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DIREITO PENAL

Prof. Nidal Ahmad


1. DA APLICAÇÃO DA LEI PENAL

1.1. DA LEI PENAL NO TEMPO

I) INTRODUÇÃO

Pelo princípio tempus regit actum (‘o tempo rege o ato’), a lei
penal não alcança os fatos ocorridos antes ou depois de sua vigência, de forma que,
em regra, a lei aplicável a um crime é aquela vigente ao tempo da execução deste crime.

A regra, pois, é que a atividade da lei penal se dê no período de


sua vigência; a extra-atividade é exceção a esta regra.

II) PRINCÍPIOS DA LEI PENAL NO TEMPO

Há dois princípios que regem os conflitos de leis penais no


tempo:

1º) o da irretroatividade da lei mais severa;

2º) o da retroatividade da lei mais benigna.

Esses dois princípios podem ser resumidos em um só: o da


retroatividade da lei mais benigna.

O princípio da irretroatividade da lei mais gravosa constitui um


direito subjetivo de liberdade, com fundamento no art. 5º, XXXVI e XL, da CF/88. O
primeiro dispõe que “a lei não prejudicará o direito adquirido”; o segundo, que “a lei penal
não retroagirá, salvo para beneficiar o réu”.

1.2. HIPÓTESES DE CONFLITOS DE LEIS PENAIS NO TEMPO

A) ABOLITIO CRIMINIS

Ocorre a chamada abolitio criminis quando a lei nova já não


incrimina fato que anteriormente era considerado como ilícito penal. A nova lei,
demonstrando não haver mais, por parte do Estado, interesse na punição do autor de
determinado fato, retroage para alcançá-lo. (adultério era típico, mas se tornou atípico
com a Lei 11.106/05). É decorrência da previsão do art. 5º, XL, CF, e art. 2º, do CP.

A abolitio criminis, além de conduzir à extinção da punibilidade,


apaga todos os efeitos penais da sentença condenatória, permanecendo, no entanto,
íntegros seus efeitos na esfera cível. É o que se extrai do artigo 2º do Código Penal.
Diante disso, incidindo a abolitio criminis, a consequência lógica
será a retirada do nome do agente do rol de culpados, além de a condenação em relação
ao crime abolido não poder ser considerada para fins de reincidência ou antecedentes
criminais. Os efeitos civis, no entanto, permanecem hígidos, sendo possível a vítima
buscar a reparação de danos na esfera cível por meio da respectiva ação de execução,
já que a sentença penal condenatória transitada em julgado constitui título executivo,
nos termos do artigo 515 do Código de Processo Civil.

B) NOVATIO LEGIS IN MELLIUS

Além da abolitio criminis, a lei nova pode favorecer o agente de


várias maneiras. A lei posterior, que de qualquer modo favorecer o agente, aplica-se
aos fatos anteriores, ainda que decididos por sentença condenatória transitada em
julgado (CP, art. 2, parágrafo único).

Assim, se a lei nova, por exemplo, reduzir a pena mínima de uma


determinada infração penal ou passar a prever benefício até então inexistente, deverá
retroagir para alcançar os fatos praticados antes da sua vigência, ainda que tenha sido
proferida sentença transitada em julgado.

C) NOVATIO LEGIS INCRIMINADORA

A lei nova incrimina fatos antes considerados lícitos (novatio


legis incriminadora): não retroage.
A novatio legis incriminadora, ao contrário da abolitio criminis,
considera crime fato anteriormente não incriminado.
A Lei n. 10.224, de 15 de maio de 2001, tornou crime de assédio
sexual a conduta de constranger alguém com o intuito de obter vantagem ou
favorecimento sexual, prevalecendo-se o agente da sua condição de superior
hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função, o que
até então era um indiferente penal, sendo tal situação resolvida, invariavelmente, em
outra área do direito, notadamente na esfera ou trabalhista.
Por conferir tratamento severo, a novatio legis incriminadora, por
evidente, não retroage para alcançar fatos praticados antes da sua vigência, tendo
eficácia, portanto, somente em relação aos fatos praticados a partir da sua vigência.
D) NOVATIO LEGIS IN PEJUS

A quarta hipótese refere-se à nova lei mais severa a anterior (a


nova lei de drogas, Lei n. 11.343/06, no art. 33, aumentou a pena do crime de tráfico de
drogas). Incide, no caso, o princípio da irretroatividade da lei penal: "a lei penal não
retroagirá, salvo para beneficiar o réu" (CF/88, art. 5º, XL).

1.3) CRIME PERMANENTE E CRIME CONTINUADO E LEI PENAL MAIS BENÉFICA

Aplica-se a lei nova durante a atividade executória do CRIME


PERMANENTE, ainda que seja prejudicial ao réu, já que a cada momento da atividade
criminosa está presente a vontade do agente.
Da mesma forma, em sendo o CRIME CONTINUADO uma
ficção, considerando que uma série de crimes constitui um único delito para a finalidade
de aplicação da pena, o agente responde pelo que praticou em qualquer fase da
execução do crime continuado. Portanto, se uma lei penal nova tiver vigência durante a
continuidade delitiva, deverá ser aplicada ao caso, prejudicando ou beneficiando.
É o que diz a Súmula 711 do STF: “A lei penal mais grave aplica-
se ao crime continuado ou ao crime permanente, se a sua vigência é anterior à cessação
da continuidade ou da permanência”.
Assim, se, por exemplo, o agente sequestrou a vítima na
vigência de uma lei, e, posteriormente, enquanto ainda estava se desenrolando o delito,
com a vítima no cativeiro, sobrevém lei nova elevando a pena mínima do crime de
extorsão mediante sequestro, essa lei incidirá sobre o fato, ainda que tenha conferido
tratamento mais severo.

1.4) DO TEMPO DO CRIME

A análise do âmbito temporal da aplicação da lei penal necessita


da fixação do momento em que se considera o delito cometido.
O Código Penal adotou a teoria da atividade, segundo a qual se
reputa praticado o delito no momento da conduta, não importando o instante do
resultado.
Diante disso, se, por exemplo, o agente, ao tempo da ação,
contava com 17 anos, 11 meses e 25 dias, de idade, efetua disparos de arma de fogo
contra a vítima, que vem a falecer 10 dias depois, devemos indagar se incidirão as
normas de direito penal ou as normas relativas ao Estatuto da Criança e Adolescente.
Nesse caso, considerando-se a teoria da atividade, incidirão as
normas do Estatuto da Criança e Adolescente, Lei n. 8.069/90, uma vez que, ao tempo
da ação, o agente era menor de 18 anos e, portanto, inimputável, não incidindo, assim,
normas do Código Penal. Em outras palavras, ficará afastada a aplicação da lei penal,
podendo o agente ser submetido a medida socioeducativa.

1.5) DA LEI PENAL NO ESPAÇO

I) INTRODUÇÃO

A Lei Penal é elaborada para vigorar dentro dos limites em que


o Estado exerce a sua soberania.
Via de regra, pelo princípio da territorialidade, aplica-se as leis
brasileiras aos delitos cometidos dentro do território nacional. Esta é uma regra geral,
que advém do conceito de soberania, ou seja, a cada Estado cabe decidir e aplicar as
leis pertinentes aos acontecimentos dentro do seu território.

II) TERRITÓRIO BRASILEIRO POR EQUIPARAÇÃO (EMBARCAÇÕES E


AERONAVES)

Nos termos do artigo 5º, § 1º, do CP, duas situações de território


brasileiro por equiparação:
A) embarcações e aeronaves brasileiras de natureza pública
ou a serviço do governo brasileiro onde estiverem.
B) embarcações e aeronaves brasileiras, de propriedade
privada, que estiverem navegando em alto-mar ou sobrevoando águas internacionais.
Nesse contexto, se, por exemplo, um Oficial da Marinha do Brasil
é assassinado por um marinheiro dentro da embarcação pública brasileira, que se
encontrava atracada num Porto dos Estados Unidos, a lei brasileira será aplicável, uma
vez que, para efeitos penais, consideram-se como extensão do território brasileiro as
embarcações de natureza pública, onde quer que se encontrem.
De outro lado, se durante um cruzeiro marítimo em embarcação
privada brasileira, cruzando alto-mar, um turista resolve provocar lesão corporal em
outro turista, incidirá a lei penal brasileira, uma vez que, para efeitos penais, consideram-
se como extensão do território brasileiro as embarcações de natureza privada que
estiver navegando em alto-mar.
Os navios estrangeiros em águas territoriais brasileiras, desde
que públicos, não são considerados parte do nosso território. Em face disso, os crimes
neles cometidos devem ser julgados de acordo com a lei da bandeira que ostentam. Se,
entretanto, são de natureza privada, aplica-se a lei brasileira (CP, art. 5º, § 2º).
Territorialidade: é a regra. Ao crime cometido no território
nacional, aplica-se a lei brasileira, sem prejuízo de convenções, tratados e regras de
direito internacional, conforme art.5º e seus parágrafos.

1.6) LUGAR DO CRIME

A determinação do lugar em que o crime se considera praticado


é decisiva no tocante à competência penal internacional. Surge o problema quando o
crime se desenrola em lugares diferentes.
A aplicação do princípio da territorialidade guarda relação com a
determinação do lugar em que o crime se considera praticado, tendo relevância, ainda,
no tocante à competência penal internacional.
Convém, de logo, esclarecer que o tema aqui estudado não se
confunde com a fixação da competência territorial, cuja determinação, via de regra, leva
em conta o lugar da consumação do delito, conforme prevê o artigo 70 do Código de
Processo Penal.
O CP adotou a teoria da ubiquidade ou mista, segundo a qual é
lugar do crime tanto onde houve a conduta, quanto o local onde se deu o resultado.

Nos termos da teoria da ubiquidade, mista ou da unidade, lugar


do crime é aquele em que se realizou qualquer dos momentos do iter, seja da prática
dos atos executórios, seja da consumação.
Essa foi a teoria adotada pelo Código Penal, já que, segundo o
artigo 6º “Considera-se praticado o crime no lugar em que ocorreu a ação ou omissão,
no todo ou em parte, bem como onde se produziu ou deveria produzir-se o resultado”.
A expressão “deveria produzir-se o resultado” refere-se às
hipóteses de tentativa. Aplica-se a lei brasileira ao crime tentado cuja conduta tenha
sido praticada fora dos limites territoriais (ou do território por extensão), desde que o
impedimento da consumação se tenha dado no País.
Assim, na hipótese de um cidadão brasileiro que se encontra na
cidade brasileira de Santana do Livramento/RS, atirar contra a vítima que se encontra
em solo Uruguaio, na cidade de Rivera, separada por uma rua do Município brasileiro,
vindo este a falecer, aplica-se a lei penal brasileira, já que os atos executórios do crime
foram praticados em território brasileiro e o resultado se produz em país estrangeiro.
Da mesma forma, se um Americano, residente na Argentina,
envia uma carta-bomba a um brasileiro, que se encontra no Rio de Janeiro, vindo o
engenho a explodir no momento em que a vítima abriu o pacote que a continha, vindo
a falecer, também aplica-se a lei penal brasileira, já que os atos executórios foram
praticados no estrangeiro e o resultado se produziu em território brasileiro.

1.7) CONFLITO APARENTE DE NORMAS

1.7.1) CONCEITO
É o conflito que se estabelece entre duas ou mais normas
aparentemente aplicáveis ao mesmo fato. Há conflito porque mais de uma norma
pretende regular o fato, mas é aparente, porque apenas uma delas acaba sendo
aplicada à hipótese.
1.7.2) PRINCÍPIOS PARA A SOLUÇÃO DOS CONFLITOS APARENTES DE
NORMAS

A) PRINCÍPIO DA ESPECIALIDADE

Trata-se da aplicação da regra de que a norma especial afasta


a aplicação da lei geral, representado pelo brocardo “lex specialis derrogat generali”.

A lei especial, ou específica, caracteriza-se por se revestir de


sentido diferenciado, individualizado, que a particulariza em relação às demais normas.
Dito de outro modo, a norma penal especial reúne todos os elementos típicos da lei
geral, mas se revestem de outros elementos que a torna especial, que a particulariza,
chamados especializantes.
E, nos termos do artigo 12 do Código Penal, a norma especial
prevalece sobre a lei geral.
Tomemos, novamente, como exemplo o caso de uma mãe
matar, sob influência do estado puerperal, o próprio filho, logo após o parto. Há um único
fato sobre o qual, aparentemente, pode incidir o crime de homicídio, previsto no artigo
121 do Código Penal, ou infanticídio, previsto no artigo 123 do Código Penal. O crime
de infanticídio possui núcleo idêntico ao do crime de homicídio, ou seja, reúne todos os
elementos descritos no artigo 121 do Código Penal, consistentes em “matar alguém”.
Todavia, além dos elementos da norma geral, o artigo 123 do Código Penal, que tipifica
o delito de infanticídio, possui elementos que o especializa e diferencia do crime de
homicídio: autora ser a genitora da vítima, que deve ser seu próprio filho, nascente ou
neonato; prática do delito durante ou logo após o parto, sob influência do estado
puerperal.
Note-se que se estabeleceu um conflito entre as normas do
artigo 121 do Código Penal e artigo 123 do Código Penal, mas que é aparente, pois será
solucionado pelo princípio da especialidade, prevalecendo, no caso, a norma penal que
define o crime de infanticídio, já que as elementares contidas neste crime a tornam
especial em relação à norma geral que define o homicídio.

B) PRINCÍPIO DA SUBSIDIARIEDADE

B.1) Conceito de norma subsidiária

Uma norma é considerada subsidiária à outra, quando a conduta


nela prevista integra o tipo da principal, significando que a lei principal afasta a aplicação
da lei secundária.
Há relação de subsidiariedade entre normas quando descrevem
graus de violação do mesmo bem jurídico, de forma que a infração definida pela
subsidiária, de menor gravidade que a da principal é absorvida por esta.
O crime de ameaça (CP, art. 147) cabe no de constrangimento
ilegal mediante ameaça (CP, art. 146), o qual, por sua vez, cabe dentro da extorsão (art.
158). O sequestro (art. 148) no de extorsão mediante sequestro (CP, art. 159). O disparo
de arma de fogo (Lei 10.826/2003, art. 15) cabe no de homicídio cometido mediante
disparos de arma de fogo (CP, art. 121). Há um único fato, o qual pode ser maior do que
a norma subsidiária, só se pode encaixar na primária.

B.2) Espécies
a) Subsidiariedade Expressa ou explícita

Ocorre quando a própria lei indica ser a norma subsidiária de


outra. Quando a norma, em seu próprio texto, subordina a sua aplicação à não-aplicação
de outra, de maior gravidade punitiva.
A própria norma reconhece expressamente seu caráter
subsidiário, admitindo incidir somente se não ficar caracterizado fato de maior
gravidade.
Ex. Art. 132 - Expor a vida ou a saúde de outrem a perigo direto
e iminente:
Pena - detenção, de três meses a um ano, se o fato não
constitui crime mais grave.

B.2) SUBSIDIARIEDADE TÁCITA OU IMPLÍCITA

A subsidiariedade tácita ou implícita ocorre quando a norma


penal não ressalva, de modo expresso, a sua incidência na hipótese de outra norma de
maior gravidade punitiva não ser aplicável ao caso concreto. A norma subsidiária poderá
incidir ainda que o legislador não tenha expressamente previsto essa possibilidade. O
crime de constrangimento ilegal (art. 146 do Código Penal) é tacitamente subsidiário em
relação ao crime de estupro (art. 213 do Código Penal). Assim, se no caso concreto, o
crime mais grave (art. 213 do Código Penal) não restar caracterizado, ou seja, não ficar
demonstrado que o constrangimento não teve por finalidade violar a dignidade sexual
da vítima, pode-se aventar a incidência do crime de constrangimento ilegal (art. 146 do
Código Penal).

C) PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO

Conforme o princípio da consunção, ou da absorção, o fato mais


abrangente e grave consome, absorve, o fato menos abrangente e grave que figuram
como meio necessário ou normal fase de preparação ou execução de outro crime, bem
como quando constitui conduta anterior ou posterior do agente, cometida com a mesma
finalidade prática atinente àquele crime. Nesse caso, a norma consuntiva prevalece
sobre a norma consumida. Trata-se da hipótese de o crime meio ser absorvido pelo
crime fim.
Prevalece, nessa hipótese, a norma penal que define o crime
mais abrangente, que absorverá a norma que prevê conduta de menor amplitude,
evitando-se a incidência do bis in idem. Assim, se o agente, para matar a vítima, porta
ilegalmente arma de fogo, o conflito aparente entre as normas que definem os crimes
de homicídio (art. 121 do Código Penal) e porte ilegal de arma de fogo (art. 14 da Lei
10.826/2003) é solucionado pelo princípio da consunção, na medida em que o crime de
homicídio absorve o crime de porte ilegal de arma de fogo, que serviu como mero meio
necessário para consumação do crime mais grave.

02. DO FATO TÍPICO


Conforme o conceito analítico, crime é uma conduta típica,
antijurídica e culpável.
Primeiro, deve-se verificar se o agente praticou um fato típico,
caracterizado por uma conduta humana, composta por uma ação ou omissão, prevista
na norma penal como crime.
Não basta, porém, que o fato seja típico para que exista crime.
É preciso, ainda, que esse fato seja contrário ao direito, ou seja, ilícito. A partir da análise
da conduta típica, deve-se verificar se tal conduta se apresenta contrária ou não ao
ordenamento jurídico.
Por fim, não basta que a conduta seja típica e antijurídica; é
preciso, ainda, que o agente seja culpável.
A culpabilidade é o juízo de reprovação social que recai sobre a
conduta do agente, a partir da análise dos elementos que a integram: a) imputabilidade;
b) potencial consciência da ilicitude; c) exigibilidade de conduta diversa.
Fato típico é o fato praticado pelo agente que se enquadra na
descrição dos elementos constitutivos do tipo penal. É o fato que se amolda na
descrição legal da conduta proibida. Assim, a conduta voltada a matar alguém se
enquadra na definição legal do crime de homicídio, descrito no artigo 121 do Código
Penal, constituindo-se, portanto, num fato típico.
Portanto, os elementos do fato típico são:

CONDUTA

ELEMENTOS
TIPICIDADE DO FATO RESULTADO
TÍPICO

NEXO DE
CAUSALIDADE

2. RELAÇÃO DE CAUSALIDADE

2.1. Conceito

A relação de causalidade é o vínculo estabelecido entre a


conduta do agente e o resultado por ele produzido. Se entre a conduta desenvolvida e
o resultado não há relação de causa e efeito, não será possível atribuir ao agente o
resultado gerado.

Prevalece na doutrina que o vínculo que liga a conduta do


agente ao resultado guarda relação com a causalidade física. Ou seja, a expressão
“resultado” inserida no artigo 13 do Código Penal alcança apenas os crimes materiais,
cujo resultado é naturalístico, que produzem a modificação no mundo externo.

Nos crimes formais (que não exigem a produção do resultado


para sua consumação) e de mera conduta (crimes sem resultado) não se mostra
necessário o estudo da relação de causalidade, pois tais crimes se consumam com a
realização da conduta do agente.
2.2. Espécies de causas

Pela própria denominação (nexo causal) é possível perceber


que consiste no vínculo ou liame de causa e efeito entre a ação e o resultado do crime.

Via de regra, a conduta do agente produz o resultado criminoso


de forma direta. Trata-se de relação de causa (conduta) e efeito (resultado): Nexo de
causalidade.

Todavia, pode ocorrer que, aliada à conduta do agente, outra


causa contribua para o resultado. É a chamada concausa.

Esta “concausa” pode ser absolutamente independente ou


relativamente independente, dependendo se teve ou não origem na conduta do agente.

2.2.1. Causas absolutamente independentes

São aquelas que não têm origem na conduta do agente. A


expressão “absolutamente” serve para designar que a outra causa independente por si
só produziu o resultado. São causas que não se inserem na linha do desdobramento
natural da conduta do agente, ou seja, causas inusitadas, desvinculadas da ação do
agente, surgindo de fonte distinta.

Em síntese, por serem independentes, tais causas atuam como


se tivessem por si sós produzido o resultado, situando-se fora da linha de
desdobramento causal da conduta.

Há, na verdade, uma quebra do nexo causal.

São três as espécies de causas absolutamente independentes.

a) Preexistentes

Trata-se de causa que existia antes da conduta do agente e


produzem o resultado independentemente da sua atuação. Ou seja, com ou sem a ação
do agente o resultado ocorreria do mesmo modo.

Ex: O agente desfere um disparo de arma de fogo contra a


vítima, que, no entanto, vem a falecer pouco depois, não em consequência dos
ferimentos recebidos, mas porque antes ingerira veneno com a intenção de suicidar.
Nesse caso, há a conduta do agente (efetuar o disparo), mas o
que gerou o resultado morte foi outra causa (o veneno). Essa outra causa é
independente da conduta do agente (porque por si só produziu o resultado). É
absolutamente independente (porque não teve origem na conduta do agente, pois
tendo ou não efetuado o disparo o resultado ainda assim se produziria). É preexistente
porque essa outra causa (veneno) já existia antes da ação do agente.

b) Concomitantes

São as causas que não têm nenhuma relação com a conduta e


produzem o resultado independentemente desta, no entanto, por coincidência, atuam
exatamente no instante em que a ação é realizada.

Ex: “A” desfere golpe de faca contra “B” no exato momento em


que este vem a falecer exclusivamente por força de um ataque cardíaco.

Nesse caso, há a conduta do agente (desferir o golpe de faca),


mas o que gerou o resultado morte foi outra causa (o ataque cardíaco). O ataque
cardíaco se trata de causa independente da conduta do agente (porque por si só
produziu o resultado). É absolutamente independente (porque não teve origem na
conduta do agente, pois tendo ou não efetuado desferido o golpe o resultado ainda
assim se produziria). É concomitante porque essa outra causa (ataque cardíaco)
ocorreu exatamente no momento da ação do agente.

c) Supervenientes

São causas que atuam após a conduta. Ou seja, que surgem


depois da conduta desenvolvida pelo agente.

Ex: “A” ministra veneno na alimentação de “B”. Antes do veneno


produzir efeitos, há um desabamento ou incêndio na casa da vítima, que morre
exclusivamente por conta dos escombros que caíram sobre sua cabeça ou queimada
pelo fogo.
Nesse caso, há a conduta do agente (ministrar veneno), mas o
que gerou o resultado morte foi outra causa (desabamento ou incêndio). O desabamento
ou incêndio trata-se de causas independente da conduta do agente (porque por si só
produziram o resultado). É absolutamente independente (porque não teve origem na
conduta do agente, pois tendo ou não ministrado o veneno o resultado ainda assim se
produziria). É superveniente porque essa outra causa (desabamento ou incêndio)
ocorreu depois da conduta do agente.

Quando a causa é absolutamente independente da conduta do


sujeito, o problema é resolvido pelo caput do art. 13: Há exclusão da causalidade
decorrente da conduta. Ou seja, o agente responde somente por aquilo que deu causa.

Nos exemplos, a causa da morte não tem ligação alguma com o


comportamento do agente. Em face disso, ele não responde pelo resultado morte, mas
sim pelos atos praticados antes de sua produção. Isso porque ocorreu quebra do nexo
causal. Assim, se o dolo era de matar, o agente responderia por tentativa de homicídio.

CUIDADO: Se o enunciado apontar dolo de lesão corporal, por


exemplo, o agente responderá por aquilo que deu causa: lesão corporal (leve, grave ou
gravíssima).

2.2.2. Causas relativamente independentes

Causas relativamente independentes são aquelas que tiveram


origem na conduta do agente. Ou seja, essas causas somente surgiram porque o agente
desenvolveu uma conduta.

Como são causas independentes, produzem por si sós o


resultado, não se situando dentro da linha de desdobramento causal da conduta. Por
serem, no entanto, apenas relativamente independentes, encontram sua origem na
própria conduta praticada pelo agente.

Aqui não há, de regra, uma quebra do nexo causal, mas uma
soma entre as causas, que, ao final, conduzem ao resultado lesivo.

Também são três as espécies de causas relativamente


independentes.

a) Preexistentes
A causa que efetivamente gerou o resultado já existia ao tempo
da conduta do agente, que concorreu para a sua produção.

Ex: “A”, com a intenção de matar, desfere um golpe de faca na


vítima, que é hemofílica e vem a morrer em face da conduta, somada à contribuição de
seu peculiar estado fisiológico. No caso, o golpe isoladamente seria insuficiente para
produzir o resultado fatal, de modo que a hemofilia atuou de forma independente,
produzindo por si só o resultado.

