Sunteți pe pagina 1din 7

Uso do DSM-IV na prática clínica – Matos et alii

Artigo de revisão

A importância e as limitações do uso do


DSM-IV na prática clínica

Evandro Gomes de Matos*


Thania Mello Gomes de Matos**
Gustavo Mello Gomes de Matos***

HISTÓRIA psicose maníaco-depressiva 1. Freud (1895),


quase ao mesmo tempo, destacava da
Na Grécia antiga, desde o século 5 a.C., neurastenia uma síndrome, denominada
Hipócrates buscou estabelecer um sistema de neurose de angústia, que passou a ser
classificação para as doenças mentais. classificada e estudada juntamente com outros
Palavras como histeria, mania e melancolia tipos de neurose: hipocondríaca, histérica,
eram usadas para caracterizar algumas delas. fóbica e obsessivo-compulsiva 2 . Esta
Ao longo dos séculos seguintes, diversos terminologia perdurou até os anos 80, do século
termos foram sendo incorporados ao jargão 20.
médico, como, por exemplo: loucura circular, No ano de 1952, a Associação Psiquiátrica
catatonia, hebefrenia, paranóia, etc. Entretanto, Americana (APA) publicou a primeira edição do
o primeiro sistema de classificação abrangente “Manual Diagnóstico e Estatístico de
e de cunho verdadeiramente científico surgiu Transtornos Mentais” (DSM-I), e as edições
com os estudos de Emil Kraepelin (1856-1926), seguintes, publicadas em 1968 (DSM-II), 1980
que reuniu diversos distúrbios mentais sob a (DSM-III), 1987 (DSM-III-R) e 1994 (DSM-IV),
denominação de demência precoce – foram revistas, modificadas e ampliadas3.
posteriormente chamada de esquizofrenia por O DSM-III (1980) foi o mais revolucionário
Bleuler –, ao lado de outros transtornos de todos e tornou-se um marco na história da
psicóticos, separando-os do quadro clínico da psiquiatria moderna. Novas categorias
diagnósticas foram descritas, como, por
exemplo: a neurose de angústia foi subdividida
* Professor Assistente, Doutor, Departamento de Psicologia Médica e em transtorno de pânico com e sem
Psiquiatria, Faculdade de Ciências Médicas, Universidade Estadual de
Campinas (UNICAMP), SP. agorafobia e transtorno de ansiedade
** Psicóloga e Mestre, Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUC- generalizada; a fobia social tornou-se uma
Campinas), SP. entidade nosológica própria; a psicose
*** Acadêmico de Medicina, Universidade de Uberaba (Uniube), MG. maníaco-depressiva passou a ser denominada

312 Recebido em 14/01/2005. Revisado em 18/01/2005. Aceito em 01/08/2005.

Rev Psiquiatr RS set/dez 2005;27(3):312-318


Uso do DSM-IV na prática clínica – Matos et alii

de transtorno do humor bipolar, com ou sem delirante (297.1), dependência do álcool


