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O QUE É PROGRAMAR
UMA CINEMATECA HOJE?
Não foi só por provocação, nem por vontade de lançar a confusão, que neste mês em que (nos) resolvemos perguntar “o que é
programar uma cinemateca hoje?” acabámos por chegar a um programa que voluntariamente elide todas ou quase todas as
regras que costumam orientar a estrutura da programação desta Cinemateca e, por certo, da maioria das outras cinematecas do
mundo inteiro. Em vez dos habituais Ciclos e rubricas organizados em torno de um eixo definido – autoral, temático, geográfico,
etc. – apenas um grande Ciclo que se funde com a pergunta do título, um Ciclo “em interrogação” que põe em destaque – em
causa? – o próprio acto de programar, e de programar uma cinemateca.
Muitas perguntas se albergam neste Ciclo, e também, embora isso não seja necessariamente o mais importante – como se diz
noutro ponto deste programa, o Ciclo “é uma forma de perguntar” – algumas respostas e algumas afirmações. Ao suspender os
critérios habituais, a equipa de programação da Cinemateca – que tem nomes, para além do do seu responsável, Luís Miguel
Oliveira: chamam-se Antonio Rodrigues, Joana Ascensão, João Pedro Bénard, Maria João Madeira e Rita Azevedo Gomes – ficou
face a face com o desafio de enfrentar um “puro” exercício de programação. Nenhuma regra pré-estabelecida, a não ser as
definidas pelas escolhas de cada elemento, de modo a chegar a um programa que, exprimindo várias visões do que pode ser uma
programação de cinemateca, as articula de modo a chegar ao desenho de uma só grande ideia de programação de cinemateca.
Houve ajustes diversos (também por constrangimentos práticos: programar uma cinemateca, hoje como sempre, é lidar com eles)
e na arrumação final procurou-se algum equilíbrio na programação dia a dia. Mas, do princípio ao fim do Ciclo, podemos seguir
essa ideia, nas suas curvas e modulações, nos seus choques e harmonias, nos seus “fade ins” e nos seus “fade outs”. Inútil
dizerem-nos que falta isto ou aquilo; houve ajustes e equilíbrios imprescindíveis (uma relação com a colecção, uma atenção ao
cinema português) mas o jogo não presumia uma preocupação obsessiva com qualquer tipo de “representatividade”: programar
uma cinemateca hoje continua a ser lidar com a alegria de, faça-se o que se fizer, ficarem sempre coisas por ver e por mostrar.
De uma coisa temos a certeza. Enquanto exercício de programação, este Ciclo afirma algo que, mais do que estar subjacente,
precede todas as normas e todas as regras tradicionais de organização de um programa de cinemateca: é um Ciclo de e sobre
o prazer, o prazer de ver filmes e de os dar a ver, o prazer de descobrir e de dar a descobrir. O programador é, em primeiro
lugar, um espectador. Tanto quanto se dirige, sempre, ao espectador. Gostávamos que os espectadores da Cinemateca se
aventurassem – “aventura”: palavra-chave da cinefilia e do prazer cinéfilo – pelo programa deste mês, tão despido de referências
que lhes guiem o caminho, gozando a liberdade de o explorar nos seus recantos mais conhecidos ou mais obscuros, como se
ficasse para eles, espectadores, a possibilidade de construírem o seu próprio Ciclo. E então, enfim, partilhassem connosco esta
interrogação: o que é programar uma cinemateca hoje?
Em 1964, para o centenário do nascimento de Louis Lumière, Henri Langlois, fundador da Cinemateca Francesa e o mais
importante programador de filmes de toda a história do cinema, organizou uma montagem de filmes feitos pelos irmãos Lumière
e pelos seus operadores, que foi mostrada no Festival de Cannes. Ver 100 minutos consecutivos destes pequenos filmes, que são
o núcleo de toda a história do cinema, é uma experiência vertiginosa. Do primeiro filme exibido na primeira sessão pública de
cinema ao primeiro travelling, das vistas de diversas cidades do mundo às pequenas ficções, temos a demonstração indiscutível
de que os filmes dos Lumière nada tinham de primitivos e que ainda são os mais belos de sempre, porque é neles que começou
a palpitar o cinema. Os Lumière criaram o espectáculo cinematográfico e Henri Langlois ensinou a ver cinema. Reuni-los na
mesma sessão é ir ao princípio de tudo o que diz respeito ao cinema.
METROPOLIS
Metrópolis
de Fritz Lang
com Alfred Abel, Brigitte Helm, Rudolf Klein-Rogge, Gustav Fröhlich, Fritz Rasp
Alemanha, 1927 - 145 min / mudo, com intertítulos em alemão traduzidos electronicamente em português
Dos filmes mais célebres de sempre, METROPOLIS é uma parábola sobre as relações sociais numa cidade do futuro. Os
privilegiados vivem nas alturas, enquanto a massa de trabalhadores oprimidos vive nos subterrâneos, trazendo o desenlace
uma reconciliação artificial entre as classes. O que faz de METROPOLIS uma obra-prima é a realização de Fritz Lang, os
impressionantes e excepcionais cenários futuristas, o domínio absoluto das massas de figurantes, a oposição entre homens
e máquinas. É uma obra de múltiplos restauros, conhecida pela mutilação a que foi submetida logo depois da sua estreia em
Berlim em Janeiro de 1927. A apresentar na versão do último restauro, de 2010, com mais 25 minutos de duração (a partir da
descoberta, na cinemateca da Argentina, de uma cópia 16mm conforme à versão original de Lang), e pode permitir uma nova
visão da obra, segundo o historiador e arquivista Martin Koerber, responsável pelos restauros de 2001 e de 2010: “Deixou de
ser um filme de ficção científica. O equilíbrio da história foi reposto. Trata-se agora de um filme que abarca muitos géneros; um
épico sobre conflitos antigos. A máscara da ficção científica é agora muito, muito ténue.”
LIEBELEI
“Namorico”
de Max Ophuls
com Magda Schneider, Wolfgang Liebeneiner, Louise Ullirch, Willi Eichberger
Alemanha, 1932 - 85 min / legendado em francês e electronicamente em português
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Último filme realizado por Ophuls na Alemanha antes do nazismo e uma das suas obras-primas absolutas. Adaptada de uma
peça homónima de Schnitzler, esta dilacerante história de amores contrariados pelo destino é situada nos finais do século XIX,
na Viena do imperador Francisco José. Tratando-se de Viena, as alusões à música são muitas. A acção começa durante uma
récita de O Rapto do Serralho, a protagonista é cantora e o “tema do destino” da Quinta Sinfonia de Beethoven acompanha o
trágico desenlace. Toda a arte de um dos maiores realizadores de sempre está neste filme.
LIMITE
de Mário Peixoto
com Raul Schnoor, Olga Breno, Brutus Pedreira, Taciana Rey, Mário Peixoto
Brasil, 1929-31 - 110 min / mudo, sem legendas
Única obra realizada por um homem de cerca de 20 anos, LIMITE tornou-se durante muito tempo um filme mítico, porque o seu
autor proibiu a sua difusão, enquanto os seus admiradores proclamavam que era uma obra genial. Restaurado nos anos 80,
LIMITE revelou-se, de facto, um filme magnífico, uma peça de arte feita por alguém que visivelmente conhecia o melhor cinema
francês, alemão e soviético. A trama narrativa tem algo de abstracto, o que é acentuado pelo facto do filme só ter um intertítulo:
dois homens e duas mulheres num pequeno barco, lembram-se do passado numa série de flashbacks. Estão limitados no
ilimitado universo. Magnificamente filmado e montado.
LE JOUR SE LÈVE
Foi uma Mulher que o Perdeu
de Marcel Carné
com Jean Gabin, Jules Berry, Arletty
França, 1939 - 93 min / legendado electronicamente em português
Esta obra amarga e desesperada marca o apogeu do chamado “realismo poético” francês. Carné lembrou-se nitidamente do
cinema alemão mudo e de Sternberg, para criar a atmosfera do filme, com extraordinários cenários de Alexandre Trauner e
uma fotografia cheia de sombras e contrastes, num filme cuja acção se passa quase sempre à noite. Encurralado no seu quarto
pela polícia, Jean Gabin, um honesto operário que matou um patife, revive a sua história, numa série de flashbacks. Quando o
despertador toca de manhã à hora habitual, não marca o começo de um novo dia de trabalho, marca a hora da sua morte. Um
dos grandes desempenhos deste actor “minimalista”, que explodia em bruscos acessos de cólera ou de revolta.
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AGOSTO
de Jorge Silva Melo
com Christian Patey, Olivier Cruveiller, Marie Carré, Manuela de Freitas, Pedro Hestnes, Glicínia Quartin, Isabel Ruth
Portugal, 1988 - 95 min
Jorge Silva Melo adaptou muito livremente para a paisagem portuguesa o romance de Cesare Pavese La Spiaggia. A paisagem
física é a Arrábida e a praia, banhadas pela luz deslumbrante e dourada do Verão dela. A paisagem humana é formada pelas
pessoas singulares que aí habitam, vivendo um vazio “antonioniano” que Jorge Silva Melo transpôs para o cinema português.