Nesse caso, há a conduta do agente (golpe de faca), mas o que


desencadeou efetivamente o resultado morte foi outra causa (hemofilia). Essa outra
causa é independente da conduta do agente (porque por si só produziu o resultado). É
relativamente independente (porque teve origem na conduta do agente, pois, se não
tivesse desferido a facada, essa outra causa não seria desencadeada e o resultado não
ocorreria). É preexistente porque essa outra causa (hemofilia) já existia ao tempo da
ação do agente.

Nesse caso, como há uma soma de causas e não quebra do


nexo causal, o agente responde pelo resultado pretendido. No caso, homicídio
consumado, a menos que não tenha concorrido para ele com dolo ou culpa.

Isso, porque, segundo doutrina majoritária, a imputação do


resultado ao agente exige que ele tenha conhecimento do estado de saúde do agente
(que denota dolo) ou que, pelo menos, que lhe fosse previsível (indicativo de culpa).

Assim, se, por exemplo, o agente não sabia do estado de saúde


da vítima ou não lhe era previsível, não poderia lhe ser atribuído o resultado morte,
responderia, pois, pelo delito de tentativa de homicídio (se agiu com a intenção de
matar). Da mesma forma, se pretendia ferir a vítima, agredindo-a com um soco e, que,
em razão da hemofilia, desconhecida pelo agente, vem a falecer em razão da eclosão
de uma hemorragia, o agente somente será responsabilizado pelo delito de lesão
corporal.

b) Concomitantes

A causa que efetivamente produziu o resultado surge no exato


momento da conduta do agente.
Ex: considera-se o ataque à vítima, por meio de faca, que, no
exato momento da agressão, sofre ataque cardíaco, vindo a falecer, apurando-se que a
soma desses fatores (causas) produziu a morte, já que a agressão e o ataque cardíaco,
considerados isoladamente, não teriam o condão de produzir o resultado morte.

Nesse caso, há a conduta do agente (golpe de faca), mas o que


desencadeou efetivamente o resultado morte foi outra causa (ataque cardíaco). Essa
outra causa é independente da conduta do agente (porque por si só produziu o
resultado). É relativamente independente (porque teve origem na conduta do agente,
pois, se não tivesse desferido a facada, essa outra causa não seria desencadeada e o
resultado não ocorreria). É concomitante porque essa outra causa (ataque cardíaco)
já existia ao tempo da ação do agente.

Nesse caso, como há uma soma de causas e não quebra do


nexo causal, o agente responde pelo resultado pretendido. No caso, homicídio
consumado, a menos que não tenha concorrido para ele com dolo ou culpa.

c) Supervenientes

A causa que efetivamente produziu o resultado ocorre depois da


conduta praticada pelo agente.

Ex. O agente desfere um golpe de faca contra a vítima, com a


intenção de matá-la. Ferida, a vítima é levada ao hospital e sofre acidente no trajeto,
vindo, por esse motivo, a falecer. A causa é independente, porque a morte foi provocada
pelo acidente e não pela facada, mas essa independência é relativa, já que, se não
fosse o ataque, a vítima não estaria na ambulância acidentada e não morreria. Tendo
atuado posteriormente à conduta, denomina-se causa superveniente.

Nesse caso, há a conduta do agente (golpe de faca), mas o que


desencadeou efetivamente o resultado morte foi outra causa (traumatismo decorrente
do acidente). Essa outra causa é independente da conduta do agente (porque por si
só produziu o resultado). É relativamente independente (porque teve origem na
conduta do agente, pois, se não tivesse desferido a facada, a vítima não estaria na
ambulância e, portanto, não teria falecido por conta do acidente). É superveniente
porque essa outra causa (traumatismo pelo acidente) surgiu depois da conduta do
agente.

Na hipótese das causas supervenientes, embora exista nexo


físico-naturalístico, a lei, por expressa disposição do art. 13, § 1º, CP, que excepcionou
a regra geral, exclui a imputação do resultado ao agente, devendo, no entanto,
responder pelos atos anteriormente efetivamente praticados.

Assim, o agente não responde pelo resultado ocorrido, mas


somente pelos atos anteriores, que, no caso, foi tentativa de homicídio.

CUIDADO: Se o enunciado apontar dolo de lesão corporal, por


exemplo, o agente responderá pelos atos anteriores praticados, no caso, lesão corporal
(leve, grave ou gravíssima).

3. DOS CRIMES OMISSIVOS E RELEVÂNCIA DA OMISSÃO

3.1. Considerações gerais

A conduta humana não se externa apenas a partir de um


movimento corpóreo, traduzido por uma ação. De fato, ao lado da ação, a conduta
omissiva constitui uma forma independente de conduta humana, suscetível de ser
regida pela vontade dirigida para um fim.

O crime omissivo se configura quando o agente deixa de fazer


aquilo que poderia e deveria fazer algo em estaria obrigado em virtude de lei.

Os crimes omissivos podem ser próprios ou impróprios (ou


comissivos por omissão).

3.2. Crimes omissivos próprios

São os que se perfazem com a simples conduta negativa do


sujeito, independentemente da produção de qualquer consequência posterior.

Nos crimes omissivos próprios basta a abstenção, é suficiente a


desobediência ao dever de agir para que o delito se consume. A obrigação do agente é
de agir e não de evitar o resultado. O resultado que eventualmente surgir dessa omissão
será irrelevante para a consumação do crime, podendo apenas configurar uma
majorante ou uma qualificadora.

Ex: Omissão de socorro

Art. 135 - Deixar de prestar assistência, quando possível fazê-lo


sem risco pessoal, à criança abandonada ou extraviada, ou à pessoa inválida ou ferida,
ao desamparo ou em grave e iminente perigo; ou não pedir, nesses casos, o socorro da
autoridade pública:
Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa.
Parágrafo único - A pena é aumentada de metade, se da
omissão resulta lesão corporal de natureza grave, e triplicada, se resulta a morte.

DEVER DE AGIR

PODE CONFIGURAR
NÃO TEM O DEVER DE NÃO RESPONDE PELO EX: ART. 135,
CRIMES OMISSIVOS

MAJORANTE ou
IMPEDIR O RESULTADO RESULTADO QUALIFICADORA PARÁGRAFO ÚNICO, CP
PRÓPRIOS

DESCREVE CONDUTA EX: ART. 135 CP


OMISSIVA ART. 244 CP
NORMA PENAL
ESPECÍFICA
MANDAMENTAL
CRIME DE MERA
CONDUTA

NÃO ADMITE
TENTATIVA

3.3. Crimes omissivos impróprios ou comissivos por omissão


Nos crimes omissivos impróprios, o agente não tem
simplesmente a obrigação de agir, mas a obrigação de agir para evitar um resultado,
isto é, deve agir com a finalidade de impedir a ocorrência de determinado evento. Nos
crimes comissivos por omissão há, na verdade, um crime material, isto é, um crime de
resultado.

O poder agir é um pressuposto básico de todo comportamento


humano. Também na omissão, evidentemente, é necessário que o sujeito tenha a
possibilidade física de agir, para que se possa afirmar que não agiu voluntariamente.
De fato, para que alguém responda por crime comissivo por
omissão é preciso que tenha o dever jurídico de impedir o resultado, previsto no artigo
13, § 2º, do Código Penal:

a) Ter por lei obrigação de cuidado, proteção ou vigilância

Nesse caso, por expressa imposição da lei, o agente estará


obrigado a agir para evitar o resultado. Assim, se o agente se omitir, ou seja, deixar de
agir, quando lhe era possível, responderá pelo resultado gerado.

Isso porque, se o sujeito, em virtude de sua abstenção,


descumprindo o dever de agir, não busca evitar o resultado é considerado, pelo Direito
Penal, como se o tivesse causado.

É o caso, por exemplo, dos pais em relação aos filhos (art. 1634
e 1566, IV, ambos do Código Civil), ao dever de mútuo assistência entre os cônjuges
(art. 1566 do Código Civil).

Ex: Mãe que deixa de alimentar o filho, que, por conta da sua
negligência, acaba morrendo por inanição. Essa mãe deverá responder pelo resultado
gerado, qual seja, homicídio culposo. Se, de outro lado, a mãe desejou a morte do filho
ou assumiu o risco de produzi-la, responderá por homicídio doloso.

b) De outra forma, assumir a responsabilidade de impedir o resultado

A doutrina não fala mais em dever contratual, uma vez que a


posição de garantidor pode advir de situações em que não existe relação jurídica entre
as partes. O importante é que o sujeito se coloque em posição de garante no sentido de
que o resultado não ocorrerá.

Aqui a obrigação de agir para evitar o resultado não decorre de


lei, mas do fato de o agente ter assumido a responsabilidade de impedi-lo.

Ex: babá que, por negligência, deixa de cumprir corretamente


sua obrigação de cuidar da criança, que acaba caindo na piscina e, por isso, morre
afogada. Nesse caso, responderá pelo resultado gerado, qual seja, homicídio culposo.
Se, de outro lado, desejou a morte da criança ou assumiu o risco de produzi-la,
responderá por homicídio doloso.
c) Com o comportamento anterior, criar o risco da ocorrência do resultado

Nesta hipótese, o sujeito, com o comportamento anterior, cria


situação de perigo para bens jurídicos alheios penalmente tutelados, de sorte que, tendo
criado o risco, fica obrigado a evitar que ele se degenere ou desenvolva para o dano ou
lesão.

Não importa que o tenha feito voluntariamente ou


involuntariamente, dolosa ou culposamente; importa é que com sua ação ou omissão
originou uma situação de risco ou agravou uma situação já existente.

Aluno veterano, por ocasião de um trote acadêmico, sabendo


que a vítima não sabe nadar, joga o incauto calouro na piscina. Nesse caso, contrai o
dever jurídico de agir para evitar o resultado, sob pena de responder por homicídio.

4. CRIME DOLOSO

4.1. Introdução

Conforme dispõe o artigo 18, I, do Código Penal, o crime será


doloso “quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzi-lo”. Essa
previsão legal equipara dolo direto e dolo eventual.

O conceito de dolo, à evidência, é muito mais abrangente e


complexo do que aquele atribui pela lei penal.

Com o sistema finalista, o dolo passou a integrar a conduta,


elemento do fato típico. Trata-se de um elemento psicológico introduzido no tipo penal,
característico do crime doloso.

Nesse sentido, no crime doloso, o agente desenvolve uma


conduta com vontade e consciência dirigida a produzir determinado resultado. É a
vontade e consciência voltadas a realizar a conduta descrita no tipo penal incriminador.
É, em síntese, a consciência e vontade de realizar o tipo objetivo

4.2. Dolo direto e dolo eventual

Dolo direto, também chamado dolo determinado, intencional,


imediato ou incondicionado, é aquele que se caracteriza pela vontade do agente estar
dirigida especificamente à produção do resultado típico, abrangendo os meios utilizados
para tanto. No dolo direto o agente quer o resultado por ele anteriormente representado.

Tomemos como exemplo o agente que, pretendendo subtrair


coisa alheia móvel, mediante emprego de grave ameaça, anuncia o assalto e desapossa
a vítima dos bens que estavam em seu poder. Nesse caso, a vontade do agente é
dirigida a produzir o resultado decorrente do crime de roubo (CP, art. 157).

Ocorre o dolo eventual quando o sujeito assume o risco de


produzir o resultado, isto é, admite e aceita o risco de produzi-lo. No dolo eventual, o
agente não quer o resultado (se desejasse, seria dolo direto), mas, mesmo prevendo a
realização do resultado, segue em diante na sua conduta assumindo o risco de produzi-
lo. Em relação ao dolo eventual, adota-se a teoria do consentimento ou assentimento,
inserta na expressão “assumiu o risco de produzi-lo”, encartada no artigo 18, I, do
Código Penal.

Tomemos como exemplo a conduta do agente que pretende


atirar contra o seu desafeto, que se encontra conversando com outra pessoa. O agente
prevê que também pode atingir a outra pessoa, mas segue em diante na sua conduta,
assumindo o risco de errar o disparo contra o seu desafeto e atingir a outra pessoa,
sendo-lhe indiferente quanto ao resultado que possa a vir ser produzido em relação ao
terceiro. Se efetuar disparos matando o seu desafeto e também a outra pessoa, o
agente responderá por dois crimes de homicídio: o primeiro, a título de dolo direto; o
segundo, a título de dolo eventual.

5. TEORIA DO CRIME CULPOSO

5.1. Introdução

É a conduta humana voluntária desenvolvida sem observar o


dever de cuidado objetivo, que, por imprudência, negligência ou imperícia, produz um
resultado involuntário, objetivamente previsível, que poderia ter sido evitado.

Os tipos que definem os crimes culposos são, em geral, abertos,


limitando-se a descrever “se o crime é culposo, a pena será de ...”, sem especificar
minuciosamente a conduta delitiva.

São elementos do fato típico culposo:

* Conduta humana voluntária;


* Resultado involuntário;

* Inobservância do dever de cuidado objetivo;

* Nexo de causalidade;

* tipicidade;

* Previsibilidade objetiva;

* Ausência de previsão.

5.2. Modalidades de culpa

A inobservância do dever objetivo de cuidado, que é a quebra


do dever de cuidado imposto a todos, é manifestada por meio de três modalidades de
culpa, todas previstas no artigo 18, II, do CP: imprudência, negligência e imperícia.

5.2.1. Imprudência

A conduta imprudente se caracteriza por agir um positivo, sem a


observância do dever de cuidado objetivo. Ocorre quando o agente pratica fato perigoso,
de forma intempestiva e precipitada.

É a culpa decorrente de um comportamento positivo descuidado.


Trata-se de modalidade de culpa que incide paralelamente à ação do agente.

Tomemos como exemplo condutor de veículo automotor, que,


imprimindo excessiva velocidade, atropela e mata um pedestre.

Da mesma forma, age com imprudência o agente que limpa


arma de fogo carregada e, de forma descuidada, aciona o gatilho, matando pessoa que
estava ao seu lado.

5.2.2. Negligência

Trata-se de modalidade negativa de culpa, em que a


inobservância do dever de cuidado do agente é retratada pela ausência de cautela e
precaução. É a culpa na forma de deixar de adotar as cautelas

Ao contrário da imprudência, que ocorre durante a ação, a


negligência dá-se sempre antes do início da conduta. O negligente deixa de tomar, antes
de agir, as cautelas que deveria.
Tomemos como exemplo o condutor de veículo que, antes de
sair de viagem, deixa de reparar os pneus e verificar os freios.

5.2.3. Imperícia

A imperícia se caracteriza pela falta de capacidade, preparo ou


de conhecimentos técnicos suficientes de agente autorizado a desempenhar
determinada arte, profissão ou ofício.

É a chamada culpa profissional, pois decorrente da falta de


aptidão para o exercício de arte, ofício ou profissão. Ocorre quando o agente não tem o
adequado conhecimento acerca das técnicas e regras que todos que se dedicam à
determinada deveriam dominar.

Assim, se um médico cirurgião, que não domina determinada


técnica inerente à determinada intervenção cirúrgica, causar a morte do paciente,
responderá por homicídio culposo (CP, art. 121, § 3º), já que agiu com imperícia no
exercício da sua profissão.

5.3. Culpa inconsciente e culpa consciente

O Código Penal não prevê expressa distinção entre culpa


inconsciente e culpa consciente, sendo, no entanto, importante estabelecer a diferença,
até mesmo para fins de fixação da pena, diante de cada caso concreto.

A culpa inconsciente é aquela em que o resultado não é


previsto pelo agente, embora objetivamente previsível. É a culpa comum, aquela que se
caracteriza pela ausência de previsão do resultado. É a culpa sem previsão.

Tomemos o seguinte exemplo: Dagoberto, quando limpava sua


arma de fogo, devidamente registrada em seu nome, que mantinha no interior da
residência, deixando de observar o dever de cuidado necessário, inclusive o de
desmuniciá-la, acaba, acidentalmente, por acionar o gatilho, efetuando um disparo que
atingiu seu vizinho Mário, que, em razão disso, veio a falecer. Nesse caso, diante da
sua conduta imprudente, Dagoberto responderá por homicídio culposo, já que não
previu que poderia causar a morte de alguém, embora objetivamente previsível que
limpar arma municiada poderia gerar o acionamento do gatilho e, por conseguinte, o
disparo do projétil.
Na culpa consciente há a previsão do resultado, mas o agente
realiza a conduta considerando, sinceramente, que nenhum resultado se produzirá ou,
ainda, que reúne habilidade suficiente para evitá-lo. É a chamada culpa com previsão.

Em outras palavras, na culpa consciente, o agente prevê o


resultado, mas não aceita sua produção. Embora previsível, confia sinceramente que o
resultado não ocorrerá ou que, por conta da sua habilidade, conseguirá impedir que o
evento se produza.

Exemplo: Leonardo conduz seu veículo por uma avenida. No


banco do carona está sua namorada, Célia. Durante o percurso, Leonardo imprime
velocidade excessiva no veículo, gerando protestos por parte de Célia, que lhe pedia
para reduzir a velocidade. Leonardo responde dizendo que nada iria acontecer, até
porque era um excelente motorista. Todavia, ao fazer uma curva, Leonardo perde o
controle do veículo e atropela uma pessoa, causando-lhe a morte. Diante disso,
Leonardo responderá pelo crime de homicídio culposo na condução de veículo
automotor (Lei 9.503/97, art. 302). Note-se que, no caso, havia por parte do motorista a
previsibilidade do resultado, que não era aceito e nem esperado e, ainda, a leviana
percepção de que sua habilidade como condutor impediria a produção de qualquer
evento lesivo.

6. ITER CRIMINIS
6.1. Introdução

Iter criminis significa literalmente “caminho do crime”. Trata-se


do caminho percorrido pelo agente para a prática da infração penal, passando pela
ideação até chegar à consumação. Em síntese, iter criminis é o conjunto de fases pelas
quais passa o delito.

Compõe-se de uma fase interna, na qual o agente representa


mentalmente a prática delituosa, bem como de uma fase externa, em que o agente
exterioriza a sua conduta, colocando em prática a ideia criminosa, praticando atos
preparatórios e executórios até alcançar a consumação.
O iter criminis, pois, é composto pelas seguintes fases.

c) EXECUÇÃO

d) CONSUMAÇÃO

6.1.1. Cogitação

O primeiro momento do iter criminis é a chamada cogitatio. O


agente idealiza, internamente, a atividade criminosa. Elabora mentalmente a infração
penal, delibera sobre o desenvolvimento da conduta e, por fim, decide praticar a infração
penal. Toda essa representação ainda se encontra no plano interno do agente, ou seja,
ainda não há exteriorização de nenhum ato.
É exatamente por isso que a fase da cogitação não é punível.
De fato, como ainda está no plano interno do agente, não há ainda qualquer violação a
bem jurídico, razão pela qual não incidem as normas de Direito Penal.

6.1.2. Atos preparatórios

Os atos preparatórios consistem no conjunto de atos voltados a


concretizar a infração penal. O agente passa da cogitação para a exteriorização da sua
atividade criminosa, buscando, previamente ao início da execução, os elementos
necessários para o desenvolvimento da conduta delituosa. É a partir dos atos
preparatórios que o agente começa a materializar, ou seja, exteriorizar sua busca pela
consumação da infração penal.

A aquisição de uma arma, por exemplo, para a prática do


homicídio, constitui ato preparatório. Da mesma forma, o estudo do local do crime,
buscando identificar a melhor hora e forma de ingressar no ambiente, constituem atos
preparatórios do crime de furto.

Os atos preparatórios, via de regra, não são puníveis, nem na


forma tentada, uma vez que, nos termos do artigo 14, inciso II, do Código Penal, afigura-
se necessário o início da execução do delito, com a realização da conduta nuclear
descrita no tipo penal.

Todavia, em casos excepcionais, o legislador descreve atos que


na sua concepção seriam preparatórios como delitos autônomos. São os chamados
crimes-obstáculo.

Nesses casos, o legislador considera o ato preparatório de um


determinado delito em crime autônomo e independente, tratando-o, na situação
específica, como verdadeiro ato executório.

A associação de três ou mais pessoas, para o fim específico de


cometer crimes, constitui crime autônomo (CP, art. 288), ainda que nenhum crime seja
praticado.

Da mesma forma, o legislador considera crime autônomo atos


preparatórios para a prática do crime de moeda falsa. De fato, nos termos do artigo 291
do Código Penal, constitui crime fabricar, adquirir, fornecer, a título oneroso ou gratuito,
possuir ou guardar maquinismo, aparelho, instrumento ou qualquer objeto
especialmente destinado à falsificação de moeda, ainda que nenhuma moeda tenha
sido falsificada.

O artigo 5º da Lei 13.260/2016 prevê conduta criminosa do


agente que realizar atos preparatórios de terrorismo com o propósito inequívoco de
consumar tal delito, ainda que nenhum ato executório seja realizado.

6.1.3. Execução

Idealizada a infração penal e após proceder aos atos


preparatórios, o agente passa à fase de execução do delito, com a efetiva agressão ao
bem jurídico tutelado.

O agente passa a desenvolver conduta voltada a realizar o verbo


nuclear do tipo. A partir dos atos executórios o fato passa a ser punível, ao menos na
forma tentada. Isso porque o próprio artigo 14, inciso II, do Código Penal atrelou a
tentativa ao início da execução do crime, condicionando, pois, sua punibilidade ao início
da prática de atos executórios.

O ato executório deve ser idôneo e inequívoco para alcançar o


resultado.

Ato idôneo é aquele suficiente apto a atingir um bem jurídico


penalmente tutelado, ao passo que o ato inequívoco é aquele que confere a certeza
necessária do plano concreto do agente no sentido de consumar a infração penal.

Exemplo: adquirir um revólver para matar a vítima é apenas a


preparação do crime de homicídio. Agora, desferir o primeiro tiro em direção à vítima já
constitui ato executório, já que o agente revelou conduta idônea em busca da
consumação do delito.

6.1.4. Consumação

É o elemento culminante do iter criminis.

É o momento de conclusão do delito, reunindo todos os


elementos do tipo penal. Trata-se do crime perfeito ou completo, já que a conduta do
agente atingiu a plenitude, culminando na concretização dos elementos que definem o
tipo penal.

A consumação reclama um estudo mais pormenorizado.

7. TENTATIVA

7.1. Introdução

Nos termos do artigo 14, inciso II, do Código Penal, tentativa se


caracteriza pelo início da execução de um crime, que não se consuma por
circunstâncias alheias à vontade do agente.

Como se vê, para caracterizar ao menos crime tentado, deve o


agente passar pelos atos preparatórios e dar início à execução do delito, que, por razões
alheias à sua vontade, não alcance a consumação.

A tentativa possui outras denominações: conatus, crime


imperfeito, crime manco, ou crime incompleto.
A tentativa se reveste de todos os elementos do crime desejado,
exceto a consumação.

São três os elementos da tentativa: a) dolo da consumação; b)


início da execução do crime; c) não consumação por circunstâncias alheias à vontade
do agente.