sintomas psicóticos . Muitas palavras (303.90), etc.
passaram a ser evitadas. O termo neurose, por Eixo II: Descreve o retardo mental. Por
exemplo, deixou de ser usado, para não suscitar exemplo: retardo mental severo (318.1) e
questões etiológicas, a palavra histeria transtornos de personalidade, que foram
desapareceu do texto, pelo mesmo motivo, a reunidos em três grandes agrupamentos
expressão doença mental foi substituída por (clusters). No grupo A, estão os indivíduos com
transtorno mental, etc. traços estranhos ou bizarros – por exemplo,
Além disto, uma característica importante transtorno de personalidade esquizóide
do DSM-III foi a hierarquização dos (301.20); no grupo B, os indivíduos com traços
diagnósticos. Um paciente diagnosticado como dramáticos e instáveis – por exemplo,
esquizofrênico, por exemplo, não poderia transtorno de personalidade borderline
receber o diagnóstico simultâneo de transtorno (301.50); e, finalmente, os inseguros e ansiosos
de pânico. A esquizofrenia, patologia mais no grupo C – por exemplo, transtorno de
grave, era considerada hierarquicamente personalidade dependente (301.6).
superior ao quadro do pânico. Desta forma, era Eixo III: Descreve as condições médicas
atendida a velha máxima da medicina, que gerais. Por exemplo: otite média recorrente
preconiza a identificação de uma única (382.9).
patologia para explicar todos os sintomas que Eixo IV: Trata dos problemas psicossociais
compõem o quadro clínico de um paciente. e ambientais, associados com o transtorno
Entretanto, em 1987, com a publicação do mental em questão. Por exemplo: ameaça de
DSM-III-R, esta hierarquia foi abolida, e o perda de emprego.
manual passou a incentivar a feitura simultânea Eixo V: Constitui-se por uma escala de
de dois ou mais diagnósticos num mesmo avaliação global de funcionamento (AGF), que
paciente. Surgiu, assim, o conceito de recebe uma numeração. Por exemplo: AGF =
comorbidade, em psiquiatria, que foi 82.
confirmado pelo DSM-IV e amplamente As principais características do DSM-IV
difundido nos anos 90, sendo utilizado são: 1. descrição dos transtornos mentais; 2.
regularmente nos dias atuais 3. definição de diretrizes diagnósticas precisas,
Na verdade, o conceito de comorbidade através da listagem de sintomas que configuram
remonta ao ano de 1970, quando Feinsten o os respectivos critérios diagnósticos; 3. modelo
utilizou pela primeira vez para definir “qualquer ateórico, sem qualquer preocupação com a
entidade clínica adicional que tivesse existido etiologia dos transtornos; 4. descrição das
ou que pudesse ocorrer durante o curso clínico patologias, dos aspectos associados, dos
de um paciente, que tivesse a doença índice padrões de distribuição familiar, da prevalência
em estudo” 4. O assunto será retomado mais na população geral, do seu curso, da evolução,
adiante. do diagnóstico diferencial e das complicações
psicossociais decorrentes; 5. busca de uma
O QUE É O DSM-IV? linguagem comum, para uma comunicação
adequada entre os profissionais da área de
O DSM-IV é, portanto, um manual saúde mental; 6. incentivo à pesquisa.
diagnóstico e estatístico, que foi adotado pela
APA 5 e que correlaciona-se com a AS VANTAGENS DA UTILIZAÇÃO DO DSM-IV
Classificação de Transtornos Mentais e de
Comportamento da CID-106, da Organização O DSM-IV atingiu muitos dos seus
Mundial da Saúde (OMS). Trata-se de um objetivos. Na prática clínica, inúmeros
sistema classificatório multiaxial – publicado exemplos podem ser destacados. Indivíduos
nos anos 90, que são considerados “a década anteriormente diagnosticados como “histéricos”
do cérebro” pela OMS –, organizado de maneira eram ridicularizados, nas salas de atendimento
a agrupar 16 classes diagnósticas distintas, que de urgência, por não terem o seu sofrimento
recebem códigos numéricos específicos e se reconhecido pelos médicos. Alguns termos
distribuem por cinco grandes eixos, que são os pejorativos ainda ressoam em nossos ouvidos:
seguintes: “crise pitiática”, paciente “píssico”, “piti” ou “hy”.
Eixo I: Descreve os transtornos clínicos Muitos deles sofriam, na verdade, de ataques
propriamente ditos. Por exemplo: transtorno de de pânico e eram desmoralizados porque os
pânico sem agorafobia (300.01), transtorno seus sintomas – parestesias (formigamentos e
depressivo recorrente (296.3), transtorno adormecimentos), ondas de calor, 313

Rev Psiquiatr RS set/dez 2005;27(3):312-318


Uso do DSM-IV na prática clínica – Matos et alii

despersonalização/desrealização, tonturas, bem à terapia comportamental. Episódios de


