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Problemas no preenchimento

da Declaração de Óbito:
estudo exploratório

Fabrício Martins Mendonça*


Eliane Drumond**
Ana Maria Pereira Cardoso***

Os dados do Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM) representam a


principal fonte de informações sobre mortalidade no Brasil, embora apresentem
com frequência alguma inconsistência. Uma dificuldade para a geração dos
dados de mortalidade confiáveis é o correto preenchimento da Declaração de
Óbito (DO), instrumento de alimentação de dados para o SIM. O artigo relata
estudo exploratório sobre problemas de preenchimento da DO, utilizando
abordagem semiqualitativa. A coleta dos dados foi realizada por meio de
entrevistas semiestruturadas e questionários estruturados aplicados a médicos. Os
resultados mostram que os principais problemas relacionados ao preenchimento
da DO são o desconhecimento médico acerca da importância do correto
preenchimento de todos os campos do formulário, a pouca utilização dos materiais
de instrução fornecidos aos médicos pelos órgãos e instituições responsáveis, o
desconhecimento sobre a importância do detalhamento e a adequação da cadeia
de eventos patológicos no campo das possíveis causas de morte.

Palavras-chave: Atestado de óbito. Registros de mortalidade. Sistemas de


Informação.

Introdução Ministério da Saúde, implantado no país a


partir de 1975.
Informações sobre mortalidade são O SIM, apesar de representar a principal
importantes para estudos epidemiológicos
fonte de dados sobre mortalidade no Brasil,
e demográficos da população de um país,
com visível aumento anual de sua abran-
bem como para planejamento e gestão
gência, enfrenta obstáculos para melhorar
de políticas e ações em saúde, tornando
imprescindível que sejam fidedignas, tem- a qualidade dos seus dados, principalmente
pestivas e acessíveis. em razão do preenchimento inadequado
Atualmente, os dados sobre mortalida- do seu documento padrão: a Declaração
de da população brasileira são produzidos de Óbito (DO), que é “documento-base
tanto pelo Instituto Brasileiro de Geografia do Sistema de Informação de Mortalidade
e Estatística (IBGE), quanto pelo Sistema (SIM) do Ministério da Saúde, utilizado
de Informação de Mortalidade (SIM) do pelos Cartórios para emissão da Certidão

* Mestre em Informática pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais – PUC-Minas, professor da Faculdade
Pitágoras, curso de Ciência da Computação.
** Doutora em Medicina/Epidemiologia pela Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG, pediatra e gerente de Epide-
miologia da Secretaria Municipal de Saúde e Assistência de Belo Horizonte – Gerência de Epidemiologia e Informação.
*** Doutora em Ciências/Comunicação pela Universidade de São Paulo – USP, professora da Pontifícia Universidade
Católica de Minas Gerais – PUC-Minas, no curso de Mestrado em Informática.

R. bras. Est. Pop., Rio de Janeiro, v. 27, n. 2, p. 285-295, jul./dez. 2010


Mendonça, F.M., Drumond, E. e Cardoso, A.M.P. Problemas no preenchimento da Declaração de Óbito

