalmente publicado com o título “Marginalidad y


otras cuestiones” na Revista Latinoamericana de Ciencias Sociales, FLACSO, núm. 4, pp. 97-128) in
NUN, José Luis – Marginalidad y Exclusión Social – Buenos Aires: Fondo de Cultura Económica,
2001.

_____________ – “Superpopulación relativa, ejército industrial de reserva y masa marginal”, in: Revista
Latinoamericana de Sociología, v. 5, n. 2, julho de 1969.

_____________ – “O futuro do emprego e a tese da massa marginal” – São Paulo: Novo Estudos Cebrap,
no 56, março de 2000.

POCHMANN, Marcio – O Trabalho sob Fogo Cruzado – São Paulo: Contexto, 1999.

48
QUIJANO, Aníbal – “Redefinición de la dependencia y marginalización en America Latina” – Santiago,
Centro de Estudios Socio-Económicos, Univ. Chile, 1970.

RIFKIN, Jeremy – El fin del trabajo – Barcelona: Paidós, 1996.

SALAIS, Robert; BAVAREZ, N. & REYNAUD, B.: “Introduccion: Paro y Representaciones”; “Las
Representaciones del Trabajo a Finales del Siglo XIX” (pg. 15-78), in: La Invencion del paro em
Francia – Madrid: Ministerio de Trabajo y Seguridad Social, 1990.

SCHEHR, Sebastien – La vie quotidienne des jeunes chômeurs – Paris: PUF, 1999.

SOUZA, Davisson C. C. – “As Iniciativas do Sindicato dos Metalúrgicos de Campinas e Região Frente o
Desemprego no Período de 1994 a 1999” – monografia defendida no Instituto de Filosofia e Ciências
Humanas, na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), em novembro de 2001.

SOUZA, Paulo Renato – “O setor informal e a pobreza urbana na América Latina” (pp. 128-170), in:
Emprego, salários e pobreza – São Paulo: Hucitec/Fucamp, 1980.

TOPALOV, Christian – “Avant-propos”; “Naissance du chômeur: 1880-1910” (pg. 9-35), in: Naissance
du Chômeur: 1880-1910 – Paris: Albin-Michel, 1994.

49

S-ar putea să vă placă și