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UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO


DEPARTAMENTO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL
PÓS-GRADUAÇÃO EM LINGUAGENS AUDIOVISUAIS E MULTIMÍDIA

HERBERT PABLO BASTOS

FOLHETIM SEREIA:
PERCURSOS DA WEBARTE

VITÓRIA – ES
2010
 

HERBERT PABLO BASTOS

FOLHETIM SEREIA:
PERCURSOS DA WEBARTE

Monografia apresentada
à Pós-Graduação em Linguagens
Audiovisuais e Multimídia do
Departamento de Comunicação Social
da Universidade Federal do Espírito
Santo, como requisito parcial para
obtenção do título de Especialista em
Linguagens Audiovisuais e Multimídia.
Orientadora: Prof.ª Msª Daniela Zanetti

VITÓRIA – ES

2010

HERBERT PABLO BASTOS

FOLHETIM SEREIA:
PERCURSOS DA WEBARTE

Monografia apresentada à Pós-Graduação em Linguagens Audiovisuais e


Multimídia do Departamento de Comunicação Social da Universidade Federal
do Espírito Santo, como requisito parcial para obtenção do título de
Especialista em Linguagens Audiovisuais e Multimídia.

Aprovada em 31 de março de 2010.

COMISSÃO EXAMINADORA

________________________________
Prof.ª Ms.ª Daniela Zanetti
Universidade Federal do Espírito Santo
Orientadora

________________________________

Prof. Dr. Alexandre Curtiss


Universidade Federal do Espírito Santo

________________________________
Prof.ª Ms.ª Rosane Zanotti
Universidade Federal do Espírito Santo 

 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Para meus padrinhos Guerino Fieni e T. Ruas
AGRADECIMENTOS

Aos meus professores que mantém o Departamento de


Comunicação Social da Universidade Federal do Espírito Santo.

"Finalmente, a viagem conduz à cidade de Tâmara.


Penetra-se por ruas cheias de placas que pendem das
paredes. Os olhos não vêem coisas, mas figuras de
coisas que significam outras coisas..."
Italo Calvino

RESUMO  
 
 
 
A  necessidade de investigar a produção de arte pela Internet diz respeito a
questões que evocam a minha própria produção artística, iniciada em Vitória
nos anos 90 na exposição Digital - Arte por Computador e especialmente na
Ywebarte, considerada uma das primeiras galerias de trabalhos virtuais que se
propuseram a discutir a arte na WEB. Este trabalho contextualiza as
sucessivas apropriações históricas dos meios técnicos pelos artistas e
especificamente as relações desses com o novo campo de trabalho chamado
Web arte, e suas potencialidades técnicas como a interatividade, apresentando
obras referenciais nesse campo de pesquisa como as do artista Eduardo Kac,
que articulam processos de transmissão e recepção de mensagens, e dos
artistas Rafael Rozendal e Elna Frederick, que abordam em suas obras
poéticas metalinguísticas que desvelam a estrutura da imagem sob as
interfaces de representação da WEB.

O estudo segue apresentando a produção de arte eletrônica no ES e minha


última produção em Web arte, intitulada Folhetim Sereia, que discute o
incessante fluxo de imagens em trânsito na rede. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO
1. ARTE, TÉCNICA E TECNOLOGIA NAS ARTES
2. O COMPUTADOR COMO FERRAMENTA ARTÍSTICA
2.1 WEB ARTE E YWEBARTE
2.2 O MITO DA INTERATIVIDADE NA WEB
2.3. WEBARTISTAS E METALINGUAGEM
2.4 TRANSMISSÃO, TELEPRESENÇA E REDES SOCIAIS
EM EDUARDO KAC
3. A EXPERIÊNCIA DA ARTE ELETRÔNICA NO ESPÍRITO SANTO
3.1 FOLHETIM SEREIA
4. CONCLUSÕES
5. REFERÊNCIAS
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 

INTRODUÇÃO

O verbete Internet na web demonstra a extensão de campos do conhecimento


que articulam discursos sobre as novas tecnologias de comunicação
acessadas via computador. São inúmeras publicações a respeito de educação
em rede, design para web, arquitetura da informação, redes sociais e outras
infinitas possibilidades de assuntos relacionados a essa nova mídia. Quanto ao
campo de produção artística este nunca foi alheio às revoluções técnicas, ao
contrário, percebemos um contínuo de experimentações de artefatos
tecnológicos que seguem ao longo da história da arte a disseminar conteúdos
que afastam esses meios do uso original para o qual foram criados, aflorando
uma constante de outras e novas possibilidades subjetivas pelo campo de
experimentação artística. dessas relações de embate entre a arte e os meios
técnicos da comunicação, articulando processos que se acumularam até a
década de 90, período no qual o computador é popularizado como ferramenta
de comunicação em massa ligada em rede, e começa a ser usado como
suporte para um novo tipo de arte, que é o foco de atenção principal desse
estudo, ao qual chamamos de Webarte. O surgimento dessa nova categoria
artística suscitou a necessidade de se pensar suas características estéticas, de
produção e propagação, através do pensamento de Pierre Lévy em suas
reflexões sobre o deslocamento dos signos visuais, sonoros e linguísticos para
as redes, e do pesquisador de arte eletrônica e Web arte brasileira, Fabio
Oliveira Nunes, que sugere através de seus estudos tentativas de categorizar
as potencialidades da Web arte, como a hipertextualidade e a possibilidade de
reprodução infinita.

Será pontuada a inserção dessas novas linguagens nos circuitos artísticos do


Espírito Santo, através das minhas primeiras experiências em exposições
voltadas para a arte eletrônica como a Digital e a Ywebarte, a partir de
produções de minha autoria como as séries Cliparts e Neutrinos e obras
referencias de artistas capixabas como Juliana Morgado e Orlando da Rosa
Farya, que discutem a gravura e fotografia em meios digitais.
10 

Ao transpormos essa primeira fase de produção nos anos 90, e os


conceitos que surgem junto com o termo Web arte, o trabalho se dedica a
investigar os experimentos interativos na arte eletrônica que prosperaram nos
anos 2000 através de expressões como a Videoinstalação e o CD-ROOM,
considerados circuitos de arte off-line, que funcionando fora da WEB rivalizam
em quantidade de produção e viabilidade técnica com os experimentos
interativos criados especificamente para a rede.

Estudo de casos de Web arte serão apresentados a partir do trabalho do


brasileiro Eduardo Kac, artista que articula subjetivamente as características
midiáticas da WEB, experimentando em suas produções as tecnologias de
transmissão e redes sociais, bem como as obras dos artistas Rafael Rozendal
e Elna Frederick, que acionam mecanismos de metalinguagem, desenvolvendo
imagens e animações poéticas que auto-referenciam os suportes digitais que
as mantém on- line.

Finalizo apresentando o meu trabalho de Web arte Folhetim Sereia, articulado


sob a idéia de produção de uma imagem mestiça, híbrida em sua constituição,
termo apropriado do discurso teórico de Arlindo Machado.

 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
11 

1. ARTE, TÉCNICA E TECNOLOGIA NAS ARTES

“A Obra de Arte na era de sua Reprodução Técnica” escrito por Walter


Benjamin em 1936, propõe uma mudança nos conceitos da estética clássica,
acreditando que a possibilidade de reprodução quase infinita das imagens
altera o cerne da experiência artística¹. Neste ensaio Benjamin descreve as
sucessivas evoluções dos suportes de reprodução, que se iniciam com a
Xilogravura², que tem como uma das ilustrações mais antigas um exemplar da
oração budista Sutra Diamante China no ano de 868, e que marcou os séculos
XIV e XV na Europa numa intensa fase de reprodução da imagem sacra,
especialmente os populares santinhos, comuns entre os católicos desde então.
Feita a partir de entalhes em um pedaço de madeira, deixando as figuras em
relevo que recebem a tinta que é transferida a um suporte, a Xilogravura passa
a fazer parte do repertório de alguns artistas, em especial o alemão Albrecht
Dürer (1471-1528) que busca nas potencialidades da madeira uma linguagem
plástica que influenciou grandemente a ilustração alemã.
1
*ppppppppppp
No século XIX a Litogravura³, que substitui a madeira pela inscrição da matriz
em pedra ou chapa de cobre, segundo Benjamim “permitiu às artes gráficas
pela primeira vez colocar no mercado suas produções não somente em massa,
como já acontecia antes, mas também sob a forma de criações sempre
novas”4. Com a litografia, o desenho ganha com a ampliação da escala
cromática disponível para uso nas composições, e uma maior precisão da
linha, possibilitando um grau de detalhamento das figuras livre das ranhuras da
madeira, então estetizadas por Dürer.

As questões relacionadas à xilogravura e a litogravura dizem respeito à


reprodução de desenhos, e continuam a fazer parte das cadeiras de estudo
dos centros de artes, que vêem na gravura uma categoria de importância
                                                            
1
BENJAMIN, 1993, p. 165-171 passim.
² CASA DA XILOGRAVURA, acesso em 21 mar. 2010
³ TIPÓGRAFOS.NET, acesso em 21 mar. 2010
4
Ibid., p.166
12 

indiscultível na História da Arte, além de serem procedimentos que impregnam


os seus produtos com os vestígios dos materiais utilizados nos processos,
definindo esteticamente particularidades visuais que se colocam a serviço do
imaginário artístico, da mesma maneira que a composição reticular,
característica das imagens produzidas em processos de reprodução por
fotolitagem como o off-set, que tem em sua natureza pontilhista uma marca
associada à imagem de massa industrial, torna-se uma das temáticas da
PopArt, com seu apogeu nos anos 60, em trabalhos como o do pintor Roy
Liechtenstein, que pinta manualmente temas de publicidades e especialmente
dos quadrinhos, deslocando a reticulagem desses contextos, o que produz uma
investigação original entre meios.