medo de morrer ou de perder o controle, entre depressão leves e moderados respondem bem
outros – eram mal interpretados por quem os tanto aos antidepressivos quanto à TCC,
atendia 7 . Outros pacientes receberam isoladamente. Todavia, a associação dos dois
indevidamente o diagnóstico de esquizofrenia, procedimentos oferece resultados ainda
juntamente com todo o estigma decorrente melhores e mais duradouros. Da mesma forma,
deste termo, ao invés de transtorno do humor pacientes com fobia social têm indicação para
com sintomas psicóticos, o que muda não as duas formas de intervenção –
apenas o prognóstico, mas também, antidepressivos e TCC –, porque muitos deles,
substancialmente, a abordagem terapêutica. A após a remissão dos sintomas físicos da
fobia social, negligenciada por todas as ansiedade obtida com o uso dos medicamentos,
classificações anteriores ao DSM-III, foi descrita necessitam de treinamento para mudança de
como uma entidade nosológica separada, e os comportamento, melhora da assertividade e do
estudos subseqüentes mostraram tratar-se do crescimento do repertório social 11.
mais comum dos transtornos de ansiedade,
atingindo cerca de 12% da população geral. LIMITAÇÕES E DESVANTAGENS DO USO
Pôde-se compreender que o transtorno DO DSM-IV
distímico é um distúrbio clínico que, embora de
curso crônico, não se caracteriza por ser um O uso do DSM-IV é limitado e trouxe
traço de personalidade, como era considerado, também inúmeras desvantagens. A primeira
mas um estado patológico passível de ser delas diz respeito ao próprio sistema, que
diagnosticado e tratado 8 . O transtorno produziu uma excessiva fragmentação dos
obsessivo-compulsivo é mais freqüente do que quadros clínicos dos transtornos mentais.
se pensava, atingindo cerca de 3% da Assim, muitos pacientes precisam receber
população geral, e a sua associação com o simultaneamente inúmeros diagnósticos, já que
transtorno de personalidade obsessivo- os sintomas ultrapassam os limites rígidos,
compulsivo é infreqüente, ao contrário do que propostos pelo manual. Por isto, a comorbidade
era postulado anteriormente. dentro de um eixo (ou de vários deles) passa a
O desenvolvimento das pesquisas na área ser quase sempre a regra, e não a exceção.
de saúde mental tomaram um impulso Fóbicos sociais recebem, em 80% dos casos,
extraordinário nos últimos anos. A atenção para outro diagnóstico correlato11. O transtorno de
o diagnóstico e a comunicação entre os pânico surge ao lado da depressão em mais de
diversos profissionais – psiquiatras, 50% dos casos e muitas vezes está associado,
psicoterapeutas e psicólogos – estabeleceram ainda, com ansiedade generalizada, fobia
uma nova parceria entre a psiquiatria clínica e social, transtorno obsessivo-compulsivo e
as psicoterapias comportamental, outros transtornos de personalidade, situados
comportamental-cognitiva (TCC) e interpessoal no eixo II 12. A recomendação de se registrar
– únicas na história de nossa especialidade –, todos os diagnósticos representa, obviamente,
que resultou no desenvolvimento de novas uma desvantagem. Além disto, as listas dos
técnicas de terapia, com grande melhoria da sintomas não contemplam todas as queixas
qualidade de vida oferecida aos nossos apresentadas pelos pacientes na prática clínica.
pacientes. Alguns achados vão se confirmando Por exemplo, dor de cabeça, boca seca, visão
na literatura especializada. Transtorno borrada e acessos de choro não estão descritos
obsessivo-compulsivo, por exemplo, pode ser entre os sintomas dos ataques de pânico,
tratado eficazmente com medicamentos embora surjam com freqüência na vigência
antidepressivos, que inibem a recaptação da destes episódios.
serotonina (IRSS), ou com terapia A segunda dificuldade diz respeito ao
comportamental. Estudos originais constataram profissional que vai utilizá-lo. O DSM-IV não
que as alterações funcionais, detectadas por deve ser usado como uma lista infalível, que,
imagem cerebral, antes desses procedimentos, sendo preenchida, fornece automaticamente
regridem ao seu término9,10. Por outro lado, um diagnóstico psiquiátrico. Em mãos
sabe-se que os psicofármacos atuam melhor inexperientes, os resultados são desastrosos.
nas idéias obsessivas, enquanto a terapia trata Muitos sintomas são superpostos a diversos
melhor das compulsões. Em diversos casos, quadros clínicos, e a decisão de sua origem, ou
portanto, há indicação para a escolha de ambas de qual estado eles fazem parte, deriva
as formas de tratamento. A fobia específica não exclusivamente de um julgamento clínico. E
314 melhora com medicamentos, mas responde este advém dos conhecimentos teóricos de