7.2. INFRAÇÕES QUE NÃO ADMITEM A TENTATIVA


1. Crimes culposos
No crime culposo, o agente não deseja e nem assume o risco na
produção do resultado. O resultado, pois, é involuntário. Na tentativa, o agente deseja
ou assume o risco na produção do resultado, que, no entanto, não ocorre por
circunstâncias alheias à sua vontade.
Em outras palavras, no crime culposo, há resultado sem
intenção de provocá-lo; na tentativa, o agente quer o resultado, mas não consegue.
Logo, verifica-se a absoluta incompatibilidade entre o crime culposo e a tentativa.
Isso porque não se afigura admitir, em um crime sem intenção
na produção do resultado, o início da execução de um delito que não se consuma contra
a vontade do agente.
Há, no entanto, uma classe de crimes culposos que admitem a
tentativa: culpa imprópria.
2. crimes preterdolosos
Nos crimes preterdolosos, a conduta é desenvolvida de forma
dolosa, mas o resultado agravador é culposo. Ou seja, embora tenha agido com dolo na
conduta, o resultado mais grave não é desejado pelo agente.
Assim, como no crime preterdoloso o resultado agravador não é
desejado pelo agente, não há falar em tentativa, que pressupõe a não consumação do
delito por circunstâncias alheias à a sua vontade.
Nesse contexto, se o agente pretende lesionar a vítima, mas, de
forma involuntária, causa-lhe a morte, responderá por lesão corporal seguida de morte.
Se, nesse caso, não resultar morte da vítima, o agente responderá unicamente pela
lesão corporal dolosamente praticada, e não, à evidência, por tentativa de lesão corporal
seguida de morte.
3. Contravenções Penais
Nos termos do artigo 4º do Decreto-lei 3688/41, “não é punível a
tentativa na contravenção penal”. Assim, conquanto no plano fático seja, a princípio,
possível o início da execução da contravenção penal, que não se consuma por
circunstâncias alheias à vontade do agente, a tentativa não será punível por expressa
previsão legal.
4. Crimes omissivos próprios

Os crimes omissivos próprios não admitem tentativa, porque não


se afigura possível fracionar a conduta omissiva do agente. Isso porque ou o agente
observa o seu dever de agir implícito no tipo penal, e o crime se consuma; ou pratica a
conduta, e não há crime.
Tomemos como exemplo o crime de omissão de socorro (CP,
art. 135). Se, ao se deparar com um acidente, com pessoa gravemente ferido, deixar de
prestar assistência, o crime estará consumado. De outro lado, nesse mesmo caso, se o
agente agir para socorrer a vítima, não haverá crime.
No caso, não há viabilidade de se verificar o início da execução
do delito e não consumação por circunstâncias alheias à vontade do agente, não sendo
possível, pois, fracionar a conduta omissiva.
Os omissivos impróprios ou comissivos por omissão, que
produzem resultado naturalístico, admitem tentativa.
Exemplo: Pai, desejando a morte do filho, visualiza a criança se
aproximando da piscina e nada faz para evitar o resultado. A funcionária da residência,
percebendo a situação, se joga na água e socorre a criança. O pai desalmado
responderá pelo delito de tentativa de homicídio.
5. Crimes unissubsistentes

Os crimes unissubsistentes ou de ato único não admitem


tentativa, diante da impossibilidade de fracionamento dos atos de execução. Ou seja,
não é possível dar início à execução do delito e não atingir a consumação por
circunstâncias alheias à vontade do agente.
Tomemos como exemplo a injúria verbal (CP, art. 140). Nesse
caso, ou o agente profere a expressão ofensiva à dignidade ou decoro da vítima, ainda
que ela não se sinta ofendida, e o crime estará consumado, ou permanece silente, e
não haverá crime. Note-se que não é possível fracionar a conduta de alguém que chama
a vítima, por exemplo, de idiota.
6. Crimes habituais
Crimes habituais são aqueles que, para sua consumação,
exigem que o agente pratique, de forma reiterada e habitual, a conduta descrita no verbo
nuclear do tipo. Os atos praticados, isoladamente considerados, constituem um
indiferente penal.
Exemplos: Crime de manutenção de casa de prostituição (CP,
art. 229) e curandeirismo (CP, art. 284).
Assim, ou o agente mantém, de forma habitual e reiterada,
estabelecimento em que ocorra exploração sexual, e o crime do artigo 229 do Código
Penal estará consumado, ou não há reiteração da conduta, e o fato será atípico.
7. Crimes de atentado
Nos crimes de atentado a mera prática da tentativa é punida com
as penas do crime consumado. Diante disso, não há se falar em tentativa, já que o crime
inacabado prevê a mesma pena do delito na sua modalidade consumada.
Exemplo: Crime de evasão mediante violência contra a pessoa,
previsto no artigo 352 do Código Penal. O tipo penal prevê a mesma pena para o preso
que se evadir ou tentar se evadir, usando de violência contra a pessoa.

8. DESISTÊNCIA VOLUNTÁRIA E ARREPENDIMENTO EFICAZ


A desistência voluntária e o arrependimento eficaz estão
previstos no artigo 15 do Código Penal, segundo o qual “O agente que, voluntariamente,
desiste de prosseguir na execução ou impede que o resultado se produza, só responde
pelos atos já praticados”.

8.1. DESISTÊNCIA VOLUNTÁRIA

A desistência voluntária se caracteriza por um comportamento


negativo do agente, que, após dar início à execução do delito, adota uma postura de
abstenção, ou seja, cessa o seu comportamento delitivo, não leva adiante a atividade
executória, mesmo podendo prosseguir, desiste da realização típica.
Em outras palavras, iniciada a execução, o autor do ilícito, antes
de esgotá-la ou exauri-la, resolve, voluntariamente, não seguir adiante no
comportamento delituoso.
Como se vê, a desistência voluntária incide no contexto da
tentativa imperfeita ou inacabada, antes, pois, do exaurimento dos meios executórios.
Tomemos como exemplo a conduta do agente que, com a
intenção homicida, desfere um disparo de arma de fogo contra a vítima, acertando-a em
região não letal. Podendo prosseguir, já que tinha mais cinco balas no revólver, o agente
resolve, por vontade própria, não efetuar mais disparos, deixando a vítima sobreviver.
Indubitável que o agente deu início à execução do delito, mas
não consumou o homicídio por vontade própria, já que adotou uma postura de
abstenção, cessando a atividade executória antes de esgotar todos os meios que tinha
à sua disposição. Trata-se, pois, de desistência voluntária.

8.2. ARREPENDIMENTO EFICAZ


No arrependimento eficaz, o agente, após ter esgotado todos os
meios à sua disposição para a consumação do delito, arrepende-se e, adotando uma
postura ativa, impede que o resultado se produza.
O agente esgota sua potencialidade lesiva, faz tudo que está ao
seu alcance para consumar o delito, mas antes de alcançar o resultado inicialmente
desejado, arrepende-se e adota um comportamento ativo para evitar a sua consumação.
Diversamente do que ocorre na desistência voluntária, o
arrependimento eficaz se caracteriza pelo fato de o agente, após esgotar os meios
executórios, desenvolver uma nova atividade, a fim de evitar a consumação do delito.

Exemplo: agente que, com a intenção homicida, após efetuar


disparos de arma de fogo contra a vítima, utilizando todas as balas do revólver,
arrepende-se e, adotando postura ativa, leva a vítima até o hospital, que, submetida a
intervenção cirúrgica exitosa, acaba sobrevivendo.
8.3. CONSEQUÊNCIA
Nos termos da parte final do artigo 15 do Código Penal, não
obstante a desistência voluntária e o arrependimento eficaz, o agente responde pelos
atos já praticados. Desta forma, retiram a tipicidade dos atos somente com referência
ao crime cuja execução o agente iniciou. É o que se denomina TENTATIVA
QUALIFICADA.
Assim, o agente que ingressa numa residência e, por ato
voluntário, desiste de consumar a subtração, não responderá por tentativa de furto, mas
pelos atos até então praticados, quais sejam, violação de domicílio (CP, art. 150).
Da mesma forma, se o agente efetua vários disparos contra a
vítima, e, por ato voluntário, se arrepende, levando-a ao hospital, o que contribuiu para
sobrevivesse, não responderá por tentativa de homicídio, mas lesão corporal leve, grave
ou gravíssima, conforme o caso, se restaram lesões na vítima.

9. ARREPENDIMENTO POSTERIOR
9.1. CONCEITO
Trata-se de causa obrigatória de diminuição da pena que incide
quando o agente, responsável pelo crime praticado sem violência ou grave à pessoa,
repara o dano provocado ou restitui a coisa, desde que de forma voluntária, até o
recebimento da denúncia ou da queixa.

9.2. REQUISITOS

Extrai-se do artigo 16 do Código Penal os requisitos para a


incidência do arrependimento posterior:

a) Crime cometido sem violência ou grave ameaça à pessoa

Nos termos do artigo 16 do Código Penal, cabe arrependimento


posterior nos crimes praticados sem violência ou grave ameaça à pessoa.
Não se restringe aos crimes contra o patrimônio, podendo ser
aplicado a qualquer delito compatível com a reparação do dano decorrente da conduta
do agente. Por isso, entende-se, por exemplo, possível a aplicação do arrependimento
posterior no peculato doloso (CP, art. 312).

b) Reparação do dano ou restituição da coisa

A reparação do dano ou restituição da coisa deve ser voluntária,


pessoal e integral.

Exige a lei que seja voluntária, exercida sem coação física ou


moral.
Não se exige seja necessariamente espontânea, no sentido de
que tenha a iniciativa tenha surgido na mente do agente, incidindo o arrependimento
posterior ainda que a reparação ou restituição tenha sido decorrente de conselho ou
sugestão de terceiro, uma vez que o ato, embora não espontâneo, foi voluntário.
c) Até o recebimento da denúncia ou queixa
A reparação do dano ou restituição da coisa deve ser realizada
até o recebimento da denúncia ou queixa, independentemente do momento do
oferecimento da peça acusatória.
Se a reparação do dano ou restituição da coisa ocorrer após o
recebimento da denúncia ou da queixa, mas até sentença, aplica-se a atenuante
genérica prevista no artigo 65, III, “b”, do Código Penal.
Assim, se o agente subtraiu uma TV do seu local de trabalho e,
ao chegar em casa com a coisa subtraída, é convencido pela esposa a devolvê-la, o
que efetivamente vem a fazer no dia seguinte, mesmo quando o fato já havia sido
registrado na delegacia, haverá arrependimento posterior, com reflexo na dosimetria da
pena.

10. CRIME IMPOSSÍVEL


10.1. Introdução

O instituto do crime impossível está previsto no artigo 17 do


Código Penal. Trata-se de hipótese de tentativa não punível, verificando-se quando o
agente, por ineficácia absoluta do meio ou impropriedade absoluta do objeto sobre o
que recaiu sua conduta, jamais alcançará a consumação do delito.
10.2. ESPÉCIES DE CRIME IMPOSSÍVEL
Conforme se extrai do artigo 17 do Código Penal, há duas
espécies de crime impossível: crime impossível pela ineficácia absoluta do meio e crime
impossível por impropriedade absoluta do objeto.
10.2.1. Crime impossível por ineficácia absoluta do meio

O crime impossível por ineficácia absoluta do meio guarda


relação com o meio de execução ou instrumento utilizado pelo agente, que, por sua
natureza, será incapaz de produzir qualquer resultado, ou seja, jamais alcançará a
consumação do delito.
É o caso do agente que, pretendendo matar a vítima, usa como
meio executório arma completamente defeituosa, que jamais efetuaria qualquer disparo.
10.2.2. Crime impossível por impropriedade absoluta do objeto
O crime impossível pela impropriedade absoluta do objeto
guarda relação com o objeto material, compreendendo a pessoa ou coisa sobre o qual
recai a conduta do agente.
O objeto será absolutamente impróprio quando inexistente ao
tempo da conduta do agente ou, ainda, pelas circunstâncias em que se encontra,
afigura-se impossível a produção do resultado visado pelo agente.
Tomemos como exemplo a conduta do agente, que pretendendo
matar a vítima, desfere vários disparos de arma de fogo contra o seu corpo, verificando-
se, após, que, ao receber os disparos, já se encontrava morta, em decorrência de ter
sofrido, momentos antes, fulminante ataque cardíaco. Evidente, nesse caso, a
impropriedade absoluta do objeto, diante da impossibilidade de ceifar a vida de pessoa
que já estava morta.

Da mesma forma, caracteriza crime impossível pela


impropriedade absoluta do objeto a conduta da mulher que ingere substância abortiva,
demonstrando-se, após, que jamais estivera grávida. Trata-se de fato atípico, pois não
há objeto material a ser atingido (feto com vida intrauterina), não sendo possível, pois,
punir a mulher nem mesmo a título de tentativa de aborto.

11. ERRO DE TIPO


11.1. CONCEITO
Nos termos do artigo 20, “caput”, do Código Penal, caracteriza-
se pelo erro sobre o elemento constitutivo do tipo penal.
Antes de mais nada, mostra-se importante compreender o que
significa a expressão elemento constitutivo do tipo penal. A figura típica (ou tipo legal) é
composta de elementos específicos ou elementares. Cada expressão que compõe uma
figura típica é um elemento que constitui o modelo legal de conduta proibida.
Exemplo: O crime de homicídio (CP, art. 121) é composto pelos
elementos “matar” “alguém”. “Matar” é um elemento constitutivo do tipo que define o
crime de homicídio. “alguém” é também um elemento constitutivo do tipo que define o
crime de homicídio.
O erro de tipo é o erro que recai sobre um dos elementos
constitutivos do tipo penal. Há uma falsa percepção da realidade que cerca o agente. O
agente desenvolve uma conduta sem saber que está praticando um fato típico. Não
sabe, em função do erro, que está praticando uma conduta típica.
Exemplo: Durante uma caçada, o agente percebe que há
movimentação atrás de arbustos. Supondo ser um animal, atira em direção ao alvo, e,
quando vai se certificar do produto da caça, verifica que, na realidade, atingiu uma
pessoa, que estava escondido atrás dos arbustos. A realidade do caçador era a de que
estava atirando contra um animal. Todavia, trata-se de uma falsa percepção da
realidade, já que acabou atingindo uma pessoa humana. O agente errou sobre o
elemento constitutivo “alguém”. Desenvolveu uma conduta sem saber, por conta do erro,
que estava praticando um fato típico.
O erro de tipo pode ser essencial ou acidental.
O erro de tipo essencial se subdivide em: invencível ou vencível.
11.2 ESPÉCIES DE ERRO DE TIPO ESSENCIAL
11.2.1. Invencível ou inevitável ou escusável
É aquele erro em que qualquer pessoa, nas mesmas
circunstâncias, incorreria. É o erro inevitável, desculpável ou escusável, que não poderia
ser evitado, mesmo por uma pessoa cautelosa e prudente.
Tomemos como exemplo a conduta de uma estudante que deixa
seu celular carregando na tomada da sala de aula e sai para comprar café na cantina
do local. Quando retorna, retira um celular da tomada, que, na verdade, não era o seu
aparelho, mas de sua colega, que havia colocado um celular idêntico para carregar em
substituição ao da estudante. Nesse caso, há evidente erro de tipo, pois a estudante,
por conta da falsa percepção da realidade (supôs ser seu o celular, já que idêntico),
errou em relação ao elemento “alheio” do tipo que define o crime de furto. E, trata-se de
erro de tipo invencível, porque qualquer pessoa, nas circunstâncias, consideraria que
era o seu telefone celular que estava carregando na tomada onde havia deixado.
Outro exemplo: Agente que se embrenha em mata fechada,
distante de qualquer centro urbano, com rara circulação de pessoas. Em dado momento,
visualiza algo se movimentando atrás da intensa vegetação. Supondo ser um animal,
efetua um disparo. Ao verificar o produto da caça, verifica, para sua surpresa, que não
matou um animal, mas uma pessoa, que, por infeliz coincidência, também caçava no
local. Trata-se de erro de tipo, pois o caçador, por conta da falsa percepção da realidade
(supôs ser um animal), errou em relação ao elemento “alguém” do tipo que define o
crime de homicídio. E, trata-se de erro de tipo invencível, porque qualquer pessoa, nas
circunstâncias, consideraria que a movimentação atrás da vegetação seria a de um
animal, não sendo possível supor, nem mesmo para uma pessoa mais cautelosa e
diligente, que, na verdade, tratava-se de uma pessoa.
O erro de tipo essencial invencível exclui o dolo e a culpa, pois
o sujeito não age dolosa ou culposamente.
11.2.2. Vencível, evitável ou inescusável
É aquele erro em que uma pessoa mais cautelosa e prudente,
nas mesmas circunstâncias, não incorreria. É o erro evitável, indesculpável ou
inescusável, que uma pessoa cautelosa e prudente teria evitado.
Tomemos como padrão o exemplo anterior. Imaginemos que
outra estudante, menos cautelosa e prudente, tivesse deixado seu celular carregando
na tomada da sala de aula e sai para comprar café na cantina do local. Quando retorna,
retira um celular da tomada, que, na verdade, não era o seu aparelho, mas de sua
colega, que havia colocado para carregar em substituição ao da estudante. Todavia,
não obstante e troca dos aparelhos, o celular da colega, embora parecido, era de outro
modelo e marca, diferenças que uma pessoa mais prudente teria percebido. Nesse
caso, há evidente erro de tipo, pois a estudante, por conta da falsa percepção da
realidade (supôs ser seu o celular), errou em relação ao elemento “alheio” do tipo que
define o crime de furto. No entanto, nesse caso, trata-se erro de tipo vencível, porque
uma pessoa mais diligente teria, nas circunstâncias, percebido que não era seu o
aparelho celular que se apossou.
O erro de tipo essencial vencível exclui o dolo, mas não a culpa,
desde que previsto em lei o crime culposo.
11.2.3. Efeitos do erro de tipo essencial
O erro de tipo invencível, inevitável ou escusável exclui o
dolo e a culpa. Isso porque o agente não age com dolo ou culposa, razão pela qual não
será responsabilizado criminalmente, já que se trata de fato atípico. Vale lembrar que o
dolo e a culpa, segundo a concepção finalista da ação, integram a conduta. Em sendo
a conduta elemento do fato típico, a ausência de dolo ou culpa, leva à atipicidade da
conduta.
Logo, nos exemplos relacionados ao erro de tipo invencível, a
estudante e o caçador não seriam responsabilizados criminalmente, diante da ausência
de dolo e culpa.
O erro vencível, evitável ou inescusável, recaindo sobre
elementar, exclui o dolo, pois todo erro essencial exclui, mas não a culpa. Se o erro
poderia ter sido evitado com emprego de diligência mínima, pode-se responsabilizar o
agente pelo crime culposo, desde que previsto em lei nessa modalidade.
Assim, se o fato for punido sob a forma culposa, o agente
responderá por crime culposo. Quando o tipo, entretanto, não admitir essa modalidade,
a consequência será inexoravelmente a exclusão do crime, já que configurará fato
atípico.
No exemplo do caçador que praticava a caça em mata próxima
à zona urbana, onde havia circulação de pessoas, o agente responderá pelo crime de
homicídio culposo, já que se trata de erro de tipo vencível.
De outro lado, no exemplo da jovem estudante que não
empregou a necessária diligência para identificar se o celular que se apossou era seu
ou não, restará afastado o dolo, devendo ela responder pelo crime na modalidade
culposa, já que se trata de erro de tipo vencível. Todavia, como não existe furto na
modalidade culposa, haverá exclusão do crime, já que o fato é atípico.
12. ERRO SOBRE PESSOA
O erro sobre pessoa incide quando o agente desenvolve conduta
voltada a atingir a pessoa pretendida, mas, confundindo-se em relação à sua identidade,
pratica o delito contra pessoa diversa.
Conforme se extrai do artigo 20, § 3º, do Código Penal, no
contexto de erro quanto à pessoa, o agente não será isentado de pena, recebendo
tratamento penal consideram-se as condições ou qualidades da vítima pretendida.
Assim, se, por exemplo, o agente pretendendo matar o próprio
pai, verificando-se a aproximação de uma pessoa e, supondo ser a vítima pretendida,
atira e atinge pessoa diversa. Nesse caso, responderá pelo crime de homicídio, com a
incidência da agravante de ter praticado crime contra ascendente, prevista no artigo 61,
II, “e”, 1ª parte, do Código Penal.
Da mesma forma, se uma mãe, sob o efeito do estado puerperal,
logo após o parto, durante a madrugada, vai até o berçário onde acredita encontrar-se
seu filho recém-nascido e o sufoca até a morte, retornando ao local de origem sem ser
notada, verificando-se, após, que, na verdade, a criança morta não era o seu filho, que
se encontrava no berçário ao lado, tendo ela se equivocado, portanto, quanto à vítima
desejada, responderá pelo crime de infanticídio (CP, art. 123), pois, embora tenha
atingido bebê diverso, é como se tivesse matado a vítima pretendida, seu filho.

13. Erro na execução (aberratio ictus)


13.1. Conceito
Erro na execução ou aberratio ictus significa aberração no
ataque ou desvio do golpe.
Ocorre erro na execução quando o agente, pretendendo atingir
uma pessoa, por acidente ou erro no uso dos meios de execução, acaba atingindo
pessoa diversa. A relação é de pessoa x pessoa e não crime x crime.
O agente não erra quanto à identidade da pessoa, mas quanto
aos meios no uso dos meios de execução do delito. Com efeito, visualiza como certa a
vítima pretendida, mas, por erro na pontaria, por exemplo, acaba atingindo pessoa
diversa.
A aberratio ictus pode ocorrer quando, por acidente, o agente,
ao invés de atingir a pessoa pretendida, atinge pessoa diversa. Suponhamos, nesse
caso, que o agente pretende matar Wilson, deixando na sua mesa de trabalho uma
xícara de café contendo veneno. Todavia, quem toma o café é Pedro, que acaba
falecendo.
Pode ocorrer também quando, por erro nos meios de
execução, o agente, ao invés de atingir a pessoa pretendida, atinge pessoa diversa.
Exemplo: Agente pretendendo matar Wilson, visualiza a vítima, tendo-a como certa, faz
a mira e efetua o disparo, mas, no entanto, erra o alvo pretendido, atingindo pessoa
diversa, que se encontrava próxima ao local.
13.2. Espécies
Há duas espécies de aberratio ictus: a) aberratio ictus com
unidade simples; b) aberratio ictus com resultado duplo.
a) Aberratio ictus com unidade simples ou com resultado único
Ocorre a aberratio ictus com resultado único quando em face de
erro na execução somente a pessoa diversa da pretendida é atingida, resultando lesão
corporal ou morte.
A consequência jurídica da conduta do agente se encontra
retratada no artigo 73, 1ª parte do Código Penal, que faz expressa remissão ao artigo
20, § 3º, do Código Penal. Ou seja, na hipótese de erro na execução, deve-se observar
o disposto no artigo 20, § 3º, do Código Penal, segundo o qual, embora tenha atingido
pessoa diversa, o agente deve receber tratamento penal considerando-se as condições
ou qualidades da pessoa pretendida (vítima virtual), desprezando-se as condições
pessoais da vítima efetivamente atingida.
Exemplo: É o caso do agente que, pretendendo matar o seu pai,
efetua disparo de arma de fogo, mas, por erro na pontaria, acaba atingindo pessoa
diversa, que se encontrava próximo ao seu genitor. Nesse caso, teríamos a falsa
impressão que incidiria tentativa de homicídio em relação ao pai, e homicídio culposo
em relação à pessoa diversa.
Todavia, nos termos do artigo 20, § 3º, do Código Penal, deve-
se considerar as condições ou qualidades da vítima pretendida. Assim, no caso, embora
tenha atingido de forma letal pessoa diversa, o agente responde como se tivesse
atingido a pessoa pretendida, ou seja, como se tivesse matado o próprio pai. Logo,
responderá pelo crime de homicídio doloso consumado, com a incidência da agravante
de ter praticado crime contra ascendente, prevista no artigo 61, II, “e”, 1ª figura, do
Código Penal.
b) Aberratio ictus com unidade complexa ou com resultado duplo
A aberratio ictus com resultado duplo ocorre quando o agente,
além de atingir a vítima pretendida, atinge também pessoa diversa.
Nesse caso, com uma única ação, o agente produz mais de um
resultado: atinge a pessoa pretendida, e também pessoa diversa. Por essa razão, o
artigo 73, 2ª parte, do Código Penal faz expressa remissão ao artigo 70 do Código Penal,
devendo ser aplicada a regra do concurso formal de crimes.
Exemplo: Pretendendo matar Wilson, o agente efetua um
disparo, que, além de atingir Wilson, atinge também Pedro, que se encontrava atrás da
vítima pretendida. Por conta da potência da arma utilizada, o disparo efetuado causou
a morte da pessoa pretendida e também da pessoa diversa. Em tese, teríamos
homicídio doloso em relação à vítima pretendida e homicídio culposo em relação à
pessoa diversa.
Nesse caso, nos termos do que dispõe o artigo 73, 2ª parte, do
Código Penal, deve-se aplicar a regra do artigo 70 do Código Penal, segundo o qual, se
o agente com uma única ação praticar dois ou mais crimes, deve-se considerar a pena
do crime mais grave, aumentando-a de 1/6 (um sexto) até a ½ (metade).
Convém mencionar que, se houver dolo eventual em relação à
vítima efetiva e dolo direto em relação à vítima visada, não há falar propriamente em
erro na execução, incidindo, no caso, inclusive, hipótese de concurso formal imperfeito,
aplicando-se o sistema do cúmulo material (soma das penas).
Assim, se o agente mira em direção à vítima visada (A),
visualizando a possibilidade de também atingir pessoa diversa (vítima B), assumindo o
risco e aceitando o resultado, atingindo-a e causando-lhe a morte, teremos tentativa de
homicídio, na modalidade dolo direto em relação à vítima A, e homicídio doloso, na
modalidade dolo eventual, em relação à vítima B, em concurso formal imperfeito (as
penas serão somadas).
14. Resultado diverso do pretendido
14.1. Conceito
Enquanto na aberratio ictus, a relação é entre pessoa x pessoa,
ou seja, o agente, pretendendo atingir uma pessoa, acaba ofendendo pessoa diversa,
na aberratio criminis, o agente quer atingir uma pessoa e ofende outra (ou ambas). Na
aberratio criminis, o agente quer atingir um bem jurídico e ofende outro bem jurídico,
produzindo resultado diverso do pretendido.
Exemplo: O agente, pretendendo praticar o crime de dano (CP,
art. 163), atira uma pedra contra um carro. Todavia, por erro na pontaria, a pedra acabou
atingindo uma pessoa que se encontrava próxima ao local. Note-se que o agente
pretendia produzir um resultado (dano no veículo), mas acabou produzindo um resultado
diverso do pretendido (lesão corporal).
14.2. Espécies
Há duas espécies de aberratio criminis: a) aberratio criminis com
unidade simples; b) aberratio criminis com resultado duplo.
a) Com unidade simples ou resultado único:
Na aberratio criminis com unidade simples, o agente somente
atinge o bem jurídico diverso do pretendido. Ou seja, o agente quer atingir uma coisa e
atinge uma pessoa.
Nesse caso, o agente responde pelo resultado produzido a título
de culpa, se o fato é previsto como crime culposo.
Assim, se o agente, pretendendo atingir o veículo do desafeto,
com o intuito de praticar o crime dano, por erro na execução, não atingir o objeto, mas
somente uma pessoa que se encontrava próxima ao local, responderá por lesão
corporal culposa (CP, art. 129, § 6º), se resultar lesão corporal; ou por homicídio culposo
(CP, art. 121, § 3º), se resultar morte.
b) Com unidade complexa ou resultado duplo:
Na aberratio criminis com resultado duplo, o agente, além de
praticar o crime pretendido, também acaba produzindo um resultado diverso do
pretendido. Ou seja, com uma ação ou omissão, acaba provocando dois resultados.
Nesse caso, como expressamente prevê a parte final do artigo
74 do Código Penal, aplica-se a regra do concurso formal de crimes (CP, art. 70),
considerando-se a pena do crime mais grave aumentada de 1/6 até metade, de acordo
com o número de resultados diversos produzidos.
Imaginemos que certo dia, o agente, com raiva do vizinho,
resolva quebrar a janela da residência deste. Para tanto, espera chegar a hora
adequada e, supondo não haver ninguém na residência, o agente arremessa com força,
na direção da casa do vizinho, um enorme tijolo, que, além de quebrar a vidraça, atinge
também sua nuca. O vizinho falece instantaneamente. Nesse caso, o agente deverá
responder por homicídio culposo em concurso formal com o crime de dano (art. 121, §
3º, e art. 163, na forma do art. 70, todos do Código Penal), considerando-se a pena
aplicada para o crime de homicídio culposo, já que mais grave, aumentada de 1/6.
Cumpre ressaltar, por pertinente, que, se o resultado previsto
como crime culposo for menos grave ou se o crime não prever modalidade culposa, não
aplica o disposto no artigo 74 do Código Penal. Assim, se o agente efetua disparos de
arma para matar a vítima, mas não o acerta e quebra a vidraça de uma casa ou acerta
um carro, deve-se desprezar a hipótese do artigo 74 do Código Penal, responderá por
tentativa de homicídio. Primeiro, porque o crime de tentativa de homicídio é mais grave
do que o delito de dano; segundo, porque não há previsão legal de dano culposo.
15. CAUSAS EXCLUDENTES DE ILICITUDE