de Óbito”, segundo definição do Manual de Sobre o preenchimento dos campos da


Procedimentos do SIM (BRASIL, 2001a). DO, Niobey et al. (1990) afirmam que:
Tendo em vista que a DO constitui o Os médicos não se sentem responsáveis
instrumento padronizado pelo Ministério pelo preenchimento da parte ”menos nobre”
da Saúde para a coleta de dados de mor- da DO, referente ao nome do falecido, sua
talidade no Brasil pelo SIM, é importante a profissão, idade, residência; ficando para
realização de estudos que possam contribuir funcionários administrativos – ainda menos
comprometidos – a tarefa de completar es-
para o aprimoramento de seu preenchimen- ses campos.
to, com os consequentes reflexos sobre a
consistência das informações sobre morta- De maneira geral, os médicos preocu-
lidade no país. pam-se apenas em anotar as informações
sobre as causas e condições do óbito, que
A Declaração de Óbito e seu fazem parte do Bloco VI da DO, mas, ainda
preenchimento assim, as informações declaradas nesses
campos apresentam muitos problemas,
A DO é constituída por um formulário principalmente com relação à sequência
composto por nove blocos de variáveis, ou lógica correta de causas da morte, que,
nove agrupamentos de campos em comum muitas vezes, é declarada incorretamente.
(BRASIL, 2001b): Uma das razões da declaração incorreta
• Bloco I – Cartório (informações sobre o nos campos do Bloco VI é o fato de que,
cartório onde foi registrado o falecimento); muitas vezes, os médicos atribuem aos sin-
• Bloco II – Identificação (informações sócio- tomas ou modos de morrer a causa básica
demográficas do falecido); do óbito, declarando na DO, por exemplo,
• Bloco III – Residência (também faz parte do falência múltipla de órgãos. É por essa razão
grupo de informações sócio-demográficas
que, segundo Oliveira e Pereira (1997, apud
do falecido, mas foi desmembrado do
bloco anterior por questões operacionais); QUEIROZ, 2002), “um dos principais proble-
• Bloco IV – Ocorrência (informações sobre mas relacionados à qualidade dos dados
o local físico – incluído o estabelecimento da DO é o acentuado número de óbitos por
de saúde onde ocorreu o óbito); Sintomas e Sinais Mal-Definidos, declarados
• Bloco V – Óbito fetal ou menor de um ano devido à falta da avaliação das causas ou
(informações sobre a mãe e o falecido nos condições mórbidas que teriam levado ao
casos de óbito fetal ou óbito em menor de
um ano);
óbito”. Os óbitos registrados dessa maneira
• Bloco VI – Condições e causas do óbito são classificados como diagnósticos incom-
(informações sobre óbitos de mulheres pletos, segundo Jorge et al. (2002).
em idade fértil, assistenciais e sobre as O processo de instrução aos médicos
condições e causas que provocaram o para o preenchimento da DO inicia-se ainda
óbito); na faculdade, durante sua formação, e, algu-
• Bloco VII – Médico (informações básicas mas vezes, tem continuidade nos locais de
sobre o médico que assina a DO);
trabalho, tais como hospitais, ambulatórios,
• Bloco VIII – Causas externas (prováveis
circunstâncias de morte não natural); etc. O Ministério da Saúde disponibiliza aos
• Bloco IX – Localidade sem Médico (óbitos médicos documentos-padrão, contendo
ocorridos em localidades onde não exista instruções para o adequado preenchimento
médico). da DO, como o Manual de Instruções para
Com exceção do Bloco I, que deve ser o Preenchimento da Declaração de Óbitos
preenchido exclusivamente pelo Cartório (BRASIL, 2001b), elaborado pela Fundação
de Registro Civil, todos os demais blocos Nacional de Saúde (Funasa), em 2001, e,
de variáveis devem ser preenchidos pelo mais recentemente, em 2006, a Cartilha do
médico, que “tem responsabilidade ética e CFM (BRASIL, 2006), produzida em parceria
jurídica pelo preenchimento e pela assina- pelo Secretariado de Vigilância em Saúde,
tura da DO, assim como pelas informações o Conselho Federal de Medicina e o Centro
registradas em todos os campos desse Colaborador da Organização Mundial da
documento” (BRASIL, 2006). Saúde. Esses documentos estão disponíveis

