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Pekelman Halo1
e-mail: pekelman@yahoo.com.br
twitter: @Pekelman_Halo
site: www.transparenciama.blogspot.com
site: www.pekelmanhalo.blogspot.com
1. Introdução
Este trabalho2 visa analisar de modo breve a possibilidade de se exerce controle sobre
atos fraudulentos ou corruptos de agentes públicos, em situações normativas dadas, mediante
antecipações de ações e decisões estratégicas oferecidas pela teoria dos jogos em adaptação
das ciências econômicas para as ciências jurídicas.
O primeiro tópico consistirá em breve explanação do que seja a teoria dos jogos. O
segundo tópicos tentará demonstrar de que modo essa teoria pode ser aplicada para a
efetivação das normas que tipificam os crimes de lavagem de dinheiro. O terceiro e ultimo
tópico fará o mesmo em relação aos delitos de Improbidade Administrativa, com foco para o
instituto do enriquecimento ilícito.
1
Licenciado em História pela UFMA (Universidade Federal do Maranhão). Acadêmico de Direito da UNDB
(Unidade de Ensino Superior Dom Bosco). Membro do NEC (Núcleo de Estudos da Corrupção).
2
Este artigo foi escrito em setembro/2010 por ocasião de avaliação na Disciplina Processo Penal II ministrada
pelo Prof. Ms. José Cláudio Cabral Marques.
2. Em que consiste a teoria dos jogos
Essa teoria tem um longo panorama histórico. Aparece pela primeira vez no século
XVII. Os autores Stuart J. Russell e Peter Norving Russell explicam que:
As raízes mais antigas da teoria dos jogos podem ser localizadas em propostas
feitas no século XVII por Christiaan Huygens e Gottfried Leibniz para estudar
interações humanas competitivas e cooperativas de forma científica e matemática.
Ao longo do século XIX, vários economistas importantes criaram exemplos
matemáticos simples para analisar casos específicos de situações competitivas. Os
primeiros resultados formais em teoria dos jogos se devem a Zermelo -1913-, que,
no ano anterior, sugeriu uma forma de busca de minimax (sic!) para jogos, embora
ela estivesse incorreta (RUSSELL, 2004, p. 623).
O próximo passo foi dado em 1921 por Emile Borel num artigo em francês de sua
autoria intitulado “La théorie du jeu” onde desenvolve a aplicação de estratégias mistas nas
decisões. Aparece novamente só em 1944 com Von Neumann e Oskar Morgenstern, que
publicaram o livro The Theory of Games and Economic Behavior. Sete anos após, em 1951
John Nash escreve os artigos “Noncooperative games” e “The bargaining problem e two-
person cooperative games”.
É confirmado por Russell (2004, p. 623) que “em 1950, com 21 anos de idade, John
Nash publicou suas idéias relativas a equilíbrios em jogos gerais. Sua definição de uma
solução de equilíbrio, embora se originasse do trabalho de Cournot (1838), ficou conhecida
como equilíbrio de Nash”.
Os estudiosos que contrapõem Direito e Economia usam a teoria dos jogos para
analisar o comportamento das empresas frente às regras do mercado e frente às leis,
calculando a melhor forma de ganho, e analisando sobretudo “como elas influenciam seu
comportamento estratégico como agentes econômicos ou como partes em litígios de diversos
tipos”. Assim, para a Teoria dos Jogos, “os comportamentos não são ditados, mas sim
influenciados pela norma legal, visto que, em certas circunstâncias, pode ser racional ir
contra ela” (PINHEIRO, 2005, p. 157).
Desse raciocínio decorre a regra em que sempre deve haver dois ou mais tomadores
de decisões estratégicas em uma situação estratégica de jogo. Decorre em seqüência outra
regra na qual um agente deve levar em conta as possíveis decisões de outros agentes
envolvidos numa determinada situação estratégica. É aí que “instala-se um conflito de
interesses, o que obriga a que cada participante do jogo escolha a melhor estratégia para si,
mas considerando, também, a melhor estratégia para cada um dos demais jogadores”.
(CARVALHO, 2007, p. 215).
É a previsão de como cada agente envolvido iria ou irá se comportar que influencia a
decisão do jogador. Faz parte da estratégia do jogo, ligar as decisões, ou seja, cruzar as
informações de todas as decisões e seus resultados de modo a configurar um quadro de
controle das decisões mais seguras. Prever os possíveis resultados é um dado indispensável
para a tomada da melhor decisão. As ações dos agentes afetam-se reciprocamente umas às
outras. O agente deve ter essa consciência com relação a seu opositor. Deve montar uma
estrutura de previsão desses efeitos, estes, dados pelos resultados das ações escolhidas em
conjunto.
A teoria dos jogos visa, portanto permitir ao jogador determinar qual será a melhor
estratégia a ser adotada numa dada situação em que os agentes envolvidos alcancem o melhor
resultado individualmente. O agente monta um plano de ação (estratégia). A melhor
estratégia será aquela que indicar a melhor recompensa. A expectativa que um jogador tem
em ralação ao outro deve ser analisada com base em suas previsibilidades e
imprevisibilidades, apontando possíveis resultados negativos ou positivos.
John Forbes Nash Jr., Prêmio Nobel em ciências econômicas em 1994 dizia “o
melhor resultado acontece quando todos os integrantes de um grupo fazem o melhor por si
próprios e pelo grupo”. Assim, a cooperação superaria a competição.
No Direito, a reformulação teórica profunda que ocorre com a teoria dos jogos
consiste em negar a tese positivista que dizia ser a norma um comando dos comportamentos
desejados, ou seja, que a norma dita qual comportamento o sujeito deve adotar. A tese
desenvolvida na teoria dos jogos é a de que a norma apenas tem o condão de influenciar na
estratégia da decisão que irá ser tomada. A norma por si só, portanto, não define o
comportamento.
