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Este artigo é uma versão amplia- Resumo
da do que foi apresentado no XII
Congresso Brasileiro de Ergono- Este artigo discute a implantação da ginástica laboral em uma central de telea-
mia, Fortaleza, 2002.
tendimento e evidencia os efeitos da organização do trabalho sobre a atividade
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Mestre em Engenharia de laborativa de atendimento. Buscou-se reunir elementos para analisar a baixa
Produção, Psicóloga do Traba- adesão ao Programa de Ginástica Laboral que foi implantado pelo Comitê de
lho, Pesquisadora associada ao
Ergonomia da empresa após a solicitação dos teleatendentes.
Laboratório de Ergonomia do
Departamento de Engenharia de Os dados obtidos por meio de observação da atividade, entrevistas abertas e
Produção da Escola de Engenharia aplicação de questionário são aparentemente contraditórios, pois, apesar do
da Universidade Federal de Minas reconhecimento da importância dos objetivos do programa pela maioria de-
Gerais, Brasil.
les, o comparecimento às sessões de ginástica laboral (GL) sempre foi baixo.
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Doutora em Ergonomia, Médica Viu-se que a implantação da GL sem reorganização do trabalho pode provocar
do Trabalho, Professora do Progra- constrangimentos aos trabalhadores. Os autores discutem as interações entre
ma de Pós-Graduação em Saúde
espaço físico e espaços social e organizacional no ambiente de trabalho e, ao
Pública da Faculdade de Medicina
final, apresentam parâmetros para o planejamento e seguimento dos progra-
da Universidade Federal de Minas
Gerais. Pesquisadora do CNPq, mas de GL.
Brasil. Palavras-chaves: atividade, ginástica laboral, organização do trabalho, Comitê
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Doutor em Ergonomia, Engenhei- de Ergonomia.
ro Mecânico/Produção, Professor
do Programa de Pós-Graduação
em Engenharia de Produção da Abstract
Universidade Federal de Minas
Gerais, Brasil. This article discusses a labor gymnastics program implementation at a call cent-
er, evidencing the effects of labor organization on telemarketing work practices.
It aims at understanding the reasons for the low participation in the program,
which was implemented after the workers’ request, by the company ergonomics
committee.
The data obtained through field observation and semi-structured interviews
were apparently contradictory, as attendance to the labor gymnastics sessions
kept low, although most workers expressed very favorable opinions about the
program. It was observed that the implementation of a gymnastic program with-
out work reorganization might cause workers’ hindrance. The authors discuss
the interactions between physical ambiance, as well as social and organiza-
tional space. Finally, aiming at a more effective planning, other parameters for
a gymnastic program are suggested.
Keywords: activity, labor gymnastics, work organization, ergonomic com-
mittee.
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Introdução: histórico do setor antes da implantação
do programa de ginástica
O objetivo deste artigo é apresentar as de vídeo, equipamentos que poderiam aju-
dificuldades enfrentadas pelo Comitê de dá-los a manter uma postura menos este-
Ergonomia de uma empresa do setor pú- reotipada. A organização do trabalho será
blico, por ocasião da implantação da GL detalhada mais adiante (item 3) devido a
no serviço de teleatendimento. A proposta sua importância para explicar a não adesão
surgiu no bojo da discussão dos resultados ao programa de GL.
de um estudo ergonômico realizado na em-
Resultados da análise ergonômica
presa com a finalidade de estabelecer re-
comendações de melhorias das condições Por ocasião do estudo ergonômico, a
ambientais e ergonômicas e de definir pro- atividade era caracterizada por uma so-
cedimentos operacionais coerentes com o brecarga muscular devido ao excesso de
intuito de preservar a saúde dos trabalha- transcrições manuais, ao volume de dados
dores do setor. O estudo ergonômico foi re- digitados, às posturas desconfortáveis ori-
alizado em 1999; as recomendações descri- ginadas pelas inadequações do posto de
tas abaixo começaram a ser implementadas trabalho, à organização do trabalho (ritmo,
em 2000 e o programa de ginástica foi im- pausas, jornada, hierarquia, falta de comu-
plantado em 2001 e avaliado naquele mes- nicação entre áreas de interface), gerando
mo ano, quando se constatou a não adesão adoecimentos manifestados em sua maio-
dos trabalhadores. ria pelo estresse e pelas Lesões por Esfor-
Descrição da função do teleatendente e do ços Repetitivos/Doenças Osteomusculares
posto de trabalho Relacionadas ao Trabalho (LER/DORT).
