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PARTIDOS E ELEIÇÕES NO PARANÁ:
UMA ABORDAGEM HISTÓRICA

Adriano Nervo Codato


Fernando José dos Santos
(orgs.)

TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL DO PARANÁ


- 60 ANOS -

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Tribunal Regional Eleitoral do Paraná

© Copyright dos autores


Direção
Direção: Ivan Gradowski
Coordenação
Coordenação: Ana Flora França e Silva
Capa e projeto gráfico: Milena Nervo Codato e Daniel Amaral Vilela
Revisão técnica
técnica: Gustavo Biscaia de Lacerda
Fábia Berlatto

Partidos e eleições no Paraná: uma abordagem histórica


Suplemento: PARANÁ ELEITORAL

Edição Comemorativa:
60 anos - Tribunal Regional Eleitoral do Paraná

ISBN 85-60558-00-4
Ciência Política. Direito Eleitoral. Direito Político. Direito Partidário. Eleições. Partidos
Políticos. Sociologia Política.
CDD 341.2805

Tiragem: 1.500 exemplares

Os conceitos e interpretações contidos nos trabalhos assinados são de exclusiva


responsabilidade de seus autores.

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Quem não se preocupa com os
fatos não pode entender a política.
Robert Dahl
Análise política moderna, 1976.

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SUMÁRIO

Prefácio (Sérgio Soares Braga) ....................................................................................9


Sobre os autores ........................................................................................................13
Apresentação: Des. Clotário de Macedo Portugal Neto...............................................15
Introdução: Novos horizontes para o estudo da política
institucional no Paraná (Adriano Nervo Codato) ..........................................................17
Lista de siglas .............................................................................................................23

Anos 1940
1. A SEMILEGALIDADE CONSENTIDA:
O desempenho eleitoral do Partido Comunista no Paraná
em meados do século XX
Márcio Kieller .............................................................................................................25

Anos 1950
2. O VOTO INTEGRALIST
INTEGRALISTAA NO PPARANÁ: ARANÁ:
Uma análise das eleições presidenciais de 1955
Amanda Litzinger Gomes ..............................................................................................45

Anos 1960 e 1970


3. A VOTAÇÃO DO MDB DO PPARANÁ:
VOTAÇÃO ARANÁ:
Uma análise histórica (1966 e 1978)
Moacir Ribeiro de Carvalho Júnior ..............................................................................69

4. A VOT AÇÃO DA ARENA NO PPARANÁ:


VOTAÇÃO ARANÁ:
Uma análise histórica (1966 e 1978)
Jorge Eduardo França Mosquera ..................................................................................95

Anos 1980
5. OPÇÃO PELO POPULISMO:
Dissidência política e renovação eleitoral no município de Ponta Grossa
Emerson Urizzi Cervi .................................................................................................125

Anos 1990
6. CLIENTELISMO ELEITORAL E CORONELISMO POLÍTICO:
Estudo de um pequeno município paranaense
Alessandro Cavassin Alves .........................................................................................147

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7. GEOGRAFIA DO VOTO DE ESQUERDA NO PPARANÁ: ARANÁ:
Uma análise do desempenho eleitoral do PT nas eleições presidenciais
(1989-2002)
Luzia Maristela Cabreira Bonette ...............................................................................171

8. CORRUPÇÃO ELEITORAL NO PPARANÁ: ARANÁ:


Um estudo de caso das eleições municipais de 1996
Fernando José dos Santos .........................................................................................187

9. POLÍTICA LOCAL E A OCUP


OCUPAÇÃOAÇÃO DE CARGOS ELETIVOS
EM CURITIBA (1985-2000)
Louise Ronconi de Nazareno ......................................................................................219

Anos 2000
10. INSTITUCIONALIZAÇÃO PPARTIDÁRIA:
ARTIDÁRIA:
Uma discussão empírica a partir do caso do PFL do Paraná
Emerson Urizzi Cervi & Adriano Nervo Codato .........................................................245

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PREFÁCIO
Um sintoma da crescente institucionalização e profissionalização da Ciência
Política no Brasil é o surgimento de um corpus cada vez mais amplo e consistente de
estudos que tomam como objeto de análise atores, instituições e processos políticos nas
esferas subnacionais de governo. É cada vez maior e, mais importante, de maior qualidade
o número de trabalhos que buscam analisar processos políticos nos estados e municípios
brasileiros, investigando de maneira mais sistemática e profunda as características e a
diversidade dos vários “subsistemas” políticos que coexistem em nosso espaço territorial,
para empregar uma expressão de uso consagrado por este tipo de literatura.
O presente livro, organizado por Adriano Nervo Codato e Fernando José dos
Santos, se insere dentro desse contexto de aumento do interesse da corrente dominante da
Ciência Política brasileira pelas unidades político-administrativas subnacionais. Entretanto
os textos contidos nessa coletânea apresentam algumas características específicas e
qualidades que não são comuns de serem encontradas nesses tipos de estudos e para as
quais gostaríamos de chamar a atenção do leitor deste prefácio com vistas a estimulá-lo
desde logo a consultar da maneira mais atenta possível, uma a uma, as importantes
contribuições incluídas nesta obra coletiva.
Em primeiro lugar, devemos destacar o fato de o presente livro ser um ótimo
exemplo do tipo de intercâmbio que pode e deve haver entre a pesquisa acadêmica, que se
realiza na universidade (no caso, os pesquisadores integrantes do Núcleo de Pesquisa em
Sociologia Política Brasileira, da UFPR), e o importante trabalho de preservação,
sistematização e organização de informações realizado por instituições da idoneidade e
do porte do Tribunal Regional Eleitoral do Paraná. Nesse sentido, as pesquisas compiladas
neste livro são uma excelente amostra do tipo de resultados que pode produzir tal
cooperação, se conduzidas por profissionais dedicados e efetivamente comprometidos
com a divulgação dos dados contidos nos acervos desses órgãos públicos para setores
mais amplos da população. Dados e informações estes aqui postos à disposição do
público especializado e do leitor comum no seu grau mais elevado de tratamento analítico,
ou seja, na forma de exposição dos resultados de pesquisas científicas.
Outra característica importante do livro, para a qual o leitor deve estar desde
logo atento, é a de que, embora “empiricamente orientados”, os textos constantes deste
trabalho fogem do empirismo de cunho descritivo presente em boa parte dos estudos
sobre as unidades subnacionais brasileiras, especialmente os produzidos sob o influxo
teórico-metodológico de certos modismos acadêmicos que, de tempos em tempos, assolam
a politologia nacional.

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Ao contrário, embora amplamente ilustrados por evidências empíricas, cada
um dos textos contidos na coletânea traz, subjacente ao processo de exposição dos
resultados das pesquisas, a “problematização” de determinados conceitos ou hipóteses
teóricas que dão sentido e consistência analítica ao processo de coleta e sistematização
de tais evidências.
Assim sendo, um amplo leque de problemas de cunho propriamente teórico é
examinado no conjunto dos artigos, tais como: a participação eleitoral de partidos de
esquerda num contexto de “democracia restringida”; as várias hipóteses explicativas para
as causas do pitoresco voto paranaense num candidato conservador nas eleições
presidenciais de 1955 (o ex-integralista Plínio Salgado); o comportamento eleitoral e a
institucionalização política dos dois grandes partidos durante a vigência do bipartidarismo
autoritário no País (Arena e MDB); as causas da reemergência do populismo num pequeno
município do interior do estado; a sobrevivência de uma espécie de “neocoronelismo”,
em plena entrada do século XXI, em um pequeno município da região metropolitana de
Curitiba; a distribuição espacial dos sufrágios nas últimas eleições majoritárias para
presidente da República nos principais colégios eleitorais do estado; o padrão de corrupção
eleitoral observado nas eleições municipais no Paraná em 1996, através dos julgados de
um tribunal; as relações entre o Executivo e o Legislativo e o padrão de recrutamento das
coalizões e de comportamento dos vereadores nas últimas gestões da prefeitura de Curitiba;
e, para coroar o processo expositivo, a proposição de um modelo de análise que possibilite
a verificação empírica do “grau de institucionalização” das agremiações partidárias,
procedimento analítico corajoso e ambicioso no bom sentido do termo, que nos permite
refletir de maneira mais fundamentada sobre um dos mais controversos conceitos da
Ciência Política (o de “grau de institucionalização”).
Basta a mera enumeração desses significativos problemas de análise política
para verificarmos a riqueza e abrangência dos textos contidos nesta compilação. Por sua
vez, essa variedade temática é complementada por uma amplitude cronológica que possibilita
ao leitor uma visualização abrangente da evolução do “subsistema político” paranaense,
desde os primórdios de criação das primeiras instituições democráticas no pós-II Guerra
Mundial, quando os partidos semiclandestinos de esquerda ainda necessitavam utilizar
subterfúgios para apresentar em outras legendas seus candidatos aos pleitos eleitorais,
até os tempos presentes, quando uma outra esquerda, agora no poder, enfrenta os desafios
e os dilemas da institucionalização partidária e do “ser governo”, ou seja, do estar na
vanguarda do próprio processo de elaboração e de implementação de políticas
governamentais, podendo, portanto, ser responsabilizada por seus acertos e desacertos.
Por fim, gostaríamos de chamar a atenção para uma derradeira qualidade do
trabalho que, nem por ser a última, deixa de ser da maior relevância. É que, embora
centrados na análise de processos políticos ocorridos numa unidade subnacional específica
da região Sul do País, nada mais estranho aos vários textos contidos nessa coletânea do
que o provincianismo empolado que consiste em afirmar, a priori e sem o cotejo sistemático
com estudos de cunho comparativo, a “singularidade” ou a “diferença” específica dos
processos políticos ocorridos no estado do Paraná vis-à-vis outras unidades da federação.

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Ao contrário, são problemas e preocupações universais da Ciência e da Teoria Políticas
que fazem parte do foco de interesses dos artigos e de seus autores, destituídos de
qualquer intencionalidade apologética em relação aos atores participantes de tais processos,
ou da preocupação algo provinciana com a “singularidade” dos fenômenos observados
ou com a “identidade” sociológica e cultural de uma determinada região, um tipo de
preocupação ainda presente em certa categoria de estudos históricos e sociológicos a
respeito das unidades subnacionais brasileiras, e que nem sempre produz resultados
analíticos fecundos.
Essa amplitude de vistas e densidade teórica, cujo sintoma mais patente é o bom
nível do diálogo empreendido com a literatura contemporânea produzida em vários ramos
das ciências sociais, faz com que Partidos e eleições no Paraná possa ser consultado com
proveito não apenas pelos leitores interessados nos problemas referentes à história e à
política paranaenses, mas também por pesquisadores e analistas de outros estados que
buscam inspiração e parâmetros analíticos comparativos para a realização de pesquisas
noutras esferas subnacionais.
Todas estas características e qualidades dos artigos contidos nessa coletânea –
dentre outras que o leitor atento perceberá ao percorrer os textos _ estão presentes de
forma concentrada neste livro, certamente devido à capacidade aglutinadora de seus
organizadores e sua dedicação ao trabalho coletivo de pesquisa. Sendo assim, resta ao
prefaciador parabenizar os autores e as instituições envolvidos na elaboração deste trabalho
que _ sem favor algum e para usar uma expressão que nem por ser um clichê deixa de ser
verdadeira _ constitui-se numa referência obrigatória para os estudos sobre “partidos e
eleições” nas unidades subnacionais brasileiras, e não apenas no estado do Paraná.
Como corolário dessas já longas considerações, resta-nos apenas fazer votos
para que a publicação deste livro inspire e estimule pesquisadores de outros estados e
municípios brasileiros a interagir da mesma forma com as respectivas instituições públicas,
para produzirem estudos da mesma qualidade e relevância que os contidos nesta importante
obra.

Sérgio Soares Braga


Curitiba, maio de 2006.

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SOBRE OS AUTORES
ADRIANO NERVO CODATO
Adriano Nervo Codato é professor de Ciência Política na Universidade Federal
do Paraná (UFPR) e coordenador do Núcleo de Pesquisa em Sociologia Política Brasileira.
É autor de Sistema estatal e política econômica no Brasil pós-64. Sao Paulo: Hucitec/
ANPOCS/Ed. da UFPR, 1997; e Political Transition and Democratic Consolidation: Studies
on Contemporary Brazil. New York; Nova Science, 2006. É editor da Revista de Sociologia
e Política.

ALESSANDRO CAVASSIN ALVES


Alessandro Cavassin Alves é mestre em Sociologia pela Universidade Federal do
Paraná (UFPR) e Bacharel em Ciências Sociais também pela UFPR.

AMANDA LITZINGER GOMES


Amanda Litzinger Gomes é Bacharel em Ciências Socias pela Universidade Federal
do Paraná (UFPR), e Especialista em Gestão de Políticas, Programas e Projetos Sociais,
pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR).

EMERSON URIZZI CERVI


Emerson Urizzi Cervi é graduado em Comunicação Social pela Universidade
Estadual de Ponta Grossa (UEPG) e concluiu o mestrado em Sociologia na Universidade
Federal do Paraná (UFPR) em 2002. Cursa o doutorado em Ciência Política no Instituto
Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (IUPERJ). Atualmente é professor das
Faculdades Integradas do Brasil (UniBrasil) e Professor do Curso de Especialização em
Sociologia Política da Universidade Federal do Paraná. Atua na área de Ciência Política,
com ênfase em comunicação política, opinião pública e comportamento eleitoral.

FERNANDO JOSÉ DOS SANTOS


Fernando José dos Santos é Assessor Técnico de Sessões e editor da revista
Paraná Eleitoral no TRE/PR, Professor de Direito Eleitoral nas Faculdades Integradas do
Brasil, co-autor de Crimes Eleitorais e Outras Infringências, Juruá Editora, 2ª Edição,
1996.

JORGE EDUARDO FRANÇA MOSQUERA


Jorge Eduardo França Mosquera é jornalista formado pela Universidade Federal do Paraná
(UFPR). Foi repórter e editor em jornais de Curitiba, correspondente de esportes de O
Globo, correspondente de Veja e chefe da sucursal de O Estado de S. Paulo. Atualmente, é
coordenador de conteúdo do site da Prefeitura de Curitiba. Especializou- se em Sociologia
Política pela UFPR e cursa Direito nas Faculdades Integradas do Brasil (UniBrasil).
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LOUISE RONCONI DE NAZARENO
Louise Ronconi de Nazareno é graduada em Ciências Sociais pela Universidade
Federal do Paraná (UFPR) e mestre em Ciência Política pela Universidade de São Paulo
(USP). Socióloga do Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econômico e Social
(IPARDES), é também professora do curso de graduação em Ciência Política da Faculdade
Internacional de Curitiba (FACINTER).

LUZIA MARISTELA CABREIRA BONETTE


Luzia Maristela Cabreira Bonette é Graduada em Ciências Sociais pela
Universidade Federal do Paraná (UFPR), Especialista em Sociologia Política, também pela
UFPR, fez pós-graduação em Formação Pedagógica do Professor Universitário e é mestranda
em Educação na Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR).

MÁRCIO KIELLER
Márcio Kieller é Bacharel em Ciências Sociais pela Universidade Federal do
Paraná (UFPR), Mestre em Sociologia também pela UFPR e foi professor de Ciência Política
da Faculdade Internacional de Curitiba (FACINTER). É autor do livro: PCB/PCdoB: a
unidade comunista no Brasil (Ibert, 2002).

MOACIR RIBEIRO DE CARVALHO JÚNIOR


Moacir Ribeiro de Carvalho Júnior é graduado em Direito pela Pontifícia
Universidade Católica do Paraná (PUC-PR), advogado em Curitiba, tem Especialização em
Sociologia Política na Universidade Federal do Paraná (UFPR) e é mestrando em Gestão
Urbana na PUC-PR.

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APRESENTAÇÃO
Logo após a minha posse na presidência do Tribunal Regional Eleitoral do
Paraná chegou-me a solicitação para minutar a apresentação de um livro organizado pelo
servidor Fernando José dos Santos, responsável pela já reconhecida revista “Paraná
Eleitoral”, e pelo professor Adriano Nervo Codato.
O livro intitulado Partidos e eleições no Paraná: uma abordagem histórica foi
levado a efeito pela parceria inédita e importantíssima, digo desde já, com o Núcleo de
Pesquisa em Sociologia Política Brasileira, vinculado ao Departamento de Ciências Sociais
da Universidade Federal do Paraná, sob o patrocínio do Tribunal Eleitoral do Paraná.
Despido de qualquer sentimento de vaidade, mas tomado completamente pelo
orgulho, não posso deixar de registrar um fato histórico curioso, máxime em consideração
a abordagem histórica da publicação.
Clotário de Macedo Portugal, meu avô, há sessenta anos, foi o primeiro presidente
deste Tribunal. Agora, passados todos esses anos, como o fecho de um percurso, o fim de
uma caminhada, sou levado ao encargo de fazer a ligação dessas linhas históricas iniciadas
na conformidade daquela época.
Digo isso porque tenho certeza que seus atos, a seu modo, em muito contribuíram
para encaminhar esta então incipiente Justiça especializada.
Faço essa menção histórica com o único objetivo de trazer à reflexão o fato da
transitoriedade dos homens, administradores públicos.
Nesses 60 anos que intermediaram nossos mandatos, dezenas de
desembargadores, alguns melhores administradores, outros mais eloqüentes julgadores,
passaram pela cadeira da presidência desta Casa.
Uma passagem de olhos pela Galeria de ex-presidentes, que fica anexa à nossa
Sala de Sessões, nos remete a uma sensação de transitoriedade e eu diria até fungibilidade.
Pois bem, faço toda essa digressão para dizer-lhes, sem adjetivos inúteis, da verdadeira
importância da palavra escrita.
A contribuição do Núcleo de Pesquisa em Sociologia Política Brasileira, com
quem temos trocado valiosas informações, é de importância sem precedentes.
As observações sociológicas, políticas, os estudos doutrinários e todas essas
contribuições permanecerão para sempre.
Os escritores se tornam eternos por intermédio dos seus textos e as idéias, uma
vez publicadas, retratam toda uma época.
De algum modo, todos nós que integramos o Tribunal, magistrados e servidores,
temos o poder da representação pessoal e até de dizer em nome do Tribunal.

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Todavia, são aqueles que ousam escrever sobre política, sobre direito e sobre
sociologia que, justamente, se eternizaram no poder da sabedoria.
Em nome do meu avô, que iniciou esta caminhada, agradeço a vocês pelo
empenho e pela direção a que empreenderam seus esforços.
Esta parceria inédita deve prosseguir.
Meus agradecimentos e estímulos aos coordenadores desta obra, professor
Adriano Nervo Codato, da área de Ciência Política da Universidade Federal do Paraná, ao
servidor Fernando José dos Santos, deste Tribunal, e a todos que contribuíram para esta
edição histórica, nomino-os individualmente para que, como ocorre com galeria dos ex-
presidentes, tenham sempre seus nomes lembrados: Márcio Kieller, Amanda Litzinger
Gomes, Moacir Ribeiro de Carvalho Júnior, Jorge Eduardo França Mosquera, Alessandro
Cavassin Alves, Luzia Maristela Cabreira Bonette, Louise Ronconi de Nazareno e Emerson
Urizzi Cervi.

DES. CLOTÁRIO DE MACEDO PORTUGAL NETO


Presidente

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INTRODUÇÃO
Novos horizontes para o estudo
da política institucional no Paraná

I. Dimensões de análise
Se no Brasil a Ciência Política custou a firmar-se como uma área de estudos de
direito próprio, com teorias, materiais e métodos que não fossem emprestados da Sociologia
ou do Direito Constitucional, no Paraná análises sistemáticas e regulares sobre a política
local só começaram a aparecer muito recentemente. Descontados três ensaios sobre
“partidos e eleições” na década de 19601, o tema só receberia um tratamento mais objetivo
na segunda metade dos anos 19902. Olhando a evolução do material publicado, o que se
constata é um campo inédito e imenso de questões, casos e problemas a explorar3.
Este livro retoma o caminho aberto pelos precursores, mas aproveitando-se do
significativo incremento (teórico e empírico) e da indispensável institucionalização da
nossa disciplina nos últimos vinte anos. São três os temas tratados: o desempenho político
dos partidos (à direita, ao centro e à esquerda); o estudo de determinadas eleições ao
longo do desenvolvimento político do estado; e as relações executivo-legislativo em nível
municipal. A variedade do material aqui impresso admite que se avalie (assim espero) a
dinâmica da política paranaense dos últimos cinqüenta anos nessas áreas específicas.
Trabalho indispensável que autoriza comparações históricas e geográficas que permitam
superar, de uma vez por todas, a mitologia “sociológica” da peculiaridade estadual,
construída e difundida com base em impressões muito circunstanciais e evidências, na
maioria das vezes, folclóricas. Assim, o decantado conservantismo “do Paraná” e “dos
paranaenses” (expresso dessa maneira e nesse grau de generalidade) adquire aqui uma
1
Ver: Wilson Martins, O Paraná é uma incógnita. Revista Brasileira de Estudos Políticos, n. 8, abr. 1960, p. 229-
254; José N. dos Santos, Comportamento eleitoral do Paraná nas eleições de 1962. Revista Brasileira de Estudos
Políticos, n. 16, jan. 1964, p. 227-250; e Altiva P. Balhana, Eleições em Santa Felicidade, 1945-1965. Revista
Brasileira de Estudos Políticos, n. 27, jul. 1969, p. 203-260.
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V. Luzia Helena Herrmann de Oliveira, Democratização e institucionalização partidária: o processo
políticopartidário no Paraná (1979-1990). Londrina: Editora da UEL, 1998; e Mário Sérgio Lepre, Caos partidário
paranaense. Londrina: Editora da UEL, 2000.
3
Falo aqui, evidentemente, da Ciência Política, meu ofício. Sociólogos, economistas e historiadores escreveram
bons ensaios sobre “a política paranaense”. V., por exemplo, Francisco Paz, Cenários de economia e política do
Paraná. Curitiba: Prephácio, 1991.

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base objetiva e empírica, que o conecta com a dinâmica mais geral do sistema partidário
e com a evolução do comportamento eleitoral no Brasil na segunda metade do século XX.
O proveito em adotar essa perspectiva – historicamente mais ampla e cujo foco é ajustado
a partir do sistema político federal – é confrontar idéias persistentes, como a do “Brasil
diferente”, e repor a exceção paranaense nos seus devidos termos: como um caso entre
outros, ou como um caso que, afinal de contas, não está tão afastado assim das circunstâncias
políticas nacionais.
Daí que a originalidade desses dez estudos se situe menos no ineditismo dos
objetos que trata – o populismo, o clientelismo, a institucionalização partidária e a corrupção
política, e sua relação com a política local – , e mais na maneira em pensá-los: já que não
haveria tanto mérito em se declarar explorador de um território inexplorado. Nesse
contexto, como se sabe, a cada enxadada, uma minhoca.

II. Problemas de política regional


Este livro foi também elaborado a partir de uma perspectiva histórica. Desde a
redemocratização, que pôs fim ao Estado Novo, até o regime brasileiro atual, os estudos
reunidos aqui procuram dar uma visão menos generalizante e mais circunstanciada das
forças políticas que atuaram no estado da Segunda Guerra em diante. O volume que o
leitor tem em mãos acompanha a evolução do sistema político estadual, examinando a
dinâmica partidária e eleitoral do Paraná a cada década, de 1940 aos anos 2000.
O capítulo 1, A semilegalidade consentida, de Márcio Kieller, cobre o
desempenho eleitoral do Partido Comunista no Paraná logo depois do reconhecimento
oficial da agremiação, em 1945, fazendo um relato minucioso da participação dos seus
dirigentes nas eleições majoritárias e proporcionais até a década de 1960. O estudo
mobilizou um conjunto muito variado de fontes históricas. No Arquivo Público do
Paraná foi consultado o Fundo da Delegacia de Ordem Política e Social – Dops. No
Tribunal Regional Eleitoral do Paraná (TRE-PR) foram examinados o Livro-ata da fundação
e registro do Partido Comunista no estado em 1945; o Livro-ata da composição da
primeira direção estadual e municipal do PCB-PR; e o Livro-ata com os resultados das
eleições gerais e proporcionais de 1945 e 1947. Além disso, foram realizadas uma
série de entrevistas com dirigentes do Partido. Kieller sustenta que, mesmo com uma
participação muito pequena na vida legal dos estados (pouco mais de dois anos), o
PCB-PR atuou com força nos pleitos eleitorais que antecederam à cassação do seu
registro em 1947, elegendo quatro vereadores (dois em Curitiba, um em Antonina e um
em Londrina) e um deputado estadual (José Rodrigues Vieira Netto). Depois disso,
banidos do sistema político-eleitoral, os comunistas atuaram como força auxiliar de
partidos e frentes partidárias e dirigiram lutas sociais importantes no estado, como a
Campanha dos Comunistas pela Paz e o Levante de Porecatu, cumprindo assim um papel
fundamental na organização da esquerda no Paraná até o golpe de 1964.
A pesquisa de Amanda Litzinger Gomes, O voto integralista no Paraná (capítulo
2), é uma análise das eleições presidenciais de 1955 no estado a partir de duas interrogações:
por que o líder integralista Plinio Salgado, do minúsculo Partido de Representação Popular

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(PRP), obteve um apoio político tão significativo? E por que o Paraná, onde Juscelino não
venceu, seguiu um padrão de votação diferente dos demais estados brasileiros? Nesse
pleito, Plinio alcançou a terceira maior votação (com 103 337 votos, conquistando por
isso 23% do eleitorado paranaense), batendo assim seus principais concorrentes (Juscelino
Kubitschek (da aliança PSD-PTB), Adhemar de Barros (do PSP) e Juarez Távora (da UDN-
PDC)) em vários colégios eleitorais importantes, dentre eles Curitiba, onde fez 40% dos
votos. Para responder a essas questões Amanda estudou o sistema político-partidário
brasileiro entre 1945-1964 e as principais linhas de força da política paranaense nos anos
1950. Concentrando sua atenção na campanha presidencial no Paraná, o exame dos dados
eleitorais em Curitiba destaca a coincidência da votação obtida por Plinio Salgado e a
obtida por Moysés Lupion, candidato a governador pela coligação PSD-PDC-PTN, em
todas as zonas eleitorais da cidade, com percentuais quase idênticos. Esse fato poderia
sugerir, segundo a autora, um processo maciço de transferência de votos (e prestígio
político) de Lupion a Plinio. Contudo, como não houve coligação formal entre os partidos,
nem campanha em comum entre os candidatos, sustenta-se que foi o eleitorado quem
produziu essa “aliança” informal. Essa conclusão, fundamentada empiricamente, contribui
para suspeitar das opiniões correntes que afirmam o conservadorismo atávico dos
paranaenses.
Os capítulos 3 e 4 merecem ser lidos juntos. Eles reproduzem, a partir dos
dados do TRE-PR, os resultados eleitorais obtidos pelo Movimento Democrático Brasileiro
(MDB) e pela Aliança Renovadora Nacional (Arena) na primeira e na última eleição sob o
bipartidarismo, durante a ditadura militar, em 1966 e 1978. O primeiro estudo – A
votação do MDB do Paraná: uma análise histórica – de Moacir Ribeiro de Carvalho Júnior
investiga o desempenho da sigla nas cinco maiores cidades do estado, ressaltando como
o processo de desenvolvimento urbano contribuiu para a polarização do voto. Procura-
se demonstrar que o processo de urbanização do Paraná, ao longo das décadas de 1960
e 1970, contribuiu, em certa medida, para a formação de um “espírito crítico” do eleitor
diante do regime, levando-o a optar pelo partido de oposição à ditadura. Jorge Eduardo
França Mosquera, autor do segundo estudo – A votação da Arena no Paraná: uma análise
histórica – , pôs à prova a tese conhecida segundo a qual o partido do governo era
invariavelmente bem sucedido no interior, econômica e culturalmente menos desenvolvido,
mas derrotado nas capitais. Os resultados obtidos pela Arena em Curitiba e nas outras
quatro principais cidades do estado (Londrina, Maringá, Ponta Grossa e Cascavel) revelam
que, se em 1966 a Aliança Renovadora Nacional foi a força política hegemônica no Paraná
(inclusive na capital), em 1978 o partido da ditadura perdeu força também no interior,
vencendo apenas na conservadora Ponta Grossa.
O ensaio de Emerson Urizzi Cervi – Opção pelo populismo: dissidência política
e renovação eleitoral no município de Ponta Grossa – busca uma explicação para as
relações entre a elite política e o eleitorado em disputas municipais, enfocando o processo
de substituição de grupos hegemônicos pela oposição legal. No caso em análise (as
eleições municipais de 1996 em Ponta Grossa), a troca de um grupo político por outro

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(cujo perfil era completamente diferente) se deu graças ao surgimento de uma liderança
“carismática e populista”, o radialista Jocelito Canto (do PSDB-PR). Sua eleição terminou
com um ciclo de treze anos em que uma mesma aliança política (conservadora) se
manteve à frente da prefeitura. A vitória de Jocelito não se deveu à pretensa manipulação
ideológica das necessidades das classes mais baixas, já que o candidato conseguiu maioria
de votos em todas as regiões da cidade, em todas as faixas etárias e em todas as camadas
sociais. Na verdade, a elite no poder entrou em crise interna, em especial no período que
vai de 1993 a 1996, aumentando assim a capacidade da dissidência política e a força da
oposição.
Sobre a década de 1990 o livro traz quatro estudos. Clientelismo eleitoral e
coronelismo político, de Alessandro Cavassin Alves (cap. 6), trata da política em pequenos
municípios. Segundo o IBGE, há no Paraná 323 cidades com menos de 20 mil habitantes.
Tomando o caso de Itaperuçu (na região Metropolitana de Curitiba) como exemplo, vê-se
que as estratégias das lideranças locais para vencerem as eleições, tanto para prefeito
como para vereador, ou as redes de apoio mútuo formadas por políticos estaduais e
federais com políticos e lideranças municipais, denunciam a permanência de práticas
pouco “modernas”. A análise da série de eleições majoritárias e proporcionais na cidade,
de 1992 até 2002 (para os três níveis: municipal, estadual e federal), indica que o
“coronelismo” e o “clientelismo” condicionam o funcionamento desse micro-sistema
político. Vigora em Itaperuçu, conforme mostra Alessandro, uma forma atualizada de
“compromisso coronelista”. As elites políticas locais – versões contemporâneas e mais
eficientes dos “coronéis” do interior – controlam, através do clientelismo, os votos do
município destinados a deputados estaduais e federais em troca de recursos orçamentários
para obras públicas na cidade, conservando, por essa via, seu prestígio e sua posição
política. O chefe municipal torna-se assim responsável (“padrinho”) pelas vitórias eleitorais
dos candidatos por ele apoiados, instaurando um intercâmbio de proveitos entre o poder
público estadual e federal com os governos municipais. Mas não só o processo eleitoral
firma esse “compromisso coronelista”. Há também aqui grande semelhança com a vida
política nos pequenos municípios brasileiros durante a República Velha (1889-1930), tal
como descrita por Victor Nunes Leal.
O capítulo 7 – Geografia do voto de esquerda no Paraná – de Luzia Maristela
Cabreira Bonette analisa o desempenho do Partido dos Trabalhadores no estado nas
quatro eleições presidenciais de 1989 a 2002. Iluminando o processo político dos últimos
anos, Luzia revisa a série quase infinita de condicionantes do voto “petista”, examinando
o comportamento dos eleitores em função da mudança de perfil/discurso do candidato;
das propostas do partido (ora à esquerda, ora ao centro); das sucessivas configurações
do meio político regional e nacional (o que envolve as diferentes coligações partidárias e
a adesão ou não das oligarquias locais à candidatura de Lula); do grau de informação e
sofisticação política dos votantes; da avaliação do candidato em função de características
e aspectos ligados a valores e símbolos de tipo moral (aparência, honestidade, credibilidade)
etc. Sua interpretação sustenta que os fatores explicativos variaram de eleição para eleição,

20
dependendo do contexto político, econômico e social em cada momento e em cada cidade,
o que impede a proposição de uma tese geral sobre as razões do voto na esquerda no
Paraná.
O capítulo 8 – Corrupção eleitoral no Paraná – é um estudo de caso das
eleições municipais de 1996 no estado e pretende entender e explicar o funcionamento da
justiça eleitoral e da estrutura legal frente às práticas de corrupção. Assim, Fernando José
dos Santos, através de uma criteriosa sistematização dos delitos registrados nos livros de
acórdãos do TRE-PR, oferece uma série de elementos que atestam a baixa eficiência da
estrutura jurídica existente, que não consegue tipificar os crimes mais lesivos para a
ordem democrática, principalmente o “abuso do poder econômico”.
Louise Ronconi de Nazareno descreve a dinâmica política recente em Curitiba
(entre 1985 e 2000), estudando o comportamento/atuação dos vereadores na Câmara
Municipal e, em especial, os processos de construção de apoio legislativo ao executivo. O
capítulo de Louise – Política local e a ocupação de cargos eletivos em Curitiba – é uma
tentativa, bem sucedida, de pôr em evidência as práticas clientelistas tradicionais que
reforçam os princípios, os instrumentos e o comportamento em geral dos atores políticos.
Para a autora, essas práticas estiveram a serviço da construção de uma aliança que
sustentou, no governo municipal, o grupo político de (ou ligado a) Jaime Lerner.
Por último, o capítulo 10 – Institucionalização partidária: uma discussão
empírica a partir do caso do PFL do Paraná – que escrevi com Emerson Cervi levanta as
razões da não institucionalização do Partido da Frente Liberal no Paraná. Contrariando o
estilo da agremiação em nível nacional4, o PFL-PR permaneceu um partido fraco, mesmo
depois de ocupar cargos no governo do estado durante a segunda gestão de Jaime Lerner
(1999-2002), mesmo depois de conhecer um expressivo aumento do número de cadeiras
nos legislativos estadual e municipal, um aumento importante do número de prefeituras e
alcançar uma influência política expressiva na Assembléia. Nossa hipótese é que a análise
isolada das informações sobre o incremento eleitoral e a presença institucional do PFL
não são suficientes para evidenciar se houve um “fortalecimento” do partido no Paraná a
partir da filiação do governador, em 1997. De fato, depois disso nunca ocorreu o que
seria usual esperar: um controle do governo pelo partido, mas exatamente o inverso, o
controle do partido pelo governo, passando o PFL a depender estritamente do prestígio/
poder de Jaime Lerner.

III. Fontes dos capítulos


Com exceção do capítulo 9 (de Louise Ronconi de Nazareno) e do capítulo 5 (de
Emerson Urizzi Cervi), todos os demais estudos aqui publicados resultaram de trabalhos
orientados por mim no âmbito do projeto Instituições e comportamento político no Brasil
contemporâneo: o Paraná em perspectiva histórica, que desenvolvemos no Núcleo de
Pesquisa em Sociologia Política Brasileira, do Departamento de Ciências Sociais da

4
Como se sabe, o PFL é um partido coeso, disciplinado e, durante os mandatos de Fernando Henrique (1995-
2002), com grande capacidade de influência junto ao executivo.

21
Universidade Federal do Paraná, entre 2001 e 2005.
“Institucionalização partidária: uma discussão empírica a partir do caso do PFL
do Paraná”, de Emerson Urizzi Cervi & Adriano Nervo Codato (cap. 10) é uma versão
bastante modificada do paper O PFL do Paraná: marginalidade e centralidade no sistema
político subnacional apresentado no III Encontro Nacional da Associação Brasileira de
Ciência Política (ABCP) em Niterói (RJ) em 2002. “O voto integralista no Paraná: uma
análise das eleições presidenciais de 1955", de Amanda Litzinger Gomes (cap. 2) e
“Clientelismo eleitoral e coronelismo político: estudo de um pequeno município
paranaense”, de Alessandro Cavassin Alves (cap. 6) são, ambas, novas versões dos trabalhos
de conclusão do curso de graduação em Ciências Sociais dos seus autores na Universidade
Federal do Paraná em 2003. Os capítulos 3, 4, 7 e 8, de Moacir Ribeiro de Carvalho Júnior,
Jorge Eduardo França Mosquera, Luzia Maristela Cabreira Bonette e Fernando José dos
Santos, respectivamente, são adaptações das monografias apresentadas pelos autores em
2004 ao curso de Especialização em Sociologia Política da Universidade Federal do Paraná.
E, por fim, “A semilegalidade consentida: o desempenho eleitoral do Partido Comunista no
Paraná em meados do século XX”, de Márcio Kieller (cap. 1), é parte da dissertação de
mestrado do autor apresentada ao programa de pós-graduação em Sociologia da UFPR em
2004 sob o título: A elite dos comunistas: um perfil socioeconômico dos dirigentes
estaduais do Partido Comunista Brasileiro no Paraná (1945-1964).

Adriano Nervo Codato


Curitiba, Praça do Expedicionário, maio de 2006.

22
LISTA DE SIGLAS
Acipg - Associação Comercial e Industrial de Ponta Grossa
ALN - Aliança Libertadora Nacional
Arena - Aliança Renovadora Nacional
CMC - Câmara Municipal de Curitiba
Codepar - Comissão de Desenvolvimento do Paraná
Cohab - Companhia de Habitação do Paraná
CTNP - Companhia de Terras Norte do Paraná
DOPS - Departamento de Ordem Política e Social
FDLN - Frente Democrática de Libertação Nacional
FEB - Força Expedicionária Brasileira
Femoclan - Federação Comunitária das Associações de Moradores de Curitiba e Região
Metropolitana
IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IPC - Índice de potencial de consumo
MDB - Movimento Democrático Brasileiro
OAB - Ordem dos Advogados do Brasil
PAN - Partido dos Aposentados da Nação
PCB - Partido Comunista Brasileiro
PCdoB - Partido Comunista do Brasil
PDC - Partido Democrata Cristão
PDS - Partido Democrático Social
PDT - Partido Democrático Trabalhista
PFL - Partido da Frente Liberal
PGT - Partido Geral dos Trabalhadores
PHS - Partido Humanista Social
PIB - Produto interno bruto
PJ - Partido da Juventude
PL - Partido Liberal (fundado em 1985)
PL - Partido Libertador (período 1946-1964)
PMB - Partido Municipalista Brasileiro
PMDB - Partido do Movimento Democrático Brasileiro
PMN - Partido da Mobilização Nacional
PP - Partido Progressista
PPB - Partido Progressista do Brasil

23
PPS - Partido Popular Socialista
PR - Partido Republicano
PRN - Partido da Reconstrução Nacional
PRP - Partido de Representação Popular
PRP - Partido Republicano Progressista
PRT - Partido Republicano Trabalhista
PSB - Partido Socialista Brasileiro
PSC - Partido Social Cristão
PSD - Partido Social Democrático
PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira
PSDC - Partido Social Democrata Cristão.
PSL - Partido Social Liberal
PST - Partido Social Trabalhista
PT - Partido dos Trabalhadores
PTB - Partido Trabalhista Brasileiro
PTdoB - Partido dos Trabalhadores do Brasil
PTN - Partido dos Trabalhadores da Nação
PV - Partido Verde
RMC - Região Metropolitana de Curitiba
SNI - Serviço Nacional de Informações
SRPG - Sociedade Rural de Ponta Grossa
TRE - Tribunal Regional Eleitoral do Paraná
TSE - Tribunal Superior Eleitoral
UDN - União Democrática Nacional
UFPR - Universidade Federal do Paraná
URSS - União das Repúblicas Socialistas Soviéticas

24
CAPÍTULO UM

A SEMILEGALIDADE CONSENTIDA:
O DESEMPENHO ELEITORAL DO PARTIDO COMUNISTA
NO PARANÁ EM MEADOS DO SÉCULO XX

Márcio Kieller

25
26
1. A SEMILEGALIDADE CONSENTIDA:
O desempenho eleitoral do Partido Comunista
no Paraná em meados do século XX 1

Este capítulo trata do Partido Comunista do Brasil (PCB), tanto nas suas
participações legais, ou seja, nas eleições que ocorreram no período de abertura
democrática, entre os anos 1945 e 1947, como também em sua fase clandestina, quando
se apresentou nos processos eleitorais de forma organizada, por meio de outras legendas
ou apoiando politicamente diversos candidatos, mesmo que informalmente. Busca-se
analisar o desempenho dos comunistas nessas eleições, bem como suas táticas e estratégias
eleitorais. Para tanto, verificamos quem foram os seus candidatos, em que setores atuavam,
como foi a organização de suas campanhas, quais votações obtiveram e qual foi a posição,
a importância e o papel do partido e de seus candidatos nessas disputas eleitorais. Os
dados foram obtidos no Tribunal Regional Eleitoral do Paraná (TRE-PR).

I. O RECONHECIMENTO LEGAL DO PARTIDO COMUNISTA DO BRASIL

Os primeiros documentos sobre a existência legal do Partido Comunista no


Paraná só apareceram por volta de 19452, quando se criou o TRE do Paraná; como disse
Gildo Marçal Brandão, “[...] Só a partir de 1945 o PCB começa a existir como partido”
(BRANDÃO, 1997a, p. 89).
O fim da II Guerra Mundial levou a uma grande mudança nos rumos da geopolítica
internacional. No final desse período, ao ser pressionado a tomar uma decisão, o Brasil
posicionou-se junto ao bloco aliado. Isso acarretou enormes mudanças políticas e sociais
para o país, como a abertura política, que colocou fim ao Estado Novo getulista, vigente
desde o ano de 19373.
1
O presente texto é uma versão atualizada do capítulo “O PCB e as eleições”, que integra a minha dissertação de
mestrado em Sociologia defendida em 2004 no Departamento de Ciências Sociais da Universidade Federal do Paraná.
A pesquisa focalizou os dirigentes comunistas paranaenses entre os anos de 1945 e 1964 e teve por título A elite dos
comunistas: um perfil sócio-econômico dos dirigentes estaduais do Partido Comunista Brasileiro no Paraná.
2
Entretanto os arquivos da repressão do Estado Novo no Paraná, guardados junto aos arquivos do Fundo DOPS,
informam que existiam comunistas e atividades comunistas no estado já a partir da década de 1930.
3
Com a implantação do Estado Novo foi outorgada a Constituição de 1937, conhecida pelo nome de Polaca, devido
ao fato de basear-se na Constituição fascista da Polônia. Por ela o poder Executivo e Presidente da República eram
os órgãos supremos do país, controlando todos os poderes e nomeando interventores para governá-los; dentre
outras possibilidades, podia ainda acabar com a autonomia dos estados e com as bandeiras estaduais e criou a
pena de morte no Brasil.

27
Os partidos estavam todos na clandestinidade, existia um quadro político no
Brasil em que o partido era o Estado e vice-versa. Sartori descreve esse sistema como
sendo um partido do Estado: “O rótulo é habitualmente aplicado aos Estados comunistas,
mas é também adequado ao nazismo, ao fascismo italiano e a todos os que se inspiram
nesses protótipos. Na linguagem abstrata de uma racionalização, o argumento é o de que
enquanto os partidos são partes não podem, por essa razão mesma, identificar-se com o
Estado. Pois todos não podem coexistir se não tendem a coincidir. Nesse sentido pode-se
dizer o que partido único é uma duplicação do Estado” (SARTORI, 1982, p. 66).
Com a volta da legalidade democrática em função da vitória dos aliados na II
Grande Guerra, o quadro no Brasil mudou; assim, caminhava-se desde 1943 para a
abertura política que se consolidou em 1945 com a volta dos partidos políticos e a
convocação de uma nova Assembléia Nacional Constituinte.
A justiça eleitoral, que fora extinta em 1937 com o Estado Novo, foi novamente
colocada em funcionamento pelo governo Getúlio Vargas. Em 1945, mais precisamente no
dia 7 de junho, instalou-se no Paraná o Tribunal Regional Eleitoral, sob a presidência do
Desembargador Clotário de Macedo Portugal. Junto com ele havia mais nove funcionários
de outras secretarias. Entre a criação desse Tribunal e as primeiras eleições depois do fim
do Estado Novo, que aconteceriam em 2 de dezembro de 1945, houve uma distância de
apenas sete meses.
O Partido Comunista do Brasil no Paraná, a exemplo do que aconteceu no nível
nacional, voltou a atuar legalmente apenas depois de 1945, já com uma política nacional e
organizado nos estados. No Paraná o conjunto de comunistas já era razoável, pois com o
fim do Estado Novo e a redemocratização do país, um bom número de intelectuais
aproximou-se do Partido, movidos pela liderança que Prestes exercia e também em
virtude das campanhas em favor do envio da Força Expedicionária Brasileira para a
Europa, contra o nazismo.
A novidade para o PCB era a legalidade. Diferentemente do que ocorrera no
passado, ele poderia participar e disputar eleições como qualquer outro partido. Assim,
participou legalmente das eleições de 1945, quando, elegeu uma boa bancada federal,
assim como na eleição de 1947.
A ata de fundação do Partido no Paraná, segundo depoimentos, data de 1945.
Porém sua criação legal aconteceu primeiramente em Curitiba, com uma reunião de seu
Comitê Estadual para a fundação do Comitê Municipal do PCB, que, segundo o jornal
Gazeta do Povo do dia 7 de julho de 1945, ocorreu exatamente um mês depois da instalação
do TRE-PR. O Comitê Municipal compunha-se de dez membros efetivos e dois suplentes
e foi registrado no TRE-PR após uma semana nas mãos do então Primeiro Secretário
Político do PCB na capital, o ferroviário Arpad Printz, conforme segue: “Ata da 16ª sessão
extraordinária do Egrégio Tribunal Regional Eleitoral do Paraná [...]. Aos quatorze dias
do mês de julho do ano de mil novecentos e quarenta e cinco [...] O escrivão Eleitoral, de
acordo com autorização deste Egrégio Tribunal e do senhor Arpad Printz, Secretário do
Comitê Municipal do Partido Comunista do Brasil em Curitiba, comunicam a instalação do
mesmo comitê” (TRE-PR, 1945).

28
Somente após a fundação do Partido na capital é que seu Diretório Estadual foi
fundado legalmente, tendo seu registro aceito no TRE-PR em novembro de 1945, dias
antes das eleições para a escolha do novo Presidente e da Assembléia Nacional Constituinte
que aconteceriam no início de dezembro de 1945. O Partido teve seu diretório reconhecido
em uma sessão extraordinária do TRE do Paraná: “Ata da 3ª sessão extraordinária do
Egrégio Tribunal Regional Eleitoral do Paraná [...] Aos dezessete dias do mês de novembro
do ano de hum mil novecentos e quarenta e cinco [...] julgamentos: [...] Processo 807
classe D de Curitiba. Interessado o Partido Comunista do Brasil. Relator exmo. Sr. Ernani
Cartaxo. O Tribunal mandou proceder ao registro da Direção Estadual” (TRE-PR, s/d-a, p.
154).
O Partido tornou-se legal. A fundação oficial do PCB no estado foi seu marco zero.
Segundo Galvão:
“Quando o Partido anunciou que seria instalado no Paraná, nós procuramos o
Comitê Provisório que era dirigido por um senhor que [...] participava do CNOP – Comitê
Nacional de Reorganização Provisória. O CNOP, nesse final de guerra – que começou uma
certa liberação de presos políticos –, destacou elementos locais para fazer uma organização
regional, em vários estados, os principais estados da época. Eu participei das primeiras
reuniões oficiais, assinei ata de fundação e tive um cargo na Direção Estadual no Paraná”
(GALVÃO, 2002, p. 1).
A descrição acima, feita por Nelson Torres Galvão, confirma os documentos
encontrados tanto no TRE-PR como nos arquivos do Fundo DOPS, guardados junto ao
Arquivo Público do Paraná, relativos à data de fundação do Partido em 1945. Esses
documentos indicam a data e a fundação do PCB e quem eram os membros da primeira
Direção Estadual do Partido.
A Comissão Executiva, registrada no TRE-PR no dia 17 de novembro de 1945,
foi lançada em setembro de 1945, em uma grande reunião que aconteceu em Curitiba no
antigo Cine Vitória4, com caravanas vindas de diversos lugares do estado, representando
os recém-criados diretórios municipais. Nesse lançamento legal o Partido Comunista do
Brasil, seção Paraná, homologou a composição do primeiro Secretariado5, integrado
pelos seguintes comunistas: “Secretário Político – Walfrido Soares de Oliveira, ferroviário;
Secretário de Organização e Finanças – Vilário Muller, trabalhador manual; Secretário de
Massas Eleitoral – Elias Neves Miranda, ferroviário; Secretário Sindical – Bernardo Burba
Filho; Secretários de Divulgação e Propaganda – Flávio Ribeiro, Hortêmio Batista, Aureliano
Matos Moura e Waldemar Reickdhal” (FUNDO DOPS, s/d-a).

4
O lançamento do Comitê Estadual do Partido Comunista recebeu destaque de diversos jornais da época, como
a Gazeta do Povo, em que se fizeram análises sobre o significado da instalação do comitê, onde seriam os alojamentos
e como seria a cerimônia de posse, além de sua composição e de outros detalhes.
5
Para os comunistas o Secretariado tem o mesmo peso que uma Diretoria Executiva.

29
II. O PCB LEGAL E SUA POLÍTICA DE ALIANÇAS ELEITORAIS

O PCB, por mais que procurasse ter uma fisionomia revolucionária, sempre
buscou inserir-se nas disputas eleitorais, apresentando-se como uma alternativa de poder.
Ele somente radicalizou sua linha política nos momentos em que se encontrava na
clandestinidade, o que o forçava a mudar sua política de aliança com a pequena burguesia
e a pregar a aliança operária e camponesa, como fizera no início dos anos 19506, com a
proposição da formação de uma Frente de Libertação Nacional. Essa postura era fruto das
novas orientações soviéticas, de aprofundar o enfrentamento ao regime capitalista, para
demarcar espaço geopolítico.
Fora esse período de radicalização, que foi do início da década de 1950 a
meados de 1955, o partido historicamente buscou construir alianças que privilegiaram
uma tendência centrípeta alinhada com a classe média. Segundo Milton Ivan Heller, essas
alianças nunca foram satisfatórias, pois, apesar da insistência do Partido em construir
alianças com o centro, este não queria fazer alianças com a esquerda. Nesse sentido,
alguns historiadores afirmam que o Partido sempre deixou de lado alianças mais à esquerda
por sua preferência pelas alianças mais ao centro:
“O Partido dizia que era necessária uma política de união nacional contra o
imperialismo e de aliança com a burguesia. Mas a burguesia estava no poder e não
precisava fazer aliança com ninguém. E, se precisava, não ia fazer aliança com o Partido
Comunista, isso é uma coisa lógica. Só os comunistas é que não enxergavam isso. Criava-
se essa legenda de que havia a possibilidade de aliança com a burguesia. Mas a burguesia,
como classe, sempre foi arredia a qualquer tipo de aproximação com o Partido Comunista
– isso não foi só aqui, é um fenômeno mundial” (HELLER, 2001, p. 20).
Essa tese comprova o que diversos autores constataram: o Partido tinha uma
propensão ao centro, deixando seus históricos aliados – operários e trabalhadores – fora
de suas alianças prioritárias. Gildo Marçal Brandão comenta que, na segunda metade da
década de 1930, o Partido caiu nos braços de setores médios do Exército, o que, segundo
esse autor, ocorreu em virtude da entrada de Luís Carlos Prestes no Partido. Mas o fato é
que, mesmo devido à sua composição social, a maioria dos seus quadros era oriunda das
classes média e alta:
“O PC, partido eminentemente urbano, recrutou a maior parte de seus dirigentes
entre a intelectualidade (professores universitários, jornalistas, estudantes), as forças
armadas (Exército, média oficialidade) e o proletariado. [...] Do ponto de vista étnico, os
principais dirigentes do PCB são, majoritariamente, homens, brancos, brasileiros de
famílias há muito radicadas no país (em vários casos, originários de troncos oligárquicos
nordestinos decadentes) e, secundariamente, judeus e italianos, mulatos e mestiços”
(BRANDÃO, 1997a, p. 197).
Essa composição social do Partido – ligada às classes média e alta – talvez
6
Sobre esse assunto, cf. Carone (1982, p. 108-109).

30
explique a identificação com o ideário etapista7, por muito tempo desenvolvido pelo PCB
(à exceção do período compreendido entre o início e a metade dos anos 1950). Afinal,
desde discussões acerca das influências agrário-camponesas, passando pelas questões
do etapismo como fase de superação da atrasada (e – por que não dizer? – feudal)
situação que o Brasil vivia no início do século XX, segundo alguns autores marxistas (por
exemplo, Octávio Brandão, com seu Agrarismo e industrialismo) que apontavam como
solução a passagem do Brasil ao modo de produção capitalista para que conseguisse
avançar para a construção do socialismo, considerava-se no Partido que não haveria
condições de pular etapas, isto é, de passar diretamente do regime feudal para um Estado
socialista sob a égide da ditadura do proletariado. O motivo seria a manutenção de uma
sociedade agrária baseada no latifúndio.
Assim, do ponto de vista teórico, os documentos do Partido sempre orientaram
que se buscassem alianças com a pequena burguesia, de preferência ao proletariado. O
importante a destacar é que, com raras exceções na vida política dos militantes do
Partido, sempre tiveram e continuam a ter um papel de destaque os intelectuais – que
geralmente são das classes média e alta: “Apesar da precariedade orgânica do partido,
este constituía-se então como um espaço para a participação política de intelectuais que
partilhavam uma postura crítica com relação às estruturas básicas da sociedade
brasileira” (CAVALCANTE, 1986, p. 95). Os intelectuais sempre estiveram presentes no
Partido Comunista, desde sua fundação, mas seu maior contato com o Partido teve
início nos porões da ditadura do Estado Novo e consolidou-se com a abertura política
de 1945. Esses intelectuais fizeram por muitos anos parte dos quadros de direção do
Partido. Como vimos em outro trabalho (KIELLER, 2004), em um cruzamento de dados
sobre instrução e cargos ocupados na direção, ocorria maior constância dentro das
direções de quadros com instrução superior, enquanto os trabalhos de direção
intermediária e de bases eram ocupados por dirigentes com menor grau de instrução.
Criou-se, assim, um contra-senso nas estruturas do “partido do proletariado”, em que
aos seus quadros dirigentes só ascendiam aqueles com maior grau de instrução, deixando
que se cristalizasse no topo da direção do Partido uma elite política, oriunda das
classes sociais mais educadas.

III. O PCB LEGAL E AS ELEIÇÕES DE 1945 e 1947

O partido legal, preparando-se para as disputas políticas que aconteceriam


após 1945, criou um cargo no Comitê Estadual do Partido especificamente para cuidar
da questão das eleições. Era o cargo de Secretário de Massas Eleitorais, cargo da
Direção Executiva dentro do Comitê. Esse cargo foi criado na época do processo de
7
O etapismo foi desenvolvido na década de 1940, após a II Guerra Mundial, para justificar as políticas de frentes
defendidas por Moscou. Consistia em estabelecer em qual etapa de desenvolvimento determinada sociedade
encontrava-se, indicando por quantas etapas ela ainda teria que passar para chegar ao socialismo. Nesse sentido,
muitos países ainda considerados como do modo de produção econômica feudal tinham que fazer a revolução
burguesa para depois avançar para as demais etapas da revolução e da constituição de uma sociedade socialista.

31
alistamento civil dos eleitores, quando foram criados os comitês democráticos, e logo
que o Partido tornou-se legal em 1945. Devido ao rápido crescimento que o Partido
teve nos anos após 1945, em que se manteve na legalidade, multiplicaram-se por todos
os cantos do Brasil os comitês democráticos de alistamento eleitoral, tendo aí uma
atuação-chave, pois designou para a tarefa dois dos seus mais representativos quadros,
Elias Neves de Miranda, ferroviário que fora responsável pela organização estadual da
Aliança Libertadora Nacional (ALN), e Dario Printz, também ferroviário e uma das mais
expressivas lideranças do Partido Comunista na década de 1940. Como indica José
Antônio Segatto:
“A necessidade de manter e consolidar o espaço de liberdade colocou, por
exemplo, a tarefa de criação de ‘comitês democráticos’ ou ‘comitês populares’ ou
unidades de vizinhança [...]. O programa desses comitês era basicamente o de lutar
pela ampliação da democracia ao nível local, devendo estabelecer uma plataforma que
levasse em conta as realidades sociais específicas; ali dentro, em assembléia de massa,
deveriam lutar contra a carestia e os remanescentes fascistas; promover campanha de
alistamento eleitoral, reclamar água para o bairro etc. Os comitês formavam Ligas
Juvenis, times de futebol, organizavam festas populares e piqueniques” (SEGATO, 1981,
p. 51).
Em Curitiba havia diversos comitês democráticos formados nos bairros do
Batel, do Centro, do Juvevê etc. A exemplo dos muitos outros comitês espalhados pelo
estado e pelo Brasil, porém, como o período de legalidade não ultrapassou três anos, esse
cargo de Secretário de Massas Eleitorais somente foi utilizado pelo Diretório Regional do
Paraná nas duas primeiras gestões legais, em 1945 e 1947; nas outras quatro reformulações
por que o Partido passou, entre 1945 e 1963, não houve mais esse cargo devido à situação
de semilegalidade.

IV. O PCB SEMICLANDESTINO E AS ELEIÇÕES DO PERÍODO 1950-1963

Fosse na legalidade, fosse na clandestinidade, o PCB contou com o seu


instrumento de informação, o jornal Tribuna do Povo. Nesse periódico os candidatos do
PCB, ou aqueles que eram por ele apoiados, tinham espaço para a divulgação de seus
currículos e plataformas eleitorais. A expectativa eleitoral do Partido nas eleições municipais
de 1947 não era das melhores; afinal, elegeu apenas quatro vereadores no estado inteiro,
diferentemente de outros estados, como o Rio de Janeiro, que teve um total de 15 vereadores
eleitos na Câmara Municipal . Lá, o PCB fez a maioria. Durante a década de 1950 e o início
de 1960, houve uma oscilação da posição política do Partido, que ora pregou a preparação
da revolução, ora pregou a aliança com setores da burguesia nacional. Essa oscilação
pode ser compreendida principalmente devido às reviravoltas no panorama político
internacional; assim, em determinados momentos o Partido conseguiu fazer uma separação
de setores da burguesia e em outros momentos, não.

32
Após as eleições de 1947, só haveria outra em 1950. Nesse ano, o Partido
ainda se manteve na “semiclandestinidade”, mas sua posição esquerdista estaria mais
consolidada, devido ao movimento internacional e às resoluções do Manifesto de Agosto
de 19508.
Nesse sentido, foram apresentados candidatos de Prestes a esses pleitos, que,
na verdade, apenas reproduziam do programa da FDLN (Frente Democrática de Libertação
Nacional). No Paraná, foram apresentados dois candidatos de Prestes: Joaquim Mochel,
que era o Secretário Político do Partido em Curitiba, e Manoel Jacinto Correa, que era
Vereador em Londrina9. Os dois eram candidatos a Deputado Estadual, além de serem
apresentados para o pleito como “candidatos de Prestes”. Seus programas políticos eram
baseados no da FDNL. Nenhum deles foi eleito, pois a eleição naquela altura da vida do
Partido não era fundamental, mas sim trata-se de aproveitar o momento para divulgar as
novas orientações partidárias – de radicalização e enfrentamento contra a burguesia
nacional, além de servir para divulgar suas idéias e arrecadar fundos. De qualquer forma,
a lista de candidatos de Prestes – que atingia cerca de 30 candidatos a Deputado Estadual
– foi impugnada10, não sendo considerada uma chapa legal:
“Nesse sentido, mesmo quando opta pela ‘via pacífica da revolução’, está longe de
considerar o caminho eleitoral um método eficaz de luta pelo poder – ao contrário, insiste
sempre que o poder real está situado em outro lugar. O processo eleitoral serve, é claro,
para fazer propaganda, melhorar o trabalho de organização e, sobretudo, fazer finanças,
mas a assumida doutrina da ‘acumulação de forças’ não chega a considerálo um momento da
auto-organização da sociedade e das forças democráticas, sendo propício, sim, para fazer o
partido crescer, tendo em vista o assalto ao poder. Dito de outra forma, o que interessa é o
avanço da organização, mesmo porque a solução dos problemas da sociedade quem tem é o
partido, e ele a colocará na mesa em outro momento” (BRANDÃO, 1997a, p. 188-189).
Essa guinada à esquerda fez que o PCB assumisse uma postura de denúncia das
eleições de 1950. O jornal partidário Tribuna do Povo transcreveu um artigo de apoio de
Prestes aos candidatos no Paraná, em que demonstrou o abandono do processo eleitoral
e adotou uma via mais radical:
“Com o surgimento dos candidatos de Prestes a situação modificou-se. Eles vão
ao povo, não para caçar votos, mas para convocá-lo à luta em torno de seus problemas e
na base dos nove pontos apresentados por Prestes; mostram à classe operária e ao Povo
8
O Manifesto de Agosto foi um documento lançado em 1950, apresentando novas orientações do movimento
comunista internacional, como fruto do acirramento da Guerra Fria, em que a orientação era construir o movimento
revolucionário que avançasse para o socialismo. O Brasil, ou melhor, o PCB reproduziu essa orientação
organizando em 1950 a Frente Democrática de Libertação Nacional e lançando candidatos a Deputados Estadual
em diversos estados brasileiros.
9
Manoel Jacinto não foi cassado porque fora eleito por outra legenda, apesar de ser monitorado pelos órgãos
de inteligência da repressão, desde os tempo da Revolta de Porecatu em 1948.
10
Não tem se notícias oficiais de por quais partidos esses candidatos foram lançados. Seus materiais de campanha
e o próprio jornal do Partido no estado apenas os apresentavam como sendo os “candidatos de Prestes”, sem
legenda. Porém, consta do livro de Gildo Marçal Brandão uma lista de 30 candidatos a Deputado Estadual, em 1950,
apoiados por Prestes e inscritos pelo Partido Republicano Trabalhista (PRT) (cf. BRANDÃO, 1997a, p. 186).

33
que de nada adianta substituir um Dutra por outro Dutra, tenha o nome que tiver, ou de
substituir um Lupion por um Ângelo ou Bento, pois são todos da mesma classe, de
exploradores do povo, responsáveis pelo atraso e pela ignorância em que vegeta o nosso
povo” (Tribuna do Povo, 1950, p. 2).
Apresentados como candidatos da Frente Democrática de Libertação Nacional,
eles foram, lançados para chamar a atenção para o que a FDLN denunciaria, como se vê no
bilhete publicado no jornal Tribuna do Povo11: “Povo paranaense, os candidatos populares
ao pleito de 3 de outubro próximo são os seguintes, e que merecem a minha confiança e
pelos quais solicito os seus sufrágios conscientes e esclarecidos. Para deputados estaduais
– Joaquim Mochel e Manoel Jacinto Correia. Votos por pão, terra, paz e liberdade, fazendo
vitoriosos os candidatos do povo. Saudações, Luís Carlos Prestes” (idem, capa).
Mas como o PCB estava na ilegalidade, pode-se dizer que esses candidatos eram
ao mesmo tempo, por assim dizer, “anticandidatos” que se apresentavam para denunciar
a burguesia nacional atrelada ao imperialismo norte-americano. Para os demais cargos –
os majoritários –, o PCB orientava o voto em branco, no sentido de legitimar o programa
da Frente Democrática de Libertação Nacional12. O Partido estava influenciado pela nova
linha política internacional elaborada pelo Comintern, que tinha à sua frente a URSS, com
uma defesa do chamado “realismo socialista”13. Esse processo pode ser mais bem
compreendido por meio da linha política do Manifesto de Agosto de 1950, referendado no
IV Congresso do PCB em 195414.
Nesse momento, começou a ganhar corpo na sociedade brasileira um conjunto
de bandeiras nacionalistas: a luta pelo monopólio do petróleo; os grandes atos e manifestos
da Campanha da Paz15; a busca de Getúlio Vargas de consolidar um parque industrial no
Brasil. Essas bandeiras nacionalistas, lançadas e apoiadas pelo trabalhismo getulista,
tinham apoio de amplos setores; no campo da organização popular, sofriam a forte
influência dos comunistas. No Paraná, esses movimentos tiveram grande relevância. Mais

11
O original desse bilhete de Prestes é uma das poucas coisas que Izaurino Gomes Patriota, editor da Tribuna do
Povo, diz ter conseguido guardar desse período (PATRIOTA, 2003, p. 9).
12
Esse programa baseava-se em nove itens: governo democrático e popular; paz e condenação da guerra
imperialista; imediata libertação do Brasil do jugo imperialista; entrega de terras a quem trabalha; desenvolvimento
independente da economia nacional; liberdades democráticas para o povo; imediato melhoramento das condições
de vida das massas trabalhadoras; instrução e cultura para o povo e constituição de um exército popular de
libertação nacional (cf. CARONE, 1982, p. 108-112).
13
O realismo socialista, ou realismo soviético, obrigava os artistas, literatos e intelectuais a passar para as artes
e para os textos literários uma aproximação com a realidade que a União Soviética vivia – é claro que a partir do
ponto de vista do Estado e do Comitê Central do Partido. Aqueles de fugiam do modelo do realismo socialista eram
acusados da prática de métodos pequeno-burgueses de arte e cultura. Assim, o realismo socialista influenciou
todas as áreas intelectuais e culturais do Partido e da sociedade de modo geral, acarretando o afastamento de
inúmeros intelectuais do Partido, além do já indicado processo de “esquerdização” do PCB.
14
O IV Congresso do PCB, de 1954, reafirmou a linha revolucionária do Manifesto de Agosto e radicalizou a sua
luta contra as elites políticas nacionais.
15
O Partido esteve à frente da luta pela paz e contra a ameaça atômica, organizando manifestações em todo o país
desde 1950 e o Congresso dos Partidários da Paz em 1951; na mobilização contra a participação do Brasil na Guerra
da Coréia, em 1951, e na luta contra o Acordo Militar Brasil-Estados Unidos de 1952 (RUI, 2002, p. 28-29).

34
especificamente, muitos comitês foram formados em diversas cidades do estado; os veículos
de comunicação do Partido, em sua totalidade, foram colocados a serviço dessas
campanhas, principalmente aquelas ligadas à questão da paz.
Quando Getúlio Vargas suicidou-se, houve uma comoção nacional em torno do
desaparecimento do carismático populista. O Partido então estampou na capa de seu
principal órgão de divulgação, A Imprensa Popular, que saíra para circulação externa dias
antes da morte de Vargas, a afirmação de que ele era entreguista e traidor dos brasileiros.
O suicídio fez com que o Partido recuasse da postura de acusação de Vargas, sob pena de
pagar caro, face à raiva da população, totalmente apenada com a morte – mais precisamente,
com os motivos da morte de Vargas: “A reação do povo surpreendeu seus oponentes. Uma
onda de simpatia por Getúlio envolveu o país [...]. Em meio à confusão geral, os comunistas
perplexos – e para não serem tachados – foram obrigados a sair às ruas recolhendo os
seus jornais das bancas, e depois irem a reboque da massa nas manifestações” (SEGATTO,
1981, p. 70).
Nas eleições de 1955 o Partido continuou com sua linha esquerdista, agora
reforçada pelo IV Congresso do Partido, que se realizou poucos meses depois da morte de
Getúlio Vargas. O Congresso, na prática, reafirmou a linha do documento apresentado
pelo Comitê Central do Partido em agosto de 1950, embora com uma mudança que se
pode considerar substancial: a mudança de tática adotada em relação ao trabalhismo –
afinal, até então o trabalhismo e Getúlio Vargas eram considerados pelo PCB como principais
inimigos dos comunistas, denunciados juntamente com o capitalismo imperialista.
A guinada política do IV Congresso do PCB aproximou os comunistas dos
trabalhistas, inclusive nos campos eleitoral e sindical. Como demonstrou Edgar Carone ao
transcrever o informe de Luís Carlos Prestes para o IV Congresso, o líder comunista
mudou o discurso a respeito da burguesia nacional, buscando uma aproximação com
setores dessa burguesia, preferencialmente a classe média. O Partido considerou essa
flexão tática importante para consolidar uma das etapas da revolução brasileira, que por
muitos ainda era considerada um regime de desenvolvimento agrário e semifeudal:
“No que concerne às relações com a burguesia nacional, o programa do Partido
não só não ameaçou seus interesses como defendeu suas reivindicações de caráter
progressista, em particular o desenvolvimento da indústria nacional. Essa posição acertada
decorreu de uma justa compreensão do caráter da revolução brasileira em sua primeira
etapa, quando as necessidades já maduras do desenvolvimento da sociedade brasileira,
que exigiam solução imediata, são exclusivamente as de caráter antiimperialista e antifeudal.
A burguesia nacional não é, portanto, inimiga; por determinado período de tempo pode
até apoiar o movimento revolucionário contra o imperialismo e contra o latifúndio e os
restos feudais” (CARONE, 1982b, p. 132).
Esse programa foi reforçado pela eleição de Juscelino Kubitschek a Presidente
da República – afinal, ganhou força o projeto nacional-desenvolvimentista que se iniciara
no final do governo Getúlio Vargas. Isso se evidenciou no fato de o candidato a vice-
Presidente na chapa de JK ter sido João Goulart, que foi Ministro do Trabalho de Vargas:
em tese, o governo Kubitschek seria uma vitória da continuação da política populista de

35
Getúlio Vargas. Como indicou Milton Ivan Heller, “Nas eleições presidenciais de 3 de
outubro de 1955 concorreram Juscelino Kubitschek de Oliveira pela coligação PTB-PSD
[Partido Trabalhista Brasileiro-Partido Social-Democrático], Juarez Távora – UDN [União
Democrática Nacional], Adhemar de Barros – PSP [Partido Social Popular] e Plínio
Salgado pelo PRP [Partido de Representação Nacional]. A eleição de JK, com seu vice, João
Goulart, embora por uma pequena margem de votos, representou a vitória do populismo
de Vargas” (HELLER, 1988, p. 17).
Diferentemente das eleições de 1950, em que o Partido pregou o voto em
branco e apresentou candidatos de protesto para os cargos proporcionais, em 1955 o
PCB adotou uma linha de apoio16 a Juscelino Kubitschek e a João Goulart. Esse apoio
configuraria novamente a adequação do programa do PCB aos ditames do comunismo
internacional, que, posteriormente à morte de Stálin, em 1953, voltou a acenar para uma
possível coexistência pacífica com o bloco capitalista e para a disputa por espaços políticos
dentro de processos democráticos. Isso resultou em que o Partido adotasse uma postura
mais radical na busca da legalidade, assunto que durante anos foi tido como secundário,
haja vista que a posição de semiclandestinidade era-lhe cômoda, ao garantir-lhe a alcunha
de “partido revolucionário”. Ou seja, a luta pela recuperação da legalidade durante os
primeiros anos da década de 1950 foi muito menos intensa, pois o Partido gozou de uma
semiclandestinidade consentida: “Nesse sentido, ao lado das opções políticas que fez e das
alianças que buscou, a não-recuperação, mais até do que a perda, do registro eleitoral
acabará por definir os limites da implantação e da ação do movimento comunista durante
a República Liberal [...] potencializados pelo tipo de marxismo, de leitura do
desenvolvimento capitalista e de concepções de fazer política predominante na época”
(BRANDÃO, 1997b, p. 31).
Porém os ventos novos que sopraram de Moscou fizeram que essa postura de
acomodação com a semiclandestinidade consentida mudasse e, no final da década de
1950, se tornasse uma das bandeiras do PCB – principalmente depois da cisão que o PCB
sofreu em 1960, com a saída do grupo que não concordava com a mudança de nome do
partido e nem com as alterações feitas em seus estatutos como fruto das discussões sobre
a Declaração de Março de 1958, editada pelo Comitê Central do PCB (cf. declaração sobre
a política do PCB, publicada no jornal Voz Operária, de 22 de março de 1958, e transcrita
em CARONE, 1982b, p. 176).
Em 1960, para confirmar a tendência de participar do jogo eleitoral, o Partido
posicionou-se a favor da candidatura do Marechal Henrique Teixeira Lott, que teve como
candidato a vice-Presidente João Goulart17. “Jango” foi novamente eleito vice- Presidente,
mas com um Presidente eleito por outra coligação. Nessas eleições o Partido novamente
16
É importante notar que esse apoio dos comunistas, apesar de representar um reforço do ponto de vista estrutural
de uma campanha política, era, por assim dizer, informal – afinal, para as regras eleitorais, o Partido Comunista estava
na clandestinidade –, o que não o impediu de manter uma estrutura organizada no Brasil inteiro.
17
Nas eleições majoritárias do período entre 1945 e 1960 há uma curiosidade política, que costuma passar
despercebida: havia eleições separadas para Presidente e vice-Presidente da República. Em 1955 os resultados
no Paraná foram os seguintes: o candidato a vice na coligação PSD-PTB teve, segundo dados do TRE-PR, um total
de 181.462 votos, ao passo que quem foi eleito Presidente do Brasil, na mesma coligação, obteve um total de

36
deu demonstrações de sua aproximação com o trabalhismo getulista.
No âmbito regional, o Partido seguiu as orientações nacionais de apoio ao
Marechal Teixeira Lott e João Goulart. Nas eleições para o governo do Paraná, o PCB
declarou apoio ao candidato lançado pelo PTB, Nelson Maculan18, que amargaria derrota
para Ney Braga, da aliança PDC-PL. O apoio ao candidato do PTB, da mesma forma que o
apoio à candidatura a Presidente e a vice-Presidente, ocorreu de maneira informal.
Depois da renúncia de Jânio Quadros em 1961, a Campanha da Legalidade
confirmou Jango no Palácio do Planalto, embora com poderes limitados: vendo as
possibilidades de Jango consolidar um governo com facetas populistas, setores do Exército
estabeleceram, e o Congresso Nacional aprovou, a adoção do parlamentarismo no Brasil,
enfraquecendo os poderes do Presidente. Assim, “João Goulart foi isolado de quase toda
a classe dirigente nacional e, como último recurso, tentou aproximar-se do povo” (HELLER,
1988, p. 200), propondo as “reformas de base”. O Partido Comunista apoiou e foi um dos
principais defensores do Presidente Jango19, principalmente de suas propostas de reformas
de base. O Partido estava confiante de que, com Jango, obteria novamente a legalidade:
afinal de contas, era o PCB um dos principais entusiastas das propostas de Goulart: “Em
1960, o PCB apoiou resolutamente João Goulart para a Presidência e, mais tarde, forneceu
a base de sustentação sindical para o governo. Foi no setor operário, atuando no interior
dos sindicatos oficiais, que os comunistas obtiveram seus maiores êxitos [...] o PCB
obteve o controle dos principais sindicatos, federações e confederações” (idem, p. 264).
Porém, apesar de defender o governo de João Goulart, o PCB sabia que nem
todas as concessões aos capitalistas foram excluídas no processo de reformas. Por isso o
apoio ao governo Goulart considerava-o também um governo em disputa, que precisava
ser mais firme em suas posições políticas.
As eleições de 1962, além de serem as últimas eleições antes do golpe militar de
1964, seriam apenas para cargos proporcionais e para o Senado Federal. Depois delas
somente ocorreria o plebiscito a respeito da forma de governo, que optou pelo
presidencialismo e aprofundou a crise institucional em que o país vinha mergulhado
desde a renúncia de Jânio Quadros (cf. SANTOS, 1978). O PCB do Paraná, nas eleições de
1962, tomou a posição de lançar candidatos por outras legendas – a maioria pelo PTB,
embora sem êxito na eleição de comunistas.

