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LEI DE ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA – LEI 12.

850/13

Sugestão bibliográfica: Crime Organizado – Comentários à Lei sobre crime organizado – Lei
12.850/13, Rogério Sanches Cunha e Ronaldo Batista Pinto, Editora Juspodivm.

ASPECTO MATERIAL

1. Breve histórico sobre o objeto da Lei

O art. 1º da Lei 12.850/13 define o objeto da lei.

Art. 1º  Esta Lei define organização criminosa e dispõe sobre a investigação criminal, os

meios de obtenção da prova, infrações penais correlatas e o procedimento criminal a ser

aplicado.

A lei define organização criminosa, dispõe sobre a investigação criminal, os meios de


obtenção de prova, infrações correlatas e o procedimento criminal a ser aplicado.

No ano de 1995, foi editada a Lei 9.034 dispondo sobre a utilização de meios operacionais
para a prevenção e repressão de ações praticadas por organizações criminosas. Apesar de
louvável, a inciativa veio acompanhada de falhas, chamando atenção a ausência de definição
do próprio objeto da lei: organização criminosa. O legislador criou uma lei prevendo
instrumentos de combate ao crime organizado (investigação por meio de agente infiltrado,
ação controlada etc.), porém, não definiu o conceito de crime organizado ou organização
criminosa. A não definição do objeto da lei tratava-se de erro crasso do legislador.

A omissão legislativa incentivava parcela da doutrina a emprestar a definição dada pela


Convenção de Palermo, que trata da criminalidade transnacional. Os operadores buscavam o
conceito dado pela Convenção Internacional. O STJ aplaudiu essa iniciativa.

Porém, essa postura recebeu críticas:

1ª: a definição dada pela Convenção de Palermo é muito ampla, genérica, violando a
taxatividade, desdobramento lógico do princípio da legalidade.

2ª: a definição dada pela Convenção vale para as relações com o direito internacional, e não
com o direito interno.

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3ª: as definições dadas pelas convenções ou tratados internacionais jamais valem para reger
nossas relações com o direito penal interno. No Brasil, somente lei cria crime e comina pena.
Há várias fontes formais imediatas, mas somente a lei pode criar crime e cominar pena. O
tratado internacional, a despeito de ser considerado fonte formal imediata, não pode criar
crime e cominar pena.

Essa crítica foi defendida por Luís Flávio Gomes e adotada pelo STF no HC 96.0007/SP.

Esse HC foi um divisor de águas. Nele, o STF anunciou que tratados e convenções
internacionais não podem criar crimes e cominar penas, ou seja, não podem incentivar um
direito penal interno incriminador (valeria apenas para direito penal interno não
incriminador). Foi uma provocação ao legislador, que deveria criar uma lei em que se
definisse o conceito de organização criminosa.

Foi assim que nasceu a Lei 12.694/12, em que o legislador definiu organização criminosa
para o direito penal interno.

O art. 2º da Lei 12.850/13 assim enuncia:

Art. 2o  Para os efeitos desta Lei, considera-se organização criminosa a associação, de 3

(três) ou mais pessoas, estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas,

ainda que informalmente, com objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de

qualquer natureza, mediante a prática de crimes cuja pena máxima seja igual ou superior

a 4 (quatro) anos ou que sejam de caráter transnacional.  

Portanto, organização criminosa era a associação de 3 ou mais pessoas, estruturalmente


organizada e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que informalmente, com objetivo
de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, mediante a prática de
crimes cuja pena máxima fosse igual ou superior a 4 anos ou que fossem de caráter
transnacional.

A Lei 12.850/13, editada menos de um ano após a Lei 12.694/12, por sua vez, reviu o
conceito, definindo organização criminosa no parágrafo 1º do seu artigo inaugural.

§ 1o  Considera-se organização criminosa a associação de 4 (quatro) ou mais pessoas

estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que

informalmente, com objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer

natureza, mediante a prática de infrações penais cujas penas máximas sejam superiores a

4 (quatro) anos, ou que sejam de caráter transnacional.

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A definição de organização criminosa atualmente utilizada é a trazida pela Lei 12.850/13.

Portanto, hoje, considera-se organização criminosa a associação de 4 (quatro) ou mais


pessoas estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que
informalmente, com objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer
natureza, mediante a prática de infrações penais cujas penas máximas sejam superiores a 4
(quatro) anos, ou que sejam de caráter transnacional.

Houve significativas mudanças:

Lei 12.694/12 Lei 12.850/13

Associação, de 3 ou mais pessoas Associação, de 4 ou mais pessoas

Estruturalmente ordenada e caracterizada Estruturalmente ordenada e caracterizada


pela divisão de tarefas, ainda que pela divisão de tarefas, ainda que
informalmente informalmente

Com objetivo de obter, direta ou Com objetivo de obter, direta ou


indiretamente, vantagem de qualquer indiretamente, vantagem de qualquer
natureza natureza

Mediante a prática de crimes cujas penas Mediante a prática de infrações penais cujas
máximas seja igual ou superior a 4 anos ou penas máximas sejam superior a 4 anos ou
sejam de caráter transnacional sejam de caráter transnacional

A Lei 12.850/13 exige quatro ou mais pessoas para que esteja caracterizada uma
organização criminosa.

Quanto à estrutura, não há diferença, ou seja, deve ser estruturalmente ordenada e


caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que informalmente.

O objetivo é o mesmo em ambas as leis: obter, direta ou indiretamente, vantagem de


qualquer natureza.

O objetivo se dava mediante a prática de crimes na Lei 12.694/12, enquanto na Lei


12.850/13, o objetivo é alcançado mediante a prática de infrações penais cujas penas
máximas sejam superiores (e não mais iguais) a 4 anos ou que sejam de caráter
transnacional. As infrações penais abrangem contravenção penal, desde que seja
contravenção penal com pena máxima superior a 4 anos (veja que não existe contravenção
penal com pena superior a quatro anos).

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Cuidado, pois a Lei 12.694/12 não foi revogada pela Lei 12.850/13. Apenas a definição de
organização criminosa foi revogada pela nova lei, de forma que os demais dispositivos da Lei
12.694/12 coexistem com a Lei 12.850/13. A Lei 12.694/12 criou, por exemplo, a
possibilidade do julgamento por órgão colegiado em primeiro grau em se tratando de crime
praticado por organização criminosa.

Portanto, as Leis 12.694/12 e 12.850/13 coexistem, tendo sido revogada a primeira somente
no que se refere ao conceito de organização criminosa (art. 2º).

Resumo das Leis que tratam de organização criminosa:

Lei 6.034/95 Lei 12.694/12 Lei 12.850/13

Previa meios especiais de Definiu organização Definiu organização


investigação, porém não criminosa e criou a criminosa e tratou dos meios
definia organização possibilidade de julgamento especiais de obtenção de
criminosa por órgão colegiado de prova, além de criar novos
primeiro grau delitos

A Lei 12.850/13 revogou a Lei 9.034/95 e também revogou a definição de organização


criminosa dada pela Lei 12.694/12.

É possível trabalhar com os meios especiais de obtenção de prova (agente infiltrado, ação
controlada etc.) previstos na Lei 12.850/13, mesmo que ausente organização criminosa? É
preciso lembrar que a figura do agente infiltrado foi criada principalmente para investigar
organizações criminosas e a ação controlada para permitir um flagrante em uma organização
criminosa. Seria, então, possível utilizar esses meios quando não se trata de uma
organização criminosa ou é imprescindível a caracterização da organização criminosa?

O parágrafo 2º do art. 1º, da Lei 12.850/13 autoriza, desde que reunidos alguns requisitos.

§ 2o  Esta Lei se aplica também:

I - às infrações penais previstas em tratado ou convenção internacional quando, iniciada a

execução no País, o resultado tenha ou devesse ter ocorrido no estrangeiro, ou

reciprocamente;

II - às organizações terroristas internacionais, reconhecidas segundo as normas de direito

internacional, por foro do qual o Brasil faça parte, cujos atos de suporte ao terrorismo,

bem como os atos preparatórios ou de execução de atos terroristas, ocorram ou possam

ocorrer em território nacional.

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Dessa forma, os meios especiais de obtenção de prova podem ser utilizados em infrações
penais previstas em tratado ou convenção internacional quando, iniciada a execução no
País, o resultado tenha ou devesse ter ocorrido no estrangeiro, ou reciprocamente e em
organizações terroristas internacionais, reconhecidas segundo as normas de direito
internacional, por foro do qual o Brasil faça parte, cujos atos de suporte ao terrorismo, bem
como os atos preparatórios ou de execução de atos terroristas, ocorram ou possam ocorrer
em território nacional, dispensando-se a caracterização da organização criminosa.

Um exemplo é o crime de tráfico internacional de pessoas (art. 231 do CP). No tráfico


internacional de pessoas, mesmo que não esteja presente organização criminosa, admite-se
a utilização dos modos especiais de obtenção de prova.

Até o advento da Lei 12.850/13, organização criminosa não era crime, e sim forma especial
de praticar crime. Organização criminosa não tinha tipo penal, muito mesmo pena, mas
apenas consequências.

Lei 12.850/13

Antes Depois

Organização criminosa não era crime. Organização criminosa é crime.

Organização criminosa não tinha pena, Possui tipo próprio com pena privativa de
somente consequências. Ex.: membro de liberdade.
organização criminosa podia sofrer a sanção
disciplinar do RDD.

2. Art. 2º

O crime está previsto no art. 2º da Lei 12.850/13:

Art. 2o  Promover, constituir, financiar ou integrar, pessoalmente ou por interposta

pessoa, organização criminosa:

Pena - reclusão, de 3 (três) a 8 (oito) anos, e multa, sem prejuízo das penas

correspondentes às demais infrações penais praticadas.

Com a nova Lei, a figura da organização criminosa deixou de ser “apenas” forma de se
praticar crimes para se tornar delito autônomo, punido com reclusão de 3 a 8 anos.

Ocorreu, portanto, novatio legis incriminadora, obviamente, irretroativa. Ou seja, não


alcança os fatos esgotados antes de sua vigência. Cuidado, pois o comportamento é

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permanente, ou seja, a organização criminosa que começou antes da Lei, mas continua após
o advento da Lei 12.850/13, pode sofrer os rigores da nova Lei.

2.1. Bem jurídico tutelado

Como em toda associação criminosa, tutela-se a paz pública.

De acordo com a maioria, trata-se de crime de perigo abstrato ou presumido.

2.2. Sujeito ativo e passivo

Em relação ao sujeito ativo, trata-se de crime comum, plurissubjetivo (exige número plural
de agentes, no mínimo quatro pessoas), de condutas paralelas (umas auxiliando as outras).

No número mínimo de quatro associados, computam-se eventuais inimputáveis ou pessoas


não identificadas.

Não se computa agente infiltrado. O agente infiltrado não tem o animus associativo, seu
objetivo é desmantelar a associação criminosa, e não integrá-la.

Em relação ao sujeito passivo, a sociedade aparece como vítima.

2.3. Conduta punida

A conduta punida consiste em promover (trabalhar a favor), constituir (formar), financiar


(custear despesas) ou integrar (fazer parte), pessoalmente (forma direta) ou por interposta
pessoa (forma indireta), organização criminosa.

Partindo-se da definição de organização criminosa (art. 1º, §1º), fica claro que a associação
além da pluralidade de agentes, demanda estabilidade e permanência, com estrutura
ordenada e divisão de tarefas. Faltando qualquer um desses requisitos, ainda que haja a
pluralidade de agentes, não estará configurado o delito de organização criminosa. Nesse
caso, possível configurar-se mero concurso de pessoas ou o crime de associação criminosa
do art. 288 do CP, antigamente chamado de quadrilha ou bando.

Requisitos:

i) número plural de agentes (no mínimo quatro pessoas);

Há número plural de agentes na organização criminosa, na associação criminosa (art. 288 do


CP) e no concurso de pessoas.

ii) estabilidade e permanência;

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Caso desapareça a estabilidade e a permanência, haverá mero concurso de pessoas.

iii) estrutura ordenada e divisão de tarefas;

Caso não se configure a estrutura ordenada e a divisão de tarefas, haverá crime de


associação criminosa (art. 288 do CP).

É imprescindível que a reunião seja efetivada antes da deliberação dos delitos. Caso primeiro
deliberem os delitos, para somente depois as pessoas reunirem-se em associação para
praticar os delitos certos e determinados, haverá mero concurso de pessoas. Ex.: se Rogério
se associa a Carlos e Renato e, depois de associados, deliberam os crimes que a associação
irá praticar, além de presentes os demais requisitos, trata-se de organização criminosa. Caso
Rogério primeiro delibere os crimes e depois disso saia atrás de pessoas para lhe ajudar a
praticá-los, tratar-se-á de mero concurso de pessoas.