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para acesso por meios eletrônicos e/ou são problemas de preenchimento da DO, e
distribuídos aos médicos em formato de aplicados aos médicos de hospitais de BH
cartilhas impressas. participantes de eventos médicos realizados
ao longo de 2009.
Metodologia Buscou-se, assim, validar os principais
problemas relatados pelos médicos no
Com o objetivo de identificar e analisar preenchimento da DO, que influenciam ne-
os problemas observados pelos médicos gativamente na qualidade dos dados sobre
no preenchimento das DO, foi realizado mortalidade do Brasil.
estudo exploratório, com adoção de técni- A Figura 1 apresenta as etapas seguidas
cas semiqualitativas de pesquisa e apoio para coleta de dados e sua análise para
nos pressupostos da teoria baseada em atingir os resultados relatados no presente
evidências (grounded theory). De acordo artigo.
com Sarker et al. (2001, p.38), a teoria ba- É importante destacar que apenas foram
seada em evidências permite desenvolver considerados informantes, para efeito da
a compreensão teórica de novas formas de análise e resultados do estudo, os médicos
percepção e comportamentos com base nas que declararam explicitamente já terem
experiências dos indivíduos que por elas preenchido declarações de óbito em seu
passam ou passaram. exercício profissional.
A escolha desse enfoque objetivou O primeiro passo para realização da
entender como os médicos, agentes do pre- pesquisa foi o estudo de documentos-pa-
enchimento da DO, atuam neste contexto. drão do Ministério de Saúde sobre o tópico,
O cenário atual de deficiências no processo especificamente o Manual de Instruções
de preenchimento do formulário da DO é para Preenchimento da DO, o Manual de
essencialmente um fenômeno sociocultural, Procedimentos do SIM e a Cartilha do CFM,
totalmente dependente do contexto em que além da revisão de trabalhos publicados so-
está inserido, e vai muito além da simples bre o preenchimento da DO pelos médicos
utilização de um sistema de informação para e a qualidade das informações.
coleta desses dados. Como resultado dessa etapa inicial,
Por se tratar de um estudo exploratório, elaborou-se o primeiro questionário, conten-
utilizou-se como pressuposto epistemo- do oito questões sobre dificuldades encon-
lógico o paradigma interpretativista, na tradas pelos médicos para preenchimento
tentativa de compreender o problema do da DO, acesso a algum tipo de orientação/
preenchimento do formulário da DO sob a instrução para esse preenchimento e a
ótica das pessoas diretamente envolvidas, forma como estes profissionais preenchem
procurando entender o significado que alguns dos campos do formulário.
essas pessoas dão a tal tarefa e como elas Este primeiro questionário foi aplicado
influenciam e são influenciadas pelo contex- a médicos de um hospital de grande porte
to sociocultural em que trabalham. da rede pública, referência para atendimento
Para efetivação da proposta e nos de doenças infecciosas em Minas Gerais,
marcos da teoria baseada em evidências, localizado em Belo Horizonte. Os médicos
o processo de coleta de dados foi realizado participavam de atividade de formação em
em etapas sucessivas, em que cada uma serviço, que consistiu em palestra de orien-
subsidiava a seguinte para aprimoramento tação e sensibilização para o preenchimento
dos instrumentos de coleta de dados. Ini- da DO, realizada no próprio hospital.
cialmente, foram realizadas entrevistas es- A partir dos resultados do primeiro
truturadas e semiestruturadas com médicos questionário, foi realizada nova entrevista
e profissionais da área de epidemiologia da individual semiestruturada com epide-
Secretaria Municipal de Saúde e Assistência miologista da Secretaria Municipal de
(SMSA) de Belo Horizonte e, posteriormente, Saúde e Assistência, com vistas ao ajuste
foi usada a técnica de questionários, em e refinamento das questões inicialmente
três versões elaboradas com o foco nos propostas.

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FIGURA 1
Arquitetura da metodologia para coleta e análise dos dados

Hospital da rede
pública de Belo
Horizonte
Faculdade de
Medicina UFMG
Revisão de
literatura e
1
documentos 2 3 5

1 3 4

Entrevista 1° questionário Entrevista 2° questionário


semiestruturada semiestruturada

7
7
7 3° questionário

Análise dos
dados coletados 8
Análise e
resultados

Fonte: Mendonça (2009).