18
O apoio à candidatura de Nelson Maculan pode ser constatado pela ficha do DOPS do Secretário Político do
Partido, o conhecido Capitão Agliberto Vieira de Azevedo, que foi deslocado para o Paraná no final dos anos 1950
para assumir o Partido no estado: “Em 27/09/1960 o fichado assinou um manifesto em companhia de outros
elementos comunistas, no qual apóia Nelson Maculan ao Governo do Estado” (FUNDO DOPS, s/d-b).
19
A campanha da legalidade foi uma resistência encabeçada pelos governadores Leonel Brizola, do Rio Grande
do Sul, e Mauro Borges, de Goiás, no sentido de garantir a posse de João Goulart na Presidência da República
após a renúncia de Jânio Quadros. A resistência contou com uma cadeia de 104 rádios que reproduziam os sinais
a partir do entrincheirado Palácio Piratini, do governo do estado do Rio Grande do Sul.

37
V. OS CANDIDATOS E O DESEMPENHO ELEITORAL DO PCB

O PCB, no período de 1945 a 1947, participou legalmente de apenas duas


eleições, em que apresentou candidatos próprios: as que ocorreram em dezembro de
1945 – que elegeram Eurico Gaspar Dutra para a Presidência da República – e as que
ocorreram em janeiro de 1947, quando se elegeu Governador do Paraná Moisés Lupion.
Na primeira – que, por sinal, era também para um Congresso Nacional Constituinte – o
PCB elegeu um Senador e 14 deputados federais; o Senador era Luís Carlos Prestes e entre
os deputados federais havia nomes famosos, como o escritor Jorge Amado20. Além disso,
seu candidato a Presidente, Iedo Fiúza, recebeu 10% dos votos válidos na eleição geral,
ficando em terceiro lugar no Paraná, com 6.811 votos. Um fato peculiar dessas eleições de
dezembro de 1945 é que os candidatos podiam concorrer a diferentes cargos em vários
estados, tendo apenas que optar por um deles caso eleitos (para mais de um). Assim,
Prestes foi candidato a Senador e a Deputado Federal Constituinte em diversos estados; em
alguns foi simultaneamente candidato a ambas funções. No Paraná, por exemplo, ele
concorreu a Senador e a Deputado juntamente com Octávio da Silveira, que disputou os
mesmos cargos. Nenhum dos dois foi eleito no estado, sendo suas votações respectivamente:
“6.870 votos para o Senado e 658 para o Congresso, e 6.279 para o Senado e 964 para o
Congresso” (TRE-PR, 1946, p. 3-5). Nessas eleições, foram apresentados pelo PCB do
Paraná diversos candidatos a Deputado Federal, mas nenhum conseguiu vaga no Congres-
so Nacional Constituinte. Os resultados desses candidatos foram os seguintes: “Dr. José
Rodrigues Vieira Neto, 1.469 votos; Dr. Newton Leopoldo Câmara, 1.173 votos; Octávio da
Silveira, 964 votos; Luís Carlos Prestes, 658 votos; Dr. Francisco Osvaldo Castelutti, 587
votos; José Bezerra de Vasconcelos, 443 votos; Claudemiro Batista, 344 votos; dr. Flávio
Ribeiro, 333 votos, Walfrido Soares de Oliveira, 114 votos” (ibidem).
Além dos votos individuais, o Partido recebeu 6.570 votos de legenda. Além
dessas duas eleições, o PCB esteve presente em outros processos eleitorais, por meio da
apresentação de seus candidatos por meio de outras legendas ou com o apoio dado a
outras siglas partidárias que não foram colocados na ilegalidade em 1947. Nas eleições
municipais de 1947 o PCB elegeu diversos vereadores lançados por outras legendas,
inclusive em Curitiba. Na capital foram eleitos Maria Olímpia Carneiro – eleita com 436
votos, a nona vereadora mais votada daquela legislatura – e o estudante Hedel Jorge Ázar,
pela sigla do Partido Social Trabalhista (PST). Hedel Jorge Ázar ficou como suplente,
chegando a assumir o cargo em uma discussão ligada à questão do transporte coletivo;
em Morretes elegeu-se Adão Toledo Aghar do Nascimento, pela UDN; em Londrina, Manoel
Jacinto Corrêa, com 153 votos, e Newton Leopoldo Câmara, com 188 votos, pelo PTB.

20
A bancada do PCB era a seguinte: Senador: Luís Carlos Prestes (pela cidade do Rio de Janeiro, à época Distrito
Federal); deputados federais: Carlos Marighela (Bahia), Batista Neto (Distrito Federal), João Amazonas (Distrito
Federal), Maurício Grabois (Distrito Federal), Agostinho de Oliveira (Pernambuco), Alcedo Coutinho
(Pernambuco), Gregório Bezerra (Pernambuco), Abílio Fernandes (Rio Grande do Sul), Trifino Correa (Rio
Grande do Sul), Alcides Valença (Rio de Janeiro), Claudino Silva (Rio de Janeiro); Caires de Brito (São Paulo),
Jorge Amado (São Paulo); José Crispin (São Paulo) e Osvaldo Pacheco (São Paulo) (BRAGA, 1998, p. 103).

38
Newton Câmara foi o quinto mais votado na eleição. Em Paranaguá diversos candidatos
foram lançados: Ângelo Maria Patitutti, João Batista Teixeira, Eustáquio Quadros, João
Policarpo Felipe Chede, pelo Partido Libertador (PL) e, em Ponta Grossa, João Manuel dos
Santos Ribas pelo Partido Republicano (PR)21. É importante frisar que não apenas os
dirigentes comunistas, mas também outros militantes e dirigentes intermediários, foram
candidatos pelo PCB ou, na época de semilegalidade, por outras legendas. Ainda assim,
aqui mostraremos apenas os dirigentes estaduais e municipais que foram candidatos a um
cargo eletivo no período, segundo a Tabela 1 abaixo:
Tabela 1
Dirigentes comunistas candidatos entre 1945 e 1963
CARGO CASOS
Deputado Federal 3
Deputado Estadual 22
Vereador 3
Deputado Estadual/Federal 3
Deputado Estadual/Vereador 4
Senador/Dep. Federal 1
sem informação 13
Não foram candidatos 40
Total 89
Fonte: o autor, a partir de TRE-PR (s/d-b) e Fundo DOPS (1920-1989).

O quadro era o seguinte: dos 89 dirigentes estaduais que participaram das


direções regionais entre 1945 e 1964, um total de 49 candidatos concorreu a algum cargo
eletivo, muitos a mais de um cargo, em eleições diferentes. Por exemplo, José Rodrigues
Vieira Neto foi candidato a Deputado Federal em 1945, a Deputado Estadual em 1947
(eleito e cassado) e em 1950, e candidato a Deputado Federal em 195422. Assim como ele,
muitos foram candidatos a Deputado Federal e Estadual, ou a Deputado Federal e a
Vereador ou, ainda, a Deputado Estadual e a Vereador.
Em 1945 só houve eleições para deputados federais, senadores e Presidente,
pois elegia-se um Congresso Nacional Constituinte. Nesse ano, sete dirigentes estaduais
foram lançados para Deputado Federal e um, que era Octávio da Silveira, para Senador,
sendo que Luís Carlos Prestes também concorreu como candidato a Senador e a Deputado
Federal pelo Paraná; o candidato a Presidente pelo PCB era Iedo Fiúza. De todos os
apresentados para esse pleito não se elegeu ninguém pelo estado. Para sermos mais
claros: sete dirigentes foram candidatos a Deputado Federal e, para Deputado Estadual,
foram 26 dirigentes do PCB que concorreram, distribuídos nas eleições de 1945, 1947,
1950, 1954, 1958 e 1962 – sendo que, como vimos, em 1945 somente concorreram para
21
Infelizmente não conseguimos obter o número de votos nominais dos não-eleitos nessas eleições pois as fontes
primárias que conseguimos versavam apenas sobre os eleitos, sem mencionar a quantidade de votos obtidos por eles.
22
Infelizmente não dispomos de informações a respeito de por quais legendas ele concorreu.

39
a Constituinte Federal e em 1947 houve eleições apenas para a Constituinte Estadual, em
que foi eleito um membro do PCB, o Professor José Rodrigues Vieira Neto. Candidatos a
Vereador, nas eleições de 1947, 1951, 1955, 1959, 196223 e 1963, também foram sete, em
diversas cidades do estado. Nas eleições do início de 1947, dezoito dirigentes foram
candidatos a Deputado Estadual, em uma relação aprovada pelo Comitê Central que tinha
29 nomes. O Partido Comunista no Paraná, seguindo a orientação do Comitê Nacional de
lançar candidatos em 1950, lançou apenas dois dirigentes candidatos a Deputado Estadual24
e, na verdade, foram candidatos que aproveitaram o espaço político das eleições para
apresentar à sociedade as propostas políticas da FDLN; os dois candidatos apareceram
como candidatos de Prestes no Paraná e em suas plataformas, em suma, está o manifesto
da FDNL. As candidaturas estaduais do PCB, para as eleições de 1950, foram, na verdade,
a expressão da Guerra Fria; com isso, o PCB partiu para a radicalização política, inclusive
pedindo aos seus eleitores o voto nulo para Presidente da República.
Em 1954 foram lançados dois dirigentes como candidatos a Deputado Federal
e cinco como candidatos a Deputado Estadual. Nas eleições municipais de 1955 não foi
possível identificar se algum dirigente foi lançado como candidato a Vereador, pois nessas
eleições todos os candidatos saíram por outras legendas. Em relação às eleições de 1958,
dispomos da informação de que o Partido lançou apenas um dirigente como candidato a
Deputado Estadual. A respeito das eleições de 1959 para as câmaras municipais, não se
tem notícia de nenhum dirigente que tenha sido apresentado. Nas eleições de 1962 foram
lançados três dirigentes como candidatos a Deputado Federais e cinco para Deputado
Estadual. Nas eleições municipais de 1963, última eleição livre antes da instalação do
regime militar no Brasil, o PCB lançou três dirigentes estaduais como candidatos a Vereador.
A respeito dos eleitos no período, temos algumas indicações. Em primeiro
lugar, é importante destacar que, dos sete comunistas que foram candidatos a Deputado
Constituinte em 1934, dois foram eleitos: Octávio da Silveira, médico, e Waldemar Reickdhal,
funileiro. Não temos dados precisos sobre se eles foram deputados eleitos pela legenda do
PCB ou não. Fora esses dois dirigentes, um total de mais cinco dirigentes foram eleitos nos
processos eleitorais que aconteceram entre 1945 e 1963. Assim, apenas o dirigente José
Rodrigues Vieira Neto, advogado e professor, foi eleito, em janeiro de 1947, com 775
votos. Seus suplentes foram outros quatro dirigentes: Manoel Leandro da Costa Jr., estivador,
também com 775 votos; Antônio Carlos Raimundo, gráfico, com 454 votos; Nelson Torres
Galvão, bancário, com 289 votos; Mozart de Oliveira Valin, operário25, com 286 votos, e
Miguel Pan, ferroviário, com 283 votos, todos pela legenda do PCB. Nas eleições municipais

23
As eleições municipais de 1962 foram realizadas somente para preencher o cargo de Prefeito; nesse ano não
houve eleições proporcionais para a Câmara de Vereadores (TRE-PR, s/d-b).
24
Os candidatos do PCB na eleição de 1950 foram Manoel Jacinto Correia e Joaquim Mochel. Eles não eram
candidatos reconhecidos do ponto de vista legal. Foram candidatos lançados pela FDNL, com um documento em
que apontavam nove pontos básicos de transformação da sociedade brasileira, sob orientação do conhecido
Manifesto de Agosto de 1950, que radicalizou a política do PCB (cf. CARONE, 1982).
25
Mozart de Oliveira Valin não era da Direção Estadual do PCB; deve ter sido um militante de base ou um dirigente
intermediário do PCB.

40
que ocorreram no segundo semestre de 1947 houve um total de quatro dirigentes eleitos,
sendo dois em Curitiba: Maria Olímpia Carneiro Moschel, professora, e o suplente, que
assumiu no decorrer da legislatura, Hedel Jorge Ázar, pelo PST26; em Londrina, também
foram dois dirigentes eleitos: Manoel Jacinto Correia, agricultor, e Newton Leopoldo
Câmara, médico, ambos pelo PTB; em Antonina foi eleito Adão Aghar Toledo do Nascimento,
comerciante, pela UDN. Depois das eleições de 1947, somente em 1958 é que um dirigente
do Partido apareceu como suplente da bancada de deputados estaduais do PTB – Nilo
Izidoro Biazetto, bancário. Em 1963 o sindicalista Expedito Oliveira da Rocha foi suplente
da bancada de vereadores do PTB em Curitiba.

VI. CONCLUSÃO

O PCB foi um partido que esteve presente em todos os principais momentos da


história da República após 1922. Tomou a frente na construção do período democrático
organizando por todo o Paraná os comitês democráticos, que fizeram o recadastramento
eleitoral após o Estado Novo getulista. Participou dos processos eleitorais, ainda que
poucas vezes com candidaturas próprias, e, quando estava na ilegalidade, teve a
preocupação da sua volta à legalidade.
As candidaturas ocorridas nas eleições de 1945 e 1947 foram bem estruturadas
e organizadas. Como foi visto, durante esse período de legalidade o PCB teve duas intenções
básicas. A primeira era organizar-se do ponto de vista da militância e da estruturação
política do próprio Partido. Assim, as eleições que disputava tinham como prioridade o
seu crescimento constante e a disputa política nas bases do movimento sindical e social.
Somente depois dessa finalidade alcançada é que o Partido deu importância para o processo
eleitoral em si, ou seja, para a conquista do pleito. Nesse sentido é que podemos observar
que as listas do Partido sempre eram listas numerosas, com diversos candidatos inscritos,
e a plataforma política era sempre voltada para a politização do processo eleitoral, com a
apresentação das propostas da perspectiva da construção do socialismo.
Outro aspecto importante a destacar é que o período de semiclandestinidade,
entre 1947 e 1963, foi aproveitado pelo partido para apresentar-se como uma alternativa
revolucionária para a população (BRANDÃO, 1997a). O PCB não deixou, então, de acreditar
que o momento eleitoral continuasse sendo importante para o crescimento partidário.
Nesse sentido, adotou a tática de lançar candidatos por outras legendas, pois sabia da
importância estruturadora que cumpre um parlamentar no Partido. Por mais que o
parlamento burguês, na opinião do PCB em seus anos mais radicalizados, não resolvesse
a situação, ter uma tribuna para suas idéias era importante, mesmo que se apresentando
por outras legendas partidárias. Quando adotou as idéias do Manifesto de Agosto de 1950,
de que era o momento de organizar os trabalhadores das cidades e do campo para a
revolução socialista, radicalizando a política de enfretamento com a burguesia, utilizou-se
26
Entretanto importa notar que Hedel Ázar não era da Direção Estadual.

41
do espaço eleitoral para divulgar suas idéias: esse foi o seu objetivo em 1950, com a
apresentação de seus “anticandidatos” para as eleições a Deputado Estadual.
O principal objetivo do Partido não era eleitoral, mas sim o de divulgar o manifesto
da FDLN. Como seus diretórios regionais respeitassem a organização vertical, essa
orientação perdurou e foi referendada no IV Congresso do Partido, que afirma a linha
adotada em 1950 e só teve uma nova flexão tática quando da morte de Getúlio Vargas, em
1954. O clamor popular diante da figura de Vargas aproximou politicamente o PCB do PTB
e orientou as alianças políticas dos dois partidos nas eleições de 1955 e 1960. Com o
golpe de 1964, que instaurou o regime militar no país, o Partido foi tido como subversivo
e colocado literalmente na clandestinidade com o Ato Institucional n. 2, que instalaria no
Brasil, em 1965, um sistema bipartidário.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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BRAGA, S. S. Quem foi quem na Assembléia Constituinte de 1946. Brasília: Câmara dos
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PCDOB. Vermelho. Disponível em: <http://www.vermelho.org.br/pcdob/>. Acesso em:
2002 e 2003.
TRIBUNA DO POVO. Órgão central do Partido Comunista do Brasil no estado do Paraná.
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TRIBUNA DO POVO. Curitiba: PCdoB, n. 88, 30.set.1950.
TRE-PR. Curitiba. Livro-ata das sessões do Egrégio Tribunal Regional Eleitoral. Livro n. 1,
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Eleitoral do Paraná.
_____. Curitiba. Ata da eleição de dezembro de 1945, realizada em 5.jan.1946. Tribunal
Regional Eleitoral do Paraná.

43
44
CAPÍTULO DOIS

O VOTO INTEGRALISTA NO PARANÁ:


UMA ANÁLISE DAS ELEIÇÕES PRESIDENCIAIS DE 1955

Amanda Litzinger Gomes

45
46
2. O VOTO INTEGRALISTA NO PARANÁ:
Uma análise das eleições presidenciais de 1955

I. INTRODUÇÃO

Ao estudarmos a história política paranaense dos anos 1950, deparamo-nos


com um fato sui generis referente ao comportamento político-eleitoral nas eleições
presidenciais de 1955. O líder integralista Plínio Salgado, que concorreu à Presidência da
República naquele ano, pelo Partido de Representação Popular – PRP, foi o candidato mais
votado em Curitiba e obteve uma significativa votação no estado, diferentemente de sua
atuação nos demais estados brasileiros.
Neste capítulo tentaremos responder às seguintes perguntas: 1) Por que Plínio
Salgado obteve tão significativa votação no Paraná? 2) Por que o estado do Paraná seguiu,
então, um padrão diferente de votação dos demais estados brasileiros? Para
compreendermos tal fenômeno eleitoral, analisamos no presente trabalho cinco hipóteses
rivais.
A primeira delas foi apresentada no estudo de Szvarça e Cidade (1989), em que
se sugere uma explicação de tipo societalista para a expressiva votação de Plínio Salgado
no Paraná e, principalmente, em Curitiba. Segundo os autores, as várias transformações
por que passou o estado na década de 1950 (demográficas, sociais, político-
administrativas etc.) induziram um sentimento de “crise de identidade” e insegurança
social vividos no “quotidiano” dos paranaenses, encontrando assim abrigo na pregação
autoritária do líder integralista, fato que gerou sua expressiva votação. Porém essa tese
não consegue provar a “crise de identidade” do homem paranaense e nem explica por que
cidades que não foram afetadas diretamente pelas transformações pelas quais passava o
estado foram cidades em que Plínio Salgado também obteve significativa votação, tais como
as do Norte Novo.
A segunda hipótese é a do “voto étnico”, ou seja, a explicação difundida em
várias fontes que enfatiza que quem votou em Plínio Salgado no Paraná e em Curitiba foi a
grande parcela de imigrantes alemães e italianos. Embora seja tentadora, essa hipótese é
de difícil comprovação, pois a divisão das zonas eleitorais em Curitiba, por exemplo,

47
impede uma definição mais precisa da origem nacional dos eleitores1.
Outra hipótese é a do “voto ideológico”. Houve paranaenses que votaram em
Plínio Salgado devido à ideologia do partido integralista (fascista), mesmo que a maioria
tenha votado em Plínio devido ao seu “carisma”. Porém essa hipótese também é de difícil
comprovação, pois o Partido de Representação Popular não alcançou significativa
representação política no estado na década de 1950, já que obteve insignificante votação
tanto nos municípios paranaenses quanto no estado em si.
A quarta hipótese de trabalho enfatiza a seguinte idéia. Podemos considerar que o
que ocorreu no Paraná foi a manifestação típica do fenômeno conhecido como “populismo
de direita” – hipótese que nos serviu de ponto de partida –, fenômeno político análogo ao
janismo (de Jânio Quadros) e ao adhemarismo (de Adhemar de Barros) em São Paulo.
Considerando o fenômeno do populismo como uma variável histórica com base de classe,
e não apenas um fenômeno de manipulação eleitoral, sua política definindo-se como uma
política de reforço das estruturas do Estado nacional (caracterizada como uma “ideologia
de Estado”, efeito da representação política das baixas camadas médias na cena política),
poderíamos afirmar que o que ocorreu no Paraná foi que parte do eleitorado encontrava-
se “disponível” política e ideologicamente. As aspirações das baixas camadas médias
encontraram expressão no “conservadorismo” do PRP, que sustentava a necessidade de
construção de um Estado autoritário (traços típicos da figura e do discurso integralista do
“líder” Plínio Salgado) e de uma política nacionalista (base do Programa do Partido de
Representação Popular e até mesmo anteriormente, do Manifesto Integralista de 1932)2.
Todavia essa hipótese também é de difícil comprovação, pois encontramos uma
grande dificuldade para obtenção dos dados (censo demográfico, divisão das zonas e
distritos eleitorais, entre outros) para que possamos comprovar que foram realmente as
baixas camadas médias paranaenses que votaram no líder integralista Plínio Salgado,
como fez Aziz Simão (1956) ao estudar o voto operário em São Paulo3.

1
Sabe-se que as zonas eleitorais em Curitiba eram quatro, divididas, no período de dezembro de 1961 a janeiro
de 1962, da seguinte forma: Zona 1 – parte da sede (Centro), Santa Felicidade e Campo Comprido; Zona 2 – parte
da sede, Barrerinha, Taboão, sede de Rio Branco do Sul e Açungui (Rio Branco do Sul); Zona 3 – parte da sede,
Cajuru, Boqueirão, Umbará, Tatuquara, Piraquara (sede), Campina Grande do Sul (sede) e Quatro Barras
(sede); Zona 4 – parte da sede e Portão. Nota-se que a sede (Centro) fazia parte das quatro zonas eleitorais, fato
que impossibilita verificar quem eram e de qual etnia eram os eleitores de cada zona, não podendo, então, afirmar
que quem votou em Plínio Salgado eram os imigrantes alemães e italianos.
2
Encontramos o discurso nacionalista no Manifesto Integralista de 1932 no item Para o nosso Nacionalismo, em
que é pregado, por exemplo, que se crie uma cultura, civilização e um modo de vida genuinamente brasileiro, ou
ainda na frase “O nacionalismo para nós não é apenas o culto da Bandeira e do Hino Nacional, é a profunda
consciência das nossas necessidades, do caráter, das tendências, das aspirações da Pátria e do valor da raça”.
Mas o nacionalismo também se encontra no Programa do Partido de Representação Popular (PRP) quando, por
exemplo, afirma-se querer a unidade, a independência, a soberania e o prestígio internacional do Brasil (CHACON,
1985, p. 333-338, 467-478).
3
Nesse estudo, Aziz Simão separa São Paulo em quatro zonas eleitorais operárias com taxas de operários eleitores
superiores a 40%, de acordo com os critérios de situarem-se ou não no perímetro urbano, estarem dentro ou
fora da área mais antiga e se estavam na área mais industrial do município, com o intuito de traçar um perfil do
eleitorado operário e sua distribuição (SIMÃO, 1956, p. 130-141).

48
Porém, ao analisarmos os dados eleitorais disponíveis, observamos outro fato
marcante: a semelhança na votação obtida por Plínio Salgado e por Moysés Lupion,
candidato a Governador do Estado do Paraná pela coligação Partido Social Democrático
(PSD)-Partido Democrata Cristão (PDC)-Partido Trabalhista Nacional (PTN) nas zonas
eleitorais de Curitiba. Esse fato faz-nos pensar em uma quinta hipótese de trabalho: a
transferência de votos de Moysés Lupion a Plínio Salgado – e é essa hipótese que tentaremos
comprovar aqui.
Com esse objetivo, trataremos primeiramente de analisar os dados eleitorais,
ou seja, a votação obtida por Plínio Salgado, e em seguida estudaremos a história política
do Brasil e do Paraná nos anos 1950. Finalmente, antes de concluir, analisaremos a
campanha eleitoral de Plínio Salgado no ano de 1955, tendo como fonte os dois principais
jornais do estado na época, O Estado do Paraná e a Gazeta do Povo.

II. A VOTAÇÃO

Como já foi dito e podemos verificar na Tabela 1, a votação recebida por Plínio
Salgado no Paraná foi atípica, pois ele não obteve significativa votação na maioria dos
estados, com exceção da Bahia, onde obteve a terceira maior votação; do Espírito Santo,
obtendo a quarta votação, porém muito próximo do terceiro mais votado no estado –
Juarez Távora –, e de Santa Catarina, onde obteve também a terceira maior votação.
Considerando o desempenho do candidato no Brasil (8,3% do total de votos), Plínio teve
o triplo no Paraná.
Tabela 1
Resultados eleitorais para Presidente da República de acordo com o candidato
(partido/coligação), por estado brasileiro (1955; em %)
ESTADO JUSCELINO JUAREZ ADHEMAR PLÍNIO
KUBITSCHEK TÁVORA DE BARROS SALGADO
(PSD-PTB) (UDN-PDC) (PSP) (PRP)
Acre 45,2 31,2 20,9 2,7
Amazonas 35,4 16,7 39,8 8,1
Pará 49,6 11,9 36,2 2,3
Amapá 82,7 6,3 9,4 1,6
Rondônia 30,9 5,3 61,5 2,3
Roraima 69,4 17,0 12,3 1,3
NORTE 47,3 13,2 36,1 3,4
Alagoas 39,2 44,5 10,3 6,0
Bahia 43,1 32,3 11,0 13,6
Ceará 38,3 49,5 8,4 3,8
Maranhão 47,3 11,2 39,6 1,9
Paraíba 36,6 51,4 7,6 4,4
Continua...

49
Pernambuco 38,2 43,0 12,0 6,8
Piauí 53,4 34,3 10,4 1,9
R.G. do Norte 40,7 32,3 17,7 9,3
Sergipe 45,6 49,1 3,3 2,0
NORDESTE 41,2 39,6 12,4 6,8
E. Santo 36,1 18,9 26,2 18,8
M. Gerais 58,4 23,2 12,0 6,4
R. de Janeiro 46,2 21,7 26,2 5,9
São Paulo 12,7 33,1 45,8 8,4
Guanabara 29,5 25,9 39,4 5,2
SUDESTE 32,3 27,5 32,7 7,5
Paraná 24,8 21,0 29,3 24,9
R. G. do Sul 37,7 34,6 20,1 7,6
Santa Catarina 39,2 26,3 17,0 17,5
SUL 34,6 29,3 21,9 14,2
Goiás 43,2 17,6 36,8 2,4
Mato Grosso 47,0 34,4 17,0 1,6
CENTRO-OESTE 44,6 24,1 29,2 2,1
BRASIL 35,7 30,2 25,8 8,3
Votos (valores absolutos) 3.077.411 2.610.455 2.222.725 718.609
Fonte: Lavareda (1999, p. 203).
Nota: PTB: Partido Trabalhista Brasileiro; UDN: União Democrática Nacional; PSP: Partido Social Progressista.

Nosso objetivo aqui é investigar as razões desse fenômeno. Nota-se que nesse
pleito Plínio Salgado alcançou a terceira maior votação no Paraná (103.337 votos; 22,8% do
total4) – ficando atrás de Juscelino Kubitschek por apenas 1,2% dos votos (Tabela 2) – e
venceu seus principais concorrentes (Juscelino Kubitschek (PSD-PTB), Adhemar de Barros
(PSP) e Juarez Távora (UDN-PDC)) em vários colégios eleitorais, dentre eles Curitiba – o
maior colégio eleitoral do Paraná, com 39,76% dos votos, como verificamos na Tabela 3.
Tabela 2
Resultados eleitorais para Presidente da República de acordo com o
candidato (partido/coligação) no Paraná (1955)
CANDIDATO PARTIDO/COLIGAÇÃO VOTOS
ABS. %
Adhemar de Barros PSP 127.433 28,1
Juscelino Kubitschek PSD-PTB 108.998 24,0
Plínio Salgado PRP 103.337 22,8
Juarez Távora UDN-PDC 91.136 20,1
Brancos - 10.563 2,3
Nulos - 12.522 2,7
TOTAL - 453.989 100
Fonte: Ipardes (1989, p. 9).
4
A discrepância entre os percentuais das tabelas 1 e 2 deve-se ao uso de diferentes fontes: Lavareda (1990, p. 203)
na Tabela 1 e Ipardes (1989, p. 9) na Tabela 2.

50
Tabela 3
Resultados Eleitorais para Presidente da República de Acordo com o
candidato (Partido/Coligação) em Curitiba (1955)
CANDIDATO PARTIDO COLIGAÇÃO VOTOS
ABS. %
Plínio Salgado PSP 28.894 39,7
Adhemar de Barros PSD 18.751 25,7
Juarez Távora UDN-PDC 11.848 16,3
Juscelino Kubitschek PSD-PTB 11.395 15,7
Brancos - 1.209 1,7
Nulos - 650 0,9
TOTAL - 72.747 100
Fonte: Ipardes (1989, p. 20).

Com base na Tabela 4, comprova-se a expressiva votação de Plínio Salgado nos


17 maiores colégios eleitorais, excluindo Curitiba, tendo em vista que ele obteve a primeira
colocação em quatro desses colégios eleitorais e, em seis colégios, a segunda colocação.
Observa-se, também, sua votação nos quatro maiores colégios – Ponta Grossa,
Guarapuava, Londrina e Arapongas –, nos quais ele obteve a maior votação no maior
deles, segundo lugar em Londrina e Arapongas e apenas em Guarapuava obteve a quarta
colocação.
Tendo conhecimento disso, podemos afirmar que não foram apenas os
“curitibanos” que votaram em Plínio Salgado, mas sim os paranaenses como um todo,
pois ele obteve grande aceitação no estado, principalmente no Norte Novo, região formada
recentemente e que contém um maior número de imigrantes, contrariando, assim, a
teoria da “crise de identidade do homem paranaense” proposta por Szvarça e Cidade
(1989).

Tabela 4
Posição de Plínio Salgado nos maiores colégios eleitorais do interior do
estado do Paraná, por região (1955)
MUNICÍPIO/REGIÃO TOTAL DE ELEITORES POSIÇÃO VOTOS %
PARANÁ TRADICIONAL
Ponta Grossa 17.769 1 5.937 33,41
Guarapuava 10.264 4 1.849 18,01
Irati 5.479 4 1.010 18,43
Campo Largo 5.441 3 1.202 22,09
Rio Negro 5.315 1 1.797 33,80
Continua...

51
Lapa 5.245 1 1.728 32,94
LITORAL
Paranaguá 6.163 3 767 12,44
NORTE VELHO
Jacarezinho 6.253 2 1.758 28,11
NORTE NOVO
Londrina 12.924 2 2.814 21,77
Arapongas 7.021 2 2.043 29,09
Apucarana 6.072 3 1.246 20,52
Campo Mourão 6.668 4 897 13,45
Rolândia 6.546 2 1.849 28,24
Cornélio Procópio 6.075 2 1.469 24,18
Maringá 5.549 2 1.107 19,94
Cambe 5.289 1 1.661 31,40
Santo Antônio da Platina 5.089 4 128 2,51
Fonte: revista Paraná Eleitoral (apud SZVARÇA & CIDADE, 1989, p. 207).
Nota: O critério adotado para definir os maiores colégios eleitorais foi possuírem cinco mil eleitores ou mais.

Podemos sugerir que essa expressiva votação em Plínio Salgado não resultou da
identificação do eleitorado com o Partido de Representação Popular (PRP), de ideologia
integralista. Foi, antes de tudo, uma votação na pessoa de Plínio Salgado, pois, como
podemos ver na Tabela 5, o PRP não obteve sucesso nas eleições para Vereador, no mesmo
ano, em Curitiba.
Tabela 5
Resultados eleitorais para Vereador por partido/coligação em Curitiba:
cadeiras obtidas (1955)
Nº PARTIDO/ Nº
ELEITOS DE VOTOS COLIGAÇÃO DE CADEIRAS
1. Antenor Pamphilo dos Santos 859 PSD 4
2. Maximo Pinheiro Lima 766
3. José Maria de Azevedo 698
4. Erandyr Silvério 692
5. Myltho Anselmo da Silva 771 PTB 3
6. Victorio José Roda 764
7. João Stival 655
8. Antonio Damakoski 1.023 UDN 3
9. Elias Karas 943
10. Jurandyr de Azevedo e Silva 519
11. Dorgelo Antonio Biazetto 1.014 PR 3
12. Sebastião Penteado Darcanchy 663
13. Menoti Caprilhone 600
14. Vicente Capriglione 633 PSP 3
Continua...

52
15. Ondino Ruy Camargo de Loyola 594
16. Ivo Moro 539
17. Edmundo Leinig Saporski 770 PDC 2
18. Yrlan Cavet 678
19. João Gasparin Filho 570 PRT 1
20. Felipe Aristides Simão 777 PL 1
TOTAL 20
Fonte: a autora, a partir de TRE-PR (s/d).

O mesmo ocorreu nos demais municípios paranaenses, como nos mostra a


Tabela 6. Observamos também que, além de o PRP não ter obtido significativa votação, sua
atuação política era pouco expressiva, pois em apenas 14 municípios, dos 153 do estado,
apresentou candidato a Vereador, sendo que em apenas cinco desses municípios elegeu
representante.

Tabela 6
Resultados eleitorais do PRP nas eleições municipais nas cidades onde
apresentou candidato a vereador: cadeiras obtidas (1955)
MUNICÍPIO Nº DE PARTIDO Nº DE Nº DE CADEIRAS
VOTANTES COLIGAÇAO VOTOS CANDIDATOS OBTIDAS
RECEBIDOS APRESENTADOS

Arapongas 7.021 PR-UDN-PRP 822 20 2


(Frente Popular
Democrática)
Bela Vistado Paraizo 2.617 PRP 82 9 0
Cambe 5.289 PRP 166 9 0
Guarapuava 9.617* PRP s/i 2 1
Curitiba 72.751 PRP 3.581 26 0
Lapa 5.245 PRP 416 10 1
Londrina 12.942 PRP 1.500 17 2
Ponta Grossa 17.769 PRP 824 20 0
Prudentópolis 4.535 PRP 120 s/i 0
Rio Branco do Sul 1.821 PRP 72 3 0
Rio Negro 5.304 PRP 660 12 2
Sertanópolis 4.004 PRP 192 7 0
Santa Mariana 2.457 PRP 84 s/i 0
União da Vitória 4.567 PRP 131 8 0
Fonte: a autora, a partir de TRE-PR (s/d).
Notas:
1. s/i: sem informação
2. * Esse valor é uma projeção.
3. Em Prudentópolis o PRP lançou a candidatura para Prefeitura de Paulo Christiano dos Santos,
porém o mesmo ficou em último lugar, com 53 votos.

53
A Tabela 7 mostra-nos que nas eleições para Deputado Federal, no ano de 1958,
Plínio Salgado foi eleito pelo PRP, com pouco mais de 50 mil votos (4ª posição), superando
nomes importantes da política local, tais como Othon Mäder (9ª posição) e Bento Munhoz
da Rocha Netto (11ª posição), provando mais uma vez que não foi por mero acaso que o
líder integralista obteve grande aceitação no Paraná nas eleições presidenciais de 1955.
Tabela 7
Relação nominal dos candidatos eleitos para a Câmara dos deputados por
partido/coligação no Paraná (1958)
CANDIDATO PARTIDO-COLIGAÇÃO Nº DE VOTOS
1. Janio Quadros PTB 78.810
2. Ney Amintas de Barros Braga PDC 57.099
3. Francisco Accioly R. da Costa Filho PSD 56.392
4. Plínio Salgado PRP 50.628
5. Raphael Ferreira Rezende PSD 27.802
6. Petronio Fernal PTB 26.129
7. Miguel Bufara PTB 22.614
8. Mario Gomes da Silva PSD 18.847
9. Othon Mäder UDN/PR/PSP 17.821
10. José Teixeira da Silveira PTB 17.536
11. Bento Munhoz da Rocha Neto UDN/PR/PSP 17.199
12. Jorge de Lima PTB 15.977
13. Manuel de Oliveira Franco Sobrinho PSD 14.046
14. Antonio Baby PTB 9.806
Fonte: Ipardes (1989, p. 113).
Nota: PR: Partido Republicano.

Enfim, a partir da análise dos dados, concluímos que a votação obtida por Plínio
Salgado no Paraná segue, de fato, um padrão diferente do observado se comparado com os
demais estados brasileiros, pois foi apenas nesse estado que o líder integralista obteve tão
significativa votação. Não podemos deixar de pensar que o seu partido não obteve a mesma
votação no estado5, sugerindo assim que foi Plínio Salgado quem obteve esses votos e não
o Partido de Representação Popular, ou a ideologia integralista pregada pelo partido e pelo
líder Plínio Salgado.

5
Vide tabelas em anexo que reforçam tal afirmação: 1. Resultados eleitorais para Prefeito do Município de Curitiba
por candidato-partido/coligação em 1954; 2. Resultados eleitorais para Câmara Municipal de Curitiba por candidato
eleitopartido/ coligação em 1955; 3. Resultados eleitorais para Prefeito do Município de Curitiba por candidato-
partido/ coligação em 1958; 4.Resultados eleitorais para Câmara Municipal de Curitiba por candidato eleito-
partido/coligação em 1959; 5 Resultados eleitorais para Prefeito do Município de Curitiba por candidato-partido/
coligação em 1962. Tais tabelas mostram que o PRP não elegeu nenhum candidato para a prefeitura de Curitiba
nem para Câmara de Vereadores desse Município no período de 1954 a 1962.

54
III. ELEMENTOS DA HISTÓRIA POLÍTICA

Para melhor compreendermos por que Plínio Salgado – e não o PRP – obteve
significativa votação naquele momento, faz-se necessário conhecermos o cenário político
nos âmbitos nacional e estadual então vigente.
Começamos nossa análise do contexto político em 1945, quando Getúlio Vargas
foi derrubado do poder, afetando a política brasileira dos anos vindouros, pois a sombra
de sua personalidade veio a dominar o cenário político dos anos seguintes. Com a volta da
democracia fez-se necessária a criação de uma nova estrutura legal, dando ensejo ao
aparecimento de desacordos e conflitos, pois a sociedade brasileira dividia-se cada vez
mais (SKDIMORE, 1982).
A divisão mais elementar da política brasileira, em meados de 1945, era
entre os “de dentro” – “situacionistas” (mantenedores do status quo), que haviam
apoiado Getúlio Vargas durante o Estado Novo e que agora representavam uma grande
proporção de votos para o candidato que lhes parecesse disposto a continuar as
diretrizes básicas de Vargas –, e os “de fora” – “oposicionistas”, que haviam sido
excluídos do poder desde 1937, entre os quais estavam especialmente os
constitucionalistas liberais.
Nesse ambiente, em 2 de dezembro de 1945 realizaram-se as eleições e o ex-
Ministro da Guerra, Eurico Gaspar Dutra, venceu com 55% da votação nacional. Nas
eleições para o Congresso o PSD ganhou 151 cadeiras, a UDN, 77 cadeiras, o PTB, 22
cadeiras e o PCB, 14 deputados e um Senador. As poucas cadeiras restantes ficaram com
os partidos menores. Desse resultado pode-se perceber que a aliança entre os “de dentro”
podia sobreviver a uma eleição livre.
Com a posse do novo Presidente, o país estava pronto para a redemocratização
e em setembro de 1946 foi aprovada uma versão final da nova Constituição, que englobava
tanto as esperanças dos constitucionalistas liberais quanto as dos que eram favoráveis a
um governo federal forte. Como em 1934, foram incluídos elaborados dispositivos,
destinados a assegurar eleições livres e direitos cívicos. O eleitorado foi formado com a
exclusão dos analfabetos e dos convocados para as Forças Armadas.
Quanto à economia, no fim do governo Dutra o Brasil já ostentava um bom
índice de desenvolvimento, pois entre 1945 e 1951 houve um crescimento de 6% ao ano
no produto real total e de 3,2% no produto per capita. O planejamento econômico,
durante os anos Dutra, realizou-se em base regional e setorial, acompanhado por uma
redução da intervenção estatal na economia.
No ano de 1950 realizou-se nova eleição presidencial, em que a antigetulista
UDN indicou novamente o Brigadeiro Eduardo Gomes como seu candidato, aceitando o
apoio formal da última leva de integralistas de Plínio Salgado, que agora se organizavam
no Partido de Representação Popular. Todavia Getúlio Vargas ressurgiu no cenário nacional,
agora como campeão do trabalhismo e como candidato endossado por seu rival mais
próximo em populismo, Adhemar de Barros. Enfim, Vargas aliou-se ao PSP de Adhemar

55
de Barros, ao PTB e ao PSD (nos lugares onde a lealdade dos membros desse partido
fosse negociável6).
Em 1951 Getúlio Vargas assumiu a Presidência da República, vindo a encontrar
um país diferente daquele que deixara em 1945, pois a sociedade apresentava uma estrutura
de classes mais nitidamente diferenciada do que aquela do Estado Novo, em decorrência
do duplo processo de industrialização e urbanização que se ampliou, fortalecendo três
classes: os industriais, a classe operária urbana e a classe média urbana. Desse modo,
Vargas presidiu um sistema político aberto e fluido, em que os votos mobilizados pelos
chefes políticos do interior perdiam importância, enquanto o eleitorado urbano crescia
rapidamente.
Vargas teria muitos problemas econômicos para resolver, entre eles superar os
pontos de estrangulamento estruturais, atrasos setoriais, desequilíbrios regionais, o
balanço de pagamentos, as limitações que se impunha à capacidade do país para importar
e ainda o súbito crescimento da taxa de inflação.
Com o intuito de resolver esses problemas, Vargas decidiu explorar os
sentimentos de nacionalismo econômico e de animosidade popular contra os investimentos
estrangeiros, como justificativa para uma mudança de política que poderia, no entanto,
ser defendida em linguagem menos emocional, segundo Skidmore (1982). Vargas tomou
essa decisão pois sabia que a classe média era atraída pelas doutrinas do nacionalismo
econômico, assim como a classe operária urbana, possibilitando-lhe, então, edificar um
consenso popular acerca da política econômica, em prol da industrialização. Porém tal
decisão poderia resultar em uma divisão política do país.
Como esperado, o impulso do Brasil para a industrialização e para maior
autonomia econômica despertou tensões sociais, principalmente entre as classes
tradicionais ligadas ao comércio de exportação e importação, pois esses grupos temiam a
perda de importância relativa e de status.
Em 1953, lutando contra a inflação, Vargas reorganizou o seu ministério, reorientando
sua política, baseada em um esforço para mobilizar a classe operária sem afastar os industriais.
Porém tal estratégia se complicaria quando as verdadeiras medidas de estabilização se fizessem
sentir, pois os trabalhadores pediam aumentos de salários para compensar a inflação, e os
industriais pressionavam o governo no sentido de manter a política creditícia que havia
possibilitado o extraordinário surto industrial, entre 1948 e 1952.
No ano de 1954 o Brasil e Vargas enfrentavam uma situação difícil, pois o país
estabeleceu um alto preço do café, fato que veio a irritar os americanos, que revidaram
com uma investigação, gerando protestos no Brasil, por sua vez. Tudo isso fortaleceu o
sentimento nacionalista no Brasil, desviando a atenção do problema mais crucial, o das
medidas internas antiinflacionárias. Porém as vendas de café do Brasil para os Estados
Unidos diminuíram tanto que o País, na verdade, obtinha menos divisas que em 1953,
quando o preço do café era mais baixo.

6
Porém, em Pernambuco, Vargas encontrou o PSD comprometido com Cristiano Machado e foi forçado a aliar-
se à UDN, o que prova o caráter não-doutrinário dos partidos nos estados economicamente atrasados.

56
Em agosto de 1954 Getúlio Vargas suicidou-se, desarmando os antigetulistas e
privando-os de uma nítida vitória. Assim, o vice-Presidente da República, que era um líder
do PSP de Adhemar de Barros e mais conservador que Vargas, Café Filho, prestou juramento
como Presidente da República, organizando um novo gabinete que, agora, incluía diversos
líderes identificados com a UDN. Mas mesmo com políticos udenistas e militares
antigetulistas, presentes no novo governo, não havia perspectivas de um expurgo anti-
Vargas nos moldes solicitados anteriormente por extremistas, pois se sabia que Café Filho
era adepto ferveroso dos princípios da “legalidade”, realizando, então, as eleições para o
Congresso, programadas para outubro de 1954.
As eleições realizaram-se como programadas e os resultados revelaram que
a crise política pouco afetava a opinião dos eleitores, pois o PTB não conquistou uma
vitória significativa (56 cadeiras na Câmara dos Deputados contra 51 cadeiras no
Congresso anterior), embora Lutero Vargas, filho de Getúlio Vargas, fosse reeleito para
o Congresso; João Goulart viu frustrar-se seu projeto de eleger-se Senador pelo PTB de
seu estado natal, o Rio Grande do Sul, mesmo baseando sua campanha no apelo à
memória de Vargas. A UDN perdeu terreno na eleição, caindo de 84 cadeiras para 74,
embora Carlos Lacerda tivesse sido eleito para a Câmara dos Deputados. O PSD, o
partido menos atingido no conflito, aumentou ligeiramente a sua representação, de 112
para 114 cadeiras. Havia tendências marcantes dos candidatos de concorrerem em
chapas de “coalizão”, que combinavam legendas partidárias; no entanto, o resultado
eleitoral indicava que quem quer que fosse eleito Presidente em 1955 enfrentaria um
Congresso com a mesma complexidade política substancial daquele que Vargas enfrentara
em 1945.
Café Filho começou 1955 reafirmando a intenção de o governo realizar a eleição
presidencial na data marcada, em outubro. O PSD foi o primeiro partido a escolher o seu
próprio candidato, o Governador de Minas Gerais Juscelino Kubitschek, herdeiro de uma
das alas do sistema político de Vargas. Em abril, o PSD celebrou aliança com o PTB,
lançando a candidatura de João Goulart (PTB) para vice-Presidente, combinando o poder
eleitoral da máquina rural do PSD como o poder do PTB nas cidades.
Em abril, uma facção dissidente do PSD realizou sua própria convenção; esse
grupo, de caráter conservador, indicou como candidato próprio o ex-Governador de
Pernambuco, Etelvino Lins, político de pouca projeção nacional, posteriormente endossado
pela UDN.
Em maio, Adhemar de Barros (PSP) entrou na Arena. Esperava-se que ele
arrebatasse de Kubitschek os votos da classe trabalhadora e, desse modo, aumentasse as
chances do candidato da UDN.
Em junho, a UDN começou a preocupar-se com a falta de projeção do seu
candidato, Etelvino Lins, e retirou a sua candidatura, substituindo-o pelo General Juarez
Távora, que veio a ter o apoio do PDC.
Mesmo em meio a conflitos, Café Filho fez realizar-se a eleição. Houve quatro
candidatos: Juscelino Kubitschek (PSD-PTB), Juarez Távora (UDN-PDC), Adhemar de
Barros (PSP) e Plínio Salgado (PRP).

57
Sabemos que Café Filho herdou uma crise financeira de proporções realmente
alarmantes, pois a produção industrial tanto de bens de consumo como de bens de capital
continuava a crescer no início da década de 1950, assim como os demais problemas que
Vargas não conseguiu resolver, como a inflação e os déficits de pagamentos externos. Café
Filho pretendia apenas levar adiante uma série de medidas essenciais a curto prazo, pois
não teria tempo de atacar os problemas básicos, deixando, assim, para o próximo governo
resolver os problemas mencionados. Foi nesse ambiente que se deu a eleição para a
Presidência da República, de que saiu vitorioso, para o desalento dos antigetulistas,
Juscelino Kubitschek.
Simultaneamente e em conseqüência disso, o Paraná também sofria modificações
em seu cenário político, pois logo após as eleições de 1945 o Des. Clotário Portugal
passou a Interventoria a Brasil Pinheiro Machado, que, após assumir o governo estadual,
passou a ocupar a Presidência do Diretório Regional do PSD e a usar a máquina do
governo para fins eleitoreiros. Devido a isso, Brasil Pinheiro Machado foi substituído
pelo Tenente-Coronel Mário Gomes da Silva.
Na campanha de 1946, a candidatura de Moysés Lupion foi articulada de tal
modo que nenhuma força poderia derrotá-lo, pois tinha o apoio dos três maiores partidos
(PSD, PTB e UDN), recursos financeiros, o apoio do Presidente da República (Eurico
Gaspar Dutra) e o principal, a popularidade de seu nome, difundido em todo o estado.
Mesmo assim, foi lançada a candidatura de Bento Munhoz da Rocha Netto, que sabia que
não tinha chances, pois Lupion, além de ter conseguido unir em torno de seu nome os
partidos centristas, conciliava “os extremos mais profundos, ao receber o apoio a um só
tempo de integralistas e comunistas” (COSTA, 1995, p.366).
A Assembléia Constituinte do Estado formou-se da seguinte maneira: o Partido
Social Democrático com 17 deputados, a União Democrática Nacional com oito, o Partido
Trabalhista Brasileiro com seis, o Partido Republicano com quatro, o Partido de
Representação Popular com dois e, com um representante cada, o Partido Social Progressista
e o Partido Comunista Brasileiro.
O secretariado montado por Moysés Lupion refletia a composição de forças do
acordo interpartidário feito durante a campanha eleitoral, representada na Assembléia
Constituinte como segue: Gomy Júnior (PSD), na pasta do Interior, Justiça e Segurança
Pública; Paula Soares (UDN), na Fazenda; Francisco Maravalhas (PTB), na Agricultura;
Benjamin Mourão (PRP), na Viação e Obras Públicas; Milton Munhoz (UDN), na Saúde;
Gaspar Velozzo (PSD), na Educação, e Ângelo Lopes (PSD), na Prefeitura de Curitiba.
Sabe-se que no decênio 1940-1950 o estado do Paraná dobrou sua população
devido ao processo de migração interna que desbravou e ocupou o Norte do Estado. Em
virtude disso, durante seu governo Moysés Lupion manteve compromissos políticos e
populares extremamente sensíveis ao clamor de populações desenraizadas e sedentas de
um lugar ao sol, tanto mais em uma área do país justamente decantada pela abundância e
fertilidade de suas terras.
Politicamente falando, o Paraná não gozava de um clima confortável, pois houve
o rompimento da coligação que elegeu Moysés Lupion (PSD-UDN-PTB), desgastando a

58
imagem do Governador, tanto aos olhos dos eleitores quanto da bancado do PSD e de seu
próprio secretariado.
É interessante notar que, em conseqüência das múltiplas frentes de pioneirismo
que se abriam pelo interior do estado, a feição do eleitorado tornava-se flutuante, pois a
grande mobilidade demográfica quase não permitia que os contatos se consolidassem na
base de uma identidade de interesses e de reivindicações comuns.
No fim de seu mandato, em 1950, Moysés Lupion lançou para sua própria
sucessão a candidatura do engenheiro Ângelo Lopes, contando apenas com o apoio do
PSD, bem estruturado nos municípios e com uma grande bancada na Assembléia Legislativa.
Porém foi Bento Munhoz da Rocha Netto quem saiu vitorioso dessa vez, pois tinha de seu
lado a forte coligação de PR, UDN, PST e PL, além de uma parte do PTB e de uma
dissidência do majoritário PDS.
Bento Munhoz da Rocha Netto, desde o início de sua gestão, contou com um
bom trânsito junto ao Presidente Getúlio Vargas, devido às estreitas relações de amizade
com o vice-Presidente Café Filho. Durante o governo de Munhoz da Rocha a maior bancada
na Assembléia Legislativa continuou sendo a do PSD, sendo a segunda maior a do PTB.
Foi no governo de Munhoz da Rocha que se deu a comemoração do primeiro
centenário de emancipação política do Paraná, fato que representou para o estado “um
divisor de águas e uma tomada de consciência, o Estado atingia uma idade historicamente
adulta e politicamente madura para assumir maiores espaços no contexto nacional” (COSTA,
1995, p. 402-403).
Nesse período de realizações do governo de Munhoz da Rocha, o Paraná
despontava na economia nacional como o principal produtor e exportador de café no
mercado mundial.
Enfim, foi nesse contexto que se deram as eleições para Governador do Estado
e Presidente da República, em 1955.
Tais eleições tiveram como candidatos para o Governo: Moysés Lupion (PSD-
PDC-PTN), que foi eleito; Mário Baptista de Barros (PTB-PR); Othon Mäder (UDN); Luiz
Carlos Pereira Tourinho (PSP) e Carlos A. Osório (PSB).
Quanto à situação dos partidos, sabe-se que em 1948 a UDN foi maioria nos
pleitos municipais de novembro, conquistando prefeituras de grande expressão, como
Ponta Grossa e Londrina, ou seja, o partido antigetulista tinha grande força no Paraná.
Quanto ao PTB, em 1950 ele estruturou-se como uma força popular, um partido de
massas, exigência da época.

IV. A CAMPANHA

Ao analisarmos os dados eleitorais disponíveis observamos um fato marcante:


a semelhança na votação obtida por Plínio Salgado e por Moysés Lupion, candidato a
Governador do Estado do Paraná pela coligação PSD-PDC-PTN, nas zonas eleitorais de
Curitiba, como podemos ver no Gráfico 1.

59
Gráfico 1
Resultados eleitorais comparados entre Plínio Salgado e Moysés Lupion
em Curitiba, por zonas eleitorais (1955)

35.000

30.000

25.000

20.000

15.000

10.000

5.000

0
Zona eleitorais Zona 1 Zona 2 Zona 3 Zona 4 TOTAL

Plínio Salgado (PRP) Moysés Lupion (PSD-PDC-PTN)

Fonte: a autora, a partir de Paraná Eleitoral (1955, p. 6) e Szvarça e Cidade (1989, p. 202).
Nota: As zonas eleitorais de Curitiba estavam formadas, no período de dezembro de 1961 a janeiro de 1962, da seguinte
forma: Zona 1 – parte da sede (Centro), Santa Felicidade e Campo Comprido; Zona 2 – parte da sede, Barrerinha, Taboão,
sede de Rio Branco do Sul e Açungui (Rio Branco do Sul); Zona 3 – parte da sede, Cajuru, Boqueirão, Umbará, Tatuquara,
Piraquara (sede), Campina Grande do Sul (sede) e Quatro Barras (sede); Zona 4 – parte da sede e Portão.

Observando isso podemos pensar em nossa quinta hipótese de trabalho: a


transferência de votos de Moysés Lupion para Plínio Salgado, que podem ter feito uma
aliança eleitoral, não necessariamente ideológica, com o intuito de maximizar os votos.

60
Temos o conhecimento de que no início das eleições casadas de 1955 Moysés
Lupion apoiava Juscelino Kubitschek, mas eles romperam e Lupion pode ter apoiado
Plínio Salgado7. O problema é que não sabemos por que ocorreu a ruptura e nem se o
apoio seria dado a Plínio Salgado. A campanha eleitoral assume, assim, grande importância
para compreendermos as razões do voto do eleitor, de modo que passaremos a tratar
dela, considerando tanto a campanha de Plínio Salgado quanto a de Moysés Lupion no
estado do Paraná.
Primeiramente, temos que esclarecer o que entendemos por “eleições casadas”.
Para isso partiremos do estudo realizado por Marcus Figueiredo (1994), que afirma que
eleições casadas seriam produzidas pela coincidência da eleição presidencial com as
demais, para Governador e para o poder Legislativo, o que permitiria a formação de
alianças apenas para fins eleitorais, fato que estimularia a estratégia maximizante do voto
fundada na aritmética eleitoral e não na aritmética ideológica.
Outro ponto necessário a ser enfatizado a propósito das eleições casadas é que
os partidos participantes de candidaturas nacionais podem aliar-se a candidaturas estaduais
concorrentes com as nacionais, pois o objetivo principal de qualquer partido é a
maximização dos votos; secundariamente vem a preferência a aliar-se a agremiações de
seu próprio campo ideológico.
No caso do estado do Paraná, observamos que no período de 1950 a 1960 as
eleições para Governador do Estado e Presidente da República foram casadas (Tabela
8). Levando esse fato em consideração, passaremos a analisar a campanha eleitoral de
1955 em si, considerando a atuação tanto de Plínio Salgado quanto de Moysés Lupion,
no sentido de examinar se Lupion coligou-se, mesmo que informalmente, com Plínio
Salgado.

7
Em entrevista realizada pelo pesquisador Márcio Kieller, em julho de 2001, com Milton Ivan Heller, jornalista e
ex-dirigente do PCB do Paraná, no período 1945-1964, o entrevistado prestou o seguinte depoimento:
“MK – E a situação política no Paraná nessa época: qual partido dominava?
MIH – Eu peguei um período de transição. Em 1956 o Lupion foi eleito Governador pela segunda vez. Foi eleito
Governador, mas aí já começaram com uma violenta oposição contra ele, acusaram de ladrão e tudo. Fizeram
uma fofoca, uma denúncia vazia nos ouvidos do Juscelino Kubitschek, de que ele teria apoiado o Adhemar de
Barros [para a Presidência da República]. Porque o Juscelino concorreu à Presidência contra o Joaquim Távora,
contra o Adhemar de Barros e contra o Plínio Salgado. No Paraná ele teve poucos votos, o mais votado aqui em
Curitiba, por incrível que pareça, foi o Plínio Salgado. Adhemar de Barros teve bastante votos, porque o Norte do
Paraná e São Paulo são muito próximos, muito ligados, com interesses comerciais, tem muita gente veio de São
Paulo para o Norte do Paraná, então o Adhemar tinha que ter votação aqui. O Juscelino ficou em terceiro e o
último em votos foi candidato da UDN, foi Juarez Távora. O Juscelino achava que tinha sido traído. Não, traído
não. O Governador lá é sócio do Adhemar e o PSD trabalhou para o Adhemar e tal. O que aconteceu foi que, na
época, o estado vivia do imposto de vendas e consignações, que mais foi substituído pelo ICMS [Imposto sobre
Circulação de Mercadorias e Serviços], e os repasses federais eram poucos, mas eram importantes, porque era
o dinheiro com que o estado contava para fazer alguma obra, para algum investimento – afinal, a arrecadação
própria mal dava para pagar o funcionalismo. Aí o Juscelino não passou nem um centavo para o Paraná, porque
lhe disseram que o Lupion tinha apoiado o Adhemar de Barros. O Lupion ficou em dificuldades muito sérias,
chegou a atrasar o salário do funcionalismo seis meses e isso causou um desgaste político muito grande, que
coincidiu também com a revolta dos posseiros de 1957, lá no Sudoeste”.

61
Tabela 8
Resultados eleitorais para presidente e governador por taxa de
comparecimento (%) no Paraná (1945-1960)
1945 1947 1950 1954 1955 1958 1960
PRESIDENTE 58,24% NH 73,63% NH 67,52% NH 81,73%
GOVERNADOR NH 60,60% 73,56% NH 67,51% NH 81,72%
Fonte: a partir de Santos (1990, p. 144-147).
Notas:
1. NH: Não houve eleição para esse pleito.
2. Em 1954 e 1958 alguns estados brasileiros tiveram eleições para Governador, mas não foi o caso do Paraná.

Ao lermos os dois principais jornais do estado – Gazeta do Povo e O Estado do


Paraná, edições diárias do ano de 1955, observamos que em nenhum dos dois há um
posicionamento favorável à candidatura de Plínio Salgado; muito pelo contrário, há flagrante
menosprezo pela sua candidatura, como podemos ver no Panorama Político do Estado do
Paraná do dia 25 de janeiro de 1955:

Mas se o Ministro Orozimbo não será pretendente ao Catete, já o mesmo


não se poderá dizer do sr. Plínio Salgado. Claro está que o chefe dos
integralistas só tem “chance” de chegar em último, mesmo se os candidatos
forem quatro ou cinco. Não obstante, para atender aos desejos dos seus
“águias brancas” de secção de São Paulo do PRP, o sr. Plínio Salgado
concordou com a indicação de seu nome à presidência da República, ‘ad
referendum’ da Convenção Nacional de seu partido. Embora careça de
ponderabilidade, registre-se a candidatura em questão como a 2º, na
ordem cronológica para o próximo pleito presidencial (PANORAMA
POLÍTICO, 1955, p. 4).

Por outro lado, Lupion (PSD-PDC-PTN) teve grande apoio da Gazeta do Povo,
do mesmo modo que Juscelino Kubitschek, candidato a Presidente pela coligação PSD-
PTB. Porém o jornal Estado do Paraná parece ter apoiado a candidatura Mário de Barros,
da coligação PTB-PR.
Mesmo assim Plínio Salgado, em seu comício realizado em 5 de setembro de
1955, na Avenida João Pessoa em Curitiba, atraiu uma multidão, segundo a imprensa local.
Foi o maior comício de campanha, em comparação com os de seus adversários, como
afirma o Estado do Paraná do dia 6 de setembro de 1955.
Ao obter a maior votação em Curitiba, os jornais procuraram explicação para o
fato, afirmando que foi o apoio do clero que deu essa votação extraordinária a Plínio
Salgado. Em contrapartida, “o clero também apoiou Mário de Barros, que quase nada
conseguiu” (Gazeta do Povo, 7.out.1955), comprovando então que o apoio do clero não
explica a expressiva votação obtida por Plínio Salgado.
Como podemos verificar, infelizmente não foi possível encontrar informações

62
que comprovem de fato a coligação de Moysés Lupion com Plínio Salgado. Todavia
sugerimos que foi o eleitor quem fez a aliança pois, como enfatiza Figueiredo (1994, p.
11), o eleitor tem liberdade absoluta para escolher seus candidatos e tende a desconsiderar
as vinculações partidárias e as alianças nacionais e estaduais, pois, assim como os partidos,
os eleitores também maximizam seus atos no processo eleitoral. Enfim, o eleitor escolhe
seus candidatos e por si próprio “produz” alianças.
Porém para compreendermos o porquê de o eleitor realizar tal aliança, teríamos
que fazer um estudo comportamental, ou seja, analisar o comportamento do eleitor
paranaense nas eleições de 1955, e esse não é o objetivo do presente trabalho.
A principal hipótese “comportamental”, que deve ser estudada futuramente,
parte da observação de que nas eleições presidenciais de 1955 houve a maior taxa de
abstenção no Paraná (67,52%) no período de 1945 a 1960, e a segunda maior para as
eleições para o governo do estado (32,49%), como verificamos nas tabelas 9 e 10. Isso
nos faz pensar que o eleitor paranaense de algum modo não estava satisfeito com a
situação política por que passava o país, tendo então realizado o conhecido “voto de
protesto”, vindo a eleger a oposição, que se dava nos nomes de Moysés Lupion para
Governador e Plínio Salgado para Presidente.
Tabela 9
Resultados eleitorais para Presidente da República por números de
eleitores, taxa de comparecimentos, taxa de abstenção, percentual de
votos brancos e nulos e votação do eleito no Paraná (1945-1960)
1945 1950 1955 1960
Eleitorado (A) 229.672 372.796 672.645 885.418
Votantes (B) 195.768 274.474 454.140 723.609
% Comparecimento. (B/A) 85,24% 73,63% 67,52% 81,73%
Abstenção (C) 33.904 98.322 218.505 161.809
% Abstenção (C/A) 14,76% 26,37% 32,48% 18,27%
Brancos e nulos (D) 586 9.268 23.555 67.702
Votos válidos (E) 195.182 265.206 430.585 655.907
% Brancos e nulos (E/B) 0,30% 3,38% 5,19% 9,36%
% Votos válidos (E/B) 99,70% 96,62% 94,81% 90,64%
Votação do Presidente eleito (F) 137.060 196.036 108.031 369.737
% Votação do Presidente eleito (F/E) 70,22% 63,74% 25,09% 56,37%
Fonte: a autora, a partir de Santos (1990).

63
Tabela 10
Resultados eleitorais para governador do Estado do Paraná por número
de eleitores, taxa de comparecimento, taxa de abstenção, % votos brancos
e nulos e votação do eleito (1947-1960)
1947 1950 1954 1955 1958 1960
Eleitorado (A) 239.801 372.796 N/H 672.645 N/H 885.418
Votantes (B) 145.309 274.560 N/H 454.117 N/H 723.530
% Comparecimento (B/A) 60,60% 73,65% N/H 67,51% N/H 81,72%
Abstenção (C) 94.492 98.236 N/H 218.528 N/H 161.888
% Abstenção (C/A) 39,40% 26,35% N/H 32,49% N/H 18,28%
Brancos e nulos (D) 8.309 17.299 N/H 25.151 N/H 50.776
Votos válidos (E) 137.000 257.261 N/H 428.966 N/H 672.754
% Brancos e nulos (E/B) 5,72% 6,30% N/H 5,54% N/H 7,02%
% Votos válidos (E/B) 94,28% 93,70% N/H 94,46% N/H 92,98%
Votação Governador eleito (F) 91.059 172.638 N/H 185.108 N/H 253.552
% Votação Governador eleito (F/E) 66,47% 67,11% N/H 43,15% N/H 37,69%
Fonte: a autora, a partir de Santos (1990).
Notas:
1. N/H: não houve eleições.
2. Em 1954 e 1958 alguns estados brasileiros tiveram eleições para Governador, mas não foi o caso do Paraná.

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Estado do Paraná, Curitiba, janeiro a dezembro de 1955.


Gazeta do Povo, Curitiba, janeiro a dezembro de 1955.
HELLER, Milton Ivan. Entrevista concedida a Márcio Kieller. Curitiba, 1 e 7. Jul.
2001.
Panorama político. Estado do Paraná, Curitiba, 25.jan.1955, p. 4.[Editorial]
TRE-PR. Base de dados primários da Seção de Divulgação de Resultados. Curitiba:
Tribunal Regional Eleitoral do Paraná, s/d.

65
ANEXOS
Tabela 1 - Anexo
Resultados eleitorais para Prefeito do Município de Curitiba por candidato-
partido/coligação em 1954.
CANDIDATO PARTIDO-COLIGAÇÃO Nº DE VOTOS
Alfredo Pinheiro Júnior PSD 11.070
Amâncio Moro PL 5.213
Estevam Ribeiro de Souza Neto PTB 8.007
João Cid Macedo Portugal PDC 4.567
Manoel de Freitas Valle Aranha UDN 1.101
Ney Amintas de Barros Braga PSP/PR 18.327
Roberto Barroso PTN 1.307
Wallace Thadeu de Mello e Silva PST 11.576
Fonte: TRE-PR. Compilação da autora.

Tabela 2 - Anexo
Resultados eleitorais para Câmara Municipal de Curitiba por candidato
eleito-partido/coligação em 1955.
CANDIDATO PARTIDO-COLIGAÇÃO Nº DE VOTOS
Antonio Damakoski UDN 1.203
Dorgelo Antonio Biazetto PR 1.014
Elias Karam UDN 943
Antenor Pamphilo dos Santos PSD 859
Felipe Aristides Simão PL 777
Myltho Anselmo da Silva PTB 771
Edmundo Leinig Saporski PDC 770
Maximo Pinheiro Lima PSD 766
Victorio José Roda PTB 764
José Maria de Azevedo PSD 698
Erondy Silvério PSD 692
Yrlan Cavet PDC 678
Sebastião Penteado Darcanchy PR 663
João Stival PTB 655
Vicente Capriglione PSP 633
Menoti Caprilhone PR 600
Ondino Ruy Camargo de Loyola PSP 594
João Gasparin Filho PRT 570
Ivo Moro PSP 539
Jurandyr de Azevedo e Silva UDN 519
Fonte: TRE-PR. Compilação da autora.

66
Tabela 3 - Anexo
Resultados eleitorais para Prefeito do Município de Curitiba por candidato-
partido/coligação em 1958.
CANDIDATO PARTIDO-COLIGAÇÃO Nº DE VOTOS
Ibere de Mattos PTB 32.313
Felipe Arístides Simão PL/PDC 26.691
Luiz Carlos Pereira Tourinho PSP/UDN 16.690
Walece Thadeu de Mello e Silva PSD/PST 11.554
João Pereira de Macedo PRT 2.435
Fonte: TRE-PR. Compilação da autora.
Tabela 4- Anexo
Resultados eleitorais para Prefeito do Município de Curitiba por candidato-
partido/coligação em 1959.
CANDIDATO PARTIDO-COLIGAÇÃO Nº DE VOTOS
Erondy Silvério PSD 2.699
Marcos Bertoldi PSD 2.367
Felipe Aristides Simão PL 1.935
Guilherme Cleo Biasi PSD 1.858
Carlos Alberto Moro PTB 1.756
José Maria de Azevedo PSD 1.662
Aldo Schmind PTB 1.558
Elias Karam UDN 1.344
Sebastião Penteado Darcanchy PR 1.145
Aristides Athayde Junior PTB 1.111
Victorio Jose Roda PTB 1.021
Maria Clara Brandão Tesserolli PSD 940
Washington Mansur PDC 921
Arlindo Ribas de Oliveira PSP 886
Domingos Primo Moro PDC 859
Lellis Antonio Correa PDC 846
Igo Iwant Losso PRT 833
Diogenes D’Stori PL 818
Ivo Moro PSP 809
Menotti Caprilhone PR 802
Fonte: TRE-PR. Compilação da autora.
Tabela 5- Anexo
Resultados eleitorais para Prefeito do Município de Curitiba por candidato-
partido/coligação em 1962.
CANDIDATO PARTIDO-COLIGAÇÃO Nº DE VOTOS
Ivo Arzua PDC/UDN/PL 51 .511
Carlos Alberto Moro PTB 40 .187
Abilio Ribeiro PSD 17 .023
Fonte: TRE-PR. Compilação da autora.
67
68
CAPÍTULO TRÊS

A VOTAÇÃO DO MDB NO PARANÁ:


UMA ANÁLISE HISTÓRICA (1966 e 1978)

Moacir Ribeiro de Carvalho Júnior

69
70
3. A VOTAÇÃO DO MDB NO PARANÁ:
Uma análise histórica (1966 e 1978)

I. INTRODUÇÃO

Ao pesquisar-se o desempenho político do Movimento Democrático Brasileiro


(MDB) no estado, uma preciosa fonte foram os dados levantados junto ao Tribunal
Regional Eleitoral do Paraná (TRE-PR). Determinaram-se os cinco maiores colégios
eleitorais da época e, a partir daí, houve o acompanhamento do desempenho do referido
partido em duas eleições críticas: a primeira, de 1966, e a última, de 1978, ambas tratando
da eleição para deputados estaduais, deputados federais e senadores.
O interesse em estudar o MDB surgiu a partir da constatação de que esse
partido demonstrou uma grande capacidade de articulação em um período em que a
estrutura político-burocrática então vigente fornecia todos os elementos para o seu fracasso.
Além do cenário político da época, após o golpe militar de 1964, faz-se necessária a
observação, como lembra Bolívar Lamounier (1978, p. 2), do elemento local, municipal,
ao explicar o comportamento do eleitorado diante de tais transformações.
Todo o levantamento de dados e referencial bibliográfico aqui apresentado
objetiva responder, mesmo que provisoriamente, à seguinte indagação: é possível traçar
um denominador comum quando o assunto é o MDB nacional e o desempenho do seu
diretório regional perante o eleitorado paranaense?
Durante um período de cerca de 20 anos (1945-1964) o Brasil gozou um clima
de resgate da sua democracia, no período posterior à “Era Vargas”, com um pluripartidarismo
que trazia no seu bojo siglas de linha conservadora, como a União Democrática Nacional
(UDN) e o Partido Social Democrático (PSD), e de linha trabalhista-reformista, como o
Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) e o Partido Democrata Cristão (PDC).
Mesmo valendo-se de uma liberdade institucional, a linha populista-trabalhista,
herdeira de Getúlio Vargas, continuava a reger os rumos do país graças à força eleitoral da
aliança PSD-PTB. O golpe de 1964, além de contar com a ação objetiva da instituição do
Exército, contou com o apoio de setores civis, de linha conservadora, interessados em
galgar o poder no cenário político.
71
Contudo, houve diversas situações conflituosas nos primeiros meses do novo
governo militar, inclusive envolvendo a ala civil de apoio ao golpe, levando o então presidente
Castelo Branco a decretar o Ato Institucional n. 2 (AI-2), em 27 de outubro de 1965.
Desse instituto legal interessa ao presente estudo o dispositivo que determinou a extinção
dos partidos políticos existentes, que seriam reorganizados sob a letra do Ato Complementar
n. 4 (AC-4).
Como o novo governo não obteve êxito ao trabalhar com os partidos políticos
do antigo regime, optou pela extinção do pluripartidarismo e no seu lugar, mediante o Ato
Institucional n. 4 (AI-4), permitiu-se a existência de apenas dois partidos políticos: um de
apoio ao governo e outro de oposição. Tal medida foi uma nítida “cópia” dos modelos
políticos britânico e norte-americano.
No entender de Paulo Roberto Motta (MOTTA, 1971, p. 67), o interesse do
governo pelo bipartidarismo norte-americano tinha um caráter mais profundo que uma
mera cópia impensada. Na verdade, segundo esse autor, a dualidade criada no seio
parlamentar daquele momento refletia o mesmo clima político observado no período
anterior a 1930, quando se digladiavam apenas duas forças políticas nacionais: a elite
agrária e os grupos liberais. Após 1965, a idéia era manter o cenário político oscilante
apenas entre governo e oposição, desprezando qualquer outro grupo de interesse
eventualmente formado. Agindo assim, conclui o referido pesquisador, os militares
puderam aglutinar em uma única frente, passível de maior controle, todos os interesses
dos setores mais conservadores da sociedade e discriminando em uma única sigla os
setores trabalhista-reformistas.
Estava presente na pauta dos udenistas sepultar definitivamente a aliança PSD /PTB.
O próprio governo militar entendia a necessidade de extirpar a influência do PTB no
cenário político (KINZO, 1988, p. 28).
A Aliança Renovadora Nacional (Arena) enfrentou uma grande dificuldade de
congregar sob a mesma sigla antigos rivais políticos, como era o caso do PSD e da UDN.
A solução ao impasse foi a adoção das chamadas “sublegendas”, por proposta do ex-
udenista Mem de Sá (idem, p. 30), as quais permitiram aos grupos rivais disputarem,
dentro da mesma sigla, os pleitos na esfera local.
Outra grande dificuldade foi agremiar uma oposição. Ninguém estava interessado
em combater um regime autoritário. Aliás, os verdadeiros críticos do golpe já haviam sido
afastados do cenário político por ocasião do primeiro Ato Institucional, decretado pelo
Supremo Comando Revolucionário, que arbitrariamente suspendeu os mandatos e os
direitos políticos de 50 deputados federais e de nove suplentes, sendo 25 do PTB e 12 de
partidos menores com orientação trabalhista-reformista.
Contudo, em 10 de fevereiro de 1966 o Deputado Federal Vieira de Melo leu o
manifesto que oficializava o nascimento do Movimento Democrático Brasileiro perante a
Câmara dos Deputados. No Paraná, segundo o relato de Sylvio Sebastiani (1992, p. 6), a
estruturação da nova “organização provisória” ficou a cargo do Deputado Federal Miguel
Buffara, ex-PTB, por ordem do então Presidente nacional do MDB, Senador Oscar Passos.
No dia 24 de março de 1966, tanto a Arena quanto o MDB foram reconhecidos

72
como organismos políticos ativos pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Suas siglas não
continham o termo “partido” porque o AI-4 permitia a criação apenas de “organizações
provisórias”, as quais, conforme o rumo das eleições daquele ano, poderiam serem
dissolvidas ou alteradas.