Figura 01 - Roy Lichtenstein: Brushstroke Still Life with Lamp, 1997


Fonte: http://looksee.chrisashley.net/?m=200807, acesso em 4 mar., 2010

No que abrange o surgimento de técnicas que são fundamentais para


entendermos os processos de troca entre os movimentos artísticos e as mídias,
que se fundamentam em publicar e propagar mensagens, a fotografia é uma
grande articuladora das novas gerações de imagens. Desapegada da gravura
manual a técnica fotográfica instaura uma nova maneira de lidar com a
reprodução das imagens, segundo Benjamim:
13 

“... a mão foi liberada das responsabilidades artísticas mais


importantes, que agora cabiam unicamente ao olho. Como o olho
apreende mais depressa que a mão desenha, o processo de
reprodução das imagens experimentou tal aceleração que começou a
situar-se no mesmo nível que a palavra oral. Se o jornal ilustrado
estava contido virtualmente na litografia, o cinema falada estava
contido virtualmente na fotografia...” (BENJAMIM, 1993, p. 167)

Percebe-se que a partir desse momento no século XIX uma forte articulação da
imagem gerada automaticamente na câmera escura, referente á fotografia e ao
cinema, que prosperaram como o meios de representação que expressaram as
urgências do mundo moderno em meio á Revolução Industrial5, termo
empregado pela primeira vez na França em 1928 para indicar a disseminação
dos maquinários industriais a vapor, cuja primeira patente retoma ao ano de
1769 e que com sua expiração em 1800, teve sua ampla disseminação na
Inglaterra, Europa e Estados Unidos, o que reformulou o conceito de trabalho e
produção que passaram a alimentar o imaginário popular e artístico, como no
filme Metrópolis dirigido por Fritz Lang em 1927, que traz além de uma
metáfora do automatismo exposta na presença da personagem Maria, um robô
de forma sensualmente humana, a apresentação de uma cidade permeada por
arranha-céus, onde tudo aponta para cima, num sentido de busca já presente
na arquitetura gótica, mas que visa o progresso e não os meandros do divino,
separando trabalhadores ocupados em fazer com que as máquinas funcionem
nos porões, e os donos das máquinas que habitam as alturas das construções.
Blade Runner rodado em 1982 por Martin Scorcese, também usa essas
máximas em sua narrativa. Sua cidade é como a de Langz, mas seus
autômatos são libertos do corpo maquímico e forjados pelas leis de
manipulação genética. Já a cidade de Matrix, produzido em 1999 pelos irmãos
Wachowski é desmaterializada, formada pelo fluxos de informações
organizados por inteligências artificiais e habitada por duplos virtuais que agem
dentro dessa ilusão consensual forjada pelas máquinas. 2

                                                            
5
Ver em http// www.históriasmodernas.com.br, acesso em 4 mar., 2010
14 

3
Metrópolis, Blade Runner e Matrix são obras que debatem através de suas
metáforas a forte presença da tecnologia em momentos históricos diferentes. A
máquina, o ser híbrido e a virtualização dos corpos expressam uma forte
relação contextual com a ciência de cada época nesses filmes que pertencem
a um gênero narrativo que conhecemos por ficção científica, responsável na
literatura e no cinema por agrupar obras que se fundamentam pelo interesse no
tecnológico.

Uma das primeiras obras literárias que trazem elementos do gênero de ficção
científica é Frankenstein, ou o moderno Prometeu de Mary Shelley, escrita em
1818. O cientista que tenta dominar a força dos raios para animar sua criatura
feita de resto de cadáveres, é uma narrativa que se sustenta no então recente
advento da eletricidade. Percebe-se a confluência entre o imaginário da autora,
que redigiu o livro em 1818, em meio aos estudos científicos da época sobre a
potência de força contida nos raios, que se confirmaram com o advento da
lâmpada elétrica por Thomas Edison6, primeiro a desenvolver a primeira delas
capaz de ser comercializada em 1879, o que acarretou em 1882 a construção
da primeira usina elétrica, em Nova York.

A passagem do vapor á eletricidade é contemporânea da vanguardas


modernistas que surgiam interessadas pelos temas tecnológicos e pelas novas
relações com a realidade em que esses estavam implicados. Conceitos como o
de velocidade, vivenciada com os primeiros automóveis, estavam expressos no
Futurismo7 fundado por Filippo Tommaso Marinetti em 1909, que através de
seu manifesto propagava a exaltação da máquina e da "beleza da velocidade",
associada ao elogio da técnica e da ciência.

A vanguarda surrealista de 1924 passa a incorporar a produção de impressos


em suas colagens aleatórias de recortes de revistas e jornais criando
paisagens que segundo André Breton, responsável pelo primeiro manifesto
desse movimento, era o de "resolver a contradição até agora vigente entre
                                                            
6
Ibid., 2004, p.148
7
Itaú Cultural, acesso em 10 de mar., 2010
15 

sonho e realidade pela criação de uma realidade absoluta, uma supra-


realidade"8. Esse caminho da unir peças aleatórias do Surrealismo9 estava
também presente no movimento que o precede: o Dadaísmo10, fundado em
1916 em Zurique pelos escritores alemães H. Ball e R. Ruelsenbeck. Ao
transformar qualquer objeto escolhido ao acaso em obra de arte, Duchamp, um
dos grandes expoentes do Dada, realiza uma crítica radical ao sistema da arte.
Assim, objetos utilitários sem nenhum valor estético em si são retirados de seu
contexto original e elevados à condição de obra de arte ao ganhar uma
assinatura e um espaço de exposição, museu ou galeria. Por exemplo, a roda
de bicicleta que encaixada num banco vira Roda de Bicicleta de 1913, ou um
mictório, que invertido se apresenta como Fonte de 1917.

Os Dadaístas formavam suas ações em torno de apropriações de objetos


industriais, como também das múltiplas ações conhecidas como happenings,
que uniam a performance, o teatro, a música, o cinema e a fotografia, num
ensejo de simultaneidade e multiplicidade que permeia a obras de arte na era
moderna e que tem na Les Demoiselles d'Avignon, pintada por Pablo Picasso
em 1907, obra fundadora em Paris do Cubismo, uma nova forma de
representação da figura, que permeada por planos geométricos entrecortados
reconstroem formas que se apresentam, simultaneamente, em vários ângulos
nas telas, num contexto em que o mundo ainda estava se acostumando com
questões referentes ao transporte mecânico como também ao tráfego de
informações, que além das prensas dos jornais, contavam com os novos
suportes movidos à eletricidade de comunicação como o telégrafo, que em
1837 teve sua primeira patente registrada na Grã Bretanha por William
Fothergill e Charles Wheatstone11, seguida pela patente do telefone em 1876
por Alexander Graham Bell12, que trouxeram novas formas de se relacionar
com o espaço e com o tempo que impregnaram o olhar modernista.
4

                                                            
8
Ibid., acesso em 10 de mar., 2010
9
Ibid., acesso em 10 de mar., 2010
10
Ibid., acesso em 10 de mar., 2010
11
BRIGGS;BURKE, 2004, p. 142
12
Ibid., 2004, p. 149
16 

A questão da figura que se estilhaça e se reagrupa na pintura de Picasso, nos


fala de uma busca que permeia os movimentos artísticos de buscarem novas
formas de representação ligadas às características dos meios de produção que
absorvidos pela sociedade, implicam em novas formas de observar o mundo e
de interagir com este.

Figura 02 - Pablo Picasso: Les Demoiselles d'Avignon,1907


Fonte: http://www.bergoiata.org/fe/Art/10.htm, acesso em 8 mar., 2010

As incessantes buscas por novas formas de representação da imagem


acompanharam o imaginário do homem moderno, e no que se refere à busca
pelo automatismo da imagem, referenciado pelo advento da fotografia, forma
de representação marcante no Modernismo, este é revigorado com a imagem
eletrônica, que tem como seu primeiro suporte a TV e posteriormente o Vídeo,
formatos apropriados, pela sua característica estrutura formada por linhas, para
sofrer interferências, mas que segundo Couchot, representavam apenas uma
parcela do processo:
17 

“[...] a televisão torna-se capaz de analisar cada ponto de cada linha


da imagem e de reconstruir a imagem sob a forma de uma espécie de
mosaico luminoso... Mas nem sempre era possível controlar o ponto
de imagem com perfeita exatidão, agir por exemplo sobre um único
ponto...
Essa última etapa na busca do menor elemento constituinte da
imagem foi superada graças ao computador. O computador permitia
não somente dominar totalmente o ponto da imagem – pixel – como
substituir, ao mesmo tempo, o automatismo analógico das técnicas
televisuais pelo automatismo calculado, resultante de um tratamento
numérico da informação relativa à imagem.”
(COUCHOT, 1993, p.38)

Essa imagem numérica gerada por computador, ao qual Couchot se refere,


como “hibridação inesperada de um calculador eletrônico e de uma tela de
televisão”13 é identificada por Plaza como uma imagem algorítmica, que
segundo ele “é conseguida, portanto, pelos números como signos transdutores
e como regras organizativas, que impõe uma ordem ao conjunto dos pixels”.
(PLAZA; TAVARES, 1998, p. 28)

Essa nova ordem no mundo das imagens está presente no nosso contexto
cotidiano através dos aparatos eletrônicos e digitais que se multiplicaram desde
então, e que seguem o percurso de se realinharem como seus antecessores
técnicos com os anseios da criação artística. Nesse sentido, para Machado:

“É difícil imaginar que um artista sintonizado com o seu tempo não se


sinta forçado a se posicionar com relação a isso tudo e a se perguntar
que papel a arte ainda pode desempenhar nesse contexto[...]. Nesse
sentido, não é preciso muito esforço para perceber que o mundo da
mídias, com sua ruidosa irrupção no século XX, tem afetado
substancialmente o conceito e a prática da arte [...] em meios
despontados no século XX, como o cinema por exemplo, os produtos
da criação artística e da produção midiática não são mais tão
facilmente distinguidos com clareza.” (MACHADO, 2007, p. 23)

                                                            
13
COUCHOT, 1993, p.39
18 

2. O COMPUTADOR COMO FERRAMENTA ARTÍSTICA


 
 
Apesar da origem controversa da arte eletrônica é no ambiente da
experimentação da vídeoarte nos anos 1960, que segundo Machado (2007)
essa nova categoria surge com as experiências do alemão Wolf Vostell e do
coreano Nam June Paik. Ainda nessa década os computadores estavam
despertando o interesse de pesquisadores que partiram para a construção de
circuitos integrados, que otimizaram os processamentos e introduziram
conceitos como memória virtual, multiprogramação e sistemas operacionais,
que criaram uma nova geração que em muito se distanciava dos primeiros
computadores que retomam aos anos 1940 com o Eniac14 6 , de fabricação
americana e o Colossus, construído na Grã-Bretanha.