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A GL foi incluída após sugestão dos tra- que solicitaram a implantação do progra-
balhadores, pois não constava do conjunto ma já não se encontravam no setor. Diante
das recomendações iniciais. Os benefícios da mudança dos efetivos, uma nova con-
da implantação da GL dizem respeito à me- sulta foi realizada à época do treinamento
lhoria do funcionamento geral do aparelho introdutório dos trabalhadores, por so-
musculoesquelético, sendo útil em situa- licitação dos coordenadores do setor, na
ções de esforço postural estático exacer- expectativa de que a implementação da
bado. No entanto, as análises do trabalho ginástica diminuiria as queixas de dores
no teleatendimento evidenciaram outros registradas. Em nenhum momento o cor-
constrangimentos (visuais, pressão de tem- po gerencial tolhia a participação dos te-
po, software, dimensões dos postos etc.) e leatendentes ou influenciava a decisão da
formas específicas de adoecimentos causa- não adesão. Assim, pelo menos no âmbito
dos pela repetitividade dos movimentos. intersubjetivo, a chefia não criava obstá-
Entendendo que a postura de trabalho é culos para que a pausa fosse aproveitada
um meio e suporte da atividade, de modo e, conseqüentemente, que fosse ocupada
geral, a ginástica tem efeito apenas paliati- com a ginástica.
vo, pois as múltiplas exigências da situação
O Comitê de Ergonomia adota como
de trabalho influenciam na dinâmica dos
princípio garantir a cada trabalhador a livre
arranjos posturais (ver item 2 do presente
adesão ao programa proposto, entendendo
artigo). Sob esses preceitos, a intervenção
que o uso do corpo é uma decisão que cabe
ergonômica não indicou a GL por enten-
a cada trabalhador individualmente. O tra-
der que, no caso de teleatendimento, não
balhador tinha direito à pausa, mas não a
teria grandes efeitos preventivos em face à
obrigatoriedade de ocupar este tempo com
complexidade da exposição aos riscos de
a ginástica.
adoecimento.
As mudanças materiais e organizacio-
Por outro lado, diante das demandas
nais em processo de implementação não
dos trabalhadores e como as recomenda-
dispensavam a introdução do programa de
ções propostas ao final da análise ergonô-
GL, em voga no momento de realização do
mica prévia à introdução da ginástica (mu-
estudo ergonômico. Além disso, as melho-
danças de mobiliário, introdução de novo
rias ergonômicas (novo software, leiaute e
software, mudança de leiaute e de espaço
mobiliário, pausas e treinamento introdu-
físico, reuniões periódicas entre as áreas de
tório), com efeitos sensíveis na carga de
interface, introdução de treinamento volta-
trabalho imediata, ainda não deixavam
do à realidade do atendimento) estavam
gerentes e trabalhadores completamente
em fase de implementação, entendeu-se
seguros de que os efeitos de longo prazo se-
que o programa de ginástica não seria algo
riam evitados. Alguns teleatendentes já ti-
isolado nem solução para “todos os males”.
nham a experiência da GL nos locais onde
Além do mais, mesmo que os efeitos be-
trabalhavam anteriormente e a julgavam
néficos da ginástica não estejam compro-
benéfica, outros aderiram à idéia conside-
vados para prevenção das LER/DORT, sua
rando-a adequada, já que sabiam dos afas-
adoção traz benefícios secundários, o que
tamentos dos colegas que os antecederam.
justifica, per se, sua adoção. O Comitê de
Globalmente, a tarefa permanecia a mes-
Ergonomia apresentava também argumen-
ma, sobretudo pelo fato da gerência não ter
tos quanto aos limites de medidas como
relaxado os constrangimentos de tempo, os
a ginástica laboral ou educação postural,
quais, acreditava-se, seriam amenizados
reunindo elementos para afirmar que essas
pelas melhorias do software.
medidas não seriam suficientes para preve-
nir as LER/DORT, as depressões, as crises A questão que se coloca é a seguinte:
de ansiedade, as dores no pescoço, coluna, por que pessoas que voluntariamente so-
ombros, braços e mãos. licitam ou aceitam participar de um pro-
grama de GL, quando lhes é oferecida essa
O programa de ginástica laboral
possibilidade, não realizam os exercícios?