Rev Psiquiatr RS set/dez 2005;27(3):312-318


Uso do DSM-IV na prática clínica – Matos et alii

psicologia, psicopatologia e psiquiatria, do predispõe ao transtorno A; 3. A e B são


treinamento adequado e da experiência influenciados por um fator subjacente C,
acumulada ao longo dos anos de exercício da predisponente ou causal; 4. a associação entre
profissão13. O DSM-IV não é um compêndio de A e B é produzida pelo acaso – por exemplo,
psiquiatria e não deve ser consultado como a pela freqüente ocorrência de ambos os
única fonte de conhecimento da especialidade. transtornos ao longo da vida, na população
Ao listar os sintomas, o manual busca auxiliar o geral; 5. A e B estão associados porque os
reconhecimento dos transtornos mentais, mas seus sintomas se superpõem15.
não se presta a substituir a abrangência do O modelo categorial distingue também o
diagnóstico clínico, que resulta, acima de tudo, transtorno primário, que ocorre primeiro em
da intuição, da percepção e do feeling, que seqüência temporal, do secundário. É o caso
surge desta relação única que se estabelece do quadro da depressão secundária ao
entre o profissional e o seu paciente. Neste transtorno de pânico, descrito por Klein et al.
sentido, é bom frisar que o próprio manual (apud Gomes de Matos16), que se origina da
destaca, logo na introdução, um capítulo desmoralização pela qual passa o paciente,
denominado “Uma palavra de cautela”, onde que não recebe do profissional o diagnóstico e
estes aspectos são devidamente tratados, e o tratamento adequados. Ele passa a ser
que recomendamos ao leitor. tratado com indiferença ou hostilidade pelos
Tudo isto nos leva a refletir que o DSM-IV amigos e familiares, estribados pelo parecer
está longe de resolver os problemas médico errôneo, e não consegue avaliar o grau
diagnósticos e estatísticos de nossa de seu sofrimento e as limitações funcionais e
especialidade. Mostra-nos um longo caminho a sociais decorrentes do transtorno. A depressão,
percorrer, que será realizado com sucesso, neste caso, apresenta-se com características
desde que as questões e preconceitos de cada diferentes de um episódio típico (primário) de
especialidade sejam deixadas de lado, e, em depressão maior, com uma evolução mais
seu lugar, esforcemo-nos para realizar um favorável, e remite com o tratamento específico
trabalho conjunto, reunindo os achados para transtorno de pânico, que é considerado o
científicos da psiquiatria, que inclui os avanços distúrbio primário e causal17.
no campo da neuroimagem e da neurofisiologia Por outro lado, o modelo dimensional
por um lado, e a aplicação, comparação e ganhou força, neste século, principalmente com
aferição sistemática dos procedimentos os estudos de Kretschmer & Akiskal, que se
psicofarmacológicos e psicoterapêuticos basearam no pensamento de Platão e na visão
utilizados por outro. holística do homem. Eles descrevem a doença
Desta forma, ambos os sistemas mental como sendo uma disfunção única, que
diagnósticos – DSM-IV e CID-10 – são se expressa de forma variada. Os sintomas da
nosográficos e têm por objetivo listar e depressão – segundo a escola de Akiskal et al.,
classificar os transtornos mentais, mas não por exemplo –, quando típicos, estão situados
substituem o exercício da clínica. O modelo no extremo de um continuum, do qual faz parte
destes sistemas, que é denominado categorial, a ansiedade, que, por sua vez, na sua forma
se opõe, em contrapartida, a um outro, dito pura, situa-se no outro extremo. Os transtornos
dimensional, como veremos em seguida. intermediários estariam representados pelos
quadros de sintomatologia mista, onde os
OS MODELOS CATEGORIAL E sintomas de depressão e ansiedade se
DIMENSIONAL misturam e se superpõem das mais diversas
maneiras. Assim, no modelo dimensional, ao
O modelo categorial admite, no seu bojo, a contrário do anterior, a depressão e a
inclusão de entidades comórbidas. O conceito ansiedade são consideradas a expressão de
de comorbidade de Feinsten – conforme vimos uma mesma e única patologia. Isto nos remete
acima – foi ampliado para a psiquiatria por ao conceito de spectrum, termo utilizado como
Klerman, em 1990, como sendo um termo que uma metáfora do fenômeno físico da
“se refere à ocorrência conjunta de dois ou decomposição da luz, que ocorre ao passar por
mais transtornos mentais entre si e/ou com um prisma. Da mesma forma, o espectro de um
outras condições médicas”14. Posteriormente transtorno mental, que não pode ser abarcado
(1990), Frances et al. criaram o seguinte pelo DSM-IV, inclui sintomas preditores, que
esquema para o aparecimento de dois surgem na infância, e sintomas prodrômicos e
transtornos comórbidos: 1. o transtorno A periféricos, que ocorrem junto com os sintomas
predispõe ao transtorno B; 2. o transtorno B típicos, ou que se manifestam com magnitude 315

