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FOLHETIM SEREIA:
PERCURSOS DA WEBARTE
VITÓRIA – ES
2010
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FOLHETIM SEREIA:
PERCURSOS DA WEBARTE
Monografia apresentada
à Pós-Graduação em Linguagens
Audiovisuais e Multimídia do
Departamento de Comunicação Social
da Universidade Federal do Espírito
Santo, como requisito parcial para
obtenção do título de Especialista em
Linguagens Audiovisuais e Multimídia.
Orientadora: Prof.ª Msª Daniela Zanetti
VITÓRIA – ES
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2010
FOLHETIM SEREIA:
PERCURSOS DA WEBARTE
COMISSÃO EXAMINADORA
________________________________
Prof.ª Ms.ª Daniela Zanetti
Universidade Federal do Espírito Santo
Orientadora
________________________________
________________________________
Prof.ª Ms.ª Rosane Zanotti
Universidade Federal do Espírito Santo
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Para meus padrinhos Guerino Fieni e T. Ruas
AGRADECIMENTOS
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RESUMO
A necessidade de investigar a produção de arte pela Internet diz respeito a
questões que evocam a minha própria produção artística, iniciada em Vitória
nos anos 90 na exposição Digital - Arte por Computador e especialmente na
Ywebarte, considerada uma das primeiras galerias de trabalhos virtuais que se
propuseram a discutir a arte na WEB. Este trabalho contextualiza as
sucessivas apropriações históricas dos meios técnicos pelos artistas e
especificamente as relações desses com o novo campo de trabalho chamado
Web arte, e suas potencialidades técnicas como a interatividade, apresentando
obras referenciais nesse campo de pesquisa como as do artista Eduardo Kac,
que articulam processos de transmissão e recepção de mensagens, e dos
artistas Rafael Rozendal e Elna Frederick, que abordam em suas obras
poéticas metalinguísticas que desvelam a estrutura da imagem sob as
interfaces de representação da WEB.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO
1. ARTE, TÉCNICA E TECNOLOGIA NAS ARTES
2. O COMPUTADOR COMO FERRAMENTA ARTÍSTICA
2.1 WEB ARTE E YWEBARTE
2.2 O MITO DA INTERATIVIDADE NA WEB
2.3. WEBARTISTAS E METALINGUAGEM
2.4 TRANSMISSÃO, TELEPRESENÇA E REDES SOCIAIS
EM EDUARDO KAC
3. A EXPERIÊNCIA DA ARTE ELETRÔNICA NO ESPÍRITO SANTO
3.1 FOLHETIM SEREIA
4. CONCLUSÕES
5. REFERÊNCIAS
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INTRODUÇÃO
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Percebe-se que a partir desse momento no século XIX uma forte articulação da
imagem gerada automaticamente na câmera escura, referente á fotografia e ao
cinema, que prosperaram como o meios de representação que expressaram as
urgências do mundo moderno em meio á Revolução Industrial5, termo
empregado pela primeira vez na França em 1928 para indicar a disseminação
dos maquinários industriais a vapor, cuja primeira patente retoma ao ano de
1769 e que com sua expiração em 1800, teve sua ampla disseminação na
Inglaterra, Europa e Estados Unidos, o que reformulou o conceito de trabalho e
produção que passaram a alimentar o imaginário popular e artístico, como no
filme Metrópolis dirigido por Fritz Lang em 1927, que traz além de uma
metáfora do automatismo exposta na presença da personagem Maria, um robô
de forma sensualmente humana, a apresentação de uma cidade permeada por
arranha-céus, onde tudo aponta para cima, num sentido de busca já presente
na arquitetura gótica, mas que visa o progresso e não os meandros do divino,
separando trabalhadores ocupados em fazer com que as máquinas funcionem
nos porões, e os donos das máquinas que habitam as alturas das construções.