A codificação numérica que caracteriza o armazenamento de dados a ser


processado, passou por uma grande revolução em 1968, segundo Johnson
(2001), quando Doug Engebart fez uma demonstração em São Francisco de
um visor que de representava metáforas visuais de maneira inteligível através
de uma interface, termo que se refere “a softwares que dão forma à interação
entre, usuário e computador, ao atuar como uma espécie de tradutor,
mediando entre as duas partes, tornando uma sensível para a
outra.”(JOHNSON, 2001, p. 17)

Essa imagem surgida pela cartografia do código é descrita por Plaza como
uma imagem pós-industrial, predestinada à criação de novas artes:

“Se o modo de produção industrial se caracteriza pela produção de


imagens a partir de artefatos ótico-mecânicos (fotografia) ou eletro-
mecânicos, a produção pós-industrial caracteriza-se,
dominantemente, pelo uso de aparelhos de natureza numérica e
digital (infografia ou computação gráfica) e fotônica possivelmente,

                                                            
14
Ver em: http://www.mansano.com/beaba/hist_comp.aspx, acesso em 20 mar., 2010
19 

serão traduzidas em objetos, ou, ainda transmutados em outras


linguagens, em processos intersemióticos de multimídia. Essas
tecnologias, além de novas obras produzam novas artes.” (PLAZA;
TAVARES, 1998, p. 21)

A pesquisa em arte computacional teve como obra inaugural no Brasil o


trabalho Derivadas de uma imagem criada pelo artista plástico Waldemar
Cordeiro14 em parceria com o físico Giorgio Moscati, que se dedicava ao
desenvovimento de programas para finalidades multidisciplinares em 1969.
Derivadas de uma imagem trata-se de uma digitalização de uma imagem de
anúncio publicitário para os dias dos namorados, que tendo sido codificada
pelos então cartões perfurados que se constituiam como as memórias dos
antigos computadores, gerava derivações do original através da interferência
na base de dados, que mapeavam os claros e escuros, separando ou
agrupando os pontos de contraste, em acordo com o alternâncias dos cálculos

Figura 03 - Waldemar Cordeiro: Derivadas de


uma imagem, 1969
Fonte: http://www.visgraf.impa.br/Gallery/waldemar/waldemar.htm
acesso em 10 mar., 2010

                                                            
14
Arteônica, acesso em 10 de mar., 2010
20 

gráficos. Essa é potência da imagem digital, disposta a ser resignificada em


sua natureza de código repleto de possibilidades combinatórias. Uma outra
parceria dos dois se deu em Beabá também de 1969, obra voltada para a
pesquisa dos signos alfabéticos que agrupados em pares como ab, de, zu,
eram reagruapados continuamente de forma aleatória pelas linhas de cálculo
do computador que imprimia o resultado numa impressora line printer,
precurssora das contemporâneas jato de tinta e laser. Beabá se configura na
história da arte brasileira como o primeiro dos muito experimentos de
videotexto que começaram a surgir nos anos 70 e se fizeram muito presentes a
partir dos anos 80, tendo como um dos expoentes o artista e teórico Júlio
Plaza, com seu trabalhos de poesia em suportes eletrônicos que segundo ele
“se afastam da palavra tipo, a que é encontrada no dicionário, e passa a ser da
ordem da palavra evento, disposta em um contexto linguístico determinado
onde adquire as colorações diversas de sentido relativas ao contexto”
(PLAZA;TAVARES,1998, p.125). Entre seus experimentos em videotexto estão
Luz azul de 1982, um sistema de computação gráfica levado ao “ar”num painel
luminoso digital urbano, como também Pluvial...Fluvial, do mesmo ano,
inspirado numa poesia concreta de 1955 de autoria de Augusto de Campos,
utilizando o sistema de varredura videográfica para formar as palavras que
deslizam pela tela. Plaza leva adiante sua pesquisa de videotexto nos anos 90,
a reclassificando como videopoesias, lançando mão de procedimentos digitais
de síntese como a modelagem e renderização na plataforma Silicon Graphics
transferidas para fitas de vídeo como o U-Matic e o SVHS. É nesse contexto
dos anos 90, num período que a pesquisa de arte eletrônica avançava
utilizando-se de vários suportes,  que o advento dos  computadores em rede
anuncia o surgimento de uma nova categoria da arte eletrônica: a Web arte. 
21 

2.1 WEBARTE E YWEBARTE


 
 
 
Johnson (1999) aponta o surgimento do Mosaic , primeiro programa com
interface gráfica para a World Wide Web em 19 93, como fato que deflagrou
definitivamente a popularização da rede Internet que assumiu ao longo da
década a proporção de uma autêntica mídia de massa como a conhecemos
hoje e que despertou nos artistas o mesmo interesse que as mídias que a
antecederam.

No ciberespaço, termo cunhado pelo escritor Willian Gibson em seu legendário


livro Neuromancer de 1984 e definido por Pierre Lévy (1999) como espaço de
comunicação aberto pela interconexão mundial dos computadores e das
memórias dos computadores, novos experimentos artísticos começaram a ser
produzidos, gerando a necessidade dos pesquisadores de apontarem as
características que a arte assumiria nesse novo suporte de produção, a
exemplo do que Phillipe Dubois (2004) articula em seu livro Cinema, Vídeo
Godard, em que expressa as características fundamentais das imagens
videográficas como a sobreimpressão, o chroma-key e as multijanelas.
.

Nesse sentido de refletir sobre o novo meio, Lévy aponta o que seria uma nova
forma de se lidar com os signos:

[...] Para cada uma das grandes modalidades do signo,


texto alfabético, música e imagem, a cibercultura faz
emergir uma nova forma e maneira de agir.

Texto: hipertexto, indefinidamente aberto e móvel.


Música: sampling e remixagem.
Imagem: imersão e interação sócio-motora: a obra não
está mais distante, e sim ao alcance da mão e somos em
parte seus autores. ( LÉVY, 1999, p. 149)

É nesse contexto do ciberespaço de novas possibilidades de interconexões dos


signos que a Webarte acontece. No Brasil o pesquisador Fábio Oliveira Nunes
22 

relata alguns fundamentos intrísicos ao funcionamento da Internet que são


pontos fundamentais a serem considerados pelos artistas que se interessam
pelo novo meio, e que segundo ele delineiam a nova forma de produção dos
meios anteriores gerando experiências próprias diretamente relacionadas com
o espectador do ciberespaço:

Hipertexto - a utilização de hiperlinks entre documentos de um site é


a prática fundamental da rede. Além de ser a responsável pela
existência de complexas estruturas de navegação, estabelece a
escolha como ponto fundamental para o comportamento ativo do
Internauta.

Instantaneidade - a rede possibilita o uso de diversos dispositivos de


software e hardware que viabilizam a comunicação entre pessoas e a
transmissão de imagem e som em tempo real.

Interatividade - trata-se de um fenômeno comportamental que com a


existência dos suportes eletrônicos e digitais torna-se cada vez mais
efetiva. Interagir, agir, modificar e intervir são possibilidades dos
meios digitais que retornam mensagens e ações instantâneas a cada
intervenção do usuário. Sua utilização na Internet está intimamente
ligada com o uso do hipertexto, aplicativos multimídia e animações.

Imaterialidade - é um conceito diretamente relacionado com a


existência do ciberespaço. A destituição de referenciais físicos tanto
geográficos como materiais torna a experiência do Internauta, um
grande fluxo de informações.

Alcance Mundial - Não há fronteiras no mundo virtual: somente


caminhos a serem descobertos e percorridos.

Reprodutibilidade infinita - A rede proporciona a cópia infinita e a


inexistência de original. Na prática, a cada novo acesso a uma página
da Internet, uma nova cópia é transferida para o computador que
visitou o endereço da rede. (NUNES, 2003, p. 39)

No Espírito Santo a primeira experiência de Webart aconteceu com a exposção


Ywebart que teve sua primeira publicação em 1998, atualizada por mais duas
vezes nos anos de 2000 e 2005. Vindos em sua maioria da exposição Digital, o
grupo de artistas estava fortemente comprometido em estabelecer um espaço
privilegiado para a arte feita em computador e nessa primeira experiência com
o suporte em rede tudo se configurava como uma grande novidade. Estavamos
todos realmente empolgados e entregues a possibilidade de publicar um
trabalho virtual, sem a necessidade do suporte material e acessado de
qualquer ponto de conexão, que era uma nova forma de circulação que
23 

desafiava a ordem referente aos espaços sacralizados à Arte como também


uma inovação referentes à audiência do trabalho. Sem perceber as grandes
questões com as possibilidades técnicas oferecidas pela rede, evidenciada
pelo pouco uso de links e do movimento, o foco da maioria dos trabalhos está
simplemente em expor a imagem nesse suporte de luz, onde a imagem digital
ganha como nicho expositor a própria tela do computador. A questão da
Ywebarte diz mais respeito à propagação da imagem pela rede, tanto por
desenhos e especialmente pela fotografia, que se multiplica atualmente nas
inúmeras redes sociais centradas na publicação de álbuns virtuais como o
Orkut e o Fotolog, confirmando a natureza da fotografia digital que se
apresenta como algo a ser partilhado, que se nega a ser revelada num papel
esquecido num fundo de gaveta, mas que ao contrário quer ser acessada e
reprocessada a todo instante.