A proposta de ginástica na empresa foi Não se trata, aqui, de discutir se a GL é de
implementada por uma empresa contrata- fato útil ou não para prevenir LER/DORT
da, dois anos após a análise ergonômica ou se as outras mudanças ergonômicas
do setor. A demora se deu em virtude do a tornam dispensável, mas sim as razões
contexto político vivenciado pela empre- da não adesão dos trabalhadores, quando,
sa à época e, quando ele foi efetivamente aparentemente, havia condições favoráveis
implantado, a maioria dos trabalhadores para que o programa desse certo.
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A prática da ginástica laboral e a ergonomia
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ção e estudo das situações de trabalho, tem em situações de trabalho, a postura não
como centro a análise da atividade do ho- é um fim em si mesmo, como faz supor a
mem e integra conhecimentos psicofisioló- prática de “educação postural”. Durante a
gicos para recomendar melhorias e identi- realização de um trabalho, as exigências
da tarefa e a atividade em curso tendem
ficando elementos críticos sobre a saúde
a prevalecer sobre a “consciência corpo-
do trabalhador.
ral”. De certa forma, estar envolvido com
A AET ultrapassa as relações simplis- um trabalho que exige atenção ou pressa
tas de causa e efeito. A principal diferen- requer que esqueçamos do corpo pró-
ça entre a abordagem ergonômica e a GL é prio, fixando a consciência no trabalho,
seus instrumentos e objetos. O corpo e a
que a primeira propõe medidas de preven-
postura se tornam meios de uma ativida-
ção a partir do que fazem os trabalhadores
de finalizada, que entra em conflito e se
para proteger a sua própria saúde contra sobrepõe à autoconsciência ou mesmo
os riscos presentes nos locais de trabalho às percepções do corpo próprio. (LIMA,
(ASSUNÇÃO, 2001) e a segunda apresenta 2000)
uma gama de exercícios físicos que prepa-
ram o trabalhador: Evidenciou-se, com a revisão biblio-
gráfica e diante da prática da ergonomia,
para as atividades laborais diárias, ati-
que a prevenção necessita de medidas
vando a circulação geral e o aparelho res-
piratório, além de preparar as estruturas complexas e que medidas isoladas e de-
musculoligamentares de forma que os sarticuladas são inócuas para evitar doen-
funcionários fiquem menos propensos a ças relacionadas ao trabalho.
problemas de saúde. (MILITÃO, 2001)
Ao revelar as relações da postura e do
No primeiro caso, o foco é a relação en- uso do corpo com o contexto organizacio-
tre o trabalhador e a situação de trabalho, nal, torna-se necessário estabelecer um
espaço onde se desenvolve uma atividade espaço de negociação entre trabalhadores,
orientada por objetivos específicos, cuja re- empresários e profissionais que estudam o
alização se serve do corpo como um meio. trabalho para definir critérios de ação em
O ponto forte dessa abordagem é a análise todos os aspectos relevantes para explicar
minuciosa do comportamento dos homens essas relações, viabilizando, assim, uma
em situações de trabalho, que permite alternativa efetiva de prevenção, inclusive
identificar e eliminar as causas mediatas a GL, mas não exclusivamente:
de acidentes, de doenças e de sobrecarga
de trabalho que geram situações penosas. A centralização no homem, que caracteri-
(LIMA, 2000) za a prática de programas de exercícios la-
borais, não atende aos princípios básicos
Na GL, o corpo aparece como um fim da ergonomia, dentro do contexto mais
em si mesmo e objeto direto da intervenção amplo de adaptação do meio ao homem.
do especialista. No entanto: (LONGEN, 2003)
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A variabilidade das demandas de ser- As pressões inerentes às exigências
viço desse processo de trabalho contribui do atendimento ao público são caracterís-
para a não utilização de uma fraseologia ticas da atividade de atendimento. A car-
rígida, obrigatória, mas se espera que o ga de trabalho advinda da interação com
atendimento seja objetivo. Essa exigên- o cliente, a necessidade de se estabelecer
cia de objetividade desconsidera a varia- um diálogo compreensivo, o confronto de
bilidade do conteúdo de cada chamada e situações conflitantes com as normas da
a amabilidade e a cordialidade que cada empresa e a tentativa de convencimento
usuário espera do atendente. A exemplo mútuo exigem um esforço psíquico subs-
das afirmativas de diversos autores (VILE- tancial (SOARES, 2005).