2.4. Voluntariedade

O crime é punido a título de dolo.

O crime exige o fim especial de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer


natureza mediante a prática de infrações penais.

É imprescindível o animus associativo.

2.5. Consumação

Consuma-se o delito com a societas criminis (formação da associação), sendo indispensável


estrutura ordenada com divisão de tarefas (ausente este requisito, pode caracterizar o crime
do art. 288 do CP).

É infração permanente, ou seja, a consumação se protrai enquanto não cessada a


permanência. Isso significa:

i) que o agente pode ser preso em flagrante enquanto não desfeita a associação ou
enquanto não abandoná-la (art. 303 do CPP);

ii) o termo inicial da prescrição se dá com o fim da permanência;

A prescrição tem termo inicial diferenciado (art. 111, III, do CP).

iii) enquanto não cessada a permanência, aplica-se a Lei nova, ainda que mais grave (Súmula
711 do STF).

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Havendo delitos efetivamente praticados pela associação, esses crimes serão absorvidos? Os
agentes respondem apenas pelos crimes praticados, de forma que o crime de associação
criminosa é absorvido, respondem apenas pela organização criminosa e os crimes praticados
são por ela absorvidos ou os agentes respondem por todos os crimes, em concurso material?

Tratando-se de delito autônomo, a punição da organização independe da prática de


qualquer crime pela associação, o qual, ocorrendo, gera o concurso material (art. 69 do CP),
cumulando as penas. O que já era tranquilo na doutrina (seguida pela jurisprudência), agora
está expresso no preceito secundário do art. 2º (reclusão, de 3 a 8 anos, e multa, sem
prejuízo das penas correspondentes às demais infrações penais praticadas).

Pena - reclusão, de 3 (três) a 8 (oito) anos, e multa, sem prejuízo das penas

correspondentes às demais infrações penais praticadas.

Assim, para punir a organização criminosa, não é preciso que os crimes sejam efetivamente
praticados pela associação, mas se ocorrerem, serão punidos em concurso material com o
crime do art. 2º da Lei 12.850/13.

O crime de organização criminal admite tentativa? De acordo com a maioria, não é possível a
tentativa. Os atos praticados com a finalidade de formar a associação são atos preparatórios
e, portanto, impuníveis.

3. Art. 2º, §1º

O art. 2º, parágrafo 1º, da Lei 12.850/13 enuncia que na mesma pena (reclusão de 3 a 8
anos) incorre quem impede ou de qualquer forma embaraça a investigação penal que
envolva organização criminosa.

§ 1o  Nas mesmas penas incorre quem impede ou, de qualquer forma, embaraça a

investigação de infração penal que envolva organização criminosa.

O art. 2º, parágrafo 1º pune a obstrução, seja impedindo ou embaraçando, da persecução


penal de infração que envolva organização criminosa. A pessoa que obstrui ou embaraça a
persecução penal está violando, em última instância, a administração da justiça.

3.1. Bem jurídico tutelado

O art. 2º, parágrafo 1º, da Lei 12.850/13, tutela a administração da justiça, e não mais a paz
pública.

3.2. Sujeitos

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Em relação ao sujeito ativo, trata-se de crime comum e monossubjetivo (concurso eventual).

O agente não pode estar envolvido ou ter concorrido, de qualquer modo, para a formação
ou funcionamento da organização criminosa. Caso tenha se envolvido ou de qualquer forma
concorrido para a formação ou funcionamento da organização criminosa, responderá pelo
art. 2º, caput, da Lei 12.850/13. Nessa situação, o parágrafo 1º seria um pós factum
impunível.

O sujeito passivo é o Estado-administração.

3.3. Conduta punida

A conduta punida consiste em impedir ou, de qualquer forma, embaraçar a investigação de


infração penal que envolva organização criminosa.

Pune-se:

i) impedir;

ii) embaraçar, de qualquer forma.

Atenção, pois o legislador omitiu a obstrução do processo judicial correspondente. Essa


omissão pode ser suprida pelo intérprete?

Investigação Processo

Impedir ou embaraçar a investigação, Caso o agente impeça ou embarace o


caracteriza o art. 2º, §1º, da Lei 12.850/13 processo, há duas correntes.

Há duas correntes:

1ª corrente: a omissão não pode ser suprida, pois seria analogia incriminadora, violando o
princípio da legalidade (Cezar Roberto Bitencourt).

2ª corrente: a omissão pode ser suprida, abrangendo a fase do processo, através da


interpretação teleológica ou extensiva (Rogério Sanches, Nucci, LFG). Este é o mesmo
raciocínio que o STF faz quanto ao crime de introduzir celular em presídios, estendendo a
interpretação para o fato de introduzir chips e carregadores em presídio. A intenção do
legislador é punir qualquer conduta capaz de impedir ou embaraçar a persecução penal, nas
suas duas fases (inquérito policial e processo). Zaffaroni afirma que a interpretação extensiva
deve ser excepcional e utilizada quando qualquer outra interpretação resultar em um
absurdo.

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Cuidado, pois o crime é de execução livre, podendo ser praticado com violência, grave
ameaça, fraude etc. Aliás, usando o agente, na obstrução, de violência ou grave ameaça
contra autoridade ou qualquer outra personagem atuante na persecução penal, não há que
se cogitar do crie de coação no curso do processo, tipificado no art. 344 do CP, punido com
pena de 1 a 4 anos de reclusão. Prevalece, na hipótese, o princípio da especialidade.
Conclusão outra gera um absurdo inaceitável, desafiando a proporcionalidade e a
razoabilidade.

Exemplos:

i) Fulano embaraça investigação de organização criminosa da qual não faz parte, ameaçando
pessoas não ligadas a persecução penal. Estará configurado o art. 2º, §1º, da Lei 12.850/13,
punido com pena de 3 a 8 anos.

ii) Fulano embaraça investigação de organização criminosa da qual não faz parte, ameaçando
o Delegado de Polícia ou testemunhas. Nesse caso, estará configurado o crime do art. 2º,
§1º, da Lei 12.850/13, punido com pena de 3 a 8 anos. Não pode configurar o crime do art.
344 do CP, que tem pena de 1 a 4 anos.

Trabalha-se com o princípio da especialidade.

Rogério entende que o agente não poderia ser punido com menos ameaçando o mais e ser
punido com mais ameaçando o menos. Para ele, constitui violação da proporcionalidade e
da razoabilidade.

3.4. Voluntariedade

O crime é punido somente a título de dolo.

3.5. Consumação

Tratando-se do verbo impedir, a consumação se dá com a obstrução da investigação ou


curso do processo (de acordo com a 2ª corrente). Nessa hipótese, é admitida a tentativa.

No núcleo embaraçar, dispensa-se o resultado naturalístico, consumando-se o crime com


qualquer conduta indicativa de empecilho. Também admite tentativa: o agente tenta
praticar conduta indicativa de empecilho e não consegue por circunstancias alheias à sua
vontade.

4. Art. 2º, §2º

O art. 2º, parágrafo 2º, da Lei 12.850/13 é uma causa de aumento de pena e assim dispõe:

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§ 2o  As penas aumentam-se até a metade se na atuação da organização criminosa houver

emprego de arma de fogo.

O legislador empregou a expressão “arma de fogo”, diferentemente do que fez no crime de


roubo, em que utilizou a expressão “arma”. Significa que não abrange outro tipo de
instrumento, ainda que fabricado com finalidade bélica.

Seguindo o espírito da jurisprudência majoritária, a incidência da causa de aumento


dispensa a apreensão da arma utilizada no crime, admitindo prova por qualquer outro meio.

5. Art. 2º, §3º

Trata-se de agravante de pena, semelhante a do art. 62, I, do CP, a ser considerada pelo
magistrado na segunda fase do cálculo da pena.

§ 3o  A pena é agravada para quem exerce o comando, individual ou coletivo, da

organização criminosa, ainda que não pratique pessoalmente atos de execução.

É uma hipótese de aplicação da teoria do domínio do fato. Trata-se do autor que domina o
fato, autor genuíno do crime.

6. Art. 2º, §4º

O parágrafo 4º, do art. 2º, da Lei 12.850/13 volta a prever causas de aumento de pena.

§ 4o  A pena é aumentada de 1/6 (um sexto) a 2/3 (dois terços):

I - se há participação de criança ou adolescente;

II - se há concurso de funcionário público, valendo-se a organização criminosa dessa

condição para a prática de infração penal;

III - se o produto ou proveito da infração penal destinar-se, no todo ou em parte, ao

exterior;

IV - se a organização criminosa mantém conexão com outras organizações criminosas

independentes;

V - se as circunstâncias do fato evidenciarem a transnacionalidade da organização.

Rogério entende que a causa de aumento que tende a aparecer em provas de concurso é a
do inciso V, que trata da transnacionalidade da organização.

Ocorre que a transnacionalidade é elementar do crime de organização criminosa, prevista na


parte final do art. 1º da Lei 12.850/13. Portanto, no que diz respeito ao inciso V, o aumento

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ficará sem aplicação, pois essa circunstância aparece como elementar do tipo do art. 1º, sob
pena de configurar-se bis in idem.

7. Art. 2º, §5º

O parágrafo 5º, do art. 2º, da Lei 12.850/13 prevê uma medida cautelar.

§ 5o  Se houver indícios suficientes de que o funcionário público integra organização

criminosa, poderá o juiz determinar seu afastamento cautelar do cargo, emprego ou

função, sem prejuízo da remuneração, quando a medida se fizer necessária à investigação

ou instrução processual.

Esta medida cautelar está prevista no art. 319, VI, do CPP, pressupondo o binômio: a)
periculum in mora e b) fumus boni iuris, como toda e qualquer cautelar.

Pode ser decretada em qualquer fase da persecução penal, e não apenas na fase do
inquérito policial, abrangendo a fase da investigação ou do processo.

8. Art. 2º, §6º


§ 6o  A condenação com trânsito em julgado acarretará ao funcionário público a perda do

cargo, função, emprego ou mandato eletivo e a interdição para o exercício de função ou

cargo público pelo prazo de 8 (oito) anos subsequentes ao cumprimento da pena.

Trata-se da previsão de um efeito extrapenal da sentença condenatória definitiva.

Diferentemente do art. 92 do CP cujo parágrafo único exige decisão motivada do juízo para
gerar este efeito, a Lei de Organização Criminosa repetiu o espírito da Lei de Tortura, em que
a perda do cago, emprego ou função é automática, dispensando-se motivação.

Portanto, como já ocorre na Lei de Tortura (art. 1º, §5º), o efeito é automático, dispensando
decisão motivada do magistrado.

No que tange ao mandato eletivo, a doutrina e a jurisprudência discutem se a questão é


matéria interna corporis do Congresso Nacional ou não. Não há posicionamento definitivo
no STF.

9. Art. 2º, §7º


§ 7o  Se houver indícios de participação de policial nos crimes de que trata esta Lei, a

Corregedoria de Polícia instaurará inquérito policial e comunicará ao Ministério Público,

que designará membro para acompanhar o feito até a sua conclusão.

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A finalidade do dispositivo é garantir a eficiência da investigação policial, impedindo
omissões decorrentes de corporativismo.

O dispositivo é um desdobramento lógico do controle externo da Polícia exercido pelo


Ministério Público. É uma garantia fundamental do cidadão prevista no art. 129, VII, da CR.

Nucci afirma que o dispositivo tem a finalidade de impedir a investigação de membros da


Polícia que integrem organização criminosa, podendo o MP apenas acompanhar a
investigação. Rogério não concorda com esse posicionamento, pois em nenhum momento o
dispositivo quer dizer que o Ministério Público não pode mais investigar, questão já discutida
por ocasião da PEC 37, tendo-se decidido que o Ministério Público pode e deve investigar,
principalmente organização criminosa envolvendo policiais. Até mesmo aqueles que eram
contra a investigação conduzida pelo Ministério Público reconheciam a sua possibilidade
extraordinária em casos de policiais que integram organização criminosa.

Portanto, a atuação da Corregedoria da Polícia, acompanhada pelo Ministério Público,


obviamente não impede o Promotor ou Procurador de conduzir a investigação. Na visão de
Rogério, isso seria um absurdo, pois a condução da investigação nesse caso por órgão que
não faça parte da Polícia é necessária.

Rogério pondera, ainda, que de acordo com jurisprudência pacífica, o Promotor ou o


Procurador que participar ou conduzir a investigação não estará impedido de atuar na ação
penal.