Surgiu, desta forma, uma segunda ver- curso organizado pela Comissão de Resi-
são do questionário, com perguntas mais dência Médica do Hospital das Clínicas da
representativas sobre as dificuldades de UFMG (Coreme), que contou com a partici-
preenchimento da DO, além da adoção de pação de médicos residentes de diferentes
uma linguagem mais próxima da utilizada especialidades, tanto do Hospital das Clíni-
pelos médicos. cas quanto de outros hospitais da cidade.
Os tópicos abordados no segundo As observações feitas na ocasião da
questionário abrangiam o conhecimento dos aplicação e tabulação dos dados obtidos
médicos sobre a Cartilha do CFM e o Manual com o segundo questionário conduziram à
de Instruções para Preenchimento da DO e a elaboração do terceiro questionário. Foram
eventual consulta às informações ali contidas, agregadas questões sobre a formação dos
assim como as práticas adotadas para o médicos entrevistados, sua bagagem aca-
preenchimento dos campos de identificação dêmica e o número de óbitos declarados
do falecido (Bloco II), exame complementar, por cada médico no ano anterior ao da
condições e causas do óbito (Bloco VI), entrevista, bem como dados relativos aos
incluindo a percepção dos médicos sobre problemas ou dificuldades enfrentados por
as diferenças entre sintomas ou modos de eles para preenchimento da DO.
morrer e causas básicas de morte, óbitos Este terceiro questionário, do mesmo
provocados por causa externa (não natural) modo que o anterior, também foi aplicado
e também óbitos causados por Aids. durante o curso de ética médica para os
O segundo questionário foi aplicado na médicos residentes, mas com outro grupo
Faculdade de Medicina da UFMG, durante de participantes.

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No total das três versões, foram apli- ter recebido algum tipo de informação a
cados 63 questionários, dos quais exclu- esse respeito, enquanto os outros 20%
íram-se aqueles cujos respondentes não mencionaram nunca ter recebido qualquer
atendiam à condição inicial de já haver instrução. Esta resposta surpreende, uma
preenchido alguma DO durante seu exercí- vez que é comumente aceito que este tipo
cio profissional, resultando 44 questionários de orientação faz parte da formação médica,
válidos, que compuseram, efetivamente, o ainda no ambiente acadêmico.
quadro analisado. Sobre os documentos publicados pelo
De posse dos dados coletados por Ministério da Saúde para instrução quanto
meio dos questionários, passou-se à sua ao preenchimento da DO, 50% dos médicos
codificação, com geração de gráficos, para afirmaram conhecer o Manual de Instruções
representar os resultados obtidos. Essa pe- para o Preenchimento, ao passo que outros
núltima etapa da metodologia criou as con- 40% disseram não conhecê-lo. Outros 10%
dições necessárias para realizar a análise e omitiram sua resposta. Este é um dado a ser
discussão dos resultados obtidos durante considerado com atenção, pois se trata de
a fase de coleta de dados desta pesquisa. um documento de referência para consulta
dos médicos, em caso de dúvidas no mo-
Resultados e sua discussão mento da declaração do óbito.
O preenchimento dos campos do Grupo
Uma vez que cada questionário teve II, onde é feita a identificação do indivíduo fa-
sua especificidade e foi aplicado a grupos lecido, foi outro problema identificado: 70%
distintos de médicos, a análise e a discus- mencionaram que esse registro é realizado
são dos resultados serão apresentadas de por um funcionário administrativo, contra
forma separada. apenas 30% que afirmaram preencher, eles
próprios, esses campos. Esta constatação
O primeiro questionário comprova afirmações de trabalhos anterio-
res, como o de Niobey et al. (1990).
O primeiro instrumento para coleta Outro campo do formulário da DO cujo
dos dados teve como objetivo identificar preenchimento é muitas vezes omitido pelos
possíveis dificuldades para preenchimento médicos refere-se ao “Tempo aproximado
da DO e, como um pré-teste, possibilitar entre o início da doença e a morte”: 90%
a elaboração de questionários mais bem dos respondentes afirmaram não preencher.
direcionados ao tema. Ainda assim, foram Esse, também, é um dado preocupante, pois
obtidos resultados significativos sobre tal informação permite elaborar a sequência
alguns dos problemas de preenchimento, lógica correta de causas de morte que leva-
conforme relatado pelos médicos. ram o indivíduo à morte. Sua ausência induz
A maioria (80%) dos respondentes a falhas na sequência correta que deve ser
declarou que o fato de as instruções declarada.
para o preenchimento dos campos do Sobre o campo “Exame Complemen-
formulário da DO não estarem claramente tar”, apenas 60% dos médicos indicaram
definidas constitui a principal dificuldade, preenchê-lo, portanto, existe um número
já que provocam dúvidas no momento do elevado de médicos que não atende ao
preenchimento. Esta constatação sugere solicitado pela DO.
que é necessária uma revisão da forma de
apresentação dos campos no formulário e O segundo questionário
o significado de cada um deles.
Para 20% dos médicos respondentes, a Um conjunto de 18 médicos respondeu
principal dificuldade para o preenchimento ao segundo questionário. Destes, apenas
da DO reside na falta de informações sobre um afirmou nunca ter recebido orientação
o diagnóstico do paciente. sobre o preenchimento da DO. Essas ins-
Quanto à orientação para preenchi- truções são, normalmente, fornecidas a
mento da DO, a maioria (80%) afirmou já eles tanto na faculdade onde se formaram,