II. PERFIL SOCIOPOLÍTICO-ECONÔMICO DAS CIDADES PESQUISADAS

Conforme os gráficos 1 e 2, abaixo, as cinco principais cidades em termos


eleitorais do período aqui estudado eram, em ordem decrescente: Curitiba, Londrina,
Maringá, Ponta Grossa e Cascavel.
A evolução dessas cidades esteve condicionada, além dos ciclos de colonização,
à atuação da Comissão de Desenvolvimento do Paraná (Codepar), que incentivou a
industrialização do estado na segunda metade da década de 1960, já sob o regime militar.

A estratégia adotada foi o investimento direcionado em três eixos principais:

1.região Sul do estado, incluindo Curitiba e Ponta Grossa;


2.região Norte, incluindo Londrina e Maringá; e
3.finalmente, a região Oeste, incluindo Cascavel e Guaíra.

GRÁFICO 1
Comparação do eleitorado entre 1966 e 1978

Fonte: TRE-PR (s/d).

73
GRÁFICO 2
Comparação do número de votantes entre 1966 e 1978

Fonte: TRE-PR (s/d).

Com o advento do processo de industrialização, tais regiões mantiveram uma


estrutura econômica capaz de suportar a decadência da agricultura primária e investir na
agroindústria.
Regiões como as de Curitiba e Ponta Grossa, em um primeiro momento, mesmo
com o processo de industrialização, ainda mantiveram uma sociedade conservadora
influenciada por uma elite rural historicamente fixada nessas localidades. Como exemplo
desta afirmação, na Câmara de Vereadores de Curitiba, por ocasião da revoada dos
parlamentares a uma das siglas do bipartidarismo, dos 20 representantes ali atuantes,
apenas Arlindo Ribas de Oliveira (SEBASTIANI, 1992, p. 6-7) integrou os quadros do
MDB, demonstrando, assim, o conservadorismo da capital paranaense.
A relação do pequeno proprietário rural, fosse o caboclo, fosse o imigrante,
perante o fazendeiro era de profundo respeito, deixando-se influenciar inclusive em
relação à sua formação de valores e conceitos. Desse modo, algumas famílias de grandes
proprietários tornaram-se as verdadeiras responsáveis pela “formação de padrões de
convivência social”, os quais sustentaram “os sistemas de decisão de caráter coletivo”
(CODEM, 1966, v. I, p. 37). Altiva Pilatti Balhana percebeu que o colono europeu, inserido
em uma sociedade em que já havia uma elite local definida, estava desinteressado de
qualquer ideologia partidária ou até mesmo de atentar-se aos problemas locais ou nacionais;
o colono imigrante estava “preocupado imediatamente apenas em criar condições de
bem-estar e segurança para si e sua família” (BALHANA, 2002, v. I, p. 259-260).
Contudo, a partir de 1970 o maior investimento em indústrias de transformação,
em especial a metal-mecânica (LEÃO, 1991, p. 68-70), fez que viessem para a cidade
novas empresas, desvinculadas das tradicionais relações locais, de técnicos especializados,
assim como operários voltados aos serviços de metalurgia. Essa migração de mão-de-

74
-obra auxiliou na formação de uma população mais crítica aos modelos tradicionais já
observados na localidade, constituindo-se, em 1978, em um eleitorado de oposição à elite
conservadora local.
Na região Sudoeste ocorreram grandes disputas pela terra e pelo controle
político, uma vez que, historicamente, a região foi colonizada pela simples acomodação do
colono em terras devolutas ou por iniciativa de empresas colonizadoras, particulares ou
governamentais. Antônio Annibelli (apud FARIA & SEBASTIANI, 1997, p. 6), então membro
do PTB, confirmava o interesse de Getúlio Vargas em colonizar efetivamente o Oeste
paranaense, onde muitas terras de boa qualidade permaneciam mata fechada; ainda, era
preocupação do governo federal garantir a soberania da região com a ocupação efetiva
dos cidadãos brasileiros.
A região oscilou na disputa de dois grupos políticos, que nasceram do mesmo
embrião: o então “coronel do sertão”, líder político regional, Manoel Martins, sogro do
Deputado Cândido Machado de Oliveira, do PSD, e do também Deputado Estadual Antonio
Annibelli, do PTB (COLNAGHI, 1991, p. 11).
A mesma relação entre os dois partidos (PTB-PSD) pode ser observada em
todo o estado, uma vez que tal articulação era controlada por Moysés Willie Lupion de
Troya, herdeiro político do Interventor Manoel Ribas. Lupion manteve-se no cenário
político paranaense por mais de 15 anos, consagrando-se como “o único grande líder
populista que o Paraná teve no período democrático liberal de 1946 a 1964” (idem, p.
10). Contudo, Lupion estava voltado a atender os interesses das altas classes do estado e,
naturalmente, quando do advento do bipartidarismo o seu grupo político migrou para o
ARENA. No Norte do estado, dada a colonização induzida pela Companhia de Terras Norte
do Paraná (CTNP), houve um avanço populacional quase idêntico ao observado na região
Sudoeste; porém a expansão foi ainda mais intensa, dado o ciclo econômico ali desenvolvido:
o do café, que movimentava maior quantidade de riquezas e, dada a conexão com o porto
de Santos, era de fácil escoamento.
Em Londrina e Maringá houve grandes investimentos, inclusive do governo
federal, nas companhias estrangeiras (CESÁRIO, 1991, p. 43). A região estava interligada
com o interior do estado de São Paulo por meio da Ferrovia Sorocabana. A região foi
colonizada basicamente por paulistas e mineiros, mantendo-se por muito tempo desligada
do Sudeste do Estado, onde se encontrava a capital. Por esse motivo foi fácil formar na
região o embrião de uma oposição combativa ao governo paranaense, uma vez que as
riquezas geradas ali escoavam, em forma de impostos e investimentos, para o
enriquecimento de Curitiba.
Apenas no governo do interventor Manoel Ribas foi construída a Estrada do
Cerne, que ligava precariamente o Norte ao Sul. Contudo foi no governo de Ney Braga,
eleito Governador do Estado em 1960, que tal integração efetivou-se com a construção da
“Rodovia do Café”. Segundo o ex-Governador, essa foi sua principal obra rodoviária
(Braga apud FARIA & SEBASTIANI, 1997, p. 29): “Nós ligamos o Norte a Curitiba. A
Estrada do Café é a integração do Paraná. Eu me emocionei tanto na inauguração. Trouxe
até o Presidente da República Castelo Branco. Lá em Ponta Grossa ele me disse: ‘Que

75
maravilha de obra’. A Estrada do Café foi a obra mais importante do meu Governo, ao meu
ver [...] porque uniu o Paraná”.
Apesar das afirmações do trecho acima, o ex-Prefeito de Londrina, o emedebista
Dalton Paranaguá, comentou a integração proporcionada pela referida rodovia (Paranaguá
apud CESÁRIO, 1991, p. 57):

“[...] Então já vieram [os migrantes] como conquistadores e aqui se plantaram.


E aqui fizeram surgir um Paraná diferente, que toma café e não toma chá. Que
trabalha e não manda o outro trabalhar. Que produz e não se serve do produto.
Então, falta nesse povo que está aqui nesta região uma coisa, e é um povo que
começa a se frustrar; falta o poder. Produz, gera a riqueza e tem uma estrada
de integração chamada Estrada do Café.
Essa só vai e não vem. Ela só leva daqui prá lá e não tem o retorno de lá prá cá.
Então, produzir uma Curitiba bonita, grande, capital próspera, uma das mais
bonitas cidades do país, com repartições públicas notáveis, acarpetadas, ar
condicionado, gente mandando, gente faturando bem e nós trabalhando. Então
esse povo já não aceita mais isso. E é um povo de oposição. É uma oposição
natural. Gerada no dia a dia...
[...] Esse quadro de dependência gerou uma insatisfação. E quantas eleições
houver aqui, Londrina se posicionará sempre contra Curitiba. Historicamente
foi assim com todos os prefeitos, todos. Foi assim com o Cabral, foi assim
com Milton Menezes. Foi assim com Hosken, foi assim com o Richa, foi assim
com o Antoninho, foi assim com o Milton novamente, foi assim comigo, foi
assim com o Belinati e foi assim com todos os outros, todos, todos, todos.
Curitiba diz: o prefeito vai ser esse, Londrina já está do outro lado. Entendeu?
Ela é uma cidade de oposição”.

Foi justamente na década de 1970 que o Paraná passou por uma urbanização
motivada pelo êxodo dos meios rurais e pela diversificação das pessoas vindas dos outros
estados da federação. A fim de ilustrar tal caso, segundo dados do TSE, de um modo geral
o eleitorado brasileiro cresceu em 51% no período do bipartidarismo, de 1966 a 1978.
No caso paranaense a evolução deu-se do seguinte modo:
Tabela 1
Comparação do Eleitorado (1966 e 1978)
MUNICÍPIO 1966 1978
Curitiba 195.777 458.938
Londrina 43.981 139.164
Maringá 35.212 96.131
Ponta Grossa 37.149 81.383
Cascavel 12.274 71.532
Fonte: TRE-PR (s/d).

76
Saliente-se que este eleitorado apenas poderia ser composto de cidadãos maiores
de 18 anos e alfabetizados. Como o crescimento deu-se no bipartidarismo, um terço do
eleitorado brasileiro não havia tido qualquer experiência ideológica ou partidária além
das siglas Arena ou MDB. O período anterior não serviu, ou serviu muito pouco, na
formação desse eleitor (KINZO, 1988, p. 84). Nas principais cidades houve um crescimento
de mais de 100%. Alguns fatores contribuíram para este cenário, dentre eles a expansão
da alfabetização entre as camadas populares e a melhoria dos serviços, nas cidades,
encarregados de garantir a cidadania à população (cartórios de registro civil, Justiça
Eleitoral, escolas para adultos...).

III. AS ELEIÇÕES DE 1966

Os pleitos de 1966 definiriam os cargos de Deputado Estadual, Deputado Federal


e Senador da República. A Revolução abolira a eleição direta para os cargos de Presidente
da República e de Governador de Estado. No primeiro caso, ficaria sob a responsabilidade
do Congresso Nacional proceder à eleição, no outro caso, a responsabilidade caberia às
Assembléias Legislativas de cada estado.
Assim, em 3 de outubro de 1966 o Congresso ratificou o nome do então Ministro
da Guerra General Costa e Silva como o sucessor do Presidente Castelo Branco.
Não havia uma linha clara e objetiva do MDB em demonstrar-se como uma
oposição efetiva ao regime (KINZO, 1988, p. 93). É importante salientar que, como
lembrou David V. Fleischer (FLEISCHER, 1981, v. I, p. 185), o MDB já nasceu sob o temor
da violência, uma vez que o PTB, partido que mais contribuiu para as fileiras emedebistas,
no período anterior à implantação do bipartidarismo, sofreu a perda dos parlamentares
mais combativos ao regime militar por força do AI-1 e do AI-2. O autor indica que em
1963 o PTB contava com 119 deputados federais e que em 1966 esse número caiu para
109 (já no MDB).
Além disso, um desentendimento entre os poderes Legislativo e Executivo – que
se valia das cassações para amedrontar a oposição – fez com que, na madrugada do dia 20
de outubro, um forte aparato militar fechasse o Congresso Nacional, justamente durante
as eleições daquele ano.
Os reflexos dessa opressão podem ser percebidos no Gráfico 3, que apresenta
os votos da eleição para Senador de 1966 – naquela ocasião, essa era a mais importante,
sob o ponto de vista do eleitor, dada a impossibilidade de fazer campanhas aos cargos do
poder Executivo nos níveis federal e estadual. A mesma situação pode ser percebida nos
gráficos 6 a 9, dada a pouca capacidade de articulação da oposição e, ainda, devido a um
regime que mantinha altos índices de aprovação popular. Abaixo seguem todos os gráficos
(3 a 11) com as informações das eleições de 1966.

77
GRÁFICO 3
Eleições Senador - Paraná
1966

Fonte: TRE-PR (s/d).

GRÁFICO 4
Eleições Senador - 1966
ARENA

Fonte: TRE-PR (s/d).

78
GRÁFICO 5
Eleições Senador - 1966
MDB

Fonte: TRE-PR (s/d).

GRÁFICO 6
Eleições Deputado Federal - Paraná
1966

Fonte: TRE-PR (s/d).

79
GRÁFICO 7
Eleições Deputado Federal 1966
ARENA

votos

Fonte: TRE-PR (s/d).

GRÁFICO 8
Eleições Deputado Federal 1966
MDB

votos

Fonte: TRE-PR (s/d).

80
GRÁFICO 9
Eleições Deputado Estadual - Paraná
1966

Fonte: TRE-PR (s/d).

GRÁFICO 10
Eleições Deputado Estadual 1966
ARENA

votos

Fonte: TRE-PR (s/d).

81
GRÁFICO 11
Eleições Deputado Estadual 1966
MDB

Fonte: TRE-PR (s/d).

Apesar desses fatores, o MDB paranaense elegeu para a Câmara dos Deputados
nessa ocasião Léo de Almeida Neves, Renato Celidônio, José Richa, Fernando Gama e
Antônio Annibelli (SEBASTIANI, 1992, p. 8). Na Assembléia Legislativa do Paraná, obteve
apenas oito cadeiras: Jacinto Simões, José Alencar Furtado, Valmor Giavarina, Sílvio Barros,
Sinval Martins Araújo, Nélson Buffara, Lázaro Servo e Eurico Batista Rosas.
A Arena foi a vitoriosa no pleito ao Senado, elegendo Ney Amintas de Barros
Braga, ex-PDC, com 660.529 votos, contra os 273.378 votos obtido por Nelson Maculan
e, na sublegenda, dos 84.275 votos de Affonso Camargo, que representava a força do
extinto PDC. Saliente-se que Ney Braga, durante o período de transição dos regimes, era
o Governador do Paraná e deixou como sucessor no governo paranaense o seu Secretário
de Agricultura, Paulo Cruz Pimentel, que desenvolveu um programa de adensamento do
rebanho bovino no estado, criando uma boa imagem junto aos fazendeiros regionais
(FARIA & SEBASTIANI, 1997, p. 56). Tais políticos arenistas contavam com a simpatia dos
militares e, dada a influência no poder local do governo, da maioria do eleitorado para
garantir a vitória da Arena sobre o MDB na eleição de 1966.

IV. AS ELEIÇÕES DE 1978

Nos pleitos de 1978 o MDB obteve resultados satisfatórios, pois serviu como
único canal de oposição partidária ao governo central, a que se somou o desgaste natural da
“Revolução”, que enfrentava várias crises internas e focos de resistência na sociedade civil.

82
O MDB progrediu no cenário político daquele momento graças à sua
reestruturação interna, que minou a atuação branda dos velhos políticos do regime anterior,
originários do PTB e PSD, dando maior atuação aos jovens nascidos nas entranhas do
partido. Esses novos políticos souberam conduzir sua vida política em uma linha mais
radical de combate ao regime militar.
Desde os pleitos de 1974 o partido optou por seguir uma linha mais contundente
contra o governo (KINZO, 1988, p. 137-138). Tal medida foi adotada após as definitivas
derrotas nos pleitos de 1966 e de 1970, quando a direção do partido, sob os cuidados do
então Deputado Federal Ulysses Guimarães, percebeu que não adiantava tentar dialogar
com o governo militar, que, por sua vez, aumentava o rigor ao lidar com os focos de
contestação ao regime.
Pouco a pouco cresceu a simpatia do eleitorado pelo partido. Os discursos
proferidos no rádio e na televisão nas eleições de 1974 conduziram o povo, já desiludido
com o governo, a votar maciçamente na oposição. No Congresso Nacional, o MDB formou
uma bancada que ocupava 44% das cadeiras da Câmara dos Deputados e 30% do Senado
Federal. Como conseqüência, a sociedade civil sofreria várias privações das suas liberdades,
com a aplicação do Ato Institucional n. 5 (AI-5) (que privava o cidadão dos seus direitos
civis) e da Lei de Segurança Nacional; com a reforma do Judiciário (que também estava
sob o jugo do poder Executivo) e com o chamado “Pacote de Abril” de 1977, que determinava
eleições indiretas para Presidente da República, governadores de estado e um terço do
Senado Federal.
Até as eleições, o partido lutou por uma Assembléia Nacional Constituinte, de
caráter democrático; aliou-se a grupos civis de oposição, como setores da Igreja, sindicatos,
e o movimento estudantil e engajou-se na Frente Nacional de Redemocratização, que
lançou um candidato à Presidência da República, contra o escolhido pelo governo.
O público já se identificara com o MDB ao longo de sua existência e, mesmo
com as restrições impostas pelo governo, o partido conseguiu eleger oito senadores,
contra os 15 da Arena, que se valeu indiscriminadamente do uso da sublegenda, pois
estava autorizado a cada um dos partidos concorrer com até três candidatos a uma vaga
senatorial.
No Paraná, como em 1974, o MDB conseguiu eleger um Senador. Naquela
ocasião o vitorioso foi o candidato Francisco Leite Chaves, que derrotou o “imbatível”
arenista João Mansur. Em 1978, o vitorioso foi o londrinense José Richa.
O partido, em 1978, obteve resultados positivos, mesmo em regiões
historicamente conservadoras, como no caso de Curitiba (ver Gráfico 12). Terminada a
apuração dos votos, constatou-se que o MDB elegera 15 deputados federais e 24 deputados
estaduais, contra os 19 deputados federais e 34 estaduais da Arena.
Alguns emedebistas reelegiam-se em seus mandatos, como foi o caso do Deputado
Federal Álvaro Dias, que foi, novamente, o mais votado do partido, com 127. 903 votos. A
mesma casa abrigou, ainda, Heitor Alencar Furtado, com 32.896 votos, e o Vereador de
Curitiba, Amadeu Geara (Gráfico 15). Na Assembléia Legislativa o mais votado foi o
Deputado Estadual reeleito Deni Schwarts, com 28.197 votos, e, ainda, recebeu o também

83
Vereador curitibano Mário Celso, como se observa no Gráfico 18.
Abaixo seguem todos os gráficos (12 a 20) com as informações das eleições de 1978.
GRÁFICO 12
Eleições Senador Paraná
1978

Fonte: TRE-PR (s/d).

GRÁFICO 13
Eleições Senador 1978
ARENA

votos

Fonte: TRE-PR (s/d).

84
GRÁFICO 14
Eleições Senador - 1978
MDB

votos

Fonte: TRE-PR (s/d).

GRÁFICO 15
Eleições Deputado Federal - Paraná
1978

Fonte: TRE-PR (s/d).


ARENA MDB

85
GRÁFICO 16
Eleições Deputado Federal 1978
ARENA

votos

Fonte: TRE-PR (s/d).

GRÁFICO 17
Eleições Deputado Federal 1978
MDB

votos

Fonte: TRE-PR (s/d).

86
GRÁFICO 18
Eleições Deputado Estadual - Paraná
1978

Fonte: TRE-PR (s/d).

GRÁFICO 19
Eleições Deputado Estadual 1978
ARENA

Fonte: TRE-PR (s/d).

87
GRÁFICO 20
Eleições Deputado Estadual 1978
MDB

votos

Fonte: TRE-PR (s/d).

Ao analisar os gráficos da eleição de 1978 nota-se que a vitória de José Richa


apenas foi possível graças aos votos obtidos nas áreas mais urbanizadas, como foram os
casos de Curitiba e Londrina. As duas cidades fizeram a diferença ao tratar-se dos candidatos
à Câmara dos Deputados. Apenas Ponta Grossa demonstrou uma preferência arenista
justificada pela sociedade declaradamente conservadora ali constituída.
A situação quase é a mesma ao observar os mandatos da Assembléia Legislativa,
bastando comentar o equilíbrio aparente de Cascavel, onde estava o cenário da disputa
histórica dos antigos PTB e PSD. Contudo, os resultados de 1978 na cidade foram positivos,
haja vista a pouca expressão do MDB em 1966. Tal progresso justifica-se pelo aumento da
população jovem, que cresceu e amadureceu politicamente no período bipartidário. Em
Maringá observou-se uma disputa equilibrada que avançou em favor do MDB, quando
comparada à eleição de 1966. Nessa localidade, a Arena tinha um grande prestígio junto à
população, uma vez que esta, na sua grande maioria, ainda se vinculava aos setores
agrários.

V. DISCUSSÃO TEÓRICA

No intuito de responder à questão a respeito da possibilidade de haver um


“denominador comum” entre o MDB nacional e o desempenho do seu diretório regional
do Paraná em 1966 e 1978, faz-se necessário voltar os olhos sobre o próprio Paraná
naquele momento histórico.

88
Justamente no período do bipartidarismo o estado consolidava a maior parte
dos seus municípios, principalmente aqueles que receberam o maior contingente de
imigrantes do meio rural. A ocupação do seu território deu-se efetivamente ao longo do
século XX com as diversas correntes imigratórias européias e, ainda, com as correntes
migrantes internas de paulistas e mineiros para o Norte, de catarinenses e gaúchos para
a região Sudoeste e, mais tarde, com o deslocamento de indivíduos do meio rural para o
urbano.
Tal movimentação de pessoas fez que as estruturas políticas arraigadas nas regiões
estudadas sofressem influência. Nesse caso, a mudança do perfil econômico de uma
cidade ou simplesmente o aumento da população urbana poderia constituir- se em uma
importante variável para justificar o avanço, ou não, do MDB nesses municípios.
Esse foi o caso da cidade de Cascavel, onde, em 1978, o Senador emedebista
venceu o pleito, dado o descontentamento com os governadores arenistas. A vinculação
do eleitorado com o candidato emedebista representava a insatisfação do povo com o
governo então instituído.
Ao analisar os resultados eleitorais, fornecidos pelo TRE-PR, revela-se, em
maior ou menor grau, a identificação partidária dos eleitores daquele momento. Essa
observação visa a salientar os elementos subjetivos que vincularam o eleitor a determinado
candidato e a sua respectiva sigla partidária (a esse respeito, ver LAMOUNIER, 1978, p.
23-34), e a intensidade e a fidelidade que tais eleitores mantiveram ao longo do processo.
Os militares, segundo Paulo Roberto Motta, forçaram a criação de um
bipartidarismo justamente com o intuito de condensar em um dos partidos todos os
interesses das classes dominantes do país, nitidamente conservadora, e na “oposição de
faixada” um pequeno, e inexpressivo, grupo que, desse modo, projetaria no cenário
político internacional a falsa noção de um Brasil edificado sobre a democracia, pois essa
estrutura política em vigência legitimaria os militares e as elites civis no poder.
O Paraná comprova essa assertiva pois os principais políticos da Arena oscilaram
entre cargos eletivos e cargos da estrutura burocrática estatal, como foi o caso do ex-
Governador Ney Braga, que, antes de eleger-se Senador, ocupou o cargo de Ministro da
Agricultura no governo Castelo Branco e, depois de passar pelo Senado, foi Ministro da
Educação e Cultura de Geisel. Uma opulenta estrutura ofertada pelo governo permitiu à
Arena os ótimos desempenhos obtidos no Paraná, principalmente nas eleições para
Deputado Estadual, que refletiram o voto regionalizado e o clientelismo das bases políticas.
Seria um caminho perigoso afirmar simplesmente que “o MDB é o partido dos
pobres e a Arena o partido dos ricos”, uma vez que nos dois extremos do estrato social
há eleitores arenistas, ou seja, entre os mais ricos e os mais pobres marginalizados. Fábio
Wanderley Reis, ao estudar tal fenômeno, propôs um esquema em que há a junção de dois
modelos explicativos: o da “centralidade” e o da “consciência de classe”. No primeiro
caso, analisa-se o indivíduo em sua posição social global, levando-se em conta a sua rede
de interações e comunicações de que participa quando integrado na sua comunidade. Tal
modelo oscila entre dois extremos: 1) baixos estratos rurais; 2) altos estratos urbanos
(REIS, 1978, p. 292). Esse modelo é conexo com o segundo, que trata da “consciência de
89
classe”, como proposto por Pizzorno.
O primeiro modelo justifica a participação política do indivíduo conforme a sua
oscilação entre os estratos propostos: quanto mais central é a posição desse indivíduo
(mais urbana, melhor condição socioeconômica), maior será a sua participação; quanto
maior a sua oscilação, principalmente no sentido dos estratos baixos, maior será a sua
apatia em relação à política.
No caso do Paraná, tal modelo justifica-se com o avanço gradual das redes de
relações urbanas em que os indivíduos conseguem ultrapassar as relações clientelistas do
meio rural. Na cidade há melhores condições de estudo e trabalho. A educação é uma
importante variável no modelo da “consciência de classes”, porém o avanço na educação
do indivíduo está associado à sua “oscilação” dentro dos estratos sociais. Nessa junção de
modelos, proposta por Reis, encontramos uma lógica segura a fim de entender a
subjetividade do eleitorado paranaense e se este se comportou de modo semelhante com
o resto do país.
Não basta o mero acesso à educação para que o eleitor opte por votar de modo
menos conservador, é também necessário o seu deslocamento dentro da estrutura social.
Luiz Navarro de Brito (1981, p. 238-239) concluiu que existiram “três Brasis” no período
do bipartidarismo. Ao presente estudo basta lançar os olhos sobre o Brasil do Sul, onde
o MDB venceu os pleitos para o Senado mas perdeu os que foram realizados para a
Câmara. O aumento da urbanização e da classe média colaboraram com a determinação
dos resultados eleitorais. Na mesma constatação seguem Leônidas Xausa e Francisco
Ferraz (1981, p. 163), que observaram o avanço do MDB gaúcho nas regiões mais
industrializadas e urbanizadas desse estado, tradicionais redutos petebistas – ao passo
que a Arena venceu nas áreas mais rurais, em especial junto às colônias italianas e alemãs
fronteiriças com Santa Catarina.
Foi justamente no interior do país que as grandes disputas eleitorais foram
travadas. Como a Arena representava todo o aparato estatal e estava espalhada
homogeneamente pelo território nacional, pelo menos nas regiões mais povoadas, criou-
se uma sólida base de apoio político ao governo. David Fleischer (1981, p. 189) identificou
os componentes da Arena como recrutados em maior número junto aos proprietários
rurais, enquanto o MDB recrutava seus correligionários junto aos advogados, profissionais
da imprensa, do agregado comércio-bancos-finanças, professores e funcionários públicos
– categorias nitidamente das classes médias urbanas.
Voltando ao modelo de Fábio W. Reis: não basta a mera oscilação, ascendente ou
descendente, nos estratos sociais para vincular o indivíduo ao voto. Olavo Brasil de Lima
Jr. (1978a, p. 142), ao estudar as eleições de 1976 em Niterói, descobriu que o voto no
MDB estava associado à indignação do eleitor com o governo; já o voto arenista localizou-
se nas mais altas camadas sociais, assim como nas mais baixas, principalmente aquelas
próximas ao meio suburbano ou rural.
Tal sentimento de indignação era identificado nas camadas sociais em que havia
elevado grau de escolarização e baixo grau de remuneração. Esse foi um fenômeno surgido
nas classes operária e média urbana, em especial entre profissionais liberais, que
90
comporiam o MDB. E mais: a polarização em relação ao partido apenas se manteria caso
as suas lideranças locais conseguissem traduzir para a disputa regional a ideologia
propagada em âmbito nacional. Basta comparar as votações obtidas em Ponta Grossa
favoráveis à Arena nas duas eleições estudadas, com os resultados do trabalho de Bolívar
Lamounier (1978), que estudou as eleições do município de Presidente Prudente. Em
ambos os casos a Arena lidera nessas regiões urbanizadas, porém pouco industrializadas,
dada a incapacidade dos MDBs locais de disporem de um discurso que traduzisse os
anseios das classes populares. Ao contrário, a existência de um discurso desse tipo
permitiu uma votação homogênea na Arena, advinda de todas as classes sociais, sem
dispor de qualquer artifício capaz de polarizar um estrato a seu favor.
Ao observar o discurso de Dalton Paranaguá, transcrito em outra seção deste
capítulo, vê-se evidente a linha política ali adotada, ou seja, despertava-se um sentimento
anticuritibano no eleitorado londrinense, valendo-se da figura mítica do “pioneiro que
colonizou e construiu o Norte do Paraná”. Tal discurso conseguiu criar um forte vínculo
simbólico entre os eleitores. A cidade de Londrina constituiu- se em um dos mais
importantes redutos emedebistas do estado. Dessa cidade saíram nomes como os de José
Richa, Álvaro Dias, o próprio Dalton Paranaguá, Leite Chaves e outros. Por essa capacidade
de despertar, em maior ou menor grau, o inconformismo do indivíduo escolarizado que
o modelo da “centralidade” relaciona- se com o da “consciência de classe”, pois com o
avanço do desenvolvimento intelectual individual e a participação (ou exclusão) do cidadão
do grupo social, seja rural ou urbano, formar-se-ão suas determinantes psicológicas que
servirão de instrumentos a vincular o seu voto.
A identificação partidária do eleitor, segundo Lamounier (idem, p. 24-25),
obedecerá à sua posição segundo a centralidade nos estratos propostos por Reis. Nos
dois extremos, urbanos altos e rurais baixos, a tendência de voto é em favor da Arena,
enquanto o indivíduo mais próximo da centralidade tende a votar a favor do MDB. Neste
estudo constatamos ainda que nos estratos mais baixos, inclusive no meio urbano, o voto
arenista associava-se ao baixo nível de escolaridade do eleitor que, por questões de
vínculo subjetivo, ainda seguia no sentido de votar com o governo ou com a elite local.
Assim, as eleições de 1966 garantiram a vitória arenista em solo paranaense
enquanto na eleição de 1978, quando o Paraná já contava com cidades industrializadas e
com grande contingente de população suburbana, o MDB venceu os pleitos na medida em
que conseguiu traduzir os anseios dessas camadas nos seus discursos. A intensidade do
vínculo ao voto emedebista foi positivo, dado o fato de as eleições de 1978, apesar das
dificuldades, ainda conseguirem refletir a vitória nacional do partido em 1974.
A grande dificuldade para MDB avançar sobre determinadas cidades em
específico, como foi o caso de Ponta Grossa, associava-se, inclusive, às variáveis
“informação” e “instrução” do eleitorado em relação à oposição. Ademais, há o fato de o
diretório local do MDB ter sido incapaz de desarticular as iniciativas e os instrumentos
do governo e do seu representante político, a Arena, utilizados na contenção do avanço da
oposição. A falta de informação mantinha o eleitor refém da propaganda oficial que se
valia, inclusive, da imprensa (KINZO, 1988, p. 103) para transmitir uma falsa idéia de
91
progresso, otimismo, nas políticas então adotadas.
Nesse sentido, o MDB não conseguiu avançar no imenso Brasil rural, onde a
força das oligarquias agrárias, refletidas na Arena, mantinham o eleitor subjugado pela
força de uma estrutura social que condicionava a sua subjetividade em favor de um
conformismo com a situação vigente naquele momento. Basta observar o avanço do MDB
nos pleitos de âmbito federal e a sua tímida expressão junto à Assembléia Legislativa.
Curitiba confirma o avanço da oposição conforme a cidade industrializou-se e
a sua população aumentou consideravelmente. O progresso industrial observado na capital
paranaense conseguiu quebrar as estruturas sociais tradicionais na medida em que
aumentaram entidades como sindicatos, instituições de ensino, o movimento social da
Igreja e outras.
Nesse cenário, o indivíduo, mesmo vindo do meio rural, deixava para as suas
futuras gerações um novo condicionamento psicológico que quebrou o vínculo com
valores tradicionais, fazendo com que a nova geração compreendesse a sua inserção
social de modo mais crítico. Foi o que se observou na cidade de Cascavel, onde a sua
população, ao longo da década de 1970, contava com 75,7% dos habitantes abaixo dos 30
anos de idade. Um eleitorado jovem que teria como primeira experiência política a fase
bipartidária e, segundo os gráficos apresentados, votava ativamente no MDB, justificando
o modelo da “consciência de classe” associado ao da “centralidade”.

VI. CONCLUSÕES

Diante do que foi aqui exposto, o presente trabalho sustenta que o MDB paranaense,
apesar das particularidades estaduais, demonstrou um padrão conexo com aquilo observado
nos demais diretórios espalhados por todo o território nacional.
No Paraná, como exemplo, o partido pôde avançar na medida em que se infiltrava
nas grandes cidades industrializadas, como foi observado no Rio Grande do Sul e São
Paulo, e também na mesma proporção em que o seu discurso conseguia captar e canalizar
a insatisfação preexistente na população, que sentia, no seu quotidiano, o desgaste do
regime militar em vigência, como acontecia no Rio de Janeiro com o “chaguismo”. Além
disso, o progresso do MDB associava-se à sua capacidade de vincular o discurso ao
antigo PTB, de base trabalhista-reformista, haja vista a atuação ainda presente de lideranças
regionais como a de Antônio Anibelli, em Cascavel.
Com o reestabelecimento da democracia, o MDB avançou contra todos os
instrumentos institucionais destinados a conter qualquer crítica ao sistema político vigente.
Foi daí que surgiu o fascínio em estudá-lo e tentar, na medida do possível, compreender
os elementos que o fizeram o “verdadeiro reduto oposicionista ao regime militar”.

92
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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UNB, 1981.

OUTRAS FONTES

TRE-PR. Base de dados primários da Seção de Divulgação de Resultados. Curitiba: Tribunal


Regional Eleitoral do Paraná, s/d.

94
CAPÍTULO QUATRO

A VOTAÇÃO DA ARENA NO PARANÁ:


UMA ANÁLISE HISTÓRICA (1966 e 1978)

Jorge Eduardo França Mosquera

95
96
4. A VOTAÇÃO DA ARENA NO PARANÁ:
Uma análise histórica (1966 e 1978)

I. INTRODUÇÃO

Explicar a Aliança Renovadora Nacional (Arena) paranaense e analisar seus


resultados eleitorais são o objetivo deste capítulo. Optou-se por estudar a primeira e a
última eleições em que o partido do governo militar concorreu, em 1966 e 1978, esta
última no ano anterior ao do restabelecimento do pluripartidarismo. Os dados eleitorais
da presente pesquisa foram recolhidos no Tribunal Regional Eleitoral do Paraná (TRE-
PR). A hipótese aqui levantada e que se tentará comprovar é a da divergência em relação
a estudos que apontam a clivagem segundo a qual, na ditadura militar, o voto da capital é
progressista e o voto do interior, conservador. A primeira questão: Curitiba, repete essa
tendência no voto? A resposta, logicamente, está na votação conseguida pela Arena na
capital, em 1966 e em 1978, influenciada na primeira fase pela força eleitoral de Ney
Braga1 e dela liberada em 1978, quando essa força encontrava-se no ocaso.
Buscou-se também analisar o voto conservador do interior paranaense, onde,
em 1966, a urbanização era restrita, não havia movimentos sociais e sindicais e mesmo o
movimento estudantil era ralo. Lá, a influência dos governos federal e estadual era decisiva
e, quanto maior a população rural, maior o peso dos proprietários de terras, integrantes
ou aliados da elite política local. No interior, o peso de Ney, do neyismo e de suas
realizações também era grande em 1966.
O interior estudado neste capítulo é representado pelas quatro maiores cidades
paranaenses depois da capital: Londrina, Ponta Grossa, Maringá e Cascavel. A análise
resultou algo prejudicada pela indisponibilidade de informações sobre indicadores
econômicos e sociais e, ainda, pela ausência de dados populacionais das zonas urbana e
rural dos municípios de Curitiba, Ponta Grossa e Maringá.

1
A importância de Ney Braga na história política do Paraná e a larga malha de influências dele emanada, que se
convencionou chamar, apropriadamente, de neyismo, mereceram abordagens ao longo do texto por estarem
intimamente ligadas à história da Arena no estado.

97
Na segunda seção será contada a história do bipartidarismo no Brasil e no
Paraná, com ênfase no aspecto legal da ditadura, que, ao arvorar-se em poder constituinte
“recebido da vontade popular”, emanou leis e promoveu atrabiliária reforma constitucional.
Foi ao atropelar o ordenamento jurídico, que o governo autoritário criou bases para
tentar legitimar-se – tendo a Arena como seu braço político eleitoral.
A terceira seção é dedicada a contar a história da Arena no Brasil e no Paraná;
a quarta apresenta os resultados do confronto entre Arena e MDB em 1966 e 1978,
dispondo de gráficos sobre os seus resultados, na capital e nas quatro cidades acima
relacionadas, das eleições ao Senado Federal, à Câmara dos Deputados e à Assembléia
Legislativa do Paraná, obtidos junto ao TRE-PR. A análise desses resultados está na quinta
seção, em que se juntam informações históricas, reunidas nas seções anteriores, às do
comportamento eleitoral propriamente dito.

II. RESUMO HISTÓRICO DO BIPARTIDARISMO NO BRASIL E NO PARANÁ

II.1. A ditadura faz e impõe o ordenamento jurídico


Uma das características do regime autoritário militar brasileiro era a busca de
legalidade formal que respaldasse seus atos. A ditadura empalmava a prerrogativa de criar
leis, retirando-a do poder Legislativo. O Ato Institucional n.º 1, o AI-1, de 9 de abril de
1964, transferiu o poder aos militares, cassou mandatos e suspendeu por dez anos os
direitos políticos de centenas de pessoas. A composição do Congresso Nacional foi alterada,
principalmente entre os quadros opositores, e a intimidação passou a ser o principal
argumento do regime.
Dos 16 atos institucionais e complementares baixados pelos governos militares
entre 1964 e 1978, sem dúvida o que mais marcou os brasileiros e agrediu a cidadania foi
o Ato Institucional n. 5 (AI-5) – de que não se tratará no presente trabalho. Mas não se
pode esquecer que aquela violência de 1968 foi precedida por outra quase tão grave já em
1965, pouco mais de um ano e meio depois do golpe. Com efeito, o Ato Institucional n. 2,
o AI-2, baixado por Castello Branco em 27 de outubro de 19652, retirava liberdades,
suprimia direitos, impunha a vontade da elite da caserna – fielmente coadjuvada pela elite
política conservadora – e submetia a nação à condição de cega obediente à Revolução
“Redentora”.
A nação submergiu no autoritarismo quando dela se retirou a prerrogativa de
escolher, pela via direta, seu chefe supremo, conforme o artigo 9.º, caput, do AI-2: “A
eleição do Presidente e do Vice-Presidente da República será realizada pela maioria absoluta
dos membros do Congresso Nacional, em sessão pública e votação nominal” (BRASIL,
1965). Atente-se, também, para o que prevêem os artigos 15 e 16, de inevitável e direto
alcance sobre as instituições políticas e as liberdades individuais – sobre a democracia,
enfim:
2
Também assinam o AI-2: Juracy Montenegro Magalhães, Paulo Bossisio, Arthur da Costa e Silva, Vasco Leitão da
Cunha e Eduardo Gomes.

98
Art. 15 – No interesse de preservar e consolidar a Revolução, o Presidente da
República, ouvido o Conselho de Segurança Nacional, e sem as limitações
previstas na Constituição, poderá suspender os direitos políticos de quaisquer
cidadãos pelo prazo de 10 (dez) anos e cassar mandatos legislativos federais,
estaduais e municipais.
Parágrafo único – Aos membros dos Legislativos federal, estaduais e municipais
que tiverem seus mandatos cassados não serão dados substitutos,
determinando-se o quorum parlamentar em função dos lugares efetivamente
preenchidos.
Art 16 – A suspensão de direitos políticos, com base neste Ato e no art. 10 e
seu parágrafo único do Ato institucional n.º 1, de 9 de abril de 1964, além do
disposto no art. 337 do Código Eleitoral e no art. 6º da Lei Orgânica dos
Partidos Políticos, acarreta simultaneamente:
I – a cessação de privilégio de foro por prerrogativa de função;
II – a suspensão do direito de votar e de ser votado nas eleições sindicais;
III – a proibição de atividade ou manifestação sobre assunto de natureza
política;
IV – a aplicação, quando necessária à preservação da ordem política e social,
das seguintes medidas de segurança:
a) liberdade vigiada;
b) proibição de freqüentar determinados lugares;
c) domicílio determinado (ibidem).

O AI-2 desceu sobre a nação com 33 artigos, programado para vigorar na sua
publicação, a 15 de março de 1967. Previa, ainda, seu robustecimento por meio de atos
complementares. Tratava-se de uma compulsória reforma constitucional, instituída pela
e para a ditadura, em nome do “poder constituinte” conferido pelo povo brasileiro.

II.2. O bipartidarismo e seus rebentos

A arquitetura partidária brasileira foi tratada direta e secamente no artigo 18 do


AI-2, que lhe alterou as formas, instituiu um novo conteúdo ideológico e forçou ainda
mais uma profunda modificação no destino do país. Diz o texto: “Art 18 – Ficam extintos
os atuais Partidos Políticos e cancelados os respectivos registros. / Parágrafo único –
Para a organização dos novos Partidos são mantidas as exigências da Lei nº 4.740, de 15
de julho de 1965, e suas modificações” (ibidem).
O Brasil ficou sem partidos políticos em 27 de outubro e assim esteve até 20 de
novembro de 1965, quando o governo militar baixou o Ato Complementar n. 4 (AC-4),
que outorgava aos membros efetivos do Congresso Nacional, em número não inferior a
120 deputados e 20 senadores, a iniciativa de criar, em 45 dias a contar daquela data,
organizações dotadas de atribuições de partidos políticos, “enquanto estes não se
constituírem”.

99
Olavo Brasil de Lima Júnior nota que o sistema criado foi bipartidário porque
cada organização que surgiria precisava contar com quase um terço dos congressistas
existentes, “afora o fato de que os representantes do povo tiveram, por lei, 45 dias para
organizar os novos partidos” (LIMA JÚNIOR, 2004). Diferentemente da situação até
confortável dos apoiadores do regime, a oposição, ou o que dela restava na legalidade,
com suas bases e quadros esfacelados e tendo o tempo contra si, tratou de superar suas
limitações e organizar-se como pôde.
De 1964 à extinção dos partidos, o governo militar atuava apoiado no Congresso
Nacional pelo Bloco Parlamentar da Revolução, constituído pelos vários partidos
conservadores. De seu lado, a oposição, tendo o PTB como elo mais forte, também atuava
em bloco. Com o bipartidarismo, sacramentou-se no país uma clivagem que caracterizaria
a política brasileira “durante uma geração: autoritários versus democratas” (MAINWARING,
MENEGUELLO & POWER, 2000, p. 23).
Reportagem especial sobre o golpe militar, publicada por O Estado de S. Paulo
(2004), informa que em reunião extraordinária, no dia 30 de dezembro de 1964, o Presidente
Castello Branco e seus ministros discutiram a situação política do país e ponderaram que,
além de realizações, o governo precisava de sustentação política no Congresso Nacional,
onde a oposição ainda era forte. Relatório do Serviço Nacional de Informações (SNI),
provavelmente produzido pelo general Golbery do Couto e Silva, segundo o jornal, propôs
alterações nas leis eleitorais e partidárias. O documento sugeria a criação “de uma frente
interpartidária em defesa dos objetivos e dos postulados revolucionários”.
Do regime militar e sob a aura da virtual legalidade do AC-4 surgiram a
subserviente Aliança Renovadora Nacional, a Arena, e, como oposição consentida, o
Movimento Democrático Brasileiro, o MDB. Como o sistema anterior havia sido arrancado
pela raiz, as novas organizações partidárias não poderiam ostentar nomes, siglas ou
símbolos que representassem os partidos extintos.
Pesquisa de Margaret Jenks (apud MAINWARING, MENEGUELLO & POWER, 2000,
p. 24) apontou que se agruparam na Arena cerca de dois terços dos parlamentares e todos
os 22 governadores – a rigor, os que haviam sobrevivido às primeiras cassações. Veículo
legitimador da ditadura, a Arena tinha entre suas tarefas aprovar no Congresso Nacional e
reproduzir nos estados todas as medidas tomadas pelo governo, política e administrativamente,
garantindo uma aparência de democracia.
O Partido Social Democrático (PSD) e a União Democrática Nacional (UDN)
serviram de principal esteio à Arena: o primeiro, mais espraiado nas áreas rurais e nos
pequenos municípios; a segunda, de feição mais urbana, cuja maior força estava concentrada
no Rio de Janeiro-Guanabara, controlado por Carlos Lacerda.
Havia ainda partidos conservadores de menor porte, que ajudaram a encorpar
a agremiação do governo, cujas características são descritas por Mainwaring, Meneguello
e Power (2000, p. 21): Partido Republicano (PR), de base principal localizada em Minas
Gerais; Partido Libertador (PL), mais centralizado no Rio Grande do Sul; Partido de
Representação Popular (PRP), de extrema-direita; Partido Social Progressista (PSC);
Partido Democrata Cristão (PDC), de centro-direita.
100
Para Judson de Cew (1978, p. 211), “explícita ou implicitamente, a Arena
simboliza as orientações oficialmente tomadas pelo sistema político vigente, ou seja, o
desenvolvimento capitalista sob um ambiente de paz social controlada. O MDB, por sua
vez, embora não questione o modelo capitalista globalmente, insiste na redemocratização
do regime e na melhor distribuição dos benefícios da sociedade. Esta clivagem básica
representa a verdadeira problemática da política brasileira”.
O Brasil sob o bipartidarismo teve quatro eleições majoritárias para o Senado
e quatro pleitos proporcionais à Câmara Federal e às assembléias legislativas, em 1966,
1970, 1974 e 1978. Em 13 de outubro de 1978, a Emenda Constitucional n.º 11 introduziu
nova estruturação partidária no país. A ditadura, com a mediação do General Golbery, do
Senador arenista Petrônio Portella e de setores moderados da oposição, permitiu a
reinstalação do pluripartidarismo, embora mitigado. Surgiram, primeiro, o Partido
Democrático Social (PDS) em lugar da Arena e, em substituição ao MDB, o Partido do
Movimento Democrático Brasileiro (PMDB).
Era prática do regime autoritário, do alto de seu autoproclamado “poder
constituinte decorrente da vontade popular”, promover golpes dentro do golpe para
assegurar vitórias eleitorais na busca e manutenção do binômio “segurança e
desenvolvimento”. O mais significativo lance desleal viria a ocorrer em 8 de abril de 1977,
com o “Pacote de Abril”, de triste fama, baixado pelo Presidente Ernesto Geisel. Tratou-se
de criar uma Emenda Constitucional, com base no Ato Complementar de 1º de abril
daquele ano, facultando ao poder Executivo legislar a fim de reformar o Poder Judiciário.
A reboque vieram outras medidas, urdidas pelos juristas da ditadura, que modificaram
profundamente a política brasileira. A primeira delas, para manter o Congresso fora da
cena, foi a decretação de recesso parlamentar de 14 dias. Eis outras:

- pela primeira vez na história da República, passou a ser indireta a escolha de


um terço do Senado, criando-se a figura do “senador biônico”, na renovação
de dois terços da Casa. As vagas restantes seriam preenchidas pelo voto
direto, com direito a sublegenda;
- o critério para composição das bancadas estaduais na Câmara dos Deputados
passaria a ser o demográfico e não mais o do número de eleitores, beneficiando
estados com baixa alfabetização e industrialização e prejudicando centros
como São Paulo e Minas Gerais;
- estendeu-se para seis anos o mandato do futuro sucessor de Geisel, que viria
a ser o general João Baptista de Oliveira Figueiredo, então ainda não escolhido;
- a propaganda eleitoral ficou restrita aos limites previstos na Lei Falcão3;
3
A Lei Falcão (Lei n. 6.339, de 1º de julho de 1976), que teve como principal mentor o então ministro da Justiça
Armando Falcão, proibiu a propaganda eleitoral pelo rádio e pela televisão, permitindo apenas a divulgação do
currículo resumido dos candidatos. Era mais uma resposta desleal do governo ao avanço do MDB, que em 1974
tivera vitória acachapante nas eleições para o Senado Federal – conquistando cadeiras de 16 estados – e para
deputados federais e estaduais. Era notório que a Lei Falcão tratava-se de uma blindagem preparada para favorecer
a Arena nas eleições municipais de 1976, antevistas como um plebiscito em nível nacional.

101
- coincidência de mandatos a partir de 1982, com eleições gerais de quatro em
quatro anos, não mais alternadas, a cada dois anos, entre pleitos municipais
e parlamentares; e
- mandato-tampão de dois anos para os prefeitos e para os vereadores que
seriam eleitos em 1980.

II.3. Os dois pratos da balança no Paraná


O major da reserva do Exército Ney Aminthas de Barros Braga, nascido no
município da Lapa, começou sua carreira política como chefe de Polícia em Curitiba.
Prefeito eleito da capital em 1954, concorreu a deputado federal pelo Partido Democrata
Cristão (PDC) em 1958. Foi eleito com 57.099 votos, disputando com dois nomes de
projeção nacional: Plínio Salgado, ex-líder da Ação Integralista Brasileira, com 50.628
votos, pelo Partido de Representação Popular (PRP), e Jânio Quadros, futuro presidente
da República, pelo Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), com 78.810 votos. Dois anos
depois, quando Ney foi eleito governador, assumiu sua cadeira na Câmara o primeiro
suplente, Estefano Mikilita, do alto de nada sonoros 1.983 votos (COSTA, 1995, v. II, p.
582).
O PDC elegeu, naquele 1958, sempre em “dobradinha” com Ney, apenas três
candidatos à Assembléia Legislativa: os oficiais do Exército Eduardo Machado Lima e
Agostinho Rodrigues e o padre e professor de latim Waldemiro Haneiko. O Partido Social
Progressista (PSP) elegeu quatro candidatos; a coligação UDN-PR, sete; o PTB, treze, e o
PSD, dezessete.
O movimento da democracia cristã e o PDC tinham matizes ideológicos de
centro-direita, estando assim mais afeitos ao PSD e à UDN. O partido comandado no
Paraná por Ney Braga aderiu de pronto ao golpe de 1964. Governador do Estado, Ney foi
um dos condutores da nova situação na política local. De aparência liberal, assumiu a
“revolução” e chegou a queimar livros em frente ao Palácio Iguaçu, incluindo “um retorcido
Dostoievsky cremado em cinzas” (NERY, 1975, p. 67).
Nas últimas eleições proporcionais antes do bipartidarismo, disputadas em
1962, o PDC paranaense já rivalizava com o forte PTB. Os dois elegeram 12 deputados
estaduais cada um, fazendo o PSD cair de 17 para sete cadeiras. A coligação PRP/ PTN/
PST/PR fez seis deputados e a UDN, apenas oito.
Dessa forma, caracterizava-se já a bipolarização entre o PSD, a poente UDN e o
crescente PDC, de um lado, e o PTB, mais progressista, de outro. Natural, portanto, que,
do ponto de vista dos militares, fosse o PTB considerado o inimigo e seus quadros mais
à esquerda, os alvos preferenciais.
Quando a ditadura, em 20 de novembro de 1965, baixou o Ato Complementar
n.º 4, estabelecendo normas para a criação de agremiações com feições partidárias,
desencadeou uma composição de forças desordenada e desequilibrada. Artificial, porém
eficaz, essa composição tinha a supremacia da Arena, esculpida para colaborar no esforço
da segurança e do desenvolvimento, a legitimar os feitos da ditadura, dar-lhe feição de
democracia e derrotar no voto o aguerrido MDB.

102
III. A ARENA NO BRASIL E NO PARANÁ

III.1. Nascimento e morte do partido do governo


Fundada em 4 de abril de 1966, a Arena operou como braço político do Exército,
o partido que realmente mandava, até ser liquidada em 29 de dezembro de 1979, quando
o regime decidiu e o Congresso Nacional decretou o fim do bipartidarismo e o
restabelecimento de um sistema multipartidário. Dos 213 deputados que amealhou ao ser
criada, a Arena concentrou o recrutamento na UDN (70), PSD (60), PDC (14) e PR (10).
No Senado, ficou com 42 representantes, dos quais 19 vieram das fileiras do PSD e 15, da
UDN. Os 22 governadores também aderiram de pronto ao partido. O MDB ficou com
cerca de um terço do Senado Federal e também da Câmara dos Deputados. O partido
recebeu 69% dos parlamentares do PTB.
“No decorrer do ciclo autoritário, a dimensão do apoio dado à Arena variava
inversamente à urbanização”, constatam Scott, Meneguello e Power (2000, p. 25). Assim,
o partido do governo estendia-se ao interior, aos pequenos municípios e, além, aos
grotões dominados pelos coronéis. Era terreno fértil, devido ao baixo nível de informação
política, quando não de explícito mandonismo, e alta dependência de recursos federais.
Onde havia indicadores altos de desenvolvimento, a votação da Arena era menor, incluídas
aí até capitais de estados mais pobres. Scott, Meneguello e Power lembram que era tal a
definição desses modelos que, ao suceder a Arena, o PDS passou a ser apelidado pela
imprensa de “partido do Nordeste”.
Em nível nacional, a Arena venceu com tranqüilidade as eleições de 1966 e
1970. Para surpresa até mesmo do MDB, o partido da oposição tomou as urnas em 1974,
conquistando 16 das 22 cadeiras em disputa no Senado. Em 1976, já no início do processo
de “distensão lenta e gradual” do regime, o MDB avançou em mais municípios e dois anos
depois teve bom desempenho nas eleições nacionais e legislativas estaduais. A Arena
manteve apertada dianteira na Câmara e nas assembléias estaduais, graças à votação nos
centros menores e mais dependentes do governo federal. O partido do governo só garantiu
maioria no Senado graças à indicação de um terço de “biônicos”.
Scott, Meneguello e Power explicam que “A avaliação dos estrategistas militares
de que o sistema bipartidário não mais funcionava de forma vantajosa levou Geisel à opção
de ‘dividir e conquistar’ a oposição, através do retorno imposto a um sistema
multipartidário. Esperava-se com isso que a coalizão situacionista se mantivesse intacta,
enquanto o MDB se partisse em várias facções” (idem, p. 26).
A avaliação revelou-se correta. Em 1979, com o bipartidarismo, o MDB foi à
luta como PMDB, perdendo em seguida importantes fatias eleitorais e quadros para os
recém-nascidos Partido dos Trabalhadores (PT); Partido Popular (PP) – que se fundiria
ao PMDB em 1983 – e os dois autoproclamados herdeiros do PTB de Getúlio Vargas: o
PTB de Ivete Vargas, que conseguira a legenda graças a esperta manobra do general
Golbery, e o Partido Democrático Trabalhista (PDT) de Leonel Brizola.
A Arena, que sofreu menos esfacelamento, assumiu no bipartidarismo o nome
de Partido Democrático Social, o PDS. Vieram as eleições de 1982, no governo Figueiredo,

103
e o partido da situação foi derrotado em todos os níveis, diante do crescimento das
forças da oposição capitaneada pelo PMDB. O PDS conquistou 12 governos, na maioria
dos estados mais pobres, cabendo dez à oposição, em estados responsáveis por 75%
do PIB, segundo Maria Helena Moreira Alves, citada por Scott, Meneguello e Power
(idem, p. 27).

III.2. A Arena no Paraná


Ney Braga era governador do Paraná quando o movimento militar de 1964
eclodiu e tomou o poder. Não foi surpreendido, pois operou como um de seus articuladores
locais logo que soube do golpe. Quando foi imposto o bipartidarismo, Ney liderou a
composição de forças entre seu PDC, o PSD, a UDN e outros partidos conservadores para
montar a Arena paranaense4. Liderou o partido até sua dissolução e comandou a criação
do sucessor PDS.
À exceção de Haroldo Leon Peres, em 1970, todos os governadores depois de
Ney Braga – incluindo Paulo Pimentel, o último eleito pelo voto antes do golpe militar –
foram por ele indicados e pela ditadura referendados. Em 1978, ele escolheu a si próprio,
foi referendado pela Assembléia Legislativa e abençoado pelos militares (de cujo governo
fora ministro). Ficou até o começo de 1982, já no PDS, quando entregou o cargo ao vice-
governador, o advogado José Hosken de Novaes, e partiu para a eleição direta. Concorreu
ao Senado, foi derrotado pelo jovem peemedebista Alvaro Dias e viu seu candidato ao
governo – o ex-prefeito da capital Saul Raiz – ser sufocado nas urnas por seu ex-chefe de
Gabinete José Richa.
Ney instituiu o “neyismo”, que controlava, além de uma extensa lista de criaturas
de sua forja, uma rede de clientelismo que ele soube expandir por todo o estado, indo do
Senado às câmaras de vereadores e ocupando toda a máquina pública do Poder Executivo
com quadros cuja aprovação passava obrigatoriamente por seu crivo. Apesar da oposição,
deteve sempre a maioria na Assembléia Legislativa.

IV. OS RESULTADOS ELEITORAIS DA ARENA NO PARANÁ

IV.1. As eleições e as cidades pesquisadas


IV.1.
Com base nos censos do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)

4
O documento mais antigo relativo à Arena encontrado nos arquivos do TRE-PR consta do Fichário dos Diretórios
dos Partidos Políticos. O Diretório Regional do partido governista registrado em 31 de maio de 1966, por meio
do Processo n. 7.002, tinha a seguinte composição, de relevância histórica para pesquisa posterior. O Gabinete
Executivo Regional tinha como Presidente Algacir Guimarães e, como vice-presidentes, Rafael Resende, Zacarias
Seleme e Ivan Luz. O Secretário era Ubiratan Pompeo Sá e os vogais, Armando Queiroz, João de Mattos Leão, Miran
Pirih (falecido), Paulo Poli e Horácio Vargas. A Comissão Diretora Regional tinha 67 integrantes. O Ofício n.º 37/
69, de 30 de setembro de 1969, protocolado sob o n. 4.136, de 9 de setembro do mesmo ano, informava a eleição
ao Diretório Estadual do Deputado Federal Cid Rocha e do Senador Ney Braga. O ex-Governador e articulador
arenista no Paraná tinha posição discreta entre os quadros dirigentes de seu partido, mas não agia à sombra:
mandava na Arena, mandava na política do Paraná e era o interlocutor preferencial dos novos donos do poder.

104
realizado nos anos de 1960, 1970 e 1980, foram apontadas as cinco maiores cidades do
Paraná, de eleitorado diversificado e distribuído por regiões geográfica e economicamente
estratégicas.
Curitiba, Londrina, Ponta Grossa, Maringá e Cascavel, pela ordem, eram as
maiores cidades do estado em 1966. Ponta Grossa e Maringá trocaram de posição em
1978. O contingente eleitoral de cada uma delas consta dos resultados apurados pelo
TRE-PR. As informações populacionais, levantadas pelo IBGE, foram prestadas pelas
prefeituras. Estão aqui, contudo, relativizadas na análise porque a prefeitura de Ponta
Grossa não dispõe de informações anteriores ao censo de 2000 e as de Maringá e Curitiba
não possuem informações sobre populações urbana e rural ao longo do período
pesquisado.
Essa seria uma variável explicativa interessante, pelo fato de na zona rural,
principalmente nos anos 60 do século passado, vicejarem a baixa politização, a pouca
informação, o clientelismo, o coronelismo e a alta possibilidade de corrupção eleitoral.
De todo modo, a separação entre populações urbana e rural em Londrina e em Cascavel
é abordada neste capítulo.
O número total de eleitores nesses cinco municípios, em 1966, era de 324.393,
dos quais votaram 273.844. Curitiba, a capital, tinha em 1966, de acordo com o censo de
1960, uma população de 361.309 habitantes e 195.777 cidadãos aptos a votar. Londrina,
no Norte do estado, a 390 km da capital, contava 77.382 habitantes na zona urbana e
57.439 na zona rural (total de 134.821), e 43.891 eleitores. Ponta Grossa, na Região Sul,
a apenas 118 km de Curitiba, tinha 37.149 eleitores. Maringá, ao Noroeste, distante 434
km da capital, possuía 104.131 habitantes e 35.212 eleitores. E, finalmente, Cascavel, a
514 km, situada no Oeste, contava em 1966 com 12.274 eleitores; sua população na área
rural, conforme o censo de 1960, era de 5.274 habitantes e a da zona urbana, 34.324,
totalizando 39.598 habitantes.
O quadro completo, com o número de eleitores, de votantes e os resultados da
Arena e do MDB nas cinco cidades pesquisadas está na Tabela 1, a seguir. Os números
foram retirados dos mapas do TRE-PR. Pela falta de informações precisas, não se
consideram os votos inválidos, o que explica a diferença entre a soma dos votos dos
candidatos e o número de votantes.

105
Tabela 1
VOTAÇÕES NAS CIDADES, POR PARTIDO E POR CARGO (1966)
SENADOR
CIDADE ARENA MDB VOTANTES ELEITORADO POPULAÇÃO
Curitiba 87.194 55.968 167.443 195.777 361.309
Londrina 20.002 9.914 33.513 43.981 134.821
Ponta Grossa 16.742 11.945 33.734 37.149 s/i
Maringá 17.133 7.405 28.400 35.212 104.131
Cascavel 5.964 3.600 10.754 12.274 39.598
DEPUTADO FEDERAL
CIDADE ARENA MDB VOTANTES ELEITORADO POPULAÇÃO
Curitiba 75.799 30.998 167.443 195.777 361.309
Londrina 17.419 7.288 33.513 43.981 134.821
Ponta Grossa 18.152 7.186 33.734 37.149 s/i
Maringá 17.761 6.013 28.400 35.212 104.131
Cascavel 7.876 829 10.754 12.274 39.598
DEPUTADO ESTADUAL
CIDADE ARENA MDB VOTANTES ELEITORADO POPULAÇÃO
Curitiba 80.630 32.577 167.443 195.777 361.309
Londrina 17.189 7.180 33.513 43.981 134.821
Ponta Grossa 19.509 7.652 33.734 37.149 s/i
Maringá 17.024 5.885 28.400 35.212 104.131
Cascavel 8.645 798 10.754 12.274 39.598
Fonte: TRE-PR (s/d).
Nota: s/i: sem informação.

IV.2. A vitória arenista


IV.2.

IV.2.1. Ney derrota dois do MDB


IV.2.1.
Pesquisas de intenção de voto e análises de resultados eleitorais realizadas em
outros estados, ao longo do bipartidarismo, indicavam o voto progressista nas capitais e
o voto conservador no interior, aqui motivado pela baixa urbanização e industrialização,
falta de informação, forte influência do Poder Executivo e, como dito acima, pelo coronelismo
e, até, pela corrupção. Mas a clivagem entre voto da capital e voto do interior como
variável explicativa para o voto progressista e voto conservador cai por terra em Curitiba
no primeiro confronto entre Arena e MDB, tanto na eleição majoritária quanto nas
proporcionais. Confirma-se, contudo, no interior.
As eleições de 1966 renovaram uma cadeira no Senado e 25 na Câmara dos
Deputados. Na majoritária, a lei eleitoral permitia a sublegenda, o que possibilitou ao
MDB lançar dois candidatos para enfrentar Ney Braga. Eram eles o líder petebista Nelson
Maculan e o ex-socialista e futuro senador “biônico” Affonso Camargo. Tendo como
suplente Octavio Cezário Pereira Júnior, Ney elegeu-se com 660.529 votos. Nelson Maculan
106
teve 273.378 votos e Affonso Camargo, 84.275 votos. A votação dos dois chegou a 357.653
– um total de 302.876 votos a menos que os dados ao candidato arenista.
O universo de eleitores a votar era de 1.476.143, e o total de votantes ao Senado
foi de 1.018.182. O TRE-PR computou ainda 51.751 votos em branco e 66.190 votos
nulos. Estes somados – 117.941 –, chegam-se a 33.666 a mais que a votação do MDB.
Em Curitiba, a Arena obteve 87.194 votos contra 55.968 do MDB – uma diferença
de 32.864 votos, apenas um a menos do que toda a votação deste partido nas quatro
cidades do interior. Votaram 167.443 eleitores, tendo sido registrada abstenção de 28.334.
Essa abstenção na capital é significativa por ser maior que a votação obtida por Ney Braga
em Londrina. Com 20.002 votos, a Arena deixou longe o MDB, que obteve 9.914 votos. A
abstenção de 10.468 eleitores de Londrina foi semelhante à de Maringá e,
proporcionalmente, de elevado grau como em Ponta Grossa e Cascavel, como se verá a
seguir.

O voto comparativo entre os candidatos da Arena e do MDB está exibido no


Gráfico 1. O gráfico comparativo dos votos da Arena está no gráfico 2 e o dos votos do
MDB, no Gráfico 3.

GRÁFICO 1
Eleições Senador - Paraná
1966

Fonte: TRE-PR (s/d).

107
GRÁFICO 2
Eleições Senador 1966
ARENA

votos

GRÁFICO 3
Eleições Senador 1966
MDB

votos

Fonte: TRE-PR (s/d).

IV.2.2. A Arena domina a Câmara


IV.2.2.
Coube ao Paraná, em 1966, um total de 25 cadeiras na Câmara dos Deputados.
Ainda incipiente, o MDB elegeu apenas cinco deputados, ficando as 20 restantes com o
partido do governo. Novamente caiu por terra a tese de que o voto nas capitais deve ser
progressista devido às características de seu eleitorado.

108
A votação da Arena e do MDB, cidade a cidade, está no Gráfico 4; uma comparação
entre as cidades, com a votação da Arena, está no Gráfico 5; no Gráfico 6 está a votação do
MDB, comparando as cidades.
GRÁFICO 4
Eleições Deputado Federal - Paraná
1966

ARENA MDB

Fonte: TRE-PR (s/d).

GRÁFICO 5
Eleições Deputado Federal 1966
ARENA

votos

109
GRÁFICO 6
Eleições Deputado Federal 1966
MDB

votos

IV .2.3. Diferença ampliada na Assembléia


IV.2.3.
Na eleição para a Assembléia Legislativa, a vitória da Arena sobre o MDB foi ainda
mais ampla. O partido do governo conquistou 37 cadeiras, ao passo que a oposição ficou com
apenas oito. A vitória da Arena nas cinco cidades analisadas somou 142.997 votos, ficando o
MDB com 54.792 votos. A diferença da situação sobre a oposição foi de 88.205 votos.
A votação dos dois partidos, nas cinco cidades pesquisadas, está no Gráfico 7; a da
Arena, comparativamente entre as cidades, consta do Gráfico 8, e a do MDB, do Gráfico 9.
GRÁFICO 7
Eleições Deputado Estadual - Paraná
1966

Fonte: TRE-PR (s/d). ARENA MDB

110
GRÁFICO 8
Eleições Deputado Estadual 1966
ARENA

votos

GRÁFICO 9
Eleições Deputado Estadual 1966
MDB

votos

IV.3. A oposição cresce


IV.3.

IV.3.1. Empate no Senado: derrota nas urnas e nomeação do “biônico”


IV.3.1.
Em 1978, o eleitorado do Paraná já chegava a 3.565.871 cidadãos, dos quais
2.639.050 compareceram às urnas. Houve, assim, 926.821 abstenções. O eleitorado de
Curitiba crescera de 195.777 em 1966 para 458.938; a população da cidade, segundo o
censo do IBGE de oito anos antes, aumentara para 609.026 e passaria do milhão no censo
de 1980. Os gráficos 10 e 11 informam a evolução do eleitorado e do comparecimento de
votantes, em 1966 e 1978.

111
GRÁFICO 10
Comparação do Eleitorado entre 1966 e 1978

GRÁFICO 11
Comparação número de votantes entre 1966 e 1978

A eleição ao Senado confirmou a supremacia do MDB. Depois de eleger Francisco


Leite Chaves em 1974, o partido oposicionista ganhou mais uma cadeira em 1978, com
José Richa. O MDB foi beneficiado pela sublegenda, tendo concorrido com dois candidatos
contra apenas um da Arena. José Richa, cujo suplente era Airton Reis, obteve 895.013
votos. Na sublegenda MDB II, Enéas Faria, tendo por suplente Edgard Virmond Arruda,
fez 254.520 votos. O arenista Túlio Vargas conseguiu 1.083.573 votos. Houve ainda
208.183 votos em branco e 197.761 votos nulos. O total de votantes para o Senado foi de
2.639.050.

112
Mas a Arena não foi de todo derrotada nessa eleição. O “Pacote de Abril”,
baixado pelo presidente Geisel em 1977, garantiu ao partido, no ano seguinte, a renovação
de um terço do Senado pela via indireta. No Paraná, o então Presidente do partido do
governo era o mesmo Affonso Camargo que concorrera contra Ney Braga, pelo MDB, na
eleição ao Senado em 1966. Expressiva liderança do adesismo, Affonso foi indicado
senador “biônico” e passou a dividir com José Richa a representação do Paraná no
Senado da República. Confira-se a Tabela 2 abaixo.

Tabela 2
VOTAÇÕES NAS CIDADES, POR PARTIDO E POR CARGO (1978)
SENADOR
CIDADE ARENA MDB VOTANTES ELEITORADO POPULAÇÃO
Curitiba 87.194 55.968 167.443 195.777 361.309
Londrina 20.002 9.914 33.513 43.981 134.821
Ponta Grossa 16.742 11.945 33.734 37.149 s/i
Maringá 17.133 7.405 28.400 35.212 104.131
Cascavel 5.964 3.600 10.754 12.274 39.598
DEPUTADO FEDERAL
CIDADE ARENA MDB VOTANTES ELEITORADO POPULAÇÃO
Curitiba 75.799 30.998 167.443 195.777 361.309
Londrina 17.419 7.288 33.513 43.981 134.821
Ponta Grossa 18.152 7.186 33.734 37.149 s/i
Maringá 17.761 6.013 28.400 35.212 104.131
Cascavel 7.876 829 10.754 12.274 39.598
DEPUTADO ESTADUAL
CIDADE ARENA MDB VOTANTES ELEITORADO POPULAÇÃO
Curitiba 80.630 32.577 167.443 195.777 361.309
Londrina 17.189 7.180 33.513 43.981 134.821
Ponta Grossa 19.509 7.652 33.734 37.149 s/i
Maringá 17.024 5.885 28.400 35.212 104.131
Cascavel 8.645 798 10.754 12.274 39.598
Fonte: TRE-PR (s/d).
Nota: s/i: sem informação.

113
O Gráfico 12 compara a votação dos dois partidos nos cinco municípios
analisados; o Gráfico 13 mostra como foi a votação da Arena cidade a cidade, e o 14 mostra
como se comportou o MDB.
GRÁFICO 12
Eleições Senador - Paraná
1978

Fonte: TRE-PR (s/d).

GRÁFICO 13
Eleições Senador 1978
ARENA

votos

Fonte: TRE-PR (s/d).

114
GRÁFICO 14
Eleições Senador - 1978
MDB

votos

IV.3.2. Equilíbrio na Câmara


IV.3.2.
A eleição de 1978 para a Câmara dos Deputados foi mais equilibrada. O MDB
saiu de cinco cadeiras em 1966 para 15 na segunda eleição analisada. A Arena perdeu uma
cadeira na Câmara – de 20 para 19. O partido da oposição conseguiu 44.535 votos de
legenda, totalizando 925.875 votos. Os votos de legenda à Arena foram 27.612, perfazendo
um total de 1.216.666 votos. Houve ainda 329.619 votos em branco e 166.890 votos
nulos; o total de votantes foi de 2.639.050.
O Gráfico 15 mostra o comportamento de Arena e MDB nas cinco cidades
pesquisadas; o Gráfico 16 traz a votação da Arena nesses municípios e o 17, a do MDB.
GRÁFICO 15
Eleições Deputado Federal - Paraná - 1978

Fonte: TRE-PR (s/d).

115
GRÁFICO 16
Eleições Deputado Federal 1978
ARENA

votos

Fonte: TRE-PR (s/d).

GRÁFICO 17
Eleições Deputado Federal 1978
MDB

votos

Fonte: TRE-PR (s/d).

