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In: ENCONTRO DE ESTUDOS ORGANIZACIONAIS, 2., 2002, Recife. Anais...

Recife: Observatório da
Realidade Organizacional : PROPAD/UFPE : ANPAD, 2002. 1 CD.

A Relação Indivíduo-Organização: é Possível não se Identificar com a Organização?

Beatriz Braga Lacombe

Resumo
A gestão das organizações, em busca de agilidade e flexibilidade, vem procurando
estabelecer relações do tipo transacional, em que as trocas entre o indivíduo e organização
compreendem apenas o trabalho executado e a remuneração correspondente e onde a
identificação do indivíduo estaria mais relacionada à profissão e ao trabalho executado do que
à organização. Esse trabalho se propõe analisar um dos elementos constituintes desse tipo de
relação – o processo de identificação – e responder à questão: a não-identificação com a
organização é possível? Para tanto, é feita uma exploração (a) da relação Homem-Trabalho
que emerge da condição ontológica do ser humano e (b) do processo de identificação, tal
como apresentado pela Psicologia Social. Dessa investigação são extraídos os elementos
utilizados para a avaliação das possibilidades da relação Homem-Trabalho e dos processos de
identificação na organização capitalista industrial; da mesma forma, são avaliadas as políticas
e práticas do paradigma emergente – que tem sido denominado de flexível – e os tipos de
relação indivíduo-organização que daí resultam. Como resultado da discussão, o trabalho
ressalta alguns pontos que merecem reflexão no estabelecimento das relações entre as pessoas
e a organização.

Abstract
In the search for agility and flexibility, management has been trying to establish
transactional relationships – in which the relationship between the individual and the
organization is limited to the exchange of the work performed for a fair financial
compensation and in which the individual’s identification is encouraged to be towards the
work itself or the profession, rather than the organization. This work intends to analyze one of
the elements that constitute this new contract – the identification process – and to try to
answer the question: is it possible for the individual not to identify with the organization? In
order to do so, this paper explores (a) the Man-Work relationship that emerges from Man’s
ontological condition and (b) the identification process, as presented by Social Psychology
theorists. This investigation provides the elements that are used for the evaluation of the Man-
Work relationship and the identification process in the industrial capitalistic organization; in
the same way, it is possible to evaluate the policies and practices of the present management
model, which has been called flexible, and the kinds of relationships that may derive from
them. This investigation points to some aspects that deserve careful attention in the
development of these relationships.

Introdução
O reconhecimento da importância do compartilhamento de valores e objetivos entre
indivíduo e organização, como meio de se obter lealdade, cooperação e esforço das pessoas,
data de muitos anos atrás (Jucius, 1955), mas é na década de 80 que o conceito se torna mais
saliente, em especial com Peters e Waterman (1982), quando a cultura organizacional ganha
força como agente da competitividade. De acordo com essa linha de argumentação, alguns
autores propõem que a maior identificação das pessoas com a organização e uma cultura
organizacional forte e coesa são fatores que promovem o desempenho e a competitividade
(Schein, 1985; Peters e Waterman, 1982 ). Sendo assim, pode-se dizer que os esforços da
gestão são direcionados para que o know-why - os interesses, motivações e aspirações do
indivíduo em relação ao trabalho – corresponda aos objetivos e aos valores adotados pela
organização.
Nas duas últimas décadas, no entanto, em busca de agilidade e competitividade, a
gestão das organizações vem reformulando políticas e práticas que afetam diretamente os
contratos estabelecidos com as pessoas que nelas trabalham. Os contratos anteriormente
estabelecidos entre os trabalhadores e a organização contemplavam, ainda que de maneira
implícita, sentimentos como lealdade e dedicação à organização por parte do trabalhador e a
garantia do emprego e de aumentos salariais contínuos, por parte da empresa. Esse tipo de
relação que inclui aspectos de ordem pessoal e emocional corresponde ao que Mirvis e Hall
(1994) definem como o contrato relacional. O paradigma emergente de gestão, que tem sido
denominado de flexível, pressupõe que a relação entre indivíduo e organização se limite à
uma relação transacional, onde ocorre a troca do trabalho por uma remuneração adequada,
onde as carreiras se tornam sem fronteiras, o conceito de sucesso profissional está mais
associado a critérios pessoais (e não mais à ascensão na escala hierárquica e aumentos de
salários) e onde o indivíduo é encorajado a se identificar mais com o próprio trabalho e com a
sua profissão e menos com uma organização específica (Defillipi e Arhtur, 1994).
Essa gestão se caracteriza pela adoção de estruturas fluidas, caracterizadas pela
ausência de determinação das tarefas a serem realizadas e pela composição também mutável
das pessoas que compõem as equipes de trabalho. Os vínculos estabelecidos entre as pessoas e
a organização são de naturezas diversas – empregados, contratados, temporários, autônomos,
terceirizados, e assim por diante, o que confere flexibilidade e agilidade de resposta às
demandas encontradas. No entanto, embora possa haver uma diferenciação contratual das
pessoas em termos de núcleo e periferia, muitas das políticas e demandas acabam sendo
aplicadas a todos indiscriminadamente – a necessidade de comprometimento, por exemplo
(Legge, 1995). Essas condições colocam a organização em uma situação que é descrita por
Morhman e Lawler III (1997) como um dilema pois, de um lado, a necessidade de
flexibilidade e adaptação a mudanças impõe a construção de relações transacionais,
caracterizadas pela autonomia dos indivíduos em relação ao vínculo de emprego; por outro
lado, são as pessoas, detentoras da capacidade de criação de conhecimento e aprendizado, a
fonte da vantagem competitiva mais duradoura - o conhecimento intangível e específico da
organização (Spender, 1996) - e, portanto, o seu envolvimento com o trabalho e a
identificação com a organização parecem ser elementos desejáveis. Como consequência, essa
gestão coloca as pessoas em uma situação onde são chamadas a se comprometer com o
trabalho e a inovar em termos das soluções encontradas - o que demanda investimento
contínuo no conhecimento e na requalificação – e onde, ao mesmo tempo, precisam gerir suas
carreiras de forma a não depender da organização em que trabalham.
Esse tipo de gestão tem sido alvo de críticas, uma vez que a contradição (necessidade
de comprometimento e flexibilidade) parece ser administrada por meio da manipulação de
símbolos e do discurso que buscam a identificação do indivíduo com os valores e objetivos da
organização (Legge, 1995; Wood, 2000) e onde a distribuição de recompensas – que não se
limitam às recompensas monetárias – representa um papel central pois, conforme coloca
Pagès (1987, p. 27), “...os privilégios funcionam como um terceiro termo que vem ocultar a
contradição entre os objetivos da empresa, os do sistema capitalista (o lucro e a dominação) e
os objetivos dos trabalhadores”. Dessa maneira, se a gestão se utiliza de argumentação e de
sistemas de recompensas de natureza pessoal e emocional, pode-se dizer que a relação que
vem sendo estabelecida entre indivíduo e organização não é transacional; além disso, os
apelos à identificação com os valores e objetivos e ao comprometimento com a organização
vêm contradizer a proposta de identificação com o próprio trabalho e com a profissão.
Sendo assim, se tanto a organização como as pessoas se encontram em posições que
exigem atitudes contraditórias, é preciso investigar a validade da possibilidade do
estabelecimento de uma relação transacional entre indivíduo e organização e as condições em
que pode ocorrer. Esse trabalho se propõe explorar um dos elementos constituintes dessa
relação – o processo de identificação em relação ao trabalho – e busca responder às questões
colocada pelas novas formas de gestão: é possível o indivíduo identificar-se com o trabalho e
a profissão, ao invés da organização? Em que condições isso pode ocorrer? Que políticas e
práticas estimulam a não-identificação com a organização?
Para essa avaliação é feita, após esta introdução, uma análise da relação Homem-
Trabalho que emerge da condição ontológica do ser humano a fim de buscar melhor
compreender a construção do know-why e uma investigação do processo de identificação; em
seguida, é feita uma exploração das condições de desenvolvimento dessa relação e de seus
elementos no modo de produção capitalista - na organização taylorista/fordista e no
paradigma emergente de gestão. Estas análises mostram pontos que precisam ser melhor
pensados e discutidos pela gestão, a fim de que políticas apropriadas possam ser
implementadas.