O meu primeiro trabalho de Webarte se chamava Neutrinos, e fez parte dessa


primeira leva de trabalhos da Ywebarte. Os neutrinos são micropartículas do
átomo capazes de dribar e atravessar corpos sólidos, uma referência a
imaterialidade que logo se tornou um tema de interesse para mim nesse novo
mundo virtual formado de luz. Os desenhos foram gerados diretamente no
computador não passando por prévias feitas em papel, estabelecendo a
continuação da minha relação com os vetores, a técnica de desenho dos
softwares que iniciei na série de cliparts, e que agora eu criava a partir do meu
computador. A relação com os links era nova para mim e devo admitir que
achava muito interessante poder criar vínculos entre uma imagem e outra,
traçando um singelo mapa de navegação para os internautas.
Na segunda atualização da YWebarte criei um longo plano de imagens
escaneadas de gravuras e objetos. Passei a me interessar pelas camadas de
cores das imagens, que separava revelando os layers que a constituíam
digitalmente e chamei o trabalho de Gira, uma tentativa de compartilhar minhas
gravuras e objetos pessoais de cunho religioso, escaneados sequencialmente
num único plano. A navegação é extremamente simples e mesmo já ciente dos
24 

Figura 04 – Herbert Pablo: Neutrinos, Web arte, 1998


Fonte: http://www.nenna.com/ywebarte/

recursos do software Flash para animar eu estava interessado no uso da barra


de rolagem para a visualização completa do trabalho, hoje considerada um
impecilho pelos arquitetos da informação, pelos riscos de que o internauta não
acesse os “cantos” da página.

Figura 05 – Herbert Pablo: Gira, Web arte, 2000


Fonte: http://www.nenna.com/ywebarte/

Na terceira atualização da Ywebarte, renomeada de Taru pelo artista e curador


Nenna, lancei o Bit Tarot, uma série onde tendo escaneado meu jogo de cartas
passei a deixar a mostra os pixels que passam a constituir a imagem a partir de
sua digitalização e criei questões relacionadas a circulação das inúmeras
25 

páginas de publicidade. Gerei um simulacro de site esotérico onde prometia


aos internautas que caso lessem os textos vinculados a cada arcano,
aprenderiam o mistério das cartas. Os textos na verdade eram contos escritos
por mim a partir de um ponto de vista subjetivo que tenho sobre cada
personagem do Tarot, o que certamente não faria de ninguém um tarólogo.
Estabelecida a ironia ativei links onde os internautas pudessem fazer
livremente downloads das 22 gravuras do Tarot, cada vez mais ciente dos
sistemas de compartilhamento de arquivos conhecidos como copyleft, que em
sua maioria circulam sem ao menos a assinatura do autor.

Figura 06 – Herbert Pablo: Bit Tarot, Web arte, 2000


Fonte: http://www.nenna.com/ywebarte/

Desvinculados de outros centros produtores desse novo suporte artístico,


produzimos intuitivamente essa primeira exposição e suas atualizações, e hoje
                                                            
26 

revisando a produção de alguns artistas que eram contemporâneos aos nosso


grupo dos anos 90, percebo outros caminhos conceituais, que não se baseiam
na publicação de imagens digitais. É o caso do Livro depois do Livro de Gisele
Beiguelman de 1999, que utilizando os recursos dos hiperlinks evidenciam
conceitualmente a natureza do documento hipertextual e de sua estrutura,
criando planos instigantes que revelam o cerne tecnológico usado para a
criação das páginas de web. Temos ainda a paisagem técnica criada pelos
artistas Celso Reeks e Thiago Boud’hors intitulada Lands Beyond, que segundo
Nunes (2003) estetiza os elementos comuns ás páginas da web e aborda a
partir do título e das composições – visivelmente aéreas – que diretamente
referencia a perda da importância geográfica e desterritorialização, tão em
voga nas discussões sobre a Rede Internet.

Figura 07 - Celso Reeks e Thiago Boud’hors : Lands Beyond, Web arte, 2003
Fonte: http://www.distopia.com/LandsBeyond/, acesso em 8 mar., 2010

De forte apelo metalinguístico esses trabalhos articulam o que Arlindo Machado


(2007) chama de uma necessidade dos artistas de interferir na própria lógica
das máquinas, subvertendo as possibilidades prometidas pelos aparatos e
colocando a nu os seus pressupostos e finalidades. Nesse sentido um trabalho
também de grande relevância foi lançado no ano 2000 pelo artista Mark Napier.
Trata-se de Riot, um browser não linear, que permite que digitemos o endereço
da URL desejada, mas ao contrário dos sistemas de busca de endereços
27 

eletrônicos convencionais, a informação da página é acessada com uma


grande fusão das informações nela contida, de forma a criar paisangens de
signos que se sobrepõe caoticamente, não permitindo o conforto da linearidade
de leitura de um browser convencional. É um trabalho que traz consigo uma
ação que Machado chama de “desprogramar” a técnica, distorcer as suas
funções simbólicas, obrigando-as a funcionar fora de seus parâmetros
conhecidos e a explicitar os seus mecanismos de controle e sedução. Um
caminho que deve certamente ser considerado pelos webartistas para que não
repitam os clichês das imagens fáceis da publicidade em suas obras, ou que as
coloquem a serviço da criação de algum conceito que a justifique enquanto
algo que almeje ser apreciado como arte.

Figura 08 - Mark Napier: Riot, Web arte, 2000


Fonte: http://www.potatoland.org/riot/ , acesso em 4 mar. , 2010

2.2 O MITO DA INTERATIVIDADE NA WEB


28 

Ao articular a palavra mito no título desse capítulo pensar em seus sentidos de


uso. Um primeiro que nos fala de algum enunciamento de grande vulto e outro
que nos remete a algo que não se constituiu da maneira esperada, que era
apenas um mito. Através dessas duas perspectivas tentarei abordar as
questões a cerca do desenvolvimento dos espaços de realidade virtual,
relacionados à criação de experiências interativas em mundos puramente
digitais.

Pierre Lévy afirma que “quanto mais a obra explorar as possibilidades


oferecidas pela interação, pela interconexão e pelos dispositivos de criação
coletiva, mais será típica da cibercultura... e menos será uma obra no sentido
clássico do termo...” (LÉVY, 1999, p. 147). É exatamente com nessa
perspectiva que endossa a interatividade como grande potência inovadora da
arte em rede que vimos surgir proposições ainda nos anos 90, não levadas a
diante, que trabalhos que não mergulhassem nessa questão não poderiam ser
categorizados como Web arte. A potência interativa já estava presente em
outras mídias bem mais antigas como no tete a tete do telefone e no rádio, no
que se refere à relação entre interlocutor e o auditório presente nos estúdios de
transmissão em seus primórdios, característica por sinal herdada pelos
programas de TV na atualidade. Tentar normatizar a produção artística via
regras é algo impossível, pois a produção de subjetividades desencadeiam
processos originais que não se adéquam a enquadramentos pré-estabelecidos.
Lev Manovich, autor da obra The Language of New Media, publicado em 1999,
vai além comentando em entrevista para O Estado de São Paulo:

“Todas as experiências culturais, no fundo, podem ser definidas como


uma forma de interação... Alguém que lê um texto não-interativo pode
também construir sua própria versão dele, mentalmente.”
(MANOVICH, LEV, acesso em 15 de mar. de 2010)
29 

A intenção de Manovich com essa afirmação é o de desviar o foco da


interatividade nas novas mídias no sentido em que elas não são as fundadoras
do gênero bem como não e se limitam a isso. Machado corrobora com a fala de
Manovich o afirmar que “a incorporação interativa das respostas do público se
transformou numa norma (quando não numa mania) em qualquer proposta
artística que se pretenda atualizada e em sintonia com o estágio atual da
cultura.” ( MACHADO, 2007, p. 53).

No contexto da Web arte a questão da interatividade se dá pela possibilidade


de percursos de navegação pelo internauta através dos vínculos entre páginas
acionados pelos links. É um fato intrínseco ao suporte que ganhou um estágio
de sofisticação com as novas técnicas de ambientes de simulação interativa
como o VRML, específico para a emulação em ambientes 3D, linguagem
enunciada pelos artistas como a grande possibilita Dora dos universos de
simulação interativa na Web. A cada inovação técnica os criadores se
atropelam em querer dominar a nova possibilidade de interagir com a
audiência, numa inquietante busca de não deixar que seus experimentos sejam
superados. A questão é que uma interface sofisticada como essa depende de
uma capacidade de processamento de dados que extrapola o atual estágio em
que a rede se encontra. Longe de querer desqualificar os experimentos dos
artistas, que certamente devem se apropriar das novas linguagens na intenção
de criar novas poéticas, mas que ao desviarem todas as atenções a cada
instante nesse nosso mundo de revoluções técnicas diárias, parecem as vezes
não contribuir com a produção de poéticas significativas e que principalmente
funcionem no ambiente virtual em rede.

A questão das simulações interativas parece estar sendo mais bem articulada
atualmente em instalações de arte eletrônica que prosperam utilizando
modernos recursos de projeção vinculados a softwares e telas sensíveis ao
toque no contexto das galerias de arte do que propriamente no circuito da Web
arte. Ao revisar os catálogos do Instituto Itaú Cultural (2002), responsável pelo
mapeamento da produção emergente no Brasil, pesquisa que se estende
desde os anos 90 até a atual década, percebo uma grande adesão dos artistas
30 

ao uso dos softwares interativos na intenção de criar ambientes de simulação


de forma muito mais abrangente do que na rede. Não que a produção na área
de Web arte se configure como nula, mas a experiência da interação emissiva
se deu de forma muito mais contundente no âmbito das instalações.