SCHASTYE
“A Felicidade”
de Alexandr Medvedkin
com Petr Zinoiev, Elena Egorova
URSS, 1934 - 70 min / mudo, intertítulos em russo traduzidos em françês
Alexandr Medvedkine é sem a menor dúvida um dos mais originais realizadores da primeira geração soviética e só foi plenamente
reconhecido nos anos 70. Medvedkine nasceu para o cinema com as curtas-metragens de “intervenção imediata” que fizera
no cine-comboio no qual realizou seis viagens pela URSS em 1932 e 1933, das quais resultaram dezenas de breves filmes.
SCHASTYE, o mais conhecido dos seus filmes, é a história de um camponês que julga ter alcançado a felicidade, quando
encontra um saco cheio de dinheiro, acabando por verificar que só a encontra no trabalho colectivo, dentro do kolkhoze a que
pertence. Ao vê-lo, Sergei Eisenstein observou: “Hoje, vi como ri o bolchevique. Não temos apenas uma obra magnífica. Temos
um autor extraordinário. Temos uma personalidade autêntica, original, madura”.
ZE SOBOTY NA NEDELI
“De Sábado para Domingo”
de Gustav Machaty
com Ladislav Struna, Magda Maderova, Jirina Sejbalova
Checoslováquia, 1931 - 69 min / legendado electronicamente em português
O checo Gustav Machaty (1901-1963) é conhecido sobretudo por EKSTASE, o escandaloso filme com os nus de Hedy Lamarr, que
fez em 1933. Quase toda a sua restante obra vive na sombra desse filme. Foi o que aconteceu, durante anos, a ZE SOBOTY NA
NEDELI, o primeiro filme sonoro de Machaty, realizado dois anos antes de EKSTASE. Quando saiu da sombra, foi o êxtase: trata-
se de um filme maravilhoso, história de “pequenos amores” na velha Praga, num registo realista temperado por um imaginário
surrealista, que nos faz pensar tanto em Bresson como nos mestres do melodrama clássico. É uma raridade e continuará a
sê-lo: mais uma razão para não perder a oportunidade de o ver.
SENSO
Sentimento
de Luchino Visconti
com Alida Valli, Farley Granger, Massimo Girotti, Rina Morelli
Itália, 1954 - 115 min / legendado electronicamente em português
Uma das obras-primas máximas de Luchino Visconti, e provavelmente o mais operático entre todos os seus filmes (a famosa
cena de abertura tem lugar durante uma récita do Trovador, no La Fenice de Veneza). Durante as lutas políticas na Itália, em
meados do século XIX, a louca paixão de uma condessa veneziana por um tenente austríaco, paixão que a levará a trair, em
vão, a causa do seu país. Na pele da Condessa Livia Serpieri, Alida Valli no seu mais célebre papel.
EROTIKON
Sedução
de Gustav Machaty
com Olaf Fjord, Ita Rina, Karel Schleichert
Checoslováquia, 1929 - 85 min / mudo, intertítulos em checo traduzidos em inglês
Realizado quatro anos antes do célebre EKSTASE, do mesmo Machaty, EROTIKON foi um dos primeiros filmes não pornográficos
a mostrar a nudez feminina integral. Trata-se de uma jóia do cinema mudo que, como indica o título, tem no prazer físico o seu
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tema central, inclusive o prazer feminino (os grandes planos do rosto da actriz chocaram à época). Sobre a trama convencional
de sedução e abandono de uma jovem, Machaty fez uma narrativa poética, que resultou num belíssimo momento de cinema.
A descobrir.
BONJOUR TRISTESSE
Bom Dia Tristeza
de Otto Preminger
com Deborah Kerr, David Niven, Jean Seberg, Mylene Demongeot
Estados Unidos, 1958 - 94 min / legendado electronicamente em português
Depois de ter contribuído para a desmontagem do modelo clássico de Hollywood, Preminger não deixou de procurar novos e
alternativos caminhos. BONJOUR TRISTESSE, adaptação do livro homónimo de Françoise Sagan, é um bom exemplo disso, com
uma estrutura e estilo que parecem resultar (ou resultam mesmo) de um encontro feliz entre uma sensibilidade americana e uma
sensibilidade europeia. Um filme ímpar, centrado num complexo trio de personagens (Kerr, Niven, Seberg).
FILM
de Samuel Beckett, Alan Schneider
com Buster Keaton
Estados Unidos, 1965 - 20 min / mudo
CÉZANNE
de Jean-Marie Straub, Danièle Huillet
França, 1989 - 50 min / legendado electronicamente em português
CÉZANNE é um dos filmes mais intensamente belos realizados por Straub e Huillet. Sobre alguns quadros de Cézanne, sempre
filmados na totalidade da sua superfície, com a moldura, numa parede, ouvimos em off a leitura de trechos dos diálogos
de Cézanne e Joachim Gasquet, intercalados com cenas de MADAME BOVARY, de Renoir, e de DAS TOD DES EMPEDOKLES,
dos próprios Straub-Huillet. Quinze anos depois os cineastas seguirão um princípio semelhante para filmar UNE VISITE AU
LOUVRE.
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PUTYOVKA V ZHIZN
“O Caminho da Vida”
de Nikolai Ekk
com Nikolai Batalov, Ivan Kyria, Mikhail Dzagofarov, Mikhail Zharov
URSS, 1931 - 75 min / legendado em francês
“O homem de um só filme, mas que filme!”, escreveu um crítico a propósito de Nikolai Ekk. O crítico fazia alusão a “O CAMINHO DA
VIDA”, primeiro filme sonoro realizado na União Soviética e cuja linguagem ainda tem laços com a do cinema mudo. Realizado pouco
antes da glaciação estalinista, “O CAMINHO DA VIDA” conta a história de um grupo de jovens delinquentes, órfãos de guerra, levados
para um campo de trabalho que não usa métodos repressivos e onde vão aprender “o caminho da vida”, embora o desenlace não
seja totalmente feliz. Um clássico do cinema soviético, que também é um filme comovente e magnificamente realizado.
LE MÉPRIS
O Desprezo
de Jean-Luc Godard
com Brigitte Bardot, Michel Piccoli, Jack Palance, Fritz Lang
França/Itália, 1963 - 103 min / legendado em português
Vagamente inspirado no romance de Moravia, LE MÉPRIS constrói-se em torno de uma reflexão sobre o cinema, onde «um
travelling é uma questão de moral». É também uma homenagem ao cinema clássico, com a presença de Fritz Lang no papel
de um artista imperturbavelmente resistente ao comercialismo reinante no mundo cinematográfico. Godard tem uma aparição
discreta como assistente de realização de Lang na produção desse filme que parte de Homero e que se desenvolve num décor
mediterrânico, traçando um paralelo entre o mundo dos deuses e o mundo dos homens.
MÉDITERRANÉE
de Jean-Daniel Pollet
França, 1963 - 41 min / legendado electronicamente em português
VESNOY
«Na Primavera»
de Mikhail Kaufman
URSS, 1929 - 54 min / mudo, intertítulos em russo traduzidos em português
VESNOI é um documentário dirigido pelo irmão de Dziga Vertov, Mikhail Kaufman, que com ele colaborou à câmara no HOMEM
DA CÂMARA DE FILMAR. Marcado pelas grandes inovações formais dentro do género «sinfonias de cidades», que, diz-se, teria
influenciado Walter Ruttmann e a sua SINFONIA DE UMA CAPITAL, VESNOI é um retrato dos rigores do Inverno e um tributo
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ao espírito da Primavera. Joris Ivens descreveu Kaufman como alguém que combina “a acidez rigorosa de Dziga Vertov com a
abordagem humanista de Cavalcanti.”
LE FANTÔME DE LA LIBERTÉ
O Fantasma da Liberdade
de Luis Buñuel
com Jean-Claude Brialy, Monica Vitti, Milena Vukotic, Michel Piccoli, Adriana Asti, Adolfo Celi, Paul Frankeur, Michel Londsdale
França, 1974 - 103 min / legendado electronicamente em português
Penúltimo filme de Buñuel, LE FANTÔME DE LA LIBERTÉ faz – tão admirável quanto subtilmente – uma síntese de toda a carreira
deste cineasta único e ímpar. Paradoxalmente foi, e provavelmente ainda é, um dos filmes menos amados de Buñuel. Não passa
na Cinemateca desde 1982.
WELFARE
de Frederick Wiseman
Estados Unidos, 1975 - 167 min / legendado electronicamente em português
WELFARE revela a natureza e a complexidade do sistema social norte-americano através de um conjunto de sequências que
ilustram a diversidade de problemas que dele fazem parte: desemprego, divórcio, questões médicas e de alojamento, abandono
infantil, apoio aos idosos, etc. Wiseman traça o retrato de um centro de assistência social, mostrando como os trabalhadores
do sistema e os seus utentes enfrentam uma luta diária para se enquadrar nas leis governamentais que os regem. Um olhar
acutilante sobre uma instituição americana, que é um dos mais importantes filmes de Wiseman deste período.
