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meu "filho" crescendo nessas
Meu Deus, está acabando! páginas.
Hoje sai o último capítulo de Dies
Irae. Meu bebê cresceu! No último Minha nossa, tagarelei
editorial, compararam ter o primeio demais de novo! Andem logo,
text concluído a ter um filho, e o vamos ler a revista!!
pior é que é mais ou menos assim.
E é com vergonha que eu
(Carine Ribeiro)
digo que Dies nasceu apenas por
obrigação: um trabalho de faculdade,
que foi praticamente psicografado
em três dias. O Mais triste é que a
professora ficou tão revoltada com o equipe:
tamanho que nem o leu!
Acho que isso só reforça Redação: Gustavo Martins,
a honra que sinto de ter tido meu Bryan Dias, Ribeiro Carine,
humilde textinho publicado na ,Matheus de Souza
Projeto Redação: pude mostrar Colaboradores: TAXD,
aos outros minhas divagações que Bruno Vieira "Hanzo",
foram "paridas" pela minha cabeça. LukPla60, Emanuel R.
Espero que tenham gostado dos Marques
personagens, torcido pelos herois e Diagramação: Aero
se divertido com a historia, porque Artifinalismo: Aero
eu me diverti um bocado escrevendo, Edição: Gabriel "the Gabs"
naquele feriado prongado no qual
não saí da frente do pc pra nada.
Devo agradecer a quem fez
a edição de Dies, afinal eu mandei
o conto inteiro, mas foi editado
Contato:
brilhantemente nas partes mais
adequadas e eu não faria melhor. projetoredacao@gmail.com
E também devo confessar que vou
sentir falta disso. De re-acompanhar
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Sumário
Apresentação . ................................................................. 3

Sumário ........................................................................... 4

Entrevista ........................................................................ 5
Jones V. Golçalves ...................................Carine Ribeiro

Sagas ............................................................................. 9
Chantel ........................................................................... 9
World of Humans ......................................................... 15
Guerreiros Predestinados ............................................. 19
Dies Irae ....................................................................... 24

Contos e Crônicas ........................................................ 35


Batalha no Deserto . ..................................................... 36
A boneca . ..................................................................... 42
O Engenheiro de Sonhos............................................... 47

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ENTREVISTA
Carine Ribeiro (Eirea)
por Gustavo Martins
apenas duas laudas. O que
Hoje vamos entrevistar foi meio triste. Senti que
Eirea, autora da saga "Dies ficou meio corrido... Já não
Irae", que chega ao seu bastava a minha professora
final nessa edição de literatura portuguesa
quase me matar ao ver que
Projeto Redação: Primeiro teria que ler tudo aquilo.
queria agradecer por nos
deixar publicar Dies Irae. Projeto Redação: (risos)
Foi um prazer Acho que ela
para nós. mudaria de idéia
Eirea: O prazer sobre a história.
é meu, de terem Sou só eu ou
publicado... tem mesmo
Afinal, foi legal uma ponta de
alguém não ter influências de
torcido o nariz ao RPGs nela?
ver o tamanho do Eirea: Uma
texto. ponta?
(risos)
Projeto Eufemismo o
Redação: seu... Bom, ela
Não importa o havia nos pedido
tamanho e sim o uma novela
conteúdo. de cavalaria nos tempos
E, aliás, foi um belo atuais. Eu que enchi o saco
trabalho tratar da história pra fazer em algo meio
em tão pouco tempo. Foi fantasia medieval porque,
muito difícil para você? assim que ela falou, veio
Eirea: Nem me fala... a historia se montando na
Bom, acho que você não minha cabeça.
sabe, mas Dies Irae foi um
trabalho de faculdade. Projeto Redação: Alguma
Eu escrevi tudo em 4 base ou realmente do zero?
dias e tentei enxugar ao Eirea: Tinha uma base
máximo, porque eu deveria sim... Personagens de RPG.
entregar um texto de Minha elfa ladina e o elfo

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ENTREVISTA
do meu namorado. Mas, realmente mau. Apenas
no fim das coisas, da base alguém que não soube lidar
só restaram o banimento, o com perdas.
fato d’ela ser uma ladina, e Eu queria falar mais sobre
ele um nobre. Aldebarand também.

Projeto Redação: Agora, Projeto Redação: É


uma pergunta que eu realmente uma pena. Teria
queria fazer por curiosidade sido muito bom ter visto
mesmo. O Aldebarand tem mais sobre os personagens
algum problema? e, principalmente, sobre o
Eirea: (risos) Bom, é "vilão" tudo. Ele realmente
que eu não pude perder me pareceu alguém que
a oportunidade de fazer sabia o que fazia
um bárbaro clichêzão... Eirea: Isso era o que havia
O clássico meio-orc. Mas de mais legal, e eu não
o fato é que ele vem de pude aproveitar. Ele não
longe, não fala bem o sabia. Foi um fantoche, e
idioma. isso só foi citado uma única
vez. E nunca mais pude
Projeto Redação: Isso falar no assunto.
explica a terceira pessoa
Eirea: Uhum... Tem muita Projeto Redação: Ao que
coisa legal que pensei pros parece temos material para
personagens, mas não uma remake.
pude aproveitar... Maldita Eirea: Ou continuação.
professora preguiçosa
Projeto Redação: Seria
Projeto Redação: O que realmente interessante.
era? Oh, perdão. Pergunta Agora que Dies acabou tem
errada. algum projeto futuro em
Poderia citar exemplos mente?
dessas coisas? Eirea: Bom, como eu
Eirea: Bom... A história, e disse, Dies não foi bem um
os motivos do vilão, como "filho planejado". Então,
ela era visto no reino. pretendo SIM continuá-
Não gosto do padrão... lo. Dies Irae teve um final
Vilão que é mau por si só. muito abrupto. Tanta coisa
Apesar de tudo, ele é um pra falar...
bom Rei. E não é um cara Também pretendo fazer

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ENTREVISTA
um projeto de RPG, mas sequência. Mas posso dizer
isso vai ser BEM mais que tem haver com o que
complicado. estava por trás de nosso
vilão.
Projeto Redação: Gráficos
que o digam. Projeto Redação: Se
Sobre a sequência da bem me lembro era o Anti-
guerra, o que exatamente cristo, correto?
estava sendo enfrentado? Eirea: Exato. Mas, por
Eram zumbis ou humanos que? O que faria o próprio
enfeitiçados? se envolver em uma mera
Eirea: A última batalha? disputa territorial local?

Projeto Redação: Sim. Projeto Redação: É uma


Eirea: Algo entre os dois. boa pergunta.
Eu me lembrei de Eragon Eirea: Era isso o que eu
na hora, sabe? quis explicar, mas não tive
espaço. Nem tempo, né?
Projeto Redação: Na E que tenho vontade de
verdade não sei. explicar em breve.
Eirea: oh...
Era como se eles não Projeto Redação: Espero
caíssem. E, quando que sim. Realmente quero
finalmente morriam, se chegar ao fundo dessa
levantavam. Em Eragon, história e tenho certeza
eles apenas não sentiam que os leitores também
dor. Aliás, os zumbis só querem.
caíam, ou quando os anjos Eirea: Que bom!
finalmente os matavam.
Aliás, também gostaria Projeto Redação: Você
de ter explicado porque nomeou a história pela
os anjos resolveram se música ou por alguma
envolver... outra razão?
Eirea: Acredite, tem haver
Projeto Redação: coma música sim. Mas
Essa era minha próxima não pela qual você estava
pergunta. Acho que não pensando.
poderá respondê-la, não é? Eu escrevi toda a história
Eirea: É... ouvindo tanto o Requiem
A não ser que eu faça a de Mozart quanto o de

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ENTREVISTA
Webber inteiro. Em loop. Projeto Redação:
Vejamos...
Projeto Redação: E existe É, parece que estamos
outra Dies Irae? chegando ao fim dessa
Eirea: Sim, em qualquer entrevista. Porém temos
Requiem há o Dies Irae. uma ultima pergunta antes
Calhou de eu ouvir o Dies da sua mensagem final.
Irae de Webber durante a Eirea: Pómandá
primeira batalha. E pareceu
tão... Épico. Parecia a Projeto Redação: Qual
manifestação da própria ira a resposta para a vida, o
divina. Então, quando eu universo e tudo mais?
escrevi a cena que os anjos Eirea: 42, com toda a
apareciam soube que não certeza.
haveria nome melhor.
Projeto Redação: Muito
Projeto Redação: Tudo bom!
faz sentido agora... Gostaria de deixar uma
Sobre o cenário em si... mensagem final?
Eirea: É, acho que ele Eirea: Bom... Quero
talvez seja meio zoado fora agradecer a todo mundo
da minha cabeça... que acompanhou minha
seriezinha...
Projeto Redação: Nem Juro que vou sentir
tanto. Foi apenas um saudades dela, e não quero
pouco difícil situar uma largar o projeto redação,
época e baseado nisso nem que eu continue só
suponho que seja algo como leitora.
como a Europa medieval, Agradeço mesmo
não?
Eirea: Algo parecido. Projeto Redação:
Eu fiz algo não situado Obrigado pela entrevista e
nem espacial nem pelo grande trabalho
temporalmente. Gostaria Esperamos poder continuar
de poder dar uma contando com você.
justificativa melhor, mas Eirea: Eu que agradeço
eu apenas não tive tempo pela oportunidade. Tomara
para pesquisar e situar que o pessoal tenha
fisicamente com perfeição. gostado!