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quanto nas instituições de saúde onde tra- Segundo 81% dos médicos entrevista-
balham diuturnamente. dos, a maior dificuldade reside na ausência
Apesar de haver instruções distribuídas de informações sobre o diagnóstico do pa-
pelo Conselho Federal de Medicina (CFM) ciente. Em segundo lugar (19%) encontra-se
e pelo Ministério da Saúde, para o correto a forma como os campos estão definidos
preenchimento da DO, os dados coletados no formulário da DO. Não há nenhuma
indicam que a consulta a essa forma de indicação relacionada com a inexistência
orientação ainda não conseguiu atingir uma ou pouca instrução para o preenchimento,
receptividade alta entre os médicos, como uma vez que, do ponto de vista desses
pode ser visto no Gráfico 1. respondentes, eles são detentores de sufi-
Verifica-se que, dos 18 médicos res- ciente entendimento sobre a forma correta
pondentes, 13 (75%) não conhecem o de registrar os óbitos. É possível interpretar
Manual de Instruções, enquanto 11 (60%) que aos médicos passam despercebidas
não conhecem a Cartilha do CFM. Ainda as inconsistências causadas pelo preen-
que este dado possa ser relativizado, em chimento parcial e/ou insatisfatório da DO,
função do pequeno número de responden- que são detectadas por epidemiologistas e
tes, acrescido ao fato de serem médicos outros pesquisadores que buscam no SIM
residentes e, portanto, com pouca experi- elementos para compreender o quadro real
ência profissional, trata-se de uma evidência da mortalidade no país.
preocupante o desconhecimento desses A conjunção dos dados apresentados
médicos, recém-formados, a respeito dos permite que se afirme que os médicos
documentos básicos de instruções para o desconhecem a função concreta da DO,
correto preenchimento da DO. tratando seu preenchimento como mera
Pode-se concluir que são necessá- exigência burocrática, descolada da prática
rias ações para maior disseminação das profissional da medicina.
informações desses documentos entre os Outro ponto tratado pelo estudo e que
estudantes e profissionais de medicina e vem corroborar as observações relatadas
para incentivo aos médicos quanto ao seu no item anterior diz respeito à identificação
uso, pois só assim será alcançada uma boa da causa básica de morte, como foi visto
qualidade nos dados contidos na DO e, por- em Oliveira e Pereira (1997 apud QUEIROZ,
tanto, nos dados disponibilizados pelo SIM. 2002) e em Jorge et al. (2002). O Gráfico 2
É interessante comparar estas obser- apresenta os resultados referentes aos sin-
vações com os resultados obtidos sobre a tomas ou modos de morrer considerados,
percepção dos médicos acerca da principal pelos médicos, uma causa básica de morte.
dificuldade enfrentada para o preenchimen- Esperava-se que nenhum desses sinto-
to da DO. mas ou modo de morrer fosse mencionado

GRÁFICO 1
Distribuição dos médicos, segundo conhecimento sobre os documentos de orientação
para o preenchimento da DO

Fonte: Mendonça (2009).