A relação Homem-trabalho e o processo de identificação


Braverman (1987) define o trabalho como a atividade exercida sobre os materiais da
natureza de forma a melhorar a sua utilidade. Dessa maneira, homens e animais trabalham,
pois atuam sobre a natureza “...de modo a transformá-la para melhor satisfazer as suas
necessidades” (Braverman, 1987, p. 49). O Homem, como o animal, precisa da natureza para
sobreviver. Mas, ao contrário do animal, que age de acordo com o desejo biológico, o Homem
é dotado de uma riqueza de recursos que lhe proporciona várias formas de integração com a
natureza e, portanto, de sobrevivência.
Malvezzi (1988) entende que a relação que o Homem estabelece com o trabalho se
origina da condição ontológica de abertura do ser humano, que depende de sua interação com
a natureza para materializar sua indeterminância. Como não é pré-determinado e pode se
completar de inúmeras maneiras, ele tem uma variedade de escolha entre as alternativas
disponíveis. Ao escolher uma das alternativas, se torna responsável e, ao mesmo tempo,
determina a sua privação. A responsabilidade deriva, portanto, da flexibilidade para definir
objetivos quaisquer e da capacidade de determinar como esses objetivos serão atingidos. Para
fazer essa escolha, o indivíduo leva em conta o contexto em que vive e a sua própria maestria
do contexto. Dessa forma, é o seu desejo que torna possível a objetificação de sua
indeterminância. É a possibilidade de escolher como será objetivada a própria
indeterminância que torna o indivíduo responsável e define o caráter realizador do trabalho.
Sendo assim, a relação que o Homem estabelece consigo próprio por meio do trabalho
é de objetificação da sua indeterminância, de singularização de sua individualidade (Malvezzi,
1988). Essa singularização, enquanto expressão de sua escolha, reflete como o indivíduo vê a
própria vida, suas aspirações, suas habilidades, os acontecimentos à sua volta e as ações que
toma.
E essa “consciência que o indivíduo tem de si próprio como sujeito criador e executor
de suas ações, assim como das relações que emergem como resultado de tais papéis e que
ligam o indivíduo ao ambiente” (Malvezzi, 1988, p. 165) é a auto-consciência e implica a
colocação de objetivos e a criação de um plano mental para o atingimento destes objetivos. A
colocação de objetivos determina que o produto, a objetificação de suas possibilidades seja
não apenas o reflexo e o reconhecimento de si mesmo, mas também capaz de satisfazer seus
desejos e necessidades. Esse produto, que age e transforma o seu mundo, será tão mais
variado e atenderá a maior gama de desejos e necessidades quanto maior for a capacidade do
indivíduo de lidar com o seu ambiente. Em outras palavras, através do desenvolvimento de
seus recursos (potencialidades) o Homem pode satisfazer seus desejos e necessidades, criar e
recriar o mundo ao seu redor, estabelecendo uma relação de reciprocidade, na qual ambos se
transformam. O desenvolvimento do próprio potencial não apenas amplia o conhecimento do
mundo, como também amplia a possibilidade de uso dos recursos pessoais, criando novas
oportunidades e maneiras de se realizar, repondo a sua indeterminância.
A vivência em grupo (e os objetivos deste) impõe a organização e a institucionalização
do trabalho, que cria papéis e padrões esperados de desempenho e comportamentos,
estabelecendo uma teia de relações que podem ser de mando, de lealdade, de confiança, de
cooperação, servidão, e assim por diante, e posicionando as pessoas em relação a si próprias e
em relação aos outros. Nesse sentido, o exercício da atividade profissional não apenas
expressa a singularidade do indivíduo, resultado das suas escolhas, mas também o posiciona
no seu grupo social. A sua mobilidade manifesta o desenvolvimento de suas habilidades e a
valorização de sua atividade em relação ao seu grupo.
Pode-se observar, portanto, que dois dilemas se colocam ao Homem, como resultado
de sua indeterminância. Ele tem uma gama de recursos que lhe dá possibilidades infinitas de
realização da sua indeterminância, mas onde a própria objetificação dessa riqueza de recursos
já constitui uma escolha, uma privação. Sendo assim, o trabalho, como atividade exercida
sobre a natureza para a satisfação das próprias necessidades já traz, para o Homem, um
dilema, que é a escolha de uma forma de satisfação, processo que exclui as outras infinitas
formas. Além disso, a objetificação se sujeita aos objetivos e normas do grupo social a que
pertence, ou seja, às formas institucionalizadas de organização do trabalho desse grupo social,
caracterizando uma outra limitação de suas possibilidades, um segundo dilema. Se esses
dilemas são inerentes à condição do Homem, cada forma de institucionalização do trabalho, a
artesanal, o taylorismo/fordismo e o paradigma emergente, que tem sido denominado de
flexível, vai representar diferentes escolhas do Homem e de seu grupo social e vai determinar
diferentes privações.
Daí decorre que a construção da identidade do indivíduo também se dá por meio do
trabalho. Jaques (1996) sustenta que, embora o trabalho tenha sua importância exagerada na
sociedade ocidental, é inegável a articulação existente entre identidade e trabalho pois que o
trabalho é um dos elementos de interação entre indivíduo e sociedade e que, portanto, a
construção da identidade se dá a partir da dialética entre indivíduo e sociedade, na qual um se
identifica a partir do outro. Coutinho (2000) faz uma análise dos conceitos de identidade e
identificação a partir de construções teóricas oriundas da Psicologia Social e da Sociologia e
após revisar autores como Ciampa, Jaques, Berger e Lukman, e Martin-Baró, entre outros, a
autora conclui que “...a identidade de cada um é singular.....[e] também possui características
partilhadas com outros membros dos grupos a que pertence e que o identificam com eles”
(Coutinho, 2000, p, 55). Nesse sentido, pode-se dizer que a identidade compreende
características derivadas de diversos processos de identificação.
De acordo com Ashforth e Mael (1989), as pessoas tendem a se classificar e aos outros
em várias categorias sociais como membros de uma organização, afiliação religiosa, gênero,
faixa etária, e assim por diante. As categorias são definidas por características prototípicas de
seus membros. A identificação social tem duas funções: em primeiro lugar, segmenta e ordena
o ambiente social como uma maneira sistemática de definir os outros; em segundo, a
classificação permite que o indivíduo se localize dentro do ambiente social. Dessa maneira, a
identidade compreende características idiossincráticas como atributos físicos, habilidades,
traços psicológicos, interesses e uma identidade social que compreende classificações de
grupos relevantes. Pode-se dizer que o indivíduo se define parcialmente em termos de
referentes sociais e que a identificação com um grupo emerge do desejo de auto-definição. A
identificação é, dessa maneira, um processo cognitivo em que o indivíduo se julga um
exemplo típico de um determinado grupo.
Alguns autores defendem que a própria escolha da profissão passa por processos de
identificação. Embora reconheçam que, para alguns grupos de pessoas – provenientes de
classes sócio-econômicas mais baixas, sem instrução básica, por exemplo – o contexto possa
apresentar condições que restringem as opções de carreira, Lent e Brown (1996) apontam que
os interesses de carreira se dirigem para aquelas áreas onde as pessoas possam desempenhar
as atividades que mais gostam e onde acreditam que poderão interagir com outros com os
quais se julgam semelhantes. Conforme coloca Super (1992, p. 130), “...dentro dos limites
apresentados pelo ambiente e pela base genética do patrimônio individual, uma pessoa se
identifica com outros indivíduos numa determinada ocupação”. Jaques (1996) sustenta que a
criança, por meio da observação e do convívio com adultos, vai formando modelos
relacionados às profissões, que influenciarão suas escolhas de carreira. Schein (1993)
acrescenta que as pessoas também têm expectativas sociais das atividades escolhidas e,
portanto, associam as profissões a determinados retornos monetários, status, e assim por
diante. Dessa maneira, a escolha também se dá pela associação de padrões de atividades,
comportamentos, retornos financeiros e sociais a determinadas profissões e pela percepção de
semelhanças ou dessemelhanças dos próprios atributos em relação a esses padrões. Portanto,
pode-se dizer que a identidade profissional se constrói a partir de escolhas feitas em função do
auto-conhecimento e da vivência e do conhecimento do grupo social em que se está inserido.
Sendo assim, a construção da identidade profissional é, ao mesmo tempo, um processo
individual e social. As escolhas feitas em relação ao trabalho exercido resultarão das
experiências, gostos, interesses e aspirações pessoais e também são resultado da história de
vida do indivíduo, da sua interação com os diversos grupos sociais e das expectativas que daí
são formadas. Dessa maneira, a identificação com uma profissão significa ter afinidade com
as atividades a ela inerentes e pode ser considerada parte do processo de escolha e de
construção da identidade profissional.