10. Crimes ocorridos na investigação e na obtenção de provas

Há um capítulo próprio na Lei 12.850/13 prevendo crimes ocorridos na investigação e na


obtenção de provas. O legislador decidiu criar crimes ligados à investigação e obtenção de
provas em crimes de organização criminosa. São crimes novos, que buscam inibir
comportamentos que prejudiquem a investigação e a obtenção de provas.

A Lei 12.850/13 anunciou importantes meios de obtenção de provas, notadamente:

a) colaboração premiada;

b) agente infiltrado;

c) quebra de sigilo de dados;

O legislador criou crimes para inibir comportamentos que prejudiquem esses meios
extraordinários de obtenção de prova.

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10.1. Art. 18

Art. 18.  Revelar a identidade, fotografar ou filmar o colaborador, sem sua prévia

autorização por escrito:

Pena - reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa.

O art. 5º, II, da Lei 12.850/13 assegura ao agente colaborador sigilo quanto à identidade.

O art. 5º, V, da Lei 12.850/13, por sua vez, enuncia que é direito do agente colaborador não
ter sua identidade revelada por qualquer meio de comunicação sem sua prévia autorização.

A finalidade de tais segredos é não apenas preservar o meio de obtenção de provas (a


eficácia da colaboração), mas também a segurança do agente colaborador. Este, inclusive, é
o bem jurídico tutelado pelo dispositivo.

Em relação ao sujeito ativo, o crime é comum, podendo ser praticado por qualquer pessoa. A
vítima é o Estado, periclitado na sua tarefa de obtenção de provas e o próprio agente
colaborador.

Trata-se de crime de ação múltipla, punindo os seguintes comportamentos (alternativos):

a) revelar (dar conhecimento), de qualquer modo, a identidade do agente colaborador;

b) fotografar o agente colaborador;

c) filmar o agente colaborador.

Atenção, pois nas três formas de execução, é imprescindível que o autor do crime haja sem
prévia autorização por escrito do agente colaborador. O fato será atípico se a pessoa tiver
autorização por escrito do agente colaborador.

Pune-se somente a forma dolosa da conduta, leia-se, vontade consciente de revelar


identidade, fotografar ou filmar pessoa que sabe ser agente colaborador, dispensando
finalidade especial animando a conduta do agente.

Se houver dúvida quanto à identidade do agente colaborador, poderá caracterizar dolo


eventual.

Consuma-se o crime com a prática de qualquer dos núcleos, sendo perfeitamente possível a
tentativa. Trata-se de crime plurisubssistente (a execução pode ser fracionada em vários
atos).

10.2. Art. 19

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Este crime pune o agente colaborador.

Art. 19.  Imputar falsamente, sob pretexto de colaboração com a Justiça, a prática de

infração penal a pessoa que sabe ser inocente, ou revelar informações sobre a estrutura

de organização criminosa que sabe inverídicas:

Pena - reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.

Trata-se do agente colaborador que colabora de forma fraudulenta. O dispositivo trata da


falsa colaboração.

Junto com a administração da justiça, o art. 19 tutela de forma mediata, a honra da pessoa
inocente a quem o colaborador imputou a prática da infração penal.

Figura como sujeito ativo o agente colaborador, nos termos do art. 4º, da Lei 12.850/13. Nos
termos do art. 4º, §14, o agente renuncia, na presença de seu defensor, o direito ao silêncio
e presta o compromisso de dizer a verdade.

§ 14.  Nos depoimentos que prestar, o colaborador renunciará, na presença de seu

defensor, ao direito ao silêncio e estará sujeito ao compromisso legal de dizer a verdade.

Há crítica em relação à expressão “renuncia”. Trata-se de impropriedade do legislador, na


medida em que o direito ao silêncio constitui-se em direito fundamental, que tem como
característica inerente a irrenunciabilidade. O ideal, portanto, é falar em não exercício do
direito ao silêncio.

A vítima imediata é o Estado, além da pessoa objeto da injusta provocação (vítima eventual
mediata).

O tipo incrimina dois comportamentos alternativos:

a) colaboração caluniosa: a primeira conduta típica consiste em imputar falsamente, sob


pretexto de colaboração com a justiça, a prática de infração penal a pessoa que sabe ser
inocente.

O agente colaborador, durante a negociação da colaboração premiada, atribui a alguém


(pessoa certa e determinada) infração penal sabidamente falsa.

Haverá o crime quando o fato imputado jamais ocorreu – é a chamada falsidade que recai
sobre o fato – ou, quando real o acontecimento, não foi a pessoa apontada o seu autor – a
falsidade recai sobre a autoria do fato.

15
Diferentemente da denunciação caluniosa (art. 339 do CP), dispensa-se que da falsa
imputação ocorra a instauração de procedimento oficial em face do inocente imputado. No
crime do art. 339 do CP é imprescindível que seja instaurado procedimento oficial.

b) colaboração fraudulenta: na segunda conduta típica, o colaborador revela informações


sobre a estrutura de organização criminosa que sabe inverídicas, podendo confundir as
autoridades na difícil investigação que busca desmantelar o grupo criminoso.

A Lei 12.850/13 orienta, sempre que possível, registrar os atos da colaboração.

Pune-se apenas a título de dolo. O agente deve saber que pratica colaboração caluniosa ou
fraudulenta.

É indispensável que o sujeito ativo tenha consciência de que a imputação a pessoa inocente
é falsa. A dúvida pode configurar dolo eventual.

Na segunda parte (colaboração fraudulenta), deve saber que as informações reveladas são
inverídicas. De acordo com a leitura do tipo, a dúvida parece configurar fato atípico.

Obviamente, a boa-fé exclui o dolo. Ex.: agente colaborador acreditava que as informações
eram verídicas, ainda que efetivamente não sejam.

O crime se consuma com a falsa imputação ou com a revelação de informações não


verdadeiras, dispensando efetivo prejuízo para a administração da justiça.

Tratando-se de crime plurissubsistente, é possível a tentativa.

10.3. Art. 20

Art. 20.  Descumprir determinação de sigilo das investigações que envolvam a ação

controlada e a infiltração de agentes:

Pena - reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.

A ação controlada e a infiltração de agentes são meios extraordinários de obtenção de


prova.

Com o objetivo de garantir o êxito da investigação, sem desconsiderar a necessidade de


preservar os protagonistas das diligências, o crime do art. 20 incrimina a violação do sigilo
envolvendo ação controlada e infiltração de agentes.

Figura como sujeito ativo apenas personagem que atua na persecução penal de organização
criminosa. Trata-se de delito próprio, são as pessoas que em razão do cargo devem guardar
sigilo. Isso, contudo, não impede que particular concorra para o crime.

16
Sujeito passivo é o Estado administração. São vítimas mediatas os outros personagens que
tiveram a segurança periclitada por conta da ação de outro servidor que violou o sigilo da
ação controlada ou da infiltração de agentes.

A conduta punida pelo tipo consiste em descumprir determinação (legal ou judicial) de sigilo
das investigações que envolvam a ação controlada e a infiltração de agentes. O sigilo pode
ser imposto por lei ou pelo magistrado.

Dispõem o art. 8º, §§ 2º e 3º:

Art. 8o  Consiste a ação controlada em retardar a intervenção policial ou administrativa

relativa à ação praticada por organização criminosa ou a ela vinculada, desde que mantida

sob observação e acompanhamento para que a medida legal se concretize no momento

mais eficaz à formação de provas e obtenção de informações.

§ 2o  A comunicação será sigilosamente distribuída de forma a não conter informações

que possam indicar a operação a ser efetuada.

§ 3o  Até o encerramento da diligência, o acesso aos autos será restrito ao juiz, ao

Ministério Público e ao delegado de polícia, como forma de garantir o êxito das

investigações.

O art. 10 acrescenta:

Art. 10.  A infiltração de agentes de polícia em tarefas de investigação, representada pelo

delegado de polícia ou requerida pelo Ministério Público, após manifestação técnica do

delegado de polícia quando solicitada no curso de inquérito policial, será precedida de

circunstanciada, motivada e sigilosa autorização judicial, que estabelecerá seus limites.

Todos os dispositivos trabalham o sigilo envolvendo a ação controlada e a infiltração de


agentes.

O crime pode ser praticado por ação e omissão.

Existe o crime mesmo que a revelação se dê a outro funcionário sem acesso ao segredo.

Na Lei 12.850/13, protege-se apenas o sigilo das investigações, não abrangendo o do


processo. A revelação de sigilo do processo configura o crime do art. 325 do CP.

Havendo justa causa para a revelação do sigilo poderá ser excluído o caráter criminoso do
fato.

O crime é punido a título de dolo.

17
Consuma-se com a revelação do sigilo. Se praticado por ação, admite tentativa. A tentativa
também é admitida em caso de omissão imprópria.

10.4. Art. 21

Art. 21.  Recusar ou omitir dados cadastrais, registros, documentos e informações

requisitadas pelo juiz, Ministério Público ou delegado de polícia, no curso de investigação

ou do processo:

Pena - reclusão, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa.

O bem jurídico tutelado é a administração da justiça.

Figura como sujeito ativo qualquer pessoa a quem se dirige a requisição (e que tenha poder-
dever de obedecê-la). Trata-se de crime comum.

Servidor público não pratica este crime, e sim o de prevaricação.

O sujeito passivo é o Estado administração desprestigiado na ordem.

Pune-se o agente recusar (não aceitar) ou omitir (deixar de fazer) dados cadastrais, registros,
documentos e informações requisitadas pelo juiz, Ministério Público ou delegado de polícia,
no curso de investigação ou do processo.

De acordo com os arts. 15, 16 e 17, da Lei 12.850/13, não só o juiz, como também delegado
e Ministério Público terão acesso direto a determinados dados cadastrais. Ex.: itinerários de
viagens, números das contas bancárias etc.

As informações requisitadas devem se restringir, única e exclusivamente, aos dados


cadastrais. Isso porque o mero acesso a dados cadastrais não implica em quebra de sigilo
pessoal, quer de ordem fiscal, quer mesmo de comunicação.

É punido a título de dolo.

A consumação se dá com a recusa ou omissão. Trata-se de crime omissivo próprio, que não
admite tentativa.

O parágrafo único do art. 21 pune com a mesma pena quem, de forma indevida, se apossa,
propala, divulga ou faz uso dos dados cadastrais de que trata a Lei.

Parágrafo único.  Na mesma pena incorre quem, de forma indevida, se apossa, propala,

divulga ou faz uso dos dados cadastrais de que trata esta Lei.

18
Apesar do silêncio da redação típica, parece evidente que os cadastros devam conter
informações sigilosas.

10.5. Alteração do art. 288 do CP

Atenção, pois o art. 24 da Lei 12.850/13 alterou o art. 288 do CP, que passa a se chamar
associação criminosa e vigorar com a seguinte redação:

Art. 24.  O art. 288 do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal),

passa a vigorar com a seguinte redação:

“Associação Criminosa

Art. 288.  Associarem-se 3 (três) ou mais pessoas, para o fim específico de cometer

crimes:

Pena - reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos.

Parágrafo único.  A pena aumenta-se até a metade se a associação é armada ou se houver

a participação de criança ou adolescente.” (NR)

Tabela explicativa:

Art. 288 do CP (antes da Lei 12.850/13) Art. 288 do CP (depois da Lei 12.850/13)

Associarem-se mais de três pessoas, em Associarem-se três ou mais pessoas, para o


quadrilha ou bando, para o fim de cometer fim específico de cometer crimes
crimes

Pena – reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos Pena – reclusão de 1 (um) a 3 (três) anos

Parágrafo único. A pena aplica-se em dobro, Parágrafo único. A pena aumenta-se até a
se a quadrilha ou bando é armado metade se a associação é armada ou se
houver a participação de criança ou
adolescente

19
ASPECTO PROCESSUAL

1. Introdução

1.1. Objeto da Lei 12.850/13

O art. 1º da Lei 12.850/13 dispõe sobre o objeto da lei:

Art. 1o  Esta Lei define organização criminosa e dispõe sobre a investigação criminal, os

meios de obtenção da prova, infrações penais correlatas e o procedimento criminal a ser

aplicado.

Os meios de obtenção de prova e a investigação, assim como o procedimento são tratados


no Capítulo II da Lei, a partir de seu art. 3º:

Art. 3o  Em qualquer fase da persecução penal, serão permitidos, sem prejuízo de outros

já previstos em lei, os seguintes meios de obtenção da prova:

I - colaboração premiada;

II - captação ambiental de sinais eletromagnéticos, ópticos ou acústicos;

III - ação controlada;

IV - acesso a registros de ligações telefônicas e telemáticas, a dados cadastrais constantes

de bancos de dados públicos ou privados e a informações eleitorais ou comerciais;

V - interceptação de comunicações telefônicas e telemáticas, nos termos da legislação

específica;

VI - afastamento dos sigilos financeiro, bancário e fiscal, nos termos da legislação

específica;

VII - infiltração, por policiais, em atividade de investigação, na forma do art. 11;

VIII - cooperação entre instituições e órgãos federais, distritais, estaduais e municipais na

busca de provas e informações de interesse da investigação ou da instrução criminal.