ARMIDE
de Jean-Luc Godard
com Marion Peterson, Valérie Allain, Jacques Neuville, Luke Corre
Reino Unido, 1987 - 12 min / sem legendas
GOSHOGAOKA
de Sharon Lockhart
Japão, Estados Unidos, 1997 - 63 min / sem legendas
Uma das mais audaciosas curtas-metragens de Godard concebida para integrar ARIA, filme formado por vários sketches.
Partindo de excertos de Armide, ópera composta por Jean-Bapiste Lully, Godard concentra-se na actividade de um ginásio,
aliando-a a um movimento de sedução. Duas mulheres que zelam pela limpeza do espaço apresentam-se despidas face
aos homens que aí se exercitam, procurando atrai-los sem qualquer sucesso. Simples e inspirado, ARMIDE é um importante
retrato da vida moderna. GOSHOGAOKA é um dos primeiros filmes de Sharon Lockhart, artista plástica e cineasta que trabalha
aqui a confluência entre uma atitude documental e a ficção. GOSHOGAOKA acompanha os treinos de uma equipa de basquete
japonesa, composta por raparigas de um liceu situado nos arredores de Tóquio. Uma sucessão de “quadros”, mais ou menos
coreografados, revelam as suas rotinas, enfatizando os movimentos e a composição. O filme de Lockhart é uma primeira exibição
na Cinemateca.
THE RIVER
O Rio Sagrado
de Jean Renoir
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com Adrienne Corri, Patricia Walter, Nora Swinburne, Radha Shri Ran, Esmond Knight, Thomas E. Breen
França, Índia, Estados Unidos, 1951 - 99 min / legendado electronicamente em português
THE RIVER marca o início da fase final da carreira de Renoir. Filmado na Índia, a cores, o filme conta a história de uma
família inglesa e a “acção” resume-se ao facto de nascer, morrer e amar pela primeira vez. O rio do título é ao mesmo tempo
físico (o Ganges) e metafísico (a vida, o tempo). Um dos filmes mais celebrados de Renoir, imbuído de uma espiritualidade
assombrosamente serena. A projecção de THE RIVER será antecedida e sucedida de uma apresentação filmada de e com João
Bénard da Costa, da série “No Meu Cinema”, realizada por Margarida Gil.
DONOVAN’S REEF
A Taberna do Irlandês
de John Ford
com John Wayne, Lee Marvin, Elizabeth Allen, Cesar Romero, Dorothy Lamour
Estados Unidos, 1964 - 108 min / legendado em espanhol
Um conto de fadas com o paraíso por cenário e uma bebedeira de amigos por moral. Uma jovem puritana, da aristocracia de
Boston, parte para os mares do Sul em busca do pai. A viagem vai mudar toda a sua vida. Um filme da fase final da obra de
Ford, a serenidade do olhar e o amor à vida no seu ocaso, o humor esfuziante dos combates entre John Wayne e Lee Marvin e
o mais surpreendente Natal que o cinema mostrou. Em filigrana, uma variante sobre A Tempestade de Shakespeare.
LA RÈGLE DU JEU
A Regra do Jogo
de Jean Renoir
com Marcel Dalio, Nora Grégor, Roland Toutain, Julien Carette, Gaston Modot, Mila Parély, Jean Renoir
França, 1939 - 110 min / legendado em português
O mais lendário filme de Jean Renoir. Sem personagem principal, com nada menos do que oito protagonistas, “sem história”,
implacável e demencial, objecto de tanta ira como de admiração, LA RÈGLE DU JEU é, para muitos, a obra máxima de Renoir,
mostrando-nos uma coreografia em que a câmara acompanha as fugas e jogos de amor das personagens, numa mansão
senhorial. Enquanto dançam sobre o vulcão, a Europa e o mundo caminham para a guerra.
TRÖLLFLÖJTEN
A Flauta Mágica
de Ingmar Bergman
com Josef Köstlinger, Håkan Hagegard, Irma Urrila, Birgid Nordin, Ulric Cold
Suécia, 1974 - 134 min / legendado em português
Ao filmar a ópera de Mozart (cantada em sueco e não no alemão original), Bergman decidiu filmar não a ópera, mas uma
representação desta ópera. Ou seja, estamos num teatro, com os seus bastidores, o seu público e o seu palco, a léguas da
opção que fizeram quase todos os cineastas que filmaram óperas, que consiste em transpor a acção para cenários naturais e
“cinematográficos”. À fidelidade ao compositor acrescenta-se a modernidade do conceito do realizador. Bergman, como Mozart,
conseguiu o milagre da mais aparente simplicidade com o máximo de construção e elaboração.
SOMMARNATTENS LEENDE
Sorrisos de uma Noite de Verão
de Ingmar Bergman
com Ulla Jacobson, Gunnar Björnstrand, Eva Dahlbeck, Harriet Andersson
Suécia, 1955 - 105 min / legendado em espanhol
SOMMARNATTENS LEENDE foi o primeiro grande sucesso internacional de Bergman, o filme que, definitivamente, o impôs como
um dos grandes nomes do cinema. Adaptação muito livre de Sonho de Uma Noite de Verão, de Shakespeare, SOMMARNATTENS
LEENDE é, sob o registo de comédia, um verdadeiro tratado sobre a condição humana.
WAQT
Tempo
de Yash Chopra
com Sunil Dutt, Sadhana Shivdasani, Shashi Kapoor
Índia, 1965 - 178 min / legendado em inglês
WAQT é a terceira longa-metragem do cineasta indiano Yash Chopra que, apesar de ser altamente cotado no seu país, ainda é
pouco conhecido e visto na Europa. A história segue os membros de uma família que se viram forçados a separar-se devido a
uma catástrofe natural; anos depois, sem nunca se reencontrarem, estranhamente, as suas vidas interligam-se. “Waqt” quer
dizer tempo. E foi isso que Yash Chopra filmou. Não é fácil nem óbvio.
AFTER MIDNIGHT
Depois da Meia-Noite
de Monta Bell
com Norma Shearer, Lawrence Gray, Gwenn Lee, Eddie Sturgis
Estados Unidos, 1927 - 70 min / mudo, com intertítulos em inglês traduzidos em português
O grande e hoje pouco conhecido Monta Bell filma aqui a história de uma rapariga de cabaret que se apaixona por um ladrão a
quem convence a regenerar-se pelo trabalho… até que a chegada de uma irmã perturba a vida de todos e o drama se consuma.
O cartaz original apregoa “While New York sleeps!”, de acordo com o fulcro narrativo do filme que põe na ribalta a noite nova-
iorquina dos anos 1920.
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DOV’È LA LIBERTÀ
Onde Está a Liberdade?
de Roberto Rossellini
com Totò, Vera Molnar, Nyta Dover, Mario Castellani, Franca Faldini, Giacomo Rondinella, Leopoldo Trieste, Vincenzo Talarico
Itália, 1952-1954 - 91 min / legendada electronicamente em português
A seguir ao negrume e gravidade de EUROPA 51, Rossellini ofereceu a Totò uma fábula que ficou como um dos maiores papéis
cinematográficos do grande cómico italiano. Totò é Salvatore, um pobre diabo, que, após cumprir uma pena de prisão, procura
adaptar-se à vida em liberdade, sempre encontrando pela frente preconceitos e regras que o frustram, o que o leva a tomar
consciência de que só na cadeia encontrará a liberdade.
EL ANGEL EXTERMINADOR
O Anjo Exterminador
de Luis Buñuel
com Claudio Brook, Enrique Rambal, Jacqueline Andere, Silvia Pinal
México, 1962 - 95 min / legendado em português
“A melhor explicação para EL ÁNGEL EXTERMINADOR é que, racionalmente, não tem nenhuma”. Assim “explica” Luis Buñuel a
sua obra-prima e o penúltimo filme que dirigiu no México, fábula feroz sobre a burguesia presa dos seus conceitos, preconceitos
e ideias feitas, onde um grupo de pessoas é misteriosamente impedido de sair de uma festa.
BRIEF ECSTASY
O Passado Não Morre
de Edmond T. Greville
com Hugh Williams, Linden Travers, Paul Lukas
Grã-Bretanha, 1937 - 87 min / legendado electronicamente em português
O encontro de uma mulher casada com o antigo amante faz renascer a velha paixão. O tema é semelhante ao de um outro
filme, mais famoso e sobrevalorizado, que David Lean fez oito anos depois, BRIEF ENCOUNTER. Mas o de Greville é um
prodígio de mise-en-scène. Um filme esquecido, recentemente redescoberto com entusiasmo por os ainda relativamente
poucos que o viram.