Ao longo da pesquisa houve a tentativa de acesso a sites com conteúdo


interativo e foram detectados sérios problemas de navegação como a tediosa
necessidade de instalação de vários plugins que são necessários para a
visualização das obras. Quando conseguimos superar alguns obstáculos
surgem incompatibilidades entre as placas de som ou a de cores utilizadas
pelos monitores. Clássicos na história da Web arte como Desertesejo15 de
Gilberto Prado e o sítio eletrônico da dupla holandesa Jodi16 são nesse instante
referências que não foram vivenciadas por questões técnicas.
9

Nesse contexto movediço da web as instalações bem como as chamadas


multimídias ou CD-ROOM, com conteúdo de navegação, são alternativas aos
interessados na simulação interativa, que acontecem com maior controle de
maneira off line, que com tecnologia compatível com a rede proliferam fora
dela.

Uma pesquisa voltada para os ambientes de simulação que se deu de maneira


mais completa ao meu ver, utilizou uma estratégia interessante ao pegar
carona num potente provedor de simulação conhecido como Second Life.
Trata-se de um trabalho de 2008 assinado por Giselle Beiguelman e Vera
Bighetti, chamado Arquiteturas Improváveis que parte dos princípios da
endofísica de Otto Roslër, que desembocaram na teoria do caos, para criar um
espaço que desafia a percepção dos internautas e reage à sua presença,
sendo remodelado e sofrendo mutações estruturais quando visitado e
percorrido. As artistas constroem nesse ambiente virtual povoado por Avatares,
duplos digitais dos internautas que utilizam a plataforma gratuitamente,
edifícios de arquiteturas improváveis, suspensas, transparentes e sem colunas,
                                                            
15
Ver em: http://www.cap.eca.usp.br/desertesejo/ , acesso em 20 fev. 2010
16
Ver em: http://www.jodi.org , acesso em 20 fev. 2010
31 

com formatos inusitados que permitem navegar no seu interior e exterior,


atravessando as paredes e mesclando-se com a estrutura. O trabalho acontece
a partir de uma plataforma consistente e o ambiente formado por esculturas de
imagens transitórias, baseadas em materiais líquidos e gasosos, sem portas ou
janelas, são um convite à exploração por sentidos emergentes nos contextos
dos espaços imersivos.

Figura 09 - Giselle Beiguelman e Vera Bighetti: Arquiteturas Improváveis


Fonte: http://www.noema.art.br/ai/ , acesso em 4 mar., 2010

Ainda pesquisando as relações de alguns artistas no que se refere à


contraposição entre instalações interativas e Web arte, um caso desperta
interesse. No site da artista Anaisa Franco me surpreendo com a complexidade
de seus trabalhos de instalação com o uso de softwares desenvolvidos por ela,
como no trabalho Expanded Eyes de 2009, que se constitui de projeções das
retinas do público que circula pela galeria em visores, que passam por
interferências em tempo real. Logo imaginei o que uma projetista de software
poderia apresentar como trabalho de Web arte e em contrapartida me deparei
com um único mas surpreendente trabalho desse gênero. Ao contrário do que
se pensaria o ambiente da web não foi escolhido pela artista como palco para
interações com seus softwares, mas surpeendentemente sua obra para o meio
32 

se configura de um simples livro codificado em pdf, que subverte a função


original desse arquivo que é o de compartilhar documentos e teses. O trabalho

Figura 10 – Anaisa Franco: Dreams Diary, Instalação, 2008


Fonte: http://www.anaisafranco.com, acesso em 4 mar., 2010

chama-se Dream Diary, apresentado como um livro bilíngue que narra de


forma descontinuada a aventura de um menino e de seu urso de estimação,
por motes as vezes grotescos , estetizados como desenhos infantis, que de tão
bem acabados nos fazem pensar se não seriam simulacros digitais dessa
estética, nesse mundo de imagens blefes em que estamos mergulhados. O
trabalho não lança mão de um aparato sofisticado como o da instalação off line

Figura 11 – Anaisa Franco: Dreams Diary, Arquivo pdf, 2007


Fonte: http://www.anaisafranco.com, acesso em 4 mar., 2010
33 

por uma escolha da artista, que certamente toca as questões relacionadas as


problemáticas de circulação de dados online, mas ao mesmo tempo cria uma
singular forma de circulação poética que depende da rede para completar o
ciclo de visibilidade do trabalho, que deve ter o link do pdf acessado e aberto
pelo usuário, que pode salvá-lo e até mesmo imprimi-lo se assim quiser, como
um livro convencional.

Dreams Diary é uma confirmação que a webarte prossegue em sua poética


surpreendendo nos novos modos de apropriação criativa do meio pelos
artistas, que não se apegam a obrigações ou regras a serem cumpridas para
comprovarem o valor da obra. É um trabalho que não discute da forma como
se convencionou pensar as questões da interatividade mas que cria relações
múltiplas com a sensibilidade da audiência, demonstrando que o conceito de
uma obra supera em muito o que Arlindo Machado chama de “uma espécie de
estética do merchandising, em que cada trabalho deve fazer nada mais que
uma demonstração das qualidades do hardware ou das potencialidades do
software.” (MACHADO, 2007, p.54)
34 

2.3 WEBARTISTAS E METALINGUAGEM

Através do verbete Web arte na rede foram pesquisadas amostras de trabalhos


cuja produção está centrada na Internet como suporte de linguagem e de
circulação. Nesses trabalhos dos artistas Chris Ashley, Rafael Rozendal e Elna
Frederick estão articulados elementos metalinguísticos como em trabalhos
inaugurais da Webarte a exemplo de Riot, que abordava os códigos
hipertextuais que estruturam as redes. Nas obras do artistas em questão as
questões estão voltadas á natureza da imagem digital.

Chris Ashley em seu blog Look see posta diariamente uma composição feita
em código HTML, que muito se aproxima esteticamente dos trabalhos
construtivistas e se relaciona diretamente com o movimento artístico
Supratismo17 iniciado pelo russo Kasimir Malevith em 1915 que defendia a
10

Figura 12 - Kasimir Malevich: Quadrilátero Negro sobre fundo branco, 1915


Fonte: http://www.pucsp.br/pos/cos/budetlie/tec6.htm , acesso em 9 mar., 2010

                                                            
17
Ver em: http://www.pucsp.br/pos/cos/budetlie/tec6.htm
35 

supremacia da forma pura em oposição ao mundo objetivo. O "Quadrilátero


negro sobre fundo branco" de Malevith é um dos trabalhos expoentes desse
movimnto artístico e pode ser considerado um precursor da discussão presente
nas composições de Chris, em sua busca construtiva de agrupar esses pontos
que expressam estruturalmente a possibilidade dos monitores expressarem
graficamente a imagem codificada de forma numérica, desvinculado da
representação figurativa.

Figura 13 – Chris Ashley: Honeycomb, 2010


Fonte: http://looksee.chrisashley.net/

Rafael Rozendal também tem uma série não figurativa, que em seu trabalho se
presentifica através de campos cromáticos que se sobrepõe como na animação
A fucking rainbow. Um outro trabalho seu que abusa da construção RGB do
artista é Infotime, uma tela de cor movediça que se deixa fatiar ao clique do
mouse, criando uma série de polígonos que vibram em cores que se fundem
em degrades. A discussão da cor luz, a cor que é emitida pelos suportes
luminosos dos computadores é uma necessidade de pesquisar e evidenciar as
36 

potencialidades dessa cartela cromática que é formada pelos sinais de RGB,


respectivamente red, green, blue, as chamadas cores primárias

Figura 14 – Rafael Rozendal: Infotime, Web arte, 2006


Fonte: http://www.newrafael.com, acesso em 10 mar., 2010

Mais um trabalho dessa série é Colorflip que consiste numa página de cor pura
que quando clicada permite que a cor seja trocada numa animação de uma
página de livro que vira, acompanhada do barulho realista de páginas,
descortinado a outra cor que está por baixo. Os planos de página se interpõe
criando uma bela metáfora de livro com as camadas de cor de cada página que
se sobrepõe a outra. Esses inúmeros layers também são próprios das imagens
de vídeo que segundo Dubois (2004) possuem o que podemos chamar de
espessura. São imagens que guardam em si múltiplas camadas.

Os bitmaps são o tema do trabalho de Elna Frederick. A interessante galeria on


line da artista traz o que esperamos de um autêntico trabalho de Web arte. É
impossível imaginarmos os trabalhos fora do suporte computador para sua
execução, e os leves gráficos gerados por bitmaps, mapeaments dos pontos
que constituem a imagem , criam paisagens de forte proposição estéticas que
tem como seu lugar de circulação ideal as telas dos computadores e o pouco
37 

espaço ocupado por esse tipo de imagem, e consequente rápido carregamento


do código HTML, evidencia a busca da artista de um meio estético que
evidencia sua natureza numérica, desvinculada de imagens originadas de
planos reais e que está mais adequado ao suporte da comunicação em rede.

A artista experimenta essas paisagens pixeladas também no campo da


animação criadas a partir de arquivos gifs, que tem como característica
sequenciarem imagens na web ao estilo das stop motions, como no trabalho
sea, algumas interativas como nos trabalhos wildlife, graveyard, stardust,
precipitation e no @=Landscape, no qual numa simples representação de
nuvem chovendo, cria uma interessante relação ao permitir que toquemos a
tela, influenciando na forma como evoluem o movimento das “gotas”.