116
IV.3.3. Crescimento e vitória na Assembléia
IV.3.3.
A votação da Arena na eleição para a Assembléia Legislativa teve comportamento
diverso das votaçõe para o Senado Federal e para a Câmara dos Deputados, registrando
vitória sobre a oposição. O partido governista vinha de estragos pesados, com a renúncia
forçada do governador Haroldo Leon Peres, seguida da morte de seu sucessor, Parigot de
Souza, e do mandato-tampão de Emílio Gomes. A bancada na Assembléia reduzira-se, em
1974, de 38 para 29 deputados, ao passo que o MDB experimentara um crescimento de
9 para 25 parlamentares.
No pleito de 1978, a bancada da Arena na Assembléia subiu para 34 deputados,
dos quais 22 eram reeleitos. Já o MDB, que elegera 25 deputados em 1974, perdeu uma
cadeira em 1978.
O Gráfico 18 mostra o comportamento eleitoral de Arena e MDB na eleição à
Assembléia, nas cinco cidades pesquisadas. O Gráfico 19 traz o número de votos da
Arena, cidade a cidade, e o 20, o do MDB. No total do estado, o MDB recebeu 44.288 votos
de legenda, totalizando 914.121 votos. Já a Arena obteve 30.613 votos de legenda,
alcançando 1.259.873 em todo o estado.

GRÁFICO 18
Eleições Deputado Estadual - Paraná
1978

ARENA MDB

Fonte: TRE-PR (s/d).

117
GRÁFICO 19
Eleições Deputado Estadual 1978
ARENA

votos

Fonte: TRE-PR (s/d).

GRÁFICO 20
Eleições Deputado Estadual 1978
MDB

votos

118
V. DISCUSSÃO: A VITÓRIA ARENISTA DE 1966 E A DERROTA DE 1978

V.1. 1966: a vitória do neyismo


No Paraná, em 1966, não se confirmou a clivagem entre os tipos de eleitores, do
voto da capital (progressista) e do voto do interior (conservador). Importante variável
explicativa é a figura do neyismo, já descrita na seção 4 deste trabalho. Ney Braga, com
efeito, tinha estreita ligação com a cidade, como chefe de Polícia, prefeito e, até 1965,
governador do Estado.
Affonso Camargo, de tradicional família paranaense, e o londrinense Nelson
Maculan não possuíam densidade política à altura de Ney e naquele 1966 seu partido, o
MDB, buscava mais “marcar posição” na cena eleitoral. Seus 55.969 votos, contudo,
não são desprezíveis e podem ser atribuídos aos tradicionais eleitores do antigo PTB,
de migração para o MDB por gravidade, e aos descontentes com a “Revolução”, entre
os quais estudantes universitários e profissionais liberais (muitos deles ligados ao
PCB).
O comportamento eleitoral da Arena no interior seguiu, efetivamente, a tendência
conservadora do voto. Baixa urbanização, reduzido grau de instrução, quase nenhuma
industrialização nem movimento sindical, mais a influência dos governos estadual e federal
– por pressão política e grande transferêndia de recursos – e o controle direto dos
fazendeiros sobre a população rural, dominaram a eleição em Londrina.
Há ainda outra variável importante, também ligada a Ney Braga. A “Rodovia do
Café”, construída por ele ligando Londrina a Curitiba e esta ao Porto de Paranaguá,
garantia o escoamento da safra, menor custo de frete rodoviário e, em conseqüência,
maior resultado financeiro. Seus reflexos na economia da cidade, cuja população crescia
ano a ano, tinham, evidentemente, efeito eleitoral. Pelo censo de 1970, realizado dois anos
depois da eleição, a população londrinense saltara para 228.101 habitantes – 64.573 na
zona rural e 163.528 na zona urbana.
Maringá, cuja população era de 104.131 habitantes de acordo com o censo de
1960 e que chegaria no seguinte a 121.374, também tinha sua economia baseada no café
e características semelhantes às de Londrina, configuradas no voto conservador. Maringá
fica a cerca de 100 km da “Rodovia do Café”, mas ainda assim sua economia foi
beneficiada pela nova estrada, que teve mais seguro escoamento de safra. Em relação a
Ponta Grossa, é possível inferir que sua proximidade com a capital tenha sido
determinante para a vitória da Arena. No mais, a “capital cívica do Paraná” era uma
cidade de economia ainda incipiente, sem nenhuma industrialização e comércio pouco
desenvolvido. Era uma cidade de ferroviários, aquela altura categoria destituída de
organização sindical e viés progressista.
Cascavel é a segunda cidade do estado de que se dispõe de informações sobre
população urbana e rural. Pelo censo de 1960, tinha apenas 5.274 habitantes na área
urbana e 34.324 na rural. Em 1979, eram 34.961 pessoas na zona urbana e 54.960 na

119
rural. Baixa urbanização e escolaridade, nenhuma industrialização e sindicalismo e decisiva
influência política sobre grandes e pequenos proprietários são as variáveis a explicar a
vitória arenista. É desconhecido o peso da influência gaúcha, traço marcante da colonização
da região, sobre o voto no partido do governo. Ressalte- se a diferença de votos nas
eleições proporcionais: 7.876 (Arena) a 829 (MDB) no pleito federal e 8.645 (Arena) a
798 (MDB) no estadual.

V.2. A Arena começa a definhar


Vencedora em 1966, a Arena repetiu o desempenho em 1970. Mas em 1974
amargou inesperada derrota, produto de latente insatisfação do eleitorado com os rumos
do governo militar. Nesse ano, a oposição tomou 16 cadeiras no Senado pertencentes aos
estados mais importantes do país, entre os quais o Paraná. Accioly Filho e Mattos Leão,
eleitos em 1970, quatro anos depois passaram a ter como companheiro de bancada o
advogado Francisco Leite Chaves.
Como se viu na Tabela 1, na seção 4 deste trabalho, o partido do governo ainda
conservou, até 1974, pequena vantagem na votação para a Câmara dos Deputados e para
as assembléias legislativas, mas seu declínio era evidente. Mesmo assim, manteve ligeira
maioria nessas casas também em 1978, graças a toda sorte de casuísmos eleitorais
criados pelo governo militar, dos quais ressaltava a Lei Falcão.
Na eleição ao Senado, o MDB lançou José Richa, que fora derrotado na disputa
pelo mesmo cargo em 1970, quando foram eleitos os arenistas Accioly Filho e Mattos
Leão. Já em 1978, porém, a oposição cresceu. Richa ocupara a Prefeitura de Londrina
(1973-1976) e surgia como a grande força eleitoral que emergia do interior. A população
de Londrina, segundo o censo de 1970, passava de 228 mil habitantes, mais de 163 mil na
área urbana. Lá o partido do governo perdia força. A cidade já ostentava marcante
urbanização e era a terceira maior do Sul do país (atrás de Porto Alegre e Curitiba,
apenas); sua população universitária aumentava e tornava-se cada vez mais marcante a
rivalidade com a capital.
O nome de José Richa é outra variável para explicar a vitória do MDB em Londrina.
Afinal, lá era sua base eleitoral, ele fora prefeito da cidade e, político moderado, apesar de estar
na oposição, conquistou setores que seriam refratários a uma candidatura de perfil mais
ousado. A votação da Arena em Londrina foi a menor entre as cinco cidades.
A diferença de 410 votos em favor do MDB em Maringá foi a mais apertada nas
cidades pesquisadas. Em Cascavel, cidade em que a Arena detinha ampla maioria eleitoral
em 1966, em 1978 o partido governista foi derrotado na eleição ao Senado com uma
diferença de 7.206 votos.
O perfil conservador do eleitorado de Ponta Grossa confirmou-se em 1978,
quando Túlio Vargas venceu a eleição para senador na cidade, com uma diferença de
4.002 votos sobre a oposição.

V.3. Ponta Grossa, a conservadora


A única das cidades pesquisadas que manteve o voto arenista, em 1966 e 1978,

120
nas eleições majoritárias e proporcionais, foi Ponta Grossa, conhecida como a “capital
cívica” do Paraná. Em 1978, a Arena fez 37.793 votos para deputado federal, contra
19.367 dados para o MDB – diferença de 18.426 votos. Na eleição para Deputado Estadual,
o partido do governo fez 40.434 votos na cidade e o MDB, 18.660 – diferença de 21.774
votos.
Os resultados da eleição proporcional para Deputado Federal indicam maior
equilíbrio, como em Curitiba, onde a diferença favorável à oposição foi de 25.057 votos.
A maior diferença foi a de Londrina, onde a oposição manteve uma dianteira de 29.416
votos.
A recuperação da Arena em 1978 teria sido maior em Londrina se não fossem
da cidade três dos cinco candidatos mais votados do MDB: Alvaro Dias, Waldmir Belinati
e Hélio Duque. As vitórias mais apertadas do MDB, como se viu no Gráfico 15, foram em
Maringá (diferença de 1.109 votos) e Cascavel (diferença de 2.505 votos). O
comportamento do eleitorado nessas cidades foi semelhante ao da eleição para a Assembléia
Legislativa, com vitória arenista na primeira e emedebista na segunda. Em Maringá, a
diferença foi de apenas 560 votos para o partido do governo. Em Cascavel, a vitória da
oposição teve 2.583 votos de vantagem na eleição para Deputado Estadual. Em Londrina,
o MDB conseguiu boa dianteira na votação para a Assembléia Legislativa, reafirmando que
a cidade, agora urbanizada, com uma universidade forte e entidades civis organizadas,
caracterizava-se como eleitoralmente progressista não só no voto para o Senado como em
seus populares candidatos para Deputado Federal.
O MDB teve na capital uma diferença de 19.298 votos, indicando boa recuperação
em relação ao pleito de 1966, quando a Arena suplantou a oposição na eleição para
Deputado Estadual por uma diferença de 48.053 votos. Em 1978, Curitiba ostentava
invejável urbanização, o movimento estudantil fervilhava, os primeiros sindicatos e greves
começavam a pipocar e a sociedade civil manifestava-se. Assim se explica a vitória da
oposição em 1978.

VI. CONCLUSÃO

Os 14 anos de vigência do bipartidarismo no Brasil foram a moldura eleitoral


de um país que, apesar do regime autoritário, passou por diversas transformações,
evoluiu social e politicamente e mostrou-se eficiente para pressionar pela volta da
democracia. A pesquisa em torno dos resultados eleitorais da Arena e do MDB nos cinco
maiores municípios do Paraná, em períodos distintos – 1966 e 1978 –, teve como pano
de fundo um estado que se alterou economicamente e evoluiu politicamente, do voto pró-
governo à confirmação da oposição como vetor de mudanças.
Na análise eleitoral de 1966, Curitiba, como se supunha, desmentiu o que os
cientistas políticos haviam tornado regra em relação às capitais do Sul-Sudeste: nestas, o
voto era progressista e, sob o regime autoritário, orientava-se para a oposição. Curitiba,
diferentemente, pelas razões expostas ao longo deste capítulo, exibiu um voto conservador,
tanto na eleição majoritária para o Senado quanto nas proporcionais para a Câmara dos

121
Deputados e para a Assembléia Legislativa.
O interior, como se esperava, confirmou-se conservador no voto, ainda devido
à baixa informação, pouca politização do eleitorado, influência dos governos estadual e
federal, ao coronelismo e, possivelmente, à corrupção. Mostrou-se, portanto, incorreta,
no Paraná, a clivagem voto progressista da capital-voto conservador do interior.
Em 1978, inverteu-se a equação. O voto na capital revelou-se finalmente
progressista, com a vitória do MDB sobre a Arena. No interior, onde tradicionalmente se
votava com o partido do governo, rompeu-se a tendência e a oposição também venceu.
Exceção feita, em todas as situações, ao município de Ponta Grossa, onde a
Arena sempre venceu, na eleição para o Senado em 1978 inclusive, oportunidade em que
o MDB obteve vitória maciça em todas as demais cidades.
Afigurou-se neste trabalho, ao longo da demonstração histórica e da análise
sociológica, a forte presença do neyismo em 1966, quando Ney Braga dominava a Arena
e a cena política local.
O quadro em 1978 encontra um Paraná mais integrado por rodovias e as
telecomunicações operando em nível mais que razoável. A crescente urbanização e a
mecanização da agricultura mudaram o perfil da zona rural. Apesar da industrialização
ainda reduzida – casos de Curitiba, Londrina e Maringá –, categorias profissionais já se
manifestavam com mais ênfase, como no nascente movimento dos operários metalúrgicos
e dos trabalhadores da construção civil na capital. Além de tudo, a sociedade organizada
– como a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), associações de professores e o
movimento estudantil – contribuiu para a configuração de um perfil eleitoral mais avançado.
Com o fim do bipartidarismo, a Arena deu origem ao Partido Democrático
Social (PDS), e o MDB, ao Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB).
Surgiriam outros partidos, à direita e à esquerda, mas foram esses dois os que iniciaram
o retorno do país ao pluripartidarismo e ensaiaram com a população os primeiros passos
do retorno à democracia.
Com os mesmos atores do bipartidarismo, PDS e PMDB enfrentaram-se em
1982, em eleições proporcionais e majoritárias ao Senado e, pela primeira vez desde
1965, ao Governo do Estado. Como em 1978, o partido do governo foi derrotado.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Janeiro, n. 51, p. 37-70, jul.1980.
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e as constituições estaduais e respectivas emendas, com as modificações que menciona.
Diário Oficial da União, Brasília, p. 11017, 27.out.1965. Disponível em: <http://
www.acervoditadura.rs.gov.br/legislacao_3.htm>. Acesso em: 24.nov.2005.
O ESTADO DE S. PAULO. Março de 64. 40 anos esta noite. 2004. Disponível em <http:/ /

123
www.estadao.com.br/1964/pg1.htm>. Acesso em: 24.nov.2005.
TRE-PR. Base de dados primários da Seção de Divulgação de Resultados. Curitiba: Tribunal
Regional Eleitoral do Paraná, s/d.

124
CAPÍTULO CINCO

OPÇÃO PELO POPULISMO:


DISSIDÊNCIA POLÍTICA E RENOVAÇÃO
ELEITORAL NO MUNICÍPIO DE PONTA GROSSA

Emerson Urizzi Cervi

125
126
5. OPÇÃO PELO POPULISMO:
Dissidência política e renovação
eleitoral no município de Ponta Grossa

I. INTRODUÇÃO

Na literatura da Ciência Política sobre processos eleitorais, os conceitos de “eleições


críticas”, “realinhamento” e “mantenedoras” são usados já há algumas décadas. O texto
que apresentou pela primeira vez o conceito de eleições críticas é o de V. O. Key, publicado
em 1955, sob o título A Theory of Critical Elections. Nesse texto o autor identifica, a partir
de análises eleitorais do final do século XIX nos Estados Unidos, o fato de que, em alguns
casos, os eleitores dão mais importância a fatores identificados com padrões de longo
prazo dos processos políticos, enquanto em outras eleições esses fatores dão espaço para
que as decisões sejam tomadas com base em elementos de curto prazo. Com isso, é
possível identificar os motivos que levam eleitores que tradicionalmente escolhem seus
candidatos a partir de determinadas características, em dados momentos, a resolver
selecionar outras características – até então com apoio minoritário ou até mesmo rejeitadas
– para escolher seus futuros representantes.
Nessa mesma linha analítica, a idéia de realinhamento crítico é caracterizada
pela associação de temas de curto prazo com rupturas muito intensas nos padrões de
comportamento eleitoral (BURNHAM, 1970). Nesse sentido, quando se abre espaço para
que partidos majoritários tornem-se minoritários, políticas que eram competitivas
eleitoralmente passam a perder essa competitividade, e perfis de candidatos que antes não
tinham relevância na competição passam a apresentar uma intensa competição nos
momentos de realinhamentos críticos. Em outras palavras, as eleições de realinhamentos
críticos são caracterizadas por uma anormalidade com alta intensidade1. Quando não
existem esses elementos geradores de realinhamentos, o padrão de comportamento dos
eleitores gera a chamada “eleição de manutenção”, em que o perfil dos representantes
tende a manter-se estável ao longo do tempo.

1
Usamos a expressão “anormalidade eleitoral” no sentido de apresentar períodos de duração variados,
dependendo dos fatores geradores que dão sustentação aos realinhamentos.

127
Partindo dessa análise teórica, considera-se que os processos eleitorais para
escolha dos prefeitos do município de Ponta Grossa nas décadas de 1980 e 1990 podem
ser claramente identificados como, no início, eleições de manutenção, com um perfil
constante dos eleitos, para, a partir de meados dos anos 1990, passar para eleições de
realinhamento crítico e, após dois mandatos, os realinhamentos cederem espaço à
manutenção do perfil tradicional de representantes políticos locais.
Os períodos de realinhamentos críticos são marcados pela ocorrência de
reorganizações nos padrões das bases de coalizão dos eleitores. Uma análise de longo
prazo poderia identificar os intervalos de tempo em que esses períodos acontecem, além
de suas causas. Os realinhamentos críticos eleitorais são associados de maneira geral a
crises no sistema socioeconômico, marcados pela polarização ideológica e distanciamento
entre a capacidade que a elite tradicional apresenta e os novos padrões de exigência dos
eleitores. A conseqüência é que os eleitores passam a apresentar novos padrões de
comportamento e de expectativa em relação à elite política. O município de Ponta Grossa
é um caso típico de realinhamento crítico radical, em que o perfil do representante
desejado foi rapidamente alterado para em seguida as demandas voltarem aos padrões
anteriores, ou seja, aos padrões das eleições de manutenção, o que aconteceu na disputa
pela Prefeitura em 2004.
O objetivo deste texto é identificar, ainda que de maneira exploratória e descritiva,
as principais características da elite política local e os elementos explicativos do
comportamento dos eleitores nos últimos 25 anos. Para tanto, a elite política local vencedora
das eleições de manutenção é chamada de não-populista, com perfil tradicional, realizadora
de administrações técnicas e responsáveis, com pouco apelo em favor da participação
popular. Já o perfil da administração que surge da eleição de realinhamento crítico de
1996 é chamado de populista, pois representa o oposto do perfil da elite anterior.
O texto está dividido em três partes. Na primeira são apresentadas as
características das administrações locais não-populistas, originadas de eleições
mantenedoras, além dos indicadores eleitorais que mostram uma tendência de mudança
nos critérios de escolha dos representantes eleitos. Na segunda parte é indicada a forma
como a eleição de realinhamento crítico aparece em 1996 e depois em 2000. Na última
parte do texto é apresentada a explicação econômica como justificativa para a mudança de
padrões de escolha nos anos 1990, o que gerou as eleições de realinhamento crítico.

II. ANOS 1980: PERÍODO DE MANUTENÇÃO DO PERFIL DE ELITE ELEITORAL

A política pontagrossense entre os anos 1980 e 1990 foi caracterizada


principalmente pela consolidação de um mesmo perfil de representantes das principais
lideranças locais que chegaram à Prefeitura e compuseram as bancadas majoritárias na
Câmara Municipal. O perfil dessa classe dirigente era de conservadores tradicionais,
pertencente ao mesmo grupo político e apresentando algumas características pessoais em
comum (que serão apresentadas no decorrer do trabalho).
O primeiro Prefeito desse grupo foi Otto Santos Cunha, eleito em 15 de novembro

128
de 1982 pelo Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB). Essas foram as
últimas eleições municipais em que a legislação permitiu a formação das sublegendas,
quando mais de um candidato concorria pela mesma sigla. O PMDB indicou dois candidatos:
os empresários Otto Santos Cunha e José Gomes do Amaral. Os principais opositores
eram do Partido Democrático Social (PDS); os empresários Cyro Martins, Plauto Miró
Guimarães (pai do atual Deputado Estadual e candidato a Prefeito em 1996, Plauto Miró
Guimarães Filho), além de César Fernando Pilati. Pelo Partido Trabalhista Brasileiro
(PTB) candidataram-se Brasil Ribas Neto e Antônio Maire, também empresários. O Partido
dos Trabalhadores (PT), que disputava suas primeiras eleições nacionais, lançou apenas
um candidato, o professor universitário Péricles de Holleben Mello. A chegada de Otto
Cunha2 à Prefeitura em 1982 marca o início do período de governos não-populistas.

Tabela 1
Resultado da eleição para prefeito de Ponta Grossa (1982)
CANDIDATO PARTIDO Nº DE VOTOS % DE VOTOS
Otto Santos Cunha PMDB 28.509 33,6
José Carlos do Amaral PMDB 20.201 23,8
Cyro Martins PDS 15.724 18,5
Plauto Miró Guimarães PDS 10.884 12,8
César Fernandes Pilati PDS 337 0,4
Brasil Ribas Neto PTB 1.374 1,6
Antônio Maier PTB 276 0,3
Péricles de Holleben Melo PT 650 0,7
Votos em branco - 4.617 5,4
Votos nulos - 2.168 2,5
Votos válidos - 77.955 92,0
Total de votantes - 84.740 -
Fonte: TRE-PR (s/d).

Em relação às eleições de 1982, as votações em sublegendas e a concorrência


de até três candidatos por partido dificulta a comparação com as eleições posteriores,
embora a soma de votos válidos para a legenda vitoriosa (Otto Cunha) tenha sido a única
do período de eleições de manutenção que conseguiu maioria absoluta3.

2
Otto Santos Cunha faz parte de uma das famílias mais tradicionais de Ponta Grossa. Os Cunhas chegaram ao
município no século XX para explorar a pecuária de corte e a atividade madeireira em extensas áreas rurais na
região. Otto Cunha é pecuarista por herança familiar, integrando a elite econômica do município.
3
Os candidatos Otto Cunha e José Carlos do Amaral, da legenda do PMDB, somaram 56,4% dos votos válidos para
Prefeito de Ponta Grossa em 1982 (TRE-PR, s/d).

129
O Secretário de Finanças do governo Otto Cunha foi seu primo, Paulo Cunha
Nascimento, que veio a ser o último Prefeito não-populista do período de eleições de
manutenção. Otto Cunha conseguiu eleger-se Deputado Federal em 1990, dois anos depois
de terminar o mandato de Prefeito. Não foi reeleito em 1994. Participou das eleições
municipais de 1996 como conselheiro da campanha de Plauto Miró Guimarães Filho. Em
1998 não viabilizou politicamente sua candidatura a Deputado Federal. Nas eleições
municipais de 2000, o filho de Otto Cunha, Leopoldo Guimarães da Cunha Neto, foi eleito
Vereador Municipal pelo PSL, mantendo a tradição da presença familiar na política local.
O segundo Prefeito de Ponta Grossa do período de não-populistas foi o
empresário Pedro Wosgrau Filho, eleito em 15 de novembro de 1988. Nessa eleição não
existiam mais as sublegendas. Pedro Wosgrau Filho foi candidato pelo nanico PDC (Partido
Democrata Cristão). Engenheiro civil formado pela Universidade Federal do Paraná (UFPR),
começou sua vida profissional em uma construtora da família Wosgrau em Ponta Grossa.
É descendente de família tradicional da cidade; atua profissionalmente na área de
incorporação de imóveis, tem propriedades rurais e uma madeireira; também faz parte da
elite econômica da cidade. Foi o indicado de Otto Cunha para dar continuidade à
administração municipal e teve como vice-Prefeito Paulo Cunha Nascimento, que acumulou
a função de vice-Prefeito com a de Secretário de Finanças do Município na administração
de Wosgrau4.
Tabela 2
Resultado da eleição para prefeito de Ponta Grossa (1988)
CANDIDATO PARTIDO Nº DE VOTOS % DE VOTOS
Pedro Wosgrau Filho PDC 46.457 46,7
Djalma de Almeida César PMDB 27.416 27,5
Luiz Carlos Zuk PDT 17.430 17,5
Silvio Fernandes da Silva PT 8.033 8,3
Votos em branco - 9.580 8,5
Votos nulos - 3.281 3,0
Votos válidos - 99.336 88,5
Total votantes - 112.197 -
Fonte: TRE-PR (s/d).
Nota: PDT: PARTIDO DEMOCRÁTICO TRABALHISTA.

Em 1988, o candidato da continuidade, Pedro Wosgrau Filho, ficou com 46,76%


dos votos válidos. Ele fez uma votação proporcionalmente mais expressiva que Jocelito
Canto em 1996, que ficou em primeiro lugar com 42,04%. Canto não é um fenômeno

4
Naquela campanha eleitoral, os principais adversários foram o ex-Prefeito e empresário rural Luiz Carlos Zuk
(PDT), terceiro colocado, e o então Deputado Estadual Djalma de Almeida César (PMDB), militante político na
cidade desde o início dos anos 1970, que foi o segundo colocado. A opção dos eleitores foi clara pela continuidade
do grupo hegemônico no poder naquela ocasião. Em quarto lugar naquelas eleições ficou o candidato do PT,
Sílvio Fernandes da Silva.

130
eleitoral como se costuma imaginar a respeito de um radialista. Ele foi eleito em 1996 sem
a maioria absoluta da preferência dos eleitores. Ainda em 1988, o principal grupo de
oposição, representado pelo PMDB de Djalma de Almeida César, ficou com 27,59% dos
votos, em segundo lugar. Luis Carlos Zuk, o terceiro colocado, fez 17,54% dos votos
válidos e, em quarto lugar, o PT teve 8,08%.
O terceiro Prefeito do período, Paulo Cunha Nascimento, eleito no dia 3 de
outubro de 1992, governou a cidade de 1993 a 1996. Sua eleição também foi pelo PDC.
Tinha sido Secretário Municipal de Finanças do primeiro governo não-populista e vice-
Prefeito no segundo. Pertencente a uma família tradicional da cidade, Paulo Cunha
administrava uma beneficiadora de sementes e propriedades agrícolas da família. Pela
primeira vez na terceira colocação apareceu o PT, com Padre Roque Zimermann como
candidato. Em quatro lugar, o dono de um jornal local, Adail Inglês, candidato do PTB.
Paulo Cunha não tinha experiência em disputas eleitorais como candidato antes de concorrer
a vice-Prefeito em 1988. Até 1983, quando foi nomeado Secretário Municipal de Finanças,
sua vida profissional dera-se nas propriedades rurais da família e na empresa Joná
Sementes, beneficiadora de sementes agrícolas fundada pelo pai, João Nascimento. Paulo
Cunha não fez uma administração popular. Teve altos índices de rejeição no final do
mandato (Jornal da Manhã, 1995) – tanto que o candidato da continuidade, Plauto Miró
Guimarães Filho, não aceitou seu apoio oficial.

Tabela 3
Resultado da eleição para prefeito de Ponta Grossa (1992)
CANDIDATO PARTIDO Nº DE VOTOS % DE VOTOS
Paulo Cunha Nascimento PDC 45.503 41,9
Djalma de Almeida César PMDB 36.209 33,3
Padre Roque Zimermann PT 21.097 19,4
Adail Inglês PTB 5.709 5,4
Votos em branco - 7.245 5,8
Votos nulos - 7.883 6,4
Votos válidos - 108.518 87,7
Total votantes - 123.646 -
Fonte: TRE-PR (s/d).

Na eleição de 1992 ficou evidenciada a queda na aceitação do grupo político


tradicional e o crescimento das oposições. Paulo Cunha Nascimento, candidato da
“situação”, foi eleito com 41,93% dos votos válidos – quase cinco pontos percentuais a
menos de votos que seu antecessor, Pedro Wosgrau. Em segundo lugar continuaram os
opositores do PMDB, mas, desta vez, com 33,36% dos votos válidos, um crescimento
significativo em relação à eleição anterior. No mesmo ano o PT conseguiu uma

131
ampliação de mais de 100% dos votos válidos em relação a 1988: o candidato Padre
Roque Zimermann ficou com 19,44% dos votos válidos em 1992. Ainda houve 5,26% dos
votos válidos para o candidato Adail Inglês, que não representava nenhuma facção política
de importância no município e tinha um perfil político muito próximo do das lideranças
não-populistas.

III – REALINHAMENTO ELEITORAL EM 1996

A aplicação do índice de avanço partidário para os votos brancos e nulos em


Ponta Grossa entre 1982 e 1996 mostra que havia um contínuo desgaste das lideranças
políticas de perfil tradicional na cidade durante o período nãopopulista e que as eleições
de manutenção começavam a ceder espaço para outros critérios de escolha, o que originou
novos alinhamentos e a primeira eleição de realinhamento crítico do período.

Tabela 4
Avanço dos votos brancos e nulos em Ponta Grossa (1988 a 1996)
ELEIÇÃO MUNICIPAL DE 1988
Total de votos 84.740
Total de votos brancos e nulos 6.785
Índice de avanço de votos brancos e nulos 2,78%
ELEIÇÃO MUNICIPAL DE 1992
Total de votos 123.646
Total de votos brancos e nulos 7.245
Índice de avanço de votos brancos e nulos 1,72%
ELEIÇÃO MUNICIPAL DE 1996
Total de votos 134.305
Total de votos brancos e nulos 5.015
Índice de avanço de votos brancos e nulos 0,20%
Fonte: o autor, a partir de TRE-PR (s/d).

O índice de avanço dos votos brancos e nulos de Ponta Grossa no período


anterior à eleição de 1996 manteve-se sempre positivo, o que significa que, por vários
motivos, a cada pleito mais eleitores optavam por não escolher nenhum candidato. É
evidente que uma parcela dos votos brancos e nulos deve-se não ao descontentamento do
eleitor, mas a erros no momento da votação ou à interpretação dos escrutinadores (na
época a votação e a apuração dos votos eram manuais). O que importa aqui não são os
números absolutos de votos brancos e nulos, mas o seu crescimento contínuo entre as
eleições.
Com a não-eleição de Plauto Miró Guimarães Filho em 1996 e a chegada à
Prefeitura do radialista Jocelito Canto terminou o período de governos não-populistas em

132
Ponta Grossa. Saíram de cena os prefeitos empresários ou proprietários rurais, nascidos
em Ponta Grossa e descendentes de famílias tradicionais da cidade, encerrando o período
de governos de continuidade, com o mesmo perfil administrativo, que teriam continuidade
caso Guimarães Filho fosse eleito naquela oportunidade; no entanto, ele contou com
menos de 32% dos votos válidos, conforme mostra a Tabela 5.

Tabela 5
Resultado da eleição para prefeito de Ponta Grossa (1996)
CANDIDATO PARTIDO Nº DE VOTOS % DE VOTOS
Jocelito Canto PSDB 54.363 42,0
Péricles Holleben Melo PT 41.311 31,9
Plauto Miró Guimarães Filho PFL 31.088 24,0
José Penkoski PSC 2.528 1,9
Votos em branco - 1.059 0,8
Votos nulos - 3.956 2,9
Votos válidos - 129.190 96,3
Total votantes - 134.305 -
Fonte: TRE-PR (s/d).
Nota: PSDB: Partido da Social Democracia Brasileira; PFL: Partido da Frente Liberal; PSC:
Partido Social Cristão

Ainda a respeito das administrações de 1983 a 1996 é preciso lembrar que a


relação dos prefeitos com as administrações estaduais não era de afinidade política.
Durante os governos não-populistas na Prefeitura de Ponta Grossa, a administração
municipal passou a maior parte do tempo na oposição à administração estadual5.
Independentemente dos partidos em que se elegeram, Otto Cunha, Pedro Wosgrau e Paulo
Cunha representavam os remanescentes da Arena (Aliança Renovadora Nacional). Otto
Cunha foi candidato a prefeito pelo PMDB porque ele era o principal opositor ao então
Prefeito Zuk, que foi eleito em 1978 ainda pela Arena.
Nem Otto Cunha nem os outros prefeitos tinham vínculos partidários fortes
além do âmbito municipal e não tiveram militância política significativa anterior aos seus
mandatos como prefeitos. Durante a maior parte de governos não-populistas em Ponta
Grossa o PMDB elegeu os governadores do Paraná: José Richa de 1982 a 1986, Álvaro
Dias de 1986 a 1990 e Roberto Requião de 1991 a 1994. Excetuando os dois últimos anos
do mandato de Paulo Cunha, que foram no início do primeiro governo Jaime Lerner, e os
dois primeiros de Otto Cunha, durante o governo José Richa, o período de governos não-
populistas na Prefeitura de Ponta Grossa foi de oposição política ao governo do estado.
Apesar disso, o grupo político não-populista conseguiu vencer os candidatos do governo
do estado nas três disputas municipais. Entre as explicações possíveis para esse fato está
5
A primeira parte do mandato de Otto Cunha ocorreu simultaneamente ao governo de José Richa, ambos do
PMDB. Essa é a única exceção de proximidade partidária entre o Prefeito não-populista de Ponta Grossa e o
Governador do Estado.

133
a grande liderança dos não-populistas em Ponta Grossa no período, mais identificados
com o perfil desejado pelo eleitor local para os representantes em disputas de manutenção.
Todos os governadores do PMDB eleitos nos anos 1980 não foram bem votados em Ponta
Grossa (TRE-PR, s/d). Além disso, é possível constatar, por meio desse fato, que em
eleições municipais o eleitor tende a decidir o voto de maneira distinta de outras eleições.
Ele conseguiria diferenciar as duas esferas de representação, embora haja uma tendência
à responsabilização dos líderes locais pelas crises ou possíveis perdas socioeconômicas
que venha a enfrentar em determinados períodos.
O período de eleições de manutenção em Ponta Grossa termina em 1996,
quando o radialista Jocelito Canto, possuidor de um perfil pessoal totalmente distinto do
dos prefeitos anteriores, conseguiu vencer a disputa eleitoral. Ele não pertence a família
tradicional da cidade: chegou a Ponta Grossa em 1991 à procura de emprego. Bateu às
portas de todas as rádios da cidade sem sucesso. Então, alugou uma caixa amplificadora
de som e um microfone para fazer apresentações populares na praça central da cidade.
‘Abria’ o microfone para a população apresentar suas queixas. Conseguiu levar alguns
políticos para debater com o povo em praça pública e seu programa ganhou repercussão.
Assim começou sua carreira política, que tinha como objetivo inicial ocupar uma vaga de
Vereador no Município.
Canto é natural do Rio Grande do Sul, não faz parte da elite econômica local e
jamais foi empresário. Na infância, trabalhou como engraxate para ajudar no orçamento
da família. Depois, adulto, casou-se e passou a não apresentar uma vida familiar estável6,
com repetidas crises conjugais públicas quando era radialista e depois que se tornou
Deputado Estadual, em 1994. Isso é uma característica altamente negativa para os
representantes políticos em sociedades conservadoras, como a de Ponta Grossa. O perfil
oposto ao dos prefeitos anteriores e a sensibilidade para reconhecimento das novas
demandas populares fizeram de Canto a principal opção oposicionista no município em
1996, substituindo os políticos da oposição tradicional à elite política hegemônica local:
Djalma de Almeida César e Luiz Carlos Zuk. Em 1996, depois de dois anos como Deputado
Estadual e com seu programa de rádio melhor estruturado, Jocelito Canto transformou-
se em candidato natural da oposição à Prefeitura local. Em 2000, quando completava seu
primeiro mandato com Prefeito sem ter deixado de ser radialista, candidatou-se à reeleição,
mas não conseguiu repetir o bom desempenho eleitoral de 1996. Foi derrotado por
Péricles de Holleben Melo (PT). Durante seu mandato, Canto não conseguiu cumprir as
“promessas” feitas aos eleitores em 1996, no momento dos realinhamentos eleitorais,
perdendo a exemplaridade como líder, apesar de seu carisma. Isso resultou na sua
substituição por um político 6 de perfil oposto ao seu e diferente do perfil tradicional das
lideranças locais. Mas, antes dele, quem primeiro teve a capacidade de representação
popular reduzida, abrindo espaço para a opção populista, foram as elites com perfil
tradicional.

6
Uma das características presentes nos políticos não-populistas de Ponta Grossa e que se acreditava ser uma
exigência do eleitorado local era a vida familiar estável, sem escândalos públicos – exatamente o contrário de Canto.

134
Analisando a curva histórica dos resultados eleitorais de 1992 a 2000 em Ponta
Grossa, pode-se afirmar que a vitória do novo perfil de governante na eleição de
realinhamento crítico em 1996 foi o resultado de um processo de desgaste da elite
dominante. A votação de Plauto Miró Guimarães Filho naquele ano representou o ápice
desse processo de desgaste do grupo político identificado com a continuidade. Esse grupo
chegou ao poder político local em 1982 com a eleição de Otto Cunha, que teve 62% dos
votos válidos. Em 1988 a aceitação dos eleitores pela elite dirigente tradicional caiu para
46%, ainda assim mantendo-se à frente do principal grupo político opositor. Em 1992, a
aceitação, representada pelo número de votos obtido pelo candidato do grupo político,
caiu para 41%, ainda suficiente para garantir a continuidade – mas em 1996 essa
continuidade ficou inviável, com apenas 24% dos votos para Plauto Miró Guimarães Filho.
A crise no grupo não-populista aumentou em 2000, quando a elite dirigente
tradicional não encontrou um político viável eleitoralmente para representá-la e a disputa
passou a ser polarizada entre Canto e Mello.

Tabela 6
Resultado da eleição para prefeito de Ponta Grossa (2000)
CANDIDATO PARTIDO Nº DE VOTOS % DE VOTOS
Péricles Holleben Melo PT 72.583 49,7
Jocelito Canto PSDB 60.459 41,4
Carlos Tavarnaro PFL 6.762 4,6
Wagner Menezes PPS 3.023 2,0
José Penkoski PSC 2.857 1,9
Rogério Marcondes PRN 279 0,2
Votos em branco - 2.813 1,8
Votos nulos - 5.927 3,8
Votos válidos - 145.965 94,4
Total votantes - 154.705 -
Fonte: TRE-PR (s/d).
Nota: PPS: Partido Popular Socialista; PRN: Partido da Reconstrução Nacional.

Péricles Mello foi o mais votado em quatro zonas eleitorais, variando de 52% a
48% os votos válidos em cada uma. Mas na 139º Zona Eleitoral, localizada na região de
Uvaranas, Jocelito Canto ficou à frente do adversário com 48% contra 45% dos votos
válidos. Essa é a região da cidade que mais sofreu com a crise econômica dos anos 1980
e 1990 e foi onde a administração de Jocelito Canto mais investiu em políticas sociais,
como a construção de casas populares pelo sistema de mutirão para “desfavelização”.

135
Outra informação importante sobre o resultado eleitoral de 2000 é que o
candidato Jocelito Canto ficou com 41,42% dos votos válidos naquele ano, menos de um
ponto percentual de diferença da votação que fizera em 1996, quando foi vitorioso
(42,04%). Isso demonstra que o eleitorado de Canto foi praticamente1 o mesmo nas duas
eleições. O que mudou foi o percentual de aceitação do candidato do PT, que passou de
31,95% dos votos válidos em 1996 para 49,72% em 2000. Com a ausência de um candidato
que representasse o grupo tradicional na política, o eleitor tradicional dos candidatos
não-populistas optou por votar no representante do PT ao invés de votar na manutenção
do populista. Apesar das diferenças ideológicas entre Péricles Mello e os representantes
dos governos dos anos 1980 e 1990 na cidade, o perfil social do candidato petista aproxima-
se mais do perfil não-populista do que de Jocelito Canto. Mesmo sem pertencer a uma
família integrante da elite econômica local, Péricles Mello é nascido em Ponta Grossa,
professor universitário e tradicional ativista político local.
A comparação entre os resultados eleitorais de 1996 e 2000 permite afirmar
que o candidato de perfil populista manteve o eleitorado no período de sua administração,
mas não conseguiu ampliar sua capacidade de representação, o que inviabilizou sua
reeleição – isso mesmo ainda sendo radialista durante os quatro anos como Prefeito.

IV – EXPLICAÇÃO ECONÔMICA PARA OS REALINHAMENTOS CRÍTICOS

Além da explicação política para a decadência da elite local não-populista nos


anos 1990, há também uma variável econômica que colaborou para o descrédito desse
perfil de governante. O município passou por uma crise econômica que começou em
meados dos anos 1970 e seguiu até meados dos anos 1990. Nesse período surgiu no
cenário político local um outsider7 carismático com as características de um populista –
opostas aos governantes de então –, o radialista Jocelito Canto. Nos 13 anos de governos
não-populistas (1983 a 1996) Ponta Grossa viveu um período de estagnação econômica.
Depois de um vertiginoso crescimento industrial nos anos 1970, com a instalação dos
complexos moageiros de soja no município, a economia parou de crescer durante os
governos não-populistas. O PIB per capita de Ponta Grossa transformou-se em um dos
menores entre os municípios médios do estado e as perspectivas profissionais definharam-
se entre os anos 1980 e 1990.
Apesar de ser mais antigo, em 1996 Ponta Grossa (172 anos) tinha praticamente
a mesma população que Maringá (60 anos). Eram 266.390 habitantes no primeiro e
286.068 habitantes no segundo município (IBGE, 1996). Comparando alguns indicadores
econômicos dos dois municípios percebe-se o fraco desempenho da economia
pontagrossense em meados dos anos 1980. Apesar de a indústria em Ponta Grossa ter
uma participação maior na economia local do que Maringá, a renda per capita
pontagrossense, em meados dos anos 1990, estava cerca de 20% abaixo da renda per
capita maringaense. O número de estabelecimentos industriais de Maringá era o dobro do
7
Alguém “de fora” (nota do revisor).

136
de Ponta Grossa no ano da eleição do populista, embora a participação do setor na renda
total fosse maior em Ponta Grossa. Maringá também tinha um setor de serviços mais
desenvolvido que o de Ponta Grossa. O setor agropecuário de Ponta Grossa tem três vezes
maior participação na renda municipal que o de Maringá. O setor terciário (de serviços),
que apresenta a maior capacidade de distribuição de riqueza e exige profissionais mais
especializados, em Maringá estava mais desenvolvido que o setor terciário de Ponta
Grossa. Esse é outro indicativo da concentração de renda e da lentidão no desenvolvimento
econômico de Ponta Grossa. Por último, a participação da economia agropecuária no total
da riqueza gerada no município é três vezes mais importante que em Maringá. Aqui, faz-
se uma distinção rápida, mas importante. Enquanto em Maringá a economia agropecuária
é caracterizada principalmente por pequenas e médias propriedades rurais, em Ponta
Grossa a predominância é de grandes propriedades. Em Maringá, as características do
solo garantem um tipo de exploração agrícola mais intensiva. Em Ponta Grossa há grandes
extensões de áreas rurais com pouca fertilidade, que só podem ser exploradas pela
pecuária extensiva. Por isso a predominância de grandes propriedades rurais, a
concentração de renda no campo e a pobreza da população rural de Ponta Grossa são
maiores que em Maringá.
Considerando que o menor número de indústrias e a maior participação delas na
economia demonstra que o setor industrial de Ponta Grossa era concentrado em um pequeno
número de grandes fábricas, percebe-se que também existia uma tendência à concentração
de renda na área urbana desse município. As características da atividade agropecuária local
e sua importância no total da economia gerada apontam para uma concentração de renda. O
menor PIB per capita de Ponta Grossa mostra uma atividade econômica menos auto-suficiente,
com evasão de recursos para outros municípios ou regiões.
Esses fatores colaboraram para a geração de uma pressão social crescente por
mudanças na atividade econômica local. Os políticos que administraram a cidade no
período foram os primeiros a sofrer os efeitos negativos. Os eleitores – os pequenos
empresários em busca da expansão do setor de prestação de serviços, os trabalhadores
assalariados em busca de melhores rendimentos, os pequenos industriais que esperam
condições favoráveis ao crescimento de suas empresas – fizeram a opção por uma
administração municipal com perfil distinto do não-populista em 1996.
Uma pesquisa com base em levantamentos por estimativa domiciliar, feita pelo
IBGE a respeito do perfil econômico dos principais municípios do interior do Paraná,
abrangendo o período de 1983 a 1997, mostra que Ponta Grossa empobreceu nesse
período. Além de Ponta Grossa, foram pesquisados outros cinco municípios paranaenses
(Maringá, Londrina, Foz do Iguaçu, Curitiba e Cascavel). Em todos eles, e na média do
estado, o poder aquisitivo da população sofreu uma sensível queda no período. Mas em
Ponta Grossa a redução da classe alta e o crescimento da participação das classes média-
baixa e baixa no total da população foram mais acentuados.
Em 1983, 7,5% dos domicílios de Ponta Grossa eram considerados como
pertencentes à classe alta, segundo definição do IBGE. Em 1989 essa participação caiu
para 6,81% e em 1997 era de apenas 2,92%. A média dos domicílios paranaenses
137
considerados como de classe alta era de 7,2% em 1983, 6,53% em 1989 e 3,95% em
1997. As médias pontagrossenses de participação de domicílios de classe alta no total da
população ficaram acima das médias estaduais até o final da década de 1980. Nos
anos 1990 isso se inverteu.
No outro extremo das camadas sociais, as mais baixas, também é possível
constatar a estagnação econômica do município nesse período. Em 1983, 34,8% dos
domicílios de Ponta Grossa eram considerados de classe baixa e 8,8%, de miseráveis; a
soma das duas classes representava 43,6%. Em 1989 a participação dos domicílios de
classe baixa subiu para 35,61% e os de famílias miseráveis caíram para 7,82%. A soma
ficou em 42,43%. Em 1997 o empobrecimento cresceu significativamente. Nesse ano o
IBGE constatou 42,84% dos domicílios de Ponta Grossa como pertencentes à classe baixa
e 9,46%, à miserável; no total, 52,30%, um crescimento real de mais de 12% da pobreza
em oito anos e pela primeira vez os domicílios de família pobres e miseráveis passaram
a ser maioria no município. Na média do estado, em 1983 o Paraná tinha 33,6% de seus
domicílios considerados como sendo de famílias pobres e 8,5% de miseráveis. Em 1989
os índices subiram para 34,37% de pobres e 7,55% de miseráveis. Em 1997 as médias
foram de 42,84% de domicílios pobres e 9,46% de miseráveis. Em todo o período o índice
de participação dos pobres na totalidade da sociedade de Ponta Grossa foi maior que a
média estadual. A diferença, porém, cresceu muito entre 1989 e 1997.
A renda per capita anual e os índices de potencial de consumo (IPC) dos
principais municípios paranaenses entre 1983 e 1997 também demonstram a estagnação
econômica de Ponta Grossa nesses 14 anos. O período em que os prefeitos não-populistas
administraram o município de Ponta Grossa coincidiu não apenas com uma estagnação
econômica local, mas com uma queda nos indicadores econômicos da cidade em relação
a outros municípios do estado. Em 1983, quando começou o primeiro governo não-
populista de Ponta Grossa, a renda per capita anual do pontagrossense só perdia para a do
curitibano entre os municípios pesquisados, e o índice de potencial de consumo de Ponta
Grossa era o segundo maior do interior do Paraná. Em 1997 a renda per capita de Ponta
Grossa passou a ser a pior entre os municípios de porte médio do Paraná e encontrava-
se abaixo da média estadual. O IPC acompanhou a queda, ficando à frente apenas dos de
Cascavel e de Foz do Iguaçu em 1997. As condições econômicas desfavoráveis e a queda
da riqueza local formaram o cenário ideal para o discurso populista da mudança política
e tiveram efeitos diretos na escolha dos eleitores em 1996. Assim, como visto nas explicações
para as ocorrências populistas clássicas, houve uma massificação da demanda social por
melhorias na economia local, pois integrantes de todas as classes vinham sofrendo as
conseqüências da crise social, que terminou transformando-se em crise do discurso
hegemônico a partir do momento em que as elites dirigentes demonstraram não ter
condições para solucionar a crise.
As perspectivas de desenvolvimento pessoal e o poder aquisitivo de todas as
classes sociais restringiram-se gradativamente em Ponta Grossa entre os anos 1980 e
1990. Como os governantes estavam distantes das classes populares, as políticas públicas
implementadas por eles não atendiam às novas demandas sociais. As pressões para uma
138
ampliação e transformação da elite dominante cresceram até o ponto da substituição
dessa elite pela liderança populista. Se o grupo político hegemônico tivesse percebido essa
tendência a tempo de fazer uma aliança e ampliar a participação de setores sociais no
governo, o discurso populista perderia força. O então candidato Jocelito Canto não
personificou apenas uma “mudança” durante a campanha eleitoral de 1996, mas a mudança
em favor do atendimento às demandas sociais reprimidas. A coincidência histórica da
estagnação econômica com permanência de representantes com o mesmo perfil político
no poder no mesmo período foi decisiva para o sucesso eleitoral do populismo. Durante
os 13 anos de governos nãopopulistas, a administração municipal de Ponta Grossa tentou
ser o mais “responsável” possível. O discurso político predominante era o da elite
econômica responsável pela preservação dos bens públicos. Eram governos para o povo,
comuns quando a elite política sente-se mais capacitada para decidir o que é melhor para
a sociedade do que a própria sociedade.
Essa postura de afastamento das bases sociais gerou distorções na implementação
de políticas públicas, gerando a crise no discurso hegemônico. As lideranças tradicionais
deixaram de ser consideradas a melhor opção eleitoral, produzindo um vazio político
propício para o crescimento do populismo eleitoral, a partir de novos alinhamentos
políticos. As políticas públicas “responsáveis” implementadas pelos governos não-
populistas foram apresentadas em forma de discurso político nas campanhas eleitorais de
1982 a 1992 e aceitas pela maioria dos eleitores. Para poder compreender como a
distorção entre discurso e prática abriu espaço ao populismo, é preciso considerar como
as promessas eleitorais do grupo não-populista transformaram- se em política pública,
por exemplo.
Uma das constantes promessas de campanha dos governos não-populistas foi
fazer investimentos em saúde pública. A demanda da população nessa área era por
atendimento público em maior quantidade (número de consultas disponíveis). Nas três
administrações que antecederam Canto, multiplicou-se o número de postos de saúde da
Prefeitura, descentralizando o atendimento para os bairros. De Otto Cunha a Paulo Cunha
as unidades de saúde em funcionamento nos bairros passaram de dez em 1983, para 62
em 1996, em um município com cerca de 263 mil habitantes no final do período. A
estrutura de atendimento cresceu 500% em pouco mais de uma década8, enquanto o
crescimento anual médio da população ficou abaixo de 2%, segundo dados do IBGE.
Apesar dos investimentos na construção de novas unidades de saúde, a população
continuou sem o atendimento médico público descentralizado que exigia porque as obras
não foram acompanhadas pela contratação de novos médicos. No final do governo Paulo
Cunha, o Município tinha 62 postos de saúde e apenas 30 médicos clínicos gerais, pediatras
ou ginecologistas para prestar atendimento nessas unidades. Cada uma delas tinha médico,
em média, duas vezes por semana, e a população dos bairros era obrigada a procurar os
serviços do pronto-socorro municipal ou hospitais do centro da cidade.

8
Para entender a desproporção da decisão política em relação às demandas populares, o município de Curitiba,
que na mesma época tinha 1,2 milhão de habitantes, era servido por 95 postos de saúde municipais.

139
Político sensível às demandas sociais, Jocelito Canto soube explorar os desvios
entre as promessas e as ações práticas dos governos não-populistas. Criticou as filas no
pronto-socorro, a falta de médicos nas unidades de saúde dos bairros e a desatenção das
administrações municipais com as classes sociais carentes. Em seu programa de rádio,
ele apresentava com freqüência casos de pessoas que precisavam do serviço público de
saúde e que não conseguiam ser atendidas no pronto-socorro. Relatos de crianças que
passavam a madrugada em salas de espera dos hospitais também eram comuns. Durante
a campanha eleitoral de 1996, uma das principais promessas de Canto foi a inauguração
de quatro postos de saúde, um em cada região da cidade, com atendimento médico 24
horas por dia. Assim, a população não se deslocaria mais para o centro da cidade quando
precisasse de atendimento a qualquer hora do dia9. Esse exemplo mostra como um
governo “responsável”, mas sem bases populares sólidas, pode equivocar-se na
implementação de políticas públicas e abrir espaço para o surgimento de uma oposição
com força eleitoral suficiente para chegar ao poder.
O programa de rádio Garagem da esperança serviu como instrumento para
identificação do radialista com o discurso populista. O que criou espaço para o crescimento
da aceitação desse discurso foi o baixo índice de responsividade das administrações não-
populistas. Se a implementação das políticas públicas desse período, principalmente no
último mandato, tivessem considerado as novas demandas da sociedade10, seria mais
difícil o convencimento do eleitor pelo discurso da mudança, mesmo que ele fosse
transmitido via ondas hertzianas. Sucessivos fracassos na implementação de políticas
públicas pelos governos não-populistas abriram espaço para que a oposição política
populista crescesse.
Governos “responsáveis” não fazem questão de relacionar-se de maneira
constante com diferentes organizações sociais, estando por isso mais sujeitos ao acúmulo
de pequenos déficits na implementação das políticas públicas (HAM & HILL, 1993, p. 94).
Lembrando trabalhos de outros autores, Ham e Hill introduzem no debate sobre
implementação de políticas públicas o conceito de “déficit”, segundo o qual, quando a
cooperação entre as organizações envolvidas na implementação das políticas públicas é
menor que a perfeita, passa a existir um déficit cumulativo. No caso dos governos não-
populistas de Ponta Grossa, esse déficit começou a acumular-se quando as políticas
implementadas, fruto das promessas de campanha, deixaram de cumprir o papel desejado
pelo conjunto da sociedade.
Associa-se a isso o conceito de sistema top-down11 de implementação das políticas
públicas, segundo o qual as ações dos indivíduos ou grupos públicos são dirigidas a
objetivos previamente estabelecidos mediante decisões políticas, sem que para tanto seja
necessário ouvir as bases sociais (a população que será afetada pelas decisões).
9
Essa promessa não foi cumprida no início do mandato de Canto, como prometido. O Secretário Municipal de
Saúde chegou à conclusão de que seria muito caro manter médicos de plantão em quatro unidades de saúde 24
horas para um baixo número de atendimentos durante a madrugada.
10
Como mais médicos nos bairros da periferia, por exemplo.
11
“De cima para baixo” (N. R.).

140
Pode-se afirmar que em um sistema democrático, com eleição periódica de
tomadores de decisões políticas, a realimentação das entradas é um dos pontos fundamentais
para a manutenção de um grupo político no centro da tomada de decisões. A
responsabilidade por essa realimentação é dos grupos de pressão da sociedade que têm
acesso direto à elite política – que toma decisões. Os grupos de pressão estão livres da
estrutura burocrática e “disponíveis” para receber as demandas do ambiente e introduzi-
las na caixa de tomada de decisões. Se por qualquer motivo essa realimentação for distorcida
ou começar a falhar, as decisões e ações da elite política dissociam-se das expectativas do
conjunto da sociedade. É quando começa a decadência de uma elite política e sua substituição
por outro grupo. A falta de conexão entre as ações públicas e as demandas da sociedade
foi responsável pela substituição dos governos não-populistas em Ponta Grossa em uma
típica eleição de realinhamento crítico.
Na prática, o distanciamento da elite política não-populista que governou a
prefeitura de Ponta Grossa pode ser percebida em ações de alguns grupos de pressão. As
duas principais instituições que deram sustentação aos governos não-populistas no início
do período foram a Sociedade Rural dos Campos Gerais (SRCG) e a Associação Comercial
e Industrial de Ponta Grossa (ACIPG). Outras instituições também faziam a intermediação
entre a elite política eleita e os interesses da sociedade, mas essas duas, por serem as
maiores, tinham direito de indicar secretários municipais e de participar de decisões
importantes do poder público. Por tradição dos prefeitos daquele período, o Secretário
Municipal de Indústria e Comércio era indicado pela ACIPG e o Secretário Municipal de
Agricultura era indicado pela SRCG. Antes da existência de secretarias específicas, as
associações classistas indicavam os diretores de departamentos ligados aos setores de
indústria, de comércio e de agricultura. Boa parte das demandas dos grupos sociais
representados por estas instituições chegavam ao centro de tomada de decisões públicas
por intermédio de “seus” secretários. A manutenção dos secretários “classistas” garantia
as “entradas” no sistema político com poucas distorções e que a implementação de
políticas públicas atenderia as demandas desses grupos. A sucessão de governos fez com
que a elite política não-populista se sentisse cada vez mais auto-suficiente, e os selecionados
para os postos de tomada de decisões passaram a desconsiderar as pressões externas.
O caso mais aparente é o da SRCG no último mandato do período não-populista.
A direção dessa entidade, que representa a classe dos pecuaristas locais, apoiou a eleição
dos três prefeitos não-populistas. Afinal de contas, todos eles tinham ligações diretas ou
indiretas com o setor agropecuário. Durante o primeiro mandato, a SRCG dividiu o centro
das decisões políticas com a ACIPG. Ambas conseguiam interferir na tomada das principais
decisões políticas e relacionavam a elite política com a sociedade, pois juntas representam
a maior parte da população economicamente ativa do município. No segundo governo,
como Wosgrau Filho era principalmente um empresário urbano (construção civil e
incorporação de imóveis), a Associação Comercial ganhou espaço como grupo de pressão
da classe política. O centro do poder foi distanciando-se gradativamente da Sociedade
Rural. Isso pode ser percebido na composição dos conselhos municipais. A partir dos
anos 1990 os estatutos dessas entidades normalmente passaram a prever a indicação de
141
um representante da Associação Comercial e raramente um da Sociedade Rural.
Foi no terceiro governo do período que o afunilamento da elite política ficou
mais nítido. A Sociedade Rural passou de grupo de pressão distante para quase opositora
à administração. O Prefeito Paulo Cunha Nascimento manteve durante todo o seu mandato
o Secretário de Agricultura e Pecuária, Cristiano Justus Neto. Como não era indicação da
Sociedade Rural, o Secretário não priorizava o atendimento às demandas do grupo de
pressão. Achava que a Secretaria deveria dar apoio à pequena e média propriedade, por
ser menos organizada e com menor representação no poder público. As discordâncias
cresceram a tal ponto que o Secretário, sendo pecuarista e proprietário de uma pista de
remates, marcava os leilões gerais em sua propriedade para os mesmos finais de semana
em que ocorreriam os eventos da Sociedade Rural. Como o Prefeito manteve o Secretário
no cargo, a conclusão é a de que a opção de Paulo Cunha foi pelo afastamento do grupo de
pressão em favor da manutenção do Secretário. Só no final de seu mandato, em junho de
1996, o Prefeito anunciou à direção da Sociedade Rural que faria um empréstimo municipal
para a construção do Parque Agropecuário de Ponta Grossa, obra que não chegou a
concluir em seu mandato12.
O relacionamento tumultuado entre a elite política e o grupo de pressão de um
setor tradicional como o da atividade pecuária é apenas um exemplo e mostra o processo
pelo qual os governos não-populistas foram perdendo espaço na sociedade. O mesmo
aconteceu com outros integrantes da classe política, que se foram afastando do centro do
poder a cada processo de renovação interna. Sem uma diversidade de grupos de pressão,
as decisões passaram a ser tomadas em favor de um grupo cada vez mais restrito. Assim,
as demandas populares começaram a chegar truncadas ao centro do poder até o momento
em que, sem intermediadores com a sociedade, a elite política não-populista tornou-se
insustentável como representante popular.
No final de seu mandato, Paulo Cunha Nascimento não tinha mais do que poucos
aliados políticos. Na última metade do mandato, teve dificuldades até para nomear um
líder do governo na Câmara Municipal. Além dos crescentes ataques da oposição, que se
aproveitava da imagem da administração junto à opinião pública, tinha que mediar disputas
internas por fatias do poder.
As dissidências na classe política foram fortalecendo a oposição, que se
aproveitou da ascensão de uma nova liderança popular, sem vínculos com a classe dirigente
e, portanto, identificada como legítima representante do povo, para voltar ao poder. A
campanha eleitoral de 1996 mostra que Jocelito Canto não entrou na disputa apenas com
a ajuda da massa. Ele foi a “cabeça” de um corpo de dissidentes da classe política que se
formou durante os 13 anos de seleção interna da elite política não-populista de Ponta
Grossa. Canto foi a opção que os agropecuaristas encontraram para retornar ao centro do
poder – tanto que os secretários de Agricultura do governo de Canto foram indicados pela
12
O município perdera seu parque agropecuário no final do governo Otto Cunha e passou mais de dez anos sem
um local apropriado para realizar feiras e exposições do setor rural, o que também demonstra o afastamento do
grupo de pressão pecuarista do centro das decisões políticas locais.

142
SRCG e a nomeação do Secretário de Indústria e Comércio “apenas” recebeu o apoio da
ACIPG. A candidatura de Jocelito Canto à Prefeitura em 1996 também foi o resultado de um
realinhamento da classe política local e não apenas do realinhamento dos critérios de
escolha dos eleitores.

V. COMENTÁRIOS FINAIS

A eleição de Jocelito Canto foi, em grande medida, uma conseqüência da


incapacidade da elite política tradicional de Ponta Grossa de identificar a sua própria
decadência como representante pública e a possibilidade cada vez maior de um
realinhamento eleitoral. Se a vitória da oposição em 1996 deveu-se ao esgotamento do
grupo político até então hegemônico e de suas práticas administrativas, então por que o
escolhido como substituto não foi o candidato do PT? O partido vinha disputando as
eleições municipais desde 1982. Tinha ficado em terceiro lugar nas eleições de 1988 e
1992 para Prefeito, com 19,4% dos votos válidos. Possuía desde 1989 uma vaga na
Câmara de Vereadores. Tinha um representante local na Câmara dos Deputados, o Deputado
Federal Padre Roque (eleito em 1994), e um na Assembléia Legislativa, o Deputado Estadual
Péricles de Holleben Melo (também eleito em 1994), ambos com experiências eleitorais
anteriores e bases políticas organizadas no sindicalismo e movimentos sociais,
principalmente nas diretorias de associações de moradores de bairros. O PT não seria
o substituto natural dos governos municipais anteriores a 1996? Não.
Caso não tivesse surgido Jocelito Canto, provavelmente uma parte da dissidência
do grupo hegemônico apoiaria a candidatura petista – como aconteceu em 1996 – e
aumentaria suas chances de vitória eleitoral. Mas a existência de uma alternativa, aliada a
fatores históricos tradicionais, fez com que a preferência dos eleitores recaísse no candidato
populista e não no do PT.
Até 1996 o PT de Ponta Grossa tinha dificuldades em fazer alianças eleitorais.
Os dirigentes do partido defendiam a tentativa de vencer uma eleição sem coligações
políticas. Por isso, nas eleições municipais daquele ano, o PT coligou-se com PCB, PCdoB,
PSB, PSTU e PV. Nenhum desses partidos nanicos apresentava bases sociais organizadas
e consistentes no município, do ponto de vista eleitoral. A coligação teve dificuldades até
para completar a chapa de 24 candidatos a Vereador. O PT lançou-se à campanha eleitoral
praticamente sozinho.
As bases sociais do PT em Ponta Grossa não cresceram na proporção necessária
para garantir uma vitória eleitoral para Prefeito em 1996. O município viveu quase duas
décadas de estagnação econômica, o que impediu o crescimento da organização dos
trabalhadores por meio dos sindicatos. O sindicalismo é o principal braço de intermediação
do PT junto aos eleitores e, onde ele não está bem enraizado nas classes trabalhadoras, os
candidatos do partido têm dificuldade em apresentar suas propostas.
Existe ainda a limitação política de uma candidatura do PT nas classes sociais
mais baixas de uma cidade conservadora, aquelas que sofreram diretamente os efeitos
negativos de um período de administrações pouco sensíveis às demandas sociais. Em
143
todo o período de governos não-populistas o PT e suas principais lideranças fizeram
parte do cenário político. Péricles Mello foi candidato a Prefeito em 1982 e foi eleito
Vereador em 1988. De uma forma ou de outra as lideranças petistas estavam inseridas
naquele período político, mesmo tentando identificar-se como oposição.
O fato é que durante os governos não-populistas, o Partido dos Trabalhadores
estava presente no cenário, representado principalmente pelo candidato a Prefeito Péricles
de Holleben Mello, e não conseguiu fazer com que as demandas sociais fossem atendidas.
Logo, o eleitorado de baixa renda não tinha motivos para acreditar que uma Prefeitura
administrada pelo PT resolveria os problemas emergenciais da comunidade, não
identificados pelas elites hegemônicas. O único candidato realmente novo no cenário e
que se mostrava capaz de resolver os principais problemas das classes baixas sem parecer
artificial foi Jocelito Canto. Por isso a opção do eleitorado recaiu sobre ele e não sobre o
PT naquela eleição.
Essa identificação do PT com a crise local tem maior poder explicativo do que o
possível medo que os eleitores de uma sociedade conservadora sentiriam em relação ao
candidato do Partido dos Trabalhadores. Isso porque em 1996 Péricles de Mello foi o
segundo colocado na disputa, com 31,9% dos votos válidos, ou seja, quase um terço do
eleitorado. Quatro anos depois, em 2000, Péricles de Mello conseguiu eleger-se Prefeito
de Ponta Grossa como candidato do PT que fez alianças com o empresariado local13.
Os resultados das eleições de 1996 mostram um avanço significativo na aceitação
das propostas do PT em Ponta Grossa – tanto que, em 2000, o partido conseguiu chegar
à Prefeitura da cidade. Mas, antes disso, a crise do discurso hegemônico e o surgimento
de um outsider da política permitiram o sucesso eleitoral do populismo na política local.
Essas condições sociais, aliadas à difusão do discurso do realinhamento radical, foram o
que promoveram Jocelito Canto a candidato viável para a Prefeitura da cidade. Em 2000,
a situação mudara. O PT estava desfrutando das conseqüências positivas do crescimento
eleitoral de 1996, enquanto Jocelito Canto sofria o desgaste da não-solução dos problemas
socioeconômicos pela administração municipal. O resultado foi a vitória eleitoral de
Péricles Mello em 2000. Porém a administração local do PT não foi bem-sucedida. O

13
Apesar de o Partido dos Trabalhadores apresentar todas as limitações já citadas, que impediram sua vitória
eleitoral em 1996, é preciso ressaltar que do ponto de vista político foi o partido que mais avançou nas eleições
de 1996 em Ponta Grossa, dando maiores possibilidades para a vitória em 2000. Pela primeira vez seu candidato
a Prefeito deixou a terceira posição para passar ao segundo lugar sem fazer alianças e concessões a outros
partidos políticos com representatividade. Péricles Mello ficou 12 mil votos à frente de Plauto Miró Guimarães
Filho – representante da elite política tradicional. A bancada do PT na Câmara Municipal triplicou, subindo de uma
para três cadeiras de um total de 21. Ficou acima da bancada do PSDB, partido do Prefeito eleito, que conseguiu
preencher apenas duas vagas. O PT igualou seu número de vereadores ao do PMDB, partido mais organizado e
com maior número de filiados no município, e ao do PFL em 1996. Naquelas eleições o partido contou com o apoio
de parte da elite econômica e de setores dos profissionais liberais – principalmente médicos – que não conseguia
sensibilizar em campanhas eleitorais. Essa aproximação de integrantes de camadas sociais superiores ao PT de
Ponta Grossa é um indicativo do realinhamento político na cidade. Além disso, profissionais liberais apresentam,
normalmente, maiores resistências à aceitação do discurso populista de solução fácil para todos os problemas
sociais.

144
Prefeito sofreu muitos desgastes durante a sua gestão, em especial com os grupos políticos
que tradicionalmente davam sustentação ao PT na cidade. Em 2004 o então Prefeito não
conseguiu reeleger-se. O resultado mostrou um novo realinhamento eleitoral, porém,
dessa vez, na direção do perfil dos tradicionais líderes políticos locais, com a eleição –
quase no primeiro turno – do então ex-Prefeito de Ponta Grossa, Pedro Wosgrau Filho,
um representante da elite tradicional governante da cidade.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BURNHAM, W. D. Critical Elections. New York: W.W. Norton, 1970.


HAM, C. & HILL, M. The Policy Process in the Modern Capitalist State. 2nd. ed. London:
Harvester Wheatsheaf, 1993.
IBGE. Pesquisa Nacional por amostragem domiciliar. Ponta Grossa: Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística, 1996.
IPARDES. Perfil econômico dos municípios do Paraná. Curitiba: Instituto Paranaense de
Desenvolvimento Econômico e Social, 1998.
KEY, V. O. A Theory of Critical Elections. Journal of Politics, n. 17, p. 3-18, 1955.

OUTRAS FONTES

JORNAL DA MANHÃ. Pesquisas de desempenho administrativo. Ponta Grossa, 1995.


TRE-PR. Base de dados primários da Seção de Divulgação de Resultados. Curitiba: Tribunal
Regional Eleitoral do Paraná, s/d.

145
146
CAPÍTULO SEIS

CLIENTELISMO ELEITORAL E
CORONELISMO POLÍTICO
ESTUDO DE UM PEQUENO MUNICÍPIO PARANAENSE
Alessandro Cavassin Alves

147
148
6. CLIENTELISMO ELEITORAL E
CORONELISMO POLÍTICO:
Estudo de um pequeno município paranaense1

I. INTRODUÇÃO

Este estudo refere-se ao processo político-eleitoral no pequeno município de


Itaperuçu, no Paraná, no período de 1992 a 2002. Ao observarmos a prática corrente da
política local, procuramos entender o seu funcionamento e o seu significado.
Revisando a literatura sobre a política em pequenos municípios, destacamos
desde o início o clássico estudo de Victor Nunes Leal, Coronelismo, enxada e voto – O
município e o regime representativo no Brasil, publicado pela primeira vez em 1949.
Nesse estudo, Leal busca entender o funcionamento da política no interior do Brasil, na
época da República Velha brasileira (1889-1930). Aí se encontra a definição mais clássica
do fenômeno do “coronelismo”, atrelado a uma estrutura agrária latifundiária.
A leitura desse ensaio e, posteriormente, as observações e análises de dados
levantados na cidade de Itaperuçu apresentaram semelhanças interessantes. Como poderia
uma antiga forma de dominação política persistir até os dias de hoje?
Ao aprofundar a literatura sobre o assunto, deparamo-nos com a variação do
uso e do sentido do conceito de “coronelismo” ao longo da história brasileira. Muitos
autores consideram extinto tal fenômeno2, enquanto outros buscam associá-lo às modernas
estruturas de dominação no Brasil3. Sabemos que o clientelismo é uma estrutura que
atravessa a história brasileira (NUNES, 1999); portanto, é tão antiga quanto o
“coronelismo”, ou mais. Porém, são práticas políticas distintas: a primeira refere-se ao
poder de mando de um chefe político em uma determinada localidade e sua barganha com
o governo estadual e federal; a segunda é uma estrutura que envolve um tipo de relação
entre atores políticos que trocam benefícios por apoio político e votos (CARVALHO,
1997).
1
Este capítulo é uma síntese de minha monografia de graduação em Ciências Sociais, defendida no Departamento
de Ciências Sociais da Universidade Federal do Paraná no início de 2003 sob a orientação do Professor Adriano
Nervo Codato. Gostaria de agradecer os comentários da banca examinadora, composta pelos professores Sérgio
Soares Braga e Christine de Alencar Chaves.
2
O ocaso do “coronelismo” é sustentado por Vilaça e Albuquerque (1978), Pang (1978), Dantas (1987),
Carvalho (1997), Saes (1998) e Farias (2000).
3
Representantes da possível identificação do “coronelismo” com a política atual seriam Janotti (1981) e Queiroz
(1997).

149
A pergunta refaz-se: como podem estruturas tidas como arcaicas persistir no
funcionamento de nossa democracia?
Neste capítulo, buscamos comparar as características políticas dos pequenos
municípios dominados por coronéis, como descritos por Leal (1997), com as observações
e análises realizadas no município de Itaperuçu (1992-2002). Assim, traçamos um pequeno
histórico deste último, destacando seus personagens e grupos políticos, bem como suas
interações e recursos para manterem-se no poder.
Procuramos entender ainda a variação do conceito do “coronelismo” na literatura
política brasileira. Para isso analisamos dois autores em particular, Maria Isaura Pereira
de Queiroz (1997) e Décio Saes (1998), tomando cuidado especial na sua definição e em
sua possível aplicação à realidade atual. Procuramos também distinguir “coronelismo” de
“clientelismo”.
Da mesma forma, estabelecemos a rede de compromissos que se forma entre o
poder local e os poderes estadual e federal. Adiantamos que esse compromisso dá-se por
meio da “transferência de votos” por parte dos políticos locais para os políticos “graúdos”
e do apoio que estes oferecem aos chefes políticos locais. Aqui, é importante frisar, como
Marcos Otávio Bezerra (1999, p. 17), que, ao estudar esse compromisso entre
parlamentares estaduais e federais com políticos locais, é fundamental analisar a dimensão
sociológica dessas trocas, isto é, examinar “as mediações necessárias para que os benefícios
sejam concedidos e os votos obtidos”. Na República Velha brasileira, esse era o
“compromisso coronelista”.
Propomos, por fim, repensar o fim do “coronelismo”, pois consideramos ser
importante testar evidências políticas “arcaicas” que ainda persistem em municípios
brasileiros apesar da consolidação da democracia representativa, da urbanização, da
expansão do trabalho assalariado, do voto livre etc. Talvez o “coronel”, latifundiário pré-
capitalista, que controla trabalhadores dependentes em suas terras, não exista mais. O
que observamos, e isso será melhor argumentado posteriormente, é que as características
contidas nesse sistema coronelista continuam a existir, isto é: os currais eleitorais, a
fidelidade ao “coronel” em época de eleição e a vinculação das escolhas eleitorais nos
vários níveis da eleição (estadual e federal); o “coronel” que apóia os candidatos governistas
nos níveis estadual e federal continua dando-lhes votos em troca de recursos; permanece
o medo das pessoas em “desrespeitar o chefe”; o “coronel” ainda é visto como o único
que pode trazer recursos ao município; mantêm-se prefeituras pouco técnicas, com o
empreguismo e favoritismo, contra o concurso público e a burocracia etc. (LEAL, 1997,
cap. 1).
Olavo Brasil de Lima Júnior afirmou, com propriedade, que “os estudos
abandonaram, mais recentemente, o município como unidade analítica” e que “[...] não se
sabe ao certo quão longe estamos dos ‘coronéis, das enxadas e dos votos’” (LIMA JR.
1999, p. 38). Daí a relevância do tema, pois há poucos estudos sobre o processo político
nos pequenos municípios, bem como a descrição de como esses microssistemas políticos
funcionam de fato.