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Chantel

Capítulo 10
“Vamos entrar na sua mente”.
Aquilo era absurdo demais. Apenas pensar naquilo fazia minha
cabeça latejar violentamente.
—Lisa, tem mais daqueles comprimidos? – perguntei virando
para ela.
—O quê? — ela perguntou surpresa.
Podia ser só minha impressão, mas parecia que ela estava
entendendo toda a situação tão bem quanto eu. De certo modo isso
me deixava aliviado já que começava me achar um idiota.
—Essa coisa toda é demais para minha cabeça! no que eu estava
pensando? Me entupir de analgésicos não ajudaria em nada – Esquece!
– olhei para Chantel – Você disse que vai entrar na minha mente?
—Exatamente! – ela falou como se fosse a coisa mais normal do
mundo.
Respirei fundo tentando me recompor. Para mim tudo aquilo
era simplesmente ininteligível.
—Você notou o tamanho da loucura que você está dizendo? –
disse.
—Viu! Até ele concorda! – Mary interveio.
Chantel fulminou-a com um olhar reprovador.
—O que você considera loucura e o que ele considera loucura
são coisas completamente diferentes! – ela disse, levemente irritada.
Mary cruzou os braços e me encarou.
—Eu acho que entrar na sua mente é uma loucura! Você não
concorda? – ela me perguntou com um olhar inquisidor.
Concordei com a cabeça. Após receber um olhar daqueles,
você simplesmente concorda com o que quer que seja. Porém, apesar
daquela ser a primeira demonstração de bom senso que vi em tempos,
algo me parecia estranhamente errado.
—Viu! Ele também acha que é uma loucura! – ela exclamou
orgulhosa.
Chantel fitou-a com uma expressão indecifrável. As duas
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Chantel
ficaram se entreolhando, imóveis, durante longos instantes.
—Sabe, Mary, eu ainda sou a superior aqui! – Chantel disse
sorrindo matreira.
As duas continuaram se olhando até que Mary suspirou
profundamente, claramente frustrada. Aquele não era um argumento
que ela podia contestar.
—Tudo bem! – Mary disse cabisbaixa – Mas eu ainda acho isso
uma loucura!
Não fazia idéia do que estava acontecendo lá. Sentia-me como
um aluno do primário tentando entender a conversa dos professores.
Olhei para Dave, tentando encontrar uma resposta, mas ele limitou-se
a dar de ombros. Corri o olhar para Lisa, mas ela apenas sorriu.
Quanto mais eu ficava naquele lugar mais me convencia da falta
de sanidade de todos os presentes. Pergunto-me se aquela não seria a
razão de existirem tantas invenções inúteis por aí.
—Poderiam pelo menos me explicar direito isso tudo? Se alguém
diz que vai “entrar na sua mente” e meio difícil se manter no lugar,
compreendem? Mesmo com toda essa coisa de Realidade Estendida
ainda é da minha mente que estamos falando! – disse com minha voz
mais calma.
Chantel tomou posição para começar a explicação. Senhorita
sem sentido iria atacar novamente...
—A idéia é simples: Quando Hipnos tenta penetrar em sua
mente ele tem que enviar a própria consciência para superar a sua
e penetrar no seu “subconsciente”. A questão é que seria impossível
um único corpo suportar duas mentes, bem, existem os casos de Duo
persona, mas isso é diferente já que não duas mentes num corpo. Se
esse fosse o…
—O que? – Tentei dizer algo mais inteligente, mas meu estado
mental não permitiu. Ao menos consegui fazê-la parar.
—Duo persona! Não conhece? – ela indagou, indignada.
—Eu sei o que é Duo Persona! Mas o que isso tem haver com
o assunto? – aquilo já começava a me irritar.
—Eu estava falando de duas mentes num corpo e como isso
seria impossível, pois segundo a teoria de Her… – ela continuou.
—Só continue explicando a Realidade Estendida! – interrompi.
– Não estou com nem um pouco de cabeça para ouvir teorias!

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Chantel
Chantel me olhou de modo indecifrável. Ela deveria estar
querendo me dizer algo, porém eu simplesmente não entendia o que
era. O sotaque facial dela também não ajudava em nada.
—Acho que seria melhor se eu explicasse. – sugeriu Dave.
Eles se olharam por um instante e então Chantel foi se sentar.
O nível de entendimento deles era algo realmente assustador.
—Desculpe por isso, às vezes ela divaga demais. – sussurrou-me
Dave.
Concordei com a cabeça. Queria adicionar alguma coisa àquela
frase, mas achei melhor ficar calado.
—Bem, vamos às explicações! – Dave fechou os olhos por um
instante, respirou fundo e começou a explanação – A teoria é simples:
Um único corpo não consegue suportar duas mentes diferentes, pois
cada mente possui uma freqüência de onda própria. Baseada nisso
Chantel deve ter suposto que o que Hipnos faz é instalar uma ponte no
seu subconsciente, ou Mundo Interior. Essa tese é corroborada pelo fato
da magia apenas ter efeito durante o sono, quando a o subconsciente
está no controle. Todavia já tivemos prova de que ele consegue forçá-
lo a desmaiar, o que significa que ele mantém uma ligação continua
com você. Tendo isso como verdade o plano é simples: da próxima
vez que ele tentar te desmaiar você executará uma magia de Realidade
Estendida fazendo com que penetremos na sua mente ao mesmo
tempo em que ele está ativo lá. Isso vai evitar com que ele possa sair e,
uma vez lá dentro tudo, que temos a fazer é derrotá-lo.
Aquela foi a mais rápida sucessão de palavras que vi na minha
vida. Ainda me pergunto se não teria sido melhor ouvir as divagações
da Chantel.
Olhei para Lisa que, novamente, parecia tão perdida quanto
eu. Naquele momento concluí que nem toda pessoa que trabalha no
Instituto é louca, apenas Chantel e todos aqueles que conviviam com
ela. Saber que alguém assim ia entrar na minha mente não era nada
animador.
—Você falando até parece fácil… – murmurou Mary.
Chantel e Dave a olharam irritados.
—O que foi? – Ela esbravejou – Sabem tão bem quanto eu que
nunca é simples lutar contra um Rosenscherwt! Não o chamam de
Deus dos Sonhos à toa!

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Chantel
A expressão de Mary, apesar de um tanto ruborizada, era séria.
E tenho plena consciência do por quê. Já havia tido amostras do poder
de Hipnos e gostaria de nunca ter que ficar frente a frente com alguém
como ele outra vez. Porém fugir não era uma opção.
—É por isso que vamos pegar reforços! – Chantel olhou para
Lisa, que ainda parecia confusa – Gostaria que fosse conosco nessa
missão, Lisa! Soube que você já participou de caçadas à Rosenscherwt
e até mesmo fez parte de uma campanha de retaliação a um kaiju. – ela
sorriu – Sua experiência seria de grande valia para nós!
Olhei para Lisa, atônito. Não importava de que ângulo a
analisava, ela não parecia o tipo de pessoa que havia enfrentado algo
desse nível. Sabia que os médicos da campanha sempre ficavam nas
linhas de trás, mas ainda assim era estranho ela não ter uma marca
sequer depois de enfrentar um kaiju. Além disso, simplesmente não
conseguia imaginá-la num campo de batalha.
—Você está num cargo superior ao meu, Srta. Grace. – Lisa
sorriu – Não tem motivos para me pedir esse tipo de coisa, pois creio
que tenha plena noção da sua autoridade.
Chantel concordou.
—Mas não seria certo te envolver nisso sem que você queira.
Não estamos falando de um inimigo comum e sim de alguém realmente
poderoso.
A empatia dela era absurda. Pergunto-me se ela ainda lembrava
que eu, o dono da mente que serviria de campo de batalha, ainda estava
lá.
—Não se preocupe quanto a isso. – Lisa me olhou gentilmente
– Uma enfermeira sempre acompanha seu paciente. – seu olhar
percorreu o vazio por alguns instantes – E, além disso, tenho motivos
pessoais para aceitar a proposta.
—Certo! – exclamou Chantel – Dave! Vá falar com o
coordenador da Divisão Médica e peça para liberar a Lisa por uma
semana!
—Agora mesmo! – Dave respondeu enquanto saía da sala.
—Mary, você cuida da papelada e pega a permissão com o
Alexander!
Mary suspirou, irritada.
—Por que eu sempre fico com a parte burocrática? – ela

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Chantel
murmurou.
—Você sabe como ele gosta de você. – ela disse olhando-a de
um modo… não muito profissional, digamos.
—Vá à merda, Chantel! – Mary xingou enquanto se retirava.
Assim que Mary se retirou, Lisa levantou-se e olhou para
Chantel.
—Sinto muito, mas devo me retirar. Tenho trabalho a fazer na
Divisão Médica e acabei usando mais tempo do que dispunha.
—Certo. – Chantel sorriu – Obrigado, Lisa!
Lisa consentiu com a cabeça e iniciou sua trajetória de partida,
porém, ao chegar ao limiar da porta, virou-se para mim.
—Se precisar de qualquer coisa não hesite em me chamar. – ela
disse sorrindo gentilmente.
Concordei com a cabeça e Lisa se retirou. Fiquei parado por
alguns segundos olhando-a sair do meu campo de visão. A elegância
com a qual ela andava era impressionante.
—Que fofo! – riu Chantel.
—O que foi? – perguntei irritado.
—Nada demais. – ela respondeu sorrindo.
Realmente odiava a postura sabe-tudo dela. Era uma das poucas
coisas que conseguiam me tirar do sério.
—Espere um segundo. – ela me disse indo em direção à sua
mesa.
Chegando lá ela pareceu pegar algo da gaveta. De longe não
consegui ver do que se tratava, mas quando ela se aproximou percebi
que era um molho de chaves.
—Venha comigo, Johan! – ela ordenou.
Até a porta a segui sem hesitar. Logo após ela, porém, decidi
tentar descobrir onde ela pretendia me levar.
—Para onde estamos indo? – perguntei.
Após trancar a porta e guardar as chaves ela se virou para mim.
—Tenho menos de uma semana para te ensinar uma magia
tão difícil que muitos preferem ignorar. – ela então sorriu, confiante –
Vamos para a Zona Zero!