LA & ASSUNÇÃO, 2004; MARINHO, 2004; Trata-se de uma atividade que exige
MASCIA & SZNELWAR, 2000), as metas uma construção constante dos problemas
de quantidade se sobrepõem ao objetivo de tratados em função da grande quantidade
qualidade do atendimento e satisfação do de informações e dos processos cognitivos
cliente. envolvidos, tais como: atenção, memoriza-
Existem variados instrumentos de con- ção, antecipação, tratamento e elaboração
trole da produtividade: o instrumento de de informações, resolução de problemas
trabalho (distribuidor automático de cha- e tomada de decisão. Isso vem ao encon-
tro dos resultados obtidos na pesquisa de
madas), que emite um alarme luminoso du-
Echternacht (1998), em que foi verificado
rante a maior parte do tempo, sinalizando
que essa atividade de comunicação media-
as chamadas que estão na espera; o cliente
da pelo meio técnico (informatizado) e o
que busca prolongar o tempo da ligação até
meio social (cliente) aumenta as exigências
garantir a execução do serviço solicitado;
psicocognitivas.
o atendente que procura resolver o proble-
ma do cliente ou “se livrar” dele; e as bases Nesse contexto, a atenção às condições
quantitativas sobre as quais são estabele- postas pelas políticas de gestão e estruturas
cidos os critérios de eficiência e eficácia organizacionais de um lado e as impossibi-
do atendimento ao cliente. No geral, con- lidades reais de regulação da carga de tra-
figura-se um quadro já exposto por Wisner balho do outro trazem pressões no trabalho
(1994): a solicitação da memória imediata, que se transvestem em queixas, dores e fa-
as microdecisões, as exigências conflitan- diga, tanto na esfera física quanto na men-
tes, as pressões temporais e o contato com tal. As condições materiais inadequadas
o público, às vezes agressivo, como fatores de trabalho (equipamentos de informática,
que levam à auto-aceleração. mobiliário e espaço físico) somadas a fato-
res organizacionais e psíquicos (a não exe-
A exigência de rapidez é um fator que cução do trabalho operacional, a falta de
torna difícil a relação com os clientes, dei- privacidade, a ausência de credibilidade e
xando o atendente tenso e ansioso, o que confiabilidade no setor de teleatendimento
faz com que suas respostas fiquem cada por parte dos usuários, a falta de resposta
vez mais rápidas e mais secas. Foi observa- para o cliente, a desvalorização do trabalho
do em algumas situações que o cliente não do atendente e a conseqüente desvaloriza-
se satisfaz com a informação dada e volta ção pessoal por parte da hierarquia) podem
a ligar ou ainda exige na mesma ligação ser consideradas como causas do adoeci-
respostas mais claras, aumentando assim o mento do atendente, causando estresse,
número e o tempo dos atendimentos. crises nervosas, alterações de humor, insô-
nia, angústia, falta de apetite, dificuldades
De fato, os trabalhadores sociais que fa-
zem corretamente seu trabalho não raro no trabalho intelectual, isolamento, com
têm uma carga cognitiva alta em razão interferência nas relações sociais e sinto-
das dificuldades de compreensão das re- mas de LER/DORT. É freqüente atenderem
clamações do público, freqüentemente ao telefone de casa com expressões cotidia-
ignorante do jargão e das categorias admi- nas do trabalho, quadro clínico semelhante
nistrativas. (WISNER, 1994) ao descrito por Le Guillant et al. (1984), a
respeito da neurose das telefonistas. Para
A natureza do trabalho não permite a
melhor ilustrar esta afirmação, algumas fa-
comunicação constante. Existe clara im-
las dos trabalhadores são exemplares:
possibilidade de conversas durante as ati-
vidades, restringindo as possibilidades de “Em casa não consigo desacelerar.”
contato entre os trabalhadores para troca “Não consigo dormir, à noite fico rolando
de informações úteis, como também desta- de um lado para o outro, durmo pouco e
cado por Veras (2006). acordo toda hora.”