Num cálculo feito pelo agente visando a melhor decisão, o comando normativo (a lei)
será apenas um dos fatores a serem analisados. Por isso que, acaso tal comando seja
improducente, em certas circunstâncias, pode ser racional ir contra ele, pois nem toda
estratégia tida como racional (ou legal) trará resultados positivos, pois, em alguns casos,
necessitará de que as instituições legais criem incentivos para o seu cumprimento. Muitas
vezes, indivíduos racionais, baseando-se em comandos normativos, são conduzidos a um
comportamento irracional. Por isso a crítica constante a certos comandos legais:
A Lei Nº 9.613/98 que trata dos crimes de “lavagem de dinheiro” (LCLD) e cria o
COAF (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) dispõem em seu art. 1º caput e
inciso V, o seguinte:
Art. 1º. Ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização, disposição,
movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores provenientes, direta ou
indiretamente, de crime:
V – contra a Administração Pública, inclusive a exigência, para si ou para
outrem, direta ou indiretamente, de qualquer vantagem, como condição ou preço
para a prática ou omissão de atos administrativos;
Pena: reclusão de 3 (três) a 10 (dez) anos e multa.
Contudo, não pode existir ação racional em sua forma pura, diz Marcos Fernandes
Gonçalves da Silva (2007, p. 56), seja pelas ocorrências histórico-sociais não planejadas pela
humanidade, seja pela existência de “uma racionalidade ímpar” do mundo social “passível de
interpretação científica distinta”, ambas exclusivas do Homo sapiens sapiens. A
racionalidade, sem dúvida, é uma ferramenta, mas sempre estará limitada por fatores
exógenos inescapáveis (imprevistos, normas morais, valores, sentimentos de mudança etc.).
Ambos são normativos com igual força. A evolução das instituições permitirá a seleção
daqueles fatores exógenos desejáveis.
Daí que: a teoria da escolha racional possui duas versões, a estrita e a ampliada. A
estrita baseia-se em racionalidade ilimitada onde prevalece a maximização dos ganhos do
agente sobrepondo-se a normas morais ou legais frágeis e desestimulantes – se levar em
consideração apenas a variável “agente” isolado, imune à normatividade relacional da
sociedade. A ampliada, d’outro modo, identifica a racionalidade limitada quando considera a
influência de fatores exógenos à lógica racional estrita, ou seja, é a influência de valores
morais e éticos na ação racional do agente em seu relacionamento reflexo com a sociedade. O
autor concebe ética ao modo de Peter Singer “como algo que evolui na forma de círculos de
expansão”.
Dadas essas condições, entre os sujeitos envolvidos no jogo, aquele que terá os
resultados maximizados é o próprio acusado, uma vez que a sua punição pelo feito não será
alcançada mediante esse instituto legal. Mais uma vez frustra-se a esperança de impedir tais
atos de corrupção via legislação. Os legisladores estão politicamente e racionalmente ligados
aos administradores públicos, por isso legislam em seu proveito próprio (ato absolutamente
racional) vez que não há mecanismo para impedir tal situação e por conseqüência
desestimular a improbidade e o enriquecimento ilícito.
Já existe doutrina nesse sentido com Wallace Paiva Martins Junior (2009, p. 238)
entendendo este que se não for possível identificar o ato específico da fraude do agente
público, mas havendo “sinais exteriores de riqueza” suficientes, onde se possa ver ostentação
incompatível com sua renda normal, já seria possível a configuração do delito. Uma vez que
esta regra passasse a valer para o jogo efetivamente, o jogador corrupto mudaria suas
decisões estratégicas para outras mais elaboradas, não obstante sua tarefa já estaria um pouco
mais dificultada.
5. Considerações finais
Os jogadores traçam suas estratégias e tomam suas decisões por conta própria
somente após o jogo começar. Antes do jogo começar, todos devem participar igualmente da
elaboração das regras prévias ao jogo. Numa sociedade com problemas estruturais de
corrupção tal não ocorre. Nela, as regras são manipuladas por apenas um ou alguns dos
jogadores, produzindo resultados desleais.
As regras do jogo é que devem ser mudadas e não as decisões dos jogadores, nesses
casos aqui considerados. E as mudanças não deverão vir apenas da letra da lei, conforme dito
acima, mas de todas as outras sugeridas nas linhas anteriores. Pois que, se os jogadores
entenderem que as regras são outras, tomarão outras decisões. Com regras equânimes para o
fraudador, mesmo que este tome a sua melhor decisão ainda assim sua fraude não o
compensará. Sempre seus ganhos estarão abaixo dos seus prejuízos e não terá mais incentivo
a fraudar.
Referências bibliográficas:
CARVALHO, José Augusto Moreira de. Introdução à teoria dos jogos no Direito. Revista
de direito constitucional e internacional. São Paulo, v. 15, n. 132, p. 213-234, abr./jun. 2007.
DAVIS, Morton David. Teoria dos jogos: uma introdução não técnica. São Paulo: Cultrix,
1970.
FIANI, Ronaldo. Teoria dos jogos: para cursos de administração e economia. 2. ed. Rio de
Janeiro: Elsevier, 2006.
MARTINS JUNIOR, Wallace Paiva. Probidade administrativa. 2 ed. São Paulo: Saraiva,
2009.
RUSSELL, Stuart J.; RUSSELL, Peter Norving. Inteligência artificial. 2. ed. Rio de Janeiro:
Elsevier, 2004.