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world of humans

Capítulo 10
“Estou de frente com vocês seus animais!” Disse o
garoto de cabelos castanhos desarrumados, que em uma mão estava sua
AR-15 e na outra uma granada.
“Vou matar todos vocês!” Gritou o rapaz indo de encontro às
criaturas que iam de frente ao garoto, que estava no último patamar
antes da lagoa.
Até que um raio caiu na lagoa, eletrocutando grande parte das
criaturas, e as outras que restaram saiu correndo se esconder por conta
do barulho feito.
“Humm... que sorte, meu deus!” Disse o garoto caindo no chão
e parando um pouco para descansar.
“Deixa eu guardar minhas coisas aqui , por que os outros estão
me esperando.”
E Thiago foi indo para dentro da escuridão, com uma pistola e
um sinalizador em outra mão.
Ele foi passando pelo corredor escuro até que conseguiu ver uma
luz fraca iluminando uma parte não muito longe da onde estava.
“Vou ver o que é...” Vociferou Thiago.
Uma sequencia de tiros foi feita fazendo o garoto apressar os
passos, e em conjunto gritos de dor ecoaram freneticamente, que fizeram
com que ele começasse agora a correr meio a escuridão em direção aos
eventos ocorridos.
Ainda correndo, o garoto pegou seu sinalizador e atirou três
vezes. Todas acertaram nos rostos de um daqueles animais, que caíram
inertes no chão com o rosto em chamas e dando uivos de forte dor.
“Thiago!” Gritou em êxtase Kimberly, abraçando o garoto.
“Calma Kim, está tudo bem com você?” Disse o garoto
abraçando-a também, e beijando o cocuruto de sua cabeça.
“Thiago! Que bom vê-lo” Disse Leonardo cumprimentando o
rapaz.
“Comigo está tudo ótimo, e com você? Como você escapou? E
esses monstros que estavam aqui, como chegaram?” Disse a garota para
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world of humans
o menino.
“Calma linda, comigo está tudo ótimo, eu escapei porque
quando eu ia par ao ponto final, um raio caiu na lagoa e eletrocutou
aquelas criaturas, matando-as. Eu ia lhe perguntas da onde saíram esses
meta-humanos, porque não veio nenhum comigo.” Terminou o garoto
já atirando um sinalizador para verem um caminho a seguir.
“Ufa, que bom! O importante é que você está bem meu amor,
agora vamos achar uma saída daqui e ficar atento com esses monstros.”
Disse Kimberly pegando sua mala e a mão de Thiago, rumando para o
único caminho que dava para ir.
Dois minutos de caminhada silenciosa e sem nenhum
contratempo se passou, até que os garotos tropeçaram em algo frio e
inerte no chão.
“O que é isso?” Indagou Leonardo, que pegou seu sinalizador e
atirou no chão para conferir sua pergunta.
Gritos de repudio foram dados por Kimberly ao ver do que
realmente se tratava.
Um chão inteiro completo de sangue, e destroços do que antes
parecia ser um corpo. Vários daquela Meta-humanos no chão, que agora
apresentavam seu aspecto humano novamente, porém agora com um
corte do pescoço ao umbigo, que revelava um celoma, uma cavidade
corporal sem nenhum órgão interno, com todas as tripas espalhadas
pelo chão, como se alguma coisa tivesse saído de dentro do corpo para
fora dele.
Em meio a essas desgraças, um “rosto” conhecido. Era o de
Fernando, no qual Leonardo tropeçou, e ao olhar a cabeça, somente ela
e sem mais nada. Todo o cabelo que ele tinha não estava mais presente,
assim como os olhos, que estão explodidos e murchos. Sua boca estava
totalmente aberta, e sua mandíbula totalmente quebrada.
Ao ver isso, Leonardo deu um pulo para trás e entrou em estado
de choque, que após um minuto de reflexão, “voltou” ao normal e
continuou andando, puxando os outros dois para o caminho em frente,
no qual tinha uma porta de ferro que estava entreaberta.
“Leo, está tudo bem com você?” Disse Kim, achando estranho o
comportamento do garoto e demonstrando certo interesse nele.
“Sim. Vamos.” Respondeu secamente o garoto.
Ao entrarem na porta de ferro, entraram em um salão de

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world of humans
fraca iluminação, com pisos de mármore branco e alguns pilares que
sustentavam tal estrutura. Ao fundo uma escadaria que ligava a um
andar superior.
“Vamos em frente” Disse Thiago, que ao dar um passo à frente,
um grito já conhecido fez-se presente.
Um daqueles meta-humanos estava na porta da escadaria, que
começou a vir em direção aos garotos.
“O deixe comigo.” Falou rispidamente Leonardo, colocando os
braços na frente dos dois, que já iam ao encontro da fera.
Com um grito de força, o rapaz foi ao encontro da fera, tirando
uma faca do bolso da perna e gritando com força, cravando uma faca
bem no peito da criatura, que uivou de dor e, antes de cair inerte no
chão, rasgou o ombro de Leonardo, que também caiu no chão.
“Leo!” Gritou Kimberly que foi ao encontro do garoto, que
gritava de dor no chão.
Ela pegou rasgou uma parte de sua blusa e cobriu o ferimento do
garoto, que começou a levantar aos poucos e foi, com o ombro sangrando,
rumo à escadaria.
Ao chegarem ao patamar acima, encontraram uma sala igual a
anterior, só que com uma iluminação muito melhor, e com um buraco
grande na parede.
“Vamos entrar nesse buraco.” Disse Thiago, já entrando no local
junto com os outros dois.
Um conjunto de barulhos iguais a pessoas caindo foram ouvidas,
e Thiago não conseguiu ver mais nada, uma escuridão tomou sua visão.

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guerreiros predestinados
“O Guerreiro Predestinado a quem eu e meu filho pedimos um favor,
retornou de sua busca por armas melhores e já iniciou o seu treinamento,
ele teve uma conversa com Tarim seu Escudei-ro no Vulcão, mas ao
escalarem a cachoeira se depararam com outro problema”.

capítulo 8
Fim do Treinamento

Pela manhã do dia sHércules pega uma de suas Adagas e


lança com força na boca do peixe, a Adaga não pega muita velocidade
devido a estar em baixo da água, mas como Hércules andou treinando
com a espada pesada, a Adaga fere a boca do peixe que se fecha. Tarim
puxa sua Espada de Aço e corta o tentáculo que o segurava, Hércules e
Tarim nadam para a superfície para pegar ar.
O peixe pula para fora da água, por cima de Hércules, ele levanta
sua espada ferindo o peixe na parte inferior, Tarim pega a corda de cipó
pela qual subiram, o Bumerangue ainda está amarrado a ela, ele lança o
bumerangue e consegue amarrar uma das barbatanas do peixe.
Hércules dá um golpe vertical com a espada cortando o peixe no
meio, derrotando a criatura.
Hércules e Tarim puxam o enorme peixe (ou suas partes) pra
fora do rio, e depois de cortar alguns pedaços com suas espadas, comem
porções da carne do peixe, assando-os em uma fo-gueira, enquanto
comem conversam:
- Obrigado Mestre, essa passou perto.
- Que isso Tarim, você fez a maior parte do trabalho. É bom ver
que o treino esta dando re-sultado para nós, será bem necessário.
À noite, Samir vem a Hércules e Tarim:
- Foram muito bem, eu estive observando a subida e a luta contra
o peixe.
- Seu treino está dando resultado Mestre Samir.
- Não Hércules, o esforço de vocês está. Podem ir agora, voltem
pela manhã.
O tempo passa e o duro treino de Hércules e Tarim já dura seis
meses, estão muito mais fortes e habilidosos agora.
Em uma manhã eles vêm ao forte de Samir que lhes diz:
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guerreiros predestinados
- Quero que me mostrem o quanto melhoraram nestes seis
meses que se passaram.
Hércules e Tarim já conseguem carregar o mesmo número
de pedras que da última vez em duas horas, conseguem tocar com as
espadas pesadas todas as folhas antes que toquem o chão, conseguem
rodar as espadas pesadas com surpreendente velocidade, suportam o
calor do Vulcão Amir a ponto de ficarem bem do lado da lava por muito
tempo, a uns 50 centímetros, mas sem tocá-la, sobem a cachoeira só com
a força dos braços. Ao ver toda a demonstração Samir diz:
- Vocês melhoraram espantosamente, é hora de aprenderem a
concentrar sua força interior, para usarem magia; primeiro vejamos o
quanto vocês suportam o fogo, Hércules posicio-ne-se em defesa.
Hércules coloca-se em postura de defesa e se protege com seu
escudo de Bronze, Samir se concentra faz alguns gestos e em suas mãos
aparecem chamas, então ele lança essas chamas em Hércules, Hércules
suporta o calor e o impacto no escudo por dois minutos e então se
esquiva, Samir diz:
- Nada mal Hércules, essa é uma magia de fogo simples do
meu povo, mas dificilmente vo-cê irá aprendê-la, é mais fácil pra você
aprender magias de folhas. Tarim é sua vez, posi-cione-se em defesa, use
o escudo de Hércules.
Tarim usa o escudo de Hércules e suporta a mesma magia por 1
minuto e 20 segundos, de-pois esquiva.
- Você também evoluiu muito Tarim. Hércules e Tarim, quando
se concentrarem, podem u-sar sua energia interior para atrair as folhas
das árvores – um grande número de folhas cerca Samir – essa magia
exige mais força interior de mim que sou do fogo do que de vo-cês,
mas eu também posso usá-la – as folhas se tornam projéteis, Samir as
envia na dire-ção de uma rocha as folhas as destroem – lembrem-se,
essa magia é boa, mas futuramente terão de aprender magias melhores,
e será necessárias árvores por perto para poder realizá-las, depois de
usar magias ficarão cansados, quando não puderem mais usar sua força
interior, terão de descansar e se recuperar, ou tomar poções mágicas de
restauração, todos possuímos uma força mágica dentro de nós, nesse
planeta usamos magias através dela, quanto mais forte ficamos, mais
forte ficam as magias que usamos e quanto mais fortes mais magias
poderosas podemos usar, agora tentem fazer esta magia, concentrem-se