150
Tendo como objetivo identificar as relações de poder em nível local, as hipóteses
de trabalho recaem sobre a sobrevivência de estruturas tidas como “arcaicas” na política
brasileira.
A pesquisa empírica contou com os dados eleitorais coletados no Tribunal
Regional Eleitoral do Paraná (TRE-PR), com as informações obtidas nas prefeituras e nas
câmaras de Vereadores de Itaperuçu e de Rio Branco do Sul, em jornais locais e em
entrevistas com eleitores no período de janeiro a outubro de 2002, além da bibliografia
voltada ao tema.
O trabalho, em princípio, parte do seguinte esquema de análise:

Esquema de análise 1
Relações políticas do clientelismo e do coronelismo
Eleitores Relaçlão de Prefeito ou chefe Relaçlão de Governo estadual
fiéis político local federal e
”clientelismo” ”coronelismo” parlamentares
Fonte: o autor.

A relação de clientelismo faz com que muitos eleitores tornem-se fiéis aos
chefes políticos municipais. Essa fidelidade faz do líder político local um chefe supremo
do município. Por sua vez, esses líderes locais conseguem vincular essa lealdade às suas
opções políticas estaduais e federais, transferindo, assim, uma porcentagem significativa
de votos a esses políticos. Esse é um esquema de poder local que lembra a relação de
“coronelismo” da República Velha brasileira.
Este trabalho não procura fazer grandes generalizações, afirmando por exemplo
que todo o eleitorado desse município está envolvido em uma relação de clientelismo ou
coronelismo. Porém, com a análise dos resultados eleitorais e de entrevistas, pudemos
constatar que tais relações possuem um peso muito grande e que devem ser levadas em
conta ao estudar-se o seu comportamento político.

II. CLIENTELISMO ELEITORAL E CORONELISMO POLÍTICO

II.1. Coronelismo, enxada e voto


Victor Nunes Leal descreve o “coronelismo” da seguinte forma: “O ‘coronelismo’
é sobretudo um compromisso, uma troca de proveitos entre o poder público,
progressivamente fortalecido, e a decadente influência social dos chefes locais, notadamente
dos senhores de terra. Não é possível, pois, compreender o fenômeno sem referência à
nossa estrutura agrária, que fornece a base de sustentação das manifestações de poder
privado ainda tão visíveis no interior do Brasil” (LEAL, 1997, p. 40).
As idéias destacadas desse conceito são que o “coronelismo” é um compromisso
entre chefes políticos locais, os coronéis, e o poder público (estadual e federal). O

151
coronel, como senhor de terras, pertence a uma estrutura agrária latifundiária e, em uma
base de “troca de proveitos” com o governo, mantém sua base de dominação nas pequenas
localidades com “manifestações de poder privado”, sustentando com votos, por sua vez,
o governismo.
Leal descreve, a partir desse conceito, os principais traços da vida política dos
municípios do interior e como se dá a liderança do coronel como chefe político local.
Algumas dessas características assemelham-se às existentes nos pequenos municípios
atuais. Por exemplo: a liderança indiscutível do coronel no âmbito local, “que comanda
discricionariamente um lote considerável de votos de cabresto” (idem, p. 42; grifos no
original). É inegável que nos pequenos municípios existem lideranças políticas que
conseguem mobilizar um grande número de votos para determinados candidatos por eles
apoiados. Isso se dá porque, segundo Leal, o coronel exerce ampla jurisdição sobre seus
dependentes, podendo ajudar a “todos” na hora do “aperto” (emprestar dinheiro, doar
cesta básica, arrumar remédio, fornecer consulta médica, ambulância, advogado etc.).
Outra característica apontada por Leal é que, pelo chefe político local, vem o “progresso”
para o município. As poucas melhorias do lugar (a escola, a estrada, o correio etc.), “tudo
exige seu esforço, às vezes um penoso esforço que chega ao heroísmo [...]. É com elas
que, em grande parte, o chefe municipal constrói ou conserva sua posição de liderança”
(idem, p. 58). Outras características descritas pelo autor e que se revelam atuais são a
concessão de favores pessoais de toda ordem por parte desses chefes políticos, o
paternalismo, o filhotismo (empreguismo) e “negar pão e água ao adversário” (idem,
p.60). Os “inimigos” políticos são discriminados em todo o período da gestão de seu
opositor, negando melhorias em suas ruas, transferindo ou demitindo funcionários de
“grupos contrários” etc. Enfim, características encontradas em muitos municípios atuais
– em especial, neste estudo em Itaperuçu.
Porém, o conceito de coronelismo passou por várias interpretações (Dantas,
1987; Janotti, 1981; Pang, 1987; etc.). A mais importante delas é a de Maria Isaura Pereira
de Queiroz (1997), que associa o coronel à sua capacidade de barganha eleitoral: “a
exigência de um coronel para que seus apaniguados votem em determinado candidato –
imposição muitas vezes sem apelo – tem como contrapartida o dever moral que o coronel
assume de auxiliar e defender quem lhe deu o voto” (idem, p. 163). A barganha eleitoral
é parte integrante das práticas de mando do coronel. O voto é um “bem de troca” para a
autora. Queiroz fundamenta ainda a estrutura coronelística na posse de bens de fortuna,
isto é, não é necessariamente a terra que faz um coronel, mas principalmente sua riqueza,
que poderá favorecer e “granjear clientela”.
Diferentemente, a interpretação de Décio Saes define o coronelismo apartir de
duas dimensões:“De um lado, a base infra-estrutural (dimensão econômica): o proprietário
de terras tem um poder econômico sobre o trabalhador a quem cede a posse da terra. De
outro lado, o traço superestrutural que lhe corresponde (dimensão ideológica): a
dependência pessoal, cujo fundamento é a cessão da posse da terra, exprime-se
ideologicamente como obrigação subjetiva de lealdade para com o senhor da terra, ou,
num nível mais diretamente político, como fidelidade ao chefe local” (SAES, 1998, p. 85;

152
sem grifos no original). Duas características importantes dessa definição: a dimensão
econômica, da propriedade da terra, e a dimensão ideológica, a dependência e a fidelidade
dos trabalhadores da terra ao coronel. A manipulação eleitoral que detém o coronel
provém de sua base social que são as relações de dominação e dependência pessoal,
devido a laços fundados na propriedade da terra, em uma base pré-capitalista em que o
voto ainda não é objeto comercial, e não da barganha eleitoral, como afirmava Maria
Isaura Pereira de Queiroz. Para Saes, no coronelismo não se compra o voto, ele é cedido
ao coronel graças à situação de fidelidade em que se encontra inserido o “eleitor”.
Diante dessas duas interpretações sobre o coronelismo, nossa posição é a de
que a base social do coronel fundamenta-se muito mais na relação de dominação que gera
dependência pessoal (SAES, 1998) do que na barganha eleitoral (QUEIROZ, 1997). Quando
a barganha é utilizada, isso significa principalmente a desestruturação do “coronelismo”.
Isso tudo em um sistema rural, latifundiário – que é a base econômica do “coronelismo”.
A interpretação de Saes, nesse sentido, parece ser bem mais coerente devido a inúmeros
outros estudos que demonstram a maior importância da dominação como característica
própria do coronelismo do que da barganha. Seria, então, o fim do coronelismo?

II.2. Fim do coronelismo?


Para discutir o fim do fenômeno do coronelismo, destacamos, entre muitos
autores, o artigo de Francisco Farias (2000), que chega à conclusão de que o coronelismo,
como sistema político, não existe mais. Há sim a ascensão do clientelismo como prática
política dominante.
Farias ressaltava os aspectos dessa mudança política e as “razões da ascensão
do clientelismo” e da queda do coronelismo. Isso se deu principalmente devido às seguintes
razões: a transformação da estrutura agrária regional; a substituição da grande propriedade
agrária pré-capitalista (absorvedora de um enorme contingente de trabalhadores
dependentes do dono da terra) pelas formas de propriedade capitalista, mais moderna,
com menos trabalhadores; a modernização dos latifúndios; os projetos governamentais
de apoio à pequena produção, como a agricultura familiar, projetos de empréstimo de
dinheiro a pequenos agricultores diretamente do governo federal e não por intermédio de
um “coronel”; a urbanização em contraposição ao espaço rural (característico do
coronelismo); a liberdade do mercado de trabalho (em oposição à sujeição pré-capitalista
do campo); as políticas comunitárias e clientelismo estatal, definido como “a modalidade
de clientelismo na qual os ‘políticos de profissão’ distribuem recursos ‘públicos’ e favores
ligados às instituições governamentais, em troca de sustento eleitoral” (Caciagli apud
FARIAS, 2000, p. 59). “Políticos de profissão” destinam recursos diretamente a
comunidades e líderes comunitários em troca do voto e não mais a “coronéis”.
Para compreender melhor seus argumentos, elaboramos um quadro-síntese
de como se dá essa transição do “coronelismo” para o clientelismo, em que as caracterís-
ticas da primeira coluna não mais subsistem nas práticas político-eleitorais de uma sub-
região do Piauí, local em que Farias fez seu estudo:

153
Quadro 1
Características do coronelismo e clientelismo
CORONELISMO CLIENTELISMO
Voto de cabresto: votar no “coronel” e nos Voto livre: os eleitores podem desvincular o
candidatos apoiados por ele. voto no candidato a Prefeito das opções
partidárias desse candidato em outros níveis
Há aqui uma fidelidade ao coronel que implica a da eleição. Este voto se traduz, na maioria
vinculação das escolhas nos vários níveis da dos casos, no voto de barganha, que assume
eleição. uma forma sofisticada por meio do
associativismo (associações locais dominadas
por cabos eleitorais).
Currais eleitorais. Multiplicidade de Partidos. Pluralismo concor-
Caráter não concorrencial nas eleições. rencial, exigindo recursos financeiros dos Par-
Predomínio da opção eleitoral do coronel. tidos e candidatos no convencimento dos elei-
tores.
Local de votação: zona urbana. Trabalhadores Local de votação: vários locais. Maior ação de
(eleitores) dependiam da condução, da roupa, cabos eleitorais. Locais de votação espalhados
da alimentação oferecida pelos coronéis nos por todas as localidades do Brasil.
dias de eleição. As eleições como festas. E
ainda havia o ‘bico de pena’ = fraudes eleitorais.
Políticas Sociais. Constituição de 1988.
Municípios pobres e dependentes. O coronel Municípios mais autônomos, mais ricos.
trazia recursos e fazia obras. A Prefeitura realiza as obras para garantir o
Uma associação entre os feitos públicos como apoio de seus eleitores.
obras do coronel.
Prefeituras pouco técnicas. Prefeituras mais técnicas.
Os empregos eram indicados pelo coronel Concurso público; obras feitas pela
(filhotismo). administração da Prefeitura.
Favoritismo. Crescimento dos partidos de esquerda.
Recursos estatais eram propriedades da facção Cabos eleitorais identificados com a política
governante, dos coronéis. comunitária. A esquerda fiscalizando as obras
da Prefeitura.
Fonte: Farias (2000, passim) elaboração do autor.

Procuramos ilustrar o enfoque sobre o clientelismo com o estudo das práticas


político-eleitorais em uma sub-região do Piauí, cujo processo de mudança
política é representativo do que vem ocorrendo em grande parte do Nordeste
rural brasileiro. Chegamos à conclusão básica de que, na área pesquisada,
impôs-se, na década de 1990, a desagregação do coronelismo (voto de cabresto,
confusão entre as esferas pública e privada) e a sua substituição pelo

154
clientelismo (voto de barganha, distinção normativa entre o público e o privado)
(idem, p. 53; grifos no original).

Tornam-se claros, para o autor, os aspectos da mudança política com o fim do


“coronelismo” e a ascensão do clientelismo. Porém nas considerações finais desse capítulo
iremos discordar de alguns pontos sobre o “fim do coronelismo” proposto por Farias.

II.3. O estudo do clientelismo


Este capítulo também busca entender o conceito de “clientelismo”. Edson Nunes
identifica este tipo de fenômeno político como uma estrutura que atravessa a história
brasileira:

O clientelismo é um sistema de controle do fluxo de recursos materiais e de


intermediações de interesses, no qual não há número fixo ou organizado de
unidades constitutivas. As unidades constitutivas do clientelismo são
agrupamentos, pirâmides ou redes baseados em relações pessoais que
repousam em troca generalizada. As unidades clientelistas disputam
freqüentemente o controle do fluxo de recursos dentro de um determinado
território. A participação em redes clientelistas não está codificada em nenhum
tipo de regulamento formal; os arranjos hierárquicos no interior das redes
estão baseados em consentimento individual e não gozam de respaldo jurídico.
Ao contrário do corporativismo, que é baseado em códigos formais legalizados
e semi-universais, o clientelismo se baseia numa gramática de relações entre
indivíduos, que é informal, não legalmente compulsória e não-legalizada
(NUNES, 1999, p. 40-41).

A definição acima remete a um sistema de controle assimétrico, com redes


clientelistas informais, sem regulamento, em que a amizade, as relações pessoais, o
“jeitinho” são elementos importantes que as compõem.
Marcos Otávio Bezerra (1999, p. 16) destaca que os estudos sobre patronagem
e clientelismo distribuem-se em duas linhas de interpretação: 1) para as teorias
modernizantes, essas relações são interpretadas como “tradicionais” e em vias de
desaparecer com o surgimento de instituições políticas “modernas”; 2) num outro registro,
são consideradas relações de complemento, adendum, que aparecem para cobrir lacunas
(gaps) e falhas dessas instituições políticas e que também tendem a desaparecer. O autor,
porém, analisa da seguinte forma esses conceitos: “A consideração da patronagem e do
clientelismo como relações dotadas de uma certa autonomia e racionalidade é um passo
importante para a análise aqui desenvolvida, uma vez que abre a possibilidade para se
pensar nas trocas de serviços, favores, apoios, votos e lealdades entre parlamentares,
lideranças políticas locais e autoridades governamentais não como sobrevivência de
relações pretéritas ou mecanismos que cobrem certas falhas, mas como relações
constitutivas do universo político” (ibidem). Citando novamente o autor:

155
Como sugerido acima, estas análises têm dado destaque à idéia de que o
clientelismo implica troca de benefícios públicos por apoio político e votos. Se
o cálculo político-eleitoral é um dos elementos desta relação, ele, entretanto,
não é o único presente. O fato da troca de benefícios e apoio (ou votos)
constituir um momento de uma relação mais ampla entre os atores envolvidos
ou instituir obrigações morais entre eles não são aspectos considerados. De
modo geral, o que parece evidente é que predomina uma perspectiva,
reducionista a meu ver, que tende a mercantilizar estas trocas. Elas são tratadas
de modo mecânico, utilitarista e tornam-se uma espécie de toma-lá-da-cá.
Desse modo, predomina a fórmula: benefícios públicos são retribuídos com
votos. Neste caso, a dimensão propriamente sociológica dessas trocas é deixada
de lado. Assim, as mediações necessárias para que os benefícios sejam
concedidos e os votos obtidos não chegam a ser examinados. Entre outros
aspectos, não é levado em conta o intervalo de tempo que existe entre a
concessão dos favores ou benefício público e os votos, por conseguinte, as
práticas – como as que são responsáveis pela demonstração de interesse na
continuidade da relação (correspondências, pequenos favores, visitas etc.) –
que se interpõem entre estes atos. Some-se a isso o fato de que ao se dar
ênfase à troca de benefícios públicos por apoio e voto, ignora-se que a mesma
ocorre num contexto complexo onde estão em jogo a busca de prestígio,
poder e o cumprimento de obrigações formais e morais (idem, p. 16-17; sem
grifos no original).

Ao estudar as práticas políticas em Itaperuçu, procuramos, assim como Bezerra


alerta, salientar que é necessário não reduzir o clientelismo a simplesmente “benefícios
públicos em troca de votos”, mas observar as mediações entre os políticos e os seus
eleitores e entre políticos locais e os políticos estaduais ou federais, que implicam a
mercantilização das relações políticas. São relações amplas entre os atores envolvidos
que geram obrigações morais em que o voto é apenas uma conseqüência. Como afirma o
autor, são as relações clientelistas mantidas por políticos, ao longo de toda sua carreira,
que fazem instituir essas obrigações morais no eleitor para com esse chefe político, da
mesma forma que na República Velha o eleitor votava no candidato do “coronel” porque
vivia em suas terras, “devia-lhe a vida”. Hoje também, apesar da liberdade do voto, o chefe
político local cria junto aos eleitores laços de dependência pessoal que devem ser analisados.
Por exemplo, em Itaperuçu pudemos constatar, por meio de entrevistas e conversas
informais, essa “relação clientelista” de eleitores com determinados políticos, evidenciando
uma conexão mais ampla do que a simples troca de benefícios entre eles. Havia, o que
Bezerra destaca, a obrigação moral do eleitor para com o político, constituída por
mediações diversas.
De posse desses dois conceitos clássicos da literatura política – clientelismo e
coronelismo –, passamos a analisar os grupos políticos em Itaperuçu.

156
III. O MUNICÍPIO DE ITAPERUÇU

Itaperuçu foi emancipado politicamente pela Lei Estadual nº 9.437, de 9 de


novembro de 1990, assinada pelo Presidente da Assembléia Legislativa Aníbal Khury e
publicada no Diário Oficial do Estado do Paraná em 10 de dezembro desse ano (a data de
comemoração municipal é 10 de dezembro), desmembrando-se do município de Rio
Branco do Sul, após aprovação por plebiscito pela comunidade local. Sua sede municipal
foi instalada em 1º de janeiro de 1993.
O processo de emancipação de Rio Branco do Sul deu-se por iniciativa do
Deputado Estadual Aníbal Khury e pelo então Presidente da Câmara de Vereadores de Rio
Branco do Sul, Manoel Joekel, residente em Itaperuçu e único Vereador do Distrito na
legislatura de 1989-1992.
Na história política de Rio Branco do Sul, instituído como Vila desde 1871, poucos
foram os moradores de Itaperuçu que chegaram a um cargo eletivo público. Não houve
nenhum Prefeito que morasse em Itaperuçu e houve poucos Vereadores itaperuçuenses até
1992. Podemos lembrar Benedito Pedroso de Moraes, Zacarias Stresser e o próprio Manoel
Joekel, Vereadores de Rio Branco do Sul e moradores no então Distrito de Itaperuçu.
Na história de Rio Branco do Sul (CONHEÇA RIO BRANCO DO SUL, 2001),
constata-se que muitas das primeiras famílias de Itaperuçu eram descendentes de
riobranquenses (como as famílias Pedroso de Moraes, Furquim, Stresser). Posteriormente,
com famílias provenientes de municípios vizinhos, como Colombo, Curitiba, entre outros,
passou-se a ter uma movimentação e participação política mais consistente no município.
Itaperuçu, apesar de ter pertencido a Rio Branco do Sul, maior produtor de
cimento na região Sul do Brasil4, sempre foi uma localidade considerada de baixo nível de
renda e de economia rural5.

III.1. Grupos políticos em Itaperuçu


Da emancipação política do município até o ano 2002, formaram-se grupos
políticos com lideranças distintas. Quando as pessoas referiam- se à disputa política em
Itaperuçu, logo duas figuras eram as mais citadas: Manoel Joekel e Gentil Paske de Faria.
Ficava claro que eram elas as principais lideranças políticas locais e cada qual possuía e
seus aliados.
Marcos Lanna (1995) salienta que a oposição entre dois grupos “é fundamental
nos estados nordestinos” (Lewin apud LANNA, 1995, p. 87). Isso se dá também no nível

4
“A marca Votoran, inconfundivelmente associada a cimento e argamassas de alta qualidade, exerce forte liderança,
com participação de 42% no mercado cimenteiro do Brasil [...]. Acumulando experiência de cinco décadas, alta
tecnologia e qualidade nos serviços de pré e pós-venda, a Cimento Rio Branco S/A é líder na Região Sul, com
participação de 66% no mercado” (CONHEÇA RIO BRANCO DO SUL, 2001, p. 9).
5
Como demonstram os dados de Índice de Desenvolvimento Humano, Itaperuçu é um dos municípios mais
pobres do Paraná, encontra-se na 381ª posição, com renda per capita de R$ 133,47, medida no ano 2000
(IPARDES, 2005). A economia do município gira em torno da madeira (pinus e bracatinga), de frutas (como a
poncã), da agricultura (principalmente de feijão e de milho) e da extração do calcário.

157
local, “nos municípios assim como nos distritos, onde facções concorrentes são formadas
a partir das alianças feitas no nível estadual (e vice-versa). Isto é, os grupos políticos
locais definem-se em relação às posições assumidas por ‘políticos graúdos’, como
deputados”. E ainda, “por outro lado, ‘facções surgem com a criação de município’, o que
deve ser ‘correlacionado com a emergência de um coronel, que age ao mesmo tempo
como líder civil e empresário’” (Gross apud LANNA, 1995).
Os dois líderes políticos locais formaram ao longo da curta história de Itaperuçu
seus grupos e ambos conseguiram chegar ao comando político do município.
Tabela 1
Prefeitos de Itaperuçu (1993-2002)
PREFEITO PARTIDO POLÍTICO GESTÃO
Manoel Joekel PTB 1993-1996
Gentil Paske de Faria PSDB 1997-2000
Rosa Chevônica Joekel PSL-PMDB 2001-2004
Fonte: TRE-PR (s/d).
Notas:
1. Rosa Chevônica Joekel (PSL) é esposa de Manoel Joekel (PMDB).
2. PTB: Partido Trabalhista Brasileiro; PSDB: Partido da Social-democracia Brasileira; PSL: Partido Social Liberal;
PMDB: Partido do Movimento Democrático Brasileiro.

III.1.1. Grupo político I – Manoel Joeckel


Manoel Joekel, morador de Itaperuçu, empresário madeireiro, proprietário de
terras, é um político de tradição na região. Foi eleito Vereador pelo Município de Rio
Branco do Sul para as legislaturas 1983-1987 e reeleito em 1988-1992, além de líder
fundador do processo de emancipação de Itaperuçu em 1990, quando era o Presidente da
Câmara de Vereadores de Rio Branco do Sul. Primeiro Prefeito de Itaperuçu em 1992, nas
eleições de 2000 elegeu sua esposa Rosa Chevônica Joekel Prefeita, e seu filho José João
Joekel Vereador e Presidente da Câmara Municipal de Itaperuçu. Outro fato a salientar é a
presença de seu sobrinho Vereador Josmar Ezekiel Joekel Vaz na legislatura 1993-1996,
e da cunhada de Manoel Joekel, Aracy Sabadin Vaz, eleita Vereadora para o período de
2000-2004, mãe de Josmar E. Joekel Vaz.

III.1.2. Grupo político II – Gentil Paske de Faria


Gentil Paske de Faria é natural de Itaperuçu e empresário madeireiro. Seu
histórico político é o seguinte: Candidato a Vereador pelo Partido dos Trabalhadores (PT)
em Rio Branco do Sul em 1988, foi o mais votado do partido, mas não se elegeu (333
votos); participava dos movimentos católicos de base em Itaperuçu. Em 1992 saiu como
candidato a Prefeito de Itaperuçu pelo PMDB e obteve o segundo lugar, conseguindo
superar o ex- Vereador de Rio Branco do Sul e também morador de Itaperuçu Benedito
Pedroso de Moraes, que ficou em terceiro lugar nessa eleição, o que consolidou o seu
nome para as eleições de 1996. Em 1996 elegeu-se Prefeito, em uma vitória apertada.
Tendo como vice-Prefeito Cezar Luiz Benatto (ex-candidato a Vereador pelo PT em 1988

158
em Rio Branco do Sul e que obteve 239 votos), em 2000 não conseguiu reeleger-se,
perdendo por apenas 110 votos.

III.1.3. Os vereadores de Itaperuçu


Em relação aos representantes do poder Legislativo, são nove Vereadores eleitos
para cada gestão. O que percebemos por meio do estudo das coligações que se formaram
para disputar as eleições no município de Itaperuçu e seu arranjo político pós-eleição é que
os candidatos a vereadores juntam-se em torno das lideranças que disputam as eleições
majoritárias (os grupos políticos) e depois de eleitos, mesmo por coligações contrárias,
acabam apoiando o Prefeito vencedor. Com raras exceções um Vereador eleito mantém-se
fiel à coligação eleitoral derrotada. A oposição, politicamente organizada em partidos políticos
é portanto praticamente nula. Os Vereadores organizam-se muito mais em volta de Prefeitos
do que em instituições partidárias organizadas.
Quadro 2
Vereadores eleitos em Itaperuçu
VEREADORES 1993-1996 VEREADORES 1997-2000 VEREADORES 2001-2004
1. Antônio Portes de Barros (PTB) 1. João Lapola de França (PMDB) 1. João Moraes de Lara
2. Genesio Clerice (PTB) 2. Jair Leonardo da Costa (PPB)
(PSDB) 2. Osmario de Bonfim
Castro (PSDB)
3. Jair Leonardo da Costa (PST) 3. Osmario de Bonfim Castro 3. Gerson Ceccon (PDT)
(PTB)
4. Vidal de Lara Costa (PMDB) 4. Manoel Alves dos Santos 4. Isael de Castro França
(PFL) (PDT)
5. João Bueno de Castro (PSDB) 5. Valdemiro Batista (PDT) 5. Manoel Alves dos Santos
6. Josmar Ezekiel Joekel 6. Edilson José Bueno (PMDB) (PMDB)
Vaz (PSDB) 6. José João Joekel (PSL)
7. Juvenal dos Santos (PFL) 7. Mauri Bortoluzzi (PTB) 7. Mauri Bortoluzzi (PPB)
8. Ivo da Silva (PMDB) 8. Ivo da Silva (PFL) 8. João Lapola de França
9. Adimir José Tomé de 9. Antônio Ferreira dos Santos (PPB)
Oliveira (PSDB) (PMDB) 9. Aracy Sabadin Vaz (PFL)
Fonte: TRE-PR (s/d).
Notas:
1. Os vereadores estão listados por ordem de votação.
2. PPB: Partido Progressista Brasileiro; PST: Partido Social Trabalhista; PDT: Partido Democrático Trabalhista; PFL:
Partido da Frente Liberal.

IV. POLÍTICAS LOCAL, ESTADUAL E FEDERAL: UMA REDE DE


COMPROMISSOS

Outro fator importante para compreender-se politicamente os pequenos


municípios é a rede de compromissos que se forma entre políticos locais e políticos
estaduais e federais, construída pelo clientelismo e constituída por mediações diversas

159
entre o político municipal e o político “graúdo”.
No coronelismo, esse sistema era representado pelos coronéis que comandavam
pequenos municípios e tinham à sua disposição eleitores fiéis que, além de votarem para
si e para seus candidatos locais, votavam também “com ele” em nível estadual e federal,
conseguindo assim obter apoio do governo. Como exemplo, Leal lembra que “É sabido
que os serviços públicos do interior são deficientíssimos, porque as municipalidades não
dispõem de recursos para muitas de suas necessidades. Sem o auxílio financeiro do
Estado, dificilmente poderiam empreender as obras mais necessárias, como estradas,
pontes, escolas, hospitais, água, esgotos, energia elétrica. Nenhum administrador municipal
poderia manter por muito tempo a liderança sem realizar qualquer benefício para sua
comuna” (LEAL, 1997, p. 65-66).
Hoje, os municípios do interior ainda não sobrevivem sem o auxílio do Estado.
Por isso, por meio da intermediação entre o político local com parlamentares das esferas
estadual e federal, recursos extra-orçamentários tornam-se mais acessíveis às lideranças
locais, consolidando a sua força política e ampliando as bases eleitorais dos parlamentares.
Em entrevista, um ex-funcionário da Prefeitura de Itaperuçu relatou que com o
auxílio de verbas estaduais e federais muitas melhorias foram feitas nos bairros de Itaperuçu.
Essas verbas eram obtidas por meio da ação do Deputado Federal Basílio Vilani (PSDB),
então membro da Comissão Mista de Orçamento. Ele citou uma creche, uma cancha coberta
poliesportiva, uma ponte sobre o rio Açungui no interior do município e outras obras
realizadas com recursos federais. Algumas foram financiadas com verbas estaduais, obtidas
por meio do Deputado Estadual Cleiton Kielse (PFL), como asfalto, Casa Lar etc.
Para Marcos Otávio Bezerra, “o foco nesse lado da atuação parlamentar mostra
que, a partir do acesso às instituições do poder público, como o orçamento da União, são
construídos os fundamentos do poder local do parlamentar e explicita-se o seu lugar na
rede de relações que vincula políticos atuando nas dimensões municipal, estadual e federal”
(BEZERRA, 1999, p. 256). Trata-se de uma rede de relações, entre o político local e o
político estadual e federal, construídas por meio de mediações diversas, como visitas,
cartas, presentes, viagens, festas, que se reflete no resultado eleitoral municipal, formando
os “fundamentos do poder local do parlamentar”, mas, principalmente, reforçando os
fundamentos do poder do político municipal.

IV ransferência de votos6
.1. TTransferência
IV.1.
Nas tabelas abaixo demonstramos como a opção política dos dois principais
líderes locais (no caso de Itaperuçu, Manoel Joekel e Gentil Paske de Faria) condiciona o
resultado eleitoral no município. Também destacamos a presença de cabos eleitorais que
trabalham em favor de outros candidatos e conseguem uma porcentagem significativa de
votos, porém menor do que a obtida pelos principais líderes políticos do município (no

6
“Transferência de votos” significa neste trabalho uma característica do coronelismo em que o coronel possui
um “lote de votos de cabresto” que destina aos políticos governistas por ele apoiado. São os eleitores fiéis do
coronel, fidelidade essa mantida por favores, cargos públicos, parentesco etc. Cf. o Esquema de análise 1, acima.

160
caso das tabelas abaixo: vereadores Osmário Bonfim e José Saruva, líderes evangélicos e
líderes do PT de Itaperuçu).
As tabelas são divididas em candidato, número de votos, porcentagem dos
votos válidos e apoio recebido por parte de um líder ou grupo político de Itaperuçu.
Quando a linha de apoio estiver em branco é porque não se identificou ao certo quem
apoiou ou não houve um posicionamento específico das lideranças políticas locais.
As tabelas trazem os resultados eleitorais dos candidatos mais votados no
município de Itaperuçu para deputados Federal e Estadual nas eleições de 1994, 1998 e
2002. O critério adotado para essa seleção é o maior número de votos conseguidos e uma
porcentagem significativa.

Tabela 2
Eleição para Deputado Federal em Itaperuçu (1994)
CANDIDATOS A DEPUTADO FEDERAL Nº DE VOTOS % VOTOS APOIO
Luciano Pizzatto (PFL) 1.307 32,72% Manoel Joekel
Afonso Camargo Neto (PPR) 432 10,84% -
Abelardo Lupion Mello (PFL) 430 10,79% -
Paulo Roberto Cordeiro (PTB) 357 8,95% -
Fonte: TRE-PR (s/d).
Nota: PPR: Partido Progressista Reformador.

Tabela 3
Eleição para Deputado Estadual em Itaperuçu (1994)
CANDIDATOS A DEPUTADO ESTADUAL Nº DE VOTOS % VOTOS APOIO
Anibal Khury (PTB) 1.451 28,10% Manoel Joekel
Carlos X. Simões (PFL) 1.184 22,93% -
Horacio Rodrigues Sobrinho (PL) 979 18,96% -
Fonte: TRE-PR (s/d).

Tabela 4
Eleição para Deputado Federal em Itaperuçu (1998)
CANDIDATOS A DEPUTADO FEDERAL Nº DE VOTOS % VOTOS APOIO
Basílio Vilani (PSDB) 1.928 28,91% Gentil Paske
Luciano Pizzatto (PFL) 995 14,92% Manoel Joekel
Íris Simões (PTB) 894 13,40% -
R. Stephanes (PFL) 539 8,07% Ver. Osmário B.
Padre Roque (PT) 305 4,57% PT local
Fonte: TRE-PR (s/d).

161
Tabela 5
Eleição para Deputado Estadual em Itaperuçu (1998)
CANDIDATOS A DEPUTADO ESTADUAL Nº DE VOTOS % VOTOS APOIO
Anibal Khury (PFL) 2.429 32,35% Manoel Joekel
Cleiton Kielse B. Crisóstomo (PFL) 2.384 31,75% Gentil Paske
Carlos X. Simões (PTB) 710 9,46% -
Fonte: TRE-PR (s/d).

Tabela 6
Eleição para Deputado Federal em Itaperuçu (2002)
CANDIDATOS A DEPUTADO FEDERAL Nº DE VOTOS % VOTOS APOIO
José Janene (PPB) 1.631 14,60% Manoel Joekel
Íris Simões (PTB) 1.376 12,32% Gentil Paske
Reinhold Stephanes (PMDB) 1.080 9,67% Ver. Osmário B.
Takayama (PTB) 905 8,10% Evangélicos
Afonso Camargo Neto (PSDB) 761 6,81% -
Justino Costa Rosa (PL) 662 5,93% População
Irineu Colombo (PT) 578 5,17% PT local
Assis do Couto (PT) 491 4,39% Sindicato Cresol
Fonte: TRE-PR (2002).
Nota: Justino Costa Rosa é natural de Rio Branco do Sul, município vizinho de Itaperuçu e, portanto,
um candidato local a Deputado Federal.

Tabela 7
Eleição para Deputado Estadual em Itaperuçu (2002)
CANDIDATOS A DEPUTADO ESTADUAL Nº DE VOTOS % VOTOS APOIO
José Augusto Liberato (PT) 2.609 23,13% PT local
Nelson Justus (PFL) 1.957 17,35% Manoel Joekel
Delegado Bradock (PMDB) 1.937 17,17% José Saruva
Carlos Simões (PTB) 1.029 9,12% Gentil Paske
Vanderlei Iensen (PDT) 303 2,69% Evangélicos
Edson Strapasson (PMDB) 281 2,49% -
Fonte: TRE-PR (2002).
Nota: José Augusto Liberato é natural de Itaperuçu. Pela primeira vez o município teve um candidato
próprio para disputar o cargo de Deputado Estadual. Fato curioso é que conseguiu superar os
candidatos de Manoel Joekel e Gentil Paske, com expressiva votação. Essa votação não parece
identificar-se ideologicamente com o PT, mas com o fato de que José Augusto era um personagem
de prestígio local. José Augusto e Mirian Bini, ambos filiados ao PT, são lideranças partidárias
importantes nesse microssistema político.

162
Queremos demonstrar com as informações acima que o apoio de lideranças
políticas locais é um fator decisivo para a vitória eleitoral de um Deputado Estadual ou
Federal no nível local.
As tabelas revelam pontos importantes da política em Itaperuçu. Comentemos
os resultados eleitorais dos candidatos a Deputado Federal. Gentil Paske de Faria (gestão
1997-2000) apoiou nas eleições de 1998 o candidato a Deputado Federal Basílio Vilani,
que já o tinha apoiado em sua candidatura a Prefeito (1996). Entre Vilani e Paske certamente
se criou uma relação política que vai além da simples troca de favores, como descreve
Bezerra (1999), e que envolve um apoio institucional, eleitoral etc. Por meio desse
Deputado, verbas foram para o município. Nessa relação política, como demonstra a
Tabela 4, Basílio Vilani conseguiu quase 29% dos votos válidos para Deputado Federal em
Itaperuçu em 1998. Essa porcentagem é significativa, pois evidencia a capacidade de
“transferência de votos” de Paske para o “seu” Deputado Federal. Paske não é um simples
cabo eleitoral, mas um político influente que consegue mobilizar toda uma base eleitoral
em favor de um candidato específico. Em 2002, Gentil Paske, fora da Prefeitura, conseguiu
mobilizar votos para o candidato a Deputado Federal Iris Simões (PTB), que foi o segundo
mais votado em Itaperuçu. Um fato interessante é que, nas eleições de 1994, Basílio Vilani
(PPR), candidato a Deputado Federal, sem o apoio de Gentil Paske, obteve em Itaperuçu
11 votos (0,28%). Quatro anos depois, foi o mais votado do município. No ano de 2002
Basílio Vilani não se candidatou.
Tabela 8
Resultados Eleitorais de Basílio Vilani em Itaperuçu (1994 e 1998)
1994 1998
Número de votos 11 votos 1.928 votos
Fonte: TRE-PR (s/d).

O candidato a Deputado Federal Luciano Pizzatto (PFL) foi apoiado por Manoel
Joekel em 1994, quando obteve 1.307 votos, e em 1998 recebeu 995 votos. Pizzatto, nas
eleições de 2002, foi candidato a Senador, sendo o segundo mais votado do município. Na
última eleição, Joekel transferiu seus votos para o candidato a Deputado Federal José
Janene (PPB), com 1.631 votos, quem, nas eleições de 1994, obteve apenas um voto
(0,03%) em Itaperuçu. Portanto, um enorme salto de 1994 a 2002.

Tabela 9
Resultados Eleitorais de José Janene em Itaperuçu (1994 e 2002)
1994 2002
Número de votos 1 voto 1.631 votos
Fonte: TRE-PR (s/d).

163
Outro caso de transferência de votos foi para Reinhold Sthephanes (PMDB),
que obteve apenas nove votos em 1994, mas com o apoio do Vereador Osmário Bonfim
obteve 539 votos em 1998 e 1.080 votos em 2002. É interessante observar também a
atuação dos cabos eleitorais, como indicava Paul Singer (1965), importantes atores para
a compreensão do processo eleitoral. Por exemplo, a organização dos membros do
Diretório Municipal do PT de Itaperuçu apoiou em 1998 o candidato a Deputado Federal
Padre Roque (PT), que obteve 4,57% dos votos válidos. Em 2002 conseguiram 5,17%
para o candidato Irineu Colombo (PT).
Esses dados demonstram o quanto é importante o apoio de um político local
para que determinado candidato a cargo estadual ou federal possa ter uma porcentagem
considerável de votos.
A análise mais interessante gira em torno do apoio dado aos deputados estaduais.
Nas eleições de 1998, Cleiton Kielse (PFL) obteve apoio de Gentil Paske e Anibal Khury
(PFL) por parte de Manoel Joekel. Em 2002, Paske apoiou Carlos Simões (PTB) e Joekel
apoiou Nelson Justus (PFL).
Para os candidatos a deputados estaduais, os políticos locais empenham-se
mais na busca do voto. O motivo destacado por Bezerra (1999) é a maior proximidade
entre eles, facilidade do contato, troca de favores diversos, verbas extras para obras etc.
Portanto, há mais empenho e recursos financeiros aplicados na campanha por parte dos
políticos locais (pagavam-se luz e água, promoviam-se festas e comícios, um número
maior de propagandas desses candidatos circulava na cidade). Em 1998, no imaginário
popular, os dois principais concorrentes a candidatos a Deputado Estadual em Itaperuçu,
Cleiton Kielse (PFL) e Anibal Khury (PFL), eram “inimigos”: afinal, “um era do Gentil e o
outro do Manoel”, como afirmou um eleitor. Detalhe: ambos os candidatos a Deputado
Estadual concorreram pelo PFL, ou seja, ambos eram governistas. Nessa disputa, eles
conseguiram aproximadamente 64% dos votos válidos para Deputado Estadual em Itaperuçu
(cf. Tabela 5). Mas note bem: discordamos de Paul Singer sobre a questão de cabos
eleitorais, pois ele reduz a isso toda a influência desses políticos e seus grupos locais,
considerando-os meros cabos eleitorais de políticos “maiores”. Hoje as eleições são
livres e competitivas, mas é a fidelidade ao “coronel” que ainda persiste, uma fidelidade
que garante “prestígio político” e transfere votos a candidatos governistas. É a continuidade
do “voto de cabresto” em microssistemas políticos.
Outros dados comparativos interessantes para Deputado Estadual em Itaperuçu:
em 1994, Nelson Justus (então no PTB, depois no PFL) obteve 12 votos; em 2002, com a
ajuda de Manoel Joekel, obteve 1.957 votos. O mais interessante é o histórico da votação
de Cleiton Kielse (PMDB em 1994, mais tarde no PFL) em Itaperuçu, pois em 1994 obteve
88 votos; em 1998, com o apoio de Gentil Paske, conseguiu 2.384 votos, mas em 2002,
sem o apoio dessa liderança política local, voltou a obter 93 votos. Na eleição de 2002 um
carro de som do “Deputado Kielse” jogava nas ruas de Itaperuçu propagandas e panfletos
explicativos de todas as verbas e conseqüentes obras conseguidas por ele no período
1998-2002 para o município. Mesmo com todas essas informações, poucos eleitores
itaperuçuenses votaram em Kielse.
164
Tabela 10
Resultados Eleitorais de Nelson Justus em Itaperuçu (1994 e 2002)
1994 2002
Número de votos 12 votos 1.957 votos
Fonte: TRE-PR (s/d; 2002).

Tabela 11
Resultados Eleitorais de Cleiton Kielse em Itaperuçu (1994, 1998 e 2002)
1994 1998 2002
Número de votos 88 votos 2.384 votos 94 votos
Fonte: TRE-PR (s/d; 2002).

Aníbal Khury (no PTB em 1994 e no PFL em 1998) foi um político influente na
região. Nas duas primeiras eleições do município, Khury foi o candidato mais votado a
Deputado Estadual, com 1.451 votos em 1994 e 2.429 votos em 1998. Inaugurou inúmeras
obras em Itaperuçu, como pontes, escolas, postos de saúde, em uma rede de compromissos
com o líder político local Manoel Joekel dando-lhe “carta branca”, que assim retribuía
transferindo votos a esse político estadual. Com o falecimento de Khury, Nelson Justus
passou a ser um dos deputados de apoio de Manoel Joekel. Entre Khury e Joekel havia,
sem dúvida, inúmeras mediações pessoais e políticas.
Concluindo, retomamos a hipótese inicial deste trabalho que é o Esquema de
análise 1, em que políticos locais mantêm eleitores fiéis por meio da relação clientelista,
conseqüentemente formando “cidadãos no cabresto”, que votam segundo sua indicação,
caracterizando um comportamento eleitoral no estilo coronelista.

V. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este capítulo é uma discussão com Victor Nunes Leal. As características que Leal
descreve sobre a vida política do interior do Brasil, o coronelismo, continuaram a persistir
em Itaperuçu, nos anos de 1992 a 2002. Os exemplos levantados por Leal e as observações
feitas em campo demonstram que as características do coronelismo são ainda determinantes
na estrutura política do município, mesmo que a literatura política atual chame-a de
“clientelismo” e que a preocupação de Olavo Brasil de Lima Júnior sobre “quão longe
estamos dos ‘coronéis, das enxadas e dos votos’” seja real e necessite de mais estudos e
comparações entre esses muitos microssistemas políticos.
Décio Saes corrobora o “fim” do coronelismo quando afirma que nesse fenômeno
o votante está ideologicamente imerso em uma situação de obrigação subjetiva de lealdade
para com o senhor da terra e que, portanto, a troca de favores não é o fator condicionante
do voto, mas sim as relações de dominação e dependência pessoal. Essa seria a base

165
ideológica do “coronelismo”, inseparável de seu fundamento infra-estrutural – o latifúndio
pré-capitalista –, em que o proprietário de terras cede ao trabalhador a posse da terra e
este submete-se a uma fidelidade ao chefe local (SAES, 1998, p. 85).
Seria um erro, então, considerar a existência do fenômeno coronelista na presente
história brasileira? Certamente que sim. Porém – é o que consideramos relevante –, são
as relações ditas de dominação e dependência pessoal, que Décio Saes caracteriza como
a dimensão ideológica do “coronelismo”, que parece persistir em pequenos municípios
sob a forma de obrigações morais, o que acaba gerando uma relação de dominação.
Enquanto a dimensão econômica do proprietário de terras, que tem poder sobre o
trabalhador, a quem cede a posse da terra, não é mais viável, a dimensão ideológica ainda
o é. As entrevistas que fizemos demonstraram muito esse aspecto de dependência que as
pessoas têm para com os chefes políticos locais. Como exemplo, um funcionário público
da Prefeitura de Itaperuçu ao ser entrevistado respondeu que vê a política no município
ainda “de uma maneira tradicional, em que o eleitor respeita a amizade, não levando em
conta outros fatores como partidos e sua ideologia, planos de governo etc.” Há uma
relação de dependência dos votantes para com o político local, construída ao longo de
toda a sua carreira política. Parece que se institui uma obrigação subjetiva de lealdade, da
mesma forma como o “coronel” tinha para com os seus agregados no tempo da Primeira
República, provinda de questões materiais: favores de toda ordem, empreguismo etc. e
também de fatores como compadrio, amizade, parentesco.
O relacionamento que esses políticos têm com seus eleitores, por meio de
todos esses exemplos, são fatos essenciais na análise da política. Se “coronelismo” é um
termo que se refere a um fenômeno político passado, ao menos é uma espécie de
“coronelismo modernizado” o que vemos em diversos municípios com a existência de
eleitores fiéis, muitas vezes mantidos pelo clientelismo e por fatores relacionais de mando,
prestígio, amizade e parentesco.
Marcos Bezerra descreve esse relacionamento entre políticos e seus eleitores
da seguinte forma: “A formulação de que a concessão de favores e serviços proporciona
votos faz sentido na medida em que os favores concedidos e recebidos instituem entre os
parlamentares e os beneficiados uma relação do tipo credor e devedor. [...] Assim, um
eleitor ou liderança política que tem seu pedido atendido por meio da mediação do
parlamentar sente, portanto, que tem com este uma dívida pessoal” (BEZERRA, 1999, p.
117).
Essa “dívida pessoal” que o eleitor passa a ter com o líder político é perceptível
nas conversas e entrevistas. Em uma conversa informal, uma eleitora disse ter votado em
um político local por ter ganho telhas para a construção de sua garagem. Outra votou
porque, quando seu pai estava doente, foi ele (o “chefe político”) que conseguiu uma
ambulância para levá-lo ao hospital em Curitiba. Porém essa é uma relação de fidelidade
que pode ser transitória, na medida em que, em outro momento, essa pessoa venha a
receber um favor de outro chefe político. Entretanto o que se percebe é que, em geral, a
fidelidade a um grupo político, liderado por um chefe local, é mais estável do que instável.
Comenta-se com freqüência, quando o assunto é política, que famílias inteiras são de
166
“fulano de tal” e “não mudam” e que determinadas localidades de Itaperuçu, principalmente
no interior, são redutos eleitorais de “cicrano”. Sem dúvida, existe uma troca de favores
(voto por bens materiais), porém não estão em jogo somente os bens materiais, mas
mobiliza-se toda uma estrutura social que gera fidelidade para com o chefe político local,
produzindo dependência e dominação.
O clientelismo é utilizado pelos líderes políticos para manterem-se no poder.
Ao redor de si formam grupos de eleitores fiéis que sabem que com sua vitória aproveitarão
melhor as possibilidades que a estrutura da Prefeitura oferece. Para Karina Kuschnir, “o
clientelismo é um problema do ponto de vista democrático, pois opera sob o princípio da
dádiva, implicando sentimentos de lealdade e empenho individual. O eleitor, ao invés de se
identificar com seu grupo ou classe, como trabalhador e cidadão, se identifica como
beneficiário de um político influente, tornando a política ‘inacessível sem a interferência
das relações pessoais’. Tanto para o político quanto para o eleitor envolvido, esse tipo de
relação política é legítima e positiva” (KUSCHNIR, 2000, p. 140-141).
A observação de Kuschnir mostra um dos aspectos da política, muitas vezes
ocultado pelo ideal de uma democracia consciente e participativa, que é a prestação de
favores por parte do político em troca do apoio fiel do eleitor.
Outro ponto mencionado neste trabalho é a questão do “curral eleitoral” e do
“voto de cabresto”. A fidelidade por parte dos eleitores para com políticos locais faz com
que estes tenham uma determinada porcentagem de votos fixos e, em conseqüência,
transfiram esses votos aos políticos governistas, da mesma forma como um “coronel” da
República Velha. Forma-se, assim, o seguinte esquema:
Esquema de análise 2
“coronelismo” em Itaperuçu
Eleitores fiéis Líderes Parlamentares
(“voto de políticos estaduais e federais
cabresto”) locais “governistas”
Fonte: o autor.

Itaperuçu torna-se “curral eleitoral” de alguns parlamentares. É suficiente que


esses políticos “graúdos” aliem-se aos chefes políticos locais para conseguirem votos e,
em troca, sustentem o seu poder local. Resta saber como se chega a esse apoio recíproco.
Por exemplo, o que leva determinado chefe político local a apoiar em uma eleição um
Deputado Estadual e, em outra eleição, outro?
A “ágora” grega, espaço público de discussão democrática e tomada de decisões
por parte de todos os cidadãos livres e iguais, em favor dos destinos da polis, parece
distanciar-se dessa pequena localidade populacional. Ao contrário, aqui a concentração
do poder está nas mãos de poucos que se juntam ao redor de um líder. Os vereadores de
Itaperuçu, ao longo da história política da localidade, sempre se posicionaram a favor da
administração vigente, mesmo sendo eleitos por coligações contrárias ao chefe do poder
Executivo.
167
A oposição organizada em partido político é de uma minoria de pessoas que
pouco afeta a estrutura de poder. O que talvez “atrapalhe” quem manda é o seu grupo
opositor, mas que age da mesma forma quando está no poder.
Enquanto o estudo de Farias (2000) tenta demonstrar a desagregação do
“coronelismo” a partir de pesquisa empírica em uma sub-região do Piauí na década de
1990, concluindo como sendo esse um quadro representativo do que vem ocorrendo no
Nordeste rural brasileiro, esse trabalho buscou demonstrar que características
“coronelistas” (descritas principalmente por Leal (1997) ainda se impõem à política nos
dias atuais em pequenos municípios. Concordamos com Farias que o estilo democrático
brasileiro, comprometido com uma dada ordem social, a saber, a manutenção do
capitalismo, “coexiste com vários mecanismos particularísticos de controle do eleitorado,
tal como o clientelismo” (FARIAS, 2000, p. 50; grifo no original) e – por que não? – com
algumas características, como acima descritas, do “coronelismo” da Primeira República.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BEZERRA, M. O. Em nome das “bases”. Política, favor e dependência pessoal. Rio de


Janeiro: Relume Dumará, 1999.
CARVALHO, J. M. Mandonismo, coronelismo, clientelismo: uma discussão conceitual.
Dados, Rio de Janeiro, v. 40, n. 2, p. 229-250, 1997.
DANTAS, I. Coronelismo e dominação. Aracaju: UFSE, 1987.
FARIAS, F. P. Clientelismo e democracia capitalista: elementos para uma abordagem
alternativa. Revista de Sociologia e Política, Curitiba, n. 15, p. 49-65, nov.2000.
IPARDES. Perfil municipal de Itaperuçu . 2005. Disponível em: <http://
www.ipardes.pr.gov.br/>. Acesso em: 24.nov.2005.
JANOTTI, M. L. M. O coronelismo: uma política de compromissos. São Paulo: Brasiliense,
1981.
KUSCHNIR, K. O cotidiano da política. Rio de Janeiro: J. Zahar, 2000.
LANNA, M. P. D. A dívida divina: troca e patronagem no Nordeste brasileiro. Campinas:
UNICAMP, 1995.
LEAL, V. N. Coronelismo, enxada e voto: o município e o regime representativo no Brasil.
3ª ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1997.
LIMA JÚNIOR, O. B. Partidos, eleições e poder Legislativo. In: MICELI, S. (org.). O que ler
na Ciência Social brasileira: 1970-1995. V. III: Ciência Política. São Paulo: Sumaré,
1999.
MACHADO, I. R. Dias em movimento: espaço e poder numa “comunidade-dormitório”
mineira. Campinas. Dissertação (Mestrado em Antropologia). Universidade Estadual
de Campinas, 1997.
NUNES, E. A gramática política do Brasil. Clientelismo e insulamento burocrático. 2ª ed.
Rio de Janeiro: J. Zahar, 1999.
OLIVEIRA, R. C. Análise dos parlamentares paranaenses na entrada do século XXI. Curitiba:
APUFPR-Ssind, 2002.
168
PALMEIRA, M. & GOLDMAN, M. (orgs.). Antropologia, voto e representação política. Rio
de Janeiro: Contra Capa, 1996.
PANG, E.-S. Coronelismo e oligarquias – 1889-1934. A Bahia na Primeira República
brasileira. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1978.
QUEIROZ, M. I. P. O coronelismo numa interpretação sociológica. In: FAUSTO, B. (org.).
História geral da civilização brasileira. V. III: O Brasil republicano. Estrutura de
poder e economia (1889-1930). Rio de Janeiro: B. Brasil, 1997.
SAES, D. Coronelismo e Estado burguês: elementos para uma reinterpretação. In: Estado
e democracia: ensaios teóricos. Campinas: UNICAMP, 1998.
SINGER, P. A política das classes dominantes. In: IANNI, O. (org.). Política e revolução
social no Brasil. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1965.
VILAÇA, M. V. & ALBUQUERQUE, R. C. Coronel, coronéis. 2ª ed. Rio de Janeiro: Tempo
Brasileiro; 1978.

OUTRAS FONTES

Entrevistas com eleitores de Itaperuçu, políticos locais e funcionários da Prefeitura


Municipal de Itaperuçu, realizadas pelo autor em 2002.
Conheça Rio Branco do Sul. Raio X, Rio Branco do Sul, ano I, n. 1, ago. 2001.
JORNAL NOVO HORIZONTE. Itaperuçu. Vários números.
JORNAL RAIO X DA REGIÃO DOS MINÉRIOS. Rio Branco do Sul. Vários números.
TRE-PR. Base de dados primários da Seção de Divulgação de Resultados. Curitiba: Tribunal
Regional Eleitoral do Paraná, s/d. Eleições 2002. Resultados no Paraná. Votação por
município. Curitiba: Tribunal
Regional Eleitoral do Paraná, 2002. Disponível em: <http://www.tre-pr.gov.br/ eleicoes/
2002/resu_bai.htm>. Acesso em: 24.nov.2005.

169
170
CAPÍTULO SETE

GEOGRAFIA DO VOTO
DE ESQUERDA NO PARANÁ:
UMA ANÁLISE DO DESEMPENHO ELEITORAL
DO PT NAS ELEIÇÕES PRESIDENCIAIS (1989-2002)

Luzia Maristela Cabreira Bonette

171
172
7. GEOGRAFIA DO VOTO
DE ESQUERDA NO PARANÁ:
Uma análise do desempenho eleitoral do PT
nas eleições presidenciais (1989-2002)

I. INTRODUÇÃO

A ascensão do Partido dos Trabalhadores (PT) no estado do Paraná e a eleição


de Luís Inácio Lula da Silva para Presidente da República despertaram nosso interesse
sobre os fatores condicionantes de tal resultado.
Assim, esta pesquisa sobre o processo eleitoral limitou-se aos fatores
condicionantes da ascensão do PT no Paraná: comportamento eleitoral, mudança de perfil
do candidato e necessidades de novas configurações no meio político.
A votação do candidato Lula e do PT constituiu-se ponto de partida para uma
reflexão sobre os resultados apurados nas eleições para Presidência da República em
2002, não com a pretensão de abarcá-la em todos os seus aspectos, mas apenas de
ressaltar a importância do que se vinha passando no terreno especificamente político-
eleitoral, a partir de um recorte das votações nas cidades de maior densidade demográfica
do Paraná: Curitiba, Cascavel, Londrina, Maringá e Ponta Grossa.
O PT foi fundado em 10 de fevereiro de 1980 por líderes sindicais da região do
ABC paulista inspirados nos movimentos de greve dos metalúrgicos de 1978. Tornou-se o
maior partido de esquerda e de oposição ao governo federal, tendo em seu programa a
inspiração socialista e como ação prioritária a reforma agrária que vê na ocupação de
terras improdutivas uma forma lícita de pressão. Esse partido colocou-se contra as
privatizações e sua maior expressão é o ex-sindicalista Luís Inácio Lula da Silva, que
concorreu às eleições para Presidência da República nos anos de 1989, 1994, 1998 e
2002, elegendo-se na última.
O texto está dividido em seis partes: 1) Esta apresentação; 2) A geografia do voto
no Paraná; 3) Contexto e fatores condicionantes das eleições no Paraná nos anos de 1989,
1994, 1998 e 2002; 4) Hipóteses do voto petista no Paraná; 5) Como se deu a adesão e
votação e 6) Considerações finais.

173
II. A GEOGRAFIA DO VOTO NO PARANÁ

Abaixo apresentamos um mapa do Paraná, em que se indicam as cidades que


analisaremos.

Mapa 1 – Cidades paranaenses analisadas

Fonte: Waniez (2002).


Nota: 1) Cascavel; 2) Curitiba; 3) Londrina; 4) Maringá; 5) Ponta Grossa.

Com a apresentação dos dados sócio-econômicos das cidades analisadas, pode-


se entender um pouco melhor a preferência eleitoral, pois eles devem indicar-nos algo
sobre os interesses e os fatores condicionantes nas eleições no Paraná. Com a análise das
eleições e a descrição das cinco maiores cidades do Paraná, considerando suas condições
sócio-econômicas durante as eleições de 1989, 1994, 1998 e 2002 e tendo por base o
levantamento de votos obtidos pelo PT, certamente teremos um bom referencial para
sugerir uma correlação entre voto e posição socioeconômica, além de outros fatores que
venham a estabelecer tendências básicas nas cidades analisadas.

174
Tabela 1
Dados socioeconômicos dos municípios paranaenses estudados
ANO E TOTAL DE 1940/50 1960/162 1980/290 2000/399
MUNICÍPIOS DO ESTADO
Distribuição da população - As cidades correspondem à densidade demográfica de 47,88,
(hab/km²) densidade apresentada no Paraná.
- A concentração mínima para identificação de aglomerações
urbanas conforme classificação do IBGE é de 60 hab/km . 2

- No Brasil encontra-se o correspondente a 19,92.


Economia e ocupação - Cascavel, Curitiba e Região Metropolitana, Guarapuava, Londrina
e Maringá correspondem a menos de 1% da massa salarial
estadual.
- Participação na massa de salários do setor formal, superior ou
igual a 1%, no Paraná, em 2000.
Educação e renda - Domicílios com responsável sem instrução ou menos de três
anos de estudo: 30,48% (Brasil é de 34,7%; região Sul: 25,6%).
Fonte: IBGE (2002).

II.1 Desempenho eleitoral de Lula em Curitiba, Cascavel e Ponta Grossa

II.1.1 Desempenho eleitoral da cidade de Curitiba


Ao visualizarmos a Tabela 2, que apresenta o resultado das eleições em Curitiba
nos anos de 1989, 1994, 1998 e 2002, observamos que Lula, ao ter como adversário o
candidato do Partido da Renovação Nacional (PRN), Fernando Collor de Mello, obteve
grande votação em 1989.
Nas eleições de 1994 e 1998, ao ter como adversário Fernando Henrique
Cardoso, do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), seu percentual de votação
foi pequeno, voltando a crescer nas eleições de 2002, mesmo tendo como adversário um
candidato apresentado por Fernando Henrique Cardoso, Presidente da República na época:
Lula conseguiu então superar seu adversário José Serra do PSDB no segundo turno, com
mais de 50% dos votos na cidade.

Tabela 2
Desempenho do candidato Lula na Cidade de Curitiba
ANO 1989 1994 1998 2002
Total de votos 303.551 189.632 217.472 585.548
Percentual de votos 41,01% 23,75% 28,68% 64,71%
Fonte: TRE-PR (s/d).
Nota: Os dados de 1989 e 2002 referem-se ao segundo turno.

175
II.1.2 Desempenho eleitoral de Lula em Cascavel e em Ponta Grossa
As tabelas 3 e 4 apresentam os resultados das eleições em Cascavel e em Ponta
Grossa nos anos de 1989, 1994, 1998 e 2002; nelas podemos observar uma situação
parecida com a de Curitiba. Lula, apesar de não ter sido eleito, apresentou uma boa
votação em 1989.
No entanto, ao confrontar-se com Fernando Henrique Cardoso nas eleições de
1994 e 1998 – o qual foi apoiado por uma ampla coligação de partidos – PSDB, Partido
da Frente Liberal (PFL), Partido Trabalhista Brasileiro – PTB, Partido do Movimento
Democrático Brasileiro (PMDB) e Partido Progressista Brasileiro (PPB) –, seu percentual
de votação em Cascavel e em Ponta Grossa também foi pequeno. Somente nas eleições de
2002 Lula voltou a crescer e conseguiu superar o adversário do PSDB no segundo turno,
com um percentual de votação superior a 50%.

Tabela 3
Desempenho de Lula em Cascavel
ANOS 1989 1994 1998 2002
Total de votos 41.300 21.352 34.340 79.296
Percentual de votos 43,74 20,86 33,85 66,78
Fonte: TRE-PR (s/d).
Nota: Os dados de 1989 e 2002 referem-se ao segundo turno.

Tabela 4
Desempenho de Lula em Ponta Grossa
ANOS 1989 1994 1998 2002
Total de votos 39.862 29.927 31.207 78.146
Percentual de votos 33,39 22,85 25,16 53,80
Fonte: TRE-PR (s/d).
Nota: Os dados de 1989 e 2002 referem-se ao segundo turno.

II.1.3 Desempenho eleitoral de Lula em Londrina e Maringá


A partir das tabelas 5 e 6, com os resultados das eleições em Londrina e em
Maringá, nos anos de 1989, 1994, 1998 e 2002, podemos observar que houve nessas
cidades um pequeno crescimento nos votos para Lula, não sendo suficientemente expressivo
para que o candidato vencesse nelas. Sabemos que Londrina e Maringá são cidades que
têm como base econômica a agricultura e a pecuária e que, ao mesmo tempo, houve um
histórico de ocupações de sem-terras na região, entre 1996 e 1999. Sendo a reforma
agrária uma das prioridades do programa do Partido dos Trabalhadores, interpretamos
essas ocupações como um dos condicionantes da não-adesão do eleitorado ao partido e,
conseqüentemente, a Lula nas eleições de 2002.

176
Tabela 5
Desempenho de Lula em Londrina
ANOS 1989 1994 1998 2002
Total de votos 69.910 32.686 35.144 106.220
Percentual de votos 33,83 15,67 17,70 44,63
Fonte: TRE-PR (s/d).
Nota: Os dados de 1989 e 2002 referem-se ao segundo turno.

Tabela 6
Desempenho de Lula em Maringá
ANOS 1989 1994 1998 2002
Total de votos 41.795 30.806 33.764 75.580
Percentual de votos 33,87 23,30 24,59 47,89
Fonte: TRE-PR (s/d).
Nota: Os dados de 1989 e 2002 referem-se ao segundo turno.

III. ELEIÇÕES NO PARANÁ: UM RECORTE GEOGRÁFICO

Embora os dados agregados da votação no PT e em Lula em 2002 no Paraná


sejam os segundos maiores percentuais da região Sul (apenas atrás do Rio Grande do
Sul), eles não traduzem a real votação, pois, ao analisar-se as cinco maiores cidades do
estado, pode-se constatar as diversidades de votação e adesão em cada uma delas. Por
meio de uma análise do recorte geográfico, constatamos que não existiu unanimidade na
votação de 2002, pois em Curitiba, Cascavel e Ponta Grossa houve um crescimento dos
votos, culminando na vitória de Lula nesses municípios; já em Londrina e Maringá os
resultados não foram os mesmos.
Para um melhor entendimento da ascensão de Lula, apresentam-se os resultados
das eleições de 2000 para Prefeito nas cidades analisadas.
Em Curitiba, nas eleições para Prefeito no ano 2000, Cássio Taniguchi (PFL) foi
eleito no segundo turno. Ele era o candidato da situação e foi reeleito com 462.811 votos
contra os 436.270 voto do candidato da oposição, Ângelo Carlos Vanhoni (PT). Taniguchi
coligou-se com os seguintes partidos: PTB, Partido Socialista Brasileiro (PSB), Partido
Liberal (PL), Partido Social Democrático (PSD), Partido Social Cristão (PSC), PRN, Partido
Social Trabalhista (PST), PRP (Partido Republicano Progressista), Partido dos
Trabalhadores do Brasil (PTdoB), PPB e Partido Social Liberal (PSL). Já Ângelo Vanhoni
coligou-se com o Partido Comunista do Brasil (PCdoB), Partido Comunista Brasileiro
(PCB), Partido Humanista Social (PHS), Partido da Mobilização Nacional (PMN), Partido
Popular Socialista (PPS) e Partido Verde (PV).
Em Cascavel, o Prefeito eleito em 2000 foi Edgar Bueno, do Partido Democrático
Trabalhista (PDT). Ele fez coligação com os partidos: PMDB, PSDB, PT, PPS, PL, PHS, PSC,

177
PSL, PSD, PSB, Partido da Social Democracia Cristã (PSDC) e PST (Partido Social
Trabalhista), vencendo no primeiro turno.
Em Ponta Grossa, o eleito foi Péricles de Holleben de Melo, do PDT; fazendo
coligação com PT, PMDB e PHS, ele venceu no primeiro turno.
Assim, nas cidades de Cascavel e Ponta Grossa, os candidatos eleitos fizeram
várias coligações, inclusive com o Partido dos Trabalhadores, o que leva a concluir que,
além do partido do Prefeito, os outros partidos também apoiaram o PT e Lula nas eleições
para a Presidência da República, contribuindo para o êxito no pleito.
Na cidade de Londrina, o candidato eleito para Prefeito nas eleições de 2000 foi
Nedson Luís Micheleti, do PT, coligado com os seguintes partidos: PPS, PCdoB e Partido
dos Aposentados da Nação (PAN). Ele venceu seu adversário por uma grande diferença de
votos: enquanto Micheleti obteve 153.400 votos (64,25% dos votos válidos), Homero
Barbosa Neto, do PPB, fez coligação com PDT, Partido Renovador Trabalhista Brasileiro
(PRTB) e PSC, e obteve 85.744 votos (35,85%). Uma vitória de 50% de diferença, em
relação ao seu adversário, no segundo turno.
Em Maringá, o candidato José Cláudio Pereira, do PT, venceu as eleições no
segundo turno; também foi uma vitória com poucos votos de diferença em relação ao seu
adversário: o PT obteve 107.320 votos (69,70%) e o candidato do PTB, Manoel Batista da
Silva Júnior, que fez coligação com o PDT, obteve 46.659 votos (30,30%).
Há outro fato político que deve ser aqui apresentado: em 2002 aconteceram
também eleições para Governador do Estado; o candidato paranaense, eleito no segundo
turno com 55,15% de votos, foi Roberto Requião de Mello e Silva, do PMDB. Ele foi
apoiado e apoiou Lula durante o segundo turno da campanha eleitoral.
Ao analisarmos os dados sobre as eleições de prefeitos e coligações é possível
perceber alguns fatores de êxito de Lula: ele conseguiu a vitória em Curitiba – onde o
Prefeito era do PFL –, em Cascavel e Ponta Grossa – onde os prefeitos eram do PDT –, mas
nas cidades em que os prefeitos eram do PT, como Londrina e Maringá, Lula não conseguiu
a adesão dos eleitores. Isso causa surpresa: o que levou os eleitores a votarem (ou não)
no Partido dos Trabalhadores e em Lula?
Diante dos dados acima, faz-se necessária uma análise sobre os fatores de
influência na decisão de voto dos eleitores. Conforme Palmeira (1991, p. 120-121), as
interferências dão-se de muitas formas, na medida em que muitos interesses encontram-
se em pauta no jogo político. Assim, ao visualizar quais são os fatores e como eles
contribuíram para o desempenho de Lula no Paraná em 2002, é possível responder às
questões acima.

IV. CONTEXTO DAS ELEIÇÕES NO PARANÁ

IV.1 Eleições de 1989


IV.1
Pelo que se observou nas tabelas apresentadas, tem-se que o resultado das
eleições de 1989 no Paraná não foi diferente do das de âmbito nacional. Apesar da grande
votação recebida por Lula, não foi possível atingir um número de votos suficiente para ele

178
ganhar as eleições. De acordo com Carreirão (2000, p. 120), a relevância da avaliação
sobre as qualidades pessoais de Lula, associada à avaliação de sua capacidade técnico-
administrativa, teve um peso maior do que a defesa dos interesses dos trabalhadores, não
apenas para o conjunto de eleitores do PT como para os eleitores de quase todos os
candidatos relevantes em 1989, como Collor de Mello (PRN), Leonel Brizola (PDT),
Mário Covas (PSDB), Paulo Maluf (PDS) e Ulysses Guimarães (PMDB).
A votação em Collor também ocorreu devido à escolha de eleitores menos
sofisticados politicamente, ou seja, pelo eleitorado de menor grau de escolaridade, o que
foi verificado pelo Censo de 2000, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE),
como sendo o maior número de votantes no Paraná.
Como no resto do Brasil, os votos foram para o candidato mais associado à
defesa dos interesses dos trabalhadores (do povo, dos pobres, da maioria), podendo- se
concluir que foi decidido de forma “emocional em função das características e dos aspectos
valorativos e simbólicos de caráter moral” (escolha feita pelos eleitores em função de
interesses próprios e de análise pessoal do candidato) (idem, p. 120).
Além disso, Collor associou estrategicamente a imagem de Lula a medidas
estatizantes (confisco de poupança) e ao caos e à desordem política, social e econômica
que poderia vir a ocorrer caso ele fosse eleito; assim, ele fez o preconceito falar mais alto
nos setores de classe média e até entre a classe trabalhadora. Associou ainda a cor
vermelha do partido à desordem. (SILVEIRA, 2002, p. 2).

IV.2 Eleições de 1994


IV.2
Na eleição de 1994, como já observado nas tabelas apresentadas, Lula não
teve boa votação diante do adversário Fernando Henrique Cardoso (FHC). FHC foi o
condutor direto do governo anterior e acabou beneficiando-se da avaliação favorável
que a maioria dos eleitores fazia do Plano Real, em virtude de ter controlado e reduzido
a inflação na época. Assim, os eleitores em 1994 votaram em FHC por suas supostas
qualidades: “credibilidade/confiança” e “experiência/ capacidade administrativa”
(CARREIRÃO, 2000, p. 131). Conforme indicou Carreirão (idem, p. 141), segundo
uma pesquisa nacional, em que se aplicaram questões abertas sobre os fatores que
influenciaram o voto, poucos eleitores apontavam motivos enquadrados sob o rótulo
de “preocupação com problemas sociais” (categoria que mais se aproximaria da idéia
de uma “defesa dos interesses dos trabalhadores”, proposta apresentada por Lula),
reduzindo os eleitores de Lula (15%) a uma parcela praticamente insignificante em
relação aos demais candidatos.
Assim, os elementos fundamentais para a eleição de FHC foram ao encontro da
tese de Rahn et al., tese mencionada por Carreirão (ibidem), segundo a qual “o eleitor dá
peso à avaliação dos candidatos, mas, ao mesmo tempo, [considera que] o contexto
político (partido político que pertence, o conjunto de sua vida política anterior) influencia
essa avaliação, não se tratando apenas de uma avaliação do caráter do candidato baseada
em aparências, ou num julgamento estritamente moral”.

179
IV.3 Eleições de 1998
IV.3
Lula não venceu as eleições de 1998 no Paraná e no Brasil, perdendo para
Fernando Henrique Cardoso que enfatizava as conquistas de administração anterior, como
queda da inflação e sua capacidade de enfrentar problemas, mesmo que em sua campanha
Lula enfatizasse seu compromisso com os interesses da maioria da população (contra um
Presidente cujas políticas beneficiavam as elites e fragilizavam o país diante de crises
internacionais). Fernando Henrique Cardoso foi eleito no primeiro turno; conforme já
vimos anteriormente, o que contou foi a “avaliação de desempenho do candidato do
governo”. Conclui- se que o eleitor, nessa eleição como na de 1994, deu peso à avaliação
do candidato e ao contexto político, não se tratando apenas de uma avaliação do caráter do
candidato baseada em aparências, ou em um julgamento estritamente moral, conforme
mencionamos anteriormente.

IV.4 Eleições de 2002


IV.4
Na eleição de 2002 houve um expressivo crescimento de Lula em várias regiões
do interior do país. No entanto, no Paraná Lula e seu partido ganharam nas cidades de
Cascavel, Curitiba e Ponta Grossa, ao contrário de Londrina e Maringá.
Segundo Barreto (2003), a partir da análise dos resultados das pesquisas de
intenção de votos, feitas e divulgadas ainda antes do segundo turno das eleições de 2002,
verifica-se que o eleitor estava disposto a votar em Lula independentemente da região em
que morava, de sua faixa etária, renda familiar, nível de instrução e sexo. Ao compararem-
se esses resultados apresentados por Barreto aos resultados das pesquisas realizadas
nas vésperas das eleições anteriores (1989, 1994 e 1998), segundo as quais havia uma
preferência por Lula concentrada nas camadas sociais mais favorecidas da sociedade,
pode-se perceber que, em 2002, Lula conquistou também os votos dos mais pobres, dos
que possuem menor nível de escolaridade e renda familiar.
Todavia, no Paraná – mais especificamente em Londrina e Maringá –, Lula não
pode ser considerado um candidato preferido por todas as classes, já que há indícios de
rejeição. Essa rejeição pode estar associada à imagem do candidato, que sempre foi alvo do
preconceito. Além disso, outro fator interveniente pode ser o de, nos arredores das cidades
de Londrina e Maringá, terem ocorrido muitas ocupações de terra.
Assim, mesmo que em nível nacional tenha havido uma grande vontade de
mudança, no Paraná, representado pelas cidades analisadas, outros motivos foram mais
fortes na escolha do candidato. É necessário avaliar por que em cidades como Curitiba,
Cascavel e Ponta Grossa Lula e seu partido venceram o pleito, enquanto em Londrina e
Maringá, mesmo tendo prefeitos do PT, Lula não conseguiu a maioria dos votos.