VALE ABRAÃO
de Manoel de Oliveira
com Leonor Silveira, Luís Miguel Cintra, Isabel Ruth
Portugal, 1993 - 203 min
A versão integral de um dos mais célebres filmes de Manoel de Oliveira, inspirado na Madame Bovary de Flaubert, tal como
foi recriada por Agustina Bessa-Luís no romance homónimo. VALE ABRAÃO é um filme “sensualista”, dominado pelas cores, os
perfumes, as atmosferas, e pela presença majestosa do rio Douro. Seguindo-se a OS CANIBAIS, NON OU VÃ GLÓRIA DE MANDAR
e A DIVINA COMÉDIA, a personagem de Ema, absolutamente central em VALE ABRAÃO, foi a quarta das múltiplas participações
de Leonor Silveira em filmes de Oliveira.
HÄXAN O HÄXAN
“A Feitiçaria Através dos Tempos”
de Benjamin Christensen
com Benjamin Christensen, Emmy Schönfeld, Alice Fredericksen
Suécia, 1921 - 106 min / mudo, intertítulos em sueco traduzidos electronicamente em português
Depois de realizar melodramas e filmes policiais no seu país natal, o dinamarquês Benjamin Christensen realizou na Suécia
este filme que garantiu a perenidade do seu nome na História do Cinema. Ilustrando diversos casos de feitiçaria (uma mulher
frustrada que tem relações sexuais com o demónio, uma velha acusada de feitiçaria) e inspirando-se nos mestres da pintura
alemã e flamenga do século XVI, Christensen assinou uma extraordinária obra-prima, que também pode ser vista como um
requisitório contra o puritanismo e a intolerância. Um dos pontos altos do cinema mudo.
UNDER CAPRICORN
Sob o Signo de Capricórnio
de Alfred Hitchcock
com Ingrid Bergman, Joseph Cotten, Michael Wilding, Margaret Leighton, Cecil Parker
Estados Unidos, 1949 - 115 min / legendado em português
Um dos filmes mais discutidos de Hitchcock, que nele leva a cabo outra experiência notável no uso do plano-sequência (depois
de ROPE), e que aqui tem uma genial aplicação na sequência da confissão de Ingrid Bergman, num grande plano que dura
quase dez minutos. Tendo por cenário a Austrália do século XIX, que era também um local de degredo para condenados pela
lei, UNDER CAPRICORN é uma admirável história de amor, de culpa e de redenção, fotografada com mão de mestre por Jack
Cardiff.
L’AVVENTURA
A Aventura
de Michelangelo Antonioni
com Lea Massari, Monica Vitti, Gabriele Ferzetti
Itália, 1960 - 136 min / legendado electronicamente em português
“Itinerário sentimental de um par” (nas palavras do realizador), L’AVVENTURA é o primeiro filme da famosa trilogia antonioniana
sobre a alienação. Uma mulher desaparece durante um cruzeiro no Mediterrâneo. O namorado e uma amiga tentam encontrá-la
e acabam por tornar- -se amantes. Um dos mais belos filmes de Antonioni.
EL
de Luis Buñuel
com Arturo de Córdova, Delia Garcés, Luís Beristain
México, 1951 - 90 min / legendado electronicamente em português
Um dos grandes filmes de Buñuel e um dos mais perversos, cheio de símbolos e fetiches que materializam as fixações e
a paranóia do protagonista. Buñuel foi buscar um dos grandes símbolos do macho nos melodramas mexicanos, Arturo de
Córdova, transformando-o num impotente, paranoicamente ciumento, e contrapondo-o à elegante actriz argentina Delia Garcés.
Como sempre em Buñuel, o filme é repleto de humor. Uma obra-prima indiscutível, que Jacques Lacan mostrou durante vários
anos aos seus alunos, como ilustração da paranóia.
ORDET
A Palavra
de Carl Th. Dreyer
com Henrik Maalberg, Emil Haas, Prebben Lendorf Rye
Dinamarca, 1955 - 120 min / legendado em inglês
ORDET é, talvez, a obra cinematográfica que melhor põe em cena a questão da fé, construída inteiramente à volta da interrogação:
A palavra (Ordet) pode chegar até Deus e Este responder--lhe? O crente, como Dreyer, diz que sim e ORDET (o filme) é a sua
expressão. Sobre este filme, José Régio escreveu que era “uma apologia da fé levada ao extremo limite.”
BITTER VICTORY
Cruel Vitória
de Nicholas Ray
com Richard Burton, Curd Jurgens, Ruth Roman, Raymond Péllegrin
Estados Unidos, França, 1957 - 102 min / legendado em português
Uma das obras mais admiradas de Nicholas Ray, apesar de ter sido manipulada pelos produtores, à revelia do realizador.
Richard Burton tem um dos melhores papéis da sua carreira na figura de um oficial que salva uma missão prejudicada pela
cobardia do superior (Curd Jurgens) obcecado pela relação que o subalterno tivera com a sua mulher. A juntar a Burton e
a Jurgens, o deserto, filmado em scope, ganha o estatuto de protagonista ao acolher a inesquecível e belíssima sequência
final. O deserto e o vento, o vento e o deserto. O filme que fez Godard, numa célebre critica nos Cahiers, dizer: “E o cinema
é Nicholas Ray.”
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SOMMARLEK
Um Verão de Amor
de Ingmar Bergman
com Maj-Brit Nilsson, Alf Kjellin, Birger Malmsten
Suécia, 1951 - 95 min / legendado em português
“SOMMARLEK é o mais belo dos filmes”, escreveu Jean-Luc Godard quando o filme se estre- ou. Talvez seja mesmo. Baseado
num romance que escreveu quando era muito novo, Bergman visita o tempo dos morangos silvestres e do amor absoluto.
Sabendo que tudo isso acabou e que nada volta mais. E os amores que regressam nunca são iguais aos amores que foram.
Mas a única fidelidade à morte é a vida.
FAISONS UN RÊVE
de Sacha Guitry
com Sacha Guitry, Jacqueline Delubac, André Guize, Raimu, Michel Simon, Arletty
França, 1936 - 76 min / legendado electronicamente em português
Adaptado de uma das primeiras peças de Sacha Guitry, FAISONS UN RÊVE segue a história de um amante que propõe casamento
à mulher junto de quem adormeceu no momento em que o infiel marido dela chega, também ele atrasado por uma noite de
infidelidade conjugal, para ouvir do amante da mulher o conselho de partir em viagem e lhe telegrafar com a justificação desse
álibi. A comédia de Guitry guarda a marca teatral de origem trabalhando-a na mais absoluta liberdade cinematográfica que é
prova da originalidade e do génio do realizador, tão prolífero nesses anos 1930.
PARSIFAL
de Hans-Jürgen Syberberg
com Armin Jordan, Martin Sperr, Robert Lloyd, Michael Kutter, Karin Krick
Alemanha, França, 1982 - 255 min / legendado em francês
Adaptação integral da última e mais hermética das obras de Wagner, este PARSIFAL designado por Syberberg como um “filme-
ensaio” é um ponto maior da fusão das linguagens operática e cinematográfica. A máscara mortuária do compositor preside à
recriação da ópera e o papel de Parsifal é confiado a dois actores, com a surpresa de um ser homem e outro mulher, dobrada
pela mesma voz (a do tenor Rainer Goldberg).
ROPE
A Corda
de Alfred Hitchcock
com James Stewart, John Dall, Farley Granger, Cedric Hardwicke, Joan Chandler
Estados Unidos, 1948 - 78 min / legendado em português
O único exercício de virtuosismo “declarado” na carreira de Hitchcock fica assinalado na história do cinema como o filme de um
só plano. Um longuíssimo plano-sequência que completa, em forma perfeita, a história de um crime perfeito. Muita da tensão de
ROPE nasce da construção de uma unidade espácio-temporal como sintoma de perfeição: um espaço “uno”, mas na realidade
com dez imperceptíveis cortes; um tempo “contínuo”, mas no qual duas horas não são mais que oitenta minutos. Mas o que é a
perfeição, e já agora o cinema, senão a eficaz manipulação das ilusões?
TA’M E GUILASS
O Sabor da Cereja
de Abbas Kiarostami
com Homayun Ershadi, Adbol Hosein, Baghen, Safar Ali Moradi, Mir Hosein Noori
Irão, 1997 - 99 min / legendado em português
Um carro branco atravessa uma paisagem de colinas empoeirada. Guia-o um homem de 50 anos, o senhor Badii, que se decidiu
suicidar e anda à procura de alguém disponível para encher de terra o túmulo que ele próprio escavou, ou a levá-lo para casa,
se mudar de ideias. A ideia do filme surgiu da leitura de um aforismo de Cioran: “Se não existisse a possibilidade do suicídio, já
me teria morto há muito tempo.” É o filme que Kiarostami fechou com um prólogo que assume a diferença também na espessura
da imagem.
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SAMMA NO AJI
O Gosto do Saké
de Yasujiro Ozu
com Shima Iwashita, Shinichiro Ikami, Chishu Ryu
Japão, 1962 - 112 min / legendado em francês
Foi o último filme de Yasujiro Ozu e é uma nova variação sobre uma história de separação familiar em reflexão nostálgica sobre
o começo do “Inverno da vida”. É também a sua celebração e a despedida ao “gosto do saké”, onde cabe toda a memória do
passado e dos “bons tempos”. Profundamente comovente, SAMMA NO AJI é um dos mais perfeitos filmes de Ozu, aquele onde a
depuração do seu estilo atinge níveis supremos. Simples e sublime.