O processo de identificação no contexto organizacional


Rousseau (1998) define a identificação como o estado psicológico pelo qual o
indivíduo se percebe parte de um todo maior (grupo de trabalho, empresa, igreja, etc). A
identificação organizacional ocorre, portanto, quando o indivíduo se sente parte de uma
organização e “a base das ações corporativas seriam processos cognitivos onde os indivíduos
expandem o modo como se sentem sobre si mesmos para incluir mais e maiores conjuntos de
objetos sociais” (Rousseau, 1998, p. 217). Dessa maneira, a identificação é um estado
cognitivo, a percepção do indivíduo em relação à organização e difere do comprometimento,
uma resposta afetiva, emocional à organização. No entanto, os dois processos podem ocorrer
simultaneamente e se influenciam, afetando diretamente a ação do indivíduo.
Daí decorre que o processo de identificação com a organização é pessoal, ou seja,
ocorre com cada indivíduo e em cada organização à qual ele pertence, em diferentes graus.
Quanto maior o grau de identificação, maior será a sensação de perda quando o indivíduo
deixa a organização. Além disso, para que a identificação ocorra, não é necessário que os
valores e objetivos da organização sejam internalizados pelo indivíduo; basta apenas que ele
reconheça atributos semelhantes entre ele mesmo e a organização, ou seus outros membros.
Ashforth e Mael (1989) consideram que além de atributos como a interação pessoal, a
semelhança, os gostos, a proximidade, objetivos compartilhados e uma história comum, por
exemplo, alguns outros fatores aumentam a tendência à identificação com a organização: suas
características únicas (que a torna diferente das outras), seu prestígio, e a saliência das outras
organizações. A identificação, por seu lado, promove o apoio e o comprometimento com a
organização, assim como sentimentos de lealdade e orgulho no indivíduo. Facilita, ainda, a
internalização de valores e normas e a homogeneidade de comportamentos.
Rousseau (1998) propõe dois tipos de identificação com a organização: a situacional e
a de estrutura profunda. A identificação situacional ocorre quando indivíduos e organização
têm interesses comuns que conseguem se sobrepor às suas diferenças. O indivíduo percebe
que a relação forma um ‘nós’. Essa percepção é criada por sinais específicos – situações – que
demandam o compartilhamento de interesses e a identificação persiste somente enquanto a
sinalização existir. Os resultados das ações são comuns a todos e compartilhados. Esse tipo de
identificação tem sido criada com sucesso em arranjos temporários por meio de diversas
intervenções e parece ser relevante para as novas formas de trabalho, onde o indivíduo pode
trabalhar com diferentes empregadores ao mesmo tempo. O trabalho a ser realizado demanda,
em geral, habilidades e conhecimentos variados e há recursos e prazos limitados para a sua
execução. São exemplos desses arranjos as campanhas políticas, times de consultoria e
auditoria, equipes de filmagens, entre outros. O compartilhamento do objetivo, das restrições
e dos resultados requer relações e confiança e promove a identificação, que se extingue
quando a tarefa for concluída.
A identificação profunda resulta de um processo onde as interpretações das
experiências vividas pelo indivíduo em relação à organização são sistematizadas e ordenadas,
formando percepções ou modelos mentais relativamente estáveis sobre essa relação. A
identificação profunda torna confusas as fronteiras entre o interesse individual e o da
organização e geram uma disposição positiva em relação à organização e aos seus interesses.
A identificação profunda ocorre, portanto, em situações de duração indeterminada e, de
acordo com a autora, se tornam cada vez menos prováveis no momento atual, dadas as
frequentes mudanças nas organizações, aos inúmeros processos de reestruturação, às fusões e
aquisições, e assim por diante. A identificação profunda pode ser promovida pela forma de
distribuição das recompensas: quando a organização oferece um amplo espectro de
recompensas de natureza particularista – status, apoio pessoal e à família, por exemplo – o
indivíduo pode acreditar que um laço pessoal tenha sido estabelecido; ou quando o significado
atribuído às recompensas adquire conotações simbólicas mais amplas, que alteram a
percepção da relação estabelecida. Recompensas distribuídas voluntariamente – ao invés de
exigidas pelos trabalhadores por meio de ameaças, por exemplo – promovem a sensação de
que a organização é justa e se preocupa com as pessoas, facilitando o processo de
identificação. A diferenciação no processo de distribuição das recompensas – empregados do
núcleo versus temporários, por exemplo – também pode afetar significativamente a percepção
dos diversos tipos de empregados, promovendo diferentes graus de identificação.
Para Rousseau (1998), a identificação profunda também pode ocorrer quando o
controle sobre a ação do indivíduo é transferido para outro, em situações de socialização
intensa, como é o caso do exército, por exemplo, ou sob a influência de um líder carismático.
Esse tipo de processo de identificação pode ser encontrado em organizações (a) onde a cultura
organizacional é forte e continuamente reforçada por meio de símbolos e rituais e/ou (b) que
têm líderes carismáticos; de tal sorte que não se consegue dizer se estas organizações são uma
cultura ou um culto (Rousseau, 1998, p. 226).
Considerando-se as proposições de Ashforth e Mael (1989) e Rousseau (1998), pode-
se inferir que a relação de cada pessoa com o trabalho passa por diversos processos de
identificação, desde a escolha de uma profissão à identificação com colegas de trabalho,
grupos temporários formados com objetivos específicos e à própria organização e que, além
disso, a identificação com cada grupo varia em intensidade, de acordo com o tipo de relação
que se estabelece entre o indivíduo e o grupo. Nesse sentido, é de se esperar que a pessoa se
identifique mais com os colegas de trabalho mais próximos, de sua unidade de trabalho, por
exemplo, do que com aqueles que trabalham em áreas mais distantes. Além disso, Sainsaulieu
(1977) propõe que os grupos desenvolvem identificações diferenciadas, que variam de acordo
com a posição que ocupam na escala hierárquica (ou em relação ao poder) e com a natureza
do trabalho que exercem, podendo experimentar diferentes graus de identificação com a
ideologia dominante e com a organização. O autor sustenta que os grupos de trabalhadores
não-especializados, por terem sua capacidade de expressão e autonomia limitadas, são mais
propensos a desenvolverem identificações verticais – com as chefias – e, dessa maneira,
também são mais propensos a aceitarem as idéias e valores impostos ou ‘sugeridos’ pela
gestão. Em contrapartida, os grupos de pessoas que dispõem de maior mobilidade na
organização – jovens executivos e trainees, por exemplo – tendem a desenvolver
identificações mais temporárias com colegas e chefes, priorizando a própria carreira. Isso
significa que serão mais propensos a trocar de trabalho e que não são tão permeáveis ao
discurso da gestão.
Com base na premissa de que o maior comprometimento, ou o esforço despendido em
favor dos seus objetivos, será derivado de graus mais intensos de identificação, as
organizações têm buscado gerar identificações mais fortes dos indivíduos por meio da
rotinização do carisma ou de processos de internalização de valores e objetivos. “Por meio da
manipulação de símbolos como tradições, mitos, metáforas, rituais, sagas, heróis e o arranjo
físico, a administração pode reforçar a sensação de pertencimento e semelhança e promover
imagens poderosas do que a organização ou o grupo representa” (Ashforth e Mael, 1989, p.
28). Os autores afirmam que é tacitamente reconhecido entre gerentes que uma identidade
positiva e única para a organização atrai reconhecimento, apoio e lealdade não apenas dos
seus membros, mas de outros constituintes como os acionistas, clientes, por exemplo. No
entanto, conforme colocado por Sainsaulieu (1977), o resultado dessas ações podem atingir os
diversos grupos de maneiras distintas, obtendo graus diferenciados de identificação com a
organização.