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como causa básica de morte, mas, pelos óbitos por Aids, a existência de preconceitos
dados coletados, apenas um médico enten- e estigma social acarretados por esta doença
deu desta forma. A maior parte considerou pode levar a situações de mascaramento,
o choque (35%) e a insuficiência respiratória como relatado por Lemos et al. (2001). No
(30%) como causas básicas de morte, o que grupo estudado, nenhum médico afirmou
está em flagrante contradição com a con- declarar outra causa de morte em lugar da
cepção dos campos da DO. As respostas Aids, embora em alguns casos eles registrem
obtidas demonstram que o entendimento essa causa escrevendo a sigla em português
dos médicos sobre as expectativas quanto (Sida), ou o nome da doença por extenso.
ao registro na DO das causas básicas de Já os dados coletados em relação ao
morte ainda precisa de aprimoramento, o preenchimento dos campos de identifica-
que pode ser solucionado com uma leitura ção do falecido (Grupo II), apresentados
mais atenta dos documentos de orientação, no Gráfico 3, comprovam que a qualidade
além da inclusão do tema nos currículos mé- das informações produzidas pelo SIM pode
dicos e de palestras direcionadas a esse fim. ser distorcida devido à divisão de respon-
Não foram identificadas percepções dis- sabilidades sobre o preenchimento desses
torcidas dos médicos em relação aos dados campos, ou ao seu processamento em
coletados sobre o registro de óbitos quando momentos/espaços diferentes dentro da
a causa de morte é a Aids, trauma antigo (que instituição de saúde, ou ainda à desatenção
caracteriza uma morte por causa externa) ou pelas informações “menos nobres” no dizer
causa de morte indeterminada. No caso dos de Niobey et al. (1990).

GRÁFICO 2
Distribuição dos médicos, segundo sintomas ou modos de morrer indicados como causa básica de morte

Fonte: Mendonça (2009).

GRÁFICO 3
Distribuição dos médicos, segundo a indicação das pessoas que preenchem os campos de identificação do
falecido – (Grupo II) da DO

Fonte: Mendonça (2009).

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Aproximadamente 28% dos médicos em evento promovido pela Faculdade de