Ilicitude é a contrariedade do fato típico praticado pelo agente


em relação ao ordenamento jurídico, ou seja, além de típico, a conduta desenvolvida
pelo agente também é contrária ao ordenamento jurídico.
Em que pese o fato praticado pelo agente seja típico, pode, em
determinadas circunstâncias, incidir causas que excluem a ilicitude desse fato. Em
outras palavras, o fato será típico, mas não será ilícito.
As causas legais de exclusão de ilicitude estão previstas no
artigo 23 do Código Penal.

15.1. ESTADO DE NECESSIDADE


15.1.1. Conceito

Nos termos do artigo 24 do Código Penal, estado de


necessidade é a causa de exclusão da ilicitude da conduta de quem, não tendo o dever
legal de enfrentar o perigo atual, a qual não provocou por sua vontade, sacrifica um bem
jurídico ameaçado por esse perigo para salvar outro, próprio ou alheio, cuja perda não
era razoável exigir.
15.1.2. Requisitos

O artigo 24, “caput”, e seu § 1º, do Código Penal, prevê os


requisitos para a incidência do estado de necessidade. Tais requisitos são cumulativos,
devendo todos estarem presentes para configurar a causa excludente de ilicitude.

Os requisitos para configurar o estado de necessidade são:

Perigo atual

Ameaça a direito próprio ou alheio

Situação de perigo não provocado voluntariamente pelo agente

Ausência do dever legal de enfrentar o perigo

Inevitabilidade do comportamento lesivo

Não ser exigível sacrifício do interesse ameaçado

Ter conhecimento da situação do fato justificante

1. Situação de perigo atual

A situação de perigo caracteriza o estado de necessidade. O


agente pratica um fato típico, para se salvar de uma situação de perigo. Trata-se de
hipótese de o agente estar diante de um fato que exponha seu bem jurídico a uma
probabilidade de dano.

Essa situação de perigo pode decorrer de ação humana


(lesionar uma pessoa durante fuga para se salvar de um incêndio provocado por
alguém); por um fato da natureza (subtrair um barco para se salvar de uma inundação);
por comportamento de um animal (danificar um patrimônio para se salvar de ataque de
um cão bravio).

2. ameaça a direito próprio ou alheio: estado de necessidade próprio e de terceiro

A expressão “direito”, contida no artigo 24 do Código Penal, deve


ser interpretada de forma abrangente, atingindo qualquer bem jurídico, próprio ou de
terceiro, exposto a perigo, tais como a vida, a integridade física, a honra, a liberdade e
o patrimônio.

Em relação ao terceiro, não se exige qualquer relação jurídica


entre o agente que age em estado de necessidade e o terceiro, sendo, pois, dispensável
qualquer relação de parentesco, amizade ou subordinação entre o agente e o terceiro
necessitado. Assim, perfeitamente possível arguir estado de necessidade para defesa
de bem jurídico de pessoa desconhecida.

3. situação de perigo não causada voluntariamente pelo sujeito

O Código Penal é expresso no sentido de não viabilizar a


possibilidade de se invocar estado de necessidade quem provocou a situação de perigo
voluntariamente. De fato, parece sintomática e lógica a previsão do legislador, já que o
ordenamento jurídico não pode referendar sacrifício de um direito, beneficiando com
uma causa de exclusão de ilicitude agente que provocou, de forma voluntária, uma
situação de perigo.

Ex: Tício mora no 3º andar de prédio de sua propriedade. Com


ele reside colega de escritório. Com a intenção de receber seguro, Tício ateia fogo no
edifício. O incêndio, porém, assume rapidamente proporções inesperadas e bloqueia
praticamente todas as saídas. Tício, neste momento, percebendo que o colega usa uma
corda para descer pela janela mata o companheiro para pegar a corda e salvar-se. O
homicídio do companheiro de escritório não encontra no estado de necessidade causa
de justificação, uma vez que Tício criara o perigo que ensejou a situação aflitiva.

4. Ausência do dever legal de enfrentar o perigo

Nos termos do artigo 24, § 1º, do Código Penal, “Não pode


alegar estado de necessidade quem tinha o dever legal de enfrentar o perigo”. Assim,
por força desse dispositivo, quando a lei impuser ao agente o dever de enfrentar o
perigo, deve ele buscar salvar o bem ameaçado sem sacrificar outro qualquer, ainda
que tenha de correr os riscos inerentes à sua função.

5. inevitabilidade do comportamento lesivo


Ao tratar do estado de necessidade, o Código Penal, no seu
artigo 24, exige, como pressuposto, a inexistência de um outro meio de evitar o perigo,
isto é, quando o dano produzido pelo agente for inevitável.

Assim, o agente estará autorizado a praticar um fato típico


quando for absolutamente imprescindível para evitar a lesão ao bem jurídico.

Se possível afastar o perigo por qualquer outro meio, deve o


agente se abster de sacrificar bem jurídico alheio. Isso porque o estado de necessidade
apresenta um caráter de subsidiariedade, ou seja, entre sacrificar o bem jurídico e se
afastar da situação de risco, deverá por essa solução optar o agente.

Se o perigo pode ser afastado por uma conduta menos lesiva, a


prática do comportamento mais lesivo não configura a excludente.

Exemplo: se para se salvar do ataque de um cão bravio, pode o


agente empreender fuga, não poderá matar o animal e depois alegar estado de
necessidade, porquanto havia outra forma de impedir a lesão ao seu bem jurídico.

6. inexigibilidade de sacrifício do interesse ameaçado

A ponderação de bens está insculpida no final do art. 24 do


Código Penal, ao admitir o estado de necessidade, para proteger direito próprio ou
alheio “cujo sacrifício, nas circunstâncias, não era razoável exigir-se”. A admissibilidade
do estado de necessidade é orientado pelo princípio da razoabilidade ou
proporcionalidade.

Isso significa que se deve observar a proporcionalidade entre o


bem sacrificado e o bem protegido, não sendo razoável admitir o sacrifício de uma vida
para preservar um patrimônio.

Em síntese, somente se admite a invocação da excludente do


estado de necessidade, quando para salvar bem de maior ou igual valor ao do
sacrificado. Há ponderação de bens.

16. LEGÍTIMA DEFESA


16.1. Introdução

Nos termos do art. 25 do CP, “Entende-se em legítima defesa


quem, usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, atual
ou iminente, a direito seu ou de outrem”.
É uma causa de exclusão da ilicitude que consiste em repelir
injusta agressão, atual ou iminente, a direito próprio ou alheio, usando moderadamente
dos meios necessários.

A Lei 13.964/2019 introduziu o parágrafo único ao artigo 25 do


Código Penal, segundo o qual Parágrafo único. Observados os requisitos previstos
no caput deste artigo, considera-se também em legítima defesa o agente de segurança
pública que repele agressão ou risco de agressão a vítima mantida refém durante a
prática de crimes.”

Em que pese já se enquadrar no “caput” do artigo 25 do Código


Penal, o legislador optou por especificar a conduta do agente de segurança que se
depara com agressão ou risco de agressão a vítima mantida refém durante a prática de
crimes.

É o caso, por exemplo, do agente de segurança efetuar disparos


contra o sujeito que, durante a prática de roubo a banco, mantém vítima refém.

16.2. Requisitos

A legítima defesa, nos termos em que é proposta pelo nosso


Código Penal, exige a presença simultânea dos seguintes requisitos: agressão injusta,
atual ou iminente; direito próprio ou alheio; meios necessários usados moderadamente;
elemento subjetivo; animus

1. Agressão injusta, atual ou iminente

Exige-se, para caracterizar a legítima defesa, a existência de


uma agressão injusta. Injusta será a agressão que não estiver protegida por uma norma
jurídica, isto é, não for autorizada pelo ordenamento jurídico.

Além de injusta, a agressão deve ser atual ou iminente.

Atual é a agressão que está acontecendo, ou seja, o efetivo


ataque já em curso no momento da reação defensiva

Iminente é a que está prestes a ocorrer. Nesse caso, a agressão


ainda não teve início, mas poderá ocorrer em momento imediato. Exemplo do agressor
que anuncia o ataque, e parte, munido de uma faca, em direção à vítima para matá-la,
que reage desferindo um disparo de arma de fogo contra o agressor, fazendo cessar a
agressão.
A agressão que se anuncia para o futuro e a agressão passada
não autoriza a legítima defesa. De fato, não se admite legítima defesa contra suposta
agressão que nem sequer poderá ocorrer, nem tampouco em relação à agressão
pretérita, pois caracterizaria vingança.

Em relação ao titular do bem jurídico sujeito à agressão, há duas


formas de legítima defesa: a) legítima defesa própria, quando a agressão é direcionada
ao próprio titular do bem jurídico atacado ou ameaçado; b) legítima defesa de terceiro,
quando a agressão é voltada a atingir bem jurídico alheio.

2. Reação com os meios necessários

Meios necessários são aqueles à disposição do agredido


eficazes e suficientes para repelir a agressão injusta, devendo ser a menos lesiva
possível ao agressor. O ofendido deve eleger, dentre os que se encontram ao seu
alcance, o meio capaz de fazer cessar a agressão.

Assim, se o agressor franzino atacar o ofendido de próprio


punho, a princípio, um pedaço de madeira ou uma barra de ferro seria suficiente para
fazer cessar a agressão. Se o ofendido, nesse caso, eleger uma arma de fogo para
repelir a injusta agressão, estará incorrendo em excesso, pois usou mais lesivo para
cessar o ataque.

3. Uso moderado dos meios necessários

Após eleger o meio necessário, o agredido deverá fazer uso


moderado desses meios, suficiente para fazer cessar a agressão injusta.

É o emprego dos meios necessários dentro do limite do razoável


para conter a agressão. A proporção entre o ataque e a defesa empreendida deve ser
verificada no caso concreto, considerando-se a natureza e a gravidade da agressão, e
a extensão da reação.

Assim, se a vítima está sendo atacada pelo agente munido de


uma faca, poderá se utilizar de uma arma de fogo para repelir a injusta agressão (eis o
meio necessário), mas deverá agir com moderação. Nesse caso, se um disparo foi um
suficiente para fazer cessar a agressão, o ofendido não poderá efetuar o segundo
disparo, sob pena de incorrer em excesso e responder pelo resultado produzido pela
desproporção da defesa em relação ao ataque.
16.2.1. Excesso

Há excesso quando o agente extrapola os limites da legítima


defesa, intensificando a reação, dolosa ou culposamente, elegendo meio além do
necessário ou fazendo uso imoderado dos meios necessários para repelir a injusta
agressão.

Nesse caso, embora num primeiro momento o agente estivesse


sob o amparo da legítima defesa, presente o excesso, os requisitos da excludente de
ilicitude deixará de existir, devendo o agente responder pelas desnecessárias lesões
causadas ao bem jurídico ofendido.

O excesso pode ser doloso ou culposo.

Há excesso doloso quando o sujeito, de forma consciente,


extrapola o necessário para repelir a agressão, valendo-se de meios mais lesivos ou
usando de forma imoderada os meios que elegeu para reagir à injusta agressão.

Assim, quando o agente, para se defender de um tapa, efetua


disparos de arma de fogo contra o agressor. Ou, ainda, quando, após fazer cessar a
agressão, o agente segue em diante na reação até matar o então agressor.

Constatado o excesso doloso, o agente responde pelo resultado


dolosamente. No caso, o agente, que num primeiro momento estava em legítima defesa,
responderá pelo crime de homicídio doloso.

No excesso culposo não há intenção em extrapolar os limites


da repulsa à agressão injusta, supondo o agente ainda estar sofrendo a agressão, que,
na verdade, havia cessado. Nesse caso, o agente responderá pelo resultado produzido
a título de culpa.

16.3. ESTRITO CUMPRIMENTO DO DEVER LEGAL

Ao contrário do estado de necessidade (CP, art. 24) e da legítima


defesa (CP, art. 25), o Código Penal não dispôs sobre o conceito e requisitos do estrito
cumprimento do dever legal, relegando à doutrina e jurisprudência estabelecer as
características dessa causa excludente de ilicitude.

Estará ao abrigo do estrito cumprimento do dever legal, o agente


que praticar um fato típico em face do cumprimento de um dever observando
rigorosamente os limites impostos pela lei, de natureza penal ou não.
Exemplo: policial que prende o agente em flagrante ou mediante
cumprimento de mandado de prisão, embora atinja o seu direito de liberdade, não
comete o crime previsto no art. 148 do Código Penal, porque cumpre o dever que lhe é
imposto por lei.

Da mesma maneira, inexiste violação de domicílio criminosa


(CP, art. 150) se policial invade residência alheia para realizar prisão em flagrante pela
prática de crime que está sendo praticado no local.

A excludente é destinada precipuamente aos agentes que


exercem atividade pública, tal como funcionário público ou agente público que age por
ordem da lei. Também alcança o particular que exerce função pública, ainda que
temporariamente, como, por exemplo, o jurado, mesário da Justiça Eleitoral.

16.4. EXERCÍCIO REGULAR DE DIREITO

Assim como o estrito cumprimento do dever legal, não há no


Código Penal dispositivo estabelecendo o conceito e as características do exercício
regular do direito, limitando-se o legislador a indicar que se trata de excludente de
ilicitude, nos termos do artigo 23, III, do Código Penal.

Qualquer direito, público ou privado, penal ou extrapenal,


regulamente exercido, afasta a antijuridicidade. Mas o exercício deve ser regular, isto é,
deve obedecer a todos os requisitos objetivos exigidos pela ordem jurídica.

A Constituição Federal dispõe que ninguém será obrigado a


fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei (CF/88, art. 5º, II). Logo,
se a lei autoriza o agente a praticar determinada conduta, não poderá, à evidência,
considerá-la ilícita.

A expressão direito é empregada em sentido amplo, abrangendo


todas as formas de direito subjetivo, penal ou extrapenal, como, por exemplo, a
faculdade do uso moderado dos meios de correção e disciplina, decorrentes do poder
familiar, nos termos do artigo 1634, inciso I, do Código Civil.

Conforme parte da doutrina, o costume também legitima certas


ações e fatos típicos, como, por exemplo, o trote acadêmico, em que as violências,
injúrias e constrangimentos que os veteranos praticam contra os noviços não se
consideram atos antijurídicos em face do direito penal, porque longo e reiterado costume
consagra o “trote” como instituição legítima.

Qualquer pessoa pode exercitar um direito subjetivo ou uma


faculdade prevista em lei (penal ou extrapenal). Exemplo clássico é do particular que
realiza a prisão em flagrante, conforme prevê o artigo 301 do Código de Processo Penal.

A prática de determinadas atividades esportivas produzem,


invariavelmente, lesões corporais, tais como o futebol, o boxe e a luta livre.

Nesses casos, o fato típico praticado não será ilícito, desde que
a conduta desenvolvida pelo agente observe os estritos limites das regras do esporte
praticado.

Se, no entanto, o desportista não observar as regras que


disciplinam o esporte praticado, responderá pelo resultado lesivo que produzir, segundo
seu dolo ou sua culpa.

Assim, se um jogador de futebol desferir um violento pontapé no


rosto do adversário caído ao solo, responderá pelo resultado produzido, qual seja, lesão
corporal, já que extrapolou os limites das regras da atividade desportiva que exercia.

17. CULPABILIDADE

17.1. INTRODUÇÃO

Doutrinariamente, a culpabilidade é considerada um juízo de


censurabilidade e reprovação social incidente sobre o fato e seu autor, como forma de
se verificar a necessidade de aplicação de uma pena.

Em outras palavras, quando pratica um fato típico e ilícito, o


agente será submetido a um juízo de censura, que incide sobre a manifestação e
exteriorização da vontade do agente, a fim de verificar a possibilidade de imposição de
uma pena.
17.2. ELEMENTOS DA CULPABILIDADE

Segundo a teoria limitada da culpabilidade adotada pelo CP, os


elementos da culpabilidade são:

c
A imputabilidade do sujeito;

Potencial consciência da ilicitude;

Exigibilidade de conduta diversa.

De outro lado, as causas excludentes de culpabilidade


consistem na inimputabilidade, falta de potencial consciência de ilicitude e
inexigibilidade de conduta diversa.

EXCLUDENTES DE
CULPABILIDADE

INIMPUTABILIDADE INEXIGIBILIDADE DE
CONDUTA DIVERSA
FALTA DE POTENCIAL

Doença
CONSCIÊNCIA DA
Coação
Mental art. 21, CP Moral
art. 26, CP
Irresistível
art. 22, CP

Embriaguez completa e
acidental ERRO DE Obediência
art. 28, § 1º, CP PROIBIÇÃO
Hierárquica

art. 22, CP
17.3. Inimputabilidade por doença mental, desenvolvimento mental incompleto ou
desenvolvimento mental retardado
A inimputabilidade pela enfermidade mental é aferida pelo
sistema biopsicológico. Além da doença mental, é necessário que, em consequência
desse estado biológico, o agente seja, no momento da conduta, inteiramente incapaz
de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse
entendimento.
Logo, se, embora portador de doença mental, o agente, ao
tempo da conduta, apresentar lucidez, isto é, capacidade de compreensão do caráter
ilícito do fato e de determinação de acordo com esse entendimento, será considerado
imputável.
Em relação aos menores de 18 anos de idade, a
inimputabilidade gera presunção absoluta, não admitindo prova em contrário, sem
prejuízo, à evidência, de instauração de procedimento para apuração de ato infracional
no Juizado da Infância e Juventude.
A responsabilidade do menor de 18 anos de idade é aferida
conforme o que dispõe a Lei 8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente), mediante
a instauração de procedimento para apuração de ato infracional, com aplicação, se for
o caso, de medida socioeducativa.
Em relação à inimputabilidade pela enfermidade mental, o
agente será processado e julgado normalmente, mas, ao final, o juiz não poderá proferir
sentença condenatória. Isso porque ausente a culpabilidade, pressuposto para a
aplicação da pena.
Nesse contexto, uma vez verificado que o agente praticou um
fato típico e ilícito, sendo, ao final, considerado inimputável por conta da sua
enfermidade mental, o juiz deverá proferir sentença absolutória imprópria, aplicando
medida de segurança, consistente em internação em hospital de custódia ou tratamento
ambulatorial, nos termos do artigo 386, parágrafo único, inciso III, do Código de
Processo Penal.
17.3.1. Semi-imputabilidade ou imputabilidade diminuída ou restrita
A semi-imputabilidade ou imputabilidade diminuída ou restrita
encontra previsão no artigo 26, parágrafo único, do Código Penal. Trata-se, na verdade,
de uma causa de diminuição da pena.
O artigo 26, parágrafo único, do Código Penal traz a expressão
“perturbação mental”, que também se caracteriza como doença mental, mas de menor
intensidade, já que não retira completamente a capacidade de compreensão do caráter
ilícito do fato e de determinação de acordo com esse entendimento.
Diversamente do que ocorre na inimputabilidade, em que o
agente tem suprimida por completo a capacidade de compreensão e de determinação,
na semi-imputabilidade há a redução da capacidade de entendimento e de
autodeterminação. Em outras palavras, o agente, não obstante a perturbação mental,
detém capacidade de compreensão e de autodeterminação, mas em grau reduzido,
subsistindo, por isso, a imputabilidade e, por conseguinte, a culpabilidade.
17.4. Da inimputabilidade por embriaguez completa proveniente de caso fortuito
ou força maior
17.4.1. Conceito
Embriaguez é a intoxicação aguda e transitória causada pelo
álcool ou qualquer substância de efeitos análogos, sejam eles entorpecentes (morfina,
ópio), estimulantes (cocaína) ou alucinógenos (ácido lisérgico), capaz de levar à
exclusão da capacidade de entendimento acerca do caráter ilícito do fato ou de
determinar-se de acordo com esse entendimento.
17.4.2. Espécies de embriaguez
A embriaguez aguda classifica-se quanto à intensidade e quanto
à origem.
Quanto à intensidade, a embriaguez pode ser completa ou
incompleta.
A embriaguez completa, total ou plena, é aquela em que o
agente chegou à segunda ou terceira fase.
A embriaguez incompleta, parcial ou semiplena, é aquela em
que o agente ficou na 1ª fase.
Quanto à origem, a embriaguez voluntária, culposa,
preordenada ou acidental.
A embriaguez voluntária, ou intencional, como o próprio nome
diz, é aquela em que o agente ingere bebida alcóolica com a intenção de se embriagar,
mas sem o desiderato de praticar infração penal.
A embriaguez culposa é aquela em que a intenção do agente
se limita a apenas ingerir bebida alcóolica, mas não a de se embriagar. No entanto,
acaba se excedendo no consumo do álcool e acaba se embriagando.
Nos termos do artigo 28, inciso II, do Código Penal, a
embriaguez voluntária ou culposa não exclui a imputabilidade penal, e, por
consequência, não fica excluída a culpabilidade. Ele responde pelo crime.
A embriaguez preordenada, ou dolosa, é aquela em que o
agente se embriaga intencionalmente para cometer uma infração penal. A embriaguez
serve como espécie de estímulo e encorajamento para a prática de crime ou
contravenção penal. Evidentemente, não há exclusão da imputabilidade, antes pelo
contrário, pois, além de responder pelo delito, incide, ainda, a agravante prevista no
artigo 61, II, “l”, do Código Penal.
A embriaguez é acidental quando não voluntária nem culposa.
Pode ser proveniente de caso fortuito ou força maior.
No caso fortuito, o sujeito desconhece o efeito inebriante da
substância que ingere, ou quando, desconhecendo uma particular condição fisiológica,
ingere substância que possui álcool (ou substância análoga), ficando embriagado. Ex:
agente ingere substância alcóolica e, inadvertidamente, também medicamento que
potencializa os efeitos do álcool.
Na força maior, o agente é obrigado a ingerir bebida alcoólica.
Tomemos como exemplo trote acadêmico de mau gosto, em que os veteranos obrigam
um calouro a ingerir bebida alcóolica.
Quando a embriaguez acidental, proveniente de caso fortuito ou
força maior, for completa, ou seja, apta a deixar o agente, ao tempo da ação ou da
omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se
de acordo com esse entendimento, há exclusão da imputabilidade, nos termos do que
dispõe o artigo 28, § 1º, do Código Penal.
Logo, não basta a embriaguez acidental, sendo, ainda,
necessário que, em decorrência da substância alcoólica ou de efeitos análogos, o
agente tenha ficado, ao tempo da conduta, inteiramente incapaz de entender o caráter
ilícito da sua conduta ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.
Quando a embriaguez acidental, proveniente de caso fortuito ou
força maior, é incompleta, não há exclusão da imputabilidade. O sujeito responde pelo
crime com a pena atenuada, desde que haja redução de sua capacidade intelectiva ou
volitiva. A sentença é condenatória. Aplica-se o disposto no art. 28, § 2º, do Código
Penal.
17.5. POTENCIAL CONSCIÊNCIA DA ILICITUDE
17.5.1. Introdução
Trata-se, na verdade, da possibilidade de o agente estabelecer
um juízo de valor acerca da sua conduta, reunindo condições de compreender o caráter
ilícito do fato.
A falta da potencial consciência acerca da ilicitude do fato gera
a exclusão da culpabilidade pelo erro de proibição escusável ou inevitável, nos termos
do artigo 21 do Código Penal.
17.5.2. Erro de proibição
Nos termos do artigo 21 do Código Penal, o desconhecimento
da lei é inescusável. Não se mostra possível, portanto, o agente acusado de uma
infração penal alegar desconhecimento da lei para se eximir da aplicação da lei penal.
A partir da publicação da lei no Diário Oficial, há presunção absoluta acerca do seu
conhecimento.
O desconhecimento da lei não se confunde com a falta de
potencial consciência da ilicitude. A primeira guarda relação com o desconhecimento do
seu texto legal, dos seus detalhes, ao passo que a segunda se caracteriza pela ausência
de conhecimento que a conduta desenvolvida é ilícita. É nesse contexto que surge o
instituto do erro de proibição.
O erro de proibição é o erro que incide sobre a ilicitude do fato.
Encontra-se disciplinado no artigo 21 do Código Penal.
No erro de proibição, o agente desenvolve uma conduta movido
por uma falsa percepção acerca do caráter ilícito do fato típico praticado. Ou seja, o
agente tem consciência da conduta praticada, mas lhe falta potencial consciência da
ilicitude do fato.
17.5.3. Efeitos: Erro de proibição escusável e inescusável
O erro de proibição escusável, inevitável ou invencível
ocorre quando o erro sobre a ilicitude do fato é impossível de ser evitado, valendo-se o
ser humano da sua diligência ordinária.
Em outras palavras, ainda que tivesse empregado as diligências
necessárias à sua condição pessoal, o agente não reuniria condições para compreender
o caráter ilícito do fato praticado.
Exemplo: um telejornal de alcance nacional informa, de forma
equivocada, a aprovação da lei que autoriza a eutanásia de doentes em estágio
terminal. Não havendo nenhuma razão para duvidar da veracidade da notícia, o agente
se dirige até o hospital e desliga os aparelhos que mantinham vivo um ente querido, que
se encontrava sofrendo com a doença que o acometia e em estágio terminal, causando-
lhe a morte. Praticou fato típico e ilícito, mas lhe faltou potencial consciência da ilicitude,
incidindo o erro de proibição inevitável, cuja consequência será a exclusão da
culpabilidade.