A relação Homem-trabalho e o processo de identificação no modo de produção


taylorista/fordista
Dentre as formas institucionalização da produção organizadas pelo Homem, o trabalho
do artesão tem sido frequentemente utilizado para ilustrar como trabalho, arte, prazer e
sobrevivência podem se unir no trabalho (Anthony, 1984). Embora as condições de trabalho
não fossem as mesmas para todos e muitos eram explorados por seus mestres (Pahl, 1989), o
trabalho do artesão permite não apenas a concepção e a execução da obra pelo trabalhador,
mas também o contato próximo com o cliente – o que lhe permite negociar materiais e preços
– e o desenvolvimento da técnica, necessária para a execução de obras cada vez mais
aperfeiçoadas. Conforme ressalta Kuller (1996), há uma proposta educativa inerente ao
trabalho, demonstrado pelo interesse e pelo orgulho com que o educador, o mestre,
acompanha o destino profissional de seus aprendizes, pois o artesão formado, é considerado
como uma extensão da obra de seu mestre. E esses são os elementos que caracterizam um
ofício, uma profissão; quando ausentes, fica difícil dizer que o indivíduo tem uma profissão
com a qual possa se identificar – ele apenas trabalha.
Braverman (1987) mostra como as formas de trabalho predominantes na era feudal
foram se alterando para dar lugar ao trabalho assalariado do capitalismo industrial. Os
empregados das primeiras manufaturas podiam trabalhar em suas casas, por exemplo, e serem
pagos por peça produzida. O capitalista, nesse caso, determinava como deveria ser o produto
final e fornecia o material e a matéria-prima. O modo de fazer e o tempo despendido,
entretanto, eram escolhas feitas pelo próprio trabalhador. A subcontratação também era
bastante frequente, sendo os trabalhadores sujeitos a longas horas e ao pagamento feito,
muitas vezes, em gêneros. Segundo o autor, essas formas de trabalho representam uma
transição, “...fase durante a qual o capitalista não havia assumido a função essencial de
direção no capitalismo industrial e o controle sobre o processo de trabalho...” (Braverman,
1987, p. 64). Com o aumento da produção, entretanto, o controle passa a ser função essencial,
surgindo a figura do gerente e a necessidade de reunir os trabalhadores num mesmo local.
O desenvolvimento da mecanização e da automação desloca ainda mais a função
operacional do trabalhador para a máquina. Kuller (1996) destaca os elementos que
caracterizam a relação indivíduo-organização na organização técnico-científica: a separação
entre concepção e execução, a fragmentação do trabalho de execução, a relação aversiva com
o trabalho, o resultado coletivo do trabalho, a produção em massa, a especialização e ajuste do
Homem a atividades repetitivas, o controle externo do tempo e do ritmo de trabalho, a não-
propriedade dos meios de produção e a separação papel/pessoa. O autor ressalta que a
proposta de Taylor buscava a ampliação da produtividade fundamentada no aumento do
controle sobre a força de trabalho. Se na empresa manufatureira o controle pelos supervisores
podia significar apenas a fixação de tarefas, com um mínimo de interferência sobre o modo de
execução das mesmas, na organização taylorista os papéis se invertem e o gerente passa a ter
o controle sobre todas as atividades no trabalho. Esse controle, baseado no estudo do tempo e
no planejamento minucioso das tarefas, elimina a iniciativa do trabalhador, transferindo-a ao
gerente que, com isso, podia garantir o maior retorno possível ao empregador.
Para o trabalhador, a divisão técnica do trabalho determina necessidades de
treinamento para tarefas específicas, não constituindo, como no caso do artesão, o
aprendizado de um ofício e sendo “toda fase do processo produtivo tão divorciada, tão longe
quanto possível, do conhecimento e preparo especial, e reduzida a simples trabalho. Nesse
ínterim, as relativamente poucas pessoas para quem se reservam instrução e conhecimento são
isentas tanto quanto possível da obrigação de simples trabalho” (Braverman, 1987, p. 80).
Esse trecho do autor deixa clara a separação estabelecida no sistema capitalista industrial
entre o desenvolvimento de habilidades que definem um ofício ou ocupação e o trabalho
executado nas linhas de produção das organizações técnico-científicas. O trabalho executado
e o produto dele, por não serem fruto da concepção e da escolha do indivíduo, deixam de ser a
expressão das potencialidades do indivíduo e da objetificação da sua indeterminância. Além
disso, o aprendizado de tarefas parceladas não proporciona o desenvolvimento das
potencialidades e recursos do indivíduo que possibilita a relação de reciprocidade e criação de
seu mundo e a reposição de sua indeterminância.
Conforme coloca Malvezzi (1988), na sociedade industrial a forma prevalecente de
trabalho é o emprego, que se torna o mediador entre o Homem e suas possibilidades de