Rev Psiquiatr RS set/dez 2005;27(3):312-318


Uso do DSM-IV na prática clínica – Matos et alii

suficiente para mascará-los18. Neste sentido, simples, poderá ser vista de uma nova maneira,
os estudos de Kretschmer postulam que os tomando-se por referência os sintomas
temperamentos esquizotímico e ciclotímico positivos (alucinações e idéias delirantes) e os
fazem parte do espectro da esquizofrenia e do sintomas negativos (déficits cognitivos). Isto
transtorno do humor (originalmente PMD), decorre dos achados obtidos nos estudos
respectivamente, e que os indivíduos realizados com as técnicas de imagem cerebral
esquizóides e ciclóides se situam numa posição de última geração. Os pacientes
intermediária entre eles19. esquizofrênicos com sintomas
Os quadros clínicos, sob a ótica do modelo predominantemente negativos apresentam,
dimensional, são decorrentes de alterações de com uma freqüência muito maior do que os com
quantidade, que se expressam conforme o seu sintomas positivos, alterações de algumas
grau de intensidade, ao contrário do que propõe estruturas cerebrais, que atuam de forma
o modelo categorial – que inclui os sistemas do correlata. A tomografia por emissão de
DSM-IV e da CID-10 –, que considera os pósitrons (PET), nesses pacientes, permite uma
transtornos mentais como sendo produzidos por avaliação – em vivo – do fluxo cerebral, que
uma alteração de qualidade, distinta para cada está diminuído no córtex pré-frontal, no
um dos transtornos. cerebelo e no tálamo, que é a estrutura cerebral
que funciona como um filtro sensorial da
PERSPECTIVAS FUTURAS informação. O cerebelo coordena a cognição, a
linguagem e as habilidades motoras. O termo
Atualmente, diversos autores desenvolvem dismetria cognitiva tem sido usado para
pesquisas com o intuito de aprimorar os caracterizar esta disfunção, encontrada na
sistemas categoriais, DSM-IV e CID-10. Alguns esquizofrenia. Se isto se confirmar, em estudos
quadros serão subdivididos em outras futuros, a perda cognitiva das associações
categorias diagnósticas, ampliando ainda mais lógicas será considerada o ponto central para o
as listas dos transtornos mentais. É o que deve diagnóstico da esquizofrenia, confirmando a
ocorrer, por exemplo, com os transtornos do descrição original de Bleuler do início do
humor bipolar I e II. No DSM-IV, eles são século21.
caracterizados pela sucessão de fases de Outros autores têm considerado que alguns
depressão e mania ou de hipomania, transtornos de personalidade (eixo II) são, na
respectivamente, e deverão ser acrescidos por realidade, parte do espectro de outros quadros
duas novas categorias, III e IV. O transtorno mentais. Da mesma forma que o transtorno
bipolar III se caracterizaria pelos quadros distímico – anteriormente reconhecido como um
daqueles pacientes que desenvolvem, distúrbio de personalidade e que passou a ser
naturalmente, apenas episódios de depressão, descrito como uma categoria do eixo I, como
mas que passam a apresentar episódios de vimos acima –, o transtorno de personalidade
mania ou de hipomania, desencadeados pelo borderline deixaria de ser considerado uma
uso de medicamentos antidepressivos. O condição clínica isolada, para fazer parte do
transtorno bipolar IV ocorreria em pessoas com espectro do transtorno bipolar, e os transtornos
temperamento hipertímico, que desenvolvem de personalidade esquizotípico, esquizóide e
episódios depressivos, geralmente muito paranóide seriam incluídos na esquizofrenia.
graves, e com elevado risco de suicídio. A Atualmente, diversas pesquisas clínicas
recuperação de quadros psicopatológicos, têm sido levadas adiante no sentido de
negligenciados pelos sistemas classificatórios reconhecer e agrupar os sintomas que não são
atuais, como a alteração de personalidade típicos, mas que se misturam ou encobrem o
hipertímica, descrita originalmente por Kurt quadro principal e não estão presentes nas
Schneider, é louvável do ponto de vista listas dos critérios diagnósticos do DSM-IV,
científico20. aproximando os modelos categorial e
Por outro lado, alguns transtornos deverão dimensional. Na UNICAMP, no ano de 2000,
ser reagrupados, como o transtorno de implantou-se um serviço ambulatorial
personalidade de esquiva, situado no eixo II, denominado Núcleo de Atendimento e
que poderá ser incluído, juntamente com o Tratamento dos Transtornos de Ansiedade
quadro de mutismo seletivo da infância, dentro (NATA), que estabeleceu uma parceria com a
da fobia social, por compartilharem os mesmos Universidade de Pisa, onde a equipe do Prof.
sintomas, evolução e resposta ao tratamento. A Giovani Cassano desenvolveu um amplo
esquizofrenia, classicamente subdividida nas projeto para o estudo do espectro dos
316 formas paranóide, hebefrênica, catatônica e transtornos mentais. A parceria entre as duas