O erro de proibição inescusável ou evitável ocorre quando o erro


sobre a ilicitude do fato não se justifica, pois, se tivesse havido um mínimo de empenho
em se informar, o agente poderia ter tido conhecimento da realidade.

O critério de aferição do erro de proibição inescusável, vencível


ou evitável encontra-se no parágrafo único do artigo 21 do Código Penal, segundo o
qual “considera-se evitável o erro se o agente atua ou se omite sem a consciência da
ilicitude do fato, quando lhe era possível, nas circunstâncias, ter ou atingir essa
consciência”.

Em se tratando de erro de proibição evitável, permanece hígida


a culpabilidade do agente, sendo, no entanto, causa de diminuição da pena de um sexto
a um terço.
17.6. EXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA

17.6.1. Conceito

A exigibilidade de conduta diversa é o terceiro elemento da


culpabilidade. O agente, ao praticar a infração penal, frustra a expectativa da sociedade,
pois lhe era exigido conduta diversa daquela que deliberadamente adotou. Ou seja, o
agente poderia se comportar conforme o direito, mas optou por infringir a norma penal.

De outro lado, quando não lhe era exigível comportamento


diverso, não incide o juízo de reprovação, excluindo a culpabilidade.

E, nesse particular, as causas legais de exclusão da


culpabilidade pela inexigibilidade de conduta diversa estão previstas no artigo 22 do
Código Penal, consistentes na coação moral irresistível e a obediência hierárquica.

17.6.2. Coação moral irresistível

Nos termos do artigo 22 do Código Penal, se o fato é cometido


sob coação irresistível somente o autor da coação é punido.

Na coação moral, o agente coator, para alcançar o resultado


desejado, emprega grave ameaça contra o coagido, que, por medo de suportar um mal
grave contra si ou contra outrem, acaba realizando a conduta criminosa exigida. A
coação empregada pelo agente, vicia a vontade do coagido, retirando-lhe a exigência
de se comportar de modo diferente. Nesse caso, em relação ao coagido, incide a causa
de exclusão da culpabilidade decorrente da inexigibilidade de conduta diversa.

Exemplo: se o sujeito é coagido a assinar um documento falso,


responde pelo crime de falsidade o autor da coação. O coato não responde pelo crime,
uma vez que sobre o fato incide a causa de exclusão da culpabilidade. Assim, quando
o sujeito comete o fato típico e antijurídico sob coação moral irresistível não há
culpabilidade em face da inexigibilidade de outra conduta (não é reprovável o
comportamento). A culpabilidade desloca-se da figura do coato para a do coator.

Convém sinalar que, se o sujeito pratica o fato sob coação física


irresistível, não praticará crime por ausência de conduta. Trata-se de causa excludente
da tipicidade.
17.6.3. Obediência hierárquica

17.6.3.1. Conceito

Obediência hierárquica decorre da conduta do subordinado que,


por força de ordem não manifestamente ilegal emanada por superior hierárquico, pratica
fato típico e ilícito.

Trata-se de causa excludente de culpabilidade, consistente na


inexigibilidade de conduta diversa, prevista no artigo 22 do Código Penal.

A obediência hierárquica depende da presença de alguns


requisitos.

a) Ordem não manifestamente ilegal

Ordem de superior hierárquico é a manifestação de vontade do


titular de uma função pública a um funcionário que lhe é subordinado, no sentido de que
realize determinada conduta.

A ordem não manifestamente ilegal é aquela que revela


aparente legalidade, mas que, na realidade, é contrária ao direito. O subordinado, por
força da ordem emanada pelo superior hierárquico, realiza a conduta que lhe foi
ordenada, considerando-a lícita, quando, na realidade, constitui fato típico e ilícito.

No caso de a ordem não ser manifestamente ilegal, embora a


conduta do subordinado constitua fato típico e antijurídico, não é culpável, em face de
incidir um relevante erro de proibição. Diante disso, o subordinado não responde pelo
crime, em face da ausência de culpabilidade.

b) Ordem emanada por autoridade competente

A ordem deve ser emanada por autoridade competente para


emiti-la. Eventual cumprimento de ordem determinada por autoridade sem competência
para tanto pode ensejar erro de proibição.

c) Relação de direito público

A obediência hierárquica tem relação de direito público entre


superior e subordinado. A subordinação doméstica não ingressa na teoria da obediência
hierárquica.
Assim, não há obediência hierárquica, para fins penais, entre
relações particulares.

d) Presença de no mínimo três pessoas

Há, necessariamente, a presença de três pessoas: o superior


hierárquico (mandante da ordem), o executor da ordem (subordinado) e a vítima do
crime praticado.

e) Cumprimento estrito da ordem

O executor deve pautar sua conduta nos estritos limites da


ordem emanada pelo superior hierárquico, sob pena de não incidir a excludente.

No caso de a ordem não ser manifestamente ilegal, embora a


conduta do subordinado constitua fato típico e antijurídico, não é culpável, em face de
incidir um relevante erro de proibição. Diante disso, o subordinado não responde pelo
crime, em face da ausência de culpabilidade. A obediência hierárquica constitui, assim,
causa de exclusão da culpabilidade.
Nesse caso, somente o superior hierárquico responderá pelo
resultado produzido pelo executor. É o que se extrai do artigo 22 do Código Penal.
Tomemos como exemplo a hipótese de um Delegado de Polícia
que determina a um inspetor de polícia recém empossado na instituição conduza um
desafeto até a Delegacia, sem nenhuma razão plausível para isso. Desconhecimento
os motivos do superior hierárquico, o subordinado cumpre estritamente a ordem. Nesse
caso, o subordinado não será responsabilizado criminalmente, já que incide em seu
favor a causa excludente de culpabilidade. O crime de abuso de autoridade deve ser
atribuído exclusivamente ao autor da ordem.

Se a ordem for manifestamente ilegal, tanto o superior


hierárquico, quanto o subordinado responderão pelo delito praticado. Nesse caso, para
o superior hierárquico incide a agravante genérica descrita no artigo 62, III, 1ª parte, do
Código Penal. E, em relação ao subordinado, aplica-se a atenuante prevista no artigo
65, III, “c”, do Código Penal.
18. CONCURSO DE PESSOAS

18.1. Conceito
Trata-se de contribuição entre dois ou mais agentes para o
cometimento de uma infração penal. Ocorre quando duas ou mais pessoas, em
conjugação de esforços e comunhão de vontades, reúnem-se para a prática de um ou
mais delitos.
A doutrina utiliza também as expressões concurso de agentes e
codelinquência.
Para a maioria da doutrina, a teoria restritiva é a aplicada pelo
Código Penal, embora a teoria do domínio do fato já tenha sido admitida pelo STF.

Assim, AUTOR é quem realiza a figura típica, isto é, quem executa o


crime, enquanto o P AR TÍ CIPE é todo aquele que contribui de qualquer forma
para a prática delituosa, induzindo, instigando ou auxiliando, sem executar,
portanto, a ação descrita no verbo nuclear do tipo.

18.2. Participação
Conforme a teoria restritiva de autoria, partícipe é quem contribui
para que o autor ou coautores realizem a conduta principal, ou seja, aquele que, sem
praticar o verbo nuclear do tipo, concorre de algum modo para a produção do resultado.
A participação pode ser:
A) Moral
A determinação (ou induzimento) e a instigação são as formas
de participação moral.
A.1) Induzimento ou determinação
Ocorre a determinação ou induzimento quando uma pessoa faz
surgir na mente de outra a intenção delituosa.
Ex: Rafa incute na mente de Iuri a ideia homicida contra Jonas.
A característica da determinação é a inexistência da resolução criminosa na pessoa do
autor principal. Se Iuri matar Jonas, Rafa responde por homicídio na condição de
partícipe.
A.2) Instigação
Instigar é reforçar uma ideia já existente. O agente já a tem em
mente, sendo apenas reforçada pelo partícipe.
No caso do exemplo acima, Iuri já tinha em mente matar Jonas.
Rafa apenas reforçou a ideia homicida. Rafa é partícipe do crime de homicídio, enquanto
Iuri responde pelo crime na condição de autor.
B) Material
Ocorre na forma de auxílio. Considera-se, assim, partícipe
aquele que presta ajuda efetiva na preparação ou execução do delito.
Auxilia na preparação quem fornece a arma ou informações úteis
à realização do crime. Auxilia na execução quem permanece de atalaia, no sentido de
avisar o autor da aproximação de terceiro, leva o ladrão em seu veículo ao local do furto,
carrega a arma do homicida.
18.2.1. Natureza Jurídica da participação
A participação é acessória a um fato principal. Significa que não
se pode falar em participação sem que haja uma ação principal, ou seja, sem que
alguém realize atos de execução de um crime consumado ou tentado.
Como a conduta do partícipe não descrita no tipo penal, faz-se
necessária uma norma de extensão que viabilize a adequação típica da conduta do
partícipe à norma incriminadora. Trata-se de uma norma de ligação entre a conduta do
partícipe e o tipo penal. E essa norma se encontra no artigo 29 do Código Penal,
segundo o qual quem concorrer, de qualquer forma, para um crime por ele responderá.
Para a participação ser punível, afigura-se imprescindível que o
ato executório do crime tenha sido iniciado.
Ex: Fabrício contrata Félix para matar Mafalda. Félix sai em
busca de Mafalda e, ao avistá-la, apiedado, não dá início ao intento executório. Nesse
caso, tanto Fabrício quanto Félix não respondem pelo delito de homicídio, pois sequer
foi dado início ao ato executório.
18.2.2. Teorias do concurso de pessoas
a) Teoria Pluralista
Para esta teoria, havendo pluralidade de agentes, com
diversidade de condutas, ainda que provocando somente um resultado, cada agente
responde por um delito.
Em outras palavras, para a teoria pluralista, atribui-se a cada um
dos agentes um delito diferente.
b) Teoria dualista
Para esta teoria, há dois crimes: um para os autores e outro para
os partícipes.
c) Teoria unitária (ou monista)

Todos os que contribuem para a prática do delito cometem o


mesmo crime, não havendo distinção quanto ao enquadramento típico entre autor e
partícipe.
Daí decorre o nome da teoria: todos respondem por um único
crime (Teoria unitária).

* TEORIA ADOTADA QUANTO À NATUREZA DO CONCURSO DE PESSOAS:


O Código Penal adota a teoria monista (ou unitária), segundo a qual
havendo pluralidade de agentes, com diversidade de condutas, mas provocando
apenas um resultado, há somente um delito. Nesse caso, portanto, todos os
que tomam parte na infração penal cometem o mesmo delito.

É o que se extrai do artigo 29, “caput”, do Código Penal: “Quem, de qualquer modo,
concorre para o crime incide nas penas a este cominadas, na medida de sua
culpabilidade”.

18.2.3. REQUISITOS DO CONCURSO DE PESSOAS

A) Pluralidade de condutas
Trata-se de requisito elementar do concurso de pessoas: a
concorrência de mais de uma pessoa na execução de uma infração penal.

Assim, para que haja concurso de pessoas, exige-se que cada


um dos agentes tenha realizado ao menos uma conduta relevante. Pode ser em
coautoria, onde há duas condutas principais; ou autoria e participação, onde há uma
conduta principal e outra acessória, praticadas, respectivamente, por autor e partícipe.
B) Relevância causal das condutas
Para justificar a punição de duas ou mais pessoas em concurso,
afigura-se necessário que a conduta do agente tenha efetivamente contribuído, ainda
que minimamente, para a produção do resultado.
Em outras palavras, se a conduta não tem relevância causal, isto
é, se não contribuiu em nada para a produção do resultado, não pode ser considerada
como integrante do concurso de pessoas.
A simples manifestação de adesão a uma prática delituosa não
configura participação.
Assim, se Tereza Cristina simplesmente diz que vai concorrer no
homicídio a ser cometido por Ferdinand não há participação. Agora, se Tereza Cristina
instiga Ferdinand a matar, ocorrendo pelo menos tentativa de homicídio, existe
participação.
De outro lado, no exemplo daquele que, querendo participar de
um homicídio, empresta uma arma de fogo ao executor, que não a utiliza e tampouco
se sente estimulado ou encorajado com tal empréstimo a executor o delito. Aquele não
pode ser tido como partícipe pela simples e singela razão de que o seu comportamento
foi irrelevante, isto é, sem qualquer eficácia causal. (BITENCOURT, 2011, p. 485).
C) Do Liame subjetivo e normativo (Vínculo subjetivo e normativo entre os
participantes)
Exige-se homogeneidade de elemento subjetivo-normativo.
Significa que autor e partícipe devem agir com o mesmo elemento subjetivo (dolo+dolo)
ou normativo (culpa+culpa).
As várias condutas não são suficientes para a existência da
participação ou coautoria. Imprescindível é o elemento subjetivo, pelo qual cada
concorrente tem consciência de contribuir para a realização do resultado.
Os agentes devem atuar conscientes de que participam de crime
comum, ainda que não tenha havido acordo prévio de vontades. A ausência desse
elemento psicológico inviabiliza o concurso de pessoas, ensejando condutas isoladas e
autônomas.
Ex. uma empregada doméstica, percebendo a presença de um
ladrão, para vingar-se do patrão, deliberadamente deixa a porta aberta, facilitando a
prática do furto. Há participação e, não obstante, o ladrão desconhecia a colaboração
da empregada. Por consequência, a empregada também responderá pelo crime de
furto.
Vínculo normativo guarda relação com os crimes culposos.
D) Identidade de infração para todos os participantes
Nos termos do artigo 29, todos que concorrem para o crime
respondem pelo mesmo delito.
Ex: Alguém planeja a realização da conduta típica, ao executá-
la, enquanto um desvia a atenção da vítima, outro lhe subtrai os pertences e ainda um
terceiro encarrega-se de evadir-se do local com o produto do furto.
É uma exemplar divisão de trabalho constituída de várias
atividades, convergentes, contudo, a um mesmo objetivo típico: subtração de coisa
alheia móvel. Respondem todos por um único tipo penal, qual seja, furto.

19. PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE

19.1. Conceito

A pena privativa de liberdade repercute diretamente no direito de


locomoção do agente condenado, por tempo determinado.

Há três espécies de penas privativas de liberdade: reclusão e


detenção, vinculados a crimes (CP, art. 33, “caput”), e prisão simples, em relação às
contravenções penais (LCP, art. 5º, I).

19.2. Regimes penitenciários

O regime penitenciário é o meio pelo qual é executada ou


efetivado o cumprimento da pena privativa de liberdade.

O artigo 33, § 1º, do Código Penal prevê três regimes:

a) fechado: a pena privativa de liberdade é executada em


estabelecimento de segurança máxima ou média;

b) o semiaberto: a pena privativa de liberdade é executada em


colônia agrícola, industrial ou estabelecimento similar;
c) aberto: a pena privativa de liberdade é executada em casa de
albergado ou em estabelecimento adequado.

19.3. Fixação do regime inicial de cumprimento de pena

Após estabelecer a quantidade da pena imposta da sentença,


cumpre ao juiz fixar o regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade,
levando em conta: a) a quantidade da pena imposta; b) a reincidência; c) as
circunstâncias judiciais do art. 59 do Código Penal.

Nos termos do artigo 33, “caput”, do Código Penal, nos crimes


apenados com reclusão, o juiz poderá fixar o regime inicial fechado, semiaberto ou
aberto. Aos crimes apenados com detenção, o juiz poderá fixar o regime inicial
semiaberto ou aberto. Logo, nos crimes apenados com detenção não é possível ao juiz
fixar o regime inicial fechado, podendo, no entanto, haver regressão para o regime
fechado, no caso, por exemplo, de falta grave.

O início do cumprimento da pena para os crimes apenados com


reclusão se dará da seguinte forma, nos termos do art. 33, § 2º, do Código Penal.

a) o condenado a pena superior a 08 anos deverá começar a


cumprir a pena privativa de liberdade no regime fechado;

b) o primário, cuja pena seja superior a 04 anos e não exceda a


08, poderá, desde o princípio, cumpri-la em regime semiaberto;

c) o primário, cuja pena seja igual ou inferior a 04 anos, poderá,


desde o início, cumpri-la em regime aberto.

Em que pese parte da doutrina entender que o reincidente


deverá iniciar a cumprir a pena no regime fechado, o Superior Tribunal de Justiça
abrandou esse rigor ao editar a Súmula 269, segundo a qual “É admissível a adoção do
regime prisional semi-aberto aos reincidentes condenados à pena igual ou inferior a 04
anos se favoráveis as circunstâncias judiciais”.

Nos crimes apenados com detenção, os critérios para a


definição do regime inicial são os seguintes:

a) Se a pena for superior a 04 anos, o juiz fixará o regime inicial


semiaberto;
b) Se a pena for igual ou inferior a 04 anos, o regime inicial será
o aberto.

c) Se o condenado for reincidente, o regime inicial será o


semiaberto, independentemente da quantidade da pena.

O regime inicial não depende, pois, exclusivamente, da


quantidade da pena fixada, mas também das circunstâncias judiciais da fixação da
pena-base, previstas no art. 59 do CP. Desde que haja fundamentação expressa na
sentença, o condenado que tenha péssimos antecedentes, alta periculosidade, desvio
de comportamento moral, insensibilidade e perversão, ainda que primário e condenado
a pena inferior a 04 anos, deve ficar sujeito ao regime fechado.

Além disso, a imposição de regime inicial fechado depende de


fundamentação adequada, não se revestindo a gravidade em abstrato do delito
motivação idônea para a fixação de do regime de cumprimento de pena mais severo do
que a pena aplicada exigir. É o que se extrai das Súmulas 718 e 719, ambos do Supremo
Tribunal Federal, e Súmula 440 do Superior Tribunal de Justiça.

20. DAS PENAS RESTRITIVAS DE DIREITOS

20.1. Conceito

São penas alternativas às privativas de liberdade,


expressamente previstas em lei, com a finalidade de evitar o encarceramento de
determinados criminosos, autores de infrações penais consideradas mais leves,
provocando-lhes a recuperação através de restrições a certos direitos.

Nos termos do artigo 43 do Código Penal, as penas restritivas


de direitos são: a) prestação pecuniária; b) perda de bens e valores; c) prestação de
serviço à comunidade ou a entidades públicas; d) interdição temporária de direitos; e)
limitação de fim de semana.

Trata-se de rol taxativo, não sendo possível o magistrado, no


momento da sentença, criar pena alternativa diversa da prevista em lei.

20.2. Natureza jurídica

A própria Constituição Federal, no artigo 5º, XLVI, arrola


algumas penas restritivas de direitos, viabilizando a criação de outras, quando adota a
expressão “entre outras”.
Nos termos do artigo 44 do Código Penal, são sanções penais
substitutivas e autônomas.

As penas restritivas de direitos são substitutivas, uma vez que


o juiz, depois de fixar a pena privativa de liberdade, verificando a presença dos
requisitos, efetua a substituição por uma ou mais penas restritivas de direitos, conforme
o caso. Isso porque não há, no preceito secundário dos tipos penais incriminadores,
previsão direta de pena restritiva de direitos, mas tão somente pena privativa de
liberdade.

A exceção reside no artigo 28 da Lei 11.343/2006, cujo preceito


secundário não prevê pena privativa de liberdade, mas apenas penas restritivas de
direitos, consistentes em advertência sobre os efeitos das drogas, prestação de serviços
à comunidade e medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo.

A autonomia deriva do fato de que, ao substituir a pena privativa


de liberdade, a pena restritiva de direitos segue regras próprias, autônomas, não sendo
possível, portanto, sua cumulação com pena privativa de liberdade.

20.3. Requisitos das penas restritivas de direitos

A substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de


direitos não se aplica para qualquer crime. Devem ser observados requisitos objetivos
e subjetivos, previstos no artigo 44 do Código Penal.

Se, no caso concreto, todos os requisitos estiverem presentes,


constitui direito subjetivo do réu a substituição da pena privativa de liberdade por
restritiva de direitos.

20.3.1. Requisitos objetivos

a) Quantidade da pena aplicada

O legislador estabeleceu como parâmetro para a concessão da


pena restritiva de direitos a pena aplicada na sentença, independentemente da pena
abstratamente cominada no preceito secundário do tipo penal.