trabalho e, portanto, o mediador entre o Homem e seus objetivos. O emprego, constituído de
um conjunto de objetivos e tarefas, está ligado a outros conjuntos de tarefas que foram
definidos em função de um objetivo mais amplo, o da organização, adquirindo daí o seu valor
social, mas não há nada que garanta que esse conjunto de tarefas seja a expressão das
possibilidades do indivíduo e da construção de sua identidade. Anthony (1984) ressalta que a
relação mostrada por Arendt entre labor e o ciclo natural, que poderia conferir dignidade ao
trabalho, está ausente na linha de montagem ou no escritório. "Se o trabalho se tornou sem
sentido é porque, embora necessário, a conexão imanente entre trabalho e sobrevivência se
tornou obscura nas sociedades industriais" (Anthony, 1984, p. 315), não apresentando nem
mesmo as características da fadiga ou exaustão existentes no ciclo natural descrito pela
autora, onde o Homem “...labuta e repousa, labora e consome” (Arendt, 1999, p.118).
Na organização capitalista industrial, as decisões tomadas sobre o trabalho não
levavam em conta as aspirações e necessidades dos indivíduos, o que ocasionava a separação
entre a pessoa e o trabalhador. O trabalho era previamente desenhado e a movimentação das
pessoas, que definia as carreiras, obedecia às necessidades da organização, sendo mínimo o
grau de consultação e de escolha conferido aos trabalhadores (Boerlijst, 1984). O
desenvolvimento das carreiras estava sujeito aos planos de carreira que, com o passar do
tempo, vieram a ser mais associados à distribuição de recompensas extrínsecas e de símbolos
de status e poder, do que com o desenvolvimento de potencialidades; este, por sua vez, era
definido pela organização – as necessidades de treinamento – e que podia ficar restrito ao
aprendizado de tarefas isoladas, fragmentadas e repetitivas, não constituindo o aprendizado de
um ofício. Dessa maneira, a identificação com a profissão era uma possibilidade remota para
muitos trabalhadores.
Como a escolha não está presente na organização capitalista taylorista/fordista, o
trabalhador torna-se preso a determinações externas (Malvezzi, 1988). Para compensar este
aprisionamento, salário e carreira são oferecidos pelas organizações, passando a ser os
mediadores entre o Homem e suas possibilidades. O salário não reflete esforço, é um valor
artificial, que segue fatores como as leis de mercado e do governo, necessidades da empresa,
exigências de sindicatos, entre outros, e nem sempre é suficiente para atender às necessidades
do indivíduo. O plano de carreira o recompensa na medida em que lhe oferece a oportunidade
de adquirir mais status, salários melhores, maiores privilégios e tarefas mais gratificantes,
sem, entretanto, mudar a essência da relação entre o trabalhador e o seu trabalho. O prazer no
desempenho não tem valor algum. Diante da impossibilidade de se exercer um trabalho
realizador, o trabalhador concentra seus esforços para conseguir remunerações e benefícios
sempre crescentes, associando satisfação a promoções e símbolos de prestígio e status. Além
disso, para muitas pessoas, identificar-se com o trabalho em si se torna impossível, porque
isto significaria se identificar com algo ínfimo, fragmentado e sem importância aparente. A
identificação se transfere para a organização, símbolo de grandeza e poder, que é, sobretudo, a
entidade capaz de dar o que o trabalhador precisa, sendo necessário, para tanto, que ele realize
o trabalho da forma como é apresentado.
Subir na escala hierárquica torna-se o retorno desejado, porque pode significar o
reconhecimento da organização. A carreira é tida como uma mediação na instância econômica
que, como os altos salários, significam a aceitação do lucro e da expansão da empresa,
levando os empregados a se encarregar, eles mesmos, da contradição de ter que suportar, de
um lado, uma carga de trabalho opressiva e uma tensão permanente e ter, por outro lado, seus
desejos, muitas vezes não realizados, de liberdade e autonomia. Essa atribuição de
responsabilidade é possível a partir do momento em que o indivíduo deseja fazer carreira, pois
o desejo de vencer leva-o a trabalhar sempre mais e melhor. “A força da empresa consiste em
fazer esse desejo em necessidade” (Pagès et al., 1987, p. 133). E são esses os mecanismos que
levam a classe gerencial a se sentir diferente das demais: eles não apenas desenham e
controlam o trabalho dos outros, mas também são recompensados de maneira diferenciada,
com benefícios mais diversificados e individualizados. E é por isso que o executivo, em geral,
demonstra um grau elevado de identificação com a organização pois são levados a situações
onde “...os valores e objetivos não têm que ser impostos aos gerentes”, pois eles, na verdade,
aspiram a este mundo (Anthony,1984, p. 294).