Rev Psiquiatr RS set/dez 2005;27(3):312-318


Uso do DSM-IV na prática clínica – Matos et alii

universidades permite a comparação deste comum, entre médicos psiquiatras e psicólogos


novo modelo em populações diferentes. Os em todo o mundo. Entretanto, o uso do manual é
primeiros resultados serão publicados em limitado, não substitui o estudo dos tratados
conjunto, num futuro próximo. À guisa de clássicos de psicologia, psicopatologia e
exemplo, descreveremos abaixo, sucintamente, psiquiatria, e nem a experiência clínica e o
o trabalho com o transtorno de pânico, treinamento que o precede. Modelos híbridos
atualmente em andamento. que buscam conciliar os modelos categorial e
O Spectrum Project, assim denominado por dimensional, envolvendo psiquiatras e
Cassano et al., inclui a avaliação dos diversos psicólogos, têm sido desenvolvidos atualmente,
transtornos de ansiedade e do humor. Para o com perspectivas promissoras para o
transtorno de pânico, foram desenvolvidas, desenvolvimento de nossa especialidade.
especificamente, duas escalas de avaliação
diagnóstica. A primeira destina-se à população REFERÊNCIAS
geral, e a segunda, aos pacientes
diagnosticados com pânico: SCI-PAS e PAS- 1. Alexander FG, Selesnick ST. História da psiquiatria. São
SR, respectivamente. Ambas contemplam os Paulo: IBRASA; 1968.
seguintes itens: 1. utilização dos critérios do 2. Freud S. (1895). Sobre os critérios para destacar da
neurastenia uma síndrome particular intitulada “neurose
DSM-IV para identificar ataques de pânico; e 2. de angústia”. In: Obras completas de Sigmund Freud,
entrevista estruturada, composta por diversas Edição Standard Brasileira. Rio de Janeiro: IMAGO;
questões, para avaliar: a) sensibilidade à 1974. v. 8, p. 107-37.
separação na infância (considerada um preditor 3. Stone MH. A cura da mente. Porto Alegre: Artmed; 1999.
importante, embora não específico, do transtorno 4. Feinstein AR. The pre-therapeutic of co-morbidity in
chronic disease. J Chron Dis. 1970;23:455-68.
de pânico); b) sintomas típicos e atípicos do
5. American Psychiatric Association. Diagnostic and
pânico (sensação de perda da visão ou da statistical manual of mental disorders. 4.ed. Washington:
audição, sensação de que algo se rompeu em APA; 1994.
seu cérebro, desconforto no escuro ou na 6. Organização Mundial da Saúde. Classificação de
neblina, desconforto ao ruído, etc.); c) transtornos mentais e de comportamento da CID-10.
Porto Alegre: Artes Médicas; 1993.
sensibilidade ao estresse (sintomas de 7. Gomes de Matos E, Gomes de Matos TM, Gomes de
ansiedade física, como palpitações, sudorese, Matos G. Histeria: uma revisão crítica e histórica do seu