declararam que nas instituições de saúde Medicina desta universidade.
em que trabalham os campos de identi- Um importante dado mapeado foi o
ficação do Grupo II são preenchidos por local onde os médicos entrevistados rece-
outros profissionais: 17% mencionaram beram orientação sobre o preenchimento
um funcionário administrativo; e os outros da DO. A maioria (60%) declarou haver
11% disseram que isso é feito por outras recebido tais instruções na faculdade
pessoas, cujo cargo não foi mencionado. onde se formou, sendo que alguns (27%)
afirmaram continuar a receber orientações
O terceiro questionário no serviço de residência médica do Hos-
pital onde trabalham. No entanto, 13% dos
Os resultados obtidos com a aplicação participantes disseram nunca ter recebido
do terceiro questionário possibilitaram o ma- qualquer instrução sobre o preenchimento
peamento das características dos médicos da DO, nem mesmo na faculdade, e con-
respondentes, que, em sua maioria, eram firmaram já terem realizado o registro de
profissionais do Hospital das Clínicas da óbitos pela DO.
UFMG. Também puderam ser comprovadas Também havia perguntas dirigidas às
algumas das dificuldades anteriormente percepções dos médicos em relação aos
identificadas. problemas identificados para o preen-
Com relação às características dos chimento da DO, visando complementar
médicos, a primeira foi a sua especialidade. informações obtidas com o segundo ques-
Havia uma grande diversidade delas entre tionário. Os novos respondentes apresen-
os participantes, com predominância da taram uma visão complementar à anterior,
Ginecologia-Obstetrícia (32%). O objetivo destacando inclusive aspectos específicos
dessa pergunta foi apenas descrever um do formulário da DO, antes não mencio-
aspecto desses profissionais, não se bus- nados. Os resultados obtidos podem ser
cando, nesse trabalho, nenhuma relação observados no Gráfico 4.
entre a especialidade médica e o correto É possível perceber que, embora parte
ou incorreto preenchimento da DO pelos dos médicos (32%) não tenha problemas
médicos. para preencher a DO, 68% relataram algu-
Também foi identificada a instituição ma dificuldade em fazê-lo. Trata-se de um
de ensino em que esses médicos se for- percentual alto, que justifica a ampliação do
maram. Observou-se a predominância de debate sobre este tema. Os problemas men-
profissionais formados pela UFMG (52%). cionados pelos médicos no preenchimento
Esse resultado já era esperado, uma vez da DO foram agrupados nas seguintes
que o questionário elaborado foi aplicado categorias: 31% indicaram a grande quan-

GRÁFICO 4
Distribuição dos médicos, segundo tipo de dificuldade sentida para preencher a DO

Fonte: Mendonça (2009).

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tidade de campos a serem preenchidos no identificou aspectos problemáticos no pro-


formulário; 16% alegaram problemas decor- cesso de preenchimento da DO. Os pontos
ridos das incertezas ao se tratar de causa levantados pelo estudo permitem esboçar
de morte violenta ou externa; 11% citaram uma situação que deve ser considerada
que as explicações para o preenchimento em discussões acerca do aprimoramento
da DO são pouco claras; 5% apontaram dos sistemas de informação em saúde no
questões relacionadas às imposições de Brasil, bem como orientar a preparação de
cada cartório (onde a DO é instrumento para material instrucional acerca do registro das
obtenção da certidão de óbito que possibilita informações sobre mortalidade, direcionado
o sepultamento); e outros 5% justificaram a médicos, estudantes de medicina e ges-
ter dificuldades quando exercem o papel tores de saúde.
de médico substituto. As informações coletadas por esta pes-
A grande quantidade de campos da quisa representam também um instrumento
DO e a falta de informações sobre o pa- importante de análise do preenchimento da
ciente foram apontadas como os principais DO. Os resultados aqui obtidos mostram
problemas enfrentados pelos médicos no que os principais problemas relacionados
preenchimento das DO. Essas duas dificul- ao correto preenchimento da DO são de-
dades se complementam e mostram que correntes:
apenas com informações suficientes e com • do próprio formulário (grande núme-
a melhoria no nível de detalhamento das
ro de campos a serem preenchidos);
causas diagnosticadas de morte para o
óbito registrado os médicos terão condições • das falhas na disseminação de
de melhorar a qualidade das informações instruções referentes ao preenchi-
contidas na DO. mento desses campos;
• da falta de informações suficientes
Discussão nas mãos dos médicos para regis-
trarem o óbito;
A metodologia utilizada neste trabalho • da necessidade de melhorias no
(entrevistas individuais semiestruturadas nível de conhecimento dos médicos
com médicos e epidemiologistas e a aplica- sobre o adequado detalhamento
ção de questionários estruturados) permitiu das possíveis causas de morte que
coletar as percepções dos médicos sobre determinaram o óbito em registro,
os problemas envolvidos no preenchimento principalmente no que diz respeito
da DO. A opção pela abordagem segundo à causa básica;
os pressupostos da teoria baseada em
evidências, dentro de uma perspectiva in- • do desconhecimento por parte dos
terpretativista, possibilitou a construção de médicos da importância do ade-
conhecimento junto aos atores do processo quado e completo preenchimento
examinado, destacando aspectos e percep- do formulário para a veracidade
ções subjetivas que interferem, em última e consistência das informações
análise, na qualidade das informações dis- coletadas pelo SIM.
ponibilizadas pelo SIM. Trata-se de um estu- O cenário de problemas apresentado
do conduzido de forma inovadora, uma vez sobre o preenchimento da DO mostra como
que esse tipo de abordagem diferencia-se a qualidade das informações declaradas
da maioria das pesquisas sobre este tema, ainda necessita de melhorias. A situação
baseadas em abordagens quantitativas e detectada e descrita aponta para ações
que privilegiam métodos estatísticos para concretas a serem implementadas pelas
condução da análise. instâncias competentes.
Ainda que as conclusões desse estudo O Ministério da Saúde, como responsá-
fundamentem-se em uma diminuta amos- vel pela elaboração e distribuição das DO,
tra de médicos pesquisada, o propósito deveria promover a revisão e o aprimora-
buscado foi alcançado, na medida em que mento dos campos de preenchimento deste

