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2012
Monografia da Disciplina
Doutorado
Área de Concentração: Planejamento Urbano e Regional
1. Introdução
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Atualmente, no Brasil, são definidos como “cidades médias”, grosso modo, aqueles municípios com
população entre 100.000 e 500.000 habitantes. Esta definição demográfica é utilizada por parte da
bibliografia aqui utilizada, caso dos trabalhos de Andrade e Serra (2001) e Braga (2005). Entretanto,
outras questões também se fazem importantes, como suas características funcionais ou o fato de se
constituírem como elos de ligação entre os centros locais e os centros globais (CASTELLO BRANCO,
2006, p.245-6). Assim, a definição de cidade média estaria condicionada a outros fatores qualitativos tão
ou até mais importantes que aqueles de ordem quantitativa. No início do século XXI o debate acerca
dessa definição conceitual ganhou novo fôlego, dada a importância crescente dos municípios de médio
porte não-metropolitanos. Amorim Fº e Serra (2001) identificavam três condições que responderiam à
definição: aqueles que cumprissem a função de articuladoras de “eixos ou corredores de transportes e
desenvolvimento”; constituíssem “pivôs de articulação” na estruturação de redes urbanas regionais ou
nacionais; e que tivessem papel relevante na atração e constituição de “polos tecnológicos”, inserindo-se
na nova economia baseada no chamado “terciário avançado” (AMORIM Fº & SERRA, 2001, p.28-9).
Castello Branco (2006) procurou estabelecer uma base de critérios quantitativos que, em conjunto,
definissem o conceito: tamanho populacional e econômico, grau de urbanização, centralidade e qualidade
de vida (CASTELLO BRANCO, 2006, p.249). Na falta de uma definição consensual e conceitualmente
precisa, parece-nos que o recorte pela referida faixa demográfica, associado à sua localização geográfica
e ao papel desempenhado por determinadas cidades na articulação de redes urbanas mais amplas
permite estabelecer o entendimento a respeito da referida tipologia urbana.
Por fim é apresentado um quadro das transformações e impactos produzidos
pelas dinâmicas observadas no período que se inicia na década de 1970 sobre as
cidades médias do interior paulista. Nessa seção o foco recai sobre as dinâmicas
urbanas e regionais e o papel desempenhado por essas cidades na articulação de
redes mais amplas, território do desenvolvimento industrial contemporâneo no Brasil.
Naquele ano o interior de São Paulo – compreendido pelo estado de São Paulo
exceto os municípios hoje integrantes da RMSP - Região Metropolitana de São Paulo
– apresentava-se como a terceira força em termos de participação nacional no VTI -
Valor de Transformação industrial, com 14,7% do total (quase igual ao seu percentual
de 1939, que era de 14,4%, quando já ocupava essa posição relativa); à época a
indústria de transformação da RMSP representava 43,5% do VTI nacional, secundado
pelo do estado do Rio de Janeiro, com 15,5%, praticamente igual ao do conjunto do
interior paulista. Ressalte-se que o ano de 1970 representa o ápice da concentração
industrial no estado de São Paulo, com este apresentando 58,2% do total do VTI
nacional.
Como se pode perceber a partir dos dados expostos na Tabela 3.1, o interior
paulista já apresentava significativa produção industrial a essa época, resultado do
processo histórico de constituição de seu espaço econômico, fornecendo as bases
para sua futura expansão econômica a partir dessa data, ultrapassando o estado do
Rio de Janeiro já em 1975 e chegando aos anos 2000 como o mais importante espaço
industrial brasileiro, representando cerca de um quarto da indústria de transformação
nacional.