V. HIPÓTESES DO VOTO PETISTA NO PARANÁ

Ao observar as tabelas de votações e resultados eleitorais, podem-se notar


algumas tendências nas cidades pesquisadas. Assim, nas eleições de 1989, 1994 e 1998,

180
os adversários de Lula conseguiram maior número de votos, pelos diversos motivos já
mencionados anteriormente: aparência do candidato, suas supostas qualidades, propostas
de caráter econômico e social de acordo com a análise e contexto político das eleições.
Mas em 2002 outros resultados foram-nos apresentados, em algumas cidades do Paraná.
Em Curitiba, Cascavel e Ponta Grossa, o candidato conseguiu mais de 50% de
adesão dos eleitores. Pode-se observar uma correlação nos resultados das eleições para
Governador do Estado e Prefeito nas cidades analisadas, a partir do apoio recebido por
Lula, na coligação de partidos nas eleições para Prefeito, e, em outras cidades, o apoio do
candidato a Governador, Roberto Requião.
Em Curitiba, Cascavel e Ponta Grossa, a base econômica constitui-se em atividades
de agropecuária, agricultura, indústria e serviços; assim como Londrina e Maringá, essas
cidades também sofreram ocupações de sem-terra, mas isso não foi decisivo no jogo
eleitoral.
Mesmo havendo uma grande votação no PT em Curitiba, Cascavel e Ponta Grossa,
não se pode concluir se realmente foram votos de protesto, diante da insatisfação com o
governo em curso na época e sua política econômica e social, ou se o eleitor sofreu outro
tipo de influência, seja de representantes dos partidos coligados ao Partido Trabalhista ou
pela “melhora” de sua imagem por meio da interferência dos meios de comunicação.
Em Londrina e Maringá apresentou-se outro cenário político, pois os Prefeitos
eleitos em 2000 eram do PT e, no entanto, Lula não recebeu apoio suficiente nessas
eleições. Nessas cidades existe, como já mencionamos, a questão dos movimentos de
ocupação de terras. Sugerimos, assim, que a não-adesão a Lula deveu-se à contrariedade
do eleitor às invasões e ao programa do PT, que tem como ação prioritária a reforma
agrária e vê nas invasões de terra uma forma lícita de pressão.

VI. ADESÃO E VOTAÇÃO

Apesar da importância da identificação partidária, não discutiremos essa questão


neste trabalho; consideraremos outras variáveis. André Singer refletindo a respeito dos
fatores que levaram o eleitor a votar em Collor nas eleições de 1989 (2000, p. 81)
menciona que, dependendo do grau de instrução do eleitor, na hora de escolher o candidato
“existe forte associação entre o voto e a imagem que os eleitores tinham de como os
candidatos se posicionavam no eixo socioeconômico (defesa dos mais pobres contra os
mais ricos ou vice-versa)”. O autor considera que a escolha do voto varia também de
acordo com a “sofisticação política do eleitor”: um eleitor com maior “sofisticação política”,
com uma visão mais apurada da política, poderia ter notado que Collor defenderia os
ricos e Lula, os pobres. No entanto, nesse caso os eleitores com menos instrução, ou
“menos sofisticados”, como diz Castro (apud SINGER, 2000, p. 81), “projetou sobre
Collor a posição de defensor dos pobres”. Assim, a “sofisticação”, ou o conhecimento que
o eleitor tem do jogo político, torna-se um elemento central para a definição do voto, uma
vez que incide diretamente na capacidade de discernimento sobre a verdadeira posição
dos candidatos. Como se pode constatar ao analisar os motivos que levaram à não-eleição

181
de Lula em três dos pleitos analisados, a questão partidária parece não ter sido a grande
influência, pois a eleição no pleito ocorreu por agremiação sem histórico eleitoral.
Conforme dados do IBGE, a concentração urbana e a distribuição da população
no espaço, no Paraná, e em especial nas cidades analisadas, são aceitáveis1 e até mesmo
pequenas em relação à distribuição geral do Brasil (IBGE, 2002).
Em Curitiba e Região Metropolitana, onde se concentra uma grande população
urbana, pode-se considerar como fatores de adesão e votação em Lula o baixo grau de
escolaridade dos eleitores; a influência dos meios de comunicação; a forte representatividade
da coligação partidária que apoiou Lula e, principalmente, o apoio de Roberto Requião,
candidato a Governador do Paraná. Requião e representantes de outros partidos da
coligação que o apoiou reconheceram em Lula uma certa legitimidade para agir na política,
um certo capital cultural (MIGUEL, 2003, p. 7). Lula teria um treinamento para a ação
política que beneficiaria o estabelecimento de redes de relações e alianças com o capital
econômico. Isso proporcionaria, conforme Miguel (ibidem), o ócio necessário à prática
política, pois, ao “buscar a coligação e apoiar o candidato, o político estará procurando
uma legenda que lhe garante mais recursos e condições para a sobrevivência na política”
(MELO, 2002).
Em Cascavel, Londrina, Maringá e Ponta Grossa, há uma importante concentração
de grandes e pequenos agricultores. Assim, nessas regiões, a pequena produção agrícola
tem sofrido com a concentração da propriedade da terra e com o exôdo rural que resulta,
em grande parte, da expansão da cultura da soja. Essas transformações levaram um
grande número de pequenos produtores rurais, vítimas do processo de modernização da
agricultura, à mobilização e à adesão ao Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra.
Com isso, as ocupações de terras, nas regiões mencionadas, aumentaram sensivelmente.
Nas regiões de Londrina e Maringá, mesmo Lula mudando sua imagem,
mostrando- se menos radical, lançando novas bandeiras, menos agressivas e com idéias
mais receptivas à classe média, o eleitor considerou a importância do capítulo dedicado à
reforma agrária, apresentado em sua plataforma política2.
Já em Cascavel e Ponta Grossa, Lula venceu o pleito de 2002. É curioso o fato de
que, apesar de essas cidades terem Prefeitos do PDT, elas apresentavam o mesmo perfil
político, social e econômico de Londrina e Maringá, cidades em que o candidato não
conseguiu a adesão da maioria dos eleitores.

VII. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A análise da participação de Lula e do PT nas eleições presidenciais ocorridas


entre 1989 e 2002, no Paraná, mostra que muitos fatores podem ter influenciado a
1
Ou seja, o espaço ocupado pela população, em metros quadrados, está dentro de um padrão considerado
aceitável pela Organização Mundial da Saúde (OMS).
2
Todavia importa notar que essa questão demanda um estudo mais aprofundado; da mesma forma, as oligarquias
regionais, representadas pelos pequenos e grandes produtores da região, devem também ser analisadas em
relação à adesão ou não a Lula e ao PT.

182
votação eleitoral. No entanto, foram analisados somente os fatores de maior visibilidade
nas cidades pesquisadas. É importante frisar que a discussão em torno desse assunto é
muito ampla e demandaria uma pesquisa de maior alcance.
Pode-se observar que há uma pequena instabilidade em relação ao comportamento
e às preferências eleitorais entre as cidades pesquisadas. Em relação aos fatores condicionantes
do comportamento eleitoral, como mudança de perfil do candidato e necessidade de novas
configurações no meio político, as análises levaram-nos à conclusão de que o eleitor está
sempre atento a esses fatores, podendo-se explicá-los a partir de um maior investimento do
candidato na sua forma de comunicação e na construção de sua imagem. Com relação à
esperança de mudanças no cenário brasileiro, na política, na economia ou na parte social,
nota-se que é muito mais a partir da escolha macrossocial que os eleitores votam em
determinado candidato. Existem ainda casos em que os eleitores, com a influência dos meios
de comunicação, identificam-se com partidos ou candidatos carismáticos.
No estudo das quatro eleições aqui focadas, conclui-se que não se seguiu
completamente um padrão de comportamento, mas há fatores condicionantes semelhantes,
embora com peculiaridades. Notou-se, por exemplo, que os fatores variaram de eleição
para eleição, dependendo: do contexto político, econômico e social apresentado em cada
momento e em cada cidade; de como o candidato posicionou-se no eixo socioeconômico
local; das propostas do partido (interesses sociais defendidos em favor dos mais pobres
contra os mais ricos ou vice-versa) e da sofisticação política do eleitor (grau de
conhecimento do jogo político), além da questão não-racional de escolha do voto, em que
o eleitor avalia o candidato em função de características e aspectos valorativos e simbólicos
(aparência, honestidade, credibilidade etc.).
Nas eleições de 2002, principalmente, pôde-se observar que nas cidades de
Curitiba, Cascavel e Ponta Grossa realmente havia uma vontade de mudança por parte dos
eleitores, e as modificações efetivas do PT e de Lula, as novas coligações partidárias, o
apoio do candidato a governador do Paraná, Roberto Requião de Melo e Silva, do PMDB,
a nova atuação política e mudanças na imagem do PT e de Lula fizeram com que os
eleitores, mobilizados, e motivados pela ação dos meios de comunicação e identificados
com o partido, sofressem a influência do ambiente e votassem em Lula.
Nas cidades de Londrina e Maringá, os eleitores sofreram outra forma de
influência. Nessa região, a pesquisa se centrou nas questões relacionadas às ocupações de
terra, considerando esse como um fator de rejeição. Ao não aderir ao candidato Lula, o
eleitor pesou principalmente a questão do discurso do Partido Trabalhista em favor da
reforma agrária e em apoio às ocupações de terra como forma lícita de pressão. Nessa
região, pôde-se observar, os eleitores partiram da idéia de que, se aderissem ao candidato do
PT, estariam comprometendo a si e a sua família, bem como toda a rede de relações em que
se circunscreviam, com a possibilidade de conflitos pela terra interferirem decisivamente no
contexto regional. Portanto, minha hipótese é que essa questão foi decisiva na derrota de
Lula e do PT nessas cidades.
Os fatores relacionados à imagem do candidato apresentada pela mídia, à
mudança de seu perfil e do partido, como já mencionamos anteriormente, por meio de

183
uma mensagem menos radical, menos agressiva e com idéias mais receptivas à classe
média, associando sua imagem à de um negociador e conciliador das camadas sociais
brasileiras, as alianças com a oposição, o apoio que o PT recebeu do prefeito da cidade na
época da eleição, foram considerados como condicionantes das vitórias de Lula e do PT
nas cidades de Curitiba, Cascavel e Ponta Grossa.
A eleição vencida nas cidades de Curitiba, Cascavel e Ponta Grossa leva a crer
que mudanças (como o novo posicionamento político, menos radical) favoreceram também
a conquista de eleitores considerados tradicionais e clientelistas. No entanto, esses fatores
não surtiram grande efeito em Londrina e Maringá, onde se deu ênfase aos fatores locais
e regionais.
Enfim, a pesquisa indica que a vontade de mudar de uma parcela de eleitores
contribuiu para que eles superassem preconceitos sociais e políticos contra Lula e o PT.
Essa vontade de mudar, que se tornou um desafio para as campanhas eleitorais, pode ser
formulada como necessidade de novas configurações no meio político (desejo da sociedade
brasileira de mudança na política, com a presença de novos atores políticos).
Assim, Lula passou a representar essa mudança nos meios de comunicação,
apresentando-se como um candidato carismático, flexível e negociador, isto é, com
qualidades consideradas necessárias para o bem do País. Da mesma forma, apresentou-
se o candidato como tendo o auxílio de especialistas do Partido, que de certa forma
compensariam a falta de preparo acadêmico e prático do próprio candidato. Além disso,
pesquisas indicaram a percepção de que Lula poderia dar maior atenção a temas socias e
governar com mais “garra” e “emoção”.
Lula lançou mão dessa “emoção” para atingir com êxito o eleitor e em algumas
regiões do Paraná. Usando um discurso menos agressivo e despido de propostas radicais
que o acompanhavam desde a fundação do PT, aliou elementos da “ideologia de esquerda”,
de Lula e do PT, com elementos da “ideologia de direita”. Esses fatores, bem como as
novas coligações partidárias e a adesão das oligarquias regionais, foram de grande
importância, propiciando sua vitória em algumas regiões do Paraná.

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186
CAPÍTULO OITO

CORRUPÇÃO ELEITORAL NO PARANÁ:


UM ESTUDO DE CASO DAS ELEIÇÕES MUNICIPAIS DE 1996

Fernando José dos Santos

187
188
8. CORRUPÇÃO ELEITORAL NO PARANÁ:
Um estudo de caso das eleições municipais de 1996 1

I. INTRODUÇÃO

O presente trabalho é um estudo sobre a corrupção eleitoral, em um sentido


genérico da expressão. Pretende-se analisá-la por meio de casos e fatos que tiveram
contato com a arena política do Tribunal Regional Eleitoral do Paraná (TRE-PR). Esses
casos e fatos foram verificados em pesquisa realizada nos documentos de julgados,
denominados “acórdãos”2, relativamente às eleições municipais de 1996, no estado do
Paraná.
O objeto deste estudo é o sistema jurídico-eleitoral. Assim, serão apresentadas
as fontes que perfazem as “malhas” de sua estrutura e também os princípios fundamentais
que compõem os pilares desse sistema. Serão feitas considerações sobre algumas
características da democracia brasileira e alguns fatores históricos que permitiram e
permitem a corrupção eleitoral no Brasil, situando assim a conjuntura em que ela se
estabelece. Em seguida, apresentar-se-á uma classificação3 de casos e fatos relativos à
corrupção que entraram em contato com a estrutura jurídica do TRE-PR e que estão
presentes no meio social, segundo reconhecimento de analistas e estudiosos jurídicos,
políticos e sociais. Essa classificação será apresentada e testada mediante a pesquisa
realizada no âmbito do TRE-PR e em confronto com estudos teóricos de Sociologia e
Ciência Política.
Pretende-se conhecer, por meio deste estudo, o funcionamento do sistema
jurídico-eleitoral, frente aos casos e fatos de corrupção que têm contato com a instituição
do TRE-PR e verificar se a estrutura jurídico-normativa cumpre a finalidade de garantir a
legitimidade do processo eleitoral e democrático brasileiro frente aos grandes problemas
1
O capítulo faz parte da monografia apresentada ao Curso de Especialização em Sociologia Política da Universidade
Federal do Paraná em 2003, e que teve como orientador o Prof. Adriano Nervo Codato.
2
Documento onde consta o julgamento de colegiado (grupo de juízes), ao contrário de decisão ou sentença
proferida por juízo singular.
3
Os casos foram organizados e aglutinados em vista de critérios de semelhança em face das suas práticas, bem
como, baseado na legislação e denominações posteriores às de 1996, na perspectiva de propiciar paralelos de
comparação para pesquisas futuras.

189
históricos e contemporâneos da democracia brasileira, a saber, corrupção eleitoral e
abuso de poder econômico-político.

II. A CORRUPÇÃO ELEITORAL

De início importa situar a expressão central e tema do presente trabalho – a


corrupção eleitoral – e apresentar as fontes jurídico-positivas do Direito Eleitoral referentes
às práticas de corrupção.
O ponto de partida é a definição comum de corrupção. Assim, eis o que diz o
Dicionário prático da língua portuguesa Michaelis (1987, p. 237): “corrupção. 1. Ato ou
efeito de corromper; decomposição, putrefação. 2. Depravação e devassidão”. Sobre isso
anota Mônica Caggiano (2002, p. 27): “o termo corrupção indica quaisquer ações praticadas
de forma camuflada, a partir de uma zona de penumbra, à margem das linhas
comportamentais norteadas pela lei e pela moral, sempre com vistas à obtenção de vantagens
individuais ou em prol de um grupo, intangíveis pelas vias ordinárias”.
No Direito, o termo “corrupção eleitoral” é utilizado como uma espécie de
crime eleitoral previsto no Artigo 299 do Código Eleitoral (BRASIL, 2002a). Esse, todavia,
não é o enfoque e sim a definição genérica do termo.

II.1 Estrutura normativa – fontes do Direito Eleitoral


A estrutura de normas, também denominada de fontes do Direito Eleitoral, visa
a garantir acima de tudo o Estado democrático de Direito, conforme o artigo 1º da
Constituição Federal de 1988. A normalidade do processo eleitoral encontra esteio em
dispositivos de natureza constitucional e eleitoral. De fundamental e no topo está a
Constituição Federal, cujo Art. 14, parágrafo 9º, dispõe: “Lei complementar estabelecerá
outros casos de inelegibilidade e os prazos de sua cessação, a fim de proteger a probidade
administrativa, a moralidade para o exercício do mandato, considerada a vida pregressa
do candidato, e a normalidade e legitimidade das eleições, contra a influência do poder
econômico ou abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta
ou indireta” (BRASIL, 2002b; sem grifos no original).
A lei que veio a regulamentar tal dispositivo constitucional foi a de nº 64/90, que
estabeleceu os casos de inelegibilidade, prazos de afastamentos e outros aspectos.
A Lei nº 4.737 de 1965 – Código Eleitoral – já previa anteriormente aos textos
legais citados dispositivos de caráter moralizador e garantidor do regime democrático
contra a corrupção eleitoral, procurando impedir a desigualdade na corrida eleitoral.
Assim consta de seu artigo 237: “A interferência do poder econômico e o desvio ou abuso
de poder de autoridade, em desfavor da liberdade do voto, serão colhidos e punidos”
(BRASIL, 2002a).
O referido código contempla também as disposições penais que abrangem os
tipos dos crimes eleitorais constantes dos seus artigos 289 a 354. As eleições municipais
de 1996 foram regulamentadas pela edição da Lei nº 9.100/95, sendo essa a última lei que

190
normatizou eleições específicas. Havia até então a crítica de que tais leis eleitorais eram
casuísticas porque voltadas aos interesses políticos momentâneos. Tal lei disciplinou a
propaganda eleitoral, as pesquisas eleitorais, os crimes eleitorais, as prestações de contas
e outros assuntos. Na prática, essas leis “anuais” reiteravam dispositivos do Código
Eleitoral ou da própria lei da eleição anterior, incorporando alguns novos dispositivos.
As resoluções baixadas pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral) também compõem
a estrutura normativa. Nesse ponto, há uma discussão jurídica e política quanto ao papel
normatizador da Justiça Eleitoral, que vez ou outra edita norma substancial afetando as
regras do jogo político democrático4: de fato, a Constituição de 1988 não outorgou esse
papel à Justiça Eleitoral; por outro lado, essa Justiça especializada tem o papel crucial de
ser efetiva na consecução de sua missão, ou seja, realizar as eleições de modo a resguardar
os princípios democráticos. Para o momento, interessa o que de fato acontece: assim, a
Justiça Eleitoral realmente atua de modo a compor a estrutura do sistema normativo.
Nesse sentido, Gomes (1998, p. 174) considera que “[...] é inegável o caráter cogente das
resoluções emanadas do egrégio Tribunal Superior Eleitoral, que, ao lado das leis, integram
a legislação eleitoral”.

III. FATORES QUE PROPICIAM A CORRUPÇÃO NA DEMOCRACIA BRASILEIRA

Já foi situada a estrutura normativa do Direito, com a qual o Estado brasileiro


visa a proteger a ordem institucional em face dos atos que possam corrompê-la.
Abaixo apresentaremos os tópicos que constam da pesquisa realizada no Tribunal
Regional Eleitoral do Paraná, como também analisaremos o seu contato com a “malha
judiciária” eleitoral.
Na presente seção pretendemos entender a vinculação e a influência dessa
estrutura normativa e os referidos tópicos no contexto das teorias da democracia e dos
fatores que formam a estrutura social e política brasileira. Sem dúvida, este trabalho está
longe de esgotar o assunto, mas pode apontar fatores desmistificadores da teoria clássica
da democracia assim como características próprias das democracias liberais.
Particularmente, analisam-se algumas condições e aspectos históricos do Brasil, para
melhor compreender as condições em que se fixaram os pilares da democracia brasileira.
Para tanto, realizaremos uma breve análise de autores clássicos da Ciência Política e da
Sociologia Política.
Assim, um termo inicial fundamental a ser tratado é “política”. Weber (1999, p.
526) afirma que: “Política significaria para nós, portanto, a tentativa de participar no
poder ou de influenciar a distribuição do poder, seja entre vários Estados, seja dentro de
um Estado entre os grupos de pessoas que este abrange. [...] Quem pratica política
reclama poder: poder como meio ao serviço de outros fins – ideais ou egoístas – ou
poder ‘pelo próprio poder’, para deleitar-se com a sensação de prestígio que proporciona”.
4
Dois exemplos: 1) a verticalização das coligações nas eleições de 2002 e 2) a diminuição do número de cadeiras
das Câmaras Municipais, nas eleições de 2004.

191
Outro termo oportuno é “Estado”, de que igualmente tratou Weber (ibidem):

O Estado, do mesmo modo que as associações políticas historicamente


precedentes, é uma relação de dominação de homens sobre homens, apoiada
no meio da coação legítima (quer dizer, considerada legítima). Para que ele
subsista, as pessoas dominadas têm que se submeter à autoridade invocada
pelas que dominam no momento dado. Quando e por que fazem isto, somente
podemos compreender conhecendo os fundamentos justificativos internos e
os meios externos nos quais se apóia a dominação. [...] Para nossa
consideração, cabem, portanto, constatar o puramente conceitual: que o
Estado moderno é uma associação de dominação institucional que dentro de
determinado território pretendeu com êxito monopolizar a coação física
legítima como meio da dominação e reuniu para este fim, nas mãos de seus
dirigentes, os meios materiais de organização [...].

A figura do político surge então como representante do Estado e como ator na


disputa pelo poder. A esta figura, acrescenta-se outro elemento importante para análise do
trabalho, como se vê nessa outra citação de Weber (idem, p. 527; sem grifos no original):
“No entanto, esses políticos de ‘profissão’, no sentido de vocação, não são em lugar algum
as únicas figuras decisivas nas manobras da luta pelo poder político. Altamente decisiva é
antes a natureza dos recursos de que dispõem”. Essa passagem remete à nossa realidade,
em que as modernas democracias têm dificuldades para controlar e permitir a transparência
da origem dos financiamentos de campanhas.
Sobre o conceito de democracia, convém situar a expressão no seu sentido
comum, ou seja, a idéia de que a democracia é o governo “do povo e para o povo”.
Saliente-se que esse é o sentido clássico que dá a idéia de que o cidadão comum tem
possibilidade de gerir seu destino e o de seus iguais, conforme as origens que remontam
a Atenas antiga, relativamente presente no senso comum das pessoas na atualidade.
Em um sentido mais atual, a democracia, para Luís Felipe Miguel (2004, p. 483),
“limita-se a escolher entre as opções que lhe são apresentadas por grupos organizados,
já que o próprio sentido da representação política foi alterado, destinando ao eleitor um
papel reativo [...]”. O autor, ao fazer referência à chamada “teoria das elites”, fundada por
Mosca, Pareto e Michels, explica que ela se opôs aos movimentos democráticos no momento
de sua formulação. De acordo com essa teoria, sempre haverá minoria dirigente e maioria
dirigida, cujo resultado para a democracia como governo do povo é uma “fantasia
inatingível”, pois sempre haverá desigualdade. Tais pensamentos vêm na esteira da teoria
formulada em 1940 por Schumpeter e que causou profunda transformação nas teorias da
democracia, repercutindo drasticamente em estudos e análises sobre o tema desde então.
Eis os pressupostos básicos da teoria formulados por Schumpeter, citado por Amantino:

1. Não existe o chamado bem comum, isso pelo simples fato de


que, para indivíduos, grupos e classe diferentes, o bem comum

192
significa coisas diferentes;
2. o chamado governo pelo povo é uma ficção; o que existe, na
realidade, ou pode existir, é governo para o povo;
3. o governo é exercido por elites políticas;
4. essas elites competem no mercado político pela preferência
dos eleitores;
5. a concorrência no mercado político, tal como no mercado
econômico, é imperfeita, isto é, oligopólica;
6. partidos políticos e eleitores atuam no mercado político de
maneira semelhante à atuação das empresas e consumidores no
mercado econômico;
7. o voto é a moeda por meio da qual o eleitor compra os bens
políticos ofertados pelos partidos;
8. a soberania popular, embora não seja nula, é reduzida, visto
que são as elites políticas que propõem os candidatos e as
alternativas a serem escolhidas pelo eleitor;
9. o objetivo primordial dos partidos políticos é conquistar e
manter o poder. A realização do bem comum é um meio para
atingir este objetivo;
10. a necessidade de maximizar votos impede que os partidos e
os políticos sirvam exclusivamente a seus interesses grupais ou
de classe. Como diz Bobbio [...], os controladores são controlados
(AMANTINO, 1998, p. 138).

Concluindo e voltando a Miguel:

Ao dar fundamento retórico aos regimes eleitorais que chamam a si


mesmo de democracia, Schumpeter e seus seguidores buscam
neutralizar aqueles que reivindicam um regime mais participativo e
igualitário. Mas a idéia de “governo do povo” – no sentido da
igualdade efetiva na tomada das decisões públicas – insiste em
permanecer à tona, quando menos como um parâmetro normativo
que revela quão pouco os regimes ocidentais realizaram as
promessas do rótulo que carregam. Por trás das “democracias
realmente existentes” de hoje, domesticadas, que aceitam todas as
desigualdades sociais e se contentam com um papel secundário
diante do ordenamento capitalista da sociedade, o ideal democrático
continua exibindo seu caráter subversivo (MIGUEL, 2004, p. 503).

III.1 Aspectos históricos da corrupção eleitoral no Brasil


Após a apresentação dos conceitos de política e Estado conforme propõe o
pensamento de Weber e dos conceitos mais atuais das democracias ocidentais, que lhes
193
desmistificam antigos ideais de pureza, interessa agora demonstrar como se deram essas
relações no desenvolvimento histórico do Brasil e sobretudo qual seu legado para a
compreensão do fenômeno atual da corrupção eleitoral.
A primeira categoria para essa análise é a do “patrimonialismo”. Ele constituiu-
se em uma forma de poder característica do Estado brasileiro em uma “viagem de seis
séculos”. Conforme Faoro (1975, p. 733):

uma estrutura político-social resistiu a todas as transformações fundamentais,


aos desafios mais profundos, à travessia do oceano largo. O capitalismo
politicamente orientado – o capitalismo político, ou o pré-capitalismo –,
centro da aventura, da conquista e da colonização, moldou a realidade estatal,
sobrevivendo e incorporando na sobrevivência o capitalismo moderno, de
índole industrial, racional na técnica e fundado na liberdade do indivíduo –
liberdade de negociar, de contratar, de gerir a propriedade sob a garantia das
instituições. A comunidade política conduz, comanda, supervisiona os negócios
como negócios privados dos seus [...]. Dessa realidade se projeta, em
florescimento natural, a forma de poder, institucionalizada num tipo de domínio:
o patrimonialismo, cuja legitimidade assenta no tradicionalismo – assim é
porque sempre foi.

Além do patrimonialismo há outras estruturas de poder e dominação. Conforme


indica José Murilo de Carvalho, a literatura tem demonstrado a relação entre
patrimonialismo, corporativismo e autoritarismo, bem como entre clientelismo e
populismo. É importante notar que a terminologia usada para discutir o poder local na
Colônia, no Império ou na Primeira República reflete visões do Brasil de hoje ou mesmo
visões mais gerais sobre as leis e tendências das trajetórias das sociedades.
Carvalho procura detectar o problema da natureza da dominação:

Funda-se na expansão lenta do poder do Estado que aos poucos penetra na


sociedade e engloba as classes via patrimonialismo, clientelismo, coronelismo,
populismo, corporativismo. A outra linha, menos importante no nosso contexto,
trata do movimento centrado na dinâmica do conflito de classes gerado na
sociedade de mercado que surgiu da transformação do feudalismo na moderna
sociedade industrial, via contratualismo, representação de interesses, partidos
políticos, liberalismo político (CARVALHO, 1997).

Um conceito empregado popularmente – o de coronelismo – relaciona-se à


prática do “voto de cabresto” e consagrou-se com o sentido de corrupção eleitoral. Ele é
caracteristicamente brasileiro, ligado à estrutura social gerada em um sistema de poder
baseado em barganhas. Os conceitos de clientelismo e mandonismo relacionam- se e
assemelham-se a essas idéias e, por isso, podem gerar certa confusão.
Iniciando pelo coronelismo, Carvalho (ibidem), a partir do livro clássico de Vítor
194
Nunes Leal, Coronelismo, enxada e voto, considera que esse “é um sistema político, uma
complexa rede de relações que vai desde o coronel até o Presidente da República,
envolvendo compromissos recíprocos”. Ele surge da confluência de um fato político – o
federalismo – com uma conjuntura econômica – a decadência econômica dos fazendeiros.
O mandonismo, por seu turno, refere-se à existência local de estruturas
oligárquicas e personalizadas de poder. O mandão, o potentado, o chefe ou mesmo o
coronel como indivíduo é aquele que, em função do controle de algum recurso estratégico
– em geral a posse da terra –, exerce sobre a população local um domínio pessoal e
arbitrário que a impede de ter livre acesso ao mercado e à sociedade política. O
mandonismo não é um sistema, é uma característica da política tradicional. Para o autor,
a tendência é que essa característica desapareça completamente à medida que os direitos
civis e políticos alcancem todos os cidadãos, sendo que a história do mandonismo confunde-
se com a história da formação da cidadania.
O clientelismo, para Carvalho, “indica um tipo de relação entre atores políticos
que envolve concessão de benefícios públicos, na forma de empregos, benefícios fiscais,
isenções, em troca de apoio político, sobretudo na forma de voto” (idem).
Estudo realizado em 2000 sobre clientelismo eleitoral e coronelismo no
Município de Itaperuçu, na região metropolitana de Curitiba, a 37 km da capital paranaense,
resgata tais conceitos, demonstrando sua atualidade no sul do Brasil.

[...] os estudos de Marcos Lanna [...], Igor de Rennó Machado [...], Francisco
Pereira de Farias [...], Ibarê Dantas [...], entre outros, ajudam a perceber que
não há diferenças gritantes entre os municípios do Nordeste, Sudeste e os do
Sul do Brasil. As interpretações sobre os fatos podem ser divergentes, mas as
estruturas de ações parecem semelhantes. E, principalmente, velhas estruturas
de poder continuam a persistir na democracia brasileira, como é o caso das
características descritas por Victor Nunes Leal (ALVES, 2003, p. 56).

Do Brasil-Império à atualidade, essas características do patrimonialismo


evoluíram para uma cultura política que perdura no tempo e que influencia a estrutura
normativa que objetiva combatê-la e coibi-la.

IV. CARACTERIZAÇÃO DOS FATOS E CASOS

Nesta seção apresentaremos uma listagem de casos e fatos referentes à corrupção


encontrados nos acórdãos, relativamente às eleições de 1996, no Paraná, e a maneira
como se relacionam com o sistema jurídico-eleitoral. Algumas considerações jurídico-
políticas, comentários de autores da Ciência Política, juristas e também dados estatísticos
serão apresentadas no sentido de justificar a idéia de que se tratam de casos e fatos que
têm a propriedade de influenciar na normalidade e regularidade do pleito e, assim,
corromper o processo eleitoral.

195
Os casos foram organizados e aglutinados em vista de critérios de semelhança
em face de suas práticas, com base na legislação e denominações posteriores às de 1996,
na perspectiva de propiciar paralelos de comparação para pesquisas futuras. Ei-los:

- irregularidade na apuração, na contagem ou na totalização de votos;


- divulgação de pesquisa eleitoral supostamente irregular;
- impetração de fato ofensivo à honra – direito de resposta;
- veiculação de propaganda eleitoral irregular;
- crime eleitoral: crime contra a honra;
- divulgação de publicidade institucional irregular;
- abuso de poder econômico-político;
- programação irregular de rádio, TV e outros meios de comunicação;
- condutas vedadas aos agentes públicos;
- crime eleitoral: fraude;
- crime eleitoral: dar, oferecer, receber sorteio – aliciamento;
- crime de desobediência à Justiça Eleitoral;
- propaganda partidária gratuita irregular;
- impedir exercício de propaganda;
- transporte irregular de eleitores;
- irregularidades praticadas por servidor da Justiça Eleitoral; e
- diversos.

IV.1 Irregularidade na apuração, na contagem ou na totalização de votos


IV.1
A irregularidade, aqui, refere-se ao procedimento formal e administrativo,
passando pelo funcionamento e composição das mesas receptoras, procedimentos na
realização da coleta de votos, contagem, apuração e totalização. É importante, ressalte- se,
o tão propalado “mapismo”: fraude contábil realizada pelos “mapeiros”, escrutinadores,
na transcrição dos mapas, a que os idealizadores da urna eletrônica buscaram erradicar
quando eliminaram a própria participação maciça de tais colaboradores.
Vale lembrar que anteriormente às urnas eletrônicas o procedimento regrado
pela Lei nº 8.713/93 já visava a evitar essa prática, quando da ocorrência de dados
conflitantes referentes a votos nulos, brancos ou válidos em relação às médias gerais
verificadas no município, na seção e na zona eleitoral.
O fenômeno do mapismo começou a ser eliminado a partir da introdução da
urna eletrônica nas eleições de 1996; no Paraná, apenas Curitiba e Londrina experimentaram
tal novidade nessas eleições. Sabe-se que o controle das apurações deixou de ser formal-
material, passou mais a ser um controle virtual, restrito a técnicos especializados da
Justiça Eleitoral e representantes partidários. Esse controle é também feito, indireta e
subjetivamente, a partir de estatísticas e projeções de pesquisadores, em confronto com
os resultados eleitorais, efetuadas por analistas políticos e cientistas sociais. Em eleições
futuras, registre-se, o voto impresso e auditorias foram introduzidos.
Um fator que deve também ser sopesado, sobretudo quando da análise da
196
pesquisa, é o do volume de casos das supostas irregularidades que decorrem de
procedimentos menos formais, denominados de impugnações de votos e urnas. Embora
sejam meras reclamações, em nome do rigor científico eles foram coletados. Registra-se,
por oportuno e para bem demonstrar tal situação, que os pedidos de impugnações e
recontagens de votos, formulados por candidatos e partidos, refletem por vezes a busca
aflita de poucos votos que lhes garantam a eleição, figurando a Justiça Eleitoral ou a Junta
Apuradora no pólo passivo do processo. Em um breve apanhado dos acórdãos do TRE-
PR é possível constatar esse fato:
- Acórdão nº 21.314, de 21 de novembro de 1996:

Ementa: Recurso Eleitoral. Recontagem de Votos. Incompetência.


Nulidade.
Cabe à Junta Eleitoral decidir sobre os pedidos de recontagem de votos,
sendo nula a decisão do Juízo monocrático. Justificativa do pedido
constante do Relatório: “[...] ingressou com pedido de recontagem de
votos, cumulado com pedido de explicações, sob o argumento de que
obteve 284 votos, e o candidato eleito Altivo Heleno Dias, que disputou
as eleições pelo PT, obteve 290 votos. Tendo em vista a diferença de
votos, requereu informações acerca do cálculo do quociente eleitoral
[...] enfim a recontagem total de votos, a fim de averiguar a possibilidade
de ter sido eleito” (PARANÁ. TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL, 1996a).

-Acórdão nº 21.334, de 22 de novembro de 1996: Ementa: “Recontagem de


votos. Indeferimento. Ausência de impugnação perante a mesa apuradora – art. 171, CE”.
Justificativa constante do Relatório: “[...] alegando o cerceamento do direito de fiscalização
e erro material na apuração, pois muitos votos de Rubens foram, na dúvida quanto à
grafia, atribuídos a Orlando Bonette, candidato do PT” (PARANÁ. TRIBUNAL REGIONAL
ELEITORAL, 1996b).
- Acórdão nº 21.339, de 25 de novembro de 1996: Ementa: “Recurso Eleitoral
contra decisão da junta apuradora que indeferiu a recontagem de votos”. Justificativa do
pedido constante do Relatório: “Alegou que em Cascavel todas as pesquisas de intenção de
votos foram contrariadas pela apuração, sendo que o candidato da requerente, Edgar
Bueno, deveria ter ganho do candidato Salazar Barreiros com uma margem de 4% a 8% e
acabou perdendo por apenas 0,15% (220 votos num contexto de 138.000 eleitores)”
(PARANÁ. TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL, 1996c).

IV.2 Divulgação de pesquisa eleitoral supostamente irregular


IV.2
Esse é um tema que assumiu grande destaque no cenário político-eleitoral e,
por isso, foi separado do caso ou fato “Propaganda, informação e corrupção eleitoral”. A
utilização de pesquisa é das práticas mais recentes no processo eleitoral. Surgiu com a
sociedade de massas e obteve a atual ênfase com o processo de redemocratização nos
anos 1980 no Brasil, ganhando força com a revogação do dispositivo do Código Eleitoral
197
de 1964, Art. 2555, após a edição da Constituição de 1988 e do princípio disposto no
Artigo 220, § 1º, que trata da liberdade de informação. Muito embora esse princípio seja
consagrado, a cada eleição as pesquisas eleitorais são alvos de muita discussão e têm sido
objeto de análise e alteração por parte dos legisladores. Foi assim com a Lei nº 8.713, que
regulou as eleições de 1994; com a Lei nº 9.100/95, que disciplinou as eleições de 1996,
e a Lei nº 9.504/97, que regulou as eleições subseqüentes, seguindo até as discussões que
estiveram na pauta da atual reforma política no Congresso Nacional.
A instrução emitida pelo TSE6 para as eleições de 2004 contou com 21
dispositivos, indo bem além do já disciplinado na Lei das Eleições (nº 9.504/97), fruto,
certamente da experiência de reiteradas eleições, que têm demonstrado a todos – intérpretes,
políticos e cientistas políticos – a necessidade do aperfeiçoamento, em vista sobretudo da
necessidade de harmonização dos princípios de liberdade de informação e da isonomia
dos candidatos frente ao processo eleitoral e às instituições democráticas.
Voltando um pouco no tempo e situando a realidade das eleições de 1996, a Lei
nº 9.100/95 tipificou como crime eleitoral a pesquisa manipulada como infringência dos
artigos 48 e 49, que tratam das pesquisas eleitorais.
Autores do ramo do Direito Eleitoral como Lauro Barreto (1997) e Olivar
Coneglian (1996), à época da edição da lei acima referida, faziam análises que confluíam
na mesma direção: de que pesquisas orientam candidatos a mudarem as estratégias;
contudo admitiam o mau uso das pesquisas para enganar o público com falsas tendências.
5
Art. 255 da Lei nº 4.737/65: “Nos 15 dias anteriores ao pleito é proibida a divulgação, por qualquer forma, de
resultados de prévias ou testes pré-eleitorais” (BRASIL, 2002a).
6
A Resolução nº 21.576 do TSE regulará as eleições de 2004: “Art. 2º A partir de 1º de janeiro de 2004, as
entidades e empresas que realizarem qualquer tipo de pesquisas de opinião pública relativas às eleições ou aos
candidatos, para conhecimento público, são obrigadas, para cada pesquisa, a registrar no juízo eleitoral ao qual
compete fazer o registro dos candidatos, até cinco dias antes da divulgação, as seguintes informações [...] (Lei nº
9.504/97, Art. 33, I a VII, e § 1º); § 4º O não-cumprimento do disposto neste Artigo ou qualquer ato que vise a
retardar, impedir ou dificultar a ação fiscalizadora dos partidos constitui crime, punível com detenção de seis meses
a um ano, com a alternativa de prestação de serviços à comunidade pelo mesmo prazo, e multa no valor de R$
10.641,00 (dez mil, seiscentos e quarenta e um reais) a R$ 21.282,00, (vinte e um mil, duzentos e oitenta e dois reais)
(Lei nº 9.504/97, art. 34, § 2º). Art. 14. A divulgação, ainda que incompleta, de resultado de pesquisa sem o prévio
registro das informações de que trata o art. 2º desta Instrução, sujeita o instituto de pesquisa, o contratante da
pesquisa, o órgão de imprensa, o candidato, o partido político ou coligação ou qualquer outro responsável à multa
no valor de R$ 53.205,00 (cinqüenta e três mil, duzentos e cinco reais) a R$ 106 410,00 (cento e seis mil, quatrocentos
e dez reais) (Lei nº 9.504/97, art. 33, § 3º; Acórdão nº 372, de 25 jun. 2002). § 1º O veículo de comunicação social
arcará com as conseqüências da publicação de pesquisa não registrada, mesmo que esteja reproduzindo matéria
veiculada em outro órgão de imprensa (Acórdão nº 19.872, de 29.ago.2002). § 2º Estarão isentos de sanção os
institutos de pesquisa que comprovarem que a pesquisa foi contratada com cláusula de não-divulgação e que esta
decorreu de ato exclusivo de terceiros, hipótese em que apenas estes responderão pelas sanções previstas. Art. 15.
A divulgação de pesquisa fraudulenta constitui crime, punível com detenção de seis meses a um ano e multa no valor
de R$ 53.205,00 (cinqüenta e três mil duzentos e cinco reais) a R$ 106 410,00 (cento e seis mil quatrocentos e dez
reais) (Lei nº 9.504/97, art. 33, § 4º). Art. 16. Pelos crimes definidos nos §§ 4º e 5º do art. 13 e no art. 15 desta
Instrução, podem ser responsabilizados penalmente os representantes legais da empresa ou entidade de pesquisa
e do órgão veiculador (Lei nº 9.504/97, art. 35). Art. 17. As pesquisas eleitorais poderão ser divulgadas a qualquer
tempo, inclusive no dia das eleições (Constituição, art. 220, § 1º; Acórdão-TSE nº 10.305, de 27.out.1988) (BRASIL.
TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL, 2003b).

198
Não havia na época, como hoje é feitos pelos analistas, uma avaliação do forte impacto que
as pesquisas têm exercido sobre o resultado eleitoral.
A evolução do processo democrático nacional tem demonstrado que pesquisas
ganham eleições e que o grande desequilíbrio entre os princípios de liberdade de expressão
e de igualdade entre os candidatos tem arranhado o processo eleitoral e a democracia.
Nesse sentido, é oportuna a análise do jornalista Sérgio Buarque de Gusmão:

[...] É indisfarçável, no entanto, que os institutos escalaram um Everest de


erros nas pesquisas para as eleições de 1998. [...] Os erros foram maiores
do que a boa-fé pode suportar. Tome-se o desempenho do Datafolha. O
instituto associado ao maior jornal do país, a Folha de S. Paulo, tropeçou
em todas as pesquisas de intenção de voto para governador de nove
estados e do Distrito Federal, realizadas dois dias antes da eleição, dia 4
de outubro. O Datafolha errou a votação de pelo menos 13 de 22 candidatos
mencionados. Em São Paulo, Bahia e Distrito Federal, embaralhou a ordem
de colocação dos candidatos – de tal sorte que um segundo colocado
(Francisco Rossi, em São Paulo) caiu para o quarto lugar. No Rio, ao
contrário do que previu o instituto, Anthony Garotinho não venceu no 1.º
turno – obteve 46,86% e não 52% dos votos válidos. O Ibope, decano dos
institutos de pesquisa, há cinqüenta anos no ramo, boiou tanto quanto um
ginasiano esquadrinhando o teorema de Fermat. No Maranhão, para ficar
no caso mais vexatório, o instituto previu que a governadora Roseana
Sarney seria reeleita com 70% do total de votos, e ela estacou em 48,8% –
uma diferença de 21 pontos percentuais que fariam uma instituição séria
corar de vergonha e pedir desculpas ao público (GUSMÃO, s/d).

Na atualidade existe quase um consenso nas casas legislativas, Câmara dos


Deputados e Senado Federal a respeito da necessidade de alteração dos mecanismos existentes.
Tal análise foi retratada no atual relatório da Reforma Política que tratou do tema:

A questão da pesquisa eleitoral foi um dos pontos muito debatidos nesta


Comissão e existe um consenso muito grande no sentido da necessidade
de haver uma limitação da sua divulgação, sobretudo nos últimos dias.
[...] Nossa sugestão é que nos últimos 15 dias de campanha seja proibida
a divulgação de pesquisa para evitar que se possa mudar ou transformar
a vontade do eleitor. E não é essa, em absoluto, a intenção. Ou seja, os
partidos podem continuar fazendo suas pesquisas, podem continuar
fazendo seus acompanhamentos [...] Esse foi o sentido que pudemos
captar das discussões, dos anseios, das conversas [...]. Creio que em
cada Estado temos histórias para contar acerca de pesquisas. Imagino
que não existe um Estado brasileiro em que não se tenha algo a contar de
pesquisa. Existe até o caso de pesquisa que funcionou para o outro lado,

199
ou seja, pessoas que estavam com a eleição ganha e, pela divulgação da
pesquisa, que forçou o voto útil, o resultado foi mudado. No nosso
entendimento, a medida de proibir a divulgação nos últimos 15 dias é
extremamente salutar para a garantia do resultado do processo e a vontade
do eleitor”. A Comissão apoiou integralmente a proposta de emenda
à Constituição oferecida pelo relator
relator, qual seja: PROPOSTA DE EMENDA
À CONSTITUIÇÃO Nº, DE 1998: Acrescenta inciso III ao § 3º do art. 220
da Constituição Federal, a fim de permitir que a lei possa impor restrições
à divulgação de pesquisas eleitorais (BRASIL. SENADO FEDERAL, 1998;
itálicos no original; sem negritos no original).

Contudo, ressalve-se que 15 dias é um exagero da proposta.

.3 VVeiculação
IV.3
IV eiculação de propaganda eleitoral irregular; divulgação de publicidade
institucional irregular; programação irregular de rádio e TV e propaganda
partidária gratuita irregula
irregular
Os tópicos propaganda e informação são dos mais importantes na atualidade
das democracias mundiais. Eles recaem no tema geral da comunicação e estão
intrinsecamente ligados à questão do abuso de poder econômico. Ambos vêm-se
constituindo em um desafio para todos que se interessam pela discussão da democracia.
Os itens propaganda e informação passaram pelas reformulações constantes
das leis dos anos das eleições: leis nº 8.214/91, nº 8.713/93 e nº 9.100/95, até a edição da
Lei das Eleições, a de nº 9.504/97. Os tópicos pesquisa eleitoral e impetração de fato
ofensivo – direito de resposta foram excluídos para melhor se delinear os contornos dos
tópicos dentro do próprio tema e ante o grande volume dos casos de direito de resposta.
No tocante às eleições de 1996, sobre propaganda em geral e em vista dos
dispositivos que regularam a Lei nº 9.100/95, ressalta-se que: 1. foram revogadas as
proibições de gravações externas; 2. aplicação de horário em rede para as emissoras que
operem em VHF e UHF; 3. houve a implantação de spots; 4. ocorreu a proibição de cidadão
filiado a partido diverso do responsável pelo horário (artigos 56 a 61); 5. quanto aos
debates, ficou mantida exigência da lei anterior, sendo permitidos desde que com a
participação de todos os partidos (art. 62) e 6. em relação aos anúncios em outdoors, foi
permitida sua utilização após o registro de candidatos, observando-se a divisão de espaços
entre os concorrentes, considerando os espaços de maior ou menor impacto (art. 55).
Ainda quanto ao aspecto jurídico, cabe ao intérprete sopesar os seguintes
princípios aplicáveis à propaganda eleitoral: liberdade de informação (art. 220 da
Constituição Federal); isonomia entre os candidatos frente ao processo eleitoral e às
instituições democráticas (art. 1º, parágrafo único, e art. 14, § 9º, da Constituição Federal)
e direito à privacidade (art. 5º, XLI, da Constituição Federal). Lima Sobrinho, tratando do
assunto da regulamentação da liberdade de informação na propaganda, afirma que “cifra-
se a uma tentativa para encontrar o meio-termo ideal entre a licença e a tirania” (Lima
Sobrinho apud FRUET, 1997, p. 153).
200
A legislação traz vedações à atuação das emissoras de comunicação no artigo 64
da Lei nº 9.100/95, prestigiando um dos princípios existentes – no caso, o princípio da
isonomia7. Posteriormente, a Lei nº 9.504/97, em seu artigo 45, ampliou os dispositivos
abarcando os radialistas e seus programas, sendo-lhes vedados a partir de 1º de julho
divulgar nome de programa e, a partir de 1º de agosto, às emissoras, de transmitir
programas apresentados ou comentados por candidato. Dentro do tema propaganda, é
interessante observar a evolução do instituto na busca de fechar as malhas legais, objetivando
coibir práticas irregulares. Essa evolução ocorreu em uma época em que os candidatos
radialistas e apresentadores de programas tiveram grande evidência no processo eleitoral
devido ao sucesso obtido nas urnas, gerando desigualdade na corrida eleitoral entre os
candidatos.
Como não existem fórmulas para aplicar a todos os casos concretos, como a lei não
pode prever tudo e também não pode restringir os limites da comunicação, entra em cena o
intérprete para equacionar os princípios em vista das situações presentes. O ex-Ministro do
TSE e advogado Torquato Jardim relaciona o problemático limite da restrição dos meios de
comunicação à questão da falsa informação em vista do voto conscientemente informado.

Os recursos de manipulação das mentes, subliminares ou mesmo


explícitos, são ilimitados. Os exemplos na história deste século são
incontáveis: os cultos de personalidade, a “fabricação” de mitos, a
“produção” de candidatos, a escolha de assuntos para “públicos-alvo”
são apenas algumas das expressões que as campanhas políticas
consagraram. [...] A lei não restringe a expressão da comunicação; nem
impõe licença prévia, nem censura posterior. Tal intuito seria contrário
ao sistema da Constituição. Ocorre que a mesma Constituição também
assegura o exercício da cidadania mediante sufrágio universal, o que
pressupõe, para a estabilidade da democracia, o voto conscientemente
informado. Voto livre de cultos de personalidade, de “fabricação” de
mitos, de “produção” de candidatos (JARDIM, 1994, p. 69).

Indo mais a fundo na questão da interferência dos meios de comunicação no


processo eleitoral, Antonio Rubin considera que:

No mundo contemporâneo, o nome de midiática e a conformação de uma


7
“Art. 64. A partir de 1º de julho de 1996, é vedado às emissoras, em sua programação normal ou noticiário: I
– transmitir, ainda que em forma de entrevista jornalística, imagens de realização de pesquisa ou qualquer outro
tipo de consulta popular de natureza eleitoral em que seja possível a identificação do entrevistado, ou manipulação
de dados; II – utilizar trucagem, montagem ou outro recurso de vídeo ou áudio, ou produzir ou veicular programa
que possa degradar ou ridicularizar candidato, partido ou coligação. III – veicular propaganda política ou difundir
opinião favorável ou contrária a candidato, partido ou coligação, ou seus órgãos ou representantes; IV – dar
tratamento privilegiado a candidatos, partidos ou coligações . V- veicular ou divulgar filmes, novelas, minisséries
ou qualquer outro programa que faça alusão ou crítica que prejudique candidato, partido político ou coligação,
mesmo que de forma dissimulada” (BRASIL, 1995; sem grifos no original).

201
sociabilidade estruturada e ambientada pela mídia recolocam em intensa
evidência a temática do relacionamento entre política e comunicação e, em
especial, da interação entre mídia e eleições; surgimento e desenvolvimento
de uma nova modalidade de comunicação, aqui, pois eles ressignificam
em profundidade os termos envolvidos na relação, alterando de modo
significativo as configurações do processo eleitoral, como se pretende
demonstrar (RUBIN, 2001, p. 172).

O autor segue adiante enfatizando a importância desse novo espaço, agora de


disputa de poder, ocupado pelas mídias: “Por meio desta autonomização, na produção de
acontecimento e de sua dinâmica, o espaço eletrônico se transforma ele mesmo em lugar
essencial de disputa política-eleitoral [...]. A tela – objeto síntese destes espaços eletrônicos
conectados em rede, emerge assim como novo e privilegiado espaço de disputa a ser
ocupado pela política” (idem, p. 182).
Como situações emblemáticas desses casos, Rubin conclui que dessas
transformações é possível constatar: “o deslocamento do espaço privilegiado da rua para
a tela, especialmente em eleições majoritárias; o advento de novos formatos políticos seja
na tela, seja na rua e, por fim, a aparição como possibilidade produtiva de novos
acontecimentos políticos, ensejados na tela e em uma perspectiva específica autonomizados
frente à campanha de rua, cuja produção torna-se crucial para a campanha eleitoral”
(idem, p. 185). O mesmo autor encerra, dizendo: “as novas configurações das eleições
sintonizadas com as novas configurações assumidas pela política em uma sociedade
estruturada e ambientada pela comunicação e pela mídia” (ibidem).

IV.4 Impetração de fato ofensivo à honra – direito de resposta; crime eleitoral –


IV.4
crime contra a honra
Este item congrega dois casos e fatos: direito de resposta e crime eleitoral na
modalidade de crime contra a honra. No tópico IV.3 são tratadas as situações decorrentes
da prática de propaganda eleitoral irregular ou práticas de comunicação irregular
contra candidatos, partidos ou coligações. O artigo 66 da Lei nº 9.100/95 dispõe que a
partir da escolha de candidatos em convenção é assegurado o direito de resposta a
candidato, partido ou coligação atingidos, ainda que de maneira indireta, por imagem,
conceito ou afirmação caluniosa, difamatória ou sabidamente inverídica, difundidos
por qualquer veículo de comunicação social. O artigo 64 do mesmo diploma veda a
utilização, pelas emissoras, de trucagem, montagem ou outro recurso de vídeo ou
áudio ou, ainda, produzir ou veicular programa que possa degradar ou ridicularizar
candidato, partido ou coligação.
Ao intérprete – ao julgador – cabe a missão de vislumbrar o equilíbrio nos
casos de direito de resposta em face dos princípios de direito constitucional: liberdade de
expressão, direito à privacidade e isonomia entre os candidatos, bem como saber os
limites entre a liberdade e a crítica frente a indivíduos que são investidos em cargos de
natureza pública, que detêm notoriedade em face do poder que exercem.
202
Nesse sentido citamos duas ementas iniciais de acórdãos do TRE-PR8, referentes
ao assunto, da lavra do Juiz Relator Clemerson Mèrlin Clève:

Rec. Eleitoral 97.


[...] 1. A trucagem ou montagem na propaganda eleitoral apenas é vedada
se tiver por escopo ridicularizar ou degradar a imagem de candidato,
partido ou coligação; [...] Acórdão nº 22.563, de 29.09.98. Recurso
Eleitoral 8. Representação. Ofensa. Inconfiguração. Direito de crítica. O
simples exercício de crítica, ainda que dura, não implica ofensa passível
de censura ou de emergência do direito de resposta. Acórdão nº 22.552
de 25.09.98. A segunda situação do item 2.4 é mais grave e, por isso
mesmo, denominada de “crime”. Trata-se de uma infração penal. A outra,
uma infração eleitoral, que resolve-se, em princípio, pela oportunidade
de a parte ofendida exercitar seu direito de resposta. Os crimes contra a
honra estão previstos no Código Eleitoral, Lei nº 4.737/ 65, nos artigos
324 a 326.

Eis uma breve noção dos conceitos de calúnia, difamação e injúria: “Calúnia: é
a falsa imputação a alguém de fato definido como crime; Difamação: é a imputação a
alguém de fato ofensivo à sua reputação; injúria: é a ofensa ao decoro ou à dignidade de
alguém” (COSTA, 2002, p. 99-100).

IV .5 Abuso de poder econômico-político


IV.5
Um dos grandes problemas das democracias contemporâneas é o abuso do
poder econômico. O poder político e de autoridade, semelhante e confluente ao econômico,
diferem na fundamentação em processos judiciais, muito embora o ato de corrupção
possa dar-se em ambos os casos pela via econômica. É importante a constatação de que o
uso do poder econômico não é proibido e sim o seu abuso, assim como uma dádiva que
não se constitua em abuso pode ser configurada, ainda, como crime se vinculada à
obtenção do voto do eleitor.
Uma dificuldade constatada pelos aplicadores do Direito é quanto à definição da
expressão “abuso de poder econômico”. Certamente está subentendida a utilização do
poder econômico, mas como precisar o limite para o excesso? Eneida Desirée Salgado,
tratando do assunto, comenta que: “O poder Judiciário fica, por assim dizer, com um
‘tipo’ cujo núcleo é um conceito jurídico, indeterminado. [...] Aqui deve-se reconhecer a
‘certeza’ e as zonas cinzentas do conceito. Em alguns casos há, certamente, abuso do
poder econômico. Em outros, esta afirmação depende de um sistema valorativo
desenvolvido pelo aplicador da lei” (SALGADO, 2001, p. 16).

8
Usamos como fonte de pesquisa o SJUR (Sistema de Jurisprudência) constante da intranet, rede interna da
Justiça Eleitoral. Ele é constante também da internet, no sítio http://www.tse.gov.br, mediante pesquisa pelos
indexadores propaganda eleitoral ou mediante busca pelo próprio número do documento.

203
Um instrumento intrinsecamente ligado ao abuso de poder e que se presta para
contê-lo é a prestação de contas. A Lei nº 9.100/95, disciplinando a prestação de contas,
dispôs:

Art. 33. As despesas da campanha eleitoral serão realizadas sob a


responsabilidade dos partidos, ou de seus candidatos, e por eles pagas.
Art. 34. Juntamente com o pedido de registro de seus candidatos, os
partidos e coligações comunicarão à Justiça Eleitoral os valores máximos
de gastos que despenderão por candidatura em cada eleição que
concorrerem (BRASIL, 1995).

Desses dois artigos depreende-se a natureza completamente liberalizante quanto


ao controle do sistema. A verificação por parte da Justiça Eleitoral dá-se por mera
escrituração contábil.
Nessa linha, eis a análise do ex-Ministro do TSE Jardim: “Submetidas as
prestações de contas à Justiça Eleitoral, a lei, com apuro técnico, assim como já o fazia a
lei da eleição de 1996, limita o visto judicial à afirmação de regularidade. Não há, por
conseqüência, juízo de julgamento, ou decisão judicial de aprovação ou rejeição” (JARDIM,
1998, p. 130)9.
Com base na perspectiva acima, Jardim faz a crítica:

As instituições da democracia representativa liberal estabelecem um poder


político relativamente fraco. Se isto permite mais liberdade aos cidadãos,
por outro lado, as tornam mais vulneráveis à pressão dos poderes
econômicos, os quais nunca estão organizados de maneira democrática.
Neste sentido, as democracias ocidentais são plutocracias, nas quais o
poder real repousa ora no povo, por meio da eleição, ora no dinheiro,
por meio dos grupos de pressão (DUVERGER). [...] O tema remete às
promessas não cumpridas da democracia, em particular à não-eliminação
do poder invisível (BOBBIO)” (idem, p. 132).

Foi visto, em separado, o abuso de poder econômico-político, de outro caso ou


fato que virá a seguir, denominado “crime eleitoral”; esses têm entre si estreita correlação.
A distinção propugnada está no tocante à tipificação, que no presente caso lastreia-se
essencialmente na Constituição Federal e na Lei Complementar nº 64/90; os crimes eleitorais,
por sua vez, remetem-se às tipificações constantes do Código Eleitoral e da Lei das Eleições
(nº 9.504/97). A divisão dá-se, também em face do impacto maior do primeiro no processo
eleitoral.

9
Por tais argumentos e pela prática vivenciada na área jurídico-eleitoral, não incluímos na relação de casos e fatos
o tema “prestação de contas”, estando o tema, contudo, ligado ao caso de abuso de poder econômico.

204
IV.6 Crime eleitoral – fraude; crime eleitoral – dar
IV.6 dar,, oferecer
oferecer,, receber sorteio ou
aliciamento; crime de desobediência; transporte irregular de eleitores
Esse conjunto de práticas de corrupção eleitoral é tipificado expressamente no
Código Eleitoral, Lei nº 4.737/65. A fraude, contudo, compreende um conjunto de tipos
penais eleitorais previstos nos artigos 348 a 350.10
O crime de desobediência refere-se à desobediência ao próprio Juiz Eleitoral.
Essa situação é muito freqüente em propaganda eleitoral, quando alguém é intimado a
fazer ou deixar de fazer algo e para tanto foi intimado com advertência do Juiz.
O transporte irregular de eleitores é tipo penal previsto no art. 5º da Lei nº
6.091 de 197411, em uma hipótese também prevista no artigo 302 do Código Eleitoral.
Os tipos de crimes eleitorais referentes aos atos de dar, oferecer, receber
sorteio e aliciamento caracterizam-se em figuras clássicas de corrupção. A figura das
1
famosas “cestas básicas”, que se configura no tipo do art. 299 do Código Eleitoral12,
continua presente em eleições em todos os pontos do Brasil, principalmente em centros
menores, pois nossa evolução urbana tem substituído, conforme já se falou, velhas práticas
de corrupção por novas formas como o abuso de poder econômico e dos meios de
comunicação. Sobre o assunto, Barreto considera que, “Da mesma forma, quase não se vê
hoje em dia a transferência ou a promoção de certas categorias de funcionários públicos
(Delegados de Polícia, Fiscais de Renda etc.) como instrumento de pressão para conquista
de votos; como também é cada vez mais raro, fora dos tais grotões, a distribuição
individualizada de favores ou dinheiro em troca do voto” (BARRETO, 1995, p.13).
De outro lado, aspecto relevante a ser inserido nesse contexto jurídico-político
é o referente à Lei de Anistia, promulgada em agosto de 2000, relativa às eleições de 1996
e 1998. A lei anistiou os débitos decorrentes de multas aplicadas pela Justiça Eleitoral,
abrangendo desde eleitores que deixaram de votar, mesários que não comparecerem às
seções até as multas resultantes de propaganda eleitoral irregular. Tal lei foi recebida

10
“Art. 348 – Falsificar, no todo ou em parte, documento público ou alterar documento público verdadeiro, para
fins eleitorais [...].
Art. 349 – Falsificar, no todo ou em parte, documento particular ou alterar documento particular verdadeiro, para
fins eleitorais [...].
Art. 350 – Omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar ou nele inserir ou fazer
inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, para fins eleitorais [...]”.
11
“Art. 5º – Nenhum veículo ou embarcação poderá fazer transporte de eleitores desde o dia anterior até o
posterior à eleição, salvo: I. a serviço da Justiça Eleitoral. II. Coletivos de linhas regulares e não fretados; III. De
uso individual do proprietário, para o exercício do próprio voto e dos membros de sua família; IV. O serviço
normal, sem finalidade eleitoral, de veículos de aluguel não atingidos pela requisição de que trata o Art. 2º”
(BRASIL, 1974).
12
“Art. 299. Dar, oferecer, prometer, solicitar ou receber, para si ou para outrem, dinheiro, dádiva, ou qualquer
outra vantagem, para obter ou dar voto e para conseguir ou prometer abstenção, ainda que a oferta não seja aceita”
(BRASIL, 2002a).
A recente Lei nº 9.840 alterou o Art. 41 da Lei nº 9.504, mas, por tratar-se de dispositivo posterior e ampliar as
situações do tipo, não está aqui contemplada.
“Art. 334. Utilizar organização comercial de vendas, distribuição de mercadorias, prêmios e sorteios para
propaganda ou aliciamento de eleitores [...]” (idem).

205
como uma afronta ao poder Judiciário13, conforme referência ao ato pela Procuradora da
República Eleitoral na época, Denise Vince Túlio, que escreveu: “a anistia soa como um
prêmio àqueles cidadãos que, no afã de conseguir votos a qualquer preço, violaram a lei.
Eles detêm a esperança, não tão infundada, de que a condenação pelo poder Judiciário
pouco importa diante do beneplácito do poder Legislativo” (TÚLIO, 2000, p. 22). Em nota
nesse artigo, a autora reporta-se a matéria da revista Época, que indicava visar o projeto
a beneficiar dez governadores, 69 deputados federais e 20 senadores. Mais que uma
afronta ao poder Judiciário, certamente, constituiu-se também em uma afronta à democracia.
Outro aspecto interessante e que situa de maneira relativa e quantitativa o problema
é a situação de um município do estado do Paraná, Maringá. Em 1996, em uma pesquisa
realizada por uma empresa de assessoria estatística, revelou-se a existência nessa cidade
e na região de um contingente de aproximadamente 7% de eleitores que trocaram votos
por favores ou negociaram-nos por presentes, como cestas básicas, cadeiras de rodas e
óculos. Segundo a pesquisa, “existem de 6% a 8% de eleitores potencialmente corruptores
[...] alguns afirmaram receber favores ou cestas, por exemplo, de três ou quatro candidatos,
mas disseram que normalmente votam naquele que deu o objeto por último. A pesquisa
classifica os eleitores ‘mercenários’ que negociaram seu voto para mais de um candidato,
às vezes até 10. A amplitude de eleições pesquisadas foram duas, de 1992 e 1996"
(ELEITOR TROCA VOTO, 1996, p. 4).
Em contexto recente, uma pesquisa sobre compra de votos nas eleições de
2002, realizada para a organização não-governamental Transparência Brasil, revelou que
nas eleições de outubro e novembro desse ano cerca de 3% dos eleitores receberam
oferta de candidatos ou cabos eleitorais para vender o seu voto. Entre os benefícios
oferecidos está em primeiro lugar o dinheiro (56%), seguido de bens materiais (30%) e
favores da administração (11%). Em pesquisa anterior desse mesmo gênero, realizada
após as eleições municipais de 2000, seis por cento dos eleitores afirmaram que receberam
ofertas para que vendessem o voto por dinheiro (SPECK & ABRAMO, 2002, p. 1). O dado
mais relevante dessa pesquisa para o presente trabalho é que cerca de 3 milhões de
eleitores no Brasil receberam oferta de vender o seu voto (idem, p. 4).
A dificuldade apontada pelos críticos em exterminar-se ou mesmo coibir essas
práticas descritas é a efetividade da aplicação das penas, em face do rito demorado da ação
penal. A Lei nº 9.099/95 veio justamente a partir dessa preocupação de combater a
impunidade, pois muitos processos no âmbito eleitoral são arquivados devido à prescrição.
Esclareça-se que tal lei veio a partir de uma tendência, também, do Direito Penal de
despenalização, sendo possível então aplicar o instituto da transação penal e da possibilidade
da suspensão condicional do processo nos casos de crimes eleitorais considerados de
menor potencial ofensivo, o que representa a ampla maioria dos crimes eleitorais.

13
A XV Reunião do Colégio de Presidentes dos Tribunais Eleitorais do Brasil, realizada em agosto de 1999, em
Curitiba, retirou manifesto contrário à aprovação do referido projeto de lei (TULIO, 2000 p. 22).

206
V. APRESENTAÇÃO E INTERPRETAÇÃO DE QUADROS DOS DADOS
PESQUISADOS NOS ACÓRDÃOS DO TRE-PR14
Quadro 1
Fatos
Nº CRIMES ELEITORAIS QUANTIDADE
1. Irregularidade na apuração, na contagem ou na totalização de votos 170
2. Divulgação de pesquisa eleitoral supostamente irregular 61
3. Impetração de fato ofensivo à honra – direito de resposta 209
4. Veiculação de propaganda eleitoral irregular 212
5. Crime eleitoral – crime contra a honra 32
6. Divulgação de publicidade institucional irregular 14
7. Abuso de poder econômico-político 46
8. Programação de rádio, TV ou outros irregular 55
9. Condutas vedadas aos agentes públicos 13
10. Crime eleitoral – fraude 25
11. Crime eleitoral – dar, oferecer, receber; sorteio ou aliciamento 71
12. Crime de desobediência 4
13. Propaganda partidária gratuita irregular 1
14. Impedir exercício de propaganda 4
15. Transporte irregular de eleitores 11
16. Irregularidades praticadas por servidor da Justiça Eleitoral 9
17. Crime eleitoral – diversos 3
Fonte: o autor, a partir de Paraná. Tribunal Regional Eleitoral (1996-2004).

O Quadro 1 indica ocorrências de processos que trataram dos casos de corrupção


eleitoral no TRE-PR, decorrentes das eleições de 1996. Compreendem a totalidade dos
casos que tramitaram no TRE, independentemente de ter havido confirmação da
irregularidade ou não. Pretende-se, assim, dar a totalidade dos casos e o volume do que
efetivamente ingressou no Tribunal, seja em matéria de recursos, que é a maioria dos
casos, seja proveniente de ações julgadas originariamente (o ingresso do processo faz-se
diretamente no Tribunal onde é feito o primeiro julgamento).

14
A pesquisa foi realizada nos livros de acórdãos do TRE-PR, no período de junho de 1996 a maio de 2004.
Foram registradas nesse período 906 ocorrências de julgados realizados pelo TRE PR, seja em grau de recurso,
seja em grau de decisão originária, tratando dos casos relacionados acima, provenientes de cartórios ou zonas
eleitorais de todo o estado do Paraná. É necessário esclarecer que os documentos em que realizamos a pesquisa
são denominados “acórdãos”, onde consta o julgamento de colegiado (grupo de Juízes), ao contrário de decisão
ou sentença proferida por juízo singular. Também esclarecemos que os livros que contêm os documentos acórdãos
destinam-se essencialmente ao uso pelo meio jurídico, de modo que não foram elaborados e organizados para
a presente pesquisa. Assim, os dados não são objetivamente dispostos em data do fato, eleição em que ocorreu
o caso e a própria descrição do fato. Resgatou-se tais dados a partir da análise do documento físico, verificando-
se a legislação aplicável, a eventual menção de dados nos relatórios e assim por diante. Esses dados foram
dispostos na ordem seqüencial em que se apresentam nos documentos acórdãos: 1.TRE-PR; 2. tabela do respectivo
tipo de processo; 3. procedência; 4. partes; 5. advogados; 6. nome do relator; 7. revisor, se houver; 8. ementa; 9.
decisão; 10. data; 11. relatório; 12. dispositivo e voto.

207
O Gráfico 2 indica a ocorrência de casos que tramitaram e tiveram penalidade
aplicada pela corte eleitoral, nos casos de abuso de poder econômico-político, nas cidades
com maior ocorrência. Esse gráfico demonstra as cidades com maior ocorrência de casos
relacionados ao assunto e, no conjunto, indica o volume das cidades mais afetadas e se há
ou não disparidade ou equilíbrio entre as cidades.
Gráfico 2
Abuso de poder econômico-político

Campo Mourão/Curitiba/Londrina Arapongas/Barracão/Campina da Lagoa/Campo Largo


Engenheiro Beltrão/Grandes Rios/Irati/Palmeira/Ponta
Grossa/Porecatu/São Miguel do Iguaçu

Fonte: o autor, a partir de Paraná. Tribunal Regional Eleitoral (1996-2004).

Gráfico 3
Crime eleitoral - Dar, oferecer, receber...; sorteio ou aliciamento

Barracão/Curitiba Joaquim Távora/ Alto Paraná/Campina da Lagoa/


Rio Branco do Sul Campo Largo/Campo Mourão/Maringá/
Palmas/Pitanga/Santo Antônio da Platina/
São Miguel do Iguaçu
Fonte: o autor, a partir de Paraná. Tribunal Regional Eleitoral (1996-2004).

O Gráfico 3 refere-se a casos de condenações no TRE-PR, relativos à ocorrência


da prática de crime eleitoral, na modalidade de dar, oferecer, receber ou de sorteio ou
aliciamento. Indica também as cidades de origem.

208
Gráfico 4
Resultados dos fatos

Fonte: o autor, a partir de Paraná.


Tribunal Regional Eleitoral
(1996-2004).

O Gráfico 4 indica os resultados ou respostas dos julgamentos dos


processos:
- a absolvição indica que houve posicionamento no TRE-PR quanto ao fato
imputado e a parte foi considerada inocente;
- a condenação indica que houve posicionamento no TRE-PR quanto ao
fato imputado e a parte foi considerada culpada.
- o mérito não analisado indica que não houve posicionamento do Tribunal
a indicar a culpa ou não, podendo ter ocorrido: arquivamento; extinção
do processo; prescrição e decadência; julgamento em recurso tratando
de aspectos processuais; julgamentos em habeas corpus etc.
Gráfico 5
Recorrências dos Processos por mês

Fonte: o autor, a partir de Paraná. Tribunal Regional Eleitoral (1996-2004).

209
O Gráfico 5 apresenta as recorrências dos processos por mês, indicando a
ocorrência em quantidades de processos julgados nos meses indicados.

Gráfico 6
Irregularidade de apuração,
na contagem ou na totalizações dos votos

Fonte: o autor, a partir de Paraná. Tribunal Regional Eleitoral (1996-2004).

Por fim, o Gráfico 6 trata de irregularidades em apuração, contagem ou totalização


de votos.

VI. INTERPRETAÇÃO DOS DADOS

Sendo o tema central desse trabalho a corrupção eleitoral, o gráfico norteador


na interpretação dos dados é o Gráfico 1; os demais são auxiliares nas interpretações.
Pelo Gráfico 1 compreende-se, em uma análise inicial, que houve um amplo
predomínio de casos e fatos relacionados aos meios de comunicação. A partir dessa
observação, reagrupamos os casos e fatos em nova ordem, aglutinando-os em vista do
destaque no gráfico e da referência feita na literatura acima apresentada.
Eis os reagrupamentos:
1. casos e fatos relacionados aos meios de comunicação: impetração de fato
ofensivo à honra – direito de resposta; crime eleitoral contra a honra – direito de
resposta; propaganda partidária gratuita irregular; divulgação de pesquisa eleitoral
irregular; veiculação de propaganda eleitoral irregular; divulgação de publicidade

210
institucional irregular; programação de rádio/TV/outros irregular;
impedimento do exercício de propaganda;
2. abuso de poder econômico-político e condutas vedadas;
3. crime eleitoral – dar, oferecer, receber sorteio ou aliciamento; transporte
irregular de eleitores; crime eleitoral – fraude;
4. irregularidade na apuração/contagem ou totalização de votos; irregularidades
praticadas por servidor membro de Justiça Eleitoral; e
5. crime eleitoral – diversos.
Isso posto, vamos às análises.

VI.1 Meios de comunicação


O tema comunicação, compreendido no item 1 acima, domina amplamente a
pauta dos processos julgados na arena TRE-PR. Os 17 fatos elencados na pesquisa
representam total de 930 casos e fatos, e os referentes à propaganda somam o equivalente
a 59,70% do total. Esses dados dão a dimensão de que:
- conforme exposto na seção IV, em que se tratou de propaganda e do impacto da
mídia no processo eleitoral, viu-se que o espaço eletrônico transforma- se ele
mesmo no lugar essencial de disputa político-eleitoral no mundo contemporâneo,
conforme Rubin (2001, p. 182). Tal argumento confirma-se, amplamente, a partir
dos gráficos apresentados;
- a Justiça Eleitoral emerge como ator no cenário político, já que a disputa político-
eleitoral – a luta pelo poder político – passa pela mediação e julgamento dessa
justiça especializada, cabendo-lhe definir o direito dos candidatos e partidos
políticos de propagar algo ou mesmo uma restrição dessa divulgação, com as
conseqüências inerentes ao processo de informação eleitoral, ocorrendo assim o
que poderia se denominar de judicialização15 da política; o volume de trabalho e
da sobrecarga concentrada em um período específico – setembro e outubro, em
que a totalidade das questões de propaganda é discutida na corte do TRE-PR –,
justamente na reta final do processo eleitoral, o que leva à preocupação quanto à
falibilidade humana diante das condições extenuantes de trabalho em face do alto
relevo do assunto – eleições e democracia – possam de alguma forma prejudicar
a qualidade e o resultado dos processos.