Blade Runner rodado em 1982 por Martin Scorcese, também usa essas
máximas em sua narrativa. Sua cidade é como a de Langz, mas seus
autômatos são libertos do corpo maquímico e forjados pelas leis de
manipulação genética. Já a cidade de Matrix, produzido em 1999 pelos irmãos
Wachowski é desmaterializada, formada pelo fluxos de informações
organizados por inteligências artificiais e habitada por duplos virtuais que agem
dentro dessa ilusão consensual forjada pelas máquinas. 2
5
Ver em http// www.históriasmodernas.com.br, acesso em 4 mar., 2010
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Metrópolis, Blade Runner e Matrix são obras que debatem através de suas
metáforas a forte presença da tecnologia em momentos históricos diferentes. A
máquina, o ser híbrido e a virtualização dos corpos expressam uma forte
relação contextual com a ciência de cada época nesses filmes que pertencem
a um gênero narrativo que conhecemos por ficção científica, responsável na
literatura e no cinema por agrupar obras que se fundamentam pelo interesse no
tecnológico.
Uma das primeiras obras literárias que trazem elementos do gênero de ficção
científica é Frankenstein, ou o moderno Prometeu de Mary Shelley, escrita em
1818. O cientista que tenta dominar a força dos raios para animar sua criatura
feita de resto de cadáveres, é uma narrativa que se sustenta no então recente
advento da eletricidade. Percebe-se a confluência entre o imaginário da autora,
que redigiu o livro em 1818, em meio aos estudos científicos da época sobre a
potência de força contida nos raios, que se confirmaram com o advento da
lâmpada elétrica por Thomas Edison6, primeiro a desenvolver a primeira delas
capaz de ser comercializada em 1879, o que acarretou em 1882 a construção
da primeira usina elétrica, em Nova York.
8
Ibid., acesso em 10 de mar., 2010
9
Ibid., acesso em 10 de mar., 2010
10
Ibid., acesso em 10 de mar., 2010
11
BRIGGS;BURKE, 2004, p. 142
12
Ibid., 2004, p. 149
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Essa nova ordem no mundo das imagens está presente no nosso contexto
cotidiano através dos aparatos eletrônicos e digitais que se multiplicaram desde
então, e que seguem o percurso de se realinharem como seus antecessores
técnicos com os anseios da criação artística. Nesse sentido, para Machado:
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COUCHOT, 1993, p.39
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Essa imagem surgida pela cartografia do código é descrita por Plaza como
uma imagem pós-industrial, predestinada à criação de novas artes:
14
Ver em: http://www.mansano.com/beaba/hist_comp.aspx, acesso em 20 mar., 2010
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14
Arteônica, acesso em 10 de mar., 2010
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Nesse sentido de refletir sobre o novo meio, Lévy aponta o que seria uma nova
forma de se lidar com os signos:
Figura 07 - Celso Reeks e Thiago Boud’hors : Lands Beyond, Web arte, 2003
Fonte: http://www.distopia.com/LandsBeyond/, acesso em 8 mar., 2010
A questão das simulações interativas parece estar sendo mais bem articulada
atualmente em instalações de arte eletrônica que prosperam utilizando
modernos recursos de projeção vinculados a softwares e telas sensíveis ao
toque no contexto das galerias de arte do que propriamente no circuito da Web
arte. Ao revisar os catálogos do Instituto Itaú Cultural (2002), responsável pelo
mapeamento da produção emergente no Brasil, pesquisa que se estende
desde os anos 90 até a atual década, percebo uma grande adesão dos artistas
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Chris Ashley em seu blog Look see posta diariamente uma composição feita
em código HTML, que muito se aproxima esteticamente dos trabalhos
construtivistas e se relaciona diretamente com o movimento artístico
Supratismo17 iniciado pelo russo Kasimir Malevith em 1915 que defendia a
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Ver em: http://www.pucsp.br/pos/cos/budetlie/tec6.htm
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Rafael Rozendal também tem uma série não figurativa, que em seu trabalho se
presentifica através de campos cromáticos que se sobrepõe como na animação
A fucking rainbow. Um outro trabalho seu que abusa da construção RGB do
artista é Infotime, uma tela de cor movediça que se deixa fatiar ao clique do
mouse, criando uma série de polígonos que vibram em cores que se fundem
em degrades. A discussão da cor luz, a cor que é emitida pelos suportes
luminosos dos computadores é uma necessidade de pesquisar e evidenciar as
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Mais um trabalho dessa série é Colorflip que consiste numa página de cor pura
que quando clicada permite que a cor seja trocada numa animação de uma
página de livro que vira, acompanhada do barulho realista de páginas,
descortinado a outra cor que está por baixo. Os planos de página se interpõe
criando uma bela metáfora de livro com as camadas de cor de cada página que
se sobrepõe a outra. Esses inúmeros layers também são próprios das imagens
de vídeo que segundo Dubois (2004) possuem o que podemos chamar de
espessura. São imagens que guardam em si múltiplas camadas.