Tabela 3.1 – Indústria de Transformação: participação regional no VTI – 1939/2004
1939 1949 1959 1970 1975 1980 1985 1989 1995 1996 2004
Norte * 1,1 0,7 0,9 0,8 1,3 2,4 2,5 *** *** 4,2 5,0
Nordeste 10,9 9,1 6,9 5,7 6,6 8,1 8,6 8,1 8,1 7,3 8,5
Minas Gerais 7,6 6,6 5,8 6,5 6,3 7,7 8,2 8,2 8,8 8,4 9,9
Espírito Santo 0,3 0,4 0,3 0,5 0,6 0,9 1,2 *** *** 1,1 1,6
Rio de Janeiro 25,5 20,6 17,6 15,5 13,5 10,6 9,5 10,3 8,6 8,1 8,1
São Paulo 40,7 48,9 55,6 58,2 55,9 53,4 51,9 50,2 49,8 50,9 43,1
RMSP ** 26,3 32,4 41,0 43,5 38,8 33,6 29,4 28,8 25,4 27,3 16,9
Interior ** 14,4 16,5 14,6 14,7 17,1 19,8 22,5 21,4 24,4 23,6 26,2
Paraná 2,3 2,9 3,1 3,1 4,0 4,4 4,9 5,3 5,5 5,4 7,0
Santa Catarina 2,1 2,4 2,2 2,6 3,3 4,1 3,9 4,0 4,4 4,6 5,0
Rio Grande do
9,1 7,9 7,0 6,3 7,5 7,3 7,9 7,8 8,2 7,9 8,2
Sul
Centro-Oeste * 0,4 0,5 0,6 0,8 1,0 1,1 1,4 *** *** 2,2 3,6
Notas:
* A partir de 1989 Norte inclui Tocantins e Centro-Oeste exclui Tocantins
** RMSP e Interior: estimados em 1939 pelo Valor de Produção; 1949/85: Censos Industriais; a partir de
1989: participações calculadas sobre o total do estado de São Paulo, com base no Valor Adicionado
Fiscal informado pela SESP e FSeade.
*** Por resíduo (100% - regiões calculadas): Norte + Espírito Santo + Centro-Oeste teria 6,1 em 1989 e
6,6 em 1995
Cano (2008) vai definir o período entre 1970 e 1980 como de desconcentração
virtuosa, com o PIB das demais regiões brasileiras crescendo mais que o de São
Paulo (8,1% a.a. contra 10,2% a.a. do resto do país). Ainda segundo ele, essa
desconcentração apresentava dois movimentos: de São Paulo em direção às outras
regiões do país, e da Grande São Paulo em direção ao interior paulista. Além disso,
essa expansão econômica teve por base o crescimento do setor secundário,
especialmente os segmentos de bens intermediários (10,6% a.a.) e o de bens de
consumo durável e de capital (11% a.a. no período), fortemente impulsionados pelos
projetos dirigidos ou impulsionados pelo II PND – Plano Nacional de Desenvolvimento
(CANO, 1985, p.65).
Essa forte expansão industrial perde fôlego ao fim da década, entrando num
processo francamente recessivo no começo dos anos 1980, quando a indústria de
transformação paulista declinou 7,1% entre 1980 e 1985. Na chamada “década
perdida” a desconcentração industrial teve continuidade menos por uma expressiva
expansão da periferia nacional que pela estagnação, quando não retração, do polo
econômico paulista, uma vez que a indústria de transformação de São Paulo cresceu
a taxas medíocres de 0,2% a.a. entre 1980 e 1989, ao passo que no restante do país
as taxas foram de 1,5% a.a. A retração industrial na metrópole veio acompanhada, por
outro lado, de uma diversificação do setor terciário. O interior paulista também foi
afetado pela crise; contudo, passou por reestruturação agrícola e agroindustrial ao
longo do período, sendo objeto, ainda, da implantação de segmentos industriais
modernos na região de Campinas e no Vale do Paraíba, sendo o grande beneficiado
pela desconcentração industrial da Grande São Paulo (CANO, 1985, p.119-20), como
pode ser observado no Mapa 3.1.
Mapa 3.1 – Expansão da indústria no estado de São Paulo e sua localização no Sudeste
Quanto a este último ponto, cabe ressaltar que a piora considerável das
condições ambientais, decorrentes da poluição gerada pela concentração industrial na
metrópole, acabaram por fomentar a criação da Cetesb – Centro Tecnológico de
Saneamento Básico (atualmente, Companhia Ambiental do Estado de São Paulo) em
1968, tornando-se “importante instrumento de controle de ampliação ou instalação de
unidades industriais” por meio do controle de seus impactos ambientais (NEGRI, 1996,
p.182).
Não apenas o interior paulista, mas, de modo geral, toda a periferia nacional,
cresceu a taxas mais elevadas que a metrópole a partir de meados dos anos 1970
fruto das políticas de investimento federais, consubstanciadas no II PND, última
grande reflexão em termos de desenvolvimento regional para o Brasil (COUTINHO,
2003, p.41).