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“Isto aqui é fábrica de fazer louco.” acima podem estar associados aos proble-
mas musculoesqueléticos. De acordo com
No que tange ao distúrbio físico, as LER/
Theorell (1996), os fatores psicossociais
DORT ocupam o primeiro lugar em termos podem estar associados a problemas osteo-
de prevalência. Além dos fatores biomecâ- musculares, pois já foi observado que tanto
nicos já mencionados, como a inadequação exigências físicas quanto psicológicas inte-
do mobiliário e das condições de trabalho, ragem de várias formas, contribuindo para
os fatores técnico-organizacionais descritos o aumento na atividade elétrica muscular.
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Quadro 1 Questionário de avaliação da ginástica laboral utilizado pela empresa res-
ponsável pelo programa.
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“Precisa ter uma pessoa responsável para A maioria dos trabalhadores (21) evo-
o bom funcionamento e desenvolvimento cou o relaxamento quando perguntados so-
desta atividade que nos beneficia.”
bre o significado da ginástica.
“É preciso ser obrigatório.”
Para sete trabalhadores, a ginástica
“Acho que é pouco tempo de ginástica significa lazer, para oito, prazer; apenas
para apresentar um bom resultado.” um deles disse que significa tarefa, outro
A maior parte dessas sugestões remete funcionário afirmou se tratar de uma obri-
à necessidade de motivar as pessoas (músi- gação. Seis trabalhadores disseram haver
ca, grupo, orientação, acompanhamento...) união com os colegas, sete evocaram estí-
e de vencer as resistências iniciais, desen- mulo, e 16 disseram que a ginástica signi-
volvendo o hábito da atividade física. fica prevenção.
Discussão
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no setor para lembrá-los da atividade cole- Se o grupo estudado considera a ginástica
tiva. Os facilitadores voluntários não incor- necessária e cerca da metade pratica regu-
poraram o papel a eles destinado, ou seja, larmente alguma atividade física extra-tra-
a proposta do grupo externo, responsável balho, como explicar a baixa adesão?
pela ginástica, de nomear um instrutor da
Analisando o conteúdo das falas, vê-se
empresa para divulgar, estimular e acom-
que os trabalhadores parecem reproduzir o
panhar os exercícios diariamente não vem
discurso dos defensores do programa, mas
surtindo os efeitos esperados. Segundo os
não estão convictos dos seus propósitos,
instrutores, eles se sentem pouco à vontade
uma vez que mencionam o caráter de ta-
ou com baixa capacidade para incentivar
a ativa participação dos colegas, fazendo refa e obrigação do mesmo. Trata-se aqui
com que a atividade seja dependente da de uma ambivalência que guardaria uma
presença do instrutor. Não se trata apenas relação com o objetivo imperativo do te-
de exercer um papel de fiscalização (lem- leatendente de cumprir a sua missão. Ou
bre-se de que a adesão é voluntária), mas seja, entre realizar o seu trabalho e fazer
também de emulação e de acompanhamen- a ginástica, os trabalhadores optariam pelo
to técnico, como transparece nas seguintes primeiro, mesmo considerando possíveis
falas: “Cobrar junto aos escolhidos para benefícios da ginástica. Isso remete à dis-
instruir-nos”; “Acompanhamento com as cussão fundamental dos ergonomistas
instrutoras diariamente”; “Tem que ser dia- (GUÉRIN et al., 2001, DANIELLOU et al.,
riamente, mais vezes e mais horários, até a 1989), segundo os quais parte das dificul-
turma acostumar, nos primeiros meses pre- dades para realizar os procedimentos pre-
cisa de um acompanhamento, ou seja, um vistos é conseqüência da maneira como o
empurrãozinho”; “Um horário fixo para trabalho é organizado, da distância entre o
que todos possam fazer juntos”. prescrito e o real.
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Conclusões
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