Nos crimes dolosos, praticados sem violência ou grave ameaça,


apenados com reclusão ou detenção, o limite estabelecido pelo legislador é de 04
(quatro) anos.
Em se tratando de concurso de crimes, deve-se levar em conta
o total da pena imposta, por conta da aplicação das regras do cúmulo material ou
exasperação da pena. Dessa forma, se aplicadas as regras do concurso material,
concurso formal e crime continuado, o total da pena privativa de liberdade efetivamente
imposta não exceder a 04 (quatro) anos, será possível a substituição por pena
alternativa.

No caso de condenação por crime culposo, a substituição será


possível, independentemente da quantidade da pena imposta, não existindo tal
requisito, ainda que resulte violência contra a pessoa, como, por exemplo, no homicídio
culposo do Código Penal (CP, art. 121, § 3º) e no homicídio culposo na condução de
veículo automotor (CTB, art. 302).

b) Natureza do crime cometido

As penas restritivas de direitos são aplicáveis aos crimes


cometidos sem violência ou grave ameaça à pessoa.

20.3.2. Requisitos subjetivos

Os requisitos subjetivos levam em conta as características


pessoais do sentenciado.

a) Réu não reincidente em crime doloso

Nos termos do artigo 44, II, do Código Penal, para concessão do


benefício, é necessário que o sujeito não seja reincidente em crime doloso. O texto não
trata de qualquer reincidente. Refere-se ao não reincidente em crime “doloso”, de modo
que não há impedimento à aplicação da pena alternativa quando:

a) os dois delitos são culposos;

b) o anterior é culposo e o posterior é doloso;

c) o anterior é doloso e o posterior culposo.

Ainda que o réu seja reincidente em crime doloso, o Código


Penal, no seu artigo 44, § 3º, prevê uma exceção. Se, em face de condenação anterior,
a medida for socialmente recomendável e a reincidência não se tenha operado em
virtude da prática do mesmo crime, será possível aplicar a substituição da pena privativa
de liberdade por restritiva de direitos.
Portanto, a reincidência que proíbe de forma absoluta a
substituição é a que ocorre com a “prática do mesmo crime doloso”, isto é, a específica.

b) A culpabilidade, os antecedentes, a conduta ou a personalidade ou ainda os


motivos e circunstâncias recomendarem a substituição.

Conforme o artigo 44, III, do Código Penal, “a culpabilidade, os


antecedentes, a conduta social e a personalidade do condenado, bem como os motivos
e as circunstâncias indicarem que essa substituição seja suficiente”.

Convém notar que esses requisitos praticamente reproduzem as


circunstâncias judiciais previstas no artigo 59, “caput”, do Código Penal, com exceção
de duas: comportamento da vítima e consequências do crime, coincidentemente as
únicas de natureza objetiva. Logo, verifica-se que o art. 44, III, do Código Penal somente
levou em conta as circunstâncias subjetivas.

20.4. Penas restritivas de direitos e violência doméstica ou familiar contra a


mulher

Nos termos do artigo 17 da Lei 11.340/2006, conhecida como


Lei Maria da Penha, “É vedada a aplicação, nos casos de violência doméstica e familiar
contra a mulher, de penas de cesta básica ou outras de prestação pecuniária, bem como
a substituição de penas que implique o pagamento isolado de multa”.

Conforme a Súmula 588 do STJ, a prática de crime ou


contravenção penal contra a mulher com violência ou grave ameaça no ambiente
doméstico impossibilita a substituição de pena privativa de liberdade por restritiva de
direitos.

20.5. Formas de substituição

Conforme o artigo 44, § 2º, do Código Penal, tratando-se de


condenação a pena igual ou inferior a um ano, a substituição pode ser feita por multa
ou por uma pena restritiva de direitos. Assim, quando o tipo penal prevê prisão e multa
cumulativamente, nada impede que o juiz substitua a pena de prisão aplicada até o
limite de um ano por multa ou restritiva.

Se, todavia, a condenação for superior a um ano, a pena


privativa de liberdade pode ser substituída por uma pena restritiva de direitos e multa ou
por duas restritivas de direitos.
21. DA PENA DE MULTA

21.1. Conceito

Trata-se de uma sanção penal, de natureza patrimonial,


consistente no pagamento de uma determinada quantia em pecúnia, previamente fixada
em lei, em favor do Fundo Penitenciário Nacional.

21.2. Critério de fixação da pena de multa

Diversamente da pena privativa de liberdade, cujo sistema é o


trifásico, a aplicação da pena de multa observa um sistema bifásico, comportando, pois,
duas fases distintas e sucessivas.

Para o cálculo da pena de multa, o Código Penal adotou o


sistema do dia-multa.

Na 1ª fase, o juiz deverá estabelecer o número de dias-multa,


que varia de, no mínimo, 10 (dez) dias-multa a, no máximo, 360 (trezentos e sessenta)
dias-multa. É o que se extrai do artigo 49 do Código Penal.

Para chegar ao número de dias-multa, o Magistrado considera


as circunstâncias judiciais do art. 59, “caput”, do Código Penal, bem como eventuais
atenuantes e agravantes, além de causas de diminuição e aumento de pena.

Na 2ª fase, o juiz deverá fixar o valor do dia-multa, não podendo


ser inferior a um trigésimo do salário mínimo mensal de referência vigente ao tempo do
fato, nem superior a 05 vezes esse salário (CP, art. 49, § 1º).

Para aferir o valor do dia-multa, o juiz deverá considerar a


situação econômica do réu, podendo chegar ao triplo, se considerada insuficiente e
ineficaz diante da situação financeira do réu, conforme dispõe o artigo 60 do Código
Penal.

21.3. Pagamento da pena de multa

Nos termos do artigo 50 do Código Penal, a multa deve ser paga


voluntariamente pelo pagamento, de duas formas: a) de uma só vez (dez dias depois
do trânsito em julgado da sentença); b) em parcelas mensais.

O juiz, tendo em vista a situação econômica do condenado, pode


dividir o valor total da multa em quantas parcelas necessárias.
Efetuado o pagamento da multa, de uma ou outra forma, julga-
se extinta a pena.

É possível a cobrança da multa mediante o desconto nos


vencimentos do condenado ou no seu salário, quando: aplicada isoladamente, aplicada
cumulativamente com pena restritiva de direitos ou quando concedido o sursis.

21.4. Execução da pena de multa

Conforme o ordenamento jurídico vigente, a inadimplência no


pagamento da multa estatal não conduz, em nenhuma hipótese, à aplicação da pena de
prisão. Ninguém pode ser privado da liberdade em razão do não pagamento de uma
multa estatal.

Nos termos do art. 51 do Código Penal, transitada em julgado a


sentença condenatória, o valor da multa deve ser inscrito como dívida ativa em favor da
Fazenda Pública. A multa permanece com sua natureza penal. A execução é que se
procede em termos extrapenais. Em face disso, a obrigação de seu pagamento não se
transmite aos herdeiros do condenado.

A novidade introduzida pela Lei 13.964/2019 diz respeito à


execução da pena de multa. Nos termos da atual redação do artigo 51 do Código Penal,
a legitimidade para a execução da pena de multa passa a ser do Ministério Público,
sendo executada perante o juiz da execução penal.

22. DA APLICAÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE

22.1. Sistema de fixação ou dosimetria da pena

Da leitura do artigo 68 do Código Penal, verifica-se que, em


relação à pena privativa de liberdade, a legislação penal adotou o critério trifásico,
preconizado por Nelson Hungria: “A pena-base será fixada atendendo-se ao critério do
art. 59 deste Código; em seguida serão consideradas as circunstâncias atenuantes e
agravantes; por último, as causas de diminuição e de aumento”.

Em relação à pena de multa, convém repetir, o Código Penal


adotou o sistema bifásico, conforme se extrai do artigo 49 do Código Penal.

22.2. Primeira fase da fixação da pena: pena-base e circunstâncias judiciais


As circunstâncias judiciais são as que envolvem o crime, nos
aspectos objetivo e subjetivo, extraídas da livre apreciação do juiz, desde que
respeitados os parâmetros fixados pelo legislador no art. 59 do Código Penal,
constituindo efeito residual das circunstâncias legais.

A fixação da pena-base leva em conta a análise das


circunstâncias judiciais previstas no artigo 59 do Código Penal. São chamadas de
circunstâncias judiciais porque, na fixação da pena-base, o juiz detém amplo grau de
discricionariedade.

Todavia, em que pese o grau de discricionariedade, o juiz, nessa


fase, está restrito à cominação legal da pena, devendo observar o mínimo e o máximo
da pena legalmente prevista. Em outras palavras, ainda que todas as circunstâncias
judiciais sejam favoráveis ao réu, a pena-base não poderá ficar abaixo do mínimo legal.
De outro lado, se as circunstâncias judiciais forem desfavoráveis ao réu, não será
possível ao juiz fixar a pena-base além do máximo da pena cominada ao delito. Assim,
por exemplo, em relação ao crime de furto simples (CP, art. 155, “caput”), o juiz somente
poderá fixar a pena-base dentro do limite de 01 (um) a 04 (quatro) anos.

22.3. Segunda fase da fixação da pena: Circunstâncias agravantes e atenuantes

22.3.1. Agravantes genéricas

No art. 61, “caput”, o Código Penal emprega o advérbio


“sempre”, indicando que, via de regra, as agravantes são de aplicação obrigatória. Em
razão disso, o juiz não pode deixar de agravar a pena, ficando o quantum da pena ao
seu critério.

Todavia, quando uma das circunstâncias agravantes funciona


como elementar ou como circunstância qualificadora não se aplica a agravante, a fim
de evitar o “bis in idem”.

Assim, se, por exemplo, o agente praticar homicídio por motivo


fútil (CP, art. 121, § 2º, II), não incide a agravante do art. 61, II, “a”, 1ª figura (ter sido o
crime cometido por motivo fútil), pois a circunstância genérica funciona como
“qualificadora” do homicídio.
Da mesma forma, no crime de aborto (CP, arts. 124 a 127) não
incide a agravante consistente em praticar crime contra mulher grávida (CP, art. 61, II,
“h”, 4ª figura), já que tal circunstância constitui, integra, tal delito.

O rol das agravantes é taxativo, não admitindo ampliação.

22.3.2. Da reincidência

I) Introdução

A reincidência pressupõe uma sentença condenatória transitada


em julgado por prática de crime. Há reincidência somente quando o novo crime for
cometido após a sentença condenatória de que não cabe mais recurso.

Exemplo: o agente pratica um crime, sendo processado e


condenado. Não recorre, vindo a sentença transitar em julgado. Meses depois, vem a
praticar novo crime. É considerado reincidente uma vez que cometeu novo delito após
o trânsito em julgado de sentença que o condenou por prática de crime.

Além disso, complementando os pressupostos da reincidência,


o artigo 7º da Lei de Contravenções Penais dispõe que: “verifica-se a reincidência
quando o agente pratica uma contravenção depois de passar em julgado a sentença
que o tenha condenado, no Brasil, ou no estrangeiro, por qualquer crime, ou, no Brasil,
por motivo de contravenção”.

Assim, podem ocorrer várias hipóteses:

a) o agente, condenado irrecorrivelmente pela prática de um


crime, vem a cometer outro delito: é reincidente (CP, art. 63).

b) o agente pratica um crime; condenado irrecorrivelmente, vem


a cometer uma contravenção: é reincidente (CP, art. 7º LCP).

c) o sujeito pratica uma contravenção, vindo a ser condenado


por sentença transitada em julgado; comete outra contravenção: é considerado
reincidente (LCP, art. 7º).

d) O sujeito comete uma contravenção; é condenado por


sentença irrecorrível; pratica um crime: não é reincidente (CP, art. 63).
O crime anterior pode ter sido cometido no Brasil ou no
estrangeiro. Na última hipótese, a sentença estrangeira não precisa ser homologada.
Pode-se encontrar descrito no Código Penal ou em lei extravagante.

Se o juiz aplicou o perdão judicial em relação ao delito anterior,


vindo o sujeito a cometer novo crime não será considerado reincidente, nos termos do
art. 120 do Código Penal.

II) Eficácia temporal da condenação anterior para efeito da reincidência

O Código Penal adotou o sistema da temporariedade, ou seja,


os efeitos da reincidência não são perpétuos, tendo um prazo determinado para
cessarem os seus efeitos.

Nos termos do art. 64, inciso I, do Código Penal, não prevalece


a condenação anterior, se entre a data do cumprimento ou extinção da pena e a infração
posterior tiver decorrido período de tempo superior a 5 (cinco) anos, computado o
período de prova da suspensão ou do livramento condicional, se não ocorrer revogação.

Logo, o prazo de 5 (cinco) anos começa a correr a partir do


cumprimento da pena ou a sua extinção por outro modo, como, por exemplo, incidência
de uma causa extintiva da punibilidade, como a prescrição da pretensão executória,
graça ou indulto.

Convém ressaltar que, se a causa extintiva da punibilidade


consistir em anistia ou abolitio criminis, cessam todos os efeitos da sentença penal
condenatória, não ensejando, portanto, reincidência a eventual prática de novo crime.

Nos termos do artigo 64, I, do Código Penal, o período de prova


do livramento condicional e da suspensão condicional da pena será computado para
fins de cessar os efeitos da reincidência.

Assim, em tese, ao agente condenado a 06 (seis) anos de


reclusão, cumprindo 1/3 (ou seja, 02 anos), será concedido o livramento condicional
(CP, art. 83, I), restando outros 04 (quatro) anos para o término da pena, que será o
período de prova.

Consideremos a hipótese de o agente ter iniciado a cumprir a


pena no dia 10/08/2010. Após cumprir 1/3 da pena, dois anos, portanto, obteve o
livramento condicional em 10/08/2012, cumprindo integralmente a pena no dia
10/08/2016.

Em 10/09/2017, o agente pratica novo crime. Nesse caso, não


será considerado reincidente, pois se passaram mais de 05 (cinco) anos entre a data do
cumprimento da pena e a prática do novo crime, computando-se o período de prova
do livramento condicional.

III) Crimes que não induzem reincidência

O art. 64, II, do Código Penal dispõe que para efeito de


reincidência, não se consideram os crimes militares próprios ou políticos.

Os crimes militares próprios são os definidos como crimes


apenas no Código Penal Militar (Decreto-lei 1.001/1969). Se a condenação definitiva
anterior for por crime militar próprio, a prática de crime comum não leva à reincidência.
Se o agente, porém, pratica crime militar próprio, após ter sido definitivamente
condenado pela prática de crime comum, será reincidente perante o Código Penal
Militar, que, no seu artigo 71, prevê a reincidência quando o militar pratica um crime
militar próprio, e, depois da condenação definitiva, comete outro crime de igual natureza.

Os crimes políticos, sejam puros (exclusiva natureza política) ou


relativos (ofendem simultaneamente a ordem político-social e um interesse privado),
próprios (atingem a organização política do Estado) ou impróprios (ofendem um
interesse político do cidadão), também não geram a reincidência prevista no Código
Penal.

Convém ressaltar que, conquanto não gere reincidência, o


trânsito em julgado de uma sentença penal condenatória por crime militar próprio ou
crime político gera maus antecedentes, já que o artigo 64, II, do Código Penal, limita-se
a afastar a reincidência, nada dispondo sobre maus antecedentes.

22.3.3. Circunstâncias atenuantes (arts. 65 e 66 do CP)

As circunstâncias atenuantes são de aplicação em regra


obrigatória, pois o caput do art. 65 reza: “são circunstâncias que sempre atenuam a
pena”.

Entretanto, quando a pena-base for fixada no mínimo legal, a


incidência da circunstância atenuante não pode conduzir à redução da pena abaixo da
pena mínima cominada. É o que se extrai da Súmula 231 do STJ: “A incidência da
circunstância atenuante não pode conduzir à redução da pena abaixo do mínimo legal”.

É possível que a atenuante do artigo 65 funcione na Parte


Especial do Código Penal como causa da diminuição da pena. Nesse caso, não se
aplica a atenuante genérica. Exemplo: A circunstância consistente em praticar crime por
motivo de relevante valor moral ou social integra o homicídio privilegiado (CP, art. 121,
§ 1º); logo, não poderá ser considerada como atenuante genérica.

Ao contrário das circunstâncias agravantes, que somente podem


ser aplicadas se expressamente previstas em lei, pode o Magistrado considerar, na
segunda fase de fixação da pena, atenuante não prevista em lei, levando em conta
circunstância relevante, anterior ou posterior ao crime. É o que se extrai do artigo 66 do
Código Penal.

Assim, se, por exemplo, restar comprovado que o agente


praticou o crime de furto em razão de desemprego ou moléstia grave na família, poderá
o Magistrado considerar essa circunstância para atenuar a pena, ainda que não
expressamente prevista em lei.

22.4. Terceira fase da aplicação da pena: causas de aumento e de diminuição da


pena

Na terceira e última fase de aplicação da pena, o juiz deve


considerar as causas de aumento e de diminuição da pena presentes no caso concreto.
Essas causas de aumento e de diminuição da pena podem estar previstas tanto na Parte
Geral do Código Penal quanto na Parte Especial.

São causas de facultativo ou obrigatório aumento ou diminuição


da sanção penal em quantidade fixada pelo legislador, geralmente em frações.

As causas de aumento ou de diminuição da pena dividem-se em


genéricas, quando previstas na Parte Geral do Código Penal, e específicas, se previstas
na Parte Especial do Código Penal ou em legislação especial.

Na parte geral do Código Penal, encontram-se, por exemplo, as


seguintes causas de aumento e de diminuição da pena: art. 14, parágrafo único; art. 24,
§ 2º; art. 26, parágrafo único; art. 28, § 2º; art. 29, §1º; art. 60, § 1º; art. 70, “caput”; art.
71, “caput”; 73, 2ª parte, e 74, parte final.
Na parte especial do Código Penal, podem ser citados como
exemplos as circunstâncias do art.. 121, §§1º e 4º; art. 122, parágrafo único; art. 157, §
2º.

Causa de aumento de pena não se confunde com qualificadora.


Nesta, o legislador eleva a pena no seu mínimo e no máximo, enquanto na causa de
aumento de pena o legislador eleva a pena em frações.

Nos termos do artigo 68 do Código Penal, após analisar as


circunstâncias judiciais encontrando a pena-base e verificar a presença de agravantes
e atenuantes, obtendo a pena provisória, o Magistrado deverá, por último, considerar as
causas de aumento e de diminuição da pena, se presentes no caso concreto.

O cálculo decorrente da causa de aumento ou diminuição da


pena deve incidir sobre a pena provisória, encontrada na segunda fase, de forma
cumulada.

É importante salientar que, com o reconhecimento de causa de


aumento ou de diminuição de pena, o juiz pode aplicar pena acima da máxima ou inferior
à mínima cominada em abstrato.

23. CONCURSO DE CRIMES

23.1. Introdução

O concurso de crimes se caracteriza quando o agente, mediante


uma ou várias condutas, pratica duas ou mais infrações penais.

Diversamente do que ocorre no concurso de pessoas, onde, via


de regra, há um único crime praticado por várias pessoas em conjunto, no concurso de
crimes, há pluralidade de crimes, devendo-se estabelecer regras para aplicação da pena
nesses casos.

Para a fixação da pena no caso de concurso de crimes, a


legislação brasileira prevê dois critérios: a) sistema da acumulação material ou cúmulo
material; b) sistema da exasperação da pena.

De acordo com o sistema do cúmulo material, a incidência de


mais de um crime implica na soma das suas penas. Em outras palavras, havendo mais
de um resultado delituoso, as penas serão somadas. É adotado no concurso material
(CP, art. 69, “caput”) e no concurso formal imperfeito (CP, art. 70, “caput”, 2ª parte).
Conforme o sistema da exasperação da pena, por política
criminal, o legislador estabeleceu que, na hipótese de produção de mais de um resultado
delituoso, será aplicada a mais grave das penas cabíveis ou, se iguais, somente uma
delas, mas aumentada, em qualquer caso, de determinada quantidade em fração por
conta da prática dos demais delitos. É o critério adotado nos casos de concurso formal
próprio (CP, art. 70, 1ª parte) e crime continuado (CP, art. 71).

23.2. CONCURSO MATERIAL

23.2.1. Conceito

Ocorre o concurso material, também chamado de real, quando


o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes, idênticos
ou não (CP, art. 69, caput). Há, pois, pluralidade de condutas e pluralidade de
resultados.

Na hipótese de crimes conexos apurados na mesma ação penal,


a soma das penas, pelo concurso material, será realizada na própria sentença, após a
adoção do critério trifásico para cada um dos delitos. Exemplo: O agente pratica o crime
de estupro (CP, art. 213) e, para assegurar a sua impunidade, mata, na sequência, a
vítima (CP, art. 121, § 2º, V). Imaginemos que o juiz fixe, em relação ao delito de estupro,
a pena de 08 anos; e, em relação ao crime de homicídio qualificado, a pena de 20 anos.
Ao final, verificando-se tratar de concurso material de crimes, o Magistrado aplicará o
sistema do cúmulo material, somando as penas, alcançando a pena definitiva de 28
anos.

De outro lado, na hipótese de não haver conexão entre os


crimes, sendo, por isso, julgados e processos distintos, a soma das penas será realizada
perante o juízo da execução criminal, por força do disposto no artigo 66, III, “a”, da Lei
de Execução Penal.

23.2.2. Aplicação da pena

Nos termos do art. 69, “caput”, do Código Penal, quando o


agente realiza o concurso real de crimes, “aplicam-se cumulativamente as penas em
que haja incorrido”. Portanto, no concurso material as penas são cumuladas, somadas.

Aplica-se, pois, o sistema do cúmulo material de crimes.

23.3. CONCURSO FORMAL


23.3.1. Conceito

Ocorre o concurso formal (ou ideal) quando o agente, mediante


uma só ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes (CP, art. 70, “caput”). Há unidade
de conduta e pluralidade de crimes.

A unidade de conduta se concretiza quando os atos são


realizados no mesmo contexto espacial e temporal, não exigindo, necessariamente, ato
único. De fato, pode haver unidade de conduta mesmo quando fracionada em vários
atos, como, por exemplo, agente que subtrai objetos pertencentes a pessoas distintas,
no mesmo contexto fático.

O Superior Tribunal de Justiça tem entendido que praticado o


crime de roubo em um mesmo contexto fático, mediante uma só ação, contra vítimas
diferentes, tem-se configurado o concurso formal de crimes. 1

23.3.2. Concurso formal perfeito e concurso formal imperfeito

O concurso formal perfeito, ou próprio, está previsto na


primeira parte do artigo 70 do Código Penal. Ocorre quando o agente pratica duas ou
mais infrações penais através de uma única conduta. Resulta de um único desígnio. O
agente, por meio de um só impulso volitivo, dá causa a dois ou mais resultados, sem
desígnios autônomos em relação a cada um dos resultados.

Desígnio autônomo se caracteriza pelo fato de o agente


pretender, mediante uma única conduta, atingir dois ou mais resultados. Ou seja, o
agente, mediante uma ação ou omissão, age com consciência e vontade em relação a
cada um deles, considerados isoladamente.

Assim, se, por exemplo, o agente, na condução de veículo


automotor, atropela e causa a morte de uma pessoa e lesão corporal em outra,
praticando um crime de homicídio culposo na condução de veículo automotor (CTB, art.
302), em concurso formal perfeito, já que não tinha desígnios autônomos em relação a
cada um dos resultados.

1
AgRg no HC 412140/MG, Superior Tribunal de Justiça, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, 6ª Turma, j.
01/03/2018.
No concurso formal imperfeito, ou impróprio, o agente, mediante
uma ação ou omissão, pretende, de forma consciente e voluntária, o resultado em
relação a cada um dos crimes.

Exemplo: o agente provoca fogo em uma residência com a


intenção de matar todos os moradores. O agente tem desígnios autônomos (intenção
de matar) em relação a cada um dos moradores da residência.

A expressão “desígnios autônomos” abrange tanto o dolo direto


quanto o dolo eventual. Assim, haverá concurso formal imperfeito, por exemplo, entre o
delito de homicídio doloso com dolo direto e outro com dolo eventual.

23.3.3. Aplicação da pena no concurso formal

Em relação ao concurso formal perfeito, ou próprio, o Código


Penal adotou o sistema de exasperação da pena. Aplica-se a pena do crime a mais
grave ou, se iguais, somente uma delas, mas aumentada, em qualquer caso, de um
sexto até metade.

O critério adotado pela jurisprudência para a fixação do aumento


da pena em decorrência do concurso formal perfeito de crimes tem relação com o
número de crimes cometidos pelo agente.