tremores, etc., em situações de estresse conceito. J Bras Psiquiatr. 2005;54(1):49-56.
consideradas não intensas, como excesso de 8. Spanemberg L, Juruena MF. Distimia: características
históricas e nosológicas e sua relação com transtorno
trabalho, problemas familiares, etc.); d) depressivo maior. Rev Psiquiatr RS. 2004;26(3)300-11.
sensibilidade ou fobia aos fármacos e outras 9. Schwartz JM, Stoessel PW, Baxter LR, Phelps ME.
substâncias (intolerância a antidepressivos, Systematic changes in cerebral glucose metabolic rate
ansiolíticos, café, perfumes ou outros odores, after successful behavior modification treatment of
obsessive-compulsive disorder. Arch Gen Psychiatry.
etc.); e) expectativa ansiosa (ansiedade 1996;55(2):109-13.
antecipatória e estado de alarme); f) agorafobia 10. Goodman WK. Obsessive-compulsive disorder: diagnosis
(típica e atípica); g) sintomas hipocondríacos e and treatment. J Clin Psychiatry. 1999;60(18):27-32.
fobia a doenças (sensação de estar preso ou de 11. Lecrubier Y. Comorbidity in social anxiety disorder:
sufocação na cadeira do dentista, medo de impact on disease burden and management. J Clin
Psychiatry. 1998;17(59):33-7.
procedimentos médicos, como realizar 12. Kaplan HI, Sadock BJ. Comprehensive textbook of
eletroencefalograma, colheita de sangue, ver um psychiatry. 6.ed. Baltimore: Willians & Wilkins; 1995.
bisturi, etc.); e h) sensibilidade ao 13. Cheniaux E. Psicopatologia descritiva: existe uma
reasseguramento (procura de ajuda, como idas linguagem comum? Rev Bras Psiquiatr. 2005;2(27)157-
62.
freqüentes ao pronto-socorro, interpretações
14. Klerman GL. Approaches to the phenomena of
catastróficas de situações, dramatização, etc.)22. comorbidity. In: Maser JD, Cloninger CR, eds.
Comorbidity of mood and anxiety disorders. Washington:
American Psychiatric Press; 1990. p. 13.
CONCLUSÕES 15. Frances A, Widiger T, Fyer MR. The influence of
classification methods on comorbidity. In: Maser JD,
A consulta e o uso adequado do DSM-IV é Cloninger CR, eds. Comorbidity of mood and anxiety
de suma importância para os profissionais que disorders. Washington: American Psychiatric Press;
atuam na área da saúde mental. A sua utilização 1990. p. 256.
16. Gomes de Matos E. Contribuições ao estudo do distúrbio
tem resultado, nos últimos anos, em avanços de pânico e prolapso de valva mitral [tese de doutorado].
científicos significativos no campo da prática Campinas: Unicamp; 1992.
clínica e do estudo epidemiológico dos 17. Gomes de Matos E. Ansiedade antecipatória, distúrbio
transtornos mentais. Possibilitou também uma de pânico e depressão secundária. J Bras Psiquiatr.
1994;43(2):75-8.
ampla comunicação, através de uma linguagem 317