Veja que o caput do art. 3º fala em persecução penal. Portanto, pelo menos em tese, os
meios de obtenção de prova podem ser utilizados na investigação ou no curso do processo.

O artigo indica alguns meios de obtenção de prova que podem ser utilizados na investigação
de crimes praticados por organizações criminosas. Contudo, nem todos os meios de
obtenção de prova estão regulamentados na Lei 12.850/13, que dispõe apenas sobre
colaboração premiada, ação controlada, acesso a registro de ligações telefônicas e
telemáticas e dados cadastrais, assim como infiltração por policiais.

20
1.2. Distinção entre meios de obtenção de prova e meios de prova

A Lei fala em meios de obtenção de prova e não em meios de prova. As expressões não são
sinônimas e é preciso ter cuidado com a terminologia.

Fontes de prova são as pessoas ou coisas exteriores ao processo e que têm algum
conhecimento sobre o fato delituoso. É tudo o que está relacionado ao fato delituoso. São
anteriores ao processo e sua introdução no processo ocorre através dos meios de prova.

Ex.: ocorrido um crime em um estúdio de televisão, as pessoas que presenciaram, as


impressões digitais, as capsulas da arma, são fontes de prova. A introdução dessas fontes de
prova no processo dar-se-á pelos meios de prova (oitiva das testemunhas em juízo, exames
periciais etc.).

Meios de obtenção de prova são procedimentos investigatórios realizados sem o


conhecimento prévio do investigado, cujo objetivo é conseguir coletar provas materiais e
que podem ser realizados por outros funcionários que não o juiz. A surpresa é característica
inerente, ou seja, o acusado não pode tomar ciência do procedimento investigatório, tendo
em vista que poderá tomar medidas para impedir o conhecimento pelo Estado desses meios
de prova.

Ex.: busca domiciliar é um meio de obtenção de prova. É preciso ter em conta que busca e
apreensão não são um único meio de obtenção de prova. A busca pode ser pessoal ou
domiciliar. Pode haver busca sem apreensão.

Atualmente, dá-se especial importância às técnicas especiais de investigação (TEI) ou meios


extraordinários de obtenção de prova. O CPP é da década de 1940 e prevê meios de
obtenção de prova arcaicos e desatualizados com a atual sistemática das organizações
criminosas. Com o passar dos anos, o legislador começou a perceber que o Estado precisava
se modernizar em relação aos meios de obtenção de prova.

As TEI são ferramentas sigilosas, postas à disposição do Estado para a apuração e persecução
de crimes graves, que exijam o emprego de estratégias investigativas distintas das
tradicionais que se baseiam normalmente em prova documental ou testemunhal. São novos
procedimentos investigatórios. Caracterizam-se por dois elementos: sigilo e dissimulação.

O sigilo é inerente à eficácia das TEI. Na dissimulação, vez por outra, o Estado se vale de
métodos dissimulados para que o acusado não tome conhecimento do procedimento
investigatório. Foram pensadas para o crimes de tráfico de droga e foram posteriormente
utilizadas em relação ao crime de organização criminosa.

21
Meios de prova, por fim, são os instrumentos através dos quais as fontes de prova são
introduzidas no processo. Os meios de prova, ao contrário das fontes, referem-se a
atividades endoprocessuais, desenvolvidas perante o juiz. O contraditório e a ampla defesa
são elementos inerentes para a caracterização dos meios de prova.

3. Colaboração premiada

3.1. Conceito e origem

A colaboração premiada é tratada de forma detalhada nos arts. 4º, 5º, 6º e 7º da Lei
12.850/13. Esses dispositivos constituem um regramento geral da colaboração premiada.

Está relacionada à ideia da traição. O Estado acaba interessando-se por essa traição. As
organizações criminosas possuem um caráter coeso muito marcante e o Estado reconhece
que não possui meios de obter informações senão por intermédio de um dos integrantes
desse grupo.

A origem está relacionada ao direito anglo-saxão, principalmente aos EUA e Itália (no
combate à máfia). Utiliza-se a expressão crown witness.

Colaboração premiada nada mais é do que uma técnica especial de investigação ou meio de
obtenção de prova por meio do qual o Estado oferece ao coautor ou partícipe um prêmio
legal, em troca de informações relevantes para a persecução penal. Trata-se de uma
negociação. O Estado é incapaz de resolver o problema da criminalidade e realiza uma troca
com o criminoso oferecendo prêmios em troca de informações. Os prêmios vão desde uma
causa de diminuição de pena até uma possível extinção da punibilidade pelo perdão judicial.

3.2. Distinção entre colaboração premiada e delação premiada

Muitos doutrinadores insistem em utilizar o termo delação premiada. A tendência atual é


utilizar a expressão colaboração premiada.

A expressão colaboração premiada deve ser compreendida como gênero do qual a delação
premiada é uma das espécies. A delação premiada pressupõe que a pessoa incrimine os
comparsas. Fala-se, portanto, em delação quando houver a incriminação de comparsas pelo
coautor ou partícipe. O acusado confessa a prática delituosa e incrimina antigos comparsas.
A delação é também denominada chamamento de corréu.

Há outras espécies de colaboração premiada. O acusado pode ser útil não apenas
identificando seus comparsas, mas também prestando outras informações relevantes. Ex.:

22
acusado ajuda com a localização da vítima com sua integridade física preservada. Neste
caso, não há delação e sim colaboração premiada.

A expressão delação premiada deve ser evitada, pois traz em si a ideia pejorativa de traição.

Renato Brasileiro sugere que em provas utilize-se a expressão colaboração premiada caso o
candidato perceba que o examinador faz tal distinção. Contudo, a tendência é que
examinadores mais antigos não façam tal distinção, utilizando as expressões como
sinônimas.

3.3. Ética, moral e motivação do colaborador

A colaboração premiada é compatível com a ética e a moral? E a motivação do colaborador,


é importante?

Alguns doutrinadores são contrários à colaboração premiada sob o argumento da


contrariedade do instituto com a ética e a moral. O Estado estaria incentivando a traição,
comportamento antiético e imoral, concedendo um prêmio ao traidor. Tal entendimento
deve ser utilizado em provas de Defensoria Pública.

Renato Brasileiro pondera que tal entendimento não é o majoritário. Isso porque falar em
ética e moral dentro de uma organização criminosa soa contraditório. As organizações
criminosas não prezam pela ética e moral. Ex.: integrantes do PCC determinam, de dentro do
presídio, julgamento sumários, execução de policiais etc.

Não há como negar que é perfeitamente possível a colaboração premiada sem qualquer
violação da ética e da moral que sequer existem dentro de uma organização criminosa.

A motivação do colaborador não interessa. Quando o Estado faz um acordo de colaboração


premiada interessa unicamente a relevância das informações prestadas pelo criminoso, que
devem ser objetivamente eficazes para atingir um dos resultados previstos em lei. Não
interessa, portanto, se o criminoso está arrependido, quer prejudicar comparsas ou se
corrompeu pelo prêmio oferecido.

3.4. Direito ao silêncio

O direito ao silêncio está previsto no art. 5º, LXIII, da CR. Tal dispositivo estabelece que o
preso será informado de seus direitos entre os quais o de permanecer calado, sendo-lhe
assegurada a assistência da família e de advogado.

23
É um dos desdobramentos do direito à não autoincriminação. Ninguém é obrigado a
colaborar com sua própria destruição.

A colaboração premiada é compatível com o direito ao silêncio, pois o indivíduo confessa e


presta informações, ou seja, opta pelo não exercício desse direito. É a mesma ideia da
confissão: o acusado não é obrigado a confessar, por isso a confissão é compatível com o
direito ao silêncio, desde que o acusado seja informado de que não é obrigado a produzir
prova contra si mesmo.

Portanto, a colaboração premiada é compatível com o direito ao silêncio, desde que o


acusado seja informado de que não é obrigado a produzir prova contra si mesmo.

No acordo de colaboração premiada é obrigatória a presença de um defensor para o


acusado. Essa presença é obrigatória exatamente para que seja assegurado o direito ao
silêncio. Portanto, o acusado será orientado pelo defensor para optar pelo direito ao silêncio
ou colaborar com o Estado.

O art. 4º, §14 assim dispõe:

§ 14.  Nos depoimentos que prestar, o colaborador renunciará, na presença de seu

defensor, ao direito ao silêncio e estará sujeito ao compromisso legal de dizer a verdade.

A Lei estabelece que o indivíduo renuncia ao direito ao silêncio na presença do defensor e


estará sujeito ao compromisso legal de dizer a verdade. Poderia o acusado responder por
falso testemunho se mentir?

Há, ainda, o crime do art. 19 da Lei 12.850/13 que trata de imputar falsamente a prática de
crime a pessoa que sabe ser inocente ou divulgar informação falsa sobre a organização
criminosa.

Art. 19.  Imputar falsamente, sob pretexto de colaboração com a Justiça, a prática de

infração penal a pessoa que sabe ser inocente, ou revelar informações sobre a estrutura

de organização criminosa que sabe inverídicas:

Pena - reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.

Esses dispositivos são compatíveis com o direito ao silêncio?

Primeiramente, é importante pontuar que o direito ao silêncio é um direito fundamental e


uma de suas características é a sua indisponibilidade. Ou seja, o indivíduo não pode
renunciar a um direito fundamental. O legislador, portanto, andou mal ao utilizar o verbo
renunciar, na medida em que não se pode renunciar a direito fundamental. O colaborador,

24
em verdade, opta pelo não exercício do direito ao silêncio. Trata-se de impropriedade do
legislador, pois o acusado continua tendo o direito ao silêncio, mas fez uma opção
consentida e informada de que não exerceria o direito ao silêncio.

O colaborador, obviamente, não responde por falso testemunho porque ele é um dos
coautores ou partícipes e não testemunha do crime, portanto, não pode responder pelo
crime.

Em relação ao crime do art. 19, no RE 561.704, o STF entendeu que o direito ao silêncio não
dá ao acusado o direito de praticar o crime de falsa identidade, por não ser um direito
absoluto. É muito comum que a pessoa pratique a falsa identidade para esconder um
passado criminoso. Não há plausibilidade em afirmar que o acusado poderia cometer crimes
em decorrência de seu direito ao silêncio. O acusado, portanto, não é obrigado a produzir
prova contra si mesmo, mas o direito ao silêncio não lhe concede o direito de imputar
falsamente crimes a terceiros inocentes.

Não há qualquer problema com o crime previsto no art. 19 da Lei 12.850/13.

3.5. Previsão legal

Não há como negar que a colaboração premiada já estava inserida no CP, principalmente a
partir da Reforma de 1984. Há, por exemplo, o arrependimento posterior, arrependimento
eficaz, atenuantes de pena para a confissão espontânea, art. 159, §4º etc.

Até o advento da Lei 12.850/13 não havia sistematização da colaboração premiada, de


forma que seus objetivos variavam conforme a legislação.

Dispositivos legais que tratam da colaboração premiada:

i) Lei 8.072/90

Art. 8º Será de três a seis anos de reclusão a pena prevista no art. 288 do Código Penal,

quando se tratar de crimes hediondos, prática da tortura, tráfico ilícito de entorpecentes

e drogas afins ou terrorismo.

Parágrafo único. O participante e o associado que denunciar à autoridade o bando ou

quadrilha, possibilitando seu desmantelamento, terá a pena reduzida de um a dois terços.

Nesse artigo, a colaboração visa ao desmantelamento do bando ou quadrilha, agora


denominada associação criminosa, com o prêmio de redução da pena de 1 a 2/3.

ii) CP

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art. 159.

 § 4º - Se o crime é cometido em concurso, o concorrente que o denunciar à autoridade,

facilitando a libertação do sequestrado, terá sua pena reduzida de um a dois

terços. (Redação dada pela Lei nº 9.269, de 1996)

iii) Lei 7.492/86

§ 2º Nos crimes previstos nesta Lei, cometidos em quadrilha ou coautoria, o coautor ou

partícipe que através de confissão espontânea revelar à autoridade policial ou judicial

toda a trama delituosa terá a sua pena reduzida de um a dois terços. ( Incluído pela Lei nº

9.080, de 19.7.1995)

iv) Lei 8.137/90

Art. 16. Qualquer pessoa poderá provocar a iniciativa do Ministério Público nos crimes

descritos nesta lei, fornecendo-lhe por escrito informações sobre o fato e a autoria, bem

como indicando o tempo, o lugar e os elementos de convicção.