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Kac tem em seu repertório de produções trabalhos que tem por aparato
imprescindível para sua existência as webcams, o tráfego de pessoas na rede
e a vocação da Internet para as transmissões ao vivo, uma expressão da
imagem temporal que conhecíamos num primeiro momento da televisão e que
destacam Kac como um artista que utiliza a rede em seus processos.
Inaugurando a "arte transgênica", Kac apresentou em 1999 a obra Genesis
realizada no contexto do festival Ars Eletronica, em Linz, Áustria. Kac criou um
um gene sintético, inventado por ele mesmo e não existente na natureza.
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Em Uirapuru, a ave amazonense famosa por seu canto e também pelas lendas
a ela associadas, transformou-se, na versão interativa de Kac, num peixe
voador telerrobótico que canta quando incorpora os espíritos daqueles que
estão longe, no caso a audiência esparsa geograficamente, mas agrupada em
um ponto da rede. Por meio de uma interface própria, o Uirapuru-robô pode ser
movido livremente no espaço da galeria, e esse movimento, captado por
sensores, é enviado a um servidor que, por sua vez, utiliza os dados de seu
deslocamento para mover um avatar do peixe voador no espaço virtual da
Web. Ao entrar no site do Uirapuru, atualmente fora do ar, os usuários podiam
também adotar seus próprios avatares em forma de peixe voador e interagir
com o avatar do Uirapuru telerrobótico ou com os outros avatares que estão
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peça pode ser vista por qualquer pessoa no mundo com acesso à rede,
eliminando paredes de galerias e tornando seu trabalho acessível a audiências
maiores. Com o Ornitorrinco, transformamos o espaço eletrônico de meio de
representação em meio de atuação.
ponto de vista o que tinha que ser feito era simples: um bom curso de
informática! A tentativa de desqualificar a foto digital foi inútil e ela passou a
integrar inevitavelmente o circuito de salões de arte. Em Vitória o responsável
pela consagração do estilo ficou por conta do artista plástico Orlando da Rosa
Farya. Com uma pesquisa voltada para a pintura desde os anos 70, Orlando
transfere sua discussão pictórica para a fotografia digital, articulando as
similaridades de representação desses dois processos, como o pontilhismo, em
um percebido através das pinceladas que constituem o plano pictórico e no
outro o pixel, bem como das camadas cromáticas, na pintura expressa pelas
veladuras de tinta e na imagem de síntese pelos canais RGB que se sobrepõe
para definir o espectro cromático da fotografia digital.
O Folhetim Sereia começa pela minha coleção de jpgs do Google que organizo
como figurinhas em álbuns no meu micro. Quando colecionamos no
computador e passamos a organizar agrupamentos de imagens em pastas,
percebemos como associamos afetivamente umas com as outras fazendo com
que faça sentido que sejam guardadas no mesmo diretório. Cindy Scherman,
Nan Goldin, Orlan, Márcia X, Rebecca Horn e Marina Abramovic, viviam juntas
numa pasta nomeada de Sereias. Cindy continuava a se fotografar travestida
sob a máscara de algum personagem. Desde sua séries de Stills de 1970,
fotografias simulacro de frames de filmes que não existem, falar de auto-retrato
em sua obra é refletir sobre a construção de personagens. Das imagens de
cinema, Cindy estava agora interessada em pintura clássica em uma nova
série de seus supostos auto-retrativos, mascarada como madonas medievais.