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guerreiros predestinados
e usem os gestos que viram.
Hércules e Tarim se concentram, é mais difícil que parece, eles
imitam os gestos e conse-guem atrair as folhas para seu redor, Samir diz:
- Lancem a magia na rocha.
Eles lançam e também destroem uma das rochas do local. Samir
diz:
- Foi um pouco mais fácil para vocês, porque como já são do
Povo das Folhas, gastam menos força mágica em magias que usam
folhas. Lembre-se que essa magia não é muito forte contra pessoas do
meu povo. Hércules, Tarim, não há mais nada que posso ensinar a vocês,
devem continuar treinando, praticando o que aprenderam, procurar
novos treinos, novas magias, e Hércules, quando quiser, eu o levarei ao
local onde será testado e se passar no teste, será intitulado oficialmente
como Cavaleiro do Povo das Folhas de Terak.
- Samir - diz Hércules – eu agradeço, mas não tenho a intenção
de fazer teste e me tornar um Cavaleiro, por isso, vou libertar as crianças
como prometi a Amesina e depois irei atrás de alguém que possa me
ajudar a resgatar Heymore como prometi a você, depois irei buscar o
caminho de volta para minha casa, eu parto amanhã para as Colinas de
Hércule. Agradeço a você de todo o coração por ter me treinado todo
este tempo.
Pela manhã, ao sair, o Povo da Vila I está na porta de Hércules,
muitos vieram lhe desejar boa sorte, lhe deram frutas e mantimentos
para a viagem, Theros e Amesina também estão lá, Hércules diz:
- Obrigado a todos, farei o melhor que puder. – então ele se vira
para Tarim – Tarim eu que-ro que você fique aqui na Vila I.
- Mas Mestre, depois de todo o treinamento, eu quero ir com
você, sei o que as crianças sofrem naquele lugar, quero ajudá-las.
- Tarim, eu preciso que alguém fique aqui tomando conta da
casa e das pessoas da Vila I, caso algo aconteça em minha ausência.
- Mas Mestre...
- Chega de mais, Tarim; não quero discussões, você me prometeu
obediência, e lembre-se do seu dever como Escudeiro, se eu morrer, use
minhas armas e se torne um Guerreiro mais poderoso do que eu fui.
Cuide-se meu jovem amigo.
Hércules abraça Tarim, despede-se de todos e diz a Theros e
Amesina:

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guerreiros predestinados
- Eu resgatarei o jovem Sekir e quantas crianças mais puder.
Vendo Hércules se afastar no caminho para a Colina de Hércule,
Tarim e Theros ficam em uma grande expectativa do que acontecerá
com o herói da Vila I, Tarim aproveita que ainda é dia, e retorna para o
forte de Samir para treinar. Samir pergunta a Tarim:
- Então ele foi mesmo para a Colina antes de querer fazer o
teste.
- Sim Mestre Samir, – diz Tarim frustrado - e eu fiquei pra trás.
- Ainda não compreende que Hércules quer que você fique seguro
Tarim? Além do mais, ele sabe que você tem capacidades combativas,
pois treinou todos os dias a seu lado, o que Hércules quer deixando você
aqui, é que você auxilie Theros de alguma forma, eu não sei porque, mas
seu Mestre acredita que você terá capacidade para ajudá-lo de alguma
forma, é como se Hércules pressenti-se isso e por isso o deixou.
- Como sabe disso, Mestre Samir?
- Eu sou um Mestre do Povo do Fogo Tarim, já passei por coisas
que você desacreditaria, eu sei como um guerreiro do feitio de Hércules
pensa, agora volte a treinar, eu vou intensi-ficar a dificuldade do seu
treinamento para que quando Hércules voltar, você esteja mais forte
do que está agora. O treino será o mesmo, mas com mais peso e menos
tempo.
- Obrigado Mestre Samir, eu aceito o desafio.

“Hércules conseguirá vencer os desafios das Colinas de Hércule? Ele


aceitará fazer o teste para se tornar Cavaleiro caso retorne? Tarim
suportará o meu treino intensificado?”.

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24
Dies Irae

Capítulo 9

Os boatos que Melian espalhou sobre Firleu ter sido
deserdado e de ter sido condenado a nunca mais pisar no lado oeste da
fronteira, renderam um convite para o baile. Por dias eles organizaram
os preparativos para o grande dia.
Aldebarand disputava quedas de braço e Avenel disputava
pontaria. Assim, eles arrecadavam dinheiro para a indumentária
adequada. Firleu se comunicava por correspondência com o rei,
por intermédio de um mensageiro subornado por Melian, que após
resolver detalhes como encomendar a condução, já não podia fazer
muita coisa além de alternar entre ir à costureira e ao alfaiate.
Até que, enfim, chega o grande dia. Avenel e Aldebarand já
haviam ido para suas posições, e Melian e Firleu já estava na entrada
do salão do castelo. Nenhum deles havia gostado muito do plano, mas
era a única alternativa possível. Eles foram anunciados e entraram.
Após passarem algum tempo no que era aparentemente uma festa
comum, foram levados à presença do rei Baderon. Um homem de
aparência doentia e ensandecida. Mas que era possível perceber certa
astúcia. Uma astúcia arrogante, mas ainda assim, astuciosa.
-Ora, Firleu. Confesso ser uma grande surpresa tê-lo em minha
presença. E quem é essa bela jovem ao seu lado?
-Minha esposa.
-Oh... Eu não sabia que era casado. Seria esse o motivo de ter
sido deserdado?
-Nos casamos em segredo. Mas não é isso que vim discutir. Eu
quero o que é meu por direito de volta. Vim propor um acordo.
-Sim... – Suas mãos se cruzaram em frente ao rosto, mas não
conseguiam esconder seu sorriso sádico. – Quais são os seus termos?
-Caso concorde em me entregar o meu reino, intacto, quando
tudo isso acabar eu... O que está acontecendo?
Um forte odor de fumaça se espalha pelo castelo. É possível ver

25
Dies Irae
pelas janelas que está acontecendo um grande incêndio na floresta que
rodeia o lado esquerdo do castelo. Melian começa a tossir, e desfalece
nos braços de Firleu.
-Faça alguma coisa! Aonde posso deixá-la em segurança?
-No andar superior há alguns quartos. Deixe-a na ala à sua
direita assim que subir as escadarias.
Ele subiu correndo com ela nos braços. Assim que encontrou a
ala, abriu a porta de um dos quartos. Logo após adentrá-lo, ele a pôs
no chão e a beijou.
-Irei distraí-lo. Tome cuidado.
-Eu tomarei. E o beijou novamente.
Ele a deixou no quarto e desceu as escadas para procurar o rei.
Ele estava em pânico, esbravejando ordens aos criados para jogarem
água. Firleu apenas observava a tudo, pronto para pensar em algo que
o mantivesse ali, por mais que parecesse que ele não fosse precisar,
afinal, o incêndio parecia incontrolável.
A única coisa que o preocupava eram Aldebarand e Avenel, que
poderiam perecer no incêndio que tinham provocado como distração.
Até que o mago conjurou uma chuva morna sobre toda a área, que foi
extinguindo todo o fogo. Já havia passado mais de meia hora e nada da
Melian voltar.
Ele se apavorou. Então ele estava com o grimório. Sua esposa
provavelmente seria pega e ele não poderia fazer nada quanto a isso. A
missão estava acabada, e ele precisava pensar rápido antes de tomar a
próxima decisão, que seria decisiva.
-E então, jovem príncipe sem reino... Aonde paramos?
-Eu disse... Melian!
Ela apareceu descendo as escadas, com uma expressão perdida.
-O que aconteceu? Eu acordei em um quarto estranho e me
perdi.
-Você desmaiou, querida. Creio que apertou demais seu
espartilho. Bom, como eu dizia majestade, prefiro não fazer acordo
com quem sequer sabe cuidar de seu castelo.
-Irá se arrepender disso, jovem.
-Já me arrependi de perder o meu tempo em vir aqui. Passar
bem.
-Seu amado reino será destruído. Implorará por minha

26
Dies Irae
clemência e eu não a concederei.
Firleu estacou na porta, e depois continuou seu caminho de
braços dados com Melian, sem olhar para trás. Eles entraram na
carruagem alugada, onde Melian trocava de roupa. Pediram para parar
em um caminho remoto, o pagaram, e desceram. Lá, se afastaram
andando por um tempo, depois correram ao ponto de encontro. Onde
Aldebarand e Avenel já o estavam aguardando.
-Avenel... Conseguiu pegar?
Ele estende sorrindo algo embrulhado em tecido.
-Aldebarand que pegou livro! Moça bonita jogou forte, e
Avenel não conseguiu pegar, mas Aldebarand conseguiu!
-Perfeito! Não toquem no livro em hipótese alguma, pode estar
amaldiçoado.
-Eu não entendo. Ele conjurou uma magia de lá de dentro.
Como ele conseguiu sem o grimório?
-Ele pode memorizar algumas magias ao amanhecer. Mas
assim que as usa, ele as esquece.
-Isso explica tudo... Mas agora... Sem mais conversa! Está
tudo pronto? Devemos partir imediatamente. Além de eu ter ferido
gravemente o orgulho dele, em breve ele dará por falta do grimório.
Temos que correr.
A viagem de volta foi intensa. Apesar de não terem encontrado
maiores problemas, eles tinham a obrigação de serem rápidos. Era
uma verdadeira fuga, exaustiva, porém incansável. A sorte deles foi
o reaparecimento dos cavalos, que pareciam mais resistentes do que
nunca, provavelmente graças às bênçãos dos anjos.
Após muito cavalgarem, e enfrentarem várias noites mal
dormidas e sem descanso, eles finalmente chegaram ao acampamento.
Chegaram sem prévio aviso, durante o período noturno. Assim que
eles desmontaram de seus cavalos, foram recebidos com surpresa, e
talvez certa veneração. O acampamento parecia ter bem menos gente
do que quando partiram. Firleu tomou o pacote com o grimório, e foi
procurar o general Roderick, após orientar aos seus companheiros a
descansarem, e ordenar a alguns soldados que tratassem dos cavalos.
Firleu se espantou ao olhar para o General. Ele estava mais magro, seu
rosto pálido e envelhecido, e seus olhos eram rodeados por grandes
olheiras. Essa aparência cansada e preocupada o encheu de compaixão.