 Parágrafo único. Nos crimes previstos nesta Lei, cometidos em quadrilha ou coautoria, o

coautor ou partícipe que através de confissão espontânea revelar à autoridade policial ou

judicial toda a trama delituosa terá a sua pena reduzida de um a dois terços.     (Parágrafo

incluído pela Lei nº 9.080, de 19.7.1995)

Os artigos citados trazem uma colaboração premiada de pouca ou nenhuma relevância


prática, pois o prêmio era apenas uma diminuição da pena de 1 a 2/3. O criminoso não se
sentia estimulado em colaborar com o Estado, haja vista que a traição é punida com pena de
morte no âmbito criminoso.

A Lei 9.613/98 concedeu benefícios mais atrativos.

v) Lei 9.613/98

art. 1º.

§ 5o  A pena poderá ser reduzida de um a dois terços e ser cumprida em regime aberto ou

semiaberto, facultando-se ao juiz deixar de aplicá-la ou substituí-la, a qualquer tempo, por

pena restritiva de direitos, se o autor, coautor ou partícipe colaborar espontaneamente

com as autoridades, prestando esclarecimentos que conduzam à apuração das infrações

penais, à identificação dos autores, coautores e partícipes, ou à localização dos bens,

direitos ou valores objeto do crime. (Redação dada pela Lei nº 12.683, de 2012)

26
Há uma novidade, pois além da diminuição de pena pode haver fixação do regime inicial de
cumprimento de pena aberto ou semiaberto, independentemente do cumprimento dos
requisitos previstos no art. 44 do CP.

Faculta-se, ainda, ao juiz, deixar de aplicar a pena (perdão judicial com a consequente
extinção da punibilidade) ou substituí-la por pena restritiva de direitos.

O criminoso autor, coautor ou partícipe precisa colaborar espontaneamente com as


autoridade, prestando informações que conduzam à apuração das infrações penais, à
identificação dos autores, coautores e partícipes ou à localização dos bens, direitos ou
valores objeto do crime.

Cuidado com a conjunção alternativa “ou”. Na antiga Lei de Lavagem de Capitais, esses
requisitos eram cumulativos. A conjunção “ou” indica alternatividade para a concessão do
benefício legal.

A Lei de Lavagem estabelece que a colaboração deve ser espontânea. Para fins de concessão
dos benefícios legais, a colaboração precisa de fato ser espontânea ou basta ser voluntária?
Cuidado, pois voluntariedade e espontaneidade não se confundem.

Espontâneo é algo que parte do indivíduo. O próprio agente deve resolver colaborar, a ideia
deve partir dele. Isso não é necessário para fins de colaboração premiada. O Estado não se
preocupa se o agente recebeu algum tipo de incentivo.

A colaboração, portanto, não precisa ser espontânea, e sim voluntária. Será beneficiado
tanto o indivíduo que espontaneamente resolveu colaborar quanto aquele que resolveu
colaborar após a influência de alguém. O indivíduo somente não poderá ser constrangido a
colaborar.

vi) Lei 9.807/99

Art. 13. Poderá o juiz, de ofício ou a requerimento das partes, conceder o perdão judicial e

a consequente extinção da punibilidade ao acusado que, sendo primário, tenha

colaborado efetiva e voluntariamente com a investigação e o processo criminal, desde

que dessa colaboração tenha resultado:

I - a identificação dos demais coautores ou partícipes da ação criminosa;

II - a localização da vítima com a sua integridade física preservada;

III - a recuperação total ou parcial do produto do crime.

Parágrafo único. A concessão do perdão judicial levará em conta a personalidade do

beneficiado e a natureza, circunstâncias, gravidade e repercussão social do fato criminoso.

27
Essa é a Lei de Proteção às Testemunhas, por isso a doutrina entende que a colaboração
premiada nela prevista pode ser usada como regramento geral e não apenas para
determinado crime, como nos demais dispositivos citados.

vii) Lei 11.343/06

Art. 41.  O indiciado ou acusado que colaborar voluntariamente com a investigação

policial e o processo criminal na identificação dos demais coautores ou partícipes do crime

e na recuperação total ou parcial do produto do crime, no caso de condenação, terá pena

reduzida de um terço a dois terços.

A Lei de Drogas é tímida e traz apenas a diminuição de pena.

viii) Lei 12.529/11

Art. 86.  O Cade, por intermédio da Superintendência-Geral, poderá celebrar acordo de

leniência, com a extinção da ação punitiva da administração pública ou a redução de 1

(um) a 2/3 (dois terços) da penalidade aplicável, nos termos deste artigo, com pessoas

físicas e jurídicas que forem autoras de infração à ordem econômica, desde que

colaborem efetivamente com as investigações e o processo administrativo e que dessa

colaboração resulte: 

I - a identificação dos demais envolvidos na infração; e 

II - a obtenção de informações e documentos que comprovem a infração noticiada ou sob

investigação. 

Art. 87.  Nos crimes contra a ordem econômica, tipificados na Lei no 8.137, de 27 de

dezembro de 1990, e nos demais crimes diretamente relacionados à prática de cartel, tais

como os tipificados na Lei no 8.666, de 21 de junho de 1993, e os tipificados no art. 288

do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940  - Código Penal, a celebração de

acordo de leniência, nos termos desta Lei, determina a suspensão do curso do prazo

prescricional e impede o oferecimento da denúncia com relação ao agente beneficiário da

leniência. 

Parágrafo único.  Cumprido o acordo de leniência pelo agente, extingue-se

automaticamente a punibilidade dos crimes a que se refere o caput deste artigo. 

Trata-se do acordo de leniência, também conhecido como acordo de brandura ou doçura.


Nada mais é do que uma espécie de colaboração premiada em crimes contra a ordem
econômica.

ix) Lei 12.850/13

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Art. 4o  O juiz poderá, a requerimento das partes, conceder o perdão judicial, reduzir em

até 2/3 (dois terços) a pena privativa de liberdade ou substituí-la por restritiva de direitos

daquele que tenha colaborado efetiva e voluntariamente com a investigação e com o

processo criminal, desde que dessa colaboração advenha um ou mais dos seguintes

resultados:

I - a identificação dos demais coautores e partícipes da organização criminosa e das

infrações penais por eles praticadas;

II - a revelação da estrutura hierárquica e da divisão de tarefas da organização criminosa;

III - a prevenção de infrações penais decorrentes das atividades da organização criminosa;

IV - a recuperação total ou parcial do produto ou do proveito das infrações penais

praticadas pela organização criminosa;

V - a localização de eventual vítima com a sua integridade física preservada.

A Lei prevê três possíveis prêmios legais: diminuição de pena em até 2/3, substituição por
pena restritiva de direitos e concessão de perdão judicial.

Entretanto, a Lei não determinou para qual crime poderá ser utilizada a colaboração
premiada. Isso porque, atualmente, organização criminosa passou a ser crime, mas o agente
responderá também pelos crimes praticados pela organização. Seria apenas para o crime de
organização criminosa ou também para os crimes praticados pela organização criminosa?

Renato pondera que certamente haverá discussão, mas entende que onde a lei não restringe
não é dado ao interprete fazê-lo, por isso a colaboração premiada poderia ser utilizada em
todos os crimes.

Objetivos:

i) a identificação dos demais coautores e partícipes da organização criminosa e das infrações


penais por eles praticadas;

ii) a revelação da estrutura hierárquica e da divisão de tarefas da organização criminosa;

iii) a prevenção de infrações penais decorrentes das atividades da organização criminosa;

iv) a recuperação total ou parcial do produto ou do proveito das infrações penais praticadas
pela organização criminosa;

v) a localização de eventual vítima com a sua integridade física preservada. O legislador não
tratou da integridade psicológica da vítima.

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Esses objetivos são alternativos. A própria Lei deixa isso claro quando determina que da
colaboração deve advir um ou mais dos resultados.

Claro que se o indivíduo tem mais de uma informação objetivamente eficaz é interessante
que ele traga todas ao processo, para ser agraciado com o prêmio máximo que é a
concessão do perdão judicial com a consequente extinção da punibilidade.

Cuidado para não achar que prestadas as informações o indivíduo receberá necessariamente
o prêmio legal. Renato cita o caso de um investigador de polícia que se associou a criminosos
para o cometimento do crime de sequestro. Nesse caso, não há que se falar em prêmio
legal, na medida em que o acusado era um agente do Estado, incumbido exatamente da
investigação de crimes. Para Renato, nessa hipótese, a concessão de diminuição de pena ou
extinção da punibilidade seria totalmente descabida.

§ 2o  Considerando a relevância da colaboração prestada, o Ministério Público, a qualquer

tempo, e o delegado de polícia, nos autos do inquérito policial, com a manifestação do

Ministério Público, poderão requerer ou representar ao juiz pela concessão de perdão

judicial ao colaborador, ainda que esse benefício não tenha sido previsto na proposta

inicial, aplicando-se, no que couber, o art. 28 do Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de

1941 (Código de Processo Penal).

Alguns doutrinadores entendem que o perdão judicial poderia ser concedido


independentemente da existência do processo. Em consequência disso, o indivíduo sequer
seria processado. Outros entendem que poderia ser concedido no limiar do processo, pois
uma das causas da absolvição sumária é a extinção da punibilidade (art. 397, IV, do CPP).

É preciso ter cuidado, todavia, porque o STF possui posicionamento proferido no julgamento
da AP 470 (caso do Mensalão), questão de ordem 03, no sentido de que o prêmio da
colaboração premiada não pode ser concedido no início do processo. Por mais que o
indivíduo resolva colaborar, ele terá de ser objeto de denúncia.

§ 3o  O prazo para oferecimento de denúncia ou o processo, relativos ao colaborador,

poderá ser suspenso por até 6 (seis) meses, prorrogáveis por igual período, até que sejam

cumpridas as medidas de colaboração, suspendendo-se o respectivo prazo prescricional.

A Lei 12.850/13 prevê a possibilidade de suspensão do oferecimento da denúncia e até


mesmo do processo por até 6 meses, prorrogáveis por igual período. Enquanto o acusado
colabora com o Estado fica suspenso o oferecimento da denúncia.

§ 4o  Nas mesmas hipóteses do caput, o Ministério Público poderá deixar de oferecer

30
denúncia se o colaborador:

I - não for o líder da organização criminosa;

II - for o primeiro a prestar efetiva colaboração nos termos deste artigo.

O MP pode deixar de oferecer denúncia se o colaborador não for o líder da organização


criminosa ou for o primeiro a prestar efetiva colaboração. Verifica-se, nesse dispositivo, que
o prêmio poderá ser concedido no início do processo e que o MP poderá até mesmo deixar
de oferecer denúncia.

3.6. Eficácia objetiva da colaboração premiada

Em relação à eficácia objetiva da colaboração premiada, impõe-se a seguinte indagação: as


informações prestadas pelo criminoso precisam ou não ser relevantes? O prêmio é
concedido sem que as intenções subjetivas do agente sejam consideradas. Não basta que o
agente arrependa-se e decida colaborar. O Estado preocupa-se unicamente com a relevância
das informações que devem ser objetivamente eficazes para atingir um dos objetivos
previstos na lei.

Ex.: acusado indica o local em que se encontra a vítima no momento em que ela ainda se
encontra com vida. Caso a polícia chegue ao local e encontre a vítima morta, o agente não
será beneficiado, haja vista que a vítima não foi encontrada com a integridade física
preservada.

3.7. Acordo de colaboração premiada

Até o advento da Lei 12.850/13 não havia previsão expressa desse acordo que, no entanto,
era feito na prática.

Na prática, a colaboração premiada é celebrada de maneira informal. Ex.: agente policial


conversa com o criminoso e lhe esclarece do prêmio legal que pode ser concedido caso os
objetivos sejam alcançados, de forma que o criminoso aceita prestar informações relevantes
para a descoberta do produto do crime e identificação dos demais coautores.

Esse acordo informal, entretanto, é deveras perigoso para o criminoso, pois não há
segurança de que os benefícios legais serão de fato levados em consideração pelo juiz. O juiz
sequer participou ou homologou o acordo.

Daí decorre a relevância do acordo de colaboração premiada celebrado entre o criminoso


com a presença de seu defensor e o MP.

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Há quem entenda que o delegado de polícia poderia celebrar esse acordo. Renato adverte
que esse posicionamento somente deve ser defendido em provas para delegado. Em outros
concursos, o ideal é defender que o delegado pode sugerir ao criminoso a celebração do
acordo, mas a efetiva celebração deve ser realizada com a presença obrigatória do membro
do MP, titular da ação penal.