Essas seis mulheres que propõem através seus corpos conflitos de diversas
naturezas, assim como as sereias, híbridos de homem e peixe em eterno
embate por pertencerem a dois mundos ao mesmo tempo, chegaram a mim
através de suas imagens á deriva na rede. Interessado em manipulá-las criei
reproduções onde estudava o desenho de seus rostos no processo de
vetorização, reconstruindo as feições com linhas gráficas chapadas. Essa é
uma técnica que relega à imagem um caráter bidimensional se afastando da
perspectiva e da profusão cromática, máximas usadas pela pintura e fotografia
para criar simulações dos objetos com que se deixam impregnar. Nesse ponto
da produção eu sabia que o que eu tinha em mãos eram imagens em trânsito,
que produzidas como fotografias de arte ou registro de ações de performances,
se multiplicaram num circuito de comunicação digital e agora estavam prestes
a terem seu discurso atualizado através de sua materialização na cidade.
Dos moldes digitais nasceram grandes vitrais urbanos, pintados com verniz, o
que tornava esses corpos femininos transparentes e aflitos em se mimetizarem
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Ser mestiça nesse sentido é certamente uma marca dessas novas gerações de
imagens inquietas por trafegarem nos muitos fluxos de possibilidades técnicas
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4. CONCLUSÃO
As questões que surgem diante das trocas simbólicas entre Arte e Mídia, nos
fazem buscar novos referenciais críticos que nos possibilitem analisar e discutir
os conceitos articulados nesses novos tipos de arte. Em seu percurso de
apropriação de meios fundados no interior de modelos econômicos, a Arte
Eletrônica, em suas muitas expressões como a Infogravura, a Videoinstalação
e a Web arte, confronta o olhar desatento ao criar relações subjetivas que não
estão circunscritas nos parâmetros previsíveis de uso da técnica midiática ao
mesmo tempo que suscitam questionamentos a cerca de seu valor como arte,
por parte de uma audiência ainda apegada ao conceito da “aura” da obra de
arte descrita por Benjamim (2003), relacionada a valores do objeto único. No
entanto, em nossa sociedade em rede torna-se cada vez distante esse olhar
obtuso. Estamos vivenciando na atualidade experiências através da tecnologia
que dinamizam e reestruturam as relações sociais e reformulam o objeto
artístico, perpassado pelos ruídos que se fazem entre os suportes materiais e
eletrônicos, com sua intrínseca capacidade de ampliar nossa relação como
expectadores da obra ou como co-autores da mesma.
A Web arte, que tem como seu suporte a rede digital de computadores
certamente demonstra através de seus artistas, que está apta a discutir essas
passagens entre os meios e as hibridizações que caracterizam a produção de
arte contemporânea.
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5. REFERÊNCIAS
LÉVY, Pierre. Cibercultura / Pierre Lévy; tradução Carlos Irineu da Costa. Rio
de Janeiro: Ed. 34, 1999.
LITOGRAVURA. Disponível em http://tipografos.net/tecnologias/litografia.html
MACHADO, Arlindo. Arte e Mídia. 2.ed. Rio de Janeiro: Ed. Jorge Zahar, 2008.
NUNES, Fábio Oliveira. Web arte no Brasil : algumas poéticas e interfaces
no universo da rede Internet / Fábio Oliveira Nunes.
— Campinas, SP : [s.n.], 2003.
PABLO PICASSO. Disponível em: http://www.bergoiata.org/fe/Art/10.htm
PLAZA, JÚLIO. Processos criativos com os meios eletrônicos: Poéticas
Digitais / Júlio Plaza e Mônica Tavares. São Paulo: Ed. Hucitec Ltda, 1998.
RAFAEL ROZENDAL. Disponível em: http://www.newrafael.com/