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formulário, reforçando, ao lado dos órgãos para tal. Esta é sem dúvida uma medida
e instituições responsáveis – Conselho Fe- necessária para elevar a qualidade da infor-
deral de Medicina, instituições de ensino e mação obtida com a utilização do SIM em
de saúde – as ações já desenvolvidas junto todo país, um subsídio importante para as
aos médicos sobre a importância do seu decisões e ações que objetivem a melhoria
adequado preenchimento, instruindo-os do estado de saúde da população brasileira.

Referências

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Resumen

Problemas en la cumplimentación de la declaración de defunción (DO): estudio exploratorio

Los datos del Sistema de Información sobre Mortalidad (SIM) representan la principal
fuente de información sobre mortalidad en Brasil, aunque presenten con frecuencia alguna
inconsistencia. Una dificultad para la generación de datos de mortalidad fiables es la correcta
cumplimentación de la Declaración de Defunción (DO), instrumento de alimentación de datos
del SIM. El artículo versa sobre un estudio exploratorio acerca de problemas de cumplimentación
de la DO, utilizando un enfoque semicualitativo. La recogida de datos fue realizada mediante
entrevistas semiestructuradas y cuestionarios estructurados aplicados a médicos. Los resultados
muestran que los principales problemas relacionados con la cumplimentación de la DO son el
desconocimiento médico, acerca de la importancia de la correcta cumplimentación de todos
los campos del formulario; la poca utilización de los materiales de instrucción proporcionados
a los médicos por los órganos e instituciones responsables; el desconocimiento sobre la
importancia de documentos detallados y la adecuación de la cadena de eventos patológicos
en el campo de las posibles causas de muerte.
Palabras-clave: Certificado de defunción. Registros de mortalidad. Sistemas de Información.

Abstract

Problems filling out death certificates: exploratory study

Data from the Brazilian Mortality Information System (SIM, in Portuguese) represent the
main source of information on mortality in Brazil, even though the system contains many
inconsistencies. One difficulty in generating reliable data on mortality is the correct filling
out of death certificates (DOs), which are source instruments for the SIM system. This article
describes an exploratory study on problems related to the filling out of DOs, using a semi-
qualitative approach. The data was collected in semi-structured interviews and questionnaires
with medical doctors. The results show that the main problems related to filling out DOs are
lack of medical information regarding the importance of the correct filling out of all the fields
on the form, the limited use of the instructions issued by responsible organs and institutions,
and lack of knowledge as to the importance of certain details and descriptions of the chain of
pathological events in the field of possible causes of death.
Keywords: Death certificate. Death records. Information systems.

Recebido para publicação em 02/04/2010


Aceito para publicação em 26/05/2010

R. bras. Est. Pop., Rio de Janeiro, v. 27, n. 2, p. 285-295, jul./dez. 2010 295

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