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Dies Irae
-Alteza... Vejo que completou a sua missão...
-Aqui está. Não... Não o toque. Ele ficará comigo, pode ser
perigoso. Relatório.
-Nossas tropas se empenharam em vários combates. Ganhamos
a maioria das batalhas, mas tivemos muitas baixas.Recebemos muitos
reforços, mas como pode ver, a quantidade de homens é bem menor
do que quando partiu. Não duraremos muito tempo, Alteza...
-Mande chamar Melian. Devemos reorganizar nosso grupo
de batedores. Baderon irá atacar o meu reino, e já está a caminho.
Estaremos esperando por eles, mas sei que eles sabem disso. Não será
nenhuma surpresa para nenhum, mas deveremos defender nosso povo,
ou morrer lutando.
-Sim, Alteza...
Enquanto Roderick saiu para buscar Melian, ele ficou
analisando os mapas da concentração dos inimigos, e notou que eles
haviam se espalhado muito.
-Alteza? Mandou me chamar?
-Amanhã quero que saia com um grupo de batedores, preciso de
toda a informação possível sobre o inimigo. Quero saber se realmente
atacarão meu reino.
-Sim, Alteza.
-Dispensada. Roderick, caso o ataque seja real, precisaremos
reunir todas as tropas aliadas. Algo me diz que será a última grande
batalha, independente dos resultados. Por hoje, recomendo que
descanse. Um guerreiro exausto não é útil, assim como um general
cansado demais para pensar com clareza. Dispensado. E vá dormir.
É uma ordem. – E saiu da tenda do general, indo na direção de sua
própria. Ao entrar, encontrou Melian o esperando.
-Meu amado, parecia preocupado lá dentro...
-Tivemos muitas baixas. Acho que chegamos tarde demais...
-Acalme-se – Ela disse enquanto o abraçava – Tudo vai ficar
bem, prometo... Darei tudo de mim para conseguir as informações
mais úteis, está bem?
-Ficarei preocupado...
-Eu sei me cuidar. – E se beijaram, e adormeceram.
Ele acordou e ela não estava mais lá. Provavelmente saiu
antes de ser vista, afinal, eles decidiram manter isso em segredo até o

28
Dies Irae
casamento ser oficializado. Pois, apesar de não ser um pecado diante
de Deus, o seria para os homens. Após sair e desjejuar, soube que
ela já havia partido com sua equipe. Avenel estava entre eles. Mais
tranqüilo por saber que ela, e a missão estavam em mãos mais do que
competentes, ele começou a enviar mensagens às tropas aliadas. Uma
manobra arriscada, mas decisiva para o resultado final.
Passaram-se dias desde a partida dos batedores, e todos estavam
em estado de tensão. Firleu estava praticando o combate de espadas
com um capitão quando notou um alvoroço na parte mais interna
do acampamento. Alguns instantes depois um jovem soldado veio
chamá-lo.
-Eles chegaram! O General já se reuniu com a líder na tenda
dele. Eles o estão esperando.
-Obrigado. Estou a caminho.

29
Dies Irae

Capítulo 10

Em alguns minutos, os três já estavam discutindo as
novas informações.
-Como vossa Alteza imaginou, há uma extensa movimentação
dos exércitos nessa direção. Pelo que ouvi sendo dito, existem
verdadeiros batalhões vindo do Leste. Parece que sua Alteza realmente
atingiu o orgulho dele, não é?
-Isso é bom. Mas ainda temos o problema da desvantagem
numérica. Já contatei algumas das tropas ao sul.
-Não se preocupe general. Já enviei mensageiros solicitando
representantes das demais tropas. Creio que chegarão em breve.
Melian, tem algum plano?
-Achei que nunca iria perguntar. Veja bem. Separaremos as
tropas aliadas em pequenos grupos, enquanto nós todos iremos para
cá. Assim, parecerá que apenas nós estamos em uma tentativa vã e
desesperada de proteger suas fronteiras. Os pequenos grupos irão
se reagrupar nesses pontos. De lá, eles se moverão para esses locais,
aonde acontecerá outros pequenos reagrupamentos. Assim, o inimigo
nos atacará mais imprudente. Então, queimaremos o grimório diante
dos olhos deles. Assim, além de poupar nosso maior inimigo de sua
maior fonte de poder, o tornaremos mais furioso e irracional e ainda
diminuiremos a confiança dos soldados dele!
-Creio que essa área é a mais apropriada para o combate. A
geografia pode nos favorecer, e esses rochedos aqui têm várias fendas,
onde podemos esconder alguns arqueiros.
-Perfeito, general! Mas não todos os arqueiros... Será bom
surpreende-los.
-Muito bem... Roderick, vamos começar os preparativos
imediatamente. Melian, passe instruções para me contatarem assim
que os mensageiros chegarem. Nossas chances são mínimas, mas
devemos aproveitar o máximo possível.

30
Dies Irae

...

E era o grande dia. Quando partiu de seu castelo, acreditou que


aquele era o momento mais marcante de sua vida, porém agora ele
tinha a certeza de que não. Dessa vez, ele estava realmente encarando
a situação mais importante de sua vida. Esse era o dia que definiria o
seu destino.
Ele respirou fundo ao sair de sua cabana. Seu elmo em suas
mãos, os cabelos dourados ao vento, como no dia em que tudo começou.
Ao observar seu exército, foi tomado de certa comoção. Havia mais
gente do que ele esperava. E cada homem ali, era um homem leal a
ele, pronto para morrer pela liberdade. Os batedores já deram a notícia
de que os inimigos estavam se encaminhando, Melian já havia se
posicionado, assim como os arqueiros. Estava tudo pronto. Ele pôs o
elmo, seus olhos azul-violeta faiscando coma expectativa. Sua mente
estava tão longe que mal pôde ouvir o discurso de Roderick. Gritou
junto com seus companheiros e se pôs a falar.
-Homens! Meus leais soldados! Essa batalha é a batalha de
nossas vidas. Cada luta menor a que sobrevivemos foi apenas uma
pequena prévia do que está por vir. Perdemos muitos bons homens
nas últimas lutas, e sinto com as próprias famílias a dor da perda, pois
perdi parte muitos irmãos de armas. Nesta batalha, o mais provável é
que nos juntaremos a eles, mas talvez sobrevivamos. Mas mesmo que
seja esse o dia de nossa morte, morreremos como homens, lutando
por nossas famílias, cujos destinos estão em nossas mãos! E ao cair,
levaremos quantos pudermos conosco, para que mostremos a eles que
jamais subjugarão nosso povo sem luta!
Todos gritaram em êxito. Firleu se sentiu na necessidade ser
honesto, e ficou muito feliz ao ver que sua honestidade funcionou. A
expectativa o corroia por dentro. Após um tempo, ninguém falava uma
palavra. O silêncio era sufocante. Após alguns minutos de espera, já se
podia ouvir os tambores da marcha. Iria começar.
O Rei Baderon parou surpreso ao ver Firleu logo na linha de
frente. Seus olhos se arregalaram, e uma expressão de quem havia
finalmente compreendido algo se formou em seu rosto. Em seguida,
ele se preparou para dar a ordem de ataque. Quando a ordem foi dada,

31
Dies Irae
os exércitos se chocaram.
Assim começou uma batalha sem precedentes. Firleu notou que
nenhuma outra na qual estivera fora tão sangrenta e intensa quanto
essa. Ele buscava se inspirar visualizando como tudo seria se eles não
vencessem. Cada golpe seu era repleto de fúria racional. Se perdesse
a razão, provavelmente poria tudo a perder. Essa determinação aliada
com seu controle, o fazia parecer uma ameaça ambulante.
O sangue se espalhava, e muitos tombavam. Ao olhar para o
lado, ele vê Baderon lutando contra Aldebarand, já a ponto de decapitá-
lo. Ele abriu caminho até seu companheiro com uma velocidade épica,
e conseguiu, por pouco, chegar a tempo de parar o golpe da espada. A
partir desse instante, ambos começaram a duelar.
Ambas as habilidades eram perfeitamente equivalentes. Cada
golpe de um lado, era aparado pelo outro. Ele estava tão compenetrado,
que pareceu a ele que a batalha ali fora já não mais acontecia. Todavia,
foi despertado desse transe pelo som de um machado. Viu que era
Aldebarand, que havia acabado de salva-lo de um soldado que o
tentou golpeá-lo pelas costas. A partir daí, se mostrou mais atento, e
pôde notar que, apesar da estratégia, estavam perdendo. Ainda assim,
dava graças aos céus por Baderon não ter a magia de seu grimório para
dá-lo ainda mais vantagem.
Ainda assim, por mais inimigos que tombavam, o número deles
ainda não parecia diminuir. Foi Aldebarand que percebeu o que estava
acontecendo:
-Inimigos mortos não morrem!
Firleu a princípio ficou confuso, mas depois concluiu que
eles provavelmente haviam sido enfeitiçados antes do grimório ser
roubado. Foi quando algo passou voando perto deles e finca no chão
perto dos pés de ambos. Era o grimório, aberto. Perto deles, uma corda
lambuzada em óleo pegando fogo. Antes que Baderon pudesse pega-
lo, o fogo atingiu o livro o queimando. Ele podia ouvir o grito de
desespero de seu oponente. A batalha cessou por alguns instantes, e
parecia que nesse momento todos cessaram inclusive a respiração. E
então, Firleu teve a impressão de ter ouvido o som de trombetas.
Vinda diretamente do céu, uma legião de anjos com espadas em
chamas descia. Os guerreiros do Oeste se sentiram mais encorajados,
e agora lutavam com ainda mais vigor, assim como Firleu. As flechas

32
Dies Irae
zuniam, as espadas tilintavam, e os anjos voavam em rasante levando
muitos inimigos consigo, matando os que já estavam mortos. Até que
o único inimigo de pé era o próprio rei Baderon. Aquela era uma luta
que Firleu deveria vencer sozinho.
Ambos já estavam feridos e sangrando, já sem forças, mas ainda
se mantinham de pé. Então, Firleu fraquejou e cambaleou para frente.
Baderon tentou se aproveitar, mas foi recebido antes por um golpe na
barriga, dado pelas últimas forças de Firleu, que desmaiou em seguida
com o ombro direito perfurado.

...

Ele abriu os olhos. Estava em sua cama novamente. Ele se


perguntou se tudo teria sido um sonho, mas suas ataduras estavam lá
para comprovar que não havia sido. Ele podia ouvir os sons de uma
comemoração ao longe. Ao olhar para o lado, viu Melian.
-Vencemos, meu amado. Vencemos! Toda a festa lá fora é para
você!
Ele se levantou, e assim que Melian se retirou, ele se arrumou,
e foi se juntar aos seus companheiros na comemoração. Ali, ele viu o
seu pai sorrindo, após muito tempo. E, pasmou-se ele, o recebeu com
um abraço.
-Meu filho. Fez seu papel na batalha, e venceu. E ainda voltou
como um herói de guerra. Estou orgulhoso.
-Obrigado, meu pai. Mas saiba que apenas foi possível graças à
intervenção divina. Pai... Gostaria de apresentá-lo a algumas pessoas.
Ele os apresentou a Melian, Aldebarand e Avenel, exaltando a
importância de cada um para a vitória. O general Roderick já conhecia
o rei, mas também teve sua responsabilidade reconhecida e destacada.
Todos agora eram vistos como verdadeiros heróis de guerra. Mais tarde,
quando o rei Halinard conseguiu ficar a sós com seu filho, comentou:
-Essa Melian é uma bela mulher, e hábil estrategista. Não é
comum encontrar esse três predicados em uma pessoa só. É de uma
rainha assim que o nosso reino precisa...