VI.2 Abuso do poder econômico-político e condutas vedadas


Em virtude da natureza semelhante dos dois casos e fatos “abuso de poder
econômico-político” e “condutas vedadas”, cabe-lhes aqui uma abordagem única. Os
gráficos demonstram que, quantitativamente, a questão dos abusos não tem maior relevância.
Contudo mais importante é saber se os casos e fatos que penetraram nas malhas judiciais

15
Termo utilizado por Vera Karan de Chueiri no painel “A democracia e a judicialização da política: a jurisdição
constitucional no governo Lula”, apresentado no Ciclo de Debates “Fim da política? A crise da esquerda e a crise
do governo”, realizado em Curitiba, em dezembro de 2005.

211
foram captados pela estrutura e se os responsáveis sofreram reprimendas. Para isso a
análise do Gráfico 4 assume relevo. Desses gráficos conclui-se, pelo baixo índice de
condenações dos casos, que há falta de efetividade do sistema em captar e posteriormente
coibir as práticas de abuso de poder econômico-político e condutas vedadas.
Do exposto é possível perceber que a questão do abuso de poder econômico
nas eleições municipais de 1996 no Paraná não teve maior incidência na estrutura judicial
do TRE-PR. Contudo, por meio da análise da literatura coletada e de maneira contraditória
aos presentes resultados, observa-se que um dos grandes problemas das democracias
contemporâneas é o abuso do poder econômico. Essa afirmação tem sido propalada por
estudiosos da área do mundo inteiro. Vai nessa linha a crítica de Jardim: “as democracias
ocidentais são plutocracias, em que o poder real repousa ora no povo, por meio da
eleição, ora no dinheiro, por meio dos grupos de pressão (DUVERGER)” (JARDIM, 1998,
p. 132); daí o autor desenvolve uma crítica sobre a prestação de contas, em que Justiça
Eleitoral limita-se ao visto judicial, não havendo juízo de julgamento ou decisão judicial de
aprovação ou rejeição.
A indicação dos doadores, financiadores de partidos e candidatos nas prestações
de contas nas eleições de 1996 não constituiu avanço para Fruet (1997, p. 277): “[...] Se,
por um lado, constitui avanço a prestação de contas, com a relação de doadores – mesmo
que parcial, por outro, pode-se afirmar que este instrumento legitima, por vez, a verdadeira
‘parceria’ entre o poder político e o poder econômico, visando ao ‘mando político”.
Para concluir esta seção, pode-se dizer que há um verdadeiro “buraco negro” no
sistema jurídico, caracterizado pela ausência significativa de casos contidos nas malhas da
estrutura legal, significando que essa não tem captado os casos nem reprimido os infratores
com a devida sanção legal.

VI.3 Crime eleitoral – dar dar,, oferecer


oferecer,, receber sorteio ou aliciamento; transporte
irregular de eleitores; crime eleitoral – fraude
Em uma análise preliminar, verifica-se, conforme o Gráfico 1, que esse tópico
tem presença significativa. A soma dos três casos e fatos perfaz um total de 108 ocorrências,
embora não os coloquem em grande evidência na arena TRE-PR.
Em outra análise (Gráfico 3) que indica o resultado desses processos, constata-
se que apenas um pequeno número de condenações realizaram-se no âmbito do TRE-PR.
É possível verificar na tabela de gráfico de ocorrências o detalhe do lapso temporal e da
demora dos julgamentos, o que sugere que boa parte dos casos deve ter incorrido em
decadência. Por outro lado, não há elementos para comparações, mas a introdução da Lei
nº 9.099/95 (juizados especiais, cíveis e criminais) e sua incidência no âmbito eleitoral
pode ter sido um fator de redução de número de condenações.
A corrupção eleitoral no Brasil – que, como se procurou demonstrar neste
trabalho, está afeta às relações de poder e penetrou na sociedade via patrimonialismo,
clientelismo, coronelismo, populismo e corporativismo e que consta da relação proposta
de fatos e casos – é o tópico que mais se aproxima dessa realidade, muito embora tenha
íntima relação com o tópico IV.5 – abuso de poder econômico-político.
212
Os dados em termos quantitativos que se extraem do Gráfico 1 são relativamente
baixos em vista do histórico e do próprio panorama apresentado no trabalho, que, em
tese, deveria ter um número bem maior.
Quanto ao gráfico, convém lembrar que o rito processual adotado, devido à sua
lentidão, leva a um elevado número de decadência e prescrições, como também alguns
processos podem ter sido alcançados pelo instituto da transação penal. Tais considerações,
contudo, são relativamente frustrantes diante da literatura anteriormente apresentada,
tanto quanto devido à ausência de resposta efetiva à sociedade, atacada em sua soberania
da liberdade do sufrágio e do princípio democrático.

VI.4 Irregularidade em apuração, contagem ou totalização de votos e


irregularidades praticadas por servidor -membro da Justiça Eleitoral
servidor-membro
Os gráficos indicam uma presença pequena, porém considerável, de casos,
sobretudo de irregularidades em apuração.
É necessário esclarecer, mais uma vez, que as eleições municipais de 1996 contaram
com pequena quantidade de urnas eletrônicas, sendo que a ampla maioria das cidades do
interior utilizaram as tradicionais urnas de lonas, o que gerava muitos recursos,
diferentemente do que ocorre atualmente.
O Gráfico 6, referente às irregularidades em apuração, contagem ou totalização de
votos, dá evidência do que foi indicado anteriormente. O resultado apertado nas eleições
de Cascavel em 1996 levou a uma grande movimentação de advogados no sentido de
recorrerem ingressando com pedidos de recontagem de votos. Tais aspectos resultaram
em significativo impacto nos gráficos analisados comparativamente entre as cidades;
contudo não é possível obter-se avanços e conclusões sobre a temática de corrupção.
Possivelmente uma comparação com pesquisa idêntica referente às eleições do ano 2000
possibilite algumas inferências.

VI.5 TTempo
empo do processo
O Gráfico 5 não se refere a um caso ou fato, mas trata da recorrência dos
processos TRE-PR. O gráfico apresenta o ritmo, volume e impacto dos processos julgados
na corte do TRE-PR. Constata-se, de um lado, o volume altíssimo de casos concentrados
na reta final do processo eleitoral, ou seja, em setembro e outubro, em sua maioria
relativos a questões de propaganda e direito de resposta, em que se percebe a extrema
celeridade do órgão julgador. De outro lado, há um grande lapso temporal no andamento
de certos processos, sobretudo os de crime eleitoral e ação de impugnação de mandato
eletivo (AIME), que têm maior lentidão em virtude do ritmo da processualística.

VII. CONCLUSÕES

O presente trabalho buscou analisar a corrupção eleitoral nas malhas do sistema


jurídico-eleitoral e obteve alguns resultados que, se porventura não são surpreendentes,
apontam realidades e algumas novidades, abrindo certamente possibilidades de novos

213
estudos acadêmicos.
Uma primeira conclusão central, e da maior relevância em vista do objetivo do
estudo, é quanto ao aspecto do abuso do poder econômico. A estrutura jurídica existente
não capta os crimes mais lesivos para a ordem democrática. A máquina é movimentada
enormemente no período crítico do processo eleitoral com processos decorrentes de
infringências de menor potencial ofensivo. Tal situação, por sua vez, indica duas hipóteses:
ou a estrutura jurídica não está voltada para os casos e situações que deveria (no caso, o
abuso de poder econômico-político), ou tais penetram no sistema e escapam dessa
estrutura.
A segunda conclusão é que os meios de comunicação de massa e os espaços
eletrônicos, em decorrência da disputa eleitoral pelos partidos, exercem, no TRE-PR,
posição de relevante destaque, em face do disparado número de ações que movimentam
o órgão eleitoral. Ou seja, é o assunto que predomina e detém o maior impacto na arena
jurídico-eleitoral. Como já foi dito, os casos individualmente considerados não têm grande
potencial ofensivo, mas o montante verificado nos gráficos indica que as práticas são
reiteradas entre os adversários políticos, em uma autêntica “guerra” pelo poder.
A terceira conclusão, decorrente da anterior, é a judicialização da disputa eleitoral.
As questões eleitorais trazidas para serem resolvidas pelo poder Judiciário fazem emergir a
Justiça Eleitoral como importante ator no processo eleitoral; o movimentar de sua balança
revela e traduz o papel significativo dessa Justiça especializada no cenário político e eleitoral.
A quarta conclusão, no tocante aos denominados crimes eleitorais relacionados
às práticas de dar, oferecer, receber etc., é que, em face da frustração gerada por sua
ausência nos gráficos, o sistema normativo existente para as eleições do ano de 1996 não
logrou sucesso no sentido de captar tais atos, e parte do pouco que foi captado perdeu-se
pelo decurso do tempo.
A quinta conclusão, baseada nas seções relativas aos fatores históricos do
processo político eleitoral brasileiro e aos fatores que propiciam a corrupção nas atuais
democracias, em particular a brasileira, é que ambas formam uma cultura balizadora
dessa sociedade e, ao gerarem estruturas normativas para coibirem-se práticas de
corrupção, fortalecem essa mesma cultura, gerando um processo vicioso a refletir nas
regras do jogo político-eleitoral e, por fim, na própria democracia.

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217
218
CAPÍTULO NOVE

POLÍTICA LOCAL E A OCUPAÇÃO DE


CARGOS ELETIVOS EM CURITIBA
(1985-2000)
Louise Ronconi de Nazareno

219
220
9. POLÍTICA LOCAL E A OCUPAÇÃO DE CARGOS
ELETIVOS EM CURITIBA (1985-2000)

I. O LOCAL EM FOCO

O presente capítulo discute a dinâmica política recente em Curitiba, entre 1985


a 2000, e é dividido em seis seções: a primeira introduz o debate sobre como estudar a
política local; a segunda explicita os dados eleitorais de Curitiba; a terceira comenta a
relação entre os poderes Legislativo e Executivo e o processo interno da Câmara de
Vereadores; a quarta faz uma avaliação pontual sobre a relação entre vereadores e eleitores
a partir do tema da reeleição e da migração partidária; a quinta seção trata da atuação
parlamentar no que se refere às reeleições e às migrações e, na sexta e última, apresentamos
algumas conclusões gerais.
Baseamo-nos em Mollenkopf (1992) para, de maneira simplificada, estruturar
o ambiente político local. O trabalho desse autor, Phoenix in the Ashes, trata da administração
do Prefeito Edward Koch em Nova Iorque, que se tornou uma coalizão dominante por 12
anos. O exame da construção de apoio e das relações do governo com os maiores centros
de poder públicos e privados na cidade tornou-se a base para pensar a posição e a
capacidade do sistema político local. Mollenkopf discute como estudar a política local por
meio do debate entre as abordagens estruturalistas e pluralistas, reconhecendo, por um
lado, que a coalizão de governo de Koch é uma aliança de trabalho estável e transversal aos
temas políticos e, por outro, que o governo municipal nem sempre planeja ou é hábil para
desenvolver atividades que favorecem “a classe dominante” e “o capital”. Ou seja, na sua
discussão, os pluralistas auxiliam o tratamento das estratégias por que a administração
pública desenvolve os apoios políticos e os estruturalistas providenciam o contexto social
e econômico que molda a competição política, possibilitando uma articulação analítica
entre as duas abordagens. Além disso, o autor traz à cena os interesses do setor público,
que é um agente permanente de interferência de governo. Nesse sentido, sua síntese tenta
evitar o pluralismo voluntarista e o determinismo econômico, que reduz o Estado ao
poder de classe, igualando a influência da esfera econômica à da político-eleitoral (idem,
p. 39) e relativizando as polarizações entre estrutura e ação, determinação e contingência,
estabilidade e dinâmica.

221
Eduardo César Marques, em seu livro (MARQUES, 2003) também discute as
abordagens pluralistas e estruturalistas que embasam as explicações sobre o poder na
cidade. Ele enfatiza três linhas explicativas de influência para os estudos brasileiros: teoria
das elites; os pluralistas (com o famoso debate entre “elitistas” e “pluralistas” na década
de 1950) e marxismo, pelo viés da Sociologia Urbana francesa dos anos 1960-1970.
Do lado dos elitistas, é dado de antemão que todo governo é oligárquico e,
assim, as políticas seguem os interesses das elites que mantêm posições econômicas,
sociais e políticas imbricadas. A Ciência Política deve preocupar-se em identificar as
posições formais de mando em uma dada comunidade, as características do grupo que
controla tais posições e também os mecanismos sociais que garantem a condução e a
manutenção desses indivíduos no topo das instituições de mando (Wright Mills e Milliband
apud PERISSINOTO, 2002). Os principais problemas da teoria das elites citados por
Marques (2003) seriam: 1) dificuldades para incorporar as mudanças e contingências
dos processos políticos e 2) o entendimento do Estado como uma “casca vazia”, ocupado
sempre pelas elites. Mas, assim como o autor afirma que alguns elementos da cena política
paulistana assemelham-se a essa descrição elitista, em Curitiba vê-se, também, a estabilidade
do grupo no poder e semelhanças na origem social da classe política (ver OLIVEIRA,
2001). Derivar mecanicamente ações políticas das origens sociais, entretanto, seria um
grande erro.
Há problemas também na definição das posições de mando, já que não há
evidências incontestáveis que comprovem que quem ocupa essas posições de mando
governa de fato. Pelos pluralistas, Robert Dahl, como principal expoente crítico contra a
teoria das elites, afirma que não há acumulação de todos os recursos sociais, econômicos,
políticos e culturais nas mãos de uma mesma classe. Disso resulta que nenhum grupo
político controla todas as questões de política, ao mesmo tempo em que não há ganhos
estáveis ao longo do tempo. Seria, então, preciso analisar o processo decisório de modo
detalhado, o que identificaria a contingência e as mudanças do processo político, dando
relevância aos políticos e à política e respondendo à questão “quem governa?”. O
detalhamento do processo decisório, no entanto, parece não incorporar como se
transformam determinados temas em não-decisões, em outras palavras, como se
determinam temas que serão ou não decididos pelos políticos (Bachrach e Baratz apud
PERISSINOTO, 2002).
Torna-se um problema para o pluralismo lidar com a continuidade de domínio
do poder por um grupo e com seus ganhos estáveis. E, como já mencionado, esse problema
vê-se no caso da cidade de Curitiba. O pluralismo, mesmo retirando a política de uma
posição subalterna, também percebe o Estado como casca, como lugar a ser ocupado,
mas por diferentes grupos, desconsiderando os interesses dos funcionários do Estado,
bem como suas instituições.
Do lado dos marxistas provém o interesse sobre quais relações sociais as
decisões políticas reproduzem, não importando a questão “quem governa?”. Da Sociologia
marxista, mais especificamente, Marques enfatiza que se retiram as contribuições sobre a
inclusão dos conflitos na cena urbana e a dessacralização da produção do espaço, mostrando

222
os interesses dos capitais que produzem a cidade. A tese de Dennison de Oliveira (2000)
aborda a importância desses interesses na capital paranaense. Mas as análises marxistas
apresentam o mesmo problema ao desconsiderarem o papel da burocracia e das instituições
estatais. O Estado continua sendo um lugar a ser capturado. As instituições políticas e os
produtores de políticas do setor público só aparecem significativamente com os estudos
do neo-institucionalismo1.
Essa corrente das Ciências Sociais é relativamente recente e se fundamentou
principalmente em contraposição aos estudos comportamentalistas predominantes, junto
com o pluralismo, na área de política comparada americana das décadas de 1950 e 1960
(THELEN & STEINMO, 1992). Dentre as contribuições do neo-institucionalismo, que não
se trata de um paradigma nem tampouco de uma corrente teórica unitária, não se acentua
apenas que “as instituições importam” e precisam ser analisadas, mas que elas devam ter
enfoque central, preocupando-se com a questão de como elas moldam as estratégias
políticas (e até as preferências) e influenciam os resultados políticos: “how a given
institutional configuration shapes political interactions”2 (idem, p. 6; MELO, 1996;
MARQUES, 1997). Há também outro ponto enunciado pelo neo-institucionalismo histórico
que diz respeito à consideração da autonomia e do poder dos atores estatais. No caso do
tratamento do poder Executivo, existem grupos de funcionários capazes de estabelecer
políticas de governo, relativamente independentes do grupo dirigente eleito e que engendram
ações estatais que tendem a reproduzir ou aumentar o poder e o controle das instituições
estatais sobre a sociedade (MARQUES, 1997). Como complemento, assume-se nesse
enfoque que a formação histórica do Estado e de suas instituições e o legado das políticas
são imprescindíveis para a análise das interações entre inputs e outputs com atores
envolvidos em um determinado campo, comunidade e setor de política.
A partir da apresentação dessas idéias, o que se pode extrair delas para estudar
a política local? A idéia de que o Estado não é um lugar vazio constitui-se em um primeiro
passo para entender também que a dinâmica política local não está subordinada a processos
macroeconômicos, sociais e políticos e que pode ser investigada com sua especificidade
e autonomia. Isso significa incorporar também a relevância da política e dos políticos e
entender que a questão “quem governa?” representa uma variável importante na forma
pela qual é conduzida a política de uma dada comunidade. Mas, sem dúvida, para o caso
curitibano como para o paulistano a continuidade e os ganhos estáveis do grupo no poder
precisam ser compreendidos como um processo que articula representantes dos capitais
produtores da cidade, funcionários do Estado e políticos eleitos, que queremos apreender
pelas redes que formaram.
Voltando a Mollenkopf (1992): destacam-se quatro tipos de interesses envolvidos
nas interações do governo local com os cidadãos: 1) os interesses da burocracia (setor
público); 2) os da população; 3) os interesses das lideranças políticas e 4) os do mercado

1
Para discussão detalhada sobre o neo-institucionalismo, ver: Skocpol (1985), Thelen e Steimo (1992), Limongi
(1994) e Marques (1997).
2
“Como uma dada configuração institucional molda as interações políticas” (nota do revisor).

223
privado. Todos os tipos de interesses são marcados por certo grau de heterogeneidade
variável e convivem em três tipos básicos de interações dos atores: 1) relações entre
líderes; 2) relações entre líderes e eleitores e 3) relações dos líderes com o ambiente
econômico. Este capítulo procura desenvolver alguns apontamentos sobre os dois primeiros
tipos de interação entre os atores políticos locais. As relações entre agentes econômicos
e o poder público levariam a um outro estudo.

II. ELEIÇÕES MUNICIPAIS

O realinhamento das forças políticas durante a transição democrática em Curitiba


acompanhou a tendência brasileira. O Partido Democrático Social (PDS) saiu enfraquecido
do regime de 1964, sendo que seu líder mais proeminente, Ney Braga, passou o cargo de
Governador do Estado do Paraná para o representante do Partido do Movimento
Democrático Brasileiro (PMDB), José Richa, em 1982. Em seguida, Jaime Lerner, já no
Partido Democrático Trabalhista (PDT), apoiado por Braga do Partido da Frente Liberal
(PFL)3, perdeu a eleição para a Prefeitura para Roberto Requião, também do PMDB. O
PDS também perdeu em 1985, quando um ex- Governador de estado, Paulo Pimentel,
candidato a Prefeito, e um ex-Prefeito de Curitiba, Ivo Arzua, candidato a vice-Prefeito,
fizeram votação pouco expressiva nessa eleição majoritária. Todavia o novo sistema
partidário permitiu que parte do PDS, constituindo o Partido Progressista (PP), apoiasse
o PMDB no governo do estado, com o cargo de vice-Governador em 1986, enquanto o
PFL, também surgido do PDS, apoiou o grupo de Lerner.
A partir da visualização de dados eleitorais poderíamos notar que o PMDB e o
PDT (como cabeça de chapa), canalizaram a grande maioria dos votos do eleitorado nas
eleições majoritárias até 1996 (ver Tabela 1) e eram adversários. Tendo em vista essas
novas acomodações, o campo da política local mostra dois blocos principais que podem
ser separados pela clivagem ideológica esquerda versus direita, PMDB, Partido dos
Trabalhadores (PT) versus PDT (Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), PFL, Partido
Progressista Brasileiro (PPB)). Esses blocos herdam os líderes e as posições da Aliança
Renovadora Nacional (Arena) e do Movimento Democrático Brasileiro (MDB). As votações
nos diversos partidos, no entanto, são bastante variadas: no início houve polarização
entre PDT e PMDB, que se transformou em 2000 em uma disputa entre PFL e PT e, em
2004, entre o Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB) e o PT. Em certa medida, as

3
O PFL do Paraná não se fortaleceu na segunda metade dos anos 1980 em virtude da decadência do PDS. No
Paraná, o PDS não foi a principal alternativa partidária aos integrantes da Arena, principalmente aqueles que
continuaram disputando eleições nos anos 1980, como é o caso de Jaime Lerner, que foi para o PDT, destino da
maioria dos lerneristas naquele período. O PFL do Paraná ficou no ostracismo por falta de lideranças estaduais
fortes e ainda atuantes. O principal líder do PFL no estado continuou sendo o ex-Governador e ex-Ministro Ney
Braga, que, em 1982, após ser derrotado em uma eleição para o Senado Federal, decidiu não mais disputar cargos
eletivos. O partido só ganhou peso eleitoral depois de 1997, após a filiação do então Governador Jaime Lerner,
do Prefeito de Curitiba Cássio Taniguchi e de grande parte de seu grupo. Em poucas semanas, o PFL passou de
um partido praticamente inexistente a principal potência política do Paraná. Ver, neste livro, o capítulo 10.

224
votações eleitorais parecem coerentes se tomadas como apoio às pessoas que encabeçam
as chapas explicando o PSDB em 1996, de Carlos Simões, tomou o lugar do PMDB e do PT,
e o PFL de Luciano Pizatto, em 1992, quando tentou afastar-se do PDT. Há partidos que
mantêm suas alianças em um bloco apenas, outros que oscilam entre os blocos. Afinal,
partidos coligados podem passar uns por cima dos outros. Mas essas coalizões de partidos
estão organizando o apoio ao governo, garantindo maioria nas casas legislativas e estruturam
o campo político em torno de dois pólos, “situação” e “oposição”.
Por outro lado, seria possível pensar que a eleição de 1982 para o governo do
estado teria quebrado a hegemonia da direita, representada pela Arena, na administração
da capital?
Observemos que, no entanto, nas eleições majoritárias, o PFL aliou-se ao PDT
em 1985, 1988 e 1996. O PTB também se torna aliado do PDT de 1988 até 2000. O PPB,
atual PP, virou aliado do PDT em 1992, depois da quebra da aliança tácita com o PMDB,
na eleição de 1988. O PDT apenas não se aliou aos partidos de direita na eleição de 2000,
em que saiu sozinho4, depois de um desfalque dos quadros que saíram do partido
juntamente com o seu maior catalisador de votos, Jaime Lerner. As gestões do PMDB
aparecem mais como uma interrupção momentânea para o controle do bloco de direita do
que propriamente uma mudança. A unidade de apoio da elite ao grupo de Jaime Lerner foi
grande; embora não possamos afirmar que tenha sido controladora, ela moldou a trajetória
do desenvolvimento político de Curitiba5.

Tabela 1
Eleições majoritárias em Curitiba (1985-2000)
COLIGAÇÃO PREFEITO VICE-PREFEITO VOTOS %
1985
PMDB Roberto Requião Adhail S. Passos 227.249 43,7
PDT, PFL Jaime Lerner Francisco Fernando 208.384 40,1
Fontana
PDS Paulo Pimentel Ivo Arzua 24.269 4,7
Demais candidatos – – 39.786 7,6
Comparecimento 519.959 100
Continua...

4
A coligação majoritária foi com o PGT, partido de baixa expressão em Curitiba, que foi em seguida incorporado
pelo PL.
5
A dissertação de mestrado que fundamenta este texto trata em capítulo específico da ocupação de cargos executivos
no governo municipal; verificou-se que muitos indivíduos que ocupam cargos na Prefeitura durante o período
democrático já haviam participado das gestões de Lerner no regime ditatorial. Ver Nazareno, 2003.

225
1988
PPDT, PTB, PFL Jaime Lerner Algacir Túlio 326.815 48,6
PMDB, PCB, PJ, Maurício Fruet José Maria Correa 198.348 29,5
PC do B, PSD, PSB
PT Claus Germer Gilberto Carvalho 36.054 5,4
Demais candidatos – – 12.098 1,8
Comparecimento 672.614 100
1992
PDT, PTB Rafael Greca José Carlos 324.348 43,4
de Carvalho
PMDB Maurício Fruet 144.479 19,3
PFL Luciano Pizzatto 76.742 10,3
PT, PCdoB, PCB Florisvaldo Fier 40.567 5,4
Demais candidatos – – 38.130 5,0
Comparecimento 747.674 83,4
1996
PPB, PDT, PTB,
PSC, PFL Cássio Taniguchi Algacir Túlio 414.648 50,6
PPS, PSDB Carlos Simões 229.470 28,0
PT, PCB, PCdoB, PV Ângelo Vanhoni 83.052 10,1
Demais candidatos – – 31.332 3,8
Comparecimento 819.953 100
2000
PFL, PPB, PSC, PTB, PRN,
PL, PRP, PST, PSB, PSL,
PSD, PTdoB, PTN, Cássio Taniguchi Beto Richa 378.993 40,9
PT, PV, PPS, PCB, Ângelo Vanhoni José Maurino 304.902 33
PCdoB, PMN, PHS
PAN, PMDB Maurício Requião 89.017 10
PSDB, PSDC Luiz Forte Netto 71.394 8
Demais candidatos – – 17.687 2
Comparecimento
(primeiro turno) 927.260 100

PFL, PPB, PSC, PTB,


PRN, PL, PRP, PST, PSB,
PSL, PSD, PTdoB, PTN , Cássio Taniguchi Beto Richa
PT, PV, PPS, PCB, Ângelo Vanhoni José Maurino
PCdoB, PMN, PHS
Comparecimento
(segundo turno) 928.024 100
Fonte: TRE-PR (s/d).
Notas: 1. Os porcentuais referem-se ao total do comparecimento do eleitorado. 2. PTdoB: Partido dos Trabalhadores do
Brasil; PSC: Partido Social Cristão; PPS: Partido Popular Socialista; PCB: Partido Comunista Brasileiro; PCdoB: Partido
Comunista do Brasil; PV: Partido Verde; PRN: Partido da Reconstrução Nacional; PL: Partido Liberal; PRP: Partido
Republicano Progressista; PST: Partido Social Trabalhista; PSB: Partido Socialista Brasileiro; PSL: Partido Social Liberal;
PSD: Partido Social Democrático; PTN: Partido dos Trabalhadores da Nação; PMN: Partido da Mobilização Nacional;
PHS: Partido Humanista Social; PAN: Partido dos Aposentados da Nação; PSDC: Partido Social Democrata Cristão.

226
As vitórias do PDT em Curitiba dizem pouco sobre a construção ou posição
desse partido. Como se sabe, o comando único e centralizador de Leonel Brizola distingüia
o PDT e foi pelas mãos de Brizola que Lerner saiu da Arena. Tendo um baixo grau de
institucionalização, reconhecido pela falta de empenho em atrair e treinar quadros
partidários administrativos tecnicamente capacitados para sua direção nacional, o PDT
usou uma estratégia agressiva de cooptação de políticos ligados a poderosos esquemas
clientelísticos (MARQUES, 2003, p. 2). Em Curitiba, mais do que isso, houve uma a
cooptação dos quadros tecnocráticos locais.
As alianças eleitorais locais, por sua vez, mostraram coerência com o tipo de
direcionamento nacional dos partidos. Por exemplo, as instâncias subnacionais do PFL
têm grande autonomia para conduzir assuntos locais, por isso nunca houve interferência
ou impedimento para o PFL apoiar o PDT de Curitiba, o que resultou posteriormente na
cooptação de Lerner e muitos dos seus apoiadores. A heterogeneidade e a falta de consenso
no PMDB e a ambigüidade de seus líderes também provou ser racional para os
parlamentares posicionarem-se individualmente, como bloco de apoio ou oposição ao
poder Executivo controlado pelo PDT e posteriormente pelo PFL. A construção dos partidos
no plano local e sua institucionalização podem justificar, em parte, as conformações dos
vereadores na Câmara Municipal de Curitiba (CMC).
Na Câmara, o PT, o PDT, o PSDB e o PMDB ocuparam parte significativa das
cadeiras durante o período estudado (ver Tabela 2). Apesar de um estudo ao modo do de
Figueiredo e Limongi (1999) ainda não ter sido efetuado para a CMC, pode-se perceber dois
blocos ideológicos, direita x esquerda, dando força e significância à separação entre situação
e oposição. Vê-se, por um outro ponto de vista, que, independentemente do comportamento
dos parlamentares, não investigado nas votações da CMC, o número de cadeiras parlamentares
conseguidas pela coligação vitoriosa na eleição majoritária é bastante significativo (ver
Tabela 2). Isso se dá mesmo com o aumento do número de partidos concorrendo à eleição
majoritária e com o aumento da fragmentação partidária na Câmara.
Tabela 2
Distribuição de cadeiras nas eleições proporcionais de Curitiba (1988-
2004)
1982 1988 1992 1996 2000 2004
Partido Abs. % Abs. % Abs. % Abs. % Abs. % Abs. %
PC do B 0 0 0 0 0 1 2
PDT 0 6 18 8 24 8 23 2 6 3 8
PDS 11 33 0 0 0 0 0
PFL 0 3 9 3 9 4 11 9 26 5 13
PL 0 4 12 5 15 0 0 3 8
PMDB 22 67 12 36 4 12 4 11 3 8 4 10,5
PPB/PP 0 0 0 5 14 4 11 3 8
PPS 0 0 0 0 0 4 10,5
Continua...

227
PRN 0 0 1 3 0 0 0
PSB 0 0 0 0 2 6 3 8
PSC 0 0 0 0 3 8,5 0
PSDB 0 0 2 6 7 20 3 8,5 4 10,5
PST 0 0 2 6 0 1 3 0
PT 0 3 9 3 9 3 8 6 17 3 8
PTB 0 5 15 5 15 4 11 2 6 4 10,5
PV 0 0 0 0 0 1 2
apoio* 22 67 14 42 18 54,5 21 60 24 68,5 13 34
cadeiras 33 100 33 100 33 100 35 100 35 100 38 100
partidos 2 6 9 7 10 12
Ne** 1,84 4,65 7,26 6,37 6,92 11,03
Fonte: a autora, a partir de TRE-PR (s/d).
Notas:
1. * O apoio foi contado a partir da coligação para eleição majoritária.
2. ** Número de partidos efetivos.

Para além da sustentação na coligação eleitoral, no momento em que se assume


a prefeitura, a construção de uma coalizão de governo estabelece novas relações entre os
poderes Executivo e Legislativo. Assumimos, como Mollenkopf (1992), que as coalizões
podem ser estáveis, operar transversalmente aos assuntos das políticas governamentais e
criar ganhadores e perdedores mais permanentes. Os atores juntam-se produzindo uma
constante circulação de benefícios aos aliados, sem a necessidade de coagir ou induzir
ações específicas, a não ser em casos polêmicos. Nesse sentido, há grupos que ganham ao
longo do tempo, de modo estável, mesmo que não em todas as áreas, mas nas que
escolhem como relevantes. No entanto, o conceito de coalizão deste autor é mais abrangente:
estende-se aos apoios de grupos econômicos e sociais; o que pretendemos destacar, por
hora, seria a coalizão como padrão de relacionamento entre os poderes Executivo e
Legislativo. Dessa forma, adotaremos a idéia geral de Amorim Neto (2000) a respeito da
tipologia de gabinetes.

III. INDICATIVOS DAS RELAÇÕES ENTRE OS


PODERES EXECUTIVO E LEGISLATIVO MUNICIPAIS

Sabendo-se que cabe ao Prefeito a prerrogativa de formar seu grupo de trabalho


no poder Executivo, podemos encontrar, simplificando os tipos de gabinetes (MELO,
2004, p. 83), gabinetes de coalizão, de cooptação ou apartidários. No primeiro, há acordo
entre o chefe do poder Executivo e partidos para ser sua base, respeitando a força dos
partidos no poder Legislativo, segundo critérios partidários. Nos outros, não há acordos
do chefe do Executivo com os partidos, e a estratégia de aquisição de base de sustentação
dá-se de maneira mais ou menos individualizada – mas, no caso de cooptação, ainda se
mantém um recrutamento partidário; no último caso, o gabinete compõe-se por mais de
50% de nomes sem laços partidários.

228
Em todos os casos, a vida da coalizão depende dos acordos e da capacidade de
negociação das lideranças. A sustentabilidade, por outro lado, das alianças entre os poderes
Executivo e Legislativo com um gabinete de coalizão pressupõe que o Legislativo aja
partidariamente, com disciplina e previsibilidade, o que Figueiredo e Limongi (1999) já
sugeriram. O pressuposto para gabinetes de cooptação e apartidários, porém, parece ser
outro. Gabinetes desses tipos, no entanto, sustentaram-se por pouco tempo na esfera
federal (AMORIM NETO, 2000). A questão neste trabalho diz respeito ao domínio da
política local: que tipos de gabinete estão se constituindo na cidade de Curitiba? Há
problemas de sustentação das bases de apoio ao poder Executivo no âmbito municipal? A
administração de gabinetes de cooptação e apartidários no campo local cria tensões entre
Câmara e Prefeitura?

Tabela 3
Partidos em coalizão e coligação vencedora das eleições, a partir da
Câmara Municipal de Curitiba
1985 1988 1992 1996 2000
Partidos em PMDB PDT, PTB, PFL PDT, PTB, PPB, PDT, PFL, PSDB,
coligação eleitoral PL, PST PTB, PSC, PPB, PSC,
PFL PTB, PRN,
PRP, PST,
PSB, PL,
PSL, PSD,
PTdoB, PTN
Partidos em PMDB PDT, PTB, PFL, PDT, PTB, PPB, PDT,
apoio ao governo PL, PMDB* PL, PST, PTB, PSC,
PFL, PRN, PFL, PSDB,
PMDB* PMDB*
Fonte: TRE-PR (s/d).
Nota:
* Partidos em que nem todos seus membros parlamentares fizeram parte do apoio ao governo; no caso investigado, só
se refere ao PMDB.

Verificamos, a partir da tabela 3, que duas maneiras de construção de gabinetes


desenvolveram- se em Curitiba, a partir das eleições de 1985. Não são propriamente
coalizões, pois não foram oferecidos cargos para partidos: foi apoio dos Vereadores ao
Prefeito. O PMDB não tirou nenhuma resolução de apoio ou proibiu seus parlamentares
de votar com o Prefeito, mas há sempre os que o fazem, assim como sempre há uma
oposição dentro do próprio partido. A primeira, na gestão de Requião do PMDB, era um
gabinete em base partidária, um governo convergente, não de coalizão, pois fundamentado
apenas no PMDB, já que a Câmara eleita em 1982 contemplava apenas o PMDB (maioria)
e o PDS. A segunda, a partir da primeira vitória do grupo de Jaime Lerner em 1988, pode
ser chamada de apartidária em um primeiro momento, mas também se confunde com

229
estratégias de cooptação ao longo do tempo6. O que interessa para o desenvolvimento de
nosso argumento é que o gabinete de Jaime Lerner estruturava-se a partir do estabelecimento
de um núcleo de governo técnico. Esse perfil de administrador também pode ser encontrado
na construção do grupo de César Maia no Rio de Janeiro (ver MARQUES, 2003), mas o
grupo de Jaime Lerner possui heranças das suas outras gestões como Prefeito de Curitiba,
na época da ditadura (1971-1975 e 1979-1983), e diferenças nas escolhas de distribuição
do seu grupo.
Ao contrário de César Maia, Jaime Lerner minou as estruturas das
administrações
regionais e não descentralizou as execuções dos serviços públicos por meio delas. Foi
extinta a Secretaria de Administrações Regionais, redefiniram-se os domínios das
freguesias, diminuindo sua quantidade. As Secretarias Municipais, por sua vez, criaram
suas próprias coordenações regionais que agiam de maneira autônoma em relação aos
administradores regionais. Assim, ele não criou espaço para a criação de novos quadros
políticos, tampouco ofereceu aos vereadores cargos para barganha de indicações. Ele
estabeleceu um vínculo direto entre órgãos de governo e Vereadores da base de apoio,
diminuindo também conflitos possíveis a respeito da relação entre cidadão (eleitor-
freguês) e representante político, já que os parlamentares permaneceram com o
monopólio (formal) da mediação entre o eleitor e o poder Executivo. A exemplo de nova
patronagem, o grupo estabelece relações também com a Femoclan (Federação Comunitária
das Associações de Moradores de Curitiba e Região Metropolitana), que sustenta a
coalizão, e também mantém relações diretas com os órgãos do Executivo. Esses vínculos,
no entanto, não serão tratados neste estudo, por falta de dados, fugindo da abordagem
aqui empregada. Apontamos essa relação com a Femoclan7 para mostrar que os esforços
de manutenção do grupo no centro do poder local amplificaram suas estratégias, em
relação à busca de apoio no eleitorado, por meio de lideranças comunitárias, sendo o
monopólio dos vereadores relativizado8. Ou seja, a organização do grupo no poder
combina diferentes técnicas de arregimentação e mobilização de apoio externo.
Como garantir o apoio da CMC construindo um gabinete apartidário e de
cooptação? Como sustentar a coligação de partidos e aumentar o apoio parlamentar, com
outros partidos, ou com outros parlamentares, sem contar com critério partidário? Seria
coerente pensar que pelos meios de cooptação uma coalizão torna-se mais instável, pois
não pode contar com disciplina nas votações, nem tem como aliada a previsibilidade do
comportamento parlamentar. A CMC mostra, todavia, apoio permanente e majoritário ao
Executivo ao longo do tempo estudado, principalmente após 1988. A bancada de apoio
ultrapassa facilmente a maioria simples dos vereadores; a Mesa Executiva, com exceção de

6
Apresentamos um detalhamento das nomeações, das permanências e das rotatividades dos nomes nos cargos
do poder Executivo (NAZARENO, 2003).
7
O auxílio à Femoclan pode ser entendido como uma nova forma de patronagem, pois o favorecimento de uma
associações torna-se uma importante ferramenta de cooptação (cf. MOLLENKOPF, 1992).
8
O marketing político é outra peça constante nas gestões do grupo Jaime Lerner, que, de sua parte, também
contribuem para a sustentação desse grupo no poder ao longo dos anos.

230
um mandato (1989-1990), nunca abrigou componentes da bancada de oposição; as duas
principais comissões são sempre presididas pelos membros do bloco de apoio e, se
fizéssemos análise das aprovações dos projetos legislativos, provavelmente
comprovaríamos as afirmações dos nossos entrevistados, de que a oposição está sempre
em desvantagem, por seus projetos e emendas terem baixa aprovação em relação à situação.
Foi na gestão Requião que os conflitos entre a Câmara Municipal e o poder Executivo
fizeram-se visíveis, provocando a formação no poder Legislativo de um grupo contrário
às idéias do Prefeito, principalmente no que se referia ao transporte coletivo, e que se
consolidou no Grupo Pró-Cidade, dando origem a uma grande bancada de apoio ao
Executivo a partir de Jaime Lerner.
Essa aliança estável entre vereadores e Prefeitura explica-se pela natureza da
instituição, moldada pelas regras do processo legislativo local, e pelo comportamento
parlamentar majoritário, dentro da CMC, que estabelece os vínculos com a administração
municipal.

IV. TIPOS DE VEREADORES

Uma hipótese a respeito desse problema seria que a relação de apoio do


Legislativo ao Executivo estrutura-se em um tipo de atuação parlamentar particular que foi
se perpetuando ao longo do tempo, reforçada pelas escolhas da formação do grupo Jaime
Lerner até hoje, baseada nas regras do processo legislativo da CMC.
Eli Diniz (1988), ao discutir a máquina política, aponta para a necessidade
de considerar o sistema de incentivos como um elemento estruturante de apoio e
sustento de um grupo no poder, utilizado pela organização como estratégia de
sobrevivência política. A autora baseia-se em quatro modalidades de incentivos, que
poderiam ser agrupadas em três: 1) materiais, 2) solidários (específicos e coletivos)
e 3) de identificação, para ponderar sobre a “forma de constrangimento e de influência
sobre o comportamento individual dos membros de uma organização que os tipos de
incentivos exercem” (idem, p. 29-31). A sugestão de uso dessas considerações, aqui,
com relação à conexão entre grupo no poder Executivo e base de apoio parlamentar
diz respeito ao estabelecimento de um sistema de incentivos predominantemente
materiais, nos moldes da caracterização de máquinas políticas. No entanto, a
organização não tem base no partido, nem se circunscreve a ele, mas a uma coalizão
de governo, em que o núcleo expande-se pelo controle de recursos do poder Executivo
municipal.
Para tentar entender os atores envolvidos na sobrevivência do grupo político
no poder municipal em Curitiba, desenvolvemos uma tipologia a partir de critérios
sobre a relação do Vereador com o eleitorado e sua ação política que deu origem à
conquista do cargo parlamentar. Não os classificamos por meio dos conteúdos de
políticas propostas por eles, mas nos moldes da tipologia efetuada por Miranda
(apud ZAPPI, 2004). Obtivemos as informações biográficas dos Vereadores elaboradas
por suas assessorias para constar oficialmente das informações da CMC, da Assembléia

231
Legislativa do Paraná e do Congresso Nacional9.
Como toda tipologia, a separação dos vereadores em cada categoria não significa
restringi-los a uma origem única, bem delineada, sem influências dos vários tipos. Importa
entender que as categorias foram elaboradas a posteriori, baseando-se nas informações
disponíveis nos discursos biográficos. Em algum ponto eles declaram sua identidade, ou
silenciam-se sobre vínculos não existentes. Não possuíamos todas as biografias dos vereadores
que passaram pelas cadeiras da CMC, mas tínhamos as biografias simplificadas de pelo
menos 50% dos Vereadores eleitos, desde a eleição proporcional de 198810.
Dividimos os vereadores em quatro categorias: 1) comunitários, 2) midiáticos,
3) temático-institucionais e 4) funcionários políticos. A primeira categoria contempla os
vereadores que têm sua origem ligada a associações de bairro, grupos de bairro da escola ou
também que declaram defender interesses do bairro, instalam escritórios nas comunidades,
mantendo vínculos de atendimento à população. No caso da segunda categoria, são
parlamentares que se estabeleceram nos meios de comunicação e assumem como identidade
principal sua atividade na mídia, trazendo uma imagem pública anterior quando assumem
suas cadeiras. Não basta ter um programa de rádio, mas já o ter antes da carreira política. Os
considerados “temático-institucionais” são os vereadores que provêm de ligações com
categorias específicas, como sindicatos, movimentos ecológico, religioso, estudantil etc. São
parlamentares já familiarizados com outros tipos de ação política, como passeatas, abaixo-
assinados, pois já se socializaram organizando atos para os movimentos e categorias que
representam e isso, muitas vezes, marca sua atuação parlamentar. O quarto tipo diz respeito
àqueles que começam sua carreira política a partir de ligações com outros políticos, seja em
órgãos do poder Executivo, seja como assessores, seja, ainda, aqueles que de alguma forma
percorrem os passos daqueles a que se declaram vinculados (avô, pai, líder etc.). Dentre
todas as categorias, somente a última pode indicar um vínculo mais fraco entre o Vereador
e a população no início da carreira política, pois pressupõe que ele tenha-se socializado
politicamente por meio de lideranças e cargos, sem necessariamente atuar junto à população.
Com as poucas informações de que dispomos, podemos notar que há um certo
equilíbrio entre vereadores de origem de tipo comunitário e de tipo temático-institucional,
com exceção da legislatura de 2000, em que os do último tipo dobraram. No entanto, não
foram avaliados os suplentes e nem toda a composição das legislaturas, de modo que seria
prematuro tentar tirar conclusões a respeito11.
9
Na medida em que diversos ex-Vereadores tornaram-se, posteriormente, Deputados estaduais e federais.
10
Obtiveram-se 18 biografias do total de 33 Vereadores eleitos em 1988; dos 33 eleitos em 1992, conseguimos
apenas 17 biografias. Em relação aos eleitos em 1996, conseguimos 25 e, relativamente a 2000, obtivemos 30.
Reforçamos que as biografias são feitas pelas respectivas assessorias e de modo opcional, para constar dos
portais eletrônicos da Câmara Municipal de Curitiba e Assembléia Legislativa do Paraná.
11
Pretendemos obter as informações ausentes para compararmos as categorias e pensarmos com maior rigor
a tipologia, no sentido de achar uma relação entre o tipo de origem política do Vereador e o comportamento
situacionista na CMC. Questionamos que tipos são estimulados a manter uma base de apoio ao poder Executivo
e que práticas são consolidadas, conformando e controlando os tipos de vereadores eleitos. Todavia não afirmamos
que será possível encontrar um padrão, o que torna mais complexo o entendimento de como se sustenta uma
coalizão tão duradoura, sem percalços. Em outro sentido, é importante indicar a necessidade de um trabalho que
possa realizar uma tipologia mais completa e abrangente do comportamento parlamentar, a partir de estudo de
caso mais detalhado, referindo-se a proposições, participação em composição do plenário e gabinete do Vereador
em conjunto com a origem do seu capital político.

232
Derivamos da idéia de uma tipologia da origem do capital político dos Vereadores
uma concepção a respeito do comportamento do Vereador, que, em termos gerais, agrega-
se ao grupo no poder do Executivo. O parlamentar tem no Executivo os instrumentos
necessários para o atendimento das demandas de seus eleitores e, por outro lado, o
poder Executivo precisa do parlamentar para viabilizar seus projetos, negociando com os
parlamentares recursos. Uma relação de clientelismo em que, retomado o argumento de
Diniz (1988), os sistemas de incentivos materiais delineiam o perfil e caracterizam a
dinâmica de formação e desenvolvimento de um grupo no poder. As relações
interdependentes que se estabelecem entre o cidadão e o Vereador e o Vereador e o poder
Executivo seriam assimétricas, pessoais e estariam fundamentadas nas concessões de
benefícios particularizados, principalmente tangíveis, mas que não se restringem ao campo
econômico da troca, envolvendo questões de prestígio, deferência pessoal, lealdade,
gentileza etc. As negociações, por sua vez, não parecem ser exclusivamente individuais e
indiscriminadas. Há um padrão de relacionamento de situação e oposição que estão
apoiadas na rede de coalizão dos poderes Executivo e Legislativo.
No domínio político nacional, o comportamento parlamentar no processo
decisório do Congresso, permite ações partidárias (cf. FIGUEIREDO & LIMONGI, 1999),
possibilitando aos grupos ali representados desenvolver um sistema de incentivos de
identificação. O domínio local permitiria também essa prática, ou será que, quanto mais
afastado do poder central, menor é o espaço para incentivos não particularistas? Há
condições de permanência e sobrevivência política para Vereadores que escapam do
sistema clientelístico de cooptação do poder Executivo? Essas são questões inquietantes
que o estudo das instituições políticas locais trazem aos pesquisadores.
Segundo Bezerra (1999) há um problema para pensar-se as práticas clientelistas,
pois elas não são percebidas com estatuto sociológico próprio. O sistema de clientela
tende a ser integrado em posição subordinada ao sistema político moderno, baseado nos
conceitos de representação, multipartidarismo e liberalismo, um modelo ideal de política.
São vistos ou como resquícios de formas de dominação tradicionais, ou como maneiras
desviantes, ligadas à corrupção das instituições públicas. Com isso há uma perda conceitual,
ao tratar o clientelismo como anomalia do sistema de representação, porque se deixa de
explicar os mecanismos pelos quais ele opera e convive com outros tipos de atividades e
sistemas de representação política. A troca de votos por favores, a distribuição de benefícios
particularistas, a perpetuação de relações assimétricas entre cidadãos podem ser avaliadas
como um fenômeno político autônomo e dotado de racionalidade, sem postular
incompatibilidade operacional entre clientelismo e os pressupostos do Estado republicano-
democrático.
De acordo com Bezerra (idem), a concessão de favores relacionados aos órgãos
públicos e a obtenção de recursos são mecanismos sociais por meio dos quais os
parlamentares acumulam certo poder social. As chances de concessão desses favores e
recursos passam pelas relações estabelecidas entre Vereadores com a Câmara Municipal
e com o poder Executivo. Aos parlamentares interessa o acesso às arenas decisórias
capazes de atender as demandas do seu eleitorado, de base comunitária, temática ou
233
midiática, e o controle de postos. No caso de uma coalizão de cooptação e apartidária, são
principalmente os acessos que manterão a aliança majoritária entre poderes, produzindo
a circulação constante dos benefícios aos aliados, pois a nomeação de cargos não está tão
clara na coalizão de Curitiba como no caso de São Paulo (ZAPPI, 2004).
Os acessos constituem estratégia política para os parlamentares e possibilitam
as intermediações com seus pares e com a sociedade. A atuação dos Vereadores – aliás,
dos parlamentares em geral – como mediadores de demandas dos eleitores junto aos
órgãos executivos tem raízes históricas (BEZERRA, 1999; KUSCHINIR, 2000). Assim,
parece bastante racional que o Vereador tenha um comportamento situacionista e a Câmara
também. Mas faz-se a ressalva de que essa concepção de “acesso” de Kuschnir fundamenta-
se na idéia de um tipo de Vereador, o comunitário, que pode ser estendido para o temático-
institucional sem caráter ideológico.
A valorização dos acessos aos recursos do poder Executivo por parte dos
parlamentares levaria a um comportamento previsível dos políticos de tipo situacionista:
“Os acessos definem as noções de política, poder público, assim como a identidade do
político” (KUSCHNIR, 2000, p. 105). Assim, de certa forma os acessos possuiriam maior
peso no campo da política local do que os partidos.
Alguns estudos sobre o processo legislativo demonstram que os Vereadores da
base de sustentação do governo têm vantagens na aprovação de projetos e emendas
legislativos12. Certos depoimentos dos entrevistados nesta pesquisa13 endossam a visão
de que os benefícios são exclusivos dos membros da base de apoio. As relações clientelistas
entre órgãos do poder Executivo e Vereadores favorecem, também, a transformação das
propostas, requerimentos e emendas legislativas em crédito perante os eleitores. Os
entrevistados ilustram a relação de interdependência entre os poderes, afirmando que
não somente o Vereador reivindica a execução de emenda requerida pela sua comunidade,
mas também os órgãos das secretarias apontam, a priori, quais obras já constam para
execução, e os Vereadores podem receber crédito por elas ao encaminhar uma proposição
que já sabem que será atendida. Não há como entender esses casos, todavia, como norma,
pois não há como os estudá-los com maior precisão devido ao sigilo que envolvem essas
práticas informais do policy making.
O requerimento de “favores” não implica questionamento dos atores envolvidos
nessas práticas em relação à pertinência dos pedidos ou sobre a particularização dos
12
Um pressuposto distributivista puro, todavia, não dá conta da complexidade das relações de mediação do
Vereador. Primeiro, porque se concentraria na análise de proposições legislativas, omitindo as outras atividades
presentes no cotidiano dos gabinetes parlamentares. Segundo, a idéia de base eleitoral restrita, para a qual o eleito
serviria de ponte até os recursos, não se adapta ao modelo eleitoral proporcional que molda as competições para
as câmaras municipais brasileiras. Ver, a respeito da corrente distributivista, seu pressuposto e novo
institucionalismo em Limongi (1994).
13
As identidades dos entrevistados não serão reveladas. As entrevistas fazem parte da aplicação do método de
análise de redes ao objeto da pesquisa. Os entrevistados são ou funcionários públicos, ou assessores parlamentares,
ou assessores do poder Executivo, cargos comissionados da Prefeitura ou os próprios políticos ocupantes de
cargos eletivos, que atuaram ou ainda atuam no domínio da política local, na cidade de Curitiba, no período
compreendido entre 1985 e 2000.

234
bens públicos. O atendimento é uma obrigação. O “clientelismo opera sob o princípio da
dádiva, implicando sentimentos de lealdade e empenho individual” (idem, p. 140),
promovendo relação de solidariedade vertical, sendo sua prática institucionalizada pela
lógica dos acessos ao poder decisório do Estado. Mas os acessos podem envolver questões
para além dos benefícios particularistas, apesar de seu caráter pessoal.
Os vínculos diretos com as secretarias por parte da bancada de apoio reduzem
a importância dos requerimentos de informações, objeto típico de fiscalização do poder
Executivo. Informações da cidade podem ser obtidas com maior confiança devido ao
mecanismo de influência operado pelo sistema de incentivos da organização ou do grupo.
Os parlamentares sem acesso à Prefeitura, de oposição declarada, por sua vez, têm nos
mecanismos formais, impessoais, a via de acesso aos órgãos do poder Executivo. Os
incentivos para o clientelismo individualista não têm efeito uniforme em toda a CMC. Os
estímulos são mais fracos entre aqueles que, excluídos dos círculos imediatos do poder
e da patronagem, estão fora da base de apoio. Estes empenham as suas energias no
ativismo oposicionista, partilham acessos limitados, envolvendo mais a compreensão do
processo de acessos do que a sua conquista em si. Mas seria nesse sentido que espaços
viabilizar-se-iam para formação de contra-redes de poder.
Não se deve restringir as estratégias de sobrevivência eleitoral dos Vereadores
a objetivos particularistas. Concordamos com a idéia de Figueiredo e Limongi de que “a
premissa usual de que os parlamentares adotam estratégias que maximizam suas chances
de reeleição está longe de implicar interesse exclusivo em patronagem ou na dilapidação
predatória do Estado” (FIGUEIREDO & LIMONGI, 1999, p. 37). Com isso, queremos
minimizar os julgamentos a respeito do clientelismo. Essas considerações relembram-
nos que os indivíduos agem conforme o ambiente em que estão envolvidos e reproduzem
as condições do meio.
Cabe mencionar aqui apenas o cuidado para perceber que as atividades dos
Vereadores contemplam um amplo leque de relações com os eleitores e com o poder
Executivo. Seria problemático enxergar apenas os objetivos formais da representação
parlamentar municipal, restringindo-os à produção de leis, pareceres, emendas e
requerimentos de fiscalização – mesmo porque, por meio dos requerimentos e seus
trâmites formais os Vereadores usam esses instrumentos para legitimar um sistema de
incentivos solidários com o seu eleitorado. Pensemos nas proposições de declaração de
utilidade pública, denominação de logradouros públicos, concessão de títulos, votos de
louvor (congratulações) e prêmios, abarcando a maior parte da produção legislativa. As
atividades realizadas nos gabinetes e em escritórios particulares, as atividades envolvendo
sua propaganda, as atividades nos partidos, nas associações, nos sindicatos ou em outros
movimentos fazem parte da agenda de representação dos vereadores.
O que podemos afirmar até agora é que, ao contrário do que querem os princípios
e os ideais, as regras de relacionamento entre poderes e de funcionamento do parlamento
local incentivam, no entanto, mais as atividades fora do âmbito legislativo. Além disso, a
força com que as práticas clientelistas, no âmbito local, constrangem ou reforçam os
princípios, os instrumentos e o comportamento dos atores políticos tem encaminhado as
235
ações pelo lado pessoal, informal. A lógica institucional mais ampla é desafiada por dentro
do processo decisório institucional. Nesse sentido, distinguir o grau de especificidade do
clientelismo e a relativização dos conceitos relacionados ao modelo ideal de política não
deve significar a valorização do clientelismo, como afirma Karina Kuschnir (2000), mas
sim identificar a permeabilidade das instituições.

V. RELAÇÕES ENTRE VEREADORES E ELEITORES

A relação entre líderes – em nosso caso, os Vereadores – e cidadãos é ambígua.


Os líderes não são mais a elite do passado. Dahl (1998), em seu livro Who Governs?,
descreve como a fragmentação do controle sobre os recursos econômicos, políticos,
culturais e sociais criou uma classe política heterogênea, competitiva, suscetível às
influências do eleitorado. Os líderes precisam pensar nas preferências dos eleitores e
entendem, de maneira ampla, a sua sobrevivência política como uma relação de legitimação
e prestação de contas aos eleitores (idem). Os sistemas clientelísticos considerados
anteriormente constituem formas de legitimação, de atendimento de preferências e também
de prestação de contas, porém de âmbito particularista. As escolhas de representação em
processos personalizados mantêm-se conseqüentemente por meio de práticas
personalizadas. Os vínculos entre eleitor e político supõem maior estabilidade explicada
por relações de dependência. Obviamente, parlamentares de ação clientelista, no nosso
sistema eleitoral proporcional, contam com votos que estão além de sua ação localizada,
pois há incentivos para que eles difundam sua atuação em busca de apoio eleitoral.
Essa identificação eleitoral mais ampla pode muito bem fundamentar-se na
clivagem direita-esquerda, representada pelos blocos PDT (PFL, PTB, PPB) x PMDB (PT)
mencionados no início do capítulo. Sabe-se que os competidores do jogo eleitoral não são
os partidos como unidades diferenciadas, mas candidatos e coligações formadas por
diversos partidos, possibilitando a visualização de blocos.
A divisão entre situação e oposição também se constitui em matéria de
identificação para o eleitor. No caso da CMC os Prefeitos uniram-se aos partidos da
coligação e a alguns Vereadores, em particular, para compor maiorias de governo estáveis.
A participação de um Vereador na bancada de apoio, dessa forma, pode ser vista como
uma sinalização para o eleitor. Para Fabiano Santos (2003), ao estudar o Congresso
Nacional, pertencer ao bloco do governo seria uma estratégia do Deputado para sinalizar
à sua base eleitoral a que posição ele adere, já que a base é incerta a respeito dos
responsáveis pelas políticas públicas. No caso local, a sinalização, além de referir-se à
responsabilidade pelas políticas públicas, contempla também a possibilidade de acesso
aos benefícios das políticas públicas de um modo mais direto.
A identificação do eleitor com o político pode mantê-lo no cargo representativo.
Um problema derivado seria a permanência dos políticos na CMC. A idéia central parte de
Fabiano Santos (2000): a capacidade de o poder Legislativo federal reter políticos está
positivamente relacionada ao seu poder de agenda. Ou seja, quanto maior o poder de
agenda do poder Legislativo, mais ele é relevante para o processo decisório de políticas

236
públicas, maior capacidade de reter políticos, maior sua permanência nos cargos
parlamentares. Santos indica que a permanência do político mostra seu interesse na
carreira na instituição e verifica que mesmo o Legislativo não sendo capaz de compartilhar
a agenda pública com o poder Executivo (LIMONGI & FIGUEIREDO, 1999), a média de
permanência é alta. O poder de reter membros, então, volta-se para o perfil dos Deputados,
que significa experiência e força eleitoral. Santos constata que a Câmara dos Deputados é
habitada por Deputados inexperientes e de desempenho eleitoral médio, permanecendo
por períodos longos. Seus pressupostos referem-se a Weber: quanto maior o poder
concedido ao parlamento, mais preparados tornam-se os parlamentares, melhor a qualidade
de líderes e menor o peso da burocracia.
De modo simplificado constata-se, na CMC, que a eleição de 2000 elegeu 45%
(16 do total de 35 cadeiras) de Vereadores que já tinham ao menos três mandatos na CMC.
A eleição de 2004 manteve um índice de 47% de Vereadores também com, pelo menos,
três mandatos na CMC (18 do total de 38 cadeiras)14. Os nomes que compõem a Mesa
Executiva da Câmara também indicam uma certa deferência ao tempo do Vereador na casa.
Com exceção da Mesa do período de 1991-1992, em que apenas o presidente já estava em
seu segundo mandato, todas as mesas seguintes compuseram- se de Vereadores no mínimo
em seu segundo mandato (salvo algumas exceções).
No caso da CMC, sua estrutura institucional beneficia o bloco de situação e o
comportamento de aquisição de acessos à administração municipal, em contrapartida do
apoio à agenda do poder Executivo. O canal da representação que seria o principal acesso
ao locus de decisão – poder de agenda – transforma-se no principal acesso aos loci de
implementação. De um lado, o poder de acessos transforma-se em um incentivo tão
importante para a carreira do vereador quanto o poder de agenda. De outro lado, o perfil
do parlamentar pode assemelhar-se ao dos Deputados estudados por Santos (2000). No
entanto, esses dados não estão disponíveis e completos nesta pesquisa e só é possível
especular a respeito.

V.1 Reeleição
Os Vereadores com vínculo de dependência com a comunidade têm interesse
em investir na continuidade de sua carreira política. A suposta atração por cargos executivos
não exclui o investimento nos cargos parlamentares, tendo em vista o poder de acessos
em Curitiba. O interesse em influenciar o processo decisório contempla-se com os acessos
e a constante circulação de benefícios, caso a opção do Vereador vincule-se à estratégia da
sobrevivência via apoio do poder Executivo. Pois, mesmo assumindo-se a predominância
do poder Executivo na CMC, os Vereadores de apoio estariam envolvidos nos processos
decisórios que lhes interessam. Seriam os políticos externos às coalizões que teriam mais
problemas para realimentar seu interesse no desenvolvimento de uma carreira voltada ao
parlamento. Mesmo assim, os Vereadores de oposição de Curitiba desenvolveram carreiras

14
Aumentaram-se três cadeiras por decisão do Tribunal Superior Eleitoral em 2004.

237
parlamentares e investiram nas suas candidaturas de reeleição, em sua maioria – mesmo
os do PMDB que tiveram oportunidades de ocupar cargos no poder Executivo estadual
durante o período analisado.
Muitos políticos locais investem na conquista dos cargos na CMC, a ponto de
Vereadores candidatos à reeleição que não se reelegem candidatarem-se novamente em
outra eleição15; pouco muda se a reeleição seria o objetivo principal do político ou um
objetivo intermediário para as taxas de reeleição16.
A década de 1980, de transição democrática, foi de alta renovação dos
parlamentares municipais. Na eleição de 1982, somente se reelegeram nove Vereadores
para os 33 lugares disponíveis (27%). O PMDB foi o grande responsável por essa
renovação: dos nove vereadores reeleitos, sete eram do PDS e o PMDB acabou ocupando
60% das vagas da CMC (vinte Vereadores entraram por esta legenda). Dos 33 Vereadores
eleitos em 1982, apenas oito (24%) foram reeleitos em 1988 e apenas um faria seu
terceiro mandato (José Gorski). Foi a maior taxa de renovação da CMC durante o
período estudado. A coligação para a eleição majoritária que elegeu o Prefeito, Jaime
Lerner, ocupou 14 das cadeiras (42%). Porém o bloco de sustentação do governo era
maior, consolidando o processo da construção do grupo interno da Câmara chamado
Pró-cidade.
Sabe-se que os resultados das eleições proporcionais possuem razoável dose
de imprevisibilidade (MELO, 2004, p. 61). Mas a década de 1990 mostrou uma taxa alta
de reeleição, conseqüentemente apontando alguma vantagem dos ocupantes de cargos. A
Câmara eleita em 1992 tinha 22 Vereadores reeleitos (66%), as maiores votações foram
deles, com exceção do primeiro da lista, Íris Simões17. Desses reeleitos, dezenove
compunham o bloco de apoio ao poder Executivo; um Vereador iria para seu quarto
mandato consecutivo, seis para o terceiro e 15 para o segundo. Por falta de dados18, não
pudemos identificar quantos eram da coligação vencedora, mas ao menos 13 Vereadores
eram da coligação para eleição majoritária que apoiou o Prefeito eleito.
Nas eleições municipais seguintes, de 1996, as cadeiras aumentam de 33 para
35 e 21 foram ocupadas por Vereadores reeleitos (60%): um em seu quinto mandato,

15
Eugênio Bim, Ítalo Tanaka, Antônio Marchalek voltaram a candidatar-se em 1988 e perderam, como em 1982.
Eugênio Bim e Santiago Losso candidataram em 1992 e perderam como em 1988. Luiz Ernesto candidatou-se em
1996 e ganhou após perder em 1992. Paulo Salamuni, Geraldo Bobato e Marcelo Almeida candidataram-se e
elegeram-se em 2000, após derrota em 1996. Josias Lacour e Rosa Maria Chiamulera candidataram-se em 2000
e perderam como em 1996. Jonathas Pirkiel candidatou-se e não se elegeu em 2000, após alguns anos de
afastamento após derrota para Prefeito em 1992. Borges dos Reis e José Gorski candidataram-se em 2004 e não
se elegeram, assim como em 1996. Nely Almeida, Custódio, Sandoval e Tito Zeglin retornaram à CMC em 2004,
após derrota em 2000 (a primeira assumiu a suplência do cargo de Mauro Moraes em 2003).
16
Esse fator pode importar para distinguir um comportamento parlamentar voltado exclusivamente à reeleição
e um outro diferenciado; todavia esse assunto demandaria um estudo mais pormenorizado.
17
Irmão de Carlos Simões e ex-Vereador, ambos radialistas. Pode-se especular a respeito da transferência de
votos do irmão não-candidato para o irmão candidato.
18
Não sabemos de todos os partidos que fizeram alianças para a eleição majoritária.

238
quatro em seu quarto19, nove no terceiro20 e sete no segundo21. Dentre eles, treze foram
reeleitos pela coligação na eleição majoritária que apoiou o Prefeito eleito, mas apenas
três não se declaravam do bloco de apoio ao poder Executivo.
Na eleição de 2000, das 35 cadeiras, 22 (63%) eram Vereadores reeleitos: três
pelo seu quinto mandato (desde 1982), sete pelo seu quarto, seis pelo seu terceiro22 e seis
pelo seu segundo. Doze Vereadores eleitos em 1988 foram também eleitos em 2000;
dentre eles, dez faziam parte do Grupo Pró-cidade iniciado na gestão de Requião e
consolidado na gestão Jaime Lerner.
Os dados que fundamentaram essa descrição a respeito da reeleição dos
Vereadores são do Tribunal Regional Eleitoral do Paraná (TRE-PR). A partir da lista dos
candidatos a Vereador de eleição para eleição, verificamos quem foi reeleito. Isso significa
que os suplentes que assumiram parte do mandato não estão contabilizados nas
candidaturas para a reeleição. Sabemos que mais da metade dos suplentes cumprem, ao
menos, a metade do período de mandato (dois anos) que, a partir da eleição de 1988,
coincide com os anos das eleições estaduais e federais e que o uso do mandato poderia
assegurar algumas vantagens em relação aos não mandatários23, mas os dados sobre os
suplentes eram insuficientes para considerá-los.

V.2 Migrações
Outro problema a ser discutido a respeito da relação político-eleitor trata da
migração parlamentar. Nos modelos clássicos a identificação partidária importa para a
redução de custos de informação dos eleitores. Em um contexto em que a escolha
eleitoral é personalizada, o que importa não é tanto o novo partido em si, mas as
condições que ele oferece para a disputa, mesmo não existindo garantia para a reeleição
(MELO, 2004, p. 127). As migrações tendem a não ser punidas pelo eleitor24. Realizar
a mudança de partido não constitui nenhum problema, pondera Ranulfo Melo, pois as
regras eleitorais facilitam essa decisão. “A mudança de partido poderá, portanto, ocorrer
sempre que o deputado a considerar benéfica, ou, pelo menos, não prejudicial à sua
carreira. [Mas] o cenário é de incerteza em relação aos efeitos das opções feitas”
(idem, p. 63). Se pensarmos em um parlamentar preocupado com sua sobrevivência
política, a migração pode não lhe acarretar perdas, principalmente em um contexto de
reeleição ao cargo.
19
Nessa categoria, seis Vereadores da legislatura anterior poderiam completar o quarto mandato, mas dois não
se candidataram, ou seja, não houve taxa de falência nesse subgrupo.
20
Nesse subgrupo, dos 15 que completariam seu terceiro mandato com uma reeleição, doze candidataram-se e
três perderam o mandato (25% de falência).
21
A exemplo das notas anteriores, oito candidataram-se e sete reelegeram-se (12% de falência).
22
Taxa zero de falência: dos sete que poderiam completar seu terceiro mandato, seis apresentaram candidatura.
23
Essa discussão teve origem no artigo de Mayhew (1971).
24
Embora um caso não prove a afirmação, ele mostra-se interessante como descrição do procedimento migratório:
Mauro Moraes foi o Vereador mais bem-votado da história de Curitiba (resultado de 2000), inclusive dos resultados
recentes de 2004: em 2000, conquistou o seu quinto mandato consecutivo, realizando três mudanças de partidos:
do PMDB (1983 e 1988) para o PRN (1992), deste para o PSDB (1996) e então para o PSC (2000).

239
Pôde-se observar em Curitiba, até agora, apenas as mudanças de eleição para
eleição (ver Tabela 4). Os dados das migrações partidárias intramandatos não eram
completos, por isso não pudemos averiguar as freqüências de migrações durante os
mandatos, nem desenvolver relações com o período de escolha da Mesa Executiva da
CMC. Considerações a respeito da relação das migrações e o aumento dos partidos na
CMC, sem esses dados, também ficam prejudicadas.
Mas o questionamento a respeito da instabilidade que as migrações trariam às
bancadas dos partidos não faz muito sentido se observamos que os loci de decisões da
CMC são os blocos situação x oposição. Como já consideramos, na CMC há poucos
incentivos para a institucionalização de um tipo de comportamento partidário restrito:
não há centralização de decisões nos líderes, blocos podem ser feitos e refeitos
transpassando legendas, há grande fragmentação e certo equilíbrio de cadeiras entre os
partidos, o que não permite nenhuma dominância. A força da expressão de uma divisão
entre bancada de apoio ao poder Executivo e a bancada de oposição nas negociações da
casa são mais comuns do que negociações partidárias.

Tabela 4
Mudanças de partido dos vereadores de Curitiba de eleição a eleição
(1988-2004)
1988/1992 1992/1996 1996/2000 2000/2004
abs % abs. % abs. % abs %
Mudanças novas 8 36 4 11 5
reincidentes* 2 29 2 59 6 58
Total** 22 100 21 100 22 100 19 100
Fonte: TRE-PR (s/d).
Notas:
1. * O total se refere aos vereadores reeleitos.
2. ** Quando vereadores que já haviam migrado anteriormente fazem novamente uma mudança,
foi computado a partir de primeira mudança considerada.

Todos os migrantes – com exceção de Jorge Samek, que passou do PMDB, em


1988, para o PT, em 1992 – eram da bancada de apoio ao poder Executivo no mandato
anterior à mudança de partido. As migrações não parecem acarretar problemas para a
coalizão de governo. Os Vereadores da bancada de apoio, trocados seus partidos, continuam
na bancada de apoio. Os Vereadores também acompanham a mudança de partido do
Prefeito. Na legislatura de 1997-2000, seis Vereadores integravam o PDT, com maior
bancada da CMC, mas seis deles mudaram de partido com a migração de Jaime Lerner
para o PFL; todavia, nem todos foram para a mesma legenda: houve uma distribuição para
PFL, PTB e PSB, todos partidos possíveis para futuras alianças. Essa migração em massa
criou problemas para o partido abandonado, mas não para o sustento do poder Executivo,
pois todos os Vereadores migrantes também eram presidentes de diretórios zonais do

240
PDT e mantinham a estrutura desses escritórios25.
O volume de migrações aqui verificado não diz nada sobre a disciplina dos
Vereadores, nem tampouco mostra fragilidade do apoio ao poder Executivo, mas não
autoriza que se fale em vínculos fortes entre os partidos e os parlamentares. Essa discussão
sobre a fragilidade das instâncias partidárias no âmbito local aponta caminhos para
conhecermos melhor como as lideranças políticas relacionam-se entre si – mais
especificamente, como o grupo no poder Executivo apropria-se das estruturas partidárias
e como é influenciado pelo tipo de partido em que se encontra. Esse debate, todavia,
merece ser desenvolvido em outro estudo.

VI. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A unidade de apoio do legislativo ao grupo de Jaime Lerner foi grande e, embora


não possamos afirmar que tenha sido controladora, moldou a trajetória do desenvolvimento
político de Curitiba. Essa estável aliança entre Vereadores e Prefeitura explica-se pela
natureza da instituição, que foi moldada pelas regras do processo legislativo local, assim
como pelo comportamento parlamentar majoritário dentro da CMC, que estabelece os
vínculos com a administração municipal.
Com relação ao comportamento dos parlamentares, os acessos aos órgãos
executivos constituem-se em estratégia política para os políticos e possibilitam as
intermediações com seus pares e com a sociedade. A atuação dos Vereadores, aliás, dos
parlamentares em geral, como mediadores de demandas dos eleitores junto aos órgãos
executivos tem raízes históricas (BEZERRA, 1999; KUSCHINIR, 2000). Assim, parece
bastante racional que o Vereador tenha um comportamento situacionista e a Câmara
também. A valorização dos acessos aos recursos do executivo por parte dos parlamentares
levaria a um comportamento previsível dos políticos. Assim, poderíamos dizer que os
acessos possuiriam maior peso no campo da política local do que os programas partidários.
Fazemos a ressalva de que essa concepção de acesso de Kuschnir fundamenta-se na idéia
de um tipo de Vereador, em especial o Vereador comunitário. Na Câmara Municipal de
Curitiba, verificamos que o bloco de apoio ao governo compõe-se dos variados tipos de
Vereadores, enquanto o bloco de oposição ao longo do tempo se compunha de Vereadores
do tipo temático-institucional.
O que podemos entender até aqui é que, ao contrário do que quer os princípios
e os ideais, as regras de relacionamento entre poderes e de funcionamento do parlamento
local incentivam, no entanto, mais as atividades fora do âmbito legislativo restrito. Além
disso, a força com que as práticas clientelistas, no âmbito local, constrangem ou reforçam
os princípios, os instrumentos e o comportamento dos atores políticos tem encaminhado
as ações pelo lado pessoal, informal. A lógica institucional mais ampla é desafiada por
dentro do processo decisório institucional. Significa enfim que precisamos considerar e
identificar a permeabilidade das instituições como um fato político.
25
Depoimentos dos entrevistados contam como os presidentes de zonais e Vereadores desestruturaram o PDT,
levando atas de reuniões internas e lista de filiados embora consigo, como se fossem bens pessoais.