O art. 6º dispõe sobre o acordo:

Art. 6o  O termo de acordo da colaboração premiada deverá ser feito por escrito e conter:

I - o relato da colaboração e seus possíveis resultados;

II - as condições da proposta do Ministério Público ou do delegado de polícia;

III - a declaração de aceitação do colaborador e de seu defensor;

O defensor deve sempre estar presente quando o acordo for discutido.

IV - as assinaturas do representante do Ministério Público ou do delegado de polícia, do

colaborador e de seu defensor;

V - a especificação das medidas de proteção ao colaborador e à sua família, quando

necessário.

Cuidado, pois o acordo de celebração da colaboração não é condição sine qua non para a
concessão dos benefícios legais. O acordo existe para dar aos envolvidos maior segurança
jurídica, mas não se pode admitir que ao criminoso somente sejam concedidos os prêmios
legais se houver acordo escrito.

3.8. Papel do juiz no acordo de colaboração premiada

Não se deve permitir que o juiz tenha papel de protagonismo na celebração do acordo, em
razão da garantia da imparcialidade. Não há como negar que haveria graves prejuízos à
imparcialidade do juiz.

O papel do juiz é de distância, exatamente para preservar sua imparcialidade. A Lei foi
categórica nesse sentido:

Art. 4º.

§ 6o  O juiz não participará das negociações realizadas entre as partes para a formalização

do acordo de colaboração, que ocorrerá entre o delegado de polícia, o investigado e o

defensor, com a manifestação do Ministério Público, ou, conforme o caso, entre o

Ministério Público e o investigado ou acusado e seu defensor.

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O juiz não participa das negociações, das tratativas do acordo. Ou seja, o juiz não deve
conversar com o criminoso e oferecer-lhe um acordo de colaboração premiada, mas é óbvio
que deverá intervir.

Alguns doutrinadores entendem que o juiz jamais deve intervir no acordo. O problema é que
se o juiz não participa em momento algum, a concessão do prêmio no processo poderia
restar inviabilizada (o juiz poderia alegar que o promotor ofereceu o prêmio e que esse não
é o seu entendimento).

Por isso, o art. 7º assim determina:

§ 7o  Realizado o acordo na forma do § 6o, o respectivo termo, acompanhado das

declarações do colaborador e de cópia da investigação, será remetido ao juiz para

homologação, o qual deverá verificar sua regularidade, legalidade e voluntariedade,

podendo para este fim, sigilosamente, ouvir o colaborador, na presença de seu defensor.

Portanto, o juiz não participa das tratativas, mas o acordo deverá ser a ele remetido para
homologação. A intervenção do juiz é necessária para fins de homologação, em que ele
deverá verificar sua regularidade, legalidade e voluntariedade, podendo, para este fim,
sigilosamente, ouvir o colaborador, na presença de seu defensor.

O art. 8º estabelece que o juiz poderá recusar a homologação do acordo de colaboração


premiada.

§ 8o  O juiz poderá recusar homologação à proposta que não atender aos requisitos legais,

ou adequá-la ao caso concreto.

3.9. Momento para a celebração do acordo de colaboração premiada

Não há dúvidas que a colaboração premiada poderá ser celebrada durante a investigação. E
é nesse momento que ela se revela mais eficaz, pois é na investigação que o Estado precisa
de informações relevantes para o esclarecimento do crime.

Durante o processo de conhecimento também não há problema algum na celebração do


acordo de colaboração premiada.

A pergunta relevante sobre o momento da celebração do acordo é se a colaboração


premiada pode ser celebrada durante a execução criminal, isto é, após o trânsito em julgado
da sentença condenatória.

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Até pouco tempo atrás, isso era discussão meramente doutrinária. Ocorre que desde o
advento da Lei 12.683/12 isso passou a ser uma realidade.

§ 5o  A pena poderá ser reduzida de um a dois terços e ser cumprida em regime aberto ou

semiaberto, facultando-se ao juiz deixar de aplicá-la ou substituí-la, a qualquer tempo, por

pena restritiva de direitos, se o autor, coautor ou partícipe colaborar espontaneamente

com as autoridades, prestando esclarecimentos que conduzam à apuração das infrações

penais, à identificação dos autores, coautores e partícipes, ou à localização dos bens,

direitos ou valores objeto do crime. (Redação dada pela Lei nº 12.683, de 2012)

A Lei 12.683/12 acrescentou a expressão “a qualquer tempo”, isto é, mesmo após o trânsito
em julgado da sentença condenatória. A colaboração premiada pode ser celebrada, assim,
durante a execução criminal. É preciso ter em conta que pode haver a colaboração premiada
após o trânsito em julgado da sentença condenatória, mas as informações ainda assim
devem ser objetivamente eficazes. Um bom exemplo é o criminoso que cumpre pena pelo
crime de lavagem de capitais e decide colaborar para a localização do produto do crime e
das infrações antecedentes.

Durante a execução penal, alguns doutrinadores entendem que a colaboração premiada


exigiria uma revisão criminal. Renato entende que não é caso de revisão criminal que
pressupõe um erro, devendo a colaboração ser concedida e homologada pelo próprio juiz da
execução.

A própria Lei traz essa possibilidade:

§ 5o  Se a colaboração for posterior à sentença, a pena poderá ser reduzida até a metade

ou será admitida a progressão de regime ainda que ausentes os requisitos objetivos.

A colaboração premiada após o trânsito em julgado pode ser útil para diminuição de pena
ou progressão de regime, ainda que ausentes os requisitos objetivos.

3.10. Valor probatório da colaboração premiada

É possível condenar um acusado exclusivamente com base nas informações obtidas com a
colaboração premiada?

Sobre o assunto, a jurisprudência sempre entendeu que isoladamente consideradas, as


informações prestadas pelo criminoso não podem servir para condenar alguém. As
informações poderão ser utilizadas para deflagrar uma investigação ou o oferecimento de
uma denúncia.

34
Atualmente, é o que prevê o §16 da própria Lei:

Art. 4º.

§ 16.  Nenhuma sentença condenatória será proferida com fundamento apenas nas

declarações de agente colaborador.

Trata-se da regra de corroboração. Andrey Borges de Mendonça trata dessa regra. Não basta
que o criminoso confesse a prática delituosa e identifique os demais coautores. Ele deverá,
ainda, trazer fontes de prova aptas a confirmar as informações por ele prestadas. Ex.: agente
indica um coautor e um telefone que ele utiliza para conversar sobre o tráfico, para que a
polícia possa interceptar.

As informações prestadas devem ser confirmadas por outros elementos.

4. Ação controlada

4.1. Conceito

Ação controlada consiste no retardamento da intervenção do aparato estatal para que se dê


no melhor momento do ponto de vista da colheita de provas. O Estado já poderia agir para,
por exemplo, efetuar uma prisão em flagrante, mas sabe que efetuada a prisão em flagrante
naquele momento teria pouca ou nenhuma eficácia no combate à organização criminosa, na
medida em que poucos elementos de prova seriam colhidos. O Estado retarda a intervenção
do aparato estatal, exatamente para que a intervenção ocorra em um momento mais eficaz
para a colheita de prova.

Ex.: crime de tráfico de drogas. Em Cáceres/MT, um indivíduo acaba de adentrar um ônibus


e o Estado tem a informação de que traz cocaína em sua bagagem. A polícia poderia efetuar
a prisão em flagrante naquele momento. Ocorre que, efetuada a prisão naquele momento,
teria pouca eficácia para combater a organização criminosa, pois seria preso apenas um
indivíduo, sem a identificação dos demais componentes da organização criminosa. O Estado
pode, então, utilizar-se da ação controlada: a polícia deixa o indivíduo passar, sob
supervisão, e a prisão seria efetuada em momento posterior, subsequente, mais oportuno
sob o ponto de vista da análise do conjunto probatório. No exemplo, a prisão poderia ser
feita quando encontrasse com os demais membros da organização criminosa.

4.2. Previsão legal

i) Lei 9.034/95

35
A antiga e revogada Lei 9.034/95 já previa a ação controlada. A Lei 9.034/95 foi revogada
pela Lei 12.850/13.

 Art. 2º Em qualquer fase de persecução criminal são permitidos, sem prejuízo dos já

previstos em lei, os seguintes procedimentos de investigação e formação de

provas:    (Redação dada pela Lei nº 10.217, de 11.4.2001)

II - a ação controlada, que consiste em retardar a interdição policial do que se supõe ação

praticada por organizações criminosas ou a ela vinculado, desde que mantida sob

observação e acompanhamento para que a medida legal se concretize no momento mais

eficaz do ponto de vista da formação de provas e fornecimento de informações;

ii) Lei 9.613/98

Art. 4o-B.  A ordem de prisão de pessoas ou as medidas assecuratórias de bens, direitos

ou valores poderão ser suspensas pelo juiz, ouvido o Ministério Público, quando a sua

execução imediata puder comprometer as investigações.  (Incluído pela Lei nº 12.683, de

2012)

Essa hipótese configura a ação controlada. O juiz, por exemplo, em uma investigação de
lavagem de capitais, poderia determinar o sequestro de bens hoje. Mas, sabe que isso
poderia obstar a localização de outros bens, na medida em que poderiam ser adotadas
medidas para camuflar os demais bens. Retarda-se, portanto, a intervenção para adotá-la
em momento mais eficaz sob o ponto de vista da colheita de provas.

iii) Lei 11.343/06

Art. 53.  Em qualquer fase da persecução criminal relativa aos crimes previstos nesta Lei,

são permitidos, além dos previstos em lei, mediante autorização judicial e ouvido o

Ministério Público, os seguintes procedimentos investigatórios:

II - a não-atuação policial sobre os portadores de drogas, seus precursores químicos ou

outros produtos utilizados em sua produção, que se encontrem no território brasileiro,

com a finalidade de identificar e responsabilizar maior número de integrantes de

operações de tráfico e distribuição, sem prejuízo da ação penal cabível.

Parágrafo único.  Na hipótese do inciso II deste artigo, a autorização será concedida desde

que sejam conhecidos o itinerário provável e a identificação dos agentes do delito ou de

colaboradores.

Trata-se de mais uma hipótese de ação controlada.

iv) Lei 12.850/13

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Art. 8o  Consiste a ação controlada em retardar a intervenção policial ou administrativa

relativa à ação praticada por organização criminosa ou a ela vinculada, desde que mantida

sob observação e acompanhamento para que a medida legal se concretize no momento

mais eficaz à formação de provas e obtenção de informações.

A antiga Lei de Organização Criminosa fazia referência apenas ao retardamento da


interdição policial. A nova Lei vai além, ao prever que a ação controlada poderá consistir no
retardamento da intervenção policial e administrativa. Ex.: procedimentos administrativos
como o procedimento de uma corregedoria que está investigando uma infração
administrativa de um servidor.

4.3. (Des) necessidade de prévia autorização judicial

A antiga Lei não exigia autorização judicial para a ação controlada. Por isso, alguns
doutrinadores referiam que a ação controlada era descontrolada, pois não havia
necessidade de prévia autorização policial. A polícia levava em frente a ação controlada e
ninguém ficava sabendo disso. A ação controlada, inclusive, era utilizada como falso álibi
para justificar a conduta de policiais corruptos. Não havia controle sobre a ação controlada.

A Lei 9.613/98 estabelece que a ação pode ser suspensa pelo juiz. A Lei 11.343/06 também
exige prévia autorização para a ação controlada.

Renato entende que a necessidade de autorização judicial prévia é um erro, pois a ação
controlada exige rapidez e a autorização judicial pode levar dias para ser analisada. Na visão
de Renato, a Lei 12.850/13 andou bem, pois não prevê a necessidade de prévia autorização
judicial. A Lei prevê apenas que deverá haver prévia comunicação ao juiz competente.

§ 1o  O retardamento da intervenção policial ou administrativa será previamente

comunicado ao juiz competente que, se for o caso, estabelecerá os seus limites e

comunicará ao Ministério Público.

Cuidado, pois a Lei não exige prévia autorização judicial, como faz a Lei 11.343/06. A Lei
12.850/13 apenas diz que o retardamento da intervenção policial ou administrativa será
previamente comunicado ao juiz competente. Não se pode confundir autorização com
comunicação ao juiz.

O melhor entendimento é que a ação controlada continua independendo de prévia


autorização judicial. O que, aliás, é salutar, pois acaba otimizando a utilização dessa técnica
especial de investigação. Exige-se, contudo, comunicação ao juiz competente. O ideal é que

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a autoridade policial remeta ofício ao juiz competente comunicando o início da ação
controlada.

A comunicação tem a finalidade de supervisão sobre a ação controlada. Havendo


necessidade, o juiz deverá estabelecer os limites da ação controlada. Ex.: caso de roubo a
casa lotérica em que poderá haver prejuízo à integridade corporal das pessoas.