ON THE BOWERY
de Lionel Rogosin
com Gorman Hendricks, Frank Matthews, Ray Salyer
Estados Unidos, 1956 - 65 min / legendado electronicamente em português
É um clássico do cinema independente americano. Foi a primeira obra de Lionel Rogosin, que antes de começar a filmar
mergulhou no bairro do Lower East Side nova-iorquino do Bowery durante seis meses para lhe sentir o pulso, os ritmos, conhecer
os habitantes. Depois filmou-os, sem condescendência e incandescentes, tomando para si os ensinamentos de Flaherty e a
inspiração no neo-realismo italiano e em THE QUIET ONE, de Sidney Meyers, mas também em Weegee ou Jacob Riis. ON THE
BOWERY dá a ver Nova Iorque como nunca antes no cinema. “Um estudo pessoal em grande plano dos mais negros recantos
da sociedade e um trabalho crucial do realismo americano (John Cassavetes, Shirley Clarke, Robert Frank e Kent MacKenzie
devem-lhe todos alguma coisa)” (Michael Joshua Rowin). A apresentar no restauro feito em 2006 pela Cineteca di Bologna e o
laboratório L’Immagine Ritrovata em colaboração com Rogosin Heritage Inc a partir dos negativos originais preservados pelo
Anthology Film Archives. Primeira exibição na Cinemateca.
DU CÔTÉ D’OROUËT
de Jacques Rozier
com Danièle Croisy, Françoise Guégan, Caroline Cartier, Bernard Menez, Patrick Verde
França, 1969 - 150 min / legendado electronicamente em português
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Em cerca de uma trintena de filmes (curtas-metragens, filmes publicitários e para televisão incluídos), Jacques Rozier filmou seis
longas-metragens ao longo de uma obra de quatro décadas que marcou a história do cinema. DU CÔTÉ D’OROUËT, o filme em
que três jovens raparigas passam umas férias de verão à beira mar, descrição brevíssima que lhe passa ao lado, é uma das
mais raras. Nove anos posterior a ADIEU PHILIPPINE, foi o seu primeiro com som directo. “Com o tempo [o filme] ganha uma
dimensão ‘à procura do tempo perdido’” (Jacques Rozier). Primeira exibição na Cinemateca.
QUANDO TROVEJA
de Manuel Mozos
com Miguel Guilherme, Elsa Valentim, José Wallenstein, Isabel de Castro
Portugal, 1999 - 93 min
Depois de a namorada o ter trocado por um amigo, um auto-destrutivo António deixa-se dominar por fantasmas. É quando,
do bosque, chegam dois estranhos seres em seu socorro, Violeta e Gaspar. …QUANDO TROVEJA, segunda longa-metragem de
Manuel Mozos e a primeira a ser estreada (XAVIER estrearia depois), revelou um universo onde o quotidiano coexiste sempre
com a hipótese da sua transfiguração.
L’ATALANTE
Atalante
de Jean Vigo
com Michel Simon, Jean Dasté, Dita Parlo
França, 1934 - 78 min / legendado em português
Adaptando um conto de Maupassant, Renoir assina o mais impressionista dos seus filmes em acordo com o universo pictórico
do seu pai Pierre Auguste, mas PARTIE DE CAMPAGNE é um filme do movimento. O dos elementos na imagem (a água do rio, o
vento nas árvores) e o da fluidez da câmara.
L’HIPPOCAMPE
de Jean Painlevé
França, 1933 - 14 min
L’ÉTOILE DE MER
de Man Ray
com Robert Desnos, Kiki de Montparnasse
França, 1928 - 17 min / intertítulos em francês
VAMPYR
de Carl Th. Dreyer
com Julian West, Maurice Schultz, Sybille Schmitz
França, Alemanha, 1930 - 65 min / legendado electronicamente em português
Jean Painlevé foi precursor dos “documentários científicos” numa prática que recusou fronteiras de género, como L’HIPPOCAMPE
garante: movido pelo motivo de registo do ciclo vital do cavalo-marinho (ou, em versão mais romântica, pelos amores do cavalo-
marinho), o único peixe que se desloca na vertical, trata-se de um filme de imagens submersas, aceleradas e desaceleradas,
grandes planos, movimentos de câmara, formas e pontos de luz que dão a ver o desejo de tornar visível o que o não é. Dentro
do espírito do movimento surrealista dos anos 1920, Man Ray filmou L’ÉTOILE DE MER inspirado num poema de Robert Desnos
pondo a par a beleza de uma estrela do mar e a de um amor perdido em imagens oníricas de profundo lirismo e sensualidade.
VAMPYR: “Um filme de terror banhado numa claridade puríssima. Um filme sonoro que reinventa a noção de cinema mudo.”
Assim se exprimiu Edgardo Cozarinsky sobre esta obra-prima de Carl Th. Dreyer, poema de morte e ressurreição pela luz do
cinema, inspirado na novela Carmilla de Sheridan le Fanu.
HISTÓRIAS SELVAGENS
de António Campos
com Glicínia Quartim, Carlos Bartolomeu, Cremilda Gil, Márcia Breia, João Lagarto
Portugal, 1978 - 102 min
Adaptação de dois contos de Paços Coelho, trata-se de uma crónica sobre o trabalho rural na região de Montemor-o-Velho.
Primeira obra de Campos com actores profissionais e não actores, um dos mais secretos filmes de António Campos e um título
fundamental da sua obra, marcado por uma insólita estrutura temporal e um evidente desejo de ficção.
condenado Veidt para este se infiltrar como espião no castelo do chefe rebelde, o duque de Foix. É a terceira adaptação ao
cinema do romance de Edward E. Rose, inteiramente filmada em estúdio, com cenários estilizados e labirínticos, enquadramentos
e iluminação inspirados na pintura flamenga.
ESPLENDOR SELVAGEM
de António de Sousa
Portugal, 1972 - 94 min
Realizador, director de fotografia e produtor, António de Sousa dedicou grande parte da sua vida a Angola, onde viveu até finais
dos anos 1970, antes de se mudar para a ilha da Madeira, e que documentou em inúmeras actualidades cinematográficas.
ESPLENDOR SELVAGEM é um dos seus “filmes angolanos”, um filme de paisagens, retrato de comunidades, cerimónias e rituais.
Como se diz no fim, “Esta é a África do passado, a África do esplendor selvagem.” Primeira exibição na Cinemateca. A mostrar
em cópia nova.
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UMBRACLE
de Pere Portabella
com Christopher Lee
Espanha, 1972 - 85 min / legendado electronicamente em português
Usualmente associado a CUADECUC, VAMPYR (1970), UMBRACLE tem, como aquele, fotografia a preto e branco de películas
de tipo diferente, e uma banda sonora de Carles Santos, colaborador regular de Portabella. Ao contrário de CUADECUC, tem
sequências com som síncrono, de que é exemplo uma cena em que Christopher Lee declama O Corvo, de Edgar Allan Poe, e
canta ópera num teatro vazio, ou uma outra que capta uma discussão sobre censura entre realizadores espanhóis. Portabella
explora a linguagem do cinema experimental aqui trabalhando com um actor vindo de outros universos. “Lee ofereceu-se,
com prazer, para interpretar as minhas ideias. Consegui mesmo que fizesse o que para um actor é o mais duro: nada” (Pere
Portabella). Primeira exibição na Cinemateca.
ABRAHAM LINCOLN
de David W. Griffith
com Walter Huston, Una Merkel, Kay Hammond, E. Alyn Warren, Henry B. Walthall
Estados Unidos, 1930 - 84 min / legendado em português
O primeiro all talkie de Griffith retrata a vida de Abraham Lincoln como um homem só e angustiado, porventura reflectindo a
solidão e o pessimismo de DWG nesta fase da sua vida. “Um pesadelo para a razão e para os nervos” foi como o próprio se referiu
às oito semanas de rodagem de ABRAHAM LINCOLN. Pelo seu lirismo e dimensão pictórica, o filme tem sido entusiasticamente
reavaliado. Verdadeiramente surpreendente é o uso dramático do trabalho da banda sonora.
MARIA
de João Mário Grilo
com Isabel Alves de Carvalho
Portugal, 1979 - 81 min
Originalmente filmado em Super 8, a primeira longa-metragem de João Mário Grilo (também responsável pelo argumento,
montagem e produção executiva) é um filme pessoal, a partir de fotografias de família e centrado na figura do avô, capitão de
um navio bacalhoeiro, mas também na da personagem feminina que lhe dá o título.