Número de Aumento da pena


crimes

2 crimes 1/6 de aumento

3 crimes 1/5 de aumento

4 crimes ¼ de aumento

5 crimes 1/3 de aumento

6 ou mais ½ de aumento

No concurso formal imperfeito, ou impróprio, por conta do maior


grau de reprovabilidade da conduta do agente, visando a não beneficiar agente que agiu
com desígnios autônomos em relação a cada resultado, as penas devem ser somadas,
adotando-se o critério do cúmulo material, nos termos do artigo 70, “caput”, 2ª parte, do
Código Penal.

23.4. CONCURSO MATERIAL BENÉFICO

Se, da aplicação da regra da exasperação da pena no concurso


formal, a pena tornar-se superior à que resultaria se somadas, deve-se adotar o critério
do cúmulo material, porque, nesse caso, será mais benéfico (CP, art. 70, parágrafo
único).

Exemplo: Suponha-se que o agente tenha praticado um


homicídio simples (CP, art. 121 – pena de 06 a 20 anos) e uma lesão corporal leve (CP,
art. 129, “caput” – pena de 03 meses a 01 ano), em concurso formal. Aplicado o critério
da exasperação da pena, considerando-se a pena do crime mais agrave, acrescido de
1/6, resultaria na pena de 07 anos.

Se aplicada a pena considerando-se o critério do cúmulo


material, considerando-se a pena aplicada para crime de homicídio simples (06 anos) e
lesão corporal leve (03 meses), a pena definitiva ficaria em 06 anos e 03 meses. Essa
seria a pena a ser aplicada, já que a aplicação do critério do concurso material é mais
benéfico.

Em face disso, a pena a ser aplicada não pode ser superior à


que seria cominada se fosse caso de concurso material, aplicando-se, nesse caso, o
disposto no artigo 70, parágrafo único, do Código Penal.

23.5. CRIME CONTINUADO

23.5.1. Conceito

Ocorre o crime continuado quando o agente, mediante mais de


uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes da mesma espécie, devendo os
subsequentes, pelas condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras
semelhantes, ser havidos como continuação do primeiro.

23.5.2. Requisitos

Para a incidência das regras do crime continuado é preciso


verificar a presença de requisitos dispostos no artigo 71 do Código Penal, consistentes:
a) pluralidade de condutas; b) pluralidade de crimes da mesma espécie; c) mesmas
condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes.

23.5.2.1. Pluralidade de condutas

Nos termos do artigo 71 do Código Penal, o crime continuado se


caracteriza pelo fato de o agente praticar crimes mediante mais de uma ação ou
omissão, exigindo, pois, pluralidade de condutas.

Distingue-se do concurso material, que também exige


pluralidade de condutas, por força da incidência dos demais requisitos, ou seja, a prática
de crimes de mesma espécie, nas mesmas condições de tempo, lugar e maneira de
execução.

23.5.2.2. Crimes da mesma espécie

Crimes da mesma espécie são os que estiverem previstos no


mesmo tipo penal, considerando-se, inclusive, as figuras simples ou qualificadas,
dolosas ou culposas, tentadas ou consumadas.

De outro lado, a teor da jurisprudência do Superior Tribunal de


Justiça, não há como reconhecer a continuidade delitiva entre os crimes de roubo e o
de latrocínio porquanto são delitos de espécies diversas, já que tutelam bens jurídicos
diferentes. 2

23.5.2.3. Condições de tempo

Exige-se, para caracterizar crime continuado, conexão temporal


entre as condutas praticadas para que se configure a continuidade delitiva. Deve existir,
em outros termos, uma certa periodicidade que permita observar-se um certo ritmo, uma
certa uniformidade, entre as ações sucessivas, embora não se possam fixar, a respeito,
indicações precisas.

A jurisprudência tem admitido crime continuado quando entre as


infrações penais não houver decorrido período superior a 30 (trinta) dias. 3

23.5.2.3. Condições de lugar

2
HC 384875/SP, Superior Tribunal de Justiça, Rel. Min. Ribeiro Dantas, 5ª Turma, j. 20/03/2018.
3
AgRg no AREsp 542556 / SC, Superior Tribunal de Justiça, Rel. Min. Jorge Mussi, 5ª Turma, j. 14/03/2018
Deve existir entre os crimes da mesma espécie uma conexão
espacial para caracterizar o crime continuado.

A prática de crimes da mesma espécie em locais diversos não


exclui a continuidade. Assim, crimes praticados em bairros diversos de uma mesma
cidade, ou em cidades próximas, podem ser entendidos como praticados em condições
de lugar semelhantes.

23.5.2.4. Maneira de execução

A lei exige que a forma de execução das infrações continuadas


seja semelhante, traduzindo-se no modo, forma e os meios empregados para a prática
dos delitos. Exemplo: empregado de um estabelecimento comercial que subtrai,
diariamente, objetos da empresa.

Todavia, um crime de furto qualificado pela escalada e outro


furto qualificado pela destreza, conquanto crimes da mesma espécie, inviabilizam a
incidência do crime continuado, já que empregaram modos de execução distintos.

23.5.5. Crime continuado específico

O crime continuado específico prevê a necessidade de três


requisitos, que devem ocorrer simultaneamente:

a) Contra vítimas diferentes:

Admite-se nexo de causalidade entre crimes que lesam


interesses jurídicos pessoais, ainda que praticados contra vítimas diversas

De fato, a circunstância de os delitos componentes atingirem


bens jurídicos pessoais não impede a continuação. Entretanto, cumpre observar o
disposto no parágrafo único do art. 71: “Nos crimes dolosos, contra vítimas diferentes,
cometidos com violência ou grave ameaça à pessoa, poderá o juiz, considerando a
culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do agente, bem
como os motivos e as circunstâncias, aumentar a pena de um só dos crimes, se
idênticas, ou a mais grave, se diversas, até o triplo, observadas as regras do parágrafo
único do art. 70 e do art. 75 deste Código.”

Assim, admite o Código Penal nexo de continuidade entre


homicídios, lesões corporais ou roubos contra vítimas diversas, podendo o juiz, de
acordo com as circunstâncias judiciais do art. 59, “caput”, do Código Penal, aumentar a
pena de um dos delitos até o triplo, desde que a pena não seja superior à que seria
imposta se o caso fosse de concurso material.

b) com violência ou grave ameaça à pessoa

Mesmo que o crime seja contra vítimas diferentes, se não houver


violência – real ou ficta – contra a pessoa, não haverá a continuidade específica, mesmo
que haja violência contra a coisa.

c) somente em crimes dolosos

Se a ação criminosa for praticada contra vítimas diferentes, com


violência à pessoa, mas não for produto de uma conduta dolosa, não estará
caracterizada a exceção.

23.5.6. Aplicação da pena

Tratando-se de crime continuado comum, aplica-se a pena do


crime mais grave, aumentada de 1/6 até 2/3.

O parâmetro para o aumento da pena entre 1/6 e 2/3 deve ser


proporcional ao número de infrações praticadas.

Número de Aumento da pena


crimes

2 crimes 1/6 de aumento

3 crimes 1/5 de aumento

4 crimes ¼ de aumento

5 crimes 1/3 de aumento

6 crimes ½ de aumento

7 crimes ou mais 2/3

Em se tratando de crime continuado específico, previsto no


artigo 71, parágrafo único, do Código Penal, aplica-se a pena do crime mais grave
aumentada até o triplo. Todavia, segundo o entendimento do Supremo Tribunal Federal,
no crime continuado qualificado, a majoração da pena não está adstrita ao número de
infrações praticadas, haja vista que o art. 71, parágrafo único, do Código Penal,
determina que poderá o juiz, “considerando a culpabilidade, os antecedentes, a conduta
social e a personalidade do agente, bem como os motivos e as circunstâncias, aumentar
a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, até o triplo”.
Logo, a fração de aumento de pena no crime continuado qualificado lastreia-se nos
vetores em questão, e não apenas no número de infrações praticadas. 4

Se, da aplicação da regra do crime continuado, a pena resultar


superior à que restaria se somadas as penas, aplica-se a regra do concurso material.

24. LIMITE DE CUMPRIMENTO DA PENA

É possível que o agente, num ou em vários processos, seja


condenado a penas extensas, sobretudo no contexto de concurso material de crimes.

A Lei 13.964/2019 aumentou o limite de tempo de cumprimento


de pena, passando o limite de 30 anos, para 40 anos, nos termos da atual redação do
artigo 75 do Código Penal.

E o fundamento dessa limitação diz respeito à vedação


constitucional da pena de caráter perpétuo (CF, art. 5º, XLVII, “b”).

Com efeito, de nada adiantaria a vedação constante na


Constituição Federal ao agente condenado a penas privativas de liberdade no montante
de 60, 70, 80 anos, por exemplo.

Além disso, a limitação do tempo de cumprimento de pena


também encontra fundamento no princípio da dignidade da pessoa humana, previsto no
artigo 1º, III, da Constituição Federal.

Assim, nos termos do artigo 75, § 1º, do Código Penal, quando


o agente for condenado a penas privativas de liberdade cuja soma seja superior a 40
(quarenta) anos, devem elas ser unificadas para atender ao limite máximo de 40
(quarenta) anos.

4
HC 131871/ PR, Supremo Tribunal Federal, Rel. Min. Dias Toffoli, 2ª Turma, j. 31/05/2016.
Todavia, esse limite só se refere ao tempo de cumprimento de
pena, não podendo servir de base para o cálculo de outros benefícios, como o
livramento condicional e progressão de regime.

Nesse sentido é o teor da súmula 715 do STF: “A pena unificada


para atender ao limite de trinta anos de cumprimento, determinado pelo art. 75 do
Código Penal, não é considerada para a concessão de outros benefícios, como o
livramento condicional ou regime mais favorável de execução”.

Logo, se o agente ostentar condenação no montante, por


exemplo, de 50 (cinquenta) anos, o limite de cumprimento da pena será 40 (trinta) anos,
mas o requisito objetivo para obtenção dos benefícios externos, tais como progressão
de regime e livramento condicional, por exemplo, levará em conta o total da pena, ou
seja, 50 (cinquenta) anos.

25. DA SUSPENSÃO CONDICIONAL DA EXECUÇÃO DA PENA (SURSIS)

25.1. CONCEITO

Trata-se de um instituto de política criminal, tendo por fim a


suspensão da execução da pena privativa de liberdade, evitando o recolhimento ao
cárcere do condenado não reincidente condenado à pena não superior a 02 anos (ou a
04 anos, na hipótese de sursis etário ou humanitário), mediante o cumprimento de
determinadas condições, fixadas pelo juiz, durante o período de prova.

Em outras palavras, o réu é condenado a uma pena privativa de


liberdade, e, se preenchidos os requisitos do artigo 77 do Código Penal, a execução da
pena ficará suspensa, mediante o cumprimento das condições impostas pelo juiz.

Esgotado o período de prova sem revogação do “sursis”, o


Magistrado declarará extinta a pena imposta ao réu.

25.2. REQUISITOS

Os requisitos da suspensão condicional da execução da pena


estão previstos no artigo 77 do Código Penal.
25.2.1. Requisitos objetivos

a) Pena privativa de liberdade

Quanto à qualidade da pena, somente a pena privativa de


liberdade, seja reclusão, seja detenção, admite a suspensão condicional da execução
da pena.

Não cabe “sursis” em relação à pena restritiva de direitos e à


pena de multa. É o que se extrai do artigo 80 do Código Penal, segundo o qual “a
suspensão não se estende às penas restritivas de direitos nem à multa.”

Não se aplica o “sursis” às medidas de segurança, uma vez que


o instituto é voltado a suspender a execução da pena. E medida de segurança não tem
natureza jurídica de pena. Além disso, verificada a inimputabilidade pela enfermidade
mental, a sentença será absolutória imprópria, não havendo, pois, execução da pena a
suspender.

b) Quantidade da pena privativa de liberdade

Como regra geral, a quantidade da pena imposta na sentença


não pode ser superior a 02 (dois) anos, ainda que resulte, no concurso de crimes, de
sanções inferiores a ela.

Tratando-se, entretanto, de condenado maior de setenta anos


de idade, ao tempo da sentença ou do acórdão (sursis etário) ou em razão de saúde
(sursis humanitário ou profilático), a pena aplicada pode ser igual ou inferior a quatro
anos (CP, art. 77, § 2º).

Em se tratando de concurso de crimes, em qualquer das suas


espécies, a pena aplicada, considerando os critérios da exasperação da pena ou cúmulo
material, não pode ser superior a 02 anos (ou 04 anos, na hipótese de sursis etário ou
humanitário).

Assim, em relação ao crime continuado, descabe a aplicação


analógica da Súmula 497 do Supremo Tribunal Federal.

Portanto, é perfeitamente possível aplicar a suspensão


condicional da pena ao concurso de crimes, bastando que a pena aplicada não
ultrapasse o limite imposto pela lei. Dessa forma, se, em virtude de concurso material,
o sentenciado obtiver uma pena de 1 ano e 6 meses, fruto de três penas de 6 meses
cada uma, seria possível aplicar o benefício.

c) Impossibilidade de substituição por pena restritiva de direitos

Somente se aplica o “sursis” quando incabível ou não


recomendável a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos (CP,
art. 77, III).

O caráter subsidiário do sursis em relação à pena alternativa, na


prática, diminuiu a incidência do “sursis”, pois, como cabe a substituição por pena
restritiva de direitos, quando a pena privativa imposta for igual ou inferior a 04 (quatro)
anos, e como o juiz é obrigado a buscar, em primeiro lugar, essa possibilidade,
dificilmente sobrará hipótese para a suspensão condicional da pena, a qual tem
cabimento, via de regra, no caso de pena igual ou inferior a 02 (dois) anos.

Portanto, somente em casos excepcionais, quando não for


cabível a referida substituição, como, por exemplo, quando se tratar de crimes violentos
contra a pessoa, como a lesão corporal, pode o juiz aplicar o sursis, se preenchidos os
demais requisitos.

25.2.2. Requisitos subjetivos

a) Condenado não reincidente em crime doloso

Nem toda reincidência impede a concessão do sursis, mas


somente a reincidência em crime doloso. Isso quer dizer que a condenação anterior,
mesmo definitiva, por crime culposo ou por simples contravenção, por si só, não é causa
impeditiva da suspensão condicional da pena.

Todavia, a reincidência, ainda que em crime doloso, em


decorrência de anterior condenação a pena de multa, não impede a concessão do
“sursis’ (CP, art. 77, § 1º).

b) Circunstâncias judiciais favoráveis ao agente

Não é indispensável que todas as circunstâncias sejam


favoráveis, como ocorre com sursis especial. Basta que, no geral, não sejam
desfavoráveis de modo a criar dúvidas fundadas sobre a possibilidade de o condenado
voltar a delinquir.
26. DO LIVRAMENTO CONDICIONAL

26.1. CONCEITO

Trata-se de um instituto de política criminal, destinado a


antecipar o retorno do condenado ao convívio social, mediante determinadas condições
e de forma precária, desde que preenchidos os requisitos legais.

A liberdade é antecipada, porque o apenado retorna ao convívio


social antes do término da pena privativa de liberdade. É condicional, porque o
condenado fica subordinado ao cumprimento das condições impostas na decisão que
concedeu o benefício. E precária, porque se incidir uma das causas dos artigos 86 e
87, ambos do Código Penal, o benefício pode ser revogado.

26.2. REQUISITOS

Os requisitos do livramento condicional, de ordem objetiva e


subjetiva, encontram-se no art. 83 do Código Penal.

26.2.1. Requisitos objetivos

Os requisitos objetivos estão previstos no artigo 83, incisos I, II,


IV e V, do Código Penal, vinculando-se à pena e à reparação do dano.

I. Natureza e quantidade da pena

Assim como na suspensão condicional do processo, o


livramento condicional somente pode ser concedido em relação à pena privativa de
liberdade. Não cabe, pois, à pena restritiva de direitos e multa.

Além disso, o benefício somente poderá ser concedido à pena


privativa de liberdade igual ou superior a dois anos (CP, art. 83). A soma das penas é
permitida para atingir esse limite mínimo, mesmo que tenham sido aplicadas em
processos distintos, nos termos do artigo 84 do Código Penal.

II. Cumprimento de parte da pena

Nos termos do artigo 83, I, do Código Penal, se o criminoso não


for reincidente em crime doloso e ostentar bons antecedentes, deverá cumprir mais de
1/3 da pena privativa de liberdade para obter o benefício. É a hipótese de livramento
condicional simples.
Se o condenado for reincidente em crime doloso, deverá cumprir
mais da metade da pena privativa de liberdade, conforme dispõe o artigo 83, inciso II,
do Código Penal. Trata-se do livramento condicional qualificado. Nesse particular, há
uma omissão do legislador na hipótese de o condenado não ser reincidente em crime
doloso, mas portador de maus antecedentes. Isso porque não se enquadra na hipótese
do inciso I (que exige bons antecedentes) nem no inciso II (que trata da hipótese de
reincidente em crime doloso) do artigo 83 do Código Penal.

Nesse caso, prevalece o entendimento no sentido de que, por


conta da ausência de expressa previsão legal, deve-se conferir ao condenado o
tratamento mais benéfico. Ou seja, o condenado não reincidente em crime doloso, mas
portador de maus antecedentes, deverá cumprir mais de 1/3 da pena para obtenção do
livramento condicional. É a posição do Superior Tribunal de Justiça. 5

Tratando-se de condenado por prática de tortura, crime


hediondo, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, terrorismo e tráfico de pessoas
(introduzido pela Lei 13.344/2016), desde que não seja reincidente específico em tais
delitos, deve cumprir mais de 2/3 da pena (CP, art. 83, V). Trata-se do livramento
condicional específico.

Assim, sendo reincidente específico em crime hediondo ou


equiparado não é admissível o livramento condicional. Há reincidência específica, para
efeito desse dispositivo, quando o sujeito, já tendo sido condenado por qualquer dos
delitos hediondos por sentença transitada em julgado, vem novamente a cometer crime
dessa mesma natureza. Exemplo: Após condenação definitiva por crime de homicídio
qualificado, o agente pratica e é condenado pelo crime de tráfico de drogas. Nesse caso,
não terá direito a livramento condicional, por ser reincidente específico por crime de
natureza hedionda e equiparado.

III. Reparação do dano, salvo efetiva impossibilidade

Nos termos do art. 91, I, do Código Penal, a condenação torna


certa a obrigação de indenizar o dano resultante do crime. Assim, o condenado não

5
HC 102.278/RJ. Superior Tribunal de Justiça. Rel. Min. Jane Silva (Desembargadora Convocada do
TJ/MG), 6ª Turma, julgado em 03/04/2008.
pode obter o livramento condicional enquanto não repara o dano causado, salvo quando
insolvente.

Na prática, esse requisito tem limitado alcance, uma vez que, via
de regra, os condenados são pessoas pobres, absolutamente insolventes, sem a menor
possibilidade de reparar o dano causado.

26.2.2. Requisitos subjetivos

Os requisitos subjetivos referem-se à pessoa do condenado.


São analisados para constatar se o condenado reúne condições pessoais para retornar
ao convívio social.

A Lei 13.964/2019 acrescentou mais requisitos objetivos para a


obtenção do livramento condicional, prevendo o artigo 83, III, do Código Penal, a
necessidade da comprovação:

a) Bom comportamento durante a execução

O artigo 112, “caput”, da Lei 7210/84 prevê a expressão “bom


comportamento carcerário”, enquanto no Código Penal consta a expressão
“comportamento satisfatório” (CP, art. 83, III).

O bom comportamento carcerário, via de regra, é aferido a partir


do atestado emitido pelo diretor do estabelecimento carcerário, considerando-se a
conduta do condenado ao longo da execução da pena. Em outras palavras, para a
verificação do requisito subjetivo não se leva em conta o crime praticado pelo
condenado, mas seu comportamento durante o cumprimento da pena.

Convém sinalar, por pertinente, que a prática de falta grave não


interrompe o prazo para a concessão do livramento condicional. É o que se extrai da
Súmula 441 do STJ, segundo a qual “A falta grave não interrompe o prazo para obtenção
de livramento condicional.”

De acordo com a Súmula 439/STJ, "admite-se o exame


criminológico pelas peculiaridades do caso, desde que em decisão motivada"
b) Não cometimento de falta grave nos últimos 12 meses

A Lei 13.964/2019 acrescentou mais um requisito para obtenção


do livramento condicional, consistente no não cometimento de falta grave nos últimos
12 meses de execução da pena.

As hipóteses de falta grave durante a execução da pena estão


previstas no artigo 50 da Lei 7210/84.

Se o condenado praticou falta grave ao longo dos últimos 12


meses, não terá direito à obtenção do livramento condicional, ainda que preenchidos os
demais requisitos.

c) Bom desempenho no trabalho

Trata-se de uma exigência salutar para o retorno do condenado


ao convívio social, mas, infelizmente, de pouca efetividade prática, por conta da carência
ou dificuldade de inserção do apenado no mercado de trabalho.

Ao referir-se a “trabalho que lhe foi atribuído” fica claro que não
se trata apenas das atividades laborais desenvolvidas no interior do cárcere, mas
também se refere ao trabalho efetuado fora da prisão, como, por exemplo, o serviço
externo, tanto na iniciativa privada como na pública.

d) Aptidão para prover a própria subsistência com trabalho honesto

A lei não determina que o apenado deve ter emprego


assegurado o momento da liberação. O que a lei exige é a aptidão, isto é, a disposição,
a habilidade, a inclinação do condenado para viver às custas de seu próprio e honesto
esforço.

e) Constatação de condições pessoais que façam presumir que o liberado não


voltará a delinquir na hipótese de condenado por crime doloso, cometido com
violência ou grave ameaça

Tratando-se de condenado por crime doloso cometido com


violência ou grave ameaça à pessoa, a concessão do livramento fica subordinada, além
dos requisitos do art. 83 do Código Penal, à constatação, mediante perícia, de condições
pessoais que façam presumir que o liberado não voltará a delinquir (CP, art. 83,
parágrafo único).
26.3. LIVRAMENTO CONDICIONAL VEDADO

A Lei 13964/2019, alterando o artigo 112 da Lei 7210/84 (LEP),


passou a prever vedação do livramento condicional a condenados pela prática de
determinados crimes.

É vedado o livramento condicional:

a) ao pela prática de crime hediondo ou equiparado, com


resultado morte (LEP, art. 112, VI, “a” e “c”);

b) reincidente em crime hediondo ou equiparado com resultado


morte, vedado o livramento condicional (LEP, art. 112, VIII);
c) O condenado expressamente em sentença por integrar
organização criminosa ou por crime praticado por meio de
organização criminosa não poderá progredir de regime de
cumprimento de pena ou obter livramento condicional ou
outros benefícios prisionais se houver elementos probatórios
que indiquem a manutenção do vínculo associativo (Lei
12850/2013, art. 2º, § 9º);

26.4. CAUSAS DE REVOGAÇÃO DO LIVRAMENTO CONDICIONAL

O livramento condicional, pela própria natureza do benefício, é


passível de revogação a qualquer momento, desde que presentes alguma hipótese que
a justifique.

As causas de revogação obrigatórias estão previstas no artigo


86 do Código Penal, ao passo que as causas de revogação facultativa estão previstas
no artigo 87 do Código Penal.

26.4.1. Causas de revogação obrigatória

Quando ocorre uma causa obrigatória não fica a critério do juiz


revogar o livramento condicional ou não, a revogação decorre da própria lei.

A revogação obrigatória incide quando o liberado vem a ser


condenado a pena privativa de liberdade, em sentença irrecorrível, por crime praticado
durante ou antes da concessão do livramento condicional.
A condenação pela prática de contravenção penal ou por crime
a pena que não seja privativa de liberdade constitui causa de revogação facultativa.

26.4.2. Causas de revogação facultativa

Nas hipóteses de revogação facultativa cumpre ao juiz deliberar


acerca da revogação ou manutenção do livramento condicional. Tratam-se, pois, de
causas judiciais de revogação do livramento condicional.

Se mantido o livramento condicional, na hipótese da revogação


facultativa, o Juiz deverá advertir o liberado ou agravar as condições (LEP, art. 140,
parágrafo único).

Duas são as hipóteses de revogação facultativa:

Nos termos do art. 87 do Código Penal, duas são as hipóteses


de revogação facultativa:

I. Se o liberado deixar de cumprir qualquer das obrigações constantes na sentença

II. Se o liberado for irrecorrivelmente condenado, por crime ou contravenção, a pena


que não seja privativa de liberdade

27. EFEITOS DA SENTENÇA CONDENATÓRIA

27.1. NOTA INTRODUTÓRIA

Após a prática, em tese, de um fato típico, ilícito e sendo o


agente culpável, instaura-se uma ação penal, que pode ser pública ou privada, para,
observando-se as garantias constitucionais do contraditório, ampla defesa e do devido
processo legal, chegar ao final e, se comprovada a materialidade e a autoria, o Estado,
por meio do Poder Judiciário, aplicar uma sentença ou acórdão condenatório, com a
fixação de uma pena.