A ação controlada também é conhecida como flagrante retardado, prorrogado, postergado


ou diferido. É uma exceção à prisão em flagrante obrigatória (flagrante obrigatório é o
executado pelas autoridades policiais).

Cuidado, pois o exemplo de ação controlada da Lei de Lavagem de Captais não pode ser
chamado de flagrante prorrogado, pois a Lei fala em “ordem de prisão”, ou seja, a prisão é
efetuada com prévia autorização judicial. A única prisão que não precisa de ordem prévia é a
prisão em flagrante. O ideal é entender que a prisão em flagrante continua sendo obrigatória
na Lei de Lavagem. A ação controlada na Lei de Lavagem refere-se a uma possível prisão
preventiva ou temporária.

Conforme já analisado, na Lei 12.850/13 não há necessidade de prévia autorização judicial


para a ação controlada, devendo haver apenas comunicação ao juiz. Questão interessante é
se, no momento posterior, quando a prisão enfim for efetuada, haverá necessidade de
autorização judicial?

Na ação controlada, a intervenção pode ser retardada, mas a prisão posterior não pode ser
efetuada a qualquer tempo. É preciso ter em conta que a CR estabelece que ninguém será
preso, salvo em flagrante delito ou com prévia ordem judicial. No momento posterior, a
prisão somente poderá ser efetuada pela autoridade policial se o agente estiver em situação
de flagrância ou se existir ordem judicial.

4.4. Entrega vigiada

É a técnica especial de investigação que consiste em permitir que remessas ilícitas ou


suspeitas saiam do território de um ou mais Estados, os atravesse ou neles entrem, com
conhecimento e controle das autoridades, com a finalidade de investigar infrações e
identificar pessoas envolvidas na sua prática.

A Convenção de Palermo, que foi incorporada ao ordenamento jurídico pátrio, prevê a


entrega vigiada.

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Ex.: pacote enviado de SP com droga para outra localidade. Ao invés de haver a
interceptação em SP, as autoridades interceptam a droga no local de destino.

Há duas espécies de entrega vigiada: limpa e suja. Na entrega vigiada limpa, há a


substituição do conteúdo da embalagem. A polícia, por exemplo, retira a cocaína da
embalagem e coloca pó de talco em seu lugar, antes que o pacote siga seu caminho normal.
Na suja, a encomenda segue seu destino sem modificação em seu conteúdo.

Na suja, é necessário que a autoridade policial mantenha supervisão.

5. Agente infiltrado

5.1. Conceito

Agente infiltrado consiste em uma técnica especial de investigação, por meio da qual um
agente do Estado é inserido dissimuladamente no seio de uma organização criminosa com o
objetivo de indicar fontes de prova aptas a desarticular a organização criminosa.

É chamado de undercover agent. Tem origem no direito norte-americano.

5.2. Previsão legal

A primeira lei que tratou do agente infiltrado foi a revogada Lei de Organização Criminosa.

i) Lei 9.034/95

Art. 2o Em qualquer fase de persecução criminal são permitidos, sem prejuízo dos já

previstos em lei, os seguintes procedimentos de investigação e formação de

provas:    (Redação dada pela Lei nº 10.217, de 11.4.2001)

V – infiltração por agentes de polícia ou de inteligência, em tarefas de investigação,

constituída pelos órgãos especializados pertinentes, mediante circunstanciada

autorização judicial.    (Inciso incluído pela Lei nº 10.217, de 11.4.2001)

A infiltração de agentes poderia ser realizada por agentes de polícia ou de inteligência. No


Brasil, as atividades de inteligência são executadas pela ABIN – Agência Brasileira de
Inteligência. Esse dispositivo era alvo de críticas, pois dentro da persecução penal não
poderia haver infiltração executada por agente de inteligência.

O STJ julgou o HC 149.250, no âmbito da operação Satiagraha, desencadeada pelo delegado


de polícia Protógenes Queiroz com a participação de integrantes da ABIN sem autorização
judicial. O STJ entendeu que tratando-se de investigação criminal não se pode permitir,
sobretudo sem autorização judicial, que agentes da ABIN possam levar adiante

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procedimentos típicos de polícia judiciária. O STJ declarou a ilegalidade desse procedimento
investigatório.

ii) Lei 11.343/06

Art. 53.  Em qualquer fase da persecução criminal relativa aos crimes previstos nesta Lei,

são permitidos, além dos previstos em lei, mediante autorização judicial e ouvido o

Ministério Público, os seguintes procedimentos investigatórios:

I - a infiltração por agentes de polícia, em tarefas de investigação, constituída pelos órgãos

especializados pertinentes;

É necessária a autorização judicial. A Lei de Drogas prevê infiltração apenas de agentes de


polícia.

iii) Lei 12.850/13

Art. 10.  A infiltração de agentes de polícia em tarefas de investigação, representada pelo

delegado de polícia ou requerida pelo Ministério Público, após manifestação técnica do

delegado de polícia quando solicitada no curso de inquérito policial, será precedida de

circunstanciada, motivada e sigilosa autorização judicial, que estabelecerá seus limites.

A Lei 12.850/13 tratou de forma pormenorizada da infiltração de agentes. O legislador


dispôs sobre a infiltração e regulamentou o procedimento.

5.3. Atribuição para a infiltração

5.3.1. (Im) possibilidade de infiltração de particulares

Na antiga Lei das Organizações Criminosas, agentes de inteligência também poderiam ser
infiltrados. Esse dispositivo foi revogado.

A Lei 12.850/13 estabelece que a atribuição para a infiltração é exclusiva de agentes de


polícia. Agentes de inteligência não possuem mais atribuição para a infiltração.

A atribuição depende da natureza do crime investigado. Em tese, a atribuição é somente da


polícia judiciária, civil ou federal. Há quem entenda que a Polícia Militar não poderia realizar
a infiltração. Porém, quando se trata de um crime militar, as polícias militares e as Forças
Armadas têm atribuição de polícia judiciária. Portanto, não há como negar essa
possibilidade.

Particulares podem colaborar como agentes infiltrados? Em uma prova que traga texto de
lei, a resposta deve ser negativa, na medida em que a Lei não faz menção a particulares.

40
Há, entretanto, alguns doutrinadores que sustentam ser possível que a colaboração
premiada seja utilizada de maneira concomitante com a infiltração. Em um caso concreto,
entendeu-se que seria interessante que o colaborador permanecesse no seio da organização
criminosa, como agente infiltrado, para a descoberta de novas fontes de prova. Seria a única
hipótese, admitida pelo professor Vladimir Aras, de infiltração por particular.

5.4. Requisitos para a infiltração

i) prévia autorização judicial do juízo competente. Essa autorização judicial deverá ser
fundamentada e sigilosa. Nessa decisão, o juiz deve estabelecer os limites da atuação do
agente infiltrado, determinando os crimes que poderão ou não ser praticados pelo agente
infiltrado.

É preciso ter cuidado com a teoria do juízo aparente. Na interceptação telefônica essa teoria
fica mais clara, pois a interceptação deve ser autorizada pelo juiz competente. O problema é
que às vezes, no momento inicial das investigações, o juiz competente aparenta ser um e,
com o prosseguimento das investigações, verifica-se que o crime seria da competência de
outro juiz. Surge o seguinte questionamento: a interceptação decretada por um juiz cuja
competência descobriu-se posteriormente ser de outro juiz é válida? Deverá ser considerada
válida em razão da teoria do juízo aparente.

O juízo competente deve ser verificado de acordo com os elementos probatórios então
existentes.

O mesmo se aplica à infiltração policial. Para a autorização da infiltração, interessam os


elementos de prova existentes à época, ainda que posteriormente a competência seja
alterada.

ii) indícios de infração penal – fumus comissi delicti e periculum libertatis. No momento de
decretar a medida, o juiz deve demonstrar que há indícios de infração penal de que trata o
art. 1º da Lei 12.850/13. Cuidado, pois a infiltração pode ser utilizada no crime de
organização criminosa e para os crimes por ela praticados, como também para infrações
penais previstas em tratado internacional de caráter transnacional e organizações terroristas
internacionais.

Veja que a Lei não exige indícios de autoria, mas apenas elementos da probabilidade da
prática de crimes.

iii) indispensabilidade da infiltração. Trata-se do princípio da proporcionalidade, que se


subdivide em necessidade, adequação e proporcionalidade em sentido estrito. Não deve

41
haver outro procedimento investigatório menos gravoso, apto a atingir a mesma finalidade
no caso concreto. O juiz também deve sopesar o risco inerente à infiltração policial, pois um
agente de polícia passará a agir como se fosse um criminoso. Haverá risco pessoal e para sua
família. Esse risco também deve ser considerado pelo juiz.

Renato acrescenta um quarto requisito:

iv) concordância do agente de polícia. Para Renato, a concordância é obrigatória, pois o


agente policial não é obrigado a atuar como integrante de organização criminosa, ainda que
o objetivo seja colaborar com o Estado. A própria Lei estabelece que uma das hipóteses de
interrupção da infiltração é a recusa do agente. O agente tem direito de renunciar ou
recusar a atuação infiltrada.

5.5. Duração da infiltração

Na interceptação telefônica, o prazo é de 15 dias, renovável por mais 15 dias e prorrogável


sucessivamente, desde que mantida a necessidade. A Lei de Interceptações foi muito tímida,
pois 15 dias é um prazo muito exíguo e a autoridade policial tem de requerer a renovação do
prazo.

A Lei 12.850/13 prevê um prazo mais elástico, de 6 meses, renovável desde que haja
comprovada necessidade.

Art. 10.

§ 3o  A infiltração será autorizada pelo prazo de até 6 (seis) meses, sem prejuízo de

eventuais renovações, desde que comprovada sua necessidade.

O prazo limite de 6 meses se aplica para cada decisão judicial. Próximo ao final do prazo,
deverá haver nova decisão prorrogando o prazo por mais até 6 meses e assim
sucessivamente. O que eventualmente for descoberto sem que o prazo tivesse sido
renovado será considerado prova ilícita.

5.6. Agente infiltrado e agente provocador

Agente infiltrado é um agente de polícia que obtém autorização judicial para ser introduzido
dissimuladamente em uma organização criminosa, de modo a coletar informações
necessárias para o desmantelamento da associação. A atuação do agente infiltrado é inerte,
isto é, o agente não deve incentivar novas práticas delituosas. Deve apenas tomar
conhecimento das práticas criminosas que serão praticadas.

42
Essa atuação caracteriza um flagrante esperado, pois não há ação de provocação da prática
criminosa.

Não se confunde com o agente provocador que pode ser tanto um particular quanto um
policial. Não depende de prévia autorização judicial e tem papel proativo, induzindo o
criminoso a praticar delitos, adotando, ao mesmo tempo, precauções para que o crime não
se consume.

Segundo a melhor doutrina, na hipótese do agente provocador, há flagrante preparado ou


delito de ensaio. O flagrante preparado, ao contrário do flagrante esperado, é hipótese de
prisão ilegal que deverá ser relaxada pelo juiz tão logo seja comunicado da prisão. Aplica-se
a Súmula 145 do STF: não há crime quando a preparação do flagrante pela polícia torna
impossível sua consumação.

O agente infiltrado não deve induzir novas práticas delituosas. Deve adotar posicionamento
inerte para a colheita de informações.

5.7. Responsabilidade criminal do agente infiltrado

Quando o juiz defere uma autorização para a infiltração do agente ele deve estabelecer
limites para essa atuação. O agente infiltrado, quando entra na organização criminosa, será
obrigado a praticar crimes para não levantar suspeitas dos criminosos. Ou seja, o agente
deverá participar da prática de alguns crimes para que as informações sejam obtidas.

O art. 10 da Lei 12.850/13 determina que o magistrado estabeleça limites para a atuação do
agente infiltrado. O problema é que o legislador não diz quais são esses limites.

É óbvio que a autorização judicial deve abranger o crime de organização criminosa. Em


relação a outros crimes, a lei silencia. Assim o juiz poderia dar autorização para que o agente
pratique extorsão mediante sequestro?

Renato pondera que, diante do silêncio da lei, o ideal é entender que o juiz poderia autorizar
apenas a prática de crimes de perigo, abstrato ou concreto. Ex.: autorização judicial para que
o agente se infiltre e pratique o crime de tráfico de drogas, além do crime de organização
criminosa. O crime de tráfico é de perigo abstrato e, pelo menos em tese, não resultará na
morte de uma pessoa.

Não se admite, porém, autorização judicial para a prática de crimes de dano pelo agente
infiltrado. Ex.: extorsão mediante sequestro, lesão corporal. Isso porque os fins não
justificariam os meios.