AU HASARD BALTHAZAR
Peregrinação Exemplar
de Robert Bresson
com Anne Wiazemsky, François Lafarge, Philippe Asselin, Pierre Klossowski
França, 1966 - 90 min / legendado em português
AU HASARD BALTHAZAR é uma fábula construída em torno de um burro que vagueia, ao acaso, de dono em dono. O cinema
de Robert Bresson estava, por esta altura, no máximo do seu despojamento, num misto de simplicidade e gravidade formais. As
deambulações do burro Balthazar exprimem uma figura capital no universo do cineasta, o acaso. Através dos seus sucessivos
donos, é a Humanidade que Bresson encena, num filme de uma beleza sublime.
OHAYO
“Bom Dia”
de Yasujiro Ozu
com Keiji Sata, Yoshiko Kuga., Koji Shigaraki, Masahiko Shimazu
Japão, 1959 - 94 min / legendado em inglês
Este filme pode ser considerado como uma variante, mas certamente não como um remake, de um dos mais célebres filmes de
Ozu, UMARETE WA MITA KEREDO (“NASCI, MAS…”, de 1933). Mas, contrariamente à quase totalidade das obras-primas realizadas
por Ozu na fase final da sua carreira, OHAYO não aborda o tema da dissolução de uma família, apenas um momento de crise.
Dois miúdos fazem uma greve de silêncio para protestar contra o facto dos pais se recusarem a comprar uma televisão. A
realização de Ozu, como sempre rigorosa e perfeita, tece um filme que, ao invés de mostrar o fim de uma vida, ou de uma família,
mostra uma continuidade, a aceitação da mudança. Um dos filmes onde cineasta trabalha exemplarmente a cor.
A ESPADA E A ROSA
de João Nicolau
com Manuel Mesquita, Luís Lima Barreto, Nuno Pino Custódio, Pedro Faro, Mariana Ricardo
Portugal, França, 2010 - 142 min
É a primeira longa-metragem de João Nicolau, que co-assina o argumento com Mariana Ricardo. Estreou mundialmente em
Veneza e, em Portugal, no Estoril Film Festival. João Nicolau apresenta-o como um filme de aventuras e pirataria passado nos
dias de hoje mas onde grande parte da acção decorre no mar, a bordo de uma caravela portuguesa do século XV. A sinopse
adianta que é uma traição a bordo a desencadear “uma série de acontecimentos terríveis que o protagonista atravessa sem
beliscar os seus princípios morais”.
Dois filmes de Mario Ruspoli produzidos por Anatole Dauman: LES HOMMES DE LA BALEINE, filmado numa pequena aldeia
açoriana, regista a caça de uma enorme baleia e as subsequentes operações de desmantelamento e armazenamento. Antes
de Depardon ou de Wiseman, num “primeiro olhar não condescendente”, Ruspoli filma os pacientes e os médicos de um hospital
psiquiátrico em Saint-Alban, Lozère, e as suas rotinas quotidianas em REGARD SUR LA FOLIE. Dois títulos pouco conhecidos que
a Cinemateca não exibe desde 1991.
CARTAS BRANCAS
ZA SCHASTEM
“Rumo à Felicidade”
de Yevgeni Bauer
com Emma Bauer, Tasya Borman, N. Dennitsyna, Lev Kuleshov
Rússia, 1917 - 40 min / mudo, intertítulos em francês
POEMA O MORE
“O Poema do Mar”
de Iulia Solntseva, Aleksandr Dovjenko
com Zinaida Kirienko, Boris Livanov, Boris Andreiev
URSS, 1958 - 100 min / legendado em francês
História de uma aldeia ucraniana condenada à submersão pela construção de uma barragem. É a última parte do tríptico
previsto por Dovjenko, que a morte impediu de concretizar, depois de feita a planificação e a escolha dos lugares das filmagens.
Seria a sua mulher a filmar POEMA O MORE, o que esteve na origem de uma polémica: “pela primeira vez na história do
cinema estamos perante um filme póstumo” (Fereydoun Hoveyda); “os filmes realizados com base em Dovjenko não são dele”
(Barthélemy Amengual).
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KROTKIE USTRECHI
“Breves Encontros”
de Kira Muratova
com Nina Ruslanova, Vladimir Vysotsky, Kira Muratova
URSS, 1967 - 96 min / legendado em francês
Uma das características mais interessantes do cinema soviético dos anos 60 e 70 é a narrativa “oblíqua”, com elipses, diferente
do cinema europeu e sobretudo americano. Os filmes de Kira Muratova, importante personalidade que só se tornou conhecida
fora da URSS em meados dos anos 80, nos tempos da perestroika, não fogem a esta regra. No magnífico “BREVES ENCONTROS”,
a acção centra-se num singular triângulo amoroso entre uma criada, um geólogo e a mulher deste.
JULIÃO SARMENTO
de Joaquim Sapinho
Portugal, 1994 - 58 min
Todas as sessões deste pequeno programa, não estando relacionadas umas com as outras, são excelentes exemplos de um
cinema auto-reflexivo – são documentários e ensaios que reflectem de forma diversa sobre a particularidade da obra de cada
um dos seus autores através do cinema e das suas histórias. Frampton chamou ao seu ciclo de sete filmes, à investigação
sobre a natureza da imagem cinematográfica que constitui HAPAX LEGOMENA, uma “autobiografia oblíqua” que sobrepõe a
história pessoal do autor à história das formas cinematográficas, tal como estas surgiram na sua aprendizagem. O filme de
Fieschi e Burch constitui uma tentativa de recuperação e análise de um período particular na história do cinema francês, e é
sobretudo uma declaração de princípio contra a hierarquização e categorização históricas com vista ao que Fieschi chamava
uma “conquista do presente”. René Vautier filmou um documentário comovente que reconstitui a dramática rodagem de um filme
sobre o trabalho dos pescadores na Bretanha durante o Inverno rigoroso, e em que um dos cineastas morreu no mar. É um
filme sobre a ética da relação entre aqueles que filmam e os que são filmados. Por fim, o filme de Jean-Pierre Gorin constitui, nas
suas palavras, “uma meditação sobre o método e sobre o trabalho, a paisagem americana, o imaginário masculino, o alto e o
baixo da cultura americana, a natureza materialista da imaginação artística, a amizade, a procura obsessiva do pormenor...”,
através da sua cumplicidade com o pintor e escritor Manny Farber. (Ricardo Matos Cabo - programador)
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ROUTINE PLEASURES
de Jean-Pierre Gorin
França, Grã-Bretanha, Estados Unidos, 1986 – 81 min / legendado electronicamente em português
Manny Farber era antes de tudo pintor e só depois um escritor que pensava a sua arte através do cinema (mas também da
música, banda desenhada, etc.). O filme de Jean-Pierre Gorin é uma evocação da arte de Farber e do seu trabalho, resultando da
amizade entre os dois, e tal como escreveu Gorin: “não é um documentário sobre Manny (ele nunca aparece). É uma meditação
sobre o método e sobre o trabalho, a paisagem americana, o imaginário masculino, o alto e o baixo da cultura americana, a
natureza materialista da imaginação artística, a amizade, a procura obsessiva do pormenor... Resumindo, se me perguntarem
sobre o que é o filme, sinto-me forçado a dizer simplesmente que o filme é um filme sobre.” ROUTINE PLEASURES é o filme
que nasce desse encontro e um filme sobre o prazer do cinema e da cumplicidade. Jean-Pierre Gorin organizou recentemente
um excelente programa de filmes baseado num texto de Farber, a que chamou The Way of the Termite: The Essay in Cinema.
Primeira exibição na Cinemateca.
O aparecimento e disseminação da tecnologia digital no campo do cinema (e o consequente esbatimento das fronteiras
desse campo) caracterizam um momento em que é propício pensar os materiais cinematográficos, e de que forma a imagem
cinematográfica vive desses materiais. Se o digital transporta consigo uma “desmaterialização”, torna-se um bom pretexto
para pensar o que será a “materialidade”, e o que é que esta produz na superfície visível do cinema. Esta programação
procura entrar nessa reflexão, tentando descobrir e ver o que será isso de materialidade cinematográfica.
Programam-se, para tal, filmes que parecem deixar irromper na sua superfície, às vezes por brevíssimos instantes, pedaços
de corpo, qualquer coisa normalmente oculta por baixo de histórias, ficções, ilusões, qualquer coisa que, quando exposta,
parece própria a uma avaria. São filmes que transportam um cinema embrutecido e pobre, descarnado, exposto. E desenham
aqui um percurso.
Kuleshov, cineasta-engenheiro que experimentou e testou os alcances da montagem cinematográfica, construiu um corpo de
mulher articulando imagens de corpos de diferentes mulheres; aqui ensaia-se o mesmo movimento e procura-se a imagem
de um corpo constituída pelos pedaços de material que cada filme dá, e pela sua articulação e sucessão. É um trajecto, que
é só um possível entre muitos disponíveis. E não pode ser se não provisório. (Inês Sapeta Dias - Investigadora na área da
programação e, entre outras actividades de programação, co-responsável pelo Panorma). Inês Sapeta Dias vai estar presente
em todas as sessões.