...

33
Dies Irae
Firleu estava nervoso. Andava de um lado para o outro, se
perguntando para quê tanta demora.
-Mantenha-se parado, por favor! Está deixando a todos
nervosos!
-Mas Avenel, e se ela desistir?
-Ela não irá desistir, pare de falar besteira.
Os sons do órgão começaram a ser emitidos. Um coro de vozes
líricas entoava uma canção divina. E então, ela apareceu. Bela como um
anjo, em seu vestido de noiva, lágrimas rolando pelos seus olhos. Aquele
era o momento mais feliz da vida deles. Apesar de o casamento dele já
ter sido reconhecido por Deus, a realização do sacramento formal era
importante para ele. Ele esteve maravilhosamente inebriado o tempo
todo, mas jamais se esquecerá das palavras do padre:
-E eu vos declaro marido em mulher.

FIM

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35
Batalha no Deserto

Batalha no Deserto
Um mar de areia os cercava por todos os lados. O Sol
brilhava forte e turvava a visão das quatro figuras que seguiam pelo
deserto, menos a de um deles. O guerreiro do deserto que guiava os
três amigos podia enxergar perfeitamente e parecia não sentir nada após
tanto tempo de exposição ao Sol. Ele usava uma roupa feita de panos
brancos, que se enrolava por seu corpo todo e lhe cobria a face, em sua
cintura uma cimitarra estava presa.
O minotauro seguia logo atrás do guerreiro do deserto, ele trajava
uma túnica alva e verde sobre uma cota de malha e puxava seu machado
pela areia, deixando por onde passava uma fenda na superfície macia do
deserto. Curiosamente carregava uma aljava de fechas em suas costas.
Os outros dois, já cansados da perseguição no deserto, seguiam
seu guia e seu amigo a uma boa distância, a moça se escorava como
podia no guerreiro que se utilizava de todas as suas forças para que os
dois não fossem ao chão.
A jovem, de longos cabelos castanhos encaracolados, usava
roupas de couro coladas em suas curvas sinuosas. Passava sua mão por
trás do pescoço do guerreiro que a segurava próxima ao seu ombro, sua
outra mão arrastava um cantil fechado pela fenda aberta pelo machado
do minotauro, cada passo era como um teste de resistência para ela.
O guerreiro usava uma armadura simples que cobria apenas o
peito, ombros, antebraços e canelas, seus cabelos loiros iam e vinham
conforme o vento mudava de direção. Afivelada em sua cintura seguia
sua companheira. Localizadora, esse era o nome dado pelo guerreiro
a sua espada. Em suas costas vinha seu escudo de aço escovado, sem
adornos, e um arco pendurado.
- Quanto mais teremos de andar, Utbah? – perguntou o guerreiro.
- Não muito. – respondeu o guerreiro do deserto.
- Como ela está, Miriel? – questionou o minotauro.
- Eu ainda estou viva, Amrod. – respondeu a jovem antes que

36
Batalha no Deserto
Miriel o fizesse.
- Que bom, Adara! Caso contrário eu já a teria deixado pra trás.
– brincou o guerreiro.
Seguiram em ritmo lento até o anoitecer, quando a temperatura
caiu drasticamente. Logo após a Lua mostrar sua brilhante face branca
no céu, Adara já carregava seu arco e suas flechas ela mesma, e naquela
temperatura o grupo avançava com muito mais velocidade. Ao subirem
até o topo de uma gigantesca duna de areia eles avistaram o que vinham
procurando.
Em meio ao deserto nascia uma floresta de palmeiras e mata alta,
alguns cactos cresciam em meio a vegetação enquanto outros cresciam
nas proximidades da floresta. Do meio das árvores surgia uma torre feita
de mármore negro.
Imediatamente após chegarem ao topo da duna, Miriel sacou
sua espada. A lâmina da Localizadora vibrava enfurecida, emitindo um
estranho som, um assovio assustador, porém que só podia ser ouvido
pelos quatro que admiravam a beleza do oásis. O guerreiro apontou
a espada em direção a torre e ela então parou de vibrar e assoviar. A
calmaria durou segundos, e a espada voltou a vibrar.
- Preparem-se! – ordenou Miriel.
Utbah e Amrod preparam suas armas enquanto Adara encaixava
uma flecha em seu arco. E eles então avistaram seis panteras negras
saindo do meio da mata e correndo em direção a eles. A cada segundo
que se passava as feras se aproximavam mais, e a cada passo mais
próximas, mais eles as achavam diferentes, maiores, perigosas.
Adara disparou sua flecha que viajou velozmente cortando o ar
frio do deserto, a flecha era certeira, derrubaria a pantera se ela não
tivesse se desfeito em fumaça centímetros antes do encontro mortal com
a flecha. A pantera reapareceu mais próxima do que estava antes e as seis
aumentaram suas velocidades.
A arqueira preparou outra flecha enquanto ouvia Amrod
murmurar suas preces ao seu deus. Adara disparou novamente, e obteve
o mesmo resultado. As panteras caíram sobre o grupo como uma
avalanche. Miriel acertou uma delas em cheio fazendo-a voltar a ser
somente areia, a outra o jogou no chão e rolou duna abaixo com ele.
O guerreiro do deserto desviou do ataque de uma das panteras
37
Batalha no Deserto
e assim que contra atacou, a fera se desfez em fumaça e reapareceu em
frente à Utbah, encarando-o com seus olhos vermelho sangue.
O minotauro terminou sua prece no momento em que recebeu
a trombada de uma das feras. Uma forte luz branca surgiu no ponto
exato do toque da pantera, expandindo-se e transformando-a em areia
novamente. A outra pantera recuou imediatamente e somente cercou
Amrod.
A última pantera correu em direção a Adara, que conseguiu
se desviar da investida segundos antes da colisão e disparou sua flecha
contra o felino, que se desfez em poeira negra e retornou a sua forma
antes de cair no chão.
Utbah apoiou sua mão livre no chão e entoou algumas palavras,
logo garras de areia brotaram do chão, bem abaixo da criatura, cercando-a.
A jaula foi se fechando até que a criatura já não podia mais ser vista, mas
antes que a prisão esmagasse seu prisioneiro a areia se tronou negra e
uma pantera ainda maior apareceu em seu lugar.
Nesse momento, a pantera que cercava Amrod e a que lutava
contra Adara se juntaram a que havia sido presa pelo guerreiro do
deserto, e as três juntas ganharam o tamanho de um homem. La em
baixo Miriel matara a outra fera e já começa a subir a duna novamente.
- Parece que não deu muito certo sua mágica! – provocou Adara.
Antes mesmo que Utbah responde-se a provocação, o monstro
das areias avançou contra o minotauro dando-lhe uma patada e
jogando-o longe, a luz voltou a aparecer, mas não foi suficiente para
desfazer a fera gigante.
A arqueira lançou mais uma flecha contra a pantera e dessa vez
a flecha fincou sua pele de areia mágica. A criatura rugiu e a encarou, se
contraiu e preparou o bote e então na hora de avançar sobre Adara, o
monstro gritou de forma excruciante.
Localizadora, a espada de Miriel atravessara a criatura causando-
lhe um ferimento mortal. Partes do monstro se desprendiam e iam ao
chão, retornando a sua tonalidade padrão de areia, deixando de serem
negras. Miriel guardou sua espada e andou em direção a Adara, enquanto
Utbah ajudava Amrod a se levantar e pegar seu machado.
- Ótima recepção. – Disse Adara.

38
Batalha no Deserto
- Não sei se foi a nossa aproximação, ou se foi minha espada, mas
algo avisou o mago que estávamos chegando. – Ponderou Miriel.
- Temos que chegar a torre, é lá que o feiticeiro está. – Completou
Utbah.
- Odeio panteras... – Resmungou o minotauro, enquanto se
levantava.
Os quatro desceram a duna e entraram no oásis. As palmeiras
não cresciam tão juntas como as árvores de uma floresta, mas eram
abundantes. Pequenos insetos começaram a rondar suas orelhas assim
que adentraram aquela área.
Após tantos dias no deserto a visão de tanto verde era até
perturbadora. Ali eles sentiram a umidade do ar aumentar drasticamente
e a temperatura agradável da noite voltou a ser quente. O avanço pela
mata era difícil e eles sentiam que algo estava à espreita.
No entanto antes do que pensavam eles chegaram ao grande
lago de água doce, o “Espelho do Infinito”, como era conhecido o lago
antes da chegada do mago, antes da construção da torre de mármore
negro.
A torre se erguia na outra margem do lago, seu reflexo podia ser
visto por completo no lago, e junto com ele a Lua e as estrelas brilhavam
na água doce. O grupo saiu da mata e começou a ladear o lago, indo
em direção a torre, porém antes que chegasse a metade do caminho
criaturas humanóides, escuras como a torre, saíram de dentro do lago,
deixando um rastro de água por onde andavam.
As criaturas aquosas cercaram o grupo, que já estava preparado
para o combate. Miriel foi o primeiro a avançar. Empunhando sua
espada, atacou uma das formas humanóides que se partiu ao meio. A
água que formava a criatura explodiu no chão, dando um banho no
caçador de magos.
A batalha contra as criaturas da água foi rápida. O grupo atacou
não dando chance de reação as formas aquosas invocadas pelo feiticeiro.
Eles logo terminaram de contornar o oásis e então ficaram frente a
frente com a torre. Entraram.
Na base da torre não existia nada além do começo de uma
escadaria que levava até o topo, onde ficava o salão do feiticeiro. Iniciaram
a subida sem demora e sem contratempos chegaram ao último andar,
39
Batalha no Deserto
mas lá não encontraram o feiticeiro.
Um andar praticamente vazio, as únicas coisas que ali se
encontravam eram um tapete vermelho de realeza, um trono, um orbe
sobre uma mesa e uma mulher que os encarava com um olhar cheio de
ódio, carregava consigo um cajado, que apontava em direção ao grupo.
- Intrusos, vocês devem morrer por terem invadido meu
santuário, meu território!
- Utbah, não era um feiticeiro? – perguntou Adara.
- Essa é Sinara, ela passou há poucos dias pela aldeia e outra guia
a trouxe até a Torre. Ela não retornou, nós achamos que havia morrido
aqui.
- Mas então o que isso significa? – perguntou Amrod. – Ela era
o feiticeiro?
- Não faço idéia, Amrod, mas pelo visto ela não está muito a fim
de conversa. – disse Miriel.
A maga murmurou algumas palavras e ao seu lado surgiu uma
pantera, idêntica aquela que atacara o grupo nas dunas, e do outro lado
surgiu uma criatura aquosa, como aquelas enfrentadas ao pé da Torre.
- Ataquem! – ordenou avançando também para o combate.
Amrod correu em direção a pantera, enquanto Utbah lutava
contra a criatura das águas. Miriel e Adara lutavam contra a maga. As
flechas disparadas pelo arco de Adara eram repelidas magicamente pela
maga, porém, suas magias não surtiam efeito nenhum contra Miriel e
suas proteções anti mágica.
O minotauro, utilizando-se de sua magia branca, venceu
rapidamente a pantera e Utbah com suas técnicas de areia sugou toda a
água encantada que formava a criatura aquosa, logo eles se juntaram aos
outros dois na batalha contra a maga.
Entendendo que não teria chances de vencer aquele combate
contra os quatro guerreiros, Sinara bateu em retirada, desaparecendo em
meio a batalha, deixando o grupo no último andar da Torre de Mármore
Negro, que tremia e ameaçava cair.
Os quatro iniciaram a descida da torre em disparada, tentando
chegar ao oásis antes que a torre o fizesse. Eles saíram da torre segundos
antes que ela desabasse a suas costas. A areia subiu impossibilitando que