A relação Homem-Trabalho e o processo de identificação no modo de produção


flexível
Mirvis e Hall (1994) situam no final da década de 60 o surgimento de arranjos
temporários, recomendados pela literatura e adotados pelas organizações com a finalidade de
responder mais rapidamente às mudanças no ambiente. Na década de 70, esta flexibilidade se
faz presente por meio da instituição de grupos e projetos de trabalho, estruturas paralelas
semi-permanentes compostas de gerentes e trabalhadores para monitorar as mudanças e pela
difusão da estrutura organizacional matricial, que modifica as antigas fronteiras entre
departamentos e divisões. Nos anos 80, a mudança se acelera e as organizações adotam novos
desenhos de trabalho, programas de qualidade e de melhoria contínua, multiplicando-se as
fusões, aquisições e parcerias de vários tipos, que acabam por configurar, na década de 90, as
organizações sem fronteiras, assim denominadas por não serem claras e estáveis as suas
fronteiras com o ambiente ou com as outras organizações. Esse tipo de organização consegue
se movimentar mais agilmente não apenas pela sua flexibilidade estrutural, mas também pela
diversidade de habilidades que pode conseguir, pela ausência de descrições precisas de cargos
e pela possibilidade de movimentar as pessoas rapidamente entre projetos, formando novas
estruturas (Mirvis e Hall, 1994, p. 368). A ação gerencial anteriormente baseada na
racionalização de tarefas, na autoridade hierárquica e na estrutura de cargos, passa a ser “...a
criação e a coordenação das competências organizacionais, ou seja, a produção de
instrumentos ad hoc que lhe permitam intervir nos sistemas de atividades com legitimação e
apoio das equipes” (Malvezzi, 2000, p. 138).
A indeterminação característica da organização flexível, onde as tarefas passam a ser
abertas - sem descrição precisa e detalhada – colocam sobre o trabalhador a responsabilidade
da criação do seu próprio trabalho, obrigando-o a tornar-se um agente ativo e a apropriar-se
de seu destino dentro da empresa. O processo do exercício do trabalho sofre transformações e
pode (a) proporcionar às pessoas a oportunidade de fazer algumas escolhas, tornando-se
responsáveis pelo modo de realização do trabalho e (b) possibilitar que as pessoas
estabeleçam planos para o desenvolvimento das habilidades. A possibilidade de planejamento
das tarefas e de sua forma de execução traz ao indivíduo a oportunidade de pensar sobre o
trabalho a ser realizado e suas implicações. Isso confere, além de maior autonomia no
processo decisório e no ato do trabalho em si, uma possibilidade maior de avaliação da
própria vida profissional, de maneira a propiciar o desenvolvimento de uma profissão, que
possa se integrar a um projeto de vida. Nesse sentido, a organização pode ser considerada
fonte de oportunidades de trabalho para as pessoas (Malvezzi, 2000).
Ademais, as carreiras deixam de ser pré-determinadas e passam a depender muito mais
da qualificação do indivíduo. As frequentes reestruturações eliminam níveis hierárquicos,
muitos dos cargos e os benefícios e símbolos de status a eles associados. A ascensão na
hierarquia torna-se mais difícil e, portanto, deixa de constituir um objetivo para as pessoas e
um instrumento de manipulação da gestão. A movimentação – quase sempre lateral – pelas
posições nas equipes de trabalho é negociada de acordo com a qualificação e os resultados
anteriormente mostrados. Acompanhando as transformações na gestão das pessoas, os
sistemas de remuneração deixam de apresentar grades salariais fixas, com aumentos
automáticos por senioridade ou por mudanças de posições (cargos) e passam a enfatizar o
indivíduo, o seu desempenho e o seu desenvolvimento de habilidades e competências (Legge,
1995). As recompensas não-monetárias se concentram no reconhecimento dos colegas, pois
esse reconhecimento possibilita a participação em outros projetos e amplia as oportunidades
de trabalho. Para tanto, é importante que o indivíduo desenvolva o que Defillipi e Arthur
(1994) denominam de competências do know-how e know-whom, ou seja, o conhecimento
relacionado à área de interesse e a capacidade de se relacionar bem com as pessoas e de
conseguir interagir de forma a trazer boas soluções para colegas, clientes e fornecedores.
É nesse contexto que Defillipi e Arthur (1994) propõem que a identificação das
pessoas se voltaria mais para o trabalho e para a profissão do que a uma organização
específica. Isso porque o auto-conhecimento, o planejamento da própria carreira e o
desenvolvimento de habilidades torna o indivíduo mais capacitado para se engajar em
diversos tipos de trabalho e projetos, com diversos empregadores. E como as organizações
estariam sinalizando que não desejam estabelecer vínculos de longa duração, o gerenciamento
da carreira e a identificação com a profissão seriam os atributos mais compatíveis com essas
condições.
Entretanto, a partir da observação do discurso e das práticas de muitas empresas,
alguns autores vêm levantando críticas a esse modo de gestão e à relação que se estabelece
entre a organização e as pessoas. Souza (2000) faz uma análise da institucionalização do
trabalho na organização taylorista/fordista e na integrada/flexível, à luz da relação Homem-
Trabalho, investigando a possibilidade de ter havido um salto qualitativo para o indivíduo
nessa nova forma de se trabalhar. A autora considera que a institucionalização do trabalho na
organização integrada e flexível representa, em alguns pontos, um efetivo avanço em relação
à organização taylorista/fordista, pois rompe com algumas das condições alienantes
anteriormente estabelecidas. Esse avanço se refere, principalmente ao maior envolvimento e
autonomia do indivíduo com o seu trabalho, que “...realiza seu trabalho compreendendo a