LA JETÉE
de Chris Marker
com Jacques Ledoux, Hélène Chatelain, Davos Hanich
França, 1962 - 28 min / sem legendas
BRANCA DE NEVE
de João César Monteiro
com as vozes de Maria do Carmo, Reginaldo da Cruz, Ana Brandão, Luís Miguel Cintra, Diogo Dória, João César Monteiro
Portugal, 2000 - 72 min
LA JETÉE é um dos mais célebres filmes de Chris Marker, extraordinária reflexão sobre o tempo e a temporalidade, concebida
com base em fotografias – uma obra-prima desse imenso cineasta que é Marker. A BRANCA DE NEVE de João César Monteiro
adapta uma peça de Robert Walser que retoma o conto dos irmãos Grimm: salva pelo beijo do Príncipe ao sono das trevas,
Branca de Neve confronta a madrasta e o caçador que esta incita a apunhalar a enteada. João César Monteiro deixou a tela
quase sempre negra, com raras imagens de outra cor e as imagens sonoras (as vozes dos actores). Na altura deu brado e foi o
escândalo, mas já não vale a pena voltar a ele. Vale a pena é voltar a ver BRANCA DE NEVE, outra vez e outra vez, no escuro
da sala, no quarto escuro.
É um filme da luz, como disse Garrel. LES HAUTES SOLITUDES corresponde, na sua obra, ao encontro com Jean Seberg. Rodado
“pelo preço de um 2 cavalos”, é mesmo, assumidamente, um retrato de Seberg, filmado ao improviso. Quando Garrel mostrou a
montagem à actriz, ainda sem banda sonora, ela respondeu que “ficava contente se o filme acabasse assim”. E assim, mudo,
o filme ficou.
79 PRIMAVERAS
de Santiago Alvarez
Cuba, 1969 - 25 min / legendado electronicamente em português
LE MYSTÈRE PICASSO
de Henri-Georges Clouzot
França, 1976 - 73 min / legendado electronicamente em português
WAVELENGTH
de Michael Snow
com Hollis Frampton, Amy Toubin
Estados Unidos, 1967 - 45 min / sem diálogos
TUNG
de Bruce Baillie
Estados Unidos, 1966 - 5 min / sem diálogos
FILM IN WHICH THERE APPEAR EDGE LETTERING, SPROCKET HOLES, DIRT PARTICLES, ETC.
de George Landow
Estados Unidos, 1965-66 - 6 min / sem diálogos
13 MOST BEAUTIFUL WOMEN corresponde a uma das compilações de Warhol a partir dos cerca de 500 SCREEN TESTS filmados
entre 1964 e 1966 (também há 13 MOST BEAUTIFUL BOYS ou 50 FANTASTICS AND 50 PERSONALITIES). O conjunto das 13 mais
belas mulheres filmadas em 16mm contempla Baby Jane Holzer, Anne Buchanan, Sally Kirkland, Barbara Rose, Beverly Grant,
Nancy Worthington Fish, Ivy Nicholson, Ethel Scull, Isabel Eberstadt, Jane Wilson, Imu, Marisol, Lucinda Childs e Olga Kluver,
mas delas vamos apresentar apenas os quatro retratos da colecção do MoMA. L’ARRIVÉE D’UN TRAIN EN GARE DE LA CIOTAT
é o mais mítico dos títulos do catálogo Lumière como lendário é o relato da sua primeira projecção pública. O “one shot movie”
de Michael Snow é basicamente composto por um longo zoom, que parte de um plano geral do interior de um apartamento
para se deter numa fotografia afixada na parede. A experiência da duração, o jogo entre o dentro e o fora de campo e a
“falsidade” do plano único fazem de WAVELENGTH um “sucedâneo underground” de ROPE, de Hitchcock. TUNG é uma das
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curtas- -metragens do cineasta experimental Bruce Baillie. Em FILM IN WHICH THERE APPEAR EDGE LETTERING, SPROCKET
HOLES, DIRT PARTICLES, ETC., Landow trabalha a ideia da imperfeição usualmente suprimida no cinema usando um segmento
de teste da película colorida da Kodak. O primeiro e os dois últimos títulos da sessão são primeiras exibições na Cinemateca.
A generosidade da carta branca torna-a também um pouco gratuita. É certo que não se substitui aos programas que ficaram
por realizar. E pede o brilho singular dos filmes soltos e desligados, mais do que programas complexos. Mas se programar é
arranjar desculpas para passar bons filmes, convém igualmente que as desculpas sejam boas. Um autor, por exemplo, ainda
que desconhecido, é sem dúvida uma velha e insistente desculpa. Talvez porque algo de vivo e impessoal, difícil de cingir e
todavia essencial, se esconde por trás dessa aparição do nome. Já o cânone, indutor de vertigens, mais do que mostrar, oculta.
Há então que fingir que essa acumulação hierárquica não existe sequer e dar simplesmente importância ao que um dia tivemos
perante os olhos: a intuição de cada um. Uma ideia de programação pede assim a declinação quase infinita dessa “menoridade”.
Acima de tudo, pede a clarificação da necessidade dos filmes, o que é inseparável do gesto – talvez ilusório, porque dificilmente
antecipável – de experimentar fazê-los chegar a quem deles precisa. Afinal, não sabemos nós como as obras mais delicadas e
subtis são continuamente enterradas vivas logo à nascença? Por que haveriam outras épocas de ter sido menos empenhadas
na sua cegueira do que a nossa?
Algumas “descobertas” feitas em viagens de estudo: as duas primeiras na distante Austrália, oferendas do crítico Adrian Martin;
no Brasil, Ozualdo Candeias, objecto do entusiasmo generoso dos cinéfilos locais e, sobretudo, exposição crua de como os limites
do cinema e da sua história não estão definidos; e NEAR DEATH, quinze anos depois da sua passagem nesta mesma Cinemateca
pela mão de um professor, porque há que continuamente experimentar a extraordinária complexidade redentora, que é a matriz
de toda a obra de Wiseman, mesmo quando se dá neste contexto extremo de proximidade com a morte. (André Dias – autor do
blogue Ainda não começámos a pensar dedicado às relações entre cinema e pensamento, programador ocasional e doutorando
em cinema na Universidade Nova de Lisboa). André Dias estará presente em todas as sessões.
WORDS AND SILK: THE IMAGINARY AND REAL WORLDS OF GERALD MURNANE
de Philip Tyndall
com Gerald Murnane
Austrália, 1989 - 86 min / legendado electronicamente em português
Impressionante filme num género raramente feliz: o retrato de um escritor. Neste caso, trata-se do australiano Gerald Murnane,
autor do espantoso The Plains (1982). A subversão das regras do género passa aqui pelo profundo mergulho na matéria labiríntica,
ainda que aparentemente circunscrita, da obra literária de Murnane, despoletada pela voz e presença do próprio escritor e
configurada pelas suas obsessões: a escrita, as corridas de cavalos, a paisagem, os pássaros e a cor. Uma oportunidade para
repensar as equívocas relações entre literatura e cinema. Primeira exibição na Cinemateca.
BEHINDERT
de Stephen Dwoskin
com Carola Regnier Stephen Dwoskin
Reino Unido, 1974 - 96 min / sem legendas
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A HERANÇA
de Ozualdo R. Candeias
com David Cardoso, Rosalvo Caçador, Bárbara Fazio, Deoclides Gouveia
Brasil, 1971 - 83 min
Adaptação peculiar de um clássico da literatura mundial ao contexto brasileiro do Sertão por Ozualdo Candeias, “marginal
entre os marginais”. “Quando viram A HERANÇA, meu Hamlet caipira, uns caras disseram que eu tinha avacalhado a peça de
Shakespeare. Então falei: vocês estão muito enganados. O Hamlet p’ra mim é um puta babaca, se visto no lado social, e eu dei
uma dignidade para a morte dele. Antes de morrer, pegou as terras dele e deu para aquele pessoal que trabalha. E o pessoal
que trabalha, os caras que eu botei como essas pessoas, são os mais fodidos possíveis. Então o que eu fiz foi livrar a cara do
Hamlet e vocês ainda vêm aqui me encher o saco?». Na ausência de diálogos propriamente ditos (se exceptuarmos algumas
legendas), substituídos por ruídos de animais e outros sons, uma espantosa cena com uma moda de viola cantada e infinitas
trocas de olhares dá conta, ao mesmo tempo, do esplendor da voz humana e do poder restituído do cinema mudo. Porque “deve
haver mais coisa entre o céu e a terra que a nossa já estúpida filosofia”. Primeira exibição na Cinemateca.
NEAR DEATH
de Frederick Wiseman
Estados Unidos, 1989 - 358 min / legendado electronicamente em português
NEAR DEATH é talvez a mais intensa experiência oferecida pela filmografia de Frederick Wiseman. Não se trata simplesmente, e
como na generalidade dos seus filmes, de documentar “como vivem as pessoas”, mas, liminarmente, “como morrem as pessoas”.
