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outra?
Sophus A. Reinert
3 de abril de 2020
Houve sucessos também; ela e sua sócia, Amanda Ibrahim, compraram uma
pequena fazenda, escolheram uma fábrica para fazer o processamento e
concluíram o primeiro produto que carregava a assinatura da Inganci: uma pasta
de tomate feita na Nigéria com os frutos cultivados localmente. Porém, ainda
faltava realizar uma venda com o nome de sua própria marca. A grafia do nome da
empresa saiu errada na embalagem, e Sonia e Amanda não tiveram outra opção
que não fosse vender seu produto a um concorrente.
Amanda deixara a Inganci havia alguns meses por uma empresa de consultoria em
Londres.
Esse era o plano desde o início, mas Sonia sentia falta de trabalhar com ela,
principalmente agora.
Sonia e Amanda foram colegas de faculdade de administração por dois anos. Elas
riam muito do fato de a empresa ter nascido no estacionamento de um
supermercado. Estavam empolgadas com um projeto de dimensionamento do
mercado nessa região que lhes fora atribuído1.
Sonia, então, compartilhou com a amiga sua ideia de criar uma empresa de pasta
de tomate que controlaria toda a cadeia de valor do produto, do cultivo das mudas
à embalagem — tudo feito na Nigéria. Amanda topou de imediato. Se elas
pudessem mostrar que uma empresa nigeriana era capaz de diminuir a perda pós-
colheita e aumentar o rendimento dos fazendeiros, conseguiriam reduzir o que
calculavam ser uma diferença de US$ 900 milhões na produção de tomates4. As
duas elaboraram um plano de negócio, buscaram investidores nos Estados Unidos
e na Nigéria e se mudaram para Kano após a formatura.
Essa era de fato uma boa notícia, mas era somente uma peça
do quebra-cabeça. Os “impostos” informais cobrados das
empresas por um grupo infindável de organizações locais,
estaduais e federais, juntamente com os custos exorbitantes de
transporte de produtos dentro do país, faziam com que os
gastos operacionais fossem muito maiores do que precisavam
ser7. Para que a Inganci fosse bem-sucedida, o governo
precisaria reduzir toda a burocracia, ou então as margens nos
produtos teriam de aumentar drasticamente. Volta-e-meia
Sonia perguntava a si mesma se a empresa alguma vez seria
tão bem-sucedida quanto ela e Amanda previram nas
planilhas.
Olhando nos olhos Kani, ela tinha de acreditar que seria. Ele
certamente acreditava.
OS PODEROSOS
Sonia ligou para um de seus amigos dos tempos de faculdade, Tendai Park, em
busca de conselho. Tendai trabalhava no LFM Capital desde que se formara.
Ao longo do último ano ele vinha insistindo com Sonia para que ela considerasse
a hipótese de ir para o LFM. Ele até a ajudou a preparar sua carta de apresentação. /
Sonia estava aliviada por poder ouvir a opinião de alguém de dentro da empresa.
Sonia suspeitava que Tendai a pressionaria a aceitar a oferta, mas achava que ele
seria um pouco mais sutil.
— Pense nisto: você teria segurança financeira garantida, melhor estilo de vida e
até a chance de voltar aos Estados Unidos de vez em quando, além de uma
posição que lhe permitiria influenciar a agricultura africana em grande escala9.
— Mas eu não seria uma empreendedora atuando in loco. Estaria respondendo aos
mais graúdos.
— Entendo. Porém, o LFM é um bom lugar para trabalhar e não tenho certeza de
que nossos chefes aqui são mais difíceis de lidar do que os burocratas nigerianos.
Sua visão sempre foi encorajar a segurança alimentícia e o desenvolvimento
econômico. Você causaria maior impacto se fizesse isso com o dinheiro e a
influência do LFM. Nossos executivos têm contato com políticos nigerianos,
ganeses e quenianos. Você também teria.
— Eu queria conseguir isso levando a Inganci até um ponto em que eu pudesse
deixá-la para assumir algo melhor. Ainda não chegamos a este ponto10.
— E acha que algum dia você vai chegar? — perguntou Tendai gentilmente. — É
você que está dizendo isso. Existe algum produtor doméstico capaz de competir
de fato com as importações chinesas? E se eles são capazes de fornecer pasta de
tomate mais barata para a Nigéria, o cidadão comum vai preferir produtos locais
mais caros?
— Os deles não são cultivados em solo próprio — disse ela. — Os nigerianos
merecem qualidade e os benefícios de produzir a comida que consomem.
— Você não precisa ser mártir, Sonia. Sei que seus investidores e financiadores a
apoiam, mas eles vão entender a sua decisão. Pergunte a si mesma se você é a
pessoa certa para encarar este desafio, e se a Inganci é a empresa certa.
/
Sonia: Acabei de falar com Tendai. Ele acha que devo ir para o
LFM.
Sonia: Não.