241
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243
244
CAPÍTULO DEZ

INSTITUCIONALIZAÇÃO PARTIDÁRIA:
UMA DISCUSSÃO EMPÍRICA A PARTIR DO CASO DO PFL DO PARANÁ

Emerson Urizzi Cervi & Adriano Nervo Codato

245
246
10. INSTITUCIONALIZAÇÃO PARTIDÁRIA:
Uma discussão empírica a
partir do caso do PFL do Paraná 1

Ao contrário da experiência em outros estados do Brasil, o Partido da Frente


Liberal (PFL) não se fortaleceu como a principal agremiação conservadora do Paraná a
partir da decadência do PDS na segunda metade dos anos oitenta. Nem foi a alternativa
política aos integrantes da Arena quando ela foi extinta, no final dos anos setenta. Os
líderes de maior prestígio migraram, curiosamente, para o Partido Democrático Trabalhista
(PDT), de Leonel Brizola.
Seu principal representante no estado, Jaime Lerner, participou da disputa em
1986 como candidato a vice-Governador, venceu a eleição para Prefeito de Curitiba em
1988 e a de Governador em 1994 sempre pela legenda do PDT. Durante todo esse período,
o PFL ficou no ostracismo por falta de lideranças estaduais fortes e atuantes2. Além de
tudo, o PFL seria o único entre os grandes partidos a apresentar uma trajetória estadual
distinta da trajetória nacional. O PMDB paranaense, por exemplo, seguiu a mesma direção
que a agremiação em nível nacional. Nos anos 1980 e início dos 1990 foi o partido
majoritário, tendo conseguido eleger três Governadores consecutivos, que administraram
o estado entre 1982 e 19943. Em 1997, o Governador Jaime Lerner, depois de muitas
negociações, inscreveu-se no Partido da Frente Liberal, dando um impulso formidável à
estrutura da agremiação.
O objetivo deste capítulo é justamente analisar e discutir a forma de crescimento
do partido liberal no estado e a natureza desse crescimento.

1
Versão preliminar deste trabalho foi apresentada no III Encontro da Associação Brasileira de Ciência Política –
ABCP, realizado em Niterói, em julho de 2002. Agradecemos a leitura atenta e os comentários de Renato Monseff
Perissinotto, Mário Sérgio Lepre e Luzia Helena Hermann de Oliveira.
2
Até meados dos anos noventa, a principal figura do PFL continuou sendo o ex-Governador e ex-Ministro Ney
Braga. Em 1982, após ser derrotado na disputa de uma cadeira no Senado Federal, decidiu não disputar mais
cargos eletivos. Ney foi o único político paranaense a assinar o manifesto de fundação da Frente Liberal, em 1984.
Como ele não participaria mais de eleições depois de 1982, os políticos estaduais conservadores procuraram
outras legendas que contassem com lideranças com o mesmo prestígio e/ou influência.
3
Ver o Quadro 4 do Anexo.

247
Note-se que o controle do governo por determinada agremiação – o que constitui,
de resto, a base para a distribuição de empregos (“cargos”) e recursos públicos em troca
de apoio político – tende a contribuir decisivamente para a institucionalização partidária,
seja no âmbito eleitoral, seja no âmbito organizacional. Partidos que contam com o
Presidente, ou com o Governador, ou com um número respeitável de Prefeitos, tendem a
avançar eleitoralmente e estruturar-se materialmente, crescendo em importância junto à
elite política. O exemplo do Partido da Frente Liberal no Paraná é uma evidência típica
disso. O partido só vai ganhar peso efetivo no sistema político, no estado, após 1997.
Nossa hipótese, entretanto, é que a análise isolada das informações sobre o
incremento eleitoral e a presença institucional do PFL não são suficientes para evidenciar
se houve de fato um “fortalecimento” do partido no Paraná a partir da filiação de Lerner.
O caso do Paraná é tanto mais relevante quando se considera as características
do PFL como agremiação nacional. Como se sabe, trata-se de um partido disciplinado
internamente (o que pode ser visto pelas votações no legislativo), coeso ideologicamente
(suas divisões internas resultam mais de facções regionais do que de tendências que
defendem princípios diferentes) e estável (isto é, com baixo índice de migração para
outras legendas)4.
A avaliação do PFL como uma agremiação política coesa, disciplinada, centralizada
e articulada – “mecanismos fundamentais no processo de desenvolvimento e
institucionalização” do partido – pode ser lida, por exemplo, em Ferreira (2002). Conforme
a autora, a sigla “tem crescido nas demais regiões do país”, deixando, portanto, de ser um
“partido de nordestinos”. Ela sustenta ainda que

“Os resultados eleitorais [mostram] que o PFL tem-se firmado como uma
legenda com expressiva votação, [...] conquistando razoável estabilidade
e crescimento eleitoral, que se constituem em indicadores de
desenvolvimento e da institucionalização partidária. Além disso, [...] tem
procurado” difundir “um projeto de feição liberal para o País. Essa
perspectiva articula-se em torno de idéias cujo núcleo básico é constituído
pela crítica à atuação e interferência do Estado, principalmente na economia
[...]” (Ferreira, 2002, p. 213-214).

Por tudo isso, o PFL está longe de representar uma instituição destinada apenas
a realizar o interesse político-eleitoral de seus líderes.
Essa conclusão é válida para a agremiação no Paraná? Para testar essa afirmação
analisaremos o desempenho eleitoral e a organização interna do PFL no estado entre 1986
e 2004. As questões que orientam esse estudo são as seguintes: depois de 1997 qual foi o
índice de avanço eleitoral do partido no estado?5 Nas eleições proporcionais (Deputado
4
Para os baixos índices de migração partidária do PFL, v. Melo, 2000; para sua disciplina em plenário, v. Figueiredo
e Limongi, 1995.
5
Para uma definição completa do índice de avanço, v. Santos, 1977, p. 215-216. A fórmula de cálculo é (votos
partido t1 - votos partido t0)/votos partido t0)/((votos totais t1 – votos totais t0)/votos totais t0).

248
federal, Deputado estadual, Vereadores da capital) esses índices foram significativos e
constantes? Qual foi a taxa de crescimento de prefeituras controladas pela agremiação?
Essa é uma tendência ascendente ou ao menos estável? Quais as taxas de disciplina e
fidelidade partidárias alcançadas pelos “liberais” no estado?
O estudo de uma agremiação específica (PFL) num estado determinado (Paraná)
deve trazer dois proveitos: além do aumento do conhecimento sobre a política paranaense
(cujos preconceitos positivos em torno de algumas de suas lideranças políticas mais
conhecidas são renitentes), lança uma luz à dimensão política “regional” do sistema
político nacional. Definir melhor o perfil estadual dos partidos num regime federativo,
imagina- se, é central6.
Este capítulo está dividido em quatro seções. Na primeira estipula-se uma série
de critérios metodológicos a fim de definir e avaliar o grau de institucionalização dos
partidos políticos. A segunda seção resume o desempenho eleitoral e político do PFL-PR
antes e depois de 1997 e determina as razões do crescimento do partido. A terceira seção
interpreta o significado desse crescimento e os motivos de sua retração brusca no período
mais recente. A última seção expõe algumas explicações e sugere tendências eleitorais
futuras.

I. UM MODELO DEDUTIVO PARA INSTITUCIONALIZAÇÃO PARTIDÁRIA

Como, quando e sob que condições pode-se sustentar que um partido político é
“forte”, em sentido amplo, ou está institucionalizado? Qual é o “ponto ótimo” (se é que
existe um) a partir do qual um partido está enraizado no sistema político a ponto de não
depender da transferência de prestígio de uma liderança “carismática” ou de um “chefe”
local?
A noção de institucionalização que utilizamos neste estudo está ligada à idéia de
estabilidade e essa estabilidade teria de se evidenciar em duas dimensões: junto ao eleitorado
e junto à elite política. O apoio político obtido pelo PFL-PR é permanente, isto é, iria além
do período de governo de Jaime Lerner? O partido apresenta baixas taxas de migração e
alta presença nos escalões superiores do governo, por exemplo?
Idealmente, um partido “institucionalizado” deveria demonstrar força eleitoral
autônoma como marca de seu enraizamento na sociedade. Essa variável pode ser medida
seja em função da independência da organização frente a um “cacique político”, seja em
função do grau de identificação/reconhecimento do eleitorado junto ao partido. Esse traço
pode ser evidenciado a partir de séries eleitorais razoavelmente longas e da própria
história partidária. Uma das condições necessárias da institucionalização é o crescimento
eleitoral (aumento do número de cadeiras nos legislativos e aumento do número de
mandatos conquistados nos executivos) e a fixação da preferência partidária (voto de

6
Há pouquíssimos estudos sobre “partidos e eleições” no Paraná. Eles são dispersos e rarefeitos. A propósito,
ver a lista quase integral: Martins, 1960; Santos, 1964; Balhana, 1969; Franco Sobrinho, 1976; Moura e Kornin,
2001; e Cervi, 2002. Os trabalhos mais completos são Oliveira, 1998; e Lepre, 2000.

249
legenda) num grau relevante. Mas esse critério – representatividade eleitoral – tem de ser
completado por um outro: é preciso que as bancadas sejam estáveis e obedientes.
Isso nos leva ao segundo critério: coesão partidária e disciplina organizacional.
Coesão partidária e disciplina organizacional são medidas seja pela migração partidária
(baixa), seja através do comportamento unificado da bancada no legislativo: rejeição
(quando na oposição) ou apoio (quando na situação) às iniciativas do executivo nas
proposições e votações mais importantes.
O terceiro critério é a capacidade de influência do partido junto às instituições
políticas (governo e legislativo). Seus indicadores são os graus de controle dos recursos
políticos do sistema, medidos pela alta presença nos escalões superiores do governo
(ocupação/indicação de posições relevantes no executivo) ou nas comissões do legislativo,
e grande competência de definição e/ou influência sobre o processo decisório, o que
equivaleria à “implementação do programa” da agremiação, pelo menos em seus aspectos
básicos.
A variação desses fatores, em conjunto, indica o coeficiente de implantação da
agremiação partidária no sistema político e sua solidez. Esquematicamente teríamos o
seguinte:

Quadro 1
Variáveis selecionadas para determinar a institucionalização partidária
CRITÉRIOS O QUE É INDICADORES EVIDÊNCIAS EXEMPLO
MENSURADO
1) força a penetração 1. número de a. (in)dependência - crescimento
eleitoral junto ao cadeiras no da organização eleitoral
autônoma eleitorado legislativo/ frente a um constante
(“representatividade”) número de “cacique político”
mandatos no
executivo

2. grau de b. fixação da - crescimento


identificação do preferência do voto de
eleitorado junto partidária legenda
ao partido

3. índice de c. crescimento - crescimento


avanço eleitoral líquido no real no número
número de de votos
votos do partido obtidos (e não
de cadeiras
conquistadas)

Continua...

250
2) coesão a adesão 4. taxa de d. baixa - poucas trocas
partidária e partidária permanência migração de agremiações
disciplina (“fidelidade”) dos membros partidária
organizacional no partido

5. índice de e. comportamento - votações


disciplina unificado significativas de
partidária da bancada no acordo com a
legislativo posição do líder
do partido

3) influência o controle dos 6. taxa de f. nível alto de - número não


junto às recursos presença nos ocupação/ desprezível de
instituições políticos do escalões indicação de secretários de
políticas sistema superiores do posições estado
(“efetividade”) governo relevantes no pertencentes ao
executivo partido

- tipo de cargos
conquistados

7. taxa de g. nível alto de - domínio de


presença/ ocupação/ presidências/
controle de indicação de relatorias de
comissões no posições comissões
legislativo relevantes no
legislativo - controle da
mesa diretora

8. potencial de h. grande - realização de


definição e/ou capacidade de políticas de
influência sobre implementação governo
o processo do “programa” exemplares
decisório da agremiação

Para efeito da análise aqui empreendida tomaremos cinco indicadores


combinados (distribuídos entre os três grupos) para avaliar o grau de institucionalização
ou estabilidade do Partido da Frente Liberal no Paraná: o aumento do tamanho das bancadas
de Deputados federais, estaduais e Vereadores (da capital), no período 1986-2004, além
da quantidade de prefeituras controladas pela sigla no estado, no intervalo 1988- 2004; o
índice de avanço eleitoral; a presença de membros do partido nos escalões superiores do
governo (secretários); o domínio de comissões no legislativo; e a taxa de permanência
dos políticos eleitos no partido (para Deputados estaduais). Os outros elementos do
modelo proposto não são evidências secundárias, mas carecem, segundo as informações
de que se dispõe no momento, de maior comprovação empírica.
O primeiro grande critério permite determinar o crescimento eleitoral e sua
constância ao longo do tempo; o segundo mede o grau de adesão partidária, sendo um
índice de fidelidade à sigla; e o terceiro é um indicador do controle de uma parte dos
recursos políticos do sistema pela agremiação.

251
II. O PFL DO PARANÁ: DE PARTIDO DE OPOSIÇÃO A PARTIDO DO GOVERNO?

O panorama da política paranaense desde 1982 acompanhou de perto a tendência


nacional. Não fomos um “Brasil diferente”. Ao longo dos anos oitenta (e até a primeira
metade dos noventa), o PMDB converteu-se em partido dominante elegendo, em seqüência,
três Governadores: José Richa em 1982, Álvaro Dias em 1986 e Roberto Requião em
1990. Durante esses doze anos o PMDB controlou mais da metade das prefeituras do
estado, boa parte da representação na Câmara Federal e a maioria das cadeiras na Assembléia
Legislativa7.
A única agremiação que chegou a rivalizar com o PMDB, mas nunca ameaçou
sua hegemonia, foi o PDT de Jaime Lerner que em 1988 conquistou a prefeitura de
Curitiba8. O Partido da Frente Liberal, que teve um crescimento importante após sua
fundação em janeiro de 1985, convertendo-se num dos principais partidos nacionais,
participando de todos os governos desde a Aliança Democrática (1985) até 2002, sempre
foi, no Paraná, uma organização acessória, praticamente inexistente no cenário político9.
A fragilidade inicial do PFL-PR tem uma razão trivial: os principais integrantes
do PDS paranaense que romperam com a ala “malufista” do partido não fundaram o PFL,
como aconteceu em outros estados. Eles se dividiram em grande parte entre o PDT e o
PTB. Na época, o então ex-Prefeito de Curitiba, Jaime Lerner, depois de uma carreira bem-
sucedida na Arena, e uma passagem pelo PDS, optou pelo Partido Democrático Trabalhista,
levando consigo boa parte dos quadros políticos que logo em seguida viriam constituir-se
na principal alternativa partidária aos governos do PMDB.
A história eleitoral do PFL-PR até a segunda metade dos anos noventa é, como se
verá a seguir, ilustrativa da sua insignificância frente a essas duas siglas (PDT e PMDB) e
do caráter secundário do partido na política local.

II.1 Desempenho político e história eleitoral


Em 1985 o PFL coligou-se com o PDT para apoiar o candidato Jaime Lerner nas
eleições para a prefeitura de Curitiba. Lerner ficou em segundo lugar. O candidato vitorioso
foi Roberto Requião, do PMDB. Nas eleições de 1986 o PFL não apresentou candidato a
Governador. O partido aliou-se ao PDT, PMB e PJ e apoiou o candidato do PMB, Alencar
Furtado, que ficou em segundo lugar, sendo derrotado por Álvaro Dias (PMDB). Nesse
ano, o partido elegeu uma bancada de cinco Deputados federais e oito Deputados estaduais
(ver Tabelas 1 e 2). O PMDB fez maioria absoluta em ambas as casas (cf. Quadro 4, em
anexo). Nas eleições de 1988 o PFL elegeu 36 Prefeitos, o que representou apenas 11%
dos 317 municípios do Paraná, tendo ficado em terceiro lugar (ver Tabela 3). O PMDB,
partido do governo, elegeu o maior número de Prefeitos: 162, ou 51%. Em segundo ficou
7
Uma visão mais precisa dessas informações pode ser lida na Tabela 3 e no Quadro 4, do Anexo. Sobre o PMDB-
PR nos anos oitenta, cf. Oliveira, 1998, p. 65-120.
8
Para uma descrição detalhada da trajetória política de Jaime Lerner, v. Braga, 2002.
9
Ames sublinha, a propósito, a fraqueza eleitoral dos partidos de direita (PFL, PPB e PTB) no Paraná em
comparação com o vizinho Santa Catarina (Ames, 2000, p. 110-116).

252
o PTB, com o controle de 65 cidades, ou 20,5% das prefeituras (ver Tabela 3). Em
Curitiba, o PFL não apresentou novamente candidato e conseguiu eleger apenas três
Vereadores de um total de 33 (o PMDB ficou com 12 cadeiras; ver Tabela 4).
No pleito de 1990 o PFL “collorido” coligou-se ao PDC, ao PSC e ao PRN, e apoiou as
pretensões eleitorais do candidato José Carlos Martinez (PRN) ao governo do estado. Ao
Senado, lançou a candidatura de Paulo Pimentel, mal-sucedida. Foram eleitos quatro Deputados
federais e seis estaduais, o pior desempenho da agremiação até então (com um índice de
avanço negativo; ver Tabelas 1 e 2). Nas eleições de 1992 o Partido da Frente Liberal elegeu
39 prefeitos, ou 10,5% dos 370 municípios, tendo ficado em quinto lugar, confirmando a
tendência de queda junto ao eleitorado estadual iniciada em 1990. Em primeiro lugar ficou
novamente o partido do governo, o PMDB, com 138 prefeituras (ou 37%) (ver Tabela 3). A
Prefeito de Curitiba o PFL lançou Luciano Pizzatto, que ficou em terceiro lugar na disputa que
consagrou a vitória do candidato do PDT, o lernista Rafael Grecca; o partido, mais uma vez,
elegeu uma bancada de três Vereadores, apenas 9% da casa (ver Tabela 4). Em 1994, o PFL
novamente não apresentou candidato próprio ao governo do estado, nem ao Senado, e
apoiou a candidatura de Jaime Lerner, do PDT. O partido melhorou seu desempenho na
Câmara Federal e elegeu 6 Deputados, 14% do total de votos (ver Tabela 1), mantendo sua
bancada na Assembléia Legislativa: seis representantes também (ver Tabela 2). Nas eleições
municipais de 1996, todavia, o PFL fez apenas 37 Prefeitos, o que representou pouco mais de
9% dos municípios do estado, tendo ficado em quinto lugar, pouco à frente mesmo do
fraquíssimo PPB. Em primeiro ficou o PDT, partido do Governador, com 111 prefeitos ou
28% das cidades (ver Tabela 3). Em Curitiba, o PFL coligou-se com o PDT e outros partidos
(PPB/PTB/PSC) em apoio a Cássio Taniguchi (PDT), afilhado político de Lerner, que foi o
candidato escolhido. Na Câmara Municipal o PFL fez uma bancada de quatro Vereadores, um
a mais do que nas outras disputas (ver Tabela 4).
Na bancada federal do Paraná, o partido manteve, de 1986 a 1998, a média de
cinco parlamentares por legislatura, só ultrapassando os 20% de votos válidos em 1998 (cf.
Tabela 1). Porém, em 2002 o PFL experimentou uma retração significativa no seu desempenho
Tabela 1
Desempenho do PFL nas eleições para deputado federal do Paraná (1982-
2002)
ANO TOTAL TOTAL % DO Nº DE ÍNDICE DE
VOTOS VOTOS PFL TOTAL CADEIRAS AVANÇO*
1982 2.730.266
1986 3.058.914 470.641 15,39 5
1990 2.258.126 217.850 9,65 4 -2,05
1994 2.287.868 390.319 14 6 3,37
1998 4.223.167 881.375 20,87 6 2,44
2002 5.146.730 363.093 7,05 2 -2,68
Fonte: TRE-PR. Compilação dos autores.
* O índice da última coluna da tabela diz respeito ao avanço no total de votos do PFL-PR.

253
eleitoral, alcançando apenas 7% dos votos válidos e apenas duas cadeiras, sua pior
performance desde 1986. Isso fez com que o índice de avanço da bancada caísse para -2,68,
voltando a ser um pequeno partido no estado. Voltaremos a esse ponto mais adiante.
Como agremiação secundária e de oposição aos governos do PMDB até 1994, os
representantes do PFL, como seria de se esperar, não ocuparam postos importantes nem
na máquina governamental, nem na Assembléia Legislativa (ALEP). O partido controlou
entre 8 (máximo) e 6 (mínimo) cadeiras nas eleições de 1986, 1990 e 1994, com um teto
de 13% dos votos válidos para Deputado estadual (isso na primeira eleição que disputou,
em 1986). Mesmo após 1994, quando apoiou o candidato vitorioso ao governo do estado,
Jaime Lerner (PDT), sua participação na ALEP continuou sendo meramente acessória.
Com apenas seis Deputados (ver Tabela 2), foi a segunda menor bancada eleita em 1994
entre os partidos relevantes, empatando com o PTB e superando apenas o pouco expressivo
PT, que elegeu cinco parlamentares. O PMDB conquistou 12 das 54 cadeiras na Assembléia,
permanecendo como o maior partido da Casa.
Tabela 2
Desempenho do PFL nas eleições para deputado estadual do Paraná (1982-
2002)
ANO TOTAL TOTAL % DO Nº DE ÍNDICE DE
VOTOS VOTOS PFL TOTAL CADEIRAS AVANÇO*
1982 2.705.436
1986 3.113.887 417.657 13,41 8
1990 2.554.742 213.531 8,36 6 -2,72
1994 3.201.212 361.738 11,3 6 2,74
1998 4.433.259 989.060 22,31 12 4,51
2002 5.189.688 575.987 11,09 7 -2,47
Fonte: TRE-PR. Compilação dos autores.
* O índice da última coluna da tabela diz respeito ao avanço no total de votos do PFL-PR.

Em 1997 Jaime Lerner ingressou no PFL-PR, ao final de seu primeiro mandato


como Governador do estado (1995-1998). Pode-se a partir daí dividir a história do
partido no Paraná em duas fases bastante distintas.
Durante todo o primeiro período de governo, Lerner teve de optar entre manter-
se fiel ao PDT de Leonel Brizola, candidato derrotado nas eleições de outubro de 1994
para a presidência da República, ou aproximar-se do governo de Fernando Henrique
Cardoso (PSDB). Apesar de ideologicamente mais íntimo do segundo que do primeiro, o
Governador paranaense esforçou-se por protelar a decisão o máximo possível. Aprovada
a legislação que autorizava Governadores, Prefeitos e Presidente da República postularem
a reeleição, ele desejou transferir-se para o partido do governo federal. Todavia, graças ao
apoio do então Ministro das Comunicações e conselheiro político de Fernando Henrique,
Sérgio Motta, o ex-Governador Álvaro Dias – candidato derrotado pelo próprio Lerner na

254
eleição de 1994 e recém-filiado ao PSDB – conseguiu barrar interferências federais pró-
Lerner e evitou, dentro do diretório regional, a admissão do Governador do estado no
Partido da Social Democracia Brasileira.
A alternativa mais imediata e viável àquela altura foi inscrever-se no PFL, a legenda
politicamente mais próxima do presidente depois do PSDB. Assim, em setembro de 1997,
em função de uma contingência política, com fichas abonadas pelo vice-Presidente da
República, Marco Maciel, o chefe do governo estadual paranaense, mais vários outros
políticos (secretários de estado, assessores, lideranças regionais, Prefeitos do interior),
transferiram-se para o Partido da Frente Liberal. Começa assim a segunda fase da agremiação
no estado: a fase do “PFL gigante”.
Em poucas semanas, o PFL deixou de ser um partido praticamente inexistente e
passou a potência política. Para os pefelistas genuínos, o agigantamento do PFL trouxe
benefícios. Com a entrada do grupo político de Lerner o PFL ganhou a força e o prestígio
de novas lideranças. Em fins de 1997 o partido transformou-se na principal fonte de
recrutamento para posições no legislativo e cargos no executivo. Além de ser agora o
partido do governador, passou a contar com a maior bancada na Assembléia (ao lado do
PTB) por conta da intensa migração dos deputados que deixaram o PDT10.
Na Assembléia Legislativa, a bancada do PFL sempre apresentou alguma
movimentação, mas o período mais intenso de trocas de legendas foi justamente em
agosto e setembro de 1997, quando recebeu 13 novos parlamentares em uma bancada de
seis deputados, eleita em 199411. Ingressaram no PFL, vindos do PDT, Luiz Carlos Martins,
Luiz Acorsi Motta, Edno Guimarães, Nelson Tureck, Walmor Trentini e Julio Ando (os dois
últimos, suplentes do partido). Da bancada do PTB saíram Luiz Carlos Alborguetti, José
Alves dos Santos, Aníbal Kury e Eduardo Trevisan. Da bancada do PMDB desembarcaram
no PFL Durval Amaral e Cleiton Crisóstomo. Da bancada do PP, Geraldo Cartário (que
antes havia passado pelo PTB)12. O quadro abaixo mostra o histórico partidário dos
Deputados estaduais que se transferiram para o PFL em 1997 e permaneceram depois de
1998.
10
O PDT elegera a maior bancada governista em 1994, com nove deputados. Após a transferência de Lerner para
o PFL, a sigla ficou com apenas três parlamentares. V. Lepre, 2000, p. 73-76.
11
Entre 1995 e 1997 o PFL perdeu apenas um Deputado, Carlos Xavier Simões, que se transferiu para o PSDB
e depois para o PTB.
12
O ano mais intenso de migrações na bancada de Deputados federais do PFL do Paraná fora, porém, em 1991.
Os deputados eleitos em 1989 pelo PRN, Max Rosenmann, Luciano Pizzatto e Basílio Vilani, trocaram a legenda
pelo PFL em agosto de 1991. A justificativa apresentada era simples: que o principal representante do governo
Collor no Paraná era o então Ministro da Saúde, Alceni Guerra, do PFL, e não mais o ex-candidato a Governador,
Luis Carlos Martinez, do PRN. Na legislatura de 1991 a 1995 a bancada de seis Deputados estaduais recebeu três
novas filiações: Carlos Xavier Simões (eleito pelo PMDB, passou pelo PL antes de entrar no PFL em dezembro de
1993) e Nelson Garcia, eleito pelo PRN. Nessa legislatura a bancada do PFL perdeu Antonio Costenaro Neto para
o PP em janeiro de 1993 e Duílio Genari, filiado ao PP em janeiro de 1994. Para a legislatura 1987 a 1991 o partido,
que havia eleito oito Deputados à Assembléia Legislativa, não contou com nenhuma filiação. Nesse período, a
bancada do PFL apenas perdeu Deputados. Ezequias Losso foi para o PL em setembro de 1987, Lindolfo Júnior
passou para o PTB em setembro de 1987, PMDB em julho de 1988 e PL em outubro de 1989. David Cherigate
foi para o PRN em julho de 1989.

255
Quadro 2
Carreira partidária dos parlamentares do PFL-PR (1982-1999)
DEPUTADOS ESTADUAIS 1999 1997* 1995 1991 1987 1982
Anibal Khury PFL PFL PTB PTB PMDB PMDB
Basílio Zanusso** PFL PFL PFL PFL PFL PDS
Cleiton Kielse Crisóstomo PFL PFL PMDB
Edno Guimarães PFL PFL PDT
Eduardo Trevisan PFL PTB
Élio Rusch** PFL PFL PFL PFL
Geraldo Cartário PFL PFL PP PDT
Hidekazu Takayama** PFL PFL PFL
José Durval Amaral PFL PFL PMDB PMDB
José Marcos Alves dos Santos PFL PTB PTB
Julio Hideo Ando PFL PDT***
Luis Carlos Alborghetti PFL PFL PTB PRN PMDB
Luiz Carlos Martins Gonçalves PFL PDT PMDB
Luiz Roberto Accorsi PTB PFL PDT
Nelson Garcia** PFL PFL PFL PRN
Nelson Tureck PFL PFL PDT
Plauto Miró Guimarães Filho** PFL PFL PFL PFL
Reny Borsatto** PFL PFL
Walmor Trentini PFL PDT**
Fonte: TRE-PR. Compilação dos autores.
* Outubro de 1997 (um mês depois da filiação de Jaime Lerner e último prazo para troca de partido).
** Deputados eleitos originalmente pelo PFL.
*** Suplentes de Deputado que assumiram o mandato em janeiro de 1999.

Em 1998 os pefelistas do Paraná foram para sua primeira campanha majoritária


no estado com “seu” governador candidato à reeleição e uma das mais competitivas
chapas para as eleições proporcionais. O PFL não lançou candidato a Senador por opção
do partido13. Jaime Lerner foi eleito em primeiro turno, com 52% dos votos válidos,
enquanto Roberto Requião ficou com 46%. Os outros dos candidatos juntos fizeram
apenas 2% dos votos válidos.
Além de reeleger o Governador, o PFL também fez a maior bancada de Deputados
estaduais, com 12 cadeiras (índice de avanço: 4,51; ver Tabela 2), dobrando, portanto, sua
representação em relação a 1994 e batendo o todo-poderoso PMDB14. Na bancada federal
13
Segundo consta, houve um “acordo branco” entre Jaime Lerner e Álvaro Dias. Ao retirar-se da disputa à única
cadeira ao Senado, o PFL praticamente garantiria a eleição de Álvaro ao posto. Em contrapartida, o PSDB não
lançaria candidato ao governo, permitindo a polarização Jaime Lerner versus Roberto Requião (PMDB), o que,
imaginava-se, ajudaria a evitar um eventual segundo turno. Foi o que ocorreu.
14
No pleito, o PTB conquistou onze vagas na AL e o PPB, oito. Os três maiores partidos em número de deputados,
31 representantes (57,5% do total), fizeram parte da coligação de apoio à reeleição do Governador. O PSB, com
dois Deputados eleitos, o PSC, com uma cadeira, e o PSDB, com seis, não fizeram parte da coligação, mas deram
apoio ao executivo (somando mais 16,5% das vagas). Um Deputado do PSDB sempre se posicionou contrário
à maioria da bancada e votou contra o governo. A oposição ficou com apenas 26% das vagas depois da eleição,
distribuídas da seguinte forma: sete para o PMDB, quatro para o PT e três para o PDT. Aqui também houve
dissidências: dois deputados do PDT começaram o mandato votando com o governo, mas no final
resolveram romper publicamente com a base aliada e juntar-se à oposição.

256
não houve a mesma transferência de prestígio do líder político para a sigla, e o partido
permaneceu com seis parlamentares na Câmara dos Deputados, mas superou enfim a barreira
dos 20% dos votos válidos (cf. Tabela 1), seu mais expressivo desempenho até então15.
Na esfera municipal esse crescimento significativo também se verificou. Em
1996 o Partido da Frente Liberal elegeu prefeitos em menos de 10% dos municípios,
mantendo a performance “histórica” de 1992 e 1988. Em 2000, foi quem mais conquistou
prefeituras, oitenta (20% dos municípios), superando o PDT, que no pleito anterior fizera
perto de 30% das cidades do Paraná. Em 2000, o Partido Democrático Trabalhista ficou
reduzido a apenas 18 cidades (4,5%; ver Tabela 3)16.
Tabela 3
Prefeitos eleitos segundo partidos políticos – Paraná (1988-2000)
ELEIÇÕES/ 1988 (317 1992 (370 VARIAÇÃO 1996 (399 VARIAÇÃO
PARTIDOS MUNICÍPIOS) MUNICÍPIOS) 1992/1998 MUNICÍPIOS) 1996/1992
AUMENTO DIMINUIÇÃO AUMENTO DIMINUIÇÃO
(+) (-) (+) (-)

PMDB 162 (51,1%) 138 (37,29%) -24 74 (18,74%) -64


PTB 65 (20,5%) 40 (10,81%) -25 54 (13,53%) 14
PFL 36 (11,35%) 39 (10,54%) 3 (0,81%) 37 (9,2%) -2 (-1,34%)
PDT 25 (7,88%) 40 (10,81%) 15 (+2,93) 111 (27,81%) 71
(PDS) PPB 13 10 -3 35 28
PSDB 0 15 15 73 58
PT 2 1 -1 6 5
Outros 20 88 9
TOTAL 323 371 48 399 28
ELEIÇÕES/ 2000 (399 VARIAÇÃO 2004 (400 VARIAÇÃO
PARTIDOS MUNICÍPIOS) 2000/1996 MUNICÍPIOS) 2004/2000
AUMENTO DIMINUIÇÃO AUMENTO DIMINUIÇÃO
(+) (-) (+) (-)
PMDB 73 (18,29%) -1 121 (30,25%) 48
PTB 40 (10,02%) -14 24 (6%) -16
PFL 80 (20,05%) 43 (+10,85%) 25 (6,25%) -55
PDT 18 (4,51%) -93 44 (11%) 26
(PDS) (PPB) PP 28 -7 38 (9,5%) 10
PSDB 89 16 50 (12,5%) -39
PT 7 2 29 (7,25%) 22
Outros 64 69
TOTAL 399 400
Fonte: Dados adotados e recalculados a partir de Dória, 2001, Tab. 1, p. 72, e Tab. 3, p. 96.
Para o ano de 2004, dados do TRE-PR, compilação dos autores.

15
De uma bancada de trinta Deputados na Câmara Federal, o PFL do Paraná conseguiu, em 1998, seis vagas,
empatando com o PTB. Em seguida vieram o PSDB e o PPB, com cinco Deputados eleitos cada um. Depois o PMDB
com quatro, o PT com três e o PDT com um.
16
O PMDB também perdeu muitas prefeituras quando deixou o governo do estado: em 1992 (sob a administração
Requião) fez 138 municípios (37% do total); em 1996 (sob a administração Lerner) perdeu 64 cidades.

257
Nas eleições em 2000 para prefeito da capital e para a Câmara de Vereadores de
Curitiba o partido teve o mesmo desempenho exibido na Assembléia Legislativa.

Tabela 4
Desempenho do PFL na bancada municipal de Curitiba (1988-2000)
ANO TOTAL TOTAL % DO Nº ÍNDICE DE
VOTOS VOTOS PFL TOTAL CADEIRAS AVANÇO*
1988 672.614 49.032 7,95 3 0
1992 747.674 56.869 7,6 3 1,43
1996 819.953 73.978 11,88 4 3,11
2000 927.260 191.603 21,13 9 12,15
2004 1.009.045 105.927 10,49 5 -5,5
Fonte: TRE-PR. Compilação dos autores.
* O índice da última coluna da tabela diz respeito ao avanço no total de votos do PFL.

Depois de 1997, o PFL dobra não somente a bancada na Assembléia, mas o


número de Prefeitos eleitos e o número de Vereadores em Curitiba, que passam de quatro
para nove, controlando mais de 21% dos eleitores da capital. Reelege também o prefeito
de Curitiba, Cássio Taniguchi (ex-PDT).

II.2 A influência do PFL na Assembléia Legislativa e no executivo estadual


Além do avanço eleitoral importante no intervalo 1998-2000, o PFL ganhou poder
também na esfera parlamentar e no executivo estadual. Em 1998 elegeu pela primeira vez
o presidente da Assembléia Legislativa do Paraná, Aníbal Khury17. Passou também a contar
com funções importantes nas principais comissões parlamentares e a ocupar posições-
chave em comissões especiais. A Comissão Permanente de Constituição e Justiça, por
onde passam todos os projetos que tramitam na Assembléia, foi presidida pelo Deputado
Basílio Zanusso. Além dela, o partido comandou a Comissão de Agricultura, Indústria e
Comércio (Deputado Plauto Miró Guimarães) e a Comissão de Ecologia e Meio Ambiente
(Deputado Kiélse Crisóstomo)18.
Na esfera do poder executivo o PFL também ganhou força. Apesar de ter feito
parte da coligação que elegeu Lerner em 1994, o partido não havia conseguido indicar
nenhum secretário de estado até 1997. Desde a filiação do Governador, o PFL passaria a
contar com cerca de um terço dos secretários estaduais19.

17
O deputado Khury já tinha sido presidente da Assembléia por duas gestões, mas não estava filiado ao PFL.
18
O partido ocupou funções mais elevadas também em Comissões Especiais. Em 2000 o Deputado Plauto Miró
Guimarães foi vice-presidente da Comissão Especial de Investigação do Cartel dos Supermercados. Em 2001
Plauto foi novamente Vice-Presidente da Comissão Especial de Investigação da Sanepar (Companhia de Saneamento
do Paraná).
19
Esse é um número aproximado em função das repetidas modificações no número de secretarias, fusões de
órgãos e da criação de “Organizações Sociais”, que as substituíram.

258
Quadro 3
Secretários de estado filiados ao PFL nos governos Lerner (1995 - 1998
e 1988 - 2002)
Primeiro Governo (1995-1998)
SECRETÁRIO SUB- SECRETARIA PARTIDO DE PARTIDO NO
DE ESTADO PERÍODO ORIGEM GOVERNO
1. Silvio Barros II 1995-1996 Esporte e Turismo PFL PFL
2. Cândido Martins 1995-1998 Segurança Pública ARENA/
Oliveira sem part. PFL
1. José Cid Campelo 1998-1998 de Governo PDT PFL
Filho
3. Cássio Taniguchi 1995-1996 Planejamento e Coordenação PDT PDT
4. Lubomir Ficinski 1995-1998 Desenvolvimento Urbano PDT PDT
Dunin
5. Giovani Gionédis 1995-1997 Governo PDT PDT/PFL
6. Hitoshi Nakamura 1995-1998 Meio Ambiente PDT PDT/PFL
7. Rafael Greca 1997-1997 Planejamento e Coordenação PDT PFL
8. Reinhold Stephanes 1995-1998 Administração PFL PFL
Jr.
9. Alceni Guerra 1997-1998 Casa civil PFL PFL
10. Nelson Justus 1996-1998 Indústria, Comércio e do PTB PFL
Desenvolvimento Econômico
Banco oficial
Ingo Hübert 1995-1997 Banestado sem partido PFL
Manoel Campinha 1997-1999 Banestado PFL sem
Garcia Cid partido

Segundo Governo (1998-2002)


SECRETÁRIO SUB- SECRETARIA PARTIDO DE PARTIDO NO
DE ESTADO PERÍODO ORIGEM GOVERNO
1. Alex Canziani 1999-1999 Emprego e Relações PTB PFL
do Trabalho
2. José Tavares Silva 1999-2000 Justiça e da Cidadania PTB PFL
Neto
3. Carlos Henrique Sá 2000-2000 Comunicação Social PFL PFL
de Ferrante
4. Mônica Rischbieter 2000-2001 Cultura PDT /PSB PFL
5. Alceni Guerra 2000-2002 Casa Civil PFL PFL
6. José Andreguetto 2000-2002 Meio Ambiente sem partido PFL
7. Ricardo Cunha 2000-2002 Administração sem partido PFL
Smijtink
8. Guaracy Andrade 2000-2002 Integração Regional PDT/PFL PFL
Fonte: Núcleo de Pesquisa em Sociologia Política Brasileira - Universidade Federal do Paraná (UFPR).

259
II.3 O comportamento da bancada do PFL na ALEP
A partir de 1997 a bancada do Partido da Frente Liberal na Assembléia tornou-se
a base de sustentação do governo. Em todas as votações importantes – concessões para
privatização das rodovias estaduais; instituição de um novo sistema de previdência pública
e assistência médica (“Paraná Previdência”); e autorização para a privatização da companhia
de energia do estado (Copel) – o governo obteve maioria simples de votos em função do
apoio principalmente do PFL e do PTB. Duas delas merecem destaque.
Em dezembro de 1998, ao fim da última legislatura, foi votado na Assembléia
Legislativa o projeto de lei que criava o novo sistema de previdência e assistência dos
servidores públicos, o “Paraná Previdência”. O sistema substituía o extinto IPE (Instituto
de Previdência do Estado) e sofreu muitas críticas, principalmente de representantes
sindicais das categorias de funcionários públicos20. Os Deputados do PFL votaram em
bloco a favor da proposta e garantiram sua aprovação.
Outro projeto polêmico do governo Jaime Lerner foi a proposta, formalizada no
início de 2001, para a privatização da Companhia Paranaense de Eletricidade (Copel) em
outubro do mesmo ano. Desde o início a iniciativa do executivo estadual recebeu críticas
de importantes setores da sociedade21. Apesar da pressão e do inevitável desgaste político,
todos os deputados do PFL votaram a favor da venda da companhia. A medida foi aprovada.
Essas duas votações evidenciam o grau de união do PFL em torno do executivo
estadual, sua disciplina como partido do governo e sua força relativa diante das outras
agremiações na Assembléia.
Parece certo, portanto, afirmar que o PFL só ganha importância – eleitoral, política
e parlamentar – como partido no Paraná apenas após a entrada na agremiação de Jaime
Lerner. Contudo, o PFL-PR constituiu-se, a partir de 1997, em um partido para o governo
e não num partido de governo.

III. CENTRALIDADE RELATIVA NA POLÍTICA ESTADUAL:


RENDIMENTO ELEITORAL E ÍNDICE DE PERMANÊNCIA

Com base nos dados eleitorais, que indicam um crescimento real da sigla no

20
Pelo IPE, os cerca de 200 mil servidores da ativa e aposentados tinham direito a consultas e tratamentos médicos
em todas as cidades do Paraná. Com o “Paraná Previdência”, apenas hospitais credenciados poderiam realizar
tratamentos, que seriam pagos pelo plano de saúde estadual. Além dos problemas relativos à assistência médica,
o projeto do governo apresentava um problema político ainda maior para seus defensores: quando aprovado,
não tinha nem previsão orçamentária, nem definia a origem dos recursos para manutenção dos pagamentos das
aposentadorias e pensões.
21
Dirigentes de entidades que normalmente davam seu apoio ao governo Lerner, como a Federação das Indústrias
do Estado do Paraná (FIEP) e a Associação Comercial do Paraná (ACP), manifestaram-se oficialmente contrários
à privatização da Copel. Até mesmo a imprensa local, que quase nunca adota posições antigovernistas, alinhou-
se contra a privatização da Companhia, através da associação que representava os donos de veículos de
comunicação do Paraná. Paralelamente, nos meses que antecederam a votação do projeto que permitia o leilão
da maioria acionária da empresa, partidos de oposição organizaram uma coleta de assinaturas em todas as
regiões do Paraná a fim de apresentar um projeto de lei de iniciativa popular que impedia a privatização.

260
estado a partir das eleições de 1998, e no aumento da participação do partido em postos
no governo e na Assembléia, seria justo pensar que o PFL-PR estaria se institucionalizando,
a exemplo do que aconteceu com o PFL em nível nacional.
Porém uma análise mais detalhada do partido (da sua votação e da dinâmica de
suas bancadas) no período posterior ao ingresso do Governador Lerner mostra que, ao
invés de crescer, o partido inflou e, ao invés de se transformar no partido do governo,
tornou-se um partido para o governo. Seu novo papel diz respeito prioritariamente à
“governabilidade” (e a exigência daí derivada de formação de maiorias estáveis); ele não
se tornou uma máquina política destinada a ocupar e/ou controlar o executivo estadual ou
seus centros decisórios principais.
A fim de evitar conclusões pouco fundamentadas, compare-se o rendimento
dos liberais com outros partidos de governo em períodos anteriores. A análise do
comportamento eleitoral do PFL no interior do Paraná nas eleições municipais de 2000 –
as primeiras com a presença do Governador no partido – sugere que se deva relativizar
o fortalecimento da sigla no período recente. Voltaremos a esse ponto mais adiante.
Analise-se igualmente a bancada eleita de Deputados estaduais do PFL na legislatura 1998-
2002 na Assembléia estadual. Sob nenhum ponto de vista tratou-se de um grupo politicamente
homogêneo (apesar da coesão nas votações, como se viu).
Até a entrada do Governador Lerner, a bancada do partido na Assembléia possuía
seis cadeiras e seus integrantes tinham um perfil político muito bem definido. Dessa fase
do “PFL original”, faziam parte do partido, por exemplo, o deputado Basílio Zanusso, um
dos fundadores da agremiação no estado, em 1985. Com o extraordinário crescimento da
sigla a partir de 1997 surgiu uma nova ala, formada principalmente por migrantes recém-
chegados do PDT. O desenvolvimento de conflitos entre as duas facções do partido não
demorou muito a aparecer. Depois da reeleição do Governador, em 1998, os pefelistas
originais perceberam que os ex-pedetistas haviam tomado conta da máquina partidária,
em prejuízo dos interesses “históricos” dos quadros originais22.

III.1 Os prefeitos do Paraná


Do ponto de vista estritamente eleitoral, a Tabela 3 sugere algumas conclusões
interessantes.
Enquanto controlou o governo do estado, durante os anos oitenta e na primeira
metade dos noventa, o PMDB conseguiu eleger 51% prefeitos dos municípios paranaenses
em 1988 e 37% em 1992. Nas eleições municipais de 1996 o partido já tinha deixado o
22
O ponto de maior tensão entre adventícios e “autênticos” deu-se em 2000, quando o Deputado Abelardo Lupion
(representante dos segundos) resolveu candidatar-se a presidente do diretório estadual contra o grupo do
Governador Lerner. Representante destacado dos ruralistas, Lupion queria ver cumpridos 57 mandados judiciais
de reintegração de posse de propriedades rurais invadidas pelo MST no estado, decisão adiada pelo Secretário
de Segurança Pública (Cândido Martins de Oliveira). A candidatura promoveu um “racha” interno e o partido
quase se dividiu. Foi preciso a indicação do ex-Governador João Elísio Ferraz de Campos, um nome de consenso
entre os governistas e os genuínos, para impedir dissidências maiores. Lupion retirou sua candidatura e João
Elísio, que vive no Rio de Janeiro, onde preside uma federação nacional de empresas seguradoras, foi eleito
presidente estadual do PFL.

261
executivo e fez apenas 18,5% de prefeitos, mantendo praticamente o mesmo índice em
2000 (perdendo apenas uma cidade), com 18% (ver Tabela 3).
Já o PDT, enquanto esteve na oposição ao governo estadual, conquistou 8% das
cidades em 1988 e quase 11% em 1992. Nas eleições municipais de 1996 o partido, que
contava com o apoio do Governador Lerner, quase conseguiu triplicar o número de
prefeituras, chegando a 28% dos candidatos eleitos (o que significa um aumento de quase
200%). Em 2000, fora do governo, o PDT só alcançou 4,5% das prefeituras do Paraná.
O PFL, por sua vez, tinha pouco mais de 11% de Prefeitos eleitos em 1988,
10,5% em 1992 e 9% em 1996, mantendo praticamente os mesmos índices durante todo
o período em que esteve na oposição. Em 2000, com o apoio, prestígio, cargos e verbas
do Governador, o partido mais que dobrou o número de cidades sob seu controle. Fez
20,5% dos Prefeitos eleitos, um crescimento expressivo.
Todavia uma leitura mais atenta desses números indica que, apesar da presença
de Lerner e do visível avanço eleitoral, o PFL não conseguiu fortalecer sua presença no
interior: no período dos seus governos o PMDB chegou a ter nada menos do que 51% das
prefeituras. Até mesmo o PDT, partido do Governador nas eleições de 1996, conseguiu
melhor desempenho nos municípios (28%) do que o PFL em 2000. O avanço eleitoral não
foi acompanhado por um enraizamento do partido fora de Curitiba, num movimento de
capilarização.
Deputados indicam o fato do Governador não ser um “homem de partido”
como responsável pelo crescimento relativo da sigla23. Além disso, o fato de o Governador
ter sido reeleito em 1998 por uma coalizão de partidos24, e não por uma única sigla,
significa dizer que o governo teria de dar espaço a outras agremiações, ao contrário do
que ocorreu nos anos oitenta, quando o PMDB foi hegemônico e reinou sozinho no
cenário político regional.

III.2 Instabilidade das bancadas


As bancadas de representantes do PFL na Assembléia do Paraná e na Câmara
Municipal de Curitiba, apesar de terem sido as maiores nas eleições de 1998 e 2000 (12
e 9 cadeiras, respectivamente), demonstraram muita instabilidade.
Para medir a estabilidade da bancada nós criamos o Índice de Permanência
Média no Partido (ou simplesmente índice de permanência – IPM). O objetivo desse
indicador é avaliar o percentual médio de permanência dos Deputados nas bancadas ao
longo do mandato parlamentar. Trata-se de um índice agregado; portanto, não há interesse
em medir a permanência individual nas bancadas, mas sim a média da bancada. Logo,
quando o índice de permanência do partido x indica por exemplo 0,75 para o ano y, isso
23
Em entrevista aos autores, o deputado Basílio Zanusso declarou que Jaime Lerner não se preocupava muito
com a vida partidária e nem se interessava por estimular reuniões do PFL. Outro ponto decisivo: no governo, as
decisões principais continuaram nas mãos de Lerner e de sua “equipe”, e não do partido. Entrevista concedida
em 26 fev. 2002.
24
Nada menos de 14 partidos. Doze partidos de direita: PFL, PPB, PTB, PSL, PST, PTN, PSC, PL, PRN, PSD, PRP
e PT do B; dois partidos de esquerda: PPS, PSB.

262
significa que, do total de Deputados que passaram por aquele partido, eles permaneceram,
em média, 75% dos meses daquele ano na sigla. Se, no mesmo ano, o partido z teve índice
de permanência de 0,8, significa que, comparativamente, os Deputados do partido z
ficaram mais tempo na sigla que os Deputados do partido x. O estabelecimento dos índices
ao longo dos anos deve mostrar se para um mesmo partido houve um crescimento ou
decréscimo do tempo médio de permanência na bancada25.
Os valores podem variar de 0 a 1. Zero representa a inexistência de parlamentares
filiados ao partido em determinado período e 1 significa que todos os parlamentares que
iniciaram o período em certo partido terminaram na mesma agremiação. Quanto maior
for o índice de permanência, maior será a “fidelidade” do conjunto de parlamentares da
bancada ao partido. Do contrário, quanto menor o índice de fidelidade, maior será a
volatilidade dos parlamentares em relação à bancada. O indicador é sensível tanto para a
saída quanto para a entrada de Deputados no partido. Portanto, se uma bancada cresce
muito durante um mandato, isso significa que o índice de permanência irá cair, pois o
percentual médio de permanência dos parlamentares naquele partido será reduzido.
Como se trata de medir fidelidade ao partido, o índice de permanência foi criado
para apresentar, com a maior precisão possível, não apenas as pontas de início ou fim de
mandato, mas para indicar alterações durante a legislatura. Por exemplo: tome-se dois
partidos (A e B) que começaram o período de análise com nove parlamentares na bancada
e terminaram o período, ambos, com 12 parlamentares (a bancada aumentou, portanto).
Agora imaginemos que partido A tivesse começado a legislatura com nove parlamentares
e ganho três durante o período e o partido B também tivesse começado também com nove
parlamentares, perdido um e filiado outros quatro, apenas o índice de permanência,
como proposto aqui, seria capaz de indicar a diferença nas duas bancadas. De acordo
com este método, a permanência média no partido B ficaria um pouco abaixo da
permanência média no partido A para o mesmo período. Igualmente, o índice de
permanência é capaz de mostrar variações de comportamentos de bancadas de partidos
com o mesmo número de parlamentares (cujo valor total não variou), mas que se
comportaram de maneira distinta durante o ano ou mandato. Por exemplo, digamos que
os partidos C e D iniciaram determinado mandato parlamentar com bancadas de 10
cadeiras cada um e ambos terminaram o mandato com as mesmas 10 cadeiras cada.
Acontece que a bancada do partido C, no segundo ano de mandato, perdeu 5 parlamentares
e ganhou outros cinco, que permaneceram até o final. Considerando que o mandato é de

25
O maior refinamento do índice depende do corte temporal a ser utilizado para medir a permanência. Esse corte
pode ser anual, quando o objetivo é medir a permanência média em um mandato, mensal, semanal ou diário,
quando se quiser medir a permanência média em um ano. Uma vez tomado o índice de permanência anual, basta
calcular a média dos quatro anos para obter o valor para o mandato. Se o recorte for anual, cada mês que um
Deputado passou em determinada bancada representará 1/12 do total. Se for semanal, uma semana representará
1/47. E se diário, cada dia terá peso de 1/365 do total do ano. Após obter o resultado por parlamentar no
decorrer do ano, somam-se os valores dos parlamentares e divide-se pelo número de Deputados que passaram
pela bancada do partido no ano. O resultado será o índice de permanência média na bancada. Nossa base de
cálculo foi mensal.

263
4 anos, ao final, o partido C terá um índice de permanência de 0,75 e o partido D um índice
de permanência de 1. Ou seja, os parlamentares do partido D foram mais fiéis à sigla que
os do partido C, embora as duas bancadas tenham começado e terminado o mandato do
mesmo tamanho.
Apesar de se tratar de um dado agregado, as mudanças individuais influenciarão
o índice geral. Por exemplo, numa bancada hipotética formada por dois parlamentares em
que um deles permaneceu todo o período no partido e o outro apenas metade do período
em análise, o valor individual do primeiro será 1 e do segundo, 0,5. A média dos dois
parlamentares resultará em um índice médio de permanência de 0,75 no partido no
período.
O recorte temporal adotado neste trabalho foi mensal. Aferiu-se a filiação
partidária de cada Deputado durante os 12 meses do ano para identificar em quais
bancadas ele esteve e que peso proporcional ele teria tido para cada partido pelo qual
passou no período. Isso foi realizado para os 16 anos analisados (1987-2002). Apenas
no último ano, ao invés de serem contados 12 meses, foram apenas seis, pois a pesquisa
seguiu os parlamentares até o mês de junho de 2002. Para efeito de cálculo só se considera
o tempo em que o Deputado permaneceu na Assembléia Legislativa. Se ele faleceu ou
deixou o mandato por ter sido nomeado Secretário de estado ou eleito a outro cargo
político, esse fato cessa a influência no índice de permanência. Por exemplo, se o Deputado
z faleceu no mês de maio, a proporção mensal de permanência do indivíduo na bancada
será de 1/5 e não de 1/12. O mesmo vale para seu suplente, que terá uma proporção de
permanência na bancada para aquele ano de 1/7. Não sumarizamos os índices por mandato,
como se verá a seguir, mantendo-os com referência aos anos porque, em primeiro lugar,
os dados anuais são mais ricos que as médias por mandato, que poderiam esconder
particularidades; e, em segundo lugar, porque uma correlação bivariada simples entre o
índice de permanência e os períodos dos mandatos mostrou um coeficiente muito baixo,
considerado não significativo estatisticamente.
A seguir, a Tabela 5 sumariza os Índices de Permanência mensal (em médias
anuais) e o tamanho da bancada do PFL na Assembléia Legislativa do Paraná no início de
cada ano desde 1987. As duas variáveis serão analisadas em conjunto como indicadores
empíricos de um suposto processo de institucionalização. Para essa análise pormenorizada
optamos por tratar apenas da bancada de Deputados estaduais do PFL. Isso por dois
motivos. O primeiro é que não existem dados disponíveis sobre a migração partidária
para o mesmo período (1987 a 2002) para as bancadas no legislativo municipal de
Curitiba. Em segundo lugar, porque, de acordo com nosso modelo, supomos ser a
Assembléia Legislativa a melhor arena para indicar se um partido está se institucionalizando
no estado ou não.

264
Tabela 5
Demonstrativo da bancada do PFL na Assembléia Legislativa do Paraná
(1987-2002)
ANO ÍNDICE PERMANÊNCIA TAMANHO BANCADA*
1987 1,00 8
1988 1,00 6
1989 0,93 6
1990 1,00 5
1991 0,95 6
1992 0,96 7
1993 0,79 8
1994 1,00 6
1995 0,99 7
1996 1,00 7
1997 0,54 6
1998 1,00 19
1999 0,83 10
2000 0,94 9
2001 0,86 10
2002 1,00 9
Fonte: TRE-PR. Compilação dos autores.
* dados referentes ao tamanho da bancada no mês de fevereiro de cada ano.

Como salientado anteriormente, a consideração apenas do crescimento numérico


da bancada estadual de um partido (em termos absolutos) é insuficiente como indicador
de institucionalização partidária, pois muitas bancadas podem prosperar e manterem- se
estáveis numericamente, porém com uma grande variação interna de seus membros.
Logo, o índice de avanço parlamentar do partido – uma adaptação do índice de avanço
eleitoral – não é suficiente para medir a institucionalização. O índice de permanência
média na bancada é mais apto para este fim. Quanto maior for a permanência média, mais
institucionalizado está o partido no parlamento. No entanto, isso não significa que o
partido esteja institucionalizado na sociedade (i.e., junto ao eleitorado). Pode haver um
partido “nanico” no parlamento, altamente institucionalizado, porque não há mudanças
de parlamentares em sua bancada, mas com baixa representatividade social. Considerando
o fato de que, para ser institucionalizado, um partido precisa de raízes sociais (i.e.,
votos), uma sigla com uma bancada pequena tem grandes chances de não possuir a
difusão social mínima esperada pelo modelo.
A opção aqui adotada foi analisar as duas variáveis, tamanho de bancada e índice
de permanência para que o resultado dos dois indicadores pudesse apontar se existiu (ou
não) um processo de institucionalização no período. Assim, segundo nossa proposta, só
pode ser considerado partido em processo de institucionalização regional aquele cuja
bancada, na Assembléia Legislativa, apresentar uma curva ascendente tanto no número de

265
parlamentares quanto no índice de permanência média ao longo de tempo. Partidos que
apresentarem índices de permanência em crescimento e bancada em queda não podem
ser considerados em processo de institucionalização, pois estarão perdendo representação
social. Por outro lado, partidos que apresentarem índice de permanência em queda e
bancada em crescimento também não podem ser considerados institucionalizados, pois o
grau de fidelidade dos representantes eleitos à sigla estará em queda, apesar de ele ter uma
significativa representatividade social, através dos votos obtidos. Conforme explicado
acima, o índice de permanência leva em conta o período total em que o Deputado esteve na
Assembléia, não sendo aplicados os 48 meses para aqueles que faleceram, deixaram o
mandato para assumir uma secretaria de estado ou foram eleitos Prefeito no meio da
legislatura. Nesses casos, o número de meses em que o parlamentar esteve na Assembléia
será usado como base para o cálculo do índice de permanência.
Este exercício tem a função de indicar tendências temporais, pois se sabe que,
quando há uma mudança no tamanho da bancada do partido – independente do sinal –,
haverá queda no índice de permanência média. Por isso optamos pela apresentação da
tendência temporal através de uma regressão linear, com a apresentação de gráficos
contendo a curva normal.

Gráfico 1
Índice de permanência PFL

ANO

Gráfico 2
Bancada PFL

ANO

266
Durante os anos oitenta e início dos noventa o PFL do Paraná não tinha uma liderança
regional de peso (tal como em outros estados – na Bahia, Antonio Carlos Magalhães; em
Pernambuco, Marco Maciel; em Santa Catarina, Jorge Bornhausen (cf. Cantanhêde, 2001)) e,
se não fazia oposição aberta ao Governo do estado, estava, em todo caso, longe do poder26.
Com a eleição de Jaime Lerner, em 1994, o PFL converteu-se em partido da base governista
e, em 1997, com a filiação do governador, começou a contar com uma figura forte para
polarizar votos e transferir prestígio. Isso foi suficiente para fazer com que a bancada do PFL
na Assembléia apresentasse uma curva normal ascendente no período 1997-1999 (ver
Gráfico 2). Porém, foi insuficiente para garantir a fidelidade dos parlamentares ao partido,
pois o índice de permanência apresentou uma curva descendente (ver Gráfico 1), sabotando
o processo de institucionalização. Percebe-se que a maior queda no índice de permanência
do partido acontece exatamente no ano da filiação do governador Lerner (1997). Da mesma
forma, o maior crescimento da bancada acontece nesse ano (variação captada pelos dados de
fevereiro de 1998, de acordo com a Tabela 5); porém o número de representantes não
consegue sustentarse e começa a diminuir nos dois anos seguintes.
A título de comparação, veja-se o que se passou noutros dois partidos. O PMDB do
Paraná apresentou uma tendência inversa à do PFL. O partido, que foi governo até meados
dos anos noventa, teve uma queda no tamanho da bancada durante todo o período, com uma
curva normal acentuadamente descendente nessa variável (ver Gráfico 4). Isso evidencia a
redução da capacidade de representação na sociedade por parte do partido. Por outro lado,
o índice de permanência do PMDB no período (Gráfico 3) teve uma curva normal ascendente,
demonstrando um crescimento da fidelidade dos parlamentares que permaneceram na sigla
mesmo depois que o partido deixou o executivo e passou a fazer oposição ao governo.
Seguese daí que o PMDB tende a ser mais institucionalizado que seu rival.

Gráfico 3
Índice de
permanência PMDB

ANO

26
Foi um período, segundo o Deputado Zanusso, “de grandes dificuldades”, em que a representação na Assembléia
Legislativa era “pouco expressiva” e ao partido faltava “organização”. “Também não tínhamos experiência de
oposição, pois o PFL nunca soube fazer uma oposição muito forte e aguerrida”. Entrevista aos autores (26 fev.
2002). Isso só mudava, para Pizzato, “nos períodos eleitorais”, em que a relação com os governos do PMDB
“tornava-se mais contundente”. Entrevista do Deputado federal Luciano Pizzato aos autores (por correio
eletrônico) em 30 abr. 2002.

267
Gráfico 4
Bancada PMDB

O único dos principais partidos da Assembléia Legislativa do Paraná no período


de 1987 a 2002 a apresentar as duas curvas no sentido ascendente foi o PTB. Mesmo
tendo obtido um aumento médio em sua bancada parlamentar no estado, o partido
conseguiu ter um crescimento médio do índice de permanência. Isso não significa que não
houve transformações na bancada do partido no período em análise. O gráfico do índice
de permanência mostra que em 1997 o PTB partido chegou ao ponto mais baixo dos anos
analisados aqui. O tamanho da bancada também teve significativas oscilações entre 1997
e 2002. O importante a ressaltar aqui é que uma visão distanciada de fatores conjunturais
mostra que o partido apresentou uma tendência de crescimento em ambas variáveis. O
que diferencia o PTB do PMDB e do próprio PFL no período é que o primeiro não teve uma
liderança regional de expressão no Paraná, tendo participado dos governos do PMDB,
exceto no último (1990-1994); e apoiou os oito anos de governo de Jaime Lerner e dele
participou oficialmente.

Gráfico 5
Índice de permanência PTB

268
Gráfico 6
Bancada PTB

Voltando ao PFL-PR, vê-se que a progressão do tamanho da bancada do partido


na Assembléia está em relação direta com dois eventos: a filiação em 1997 e a reeleição do
governador em 1998. Parece claro que foi isso (e só isso) que promoveu seu crescimento
no estado. O índice de permanência, entretanto, variou significativamente (ver Gráfico 1).
Ele foi 1,00 apenas nos anos pares, que são os anos em que ocorrem eleições. Isso sugere
uma relação causal simples: os políticos só permanecem no partido porque a legislação
eleitoral exige dos candidatos a sua filiação à sigla pela qual irão concorrer ao menos um
ano antes da eleição27. Nos outros anos eles se mudam com freqüência, fazendo cair o
IPM. Não foi diferente com os “liberais” paranaenses.

III.3 Migrações partidárias


Por que os políticos migram? Parlamentares trocam de partidos em função de
estratégias eleitorais futuras de curtíssimo prazo, principalmente para garantir maior
possibilidade de reeleição28. Por isso os índices de migração em anos ímpares (quando
termina o prazo legal para as filiações de candidatos às eleições seguintes) aumentam em
relação aos anos pares. Outra razão que deve ser considerada é a chamada “conexão
presidencial” (Amorim & Santos, 2001), que leva em conta a relação entre o executivo e
o legislativo, incluindo barganha, patronagem e clientelismo dos congressistas como um
estímulo à migração partidária. Nesse caso, os beneficiados com os recursos de patronagem
tenderiam a migrar para partidos da base do governo.
Essa é, imagina-se, uma hipótese bastante rentável. Como esse trabalho trata de
partidos nos estados, substituiremos o termo “conexão presidencial” por “conexão
governamental”. De acordo com nossa interpretação, políticos buscam conexão

27
Lei 9.504, de 1997.
28
O que equivale a dizer “que os deputados optam pelas alternativas de ação capazes de maximizar suas chances
de sucesso na carreira política” (Melo, 2000). Ver também Schmitt, 1999. Para um resumo da polêmica na
literatura a respeito da migração, e uma posição própria, cf. Diniz, 2000.

269
governamental para aumentar sua possibilidade de reeleição, trazer benefícios para suas
bases eleitorais e melhorar sua posição relativa no campo político (no legislativo e junto
ao executivo). Esse movimento, embora faça aumentar o partido - do ponto de vista
eleitoral e organizacional - não o fortalece, ou o “institucionaliza”, nos nossos termos.
Dificuldades conjunturais diversas - derrota eleitoral do governo, queda dos índices de
popularidade da liderança política principal, desgastes da administração pública, efeitos
negativos de projetos polêmicos diante da opinião pública etc. - promovem nova leva de
migrações, fragilizando a agremiação.
O recuo significativo do índice de avanço nas eleições proporcionais de 2002 (v.
Tabelas 1 e 2) é uma prova do que se quer dizer. O mesmo fenômeno se repetiu nas
eleições de Vereadores em 2004 (v. Tabela 4). Das nove cadeiras conquistadas em 2000 o
partido só conservou cinco.
No período final do governo Lerner houve uma queda brusca do desempenho
eleitoral do PFL. O partido fez 11% dos votos válidos para Deputado estadual (contra os
22% que garantiu para si em 2000), voltando aos níveis do início da década de noventa. Na
verdade, tratou-se do segundo pior desempenho da sigla desde 1986. Isso lhe deu apenas
sete cadeiras na Assembléia Legislativa, atrás de PMDB e PT, e um índice de avanço
eleitoral de -2,47. Na Câmara Federal a performance do PFL-PR foi ainda pior: 7% dos
votos, apenas duas cadeiras conquistadas e um índice de avanço negativo: -2,68. O partido
sequer apresentou candidato à sucessão governamental. Assistiu assim impassível ao
retorno do PMDB e de sua maior liderança política no estado: Roberto Requião.
Em 2004, já sem Lerner, que trocara o PFL pelo PSB no segundo semestre de
200329 , o Partido da Frente Liberal venceu em 25 cidades apenas, perdendo 55 prefeituras
sob seu controle, Curitiba inclusive (ver Quadro 4 em anexo). Nunca o percentual de
municípios sob os liberais foi tão escasso: somente 6% de todo o estado. O partido do
Governador reconquistou sua hegemonia e o PMDB passou a controlar 30% das
administrações municipais (ver Tabela 3).
Esses valores - índice de avanço eleitoral, taxas de prefeituras conquistadas e
índice de permanência média da bancada - indicam que o partido, ao amarrar seu destino
institucional à figura pessoal do governador Lerner, ficou na dependência das oscilações
da sua presença à frente do governo e, igualmente, do seu prestígio pessoal.
Enquanto o Chefe do executivo estadual contou com um bom índice de aceitação
junto à opinião, o partido cresceu. A decadência da imagem pública de Lerner, contudo,
levou o partido a uma regressão no cenário político regional. Segundo o ranking dos
Governadores do Instituto Datafolha, de junho de 2001, Jaime Lerner passou de sétimo
para nono colocado nacional. Sua nota média à época era de 5,0 pontos. Cerca de um terço
dos entrevistados, 32%, reprovava seu desempenho; para 37% ele era regular e 27% o
aprovavam. Desde o início de seu segundo mandato (1999-2002), Lerner apresentou
queda nas taxas de popularidade. Em junho de 1999 era aprovado por 52%, em dezembro

29
O ex-governador deixou o PFL e filiou-se ao PSB pois pretendia-se candidatar-se à Prefeitura do Rio de Janeiro
em 2004 e transferiu o seu domicílio eleitoral para a cidade.

270
do mesmo ano essa taxa caiu para 46%. Em junho de 2000 oscilou para 44%, caindo para
35% em dezembro deste ano e em dezembro de 2002 chegou a 27%, o menor índice desde
que assumiu o governo pela primeira vez em 1995. A taxa de rejeição a seu governo
cresceu continuamente ao longo do segundo mandato e oscilou de 19% (junho de 1999)
a 36% (dezembro de 2002)30.
De fato, há fortes indicações de que o personalismo suplantou a estruturação
partidária no caso do PFL do Paraná nos anos noventa e no início da década seguinte. Os
resultados eleitorais de 2002 e 2004 confirmam essa hipótese, mostrando um recuo do
partido também na arena eleitoral.

IV. CONCLUSÕES

A história do Partido da Frente Liberal no Paraná pode ser dividida em duas


fases bem distintas. Uma antes, outra depois do ingresso, na agremiação, do governador
Jaime Lerner.
Procuramos demonstrar que, mesmo tendo ganho significativo fôlego eleitoral,
aumentado suas bancadas estadual e federal em 1997-1998 e conquistado 20% das
prefeituras do estado em 2000, o PFL-PR não conseguiu institucionalizarse ou tornar-se
um partido estável, contrariando o estilo nacional da agremiação. Mesmo os dados eleitorais
devem ser tomados com o devido cuidado.
Por outro lado, note-se, nunca se tratou do controle do governo por determinado
partido, mas exatamente do seu inverso: do controle do partido por determinado governo.
A ocupação de cargos no primeiro e segundo escalão possivelmente não se
traduziu em influência efetiva sobre o processo decisório governamental, ficando a “equipe”
do governador com o monopólio das questões-chave; o comportamento unificado da
bancada (disciplina partidária) não induziu fidelidade partidária e as taxas de migração
dos políticos pefelistas continuaram elevadas. Ao invés de transformar- se no partido do
governo, o PFL-PR foi apenas um partido para o governo e um recurso institucional
importante do líder político no estado, notadamente no que se refere à “governabilidade”.
Quando as taxas de popularidade do segundo decresceram, a incipiente “institucionalização”
do primeiro também recuou. Quando Lerner deixou a agremiação, seu desempenho
diminuiu drasticamente. Pagouse assim o preço da dependência quase exclusiva de uma
liderança personalista que, curiosamente, apresenta-se como puramente “técnica”.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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AMORIM NETO, Octavio & SANTOS, Fabiano. A conexão presidencial: facções pró e
30
Cf. dados do sítio do Instituto Data Folha ver http://www.folha.uol.com.br/folha/datafolha/po/
avalgov_pr_9402.shtml<acesso: 22 de julho 2003>

271
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272
Anexo
Quadro 4
Eleições no Brasil – Paraná e Curitiba (capital) (1982-2002)
Eleitos por partido/coligação; partido majoritário nos legislativos
(número de cadeiras do partido majoritário/número total de cadeiras)
Prefeitura Câmara dos Governo Assembléia Câmara dos Senado Presidência da
(Curitiba – PR) Vereadores Estadual Legislativa Deputados Federal República
(Curitiba – PR)

1982 Maurício Fruet PMDB (22/33) José Richa PMDB(34/58) PMDB (20/34) Álvaro Dias
(PMDB)* (PMDB) (PMDB)

1985 Roberto Requião


(PMDB)

1986 Álvaro Dias PMDB/PND PMDB/PND José Richa


(PMDB/PND) (37/54) (24/30) (PMDB/PND)
Affonso Camargo
(PMDB/PND)

1988 Jaime Lerner (PDT) PMDB (12/33)

1989 Fernando Collor


(PRN)

1990 Roberto Requião PMDB (16/54) PRN (8/30) José Eduardo


(PMDB) Vieira
(PTB/PDS/PTR/
PST)

1992 Rafael Greca (PDT) PDT (8/33)

1994 Jaime Lerner PMDB (12/54) PP e PFL Roberto Requião Fernando Henrique
(PDT) (6 e 6/30) (PMDB) Cardoso (PTB/PFL/
Osmar Dias (PP) PSDB)

1996 Cassio Taniguchi PDT (8/35)


(PDT/PPB/PTB/
PSC/PFL)

1998 Jaime Lerner PFL (12/54) PTB e PFL Álvaro Dias Fernando Henrique
(PFL) (6 e 6/30) (PSDB) Cardoso (PPB/PTB/
PFL/PSDB/PSD)

2000 Cassio Taniguchi PFL (9/35)


(PFL)

2002 Roberto Requião PFL (9/54) PMDB e PT Osmar Dias Luis Inácio Lula
(PMDB) (6 e 6/30) (PDT) da Silva
Flávio Arns (PT)
(PT)

2004 Beto Richa PT/PTB/PMDB/


(PSDB) PCB/PCdoB
(12/38)

Fonte: TRE-PR. Compilação dos autores.


*nomeado

273
Quadro 5
Indicadores partidários na Assembléia Legislativa do Paraná
Índice de permanência e bancadas por principais partidos (1987-2002)*

índice bancada índice bancada índice bancada índice bancada índice bancada
permanência PDT PDT permanência PFL permanência PMDB permanência PT permanência PTB
PFL PMDB PT PTB

1987 ,79 5 1,00 8 1,00 37 1,00 1 ,63 ,


1988 1,00 4 1,00 6 ,97 37 1,00 1 ,88 4
1989 ,92 4 ,93 6 ,88 32 1,00 1 ,72 3
1990 1,00 5 1,00 5 ,80 24 1,00 1 ,92 2
1991 ,97 6 ,95 6 ,92 16 1,00 3 ,79 5
1992 ,96 5 ,96 7 ,93 12 1,00 3 ,96 7
1993 ,92 6 ,79 8 ,99 12 1,00 3 ,84 6
1994 1,00 7 1,00 6 1,00 12 1,00 3 1,00 11
1995 ,98 9 ,99 7 ,96 12 1,00 5 ,88 5
1996 1,00 9 1,00 7 1,00 12 1,00 5 1,00 5
1997 ,72 11 ,54 6 ,85 11 ,93 5 ,47 6
1998 1,00 2 1,00 19 1,00 8 1,00 4 1,00 10
1999 1,00 3 ,83 10 1,00 7 1,00 4 ,92 12
2000 ,97 3 ,94 9 1,00 7 1,00 4 ,89 10
2001 ,50 2 ,86 10 ,96 7 1,00 4 ,83 12
2002 1,00 6 1,00 9 1,00 8 1,00 4 1,00 5
* As bancadas partidárias indicadas são as existentes no mês de fevereiro de cada ano.

274

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