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Americana, Andradina, Araçatuba, Araraquara, Araras, Assis, Avaré, Barretos, Bauru, Bebedouro,
Bragança Paulista, Botucatu, Catanduva, Cubatão, Fernandópolis, Franca, Itapetininga, Itapeva,
Jaboticabal, Jaú, Limeira, Lins, Marília, Mogi-Mirim, Mogi-Guaçu, Ourinhos, Pinhal, Piracicaba, Presidente
Prudente, Registro, Ribeirão Preto, Rio Claro, São Carlos, São João da Boa Vista, São José do Rio Preto,
São Vicente, Sorocaba, Tatuí, Tupã e Votuporanga.
.
peso elevado das cidades paulistas é fortemente reduzido nas etapas seguintes do
programa (STEIBERGER & BRUNA, 2001, p.53-4).
Com escopo muito mais tímido que as PNDs dos anos 1970 foi desenvolvida,
no começo dos anos 2000, a PNDR – Política Nacional de Desenvolvimento Regional,
tendo por objetivos, por um lado, o enfrentamento às desigualdades regionais e, por
outro, o aproveitamento dos potenciais regionais endógenos (ARAÚJO & GALVÃO,
2004). Ainda que não tenha dado origem a ações integradas ou orientado políticas de
investimento de grande porte, a PNDR mostra-se interessante pelo diagnóstico
elaborado para o Brasil em nível microrregional, permitindo observar os resultados das
transformações produtivas em termos espaciais a partir do quadro registrado no início
do século XXI.
Não por acaso o II PND, ao propor uma política de desenvolvimento com foco
na interiorização do desenvolvimento, incluiu o fortalecimento das cidades médias
como uma das ações necessárias ao desenvolvimento econômico. Decorrência disso
é o fato de mais da metade das cidades contempladas com recursos na primeira etapa
do Programa Cidades Médias ser representada por centros de porte médio do interior
paulista.
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Entendida como economias de escala, economias de localização e economias de urbanização
(ANDRADE & SERRA, 2001, p.132).
Como observaram Amorim Fº e Serra (2001), a partir da década de 1970 o
sistema urbano nacional evoluiu rapidamente em direção a uma situação
“hierarquicamente mais equilibrada” (p.11). O estudo “Caracterização e Tendências da
Rede Urbana do Brasil”, realizado em 1999 pelo IPEA – Instituto de Pesquisa
Econômica Aplicada, pelo IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística e pela
UNICAMP, aponta essas mudanças. Nesse estudo foi constatada uma maior
“interiorização da rede urbana”, com a difusão do “fenômeno das aglomerações
urbanas” (MOTTA & AJARA, 2000, p.20). A análise acerca da nova configuração da
rede urbana brasileira indicava que ela tinha
No estado de São Paulo as cidades médias vêm aumentando seu peso relativo
demográfica e economicamente. Tomando como referência apenas o número de
cidades enquadradas no intervalo populacional entre 100 mil e 500 mil habitantes,
excluindo-se aquelas localizadas na Região Metropolitana de São Paulo, observa-se
que elas passaram de 21, em 1980, para 25 e 33, em 1991 e 2000, respectivamente
(BRAGA, 2005, p.2245), chegando a 46 em 2010, onde viviam 8.873.886 paulistas
(Censo 2010/IBGE).
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O estudo “Caracterização e Tendências da Rede Urbana do Brasil” apontou, em 1999, a existência de
11 aglomerações urbanas no interior paulista, polarizadas pelos seguintes municípios: São José dos
Campos, Ribeirão Preto, Santos, Sorocaba, São José do Rio Preto, Jundiaí, Limeira/Rio Claro,
Araraquara/São Carlos, Araçatuba, Mogi-Guaçu/Mogi-Mirim, Guaratinguetá/Aparecida.
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Refere-se ao já mencionado “polígono industrial” definido por Diniz e Crocco como os limites à
desconcentração industrial.
Negri (1996) também observa que o processo de desconcentração industrial no
interior paulista tinha relação direta com a intensificação da urbanização e, sobretudo,
com a importância crescente das cidades médias, que passavam a apresentar
significativo crescimento demográfico, especialmente aquelas localizadas nos
eixos de penetração da Via Dutra ( até São José dos Campos e Taubaté),
da Via Anhanguera (até Ribeirão Preto), da via Washington Luiz (até São
José do Rio Preto) e da Rodovia Castelo Branco (até Sorocaba) (NEGRI,
1996, p.169).
5. Conclusão
6. Referências Bibliográficas
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