Ela precisa refletir bastante sobre o motivo que a fez querer fundar a Inganci
Tumatir. O sonho dela é fundar e gerir uma empresa? Ajudar pequenos
produtores? Transformar a agricultura da Nigéria? Um emprego no LFM pode
preparar o caminho para que ela consiga tudo isso.
Parece que a missão do LFM está em consonância com a dela: ajudar donos de
pequenas empresas. Na organização de investimentos ela pode fazer isso em
/
escala bem maior e com financiamento garantido, apoio e estrutura. E ainda
concentrar-se na Nigéria e na agricultura do país.
Do ponto de vista pessoal, acredito que Sonia se sentiria menos isolada. Ela
estaria cercada de colegas com a mesma mentalidade, residentes em Nairóbi,
cidade que conta com uma comunidade de expatriados. Além disso, receberia uma
boa renda em vez de ficar constantemente tentando angariar fundos de
investidores sem fazer muita coisa por si mesma.
A decisão não pode pautar-se pelo “ou isto ou aquilo”. Encerrar as atividades da
Inganci é apenas uma opção caso Sonia vá para o LFM. Outra é colocar a startup
em uma espécie de pausa e recomeçar sua atuação em alguns anos. Sonia pode
também contratar alguém para gerir a Inganci em seu lugar. E oferecer orientação
estratégica como consultora ou membro de conselho — e, com seu salário no
LFM, possivelmente oferecer apoio financeiro, mas sem ter de lidar com as
operações do dia a dia.
Foi esse o modelo que segui. Ingressei na McKinsey logo após sair da pós-
graduação. Estou na empresa há 20 anos. Lancei, orientei e fundei uma série de
startups ao mesmo tempo. Isso significa que não só ofereço consultoria a clientes,
mas também auxilio no crescimento de instituições que podem transformar o
continente. O principal é descobrir os parceiros certos: gente que se comprometa a
liderar instituições no dia a dia, que entenda as dinâmicas locais. Esses parceiros
precisam da capacitação operacional que não é ensinada nas faculdades de
administração — capacitação que Sonia está apenas começando a adquirir.
Meu conselho a Sonia: reflita sobre o propósito de sua vida e então decida se o
LFM pode ajudá-la a atingi-lo mais rápida e efetivamente do que a Inganci.
Sei exatamente o que ela está passando, uma vez que sua história é baseada na
minha. Comecei minha empresa de pasta de tomate em 2014. Imaginava que a
esta altura estaria administrando uma empresa grande e rentável, mas tudo levou
duas vezes mais tempo do que eu esperava. No momento, o objetivo é lançar
nosso produto em 2021 — sete anos depois de ter dado início àquela empreitada!
Tem sido uma jornada longa e desafiadora. Mas se conseguirmos colocar um
produto cultivado e produzido localmente nas prateleiras e nas nas mãos dos
clientes, que contam com muito mais recursos, meu senso de realização será
imenso.
Primeiro, ela parece ter paixão por empreendedorismo e por este empreendimento
em particular. Ela acredita no negócio e em sua capacidade de geri-lo. É seu bebê,
e ela claramente não está preparada para abandoná-lo.
Em segundo lugar, o melhor momento para ela administrar esse tipo de startup é
agora. Sonia é solteira e aparentemente não tem nenhuma dívida estudantil, por
isso seus entraves financeiros são mínimos. Seus amigos podem estar levando
uma vida pródiga nos Estados Unidos, na Europa e em algum outro lugar da
África, mas em que outro momento ela poderá morar em Kano e construir alguma
coisa do zero? O emprego no LFM, e outros similares, provavelmente ainda
estarão disponíveis em alguns anos. Talvez, aí, após ter provado do que é capaz,
Sonia receba uma oferta para ser vice-presidente ou diretora em vez de analista. /
O terceiro ponto é que acredito que os melhores aprendizados são os que obrigam
você a pôr a mão na massa. Erros serão cometidos e haverá contratempos, mas
eles nos ensinam a ser resilientes. E, como CEO de startup, ganha-se experiência
imensurável do mundo real. É muito mais difícil aprender a ser gestor trabalhando
em empresa de investimentos.
Imaginando que Sonia decida seguir com a Inganci, algumas ações lhe serão úteis
para aumentar suas chances de sucesso e para manter a saúde mental: reavaliar
regularmente seu plano de negócio, garantindo a viabilidade; contratar uma boa
equipe local a quem possa delegar tarefas; ter em mente que talvez progrida mais
devagar do que gostaria, dar tempo a si mesma para recuperar fôlego, relacionar-
se com os amigos e, consequentemente, sentir-se menos sozinha e estressada.
Dizem que toda startup é um fracasso até ser bem-sucedida, e como nunca se sabe
quando virá o sucesso, é preciso seguir tentando. Se eu tivesse notado desde o
início que passaria os primeiros dois anos morando em um viveiro de galinhas
adaptado sem eletricidade e sem salário, e que levaria sete anos para termos um
produto para vender, talvez eu não tivesse tido coragem de começar. Mas agora
que já estou aqui, jamais vou desistir. Sonia está na mesma situação; ela ama sua
empresa e deve seguir com ela.