Figura 15 – Elna Frederick, @=Landscape, Web arte, 2006


Fonte: http://elnafrederick.computersclub.org/, acesso em 6 mar., 2010

A animação interativa também está presente no trabalho de Rafael Rozendal,


baseadas em programações do software Flash. São vários experimentos
mediados pela ação dos mouses. Em Biglongow portas se abrem para lugar
algum e em Coldvoid teias de aranha grudam no mouse e podem ser
despedaçadas se manipuladas abruptamente.
38 

Figura 16 – Rafael Rozendal: Cold Void, Web arte, 2008


Fonte: http://www.newrafael.com/ , acesso em 4 mar., 2010

O software Flash usado nesses trabalhos de Rozendal, é uma plataforma de


animação com possibilidades de programação interativa para WEB, que
articulando especialmente os elementos do desenho se afasta da característica
dos emuladores VRML de 3D, em sua busca por renderizações de
perspectivas e texturas de profusão hiperealista. Essa busca pela síntese está
também expressa nos acima citados trabalhos de pixelarte e bitmaps se
relacionam em de alguma numa colocação feita pelo cineasta Jean-Luc Godard
em seu trabalho Nossa Música de 2004. Godard neste filme quer encontrar a
representação perfeita de uma imagem sagrada e repousa sua atenção sobre
uma madona bizantina, caracterizada pela bidimensionalidade de seus traços e
economia de simulações volumétricas, artifícios tão presentes nas madonas
renascentistas. Essa busca fala sobre o apuro de significado que encontramos
no ícone e que percebo estar presente no trabalho desses artistas que
apresentam em seus trabalhos fortes indícios de como a Web arte está sendo
articulada metalingusticamente nesse momento.

 
 
 
 
39 

2.4 TRANSMISSÃO, TELEPRESENÇA E REDES SOCIAIS EM EDUARDO


___KAC

As imagens dos programas de TV com repórteres conversando via satélite ao


vivo de diversos pontos do planeta e o cotidiano bate-papo no MSN pela
webcam com um amigo do outro lado da cidade, são imagens da ordem da
transmissão que telepresenticam atores e ações, ampliando nossa experiência
de espacialidade e temporalidade.

Trabalhando com demandas que são da ordem da telepresença e interessado


em questões acerca das redes sociais que se mobilizam para executar tarefas,
Eduardo Kac, que ficou famoso ao construir a coelha Alba, sua quimera de
DNA fluorescente, é um artista que articula os meios de uma maneira que
segundo Machado (2007) é uma forma de desprogramá-los para suas funções
originais. Nesse sentido a telepresença, as transmissões e o contato remoto
com o outro fazem parte de seu repertório de estratégias que refazem o sentido
de uso das tecnologias envolvidas em seus trabalhos ligados intimamente com
a questão dos processamento e transmissão dos códigos, inclusive nas suas
investidas no campo da arte transgênica, onde percebermos que ele trata o
texto combinatório do DNA como algo que pode ser reescrito, e o faz de fato.

Kac tem em seu repertório de produções trabalhos que tem por aparato
imprescindível para sua existência as webcams, o tráfego de pessoas na rede
e a vocação da Internet para as transmissões ao vivo, uma expressão da
imagem temporal que conhecíamos num primeiro momento da televisão e que
destacam Kac como um artista que utiliza a rede em seus processos.
 
Inaugurando a "arte transgênica", Kac apresentou em 1999 a obra Genesis
realizada no contexto do festival Ars Eletronica, em Linz, Áustria. Kac criou um
um gene sintético, inventado por ele mesmo e não existente na natureza.
40 

Figura 17 – Eduardo Kac: Genesis, Instalação, 1999


Fonte: http://www.ekac.org/ , acesso em 6 mar., 2010

O gene foi introduzido em bactérias, que foram postas em placas de Petri. Na


galeria, as placas foram postas sobre uma caixa de luz ultravioleta, controlada
por participantes remotos na Web. Ao acionar a luz UV, participantes na Web
causam mutação do código genético e assim mudam o texto contido no corpo
das bactérias.

Em Uirapuru, a ave amazonense famosa por seu canto e também pelas lendas
a ela associadas, transformou-se, na versão interativa de Kac, num peixe
voador telerrobótico que canta quando incorpora os espíritos daqueles que
estão longe, no caso a audiência esparsa geograficamente, mas agrupada em
um ponto da rede. Por meio de uma interface própria, o Uirapuru-robô pode ser
movido livremente no espaço da galeria, e esse movimento, captado por
sensores, é enviado a um servidor que, por sua vez, utiliza os dados de seu
deslocamento para mover um avatar do peixe voador no espaço virtual da
Web. Ao entrar no site do Uirapuru, atualmente fora do ar, os usuários podiam
também adotar seus próprios avatares em forma de peixe voador e interagir
com o avatar do Uirapuru telerrobótico ou com os outros avatares que estão
41 

nesse momento navegando na rede. No mesmo espaço da galeria, encontram-


se ainda diversos pássaros robóticos que simulam a fauna aviária tropical da
Amazônia e a exuberante sonoridade de seus cantos. Esses pássaros enviam
comandos a servidores localizados na região amazônica e um sistema experto
calcula o ritmo do tráfego na Internet, com base no tempo levado para os
comandos enviados de Tóquio serem respondidos pelos servidores de
Manaus. Os resultados obtidos são utilizados para modular a melodia do canto
dos pássaros. Assim, os pássaros cantam na galeria de acordo com o volume
total de trânsito de informação na rede planetária.

Figura 18 – Eduardo Kac: Uirapuru, Instalação, 1999


Fonte: http://www.ekac.org/ , acesso em 6 mar., 2010

Criado por Eduardo Kac e Ed Bennett em 1989, Ornitorrinco é o nome dado


tanto aos trabalhos de arte de telepresença em andamento quanto ao telerrobô
que os realiza.

Os eventos do Ornitorrinco envolvem duas localidades distintas. Um ou mais


membros do público navegam por instalação em local remoto, pressionando
teclas de telefone comum ou clicando no mouse de computador. Recebem,
então, feedback visual sob a forma de imagens paradas ou em movimento, em
tela de computador ou monitor de vídeo. Ao ser experimentada pela Internet, a
42 

peça pode ser vista por qualquer pessoa no mundo com acesso à rede,
eliminando paredes de galerias e tornando seu trabalho acessível a audiências
maiores. Com o Ornitorrinco, transformamos o espaço eletrônico de meio de
representação em meio de atuação.

Na mistura de telerrobótica, participação a distância, espaços geograficamente


dispersos, sistema normal de telefonia, controle de movimentos em tempo real
e videoconferência pela Internet, o trabalho em constante andamento produz
nova forma de arte interativa – arte que não se curva às estruturas
unidirecionais do cenário da mídia.

Outro trabalho igualmente importante dentro deste percurso é Teleporting An


Unknown State, de 1996, onde o artista coloca uma semente num espaço
expositivo que semina e cresce somente com uma luz “teletransportada” pela
rede Internet. Num espaço escuro, a semente recebe luz através de um
projetor de vídeo que transmite imagens de céus, enviadas em tempo real, por
internautas anônimos que apontam suas webcams para a luz do sol. Além da
participação colaborativa e coletiva dos participantes e da subversão ao uso
tradicional dos recursos de vídeo conferência, trata-se verdadeiramente de um
teletransporte de partículas luminosas: fótons que nutrem a vida da planta on
line.

Figura 19 – Eduardo Kac: Teleporting An Unknown State,


Instalação, 1996
Fonte: http://www.ekac.org/ , acesso em 6 mar., 2010
43 

3. ARTE ELETRÔNICA NO ESPÍRITO SANTO

Em Vitória recebíamos poucas informações a cerca das imagens técnicas.


Somos historicamente ligados ao fazer artesanal, e meus primeiros contatos
com obras de arte se deram no âmbito convencional das galerias capixabas
que investiam nas pesquisas principalmente de pintores e desenhistas. No
entanto, durante os anos 90 vivíamos a recente novidade da popularização dos
computadores como também da Internet, o que gerou produções experimentais
nesses meios e a consequente necessidade de ampliação das categorias
artísticas para abarcar as novas possibilidades de criação que eles expressam.

Nas galerias capixabas, trabalhos que se propunham a estudar os novos


suportes artísticos como a infogravura e a fotografia digital passaram a figurar
entre os suportes tradicionais da arte. Em 1997, a Galeria de Arte e Pesquisa
da UFES, sob a coordenação de Neusa Mendes, lança através da curadoria de
Flávia Carvalinho a exposição Digital - Arte no computador. Como inovação
técnica a exposição trouxe todos os trabalhos impressos em plotter sobre
papel, produzidos em grandes máquinas de jateamento de tinta e de queima de
pigmentos a laser e cera, que se tornaram acessíveis com a chegada de
grandes bureaus de impressões como a Xerox do Brasil, mesmo já sendo um
processo conhecido de Waldemar Cordeiro que em 1969 lançara em São
Paulo a exposição Computer Plotter Art111, colocando no circuito a técnica em
questão.

As discussões nessa época sobre o uso da impressão de plotter, categorizada


no circuito das artes como Infogravura, eram muitas, afinal tínhamos uma
questão a ser debatida: é possível multiplicar indefinidamente as gravuras
digitais sem perda de qualidade do produto final, processo que Arlindo
Machado chama de “uma vocação da imagem digital que é da ordem da
distribuição e não da reprodução, no sentido que cópias se confundem com a
matriz, pela não variação de qualidade na reprodução” (MACHADO, 2007)
extravazando os meios técnicos contemporâneos aos estudos de Walter
44 

Benjamim, como a fotografia, que inscrita em um suporte material, pode vir a


sofrer alternâncias nos percursos entre matriz e cópias.

Os trabalhos da Digital traduziam em sua maioria a ferramenta do computador


como um potente instrumento de colagem fotográfica, possibilitando a união de
elementos visuais de diversas naturezas em um mesmo plano, expressando o
que seria hoje a forma mais comum de imagem que encontramos, as
conhecidas fotomontagens, mantendo o discurso extremamente ligado à
estética do design, ao mesmo tempo que retomava as técnicas de
sobreposição e colagens fotográficas muito recorrentes às vanguardas
modernistas, como o trabalho da curadora da exposição Flávia Carvalinho
intitulado Medusa.