relação entre causa e efeito...” (Souza, 2000, p. 91). Entretanto, a autora considera que o
avanço é tímido, na medida em que esta autonomia e envolvimento devem servir aos
objetivos da organização, não havendo a preocupação legítima com a satisfação da pessoa.
Além disso, o ‘culto à excelência’, ou a busca da melhoria contínua, institui um nível de
exigência e intensificação do trabalho que caracteriza o trabalhador como um instrumento de
trabalho. O apelo ao comprometimento com a excelência é, em última instância, um apelo ao
esforço máximo em benefício da organização.
Inúmeros outros autores sustentam que a gestão de muitas empresas continua com
ações que encorajam a identificação das pessoas com a organização (Legge, 1995; Wood,
2000, entre outros). A busca pelo comprometimento com os valores e objetivos da
organização favorece a intensificação do grau da identificação; a ênfase na unicidade e nos
atributos positivos – empresa preocupada com a comunidade, boa para os empregados,
clientes e acionistas, por exemplo – reforça a idéia de que será difícil para o indivíduo
encontrar outra igual; políticas de cunho personalistas que vão desde à criação de espaços de
lazer como clubes para a família, por exemplo, a empréstimos em dinheiro (para serem
descontados na folha de pagamento), acabam por trazer à relação do indivíduo com o
organização um caráter pessoal e emocional, que não se encaixa em um contrato transacional.
Nesse sentido, quanto mais preocupada com as pessoas e diferente das demais a empresa se
mostrar, mais difícil será para as pessoas se desligarem, caso seja preciso.
Vale ressaltar o papel desempenhado pela organização na distribuição das
recompensas. Os sistemas de recompensas implantados, que têm como ponto central a
remuneração do desempenho, apresentam algumas vantagens em relação aos sistemas
anteriores, que remuneravam de acordo com o cargo e a senioridade e que, traduzidos em
planos de carreira, podiam constituir instrumentos de manipulação da gestão. No entanto,
ainda que possam trazer maior responsabilidade à pessoa e, nesse sentido, incentivar a
reflexão e o desenvolvimento de inúmeras habilidades e competências, os novos sistemas são
aplicados a cada pessoa individualmente e trazem a possibilidade de se tomar decisões
baseadas em critérios subjetivos. A participação em projetos, por exemplo, pode se tornar
mais uma questão de amizade, lealdade e relações de apadrinhamentos, do que apenas uma
combinação de talentos necessários à consecução de um objetivo, conforme propõe Rousseau
(1998). Portanto, além de políticas de cunho particularistas que podem promover sensações de
que o vínculo estabelecido com a organização é de natureza pessoal, a distribuição de tarefas
e recompensas não-monetárias pode ficar sujeita a julgamentos também de ordem pessoal e
emocional. Esses dois elementos, como se observou anteriormente, levam à maior
identificação com a organização ou com os grupos formados dentro dela.
Quanto ao desenvolvimento das profissões nas organizações e, a possibilidade de
identificação com a profissão, o relato de Sennett (1998) ressalta uma dificuldade – a
definição das profissões. O autor conta que, ao visitar uma padaria, constatou que todas as
atividades relacionadas ao ‘fazer pão’ se resumiam a apertar botões diversos, que
determinavam a composição da massa, o tipo de pão a ser feito, o tempo de cozimento, e
assim por diante. As qualidades anteriormente necessárias ao exercício da profissão de
padeiro estavam ausentes nas pessoas que lá trabalhavam. Além disso, um dos empregados
relatou que se sentia habilitado para trabalhar em qualquer outro ofício, como fazer sapatos,
por exemplo, uma vez que também era somente uma questão de apertar botões. Esse relato
levanta alguns pontos que merecem ser considerados: no caso de inúmeros trabalhadores, será
que é possível se falar em profissão? e em identificação com a profissão ou com o trabalho? e
com o quê ou quem essas pessoas vão poder se identificar em relação ao seu trabalho?
Por fim, conforme observa Freitas (1999), as organizações vêm ocupando espaços
cada vez mais ampliados – saúde, educação, cultura, artes, lazer, etc – onde quase todas as
profissões estão sendo exercidas, em alguma medida, em organizações. Isso também contribui
para que a identificação com a profissão seja, ao menos, dividida com a organização. É
possível aos médicos, por exemplo que, além da dedicação à profissão, também se
considerem vinculados pessoalmente a um determinado hospital ou instituição; da mesma
forma, outros profissionais liberais como advogados, arquitetos, artistas, engenheiros, etc,
podem desenvolver vínculos fortes com organizações específicas. Ainda que a organização
não estimule o vínculo de longo prazo, pode ser vantajoso e gratificante para o indivíduo dizer
que tem uma relação com a instituição X. Nesse sentido, o indivíduo busca a identificação
com a organização, que pode funcionar, entre outras coisas, como um cartão de apresentação
para outros projetos.
Concluindo, é válido dizer que, ainda que um novo paradigma possa estar se
configurando para a gestão, a relação Homem-Trabalho continua sendo mediada pela
organização em alguns de seus aspectos essenciais, pois embora haja maior poder de escolha
por parte das pessoas quanto ao trabalho a ser desempenhado, as decisões sobre o resultado do
trabalho e a distribuição das recompensas são provenientes da organização. Diferentemente
do artesão, que negociava o preço a ser cobrado por sua obra com o seu cliente, o indivíduo
continua preso a determinações da organização. Muitas das identificações que fazem parte da
construção da identidade profissional são derivadas da organização e das políticas praticadas
que, se incentivam o comprometimento com a organização, tornam mais difíceis o
estabelecimento de relações transacionais.