Filmado na unidade de cuidados intensivos de um hospital de Boston, NEAR DEATH segue uma série de casos de doentes em
estado terminal, e a forma como médicos, familiares e amigos se relacionam entre si e com os pacientes, em função, por vezes,
das decisões difíceis que é preciso tomar ou, pelo menos, discutir. Também é esta, e talvez seja sobretudo esta, a questão: os
vivos perante a morte, no momento em que a morte deixa de ser uma abstracção.
Servem estas singelas linhas para informar que o único critério que presidiu à escolha dos cinco filmes foi o prazer que quem
os escolheu sentiu ao vê-los. E por terem sido vistos na década passada, em anos e países diferentes mas não em Portugal –
embora um ou outro tenha tido uma fugaz sessão em festivais – pensou em reuni-los na Cinemateca Portuguesa em Janeiro
de 2011 porque para isso existiu oportunidade. (Miguel Gomes – realizador). Algumas das sessões contarão com a presença de
Miguel Gomes.
RR
de James Benning
Estados Unidos, 2007 - 112 min / sem legendas
Pode ser descrito como um estudo dos caminhos-de-ferro norte-americanos ou um “filme de comboios”. Filmado em 16mm, é
composto por 43 planos fixos de comboios de mercadoria (seleccionados entre cerca de 200, filmados ao longo de dois anos e
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meio) que duram o tempo da sua passagem na imagem. As noções de espaço e de tempo, a topografia e a história dos Estados
Unidos são marcas da obra de Benning e participam dele. “O filme chama-se RR, mas gosto de lhe chamar ‘Railroad / Caminho-
de-ferro’, porque RR soa a filme de piratas” (James Benning). Primeira exibição na Cinemateca.
HISTORIAS EXTRAORDINARIAS
de Mariano Llinás
com Héctor Díaz, Klaus Díaz, Eduardo Iaccono, Walter Jakob, Mariano Llinás
Argentina, 2008 - 245 min / legendado electronicamente em português
É um filme em 18 capítulos, três histórias principais entre diversas outras secundárias, que o vão fazendo variar entre o road
movie e o thriller ou o filme romântico e de guerra, e uma narração em off permanente, nem sempre síncrona com a banda
de imagem. “O filme revela a procura do seu realizador, transporta a marca amadora, mas finalmente muito profissional,
característica de Llinás, assim como uma espécie de estranha melancolia sobre o absurdo do seu empreendimento. (…) Respira
liberdade” (Quintín, Cinemascope). Primeira exibição na Cinemateca.
MEIN STERN
“És a Minha Estrela”
de Valeska Griesebach
com Bajah Freeman, Daniela Costa, Fernanda Lapa, Frank Abrahams, Gabrielle Uetz, Steve Kondaks
Alemanha, Áustria, 2001 - 61 min / legendado electronicamente em português
Um casal de jovens adolescentes vive uma história de amor no apartamento dos pais da rapariga onde ambos representam
os papeis de marido e mulher, ou os de estrelas de cinema que se passeiam em público. A perspectiva de um tempo que corre
enquanto a eles tudo parece possível é um dos pontos da primeira longa-metragem de Valeska Griesebach. “Interessa-me o
normal, o quotidiano. Não quis fazer um filme com afirmações genéricas sobre a juventude no ano 2000 mas captar um momento
intemporal e talvez mesmo antiquado.” Primeira exibição na Cinemateca.
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para esta área, em diálogo com Os Filhos de Lumière Associação Cultural, responsável por alguns projectos fundamentais em
curso nesta área no nosso país.
A NATUREZA DO CINEMA
PROGRAMA ESPECIAL DE FILMES APRESENTADOS POR PETER KUBELKA
sessão única com dois intervalos,
Nome relevante do segundo grande movimento histórico de vanguarda cinematográfica, Peter Kubelka foi um dos co-fundadores
(com Mekas, Brakhage, Jerome Hill e Adams Sitney) do quartel general dela – o mítico Anthology Film Archives de Nova Iorque,
criado em 1969. Uns anos antes (em 1964) tinha já sido também co-fundador (com Peter Konlechner) do Oesterreichisches
Filmmuseum (Museu de Cinema da Áustria), do qual foi co-director até 2001, e no qual realiza hoje, regularmente, projecções
sob o mesmo título desta sessão (WAS IST FILM). Também no seu caso, trata-se de um regresso à Cinemateca, para uma única
e especialíssima jornada, de filmes e conversa sobre eles, a começar às 15:30 e a acabar cerca da meia-noite. A apresentação
será proferida em inglês. (Programa detalhado a anunciar.)
CINEMATECA JÚNIOR
A Cinemateca Júnior abre o ano de 2011 com a proposta de dois clássicos especialmente dedicados ao público juvenil e
dois filmes de animação para os espectadores infantis. Janeiro começa com Spielberg e o extraterrestre mais célebre do
cinema americano de ficção científica: E.T., o filme em que uma viagem de bicicleta para outro mundo fez le-vantar milhões de
espectadores em outras tantas salas de cinema em todo o mundo. No Salão Foz, é no dia 8. A segunda sessão clássica, no dia
22, traz o musical aos Restauradores com Minnelli a filmar Gene Kelly como “um americano em Paris”.
Para os mais pequenos, dobrados em português, 101 DÁLMATAS e MADAGASCAR 2, a 15 e a 29 de Janeiro: o primeiro, de
1961, é o filme dos cachorrinhos malhados e da tresloucada e vil Cruela. O segundo, já deste século XXI, junta animais menos
domésticos numa aventura por terras africanas.
No dia 29, às 11h30, a Cinemateca Júnior propõe um atelier matinal dedicado às Sombras Mágicas de Animais, onde todos os
participantes (dos 5 aos 8 anos) podem criar uma sombra articulada e inventar uma história a partir da representação do mundo
animal. O atelier requer marcação prévia até dia 25 de Janeiro para o e-mail cinemateca.júnior@cinemateca.pt.
De segunda a sexta-feira, a Cinemateca Júnior dedica-se a sessões de cinema e ateliers para escolas. O convite mantém-se:
venha visitar-nos ao Palácio Foz. Veja os filmes e aproveite para visitar a exposição permanente de materiais que antecederam
o cinema. Pode ver, tocar e brincar, e apreender a magia do pré-cinema.
101 DALMATIANS
Os 101 Dálmatas
de Hamilton Luske, Clyde Geronimi
Estados Unidos, 1961 - 74 min / dobrado em português do Brasil
Pongo e Perdita são um casal de bonitos cães dálmatas com uma ninhada de 15 cachorrinhos. Estes tornam-se a obsessão de
Cruella DeVil que, apostada em fazer um casaco com a pele dos cachorros, força o seu mordomo a raptá-los. Aliados a outra
bicharada, os pais levam a cabo uma operação de resgate com a ajuda dos 101 dálmatas prisioneiros, que deixa Cruella em
mau estado.
AN AMERICAN IN PARIS
Um Americano em Paris
de Vincente Minnelli
com Gene Kelly, Leslie Caron, Oscar Levant, Georges Guétary, Nina Foch
Estados Unidos, 1951 - 115 min / legendado em português
Um dos mais célebres musicais de Minnelli, que leva a sua estética e a da Metro Goldwyn-Mayer ao apogeu. Na Paris de inícios
do século XX, um músico americano hesita entre uma jovem com pouco dinheiro e uma mulher abastada. Tal é o pretexto para
um exuberante e luxuoso musical, com música de Gershwin, que arrebatou sete Oscars. Um deles foi para a direcção artística
de Cedric Gibbons, E. Preston Ames, Edwin B. Willis, F. Keogh Gleason; outro sagrou-o melhor filme do ano.
APOIO
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dições
ÚLTIMAS
Programa sujeito a alterações • Preço dos bilhetes: 2,5 Euros • Horário da bilheteira: De Segunda a Sábado, 14:30 - 15:30 | Sala Dr. Félix Ribeiro e 18:00 - 22:00 | Sala Luís de
Pina • Não há lugares marcados - Os bilhetes para as sessões só serão vendidos no dia em que as mesmas se realizam • Sala 6 X 2, Sala dos Carvalhos e Sala dos Cupidos, de
Segunda a Sábado, 13:30 - 22:00 | Sala Luís de Pina - entrada gratuita • Amigos da Cinemateca / Marcação de Bilhetes: Tel. 21 359 62 62 - Os Amigos da Cinemateca têm
direito a 2 bilhetes, mas o bilhete do(a) acompanhante é vendido sem desconto. • Classificação Geral dos Espectáculos: Maiores de 12 anos
Informação diária sobre a programação: Tel. 21 359 62 66 • Transportes: Metro: Marquês de Pombal, Avenida • Bus: 2, 9, 36, 44, 45, 90, 91, 732, 746 • Venda das EDIÇÕES
DA CINEMATECA no Centro de Documentação/Biblioteca • Espaço dos 39 Degraus: Restaurante/Bar de Segunda a Sábado, das 12:30 às 00:30 • Biblioteca, de Segunda a
Sexta, 14:00 - 19:30 | Sala Luís de Pina.