43
E se, diante da situação fática, o agente infiltrado se veja obrigado a praticar outros crimes
que não crimes de perigo para que sua verdadeira identidade não seja descoberta?

A maioria da doutrina, entende que nesse caso o agente não responde pelos crimes que seja
obrigado a praticar. Há parte minoritária da doutrina sustentando que nesse caso haveria
uma causa extintiva da punibilidade (o fato seria típico, ilícito e culpável, mas não seria
punível). A melhor posição para concurso é defender que o agente infiltrado não responde
pelo crime em razão de causa excludente da culpabilidade por inexigibilidade de conduta
diversa.

O art. 13 da Lei 12.850/13 estabelece a exclusão da culpabilidade por inexigibilidade de


conduta diversa, ainda que o legislador tenha falado impropriamente em “não é punível”.

Art. 13.  O agente que não guardar, em sua atuação, a devida proporcionalidade com a

finalidade da investigação, responderá pelos excessos praticados.

Parágrafo único.  Não é punível, no âmbito da infiltração, a prática de crime pelo agente

infiltrado no curso da investigação, quando inexigível conduta diversa.

O agente infiltrado, ademais, será coagido pelos demais integrantes a praticar os crimes e
não se pode exigir dele conduta diversa. Por isso essa conduta não seria culpável.

5.8. Mecanismos de proteção do agente infiltrado

Na legislação anterior não havia qualquer regulamentação. A Lei 12.850/13 demonstra


preocupação com o agente, estabelecendo seus direitos no art. 14:

Art. 14.  São direitos do agente:

I - recusar ou fazer cessar a atuação infiltrada;

A qualquer momento que o agente infiltrado verifique a superveniência de risco, poderá


solicitar ao juiz a suspensão imediata da atuação.

II - ter sua identidade alterada, aplicando-se, no que couber, o disposto no art. 9o da Lei

no 9.807, de 13 de julho de 1999, bem como usufruir das medidas de proteção a

testemunhas;

A doutrina já sustentava, diante da falta de regulamentação, a aplicação da proteção da Lei


9.807/99 ao agente infiltrado. Dentre as várias medidas previstas nessa lei, havia a alteração
da identidade do indivíduo.

III - ter seu nome, sua qualificação, sua imagem, sua voz e demais informações pessoais

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preservadas durante a investigação e o processo criminal, salvo se houver decisão judicial

em contrário;

Não é dado ao juiz revelar a identidade do agente infiltrado. Renato não entende como uma
decisão judicial poderia revelar essas informações. O direito do acusado de acompanhar os
depoimentos não é absoluto e a revelação da identidade do agente infiltrado acarretará em
risco de morte. Trata-se da figura da testemunha anônima. É a testemunha que não tem sua
identidade e qualificação reveladas. A discussão quanto à validade da testemunha anônima
já foi decidida pelo STF no julgamento do HC 90.321, no qual entendeu ser plenamente
possível, desde que haja decisão do juiz no sentido da necessidade de se preservar a
identidade da testemunha.

IV - não ter sua identidade revelada, nem ser fotografado ou filmado pelos meios de

comunicação, sem sua prévia autorização por escrito.

Os meios de comunicação não podem divulgar a identidade do agente infiltrado. O sigilo é


um elemento inerente ao procedimento e à preservação da vida do agente. Há, inclusive, o
crime do art. 20 da Lei 12.850/13 que trata do tema:

Art. 20.  Descumprir determinação de sigilo das investigações que envolvam a ação

controlada e a infiltração de agentes:

Pena - reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.

6. Obtenção de dados cadastrais

A Lei 12. 850/13 passou a regulamentar a obtenção de dados cadastrais.

Art. 15.  O delegado de polícia e o Ministério Público terão acesso, independentemente de

autorização judicial, apenas aos dados cadastrais do investigado que informem

exclusivamente a qualificação pessoal, a filiação e o endereço mantidos pela Justiça

Eleitoral, empresas telefônicas, instituições financeiras, provedores de internet e

administradoras de cartão de crédito.

O delegado e o membro do MP terão acesso, independentemente de autorização judicial,


apenas aos dados cadastrais do investigado.

O art. 15 da Lei 12.850/13 é muito semelhante ao art. 17-B da Lei 9.613/98, com redação
dada pela Lei 12.683/12.

O acesso não depende de autorização judicial. Certamente, o questionamento sobre esse


dispositivo será em relação à intimidade do acusado. Haveria uma exceção à cláusula de

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reserva de jurisdição, na medida em que esses dados só poderiam ser obtidos pelo MP e
pela polícia mediante autorização judicial. Esse posicionamento deve ser adotado em provas
de Defensoria.

Renato pondera que não se pode superdimensionar o direito à intimidade. Além disso, o MP
e o delegado somente poderão ter acesso a informações sobre qualificação pessoal, filiação
e o endereço mantidos pela Justiça Eleitoral, empresas telefônicas, instituições financeiras,
provedores de internet e administradoras de cartão de crédito. Essas informações, para
Renato, são de conhecimento público e dizem respeito à identidade da pessoa. Ex.: o MP
não pode, sem autorização judicial, quebrar o sigilo de dados bancários e financeiros.

O art. 17 traz comando para empresas de telefonia:

Art. 17.  As concessionárias de telefonia fixa ou móvel manterão, pelo prazo de 5 (cinco)

anos, à disposição das autoridades mencionadas no art. 15, registros de identificação dos

números dos terminais de origem e de destino das ligações telefônicas internacionais,

interurbanas e locais.

Esse dispositivo vem sendo questionado pela doutrina. Paccelli entende que é
inconstitucional, pois dá a impressão de que MP e delegado poderiam ter acesso ao registro
de dados telefônicos independentemente de autorização judicial e isso violaria o direito à
intimidade e vida privada.

7. Formação do juízo colegiado para o julgamento de crimes praticados por


organizações criminosas

7.1. Origem

A formação do juízo colegiado está relacionado aos recentes homicídios de quatro juízes
(Leopoldino Marques do Amaral, Antônio José Machado Dias, Alexandre Martins e Patrícia
Accioli).

A partir do momento em que juízes começam a ser vítimas das organizações criminosas,
surge a ideia do juízo colegiado. A ideia constou do II Pacto Republicano de Estado,
celebrado no ano de 2009.

A ideia básica é que através da criação do juízo colegiado, formado por três magistrados, se
consiga tornar a decisão um pouco mais impessoal. Quando a decisão judicial é proferida por
um único magistrado, é possível que o integrante da organização criminosa queira se vingar
dessa pessoa. O criminoso corporifica sua raiva em uma única pessoa. O juízo colegiado

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pretende que essa decisão seja um pouco mais impessoal, despersonalizando a decisão
judicial.

A Lei 12.694/12 prevê o juízo colegiado.

7.2. ADI 4.144

A ADI 4.144 foi apreciada em 2012 e se refere a uma Lei estadual de Alagoas. Trata-se da Lei
6.806/07, que criou um juízo colegiado composto por cinco juízes para o julgamento das
organizações criminosas.

A Lei federal que tratou do assunto foi a Lei 12.694/12. Porém, muitos estados da federação
já demonstravam preocupação com a matéria, ao criar varas especializadas para julgar
organizações criminosas.

Um dos juízes do colegiado é o juiz natural que, através de sorteio, convoca outros dois
magistrados.

A ADI 4.144 é importante, pois nela o STF enfrenta a possibilidade de uma lei estadual dispor
sobre o assunto. Além disso, trata da possibilidade de uma lei estadual prever a criação de
juízo colegiado e a possibilidade de definir o conceito de organização criminosa.

Lei estadual não pode dizer o conceito de organização criminosa, ainda que invocando a
Convenção de Palermo, pois isso viola o princípio da legalidade. No HC 96.007, o STF decidiu
que organização criminosa somente pode ser definida por lei federal aprovada pelo
Congresso Nacional.

O STF decidiu que Lei estadual pode dispor sobre a formação do juízo colegiado, pois o
assunto estaria no âmbito da organização judiciária de cada estado.

Por fim, o Tribunal entendeu que não há problema na criação do juízo colegiado, da mesma
forma que existem as Juntas Eleitorais, Turmas Recursais e julgamento pelo Tribunal do Júri,
todos órgãos colegiados. Não há violação ao juiz natural, pois não há prejuízo para a
imparcialidade. Aliás, um magistrado coagido, ameaçado não poderá julgar com
imparcialidade e independência. É importante entender que o juízo colegiado não é a regra,
mas há essa possibilidade, caso seja constatado risco para a integridade física do juiz.

7.3. Distinção entre juízo colegiado e juiz sem rosto

Com o advento da Lei, houve quem sustentasse que o legislador teria criado a figura do juiz
sem rosto.

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A figura do juiz sem rosto ou secreto foi utilizada na Colômbia e no Peru. Trata-se de um juiz
em relação ao qual não há qualquer conhecimento. A decisão é, inclusive, apócrifa. O juízo
colegiado tem rosto, no entanto, em vez de um rosto há três. A Lei criou, portanto, um juízo
colegiado, pois a qualificação dos juízes é conhecida. A única restrição é que não deve haver
menção a eventual voto divergente.

O § 6º do art. 1º da Lei 12.694/12 assim estabelece:

§ 6o  As decisões do colegiado, devidamente fundamentadas e firmadas, sem exceção, por

todos os seus integrantes, serão publicadas sem qualquer referência a voto divergente de

qualquer membro.  

Portanto, verifica-se que as decisões do colegiado são devidamente fundamentadas.

7.4. Requisitos para a formação do juízo colegiado

Art. 1o  Em processos ou procedimentos que tenham por objeto crimes praticados por

organizações criminosas, o juiz poderá decidir pela formação de colegiado para a prática

de qualquer ato processual, especialmente:  

I - decretação de prisão ou de medidas assecuratórias;  

II - concessão de liberdade provisória ou revogação de prisão;  

III - sentença;  

IV - progressão ou regressão de regime de cumprimento de pena;  

V - concessão de liberdade condicional;  

VI - transferência de preso para estabelecimento prisional de segurança máxima; e  

VII - inclusão do preso no regime disciplinar diferenciado.  

§ 1o  O juiz poderá instaurar o colegiado, indicando os motivos e as circunstâncias que

acarretam risco à sua integridade física em decisão fundamentada, da qual será dado

conhecimento ao órgão correicional.  

§ 2o  O colegiado será formado pelo juiz do processo e por 2 (dois) outros juízes escolhidos

por sorteio eletrônico dentre aqueles de competência criminal em exercício no primeiro

grau de jurisdição.  

i) crimes praticados por organização criminosa. Pelo menos em tese, não se pode utilizar o
juízo colegiado para julgamento do crime de associação criminosa. Deve-se utilizar qual

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conceito de organização criminosa, a do art. 2º da Lei 12.694/12 ou a do art. 1º da Lei
12.850/13?

Há quem defenda que atualmente há dois conceitos de organização criminosa, um utilizado


para a formação do juízo colegiado e outro para a configuração do crime de organização
criminosa.

Renato sustenta que em um ordenamento jurídico não podem existir dois conceitos para o
mesmo instituto. Portanto, se a Lei 12.850/13 é posterior e tratou de maneira diversa, o art.
2º da Lei 12.694/12 foi tacitamente revogado, de forma que o conceito de organização
criminosa deve ser extraído do art. 1º, §1º, da Lei 12.850/13.

§ 1o  Considera-se organização criminosa a associação de 4 (quatro) ou mais pessoas

estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que

informalmente, com objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer

natureza, mediante a prática de infrações penais cujas penas máximas sejam superiores a

4 (quatro) anos, ou que sejam de caráter transnacional.

Cuidado, pois a Lei 12.694/12 não foi inteiramente revogada, mas apenas no que diz
respeito ao conceito de organização criminosa.

ii) decisão judicial fundamentada em que deve apontar quais são os riscos à sua integridade
física ou psicológica ou de seus familiares.

Qualquer ato processual pode ser praticado pelo juízo colegiado. O rol trazido pelo art. 1º da
Lei 12.694/12 é meramente exemplificativo. A formação do colegiado poderá ser feita a
qualquer momento, seja durante as investigações, o processo ou mesmo na execução penal.
Esse entendimento é extraído dos exemplos de atos trazidos pelo rol do art. 1º.

Há doutrinadores que sustentam que o colegiado deve ser formado a cada ato processual.
Para Renato, esse entendimento viola a necessidade de celeridade processual, de forma que
não é proporcional. Uma vez formado o colegiado, poderá decidir qualquer questão
processual posterior.

O juiz inicialmente competente é mantido no processo e a ele se somam mais dois


magistrados escolhidos por sorteio eletrônico. O juiz, portanto, não escolhe os demais juízes
que comporão o juízo colegiado.

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