Figura 20 - Flávia Carvalinho: Medusa, Infogravura,1997


Fonte: Arquivo da artista

Especificamente o meu trabalho na Digital levava o nome dos desenhos


vetorizados que circulavam pela web, então chamados de cliparts e
recentemente conhecidos também como dingbats, disseminados como
45 

arquivos de fontes nas primeiras redes de troca de arquivos mantidas por


designers e artistas na Internet e que se multiplicam na atualidade como no
famoso sítio dafont.com, espaço dedicado ao compartilhamento de arquivos
para livre uso com amostras de proposições estéticas das mais variadas.
Minhas composições foram feitas através da apropriação desses cliparts, que
instalados no computador são acessados através de digitação como uma letra
comum, composta não por signos alfabéticos mas sim por desenhos,
evidenciando minha ironia com os limites pouco claros entre o que seria uma
imagem artística e uma imagem de design, colocando em circulação num
espaço artístico esses caracteres gráficos que tem como intenção primeira a de
serem usados em publicidades pelos designers gráficos.

Figura 21 – Herbert Pablo: Clipart, Infogravura, 1997


Fonte: Arquivo do artista
46 

Superada essa primeira questão estabelecida pela gravura digital, outras se


formavam entre os artistas, que habituados ao desenho e a pintura em
suportes tradicionais não sabiam ao certo categorizar a nova produção que
mediada pelo mouses, através dos recursos gráficos especialmente do
Photoshop, abria mão das ferramentas tradicionais como os pincéis, uma
atitude extrema aos olhos da classe artística capixaba extremamente ligada ao
fazer manual. Debates eram feitos acerca dessa nova mediação, e a
desconfiança que a imagem técnica ainda despertava por aqui chega a ser
engraçada. Os cânones capixabas repentinamente se depararam com suas
seculares texturas matéricas, como a aquarela, o carvão e o lápis pastel
migrando para o contexto de simulação dos softwares. Em relação a desordem
causada pela imagem técnica por aqui prevalece o comentário de Walter
Benjamim que “...em certos estágios do seu desenvolvimento as formas
artísticas tradicionais tentam laboriosamente produzir efeitos que mais tarde
serão obtidos sem qualquer esforço pelas novas formas de arte” (BENJAMIM,
1993, p. 185). Dessa mesma forma os próprios trabalhos da Digital, anunciados
como marca de grande novidade, ficaram diluídos pela insistente estética da
fotomontagem publicitária, num caminho de encanto pelas possibilidades do
software.

Além dos trabalhos de temática propriamente digital comecei a perceber o


aparecimento de outras estratégias de apropriação do computador para uso
artístico que começaram a despontar por aqui bem no final dos anos 90.
Alguns artistas passaram a usar os softwares como ferramenta de produção
de layouts que serviam como guias esquemáticos para a construção de murais
de pinturas, objetos e outras técnicas além da Infogravura tornando a
discussão da validade do uso do computador em processos artísticos cada vez
menos apropriada, tendo em vista a hibridização das técnicas digitais com as
técnicas tradicionais de arte. Estudos feitos nos softwares resultavam em
objetos artísticos como na série Brain Slicer de Juliana Morgado, que não tinha
sua discussão centrada no computador como ferramenta, mas sim no de criar
um simulacro de publicidade através do anúncio de um fatiador de cérebros.
47 

Figura 22 – Juliana Morgado: Brain Slicer, Objeto, 1999


Fonte: Arquivo do artista

A presença do computador no Brain Slicer aqui se dá primeiramente pela


adequação técnica do trabalho a ser produzido que é uma serigrafia em série,
que necessitava de uma matriz digital para se constituir, mas percebi que o
processo digital não estava simplesmente embutido como mera fase de
produção do trabalho, que foi materializado como um objeto serigrafado, mas
certamente acaba por influenciar a estética do mesmo. Livre do processo
artesanal de composição gráfica essa série arte finalizada por mim para a
artista teve a possibilidade de acabamento e experimentação de composição
sem medo de errar a matriz que antes não conhecíamos nos meios de
produção de arte final artesanal, que dizem respeito as hoje remotas
montagens das tipologias e ilustrações em mesas de luz. Alforriados dos
acertos manuais de fotolito e adeptos a novidade do control+z artistas passam
48 

a experimentar o computador como base de estudos para trabalhos finalizados


em outras técnicas diversas.

Essa tendência de projetar o trabalho artístico no computador e de se deixar


impregnar pela linguagem do mesmo está bem expressa na exposição 7Sete,
coletivo de artistas que ocuparam a galeria Homero Massena com trabalhos
acerca dos sete pecados capitais em 2000. Desde a montagem da exposição,
arquitetada a partir de uma planta digitalizada da galeria aos estudos para
produção dos trabalhos, percebíamos em nossa curadoria coletiva como o
computador estava fortemente presente nos processos. Todos trabalhos
transbordavam de informação gráfica mas eram feitos de pintura como a série
Inveja de Júlio Schmidt e no meu caso de serigrafia. Meu trabalho chamado
Avareza mesmo tendo sido finalizado por processo manual de serigrafia sobre
chapas de ferro esmaltados, trazia em suas imagens os ruídos da interface
digital percebidas pela pixelização da ampliação da fotografia digital de um
monitor de TV. Nossos trabalhos pareciam botões instalados na galeria, de tão
impregnados da arte final de computador que estavam. Naquele momento
estávamos superando as primeiras levas de trabalhos capixabas impressos e
apresentando uma pesquisa típica das Artes Plásticas que é a busca de
suportes associada à produção de sentidos, no caso da avareza a pesada
chapa de metal esmaltada de amarelo ouro, referenciado o apego a material.

Figura 23 – Herbert Pablo, Avareza, Serigrafia s/ metal, 2000


Fonte: Arquivo do artista
49 

Gostaria de dizer que mesmo já percebendo uma grande onda de


desmaterialização do objeto artístico nos anos 2000, meu interesse pelas
técnicas formais era e continua sendo muito grande, o que confunde até hoje
os colegas e a audiência das exposições, pois numa primeira impressão de
que voltado para a produção com softwares eu estaria desprezando a tradição
surpreende a todos quando passei a pintar, como na série Postais e montar
mosaicos dos meus arquivos. O resultado é pura arte de computador
desenvolvida com artifícios presentes desde os primórdios da história da arte.
Não havia um conflito para mim mas sim uma possibilidade de gerar novas e
outras poéticas.

Figura 24 – Herbert Pablo: Postal da Vila, Pintura, 2004


Fonte: Arquivo do artista

Em 2003 desenvolvi um trabalho que lidava com a questão da telepresença,


temática que não despertou interesse nos artistas que produzem na cidade.
Golem, apresentada no Museu de Arte do Espírito Santo em 2003, é uma ação
onde trancado em uma das salas do museu desenvolvo uma performance na
qual construía um Golem, criatura mitológica hebraica criada pela magia
humana desafiando á supremacia divina, enquanto a imagem da ação era
transmitida em tempo real a um projetor na sala ao lado através de um circuito
de transmissão mediado por 20 metros de cabos e experimentei pela primeira
50 

vez a diluição e a multiplicação do meu corpo em dois espaços em tempo


simultâneo.

Figura 25 – Herbert Pablo: Golem, Performance de telepresença, 2003


Fonte: Arquivo do artista

Para frisar como a inserção de uma nova técnica se dá de maneira caótica no


universo das artes tradicionais, um outro grande embate durante essa minha
inserção no circuito de galerias capixabas que diz respeito às frequentes
críticas recebidas pela fotografia digital em suas primeiras aparições nos
salões. Foco, qualidade de captura, a substituição do grão pelo pixel e a
famigerada manipulação digital eram bombas nas mãos dos fotógrafos
tradicionalistas que primavam pelo apuro técnico e se orgulhavam da qualidade
de revelação de seus negativos. Tínhamos em mãos a primeira leva de
câmeras digitais que proporcionavam a imediata possibilidade de interferência
nos valores cromáticos da imagem entre outras, e a nova gama de
possibilidades soava como uma trapaça para aqueles que a muito custo
aprenderam os esquemas da ampliação laboratorial. O que não se percebia
nesse primeiro instante é que da mesma forma que desenhávamos com o
mouse, utilizando-se dos recursos de espessura, textura e intensidade
simulados pelo computador e que pintávamos com os aerógrafos digitais,
51 

tínhamos a nossa disposição filtros digitais que referenciavam de maneira


explícita o fazer artesanal da fotografia: o azul do nitrato de prata e o sépia
agora era instaurados pelo color balance, fazíamos o negativo da foto através
do control+i (i de invert color), chegávamos a resultados idênticos aos da
solarização, obtidos classicamente através do truque de ascender a luz do
estúdio enquanto o papel fotográfico está mergulhado na emulsão reveladora,
através de um menu chamado solarize. O ajuste do contraste se dava de
maneira simplificada, sem a necessidade de acompanhar tempo de queima do
papel na sala escura e mesmo quem não possuía uma camereta digital, ainda
rara naquele momento, passou a usar o escâner para digitalizar e ajustar a luz
de sua foto. A indústria convulsionava para acompanhar os novos modos de
fotografar e de revelar e penso se as novas formas de fotografar
surpreenderiam o senhor Kodak, que ampliou nossa relação com a fotografia
quando passou a nos fornecer câmeras que deveriam ser enviadas para seus
laboratórios para terem o filme revelado, nos preparando de alguma forma para
essas novas relações que se estabeleceriam entre a fotografia e sua clientela
com os atuais aparatos técnicos digitais ao nos mostrar que nós também
somos capazes de fotografar.
Lembro de algumas técnicas de revelação que surgiram para atender a
demanda digital como a que gerava um negativo fotográfico a partir de um
arquivo jpg, o que era um tanto estranho para todos que estavam acostumados
a registrar suas fotos naquele negativo que ficava bem escondido da luz no
interior da câmera fotográfica. Uma outra, a que perdura até hoje espalhadas
pelos shoppings, possibilita a queima direta do papel fotográfico a partir de uma
imagem digitalizada, utilizando o mesmo sistema de cor luz RGB ( red, green,
blue) da revelação clássica, não tirando a imagem de seu espectro cromático
original, o que acontece com a infografia e com os processos de impressão
offset, que convertem esse sistema para o CMYK, sigla para cyan, magenta,
amarelo e preto, que se constituem como as cores pigmentos que por soma
atingem a policromia nas artes gráficas impressas. Todo esse tumulto deixou
os fotógrafos de certa forma acuados, da mesma maneira que os arte finalistas
de agências estavam pensando o que fazer da vida com a chegada do Corel
Draw que simulava muito das etapas da finalização manual de layouts. Do meu
52 