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Batalha no Deserto
qualquer coisa pudesse ser vista, mas não privando os guerreiros de sua
audição. E nesse momento um grito foi ouvido.
Quando a areia baixou Miriel foi o primeiro a ver Adara no
chão, em meio a uma grande poça de sangue. Não havia mais vida ali.
A maga havia se vingando, eles ficariam com o oásis, mas nunca mais
veriam a arqueira. No oásis não havia mais nenhum sinal de que uma
torre estivera ali, nem se quer uma única pedra negra habitava mais
aquele oásis.
- Não! Adara, não! – gritou Miriel.
Utbah e Amrod se aproximaram de Miriel que segurava Adara
contra seu peito, a tristeza tomou seu corações ao mesmo tempo que o
ódio lhes inflamava o peito.
- Eu vou caçá-la! Eu vou caçá-la até que não haja mais canto
para você se esconder! – gritava Miriel.
- Nós vamos, Miriel, nós vamos caçá-la! – disse Amrod.
- Vocês me ajudaram a devolver o oásis a minha aldeia, eu estou
em debito com vocês. Ajudarei na busca por Sinara. – disse Utbah.
Os três sepultaram Adara no oásis, o único local do deserto onde
Adara se sentiria bem. Seu túmulo foi construído onde antes havia a
Torre de Mármore Negro e logo depois de seu funeral realizado pelo
clérigo minotauro o novo grupo seguiu viagem pelo deserto, a procura
de Sinara.

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A Boneca

A Boneca
O corpo frágil jazia sob o chão molhado, fugitivo de seus
donos. Um sorriso estava estampado no rosto de boneca de porcelana,
porém os olhos inchados pelas lágrimas revelavam o que realmente
sentia. A chuva que caía violenta parecia ignorá-la, assim como todo o
resto do mundo. Era uma mulher amaldiçoada pela dádiva celeste.
Seus tristes olhos negros acompanhavam aquele que homem
que se aproximava. Viram-no se abaixar e tocar-lhe a face, viram seus
lábios se moverem para falar algo a ela:
—Qual seu nome? – ele perguntou.
A mulher nada respondeu. Não desejava ignorá-lo, porém aquela
pergunta não poderia ser respondida. Jamais tivera um nome, de onde
veio ninguém necessitava deles.
Fechou os olhos e se abandonou naquelas amargas memórias.

O quarto era escuro. Não haviam janelas e a única fonte de luz


era um velho lampião que um homem vinha conferir todos os dias. Não
tinha nenhum tipo de móvel ou decoração, exceto por aquele lampião.
Lá vivia junto a outras meninas, todas tão crianças como ela.
Todos os dias quando o homem vinha verificar o lampião trazia
também uma tigela com algo que vagamente lembrava comida. Ela era
a menor e mais fraca de todas, portanto nunca lhe sobrava nada. Talvez
conseguisse pegar algo se tentasse, mas não sentia que era necessário
fazê-lo. Nunca sentira fome logo não havia razão para que comesse.
Vez ou outra o homem vinha acompanhado de outro que parecia
examinar as meninas. Naquelas não tão raras ocasiões uma garota
sempre era levada para fora do quarto e voltava, horas depois, vestida
com roupas novas. Ela sempre quis saber para onde as outras meninas
eram levadas, pois aquilo nunca lhe tinha acontecido. Imaginava que se
se comportasse talvez pudessem levá-la da próxima vez.
Vários anos se passaram naquela situação. De tempos em tempos
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A Boneca
as garotas eram levadas embora e outras, mais jovens, eram trazidas em
seus lugares. A certa altura percebeu que eram mandadas embora as
meninas que mais ganhavam roupas novas. Sentia inveja delas, pois
também gostaria de poder, mesmo que por algumas horas, sair daquela
prisão. Sonhava todas as noites com o dia em que sairia por aquela porta
para não mais voltar.
Eis que um dia o homem do lampião entrou acompanhado de
outro, um sujeito muito vistoso. Viu que o sujeito bonito apontara para
ela. Uma pequena discussão entre os dois homens se seguiu, ao final da
qual se viu atravessando a porta. Seu momento finalmente chegara.
Foi levada para outro quarto, dentro da mesma casa, porém
completamente diferente do qual normalmente ocupava. Uma grande
janela permitia que a luz pálida do luar entrasse no cômodo, dando aos
móveis um ar belíssimo. Havia uma enorme e macia cama, forrada com
bonitos lençóis e, ao lado dela, ficava uma cômoda, sobre a qual havia
um objeto que lhe despertou o interesse. Era uma pequena caixa cor-
de-rosa, com uma chave ao seu lado. Virou-a de todos os modos até que,
virando a chave, conseguiu abri-la. De dentro surgiu uma pequena e
elegante boneca que rodopiava ao som de uma doce melodia. Por longos
minutos ela assistiu a aquele espetáculo, maravilhada. Não conseguia
compreender aquilo, mas se encantava com a maneira sempre elegante
da boneca.
Subitamente foi tirada do seu estado de deslumbramento pelo
som da porta se fechando. Viu o homem garboso de antes aproximar-se
dela, que se encontrava sentada na cama. Ele acariciou-lhe os cabelos
e sorriu-lhe docemente. Aqueles gestos fizeram algo dentro dela
tremer. Não compreendia aquilo, porém a sensação se repetiu quando
ele encostou os lábios nos seus. Naquele instante sentiu-se confusa e
perdida. Teve vontade de afastá-lo de si, porém temia o que poderia lhe
acontecer e acabou por entregar-se. Quando finalmente se separaram,
ele colocou as mãos sobre seus ombros e, com esforço quase nulo, fez-lhe
o vestido cair sobre a cama. Daí em diante não conseguiu compreender
nada mais, porém desejou gritar e fugir quando ele a invadiu. Seu corpo
infantil, despreparado para aquela situação, não sabia como reagir. De
início tentou resistir, mas a força do outro era maior. Correu os olhos
para a boneca que, alheia a tudo, rodopiava elegante ao som da música
infantil sob a luz fria do luar. Naquele momento entendeu que também
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A Boneca
era uma boneca, um brinquedo destinado a ser usado por homens.
Resistiu àquela idéia com todas as forças, porém não tardou para que
seu corpo não mais resistisse. Tinha doze anos quando cedeu à sua sina.
Durante os anos que se seguiram, aquela situação se repetiu
incontáveis vezes. Pouco a pouco foi tomando maior conhecimento
de sua situação e também de suas capacidades. Já havia se passado
algum tempo desde que notara que não era como as outras garotas.
Diferentemente delas não necessitava de comida para viver e quando
ferida não sangrava ou sentia dor. Havia algo de errado com seu corpo,
porém isso poderia lhe ser a chave para a liberdade.
Por semanas pensou numa maneira de fugir, enquanto isso testava
os limites de seu corpo. Os pregos cravados na carne não lhe causavam
dor, o vidro que normalmente rasgaria a garganta ao ser engolido lhe
era alheio e nada sentia ao mergulhar de cabeça contra o chão. Nada
lhe causava dano. Poderia executar o plano, porém ainda restava um
empecilho. Outras garotas tentaram fugir antes delas e nessas ocasiões
teve a oportunidade de ver que outros homens trabalhavam com o do
lampião. Eles não poderiam matá-la, entretanto sabia que não poderia
fazer frente à força deles. Teria de garantir que não a seguiriam, e sabia
só haver um modo de fazê-lo.
Não tardou para que fosse chamada mais uma vez. O homem
que a desejava era velho, gordo e decrépito, mas talvez fosse melhor
assim. Se fosse jovem poderia tentar impedi-la. Porém a idéia de ter de
se entregar àquele homem a enojava.
Entrou no quarto como faria em qualquer outra ocasião
daquelas e o velho a seguir. Deitou-se na cama e sua carne velha e
encardida esparramou-se sobre o lençol. Uma imagem verdadeiramente
repugnante. O rosto horrível daquele homem a chamava de um modo
que a ofendia mais que qualquer outra coisa. Fugiria agora, pois jamais
se perdoaria se deixasse que aquele ser a invadisse.
Estava prestes a executar o plano quando a viu. A pequena
caixa de música, agora envelhecida e desbotada, jogada num canto. Não
deveria levar nada daquilo para sua vida, porém aquele objeto significava
muito para ela. Sabia que não teria coragem de deixá-la para trás, sendo
usada por homens como aquele. Recolheu-a carinhosamente e acariciou
sua tampa esbranquiçada. Seriam livres, as duas.