Essa sentença condenatória transitada em julgado naturalmente


gera efeitos que, direta ou indiretamente, atinge o condenado não só na esfera penal,
mas também em outras áreas do Direito, como cível, administrativa, eleitoral, por
exemplo.

27.2. EFEITOS DA CONDENAÇÃO

Os efeitos da condenação são divididos em principais e


secundários.
27.2.1. Efeitos principais

Como corolário lógico da sentença penal condenatória, o efeito


principal consiste na aplicação de uma pena privativa de liberdade, restritiva de direitos
e/ou multa, além de medida de segurança, no caso de agente semi-imputável que revela
periculosidade.

27.2.2. Efeitos secundários

Além dos efeitos principais, a sentença condenatória também


gera efeitos secundários, também denominados efeitos mediatos, acessórios, reflexos
ou indiretos, de natureza penal e extrapenal.

27.2.2.1. Efeitos secundários de natureza extrapenal

Além de, à evidência, gerar efeitos penais, a sentença penal


condenatória transitada em julgado gera efeitos extrapenais, ou seja, em outras áreas
do direito, como na esfera cível, administrativa, trabalhista, eleitoral, etc.

Esses efeitos se dividem em genéricos e específicos.

Os efeitos genéricos incidem sobre todos os crimes e estão


previstos no artigo 91 do Código Penal, consistentes em reparar o dano e confisco.
Incidem de forma automática, não sendo necessário, portanto, o juiz declarar na
sentença. É o que se extrai, a contrario sensu, do disposto no artigo 92, parágrafo único,
do Código Penal.

Os efeitos específicos são aqueles previstos no artigo 92 do


Código Penal. Nos termos do artigo 92, parágrafo único, do Código Penal, esses efeitos
não incidem de forma automática, devendo o juiz declará-los motivadamente na
sentença.

27.2.2.2.1. Efeitos genéricos

27.1.2.2.1.1. Tornar certa a obrigação de indenizar o dano


causado pelo crime

Nos termos do artigo 91, I, do Código Penal, constitui efeito da


sentença penal condenatória “tornar certa a obrigação de indenizar o dano causado pelo
crime”. Trata-se de efeito automático decorrente da sentença penal condenatória, já que
meramente declaratória no tocante à indenização civil, não sendo necessário
mandamento expresso no sentido de o réu reparar o dano resultante do crime.

A sentença penal condenatória transitada em julgado permite à


vítima promover a ação de execução ex delicto, nos termos do artigo 63 do Código de
Processo Penal, já que constitui título executivo judicial, conforme prevê o artigo 515, I,
do Código de Processo Civil de 2015.

Assim, transitada em julgado a sentença penal condenatória a


sua execução no juízo cível visa tão somente estabelecer o quantum da reparação do
dano, não sendo, portanto, objeto de discussão o mérito da causa.

b) A perda em favor da união, ressalvado o direito do lesado


ou de terceiro de boa-fé, dos instrumentos do crime, desde que consistam em
coisas cujo fabrico, alienação, uso, porte ou detenção constitua fato ilícito

É a hipótese do confisco como efeito da condenação, previsto


no artigo 91, II, do Código Penal. Trata-se da perda em favor da União de bens de
origem ilícita, decorrente do delito praticado.

Constitui efeito automático da sentença penal condenatória


transitada em julgado, não sendo, pois, necessário que o juiz declare expressamente
na sentença.

27.2.2.2.2. Perda de bens correspondentes ao valor incompatível com o


rendimento lícito do condenado

A Lei 13.964/2019 introduziu mais um efeito da sentença penal


condenatória.

Nos termos do artigo 91-A do Código Penal, na hipótese de


condenação por infrações às quais a lei comine pena máxima superior a 6 (seis) anos
de reclusão, poderá ser decretada a perda, como produto ou proveito do crime, dos
bens correspondentes à diferença entre o valor do patrimônio do condenado e aquele
que seja compatível com o seu rendimento lícito.

Para efeito da perda prevista no caput do referido artigo,


entende-se por patrimônio do condenado todos os bens:
I - de sua titularidade, ou em relação aos quais ele tenha o
domínio e o benefício direto ou indireto, na data da infração penal ou recebidos
posteriormente; e

II - transferidos a terceiros a título gratuito ou mediante


contraprestação irrisória, a partir do início da atividade criminal.

O condenado poderá demonstrar a inexistência da


incompatibilidade ou a procedência lícita do patrimônio.

A perda prevista neste artigo deverá ser requerida


expressamente pelo Ministério Público, por ocasião do oferecimento da denúncia, com
indicação da diferença apurada.

Na sentença condenatória, o juiz deve declarar o valor da


diferença apurada e especificar os bens cuja perda for decretada.

Os instrumentos utilizados para a prática de crimes por


organizações criminosas e milícias deverão ser declarados perdidos em favor da União
ou do Estado, dependendo da Justiça onde tramita a ação penal, ainda que não ponham
em perigo a segurança das pessoas, a moral ou a ordem pública, nem ofereçam sério
risco de ser utilizados para o cometimento de novos crimes.

27.2.2.2.1. Efeitos específicos

24.1.2.2.2.1. A perda de cargo, função pública ou mandato


eletivo

O artigo 92, I, do Código Penal, prevê duas hipóteses de perda


de cargo, função ou mandato eletivo como efeito da sentença penal condenatória:

a) quando aplicada pena privativa de liberdade por tempo igual


ou superior a um ano, nos crimes praticados com abuso de poder ou violação de dever
para com a Administração Pública;

b) quando for aplicada pena privativa de liberdade por tempo


superior a 4 (quatro) anos nos demais casos.

A primeira hipótese pode incidir quando o funcionário público


praticar o delito no exercício das suas funções ou em razão dela, e a pena privativa de
liberdade seja aplicada por tempo igual ou superior a um ano.
Não se tratando de crime funcional, a perda do cargo, função
pública ou mandato eletivo poderá incidir quando a pena aplicada for igual ou superior
a quatro anos.

Esse efeito, no entanto, não é automático, ou seja, exige para


sua incidência que o juiz declare expressamente em decisão motivada (CP, art. 92,
parágrafo único).

27.2.2.2.2.2. A incapacidade para o exercício do pátrio poder


(poder familiar), tutela ou curatela

Além do vínculo entre autor do fato e a vítima, a incidência do


efeito específico consistente na incapacidade para o exercício do poder familiar, tutela
ou curatela, depende de duas condições: a) que o crime seja doloso; b) que seja
cominada pena de reclusão.

Esse efeito não é automático, devendo ser declarada na


sentença em decisão motivada, conforme se extrai do artigo 92, parágrafo único, do
Código Penal. Assim, cumpre ao Magistrado, no caso concreto, avaliar a necessidade
da imposição da incapacidade para o exercício do poder familiar, tutela ou curatela.
Exemplo: pai condenado pela prática do crime estupro de vulnerável (CP, art. 217-A)
contra filha de tenra idade.

27.2.2.2.2.3. A inabilitação para dirigir veículo, quando


utilizado como meio para a prática de crime doloso.

A aplicação desse efeito específico depende de dois requisitos:


a) que o crime seja doloso; b) que o veículo tenha sido utilizado “como meio” para a sua
prática. Logo, não incide esse efeito no caso de crime culposo.

28. DA PRESCRIÇÃO

28.1. INTRODUÇÃO

Quando um indivíduo pratica, em tese, um fato típico e ilícito,


surge para O Estado o poder e o dever de buscar a punição do responsável. E essa
punição é concretizada com a sentença penal condenatória transitada em julgado, com
a imposição de uma pena, surgindo, a partir de então, a pretensão do Estado executar
essa pena.
Todavia, a pretensão punitiva e executória do Estado é limitada,
não perdurando, via de regra, por tempo indeterminado. Com efeito, a direito de punir e
de executar a pena imposta ao apenado encontra limites temporais, que, se não
observados, podem levar à extinção da punibilidade do agente pela incidência
prescrição da pretensão punitiva ou prescrição da pretensão executória.

A prescrição penal, pois, é a perda da pretensão punitiva ou


executória do Estado pelo decurso do tempo sem o seu exercício.

28.2. IMPRESCRITIBILIDADE

Em regra, a prescrição alcança todas as infrações penais,


inclusive os crimes hediondos e equiparados.

Todavia, nos termos da Constituição Federal, alguns crimes são


imprescritíveis, viabilizando, assim, o exercício da pretensão punitiva e executória a
qualquer tempo.

São imprescritíveis os crimes de racismo (CF, art. 5º, XLII; Lei n.


7.716/89) e os referentes à ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem
constitucional e o estado democrático (CF, art. 5º, XLIV).

28.3. REDUÇÃO DOS PRAZOS DE PRESCRIÇÃO EM FACE DA IDADE DO SUJEITO


– Art. 115

O art. 115 determina que SÃO REDUZIDOS DE METADE os


prazos da prescrição quando o criminoso era, AO TEMPO DO CRIME, MENOR DE 21
ANOS ou MAIOR DE 70 ANOS na DATA DA SENTENÇA.

28.4) PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA


28.4.1) PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA EM ABSTRATO – Art. 109
A) CONTAGEM DO PRAZO DA PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA EM
ABSTRATO

Na PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA, o decurso do


tempo faz com que o Estado perca o direito de punir no tocante à pretensão de o Poder
Judiciário julgar a lide e aplicar a sanção penal.

A prescrição da pretensão punitiva OCORRE ANTES DE A


SENTENÇA FINAL TRANSITAR EM JULGADO.
Para saber qual o prazo de prescrição da pretensão abstrata
punitiva devemos verificar o limite máximo da pena imposta em abstrato no preceito
sancionador e enquadrá-lo em um dos incisos do art. 109 do CP.

Ex. Suponha-se que um sujeito cometa um crime de lesão


corporal leve (pena de 03 meses a 01 ano), não se descobrindo a autoria. Se o Estado,
dentro de 04 anos, não exercer o direito de punir, opera-se a extinção da punibilidade
pela prescrição da pretensão punitiva. Aplica-se o disposto no art. 109.

Ex. calúnia (art. 138). Máximo da pena abstrata: 02 anos. Prazo


prescricional da pretensão punitiva: 04 anos (art. 109, V).

No CONCURSO DE CRIMES (concurso material, formal e


continuado), a prescrição atinge a pretensão punitiva em relação a CADA INFRAÇÃO
CONSIDERADA ISOLADAMENTE (art. 119).

B) TERMOS INICIAIS DA PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA – Art. 111

O primeiro termo inicial é a data da consumação do delito (I).


Constitui exceção à teoria da atividade, pois, na prescrição, adota-se a teoria do
resultado.

No caso da tentativa (II), o termo a quo da prescrição da


pretensão punitiva é o dia da cessação da atividade criminosa.

No crime permanente (III) a prescrição começa a correr do dia


em que cessou a permanência (CP, art. 111, III, 1ª figura). Suponha-se que a vítima de
sequestro permaneça presa durante 30 dias. A prescrição começa a correr a partir do
dia em que conseguiu a liberdade.

No crime continuado, a prescrição deve ser considerada em


relação a cada crime, isoladamente (art. 119).

Nos crimes de bigamia e de falsificação ou alteração de


assentamento de registro civil (arts. 235 e 299, § único), a prescrição começa a correr
da data em que o fato se tornou conhecido de qualquer autoridade pública (art. 111, IV).

Nos crimes contra a dignidade sexual de crianças e


adolescentes, previstos no Código Penal ou em legislação especial, o termo inicial da
prescrição ocorre da data em que a vítima completar dezoito anos, salvo se a esse
tempo já houver sido proposta a ação penal (art. 111, V). Esse inciso foi introduzido no
Código Penal pela Lei nº 12.650/2012.

Nesse sentido, se uma criança de 10 anos for vítima de crime de


estupro de vulnerável, por exemplo, e a ação ainda não tiver sido instaurada, o prazo
prescricional passará a correr a partir da data em que ela completar 18 anos.

28.4.2) PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA RETROATIVA – Art. 110, § 1º,


parte final, do Código Penal
A prescrição retroativa tem por pressuposto o trânsito em julgado
da sentença penal condenatória para a acusação. Com o trânsito em julgado da
sentença penal condenatória para a acusação, tem-se que, a partir de eventual recurso
da defesa, o Tribunal não poderá agravar a situação do réu, sob pena de incidir na
reformatio in pejus direta, o que é vedado conforme prevê o artigo 617 do Código Penal.

Assim, a base para calcular a prescrição se altera, passando a


ser considerada a pena aplicada na sentença. Nesse caso, deve-se considerar a pena
aplicada na sentença e enquadrá-la num dos incisos do artigo 109 do Código Penal para
verificar o prazo prescricional.

Verificado o prazo prescricional com base na pena aplicada na


sentença, a prescrição retroativa deve ser considerada a partir da publicação da
sentença ou acórdão condenatório para trás. Por isso, o nome retroativa, porque sua
incidência é verificada entre os marcos interruptivos existentes antes da sentença
condenatória.

Nos crimes em geral, a prescrição da pretensão retroativa pode


ocorrer entre a publicação da sentença ou acórdão condenatório e o recebimento da
denúncia ou queixa.

No contexto dos crimes de competência do Tribunal do Júri, a


prescrição retroativa pode incidir: a) entre a data da publicação da sentença
condenatória e decisão confirmatória da pronúncia; b) entre a decisão confirmatória da
pronúncia até a decisão de pronúncia; c) entre a pronúncia e o recebimento da denúncia.
28.4.3.) PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA INTERCORRENTE OU
SUPERVENIENTE À SENTENÇA CONDENATÓRIA – Art. 110, § 1º

Em sendo espécie de prescrição da pretensão punitiva, a


prescrição da pretensão punitiva intercorrente incide somente antes do trânsito em
julgado da sentença penal condenatória para todos.

Como visto, nos termos do que dispõe o art. 109, caput, do CP,
a prescrição da pretensão punitiva, salvo a exceção do § 1º do art. 110, é regulada pelo
máximo da sanção privativa de liberdade.

Há, porém, no art. 110, § 1º, uma primeira exceção: caso em


que, não obstante TRATAR-SE DE PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA,
TRANSITANDO EM JULGADO a sentença condenatória para a ACUSAÇÃO, ou
SENDO IMPROVIDO o seu recurso, a partir da sua publicação começa a correr prazo
prescricional regulado pela PENA CONCRETA.

Ex: Suponha-se que o réu venha a ser condenado a 02 anos de


detenção, tendo transitado em julgado a sentença para a acusação. Sendo a pena
aplicada de 02 anos, o prazo prescricional é de 04 anos (art. 109, inciso V, do CP). O
réu interpôs recurso de apelação, que, passados 04 anos, ainda não havia sido julgado
pelo Tribunal. No caso, passados quatro anos entre a data da publicação da sentença
sem que o recurso interposto pela defesa tenha sido apreciado, ocorrerá a prescrição
da pretensão punitiva superveniente ou intercorrente, prevista no artigo 110, § 1º, do
CP.

28.4.4.) PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO EXECUTÓRIA – Art. 110, “caput”


I) CONCEITO

Na PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO EXECUTÓRIA, o decurso


do tempo sem o seu exercício faz com que o Estado perca o direito de executar a sanção
imposta na sentença condenatória.

A prescrição da pretensão executória INCIDE APÓS O


TRÂNSITO EM JULGADO da sentença condenatória.
Nos termos do artigo 110, caput, a prescrição, depois de transitar
em julgado a sentença condenatória, REGULA-SE PELA PENA IMPOSTA NA
SENTENÇA e verifica-se nos prazos fixados no art. 109, os quais se aumentam de 1/3
se o condenado é reincidente.

Ex. suponha-se que o agente tenha sido condenado


irrecorrivelmente a quatro anos de reclusão pela prática do delito de roubo simples (art.
157 do CP). O prazo prescricional, considerando a pena aplicada, será de 08 anos (art.
109, IV, do CP). Nesse caso, se o Estado não iniciar a execução da pena dentro de 08
anos, opera-se a extinção da punibilidade pela prescrição da pretensão executória.
Aplica-se o disposto no art. 110 do CP.

Ex. Réu condenado a 01 ano de reclusão: prazo da prescrição


executória: 04 anos (art. 109, V);

Tratando-se de REINCIDENTE, o prazo da prescrição da


PRETENSÃO EXECUTÓRIA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE É AUMENTADO
DE 1/3 (ART. 110, CAPUT, IN FINE). Para tanto, é necessário que a sentença
condenatória tenha reconhecido a reincidência.

No CONCURSO MATERIAL E FORMAL cada delito tem seu


prazo prescricional ISOLADO, ainda que as penas tenham sido impostas na mesma
sentença (art. 119).

II) TERMOS INICIAIS DA PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO EXECUTÓRIA – Art. 112

a) DO DIA EM QUE TRANSITA EM JULGADO A SENTENÇA CONDENATÓRIA,


PARA A ACUSAÇÃO, OU A QUE REVOGA A SUSPENSÃO CONDICIONAL DA
PENA OU O LIVRAMENTO CONDICIONAL

Cumpre observar: a prescrição da pretensão executória


depende de uma condição: O TRÂNSITO EM JULGADO DA SENTENÇA
CONDENATÓRIA PARA A ACUSAÇÃO E DEFESA. Satisfeita a condição, entretanto,
na contagem do prazo leva-se em conta a data em que transitou em julgado para
a acusação.

b) DO DIA EM QUE SE INTERROMPE A EXECUÇÃO, SALVO QUANDO O TEMPO


DA INTERRUPÇÃO DEVA COMPUTAR-SE NA PENA.

INTERROMPIDA A EXECUÇÃO DA PENA PELA FUGA DO


CONDENADO, inicia-se a contagem do prazo prescricional da prescrição executória
(art. 112, II, 1ª parte).

Nos casos dos arts. 41 e 42 do CP (superveniência de doença


mental ou internação em hospital), em que se aplica o princípio da detração penal,
embora interrompida a efetiva execução da pena, não corre a prescrição (art. 112, II, 2ª
parte).

III) PRESCRIÇÃO NO CASO DE EVASÃO DO CONDENADO OU DE REVOGAÇÃO


DO LIVRAMENTO CONDICIONAL – Art. 113

Ex. suponha-se que o detento fuja faltando 02 anos para o


cumprimento da pena. A partir da data da fuga começa a correr a prescrição da
pretensão executória (art. 112, II, 1ª parte), ocorrendo em 04 anos (art. 109, V, CP). Ou
seja, se nesse período de 04 anos o apenado não for localizado para dar continuidade
ao cumprimento da pena, ocorrerá a prescrição da pretensão executória.

28.5. CAUSAS SUSPENSIVAS DA PRESCRIÇÃO

O Código Penal prevê causas impeditivas ou suspensivas da


prescrição (art. 116), distintas das causas interruptivas (art. 117). Na suspensão da
prescrição o tempo decorrido antes da causa é computado no prazo; na interrupção, o
tempo decorrido antes da causa não é computado no prazo, que recomeça a correr por
inteiro.

27.5.1. Causas suspensivas da prescrição punitiva

a) ENQUANTO NÃO RESOLVIDA, EM OUTRO PROCESSO, QUESTÃO DE QUE


DEPENDA O RECONHECIMENTO DA EXISTÊNCIA DO CRIME;

Nos termos do art. 116, I, do CP, a prescrição não corre


enquanto não resolvida, EM OUTRO PROCESSO, questão de que depende o
reconhecimento da existência do crime (questão prejudicial, tratada nos arts. 92 a 94 do
CPP).

b) ENQUANTO O AGENTE CUMPRE PENA NO EXTERIOR

A SEGUNDA CAUSA suspensiva é prevista no art. 116, II: antes


de passar em julgado a sentença final, a prescrição não corre enquanto o agente cumprir
pena no estrangeiro. Não impede o decurso do prazo prescricional, entretanto, estar o
sujeito cumprindo pena, em razão de outro processo, no Brasil.

III - na pendência de embargos de declaração ou de recursos aos Tribunais Superiores,


quando inadmissíveis

A Lei 13.964/2019 introduziu mais uma causa suspensiva da


prescrição, visando a dificultar a incidência da prescrição da pretensão punitiva na
pendência de recursos interpostos perante Tribunais Superiores.

Assim, enquanto tramitam os embargos de declaração ou


recursos aos Tribunais Superiores, o prazo prescricional ficará suspenso, aguardando
julgamento inadmissível, sendo considerado o período de suspensão do prazo
prescricional, se inadmissíveis os recursos.

c) enquanto não cumprido ou não rescindido o acordo de não persecução penal.

Trata-se de outra causa suspensiva da prescrição introduzida


pela Lei 13.964/2019.

Durante o período relativo ao acordo de não persecução penal,


o prazo prescricional ficará suspenso.

II) CAUSAS SUSPENSIVAS DA PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO EXECUTÓRIA– Art.


116, PARÁGRAFO ÚNICO

Depois de passada em julgado a sentença condenatória, a


prescrição não corre durante o tempo em que o condenado está preso por outro motivo.

Suponha-se que o sujeito seja condenado em duas comarcas,


iniciando o cumprimento da pena imposta na ação penal de uma delas. Enquanto está
cumprindo a pena não corre a prescrição da pretensão executória em relação à outra
condenação.
28.5.2. Causas interruptivas da prescrição – art. 117

Ocorrendo uma causa interruptiva, o curso da prescrição


interrompe-se, desaparecendo o lapso temporal já decorrido, recomeçando sua
contagem desde o início.

A incidência das causas do art. 117, salvo a do inciso V, faz com


que seja extinto o prazo decorrido antes da interrupção, recomeçando a correr a
prescrição por inteiro (§ 2º).

I - PELO RECEBIMENTO DA DENÚNCIA OU DA QUEIXA

O recebimento da denúncia interrompe o prazo prescricional,


recomeçando a correr a prescrição da pretensão punitiva por inteiro, não se levando em
conta o tempo já decorrido antes da interrupção.

II - PELA PRONÚNCIA

A pronúncia também interrompe a prescrição (art. 117, II). A


decisão do juiz tem força de interromper a prescrição, ainda que o réu venha a ser
absolvido no Júri.

III - PELA DECISÃO CONFIRMATÓRIA DA PRONÚNCIA

“Decisão confirmatória da pronúncia”. Se o RÉU RECORRE DA


PRONÚNCIA e o Tribunal confirma, o Acórdão também interrompe a prescrição (art.
117, III, CP), o mesmo ocorrendo quando é impronunciado (art. 409, caput, CPP) ou
absolvido sumariamente (art. 411 CPP) e o tribunal o pronuncia.

IV - PELA PUBLICAÇÃO DA SENTENÇA OU ACÓRDÃO CONDENATÓRIOS


RECORRÍVEIS

O art. 117, IV, CP determina que a prescrição se interrompe pela


sentença condenatória recorrível. A interrupção ocorre na data da publicação da
sentença, i.e., no dia em que o escrivão recebe a sentença do juiz e a junta aos autos,
independentemente do registro e de outras diligências.

O ACÓRDÃO CONDENATÓRIO, ainda que não unânime, e por


isso sujeito a embargos infringentes, TAMBÉM INTERROMPE O PRAZO
PRESCRICIONAL da pretensão punitiva. Isso ocorre quando, tendo sido absolvido em
primeiro grau, O RÉU VEM A SER CONDENADO PELO ACÓRDÃO DO TRIBUNAL.
Trata-se de acórdão recorrível.

V - PELO INÍCIO OU CONTINUAÇÃO DO CUMPRIMENTO DA PENA;

Iniciando-se o prazo da prescrição da pretensão executória com


o trânsito em julgado da sentença condenatória, interrompe-se pelo começo do
cumprimento da pena. Fugindo o condenado, a prescrição começa a correr da data da
fuga (art. 112, II, 1ª parte), regulando-se pelo tempo que resta da pena (art. 113).
Recapturado, interrompe-se a prescrição.

VI - PELA REINCIDÊNCIA.

A REINCIDÊNCIA SOMENTE INTERROMPE O PRAZO DA


PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO EXECUTÓRIA, SENDO INAPLICÁVEL À
PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA (ART. 109). Nesse sentido, a Súmula 220
do STJ: “A reincidência não influi no prazo da prescrição da pretensão punitiva”.

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