Rev Psiquiatr RS set/dez 2005;27(3):312-318


Uso do DSM-IV na prática clínica – Matos et alii

18. Cassano GB, Dell’Osso L, Frank E, Minati M, Fagiolini A, models, both dimensional and categorical, was carried
Shear K, et al. The bipolar spectrum: a clinical reality in out as well. The paper was divided into the following
search of diagnostic criteria and an assessment
methodology. J Affect Disord.1999;54:319-28. sections: history, concept, advantages and
19. Kretschmer E. Psicologia médica. 13.ed. São Paulo:
disadvantages of the DSM-IV, discussion and
Atheneu; 1970. conclusion. The article also presents a project
20. Schneider K. Psicopatologia clínica. São Paulo: Mestre developed by the Núcleo de Atendimento dos
Jou; 1976. Transtornos de Ansiedade (NATA), from the
21. Korn M. Novas questões de tratamento e neurociências Department of Psychiatry at FCM/UNICAMP, which
em esquizofrenia. Neuropsiconews. 2000;32:34-9. will use an instrument for the diagnostic of the
22. Cassano GB, Michelini S, Shear K, Coli E, Maser J K, agoraphobia disorder that will follow a dimensional
Frank E. The panic-agoraphobic spectrum: a descriptive model.
approach to the assessment and treatment of subtle
symptoms. Am J Psychiatry. 1997;154(6):27-38.
Keywords: DSM-IV, multiaxial system,
psychopathology.
Title: The importance and constraints of the DSM-IV
RESUMO
use in the clinical practice
Introdução: O DSM-IV é um sistema diagnóstico
e estatístico de classificação dos transtornos mentais,
RESUMEN
segundo o modelo categorial, destinado à prática
clínica e à pesquisa em psiquiatria. O objetivo do
presente estudo foi apresentar as vantagens do uso Introducción: El DSM-IV es un sistema
deste instrumento e suas limitações. diagnóstico y estadístico de clasificación de los
Metodologia: Os autores realizaram uma ampla trastornos mentales, conforme al modelo categorial,
revisão bibliográfica e apresentaram a relevância do destinado a la práctica clínica y a la investigación en
tema, como está no momento configurado. Foram psiquiatría. El objetivo del presente estudio fue
apontadas algumas mudanças prováveis, que presentar las ventajas del uso de este instrumento,
ocorrerão nas próximas edições, e a discussão entre así como sus límites.
os modelos diagnósticos – dimensional e categorial. Metodología: Los autores realizaron una amplia
O artigo inclui os seguintes tópicos: histórico, revisión bibliográfica y presentaron la relevancia del
conceito, vantagens e desvantagens da utilização, tema, tal como se configura en el momento. Señalaron
discussão e conclusão. Apresenta, também, um algunos cambios probables, que ocurrirán en las
projeto que será desenvolvido no Núcleo de próximas ediciones, y la discusión entre los modelos
Atendimento dos Transtornos de Ansiedade (NATA), diagnósticos - dimensional y categorial. El artículo
do Departamento de Psiquiatria da FCM/UNICAMP, incluye los siguientes tópicos: histórico, concepto,
aplicando um novo instrumento diagnóstico para o ventajas y desventajas de la utilización, discusión y
espectro do pânico agorafóbico, segundo o modelo conclusión. Presenta, además, un proyecto que será
dimensional. desarrollado en el Núcleo de Atendimento dos
Transtornos de Ansiedade (NATA), del Departamento
Descritores: DSM-IV, sistema multiaxial, de Psiquiatría de la FCM/UNICAMP, aplicando un
psicopatologia. nuevo instrumento diagnóstico para el espectro del
pánico agorafóbico, conforme al modelo dimensional.

ABSTRACT Palabras clave: DSM-IV, sistema multiaxial,


psicopatología.
Introduction: The DSM-IV is a diagnostic and
statistical system for the classification of mental Correspondência:
disorders that follows a categorical model. It is used in Evandro Gomes de Matos
the clinical practice and research in the psychiatry Rua Américo Brasiliense, 244/62
area. The aim of this study was to analyze the use of Cambuí – Campinas – SP
the DSM-IV in the clinical practice and to report on its CEP 13094-770
advantages and limitations. Fone/Fax: (19) 3295.8333
Methods: A wide bibliographic review was made E-mail: evandro@fcm.unicamp.br
to show the relevance of the topic. Some probable
changes were pointed out, which will be included in Copyright © Revista de Psiquiatria
the next editions. A discussion on the diagnostic do Rio Grande do Sul – SPRS

318

Rev Psiquiatr RS set/dez 2005;27(3):312-318

S-ar putea să vă placă și