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A Boneca
Olhou para a janela para a qual tantas vezes desviou o olhar
enquanto era forçada a dar-se para homens que odiava, ou na melhor
das hipóteses desprezava. Agora ela seria um instrumento de libertação.
O velho gordo já se levantava para buscá-la quando enfim entendeu
que não poderia adiar aquilo por um instante mais. Ergueu a cabeça,
orgulhosa e correu para a janela. Com um salto atravessou-a e viu o
vidro tentar rasgar-lhe a pele.
Por um instante vislumbrou os prédios que se erguiam como
lanças negras apontadas para o céu. Sentiu-se livre enquanto pairava no
ar e, mesmo quando o vento passava furioso pelos seus ouvidos, sorriu.
Fechou os olhos e entregou-se ao sonho, apenas para vê-lo desfazer-se
no instante em que tocou o chão.
Ainda caída procurou pela caixa de música. Encontrou-a ao
seu lado, intacta. Sorriu. Ainda estava livre. Pegou o objeto e pôs-se a
correr com toda a força de seu corpo. Sabia que não tardariam a buscar
seu corpo e assim que descobrissem que não morrera, iriam caçá-la.
Ninguém escapava deles, não com vida.
Por longos minutos correu sozinha por entre as ruas que nunca
antes vira. Aquela situação lhe era nova e a cada beco sem saída o
desespero crescia em seu peito. Finalmente chegou a um rio. A correnteza
era forte e qualquer um pego por ela morreria, sem dúvidas.
Olhou para a caixa em suas mãos. Não queria abandoná-la,
porém aquela era sua melhor chance de salvação.
Desceu à margem do rio e procurou por um lugar onde pudesse
depositar aquele que tanto apreciava. Encontrou um ponto que poderia
ser facilmente visto por seus perseguidores. Por várias vezes ensaiou
depositar a caixa lá, porém em nenhuma conseguiu soltá-la. Não queria
se separar da única coisa que lhe era igual, mesmo que isso pudesse ser
um erro. Abraçou o brinquedo com um sorriso tristonho. Não poderia,
não queria deixá-lo para trás. Decidiu rasgar um pedaço do vestido e
prendê-lo em algum lugar. Teria que servir.
Caminhou até o rio. Começara a chover e em pouco tempo a
correnteza se tornaria ainda mais violenta. Deveria agir agora ou poderia
não ter outra chance. Prendeu a caixa entre os seios, sob o vestido, e
sorriu melancólica. Jamais testara se conseguiria sobreviver sem ar.
Talvez morresse naquela tentativa, porém sabia que se não o fizesse

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A Boneca
seria pega e levada de volta à clausura. Para ela morrer era um destino
melhor. Respirou profundamente, deixando o ar frio da noite encher
seus pulmões, e entregou-se às águas bravias.
Então veio a escuridão.
Quando enfim despertou estava jogada numa margem qualquer,
em meio à lama. Estava imunda, suja de barro e de dejetos, mas sorria.
Libertara-se enfim. Sentiu, porém, que faltava algo sem o qual tudo
se tornava vão. Procurou a sua volta pela caixa de música, mas não a
encontrou. Caiu no chão, esgotada, pois sem aquele objeto nada fazia
sentido. A fuga fora inútil, assim como todo seu sofrimento. Fechou os
olhos e entregou-se ao pranto. Tentou recordar a doce melodia que fazia
a boneca rodopiar. Sua mente viajou até o dia em que chegara à casa e
daí para o dia em que vira a caixa pela primeira vez. A música ecoou
em sua mente, quase como se estivesse lá. O som se aproximava cada
vez mais até que, quando abriu os olhos, viu aquele homem com a caixa
em mãos. Permitiu-se sorrir para ele, que acariciou seu rosto de boneca.
Aquele gesto era diferente dos que tantos outros homens haviam feito,
aquele toque era gentil e afetuoso:
—Qual seu nome? – ele perguntou.
Não poderia responder, pois jamais tivera um nome, porém não
queria que ele se sentisse ignorado. Sorriu tentando fazê-lo entender e
ele retribuiu-lhe o sorriso:
—Tudo bem. – disse o homem – Daqui para frente será meu
Crisântemo, se assim desejar.
O homem estendeu a mão com a caixa para ela que sorriu ao
pegar o brinquedo. Finalmente estava livre e enfim tudo fazia sentido.

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O Engenheiro de Sonhos

O Engenheiro de Sonhos
Ele não conseguia derramar uma lágrima diante daquela
cena. A cabeça de nosso avô havia sido arremessada contra a parede,
rolado e parado próxima ao meu pé. Minha reação era desconhecida,
não sei se chorava, gritava, ou vomitava. Apenas ficava parada feito um
poste vendo aquilo, enquanto o corpo derramava sangue aos poucos,
segurando o cachimbo que meu avô fumava, vestido com o casaco de
lã listrado vermelho, azul e verde que agora era banhado com o tom
escarlate.
Ele desmaiou, finalmente, após ficar quase 5 minutos olhando
para aquilo tinha quebrado o próprio recorde de não reagir ao ver
uma cena forte dessas. Próximo ao corpo havia a bola de boliche que
quebrando a janela acertou em cheio a testa do velho o decapitando
na hora e lançando sua cabeça como uma bola de gude. Havia acabado
de discutir com o moleque por tentar soldar na janela várias placas de
ferro que estavam guardadas na oficina dele, eu também havia levado
uma bronca por não estar o vigiando. Porra! O que eu ia fazer se eu
estava ocupada estudando? Ele já sabia disso, e ao invés de tomar conta
dele, ficou com a bunda gorda e flácida no sofá a tarde toda assistindo
telejornal.
O velho só deu conta do que o guri tava aprontando quando
deixou cair seu cachimbo no chão, e ao pegar vendo ele do lado de fora
soldando as janelas com as placas de ferro. Ao invés de ir lá e dar uma
bronca no garoto, foi no meu quarto e começou a gritar comigo e me
chamar de inútil, mesmo sabendo o que eu estaria fazendo. Após isso foi
até o quintal e puxou a orelha do menino até a sala e o mandou ficar de
castigo, antes mesmo que ele se virasse e o velho dissesse mais alguma
coisa, ele ouve a janela se quebrando e ao invés de se agachar vira para
trás e PLAFT!
Achava que essas coisas só acontecessem em filmes, mas depois
desse dia eu comecei a crer que estava dentro de um. Quando o menino
acordou na manhã seguinte, achando que tudo era outro sonho, começou

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O Engenheiro de Sonhos
a chorar e a culpar a si mesmo e a lamentar como um emo chorão.
Eu apenas sentei ao seu lado na cama e acariciando sua cabeça disse:
“Não adianta chorar pelo leite derramado, o que aconteceu, aconteceu.”.
Ele todo emaranhado nas palavras não sabia o que dizer por conta do
choro e da tristeza, foi ai que finalmente se acalmou e disse: “Isso não
teria acontecido se eu tivesse dito ao vovô meu sonho”. Eu levantei as
sobrancelhas fingindo que não estava surpresa, mas estranhei o que
ele tinha dito, mesmo sabendo que crianças tem uma mente fértil e
conseguem imaginar qualquer coisa.
Suspirei e perguntei:”E o que era seu sonho?”, ele secou algumas
lágrimas do rosto e com a voz um pouco rouca disse: “O vovô estava se
barbeando no banheiro com a porta aberta, e então eu chutei a minha
bola de futebol contra a parede do lado de fora e ela bateu nela indo
pro espelho o quebrando”. Era curioso isso, mas o que teria haver com
o jeito do vovô ter morrido? Como eu suspeitava, apenas imaginação
fértil. Foi ai que eu disse a ele para dormir mais um pouco e se quisesse,
poderia matar aula que eu iria ligar para a escola avisando que não iria.
Ele dormiu, mas parecia temer algo, pois gemia e chorava ao mesmo
tempo, como a gente dormia no mesmo quarto eu não conseguia me
concentrar em nada com ele fazendo esses barulhos.
O acordei e ele num impulso agarrou minha blusa ao me
ver, dizendo: “Por favor! Eu juro que não tive culpa dele ter caído do
carrinho bate-bate! Apenas bati no dele por trás, mas foi um acidente!”.
Nessas horas pensava que o vovô deixava ele beber o que tinha dentro
do armário dele.
Achava que no dia seguinte essa história toda iria ter um fim, mas
infelizmente me enganei...
“Natan C. Wilson de 15 anos morreu após ser jogado de um
automóvel em movimento pelo próprio pai, tendo seu corpo destroçado
por outro veiculo que vinha atrás e o atropela.” E adivinhem? O veiculo
era o meu, mas quando fui para o interrogatório me inocentaram, já que
o veiculo acabava de sair da oficina, e culparam o Eichel, meu ex e dono
dela por serviços mal-prestados com risco de segurança. Nunca ouvi
falar dessa lei, mas independente do porque fiquei feliz em ter saído
ilesa.
O pai de Natan odiava o garoto assim como meu avô nos odiava,

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O Engenheiro de Sonhos
até mais se duvidar, mas como eu não sabia muito da vida dele, apenas
o meu Gustavo... Sim, ,meu irmão, o que diz ter sonhado com a morte
do avô, meu nome é Angeline, não se iludam com o meu nome, me
dizem que o que tenho de celestial no nome o diabo em pessoa tem
de compaixão. As vezes imaginava que com o tanto de pessoas que o
culpavam por qualquer merda que faziam, ele era merecedor daquilo
que diziam que ele tanto negava.
Voltando ao assunto do moleque amigo do meu irmão, a
aparência dele após o acidente ficou tão bizarra que descreve-la seria
insuficiente, parece que não estou tão abalada quanto a isso, estou um
pouco por conta do jeito que ele ficou após o ocorrido, mas francamente,
para que me importar com acidentes alheios? Ele não era ninguém em
especial para mim, apenas para o meu irmão, que ao contrário de minha
pessoa, ficou tão traumatizado quanto ficou no incidente com a bola de
boliche. Alias, até hoje fico indagando sobre aquela morte.

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