Considerações finais
O processo de identificação se configura como um dos elementos centrais da relação
indivíduo-organização estabelecida pelo contrato do tipo transacional, que vem sendo buscado
para uma gestão mais ágil e flexível das organizações. No entanto, dizer que a identificação
deve ser transferida da organização para a profissão e para o trabalho simplifica uma questão
que envolve o indivíduo, as escolhas que ele faz em relação ao seu trabalho e os processos
que ocorrem na interação entre o indivíduo e os grupos com os quais trabalha. Essa
simplificação pode levar à implementação de políticas que conduzem a resultados não
desejados.
Após a discussão apresentada, pode-se tentar responder à questão colocada no início
do trabalho – “é possível a não-identificação com a organização?”. A princípio, a resposta
parece ser sim, é possível a identificação com uma profissão, como é o caso de um artista, por
exemplo, e como pode ser o caso de um consultor autônomo. No entanto, as condições
oferecidas pela organização capitalista para o exercício do trabalho tornam mais complexos os
processos de identificação que podem ocorrer com as pessoas. Conforme observado, o
trabalho realizado nas organizações nem sempre configura o exercício de um ofício ou uma
profissão, definida de acordo com o modo de produção artesanal, onde o indivíduo não apenas
concebe e executa a obra, mas também negocia o pagamento, aprende e desenvolve a sua
técnica e tem o seu trabalho integrado a um plano de vida. Ademais, contrariando as
proposições de autores como Defillipi e Arthur (1994) e Rousseau (1998) de que as políticas
deveriam ser aplicadas de maneira diferenciada para os diversos tipos de trabalhadores –
empregados, contratados, autônomos, do núcleo ou periferia, e assim por diante – o discurso e
as ações da gestão podem atuar de maneira a exigir das pessoas – mesmo aquelas que não têm
vínculo de emprego ou que não pertencem ao núcleo, por exemplo – um maior grau de
identificação com a organização – a identificação profunda. Por fim, é preciso considerar que,
ainda que possa haver uma identificação com a profissão, outros fatores podem levar à maior
identificação com a organização, como o tempo de trabalho dedicado à organização ou as
vantagens auferidas de se ter o nome ligado à determinadas instituições. Esse era o caso de
muitos artesãos, por exemplo, onde a fama da qualidade dos produtos de uma oficina
estendia-se ao mestre, seus oficiais e aprendizes, o que lhes trazia mais negócios e os
tornavam mais procurados pelos clientes com maior poder aquisitivo, como os reis e a Igreja
(Pahl, 1989). Portanto, trabalhar para a empresa X ou Y pode significar muito mais do que a
obtenção de uma remuneração adequada.
Concluindo, a exploração da relação Homem-Trabalho e dos processos de
identificação que ocorrem na vida profissional do indivíduo desenvolvida no contexto
organizacional questiona a validade da possibilidade do estabelecimento de relações
transacionais entre indivíduo e organização e sugere diversos temas que demandam esforços
de pesquisa. Entre eles pode-se ressaltar, em primeiro lugar, a validade – em termos de
contribuição para os resultados – e a possibilidade de aplicação da classificação das pessoas
em empregados e não-empregados, do núcleo ou periferia. O grau de identificação com
valores e objetivos, ou o comprometimento que, conforme mostra Bastos (1996) é um tema
bastante complexo e que está longe de estar esgotado, e a sua relação com o desempenho e os
resultados para a organização. Por fim, mostra a necessidade de não apenas implementar
políticas, mas se aprofundar a pesquisa sobre os resultados que as diversas políticas e práticas
possam ter na relação do indivíduo com o seu trabalho e com a organização.

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