ponto de vista o que tinha que ser feito era simples: um bom curso de
informática! A tentativa de desqualificar a foto digital foi inútil e ela passou a
integrar inevitavelmente o circuito de salões de arte. Em Vitória o responsável
pela consagração do estilo ficou por conta do artista plástico Orlando da Rosa
Farya. Com uma pesquisa voltada para a pintura desde os anos 70, Orlando
transfere sua discussão pictórica para a fotografia digital, articulando as
similaridades de representação desses dois processos, como o pontilhismo, em
um percebido através das pinceladas que constituem o plano pictórico e no
outro o pixel, bem como das camadas cromáticas, na pintura expressa pelas
veladuras de tinta e na imagem de síntese pelos canais RGB que se sobrepõe
para definir o espectro cromático da fotografia digital.

Figura 26 – Orlando da Rosa Farya: Marina do Recife, Foto Digital, 2010


Fonte: Arquivo do artista

Revelando a estrutura de suas imagem em ampliações dramáticas, presente


no trabalho Marina do Recife, que nos fazem perceber o tumulto dos pontos
cromáticos que se aglomeram para formar o plano, o artista demonstra que
estamos longe do esgotamento das questões conceituais e estéticas dessa
nova geração de imagens, que dialogam com as imagens que as antecedem
historicamente gerando novas cadeias de significados, conceitos e poesia.
53 

3.1 FOLHETIM SEREIA 


 

Alojado no sítio eletrônico folhetimsereia.com, o meu novo trabalho de Web


arte, com a primeira postagem em 2009, nasce das minhas observações da
cidade grafitada por muitos incógnitos artistas que numa estratégia de
aproximação com a audiência das ruas assinam seus trabalhos com endereços
de seus sítios eletrônicos ao mesmo tempo que demonstram na estética de ses
desenhos e tags, uma pregnância de valores gráficos que podem ser
referenciados pelo constante uso do computador. Fiquei instigado em viver a
experiência de interferir no corpo da cidade deixando links para o folhetim.com
e também para o fotolog.com/folhetimsereia e ao receber a confirmação que o
trabalho tinha sido aprovado pela Bienal do Mar em Janeiro de 2009.

O Folhetim Sereia começa pela minha coleção de jpgs do Google que organizo
como figurinhas em álbuns no meu micro. Quando colecionamos no
computador e passamos a organizar agrupamentos de imagens em pastas,
percebemos como associamos afetivamente umas com as outras fazendo com
que faça sentido que sejam guardadas no mesmo diretório. Cindy Scherman,
Nan Goldin, Orlan, Márcia X, Rebecca Horn e Marina Abramovic, viviam juntas
numa pasta nomeada de Sereias. Cindy continuava a se fotografar travestida
sob a máscara de algum personagem. Desde sua séries de Stills de 1970,
fotografias simulacro de frames de filmes que não existem, falar de auto-retrato
em sua obra é refletir sobre a construção de personagens. Das imagens de
cinema, Cindy estava agora interessada em pintura clássica em uma nova
série de seus supostos auto-retrativos, mascarada como madonas medievais.

Em Orlan eu estava interessado numa imagem setentista de uma de suas


primeiras performances. Vestindo uma armadura de látex que simulava sua
nudez e anunciava em letras pretas O Beijo da Artista, que estava sendo
vendido por moedas que podiam ser depositadas num bolso próximo ao falso
seio.
54 

Nan afetar be battering é um auto-retrato de uma mulher que acabou de ser


espancada pelo namorado. Nan Goldin com seus relatos fotográficos, diários
íntimos abertos, foi uma das primeiras que postei no fotolog, que passava a ser
o meu bloco de notas onde eu estava criando relações com a imagem das
mulheres artistas que eu me apropriaria no Folhetim, assim como seus relatos
fotográficos são anotações sobre seu próprio cotidiano.

O registro da performance Pancake de Márcia X me impressiona pela força


com que ela se apropria de elementos associados ao feminino, nesse caso o
leite moça e confeitos com docinhos, e os transforma seu próprio corpo numa
convulsiva escultura viva ao se banhar com esses materiais.

Fotos de mais duas performances fechavam o grupo. Usando extensões


ligadas ao corpo Marina Abramovic, calçando seu pesado sapato de ágata não
consegue se mover e Rebecca Horn, vestindo sua máscara de lápis de
escrever tenta se comunicar.

Essas seis mulheres que propõem através seus corpos conflitos de diversas
naturezas, assim como as sereias, híbridos de homem e peixe em eterno
embate por pertencerem a dois mundos ao mesmo tempo, chegaram a mim
através de suas imagens á deriva na rede. Interessado em manipulá-las criei
reproduções onde estudava o desenho de seus rostos no processo de
vetorização, reconstruindo as feições com linhas gráficas chapadas. Essa é
uma técnica que relega à imagem um caráter bidimensional se afastando da
perspectiva e da profusão cromática, máximas usadas pela pintura e fotografia
para criar simulações dos objetos com que se deixam impregnar. Nesse ponto
da produção eu sabia que o que eu tinha em mãos eram imagens em trânsito,
que produzidas como fotografias de arte ou registro de ações de performances,
se multiplicaram num circuito de comunicação digital e agora estavam prestes
a terem seu discurso atualizado através de sua materialização na cidade.

Dos moldes digitais nasceram grandes vitrais urbanos, pintados com verniz, o
que tornava esses corpos femininos transparentes e aflitos em se mimetizarem
55 

com o entorno urbano. As paredes de vidro dos pontos de ônibus eram o


suporte para criar com o interessantes com os pedestres que parados
aguardam a condução como quem posa para os arranjos do pintor ou do
fotógrafo. Passei a fotografar e gravar as relações dessas imagens em
processo com a cidade para criar um espelho na web, rede que mediou meu
primeiro contato com elas e para onde seriam devolvidas.
No site do folhetim os planos móveis do vídeo e a fotografia sequencial das
pinturas transparentes são ativadas ao tocarmos novos vetores animados feitos
a partir do registro fotográfico da pintura. São relações de trocas estéticas
geradas pelo percurso que essas imagens seguem e a impregnam de novos
sentidos através dos vestígios dos processos que as perpassaram.

Figura 26 – Fotomontagem do percurso da imagem no Folhetim Sereia. Sequencialmente: jpg


de Internet com o “original” de Cindy Scherman, vetorização para molde da pintura, pintura
aplicada na cidade e vetorização da pintura que é redigitalizada como ícone animado
Fonte: Arquivo Herbert Pablo

A somatória dos processos que envolvem o trabalho, diálogos entre pintura, a


fotografia, vídeo e desenho animado parecem ter criado no Folhetim Sereia
uma família de imagens mestiças, termo usado por Machado (2007) para
referenciar e que ele chama de imagens que tem suas origens em
hibridizações técnicas artísticas que se somam e se sobrepõe na intenção de
criar esses híbridos.

Ser mestiça nesse sentido é certamente uma marca dessas novas gerações de
imagens inquietas por trafegarem nos muitos fluxos de possibilidades técnicas
56 

na intenção de ampliarem os territórios sempre em expansão da arte


contemporânea.
57 

4. CONCLUSÃO

As questões que surgem diante das trocas simbólicas entre Arte e Mídia, nos
fazem buscar novos referenciais críticos que nos possibilitem analisar e discutir
os conceitos articulados nesses novos tipos de arte. Em seu percurso de
apropriação de meios fundados no interior de modelos econômicos, a Arte
Eletrônica, em suas muitas expressões como a Infogravura, a Videoinstalação
e a Web arte, confronta o olhar desatento ao criar relações subjetivas que não
estão circunscritas nos parâmetros previsíveis de uso da técnica midiática ao
mesmo tempo que suscitam questionamentos a cerca de seu valor como arte,
por parte de uma audiência ainda apegada ao conceito da “aura” da obra de
arte descrita por Benjamim (2003), relacionada a valores do objeto único. No
entanto, em nossa sociedade em rede torna-se cada vez distante esse olhar
obtuso. Estamos vivenciando na atualidade experiências através da tecnologia
que dinamizam e reestruturam as relações sociais e reformulam o objeto
artístico, perpassado pelos ruídos que se fazem entre os suportes materiais e
eletrônicos, com sua intrínseca capacidade de ampliar nossa relação como
expectadores da obra ou como co-autores da mesma.

As novas formas de representação e de interação com a imagem desafiam as


formas clássicas de produção artística ao se apresentarem aliadas à potência
digital da simultaneidade e da convergência dos meios pela codificação
numérica. Nesse contexto contemporâneo o que interessa na visão de
Machado (2007) não é pensar os meios individualmente, mas focar as
passagens que se dão entre a fotografia, o cinema, o vídeo e as mídias digitais.

A Web arte, que tem como seu suporte a rede digital de computadores
certamente demonstra através de seus artistas, que está apta a discutir essas
passagens entre os meios e as hibridizações que caracterizam a produção de
arte contemporânea.
58 

5. REFERÊNCIAS

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